Processo Penal - Casos Práticos
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP
AULAS PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL – PROF. JOSÉ LOBO MOUTINHO 2012/2013 PARTE I I 2012/2013 Questionário 1. Como se explica a distinção entre fases preliminares e julgamento em processo penal? As FASES PRELIMINARES (inquérito e instrução) visam aferir se existem indicios suficientes para a submissão do arguido a julgamento. Havendo indicios da prática do crime por aquele agente (entretanto constituído arguido) haverá lugar à FASE DO JULGAMENTO. O arguido só será condenado se for feita prova suficiente para o condenar. 2. O que é o inquérito? Nos termos do art. 262º/1 consagra-se o âmbito e a finalidade do inquérito:
ÂMBITO DO INQUÉRITO: o inquérito é constituido por actos de investigação para esclarecer a notícia do crime de recolha de prova dos factos apurados pela investigação. Perante uma notícia da eventual prática de um crime, cumpre averiguar se se confirmará e em que termos, quem foi o seu agente e a sua responsabilidade e ainda recolher as provas que hão-de permitir reconstruir os factos e fundamentar a decisão sobre a acusação ou o arquivamento.
FINALIDADE DO INQUÉRITO: o fim expresso do inquérito é a decisão sobre a acusação, sendo que se esta não tiver lugar o arquivamento.
Em suma: o inquérito visa averiguar se existiu ou não a prática de um crime, sendo que a recolha e/ou a produção de prova deverá ser realizada pelo MP, devendo este descobrir quem foi o agente do crime. Poder-se-á afirmar que o inquérito visa solucionar três questões: i.
Saber se houve ou não crime?
ii.
Saber se o agente praticou o crime ou não?
iii.
Saber se há prova suficiente ou não?
Maria Luísa Lobo – 2012/2013
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP 3. A quem compete? O inquérito é da competência do MP a quem cabe exclusivamente a sua direcção, mas as diligências que nele têm lugar podem ser realizadas pelo MP, pelo juíz de instrução ou por órgãos de polícia criminal. O CPP estipula que certos actos do inquérito só podem ser praticados ou autorizados pelo juiz de instrução e outros apenas pelo MP (art. 268º a 270º). Note-se que ressalvados estes casos expressamente reservados por lei, todas as diligências de investigação relativas ao inquérito podem ser delegadas nos órgãos de polícia criminal – art. 270º/1. Nos termos do art. 270º/1, com a ressalva das disposições expressas na lei, parece que o MP pode delegar tudo o que entender nos órgãos de polícia criminal para a prática de diligências e investigações relativas ao inquérito. Contudo, tal pode colidir com os seus poderes (leia-se do MP) reservados de dirigir o inquérito e donde pode resultar, na prática, a policização integral da investigação pré acusatória. Mas assim o é: sem prejuízo da direcção que lhe é reservada, o MP pode incumbir os órgãos de policia criminal de praticarem todos os actos de inquérito, ou seja, o inquérito, enquanto conjunto de diligências de investigação e recolha de provas, que por lei não sejam reservados ao juíz ou ao MP. Na opinião do PROF. GERMANO MARQUES DA SILVA quando o art. 53º/2 se refere a certas matérias que competem em especial ao MP, as três primeiras alineas (al. a), b) e c)) tais actos não são delegáveis, constituindo o cerne da acção penal que pela CRP é atribuida ao MP. Deste modo, considera-se que compete exclusivamente ao MP apreciar se a notícia é ou não uma notícia de crime e em caso afirmativo tal conduzirá à abertura do inquérito (art. 262º/2), dirigir o inquérito, deduzir acusação e sustentá-la nas fases posteriores do procedimento. Competindo a direcção do inquérito ao MP, não é adequado que o juiz possa intrometer-se na actividade de investigação e de recolha de provas, salvo se se tratar de actos necessários à salvaguarda de direitos fundamentais.
A direcção do inquérito cabe ao MP e só a ele compete decidir quais os actos que entende dever levar a cabo para realizar as finalidades do inquérito: para a prática de algum desses actos pode necessitar da intervenção do juiz, quer para os consentir quer mesmo para os praticar, mas só por sua promoção podem ter lugar, a menos que se trate de actos necessários à salvaguarda de direitos fundamentais dos requerentes. Não obstante, os actos de inquérito, em sentido estrito, que a lei reserva à competência do juiz de instrução, não lhe cabe apenas apreciar a admissibilidade desses actos, mas também da sua oportunidade e conveniência. É reservada à competência do juiz de instrução a prática dos actos de investigação, ainda que na fase processual do inquérito, que se prendam com os direitos fundamentais.
Maria Luísa Lobo – 2012/2013
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP A lei não indica quais os actos de inquérito que devem ser praticados na primeira fase do processo, o que, aliás, seria impossivel, deixando ao MP a escolha de tais actos necessários à realização da finalidade do inquérito. Contudo, é obrigatório o interrogatório do arguido nos termos do art. 272º. Tendo em consideração que a lei confia ao MP a direcção da investigação, permitindo-lhe dispor quais os actos que entenda necessários à realização da finalidade do inquérito, não seria compreensivel que depois submetesse a actividade desenvolvida a fiscalização judicial: o que fica sujeito a fiscalização judicial é a decisão do MP no termo do inquérito. 4. O Juiz de instrução intervém no inquérito? O CPP estipula que certos actos do inquérito só podem ser praticados ou autorizados pelo juiz de instrução e outros apenas pelo MP (art. 268º a 270º). ACTOS QUE DURANTE O INQUÉRITO SÃO RESERVADOS AO JUÍZ DE INSTRUÇÃO – DISTINÇÃO:
Diligências de investigação e recolha de provas: apenas poderão ser praticados ou autorizados pelo juiz de instrução quando requeridos pelo MP ou pela autoridade de polícia criminal em caso de urgência, ou requeridos pelo arguido ou assistente e se trate de actos necessários à salvaguarda dos seus direitos fundamentais – art. 268º/2.
Actos da competência do juiz a praticar no decurso do inquérito, mas não são actos do inquérito: estes actos poderão ser promovidos ou requeridos pelo MP, pelo arguido ou pelo assistente.
Em suma, quanto ao juiz de instrução é necessário atender a duas normas essenciais: art. 268º (actos a praticar obrigatoriamente pelo juiz de instrução) e art. 269º (actos que têm de ser ordenados ou autorizados. Ao juiz de instrução cabe a prática de actos que afectam direitos fundamentais do arguido por imposição da norma constitucional consagrada no art. 32º/4 CRP. 5. Qual é o conteúdo do inquérito? Da conjugação do art. 267º com o art. 262º resulta que o MP poderá adoptar as diligências que considerar necessárias para a realização da finalidade do inquérito (acusação ou arquivamento). O único acto obrigatório da fase do inquérito é o primeiro interrogatório nos termos do art. 272º, sob pena de se não o realizar estarmos face a uma nulidade dependente de arguição nos termos do art. 120º/2 al. d) primeira parte. Quando se realiza este interrogatório é ‘’obrigatório interrogá-la como arguido’’. O interrogatório visa que o arguido possa exercer o seu direito de defesa.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP 6. Como termina? FORMAS DE TERMINAR O INQUÉRITO i.
DECISÃO DE ARQUIVAMENTO – ART. 277º Nº1 (não houve crime) e Nº2 (não há provas suficientes): a decisão de arquivamento ocorre porque ou não há crime, ou porque não é aquele o agente do crime, ou por causas processuais ou, ainda, nos casos em que há crime mas não foi recolhida prova suficiente.
ii.
DEDUÇÃO DE ACUSAÇÃO – ART. 283º Existem alternativas à acusação.. a.
REQUERIMENTO PARA JULGAMENTO DO ARGUIDO EM PROCESSO
SUMARÍSSIMO: tal sucede em casos pouco graves – art. 292º - nomeadamente em casos de multa. É o MP que apresenta este requerimento (verdadeira aquisição): pretende-se que a pena seja acordada entre o MP, o juiz e o arguido, mas não existe negociação – quem faz a proposta é o MP. Se o juiz não aceitar, o processo é remtido para a forma comum – o arguido não pode voltar a fazer outra oferta. O MP tem de propor a sanção concreta. O arguido, para aceitar, tem de saber o que está a aceitar. b.
SUSPENSÃO PROVISÓRIA DO PROCESSO – ART. 281º: pretende-se que
dentro do prazo o arguido cumpra as injunções e regras de conduta que lhe forem aplicadas. Se cumpre, o processo é arquivado. É necessário um acordo: o MP toma a iniciativa e o juiz e o arguido tem de concordar. c.
ARQUIVAMENTO EM CASO DE DISPENSA DE PENA – ART. 280º: o processo
é logo arquivado. Nem se exige o consentimento do arguido. Isto é discutivel nos casos em que o arguido seja inocente e não se contente com a falta de indicios. O arguido não cumpre nada. Há acordo entre o juiz e o MP. Nestes três casos existem indicios suficientes da prática do crime, mas há que fazer um juízo de prognose: estes meios são suficientes, como meio de prevenção preventiva?
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP 7. Quando o Ministério Público arquiva um inquérito, este fica sempre logo por ali? O assistente poderá requerer a abertura da instrução nos termos do art. 287º, nomeadamente no prazo consagrado no nº1 (20 dias a contar da notificação da acusação ou do arquivamento), sendo que tal consubstancia uma fase de natureza impugnatória e não uma fase de natureza oficiosa. Nos termos do art. 278º, o assistente poderá ainda solicitar a intervenção do seu superior hierarquico. Contudo, a médio prazo podem surgir novos factos que invalidem o arquivamento do processo: nesse caso poder-se-á requerer a reabertura nos termos do art. 279º, sendo de salientar que tal só vale para os casos em que oa rquivamento tenha sido proferido nos termos do art. 277º. 8. O que é a instrução? Nos termos do art. 286º, a instrução visa impugnar a decisão proferida no fim do inquérito, ou seja visa-se uma decisão diversa daquela que fora decidida pelo MP. 9. Tem sempre lugar? Nos termos do art. 286º/2, a instrução tem caracter facultativo e apenas poderá ser utilizada em casos de processo comum (art. 286º/3). Se a instrução não for requerida, se o MP no fim do inquérito tiver deduzido acusação passa-se para a fase de julgamento; se o MP tiver arquivado o processo este assim permanece a não ser que seja pedida a sua reabertura nos termos do art. 279º ou exista suspensão provisória do processo. 10. A quem compete? A fase da instrução cabe ao juiz de instrução: nem fazia sentido que fosse o MP a impugnar a sua própria decisão, tomada de acordo de critérios de objectividade. 11. Qual é o seu conteúdo? O conteúdo da instrução encontra-se consagrado no art. 289º, havendo que distinguir: i.
