Sylvia Moretzsohn, A Velocidade Como Fetiche – o Discurso Jornalístico Na Era Do _tempo Real
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Syl vi a M or or et etzsohn, A vel oc oci da dade como feti ch che – o di sc scur so so j or or na nal ís ísti co co na er a do "tempo r ea eal "
A velocidade velocidade como fetiche – o discurso discur so jornalístico jornalístico na era do "tempo real" Sylvia Moretzsohn, More tzsohn, Universidade Universidade Federal Feder al Fluminense Fluminense (tese de mestrado, 2000)
( Introdução, Introdução, Capítulo I , Capítulo II , Capí Capítulo tulo III II I , Con Concl clusão usão & Bibliografia Bibliografia )
Capítulo I Tempo presente e tempo tem po passado são ambos presentes presentes no tempo fut uro T. S. Eli E liot ot
Chegando na frente: a imprensa no tempo do capital
A imagem recorrente foi sintetizada nos filmes policiais americanos dos anos 30: rotativas trabalhando freneticamente, despejando jornais que rodopiam até o close fechado sobre a manchete, a informação chegando veloz e simultânea aos quatro cantos do mundo, isto é, dos Estados Unidos - imagens superpostas de jornais de Nova Iorque, Chicago, Boston, Baltimore, noticiando um assalto espetacular, uma chacina estarrecedora, e finalmente o alívio pela prisão dos criminosos. Forma de arte própria da “era da reprodutibilidade técnica”, significativamente inaugurada com uma imagem emblemática dos tempos modernos - a locomotiva chegando à estação, ameaçando romper a tela e invadir a sala escura -, o cinema ajudou a fixar a idéia de que a imprensa trabalha sob o signo da velocidade. Ou melhor, de que a velocidade é uma característica da imprensa. De fato, a velocidade é uma característica do capitalismo, resumida na expressão “tempo é dinheiro”, instituindo e obedecendo a uma lógica que Marx sintetizou ao definir: “economia de tempo: a isto se reduz finalmente toda economia”. Desse modo, mostrou não apenas a importância da consideração do tempo do trabalho social para a definição do valor, mas também o caráter central do significado social do tempo no estudo das atividades humanas. A lógica do capital tende a ser estendida a todos os aspectos da vida social, num processo de naturalização que lhes retira o sentido histórico. O que buscaremos neste capítulo será precisamente recuperar esse sentido, refazendo o caminho da formação da imprensa como atividade industrial, sua afirmação como produto produto de massa e sua sua interação teração no processo processo de percepção de “aceleração aceleração do tempo” tempo” que marcou a entrada na modernidade. Para isso, vamos inicialmente apresentar o quadro de transformações nas concepções de espaço e tempo paralelamente ao surgimento e consolidação do capitalismo. A seguir, procurarem procuraremos os sin sinteti tetizar o desenv desenvolv olvimento ento da im imprensa prensa no no con contex texto to mai maiss ampl amploo da comu comunicação, de form formaa a www.bocc.ubi .pt/pag /mor etzsohn- syl vi avel oci dade- j or nal i smo- 1.html
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esclarecer o vínculo quase automático que se estabelece entre imprensa e velocidade. O aprofundamento da análise há de nos fornecer argumentos para sustentar nossa hipótese original. O tempo hegemônico
Ao tratarem das transformações na percepção de tempo e espaço, pesquisadores da área das ciências sociais deixam claro que suas análises referem-se ao significado social dessas duas categorias básicas da vida humana, alertando - quando este não é o próprio objeto de estudo - para o fato de que essas concepções podem ser extrem extremam amen ente te vari variáv ávei eiss conf conforme orme as caracterí característi sticas cas das dif diferentes erentes cul culturas. turas. Mas, Mas, em geral geral,, in iniciam ciam seu trabalho remetendo à complexidade desses conceitos no campo da física, procurando não apenas demonstrar as influências das pesquisas nesse setor sobre a sociedade como também justificar a opção metodológica etodológica adotada. adotad a. Em seu estudo sobre o que chama de “condição pós-moderna”, David Harvey não foge a essa regra. É com base na física sica que que ele ele con contest testaa a idéia déia de um senti sentido do único e objeti objetivo de tempo tempo e espaço para medir edir a diversidade de concepções e percepções humanas. Ao contrário, considera a necessidade de se reconhecer “a multiplicidade das qualidades objetivas que o espaço e o tempo podem exprimir e o papel das práticas humanas em sua construção”. Se, segundo os físicos, tempo e espaço não tinham existência antes da matéria, “as qualidades objetivas do tempo-espaço físico não podem ser compreendidas sem que se levem em conta as qual q ualiidades dade s dos do s processos pro cessos materiais” ateriais” [8] [8] . É, portanto, de acordo com essa perspectiva materialista que Harvey traçará seu amplo painel das profundas transformações na experiência do espaço e do tempo que marcaram o capitalismo nascente e o conflituoso desdobramento dessas transformações até os dias atuais: a consolidação da moeda como meio de troca estabelecendo novas regras sociais, os mercadores rompendo com os ritmos “naturais” da vida agrária medieval, os sinos chamando para o trabalho e o comércio. “Horas iguais [na cidade] anunciavam a vitória de uma nova ordem cultural e econômica” [9] econômica” [9] . Instrumentos de precisão na marcação do tempo e do espaço deram as bases para as grandes navegações e para o racion racional aliismo smo no qual qual se susten sustentav tavaa a sociedade sociedade burg burguuesa. A cartog cartograf rafiia mudou dou:: a con conffecção dos mapas abandonava a subjetividade, os elementos de fantasia e de crença religiosa, e passava a levar em conta o rigor matemático, a proporcionalidade e a objetividade necessários para a exploração do território. Os novos mapas “permitiam que toda a população da Terra, pela primeira vez na história humana, fosse localizada numa única estrutura espacial”, e essa representação de totalidade favorecerá especulações sobre os princípios racionais capazes de organizar a vida no planeta. Recuperada na Renascença, radicalizada no Iluminismo, essa perspectiva de totalidade embute uma tentativa de dominar o futuro coerente com uma concepção de tempo cujos pressupostos remontam à Grécia Antiga, e que são traduzidos pela imagem do pêndulo, a “flecha do tempo” indicando a linearidade de passado e futuro. A mecânica newtoniana será abalada no início do século XX pela relatividade de Einstein, e se até hoje são as leis de Newton que regem a vida cotidiana, não se pode dizer o mesmo sobre a nossa concepção do universo, diante das incessantes surpresas apresentadas pelas pesquisas no campo da física. www.bocc.ubi .pt/pag /mor etzsohn- syl vi avel oci dade- j or nal i smo- 1.html
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Não é o caso de abordá-las aqui, mas deve-se registrar que, desde Einstein, tais descobertas vêm permitindo sustentar hipóteses que colaboram para alterar nossa concepção de espaço e tempo, causando tensões num cotidiano que transcorre de acordo com o tempo cronológico. Como diz Paul Virilio, [a] realidade nunca é dada de antemão, mas adquirida, gerada pelo desenvolvimento das sociedades. Mesmo se a pedra permanece pedra, mesmo se a montanha continua no seu lugar, a maneira de captar a realidade varia ao ritmo da evolução do conhecimento. Aqui, como em outros domínios, já não estamos no espaço e no tempo absolutos de Newton e mais alguns, mas no espaço-tempo da relatividade geral. Incessantemente nossa espécie deriva de uma geração de realidade para outra, através de um movimento de desrealização que comporta duas fases principais: uma fase de simulação da realidade, relativa ao campo das representações filosófica, científica ou artística; e uma fase, geralmente não percebida, de substituição, na qual o real da geração precedente cede lugar ao da nova [10] . Uma série de outros fatores (culturais, religiosos, políticos) contribuem para a coexistência de vários sentidos de tempo na sociedade moderna. Harvey mostra como essa relação impõe escolhas fundamentais para a vida social: A taxa ótima de exploração de um recurso deve ser fixada pela taxa de juro ou devemos buscar, como insistem os ambientalistas, um desenvolvimento sustentado que assegure a perpetuação das condições ecológicas adequadas à vida humana num futuro indefinido? Essas questões não são de modo algum arcanas. O horizonte temporal implicado numa decisão afeta materialmente o tipo de decisão que tomamos. Se queremos deixar alguma coisa no mundo ou construir um futuro melhor para os nossos filhos, fazemos coisas bem distintas do que faríamos se nos preocupássemos apenas com os nossos próprios prazeres aqui e agora. Por essa razão, o tempo é usado na retórica política de maneiras confusas. A incapacidade de adiar prazeres costuma ser usada pelos críticos conservadores, por exemplo, para explicar a persistência do empobrecimento numa sociedade afluente, embora essa sociedade promova sistematicamente o financiamento de prazeres presentes como uma das principais engrenagens do crescimento econômico [11] . Na demarcação das correspondências e conflitos entre determinadas noções de tempo e espaço e as várias formas de desenvolvimento do capitalismo, deve-se ressaltar, em primeiro lugar, a importância do conceito de tempo universal e homogêneo “para concepções de taxa de lucro (retorno do estoque de capital no tempo, disse Adam Smith), da taxa de juro, do salário-hora e de outras magnitudes fundamentais para o processo decisório capitalista” [12] . Veremos que na transição do fordismo para a atual fase de “acumulação flexível” do capital, iniciada nos anos 70, prevalecerão outras concepções de espaço e tempo a “desterritorialização” globalizante de um universo fragmentado e um sentido de urgência no qual só existe o presente. No entanto, o sentido de descontinuidade e simultaneidade já se insinuava na metade final do século passado, com as primeiras manifestações do modernismo. Harvey ressalta, aliás, que é da própria dinâmica do capitalismo, como sistema, a tendência à fragmentação e à efemeridade; daí a tensão provocada pela “tentativa de encontrar uma mitologia estável que exprima seus valores e sentidos inerentes”. Da mesma forma, observa o movimento que se opera diante dos abalos sofridos pelo sistema: o diagnóstico das crises cíclicas (associado, portanto, a uma determinada noção de periodização do tempo) e, atualmente, os jogos no mercado futuro, a projeção de “cenários”, na tentativa de www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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garantir alguma previsibilidade, o que indica a busca de estabilidade. Esforço inútil, de acordo com Zygmunt Bauman, pois “o mercado prospera na incerteza (chamada alternativamente de competitividade, desregulamentação, flexibilidade, etc.) e a reproduz em quantidade crescente como seu principal alimento” [13] . O resultado é a enorme sensação de insegurança em que todos vivem (mesmo os vencedores, pois, por definição, são vencedores “até segunda ordem”), uma vez que “ninguém mais tem presença garantida no mundo”. Bauman justifica o aparente paradoxo - afinal, a precariedade humana não é novidade - argumentando que a descoberta da fatalidade da morte foi o que nos deu segurança a respeito da única certeza possível: a do caráter transitório, temporário de nossa presença no mundo, o que, inversamente, nos estimula a imaginar a eternidade e a buscar um sentido para a vida. Daí as tentativas de se construir projetos, associadas a uma procura por segurança que o sistema antes negava como uma disfunção interna, prometendo corrigi-la num futuro que jamais chegava, e hoje rechaça como uma pretensão arcaica que deve ser abolida. É nesse contexto de instabilidade que se dissemina a idéia de “formação permanente” anotada por Deleuze como uma das características das “sociedades de controle”. Nas sociedades de disciplina [estudadas exaustivamente por Foucault] não se parava de recomeçar (da escola à caserna, da caserna à fábrica), enquanto nas sociedades de controle nunca se termina nada, a empresa, a formação, o serviço sendo os estados metaestáveis e coexistentes de uma mesma modulação” [14] . Em síntese: onde antes havia períodos, hoje há fluxos. A aceleração do tempo
