Paul Ricoeur - Teoria da Interpretação
February 6, 2017 | Author: Rodolfo F. Alves Pena | Category: N/A
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Paul Ricceur TEORI
Os textos aqui publicados são uma síntese clara e profunda do projecto hermenêutico de P. Ricoeur e das suas categorias centrais: discurso como . evento, noção de texto, mundo da. obra; distanciação e apropriação.
INT
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BIBLIOTECA DE FILOSOFI CONTEMPORÂNEA
edições 70
TECA DE FILOSOFIA ONTEMPORANEA
edições 70
BIBLIOTECA DE FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA 1. MENTE, CÉREBRO E CIÊNCIA, John Searle 2. TEORIA DA INTERPRETAÇÃO, Paul Rícoeur 3. TÉCNICA E CIÊNCIA COMO .IDEOLOGIA~, Jurgen Habermas 4. ANOTAÇÕES SOBRE AS CORES, Ludwig Wittgenstein 5. TOTALIDADE E INFINITO, Ernrnanuel Levinas 6. AS AVENTURAS DA DIFERENÇA, Gianni Vatimo 7. ÉTICA E INFINITO, Emmanuel Levinas 8. O DISCURSO DE ACÇÃO, Paul Rícoeur 9. A ESSÊNCIA DO FUNDAMENTO, Martin Heidegger 10. A TENSÃO ESSENCIAL, Thomas S. Kuhn 11. FICHAS (ZETTEL), Ludwig Wittgenstein 12. A ORIGEM DA OBRA DE ARTE, Martin Heidegger
TEORIA
DA INTERPRETACÃO ,
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TEORIA
DA INTERPRETAOAO
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Preço:10.00 Doador:DIVERSOS
Título original: Interpretation Theory: discourse and the surplus of meaning
© 197.6 by Texas Christian Unversity Press
INTERPRETACÃO ,
Tradução de Artur Morão
o DISCURSO
E O EXCESSO DE SIGNIFICAÇÃO
Capa Depósito legal n. o 18296/87 Direitos reservados para todos os países de língua portuguesa por Edições 70, Lda. Av. Elias Garcia, 81, r/c - 1000 Telefs. 76 27 20 / 76 27 92 / 76 28 54 Fax: 761736 Telex: 64489 TEXTOS P
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PREFÁCIO No outono de 1973, Paul Ricoeur foi de Paris a Fort Worth dar uma série de lições como parte da celebração centenária da Texas Christian University. A série tinha o título "Discurso e o excesso de significação". O texto publicado aqui sob o título Teoria da Interpretação conserva o primeiro título como subtítulo. Esta mudança assinala o desenvolvimento do texto numa teoria sistemática e compreensiva que tenta explicar a unidade da linguagem humana em vista dos diversos usos a que é sujeita. Uma questão justa é a da localização deste texto dentro do horizonte das investigações de Ricoeur a propósito da linguagem e do discurso, publicadas depois de A Simbólica do Mal (1960). Este amplo horizonte é a busca de uma filosofia compreensiva da linguagem que possa explicar as múltiplas funções do acto humano de significar e todas as suas inter-relações. Nenhuma obra singular publicada durante este período (1960-1969) pretende oferecer semelhante filosofia compreensiva, e também não se pretende que as investigações tomadas em conjunto a constituam, pois Ricoeur duvida de que ela possa ser eleborada por um só pensador. Como se situa a Teoria da Interpretação relativamente a essa busca? Ocupa um lugar distinto, pois obras como Da Interpretação (1965) e O Conflito das Interpretações (1969) são sobretudo investigações dos diversos usos a que a linguagem enquanto discurso é submetida, ao passo que a Teoria da Interpretação oferece uma explicação da unidade da linguagem humana em vista dessa diversidade de funções. Em Teoria da Interpretação temos a filosofia da linguagem integral de Paul Ricoeur. Como resultado da apresentação inicial das conferências, manteve-se um seminário sobre a interpretação de textos e um simpósio acerca da linguagem na Texas Christian University em 1975. O professor Ricoeur regressou á TCU para tomar parte nesses acontecimentos e desenvolveu a sua teoria .9