ACTOS INTRUTÓRIOS: não são obrigatórios; depende do pedido do requerente e, ainda, assim, o juiz pode deferir ou não. Se não pedir pode querer apenas a reapreciação da prova (ex: testemunhas; prova pericial; requerimento de junção de documentos, etc.) ou pode levantar só questões de Direito (ex: prescrição; natureza semipública e não houve apresentação de queixa, etc.)
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP ii.
DEBATE INSTRUTÓRIO: é obrigatório; é como se fossem as alegações finais; diz-se ao juiz se já ou não indicios suficientes da pratica do crime a fim de levar a causa a julgamento.
12. Como termina? Nos termos do art. 308º/1 termina com um despacho de pronúncia (o processo vai a julgamento) ou de não pronuncia (o processo é arquivado). Note-se que quando se profere um despacho de pronúncia o facto de se ir a julgamento apenas indica se há indicios suficientes: esta decisão nunca diz se o arguido é culpado ou inocente. 13. A fase de julgamento corresponde à fase de discussão e julgamento? Não: corresponde às fases preliminares de audiência e julgamento. Na fase de julgamento (engloba quase tudo) existe o saneamento do processo – art. 311º -, existe contestação. Toda a prova tem de ser feita na audiência do julgamento. 14. Como decorre uma audiência de julgamento? Atendendo ao art. 339º.. i.
EXPOSIÇÕES INTRODUTÓRIAS: para que os sujeitos processuais digam o que se propoem provar (normalmente prescindem)
ii.
PRODUÇÃO DE PROVA: primeiro inicia-se pelas declarações do arguido, que tem de ser identificado: é obrigado a responder com verdade a isto. Quanto aos factos o arguido não é obrigado a responder, tendo direito ao silêncio, sendo que se mentir tal não consubstancia um direito, mas quase que uma clausula de exclusão de culpa não sendo a sua mentira punida. Já quanto às testemunhas não é assim: têm de responder com verdade, sob pena de serem punidas. A confissão do arguido tem valor probatório – art- 344º - sendo que se for livre, o processo termina logo com as alegações finais. II
Faça um comentário crítico ao Acórdão doTC nº 84/2010, tendo em contaoDecreto-Lei nº 194/2012, de 23 de Agosto. Houve um primeiro diplima que aprovou a figura da ASAE, diploma esse onde se regulou as competências e atribuições desta autoridade. A questão colocou-se aquando de um segundo diploma que veio expandir as competências da ASAE e atribuir à mesma competência de polícia criminal. Será constitucional ou não
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP conforme tenha havido ou não autorização da AR para o Governo legislador, visto que o regime das forças de segurança está submetido a reserva relativa de lei. A questão que se colocava era a de saber se esta entidade era ou não uma força de segurança e se exercia funções de segurança interna ou se, pelo contrário, não era uma entidade que s epudesse reocnduzir à utilização de forças de segurança para o qual era necessário autorização legislativa. O Tribunal da Relação de Lisboa proferiu uma sentença no sentido da inconstitucionalide orgânica do diploma que tambem atribuia estes poderes à ASAE. Contudo, o Tribunal Constitucional decidiu pela sua constitucionalidade. Isto era importante, porque era preciso saber se a ASAE, assim criada tinha poderes para prender uma senhora o que consubstancia uma restrição da liberdade. Além d eterem autorização para usarem armas sem necessidade de licença (algo que o Tribunal Constitucional não aceita como argumento porque há outras entidades (ex: magistrados) que também têm. A ASAE não constava de lei aprovada pela AR acerca das forças de segurança: pressupõe que a lista é taxativa. Argumento: o que deve estar no 164 é o regime geral e não a expecificação das competências ou como se trata de qualificação não se coloca esta questão? O Tribunal Constitucional afirma que como a ASAE não tem como funções prosseguir a segurança pública, logo, não é polícia. Mas o que interessa como qualificação de forças criminais são os actos e não a qualificação orgânica. III Notificado do despacho que designa dia para a audiência, o arguido Etelvino não apresenta qualquer contestação (cfr. art. 315º do CPP). No início da audiência de julgamento,
o
advogado
do
assistente
(que
também
deduzira
pedido
de
indemnização) alega que, por aplicação do artigo 490º do Código de Processo Civil, tanto para efeitos civis como para efeitos penais, se devem considerar os factos como admitidos por acordo. Terá razão? TEMA: INTEGRAÇÃO 1. ENQUADRAMENTO TEÓRICO INTEGRAÇÃO: nos termos do art. 4º do CPP dispõem-se que (1) nos casos omissos (2) quando as disposições do CPP não puderem aplicar-se por analogia (3) observamse as normas de Processo Civil que se harmonizam com o Processo Penal (é necessário que exista analogia entre os casos (o caso omisso no processo penal e o caso previsto no processo civil) e que as normas do processo civil se harmnizem com o processo penal) (4) na falta destas, aplicam-se os princípios gerais do processo penal (~ art. 10º cc)
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP DUPLA FUNÇÃO DOS PRÍNCIPIOS GERAIS DO PROCESSO PENAL i. ii.
Função negativa ou de controlo do recurso ao processo civil; Função positiva e directamente integradora
É preciso ter muito cuidado em matéria de integração analógica: só há lugar a integração quando exista lacuna e esta só exista quando haja uma situação que é necessário regular e o não é, isto é, para a qual a lei não dê directamente solução. PREENCHIMENTO DE LACUNAS NO PROCESSO PENAL – art. 4º i.
ANALOGIA
No direito penal substantivo (art. 1º/3) não há analogia para qualificar o facto como crime – PRINCÍPIO DA TIPICIDADE. O Direito Penal é a Magna Carta do criminoso, não podendo existir crimes desconhecidos.
Admite-se a analogia no processo penal, porque este não tem permissão para definir quais os factos que são crimes. Este serve para regulamentar a forma como o Direito Penal vai ser aplicado ao caso concreto. A notícia do crime é uma dúvida. Há que perguntar se realmente houve crime e, se houve, quem o praticou. Tem-se em vista a descoberta da verdade material, mas sempre com respeito pelos direitos do arguido. Apesar das diferenças entre o Direito Penal e o Processo Penal existe uma grande identidade entre elas que assenta no facto se só ser aplicado através das sentenças proferidas pelo tribunal. O contrário sucede na relação entre o Processo Civil e o Direito Civil: na grande maioria dos casos o Direito Civil aplica-se sem recorrer ao tribunal, apenas atraves da vontade das partes.
ii.
NORMAS DE PROCESSO CIVIL: sempre que estejam em harmonia com o Processo Penal
iii.
PRINCÍPIOS GERAIS DO PROCESSO PENAL
Antes o CPP era um conjunto de regras especiais que afastavam as regras do processo civil. Actualmente, não se pode dizer que o CPP é um código imperfeito: os princípios fundamentais do processo penal podem não se adequar com as soluções consagras no processo civil, ao contrário do que sucede por exemplo no Contencioso Administrativo em que o CPTA remete directamente para o CPC. 2. RESOLUÇÃO DO CASO No Processo Penal não existe qualquer ónus de impugnação especificada, sendo que para proteger o arguido o facto não se dá por confessado. Mesmo que o arguido tivesse confessado todos os factos na contestação, tal não teria valor, pois todos os factos têm de ser provados em audiência de julgamento.
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No caso não existe qualuqer lacuna: o arguido não tem de tomar posição sobre todos os factos, tendo direito ao silêncio e não existindo auto incriminação.Não se poderiam considerar provados os factos para o pedido de indemnização: é por isso que as indemnizações civis são conhecidas no processo criminal, ou seja visa-se que não existam contradições – PRINCÍPIO DA ADESÃO (art. 71º): existem duas acções, uma penal e uma civil, sendo ambas julgadas no mesmo processo (o pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só podendo ser deduzido em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei) Por exemplo, no famoso caso americano O.J. Simpson, o arguido não foi condenado por matar uma vez que tal se deu como não provado. Ele foi condenado a pagar uma indemnização, porque se deu como provado que tinha morto a ex mulher. IV Duarte é condenado a 5 anos de prisão pela prática de um crime de burla qualificada. Inconformado com a sentença, invocando que a prova testemunhal produzida no julgamento demonstra claramente a sua inocência, ao contrário do decidido pelo tribunal. Sucede que, nos termos do Código de Processo Civil, quando o recurso tem por objecto a prova gravada acrescem dez dias ao prazo respectivo, mas no Código de Processo Penal nada se diz a este respeito. Poderá Duarte beneficiar do acréscimo do prazo, por aplicação subsidiária do preceito respectivo do Código de Processo Civil? (Acórdão do S.T.J. n.º 9/2005) A situação no caso assenta em Duarte exigir que lhe seja aplicado um prazo extrea de 10 dias, como é feito no Processo Civil, quando se trata de recurso tendo como objecto prova gravada. Este prazo de + 10 dias no Processo Civil justifica-se pelo tempo que será gasto a transcrever-se a gravação. No CPP nada nos é dito quando a esta situação.Quando exista uma lacuna, o que é diferente de uma situação de silêncio da lei, só se poderá recorrer às normas de Processo Civil havendo uma verdadeira lacuna. Não se pode aplicar subsidiariamente o Processo Civil. Antes da Reforma de 98 não existia recurso tendo como objecto a reapreciação da prova gravada. O STJ recusou a pretensão de Duarte e o recurso não foi apreciado. Em 2007, no art. 411º/4 o prazo regra era de 30 dias (igual ao que sucedia em Processo Civil) e retirou-se o acréscimo de 10 dias. Esta norma, actualmente, encontra-se revogada.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP O Processo Penal é autónomo e completo: já não faz sentido falar na aplicação subsidiária do Processo Civil. V Suponha que entra hoje em vigor a Lei nº 345-A/2012, de 12 de Dezembro, que estabelece, além do mais, que: 1) O art. 92º, nº 1 do CPP passa a ter a seguinte redacção: «Nos actos processuais, tanto escritos como orais, utiliza-se a língua portuguesa, sob pena de nulidade, salvo se se tratar de processo contra cidadão britânico, caso em que se utiliza, também sob pena de nulidade, a língua inglesa». Suponha que corre neste momento um processo por crime de corrupção activa contra o cidadão britânico, no qual David Brown foi acusado de corrupção activa. Que consequências tem a nova lei nesse processo? TEMA: VALIDADE TEMPORAL DA LEI PROCESSUAL PENAL 1. ENQUADRAMENTO TEÓRICO PRINCÍPIOS GERAIS
REGRA GERAL: art. 12º do CC – a lei só dispõe para o futuro, ou seja para depois da sua entrada em vigor, sendo que só ela que dispõe pelo que é de aplicação imediata. A regra é a que a lei processual se aplica imediatamente aos processos a instaurar e aos actos a praticar nos processos pendentes: não se aplica nunca aos actos já praticados anteriormente, cuja valkidade deve ser julgada de harmonia com a lei revogada.