A base sobre a qual se desenvolve a percepção de “aceleração do tempo” repousa sobre a própria lógica do capital. Considerando que, “se o dinheiro não tem um sentido independente do tempo e do espaço, sempre é possível buscar o lucro (...) alterando os modos de uso e de definição do tempo e do espaço”, Harvey baseia-se no padrão de circulação do capital para argumentar: Há um incentivo onipresente para a aceleração, por parte de capitalistas individuais, do seu tempo de giro com relação à média social, e para fazê-lo de modo a promover uma tendência social na direção de tempos médios de giro mais rápidos. (...) O efeito geral é, portanto, colocar no centro da modernidade capitalista a aceleração do ritmo dos processos econômicos e, em conseqüência, da vida social. Mas essa tendência é descontínua, pontuada por crises periódicas, porque os investimentos fixos em instalações e equipamentos, bem como em formas organizacionais e habilidades de trabalho, não podem ser modificados com facilidade. A implantação de novos sistemas tem de esperar a passagem do tempo de vida “natural” da fábrica e do trabalhador, ou empregar o processo de “destruição criativa” que se baseia na desvalorização ou destruição forçadas de ativos antigos para abrir caminho aos novos [15] . A racionalização inaugurada com o fordismo e o taylorismo, no início do século XX, marcaria profundamente tanto o capitalismo que se expandia quanto o socialismo soviético. É sabida a simpatia de Lenin e mesmo de Trotsky pela “organização científica do trabalho” baseada na cronometragem de tempos e movimentos. Mas, www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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como nota Manuel Castells, há uma diferença essencial, de cunho ideológico, na adoção dos métodos fordistas pelos comunistas: a separação entre tempo e dinheiro, aliás bastante coerente com um modo de produção que se pretendia radicalmente novo e crítico do capitalismo. Enquanto no fordismo a aceleração do trabalho estava associada a dinheiro com aumento de pagamento, no stalinismo não só o dinheiro era um mal segundo a tradição russa, mas o tempo deveria ser acelerado por motivação ideológica. Portanto, “stakhanovismo” significava trabalhar mais por unidade de tempo como um serviço para o país, e planos de cinco anos eram cumpridos em quatro como prova da capacidade da nova sociedade para a revolução temporal [16] . Castells comenta que, “embora o tempo fosse reduzido no local de trabalho, o horizonte temporal do comunismo sempre era considerado no longo prazo e, em certa medida, eterno, como foi expresso na imortalidade personificada de Lenin e na tentativa de Stalin tornar-se um ídolo em vida”. E fala do choque provocado pela queda do comunismo na década de 90, quando esse horizonte de longo prazo do tempo histórico foi deslocado “para o curto prazo do tempo monetizado característico do capitalismo, dessa forma pondo um fim à separação estatista entre tempo e dinheiro. Com isso, a Rússia uniu-se ao Ocidente no exato momento em que o capitalismo desenvolvido revolucionava sua estrutura temporal” através do que o autor chama de “sistema de fluxos” viabilizado por meio da “empresa-rede” [17] . A passagem do fordismo para o sistema de acumulação flexível, resultante, em síntese, do esgotamento das opções para lidar com o problema da superacumulação, que já havia exposto o capitalismo a outras crises, ampliou a escala de aceleração do ritmo da inovação do produto - portanto, da obsolescência programada , reduzindo drasticamente o tempo de giro do capital através da automação da produção e de novas formas de gerenciamento. Assim, [a] estética relativamente estável do modernismo fordista cedeu lugar a todo o fermento, instabilidade e qualidades fugidias de uma estética pós-moderna que celebra a diferença, a efemeridade, o espetáculo, a moda e a mercadificação de formas culturais [18] . É a volatilidade da era do descartável, que, “mais do que jogar fora bens produzidos (criando um monumental problema sobre o que fazer com o lixo)”, significa “ser capaz de atirar fora valores, estilos de vida, relacionamentos estáveis, apego a coisas, edifícios, lugares, pessoas e modos adquiridos de agir e ser” [19] . Ressalte-se que o descarte de pessoas é citado como se aparentemente resultasse de uma espécie de “estado de espírito”, quando, de fato, é uma realidade dramática imposta pelo modo de produção, que cria uma crescente massa de excluídos já sem qualquer função a não ser, talvez, a sua utilização como justificativa para investimentos cada vez maiores nas áreas de segurança e de repressão ao crime, com a conseqüente fabricação de ondas de histeria punitiva nas grandes cidades. É fundamental perceber o quanto as atividades de comunicação ganham destaque nesse contexto. Em primeiro lugar, é notável a progressiva atenção das empresas para os investimentos de tempo de giro quase instantâneo, como a produção de eventos no campo das artes e espetáculos, objetivando dois tipos de retorno: o lucro propriamente dito e, talvez mais importante, a valorização da imagem institucional. É assim que www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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a publicidade e as imagens da mídia passaram a ter um papel muito mais integrador nas práticas culturais, tendo assumido agora uma importância muito maior na dinâmica de crescimento do capitalismo. (...) Dominar ou intervir ativamente na produção da volatilidade envolve (...) a manipulação do gosto e da opinião, seja tornando-se um líder da moda ou saturando o mercado com imagens que adaptem a volatilidade a fins particulares [e, conseqüentemente, significa] construir novos sistemas de signos e imagens, o que constitui em si mesmo um aspecto importante da condição pós-moderna [20] . Veremos neste trabalho como o processo de produção das notícias insere também o jornalismo nessa engrenagem que alimenta a volatilidade, e o quanto ele se justifica por estar supostamente oferecendo o que o público também supostamente deseja. Por ora, devemos enfatizar que é o processo de aceleração acima descrito que permite a formulação do conceito de “compressão espaço-temporal” tantas vezes referido pelos estudiosos da cultura contemporânea. Harvey ilustra esse “encolhimento do mundo” através de mapas que vão diminuindo conforme o desenvolvimento dos transportes, desde o Renascimento até meados do século XX. A reprodução de um anúncio da Alcatel, de 1987, também é significativa: o globo terrestre representado em tamanho cada vez mais reduzido, sobre o texto que afirma: “este é o ano em que o mundo ficou menor”. A IBM, outra empresa de comunicações, sintetizaria a mesma idéia em fins dos anos 90, anunciando “soluções para um mundo pequeno”. Virilio resume o processo: Uma vez que não fazemos nada mais do que pensar as dimensões que o olho é incapaz de ver, que o espaço e o tempo são para nós nada mais do que intuições, as ferramentas de percepção e de comunicação poderão realizar esse paradoxo das aparências que consiste em comprimir a dimensão do universo em um perpétuo efeito de encolhimento [21] . Esse “encolhimento” progressivo, resultante da superação de barreiras espaciais em graus cada vez maiores, significaria a própria “supressão” do espaço, em conseqüência do processo que torna possível a transmissão de informações em “tempo real”. Harvey oferecerá contra-argumentos a essa tese. Antes, porém, seria preciso identificar referências recentes e remotas desse tipo de pensamento. Primeiro, McLuhan e sua “aldeia global” celebrizada em meados dos anos 60: Após três mil anos de explosão, por meio de tecnologias fragmentárias e mecânicas, o mundo ocidental está implodindo. No decorrer das eras mecânicas, estendemos os nossos corpos no espaço. Hoje, passado mais de um século de tecnologia eletrônica, estendemos o nosso próprio sistema nervoso central num abraço global, abolindo, no tocante ao nosso planeta, tanto o tempo como o espaço [22] . Mais recentemente, desde fins dos anos 70, vários autores exploraram essa idéia, o que nos dá a sensação de que se trata de uma formulação nova ou recente. Não é bem assim, como indicam as referências de Virilio em um de seus vários estudos sobre comunicação e velocidade: Barère, que sonhava em transformar o território francês em “um vasto campo”, anuncia, em 17 de agosto de 1794, a transmissão por telégrafo da notícia da tomada de Quesnoy: “Através desta invenção”, diz ele à Assembléia, “as distâncias até os locais desaparecem”... [23] . www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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A referência é ao telégrafo ótico, cujo projeto foi apresentado à Assembléia Legislativa pelo físico Claude Chappe como “um meio adequado de estabelecer uma correspondência tal que o corpo legislativo pudesse fazer valer suas ordens nas fronteiras e receber a resposta no decorrer de uma única sessão”. O próprio Chappe demonstra perceber a importância política e estratégica de seu projeto: O estabelecimento do telégrafo é a melhor resposta aos publicistas que pensam que a França é grande demais para se constituir numa república. O telégrafo reduz as distâncias e reúne, de certa forma, uma imensa população em um único ponto [24] . Mas, como dizíamos, Harvey apresenta argumentos questionadores de concepções triunfalistas ou apocalípticas dessa “abolição do espaço”: ... a queda de barreiras espaciais não implica o decréscimo da significação do espaço. Vemos hoje, e não é pela primeira vez na