SEMINARIO 1 - DIREITO TRIBUTÁRIO E CONCEITO DE TRIBUTO
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GUSTAVO FERREIRA LOPES
SEMINÁRIO I DIREITO TRIBUTÁRIO E CONCEITO DE “TRIBUTO”
IBET Campo Grande/MS
1. Que é Direito? Antes de enfrentarmos o questionamento do que seria Direito, se faz necessário que sejam firmadas premissas quanto à diversas outras questões, especialmente aquelas inerentes ao próprio conhecimento. Inicialmente o "conhecimento era concebido como a reprodução intelectual do real, sendo a verdade resultado da correspondência entre tal reprodução e o objeto referido"1, contudo, tal visão foi superada com uma mudança na concepção filosófica do conhecimento, o movimento ao qual foi atribuído o nome de giro-linguístico, segundo a qual "a linguagem deixa de ser apenas instrumento de comunicação de um conhecimento já realizado e passa a ser condição de possibilidade para a constituição do próprio conhecimento enquanto tal"2 Nas lições de DARDO SCAVINO apud AURORA TOMAZINI DE CARVALHO "a linguagem deixa de ser um meio, algo que estaria entre o sujeito e a realidade, para se converter num léxico capaz de criar tanto o sujeito como a realidade"3, uma vez que, nas lições de TOMAZINI DE CARVALHO, "o ser humano só conhece o mundo quando o constitui linguisticamente em seu intelecto" 4. Assim, conhecer deixa de ser a simples apreensão mental da realidade, uma vez que o homem não pode apreender ou reproduzir em sua mente o dado físico experimentado, passando a constituir, por meio da linguagem, uma nova realidade. O sujeito cognoscente, ao entrar em contato com um dado físico, constrói uma realidade por meio da linguagem, passando a reproduzir não mais o dado físico, mas sim o símbolo por ele constituído para designar aquela experiência, como fica mais claro no exemplo dado por AURORA TOMAZINI DE CARVALHO: "o sujeito cognoscente entra em contato com o dado físico (cadeira),
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CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de teoria geral do direito: o constructivismo lógico-semântico / Aurora Tomazini de Carvalho. São Paulo: Noeses, 2010. p. 13 2 Ibidem, p. 13-14 3 Ibidem, p. 14 4 Ibidem, p. 14 2
mas é incapaz de apreendê-lo ou reproduzi-lo em sua mente, para conhecê-lo o constitui intelectualmente por meio de uma linguagem (a palavra cadeira)" 5. Pelo mesmo motivo o ser cognoscente passa a criar novas palavras para descrever aquela realidade por ele criada, uma vez que na impossibilidade de reproduzir o objeto físico, passa a construir, em seu intelecto, o significado da primeira palavra por meio de outras palavras. Prosseguindo nesta linha, se faz necessário firmar o conceito de linguagem que, segundo FERDINAND DE SAUSSURE apud AURORA TOMAZINI DE CARVALHO pode ser dividida em duas partes, quais sejam: "(i) uma social (essencial), que é a língua; (ii) outra individual (acessória), que é a fala. Língua é um sistema de signos artificialmente constituído por uma comunidade de discurso e fala é um ato de seleção e atualização da língua, dependente da vontade do homem e diz respeito às combinações pelas quais ele realiza o código da língua com propósito de constituir seu pensamento"6. Portanto, não há como afastar o caráter social da linguagem, ou seja, há que se reconhecer que a função precípua da linguagem é a comunicação, acarretando assim em afirmar que a realidade é também uma construção social. Em suma, o que se pretende afirmar é que a realidade é sempre constituída dentro de um contexto, ou seja, dentro dos limites culturais de uma sociedade lingüística e, em último caso, dentro dos limites do próprio intérprete. Entendendo que a realidade é construída pela linguagem, há que se reconhecer como correta a concepção de que "a verdade é o valor atribuído a uma proposição quando ela se encontra em consonância a certo modelo. Seguindo a linha das considerações feitas acima, aquilo que chamamos de "modelo" não passa de um conjunto estruturado de formulações lingüísticas" 7. Isto importa em reconhecer que a verdade não é passível de ser descoberta, uma vez que toda proposição que venha a ser tomada como verdadeira é falível uma vez que sempre pode ser revista em se mudando os referenciais culturais e lingüísticos.
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Ibidem, p. 15. Ibidem, p. 19 7 Ibidem, p. 26-27 6
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Ora, diante de tal cenário em que o conhecimento não mais é visto como um meio de reproduzir o objeto experimentado, mas sim como uma forma de construir uma realidade, e diante da falibilidade da verdade, que depende sempre do contexto em que a proposição se situa, impossível seria afirmar de forma unívoca o que seria o Direito. Assim é que se faz de suma importância a utilização do discurso científico que nada mais é do que uma construção lingüística, todavia, orientada de forma a delimitar os limites da experiência, evitando assim a tendência natural de propagação ao infinito. Como leciona AURORA TOMAZINI DE CARVALHO "o dado físico é impossível de reprodução por qualquer atividade cognoscitiva, porque o conhecimento é sempre proposicional. Podemos passar horas, meses, anos, descrevendo o mesmo objeto e nunca chegaremos ao exaurimento de suas possibilidades descritivas. O que se verifica é o esgotamento da nossa capacidade de interpretá-lo, ou seja, de produzir linguagem sobre ele" 8. Este é o motivo pelo qual PAULO DE BARROS CARVALHO afirma que "sem organização metodológica e precisa delimitação do objeto, o conhecimento científico
(ou
aquilo
que
se
propõe
como
tal)
torna-se
completo
desconhecimento".9 Assim é que, para a análise da realidade, se faz necessária a delimitação do objeto por meio de cortes epistemológicos, renunciando à partes do todo para o fim de canalizar a atenção do sujeito cognoscente à um ponto específico de forma a tentar reduzir a complexidade do objeto, havendo que se reconhecer que tais incisões "não modificam nem condicionam o dado físico, apenas delimitam o campo de experiência do sujeito cognoscente, constituindo seu objeto." 10 Tais considerações objetivam demonstrar que o direito pode ser analisado sob diversos enfoques, sendo que a resposta ao questionamento do que seria direito na realidade comporta diversas tomadas de posição, em especial quanto à delimitação que é feita por arbítrio do intérprete. 8
Ibidem, p. 41 Ibidem, p. 40 10 Ibidem, p. 41-42 9
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Firmes na filosofia da linguagem, passemos à análise do vocábulo "direito" que, tal como ocorre com as palavras em geral, e fundados nas lições de CARLOS SANTIAGO NINO11, apresenta em especial três problemas que prejudicam o conhecimento da palavra, quais sejam: (i) ambiguidade; (ii) vaguidade; e (iii) carga emotiva. No tocante à ambigüidade, em que pese esta não ser uma característica exclusiva do vocábulo direito, é ainda mais grave neste vocábulo uma vez que a ambiguidade é "constituída por vários significados estritamente relacionados entre si"12, de forma que "definir o significado de "direito" pressupõe uma tomada de decisão quanto a sua forma de uso." 13 Quanto à vaguidade, esta decorre da falta de precisão do significado do vocábulo, sendo impossível determinar exatamente quais objetos são abrangidos pelo conceito. Por fim, quanto à carga emotiva, esta decorre do fato de a atribuição de sentido ser uma construção humana e cultural, decorrente do processo de interpretação, razão pela qual os vocábulos sempre estarão impregnados de valores. Por este motivo, existem diversas teorias sobre o direito, uma vez que não podendo o objeto ser compreendido em sua plenitude, diversas são as possibilidades de se efetuar cortes epistemológicos tendentes a delimitar o objeto de estudo, resultando assim em conseqüências completamente diversas. Dentre as diversas teorias, adotamos a do constructivismo lógicosemântico, teoria concebida inicialmente por Lourival Vilanova e amplamente difundida pelo Prof. Paulo de Barros Carvalho e, dentre outros, pela Prof.ª Aurora Tomazini de Carvalho. Para a delimitação do objeto, conforme já mencionado, se fazem necessários cortes epistemológicos com intuito de delimitar o objeto de estudo, sendo que, conforme leciona PAULO DE BARROS CARVALHO apud AURORA 11
Apud AURORA TOMAZINI DE CARVALHO. Ibidem, p. 63 TÁREK MOYSÉS MOUSSALEM apud AURORA TOMAZINI DE CARVALHO, p. 65 13 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de teoria geral do direito: o constructivismo lógico-semântico / Aurora Tomazini de Carvalho. São Paulo: Noeses, 2010. p. 66 12
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TOMAZINI DE CARVALHO, este primeiro corte seria considerar o direito como "o complexo de normas jurídicas válidas num dado país"14, o que demonstra a nítida influência do pensamento kelseniano a fim de analisar o direito sob uma ótica própria. O segundo corte considera "normas jurídicas como uma manifestação lingüística, sendo este nosso segundo corte metodológico: onde houver normas jurídicas haverá sempre uma linguagem (no caso do direito brasileiro, uma linguagem idiomática, manifesta na forma escrita)." 15 E por fim, o "direito é um instrumento, constituído pelo homem com a finalidade de regular condutas intersubjetivas, canalizando-as em direção a certos valores que a sociedade deseja ver realizados"16. Sintetiza a autora com a citação da doutrina de PAULO DE BARROS CARVALHO: "TRATO O DIREITO POSITIVO ADOTANDO UM SISTEMA DE REFERÊNCIA , E ESSE SISTEMA DE REFERÊNCIA É O SEGUINTE : PRIMEIRO, UM CORTE METODOLÓGICO , EU DIRIA DE INSPIRAÇÃO KELSENIANA - ONDE HOUVER DIREITO HAVERÁ NORMAS JURÍDICAS , NECESSARIAMENTE . SEGUNDO CORTE - SE ONDE HOUVER DIREITO HÁ , NECESSARIAMENTE , NORMAS JURÍDICAS, NOS PODERÍAMOS DIZER : ONDE HOUVER NORMAS JURÍDICAS HÁ , NECESSARIAMENTE , UMA LINGUAGEM EM QUE ESTAS NORMAS SE MANIFESTAM . TERCEIRO CORTE - O DIREITO É PRODUZIDO PELO SER HUMANO PARA DISCIPLINAR OS COMPORTAMENTOS SOCIAIS ; VAMOS TOMÁLO COMO UM PRODUTO CULTURAL , ENTENDENDO OBJETO CULTURAL COMO TODO AQUELE PRODUZIDO PELO HOMEM PARA OBTER UM DETERMINADO FIM."17
Cumpre esclarecer que tal definição tem como objeto o "direito positivo", uma vez que há distinção entre direito positivo e Ciência do Direito, conforme adiante será melhor esclarecido.
