Pedro Caldeira Cabral e Concerto Atlântico apresentam O Cancioneiro Musical Manuelino

December 29, 2017 | Author: xklamation | Category: Pop Culture, People
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Pedro Caldeira Cabral e Concerto Atlântico apresentam O Cancioneiro Musical Manuelino, na Igreja Matriz de Condeixa-a-No...

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O CANCIONEIRO MUSICAL MANUELINO

CONCERTO ATLÂNTICO

CONCERTO ATLÂNTICO

Direcção de Pedro Caldeira Cabral

«ASSUNÇÃO DA VIRGEM» — Séc. XVI — Igreja do Convento de Jesus, Setúbal

O nome deste grupo é constituído por duas palavras com significado particularmente rico para nós e directamente relacionadas com a música que interpreta: a palavra Concerto era usada no Renascimento para designar conjuntos instrumentais ou grupos de vozes e instrumentos tocando simultaneamente; o Atlântico é a matriz, espaço e símbolo, via que possibilita no passado o sonho da expansão e o encontro de culturas e povos que nos enriquece o presente. O Concerto Atlântico é formado por especialistas na interpretação de música dos séculos XV a XVII, utilizando instrumentos históricos (cópias de instrumentos da época) com critérios interpretativos que procuram valorizar aspectos da expressividade do reportório a que se tem dedicado. É até hoje o único quinteto de Violas de Arco em Portugal com actividade regular, sendo os seus membros poli-instrumentistas e formando também actualmente o único coro de Charamelas no nosso país. Tem realizado programas especiais com formações corais de adultos e crianças, bem como com actores e bailarinos especializados na dança renascentista. Fundado e dirigido por Pedro Caldeira Cabral, o grupo, formado em 1991, tem efectuado inúmeros concertos no país. Tem além disso actuado no estrangeiro, nomeadamente Holanda (Utreque, Holland Festival, 1992), Marrocos (Rabat, 1992 e 1993), França (Paris, 1993 e 1994), Inglaterra (Londres, 1994) e Alemanha (Berlim 2007). O Concerto Atlântico tem-se também apresentado com alguma regularidade na Rádio (RDP Clássica, Portugal, VPRO, Holanda, BBC Inglaterra, Radio France, França, etc.) e Televisão (RTP 2) e gravou um CD intitulado Meus olhos vão pelo Mar…

Comemoração dos 500 anos do Foral Manuelino de Condeixa Igreja Matriz de Condeixa 6 de junho de 2014

O CANCIONEIRO MUSICAL MANUELINO O rei D. Manuel I (1469- 1521) ficou conhecido pelo seu apreço pelas artes e em especial pela música. De acordo com o relato de Damião de Góis, (Crónica de D. Manuel), não dispensava o acompanhamento musical nas suas refeições e durante a sesta ou em qualquer das muitas funções cerimoniais a que assistia, fossem estas actos oficiais seculares ou religiosos. A sua Capela Real, formada por cantores e instrumentistas oriundos de diversos países, estava entre as melhores da Europa de então. Entre os costumes palacianos em uso no período manuelino, contavam-se as práticas da equitação, da esgrima, da caça e das artes, como o teatro, a dança, a música e a poesia, sendo que estas últimas desde a Antiguidade se consideravam inseparáveis. No livro Il Cortegiano, de Baldassare Castiglione (1479-1529), encontramos a referência explicita da prática corrente na fidalguia de cantar acompanhado de quatro ou cinco violas de arco. Em Portugal o seu uso está documentado desde a segunda metade do século XV, numa carta do rei D. Afonso V datada de 1463, em representações pictóricas geralmente de tema religioso, nas crónicas («Hida da princeza D.Beatriz pera Savoya...», Garcia de Resende, 1521) e em notícias dispersas (p. ex., a Capela de Vila Viçosa dispunha em 1532 de cinco tangedores de viola de arco; D. Heliodoro de Paiva – Coimbra, c. 1500-1552 «... era músico mui dextro... e tangia viola de arco»). Na viola de mão, Luis Milán (c. 1500-1561) foi o primeiro a publicar a sua música impressa num livro (El Maestro,Valencia, 1536) dedicado a D. João III, no qual afirma «... el reyno de Portugal es la mar de la música...». Este mesmo autor publicou em 1561 o livro El Cortesano, inspirado na célebre obra de Castiglione traduzido em castelhano pelo grande poeta Juan Boscán (1493-1542), no qual o autor faz a descrição dos costumes e usos da côrte, entre os quais a prática de tocar as violas em concerto, isto é, em conjuntos de instrumentos da mesma família. No caso de Portugal em concreto, existia uma forte tradição poético-musical secular palaciana desde o período trovadoresco (séculos XIII / XIV), retomada com intensidade a partir da segunda metade do século XV. É neste contexto que devemos inserir a produção lírica do Cancioneiro Geral e do teatro musical de Gil Vicente, à qual tem faltado nos tempos modernos a dimensão musical que a acompanhava na origem, com a devida instrumentação, de acordo com as fontes literárias e musicais desse período. É também a partir de c. 1460 que se iniciam a recolha e compilação de um conjunto de cancioneiros senhoriais ibéricos, nos quais se cruzam autores de várias origens geográficas peninsulares, demonstrando uma grande unidade estilística na produção polifónica secular e definindo os 3 géneros principais desta produção, os vilancetes ou villancicos, as cantigas e os romances. Com a descoberta e edição recente de quatro novos cancioneiros peninsulares, contendo poesia e música polifónica secular dos séculos XV e XVI, foi possível iniciar a reconstrução da dimensão musical desta riquíssima produção lírica, seguindo de perto uma prática por alguns poetas enunciada à cabeça de alguns dos seus versos: a da música contrafacta. Consistia esta na utilização de textos musicais polifónicos preexistentes com a «letra» ou texto poético novo, como nos indicam alguns autores colocando em epigrafe aos seus poemas «cantiga velha» ou «cantiga de todos sabida». Concluindo, é parte deste espólio patrimonial de grande riqueza que nos propomos apresentar numa seleção representativa da variedade expressiva do Cancioneiro Musical Manuelino. © Pedro Caldeira Cabral 2014 2

