O Nascimento de uma Nova Física De Copérnico a Newton.pdf

September 24, 2017 | Author: Franco Zé | Category: Isaac Newton, Aristotle, Physics, Physics & Mathematics, Motion (Physics)
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O Nasctmento de wma Nova Física é um assunto relacionado com o interésse profissional de I. Bernard Cohén, da Universi...

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I. BERNARD COHEN

O nascimento de uma nova física De Copérnico a Newton

m E D A R T - S a O P A U L O — L IV R A R IA E D ITO R A L T D A . SAO_RAIII.fi

A SÉRIE E STU D O S D E CIÉNCIA

A Série Estudos de Ciencia (The Science Study Series) oferece aos estudantes e ao público em geral obras de autores famosos, que tratam dos assuntos mais excitantes e fundamentáis da Ciéncia, desde a menor das partículas conhecidas até o Uni­ verso inteiro. Alguns dos livros tratam do papel que a Ciéncia desempenha no mundo do homem, sua tecnología e civilizaqáo. Outros sao de cunho biográfico, contando as historias fascinantes dos grandes descobridores e de suas descobertas. Cada autor foi escolhido pela competéncia dentro de sua especialidade e por sua habilidade em comunicar de maneira interessante seus conhecimentos e seus próprios pontos de vista. A finalidade primordial désses livros é apresentar uma visáo geral de cada assunto dentro das possibilidades tanto do estudante como do homem comum. Fazemos votos para que muitos désses livros encoragem o leitor a fazer suas próprias investigares sobre os fenómenos naturais. Esta série, que agora apresenta tópicos sobre to­ das as ciéncias e suas aplicagóes, teve inicio num projeto de revisáo do programa de Física das esco­ las secundárias. No Instituto de Tecnología de Massachusetts, durante o ano de 1956, um grupo de físicos, de professóres secundarios, de jornalistas, de desenhistas de aparelhos, de produtores de fil­ mes e de outros especialistas organizaram o Comité de Estudos de Física (Physical Science Study Committee, PSSC ) que agora funciona como parte

do “ Educational Services Incorporated” , Watertown, Massachusetts. Todas essas pessoas canalizaram seus conhecimentos e suas experiéncias para planejamento e criaqáo de meios que auxiliassem o aprendizado da Física. Desde o inicio seus esforqos tiveram o auxilio financeiro da Fundáqáo Nacional de Ciéncia, que continua a auxiliar o programa. A Fundaqao Ford, o Fundo para o Progresso da Educaqáo e a Fundaqáo Alfred P. Sloan também tém ajudado. O Comité organizou um livro, uma extensa série de filmes, um laboratorio piloto, aparelhos especialmente desenhados, e um Guia para o Professor. A Série é dirigida por uma junta de editores constituda por: Paul F. Brandwein, de “ The Conservation Foundation” e da “ Harcourt, Brace & Co.” John H. Durston, Educational Services Incorporated. Francis L. Friedman, do Institudo Tcnológico de Massachusetts Samuel A . Goudsmit, do Laboratorio Na­ cional de Brookhaven Bruce F. Kingsbury, Educational Services Incorporated. Philippe LeCorbeiller, da Universidade de Harvard Gerard Piel, do “ Scientific American” Herbert S. Zim, da “ Simón and Schuster, Inc.”

BIOGRAFIA DO AUTOR O Nasctmento de wma Nova Física é um assunto relacionado com o interésse profissional de I. Bernard Cohén, da Universidade de Harvard. As conseqüencias históricas, científicas ¿"culturáis das grandes descobertas de Sir Isaac Newton tiveram para o Professor Cohén, durante anos, um interésse especial. Autor de Franklin e Newton (1956), de Escritos de Isaac Newton sobre Filosofía da, Natu­ reza (1957), o Professor Cohén dedicou os quatro últimos veróes á leitura de tudo quanto póde encon­ trar, escrito por Newton ou sobre Newton, nos arquivos de manuscritos das grandes academias da Inglaterra, Holanda, Franqa e Itália. Seus estudos culminaram por fim com a primeira ediqao crítica e comentada, dos Principia Mathematica de Newton, ainda nao publicada. O Professor Cohén nasceu em Far Rockway, Nova York, em 1914. Recebeu o grau de bacharel em Ciéncia, em Matemática, cum laude, em 1937 em Harvard, e realizou trabalhos correspondentes a ésse grau em Física, Astronomía e Historia da Cién­ cia, na mesma Universidade. Recebeu o grau de Ph. D. em Historia da Ciéncia, em 1947 e é agora professor desta última cadeira. Durante seis anos o Professor Cohén foi diretor-secretário e durante outros seis anos (1953-59) diretor editor de Isis, o jornal trimestral e oficial da Sociedade de Historia da Ciéncia. É autor de A Ciencia, Escrava do Homem (1948) e outros livros, e escreveu artigos para o Jornal da Historia das Idéias, Isis, Scientific American e para publicares francesas, italianas e espanholas. Foi especialmente

