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Edelton Gloeden A carreira consolidada do professor e músico
VIOLAO
Yamandu Costa
Ano 1 - Número 3 - Novembro 2015 www.violaomais.com.br
A interpretação lapidada do virtuose cheio de personalidade
E mais:
Nova coluna: Sete Cordas Conheça o bouzouki grego O repique na viola caipira Como tocar samba O uso do polegar no flamenco
Exclu Curso sivo! de vio lão popu com v lar ídeoa ulas
editorial
Chegamos à edição nº 3! Os últimos três meses passaram rápido demais. Não dá para acreditar que já está no ar a terceira edição de Violão+. Nem dá tempo de comemorar uma, já vem outra. Então, não falemos nada, vamos trabalhando assim, de modo contínuo. E todo mês a gente coloca no ar o fruto desse trabalho. Sabia que iria dar muito trabalho, mas não tanto. Também sabia que seria prazeroso. É muito mais do que eu imaginava! Muita gente entrando em contato, muita gente querendo que dê certo... E está dando! As surpresas que preparamos para você, leitor da Violão+: uma nova coluna, que muito fez falta nas duas primeiras edições: Violão 7 cordas. Nosso colaborador Cleber Assumpção nos fala sobre esse instrumento, que extrapolou as rodas de choro e vive também (muito bem!) nas mãos de solistas como o nosso entrevistado de capa, Yamandu Costa. Em conversa antes de um show no SESC Pompeia, Yamandu nos falou sobre suas influências e como vai a carreira, além de traçar um paralelo interessantíssimo entre o popular e o erudito. E ainda tocou uma música exclusivamente para nós! Também conversamos com o professor Edelton Gloeden, que está completando 60 anos de idade e 30 de USP. Muita história para contar! Na Coda, o relato de uma visita-homenagem ao grande compositor, professor e maestro Edmundo VillaniCôrtes, que acaba de completar 85 anos, com saúde, energia e produção musical. E uma paixão inconteste pelo violão, instrumento ao qual se dedicou antes de ir para o piano. Confira. Para nos livrar das vírgulas mal colocadas e das palavras mal escritas, mais uma colaboradora: Valéria Diniz, que começou com algumas colunas e seções desta vez (De ouvido, Violão Brasileiro, Iniciantes, Sete Cordas, Mundo), mas terá muito trabalho conosco a partir das próximas edições. Grande abraço, espero que esteja no ponto certo! Luis Stelzer Editor-técnico
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VIOLAO Ano 1 - N° 03 - Novembro 2015
Os artigos e materiais assinados são de responsabilidade de seus autores. É permitida a reprodução dos conteúdos publicados aqui desde que fonte e autores sejam citados e o material seja enviado para nossos arquivos. A revista não se responsabiliza pelo conteúdo dos anúncios publicados.
Editor-técnico Luis Stelzer
[email protected] Colaboraram nesta edição Alex Lameira, Breno Chaves, Cleber Assumpção, Fabio Miranda, Flavio Rodrigues, Luisa Fernanda Hinojosa Streber, Reinaldo Garrido Russo, Renato Candro, Ricardo Luccas, Rosimary Parra e Walter Nery
índice 4 Você na V+
34 Mundo
8 Em pauta
36 De ouvido
12 Retrato 20 Vitrine
40 Como estudar 41 Violão brasileiro 44 Siderurgia
62 Flamenco
48 Iniciantes
64 Improvisação
22 Yamandu Costa
54 Sete cordas
66 Classificados
32 História
59 Viola caipira
67 Coda
Publisher e jornalista responsável Nilton Corazza (MTb 43.958)
[email protected] Gerente Financeiro Regina Sobral
[email protected] Diagramação Sergio Coletti
[email protected]
Foto de capa Matheus do Val Publicidade/anúncios
[email protected] Contato
[email protected] Sugestões de pauta
[email protected]
Rua Nossa Senhora da Saúde, 287/34 Jardim Previdência - São Paulo - SP CEP 04159-000 Telefone: +55 (11) 3807-0626
você na violão+ Duo Siqueira Lima
Adorei a entrevista com o Duo Siqueira Lima. Cecília e Fernando são realmente incríveis em todos os sentidos! Muito boa a revista! Parabéns! (Joana Fátima Gonçalves, em nossa página no Facebook) Maravilhosos! Adorei o apoio dos pés! (Max Riccio, em nosso canal no Youtube) Está linda demais! Obrigado queridos Nilton e Luis! Excelentíssimo trabalho! (Cecilia Siqueira, do Duo Siqueira Lima, em nossa página no Facebook) V+: O Duo Siqueira Lima realmente é incrível, tanto pela musicalidade e competência quanto pela simpatia. prova disso é o vídeo exclusivo que gravaram para nosso canal no Youtube. O objetivo de Violão+ sempre será o de apresentar os protagonistas do universo violonístico, referências para todos aqueles que desejam se dedicar a esse instrumento.
Segunda edição
Muito bom! Essas publicações fazem muita falta. Vida longa para Violão+! (Eduardo Knaip, em nossa página no Facebook) Muito Legal, gostei muito! Parabéns a todos os colaboradores! (Nelson Moraes, em nossa página no Facebook) Acabei de ler a revista. Está muito bem feita, com matérias interessantes a todo tipo de público. Parabéns, Luis Stelzer e toda a trupe! Vocês merecem muito sucesso! (Iara de Rossi, em nossa página no Facebook) A edição n° 2 está ótima! Eu já tinha achado superlegal (e profissional) a primeira edição, mas esta segunda parece ter mais “substrato”, mais conteúdo. As entrevistas do querido Chico Saraiva e do superduo Siqueira Lima estão muito boas, nem muito formais, nem muito informais, e com informação interessante, sem “bull shit”. Parabéns, pessoal! (Conrado Paulino, em nossa página no Facebook) 4 • VIOLÃO+
você na violão+ Obrigado
V+: Agradecemos a todos pelas mensagens, das quais as publicadas aqui são uma pequena amostra. O fato de termos professores e violonistas de categoria entre nossos leitores muito nos honra e, ao mesmo tempo, nos acarreta maior responsabilidade. Esperamos poder sempre atender às expectativas de um público tão seleto e disseminar informações aos estudantes de qualquer nível e todos os amantes do violão. Todas as sugestões e críticas são muito bemvindas e nos ajudarão a aprimorar cada vez mais nossa revista.
Assinatura
Salve! Parabéns pela revista. Gostaria de saber se há versão impressa, se posso assinar e como posso adquirir os arquivos de todas as edições. Obrigado. (Wellington Farias, por e-mail) V+: A revista Violão+ é digital e pode ser acessada e baixada pelo site www.violaomais.com.br. Não há versão impressa, mas, se você quiser, pode baixar a versão PDF e imprimir as páginas que desejar.
Mostre todo seu talento! Os violonistas do Brasil têm espaço garantido em nossa revista. Como participar: 1. Grave um vídeo de sua performance. 2. Faça o upload desse vídeo para um canal no Youtube ou para um servidor de transferência de arquivos como Sendspace.com, WeTransfer.com ou WeSend.pt. 3. Envie o link, acompanhado de release e foto para o endereço
[email protected] 4. A cada edição, escolheremos um artista para figurar nas páginas de Violão+, com direito a entrevista e publicação de release e contato. Violão+ quer conhecer melhor você, saber sua opinião e manter comunicação constante, trocando experiências e informações. E suas mensagens podem ser publicadas aqui! Para isso, acesse, curta, compartilhe e siga nossas páginas nas redes sociais clicando nos ícones acima. Se preferir, envie críticas, comentários e sugestões para o e-mail
[email protected] VIOLÃO+ • 5
você na violão+
Duo Dois em Um Formado pelos violonistas Gabriele Leite e Marcelo Brito, alunos do conservatório de Tatuí, o Duo Dois em Um tem como objetivo executar músicas de diferentes períodos, mas com ênfase em músicas brasileiras. Orientados desde 2012 pela professora Márcia Braga, os integrantes do duo participaram, com colocações destacadas, de vários concursos de violão, como Souza Lima, Musicalis e Prêmio Incentivo à Música de Câmara. A integração de Gabriele e Brito, aliada ao som cristalino que o duo produz em seus instrumentos, chama a atenção, tanto pela juventude de ambos quanto pela interpretação madura de peças dos mais variados períodos. É mais um grupo a enriquecer o cenário violonístico brasileiro. 6 • VIOLÃO+
CD-60 CE
CLASSIC DESIGN SERIES
Mahogany
Black
Natural
Brown Sunburst
Os violões eletroacústicos CD-60 CE oferecem sonoridade e visual sofisticados. A combinação do tampo em Spruce laminado, com laterais e fundo em Nato, captação Fishman Isys III (ativa), Tarrachas Die-Cast cromadas, braço em Nato com escala em Sonokeling (Black, Natural e Sunburst) e Mahogany (Mahogany) de 20 trastes garantem sons ricos e encorpados. Importantes upgrades incluem um novo projeto de ponte, friso do bocal em madre-pérola e novo escudo. Os primorosos acabamentos Mahogany, Black, Natural e Sunburst oferecem classe e estilo aos instrumentos, que vêm acompanhados por um exclusivo case “Hardshell” original Fender.
Case “Hardshell“ Original Fender
/FenderBrasil
Captação Fishman Isys III
Novo Projeto de Ponte
www.fender.com.br
Friso em Madre-pérola
Tarrachas Die-Cast
EM PAUTA
BRASILEIRO VENCE CONCURSO TÁRREGA
O baiano, radicado na Europa há sete anos, João Carlos Victor Alves, venceu a 49ª Edição do Concurso Internacional de Violão Francisco Tárrega, realizado em Benicàssim, na Espanha. Ele concorreu com 28 candidatos de 17 nacionalidades distintas, sendo finalista do certame com dois artistas coreanos e um cubano, nesta que é uma das competições de performance musical mais importantes do mundo. Em 49 anos de existência do concurso, o violonista foi o segundo brasileiro a conseguir o feito, anteriormente conquistado pelo paulista Fábio Zanon. 8 • VIOLÃO+
EM PAUTA
SUPERSÔNICO
Para aqueles que querem turbinar as possibilidades do violão, o músico Robin Sukroso criou oACPAD, gadget que permite tocar diversos tipos de sons, tais como baterias, baixos e até mesmo orquestra, mantendo as mãos no instrumento. A tecnologia consiste em uma fina placa de polímero adesivo que pode ser fixada no tampo do violão e serve de interface entre o músico e o computador, além de oferecer dois loopers, dez configurações, dois sliders e oito teclas, todos customizáveis. Com a possibilidade de recarga via USB, o que garante algo em torno de 5 a 6 horas de uso ininterrupto, o acessório – que tem todos os circuitos construídos em ouro - se conecta ao computador por meio de um cabo ou dispositivo USB wireless, graças a uma entrada mini USB. O ACPAD deve estar disponível para venda a partir de junho de 2016, mas já pode ser comprado por cerca de R$ 1.000 diretamente com o inventor.
