Os métodos de investigação reflexológicos e psicológicos

April 1, 2019 | Author: Robson Hilário da Silva | Category: Experiment, Psicologia e ciência cognitiva, Ciência, Behavior, Thought
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Os métodos de investigação reflexológica do homem já chegou a um ponto de inflexão no seu desenvolvimento. A necessidade (e a inevitabilidade) dessa mudança deve-se, por um lado, à desproporção entre a imensa tarefa de estudar todo o comportamento humano que a reflexologia levanta e, por outro, os meios modestos e limitados que para sua solução proporciona o experimento clássico da formação do reflexo condicionado (secretor ou motor). Essa desproporção é cada vez mais evidente, na medida em que a reflexologia passa do estudo das relações mais básicas do homem com o meio ambiente (a atividade que reúnes as formas e fenômenos mais primitivos) à investigação de interações mais complexas e variadas, sem as quais não se pode descifrar o comportamento humano em suas leis m ais importantes. Nesse sentido, além do básico e primitivo, a reflexologia tem dado uma afirmação geral breve, aplicado igualmente a todas as formas de comportamento, de que estas são constituídas por um sistema de reflexos condicionados. Mas esta afirmação demasiado geral não tem levado em conta as particularidades específicas de cada sistema, nem as leis que regem a combinação dos reflexos condicionados no sistema de conduta, nem as complexadíssimas interações e os reflexos de uns sistemas sobre outros, e nem sequer esboçou um caminho para a solução científica dessas questões. Daí o caráter declarativo e esquemático dos trabalhos reflexológicos onde se esperam resolver os problemas do comportamento do homem em vertentes mais ou menos complexas.  A reflexologia clássica permanece em suas investigações dentro de um princípio científico universal darwiniano, reduzindo tudo ao mesmo denominador. E precisamente porque este princípio é muito geral e unversal não fornece um meio direto para julgar sobre as suas formas particulares e individuais. Afinal, a ciência concreta do comportamento humano também lhe resulta impossível limitar-se a ele, o mesmo que uma física concreta não pode se limitar tão somente ao princípio da verdade universal. Escalas são necessárias, aparatos e métodos especiais para conhecer o mundo terreno concreto, material, limitado, com a base de um princípio geral. Igual acontece com a reflexologia. Tudo induz a ciência do comportamento do homem a sair  dos limites do experimento clássico e buscar outros meios de conhecimento.

Não só coloca-se o problema como manifesta-se claramente uma tendência à ampliação da metodologia reflexológica, como que se perfilam as linhas que se deve seguir nesta ampliação: uma maior aproximação e, em última instância, a fusão definitiva com os procedimentos de investigação estabelecidos há muito pela psicologia experimental. Embora isso possa parecer paradoxal em relação à oposição destas disciplinas, e embora não haja uma unanimidade entre os próprios reflexólogos e apreciem de formas muito diversas a psicologia experimental, esta fusão, ou seja, a criação de uma metodologia única da investigação do comportamento humano e, por conseguinte, de uma disciplina científica única, pode ser considerada como um fato que está se produzindo diante de nossos olhos.  A breve história desta aproximação é a seguinte. Inicialmente, a excitação elétrica da pele se realizava na sola do pé, com o que se provocava um reflexo de defesa da mesma ou em toda ela. Posteriormente, V. T. Protopov introduziu uma importante modificação no procedimento: substituiu o pé pela mão, supondo que seria muito mais vantajoso escolher a mão como críterio precisamente por ter esta um aparelho de resposta mais elaborado, mais adaptado que o pé para as reações de orientação com a influência do meio ambiente. E apoia com argumentos extraordinariamente convincentes a grande importância que para a reação tem a escolha adequada do aparato de resposta. É claro que se escolhemos em um gago ou emum surdo seus órgãos artiulatórios como aparato de resposta, ou aquela extremidade de um cão que corresponda a um centro motor cortical que se tenha removido ou, em geral, um dispositivo pouco e mal adaptado ao tipo de reação que corresponda (como é o pé de uma pessoa para os movimentos prensores), avançaremos muito pouco no estudo da rapidez, da exatidão, a perfeição da orientação, embora se mantenham intactas a função analisadora e combinatória do sistema nervoso. “Com efeito, nossos experimentos deixam claro – disse Protopopov  – que a formação dos reflexos condicionados é conseguida mais rapidamente com as mãos, como também se obtém a diferença e se mantém de uma maneira mais consistente” (1923, p. 22). Neste sentido, a metodologia da experimentação reflexológica começa a parecer-se notavelmente com a psicologia. O sujeito

pode colocar com facilidade a mão sobre a mesa e os dedos se poem em contato com a placa através da qual passa a corrente elétrica. Portanto, se no estudo dos reflexos do homem vamos mais além do princípio geral y nos colocamos o objetivo de estudar os distintos tipos de reação que determinam o comportamento, a escolha do órgão que reagirá será um fator decisivo. Como afirmou Protopopov, “o homem e o animal dispõem de numerosos aparatos de resposta, mas sem dúvida respondem aos excitantes heterogêneos do meio ambiente com aqueles mais desenvolvidos e melhor  adaptados ao caso em questão” (Ibidem, p. 18). “O homem foge do perigo com os pés, se defende com as mão, etc. Naturalmente, se pode desenvolver no pé um reflexo combinado de defesa, mas o que temos que investigar não só a função combinatória que realiza por si mesmo os grandes hemisférios (= princípio geral – L. V.), mas também estabelecer o grau de rapidez, exatidão e perfeição da orientação, o aparato de resposta escolhido para a observação não será indiferente” (Ibidem). Mas quando dizemos também devemos dizer Protopopov se vê forçado a reconhecer que tampouco se pode deter aqui a reforma. “O homem possui um aparato referente muito mais desenvolvido que a mão no mesmo âmbito motor e com ajuda dele estabelece uma comunicação mais ampla com o mundo que o rodeia: me refiro aqui aos órgãos articulatórios. Considero perfeitamente possível e conveniente que as investigações reflexológicas passem desde de agora a utilizar a locução como objeto, considerando-a como um eixo particular das condições de comunicação que determina a interrelação do homem com o meio circundante através de sua esfera motriz” (Ibidem, p. 22). Que se considere a fala como um sistema de reflexos condicionados é algo que não é necessário repetir, pois para a reflexologia isto constitui uma verdade quase evidente. São também evidentes as vantagens que proporcionará à reflexologia a utilização da fala para ampliar e aprofundar  o círculo de fenômenos para serem estudados. Portanto, em relação ao aparato de resposta, não existem desacordos e divergências com a psicologia. Pavlov apontava as vantagens que tem a escolha precisamente do reflexo de secreção salival nos cães, sabendo que é

