Persuasão na publicidade
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A historieta de Calvin, de Bill Watterson, ilustra ilustra bem o assunto que iremos abordar neste artigo: artigo: a persuasão. No caso, para levar Calvin a comer o alimento que está no prato, o pai afirma tratar-se de um resíduo nuclear capaz de produzir alterações genéticas em quem o ingerir. Para atingir seu objetivo, o pai lança mão de uma estratégia persuasiva, de uma estratégia argumentativa que se mostra eficaz, uma vez que Calvin ingere rapidamente toda a comida. A historieta demonstra também que a todo instante precisamos ou somos levados a tentar convencer as outras pessoas para agirem de acordo com aquilo que queremos. Persuadir significa, pois, levar o outro a agir conforme nossa vontade. Embora não façamos uma nítida distinção entre os termos, convencer e persuadir, vistos como sinônimos, é possível estabelecer uma distinção entre os dois atos. O primeiro identifica-se unicamente com a razão, alicerçando-se num raciocínio lógico representado por meio de provas objetivas, enquanto o segundo dirige-se à vontade, ao sentimento do interlocutor (ou interlocutores), por meio de argumentos plausíveis ou verossímeis, isto é, semelhante à verdade.. O ato de convencer seria capaz de atingir um “auditório universal” devido ao seu caráter demonstrativo, objetivo e atemporal, e, nesse caso, as conclusões decorreriam naturalmente das afirmações iniciais, como é próprio do raciocínio matemático ou dedutivo; já o ato de persuadir tem como alvo um “auditório particular” e caracteriza-se por ser ideológico, subjetivo e temporal. Convencer conduz a certezas; persuadir suscita inferências que podem levar o auditório (o leitor/ouvinte, o consumidor), ou parte dele, à adesão aos argumentos apresentados. Considerando tal definição, teríamos na história de Calvin uma clara estratégia persuasiva, na medida em que o pai utilizou uma estratégia específica para seu filho, em um momento também específico. Uma outra estratégia, mais racional, demonstrativa, objetiva, seria a de mostrar a importância dos alimentos, que contêm vitaminas e são necessários ao bom crescimento do indivíduo etc. No entanto, por se tratar de uma criança, a estratégia adotada é sem dúvida a mais eficaz, ainda que a mãe demonstre não concordar inteiramente com o método. Outro aspecto importante, que caracteriza o discurso persuasivo, é a necessidade da liberdade de expressão e de escolha. Afinal, se não há outro caminho a seguir não haverá também a necessidade de se construir um texto persuasivo. Manda-se, e é tudo. No caso da história do Calvin, o pai poderia usar de sua autoridade e obrigar o menino a comer sob ameaças de castigo e repreensões. Por este motivo, a persuasão identifica-se com o discurso publicitário, que depende do livre mercado (a despeito da ideologia subjacente ao termo) para manifestar-se. Pode-se dizer, portanto, que a publicidade é eminentemente persuasiva, pois procura levar um interlocutor a praticar um determinado ato. O discurso publicitário quase sempre apela mais à subjetividade do que ao julgamento “frio” do público; a adesão do público-alvo ao argumento do texto publicitário é resultado de um conjunto de elementos que não depende apenas da qualidade
inerente de um produto. Para a construção do discurso persuasivo, os textos publicitários utilizamse de diferentes estratégias argumentativas. Analisemos, a seguir, as mais comuns. Quais sejam:
É bastante freqüente o uso dessa estratégia em peças publicitárias; afinal a venda de um produto adquire mais validade quando devidamente demonstrada, através de imagens, de dados estatísticos, de descrição de detalhes do produto ou serviço, de imagens comparativas entre uma dada situação antes e outra depois. Como exemplo, citemos aqueles comerciais de produtos emagrecedores ou de combate à calvície em que sempre aparece uma pessoa obesa e, na seqüência, essa mesma pessoa surge com um corpo de fazer inveja a qualquer um. A despeito do tom cômico que estes comerciais possam sugerir o fato é que a estratégia revela-se interessante, considerando o poder comprobatório apresentado em tais comparações. Também outros tipos de comerciais, com linguagem menos cansativa, adotam estratégia semelhante, como os de sabão em pó, em que é comum mostrar uma primeira cena com crianças sujando a roupa, e uma outra cena em que as mesmas crianças aparecem com a roupa limpa graças ao poder de limpeza do sabão em pó em questão. Em 2001, o