História preservada Fundada em 1900, a Giannini comemora 115 anos de existência e, cada vez mais, quer ver sua história documentada. Entre as comemorações, a empresa reuniu folhetos e catálogos de produtos antigos e os disponibilizou, gratuitamente, para download e consulta, em seu site. Ali estão reunidas raridades desde a década de 1950 até hoje. Além disso, uma série de vídeos apresenta importantes músicos e produtores contando um pouco da relação deles com a marca. E você pode participar da promoção “Eu Faço Parte Dessa História” e concorrer a uma craviola. Mais informações, aqui.
VIOLÃO+ • 9
EM PAUTA
RELÍQUIA Um violão de John Lennon, aparentemente furtado em 1963, foi leiloado no início de novembro, nos Estados Unidos, por aproximadamente R$ 9 milhões (US$ 2,4 milhões). O instrumento foi usado pelo Beatle para gravar os primeiros sucessos do grupo, como “Love Me Do” e ““PS I Love You””. A Gibson acústica J-160E, de 1962, sumiu durante o Beatles Finsbury Park Christmas Show e ficou desaparecida por mais de 50 anos. No ano passado, surgiu a notícia de que o violão estaria em poder de John McCaw, um aposentado americano que o comprou em uma loja de penhores no final dos anos 60 por US$ 275, sem saber da importância do instrumento. McCaw descobriu que tinha uma relíquia em seu poder quando viu uma foto do violão em uma revista de música e reconheceu o número de série do instrumento. Ciente da possível polêmica por leiloar um instrumento furtado, McCaw decidiu que metade do dinheiro da venda será doado à Spirit Foundation, ONG dirigida pela viúva de Lennon, Yoko Ono. 10 • VIOLÃO+
acontece
A capital paraibana realiza de 29 de novembro a 5 de dezembro o Festival Internacional de Música Clássica de João Pessoa, que conta com a participação de 15 músicos de seis nacionalidades. Um dos destaques é o violonista brasileiro Cláudio Faga, além dos violinistas Joris van Rijn (Holanda), Masha Iakovleva (Rússia), Mayu Konoe (Japão) e os brasileiros Alexandre Mandl e Alberto Johnson; os violistas Frank Brakkee (Holanda), Takehiro Konoe (Japão) e Emerson de Biaggi (Brasil); os violoncelistas Michael Müller (Alemanha) e Matias de Oliveira Pinto (Brasil); e o pianista israelense Yoram Ish-Hurwitz. Estão programados 23 concertos e 11 eventos de formação musical gratuitos, realizados em igrejas históricas, como os templos de São Bento, do Carmo, da Misericórdia, Baptista e do São Francisco, e também em pontos turísticos da cidade. Segundo Alberto Johnson, coordenador artístico do festival ao lado de Paulo Gazzaneo, o foco é unir a juventude à experiência dos participantes como forma de intercâmbio e apoio a projetos sociais.
I Concurso Sul-Americano de Violão de Corumbá Sob direção artística de André Espindola e com coordenação de Leonardo Burgos, a cidade de Corumbá realiza, de 11 a 14 de fevereiro de 2016, o I Concurso SulAmericano de Violão de Corumbá e o IV Seminário de Violão de Corumbá. Para participar do concurso, os interessados devem enviar Ficha de Inscrição, cópia de documento de identidade com fotos e link de uma gravação em vídeo da performance do candidato no Youtube até o dia 6 de dezembro para a organização do concurso. Mas corra, porque o número de inscrições é limitado. A taxa de inscrição é de R$ 80. Mais informações podem ser obtidas pelo e-mail
[email protected]. VIOLÃO+ • 11
RETRATO Edelton Gloeden
12 • VIOLÃO+
Por Luis Stelzer
RETRATO
Carreira Consolidada Edelton Gloeden, um dos mais importantes músicos brasileiros da atualidade, fala a Violão+ sobre carreira, festivais, música de câmara e muito mais Edelton Gloeden é Doutor em Artes pela Universidade de São Paulo e professor no Departamento de Música da ECA. Presença constante nos mais importantes festivais de música por todo o Brasil, entre eles os de Campos do Jordão, Brasília, Londrina, Porto Alegre, Ouro Preto, Poços de Caldas, Guaratinguetá e João Pessoa, teve entre seus mestres Henrique Pinto, Eduardo Fernandez, Guido Santórsola e Abel Carlevaro. Referência atual no ensino do violão, apresenta-se em recitais solo, com grupos de câmara, e em concertos com orquestra em todo o Brasil, América Latina, Estados Unidos e Europa. Tem se dedicado intensamente ao repertório brasileiro, realizando inúmeras primeiras audições de obras de compositores como Francisco Mignone, Camargo Guarnieri, Cláudio Santoro, Mário Ficarelli, Paulo Costa Lima e Gilberto Mendes.
De 1994 a 2008, foi o produtor e apresentador do programa Violão em Tempo de Concerto, transmitido semanalmente pela Rádio USP-FM da Universidade de São Paulo, e de séries especiais sobre o repertório violonístico realizadas para a Rádio Cultura FM de São Paulo. Também foi diretor artístico das quatro edições do Festival Internacional de Violão Leo Brouwer, com a presença do artista cubano e de alguns dos maiores nomes internacionais do instrumento, organizado pela USP, SESC e Instituto Cervantes em São Paulo. Em sua discografia, destacam-se os CDs Uma Festa Brasileira, com violão e flauta (Paulus), Os Anos 20 (EGTA) e, com o Quarteto Brasileiro de Violões, Encantamento, Essência do Brasil e Four Bach Suites for Orchestra (Delos International - EUA). VIOLÃO+ • 13
RETRATO Violão+: Você estudou com grandes mestres do violão e cita quatro em especial: Henrique Pinto, Eduardo Fernandez, Guido Santórsola e Abel Carlevaro. São quatro didáticas diferentes. É possível dizer em que cada um contribuiu ou te influenciou em sua forma de tocar e lecionar? Comecei com um aluno do Henrique Pinto, que teve carreira muito curta como professor porque abraçou outra profissão. Ele me passou para o Henrique, com uns dois anos de iniciação musical. Fiz o conservatório com ele, durante uns quatro anos, depois fiquei em contato constante durante muito tempo, desde 1969 até quando entrei na USP, em 1985. O Henrique me abriu o conhecimento do violão clássico, não só pelas aulas, mas também por gravações, me levou para os grandes cursos de violão de Porto Alegre, nos anos 1970, onde tive contato com Carlevaro, Santórsola e Eduardo Fernandez. Também me ajudou muito com empréstimo de instrumentos e o livre acesso ao seu arquivo de partituras e discos. Nos anos 1970, ele tinha uma biblioteca e uma discoteca muito atualizada. Tudo o que havia na
Edelton Gloeden: linhagem de grandes mestres 14 • VIOLÃO+
Europa e nos Estados Unidos, tudo o que saía de gravação, ou edição, me favorecia o acesso. Também os cursos do Conservatório do Brooklin (São Paulo – SP), onde a gente formou uma espécie de equipe, o Henrique coordenava. Eram meu irmão Everton Gloeden, Paulo Porto Alegre, Clemer Andreotti e eu, um núcleo de violão dos anos 1980. Em relação ao Carlevaro, tive a oportunidade de trabalhar em Porto Alegre durante um mês com ele, não particularmente, mas em seus masterclasses. E isso foi decisivo em relação ao entendimento da parte mecânica do violão e à técnica a serviço da linguagem musical, os princípios de mão esquerda que ele expõe em seus métodos, com os quais me identifico profundamente. Hoje, ele é citado em vários trabalhos de técnica. Virou referência. Ele era um sujeito tímido, um pouco reservado. Depois, tivemos encontros esporádicos e tive a oportunidade de entrevistá-lo na época do programa na rádio USP. Tenho o registro dessa entrevista. Ao mesmo tempo, tinha as aulas de harmonia e interpretação musical do Guido Santórsola, professor extremamente rigoroso, que exigia uma qualidade de execução muito grande. As lições dos dois foram muito importantes, pois formaram uma espécie de conjunto, técnica e harmonia. E eu tinha também como exemplo os alunos desses seminários, que já eram violonistas brilhantes, com o Eduardo Fernandez, o Miguel Angel Girollet e outros. Violão+: Você já se apresentou muito, como solista e camerista, em todos os lugares do Brasil e do mundo. De posse dessa experiência, o que você
RETRATO pode dizer sobre tocar em câmara com violões ou outros instrumentos, em lugares grandes ou pequenos, amplificado ou não? Como você lida com esse tipo de situação? Gosto muito de espaços pequenos, de preferência, aqueles em que você não precisa amplificar o violão. Inclusive, não uso nenhum sistema de som que eu carregue. Tento ser o máximo seletivo quanto a isso. Mas, quando você tem que tocar com uma orquestra, ou em lugares um pouco maiores, fica sempre um pouco dependente de bons técnicos, de teatros, de acústicas... No Brasil, pelo menos aqui em São Paulo, não temos muitos espaços privilegiados ou adequados para a prática do violão de concerto, em que não se precise muito de amplificação. Estou muito atento a esses novos sistemas, vendo a qualidade, mas ainda não chegamos lá. Estou procurando uma forma de superar isso, porque, às vezes, o público está em lugares grandes. Você não pode ser muito radical nesse aspecto. Violão+: Mas não é a sua preferência... Prefiro o som em alguma sala pequena. Para mim, é o ideal. Algumas igrejas, em que não haja uma reverberação muito grande, também são ambientes que gosto muito de tocar, pois há uma certa atmosfera que favorece o violão. Violão+: E a música de câmara? Sempre adorei música de câmara. Antes do violão, gostava de música em geral. Às vezes, as pessoas começam tocando violão e ficam apenas nele. Mas sempre gostei de ouvir outros instrumentos. Em minha formação, estudei com outros colegas cantores, pianistas, maestros, cantei muito em coro... Até fundei um coro
Adélia Issa e Edelton Gloeden
com o Lutero Rodrigues, nos anos 1970. Estudei também com outros professores, matérias teóricas. Ouvi muito rádio, assisti muitos concertos. Isso me estimulava a tocar com orquestras e outros instrumentos. Já fiz muitos trabalhos com flauta e violão, canto e violão, cravo e violão. Vira e mexe, estou tocando com o Quarteto Cidade de São Paulo. Com minha esposa, que é cantora, fazemos um repertório de canto e violão original. Sempre gosto de repertório original para música de câmara. Acho a experiência de música de câmara fundamental para o violonista, pois abre um horizonte em relação ao que os outros instrumentistas fazem, o que eles pensam com os instrumentos deles. Em muitos casos, até gosto mais de fazer música de câmara do que solo. É gratificante. VIOLÃO+ • 15
RETRATO
Niurka Gonzalez, Leo Brouwer e Edelton Gloeden,
Violão+: Um trabalho marcante seu é o Marília de Dirceu, com cantora Anna Maria Kiffer e a Gisela Nogueira na viola de arame... A Anna Maria Kiffer foi a primeira cantora com quem trabalhei. Meus primeiros recitais profissionais de música de câmara foram com ela e com o grupo Confraria, de música antiga, nos anos 1970/80. Também me meti com a música contemporânea, com o Gilberto Mendes, Festival de Música Nova de Santos. Sempre estou nesses festivais. Saí um pouco do meio restrito do violão. Estava interessado em outras possibilidades, o que me abriu a cabeça e foi muito útil para mim.