história do capitalismo, evidências que apontam para a tese oposta. O aumento da competição em condições de crise coagiu os capitalistas a darem muito mais atenção às vantagens localizacionais relativas, precisamente porque a diminuição de barreiras espaciais dá aos capitalistas o poder de explorar, com bom proveito, minúsculas diferenciações espaciais. Pequenas diferenças naquilo que o espaço contém em termos de oferta de trabalho, recursos, infra-estruturas, etc., assumem crescente importância. O domínio superior do espaço é uma arma ainda mais poderosa na luta de classes; ele se torna um dos meios de aplicação da aceleração e da redefinição de habilidades a forças de trabalho recalcitrantes. A mobilidade geográfica e a descentralização são usadas contra um poder sindical que se concentrava tradicionalmente nas fábricas de produção em massa. A fuga de capitais, a desindustrialização de algumas regiões e a industrialização de outras e a destruição de comunidades operárias tradicionais como bases de poder na luta de classes se tornam o pivô na transformação espacial sob condições de acumulação mais flexíveis [25] . Milton Santos é mais explícito: considera um mito a contração do espaço e do tempo, mesmo porque “o espaço se globaliza, mas não é mundial como um todo, senão como metáfora. (...) Quem se globaliza, mesmo, são as pessoas e os lugares”. Da mesma forma, não há propriamente um tempo mundial, mas “temporalidades hegemônicas e temporalidades não hegemônicas”, relacionadas ao papel dos agentes da economia, da política e da cultura [26] . Assim, a velocidade “apenas está ao alcance de um número limitado de pessoas, de tal forma que, segundo as possibilidades de cada um, as distâncias têm significações e efeitos diversos e o uso do mesmo relógio não permite igual economia de tempo”. Aldeia global tanto quanto espaço-tempo contraído permitiram imaginar a realização do sonho de um mundo só, já que, pelas mãos do mercado global, coisas, relações, dinheiros, gostos largamente se difundem por sobre continentes, raças, línguas, religiões, como se as particularidades tecidas ao longo de séculos houvessem sido todas esgarçadas. Tudo seria conduzido e, ao mesmo tempo, homogeneizado pelo mercado global regulador. Será, todavia, esse mercado regulador? Será ele global? O fato é que apenas três praças, Nova Iorque, Londres e Tóquio, concentram mais da metade de todas as transações e ações; as empresas transnacionais são responsáveis pela maior parte do comércio dito mundial; os 47 países menos avançados representam juntos apenas 0,3% do comércio mundial, em lugar dos 2,3% em 1960, enquanto 40% do comércio dos Estados Unidos ocorrem no interior das empresas [27] . O geógrafo brasileiro também questiona a idéia tão difundida de “humanidade desterritorializada”, pois, www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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de fato, as fronteiras mudaram de significação, mas nunca estiveram tão vivas, na medida em que o próprio exercício das atividades globalizadas não prescinde de uma atividade governamental capaz de torná-las efetivas dentro de um território [28] . Em outra ocasião, respondendo a uma pergunta sobre a possibilidade de “perda de materialidade” das fronteiras, divertiu-se: “Creio que a maior prova da materialidade da fronteira é o contrabando” [29] . Assim, também, Santos inverte o sentido de fragmentação, que aparentemente inviabilizaria a possibilidade de sobrevivência das chamadas “grandes narrativas” totalizantes, pois “na realidade o mundo sempre se fragmentou”, e é pela fragmentação que se dá a passagem de um tempo para outro. “A totalidade só se torna outra através da fragmentação. Fragmentação para construir outra coisa” [30] . Dessa forma, encara a chamada pós-modernidade com “um outro momento de construção”. Bem a propósito, no debate que se seguiu à aula inaugural proferida no Instituto de Geociências da Universidade Federal Fluminense em agosto de 1999, ironizando o desvirtuamento de interpretações do célebre comentário de Marx sempre citado nos estudos culturais sobre a pós-modernidade (“tudo que é sólido desmancha no ar”), o professor arrancou risos da platéia ao afirmar: “o território não desmancha”. De fato, como nota Manuel Castells, “se a primeira revolução industrial foi britânica, a primeira revolução da tecnologia da informação foi norte-americana” [31] , o que certamente diz alguma coisa sobre territórios. O autor percebe uma “continuidade da história espacial da tecnologia e industrialização na era da informação: os principais centros metropolitanos em todo o mundo continuam a acumular fatores indutores de inovação e a gerar sinergia na indústria e serviços avançados” [32] . As origens da “revolução tecnológica” também deixam clara essa relação: a associação entre empresas e universidades no Vale do Silício, a força cultural e empresarial de uma metrópole (São Francisco, EUA), a capacidade de vincular conhecimentos e informação diretamente relacionados à produção industrial e a aplicações comerciais desmistificam o conceito de inovação sem localidade geográfica na era da informação [33] . Entretanto, em sua abrangente análise, Castells não deixa de apresentar contradições. Por exemplo, anuncia sua opção metodológica avessa a determinismos: considera que nem a tecnologia determina a sociedade, nem o contrário; a tecnologia incorpora a sociedade e a sociedade utiliza a inovação tecnológica. Assim, busca enxergar a questão sob uma ótica que privilegia a interação dialética entre as várias forças em jogo, embora não desconheça a desigualdade dessas forças, e conclui que o dilema do determinismo tecnológico é um problema sem fundamento, “dado que a tecnologia é a sociedade, e a sociedade não pode ser entendida ou representada sem suas ferramentas tecnológicas” [34] . No entanto, imediatamente afirma que, “quando na década de 70 um novo paradigma tecnológico, organizado com base na tecnologia da informação, veio a ser constituído, principalmente nos Estados Unidos, foi um segmento específico da sociedade norteamericana, em interação com a economia global e a geopolítica mundial, que concretizou um novo estilo de produção, comunicação, gerenciamento e vida”. Mais adiante, sublinha a diferença fundamental que amplia o abismo entre a elite e o restante da sociedade: “as elites aprendem fazendo, e com isso modificam as aplicações da tecnologia, enquanto a maior parte das pessoas aprende usando, e, assim, permanecem dentro dos limites do pacote da tecnologia” [35] . www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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Fica difícil, nesse quadro, dizer que não há forças determinantes na condução do processo social. Talvez por isso o autor discorde da ênfase que Harvey dá à lógica capitalista no atual processo de transformação cultural, sob o argumento óbvio - e certamente inadequado, pois Harvey não incorre nesse simplismo mecanicista - de que “a cultura, em todas as suas manifestações, não reproduz simplesmente a lógica do sistema econômico”. Espaço de fluxos, “tempo real”
De todo modo, na análise de Castells há aspectos que nos estimulam a perceber a complexidade do processo atual. A começar pela abordagem que definirá a conceituação de “espaço de fluxos”: ao contrário da maioria das teorias sociais clássicas, “que supõem o domínio do espaço pelo tempo”, ele considera que o espaço organiza o tempo na sociedade em rede. Seria o “espaço de fluxos” (de informação, de capital, de tecnologia) “que, ao mesmo tempo, reúnem e separam - dependendo dos ciclos das empresas - seus componentes territoriais” [36] , mas que não abolem a existência de lugares (pois, afinal, o território não desmancha...). Assim, após demonstrar que o capital é global mas o trabalho continua sendo local, o autor conclui que “capital e trabalho tendem cada vez mais a existir em diferentes espaços e tempos: o espaço dos fluxos e o espaço dos lugares, tempo instantâneo de redes computadorizadas versus tempo cronológico da vida cotidiana” [37] . Assim, Castells argumenta que várias temporalidades subsistem, embora uma esteja emergindo como determinante: a que ele chama de “tempo intemporal”, próprio da estrutura da rede, onde passado e futuro se fundem num eterno presente. O autor reconhece que “as sociedades contemporâneas ainda estão em grande parte dominadas pelo conceito do tempo cronológico, descoberta categórica/mecânica que E. P. Thompson, entre outros, considera importantíssima para a constituição do capitalismo industrial”, mas afirma que [e]sse tempo linear, irreversível, mensurável e previsível está sendo fragmentado na sociedade em rede (...). No entanto, não estamos apenas testemunhando uma relativização do tempo de acordo com os contextos sociais ou (...) o retorno à reversibilidade temporal, como se a realidade pudesse ser inteiramente captada em mitos cíclicos. A transformação é mais profunda: é a mistura de tempos para criar um universo eterno que não se expande sozinho, mas que se mantém por si só, não cíclico, mas aleatório, não recursivo, mas incursor: tempo intemporal, utilizando a tecnologia para fugir dos contextos de sua existência e para apropriar, de maneira seletiva, qualquer valor que cada contexto possa oferecer ao presente eterno [38] . É uma noção que remete à sensação de simultaneidade. Mas, como enunciamos anteriormente, essa idéia tampouco é nova. Recorrendo a Barthes, Harvey anota o aparecimento do primeiro grande impulso cultural modernista na Paris pós-1848, relacionando manifestações no campo da arte e da literatura: As pinceladas de Manet, que começou a decompor o espaço tradicional da pintura e a alterar seu enquadramento, bem como a explorar as fragmentações da luz e da cor; os poemas e reflexões de Baudelaire, que buscava transcender a efemeridade e a estreita política do lugar à procura de significados eternos; os romances de Flaubert, com suas estruturas narrativas peculiares no espaço e no tempo (...) [explorando] a questão da representação da heterogeneidade e da diferença, da simultaneidade e da sincronia, num mundo em que tanto o www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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tempo como o espaço estão sendo absorvidos sob as forças homogeneizantes do dinheiro e da troca de mercadorias [39] . No início do século XX, Joyce se destacaria ao buscar apreender o sentido de simultaneidade. Data do mesmo período o Manifesto do Futurismo, de Marinetti, um elogio à velocidade: Nós declaramos que o esplendor do mundo se enriqueceu com uma beleza nova: a beleza da velocidade. Um automóvel de corrida com seu cofre adornado de grossos tubos como serpentes de fôlego explosivo... um automóvel rugidor, que parece correr sobre a metralha, é mais belo que a Vitória de Samotrácia. (...) Nós estamos sobre o promontório extremo dos séculos!... Para que olhar para trás, no momento em que é preciso arrombar as portas