a menos arbitrária. Isso era extraordinariamente importante durante a tentativa de descubrir o princípio mesmo dos reflexos condicionados, da “salivação psíquica” que se produz ao ver a comida. Mas as novas tarefas exigem novos meios, os avanços obrigam a mudanças de rota. O segundo e mais importante fato consiste que a própria metodologia da reflexologia tropeçou em determinados fatos que qualquer criança conhece perfeitamente. O processo de diferenciação do reflexo no indivíduo não se conseque rapidamente. Transcorre muito tempo antes de o reflexo se formar e passar de generalizado para diferenciado, isto é, para que o homem aprenda a reagir unicamente ao excitante principal e para que a reação se iniba ante dos outros. “É, portanto, (a ênfase é minha) que se atuar sobre o sujeito com as palavras adequados se pode favorecer tanto a inibição como a excitação das reações condicionadas. Se lhe explicar que um determinado som aparecerá combinado com a corrente elétrica e os restantes não, a discriminação se produzirá de imediato. Com ajuda da palavra como excitante podemos provocar a inibição e o reflexo condicionado pode-se provocar o reflexo condicionado da corrente, basta dizer para não tirar a mão. Por conseguinte, se coloca a palavra adequada na metodologia do experimento para formar a discriminação. Esse mesmo procedimento serve não só para conseguir a inibição, como também para despertar a atividade reflexa. “Se dizemos a palavra ao sujeito para tirar a mão depois de um determinarmos um sinal, o efeito não será diferente quando tira a mão pela corrente através da placa. Protopopov supõe que sempre provocamos a reação desejada. É evidente que, a partir do ponto de vista reflexológico, o fato de tirar  a mão mediante um acordo verbal estabelecido com o sujeito é um reflexo condicionado. E toda a diferença entre esta reação condicionada e a outra elaborada a partir do reflexo da corrente se limita a que neste caso estamos lidando com um reflexo condicionado secundário, enquanto que o outro se tratava de um primário. Mas também reconhece Protopopov que esta circunstância favorece esta metodologia. “É indubitável, diz ele, que no futuro a investigação reflexológica sobre o homem realizará fundamentalmente com ajuda dos reflexos condicionados secundários. E não é uma realidade evidente que serão precisamente os reflexos de ordem superior os que desempenharão

um papel importantíssimo, tanto quantitativa como qualitativamente, no comportamento do homem durante a experimentação e que serão precisamente eles que explicarão o comportamento em sua estática e dinâmica? Mas, com estas suposições: a excitação e a limitação (discriminação) da reação com ajuda de instruções verbais e a utilização de toda classe de reações, incluída a verbal, da palavra, entramos totalmente no campo da metodologia da psicologia experimental. Em seu histórico artigo citado, Protopopov se detém por duas vezes neste ponto. “A organização dos experimentos neste caso... é absolutamente idêntica a que se utiliza há muito tempo na psicologia experimental para investigar as denominadas reações psíquicas simples. A continuação do texto entra “as mais diversas modificações na organização dos experimentos, por  exemplo, cabe também para fins reflexológicos denominado experimento associativo... E, fazendo-o, não só é preciso ter em conta o objeto presente mas descobrir também vestígios de excitações anteriores, incluindo as inibidas” (ibidem).  Apesar do grande estudo que merecem os experimentos psicológicos, o passo do experimento reflexológico clássico e a diversidade da experimentação psicológica, ainda fechada para os fisiologistas, e apesar de traçar com audácia novos caminhos e métodos para a reflexologia, Protopopov deixa no ar  dois pontos muito importantes, que cuja fundamentação e defesa faremos a seguir. O primeiro ponto refere-se à técnica e aos métodos de investigação, e o segundo ponto, aos princípios e objetivos das duas ciências. Ambos estão estreitamente ligados entre si e com os dois guarda relação com um equívoco importante que obscurece o problema. A aceitação desses dois pontos a serem esclarecidos é imposta tanto pelas conclusões logicamente inevitáveis das teses reflexológicas e aceitas, como também, que em breve levantaremos, a condução da evolução adotada por este método. O que ainda falta e impede que a metodologia experimental fisiológica e reflexológica coincidam e se fundem definitiva e totalmente? Tal como afirma Protopopov, só falta uma coisa: o interrogar o sujeito, seu informe verbal sobre o curso de alguns aspectos dos processos e reações, aos que os

experimentadores não podem chegar senão através do testemunho do próprio indivíduo objeto do experimento. É aqui onde parece estar encerrada a essência da discrepância, uma discrepância que a reflexologia não hesita em converter em uma questão decisiva e de princípio. Esse fato esta relacionado com o segundo ponto, o relativo aos objetivos de ambas as cièncias. Protopopov não fala nem uma vez sobre o interrogatório do sujeito. 1.M.

Béjterev (1923) disse repetidamente que do ponto de vista

reflexológico, a investigação subjetiva só é admissível quando se realiza sobre si mesmo. Sem embargo, o interrogatório do sujeito é necessário precisamente do ponto de vista da integridade da investigação reflexológica. De fato, o comportamento do sujeito e a fixação nele de novas reações reflexas são determinadas não só pelas reações (manifestas, totalmente terminadas, aparentes e claramente perceptíveis), como também pelos reflexos não manifestados externamente, semi-inibidos, retidos. Béjterev mostra, com I. M. Séchenov, que o pensamento não é senão um reflexo inibido, retido, um reflexo interrompido em seus dois terços, concretamente no pensamento com palavras, que o caso mais comum de reflexo verbal contido. Surge a pergunta: por que admitimos o estudo dos reflexos verbais em sua integridade e incluímos nesse campo as máximas expectativas e não tomamos em consideração esses mesmos reflexos quando não se manifestam externamente, mas que sem dúvida existe objetivamente? Se pronuncio em voz alta a palavra 'tarde' para que o experimentador ouça, surgida por  associação, é considerada como uma reação verbal, um reflexo condicionado. Mas se pronuncio a palavra para mim, sem que se ouça, a penso, então para de ser um reflexo e se altera sua natureza? E, onde está o limite entre a palavra pronunciada e a não pronunciada? Se move os lábios, se eu emito um balbucio, que o experimentador não percebe, que deve se fazer em tal caso? Poderá pedir-me que repita em voz alta a palavra ou considerará que isso é um método subjetivo, introspecção ou outra coisa proibida? Se isso é viável (e nele coincidiria quase tudo) por que não pode me pedir que diga em voz alta a

