Veiga-Neto, Alfredo. Educação e governamentalidade neoliberal - novos dispositivos, novas subjetividades

July 3, 2019 | Author: Ana Cris Richter | Category: Liberalismo Clássico, Michel Foucault, Estado, Economia, Neoliberalismo
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Veiga- Neto,  Neto, Alfredo. “Educação e governamentalidade neoliberal: novos dispositivos, novas subjetivações. In: Portocarrero, Vera; Castelo Branco, Guilherme.  Retratos de Foucault . Rio de Janeiro: Nau Editora, 2000, p.179-217.

Educação e governamentalidade neoliberal: novos dispositivos, novas subjetividades

.................  Alfredo Veiga-Neto

...e eu já era quem sou, um cidadão das cidades e da história - ainda sem cidade e sem história e sofrendo por isso -, um consumidor - e vítima - dos produtos da indústria candidato a consumidor, vítima que acaba de ser designada -, e já os destinos, todos os destinos, estavam decididos, os nossos e os gerais... Calvino, 2000, p.34-35

No âmbito deste campo que costumo denominar estudos foucaultianos , é quase trivial reconhecer a importância das contribuições de Michel Foucault para o entendimento da escola moderna como maquinaria implicada na fabricação tanto do sujeito moderno quanto da própria Modernidade. Se encontramos, já em suas primeiras obras - especialmente em  História da Loucura e  As palavras e as coisas -, alguns insights

interessantes acerca da instituição escola moderna, é, sem dúvida, em Vigiar e

 punir  que

o filósofo desenvolve, de maneira [p.180] detalhada e exaustiva, várias

descrições e análises das práticas escolares, enquanto tecnologias disciplinares cujo resultado foi a produção de uma intrincada rede de novos saberes e de novas economias do poder. Em outras palavras, a obra de Foucault constitui-se num divisor de águas entre, de um lado, as concepções tecnicistas, funcionalistas, críticas e estruturalistas e, de outro, as concepções pós-estruturalistas e culturalistas acerca da escola e seu papel na sociedade moderna. No que concerne às contribuições que o filósofo fez no campo do pensamento político, merece destaque a sua discussão acerca da invenção quase-moderna do "governo dos homens" l. Nos cursos ministrados na segunda metade da década de setenta, no Collège de France , Foucault faz algo parecido com aquilo que Sharpe

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(1992) denomina "história vista de baixo", para empreender uma nova/outra maneira de pensar a Política. Ao empreender uma analítica do poder a partir das próprias práticas perspectiva que já vinha adotando desde os primórdios da sua genealogia -, Foucault parte da constatação de que houve, a partir do século XV, uma crise do poder pastoral, pelo menos da maneira como esse poder vinha sendo concebido e utilizado na tradição  judaico-cristã e ao longo da Idade Média. Essa crise consistiu na busca de novas maneiras de governar os outros e de se autogovernar. No fim do feudalismo, tal busca caminhou junto com novas práticas sociais, econômicas e políticas. Entre essas últimas, destaco a que me parece ser da maior relevância para a discussão que empreenderei neste texto; a saber: o deslocamento da ênfase da soberania sobre o território  para a ênfase da soberania sobre a população. Com esse deslocamento, a arte de governar o Estado afastou-se dos princípios centrados no governante - isso é, princípios tradicionais de virtudes e habilidades, que até então haviam servido de modelo para a boa conduta do soberano/senhor/pastor -, e se voltou para princípios centrados [p.181] no Estado - isso é, novos princípios segundo os quais o que mais importa é conhecer o que é bom para a segurança e o desenvolvimento do Estado. O que passa, então, a ser cada vez mais problematizado será o Estado e não tanto o governante, devendo ser entendido o Estado muito mais em termos de sua população do que de seu território. É a partir dessas constatações que Foucault propõe o conceito de governamentalidade , que tanto aponta para uma razão ou tática de governo, uma racionalidade governamental que descobre a economia e que faz da população o seu principal objeto, quanto denota o "contato entre as tecnologias de dominação dos outros e as [tecnologias] voltadas para [a dominação] o eu" (Foucault, 1991, p.49) . 2 Mas, ao fazer esses comentários, meu interesse não é, propriamente, festejar Michel Foucault. Valho-me de Barret-Kriegel (1990), para quem, reconhecer a importância da obra do filósofo, não implica uma comemoração: "Nós não somos os guardiães do templo, nem há aqui religião; trata-se somente da vontade de saber" ( id .,., p. 186). É essa vontade de saber que pode nos mover no sentido de ir adiante daquilo que  já aprendemos com a arqueologia e a genealogia da escola. E esse ir adiante é no sentido de examinarmos as mudanças que agora estão ocorrendo, seja nas e com as práticas escolares, seja nas relações entre a educação escolarizada e essas novas e