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Ibidem, p. 82 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de teoria geral do direito: o constructivismo lógico-semântico / Aurora Tomazini de Carvalho. São Paulo: Noeses, 2010. p. 82 16 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de teoria geral do direito: o constructivismo lógico-semântico / Aurora Tomazini de Carvalho. São Paulo: Noeses, 2010. p. 83 17 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de teoria geral do direito: o constructivismo lógico-semântico / Aurora Tomazini de Carvalho. São Paulo: Noeses, 2010. p. 83 15
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Assim, são três os critérios classificatórios a oriundos da definição do conceito de "direito" (positivo), quais sejam: (i) ser norma; (ii) ser jurídica; (iii) ser válida. Tais critérios podem ser utilizados para o fim de delimitar o que pode ser entendido como integrante do conjunto de elementos denominado "direito positivo", devendo ser utilizados tal como leciona AURORA TOMAZINI DE CARVALHO:
"COM O PRIMEIRO CRITÉRIO, DIVIDIMOS A CLASSE DAS NORMAS (LINGUAGEM PRESCRITIVA ), DA CLASSE DAS NÃO NORMAS (OUTRAS LINGUAGENS: DESCRITIVA , INTERROGATIVA, POÉTICA, ETC.). COM O SEGUNDO CRITÉRIO, SEPARAMOS A CLASSE DAS NORMAS ENTRE JURÍDICAS (POSTAS PERANTE ATO DE VONTADE DE AUTORIDADE COMPETENTE ), DAS NÃO JURÍDICAS (MORAIS, RELIGIOSAS, ÉTICAS , ETC.) E, POR FIM, COM O TERCEIRO CRITÉRIO ISOLAMOS A CLASSE DAS NORMAS JURÍDICAS EM VÁLIDAS (PRESENTES EXISTENTES ) E NÃO VÁLIDAS (FUTURAS E PASSADAS - NÃO EXISTENTES). CONSTITUÍMOS, ASSIM, A CLASSE DO "DIREITO POSITIVO", NOSSO OBJETO DE ESTUDO ."18
Seguindo o posicionamento acima adotado, a análise do direito (positivo) se limita às normas jurídicas válidas num dado país, sendo este o objeto da Ciência do Direito, que se trata de uma metalinguagem, ou uma linguagem de sobrenível, em relação ao direito positivo. Estes dois últimos critérios são de suma importância para a definição do método a ser utilizado pela Ciência do Direito, uma vez que, em razão de consideramos o direito como um corpo de linguagem, utilizamos o método analítico para seu conhecimento, sempre amparados nas Ciências da Linguagem e da Lógica. Quanto ao último critério, ou seja, em razão do direito ser entendido como objeto cultural tendente a regular as condutas intersubjetivas, não há como deixar de levar em consideração a grande carga valorativa que permeia a linguagem jurídica, razão pela qual se aplica a hermenêutica. Assim, o método a ser utilizado para a análise do objeto da Ciência do Direito deve ser o hermenêutico-analítico, tal como leciona AURORA TOMAZINI DE CARVALHO:
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Ibidem, p. 83-84 7
"NESTE SENTIDO, ANALÍTICA E HERMENÊUTICA SE COMPLETAM , CONSUBSTANCIANDO -SE NO MÉTODO PRÓPRIO DA CIÊNCIA JURÍDICA A QUAL NOS PROPOMOS. A CONSTRUÇÃO ANALÍTICO-HERMENÊUTICA , NO ENTANTO, OCORRE DENTRO DE UM PROCESSO DIALÉTICO , DE CONTRAPOSIÇÃO DE SENTIDOS , PRÓPRIO DOS OBJETOS CULTURAIS ."19
Logo, conclui-se que direito "se consubstancia no conjunto de normas jurídicas válidas num dado país, que se materializam por meio de uma linguagem, mas que só tem existência e sentido porque imersas num universo cultural (valorativo), que as determinam."20
2. Há diferença entre direito positivo e Ciência do Direito? Explique. Conforme já havíamos mencionado, direito positivo e Ciência do Direito não se confundem, sendo que o direito positivo é o objeto da Ciência do Direito e, sendo ambos linguagem, este último se configura como uma metalinguagem em relação ao primeiro, ou seja, uma linguagem de sobrenível. Conforme leciona PAULO DE BARROS CARVALHO, "o direito positivo é o complexo de normas jurídicas válidas num dado país. À Ciência do Direito cabe descrever esse enredo normativo, ordenando-o, declarando sua hierarquia, exibindo as formas lógicas que governam o entrelaçamento das várias unidades do sistema e oferecendo seus conteúdos de significação."21 Firmes no posicionamento anterior, e já adiantando que as normas jurídicas existem pra regular condutas intersubjetivas, temos que o direito positivo é uma linguagem que objetiva prescrever condutas, enquanto a Ciência do Direito é uma linguagem que visa descrever essa primeira linguagem, estando aí demonstrado o motivo de falarmos em metalinguagem ao nos referirmos à Ciência do Direito.
