Sebenta de Quimica Orgânica

May 16, 2019 | Author: Rita Gameiro | Category: Molecular Orbital, Chemical Bond, Atomic Nucleus, Atoms, Electric Charge
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Faculdade de Ciências e Tecnologia Universidade Nova de Lisboa Departamento de Química

Química Orgânica A

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira e Ana Lourenço

Monte de Caparica 2011

Química Orgânica A

1

Índice Estrutura e ligação química nas moléculas orgânicas .....................................................................5 1.1 A ligação química............................................................................................................5 1.2 Ligações puramente iónicas ............................................................................................7 1.3 Ligações covalentes.........................................................................................................9 1.4 Ligações covalentes polares ............................................................................................9 1.5 A forma geométrica dos compostos orgânicos..............................................................10 1.5.1 Orbitais atómicas ...................................................................................................10 1.5.2 Forma das orbitais .................................................................................................11 1.5.3 Orbitais moleculares..............................................................................................12 1.5.4 Hibridação molecular ............................................................................................13 2 Grupos funcionais..................................................................................................................16 3 Ácidos e bases .......................................................................................................................23 4 Alcanos ..................................................................................................................................28 4.1 Isomerismo ....................................................................................................................29 4.1.1 Isómeros constitucionais .......................................................................................30 4.1.2 Estereoisómeros - isómeros conformacionais (confórmeros) ...............................31 4.2 Nomenclatura dos alcanos .............................................................................................32 4.2.1 Alcanos não ramificados .......................................................................................32 4.2.2 Alcanos ramificados ..............................................................................................33 4.2.3 Propriedades dos alcanos.......................................................................................33 4.2.4 Fontes naturais de alcanos .....................................................................................34 4.3 Ciclo-alcanos .................................................................................................................35 4.3.1 Isomerismo cis-trans em ciclo-alcanos .................................................................35 4.3.2 Alcanos policíclicos...............................................................................................35 4.4 Conformações do ciclo-hexano .....................................................................................36 4.4.1 cis-trans..................................................................................................................37 4.5 Reacções características de alcanos e ciclo-alcanos......................................................37 4.5.1 Reacção radicalares ...............................................................................................37 4.5.1.1 Halogenação de alcanos ....................................................................................37 4.5.1.2 Cloração.............................................................................................................38 4.5.1.3 Estabilidade dos radicais ...................................................................................39 4.5.1.4 Combustão (oxidação) de alcanos .....................................................................41 4.5.1.5 O problema da destruição da camada de ozono (O3) – uma reacção radicalar.42 4.5.1.6 O problema dos CFCs.......................................................................................42 5 Halo-alcanos ou haletos de alquilo........................................................................................43 5.1 Propriedades físicas .......................................................................................................43 5.1.1 Ligação ..................................................................................................................43 5.1.2 Outras propriedades...............................................................................................45 5.2 Enantiomeria..................................................................................................................45 5.2.1 Regras de Cahn-Ingold-Prelog ..............................................................................46 5.2.1.1 Alguns isótopos usados em química orgânica...................................................49 5.3 Reacções de substituição com halo-alcanos ou haletos de alquilo................................51 5.3.1 Mecanismo da Reacção SN2 .................................................................................51 5.3.1.1 Velocidade de uma reacção ...............................................................................53 5.3.1.2 Energética da reacção ........................................................................................53 5.3.1.3 Estereoquímica do mecanismo SN2 ..................................................................53 5.3.1.4 Reactividade do grupo alquilo...........................................................................54 5.3.1.5 Efeito do grupo de saída ....................................................................................55

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Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

5.3.1.6 Efeito dos nucleófilos ....................................................................................... 56 5.3.1.7 Efeito do solvente ............................................................................................. 57 5.3.1.8 Reacção SN2 de um nucleófilo com um haleto de alquilo ............................... 57 5.3.1.9 Complicações com substituições nucleófilas de haletos de alquilo terciários.. 57 5.3.2 Mecanismo da reacção SN1.................................................................................. 59 5.3.2.1 Energética ......................................................................................................... 60 5.3.2.2 Estereoquímica ................................................................................................. 61 5.3.2.3 Efeito do grupo de saída ................................................................................... 61 5.3.2.4 Força da ligação do grupo de saída ao átomo de carbono ................................ 61 5.3.2.5 Efeito do solvente ............................................................................................. 62 5.3.2.6 Efeito do substituinte alquilo ligado ao átomo de Carbono que sofre substituição ....................................................................................................................... 62 5.3.2.7 Comparação entre os mecanismos SN1 e SN2................................................. 62 5.4 Outras reacções de halo-alcanos................................................................................... 62 5.4.1 Síntese de compostos organometálicos ................................................................ 62 5.4.2 Reagentes de Grignard (organomagnesianos) ...................................................... 63 5.4.3 Organocupratos de lítio ........................................................................................ 64 5.4.3.1 Alcanos a partir de organocupratos .................................................................. 64 5.5 Halo-alcanos importantes ............................................................................................. 64 5.5.1 Halo-alcanos como anestésicos ............................................................................ 64 5.5.2 Halo-alcanos como solventes ............................................................................... 64 5.5.3 Halo-alcanos usados em sistemas de refrigeração................................................ 65 5.5.4 Retardadores de chama ......................................................................................... 66 5.5.5 Insecticidas ........................................................................................................... 66 5.5.6 Compostos medicinais .......................................................................................... 66 6 Alcoóis.................................................................................................................................. 67 6.1 Propriedades dos alcoóis .............................................................................................. 68 6.1.1 Pontes de hidrogénio............................................................................................. 68 6.1.2 Acidez dos álcoois ................................................................................................ 69 6.1.2.1 Metanol (álcool metílico) ................................................................................. 70 6.1.2.2 t-butanol (álcool ter-butílico) ........................................................................... 70 6.1.2.3 2,2,2-trifluoroetanol.......................................................................................... 70 6.1.2.4 Alcóxidos.......................................................................................................... 71 6.2 Reacções dos alcoóis .................................................................................................... 71 6.2.1 Conversão de álcoois em haletos de alquilo ......................................................... 71 6.2.2 Reacções de álcoois com haletos de hidrogénio................................................... 72 6.2.2.1 Teste de Lucas .................................................................................................. 75 6.2.2.2 Estereoquímica ................................................................................................. 75 6.2.3 Conversão estereospecífica de alcoóis em halo-alcanos ...................................... 76 6.2.3.1 Inversão de configuração.................................................................................. 76 6.2.3.2 Retenção de configuração................................................................................. 77 6.2.4 Oxidação de alcoóis.............................................................................................. 78 6.3 Alcoóis importantes ...................................................................................................... 81 6.3.1 Metanol ................................................................................................................. 81 6.3.2 Etanol.................................................................................................................... 81 6.3.3 Isopropanol ........................................................................................................... 82 6.3.4 Etilenoglicol ou 1,2-etanodiol .............................................................................. 82 6.3.5 Glicerol ................................................................................................................. 82 7 Éteres .................................................................................................................................... 85 7.1 Nomenclatura................................................................................................................ 86 7.2 Éteres acíclicos ............................................................................................................. 86

Química Orgânica A

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7.2.1 Preparação de éteres acíclicos ...............................................................................86 7.2.1.1 Síntese de éteres de Williamson ........................................................................86 7.2.1.2 Protecção do álcool............................................................................................87 7.3 Reacções de éteres.........................................................................................................88 7.3.1 Formaação de éteres metílicos e sua quebra..........................................................88 7.4 Éteres cíclicos................................................................................................................89 7.4.1 Nomenclatura ........................................................................................................89 7.4.2 Preparação de éteres cíclicos .................................................................................89 7.4.2.1 Epoxidação ........................................................................................................89 7.4.3 Reacções de epóxidos............................................................................................90 7.4.3.1 Reacção de abertura de epóxidos catalisada por ácido......................................90 7.4.3.2 Abertura do anel de epóxidos com nucleófilos .................................................92 7.5 Éteres importantes .........................................................................................................94 7.5.1 Resinas epóxi.........................................................................................................94 7.5.2 Éter etílico .............................................................................................................95 7.5.3 Éter metil ter-butílico (MTBE) .............................................................................96 7.5.4 Alcalóides – morfina, heroína ...............................................................................96 8 Alcenos ..................................................................................................................................97 8.1 Reacções de alcenos ......................................................................................................98 8.1.1 Reacções de adição................................................................................................98 8.1.1.1 Hidrogenação catalítica .....................................................................................98 8.1.1.2 Adição electrófila a alcenos...............................................................................98 8.1.1.2.1 Mecanismo: .................................................................................................98 8.1.1.2.2 Adição de H—X com X=halogénio ............................................................99 8.1.1.3 Adição de água ..................................................................................................99 8.1.1.4 Adição anti-Markovnikov de água : como consegui-la?.................................100 8.1.1.5 Adição de halogénios ......................................................................................101 8.1.2 Oxidação de alcenos ............................................................................................101 8.1.2.1 Epoxidação de alcenos ....................................................................................101 8.1.2.2 Oxidação com permanganato de potássio .......................................................102 8.1.2.3 Ozonólise de alcenos .......................................................................................103 8.2 Reacções de preparação de alcenos.............................................................................104 8.2.1 Reacções de eliminação.......................................................................................104 8.2.1.1 Desidratação de álcoois ...................................................................................104 8.2.1.2 Desidro-halogenação de haletos de alquilo - reacção de eliminação ..............106 8.3 Alcenos Importantes ....................................................................................................108 9 Alcinos.................................................................................................................................114 9.1 Estrutura dos alcinos....................................................................................................114 9.1.1 Sistema de orbitais...............................................................................................114 9.1.2 Acidez de alcinos terminais.................................................................................114 9.2 Reacções de alcinos.....................................................................................................115 9.2.1 Adição..................................................................................................................115 9.2.2 Hidrogenação.......................................................................................................115 9.2.2.1 Hidrogenação catalítica – cis-alcenos .............................................................115 9.2.2.2 Redução de alcinos a trans alcenos .................................................................116 9.2.3 Oxidação de alcinos.............................................................................................116 9.2.3.1 Pelo ozono .......................................................................................................116 9.2.3.2 Pelo permanganato de potássio .......................................................................116 9.3 Síntese de alcinos ........................................................................................................116 9.4 Alcinos importantes.....................................................................................................116 10 Benzeno ...........................................................................................................................118

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Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

10.1 Outros compostos aromáticos..................................................................................... 119 10.2 Reacções de compostos aromÁticos........................................................................... 120 10.2.1 Substituição electrófila aromática ...................................................................... 120 10.2.1.1 Mecanismo da substituição electrófila aromática....................................... 121 10.2.1.2 Halogenação ............................................................................................... 122 10.2.1.3 Nitração....................................................................................................... 124 10.2.1.4 Sulfonação .................................................................................................. 125 10.2.1.5 Alquilação de Friedel-Crafts ...................................................................... 126 10.2.1.6 Acilação de Friedel-Crafts.......................................................................... 127 10.2.1.7 Efeitos de substituintes ............................................................................... 128 10.2.2 Halogénios .......................................................................................................... 129 10.2.3 Aplicações industriais de compostos aromáticos ............................................... 130 11 Compostos de carbonilo ................................................................................................. 132 11.1 Reacções de compostos de carbonilo ......................................................................... 132 11.1.1 Adição nucleófila................................................................................................ 132 11.1.2 Equilíbrio ceto-enólico ....................................................................................... 134 11.1.3 Tautomerismo de carbonilos / reacção com electrófilos .................................... 135 11.1.4 Adição a carbonilos ............................................................................................ 135 11.1.4.1 Redução de carbonilos / Adição de hidreto ................................................ 135 11.1.4.2 Reacção do grupo carbonilo com cianeto CN ........................................ 136 11.1.4.3 Reacções gerais do ataque de nucleófilos de azoto ao grupo carbonilo..... 137 11.1.4.3.1 Adição de aminas.................................................................................... 137 11.1.4.4 Adição de álcoois........................................................................................ 137 11.1.4.5 Adição de carbaniões.................................................................................. 138 11.2 Preparação de compostos de carbonilo....................................................................... 138 11.2.1 Aldeídos a partir de cloretos de acilo ................................................................. 138 11.2.2 Cetonas a partir de cloretos de acilo................................................................... 139 11.3 Compostos carbonílicos importantes.......................................................................... 139 11.4 Amidas importantes .................................................................................................... 141 12 Ácidos carboxílicos ........................................................................................................ 144 12.1 Estrutura dos ácidos carboxílicos ............................................................................... 144 12.2 Reacções de ácidos carboxílicos................................................................................. 145 12.2.1 Redução de ácidos carboxílicos.......................................................................... 145 12.2.2 Bromação de ácidos alcanóicos (reacção geral de compostos carbonílicos)...... 145 12.3 ácidos carboxílicos importantes.................................................................................. 145 13 Fenóis.............................................................................................................................. 146 13.1 Acidez ......................................................................................................................... 146 13.2 Substituição electrófila aromática de fenóis ............................................................... 147 13.3 Alquilação de fenóis — Síntese de Williamson ......................................................... 148 13.4 Síntese de compostos fenólicos .................................................................................. 148 13.5 Fenóis importantes...................................................................................................... 149 14 Bibliografia recomendada............................................................................................... 150

Química Orgânica A

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ESTRUTURA E LIGAÇÃO QUÍMICA NAS MOLÉCULAS ORGÂNICAS A Química é a ciência que estuda a estrutura das moléculas e as regras que governam as respectivas interacções O que distingue a Química Orgânica da Química em geral? A Química Orgânica é a química do átomo de carbono e dos seus compostos — estes são chamados compostos orgânicos. 1.1

A LIGAÇÃO QUÍMICA

As ligações químicas são forças que mantêm os átomos juntos em arranjos específicos para formar moléculas. O que são então estas ligações? Dois átomos formam uma ligação se e só se a interacção for energeticamente favorável; quer isto dizer se por exemplo calor for libertado quando a ligação se forma. Consequentemente, para quebrar essa ligação precisamos de fornecer a mesma quantidade de energia. As duas causas principais de libertação de energia associadas às ligações baseiam-se em leis fundamentais da física: 1. 2.

Cargas opostas atraem-se. Os electrões estão espalhados no espaço em torno do núcleo do átomo.

As ligações são o resultado simultâneo da atracção Coulômbica e de troca electrónica. Cada átomo é constituído por um núcleo, contendo partículas electronicamente neutras, os neutrões, e os protões que têm carga positiva. Em volta do núcleo existem os electrões carregados negativamente, em igual número ao dos protões, de modo que a carga total é zero. À medida que dois átomos se aproximam um do outro, o núcleo carregado do primeiro atrai os electrões do segundo. De modo semelhante o núcleo do segundo atrai os electrões do primeiro. Esta forma de ligação é descrita pela lei de Coulomb que diz que: cargas opostas atraem-se uma à outra com uma força inversamente proporcional ao quadrado da distância entre os centros das cargas. Lei de Coulomb carga (+) Força de atracção

=

constante

x

carga (-)

x distância

2

As forças de atracção provocam a libertação de energia à medida que os átomos se aproximam. A esta energia chama-se força da ligação. Quando os átomos atingem certa distância não se liberta mais energia e a essa distância chama-se comprimento da ligação.

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Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço átomo 1

átomo 2

absorvida

e-

0

E

e-

(energia)

libertada e

e d

0

distância interatómica

d

Moléculas em que os átomos permanecem unidos pela ligação covalente

comprimento de ligação

Se os átomos estão demasiados próximos inicia-se a repulsão electrão-electrão e núcleo-núcleo e as forças de repulsão são superiores às de atracção. Quando os núcleos têm uma separação apropriada os electrões estão espalhados em torno dos núcleos e existe um equilíbrio entre as forças de atracção e as de repulsão. O conteúdo energético do sistema dos dois átomos é mínimo. A ligação covalente ocorre quando há partilha dos electrões da ligação. De seguida representa-se essa situação onde as forças de atracção (linha a cheio) e de repulsão (linha a tracejado) estão representadas na ligação entre dois átomos. Os círculos maiores representam regiões do espaço nas quais os electrões são encontrados em torno dos núcleos. Os círculos pequenos com sinal (+) representam os núcleos. A ligação é realizada pela transferência de um electrão do átomo 1 mais electropositivo para o átomo 2 mais electronegativo, gerando dois iões de cargas opostas que se atraem. átomo 1 e-

átomo 2 e-

e-

e-

catião

anião

ligação iónica (atracção colômbica)

Vemos portanto que existem dois tipos extremos de ligações que explicam as interacções das moléculas orgânicas. 1. 2.

Uma ligação covalente formada por partilha de electrões Uma ligação iónica que se baseia na atracção electrostática de dois iões de cargas opostas.

Química Orgânica A

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Veremos que muitos átomos se ligam ao carbono de um modo intermédio entre dois extremos: algumas ligações iónicas têm um certo carácter covalente, e algumas ligações covalentes são parcialmente iónicas. Regra do Octeto Na formação de ligações os átomos tendem a adquirir a configuração electrónica do gás nobre mais próximo na tabela periódica, ficando com um octeto na camada electrónica mais externa. 1.2

LIGAÇÕES PURAMENTE IÓNICAS

A ligação iónica forma-se quando há atracção electrostática entre um catião e um anião. A ligação iónica forma-se quando um átomo electronegativo encontra um átomo de baixa electronegatividade. De acordo com a Regra do Octeto o elemento electropositivo tende a dar electrões de modo que perde os seus electrões de valência, resultando na formação de um catião (ião com carga positiva) e o elemento electronegativo recebe electrões de modo a completar a sua camada externa de forma a ficar com a configuração do gás nobre que o sucede, na forma de anião (ião com carga negativa). Uma forma conveniente para representar os electrões de valência é por pontos em torno do símbolo do elemento. Neste caso o símbolo representa o núcleo com os electrões das camadas internas. electrão desemparelhado

Li

Be

B

C

N

O

F

Na

Mg

Al

Si

P

S

Cl

Como está indicado na tabela periódica parcial seguinte a electronegatividade dos elementos aumenta da esquerda para a direita ao longo do período e diminui ao longo do grupo de cima para baixo. Os átomos mais electronegativos dos grupos VI e VII formam facilmente ligações iónicas com os átomos fortemente electropositivos dos grupos I e II. As ligações iónicas são típicas dos sais inorgânicos tais como o fluoreto de lítio (LiF) e o cloreto de sódio (NaCl). O sódio (Na), um metal reactivo interactua com o cloro, um gás reactivo, de forma violenta para produzir uma substância estável, o cloreto de sódio.

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Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

Tabela periódica parcial (electronegatividades) Período I II 1º H 2,2 2º Li Be 1,0 1,6 3º Na Mg 0,9 1,3 4º K 0,8 elementos electropositivos electrodadores

III

IV

V

VI

Halogénios VII

Gases Nobres He

B 2,0 Al 1,6

C 2,6 Si 1,9

N 3,0 P 2,2

O 3,4 S 2,6

F 4,0 Cl 3,2 Br 3,0

Ne Ar Kr elementos electronegativos electroatractores

Qual a razão do NaCl se formar tão facilmente? Porque é que a interacção é energeticamente favorável? Temos de considerar o potencial de ionização (PI) e a afinidade electrónica (AE) dos átomos envolvidos. 2,8,1

-1e-

Na

[Na

2,8

]+

PI (Potencial de Ionização) = 119 kcal mol-1

ião sódio (configuração do neon) 2,8,7

+1e-

[Cl2,8,8] -

Cl

Na+

Na + Cl

+ Cl-

AE (Afinidade Electrónica) = -83 kcal mol-1

Total =

+ 36 kcal mol-1

Forma-se o NaCl devido à interacção electrostática entre os iões. À distância interatómica mais favorável (cerca de 2,8 Å na fase gasosa), a atracção liberta cerca de 120 kcal mol-1, o que é mais do que suficiente para tornar esta reacção energeticamente muito favorável, com libertação de 84 kcal mol-1. + 36 (Energia necessária para formar os iões a partir dos átomos neutros) - 120 (energia libertada pela aproximação dos iões que se atraem) = - 84 kcal mol-1. O átomo de hidrogénio pode formar um catião ou um anião. Nesse caso temos que considerar o Potencial de Ionização para a formação do protão (H+) e a afinidade electrónica para a formação do ião hidreto (H-): H

- 1e-

+ H protão

Potencial de Ionização (PI) PI = 314 kcal mol-1

Química Orgânica A

H

+ 1e-

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Afinidade Electrónica (AE)

-

AE = -18 kcal mol-1 H ião hidreto configuração do átomo de hélio

Em resumo, as ligações iónicas implicam o preenchimento da camada de valência dos átomos por transferência de um ou mais electrões do átomo mais electropositivo para o mais electronegativo, seguido da atracção electrostática entre o catião e o anião resultantes. 1.3

LIGAÇÕES COVALENTES

A ligação covalente forma-se entre elementos do meio da escala de electronegatividades. Estes átomos não ganham nem perdem electrões, em lugar disso partilham os electrões de valência. Uma ligação covalente simples é uma ligação que partilha dois electrões entre dois átomos, completando a camada de valência de ambos. Exemplos são as ligações na molécula de hidrogénio (H2), cloro (Cl2) e na molécula de metano (CH4). Estas moléculas podem ser representadas como estruturas de Lewis nas quais só são representados os electrões de valência. H H

C

H H

H

Cl

Cl

H metano

1.4

cloro

hidrogénio

LIGAÇÕES COVALENTES POLARES

Se os átomos ligados por uma ligação covalente não apresentarem a mesma electronegatividade então os electrões da ligação estarão preferencialmente deslocados para o lado do átomo mais electronegativo provocando uma deformação da nuvem electrónica e uma polarização da molécula com o consequente aparecimento de um momento dipolar. Quanto maior a diferença de electronegatividade maior o momento dipolar. δ+ δ+ A

δB

δ−

δ+ H

F

I

dipolo menos electronegativo

Cl

δ−

H

δ−

δ+

H

C

F

H mais electronegativo

Em estruturas simétricas as polarizações das ligações individuais podem-se anular, tal como no dióxido de carbono (CO2), conduzindo a moléculas sem polarização global. δ−

δ+ O

C

δ− O

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Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

Na maior parte das ligações dos compostos orgânicos, os electrões não são igualmente partilhados, dependendo da electronegatividade dos elementos cujos átomos estão ligados como se exemplifica: δO 3.4 C 2.6 H δ+ H

H

O C

δ+ H

δ- O C H H H

H

metanol

formaldeído

1.5

A FORMA GEOMÉTRICA DOS COMPOSTOS ORGÂNICOS

As moléculas adoptam formas nas quais a repulsão electrónica está minimizada. Nas espécies diatómicas tais como H2 só há um par de electrões ligantes e um arranjo possível dos dois átomos. No BCl3 as forças de repulsão electrónicas obrigam a um arranjo trigonal, com os três átomos de cloro nos vértices de um triângulo equilátero, cujo centro é ocupado pelo átomo de boro. Cl F

Be

F Cl

BeF2 é uma molécula linear

B

Cl

BCl3 é uma molécula trigonal

Aplicando este princípio ao átomo de carbono pode-se observar no metano, CH4, que tem a estrutura de um tetraedro, onde os quatro átomos de hidrogénio se ligam ao carbono segundo os vértices de um tetraedro, que é o melhor arranjo para minimizar a repulsão.