EXCEPÇÃO: art. 5º/2 CPP (nº1 – corresponde à regra geral do art. 12º/1 CC).
NOTA: excepção da al. a) pode justificar-se por (1) aplicação do princípio jurídico constitucional da legalidade em matéria penal – art. 29º/1 CRP; (2) aplicação do art. 32º/1 CRP quando da aplicação imediata da nova lei resultar, no caso concreto, diminuição do direito de defesa do arguido, frustando as expectativas da defesa relativamente à admissibilidade de certos actos de defesa que ficariam prejudicados pela aplicação imediata da nova lei. No Direito Penal Substantivo vigora o Princípio da Irretroactividade. No Direito Processual Penal, nos termos do art. 5º/1, o Princípio é o da Aplicação Imediata da nova lei, ocorrendo neste caso a aplicação retroactiva da lei a processos pendentes. Tal deve-se ao facto que se a nova lei piorar a situação do arguido tal não se irá aplicar devido à excepção constante no art. 5º/2 al. a). O Princípio da Segurança Jurídica faz sentido no Direito Penal Substantivo, mas como o Processo Penal não tem como missão qualificar um facto como crime já não se entende que este princípio aqui vigore. Em ambos os casos entende-se que as novas leis são mais perfeitas, mas no caso do Direito Penal Substantivo o Princípio da Segurança Jurídica sobrepõe-se-
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP lhe. Em Processo Penal como se entende que as novas leis são mais perfeitas, devemse aplicar o mais rapidamente possível. 2. RESOLUÇÃO DO CASO i.
ACTOS JÁ PRATICADOS EM PROCESSO PENDENTE: aplica-se a lei anterior, não sendo necessário ir às ressalvas constantes no art. 5º/2, uma vez que tal resulta do art. 5º/1 in fine.
ii.
NOVOS ACTOS: aos actos praticados desde a entrada da nova lei irá-se aplicar a nova lei.
2) Diminuiu para metade os prazos estabelecidos no artigo 215º do CPP. Que consequências tem esse facto na situação de Diogo Vaz, que, de acordo com a antiga lei só teria de ser libertado dentro de 6 meses, muito embora, de acordo com a nova lei, devesse ser libertado hoje? O art. 215º respeita a uma norma processual material? Tendo em consideração que as normas de direito material têm d einterferir na qualificação de um facto como crime, assim sendo o art. 215º não o é, sendo portanto uma norma processual, mas que afecta direitos fundamentais. O critério entre normas processuais e normas materiais assenta em saber se interferem na qualificação de um facto como crime. No caso seria aplicável o art. 5º/1, ou seja aplica-se imediatamente a nova lei pelo que Diogo Vaz deveria ser libertado hoje. VI A revisão do Código de Processo Penal, introduzida pela Lei nº 48/2007, de 29 de Agosto, introduziu, entre outras, as seguintes alterações … A que processos se aplicam estas alterações? 1) O princípio da publicidade foi estendido à fase de inquérito (arts. 86º ss.); Na redacção inicial do Código do Processo Penal, o segredo de justiça era obrigatório, sem excepções, durante a fase do inquérito. O segredo de justiça visava garantir a eficácia da própria investigação e recolha de prova. Tal significou que os arguidos passaram a poder consultar o processo – art. 89º/1- , porque se aplicava a nova lei? Tendo em consideração a regra geral do art. 5º/1 – Aplicação Imediata da Nova Lei – na situação em quase seria necessário atender à excepção constante no art. 5º/2 al. b) e a nova lei não seria aplicada.
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O problema não foi grande, porque como é exigido requerimento, nos termos do art. 89º/1, o MP pode deferir se o processo estará ou não sujeito a segredo de justiça. O art. 7º/1 I parte consubstancia uma norma de Direito Penal Transitório, podendo o MP escolher quando a norma entra em vigor. Tal difere do que sucede no Direito Penal em que quando as novas leis são mais favoráveis ao arguido têm mesmo de se aplicar. 2) A prisão preventiva, salvo em caso de criminalidade violenta ou altamente organizada, passou a só poder ser decretada em caso de existirem fortes indícios da prática de crime doloso a que corresponda pena de prisão de máximo superior a 5 anos, e não 3 anos como era antes (art. 202º); Neste caso ocorre a aplicação da regra geral constante do art. 5º/1 e a nova lei é aplicada imediatamente. VII Na sequência de uma denúncia apresentada por António, por crime de furto qualificado, é instaurado o competente inquérito, no dia 5 de Setembro de 1998. Iniciadas as investigações surgem indícios de que o agente do crime será Bento. 1. Será obrigatório o interrogatório de Bento durante o inquérito, sabendo-se que na redacção do C.P.P. anterior à Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto, não existia qualquer preceito com o mesmo conteúdo do art. 272.º do mesmo diploma, na redacção introduzida pela mesma Lei? TEMA: VALIDADE PROCESSUAL DA LEI PROCESSUAL PENAL Em primeiro lugar será necessário atender ao momento em que a Lei nº59/98 entrou em vigor, sendo para tal necessário recorrer ao seu art. 10º. Artigo 10.º 1
-
O
presente
diploma
entra
em
vigor
em
1
de
Janeiro
de
1999.
2 - Exceptuam-se do disposto no número anterior os artigos 57.º, 58.º, 59.º, 61.º, 62.º, 64.º, 66.º, 75.º, 76.º, 77.º, 82.º-A, 196.º, 254.º, 272.º, 312.º, 332.º, 333.º, 334.º, 335.º, 336.º, 337.º, 380.º-A, 381.º, 382.º, 386.º, 387.º, 389.º e 390.º do Código de Processo Penal, na redacção introduzida pelo presente diploma, bem como o artigo 6.º, n.º 3, do presente diploma, os quais entram em vigor no dia 15 de Setembro de 1998.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP Note-se que nos termos do art. 6º/1 da Lei 59/98, de 25 de Agosto consagra-se que ‘’As alterações ao Código de Processo Penal introduzidas pelo presente diploma são aplicáveis aos processos pendentes na data da sua entrada em vigor.’’ No caso é nos dito que o inquérito foi instaurado a 5 de Setembro de 1998, sendo que o interrogatório do arguido passa a ser obrigatório a partir de 15 de Setembro de 1998 nos termos da disposição transitória consagrada no art. 10º/2 (excepção ao nº1) da Lei 59/98, de 25 de Agosto. Antes da entrada em vigor desta lei não era obrigatório proceder ao interrogatório do arguido, possuindo o MP a faculdade de indicar se o considerava necessário ou não. Com a entrada em vigor da nova lei, o interrogatório passa a ser obrigatório, quando haja suspeita fundada, sob pena de nulidade nos termos do art. 120º/2 al. d). Coloca-se a questão de saber se a nova lei é de aplicação imediata (princípio constante do art. 5º/1) ou se se insere nalguma das excepções constantes no art. 5º/2. Poder-se-ia equacionar a inserção desta questão na al. a) do art. 5º/2, ou seja o facto de o interrogatório passar a ser obrigatório consubstancia ‘’um agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do arguido, nomeadamente uma limitação do seu direito à defesa’’? Embora exista sempre o perigo de o arguido ‘’dizer mais do que aquilo que deve’’ tal não é um risco jurídico. Quando exista uma suspeita fundada chama-se o arguido a interrogatório com vista a assegurar uma ocasião de defesa daquele, o que também se relaciona com a presunção de inocência de que goza. Além disso, o arguido tem sempre o direito ao silêncio (art. 61º/1 al. d). Em termos jurícos o interrogatório não consubstancia um agravamento, embora em termos facticos possa acontecer o oposto. Deste modo, não se inserindo a obrigação de interrogatório em nenhuma das excepções previstas no art. 5º/2 conclui-se pela aplicação imediata da nova lei. 2. Suponha agora que o processo foi instaurado em 1996 e que Bento é condenado. Inconformado, o defensor de Bento interpõe recurso da sentença no dia 15 de Dezembro de 1998. São aplicáveis ao julgamento do recurso as alterações introduzidas ao C.P.P. pela Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto? No caso estamos perante a temática dos actos novos em processos pendentes. Ao contrário do que sucede em Direito Penal, em que as normas de direito transitório ou são nulas ou se limitam a repetir a solução consagrada pela CRP, no Direito Processual Penal é necessário, em primeiro lugar, analisar se existem disposições de direito transitório.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP ARTIGO 6º (Lei 59/98, de 25 de Agosto)
1 - As alterações ao Código de Processo Penal introduzidas pelo presente diploma são aplicáveis aos processos pendentes na data da sua entrada em vigor. 2 - Exceptuam-se do disposto no número anterior os processos em que tenha sido interposto recurso da sentença, nos termos do artigo 411.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, os quais continuarão a reger-se pelas disposições anteriormente vigentes.
