Sandra Caponi - Uma Lógica Da Compaixão
August 16, 2022 | Author: Anonymous | Category: N/A
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A LÓGICA DA COMPAIXÃO
San dra CAPO CAPONI NI1
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RES ESU UMO: Tomando c omo ponto de parti partida da os trabalhos de Nietzsche, Hanna h Aren Ar en dt e Miche l Foucau lt, este esc ri rito to preten de p roblemat iz izar ar a lógica lógica interna da c ompa ixão piedosa, pois, pois, como te ntaremos m ostr ostrar ar,, ela ela pa rece insta urar uma m odali odalidad dad e pec uliar de exercício exercício de pod er que s e est rutura a partir do binômio servir-obedec servir-obedec er er.. A partir dess es a utor utores, es, pretend emos ler algun algun s exemp los q ue a históri históriaa da human idad e nos apresenta para ilustrar ilustrar o exercíexercício dessa “cruel compaixão”. PALA ALAV VRAS-CHA RAS-CHAVE: VE: Comp aixão; Nietzsc he ; p ode r.
Interessa-nos problematizar a lógica interna da compaixão piedosa, pois, poi s, como ten taremos mostrar, mostrar, acha mos q ue e la instaura uma moda lili-dad e pe cu liliar ar de e xer xercí cíci cioo do poder q ue se e strutura a p artir do binômio binômio servir-obedecer, multiplicando assim a existência de relações sempre dissimétricas, entre quem assiste e quem é assistido. Se acreditamos qu e é n ece ssári ssárioo excluir excluir do discurso discurso méd ico a ca ri ridad dad e cristã e a p ieda de reli eligiosa, giosa, aqu el elaa q ue costum av avaa s ituar o d oente no lugar lugar da debili debilidadade mais absoluta e da mais extrema impotência, então será mister que possam ser dese nvo nvollvi vidas das estratégias cap azes d e fazer fazer qu e a pal palavr avraa d os doente s possa formar parte de u ma rede di dial alógica, ógica, que p ermita institui instituirr um genuí genuíno no consen so, em q ue h oj ojee existe aceitação pas si sivva. Mas, para 1 Prof Professor essoraa Adjunta Adjunta d o Departamento de Saúde Pública Pública da Univ niversi ersidade dade Federal Federal de Santa Catari Catarina – S/C – Doutora em Lógica e Filosofia da Ciência – Unicamp.
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qu e e ste obj objeti etivo vo seja seja a titing ng ido, acreditam acreditam os q ue é p reciso analisar analisar a estruturaa e o modo de funci tur uncionam onam ento des sa c ompaixão piedosa. piedosa. Empreender um a críti crítica ca d a ética da cari caridade dade e da compa ixão exige exige que nos lembremos de Nietzsche (1984), pois é mérito seu ter sabido iniciar, com lucidez e firmeza, um estudo demolidor dessas estratégias de p oder que, no preciso preciso mom ento em q ue n os promete promete m a uxí uxílilioo e assistência, multi multipli plicam cam os mec an ism os de coerção, docilizaçã docilizaçã o e sub missão. As perguntas q ueidas Nietzsche faz a respe r“É especonveniente ito eniente da caridade e d a com paixão podem se r resum n estas dfaz uas: conv ser antes de ma is nada h omen s compa ssi ssivo vos?”; s?”; “É “É conveni conveniente ente pa ra os que pad ecem qu e de les vos comp ade ça is?” (19 (1984 84,, p.338) p.338).. A resp resp osta a e ssa s q ue stões s erá, por sua vez, determinante: “Nossos benfeitores diminuem nosso valor e nossa vontade, ainda mais que nossos próprios inimigos”. O que acontece é que eles estão impossibilitados, a partir do início, de interpretar corr corretam etam ente e m toda sua s ua compl com plexi exidade dade a dor de quem que m padec p adece, e, e é ali qu quee radica um a caraterí c araterística stica que q ue defi define ne o comp ass assiivo vo:: “pois “pois o próprio próprio do sentimento de compaixão é despojar a dor alheia do que ela tem de pessoal pes soal”, ”, de indivi individua dua l, de ún úniico e irr irrepe epetítívvel el.. Quando Quan do o sentimen se ntimento to de piedadee pr dad p rete etende nde sup superar erar este limite, limite, ele ele se s e faz faz intolerável intolerável e é por isso isso q ue na maior parte dos benefícios aos necessitados existe algo que indigna, pela indiferença intelectual com que o compassivo julga o destino, sem saber nada das conseqü ênci ências as e compli complicações cações interior interiores es q ue p ara mim e p ar araa você se ch amam infortúnio. (Nietzsche,1984, p.338)
A pessoa c ompa ssi ssiva va tem o imp imp ul ulso so de socorrer socorrer,, qua nto ante s m elhor, mas o que não existe é o tempo para medir se as conseqüências dess e socorro socorro ime ime di diato ato são ou não de sej sejada ada s por aquele que p ade ce um inf nfortún ortún io. Para Para Nietzsc Nietzsc he , a fifigura do hom em piedoso é a d e alguém qu e não pode tol toler erar ar uma míni mínima ma ma rgem de d or or,, qu e nã o pode d esf esfrutar rutar ou aprender de su a solidão, solidão, é alguém alguém qu e q uer socorr socorrer e não pen sa q ue o infortúnio infortúnio pode ser uma necess idade pessoal e q ue você e eu podem os ne cessitar tanto do terror terror,, das pri privvações, da pobrez pobreza, a, das av aventuras, enturas, dos p eri erigos, gos, dos de seng anos q uanto dos b ens contrár contráriios. (19 (1984 84))
Enfim, trata-s e de al Enfi algué gué m c uj ujaa ún ica religião religião não é a ca ri ridad dad e, pois elee p rof el ofess ess a ta mb ém a “reli “religião gião do be m-e sta r” r”,, fifica ndo a ssim imposs ibililitado tado de ente nder aq uel ueles es p ara os qu ai aiss o be m-e star star,, seja seja e le imediato ou poss ível vel,, longe longe d e represe represe nta r um valor valor,, represe represe nta um a am eaç a, algo assim assi m c omo a calma calma q ue nada pr precede. ecede.
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É por isso isso q ue coti cotidi diana ana me nte podem os ass istir a imorai imoraiss m as pi pieedosas atitudes que, respondendo à força da compaixão e à procura do bem-estar, reproduzem a mais ilegítima, ainda que legalizada, coerção: aq uel uelaa q ue pess oas ca ri ridosas dosas exer exercem cem sobr sobree os inf nfortunados. ortunados. Legiti Legitima ma se assim que, compulsoriamente, os homeless sejam deslocados para abrigos públicos reconhecidamente perigosos; admite-se que os ditos “loucos” sejam isolados em centros que, clara e indiscutivelmente, não são espaços de hreabilitação estimula-se queo os de rua” sejam recol sejam ecolh idos e m asil asilos osoupacura; ra espe rar um a adoçã sem“meninos pre diferi diferida; da; inte rf rfere-se, ere-se, piedosa me nte , na dissoluçã dissoluçã o e sepa raç ão de fam fam ílilias as ca rentes. As refl reflexões exões de Nietzsche, assi ass im com o as de Hann ah Arend Arend t e Thomas Szasz se defrontam com esses mecanismos obscuros e cotidianos, por me io dos qu ai aiss a p iedad e e a compa ixão se rev revel elam am como um a pe ri rigosa gosa e te mív mível el tecnologia tecnologia de poder qu e, no e ntanto, insiste insiste em aparecer com a máscara de um desapaixonado e necessário “humanismo”. É provável que, cotidianamente, descubramos a existência desses espe tácu los de coerção e su bm issão, ma s a for força ça d a fr freqüê nci nciaa na da n os diz acerca dos motivos que levam esses homens e mulheres comuns e ben fdosa eitor ei tores rtilhar rtil har crenç cr enç as ed eq ue q ue, trásio dess trás ncliinaç ncl õess ca ri ridosa s,eseles elaescompa realizam realizam a tosa morais morai é ppororme dessas irealizaçõe reali zaçõe que eles podem converter-se e afirmar-se como pessoas virtuosas. É preciso preci so desc artar a e xi xistênci stênciaa de um ma q ui uiav aveli elismo smo c onsciente q ue pr preefere se apresentar como compassivo para poder exercer assim, mais livrem vr em en te, o dom ínio e o pod er er.. Quiçá Quiçá os motivos motivos se jam ma is simples, e é outra vez em Nietzsche que devemos procurar alguma resposta à pergun ta pe la conveniênci conveniênciaa em ser home ns com passiv passivos. os. Veremos então que as conveniências são múltiplas: O contratem po sofrido sofrido por outra outra pe ssoa nos ofend ofend e, nos faz faz sen tir nossa imp otência e talvez talvez nossa cob ardi ardia, a, se n ão acu dirmos em seu auxíli auxílio. o. ... ... Ou na dor alheia vemos algum perigo que também nos ameaça, pois ainda que só seja como sinais da inseg urança e d a fr frag ililiidad e hum ana s, os inf infortún ortún io ioss alheios podem pr produzir oduzir em nós penosos ef efeit eitos. os. Rej Rejei eitamos tamos esse gêne ro de ame aça e de dor e lhe respondemos por meio de um ato de compaixão, no qual pode existir uma sutil defesa de nós mesmos e até algum resquício de vingança. (Nietzsch e, 1978, p.133)
Em todos esses e outros fenômenos que se resumem na palavra “caridade”, o que se evidencia é que, na realidade, “pensamos muito mais em nós mesmos que nos outros”. O que fazemos no momento de reali ealizar zar um ato de cari caridade dade é liberta liberta rr-nos nos de um sentimento de dor que
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é ab sol solutam utam ente nosso, a dor que inspira inspira o es petácu lo da m iséri séria, a, e o q ue fazemos então é libertar-nos de um padecimento, de um medo que é muito pessoal e muito nosso. Nesse sentido, Tomas Szasz dá um bom exemplo de como a compaixão não tem por que ser considerada como virtude: narra suas lembranças de Budapeste, a visão de amputados e indigentes, solicitando algumas moedas, e lembra esse sentimento de compa ixão que e ntão se a poderav poderavaa dele. Nesse ínterim ínterim – diz – dei-me dei-me conta de q ue m inha g enerosi enerosidade dade não era de todo altruísta, que eu era motivado por um vago receio de que um destino sem el elhante hante pud esse recair sobre sobre m im, aliado aliado a um a esp er erança ança supersti superstici ciosa osa de q ue m inha of oferta erta pu desse ev evocar ocar uma divi divindad ndad e com poderes misteriosos misteriosos sobre ess es a ssu ntos. (199 (1994, 4, p.22) p.22)
O probl problem em a apa rece q uan do elevamos elevamos essa c ompaixão – qu e sab emos inútil e inefi inefici ciente ente , qu e reconhece mos como um pobr pobree instrume nto para sup rir qu al alqq uer nec essidade – ao nível nível de um a c ategori ategoriaa m or oral al ou ou social soci al:: q uand o acreditam acreditam os qu e a el elaa é capa z e efici eficiente ente a ponto de nos construir como agen tes “morai “morais”, s”, ou qua ndo preten preten dem os funda funda me ntar nela Ouma social queordem está em jogomais ali éjusta. a lógica interna da moral da compaixão. Um a lógica lógica q ue, c omo já já foi foi dito, pode e de ve se r analisada c omo se nd o a racionalidade própria de uma estratégia de poder. Como afirma Nietzsche: ao realizar atos de caridade o que fazemos é libertar-nos de um padecimento q ue é n osso. No entan to, não agimos nessa dir direção eção impulsionados impulsionados por um ún ico motivo, e ainda quando seja verdade que queremos nos libertar de uma dor, também é verdade que agimos impulsionados pelo júbilo provocado pelo espetáculo de uma situação oposta à nossa, pela idéia de poder socorrer àquele inf nfortunado ortunado se a ssim o d esej esejarmos, armos, pela espe rança da grati gratidão dão q ue haver haveremos emos de obter pela atividade do socorro. (1978, p.133)
Aind a q ue n os horrori Aind horrorizem zem os perant e a idéia des se júbilo, júbilo, não é outra coisa coi sa q ue s e evidencia evidencia na enunci enunciaçã açã o de a lgum as fr frases tai taiss com o: “de“deves s ac ri riffica r-te com en tus iasm o”, “deves imolar-te imolar-te a ti mesm o”. A moral da comp ai aixão, xão, que apregoa a e ntrega e a morti mortifficaçã o, detesta reconhecer que por trás de um ato de piedade e na própria entrega de si (quanto maior o sacrifício, maior a dívida gerada), o que se afirma é a existênci exi stênciaa de um a dívida dívida q ue haverá haverá de ser paga com e terna g rati atidão dão e com hu mil mildad dad e. Por isso, sen titimos mos o pior ress en titime me nto q ua ndo alguém se n ega a a ce itar noss o sac ri riffício.
