Texto Argumentativo Poema XXIV de O Guardador de Rebanhos

December 29, 2022 | Author: Anonymous | Category: N/A
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Quando me foi proposto o contrato de leitura pensei imediatamente em trabalhar uma obra que realmente tivesse a capacidade de me suscitar interesse, interesse,  logo, à partida teria que ser poesia. poesia. Após uma reflexão reflexão sobre Fernando Fernando Pessoa e heterónimos heterónimos optei pelo poema XXIV XXI V d’ “O Guarda Guardador dor de Rebanh Rebanhos” os” de Albert Albertoo Caeiro Caeiro,, devido devido essenc essencial ialmen mente te à valorização que este faz ao acto de ver que é absolutamente extraordinária e pouco convencional. Além disso, admiro o facto dos poemas carregados de uma simplicidade autêntica conseguirem ser tão perfeitos.

 

Alberto Caeiro, O Mestre, a voz de que Pessoa se serviu para se libertar da excessiva dor de pensar,foi a sua única escapatória da excessiva lucidez que o sugava e o deixava em constante desassossego.  Na obra intitulada “O Guardador de Rebanhos” ele faz questão de se considerar um pastor, pois partilha a mesma necessidade de passear sem destino com o desejo de assistir a cada demonstração espectacular da  Natureza. É de notar que a poesia de Caeiro é espontânea, natural, e além disso a sua simplicidade verifica-se na linguagem utilizada mas nem por isso a sua obra se torna menos bela.

 

Após uma leitura atenta aos poemas é possível verificar que o heterónimo está nos antípotas de Pessoa. É um homem livre de ansiedades e de preocupações porque adoptou uma maneira de ver o Mundo que o mantém distante de tudo quanto seja pensamento, ideias e filosofias. filosofias. Apesar de rejeitar a filosofia, ele próprio elaborou uma, a filosofia dos sentidos, onde nos damos conta da primazia das sensações: “Vi como um danado”.   danado”. O poeta dedica-se ao momento do “agora”, do carpe diem, o suposto apologista da rejeição da filosofia, acaba por estabelecer uma ligação com o epicurismo. Segundo ele, devemos gozar plenamente o “hoje” que nos encherá, por assim dizer, de múltiplas sensações. O pleno gozar das sensações requer o afastamento do pensamento, e isto, explica, de certo modo, explica, modo, o facto de ele ver a realidade realidade sem tempo. tempo. Caeiro Caeiro não se interessa pelo passado e muito menos pelo futuro, por um lado temos a recordação que surge à posteriori, está na memória, e lembrarmonos do que quer que seja implica pensarmos, pensarmos, por outro outro lado, por exemplo, se ambicionarmos algo começamos de certo modo a equacionar maneiras  para atingirmos certos objectivos que temos para nós. E também porque nem o passado nem o futuro têm a capacidade de nos darem sensações, logo, não fazem parte dos interesses deste poeta. Fácill de defi Fáci defini nir, r, é um home homem m simp simple less que que se dedi dedica ca únic únicaa e exclusivamente à contemplação da Natureza, nada tem a acrescentar ou a retirar reti rar à realidade realidade que se apresent apresentaa diante diante de si, e por isso, a Natureza Natureza é  perfeita. Ele vê e ama a Natureza sem fazer qualquer análise à mesma, quer  fazer parte dela, quer rasgar tudo o que há de humano em si e tornar-se  parte integrante dela. Mas é impossível tal acontecer, quer queira ou não, ele faz parte do mundo dos Homens.

 

É preciso entender que somos participantes de uma vida que não tem que ser analisada para ser mais bela. Aliás, se encararmos a vida deste modo, encontraremos a paz e o equilíbrio. Ao ler atentamente o excerto, percebe-se que o poema está dividido em dois momentos lógicos, o primeiro abrange as duas primeiras estrofes enquanto que o segundo abrange a última estrofe. Quanto ao primeiro momento, a ideia essencial a reter é a (re)afirmação que Caeiro faz, dos príncipios do sensacionismo. Em relação ao segundo momento, este fala da caminhada necessária para atingir esses objectivos. Este Es tess dois dois mome moment ntos os es estã tãoo liga ligado doss por por duas duas pala palavr vras as,, “Mas “Mas”, ”, conjunção coordenativa adversativa, adversativa, e por “Isso”, pronome demonstrativo. demonstrativo. Quanto à análise externa do poema, é de notar, a repetição dos sons “vv” presentes no verso 1 – “O que nós vemos das coisas são as coisas”, no verso 5 – “O essencial é saber ver” e ainda no verso 6 – “Saber ver sem estar a pensar”. Devemos ainda interpretar a tautologia, que é a linguagem simples que Caeiro utiliza em todos os seus poemas, as pergunta retóricas que se encontram nos versos 2 e 5, a anáfora onde “Saber ver” se repete nos versos 5, 6 e 7, a parataxe, que é a utilização excessiva do “e” e ainda as metáforas: - “as estrelas são as freiras eternas” e “as flores as penitentes convictas”, quando Caeiro fala da linguagem dos “poetas místicos”. Procedendo agora com uma análise interna, em relação à primeira estr estrof ofee do poem poemaa XXIV XXIV,, é nece necess ssár ário io re rele lemb mbra rarr que que para para Caei Caeiro ro as sensações têm um papel fundamental, é através delas que compreendemos a realidade, que chegamos à Verdade. No fundo, ele alcança a Verdade das coisas sem as pensar.