do impossível? O tempo e o espaço morreram ontem. Vivemos já no absoluto, já que nós criamos a eterna velocidade onipresente [40] . É por isso que Harvey, na parte final de seu estudo, sugere substituir a rígida distinção categórica entre modernismo e pós-modernismo pela análise do fluxo de relações interiores no capitalismo como um todo retomando a idéia de que o capital é um processo, uma relação social. Assim, talvez fosse possível dizer que essas experiências modernistas anteciparam o ambiente em que vivemos hoje, e que a novidade é a criação das condições para essa simultaneidade, com a transmissão e recepção instantânea de informações. A propósito, convém lembrar que o ressurgimento dos Jogos Olímpicos, em 1896, teve um papel decisivo como metáfora do mundo moderno, sintetizada no lema “mais alto, mais rápido, mais forte” [41] . A apropriação desse lema pela publicidade e os múltiplos significados que dele decorrem para a vida cotidiana contemporânea não deixam dúvidas quanto à força da metáfora. Mas retornemos a Castells e a seu “tempo intemporal”: podemos perceber que o conceito assemelha-se ao de “tempo de exposição”, formulado por Virilio em contrapartida ao tempo da cronologia, “que não pára, que escorre perpetuamente, o tempo linear do cotidiano”: o tempo da rápida tomada de imagens, da exposição da placa fotográfica à frequência da onda carregadora de fótons, o “tempo-luz” [42] . Assemelhase também ao “tempo instantâneo” ou “tempo sem tempo” explorado num dos workshops do NTC (Centro de Estudos e Pesquisas em Novas Tecnologias, Comunicação e Cultura) da USP, sobre “tempo real e espaço virtual”: tempo que, segundo conceituação de Edmond Couchot, tem outra natureza e não se refere à noção clássica do tempo que passa, da vida prática, mas existe numa relação quase instantânea com a máquina. O mesmo, aliás, se poderia dizer do “tempo de exposição” de Virilio [43] . Assim, a nova relação temporal é definida pela natureza do sistema e a finalidade a que se destina ao lidar com a informação. Marcos Dantas argumenta que o valor de uso da informação será tanto maior quanto mais acessível estiver o dado, por isso “o trabalho de busca e processamento visa, em essência, tornar imediato o acesso a um dado, acesso este que, obviamente, não foi imediato para quem o buscou e processou (que despendeu tempo de trabalho) mas o será para quem o usou” - para quem recebeu a comunicação. Assim, o efeito útil é a realização da comunicação, após o que seu valor se degrada. Dantas ressalta que informação não se estoca, embora o linguajar comum possa adotar expressões como “estoque de informação”, “armazenamento de informação” e outras metáforas semelhantes que, a rigor, www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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atrapalham uma correta compreensão do fenômeno. O que se pode guardar ou estocar são os suportes materiais contendo dados, nas formas de sinais registrados ou gravados, que serão informação se e quando postos numa relação comunicativa. Uma biblioteca não contém informação, contém livros, tanto quanto uma garagem contém carros e não locomoção, lembra Heinz von Foerster [44] . Pierre Lévy também ressalta que o tempo instaurado pela informática baseia-se no funcionamento de uma estrutura de banco de dados que não está programada para acumular informações, e sim para disponibilizar a versão mais atual “a um cliente com crédito”. Assim, não se trata tanto de difundir as luzes junto a um público indeterminado, mas sim de colocar uma informação operacional à disposição dos especialistas. Estes desejam obter a informação mais confiável, o mais rápido possível, para tomar a melhor decisão. Ocorre que esta informação operacional é essencialmente perecível, transitória. Quase dois terços dos dados atualmente armazenados no mundo representam informações econômicas, comerciais ou financeiras com características estratégicas [45] . Lévy refere-se ao amarzenamento não na perspectiva tradicional que supõe uma progressiva acumulação de conhecimento, mas no sentido de estabelecer uma base sobre a qual se dê uma constante atualização. A noção de tempo real, inventada pelos informatas, resume bem a característica principal, o espírito da informática: a condensação no presente, na operação em andamento. O conhecimento de tipo operacional oferecido pela informática está em tempo real [46] . Certamente sem atentar para a coexistência de diversas temporalidades, Ciro Marcondes Filho cita a associação que Fredric Jameson faz entre o “presente contínuo” do pós-moderno e o tempo do esquizofrênico - o território do inconsciente, onde não há temporalidade alguma -, vinculando-o à idéia de “fim da história”: a noção antiga do tempo nos havia engendrado essa de História. Ela é quem teria dado as condições de existência do conceito de história, de devir, de futuro, de projeto de vida. A crise desses conceitos é uma prova de que a temporalidade no sentido clássico - presente, passado e futuro - não acontece mais. (...) [t]udo é vivência imediata. Não há exemplo mais claro do que os equipamentos eletrônicos, em que tudo é instantâneo. Nossa vivência, nossa capacidade de participar, influir, fica prejudicada, pois as coisas não caminham para um lugar, são só aquilo, terminam ali. O tempo na era tecnológica nos desvencilha daquele componente histórico que existia antes [47] . É apenas articulada a essa noção de “fim da história”, capaz de “embaralha[r] presente, passado e futuro”, que Castells considera possível o surgimento do conceito de tempo “intemporal”. Lévy também se refere a esse conceito, relacionando-o ao seu objeto de estudo (os “três tempos do espírito”, relativos à oralidade primária, à escrita e à informática) e sugerindo a ocorrência de uma implosão cronológica provocada pelo tempo “pontual” da era das redes. O “fim da história” não seria, porém, o fim da aventura humana, mas sim sua entrada em um ritmo novo, num devir que aparentemente caminha muito depressa, mas não quer saber de onde vem ou para onde vai: “ele é a velocidade” [48] . Mas talvez seja este apenas mais um véu a encobrir relações de poder muito concretas. Pois, na www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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interpretação de Bauman, a integração e a reprodução da “ordem global” toma mais uma vez o disfarce de um processo espontâneo e impelido por si mesmo. A grande novidade da modernidade foi apresentar a criação, preservação e continuidade da “ordem” como uma tarefa - um propósito dificilmente atingível sem uma ação humana decidida, concertada e consciente da sua meta. Mas a produção da ordem não é vista mais como uma tarefa; ao contrário, toda ação que visa a impor uma ordem diferente daquela em vigor é suspeita de interferir indevidamente na capacidade e poder da “mão invisível” (com ênfase no invisível) [49] . A complexidade do tema começa pelo estágio proficuamente especulativo da discussão. Mas o problema principal parece estar no ato de tomar uma noção de tempo restrita à sua relação com a máquina e estendêla para o conjunto da vida social - a tensão já indicada por Castells entre o “tempo instantâneo das redes” e o “tempo cronológico do cotidiano”. Daí a simplificação quando se fala em “fim da história”, pois a perspectiva que surge imediatamente é aquela popularizada por Francis Fukuyama, e já desqualificada por autores sérios pela frágil fundamentação teórica reveladora de um óbvio comprometimento ideológico, segundo a qual o fim da guerra fria marcaria o desaparecimento da dualidade entre os modelos de sociedade até então em conflito, e portanto o capitalismo liberal democrático seria o ponto de chegada da humanidade. Totalmente distinta é a abordagem sugerida, por exemplo, por Nicolau Sevcenko, que substitui a história com “H” maiúsculo (vinculada à idéia de progresso, à perspectiva etnocêntrica homogeneizante em que uma única voz é a narradora ou controla a locução de todas as outras) por “uma concepção de historicidade dentro de um campo relacional, na qual os fatos são tratados como singularidades e compostos de forma a não refletirem uma percepção hierarquizada da cadeia de eventos”. Recorrendo à crítica da cultura ocidental empreendida por Nietzsche, o professor sugere que o “fim da História” representaria a rejeição da longa herança de princípios finalistas que marcam esse campo de saber, mas não o fim da historicidade do homem. “Todo ser humano é, antes de mais nada, um ser histórico”, afirma ele, lembrando-se dos versos de Eliot que o ajudaram a definir-se sobre a carreira que seguiria na vida: “tempo presente e tempo passado são ambos presentes no tempo futuro” [50] . Além de constituir uma polêmica atual para os próprios historiadores - e que, portanto, não caberia discutir aqui -, o problema apresentado expõe uma questão epistemológica central: a adoção ou não de uma perspectiva totalizadora, que não seja simplesmente sinônimo de etnocentrismo, mas que represente uma forma (entre tantas possíveis) de apreender o mundo e dar-lhe sentido. Milton Santos parece partir dessa hipótese: Tempo, espaço e mundo são realidades históricas que devem ser intelectualmente reconstruídas em termos de sistema, isto é, como mutuamente conversíveis, se a nossa preocupação epistemológica é totalizadora. Em qualquer momento, o ponto de partida é a sociedade humana realizando-se. Essa realização dá-se sobre uma base material: o espaço e seu uso, o tempo e seu uso; a materialidade e suas diversas formas, as ações e suas diversas feições [51] . Sintetizando: “há muitos mapas, mas o mundo é um só” [52] . Cabe também destacar que a abordagem de Sevcenko sobre o “fim da história” não parece autorizar a www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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combinação aleatória de eventos, como sugere Castells. Uma fala de Eric Hobsbawm, aliás, é esclarecedora em relação a esse processo. A referência é pertinente, embora o historiador inglês se encaixe na tradição iluminista criticada por Sevcenko, de vez que, nesse exemplo, não está em causa a questão do método, mas a defesa da necessidade de se cultivar a capacidade de conhecer e encadear fatos, pois “todo aquele que já tenha ouvido um estudante americano inteligente perguntar-lhe se o fato de falar em ‘Segunda Guerra Mundial’ significa que houve uma ‘Primeira Guerra Mundial’ [sabe] muito bem que nem sequer o conhecimento de fatos básicos do século pode ser dado por certo”. A destruição do passado - ou melhor, dos mecanismos sociais que vinculam nossa experiência pessoal à das gerações passadas - é um dos fenômenos mais característicos e lúgubres do final do século XX. Quase todos os jovens de hoje crescem numa espécie de presente contínuo, sem qualquer relação orgânica com o passado público da época em que vivem. Por isso os historiadores, cujo ofício é lembrar o que os outros esquecem, tornam-se mais importantes