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O homem cari caridoso doso satisfaz satisfaz uma neces si sidade dade de su a alma fazendo fazendo o bem . Quanto maior for essa necessidade menos se posiciona no lugar daquele que socorre e que lhe serve para satisfazer essa necessidade, e até reage duro e ofensivo em certos casos. (Ibidem, p.334)
Limitamo-nos aq ui à tenta titiva va de responder à p ri rime me ir iraa da s du as p ergu nta s formuladas formuladas p or Ni Nietzsc etzsc he, aq uela ref referi erida da e spe cif cifiicam en te à conveniên eniênci ciaa e m sermos home ns compa ssi ssivo vos. s. Para Para resum ir ir,, digam digam os q ue essa conv conveniên eniênci ciaa pode ser analisada analisada como um a dívida dívida q ue se imp õe à pess oa auxili auxiliada, e na me di dida da em q ue se trata de u ma dí dívi vida da contraída contraída por algué algué m, cu ja c ondi ondição ção é de precari precarieda eda de extrema, e sta retribuição retribuição espe rada nã o haverá haverá de ser outr outraa q ue um e stado de g ratidão perm anen te. Porém, Porém, ao me smo te mp o o que a li está e m jogo jogo é um a pe ri rigosa gosa trantranqüilidade qüili dade de consciên consciênci cia, a, q ue imp ossi ossibil biliita a análi análise se das conseq üênci üências as de nossas ações cari caridosas: dosas: Em si própria a compaixão não tem de benfeitora mais do que qualquer outro instinto. Só quando a exigimos e a elogiamos – e isto acontece quando não se compreende o prejuízo que produz, quando é olhada como fonte de prazer – é que ela vem acompanhada da tranqüilidade de consciência e então nos en tr tregam egam os a el elaa se m teme r suas c onseqü ênci ências. as. (I (Ibidem, p.134) p.134)
Fica a ind a por delimitar Fica delimitar em q ue c onsiste a con veni veniência ência de ser objeobjeto de compaixão compaixão para para aqu el eles es q ue pade cem. Se q ui uisermos sermos aventurar al algum gum a resposta a ess a q uestã o, não poderemos prescindir de uma problematização da distinção existente entre aqu el elee q ue se compadece e aq uel uelee q ue é compadecido compadecido.. Em Em outras palapalavras: entre aquele que se afirma, em seu gesto de entrega, como um ben fei eitor tor e aq uel uelee q ue, p or receb receb er assistência assistência (ai ainda nda qu e e sta não s ej ejaa solicitada soli citada ) se diz ben efi eficiado. ciado. Essa Essa d istinção pa rec e est ar fun fun dam en tad a em auma dissimetria de ”. Nietzsche, é insuperável. Par Para e le, “comp ad ece que, r-se ena qu iperspectiva valee a de preciar val preciar”. Por isso, Por isso, “entre os selv selvaagens, o homem pensa com terror terror em quais poderão poderão ser as causas que o levari evariam am a se r comp ad ec ido, pois isso isso se ri riaa con siderado com o prova prova de q ue el elee c arece de q ualque r virtude ” (I(Ibidem , 1978 1978,, p.134) p.134). A partir do momento em que alguém pode manifestar piedade por outraa pe ssoa, a ca rac teri outr teriza za como su jeita a um a de bil biliidade , como algué algué m qu e só pode su perar suas limitações limitações pe lo socorro socorro que a pe ssoa com passivva p ode ofer si oferecer. ecer. Então, Então, com um me smo g esto se estab el elece ece uma divi divi-são binária binária en tr tree aq uel uelee q ue se eng rand ece ao reali realizar zar a ação e a qu el elee q ue s e diminui ao rec rec ebê -l -la. a. Como já já dissem os, concede r à com pa ixão, à
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caridade ou à p ieda de u m valor valor moral pode levar a crer, crer, errad errad am en te, q ue ao socorrer os outros nos engrandecemos como agentes morais, e que, des se modo, m odo, podemos podem os converter-nos em sujeitos sujeitos moralme moralme nte inobjetá inobjetá vei veis. s. Mas, é justam justam ente e sta ilusão, ilusão, basea da no suposto eng rand ecimento “moral”” de si, que imp ede pen sarmos qu e, talvez, ral talvez, nosso gesto d e com paix paixão ão não seja desejado; que qu içá e le possa ter conseqü ênci ências as ne gativ gativas as pa ra o “bene ficiári ciário”; o”; ou ou qu e, simplesm simplesm en te, poss a ge rar e promover esta dos de depe ndêcom nciaac eui nci de subm Algo assim Algo assi m ac aontece sufocam sufocam os o doente uidados dados quissão. e e le próprio própri o poderia poderi as sumqir ir,uand , quaondo pe lo bem de al algum gum as pes soas “i “inconv nconvenientes enientes ” as pref preferi erimos mos excl excluir uir e m edicali edicalizar zar,, quando ac redi editamos tamos conhece r as necessidades e as dema ndas d os outros, outros, muito antes d e q ue el elas as p ossam ser soli solicitadas. Nesse jogo perverso, perverso, o infortúnio do semelhante corre o risco de converter-se em “edificante” para os seres compassivos. Então, pode tornar-se viável esse irônico e im pl plac acável ável afori aforism sm o nietzsch ea eano: no: q uand o um home m é inf infortunado, ortunado, acodem as pess oas piedosas piedosas e lame lame ntam se u infortún inf ortún io io.. Quan do elas sa em , no fim satisf satisfeitas eitas e edif edificadas, icadas, ficaram fartas do espan to do infortunado, infortunado, como s e se tr tratara atara de se u p rópri óprioo espa nto, e pas saram um a boa tarde. (I (Ibidem , 1978, 1978, p.224)
Send o assim, assim, parece q ue nã o pode existir existir nenhu m es paç o reservado reservado pa ra a lgu ma forma leg ítima d e c omp aixão. Podem Podem os, ent ão, formu formu lar alalg u m a s p e rg u n t a s : s e rá q u e s e m p re e fa t a l m e n t e d e p re c i a m o s o beneficiário de nossa piedade? Não existe um sentimento legítimo pelo qu al me reconheç o como igua igua l ao outro, outro, no mom ento em qu e me compa deç o de seu sof sofri rime me nto? Ap ar arentem entem ente não é possí possívvel respond respond er afirafirmativamen mativ amen te a ne nhuma de ssas q uestões se tomarmos como ponto de partida o aforismo nietzscheano antes citado. Porém, haverá de ser o próprioo Nietzsche própri Nietzsche qu em fornecerá u m suporte para refletir refletir sobre sobre u m modo llegíti egítimo mo dveosp eiedad e. Estetep ode r um, sósentimento paz dsingu e ge rar víncuvíncuos positiv positi m or oralmen almen legítisemos legítimos em ce rtoscac asos lares: a li onde exi exista sta pr prox oxiimidade e identifi identificaç ão com essa pessoa qu e consi consideraderamos como infortunad infortunad a. Então, qua ndo u m am igo adm ir irado ado ou um inimi nimigo go respeitado respeitado v iverem um a situaç ão de infeli infelicidade cidade ou s e vejam vejam forçados a p ad ec er algu algu m titipo po de s of ofri rime me nto, é q ue m inh a com pa ixão pode s er defi definida com o leg leg ítitim m a, pois pois ali é m inha própri própriaa de sg raç a q ue s of ofrro. Isso Isso pod erá ac onte cer cada vez que, por causa de um infortúnio, deva enfrentar a privação desse afeto e dessa amizade que me alegra e gratifica. Mas também pode existir um modo legítimo de piedade quando vejo “padecer um 96
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ini nimigo migo a que m consi considero dero um igua l em or orgul gulho ho e a quem o torme torme nto não derrota, derro ta, e em ge ral q uand o vem vem os padec er a um ser que não qu er pedir comp aix aixão, ão, qu e é, é , a humil hu milhaç hação ão m ais vergo vergonhosa nhosa e m ais baixa” baixa” (Ni (Nietzsch etzsche, e, 1978 19 78,, p.324) p.324).. Ali pa rec e q ue nos e nf nfrren tam os com um sen timen to próxipróximo da adm ir iração, ação, mas q ue, no entanto, não pode ser inteir nteiram am ente se parado de um a forma forma d e piedade qu e é m enos “comp “comp assiv assiva” a” do qu e “apai“apaixonada”. O qu e d iferen erenci ciaa e ste sentimento legíti egítimo mo da pi piedad edad e c ompa ssiva queo contrário, não existe ali que ser associado desprezo; muitoé pelo pel contrári o, ele elenada s e funda empossa um sentimento q ue éaopró próxi ximo mo d a adm ir iraçã açã o. Esse Esse inf nfortúnio ortúnio não nos en al altece tece nem nos faz faz m ai aiss hum anos ou mais virtuosos, simplesmente nos iguala com aquele que padece. Ainda em tais circunstâncias, é possível afirmar com Nietzsche que em si mesm a “a compa ixão não tem de b enf enfei eitor toraa m ai aiss q ue q ual ualqq uer outro outro instinto” nstinto”,, que não é esse sentimen to que nos faz faz ma is virtuosos ou morais, mas sim os atos q ue d e fato fato som os cap azes d e realizar realizar.. A compa ixão assim como pode gerar atos virtuosos também pode representar uma deb ililiidad e m or oral al.. É assim com o os estóicos a vêem : pa ra e les não e xi xiste ste disti di stinçã nçã o entre a pieda pieda de e a inví invídi dia: a: “Poi “Pois o home m q ue se comp adec e de outro, tamb ém pode ficar aflito aflito pela prospe prospe ri rida da de dos out ro ros” s” (S (Szasz, 1994, p.25). Mas, a piedade é sempre uma debilidade para aqu el elee qu e, num s entido ou noutro, noutro, quer servir de m édico à human idade . Elee tem que tomar precauções El precauções contra esse sentimento q ue o paralisa paralisa nos m omentos decisivos, que ata sua consciência e sua mão hábil. (Nietzsche, 1978, p.134)
Enfrenta mo-nos com um sentimento q ue n ão é, em si própri Enfr próprio, o, nem bom ne m ruim, mas, no mome nto em q ue ele é exigido exigido e exaltado exaltado como um val valor or moral moral,, na m edida em qu e fazem fazem os desse sentimento um a regra de c omportam ento, capa zpara de dum efiinir ef por sihumano, própriaa um própri parâmeotr troorisco do qudee é moralmente desejável grupo corremos leg ititima ma r certa s estratégias de coerção q ue se exer exercem cem em n ome e p el eloo bem dos considerados beneficiários.