Qual é a sensação de apresentar algo nunca tocado antes? Fazendo uma avaliação, não foram tantas obras assim. Na medida em que a minha cultura musical foi seguindo, percebi que havia feito muitas estreias no Brasil sem me preocupar muito com registros. O que me move, a princípio, é gostar da peça. Depois, se ela se encaixa em minha maneira de tocar. Levo muito em consideração isso. Às vezes, é uma peça muito boa, muito importante, mas não cabe na minha mão, não cabe na minha cabeça, aí não faço. Já fiz muita coisa também por encomenda, encomenda de festivais etc. Depois vejo se aquilo fica no meu repertório. Toquei também muito o repertório do Julian Bream aqui no Brasil Violão+: Você lança coisas novas, pela primeira vez. Muitas obras do Leo obras em primeira audição mundial. Brouwer que nunca tinham sido tocadas 16 • VIOLÃO+
RETRATO aqui. Lancei obras do Francisco Mignone. Não tenho um levantamento exato do que estreei. O Eduardo Fernandez mandou uma obra agora para nós, voz e violão. Mas tem que passar pela identificação com a obra, ver o que a obra me oferece e a minha possibilidade de tocá-la.
competência musical. Quem realmente quer seguir uma carreira como violonista e professor, já chega muito preparado para o vestibular. Tenho tido muita sorte com os alunos que aparecem e adoro trabalhar na graduação. Tenho ex-alunos que estão em grandes universidades e escolas de música, espalhados pelo Violão+: Você é professor da USP, Brasil. Outros estão fora do Brasil, que é o objeto de desejo de vários Estados Unidos, Alemanha... Isso, sem violonistas que vão para o curso interceder muito. Nunca fui de dirigir os superior. E está lá há bastante tempo, alunos na carreira. Depois da graduação, desde 1986. Você tem sentido alguma eles têm que se virar (risos). E eles têm mudança no perfil dos candidatos às que ver isso já durante a graduação. vagas de violão? O que mais mudou nesse tempo? O violonista chega hoje Violão+: Mas você sempre gostou de mais pronto? dar aulas... Não vejo muita diferença entre os meus Eu aprendi a gostar. Comecei a dar aulas primeiros alunos e os alunos agora. Tive muito cedo, aos quinze anos. Então, às uma primeira classe de violão privilegiada vezes, era legal. Outras, muito penoso. quando entrei na USP: Camilo Carrara, Houve um momento da minha vida, Paulo Castagna, Cristina Azuma e Fabio em que eu estava no Conservatório do Zanon. O que posso dizer é o seguinte: Brooklin, no início dos anos 1980. Lá, o processo seletivo da USP, às vezes, é eu tinha um ambiente muito legal e uma muito injusto. Não há possibilidade de a grande liberdade para trabalhar. Então, gente escolher exatamente o que a gente comecei realmente a gostar de dar aulas. quer. A gente perde muitos talentos no Um pouco depois dessa experiência, processo seletivo, ou seja, no vestibular. Tem a prova de aptidão antes, depois ele vai para a FUVEST, para as provas gerais. Muitos são barrados aí. A gente manda alunos para essa fase final da FUVEST, com notas altas ou notas médias. E quem entra são os que têm notas médias. Os reais talentos não conseguem muitas vezes. Também nosso processo não é perfeito: um aluno muito talentoso no vestibular, às vezes não corresponde tanto durante o curso, e o contrário também acontece. Alguns que não brilham tanto na prova de aptidão se revelam durante o curso, se mostram fantásticos, de grande Repertório diferenciado: estreias mundiais VIOLÃO+ • 17
RETRATO já estava entrando na USP. E entrei lá muito motivado. É claro, a gente comete uns erros, é normal. As pessoas pensam: nossa, professor da USP, doutor... Mas a gente erra também e tem que correr atrás, o que também é uma forma de aprender. Voltando à época do Brooklin, foi quando comecei a correr o País trabalhando em festivais: Brasília, Ouro Preto etc. Violão+: Os festivais são de uma importância fundamental para o desenvolvimento dos alunos em várias regiões do país. O perfil dos festivais é bem diferente do que era há alguns anos. Antes, eles eram grandes, com duração de um mês. Os cursos pequenos que eram dados aqui em São Paulo eram de duas semanas. Hoje esses eventos são menores, em função de dinheiro, disponibilidade e tudo mais. Embora não pareça nada bom, acaba facilitando que surjam em vários pontos do Brasil. Naquela época, era só Porto Alegre. No Rio de Janeiro, havia o Concurso VillaLobos, que também mexia com o País e até com o exterior. Mas eram poucos. Hoje, temos mais eventos, de menor duração. Também temos a chegada do violão às universidades, que hoje tem um papel muito importante na formação do violonista. Há uma divulgação do instrumento. De norte a sul do país, os professores estão se movimentando, fazendo festivais mais curtos, trazendo gente de fora. Tudo isso é muito importante. Mas com esforço hercúleo. Violão+: Você comandou o Festival Leo Brouwer, que foi enorme. Com 18 • VIOLÃO+
certeza, enormes dores de cabeça também. Para conseguir tudo aquilo, imagino o trabalho que deu... Claro que isso não foi sozinho, é preciso montar uma equipe. O Festival Brouwer foi realmente muito interessante. O meu colega do Departamento de Música, Gil Jardim, regente, é meu conhecido desde a época de estudantes. E a gente pensava na possibilidade do Brouwer vir ao Brasil, o que era uma loucura, ainda mais em tempos de ditadura. Era impossível pensar uma coisa dessas. Um belo dia, o Franceschi, diretor do instituto Cervantes, e o Gil, que acabara de entrar na chefia do Departamento de Música da USP, me chamaram no corredor e falaram: “bola um festival, nós vamos trazer o Brouwer!”. A história começou desse jeito. O Franceschi foi diretor do Instituto Cervantes em Berlim e, depois, transferido aqui para São Paulo. É um cara que adora violão. Fez uma série no Instituto, trazendo vários violonistas espanhóis. Ocorreram quatro edições. Agora, estamos em compasso de espera, tomando fôlego para outros. Fui recentemente a Porto Alegre, em um festival organizado pelo Daniel Wolff, que é professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Foi um festival maravilhoso, internacional, de altíssimo nível. O que é bacana de ver é que esses eventos estão acontecendo. Também aqui em São Paulo, com a entrada do Gilson Antunes na UNICAMP, estamos fazendo um esforço para manter um intercâmbio entre as universidades, fazendo ações, a princípio no campo pedagógico, nos programas de graduação e pós. E um segundo momento, vamos abrir isso para o grande público. Essa é nossa ideia.
RETRATO
Edelton Gloeden VIOLÃO+ • 19
VITRINE
GNC-115 Série Tranquillo Giannini O violão Clássico Acústico GNC-115, comemorativo 115 anos, da Giannini, traz tampo em German Spruce maciço, laterais e fundo em Indian Rosewood maciço e escala em Ébano. As tarraxas são clássicas douradas especiais com botões padrão ébano e o braço, em African Mahogany traz tensor bi-direcional. O instrumento tem acabamento em verniz brilhante e oferece como acessórios case Luxo e umidificador. Giannini Instrumentos Musicais www.giannini.com.br
Ron Emory Loyalty O violão utilizado pelo guitarrista da banda T.S.O.L., Ron Emory, traz acabamento em vintage sunburst dos anos 30 e corpo estilo Slope Shoulder Dreadnought com friso Herringbone. Com tampo em spruce laminado, fundo e laterais em mahogany laminado e braço em mahogany soft “V” shape, o instrumento ostenta headstock estilo 70’s e escala em rosewood com 25.3” (643 mm) com 20 trastes estilo vintage. Pride Music www.fender.com.br
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VITRINE
iRig Acoustic O iRig Acoustic, da IK Multimedia, é primeiro microfone/interface mobile desenvolvido especificamente para violão acústico. O equipamento, patenteado pela empresa, comporta um microfone tipo MEMS de padrão polar omnidirectional, resposta de frequência de 15 Hz a 20 kHz e sensibilidade de -40dBv (1kHz, 94dB SPL) com SPL máximo de 130dB SPL e relação sinal ruído de 63dBA. Se prende à boca do violão por meio de um clipe emborrachado e possui monitoração e saída de linha embutidas para se conectar diretamente a iPhones, iPads, iPod touchs, e demais equipamentos Mac e Android. O iRig Acoustic vem com o aplicativo parceiro AmpliTube® Acoustic - o primeiro desenhado especificamente para violão, performance ao vivo e gravação - que vem carregado com novos equipamentos acústicos. Soundix Brazil www.soundixbrasil.com
VIOLÃO+ • 21
matéria de capa
Por Luis Stelzer
Personalidade
Lapidada O violonista e compositor gaúcho Yamandu Costa é a síntese de muitos estilos, do choro à música erudita, criando interpretações de muita personalidade no violão 7 cordas
yamandu costa Nascido em Passo Fundo, em 1980, e considerado um prodígio do violão, Yamandu Costa começou a aparecer em shows e programas de TV aos 7 anos, ao lado do pai, Algacir Costa. Nascido em meio musical, viajando desde bebê no ônibus do grupo regionalista Os Fronteiriços, aprimorou-se com Lúcio Yanel, virtuoso argentino radicado no Brasil. Até os 15 anos, sua única escola musical era a música folclórica do Sul do Brasil, Argentina e Uruguai. Aos 16 anos mudou-se para São Paulo e em 2001 conquistou o Prêmio Visa de Música Daí, foi para o Rio de Janeiro, transformando-se em sensação nos bares do bairro boêmio da Lapa. Yamandu hoje se apresenta regularmente com importantes grupos orquestrais da atualidade, atuando ao lado de regentes consagrados como Kristjan Jarvi, Kurt Mazur e Roberto Minkzuc, entre outros. Além disso, possui extensa e variada
discografia e trabalhos com luminares da música brasileira, como Dominguinhos e Paulo Moura. Yamandu é hoje uma das maiores referências mundiais do violão 7 cordas e inspiração para a jovem geração. VIOLÃO+: Como surgiu o gosto pelo violão? Yamandu – O violão é um instrumento caseiro. Meu pai tocava muito bem. E era todo cuidadoso com o violão dele. Então, ele guardava bem o instrumento, não deixava criança chegar perto, por ter todo um respeito por aquele objeto que ele gostava tanto. Chegou um cara na minha casa, eu tinha uns 4 anos, chamado Lucio Yanel, argentino, que tive a sorte de ter no convívio familiar. Foi o cara que me inspirou a tocar violão. Ele tinha uma personalidade tão forte tocando e tanta generosidade que, quando eu o vi tocando, me dei conta que eu queria fazer aquilo. Queria pelo menos entender
Yamandu Costa: arroubos interpretativos 24 • VIOLÃO+
yamandu costa aquela linguagem. Aí, foi uma coisa meio sem volta. Desde muito pequeno, 4 ou 5 anos, eu já sabia o que queria fazer. Nunca tive dúvida alguma a esse respeito. Então, o foco foi esse: com 5 ou 6 anos, comecei a pegar o instrumento e não larguei até hoje. Digamos, é outra maneira que tenho de me comunicar, através do violão, da música. VIOLÃO+: Até a sua adolescência, seu contato musical foi mais com o que se tocava no Sul do Brasil e nas fronteiras. Como se deu a abertura? Que outros estilos você ouviu, do resto do Brasil e de outros lugares do mundo? Yamandu – Meu pai era um cara que gostava de tudo. Eu ouvia, desde pequeno, o folclore da música argentina, especialmente músicas do norte da Argentina. Foi o que mais me chegou, desde criança. Mas meu pai adorava jazz, música clássica, nos mostrava o choro. Ele fazia questão de tocar choro. Não tocava por profissão, mas porque gostava. Ele falava: meu filho, se você quer tocar música brasileira, tem que conhecer o choro, tem que conhecer a música do nordeste, tem que conhecer a linguagem do frevo. Meu pai era um cara muito aberto nesse ponto. Essa curiosidade de ouvir muitas coisas e querer tocar, herdei dele. E música de fora do Brasil também. Saí um pouco do Brasil e comecei a gostar muito de música cigana, a música das fronteiras da França e da Alemanha... Música cigana em geral, música improvisada. A improvisação é uma coisa que nasce da cultura popular, não é algo que você pensa: ah, vou fazer isso agora. Faz parte de um ambiente de vida musical.