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Nesse sentido, explorar algumas possibilidades do pensamento de Foucault para a análise e compreensão da escola que hoje temos - e aí me refiro tanto às práticas que se dão na e em torno da escola, quanto aos discursos que a representam [p. 182] dessa ou daquela maneira - significa tomar algumas precauções metodológicas. Em primeiro lugar, é preciso colocar a questão em termos muito amplos, não só contextualizando-a histórica, social, política, econômica e culturalmente, como também levando em consideração que as relações entre a escola e a sociedade são daquele tipo que Deleuze (1991) chamou de causalidade imanente . Não se trata apenas de entender que a implicação entre a instituição escolar e a sociedade é complexa; mais do que complexidade, o que se tem, nesse caso, é uma própria relação de imanência. Numa perspectiva foucaultiana, isso não se constitui numa novidade. Mas aqui essa precaução parece assumir a maior importância, dado aquilo que está em jogo não é apenas examinar as transformações históricas e escolares - e suas interpenetrações e implicações -; mais do que isso, como argumentarei mais adiante, trata-se de levar em consideração que o declarado projeto iluminista de escolarização única/igualitária, universal e obrigatória, está se revelando uma impossibilidade histórica na medida em que ele se insere na lógica da própria Modernidade, uma lógica ambígua que está implicada, per se, tanto com a domesticação da diferença quanto com o diferencialismo e a desigualdade e, por conseqüência, com a exclusão. Uma segunda precaução metodológica (e relacionada com o que comentei acima): e preciso estar atento para o fato de que vivemos num mundo que não pode ser compreendido nos registros das metanarrativas da Modernidade. Não é o caso de discutir, aqui, se jamais fomos modernos, ou se já saímos da Modernidade, ou se ainda estamos nela. Ainda que tais discussões possam ser interessantes, o que me parece mais produtivo, neste texto, é termos claro que as categorias iluministas - como a transcendentalidade da consciência e do sujeito, a totalidade, a razão, etc.- não são adequadas para explicar os [p.183] novos arranjos econômicos, geopolíticos e culturais e as novas distribuições de forças que daí decorrem. Isso significa, por exemplo, não tomar a escola por aquilo que ela deveria ser, para a partir daí lamentar seu suposto decaimento ou prescrever alternativas para a sua assim chamada recuperação. Significa, também, não buscar uma outra natureza essencial para essa instituição; buscar um outro

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pensamos que elas deveriam ser - pode ter a maior importância política e histórica. Mas meu objetivo principal aqui é de outra natureza. Além dessas precauções, um esclarecimento: não pretendo, com este texto, nem entrar em descrições e análises detalhadas sobre o tema que escolhi, nem relacionar (todas...) as possibilidades que esse tema abre para a investigação educacional, nem inventariar o que tem sido feito (um pouco) por mim e (muito) por outros autores nesse campo - fazer o que seria, digamos, o estado-da-arte. Ao contrário, meu objetivo é outro; para maior clareza - e guardadas as devidas proporções... -, recorro às palavras que Ewald disse sobre a obra de Foucault: Nada de imposições, uma possibilidade entre outras; certamente que não mais verdadeira que as outras, mas talvez mais pertinente, mais eficaz, mais produtiva... E é isso que importa: não produzir algo de verdadeiro, no sentido de definitivo, absoluto, peremptório, mas dar "peças" ou "bocados", verdades modestas, novos relances, estranhos, que não implicam em silêncio de estupefação ou um burburinho de comentários, mas que sejam utilizáveis por outros como as chaves de uma caixa de ferramentas ferramentas (Ewald, 1993, 1993, p.26). [p.184]

A metáfora da ferramenta é bastante útil, pois permite estabelecer uma distinção entre um "uso de Foucault" que me parece apropriado e outros usos que considero, no mínimo, equivocados. Mesmo que não caiba, aqui, fazer um inventário crítico daquilo que eu considero acertos e desacertos desses diferentes usos, esclareço que meu recurso ao filósofo não é nem para denunciar as práticas repressivas da escola moderna, nem para lamentar as opressões econômicas e culturais do capitalismo (avançado), nem para - tentando submeter e domesticar o seu pensamento perverso 3 - aplicá-lo através de um filtro psicologizante, nem para empreender uma análise arqueológica dos discursos acerca da escola moderna e do liberalismo, nem para - colocando-o contraditoriamente a serviço de um ideologismo assumido a priori - prescrever como se poderia chegar, mesmo num mundo neoliberal, à conscientização e à liberdade. Tais usos impertinentes de Foucault não me interessam. Meu objetivo vai noutra direção e é mais modesto: contento-me em sugerir alguns bocados, alguns relances, que recorrendo a outras contribuições foucaultianas que me parecem pertinentes - ajudem a compreender o papel da Educação nas mudanças do mundo atual.