Sociedades compassivas A históri história da hum an idad e apresenta m ui uitos tos exemplos exemplos qu e podem ililust ust rar o exercício exercício dess a “crue l com pa ixão”, e q uiçá o p ri rim m eiro deles deles é a implem implem enta ção, na Inglaterr nglaterra, a, da s 43 leis leis de Isabel, Isabel, tam bém conhec i-
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das como “Lei “Lei de Pobres”. Pobres”. Tanto na s ua imp lem enta ção, por meio da organização e administração paroquial, que caracterizou a Inglaterra dos s écu los XVII e XVIII, q uan to na sua poste ri rior or revi revisão são e ref eformulação, ormulação, a Le i d e Pob Pobrre s representa o mais antigo e o mais claro exemplo de coerção comp assiv assiva. a. É pela força da caridade e da compaixão que o mundo da pobreza começa a ser racionalizado e quadriculado, e que se pode começar a estab elecer ecernto, diferenças diferenças ca tegori tegorias e ntr ntree os“pobres”. h abitantes uiloo que e,auaté uil est e mel ome formavae par formava te d o as contínuo “pobres”. Parad aq Para assistir xi-xi liar os pobres foi mister, em primeiro lugar, designar lugares e funções, distribuir e fixar a cada um dos necessitados um espaço preciso. Na medida em que cada paróquia era a responsável pela administração e gestão d este auxí auxíllio, foi foi indispensável q ue, ao m esm o tem po em qu e se socorriaa e se cu idava, fosse socorri fosse procur procurado ado um me io pa ra fixar fixar cad a indiví indivídu o dentro do espa ço da qu el elaa q ue seri seriaa s ua paróquia ben fei eitor tora. a. Surge Surge a ssim, de ntre as 43 leis, leis, a fam fam osa Le Leii de d e A s s e n ta tam m e n to toss , que imped ia q ue qu al alqq uer habitante do mund o da pobreza pudesse deslo deslocar-se car-se em dir direeção a outros outros cen tr tros; os; exceto se ele pudess e dem onstr onstrar ar que p oderi oderiaa pagar, do prazo de a4010dias, dilibras. as, o a lugu el de um a m or orad ad ia “digna”, cujo cujo valordentro não fosse inferior É evident evident e q ue e m c ir ircun cun stânci stâncias as na s qu ais a maior maior parte dos traba lha dores nec ess itava, em a lgu m m ome nto, de a uxíl uxíliio paroquial (seja por doen ça ou por fal falta ta d e e mp rego) ego),, a Le i d e A s s e n t am e n t o s t rans formava-se nu m instrum ento d e imobili imobilização d a for força ça de tr traba aba lho. Nessas circuns cir cuns tânci tâncias as em qu e os concei conceitos tos de “tr “traba aba lho” e d e “pobreza” “pobreza” eram quase sinônimos, pois era inevitável a oscilação existente entre o traba lho e a des ocup aç ão, es sa lei pa rec ia reivi reivind nd icar pa ra si o direito direito e o dever dev er de constitui constituir-se r-se num a instância instância legíti legítima ma de contro controlle e de coerção social soci al,, qu e t inha por objeto objeto vigiar vigiar essa me tade “bai “baixa” xa” da popu laçã o que, era caraterizada como aquela que “diminui a riquezaestranhamente, do reino”. Um bom exem pl ploo des se control controlee p ri rim m ititivo vo cons titui um a lei conh ecida com o a bsurdo nome de “lei “lei da letra letra P ”. Ela obrigava todos os pobres qu e gozavam gozavam do privil privilég io da assistênci assistência, a, ou q ue pude ssem , eventu eventu al al-me nte , nec ess itar de sse au xí xílilio, o, a levar levarem em um disti distintiv ntivo: o: a letra letra “ P ” num tamanho claro e legível, pintada nas costas dos agasalhos. A utilidade des sa lei pa rec e se r sim sim pl plesm esm ent e ritua ritua l, pois pois a limitaçã limitaçã o da libe libe rdad e de de sl slocar-se ocar-se d e um a pa róquia a outra, difi dificil cilme me nte pode ri riaa se r control controlada ada pelo uso de um a letra letra que q ue u nif nifiicava a todos e a ca da u m d os “bene ficiári ciários” os” do auxíl auxíliio e sta tal.
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Essa p ersi ersistênci stência, a, es sa conti continui nuidade dade no tem po, de di differ erente ente s m odos de auxílio aos pobres que eram administrados e unificados por meio da açã o caridosa caridosa da s pa ró róqq ui uias, as, encontra encontra su a razão de ser e sua lógi ógica ca n essa figura confusa e equívoca da “compaixão piedosa”. Isso não implica afirmar que fosse um auxílio inútil. Sem dúvida, ele fez o possível para q ue p ess oas pobres pu des sem gozar do direito direito irr irrenunciáv enunciável el e irrecu irrecu sável de satisf satisfazer azer suas nece ssi ssidad dad es e lem enta res. Trata-se aq ui de evidenci evidenciar ar ao outra facepara face do socorro, socorr de m ostr ostrar qu e a ação piedosa edosa das diferenciado, paróquias fez fez possível que oo,mundo daarpobreza fossepi invadido, classifiicad o e fifixado e m u m e spa ço preciso. Como classif Como a firma Foucau lt: com a Lei de Pobres Pobres em er erge, ge, de man eir eiraa am bígua, um importan te fator fator na h istória da medicina social: a idéia de uma assistência fiscalizada, de uma intervenção m édica q ue con stitui um me io de auxiliar auxiliar os pobres pobres a sa tisf tisfazer azer neces sidades de saúde que, por sua pobreza, não podiam atender e que, ao mesmo temp o, permitiri permitiriaa m anter um contro controlle p el eloo q ual as classes en dinheir dinheiradas adas garantiam ... a p roteçã o de um a faixa faixa privileg privileg iada d a p opu laçã o. (199 (1993, 3, p.146) p.146)
Por muito tempo, tanto na Inglaterra quanto em outros países europeus, a assistência e oque cuidado por conta “mulher “mul her consag rada”, a ntecedos de àpobres figuraficou da e nf nfermeir ermeira a q da ue,figura como da ta l (isto é: de svin svincu cu lada de funções funç ões religiosas) religiosas),, só aparece rá na segun se gun da m etade d o século XIX. Entre Entre os pobres de Deus, que se b ene fici ciam am da c ari aridadade e das mulheres benfeitoras, não existe nada semelhante a um “intercâm bi bio” o” no qu al se reconheça a indep indep endê nci nciaa ou a igualdade igualdade dos agen tes. Todas Todas as rel elações ações q ue ali aparecem , pertencem, sem pre e nece ssari ssariaame nte , ao reg reg istro do “dar” e do “rec “recebe ebe r” r”:: acr ac redita-se q ue e xi xiste ste,, por um a parte , a ne cessidade e, por outr outra, a, assu me -se a exi existênci stênciaa do su pérfl pérfluo. uo. Por meio dessa dissimetria anula-se toda reciprocidade, porém, se alimenta, ao mesmo tempo, uma necessidade de reconhecimento. Os pobr pobres es dam e Deus: “estãoa dsem pre e em dívi dí vida ome osãbe uedos” lhes(Col é feit feito o e,e não tom consciência consciênci a depr pen dência dênci a da e mc qu om maqnti ntidos” (Colli liér ére, 1989 19 89,, p.71). p.71). Encontram Encontram os just just am en te a li um ri risco sco q ue é inerente à figura figura da m ul ulher her benfei benfeitor tora: a: na me di dida da e m q ue c entra todos os seus c ui uidados dados e toda s ua a ten çã o na pob reza, pod e correr o perigo de ref reforçar orçar esse s of ofri ri-mento e essa pobreza, convertendo-os num mal que é necessário para poder exercer exercer o bem . Hospícios e hospitais são estações obrigatórias no trajeto de assistência generalizada, verdadeiras bases de apoio de uma política de quadrícula difusa das fam ílilias as e ob servatório privil privileg eg iado d as e spé cies e da s formas formas de indigência (De Gerando, 1977, p.89).
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A mulher consag consag rada contri contribui, bui, assim, em estab el elecer ecer as dem ar arcacações e classificações que desarticulam o antigo “contínuo pobres”, em diferentes tipos de pobreza: a digna e a indigna, a laboriosa e ociosa, a doente e a saud ável ável,, enfi enfim, a pobr pobreza eza cons iderada n ormal e a qu el elee e stado pa tol tológico ógico que devi deviaa s er assistido assistido e normali normalizado. zado. Dem Dem ar arcaç caç ões q ue adotaram um estat uto jurí jurídi dico co com a ass im ch am ada N Nov ovaa lei le i de d e p ob re s . Foii só, em 18 Fo 1843 43,, qu and o ess a lei foi promulgada, q ue aq ue la Le Leii d e A s sentamentos foicontrário derrogada. certo é que,que ainda de um marco completamente às Onecessidades as dentro novas demandas industriaiss impunha m, a Le dustriai Leii de d e A s s e n t am e n t os pôde persistir por ma is de dois séculos. Essa lei só foi derrogada no mesmo momento em que se excluí excl uíam am os pobres ad ulto ultoss e saud ávei áveis, s, cap azes de tr traba aba lhar har,, de q ual ual-qu er outro outro modo de auxí auxílilioo qu e n ão fossem fossem as Work-houses . Mas, o que e ra esta Le Leii d e Pob Pobrre s que ma rcou o iní iníci cioo da ch am ada “Época da Bondade”? Ela se definia como uma lei capaz de garantir: “trabalho “tr abalho para para os q ue q uerem trabalhar trabalhar,, castigo para para os q ue n ão qu er erem em e pão para os que não podem” (Himmelfarb,1986, p.40). Entre os beneficiários incluíam-se, inicialmente, tanto os pobres dependentes
qu anto os inde entee s, pobr dignos qua nto os Aindignos, indignos, osent quree deviam s erinde castpend igad os os os qu pobres e devesiam ser auxiliad auxili ad os. diferençaos dif eles só se estabelecia pelo tipo de auxílio a que tinham direito, ainda qu ando e ssas disti distinções nções nunca fificaram c ompl ompletam etam ente cl claras. aras. Em princípio, todos os pobres habitantes de Inglaterra, em algum momento, eram beneficiários da caridade, ainda quando existiam diferentes tipos de auxílio para os diferentes tipos de pobres: “esmolas e asilos asil os pa ra os idosos idosos e doen tes , aprendizado de of ofíícios e esc ol olas as d e c arida de p ara as crianç as, ca stigo e clau clau sura pa ra os ‘and ‘and aril arilhos hos te imos os’ os’,, e trabalho para os sadios” (Ibidem, p.33). Surgiram então os “Asilos de Pobr Po bres” es” onde acha vam seu socorr socorroo tanto os velhos velhos q uan to os doente s, os inválidos quanto soldados as crianças e as pes soas s em lar ar.. Por Pos or sua vez, osdesertores, regu lam entos regu q ua se religiosos reliabandonadas giosos das Workhouses , em que mulheres e homens eram empregados para trabalhar, trocavam tro cavam m or orad ad ia e com ida p ela imob imob ililiidad e a q ue os su jeitav eitavaa um salárioo só pa go de pois de u m an o de lab or ri or.. Multipli Multiplicaram caram -se por toda Inglaterra as escolas de caridade onde, conforme explica Thompson, dificilme nte as cri criança ança s pud er eram am ati ating ng ir al algo go mais do que rudimentos de e scrita e d e leitura leitura ce ntrada na Bíbli blia. a. Um U m d e seu s ma is ac érri érrim m os críti críticos, cos, Man devill deville, e, afirmava afirmava qu e, sen do tão pouca a influência moral que a educação tinha entre os ricos, seriaa inútil e desa titinado seri nado pr preten eten der este ndê-la aos p obr obres: es:
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Para fazer fazer a socieda de feli elizz e pa ra que o povo fificas se s osse gad o na s piores circunstâncias, requer-se a existência de grande quantidade de ignorantes e pobres. pobr es. O conhec imen to acrescen acrescen ta e m ul ultitipli plica ca n ossos dese jos, e qu anto m enos coisas des ej ejee o h omem , mais facil facilmen men te p ode sa titisf sfazer azer suas n ecessidades. (Himmelfarb, 1986, p.39)
Essas críti críticas cas d e Mand evil evillle nã o eram eram n em comuns n em a ceitas na chamada “Época da Bondade”. Esse cinismo conservador, que ainda hoje existe, irritava os homens sensíveis da num Inglaterra que,senoiguala entanto, conseguiram dar resposta a essas críticas, tom que em brutalidad brutali dad e e ci cinismo. nismo. Os defensores defensores das escol escolas as de caridade e scol scolheheram dar um a resposta sincera: sincera: Os pobres, longe de serem corrompidos pela educação, aprenderão a tolerar sua pobreza com maior fortaleza, serão dissuadidos a levar uma vida de dissipação dissi pação e deli delito to e aprenderão as virtudes e as habili habilidades dades , que os tornarão me lhores op erári erários os e me lhores p ess oas. (Ibidem (Ibidem , p.40). p.40).