palavra pronunciada mentalmente, isto é, murmurando sem mover os l ábios, na medida em que foi e seguiu uma reação motriz, um reflexo condicionado sem o qual não há pensamento? E aqueles já é interrogatório, testemunho verbal e declaração do sujeito a respeito das reações não manifestas, não captadas pelo ouvido do experimentador mas que indubitavelmente tinham existência objetiva com anterioridade (e aí reside toda a diferença entre os pensamentos e a linguagem, só nisso!). Termos muitos meios de confirmar que existiam de fato com todas as categorias de sua realidade materia, e, o que é mais importante, elas mesmas se ocuparam de nos convencer de sua existência. Será colocado de manifesto com tanta força e claridade no curso posterior da reação que obrigaram o experimentador a tomá-las em conta ou renunciar em geral o estudo do curso das reações em que estão inseridas. E existem muitos desses processos de reações, de desenvolvimento de reflexos condicionados onde não se introduzem reflexos inibidos (= pensamentos)? Portanto, ou renunciamos estudar o comportamento da personalidades em suas formas transcendentais ou introduzimos obrigatoriamente em nossos experimentos o controle desses reflexos não manifestados. A reflexologia está obrigada a ter também em conta os pensamentos e a totalidade da psique se quiser compreender o comportamento. A psique é unicamente um movimento inibido, e não só o que objetivamente se pode tocar e que qualquer um pode ver. O que se vê só através do microscópio, do telescópio ou dos raios X também é objetivo. O próprio Béjterev afirma que os resultados das investigações levadas a cabo pela escola de Wurtzburgo no âmbito do “pensamento puro”, nas esferas superiores da psique, coincidem em essência com o que sabemos dos reflexos condicionados. M. B. Krol disse claramente que os novos fenômenos descobertos pelos investigadores de Wurtzburgo no campo do pensamento sem imagens e não-verbal não são outra coisa que os reflexos condicionados pavlovianos. E que o trabalho tão minucioso que é requerido precisamente para a análise dos informes e testemunhos verbais dos sujeitos só para chegar a conclusão de que o ato mesmo do pensamento escapa pela introspecção, que eoncontramos aqui, preparado, não tem lugar  em informes ou, o que é o mesmo, é um reflexo puro!

Escusado será dizer que o papel desses informa e interrogatórios verbais, e o valor que lhe são concedidos tanto pela investigação reflexológica como pela psicológica de caráter científico, não coincidem integralmente com as atribuições que lhes davam os psicólogos subjetivistas. Como devem ser  considerados pois pelos psicólogos objetivistas e qual é seu papel e sua importância em um sistema de experimentação rigorosa e cientificamente verificáveis? Os reflexos não existem isoladamente, nem atuam de uma maneira dispersa, mas se estruturam em complexos, em sistemas, em complicados grupos e formações que determinam o comportamento do homem. As leis que regem a estruturação dos reflexos em complexos, os tipos que adotam estas formações, as variedades e formas de interação dentro deles e de interação entre a totalidade dos sistemas, todas elas são questões de primordial importância dentro dos graves problemas com que se enfrenta a psicologia científica do comportamento. A doutrina dos reflexos só está em seus inícios e todavia não investigou em todos os seus âmbitos. Mas podemos falar da indubitável interação entre sistemas isolados de reflexos, da influência de uns sistemas em outros e inclusive aproximarmos de uma explicação dos traços, por enquanto gerais e brutos, que regem o mecanismo dessa influência. O mecanismo seria este: em um reflexo qualquer, sua própria parte reativa (movimento, secreção) se converte em excitante de um novo reflexo do mesmo sistema ou de outro sistema. Embora não se tenha podido encontrar esta formulação em nenhum reflexólogo, sua verdade é tão patente que sua ausência só é explicada porque todos a subentende e a aceita tacitamente. O cão reage ao ácido clorídrico secretando saliva (reflexo), mas a própria saliva constitui um novo excitante para o reflexo da deglutição ou para a expulsar para fora. Em uma associação livre, em resposta à palavra “rosa”, que atua como excitante, pronuncio “capuchina”. Se trata de um reflexo, que é por sua vez um excitante da palavra seguinte: “ranúnculo”. (Tudo isso ocorre dentro de um mesmo sistema ou de sistemas próximos, que colaboram). O uivo de um lobo provoca em mim, como excitante, reflexos somáticos e mímicos de temor; a mudança na respiração, as palpitações do coração, tremores, a garganta seca me fazem concluir: “Eu

tenho medo”. Portanto, um reflexo pode desempenhar um papel de excitante a respeito de outro reflexo do mesmo sistema ou de um sistema diferente e provocar também como excitante externo (de outros). E, nesse sentido, podese considerar que a própria relação entre reflexos está submetida a todas as leis de formação dos reflexos condicionados. De acordo com uma lei dos reflexos condicionados, um reflexo entre em conexão com outro convertendose, em determinadas circunstâncias, em seu excitante condicionado. Esta é a primeira lei, evidente e fundamental, da relação entre os reflexos. Este mecanismo é o que permite compreender os traços muito aproximados e gerais do valor (objetivo) que pode ter a investigação científica dos testemunhos verbais dos sujeitos em prova. Os reflexos não manifestados (fala silenciosa), os reflexos internos, inacessíveis à percepção direta do observador, muitas vezes podem se manifestar indiretamente, de forma mediada, através de reflexos acessíveis à observação a respeito dos quais desempenham o papel de excitantes, através da presença de reflexo completo (a palavra) estabelecemos o correspondente excitante, que neste caso desempenha um duplo papel: de excitante a respeito ao reflexo completo e de reflexo a respeito ao excitante anterior. Seria um suicídio para a ciência que, dado o enorme papel que desempenha precisamente a psique, isto é, o grupo dos reflexos inibidos, na estrutura da conduta, renunciar a aceder a ela através de um caminho indireto: sua influência em outros sistemas de reflexos. (Recordemos a doutrina de Béjterev sobre os reflexos internos, externointernos, etc. E mais se levamos em conta que com frequência dispomos de excitantes internos, que não estão à vista; que permanecem ocultos nos processos somáticos e que, sem embargo, podem ser desvelados através dos reflexos produzidos por eles. A lógica é neste caso a mesma e idêntica ao funcionamento dos pensamentos e sua manifestação material). Interpretado desse modo, o informe do sujeito não constitui de modo algum em ato de introspecção que vem a fechar sua gota de amargura em um barril de mel da investigação científica. Não se trata de introspecção. Nem o sujeito adota de modo algum a posição do observador nem ajuda o experimentador a buscar reflexos ocultos. O exame se mantém até o final como objeto do experimento, mas tanto nele como no próprio informe se