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mundo atual e para a educação escolarizada, bem como comentar algumas novas práticas educacionais que estão se dando na e  fora da escola e que estão operando no sentido de produzir novas subjetividades e qual a relação de tudo isso para o "governo dos homens".4 Mas antes de chegar lá, começo com um comentário acerca do entendimento que se pode ter da Modernidade e da escola moderna, numa perspectiva foucaultiana. [p.185] O mundo moderno

A partir dos estudos genealógicos sobre a disciplinaridade - principalmente em Vigiar e punir  -

e sobre o biopoder - principalmente em  A vontade de saber  - pode-se

fazer uma articulação entre tais estudos e as análises políticas que Foucault desenvolveu na segunda metade da década de setenta - principalmente nos cursos Segurança, território e população e  Nascimento da biopolítica

-, para compreender a Modernidade

como o resultado da combinação de duas superfícies de emergência: o deslocamento das práticas pastorais e o advento da Razão de Estado. Nesse sentido, Ransom (1997) diz que o poder, no Estado Moderno, baseia-se na interação de pelo menos duas diferentes racionalidades. Uma delas é a do poder pastoral, o qual tem suas origens na longa história das práticas confessionais cristãs. (...) Mas as condições para a expansão desse pastoreio extraeclesiástico deram-se no contexto de uma racionalidade que tomou o rumo numa direção quase oposta: a "Razão de Estado" (Ransom, 1997, p.74).

É no contato dessas duas superfícies que se estabelece a combinação equilibrada e demoníaca entre dois jogos antagônicos: o  jogo da cidade - totalizador, jogado na população e o  jogo do pastor  - individualizador, jogado no indivíduo (Foucault, 1988). Ainda que antagônicos, esses jogos se complementam no sentido de "criar" as condições de possibilidade para o Estado Moderno. O papel da disciplina foi fundamental para o jogo do pastor. É a disciplina enquanto "anatomia política do detalhe" (Foucault, 1989, p.128) - que funciona como um operador, como uma técnica, em bloco (Marshall, 1994), capaz de colocar para dentro de cada indivíduo o olhar do soberano que se apaga com o raiar da Modernidade.

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Para o jogo da cidade, foi fundamental a emergência de novos saberes: inicialmente, a Estatística, a Economia e a Demografia; depois, a Saúde Pública; logo adiante, toda a "área psi" (a Psiquiatria, a Psicologia, a Psicanálise). Esses novos saberes foram cruciais para o bom governo do Estado. E falar em bom governo do Estado implica falar em uma economia de governo, graças à qual se possa obter os maiores resultados a partir dos mínimos esforços, tudo isso entendido tanto em termos estritos monetários e financeiros -, seja em termos amplos - de tempo, de afetos, prazer e felicidade. É justamente no jogo da cidade que se configura o liberalismo enquanto etos da crítica permanente e insatisfeita à Razão de Estado; uma crítica que descobre que governar demais é irracional, pois é antieconômico e frustrante; uma crítica que se manifesta como um horror ao Estado. Assim, na perspectiva de Foucault o liberalismo é menos uma fase histórica, uma filosofia política ou um sistema econômico, e mais um refinamento da arte de governar, em que o governo, para ser mais econômico, torna-se mais delicado e sutil, de modo que "para governar mais, mais , é preciso governar menos". Constitutivo da Modernidade, no campo político, para Foucault (1992) o liberalismo corresponde à máxima governamentalização do Estado e "surge em relação ao problema de conciliar a liberdade de mercado com o exercício ilimitado da soberania" (Burchell, 1996, p.21). Nas palavras de Dean (1999), a partir, por um lado, da teoria e prática da soberania e, por outro lado, da descoberta da economia, "o liberalismo procura equilibrar o imperativo bio-político de otimizar a vida da população em relação

aos direitos do sujeito jurídico-político e as normas de um governo

econômico" (id .,., p.49). [p.187] Ao querer naturalizar as relações sociais e econômicas ("a mão invisível de Deus"), o liberalismo deixa ao Estado, no máximo, a tarefa de ajustar socialmente o que  já estaria impresso na natureza humana. Trata-se de uma lógica ló gica que entende a sociedade como um todo que deve ser harmônico pela combinação complementar de seus indivíduos, cada um funcionando como um átomo indivisível, centrado e estável, que é, em si mesmo e ao mesmo tempo, réu e juiz, ovelha e pastor. Assim, o liberalismo ocupa-se do "governo da sociedade"; uma sociedade formada por sujeitos que são, cada um e ao mesmo tempo, objeto (governado de fora) e parceiro (sujeito autogovernado)

