Ser e Conhecer - Olavo de Carvalho

May 23, 2019 | Author: Mateus Carvalho | Category: Phenomenology (Philosophy), Knowledge, Reality, Immanuel Kant, Universe
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Ser e Conhecer  por Olavo de Carvalho I

§ 1. A fenomenologia em geral O ceticismo nasce da fragmentação da mente. É a postura do covarde ou do preguiçoso que, por não querer fazer o esforço de saber, tenta provar que é impossvel saber. !om esse ob"etivo, a mente cética prod produz uz impa impass sses es de dif difcil cil refut efutaç ação ão,, não não tant tanto o pelo peloss es esqu quem emas as argumentativos que os suportam, mas principalmente pelo estado de #nim #nimo o de desc descon on$a $anç nça a que que os prod produz uz.. A desc descon on$a $anç nça a susc suscit ita a ob"eç%es e mais ob"eç%es, e quando todas foram respondidas, sua inse insegu gura ranç nça a não não se apla aplaca ca e ela ela co cont ntin inua ua a apr apres esen enta tarr nova novass ob"eç%es, sem se dar conta de que são apenas variaç%es das "& respondidas. A discussão com o cético não tem $m ' não por causa da força de seus argumentos, que em si são fracos, mas por causa do medo abissal que os produz, e que não pode ser curado mediante argumentos. (o entanto, enfrentar as ob"eç%es céticas é o começo do aprendizado $los)$co. A capacidade *umana de formular d+vidas é inesgot&vel, assi as sim m co como mo a ca cap pac acid idad ade e de apro profund fundar ar,, enri enriqu quec ecer er e tirar irar conseq-ncias do que sabe. O camin*o da d+vida, entretanto, é mais f&cil, porque mec#nico e autom&tico basta dei/ar a mente pensar sozin*a que a d+vida se autopropaga como se fosse um vrus 0 da o pres prest tgi gio o bara barato to do ce ceti tici cism smo o e do relat elativ ivis ismo mo.. & a ce cert rtez eza a e a evid-ncia não se autopropagam, não podem ser obtidas a cont co ntra rago gost sto o. 2/ig 2/igem em aten atençã ção o. 2/ig 2/igem em a co conv nver ergg-nci ncia a de v&ri v&rias as faculdades intelectuais em torno de um ob"eto, o que requer esforço. A fenomenologia de 3usserl é uma tentativa de dar fundamentos apodticos ao con*ecimento. A fenomenologia não se interessa por argumentos, mas sim pela descrição precisa de fen4menos, do que apar aparec ece, e, do que que ac acon onte tece ce ante ante a co cons nsci ci-n -nci cia a co cogn gnos osci citi tiva va.. 5or e/emplo, e/emplo, como descrever este gato6 !omo é que voc-, ao v-0lo, sabe que é um gato6 O que se passa precisamente neste ato de con*ecimento6 O que é que est& subentendido nesse recon*ecimento, pelo qual podemos dar a um fen4meno particular o nome de uma ess-ncia geral6 O que se passa precisamente quando se formula um "uzo, quando se diz que isto é aquilo, que a 7é7 b6 A

fenomenologia s) se ocupa das ess-ncias, entendidas como o ob"eto do ato de con*ecimento. A fenomenologia trata da descrição de fen4menos, entendidos como atos atos de co con* n*ec ecim imen ento to,, no se sent ntid ido o pura purame ment nte e co cogn gnit itiv ivo o e não não psicol)gico. As descriç%es que se utilizam de recursos psicol)gicos dei/ dei/am am de fora fora o ob"e ob"eto to do co con* n*ec ecim imen ento to,, ou o admi admite tem m co como mo pressuposto. A imensa complicação das e/posiç%es fenomenol)gicas vem da di$culdade de se descrever os fen4menos em si mesmos, tais como aparecem, independentemente de e/plicaç%es psicol)gicas do ato de con*ecimento. 5or e/em empl plo, o, o que que é uma uma d+vi d+vida da66 A res espo post sta a prov provav avel elme ment nte e descrever& o estado psicol)gico de d+vida, e não aquilo que faz com que que a d+vi d+vida da se se"a "a d+vi d+vida da em vez vez de ce cert rtez eza, a, prob probab abil ilid idad ade e ou con"etura. (a verdade, qualquer e/plicação de um estado psicol)gico pres presssup%e up%e saber aber do que es est& t& se fala faland ndo, o, isto isto é, pres pressu sup p%e o con*ecimento das ess-ncias do que se fala. A e/plicação psicol)gica é, neste sentido, segunda ou derivada, e não primeira e fundamental como a descrição fenomenol)gica. 8ue é um "uzo de identidade6 8ue é quantidade6 ou mel*or, quando voc- pensa quantidade, 7em qu-7 est& pensando6 (ão 7como7 est& pensando, mas 7em qu-7 est& pensando6 8ual o conte+do intencional a que que se refer efere e o pens pensam amen ento to66 Onde Onde es estt& a 7red 7redon ondi dida dade de77 do redondo6 8ue é crculo6 3& uma de$nição geométrica de crculo, mas esta de$nição é apenas uma convenção que nomeia um conceito intu intuit itiv ivo o prév prévio io.. 8ual 8ual é o co cont nte+ e+do do dest deste e co conc ncei eito to intu intuit itiv ivo o de circularidade no qual se baseia a de$nição geométrica6 9ito de outra forma, a fenomenologia se ocupa da pergunta 7o que é67, é67, quid quid es est6 t6,, inde indepe pend nden ente teme ment nte e de sa sabe berr se o ob"e ob"eto to que que se investiga 7e/iste7 ou 7não e/iste7. 2ssa pergunta é decisiva em todo o proc proces esso so $los $los)$ )$co co.. A e/pe e/peri ri-n -nci cia a da feno fenome meno nolo logi gia a most mostra ra que que muitas vezes se discute por séculos um assunto sem se perguntar 7o que é7. !abe assinalar que a $loso$a começou com essa pergunta. 2ra a pergunta de :)crates. 5or e/emplo, e/emplo, o que é a "ustiça6 :)crates criou o que entendemos *o"e por de$nição. 5assados no entanto ;a/ :c*eler trata da inve"a, do rancor, etc. >as não c*ega a constituir uma $loso$a, no sentido sistem&tico. 5or outro lado, acostumando0se a descrever meticulosamente o que est& implcito nos atos cognitivos, a discussão $los)$ca tem um aprofundamento e/traordin&rio, como pode se depreender, por e/emplo, da ?enomenologia da !onsci-ncia de @empo manente de 3usserl. A maior parte das pessoas ignora isso e não imagina a import#ncia dessa riqueza descritiva. maginam que descrição é assunto da arte e se enganam, pois a arte s) produz an&logos. A arte apenas refere, alude. 5or e/emplo, em toda a literatura universal não *& nen*uma descrição de um estado psicol)gico *umano, mas apenas refer-ncias anal)gicas a tal ou qual estado, não em si mesmo, mas tal como foi vivenciado por tal ou qual personagem em particular, sem levar em cont co nta a que que o me mesm smo o es esta tado do,, e/ata /atame ment nte e o me mesm smo, o, pode poderi ria a se apresentar num outro personagem sob vestes anal)gicas diferentes, sem dei/a ei/arr de ser 7o mes esmo mo77. O ci+m ci+me e de Otelo telo não é igua igual, l, artisticamente, ao do 5aulo 3on)rio em :. Bernardo, de Craciliano Damos. 8ual é, então, o esquema invariante que permite rec econ on*e *ece cerrmos, mos, por por tr&s tr&s das das dife diferrença ençass entr entre e suas suas res espe pect ctiv ivas as simbolizaç%es liter&rias, o mesmo estado6

!olocado de outra forma, a fenomenologia se ocupa em abrir o ato intuitivo e mostrar o que *& dentro dele, ou, de outra forma ainda, em descrever o conte+do da intuição e não apenas se referir simbolicamente a ele. 5ara tanto, a fenomenologia usa a linguagem de forma diferente das formas quotidianas, cient$cas, liter&rias ou $los)$cas. >as é um uso que pretende desdobrar as implicaç%es l)gico0racionais de um conte+do que, no entanto, na pr&tica é captado de maneira intuitiva e imediata. Ou se"a, é a tomada de consci-ncia do que se passa no ato cognitivo. (este sentido, a fenomenologia é uma auto0reEe/ão e um autocon*ecimento. É o autocon*ecimento da consci-ncia, enquanto capacidade cognitiva. É saber o que é saber, saber o que se passa, efetivamente, no ato de intuição. 8ue isso tem um tremendo poder curativo é algo que os psiquiatras e terapeutas perceberam *& tempos, da a quantidade de terapias baseadas na fenomenologia. O tema tem outros desdobramentos. 5or e/emplo, o que se passa precisamente na percepção sensvel6 O que signi$ca 7ver76 Agora, estou vendo um isqueiro. >as no mesmo ato *& também o recon*ecimento da forma de uma ess-ncia, e portanto não se trata de um ato puramente visual. !omo é que no mesmo ato se v- e se recon*ece, sem ser necess&rio pensar para isso6 2m que consiste este re0con*ecimento, que est& mais ou menos subentendido em todo ato de con*ecimento6 3usserl diz que a atitude do fenomen)logo é diferente da atitude natural, a qual acumula atos cognitivos sem se ocupar com os mesmos nem com a consci-ncia, mas apenas com os conceitos dos ob"etos intudos. 2sse retorno F consci-ncia marca a atitude fenomenol)gica. 5or e/emplo, o que se passa no recon*ecimento do sentido de uma palavra6 2 quando são palavras de outro idioma6 2 quando são apenas aglomerados de sons que não são palavras6 !omo é que as recon*ecemos de forma imediata6 Daramente paramos para e/aminar estes atos e descrever 7o que7 nos apresentam. Gma coisa é realiz&0los, outra con*ec-0los. 3usserl diz que a fenomenologia descreve o modo de apresentação dos ob"etos. 5or e/emplo, um *ipop)tamo e uma crise econ4mica se apresentam a mim de formas diferentes. 2m que consiste precisamente esta diferença6 >ais ainda, a crise econ4mica é um mero ente de razão H com fundamentum in re I, mas não do tipo de um dragão aladoJ logo, também *& uma diferença entre os modos de apresentação destes dois ob"etos. !olecionando todos os modos de

apresentação que e/istem para o ser *umano, c*egaremos aos v&rios tipos de seres H ou ess-ncias I que podem se apresentar, e temos então uma ontologia geral subdividida em ontologias regionais. A ontologia tem de ser bem ampla e bem amarrada em todos os seus pontos para poder abarcar todas as c*aves que se intercalam entre um *ipop)tamo e uma crise econ4mica.