De fato, fato, todos os pr p roj ojetos etos fililant ant rópi rópicos cos d ess e p erí eríodo odo se carac caracterizam terizam pelaa sua am bi pel bigüidade. güidade. Se Se de um lado eles eles se apresentam como um a forma forma de assistência caridosa dirigida aos necessitados, de outro se propõem com o dispositi dispositivo voss de d e control c ontrolee e coerçã coerçãoo social. social. Esses dois exempl exem plos os imaginados por William Petty podem ser significativos: o projeto de criar um hospiital pa hosp parra apesta ap esta dos que q ue fosse fosse se me lha hante nte a um u m leprosário leprosário,, isto isto é, uma instituição de isolam isolam ent entoo e exclusão; e o projeto projeto de cri criar ar uma ma tern terniida dade de para mães solteiras pobres, que seria um benefício para o Estado: este tomaria a seu cargo a assistência e a proteção das mães, mas imporia como forma de pagamento que os filhos ali nascidos ficassem nas suas mã os durante 25 anos, contribuindo contribuindo para acr ac resc escent entar ar suas reservas (R (Rosen, 1980, p.225). Mesmo que esses projetos nunca tenham sido aprovados, é signifiicat signif catiivo que qu e fossem ima ginada s instituições fililant antrópi rópicas cas qu e un uniificavam, de um modo tão evidente e pacífico, a caridade e o controle social. A ne cess idad e e suj sujei eição ção d os pobres nec essitados é, por si própri própria, a, uma garantia de obediência, porém, ela representa tamb ém a impossibili impossibilidade dade , a incapac incapac idade de s e situar numa rel elação ação d e pa ri ridadade e a poss ibili bilidad dad e de evitar ter qu e en frenta r diver diversas sas formas formas de relacionam relacionam ento social que exijam julgamento e discernimento. (Colliére, 1989, p.68)
Assim, poderemos observar que a mul Assim, mulher her consag rada pode com pl pleementar um imperativo inalterável de respeito por aqueles que sabem, com um a exigença exigença de sub mi missão ssão e de acei aceitação tação qu e é expli explici citamente tamente
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reconhecida como a outra face da assistência e do cuidado. É ali, na submissão e na gratidão daqueles que ela cuida, em que a benfeitora encontraa um a c ompe nsaç ão afetiv encontr afetivaa e s oci ocial al.. O pobre desamparado é, antes de tudo, a garantia de uma eterna obediênci obediên cia; a; e a ssi ssim, m, na dedicação e na e ntr ntrega ega d e sua vi vida da a os pobres, pobres, a mu lher consag rada encontr encontraa a razão de sua exi existênci stência. a. A compensação de tanta abnegação pode encontrar-se valorização espiritual e social importante que lhe permite, sem dúvida, numa encontrar a força para assegurar a sua tarefa ... É assim que pode realizar a sua função materna, sublimad subli mad a num a m aternidade esp iri iritual tual dos doentes a tr tratar atar,, dos pecad or ores es por q ue m é p reciso rezar. (Colli (Colliére, ére, 1989, p.68)
Compa ix ixão ão a paixonada Algu ma coisa unifi Algu unifica a t odos e a c ada um dos be nf nfeitor eitores: es: “Os bons sen timent timentos”, os”, a compaixão com paixão pelos doente s. Ou como c omo diria Rousse Rousse au (19 1984 84)): “uma repugn ânci ânciaa inata em ver o sofri sofrime me nto de um sem el elhan han te”. É assim q uenoosmomento filant ropos fil se un ifica m com os revolucprincípios revol ionário onárioss frque an ceses, emingleses que se identificam aqueles Rousseau isolou e caracterizou melhor que qualquer outro pensador. A partir de Roussea Roussea u, o interesse interesse e a preocupaç ão pelos pelos outros outros viram viram um a pa ixão. Segun do a tes e d e G. Himm elf elfarb arb (19 (1986 86)), es sa prio priori rida da de concedida di da à c ompaixão está longe d e s er exclusiv exclusivaa d e Rousse Rousse au; para ela, os fililósof ósofos os m or orais ais ingleses ingleses , os fil filant ropos, ta mb ém sus ten taram seu s p roj ojeetos e idéias “na benevolência, no humanismo, na simpatia, e nos afetos sociais: sociai s: e les a té u saram a pa lavr avraa ‘com ‘com pa ixão’ xão’,, no me sm o sen tido” tido”.. Como Rouss Rouss ea u (19 (1984 84)), eles eles s itua ram ess e se ntimen to no coraçã o da natureza hum ana, conv convertend ertend o-o no atributo caracte rí rísti stico co m ai aiss importante(Him damhum anidade, e ncontr ncontrand o de eviqdências evidênci todas esfer asbedavida (Hi m elf elfarb, arb, 1986,e p.48). p.48) . É and verda verda ue osasfil fiem lósof ósofos os ingl ingaslesesf es eras sou ram s ub lilinha nha r o caráter des inte ress ad o e solidá solidá ri rioo da com pa ixão, porém, mu itos dos proj projetos etos d ef efen en didos pa rec iam sil silenciar enciar seu c aráte r igua igua lador e s oli olidá dá ri rio, o, ref reforçand orçand o, em tro troca, ca, s ua fac e m ais coerciva. coerciva. E isso isso n ão é um dado secundário; como dissemos: no preciso momento em que a compaixão paix ão e a pi piedad edad e se convertem em parâme tr tros os de m or orali alidad dad e, no prepreciso ci so mome nto em qu e faço faço ex tensiv tensivoo um s entimento, qu e só pode e xi xistir stir na intimidade (entre sujeitos que se reconhecem semelhantes), para o largo mundo dos pobres ou dos sofredores, a piedade perde seu caráter de sentimento legíti legítimo mo e se torna um a e ficaz e stratégia de poder poder..
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Hanna h Arendt soube resum ir em poucas pal palavr avras as os perigo perigoss própripróprios da sobr sobreval evalori orização zação d a c ompa ixão e d a p iedad e: A piedade, tomada como fonte de virtude, tem demonstrado possuir uma capacidade para a crueldade, maior do que a própria crueldade. “Par pitié, par amour pour l’humanité, soyez inhumains ”. (1990, p.71)
Foi isso o qu e legitimou legitimou , pa ra Ar Aren en dt, o exer exercíci cícioo do t error nos an os qu e s uced eram à Rev evol oluçã uçã o Francesa, Francesa, c ruel rueldade dade qu e ficou ficou p ar araa s em pr pree associada com o nome de Robespierre. Para ele, a ação política deveria suste ntar-se “naq uel uelee impu lso imperioso imperioso q ue nos at rai para para les homm es faible fai bless ”, nessa capacidade de “sofrer com a imensa classe dos pobres” (Aren Arendt dt , 1990, p.60). p.60). Certam ente , essa val valori orização zação d a p ieda de como fonte fonte de toda virvirtude é uma her herança ança do pensam ento de Rousseau; Rousseau; m ai aiss espe ci cifficame nte, provém provém da s tese s sobre sobre a “comiseração” “comiseração” que a parece em O discu rso sobre a origem da desigualdade entre os homens . Para ele, todos os valores humanos e todas as virtudes sociais derivam de uma única virtude virt ude q ue é a compa ixão. Com efei efeito, to, que são a generosi generosidade dade , a clemência, clemência, a hu man idade , mais do qu e a p iedade apli aplicada cada a os frfracos, aos culpados ou à esp écie human a em geral geral?? ...... Ainda Ainda qu ando fosse fosse verdade verdade q ue a comiser comiseração ação nã o é m ai aiss do q ue u m sentimen to qu e n os posiciona posiciona n o lugar lugar daq uel uelee q ue s of ofrre, sentimento e scuro e vivo vivo no homem selvagem, desenvolvido, porém mais fraco, no homem civilizado. (Rousseau, 1984, p.93)
Peran te a razão q ue isola, Peran isola, qu e es timul timulaa o am or própri próprioo e o egoísm egoísm o, Rousse au vene ra a força força n ivel elad ad or oraa d e u ma pa ixão primitiva primitiva e n atu ral al,, a mais selvagem de todas as paixões, pois é o “sentimento primeiro de toda a human idade e”. àAmedida pieda deque pieda a uxil uxili os h de omens racio acionais nais a m oderar oder ar seu amor próprio, seiatrata um sentimento natural, de snud a a valen valen tia dos m ais simp simp les: “a ralé, ralé, as mu lheres d a feira, feira, são as que se par param am os combatentes, as que impedem os homens decen tes seu mútuo extermínio” (Rousseau, 1984, p.94). Perante Per ante essa ousadia da piedade , e como su a outra outra face, face, obsc ur uraa e covarde covar de , Rouss Rouss ea u de cide s itua r a raci racionali onalida da de sob a figura d o fil filósof ósofoo que prefere tapar seus ouvidos ao clamor do sofrimento alheio e “argumentar um pouco para impedir a natureza que nele se subleva que o identifique com o assassino”. Esses e outros exemplos falam da g rand iosi osidade dade dess a virtude natu ral qu e é a pi pieda eda de, ela ela nos leva leva “sem “sem