que nunca no fim do segundo milênio [53] . Tampouco é demais recordar as conseqüências que podem advir desse eterno presente, tão bem expressas na ficção premonitória e apocalíptica de Orwell em 1984: a “atualização” permanente da história, moldada de acordo com os interesses de um poder tentacular. Não é por acaso que tantos teóricos da comunicação citam a novilíngua como exemplo em suas análises sobre as estratégias para a domesticação de consciências. A leitura mais atenta da análise de Castells, além do mais, revela uma imprecisão conceitual grave debaixo de um exercício de estilo: “[a] libertação do capital em relação ao tempo e a fuga da cultura ao relógio são decisivamente facilitadas pelas novas tecnologias da informação e embutidas na estrutura da sociedade em rede” [54] . Pois a desregulamentação e a flexibilidade atuais não representam libertação alguma, apenas uma nova forma de lidar com o tempo para “economizá-lo” e daí extrair mais-valia. Da mesma maneira, a fuga da cultura ao relógio, que costuma ser apresentada também como libertação - inclusive e especialmente pela mídia -, esconde um novo e invisível aprisionamento. Depois de horas seguidas de serviço, o operário de Chaplin deixa a fábrica repetindo mecanicamente os movimentos da linha de montagem: já nos tempos modernos dos anos 30 o ritmo do trabalho invadia a vida. O fim do expediente nunca foi a liberdade do lazer: Marcuse já percebia a reprodução, em casa, das rotinas do trabalho [55] . Christophe Déjours retomou a perspectiva dessa concepção utilitarista de tempo permeando o cotidiano, de modo que mesmo as férias do trabalhador devem ser produtivas: o ócio seria pura perda de tempo [56] . A indiferenciação formal entre os tempos de trabalho e lazer, hoje, só favorecem essa mistura. Não é outro, aliás, o projeto dos programas de qualidade total, que procuram “educar” o trabalhador e torná-lo “competitivo” visando não apenas o seu desempenho na empresa, mas a sua atitude diante da vida. Tudo muito coerente com a “sociedade de rede” e revelador de um aspecto perverso da enganosa suavidade dessa “fluidez”: o trabalhador “livre” do relógio, o trabalhador sem horário fixo é o trabalhador em tempo integral. Mas não devemos nos alongar em considerações a respeito dos desdobramentos e das perspectivas da “sociedade em rede” e seus espaços virtuais. Não só porque são muitos os riscos da análise sobre processos ainda incipientes: o próprio Castells dá um exemplo ao citar “uma importante pesquisa européia sobre www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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telecomutação”, realizada em 1988, que informou - e, segundo ele, não em tom de brincadeira - existirem, na época, “mais pessoas fazendo pesquisas sobre teletrabalho do que teletrabalhadores reais” [57] . Ou porque, como diz Armand Mattelart, “a empresa global (e por conseguinte a economia global que ela entende comandar) é antes um projeto que uma realidade” [58] . Mas sobretudo porque nosso objetivo de discutir a velocidade como fetiche, expressa exemplarmente no caso do jornalismo, se baseia no quadro já apresentado de percepção da aceleração do tempo, que se radicaliza hoje na era das redes. A imprensa nos trilhos do capital
“Imprensa e capitalismo são pares gêmeos”, afirma Ciro Marcondes Filho em sua tentativa de associar o nascimento e desenvolvimento daquela atividade profissional com esse determinado modo de produção, buscando ver como a notícia se torna mercadoria e aplicando-lhe, conseqüentemente, os conceitos de valor de uso e valor de troca da teoria marxista [59] . Adelmo Genro Filho já fez uma boa crítica dessa perspectiva, que reduz a possibilidade de uma imprensa crítica e transformadora a seu “valor de uso genérico”, identificado no campo do debate político-partidário, enquanto o “valor de uso específico” seria reduzido a zero, pois tal jornalismo não teria condições de produzir as informações relativas à imediaticidade dos fenômenos, tais como são tratados pela imprensa diária, e que correspondem a necessidades reais de informação do público [60] . Mas, embora com enfoques e conclusões distintos, os dois autores sustentam suas teses a partir de uma orientação marxista na abordagem da história da imprensa. É também o que faz Marcos Dantas em seu estudo sobre o desenvolvimento das tecnologias da informação, lembrando que [o] fato de Marx ter baseado sua análise da acumulação capitalista na apropriação da maisvalia da força de trabalho simples obscureceu a importância - logo, o valor - que o capital sempre deu à informação. Já no século XIII, os banqueiros e grandes comerciantes sustentavam redatores profissionais nas diferentes capitais européias e mediterrâneas para que periodicamente lhes enviassem relatórios sobre fatos políticos, bélicos ou comerciais que pudessem afetar, positiva ou negativamente, os negócios. Nesses relatórios encontra-se a origem remota do moderno jornalismo [61] . Marcondes Filho aponta a importância do jornal como instrumento do capitalismo para a circulação mais rápida de mercadorias e para que “as informações sobre exportações, importações e movimento do capital chegassem mais depressa e mais diretamente aos componentes do circuito comercial [62] . Assim, como nota Habermas, “a circulação de notícias desenvolve-se não somente em conexão com as necessidades da circulação de mercadorias, as próprias notícias tornam-se mercadorias” [63] . Desde a origem, portanto, a produção de notícias estará sujeita às leis do mercado. Habermas considera, porém, que só se pode falar propriamente de jornalismo quando as notícias passam a ser produzidas empresarialmente, quando “o noticiário regular torna-se público e, melhor: acessível ao público em geral”, o que ocorre apenas em fins do século XVII. Começa a se delinear aí, também, a importância política da imprensa como instrumento da burguesia contra o absolutismo. Tratando não apenas de jornais, mas da atividade impressa em seu conjunto, Robert Darnton anota o papel decisivo do desenvolvimento técnico para a ampliação da luta política: www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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Os historiadores tratam em geral a palavra impressa como um registro do que aconteceu e não como um ingrediente do acontecimento. Mas a prensa tipográfica ajudou a dar forma aos eventos que registrava. Foi uma força ativa na história, especialmente durante a década de 1789-1799, quando a luta pelo poder foi uma luta pelo domínio da opinião pública. (...) Imaginem um mundo sem telefone, rádio, televisão, no qual a única maneira de comover a opinião numa escala nacional é o tipo móvel. Imaginem esse mundo explodindo. Fragmenta-se em milhares de pedaços. Um grupo de homens tenta ajuntá-los numa nova ordem, começando com uma Declaração dos Direitos do Homem e continuando com novos modelos para uma constituição, uma administração, a igreja, a moeda, o calendário, o mapa, pesos e medidas, formas de tratamento e a própria linguagem. Em cada estágio desse processo, usam a mesma ferramenta básica: a prensa tipográfica. Sem a imprensa, podem conquistar a Bastilha, mas não podem derrubar o Antigo Regime. Para tomar o poder têm que tomar a palavra e difundi-la (...). Quando os revolucionários agarraram a alavanca da prensa e a fizeram baixar nos tipos travados na forma, enviaram um novo fluxo de energia através do corpo político. A França voltou à vida, e a humanidade se assombrou [64] . Mas, apesar das raízes iluministas que forneceriam os princípios para o exercício do jornalismo, até aquela época a imprensa ainda não havia alcançado prestígio como instrumento para expressão de idéias. Valorizados eram os livros e brochuras. A esse respeito, Albert e Terrou reproduzem um comentário de Rousseau, de 1755: O que é um livro periódico? Uma obra efêmera, sem mérito e sem utilidade, cuja leitura, negligenciada e desprezada pelos letrados, só serve para dar às mulheres e aos tolos vaidade sem instrução [65] . Também Diderot, na Enciclopédia, faria comentário semelhante: Todos esses papéis são o alimento dos ignorantes, o recurso dos que querem falar e julgar sem ler, o flagelo e o desgosto dos que trabalham. Nunca levaram um bom espírito a produzir uma boa linha, nem impediram um mau autor de fazer uma obra má [66] . Foi a precipitação dos acontecimentos em 1789 que deu à imprensa, na França, o status que já havia obtido na independência americana, como instrumento fundamental para o esclarecimento das multidões. Brissot resumiria esse papel iluminista: É preciso encontrar um outro meio que não as brochuras para instruir todos os franceses, incessantemente, com pouca despesa e sob uma forma que não os fatigue. Tal meio é um jornal político ou uma gazeta: esta é a única forma de instrução de uma nação numerosa (...) pouco acostumada a ler e que procura sair da ignorância e da escuridão. Sem as gazetas a revolução na América (...) nunca teria acontecido [67] . Porém, como nota Nicolau Sevcenko, quando o absolutismo foi suplantado e se instalaram os primeiros regimes liberais, “a situação estava longe de ser luminosa. A imprensa logo se tornou ela mesma um instrumento de manipulação, distorção e corrupção política, cruamente retratado nas Ilusões perdidas, de Balzac” [68] . E começaria a se tornar poderosa como empresa, especialmente a partir das últimas décadas do século XIX, quando se formam os primeiros grandes conglomerados jornalísticos. www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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Mas já no início daquele século a imprensa começa a transformar-se, incorporando as novidades técnicas que surgiam no campo das comunicações para a produção maciça de jornais. A utilização da prensa rápida, criada por Friedrich König, foi o marco inicial desse processo que culminaria, no fim do século XIX, com a linotipo de Mergenthaler, que garante a aceleração da composição. A corrida para a revolução nas técnicas de imprensa (...) era o ponto de partida para a produção em massa que permitia reduzir o custo e acelerava extraordinariamente a circulação. Era outra prova da interligação entre o desenvolvimento da imprensa e o desenvolvimento capitalista. O desenvolvimento das bases da produção em massa, de que a imprensa participou amplamente, acompanhou o surto demográfico da população ocidental e sua concentração urbana; paralelamente, a produção ascensional provocou a abertura de novos mercados, a necessidade de conquistá-los conferiu importância à propaganda, e o anúncio apareceu como traço ostensivo das ligações entre a imprensa e as demais formas de produção de mercadorias [69] . O Times, de Londres, adotou a prensa de König em novembro de 1814, conseguindo a impressão de mil exemplares por hora e reduzindo sensivelmente o tempo entre a ocorrência de um fato e sua divulgação em um grande território. Além disso, o jornal ganhava três horas sobre seus concorrentes