Estrutura do metano (CH4) 1.5.1

Orbitais atómicas

A descrição das ligações existentes nos compostos orgânicos tem que incorporar informação sobre o modo como os electrões se distribuem em redor do núcleo. A teoria é baseada na teoria de mecânica quântica de Heisenberg (Werner Heisenberg, 1901-1976), Schrödinger (Erwin Schrödinger, 1887-1961) e Dirac (Paul Dirac, 1902-1984). Nesta teoria o movimento de um electrão em volta do núcleo exprime-se através de equações que são semelhantes às que caracterizam as ondas. As soluções destas equações constituem as orbitais atómicas, e permitem-nos descrever a probabilidade de encontrar um electrão numa certa região do espaço.

Química Orgânica A

1.5.2

Forma das orbitais

Orbitais atómicas Orbital 1s y

A orbital s é esférica e simétrica segundo as três direcções do espaço

x

z

corte segundo duas dimensões do espaço z

sinal matemático que corresponde ao sinal da função de onda ψ — esta grandeza não é directamente identificável com uma propriedade observável do átomo - contudo ψ2 num ponto do espaço - descreve a probabilidade de x encontrar um electrão nesse ponto do espaço

Características da orbital s correspondendo à energia mais baixa - esférica/simétrica - não tem nodos (um nodo é uma zona de densidade electrónica nula)

A orbital 2s ocupa um volume maior que a 1s e tem energia superior. Apresenta um nodo, uma superfície esférica cuja densidade electrónica é nula que separa duas regiões onde a função de onda tem sinal oposto. Orbital 2s

y nodo Características da orbital 2s -

x

- esférica/simétrica - tem um nodo

Depois da orbital 2s as equações de onda para o electrão em torno do átomo de hidrogénio têm três soluções energeticamente equivalentes. As orbitais 2px, 2py, 2pz. Soluções de energia igual são chamadas degeneradas.

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Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço Orbital 2py

Orbital 2px

Orbital 2pz z

z

z

x x

x

y

y

y

Todas da mesma energia, com dois lobos de sinal contrário, e uma direcção característica do espaço - um plano nodal na origem

O terceiro conjunto de soluções origina as orbitais 3s e 3p. São de forma global semelhante mas mais difusas que as suas análogas de energia mais baixa e têm dois nodos. As orbitais de energia ainda mais elevada (3d, 4s, 4p, etc.) são caracterizadas por um maior número de nodos e uma variedade maior de formas. E, energia relativa das orbitais atómicas, está representada no seguinte diagrama, correspondendo à ordem segundo a qual elas são preenchidas pelos electrões nos átomos. As orbitais de menor energia são preenchidas primeiro; as orbitais degeneradas são preenchidas segundo a regra de Hund. 5s E 4px

4py

4pz 3d

4s 3px

3py

3pz

2py

2pz

3s 2px 2s 1s

1.5.3

Orbitais moleculares

Por sobreposição de duas orbitais atómicas formam-se duas orbitais moleculares, uma ligante de mais baixa energia e outra antiligante de energia superior.

Química Orgânica A H

H

13

H H

= 1s

1s

orbitais atómicas

orbital molecular ligante

nodo 1s

1s

orbitais atómicas

orbital molecular antiligante

Na combinação ligante a função de onda no espaço entre os núcleos é fortemente reforçada. Assim a probabilidade de encontrar electrões ocupando a orbital molecular nesta região é muito alta: uma condição para haver ligação entre os dois átomos. Por outro lado numa orbital molecular antiligante a amplitude da função de onda cancela-se entre os átomos, originando um nodo. A partir da energia das orbitais moleculares formadas e do seu preenchimento com os electrões de valência pode-se prever a formação de uma molécula. Enquanto a molécula diatómica de hidrogénio é formada com abaixamento de energia, a molécula de hélio diatómica não tem tendência a formar-se porque a sua energia seria superior à dos átomos separados, como se pode ver pelo seguinte diagrama de energia. He E

+ ΔE

+ ΔE

H orbital atómica

He

H

He − ΔE

− ΔE

H

H

orbital molecular Molécula diatómica de hidrogénio

1.5.4

He

orbital molecular Molécula diatómica de hélio que não se forma por ter energia desfavorável

Hibridação molecular

O elemento carbono está localizado no meio da tabela periódica de modo que forma essencialmente ligações covalentes. O átomo de carbono forma normalmente quatro ligações covalentes (tetravalente) como acontece no metano (CH4), e estas orientam-se segundo os vértices de um tetraedro, com ângulos diedros de 109,5º. Esta característica confirma a hibridação das orbitais atómicas do átomo de carbono da camada de valência formando quatro

14

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

orbitais sp3 todas semelhantes e preenchidas, cada uma com um electrão proveniente do átomo de carbono e outro electrão proveniente do átomo de hidrogénio. sem hibridação

2p2

1s2 2s2

C

com hibridação

2p E 4e

-

sp3 equiv.

2s 1s

1s

Espacialmente a orientação das quatro orbitais sp3 todas equivalentes e com a mesma energia será segundo os vértices de um tetraedro. 2py

C

2px 2s

2pz vista do topo 4 orbitais sp3 com a orientação dos vértices de um tetraedro

Alcanos Metano H

H

σ

Fórmula condensada

Fórmula condensada

CH4

CH4

Fórmula molecular

Fórmula condensada

C2H6

CH3 CH3

H σ 109.5°

C σH σ H

H H

H

Etano H

H H H C C H H H H

H

C

H H

+

C H

Química Orgânica A

15

Alcenos Eteno (ou etileno)

+

+ + σ

C

C

+

Hσπ H σC Cσ H σ H 120°

+ -

+

H

+ +

σ

H

π

-

H

H

Fórmula molecular

Fórmula condensada

C2H4

CH2 CH2

3 orbitais sp2, uma ligação π e uma ligação σ entre os átomos de carbono

Alcinos Etino (ou acetileno) σ σ π σ H C C H π

+ H

+ +

C

+

-

+

+

C +

-

+

-

Fórmula molecular

Fórmula condensada

C2H2

CHCH

H

semelhante a

H

C

C

H

A orientação especial é semelhante ao que acontece noutras moléculas com ligações triplas como no ácido cianídrico (H-C≡N), no monóxido de carbono (C=O ↔-C≡O+) ou no azoto molecular (N≡N).

16

2

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

GRUPOS FUNCIONAIS

Muitas moléculas orgânicas consistem num esqueleto de átomos de carbono ligados por ligações simples a átomos de hidrogénio. Contudo podem também conter ligações duplas ou triplas entre átomos de carbono, assim como outros elementos. Estes átomos ou grupos de átomos tendem a ser locais de elevada reactividade química e são referidos como grupos funcionais ou funcionalidades. Tais grupos possuem propriedades características e controlam a reactividade da molécula como um todo.

Química Orgânica A

17

Tabela — Família de Compostos e Grupos Funcionais respectivos Família alcano haleto de alquilo ou halo-alcano (X=F, Cl, Br, I) álcool tiol éter tioéter

Fórmula geral R

X

R R R R R

O S O S

R' R

C

H H R R R''

C

alceno alcino

H

R

C

haleto

C

R''' C R

C

dieno conjugado

X O S O S

C

C

H

Nome do grupo funcional hidrogénio

Grupo funcional

C

C

ligação dupla

C C

ligação tripla

C

C

C

hidroxilo tiol éter tio-éter

H H

C

C

aromático, areno

dieno

anel benzénico R N

amina

R'''

amino

N

R'

aldeído cetona ácido carboxílico haleto de ácido (X=F, Cl, Br, I) anidrido de ácido éster tioéster amida

O

O R

C O

H

C O

R

C O

R'

C O

R

C OH O

C OH O

R

C O

X

C O

X

R

C O

O

C O

O

R'

C O

C O

O

R

C O

S

C O

S

C

N

C

N

C

N

R

O C

O

R R

R'

R'

aldeído

H

ceto carboxilo haleto de acilo O C

anidrido éster tio-éster amida

R''

nitrilo

R

C

N

ciano

18

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

A classificação mais importante de compostos orgânicos é por grupos funcionais. Uma família de compostos é constituída por compostos que possuem o mesmo grupo funcional. O grupo funcional é a parte da molécula que reage e se transforma durante uma reacção química. Esta classificação é importante já que compostos com o mesmo grupo funcional, isto é pertencentes à mesma família, reagem normalmente da mesma forma sob reagentes e condições reaccionais semelhantes. Na tabela seguinte mostra-se a relação entre alcanos e halo-alcanos e as restantes famílias de compostos orgânicos. alcanos R H

aminas R

amidas O

NH2 R

halo-alcanos ou halogenetos de alquilo R Cl

ésteres O

O R

R

C

R

Cl ácidos carboxílicos O

C

N R

alcenos R' C

C

R

O

H

aldeídos O

H

R

alcinos R

1)

C

C

R'

R

O

C

R

R'

C

Alcanos − são compostos apolares (são relativamente inertes).

metano

H

cetonas O

éteres

CH4

2)

O

álcoois

C

H

R

cloreto de acilo

nitrilo

R

NH

C

CH3 CH3 etano

CH3 CH2 CH3 propano

CH2 CH2 CH2 CH2 CH2 CH2 ciclo-hexano

Alcenos - têm duplas ligações carbono-carbono (são reactivos).

R'

H

C

OR'

Química Orgânica A

19 CH3 C CH2 CH3

CH2 CH2

C C

eteno (etileno)

3)

buteno

Alcinos - têm ligações triplas (são reactivos) CH3 C C H

HC CH

C C

propino

etino (acetileno)

4)

Compostos aromáticos - têm ligações duplas conjugadas (são reactivos)

H

H

H C C

C

C

C C H

H

H

H

H

C

C

C C H

H

H

Álcoois, Tióis H

O H C H H H

H O C H C H H H H

álcool

metanol

etanol

O C

S C

H S C H C H H H H

S H C H H H

H

tiol

6)

C

Tolueno

Benzeno

5)

CH3 C

m etanotiol

etanotiol

Outras moléculas da química inorgânica:

O H

H

água

H

O O

H

peróxido de hidrogénio

S H

H

gás sulfídrico

H O N HHH hidroxilamina

20

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

7)

Halo-alcano Hal C

clorometano (anestésico)

Hal = halogénio ( F, Cl, Br, I )

8)

Cl C H Cl Cl

Cl C HH H

triclorometano clorofórmio (anestésico)

Éter

C

O

CH3

C

O

CH3

CH3CH2

CH2CH3

éter dietílico (éter) anestésico de inalação bom solvente

éter dimetílico (refrigerante)

9)

O

Amina H

N H

H

amoníaco

H

N C

H

NH2 C H H H

CH3NH2

amina primária

R

N R

H

metilamina

H3C

amina secundária

R

N R

R

amina terciária

N H

CH3

(CH3)2NH

dimetilamina

H3CH2C

CH2CH3 N CH2CH3

(C2H5)3N

trietilamina

Química Orgânica A

21

O C

carbonilo

H

O C

H

R

R

H

H

formaldeído (desinfectante)

aldeído

O C

O C

CH3

R'

O C

CH3

acetaldeído

CH3CH2

CH3

propanona (acetona) (solvente)

cetona

O C

O C

CH3

butanona (metil etil cetona) (solvente)

H

R

O C

O H

ácido

H

O C

CH3

O H

ácido fórmico (irritante)

O C

R

R

O

R

O

éster

O H

O C

H

O C

O C H

H

ácido acético (ácido etanóico) vinagre

ácido benzóico

Cl

cloreto de acetilo

R'

CH3

R'

O C

O

O C

CH3

anidrido acético

anidrido

O C

H

CH3

Cl

halogeneto de acilo O C

O C

CH3

O C

O

C2H5 acetato de etilo

O H

22

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço O H C N R H

amida primária

O H C N R R'

amida secundária

O R'' C N R R'

amida terciária

R C N nitrilo

CH3

O C

NH2

acetamida

CH3

O C

N H

C2H5

N-etilacetamida

H

O C

CH3 N CH3

N,N-dimetilformamida (solvente)

H C N ácido cianídrico

CH3 C N acetonitrilo (solvente)

Química Orgânica A

3

23

ÁCIDOS E BASES

A acidez de um composto é medida pela constante de equilíbrio relativa à ionização. Brönsted e Lowry deram uma definição simples de ácidos e bases: um ácido é um dador de protão, uma base é um aceitador de protão. A acidez e a basicidade são frequentemente medidas em água.

H Cl

H H O H

+ H O H

ácido clorídrico

+

Cl

ião hidrónio

CH3O Na + H O H

CH3 O H + Na + H O

metóxido de sódio

ião hidróxido

A água é neutra e por autodissociação forma igual número de iões H3O+ e HO- . O processo é descrito pela constante de equilíbrio Kw , a constante de dissociação da água. A 25°C: H2O Kw =

H3O

+

Kw

H2O H3O

HO

H3O

+

HO

= 10-14 mol2 L-2

= 10-7 mol L-1

pH = - log H3O

Consideremos um ácido geral HA

pH = 7

da água a 25°C

24

H

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

A

+

H2O

K

H3O

ácido

A

+

base conjugada

H3O

A

H2O

HA

K =

Calculando a concentração molar da água vem: 1 L (H2O) = 1000g

1 mole

18g

1000g são 55mol

Como em solução aquosa [H2O] = 55 mol L-1 o valor de [H2O] pode ser incorporado na constante K e assim vem

Ka = constante de acidez =

A

H3O

mol L-1

HA

Existe também como medida de acidez o pKa que é matematicamente uma grandeza logarítmica como o pH: pKa = - log Ka

=

- log

A H3O

- log HA

pH

Se A = HA vem log 1 = 0 logo o valor do pKa é igual ao valor do pH de uma solução na qual a percentagem de ionização é de 50%. Para o ácido sulfúrico o equilíbrio é o seguinte: Ácido sulfúrico H O H O S O O

+ H2O

O H O S O O

O H O S O O

O H O S O O

anião estabilizado por ressonância

+ H3O

Química Orgânica A

25

Este equilíbrio de dissociação não ocorre unicamente nos compostos inorgânicos mas também nos compostos orgânicos como a seguir exemplificado. Ácido acético O CH3 C

O H

O

O

+ H2O

CH3 C

CH3 C O

O

+ H3O

anião acetato estabilizado por ressonância

É a estabilização por ressonância electrónica do anião acetato que é responsável em larga medida pela acidez do ácido acético. Metanol H H C O H H

+ H2O

CH3 O

+ H3O

base forte ião metóxido

Na tabela seguinte estão representados os valores de pKa para alguns compostos inorgânicos e orgânicos.

26

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

Nome

Ácido A-H

ácido iodídrico

H

Ka

pKa

1,6 x 105

-5,2

1,0 x 105

-5,0 (1ª constante)

5,0 x 104 160 50

-4,7 -2,2 -1,7

16

-1,2

6,3 x 10-4

3,2

I O

ácido sulfúrico

H

O

S

O

H

O

ácido bromídrico ácido clorídrico

H H

Br Cl

H3 O O

ácido metanossulfónico

H 3C

ácido fluorídrico

H

ácido acético

H 3C

ácido cianídrico metanotiol metanol água

H C N H 3C S H H

O

H

amoníaco

H

N

H

S

O

H

O F O C O

H 3C

O

H

H

2,0 x 10-5 6,3 x 10-10 1,0 x 10-10 3,2 x 10-16 2,0 x 10-16

4,7 9,2 10,0 15,5 15,7

1,0 x 10-35

35

~1,0 x 10-50

~50

H

H

metano

H

C

H

H

Na tabela seguinte apresentam-se os valores de pKa de várias famílias de compostos orgânicos, relativamente à água. Valores relativos de pKa Compostos

pKa

Ácidos carboxílicos Fenóis Água Álcoois Aminas Alcanos

~5 ~10 15,7 ~16 ~33 ~40

Química Orgânica A

27

28

4

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

ALCANOS

Os alcanos constituem o ponto de partida de todos os compostos orgânicos, dado que directa ou indirectamente todos os compostos orgânicos se podem considerar derivados deles. Exemplo de interconversão de grupos funcionais que permite preparar um éter a partir de um alcano. Alcanos

haletos de alquilo

alcenos

alcinos

álcoois

éter

Os alcanos possuem unicamente carbono e hidrogénio e são descritos como hidrocarbonetos saturados alifáticos. - Hidrocarbonetos – compostos constituídos por carbono mais hidrogénio. - Saturados - Todas as ligações são ligações simples (ligações sigma) - Alifáticos - os alcanos exibem propriedades semelhantes aos óleos e gorduras (“aleiphar” é a palavra grega para gordura). lineares não cíclicos CnH2n+2 alcanos

ramificados

cíclicos

Por exemplo, o metano (CH4) é o constituinte principal do gás natural, usado em sistemas de aquecimento e de produção de energia. O metano, o etano e o propano representam uma série homóloga - um conjunto de compostos cuja fórmula molecular difere da anterior por um incremento constante. Neste caso o incremento é o CH2 – grupo metileno. Os alcanos podem ser definidos de dois modos diferentes: 1- Todos os alcanos são membros de uma série homóloga cujas fórmulas estruturais podem ser escritas introduzindo um grupo metileno (-CH2-) na fórmula do membro precedente. 2- As fórmulas moleculares de todos os alcanos são representadas por CnHn+2, onde n é um número inteiro. Usando a fórmula geral CnHn+2 podemos ver que a fórmula molecular do alcano em C4 é C4H10. A fórmula estrutural pode ser mais complicada devido às diversas possibilidades, como a seguir está representado.

Química Orgânica A

C4H10 - butano

H

29

isómeros constitucionais

H

H

H

H

C

C

C

C

H

H

H

H

H

H

H

H

H

C

C

C

H H

C

H H

H

o gás butano dos isqueiros é uma mistura dos dois compostos

H

n-butano

4.1

Isobutano

fórmulas de estruturas condensadas

ISOMERISMO

A mesma fórmula molecular pode representar mais do que um composto. Compostos com a mesma fórmula molecular mas estruturas diferentes são chamados isómeros. Existem muitas formas diferentes de isómeros em compostos orgânicos. No esquema seguinte estão representados os tipos de isómeros mais comuns.