convidado para realizar conferéncias no University College de Londres, na Sorbonne em Paris, em Oxford, em Florenqa, e em numerosas Uni­ versidades americanas. É vice-presidente da Sociedade de Historia da Ciéncia nos Estados Unidos e compareceu como delegado ao Nono Congresso In­ ternacional de Historia da Ciéncia ( Barcelona Madrid). Longe dos seus arquivos e da máquina de escrever, o Professor Cohén é um ardoroso viajante e escalador de torres, entusiasmo éste compartilhado por sua filha mais moga. (Uma vez quase ficou entalado nos degraus espiralados do Mosteiro de York, na Inglaterra.) Outra das suas ocupaqoes de amador ñas horas vagas é fotografar castelos e bar­ cos, especialmente barcos de pesca. A pesquisa do Professor Cohén sobre a influéncia das idéias científicas na sociedade é particular­ mente relacionada com o fermento educacional que a América está agora experimentando. Na Historia da Ciéncia éle vé “ uma unidade de toda a capacidade criadora humana e um meio pelo qual a Ciéncia pode recuperar as dimensóes humanizadoras táo freqüentemente perdidas em apresentaqóes pura­ mente formáis” . Outras obras de I. Bernard Cohén Experiencias de Benjamín Franklin Roemer e a Primeira Determinagao da Velocidade da Luz Manual de Laboratorio de Física A Ciéncia, Escrava do Homem Educagao Geral em Ciéncia Benjamín Franklin, Sua Contribuigáo á Tradigao Americana Escritos de Isaac Newton sobre Filosofia Natural Franklin e Newton x

PREFÁCIO O fim a que se propóe éste livro náo é apresentar uma Historia “ popular” da Ciéncia, nem mesmo mostrar ao leitor comum alguns dos recentes resul­ tados da pesquisa na Historia da Ciéncia. A inten Na filosofia aristotélica os corpos celestes tém uma ou duas propriedades que interessam. O éter 10

de que sao feitos é material imutável, ou para usar a velha palavra, “ incorruptível” . Isto está em con­ traste com os quatro elementos que encontramos na Terra; — éles estáo sujeitos a mudar, ou sao “ corruptíveis” . Assim, na Terra, encontramos o aparecimento, ou “ surgimento em ser” , a “ decaden­ cia” e o “ desaparecimento” ; o nascer e o morrer das coisas. Mas nos céus nada muda nunca, tudo continua o mesmo; as mesmas estrélas, os mes­ mos eternos planétas, o mesmo Sol, a mesma Lúa.* Os planétas, as estrélas e o Sol eram considerados “ perfeitos” , e através dos séculos eram freqüentemente comparados a eternos diamantes ou pedras preciosas, por causa das suas imutáveis qualidades. O único objeto celeste em que qualquer espécie de mudanga ou “ im perfecto” podia ser descoberta era a L ú a ; mas a Lúa, afinal, era o corpo celeste mais próximo da Terra, e uma espécie de marco divisorio entre a regiáo terrestre da mudanga (corruptibilidade) e a regiáo celeste da permanencia e da incorruptibilidade. Deve ser observado que neste sistema todos os objetos celestes que circundam a Terra sao mais ou menos semelhantes entre si e todos diferentes da Terra ñas características físicas, composigáo e “ propriedades essenciais” . Assim se podia compreender porque a Terra ficava firme e náo se movia, enquanto os objetos celestes se moviarft. Ainda mais, a Terra náo só nao tinha “ movimento local” , ou movimento de um lugar para outro, como também náo se supunha que girasse ao redor do seu eixo. A principal razáo física para isto, segundo o velho sistema, é que náo era “ natural” que a Terra tivesse um movimento circular; seria contrário á sua natureza tanto um movimento em órbita ao redor do Sol, quanto uma rotagáo diária ao redor do pró­ prio eixo. 17

Os Fatóres do Movimento

Examinemos agora um pouco mais de perto a Fí­ sica aristotélica do movimento dos corpos terres­ tres. Em todo movimento, dizia Aristóteles, há dois fatóres principáis: a fórqa motriz, que desig­ naremos aqui por F e a resisténcia, que designare­ mos por R. Para que ocorra movimento, segundo Aristóteles, é necessário que a fórqa motriz seja maior que a resisténcia. Por conseguinte, nosso primeiro principio do movimento é F > R

(1 )

ou, a fórqa deve ser maior que a resisténcia. Exa­ minaremos agora os efeitos de diferentes resisténcias, conservando sempre constante a fórqa motriz. Nossa experiéncia será realizada com corpos, cada um deixado cair livremente, partindo do repouso, através de um meio resistente diferente. A fim de considerar as condiqóes constantes, tomaremos es­ feras para todos os corpos que caem, de modo que o efeito de sua forma sobre o seu movimento seja o mesmo. Aristóteles, é natural, sabia perfeitamente que a velocidade de um objeto, sendo iguais todas as outras condiqóes, geralmente depende de sua for­ ma, fato que já demonstramos com o nosso páraquedas, Em nossa experiéncia, usaremos duas bolas de aqo idénticas, com a mesma forma, tamanho e péso. Deixaremos cair as duas simultáneamente, uma através do ar, e a outra através da agua. Para fazer esta experiéncia, é necessário um cilindro comprido cheio de água; segure as duas bolas uma ao lado da outra, uma na água, a outra da mesma altura, mas fora da coluna de água. (Fig. 1). Quan­ do sáo sóltas simultáneamente, vemos que náo há 18