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Ibidem, p. 88 Ibidem, p. 86 21 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário / Paulo de Barros Carvalho. - 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p.34 20
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Aliás, sintetiza PAULO DE BARROS CARVALHO que "o direito posto é uma linguagem prescritiva (prescreve comportamentos), enquanto a Ciência do Direito é um discurso descritivo (descreve normas jurídicas)" 22. Amparados na filosofia da linguagem, uma vez que ambos são produtos de um processo comunicacional, temos que o discurso de ambas são completamente diversos, constituindo-se assim realidades distintas, uma vez que no direito positivo estamos sempre diante de linguagem prescritiva, enquanto na Ciência do Direito sempre estamos diante de linguagem descritiva, sendo esta mais uma das distinções entre ambos. Embora nos pareça que a distinção entre ambas as realidades está suficientemente clara na doutrina de PAULO DE BARROS CARVALHO, AURORA TOMAZINI DE CARVALHO23 traz uma abordagem ainda mais completa e exaustiva sobre o tema, distinguindo direito positivo de Ciência do Direito de acordo com diversos critérios lingüísticos, valendo transcrever os resultados obtidos pela autora:
critérios lingüísticos função objeto nível tipo Lógica modais valências coerência
direito positivo Prescritiva condutas intersubjetivas linguagem objeto técnica Deôntica (dever-ser) obrigatório (O), proibido (V) ou permitido (P) válidas ou não válidas admite contradições
Ciência do Direito Descritiva direito positivo metalinguagem científica Atlética/Clássica (ser) possível (M) ou necessário (N) falsas ou verdadeiras não admite contradições
Sintetiza a autora:
"(I) O DIREITO POSITIVO É UM CORPO DE LINGUAGEM COM FUNÇÃO PRESCRITIVA , QUE SE DIRIGE AO CAMPO DAS CONDUTAS INTERSUBJETIVAS COM A FINALIDADE A ALTERÁ -LAS. CONFIGURA-SE COMO UMA LINGUAGEM OBJETO EM RELAÇÃO À CIÊNCIA DO DIREITO E COMO METALINGUAGEM DO TIPO TÉCNICA, QUE SE ASSENTA NO DISCURSO NATURAL , MAS UTILIZA-SE DE TERMOS PRÓPRIOS DO DISCURSO CIENTÍFICO . É OPERADO PELA LÓGICA 22
Ibidem, p. 35 CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de teoria geral do direito: o constructivismo lógico-semântico / Aurora Tomazini de Carvalho. São Paulo: Noeses, 2010. p. 118 23
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DEÔNTICA , O QUE SIGNIFICA DIZER QUE SUAS PROPOSIÇÕES ESTRUTURAM -SE SOB A FÓRMULA "H → C", ONDE A CONSEQÜÊNCIA PRESCRITIVA "C" APARECE MODALIZADA COM OS VALORES OBRIGATÓRIO (O), PROIBIDO (V) E PERMITIDO (P). SUAS VALÊNCIAS SÃO VALIDADE E NÃO VALIDADE , O QUE NÃO IMPEDE A EXISTÊNCIA DE CONTRADIÇÃO ENTRE SEUS TERMOS . (II) A CIÊNCIA DO DIREITO POSITIVO É UM CORPO DE LINGUAGEM COM FUNÇÃO DESCRITIVA , QUE TEM COMO OBJETO O DIREITO POSITIVO , CARACTERIZANDO -SE COMO METALINGUAGEM EM RELAÇÃO A ELE . É OBJETIVADA NUM DISCURSO CIENTÍFICO , ONDE OS TERMOS SÃO PRECISAMENTE COLOCADOS. SINTATICAMENTE É OPERADA PELA LÓGICA ATLÉTICA, O QUE SIGNIFICA DIZER QUE SUAS PROPOSIÇÕES MANIFESTAM-SE SOB A FORMA "S É P", ONDE O PREDICADO "P" APARECE MODALIZADO COM OS VALORES NECESSÁRIO "N" E POSSÍVEL "M". SUAS VALÊNCIAS SÃO VERDADE E FALSIDADE E SEU DISCURSO NÃO ADMITE A EXISTÊNCIA DE CONTRADIÇÕES ENTRE OS TERMOS ."24
Prosseguindo, há que se destacar que conhecermos as características da linguagem com a qual trabalhamos é de suma importância, em especial quanto à função da linguagem, que no caso do direito positivo é prescritivo. Como bem ressaltado por IRVING M. COPI apud AURORA TOMAZINI DE CARVALHO, "as manifestações lingüísticas não são espécies quimicamente puras, ou seja, não apresentam invariavelmente uma única função" 25, sendo que para "determinação da função lingüística, adota-se a vontade dominante do emissor da mensagem produzida, ainda que sobre ela outras funções se agreguem" 26. Assim, é necessário que se reconheça que mesmo quando a estruturação frásica dos enunciados do direito positivo indique outra função, como a descritiva, deve ser reconhecido seu caráter prescritivo, pois é essa a função da linguagem do direito positivo. Nesse sentido AURORA TOMAZINI DE CARVALHO cita o exemplo sobre o enunciado do art. 3º do CTN que, em que pese estar construído amparado no discurso descritivo, nada informa, mas sim prescreve como o vocábulo "tributo" dever ser entendido no discurso do direito positivo. Dessa forma, não cabe ao intérprete questionar a veracidade dos enunciados, uma vez que no discurso prescritivo estamos diante apenas das valências de validade ou não validade, mas sim construir sua realidade em atenção ao comando prescritivo emanado dos enunciados do direito positivo. 24
Ibidem, p. 117. Ibidem, p. 99 26 Ibidem, p. 99 25
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Portanto, conclui-se que tanto direito positivo quanto Ciência do Direito são linguagens, e como tal constituem realidades completamente distintas, podendo ser elencados para distingui-las diversas características contrapostas, como faz AURORA TOMAZINI DE CARVALHO, entretanto, entendemos ser os seguintes critérios os mais relevantes: (i) função (prescritiva/descritiva), (ii) objeto (conduta intersubjetiva/direito positivo), (iii) Lógica (Deôntica/Atlética) e (iv) valência (validade/verdade).
3. Que é norma jurídica? Há que se falar em norma jurídica sem sanção? Justifique. Tal como ocorre com os demais vocábulos, "norma jurídica" é um termo ambíguo, razão pela qual se faz necessária a inserção de um contexto para possibilitar-nos delimitar seu conceito, aplicando-o com o rigor que o texto científico exige. Antes de adentrarmos na significação do vocábulo, há que se tecer alguns comentários acerca do processo pelo qual atribuímos significado aos signos, ou melhor dizendo, sobre o processo de interpretação. Segundo leciona PAULO DE BARROS CARVALHO apud AURORA TOMAZINI DE CARVALHO, a trajetória de construção do sentido dos textos jurídicos se dá em quatro planos: "(i) S1 - sistema dos significantes, composto pelos enunciados prescritivos que constituem o dado jurídico material, plano de expressão do direito positivo; (ii) S2 - sistema das proposições, composto por significações isoladas atribuídas ao campo de expressão do direito, mas ainda não deonticamente estruturadas; (iii) S3 - sistema das significações deonticamente estruturadas, plano das normas jurídicas; e (iv) S4 - sistematização das normas jurídicas, no qual são constituídas as relações entre normas." 27. No primeiro plano (S1) estão os enunciados prescritivos, ou seja, o texto legislado em si, razão pela qual estamos falando apenas da leitura do texto, sendo que sua compreensão já está nos planos subseqüentes, quando passamos a
27
Ibidem, p. 237 11
formular significações isoladas do texto legislado, que é o que ocorre no plano proposicional (S2). Em que pese já estarmos diante de um processo de atribuição de significado ao texto legislado, ainda nos carece a compreensão suficiente para aplicação do direito para seu objetivo, qual seja, regular condutas intersubjetivas. Assim é que prosseguimos na interpretação para o plano normativo (S3), quando construímos significações deonticamente estruturadas aptas a regular e prescrever as condutas intersubjetivas. Por fim, o direito positivo é um todo unitário, de forma que constitui-se num sistema jurídico indivisível, sendo necessária portanto a estruturação das normas jurídicas construídas no plano anterior, momento em que adentramos no plano de sistematização (S4), em que estabelecemos as relações de coordenação e subordinação entre as normas jurídicas. Convém, entretanto, trazer a ressalva que faz AURORA TOMAZINI DE CARVALHO, segundo a qual "dizer que, na construção de sentido de textos jurídicos, o intérprete passa necessariamente pelos planos S1, S2, S3 e S4, apressadamente pode nos dar a idéia de que ele ingressa em cada um destes planos uma única vez, mas não é isto. A construção de sentido dos textos jurídicos requer várias investidas nestes subdomínios"28, o que demonstra de forma unívoca que inexiste necessária correlação entre a quantidade de enunciados e a quantidade de normas jurídicas, em sentido estrito, produzidas pelo intérprete. De tal análise inclusive que surge a distinção entre o que seria norma jurídica em sentido estrito, e norma jurídica em sentido amplo, uma vez que esta última é atribuída aos enunciados jurídicos, ou seja, ao próprio texto legislado, aquela primeira acepção (sentido estrito) é atribuída às significações deonticamente estruturadas, construída pelo intérprete nos planos S3 e S4. Aliás, é o que delimita PAULO DE BARROS CARVALHO apud AURORA TOMAZINI DE CARVALHO, definindo "(i) "normas jurídicas em sentido amplo" para designar tanto as frases, enquanto suporte físico do direito posto, ou os textos de lei, quanto os conteúdos significativos isolados destas; e (ii) "normas jurídicas 28