30

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

TIPOS DE ISÓMEROS ISÓMEROS mesma fórmula molecular mas com estrutura diferente

ESTEREOISÓMEROS mesma conectividade mas diferentes arranjos tridimensionais de átomos ou grupos de átomos

ISÓMEROS CONFORMACIONAIS isómeros que podem ser interconvertidos por rotação de uma ligação sigma (σ)

DIASTEREOISÓMEROS isómeros que não têm uma relação uns com outros tal como a de um objecto com a sua imagem num espelho

ISÓMEROS CIS-TRANS ou GEOMÉTRICOS

4.1.1

ISÓMEROS CONSTITUCIONAIS isómeros de esqueleto isómeros de posição isómeros de grupo funcional

ISÓMEROS DE CONFIGURAÇÃO isómeros que não podem interconverter-se se não por quebra de uma ligação

ENANTIÓMEROS isómeros que têm uma relação de objecto-imagem num espelho. Têm configurações opostas. OUTROS têm mais do que um estero-centro sem terem uma relação objecto-imagem

Isómeros constitucionais

Os isómeros constitucionais apresentam a mesma fórmula molecular mas conectividade diferente entre os átomos. Os esqueletos carbonados são diferentes. Tomemos como exemplo o hexano de fórmula molecular C6H14.

n-hexano

2-metilpentano

2,2-dimetil-butano

2,3-dimetilbutano

3-metilpentano

Química Orgânica A

31

Todos estes isómeros são compostos diferentes com propriedades físicas e químicas diferentes, incluindo distribuição espacial diferente dos seus átomos. A mistura dos cinco isómeros pode ser fisicamente separada nos seus cinco componentes puros que possuem unicamente em comum a sua fórmula molecular. Alcanos: fórmulas e isómeros nº átomos de carbono

fórmula molecular

1 2 3 4 5 6 20 40

CH4 C2H6 C3H8 C4H10 C5H12 C6H14 C20H42 C40H82

nº de isómeros constitucionais 0 0 0 2 3 5 366319 > 60 triliões

À medida que o número de átomos de carbono do alcano aumenta, o número de possíveis isómeros constitucionais aumenta dramaticamente como se pode ver pela tabela anterior. 4.1.2

Estereoisómeros - isómeros conformacionais (confórmeros)

A maior categoria de isómeros consiste nos estereoisómeros. Compostos com a mesma fórmula molecular as mesmas conectividades e diferente orientação tridimensional ou orientação espacial. Os confórmeros podem-se converter uns nos outros por uma simples rotação em torno de uma ligação simples. Uma das formas de visualizar os confórmeros é pelas representações bidimensionais, nomeadamente as projecções de Newmann. Representação bidimensional de estruturas tridimensionais Projecções de Newman Exemplo : Etano C2H6 Conformação Eclipsada HH H H H

H H H

H H

H H

hidrogénio ligado ao carbono da frente

H H H

H

H

H

átomo de carbono

Projecção de Newman

Projecção em perspectiva ou cavalete

32

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço Conformação Estrelada H H H H

H

H H H

H

H H

H

H

H

H H H

H Projecção de Newman

Projecção em perspectiva ou cavalete

A conformação estrelada tem menor energia por apresentar menor interacção entre os átomos de hidrogénio (repulsão electrónica e estereospacial). Conformações do n-butano C4H10 observadas através da projecção de Newman envolvendo o eixo que contém a ligação do átomo de carbono 2 com o átomo de carbono 3. conformações estreladas

H

CH3

H

H

H

H

H H

gauche

anti

CH3CH

CH3H

CH3 CH3

H

CH3

conformações eclipsadas

H H

H CH3

eclipse 1

3

H H

H H

eclipse 2

A análise de confórmeros de alcanos com mais átomos de carbono revela outros efeitos repulsivos e a possibilidade de conformações adicionais devido à interacção dos grupos substituintes. As conformações anti e gauche são duas variantes da conformação estrelada. A conformação anti tem os dois grupos mais volumosos separados de 180º e a conformação gauche tem os grupos volumosos separados de 60º. A ordem de estabilidade das quatro conformações possíveis para o n-butano é anti > gauche > eclipse 1 > eclipse 2 4.2

NOMENCLATURA DOS ALCANOS

A nomenclatura mais utilizada é a nomenclatura IUPAC (Internacional Union of Pure and Aplied Chemistry). Por vezes são utilizados nomes comuns que já se encontram vulgarizados. Segundo a nomenclatura IUPAC todos os alcanos têm o seu nome terminado em ano. 4.2.1

Alcanos não ramificados

Nome do hidrocarboneto metano etano propano butano

Nº de átomos de carbono C1 C2 C3 C4

Nome do substituinte na fórmula CH3 (metil) CH3CH2 (etil) CH3CH2CH2 (propil)

Química Orgânica A

33

C5 C6 C10 C11 C20

pentano hexano decano undecano icosano

Grupos alquilo :R- usado para representar um grupo alquilo genérico Um grupo alquilo resulta da remoção de um átomo de hidrogénio de um alcano. Um grupo alquilo não é um composto mas é simplesmente uma unidade estrutural que existe como um substituinte de uma estrutura maior. O nome do grupo alquilo é formado a partir do nome do alcano correspondente, retirando a terminação ano e substituindo por ilo. Para um substituinte onde o grupo alquilo seja escrito por uma fórmula condensada ou por uma fórmula molecular utiliza-se a designação de R. 4.2.2

Alcanos ramificados

A ramificação da cadeia carbonada aumenta a diversidade da estrutura dos alcanos. Os nomes são atribuídos segundo as regras IUPAC. Nas fórmulas condensadas são usados parênteses para definir a que átomo de carbono é que a cadeia ramificada está ligada. Por outro lado os átomos de carbono nas moléculas orgânicas são classificados segundo o número de átomos de carbono que estão ligados a ele como a seguir se descreve. primário

carbonos

primários secundários terciários quaternários

1C 2C 3C 4C

CH3 H3C CH2 CH CH3

secundário terciário

4.2.3

Propriedades dos alcanos

O estado físico dos alcanos à temperatura ambiente varia com o seu peso molecular C1—C4 C5—C16 mais de C17

gases líquidos sólidos

Exemplos de alcanos na natureza: C27H56 - cera da pele da maçã C31H64 - cera das folhas do tabaco Os alcanos são os compostos orgânicos menos densos de todos os compostos orgânicos conhecidos. São insolúveis em água devido a serem compostos apolares, por existir pouca

34

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

diferença de valor de electronegatividade entre o átomo de carbono e o de hidrogénio. Os alcanos são normalmente usados como solventes de gorduras. — Menos densos que a água - petróleo, óleo, gasolina — Insolúveis em água - são compostos apolares — Usados como solventes — Armazenados sem decomposição por longos períodos. 4.2.4

Fontes naturais de alcanos

Gás natural 80% metano Gás natural

combustível aquecimento

10% etano

Pelo “cracking” do etano obtém-se o etileno que é usado em no fabrico de polímeros. CH3 CH3

900°C H2C CH2 + H2 cracking etileno

polimerização polietileno

Petróleo O petróleo é separado por destilação em colunas de fraccionamento nas refinarias, que o separa em sete fracções que são as seguintes: Gases de ponto de ebulição inferior a 20ºC- Ponto de ebulição (p. e.) menor de 20°C. Semelhante ao gás natural mas inclui alcanos ramificados. Alcanos C1—C5 (gases). Líquidos com pontos de ebulição entre 20 e 100ºC - Alcanos de fórmulas moleculares de C5C7 lineares ou ramificados chamados nafta. Líquidos com pontos de ebulição entre 100 e 200ºC -Alcanos e compostos aromáticos de C5C10; a gasolina é recolhida nesta fracção. Líquidos com pontos de ebulição entre 200 e 300ºC - Alcanos C11-C16 fonte de queroseno. Líquidos com pontos de ebulição até 400ºC - Hidrocarbonetos contendo mais de C15. Esta fracção é a fonte de Diesel e do fuel. Líquidos residuais – Hidrocarbonetos de fórmulas moleculares com mais de 20 átomos de carbono que são utilizados como óleos lubrificantes. Resíduo sólido - Asfalto, alcatrão e ceras parafínicas. Os alcanos também podem provir da decomposição lenta de matéria animal ou vegetal na presença de água e ausência de oxigénio.

Química Orgânica A 4.3

35

CICLO-ALCANOS

Os ciclo-alcanos também fazem parte da família dos alcanos e têm a fórmula geral CnH2n. O ciclo-alcano mais simples é o ciclopropano C3H6. 4.3.1

Isomerismo cis-trans em ciclo-alcanos

Todos os ciclo-alcanos com dois ou mais substituintes não ligados ao mesmo átomo de carbono exibem um tipo de estereoisomerismo configuracional conhecido por isomerismo cis-trans. As conectividades são as mesmas mas são possíveis diferentes orientações por os substituintes poderem estar ligados do mesmo lado do anel ou de lados diferentes. O anel constitui um plano de referência para a molécula. Estes isómeros configuracionais são compostos diferentes que podem ser separados por métodos físicos e identificados, contrastando com o comportamento dos isómeros conformacionais. — cis relação entre substituintes para o mesmo lado do plano do anel, ambos para cima do plano ou para baixo do plano. — trans relação entre substituintes para lados opostos do plano do anel, para cima e para baixo do plano da molécula. Por exemplo o ciclo-alcano 1,2-dimetilciclopropano existe como dois isómeros diferentes: cis1,2-dimetilciclopropano e trans-1,2-dimetilciclopropano. Estes são dois compostos diferentes com propriedades físicas completamente distintas. para cima do plano

H3C

CH3 cis

para baixo do plano

para baixo do plano H3C

cis

CH3

H3C

estruturas idênticas cis-1,2-dimetilciclopropano

4.3.2

para cima do plano

trans

CH3

trans-1,2-dimetilciclopropano

Alcanos policíclicos

Além dos alcanos monocíclicos com um anel existem muitos alcanos interessantes que contèm mais do que um anel fundido. Os bicíclicos são aqueles que apresentam dois anéis fundidos e os policíclicos com vários anéis fundidos. decalina H

H

H

H

H

H

cis - decalina

biciclo[3,2,1]octano

trans-decalina

36

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

biciclo[3,2,1]octano

4.4

CONFORMAÇÕES DO CICLO-HEXANO

O ciclo-hexano pode adoptar várias conformações sendo as mais conhecidas as de cadeira e barco. Para uma molécula de ciclo-hexano existem duas conformações em cadeira que se interconvertem através da conformação em barco. Na conformação em cadeira os substituintes apresentam-se orientados segundo o eixo da cadeira (substituintes em posição axial) ou apresentam uma orientação segundo o plano da cadeira (substituintes equatoriais). conformação cadeira eixo do anel

- substituinte equatorial - substituinte axial

As conformações em cadeira são interconvertíveis e os substituintes que se apresentam como axiais numa conformação passam a equatoriais na outra conformação e vice-versa. cadeira

barco

cadeira

após conversão

antes da conversão

Na conformação em cadeira existe repulsão entre os substituintes. Esta repulsão depende da posição relativa dos substituintes e do seu volume. De um modo geral os substituintes na posição axial apresentam maior repulsão do que aqueles que se encontram em posição equatorial. X H 3 H

1

5 repulsão estereoquímica entre X e os átomos de hidrogénio axiais em posição 3 e 5.

H 3 H

1X

5 não existe repulsão entre X e os átomos de H pois o substituinte X encontra-se em posição equatorial

Química Orgânica A

37

Grupos X volumosos como o t-butilo (CH3)3C apresentam-se quase exclusivamennte em posição equatorial (> 99% do confórmero equatorial é preferido). 4.4.1

cis-trans

Os ciclo-hexanos dissubstituídos apresentam isomeria cis-trans. Se os dois substituintes se encontram para o mesmo lado do plano da molécula eles estão em posição cis, se se apresentam para lados opostos do plano da molécula então apresentam uma relação trans. Esta classificação não depende da posição equatorial ou axial dos substituintes como se pode observar nos exemplos seguintes: CH3 axial

CH3

axial

CH3 equatorial

menos estável CH3 axial

(axial, equatorial)

(diaxial)

axial equatorial mais estável

CH3 CH3 equatorial (di-equatorial) substituintes em posição trans

4.5

CH3 CH3 equatorial

(equatorial, axial) substituintes em posição cis

REACÇÕES CARACTERÍSTICAS DE ALCANOS E CICLO-ALCANOS

Apesar da pouca reactividade dos alcanos, frente a ácidos ou bases e a oxidantes e redutores, os alcanos sofrem contudo reacções radicalares, tais como a halogenação e a combustão. 4.5.1

Reacção radicalares

4.5.1.1 Halogenação de alcanos Força da Ligação na formação de radicais Um radical forma-se por quebra homolítica de uma ligação entre dois átomos, essa quebra requer energia que tem de ser fornecida à molécula na forma de calor ou energia fotoquímica. A recombinação de dois radicais origina uma ligação entre os átomos num processo de libertação de energia. Este processo está ilustrado de seguida para o hidrogénio.

38

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço H

+

H

H

A

H

H

ΔH0 = - 104 kcal mol-1

H

0

-1

ΔH =

H + H

104 kcal mol

A

+

B

quebra homolítica da ligação origina os radicais

A

+

B

quebra heterolítica da ligação origina iões

B

4.5.1.2 Cloração Substituição de um átomo de hidrogénio num alcano por um átomo de cloro é a reacção de cloração de um alcano. O metano é convertido no clorometano com libertação de 25 kcal mol-1, numa reacção exotérmica. (163 –188=25 kcal mol-1) Δ H3C

+

H

Cl

58 kcal mol-1

105 kcal mol-1

+

CH3 Cl

Cl ou irradiação com U.V.

H Cl

85 kcal mol-1

103 kcal mol-1

-188 kcal mol-1

+163 kcal mol-1

Reacção exotérmica. Liberta-se 25 kcal mol-1

A reacção é radicalar e dá-se por passos. Eles são os seguintes: — Iniciação Cl

Cl

Δ

2 Cl

ou hυ

— Propagação H

H Cl

+

H

C

H

Cl

H

H

+

H

H 105 kcal mol

C

-1

103 kcal mol

-1

Química Orgânica A H H

C

39 H

+

Cl

Cl

H

H

C

Cl

+

Cl

H 58kcal mol-1

—Terminação Cl

+ Cl

Cl2

CH3

+ Cl

CH3Cl

CH3

+ CH3

H3C CH3

Halogenação - generalização da reacção de cloração A reactividade dos halogénios frente à abstracção de hidrogénio é a seguinte: F

> Cl

> Br

> I

A energia de dissociação de alcanos está representada na tabela seguinte: Ligação quebrada CH3

H

C2 H5

H

C3 H7

H

(CH3)2 CH

(CH3) 3C H 3C (CH3)2 CH

(CH3) 3C (CH3) 3C

(kcal mol-1) 105 98 98

H

H CH3 CH3

CH3 C(CH3) 3

94.5 93 90 86 84 72

4.5.1.3 Estabilidade dos radicais Os radicais de carbono são muito reactivos com tempos de vida curtos. A estabilidade dos radicais alquilo é a seguinte:

40

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço <

CH3

primário

H H

<

secundário

H

C

C

terciário

C

C

H

<

C

H

C

C

C

H

C C

é necessário maior energia para os formar

O radical metilo CH3. é o mais difícil de formar. Reactividade e estereoselectividade Pode-se afirmar que a 25ºC as reactividades relativas das várias ligações C-H nas clorações é: Terciário:secundário:primário = 5:4:1 O que está de acordo com a reactividade relativa esperada quando se considera a força da ligação. A ligação C-H de um carbono terciário é mais fraca que a de um secundário e esta mais fraca que a de um carbono primário. Pode-se verificar esta ordem comparando os três tipos de átomos de hidrogénio presentes num único substrato. O 2-metilbutano é um bom exemplo. CH3 Cl2 +

cloro

CH3

C

CH3 CH2

CH3



ClCH2

-HCl

C

CH3 CH2

CH3

H

H

2-metilbutano

1-cloro-2-metilbutano

+ CH3

C

CH2

CH2Cl

H 1-cloro-3-metilbutano

27%

14%

Substituição num carbono primário: 41% = 27% + 14%

CH3 H +

CH3

C

C

H

Cl

CH3 CH3 +

2-cloro-3-metilbutano 36% Substituição num carbono secundário

O rendimento vem distribuído do seguinte modo:

CH3

C

CH2

CH3

Cl 2-cloro-2-metilbutano 23% Substituição num carbono terciário

+

Química Orgânica A 41%

cloreto primário

36%

cloreto secundário

23%

cloreto terciário

41% nº de átomos de hidrogénio

41

36%

:

9

23%

:

2

H - primários

1

H - terciários

H - secundários

A bromação é mais regiosselectiva originando quase exclusivamente o brometo terciário por causa da energia do estado de transição. Br hυ

Br2

+

Br +

H -HBr

1-bromo-2-metil propano

1-bromo-2-metil propano

>99%

C—Cl > C—Br > C—I

reactividade relativa

C—F < C—Cl < C—Br < C—I

A força da ligação varia inversamente com a reactividade relativa em reacções iónicas. Os fluoretos de alquilo são muito inertes do ponto de vista químico. A falta de reactividade química confere aos hidrocarbonetos fluorados usos variados: exemplo o Teflon é usado para revestimento de frigideiras

Química Orgânica A

F

F

C

C

F

F

45

polímero n

Teflon

5.1.2

Outras propriedades

A maior parte dos haletos de alquilo são líquidos à temperatura ambiente e a sua temperatura de ebulição é superior à dos alcanos de onde derivam. O ponto de ebulição (p.e.) de um haletos de alquilo aumenta ao longo da série R

ex: etano

<

F

fluoretano F

CH3

p.e.

CH3

-89°C

CH3

CH2

-37°C

R

Cl

<

cloroetano Cl CH3

R

<

Br

R

bromoetano Br

CH2

CH3

iodoetano

I

CH2

CH3

38°C

12°C

I

CH2

72°C

A maior parte dos haletos de alquilo líquidos é insolúvel em água e mais denso do que ela. CH2Cl2

5.2

1,3g/mL

H 2O

1,0g/mL

ENANTIOMERIA

Os enantiómeros constituem um caso especial de estereoisómeros, o que quer dizer que têm a mesma conectividade, mas diferem na sua orientação tridimensional. Na Tabela-Tipos de Isómeros resumem-se todos os tipos de isomeria que surgirão ao longo do curso. Um enantiómero tem uma propriedade física única que é rodar o plano de polarização da luz, é opticamente activo. Esta rotação é detectada e medida num polarímetro. Um polarímetro possui um cristal polarizador (prisma), um tubo fechado com a amostra e um cristal analisador. - 45º

Solução da amostra

α

α

polarizador Luz natural plano da luz polarizada não polarizada (a fonte de luz usada no polarimetro é normalmente a luz amarela da lâmpada de sódio, a chamada risca D do sódio

analisador plano da luz polarizada rodado de α°

nova direcção direcção inicial de vibração da luz polarizada

46

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

A rotação observada [α]obs é assim medida no polarímetro. A rotação varia com o solvente usado na solubilização da substância. A rotação específica [α ]D é uma propriedade física característica de cada enantiómero. t °C

temperatura da solução

t °C D

[ α] α

t D

=

risca D do sódio (λ = 589 nm)

α obs comp. do tubo (dm) x concentração da amostra (g/ml)

A que se deve o aparecimento do fenómeno de enantiomeria? A causa mais comum é a presença de um carbono quiral i.e. um carbono com quatro substituintes diferentes. Um objecto com um plano de simetria é aquiral. Um objecto sem plano de simetria é quiral. Um plano de simetria existe quando uma parte do objecto é imagem da outra metade.

5.2.1

Regras de Cahn-Ingold-Prelog

Usam-se as Regras de Cahn-Ingold-Prelog ou abreviadamente Regras CIP para classificar os carbonos quirais em R (do latim Rectus) ou S (do latim Sinister). Procedimento: 1º Localizar o carbono quiral (C*), identificar os seus quatro substituintes 2º Classificar os substituintes quanto à sua prioridade. 3º Desenhar a fórmula tridimensional colocando o substituinte de menor prioridade para trás do plano do papel. 2º Verificar as prioridades 1º, 2º, 3º, 4º a cada um dos substituintes sendo 1º >2º > 3º > 4º

se º2

3º C



R



se º1

3º C 4º



S

Determinação das prioridades 1º

Atribuir prioridades aos átomos segundo o valor decrescente de nº atómico Z

47

Química Orgânica A atribuição das prioridades a partir dos números atómicos dos elementos

a I Cl C* Br c H b d

I = 53

a Cl H3C C* CH2CH3 c H b d



Br = 35 Cl = 17

a b c

H=1

d

Cl = 17

a

C = 6

b ou c d

H=1

qual?

Análise dos substituintes que possuem os dois átomos de carbono H=1 H=1 H=1

H C H H

CH3

CH2CH3

H=1 H=1 C=6

H C H C H HH

CH2CH3 b

CH3 c

Números atómicos do 1º átomo que se liga ao carbono quiral 1 H

6 CH3

6 CH2CH3

7 NH2

6 CH2CH3 CH3

8 OH

9 F

prioridade aumenta

Números atómicos do segundo átomo ligado ao carbono quiral 1 CH3

6 CH2CH3

6 CH3 CH CH3 6

7 CH2NH2

8 CH2OH

53 CH2I

3º Para o mesmo número atómico tem precedência o isótopo mais pesado, de maior massa atómica. Conhecem-se três isótopos do hidrogénio.

48

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

T H

D

3 1H

>

trítio T

>

b

>

prioridade

CHDTOH metanol

OH

2 1H

>

deutério D > c

1 1H

prótio H d

>

Portanto a molécula do metanol, abaixo indicada, em que dois átomos de prótio (o isótopo mais abundante do hidrogénio) foram substituídos por um de deutério e um de trítio (cf. tabela de isótopos), tem quiralidade e designa-se por S-metanol. H H

T

OH H

metanol não quiral

H

OH H

OH D

T

D

S-metanol

OH H D

T

R-metanol

49

Química Orgânica A

5.2.1.1 Alguns isótopos usados em química orgânica

Elemento Hidrogénio prótio : deutéri o trítio

Carbono

Oxigénio

Azoto

Flúor Iodo

1 1H

Abundância natural ou tipo de decaimento Vida média 99,985% estável

2 1H

0,015%

estável

3 1H 12 6C 13 6C 14 6C 15 8O 16 8O 17 8O 18 8O 13 7N 14 7N 15 7N 18 9F 19 9F 127 53 I 128 53 I 131 53 I

β-

12,3 anos

98,89%

estável

1,11%

estável

β-

5570 anos

β+ 99,76%

124 segundos

0,0374%

estável

0,2

estável

β+ 99,634%

10,1 minutos

0,366%

estável

β+ 100%

110 minutos estável

100%

estável

ββ-

25 minutos

estável

estável

8,1 dias

4º Se um dos substituintes contiver uma ligação múltipla então considera-se que ao átomo em análise estão ligados tantos átomos quanto a multiplicidade da ligação. C O

considera-se

O (C) C (O) átomos duplicados entre parêntesis átomos duplicados entre parêntesis

C C

considera-se

(C) (C) C C (C)(C)

Existem muitas drogas que são misturas racémicas, e para as quais apenas um dos enantiómeros tem a actividade biológica desejada.

50

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço IBUPROFEN analgésico

H3C

H CH3 C CH2

* H3C

O C H OH

— só o enantiómero apresentado é analgésico mas é vendido como uma mistura racémica

Carbono quiral R ou S ? RESP: S

O N O

N H

Br F

I Cl

O

O

TALIDOMIDA

Em 1963 a droga foi desenvolvida para combater o enjôo matinal em mulheres grávidas e o seu uso revelou-se desastroso, dado ser um teratogéneo poderoso. Identificar o carbono quiral da talidomida.

qual a quiralidade do carbono desta molécula?