Passame por Dios barquero, daquela parte del rio, duelete del amor mio. Que si pones dilacion en venir a socorrerme No podrás despues valerme segun crece mi passion. No quieras mi perdicion Pues en tu bondad confio duele te del amor mio. Que d’esa parte se falla descanso de mis tormentos y en aquesta la batalla de mis tristes perdimientos. O ventura! Trae los vientos homildes, mansos, sin brio, duelete del amor mio.





Com estes ventos d’agora perigoso é navegar que se mudam cada hora e quem vai de foz em hora nunca mais pode tornar.   O navio pend’ à banda a razão não é ouvida a vontade tudo manda e quem há-d’andar desanda quem tem alma não tem vida.



Quem tem farelos de trigo não de centeio, venda-me este saco cheio.   Passe senhora a farinha com tempo que estou depressa aqui estou nesta travessa falando com a vizinha tire os farelos azinha de trigo não de centeio, Venda-me este saco cheio.

  Farelos tenho, mas não acabei de peneirar; a como mos há-de dar? a vintém não tem razão; a dezanove mos dão; mas a dezassete e meio venda-me este saco cheio.   Acabe de peneirar a farinha do celeiro, quando tomar o dinheiro que trago para lhe dar, do meu me há-de custar e não do suor alheio. Venda-me este saco cheio.

PROGRAMA

O Cancioneiro Musical Manuelino Meis ollos van per lo mare Niña era la infanta Danza alta In die tribulationes Partindo-se No val das mais belas Pavanas Muy serena está la mar Si tantos monteros Qual de nós vem mais cansada Tento a 4 do V tom Virgen bendita sin par Passame por Dios barquero Fantasia Com estes ventos d’ agora Senhora bem poderey Quem tem farelos Não tragais borzeguis pretos



Não tragais borzeguis pretos que na corte são defesos ora com borzeguis pretos Não tragais o que defeso porque quem trae o vedado anda sempre aventurado a ser avexado e preso verenvos andar aceso ora en cuydados secretos ora com borzeguis pretos Não tragais borzeguis pretos que na corte são defesos ora com borzeguis pretos porque quem trae o vedado anda sempre aventurado a ser avexado e preso creyobos andar aceso ora en cuydados secretos ora com borzeguis pretos E se saber a razão deste meu trago quereis a cor que trago nos pés me deu do coração porque os meus cuydados acesos e mais secretos eram ma ventura pretos