Atendendo ao art. 6º/2 da Lei 59/98, de 25 de Agosto tal consubstância uma norma de direito transitório e determina que os processos em que tenha sido interposto recurso continuam-se a reger pelas disposições anteriores à entrada em vigor desta nova lei, pelo que não são aplicáveis ao julgamento de recuso as alterações introduzidas por esta lei. A opção por esta solução relaciona-se com a harmonia e unidade do sistema processual e, mesmo que não existisse esta norma de direito transitório, estas alterações não seriam na mesma de aplicação imediata, uma vez que tal situação enquadra-se na al. b) do art. 5º/2, excepção à regra geral de aplicação imediata constante no art. 5º/1. VIII Na sequência da apresentação de denúncia contra Carlos, em que lhe é imputada a prática de um crime de furto qualificado (art. 204.º, n.º 1, do C.P.), o M.P. instaura o competente inquérito no dia 2 de Julho de 2012. Obtida fundada suspeita da prática deste crime, Carlos é interrogado na qualidade de arguido pelo M.P. no dia 4 de Março de 2013 e confessa todos os factos que lhe foram imputados. Responda às seguintes questões: 1. Se Carlos não comparecer na audiência de julgamento as suas declarações podem ser lidas, nos termos do art. 357.º, n.º 1, al. b), do CPP? Lei nº 20/2013, de 21 de Fevereiro: entra em vigor a 21 de Março de 2013 – art. 4º A questão sobre que incide o caso assenta em saber se as declarações proferidas pelo arguido tem valor de prova em audiência de julgamento.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP Ou seja, prestando o arguido as suas declarações no dia 4 de arço de 2013 estas, o que disser perante o MP pode ser usado contra ele no julgamento? A nova redacção do art. 357º/1 al. b) é aplicável ao processo em que o interrogatório do arguido tenha ocorrido a 4 de Março, sendo que a nova lei/redacção só entra em vigor a 21 de Março? Antas da entrada em vigor da nova redacção/lei, nomeadamente do art. 357º/1 al. b), o arguido não é advertido de que tais declarações poderão ser usadas em julgamento, sendo que tem sempre o direito ao silêncio. As declarações do arguido só podem ser reproduzidas ou lidas em julgamento se ele assim concordar ou se tiver sido prestadas perante o juiz e existirem contradições ou discrepâncias entre elas e as feitas em audiência. Ou seja, se o arguido confessou na fase de inquérito e no julgamento nada diz, tais declarações não podem ser lidas. Tais declarações podem ser lidas, mas a sua leitura não serve como meio de prova, podendo apenas o juiz utilizá-las para fazer a critica das declarações, ou seja com base no que o arguido afirmou na fase de inquérito desvalorizar o que ele disse no julgamento. Ou seja, o juiz não pode usar a confissão (feita no inquérito) como meio de prova, apenas servindo para fazer a crítica na audiência (art. 355º/1). A nova lei de 20/2013, de 21 de Fevereiro procede à alteração do art. 357º, nomeadamente, no que interessa ao caso, o nº1 al. b), passou a consagrar que as declarações do arguido face a autoridade judiciária (juíz, juíz de instrução e MP – art. 1 al. b)), com assistência de defensor, desde que o arguido seja advertido, poderão ser usadas e livremente apreciadas, podendo tais declarações ser utilizadas como meio de prova nos termos do art. 141º/4 al. b). No caso não se poderia aplicar a regra geral da aplicação imediata da nova lei, constante no art. 5º/1, uma vez que tal se insere na excepção prevista na al. b) do art. 5º/2: existe uma quebra da harmonia dos actos processuais, sendo que o arguido não foi advertido no momento em que prestou as declarações que tais podiam ser usadas como meio de prova no julgamento o que consubstancia igualmente um agravamento (excepção da al. a) do art. 5º/2), na medida em que se deixa no momento do julgamento as hipoteses de defesa condicionadas pela lei anterior. Importa ainda referir que nos termos do art. 4º/2 da Lei 20/2013, de 21 de Fevereiro consagra-se que ‘’Aos processos pendentes à data da entrada em vigor da presente lei em que o arguido já tenha sido interrogado continua a aplicar-se o disposto no art. 357º do CPP’’.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP 2. Suponha agora que o interrogatório de Carlos só tem lugar no dia 1 de Abril de 2013. A sua resposta é a mesma? O art. 4º/2 da Lei 20/2013, de 21 de Fevereiro consagra que se aplica a redacção anterior do art. 357º apenas se o arguido já tiver sido interrogado, algo que não sucece nesta hipotese. Nos termos do art. 272º consagram-se os termos em que decorre o primeiro interrogatório do arguido, sendo que nestes casos existe uma fundada suspeita da prática do crime por uma dada pessoa, sendo que é neste momento, em princípio, que tal pessoa é constituida como arguida (art. 58º/1 al. a)), oferecendo-lhe a hipotese de defesa através do interrogatório. O novo regime traduz um agravamento sensível e ainda evitável da situação processual do arguido? Ou seja o novo regime, aplicando ao caso, é susceptível de se enquadrar na excepção prevista no art. 5º/2 al. b)? O que o arguido declarar na fase de inquérito, naquele interrogatório, fica adquirido no processo diminuindo as opções que ele teria de outra forma na audência de julgamento. O problema assenta no facto de que Carlos ainda não fora interrogado pelo que ainda não foi constituido arguido e o art. 5º/2 al. a) refere-se expressamente a arguido. Neste caso existe uma questão duvidosa no sentido de que o art. 5º parece consubstanciar uma prioria do estatuto que ele já possui (arguido). Deste modo, aplica-se mesmo assim a norma transitória constante no art. 4º e aplica-se a nova lei. Note-se que o PROF. JOSÉ LOBO MOUTINHO admite que neste caso faz sentido aplicar a norma transitório, uma vez que ele ainda não foi constituído arguido pelo que não se poderia enquadrar na excepção constante no art. 5º/2 al. a).
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP 3. Supondo que Carlos vem a ser absolvido pela 1.ª instância e condenado pela Relação, na sequência de recurso interposto pelo M.P., a uma pena de 2 anos de prisão, será este acórdão susceptível de recurso para o S.T.J., sabendo-se que este recurso deixou de ser admissível em virtude das alterações introduzidas ao art. 400.º do C.P.P. pela Lei n.º 20/2013, de 21 de Fevereiro? (Acórdão do STJ nº 4/2009,D.R., I.ªSérie-A, de 19/03/2009) O acórdão do STJ é um acórdão de fixação de jurisprudência, dado que tinham existido dois acórdãos com soluções contraditórias. A antiga lei permitia o recurso da Relação para o Supremo, algo que a nova lei restringe. Houve uma divergência entre a decisão do acórdão e a dos votos vencidos: para os primeiros, as garantias de defesa do arguido fazem sentido quando a sentença é proferida (é nesse momento que o arguido vai decidir se vai recorrer ou não); para os segundos as garantias de defesa do arguido fazem sentido logo. No caso, para a maioria, a lei nova não se aplicava porque já tinha proferida a decisão final, já se teria constituído o direito ao recurso. Se o arguido está a ser julgado hoje e já tendo a nova lei saído quando é proferida a sentença, para o STJ aplicar-seia a nova lei porque não não se constitui na esfera do arguido o direito ao recurso. O que conta é o momento em que a decisão de 1º instância é proferida. É verdade que tal limita as garantias de defesa, mas não para o STJ. As garantias de defesa só surgem com a sentença proferida em 1º Instância. É necessário interpretar o art. 5º/2. PROF. JOSÉ LOBO MOUTINHO: o direito de recorrer só existe quando a decisão é proferida, mas o estatuto do arguido faz parte esta expectativa/direito à possibilidade de recorrer em dois graus quando adquire o estatuto de arguido (art. 61º/1 al. i)). Desde que adquiriu o estatuto de arguido, tudo o que seja no sentido de lhe retirar o possível estatuto é um agravamento sensível dos seus direitos de defesa/estatuto pessoal. O que o STJ faz é que a posição processual do arguido não seha lida no global, mas sim em cada momento do processo. PROF. HENRIQUE SALINAS: concorda com a posição minoritária, isto é, o que está em causa é a situação processual do arguido. Tal deve ser apurado no seu todo. Há que comparar qual oferece mais garantias, se de acordo com a nova lei, se de acordo com a lei antiga. Portanto, de acordo com esta posição, aplicar-se-ia a lei antiga.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP IX O Ministério Público deduziu acusação contra José Leal, imputando-lhe a prática de um crime de falsificação de documentos, em concurso efectivo com um crime de burla qualificada, por factos praticados em 1998. Quando os autos são remetidos para julgamento está já em vigor a nova redacção do C.P.P., introduzida pelo Decreto-Lei n.º 320-C/2000, de 15 de Dezembro. O arguido presta termo de identidade e residência nos termos da redacção do art. 196.º do C.P.P. introduzida por este diploma e é notificado do despacho que designa o dia para a audiência de julgamento. Na primeira data designada para a audiência de julgamento o arguido não comparece, e o tribunal considera que a sua presença no início da audiência não é indispensável para a descoberta da verdade. Pode a audiência de julgamento ter lugar na ausência do arguido, nos termos do disposto no art. 333.º da redacção em vigor do C.P.P., à data da audiência, sendo certo que, de acordo com a redacção vigente na data da prática dos factos, nesta situação a audiência era obrigatoriamente adiada? (Acórdão do S.T.J. de 24/03/2004, C.J., 2004, t. I, pp. 232 e segs.) Se o tribunal considerar que a presença do arguido não é indispensável para a descoberta da verdade material, pode decidir logo na primeira instância, sem prejuizo de o arguido vir a prestar a declarações (isto de acordo com a nova lei). De acordo com a lei antiga, aquele julgamento nunca se teria realizado sem a presença do arguido: isto permitir-lhe-ia confessar e assim ter uma atenuação da pena. Não existia norma de direito transitório, esquecendo-se o legislador do art. 5º/2, pensando apenas na regra geral do art. 5º/1. Os tribunais tentaram a seguinte solução: a lei nova aplica-se aos processos pendentes se os arguidos prestarem novo termo de identidade e residência (quando isto faz é-lhes dito quais as situações em que se popde realizar a audiência de julgamento sem o arguido). Deste modo, deveria ter sido aplicada a lei antiga. Tal consubstância uma nulidade insável nos termos do art. 119º al. c).
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP X Em determinado processo, que corre termos contra Fernando Oliveira, pela eventual prática de um crime de emissão de cheque sem provisão, e se encontra em fase de julgamento, o juiz profere o seguinte despacho: «Quando os presentes autos tiveram início, o crime de emissão de cheque sem provisão era um crime público, nos termos do Decreto-Lei n.º 454/91. Hoje, em virtude do disposto no art. 11.º-A do mesmo diploma, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 316/97, o procedimento criminal por este crime depende de queixa. Acontece que, analisados os autos, conclui-se que não foi apresentada queixa. Ora, o art. 2.º, n.º 4, do Código Penal, determina que, em casos de sucessão de leis, deve aplicar-se ao agente o regime que, concretamente, se mostrar mais favorável. Assim, sendo claramente mais favorável o actual regime (que subordinou o exercício da acção penal à existência de queixa) e concluindo-se que não foi exercido tal direito de queixa nos seis meses posteriores à entrada em vigor da nova lei, impõe-se julgar extinto o procedimento criminal contra o arguido, relativamente a estes factos, por falta de legitimidade do Ministério Público em prosseguir a acção penal (arts. 29.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa)». O juiz decidiu bem? («Assento» n.º 4/99, D.R., I.ªSérie-A, de 30/03/99 e Acórdão do S.T.J. de 05/04/2001, C.J., 2001, t. II, pp. 176 e segs.) 1. ENQUADRAMENTO TEÓRICO LEIS PROCESSUAIS PENAIS MATERIAIS Segundo o PROF. GERMANO MARQUES DA SILVA tendo a lei efeitos sobre a penalidade concreta aplicável ao arguido, ela deve ser considerada de natureza material, ainda que o seja também de natureza processual, ou seja, de natureza mista penal- processual. Quanto às normas sobre prescrição do procedimento criminal entende-se, hoje pacificamente, tais têm natureza material e por isso são de aplicação retroactiva quando mais favoráveis ao arguido. As normas sobre prescrição afectam a delimitação da infracção, necessariamente afectada pela extinção do direito de acção penal, constituem causa de afastamento da punição, condicionam a efectivação da responsabilidade penal.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP Quanto às normas sobre condições de procedibilidade existem divergências na doutrina e na jurisprudência. Que a norma que transforma o crime particular ou semipúblico em crime público ou o crime público em crime particular ou semipúblico e aquelas que respeitam à disciplina da queixa ou da acusação particular condicionam a responsabilidade penal e têm por isso tambem natureza substantiva não parece ser controverso. As duvidas assentam na sua aplicaçao pratica. Em termos gerais é de aplicar a lei que concretamente se mostre mais favoravel ao arguido e recusar a aplicaçao retroactiva da lei mais gravosa. Qual o momento a partir do qual se há-de contar o prazo para apresentação de queixa quando a lei nova exige queixa e a anterior não o exigia? PROF. TAIPA DE CARVALHO E JURISPRUDÊNCIA – solução que parece impor-se pelo direito constitucional de acesso aos tribunais e de protecção contra a vitimização secundária (art. 20º/1 e 32º/9 CRP) i.