 

E para chegar ao entendimento da realidade é necessário procedermos à distanciação da mesma, para não corrermos o risco de querer conhecer o “interior” das coisas, para não haver a tendência de ir buscar o que os seus olhos não vêem. Assim, o poeta resolve ficar na simples aparência. Existir, para ele, já é um facto maravilhoso, e não há nada por detrás das coisas, por isso ele diz: “O que nós vemos das coisas são as coisas”. Ver e ouvir seria iludirmo-nos se na base destes sentidos estivesse o  pensamento, ora como não está, eles só nos provarão a existência da realidade e nada mais. O poeta do real objectivo, faz-nos ver a realidade tal e qual como ela se apresenta, porque não há nada mais que a própria existência das coisas. E isso agrada-lhe. O tão pouco, que a nós, gente comum possa parecer, é tudo para ele. Mas a verdade é que Caeiro expressa um sorriso espontâneo a cada instante que possa olhar para a Natureza, enquanto que nós, olhamos uns para os outros e vemos demasiadas preocupações, ansiedades e tristeza,  porque pensamos demais. Talvez este modo de viver seja a nossa salvação, mas também, sabemos que Caeiro apesar de muito esforço nunca conseguiu largar para bem distante de si a complexidade do pensamento, porque é inevitável, faz parte do nosso ser. Quanto à segunda estrofe, basta-lhe este estar onde há lugar apenas  para olhar com olhos de ver, reparar de facto no mundo, e o resultado disto será o pleno gozar das inúmeras sensações que suscitarão, um puro sentir. Tudo isto sem que haja a intervenção do pensamento (“Saber ver sem estar  a pensar”), que apenas serviria para nos cegar aos poucos, para perturbar a ni niti tide dezz da vi visã são. o. Mas, Mas, como como se sabe sabe,, o “Poe “Poeta ta das das Sens Sensaç açõe ões” s” quer  quer  sobretudo ver claramente, reparar na pequenez e na simplicidade louca das coisas.

 

A meu entender, é escusado cavar mais fundo e querer ver coisas onde não existem, se nos basta a solidez da realidade, porquê esta vontade danada de procurar mais para além do que as impressões visuais nos oferecem?Para quê sujeitarmo-nos sujeitarmo-nos a uma série de questões se nunca vamos encontrar uma resposta que nos satisfaça?Questionarmo-nos acerca de tudo o que nos rodeia é deixarmo-nos na total ignorância, porque nós somos uns eternos insatisfeitos, por isso, é preferível deixarmo-nos ficar neste viver  onde não andamos de olhos vendados, mas sim, de olhos bem abertos a tudo o que passa e fica, reparando de facto. Portanto, o “poeta antimetafísico” vê as coisas como se não tivessem dentro, por mais que o “dentro” seja demasiado tentador, ele evita buscar o que os seus sentidos não conseguem captar directamente, então, agrada-se com o que há de “fora”, de “exterior” nas coisas como a cor, o movimento, a forma e a textura.   Os seus sentidos, sentidos, nomeadame nomeadamente nte a visão, visão, a audiç audição ão e o tacto, estão activos, prontos para captarem a qualquer instante tudo o que seja palpável e natural. Relativamente à última estrofe, Caeiro quer subir a um patamar um tanto difícil, quer alcançar o olhar de uma criança. Passo a explicar, ele quer manter o pasmo essencial, o mesmo que as crianças têm quando vêem as coisas pela primeira vez. Aqui está o desejo de manter a “eterna novidade do mundo”. Mas isso exige um trabalho duro por parte do poeta, “uma aprendizagem de desaprender”,a partir deste paradoxo, percebemos que ele terá que partir do zero, despir toda a cultura, esquecer-se de ser, esquecer o modo de pensar  que a sociedade impôs, ignorar que outrora fomos moldados com uma série de ideias fixas, supostas verdades absolutas e preconceitos que nos levam a crer num determ determinado inado modo modo de ver o mundo, mundo, só assim assim é que deixará deixará de olhar para reparar e de ouvir para escutar.

 

Portanto, o Argonauta das Sensações verdadeiras, para manter o pasmo e conseguir usufruir realmente das sensações e aproximar-se o mais possível da Natureza que tanto ama, terá que se isolar, abdicar do contacto humano. A liberdade que Caeiro necessita implica perder as tradições humanas, a educação que recebemos, esquecer, por assim dizer, o que resta de humano nele. Por isso a dada altura ele diz: “…E uma sequestração na liberdade daquele convento”, o convento refere-se á solidão. Só ignorando o passado, todas as experiências anteriores, é que nos sentimos dispostos a aprender de novo. De facto, conseguimos ver que há uma teoria, um plano arquitectado  para conseguir alcançar os desejos deste simples homem, mas na tentativa de passar tudo isto para a prática ele depara-se com o grande obstáculo que é nada mais nada menos que a “alma vestida”. Quanto aos três últimos versos, o autor pretende revelar a sua  posição contra o acto de atribuir nomes às coisas, as coisas são o que são, e dizer que as estrelas são as freiras eternas é deixar recair sobre as coisas a subjectividade, algo que Caeiro recusa de todo. Em suma, Alberto Caeiro pretende usufruir das sensações que derivam da contemplação da Natureza sem a intervenção do pensamento.

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