§ ;. A coisa0em0si Kantiana 8uando não se t-m os modos de apresentação bem classi$cados, os modos podem ser trocados acidentalmente. magine alguém falar do *ipop)tamo como se fosse uma realidade do mesmo tipo de uma crise econ4mica. É de uma confusão dessa ordem que vai surgir a famosa coisa0em0si Kantiana, que é a coisa 7independente do con*ecimento que temos dela7. É a coisa 7fora7 do su"eito, de todo su"eito cognoscente possvel. 5ara a fenomenologia isto é uma bobagem supor que a verdade de uma coisa apresentada é uma outra coisa que "amais pode se apresentar. Ora, se ela "amais pode se apresentar ela não e/iste para ninguém, não afeta ninguém e não age. 2 como pode ser que essa parte que não afeta nem age se"a mais real que a parte que afeta e age6 2st& a uma forte ob"eção F coisa0em0si Kantiana, baseada na consci-ncia do modo de apresentação. :egundo Lant, a coisa0em0si é o segredo que est& dentro da coisa, que é a coisa na sua consist-ncia interna, independentemente do nosso con*ecimento. Ou se"a, é a coisa na sua pura ob"etividade, desligada de qualquer sub"etividade. Ora, essa noção é inconsistente e autocontradit)ria. !oisa é aquilo que tem a capacidade de ser fen4menoJ se não a tem, não pode se mostrar de maneira alguma para ninguém, e não pode, portanto, transmitir nen*uma informação de si a qualquer outro ser. É uma coisa absolutamente irrelacionada e irrelacion&vel. 8uantos seres poderiam atender a esse requisito6 :) o nada. Mogo, a noção de coisa0em0si corresponde e/atamente ao nada. (en*um ser atende ao requisito da coisa0em0si, porque sendo ela o totalmente irrelacionado, s) pode e/istir como suposição negativa.  @ão logo se l*e atribua alguma caracterstica real, a coisa dei/a de ser a coisa0em0si e passa a ser algo para algum outro. >as esta capacidade de e/istir para o outro é a e/ist-ncia mesma. O que e/iste é aquilo que tem alguma relação com outras coisas que e/istem e o totalmente irrelacionado s) pode não e/istir, ou e/istir como conceito

vazio, ou se"a, nada. (ão faz sentido, portanto, dizer que a coisa0em0 si é mais real do que o fen4meno. !abe observar que quando Lant enuncia o conceito da coisa0em0si, ele parece fazer algum sentido porque e/pressa uma impressão sub"etiva que temos, de que con*ecer efetivamente as coisas seria con*ec-0las 7por dentro7. Agora, supor que o gato por dentro se"a mais gato que o gato por fora não faz sentido. Nirar o gato pelo avesso esclareceria alguma coisa sobre ele6 A fenomenologia se pauta pelo respeito ao modo de apresentação das coisas. 2m vez de suposiç%es, as coisas são tomadas como estão. O que interessa não é o 7gato0em0si7, mas a presença do gato, aquilo que aparece e que se faz recon*ecer como gato. 2sta é a ess-ncia do gato. 2sse é o em0si do gato, que consiste em aparecer como gato para quem se"a capaz de perceb-0lo como gato. Gma pedra, por e/emplo, não recon*eceria o gato. >as faz parte da ess-ncia do gato não ter a capacidade de noti$car a pedra de que é um gato. Assim como faz parte da ess-ncia da pedra não ter a capacidade de recon*ecer um gato. Ou se"a, os modos da apresentação coincidem com os modos de ser das coisas. O que signi$ca que não e/iste nada cu"o modo de apresentação se"a falso, ou que se"a apenas uma apar-ncia com relação F ess-ncia, porque o modo de apresentação é a pr)pria ess-ncia. (ão sei se 3usserl, ao dizer isso, tin*a idéia de que fazia eco a 5lotino, mas 5lotino diz ta/ativamente que a ess-ncia de um ente, em vez de ser um misterioso / oculto no fundo dela, é o seu aspecto mais evidente, porque é a forma manifestada. Lant diz que s) percebemos através das formas a priori, que são independentes e prévias F e/peri-ncia, como por e/emplo as formas a priori da sensibilidade espaço e tempo. Ou se"a, tudo o que se percebe se d& dentro do quadro das formas a priori do su"eito. Lant p&ra por a. >as e o ob"eto, para se mostrar6 (ão precisa deste ou de algum outro quadro6 3artmann, fenomenologista, diz que e/istem também as formas a priori da apresentação do ob"eto. magine se não fosse assim. 2ntão o tempo e o lugar em que eu ve"o esta pedra seriam formas sub"etivas min*as. ?ora isso e/istiria uma 7pedra0em0si7 que não est& em tempo algum e em lugar algum, e que necessita do espaço e do tempo apenas para se mostrar a mim, e não para e/istir. Bella roba Gma pedra intemporal e inespacial que se

temporaliza e espacializa s) para mim. Ora, então não é pedra 5orque a verdadeira pedra é aquela que est& no tempo e no espaço, para que eu a perceba no tempo e no espaço. 5ortanto o em0si da pedra é e/atamente essa capacidade de se apresentar a mim desta maneira. Mogo, o que c*amei de fen4meno é, na verdade, a ess-ncia da pedra, ou se"a, a coisa aparentemente mais super$cial é a mais profunda. A capacidade m&/ima da pedra é de apresentar0se como pedra a quem se"a capaz de apreend-0la como pedra. >as Lant diz que do mundo e/terior s) recebemos informaç%es ca)ticas, que ordenamos nas formas do espaço e tempo. 2le est& supondo, então, que podemos receber dados de uma pedra ca)tica para depois l*e dar uma unidade pro"etiva no espaço e no tempo. >ais uma vez, enganou0se. (ão é o su"eito que ordena. A pedra se apresenta na forma de pedra, que inclui sua pr)pria ordenação no tempo e no espaço. (ão fosse assim, não seria uma pedra. A 7pedra0 em0si7, sem as formas de apresentação, é inconcebvel como pedra. 5ode ser uma idéia pura plat4nica, um pensamento de 9eus, mas não uma pedra. A pedra tem um em0si que independe do su"eito, que é e/atamente a sua capacidade de apresentar0se como pedra, capacidade que o su"eito não poderia dar a ela. 9epende do su"eito a capacidade de perceb-0la, mas a visibilidade da pedra est& nela, e não no su"eito. :e estivesse no su"eito, ele é que seria pedra, com visibilidade de pedra. Gm su"eito cego não anula esta visibilidade é importante que não se confundam as formas a priori do su"eito com as formas do ob"eto. As formas do su"eito não determinam as formas do ob"eto. Além disso, é uma bobagem dizer que os dados se apresentam soltos, isolados, e que n)s é que os sintetizamos. 3ume, por e/emplo, pretendia que, ao ver uma bola de bil*ar bater em outra e causar seu movimento, vemos apenas o movimento da primeira seguido do movimento da segunda, e que sintetizamos os dois mediante a idéia de causa. Bobagem. Nemos um fen4meno +nico, coeso, e em seguida o decompomos em duas fases. 2ntre o movimento da primeira bola e o da segunda não *& um intervalo somos n)s que, por abstração mental, separamos dois movimentos que na verdade se apresentaram unidos. A noção de causa não é 7pro"etada7 pela mente sobre os ob"etos para colar partes separadas. É obtida por separação, por abstração, por an&lise daquilo que se apresentou "unto e coeso. Os dados v-m "untos, n)s é que os separamos ' e/atamente ao contr&rio do que diz 3ume, endossado por Lant.