LEI NOVA CONVERTE O CRIME PÚBLICO EM SEMIPÚBLICO: no caso de o titular do direito já conhecer o facto e os seus autores, o prazo conta-se a partir do momento em que entrou em vigor a nova lei;
ii.
LEI NOVA ENCURTA O PRAZO: aplicar-se-á a lei nova, se o tempo que ainda faltar decorrer para preencher o prazo da lei antiga for superior ao prazo da lei nova; caso contrário continuará a aplicar-se a lei antiga.
CASO EM QUE NOVA LEI CONVERTE O CRIME PÚBLICO EM SEMIPÚBLICO OU PARTICULAR (O PROCEDIMENTO PASSA A FICAR DEPENDENTE DE QUEIXA) ESTANDO O PROCESSO JÁ INSTAURADO - JURISPRUDÊNCIA: tendo a queixa natureza processual as respectivas normas são de aplicação imediata, mas não retroactiva, ou seja, o processo mantémse válido. Nenhuma nova lei processual pode afectar a validade dos actos processuais validamente praticados segundo a lei da época em que o foram. PROF. GERMANO MARQUES DA SILVA: esta situação não se resolve pela simples qualificação da queixa como condição de procedibilidade e natureza processual, pois quando as leis processuais tenham efeitos substantivos é o regime destas leis que se deve aplicar, no que favorece ao arguido. É necessário distinguir a fase em que o processo se encontra: i.
FASE DO INQUÉRITO: o MP não poderá deduzir acusação sem prévia queixa, uma vez que a legitimidade não é imutável, havendo de se aferir a cada momento do processo, em relação a cada acto que se vá praticando, em função das disposições legais aplicáveis.
ii.
FASE DA INSTRUÇÃO OU DO JULGAMENTO: passando o crime público a ser semipúblico ou particular, tal alteração não tem efeitos no que respeita à validade da acusação, mas a nova natureza do crime tem implicações, nomeadamente no que respeita ao direito de extinção do procedimento pela via da desistência da queixa (melhor, de renúncia ao procedimento)
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP 2. RESOLUÇÃO DO CASO No caso existe num processo que corre contra Fernando pela prática de um crime que, de acordo com a lei antiga, era um crime público. Quando entrou em vigor a nova lei, o procedimento criminal já tinha tido inicio, pelo que para continuar o procedimento criminal não seria necessário uma queixa: era uma questão de procedibilidade. PROF. TAIPA DE CARVALHO: não se trata de uma questão de legitimidade, uma vez que no momento em que o inquérito é instaurado o MP tinha legitimidade; trata-se, sim, de uma questão de procedibilidade. No entanto, por efeito da nova lei, o arguido passaria a beneficiar, no caso de o ofendido querer desistir da queixa: aplicar-se-ia a lei nova por ser a mais favorável ao arguido. A ideia das normas processuais materiais (como a queixa) é a de as subtrair à aplicação do art. 5º aplicando deste modo o art. 2º/4. Nestas normas processuais materiais, em que rege sempre o que art. 2º/4 - neste caso não é grave, mas nos casos de prazos de prescrição já o é – esta não se pode aplicar retroactivamente. PROF. JOSÉ LOBO MOUTINHO: defende que se deve aplicar o art. 5º/1. Aplica-se imediatamente a nova lei, mas os actos já praticados mantém-se (exemplo: lei descriminalizadora: se já cumpriu pena tal não produz qualquer vantagem).
SOBRE A POSIÇÃO DO PROF. GERMANO MARQUES DA SILVA E DO PROF. TAIPA DE CARVALHO: dizem que aplicam o art. 2º/4 quando na verdade estão a aplicar o art. 5º/1. O processo começa sem queixa do ofendido, pelo que o MP tem legitimidade para iniciar o processo. Não fazia sentido neste caso aplicar a lei retroactivamente: o que está bem praticado assim permance, sendo que a partir deste momento é que o crime passa a ser tratado como semi público. Uma aplicação retroactiva da lei faria e faz com que o ofendido pudesse desistir da queixa.
Na SOLUÇÃO o PROF. JOSÉ LOBO MOUTINHO encontra-se de acordo com a posição do PROF. GERMANO MARQUES DA SILVA E DO PROF. TAIPA DE CARVALHO; a divergência assenta no FUNDAMENTO: para o PROF. JOSÉ LOBO MOUTINHO não existe qualquer retractividade, sendo que os actos praticados na vigência da lei anterior são válidos, não existindo qualquer anulação; aplicação imediatamente a nova lei aos processos pendentes.
Em qualquer dos casos passa a existir a possibilidade de desistência de queiza (passa a ser relevante), pelo que a solução era idêntica quer aplicassemos um ou outro preceito. O processo mantém-se. O tribunal de 1º Instância foi mais longe e afirmou que seria necessária queixa, apesar de o procedimento já ter sido iniciado. A solução não é compatível com o art. 5º porque os efeitos da nova lei só se produzem para o futuro. Do ponto de vista formal,a instância tem alguma razão, porque se é aplicável retroactivamente, então, tem de ser necessária a apresentação de queixa.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP O que aconteceria se ainda estivessemos no inquerito e se transformasse o crime publico em crime particular? Ocorrendo a transformação do crime público em particular seria necessário a acusação particular, o que por sua vez seria mais favorável ao arguido, condicionado o exercício da acção penal. Os actos praticados enquanto o crime era público não são anulados. Se ainda se estiver na fase do inquérito é necessário a dedução de acusação particular. Caso já não se esteja na fase do inquérito não é necessário acusação particular, mas poderá ocorrer a desistência da queixa. Se o processo ainda não tivesse sido instaurado, o prazo de 6 meses para a apresentação da queixa conta-se a partir do momento da prática do facto ou da entrada em vigor da nova lei? Na opinião do PROF. GERMANO MARQUES DA SILVA ocorria a aplicação imediata da nova lei, contando-se o prazo de 6 meses a partir do momento da prática do facto; por sua vez tanto o PROF. TAIPA DE CARVALHO COMO O PROF. JOSÉ LOBO MOUTINHO defendem que o prazo de 6 meses conta-se a partir da entrada em vigor da nova lei. PARTE II XI O Ministério Público deduz acusação contra António, imputando-lhe a prática de um crime de furto simples. Recebidos os autos pelo tribunal de julgamento, o juiz profere despacho pelo qual considera inconstitucional, por violação do art. 32.º, n.º 4, da Constituição, o art. 263.º do Código de Processo Penal (CPP), na medida em que atribui ao Ministério Público a direcção do inquérito. Em consequência, declara juridicamente inexistentes todos os actos praticados no processo. Em recurso, o Tribunal da Relação revoga a decisão baseado em que a instrução, a que se refere aquela disposição constitucional, de acordo com o CPP compete a um juiz. Quid Iuris? (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 7/87) O Acórdão do TC 7/87 procedeu à fiscalização preventiva do art. 32º/4 da CRP. Segundo esta norma constitucional toda a instrução é da competência do juíz. As diligências processuais que cabem no art- 263º são materialmente instrutórias e, no entanto, o TC decidiu pela constitucionalidade da norma. PROF. FIGUEIREDO DIAS: actualmente, onde se diz instrução preparatória chama-se inquérito. Mudou-se o nome, mas o resto manteve-se. Este professor considera que é constitucional, porque essa fase deve caber ao MP, por isso não existe violação do art. 32º/4.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP PROF. VITAL MOREIRA: considera que toda a instrução é da competência do juiz e o que se está a fazer é dividir a instrução em duas fases, chamando-se inquérito à primeira, sendo ela materialmente instrução. A instrução prepatória não existe actualmente no nosso código, mas anteriormente existia e ao actual inquéria correspondia a instrução preparatória e a actual instrução corresponde à antiga instrução contraditória. Assim, o legislador constitucional ao elaborar o art. 32º/4 tinha como intenção que toda a instrução fosse da competência do juiz e pretendeu-se jurisdicionalizar integralmente a instrução, sem prejuizo de esta ser a unica e a melhor solução. Pretendeu-se, com isso, retirar ao MP esses poderes, porque no regime anterior o MO era controlado pelo Estado (Novo). Pretendia-se blindar todo o processo criminal ao Governo. Quanto entrou em vigor a CRP, o MP já era completamente independente, pelo que já se poderia entregar o inquérito aquele, mas ainda assim essa não foi a opção do legislador. Até, porque, na prática, quem investiga são os órgãos de polícia criminal. Assim sendo, isto nunca vigorou. Mesmo na altura, foi criado um inquérito preliminar atribuido ao MP visando esvaziar a instrução preparatória. Era completamente impraticável atribuir a direcção de todos os processos a um juiz. O juiz nao se deve imiscuir na investigação para salvaguardar a sua independencia. Alem de que não salvaguardava a estrutura acusatória do processo. Em vez de ter alterado a CRP, deu-se outro nome ao inquerito para se furtar à declaração de inconstitucionalidade. A solução correcta é a que hoje temos, mas dever-se-ia ter alterado a CRP segundo o PROF. GERMANO MARQUES DA SILVA. O que mais nos interessa é aferir qual o conteúdo útil que podemos retirar do art. 32º/4. Este artigo tambem tem influencia nao apenas na fase de instruçao, mas tambem na fase de inquerito, pois ha determinados actos que mesmo no inquerito tem necessariamente de ser praticados pelo juiz, nomeadamente os actos que colocam em causa direitos fundamentais. Se mesmo na fase de instruçao, os actos que possam afectar os direitos fundamentais tem de ser praticados pelo juiz, então, por maioria de razão, numa fase que não é dirigida ao juiz esses actos instrutorios tambem terão de ser praticados por ele. O art. 32º/4 pretendia abranger tanto a instrução como o inquérito.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP XII Faça um comentário crítico à seguinte notícia: «Reclamados mais juízes para o Tribunal Central Carlos Alexandre tem os processos mais mediáticos porque é o único titular 2010-01-19 CLARA VASCONCELOS O juiz Carlos Alexandre é o homem do momento. O superjuiz. Aquele que tem em mãos os processos judiciais mais mediáticos. Mas porquê ele e só ele? Porque é o único juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal. Um exclusividade com que a maioria discorda. Criado em 1999, o Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC) prevê, no seu quadro, a existência de um único juiz. Uma situação com que a juíza Fátima Mata-Mouros, a primeira a ocupar o cargo, sempre discordou. Mas de que também discordam o presidente do Sindicato dos Juízes Portugueses, António Martins, e o próprio Conselho Superior da Magistratura (CSM). No "ticão", como é conhecido o TCIC, são apreciados todos os casos de criminalidade grave e complexa e que, simultaneamente, abranjam vários distritos judiciais. São processos necessariamente complexos. Algumas das questões ali apreciadas nunca foram pensadas ou julgadas. É um tribunal de dimensão nacional, tal como o Supremo, mas de competência específica. Tudo isto é demasiado sério para ficar nas mãos de um único juiz. António Martins, da ASJP, defende que "os tribunais não devem ter como característica a perspectiva de órgão unipessoal". No seu entender, o que os cidadãos procuram nos tribunais "é que haja aliatoriedade na distribuição do serviço" ("escolhe-se o médico, não se escolhe o juiz"). Não é positivo que saiba, à partida, "que é este, com esta maneira de ser e esta maneira de interpretar a jurisprudência". Para além da "manipulação" que este conhecimento prévio possa estimular, como diz Mata-Mouros (ver entrevista), é a própria jurisprudência que, existindo uma única perspectiva, "sai empobrecida", diz Martins. O próprio CSM, embora sublinhando não existirem pendências naquele tribunal, "reconhece que só um juiz é insuficiente face à complexidade dos casos e à sua urgência". Fátima Mata-Mouros, que ocupou o cargo desde o seu início até 2004, sempre defendeu, em relatórios enviados ao CSM, o alargamento do quadro. Tal nunca sucedeu. Porque o legislador, a quem compete a elaboração da Lei da Organização dos Tribunais, não o quis. Ao CSM, resta nomear juízes auxiliares, mas só a pedido do juiz titular.