Sebenta de Quimica Orgânica
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Faculdade de Ciências e Tecnologia Universidade Nova de Lisboa Departamento de Química
Química Orgânica A
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira e Ana Lourenço
Monte de Caparica 2011
Química Orgânica A
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Índice Estrutura e ligação química nas moléculas orgânicas .....................................................................5 1.1 A ligação química............................................................................................................5 1.2 Ligações puramente iónicas ............................................................................................7 1.3 Ligações covalentes.........................................................................................................9 1.4 Ligações covalentes polares ............................................................................................9 1.5 A forma geométrica dos compostos orgânicos..............................................................10 1.5.1 Orbitais atómicas ...................................................................................................10 1.5.2 Forma das orbitais .................................................................................................11 1.5.3 Orbitais moleculares..............................................................................................12 1.5.4 Hibridação molecular ............................................................................................13 2 Grupos funcionais..................................................................................................................16 3 Ácidos e bases .......................................................................................................................23 4 Alcanos ..................................................................................................................................28 4.1 Isomerismo ....................................................................................................................29 4.1.1 Isómeros constitucionais .......................................................................................30 4.1.2 Estereoisómeros - isómeros conformacionais (confórmeros) ...............................31 4.2 Nomenclatura dos alcanos .............................................................................................32 4.2.1 Alcanos não ramificados .......................................................................................32 4.2.2 Alcanos ramificados ..............................................................................................33 4.2.3 Propriedades dos alcanos.......................................................................................33 4.2.4 Fontes naturais de alcanos .....................................................................................34 4.3 Ciclo-alcanos .................................................................................................................35 4.3.1 Isomerismo cis-trans em ciclo-alcanos .................................................................35 4.3.2 Alcanos policíclicos...............................................................................................35 4.4 Conformações do ciclo-hexano .....................................................................................36 4.4.1 cis-trans..................................................................................................................37 4.5 Reacções características de alcanos e ciclo-alcanos......................................................37 4.5.1 Reacção radicalares ...............................................................................................37 4.5.1.1 Halogenação de alcanos ....................................................................................37 4.5.1.2 Cloração.............................................................................................................38 4.5.1.3 Estabilidade dos radicais ...................................................................................39 4.5.1.4 Combustão (oxidação) de alcanos .....................................................................41 4.5.1.5 O problema da destruição da camada de ozono (O3) – uma reacção radicalar.42 4.5.1.6 O problema dos CFCs.......................................................................................42 5 Halo-alcanos ou haletos de alquilo........................................................................................43 5.1 Propriedades físicas .......................................................................................................43 5.1.1 Ligação ..................................................................................................................43 5.1.2 Outras propriedades...............................................................................................45 5.2 Enantiomeria..................................................................................................................45 5.2.1 Regras de Cahn-Ingold-Prelog ..............................................................................46 5.2.1.1 Alguns isótopos usados em química orgânica...................................................49 5.3 Reacções de substituição com halo-alcanos ou haletos de alquilo................................51 5.3.1 Mecanismo da Reacção SN2 .................................................................................51 5.3.1.1 Velocidade de uma reacção ...............................................................................53 5.3.1.2 Energética da reacção ........................................................................................53 5.3.1.3 Estereoquímica do mecanismo SN2 ..................................................................53 5.3.1.4 Reactividade do grupo alquilo...........................................................................54 5.3.1.5 Efeito do grupo de saída ....................................................................................55
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Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
5.3.1.6 Efeito dos nucleófilos ....................................................................................... 56 5.3.1.7 Efeito do solvente ............................................................................................. 57 5.3.1.8 Reacção SN2 de um nucleófilo com um haleto de alquilo ............................... 57 5.3.1.9 Complicações com substituições nucleófilas de haletos de alquilo terciários.. 57 5.3.2 Mecanismo da reacção SN1.................................................................................. 59 5.3.2.1 Energética ......................................................................................................... 60 5.3.2.2 Estereoquímica ................................................................................................. 61 5.3.2.3 Efeito do grupo de saída ................................................................................... 61 5.3.2.4 Força da ligação do grupo de saída ao átomo de carbono ................................ 61 5.3.2.5 Efeito do solvente ............................................................................................. 62 5.3.2.6 Efeito do substituinte alquilo ligado ao átomo de Carbono que sofre substituição ....................................................................................................................... 62 5.3.2.7 Comparação entre os mecanismos SN1 e SN2................................................. 62 5.4 Outras reacções de halo-alcanos................................................................................... 62 5.4.1 Síntese de compostos organometálicos ................................................................ 62 5.4.2 Reagentes de Grignard (organomagnesianos) ...................................................... 63 5.4.3 Organocupratos de lítio ........................................................................................ 64 5.4.3.1 Alcanos a partir de organocupratos .................................................................. 64 5.5 Halo-alcanos importantes ............................................................................................. 64 5.5.1 Halo-alcanos como anestésicos ............................................................................ 64 5.5.2 Halo-alcanos como solventes ............................................................................... 64 5.5.3 Halo-alcanos usados em sistemas de refrigeração................................................ 65 5.5.4 Retardadores de chama ......................................................................................... 66 5.5.5 Insecticidas ........................................................................................................... 66 5.5.6 Compostos medicinais .......................................................................................... 66 6 Alcoóis.................................................................................................................................. 67 6.1 Propriedades dos alcoóis .............................................................................................. 68 6.1.1 Pontes de hidrogénio............................................................................................. 68 6.1.2 Acidez dos álcoois ................................................................................................ 69 6.1.2.1 Metanol (álcool metílico) ................................................................................. 70 6.1.2.2 t-butanol (álcool ter-butílico) ........................................................................... 70 6.1.2.3 2,2,2-trifluoroetanol.......................................................................................... 70 6.1.2.4 Alcóxidos.......................................................................................................... 71 6.2 Reacções dos alcoóis .................................................................................................... 71 6.2.1 Conversão de álcoois em haletos de alquilo ......................................................... 71 6.2.2 Reacções de álcoois com haletos de hidrogénio................................................... 72 6.2.2.1 Teste de Lucas .................................................................................................. 75 6.2.2.2 Estereoquímica ................................................................................................. 75 6.2.3 Conversão estereospecífica de alcoóis em halo-alcanos ...................................... 76 6.2.3.1 Inversão de configuração.................................................................................. 76 6.2.3.2 Retenção de configuração................................................................................. 77 6.2.4 Oxidação de alcoóis.............................................................................................. 78 6.3 Alcoóis importantes ...................................................................................................... 81 6.3.1 Metanol ................................................................................................................. 81 6.3.2 Etanol.................................................................................................................... 81 6.3.3 Isopropanol ........................................................................................................... 82 6.3.4 Etilenoglicol ou 1,2-etanodiol .............................................................................. 82 6.3.5 Glicerol ................................................................................................................. 82 7 Éteres .................................................................................................................................... 85 7.1 Nomenclatura................................................................................................................ 86 7.2 Éteres acíclicos ............................................................................................................. 86
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7.2.1 Preparação de éteres acíclicos ...............................................................................86 7.2.1.1 Síntese de éteres de Williamson ........................................................................86 7.2.1.2 Protecção do álcool............................................................................................87 7.3 Reacções de éteres.........................................................................................................88 7.3.1 Formaação de éteres metílicos e sua quebra..........................................................88 7.4 Éteres cíclicos................................................................................................................89 7.4.1 Nomenclatura ........................................................................................................89 7.4.2 Preparação de éteres cíclicos .................................................................................89 7.4.2.1 Epoxidação ........................................................................................................89 7.4.3 Reacções de epóxidos............................................................................................90 7.4.3.1 Reacção de abertura de epóxidos catalisada por ácido......................................90 7.4.3.2 Abertura do anel de epóxidos com nucleófilos .................................................92 7.5 Éteres importantes .........................................................................................................94 7.5.1 Resinas epóxi.........................................................................................................94 7.5.2 Éter etílico .............................................................................................................95 7.5.3 Éter metil ter-butílico (MTBE) .............................................................................96 7.5.4 Alcalóides – morfina, heroína ...............................................................................96 8 Alcenos ..................................................................................................................................97 8.1 Reacções de alcenos ......................................................................................................98 8.1.1 Reacções de adição................................................................................................98 8.1.1.1 Hidrogenação catalítica .....................................................................................98 8.1.1.2 Adição electrófila a alcenos...............................................................................98 8.1.1.2.1 Mecanismo: .................................................................................................98 8.1.1.2.2 Adição de H—X com X=halogénio ............................................................99 8.1.1.3 Adição de água ..................................................................................................99 8.1.1.4 Adição anti-Markovnikov de água : como consegui-la?.................................100 8.1.1.5 Adição de halogénios ......................................................................................101 8.1.2 Oxidação de alcenos ............................................................................................101 8.1.2.1 Epoxidação de alcenos ....................................................................................101 8.1.2.2 Oxidação com permanganato de potássio .......................................................102 8.1.2.3 Ozonólise de alcenos .......................................................................................103 8.2 Reacções de preparação de alcenos.............................................................................104 8.2.1 Reacções de eliminação.......................................................................................104 8.2.1.1 Desidratação de álcoois ...................................................................................104 8.2.1.2 Desidro-halogenação de haletos de alquilo - reacção de eliminação ..............106 8.3 Alcenos Importantes ....................................................................................................108 9 Alcinos.................................................................................................................................114 9.1 Estrutura dos alcinos....................................................................................................114 9.1.1 Sistema de orbitais...............................................................................................114 9.1.2 Acidez de alcinos terminais.................................................................................114 9.2 Reacções de alcinos.....................................................................................................115 9.2.1 Adição..................................................................................................................115 9.2.2 Hidrogenação.......................................................................................................115 9.2.2.1 Hidrogenação catalítica – cis-alcenos .............................................................115 9.2.2.2 Redução de alcinos a trans alcenos .................................................................116 9.2.3 Oxidação de alcinos.............................................................................................116 9.2.3.1 Pelo ozono .......................................................................................................116 9.2.3.2 Pelo permanganato de potássio .......................................................................116 9.3 Síntese de alcinos ........................................................................................................116 9.4 Alcinos importantes.....................................................................................................116 10 Benzeno ...........................................................................................................................118
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Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
10.1 Outros compostos aromáticos..................................................................................... 119 10.2 Reacções de compostos aromÁticos........................................................................... 120 10.2.1 Substituição electrófila aromática ...................................................................... 120 10.2.1.1 Mecanismo da substituição electrófila aromática....................................... 121 10.2.1.2 Halogenação ............................................................................................... 122 10.2.1.3 Nitração....................................................................................................... 124 10.2.1.4 Sulfonação .................................................................................................. 125 10.2.1.5 Alquilação de Friedel-Crafts ...................................................................... 126 10.2.1.6 Acilação de Friedel-Crafts.......................................................................... 127 10.2.1.7 Efeitos de substituintes ............................................................................... 128 10.2.2 Halogénios .......................................................................................................... 129 10.2.3 Aplicações industriais de compostos aromáticos ............................................... 130 11 Compostos de carbonilo ................................................................................................. 132 11.1 Reacções de compostos de carbonilo ......................................................................... 132 11.1.1 Adição nucleófila................................................................................................ 132 11.1.2 Equilíbrio ceto-enólico ....................................................................................... 134 11.1.3 Tautomerismo de carbonilos / reacção com electrófilos .................................... 135 11.1.4 Adição a carbonilos ............................................................................................ 135 11.1.4.1 Redução de carbonilos / Adição de hidreto ................................................ 135 11.1.4.2 Reacção do grupo carbonilo com cianeto CN ........................................ 136 11.1.4.3 Reacções gerais do ataque de nucleófilos de azoto ao grupo carbonilo..... 137 11.1.4.3.1 Adição de aminas.................................................................................... 137 11.1.4.4 Adição de álcoois........................................................................................ 137 11.1.4.5 Adição de carbaniões.................................................................................. 138 11.2 Preparação de compostos de carbonilo....................................................................... 138 11.2.1 Aldeídos a partir de cloretos de acilo ................................................................. 138 11.2.2 Cetonas a partir de cloretos de acilo................................................................... 139 11.3 Compostos carbonílicos importantes.......................................................................... 139 11.4 Amidas importantes .................................................................................................... 141 12 Ácidos carboxílicos ........................................................................................................ 144 12.1 Estrutura dos ácidos carboxílicos ............................................................................... 144 12.2 Reacções de ácidos carboxílicos................................................................................. 145 12.2.1 Redução de ácidos carboxílicos.......................................................................... 145 12.2.2 Bromação de ácidos alcanóicos (reacção geral de compostos carbonílicos)...... 145 12.3 ácidos carboxílicos importantes.................................................................................. 145 13 Fenóis.............................................................................................................................. 146 13.1 Acidez ......................................................................................................................... 146 13.2 Substituição electrófila aromática de fenóis ............................................................... 147 13.3 Alquilação de fenóis — Síntese de Williamson ......................................................... 148 13.4 Síntese de compostos fenólicos .................................................................................. 148 13.5 Fenóis importantes...................................................................................................... 149 14 Bibliografia recomendada............................................................................................... 150
Química Orgânica A
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ESTRUTURA E LIGAÇÃO QUÍMICA NAS MOLÉCULAS ORGÂNICAS A Química é a ciência que estuda a estrutura das moléculas e as regras que governam as respectivas interacções O que distingue a Química Orgânica da Química em geral? A Química Orgânica é a química do átomo de carbono e dos seus compostos — estes são chamados compostos orgânicos. 1.1
A LIGAÇÃO QUÍMICA
As ligações químicas são forças que mantêm os átomos juntos em arranjos específicos para formar moléculas. O que são então estas ligações? Dois átomos formam uma ligação se e só se a interacção for energeticamente favorável; quer isto dizer se por exemplo calor for libertado quando a ligação se forma. Consequentemente, para quebrar essa ligação precisamos de fornecer a mesma quantidade de energia. As duas causas principais de libertação de energia associadas às ligações baseiam-se em leis fundamentais da física: 1. 2.
Cargas opostas atraem-se. Os electrões estão espalhados no espaço em torno do núcleo do átomo.
As ligações são o resultado simultâneo da atracção Coulômbica e de troca electrónica. Cada átomo é constituído por um núcleo, contendo partículas electronicamente neutras, os neutrões, e os protões que têm carga positiva. Em volta do núcleo existem os electrões carregados negativamente, em igual número ao dos protões, de modo que a carga total é zero. À medida que dois átomos se aproximam um do outro, o núcleo carregado do primeiro atrai os electrões do segundo. De modo semelhante o núcleo do segundo atrai os electrões do primeiro. Esta forma de ligação é descrita pela lei de Coulomb que diz que: cargas opostas atraem-se uma à outra com uma força inversamente proporcional ao quadrado da distância entre os centros das cargas. Lei de Coulomb carga (+) Força de atracção
=
constante
x
carga (-)
x distância
2
As forças de atracção provocam a libertação de energia à medida que os átomos se aproximam. A esta energia chama-se força da ligação. Quando os átomos atingem certa distância não se liberta mais energia e a essa distância chama-se comprimento da ligação.
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Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço átomo 1
átomo 2
absorvida
e-
0
E
e-
(energia)
libertada e
e d
0
distância interatómica
d
Moléculas em que os átomos permanecem unidos pela ligação covalente
comprimento de ligação
Se os átomos estão demasiados próximos inicia-se a repulsão electrão-electrão e núcleo-núcleo e as forças de repulsão são superiores às de atracção. Quando os núcleos têm uma separação apropriada os electrões estão espalhados em torno dos núcleos e existe um equilíbrio entre as forças de atracção e as de repulsão. O conteúdo energético do sistema dos dois átomos é mínimo. A ligação covalente ocorre quando há partilha dos electrões da ligação. De seguida representa-se essa situação onde as forças de atracção (linha a cheio) e de repulsão (linha a tracejado) estão representadas na ligação entre dois átomos. Os círculos maiores representam regiões do espaço nas quais os electrões são encontrados em torno dos núcleos. Os círculos pequenos com sinal (+) representam os núcleos. A ligação é realizada pela transferência de um electrão do átomo 1 mais electropositivo para o átomo 2 mais electronegativo, gerando dois iões de cargas opostas que se atraem. átomo 1 e-
átomo 2 e-
e-
e-
catião
anião
ligação iónica (atracção colômbica)
Vemos portanto que existem dois tipos extremos de ligações que explicam as interacções das moléculas orgânicas. 1. 2.
Uma ligação covalente formada por partilha de electrões Uma ligação iónica que se baseia na atracção electrostática de dois iões de cargas opostas.
Química Orgânica A
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Veremos que muitos átomos se ligam ao carbono de um modo intermédio entre dois extremos: algumas ligações iónicas têm um certo carácter covalente, e algumas ligações covalentes são parcialmente iónicas. Regra do Octeto Na formação de ligações os átomos tendem a adquirir a configuração electrónica do gás nobre mais próximo na tabela periódica, ficando com um octeto na camada electrónica mais externa. 1.2
LIGAÇÕES PURAMENTE IÓNICAS
A ligação iónica forma-se quando há atracção electrostática entre um catião e um anião. A ligação iónica forma-se quando um átomo electronegativo encontra um átomo de baixa electronegatividade. De acordo com a Regra do Octeto o elemento electropositivo tende a dar electrões de modo que perde os seus electrões de valência, resultando na formação de um catião (ião com carga positiva) e o elemento electronegativo recebe electrões de modo a completar a sua camada externa de forma a ficar com a configuração do gás nobre que o sucede, na forma de anião (ião com carga negativa). Uma forma conveniente para representar os electrões de valência é por pontos em torno do símbolo do elemento. Neste caso o símbolo representa o núcleo com os electrões das camadas internas. electrão desemparelhado
Li
Be
B
C
N
O
F
Na
Mg
Al
Si
P
S
Cl
Como está indicado na tabela periódica parcial seguinte a electronegatividade dos elementos aumenta da esquerda para a direita ao longo do período e diminui ao longo do grupo de cima para baixo. Os átomos mais electronegativos dos grupos VI e VII formam facilmente ligações iónicas com os átomos fortemente electropositivos dos grupos I e II. As ligações iónicas são típicas dos sais inorgânicos tais como o fluoreto de lítio (LiF) e o cloreto de sódio (NaCl). O sódio (Na), um metal reactivo interactua com o cloro, um gás reactivo, de forma violenta para produzir uma substância estável, o cloreto de sódio.
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Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
Tabela periódica parcial (electronegatividades) Período I II 1º H 2,2 2º Li Be 1,0 1,6 3º Na Mg 0,9 1,3 4º K 0,8 elementos electropositivos electrodadores
III
IV
V
VI
Halogénios VII
Gases Nobres He
B 2,0 Al 1,6
C 2,6 Si 1,9
N 3,0 P 2,2
O 3,4 S 2,6
F 4,0 Cl 3,2 Br 3,0
Ne Ar Kr elementos electronegativos electroatractores
Qual a razão do NaCl se formar tão facilmente? Porque é que a interacção é energeticamente favorável? Temos de considerar o potencial de ionização (PI) e a afinidade electrónica (AE) dos átomos envolvidos. 2,8,1
-1e-
Na
[Na
2,8
]+
PI (Potencial de Ionização) = 119 kcal mol-1
ião sódio (configuração do neon) 2,8,7
+1e-
[Cl2,8,8] -
Cl
Na+
Na + Cl
+ Cl-
AE (Afinidade Electrónica) = -83 kcal mol-1
Total =
+ 36 kcal mol-1
Forma-se o NaCl devido à interacção electrostática entre os iões. À distância interatómica mais favorável (cerca de 2,8 Å na fase gasosa), a atracção liberta cerca de 120 kcal mol-1, o que é mais do que suficiente para tornar esta reacção energeticamente muito favorável, com libertação de 84 kcal mol-1. + 36 (Energia necessária para formar os iões a partir dos átomos neutros) - 120 (energia libertada pela aproximação dos iões que se atraem) = - 84 kcal mol-1. O átomo de hidrogénio pode formar um catião ou um anião. Nesse caso temos que considerar o Potencial de Ionização para a formação do protão (H+) e a afinidade electrónica para a formação do ião hidreto (H-): H
- 1e-
+ H protão
Potencial de Ionização (PI) PI = 314 kcal mol-1
Química Orgânica A
H
+ 1e-
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Afinidade Electrónica (AE)
-
AE = -18 kcal mol-1 H ião hidreto configuração do átomo de hélio
Em resumo, as ligações iónicas implicam o preenchimento da camada de valência dos átomos por transferência de um ou mais electrões do átomo mais electropositivo para o mais electronegativo, seguido da atracção electrostática entre o catião e o anião resultantes. 1.3
LIGAÇÕES COVALENTES
A ligação covalente forma-se entre elementos do meio da escala de electronegatividades. Estes átomos não ganham nem perdem electrões, em lugar disso partilham os electrões de valência. Uma ligação covalente simples é uma ligação que partilha dois electrões entre dois átomos, completando a camada de valência de ambos. Exemplos são as ligações na molécula de hidrogénio (H2), cloro (Cl2) e na molécula de metano (CH4). Estas moléculas podem ser representadas como estruturas de Lewis nas quais só são representados os electrões de valência. H H
C
H H
H
Cl
Cl
H metano
1.4
cloro
hidrogénio
LIGAÇÕES COVALENTES POLARES
Se os átomos ligados por uma ligação covalente não apresentarem a mesma electronegatividade então os electrões da ligação estarão preferencialmente deslocados para o lado do átomo mais electronegativo provocando uma deformação da nuvem electrónica e uma polarização da molécula com o consequente aparecimento de um momento dipolar. Quanto maior a diferença de electronegatividade maior o momento dipolar. δ+ δ+ A
δB
δ−
δ+ H
F
I
dipolo menos electronegativo
Cl
δ−
H
δ−
δ+
H
C
F
H mais electronegativo
Em estruturas simétricas as polarizações das ligações individuais podem-se anular, tal como no dióxido de carbono (CO2), conduzindo a moléculas sem polarização global. δ−
δ+ O
C
δ− O
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Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
Na maior parte das ligações dos compostos orgânicos, os electrões não são igualmente partilhados, dependendo da electronegatividade dos elementos cujos átomos estão ligados como se exemplifica: δO 3.4 C 2.6 H δ+ H
H
O C
δ+ H
δ- O C H H H
H
metanol
formaldeído
1.5
A FORMA GEOMÉTRICA DOS COMPOSTOS ORGÂNICOS
As moléculas adoptam formas nas quais a repulsão electrónica está minimizada. Nas espécies diatómicas tais como H2 só há um par de electrões ligantes e um arranjo possível dos dois átomos. No BCl3 as forças de repulsão electrónicas obrigam a um arranjo trigonal, com os três átomos de cloro nos vértices de um triângulo equilátero, cujo centro é ocupado pelo átomo de boro. Cl F
Be
F Cl
BeF2 é uma molécula linear
B
Cl
BCl3 é uma molécula trigonal
Aplicando este princípio ao átomo de carbono pode-se observar no metano, CH4, que tem a estrutura de um tetraedro, onde os quatro átomos de hidrogénio se ligam ao carbono segundo os vértices de um tetraedro, que é o melhor arranjo para minimizar a repulsão.