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Aqui é preciso fazer um breve comentário acerca do desenvolvimento do liberalismo na segunda metade do século XX, quando ele desdobrou-se em duas tendências principais: uma, originou-se na Alemanha, no fim da década de quarenta - o ordoliberalismo -; a outra, na Escola de Economia de Chicago - o liberalismo norteamericano. Ambos se constituíram como uma crítica ao Estado de Bem-Estar e seus excessos em termos estatais e estatizantes. De um lado, o ordoliberalismo empreendeu uma desnaturalização das relações sociais e econômicas, pois entendeu que uma economia de mercado deveria ser "organizada (mas não planificada, nem dirigida) no interior de quadros institucionais ou jurídicos que, por um lado, oferecesse as garantias e as limitações da lei e, por outro, assegurasse que a liberdade dos processos econômicos não produzisse distorção social" (Foucault, 1997, p.95). De outro lado, o liberalismo norte-americano mostrou-se muito mais confiante nas próprias forças e na racionalidade do mercado, a ponto de não apenas querer afastar o Estado de qualquer tipo de ingerência sobre a economia, como, logo em seguida, querer que toda a vida social se subordinasse à lógica [p. 188] do mercado. São tais entendimentos do liberalismo que permitirão uma nova compreensão dos seus desenvolvimentos posteriores - aos quais se costuma denominar genericamente liberalismo avançado, tardio ou neoliberalismo -, uma compreensão que, como comentarei mais adiante, a diante, pouco tem a ver com as análises funcionalistas, economicistas ou críticas que têm sido desenvolvidas nos últimos anos. Mas acima dessas diferenças entre as versões alemã e norte-americana, o liberalismo foi - e o neoliberalismo continua sendo - uma prática, uma "maneira de fazer" política, "orientada para objetivos e se regulando através de uma reflexão contínua. O liberalismo deve ser analisado como princípio e método de racionalização do exercício de governo racionalização que obedece, e aí está a sua especificidade, à

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fábrica. Assim, na Modernidade essas instituições podem ser entendidas como resultados daquelas modificações sociais. Mas se falo em resultados, é preciso entender que tais instituições são, ao mesmo tempo, também produtoras dessas novidades na nossa história recente. É por isso, então, que todas elas estão intimamente conectadas com a construção da Modernidade e com a manutenção das suas práticas e dos valores que a [p.189] justificam e a sustentam. Estamos sempre, como se vê mais uma vez, falando em relações de imanência. Entre as instituições que relacionei acima, a escola parece ser a que mais se destaca nessas e para essas transformações sociais. Isso é assim porque, de certa maneira, a produtividade da escola se dá simultaneamente em três níveis: de criação, de aplicação e de difusão daquelas novas tecnologias. É fácil ver que a escola é o locus onde novas tecnologias são tanto inven¬tadas quanto aplicadas; ela é, além disso, a instituição que mais ampla e precocemente se encarrega de "capturar" os indivíduos e disseminar tais tecnologias. Assim, numa perspectiva foucaultiana, a escola moderna não é entendida como um caminho para a racionalidade, liberdade e igualdade humanas; não se trata, portanto, desse tipo de neoplatonismo , que assume o sujeito como um datum natural, centrado e unitário, a ser desenvolvido/iluminado pela ação pedagógica. Ela não é também entendida como uma instituição a ser analisada a partir de princípios intelectuais e morais tomados a priori - um tipo de ideologismo fundado nas filosofias da consciência. Ao se situar fora do platonismo e ao procurar desenvolver uma filosofia da prática, a perspectiva foucaultiana despede-se desses dois entendimentos sobre a escola, que têm sido desenvolvidos por autores tanto das vertentes conservadoras quanto das vertentes críticas.6 Numa perspectiva foucaultiana, a crítica tem de ser mais radical, perguntando e

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culturais como etnia, gênero, classe sócio-econômica, faixa etária, nacionalidade, religião, etc. No caso da Razão de Estado, como já referi a escola organizou-se enquanto a instituição capaz não apenas de gerar novos saberes - ainda que isso tenha ocorrido principalmente não nas escolas, mas nas universidades e academias -, como também de funcionar como um locus de acontecimentos acessível ao controle e à aplicação dos novos saberes e, principalmente, de preparar as massas a viverem num Estado governamentalizado. No caso do deslocamento das práticas pastorais, foi também pela escolarização de massas que se estendeu a todos, como algo natural e naturalmente necessário, tanto a constante problematização de si quanto o trabalho ético sobre si. Nas palavras de Larrosa (1994), "a própria experiência de si não é senão o resultado de um complexo processo histórico de fabricação, no qual se entrecruzam os discursos que definem a verdade do sujeito, as práticas que regulam seu comportamento e as formas de subjetividade nas quais se constitui sua própria interioridade". Temos, tanto em Varela e Alvarez-Uria (1991, 1992) quanto em Hunter (1988, 1994, 1996)7, muito boas demonstrações de que a escolarização moderna não se originou nem a partir de políticas iluministas democratizantes, nem de demandas populares, nem a partir de ideários pedagógicos que supostamente seriam anteriores às práticas escolares.8 Nas palavras de Hunter (1999, p.160), a emergência da escolarização de massas "não coincidiu nem com o capitalismo ou com a industrialização, nem com algum dos outros polos da grande dialética". Pode-se dizer, em termos muito resumidos, que a [p.191] [ p.191] escolarização de massas surgiu s urgiu de montagens e combinações, contingentes e feitas às cegas, de práticas físicas e morais, discursivas e não-discursivas que envolveram vários elementos de naturezas muito diversas:

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Um importante corolário que se obtém desse entendimento consiste em que a acusação de fracasso - em atingir os ideais iluministas de democratização, conscientização e liberdade da sociedade -, que paira constantemente sobre a escola, fica meio sem sentido. Não se trata propriamente de questionar se a escola teve ou não teve sucesso na consecução daqueles ideais. A questão é que, numa perspectiva foucaultiana, esse é um falso problema: o "desempenho" da escola não pode ser cotejado com ideais que se estabeleceram implicadas com ela, como "irmãos" dela. Em outras palavras: escola moderna e ideais iluministas estão historicamente articulados e emaranhados numa mesma episteme , de modo que uma não serve de antídoto para os supostos desvios do outro.9 Assim, aqueles ideais não podem servir de padrão de medida - para os alegados fracassos e êxitos da escolarização de massas - simplesmente porque nem tais ideais são anteriores à escola, nem eles são independentes dela e [p.192] nem mesmo a escola surgiu para resolver a sua não consecução. A escola moderna se constituiu como uma imensa maquinaria cujos princípios proclamados apontaram cada vez mais para os ideais do Iluminismo; e, ao mesmo tempo, como uma imensa maquinaria cujas práticas estiveram sempre mais ou menos ajustadas ao funcionamento do mundo que estava sendo construído a partir desses ideais. Assim, ao invés de uma contradição, o que existe é uma articulação produtiva entre escola e modernidade. A questão é que há um preço a pagar por tentar alcançar esses ideais e esse preço está no centro desses próprios ideais. O que é visto como problemas - a sujeição dos corpos e mentes, o disciplinamento, a desigualdade, etc. - faz parte das próprias condições de possibilidade do funcionamento da escola moderna e da fabricação do sujeito moderno. Dito de outra maneira: está no centro da concepção moderna de educação escolarizada não apenas os ideais iluministas, mas também o "preço a pagar"

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fabricar o mundo que hoje temos e que parece caminhar no sentido inverso daqueles ideais. Voltarei a essa questão no final. Mas não é meu objetivo, neste texto, ir além da descrição, análise e problematização prometidas no início. De qualquer maneira, não posso deixar de registrar que, no meu [p.193] entendimento, as alternativas para a escola, que estão se desenhando nas últimas décadas, não parecem muito animadoras. Com isso, posso passar à seção seguinte. Um mundo em mudança

Ainda que sejam interessantes as muitas discussões que procuram caracterizar o mundo atual - ora como pós-moderno, ora como neomoderno, ora como um mundo moderno que está em crise, etc.-, aqui o que interessa é considerarmos que vivemos num mundo que vem se transformando profunda e rapidamente nas últimas décadas. Entre as principais transformações, costuma-se citar a crescente globalização da economia, o aumento da concentração de renda com o simétrico distanciamento econômico entre o pequeno número de países ricos e o grande número de países pobres, o aparecimento e fortalecimento das mais variadas minorias - étnicas, sexuais, religiosas, culturais, etc.- e o surgimento e expansão do neoliberalismo. Vários autores têm destacado que, sob essas mudanças estão ocorrendo outras modificações mais sutis, mas não menos importantes na medida em que elas até mesmo se configuram como condições de possibilidade para que as primeiras aconteçam, pelo menos da maneira como estão acontecendo. 11 Se faço um brevíssimo apanhado sobre essas mudanças é porque, para a discussão que estou aqui desenvolvendo, interessa examinar como e em que medida a

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for, não há dúvida de que fazer uma história do nosso presente poderá contribuir para compreendê-lo e, talvez, descobrir alguns pontos de fratura nas muitas práticas que nos aprisionam, para que se possa - eventual e (pelo menos) minimamente - alterá-las. Numa perspectiva foucaultiana, podemos entrar na questão a partir das modificações que estão ocorrendo no capitalismo. Para entender como isso se engendrou, de uma forma bastante simplificada e esquemática podemos partir da mudança que ocorreu na percepção de que as três principais experiências de governo efetivadas na primeira metade do século XX - a saber, o nazismo, o socialismo de Estado e o Estado de Bem Estar - representavam uma inflação dos aparelhos governamentais destinados à planificação, condução e controle da Economia. Em outras palavras, estava-se governando demais; e isso era visto como irracional porque antieconômico e retro-alimentativo. Como comentei na seção anterior, foi a partir dessas constatações que o liberalismo desdobrou-se em duas alternativas principais: uma, alemã; a outra, norte-americana. Em qualquer dos dois casos, percebeu-se também que os mercados consumidores deveriam ser incrementados após a Segunda Guerra Mundial. 12 Mas um simples incremento na produção parecia não ser mais suficiente para aumentar a acumulação capitalista. O que foi se colocando muito claramente foi que não bastava tão somente produzir mais e melhor, mas que era preciso produzir de maneira diferente;

