Revisão - Durkheim e Mauss - Algumas Formas Primitivas de Classificação
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GRUPO DE PESQUISA: SOCIEDADE E CULTURA CONTEMPORÂNEAS FICHAMENTO Aaron França Teófilo
DURKHEIM, Émile; MAUSS, Marcel. Algumas formas primitivas de classificação: contribuição para o estudo das representações coletivas (1903). No texto em estudo nos deparamos com um problema clássico na Teoria Social como colocado por Durkheim e Marcel Mauss, fundadores da matriz do pensamento social que se convencionou chamar escola sociológica francesa . Nele, a questão mais geral é entender aspectos relativos às representações coletivas do mundo natural. Perscrutar, então, como o Homem conhece as “coisas” que lhe cerca e desperta a curiosidade. Para enfrentá-la concentram esforços na superação dos saberes errôneos que incidem sobre um aspecto das representações coletivas, as operações propriamente lógicas. Em suma, se as representações do mundo resultam de operações mentais
complexas, no que diz respeito à função classificadora, filósofos e psicólogos se equivocam ao explicarem que a classificação lógica das “coisas” resulta de operações inatas, acionadas unicamente pelas forças do indivíduo. Ao contrário, Durkheim e Mauss apostam tanto na origem quanto no desenvolvimento social do procedimento de classificação. Argumentam que todo sistema de classificação é produto de uma sociedade, que se impõe, coercitivamente, sobre os indivíduos que a compõe. Tal aposta não é leviana. A minuciosa organização organização e a análise sociológica de uma vastidão de dados recolhidos em diferentes sociedades – pelas mãos de terceiros – permite aos autores sustentarem que a classificação é um fenômeno cuja gênese pode ser justamente descrita e explicada pela Sociologia. Durkheim e Mauss argumentam que classificar implica hierarquizar as “coisas do mundo”, pois observam em todas as sociedades de que têm notícias, respectivas formas de hierarquização de tudo àquilo que desperta a faculdade especulativa de determinado agrupamento humano. Para ambos, se as “coisas do universo” se encontram de diferentes modos dispostas sistematicamente em relação de coordenação e subordinaçã o é porque a
instauração de quaisquer ordens hierárquicas se funda em origens extrassensível e
extralógica. Afirmam categoricamente que os modelos dos sistemas de hierarquização inventariados não podem ser fornecidos pelo mundo sensível nem pela consciência individual. Reconhecida a considerável particularidade das formas de classificação, o molde das operações lógicas só poderia ser fornecido pelo social .
Ademais, outro aspecto das representações coletivas relativo ao procedimento lógico é a sua historicidade. Durkheim e Mauss demonstram a partir dos dados sistematizados e analisados, que as classificações caminham paulatinamente das formas mais simples às mais complexas. No pensamento dos autores, as particularidades dos modos de hierarquização correspondem a determinado estágio evolutivo das formas de classificação. As nuances entre as maneiras de classificar arroladas no texto evidenciam que a gênese da função classificadora parte de um grau enorme de indistinção d as “coisas do universo”
e segue até a mais precisa distinção entre elas. Para Durkheim e Mauss,
coincidem “sociedades simples ” e formas mais rudimentares de classificação. Igualmente, “sociedades complexas ” e formas mais evoluídas das operações lógicas. As “sociedades primevas ” encontram o modelo que facultou o avanço de todas as formas de classificação até então catalogadas, qual seja, a própria estrutura social daquelas comunidades. É determinada hierarquização das relações sociais que serve de quadro para a classificação do “mundo” (monismo ontológico). A hierarquia lógica é um aspecto da hierarquia social . O social se con-funde com o natural. É também no seio destas “comunidades pri mitivas” que surge o impulso primevo das operações classificadoras, a saber, a afetividade social – elemento fundamental na constituição da estrutura social daquelas sociedades, balizada pelas relações de parentesco (fratrias,
clãs totêmicos...). Diferentemente, nas sociedades complexas – cuja interdependência entre as “partes” e o “todo” é por excelência a “divisão do trabalho social”,
o modelo das
operações mentais de classificação deixa de ser a “unidade social”. Bem como, a hierarquização das “coisas” passa
a ter como fundamento o pensamento metafísico e,
posteriormente, o positivo – em detrimento das emoções e crenças religiosas que eventualmente ainda sobrevivem nestas sociedades. Eis o que parece uma herança comtiana no pensamento durkheimiano e maussiano – a Lei dos Três Estados acionada na reconstrução sociológica da historicidade das formas de classificação. É na forma de vida social que se convencionou chamar de sociedade industrial ou moderna, que emergem as representações coletivas científicas, cujo pensamento
conceitual se torna a base da classificação lógica do mundo sensível. Para os autores, uma classificação científica é uma hierarquização de conceitos, cujas relações de proximidade ou distanciamento, complementaridade ou oposição entre as “coisas do universo”
é estabelecida pelo “ puro entendimento ” racional – faculdade humana capaz
de afastar a con-fusão, a enorme indistinção entre sociedade e natureza. Em conclusão, nota-se no pensamento sociológico dos autores, que o processo de mudança das formas de classificação acompanha simultaneamente os desenvolvimentos propriamente morfológicos das sociedades. Em outras palavras, as representações coletivas – no que concerne às operações lógicas – correspondem à estrutura de uma determinada ordem social. Desse entendimento decorre a seguinte compreensão durkheimiana e maussiana. A forma de vida comunitária moderna desenvolve uma progressiva autonomização dos indivíduos com relação à totalidade social, e, sendo assim, os indivíduos se tornam socialmente emancipados das emoções e crenças religiosas, capazes então de elaborar representações lógico-conceituais. Se por um lado os autores apontam para a variação das formas de classificação ( “relativismo”), por outro lado ambos enfatizam o percurso quase linear da realização – na modernidade – de uma essência do “espírito humano”
dada confusamente desde o início, o pensamento
conceitual (“evolucionismo”). Este modo de conciliação entre as vertentes “ particularista” e “evolutiva” parece um procedimento recorrente nas análises da escola
sociológica francesa.
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