Estrutura do metano (CH4) 1.5.1
Orbitais atómicas
A descrição das ligações existentes nos compostos orgânicos tem que incorporar informação sobre o modo como os electrões se distribuem em redor do núcleo. A teoria é baseada na teoria de mecânica quântica de Heisenberg (Werner Heisenberg, 1901-1976), Schrödinger (Erwin Schrödinger, 1887-1961) e Dirac (Paul Dirac, 1902-1984). Nesta teoria o movimento de um electrão em volta do núcleo exprime-se através de equações que são semelhantes às que caracterizam as ondas. As soluções destas equações constituem as orbitais atómicas, e permitem-nos descrever a probabilidade de encontrar um electrão numa certa região do espaço.
Química Orgânica A
1.5.2
Forma das orbitais
Orbitais atómicas Orbital 1s y
A orbital s é esférica e simétrica segundo as três direcções do espaço
x
z
corte segundo duas dimensões do espaço z
sinal matemático que corresponde ao sinal da função de onda ψ — esta grandeza não é directamente identificável com uma propriedade observável do átomo - contudo ψ2 num ponto do espaço - descreve a probabilidade de x encontrar um electrão nesse ponto do espaço
Características da orbital s correspondendo à energia mais baixa - esférica/simétrica - não tem nodos (um nodo é uma zona de densidade electrónica nula)
A orbital 2s ocupa um volume maior que a 1s e tem energia superior. Apresenta um nodo, uma superfície esférica cuja densidade electrónica é nula que separa duas regiões onde a função de onda tem sinal oposto. Orbital 2s
y nodo Características da orbital 2s -
x
- esférica/simétrica - tem um nodo
Depois da orbital 2s as equações de onda para o electrão em torno do átomo de hidrogénio têm três soluções energeticamente equivalentes. As orbitais 2px, 2py, 2pz. Soluções de energia igual são chamadas degeneradas.
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Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço Orbital 2py
Orbital 2px
Orbital 2pz z
z
z
x x
x
y
y
y
Todas da mesma energia, com dois lobos de sinal contrário, e uma direcção característica do espaço - um plano nodal na origem
O terceiro conjunto de soluções origina as orbitais 3s e 3p. São de forma global semelhante mas mais difusas que as suas análogas de energia mais baixa e têm dois nodos. As orbitais de energia ainda mais elevada (3d, 4s, 4p, etc.) são caracterizadas por um maior número de nodos e uma variedade maior de formas. E, energia relativa das orbitais atómicas, está representada no seguinte diagrama, correspondendo à ordem segundo a qual elas são preenchidas pelos electrões nos átomos. As orbitais de menor energia são preenchidas primeiro; as orbitais degeneradas são preenchidas segundo a regra de Hund. 5s E 4px
4py
4pz 3d
4s 3px
3py
3pz
2py
2pz
3s 2px 2s 1s
1.5.3
Orbitais moleculares
Por sobreposição de duas orbitais atómicas formam-se duas orbitais moleculares, uma ligante de mais baixa energia e outra antiligante de energia superior.
Química Orgânica A H
H
13
H H
= 1s
1s
orbitais atómicas
orbital molecular ligante
nodo 1s
1s
orbitais atómicas
orbital molecular antiligante
Na combinação ligante a função de onda no espaço entre os núcleos é fortemente reforçada. Assim a probabilidade de encontrar electrões ocupando a orbital molecular nesta região é muito alta: uma condição para haver ligação entre os dois átomos. Por outro lado numa orbital molecular antiligante a amplitude da função de onda cancela-se entre os átomos, originando um nodo. A partir da energia das orbitais moleculares formadas e do seu preenchimento com os electrões de valência pode-se prever a formação de uma molécula. Enquanto a molécula diatómica de hidrogénio é formada com abaixamento de energia, a molécula de hélio diatómica não tem tendência a formar-se porque a sua energia seria superior à dos átomos separados, como se pode ver pelo seguinte diagrama de energia. He E
+ ΔE
+ ΔE
H orbital atómica
He
H
He − ΔE
− ΔE
H
H
orbital molecular Molécula diatómica de hidrogénio
1.5.4
He
orbital molecular Molécula diatómica de hélio que não se forma por ter energia desfavorável
Hibridação molecular
O elemento carbono está localizado no meio da tabela periódica de modo que forma essencialmente ligações covalentes. O átomo de carbono forma normalmente quatro ligações covalentes (tetravalente) como acontece no metano (CH4), e estas orientam-se segundo os vértices de um tetraedro, com ângulos diedros de 109,5º. Esta característica confirma a hibridação das orbitais atómicas do átomo de carbono da camada de valência formando quatro
14
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
orbitais sp3 todas semelhantes e preenchidas, cada uma com um electrão proveniente do átomo de carbono e outro electrão proveniente do átomo de hidrogénio. sem hibridação
2p2
1s2 2s2
C
com hibridação
2p E 4e
-
sp3 equiv.
2s 1s
1s
Espacialmente a orientação das quatro orbitais sp3 todas equivalentes e com a mesma energia será segundo os vértices de um tetraedro. 2py
C
2px 2s
2pz vista do topo 4 orbitais sp3 com a orientação dos vértices de um tetraedro
Alcanos Metano H
H
σ
Fórmula condensada
Fórmula condensada
CH4
CH4
Fórmula molecular
Fórmula condensada
C2H6
CH3 CH3
H σ 109.5°
C σH σ H
H H
H
Etano H
H H H C C H H H H
H
C
H H
+
C H
Química Orgânica A
15
Alcenos Eteno (ou etileno)
+
+ + σ
C
C
+
Hσπ H σC Cσ H σ H 120°
+ -
+
H
+ +
σ
H
π
-
H
H
Fórmula molecular
Fórmula condensada
C2H4
CH2 CH2
3 orbitais sp2, uma ligação π e uma ligação σ entre os átomos de carbono
Alcinos Etino (ou acetileno) σ σ π σ H C C H π
+ H
+ +
C
+
-
+
+
C +
-
+
-
Fórmula molecular
Fórmula condensada
C2H2
CHCH
H
semelhante a
H
C
C
H
A orientação especial é semelhante ao que acontece noutras moléculas com ligações triplas como no ácido cianídrico (H-C≡N), no monóxido de carbono (C=O ↔-C≡O+) ou no azoto molecular (N≡N).
16
2
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
GRUPOS FUNCIONAIS
Muitas moléculas orgânicas consistem num esqueleto de átomos de carbono ligados por ligações simples a átomos de hidrogénio. Contudo podem também conter ligações duplas ou triplas entre átomos de carbono, assim como outros elementos. Estes átomos ou grupos de átomos tendem a ser locais de elevada reactividade química e são referidos como grupos funcionais ou funcionalidades. Tais grupos possuem propriedades características e controlam a reactividade da molécula como um todo.
Química Orgânica A
17
Tabela — Família de Compostos e Grupos Funcionais respectivos Família alcano haleto de alquilo ou halo-alcano (X=F, Cl, Br, I) álcool tiol éter tioéter
Fórmula geral R
X
R R R R R
O S O S
R' R
C
H H R R R''
C
alceno alcino
H
R
C
haleto
C
R''' C R
C
dieno conjugado
X O S O S
C
C
H
Nome do grupo funcional hidrogénio
Grupo funcional
C
C
ligação dupla
C C
ligação tripla
C
C
C
hidroxilo tiol éter tio-éter
H H
C
C
aromático, areno
dieno
anel benzénico R N
amina
R'''
amino
N
R'
aldeído cetona ácido carboxílico haleto de ácido (X=F, Cl, Br, I) anidrido de ácido éster tioéster amida
O
O R
C O
H
C O
R
C O
R'
C O
R
C OH O
C OH O
R
C O
X
C O
X
R
C O
O
C O
O
R'
C O
C O
O
R
C O
S
C O
S
C
N
C
N
C
N
R
O C
O
R R
R'
R'
aldeído
H
ceto carboxilo haleto de acilo O C
anidrido éster tio-éster amida
R''
nitrilo
R
C
N
ciano
18
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
A classificação mais importante de compostos orgânicos é por grupos funcionais. Uma família de compostos é constituída por compostos que possuem o mesmo grupo funcional. O grupo funcional é a parte da molécula que reage e se transforma durante uma reacção química. Esta classificação é importante já que compostos com o mesmo grupo funcional, isto é pertencentes à mesma família, reagem normalmente da mesma forma sob reagentes e condições reaccionais semelhantes. Na tabela seguinte mostra-se a relação entre alcanos e halo-alcanos e as restantes famílias de compostos orgânicos. alcanos R H
aminas R
amidas O
NH2 R
halo-alcanos ou halogenetos de alquilo R Cl
ésteres O
O R
R
C
R
Cl ácidos carboxílicos O
C
N R
alcenos R' C
C
R
O
H
aldeídos O
H
R
alcinos R
1)
C
C
R'
R
O
C
R
R'
C
Alcanos − são compostos apolares (são relativamente inertes).
metano
H
cetonas O
éteres
CH4
2)
O
álcoois
C
H
R
cloreto de acilo
nitrilo
R
NH
C
CH3 CH3 etano
CH3 CH2 CH3 propano
CH2 CH2 CH2 CH2 CH2 CH2 ciclo-hexano
Alcenos - têm duplas ligações carbono-carbono (são reactivos).
R'
H
C
OR'
Química Orgânica A
19 CH3 C CH2 CH3
CH2 CH2
C C
eteno (etileno)
3)
buteno
Alcinos - têm ligações triplas (são reactivos) CH3 C C H
HC CH
C C
propino
etino (acetileno)
4)
Compostos aromáticos - têm ligações duplas conjugadas (são reactivos)
H
H
H C C
C
C
C C H
H
H
H
H
C
C
C C H
H
H
Álcoois, Tióis H
O H C H H H
H O C H C H H H H
álcool
metanol
etanol
O C
S C
H S C H C H H H H
S H C H H H
H
tiol
6)
C
Tolueno
Benzeno
5)
CH3 C
m etanotiol
etanotiol
Outras moléculas da química inorgânica:
O H
H
água
H
O O
H
peróxido de hidrogénio
S H
H
gás sulfídrico
H O N HHH hidroxilamina
20
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
7)
Halo-alcano Hal C
clorometano (anestésico)
Hal = halogénio ( F, Cl, Br, I )
8)
Cl C H Cl Cl
Cl C HH H
triclorometano clorofórmio (anestésico)
Éter
C
O
CH3
C
O
CH3
CH3CH2
CH2CH3
éter dietílico (éter) anestésico de inalação bom solvente
éter dimetílico (refrigerante)
9)
O
Amina H
N H
H
amoníaco
H
N C
H
NH2 C H H H
CH3NH2
amina primária
R
N R
H
metilamina
H3C
amina secundária
R
N R
R
amina terciária
N H
CH3
(CH3)2NH
dimetilamina
H3CH2C
CH2CH3 N CH2CH3
(C2H5)3N
trietilamina
Química Orgânica A
21
O C
carbonilo
H
O C
H
R
R
H
H
formaldeído (desinfectante)
aldeído
O C
O C
CH3
R'
O C
CH3
acetaldeído
CH3CH2
CH3
propanona (acetona) (solvente)
cetona
O C
O C
CH3
butanona (metil etil cetona) (solvente)
H
R
O C
O H
ácido
H
O C
CH3
O H
ácido fórmico (irritante)
O C
R
R
O
R
O
éster
O H
O C
H
O C
O C H
H
ácido acético (ácido etanóico) vinagre
ácido benzóico
Cl
cloreto de acetilo
R'
CH3
R'
O C
O
O C
CH3
anidrido acético
anidrido
O C
H
CH3
Cl
halogeneto de acilo O C
O C
CH3
O C
O
C2H5 acetato de etilo
O H
22
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço O H C N R H
amida primária
O H C N R R'
amida secundária
O R'' C N R R'
amida terciária
R C N nitrilo
CH3
O C
NH2
acetamida
CH3
O C
N H
C2H5
N-etilacetamida
H
O C
CH3 N CH3
N,N-dimetilformamida (solvente)
H C N ácido cianídrico
CH3 C N acetonitrilo (solvente)
Química Orgânica A
3
23
ÁCIDOS E BASES
A acidez de um composto é medida pela constante de equilíbrio relativa à ionização. Brönsted e Lowry deram uma definição simples de ácidos e bases: um ácido é um dador de protão, uma base é um aceitador de protão. A acidez e a basicidade são frequentemente medidas em água.
H Cl
H H O H
+ H O H
ácido clorídrico
+
Cl
ião hidrónio
CH3O Na + H O H
CH3 O H + Na + H O
metóxido de sódio
ião hidróxido
A água é neutra e por autodissociação forma igual número de iões H3O+ e HO- . O processo é descrito pela constante de equilíbrio Kw , a constante de dissociação da água. A 25°C: H2O Kw =
H3O
+
Kw
H2O H3O
HO
H3O
+
HO
= 10-14 mol2 L-2
= 10-7 mol L-1
pH = - log H3O
Consideremos um ácido geral HA
pH = 7
da água a 25°C
24
H
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
A
+
H2O
K
H3O
ácido
A
+
base conjugada
H3O
A
H2O
HA
K =
Calculando a concentração molar da água vem: 1 L (H2O) = 1000g
1 mole
18g
1000g são 55mol
Como em solução aquosa [H2O] = 55 mol L-1 o valor de [H2O] pode ser incorporado na constante K e assim vem
Ka = constante de acidez =
A
H3O
mol L-1
HA
Existe também como medida de acidez o pKa que é matematicamente uma grandeza logarítmica como o pH: pKa = - log Ka
=
- log
A H3O
- log HA
pH
Se A = HA vem log 1 = 0 logo o valor do pKa é igual ao valor do pH de uma solução na qual a percentagem de ionização é de 50%. Para o ácido sulfúrico o equilíbrio é o seguinte: Ácido sulfúrico H O H O S O O
+ H2O
O H O S O O
O H O S O O
O H O S O O
anião estabilizado por ressonância
+ H3O
Química Orgânica A
25
Este equilíbrio de dissociação não ocorre unicamente nos compostos inorgânicos mas também nos compostos orgânicos como a seguir exemplificado. Ácido acético O CH3 C
O H
O
O
+ H2O
CH3 C
CH3 C O
O
+ H3O
anião acetato estabilizado por ressonância
É a estabilização por ressonância electrónica do anião acetato que é responsável em larga medida pela acidez do ácido acético. Metanol H H C O H H
+ H2O
CH3 O
+ H3O
base forte ião metóxido
Na tabela seguinte estão representados os valores de pKa para alguns compostos inorgânicos e orgânicos.
26
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
Nome
Ácido A-H
ácido iodídrico
H
Ka
pKa
1,6 x 105
-5,2
1,0 x 105
-5,0 (1ª constante)
5,0 x 104 160 50
-4,7 -2,2 -1,7
16
-1,2
6,3 x 10-4
3,2
I O
ácido sulfúrico
H
O
S
O
H
O
ácido bromídrico ácido clorídrico
H H
Br Cl
H3 O O
ácido metanossulfónico
H 3C
ácido fluorídrico
H
ácido acético
H 3C
ácido cianídrico metanotiol metanol água
H C N H 3C S H H
O
H
amoníaco
H
N
H
S
O
H
O F O C O
H 3C
O
H
H
2,0 x 10-5 6,3 x 10-10 1,0 x 10-10 3,2 x 10-16 2,0 x 10-16
4,7 9,2 10,0 15,5 15,7
1,0 x 10-35
35
~1,0 x 10-50
~50
H
H
metano
H
C
H
H
Na tabela seguinte apresentam-se os valores de pKa de várias famílias de compostos orgânicos, relativamente à água. Valores relativos de pKa Compostos
pKa
Ácidos carboxílicos Fenóis Água Álcoois Aminas Alcanos
~5 ~10 15,7 ~16 ~33 ~40
Química Orgânica A
27
28
4
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
ALCANOS
Os alcanos constituem o ponto de partida de todos os compostos orgânicos, dado que directa ou indirectamente todos os compostos orgânicos se podem considerar derivados deles. Exemplo de interconversão de grupos funcionais que permite preparar um éter a partir de um alcano. Alcanos
haletos de alquilo
alcenos
alcinos
álcoois
éter
Os alcanos possuem unicamente carbono e hidrogénio e são descritos como hidrocarbonetos saturados alifáticos. - Hidrocarbonetos – compostos constituídos por carbono mais hidrogénio. - Saturados - Todas as ligações são ligações simples (ligações sigma) - Alifáticos - os alcanos exibem propriedades semelhantes aos óleos e gorduras (“aleiphar” é a palavra grega para gordura). lineares não cíclicos CnH2n+2 alcanos
ramificados
cíclicos
Por exemplo, o metano (CH4) é o constituinte principal do gás natural, usado em sistemas de aquecimento e de produção de energia. O metano, o etano e o propano representam uma série homóloga - um conjunto de compostos cuja fórmula molecular difere da anterior por um incremento constante. Neste caso o incremento é o CH2 – grupo metileno. Os alcanos podem ser definidos de dois modos diferentes: 1- Todos os alcanos são membros de uma série homóloga cujas fórmulas estruturais podem ser escritas introduzindo um grupo metileno (-CH2-) na fórmula do membro precedente. 2- As fórmulas moleculares de todos os alcanos são representadas por CnHn+2, onde n é um número inteiro. Usando a fórmula geral CnHn+2 podemos ver que a fórmula molecular do alcano em C4 é C4H10. A fórmula estrutural pode ser mais complicada devido às diversas possibilidades, como a seguir está representado.
Química Orgânica A
C4H10 - butano
H
29
isómeros constitucionais
H
H
H
H
C
C
C
C
H
H
H
H
H
H
H
H
H
C
C
C
H H
C
H H
H
o gás butano dos isqueiros é uma mistura dos dois compostos
H
n-butano
4.1
Isobutano
fórmulas de estruturas condensadas
ISOMERISMO
A mesma fórmula molecular pode representar mais do que um composto. Compostos com a mesma fórmula molecular mas estruturas diferentes são chamados isómeros. Existem muitas formas diferentes de isómeros em compostos orgânicos. No esquema seguinte estão representados os tipos de isómeros mais comuns.