Governo de Goiás utilizou-se, em uma propaganda sobre um programa de erradicação do analfabetismo, de dados numéricos para comprovar a eficácia do tal programa. Diz o texto: O nó do analfabetismo está sendo desmanchado em Goiás em um grande esforço do Governo Estadual. Os números são animadores: 70.000 adultos já aprenderam a ler, escrever e contar, mostrando que é possível reduzir drasticamente o analfabetismo no Estado. É possível observar que o número em destaque (inclusive no original) funciona co mo argumento para a idéia de eficácia. Afinal, mesmo que o percentual seja baixo em relação ao número total de analfabetos, o dado é bastante chamativo para quem dispõe unicamente do texto da propaganda para ter uma idéia do alcance do “Programa Escreve Goiás”.Empresas de automóveis, em suas peças publicitárias, se utilizam largamente dessa estratégia argumentativa, sobretudo porque, além de revelar os veículos pelas imagens, também procedem a uma descrição detalhada do que é possível encontrar como itens de série e opcionais no veículo, o que funciona como argumentação do texto. Em algumas situações, a evocação do concreto ocorre pela narração de fatos ou descrição de lugares, pessoas ou coisas. Considerando que o recurso à abstração e a noções genéricas dificulta o uso da imaginação por parte do ouvinte/leitor (consumidor), tornam-se muitas vezes necessárias tanto a narração quanto a descrição remetendo o texto a algo concreto, que exemplifique aquilo que se está afirmando. É o caso do texto abaixo, em que uma dona de casa dá um depoimento de uma situação prosaica, banal, como se estivesse narrando uma situação possível, além de descrever uma cozinha igualmente verossímil. Quando você fala “não repare” para as visitas, você acha que elas obedecem? Não dá outra: com visitas xeretas, a conversa sempre chega à cozinha. Pior quando as visitas são íntimas. Daquelas que abrem geladeira sem cerimônia. E com menos cerimônia, vão reparar no que tem de novo e
principalmente no que tem de velho na sua cozinha. Nem adianta colocar capinha, jarrinho, porque elas vão fuçar e, sutilmente, vão descobrir o seu fogãozinho de estimação. Aquele que foi um lindo presente de casamento, mas que já está fazendo bodas de prata. Minha amiga, diante disso, não se espante quando ouvir algum cochicho do tipo: “Como? Ela ainda não tem um fogão Brastemp? Que unha de fome! Das duas uma: ou você troca o seu fogão e acaba com o falatório, ou começa também a reparar naquela sua amiga que engordou, naquela outra que ganhou algumas ruguinhas.
Essa estratégia é utilizada quando se recorre a um especialista em determinada área para ajudar a vender um produto, um serviço ou uma idéia. Assim, se para vender uma escova ou pasta dental, o anunciante afirma tratar-se de um produto recomendado pela Associação de Odontologia, ou se um fabricante de rações para animais domésticos diz ser o produto dele o preferido por veterinários e por criadores/tratadores de animais, teremos argumentos de autoridade. Da mesma forma, quando em um anúncio de sabão em pó afirma-se ter sido o produto testado por laboratórios renomados mais uma vez haverá a presença da estratégia argumentativa baseada na fala de uma autoridade intelectual.
Há uma semelhança com a estratégia anterior, pois em ambas temos uma declaração de alguém que diz ter utilizado o produto anunciado. Neste caso, porém, os depoimentos são dados por pessoas comuns, não necessariamente especialistas em determinada área do conhecimento. Assim, quando uma dona de casa declara ter utilizado uma marca de sabão em pó específica ou servido um produto alimentício qualquer à própria família, seu testemunho ganha em autenticidade, é autorizado pelo uso, pela experiência com o produto em questão. Esse recurso argumentativo é verificável também quando um anunciante recorre a pessoas famosas, artistas, esportistas entre outros. Nesta situação específica, é possível mesclar a estratégia à anterior, quando, por exemplo, um tenista anuncia uma determinada marca de raquete. É evidente que faz isso pela experiência, mas também por ser um especialista. A lógica de se recorrer a uma pessoa famosa é levar o consumidor comum a agir conforme as ações daquele por quem se nutre uma admiração, ou daquele a quem se deseja seguir os passos. Há também um outro raciocínio: é como se dissesse o seguinte: ela, que é uma pessoa famosa e não quer nem pode manchar a imagem pública, usa nosso produto, você, que é desconhecido, pode usar sem susto.