Companheiro: violão 7 cordas
Minha vida musical proporcionou muito esses contatos. Minha família toda tocava em bailes pelo interior do Brasil, especialmente no Sul. Nesse trabalho, a improvisação já é natural. Você é obrigado a dar o seu jeito. Assumi a guitarra dessa banda, guitarra elétrica mesmo, aos 9 anos Então, tive que aprender todo aquele repertório meio de supetão. Eu estava cumprindo uma função familiar ali. Ajudando a família a viver daquele ofício, daquela maneira. Então, senti certa facilidade para entender como funcionava aquilo, e fiz essa função por bastante tempo. Então, a improvisação, diferentemente de muita gente que teve chance de estudar ou VIOLÃO+ • 25
yamandu costa
Refinamento: erudito como caminho
que teve a oportunidade de escolher, no meu caso, foi uma necessidade. De vez em quando, chegava um doidão na noite, eu estava tocando num bar, ele saía cantando, nem perguntava... Eu estava virando músico da noite e acompanhava o cara do jeito que conseguia, ou até o ponto que conseguia. A cultura da improvisação, normalmente, veio da cultura popular, uma vez que você tem que dar o seu jeito de convencer o povo que está te vendo ali. VIOLÃO+: Isso te ajudou a ser mais maleável do que um músico que aprende improviso na escola, por exemplo? 26 • VIOLÃO+
Yamandu – Sem dúvida! É outra maneira de fazer música. Este show, por exemplo, que estou fazendo hoje com o violinista Ricardo Herz (o show ocorreu no SESC Pompeia, em São Paulo, no início do mês de novembro): a gente se encontrou há dois dias, discutimos um monte de coisas, fiquei aprendendo as músicas dele e ele, algumas das minhas. Isso é uma coisa muito bacana: poder fazer assim, ter essa compreensão da linguagem popular, da harmonia da música popular e, rapidamente, decodificar as coisas e ter essa gama de trabalhos. Nunca contei, mas tenho diversos duos com outros músicos. A quantidade é quase infinita, de trios, de quartetos. Meu leque de informações musicais é enorme, graças a essa escola. E é muito legal: você não cansa, está sempre mudando. Tenho uma vida muito dinâmica. Sexta-feira vou estrear uma obra para violão e orquestra que o compositor contemporâneo Vagner Cunha escreveu para mim, para estrear lá no Sul. É muito legal isso, hoje fazendo um show com muito improviso, semana que vem estrear uma peça com orquestra, que é outra coisa, outra forma de estudar, outro tudo. Logo depois disso, volto para casa, faço as malas e vou para a Europa, fazer quatro ou cinco concertos. Há os festivais de violão, que é outro ambiente. E também encontros de jazz. Também toco o repertório solo que faço. É uma oportunidade de ter uma vida muito interessante. Não tem aquela repetição de repertório, não vira uma coisa burocrática. É uma forma de você estar sempre se reinventando, sempre aprendendo coisas novas. Penso que isso é um privilégio.
yamandu costa VIOLÃO+: Você tem duos memoráveis, extremamente difíceis do ponto de vista técnico. Posso citar, entre tantos, um com o Hamilton de Holanda. É de um refinamento impressionante, a gente custa a acreditar que tudo aquilo acontece com menos de seis meses de ensaio. E você me diz que são poucos dias... Yamandu – A vivência do popular! Acredito que esse desequilíbrio que existe entre as duas escolas (o erudito e o popular) é uma perda de tempo, que prejudica todo mundo. Tanto de um lado quanto do outro. É uma divisão que não deveria existir. Me casei com uma violonista francesa, Elodie Bouny, que é de formação clássica, tradicional. Ela teve acesso a grandes professores na França. Tem essa formação do conservatório. A gente está aprendendo a se ajudar nesse aspecto. Quando ela chegou ao Brasil, tinha essa fobia do
palco e da plateia, muito comum dentro da escola de música erudita. Quando começou a se relacionar comigo, relaxou muito neste ponto e viu que tocar pode ser uma coisa mais leve. Ao mesmo tempo, aprendi a estudar violão com ela, de outra maneira. No ano passado, toquei o Concerto de Aranjuez, de Joaquin Rodrigo, no Canadá. E não gostei da minha performance. Corri demais dentro dos andamentos. É uma coisa muito natural para o músico popular tocar na frente. Mas não nessas ocasiões. Ela me ensinou a estudar direito. Pela primeira vez na vida, estudei com metrônomo! E aprendi que essa maneira de estudar é muito rica. Com o metrônomo, se encaixam as mãos, a conexão das mãos. Ele te dá um respiro rítmico muito mais expressivo, ou seja, te coloca no lugar. Isso, aprendi agora, uns meses atrás. Então, acredito que são escolas que não se comunicam bem, tanto uma quanto a
Improvisação: herança do popular VIOLÃO+ • 27
yamandu costa
Raízes: música do Sul
outra. Eles são muito duros e nós, muito descuidados com o acabamento das interpretações. O futuro que podemos esperar é a mistura dessas escolas. Quando a gente conseguir misturar esse cuidado, essa perfeição técnica, esse apuro, até o cuidado de como lixar as unhas, de pensar em um som redondo, na emissão desse som, todo o acabamento que essa escola proporciona, com o relaxamento, a descontração e o conhecimento harmônico prático que só o popular proporciona, vai ser outra etapa da interpretação na música. VIOLÃO+: Quais os violonistas que mais te influenciaram? E que músicos não violonistas você admira? Yamandu – Baden Powell, por exemplo, inspiração total. O Lucio, que foi o primeiro, continua sendo o meu grande mestre. Independentemente da sorte que tive de conviver com ele dentro de minha 28 • VIOLÃO+
casa, a qualidade dele como violonista e músico é fantástica. Uma personalidade viva, aperta as notas no traste, ele já te ganha antes de começar a tocar, de tão forte que é a personalidade dele. Raphael Rabello, grande, grande mestre. Minha meta como violonista brasileiro é chegar à propriedade de tocar daquele jeito, do domínio da linguagem brasileira que ele alcançou, no samba, no choro, nos ritmos que representam o país, de uma maneira geral. E outros caras internacionais: o Django Reinhardt, belga-francês que foi revolucionário nas décadas de 1930/40, criou uma linguagem que não morre, que não vai morrer. Criou uma maneira de tocar. Paco de Lucía, grande mestre, que tive o prazer de conhecer. Ele foi assistir a um concerto que fui fazer em Porto Alegre. Tê-lo na plateia foi demais. Era um cara super-humano... Muita gente me influencia, inclusive compositores. Ando num namoro muito grande com
yamandu costa um compositor colombiano, falecido recentemente, chamado Gentil Montanha. Incrível! É muita gente mesmo. Augustin Barrios, paraguaio, incrível também. São muitas influências. Estou querendo gravar um disco tocando esse repertório latinoamericano, que a gente conhece pouco e que é a produção dos nosso vizinhos, que é uma escola maravilhosa. VIOLÃO+: Você trabalhou com muitos gênios que, infelizmente, já nos deixaram. Um deles foi o Dominguinhos. Como foi trabalhar com ele nessa combinação violão e acordeon? Yamandu – Independentemente do instrumento, o Dominguinhos era um músico fora de série. Ele tinha uma maturidade... E, pelo jeito, teve essa maturidade bem cedo. Parece que tem cara que já nasce meio pronto. Foi o cara que mais me ensinou sem falar nada, só mostrando, só tocando. No convívio com ele, você já percebia muita coisa, A generosidade com que ele tocava. Era uma grande alma, um entendimento de que a música é compartilhada. Mesmo quando se está sozinho, que a plateia esteja ali e que consiga se conectar com você através da música que você está querendo passar. É uma linguagem de aproximação. O Dominguinhos fazia isso naturalmente. Era um fio de luz aberto, com toda aquela carga emotiva dele. Tinha um peso espiritual muito grande. A música era uma libertação pela qual ele passava toda essa tristeza alegre que tinha. VIOLÃO+: Você só usa violões acústicos? Não se tem notícia de show do Yamandu com violão com captadores...