30
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
TIPOS DE ISÓMEROS ISÓMEROS mesma fórmula molecular mas com estrutura diferente
ESTEREOISÓMEROS mesma conectividade mas diferentes arranjos tridimensionais de átomos ou grupos de átomos
ISÓMEROS CONFORMACIONAIS isómeros que podem ser interconvertidos por rotação de uma ligação sigma (σ)
DIASTEREOISÓMEROS isómeros que não têm uma relação uns com outros tal como a de um objecto com a sua imagem num espelho
ISÓMEROS CIS-TRANS ou GEOMÉTRICOS
4.1.1
ISÓMEROS CONSTITUCIONAIS isómeros de esqueleto isómeros de posição isómeros de grupo funcional
ISÓMEROS DE CONFIGURAÇÃO isómeros que não podem interconverter-se se não por quebra de uma ligação
ENANTIÓMEROS isómeros que têm uma relação de objecto-imagem num espelho. Têm configurações opostas. OUTROS têm mais do que um estero-centro sem terem uma relação objecto-imagem
Isómeros constitucionais
Os isómeros constitucionais apresentam a mesma fórmula molecular mas conectividade diferente entre os átomos. Os esqueletos carbonados são diferentes. Tomemos como exemplo o hexano de fórmula molecular C6H14.
n-hexano
2-metilpentano
2,2-dimetil-butano
2,3-dimetilbutano
3-metilpentano
Química Orgânica A
31
Todos estes isómeros são compostos diferentes com propriedades físicas e químicas diferentes, incluindo distribuição espacial diferente dos seus átomos. A mistura dos cinco isómeros pode ser fisicamente separada nos seus cinco componentes puros que possuem unicamente em comum a sua fórmula molecular. Alcanos: fórmulas e isómeros nº átomos de carbono
fórmula molecular
1 2 3 4 5 6 20 40
CH4 C2H6 C3H8 C4H10 C5H12 C6H14 C20H42 C40H82
nº de isómeros constitucionais 0 0 0 2 3 5 366319 > 60 triliões
À medida que o número de átomos de carbono do alcano aumenta, o número de possíveis isómeros constitucionais aumenta dramaticamente como se pode ver pela tabela anterior. 4.1.2
Estereoisómeros - isómeros conformacionais (confórmeros)
A maior categoria de isómeros consiste nos estereoisómeros. Compostos com a mesma fórmula molecular as mesmas conectividades e diferente orientação tridimensional ou orientação espacial. Os confórmeros podem-se converter uns nos outros por uma simples rotação em torno de uma ligação simples. Uma das formas de visualizar os confórmeros é pelas representações bidimensionais, nomeadamente as projecções de Newmann. Representação bidimensional de estruturas tridimensionais Projecções de Newman Exemplo : Etano C2H6 Conformação Eclipsada HH H H H
H H H
H H
H H
hidrogénio ligado ao carbono da frente
H H H
H
H
H
átomo de carbono
Projecção de Newman
Projecção em perspectiva ou cavalete
32
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço Conformação Estrelada H H H H
H
H H H
H
H H
H
H
H
H H H
H Projecção de Newman
Projecção em perspectiva ou cavalete
A conformação estrelada tem menor energia por apresentar menor interacção entre os átomos de hidrogénio (repulsão electrónica e estereospacial). Conformações do n-butano C4H10 observadas através da projecção de Newman envolvendo o eixo que contém a ligação do átomo de carbono 2 com o átomo de carbono 3. conformações estreladas
H
CH3
H
H
H
H
H H
gauche
anti
CH3CH
CH3H
CH3 CH3
H
CH3
conformações eclipsadas
H H
H CH3
eclipse 1
3
H H
H H
eclipse 2
A análise de confórmeros de alcanos com mais átomos de carbono revela outros efeitos repulsivos e a possibilidade de conformações adicionais devido à interacção dos grupos substituintes. As conformações anti e gauche são duas variantes da conformação estrelada. A conformação anti tem os dois grupos mais volumosos separados de 180º e a conformação gauche tem os grupos volumosos separados de 60º. A ordem de estabilidade das quatro conformações possíveis para o n-butano é anti > gauche > eclipse 1 > eclipse 2 4.2
NOMENCLATURA DOS ALCANOS
A nomenclatura mais utilizada é a nomenclatura IUPAC (Internacional Union of Pure and Aplied Chemistry). Por vezes são utilizados nomes comuns que já se encontram vulgarizados. Segundo a nomenclatura IUPAC todos os alcanos têm o seu nome terminado em ano. 4.2.1
Alcanos não ramificados
Nome do hidrocarboneto metano etano propano butano
Nº de átomos de carbono C1 C2 C3 C4
Nome do substituinte na fórmula CH3 (metil) CH3CH2 (etil) CH3CH2CH2 (propil)
Química Orgânica A
33
C5 C6 C10 C11 C20
pentano hexano decano undecano icosano
Grupos alquilo :R- usado para representar um grupo alquilo genérico Um grupo alquilo resulta da remoção de um átomo de hidrogénio de um alcano. Um grupo alquilo não é um composto mas é simplesmente uma unidade estrutural que existe como um substituinte de uma estrutura maior. O nome do grupo alquilo é formado a partir do nome do alcano correspondente, retirando a terminação ano e substituindo por ilo. Para um substituinte onde o grupo alquilo seja escrito por uma fórmula condensada ou por uma fórmula molecular utiliza-se a designação de R. 4.2.2
Alcanos ramificados
A ramificação da cadeia carbonada aumenta a diversidade da estrutura dos alcanos. Os nomes são atribuídos segundo as regras IUPAC. Nas fórmulas condensadas são usados parênteses para definir a que átomo de carbono é que a cadeia ramificada está ligada. Por outro lado os átomos de carbono nas moléculas orgânicas são classificados segundo o número de átomos de carbono que estão ligados a ele como a seguir se descreve. primário
carbonos
primários secundários terciários quaternários
1C 2C 3C 4C
CH3 H3C CH2 CH CH3
secundário terciário
4.2.3
Propriedades dos alcanos
O estado físico dos alcanos à temperatura ambiente varia com o seu peso molecular C1—C4 C5—C16 mais de C17
gases líquidos sólidos
Exemplos de alcanos na natureza: C27H56 - cera da pele da maçã C31H64 - cera das folhas do tabaco Os alcanos são os compostos orgânicos menos densos de todos os compostos orgânicos conhecidos. São insolúveis em água devido a serem compostos apolares, por existir pouca
34
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
diferença de valor de electronegatividade entre o átomo de carbono e o de hidrogénio. Os alcanos são normalmente usados como solventes de gorduras. — Menos densos que a água - petróleo, óleo, gasolina — Insolúveis em água - são compostos apolares — Usados como solventes — Armazenados sem decomposição por longos períodos. 4.2.4
Fontes naturais de alcanos
Gás natural 80% metano Gás natural
combustível aquecimento
10% etano
Pelo “cracking” do etano obtém-se o etileno que é usado em no fabrico de polímeros. CH3 CH3
900°C H2C CH2 + H2 cracking etileno
polimerização polietileno
Petróleo O petróleo é separado por destilação em colunas de fraccionamento nas refinarias, que o separa em sete fracções que são as seguintes: Gases de ponto de ebulição inferior a 20ºC- Ponto de ebulição (p. e.) menor de 20°C. Semelhante ao gás natural mas inclui alcanos ramificados. Alcanos C1—C5 (gases). Líquidos com pontos de ebulição entre 20 e 100ºC - Alcanos de fórmulas moleculares de C5C7 lineares ou ramificados chamados nafta. Líquidos com pontos de ebulição entre 100 e 200ºC -Alcanos e compostos aromáticos de C5C10; a gasolina é recolhida nesta fracção. Líquidos com pontos de ebulição entre 200 e 300ºC - Alcanos C11-C16 fonte de queroseno. Líquidos com pontos de ebulição até 400ºC - Hidrocarbonetos contendo mais de C15. Esta fracção é a fonte de Diesel e do fuel. Líquidos residuais – Hidrocarbonetos de fórmulas moleculares com mais de 20 átomos de carbono que são utilizados como óleos lubrificantes. Resíduo sólido - Asfalto, alcatrão e ceras parafínicas. Os alcanos também podem provir da decomposição lenta de matéria animal ou vegetal na presença de água e ausência de oxigénio.
Química Orgânica A 4.3
35
CICLO-ALCANOS
Os ciclo-alcanos também fazem parte da família dos alcanos e têm a fórmula geral CnH2n. O ciclo-alcano mais simples é o ciclopropano C3H6. 4.3.1
Isomerismo cis-trans em ciclo-alcanos
Todos os ciclo-alcanos com dois ou mais substituintes não ligados ao mesmo átomo de carbono exibem um tipo de estereoisomerismo configuracional conhecido por isomerismo cis-trans. As conectividades são as mesmas mas são possíveis diferentes orientações por os substituintes poderem estar ligados do mesmo lado do anel ou de lados diferentes. O anel constitui um plano de referência para a molécula. Estes isómeros configuracionais são compostos diferentes que podem ser separados por métodos físicos e identificados, contrastando com o comportamento dos isómeros conformacionais. — cis relação entre substituintes para o mesmo lado do plano do anel, ambos para cima do plano ou para baixo do plano. — trans relação entre substituintes para lados opostos do plano do anel, para cima e para baixo do plano da molécula. Por exemplo o ciclo-alcano 1,2-dimetilciclopropano existe como dois isómeros diferentes: cis1,2-dimetilciclopropano e trans-1,2-dimetilciclopropano. Estes são dois compostos diferentes com propriedades físicas completamente distintas. para cima do plano
H3C
CH3 cis
para baixo do plano
para baixo do plano H3C
cis
CH3
H3C
estruturas idênticas cis-1,2-dimetilciclopropano
4.3.2
para cima do plano
trans
CH3
trans-1,2-dimetilciclopropano
Alcanos policíclicos
Além dos alcanos monocíclicos com um anel existem muitos alcanos interessantes que contèm mais do que um anel fundido. Os bicíclicos são aqueles que apresentam dois anéis fundidos e os policíclicos com vários anéis fundidos. decalina H
H
H
H
H
H
cis - decalina
biciclo[3,2,1]octano
trans-decalina
36
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
biciclo[3,2,1]octano
4.4
CONFORMAÇÕES DO CICLO-HEXANO
O ciclo-hexano pode adoptar várias conformações sendo as mais conhecidas as de cadeira e barco. Para uma molécula de ciclo-hexano existem duas conformações em cadeira que se interconvertem através da conformação em barco. Na conformação em cadeira os substituintes apresentam-se orientados segundo o eixo da cadeira (substituintes em posição axial) ou apresentam uma orientação segundo o plano da cadeira (substituintes equatoriais). conformação cadeira eixo do anel
- substituinte equatorial - substituinte axial
As conformações em cadeira são interconvertíveis e os substituintes que se apresentam como axiais numa conformação passam a equatoriais na outra conformação e vice-versa. cadeira
barco
cadeira
após conversão
antes da conversão
Na conformação em cadeira existe repulsão entre os substituintes. Esta repulsão depende da posição relativa dos substituintes e do seu volume. De um modo geral os substituintes na posição axial apresentam maior repulsão do que aqueles que se encontram em posição equatorial. X H 3 H
1
5 repulsão estereoquímica entre X e os átomos de hidrogénio axiais em posição 3 e 5.
H 3 H
1X
5 não existe repulsão entre X e os átomos de H pois o substituinte X encontra-se em posição equatorial
Química Orgânica A
37
Grupos X volumosos como o t-butilo (CH3)3C apresentam-se quase exclusivamennte em posição equatorial (> 99% do confórmero equatorial é preferido). 4.4.1
cis-trans
Os ciclo-hexanos dissubstituídos apresentam isomeria cis-trans. Se os dois substituintes se encontram para o mesmo lado do plano da molécula eles estão em posição cis, se se apresentam para lados opostos do plano da molécula então apresentam uma relação trans. Esta classificação não depende da posição equatorial ou axial dos substituintes como se pode observar nos exemplos seguintes: CH3 axial
CH3
axial
CH3 equatorial
menos estável CH3 axial
(axial, equatorial)
(diaxial)
axial equatorial mais estável
CH3 CH3 equatorial (di-equatorial) substituintes em posição trans
4.5
CH3 CH3 equatorial
(equatorial, axial) substituintes em posição cis
REACÇÕES CARACTERÍSTICAS DE ALCANOS E CICLO-ALCANOS
Apesar da pouca reactividade dos alcanos, frente a ácidos ou bases e a oxidantes e redutores, os alcanos sofrem contudo reacções radicalares, tais como a halogenação e a combustão. 4.5.1
Reacção radicalares
4.5.1.1 Halogenação de alcanos Força da Ligação na formação de radicais Um radical forma-se por quebra homolítica de uma ligação entre dois átomos, essa quebra requer energia que tem de ser fornecida à molécula na forma de calor ou energia fotoquímica. A recombinação de dois radicais origina uma ligação entre os átomos num processo de libertação de energia. Este processo está ilustrado de seguida para o hidrogénio.
38
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço H
+
H
H
A
H
H
ΔH0 = - 104 kcal mol-1
H
0
-1
ΔH =
H + H
104 kcal mol
A
+
B
quebra homolítica da ligação origina os radicais
A
+
B
quebra heterolítica da ligação origina iões
B
4.5.1.2 Cloração Substituição de um átomo de hidrogénio num alcano por um átomo de cloro é a reacção de cloração de um alcano. O metano é convertido no clorometano com libertação de 25 kcal mol-1, numa reacção exotérmica. (163 –188=25 kcal mol-1) Δ H3C
+
H
Cl
58 kcal mol-1
105 kcal mol-1
+
CH3 Cl
Cl ou irradiação com U.V.
H Cl
85 kcal mol-1
103 kcal mol-1
-188 kcal mol-1
+163 kcal mol-1
Reacção exotérmica. Liberta-se 25 kcal mol-1
A reacção é radicalar e dá-se por passos. Eles são os seguintes: — Iniciação Cl
Cl
Δ
2 Cl
ou hυ
— Propagação H
H Cl
+
H
C
H
Cl
H
H
+
H
H 105 kcal mol
C
-1
103 kcal mol
-1
Química Orgânica A H H
C
39 H
+
Cl
Cl
H
H
C
Cl
+
Cl
H 58kcal mol-1
—Terminação Cl
+ Cl
Cl2
CH3
+ Cl
CH3Cl
CH3
+ CH3
H3C CH3
Halogenação - generalização da reacção de cloração A reactividade dos halogénios frente à abstracção de hidrogénio é a seguinte: F
> Cl
> Br
> I
A energia de dissociação de alcanos está representada na tabela seguinte: Ligação quebrada CH3
H
C2 H5
H
C3 H7
H
(CH3)2 CH
(CH3) 3C H 3C (CH3)2 CH
(CH3) 3C (CH3) 3C
(kcal mol-1) 105 98 98
H
H CH3 CH3
CH3 C(CH3) 3
94.5 93 90 86 84 72
4.5.1.3 Estabilidade dos radicais Os radicais de carbono são muito reactivos com tempos de vida curtos. A estabilidade dos radicais alquilo é a seguinte:
40
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço <
CH3
primário
H H
<
secundário
H
C
C
terciário
C
C
H
<
C
H
C
C
C
H
C C
é necessário maior energia para os formar
O radical metilo CH3. é o mais difícil de formar. Reactividade e estereoselectividade Pode-se afirmar que a 25ºC as reactividades relativas das várias ligações C-H nas clorações é: Terciário:secundário:primário = 5:4:1 O que está de acordo com a reactividade relativa esperada quando se considera a força da ligação. A ligação C-H de um carbono terciário é mais fraca que a de um secundário e esta mais fraca que a de um carbono primário. Pode-se verificar esta ordem comparando os três tipos de átomos de hidrogénio presentes num único substrato. O 2-metilbutano é um bom exemplo. CH3 Cl2 +
cloro
CH3
C
CH3 CH2
CH3
hυ
ClCH2
-HCl
C
CH3 CH2
CH3
H
H
2-metilbutano
1-cloro-2-metilbutano
+ CH3
C
CH2
CH2Cl
H 1-cloro-3-metilbutano
27%
14%
Substituição num carbono primário: 41% = 27% + 14%
CH3 H +
CH3
C
C
H
Cl
CH3 CH3 +
2-cloro-3-metilbutano 36% Substituição num carbono secundário
O rendimento vem distribuído do seguinte modo:
CH3
C
CH2
CH3
Cl 2-cloro-2-metilbutano 23% Substituição num carbono terciário
+
Química Orgânica A 41%
cloreto primário
36%
cloreto secundário
23%
cloreto terciário
41% nº de átomos de hidrogénio
41
36%
:
9
23%
:
2
H - primários
1
H - terciários
H - secundários
A bromação é mais regiosselectiva originando quase exclusivamente o brometo terciário por causa da energia do estado de transição. Br hυ
Br2
+
Br +
H -HBr
1-bromo-2-metil propano
1-bromo-2-metil propano
>99%
C—Cl > C—Br > C—I
reactividade relativa
C—F < C—Cl < C—Br < C—I
A força da ligação varia inversamente com a reactividade relativa em reacções iónicas. Os fluoretos de alquilo são muito inertes do ponto de vista químico. A falta de reactividade química confere aos hidrocarbonetos fluorados usos variados: exemplo o Teflon é usado para revestimento de frigideiras
Química Orgânica A
F
F
C
C
F
F
45
polímero n
Teflon
5.1.2
Outras propriedades
A maior parte dos haletos de alquilo são líquidos à temperatura ambiente e a sua temperatura de ebulição é superior à dos alcanos de onde derivam. O ponto de ebulição (p.e.) de um haletos de alquilo aumenta ao longo da série R
ex: etano
<
F
fluoretano F
CH3
p.e.
CH3
-89°C
CH3
CH2
-37°C
R
Cl
<
cloroetano Cl CH3
R
<
Br
R
bromoetano Br
CH2
CH3
iodoetano
I
CH2
CH3
38°C
12°C
I
CH2
72°C
A maior parte dos haletos de alquilo líquidos é insolúvel em água e mais denso do que ela. CH2Cl2
5.2
1,3g/mL
H 2O
1,0g/mL
ENANTIOMERIA
Os enantiómeros constituem um caso especial de estereoisómeros, o que quer dizer que têm a mesma conectividade, mas diferem na sua orientação tridimensional. Na Tabela-Tipos de Isómeros resumem-se todos os tipos de isomeria que surgirão ao longo do curso. Um enantiómero tem uma propriedade física única que é rodar o plano de polarização da luz, é opticamente activo. Esta rotação é detectada e medida num polarímetro. Um polarímetro possui um cristal polarizador (prisma), um tubo fechado com a amostra e um cristal analisador. - 45º
Solução da amostra
α
α
polarizador Luz natural plano da luz polarizada não polarizada (a fonte de luz usada no polarimetro é normalmente a luz amarela da lâmpada de sódio, a chamada risca D do sódio
analisador plano da luz polarizada rodado de α°
nova direcção direcção inicial de vibração da luz polarizada
46
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
A rotação observada [α]obs é assim medida no polarímetro. A rotação varia com o solvente usado na solubilização da substância. A rotação específica [α ]D é uma propriedade física característica de cada enantiómero. t °C
temperatura da solução
t °C D
[ α] α
t D
=
risca D do sódio (λ = 589 nm)
α obs comp. do tubo (dm) x concentração da amostra (g/ml)
A que se deve o aparecimento do fenómeno de enantiomeria? A causa mais comum é a presença de um carbono quiral i.e. um carbono com quatro substituintes diferentes. Um objecto com um plano de simetria é aquiral. Um objecto sem plano de simetria é quiral. Um plano de simetria existe quando uma parte do objecto é imagem da outra metade.
5.2.1
Regras de Cahn-Ingold-Prelog
Usam-se as Regras de Cahn-Ingold-Prelog ou abreviadamente Regras CIP para classificar os carbonos quirais em R (do latim Rectus) ou S (do latim Sinister). Procedimento: 1º Localizar o carbono quiral (C*), identificar os seus quatro substituintes 2º Classificar os substituintes quanto à sua prioridade. 3º Desenhar a fórmula tridimensional colocando o substituinte de menor prioridade para trás do plano do papel. 2º Verificar as prioridades 1º, 2º, 3º, 4º a cada um dos substituintes sendo 1º >2º > 3º > 4º
se º2
3º C
1º
R
4º
se º1
3º C 4º
2º
S
Determinação das prioridades 1º
Atribuir prioridades aos átomos segundo o valor decrescente de nº atómico Z
47
Química Orgânica A atribuição das prioridades a partir dos números atómicos dos elementos
a I Cl C* Br c H b d
I = 53
a Cl H3C C* CH2CH3 c H b d
2º
Br = 35 Cl = 17
a b c
H=1
d
Cl = 17
a
C = 6
b ou c d
H=1
qual?
Análise dos substituintes que possuem os dois átomos de carbono H=1 H=1 H=1
H C H H
CH3
CH2CH3
H=1 H=1 C=6
H C H C H HH
CH2CH3 b
CH3 c
Números atómicos do 1º átomo que se liga ao carbono quiral 1 H
6 CH3
6 CH2CH3
7 NH2
6 CH2CH3 CH3
8 OH
9 F
prioridade aumenta
Números atómicos do segundo átomo ligado ao carbono quiral 1 CH3
6 CH2CH3
6 CH3 CH CH3 6
7 CH2NH2
8 CH2OH
53 CH2I
3º Para o mesmo número atómico tem precedência o isótopo mais pesado, de maior massa atómica. Conhecem-se três isótopos do hidrogénio.
48
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
T H
D
3 1H
>
trítio T
>
b
>
prioridade
CHDTOH metanol
OH
2 1H
>
deutério D > c
1 1H
prótio H d
>
Portanto a molécula do metanol, abaixo indicada, em que dois átomos de prótio (o isótopo mais abundante do hidrogénio) foram substituídos por um de deutério e um de trítio (cf. tabela de isótopos), tem quiralidade e designa-se por S-metanol. H H
T
OH H
metanol não quiral
H
OH H
OH D
T
D
S-metanol
OH H D
T
R-metanol
49
Química Orgânica A
5.2.1.1 Alguns isótopos usados em química orgânica
Elemento Hidrogénio prótio : deutéri o trítio
Carbono
Oxigénio
Azoto
Flúor Iodo
1 1H
Abundância natural ou tipo de decaimento Vida média 99,985% estável
2 1H
0,015%
estável
3 1H 12 6C 13 6C 14 6C 15 8O 16 8O 17 8O 18 8O 13 7N 14 7N 15 7N 18 9F 19 9F 127 53 I 128 53 I 131 53 I
β-
12,3 anos
98,89%
estável
1,11%
estável
β-
5570 anos
β+ 99,76%
124 segundos
0,0374%
estável
0,2
estável
β+ 99,634%
10,1 minutos
0,366%
estável
β+ 100%
110 minutos estável
100%
estável
ββ-
25 minutos
estável
estável
8,1 dias
4º Se um dos substituintes contiver uma ligação múltipla então considera-se que ao átomo em análise estão ligados tantos átomos quanto a multiplicidade da ligação. C O
considera-se
O (C) C (O) átomos duplicados entre parêntesis átomos duplicados entre parêntesis
C C
considera-se
(C) (C) C C (C)(C)
Existem muitas drogas que são misturas racémicas, e para as quais apenas um dos enantiómeros tem a actividade biológica desejada.
50
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço IBUPROFEN analgésico
H3C
H CH3 C CH2
* H3C
O C H OH
— só o enantiómero apresentado é analgésico mas é vendido como uma mistura racémica
Carbono quiral R ou S ? RESP: S
O N O
N H
Br F
I Cl
O
O
TALIDOMIDA
Em 1963 a droga foi desenvolvida para combater o enjôo matinal em mulheres grávidas e o seu uso revelou-se desastroso, dado ser um teratogéneo poderoso. Identificar o carbono quiral da talidomida.
qual a quiralidade do carbono desta molécula?