A fenomenologia, em vez de perguntar, como Lant, se o con*ecimento é possvel, pergunta antes o que é o con*ecimento, o que é o ato de con*ecer, o que se passa precisamente quando se con*ece alguma coisa. 2stas perguntas, uma vez colocadas, "& resolvem muitos dos problemas levantados pelos $l)sofos crticos e céticos. § P. A identidade de ser e con*ecer Ao lado e sobre isso, eu acrescento a seguinte perspectiva, que é um dos pontos essenciais da doutrina metafsica que defendo não faz sentido de$nir o con*ecimento como uma relação entre o su"eito e o ob"eto, uma vez que isto pressupon*a a e/ist-ncia do su"eito e do ob"eto fora e independentemente da pot-ncia do con*ecer. Ora, é e/atamente esta pot-ncia de con*ecer e de ser con*ecido que de$ne su"eito e ob"eto. 5ortanto, a realidade em si não é nem ob"etiva, nem sub"etiva, porque ser realidade é ter a capacidade de se desdobrar nesses dois aspectos. O con*ecer, como pot-ncia, é prévio ao su"eito e ao ob"eto. :er realidade é ter a capacidade de se apresentar a alguém, o qual também tem de ser real. 5ortanto, essa dicotomia su"eito0ob"eto faz parte da estrutura da realidade. :) é real aquilo que admite esta distinção. 9eus, por e/emplo. 9eus con*ece a si mesmo. >as *&, obviamente, uma distinção entre o que é con*ecido e o que con*ece, ainda que esta distinção se"a s) relacional. Gma coisa é 2le ser, outra coisa é 2le con*ecer0se. 2stes atos são formalmente distintos, embora não se"am distintos no tempo nem no conte+do. :e não *ouvesse a possibilidade de distinguir entre esses dois aspectos ' ser e con*ecer ', não *averia sentido em dizer que 9eus se con*ece. >as, por outro lado, esta distinção também é con*ecida, e faz portanto parte do ser, e portanto é real. :) pode ser con*ecido o que é real, sob algum aspecto, e s) pode ser real aquilo que pode ser con*ecido. :upon*amos algo que não pode ser con*ecido de maneira alguma, essencialmente. Ora, se não pode ser con*ecido de maneira alguma então este algo não se relaciona com nen*um outro ser. (ão transmite informação a nen*um outro ser. 2/istir é transmitir informação, logo esse algo não e/iste. 2sta informação pode ser transmitida do ser para ele mesmo, como por e/emplo aquilo que cada um sabe a seu pr)prio respeito. A ess-ncia do ser, então, consiste em con*ecer0se, logo não *&

distinção entre o ser e o con*ecer, mas apenas uma distinção relacional são dois aspectos do ser. 2 essa distinção s) e/iste do ponto de vista sub"etivo *umano. O ser, verdadeiro, real, consiste em con*ecer0se. >as se é verdadeiro é porque é con*ecido, e se é con*ecido é porque é verdadeiro. sto se aplica tanto a mim quanto F coisa da qual estou falando. :e não sou real, não posso con*ecer. 2 se a coisa da qual estou falando também não é real, ela não pode ser con*ecida. Ora, de onde tirei essas distinç%es6 9o pr)prio conceito de con*ecer. Mogo, o con*ecer é prévio a tudo isto. O con*ecer é receber informação, o ser con*ecido é emitir informação. 2sta capacidade de receber e emitir informação é simult#nea. :) o que emite informação pode receber informação. 2mitir informação é relacionar0se de algum modo com outro ser, da mesma forma que receber informação também é relacionar0se de algum modo com outro ser. A capacidade de emitir e e a de receber informação não se separam, apenas se distinguem. (ão pode e/istir uma sem a outra. O tempo todo se veri$ca esta identidade do ser e do con*ecer. & a distinção su"eito0ob"eto é meramente funcional, descritiva. (um determinado ato de con*ecimento, um dos entes atua como receptor de informação e o outro com emissor. >as o que é receptor é emissor também, e vice0versa. Gma pedra, por e/emplo, recebe v&rias informaç%es lei da gravidade, pressão atmosférica, e as informaç%es qumicas e cristalogr&$cas que a comp%em. 2la apenas não as recebe conscientemente, o que signi$ca que essas informaç%es estão na pedra como elementos constitutivos do seu modo de apresentar0se, não do seu modo de con*ecer. Ou se"a, o con*ecer é uma relação de troca de informaç%es. 3&, no entanto, uma diferença para o caso *umano. ()s *umanos podemos reEetir sobre a informação recebida, ou se"a, não apenas recebemos a informação como também sabemos que a recebemos. Mogo, além do con*ecimento que recebemos da pedra, recebemos também um con*ecimento a nosso respeito, que é o con*ecimento de que recebemos o con*ecimento da pedra. 2ste segundo momento, que e/iste apenas para os *umanos, constitui a diferença *umana. Gma pedra, por e/emplo, recebe informação de fora, mas não de si pr)pria. 3& con*ecimento nela, mas ela não emite informação para si pr)pria, ou se"a, ela est& imune a si mesma. 2la não pode ser afetada por ela mesma, não pode fazer nada para si. 2la é inerme com

relação a si. Mogo, *& uma limitação em seu modo de ser, que corresponde a uma limitação em seu modo de con*ecer. A pedra e/iste de$cientemente porque con*ece de$cientemente. 9o mesmo modo, a e/ist-ncia do ser *umano se mostra mais rica, mais plena, mais verdadeira na e/ata medida em que mais con*ece. O ser *umano de pouca consci-ncia e/iste de maneira t-nue e fantasmal, afeta pouco o mundo circundante e age pouco sobre si mesmo. & os que con*ecem muito, como por e/emplo Arist)teles, 5latão, Mao0@se, são mais reais, porque con*ecem mais, e em conseq-ncia atuam sobre uma esfera maior durante mais tempo. Os fenomenologistas estavam nesta pista. (ão sei por que, não c*egaram a estas conclus%es metafsicas. O pr)prio 3usserl, ap)s passar a vida desenvolvendo o método, se dirige a uma $loso$a da consci-ncia que é uma espécie de idealismo $los)$co. (o entanto, esta não é a +nica direção possvel a partir da $loso$a. sto é a$rmado ta/ativamente por Doman ngarden, o grande discpulo polon-s de 3usserl. 2u pr)prio teria preferido dar esse passo e/iste uma forma de realidade que abrange su"eito e ob"eto, que se c*ama con*ecer, e esta forma é coe/tensiva ao ser, ou se"a, a distinção entre o su"eito e o ob"eto é superada no ato de con*ecer. O con*ecer não é somente uma relação entre um su"eito dado e pronto e um ob"eto dado e pronto. A pot-ncia de con*ecer est& na natureza do su"eito assim como a pot-ncia de ser con*ecido est& na natureza do ob"eto, porém não *& o su"eito puro nem o ob"eto puro, que são meras suposiç%es e conceitos funcionais. 9ito de outra forma, os conceitos de su"eito puro, que s) con*eceria e nunca seria con*ecido, e de ob"eto puro, que s) seria con*ecido e nunca con*eceria, são negaç%es da realidade. :ão obtidos por negação das condiç%es que permitem que a realidade se"a realidade. A verdadeira realidade é o con*ecer, nunca um puro su"eito ou um puro ob"eto. :u"eito e ob"eto são decorrentes do con*ecer, fundados no con*ecer. 2ntão o con*ecer é o pr)prio ser, que tem a capacidade de ser su"eito e ob"eto ao mesmo tempo. >as, se a realidade consiste fundamentalmente no ato de con*ecer, precisamos cortar do verbo con*ecer todo seu aspecto sub"etivo. O con*ecer não é algo que se passa no su"eito, apenas. O con*ecer se passa no su"eito e no ob"eto ao mesmo tempoJ o ob"eto não é $sicamente alterado pelo ato, mas ele participa do processo. :e o con*ecer, entendido como relação, como unidade dual de su"eito e

ob"eto, é a pr)pria natureza do ser, então essa mesma dualidade una tem de e/istir no pr)prio serJ e de fato e/iste, como aspectos de relaç%es que ele pode ter consigo mesmo. :e assim é, então a gradação do ser é a mesma gradação do con*ecer. :er mais ou menos é con*ecer mais ou menos. (a verdade, a pedra con*ece algo de mim. 2u passo alguma informação a ela. (o momento em que a ve"o, passo a ela um recibo da sua visibilidade, atualizo sua pot-ncia de ser vista, respondo a uma informação que ela me transmite. :) que ela não pode repetir essa informação para si e aprofund&0la, então ela tem pouca informação a meu respeito, assim como tem pouca informação a respeito dela mesma. 2la faz mais parte do meu mundo do que eu faço parte do mundo dela, embora eu a afete. (este sentido, ela é menos real do que eu. 2 pelo fato de ser menos real, ela tem algo de fantasmag)rico. 8uem quer que "& ten*a $cado sozin*o e quieto por muito tempo entre ob"etos inertes compreende o que estou dizendo. 2ssa impressão pode facilmente ser apreendida quando se est& sozin*o no meio de ob"etos inertes. Gsualmente, quem se encontra nesta situação tende a criar um di&logo interno, ou $ca com uma certa impressão de irrealidade, porque as coisas em sua presença são passivas. 2las não e/istem com a intensidade das coisas verdadeiramente reais. 2las são de$cientes. 5odemos concluir da que o que c*amamos de alma ou de esprito é a verdadeira subst#ncia da realidade. O esprito é o pr)prio con*ecer. A verdadeira natureza da realidade é de ordem espiritual, cognitiva. :e se compreende o que estou dizendo, compreende0se também que isto nada tem a ver com idealismo $los)$co, se"a idealismo sub"etivo, se"a idealismo ob"etivo. A distinção de idealismo e materialismo é posterior e derivada logicamente em relação a esta min*a doutrina, que tanto pode ser usada para fundamentar um quanto o outro, dependendo de "ulgarmos que o ato espiritual, cognitivo, é material ou imaterial 0 duas *ip)teses que, para mim, não t-m a menor import#ncia, ali&s nem t-m muito sentido.  @odo o universo é um imenso interc#mbio de informaç%es, que circulam e que vão in$nitamente além da pr)pria presença espacial dos ob"etos. Gma pedra, por e/emplo, é tudo o que ela "& sofreu, é a sua *ist)ria. (ão uma *ist)ria pro"etada, mas a *ist)ria que est& nela. :) que para ela, sub"etivamente, esta *ist)ria s) e/iste como resduo fsico, como marcas, pois ela não tem reEe/ão sobre este passado.