Axioma significa verdade absoluta, ou seja, uma afirmação de caráter incontestável, válida não importa onde, não importa quando. É claro que há em toda a verdade um componente negativo, mas aqui não é o espaço para uma discussão sobre a questão. O ponto que nos interessa é chamar a atenção para o uso que faz o discurso publicitário das afirmações axiomáticas. Evidentemente, que toda verdade de um texto, de um produto, pode ser contestada pela verdade de outro texto ou produto. No entanto, a fim de que o texto, a afirmação ganhe caráter persuasivo, é preciso que seja construída de maneira taxativa, peremptória. Um exemplo: qual das duas afirmações tem mais força: “Sempre Coca-cola” ou “Coca-cola de vez em quando”? Certamente a primeira. Pode-se dizer, pois, que boa parte dos slogans são construídos de modo axiomático, uma vez que procuram expressar uma visão de tal produto como o melhor. Normalmente, as operadoras de telefonia celular procuram convencer o cliente com o mesmo slogan: o melhor serviço com as menores tarifas. Para se chegar à conclusão de qual teria razão depende de uma análise comparativa, mas para efeito persuasivo a estratégia utilizada é semelhante ou a mesma.Outros slogans: “Ômega: absoluto”; “Sempre o menor preço”.
A escolha das palavras, no discurso publicitário, deve ser revestida de todo cuidado; as palavras devem “empolgar”, criar uma rede de associações coletivas e individuais de forte apelo, cujo impacto pode ser decisivo no processo de persuasão/convencimento. As palavras devem traduzir uma visão positiva do produto anunciado; ainda que repetidos, clicherizados, termos como inesquecível, promoção, desconto, sucesso, beleza, satisfação, melhor, maior causam impacto em uma mensagem. É o que acontece em um slogan como “Seleção de preços baixos”, além do tom axiomático, termos como seleção e preço baixo são apelativas, uma vez que transmitem idéia positiva, afinal seleção transmite sensação de os melhores (produtos, preços).
O argumento pragmático é aquele que permite considerar um ato ou um acontecimento de acordo com suas conseqüências favoráveis ou desfavoráveis. Em outras palavras, trata-se de estabelecer uma relação lógica entre causa e efeito, causa e conseqüências. No exemplo abaixo, a Shell inicialmente informa que a gasolina por ela produzida vem com um aditivo chamado ASD, para, na seqüência, reportar a dois benefícios, a dois efeitos positivos no uso contínuo do produto: motor limpo e economia. A gasolina Shell agora vem com ASD, que garante a você um motor mais limpo e uma real economia de combustível. As instituições bancárias, normalmente, fazem uso do raciocínio lógico para transmitir idéia de segurança e rentabilidade. É como se dissessem: “Quer multiplicar seu dinheiro? Aplique nos fundos do Banco X.” – ou seja, se o consumidor almeja atingir resultados (efeitos) positivos, deve fazer isso ou aquilo.Recado Final: Vale lembrar que essas estratégias não são as únicas, apenas as mais comuns no universo publicitário, nos diferentes canais, como televisão, rádio, outdoor, revista, jornal, folhetos, folders etc. Também é preciso lembrar que a estratégia argumentativa, qualquer que seja ela, não é a única determinante que fará o consumidor adquirir um produto. Outros aspectos influem na decisão final do indivíduo: preço, aparência da embalagem, facilidade de aquisição, pós-venda etc. Outro ponto importante é que um mesmo produto, ou uma mesma peça publicitária, pode fazer uso de diferentes estratégias argumentativas. Por exemplo, os comerciais de sabão em pó mesclam as diversas estratégias aqui referidas. A seguir, alguns livros que podem ser consultados para um aprofundamento da compreensão do assunto desenvolvido neste artigo. Parte desses livros, vocês encontram à venda em nossa livraria . BARRETO, Roberto Menna. Análise transacional da propaganda. S. Paulo: Summus, 1981. . BARROS, Diana L. Pessoa de. Teoria semiótica do texto. São Paulo : Ática,1996. . CARRASCOZA, João Anzanello. A evolução do texto publicitário: a associação de palavras como elemento de sedução na publicidade. S. Paulo : Futura, 1999. . CARVALHO, Nelly de. Publicidade: a linguagem da sedução. São Paulo : Ática, 1996. . CITELLI, Adilson. Linguagem e persuasão. 6ª ed., São Paulo : Ática, 1991. . DIAS DE MELO, Luiz Roberto & PAGNAN, Celso L. Prática de texto: leitura e redação. 3ª ed., S. Paulo : W3 editora, 2001. GUIMARÃES, Eduardo. Texto e argumentação. Campinas : Pontes, 198 M ARTINS, Jorge S. Redação publicitária: teoria e prática. 2ª ed., S. Paulo: Atlas, 1997. . PERELMAN, Chaïm & OLBRECHTS-TYTECA, Lucie. Tratado da argumentação: a nova retórica. São Paulo : Martins Fontes, 1999.
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