por expedir os exemplares diretamente para o interior através do trem da estação de Euston [70] . Entretanto, “o que o jornal não transmitiu aos seus leitores foi o fato de que uma máquina tão impressionante não poderia ser utilizada sem um gasto financeiro considerável, e que os custos mal poderiam ser cobertos com o produto da venda” [71] . Assim, a liberdade política começa a ser limitada pelas exigências econômicas: a imprensa, para sobreviver, necessitará de investimentos crescentes em equipamentos. Marcondes Filho aponta a separação entre imprensa como empresa capitalista e imprensa partidária, “puramente política (doutrinária, ideológica)”, dos partidos social-democratas e socialistas, de fundamental importância na luta política de fins do século XIX. “A imprensa burguesa, particularmente a partir de 1830, começara a definir-se como imprensa de negócios para o comércio de anúncios. É nessa mercantilização do jornalismo que se separam as tendências” [72] . O autor ressalta que, como empresa capitalista, é essa imprensa que mantém as características originais da atividade jornalística: a busca da notícia, o furo, o caráter de atualidade, a aparência de neutralidade, em suma, o caráter “libertário e independente”. E argumenta que, “assim como o funcionamento econômico é regido pelo laissez-faire, também em pleno capitalismo concorrencial a atividade jornalística reflete o livre jogo de forças capitalistas da disputa política”, o que lhe confere uma aparência pluralista, distintamente do caráter da imprensa partidária, contrária à lógica empresarial. O negócio da imprensa cresce com o surgimento das agências de notícias (entre 1835 e 1851 seriam criadas a Havas, francesa, a Wolff, alemã, e a Reuters, britânica, que, em 1870, formariam um cartel para partilhar entre si o mercado mundial). Segundo Mattelart, o traço distintivo da Havas é associar informação e publicidade, tornando-se precursora dos grupos multimídia do século XX. Na década de 1930, as americanas Associated Press e United Press International passam a investir também no mercado mundial [73] . Mas já na primeira metade do século XIX começa a se formar a imprensa de massas, resultante das www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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possibilidades técnicas de produção em larga escala. O New York Sun, lançado em 1833, foi o primeiro jornal desse tipo, [sem] nenhum artigo de fundo politicamente diferenciado, senão relatos sobre processos de justiça, execuções, suicídios, ocorrências locais e acontecimentos mundiais extraordinários. (...) Nos anos 1880-90, começa nos Estados Unidos a grande produção em massa. As misturas de sensacionalismo da imprensa de um penny são, então, refinadas e apresentadas tecnicamente com mais efeitos a partir de 1883 no jornal de Joseph Pulitzer, [New York] World . Aqui surge uma mescla de indiscrição, sensações, escândalos, a que se denomina, a partir daí, “interesse humano” [74] . Os comics, que surgiram em 1894, seriam um ingrediente importante na disputa de mercado entre o World e o New York Journal , de Randolph Hearst (como se sabe, foi um desses personagens de quadrinhos, o Yellow Kid , que acabou batizando aquele tipo de imprensa - yellow, para os americanos, marrom para nós). Pouco antes (1880), na França, são os folhetins o centro da briga entre o Le Petit Parisien (que em 1890 tornou-se o primeiro jornal europeu a ultrapassar a tiragem de 1 milhão de exemplares) e o Le Petit Journal , ambos publicando dois a três folhetins ao mesmo tempo, com a ajuda importante de campanhas promocionais [75] . Marcondes Filho vê entre o jornal dito “sensacionalista” e o outro dito “sério” uma diferença apenas de grau, pois, em ambos, tudo que se vende é aparência e, na verdade, vende-se aquilo que a informação interna não irá desenvolver melhor do que a manchete. (...) No jornalismo sensacionalista as notícias funcionam como pseudo-alimentos às carências do espírito. No jornal informativo comum esse caráter era menos destacado, não deixando entretanto a forma noticiosa de ser sensacional. O jornalismo sensacionalista extrai do fato, da notícia, a sua carga emotiva e apelativa e a enaltece. Fabrica uma nova notícia que a partir daí passa a se vender por si mesma. Os fatos sociais, embora não sendo sempre necessariamente notícia, uma vez trabalhados para esse fim assumiam o caráter de mercadoria [76] . Genro Filho partilha dessa interpretação, considerando que toda notícia é, de certa forma, sensacionalista, porque é construída de modo a apelar aos sentidos do público. Mas encara o jornalismo de forma bem distinta, como “forma de conhecimento do mundo” baseada no fato singular - e por isso afirma que o “segredo da pirâmide” é que ela não é invertida, como indica a técnica de redação predominante, mas está em sua posição direita, com o vértice no topo, se quisermos caracterizar o percurso de apreensão do fato singular objeto do jornalismo [77] . À parte o interesse dessa abordagem para a teoria do jornalismo, importa aqui perceber como essa “forma de conhecimento” é afetada pela competição entre os jornais na busca da “notícia em primeira mão”. É em torno dessa idéia de dinamismo que a imagem da atividade jornalística se constrói: meninos jornaleiros saem às ruas apregoando edições extras, efeitos sonoros vibrantes despertam o ouvinte para notícias curtas e rápidas, vinhetas alertam o espectador para o bombardeio de imagens. Notícias de última hora: tudo é urgência. É a ideologia da velocidade e do progresso, no dizer de François Brune: www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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Tudo que se move no mundo, tudo que anda depressa, progride. Toda mobilidade é positiva: o mal maior é ser “ultrapassado”. A maioria das competições é à base de velocidade, mas é em todos os domínios que é preciso andar depressa, pensar rápido, viver rápido. (...) Naturalmente, a vertigem da velocidade leva a aceitar em bloco todas as evoluções modernas [78] . Adauto Novaes fala da angústia gerada nesse quadro: [A]dmiramos a velocidade (que em um centésimo de segundo põe em jogo prestígio, dinheiro, interesses - já não sabemos viver a vida lenta e inexata); vivemos a era dos ruídos e da fala ininterrupta da televisão e do rádio (começamos a esquecer como é fecundar o silêncio, [entendendo-o] não como ausência de palavra mas como condição de existência da própria palavra; ...[pois] é o intervalo entre as palavras - o silêncio - que dá sentido à linguagem;) ...vivemos ainda o excesso de imagens ... mas vivemos principalmente a perda do sentimento do tempo ao considerarmos que “as coisas rápidas são muito lentas e que as próprias mensagens elétricas fazem morrer de tédio”. [79] Na pesquisa comparativa que desenvolveram em 1979 sobre a informatização no jornalismo impresso e a influência das novas tecnologias na França, na Grã-Bretanha, nos Estados Unidos e na Escandinávia [80] , Dominique Wolton e J.-L. Lepigeon verificaram o entusiasmo da maior parte dos entrevistados diante do que previam ser uma revolução na imprensa e na própria informação. Vinte anos depois, Wolton observa que essas mudanças técnicas, embora consideráveis, não representaram a revolução anunciada, “uma nova concepção da informação e do jornalismo”. Tomando por base o ideal clássico do jornalismo, o autor apresenta sua crítica ao discurso que projetava mudanças positivas no setor: Hoje, com a onipresença da informática e de todos os meios técnicos mais sofisticados, não parece que a informação e a imprensa tenham mudado muito do ponto de vista do conteúdo e de seu papel. Isso demonstra uma vez mais que uma inovação técnica, por forte que seja, não leva consigo, mecanicamente, uma transformação profunda do conteúdo das atividades. Não apenas o tempo técnico não é o tempo social, mas sobretudo a mudança técnica gera problemas novos, inesperados, que não estavam presentes nos famosos discursos premonitórios. (...) Todos esses fracassos deveriam fazer refletir, mas nada foi feito. (...) Mais que compreender que as sociedades não evoluem no ritmo das inovações técnicas, fala-se de “resistência à mudança” e de medo do futuro. (...) Tudo menos pôr em dúvida essa urgência do tempo e essa confusão entre tempo técnico e tempo social [81] . A clareza na percepção da diferença entre as duas temporalidades não esconde, porém, o equívoco de um aspecto da análise. Pois, na era do “tempo real”, quando a informação deve ser instantânea para ter valor, o jornalismo mudou profundamente, a ponto de descaracterizar-se, embora os grandes conglomerados multimídia venham consolidando seu poder econômico e político. Nessa “virada na história da informação”, como a classifica Ignacio Ramonet, a televisão tem um papel central, porque passou a ser a mídia que dá o tom e o ritmo às demais - daí, segundo ele, não se poder mais tratar isoladamente do jornalismo impresso. Se a televisão assim se impôs, foi não só porque ela apresenta um espetáculo, mas também porque ela se tornou um meio de informação mais rápido que os outros, tecnologicamente apta, desde o fim dos anos 80, pelo sinal dos satélites, a transmitir imagens instantaneamente, à velocidade da luz [82] . www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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A ênfase no “ao vivo”, além de reduzir o tempo da análise e da reflexão, cria o efeito de que todos, repórteres e público, são testemunhas oculares da “história em movimento”. Ramonet aponta aí o retorno à idéia pré-iluminista (de fato, pré-renascentista) de que “ver é compreender”. Não obstante, a racionalidade moderna, desde o século XVIII, com as Luzes e a revolução científica, desenvolveu-se precisamente contra essa idéia. Não são os olhos e sentidos que permitem compreender, é a razão, só ela. Enquanto os sentidos enganam, o cérebro, o raciocínio, a inteligência, são mais confiáveis. Portanto, o sistema atual só pode conduzir à irracionalidade ou ao erro [83] . Sem falar na superabundância de informações disponibilizadas, que geram o que Ramonet chama de censura pelo excesso. O exemplo clássico é a guerra do Golfo. A mídia não disse: “vai haver uma guerra e não vamos mostrá-la”. Pelo contrário, ela disse: “vocês vão ver a guerra diretamente”. E ela mostrou imagens tais que todo mundo acreditava estar vendo a guerra, a ponto de ninguém compreender que não a via, que aquelas imagens mascaravam silêncios; que aquelas imagens eram na maioria das vezes falsas, reconstruções, enganações. De fato, elas ocultavam aquela guerra a ponto de Jean Baudrillard poder escrever um livro intitulado A guerra do Golfo não aconteceu [84] . No mesmo sentido, Marcondes Filho fala no mito da transparência, no contexto da vitória do neoliberalismo articulado às tecnologias da comunicação: criticá-las é rejeitar o progresso, pois o “pensamento único” não deixa saídas: ou este mundo ou nenhum outro. Nesse quadro, a ideologia da transparência é o único horizonte possível da imprensa: segundo ele, o que importa hoje, em termos de jornalismo, é “ver claramente a realidade, o sentido”, isto é: bom é tudo aquilo que é diáfano, translúcido, visível; todos os espaços, territórios, processos que se deixam ver [85] . O autor localiza a origem dessa idéia na concepção do panóptico, de Bentham. Bauman, porém, recorre ao estudo de Thomas Mathiesen [86] para argumentar que esse sistema de coesão e controle social foi sendo pouco a pouco substituído pelo sinóptico: em vez de poucos vigiarem muitos, agora são muitos que vigiam poucos. “A maioria não tem outra opção senão vigiar”, diz ele, referindo-se à anulação do privado pelo público operada na pós-modernidade e ao valor de transparência que se confere automaticamente à exposição da privacidade, tanto de “grandes e famosos (grandes porque famosos)” quanto das pessoas comuns, nos inúmeros shows de variedades da TV - e, atualmente, em programas exclusivamente projetados para esse fim, na pista do sucesso de iniciativas semelhantes na internet. O retorno da política