2mbora traga nela a informação, para ela sub"etivamente esta informação não e/iste, não obstante e/ista em seu 7corpo7, digamos, para ser vista por outros seres. Ora, n)s trazemos todas essas marcas, s) que não apenas para mostrar a outros seres, mas para n)s mesmos. :omos, portanto, duplamente reais para os outros e para n)s mesmos. A pedra não, s) é real para os outros. (este sentido, ela é menos real. 2la acumula informação que circula do mundo para ela e dela para o mundo, mas não dela para ela, sendo que esta +ltima, a informação de si para si, é a que d& a dimensão de interioridade ou consci-ncia. Basta essa constatação para veri$car o quanto é est+pida qualquer tentativa de negar a consci-ncia. !onsci-ncia é a simples transmissão interna de informaç%es, transmissão que se realiza da periferia para o centro, do inferior para o superior, das partes para o todo. >in*a de$nição de consci-ncia não tem nada a ver com a distinção entre mente e corpo, que é a base de in$nitas confus%es das quais um Dic*ard DortQ, por e/emplo, se aproveita para neg&0la. Ora, se a verdadeira presença dos ob"etos consiste em emitir e receber informação, então aquele que acumula mais informação emitida, recebida e processada de si para si é mais real. @em uma dose maior de realidade porque tem uma dose maior de circulação de informaç%es, mais contato entre as partes e o todo, entre centro e periferia. (este sentido, este desenvolvimento a partir da *erança fenomenol)gica seria, se fosse preciso nome&0lo com nomes de categorias tradicionais que a ele não se aplicam bem, um verdadeiro 7idealismo materialista7. (a verdade, as pr)prias noç%es de matéria e mente $cam subordinadas a essa noção de emitir e receber informação. 8ual seria o ma/imamente real6 Aquele que emitisse e recebesse toda informação. 2ste seria o universo considerado como um em0si, não apenas como um ob"eto 0 o universo que me inclui e dentro do qual eu e/erço min*a consci-ncia. Mogo, esta min*a consci-ncia é um atributo deste mesmo universo, a min*a e todas as outras consci-ncias particulares, das quais o universo toma consci-ncia em si mesmo, através dessas mesmas consci-ncias particulares que, estando nele, são dele. Ou se"a, toda consci-ncia *umana é consci-ncia que o universo tem de si mesmo 0 apenas restando saber se elas são recol*idas num centro, se somos n)s mesmos o centro ou se o universo é apenas coisa, com um para0si t-nue ou ine/istente 0

um caso que não precisamos resolver aqui de imediato. (ossa consci-ncia seria a dose de consci-ncia que e/iste nesta parte do universo, sem contar que podem e/istir outras. Mogo, o universo considerado, não como presença fsica atual, mas como toda a massa de informação, é a m&/ima realidade, desde que esse universo ten*a um centro capaz de tornar essa massa um para0si ' ainda que esse centro se"amos n)s mesmos. 2 9eus6 :e imaginarmos um 9eus transcendente ao universo, um 9eus que não fosse o pr)prio Gniverso, mas que estivesse fora dele, estaria 2le fora necessariamente e sempre, ou seria um aspecto transcendente do pr)prio Gniverso6 Ora, é claro que 2le é um aspecto do Gniverso que não pode se reduzir a nen*uma de suas partes e que é de certa forma transcendente a si mesmo, porque inclui toda a possibilidade ainda não realizada no universo fsico. 2ssa possibilidade e/iste, e ela tem de se autocon*ecer. magine se assim não fosse a possibilidade transcendente que descon*ece a si mesma e que s) n)s, seres *umanos, con*ecemos. Gm materialista compreenderia assim. >as se s) n)s a con*ecemos ela é con*ecida, ainda que apenas em n)s. @eramos então o con*ecimento desta possibilidade, sem a possibilidade de realiz&0la. O Gniverso teria a possibilidade e não poderia con*ec-0la, *avendo dentro dele quem a con*ecesse sem ter a possibilidade de realiz&0la. :e entendemos que essa omnipossibilidade inclui as possibilidades de consci-ncia, entendemos também que essa *ip)tese materialista é absurda. Mogo, é claro que o Gniverso se con*ece. A parte dele que se con*ece mas que não est& realizada ainda, e que talvez não se realize nunca, n)s c*amamos de aspectos transcendentes de 9eus. 5ara ser transcendente, não é preciso ser transcendente a tudo. :e e/iste consci-ncia dentro do Gniverso, e/iste consci-ncia no Gniverso. ?atalmente, esta consci-ncia transcende todas as consci-ncias particulares que estão l& dentro, porque senão *averia apenas consci-ncias particulares e não sua cone/ão, e não obstante elas estão conectadas realmente, pelo fato de estarem no mesmo lugar, ter a mesma *ist)ria, etc. Assim sendo, não podemos admitir que e/ista alguma cone/ão central real dentro do universo que não se"a autocon*ecida também, embora não por esta ou aquela consci-ncia particular. 9a se conclui a necessidade absoluta de uma consci-ncia não apenas c)smica, mas suprac)smica, porque se fosse apenas c)smica estaria limitada Fquilo que o universo "& é e não teria nen*uma possibilidade acima de si. O universo não teria a

capacidade de superar0se, coisa que sabemos que ele tem geração de novas estrelas, gal&/ias, etc. Ou se"a, a necessidade de uma consci-ncia suprac)smica e de um poder suprac)smico de realiz&0la é absoluta. A e/ist-ncia de 9eus é uma evid-ncia para quem encara a coisa da maneira certa, é absolutamente necess&ria e é absolutamente inconcebvel que se"a de outra maneira. !ada frase que se pronuncia, cada sentença de qualquer ci-ncia e/ige isto. As pessoas não percebem essa necessidade porque não relacionam uma coisa com outra, ou porque t-m a ing-nua pretensão de que sua ci-ncia vai encontrar o mistério do universo que se"a descon*ecido pelo pr)prio universo. Ora, quando voc- começou a formar sua ci-ncia, voc- "& est& dando por subentendido que a e/plicação do universo est& no universo, e não apenas dentro do departamento onde o cientista trabal*a, magicamente isolado do universo. A pr)pria possibilidade de fazermos ci-ncia est& dentro do universo. (inguém sai do Gniverso para fazer ci-ncia ou o que quer que se"a. 2ssas idéias confusas v-m de uma noção equivocada de ob"etividade, que a entende como se colocar fora do problema, quando a verdadeira ob"etividade consiste em saber onde precisamente se est&, dentro do problema. 9o contr&rio, seria como se 3amlet, para con*ecer o rei ou Ofélia, precisasse sair da peça. A ob"etividade consiste na descrição e/ata das posiç%es recprocas, e não em sair de todas as posiç%es e observar como se estivesse de fora. 2stando de fora, sem nen*uma relação com o ob"eto observado, não *& sequer como observ&0lo. A idéia do 7puro observador7 é uma autocontradição, porque sem relação não *& con*ecimento. O con*ecimento é a relação, e esta relação, entendida não como "unção posterior de termos "& dados, mas como reciprocidade necess&ria de termos coe/istentes, é a estrutura mesma do ser, que consiste em autoconsci-ncia e nada mais, independentemente de quest%es in)cuas como a de saber se é material ou mental. 2is os princpios da metafsica que defendo. II

Se denominarmos "conhecimento" apenas o conjunto de dados e relações que um homem carrega consigo e tem à sua pronta disposição num dado momento da sua existência, o conhecimento será não apenas drasticamente limitado, mas informe e flutuante. or isto inclu!mos nessa noção o conjunto mais amplo das informações