51

Química Orgânica A 5.3

REACÇÕES DE SUBSTITUIÇÃO COM HALO-ALCANOS OU HALETOS DE ALQUILO R

X

halogénio

A ligação polarizável C-X quebra sob condições moderadas o que permite ao halogénio ser substituído por grande variedade de outros grupos em reacções de substituição que estão na origem de vários compostos orgânicos. Y

+ R X

R Y

+

X

ligação polarizada Y

nucleófilo

SN

substituição nucleófila

X

grupo de saída ou aceitador do par electrónico

Nu

nucleófilo

doador de electrões pode ser neutro ou carregado negativamente

Reacção de substituição nucleófila (SN). Nu

+ R X

R Nu

+ X

Nu

+ R X

R Nu

+ X

Como existem vários nucleófilos, pode-se formar uma grande variedade de produtos nesta reacção. Exemplo da reacção com CH3CH2—Br Nu- + CH3CH2 Br

Nucleófilo -:OH -:OR -:SH -:SR :NH3 :C N :C CH IR-CH2-

5.3.1

Nome Hidróxido Alcóxido Hidrosulfureto Mercaptido Amoniaco Cianeto Acetileto Iodeto Carbanião

Mecanismo da Reacção SN2

CH3CH2 Nu + Br

Produto C2 H5 OH C2 H5 OR C2 H5 SH C2 H5 SR C2H5 NH2 C2 H5 CN C2 H5 C CH C2 H5 I C2H5-CH2-R

Nome da família Álcool Éter Tiol Tioéter Amina Nitrilo Alcino Iodeto de alquilo Alcano

52

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

O mecanismo de uma reacção é a descrição detalhada dos passos individuais pela qual a transformação total ocorre. Existem vantagens em conhecer o mecanismo: 1 - Muitas reacções ocorrem pelo mesmo mecanismo. Assim, em lugar de se saber imensas reacções, poderemos unicamente saber alguns mecanismos e aplicá-los às diferentes reacções. 2 - Se se conhecer o mecanismo da reacção pode-se predizer o efeito na reacção, alterar a natureza de um substrato ou reagente ou alterar das condições da reacção. 3 -Quando se pensa nas reacções pretende-se minimizar as reacções secundárias ou laterais que produzem produtos indesejáveis. S Substituição N Nucleófila 2

bimolecular - 2 reagentes estão envolvidos no passo lento da reacção. a b c

HO:

Br

nucleófilo

O ião hidróxido nucleófilo ataca do lado de trás do átomo de carbono contendo o bromo. O carbono está relativamente electrodeficiente devido à elevada electronegatividade do átomo de bromo. A nova ligação carbono-hidroxilo é formada parcialmente pela doação do par electrónico do oxigénio, não compartilhado, ao carbono. A densidade electrónica do oxigénio diminui.

δ- a δHO Br c b

A ligação carbono-bromo alargada quebra-se parcialmente sob a influência do ataque pelo ião hidróxilo. O bromo adquire uma densidade adicional de electrões, fornecendo-lhe uma carga parcial negativa.

estado de transição

No estado de transição, os três substituintes do carbono que não estão envolvidos adquirem um arranjo planar em torno do carbono central, perpendicular ao eixo hidroxilo-carbono-bromo.

a HO c

b

Br: grupo de saída

A reacção termina na completa ligação carbono-hidroxilo e quebra completa da ligação carbono-bromo. Durante a reacção global o carbono sofreu inversão da configuração.

A reacção completa é representada por: NaOH hidróxido de sódio

+

R-Br brometo de alquilo

R-OH álcool

+

NaBr brometo de sódio

Química Orgânica A

53

5.3.1.1 Velocidade de uma reacção v = k[brometo alquilo] [ião hidróxido]

2ª ordem – ordem da reacção 1ª ordem em relação a cada reagente

Conclusão: A velocidade é influenciada pela concentração de ambos os reagentes. O passo determinante da velocidade da reacção envolve ambos os reagentes, e a reacção diz-se de 2ª ordem. 5.3.1.2 Energética da reacção

δNu

R

δX

estado de transição

energia livre

ΔG

(energia de activação)

variação da energia livre Nu + R-X reagentes ΔG° R-Nu+Br produtos coordenada da reacção

A energia de activação ΔG representa a barreira energética entre os reagentes e o estado de transição ( ). Quanto maior, menor a velocidade. ΔG

maior

Reacção concertada

velocidade de reacção mais baixa reacção num passo único

Uma vez passado o estado de transição, a libertação de energia acompanha a formação rápida dos produtos. A reacção é concertada e dá-se num só passo.

5.3.1.3 Estereoquímica do mecanismo SN2 O nucleófilo liga-se com o átomo de carbono pelo lado oposto do átomo de bromo que sai, o que resulta na inversão da configuração no átomo de carbono. O processo de inversão é como um guarda-chuva que inverte com o vento.

54

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

Exemplo: H C2H5 Br CH3 (R)-2-bromobutano

NaI acetona

I

H C2H5 CH3

NaBr

(S)-2-iodobutano

A reacção SN2 é estereospecífica porque produz um composto com uma configuração específica, isto é produz um único enantiómero. Atenção: Se se partir de uma mistura em quantidades iguais do enantiómero de configuração R e do enantiómero de configuração S, a chamada mistura racémica, o produto da reacção será também uma mistura racémica, já que cada um dos enantiómeros sofre inversão formando o outro.

Na maior parte dos casos este é o que se passa nas reacções realizadas no laboratório porque os reagentes utilizados são na maior parte da vezes misturas racémicas. Os compostos que são comercializados como um único enantiómero são os produtos naturais, como os amino ácidos da série D ou da série L, os açúcares como a glucose, etc. Um caso particular pode ser ilustrado pelos ciclo-hexanos substituídos, como o exemplo seguinte. Aqui considera-se a posição relativa dos dois substituintes. No cis-1-bromo-4-tbutilciclo-hexano os dois substituintes apresentam-se ambos para baixo do plano da molécula, encontram-se em posição cis, para o mesmo lado do plano. No produto resultante da reacção SN2 o átomo de bromo é substituído pelo átomo de iodo, com inversão da configuração do átomo de carbono a que está ligado, e os substituintes passam a ficar para lados opostos do plano do anel. Estão em posição trans. Aqui estamos a falar de configurações relativas, cis e trans e não de configurações absolutas. NaI acetona

I

Br cis-1-bromo-4-t-butilciclo-hexano

trans-1-t-butil-4-iodociclo-hexano

5.3.1.4 Reactividade do grupo alquilo Átomos de carbono ligados a diferentes grupos alquilo reagem com facilidade diferente em reacções SN2. Para uma reacção SN2 se dar com sucesso são necessários alguns requisitos: 1. — O sucesso da reacção está na capacidade do nucleófilo alcançar o átomo de carbono pela parte de trás da ligação carbono-halogénio, de modo a formar a nova ligação. 2. — Qualquer característica estrutural do grupo alquilo que iniba a aproximação do nucleófilo torna a reacção mais difícil a energia de activação mais elevada e a velocidade menor.

55

Química Orgânica A

3. — O efeito estereoquímico na reacção SN2 faz-se sentir devido ao volume dos substituintes ligados ao átomo de carbono. O haleto de alquilo é mais reactivo numa reacção SN2 quanto menos impedido for estereoquimicamente. A reactividade em reacções SN2 segue a ordem seguinte segundo a natureza do átomo de carbono onde se vai dar a substituição: metilo > primário (1º) > secundário (2º)

H3C Br metilo

H3C H C Br H

H3C H3C C Br H secundário

primário

H3C H3C C Br CH3 terciário não ocorre reacção SN2

Se o nucleófilo, o carbono atacado e o grupo de saída não assumirem uma posição colinear no estado de transição, a reacção não ocorre. Isto é o que acontece nos átomos de carbono terciários. 5.3.1.5 Efeito do grupo de saída Quanto mais fácil a quebra da ligação carbono-halogénio num haleto de alquilo, mais rápida será a reacção SN2. Relembrando: Comprimento da ligação varia da seguinte forma: C—F < C—Cl < C—Br < C—I Força da ligação varia da seguinte forma: C—F > C—Cl > C—Br > C—I Polarizabilidade varia da seguinte forma: F < Cl < Br < I reacções SN2 mais lentas R Ι

>

R Br

> R Cl

mais utilizados, mais fáceis de preparar reacções SN2 mais rápidas

Problema:

56

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

Usando setas, mostre qual o mecanismo e os detalhes estereoquímicos da reacção do iodeto de sódio com o trans-1-t-butil-4-clorociclo-hexano. 5.3.1.6 Efeito dos nucleófilos São ainda factores importantes nas reacções SN2 1. A concentração do nucleófilo. 2. A força do nucleófilo 3. A força dos nucleófilos (nucleofilia). Quanto mais forte o nucleófilo, mais facilmente os seus electrões são compartilhados com o carbono na formação de uma ligação. 1) - Os aniões são geralmente melhores nucleófilos que os ácidos conjugados de onde derivam HO- > HOH (H2O) RO- > ROH 2) – Em geral as bases são tanto mais nucleófilas quanto mais básicas forem: RO- > HOA força de uma base mede-se pelo seu Kb. Quanto maior o Kb mais forte é a base. O Kb está directamente relacionado com o Ka e varia na razão inversa. Em conclusão: Quanto maior o pKa do ácido conjugado, menos forte é a base. Exemplo: pKa do ácido conjugado, H2O (pKa=15.7) Comparando com o pKa de um álcool (pKa=17) : RO- + H3O+

ROH + H2O Ka =

[H3O+ ] [RO- ]

pKa=17

pKa = -log Ka

[ROH] Ka maior

mais dissociado

ácido mais forte

3) – Em geral na tabela periódica a nucleofilia aumenta ao longo do grupo, São melhores nucleófilo os átomos maiores que os mais pequenos.

F

<

Cl

<

Br

HO

<

HS

<

I

aumenta

4) - Nucleofilia aumenta da direita para a esquerda ao longo do período da tabela periódica, para espécies com a mesma carga: F

<

O

<

N

<

C

57

Química Orgânica A

Os catiões nunca participam como nucleófilos em reacções de substituição. 5.3.1.7 Efeito do solvente Existem dois tipos de solventes com características diferentes que podem influenciar o percurso de uma reacção: São eles os solventes próticos e os apróticos. A seguir temos alguns exemplos desses solventes. solventes apróticos O H3C S CH3 Dimetilsulfóxido (DMSO) O H C N

solventes próticos H3C OH Metanol H3CH2C OH Etanol

CH3 CH3

N,N-Dimetilformamida (DMF)

H

O

H

Água

O H3C

CH3

Acetona

Os solventes apróticos não possuem átomos de hidrogénio polarizados e são preferíveis em reacções SN2. Em resumo:

5.3.1.8 Reacção SN2 de um nucleófilo com um haleto de alquilo 1. — A reacção só é efectiva com haletos de alquilo tal como o metilo, um alquilo primário ou secundário 2. — Ocorre estereospecificamente com inversão de configuração no carbono que sofre o ataque nucleófilo. 3. — Utilização de iodetos e brometos de alquilo é preferível, pois os cloretos de alquilo reagem mais lentamente. 4. — É uma reacção de 2ª ordem, cuja velocidade é afectada pela concentração de haleto de alquilo e agente nucleófilo. 5. — Nucleófilos fortes são mais efectivos que nucleófilos fracos. 5.3.1.9 Complicações com substituições nucleófilas de haletos de alquilo terciários

58

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

O que acontece com haletos terciários? Quando se pretende fazer uma reacção de substituição em haletos de alquilo terciários, com o átomo de halogénio ligado a um átomo de carbono que não tem nenhum substituinte hidrogénio, a reacção não se dá, mas em alternativa podem ocorrer reacções de eliminação. As reacções de eliminação ocorrem quando se utilizam nucleófilos que são bases fortes. Neste caso o nucleófilo não pode atacar devido ao impedimento estereoquímico a que o átomo de carbono que está ligado ao átomo de halogénio está sujeiro. E por isso como se trata de uma base em alternativa remove um protão do átomo de carbono adjacente ao átomo de carbono ligado ao halogénio, originando uma ligação dupla com saída do halogeneto. Esta reacção é uma reacção de eliminação E2

Exemplo: Método Geral haleto de alquilo

E2

alceno

E2 C X

C

C

Exemplo para a reacção entre o cianeto de sódio e o brometo de t-butilo, onde o átomo de bromo está ligado a um átomo de carbono terciário

Na CN cianeto de sódio

CH3 H3C C Br CH3

E2

brometo t-butilo

H2C C

CH3 CH3

NaBr

HCN

isobutileno

Se o nucleófilo for fraco e for usado com um haleto terciário obtém-se uma mistura de produtos. No exemplo seguinte apresenta-se a reacção do cloreto de t-butilo com o etóxido de sódio e com o etanol. No primeiro caso, como o nucleófilo é uma base forte temos unicamente uma reacção de eliminação formando o isobutileno como produto único. No segundo caso, estamos perante um nucleófilo fraco e uma base fraca de modo que apesar de ainda haver algum produto de eliminação, o isobutileno 20%, forma-se preferencialmente o tbutil etil éter num rendimento de 80%. Esta reacção de substituição não segue um mecanismo SN2 mas um mecanismo SN1.

59

Química Orgânica A Na+

-

OC2H5

H2C C

CH3

+

NaCl

+

CH3 isobutileno

CH3 H3C C Cl CH3

C2H5OH

produto principal CH3 OC2H5 CH3 80% t-butil etil éter

H3C C2H5OH

H2C C

CH3 CH3

20% isobutileno produto secundário

Em conclusão, a substituição em átomos de carbono terciários dá-se por um mecanismo SN1. 5.3.2

Mecanismo da reacção SN1 H2O R Br brometo de acetona alquilo

HBr

R OH álcool

ácido bromídrico

Mecanismo (em 2 passos) perda de protão R1 R C Br R3

-Br

2

brometo de alquilo

1º PASSO Formação do carbocatião terciário

R1 R2 C+ R3 carbo catião

H2O

R1 H R2 C O H R3 + ião oxónio

2º PASSO Adição do nucleófilo

- H+

R3 O C H R2 1 R álcool

60

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

Sob a influência da ionização do solvente a ligação C—Br quebra-se lentamente Os electrões vão para o halogénio mais electronegativo, deixando para trás um carbono electrodeficiente (um carbocatião)

a b

Br c composto puro passo lento: determina a velocidade da reacção

- Br-

a b c+ b H2O

a) a b

O c

b)

O carbocatião é um intermediário reactivo (tempo de vida curto) e não um estado de transição. Há um estado de transição para se formar o carbocatião. O carbocatião é estabilizado por solvatação e hiperconjugação. O carbocatião é planar. A hibridação do átomo central é sp2 com uma orbital p perpendicular ao plano dos átomos.

H + a O b H c

H H

H2O -H3O+ mantém configuração a

* OH b c

H2O

-H3O+

A molécula de água ataca o carbocatião por cada um dos lados. Produz um ião oxonium em cada um dos casos. A carga positiva do C é neutralizada ficando o O com carga positiva.

inverte configuração a HO * b c

O ião oxonium dá um protão ao solvente água, formando o ião hidrónio e o álcool. Se houver um centro estereoquímico no início, resulta na formação de um racemato (par de enantiómeros)

racemato

A velocidade só depende da concentração do haleto de alquilo. A concentração e a força do nucleófilo não têm efeito na velocidade da reacção. v = k[brometo alquilo]

1ª ordem

Reacção unimolecular 5.3.2.1 Energética O carbocatião é o intermediário reactivo, é uma espécie com um carbono com três ligações e com uma carga positiva.

61

Química Orgânica A

energia livre

estado de transição 1

carbocatião reactivo R+ estado de transição 2 Δ G2

Δ G1

ΔG1 energia de activação para formação do carbocatião

Nu + R-X ΔG° reagentes R-Nu+X produtos

ΔG2 energia de activação para a reacção do carbocatião com o nucleófilo

coordenada da reacção

5.3.2.2 Estereoquímica O carbocatião é sempre uma espécie aquiral e tem um plano de simetria. A sua estrutura resulta do carbono passar da hibridação sp3 no halo-alcano, para sp2 depois da saída do ião haleto X-. A reacção SN1 é uma reacção não estereospecífica que origina sempre uma mistura racémica, dado o nucleófilo se poder aproximar de ambos os lados do carbocatião intermediário formado. Reacção de racemização, não estereospecífica

CH3 Br C2H5

CH3 H2O acetona

C3H7

(R) -3-Bromo-3-metil-hexano

CH3 OH

H5C2

C3H7

HO C2H5 C3H7

mistura de 1:1 de (S) e (R)-3-metil-3-hexanol mistura racémica

5.3.2.3 Efeito do grupo de saída Quanto mais facilmente o grupo de saída quebrar a sua ligação ao átomo de carbono (ligação mais fraca) mais rápida será a reacção SN1. O passo determinante da velocidade da reacção é a formação do carbocatião, 1º passo da reacção. 5.3.2.4 Força da ligação do grupo de saída ao átomo de carbono A força da ligação do grupo de saída, desde que halogénio ao átomo de carbono varia desde à ligação mais forte carbono-fluor e vai diminuindo até à ligação carbono-iodo, mais fraca: C—F > C—Cl > C—Br > C—I Os iodetos de alquilo sofrem reacções do tipo SN1 mais rápidas. Os iodetos e os brometos são em geral os haletos escolhidos para reacções de substituição do tipo SN1.

62

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

5.3.2.5 Efeito do solvente Qualquer solvente que favoreça a ionização e estabilize o carbocatião por solvatação facilita a reacção. Solventes próticos e polares, água e alcoois, são preferidos em reacções SN1. 5.3.2.6 Efeito do substituinte alquilo ligado ao átomo de Carbono que sofre substituição Devido ao mecanismo SN1 requerer a formação de um carbocatião intermediário, o halo-alcano deve poder formar um carbocatião estável. Caso contrário a reacção decorrá lentamente ou nem se dará. Os carbocatiões são espécies altamente reactivas e electrodeficientes. A ordem de estabilidade dos carbocatiões é: Terciários > secundários > primários

E os halo-alcanos terciários formam carbocatiões mais facilmente que os secundários. Carbocatiões em átomos de carbono primário são muito raros. 5.3.2.7 Comparação entre os mecanismos SN1 e SN2 A tabela seguinte faz uma comparação entre mecanismos SN1 e SN2: Parâmetro Velocidade da reacção Concentração do nucleófilo Força do nucleófilo Estereoquímica

Melhor solvente Estrutura favorável Melhor grupo de saída

5.4 5.4.1

SN2

SN1

2ª ordem Afecta a velocidade Modesta a fraca Estereospecífica Inversão Aprótico Metil > 1º > 2º I > Br > Cl

1ª ordem Não afecta a velocidade Irrelevante Não estereospecífica Racemização Prótico, polar 3º I > Br > Cl

OUTRAS REACÇÕES DE HALO-ALCANOS Síntese de compostos organometálicos δC

δ+ Metal

ligação covalente

δC

δ+ Metal

associada

C

Metal dissociada

carbanião — espécie muito reactiva

Os compostos organometálicos são compostos de carbono e hidrogénio que também possuem na sua constituição átomos de elementos metálicos na formação de ligações covalentes.