Yamandu - Olha esse som.. (tocando o violão ao som dos microfones do palco do SESC Pompeia) Violão! Peguei um violão (tenho uma coleção) e mandei colocar um captador, que tivemos a honra do grande Paulo Bellinati instalar, chamado Carlos Juan. Só em último caso eu uso, quando vou tocar em lugares abertos, onde não existam condições de utilizar microfones... Este som é uma delícia (toca de novo o violão), em um teatro maravilhoso, com um técnico de som maravilhoso... Tudo certo, assim é que eu gosto. Agora, se vamos tocar num lugar sem essas condições, não tem jeito. Tem que plugar. O captador vai tentar fazer essa função. Então, pedi para o Paulo colocar esse captador em um violão meu. VIOLÃO+: E esse violão 7 cordas que você tem na mão, de onde vem? Yamandu - Este é um violão canadense, que tenho usado nos últimos quatro anos, de um luthier chamado Will Hamm. Fui tocar com a Orquestra Sinfônica de Calgary, que é na região britânica do Canadá. Também fui para dar um workshop, junto com o Hamilton de
Cumplicidade: Elodie Bouny VIOLÃO+ • 29
yamandu costa
Lúcio Yanel
Hamilton de Holanda
Orquestra de Câmara Theatro São Pedro
Bobby McFerrin 30 • VIOLÃO+
Holanda. Fizemos uma masterclass para uma plateia especializada em música. Esse cara apareceu. Veio mostrar pra gente um bandolim, um bouzouki e um violão de seis cordas, de que gostei muito. Fiz um acordo com ele: “olha, cara, posso te pagar tanto, quero um violão assim, assim e assim, com a escala indo até o ré. (normalmente, o violão vai até o si – ele toca a nota, sai perfeita e cristalina). O braço tem que ser um pouquinho levantado...” Enfim, dei todas as características a ele. Queria um violão agressivo, brilhante, o que é o mais difícil no violão, pois o grave é mais fácil. Preciso de um bom sustain. Encomendei um violão com tampo de cedro. Uns oito, nove meses depois, veio ao Brasil. Ele já tinha uma conexão muito grande aqui, pois já tinha morado na Amazônia, tinha construído um barco... O cara é muito doido! Independentemente dos instrumentos que faz, é uma pessoa muito interessante. Vem uma vez por ano, pelo menos, ao Brasil, traz instrumentos. Ele fez uma tranca, uma emboscada, que luthiers às vezes fazem com a gente. Encomendei um violão de cedro. Ele chegou em casa com um de cedro e um de abeto. Dois! E me falou: “agora, você escolhe”. Isso é uma sacanagem, uma grande sacanagem. Quero os dois, respondi. Fizemos um acordo e essa parceria começou, que agora está virando uma série de violões com meu nome, minha assinatura, para o mercado internacional. Já tenho uma assinatura aqui no Brasil, com um luthier chamado João Scremin, que faz violões ótimos, que uso muito. Um violão muito bom, mesmo. Então, são esse violões que eu uso, os do Will e os do João.
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VIOLÃO+ • 31
história
Mão direita na vihuela
Por Rosimary Parra
Apesar das semelhanças entre o violão e a vihuela de mano quanto ao formato do corpo e número de ordens – violão seis cordas simples e vihuela seis cordas em pares - há diferenças que geram abordagem técnica e musical distintas Na técnica do violão clássico, a posição básica da mão direita é perpendicular às cordas. O polegar se posiciona um pouco à frente do indicador. São utilizadas diversas combinações de dedilhados em fórmulas de arpejos com polegar, indicador, médio e anular, e em passagens mais escalísticas utiliza-se muito as combinações entre indicador/ médio e médio/anular, além das diversas fórmulas de trêmulos dentre outras. O uso da unha é praticamente definido como um elemento técnico para a projeção do som além de permitir sutilezas na variação de timbres. Ainda há a possibilidade do toque com apoio e sem apoio.
A técnica da mão direita utilizada na vihuela segue muito da técnica do alaúde renascentista: a mão posiciona-se lateralmente nas cordas, com certo apoio do dedo mínimo no tampo, e o polegar coloca-se para dentro da mão. Tal posicionamento é conhecido como “figueta”. Nesta técnica trabalha-se basicamente com duas fórmulas de combinação dos dedos: uma de caráter binário, alternando polegar-indicador, e outra de caráter ternário, alternando polegarindicador-polegar. Para peças com uma só linha melódica como, por exemplo, música de dança ou aquelas com características mais
Mão direita na vihuela: uso da “figueta” 32 • VIOLÃO+
história improvisatórias, estas fórmulas funcionarão como se estivéssemos tocando com um plectro (tipo de palheta), influenciando muita na articulação. No decorrer do Renascimento as obras para alaúde e vihuela foram ganhando novas texturas na construção musical. O repertório deste período abordará peças com textura melódica, passando por obras que alternavam entre trechos mais melódicos e outros mais contrapontísticos e ainda obras totalmente contrapontísticas. Isto implicará em algumas modificações na técnica da mão direita quanto ao posicionamento do polegar e às fórmulas descritas acima, em função do repertório que será tocado. Quanto ao posicionamento do polegar, são conhecidos os termos: “figueta castellana” – o polegar se posiciona mais para fora da mão - e “figueta extrangera” - o polegar se posiciona para dentro da mão. O repertório para vihuela tem como base a polifonia contrapontística ou seja, um entrelaçamento de linhas melódicas, sendo que cada uma delas tem expressão própria. Mais especificamente, para tocar
esse repertório será necessária uma combinação da técnica básica do alaúde com outros elementos mais próximos à técnica usada para a família das guitarras (guitarra barroca, romântica e violão). Nos livros de vihuela, para passagens melódicas são descritas as fórmulas “dos dedos”- que alternam indicador e médio - e “dedillo” - usando o dedo indicador como um plectro. Normalmente, não é recomendado o uso das unhas para tocar instrumentos antigos com cordas duplas porque elas geram maior dificuldade para sentir as duas cordas e tocá-las simultaneamente com boa sonoridade. No entanto, é possível usar unhas curtas que possibilitem trabalhar bem em instrumentos de cordas duplas, desde que se ajuste o posicionamento da mão evitando o atrito da unha na corda e ouvindo com muita atenção o som resultante. Isto vale para quem queira trabalhar com os instrumentos antigos e com o violão.
Posição da mão para uso do i-m
Posição da mão para tocar notas simultâneas
Bibliografia COELHO, V.A. Performance on lute, guitar and vihuela: Historical Practice and Modern Interpretation. New York: Cambridge University Press, 1997. DAMIANI, Andrea. Metodo per liuto rinascimentale. Bologna: UT ORPHEUS EDIZIONI, 1998
VIOLÃO+ • 33
mundo
Bouzouki
Por Luisa Fernanda Hinojosa Streber
(μπουζούκι)
Esse belo instrumento é conhecido por representar a música tradicional grega e acompanhar bailes e canções, sem deixar de ter papel importantíssimo em execuções de caráter instrumental Curiosamente, o bouzouki (do turco, buzuki: “quebrado” ou “modificado”) – associado ao momento glorioso do filme “Zorba, o Grego”, quando Anthony Quinn dança ao som da música tema –, não é um instrumento camponês. Mesmo tendo origem bastante antiga, seu ápice aconteceu nas cidades, entre meados do século XIX e princípio do século XX, com a música rebetika. Tal gênero musical se compara ao tango, ao fado, ao blues e ao cante jondo do flamenco, sendo seu berço o baixo mundo da boemia, nos prostíbulos e cárceres, onde o bouzouki, esse instrumento da noite, incitava as pessoas à dança e ao namoro no compasso de um bom vinho. Na Antiguidade Chamado panduris ou pandurión, o bouzouki é o primeiro instrumento de que se tem registro com trastes ou casas e o primeiro instrumento de corda temperado, precursor de uma das famílias do alaúde que existe até hoje. Também 34 • VIOLÃO+
era conhecido como tricórdio, pois apresentava, originalmente, três cordas duplas, sendo a afinação mais comum Ré-Lá-Ré. Há registros do bouzouki nos relevos de mármore (século IV a.C.) expostos no Museu Arqueológico Nacional de Atenas. Neles, o sátiro Marsias desafia Apolo para um embate musical e uma musa aparece tocando panduris. Durante o Império Bizantino (séculos V ao XV a.C.), o bouzouki recebeu o nome de tamburas. O tambur turco moderno é igual ao panduris grego antigo.
mundo
Giorgos Zampetas
Os bouzukis tetracordes surgiram posteriormente à Segunda Guerra Mundial. Não se sabe quem colocou o quarto par de cordas no instrumento, mas a história atribui a mudança ao compositor grego Manolo Chiotis (1920-1970), considerado um dos maiores solistas do instrumento. Curiosidade Existe, também, o bouzouki irlandês, menos oval na parte posterior se comparado ao grego, mas muito parecido com ele. Reza a lenda que a explosão do vulcão de Santorini arrasou a cultura da civilização minoica na ilha de Creta e espalhou cinzas que alcançaram a Irlanda. Será que, como Fênix, o bouzouki se juntou às cinzas do Santorini e ressurgiu na Irlanda, para brilhar na música celta com seu som característico e, assim, se lançar ao mundo?
Afinação O bouzouki de quatro pares de cordas segue as notas Dó-Fá-Lá-Ré (sendo este continuação do Dó central). Recentemente, alguns intérpretes têm afinado seus bouzoukis um tom acima, na sequência Ré-Sol-Si-Mi, afinação mais comum para as primeiras quatro cordas do violão.