pelas críticas que fez nos ensaios apresentados pela faculdade da TCU e pelos estudantes de muitas e diversas disciplinas. Tais acontecimentos indicam o poder desta teoria da interpretação e desta filosofia da linguagem. É nossa intenção pô-Ia agora à disposição de um auditório muito mais vasto, mediante a publicação da versão ampliada das conferências centenárias de Paul Ricoeur da TCU. Esta Universidade escolheu o que há de melhor no saber contemporâneo para ajudar a celebrar o seu centenário e assim honrou adequadamente o professor Ricoeur pelo convite que lhe fez. Por seu turno, ele proporcionou-nos o melhor da sua investigação e honrou deste modo a Universidade, ajudando-nos a celebrar adequadamente o seu centenário. Estamos-lhe muito agradecidos .. Ted Klein Presidente do Departamento de Filosofia Texas Christian University Fort Worth, Texas
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INTRODUÇÃO Os quatro ensaios que constituem este volume baseiam-se em e ampliam as conferências que fiz na Texas Christian University de 27 a 30 de Novembro de 1973 como suas conferências centenárias. Podem ler-se ou como ensaios separados, ou também como aproximações graduais de uma solução para um problema singular, o de compreender a linguagem ao nível de produções como poemas, narrativas e ensaios, quer sejam literários ou filosóficos. Por outras palavras, o programa central que está em jogo nos quatro ensaios é o das obras; em particular, o da linguagem como obra. Uma completa apreensão deste problema não se consegue antes de chegar ao quarto ensaio, que se ocupa de duas atitudes aparentemente antagónicas que podemos assumir ao lidar com a linguagem enquanto obra; quero dizer, o conflito aparente entre a explicação e_20mpreensão. CreIO, porém, que talc-õnflifO é apenas aparente eque pode vencer-se se for possível mostrar que as duas atitudes se relacionam dialecticamente entre si. Daí, pois que o horizonte das minhas lições seja constituído por essa dialéctica. Se se puder dizer que a dialéctica entre a explicação e a compreensão fornece a referência última das minhas observações, o primeiro passo a tomar nesta direcção deve ser decisivo: devemos transpor o limiar para lá do qual a linguagem se apresenta como discurso. Por conseguinte, o tópico do primeiro ensaio é o da linguagem como discurso mas, na medida em que só a linguagem escrita ostenta plenamente os critérios do discurso, uma segunda concerne à amplitude das mudanças que afectam o discurso quando já não é falado, mas escrito. Daí o título do meu segundo ensaio, "Fala e Escrita". . A teoria do texto que emerge desta discussão é apresentada mais à frente com a questão da plurivocidade, que pertence não só às palavras (polissemia), ou mesmo a frases (ambiguidade), mas a obras inteiras de discurso como poeI1
mas, narrativas e ensaios. O problema da plurivocidade, discutido no terceiro ensaio, fornece a transição decisiva para o problema da interpretação, redigido pela dialéctica da explicação e da compreensão, que, como indiquei, é o horizonte de todo este conjunto de ensaios. Desejo expressar a minha gratidão e o meu obrigado aos elementos da Texas Christian University pela oportunidade que me ofereceram de dar as lições que formam a base desta obra e também pela sua graciosa hospitalidade, durante a minha estadia ali. Foi para mim muito aprazível poder contribuir para a celebração do seu centenário.