Ibidem, p. 254 12
em sentido estrito" para aludir à composição articulada das significações, construídas a partir dos enunciados do direito positivo, na forma hipotéticocondicional (H → C), de tal sorte que produza mensagens com sentido deôntico -
jurídico completo"29. De qualquer forma, quando definimos o conceito de direito nos reportamos à norma jurídica em sentido amplo, de forma a voltar nossa análise, tanto ao suporte física em que se encontram os enunciados, quanto à significação dos referidos "textos de lei", até porque "a existência destas depende de um suporte físico, da interpretação dos enunciados, da construção de significações isoladas (proposições) e da estruturação dos sentidos normativos" 30, ou seja, não há como falarmos de construirmos a norma jurídica em sentido estrito sem que exista o suporte físico e o processo de significação dos enunciados. Assim, norma jurídica, em sentido amplo, abrange desde os o objeto físico no qual são veiculados os enunciados, até as proposições isoladamente consideradas construídas no processo de significação pelo qual o intérprete se volta para construir as significações que originam a norma jurídica em sentido estrito, ou seja, o todo considerado desde o próprio documento normativo produzido pelo legislador, enquanto a norma jurídica em sentido estrito é a significação, estruturalmente constituída e completa, apta a regular as condutas intersubjetivas. Dessa forma, passemos nossa análise para a norma jurídica em sentido estrito, uma vez que é ela que, após o processo de significação e sistematização, quem regula as condutas intersubjetivas, que é o objetivo do direito positivo. Contudo, primeiramente se faz necessário que elejamos o instrumento a ser utilizado em nossa análise que, em atenção ao nosso segundo corte epistemológico (onde houver normas jurídicas haverá linguagem), será a Semiótica, que é a Teoria do Signos que se presta ao estudo das unidades representativas do discurso. Conforme leciona AURORA TOMAZINI DE CARVALHO, a Semiótica propicia a investigação dos sistemas signícos, como é o caso do direito, em três 29 30
Ibidem, p. 278-9 Ibidem, p. 279 13
planos, quais sejam: "No plano sintático estudam-se as relações dos signos entre si, ou seja, os vínculos que se estabelecem entre eles quando estruturados num discurso. No plano semântico, são examinadas as relações do signo com a realidade que ele exprime (suporte físico e significado). E no plano pragmático, a atenção se volta às relações dos signos com seus utentes de linguagem, isto é, ao modo como os missores e os destinatários lidam com o signo no contexto comunicacional." 31 Assim, uma vez que o presente estudo tem como objeto a norma jurídica, e não uma norma jurídica específica, voltemo-nos à análise da mesma no plano sintático, que se dá por meio da Lógica como instrumento, pois é o que "permite conhecer as relações estruturais do sistema e de sua unidade, a norma jurídica"32. Conforme AURORA TOMAZINI DE CARVALHO, "KANT já diferenciava as leis da natureza, submetidas ao princípio da causalidade física (ser), das leis jurídicas, estruturadas pela imputabilidade deôntica (dever-ser). KELSEN também assim o fez, ainda que indutivamente (sem emprego de uma lógica própria), distinguindo as relações articuladoras das proposições de cada sistema: num, a síntese do "ser" (if A is, B is - "se A é, B é") e noutro, a do "dever-ser" (if A is, B ought to be - "se A é, B deve ser"), ambas relações de índole lógica, vínculos implicacionais que atrelam um fato-causa a um fato-efeito e constituem causalidades, ainda que muito distintas"33. Assim, temos que as normas jurídicas em sentido estrito devem sempre trazer uma relação de causalidade entre proposições, sendo uma a hipótese, e a outra o conseqüente da norma, sendo que à tal causalidade é atribuída a denominação de "causalidade jurídica", todavia, diferentemente do que acontece nas leis naturais (é), a relação que se estabelece é sempre de "dever-ser", no sentido de que ocorrida a hipótese, "dever-ser" uma relação jurídica entre sujeitos. Convém esclarecer que a Lógica Clássica somente pode ser utilizada para analisar a estrutura do discurso descritivo, razão pela qual VON WRIGHT concebeu a Lógica Deôntica para ser aplicada à linguagem normativa, criando apenas três modais - (i) obrigatório (O); (ii) proibida (V); e (iii) permitida (P) 31
Ibidem, p. 165 Ibidem, p. 165 33 Ibidem, p. 194 32
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para delimitar que tipo de relação jurídica deve ser estabelecer entre os sujeitos, tal como explica AURORA TOMAZINI DE CARVALHO:
"AO FORMALIZARMOS A LINGUAGEM DO DIREITO, REDUZINDO -A DO PONTO DE VISTA GRAMATICAL A SUA ESTRUTURA LÓGICA , ENCONTRAMOS O ESQUEMA DA NORMA JURÍDICA D (H → C). A NORMA DE DIREITO ENUNCIA QUE SE OCORRER UM FATO DEVE SEGUIR -SE UMA RELAÇÃO JURÍDICA ENTRE SUJEITOS , CUJA CONDUTA REGULADA ENCONTRA -SE MODALIZADA COMO OBRIGATÓRIA (O), PROIBIDA (V) E PERMITIDA (P)."34
Assim, temos que a norma jurídica em sentido estrito é uma linguagem formalizada por meio da Lógica Deôntica como "D (H → C)", onde "H" é a hipótese, ou seja, o evento fático descrito pelo legislador que, se verificado na realidade social, implica em "C", onde "C" deve ser entendido como um relação jurídica entre sujeitos em posição ativa e passiva, onde um deles tem o dever de cumprir certa conduta, enquanto o outro tem o direito de exigir o cumprimento da mesma conduta, sendo certo que tal conduta será sempre modalizada com um dos três modais deônticos (obrigatório, proibido ou permitido).
Em outras palavras, podemos ainda reconhecer que norma jurídica é a "unidade mínima e irredutível de significação do deôntico" 35, pois isso importa em dizer que "somente a norma jurídica, tomada em sua integridade constitutiva, terá o condão de expressar o sentido cabal dos mandamentos da autoridade que legisla"36, o que acaba por nos reportar à fórmula lógica acima descrita. Contudo, há que se destacar que até agora pouco falamos sobre o caráter jurídico da norma, sendo que nos detivemos na análise acerca da estrutura da norma jurídica enquanto prescritora de condutas intersubjetivas, ou seja, faltanos dar efetividade ao comando lingüístico. Na realidade, estivemos analisando a norma jurídica como se fosse uma entidade singular, contudo, a mesma tem caráter dúplice, existindo tanto a norma primária quanto a norma secundária. 34
Ibidem, p. 211 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: fundamentos jurídicos da incidência / Paulo de Barros Carvalho - 8. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 41 36 Ibidem, p. 41 35
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Conforme AURORA TOMAZINI DE CARVALHO, a "norma primária, vincula deonticamente a ocorrência de um fato à prescrição de uma conduta. A segunda, norma secundária, logicamente conectada à primeira, prescreve uma providência sancionatória (de cunho coercitivo), aplicada pelo Estado-Juiz, caso seja verificado o fato descrito na primeira e não realizada a conduta por ela prescrita."37 O que nos faltava até então era o poder coercitivo que se imbui o Estado-Juiz para que possa efetivamente regular as condutas intersubjetivas, e não apenas recomendar determinada conduta, como seria acaso afastássemos a existência de uma sanção. Aliás, é o que afirma KELSEN, segundo o qual "a sanção está contida na ideia de norma jurídica e é desta inseparável, tendo em vista ser o direito uma ordem coativa, distinguindo-se das demais pela possibilidade de aplicação pela força estatal"38, sendo que tal entendimento é corroborado por LOURIVAL VILANOVA, PAULO DE BARROS CARVALHO e AURORA TOMAZINI DE CARVALHO. Como já dito, "uma norma é jurídica porque sujeita-se à coerção estatal, presente na prescrição de outra norma, a qual chamamos de secundária, que a ela se agrega na composição daquilo que entendemos por "norma jurídica completa""39, sendo certo que é a coercitividade exercida pelo Estado-Juiz que diferencia o direito positivo dos demais sistemas prescritivos de condutas, como é o caso do religioso e do moral. Assim, é que não há como se falar em norma jurídica sem sanção,
uma vez que é a coercitividade da sanção, ou da norma secundária, que lhe atribui a juridicidade .