Andreas Karantinis VIOLÃO+ • 35
de ouvido
Um pouco de saber Espero que tenham feito o exercício proposto na edição passada, de reconhecer sons à sua volta. Às vezes, dormimos e desistimos, de tão relaxados que ficamos – mas, com o tempo, tudo vai ficando tranquilo e interessante. É impressionante como, de início, não ouvimos certos sons e chegamos a pensar que o gravador possui maior sensibilidade de captação. Na verdade, podemos treinar nossa sensibilidade. Os sons muito fracos, em pianissíssimo (ppp, do italiano, denomina um som ou um grupo de sons com muito pouca intensidade, como se estivessem ao longe), vão sendo percebidos conforme avançamos no treinamento. É importante cuidar dos ouvidos, não se expondo a estrondos e ruídos fortes, vindos das ruas, dos nossos aparelhos de som. Algumas pessoas sentem dor física quando expostas a sons de amplitude muito alta, acima de 80 dB (decibéis). Som é a sensação auditiva que temos das vibrações rápidas que certos corpos sonoros produzem. Se pegarmos uma fina lâmina e a prendermos numa morsa, fazendo com que saia da condição de repouso e produza movimentos de ir e vir, será possível ouvir o som natural, básico e fundamental da lâmina, produzido pelo somatório do material do qual é constituído, sua elasticidade, peso, densidade, tamanho e outras particularidades menos importantes. Isso provoca oscilações constantes, e, assim, obtemos um tom, que significa som de altura definida. No Brasil chamamos, erroneamente, o tom de nota musical, pois esta é o tom “anotado” em pauta. Se encontrássemos meios para fazer a vibração aumentar em número maior de oscilações por segundo – o que se refere à frequência do som – perceberíamos o deslocamento do grave para o agudo. Então, podemos dizer que mais agudo se torna o tom, quanto maior a sua frequência. Um tom de 400 hertz (400 Hz, ou 400 oscilações por segundo) revela-se mais grave do que um tom com 950 Hz. 36 • VIOLÃO+
Reinaldo Garrido Russo www.musikosofia.com.br
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de ouvido Saber importante O tom A (lá) mais grave de um piano com 88 teclas repetese a cada vez que dobramos sua frequência. Temos a exata percepção de tratar-se do mesmo tom, mas em alturas diferentes, cada vez mais agudo. Repare que o piano possui vários tons de A (lá). Observe na tabela abaixo:
Pode-se dizer que cada tom de Lá, na tabela, está separado por uma ou mais oitavas de seus vizinhos. Vamos retroceder um pouco A partir de agora, chamaremos os tons de notas – mesmo sabendo não ser um termo adequado. Assim, evitaremos confusões relacionadas à terminologia usada no Brasil – o que será explicado quando compararmos esta à usada na língua inglesa. Oitava refere-se à nota repetida abaixo ou acima de uma nota dada. Chama-se oitava porque contamos oito notas na régua musical tão conhecida: Dó, Ré, Mi, Fá, Sol, Lá Si, Dó Conte quantas notas existem de Ré3 até Ré4. Se você contou, por meio da régua musical, oito notas – considerando o Ré3 como a número 1 –, você acertou. Podemos expressar tecnicamente: • A-2 está a duas oitavas distante de A1 – é mais grave em duas oitavas. • A3 está a quatro oitavas distante de A-2 – é mais aguda em quatro oitavas. • A1 está a três oitavas abaixo de A4 – sendo válido dizer que é mais grave em três oitavas. Exercício básico 2 Grave em seu celular sons que você considere com frequência constante, tons, que chamaremos de notas musicais. Pode ser o som de uma buzina, de uma máquina trabalhando, assobiando com frequência constante ou o ronco de um motor. Qualquer som que você perceba VIOLÃO+ • 37
de ouvido possuir certa semelhança com os sons produzidos por instrumentos musicais. Alguns sons se mesclam com ruídos e você poderá ficar confuso quanto à altura. Altura? Altura é a primeira propriedade que percebemos no som de frequência constante. O som de frequência constante, que chamaremos de nota musical, ou simplesmente nota, pode ser: gravíssimo, grave, médio grave, médio, médio agudo, agudo, superagudo. Nada como um instrumento musical para entendermos essa relatividade. Em casa, com serenidade, tente descobrir onde as notas gravadas estão na escala de seu violão. Anote o número da corda e da casa da seguinte forma: E1 – corda mi solta (0): 60 – corda 6, casa 0 A3 – lá na corda 1 e casa 5: 15
Exercício de atenção Após ler o artigo até o final, responda com V se a sentença for verdadeira e com F se for falsa. As respostas estão no fim do artigo. ( ) Um tom de 440 Hz é mais grave do que um tom de 880 Hz. ( ) Um tom de 1.150 Hz é mais grave do que um tom de 4.580 Hz. ( ) Um tom de 1 quilohertz (1 kHz) é mais agudo do que um tom de 2.000 Hz
(sabendo que 1 k é igual a 1.000 Hz).
( ) Um tom de 2 kHz é mais grave do que um tom de 1.200 Hz. ( ) Um tom de 20 kHz, sonoramente, é ouvido como um som mais grave do
que um tom de 30 kHz.
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de ouvido O primeiro dígito varia de 1 a 6 e refere-se à corda. O segundo dígito refere-se à casa e varia de 0 (corda solta) a 19 (a última casa de alguns violões). Para facilitar o entendimento dessa escrita, vamos escrever todos os sons do acorde de C (Dó Maior), da figura abaixo, do grave ao agudo, com os números de dois dígitos que representam os sons no violão. Os nomes dessas notas serão treinados na próxima edição, portanto, não se preocupe com isso agora. Teremos, do grave ao agudo: 60; 53; 42; 30; 21; 10 Veja, na figura abaixo, alguns detalhes:
• Começamos a perceber auditivamente, a partir de 20 Hz, o som mais grave. • Deixamos de perceber, a partir de 20.000 Hz, o som mais agudo. • Abaixo de 20 Hz, a denominação é infrassom. • Acima de 20 kHz, a denominação é ultrassom. • Acima de 5.000 Hz fica cada vez mais difícil perceber com exatidão a altura do tom. • Descendo, abaixo de 60 Hz, fica cada vez mais difícil perceber a altura com precisão, até deixarmos de ouvir em, aproximadamente, 20 Hz. • A3 é o tom do diapasão segundo o Congresso Mundial (Londres, 1939) A3= 440 Hz • C7 de 4.186 Hz é a nota mais aguda de um piano com 88 teclas. • A-2 de 27,50 Hz é a nota mais grave de um piano com 88 teclas. Na próxima edição, você verá a relação de altura do som entre o piano e o violão. Até lá!
Respostas do exercício de atenção: V, V, F, F, F* *A última frase é falsa, pois não temos percepção dos tons acima de 20 kHz. VIOLÃO+ • 39
como estudar
Traslado da mão direita Por conta de diferenças anatômicas e habilidades inatas – e também, da compreensão que cada músico tem de determinada obra musical -, é muito comum observar que, em uma mesma peça, cada indivíduo pode encontrar alguma dificuldade técnica para resolver determinado trecho. E a resolução desse trecho pode ser simples para alguns e extremamente difícil para outros. Muitos métodos tratam de algumas questões técnicas (por exemplo, mão esquerda), oferecendo uma série de exercícios de escalas e acordes que, na maioria das vezes, não resolvem determinado problema por falta de compreensão dos diversos fatores que envolvem a movimentação dos dedos. Traslado da mão direita (transversal e longitudinal) De maneira geral, é o movimento que a mão direita faz no sentido da 6ª corda (mi) para a 1ª corda (mi) e viceversa. A situação em que esse movimento ocorre de forma mais evidente, são nas escalas ascendentes ou descendentes. Exemplo:
Movimento: Para que esse movimento da mão direita aconteça da forma mais natural possível (sem entorse do pulso e mudança do ângulo de ataque nas cordas) é necessário que o braço faça o movimento. Nesse caso, a mão fica subordinada ao movimento do braço sem modificar o ângulo de ataque nas cordas. 40 • VIOLÃO+
Breno Chaves
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VIOLAO BRASILEIRO
Como eu toco este samba?
Renato Candro
www.renatocandro.com www.learningbrazilianguitar.com
Se você ainda não se deparou com essa situação, aguarde. Seu dia ainda vai chegar. Você aprendeu a tocar vários sambas e está feliz da vida. E com razão, afinal, sabemos que o samba tem lá seus “mistérios” e não é um estilo fácil. Como disse Joyce Moreno, muito apropriadamente, na canção Receita de Samba, “Pra se fazer um samba, você tem que gostar (...) No samba tem que estar do lado, o segredo é o sabor do refogado e a malícia que a gente dá.” Então, você vai tocar outro samba e, de repente, percebe que o ritmo simplesmente não se encaixa, que falta sincronia entre o que você canta e o que você toca. Faltou a malícia da qual Joyce falou? O tempero? Se você não sabe o que aconteceu, talvez eu possa responder: chegou seu dia. Chegou seu dia de saber que determinados sambas começam de maneira diferente em relação ao ritmo. Isso, segundo Tom Jobim e Newton Mendonça, é muito natural. Apesar de o samba ser escrito como ritmo binário (dois tempos), o tamborim tem uma célula rítmica que dura quatro batidas, ou dois compassos, e no violão é exatamente a célula do tamborim que usamos para tocar as cordas agudas, enquanto o polegar imita o surdo nos baixos. Assim, o padrão rítmico se repete a cada dois compassos, como na Figura 1. Figura 1
Repare que o ritmo do tamborim é diferente em cada compasso. VIOLÃO+ • 41
~ BRASILEIRO VIOLAO Escrevendo para o violão (Figura 2), temos: Figura 2
A maneira como um samba é composto define por onde começamos o ritmo, se pelo primeiro ou pelo segundo compasso. A Figura 3 mostra o ritmo do samba começando pelo primeiro compasso (relativo aos exemplos anteriores), como acontece na maioria dos sambas. A Figura 4 mostra o ritmo começando pelo segundo compasso, o que, apesar de mais raro, acontece. Observe que, quando temos dois acordes por compasso, a mudança dos mesmos ocorre antecipadamente, em dois pontos do ritmo. As linhas tracejadas demarcam o ponto de início e a duração de cada acorde. Figura 3
Figura 4
Se você tocar esses exemplos, facilmente perceberá que são duas situações completamente diferentes. Uma ótima dica para você entender como deve tocar um determinado 42 • VIOLÃO+
~ BRASILEIRO VIOLAO samba é prestar atenção em como a melodia se comporta. Se o samba é cantado, o posicionamento de determinadas sílabas tônicas pode indicar, claramente, de que maneira devemos começar o ritmo. Vamos usar duas ótimas músicas do Djavan como exemplos: “Flor de Lis” e “Serrado”. Veja que, em “Flor de Lis”, a primeira sílaba tônica, “lei”, na frase “valei-me Deus”, é cantada antes do primeiro tempo do compasso. Isso indica que devemos começar o ritmo da maneira mais comum, quando o acorde se antecipa ao começo do compasso. Há vários pontos de coincidência rítmica, destacados pelas linhas verticais tracejadas. “Flor de Lis” (Djavan)
Já em “Serrado”, a primeira sílaba tônica, “nhor”, na frase “Se o senhor me for louvado”, é cantada exatamente na cabeça do compasso. Então, devemos começar tocando o ritmo como na Figura 4. Repare nas coincidências rítmicas marcadas pelas linhas verticais tracejadas. “Serrado” (Djavan)
Se você já passou por isso, espero que agora consiga entender o que pode ter acontecido e que esta lição seja útil para que você corrija eventuais descompassos entre melodia e ritmo. Se ainda não passou por essa situação, não se preocupe. Já cantava Zé Rodrix, em “Quando será o dia da minha sorte?”: Sei que antes da minha morte, eu sei que esse dia chegará, mas quando será? Bons estudos! VIOLÃO+ • 43
siderurgia
Síncope Os leitores que tiveram contato com nossa coluna nas edições anteriores de Violão+ devem ter percebido uma preocupação com a questão didática e evolutiva em relação à apresentação e desenvolvimento das aulas sobre o violão cordas de aço. Na primeira, falamos do baixo alternado como um recurso de base nos arranjos de peças apropriadas para o instrumento. No número anterior, demos ênfase ao contratempo como um modo de imprimir maior dinamismo. Na presente edição, falaremos da síncope musical, um recurso rítmico expressivo e sofisticado que começou a ser largamente explorado no século XIV em um estilo musical da Europa denominado Ars Subtilior. Ao final, encerraremos a “saga” da música Mack the Knife, de Bertold Brecht e Kurt Weill, com um arranjo que procura incorporar todos os elementos abordados até aqui. Definição A síncope consiste no ato de valorizar um ponto débil em se tratando da acentuação de um determinado grupo rítmico ou até mesmo de um certo ponto de um compasso. O resultado musical é marcante e produz um efeito de suspensão em que a música transcorre com maior fluidez e leveza. Veja o Exemplo 1:
44 • VIOLÃO+
Walter Nery
www.walternery.com
siderurgia No exemplo anterior, as notas da melodia encontram-se antecipadas. Uma redução rítmica das mesmas produz um efeito de síncope interessante:
A seguinte variação também é bastante útil para os arranjos que utilizam a síncope:
No exemplo anterior, invertemos a sequência do baixo em relação ao Exemplo 2 para evitar paralelismos de oitava. Mesclando as ideias de contratempo e síncope na parte de acompanhamento podemos criar situações de grande interesse musical:
VIOLÃO+ • 45
siderurgia Ou ainda:
A divisão do tempo das notas da melodia impõe um desafio ainda maior para o executante e um ganho de complexidade ao trecho musical:
Seguem assim o último arranjo de Mack the Knife, finalizando a sequência de arranjos desta canção que nos propusemos a implantar desde o primeiro número de Violão+. Um abraço musical!