registradas e disseminadas no seu meio social, sem as quais ele pouco poderia faer por  seus pr#prios recursos. $as esse conjunto de registros, por sua %e, su&entende a existência do meio f!sico, isto ', não somente dos materiais onde se imprimem esses registros, mas tam&'m do mundo de "o&jetos" a que eles se referem e com os quais se relacionam de algum modo. ( noção de "conhecimento" como conte)do da mem#ria e da consciência humanas torna*se totalmente in%iá%el se não admitirmos que o conhecimento, so& a forma de registro, existe tam&'m fora delas. $ais ainda, não podemos admitir que existam somente os registros feitos pelo homem, já que todo material que possa ser%ir de tá&ua onde se inscre%am esses registros s# pode se prestar a esse papel precisamente porque, na sua naturea e na sua forma intr!nseca, ele tra os seus registros pr#prios, adequados a esse fim+ não se escre%e na água nem se produ uma nota musical soprando so&re uma rocha compacta. egistro ' todo traço que especifica e singularia um ente qualquer. -odo ente tra em si uma multidão de registros, alguns inerentes à forma da sua esp'cie, como por exemplo a composição qu!mica e mineral#gica de uma pedra ou a fisiologia de um gato, outros decorrentes de sua interação com o am&iente em torno  como por  exemplo as marcas da erosão na pedra ou o estado de sa)de do gato considerado num momento qualquer da sua existência indi%idual. /ntre estes )ltimos, destacam*se os registros que nele foram impressos pelos seres humanos com a finalidade de torná*lo um suporte f!sico dos atos de reconhecimento e mem#ria. ( pedra esculpida tra em si os dados de sua composição f!sico*qu!mica e mineral#gica, aos quais se superpõem as marcas da erosão e os sinais do tra&alho do escultor. (o contemplar a escultura, o espectador presta atenção consciente apenas às qualidades est'ticas da forma esculpida e à aparência %is!%el imediata da pedra que lhes ser%e de suporte, geralmente sem atentar para a composição !ntima, f!sica, qu!mica e mineral#gica, a qual, no entanto, determina a aptidão da pedra para ser%ir de suporte às qualidades que lhe são su&seq0entemente superpostas, seja pela naturea, seja pelo escultor. (t' que ponto essas qualidades !ntimas da pedra são "indiferentes" ao efeito est'tico o&tido1 ( resposta depende unicamente da amplitude da concepção do escultor, que tanto pode ter  desejado imprimir uma forma significati%a a um material qualquer, pronto a faer o mesmo so&re um outro material se este esti%esse à sua disposição, mas pode tam&'m ter  desejado esta&elecer uma ponte entre as qualidades da pr#pria pedra e as da forma impressa. 2uem leia o famoso parágrafo de 3oethe so&re o granito terá uma id'ia de quanto uma pedra, por si, pode sugerir determinadas qualidades esculturais e arquitet4nicas. 5 s# por uma comodidade prática que esta&elecemos um limite entre as qualidades da forma intencional e as do pr#prio suporte, fisicamente considerado. -udo são registros, e a amplitude maior ou menor do nosso horionte de atenção s# modifica a %isão que temos de um determinado ente, e não o conjunto o&jeti%o dos registros que estão nele. 6ada um de n#s, enquanto existente, tra em si uma multidão de registros, aos quais se acrescentam os resultantes da interação com o meio e os auto*adquiridos 7há&itos, por 

exemplo, ou a hist#ria dos nossos atos %oluntários8. 9essa multidão, onde começa o  puro "conhecer" e onde termina o puro "ser"1 :asta formularmos esta pergunta para nos darmos conta, de chofre, de que essa fronteira não existe. ; puro "ser" s# pode ser  definido como o registro que está presente mas ' desconhecido. $as um traço meu qualquer que me seja desconhecido não o ' mais, nem menos, do que um li%ro que esteja na minha &i&lioteca há anos sem que eu o tenha lido. 2uando digo portanto que o li%ro "' conhecimento" e o traço desconhecido do meu ser ' "pura existência", ' apenas  porque os registros que constam do li%ro foram postos lá por um ser humano, o qual a fortiori os conhecia, ao passo que os registros desconhecidos do meu corpo nunca foram   ao menos assim me parece  conhecidos por ningu'm. $as esta distinção ' &em ilus#ria, ao menos quando tomada ao p' da letra. 9o li%ro há decerto muitas qualidades o&jeti%amente presentes que podem ter escapado a todos os seus leitores e mesmo ao  pr#prio autor. /las serão então "conhecimento" ou "puro ser"1 9o primeiro caso, terei de admitir um "conhecimento desconhecido", no segundo terei de negar que os registros escritos sejam conhecimento. or outro lado, at' que ponto posso declarar que o traço desconhecido presente no meu corpo não ' de modo algum conhecimento1 2ualquer  que seja a informação contida nesse "x", ela não pode ser a&solutamente contradit#ria com o meu corpo considerado enquanto sistema e organismo, pois ' parte dele e se integra, de algum modo, no seu funcionamento, sendo portanto um complemento "inconsciente" das partes dele que operam "conscientemente". /sse "x", portanto, al'm de estar &em integrado num sistema do qual amplas parcelas são conhecidas, está a! à minha disposição para ser conhecido de um momento para outro, assim como o li%ro que, na estante, espera que eu o leia. ; corpo ' registro, o li%ro ' registro, os entes todos à minha %olta são registros+ transitam incessantemente do ser ao conhecer, do conhecer  ao ser, de tal modo que a distinção destes dois momentos ' antes ocasional e funcional do que outra coisa. or isto mesmo a sensação tem sido o pons asinorum de todas as teorias do conhecimento, que, não sendo teorias do ser e sim do conhecer apenas, têm de encontrar  um momento, uma passagem, um salto onde o ser se transmute em conhecer, e realmente jamais conseguem faê*lo, pela simples raão de que esse salto ' apenas uma mudança de ponto de %ista e o ser não poderia transmutar*se em conhecer se já não fosse, em si e por si, o conhecer, apenas %isto pelo a%esso+ nada poderia ser o&jeto de conhecimento se não conti%esse registros, e nada pode conter registro sem ser, já, conhecimento "em potência". $as que esta potência passe ao ato num momento determinado, desde o ponto de %ista de um determinado sujeito cognoscente, não quer  dier que este seja o )nico ou o primeiro a efeti%á*la+ o registro que me ' desconhecido e que agora se torna conhecido já pode ter sido transmitido a milhares de outros entes   humanos ou não  que entraram em contato com o portador desse registro ontem ou um milhão de anos atrás. 9ão, o "puro ser" não existe+ todo ser ' conhecido, pois algo de seus registros foi transmitido a outros seres. as, pela anu-ncia, o 2go, "& e/istente, se assume a si mesmo como autoconsci-ncia, e é isto que o constitui como poder. O 2go sem poder do 2go é o 2go vazio e inoperante que se observa naqueles estados que a psiquiatria denomina, *iperbolicamente, 7perda da identidade7. § V. !onsci-ncia autoral e unidade da e/peri-ncia pessoal. R A e/peri-ncia pessoal s) pode ter unidade quando tem como centro a consci-ncia autoral, que distingue o fazer e o padecer, isto é, o su"eito como autor de seus atos e como receptor de atos seus e al*eios. 5or outro lado, é evidente que a unidade da e/peri-ncia pessoal est& subentendida em toda aquisição, conservação e transformação de con*ecimentos. § W. O su"eito como ob"eto. Atos imanentes e transitivos. R (en*um su"eito, enquanto su"eito autoconsciente, pode ser autor de atos He/ternos ou internosI, sem ser, ipso facto, receptor deles. @odo ato tem um feedbacK, condição de seu registro memorativo e, portanto, de sua continuidade autoral no tempo. 2star consciente de si enquanto autor de atos é estar consciente de si enquanto receptor deles. A noção aristotélica de atos imanentes e transitivos adquire aqui uma nova nuance o ato é imanente quando o autor é autor e receptor sob o mesmo aspectoJ é transitivo quando o autor é autor sob um aspecto e receptor sob um outro aspecto. 5or e/emplo, se

massageio meus pr)prios m+sculos, recebo a ação sob o mesmo aspecto em que a emiti, isto é, aplico e recebo a massagem. >as, se c*uto um gato, não recebo meu pr)prio c*ute, e sim apenas a informação de que c*utei o gato. @odos os atos transitivos são portanto imanentes Hsob outro aspectoI, mas nem todos os atos imanentes são transitivos Hsob qualquer aspectoI. § 1=. nseparabilidade de autoconsci-ncia, iman-ncia e transitividade. R 2star autoconsciente ao praticar um ato inclui a distinção e/ata e instant#nea entre o que ele tem de imanente e de transitivo, no sentido acima. :e não sei se agi s) sobre mim mesmo, sobre um outro ou sobre ambos, e sob quais aspectos, então não sei se agi de maneira alguma. § 11. @ranscend-ncia da autoconsci-ncia. 00 A autoconsci-ncia inclui portanto constitutivamente su"eito, ob"eto e sua reunião0distinção no ato. Gma autoconsci-ncia solipsstica não é autoconsci-ncia de maneira alguma, e/ceto metonimicamente Htem algumas das propriedades ou partes da consci-ncia sem c*egar a ser autoconsci-nciaI. (o su"eito, a autoconsci-ncia é, "& na sua constituição mesma, um transcender0se. A autoconsci-ncia solipsstica HcartesianaI s) pode ser construda e/ post facto como *ip)tese l)gica Hpor abstração e supressão volunt&ria de dados da mem)riaI, "amais ser ob"eto de e/peri-ncia. É mais ou menos como um *omem normal imaginar0se autista R coisa que um autista não pode fazer. § 1;. @ransitividade, iman-ncia e retenção. 2go e 7mundo7. 00 :e a autoconsci-ncia é, ipso facto, consci-ncia da dosagem de transitividade e iman-ncia do ato praticado, ela o é igualmente, mutatis mutandis, no ato padecido estar autoconsciente enquanto receptor de um ato é distinguir, nessa recepção, aquilo que é puramente transitivo Histo é, aquilo que me vem de um não0euI e aquilo que, nela, é iman-ncia min*a, por e/emplo sob a forma de retenção, no tempo, de uma informação "& completada. 5or e/emplo, acabo de receber um pontapé. O pontapé "& terminou, no tempo, mas continuo sentindo a dor que ele provocou esta dor, que prolonga em meu corpo o ato al*eio "& terminado, é parte dele na medida em que vem dele como efeito, mas ela, agora, s) e/iste em mim e não nele. :em esta retenção, nen*um ser pode ser autoconscientemente receptor de nada. >as também não o pode se a retenção é mera retenção de sensaç%es ou imagens, se ela não contém em si a e/ata distinção do que me veio como transitividade pura e do que entra