63

Química Orgânica A

A vantagem principal dos compostos organometálicos é que dão possibilitam a formação de novas ligações carbono-carbono. estes compostos têm de ser manuseados em condições anidras (ausência de água) por serem bases muito fortes retiram um protão à água. Neste capítulo vamos considerar os compostos organolítios, organomagnesianos e organocupratos. 1. Reactividade nucleófila: Reacção geral:

R

M

+

H

O H

M

+

R H alcano

OH

hidróxido de metal

Exemplo: Li metálico Br

HCl H2O

Li -LiBr

CH3 CH2 Br

Li metálico éter

H + LiCl

CH3 CH2 Li

+ LiBr

Reacção geral

R

5.4.2

CH3

Li metálico R CH2Li + LiBr

Reagentes de Grignard (organomagnesianos)

Vitor Grignard - químico francês - Prémio Nobel Química 1912 descobriu a seguinte transformação: éter

Mg

+

Br

MgBr

magnésio metálico

brometo de ciclopropilo

brometo de ciclopropilmagnésio

Reacção geral R

Br

+

Mg

éter

R

Mg

Br

64

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

5.4.3

Organocupratos de lítio

Reacção geral R2CuLi

+ CuI

2RLi

+

2LiI

organocuprato de lítio

iodeto cuproso

5.4.3.1 Alcanos a partir de organocupratos

Reacção geral eter R2CuLi

CH3CH2

CuLi

+

R'

X

Br

+

R

R'

+

LiX

+

RCu

SN2

éter

CH2CH3

CH2CH3 + CH3CH2

Cu +

LiBr

etilciclopentano

Os organometálicos com nucleófilos e a sua reactividade varia como a seguir apresentado. organo lítio > organo magnesiano > organo cuprato

5.5 5.5.1

HALO-ALCANOS IMPORTANTES Halo-alcanos como anestésicos

Em 1847 o clorofórmio (triclometano, CHCl3) tornou-se no primeiro anestésico de uso geral, que tornava os doentes inconscientes e relaxados. Foi no entanto posteriormente substituído por halo-alcanos de baixo ponto de ebulição: CF3 — CHClBr

halotano

CH3CH2 — Cl pontuais.

cloreto de etilo — anestésico local usado na pele para pequenas cirurgias

5.5.2

Halo-alcanos como solventes

Química Orgânica A

65

Os halo-alcanos são solventes excelentes, quer para reacções químicas, quer para limpeza e remoção de gorduras. O tetracloreto de carbono CCl4 foi o primeiro solvente utilizado na limpeza a seco, mas é tóxico e carcinogéneo por exposição crónica pelo que actualmente é proibido por lei ser utilizado para fins industriais. Cl3C

CH3 Cl

Cl C

H Cl

Cl C

5.5.3

tricloroetileno

C

Cl

Cl

metil clorofórmio ou 1,1,1-tricloroetano

percloroetileno

C Cl

Halo-alcanos usados em sistemas de refrigeração

Os fréons eram até há pouco tempo hidrocarbonetos halogenados utilizados nos sistemas de refrigeração dos frigoráficos caseiros, sistemas de ar condicionado e nos automóveis. Fréons — CFCs ou clorofluorocarbonetos — usados em frigoríficos caseiros, sistemas de ar condicionado em edifícios e automóveis O mais comum são os CFC clorofluorocarbonetos descobertos em 1930 — o Freon-12 (nome comercial) apresenta a estrutura abaixo representada. Cl

F C

Cl

F

Estes compostos apresentam vantagens significativas que são: — óptimas propriedades de transmissão de calor — baixa toxicidade — baixa flamabilidade — enorme estabilidade O Fréon-12 foi mais tarde usado como: — agente de limpeza em semicondutores e partes de computadores — agente propelante em embalagens de aerosol — agente de espuma em placas isoladoras — em chávenas e em materiais de embalagem Estes usos, associados a perdas nos sistemas de ar-condicionado deram origem à libertação de largas quantidades de Freon-12 para a atmosfera. Como resultado de medidas iniciadas em 1970, verificou-se que os CFCs eram tão estáveis que subiam na atmosfera até à estratosfera (cerca de 15 milhas de altura) sem se destruírem. A investigação posterior de Sherwood Rowland e Mario Molina, que receberam em 1995 o prémio Nobel da Química, veio demonstrar que nas regiões polares da terra, os CFCs reagiam

66

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

e faziam diminuir a camada de ozono. O ozono atmosférico é essencial para a protecção da terra dos efeitos nefastos da radiação ultravioleta (UV) proveniente do sol. Estruturas de ressonância do ozono

O

O O

O

O

O

Em 1987 um acordo internacional — o Protocolo de Montreal — baniu de modo faseado a produção pelos países industrializados de CFCs, o que foi conseguido em 1990. As nações menos desenvolvidas têm um período adicional de 10 anos para o fazerem. Os CFCs de substituição são:

5.5.4

CF3

CH2F

HFC-134a

CH3

CCl2F

HCFC-141b

Retardadores de chama

Hidrocarbonetos halogenados semelhantes aos CFCs são os halons ; produtos usados no combate a incêndios: Halon 1301 Halon 1211

CF3Br CF2Br Cl

Os halons são usados em bibliotecas, salas de computadores e de equipamento telefónico — em zonas onde a água não pode entrar. Não deixam resíduo ao evaporar e não conduzem a electricidade. Também já foram retiradas do uso em extintores e só são usados em casos especiais. 5.5.5

Insecticidas Cl Cl

Cl C Cl C H

Cl

DDT diclorodifenil tricloroetano

Descoberto em 1939, insecticida persistente, o DDT está hoje banido de usos agrícolas, mas em casos sérios de infestação de insectos tem sido usado. Nos EUA foi banido na década de 80 mas na Índia ainda se encontra em uso, assim como na América do Sul. 5.5.6

Compostos medicinais

Os perfluorocompostos têm a capacidade de dissolver mais oxigénio do que o próprio sangue humano 60% do volume versus 20%. Fluosol-DA — perfluorodecalina - substituto do sangue durante pouco tempo.

67

Química Orgânica A

F F F F

F F F F F F F F F F F F F F

Eficaz quando não há sangue ou não há sangue do tipo requerido. O seu uso é temporário porque gradualmente é excretado do corpo, e garante a vida do doente enquanto se prepara o sangue para fazer a transfusão. Outra das propriedades mais interessantes é para arrefecer computadores em banhos de arrefecimento, banhando as diferentes partes, os componentes, etc. Tal é possível por ser inerte, não conduzir a electricidade e ter boas propriedades de condução de calor.

6

ALCOÓIS

Os alcoóis podem ser primários, secundários ou terciários dependendo da classificação do átomo de carbono ao qual está ligado o grupo hidroxilo. De seguida estão representados alguns alcoóis. 2

1

CH3—CH2—OH etanol ou álcool vulgar

OH CH3—CH2—CH2—OH

CH3—CH—CH3

1 OH 2

OH

2 OH 3

1

1

1-propanol álcool primário

5

2

3

3

2-metil-2-propanol ou ter-butanol álcool terciário

2-propanol ou isopropanol álcool secundário

3

1 OH 1

1-pentanol

OH

OH 2

2-pentanol

1 2

3

3-pentanol

68

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

HO

2 CH3

OH

HO

3

1,3-propanodiol

1,2,3-propanotriol glicerol

HO

HO

1 2 OH

etilenoglicol 1,2-etanodiol

colesterol um esteróide

6.1.1

1

OH 1

2-metilciclopentanol

6.1

OH

3 2

1 OH

PROPRIEDADES DOS ALCOÓIS Pontes de hidrogénio

Os alcoóis apresentam a capacidade de estabelecer ligações de hidrogénio, o que se faz sentir no valor do seu ponto de ebulição (p. e.) que será superior ao esperado quando comparado com compostos de igual peso molecular. p.e.

p.e.

H2O

100°C

OH

118°C

H2S

-61°C

CH3

36°C

H2Se

-43°C

ponto de ebulição superior ao esperado

A razão para esta observação é a presença do grupo —OH e a elevada electronegatividade do átomo de oxigénio. Esta situação obriga à polarização da ligação O-H e C-O.

69

Química Orgânica A δO

C

δ+ H

— ligação de hidrogénio — ligação electrostática fraca a outra molécula com a energia de 5 Kcalmol-1. É uma ligação dipolo-dipolo.

polarização

intermoleculares as ligações de hidrogénio intramoleculares

Quanto maior o número de ligações em ponte de hidrogénio, maior a solubilidade em água.

H

O H

H O

H H

O

H

R

H

O

R

O H

H O

C2 H5

H O R álcool

H O H água + álcool á Compostos com mais do que um grupo hidroxilo tal como o glicerol, o etilenoglicol e os açúcares, são muitíssimo miscíveis com a água. H O H água

6.1.2

Acidez dos álcoois

Os álcoois na presença de bases fortes são capazes de dar o protão ligado ao oxigénio. São ácidos muito fracos, mais fracos que a água pelo que o seu pKa é superior ao da água. pKa = 15,9 do CH3CH2OH

o etanol é um ácido fraco

CH3CH2OH + H2O(l)

CH3CH2O + H3O

ácido fraco

base forte

pKa = 15,7 da água -logKa

H2O + H2O(l) Ka =

H3O + OH

[H3O ] [OH ] [H2O]

Face a isto é necessário uma base mais forte que -OH para remover o protão do álcool e produz o alcóxido em concentração apreciável.

70

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

R

O

H

+

álcool

CH3CH2OH etanol pKa=15,9

R

B base

+

O

+

BH

alcóxido

NaOH

base conjugada

CH3CH2O

+

Na

HOH água pKa = 15,7

etóxido de sódio

Nota: Este equilíbrio está deslocado para a esquerda porque a base não é suficientemente forte, de modo que quase não existe etóxido em solução.

A acidez relativa dos álcoois é afectada pelos substituintes ligados ao átomo de carbono que se encontra ligado ao grupo hidroxilo através do efeito electrónico exercido por eles. O efeito indutivo exercido pelos substituintes depende da sua electronegatividade. Pode ser electro-actractor (ex. átomo electronegatico) ou electrodoador ( ex. cadeias alquílicas).

6.1.2.1 Metanol (álcool metílico) H pKa = 15,5

H

H

C

O

H

H

C

H

O

+ H

H metóxido

6.1.2.2 t-butanol (álcool ter-butílico) CH3 OH

H3C > C

O

+ H

>

H3C > C

>

pKa = 18

>

>

CH3

CH3

CH3

grupo electro doador

ter-butóxido

6.1.2.3 2,2,2-trifluoroetanol H pKa = 12.4

CF3

C

grupo electro atractor

H

H OH

2,2,2-trifluoroetanol

CF3

C

grupo electro atractor

H

O

+ H

2,2,2-trifluoroetóxido

71

Química Orgânica A

6.1.2.4 Alcóxidos R

-H+

OH

R

álcool

Nota: Se durante a formação do anião alcóxido se libertar hidrogénio, como no caso da reacção com o sódio a reacção torna-se irreversível

O

anião alcóxido

alcóxidos

bases mais fortes que OH nucleófilos solúveis em solventes orgânicos

A força do alcóxido como base é inversa da força do ácido do álcool correspondente:

Basicidade CH3

H3C CH3O

<

O

<

H3C

H3C metóxido

iso-propóxido

O CH3

ter-butóxido

basicidade aumenta

6.2

6.2.1

REACÇÕES DOS ALCOÓIS

Conversão de álcoois em haletos de alquilo

Esta reacção é realizada com sucesso por o ião brometo ser um bom grupo de saída e o ião hidróxido um forte nucleófilo. A conversão dos halo-alcanos em alcoóis pode fazer-se usando uma reacção de substituição SN2.

72

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

SN2 R Br

+

brometo de alquilo

NaOH

R OH +

hidróxido de sódio

álcool

NaBr

Será possível fazer a reacção inversa? + ?

R OH

R Br

Existe um bom grupo de saída? — Não. O OH- é: — Base forte — Não é muito polarizável O grupo hidroxilo não é um bom grupo de saída e o anião brometo é um nucleófilo moderado de modo que é necessário transformar o grupo hidroxilo noutro grupo que apresente melhores propriedades de grupo de saída. 6.2.2

Reacções de álcoois com haletos de hidrogénio

Os alcoóis reagem com haletos de hidrogénio HI, HBr, HCl para formar halo-alcanos:

CH3CH2CH2 OH +

Δ

CH3CH2CH2 Br

HBr

+

álcool primário Δ OH +

I

HI

+

H2O

álcool secundário temp. OH

+

HBr

amb.

Br

+

H2O

álcool terciário

A ordem de reactividade dos alcoóis é

álcool terciário > álcool secundário > álcool primário

H2O

73

Química Orgânica A

Os álcoois primários e secundários reagem a quente mas os álcoois terciários reagem à temperatura ambiente. Mecanismo O mecanismo depende da natureza do álcool. Pode envolver um mecanismo de substituição nucleófila unimolecular, SN1, ou um mecanismo de substituição nucleófila bimolecular, SN2. 1º passo O primeiro passo do mecanismo envolve a protonação do grupo hidroxilo para formar o ião oxónio. Este passo de protonação transforma um mau grupo de saída, o ião hidroxilo, num bom grupo de saída, a água. A água é um bom grupo de saída que pode ser substituida pelo anião haleto numa reacção de substituição.

atenção: este é um composto quiral

R''' R'' C OH R'

H Br

R''' R'' C Br R' mantém a configuração no átomo de carbono

+

R''' Br C R'' R' inversão de configuração no átomo de carbono

um único enantiómero R''' Br C R'' R'

produto único

inversão de configuração no átomo de carbono

mistura racémica quantidades iguais de cada enantiómero

74

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

C

+

OH

H

HX H C

O

ião oxónio H

(álcoois primários X e secundários) SN2 (-H2O)

C

X

halo-alcano

(álcoois terciários) SN1 (-H2O)

(o carbocatião é armadilhado rapidamente pelo nucleófilo)

C

carbocatião X

C

X

halo-alcano

As reacções de substituição nem sempre dão unicamente os produtos de substituição mas dão por vezes produtos de eliminação, alcenos. Estes produtos são considerados produtos secundários das reacções de substituição visto formarem-se em quantidades inferiores às do produto desejado. A formação destes produtos depende da natureza do nucleófilo, bases fortes e maus nucleófilos, promovem a formação de reacções de eliminação e, também depende da natureza do álcool presente. Para ocorrerem reacções de eliminação é necessário que o álcool presente tenha protões ligados ao átomo de carbono adjacente ao carbono ligado ao grupo hidroxilo. As reacções de eliminação .ocorrem preferencialmente em álcoois terciários e geralmente não ocorrem em álcoois primários.

75

Química Orgânica A

Nu

C

Nu

SN 2 O C

H

H

C

O H

H

b) C

b)

H

-H2O

a) Nu

C

a)

carbocatião E1

b)

C

Nu

SN1

-H

C C

produto de eliminação

alceno

6.2.2.1 Teste de Lucas O teste de Lucas é um teste qualitativo que relaciona a velocidade de formação do carbocatião com a substituição no átomo de carbono. A formação do carbocatião é promovida pela acção de um ácido de Lewis. O ácido de Lewis utilizado é o cloreto de zinco (ZnCl2) que coordena com o grupo hidroxilo do álcool transformando-o num bom grupo de saída com formação do carbocatião correspondente. O carbocatião formado reage com o anião cloreto e forma um cloreto que é insolúvel na solução aquosa precipitando. Os álcoois que reagem melhor no teste de Lucas são aqueles que formam carbocatiões mais estáveis. Os álcoois terciários reagem mais depressa que os secundários, e os álcoois primários não reagem. 6.2.2.2 Estereoquímica Como já foi referido as reacções de substituição que ocorram num único enantiómero puro por um mecanismo SN1 conduzem a uma msitura racémica e aquelas que ocorram por um mecanismo SN2 conduzem à formação de um único enantiómero com configuração invertida em relação ao primeiro.

76

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

R''' R''

C

OH

R' HX

HX

-H2O

-H2O

SN2

SN 1 R'''

R''' X

R''

R''

C

X

+ X

R'

R' inversão

6.2.3

C

R''' C

R''

R racemização

Conversão estereospecífica de alcoóis em halo-alcanos

6.2.3.1 Inversão de configuração Anteriormente só havia inversão da configuração do álcool em reacções que seguiam um mecanismo SN2, em álcoois primários e nalguns secundários. As reacções a seguir descritas possibilitam realizar transformações com inversão da configuração em todos os álcoois independentemente da substituição do átomo de carbono. Reacção com o cloreto de tionilo Os álcoois primários e secundários reagem com cloreto de tionilo SOCl2 na presença de piridina numa reacção estereospecífica. piridina OH

+

SOCl2

Cl

+

+ N H

ciclo-hexanol

cloreto tionilo

cloreto de ciclohexilo ou clorociclo- hexano

SO2(g)

Cl

cloreto de piridinío

Mecanismo na presença de piridina: Na presença de piridina, que é uma base mas que também é um nucleófilo a reacção de formação do cloro-alcano dá-se com inversão da configuração do átomo de carbono: O mecanismo de reacção de um álcool quiral com o cloreto de tionilo na presença de piridina é o seguinte:

77

Química Orgânica A R''' R'' C O R' H

+O S

Cl

R''' O R'' C S Cl O R' H

- Cl

Cl cloreto de tionilo

R'' Cl

N

R''' O C O S

R'

N

inversão da configuração

na presença de piridina

R''' Cl C R'' R'

De modo semelhante o tribrometo de fósforo reage com os álcoois em reacções de formação de bromo-alcanos com inversão da configuração do produto formado.

H

+

OH

Br

Br P

Br

há inversão da configuração

H

Br H3C

H3C tribrometo (S,S)-trans-3-metilciclo-hexanol de fósforo

(R,S)-cis-3-metilbromociclo-hexano

6.2.3.2 Retenção de configuração E se quisermos efectuar a halogenação com retenção de configuração? Há apenas duas maneiras de converter um composto noutro com retenção de configuração. 1) usar uma só reacção cujo mecanismo force a retenção 2) usar uma sequência de duas reacções em que em ambas haja inversão de configuração. A reacção de um álcool com o cloreto de tionilo na ausência da piridina permite a formação de um cloro-alcano com retenção da configuração do álcool inicial. O mecanismo desta reacção é apresentado de seguida: R''' R'' C O R' H álcool quiral

+O S

Cl Cl

cloreto de tionilo

- Cl

R''

R''' C O

S O Cl retenção da configuração R'

R''' R'' C Cl R' retenção da configuração

Outro modo de obter um produto com a mesma configuração do produto inicial é realizar uma transformação que envolva dois passos, e que em cada um deles se verifique a inversão da configuração. Após duas inversões a configuração obtida é a configuração inicial.

78

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

R''' R'' C O H R'

Cl O S O

R''' R'' C O Ts R'

1º passo

R''' HO C R'' R'

-OTs

HO inversão de configuração

ester éster de tosilo (tosilato)

CH3 cloreto de tosilo = TsCl

Cl mesma configuração

O S

2º passo Cl

R''' R'' C Cl R'

+ SO2 (g) + Cl-

inversão de configuração

6.2.4

Oxidação de alcoóis

As reacções de oxidação são muito importantes e frequentes em química orgânica. A maior parte dos reagentes de oxidação são compostos inorgânicos. Quando um composto é oxidado, uma de duas coisas acontece: — há um aumento no conteúdo de oxigénio do substrato — há uma diminuição do conteúdo de hidrogénio do substrato Hierarquia dos estados de oxidação de alguns compostos orgânicos facilidade de oxidação

muito difícil RCH3 alcano

< RCH2OH álcool

R = alquilo, só por combustão

muito fácil

fácil

<

R

O C

H

aldeído

R = H, muito fácil

<

R

O C

OH

<

ácido carboxílico

O C O anidrido carbónico ou dióxido de carbono

A oxidação dos álcoois pode ser realizada pela acção de vários reagentes oxidantes dos quais vamos falar de três: O permanganato de potássio, o dicromato de sódio e o clorocromato de piridínio.

79

Química Orgânica A 1. O O

Mn

O

permanganato de potássio cor roxa

KMnO4

O

K permanganato de potássio

2.

O O Cr O Na O O Cr O O Na

oxidante forte

o dicromato de sódio na presença de H2SO4 e água origina o ácido crómico

Na2Cr2O7

O VI O H Cr O O H

cor de laranja

ácido crómico verdadeira espécie oxidante

dicromato de sódio

oxidante forte CrO3 + H2SO4 aq. o trióxido de crómio na presença de H2SO4 e água origina o ácido crómico

C5H6NCrO3Cl

3. N Cl O Cr OH O

clorocromato de piridínio, é obtido por reacção entre a piridina e o ácido clorídrico

(PCC)

clorocromato de piridínio

oxidante moderado

Em química orgânica é costume escrever-se uma reacção de oxidação sem nela explicitar os compostos inorgânicos resultantes: Oxidação de álcoois primários: Para obter um ácido carboxílico:

Reacção geral O

O R CH2 OH

Na2Cr2O7 H2SO4

R

C

R

H

ácido

aldeído

álcool primário

Exemplo: Na2Cr2O7 OH H2SO4 álcool isobutílico 2-metil-1-propanol

C

O OH ácido isobutírico ácido 2-metilpropanóico

OH

80

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

Para obter um aldeído: Se queremos obter o aldeído, então devemos usar o PCC que é mais selectivo. PCC

O

OH H álcool isobutílico 2-metil-1-propanol

isobutiraldeído 2-metilpropanal

Oxidação de álcoois secundários: Os álcoois secundários por oxidação dão as cetonas. Reacção geral R'

H Na2Cr2O7

R''

OH

R' O

H2SO4 R'' cetona

álcool secundário

Exemplo: Na2Cr2O7 O

OH H2SO4 ciclopentanol

ciclopentanona

Oxidação de álcoois terciários: Com os alcoóis terciários não há reacção. R' Na2Cr2O7 R''

OH

Não há reacção

R'''

A oxidação de álcoois é uma reacção muito importante em química biológica. São em parte as reacções da oxidação que metabolizam os alimentos e nos dão grande parte da energia de que necessitamos para o corpo. Embora os reagentes sejam diferentes, o resultado é o mesmo. Por exemplo durante um exercício físico violento, as células não obtêm oxigénio suficiente para completarem o metabolismo, criando-se uma falta de oxigénio. Como resultado o ácido láctico acumula-se nos músculos o que dá origem à dor muscular. Por oxidação posterior teremos a produção de ácido pirúvico.

81

Química Orgânica A H CH3

C O

O

O

[O]

C H

CH3

C

C

OH

OH

O

ácido láctico

ácido pirúvico

acumula-se nos musculos devido ao esforço físico

Quando bebemos álcool este por oxidação metabólica é transformado no acetaldeido, que é muito tóxico para o cérebro. Só posteriormente o acetaldeido é transformado em ácido acético que já não é tóxico. H

H CH3

[O]

OH

C

CH3

H etanol

6.3 6.3.1

C

OH [O]

O

CH3

acetaldeído muito tóxico para o cérebro

O

C

ácido acético

ALCOÓIS IMPORTANTES Metanol

O metanol CH3OH obtém-se industrialmente por hidrogenação catalítica do CO (monóxido de carbono). H C

O

C

O

H2

H

catalisador

C

OH

H metanol

monóxido de carbono

O metanol é muito tóxico para os seres humanos, originando cegueira e até a morte e é usado muitas vezes como combustivel de carros de corrida H

H oxidação

H

C H

metanol

6.3.2

OH

O

controlada H

formaldeído

Etanol

O etanol CH3CH2OH obtém-se da fermentação alcoólica e é usado como um anti-séptico tópico e é hoje usado como combustível para automóveis em vários países misturado com produtos do petróleo sob o nome de “gasohol”

82 6.3.3

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço Isopropanol CH3 CH

OH

CH3

O isopropanol é usado em cosméticos, loções e perfumes 6.3.4

Etilenoglicol ou 1,2-etanodiol CH2

CH2

OH

OH

O etilonoglicol é o componente principal no fluído de arrefecimento de motores e é ideal como anticongelante já que apresenta um ponto ponto de solidificação -12°C e ponto de ebulição 119ºC. 6.3.5

Glicerol CH2

CH

CH2

OH

OH

OH

O glicerol é obtido por hidrólise (reacção com a água) das gorduras èsteres dos ácidos gordos. Os ácidos gordos são ácidos carboxílicos com cadeias carbonadas muito longas, o que os torna pouco solúveis em água. CH2 O HC

O

CH2 O

O C R' O C R'' O C R''' R''

gordura ou triglicérido

1. NaOH

CH2 OH HC

2. H3O

OH

+

CH2 OH glicerol

+

O HO C R' O HO C R'' O HO C R''' ácidos gordos

A nitração do glicerol produz trinitrato de glicerol (nitroglicerina) que é um líquido explosivo, sensível ao choque.