introduz mediante perguntas algumas variações, transformações, se introduz um novo excitante, um novo reflexo que aporta elementos de juízo sobre as partes não esclarecidas das perguntas anteriores. Parece como se se sobmetivesse o experimento a um duplo objetivo. Mas também a própria consciência toma como consciência nossos atos e estados devem ser  interpretados como um sistema de mecanismos transmissores de uns reflexos a outros que funcionam corretamente, em cada momento consciente. Quanto maior seja o ajuste com que qualquer reflexo interno em qualidade de excitante provoque uma nova série de reflexos procedentes de outros sistemas e se transmita a outros sistemas, mais capazes seremos de termos em conta em nós mesmos nossas sensações, de comunicá-las e vivê-las (sentir, fixar numa palavra, etc.). Ter em conta significa transferir uns reflexos a outros. O inconsciente psiquicamente reside em uns reflexos não serem transmitidos a outros sistemas. Podem existirem graus de consciência, ou seja, interações entre sistemas dentro do mecanismo do reflexo que atua, de diversidade infinita. A consciência das próprias sensações não significa outra coisa que o fato que atuam como objeto (excitante) de outras sensações. A consciência é a sensação das sensações, assim como as sensações simples são a sensação dos objetos. Mas precisamente a capacidade do reflexo (sensação do objeto) de ser um excitante (objeto de sensação) de um novo reflexo (nova sensação) converte-o a este mecanismo de consciência de uma transmissão de reflexos de um sistema a outro. Isso equivale mais ou menos à denominação que Béjterev faz com reflexos subordinados e não subordinados. Em particular, esta interpretação da consciência está confirmada pelos resultados das investigações da escola de Wurtzburg, que estabeleceu entre outras coisas a impossibilidade de observar  o próprio ato de pensar (não se pode pensar o pensamento), porque escapa à percepção; ou seja, não pode atuar como objeto de percepção (excitante) para si mesmo, porque se trata de fenômenos de ordem e natureza distintos dos tantos processos psíquicos que podem ser observados e percebidos (da mesma maneira que podem atuar como excitantes para outros sistemas). E, em nossa opinião, o ato da consciência não é um reflexo, como tampouco pode

ser um excitante, mas é um mecanismo de transmissão entre sistemas de reflexos. Com esta interpretação, que estabelece uma diferença metodológica radical e de princípio entre o informe verbal do sujeito e a introspecção, muda radicalmente, como é óbvio, a natureza científica do slogan como qualidade de sistema de excitantes condicionados, é provocar previamente os reflexos de orientação necessários que determinaram o curso ulterior da reação e dos reflexos de orientação dos mecanismos transmissores, precisamente daqueles mecanismos que se colocam em jogo no curso do experimento. Neste caso, o slogan que se dirige aos reflexos secundários, reflexos de reflexos, não se diferenciam basicamente em nada dos reflexos primários. No primeiro caso: basta dizer a palavra que pronunciou em seu interior. No segundo: tire a mão. Prossigamos. O mesmo interrogatório não consiste em tirar da língua do sujeitos suas vivências. A questão é radicalmente distinta em princípio. A pessoas submetida a prova não é mais uma testemunha que diz ter  testemunhado um crime (seu antigo papel), mas que é o próprio criminoso, e, o que é mais importante, no momento do crime. Não se trata de um interrogatório depois do experimento; é uma parte orgânica, integrante, do mesmo, e não se diferencia em nada daquele, salvo na utilização dos próprios dados no curso do experimento. O interrogatório não é uma superestrutura do experimento, mas o mesmo experimento que ainda não terminou e que prossegue. Daí o interrogatório se construir no como uma palestra, um discurso, como o interrogatório de um fiscal, mas como um sistema de excitantes, em que se tenha levado em conta exata cada som e se escolham rigorosamente tão só aqueles sistemas de reflexos brilhantes, que no experimento podem ter  certamente indubitável valor científico e objetivo. Por isso é porque todo sistema de modificações (a surpresa, o método gradual, etc.) do interrogatório é de grande importância. Devem criar um sistema y uma metodologia de interrogatório estritamente objetivos, como parte dos excitantes introduzidos no experimento. E é evidente que a introspecção não organizada, o mesmo que a maioria dos testemunhos, não podem ter um objetivo. Precisa-se saber o que perguntar. Quando os vocábulos, as

definições, os termos e os conceitos são vagos não podemos relacionar, através de um procedimento objetivamente confiável, o testemunho que o sujeito oferece do “leve sentimento de dificuldade” com o reflexo -excitante objetivo, provocado por este testemunho. Mas seu testemu nho: “perante a palavra trovão pensou em relâmpago” pode ter um valor completamente objetivo para o estabelecimento indireto do fato de que a palavra “trovão” reagiu com o reflexo não manifestado “relâmpago”. Por conseguinte,

é necessária uma reforma na utilização do

interrogatório e dos slogans e no controle dos testemunhos do sujeito. Eu sustento que é possível criar em cada caso individual uma metodologia objetiva que transforme o interrogatório do sujeito em um experimento científico rigorosamente exato.  Aqui, gostaria de destacar dois aspectos: um, que limita o que disse anteriormente, e outro, que amplia seu valor. O sentido limitador destas afirmações é claro por si só: esta modificação do experimento é aplicável a uma pessoa adulta normal, capaz de compreender e falar nossa linguagem. Mas não a um recém-nascido, nem a um enfermo mental, nem a um criminoso que oculta algo, faremos um interrogatório. E não o faremos precisamente porque o emaranhamento de um sistema re reflexos (consciência) e a tranmissão destes ao sistema verbal, ou não está bem desenvolvido neles ou está interrompido por doença, ou inibida e retida por outros complexos de reflexos mais potentes. Mas no caso de um adulto normal que consentiu voluntariamente em realizar a prova, o experimento é insubstituível. De fato, é fácil distinguir no homem um grupo de reflexos, cuja denominação correta seria a de sistema de reflexos de contato social (A. B. Zalkind). Se trata de reflexos que reagem a excitantes que por sua vez são criados pelo homem. A palavra ouvida é um excitante, a palavra pronunciada é um reflexo que cria esse mesmo excitante. Estes reflexos reversíveis, que originam uma base para a consciência (emaranhamento de reflexos) servem de fundamento para a comunicação social e para a coordenação coletiva do comportamento, o que indica, entre outras coisas, a origem social da consciência. De toda a massa de excitantes, destaca claramente para mim um