nela como iman-ncia min*a. (ão *& portanto autoconsci-ncia sem a consci-ncia do não eu0como agente. (ão apenas não e/iste autoconsci-ncia solipsstica, mas não e/iste a autoconsci-ncia num mundo de puros ob"etos, num mundo sem outros su"eitos. A e/ist-ncia de su"eitos agentes fora do eu, assim como o pleno recon*ecimento dela pelo eu, são elementos constitutivos da autoconsci-ncia mesma. 5or isto o eu, quando nega os outros agentes ou os reduz a meros ob"etos, não cessa de e/istir, mas cessa de ser um poder, retorna ao estado de pura potencialidade vazia. O 2go s) e/iste como poder num mundo de agentes, num mundo de su"eitos. O 7mundo7, portanto, não vem ao 2go desde fora, como um simples 7dado7, mas "& se imp%e desde dentro, como condição da possibilidade mesma do 2go como poder. 2 não cabe em gnoseologia discutir o 2go0sem0poder, pois este não é su"eito de con*ecimento e ali&s s) e/iste como possibilidade te)rica e construção l)gica *ipotética, cu"a simples formulação "& prova, no ato, sua pr)pria irrealidade, e/atamente como no caso do 7imaginar0se autista7. 5or desgraça, o 2go que foi ob"eto central de atenção durante todo o perodo que vai de 9escartes & fenomenologia de 3usserl foi o ego sem poder, ao qual se atribuiu, como *ip)tese m&gica, o dom de con*ecer, da resultando uma in$nidade de problemas insol+veis e, na verdade, perfeitamente insensatos.

IV

A idéia que inspira esta série de aulas é da total redução da gnoseologia F ontologia. @rata0se de eliminar o preliminar crtico, a crença de que primeiro é necess&rio criar uma teoria do con*ecimento para depois, com base nela, c*egar, se possvel, a uma ontologia. >as essa é apenas uma das idéias, a outra é eliminar a dualidade do racional e do intuitivo, reduzindo tudo ao intuitivo. :e tivesse tido a oportunidade de e/por isso ordenadamente nestas aulas, em vez de abordar as partes do assunto um tanto a esmo e ao sabor da ocasião, como o $z, eu partiria do rastreamento *ist)rico das origens da questão do con*ecimento no mundo moderno, da origem do primado do su"eito. 5rimeiro, mostraria como o sub"etivismo de origem cartesiana est& presente em todas as escolas, inclusive as mais antag4nicas a qualquer idealismo, pois até escolas materialistas, como o mar/ismo, aceitam implicitamente a prioridade do su"eito a diferença, no mar/imo, é que é um su"eito coletivo. >ostaria que

todos esses tr-s séculos decorridos contaminados com o primado do su"eito.

desde

9escartes

estão

 @endo veri$cado em seguida a total inviabilidade do pro"eto cartesiano, também colocaramos entre par-nteses toda a questão da fenomenologia, que não é senão um meio de tentar realizar o pro"eto cartesiano com mais fundamento ' o pr)prio 3usserl, em seu livro >editaç%es !artesianas, diz inspirar0se em 9escartes, e declara que s) quer aprofundar o cartesianismo até um nvel a que o pr)prio 9escartes não c*egou. É claro que nesse empreendimento c*ega 3usserl a v&rias conclus%es que podemos aproveitar, mas eu gostaria até de saltar essa preliminar fenomenol)gica, se possvel também neutralizando0a, pois ela ainda est& dentro da idéia do 7preliminar Kantiano7, e a min*a idéia é eliminar completamente os preliminares, mostrando que são pro"etos invi&veis. 2, para isso, é necess&rio voltar ao "& e/posto na aula 7O problema da verdade e a verdade do problema7 tantas vezes quantas se"a formulada essa questão, tantas vezes sua investigação ser& bloqueada por contradiç%es internas da formulação mesma. 2ntão, é preciso retomar o pr)prio 9escartes, e a  entra, propriamente, min*a crtica do 9escartes a idéia mesma de colocar entre parenteses o ob"eto do con*ecimento, e $car s) com o su"eito, também é impossvel *& um curto0circuito desde o incio, e c*ega a ser espantoso que ninguém ten*a me/ido nesse problema antes. Ora, su"eito e ob"eto são um modelo, uma distribuição de papéis, e ambos não são senão funç%es desempen*adas por determinados elementos, nen*um dos quais corresponde inteiramente F função respectiva não é concebvel nem o puro ob"eto nem o puro su"eito. Assim, segue0se que o que e/istem são situaç%es onde um elemento desempen*a tal papel, e o outro o outro papel ' mas essa situação é que é o decisivo, pois tanto podemos c*am&0la de con*ecer como de e/istir, "& que não *& nen*um motivo para dizer que o aspecto cognitivo predomina sobre o aspecto e/ist-ncial, se e/istir é, simplesmente, transmitir e receber informaç%es. 3istoricamente, as primeiras an&lises do fen4meno do con*ecimento atacaram diretamente o ato de con*ecimento sem perguntar se esse ato não seria espécie de algum g-nero. (a verdade, o con*ecimento é espécie do g-nero relação ' é uma relação entre dois entes. :e isso tivesse sido levado em conta, teria resolvido muitas quest%es relativas ao problema do con*ecimento todas e quaisquer relaç%es que e/istem entre quaisquer seres são transmiss%es de informaç%es, não *& uma sequer que se"a outra coisa. 5ortanto, essa modalidade de relação c*amada Xcon*ecimentoY é apenas uma modalidade,

entre mil*ares de outras, de transmissão de informaç%es Hé claro que com suas caractersticas diferenciais espec$casI. Agora, se o pr)prio e/istir é transmitir e receber informaç%es, então não e/iste um estudo do con*ecimento que possa colocar o e/istir entre par-nteses, caso contr&rio teramos o caso de uma espécie que coloca entre parenteses o pr)prio g-nero ao qual pertence. Assim, s) é possvel estudar o con*ecimento como modalidade da relação, ou se"a, como algo que acontece Fquilo que e/isteJ ou, dito de outro modo, estud&0 lo como maneira de e/istir. >as essa não é uma maneira qualquer entre outras, e sim a maneira essencial ' não é concebvel nen*uma, nen*uma forma de e/ist-ncia que não se"a, em ess-ncia, recepção e transmissão de informaç%es. O tempo todo algo é transmitido e algo é recebido se bloquearmos toda a entrada ou sada de informaç%es não teremos mais um ente e/istente, mas apenas o conceito abstrato de uma espécie. 5odemos conceber, por e/emplo, uma $gura geométrica 8ual a modalidade de e/ist-ncia de uma $gura geométrica6 Ora, ela s) e/iste idealmente como conceito de espécie 8ue é um quadrado senão o conceito de quadrado6 2le não é outra coisa senão seu pr)prio conceito, ele possui mera e/ist-ncia ideal e l)gica, e/iste como possibilidade de relação matem&tica e s). Ou se"a, não e/iste de maneira alguma ele faz parte do possvel, não do real. sso não quer dizer que uma $gura geométrica não transmita informaçãoJ mas ela transmite sempre a mesma, a informação essencial. 8ue é que o quadrado nos transmite senão o conceito de quadrado6 É essa a de$nição do ine/istir real o que e/iste apenas como possibilidade l)gica transmite uma +nica informação, que diz que o ente é aquilo que ele é. 8uando lidamos com pura de$niç%es, no reino puramente l)gico, os entes não t-m senão e/ist-ncia puramente l)gica, e não nos passam outra informação senão o conte+do de seu pr)prio conceito. >as e/istir realmente é transmitir algo mais que seu pr)prio conceito é transmitir propriedades, acidentes etc. 2 por isso mesmo essa dimensão acidental passa a ser essencial para a e/ist-ncia. A temos a idéia, esboçada no meu livreto sobre Arist)teles, do acidente meta$sicamente necess&rio. Algumas aspectos das coisas são acidentais, mas, sem eles, esses entes não poderiam e/istir. 2sses acidentes, portanto, s) são acidentais do ponto de vista l)gico para a e/ist-ncia, são essenciais. A estatura do *omem é acidental, perfeitamente, mas não é acidental, para a e/ist-ncia, que ele ten*a estatura, pois não pode *aver um *omem sem uma precisa estatura. 5ortanto, com esse enfoque, todos os problemas metafsicos e gnoseol)gicos acabam por tomar outra face, mediante essa simples