4. Há diferença entre documento normativo, enunciado prescritivo, proposição e norma jurídica? Explique.
37
CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de teoria geral do direito: o constructivismo lógico-semântico / Aurora Tomazini de Carvalho. São Paulo: Noeses, 2010. p. 305 38 Ibidem, p. 305 39 Ibidem, p. 307 16
Entendendo norma jurídica em sentido estrito, há nítida diferença entre os quatro elementos citados, uma vez que são eles pertencentes a planos de significação diversos. Segundo leciona PAULO DE BARROS CARVALHO apud AURORA TOMAZINI DE CARVALHO, a trajetória de construção do sentido dos textos jurídicos se dá em quatro planos: "(i) S1 - sistema dos significantes, composto pelos enunciados prescritivos que constituem o dado jurídico material, plano de expressão do direito positivo; (ii) S2 - sistema das proposições, composto por significações isoladas atribuídas ao campo de expressão do direito, mas ainda não deonticamente estruturadas; (iii) S3 - sistema das significações deonticamente estruturadas, plano das normas jurídicas; e (iv) S4 - sistematização das normas jurídicas, no qual são constituídas as relações entre normas." 40. O documento normativo é o próprio texto escrito, sobre o qual o intérprete se debruça para construir as significações, ou seja, é o local em que estão gravadas as "marcas de tinta" em que estão dispostas os enunciados. O enunciado prescritivo é o conteúdo do documento normativo, para onde o intérprete se volta para o fim de construir as proposições isoladas, o que faz por meio de atribuição de significações aos enunciados prescritivos. Conforme leciona PAULO DE BARROS CARVALHO, "enunciado é o produto da atividade psicofísica de enunciação. Apresenta-se como um conjunto de fonemas e de grafemas que, obedecendo a regras gramaticais de determinado idioma consubstancia a mensagem expedida pelo sujeito emissor para ser recebida pela destinatário, no contexto da comunicação" 41. Logo, o enunciado é a sentença, a oração, ou seja, o ponto de partida do intérprete quando inicia o processo de construção de sentido, sendo que o termo prescritivo se refere à função conteúdo a mensagem, que no caso do direito positivo, sempre assumirá a função prescritiva.
40
Ibidem, p. 237 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método / Paulo de Barros Carvalho. 4ª ed. - São Paulo: Noeses, 2011. p. 85 41
17
Já proposição, segundo AURORA TOMAZINI DE CARVALHO, é tomado "na acepção de "significação", isto é, aquilo que construímos em nossa mente como resultado de um processo hermenêutico"42. Aliás, no mesmo sentido PAULO DE BARROS CARVALHO, que adota segue a mesma orientação anglo-saxônica que "distingue "sentença", "oração" ("sentence") de "proposição" ("proposition"). Para os ingleses, "oração" e "sentença" teriam o mesmo valor semântico de "enunciado", isto é, a expressão oral ou gráfica de uma proposição, enquanto esta seria o conteúdo significativo que o enunciado, sentença ou oração exprimem" 43. Em síntese, a distinção entre enunciado e proposição é que este último é a significação do primeiro, ou seja, é a construção feita pelo sujeito cognoscente, sendo que a relevância de tal distinção decorre do fato do interesse da Lógica estar voltado para a forma das proposições, e não dos enunciados, valendo trazer a ressalva de PAULO DE BARROS CARVALHO, segundo o qual "é sempre relevante lembrar que as proposições não são enunciados e os elementos das proposições e das formas de proposições não são palavras nem expressões lingüísticas, mas aquilo que significam"44. Por fim, quanto à norma jurídica, tal como já mencionado, é preferível que se distinga o vocábulo em sua acepção ampla e restrita, uma vez que em sentido amplo, a norma jurídica abrange todos os conceitos anteriormente detalhados, razão pela qual somente faz sentido a presente distinção quando analisarmos a norma jurídica em sentido estrito. Aliás, é o que leciona PAULO DE BARROS CARVALHO, segundo o qual emprega-se ""normas jurídicas em sentido amplo" para aludir aos conteúdos significativos das frases do direito posto, vale dizer, aos enunciados prescritivos, não enquanto manifestações empíricas do ordenamento, mas como significações que seriam construídas pelo intérprete. Ao mesmo tempo a composição articulada
42
CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de teoria geral do direito: o constructivismo lógico-semântico / Aurora Tomazini de Carvalho. São Paulo: Noeses, 2010. p. 93 43 CARVALHO, Paulo de Barros. Direito tributário: linguagem e método / Paulo de Barros Carvalho. 4ª ed. - São Paulo: Noeses, 2011. p. 85 44 Ibidem, p. 87 18
dessas significações, de tal sorte que produza mensagens com sentido deônticojurídico completo receberia o nome de "normas jurídicas em sentido estrito"" 45. Portanto, quando falamos em norma jurídica em sentido estrito estamos nos referindo à significação construída já no plano das significações deonticamente estruturadas (S3), em que as proposições jurídicas são estruturadas em forma lógica de juízo condicionais para o fim de regular as condutas, restando assim evidente a distinção entre normas jurídicas e enunciados ou proposições, tal como afirma PAULO DE BARROS CARVALHO, segundo o qual:
"UMA COISA SÃO OS ENUNCIADOS PRESCRITIVOS , ISTO É, USADOS NA FUNÇÃO PRAGMÁTICA DE PRESCREVER CONDUTAS ; OUTRAS, AS NORMAS JURÍDICAS, COMO SIGNIFICAÇÕES CONSTRUÍDAS A PARTIR DOS TEXTOS POSITIVADOS E ESTRUTURADAS CONSOANTE A FORMA LÓGICA DOS JUÍZOS CONDICIONAIS , COMPOSTOS PELA ASSOCIAÇÃO DE DUAS OU MAIS PROPOSIÇÕES PRECRITIVAS "46.
Portanto, conclui-se haver distinção entre os referidos vocábulos, uma vez que de todos serem relacionados e, resultantes um dos outros, se dão em planos de significação diversos, com exceção do primeiro elemento que seria o veículo introdutor dos enunciados no sistema jurídico, ou seja, o objeto físico para o qual nos voltamos para iniciar o processo de significação das normas jurídicas.
5. Que é tributo? Analise criticamente o art. 3º do Código Tributário Nacional. Exigi-lo em lei e mediante atividade administrativa plenamente vinculada é aspecto fundamental da definição de tributo?
Tal como ocorre com as palavras em geral, o vocábulo "tributo" contém o vício da ambigüidade, uma vez que pode ser entendida de diversas formas, valendo destacar como aviso inicial a lição de PAULO DE BARROS CARVALHO, segundo o qual:
45 46
Ibidem, p. 128 Ibidem, p. 129 19
"TRIBUTO É NOME DE UMA CLASSE DE OBJETOS CONSTRUÍDOS CONCEPTUALMENTE PELO DIREITO POSITIVO . TRATA-SE DE PALAVRA AMBÍGUA QUE PODE DENOTAR DISTINTOS CONJUNTOS DE ENTIDADES (RELAÇÃO JURÍDICA, DIREITO SUBJETIVO, DEVER JURÍDICO , QUANTIA EM DINHEIRO , NORMA JURÍDICA E, COMO PREFERE O CÓDIGO TRIBUTÁRIO NACIONAL, A RELAÇÃO JURÍDICA, O FATO E A NORMA QUE JURIDICIZA O FATO)."47
Como se não bastassem as diversas significações estáticas acima elencadas, FERNANDO GOMES FAVACHO prossegue afirmando que, nas lições de SOUTO MAIOR BORGES, o vocábulo em uma compreensão dinâmica passa a ser entendido também como o processo todo de positivação, desde a norma constitucional autorizadora da instituição do tributo, até o seu termo final, razão pela qual o primeiro autor conclui que, "dinanicamente, ,o tributo pode ser visto, até antes do efetivo pagamento, na outorga constitucional de competência (i), na instituição (ii) e na cobrança através do lançamento (iii) 48. Como bem ressaltado por FAVACHO 49, se faz necessário que voltemos nossa análise para um momento estático, uma vez que somente assim poderemos nos aprofundar na análise do conceito, sendo que, tal como fez o doutrinador, acreditamos que a investigação da definição do conceito de tributo deve ser a do "momento da instituição, porque é ela quem diretamente autoriza a individualização e concretude da exação tributária"50. Adotada tal premissa, logo percebemos que nossa análise do vocábulo tributo está voltada para a norma jurídica, tanto é que esse foi o objeto de estudo escolhido por nós ao definirmos o objetivo da Ciência do Direito, contudo, não estamos aqui pretendendo excluir do nosso objeto de estudo a relação jurídica tributária que se desencadeia no conseqüente da norma, mas sim estudar a norma jurídica em sua plenitude, tanto a norma geral e abstrata, quanto a norma individual e concreta em que se aplica a primeira. É nesse sentido inclusive que PAULO DE BARROS CARVALHO entende que deve ser analisado o vocábulo, pois entende que o símbolo "tributo" deve ser compreendido como "toda a fenomenologia da incidência, desde a norma 47
Ibidem, p. 402 FAVACHO, Fernando Gomes. Definição do Conceito de Tributo. São Paulo: Quartier Latin, 2011. p. 83 49 Ibidem, p. 83-85 50 Ibidem, p. 84-85 48