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demandas principalmente diversificadas, além de intensas. Mas não basta esperar que simplesmente o mercado por si mesmo diversifique e intensifique suas demandas; é preciso que os consumidores - enquanto personagens que corporificam essas demandas - ou já estejam aí receptivos a tudo isso, ou sejam orientados para essas mudanças. No que diz respeito à intensificação, não existe algo de propriamente novo; de fato, há muito tempo o capitalismo já conhecia bastante bem como aumentar - até certos limites, é claro - o consumo e as conseqüentes demandas. E é claro que o desenvolvimento de novas tecnologias de marketing passaram a desempenhar um papel importante em tudo isso. Mas é no que concerne à diversificação que está a novidade. E para se encaixar com essa novidade, é preciso um novo tipo de consumidor. [p.196] [ p.196] Todas essas questões devem ser pensadas como situadas num quadro mais amplo que não se limita à economia. Tal quadro compõe-se de arranjos e condições não necessariamente centradas na economia - que vêm se engendrando na Modernidade e que possibilitaram tanto a emergência desse novo capitalismo, quanto o seu avanço. Tais arranjos e condições são muito variados e não guardam - nem entre si, nem com o próprio capitalismo - uma relação linear ou causal. Com isso, eu quero sublinhar que se, nos parágrafos acima, eu entrei na caracterização do mundo atual a partir de uma (simplificada) descrição daquilo que se costuma denominar "capitalismo avançado", foi simplesmente porque era preciso entrar por algum lugar; isso não significa que eu tenha

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retrocesso ao liberalismo clássico, com a demissão de qualquer forma de governo sobre a economia, caso em que tudo deveria ser deixado à famosa "mão invisível de Deus". Mas, numa perspectiva foucaultiana, como demonstrou Gordon (1991), isso é um equívoco, pois o neoliberalismo dá um "adeus a Deus", na medida em que desnaturaliza as relações sociais e econômicas, ao introduzir a modelagem como um princípio segundo o qual o consumidor não é mais visto como, originalmente, um  Homo œconomicus

, mas é visto como um  Homo manipulabilis manipulabilis. Isso equivale a dizer que ele

não tem em sua natureza (ou não carrega em si) um a priori econômico mas, pelo contrário, que ele é alguém que pode e deve ser levado a se comportar dessa ou daquela maneira no mundo da economia - o que, na lógica neoliberal, equivale a dizer simplesmente: no mundo. É claro que uma boa parte da modelagem pretendida pelo neoliberalismo é feita pela mídia, pelo marketing, pela indústria cultural, etc. Mas uma outra parte é deixada ao próprio Estado. Dessa maneira, tornou-se quase uma unanimidade considerar que as relações entre a economia e a sociedade - ou, mais especialmente, as relações entre os consumidores e as ofertas de bens e serviços - devem estar "informadas" também pelo Estado. Quando uso "informar" é porque não se trata nem e "tutelar", nem e "regular", nem e "controlar", mas no máximo de "orientar", de modo que os consumidores desenvolvam novas necessidades e maiores competências para fazerem as melhores

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principalmente as grandes corporações - têm muito a ganhar com o empresariamento do Estado. Assim, o que acontece é a invenção de novas táticas e novos dispositivos que colocam o Estado sob uma nova lógica. Em termos macroeconômicos - para citar um exemplo -, isso se apresenta com duas faces: ou se privatizam as atividades estatais (lucrativas), ou se submetem as atividades (não-lucrativas) à lógica empresarial. É por isso que os discursos neoliberais insistem em afirmar que o Estado deve se ocupar só com algumas atividades "essenciais", como a Educação e a Saúde; e, assim mesmo, encarregando-se de, no máximo, regulá-las ou provê-las (nesse caso, aos estratos sociais comprovadamente carentes). Em suma: o social subordina-se ao econômico (Gordon, 1991; Peters; 1994). Uma dessas novas táticas - a qual entra como um dos ingredientes mais importantes da lógica neoliberal e que interessa muito na discussão que desenvolvo aqui - é a maximização da liberdade individual. Não importa que se diga que essa maximização só se dá como uma realidade construída [p.199] discursivamente pois, se ela existe no discurso, ela está no mundo. O que importa, então, é que esses discursos produzem resultados, de modo que cada um pense que é livre para fazer suas escolhas. Ora, isso coincide exatamente com a exacerbação do individualismo que, como mostrou Elias (1994), vem sendo construído na nossa história há centenas de anos. Nesse