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP Mata-Mouros requereu-o, no final do "mandato", quando também se encontrava no final de uma gravidez. Foi destacado Carlos Alexandre. Em 2005, Ivo Rosa ganhou o lugar de juiz titular e Ana Peres foi nomeada juíza auxiliar, mas nunca ocupou o cargo, uma vez que se encontrava, em exclusivo, no processo Casa Pia. Carlos Alexandre assumiu o Tribunal em 2006, mas nunca solicitou ao CSM um auxiliar. "É demasiado poder para um só juiz" [Fátima Mata-Mouros, Juíza desembargadora] Sempre defendeu a existência de mais juízes no Tribunal Central de Instrução Criminal (TCIC), porquê? O TCIC é um tribunal com características muito especiais, com dimensão nacional, com competência para os crimes mais graves do país e que atravessam as fronteiras geográficas. Um tribunal onde necessariamente recaem todas as atenções. Só isto já chegaria para justificar um quadro mais alargado. Nenhum tribunal deve ficar dependente da jurisprudência de um só juiz. As questões que caem no Tribunal Central são muito específicas, muitas delas nunca foram pensadas. É muita responsabilidade para uma só pessoa e, acima de tudo, é muito poder. Sentiu solidão quando esteve à frente do TCIC? Claro. Senti essa solidão e essa responsabilidade, que corresponde a um tremendo poder e que é demasiado para uma cabeça só. É um juiz que se torna muito conhecido da opinião pública... E não só. Também se torna muito conhecido das polícias e dos arguidos. E isso pode dar azo a manipulações. É fácil defender que um crime ocorreu em dois distritos para que seja decidido no TCIC. Ou o contrário. É fácil perceber qual o estilo do juiz, como decidiu em casos semelhantes,etc, e agir em conformidade. Se não se soubesse à partida a que juiz calharia o processo, essa manipulação seria mais dificultada. Essa é mais uma razão a justificar um quadro de mais juízes. O facto de ser um único juiz torna-o um alvo mais fácil? Torna-se alvo das atenções e isso nunca é bom nem para a segurança, nem para a tranquilidade decisória. O juiz do TCIC devia ter segurança? É lamentável ser necessário existir uma ameaça para que um juiz tenha direito a segurança.» (http://jn.sapo.pt/PaginaInicial/Nacional/Interior.aspx?content_id=1473146 )
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP TEMA: PRINCÍPIO DO JUÍZ NATURAL 1. ENQUADRAMENTO TEÓRICO Nos termos do art art. 32º/9 CRP nenhuma causa pode ser subtraída ao tribunal cuja competência esteja fixada em lei anterior: PRINCÍPIO DO JUÍZ NATURAL OU LEGAL. Visa-se evitar a designação arbitrária de um juiz ou tribunal para resolver um caso determinado. Não é admissível que a norma autorize a determinação discricionária do tribunal ou tribunais que hão-de intervir no processo: as normas, tanto orgânicas como processuais, têm
de conter regras que permitam determinar o tribunal que há-de
intervir em cada caso em atenção a critérios objectivos. É necessário conjugar o art. 32º/9 com o art. 209º/4 que proíbe a existência de tribunais com competência exclusiva para julgar certas categorias de crimes, com excepção feita para os tribunais militares durante a vigência do estado de guerra – art. 213º. A orgem histórica do princípio do juiz natural parece ser a lei francesa de Agosto de 1790 sobre a organização judiciária, que teve como finalidade impedir a ingerência do rei nos assusntos judicias, garantindo aos cidadãos tribunais imparciais, e na sua formulação mais morderna a Constituição italiana de 1947 e a alemã de 1949. O princípio foi também acolhido na Carta Constitucional de 1826 e em textos internacionais sobre direitos fundamentais (DUDH, Convenção Europeia dos Direitos do Homem e Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos – necessidade de tribunal independente, imparcial e competente, estabelecido por lei). É necessário atender à doutrina italiana quanto à interpretação que esta faz sobre juíz pré constituído por lei: a doutrina e jurisprudência italianas começaram por interpretar a norma da sua constituição como querendo garantir, para além da proibição de tribunais extraordinários, a determinação do tribunal competente com relação ao facto abstracto realizável no futuro e não a posteriori, ou seja, uma competência fixada imediatemnte e exclusivamente por lei, excluindo a possibilidade de uma alternativa entre um juiz e outro, prevista pela lei, mas resolúvel a posteriori mediante um procedimento singular. Esta orientação consagrava uma reserva absoluta da lei em matéria de competência jurisdicional. Numa corrente doutrinal mais recente, o princípio do juíz natural pré constituido por lei vem a ser interpretado como sendo aquele que é racionalmente idóneo para garantir a objectividade e imaparcialidade do julgamento a ratio do art. 25º/1 da Constituição italiana seria então a de garantir a imparcialidade do juiz.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP A competencia do juiz deverá ser fixada na base de criterios gerais fixados previamente e não depois da prática do crime e em vista ao seu julgamento de modo a assegurar a sua efectiva imparcialidade. Garantida a exclusividade da jurisdição em matéria criminal dos tribunais judiciais (art. 211º) e a sua independência (art. 203º) é necessário assegurar a imparcialidade dos juizes o que se alcança pela previa fixação por lei de criterios objectivos gerais de repartição da competência, concretizando-se tal: i.
Em só a lei poder instituir o juiz e fixar-lhe a competência
ii.
Em a fixação do juiz e a sua competência ter de ser feita por lei anterior à prática do facto que será objecto do processo.
PROF. GERMANO MARQUES DA SILA:
em ordem a assegurar a imaprcialidade
dos juízes e tribunais, o que importa essencialmente não é a competência individualizada de um determinado tribunal para o caso concreto, proibindo-se que a causa venha a ser submetida a tribunais diferentes dos que para ela eram competentes ao tempo da prática do facto que constitui o objecto do processo, mas apenas em razão daquela causa ou de categorias de causas a que ela pertence sejam criados post factum tribunais de excepção, ou a definição individual da competência, ou do desaforamento descricionário de uma certa causa, ou por qualquer outra forma descricionária que ponha em perigo o direito dos cidadãos a uma justiça penal independente e imparcial. 2. RESOLUÇÃO DO CASO Quanto ao Tribunal Central de Instrução Criminal o critério é de que o crime tenha ocorrido em vários distritos, sendo competente, nesse caso, aquele único juiz. A lei estabece critérios gerais para a competência deste tribunal. O problema é que como só existe um juiz, isto aumenta as tentativas de manipulação. Uma solução a esta situação poderia passar pela criar de um tribunal para crimes económicos e financeiros, mas o art. 209º/4 não permite tal: existe a proibição de criação de tribunais especificos, a fim de evitar que se criem tribunais para crimes políticos, como no Estado Novo. No Processo Casa Pia provou-se que houve manipulação quanto à escolha do juiz de instrução. A importância de um juíz de instrução assenta no facto de ele proceder ao primeiro interrogatório do arguido e de
poder aplicar medidas cautelares,
nomeadamente a prisão colectiva.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP XIII Eduardo é acusado pelo Ministério Público pela prática de um crime de homicídio a pedido da vítima (art. 134.º do C.P.). Inconformado, requer a abertura da instrução. Terminada a instrução, o juiz entende que a matéria da acusação está, mais do que indiciada, verdadeiramente provada pelo que profere, desde logo, sentença condenatória, invocando razões de celeridade e economia processuais. ENQUADRAMENTO TEÓRICO SOBRE A COMPETÊNCIA FUNCIONAL E MATERIAL O CPP trata da competência material e funcional nos arts. 10º a 18º e da competência territorial nos arts. 19º a 23º. Não autonomiza a disciplina da competência material relativamente à funcional, assimilando-as, quer nos efeitos, quer na oportunidade para conhecer da incompetência correlativa. COMPETÊNCIA MATERIAL: delimita a jurisdição penal dos diversos tribunais em razão da natureza dos processos ou da qualidade dos arguidos. Todos os tribunais com jurisdição penal que podem intervir num dado processo têm competência relativamente à matéria objecto do processo.
Relativamente a um processo por crime punível com pena de prisão até 5 anos, têm, em regra, competência material o juiz de instrução criminal, o tribunal singular da comarca, o tribunal da Relação, o tribunal de execução de penas, mas são materialmente incompetentes o tribunal colectivo e o tribunal de júri.
Quanto a crimes em que seja arguido um juiz de direito são competentes o tribunal da relação, o STJ e o tribunal de execução de penas, mas são materialmente incompetentes os juízes de instrução e os tribunais de comarca.
Tradicionalmente, a competência material é analisada em função da repartição dos feitos penais pelas diferentes espécies de tribunais penais de 1ª instância e a competência funcional em atenção ao desenvolvimento do processo nas suas diferentes fases ou à competência de diferentes órgãos judiciais dentro da mesma fase.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP Não distinguindo a lei, parece dever entender-se que os diferentes nºs e alíneas dos arts. 11º a 17º delimitam simultaneamente a competência material e funcional dos respectivos tribunais. COMPETÊNCIA FUNCIONAL: delimita a jurisdição dos diferentes tribunais materialmente competentes dentro do mesmo processo e segundo as suas fases ou graus e para a prática de determinados actos dentro de cada fase ou grau de jurisdição.