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instituidora, passando pelo evento concreto, nela descrito, até o liame obrigacional que surde à luz com a ocorrência daquele fato" 51. Prosseguindo, há que se esclarecer que a definição de "tributo" não nos é dada pelo texto constitucional, contudo, do mesmo podemos extrair a denotação de tributo, ou seja, temos diversos elementos que integram o conjunto formado pelo vocábulo tributo, contudo, não temos a conotação, uma vez que a Constituição não nos dá expressamente os critérios do uso da palavra, tanto é que relega para a lei complementar tal função, conforme art. 146, inc. III, alínea "a", da Constituição Federal. É nesse contexto em que se torna relevante analisarmos o que dispõe a lei complementar, segundo a qual: "TRIBUTO É TODA PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA COMPULSÓRIA , EM MOEDA OU CUJO VALOR NELA SE POSSA EXPRIMIR , QUE NÃO CONSTITUA SANÇÃO DE ATO ILÍCITO, INSTITUÍDA EM LEI E COBRADA MEDIANTE ATIVIDADE ADMINISTRATIVA PLENAMENTE VINCULADA ."52
Cumpre esclarecer que não estamos reconhecendo que a lei complementar pode dispor sobre o que seria tributo sem qualquer restrição, uma vez que, conforme já dito anteriormente, apesar da constituição federal não nos dar a "conotação" do vocábulo tributo, nos dá sua denotação, ou seja, elementos da classe "tributo", razão pela qual a definição formulada pelo legislador infraconstitucional somente pode ser acolhida quando respeitados tais parâmetros constitucionais. De qualquer forma, em uma primeira análise sobre o que dispõe o art. 3º do CTN, logo percebemos que o vocábulo tributo não nos é mostrado na acepção de norma jurídica, uma vez que, em um primeiro momento, entendemos tributo como uma prestação pecuniária. Contudo, conforme salienta PAULO DE BARROS CARVALHO, "a menção à norma jurídica que estatui a incidência está contida na cláusula "instituída em
51
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário / Paulo de Barros Carvalho. - 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 55-56 52 Art. 3º, do Código Tributário Nacional. 21
lei", firmando o plano abstrato das formulações legislativas" 53, sendo que é por este motivo que voltamos nossa análise à norma jurídica, pois a "prestação" a que se refere o dispositivo legal nada mais é do que a conduta intersubjetiva pretendida pelo legislador, sendo que esta compõe o conseqüente da norma jurídica primária. Entendermos tributo como norma jurídica se torna relevante para que possamos manter a congruência do nosso discurso, uma vez que a Ciência do Direito se presta ao estudo das normas jurídicas, contudo, para fins de uma análise mais aprofundada do vocábulo "tributo", muitas vezes teremos que por de lado a amplitude do objeto para destinar nossa investigação à apenas alguns critérios da norma jurídica, de forma a possibilitar a compreensão do objeto, razão pela qual passamos a analisar individualmente cada um dos elementos da definição dada pelo Código Tributário Nacional. O primeiro elemento, prestação pecuniária compulsória, conforme afirma PAULO DE BARROS CARVALHO, "quer dizer o comportamento obrigatório de uma prestação em dinheiro, afastando-se, de plano, qualquer cogitação inerente às prestações voluntárias"54, ou seja, nos demonstra que o comportamento inserto no conseqüente da norma jurídica será sempre modalizado com o modal "obrigatório". O segundo elemento, "em moeda ou cujo valor nela se possa
exprimir", é visto com ressalva por PAULO DE BARROS CARVALHO 55, segundo o qual o legislador teria ampliado exageradamente o âmbito das prestação pecuniárias ao tentar reafirmar o caráter pecuniário antes mencionado. Em razão disso, alguns autores pensam ser permitida a instituição de obrigação tributária não só em pecúnia, mas também in natura ou in labore, ainda que não seja este o único fundamento adotado. Tanto é que ALFREDO AUGUSTO BECKER apud FERNANDO GOMES FAVACHO "não vê problemas em tributos não
53
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário / Paulo de Barros Carvalho. - 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 56 54 Ibidem, p. 57 55 Ibidem, p. 57 22
pecuniários: a expressão "tributo" abrangeria todos os tipos de exações que o Estado pode exigir para a realização de seus fins" 56. Contudo, deste posicionamento discorda GERALDO ATALIDA 57, pois a prestação será sempre em pecúnia, contudo, admite-se que a extinção da obrigação tributária posse se dar por outros meios que não a entrega de dinheiro, como é o caso da dação em pagamento de bem imóvel. De qualquer forma, FERNANDO GOMES FAVACHO acaba por dar a solução que melhor se encaixa na problemática ao afirmar que "a interpretação que fazemos do artigo não é a de uma dupla redundância, mas de um processo de elucidação. Tributo é prestação pecuniária. Por "pecúnia", entende-se tanto a moeda corrente (reais) como os índices de correção (Unidade Fiscal de Referência - UFIR, Bônus do Tesouro Nacional - BTN)"58. Já no que se refere ao terceiro elemento, que não constitua sanção de
ato ilícito, entendemos que isto importa em afirmar que a conduta escolhida pelo legislador na hipótese da norma jurídica nunca pode ser "proibida". Como antes já vimos, as condutas intersubjetivas são reguladas segundo três modais deônticos intraproposicionais, quais sejam: permitido, obrigatório e proibido. Assim, quando afirmamos que tributo não pode ser sanção por ato ilícito, queremos distinguir a obrigação tributária daquela decorrente do descumprimento de outra norma que havia proibido a conduta praticada. Prosseguindo, quanto à necessidade do tributo ser instituído em lei, devemos sempre lembrar que o direito é um sistema autônomo e, portanto, para novas normas ingressem no sistema deve ser seguido o procedimento competente, delimitado na Constituição Federal. Aliás, já prevê a Constituição Federal que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei, razão pela qual seria absurdo admitirmos que uma norma jurídica que tem como objetivo regular uma conduta,
56
FAVACHO, Fernando Gomes. Definição do Conceito de Tributo. São Paulo: Quartier Latin, 2011. p. 113-114 57 Apud FERNANDO GOMES FAVADHO, Ibidem, p. 114-115 58 FAVACHO, Fernando Gomes. Definição do Conceito de Tributo. São Paulo: Quartier Latin, 2011. p. 115 23
ingresse no sistema sem seu respectivo veículo introdutor, o que nos levaria a conclusão de que tal critério não é fundamental na definição do tributo. Contudo, precisamos nos aprofundar no assunto para evitar uma conclusão errônea sobre ser tal critério não ser essencial à definição de tributo. Ora, as relações sociais são todas baseadas na troca, ou seja, a sociedade somente existe em razão de alguns cederem alguns direitos para outros, enquanto estes efetuam uma contraprestação aos primeiros. Assim, se faz necessário que tenhamos em mente que existe distinção entre uma (i) conduta obrigatória em razão de uma norma jurídica e (ii) outra em razão de um acordo de vontades. Frise-se que quando falamos em acordo de vontades, estamos falando de um contrato bilateral, ou seja, onde ambos tem a vontade de celebrar o contrato. Assim é que distinguimos que uma conduta obrigatória pode ser decorrente da lei, ou ainda de um acordo de vontades, devendo ser destacado que estamos falando sempre de um primeiro momento, pois em análise final, todas as relações intersubjetivas, por serem reguladas pelo direito, são decorrentes de lei. Portanto, consideramos que a característica de ser o tributo
decorrente de lei essencial para a delimitação do critério do tributo . Por fim, o enunciado "cobrada mediante atividade administrativa
plenamente vinculada" não integra a norma jurídica tributária, uma vez que visa regular conduta de momento posterior à instituição do tributo. Para que fique mais claro, a nosso ver, tal enunciado virá a ser analisado por outra área da Ciência do Direito, pois sua significação resultará em proposições prescritivas voltadas ao agente público no âmbito do exercício de suas atribuições, que deverá observar que a cobrança do tributo não é uma atividade discricionária. Portanto, verificamos que os critérios mais relevantes para a análise do tributo são a (i) licitude da conduta e (ii) a obrigatoriedade decorrente da lei, sendo estes os critérios utilizados por GERALDO ATALIBA para distinguir as diversas obrigações da dar dinheiro ao estado, quais sejam: (i) multa; (ii) obrigação convencional; (iii) indenização por dano; e (iv) tributo.
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Logo verifica-se que o tributo sempre conterá em sua hipótese uma conduta lícita, ou seja, não proibida por outra norma jurídica, e no seu conseqüente uma conduta sempre modalizada como obrigatória (Op). Dessa forma, podemos concordar com FERNANDO GOMES FAVACHO, segundo o qual "tributo, em uma definição de conceito, é uma norma que tem como antecedente uma hipótese não vedada por outra norma, e que implica por imposição legal uma relação jurídica modalizada como obrigatória, qual seja, o dever do Contribuinte de levar dinheiro ao fisco"59, contudo acrescentamos a relação jurídica deve ser decorrente da lei, e não de um acordo de vontades.