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capacidade em competir torna-se um elemento da maior importância pois, na medida em que o Estado se empresaria, os jogos de competição que se concentravam nas atividades empresariais estendem-se por toda a parte. Assim, o sujeito ideal do neoliberalismo é aquele que é capaz de participar competindo livremente e que é suficientemente [p.200] competente para competir melhor fazendo suas próprias escolhas e aquisições. É isso que Becker (1964) quer dizer, na sua Teoria do Capital Humano, quando argumenta que esse sujeito deve desenvolver, ao máximo, sua capacidade de ser o empresário de si s i mesmo. Para que cada um conheça os critérios de escolha e saiba combiná-los para selecionar o que pensa ser melhor ou mais conveniente para si, cada um tem de não só aprender, como também ser alvo de uma grande variedade de estímulos, solicitações, apelos, sugestões, etc. Em suma, cada um torna-se um alvo de múltiplas e cambiantes interpelações que o fragmentam e o modificam incessantemente; e isso se dá num cenário que é também cambiante 16. Como argumenta Hall (1997, p.13), "esse processo produz o sujeito pós-moderno, conceptualizado como não tendo uma identidade fixa, essencial ou permanente". Essas são, por sua vez, as condições de possibilidade para o surgimento e disseminação dos mais variados grupos (muitas vezes chamados de "minorias" e tribos) que se identificam e se aglutinam em torno de temas, preferências, valores e princípios

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devem ser entendidas como uma manifestação de desinteresse, por parte dessa direita, em continuar se responsabilizando diretamente pela regulação social, em nível muito amplo e geral - em nível nacional, por exemplo -, dado que isso é muito caro e cada vez mais arriscado em termos políticos. Por outro lado, essas declarações revelam o interesse da direita no sentido de que se desenvolvam mecanismos, competências individuais e arranjos entre grupos que permitam uma maior autonomia dos indivíduos em relação a um Estado que não quer mais ser o controlador e o provedor da sociedade. Assim, de certa maneira a proliferação de diferentes instâncias sociais fora da tutela financeira do Estado - como associações, organizações não-governamentais, conselhos comunitários, etc. - têm sido úteis para que os governos se desobriguem, pelo menos em parte, do controle e do custeio sociais. Não me parece correto atribuir à direita a invenção desse interesse que ela tem em desviar as energias econômicas e políticas (do Estado) da regulação para o estímulo

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É dessa combinação inextrincável entre sujeição e expertise que vem a ilusão de que cada um é capaz de dirigir ativa e racionalmente suas escolhas; em outras palavras, a ilusão de que as escolhas pessoais são mesmo pessoais. Essa ilusão não é de natureza propriamente ideológica. Ela não decorre de uma suposta artimanha da lógica neoliberal, mas sim da própria ambivalência que a liberdade assume no neoliberalismo. Como explica Dean (1999), no neoliberalismo a liberdade do sujeito é uma condição para a sua sujeição, pois o exercício da autoridade pressupõe a existência de um livre sujeito de desejo, necessidade, direitos, interesses e escolha. Todavia [p.203] via, sua sujeição é também uma condição para a sua liberdade: para que possa agir livremente, o sujeito deve ser antes conformado, guiado e moldado para tornar-se alguém capaz de exercer responsavelmente sua liberdade num sistema de dominação. Sujeição e subjetivação estão uma ao lado da outra. Uma é a condição para a outra. ( id., p.165).

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governamentalidade, ao mesmo tempo interior e exterior ao Estado. São as táticas de governo que permitem definir a cada instante o que deve ou não competir ao Estado, o que é público ou privado, o que é ou não estatal, etc.; portanto, o Estado em sua sobrevivência e em seus limites, deve ser compreendido a partir das táticas gerais de governamentalidade (Foucault, 1992, p.292).

É nesse ponto que podemos voltar à questão do papel da escola. Como sabemos, não são poucos os teóricos que já anunciam ou lamentam o fim da escola moderna. Outros, mais saudosistas, denunciam a descaracterização dessa instituição, decorrente do que se costuma chamar de decadência dos antigos - e, em alguns casos, fantasiados "padrões de qualidade" que teriam caracterizado a educação escolarizada até recentemente. Outros, ainda, nos alertam para os ataques que hoje se desferem contra ela. "Temos um bom exemplo desse último caso em Silva (1995); esse autor identifica dois focos de onde vêm os ataques à escola: "de um lado, temos o questionamento pós-