51
Química Orgânica A 5.3
REACÇÕES DE SUBSTITUIÇÃO COM HALO-ALCANOS OU HALETOS DE ALQUILO R
X
halogénio
A ligação polarizável C-X quebra sob condições moderadas o que permite ao halogénio ser substituído por grande variedade de outros grupos em reacções de substituição que estão na origem de vários compostos orgânicos. Y
+ R X
R Y
+
X
ligação polarizada Y
nucleófilo
SN
substituição nucleófila
X
grupo de saída ou aceitador do par electrónico
Nu
nucleófilo
doador de electrões pode ser neutro ou carregado negativamente
Reacção de substituição nucleófila (SN). Nu
+ R X
R Nu
+ X
Nu
+ R X
R Nu
+ X
Como existem vários nucleófilos, pode-se formar uma grande variedade de produtos nesta reacção. Exemplo da reacção com CH3CH2—Br Nu- + CH3CH2 Br
Nucleófilo -:OH -:OR -:SH -:SR :NH3 :C N :C CH IR-CH2-
5.3.1
Nome Hidróxido Alcóxido Hidrosulfureto Mercaptido Amoniaco Cianeto Acetileto Iodeto Carbanião
Mecanismo da Reacção SN2
CH3CH2 Nu + Br
Produto C2 H5 OH C2 H5 OR C2 H5 SH C2 H5 SR C2H5 NH2 C2 H5 CN C2 H5 C CH C2 H5 I C2H5-CH2-R
Nome da família Álcool Éter Tiol Tioéter Amina Nitrilo Alcino Iodeto de alquilo Alcano
52
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
O mecanismo de uma reacção é a descrição detalhada dos passos individuais pela qual a transformação total ocorre. Existem vantagens em conhecer o mecanismo: 1 - Muitas reacções ocorrem pelo mesmo mecanismo. Assim, em lugar de se saber imensas reacções, poderemos unicamente saber alguns mecanismos e aplicá-los às diferentes reacções. 2 - Se se conhecer o mecanismo da reacção pode-se predizer o efeito na reacção, alterar a natureza de um substrato ou reagente ou alterar das condições da reacção. 3 -Quando se pensa nas reacções pretende-se minimizar as reacções secundárias ou laterais que produzem produtos indesejáveis. S Substituição N Nucleófila 2
bimolecular - 2 reagentes estão envolvidos no passo lento da reacção. a b c
HO:
Br
nucleófilo
O ião hidróxido nucleófilo ataca do lado de trás do átomo de carbono contendo o bromo. O carbono está relativamente electrodeficiente devido à elevada electronegatividade do átomo de bromo. A nova ligação carbono-hidroxilo é formada parcialmente pela doação do par electrónico do oxigénio, não compartilhado, ao carbono. A densidade electrónica do oxigénio diminui.
δ- a δHO Br c b
A ligação carbono-bromo alargada quebra-se parcialmente sob a influência do ataque pelo ião hidróxilo. O bromo adquire uma densidade adicional de electrões, fornecendo-lhe uma carga parcial negativa.
estado de transição
No estado de transição, os três substituintes do carbono que não estão envolvidos adquirem um arranjo planar em torno do carbono central, perpendicular ao eixo hidroxilo-carbono-bromo.
a HO c
b
Br: grupo de saída
A reacção termina na completa ligação carbono-hidroxilo e quebra completa da ligação carbono-bromo. Durante a reacção global o carbono sofreu inversão da configuração.
A reacção completa é representada por: NaOH hidróxido de sódio
+
R-Br brometo de alquilo
R-OH álcool
+
NaBr brometo de sódio
Química Orgânica A
53
5.3.1.1 Velocidade de uma reacção v = k[brometo alquilo] [ião hidróxido]
2ª ordem – ordem da reacção 1ª ordem em relação a cada reagente
Conclusão: A velocidade é influenciada pela concentração de ambos os reagentes. O passo determinante da velocidade da reacção envolve ambos os reagentes, e a reacção diz-se de 2ª ordem. 5.3.1.2 Energética da reacção
δNu
R
δX
estado de transição
energia livre
ΔG
(energia de activação)
variação da energia livre Nu + R-X reagentes ΔG° R-Nu+Br produtos coordenada da reacção
A energia de activação ΔG representa a barreira energética entre os reagentes e o estado de transição ( ). Quanto maior, menor a velocidade. ΔG
maior
Reacção concertada
velocidade de reacção mais baixa reacção num passo único
Uma vez passado o estado de transição, a libertação de energia acompanha a formação rápida dos produtos. A reacção é concertada e dá-se num só passo.
5.3.1.3 Estereoquímica do mecanismo SN2 O nucleófilo liga-se com o átomo de carbono pelo lado oposto do átomo de bromo que sai, o que resulta na inversão da configuração no átomo de carbono. O processo de inversão é como um guarda-chuva que inverte com o vento.
54
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
Exemplo: H C2H5 Br CH3 (R)-2-bromobutano
NaI acetona
I
H C2H5 CH3
NaBr
(S)-2-iodobutano
A reacção SN2 é estereospecífica porque produz um composto com uma configuração específica, isto é produz um único enantiómero. Atenção: Se se partir de uma mistura em quantidades iguais do enantiómero de configuração R e do enantiómero de configuração S, a chamada mistura racémica, o produto da reacção será também uma mistura racémica, já que cada um dos enantiómeros sofre inversão formando o outro.
Na maior parte dos casos este é o que se passa nas reacções realizadas no laboratório porque os reagentes utilizados são na maior parte da vezes misturas racémicas. Os compostos que são comercializados como um único enantiómero são os produtos naturais, como os amino ácidos da série D ou da série L, os açúcares como a glucose, etc. Um caso particular pode ser ilustrado pelos ciclo-hexanos substituídos, como o exemplo seguinte. Aqui considera-se a posição relativa dos dois substituintes. No cis-1-bromo-4-tbutilciclo-hexano os dois substituintes apresentam-se ambos para baixo do plano da molécula, encontram-se em posição cis, para o mesmo lado do plano. No produto resultante da reacção SN2 o átomo de bromo é substituído pelo átomo de iodo, com inversão da configuração do átomo de carbono a que está ligado, e os substituintes passam a ficar para lados opostos do plano do anel. Estão em posição trans. Aqui estamos a falar de configurações relativas, cis e trans e não de configurações absolutas. NaI acetona
I
Br cis-1-bromo-4-t-butilciclo-hexano
trans-1-t-butil-4-iodociclo-hexano
5.3.1.4 Reactividade do grupo alquilo Átomos de carbono ligados a diferentes grupos alquilo reagem com facilidade diferente em reacções SN2. Para uma reacção SN2 se dar com sucesso são necessários alguns requisitos: 1. — O sucesso da reacção está na capacidade do nucleófilo alcançar o átomo de carbono pela parte de trás da ligação carbono-halogénio, de modo a formar a nova ligação. 2. — Qualquer característica estrutural do grupo alquilo que iniba a aproximação do nucleófilo torna a reacção mais difícil a energia de activação mais elevada e a velocidade menor.
55
Química Orgânica A
3. — O efeito estereoquímico na reacção SN2 faz-se sentir devido ao volume dos substituintes ligados ao átomo de carbono. O haleto de alquilo é mais reactivo numa reacção SN2 quanto menos impedido for estereoquimicamente. A reactividade em reacções SN2 segue a ordem seguinte segundo a natureza do átomo de carbono onde se vai dar a substituição: metilo > primário (1º) > secundário (2º)
H3C Br metilo
H3C H C Br H
H3C H3C C Br H secundário
primário
H3C H3C C Br CH3 terciário não ocorre reacção SN2
Se o nucleófilo, o carbono atacado e o grupo de saída não assumirem uma posição colinear no estado de transição, a reacção não ocorre. Isto é o que acontece nos átomos de carbono terciários. 5.3.1.5 Efeito do grupo de saída Quanto mais fácil a quebra da ligação carbono-halogénio num haleto de alquilo, mais rápida será a reacção SN2. Relembrando: Comprimento da ligação varia da seguinte forma: C—F < C—Cl < C—Br < C—I Força da ligação varia da seguinte forma: C—F > C—Cl > C—Br > C—I Polarizabilidade varia da seguinte forma: F < Cl < Br < I reacções SN2 mais lentas R Ι
>
R Br
> R Cl
mais utilizados, mais fáceis de preparar reacções SN2 mais rápidas
Problema:
56
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
Usando setas, mostre qual o mecanismo e os detalhes estereoquímicos da reacção do iodeto de sódio com o trans-1-t-butil-4-clorociclo-hexano. 5.3.1.6 Efeito dos nucleófilos São ainda factores importantes nas reacções SN2 1. A concentração do nucleófilo. 2. A força do nucleófilo 3. A força dos nucleófilos (nucleofilia). Quanto mais forte o nucleófilo, mais facilmente os seus electrões são compartilhados com o carbono na formação de uma ligação. 1) - Os aniões são geralmente melhores nucleófilos que os ácidos conjugados de onde derivam HO- > HOH (H2O) RO- > ROH 2) – Em geral as bases são tanto mais nucleófilas quanto mais básicas forem: RO- > HOA força de uma base mede-se pelo seu Kb. Quanto maior o Kb mais forte é a base. O Kb está directamente relacionado com o Ka e varia na razão inversa. Em conclusão: Quanto maior o pKa do ácido conjugado, menos forte é a base. Exemplo: pKa do ácido conjugado, H2O (pKa=15.7) Comparando com o pKa de um álcool (pKa=17) : RO- + H3O+
ROH + H2O Ka =
[H3O+ ] [RO- ]
pKa=17
pKa = -log Ka
[ROH] Ka maior
mais dissociado
ácido mais forte
3) – Em geral na tabela periódica a nucleofilia aumenta ao longo do grupo, São melhores nucleófilo os átomos maiores que os mais pequenos.
F
<
Cl
<
Br
HO
<
HS
<
I
aumenta
4) - Nucleofilia aumenta da direita para a esquerda ao longo do período da tabela periódica, para espécies com a mesma carga: F
<
O
<
N
<
C
57
Química Orgânica A
Os catiões nunca participam como nucleófilos em reacções de substituição. 5.3.1.7 Efeito do solvente Existem dois tipos de solventes com características diferentes que podem influenciar o percurso de uma reacção: São eles os solventes próticos e os apróticos. A seguir temos alguns exemplos desses solventes. solventes apróticos O H3C S CH3 Dimetilsulfóxido (DMSO) O H C N
solventes próticos H3C OH Metanol H3CH2C OH Etanol
CH3 CH3
N,N-Dimetilformamida (DMF)
H
O
H
Água
O H3C
CH3
Acetona
Os solventes apróticos não possuem átomos de hidrogénio polarizados e são preferíveis em reacções SN2. Em resumo:
5.3.1.8 Reacção SN2 de um nucleófilo com um haleto de alquilo 1. — A reacção só é efectiva com haletos de alquilo tal como o metilo, um alquilo primário ou secundário 2. — Ocorre estereospecificamente com inversão de configuração no carbono que sofre o ataque nucleófilo. 3. — Utilização de iodetos e brometos de alquilo é preferível, pois os cloretos de alquilo reagem mais lentamente. 4. — É uma reacção de 2ª ordem, cuja velocidade é afectada pela concentração de haleto de alquilo e agente nucleófilo. 5. — Nucleófilos fortes são mais efectivos que nucleófilos fracos. 5.3.1.9 Complicações com substituições nucleófilas de haletos de alquilo terciários
58
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
O que acontece com haletos terciários? Quando se pretende fazer uma reacção de substituição em haletos de alquilo terciários, com o átomo de halogénio ligado a um átomo de carbono que não tem nenhum substituinte hidrogénio, a reacção não se dá, mas em alternativa podem ocorrer reacções de eliminação. As reacções de eliminação ocorrem quando se utilizam nucleófilos que são bases fortes. Neste caso o nucleófilo não pode atacar devido ao impedimento estereoquímico a que o átomo de carbono que está ligado ao átomo de halogénio está sujeiro. E por isso como se trata de uma base em alternativa remove um protão do átomo de carbono adjacente ao átomo de carbono ligado ao halogénio, originando uma ligação dupla com saída do halogeneto. Esta reacção é uma reacção de eliminação E2
Exemplo: Método Geral haleto de alquilo
E2
alceno
E2 C X
C
C
Exemplo para a reacção entre o cianeto de sódio e o brometo de t-butilo, onde o átomo de bromo está ligado a um átomo de carbono terciário
Na CN cianeto de sódio
CH3 H3C C Br CH3
E2
brometo t-butilo
H2C C
CH3 CH3
NaBr
HCN
isobutileno
Se o nucleófilo for fraco e for usado com um haleto terciário obtém-se uma mistura de produtos. No exemplo seguinte apresenta-se a reacção do cloreto de t-butilo com o etóxido de sódio e com o etanol. No primeiro caso, como o nucleófilo é uma base forte temos unicamente uma reacção de eliminação formando o isobutileno como produto único. No segundo caso, estamos perante um nucleófilo fraco e uma base fraca de modo que apesar de ainda haver algum produto de eliminação, o isobutileno 20%, forma-se preferencialmente o tbutil etil éter num rendimento de 80%. Esta reacção de substituição não segue um mecanismo SN2 mas um mecanismo SN1.
59
Química Orgânica A Na+
-
OC2H5
H2C C
CH3
+
NaCl
+
CH3 isobutileno
CH3 H3C C Cl CH3
C2H5OH
produto principal CH3 OC2H5 CH3 80% t-butil etil éter
H3C C2H5OH
H2C C
CH3 CH3
20% isobutileno produto secundário
Em conclusão, a substituição em átomos de carbono terciários dá-se por um mecanismo SN1. 5.3.2
Mecanismo da reacção SN1 H2O R Br brometo de acetona alquilo
HBr
R OH álcool
ácido bromídrico
Mecanismo (em 2 passos) perda de protão R1 R C Br R3
-Br
2
brometo de alquilo
1º PASSO Formação do carbocatião terciário
R1 R2 C+ R3 carbo catião
H2O
R1 H R2 C O H R3 + ião oxónio
2º PASSO Adição do nucleófilo
- H+
R3 O C H R2 1 R álcool
60
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
Sob a influência da ionização do solvente a ligação C—Br quebra-se lentamente Os electrões vão para o halogénio mais electronegativo, deixando para trás um carbono electrodeficiente (um carbocatião)
a b
Br c composto puro passo lento: determina a velocidade da reacção
- Br-
a b c+ b H2O
a) a b
O c
b)
O carbocatião é um intermediário reactivo (tempo de vida curto) e não um estado de transição. Há um estado de transição para se formar o carbocatião. O carbocatião é estabilizado por solvatação e hiperconjugação. O carbocatião é planar. A hibridação do átomo central é sp2 com uma orbital p perpendicular ao plano dos átomos.
H + a O b H c
H H
H2O -H3O+ mantém configuração a
* OH b c
H2O
-H3O+
A molécula de água ataca o carbocatião por cada um dos lados. Produz um ião oxonium em cada um dos casos. A carga positiva do C é neutralizada ficando o O com carga positiva.
inverte configuração a HO * b c
O ião oxonium dá um protão ao solvente água, formando o ião hidrónio e o álcool. Se houver um centro estereoquímico no início, resulta na formação de um racemato (par de enantiómeros)
racemato
A velocidade só depende da concentração do haleto de alquilo. A concentração e a força do nucleófilo não têm efeito na velocidade da reacção. v = k[brometo alquilo]
1ª ordem
Reacção unimolecular 5.3.2.1 Energética O carbocatião é o intermediário reactivo, é uma espécie com um carbono com três ligações e com uma carga positiva.
61
Química Orgânica A
energia livre
estado de transição 1
carbocatião reactivo R+ estado de transição 2 Δ G2
Δ G1
ΔG1 energia de activação para formação do carbocatião
Nu + R-X ΔG° reagentes R-Nu+X produtos
ΔG2 energia de activação para a reacção do carbocatião com o nucleófilo
coordenada da reacção
5.3.2.2 Estereoquímica O carbocatião é sempre uma espécie aquiral e tem um plano de simetria. A sua estrutura resulta do carbono passar da hibridação sp3 no halo-alcano, para sp2 depois da saída do ião haleto X-. A reacção SN1 é uma reacção não estereospecífica que origina sempre uma mistura racémica, dado o nucleófilo se poder aproximar de ambos os lados do carbocatião intermediário formado. Reacção de racemização, não estereospecífica
CH3 Br C2H5
CH3 H2O acetona
C3H7
(R) -3-Bromo-3-metil-hexano
CH3 OH
H5C2
C3H7
HO C2H5 C3H7
mistura de 1:1 de (S) e (R)-3-metil-3-hexanol mistura racémica
5.3.2.3 Efeito do grupo de saída Quanto mais facilmente o grupo de saída quebrar a sua ligação ao átomo de carbono (ligação mais fraca) mais rápida será a reacção SN1. O passo determinante da velocidade da reacção é a formação do carbocatião, 1º passo da reacção. 5.3.2.4 Força da ligação do grupo de saída ao átomo de carbono A força da ligação do grupo de saída, desde que halogénio ao átomo de carbono varia desde à ligação mais forte carbono-fluor e vai diminuindo até à ligação carbono-iodo, mais fraca: C—F > C—Cl > C—Br > C—I Os iodetos de alquilo sofrem reacções do tipo SN1 mais rápidas. Os iodetos e os brometos são em geral os haletos escolhidos para reacções de substituição do tipo SN1.
62
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
5.3.2.5 Efeito do solvente Qualquer solvente que favoreça a ionização e estabilize o carbocatião por solvatação facilita a reacção. Solventes próticos e polares, água e alcoois, são preferidos em reacções SN1. 5.3.2.6 Efeito do substituinte alquilo ligado ao átomo de Carbono que sofre substituição Devido ao mecanismo SN1 requerer a formação de um carbocatião intermediário, o halo-alcano deve poder formar um carbocatião estável. Caso contrário a reacção decorrá lentamente ou nem se dará. Os carbocatiões são espécies altamente reactivas e electrodeficientes. A ordem de estabilidade dos carbocatiões é: Terciários > secundários > primários
E os halo-alcanos terciários formam carbocatiões mais facilmente que os secundários. Carbocatiões em átomos de carbono primário são muito raros. 5.3.2.7 Comparação entre os mecanismos SN1 e SN2 A tabela seguinte faz uma comparação entre mecanismos SN1 e SN2: Parâmetro Velocidade da reacção Concentração do nucleófilo Força do nucleófilo Estereoquímica
Melhor solvente Estrutura favorável Melhor grupo de saída
5.4 5.4.1
SN2
SN1
2ª ordem Afecta a velocidade Modesta a fraca Estereospecífica Inversão Aprótico Metil > 1º > 2º I > Br > Cl
1ª ordem Não afecta a velocidade Irrelevante Não estereospecífica Racemização Prótico, polar 3º I > Br > Cl
OUTRAS REACÇÕES DE HALO-ALCANOS Síntese de compostos organometálicos δC
δ+ Metal
ligação covalente
δC
δ+ Metal
associada
C
Metal dissociada
carbanião — espécie muito reactiva
Os compostos organometálicos são compostos de carbono e hidrogénio que também possuem na sua constituição átomos de elementos metálicos na formação de ligações covalentes.