6. Com base na sua definição de tributo, quais dessas hipóteses não são consideradas tributos? Fundamente sua resposta: (i) seguro obrigatório de veículos; (ii) multa decorrente de atraso no IPTU; (iii) FGTS (vide anexos I e II e III); (iv) aluguel de imóvel público; (v) custas judiciais (vide anexo IV); (vi) prestação de serviço eleitoral; (vii) imposto sobre renda auferida por meio de atividade ilícita (ex. contrabando); (viii) tributo instituído por meio de decreto (inconstitucional – vide anexo V).
(i) seguro obrigatório de veículos e (iii) FGTS Primeiramente há que se esclarecer que o critério normalmente adotado pela jurisprudência para afirmar que as contribuições ao FGTS não tem natureza tributária são em razão da destinação de tais verbas ser a de constituir um fundo em favor dos trabalhadores, além de que seria um direito constitucional assegurado aos mesmos pela Constituição Federal. Portanto, desde logo se verifica que o critério aqui utilizado é o da destinação dos recursos, ou seja, estamos diante de um critério econômico ou financeiro, e não jurídico. Aliás, convém destacar que tal análise, digamos imediatista, deixa de lado o fato de que todos os valores arrecadados pelo Estado se destinam, em última instância, a cumprir funções sociais. 59
Ibidem, p. 202 25
De qualquer forma, é certo que o critério de gerar ou não receita pública é extrínseco à definição de tributo, razão pela qual não podemos nos embasar em tal critério para afirmarmos que a contribuição ao FGTS não tem natureza tributária. Da mesma forma ocorre com o seguro obrigatório de veículos que, assim como ocorre com a contribuição ao FGTS, se trata de uma prestação pecuniária compulsória ex lege, ou seja, decorrente da lei, que não constitui um ilícito. Ora, ambos tem na hipótese uma conduta permitida, sendo certo que a obrigação de recolher a prestação pecuniária decorre do conseqüente da mesma norma jurídica, estando assim evidente a natureza tributária das exações. Portanto, uma vez que as exações preenchem todos os critérios antes mencionados quando delimitamos o conceito de tributo, é certo que estamos diante de um tributo.
(ii) multa decorrente de atraso no IPTU As normas jurídicas que instituem multas, em geral, tem como hipótese o descumprimento de uma conduta obrigatória, o que também quer dizer que estamos diante de uma conduta proibida. Ora, uma vez que entendemos que a licitude da conduta prevista na hipótese é um dos elementos essenciais em nossa definição de tributo, por conseqüência não restam dúvidas de a multa decorrente de atraso no IPTU é tributo.
(iii) vide item (i)
(iv) aluguel de imóvel público Como já acima mencionado, tributo é uma norma que tem como antecedente uma hipótese não vedada por outra norma, e que implica por 26
imposição legal uma relação jurídica modalizada como obrigatória, qual seja, o dever do Contribuinte de levar dinheiro ao Fisco. Ou seja, para ser tributo será necessário que o contribuinte pratique uma conduta não vedada, sendo que a conseqüência será a obrigação, decorrente da lei, de recolher o tributo. Vale destacar que esta estrutura lógica não se aplica exclusivamente ao Direito tributário, mas sim à todo o direito positivo que, como sabemos, é uno e indivisível. Tecido tal comentário inicial, há que se destacar que não é permitido a uma pessoa usufruir bens de outro, ou seja, não é permitido pelo ordenamento jurídico que alguém simplesmente ocupe um imóvel, sendo que para tanto, é necessário um ajuste prévio de vontades, ou melhor dizendo, um contrato, mesmo quando em um dos pólos se encontra a Administração Pública, como no caso do aluguel de um imóvel público Vale ainda dizer que um imóvel não pode ser disponibilizado para toda a coletividade, tal como ocorre com um serviço público (ex. prestação jurisdicional), de forma que somente pessoas determinadas poderão usufruir de um imóvel público, sendo esta a distinção entre um serviço público que, via de regra, é disponibilizado à coletividade. Assim é que o particular ao "alugar" um imóvel público, na realidade está celebrando um contrato com a Administração, sendo que seu dever de pagar um preço pelo aluguel não decorre da lei, mas sim de um contrato firmado com a Administração. Frise-se que se a mesma pessoa entrasse em um imóvel público e resolvesse utilizá-lo, estaria praticando uma conduta proibida, portanto, não haveria como falar em pagamento de tributo. Na realidade, somente há licitude na conduta de usufruir de um imóvel público em razão de um contrato prévio celebrado entre as partes. Assim é que o valor pago a título de contraprestação pelo aluguel do imóvel público não pode ser considerado tributário, uma vez que tal obrigação não decorre da lei, mas sim de um contrato. 27
Cumpre esclarecer que, em última análise, todas as obrigações decorrem da lei, uma vez que é o direito quem regula como as relações intersubjetivas devem ser, contudo, a análise da obrigatoriedade no tributo deve ser imediata, e não mediata. Portanto, conclui-se que o valor pago a título de aluguel de imóvel público não é tributo, uma vez que não decorre da lei, mas sim de um contrato entre as partes.
(v) custas judiciais Prosseguindo, quanto aos serviços públicos, há que se reconhecer que existe uma grande distinção, uma vez que o serviço público é disponibilizado para toda a coletividade, e não para pessoas certas e individualizadas. Assim, optando o sujeito por usufruir do serviço público disponibilizado à toda coletividade, o mesmo deve ser compelido à efetuar o pagamento de uma prestação. Verifica-se que existe distinção entre a figura anterior pois, ao contrário do que ocorria, não existe acordo de vontade entre as partes, ou seja, o serviço público é disponibilizado para todas as pessoas em geral, e não mais para pessoas certas e individualizadas. Portanto, ao usufruir do serviço (no caso, prestação jurisdicional) ocorreu a hipótese, surgindo assim como conseqüente o dever de pagar tributo (no caso, as custas judiciais). Dessa forma, conclui-se que custas judiciais é tributo, uma vez que o dever jurídico de pagar tal prestação pecuniária decorre imediatamente da lei.
(vi) prestação de serviço eleitoral Como dito anteriormente, tributo será sempre prestação em pecúnia, sendo que pecúnia pode ser entendida não apenas como moeda corrente, como também em índices de correção (UFIR, BTN, etc.), sendo certo que eventual
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pagamento de tributo de forma diversa, como a dação em pagamento de bem imóvel, nada mais é do que uma forma de extinção da obrigação tributária. Assim, não há como admitir que a prestação de serviço eleitoral tenha natureza tributária, pois não se confunde com tributo em razão da prestação não ser em pecúnia.
(vii) imposto sobre a renda auferida por meio de atividade ilícita (ex. contrabando) É tributo pois o que se está tributando não é a atividade ilícita, mas sim o critério material "auferir renda", sendo que tal conduta não é ilícita, ou seja, é permitida pelo ordenamento jurídico. O que não se considera tributo é instituir a norma jurídica em que a hipótese seja uma conduta não permitida pelo ordenamento, pois neste caso sim estaríamos diante de uma sanção por ilícito, e não mais diante de uma norma jurídica tributária.
(viii) tributo instituído por meio de decreto (inconstitucional vide anexo V) É considerado tributo pois a inconstitucionalidade do tributo não altera sua natureza, uma vez que tal critério não é essencial na definição de tributo, além de que as normas em geral gozam de presunção de constitucionalidade, não podendo o contribuinte se furtar ao cumprimento de uma norma sob o argumento de que a mesma seria inconstitucional. No caso, um tributo instituído por meio de uma lei (em sentido amplo, inclusive decreto) que venha a ser declarado inconstitucional, somente deixa de ser exigível quando surgir outra norma, inclusive podendo ser individual e concreta, que tire a validade da primeira. Portanto,
fica
claro
que
tanto
antes
de
ser
declarada
a
inconstitucionalidade, quanto após sua declaração, o tributo mantém a mesma natureza jurídica. 29
7. O desconto de IPVA concedido para contribuintes que não incorreram em infrações de trânsito é uma utilização do tributo como sanção de ato ilícito? E a progressividade do IPTU e do ITR em razão da função social da propriedade? Considerando que o tributo não pode ser sanção de ato ilícito, pode haver majoração da obrigação “tributária” em substituição à mul ta administrativa? Tal majoração pelo não cumprimento da função social da propriedade ou em decorrência de infração de trânsito é sanção de ato ilícito tendo, portanto, caráter não-tributário? (Vide anexo VI).