observação de que as quest%es fundamentais levantadas sobre esses assuntos não são abordadas e de que, sem elas, todas as teorias do con*ecimento são pro"etos simplesmente invi&veis. @odos são assim, todos prometeram o que não podem fazer o pro"eto cartesiano da fundamentação do con*ecimento ob"etivo a partir do su"eito não vai dar em nadaJ o pro"eto Kantiano da crtica da razão tampouco o que se cria é um curto0circuito que não permite fazer progredir o con*ecimento. !omo conseq-ncia, como não *& progresso, não *& possibilidade de acumulação de con*ecimentos, essa impossibilidade passou a ser vista, por $l)sofos da tradição Kantiana, como um dos traços essenciais da $loso$a. 2u mesmo "& vi introduç%es F $loso$a que diziam o seguinte e/istem con*ecimentos que progridem, como a ci-ncia, e outros que não progridem, como a $loso$a. É o caso de dizer que $loso$a não é con*ecimento de maneira alguma, como dizia ean 5iaget $loso$a, para ele, não é con*ecimento, é uma coordenação de valores. >as, como se pode coordenar algum con*ecimento se a pr)pria regra coordenante não é con*ecimento6 É o mesmo que ter uma regra do "ogo sem nen*um con*ecimento do  "ogo. Ora, se a $loso$a não é con*ecimento ela não é absolutamente nada. Zittgenstein dizia $loso$a não é con*ecimento, mas uma atividade. !erto, mas atividade de qu-6 9e con*ecer, naturalmente. sso tudo são subterf+gios ou a $loso$a é uma ci-ncia, ou não é nada. 2 se é uma ci-ncia, tem de ser possvel colocar as quest%es, investig&0las e c*egar a alguma solução. >as desde 9escartes e Lant todas as quest%es $los)$cas não t-m mais solução ' todo o ciclo moderno é abortado pela sucessiva formulação de pro"etos impossveis. 8ue é o pro"eto de (ietzc*e6 É a transvaloração de todos os valores. 2u digo pode parar, isso não é possvel, pois, se vocderrubar todos os valores, no $m sobra voc-, e voc- passa a ser o valor. >as voc- não tem mais fundamento do que os valores que derrubou, voc- também é apenas $ngimento e auto0engano, voc- é um pobretão sofredor que se faz de Anticristo para se consolar da sua miséria. 2ntão, tudo começa com uma proposta muito arro"ada e termina mal é assim com o pro"eto cartesiano, com o Kantiano, com o mar/ista, com o de (ietzc*e. O pro"eto de Zittgenstein, por e/emplo, termina mal duas vezes o primeiro pro"eto, o da linguagem absolutamente desprovida de ambiguidades, desprovida de qualquer elemento intuitivo, não d& em nada e então Zittgenstein passa para o segundo pro"eto, o da crtica da linguagem comum. Ora, s) *& uma forma de fazer a crtica da linguagem a partir de algo que não é linguagem, como os dados dos sentidos, por e/emplo. Ora, não é possvel uma linguagem absolutamente coerente, em todos os passos, pois, se assim o fosse, dispensaria os fatos ou se"a, seria

totalmente coerente na medida em que não falasse de coisa nen*uma. 2 de fato é a onde c*ega Zittgenstein por um lado temos uma linguagem totalmente coerente e formalizada, mas sem conte+do algumJ por outro lado *& um conte+do an&rquico, atomstico, sem qualquer elo interior, que ele c*ama de XfatosY. É claro que isso é um pro"eto abortado. (o fundo toda essa aparente modéstia metodol)gica da $loso$a moderna ' todas começam com autocrticas da capa *umana ' termina numa pretensão desmedida pois seus pro"etos ultrapassam a capacidade *umana. >ais ainda todos esses pro"etos não se "usti$cam. 5or que fazer a crtica da razão pura6 5or que fundamentar o con*ecimento no su"eito6 5or que transvalorar todos os valores6 5or que transformar o mundo em vez de tentar con*ec-0 lo. (ão *& razão su$ciente para nada disso. 8uando digo que determinados pro"etos $los)$cos são invi&veis, é porque levantam perguntas sem sentido. 5or e/emplo, fundamentar o con*ecimento ob"etivo a partir do su"eito considerado isoladamente é uma impossibilidade se alegam ter abstrado todas as coisas, e ter apenas sobrado o su"eito, como produzir o ob"eto a partir do su"eito6 9escartes vai buscar um mediador em 9eus, mas, se é necess&rio apelar a 9eus, é porque é necess&rio um milagre a $loso$a de 9escartes é tão invi&vel que, para realiz&0la, é preciso um milagre. 2sses pro"etos $los)$cos são todos abortivos por sua e/cessiva pretensão. O $l)sofo cai nessa pretensão ao tentar ac*ar o fundamento absoluto de um ob"eto cu"a presença ele suprime na mesma *ora. 8ual a possibilidade de con*ecer um ob"eto que não est& l&6 (esse sentido, toda a $loso$a moderna é louca, a começar por 9escartes. 2la cai na famosa de$nição de Borges metafsica é um cego, num quarto escuro, procurando um gato preto... que não est& l&. Ne"am que mesmo o pro"eto de 5opper é invi&vel ao dizer que as teorias ci-nti$cas v&lidas são aquelas que ainda não foram impugnadas, ele concede a toda teoria cient$ca uma espécie de licença para o erro in$nito. :e não temos um método positivo de a$rmação da verdade, então não *& nen*uma possibilidade de, de antemão, impugnar outras possibilidades de contestação que possam surgir. Assim, qualquer teoria est& aberta a uma crtica in$nita, e entramos no reino da total insegurança, onde con*ecer e não0

con*ecer passam a ser a mesma coisa. Assim, pelo método popperiano, camos no total irracionalismo, no convencionalismo cient$co, onde o +nico recurso que nos sobre é o apelo F autoridade cient$ca ' Xtem de ser assim porque o consenso diz que éY.  @ambém é evidente que, não *avendo con$rmação positiva da verdade, é puro eufemismo dizer que na passagem de uma teoria impugnada a outra ainda não impugnada *& um XprogressoY. (ão e/iste XprogressoY ao longo de uma lin*a in$nita, onde a idéia mesma de movimento é anulada por *ip)tese. Ou *& um padrão de perfeição, ainda que meramente ideal, ou então é impossvel distinguir processo, retrocesso e estagnação. >as, e/iste algo em comum entre todos esses pro"etos, que os condene F inviabilidade desde o começo6 2/iste, sim é a proposta de que o pro"eto $los)$co ten*a de engolir o mundo, e não ser apenas uma parte dele no fundo o que todos querem é encontrar a fundamentação $los)$ca do mundo, mas se a primeira coisa que fazem é suprimir o mundo, como ser& possvel fundament&0lo6 É possvel, certamente, fundamentar o mundo, mas para isso, em primeiro lugar, é preciso aceitar o mundo. É preciso recon*ecer que a $loso$a é apenas uma das muitas coisas que o *omem faz no mundo, que a $loso$a é uma resposta a uma situação que "& est& dada, e que ela s) responde Fs perguntas que foram colocadas naquele momento e naquele lugar. Ou se"a, ela pode remeter a uma ordem de con*ecimentos e princpios universais, mas nunca vai e/pressar aqueles princpios na totalidade ' a função da $loso$a não pode ser essa. sso não quer dizer, no entanto, que a $loso$a ten*a de se contentar com o parcial e fragment&rio. 8uer dizer apenas que ela tem de ter a consci-ncia de participar do todo em vez da pretensão de Xabarcã0loY. A consci-ncia de participação é uma forma de con*ecimento tão e/ata quanto a ut)pica visão desde fora, com a vantagem de ser vi&vel. :e a função da $loso$a é uma função reEe/iva e crtica, de certo modo, o trabal*o dela é remeter a certos princpios que "& são con*ecidos por participação podem ser difceis de e/primir, podem variar na e/pressão de tempos em tempos, mas a $loso$a não tem de se preocupar com dar0l*es uma formulação uniforme e universalmente aceita precisamente porque o trabal*o dela não é abarc&0los dentro de si, mas lembr&0los, tornar possvel a sua reconquista na consci-ncia de *omens reais que em seguida terão todo o direito de os formular como dese"em. A $loso$a é uma correção de tra"eto ela não vai traçar o tra"eto, pois este "& est& dado esse tra"eto é o mundo. 8uando a mente *umana começa a fantasias muito, e sair da realidade, a escapar da consci-ncia viva dos

princpios, a $loso$a corrigem a rota, e isto é tudo. A $loso$a não visa a dizer qual o sistema do mundo, pois o sistema do mundo "& e/iste e est& no pr)prio mundo. :e não partirmos disso, nunca iremos encontr&0lo o mundo é sistema, e o c)digo do sistema est& no pr)prio mundo. ()s, como participantes dessa realidade, temos esse c)digo em n)s, e o con*ecemos na medida do papel que nesse todo desempen*amos não mais que isso. Assim, todos os c)digos que comp%em uma tartaruga estão na tartaruga, senão ela não poderia ser tartaruga. @odos os c)digos que comp%em cada ente estão reEetidos em todos os demais entes, mas reEetidos de maneira inversa por e/emplo, na tartaruga estão reEetidos todos os c)digos que a diferenciam de um gato ' se faltar um s), a tartaruga estar& imperfeita, ser& indistinta de um gato. :e tomarmos dois entes, todas as diferenças que os separam estão registradas nos dois 00 não podem estar registradas num s) 00, mas de maneiras diferentes e multiplamente complementares. 2ntão, o sistema do mundo est& reEetido no mundo e em n)s também de maneira direita na nossa constituição enquanto *omens, de maneira indireta na nossa diferença em relação a todos os demais *omens e a todos os demais seres e coisas, inclusive o todo universal. 2ssa lei imanente, que tem de e/istir absolutamente, é o que c*amamos sabedoria. É a sabedoria que est& no pr)prio ser, na realidade mesma, e que pode estar presente também no *omem segundo uma modalidade especi$camente *umana. 2 o que é $loso$a6 É o amor F sabedoria. É a reconquista de um con*ecimento desse sistema universal, que est& dado o tempo todo, e que con*ecemos reduzidamente mas su$cientemente. 2ntão, é um con*ecer que é um ser. O ser *umano tem em si todas as determinaç%es que o fazem *umano, que o fazem ser fulano ou ciclano individualmente e que o fazem e/istir, ser real num universo real. (ão é possvel que ele abarque em toda sua mente sub"etiva todos elementos dessa constituição, pois, se abarcasse, não abarcaria não s) conceitualmente mas e/istencialmente seria necess&rio produzir um novo *omem que contivesse o primeiro, o que não é possvel. 5ortanto aquilo que voctem em voc- como ser, quando rebate no plano do seu con*ecer sub"etivo, rebate de maneira reduzida. >as, em compensação, voccon*ece a constituição de muitos outros seres. 2sse con*ecimento, não é necess&rio registr&0lo porque o pr)prio real é o registro deles, e essa realidade, de certo modo, não é opaca, é transl+cida voc- pode sempre voltar F leitura dos mesmos registros. (ão é necess&rio saber tudo, pois o universo sabe tudo e ele est& permanentemente F nossa disposição. 2le é a nossa mem)ria, a nossa biblioteca, o nosso saber. 2le, e não o nosso cérebro. 2 qual o papel da $loso$a6 É restaurar no