Relativamente ao exemplo indicado, o juiz de instrução criminal tem competência funcional para proceder à instrução, decidir quanto à pronúncia e exercer as funções jurisdicionais relativas ao inquérito (art. 17º); o tribunal singular tem competência funcional para julgar o processo em 1ª instância (art. 16º/1, c)) e as secções do tribunal da Relação têm competência para os recursos.
Quanto ao segundo exemplo, as secções criminais das relações são funcionalmente competentes para os actos jurisdicionais relativos ao inquérito, para a instrução e julgamento (art. 12º/2, a) e b)) e as secções criminais do STJ competentes para os recursos (art. 11º/3, b)).
A competência funcional abarca a competência em função da hierarquia (art. 23º LOFTJ) e a distribuição da competência entre tribunais do mesmo grau nas diferentes fas CRITÉRIOS PARA DETERMINAÇÃO DO TRIBUNAL COMPETENTE EM 1º INSTÂNCIA – COMPETÊNCIA MATERIAL A competência material, sobretudo para o julgamento em 1ª instância, determina-se geralmente em função da natureza ou da gravidade do crime.
Critério quantitativo: atende à gravidade da pena aplicável ao crime;
Critério qualitativo:atende à espécie do crime ou à natureza de algum dos seus elementos
Arts. 14º e 16º CPP: aplicam os 2 critérios. Arts.14º/1 e 2, a) + 16º/2, a): critério qualitativo. Arts. 14º/2, b) + 16º/2, b): critério quantitativo.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP GRAVIDADE DA PENA APLICÁVEL PARA EFEITO DE DETERMINAÇÃO DA COMPETÊNCIA O critério quantitativo para delimitação da competência material dos tribunais atende à gravidade da pena aplicável ao crime. Nos termos do art. 15ºpara efeito da delimitação da competência material em razão da gravidade da pena aplicável são levadas em conta todas as circunstâncias que possam elevar o máximo legal da pena a aplicar no processo. Deste modo, só se deve atender às circunstâncias que possam elevar o máximo da pena a aplicar no processo, às circunstâncias modificativas agravantes (art. 78º CP: concurso; ART. 83º CP: delinquência por tendência; alcoólicos e equiparados: art. 86º CP). Na delimitação da competência entre o tribunal singular, o tribunal colectivo e o tribunal de júri, a lei atende à gravidade da pena aplicável (arts. 13º/2, 14º/2, b); 16º/2, b)). O tribunal do júri é competente para o julgamento de crimes cuja pena máxima aplicável for superior a 8 anos de prisão, o tribunal colectivo para o julgamento dos crimes cuja pena máxima aplicável for superior a 5 anos de prisão e o tribunal singular para os crimes cuja pena máxima aplicável for igual ou superior a 5 anos de prisão. Em função do critério quantitativo da pena a aplicar, o tribunal singular não pode aplicar penas quantitativamente superior a 5 anos de prisão e os tribunais colectivos e do júri só deverão intervir nos processos em que seja aplicável uma pena superior a 5 e 8 anos de prisão, respectivamente. É, portanto, a pena máxima abstractamente aplicável que serve de critério para delimitar quantitativamente a competência material dos diferentes tribunais. O tribunal pode vir a julgar que a circunstância invocada não se verificou e que então deveria ser julgado incompetente por excesso de competência. Porém, há a regra de que quem pode o mais pode o menos e por isso, se o tribunal colectivo podia aplicar pena de prisão superior a 5 anos pode também aplicar pena inferior. Presume-se que quanto mais solene é o tribunal maiores são as garantias de defesa, donde que não haveria dano para o arguido por ser julgado por tribunal mais solene. Há circunstâncias que fazem parte do tipo de crime (art. 72º/2 CP) e essas, sejam agravantes ou atenuantes, são já consideradas na fixação legal da penalidade. O que importa considerar para efeito de interpretação do art.15º, são as circunstâncias que não fazendo parte do tipo do crime alteram a pena aplicável. Nos termos do art. 15º só devem ser consideradas para efeitos de determinação da pena aplicável as circunstâncias modificativas agravantes comuns.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP A lei não prevê circunstâncias que tenham por efeito a agravação judicial da pena para além dos limites da pena aplicável ao tipo de crime, mas prevê circunstâncias atenuantes que têm por efeito a atenuação judicial especial da pena e estas ficam excluídas porque dependem da apreciação concreta do tribunal (o MP pode sempre ter em conta as circunstâncias atenuantes, usando da faculdade que lhe é concedida pelo art.16º/3). O art.15º manda atender ao máximo legal da pena a aplicar no processo. Não há que atender apenas ao máximo legal da pena a aplicar ao crime, mas ao máximo legal da pena que pode ser aplicada ao arguido no processo. O mesmo processo pode ter por objecto vários crimes e do concurso resultar que a pena a aplicar ao arguido seja superior à aplicável por cada um dos crimes em concurso. Nestes casos, a pena a aplicar há-de ter como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas a cada um dos crimes em concurso, nos termos do art. 78º/2 CP – solução consagrada no art. 14º/2, b). COMPETÊNCIA MATERIAL E FUNCIONAL DOS DIFERENTES TRIBUNAIS
COMPETÊNCIA FUNCIONAL DO TRIBUNAL E COMPETÊNCIA DOS JUÍZES QUE COMPÕEM O TRIBUNAL
Os arts. 10º e 18º CPP disciplinam apenas a competência material e funcional dos tribunais, mas não tratam da competência funcional de cada um dos juízes que integram o órgão jurisdicional quando de composição plural – tribunal colectivo ou do júri. Assim, as normas dos arts. 301º, 312º, 322º, 345º, 372º/1, 372º/2 respeitam à competência funcional dos juízes e jurados que compõem o tribunal. A competência é primariamente do tribunal, mas tratando-se de órgão de composição plural importa também a competência de cada um dos membros do tribunal. A LOFTJ dispõe sobre a competência do Presidente, dos Vice-Presidentes e Presidentes das secções do STJ (arts. 52º e 55º) e das relações (arts. 69º, 70º e 71º) e o art. 139º sobre a competência do presidente do tribunal colectivo.
COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DE INSTRUÇÃO CRIMINAL/JUÍZ DE INTRUÇÃO
Os tribunais de instrução criminal são tribunais de 1ª instância de competência especializada e singulares. Porque singulares é indiferente que se refiram a tribunais ou a juízes: a LOFTJ refere-se aos juízos de instrução criminal (art. 111º a 113º) e o CPP a juiz de instrução (art. 17º).
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP Compete ao tribunal de instrução criminal (ou ao juiz de instrução): proceder à instrução, decidir quanto à pronúncia e exercer as funções jurisdicionais relativas ao inquérito (art. 17º CPP e art. 111º LOFTJ).
COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL SINGULAR
O tribunal singular tanto pode ser tribunal de competência genérica (tribunal de comarca) como tribunal de competência especializada (juízos de media e pequena instância) - arts. 132º e 133º LOFTJ. Os tribunais singulares de competência genérica e os juízos de média e pequena instância têm a mesma competência em matéria criminal, competindo-lhes nos termos do art.16º CPP, julgar os processos que respeitem a crimes: a) Que não couberem na competência de tribunais de outra espécie (critério meramente residual; cabem na competência do tribunal singular todos os crimes que não caibam na competência de tribunais de outras espécies); b) Previstos no capítulo II do título V, do livro II do CP (adopta-se o critério qualitativo, em atenção a que apreensão da prova não oferece grande dificuldade, é um critério perigoso, pois não é possível estabelecer a priori quais os crimes relativamente aos quais a apreensão de prova não oferece grande dificuldade; os crimes contra a autoridade pública que podem ser puníveis isoladamente com penas de máximo superior a 5 anos e em concurso com penas até 25 anos) c) Cuja pena máxima, abstractamente aplicável, for igual ou inferior a 5 anos de prisão; d) Que devam ser julgados em processo sumário e) Os crimes de competência normal do tribunal colectivo ou do júri, em razão da pena aplicável, quando o MP entender que não deve ser aplicada, em concreto, mesmo em caso de concurso, pena de prisão superior a 5 anos.
COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL COLECTIVO
O tribunal colectivo de 1ª instância tanto pode ser tribunal de competência genérica (tribunal de comarca) como tribunal de competência especializada (tribunal criminal) e de competência específica (varas criminais). Competem-lhe julgar os processos que (art. 14º):
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP 1. Não devendo ser julgados pelo tribunal do júri, respeitarem a crimes contra a paz e a humanidade (arts. 239º a 246º CP) e contra a segurança do Estado (arts. 308º a 346º CP) 2. Não devendo ser julgados pelo tribunal singular, respeitarem a crimes: a) Dolosos ou agravados pelo resultado, quando for elemento do tipo a morte de uma pessoa e não devam ser julgados em processo sumário; b) Cuja pena máxima, abstractamente aplicável, for superior a 5 anos de prisão, mesmo quando, no caso de concurso de infracções, seja inferior o limite máximo correspondente a cada crime e não devam ser julgados em processo sumário.
COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI
O tribunal do júri só intervém quando a sua intervenção for requerida pelo MP, pelo assistente ou pelo arguido (art. 13º). O requerimento para intervenção do tribunal do júri é irretratável (art. 13º/5) e deve ter lugar no prazo para a dedução da acusação, quando for do MP ou do assistente, e no prazo para requerimento da instrução, quando for do arguido. Havendo instrução, o requerimento do assistente que não tenha deduzido acusação e do arguido devem ter lugar no prazo de 8 dias a contar da notificação da pronúncia (art. 13º/3). Compete ao tribunal do júri julgar os processos que respeitem a crimes: a) Contra a paz e a humanidade, contra a segurança do Estado e previstos na Lei Penal Relativa à Violação do Direito Internacional Humanitário (art. 13º/1); b) Cuja pena máxima, abstractamente aplicável, for superior a 8 anos de prisão, desde que não devam ser julgados pelo tribunal singular (art. 13º/2).
Exceptuam-se da competência do tribunal de júri os crimes de terrorismo e os que se refiram a criminalidade altamente organizada – art. 111º LOFTJ
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP A ressalva do art. 13º/2 – não devendo ser julgados pelo tribunal singular – respeita à possibilidade que o art. 16º/3 confere ao MP de atribuir competência ao tribunal singular relativamente a alguns crimes que, atendendo à pena aplicável em abstracto, seriam da competência do tribunal colectivo e aos crimes previstos na alínea a) do nº 2 do art. 16º, mesmo que puníveis com pena máxima superior a 5 anos (art. 141º LOFTJ e art. 207º/1 CRP).