grupo: o dos estímulos sociais, que procedem das pessoas; e se destacam porque eu mesmo posso reproduzir esses excitantes, porque para mi se converte muito rápido em reversíveis e, por conseguinte, em comparação com os restantes, determinam meu comportamento de forma distinta. Eles me fazem parecer, a mim mesmo, me identificam comigo mesmo. No sentido amplo da palavra, é na fala onde reside a fonte do comportamento e da consciência. A fala constitui, por um lado, um sistema de reflexos de contato social e, por outro, o sistema preferido dos reflexos da consciência, ou seja, que servem para refletir a influência de outros sistemas. Por isso reside aí a raiz para a solução do enigma do “eu” do outro, do conhecimento da psique dos outros. O mecanismo da consciência do um mesmo (autoconhecimento) e do reconhecimento dos outros é idêntico, temos consciência do nós mesmos, porque temos dos outros pelo mesmo mecanismo, porque nós somos com respeito a nós o mesmo que os outros com respeito a nós. Nos reconhecemos a nós mesmos só na medida em que somos outros para nós mesmos, isto é, porquanto somos capazes de perceber  de novo os reflexos próprios como excitantes. Entre o mecanismo que me permite repetir em voz alta a palavra pronunciada mentalmente e o de que possa repetir isso com outra palavra, não há basicamente diferença alguma: em ambos os casos se trata de um reflexo-excitante reversível. Po isso, é no contato social entre o experimentador e o sujeito onde esse contato se desenvolve com normalidade (uma pessoa adulta, etc.). O sistema de reflexos do sujeito oferece ao experimentador a autenticidade de um fato científico, sempre e quando se cumpram as condições de certeza, necessidade e globalidade que caracterizam um sistema de reflexos em estudo. O segundo aspecto, que amplifica o exposto anteriormente, pode ser  expressado do seguinte modo. O interrogatório do sujeito com o fim de estudar  e controlar de um modo totalmente objetivo os reflexos não manifestados, é uma parte necessária em qualquer investigação experimental de uma pessoa normal em estado de vigília. Não falamos aqui do testemunho introspectivo de sensações subjetivas, que Béjterev tinha direito em conceder um valor  unicamente complementário, colateral, auxiliar, mas de uma fase objetiva da experimentação, uma fase de verificação dos dados obtidos nas fases

anteriores, da qual quase nenhum experimento pode prescindir. Com efeito, a psique em geral desempenha nos organismos superiores e no homem um papel de complexidade reflexa crescente e o fato de não estudar isso significa renunciar a análise (precisamente a uma análise objetiva e não unilateral, subjetiva ao revés) do comportamento humano. Não houve nenhum caso de provas realizadas com sujeitos normais em que o fator dos reflexos inibidos, da psique, não tenha determinado de uma forma ou de outra o comportamento do sujeito e tenha podido portanto ser eliminado do fenômeno em estudo ou não tido absolutamente em conta. Não há nenhum ato do comportamento durante o experimento que, junto dos reflexos percebidos, não se escapem outros que não estão ao alcance da vista ou do ouvido. Isto é, não há nenhum caso que possamos renunciar esta parte do experimento, apenas a título de verificação. Se um sujeito diz que não compreendeu o slogan, não tomaria este reflexo verbal como a prova inequívoca de que seu excitante não provocou os reflexos de orientação que necessita? E se perguntar: “compreendeu o slogan?”, acaso essa precaução não implica recorrer à palavra emitida em sua totalidade como reflexiva de reflexos, como prenhe de uma série de reflexos inibidos? E quando uma reação tenha demorado muito, não leva em conta o experimentador uma declaração do sujeito desse tipo: “Recordei um assunto desagradável para mim”? Etc. Na medida em que se trata de um método imprescindível, podemos encontrar milhares de casos eu que não se utiliza cientificamente. E acaso não seria útil dirigir ao sujeito depois de uma reação demorada mais do que o normal ao levar em conta outras experiências para perguntar “Estava pensando em outras coisas durante o experimento?”, para obter a resposta: “Sim, estava pensando todo o tempo se tenho estado bem em outras coisas.” e não nesses lamentáveis casos é útil e necessário recorrer ao testemunho do sujeito. Para determinar os reflexos de orientação, para ter em conta os reflexos ocultos necessários que causamos em nós mesmos para verificar que não tenha reflexos estranhos e para outros mil objetivos é necessário recorrer a uma metodologia de interrogatório cientificamente elaborada, em lugar de se utilizar de palestra e conversas que inevitavelmente infiltram no experimento. Mas é óbvio que esta metodologia requer complexas modificações para cada caso.

Para terminar esta questão e passar para a outra, estreitamente relacionada com ela, é oportuno assinalar que os reflexólogos que adotam a metodologia da psicologia experimental em sua integralidade omitem precisamente este aspecto, por considerá-lo supérfluo e não ajustado aos princípios do método objetivo, etc. Neste sentido oferece grande interesse a recompilação “Novas ideias na medicina” (1924, n. 4), onde há uma série de artigos que perfilam uma linha de desenvolvimento metodológico na direção marcado por Protopopov, com a particularidade de excluir o interrogatório. A mesma coisa acontece na prática. Quando a escola pavloviana passou a realizar experimentos com seres humanos, reproduziu integralmente o método psicológico sem recorrem ao interrogatório. Não será esta a razão para a explicação da escassez de conclusões e a pobreza de resultados das investigações que temos ouvido nos informes experimentais apresentados neste congresso? O que pode acrescentar à verificação do princípio geral, estabelecido há muito e de maneira eloquente, é que os reflexos nos seres humanos se estabelecem com maior rapidez do que nos cães? Isso conhecemos sem necessidade de recorrer a experimentos. A constatação do evidente e a repetição do ABC do que é desconhecido é sempre um atributo de todo investigador que não deseja modificar radicalmente os métodos de seu trabalho. Tenho a tarefa neste trabalho de elaborar um esquema estrutural de um método científico-objetivo comum para a investigação e a experimentação do comportamento humano e sua defesa de um ponto de vista teórico. Mas como disse, esta questão técnica tem estreita relação com outra discrepância de caráter teórico, sobre a qual insistem os reflexólogos, inclusive aqueles que reconhecem a unidade de método dos psicólogos. Protopopov se expressa assim: “A inclusão no método [da reflexologia] dos procedimentos de análise de que se utiliza a psicologia experimental tem sido o desenvolvimento natural da própria reflexologia e não significa de modo algum a transformação desta última em psicologia. O gradual aperfeiçoamento do método reflexológico tem conduzido casualmente (a afirmação é minha) a essas modalidades de investigação que apresentam semelhanças somente externas (a afirmação é minha) com as que se aplicam na psicologia. Os princípios, o objeto e as