63
Química Orgânica A
A vantagem principal dos compostos organometálicos é que dão possibilitam a formação de novas ligações carbono-carbono. estes compostos têm de ser manuseados em condições anidras (ausência de água) por serem bases muito fortes retiram um protão à água. Neste capítulo vamos considerar os compostos organolítios, organomagnesianos e organocupratos. 1. Reactividade nucleófila: Reacção geral:
R
M
+
H
O H
M
+
R H alcano
OH
hidróxido de metal
Exemplo: Li metálico Br
HCl H2O
Li -LiBr
CH3 CH2 Br
Li metálico éter
H + LiCl
CH3 CH2 Li
+ LiBr
Reacção geral
R
5.4.2
CH3
Li metálico R CH2Li + LiBr
Reagentes de Grignard (organomagnesianos)
Vitor Grignard - químico francês - Prémio Nobel Química 1912 descobriu a seguinte transformação: éter
Mg
+
Br
MgBr
magnésio metálico
brometo de ciclopropilo
brometo de ciclopropilmagnésio
Reacção geral R
Br
+
Mg
éter
R
Mg
Br
64
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
5.4.3
Organocupratos de lítio
Reacção geral R2CuLi
+ CuI
2RLi
+
2LiI
organocuprato de lítio
iodeto cuproso
5.4.3.1 Alcanos a partir de organocupratos
Reacção geral eter R2CuLi
CH3CH2
CuLi
+
R'
X
Br
+
R
R'
+
LiX
+
RCu
SN2
éter
CH2CH3
CH2CH3 + CH3CH2
Cu +
LiBr
etilciclopentano
Os organometálicos com nucleófilos e a sua reactividade varia como a seguir apresentado. organo lítio > organo magnesiano > organo cuprato
5.5 5.5.1
HALO-ALCANOS IMPORTANTES Halo-alcanos como anestésicos
Em 1847 o clorofórmio (triclometano, CHCl3) tornou-se no primeiro anestésico de uso geral, que tornava os doentes inconscientes e relaxados. Foi no entanto posteriormente substituído por halo-alcanos de baixo ponto de ebulição: CF3 — CHClBr
halotano
CH3CH2 — Cl pontuais.
cloreto de etilo — anestésico local usado na pele para pequenas cirurgias
5.5.2
Halo-alcanos como solventes
Química Orgânica A
65
Os halo-alcanos são solventes excelentes, quer para reacções químicas, quer para limpeza e remoção de gorduras. O tetracloreto de carbono CCl4 foi o primeiro solvente utilizado na limpeza a seco, mas é tóxico e carcinogéneo por exposição crónica pelo que actualmente é proibido por lei ser utilizado para fins industriais. Cl3C
CH3 Cl
Cl C
H Cl
Cl C
5.5.3
tricloroetileno
C
Cl
Cl
metil clorofórmio ou 1,1,1-tricloroetano
percloroetileno
C Cl
Halo-alcanos usados em sistemas de refrigeração
Os fréons eram até há pouco tempo hidrocarbonetos halogenados utilizados nos sistemas de refrigeração dos frigoráficos caseiros, sistemas de ar condicionado e nos automóveis. Fréons — CFCs ou clorofluorocarbonetos — usados em frigoríficos caseiros, sistemas de ar condicionado em edifícios e automóveis O mais comum são os CFC clorofluorocarbonetos descobertos em 1930 — o Freon-12 (nome comercial) apresenta a estrutura abaixo representada. Cl
F C
Cl
F
Estes compostos apresentam vantagens significativas que são: — óptimas propriedades de transmissão de calor — baixa toxicidade — baixa flamabilidade — enorme estabilidade O Fréon-12 foi mais tarde usado como: — agente de limpeza em semicondutores e partes de computadores — agente propelante em embalagens de aerosol — agente de espuma em placas isoladoras — em chávenas e em materiais de embalagem Estes usos, associados a perdas nos sistemas de ar-condicionado deram origem à libertação de largas quantidades de Freon-12 para a atmosfera. Como resultado de medidas iniciadas em 1970, verificou-se que os CFCs eram tão estáveis que subiam na atmosfera até à estratosfera (cerca de 15 milhas de altura) sem se destruírem. A investigação posterior de Sherwood Rowland e Mario Molina, que receberam em 1995 o prémio Nobel da Química, veio demonstrar que nas regiões polares da terra, os CFCs reagiam
66
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
e faziam diminuir a camada de ozono. O ozono atmosférico é essencial para a protecção da terra dos efeitos nefastos da radiação ultravioleta (UV) proveniente do sol. Estruturas de ressonância do ozono
O
O O
O
O
O
Em 1987 um acordo internacional — o Protocolo de Montreal — baniu de modo faseado a produção pelos países industrializados de CFCs, o que foi conseguido em 1990. As nações menos desenvolvidas têm um período adicional de 10 anos para o fazerem. Os CFCs de substituição são:
5.5.4
CF3
CH2F
HFC-134a
CH3
CCl2F
HCFC-141b
Retardadores de chama
Hidrocarbonetos halogenados semelhantes aos CFCs são os halons ; produtos usados no combate a incêndios: Halon 1301 Halon 1211
CF3Br CF2Br Cl
Os halons são usados em bibliotecas, salas de computadores e de equipamento telefónico — em zonas onde a água não pode entrar. Não deixam resíduo ao evaporar e não conduzem a electricidade. Também já foram retiradas do uso em extintores e só são usados em casos especiais. 5.5.5
Insecticidas Cl Cl
Cl C Cl C H
Cl
DDT diclorodifenil tricloroetano
Descoberto em 1939, insecticida persistente, o DDT está hoje banido de usos agrícolas, mas em casos sérios de infestação de insectos tem sido usado. Nos EUA foi banido na década de 80 mas na Índia ainda se encontra em uso, assim como na América do Sul. 5.5.6
Compostos medicinais
Os perfluorocompostos têm a capacidade de dissolver mais oxigénio do que o próprio sangue humano 60% do volume versus 20%. Fluosol-DA — perfluorodecalina - substituto do sangue durante pouco tempo.
67
Química Orgânica A
F F F F
F F F F F F F F F F F F F F
Eficaz quando não há sangue ou não há sangue do tipo requerido. O seu uso é temporário porque gradualmente é excretado do corpo, e garante a vida do doente enquanto se prepara o sangue para fazer a transfusão. Outra das propriedades mais interessantes é para arrefecer computadores em banhos de arrefecimento, banhando as diferentes partes, os componentes, etc. Tal é possível por ser inerte, não conduzir a electricidade e ter boas propriedades de condução de calor.
6
ALCOÓIS
Os alcoóis podem ser primários, secundários ou terciários dependendo da classificação do átomo de carbono ao qual está ligado o grupo hidroxilo. De seguida estão representados alguns alcoóis. 2
1
CH3—CH2—OH etanol ou álcool vulgar
OH CH3—CH2—CH2—OH
CH3—CH—CH3
1 OH 2
OH
2 OH 3
1
1
1-propanol álcool primário
5
2
3
3
2-metil-2-propanol ou ter-butanol álcool terciário
2-propanol ou isopropanol álcool secundário
3
1 OH 1
1-pentanol
OH
OH 2
2-pentanol
1 2
3
3-pentanol
68
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
HO
2 CH3
OH
HO
3
1,3-propanodiol
1,2,3-propanotriol glicerol
HO
HO
1 2 OH
etilenoglicol 1,2-etanodiol
colesterol um esteróide
6.1.1
1
OH 1
2-metilciclopentanol
6.1
OH
3 2
1 OH
PROPRIEDADES DOS ALCOÓIS Pontes de hidrogénio
Os alcoóis apresentam a capacidade de estabelecer ligações de hidrogénio, o que se faz sentir no valor do seu ponto de ebulição (p. e.) que será superior ao esperado quando comparado com compostos de igual peso molecular. p.e.
p.e.
H2O
100°C
OH
118°C
H2S
-61°C
CH3
36°C
H2Se
-43°C
ponto de ebulição superior ao esperado
A razão para esta observação é a presença do grupo —OH e a elevada electronegatividade do átomo de oxigénio. Esta situação obriga à polarização da ligação O-H e C-O.
69
Química Orgânica A δO
C
δ+ H
— ligação de hidrogénio — ligação electrostática fraca a outra molécula com a energia de 5 Kcalmol-1. É uma ligação dipolo-dipolo.
polarização
intermoleculares as ligações de hidrogénio intramoleculares
Quanto maior o número de ligações em ponte de hidrogénio, maior a solubilidade em água.
H
O H
H O
H H
O
H
R
H
O
R
O H
H O
C2 H5
H O R álcool
H O H água + álcool á Compostos com mais do que um grupo hidroxilo tal como o glicerol, o etilenoglicol e os açúcares, são muitíssimo miscíveis com a água. H O H água
6.1.2
Acidez dos álcoois
Os álcoois na presença de bases fortes são capazes de dar o protão ligado ao oxigénio. São ácidos muito fracos, mais fracos que a água pelo que o seu pKa é superior ao da água. pKa = 15,9 do CH3CH2OH
o etanol é um ácido fraco
CH3CH2OH + H2O(l)
CH3CH2O + H3O
ácido fraco
base forte
pKa = 15,7 da água -logKa
H2O + H2O(l) Ka =
H3O + OH
[H3O ] [OH ] [H2O]
Face a isto é necessário uma base mais forte que -OH para remover o protão do álcool e produz o alcóxido em concentração apreciável.
70
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
R
O
H
+
álcool
CH3CH2OH etanol pKa=15,9
R
B base
+
O
+
BH
alcóxido
NaOH
base conjugada
CH3CH2O
+
Na
HOH água pKa = 15,7
etóxido de sódio
Nota: Este equilíbrio está deslocado para a esquerda porque a base não é suficientemente forte, de modo que quase não existe etóxido em solução.
A acidez relativa dos álcoois é afectada pelos substituintes ligados ao átomo de carbono que se encontra ligado ao grupo hidroxilo através do efeito electrónico exercido por eles. O efeito indutivo exercido pelos substituintes depende da sua electronegatividade. Pode ser electro-actractor (ex. átomo electronegatico) ou electrodoador ( ex. cadeias alquílicas).
6.1.2.1 Metanol (álcool metílico) H pKa = 15,5
H
H
C
O
H
H
C
H
O
+ H
H metóxido
6.1.2.2 t-butanol (álcool ter-butílico) CH3 OH
H3C > C
O
+ H
>
H3C > C
>
pKa = 18
>
>
CH3
CH3
CH3
grupo electro doador
ter-butóxido
6.1.2.3 2,2,2-trifluoroetanol H pKa = 12.4
CF3
C
grupo electro atractor
H
H OH
2,2,2-trifluoroetanol
CF3
C
grupo electro atractor
H
O
+ H
2,2,2-trifluoroetóxido
71
Química Orgânica A
6.1.2.4 Alcóxidos R
-H+
OH
R
álcool
Nota: Se durante a formação do anião alcóxido se libertar hidrogénio, como no caso da reacção com o sódio a reacção torna-se irreversível
O
anião alcóxido
alcóxidos
bases mais fortes que OH nucleófilos solúveis em solventes orgânicos
A força do alcóxido como base é inversa da força do ácido do álcool correspondente:
Basicidade CH3
H3C CH3O
<
O
<
H3C
H3C metóxido
iso-propóxido
O CH3
ter-butóxido
basicidade aumenta
6.2
6.2.1
REACÇÕES DOS ALCOÓIS
Conversão de álcoois em haletos de alquilo
Esta reacção é realizada com sucesso por o ião brometo ser um bom grupo de saída e o ião hidróxido um forte nucleófilo. A conversão dos halo-alcanos em alcoóis pode fazer-se usando uma reacção de substituição SN2.
72
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
SN2 R Br
+
brometo de alquilo
NaOH
R OH +
hidróxido de sódio
álcool
NaBr
Será possível fazer a reacção inversa? + ?
R OH
R Br
Existe um bom grupo de saída? — Não. O OH- é: — Base forte — Não é muito polarizável O grupo hidroxilo não é um bom grupo de saída e o anião brometo é um nucleófilo moderado de modo que é necessário transformar o grupo hidroxilo noutro grupo que apresente melhores propriedades de grupo de saída. 6.2.2
Reacções de álcoois com haletos de hidrogénio
Os alcoóis reagem com haletos de hidrogénio HI, HBr, HCl para formar halo-alcanos:
CH3CH2CH2 OH +
Δ
CH3CH2CH2 Br
HBr
+
álcool primário Δ OH +
I
HI
+
H2O
álcool secundário temp. OH
+
HBr
amb.
Br
+
H2O
álcool terciário
A ordem de reactividade dos alcoóis é
álcool terciário > álcool secundário > álcool primário
H2O
73
Química Orgânica A
Os álcoois primários e secundários reagem a quente mas os álcoois terciários reagem à temperatura ambiente. Mecanismo O mecanismo depende da natureza do álcool. Pode envolver um mecanismo de substituição nucleófila unimolecular, SN1, ou um mecanismo de substituição nucleófila bimolecular, SN2. 1º passo O primeiro passo do mecanismo envolve a protonação do grupo hidroxilo para formar o ião oxónio. Este passo de protonação transforma um mau grupo de saída, o ião hidroxilo, num bom grupo de saída, a água. A água é um bom grupo de saída que pode ser substituida pelo anião haleto numa reacção de substituição.
atenção: este é um composto quiral
R''' R'' C OH R'
H Br
R''' R'' C Br R' mantém a configuração no átomo de carbono
+
R''' Br C R'' R' inversão de configuração no átomo de carbono
um único enantiómero R''' Br C R'' R'
produto único
inversão de configuração no átomo de carbono
mistura racémica quantidades iguais de cada enantiómero
74
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
C
+
OH
H
HX H C
O
ião oxónio H
(álcoois primários X e secundários) SN2 (-H2O)
C
X
halo-alcano
(álcoois terciários) SN1 (-H2O)
(o carbocatião é armadilhado rapidamente pelo nucleófilo)
C
carbocatião X
C
X
halo-alcano
As reacções de substituição nem sempre dão unicamente os produtos de substituição mas dão por vezes produtos de eliminação, alcenos. Estes produtos são considerados produtos secundários das reacções de substituição visto formarem-se em quantidades inferiores às do produto desejado. A formação destes produtos depende da natureza do nucleófilo, bases fortes e maus nucleófilos, promovem a formação de reacções de eliminação e, também depende da natureza do álcool presente. Para ocorrerem reacções de eliminação é necessário que o álcool presente tenha protões ligados ao átomo de carbono adjacente ao carbono ligado ao grupo hidroxilo. As reacções de eliminação .ocorrem preferencialmente em álcoois terciários e geralmente não ocorrem em álcoois primários.
75
Química Orgânica A
Nu
C
Nu
SN 2 O C
H
H
C
O H
H
b) C
b)
H
-H2O
a) Nu
C
a)
carbocatião E1
b)
C
Nu
SN1
-H
C C
produto de eliminação
alceno
6.2.2.1 Teste de Lucas O teste de Lucas é um teste qualitativo que relaciona a velocidade de formação do carbocatião com a substituição no átomo de carbono. A formação do carbocatião é promovida pela acção de um ácido de Lewis. O ácido de Lewis utilizado é o cloreto de zinco (ZnCl2) que coordena com o grupo hidroxilo do álcool transformando-o num bom grupo de saída com formação do carbocatião correspondente. O carbocatião formado reage com o anião cloreto e forma um cloreto que é insolúvel na solução aquosa precipitando. Os álcoois que reagem melhor no teste de Lucas são aqueles que formam carbocatiões mais estáveis. Os álcoois terciários reagem mais depressa que os secundários, e os álcoois primários não reagem. 6.2.2.2 Estereoquímica Como já foi referido as reacções de substituição que ocorram num único enantiómero puro por um mecanismo SN1 conduzem a uma msitura racémica e aquelas que ocorram por um mecanismo SN2 conduzem à formação de um único enantiómero com configuração invertida em relação ao primeiro.
76
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
R''' R''
C
OH
R' HX
HX
-H2O
-H2O
SN2
SN 1 R'''
R''' X
R''
R''
C
X
+ X
R'
R' inversão
6.2.3
C
R''' C
R''
R racemização
Conversão estereospecífica de alcoóis em halo-alcanos
6.2.3.1 Inversão de configuração Anteriormente só havia inversão da configuração do álcool em reacções que seguiam um mecanismo SN2, em álcoois primários e nalguns secundários. As reacções a seguir descritas possibilitam realizar transformações com inversão da configuração em todos os álcoois independentemente da substituição do átomo de carbono. Reacção com o cloreto de tionilo Os álcoois primários e secundários reagem com cloreto de tionilo SOCl2 na presença de piridina numa reacção estereospecífica. piridina OH
+
SOCl2
Cl
+
+ N H
ciclo-hexanol
cloreto tionilo
cloreto de ciclohexilo ou clorociclo- hexano
SO2(g)
Cl
cloreto de piridinío
Mecanismo na presença de piridina: Na presença de piridina, que é uma base mas que também é um nucleófilo a reacção de formação do cloro-alcano dá-se com inversão da configuração do átomo de carbono: O mecanismo de reacção de um álcool quiral com o cloreto de tionilo na presença de piridina é o seguinte:
77
Química Orgânica A R''' R'' C O R' H
+O S
Cl
R''' O R'' C S Cl O R' H
- Cl
Cl cloreto de tionilo
R'' Cl
N
R''' O C O S
R'
N
inversão da configuração
na presença de piridina
R''' Cl C R'' R'
De modo semelhante o tribrometo de fósforo reage com os álcoois em reacções de formação de bromo-alcanos com inversão da configuração do produto formado.
H
+
OH
Br
Br P
Br
há inversão da configuração
H
Br H3C
H3C tribrometo (S,S)-trans-3-metilciclo-hexanol de fósforo
(R,S)-cis-3-metilbromociclo-hexano
6.2.3.2 Retenção de configuração E se quisermos efectuar a halogenação com retenção de configuração? Há apenas duas maneiras de converter um composto noutro com retenção de configuração. 1) usar uma só reacção cujo mecanismo force a retenção 2) usar uma sequência de duas reacções em que em ambas haja inversão de configuração. A reacção de um álcool com o cloreto de tionilo na ausência da piridina permite a formação de um cloro-alcano com retenção da configuração do álcool inicial. O mecanismo desta reacção é apresentado de seguida: R''' R'' C O R' H álcool quiral
+O S
Cl Cl
cloreto de tionilo
- Cl
R''
R''' C O
S O Cl retenção da configuração R'
R''' R'' C Cl R' retenção da configuração
Outro modo de obter um produto com a mesma configuração do produto inicial é realizar uma transformação que envolva dois passos, e que em cada um deles se verifique a inversão da configuração. Após duas inversões a configuração obtida é a configuração inicial.
78
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
R''' R'' C O H R'
Cl O S O
R''' R'' C O Ts R'
1º passo
R''' HO C R'' R'
-OTs
HO inversão de configuração
ester éster de tosilo (tosilato)
CH3 cloreto de tosilo = TsCl
Cl mesma configuração
O S
2º passo Cl
R''' R'' C Cl R'
+ SO2 (g) + Cl-
inversão de configuração
6.2.4
Oxidação de alcoóis
As reacções de oxidação são muito importantes e frequentes em química orgânica. A maior parte dos reagentes de oxidação são compostos inorgânicos. Quando um composto é oxidado, uma de duas coisas acontece: — há um aumento no conteúdo de oxigénio do substrato — há uma diminuição do conteúdo de hidrogénio do substrato Hierarquia dos estados de oxidação de alguns compostos orgânicos facilidade de oxidação
muito difícil RCH3 alcano
< RCH2OH álcool
R = alquilo, só por combustão
muito fácil
fácil
<
R
O C
H
aldeído
R = H, muito fácil
<
R
O C
OH
<
ácido carboxílico
O C O anidrido carbónico ou dióxido de carbono
A oxidação dos álcoois pode ser realizada pela acção de vários reagentes oxidantes dos quais vamos falar de três: O permanganato de potássio, o dicromato de sódio e o clorocromato de piridínio.
79
Química Orgânica A 1. O O
Mn
O
permanganato de potássio cor roxa
KMnO4
O
K permanganato de potássio
2.
O O Cr O Na O O Cr O O Na
oxidante forte
o dicromato de sódio na presença de H2SO4 e água origina o ácido crómico
Na2Cr2O7
O VI O H Cr O O H
cor de laranja
ácido crómico verdadeira espécie oxidante
dicromato de sódio
oxidante forte CrO3 + H2SO4 aq. o trióxido de crómio na presença de H2SO4 e água origina o ácido crómico
C5H6NCrO3Cl
3. N Cl O Cr OH O
clorocromato de piridínio, é obtido por reacção entre a piridina e o ácido clorídrico
(PCC)
clorocromato de piridínio
oxidante moderado
Em química orgânica é costume escrever-se uma reacção de oxidação sem nela explicitar os compostos inorgânicos resultantes: Oxidação de álcoois primários: Para obter um ácido carboxílico:
Reacção geral O
O R CH2 OH
Na2Cr2O7 H2SO4
R
C
R
H
ácido
aldeído
álcool primário
Exemplo: Na2Cr2O7 OH H2SO4 álcool isobutílico 2-metil-1-propanol
C
O OH ácido isobutírico ácido 2-metilpropanóico
OH
80
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
Para obter um aldeído: Se queremos obter o aldeído, então devemos usar o PCC que é mais selectivo. PCC
O
OH H álcool isobutílico 2-metil-1-propanol
isobutiraldeído 2-metilpropanal
Oxidação de álcoois secundários: Os álcoois secundários por oxidação dão as cetonas. Reacção geral R'
H Na2Cr2O7
R''
OH
R' O
H2SO4 R'' cetona
álcool secundário
Exemplo: Na2Cr2O7 O
OH H2SO4 ciclopentanol
ciclopentanona
Oxidação de álcoois terciários: Com os alcoóis terciários não há reacção. R' Na2Cr2O7 R''
OH
Não há reacção
R'''
A oxidação de álcoois é uma reacção muito importante em química biológica. São em parte as reacções da oxidação que metabolizam os alimentos e nos dão grande parte da energia de que necessitamos para o corpo. Embora os reagentes sejam diferentes, o resultado é o mesmo. Por exemplo durante um exercício físico violento, as células não obtêm oxigénio suficiente para completarem o metabolismo, criando-se uma falta de oxigénio. Como resultado o ácido láctico acumula-se nos músculos o que dá origem à dor muscular. Por oxidação posterior teremos a produção de ácido pirúvico.
81
Química Orgânica A H CH3
C O
O
O
[O]
C H
CH3
C
C
OH
OH
O
ácido láctico
ácido pirúvico
acumula-se nos musculos devido ao esforço físico
Quando bebemos álcool este por oxidação metabólica é transformado no acetaldeido, que é muito tóxico para o cérebro. Só posteriormente o acetaldeido é transformado em ácido acético que já não é tóxico. H
H CH3
[O]
OH
C
CH3
H etanol
6.3 6.3.1
C
OH [O]
O
CH3
acetaldeído muito tóxico para o cérebro
O
C
ácido acético
ALCOÓIS IMPORTANTES Metanol
O metanol CH3OH obtém-se industrialmente por hidrogenação catalítica do CO (monóxido de carbono). H C
O
C
O
H2
H
catalisador
C
OH
H metanol
monóxido de carbono
O metanol é muito tóxico para os seres humanos, originando cegueira e até a morte e é usado muitas vezes como combustivel de carros de corrida H
H oxidação
H
C H
metanol
6.3.2
OH
O
controlada H
formaldeído
Etanol
O etanol CH3CH2OH obtém-se da fermentação alcoólica e é usado como um anti-séptico tópico e é hoje usado como combustível para automóveis em vários países misturado com produtos do petróleo sob o nome de “gasohol”
82 6.3.3
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço Isopropanol CH3 CH
OH
CH3
O isopropanol é usado em cosméticos, loções e perfumes 6.3.4
Etilenoglicol ou 1,2-etanodiol CH2
CH2
OH
OH
O etilonoglicol é o componente principal no fluído de arrefecimento de motores e é ideal como anticongelante já que apresenta um ponto ponto de solidificação -12°C e ponto de ebulição 119ºC. 6.3.5
Glicerol CH2
CH
CH2
OH
OH
OH
O glicerol é obtido por hidrólise (reacção com a água) das gorduras èsteres dos ácidos gordos. Os ácidos gordos são ácidos carboxílicos com cadeias carbonadas muito longas, o que os torna pouco solúveis em água. CH2 O HC
O
CH2 O
O C R' O C R'' O C R''' R''
gordura ou triglicérido
1. NaOH
CH2 OH HC
2. H3O
OH
+
CH2 OH glicerol
+
O HO C R' O HO C R'' O HO C R''' ácidos gordos
A nitração do glicerol produz trinitrato de glicerol (nitroglicerina) que é um líquido explosivo, sensível ao choque.