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reflexã eflexão, o, ao socorro soc orro dos ou tros” (I(Ibide m ), ao au xíl xílio io im ed iat atoo e não nã o refletirefletido daq uel uelee q ue vem os sofr sofrer er.. No momen to em qu e e sse s er que sof sofrre já já não é um sujeito individual e próximo, quando os sofredores são o con junn t o d e u m p ovo c h a m a d o t a m b é m d e “p ob re ju ress ”, “m is isee rá ve veis is”, ”, “h o m e n s fracos”, “des “des g raç ados ”, esse socorr socorroo ime ime diato e irrefl irrefletido etido qu ase inevitavelmente se converterá numa escusa, para legitimar a violência. Em sua exaltação da piedade como virtude, Rousseau se opõe ao Discc u rso , podem os ler pensamento grego. No Dis ler que Ainda que possa corresponder a Sócrates e aos gênios de sua têmpera a aquisição da virtude pela razão, faz muito tempo que o gênero humano não existiri exi stiriaa s e s ua conservação tivesse tivesse depen dido exclusiv exclusivamen amen te d os razoamen razoamen tos dos indivíduos que o compõem. (Rousseau, 1984, p.95)
Contraa e ssa af Contr afirmação irmação A históri história diz-nos diz-nos q ue d e modo a lgum é um a coisa coisa natu ral qu e o espetá culo da m iséri sériaa mova os homen s à piedade; m esm o durante os longos longos sécu los em q ue a reli eligião gião cristã d e m iseri isericórdi córdiaa impôs pad rões m or orais ais à civiliz civilizaçã açã o ocidental, a compaixão se manifestava fora do domínio político. (Arendt, 1990, p.56)
Mas voltem voltem os agora aos g regos e lem br brem em os q ue segu ndo Aristótel Aristóteles es Nem as virtudes ne m os vícios vícios são paixões, pois pois não som os cham ados de bons ou de mau s em razão de n ossas p ai aixões xões ... Po Poiis aq uel uelee q ue v ive conforme conforme man da a p ai aixão xão não ouvirá ouvirá argumen tos que venham a dissuadidissuadi-llo, nem os compreenderá. ... A paixão parece conduzir, não ao argumento, mas à força. (Aristóteles, 1980)
Como Hannah Arendt soube mostrar, a esfera de discussão e diálogo, o jogo jogo de pe rgun tar e respond er er,, faz faz pa rte d ess e âm bito da existência existência que os gregos isolaram o âmbito “propriamente Ele define-se por um modo como de existir entredoiguais, que exigehumano”. o uso dessas artes que são a dialética e a retórica. Por isso, Aristóteles acrescenta à definição de homem como z zoo oonn p pol olititic icón ón , uma segunda especificação pela qual o homem pode ser pensado como Zo Zoon on Log Lo g on ekhón , isto é: ser vivo capaz de discurso. A pólis pólis era esse espa ço onde tudo de vi viaa se r enunciado, enunciado, onde a violência podia ser excluída excluída p ara o ext erio eriorr de se us m uros. “Par “Paraa o m odo de pens ar g rego, obrigar obrigar as p essoas pel pelaa for força, ça, m anda r em lugar de persuadir, eram formas pré-políticas para tratar com pessoas cuja existência est ava nas ma rgen s d a Pólis” Pólis” (Ar (Arend end t, 1993, 1993, p.33) p.33). Certa me nte era isso isso o
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q ue pe rmiti rmitiaa aos g regos conv iver com forma forma s des póticas de organizaçã organizaçã o, como a escravi escravidão dão ou o patriarcad patriarcad o. Coexi Coexistiam stiam a ssim es paç os onde reg ia a violência muda junto com espaços de diálogo entre iguais, que eram considerados com o a esfera esfera do propriam propriam ent e hu ma no. Escravos, Escravos, bárbaros e m ul ulheres heres eram aneu logou ( (sem sem logos) ogos);; e cl claro aro que qu e isso n ão si s ign gniifica que eles el es estiv estivessem essem “desp rovi ovidos dos da facu ldade do discurso, mas si sim m de um a forma d e vida na qu al o discurso discurso e só e le tinha se nti ntido, do, e onde a p reocupa çãSoegun primeira ntre os cidadã os e ra fal alar ar en tre eles” (I(Ibidem , p.44). p.44). do H.eArendt, os fil filósof ósofos os g regos , seja q ual for for sua posição a respeito da Pól Póliis, n ão d uvidaram de q ue a liliberdad berdad e se localiza localiza exclusivam exclusivam ent e na esf esfera era polí política, qu e a n ece ssidade é de maneira fundamental um fenômeno pré-político ... e que a força e a violência viol ência se justificam justificam n ess a es fera porqu e sã o os ún icos m eios para dom inar a necessidade e chegar a ser livres. (1993, P.41)
Ali est á a m aior dif difiicu lda de e m p en sar a com paixão den tr troo da es fera da p ol olíítica. Ela Ela pe rm ane ce a lheia a es se â mb ito qu e é p rópri róprioo do diál diálogo ogo entre iguais. iguais. Pr Preten de su perar uma nece ssi ssidade dade qu e é urgente e imediata. Enfrenta-se o sofrimento a miséria, nãoposs como iden sofrim ent o sing sing ular com de d ete rminad o ind inde icom vídu ví du o, com o qumas al me ioden tifiitif car, ma s sim sim c om o sofri sofrime me nto de um g rupo, aqu el elee dos ch am ados “miseráveis”. Superar esse sofrimento por meio da compaixão significa excluir o diálogo diál ogo e a a rgum en taç ão da ce na p ol olíítica e su bst ituí-l tuí-los os pela im im ediatice da força. Implica também sair do âmbito da liberdade para ingressar no registro da violência, pois essa esfera da liberdade estava signada pela pa lavr avra, a, p el eloo diálogo diálogo en tre igua igua is, um diál diálogo ogo q ue nem sem pre signifi significa va harm ônica conv ivênci vência, a, m as, s im, e xcl xclusã usã o de forma forma s pré-p ol olííticas e mudas de violência. o pensamento Rousseau e daqueles levaram seusPara ensinamentos para adecena política,(1984) era preciso liberarque a mais primitiva miti va e na tural das paix paixões ões hum ana s dos g ril rilhões hões q ue a razão imp imp õe, então poderia lograr-se que essa “repugnância inata em olhar o sofrime nto de u m se me lhan te” possa s ubs titituir tuir a indif indiferença erença reinan reinan te. Como já a s s in inaa la lam m o s , é p e la ra z ã o q u e , p a ra Ro Rouu s s e a u , o h o m e m s e t ra n s for for-ma em “egoísta” e perde sua capacidade para “se identificar com o inf nfortun ortun ad o” (Ar (Aren en dt, 1990, 1990, p.63). p.63). Da pe rspec titiva va de Ar Arend end t, só se pode concluir concl uir que a c apa ci cidad dad e d e refletir refletir nos isol isolaa e nos faz faz de spreocupados em rel elação ação aos outros, outros, porque po rque se desconhece que o pensam ento político é essencialmente representativo, que é um diálogo sempre
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mediatizado por “numerosos pontos de vista que tenho presentes em meu espí espíri rito, to, no momento em que av avali alioo uma questã o; e, quanto m elhor posso ima ima ginar de q ue m odo sentiria sentiria se estiv estivesse esse no lugar lugar des ses outros, outr os, tanto ma is forte forte será m inha cap acidade d e pe nsam ento reprerepresen tat ivo (Ibidem , 1992 1992,, p.300) p.300).. O que ca rac teriza nosso pe nsa me nto é seu caráter discursivo discursivo,, a p ossi ossibil biliidade de deslo deslocar-se car-se d e u m ponto de vista vi sta até outr outro, o, passa ndo p or pontos de vi vista sta dif difer erente ente s e anta gônico gônicoss tentaOndo ating ngento, ir uma gened erali alidade dade impna arci ar cial al.. ri penati sam longe longe isol isolar-nos ar-nos inte riori orida da de d o eu, nos obriga a fazer um esf esforço orço por inte inte g rar posições d iver versas sas , por ima ima g ina r como atuaríamos no lugar dos outros. Ele estabelece um diálogo com aqueles outros outr os que estão presentes e m m eu es pí píri rito, to, q uand o avali avalioo uma q uestã o, embora isso não implique que devamos recorrer ao sentimento de “em patia patia”. ”. Exi Existe ste um a ú ni nica ca condição para es se pro processo cesso de “f “formaçã ormaçã o de uma opinião refletida” que é o desinteresse, a libertação de nossos interesses privados, ou a capacidade de tornar minha posição o mais un iversa l poss ível vel.. A difer diferença ença do qu e ac ontece com o p ensa me nto polí polítitico, co, a com paixão nunca ir para individual, essa de sen tir,, napode tir própria própri a p el elealém e e nodop rópri róprio o corpo,ela o simplica ofri of rime me nto a lhecapacidade io: “como se fosse alguma coisa contagiosa” (Arendt, 1990, p.67). A compaixão caracteriza-se, como foi explicitado a partir de Rousseau, por uma aversão a qualquer espécie de diálogo conciliatório e argumentativo, onde alguém fala com outro sobre alguma coisa que é de interesse de ambos. Esse interesse no mundo, loquaz e argumentativo, é inteiramente alheio à compaixão, que se d ir iriige un icame nte e com veemente intensidade ao próprio próprio homem q ue sofr sofre. e. (Aren (Aren dt , 1990, p.67). p.67).
