Plano de Avenidas : impactos de um diagrama imposto
Short Description
Descrição: análise sobre a implantação do diagrama do Plano de Avenidas....
Description
plano de avenidas
organização urbana e planejamento faculdade de arquitetura e urbanismo
hannah campos
impactos de um diagrama imposto
contexto
Em 1924, quando em uma crise energética em São Paulo, o transporte urbano coletivo, facprimordialmente feito por bondes elétricos, é afetado a ponto de ser revisado em modelo de implementação. Neste momento colocou-se em evidência a vulnerabilidade do crescimento produtivo e populacional da cidade decorrente de sua limitação infra-estrutural. A proposta apresentada apresentada pela Companhia Light -empresa -empresa que, até então, detinha o monopólio de ambas prestações de serviço, energia e transporte, não pareceu satisfatória diante do que era tido como problema emergente, a crise de abastecimento energético. Pelo que a prefeitura da cidade, na gestão Pires do Rio, encomenda uma proposta viária que contemplasse a expansão da cidade a partir de ônibus e automóveis. Assim, em 1930, os engenheiros engenheiros Prestes Maia e Ulhôa Cintra, apresentam o‘Estudo de um Plano de Avenidas para a Cidade de São Paulo’, desenvolvidos a partir de outros estudos já feitos pelos autores em 1924, como ‘Um problema atual. Os grandes Melhoramentos para São Paulo’ e ‘Esquema Teórico Teórico de São Paulo’.
referenciais
Desde os primeiros esboços do ‘Plano de Avenidas’ é possível i dentificar pelo menos três referências teóricas, todas contemporâneas e internacionais. Do norte-americano Burnham, é reconhecida a estratégia do uso de diagramas simplificados, como instrumento contundente e duradouro de fixação no imaginário e, portanto, mais passível de implementação . Para a escolha do diagrama, Prestes Maia e Ulhôa Cintra, C intra, recorrem aos europeus: aos urbanistas Hérnard e e Stübben, em seus modelos viários radiais concêntricos; e aos exemplos implementados em Paris, Moscou, Berlim e Viena.
Diagrama para Paris (Hérnard)
1
A reprodução quase direta destes modelos externos é tida plausível, pela perspectiva de modernidade que se tinha então. Questões urbanas seriam decorrentes de processos universais e, por isso, poderiam ser resolvidas por um modelo comum. No entanto, a solução foi obstinadamente entendida como forma, e esta tão sintética que em sua proposta de aplicação não é possível reconhecer nenhuma alusão à cidade de São Paulo
Plano de Avenidas (diagrama)
premissas
Apesar do título não demonstrar, o Plano de Avenidas contempla muito mais que um projeto viário para a cidade de São Paulo. Nele, também são tratadas outras questões urbanísticas relacionadas à remodelação, expansão, ocupação e áreas verdes. Tal abrangência revela uma identificação e correlação dos fatores componentes à estruturação urbana, condizentes com a perspectiva dos autores. Contudo, a denominação Plano de Avenidas, se faz muito apropriada uma vez que todos demais fatores são subordinados ao modelo viário que se propunha. Como premissa principal, eram apresentadas maneiras de viabili zar um crescimento que fosse mais proporcional, alcançado pela melhoria da acessibilidade, exigüidade e circulação urbana. Entendia-se, portanto, que o crescimento urbano não deveria ser contido -em contraposição à vertente urbanística vigente, sustentada por Anhaia Melo, e que o problema maior seria a ‘desproporção’ atingida por um processo desenfreado.
2
propostas
O Plano de Avenidas pode ser entendido a partir de seus elementos principais, compreendidos rapidamente pelo diagrama. É importante apontar que estes não foram desenvolvidos e implementados concomitantemente, senão que sofreram alterações tanto na fase de proposta, quanto na de execução. Identifica-se dois momentos principais de formulação, em seus mandatos como prefeito: um primeiro, 1935-1945, e outro em 1955. perímetro de irradiação Tratando-se de um modelo radio-concêntrico, a porção central da cidade é bastante evidenciada nas propostas do Plano de Avenidas. Como é possível de observar nos diagramas, define-se um ‘Perímetro Radial’, dentro do qual várias alterações seriam feitas para remodelar a aparência do centro, e reconfigurar seu modelo de expansão. Nota-se aqui um aspecto muito forte à proposta, a de Plano Estético, no qual os aspectos históricos e naturais foram solapados por um ideal de beleza urbano importado. A configuração territorial das pré-existências da cidade jesuíta indicava mais bem um triângulo (formado pelas ruas Líbero Badaró, Benjamin Constant e Boa Vista) que qualquer indício dos rings de Stübben. Para que chegasse ser exequível o diagrama precisou ser conformado ao território, à topografia -‘pequena dificuldade’ que ‘antolhou’ a realização da primeira proposta. O grande esforço foi despendido para construir o perímetro de irradiação, pode ser observado nas t rês reformulações do projeto de implementação.