83
Química Orgânica A
H2SO4 CH2 OH HC
OH
quantidade catalítica
O HO N O
+ 3
CH2 O HC
CH2 OH ácido nítrico
glicerol
N
O
N
CH2 O
N
O O O O O O
nitroglicerina
Na natureza um dos alcoóis mais importantes é a glucose, que para além de cinco grupos funcionais álcool, contém também o grupo funcional aldeído. A glucose existe na forma de cadeia aberta em equilíbrio com a sua forma cíclica, glucopiranosido. glucose
O H HO H H H
C C C C C C H
H OH H OH OH OH
cadeia aberta
HO
CH2 O
HO HO
H O
OH
forma de piranose
84
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço Formação de hemi-acetal cíclico da D-glucose
H HO H H
OH 5 4 3
HOH2C
Rotação de 120º de C5 segundo a ligação C4 - C5
CH2OH 1 CHO
6
H
6
HO H H
2
H OH OH
5
OH 1 CHO
3
2
4
H OH OH
D-glucose
6
CH2OH
6
CH2OH 5
HO CH O 4
1
OH H HO 3 2 H
H H
D-glucofuranose (menos estável)
O 1
4H
C
OH
5
OH Novo estereocentro
OH H
HO 3 H
H
C
2
OH
OH
Novo estereocentro
D-glucopiranose (mais estável) (Grupos à direita na projecção de Fischer original [dentro de círculos] apontados para baixo no hemi-acetal cíclico, excepto C-5 que sofreu rotação)
85
Química Orgânica A
7
ÉTERES
Os éteres são líquidos de ponto de ebulição baixo. Não formam pontes de hidrogénio uns com os outros porque não apresentam grupos —OH. Podem fazer pontes de hidrogénio com os álcoois. Os éteres de baixo peso molecular fazem ligações de hidrogénio com a água e são parcialmente solúveis, mas a partir de certa concentração formam duas fases. hibridação sp3
hibridação sp3
O R
O
R'
H
H 105°
111° grupos mais volumosos Ângulo tetraédrico 109°
Os éteres não apresentam grande reactividade. São bons solventes - inertes e bastante polares H3C CH2 O CH2 CH3
O
éter etílico
tetra-hidrofurano
São solúveis em H2SO4 concentrado. Dá-se a protonação do átomo de oxigénio e a formação de um ião oxónio e não ocorre mais reacção, pelo que os éteres ficam solubilizados sem sofrerem alteração. Esta propriedade fá-los distinguir dos alcanos que não são solúveis em ácido sulfúrico concentrado.
H R
O
R'
+
H2SO4
R
O
R'
ião oxónio
+
HSO4
86
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
7.1
NOMENCLATURA R alcano
O
R'
substituinte alcóxido
C2H5
CH3O
metóxido
metoxi-
C4H9O
butóxido
butoxi-
O
C2H5
IUPAC
etoxi-etano
comum
éter etílico
7.2
O
O
CH3
metoxiciclopentano
2-etoxi-4-metilpentano
éter metilciclopentílico
ÉTERES ACÍCLICOS
7.2.1
Preparação de éteres acíclicos
7.2.1.1 Síntese de éteres de Williamson Reacção usada para preparar grande parte dos éteres — substituição nucleófila bimolecular (SN2) por um nucleófilo alcóxido num haleto de alquilo
halo-alcano R
O H álcool
Na remoção do protão
RO Na alcóxido
R'
Br
ataque nucleófilo do alcóxido ao halo-alcano
R
O
R'
+ NaBr
éter
A partir de um álcool e de um halo-alcano podemos realizar a síntese por dois caminhos:
87
Química Orgânica A
Via A:
OH
Na
menos formação de produto secundário (eliminação)
O C2H5Br
OC2H5 Br
Via B: C2H5
Na
OH
C2H5O
protecção do grupo —OH
7.2.1.2 Protecção do álcool
Na
OH
CH3I
O
OCH3
Problema Desenhe uma síntese do t-butil etil éter. H3C
H2C
O
Retrossíntese: É um processo imaginário em que a partir da molécula que queremos sintetizar quebramos ligações para as quais sabemos existirem reacções químicas para as formar. As setas correspondentes são do tipo , e as quebras das ligações representam-se por .
A
B
Br
Via A
+
O
O
Via B
Br
+
O
88
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço Via A
Br
+
O
O
A reacção SN1 ocorre com rendimento muito baixo pois dá-se preferencialmente a reacção de eliminação pelo mecanismo seguinte:
H Br
-Br
-
+
O
OH
Produtos principais da reacção
carbocatião
Via B: Síntese mais adequada
OH
Na
Br
O
O
reacção SN2 mais fácil C — primário
7.3 7.3.1
REACÇÕES DE ÉTERES Formaação de éteres metílicos e sua quebra
O
+
CH3I
O
CH3
Esta reacção forma um éter a partir de um álcool. Muitas vezes esta reacção é aproveitada para fazer uma protecção do grupo hidroxilo nos alcoois sendo necessário a sua posterior remoção para repor a função hidroxilo. Desprotecção — Reconversão no álcool — quebra do éter com um equivalente de um ácido muito forte.
89
Química Orgânica A
CH3
O
R
H
I
CH3
O
R
I
H
O
R
+ CH3I
H local da reacção SN2 mais desimpedido
álcool protegido
OH
ião oxónio álcool desprotegido
1. Na
OCH3
HI OH
2. CH3I
+ CH3I
H OCH3 H I
O CH3
CH3I
+
OH
I
7.4
ÉTERES CÍCLICOS O O O epóxidos oxiranos
7.4.1
O dioxano
tetra-hidrofurano
Nomenclatura 1 O
O
3 2
7.4.2
trans - 2 - butene óxido
cis - 2 - buteno óxido
trans - 2,3-dimetiloxirano
cis - 2,3-dimetiloxirano
Preparação de éteres cíclicos
7.4.2.1 Epoxidação Epoxidação - Oxidação de alcenos por perácidos A maior parte dos epóxidos são feitos a partir de alcenos usando um derivado da água oxigenada.
90
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço O
O
C
ácidos O
HOH
C
H
perácidos O
água
HO
O
H peróxido de hidrogénio
OH
Exemplos: O H O O C CH3
Cl
O H O O C
ácido peracético
ácido m-cloroperbenzóico
O peróxido de hidrogénio transfere um átomo de oxigénio para o ácido formando um perácido que posteriormente oxida o alceno formando um epóxido. Epoxidação de alcenos C C
O + CH3 C O OH
alceno
ácido peracético
C C O
+
epóxido
CH3COOOH
O H3C C OH ácido acético
O
Outro método de formação, por reacção intermolecular de ataque nucleófilo. Cl
Cl + Na OH
7.4.3
O O
Reacções de epóxidos
7.4.3.1 Reacção de abertura de epóxidos catalisada por ácido Os éteres são conhecidos pela sua falta de reactividade. A mesma falta de reactividade encontrase nos éteres cíclicos, excepto naqueles em que existe um anel muito tenso, tal como nos epóxidos. Os epóxidos podem sofrer reacções de abertura por tratamento com nucleófilos em meio básico ou ácido. A grande tensão do anel facilita a sua abertura.
91
Química Orgânica A O
O C
60° 60° 60°
C
109,5°
de hibridização tetraédrica
C
C
Por exemplo o ião iodeto I-, um bom nucleófilo abre o anel de epóxidos com grande facilidade. H H
O
I
H
H H I ácido iodídrico
H
H
I H
SN2
H
O
H
H
H
H H OH iodo-hidrina
ião oxónio cíclico Abertura do epóxido com água ou metanol
H
O
O H2O
ataque da água ou do metanol numa reacção SN2 para
H CH3OH
abrir o anel, pela parte detrás do carbono
H OCH3
OH2
ião oxónium que perde um protão para o solvente (água ou metanol)
HO
HO
HO -H
-H
OH
OCH3
reacção catalisada por ácido
HO
Se o epóxido não é simétrico, o ataque SN2 ocorre predominantemente no átomo de carbono menos substituído. Exemplo: I
I
H I O propileno óxido
O H
O H iodo-hidrina
92
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
Se houver um átomo de carbono terciário, o ião oxónio cíclico abre expontâneamente para dar o carbocatião, que é depois armadilhado pelo nucleófilo presente na reacção. H+
CH3OH
O CH3OH
O H
OH
HO
-H
OCH3
Se o epóxido está fundido com outro anel podemos operar a rotura do anel de epóxido de modo estereospecífico, formando-se apenas o isómero trans. H O
H2O
H3O
OH
OH
O
H
OH H
diluido
OH
trans-diol
plano do anel de ciclopentano
ou OH
H3CO O
CH3OH
HO HI
H+
OH
+ CH3I
só trans
H3O+ HO
OH
só trans
7.4.3.2 Abertura do anel de epóxidos com nucleófilos Para além da catálise ácida, a tensão do anel de epóxido é suficientemente grande para dar lugar à rotura do anel em presença de um bom nucleófilo. Abertura por nucleófilos: — O nucleófilo deverá ser forte e a reacção ser SN2. — Produzem-se oxianiões estáveis em solução que serão protonados no “work-up”. — Os nucleófilos reagem sempre no carbono menos substituído.
93
Química Orgânica A
H3O+
Na
O
OH
OH
HO
Na
a)
OH
1,2-propanodiol
a) b) O
Na
b) OCH3
H3O+ O
OCH3
HO
OCH3
Na
1-metoxi-2-propanol
O ataque pelo nucleófilo dá-se preferencialmente no átomo de carbono menos substituído, consistente com um mecanismo SN2. A mais importante aplicação deste tipo de substituição nucleófila é a formação de novas ligações C—C. Uma aplicação importante é o uso de nucleófilos derivados de compostos de lítio R-Li, ou de reagentes de Grignard R-Mg-Br. As reacções serão do tipo SN2 e teremos reactividade em átomos de carbono 1°>2°>3°. Durante o “work-up” realiza-se a acidificação para que o oxo-anião fique protonado. Exemplo: Uso de composto organolítio como nucleófilo
OH
HBr Br
1)
Li
O
CH2CH2OH
Li 2) H3O composto organolítio
Exemplo: Uso de reagente de Grignard como nucleófilo O
C3H7 OH
1) C3H7MgBr/éter
adição trans 2) H3O trans-2-propilciclopentanol
Para o metil lítio teremos analogamente adição trans:
CH3
CH3 Li
CH3
H /H2O
éter O
O
HO trans - 2-metilciclopentanol
94
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
Reacção geral
+
O
R
δδ+ R — Li
R
H3O
+
O Li
LiOH
HO nova ligação C—C
R OH
HBr
R Br
Li eter
1) R Li
O R CH2CH2 OH
2) H3O
homologação de 2 átomos de carbono
Problema ?
Br
CH2CH2—Br
Li
Br
CH2 CH2 OH
Li
éter HBr
CH2CH2Br
O
Li
O
H3O -H2O
Br
CH2CH2OH
CH2CH2Br
-H2O
7.5 7.5.1
ÉTERES IMPORTANTES Resinas epóxi
A palavra epóxi é familiar, muito provavelmente em ligação com a palavra resinas ou colas.
95
Química Orgânica A
De um modo geral as colas ou resinas epóxi são usadas na manufactura de cadeiras, mesas, nas lombadas de livros, etc. São colas que são usadas numa grande variedade de materiais: metais, vidro, madeira, plásticos, etc. São também usadas na indústria aeronáutica e de um modo geral em indústrias para substituição no uso de parafusos. As vantagens são a sua força de adesão, baixo peso, robustez e resistência química. A propriedade da cola de resinas epóxi está associada à abertura nucleófila de epóxidos. São constituídas por dois componentes: o epóxido (também chamado de resina) e o agente de cura que é um di ou trinucleófilo. Os dois componentes são misturados antes da cola ser aplicada. Quando misturado com a resina o agente de cura abre o anel epóxido e promove as ligações cruzadas ou “cross-linking”, entre as cadeiras poliméricas. O
O
CH2
CH
CH2
A
CH2
CH
CH2
CH3 A=
O
C
+
B=
O
H2 N
CH2CH2 N
OH B
N H
CH2
NH2
CH2 CH2
H
CH3
N H
B
C
OH CH2
A
CH2
CH
CH2
N H
B
N H
este átomo pode ainda envolver-se noutra reacção para dar uma ligação cruzada entre a cadeia do polímero
N ligações cruzadas
cadeias poliméricas
B N
7.5.2
Éter etílico
O éter etílico foi usado desde 1840 como anestésico tendo sido abandonado. Forma peróxidos com o ar, tornando-se explosivo e por isso perigoso de manusear. CH3CH2 O
CH2CH3
O éter etílico pode ser preparado por reacção do etanol na presença do ácido sulfúrico a quente
96
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
CH3CH2
OH
H2SO4
etanol
140°C
H CH3 CH2 O
CH3CH2 OH
H
CH3 CH2 + H2O O CH2 CH3 éter etílico
7.5.3
Éter metil ter-butílico (MTBE)
O MTBE facilita a combustão sendo hoje um aditivo da gasolina. O MTBE pode ser preparado pela reacção entre o isobutileno e o álcool metílico por catálise ácida. H O CH3 isobutileno
7.5.4
H O CH3
metil ter-butilmetil éter (MTBE)
Alcalóides – morfina, heroína R O
O N CH3 R'O
alcalóides naturais do complexo do ópio obtido da Papaver somniferum
R e R' = H R = CH3 e R'=H
morfina codeina
O R e R' = C CH3
heroína (sintético)
97
Química Orgânica A
8
ALCENOS
Os alcenos possuem uma ligação dupla (uma ligação σ e outra ligação π) entre dois átomos de carbono. π
C C
π
σ
σ
hibridação sp2 dos átomos de carbono fica uma orbital p para fazer a ligação π
C
C π
Alguns exemplos de alcenos conhecidos. O etileno é produzido naturalmente pelas plantas promovendo o amadurecimento dos frutos. H C C H
CH3
ou
CH2 CHCH3
ou
H propeno H
ciclo-hexeno
ciclopentadieno
H
H H etileno (eteno)
Os alcenos apresentam isomerismo cis-trans. Este isomerismo é a base do sistema binário relativo à visão monocromática no ser humano no composto chamado retinal. CH3 CH3 C C H H
CH3 H C C H CH3
cis-2-buteno
trans-2-buteno
98 8.1 8.1.1
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço REACÇÕES DE ALCENOS Reacções de adição
R
R' C
C
+
R'''
A
R
adição
B
A
B
C
C
R'
R''' R''
R''
8.1.1.1 Hidrogenação catalítica
R
R' C
C
R'''
R
+
H
H
Pd ou Pt
R''
H
H
C
C
R'
R''' R''
Exemplo: CH2
H2
CH2
CH3
Pt
eteno
CH3
etano
8.1.1.2 Adição electrófila a alcenos A adição dá-se de modo a produzir o carbocatião intermediário mais estável e este será: H R R > > R C R C R C H R H Carbono: terciário > secundário > primário
8.1.1.2.1 Mecanismo:
C C alceno
Exemplificando
+
δ+ δA B
lenta
C C A + carbocatião
B
rápido
B C C A produto
99
Química Orgânica A C2H5 C2H5 CH CH2
C2H5
B
A B
CH2 H A
B
H CH2 A
C2H5 +
H
B CH2 A
mistura racémica mistura de enantiómeros em igual percentagem
duas hipóteses de ataque ao carbocatião, pela frente ou por trás
8.1.1.2.2 Adição de H—X com X=halogénio
H
δ+ δ− H Cl
Cl
H
H
Cl
(Cloro-alcano) clorociclopentano δ+ H
CH3 C
CH2
δ− Br
CH3 C
CH3
CH3
C
CH3 δ+ H
duas hipóteses de adição de H+
δ− Br
CH3
CH3 único composto formado por adição
carbocatião terciário
CH3
Br
CH3
CH3
H C
H C
CH2
CH2
Br
CH3
CH3
não se forma este composto
carbocatião primário muito instável
A adição é regiosselectiva - o anião halogénio liga-se ao carbono que resulta do carbocatião mais estável. 8.1.1.3 Adição de água H (catálise ácida) adição Markovnikov
CH3 C
CH3 C
CH3
H2O -H
CH3
OH C
CH3
CH3 forma-se unicamente este composto
CH2
CH3 isobutileno
CH3
? adição anti-Markovnikov
CH3
H C
CH3
CH2
OH
100
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
8.1.1.4 Adição anti-Markovnikov de água : como consegui-la? A chave do problema é evitar a adição do protão no 1º passo. Isto implica evitar H2O, visto que a adição de H2O é nucleófila e não electrófila. A solução deste problema foi descoberta por H. C. Brown, que ganhou em 1979 o prémio Nobel da química — a chave está no uso do boro. O Boro tem só 6 electrões na sua camada mais externa e pode acomodar mais dois. O borano BH3 é assim um electrófilo (ácido de Lewis) e adiciona-se aos alcenos como um protão. H CH3
CH2
H
C
CH2
H
B
CH3
CH2
C
CH2
H
B
CH2
CH2
CH2
C
CH2
C
CH3
CH2
C
CH2
CH2
H + Na3BO3
B CH2
H
borato de sódio
H repetir duas vezes com duas moléculas de alceno
H H
H2O2 NaOH
B
H H
OH
CH2
H
H
H CH3
CH2
CH3
H
H borano
3 CH3
H
C
H
CH2 CH3
O mecanismo envolvido no processo será o seguinte: H R C H
R' B O R' O H
H R C H
R'
B O R' O H H R C O H H
R' O B
R'
+
H R C H
H R C O H
R' B R' O
O H
R' + O B R' H
álcool
O O B O
+
2 R'
OH
Desta forma a adição de água à ligação dupla não é realizada com água mas com peróxido de hidrogénio (água oxigenada) e com borano (BH3).
101
Química Orgânica A
8.1.1.5 Adição de halogénios A reacção de bromo vermelho-acastanhado com alcenos é usada como teste qualitativo para distinguir entre duas famílias de hidrocarbonetos, os alcenos e os alcanos. Os alcenos provocam o desaparecimento imediato da cor do bromo por este sofrer reacção de adição à ligação dupla. Nos alcanos o bromo não reage na ausência da luz. δ+ δ− Br Br
δ− δ+ Br Br
δ− δ+ Br Br
Br Br
ciclobuteno
H * Br
Br * H
Br ião bromónio Br +
* Br
* mistura racémica
possibilidade de ataque do Br a cada um dos átomos de carbono
* Representa átomos de carbono assimétricos
A adição de halogénios é estereospecífica dado que o bromo ataque pelo lado contrário ao ião bromónio: a adição diz-se anti. 8.1.2
Oxidação de alcenos
8.1.2.1 Epoxidação de alcenos A epoxidação de alcenos por perácido origina epóxidos que podem sofrer abertura na presença de um nucleófilo. Se esse nucleófilo for a água forma-se um 1,2-diol trans.
R
R
R
R alceno
Exemplificando:
O + R C O OH perácido
R
R
R O R epóxido
O + R C OH ácido
102
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço O CH3 C O
OH ácido peracético
OH
H2O
O
OH ciclo-hexeno
trans-1,2-diol
epóxido
8.1.2.2 Oxidação com permanganato de potássio O permanganato de potássio é um agente oxidante forte. Na presença da água e a frio oxida alcenos a diois vicinais. R
R R R C C R O O Mn O O
R C C
R
R
O Mn O O
O
H2O
R R R C C R OHOH
éster de manganato
diol vicinal
+ MnO2
dióxido de manganés
anião permanganato
Esta adição dos dois grupos hidroxilos é estereospecífica e é syn. O anião permanganato aproxima-se de um dos lados do alceno e forma as duas ligações carbono-oxigénio simultaneamente. Exemplificando para o ciclopenteno, obtem-se o cis-1,2-ciclopentanodiol. O isómero trans obter-se-à por oxidação com ácido peracético, com formação do peróxido respectivo e abertura com hidróxido de sódio aquoso.
KMnO4/ H2O 2
HO
1
OH
cis-1,2-ciclopentanodiol
ciclopenteno
1. CH3CO3H 2. NaOH/H2O HO
OH
trans-1,2-ciclopentanodiol
103
Química Orgânica A
8.1.2.3 Ozonólise de alcenos A ozonólise dos alcenos é muito vulgarmente usada em síntese e envolve equipamento apropriado. O ozono é gerado no laboratório pela passagem de uma descarga eléctrica de 10000 V através de oxigénio gasoso. A reacção do ozono com os alcenos envolve a adição do ozono à ligação dupla. O ozonido formado é reduzido posteriormente com zinco e água para produzir dois compostos de carbonilo. De uma forma global a ligação dupla é quebrada e os átomos de carbono da dupla ligação passam a estar ligados por ligações duplas a dois átomos de oxigénio independentes. Por exemplo o isobutileno é quebrado formando formaldeído e acetona. O
O
O
O
O
O
estruturas de ressonância do ozono CH3
H C
CH3
H O
O
CH3 H CH3 C + C H O O O
CH3 H C C CH3 H O O O
C
O
CH3
CH3 C O
O C
H H
O
ozonido primário
CH3
C
O
+
Zn/H2O
H O C H
CH3
formaldeído
acetona
Problema: Que composto X dá origem aos seguintes produtos de ozonólise? X
O3
Et CH3 C C CH3 C O O Et
+
2
Solução:
CH3
CH3 CH CH CH3 3 3 C C C C C CH3 Et
Et
O H C C CH3 O O H ozonido secundário
CH3
CH3 C CH3 O
104 8.2 8.2.1
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço REACÇÕES DE PREPARAÇÃO DE ALCENOS Reacções de eliminação A
B
C
C
C
C
H
H
H
H
-H2
- A-B
C
alceno
C
alcino
8.2.1.1 Desidratação de álcoois
R
H
R''
C
C
-H2O
OH
R
R'' C
C
R'''
R''' R'
R' alceno
álcool
A reacção de desidratação é o inverso da hidratação de alcenos para formar álcoois. Aquecendo um álcool em H2SO4 concentrado (ou H3PO4 85%) elimina-se H2O para formar alceno. As temperaturas de aquecimento a usar dependem do tipo de álcoois tratados. Para álcoois terciários a temperatura de 100°C é normalmente suficiente. Para álcoois primários, 200°C é a temperatura normalmente utilizada. H3PO4 OH
ácido fosfórico +
Δ
ciclo-hexanol
H2O
ciclo-hexeno
água
H α
OH H
H3PO4 Δ
1-propanol +
H OH
propeno H
α 2-propanol
H2O
Δ
H3PO4
(Nota: É frequente designar-se o átomo de carbono adjacente ao grupo funcional pela letra grega alfa, α.)