tarefas das duas disciplinas continuam sendo totalmente distintos. Na psicologia estuda-se os processos psíquicos como vivências anímicas em sua manifestação objetiva”..., etc. (1923, p. 25-26). O que segue é conhecido por  todos os leitores de obras de reflexologia.  Acredito que não é difícil demonstrar que essa aproximação não é casual e que a semelhança de formas de análise não é só externa. Na medida em que a reflexologia trata de explicar a totalidade do comportamento do homem tem que utilizar inevitavelmente o mesmo material que a psicologia. A pergunta se coloca assim: “Pode a reflexologia fazer caso omisso da psique e não levá-la em conta para nada no sistema de reflexos inibidos e rede de diferentes sistemas? Cabe explicar cientificamente o comportamento do homem sem recorrer à psique? Deve a psicologia sem alma, a psicologia sem metafísica alguma, converter-se em psicologia sem psique, em reflexologia? Do ponto de vista biológico, seria absurdo supor que a psique é totalmente desnecessária para o sistema da conduta. Ou aceitamos tão evidente absurdo ou negamos a existência da psique. Mas isso não são partidários os fisiólogos mais extremistas: nem Pavlov, nem Béjerev. Pavlov disse claramente que “nossos estados subjetivos constituem uma realidade primordial, que regem nossa vida cotidiana e condicionam o progresso da convivência humana. Mas uma coisa é viver de acordo com estados subjetivos e outra é analisar seus mecanismos do ponto de vista verdadeiramente científico” (1951). De sorte que há uma realidade primordial que rege nossa vida cotidiana (e isso é essencial), e, sem embargo, a investigação objetiva da atividade nervosa superior  – o comportamento – pode prescindir do controle dessa instância diretriz do comportamento, isto é, da psique. Basicamente, disse Pavlov, na vida só nos interessa uma coisa: nosso conteúdo psíquico. O que preocupa mais o homem é a consciência e os tormentos dela. O próprio Pavlov reconhece que é impossível não prestar  atenção (aos fenômenos psíquicos) porque estão estreitamente unidos aos fenômenos fisiológicos e determinam o funcionamento íntegro do organismo. Pode renunciar esse fato ao estudo da psique? E o próprio Pavlov colocou muito bem o papel de cada ciência, quando disse que a reflexologia estuda o

fundamento da atividade nervosa e a psicologia, a superestrutura. “E como o simples, o elementar, é compreensível sem o complexo, ao mesmo tempo que é impossível analisar o último sem o primeiro, daí a nossa posição ser a melhor, pois o sucesso de nossas investigações não depende em absoluto de outras. Creio que, pelo contrário, nossas investigações devem dar mais importância para a psicologia, para constituírem posteriormente o principal fundamento da psicologia” (Ibidem, p. 105). Qualquer filósofo corroborará que a reflexologia é o princípio geral, o fundamento. Resta agora, enquanto estavam construindo a base, comum para os animais e o homem, quando se tratava do simples e do elementar, não era necessário contar com o psíquico. Mas isso era um fenômeno temporário: quando os vinte anos de experiência da reflexologia passou a trinta, a situação vai variar. E eu parti da tese de que a crise da metodologia começa nos reflexólogos precisamente quando passam dos fundamentos; do elementar e do simples, para uma estrutura superior, para o complexo e sutil. Béjeterev (1923) se mostra todavia mais decidido, mais determinado ou, dito de outra maneira, adota uma postura mais inconsequente e intrinsecamente contraditória. Seria um grande erro pensar, reconhecer, que os processos subjetivos são por natureza fenômenos completamente supérfluos ou colaterais (epifenômenos), já que sabemos que nela tudo o que é supérfluo se atrofia e se destrói, enquanto que a nossa própria experiência nos diz que os fenômenos alcançam o máximo desenvolvimento em processos mais complexos de atividade correlativa. É possível excluir o estudo daqueles fenômenos que alcançam seu máximo desenvolvimento nos processos mais complexos de atividade correlativa, numa ciência que precisamente faz dessa atividade correlativa o objeto do seu estudo? Mas Béjterev não deseja uma psicologia subjetiva, mas que a exima da reflexologia. Porque é evidente para qualquer pessoa que aqui cabe adotar uma das seguintes alternativas: o bem explicar a totalidade da atividade correlativa sem a psique, um fato reconhecido por Béjterev, em cujo caso, esta última se converte em um fenômeno colateral, coisa que ele mesmo nega; ou essa bem explicação é impossível, em cujo caso se deve admitir a psicologia subjetiva, deslindando-a da ciência do comportamento, etc. Em lugar 

de optar por uma ou outra alternativa, Béjterev fala da mútua relação de ambas as ciências, de sua possível aproximação no futuro; mas como ainda não chegou esse momento, supõe que por enquanto podemos manter no âmbito de umas relações mútuas estreitas entre ambas as disciplinas científicas. Béjterev fala ainda da possível e inevitável construção no futuro de uma reflexologia que se ocupe especificamente do estudo dos fenômenos subjetivos. Mas se a psique é inseparável da atividade correlativa e alcança seu máximo desenvolvimento precisamente em suas formas superiores, como é possível estudá-los em separado? Isso seria possível se se reconhecesse que as duas faces do problema têm uma natureza e uma essência diferenciadas, como tem sustentado insistentemente a psicologia. Mas Béjterev rejeita a teoria do paralelismo e a interação psicológica e afirma precisamente a unidade dos processo psíquicos e nervosos. Fala muitas vezes da correlação entre os fenômenos subjetivos (psique) e os objetivos, mantendo-se veladamente sempre no âmbito do dualismo. Para este, a psicologia experimental não é aceitável precisamente porque recorre à introspecção para estudar o mundo interior, a psique. Béjterev propõe que sua investigação seja analisada sem levar em conta os processos da consciência. No que se refere aos métodos disse claramente que a reflexologia utiliza métodos objetivos específicos. Por certo, a respeito dos métodos vimos que a própria reflexologia reconhece que coincidem plenamente com os da psicologia. Em resumo, duas ciências que têm o mesmo objeto de análise: o comportamento do homem, que utilizam para tanto os mesmos métodos, continuam, não obstante, apesar de tudo, sendo duas ciências distintas. O que as impede de fundir-se? Fenômenos subjetivos ou psíquicos, repetem aos quatro cantos os reflexólogos. E em que consistem os fenômenos subjetivos: o psíquico? Entre os possíveis enfoque sobre esta questão, que é decisiva, a reflexologia adota a posição do mais puro idealismo e dualismo, cuja denominação correta seria a de idealismo à inversa. Para Pavlov se trata de fenômenos sem causa e que não ocupam lugar; para Béjterev carecem de existência objetiva alguma, já que só podem ser estudados dentro deles