Ela é se mp re e ne cess ari Ela ariam am ente um co-sof co-sofri rime me nto qu e não pode ir além al ém do padecimento de um semel semelhante. hante. A compaixão apaga as diferenças, elimina o espaço material que sepa ra os h omens entre eles, eles, ap rox oxiima as p essoas, n ão pela palavr palavra, a, ma s sim p elo eloss g estos ou p elo eloss s ililêncios. êncios. “Sua “Sua força reside n a força d a própri própriaa paixão, que, diferentemente da razão, só pode olhar para o particular, poiss não poi nã o possui noção do ger ge ral nem cap acidad acidadee de gen generali eralizaçã zação” o” (I(Ibidem bidem,, p.70).. Para p.70) Para q ue ess es ges tos e sil silêncios êncios poss am resu ltar signifi significat ivos é preciso que esse co-sofrimento associe entre si os sujeitos que se reconhecem como semelhantes. Só então, como diz Nietzsche, estaremos diante de uma compaixão legítima, em que não existem relações dissimétricas, em que os vínculos não encontram seu fundamento no 106
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desp rezo, mas sim na adm ir iraçã açã o. Essa legitimidade nunca poderá exceder legitimamente o vínculo que se estabelece entre duas pessoas que se reconhecem mutuamente comoo igua com iguaiis em e m or orgu gullho e digni dignidad dad e. Mas, Mas , aq ui nos inte interress essaa pr p robl oblem em atiz atizar ar esse pr preciso eciso mome nto no q ual a comp ai aixão xão se faz ex tensiv tensivaa à s relações relações sociais, soci ais, esse m oment o em qu e u m sentimento privado, privado, às vezes legíti legítimo mo e out ras ilileg eg ítimo, ing ing ress a n o âm bito do púb lilico. co. Hannah Arendt Ar endt ão” nos epropõe pro uma disti di stinção ntre os con-o ceitos de “compaixão” “compaix “pipõe “pieda edaest de”abelecer q ue pode a uxil uxili iarnção na ceompreensã de sta q ue stã o. Para Para ela, ela, só é poss ível falar de c omp aixão qua ndo existe es se ví víncu ncu lo imed iato a q ue já fizem fizem os referência. referência. Entã o fifica “eli elim m ina do o espaço material entre os homens, onde se localizam os eventos polííticos e tod o o un iverso da s relaç pol relaç ões hu ma na s”. Isso Isso imp lilica ca afi afirma rma r q ue a com pa ixão é “do ponto de vista p ol olíítico, ir irrrel elevante evante e sem cons eqüências” (Ibidem, p.68). Para ela, as conseqüências negativas dessas atitudes ati tudes compassiv compassivas as q ue, no m omento em que se p ropõem assistir assistir e auxiliar, reforçam a coerção e a submissão não são mais do que seu efeito inevitável. Efetiv Ef etivam am ente , reais não senas rá a“condições p artir da comp aixão ai xão qucapazes e p odemdeser iniciainici a-o das modificações materiais”, aliviar sofrimento das pessoas. E, no momento em que se pretende fazê-lo, é inevitável q ue sejam eliminados os extenuantes processos de persuasão, negociação e acordo, que são p rópri róprios os da lei e da polí política, tica, e q ue se e mp reste a voz ao próprio sofri sofrime me nto, que clama por ação direta e rápida, isto é, ação com os meios da violência (Ibide m , p.79)
Chegamos assim, por uma via argumentativa absolutamente diferente à de Nietzsche, aos limites e riscos inerentes a uma exaltação m or oral al da “com pa ixão”. Se a compaixão só pode referir-se ao singular, é a “piedade” que assume a função de gene rali alizar zar esse sentimento sentimento às grandes m assas de “sofredores”. A piedade diferencia-se da compaixão na medida em que não se tr trata ata d e um a pa ixão qu e se ja vivida vivida n o própri próprioo corpo, mas sim de um sentimento que, como tal, pode encontrar nele próprio seu prazer. Mas, por isso, ela pode ser também a perversão da compaixão no momento em que, ao desalinhar essa figura próxima do co-sofrimento, ao am pli pliar ar seu hori horizonte zonte pa ra o m un do dos “f “fracos”, racos”, inevitav inevitavelmen elmen te corr corree o risco risco d e g lori oriffica r essa me sm a d eb ililiida de qu e a faz existir. existir. A piedade, ao cont rár ráriio da s ol oliidari dariedad edad e, não cons idera da mes ma ma neir neiraa a
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fortuna e o infortúnio, infortúnio, o forte forte e o fraco; fraco; sem a presenç p resenç a do d o infortúnio, infortúnio, a piedade piedad e n ão pode exi existir stir,, e, portanto, tem exatam ente o me smo interesse na exi existênci stênciaa dos infeli inf elizes, zes, q ue a s ede do p oder na existênci existênciaa d os fracos. fracos. (I(Ibidem , p.71)
A própria própria e xi xistênci stênciaa d a m iséri sériaa a lilime me nta a p ieda de, na me di dida da em que é p el elaa g rande massa dos q ue sofr sofrem qu e este senti sentimento mento encontra encontra seus ali alicerces cerces e su a razão de se r. Na verdad verdad e, as relações relações que se e stabe lecem na ba se da p iedade serão sempre e necess ari ariame ame nte dissimé dissimé tri tricas, cas, pois já já nã o existe existe u m loca loca l rese rvado, como no ca so da c omp aixão, pa ra um ví víncu ncu lo leg leg íti ítim m o. Na medida em que a piedade estende ao âmbito do público um sentimento q ue perte nce inici inicial alme me nte ao priv privado, se torna indispensável indispensável que ela saia da “obscuridade do coração”, na qual encontrava seu local, e fiqu fiqu e e xposta ao mun do púb lilico. co. A compa ixão que , como vimos, prepreten dia ser ref refrratá ri riaa a t odos os argum en tos e pa lavr avras, as, precisa se r enunciada ci ada qu ando e ntra no mund o das relações relações soci sociai aiss sob a forma de pi pieda eda de. Mas assim, a declam declam açã o de qu e cad a ato que se reali ealiza za está m oti otivavado num sentimento piedoso, faz aparecer a suspeita da falsidade, da mentira e da hipocrisia. Sabemos que, quase inevitavelmente, a enunciaçã enunci açã o pública pública da pró própri priaa b ondade é a forma m ai aiss us ual de ocu ltar outras outr as “motivações “motivações sub-reptí sub-reptíci cias”. as”. Sabem Sabem os tam bém qu e sã o muitos muitos os sentimentos, senti mentos, entre entre eles a compaixão, compaixão, que, na medida em que permanecem ocult ocultos os podem se r corr corretos, etos, mas q ue de ixam de sê-l sê-loo no momen to preciso em que decidimos comunicá-los publicamente, e então começam a ter o gosto desagradável da “hipocrisia”. Declam Decl am ar nossa bondad e, torná-la torná-la p úbli ública, ca, p ar arece ece leg ititima ma r nosso direito a exigir que os outros reconheçam, também, suas motivações ocultas. ocul tas. Porém Porém , todos fificam assim, sob su speita: tanto a que le q ue d ecl eclaara suas motivações bondosas, altruístas e piedosas como aquele que prefere pref ere calar calar e reservar suas paixões, sejam e las c omp ass ivas ou n ão, ao silêncio do privado. Como afirma Arendt: A exigência de que todos anunciem em público suas motivações íntimas transforma transf orma a todos os a tor tores es em h ipócritas; no instan te em q ue se inicia inicia a exibiexibição dos motiv motivos, os, a h ipocri pocrisia sia começa a en venen ar as relações relações hu man as. Adema is, o esforço esforço por arrancar arrancar o qu e est á obs curo e escon dido para a luz luz do d ia só pode resultar numa livre e ruidosa manifestação daqueles atos cuja própria natureza os leva leva a procurar a p roteçã o da esc uridão. (I (Ibidem , p.79)
Cabe a gor goraa repetir a pergunta q ue formul formulávamos ávamos ac ima : se a com paixão só pode ser legítima no vínculo imediato, nesse reconhecimento qu e existe entre igua igua is, e se a pi pieda eda de p ode ser considerada considerada sua p erver erversão são 108
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(na m edi edida da em qu e pretende estend er esse co-sofri co-sofrimento mento à s g randes massas dos sofredor sofredores), es), resu lta disso q ue n ão existe ne nhum pri princí ncípio pio ca pa z de guiar ações tendentes a diminuir ou anular o sofrimento alheio? A alternativ al ternativaa à pi pieda edade, de, como perver p erversão são da comp compai aixão, xão, é para Hannah Ar Arend endtt (1990) a solidariedade . Já não se trata de um senti sentimento mento que leve em si própriio seu prazer própr prazer;; ne m de uma atração pe los home ns fracos fracos q ue ref refor orce ce a polaridade entre posições dissimétricas. A solidariedade encontra seu fundamen to na si simetri inter interesses, numa “desap aixonada xonada c omuni omunidade d e interesses interesses ” metria com aosdos infor inf ortuna tunaesses, dos, na m edida emai que todos c ompadartilham uma única preocupação por universalizar a “dignidade humana”. Assim, ainda que uma ação eficaz possa ser motivada pelo sofrimento, nunca é p or ele guiada, pois ela ela deve comp ree nde r: tan to os fortes fortes e os ricos, qu ant o os frfracos e os pobres. Comp arada com o sent imen to de piedade, ela pode p ar arecer ecer fri friaa e abstrata, pois pois perm anece mais comprometida pro metida com “i “idéias” déias” – grandeza, ou honra, ou dignidade dignidade – do q ue c om q ualq uer “amor” pelos pelos hom ens . (I(Ibidem , p.70)
A solida solida ri rieda eda de sup era o vínculo vínculo ime diato do co-sofri co-sofrime me nto na me dida di da e m q ue e la não é nem sil silenci enciosa osa nem gestua l, mas s im p recisa da m ediaçã o das palavr palavras as e do diálogo, diálogo, para pode r gene rali alizar-se. zar-se. É próprio próprio da compaixão e da piedade igualar, borrar as diferenças entre os que sofrem, unificá-los sob o nome de infortunados; pois, como afirmaria Nietzsc Ni etzsc he, “o próprio próprio do se ntimen to de comp aix aixão ão é des poj pojar ar a d or alheia alheia do que ela tem de pessoal”, de individual e irrepetível. A solidariedade procura, em troca, tomar como ponto de partida as diferenças, uma pluralidade humana considerada irredutível. Perante a impossibilidade de falar de uma natureza que nos unifique, ou que unifique os que sofrem, Arendt pensa a condição humana em função da categoria da “pluralidade”. “A pluralidade é a condição da ação humana, pois todos somos o me smo, isto isto é, human os, e portanto, ningué ningué m é igual a qua lqu er outro out ro que qu e ten t en ha vivi vivido, do, viva ou v iverá jam ais” (Arend (Arendt,t, 1993, 1993, p.22). p.22). PorPorq ue e xi xiste ste d iferença , mais do qu e identidad e es sencial sencial,, a açã o e o diál diáloogo não s ão luxos luxos não n eces sári sários, os, mas si sim m el elem em entos c onsti onstitutiv tutivos os des te nós q ue som os. A condição human a pode realizarrealizar-se se a p artir do mom ento em que participamos do âmbito da vida ativa, em que os vínculos devem se r semp re, e nece ssari ssariam am ente , me di diati atizados zados pe la p al alavr avraa (único (único m odo de garantir a exclusão d a violência) violência).. Por fim, rest a d izer qu e ou tor torgar gar priorida priorida de à s oli olida da ri ried ed ade sobre a piedade, à monotonia do diálogo entre iguais, sobre a aparente luz do sen timen to, nos pe rmite exc luir qua lqu er forma forma d e glori glorifica çã o da m iséTrans/ Form/Açã o, São Pau lo, 21/22: 91-117, 91-117, 1998/1999 1998/1999
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ria e, conseqüentemente, qualquer interesse sentimental em sua existência. tênci a. “Por “Por tratar-se tratar-se de um sentimento, a pi piedad edad e p ode encontrar encontrar em si própria seu prazer, isso leva, quase que automaticamente, a glorificar sua ca usa : o s of ofri rime me nto a lhe io” (Ar (Arend end t, 1990, 1990, p.71) p.71). Assim, e pe la pa tética lógica lógica da p ied ad e, a miséria e o sof sofri rime me nto de ixam d e ser obstá cu los qu e devem ser supe rados tec nicamen te para se converter em um a reali reali-dade triste, que devemos tolerar. Pois, em virtude de sua existência, o compassivo se ereconhecer como regozijar no prazer quepode de corr corre de sua bond ad e fil fum ilant antsujeito rópica rópi ca benfeitor, e ca ri ridosa dosa .sePela Pela lógica lógica perversa da piedade, a miséria legitima a mesma dissimetria de poder que a gerou.