COMPETÊNCIA DOS JUÍZOS DE PEQUENA INSTÂNCIA CRIMINAL
Os juízos de pequena instância criminal são tribunais de competência especializada que têm por competência preparar e julgar as causas a que corresponda a forma de processo sumário, abreviado e sumaríssimo.
COMPETÊNCIA DAS RELAÇÕES
O plenário das Relações (art. 12º/1) tem a competência que lhe é atribuída por lei (art. 55º LOFTJ). É necessário analisar cuidadosamente o art. 12º.
COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
O plenário do STJ (art. 11º/1) tem a competência que lhe é atribuída por lei (art. 41º LOFTJ): julgar os recursos de decisões proferidas pelo pleno das secções e exercer as demais competências conferidas por lei. É ncessário analisar cuidadosamente o art. 11º. FIXAÇÃO DA COMPETÊNCIA PELO MÉTODO DA DETERMINAÇÃO CONCRETA – ART. 16º/3 Nos termos do art. 16º/3
o MP pode sujeitar a julgamento em tribunal singular os
arguidos em processo a que corresponderia, em abstracto, pena máxima superior a 5 anos de prisão, mesmo em caso de concurso de infracções (art. 14º/2, b)), se entender que não deve ser aplicada em concreto pena de prisão superior a 5 anos. No projecto, o número correspondente ao actual nº4 do art. 16 º previa que se o tribunal obtivesse, em qualquer momento, a convicção fundada de que, no caso, devia ser aplicada pena superior à prevista no nº3 (3anos), assim o declararia em despacho fundamento, ordenando a remessa dos autos ao tribunal colectivo competente para o julgamento. A lei nº43/86 estabeleceu a possibilidade de fazr julgar pelo tribunal singular os crimes que não fossem, na óptima do MP, passíveis em concreto de pena de prisão ou medida de segurança de duracção superior à estabelecida no art. 16º/3 e o Governo interpretou esta autorização no sentido de conceder ao MP a possibilidade de fixar definitivamente a competência do tribunal singular quando na sua óptica não deva ser aplicada, em concreto, pena de prisão superior a 5 anos.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP Parece, porém, que uma norma que foi inicialmente pensada como simples regra de fixação da competência pelo método da determinação concreta ditada por razões de mera simplificação processual, acaba naquela interpretação, por ter um conteúdo que ultrapassa em muito a mera fixação precária da competência, para além disso e por via indirecta, limitar os poderes do tribunal de determinação da medida da pena no caso. Parece resultar do art. 16º que o MP pode fixar definitivamente a competência do tribunal, pois o art. 16º atribui efectivamente ao tribunal singular a competência naquela hipotese e se a norma do art. 16º/4 do projecto alerava o sentido do nº2, mostrando que o que se pretendia era uma mera fixação precária da competencia do tribunal singular, a sua omissão no CPP não deixa de alterar o sentido que então claramente era pretendido. O art. 16º/3 tem sido objecto de larga polémica, quer no que respeita à sua interpretação, quer quanto à sua constitucionalidade, mas a jurisprudência constante do TC tem sido no sentido da sua conformidade com a CRP. No entanto, tem-se argumentado que esta norma viola os princípios do juiz natural, da jurisdição, da legalidade e da igualdade. De simples critério de fixação de competência pelo método da determinação concreta, o art. 16º/3 e 4, acaba por ser uma importante manifestação do princípio da oportunidade, ao permitir ao MP decidir, sem possibilidade de controlo judicial, que a pena a aplicar num caso concreto há-de ser inferior à que é abstractamente prevista na lei. O MP só pode recorrer a esta faculdade no caso de crimes previstos no art. 14º/2, b). se não respeitar o pressuposto para o uso da faculdade o tribunal há-de declarar-se incompetente. 1) O juiz de instrução agiu bem ao condenar Eduardo? O que pode ou deve fazer o arguido para impugnar a decisão proferida? TEMA: COMPETÊNCIA FUNCIONAL
COMPETÊNCIA: compete aos tribunais o exercício do poder jurisdicional (um dos poderes soberanos do Estado). Havendo vários tribunais, a lei atribui a cada um uma parcela de jurisdição. A instrução, sendo uma fase facultativa, tem apenas lugar se for requerida pelo arguido ou pelo assistente.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP A competência é distribuida tendo em consideração três critérios: matéria, natureza e função. De seguida procede-se à distribuição da competência em função da matéria:
Natureza (critério quantitativo; critério qualitativo) e Gravidade do Crime Objecto do Processo
Qualidade do Arguido
A competência territorial respeita à àrea de jurisdição. No processo civil não se coloca qualquer problema de competência funcional, porque até à sentença, é sempre o mesmo juiz que decide, mas no processo penal não é assim: como há várias fases, pode haver diferentes tribunais competentes para cada uma das fases, nos termos do art. 17º (ex: o juiz que profere o despacho de pronúncia não pode julgar o resto do processo – visa-se a imparcialidade). Imaginando que está em causa um crime praticado pelo Presidente da República, directamente relacionado com as suas funções, o tribunal competente para julgar é o STJ, nos termos do art. 11º/3 al. a), mas o tribunal competente na fase da instrução e o seu funcionamento encontra-se consagrado no art. 11º/7. A competência funcional varia em função do crime. No caso em análise, o juiz de instrução, quando condena, viola as regras de competência funcional, porque está a exercer uma função que não lhe compete. Neste caso, estamos face a uma nulidade insanável (nulidade que não depende de arguição – art. 119º al. c). Os efeitos da declação de incompetência encontram-se consagrados no art. 33º/1. A competência do juiz de instrução encontra-se consagrada no art. 17º, não podendo ele proferir decisões condenatórias. Note-se que a expressão ‘’nulidades insanáveis’’ não é correcta, uma vez que elas sanam-se com o trânsito em julgado da sentença. No caso, o processo irá seguir para julgamento. NOTA: Quando se fala em tribunais competentes para recursos tal refere-se à competência funcional (é recurso), mas se se trata de saber se o recurso é para o Tribunal da Relação ou para o STJ já estamos face a competência em razão da matéria.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP 2) Suponha agora que Eduardo não requer a abertura da instrução. Qual o tribunal materialmente competente para o julgamento? TEMA: COMPETÊNCIA MATERIAL O que está em causa no caso é a distribuição da competência material, ou seja, se é competente o tribunal de júri, tribunal colectivo ou o tribunal singular. Para distribuir a competência material, o legislador atende à gravidade do crime e, para aferir dessa gravidade, utilizou dois critérios: i.
Critério Quantitativo – no caso, pelo art. 16º/2 al. b) será competente o tribunal singular;
ii.
Critério Qualitativo – no caso, pelo art. 14º/2 al. a) será competente o tribunal colectivo
Qual dos critérios deve prevalecer o quantitativo ou o qualitativo? O único campo de aplicação do art. 14º/2 al. a) é para os homicidios dolosos com pena inferior a 5 anos, porque para os outros casos já temos o art. 14º/2 al. b); portanto a al. b) trata de penas iguais ou superiores a 5 anos. Caso contrário a al. a) não teria qualquer utilidade. Note-se que a ressalva do art. 16º/2 respeita às situações em que há conflito de competências, apenas por aplicação do critério qualitativo, nesse caso, devendo prevalecer o tribunal singular. Sendo a vida o bem supremo seria competente o tribunal colectivo. Em suma: a instrução, nos termos do art. 286º e 287º/1 al. a) e b), tem de ser requerida; se não o for vai-se directamente a julgamento. Na prática a instrução carece de utilidade prática: a taxa de pronúncia é gigante face ao despacho de não pronúncia. Há certos tipos de arguidos que, independentemente das escolhas estratégicas, preferem sempre requer a instrução. No caso estamos face a um crime que se encontra previsto no art. 134º CP em que do seu elemento objectivo faz parte a morte e do elemento subjectivo é doloso ou agravado pelo resultado.
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP Nos termos do art. 134º o crime é punido até três anos, pelo que de acordo com o critério quantitativo a competência seria do tribunal singular (art. 16º/2 al. b)) e pelo critério qualitativo a competência seria do tribunal colectivo (art. 14º/2 al. a)). No caso irá-se aplicar o critério quantitativo, atendendo-se à medida da pena, pelo que será competente o tribunal colectivo. 3) E se o agente tiver sido detido em flagrante? PASSOS A REALIZAR 1. Competêntica Qualitativa: cabe no art. 13º/1 ou no art. 14º/1? 2. Processo Sumário? 3. Competência Quantitativa? No caso, a detenção em flagrante delito não cabia no art. 14º/1 nem no art. 13º/1, tal como também não cabia nas excepções do art. 381º/2. Deste modo aplica-se o processo sumário e o caso é julgado em tribunal singular.
Maria Luísa Lobo – 2012/2013
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HIPÓTESES PRÁTICAS DE PROCESSO PENAL FDUCP XIV Encerrado o inquérito que correu termos contra António, pela prática de um crime de furto qualificado (art. 204.º, n.º 2, al. a), do Código Penal, o Ministério Público deduziu acusação. Porém, considerando a modesta condição social e económica do arguido, a juventude do mesmo, a confissão, ainda que parcial, dos factos, logo propôs, naquela acusação, que a pena a aplicar, em concreto, não fosse superior a cinco anos de prisão, e, do mesmo passo, e invocando o disposto no art. 16.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, requereu ainda que o mesmo fosse julgado em tribunal singular. Recebidos os autos no tribunal de julgamento, o juiz proferiu despacho pelo qual julgou inconstitucionais as normas do art. 16.º, n.º 3 e n.º 4, do Código de Processo Penal, por violação dos princípios constitucionais da independência do tribunal, da reserva da junção jurisdicional, do juiz natural e da igualdade. Em consequência, considerou-se incompetente para o conhecimento do processo, ordenando a remessa dos autos ao tribunal colectivo. Quid Iuris? (Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 455/89 e 281/91) ACÓRDÃO TC nº 455/89: considera o art. 16º/3 constitucional. Quanto ao método de determinação concreta da competência: no caso concreto fica logo definido qual o tribunal competente. Ele só pode dizer que não é competente se a lei o previr. Só o pode nos casos do art. 14º/2 al. b). Ou seja, na altura questionava-se se existia inconstitucionalidade orgânica, uma vez que não se encontrava previsto na lei da organização legislativa o que o tribunal podia fazer quando recebesse os autos e não considerasse as soluções correctas. Procede-se a uma análise do art. 16º/3 numa perspestiva material devido ao Princípio do Juiz Natural, da Reserva de Jurisdição, de Independência e Obediência à Lei. Não é inconstitucional porque se encontrava em jogo a determinação concreta da pena e tal está regulado no CP. Inconstitucionalidade orgânica na altura
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