mesmos. Mas, tanto Béjterev como Pavlov sabem que estes fenômenos regem nossa vida. Não obstante, veem-nos, no psíquico, algo distinto, que deverá ser  investigado independentemente, dos reflexos, como se dever ser investigados separadamente do psíquico. Estamos, naturalmente, diante de um materialismo de puro-sangue: renunciar à psique. Mas só é um materialismo em um âmbito: o seu. Fora dessa área, atua como idealismo de puro-sangue, separando a psique e seu estudo do sistema geral de conduta do homem.  A psique não existe fora do comportamento, assim como este não existe sem aquela, embora apenas seja porque se trata do mesmo. Na opinião de Béjterev, os estados subjetivos, os fenômenos psíquicos, existem na tensão da corrente nervosa, no reflexo (anotem isto!) da concentração, ligado à retensão da corrente nervosa, quando se estabelecem novas ligações. Que fenômenos tão misteriosos são estes? Não está claro aqui que também eles são reações do organismo, mas refletidos por outros sistemas de reflexos, a linguagem, a emoção (reflexo mímico-somático) e outros? O problema da consciência dever  ser levantado e resolvido pela psicologia na medida em que se trata de uma interação, um reflexo, uma autoexcitação, de diferentes sistemas de reflexos. É consciente o que se transmite em qualidade de excitante a outros sistemas e produz neles uma resposta. A consciência é o aparato de resposta. É por isso que os fenômenos subjetivos unicamente estão ao meu alcance, só eu os percebo como excitantes de meus próprios reflexos. Neste sentido tem muita razão W. James, que mostrou em uma brilhante análise que nada nos obriga a admitir o fato da existência da consciência como algo independente do mundo, apesar de não negar nem nossas vivências nem a consciências destas. Toda a diferença entre a consciência e o mundo entre o reflexo ao reflexo e o reflexo ao excitante reside só no contexto dos fenômenos. O mundo está no âmbito dos excitantes; a consciência, no de meus reflexos. Nesta janela é um objeto (o excitante de meus reflexos); a mesma janela, com as mesmas qualidades, é minha sensação (um reflexo transmitido a outros sistemas). A consciência é o reflexos dos reflexos.  Ao afirmar que também a consciência deve ser interpretada como uma reação do organismo a suas próprias reações, se vê obrigado a ser mais reflexólogo do que o próprio Pavlov. O que vai se fazer; se se quer ser 

coerente, às vezes tem que estar contra a indecisão e ser mar papista que o papa e mais monárquico que o rei. Os reis não são sempre bons monárquicos. Quando a reflexologia exclui os fenômenos psíquicos do círculo de suas investigações como algo que não é de sua competência atua igual à psicologia idealista, que estuda a psique prescindindo de tudo o mais, como um mundo encerrado em si mesmo. Na verdade, raramente tem excluído a psicologia de seu âmbito o aspecto objetivo dos processos psíquicos e não só tem se fechado no círculo da vida interior, como se fosse uma ilha desabitada de espírito. Os estados subjetivos, isolados do espaço e de suas causas, não existem por si mesmos. E, portanto, tampouco pode existir uma ciência os estude. Estudar o comportamento da pessoa sem a psique, como quer a reflexologia, é tão impossível como estudar a psique sem o comportamento. Não é possível portanto sitiar essas duas ciências distintas. E não é preciso ser  muito perspicaz para dar-se conta de que a psique é essa mesma atividade correlativa, que a consciência é uma atividade correlativa dentro do próprio organismo. O estado atual de ambos os ramos do saber sugere claramente que a integração de ambas as ciências não só é necessária como também frutífera. A psicologia está vivendo uma séria crise no Ocidente e na URSS. Para James não é mais um monte de matérias brutas. N. N. Langue compara a situação da psicologia com a de Príamo nas ruínas de Troia (1914, p. 42). tudo está derrubado, esse é o resultado da crise e não só na Rússia. Mas também a reflexologia foi a um beco sem saída, depois de ter levantado os fundos. Uma ciência não pode prescindir da outra. É necessário e urgente elaborar uma metodologia científica comum, um levantamento comum dos problemas mais importantes que cada ciência em separado não pode fazer, não só levantar, como sequer resolver. E se não parece claro que possa construir a superestrutura salvo que se disponha de fundações, tampouco os construtores disso, uma vez que tenham terminado, possam colocar uma só pedra sem comprovar as diretrizes e o tipo de edifício que querem levantar. Temos de falar claro. Os enigmas da consciência, da psique, não podem ser elucidados com subterfúgios, nem metodológicos nem teóricos. Não pode dar um rodeio para deixar a consciência de lado. James perguntou se a

consciência existia e respondeu que a respiração sim, disso estava seguro, mas sobre a consciência, a colocava em dúvida. Mas esta abordagem da questão é gnosiológica. Psicologicamente a consciência é um fato indubitável, uma realidade primordial e um fato, não secundário, nem casual, de enorme importância. Ninguém o discute. Podemos adiar o problema, mas não eliminálo por completo. Na nova psicologia as coisas não marcharam bem depende que nos elevemos audaz e claramente o problema da psique e da consciência e basta que não o resolvamos experimentalmente apenas, mas seguindo um procedimento objetivo. Quando surguem os riscos conscientes dos reflexos, qual é o seu significado biológico, são perguntas que temos de levantar, e temos de nos preparar para resolvê-las experimentalmente. O problema reside simplesmente em levantar corretamente a questão, e a solução chegará mais cedo ou mais tarde. Em um arrebato “energético”, Béjterev atinge o pampsiquismo, ao atribuir dimensão pessoal a plantas e animais; em outro lugar não se decide em rejeitar a hipótese da alma. A reflexologia não abandonará esse estado de primitiva ignorância sobre a psique enquanto se manter afastado dela e continuar fechado no estreito círculo do materialismo fisiológico. Ser materialista em fisiologia não é difícil. Mas provar ser  materialista na psicologia e, se não conseguir, continuará sendo idealista. Recentemente o problema da introspecção e de seu papel na investigação psicológica tem se agudizado extraordinariamente sob a influência de dois fatores: Por um lado, a psicologia objetiva que, antes aparentemente tenha em um primeiro momento rejeitado o plano da introspecção, considerando-a um método subjetivo, ultimamente aventura algumas tentativas para encontrar um valor objetivo no que de denomina de introspecção. J. Watson, a Weiss e outros têm começado a falar de uma “conduta verbal” e re lacionam a introspecção com o funcionamento deste aspecto verbal de nosso comportamento; outros falam de “conduta interna”, de “conduta verbal” manifesta, etc. Por outro lado, a nova tendência da psicologia alemã, a denominada “psicologia da gestalt” (W. Köhler, K. Koffika, M. Wertheimer e outros), que alcançou nos últimos três, quatros anos enorme importância, tem intervido com