Conforme preceitua o art. 3º do CTN, bem como pelo que se verifica pela análise dos tributos previstos na Constituição Federal, a hipótese da referida norma deverá ser sempre uma conduta permitida, ou seja, o tributo não pode constituir sanção por ato ilícito. Contudo, a própria Constituição Federal aparenta trazer duas exceções à regra: o IPTU e o ITR. Tal como determina a Constituição Federal, o Fisco poderá escalonar a alíquota de forma a incentivar o contribuinte a cumprir a função social da propriedade ou, analisado pelo ponto de vista contrário, punir aquele que não cumpre a referida função social. Não há que se discutir a possibilidade da Administração Pública cobrar valores pecuniários diferenciados nas duas figuras tributárias (IPTU e ITR), uma vez que existe expressa previsão constitucional, ou seja, de hierarquia superior ao próprio Código Tributário Nacional. Contudo, há que se esclarecer que tal cobrança não é uma exceção ao conceito de tributo, mas sim uma exação não-tributária, e sim punitiva. Ora, não há como admitir que tributo seja utilizado como sanção por ato ilícito, uma vez que isso é manifestamente incompatível com a Constituição Federal. O que temos na realidade é que, além do tributo (IPTU ou ITR), o proprietário do imóvel, urbano ou rural, pode ser punido pelo descumprimento da função social da propriedade, seja por meio de cobrança de prestações pecuniárias
30
não-tributárias, seja por meio de eventual desapropriação. Aliás, é o que entende ROQUE ANTONIO CARRAZA:
"V - AINDA A RESPEITO DO IPTU, HÁ UMA QUESTÃO POUCO ESTUDADA : NADA IMPEDE QUE SUAS ALÍQUOTAS AUMENTEM PROGRESSIVAMENTE , À MEDIDA QUE O PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL URBANO FOR PERSEVERANDO EM SEU MAU APROVEITAMENTO (É A CHAMADA "PROGRESSIVIDADE NO TEMPO"). TAL AUMENTO - É O QUE ESTATUI O INCISO II DO § 4º DO ART. 182 DA CF - PODE REDUNDAR , ATÉ, NA PERDA DA PROPRIEDADE . SEMPRE COM BASE EM LEI (AGORA LEI SANCIONATÓRIA ., E NÃO TRIBUTÁRIA). DE FATO, ISTO SERÁ FEITO EXATAMENTE PARA PUNIR O PROPRIETÁRIO DO IMÓVEL QUE RENITE EM NÃO AJUSTÁ -LO ÀS DIRETRIZES DO PLANO DIRETOR "60.
Portanto, temos como firme a convicção de que tributo não pode ter como hipótese um fato ilícito, sendo certo que os valores cobrados, no caso do IPTU e ITR, com expressa autorização constitucional, em razão do descumprimento da função social da propriedade, não possuem natureza tributária. Já no que se refere ao IPVA, o dito "desconto" não é autorizado pela Constituição Federal, valendo destacar que na realidade estamos diante de um "aumento" de tributo, uma vez que o tributo seria apenas o valor já descontado, enquanto o restante, por ter como hipótese um ato ilícito, seria um tributo instituído utilizado como sanção por ato ilícito, o que é vedado. Portanto, resta evidente que em nenhum dos casos podemos admitir que tributo seja utilizado como sanção por ilícito, sendo certo que possui natureza distintas, de penalidade, todavia, por haver expressa autorização constitucional no caso do IPTU e ITR, não há qualquer óbice em se admitir referida exação pecuniária.
8. Que é direito tributário? Sob as luzes da matéria estudada, efetuar crítica à seguinte sentença: “Direito tributário é o ramo do Direito público positivo que estuda as relações jurídicas entre o Fisco e os contribuintes, concernente 60
CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário - 24ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 114 31
à instituição, arrecadação e fiscalização de tributos”, e propor definição para “direito tributário”.
Primeiramente temos que esclarecer que o direito positivo é uno e indivisível, sendo certo que eventuais cortes epistemológicos que fazemos para estudá-lo em nada o altera, pois tais cortes efetuados pela ciência em nada alteram o objeto. Aliás, é o que afirma PAULO DE BARROS CARVALHO: "COM EFEITO, A ORDENAÇÃO JURÍDICA É UNA E INDECOMPONÍVEL . SEUS ELEMENTOS - AS UNIDADES NORMATIVAS - SE ACHAM IRREMEDIAVELMENTE ENTRELAÇADOS PELOS VÍNCULOS DE HIERARQUIA E PELAS RELAÇÕES DE COORDENAÇÃO , DE TAL MODO QUE TENTAR CONHECER REGRAS JURÍDICAS ISOLADAS, COMO SE PRESCINDISSEM DA TOTALIDADE DO CONJUNTO , SERIA IGNORÁ-LO, ENQUANTO SISTEMA DE PROPOSIÇÕES PRESCRITIVAS ."61
Portanto, não há como conceber a idéia de direito "positivo" tributário, pois estamos ignorando a indivisibilidade do direito positivo, razão pela qual pensarmos em direito tributário somente seria possível se estivéssemos falando de Ciência. E já que estamos falando de "tributário", e já tendo firmado nossa premissa de que a Ciência do Direito tem por objeto normas jurídicas, por certo seria que voltássemos nossa atenção às normas jurídicas tributárias. Para tanto, se faz necessário que tragamos para nossa análise o conceito de tributo que, segundo já afirmamos anteriormente, seria:
TRIBUTO É UMA NORMA QUE TEM COMO ANTECEDENTE UMA HIPÓTESE NÃO VEDADA POR OUTRA NORMA , E QUE IMPLICA POR IMPOSIÇÃO LEGAL UMA RELAÇÃO JURÍDICA MODALIZADA COMO OBRIGATÓRIA , QUAL SEJA, O DEVER DO CONTRIBUINTE DE LEVAR DINHEIRO AO FISCO .
Portanto, a Ciência do Direito Tributário deve se voltar ao estudo das normas jurídicas acima descritas, devendo, contudo, nos voltar também à análise
61
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário / Paulo de Barros Carvalho. - 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 46 32
das demais normas decorrentes das mesmas, ou seja, as normas secundárias ou ainda as que guardem relação com as primeiras. Portanto, entendemos que Direito Tributário é o ramo da Ciência do Direito que estuda as normas jurídicas que tratam de tributo, incluindo nesta definição as relações jurídicas existentes entre Fisco e contribuintes, tanto no que se refere à instituição, arrecadação e fiscalização de tributos.
9. Dada a seguinte lei (exemplo fictício): (...) Pergunta-se: a) Quantas normas há nessa lei? São construídas quatro normas jurídicas, sendo uma norma jurídica de instituição de tributo, uma de instituição de obrigação acessória e duas que veiculam sanção.
b) Identificar todas as normas jurídicas veiculadas nessa lei. b.1) 1ª Norma Jurídica - Tributo Hipótese CM = prestação de serviço de conservação de imóveis; C.Temporal = momento da conclusão efetiva do serviço; C.Territorial = território municipal Consequente BC = preço do serviço prestado, no qual não se incluem os valores referentes aos materiais empregados na prestação do serviço AL = 5% (cinco por cento) Sujeito Ativo = Município de Caxias Sujeito Passivo = prestador de serviço, podendo ser a empresa ou o profissional autônomo
b.2) 2ª Norma Jurídica - Obrigação Acessória 33
Hipótese: idem à anterior (CM = prestação de serviço de conservação de imóveis; C.Temporal = momento da conclusão efetiva do serviço; C.Territorial = território municipal); Conseqüente: O prestador de serviço deverá emitir "NOTA FISCAL DE SERVIÇOS")
b.3) 3ª Norma Jurídica - Descumprimento de 1ª NJ Hipótese: deixar de recolher aos cofres públicos o tributo instituído na 1ª NJ até o décimo dia útil do mês subseqüente à quando o tributo passou a ser devido; Conseqüente: pagar multa de 10% (dez por cento) sobre o valor do tributo devido em razão da incidência da 1ª NJ;
b.4) 4ª Norma Jurídica - Descumprimento da 2ª NJ Hipótese: deixar de emitir a nota fiscal a que se refere a 2ª NJ Consequente: Sujeito Ativo da 1ª NJ deverá lavrar auto de infração com aplicação de multa de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor da operação. Apenas uma ressalva quanto à esta última norma jurídica é que a mesma se refere ao valor da operação, e não do tributo, razão pela qual entendo que operação quer dizer o valor do serviço prestado, ou seja, da base de cálculo da primeira norma jurídica.
c) Qual dessas normas institui tributo?
A norma que institui tributo é somente aquela que se constrói a partir dos arts. 1º ao 4º, cujo critério material é a prestação de serviço de conservação de imóveis, ou seja, aquela a qual atribuímos o item "b.1".
d) Qual dessas normas é estudada pela Ciência do Direito Tributário?
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