1ª versão do Perímetro de Irradiação
2ª versão do Perímetro de Irradiação
3
avenidas radiais A partir deste perímetro central sairiam avenidas, ao longo das quais se daria a expansão da cidade, estipulando as direções de espraiamento e verticalização. Foram determinadas segundo a vetores de crescimento reconhecidos no tecido urbano, e nos fluxos entroncados em seu centro. sistema Y Complementariamente à essas avenidas, era aplicada a proposta de Alcides Martins Barbosa para o Vale do Anhangabaú: uma diametral que faria a articulação Norte-Sul da Cidade, denominada ‘Sistema Y’ por causa de sua conformação visual. O tronco principal, seria o Parque do Anhangabaú que ligaria a Avenida Tiradentes (sentindo norte) aos galhos, estes formados pelas Avenidas 9 de Julho e 23 de maio, e, em outra, pela Avenida Tiradentes. Ressalta-se o fato de que, somente para esse trecho de projeto, são consideradas três grandes intervenções viárias em importantes vales da cidade: Anhangabaú, Saracura e Itororó. Este modelo representa uma nova lógica de estruturação urbana, se comparado às práticas de até então, absorvidas dos índios, tropeiros e jesuítas, em que os caminhos eram traçados sobre os divisores de água e os vales eram evitados
sistema Y
4
perimetrais Além do perímetro de irradiação, no Plano de Avenidas foram propostas outros dois anéis, concêntricos ao primeiro, cuja função seria conectar as avenidas radias e os bairros entre si. Sendo destinadas, também, ao uso residencial e ao lazer, servindo de conexão aos pontos notáveis à Cidade -em semelhança aos exemplos de Viena e Berlim. A segunda perimetral proposta abrigaria o leito das ferrovias, aqui removidas para as margens do rio Tietê. Por sua vez, a terceira perimetral conjugaria a circulação às áreas verdes ao longo das margens dos rios, a partir de uma reformulação das parkways propostas em 1917, por Berry Parkway . execução
As propostas do Plano de Avenidas foram, majoritariamente, executadas durante os dois mandatos de Prestes Maia, na prefeitura de São Paulo. Durante o primeiro deles, de 1938 a 1945, foram implementados o Perímetro de Irradiação, as Avenidas Radiais, e parte do Sistema Y e a 2ª Perimetral. Em seu segundo mandato, de 1961 a 1965, deu continuidade ao modelo de intervenção urbana, ainda pautado por um ideal de circulação primordialmente viário, a despeito das importantes mudanças no cenário urbano e outras novas problemáticas decorrentes do intenso crescimento ocorrido. Essa premissa parece ter sido tão profundamente consolidada no ideario de Prestes Maia, que nem mesmo a elaboração de um estudo para rede de Metrô o leva a inverter prioridades de investimentos. Assim, neste momento, foram abertas novas avenidas de fundo de vale, além da proposta uma ligação Leste-Oeste em resposta à expansão periférica que vinha ocorrendo em direção a leste. Tal ligação seria feita em cota elevada, a fim de transpor o Tamanduateí pelo Parque Dom Pedro II -gesto que, mais uma vez, solapa riquezas históricas e despreza qualidades espaciais do lugar.
impactos
Ainda que nem todas as propostas elaboradas tenham sido implementadas, muitas das diretrizes estabelecidas por Prestes Maia, desde o Planos de Avenidas, foram perpetuadas no urbanismo da cidade de São Paulo até os dias de hoje. Assim, as ações de então são refletidas em impactos, até agora, permanentes. Quanto à circulação, ao adotar um modelo de transporte público pensado exclusivamente em ônibus, substituiu-se investimentos que poderiam ser feitos em transporte de massa sobre trilhos. Apostava-se na flexibilidade e rapidez do suprimento das demandas, contudo perdendo a oportunidade de estruturar a cidade e se aproximar mais à exigüidade urbana, então almejada. De fato, o espraiamento induzido ao longo dos vetores radiais reforçou ainda mais o caráter central do perímetro de irradiação, sustentando o que viria a ser o modelo de expansão
5
periférica, que hoje caracteriza a configuração urbana da Cidade. Outra faceta deste modelo de expansão refere-se à forma ocupação das margens dos canais e dos fundos de vale, que impossibilitam integração urbana plena, pelo caráter de via expressa que as vias assumem por sua configuração atrincheirada. A escolha desse modelo estava também relacionado a uma maciça intervenção em infraestrutura de saneamento e drenagem. No entanto, também essas questões foram tratadas em vistas a responder a demanda viária, sem que fosse feita uma leitura mais precisa de suas dimensões -em comparação aos estudos de Saturnino de Brito. Daí decorrem grandes obras para se rebaixar e constranger o leito dos principais rios, dos quais se obtém canais estreitos com vazões absurdas, e margens mais amplas, drenadas e liberadas para ocupação imobiliária. Atesta-se, então, por observação das consequências vivenciadas ainda hoje, que o caráter científico da proposta de Prestes Maia e Ulhôa Cintra parecia estar mais voltado a justificar um diagrama, que propriamente embasá-lo. Da fortuita percepção inicial,em que ambienteenergia-transporte viam-se atrelados na crise de 1924, obtém-se catástrofes como resultado de uma leitura territorial deturpada por uma obstinação formal.
Avenidas em fundos de vale abertas entre 1980-2000
6
bibliografia
BUCCI, A. Anhangabaú, o Chá e a metrópole. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Universidade de São Paulo. São Paulo: 1998. 115 p. CAMPOS, C. M. Plano de Avenidas: o diagrama que se impôs. In: SOMECK, N.; CAMPOS, C. M. (orgs). A cidade não pode parar: planos urbanísticos de São Paulo no século XX. São Paulo : Mackpesquisa, 2002. p. 55-72. DELIJAICOV, A. C. P. Os rios e o desenho urbano da cidade: proposta de projeto para a orla fluvial da Grande São Paulo. Dissertação de Mestrado. Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Universidade de São Paulo. São Paulo, 1998. 108 p. MEYER, R. São Paulo Metrópole. São Paulo: Edusp, 2004. TOLEDO, B. L. Prestes Maia e as origens do urbanismo moderno em São Paulo. São Paulo: Empresa das Artes, 1996. 297p. TRAVASSOS, L. R. F. C. A dimensão socioambiental da ocupação dos fundos de vale urbanos no município de São Paulo. Dissertação de Mestrado. Programa de PósGraduação em Ciência Ambiental. Universidade de São Paulo. São Paulo, 2004. 198f.
7
View more...
Comments