uma violenta crítica nas frentes, acusando tanto a psicologia empírica quanto o behaviorismo, do mesmo pecado: de sua incapacidade para estudar mediante um método único (objetivo ou subjetivo) o comportamento real, vital, do homem  Ambos fatores reúnem mais o problema do valor da introspecção e obrigam, portanto, a analisar sistematicamente as formas, essencialmente diferentes, de introspecção a que estas três partes em discussão se referem. Trataremos nas seguintes linhas de sistematizar o problema, embora devemos fazer previamente algumas observações de caráter geral. Em primeiro lugar, devemos assinalar que a solução primeiro há de darse dentro da crise cada vez mais patente da própria psicologia empírica; nada mais falso que pretender que a crise que parece ter cindido em dois campos a ciência russa é tão só uma crise local, própria da Rússia. A crise se estende hoje por toda a psicologia universal. O aparecimento de uma escola psicológica (a psicologia da gestalt), surgida dentro da psicologia empírica, é uma boa prova

disso.

De

que

acusam

estes

psicólogos

a

introspecção?

Fundamentalmente de que com este método de estudo os fenômenos psíquicos se convertem inevitavelmente em subjetivos, porque a introspecção, que exige atenção analítica, arranca sempre o objeto a observar do nexo em que aparece e o muda para um novo sistema, “ao sistema do sujeito”, “ao eu” (K. Koffka. 1924). nessas circunstâncias, as vivências se convertem, inevitavelmente, em subjetivas. Koffka compara a introspecção, capaz unicamente de observar sensações claras, com os óculos e a lupa, para cuja ajuda recorremos quando não podemos ler uma carta. Mas enquanto a lente de aumento não modifica o próprio objeto, mas ajuda a vê-lo mais claramente, a introspecção modifica o objeto a observar. Ao comparar os pesos, Koffka disse, a descrição psicológica verdadeira não deverá ser, segundo este ponto de vista, “este objeto é mais pesado que aquele”, mas “a minha sensação de peso se intensificou”. Deste modo o objetivo se transforma em subjetivo com este método de investigação. Os novos psicólogos reconhecem também o heroico fracasso da escola de Wurtzburgo e a impotência da psicologia empírica (experimental). A verdade é que também reconhecem a esterilidade do método puramente objetivo e propõem uma perspectiva funcional e integral. Para estes psicólogos os

processos conscientes “são unicamente processos parciais de grandes configurações”; por isso, e continuando com sua posição, “após a parte consciente de um processo maior  – ou seja, a configuração  – após os limites de sua consciência”, submetemos nossas teses para a comprovação funcional com fatos objetivos. Os psicólogos que reconhecem que a introspecção não constitui o método fundamental, principal, da psicologia, se limitam a falar só daquela introspeção real, autêntica, ou seja, comprovada através de consequências extraídas funcionalmente dela e confirmada por fatos. Vemos, por conseguinte, que se, por um lado, a reflexologia russa e o behaviorismo norte-americano tentam encontrar uma “introspecção objetiva”, os melhores representantes da psicologia empírica buscam também uma “introspecção real”, fidedigna. Para responder a pergunta de em que consistiria tal coisa é pelo que há de intentar sistematizar todas as formas de introspecção e estudar cada uma delas em separado. Podemos distinguir cinco formas principais. 1. A instrução à pessoa submetida a prova. Isso é, naturalmente, em parte uma introspecção, já que pressupõe a organização consciente, interna, do comportamento dessa pessoa. Quem intente evitá-la nos experimentos com sujeitos humanos cometerá um erro, porque substituirá as consignas manifestas, e que portanto se tinha em conta, pela instrução da pessoa em questão, pela consigna inculcada pelas circunstâncias do experimento, etc. É duvidoso que atualmente tenha alguém que negue a necessidade da consigna. 2. Manifestações da pessoa submetida a prova, relativas ao objeto externo. Por exemplo, quando se mostram os círculos: “este é azul, aquele, branco”. Este tipo de introspecção, que se comprova sobre o todo recorrendo à mudança funcional de toda uma série de excitantes e declarações (não é um círculo azul, mas uma série de círculos que escurecem paulatinamente), também pode resultar fidedigna.

3. As declarações da pessoa submetida a prova sobre suas próprias reações internas: “Dói-me, sinto-me bem”, etc. É uma forma menos fidedigna de introspecção, ainda que resulta aceitável à comprovação objetivo e pode ser admitida. 4. A descoberta de uma reação oculta, a pessoa submetida a prova diz um número que lhe ocorreu; conta como está colocada a língua dentro de sua boca; repete uma palavra que tem pensado, etc. Esta é a variedade de descoberta indireta da reação, que defendemos no presente artigo. 5. Finalmente, a descrição detalhada por parte da pessoa submetida à prova de seus estados internos (metodologia de Wurtzburgo). Constitui a variedade de introspecção menos fidedigna e mais inacessível para comprovação. Aqui, a pessoa submetida à prova coloca-se na situação de observador auxiliar; o observador  (observer , como dizem os psicólogos ingleses) passa a ser neste caso o sujeito e não o objeto do experimento; o experimentador  limita-se ao papel de indagador e protocolista. Aqui, em lugar de fatos, oferecem-se teorias preparadas. Tenho a impressão de que o problema do valor científico que cabe atribuir à introspecção tem de se resolver de forma análoga a como resolvemos a do valor prático dos testemunhos da vítima e do culpado na instrução de um sumário. São parciais, isso o sabemos a priori e por isso encerram elementos de falsidade; inclusive pode ocorrer que sejam totalmente falsos. Por isso, é absurdo se fiar deles. Mas isso significa que não devemos os escutar em geral durante o processo e prescindamos de interrogar às testemunhas. Isso tampouco seria inteligente. Escutamos ao processado e à vítima, verificamos, confrontamos, recorremos a provas materiais, a documentos, impressões, depoimentos de testemunhas, aqui também há testemunhos falsos, e desse modo estabelecemos o fato. Não há que esquecer que existem muitas ciências que não podem estudar o assunto recorrendo à observação direta. Os historiadores e os geólogos restabelecem fatos que já não existem, através de métodos indiretos e, no entanto, estudam, em fim de contas, fatos que existiram e não

impressões e documentos que têm ficado e se conservaram. O psicólogo encontra-se com frequência na mesma situação que o historiador e o arqueólogo e atua então como o detetive que pesquisa um crime que não presenciou.

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