Assistên ci ciaa e p iedade Acred itam os q ue ess a g lori Acred oriffica çã o do sofri sofrim m en to alheio, alheio, que faz da dor e da miséri misériaa e lem entos n ece ssário ssárioss p ara qu e o b enf enfeit eitor or seja seja reconhe ci cido do como u m agent e m or oral al,, se faz faz evidente n a a ssi ssistênci stênciaa m édica sem pree q ue e la sea apresenta pr sob Nesse a formasentido d e um parece-nos “socorrro” ou “socor ouobrigatória um “auxí auxí-lio compassivo” quem sofre. um a remissã o ao tex to de Th oma s Szasz (19 (1994 94)), Cruel compaixão . Ali, o autor tematiza as ambivalências e os perigos que inevitavelmente parecem associar-se com diversas formas de assistência compulsiva ref eferidas eridas a um a fifigu ra paradigmá tica: o “adu “adu lto fifisicam en te ca pa z mas improdutivo” (Ibidem). São desmontados ali, pouco a pouco, esses mecanismos obscuros, históricos e cotidianos, pelos quais a piedade se revel revelaa c omo um a pe ri rigosa gosa tec nol nologia ogia de p oder que , porém porém , gosta de se apresentar com a máscara de um desapaixonado e inevitável “humanismo”. Paraasão Par q uep ró e ssa piedad possssário a se r que exercida exerci da c om fdo erocida da de (eSzasz o rigor rigor qu e lhe rópri prias, as, se rá enece possa fazera feroci doente se ref efere ere à d oenç a m en tal) um sujei sujeito to de sprovi sprovido do d os direitos direitos eleme nta res. Inicia-se então um processo pelo qual as consideradas “patologias” serão caracterizadas e classificadas de modo ambíguo como um padecime nto q ue inf nfantili antiliza za os h omen s. Assim, Assim, os doentes me ntais, consideraconsiderados como c ri rianç anç as, pas sam a se r tratad tratad os como alheios alheios a q ualquer obriobrigaçã o, e conseq üen tem ente , a q ual ualqu qu er direit direito. o. Pode Pode resultar resultar assim polilititicam cam ente legíti egítimo mo pe nsar esse s doen tes-cri tes-crianç anç as c omo não responsáveis; porém, essa identificação não é gratuita: só é na responsabilidade qu e a liberdade liberdade acha sua c ondi ondição ção e s ua razão de ser. ser. É, entã o, evident evident e
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afirma r que aus ênci afirma ênciaa de resp onsab ililiidad e haverá de se r idên idên titico co a afirma afirma r au sê ncia de liberda de (Szas z, 1994) 1994).. Podemos agora retomar a pergunta que formulávamos no início: é possível imaginar e propiciar a criação de um saber médico que, renunciando a ser um instrum ento de contr control ole, e, possa a fir irma ma r-se num e spaç o solidário de vínculos legítimos entre iguais? Se toma rmos com o ponto de pa rti rtida da a crí crítitica ca d os conceitos conceitos de c ompaix paixão ão e piedad piresposta, edad e aqnecessariamente ui esboça da, qu içáparcial possa mos nos aventurar aventurarpara em uma primeira e fragmentária, essa qu estão. De De n ossa lei leitur turaa dos textos d e Nietzsche Nietzsche e Hann ah Arendt Arendt podese c oncl oncluir uir,, em p ri rim m eir eiroo luga luga r, qu e, no âm bito da ass istê nci nciaa ou do s abe r mé di dico, co, não de veri eriaa e xi xistir stir nenhum espa ço reser reser vado p ar araa a comp ai aixão xão ou a pi pieda eda de. Pois, Pois, a partir do mom ento n o q ual a “razão “razão terapêutica” se apresenta a si própria como compassiva, corremos o risco de reforçar a dependê nci nciaa d o paciente e, conseqüentem ente, desestimar sua cap aci aci-dade de decisão, de ação, de eleição e de diálogo refletido. A razão terapêutica deve enfrentar-se quase inevitavelmente com sujeitos que se consideram a eles próprios como prisioneiros da debilidade o sof sofri rime me nto impõe, impõe, ndispensável q ue oinicial sabe r (muitas médico apele qaueestratégias capazes detorna-se impedir ique essa sujeição vezes inevitável) se possa converter em passiva aceitação; isto é, na nat urali uralizaçã zaçã o de relaçõe relaçõe s dissimé dissimé tri tricas cas de p oder oder.. Contrari Contrariand and o esse pr presessuposto, a lógi ógica ca da comp ai aixão xão dem onstr onstrou ou um a n otór otóriia e ficác ia c omo inst rum ent o cap az de garantir e ref reforçar orçar essa dissi dissime me tri triaa inicial inicial.. Segundo assinalamos, a compaixão é silenciosa, refratária às palavras vr as e a q ualque r forma forma d e diálogo. diálogo. A com iseraçã o, fun fun da da n est e reconhecime nh ecimento nto imedi imed iato, pode fal alar ar por gestos, olhares olhares ou c arí arícias, cias, mas ma s nunca ape lará para argumen tos pelos pelos qu ai aiss um a intervenç intervenç ão mé di dica ca sobre nosso corpo possa se tornar inteli inteligí gívvel e conseq üente me nte pass ível de ser ace ita oué de sersua rejeitada. rej eitada. Desde Desde c ompaixão parte do pressuposto de que pela mediação quequase apessoas se aproximam e que se podem apa gar as di distânci stâncias, as, a s p al alavr avras as vir viram am supé rfl rfluas. uas. Porém Porém , é m ister reconhe reconhe cer qu e, na condição de sof sofrredor edores, es, q uand o nos en frenta mos com o limite da dor, sempre nos assumimos como “diferentes”; reconhecemo-nos participando de uma pluralidade humana que rejeita as homogeneizações. Por meio da experiência individual do sofrimento nos reconhec em os com o ún icos e insub sti stituí tuívvei eis, s, com o difer diferente ente s; m as, ao mesmo tempo, essa experiência nos torna partícipes da condição huma na, como condição un iversal ersal.. Todos compartilhamos dessa capacidade propriamente humana de
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padecer dor e de tem er a morte, morte, mas sabem os que somente a c apacidade hu ma na d e fal falar, ar, de d izer zer,, pode s er eq uiparada a el ela, a, em un iversali ersalida da de e singularidade. Pois, por meio do diálogo e da argumentação, podemos fazer fazer que nossas expe ri riênci ências as m ai aiss ínti íntima ma s possa m s er enunciada enunciada s, adquirindo assim inteligibilidade tanto para mim quanto para os outros. É pela pela m ediação de ssa capa ci cidade dade di dial alógica, ógica, que defi define ne e p ossi ossibil biliita a existência da pluralidade humana, que nos podemos deter em pensar sobr sobre vida da e nosso corpo. Pcaráter or isso, isso, discursivo, se ad mitir mitirmos mos q ue só o qserá ue c ar aracacterizae nossa nossovi pensamento é seu Por então pela me diação da pa lavr avraa trocad trocad a com outros que p oderemos conf con frontar nossas nossa s crença cr ença s com pontos de vi vista sta d ifer erentes entes e a inda anta gôni gônicos cos aos n ossos. Só Só entã o haverá haverá de se r possív possível a enunciaçã enunciaçã o de nossa s dú vi vidas das e de n ossos me dos, tentand o ating ating ir certo g rau d e inteligibi inteligibililidade dade e ce rta ca pacidade de dec isão sobre sobre nossa s ituaç ão. Todos estamos sujeitos à dor, à doença e todos tememos a morte, porém, essa experiência, longe de nos unificar, banindo as diferenças, nos enfrenta com o fato incontestável de uma pluralidade de experiências e de pa rec eres sobre qu ais tem os o direito direito e a obrigaçã o de refletir refletir.. Por interessantes que as coisas do mundo apareçam, por mais profundamen te qu e possam nos em oci ocionar onar e estimu estimu lar ar,, elas elas não se tornam h um anas p ara nós até o mome nto em q ue possam os discutidiscuti-llas com nossos sem el elhante hante s. Tudo Tudo o que não pode ser objeto de diálogo pode muito bem ser sublime, horrível ou misterioso, misteri oso, mas n ão é ver verdadeiramente dadeiramente hu man o. Hum Hum anizamos o que pa ssa no mund o e em nós, qu ando fal falamos, amos, e com esse fal falar ar aprende aprende mos a ser human os. (Arendt , 1980, p.25)
Nesse instan te, em qu e pe la for força ça d a com paix paixão ão a razão terapê terapê uti utica ca silencia todas as palavras, a partir do momento em que o co-sofrimento mudo s ubstitui os argumen tos, e qu e a pr prox oxiimidade d o sentimento anu la as distânci stâncias e a ss m ediações o diálogo diálogoEntão, pressuépõe, pressu correm correm os oanrisco de di ref eforçar orçar as forma forma coe rciv civas as d eq ue a ssistência. a própri própria a hum ida de q ue fica fica e ntre parên tes es. O co-sofri co-sofrime me nto exc luirá a razão razão te rap êut ica d o âmb ito do propri propriam am ente huma no, inseri inserindo ndo seu s atores num m undo q ue b em poderá vir a se r de deu ses ou d e es cra cravvos, mas q ue, difi dificil cil-mente, haverá de ser um mundo de homens. Um mundo transido pelo dizer e p el eloo fazer fazer hum an os; os ú nicos ca pa zes d e ge rar vínculo vínculoss simé tri tri-cos q ue e xcl xcluam uam a c oerção e a vi viol olênci ência. a. Lem br brem em os aq ui Pl Platão, q ue, em A s leis , pela primeira vez, propõe disti di stinguir nguir um a m edici edicina na inteir nteiram am ente emp íri rica, ca, q ue pr prescinde escinde d a a rgume ntaç ão, da persuasã o e d o víncul vínculoo dialógi dialógico, co, e u ma me di dici cina na pr preocupa eocupa -
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da com a instau ração de um diál diálogo ogo simé simé tri trico co entre su jeito eitoss qu e se reconhe cem como iguais, iguais, onde n ão se p ode prescindir da for força, ça, da ar argum gum entação e da p ersuasão. A medicina, medicina, para que possa ser considerada considerada sá bi biaa e não p uramente em pí píri rica, ca, p reci recisa: sa: trocar opiniões trocar opiniões com o próprio próprio doente e se us amigos e p ró róxi ximos, mos, e, a o me smo tem po q ue (o mé dico) aprend e jun jun to aos doen tes, instrui, na med ida d o possível, possível, o próprio paciente, sem lhe prescrever nada ... e, assim, auxiliado pela persuasão, acalma e pr prepara epara continuamente seu paciente, até consegu ir restitui restituirr, pouco a pouco, sua saúde. (Platão, 1980, p.720).