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Antes de argumentar a favor dessa sugestão, lembro que boa parte dos discursos de vários governos (conservadores ou progressistas), bem como os discursos de boa parte do empresariado, não se cansam de proclamar a importância da escolarização. A implementação de políticas públicas que procuram modernizar (leia-se "empresariar") a escola e expandir o acesso a ela, bem como intensificar ou aumentar a permanência da criança nela, são iniciativas que confirmam o quanto a escola é ainda considerada importante. Lembro, também, que é preciso estar alerta para o fato de que, talvez mais do que nunca, vivemos num mundo muito heterogêneo, polimórfico e instável (seria preciso lembrar de novo que os ideais modernos de totalidade e igualdade nunca pareceram tão remotos?). Como conseqüência, fica cada vez mais problemático falar-se simplesmente em "escola"; ao invés disso, é preciso esclarecer de que "tipo de escola" está se falando -  para quem ela se destina, quais objetivos ela quer atender, [p.206]

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alcance das tecnologias de sedução ao mercado. Isso significa que o mercado - já central, essencializado e reificado no neoliberalismo - poderá funcionar também como um quase-substituto do panoptismo e das outras práticas de disciplinamento e normalização [p.207] - como o confinamento, o quadriculamento do espaço, o fracionamento do tempo, os currículos segmentados em disciplinas estanques, os exames rotineiros, etc. Além disso, Bauman nos possibilita ver duas alternativas: de um lado, "aqueles que estão ao alcance da sedução do mercado"; de outro lado, o resto, "os que não estão ao alcance da sedução do mercado". Ora, dado que para os primeiros têm mais acesso à escola privada, então se pode concluir que é nesse tipo de escola que poderão estar se tornando menos rígidas as práticas de controle; inversamente, nas escolas públicas deverão continuar funcionando com mais intensidade as práticas disciplinares tradicionais.

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de uma sociedade disciplinar. O adjetivo disciplinar , aqui, é da maior importância, pois, ao invés de pensarmos que a escola (pública) está desconectada da sociedade, podemos nos valer de Foucault e de Deleuze (1992) para ver tudo isso como manifestações de uma mudança nas regras do jogo da cidade, uma mudança segundo a qual a sociedade parece estar passando de uma lógica l ógica disciplinar para uma lógica de controle. Em suma, talvez a escola esteja deixando de ser a condição necessária para que se cumpra o primeiro imperativo hipotético da pedagogia kantiana (vide nota 9). Se isso

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Em termos muito amplos, ainda é difícil avaliar a extensão dos efeitos macroeconômicos da telemática, especialmente da Internet. No caso do Brasil, é interessante constatar como um economista tradicionalmente ligado às políticas governamentais (Franco, 2000, p.133) prevê a ocorrência do que ele chama de um quarto choque: "tudo parece indicar que vamos na direção de um hipercapitalismo, no qual a instituição central do sistema, o mercado, é reinventada e turbinada pela internet". Como traços marcantes dessa nova economia hipercapitalista, ele prevê "a

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espaço

(Jameson, 1996) - com a correspondente compressão do tempo, da qual decorre

o fenômeno conhecido como  presentificação  presentificação do futuro - é fortemente ampliada com o uso generalizado da Internet. Um dos resultados mais notáveis da compressão espaço-tempo foi a progressiva separação entre espaço (amplo e um tanto abstrato) e lugar  (cenário físico de um acontecimento social), de modo que cada lugar fica acessível e penetrável por lugares distantes. Essa penetração permite que lugares remotos, ausentes, moldem culturalmente

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individual e o cooperativo, entre o local e o global. É certo que não se trata mais daquela instituição pretendida pelos proclamados ideais igualitários e totalizantes do Iluminismo. Mas, com os olhos postos nos interesses da lógica neoliberal, qual outra instituição poderia, a curto prazo, substituir a maquinaria escolar para montar, tão ampla e rapidamente, um tal sujeito-cliente? Por outro lado, com os olhos postos numa vontade de resistência, qual outra instituição poderia ser mobilizada - também tão ampla e rapidamente - para tentar aumentar as fraturas numa lógica contra a qual muitos

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reformar ou recuperar a escola moderna. Como já referi, é nesse espaço que não se situa a crítica que aqui desenvolvo, pois qualquer tentativa de análise e de mudança do status quo,

numa perspectiva foucaultiana, [p.214] implica dar as costas àqueles ideais

iluministas e, conseqüentemente, não reconhecer as configurações atuais como insucessos. Colocar a questão fora da dicotomia sucesso-insucesso poderá deixar espaço para ver outras "saídas" e para fazer da escola um locus privilegiado para a resistência, para o exercício de práticas de transgressão dos limites que nos são impostos pela

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movimentos fundamentalistas islâmicos. Penso que, entre nós, é possível descrever e

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Nunca é demais lembrar o papel que os Estados Unidos desempenharam nesse

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Refiro-me especificamente àquelas situações em que, por questões de segurança,

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