ser *umano a con$ança e a capacidade da leitura dos registros no ser no momento em que o ser dei/a de ser opaco para alguém, est& cumprida ali a função da $loso$a. Agora, é necess&rio fazer a transcrição do ser6 Ora, se é transcrição é parcial, ela não é o pr)prio ser. 2 é feita apenas para responder apenas Fs perguntas determinadas que alguém fez. Assim, a função da $loso$a não é fazer a doutrina universal, mas remeter0nos F pr)pria realidade, que "& é a sua pr)pria doutrina, a doutrina do ser que transluz no corpo do pr)prio ser. A função da $loso$a é corretiva e, por isso, a maior parte da atividade $los)$ca é reEe/iva e crtica. (esse sentido é que não acredito em Xprogresso in$nito do con*ecimentoY, mas sim em con*ecimento in$nito. O ser que se d& a con*ecer é in$nito e se d& a con*ecer in$nitamente. O real é in$nito, é inteligvel, e é inteligvel in$nitamente no momento em que compreendemos isso, estamos curados terminou a missão da $loso$a, e, então começa a sabedoria 8ue é sabedoria6 É o con*ecimento, e, se o é, não pode ser uma doutrina, mas a pr)pria modalidade da nossa e/ist-ncia. Onde est& a sabedoria6 2st& no *omem s&bio, não no que ele disse, pois o que ele disse pode não ser compreensvel para todos. 3& sabedoria nos provérbios de :alomão6 :im, mas apenas se a compreendermos, caso contr&rio não *& nen*uma o que *&, isso sim, é o testemun*o da sabedoria. 2 onde est& a sabedoria de :alomão6 2st& em :alomão, e, se a compreendermos, ela "& não ser& mais sabedoria de :alomão, e sim nossa. 9a podemos entender que a $nalidade da $loso$a é fazer s&bios é despertar a possibilidade da sabedoria, que não é senão a inteligibilidade direta do real. 2/istem obst&culos para atingi0la obst&culos de ordem moral, $siol)gica, cultural. 2sses +ltimos obst&culos, criados pela pr)pria atividade de busca do con*ecimento, são os que a $loso$a pode remover. 5or isso, se a sociedade não c*egar ao ponto de criar confusão na esfera cultural, não *& necessidade de $loso$a. (ão se pode transmitir a sabedoria porque a sabedoria é o real, não o que pensamos ou dizemos a respeito dele. !amos *o"e numa série de ambiguidades por estarmos acostumados a entender sabedoria como conte+do de consci-ncia, não como algo que est& no ser, no real. Onde est& a ci-ncia da mineralogia6 2st& nos livros de mineralogia6 (ão ela est& nos minerais. :e assim não fosse, ela não poderia estar também nos livros de mineralogia. Os livros são apenas registros que criam um intermedi&rio *umano entre n)s e o mineral, de modo que não é necess&rio recapitular todas as observaç%es anteriores para c*egarmos até o mineral. :e ao estudarmos um tratado de mineralogia con*ecermos apenas o que nele est& escrito, sem

refer-ncia aos minerais enquanto coisas reais, então não sabemos nada. O real propriamente dito é registro in$nito de con*ecimento, essencialmente translucidez, acidentemente obscuridade, pelo "ogo dos reEe/os devido a uma ocasional posição impropcia que assumimos para enfoc&0lo R a é necess&rio mudar de posição. Ora, mas se tomarmos todas as possveis di$culdades de foco, e, com elas, tentarmos formar um sistema, formaremos o mundo das sombras, o sistema da ignor#ncia. É a isso que a $loso$a acad-mica francesa tem se dedicado nos +ltimos trinta anos. Ora, é necess&rio eliminar essa idéia de que con*ecimento s) e/iste na mente *umana, e entendermos que con*ecimento é uma relação ativa e/istente entre o ente e o restante do real, o qual é con*ecimento, ainda que sob a forma potencial. @ome a pr)pria idéia de observação para entender a vida dos tigres, n)s os observamos. Ora, se nen*um con*ecimento sobre tigres transparecesse na conduta dos tigres, de que adiantaria observ&0los6 :e o con*ecimento e/istisse apenas na mente *umana, ao observarmos o tigre não con*eceramos o tigre, mas apenas a n)s mesmos, a nossos pensamentos 00 e cairamos no curto0circuito Kantiano estamos observando apenas fen4menos que não são senão pro"etados por nossa forma cognitiva, portanto não estamos vendo um tigre, mas estamos vendo a n)s mesmos e c*amando de tigres os nossos esquemas l)gicos e formas de percepção. >uito bem, mas a o tigre come o $l)sofo Kantiano, e que é que *avemos de dizer6 8ue foram as formas a priori que comeram6 Ora, o tigre que nos ataca é o mesmo que antes con*ecamosJ ou se"a, o ob"eto que con*ecemos é o mesmo com que nos relacionamos $sicamente e praticamente. !on*ecimento e ato de con*ecer são certamente distintos. O real é registro in$nto de con*ecimentos. 2/iste, entretanto, o ato de con*ecimento, que apenas ocorre nos atos individuais concretos. 2 mesmo assim, quando estes ocorrem, ocorre duplamente, não apenas no su"eito os escol&sticos dizem que ao con*ecermos algo, esse ob"eto não é alterado pelo fato de n)s o con*ecermos. >as isso não é totalmente e/ato aquilo que con*ecemos est& transmitindo informação a seu respeito naquele mesmo momento, e ser con*ecido por um outro é alterar0se, sim. (ão é alterar0se internamente, mas alterar sua relação com o mundo em torno. magine o primeiro *omem que descobriu o diamante. (aquele mesmo instante não apenas o *omem transformou0se, mas também transformou a relação do diamante com o *omem, ou se"a, da por

diante tudo foi diferente não s) para os *omens mas também para os diamantes. @ornar0se con*ecido é ser alterado, não internamente, é claro, mas relacionalmente. ?oi porque os diamantes se tornaram con*ecido que os *omens começaram a escavar para procurar diamantes. (o mnimo, cada coisa con*ecida abre uma nova possibilidade de ação sobre ela a partir daquele momento, ela pode sofrer um tipo de ação que antes não podia. 9izer que o ob"eto não foi alterado em nada é o mesmo que dizer que, para o ob"eto, ser con*ecido ou não ser é o mesmo ora, mas não me é possvel comer um frango se nunca o con*eci. :er con*ecido abre, para o ob"eto, a possibilidade de uma nova pai/ão, de sofre um novo tipo de ação R0 isso muda o destino dele, o lugar dele na ordem c)smica. É uma mudança ob"etiva. :e entendermos que o real é registro de con*ecimento, poderemos compreender o porqu- do smbolismo do Xgrande livro da naturezaY o que é ele senão o smbolo da inteligibilidade do real6 2 o *omem tem, dentre os seres do mundo fsico, o privilégio de poder con*ecer teoricamente todas as relaç%es entre todos os seres que este"am a seu alcance. sto é, o *omem é o local onde esta inteligibilidade da natureza se realiza sob a forma de linguagem, mas não podemos esquecer que esta é apenas uma relação entre mil*ares de outras possveis. 5or isso a $loso$a tem sempre de ser sist-mica, tem de ter um centro e não pode ser arbitr&ria, mas não pode ser Xsistem&ticaY. :ist-mico é aquilo que tem um centro e se desenvolve de forma mais ou menos org#nica a partir desse centro, sistem&tico é aquilo que procura conscientemente abranger e conter nos seus pr)prios limites o todo. É perda de tempo tentar uma $loso$a sistem&tica é o mesmo que tentar recriar o universo. >as ela tem de ser sist-mica no sentido em que se refere ao sistema do universo, não perde de vista a sistematicidade do pr)prio real. 2la não é um amontoado de observaç%es an&rquicas, mas tampouco se constitui da construção sistem&tica de um todo abrangente. 8uando desen*amos uma &rvore, tentamos desen*&0la de todos os #ngulos possveis6 (ão, o que tentamos fazer é um retrato parcial referido ao todo e ao sistema, um retrato parcial que esboce, signi$que ou aponte para essa totalidade 00 quanto mais simples for o desen*o e quanto mais claramente apontar para o centro do sistema, mel*or. 2ntão, a $nalidade da $loso$a é devolver o indivduo a esta posição de observador central, na qual o conte+do sapiencial da pr)pria realidade se mostra para ele. 2 quando ela se mostra6 8uando ele

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