105
Química Orgânica A
Quando há mais do que uma posição de onde o protão pode sair, então temos o problema da regiospecificidade. Usualmente formam-se ambos os produtos possíveis, mas um é o produto principal — de um modo geral formar-se-à predominantemente o alceno mais estável que é o mais substituído (Regra de Zaitzev). H CH3 CH2 C C CH3 H O H H
H CH3 C C H3C CH3
-H2O
H H2C C CH 3 C CH3 H
+
predomina (alceno mais substituído) H CH2 OH
-H2O +
H predomina (alceno mais substituído)
Mecanismo por catálise com ácido sulfúrico H2SO4 O C
C
H
O
+
H
O
S O
H
C
C
H
O
H
OH
-H2O
C
passo lento
forma-se o carbocatião mais estável - o mais substituído
C
H
H O
ião oxónio carbocatião
O HO
passo rápido
H2SO4
+
C
C
S O
106
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
Aplicação à síntese de ciclo-hexano a partir de ciclo-hexanol: OH
H2SO4
H2
-H2O
Pd/C ciclo-hexeno
ciclo-hexanol
ciclo-hexano
8.2.1.2 Desidro-halogenação de haletos de alquilo - reacção de eliminação
R'
R''
R'
- HX R
C
C
X
H
R'''
R'' C
R
inversa
C R'''
a) Eliminação E2 δEtO
EtO H
H H
H
H
H
H
CH3
CH3
CH3
H CH3
Cl
CH3
2-clorobutano
CH3
Clδ
cis-buteno
estado de transição
Notar que na eliminação E2 anti (E=eliminação , 2=bimolecular) a reacção é estereoespecífica, de modo que o átomo de halogénio faz um ângulo sólido de 180° relativamente ao átomo de H+ que vai ser removido. A prova da estereoespecificidade obtém-se com a desidrocloração de dois derivados de produtos naturais, o cloreto de mentilo e o cloreto de neomentilo.
107
Química Orgânica A Cl
Cl CH3
CH(CH3)2
CH3
CH(CH3)2
cloreto de mentilo
cloreto de neomentilo
NaOEt / EtOH
NaOEt / EtOH
CH3
CH(CH3)2
CH3
produto minoritário
produto exclusivo
+
CH3
CH(CH3)2
CH(CH3)2 produto predominante
Esta reacção compreende-se melhor quando as estruturas conformacionais dos dois reagentes se comparam. Verifica-se que o cloreto de mentilo tem de adoptar a sua conformação menos estável (todos os substituintes axiais) para que o cloro e o hidrogénio se posicionem anti um em relação ao outro. No cloreto de neomentilo formam-se os dois produtos porque o cloro possui dois átomos de hidrogénio em posição relativa anti. EtO H 3C
H
CH3 H3C
H CH(CH3)2
H
H
Cl
H 3C
H3 C
CH(CH3)2
EtO CH3
R
Cl
CH(CH3)2 Cl
CH3
CH(CH3)2
R
CH(CH3)2 Cl CH3
H
CH3
R
H
H H
CH3H
R
H CH3H
H H
R
Cl
CH(CH3)2
108
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
Comparação E2 versus SN2
Substituição SN2 versus E2 de haletos de alquilo Reacção SN2
Condições favoráveis 1. Baixa temperatura 2. Bases modestas / nucleófilos 3. Bases com pequeno impedimento estereoquímico 4. Reactividade relativa dos grupos alquilo: 1° > 2° > 3° 1. Temperatura mais alta 2. Bases fortes 3. Bases impedidas 4. Reactividade relativa dos grupos alquilo: 3° > 2° > 1°
E2
ataque ao protão E2 Na CH3
OEt
H C CH2 Br H Na
CH3 CH CH2
(E2)
CH3 CH2 CH2 OEt
(SN2)
OEt
SN2
ataque ao carbono
8.3
ALCENOS IMPORTANTES
Preparados por desidrogenação térmica de alcanos. CH3
CH3
etano CH3
CH2
Δ catalisador
CH3
CH2
+
CH2
H2
etileno
catalisador
CH
CH3
CH2
propeno
propano
polimerização
H C
CH2
CH3
n
CH3
CH3 C
CH2
CH3 isobutileno
polimerização
C CH3
polipropileno ou plástico comum
CH2 n
borracha butílica polisobutileno
O etileno forma-se in vivo por acção de uma enzima sobre o ácido carboxílico 1aminociclopropano. O etileno é uma hormona das plantas essencial para o amadurecimento do fruto e também está envolvido na resposta da planta a uma agressão física em que se produz ferida. O etileno é usado hoje para induzir o amadurecimento rápido da fruta.
109
Química Orgânica A enzima
H
H C C
H
H2N CO2H
H
etileno
ácido 1-aminociclopropano-1-carboxílico
As plantas são grandes produtoras de alcenos, muitos deles constituindo fragâncias. De entre eles destacam-se os terpenos:
limoneno
α-pineno
O β-caroteno, responsável por exemplo pela cor das cenouras e da gema dos ovos é também um pigmento muito frequente entre plantas e animais.
β-caroteno
Formação de α- e β- caroteno
110
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
Me
OH
O2C
OH
CH2OPP 2 moles
OPP H
H
licoperseno
(cis e trans ) fitoeno
ζ-caroteno
neurosporeno
licopeno
α-caroteno
β-caroteno
Mecanismo químico da visão
111
Química Orgânica A
Estruturalmente o β-caroteno é um tetraterpeno (C40) que se caracteriza por ser um polieno completamente conjugado. Após a ingestão o β-caroteno sofre ruptura oxidativa entre os átomos C-15 e C-15’ sendo produzidas duas unidades de vitamina A (retinol). Este álcool é posteriormente oxidado a retinal. O retinal na forma cis-11-retinal reage com uma proteína, a opsina, formando-se a rodopsina (pigmento sensível à luz que se localiza na retina). Por absorção de um fotão o cis-11-retinal sofre isomerização a trans-11-retinal cuja estrutura não “encaixa” na proteína sendo libertado. Esta mudança de isomerismo geométrico provoca uma alteração de pH que induz o impulso nervoso que se traduz na visão. O mecanismo que permite a detecção contínua de luz consiste na rápida reciclagem dos compostos envolvidos. O trans-11-retinal é isomerizado a cis-11-retinal o qual reage de novo com a opsina reiniciando-se todo o mecanismo cíclico da visão. β-Caroteno, vitamina A e visão
(oxidação enzimática)
β-caroteno
R
vitamina A (retinol) retinal
centro da molécula
Dupla ligação entre os carbonos 11 e 12
R = CH2OH R = CHO
cis -11
H2N - opsina CH = O
CH = N - opsina
cis-11-retinal
rodopsina energia emitida para o nervo óptico
(isomerização enzimática)
CH = O
(hidrólise)
CH = N - opsina
- opsina trans -11
112
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço Bissíntese e degradação da vitamina D3-1,25-diol 21
24
22
20
18
25 23
12 17 19
11
13
HO
9
10 3
14
15
7
5
4
8
26
16
1 2
27
6
colesterol
seco-esteróides
19
11
hυ
1 10 3
HO
A 7
A
HO
HO
7-de-hidrocolesterol provitamina D3
previtamina D3
24
22
CO2H
cis vitamina D3
23
OH
25
OH
7
HO
OH
ácido calcitrióico
HO
OH
vitamina D3-1,25-diol (espécie activa)
HO
1
HO
1
vitamina D3 colecalciferol
Vitamina D3 - biologicamente inerte requer duas hidroxilações em C-1 e C-25 para ter acção: manter o nível de cálcio no sangue.
113
Química Orgânica A Biossíntese de hormonas esteroidais nos mamíferos
OH O
O
H
FEROMONAS HO
O HO
aldosterona
O androsta-5,16-dien-3-ona
androsta-5,16-dien-3β-ol
MINERALCORTICOIDES
22
OH
OH 20
O
O
O
18
O
HO 17 16
HO
3
5
colesterol
HO
O
HO progesterona
pregnenolona
O
4-ene/5-ene
O OH
O OH
O
O OH
11
HO 17α-OH-progesterona
17α-OH-pregnenolona
OH
OH
21
HO
corticosterona
11-desoxicorticosterona
O OH
18
HO
O cortisol
11-deoxicortisol GLUCOCORTICOIDES
O
O
OH
19
O OH
O O HO
HO
de-hidropiandrosterona
androstenodiona HO
O cortisona
estrona OH
HO
OH
OH
HO
O androstenodiol
estradiol
testosterona
OH
OH
O
HO
H
5α-di-hidrotestoterona
H
5α-androstano-3α,17β-diol
HORMONAS SEXUAIS
114
9
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
ALCINOS
Os alcinos podem ser terminais se a ligação tripla se localizar no extremo da cadeia carbonada ou alcinos internos se a ligação tripla não se localizar no extremo da cadeia carbonada.
H C C H
CH3 C C H
CH3 C C CH3
acetileno
metilacetileno ou propino
dimetilacetileno ou 2-butino
alcinos terminais
9.1 9.1.1
alcino interno
ESTRUTURA DOS ALCINOS Sistema de orbitais
+
σ σ π σ H C πC H
H
+ +
+
-
-
+
C
+
C +
-
+
H
-
semelhante a um cilindro
H
9.1.2
C
C
H
Acidez de alcinos terminais
NH3 (l) R C C H +
pKa~25
Na
NH2
amideto de sódio
R C C
Na
acetileto de sódio
+
NH3 amoníaco pKa~33
A reacção funciona porque o alcino é um ácido mais forte que o amoníaco, ou equivalentemente o amideto é uma base mais forte do que o acetileto. Comparando o acetileno com o etano verifica-se que ao aumento progressivo do carácter s da ligação carbono - carbono (de 25% no etano, 33% no etileno e 50% no acetileno) corresponde um aumento de acidez do protão.
115
Química Orgânica A sp3 (25%s, 75%p)
H
H
H
C
C
H
H
sp2 (33%s, 66%p) H
<
H
sp (50%s, 50%p)
H C
<
C
H
H
C
H
H acetileno
eteno
etano
C
aumento de acidez aumento do carácter s da hibridização
9.2
REACÇÕES DE ALCINOS
9.2.1
Adição
C
A
C
B
A
B
C
C
A
B
A
B
C
C
A
B
Exemplo: + HCl H
C
C
H
CH2
acetileno
CHCl
polimerização
CH2
cloreto de vinilo
CHCl
cloreto de polivinilo PVC
9.2.2
Hidrogenação H2 C
H2
C
C
C
CH2
catalítico
catalítico H
alcino
9.2.2.1 Hidrogenação catalítica – cis-alcenos a) hidrogenação catalítica — cis-alcenos
C
C
CH3
H
H
CH2
alcano
H
alceno
CH3
n
H
H C
C
Pd/BaSO4 CH3 CH3 (catalisador envenenado) adição estereoespecífica syn
116
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
9.2.2.2 Redução de alcinos a trans alcenos Li CH3 C C CH3
Li (ou Na) NH3
H
CH3 C C CH3 H
Li
CH3 C C CH3 H H
CH3 C C CH3 H
H
adição anti composto trans
9.2.3
Oxidação de alcinos
9.2.3.1 Pelo ozono O O O ozono CH3 C
O CH3 C
C C2H5
2-pentino
+
O H
ácido acético
O HO
C C2H5
ácido propanóico
9.2.3.2 Pelo permanganato de potássio KMnO4
C4H9 C C H 1-hexino
C4H9
O C OH
+
ácido pentanóico
O HO C O H ácido carbónico
CO2 + H2O
9.3
SÍNTESE DE ALCINOS
H C C H
Na / NH3
H C C
Br CH3
H C C CH3 propino
etino
Br brometo de ciclo-hexano
H C C
9.4
ALCINOS IMPORTANTES
O poli-acetileno é um bom condutor da electricidade quando dopado com iodo.
Química Orgânica A
H
C
C
H
CH
CH
117
n
conduz electricidade quando dopado com iodo em pequenas quantidades
poli-acetileno
Os poli-alcinos que são condutores da electricidade chamam-se metais orgânicos e é outra forma de polímeros de carbono como a grafite e o diamante. C
C
C
C
poli-alcino
C
C
118
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
10 BENZENO O benzeno é um líquido incolor, p.e. 80°C, p.f. 5°C, isolado por Michael Faraday em 1825 e mais tarde sintetizado por descarboxilação de ácido benzóico. A sua estrutura é o exemplo clássico de uma molécula estabilizada por ressonância. A determinação da estrutura do benzeno é uma tarefa difícil que só foi conseguida passados 47 após a sua descoberta. Os factos experimentais conhecidos antes da estrutura ter sido determinada eram os seguintes: 1. A fórmula molecular é C6H6. Falta-lhe 8 átomos de hidrogénio para que seja o alcano de seis átomos de carbono o n-hexano (C6H14). Deve portanto ter uma combinação de ligações simples, triplas e de anéis. 2. O benzeno não é hidrogenado com H2 sobre um catalizador de platina, debaixo das condições normais em que há hidrogenação de alcenos ou de alcinos. 3. Sob pressão elevada, o benzeno é hidrogenado e absorve 3 equivalentes de hidrogénio, produzindo um composto conhecido, o ciclo-hexano (C6H12). 4. Não é oxidado por KMnO4 a quente. 5. Não reage com bromo, ao contrário dos alcenos e os alcinos que reagem muito rapidamente. Quando o benzeno reage com um ácido de Lewis, tal como FeBr3, ocorre uma reacção de substituição produzindo-se bromobenzeno (C6H5—Br) e libertando-se HBr. 6. Bromoção posterior do benzeno usando FeBr3 produz uma mistura de 3 dibromobenzene isoméricos (C6H4Br2), que hoje sabemos serem os isómeros orto, meta e para. Br
Br
Br Br
Br
orto
meta
Br
para
1872 - August Kebulé propôs a fórmula do hexágono regular para o benzeno. nuvem de electrões π aromaticidade conceito de ressonância
6 e- - sexteto aromático
119
Química Orgânica A
.......
híbridos de ressonância designados por fórmulas de Kekulé
Existem ainda 3 informações adicionais importantes sobre a estrutura do benzeno: 1. Análise por raios-X do benzeno revela que tem um plano de simetria e um eixo de simetria hexagonal. As 6 ligações carbono-carbono são todas idênticas com o comprimento de 1,39 Å. Uma ligação simples carbono-carbono mede 1,54 Å e uma ligação dupla nos alcenos 1,34 Å. No benzeno as 6 ligações carbono-hidrogénio também são todas iguais e medem 1,09 Å. C6 (eixo de simetria hexagonal) C C
1,39 A
C H
1,09 A
2. Por ressonância magnética nuclear protónica (1H RMN) verifica-se que os 6 átomos de hidrogénio são todos electronicamente equivalente, mas possuem uma vizinhança electrónica muito diferente da dos hidrogénios ligados a uma ligação dupla. O benzeno possui uma corrente no anel que é única nos compostos aromáticos e não há qualquer evidência para que existam duas formas de benzeno em equilíbrio. 3. O calor de hidrogenação do 1,3,5-ciclo-hexatrieno deveria ser 3 x (-28,6) = -85,8 kcal/mol mas o calor de hidrogenação do benzeno é de apenas -49,8 kcal/mol. A diferença de 36 kcal/mole corresponde à estabilidade adicional do benzeno em relação ao 1,3,5-ciclo-hexatrieno. Portanto no benzeno temos 6 electrões que constituem o sexteto aromático . A deslocação dos 6 electrões numa orbital molecular, dá origem à distribuição característica de “doughnut” e à aromaticidade. Assim a ordem da ligação C-C no benzeno situa-se entre 1 e 2, traduzindo uma deslocalização electrónica. 10.1 OUTROS COMPOSTOS AROMÁTICOS
Baseado em cálculos de orbitais moleculares, o químico teórico Erich Hückel enunciou a regra de Hückel que diz que: “compostos planares, cíclicos, contendo 4n + 2 e- π, num sistema contínuo, são aromáticos se n é um inteiro positivo.”
120
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço nº electrões π
aromático
n=1
4x1+2=6π
sexteto aromático benzeno
n=2
4 x 2 + 2 = 10 π
10 electrões anulares planar
n=3
4 x 3 + 2 = 14 π
14 electrões anulares planar
4 x 4 + 2 = 18 π
18 electrões anulares planar
n=4
Para n fraccionários, as moléculas comportam-se como alcenos.
n=1/2
4 x 1/2 + 2 = 4 π
ciclobutadieno
n=3/2
4 x 3/2 + 2 = 8 π
ciclo-octatetraeno
comportam-se como alcenos
Existem alguns sistemas não neutros que também são aromáticos: 6e- π
2e- π
catião ciclopropenilo
anião do ciclopentadieno
6e- π
catião do ciclo-heptratrienilo
10.2 REACÇÕES DE COMPOSTOS AROMÁTICOS 10.2.1 Substituição electrófila aromática
A reacção mais característica dos compostos aromáticos é a substituição por uma grande variedade de reagentes electrófilos E
.
121
Química Orgânica A
halogenação
nitração
sulfonação
Br (ou Cl) bromo ou clorobenzeno O N O
nitrobenzeno
O S OH O
ácido benzenossulfónico
R
alquilbenzeno
alquilação
benzeno
O C acilação
R
acilbenzeno
10.2.1.1 Mecanismo da substituição electrófila aromática Recapitulando para os alcenos:
C C alceno
Substituição electrófila:
δ+ δ E A
electrófilo
C C E carbocatião intermediário
A
A C C E produto de adição
122
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
E + H
δ+ δE A
H
H H
H A
E A
H E
H E
H
E
H
A
Carbocatião altamente estabilizado por ressonância
E +
H A
H
intermediário HE A H
1
2 ΔG
Os custos de ΔG‡ são essencialmente de perder a aromaticidade dos estados de transição 1 e 2.
ΔG‡ benzeno + A-E E
ΔG‡ energia de act. do arénio
+ AH
r
coordenada reaccional
10.2.1.2 Halogenação Cl
Cl
+
FeCl3
δ+ Cl
Cl
δFeCl3
complexo Cl2 / FeCl3
123
Química Orgânica A
Cl Cl FeCl3 δδ+
H
-FeCl4
benzeno
Cl
Cl FeCl3
Cl
catião arénio
clorobenzeno
Exemplo: Cl 2Cl2 FeCl3 Cl p-diclorobenzeno usado como insecticida
Cl
Cl Cl C Cl C
O Cl3C C H
Cl2
H
AlCl3
Cl
Cl DDT
degrada-se Cl
C C
Cl
Cl
diclorodifeniltricloroetano usado pela 1ª vez em1939 e um dos insecticidas mais baratos alguma vez sintetisado. Encontra-se ainda em uso.
Cl DDE
inibe o enzima que facilita a acumulação de Ca2+ na formação da casca dos ovos
ácido 2,4-diclorofenoxiacético (2,4-D) é um dos herbicidas mais conhecidos O O C O Na 1. Cl CH2 2. H
O CH2 C
O Na vários
Cl
passos Cl
sal de sódio do 2,4-diclorofenol
Cl
OH
Cl 2,4-D ácido 2,4-diclorofenóxiacético
Durante a guerra do Vietnam o 2,4-D e o relacionado 2,4,5-T (ácido 2,4,5-triclorofenóxiacético) foram combinados e usados em larga escala como esfoliante, sob o nome de Agente Laranja. Descobriu-se subsequentemente que se formavam quantidades vestigiais de 2,3,7,8tetraclorodioxina, durante a síntese.