83

Química Orgânica A

H2SO4 CH2 OH HC

OH

quantidade catalítica

O HO N O

+ 3

CH2 O HC

CH2 OH ácido nítrico

glicerol

N

O

N

CH2 O

N

O O O O O O

nitroglicerina

Na natureza um dos alcoóis mais importantes é a glucose, que para além de cinco grupos funcionais álcool, contém também o grupo funcional aldeído. A glucose existe na forma de cadeia aberta em equilíbrio com a sua forma cíclica, glucopiranosido. glucose

O H HO H H H

C C C C C C H

H OH H OH OH OH

cadeia aberta

HO

CH2 O

HO HO

H O

OH

forma de piranose

84

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço Formação de hemi-acetal cíclico da D-glucose

H HO H H

OH 5 4 3

HOH2C

Rotação de 120º de C5 segundo a ligação C4 - C5

CH2OH 1 CHO

6

H

6

HO H H

2

H OH OH

5

OH 1 CHO

3

2

4

H OH OH

D-glucose

6

CH2OH

6

CH2OH 5

HO CH O 4

1

OH H HO 3 2 H

H H

D-glucofuranose (menos estável)

O 1

4H

C

OH

5

OH Novo estereocentro

OH H

HO 3 H

H

C

2

OH

OH

Novo estereocentro

D-glucopiranose (mais estável) (Grupos à direita na projecção de Fischer original [dentro de círculos] apontados para baixo no hemi-acetal cíclico, excepto C-5 que sofreu rotação)

85

Química Orgânica A

7

ÉTERES

Os éteres são líquidos de ponto de ebulição baixo. Não formam pontes de hidrogénio uns com os outros porque não apresentam grupos —OH. Podem fazer pontes de hidrogénio com os álcoois. Os éteres de baixo peso molecular fazem ligações de hidrogénio com a água e são parcialmente solúveis, mas a partir de certa concentração formam duas fases. hibridação sp3

hibridação sp3

O R

O

R'

H

H 105°

111° grupos mais volumosos Ângulo tetraédrico 109°

Os éteres não apresentam grande reactividade. São bons solventes - inertes e bastante polares H3C CH2 O CH2 CH3

O

éter etílico

tetra-hidrofurano

São solúveis em H2SO4 concentrado. Dá-se a protonação do átomo de oxigénio e a formação de um ião oxónio e não ocorre mais reacção, pelo que os éteres ficam solubilizados sem sofrerem alteração. Esta propriedade fá-los distinguir dos alcanos que não são solúveis em ácido sulfúrico concentrado.

H R

O

R'

+

H2SO4

R

O

R'

ião oxónio

+

HSO4

86

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

7.1

NOMENCLATURA R alcano

O

R'

substituinte alcóxido

C2H5

CH3O

metóxido

metoxi-

C4H9O

butóxido

butoxi-

O

C2H5

IUPAC

etoxi-etano

comum

éter etílico

7.2

O

O

CH3

metoxiciclopentano

2-etoxi-4-metilpentano

éter metilciclopentílico

ÉTERES ACÍCLICOS

7.2.1

Preparação de éteres acíclicos

7.2.1.1 Síntese de éteres de Williamson Reacção usada para preparar grande parte dos éteres — substituição nucleófila bimolecular (SN2) por um nucleófilo alcóxido num haleto de alquilo

halo-alcano R

O H álcool

Na remoção do protão

RO Na alcóxido

R'

Br

ataque nucleófilo do alcóxido ao halo-alcano

R

O

R'

+ NaBr

éter

A partir de um álcool e de um halo-alcano podemos realizar a síntese por dois caminhos:

87

Química Orgânica A

Via A:

OH

Na

menos formação de produto secundário (eliminação)

O C2H5Br

OC2H5 Br

Via B: C2H5

Na

OH

C2H5O

protecção do grupo —OH

7.2.1.2 Protecção do álcool

Na

OH

CH3I

O

OCH3

Problema Desenhe uma síntese do t-butil etil éter. H3C

H2C

O

Retrossíntese: É um processo imaginário em que a partir da molécula que queremos sintetizar quebramos ligações para as quais sabemos existirem reacções químicas para as formar. As setas correspondentes são do tipo , e as quebras das ligações representam-se por .

A

B

Br

Via A

+

O

O

Via B

Br

+

O

88

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço Via A

Br

+

O

O

A reacção SN1 ocorre com rendimento muito baixo pois dá-se preferencialmente a reacção de eliminação pelo mecanismo seguinte:

H Br

-Br

-

+

O

OH

Produtos principais da reacção

carbocatião

Via B: Síntese mais adequada

OH

Na

Br

O

O

reacção SN2 mais fácil C — primário

7.3 7.3.1

REACÇÕES DE ÉTERES Formaação de éteres metílicos e sua quebra

O

+

CH3I

O

CH3

Esta reacção forma um éter a partir de um álcool. Muitas vezes esta reacção é aproveitada para fazer uma protecção do grupo hidroxilo nos alcoois sendo necessário a sua posterior remoção para repor a função hidroxilo. Desprotecção — Reconversão no álcool — quebra do éter com um equivalente de um ácido muito forte.

89

Química Orgânica A

CH3

O

R

H

I

CH3

O

R

I

H

O

R

+ CH3I

H local da reacção SN2 mais desimpedido

álcool protegido

OH

ião oxónio álcool desprotegido

1. Na

OCH3

HI OH

2. CH3I

+ CH3I

H OCH3 H I

O CH3

CH3I

+

OH

I

7.4

ÉTERES CÍCLICOS O O O epóxidos oxiranos

7.4.1

O dioxano

tetra-hidrofurano

Nomenclatura 1 O

O

3 2

7.4.2

trans - 2 - butene óxido

cis - 2 - buteno óxido

trans - 2,3-dimetiloxirano

cis - 2,3-dimetiloxirano

Preparação de éteres cíclicos

7.4.2.1 Epoxidação Epoxidação - Oxidação de alcenos por perácidos A maior parte dos epóxidos são feitos a partir de alcenos usando um derivado da água oxigenada.

90

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço O

O

C

ácidos O

HOH

C

H

perácidos O

água

HO

O

H peróxido de hidrogénio

OH

Exemplos: O H O O C CH3

Cl

O H O O C

ácido peracético

ácido m-cloroperbenzóico

O peróxido de hidrogénio transfere um átomo de oxigénio para o ácido formando um perácido que posteriormente oxida o alceno formando um epóxido. Epoxidação de alcenos C C

O + CH3 C O OH

alceno

ácido peracético

C C O

+

epóxido

CH3COOOH

O H3C C OH ácido acético

O

Outro método de formação, por reacção intermolecular de ataque nucleófilo. Cl

Cl + Na OH

7.4.3

O O

Reacções de epóxidos

7.4.3.1 Reacção de abertura de epóxidos catalisada por ácido Os éteres são conhecidos pela sua falta de reactividade. A mesma falta de reactividade encontrase nos éteres cíclicos, excepto naqueles em que existe um anel muito tenso, tal como nos epóxidos. Os epóxidos podem sofrer reacções de abertura por tratamento com nucleófilos em meio básico ou ácido. A grande tensão do anel facilita a sua abertura.

91

Química Orgânica A O

O C

60° 60° 60°

C

109,5°

de hibridização tetraédrica

C

C

Por exemplo o ião iodeto I-, um bom nucleófilo abre o anel de epóxidos com grande facilidade. H H

O

I

H

H H I ácido iodídrico

H

H

I H

SN2

H

O

H

H

H

H H OH iodo-hidrina

ião oxónio cíclico Abertura do epóxido com água ou metanol

H

O

O H2O

ataque da água ou do metanol numa reacção SN2 para

H CH3OH

abrir o anel, pela parte detrás do carbono

H OCH3

OH2

ião oxónium que perde um protão para o solvente (água ou metanol)

HO

HO

HO -H

-H

OH

OCH3

reacção catalisada por ácido

HO

Se o epóxido não é simétrico, o ataque SN2 ocorre predominantemente no átomo de carbono menos substituído. Exemplo: I

I

H I O propileno óxido

O H

O H iodo-hidrina

92

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

Se houver um átomo de carbono terciário, o ião oxónio cíclico abre expontâneamente para dar o carbocatião, que é depois armadilhado pelo nucleófilo presente na reacção. H+

CH3OH

O CH3OH

O H

OH

HO

-H

OCH3

Se o epóxido está fundido com outro anel podemos operar a rotura do anel de epóxido de modo estereospecífico, formando-se apenas o isómero trans. H O

H2O

H3O

OH

OH

O

H

OH H

diluido

OH

trans-diol

plano do anel de ciclopentano

ou OH

H3CO O

CH3OH

HO HI

H+

OH

+ CH3I

só trans

H3O+ HO

OH

só trans

7.4.3.2 Abertura do anel de epóxidos com nucleófilos Para além da catálise ácida, a tensão do anel de epóxido é suficientemente grande para dar lugar à rotura do anel em presença de um bom nucleófilo. Abertura por nucleófilos: — O nucleófilo deverá ser forte e a reacção ser SN2. — Produzem-se oxianiões estáveis em solução que serão protonados no “work-up”. — Os nucleófilos reagem sempre no carbono menos substituído.

93

Química Orgânica A

H3O+

Na

O

OH

OH

HO

Na

a)

OH

1,2-propanodiol

a) b) O

Na

b) OCH3

H3O+ O

OCH3

HO

OCH3

Na

1-metoxi-2-propanol

O ataque pelo nucleófilo dá-se preferencialmente no átomo de carbono menos substituído, consistente com um mecanismo SN2. A mais importante aplicação deste tipo de substituição nucleófila é a formação de novas ligações C—C. Uma aplicação importante é o uso de nucleófilos derivados de compostos de lítio R-Li, ou de reagentes de Grignard R-Mg-Br. As reacções serão do tipo SN2 e teremos reactividade em átomos de carbono 1°>2°>3°. Durante o “work-up” realiza-se a acidificação para que o oxo-anião fique protonado. Exemplo: Uso de composto organolítio como nucleófilo

OH

HBr Br

1)

Li

O

CH2CH2OH

Li 2) H3O composto organolítio

Exemplo: Uso de reagente de Grignard como nucleófilo O

C3H7 OH

1) C3H7MgBr/éter

adição trans 2) H3O trans-2-propilciclopentanol

Para o metil lítio teremos analogamente adição trans:

CH3

CH3 Li

CH3

H /H2O

éter O

O

HO trans - 2-metilciclopentanol

94

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

Reacção geral

+

O

R

δδ+ R — Li

R

H3O

+

O Li

LiOH

HO nova ligação C—C

R OH

HBr

R Br

Li eter

1) R Li

O R CH2CH2 OH

2) H3O

homologação de 2 átomos de carbono

Problema ?

Br

CH2CH2—Br

Li

Br

CH2 CH2 OH

Li

éter HBr

CH2CH2Br

O

Li

O

H3O -H2O

Br

CH2CH2OH

CH2CH2Br

-H2O

7.5 7.5.1

ÉTERES IMPORTANTES Resinas epóxi

A palavra epóxi é familiar, muito provavelmente em ligação com a palavra resinas ou colas.

95

Química Orgânica A

De um modo geral as colas ou resinas epóxi são usadas na manufactura de cadeiras, mesas, nas lombadas de livros, etc. São colas que são usadas numa grande variedade de materiais: metais, vidro, madeira, plásticos, etc. São também usadas na indústria aeronáutica e de um modo geral em indústrias para substituição no uso de parafusos. As vantagens são a sua força de adesão, baixo peso, robustez e resistência química. A propriedade da cola de resinas epóxi está associada à abertura nucleófila de epóxidos. São constituídas por dois componentes: o epóxido (também chamado de resina) e o agente de cura que é um di ou trinucleófilo. Os dois componentes são misturados antes da cola ser aplicada. Quando misturado com a resina o agente de cura abre o anel epóxido e promove as ligações cruzadas ou “cross-linking”, entre as cadeiras poliméricas. O

O

CH2

CH

CH2

A

CH2

CH

CH2

CH3 A=

O

C

+

B=

O

H2 N

CH2CH2 N

OH B

N H

CH2

NH2

CH2 CH2

H

CH3

N H

B

C

OH CH2

A

CH2

CH

CH2

N H

B

N H

este átomo pode ainda envolver-se noutra reacção para dar uma ligação cruzada entre a cadeia do polímero

N ligações cruzadas

cadeias poliméricas

B N

7.5.2

Éter etílico

O éter etílico foi usado desde 1840 como anestésico tendo sido abandonado. Forma peróxidos com o ar, tornando-se explosivo e por isso perigoso de manusear. CH3CH2 O

CH2CH3

O éter etílico pode ser preparado por reacção do etanol na presença do ácido sulfúrico a quente

96

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

CH3CH2

OH

H2SO4

etanol

140°C

H CH3 CH2 O

CH3CH2 OH

H

CH3 CH2 + H2O O CH2 CH3 éter etílico

7.5.3

Éter metil ter-butílico (MTBE)

O MTBE facilita a combustão sendo hoje um aditivo da gasolina. O MTBE pode ser preparado pela reacção entre o isobutileno e o álcool metílico por catálise ácida. H O CH3 isobutileno

7.5.4

H O CH3

metil ter-butilmetil éter (MTBE)

Alcalóides – morfina, heroína R O

O N CH3 R'O

alcalóides naturais do complexo do ópio obtido da Papaver somniferum

R e R' = H R = CH3 e R'=H

morfina codeina

O R e R' = C CH3

heroína (sintético)

97

Química Orgânica A

8

ALCENOS

Os alcenos possuem uma ligação dupla (uma ligação σ e outra ligação π) entre dois átomos de carbono. π

C C

π

σ

σ

hibridação sp2 dos átomos de carbono fica uma orbital p para fazer a ligação π

C

C π

Alguns exemplos de alcenos conhecidos. O etileno é produzido naturalmente pelas plantas promovendo o amadurecimento dos frutos. H C C H

CH3

ou

CH2 CHCH3

ou

H propeno H

ciclo-hexeno

ciclopentadieno

H

H H etileno (eteno)

Os alcenos apresentam isomerismo cis-trans. Este isomerismo é a base do sistema binário relativo à visão monocromática no ser humano no composto chamado retinal. CH3 CH3 C C H H

CH3 H C C H CH3

cis-2-buteno

trans-2-buteno

98 8.1 8.1.1

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço REACÇÕES DE ALCENOS Reacções de adição

R

R' C

C

+

R'''

A

R

adição

B

A

B

C

C

R'

R''' R''

R''

8.1.1.1 Hidrogenação catalítica

R

R' C

C

R'''

R

+

H

H

Pd ou Pt

R''

H

H

C

C

R'

R''' R''

Exemplo: CH2

H2

CH2

CH3

Pt

eteno

CH3

etano

8.1.1.2 Adição electrófila a alcenos A adição dá-se de modo a produzir o carbocatião intermediário mais estável e este será: H R R > > R C R C R C H R H Carbono: terciário > secundário > primário

8.1.1.2.1 Mecanismo:

C C alceno

Exemplificando

+

δ+ δA B

lenta

C C A + carbocatião

B

rápido

B C C A produto

99

Química Orgânica A C2H5 C2H5 CH CH2

C2H5

B

A B

CH2 H A

B

H CH2 A

C2H5 +

H

B CH2 A

mistura racémica mistura de enantiómeros em igual percentagem

duas hipóteses de ataque ao carbocatião, pela frente ou por trás

8.1.1.2.2 Adição de H—X com X=halogénio

H

δ+ δ− H Cl

Cl

H

H

Cl

(Cloro-alcano) clorociclopentano δ+ H

CH3 C

CH2

δ− Br

CH3 C

CH3

CH3

C

CH3 δ+ H

duas hipóteses de adição de H+

δ− Br

CH3

CH3 único composto formado por adição

carbocatião terciário

CH3

Br

CH3

CH3

H C

H C

CH2

CH2

Br

CH3

CH3

não se forma este composto

carbocatião primário muito instável

A adição é regiosselectiva - o anião halogénio liga-se ao carbono que resulta do carbocatião mais estável. 8.1.1.3 Adição de água H (catálise ácida) adição Markovnikov

CH3 C

CH3 C

CH3

H2O -H

CH3

OH C

CH3

CH3 forma-se unicamente este composto

CH2

CH3 isobutileno

CH3

? adição anti-Markovnikov

CH3

H C

CH3

CH2

OH

100

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

8.1.1.4 Adição anti-Markovnikov de água : como consegui-la? A chave do problema é evitar a adição do protão no 1º passo. Isto implica evitar H2O, visto que a adição de H2O é nucleófila e não electrófila. A solução deste problema foi descoberta por H. C. Brown, que ganhou em 1979 o prémio Nobel da química — a chave está no uso do boro. O Boro tem só 6 electrões na sua camada mais externa e pode acomodar mais dois. O borano BH3 é assim um electrófilo (ácido de Lewis) e adiciona-se aos alcenos como um protão. H CH3

CH2

H

C

CH2

H

B

CH3

CH2

C

CH2

H

B

CH2

CH2

CH2

C

CH2

C

CH3

CH2

C

CH2

CH2

H + Na3BO3

B CH2

H

borato de sódio

H repetir duas vezes com duas moléculas de alceno

H H

H2O2 NaOH

B

H H

OH

CH2

H

H

H CH3

CH2

CH3

H

H borano

3 CH3

H

C

H

CH2 CH3

O mecanismo envolvido no processo será o seguinte: H R C H

R' B O R' O H

H R C H

R'

B O R' O H H R C O H H

R' O B

R'

+

H R C H

H R C O H

R' B R' O

O H

R' + O B R' H

álcool

O O B O

+

2 R'

OH

Desta forma a adição de água à ligação dupla não é realizada com água mas com peróxido de hidrogénio (água oxigenada) e com borano (BH3).

101

Química Orgânica A

8.1.1.5 Adição de halogénios A reacção de bromo vermelho-acastanhado com alcenos é usada como teste qualitativo para distinguir entre duas famílias de hidrocarbonetos, os alcenos e os alcanos. Os alcenos provocam o desaparecimento imediato da cor do bromo por este sofrer reacção de adição à ligação dupla. Nos alcanos o bromo não reage na ausência da luz. δ+ δ− Br Br

δ− δ+ Br Br

δ− δ+ Br Br

Br Br

ciclobuteno

H * Br

Br * H

Br ião bromónio Br +

* Br

* mistura racémica

possibilidade de ataque do Br a cada um dos átomos de carbono

* Representa átomos de carbono assimétricos

A adição de halogénios é estereospecífica dado que o bromo ataque pelo lado contrário ao ião bromónio: a adição diz-se anti. 8.1.2

Oxidação de alcenos

8.1.2.1 Epoxidação de alcenos A epoxidação de alcenos por perácido origina epóxidos que podem sofrer abertura na presença de um nucleófilo. Se esse nucleófilo for a água forma-se um 1,2-diol trans.

R

R

R

R alceno

Exemplificando:

O + R C O OH perácido

R

R

R O R epóxido

O + R C OH ácido

102

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço O CH3 C O

OH ácido peracético

OH

H2O

O

OH ciclo-hexeno

trans-1,2-diol

epóxido

8.1.2.2 Oxidação com permanganato de potássio O permanganato de potássio é um agente oxidante forte. Na presença da água e a frio oxida alcenos a diois vicinais. R

R R R C C R O O Mn O O

R C C

R

R

O Mn O O

O

H2O

R R R C C R OHOH

éster de manganato

diol vicinal

+ MnO2

dióxido de manganés

anião permanganato

Esta adição dos dois grupos hidroxilos é estereospecífica e é syn. O anião permanganato aproxima-se de um dos lados do alceno e forma as duas ligações carbono-oxigénio simultaneamente. Exemplificando para o ciclopenteno, obtem-se o cis-1,2-ciclopentanodiol. O isómero trans obter-se-à por oxidação com ácido peracético, com formação do peróxido respectivo e abertura com hidróxido de sódio aquoso.

KMnO4/ H2O 2

HO

1

OH

cis-1,2-ciclopentanodiol

ciclopenteno

1. CH3CO3H 2. NaOH/H2O HO

OH

trans-1,2-ciclopentanodiol

103

Química Orgânica A

8.1.2.3 Ozonólise de alcenos A ozonólise dos alcenos é muito vulgarmente usada em síntese e envolve equipamento apropriado. O ozono é gerado no laboratório pela passagem de uma descarga eléctrica de 10000 V através de oxigénio gasoso. A reacção do ozono com os alcenos envolve a adição do ozono à ligação dupla. O ozonido formado é reduzido posteriormente com zinco e água para produzir dois compostos de carbonilo. De uma forma global a ligação dupla é quebrada e os átomos de carbono da dupla ligação passam a estar ligados por ligações duplas a dois átomos de oxigénio independentes. Por exemplo o isobutileno é quebrado formando formaldeído e acetona. O

O

O

O

O

O

estruturas de ressonância do ozono CH3

H C

CH3

H O

O

CH3 H CH3 C + C H O O O

CH3 H C C CH3 H O O O

C

O

CH3

CH3 C O

O C

H H

O

ozonido primário

CH3

C

O

+

Zn/H2O

H O C H

CH3

formaldeído

acetona

Problema: Que composto X dá origem aos seguintes produtos de ozonólise? X

O3

Et CH3 C C CH3 C O O Et

+

2

Solução:

CH3

CH3 CH CH CH3 3 3 C C C C C CH3 Et

Et

O H C C CH3 O O H ozonido secundário

CH3

CH3 C CH3 O

104 8.2 8.2.1

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço REACÇÕES DE PREPARAÇÃO DE ALCENOS Reacções de eliminação A

B

C

C

C

C

H

H

H

H

-H2

- A-B

C

alceno

C

alcino

8.2.1.1 Desidratação de álcoois

R

H

R''

C

C

-H2O

OH

R

R'' C

C

R'''

R''' R'

R' alceno

álcool

A reacção de desidratação é o inverso da hidratação de alcenos para formar álcoois. Aquecendo um álcool em H2SO4 concentrado (ou H3PO4 85%) elimina-se H2O para formar alceno. As temperaturas de aquecimento a usar dependem do tipo de álcoois tratados. Para álcoois terciários a temperatura de 100°C é normalmente suficiente. Para álcoois primários, 200°C é a temperatura normalmente utilizada. H3PO4 OH

ácido fosfórico +

Δ

ciclo-hexanol

H2O

ciclo-hexeno

água

H α

OH H

H3PO4 Δ

1-propanol +

H OH

propeno H

α 2-propanol

H2O

Δ

H3PO4

(Nota: É frequente designar-se o átomo de carbono adjacente ao grupo funcional pela letra grega alfa, α.)