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1 LINGUAGEM
COMO DISCURSO
Os termos em que o problema da linguagem como discurso se discutirá neste ensaio são modernos no sentido de que não se teriam podido adequadamente formular sem o tremendo progresso da linguística moderna. No entanto, se os termos são modernos, o problema em si não é novo. Foi sempre conhecido. No Crátilo, Platão já mostrara que o problema da "verdade" das palavras isoladas ou nomes deve permanecer indecidido porque a denominação não esgota o poder ou a função da fala. O logos da linguagem requer, pelo menos, um nome e um verbo e é o entrelaçamento destas duas palavras que constitui a primeira unidade da linguagem e do pensamento. E mesmo esta unidade suscita uma pretensão à verdade; a questão tem ainda de decidir-se em cada caso. O mesmo problema reaparece em obras mais maduras de Platão como o Teeteto e o Sofista. A questão aí é de compreender como é que o erro é possível, isto é, como é possível dizer o que não se verifica, se falar significa sempre dizer alguma coisa. Platão é, de novo, forçado a concluir que uma palavra por si mesma não é verdadeira nem falsa, embora uma combinação de palavras possa significar alguma coisa e, no entanto, nada apreende. O suporte deste paradoxo é, mais uma vez, ~r~ não a palavra. Tal é o primeiro contexto em cujo seio se descobriu o conceito de discurso: o erro e a verdade são "afecções" do discurso, e o discurso exige dois signos básicos - um nome e gm verbo - que se conectam numa síntese que vai além das j?.alavras; Aristóteles diz a mesma coisa no seu tratádo Da Interpretação. Um nome tem um significado e um verbo tem, além do seu significado, uma indicação do tempo. Só a sua conjunção produz um elo predicativo, que se pode chamar logos, discurso. Esta unidade sintética é que comporta o duplo acto de afirmação e negação. Uma afirmação pode ser contradita por outra afirmação e pode ser verdadeira ou falsa.
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Este breve sumano do estádio arcaico do nosso problema pretende lembrar-nos da antiguidade e da continuidade do problema da linguagem enquanto discurso. Porém, os termos em que agora o discutiremos são inteiramente novos, porque tomam em consideração a metodologia e as descobertas da linguística moderna. Nos termos desta linguística, o problema do discurso tornou-se um problema genuíno, porque o discurso pode agora opor-se a um termo contrário que não era reconhecido ou tido como garantido pelos filósofos antigos. 9 termo oposto é_~ o objecto autónomo da investigação científica. É o código linguístico que fornec~ uma estrutu!.!LesQecífic~ cada um dos sistemas linguísticos, que agora conhecemos cõiüõãS diversas llnguaslaladas· pelas diversas comunidades linguísticas. oCLínguasignifica, pois, aqui algo de diferente da c.~E.acidade geral de falar o.u da competênCia comum de falar. Desigga a estrutura articular do sistema lin ístico particular. Com as palavras "estrutu'fã"e "sistema" umá nova problemática emerge que tende, pelo menos inicialmente, a pospor, se é que não a cancelar, o problema do discurso, que é condenado a retroceder do primeiro plano da preocupação e a tornar-se um problema residual. Se o discurso ~e, para nós, é problemático é porque as principais realizações da linguística dizem res eito à.lingua enquanto estruturg esistema, e não enqüãnto usada. A nossã1ã"fefã será, portanto, libertar o discurso o seu exílio marginal e precário.
Langue e Parole: O Modelo Estrutural A recessão do problema do discurso no estudo contemporâneo da linguagem é o preço que devemos pagar pelas tremendas realizações levadas a cabo pelo famoso Cours de linguistique général do linguista suíço Ferdinand de Saussure (I). A sua obra funda-se numa distinção fundamental entre ..!!linguagem como langue e como parole, que configurou forte~nte a linguística moderna. (Note-se que Saussure ~ --~. não falou de ISCurSO"mas de "paroM'. Mais tarde, entenderemos porquê.) Y!!lK.lfe é o CÓdIgOou o conjunto de código~ - sobre cuja base falante o particular produz a ~ como um~tp.ensagem particular. 14
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. A esta dicotomia ulcra igam-se várias distinções subsidiárias. Uma mensagem é individual, o seu código é colectivo. {fortemente influenciado por Durkheim, Saussure conside~nguística como um·ra~
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