46 • VIOLÃO+
siderurgia
“Mack The Knife” (versão 2)
Bertold Brecht/Kurt Weill Arranjo: Walter Nery
VIOLÃO+ • 47
iniciantes
Acordes
Ricardo Luccas
[email protected]
E então? Como foi seu primeiro contato com o instrumento? Realizou todos os exercícios? Conte para nós quais foram suas impressões. Envie sua opinião e suas sugestões. Vamos dar continuidade aos exercícios com a técnica e o desenvolvimento da coordenação das mãos direita e esquerda, novos acordes em novas sequências e novas batidas. Dessa forma, ampliaremos gradativamente nosso repertório, aumentando as possibilidades de execução. Que tal aprendermos alguns acordes novos? Instruções: • G (Sol Maior): coloque o dedo 1 na corda 5 da casa 2; o dedo 2, na corda 6 da casa 3; o dedo 3, na corda 1 (também da casa 3). • D7 (Ré Maior com sétima): coloque o dedo 1 na corda 2 da casa 1; o dedo 2, na corda 3 da casa 2; o dedo 3, na corda 1 (também da casa 2). • D (Ré Maior): coloque o dedo 1 na corda 3 da casa 2; o dedo 2, na corda 1 (também da casa 2); o dedo 3, na corda 2 da casa 3. • E7 (Mi Maior com sétima): coloque o dedo 1 na corda 3 da casa 1; o dedo 2, na corda 5 da casa 2; o dedo 3, na corda 4 (também da casa 2); o dedo 4, na corda 2 da casa 3. Ficou confuso? Então, reproduza os desenhos ao lado no braço do violão e assista ao vídeo. 48 • VIOLÃO+
iniciantes
Seguem duas novas sequências, misturando acordes novos e antigos. Consulte os novos acordes acima.
Exercícios: 1) Mão direita. Arpejos sobre os acordes Am (Lá menor) e Em (Mi menor), aprendidos na edição anterior.
VIOLÃO+ • 49
iniciantes
2) Mão direita: batida. Aprendemos, na edição anterior, uma batida que subia e descia sem parar. Agora vamos aprender algo novo e colocar um pouco de swing, tirando uma batida de um tempo fraco. Para dar sequencia ao nosso aprendizado, vamos aplicar duas novas batidas na conhecida sequência de A (Lá Maior) e E (Mi Maior). Quando sentir que já consegue realizar essa batida repetidamente, execute a mesma com as sequências novas de acordes.
50 • VIOLÃO+
iniciantes 3) Mão esquerda. Dando continuidade aos exercícios de sensibilização, vamos trabalhar mais três fórmulas. Contando com a fórmula apresentada na edição anterior, chegaremos a quatro do total de doze para atingir nosso objetivo de aprender o toque frontal ao braço do instrumento. Atenção à indicação da tablatura: devemos começar com o dedo 1 na casa 5, o dedo 2 na casa 6, e assim por diante. Os números de 1 a 4 representam os dedos da mão esquerda. As letras I e M representam os dedos indicador e médio da mão direita. Para cada nota tocada, vamos usar um dos dedos – sempre de forma alternada. Exercícios de Sensibilização: toque frontal ao braço do instrumento. Mantenha os dedos presos o maior tempo possível, procurando sempre o relaxamento. Toque lentamente.
VIOLÃO+ • 51
iniciantes Notação Musical Vamos entender como funciona a partitura. Como já havíamos explicado na tablatura, os sons na partitura pensando do registro grave para o agudo seguem a sequência de baixo para cima, ou seja, quanto mais para baixo colocamos a nota, mais grave o som e quanto mais para cima, mais agudo. A partitura ou pauta musical é composta por cinco linhas e as notas podem ser colocadas nas linhas e nos espaços entre elas. A partitura serve para representar as notas musicais e funciona para o registro dos diversos instrumentos musicais e da voz, portanto, não devemos confundir as linhas da partitura com as cordas do violão. Como o violão possui uma extensão maior de notas – em relação ao número de linhas da partitura –, usamos as linhas complementares e suplementares para preencher este registro. Para iniciar a leitura de uma partitura, coloca-se uma clave (chave) logo no início da pauta. Para o violão, utiliza-se a clave de Sol (G), escrita a partir da segunda linha da pauta, que será o local da nota Sol. Na sequência, podemos pensar: o que vem depois da nota Sol? Sim, vem a nota Lá, no espaço logo acima da segunda linha e da nota Sol. Na terceira linha, surge a nota Si, e assim por diante.
Vamos tocar as notas na primeira posição do braço do violão (as primeiras casas e as cordas soltas)? Dica: os números embaixo de cada nota representam os dedos da mão esquerda e a casa a ser tocada. 52 • VIOLÃO+
iniciantes
Topa um desafio? Vamos lá! Abaixo segue a melodia de uma música brasileira muito conhecida. Tente descobrir antes de ver o vídeo. Use a escala mostrada na primeira posição tocando nota por nota. Você vai conseguir mesmo sem conhecer a fundo a divisão rítmica. Coloquei, propositadamente, algumas vírgulas para dividir as frases da música. Boa Sorte!
VIOLÃO+ • 53
sete cordas
O início Saudações, pessoal das “baixarias”! É com grande satisfação que dou início a esta coluna para falar sobre esse instrumento fascinante que é o violão 7 cordas. Sem sombra de dúvida, sua história está intrinsecamente ligada ao choro e ao samba, mas vem sendo cada vez mais utilizado para diferentes gêneros musicais, expandindo de forma ilimitada suas possibilidades de aplicação como instrumento de acompanhamento, que era sua função de origem, e, também, como instrumento solista. Não se sabe ao certo qual a verdadeira origem do violão 7 cordas. Alguns atribuem sua chegada ao Brasil trazido por ciganos russos. Contudo, tal fato não tem comprovação histórica. O que importa é que de alguma forma ele chegou aqui e foi absorvido pela cultura musical da época, provavelmente no final do século XIX e início do século XX, tendo como principais expoentes os violonistas Tute (Arthur de Souza Nascimento) e seu contemporâneo, China (Otávio Vianna), irmão mais velho de Pixinguinha. Ambos inspiraram e influenciaram o violonista que viria a ser a maior referência do violão 7 cordas de todos os tempos: Dino 7 Cordas (Horondino José da Silva), que só tomou a iniciativa de mandar fazer seu primeiro violão 7 cordas em 1952, após o afastamento de Tute do cenário musical. Isso nos dá uma ideia do respeito e da reverência que Dino tinha pelo seu antecessor. Dino era frequentador assíduo da casa do maestro Pixinguinha, e, certamente, além das influências de Tute e China, os contracantos do maestro ao saxofone serviram de material de estudo para o genial violonista. Dessa forma, fixou de forma brilhante e definitiva a linguagem de seu instrumento. Além disso, definiu a sonoridade característica do que se pode chamar de “primeira escola do violão 7 cordas”, na qual o instrumento é encordoado com cordas de aço da 3ª até a 7ª (ele utilizava uma corda Dó de violoncelo), e com cordas de nylon nas duas primeiras, solução encontrada pelo “mestre” para suavizar o som estridente das cordas de aço, proporcionando sonoridades mais equilibradas. 54 • VIOLÃO+
Cleber Assumpção
[email protected]
Dino 7 Cordas
sete cordas Outro elemento característico dessa escola é o uso da dedeira de aço inox. O violão 7 cordas, na sua primeira escola, assume a função rítmico-harmônica, com frases de contracanto (baixarias) aplicadas, principalmente, nos finais de frase e repousos da melodia principal. Com a popularização do violão 7 cordas, em especial por meio das gravações feitas pelo mestre Dino, o instrumento passou a chamar a atenção de diversos músicos, o que resulta em um número cada vez maior de adeptos. Entre eles destaca-se outro grande violonista: Raphael Rabello. Rabello teve uma carreira breve (faleceu aos 33 anos), mas deixou um legado incomensurável ao seu instrumento e à música. Gênio precoce, estudou com outro grande mestre do violão brasileiro, Meira, e foi fortemente influenciado pela escola de Dino 7 Cordas, tornando-se um exímio acompanhador nesse estilo (vale a pena pesquisar as gravações feitas por Raphael nesse período). Contudo, sob influência de outro grande violonista, Luiz Otávio Braga, no início dos anos 1980, Raphael encomendou seu primeiro 7 cordas encordoado com nylon. A partir de então, o violão 7 cordas pôde ser dividido em duas escolas distintas: o 7 cordas de aço e o 7 cordas de nylon. Com sua forma única de tocar, Raphael ampliou as possibilidades de utilização do instrumento, atuando tanto como acompanhador quanto como solista. Agregou ao instrumento novas sonoridades com sua forma peculiar de harmonizar e com técnicas advindas de gêneros como o flamenco e o jazz. Além de Tute, China, Dino 7 Cordas, Raphael Rabello e Luiz Otávio Braga, existe um número considerável de grandes violonistas 7 cordas que merecem destaque, como Valdir Silva, Valter Silva, Ventura Ramires, Jorge Simas, Carlinhos 7 Cordas, Maurício Carrilho, Paulão 7 Cordas, Toni 7 Cordas, Marcello Gonçalves, Luisinho 7 Cordas, Edmilson Capelupi, Zé Barbeiro, Swami Jr., Alencar 7 Cordas, Yamandu Costa, Rogério Caetano, Gian Correa, Bruno Vinci, nomes que são ótimas indicações como ponto de partida e para ouvir tudo o que for possível dos grandes mestres, pois essa foi, é e sempre será a melhor forma de assimilar qualquer linguagem musical. Vamos começar a “calejar” o polegar e “gastar” as dedeiras!
Raphael Rabello VIOLÃO+ • 55
sete cordas
Afinação
Tradicionalmente, a sétima corda do violão é afinada em Dó, existindo alguns questionamentos a respeito: uns acreditam que o motivo principal são as tonalidades dos choros, pois na maioria delas o baixo Dó seria mais útil do que um baixo Si; outros acreditam que é a falta de opções de cordas que realmente funcionassem com outra afinação, o que particularmente considero mais plausível. Atualmente, existe um número cada vez maior de violonistas que utilizam a sétima corda afinada em Si, e, em alguns casos, em Lá. Venho utilizando a afinação tradicional, da sétima em Dó, para o violão com cordas de aço e em Dó ou Lá para o violão com cordas de nylon. Contudo, no decorrer de nossas matérias, pretendo levantar prós e contras de cada afinação nos exemplos de lições que demonstrarei em vídeo.