105

Química Orgânica A

Quando há mais do que uma posição de onde o protão pode sair, então temos o problema da regiospecificidade. Usualmente formam-se ambos os produtos possíveis, mas um é o produto principal — de um modo geral formar-se-à predominantemente o alceno mais estável que é o mais substituído (Regra de Zaitzev). H CH3 CH2 C C CH3 H O H H

H CH3 C C H3C CH3

-H2O

H H2C C CH 3 C CH3 H

+

predomina (alceno mais substituído) H CH2 OH

-H2O +

H predomina (alceno mais substituído)

Mecanismo por catálise com ácido sulfúrico H2SO4 O C

C

H

O

+

H

O

S O

H

C

C

H

O

H

OH

-H2O

C

passo lento

forma-se o carbocatião mais estável - o mais substituído

C

H

H O

ião oxónio carbocatião

O HO

passo rápido

H2SO4

+

C

C

S O

106

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

Aplicação à síntese de ciclo-hexano a partir de ciclo-hexanol: OH

H2SO4

H2

-H2O

Pd/C ciclo-hexeno

ciclo-hexanol

ciclo-hexano

8.2.1.2 Desidro-halogenação de haletos de alquilo - reacção de eliminação

R'

R''

R'

- HX R

C

C

X

H

R'''

R'' C

R

inversa

C R'''

a) Eliminação E2 δEtO

EtO H

H H

H

H

H

H

CH3

CH3

CH3

H CH3

Cl

CH3

2-clorobutano

CH3

Clδ

cis-buteno

estado de transição

Notar que na eliminação E2 anti (E=eliminação , 2=bimolecular) a reacção é estereoespecífica, de modo que o átomo de halogénio faz um ângulo sólido de 180° relativamente ao átomo de H+ que vai ser removido. A prova da estereoespecificidade obtém-se com a desidrocloração de dois derivados de produtos naturais, o cloreto de mentilo e o cloreto de neomentilo.

107

Química Orgânica A Cl

Cl CH3

CH(CH3)2

CH3

CH(CH3)2

cloreto de mentilo

cloreto de neomentilo

NaOEt / EtOH

NaOEt / EtOH

CH3

CH(CH3)2

CH3

produto minoritário

produto exclusivo

+

CH3

CH(CH3)2

CH(CH3)2 produto predominante

Esta reacção compreende-se melhor quando as estruturas conformacionais dos dois reagentes se comparam. Verifica-se que o cloreto de mentilo tem de adoptar a sua conformação menos estável (todos os substituintes axiais) para que o cloro e o hidrogénio se posicionem anti um em relação ao outro. No cloreto de neomentilo formam-se os dois produtos porque o cloro possui dois átomos de hidrogénio em posição relativa anti. EtO H 3C

H

CH3 H3C

H CH(CH3)2

H

H

Cl

H 3C

H3 C

CH(CH3)2

EtO CH3

R

Cl

CH(CH3)2 Cl

CH3

CH(CH3)2

R

CH(CH3)2 Cl CH3

H

CH3

R

H

H H

CH3H

R

H CH3H

H H

R

Cl

CH(CH3)2

108

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

Comparação E2 versus SN2

Substituição SN2 versus E2 de haletos de alquilo Reacção SN2

Condições favoráveis 1. Baixa temperatura 2. Bases modestas / nucleófilos 3. Bases com pequeno impedimento estereoquímico 4. Reactividade relativa dos grupos alquilo: 1° > 2° > 3° 1. Temperatura mais alta 2. Bases fortes 3. Bases impedidas 4. Reactividade relativa dos grupos alquilo: 3° > 2° > 1°

E2

ataque ao protão E2 Na CH3

OEt

H C CH2 Br H Na

CH3 CH CH2

(E2)

CH3 CH2 CH2 OEt

(SN2)

OEt

SN2

ataque ao carbono

8.3

ALCENOS IMPORTANTES

Preparados por desidrogenação térmica de alcanos. CH3

CH3

etano CH3

CH2

Δ catalisador

CH3

CH2

+

CH2

H2

etileno

catalisador

CH

CH3

CH2

propeno

propano

polimerização

H C

CH2

CH3

n

CH3

CH3 C

CH2

CH3 isobutileno

polimerização

C CH3

polipropileno ou plástico comum

CH2 n

borracha butílica polisobutileno

O etileno forma-se in vivo por acção de uma enzima sobre o ácido carboxílico 1aminociclopropano. O etileno é uma hormona das plantas essencial para o amadurecimento do fruto e também está envolvido na resposta da planta a uma agressão física em que se produz ferida. O etileno é usado hoje para induzir o amadurecimento rápido da fruta.

109

Química Orgânica A enzima

H

H C C

H

H2N CO2H

H

etileno

ácido 1-aminociclopropano-1-carboxílico

As plantas são grandes produtoras de alcenos, muitos deles constituindo fragâncias. De entre eles destacam-se os terpenos:

limoneno

α-pineno

O β-caroteno, responsável por exemplo pela cor das cenouras e da gema dos ovos é também um pigmento muito frequente entre plantas e animais.

β-caroteno

Formação de α- e β- caroteno

110

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

Me

OH

O2C

OH

CH2OPP 2 moles

OPP H

H

licoperseno

(cis e trans ) fitoeno

ζ-caroteno

neurosporeno

licopeno

α-caroteno

β-caroteno

Mecanismo químico da visão

111

Química Orgânica A

Estruturalmente o β-caroteno é um tetraterpeno (C40) que se caracteriza por ser um polieno completamente conjugado. Após a ingestão o β-caroteno sofre ruptura oxidativa entre os átomos C-15 e C-15’ sendo produzidas duas unidades de vitamina A (retinol). Este álcool é posteriormente oxidado a retinal. O retinal na forma cis-11-retinal reage com uma proteína, a opsina, formando-se a rodopsina (pigmento sensível à luz que se localiza na retina). Por absorção de um fotão o cis-11-retinal sofre isomerização a trans-11-retinal cuja estrutura não “encaixa” na proteína sendo libertado. Esta mudança de isomerismo geométrico provoca uma alteração de pH que induz o impulso nervoso que se traduz na visão. O mecanismo que permite a detecção contínua de luz consiste na rápida reciclagem dos compostos envolvidos. O trans-11-retinal é isomerizado a cis-11-retinal o qual reage de novo com a opsina reiniciando-se todo o mecanismo cíclico da visão. β-Caroteno, vitamina A e visão

(oxidação enzimática)

β-caroteno

R

vitamina A (retinol) retinal

centro da molécula

Dupla ligação entre os carbonos 11 e 12

R = CH2OH R = CHO

cis -11

H2N - opsina CH = O

CH = N - opsina

cis-11-retinal

rodopsina energia emitida para o nervo óptico

(isomerização enzimática)

CH = O

(hidrólise)

CH = N - opsina

- opsina trans -11

112

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço Bissíntese e degradação da vitamina D3-1,25-diol 21

24

22

20

18

25 23

12 17 19

11

13

HO

9

10 3

14

15

7

5

4

8

26

16

1 2

27

6

colesterol

seco-esteróides

19

11



1 10 3

HO

A 7

A

HO

HO

7-de-hidrocolesterol provitamina D3

previtamina D3

24

22

CO2H

cis vitamina D3

23

OH

25

OH

7

HO

OH

ácido calcitrióico

HO

OH

vitamina D3-1,25-diol (espécie activa)

HO

1

HO

1

vitamina D3 colecalciferol

Vitamina D3 - biologicamente inerte requer duas hidroxilações em C-1 e C-25 para ter acção: manter o nível de cálcio no sangue.

113

Química Orgânica A Biossíntese de hormonas esteroidais nos mamíferos

OH O

O

H

FEROMONAS HO

O HO

aldosterona

O androsta-5,16-dien-3-ona

androsta-5,16-dien-3β-ol

MINERALCORTICOIDES

22

OH

OH 20

O

O

O

18

O

HO 17 16

HO

3

5

colesterol

HO

O

HO progesterona

pregnenolona

O

4-ene/5-ene

O OH

O OH

O

O OH

11

HO 17α-OH-progesterona

17α-OH-pregnenolona

OH

OH

21

HO

corticosterona

11-desoxicorticosterona

O OH

18

HO

O cortisol

11-deoxicortisol GLUCOCORTICOIDES

O

O

OH

19

O OH

O O HO

HO

de-hidropiandrosterona

androstenodiona HO

O cortisona

estrona OH

HO

OH

OH

HO

O androstenodiol

estradiol

testosterona

OH

OH

O

HO

H

5α-di-hidrotestoterona

H

5α-androstano-3α,17β-diol

HORMONAS SEXUAIS

114

9

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

ALCINOS

Os alcinos podem ser terminais se a ligação tripla se localizar no extremo da cadeia carbonada ou alcinos internos se a ligação tripla não se localizar no extremo da cadeia carbonada.

H C C H

CH3 C C H

CH3 C C CH3

acetileno

metilacetileno ou propino

dimetilacetileno ou 2-butino

alcinos terminais

9.1 9.1.1

alcino interno

ESTRUTURA DOS ALCINOS Sistema de orbitais

+

σ σ π σ H C πC H

H

+ +

+

-

-

+

C

+

C +

-

+

H

-

semelhante a um cilindro

H

9.1.2

C

C

H

Acidez de alcinos terminais

NH3 (l) R C C H +

pKa~25

Na

NH2

amideto de sódio

R C C

Na

acetileto de sódio

+

NH3 amoníaco pKa~33

A reacção funciona porque o alcino é um ácido mais forte que o amoníaco, ou equivalentemente o amideto é uma base mais forte do que o acetileto. Comparando o acetileno com o etano verifica-se que ao aumento progressivo do carácter s da ligação carbono - carbono (de 25% no etano, 33% no etileno e 50% no acetileno) corresponde um aumento de acidez do protão.

115

Química Orgânica A sp3 (25%s, 75%p)

H

H

H

C

C

H

H

sp2 (33%s, 66%p) H

<

H

sp (50%s, 50%p)

H C

<

C

H

H

C

H

H acetileno

eteno

etano

C

aumento de acidez aumento do carácter s da hibridização

9.2

REACÇÕES DE ALCINOS

9.2.1

Adição

C

A

C

B

A

B

C

C

A

B

A

B

C

C

A

B

Exemplo: + HCl H

C

C

H

CH2

acetileno

CHCl

polimerização

CH2

cloreto de vinilo

CHCl

cloreto de polivinilo PVC

9.2.2

Hidrogenação H2 C

H2

C

C

C

CH2

catalítico

catalítico H

alcino

9.2.2.1 Hidrogenação catalítica – cis-alcenos a) hidrogenação catalítica — cis-alcenos

C

C

CH3

H

H

CH2

alcano

H

alceno

CH3

n

H

H C

C

Pd/BaSO4 CH3 CH3 (catalisador envenenado) adição estereoespecífica syn

116

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

9.2.2.2 Redução de alcinos a trans alcenos Li CH3 C C CH3

Li (ou Na) NH3

H

CH3 C C CH3 H

Li

CH3 C C CH3 H H

CH3 C C CH3 H

H

adição anti composto trans

9.2.3

Oxidação de alcinos

9.2.3.1 Pelo ozono O O O ozono CH3 C

O CH3 C

C C2H5

2-pentino

+

O H

ácido acético

O HO

C C2H5

ácido propanóico

9.2.3.2 Pelo permanganato de potássio KMnO4

C4H9 C C H 1-hexino

C4H9

O C OH

+

ácido pentanóico

O HO C O H ácido carbónico

CO2 + H2O

9.3

SÍNTESE DE ALCINOS

H C C H

Na / NH3

H C C

Br CH3

H C C CH3 propino

etino

Br brometo de ciclo-hexano

H C C

9.4

ALCINOS IMPORTANTES

O poli-acetileno é um bom condutor da electricidade quando dopado com iodo.

Química Orgânica A

H

C

C

H

CH

CH

117

n

conduz electricidade quando dopado com iodo em pequenas quantidades

poli-acetileno

Os poli-alcinos que são condutores da electricidade chamam-se metais orgânicos e é outra forma de polímeros de carbono como a grafite e o diamante. C

C

C

C

poli-alcino

C

C

118

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

10 BENZENO O benzeno é um líquido incolor, p.e. 80°C, p.f. 5°C, isolado por Michael Faraday em 1825 e mais tarde sintetizado por descarboxilação de ácido benzóico. A sua estrutura é o exemplo clássico de uma molécula estabilizada por ressonância. A determinação da estrutura do benzeno é uma tarefa difícil que só foi conseguida passados 47 após a sua descoberta. Os factos experimentais conhecidos antes da estrutura ter sido determinada eram os seguintes: 1. A fórmula molecular é C6H6. Falta-lhe 8 átomos de hidrogénio para que seja o alcano de seis átomos de carbono o n-hexano (C6H14). Deve portanto ter uma combinação de ligações simples, triplas e de anéis. 2. O benzeno não é hidrogenado com H2 sobre um catalizador de platina, debaixo das condições normais em que há hidrogenação de alcenos ou de alcinos. 3. Sob pressão elevada, o benzeno é hidrogenado e absorve 3 equivalentes de hidrogénio, produzindo um composto conhecido, o ciclo-hexano (C6H12). 4. Não é oxidado por KMnO4 a quente. 5. Não reage com bromo, ao contrário dos alcenos e os alcinos que reagem muito rapidamente. Quando o benzeno reage com um ácido de Lewis, tal como FeBr3, ocorre uma reacção de substituição produzindo-se bromobenzeno (C6H5—Br) e libertando-se HBr. 6. Bromoção posterior do benzeno usando FeBr3 produz uma mistura de 3 dibromobenzene isoméricos (C6H4Br2), que hoje sabemos serem os isómeros orto, meta e para. Br

Br

Br Br

Br

orto

meta

Br

para

1872 - August Kebulé propôs a fórmula do hexágono regular para o benzeno. nuvem de electrões π aromaticidade conceito de ressonância

6 e- - sexteto aromático

119

Química Orgânica A

.......

híbridos de ressonância designados por fórmulas de Kekulé

Existem ainda 3 informações adicionais importantes sobre a estrutura do benzeno: 1. Análise por raios-X do benzeno revela que tem um plano de simetria e um eixo de simetria hexagonal. As 6 ligações carbono-carbono são todas idênticas com o comprimento de 1,39 Å. Uma ligação simples carbono-carbono mede 1,54 Å e uma ligação dupla nos alcenos 1,34 Å. No benzeno as 6 ligações carbono-hidrogénio também são todas iguais e medem 1,09 Å. C6 (eixo de simetria hexagonal) C C

1,39 A

C H

1,09 A

2. Por ressonância magnética nuclear protónica (1H RMN) verifica-se que os 6 átomos de hidrogénio são todos electronicamente equivalente, mas possuem uma vizinhança electrónica muito diferente da dos hidrogénios ligados a uma ligação dupla. O benzeno possui uma corrente no anel que é única nos compostos aromáticos e não há qualquer evidência para que existam duas formas de benzeno em equilíbrio. 3. O calor de hidrogenação do 1,3,5-ciclo-hexatrieno deveria ser 3 x (-28,6) = -85,8 kcal/mol mas o calor de hidrogenação do benzeno é de apenas -49,8 kcal/mol. A diferença de 36 kcal/mole corresponde à estabilidade adicional do benzeno em relação ao 1,3,5-ciclo-hexatrieno. Portanto no benzeno temos 6 electrões que constituem o sexteto aromático . A deslocação dos 6 electrões numa orbital molecular, dá origem à distribuição característica de “doughnut” e à aromaticidade. Assim a ordem da ligação C-C no benzeno situa-se entre 1 e 2, traduzindo uma deslocalização electrónica. 10.1 OUTROS COMPOSTOS AROMÁTICOS

Baseado em cálculos de orbitais moleculares, o químico teórico Erich Hückel enunciou a regra de Hückel que diz que: “compostos planares, cíclicos, contendo 4n + 2 e- π, num sistema contínuo, são aromáticos se n é um inteiro positivo.”

120

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço nº electrões π

aromático

n=1

4x1+2=6π

sexteto aromático benzeno

n=2

4 x 2 + 2 = 10 π

10 electrões anulares planar

n=3

4 x 3 + 2 = 14 π

14 electrões anulares planar

4 x 4 + 2 = 18 π

18 electrões anulares planar

n=4

Para n fraccionários, as moléculas comportam-se como alcenos.

n=1/2

4 x 1/2 + 2 = 4 π

ciclobutadieno

n=3/2

4 x 3/2 + 2 = 8 π

ciclo-octatetraeno

comportam-se como alcenos

Existem alguns sistemas não neutros que também são aromáticos: 6e- π

2e- π

catião ciclopropenilo

anião do ciclopentadieno

6e- π

catião do ciclo-heptratrienilo

10.2 REACÇÕES DE COMPOSTOS AROMÁTICOS 10.2.1 Substituição electrófila aromática

A reacção mais característica dos compostos aromáticos é a substituição por uma grande variedade de reagentes electrófilos E

.

121

Química Orgânica A

halogenação

nitração

sulfonação

Br (ou Cl) bromo ou clorobenzeno O N O

nitrobenzeno

O S OH O

ácido benzenossulfónico

R

alquilbenzeno

alquilação

benzeno

O C acilação

R

acilbenzeno

10.2.1.1 Mecanismo da substituição electrófila aromática Recapitulando para os alcenos:

C C alceno

Substituição electrófila:

δ+ δ E A

electrófilo

C C E carbocatião intermediário

A

A C C E produto de adição

122

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

E + H

δ+ δE A

H

H H

H A

E A

H E

H E

H

E

H

A

Carbocatião altamente estabilizado por ressonância

E +

H A

H

intermediário HE A H

1

2 ΔG

Os custos de ΔG‡ são essencialmente de perder a aromaticidade dos estados de transição 1 e 2.

ΔG‡ benzeno + A-E E

ΔG‡ energia de act. do arénio

+ AH

r

coordenada reaccional

10.2.1.2 Halogenação Cl

Cl

+

FeCl3

δ+ Cl

Cl

δFeCl3

complexo Cl2 / FeCl3

123

Química Orgânica A

Cl Cl FeCl3 δδ+

H

-FeCl4

benzeno

Cl

Cl FeCl3

Cl

catião arénio

clorobenzeno

Exemplo: Cl 2Cl2 FeCl3 Cl p-diclorobenzeno usado como insecticida

Cl

Cl Cl C Cl C

O Cl3C C H

Cl2

H

AlCl3

Cl

Cl DDT

degrada-se Cl

C C

Cl

Cl

diclorodifeniltricloroetano usado pela 1ª vez em1939 e um dos insecticidas mais baratos alguma vez sintetisado. Encontra-se ainda em uso.

Cl DDE

inibe o enzima que facilita a acumulação de Ca2+ na formação da casca dos ovos

ácido 2,4-diclorofenoxiacético (2,4-D) é um dos herbicidas mais conhecidos O O C O Na 1. Cl CH2 2. H

O CH2 C

O Na vários

Cl

passos Cl

sal de sódio do 2,4-diclorofenol

Cl

OH

Cl 2,4-D ácido 2,4-diclorofenóxiacético

Durante a guerra do Vietnam o 2,4-D e o relacionado 2,4,5-T (ácido 2,4,5-triclorofenóxiacético) foram combinados e usados em larga escala como esfoliante, sob o nome de Agente Laranja. Descobriu-se subsequentemente que se formavam quantidades vestigiais de 2,3,7,8tetraclorodioxina, durante a síntese.