Só então é possível falar de uma medicina que homens livres exercem em bene fíci cioo de homen s livr livres, es, ten do sup erado desse modo os limilimites que impõem uma medicina de escravos, dirigida a escravos. Esta última últi ma ca racte ri riza-se za-se , em troca, pelo fato fato de ser ex ped itiv tivaa e prescriti prescritiva, va, sem pr pree s egura, sem deix deixar ar lugar lugar pa ra a refl eflexão exão ou as dúvidas: nenhu m de stes m édicos dá nem aceita explicação explicação alguma sobre os casos indiindividuais dos diferentes diferentes se rvos, ma s prescreve prescreve aq uil uiloo qu e su a ex periênci periênciaa su gere, como se esti estivesse vesse perfei perfem eitame tame nte informado, inf ormado, adotando a postura de u m tirano, tirano, e após isso, apressa-se atender outro doente. (Ibidem)
Entre a mb as as me di Entre dici cinas nas exi existe ste um a d ifer erenç enç a e ssenci ssencial al,, a excl excluusão da pal palavr avraa trocada e , conseqü entem ente, a eli eliminação minação do d ir irei eito to de fazer de nossa própria dor alguma coisa inteligível, algo em relação ao qual possamos ter uma opinião e um julgamento. Karl Jaspers (1988, p.61),, citan p.61) citan do ess e te xto de Pl Platã atã o, lem lem bra uma vel velha ha h istóri stóriaa se gu ndo a qu al al,, estan do doente , Aristótel Aristóteles es interrogou interrogou o mé di dico co q ue lhe deu uma terapia dizendo: “mos tra as razões de teu fazer, e, se as a cha r razoáveis, razoáveis, então as haverei de seguir”. A exclusão excl usão dos”, âmfaz bito bi todedo mé di dico, co,elde “razoáv azoávei eiss ptem ergunta er gunta razoávei azoáveis s resposta faz le asab lgoerinapelável inapeláv e, “r conseq üen ent e, sape rde oxima xi ma -o da s leg isl slaç aç ões tirânicas (Pl Platã atã o, 1980, 1980, p.857) p.857).. Ass im , na me dida em que pretendermos fundamentar a assistência médica pela compaixão, que pela sua lógica interna exclui a mediação do diálogo razoado, corremos o perigo de aproximá-la de formas de ação tirânicas. Talvvez seja por isso Tal isso q ue essa s es tr tratég atég ias muda s e coer coerciv civas as qu e s e exercem exer cem sobr sobree os corpos (pensem os na me di dicali calização zação e hospital hospitaliização dos “loucos” ou dependentes) insistem em apresentar-se como formas comp assiv assivas as e p iedosas de socorr socorroo e assistênci assistência. a. Se, tal como como pr propuseopusemos no início, desconsiderarmos a existência de uma estratégia
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ma qu iavél avéliica, q ue s e ap resen ta com o compa ssiv ssivaa pa ra pode r exercer exercer ma is lilivr vrem em ente seu poder poder,, constata rem os qu e e xi xiste ste u ma soli solidari darieda eda de nãoenunciada enunci ada entre a lógica própria própria d a c ompa ixão piedosa e essa racional acionaliidad dadee utilitarista, utili tarista, estrutu rada s egu ndo pa râme tro tross de urgência social social e de be mestar geral, que está por trás das mais diversas instituições de controle social. Tanto a razão utilitarista quanto a compaixão piedosa partem de uma agem invocando o nome bemclaro que dizem di zemcerteza. a ssi ssistir stir..Sempre Ambas conhec em esse bem de u me mo odo cldaqueles aro e distinto, distinto, ainda antes de que seja solicitado. Ambas prescindem de argumentos, excluem a s palavr palavras e silenciam silenciam q ua lq uer diálo diálogo go fun fun dad o em pe rgun tas e respostas razoáveis. A primeira, à medida que substitui essas razões pe las n orma s inape lávei áveiss q ue p resc reve. A seg und a, pe la força força do sen titi-mento compartilhado, que aproxima os sofredores, sem necessitar da me diação d e a rgu me ntos. Com o afirma afirma Ni Nietzsc etzsc he (198 (1984, 4, p.338 p.338)), o compass ivo nad a e nten de de razões, “o “o coraçã coraçã o o ma nda socorr socorrer er e e le a cr creedita fazê-lo melhor, quanto mais imediato for o socorro”. Por isso ac red itam os q ue é poss ível pe nsa r que n ão é p or ir ironia, onia, mas sim por estritasuas complementaridade, que os filantropos podiam insistir em apresentar instituições disciplinares sob a retórica da compaixão. Ali Ali, preten dia-se m ol olda da r os os corpos , mu ltipl tipliicar su a doc ililiidad e e s ua força, mas ao fazê-lo procura-se integrar os “desviados” sob um olhar mé di dico co cap az de restituírestituí-llos ao mund o da sa úde e da normali normalidade dade . Uma Uma normalidade na qual, pela arte do socorro e da caridade, todos os homens possam confraternizar, libertando-se assim dessa “repugnância inata” qu e ge ra o sofri sofrime me nto de um sem el elhante hante . Quiçá seja essa complementaridade que explique as razões desse contrato tácito que possibilitou o nascimento da clínica. Contrato pelo qual se articulam de um modo indissolúvel “o hospital onde se cura os pobres e a cl clíínica, on de se formacaridosa m os m éd (Fouca (Fo uca 1986,, p.125) 1986 p.125da). Já no início, a hospitalização dosicos” pobres e ault, emergência clíínica comp lem entam -se u ma à outra. Enquan to o pobre cl pobre se ben ef efiici ciaa de um a a ssistên ssistênci ciaa g ratuita, o sabe r médico tem sua retri etribuição buição na possi possibi bi-lilida da de d e ap ren der, obse obse rv rvar ar e lecionar lecionar,, por meio de u m olhar aten to qu e se dirige ao espetáculo que os corpos doentes representam. Haverá de ser esse sabe r que , ma is ta rde ou m ai aiss ce do, poderá be nef nefiiciar os ben feitores tor es c ompas si sivvos, pois pois será a pli plicado cado n a cu ra de suas futuras doenç as. “O que é benevolência a respeito do pobre transforma-se em conhecim en to a pli plicá cá vel ao rico” (I (Ibide bidem m , p.127). p.127). Com o nascimento da clínica, a distinção platônica antes aludida,
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com eç a a deixar de te r sign sign ifica çã o. A part ir dali, dali, tud o fifica rá sob o reg istro de um olhar médico que desloca, pouco a pouco, a persuasão, a argumen taçã o e o d iál álogo, ogo, agora agora ta mb ém do mun do dos c idad ãos livr livres. es. Esse olha olha r, junt junt am ent e com o nasc ime nto do hosp ital me dicali dicalizado zado (seu (seu complemento indissociável), contribuíram para que possam vincular-se e reforçar-se reforçar-se três mod os diferenci diferenciad ad os e privi privilleg iados de me dicali dicalizaçã zaçã o qu e a inda subsistem. Como a firma Foucault: Foucault: A assistência méd ica d o pobre, o control controlee da s aúd e da força força de trabalho e a indagação geral da saúde pública protegem as classes mais ricas dos perigos (sanitári sanitários) os) gerai geraiss e tamb ém permitem a construção d e três sistemas méd icos superp ostos e coexi coexistentes stentes : um a m edici edicina na assistenci assistencial al vol voltada tada aos m ai aiss p obr obres, es, uma medicina administrativa, encarregada de problemas gerais como vacinas, epidemias etc. e u ma med ici cina na p ri rivada, vada, qu e visava visava be nef nefiici ciar ar a q uem titinha nha os recursos para pagar. (1993, p.153)
Se nos perguntarmos agora pela medicina assistencial dedicada aos p obr obres, es, e retoma rmos a s c rí ríti ticas cas diri dirigidas gidas a o conceito conceito de comp ai ai-xão aqui esboçadas, deveremos perguntar também pelo conceito de “pi “pieda eda de” qu e,c rí segun Arendt Ar endt , constitui consti seu ae qu valente enteti g e-r nérico. Nossa Nossa ríti tica, ca, do a té Hannah o mom ento, ficou ficou n a tetuintativ ntativa d eival d eses tima ma a leg leg iti timidade midade d e um a as si sistência stência médica fundada na c ompa ixão. Mas se tentarmos generalizar essas observações (referidas ao vínculo individual exi existen sten te e ntre assistente e as si sistido) stido) para est ruturas gerais comprome pro me ti tidas das com o be m-e star social social e com a sa úde púb li lica, ca, dever-nosdever-nosemos negar a aceitar, do mesmo modo, toda intervenção fundada no conceito concei to de p ieda de. Os perigos decorrentes da extrapolação do sentimento de compaixão para o largo mundo dos que sofrem são: a) que, Na medida medi da como em q uea compaixão, a piedade piedade já já pertence não é umaoco-sofri co-sof rimento mento silenci sil encioso oso assim âmbito do privado, no momento que ela precisa ser enunciada e declarada publicamente, deve expor no âm bi bito to do pú bli blico co aq uil uiloo q ue estava reservado reservado pa ra a intimidade do sentimento. Essa bondade que agora precisa ser obsessivamente declarada e insistentemente enunciada pode converter-se em seu oposto: na h ipocri pocrisi sia, a, na fal alsi sidade dade e na persegu ição. b) Po Porr tratartratar-se se de um se nti ntimento, mento, a piedade piedade lev evaa em si pró própri priaa seu prazer. Assim, na medida em que se refere à massa dos fracos e se de svin svincu cu la d o co-sofri co-sofrim m ento priv privado, ado, p ode term inar g lori oriffican do e ssa me sma debili debilidade dade qu e é su a condição mate ri rial al de e xi xistênci stência. a. Desse Desse
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mod o, o sofri sofrime me nto, que é s ua c aus a ime ime diata, se pode c onverter num ma l que é nece ssári ssárioo para que e xi xista sta o bem . Segun do Hannah Ar Arendt, endt, a p artir dessa enunci enunciação ação da pi piedade edade como virtud e, os mode rnos Estad os ben feitor eitores es a ca bam por negligenciar negligenciar o vavalor da libe libe rdade . Foi Foi ass im com o a Revol evoluç uç ão Francesa finalmen te ass umiu c omo ob jetiv etivoo a ab und ância e não a lilibe be rda de (Ar Aren en dt, 1990, 1990, p.51). p.51). A partir prozada prome me tefal o afidme do sofrime sofri me ntoqueeda porém,dali essao Estado promess pr omessmaoderno n ão realizada reali ala outra perda n ãoesca é rssez, eclaecl ama da : já já nã o se procura criar criar inst inst ituições ca pa zes de q ueb rar os vínculos vínculos coerci coer civvos q ue nos p rende m aos outros. outros. De modo se me lhante , Foucau Foucau lt soub e m ostr ostrar ar como e ssas institui nstitui-ções de assistênci assistênciaa q ue, em nome da segur segurança, ança, do bem -estar e da assistênci si stênciaa aos nece ssi ssitados, tados, e me rgem após a Rev evol oluçã uçã o Francesa, Francesa, g eraram me ca nism os de control controlee e sujei sujeiçã çã o ant es inconcebív nconcebíveis. eis. Em diferendiferentes e studos ge nea lógico ógicoss es ta a náli nálise se s erá levada levada até o lilimite de mostrar que estes novos saberes, preocupados com o bem-estar da população, como a assistênci assistênciaa s oci ocial al ou ou o sabe r méd ico, constituem estratégias e fetivas de poder. Para manipular aqueles sujeitos que fogem à categoria médico-jurídica de “normalidade” e moldar sua vontade conforme fins precisos e socialmente eficazes, estes saberes sustentam-se em mecanismos c oer oerciv civos, os, porém soc ialmen te ad miti mitidos. dos. Digamos, por fim, que o perigo, inerente a uma assistência pública que se apresente como piedosa, consiste em que, por trás da repetição dess a velha velha p romess a se mp re poste rgada de ga rantir o bem-est ar geral, geral, elaa s e c ontenta com ref el efor orçar çar a suj sujei eição ção d os corpos, pela pela m ediação da s biopolíticas. Tanto o auxílio técnico-administrativo referido à pobreza quanto um a assistênci assistênciaa apta par paraa cobrir cobrir as deman das de saúde da populaç ão devem rej ejeitar eitar qu al alqq uer ap elo à p ieda de e p ro ropici piciar ar um a s ol oliida ri rieedade efetiv etivaa e ntr ntree iguais. iguai s. A precisa solidariedade, solidariedade, no momdoento em que edap rarguessupõe a ef pluralidade humana, da mediação diálogo me ntaçã o razoada. razoada. Fica excluí excluída, da, p ortanto, qu al alqu qu er gene rali alização zação q ue un ifiqu e a p lurali uralida da de d os q ue s of ofrrem neg liligenciando genciando su a singu laridade e sua individualidade. Só assim poderemos assumir o lugar desse outro qu e sofr sofre e qu e reclam reclam a se u d ir ireit eitoo a se r assisti assistido; do; de sse outr outroo qu e (me (me smo q uand o seus interesse interesse s possam ser contrários contrários aos meu s) reconh ecemos como algué algué m q ue é um sem el elhan han te em or orgu gu lho e dignidade. dignidade. TrataTratase,, enf se en fim , de “col “coloca ocarr o res respe peito ito acima da com pa ixão” (Szasz, (Szasz, 1994, 1994, p.306) p.306), a solidari solidariedad edad e ac ima da p iedad e. CAPONI CAPO NI,, S. The logic of comp as assion. sion. Tr Trans/ ans/ Form /A ção (São (São Paulo Paulo), v.21-22, v.21-22, p .91-
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A BS BSTR TRAA C T: Tak in ingg t h e w ork orkss of N ie ietz tz s c h e , A re nd ndtt an andd Fou oucc au aultlt as a s s t art in ingg poi p oinn t, w e an anaa lyz lyzee t h e e nd og ogee no nouu s log logic ic to t h e no nott ion of p ititifu ifull c om p as asss ion which instrumentalists a peculiar form of power captured by the duality serve-obey. From the perspective of this authors, we provide examples that history presented to illustrate the deployment of “cruel compassion”. KEYWORDS: Compassion; Nietzsche; power.
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