Condução Harmônica
Visualização das notas de acorde para encadeamento harmônico pelos baixos
Acordes Maiores e Maiores com sétima menor, seguindo cinco modelos de referência (CAGED)
Acordes com referência no modelo de Dó Maior (C)
56 • VIOLÃO+
sete cordas Acordes com referência no modelo de Lá Maior (A)
Acordes com referência no modelo de Sol Maior (G)
VIOLÃO+ • 57
sete cordas Acordes com referência no modelo de Mi Maior (E)
Acordes com referência no modelo de Ré Maior (D)
58 • VIOLÃO+
VIOLA caipira
No repique da viola
Fábio Miranda
www.fabiomirandavioleiro.com
Quando ouvimos um ponteado de viola, uma das impressões que temos é de que há mais de um instrumento tocando. Essa sonoridade “cheia” da viola caipira revela uma de suas técnicas mais singulares: o ponteio repicado. Quando falo de repicado na viola, refiro-me aos toques nas cordas soltas respondendo às melodias feitas no braço do instrumento. Dessa forma, duas coisas acontecem: 1) há o solado utilizando notas simples ou escalas duetadas, enquanto 2) toca-se os pares soltos na viola, preenchendo os espaços da melodia ponteada. Percebemos isso na grande maioria dos toques marcantes de viola presentes nos estilos dos violeiros tradicionais ou modernosos. Um exemplo clássico dessa técnica é encontrado nas introduções de pagodes de viola, consagrados pelo violeiro José Dias Nunes, o Tião Carreiro. “Pagode em Brasília” (composição de Teddy Vieira e Lourival dos Santos, gravado em 1960), considerado o primeiro pagode sertanejo gravado - e imortalizado pelo violeiro e seu parceiro, Pardinho -, traz um dos solados mais buscados pelos aprendizes de viola. Se ouvirmos com atenção, o solo dessa introdução resume-se à seguinte sequência de graus:
Essa sequência costuma ser tocada na escala duetada nas cordas primas e requintas da viola, ou seja, nos 1os e 2os pares, como ilustrado abaixo. Experimente tocar essa sequência de graus nas posições indicadas: VIOLÃO+ • 59
VIOLA caipira
Óia bem! O grau 1 do final do solo vem duplamente sublinhado, pois está uma oitava acima do grau sublinhado (1). Podemos simplificar a chegada até esse grau fazendo de forma invertida, da seguinte maneira:
E o repique? O truque acontece quando o violeiro acrescenta ao solo toques nas cordas soltas para complementar ritmicamente o solado principal: são os repicados. No caso do “Pagode em Brasília”, podemos acrescentar aos poucos os repiques, deixando o toque cada vez mais complexo. Veja a progressão demonstrada nas três tablaturas abaixo: Primeiro, alternando o solo com o canotilho solto:
Depois, acrescentando o toque solto nas primas e requintas:
60 • VIOLÃO+
VIOLA caipira E puxando as cordas apertadas logo depois de tocá-las com a mão do ponteio:
O dedilhado pode ser feito só com o polegar, ou alternando o polegar com algum outro dedo da mão que fere as cordas. Reparem que cada repique acrescentado deixa o ritmo mais articulado e o solado fica mais trabalhado. Na tablatura III há ainda o recurso do ligado, em que o efeito das cordas soltas vem da puxada feita pela própria mão do ponteio: a famosa mordida de égua! Experimentem aumentar a velocidade para perceberem melhor o efeito! Depois que aprendermos essas manhas, podemos criar nossos próprios repiques de acordo com o local em que estamos ponteando. Se o solado acontecer nos pares graves, os repiques podem ser feitos nas cordas agudas, e vice versa.
Os repiques revelam muito do estilo de cada violeiro e são parte fundamental da técnica da viola caipira consagrada por grandes violeiros como Gedeão da Viola, Bambico, Renato Andrade, Almir Sater, Zé Côco do Riachão, Tião do Carro e o próprio Tião Carreiro, que nas suas introduções de pagodes, consagrou as possibilidades desse truque. Bora debuiá! VIOLÃO+ • 61
f lamenco
O polegar
Flavio Rodrigues
www.flaviorodrigues-flamenco.eu
Nesta edição, referente à técnica, falaremos do uso do polegar aplicado à guitarra flamenca. O polegar é um dos recursos mais utilizados pelos guitarristas flamencos. Por isso, existem diferentes técnicas, e suas respectivas variantes, que veremos ao longo dos próximos números de Violão+. Vamos iniciar a abordagem das técnicas com o polegar, com um conceito bem básico, mas que curiosamente, exige um pouquinho de trabalho e atenção. É o toque do polegar aliado ao “golpe” no tampo (dedo A ou M, ou ambos juntos).
Referente ao repertório, vamos aplicar a nova técnica aprendida, em uma pequena variação que se somará ao nosso toque por Tientos. Utilizaremos apenas os seguintes acordes alternados com os baixos*:
G7
C/G
F
Bb6(4+) Gm/Ab A9b *acordes sem capo-traste (cejilla)
Na próxima edição, vamos introduzir a alzapúa. Uma técnica exclusiva da guitarra flamenca, que alterna movimentos de polegar para cima, para baixo, tocando uma ou varias cordas, com ou sem golpe no tampo. Até logo! 62 • VIOLÃO+
f lamenco
#FicaAdica Vivencias Imaginadas (1995) Vicente Amigo Segundo disco de um dos maiores nomes da guitarra flamenca da era pós Paco de Lucia. Vicente Amigo criou um estilo, uma marca registrada tanto tecnicamente, quanto na sonoridade e nas suas composições. Nessa obra, podemos apreciar sua guitarra solista em peças como Ventanas al Alma y Sierra del Agua, assim como em temas arranjados com percussão, baixo, trompete, voz, palmas... Tudo muito minimalista. Também constatamos importantes aberturas harmônicas e melódicas (inovadoras dentro da estética da música flamenca até então), a introdução de elementos jazzísticos, além de outras músicas. Destaques: “El Mandaito”, “Mensaje” e “Vivencias Imaginadas”, além da participação especial de Paco de Lucía em “Querido Metheny”. VIOLÃO+ • 63
Improvisação
Fundamentos Chamo esta coluna de fundamentos da improvisação apenas para lembrar aos leitores que improvisação não se ensina. O que se ensina são conceitos de percepção musical, estruturação e técnica para estarmos aptos e prontos para criar livremente sobre uma harmonia. Na edição anterior falamos da audição do acorde de sétima maior. Nesta, vamos nos aprofundar ainda nesse acorde. Você deve utilizar um gravador ou um pedal de loop para ouvir uma base com um acorde de Cmaj7, por exemplo, e seguir os seguintes passos: 1 – Cantar os arpejos dos acordes dados na lição passada (tétrades) no caso: Cmaj7, Em7, Gmaj7, Bm7
2- Cantar a escala e sentir cada grau: T , 2M , 3M, #11, 5J, 6M e 7M
3- Ouvir o acorde e cantar as tensões: 7M 9M e #11
Faça isso se possível nos 12 tons, mas se concentre realmente no efeito daquele grau ao ouvir o acorde, para que isso se internalize e, no momento da improvisação, fique natural. 64 • VIOLÃO+
Alex Lameira
www.alexlameira.com.br
Improvisação 4- Após os três passos anteriores, toque o acorde (de Cmaj7, por exemplo) e improvise com a voz. Crie frases com a sua voz dentro dos acordes dados acima. Tudo isso vai não somente ajudar a internalizar a sonoridade do acorde, como também sair das frases prontas que nossos dedos fazem sozinhos. O improviso deve fluir de sua mente para os dedos, e não ao contrário. Utilize um gravador para depois conferir se as notas que cantou estão dentro da escala e afinação corretas. Todo esse processo está edificando um dos pilares da improvisação que é a audição, que é o mais importante e o menos trabalhado pelos estudantes. Existem outros dois pilares importantes que são a consciência (pensamento de que nota se está tocando naquele momento) e a parte motora (escalas e arpejos no braço). Na próxima edição iremos abordar esses dois elementos. Até lá!
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66 • VIOLÃO+
+
VIOLAO
coda
Visitando o Sr. Villani Chuva. Muita chuva. O horário marcado, impossível de ser cumprido. Trânsito. Atraso. Três carros, vindos de lugares diferentes, violões, estantes, pastas. Chegando à casa do maestro, para lhe prestar uma homenagem e pedir sua bênção. O inesperado: a recepção. Por mais que soubéssemos que Edmundo Villani-Côrtes e sua esposa, Efigênia, sejam dois amores, não dava para esperar tanto sorriso, tanta alegria deles por estarmos lá. Nos contagiou, nos encheu de alegria também . E de ansiedade. O objetivo da visita era mostrar a Villani a execução de um arranjo da música “Choro Urbano”, que tem uma linda letra de Julio Bellodi. Nossa Orquestra de Violões faz a versão instrumental. Seria o nosso presente ao maestro, compositor e professor, a poucos dias de completar 85 anos, em pleno vigor, vitalidade de menino, brilho nos olhos de fazer inveja a qualquer um de nós, compondo e arranjando, tocando generosamente para um mundo que parece não se dar conta disso. Nos acomodamos como foi possível na sala, que é bem ampla, mas não foi projetada para grupos desse tamanho. Conversa daqui, afina dali, eis que o momento chega. Tocamos, fizemos o nosso melhor. André, Gustavo, Joana, Paulo, Toninho, Ricardo, Pedro, Vitor, Marines, Juliano. Eu na regência, Luisa e Miriam, de longe, torcendo. Muita emoção, nervosismo, algumas notas trocadas involuntariamente. Conseguimos, prestamos nossa
Luis Stelzer
homenagem ao homem! Depois, mais conversa, outras músicas, mais conversa (quem já foi à casa do Villani e esposa, sabe que o tempo lá é outro: é o tempo da delicadeza – é, roubei o verso!). Frase que marcou: “Vocês, que carregam seus instrumentos e tocam para outros, salvam a humanidade”. Será, pergunto eu na emoção de mais um atentado que acaba de ser noticiado, sabendo que outros tantos ocorrem a cada minuto, silenciosamente, durante séculos, e que outros vão ocorrer? Será que podemos mesmo salvar alguma coisa, ou alguém? A resposta vem quando pego meu violão e toco, nem que seja por poucos minutos. Obrigado, Villani, por mais essa lição. Fomos te dar um presente e ganhamos muito mais! Além, é claro, de mais partituras para estudar...
VIOLÃO+ • 67
Em parceria com a Tokai Japan, a Tokai do Brasil traz para o país a linha de violões mais surpreendente de todos os tempos
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