124

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

As dioxinas são muito tóxicas para o ser humano e foram já implicadas em vários problemas de saúde graves encontrados entre os soldados americanos que combateram no Vietnam. O

Cl2 AlCl3

Cl 2 3

Cl 1

OH C CH2 O

Na

O

Cl

Cl

6 5 Na OH 4 Cl Cl

Cl

Cl Cl

Cl

2,4,5-T

1,2,4,5-tetraclorobenzeno

Cl

8

Cl

7

9

10 O

1

6

O 5

4

2 Cl 3 Cl

2,3,7,8-tetraclorodioxina

10.2.1.3 Nitração O grupo nitro (—NO2) pode ser introduzido no anel aromático por um processo que se designa por nitração, que envolve ácidos nítrico e sulfúrico concentrados. NO2

HNO3 (NO2)

NH2

H2SO4 benzeno

H O

O S

O

H O

anilina

nitrobenzeno

O

H O N O

H O H O N O

+

O

O

-H2O NO2

S H O

O ião nitrónio

ácido nítrico

HSO4 H NO2 H

H NO2 H

NO2 -H2SO4 nitrobenzeno

125

Química Orgânica A

Aplicações Umas das propriedades mais importantes do grupo nitro (NO2) são as propriedades explosivas. CH3

CH3 HNO3

O2N

NO2

H2SO4 NO2 tolueno ou metilbenzeno

trinitrotolueno TNT explosivo

CH2 O NO2 CH O NO2 CH2 O NO2

O O O2N

CH2O NO2 O O O NO2

trinitroglicerina explosivo

algodão pólvora (celulose nitrada, fórmula parcial)

SEMTEX é um produto usado no fabrico de muitas bombas — é um explosivo plástico que consiste numa mistura de RDX e PETN. NO2 N N

O2N

H CH2 O NO2 O2N O C C CH2 O NO2 H CH2 O NO2

N NO 2

1,3,5 - trinitro - 1,3,5 - triazaciclo-hexano RDX

PETN

10.2.1.4 Sulfonação O S O H O

SO3 H2SO4

ácido benzenossulfónico

benzeno

Electrófilo : SO3 Anião H H

O

O S

H O

trióxido de enxofre

O S O O H

O S O O

H3O

+

H O S O O

126

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

Aplicações dos compostos aromáticos sulfonados Os sabões têm sido usados durante séculos para limpeza de roupas, da pele, de utensílios de cozinha, de casa, etc. Um sabão é um sal (Na+ / K+) onde R é uma cadeia longa: O R C O

Na

.

Os sabões são surfactantes (agentes activos sobre a superfície). Os surfactantes modernos são do tipo R

R CH CH2

R CH CH3

R = cadeia longa

SO3Na

H

SO3 H2SO4

R CH CH3

SO3H

NaOH

R CH CH3

SO3 Na

alquilbenzenossulfonato de sódio (SYNDET)

Portanto os detergentes modernos resolvem dois problemas que os sabões têm: 1) os compostos são neutros em solução aquosa e não hidrolizam para criar soluções ácidas irritantes 2) os seus sais metálicos que se formam em águas duras não precipitam, e mantêm-se em solução. Os detergentes que se compram nas lojas contêm ainda uma longa série de aditivos: — fosfatos e silicatos para complexação dos catiões de águas duras — amaciadores — enzimas que degradam as nódoas de proteínas — fragrâncias — agentes anti-estáticos — branqueadores ópticos. 10.2.1.5 Alquilação de Friedel-Crafts Descoberta em 1877 por um químico francês Charles Friedel e por um químico americano James Mason Crafts. Electrófilo : R

carbocatião Cl

R

Cl

cloreto de alquilo

Al

Cl

δ+ R

Cl

δAlCl3

R

AlCl4

Cl complexo molecular

carbocatião

127

Química Orgânica A

H

δ+ δR Cl AlCl3

AlCl3

RCl

R

H

AlCl4

H

R

R

AlCl4

R ClAlCl3 -HCl -AlCl3

H

alquilbenzeno

O carbocatião para alquilar o benzeno pode também ser obtido por outras reacções já estudadas: H R CH CH2 HF H R CH CH3 OH

CH R CH3

C6H6 R CH CH3

-H2O

H

Podemos portanto efectuar a ciclo-hexilação do benzeno:

H

HF

H OH

H3PO4

AlCl3 Cl

AlCl3

ciclo-hexilbenzeno ou fenilciclo-hexano

carbocatião ciclo-hexilo comum

10.2.1.6 Acilação de Friedel-Crafts

+ benzene

O R C Cl cloreto de acilo

R=CH3 - acetofenona

AlCl3

O C

R

acilbenzeno

+ HCl

128

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço O δR C Cl AlCl3 δ+

O R C Cl + AlCl3

O C H

O

-AlCl4

R C

R C O

AlCl4 H

R

O C

R

O C

-HCl -AlCl3

H

H

R

H

Podemos reduzir o carbonilo pela redução de Clemmensen: O H

Zn / Hg

H

HCl (conc)

Processo alternativo à alquilação de Friedel-Crafts para produzir o etilbenzeno: O

H CH3 Zn/Hg

H C

CH3

HCl acetofenona

etilbenzeno

10.2.1.7 Efeitos de substituintes Efeito orto-para: O substituinte estabiliza o carbocatião formado por entrada do electrófilo em posição orto ou para

129

Química Orgânica A orto

COMPARAÇÃO H

H

H

H

N

H

H

N

N H

E

H

E

E

etc.

meta H

N

H

H

H N

MAIS INSTÁVEL POR NÃO SER ESTABILIZADO POR RESSONÂNCIA! E H

E

para H

H

H

N

H

H

N

N

H etc.

E

E

H

EH

Conclusão: o grupo amino é um grupo director orto-para, assim como o são todos os substituintes activadores com capacidade de doar electrões. 10.2.2 Halogénios

Do mesmo modo actuam os halogénios — aqui embora os halogénios sejam atractores via ligação sigma (efeito indutivo), entram em ressonância via sistema π: Exemplo para o cloro: Cl

Cl

H E

H E

Cl

etc.

Cl etc.

H

E

H

E

130

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

Efeito meta (estabiliza o carbocatião formado por entrada do electrófilo em posição meta) O δC δ+ H O

C

H

O

C

H

O

H

E

C

δO

H H

E

H C δ+ H

E

E instável duas cargas positivas muito próximas

O

C

H

O

C

H

C

H

H

O

O

C

H

C

H

H

H

E

H E

E

C

H

E

O

O

E

E

O δ+ H C

O

H E

C

H

H E

instável duas cargas positivas muito próximas

O catião arénio resultante do ataque meta é o menos desestabilizado. 10.2.3 Aplicações industriais de compostos aromáticos

Duas reacções de oxidação do p-cresol são usadas para produzir um produto industrialmente importante o DACRON que é um poliéster muito popular. O Dacron foi primeiramente preparado como uma alternativa à fibra do algodão e é manufacturado em grandes quantidades por todo o mundo. É um polímero, um poliéster e forma-se por reacção de esterificação entre o ácido tereftálico e o etilenoglicol. O

O C

+

C

HO ácido tereftálico

OH

OH HO CH2 CH2

-H2O

O C

O C O

CH2CH2O

1,2-di-hidroxietano etilenoglicol

n DACRON

131

Química Orgânica A

O2 CH3

HO2C

CH3

CO2H

catalisador

p-cresol

ácido tereftálico

132

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

11 COMPOSTOS DE CARBONILO Compostos carbonílicos são compostos que contêm o grupo funcional carbonilo que se pode considerar como um dos mais importantes da química orgânica:

C

O

Podemos ter: R'' C O R' cetonas

aldeídos

R' O C O R

H O C O R

R

H C O R

ácidos carboxílicos

ésteres

R' N C O R amidas

A polarização do grupo carbonilo resulta da diferença de electronegatividades dos átomos de oxigénio e de carbono. electrófilos atacam Oδ

-



+

O C

nucleófilos atacam

A ligação dupla C=O resulta da coexistência de uma ligação pi, π e de uma ligação sigma, σ. ligação pi, π C

O

C

O

ligação sigma, σ

11.1 REACÇÕES DE COMPOSTOS DE CARBONILO 11.1.1 Adição nucleófila

133

Química Orgânica A

O Nu

C

O

H

C Nu

O H C Nu

intermediário tetraédrico

Nu- = nucleófilo

O nucleófilo pode ser

H ROH H2O RNH2

ião hidreto álcool água amina

A adição nucleófila é a reacção mais características dos compostos carbonílicos. Protonação O oxigénio do grupo carbonilo tem uma elevada densidade electrónica e portanto é susceptível à protonação.

C O

H

C O H

C O H

Nu

Nu C

O H

Portanto a protonação através da catalálise ácido é usada por vezes para aumentar a susceptibilidade do grupo carbonilo ao ataque por nucleófilos. O R C X + Y

O R C X Y intermediário tetraédrico

O R C Y + X

134

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

X = Cl O

O R

C

R' OH

Cl

R

-Cl

cloreto de acilo

C

H2O

OR'

hidrólise

éster

alcoólise O

R' NH2 R

C

N

O

R'

-Cl

R

H amida

aminólise hidrólise

H2O

C

OR'

O

H

HOH O O R

C

hidrólise

R

OH

C O

ácido carboxílico

N

R'

H H

Susceptibilidade do carbonilo ao ataque nucleófilo segue a seguinte ordem:

O R C Cl

>>

O R C OR'

>

O O R C NHR' >> R C OH

11.1.2 Equilíbrio ceto-enólico

Este equilíbrio é de uma enorme importância e é responsável pela reactividade existente no átomo de carbono α. O α C C H

- BH

B

O C C

carbanião hidrogénios ácidos

O C C

enolato

135

Química Orgânica A 11.1.3 Tautomerismo de carbonilos / reacção com electrófilos O C C

O -H C C H forma ceto

E O C C E

OH C C

+H

forma enólica ou enol

O C C anião enolato

tautómeros

A forma cetónica e a forma enólica da maior parte de compostos carbonílicos existe em equilíbrio, mas a forma cetónica em geral predomina. O

OH

O H

ceto > 99% O

Br

Br-Br -HBr enol < 1%

H

O H

OH H H

fenol > 99,9 %

E

E

não se detecta (ceto)

O

O H

O

O

H ceto 24%

enol 76%

TAUTOMERISMO - o fenómeno de tautomerismo é o equilíbrio que se estabelece entre as formas enólicas e cetónicas de um composto e pode ocorrer espontaneamente quer por catálise ácida, quer por catálise básica. O enol e a cetona / aldeído são isómeros constitucionais que se chamam tautómeros. O processo de enolização é a conversão da forma cetónica na forma enólica. O processo de cetonização é a conversão do enol na forma cetónica. 11.1.4 Adição a carbonilos

11.1.4.1 Redução de carbonilos / Adição de hidreto

136

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

Os compostos carbonílicos são reduzidos a álcoois por NaBH4, boro-hidreto de sódio, um dos compostos da família dos hidretos metálicos. Um hidreto é H- é um átomo de hidrogénio a que se adicionou mais um electrão, ficando com a configuração electrónica do hélio - é um nucleófilo muito poderoso.

Na H H B H H

C O

C

O BH3 Na H

boro-hidreto de sódio

carbonilo

H C O R

H H C OH H álcool primário

NaBH4

aldeído

R C O

R R C OH H

NaBH4

R cetona

álcool secundário

CN

11.1.4.2 Reacção do grupo carbonilo com cianeto H

C N C O

CH3 aldeido

H2O pH = 10

O H C H álcool

H2O

H

O C

CH3 C N

H H CN

O H C

CH3 C N

H2O

ciano-hidrina

H3O

H αO H C CH3 C O O H α-hidróxi ácido ácido α-hidróxipropiónico

137

Química Orgânica A

11.1.4.3 Reacções gerais do ataque de nucleófilos de azoto ao grupo carbonilo 11.1.4.3.1 Adição de aminas

C O

H O H

O

H2N R

C N R

-H2O

C

H

C N R

N H R

H

amino-álcool

imina R= alquilo ou arilo

H2N OH

OH C N

hidroxilamina óxima

H O H2N N C NH2

C O

O HN C NH2 C N

semicarbazida

semicarbazona

HN C N

O2 N

2,4-dinitrofenil-hidrazona NO2

H2N N H

2,4-dinitrofenil-hidrazina DNP

11.1.4.4 Adição de álcoois

ROH

+ ROH

C O H

H

H O H C O R

C

O R

hemi-acetal

Frequentemente os dois grupos OH pertencem à mesma molécula.

O R C O R acetal

138

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço OH C O

+

HO HO

C

H

O

O

C O acetal

HO

11.1.4.5 Adição de carbaniões

C O

δ− δ+ R Mg Br

+

Éter

H3O

O Mg Br

OH C

C

R

R

álcool

brometo de alcóximagnésio

Exemplo:

C6H5

O C CH3 +

acetofenona

C6H5

O C CH3 +

δ− δ+ CH3 Mg Br

OH 2 C6H5 C CH3 3 CH31

brometo de metilmagnésio

2-fenil-2-propanol

δ− δ+ CH3 Li

acetofenona

OH 2 1 C6H5 C CH3 3 CH3

metil-lítio

2-fenil-2-propanol

11.2 PREPARAÇÃO DE COMPOSTOS DE CARBONILO 11.2.1 Aldeídos a partir de cloretos de acilo

R

O C

OH

Cl

O S

Cl

R

O C

O

O S

Cl Cl

H R

O C

+ O S O + HCl Cl

cloreto de acilo

139

Química Orgânica A

O S

O R C O H

H Al OtBu tBuO OtBu Li

Cl Cl cloreto de tionilo

O

R

Cl

H

O R C H

O C

R C

Cl

H cloreto de acilo

ácido carboxílico

aldeído

11.2.2 Cetonas a partir de cloretos de acilo

O R C

δ − δ+ R' Mg Br

O R C R'

Cl cloreto de acilo

R'

H

OH R C R' R' álcool

Mg Br

R'

CuLi R' organocuprato é um nucleófilo mais fraco

O R C R' cetona

11.3 COMPOSTOS CARBONÍLICOS IMPORTANTES

O formaldeído obtém-se de oxidação do metanol usado e é na produção de resinas de ureiaformaldeído (polímeros). A uma solução aquosa a 37% de formaldeído dá-se o nome de formalina. O C H

H

formaldeído gás p. e. -21°C

O acetaldeído obtém-se por oxidação do etanol: O oxidação CH3

H

acetaldeído

CH3

CH2

OH

140

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

O benzaldeído com aroma da amêndoa amarga e a vanilina com o aroma da baunilha, têm ambos um grupo carbonilo em conjugação com um anel benzénico. O

O

H

H HO OCH3 vanilina

benzaldeído

A feromona de alarme da formiga corta-folhas:

O feromona de alarme da formiga corta-folhas

A muscona usada em perfumaria como fixativo de perfumes para tornar o cheiro mais duradouro e que é excretada pelo boi almiscarado. O

muscona

E várias hormonas :

141

Química Orgânica A H O

O

C

C

H

H

O

O progesterona (hormona excretada durante a gravidez e que suprima a ovulação)

CH3

noretisterona (esteróide sintético da pílula)

CH3 N

H O

C

C

H

O pílula anticoncepcional da manhã seguinte

11.4 AMIDAS IMPORTANTES

142

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço O 1C

2

H

O

NH2

H2N (CH2)5CO2H

6

3

ácido ε-amino capróico

H ε

H HO

O

N

5

4

OH

C α

δ

N

H

β

γ

ε - caprolactama

6 átomos de carbono O N

(CH2)5

O

C

N

H

(CH2)5

C n

H Nylon -6

O HO

C

O (CH2) 4

C

OH

+

H 2N

6 átomos de carbono

N H

H N

6 átomos de carbono

O C

C O

N H

Nylon -6.6

(CH2) 6

NH2

6 átomos de carbono O H N C

C O

6 átomos de carbono

143

Química Orgânica A

O C

O NH

C

S

H N

S

R

CH2

β - Lactamas

N

N O

O

C

C O Penicilina G

O

O

H

cefalosporina R' = CH 3R = C6 H5

O

R'

CH

NH O NH O ácido barbitúrico

NH2

O

H

144

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

12 ÁCIDOS CARBOXÍLICOS 12.1 ESTRUTURA DOS ÁCIDOS CARBOXÍLICOS

Os ácidos carboxílicos representam uma vasta família de compostos orgânicos que contêm o grupo funcional carboxílico. O R C O H grupo carboxilo

O ião carboxilato forma-se a partir do ácido carboxílico por perda de um protão: O R C O H

O R C O

O R C O

H

+

ião carboxilato

De seguida estão representados alguns exemplos de ácidos carboxílicos com os valores respectivos de pKa. CH3CO2H

ClCH2CO2H

FCH2CO2H

ácido cloroacético

ácido acético pKa=4,8

pKa=2,6

OH

OH O2N

Cl ácido benzóico pKa=4,2

pKa=0,7 O

O OH

ácido tricloroacético

ácido fluoracético

pKa=2,8 O

Cl3CCO2H

ácido p-clorobenzóico

ácido p-nitrobenzóico

pKa=4,0

pKa=3,4

Os áidos carboxílicos estabelecem pontes de hidrogénio e formam dímeros: O R C O H

H O O

C R

145

Química Orgânica A H O R C O H

H O H O H

12.2 REACÇÕES DE ÁCIDOS CARBOXÍLICOS 12.2.1 Redução de ácidos carboxílicos

O R C O H

LiAlH4

H R C H O H álcool primário

O

C

O

H

H

H H O C

LiAlH4

12.2.2 Bromação de ácidos alcanóicos (reacção geral de compostos carbonílicos)

R'

R O C C Br Br

1) Br2, P

R O C C H OH

R' 2) H2O

R'

R O C C Br OH

α-bromo ácido

12.3 ÁCIDOS CARBOXÍLICOS IMPORTANTES

O ácido acético é um constituinte do vinagre e está envolvido na produção de acetatos, como por exemplo o acetato de celulose que é um derivado que permite fabricar filmes transparentes, nomeadamente películas de filme para a indústria cinematográfica. O ácido acetilsalicílico obtido por reacção do ácido salicílico com o anidrido acético é usado como fármaco nos comprimidos de aspirina. O C O

H

C OH O ácido salicílico

H3C

O C O

CH3

anidrido acético

O O C CH3 C OH O ácido acetilsalicílico ASPIRINA

146

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

13 FENÓIS OH

SH

OH

OH Cl CH3

Cl tiofenol

fenol

2,4-diclorofenol

cresóis orto, meta, para

13.1 ACIDEZ

Uma das propriedades mais importantes dos fenóis é a sua acidez. O H

O +

Ka = 1x10-10

H

pKa = -logKa = 10

Comparando com o ciclo-hexanol: OH

O +

ciclo-hexanol

H

Ka = 1x10-17 pKa = 17

base conjugada

A deslocalização da carga negativa faz com que o fenol seja um ácido mais forte que o ciclohexanol. Podemos ver que o anião fenóxido apresenta várias estruturas de ressonância, em que surge a sua estrutura tautomérica ceto. O

O etc.

É possível modificar a acidez de fenóis pelo tipo de substituintes introduzidos para aumentar ou diminuir a estabilidade relativa do anião fenóxido.

147

Química Orgânica A OH

OH

OH

OH Cl

OH

OH

NO2

CH3

O2N

NO2

NO2 pKa

10

8,1

OH O N

O O

-H

O N

NO2 0,4

8,3

7,2

10,2

O O

O N

O

o-nitrofenóxido

O efeito indutivo do grupo NO2 é electro-atractor (devido ao efeito de electronegatividade da carga positiva no N) estabiliza o anião. 13.2 SUBSTITUIÇÃO ELECTRÓFILA AROMÁTICA DE FENÓIS

O grupo OH afecta significativamente o comportamento do anel aromático. Vimos já que o grupo OH é director orto-para para a substituição electrófila aromática. É também um activador muito forte, dando origem à substituição de fenóis, que resulta em polifenóis. Por exemplo, nitração de fenol dá o derivado 2,4,6-trinitrofenol. OH

OH nitração

O2N

NO2

NO2 2,4,6-trinitrofenol

A monossubstituição do fenol consegue-se transformando-o no acetóxibenzeno (também conhecido por acetato de fenilo) por acetilação com cloreto de acetilo.

148

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

OH

O

O C

CH3

CH3COCl

O

CH3

Br2

Br p-bromoacetóxibenzeno

Br2

1. NaOH 2. HCl

OH Br

O C

Br OH Br Br p-bromofenol

Ao usarmos o grupo acetóxido que tem um efeito electroatractor moderado, vamos estabelecer uma competição com o núcleo benzénico, tal como se vê na estrutura de ressonância: O O C CH3

O O C CH3

Portanto os electrões do oxigénio estão menos disponíveis para a substituição do que no caso do fenol. 13.3 ALQUILAÇÃO DE FENÓIS — SÍNTESE DE WILLIAMSON

OH

O NaOH

Na CH3 I SN2

O CH3

anisole +HI SN2

A técnica é usada para proteger o grupo fenol. 13.4 SÍNTESE DE COMPOSTOS FENÓLICOS

A síntese laboratorial mais usada é a diazotização.

149

Química Orgânica A

NO2 HNO3

N N

NH2

H2O

HNO2

H2 / Pt

OH

Δ

H2SO4

sal de diazónio

Mecanismo de formação do sal de diazónio a partir da anilina:

H H N

O

H O H N N

N

OH H N N

N

N

-H2O ião diazónio

13.5 FENÓIS IMPORTANTES

O fenol e o seu sal de sódio são usados como desinfectantes em usos domésticos e hospitalares. Os cresóis são preservantes de postes de madeira colocados na terra. Outros fenóis importantes são: OH

OH

OH COOCH3

CH2 CH NH2 COOH

OCH3

H

tirosina amino-ácido essencial para o ser humano

C

O

vanilina aroma da baunilha

salicilato de metilo

OH OH OCH3

HO HO

HO

CH2 CH CH2

eugenol

estradiol

antisséptico

hormona sexual feminina

OH C CH2 H NH CH3

epinefrina neurotransmissor de mamíferos

150

Ana M. Lobo, M. Manuela A. Pereira, Ana Lourenço

CH3O

CH3 O CH2 N C (CH2)4CHCH C CH3 H H

HO capsaicina ingrediente activo da pimenta picante usado na alimentação, agente tópico para a artrite

14 BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA 1- Johnson, A. W. “Invitation to Organic Chemistry”, Jones and Bartlett Publishers, Sudbury, 1999. 2- Clayden, J.; Greeves, N.; Warren, S.; Wothers, P. “Organic Chemistry”, University Press, Oxford, 2001. 3- Vollhard, K. P. C. “Organic Chemistry”, W. H. Freemahn and Company, New York, 1994.

FIM

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