124
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
As dioxinas são muito tóxicas para o ser humano e foram já implicadas em vários problemas de saúde graves encontrados entre os soldados americanos que combateram no Vietnam. O
Cl2 AlCl3
Cl 2 3
Cl 1
OH C CH2 O
Na
O
Cl
Cl
6 5 Na OH 4 Cl Cl
Cl
Cl Cl
Cl
2,4,5-T
1,2,4,5-tetraclorobenzeno
Cl
8
Cl
7
9
10 O
1
6
O 5
4
2 Cl 3 Cl
2,3,7,8-tetraclorodioxina
10.2.1.3 Nitração O grupo nitro (—NO2) pode ser introduzido no anel aromático por um processo que se designa por nitração, que envolve ácidos nítrico e sulfúrico concentrados. NO2
HNO3 (NO2)
NH2
H2SO4 benzeno
H O
O S
O
H O
anilina
nitrobenzeno
O
H O N O
H O H O N O
+
O
O
-H2O NO2
S H O
O ião nitrónio
ácido nítrico
HSO4 H NO2 H
H NO2 H
NO2 -H2SO4 nitrobenzeno
125
Química Orgânica A
Aplicações Umas das propriedades mais importantes do grupo nitro (NO2) são as propriedades explosivas. CH3
CH3 HNO3
O2N
NO2
H2SO4 NO2 tolueno ou metilbenzeno
trinitrotolueno TNT explosivo
CH2 O NO2 CH O NO2 CH2 O NO2
O O O2N
CH2O NO2 O O O NO2
trinitroglicerina explosivo
algodão pólvora (celulose nitrada, fórmula parcial)
SEMTEX é um produto usado no fabrico de muitas bombas — é um explosivo plástico que consiste numa mistura de RDX e PETN. NO2 N N
O2N
H CH2 O NO2 O2N O C C CH2 O NO2 H CH2 O NO2
N NO 2
1,3,5 - trinitro - 1,3,5 - triazaciclo-hexano RDX
PETN
10.2.1.4 Sulfonação O S O H O
SO3 H2SO4
ácido benzenossulfónico
benzeno
Electrófilo : SO3 Anião H H
O
O S
H O
trióxido de enxofre
O S O O H
O S O O
H3O
+
H O S O O
126
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
Aplicações dos compostos aromáticos sulfonados Os sabões têm sido usados durante séculos para limpeza de roupas, da pele, de utensílios de cozinha, de casa, etc. Um sabão é um sal (Na+ / K+) onde R é uma cadeia longa: O R C O
Na
.
Os sabões são surfactantes (agentes activos sobre a superfície). Os surfactantes modernos são do tipo R
R CH CH2
R CH CH3
R = cadeia longa
SO3Na
H
SO3 H2SO4
R CH CH3
SO3H
NaOH
R CH CH3
SO3 Na
alquilbenzenossulfonato de sódio (SYNDET)
Portanto os detergentes modernos resolvem dois problemas que os sabões têm: 1) os compostos são neutros em solução aquosa e não hidrolizam para criar soluções ácidas irritantes 2) os seus sais metálicos que se formam em águas duras não precipitam, e mantêm-se em solução. Os detergentes que se compram nas lojas contêm ainda uma longa série de aditivos: — fosfatos e silicatos para complexação dos catiões de águas duras — amaciadores — enzimas que degradam as nódoas de proteínas — fragrâncias — agentes anti-estáticos — branqueadores ópticos. 10.2.1.5 Alquilação de Friedel-Crafts Descoberta em 1877 por um químico francês Charles Friedel e por um químico americano James Mason Crafts. Electrófilo : R
carbocatião Cl
R
Cl
cloreto de alquilo
Al
Cl
δ+ R
Cl
δAlCl3
R
AlCl4
Cl complexo molecular
carbocatião
127
Química Orgânica A
H
δ+ δR Cl AlCl3
AlCl3
RCl
R
H
AlCl4
H
R
R
AlCl4
R ClAlCl3 -HCl -AlCl3
H
alquilbenzeno
O carbocatião para alquilar o benzeno pode também ser obtido por outras reacções já estudadas: H R CH CH2 HF H R CH CH3 OH
CH R CH3
C6H6 R CH CH3
-H2O
H
Podemos portanto efectuar a ciclo-hexilação do benzeno:
H
HF
H OH
H3PO4
AlCl3 Cl
AlCl3
ciclo-hexilbenzeno ou fenilciclo-hexano
carbocatião ciclo-hexilo comum
10.2.1.6 Acilação de Friedel-Crafts
+ benzene
O R C Cl cloreto de acilo
R=CH3 - acetofenona
AlCl3
O C
R
acilbenzeno
+ HCl
128
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço O δR C Cl AlCl3 δ+
O R C Cl + AlCl3
O C H
O
-AlCl4
R C
R C O
AlCl4 H
R
O C
R
O C
-HCl -AlCl3
H
H
R
H
Podemos reduzir o carbonilo pela redução de Clemmensen: O H
Zn / Hg
H
HCl (conc)
Processo alternativo à alquilação de Friedel-Crafts para produzir o etilbenzeno: O
H CH3 Zn/Hg
H C
CH3
HCl acetofenona
etilbenzeno
10.2.1.7 Efeitos de substituintes Efeito orto-para: O substituinte estabiliza o carbocatião formado por entrada do electrófilo em posição orto ou para
129
Química Orgânica A orto
COMPARAÇÃO H
H
H
H
N
H
H
N
N H
E
H
E
E
etc.
meta H
N
H
H
H N
MAIS INSTÁVEL POR NÃO SER ESTABILIZADO POR RESSONÂNCIA! E H
E
para H
H
H
N
H
H
N
N
H etc.
E
E
H
EH
Conclusão: o grupo amino é um grupo director orto-para, assim como o são todos os substituintes activadores com capacidade de doar electrões. 10.2.2 Halogénios
Do mesmo modo actuam os halogénios — aqui embora os halogénios sejam atractores via ligação sigma (efeito indutivo), entram em ressonância via sistema π: Exemplo para o cloro: Cl
Cl
H E
H E
Cl
etc.
Cl etc.
H
E
H
E
130
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
Efeito meta (estabiliza o carbocatião formado por entrada do electrófilo em posição meta) O δC δ+ H O
C
H
O
C
H
O
H
E
C
δO
H H
E
H C δ+ H
E
E instável duas cargas positivas muito próximas
O
C
H
O
C
H
C
H
H
O
O
C
H
C
H
H
H
E
H E
E
C
H
E
O
O
E
E
O δ+ H C
O
H E
C
H
H E
instável duas cargas positivas muito próximas
O catião arénio resultante do ataque meta é o menos desestabilizado. 10.2.3 Aplicações industriais de compostos aromáticos
Duas reacções de oxidação do p-cresol são usadas para produzir um produto industrialmente importante o DACRON que é um poliéster muito popular. O Dacron foi primeiramente preparado como uma alternativa à fibra do algodão e é manufacturado em grandes quantidades por todo o mundo. É um polímero, um poliéster e forma-se por reacção de esterificação entre o ácido tereftálico e o etilenoglicol. O
O C
+
C
HO ácido tereftálico
OH
OH HO CH2 CH2
-H2O
O C
O C O
CH2CH2O
1,2-di-hidroxietano etilenoglicol
n DACRON
131
Química Orgânica A
O2 CH3
HO2C
CH3
CO2H
catalisador
p-cresol
ácido tereftálico
132
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
11 COMPOSTOS DE CARBONILO Compostos carbonílicos são compostos que contêm o grupo funcional carbonilo que se pode considerar como um dos mais importantes da química orgânica:
C
O
Podemos ter: R'' C O R' cetonas
aldeídos
R' O C O R
H O C O R
R
H C O R
ácidos carboxílicos
ésteres
R' N C O R amidas
A polarização do grupo carbonilo resulta da diferença de electronegatividades dos átomos de oxigénio e de carbono. electrófilos atacam Oδ
-
Cδ
+
O C
nucleófilos atacam
A ligação dupla C=O resulta da coexistência de uma ligação pi, π e de uma ligação sigma, σ. ligação pi, π C
O
C
O
ligação sigma, σ
11.1 REACÇÕES DE COMPOSTOS DE CARBONILO 11.1.1 Adição nucleófila
133
Química Orgânica A
O Nu
C
O
H
C Nu
O H C Nu
intermediário tetraédrico
Nu- = nucleófilo
O nucleófilo pode ser
H ROH H2O RNH2
ião hidreto álcool água amina
A adição nucleófila é a reacção mais características dos compostos carbonílicos. Protonação O oxigénio do grupo carbonilo tem uma elevada densidade electrónica e portanto é susceptível à protonação.
C O
H
C O H
C O H
Nu
Nu C
O H
Portanto a protonação através da catalálise ácido é usada por vezes para aumentar a susceptibilidade do grupo carbonilo ao ataque por nucleófilos. O R C X + Y
O R C X Y intermediário tetraédrico
O R C Y + X
134
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
X = Cl O
O R
C
R' OH
Cl
R
-Cl
cloreto de acilo
C
H2O
OR'
hidrólise
éster
alcoólise O
R' NH2 R
C
N
O
R'
-Cl
R
H amida
aminólise hidrólise
H2O
C
OR'
O
H
HOH O O R
C
hidrólise
R
OH
C O
ácido carboxílico
N
R'
H H
Susceptibilidade do carbonilo ao ataque nucleófilo segue a seguinte ordem:
O R C Cl
>>
O R C OR'
>
O O R C NHR' >> R C OH
11.1.2 Equilíbrio ceto-enólico
Este equilíbrio é de uma enorme importância e é responsável pela reactividade existente no átomo de carbono α. O α C C H
- BH
B
O C C
carbanião hidrogénios ácidos
O C C
enolato
135
Química Orgânica A 11.1.3 Tautomerismo de carbonilos / reacção com electrófilos O C C
O -H C C H forma ceto
E O C C E
OH C C
+H
forma enólica ou enol
O C C anião enolato
tautómeros
A forma cetónica e a forma enólica da maior parte de compostos carbonílicos existe em equilíbrio, mas a forma cetónica em geral predomina. O
OH
O H
ceto > 99% O
Br
Br-Br -HBr enol < 1%
H
O H
OH H H
fenol > 99,9 %
E
E
não se detecta (ceto)
O
O H
O
O
H ceto 24%
enol 76%
TAUTOMERISMO - o fenómeno de tautomerismo é o equilíbrio que se estabelece entre as formas enólicas e cetónicas de um composto e pode ocorrer espontaneamente quer por catálise ácida, quer por catálise básica. O enol e a cetona / aldeído são isómeros constitucionais que se chamam tautómeros. O processo de enolização é a conversão da forma cetónica na forma enólica. O processo de cetonização é a conversão do enol na forma cetónica. 11.1.4 Adição a carbonilos
11.1.4.1 Redução de carbonilos / Adição de hidreto
136
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
Os compostos carbonílicos são reduzidos a álcoois por NaBH4, boro-hidreto de sódio, um dos compostos da família dos hidretos metálicos. Um hidreto é H- é um átomo de hidrogénio a que se adicionou mais um electrão, ficando com a configuração electrónica do hélio - é um nucleófilo muito poderoso.
Na H H B H H
C O
C
O BH3 Na H
boro-hidreto de sódio
carbonilo
H C O R
H H C OH H álcool primário
NaBH4
aldeído
R C O
R R C OH H
NaBH4
R cetona
álcool secundário
CN
11.1.4.2 Reacção do grupo carbonilo com cianeto H
C N C O
CH3 aldeido
H2O pH = 10
O H C H álcool
H2O
H
O C
CH3 C N
H H CN
O H C
CH3 C N
H2O
ciano-hidrina
H3O
H αO H C CH3 C O O H α-hidróxi ácido ácido α-hidróxipropiónico
137
Química Orgânica A
11.1.4.3 Reacções gerais do ataque de nucleófilos de azoto ao grupo carbonilo 11.1.4.3.1 Adição de aminas
C O
H O H
O
H2N R
C N R
-H2O
C
H
C N R
N H R
H
amino-álcool
imina R= alquilo ou arilo
H2N OH
OH C N
hidroxilamina óxima
H O H2N N C NH2
C O
O HN C NH2 C N
semicarbazida
semicarbazona
HN C N
O2 N
2,4-dinitrofenil-hidrazona NO2
H2N N H
2,4-dinitrofenil-hidrazina DNP
11.1.4.4 Adição de álcoois
ROH
+ ROH
C O H
H
H O H C O R
C
O R
hemi-acetal
Frequentemente os dois grupos OH pertencem à mesma molécula.
O R C O R acetal
138
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço OH C O
+
HO HO
C
H
O
O
C O acetal
HO
11.1.4.5 Adição de carbaniões
C O
δ− δ+ R Mg Br
+
Éter
H3O
O Mg Br
OH C
C
R
R
álcool
brometo de alcóximagnésio
Exemplo:
C6H5
O C CH3 +
acetofenona
C6H5
O C CH3 +
δ− δ+ CH3 Mg Br
OH 2 C6H5 C CH3 3 CH31
brometo de metilmagnésio
2-fenil-2-propanol
δ− δ+ CH3 Li
acetofenona
OH 2 1 C6H5 C CH3 3 CH3
metil-lítio
2-fenil-2-propanol
11.2 PREPARAÇÃO DE COMPOSTOS DE CARBONILO 11.2.1 Aldeídos a partir de cloretos de acilo
R
O C
OH
Cl
O S
Cl
R
O C
O
O S
Cl Cl
H R
O C
+ O S O + HCl Cl
cloreto de acilo
139
Química Orgânica A
O S
O R C O H
H Al OtBu tBuO OtBu Li
Cl Cl cloreto de tionilo
O
R
Cl
H
O R C H
O C
R C
Cl
H cloreto de acilo
ácido carboxílico
aldeído
11.2.2 Cetonas a partir de cloretos de acilo
O R C
δ − δ+ R' Mg Br
O R C R'
Cl cloreto de acilo
R'
H
OH R C R' R' álcool
Mg Br
R'
CuLi R' organocuprato é um nucleófilo mais fraco
O R C R' cetona
11.3 COMPOSTOS CARBONÍLICOS IMPORTANTES
O formaldeído obtém-se de oxidação do metanol usado e é na produção de resinas de ureiaformaldeído (polímeros). A uma solução aquosa a 37% de formaldeído dá-se o nome de formalina. O C H
H
formaldeído gás p. e. -21°C
O acetaldeído obtém-se por oxidação do etanol: O oxidação CH3
H
acetaldeído
CH3
CH2
OH
140
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
O benzaldeído com aroma da amêndoa amarga e a vanilina com o aroma da baunilha, têm ambos um grupo carbonilo em conjugação com um anel benzénico. O
O
H
H HO OCH3 vanilina
benzaldeído
A feromona de alarme da formiga corta-folhas:
O feromona de alarme da formiga corta-folhas
A muscona usada em perfumaria como fixativo de perfumes para tornar o cheiro mais duradouro e que é excretada pelo boi almiscarado. O
muscona
E várias hormonas :
141
Química Orgânica A H O
O
C
C
H
H
O
O progesterona (hormona excretada durante a gravidez e que suprima a ovulação)
CH3
noretisterona (esteróide sintético da pílula)
CH3 N
H O
C
C
H
O pílula anticoncepcional da manhã seguinte
11.4 AMIDAS IMPORTANTES
142
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço O 1C
2
H
O
NH2
H2N (CH2)5CO2H
6
3
ácido ε-amino capróico
H ε
H HO
O
N
5
4
OH
C α
δ
N
H
β
γ
ε - caprolactama
6 átomos de carbono O N
(CH2)5
O
C
N
H
(CH2)5
C n
H Nylon -6
O HO
C
O (CH2) 4
C
OH
+
H 2N
6 átomos de carbono
N H
H N
6 átomos de carbono
O C
C O
N H
Nylon -6.6
(CH2) 6
NH2
6 átomos de carbono O H N C
C O
6 átomos de carbono
143
Química Orgânica A
O C
O NH
C
S
H N
S
R
CH2
β - Lactamas
N
N O
O
C
C O Penicilina G
O
O
H
cefalosporina R' = CH 3R = C6 H5
O
R'
CH
NH O NH O ácido barbitúrico
NH2
O
H
144
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
12 ÁCIDOS CARBOXÍLICOS 12.1 ESTRUTURA DOS ÁCIDOS CARBOXÍLICOS
Os ácidos carboxílicos representam uma vasta família de compostos orgânicos que contêm o grupo funcional carboxílico. O R C O H grupo carboxilo
O ião carboxilato forma-se a partir do ácido carboxílico por perda de um protão: O R C O H
O R C O
O R C O
H
+
ião carboxilato
De seguida estão representados alguns exemplos de ácidos carboxílicos com os valores respectivos de pKa. CH3CO2H
ClCH2CO2H
FCH2CO2H
ácido cloroacético
ácido acético pKa=4,8
pKa=2,6
OH
OH O2N
Cl ácido benzóico pKa=4,2
pKa=0,7 O
O OH
ácido tricloroacético
ácido fluoracético
pKa=2,8 O
Cl3CCO2H
ácido p-clorobenzóico
ácido p-nitrobenzóico
pKa=4,0
pKa=3,4
Os áidos carboxílicos estabelecem pontes de hidrogénio e formam dímeros: O R C O H
H O O
C R
145
Química Orgânica A H O R C O H
H O H O H
12.2 REACÇÕES DE ÁCIDOS CARBOXÍLICOS 12.2.1 Redução de ácidos carboxílicos
O R C O H
LiAlH4
H R C H O H álcool primário
O
C
O
H
H
H H O C
LiAlH4
12.2.2 Bromação de ácidos alcanóicos (reacção geral de compostos carbonílicos)
R'
R O C C Br Br
1) Br2, P
R O C C H OH
R' 2) H2O
R'
R O C C Br OH
α-bromo ácido
12.3 ÁCIDOS CARBOXÍLICOS IMPORTANTES
O ácido acético é um constituinte do vinagre e está envolvido na produção de acetatos, como por exemplo o acetato de celulose que é um derivado que permite fabricar filmes transparentes, nomeadamente películas de filme para a indústria cinematográfica. O ácido acetilsalicílico obtido por reacção do ácido salicílico com o anidrido acético é usado como fármaco nos comprimidos de aspirina. O C O
H
C OH O ácido salicílico
H3C
O C O
CH3
anidrido acético
O O C CH3 C OH O ácido acetilsalicílico ASPIRINA
146
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
13 FENÓIS OH
SH
OH
OH Cl CH3
Cl tiofenol
fenol
2,4-diclorofenol
cresóis orto, meta, para
13.1 ACIDEZ
Uma das propriedades mais importantes dos fenóis é a sua acidez. O H
O +
Ka = 1x10-10
H
pKa = -logKa = 10
Comparando com o ciclo-hexanol: OH
O +
ciclo-hexanol
H
Ka = 1x10-17 pKa = 17
base conjugada
A deslocalização da carga negativa faz com que o fenol seja um ácido mais forte que o ciclohexanol. Podemos ver que o anião fenóxido apresenta várias estruturas de ressonância, em que surge a sua estrutura tautomérica ceto. O
O etc.
É possível modificar a acidez de fenóis pelo tipo de substituintes introduzidos para aumentar ou diminuir a estabilidade relativa do anião fenóxido.
147
Química Orgânica A OH
OH
OH
OH Cl
OH
OH
NO2
CH3
O2N
NO2
NO2 pKa
10
8,1
OH O N
O O
-H
O N
NO2 0,4
8,3
7,2
10,2
O O
O N
O
o-nitrofenóxido
O efeito indutivo do grupo NO2 é electro-atractor (devido ao efeito de electronegatividade da carga positiva no N) estabiliza o anião. 13.2 SUBSTITUIÇÃO ELECTRÓFILA AROMÁTICA DE FENÓIS
O grupo OH afecta significativamente o comportamento do anel aromático. Vimos já que o grupo OH é director orto-para para a substituição electrófila aromática. É também um activador muito forte, dando origem à substituição de fenóis, que resulta em polifenóis. Por exemplo, nitração de fenol dá o derivado 2,4,6-trinitrofenol. OH
OH nitração
O2N
NO2
NO2 2,4,6-trinitrofenol
A monossubstituição do fenol consegue-se transformando-o no acetóxibenzeno (também conhecido por acetato de fenilo) por acetilação com cloreto de acetilo.
148
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
OH
O
O C
CH3
CH3COCl
O
CH3
Br2
Br p-bromoacetóxibenzeno
Br2
1. NaOH 2. HCl
OH Br
O C
Br OH Br Br p-bromofenol
Ao usarmos o grupo acetóxido que tem um efeito electroatractor moderado, vamos estabelecer uma competição com o núcleo benzénico, tal como se vê na estrutura de ressonância: O O C CH3
O O C CH3
Portanto os electrões do oxigénio estão menos disponíveis para a substituição do que no caso do fenol. 13.3 ALQUILAÇÃO DE FENÓIS — SÍNTESE DE WILLIAMSON
OH
O NaOH
Na CH3 I SN2
O CH3
anisole +HI SN2
A técnica é usada para proteger o grupo fenol. 13.4 SÍNTESE DE COMPOSTOS FENÓLICOS
A síntese laboratorial mais usada é a diazotização.
149
Química Orgânica A
NO2 HNO3
N N
NH2
H2O
HNO2
H2 / Pt
OH
Δ
H2SO4
sal de diazónio
Mecanismo de formação do sal de diazónio a partir da anilina:
H H N
O
H O H N N
N
OH H N N
N
N
-H2O ião diazónio
13.5 FENÓIS IMPORTANTES
O fenol e o seu sal de sódio são usados como desinfectantes em usos domésticos e hospitalares. Os cresóis são preservantes de postes de madeira colocados na terra. Outros fenóis importantes são: OH
OH
OH COOCH3
CH2 CH NH2 COOH
OCH3
H
tirosina amino-ácido essencial para o ser humano
C
O
vanilina aroma da baunilha
salicilato de metilo
OH OH OCH3
HO HO
HO
CH2 CH CH2
eugenol
estradiol
antisséptico
hormona sexual feminina
OH C CH2 H NH CH3
epinefrina neurotransmissor de mamíferos
150
Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço
CH3O
CH3 O CH2 N C (CH2)4CHCH C CH3 H H
HO capsaicina ingrediente activo da pimenta picante usado na alimentação, agente tópico para a artrite
14 BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA 1- Johnson, A. W. “Invitation to Organic Chemistry”, Jones and Bartlett Publishers, Sudbury, 1999. 2- Clayden, J.; Greeves, N.; Warren, S.; Wothers, P. “Organic Chemistry”, University Press, Oxford, 2001. 3- Vollhard, K. P. C. “Organic Chemistry”, W. H. Freemahn and Company, New York, 1994.
FIM
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