Todas essas transformações fazem mais sentido, e permitem pensar em perspectivas, no contexto da “história da comunicação internacional”, que, segundo Mattelart, “é a história dos entrelaçamentos que se foram tecendo entre guerra, progresso e cultura”. A comunicação serve, antes de tudo, para fazer a guerra. (...) Ora, a guerra e sua lógica são componentes essenciais da história da comunicação internacional, de suas doutrinas e teorias, www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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assim como da forma como foi utilizada em diferentes circunstâncias. Tal fato verificou-se desde o aparecimento do telégrafo e da fotografia. E a jurisprudência estabelecida - há quase cento e quarenta anos, por ocasião da guerra da Criméia - a propósito da “transposição da guerra em imagem”, é a primeira de uma longa série de decisões que vieram a desembocar, em janeiro de 1991, no controle total da informação pelas autoridades militares. A Primeira Guerra Mundial um conflito “total” que afetou um número crescente de pessoas - foi a primeira experiência de massa a partir da qual a teoria da comunicação formulou suas hipóteses sobre a gestão das grandes multidões. (...) Fato altamente simbólico: nos anos 50, em plena guerra fria, é que vai ser publicado, nos Estados Unidos, o primeiro ensaio de construção de uma disciplina “comunicação internacional”, sob a tutela da sociologia empirista [87] . Mattelart não se detém sobre a internet, que como se sabe também resulta de um esforço originado no campo militar, nos anos 60, quando a Agência de Projetos de Pesquisa Avançada do Departamento de Defesa dos Estados Unidos desenvolveu um sistema de rede (a arpanet) com o objetivo de preservar as comunicações em caso de guerra nuclear. Mas cita os episódios que marcaram a “desinformação proposital e consentida” durante a guerra do Golfo, em 1991, para afirmar que “os velhos métodos de manipulação foram se modernizando desde o fim das guerras do Sudeste Asiático, tornando cada vez mais frágil a linha tênue que separa a informação da propaganda” [88] . A referência ao vínculo entre comunicação e progresso é mais ou menos óbvia, e a simbiose é tal que, com o impressionante desenvolvimento tecnológico dos anos 80, comunicação passa a ser sinônimo de progresso, a ponto de sugerir a concretização de utopias como a da “aldeia global” de McLuhan e outros conceitos semelhantes. Mattelart aponta, porém, o declínio dessa euforia com a emergência do debate sobre a gestão internacional da desigualdade do desenvolvimento, sintetizado, no que diz respeito à comunicação, no documento da Unesco sobre a Nova Ordem Informativa. Embora interrompido com a derrota do socialismo, o fim da URSS e a emergência do “pensamento único” neoliberal, esse debate forneceu as linhas para o enfoque da comunicação como cultura, numa vertente distinta da inaugurada pela Escola de Frankfurt, embora as críticas a esses pensadores geralmente não levem em conta um aspecto fundamental de seu trabalho, sublinhado por Marilena Chauí: a atenção ao conceito de “massa”, uma vez que os frankfurtianos lidavam com a idéia de que “a cultura dita de ‘massa’ é a negação de uma cultura democrática, pois em uma democracia não há massa; nela, o aglutinado amorfo de seres humanos sem rosto e sem vontade é algo que tende a desaparecer para dar lugar a sujeitos sociais e políticos válidos” [89] . Segundo Mattelart, a ênfase sobre a cultura tem, entre outras, a vantagem de formular “interrogações críticas sobre a pseudo-universalidade de um modo de crescimento e desenvolvimento incapaz de fornecer a todos o que tinha conseguido realizar para alguns”. É um debate ainda incipiente, como reconhece o autor, que talvez por isso tenha dado à conclusão de seu estudo o título de “o enigma”. Não é o caso de tentar decifrá-lo aqui, mas de perceber que essa forma de pensar a comunicação fornece a possibilidade de associar informação e velocidade - conforme as necessidades da guerra e de acordo com uma determinada noção de progresso - ao mesmo tempo que permite vislumbrar perspectivas críticas ao “pensamento único”, a partir dos estudos sobre a cultura. Especialmente se esses estudos forem perpassados por uma recuperação do sentido da política nas atividades humanas, como insinua o questionamento de www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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Milton Santos: A história é comandada pelos grandes atores desse tempo real, que são, ao mesmo tempo, os donos da velocidade e os autores do discurso ideológico. Os homens não são igualmente atores desse tempo real. Fisicamente, isto é, potencialmente, ele existe para todos. Mas efetivamente, isto é, socialmente, ele é excludente e assegura exclusividades, ou, pelo menos, privilégios de uso. Como ele é utilizado por um número reduzido de atores, devemos distinguir entre a noção de fluidez potencial e a noção de fluidez efetiva. Se a técnica cria aparentemente para todos a possibilidade da fluidez, quem, todavia, é fluido realmente? Que empresas são realmente fluidas? Que pessoas? Quem, de fato, utiliza em seu favor esse tempo real? A quem, realmente, cabe a mais-valia criada a partir dessa nova possibilidade de utilização do tempo? Quem pode e quem não pode? [90] A resposta foi manchete da Folha de S. Paulo de 23 de junho de 2000: “Nem 5% do mundo usa Internet, diz ONU; estudo mostra que o acesso à rede está concentrado na América do Norte, na Europa Ocidental e no Japão”. A matéria dá mais detalhes: “Quase metade dos internautas está nos EUA. Na Finlândia há mais servidores que em toda a América Latina. E, em Nova Iorque, o número é superior ao da África”. E, adiante: “...os especialistas [da ONU] pedem ação urgente para que, até 2005, todos tenham acesso à Internet, ainda que precisem caminhar durante meio dia até o micro mais próximo”. Talvez não seja necessário sublinhar a enorme diferença que continua existindo entre quem precisa apenas apertar um botão para se conectar à rede e quem é obrigado a caminhar durante meio dia para chegar a um computador. Sem contar a insinuação de que a simples existência da tecnologia representa uma conquista: está aí a velha idéia formalista de progresso, que não leva em consideração as possibilidades (culturais, inclusive) de uso dessa tecnologia. Escrevendo cinco anos antes, mas informado por documentos de teor semelhante, Castells afirmava: Não apenas a opção da multimídia ficará restrita àqueles com tempo e dinheiro para o acesso e aos países e regiões com o necessário mercado potencial, mas também as diferenças culturais/educacionais serão decisivas no uso da interação para o proveito de cada usuário. A informação sobre o que procurar e o conhecimento sobre como usar a mensagem será essencial para se conhecer verdadeiramente um sistema diferente da mídia de massa personalizada. Assim, o mundo da multimídia será habitado por duas populações essencialmente distintas: a interagente e a receptora da interação, ou seja, aqueles capazes de selecionar seus circuitos multidirecionais de comunicação e os que recebem um número restrito de opções pré-empacotadas. E quem é o quê será amplamente determinado pela classe, raça, sexo, país [91] . O paralelo da “era da informação” com a “era do rádio” é quase inevitável. Como se sabe, nos anos 20 Brecht saudou aquele novo meio de comunicação diante das perspectivas então abertas para a radicalização da democracia. Mas logo se instalou o controle: prevaleceram os interesses da indústria fabricante de equipamentos e a radiofonia se transformou num oligopólio com o exclusivo poder de emissão, deixando ao público a condição de receptor [92] . A “fluidez” da “era da informação” sugere a pulverização do poder, mas não é bem assim: não só permanece a diferença objetiva entre classes sociais e populações inteiras como o próprio controle da rede está sendo articulado de acordo com interesses comerciais. www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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Em entrevista à Folha de S. Paulo [93] , Lawrence Lessig, professor em Harvard e autor de Code and other laws of cyberspace, falou sobre os riscos de monopólio nesse espaço fluido, citando como exemplo a compra da Time-Warner pela AOL: Se a arquitetura da internet permanecer tão larga como é hoje, o tamanho da AOL não é importante, pois é fácil mudar de provedor. Mas o receio é que eles estejam fundindo a nova arquitetura da internet para possibilitar provedores como as companhias de cabo, que irão fornecer esse serviço para controlar a qual provedor você terá acesso. Isso significará que eles vão poder controlar mais facilmente o tipo de conteúdo que você poderá conseguir no ciberespaço. E esse é o medo, esse é o perigo - de como o comércio transformará a arquitetura da internet para tornar possível que essas grandes companhias tenham um poder efetivo de monopólio. Previsões à parte, Lessig afirmou que o ciberespaço está se tornando cada vez menos livre, em consequência da regulamentação imposta pelo governo americano especialmente em torno de direitos autorais, a partir de pressões das empresas que atuam no setor. ...essa tendência de patentes comerciais no ciberespaço é extremamente perigosa, especialmente para as pessoas fora dos Estados Unidos, porque o que isso implica é que, para usar uma idéia ou uma certa tecnologia no ciberespaço, a pessoa terá de vir para os Estados Unidos e conseguir uma permissão dos detentores da patente. Assim, pessoas que têm advogados americanos estão numa posição melhor do que as que têm advogados brasileiros. Ou pessoas que têm idéias no Brasil estão em muito mais desvantagem do que pessoas que têm idéias nos Estados Unidos. Portanto, esse mercado global torna-se tendencioso em favor dos americanos, o que é bastante perigoso.