Anónimo Gil Vicente (1457-1534) Francisco de La Torre (1457-1525) Damião de Góis (1502-1574) João Roiz de Castel Branco (séc.XV) Bernardim Ribeiro (1482-1552) Luis Milán (c.1500-1561) Gil Vicente Anónimo Gil Vicente D. Heliodoro de Paiva (1502-1552) Pedro de Escobar (1465-1535) Pedro de Escobar Alonso Mudarra (c.1520-1580) D. João de Menezes (c.1487-1579) Anónimo Gil Vicente Anónimo

CONCERTO ATLÂNTICO Direcção de Pedro Caldeira Cabral Maria Repas Gonçalves — Soprano, tambor e pandeireta Nina Repas Gonçalves — Contralto e viola de arco Joaquim António Silva — Viola de arco, alaúde e viola de mão Pedro Caldeira Cabral — Viola de arco, flautas e tamboril Duncan Fox — Viola contrabaixa e percussão

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Meis ollos van per lo mare, mirando van Portugale. Meis ollos van per lo rrio, [Mirando Portugal mio].



Niña era la iffanta doña Breatriz se dezia hija del Rey don Manoel y Reyna doña Maria Reyes de tanta bondad que tales dos no avia, niña la caso su padre muy hermosa a maravilla con el duque de Saboya que bien le pertenecia, ya se parte la iffanta la iffanta se partia de la muy leal ciudad que Lixbona se dezia, va por el mar de Levante tal que temblava Turquia con ella va el Arçobispo señor de la cleresia van condes y cavalleros de muy notable osadia lleva damas muy hermosas hijas dalgo y de valia, Dios los leve a salvamento como su madre querria.



In die tribulationis meae renuit consolari anima mea. Et anticipaverunt vigilias oculi mei prae lachrymis. Turbatus sum et non sum locutus cum corde meo. Haec omnia initia fuerunt dolorum meorum.

Senhora partem tam tristes Meus olhos por vós, meu bem Que nunca tam tristes vistes Outros nenhuns por ninguem.   Tam tristes, tam saudosos Tam doentes da partida Tam cansados, tam chorosos Da morte mais desejosos Cem mil vezes que da vida.   Partem tam tristes os tristes Tam fora d’esperar bem Que nunca tam tristes vistes Outros nenhuns por ninguem.

aquesta minina no val das mais belas.



Muy serena está la mar, a los remos remadores esta es la nave d’amores.   Al compas de las serenas cantarán nuevos cantares remaréis com tristes penas vuessos remos de pesares ternéis sospiros a pares, y a pares los dolores. Esta es la nave d’amores.   Y remando atromentados hallaréis otras tormientas con mares desesperados, y desestradas afrentas; ternéis las vidas contaentas con los dolores mayores. Esta es la nave d’amores.   De remar y trabajar llevaréis el cuerpo muerto, y al cabo del navegar se empieça a perder el puerto. Aunque el mal sea tan cierto, a los remos remadores. Esta es la nave d’amores.



No val das mais belas amdavão meninas colhemdo boninas mais brancas quelas De rricas crespinas amdavão toucadas e todas bordadas de perlas muy finas aquestas minynas no val das mais belas colhem bonynas mais bramcas quelas De fina escarlata amdavão vestidas e todas semgidas com simta de prata aquestas mininas olhamdo pera elas pareçem boninas ou muyto mais belas Huma so avya de bramco muy fino sempre de comtino boninas colhia Capelas fazia de rrosas amtre elas





Si tantos monteros la caça combatem por dios que la maten. Estava la caça en la cova encovada passiones com guerra la tenem çercada Si tantos monteros la caça combatem por dios que la maten. 4

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Qual de nós vem mais cansada nesta cansada jornada? Qual de nós vem mais cansada?   Nosso mar é fortunoso nosso viver lacrimoso e o chegar rigoroso ao cabo desta jornada: Qual de nós vem mais cansada nesta cansda jornada Qual de nós vem mais cansada?   Nós partimos caminhando com lágrimas suspirando sem saber como nem quando fará fim nossa jornada Qual de nós vem mais cansada nesta cansada jornada? Qual de nós vem mais cansada?





Virgen bendita sin par, de quien toda virtud mana, vos sois digna de loar. Vos sagrada Emperadora, deshicisteis el engañ. Y remediasteis el daño de la gente pecadora. De los ángeles Señora, vos queirais tal gracia dar, que no podamos pecar contra aquel que carne humana de vos le plugo tomar. Desde el principio criada antes santa que nacida, para ser nuestra abogada fuiste de Dios escogida; la muerte de nuestra vida reparásteis sin dudar: vos nuestro bien singular de quien toda virtud mana, vos sois digna de loar.



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