[8] David Harvey. Condição pós-moderna. São Paulo, Loyola, 1993, p. 189. [9] D. Landes. Revolution in time: clocks and the making of the modern world , apud Harvey, op. cit., p. 209. [10] Paul Virilio. “O resto do tempo”, trad. Juremir Machado da Silva. Porto Alegre, PUCRS. [11] Harvey. op. cit., p. 188. [12] Idem, p. 229. [13] Zygmunt Bauman. Em busca da política. Rio de Janeiro, Jorge Zahar, 2000, p. 38. [14] Gilles Deleuze. Conversações. Rio de Janeiro, 34, 1992, p. 221-222. [15] Harvey. op. cit, p. 209-210. [16] Manuel Castells. A era da informação: economia, sociedade e cultura, vol 1 - A sociedade em rede. São Paulo, Paz & Terra, 1999, p. 459. [17] Idem, ibidem. www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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[18] Harvey, op. cit., p. 148. [19] Idem, p. 258. [20] Idem, p. 259. [21] Paul Virilio. A arte do motor . São Paulo, Estação Liberdade, 1996, p. 42. Grifos do autor. [22] Apud Harvey, op. cit., p. 264-265. Grifos nossos. [23] Paul Virilio. op. cit., p. 42. Grifos do autor. [24] Idem, ibidem. [25] Harvey, op. cit., p. 265. [26] Milton Santos. Técnica, espaço e tempo - globalização e meio técnico-científico informacional . São Paulo, Hucitec, 1996, p. 31. [27] Milton Santos. Por uma outra globalização - do pensamento único à consciência universal . Rio de Janeiro, Record, 2000, p. 41-42. As cifras são retiradas de Y. Berthelot, Globalisation et régionalisation: une mise en perspective, in L’integration régionale dans le monde , Gemdev, 1994, e Noam Chomsky, Folha de S. Paulo, 1993. [28] Idem, p. 42. [29] Santos. Técnica, espaço e tempo, cit., p. 181. [30] Idem, p. 187. [31] Manuel Castells. op. cit., p. 70. [32] Idem, p. 416. [33] Idem, p. 75. [34] Idem, p. 25. [35] Idem, p. 55. [36] Idem, p. 419. [37] Idem, p. 503. [38] Idem, p. 459-460. [39] Harvey, op. cit., p. 239. [40] Marinetti. “Manifesto do Futurismo”. Le Figaro, 20 de fevereiro de 1909, apud. Gilberto Mendonça Telles, Vanguarda européia e modernismo brasileiro . Petrópolis, Vozes, 1997, p. 91-92. O Manifesto é também um elogio à guerra, “única higiene do mundo”, e não surpreende que tenha sido utilizado como propaganda do fascismo, que da mesma forma se assenhoreou da filosofia de Nietzsche e suas imagens de “potência” e “vontade de poder”. Mas as relações entre arte e política são complexas e, de qualquer modo, www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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exigiriam uma análise que extrapola os objetivos de nossa pesquisa. [41] Cf. Eugene Weber. França fin-de-siècle. São Paulo, Companhia das Letras, 1989. [42] Virilio. O espaço crítico. Rio de Janeiro, 34, 1993, p. 110. [43] Cf. “Tempo real e espaço virtual”. Atrator Estranho nº 17, São Paulo, NTC/ECA/USP, outubro de 1995. [44] Marcos Dantas. op. cit., p. 52. [45] Pierre Lévy. As tecnologias da inteligência - o futuro do pensamento na era da informática. Rio de Janeiro, 34, 1993, p. 114. [46] Idem, p. 115. [47] Marcondes Filho, in “Tempo real e espaço virtual”. op. cit. [48] Lévy, op. cit., p. 115. [49] Bauman, op. cit., p. 105. [50] Nicolau Sevcenko. “O fim da História”. Atrator Estranho nº 19, São Paulo, NTC/ECA-USP, 1996. [51] Milton Santos. Técnica, espaço e tempo, cit., p. 42. [52] Idem, p. 183. [53] Eric Hobsbawm. A era dos extremos - o breve século XX (1914-1991). São Paulo, Companhia das Letras, 1995, p. 13. [54] Castells. op. cit., p. 460. [55] Herbert Marcuse. A ideologia da sociedade industrial . Rio de Janeiro, Zahar, 1967. [56] Christophe Déjours. A loucura do trabalho. São Paulo, Cortez/Oboré, 1987. [57] W. J. Steinle. Telework: opening remarks and opening debate, in W. B. Korte, S. Robinson e W. J. Steinle (orgs ), Telework: present situation and future development of a new form of work organization . Amsterdã, North Holland, 1988, apud Castells, op. cit., p. 419. [58] Robert Boyer, apud Armand Mattelart. Histoire de l’utopie planétaire - de la cité prophétique à la société globale. Paris, La Découverte, 1999, p. 360. [59] Ciro Marcondes Filho. Imprensa e capitalismo. São Paulo, Kairós, 1984, p. 22. [60] Adelmo Genro Filho. op. cit. p. 113-114. [61] Marcos Dantas, op. cit., p. 23. [62] Ciro Marcondes Filho. O capital da notícia - jornalismo como produção social da segunda natureza. São Paulo, Ática, 1986, p. 56. www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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[63] Jürgen Habermas. “Do jornalismo literário aos meios de comunicação de massa”, in Marcondes Filho (org), Imprensa e capitalismo, cit., p. 13. [64] Robert Darnton, introdução a Revolução impressa - a imprensa na França (1775-1800), in Robert Darnton e Daniel Roche (org)., São Paulo, Edusp, 1996, p. 15-16. [65] Citado por P. Albert e F. Terrou, História da imprensa, São Paulo, Martins Fontes, 1990, p. 11-12. [66] Idem, ibidem. [67] Idem, p. 22. [68] Nicolau Sevcenko, in Bernardo Kucinski. A síndrome da antena parabólica. São Paulo, Fundação Perseu Abramo, 1998. (orelha). [69] Nelson Werneck Sodré. História da imprensa no Brasil. Rio de Janeiro, Graal, 1977, p. 3. [70] Paul Virilio, A arte do motor , op. cit., p. 29. [71] Jaenick, apud Marcondes Filho. O capital da notícia, op. cit., p. 63. [72] Marcondes Filho. op. cit., p. 65. [73] Mattelart. Comunicação-mundo - história das técnicas e das estratégias. Petrópolis, Vozes, 1994, p. 28. [74] Dieter Prokop, apud Marcondes Filho. O capital da notícia, cit., p. 66. [75] Mattelart. op. cit., p. 29. [76] Marcondes Filho. O capital da notícia, cit., p. 67. [77] Genro Filho, op. cit., p. 185 ss. [78] François Brune. “L’idéologie d’aujourd’hui”, in Manière de Voir (hors-série), Le Monde diplomatique , março de 1997, p.11. [79] Adauto Novaes. “Sobre tempo e história”. in Adauto Novaes (org.). Tempo e história, S. Paulo, Companhia das Letras, 1992, p 13. [80] De la presse écrite aux nouveaux médias. Documentation f rançaise, 1979. in Dominque Wolton. Sobre la comunicación. Madrid, Acento, 1999, p. 271. [81] Dominque Wolton., op. cit., p. 271-272. [82] Ignacio Ramonet. op.cit., p. 26. [83] Idem, p. 62. [84] Idem, p. 49. [85] Marcondes Filho. A saga dos cães perdidos. São Paulo, Hacker, 2000, p. 112. www.bocc.ubi.pt/pag/moretzsohn-sylviavelocidade-jornalismo-1.html
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[86] Thomas Mathiesen. The viewer society: Michel Foucault’s ‘panopticon’ revisited. Theoretical Criminology, 1997, p. 215-234, apud Bauman, op. cit., p. 77. [87] Armand Mattelart. op. cit., p. 10. [88] Idem, ibidem. [89] Marilena Chauí. Cultura e democracia - o discurso competente e outras falas. São Paulo, Moderna, 1981, p. 8. [90] Milton Santos. Por uma outra globalização, cit., p. 28-29. [91] Castells, op. cit., p. 394. Grifos do autor. [92] Marcos Dantas. op. cit., p. 40. [93] Folha de S. Paulo, 5 de março de 2000, caderno “Mais!”, p. 5-8.
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