___ponto de partida

> ar F ig. 1

dúvidas de que a velocidade da que se move através do ar é muitíssimo maior que a velocidade da que cai através da água. Para provar que os resulta­ dos da experiéncia náo derivam do material com que as bolas sáo feitas ou do seu determinado peso, podemos repetir a experiéncia usando bolas de ago menores, um par de bolas de vidro ou de ago, e assim por diante. Em menor escala, qualquer pes­ soa pode repetir esta experiéncia com duas “ bolinhas” de vidro e um copo grande cheii» de água até a borda. O resultado desta experiéncia pode ser escrito em forma de uma expressáo matemática que traduz o fato de que, sendo iguais todas as outras condigóes, a velocidade na água (que resiste ou di­ ficulta o movimento) é menor que a velocidade no ar (que náo dificulta o movimento tanto quanto a á g u a ): 1 F ce R

(2 ) 19

ou a velocidade é inversamente proporcional á re­ sisténcia do meio através do qual se move o corpo. É experiéncia comum que a água dificulta o movi­ mento; qualquer pessoa que tenha tentado correr através da água á beira da praia, sabe quanto a água resiste ao seu movimento, em. comparado com o ar. A experiéncia será agora realizada com dois ci­ lindros, um cheio de água e outro cheio de óleo (Fig. 2 ). O óleo resiste ao movimento ainda mais

«— ponto de partida — -

F ig. 2

que a água; quando as duas esferas idénticas de ago sao largadas simultáneamente, a da água atinge o fundo muito antes da que cai através do óleo. Como a resisténcia R 0 do óleo é maior que a resis­ téncia R a da água, podemos agora predizer que se deixarmos cair qualquer par de objetos idénticos através déstes líquidos, o que cair através da água atingirá uma determinada altura, mais depressa que 20

o que cai através do óleo. Esta previsáo pode fá­ cilmente ser verificada. A seguir, já que se achou que a resisténcia R„, da água é maior que a resis­ téncia R ar do ar, R» > Ra

(3 ) Ra ~Z> Rar

a resisténcia do óleo deve necessáriamente ser maior que a do ar, Ro >

R ar

(4 )

Isto pode ser também verificado, repetindo-se a experiéncia inicial, com um cilindro cheio de ar em vez de água. Examinemos em seguida os efeitos de diferentes fórgas motrizes. Nesta experiéncia usamos de novo um cilindro comprido cheio de água. Deixamos cair néle uma bola de ago pequeña e uma grande, simultáneamente. Verificamos que a bola grande de ago, a mais pesada das duas, alcanga o fundo antes da mais leve. Pode-se alegar aqui que o tamanho poderia produzir algum efeito, mas se algum efeito se verificasse, a bola maior deveria encontrar uma resisténcia maior do que a pequeña. Náo obs­ tante, o resultado é válido. Evidentemente, quanto maior a fórga para vencer uma resisíéncia determi­ nada, tanto maior a velocidade. Esta experiéncia pode ser repetida, desta vez com uma bola de ago e outra de vidro, de maneira que as duas tenham exatamente o mesmo tamanho mas pesos diferentes. Uma vez mais se verifica que a bola mais pesada pa­ rece muito mais apta a vencer a resisténcia do m eio; e assim chega ao fundo em primeiro lugar, ou atinge a maior velocidade. A experiéncia também pode ser feita em óleo e varios outros líquidos: álcool, 21

leite e assim por diante produzindo o mesmo re­ sultado geral. Em forma de expressóes matemáti­ cas podemos afirmar as conclusóes desta experién­ cia, como segue: V oc F

(5 ).

ou, sendo iguais todas as outras condigóes, quanto maior a fórga, maior a velocidade. Podemos agora combinar as Expressóes (2 ) e (5 ) numa só, da seguinte maneira: F V

(6)

CC R

ou seja, a velocidade é proporcional á fórga motriz e inversamente proporcional á resisténcia do meio; ou, a velocidade é proporcional á fórga dividida pela resisténcia. Esta expressáo é freqüentemente conhecida como a lei aristotélica do movimento. Dever-se-ia notar que o próprio Aristóteles náo escreveu seus resultados sob a forma de equagóes, meio moderno de expressar tais relagóes. Aristóteles e a maior parte dos antigos cientistas, inclusive Galileu, preferiam comparar velocidades com velocidades, fórgas com fórgas e resisténcias com resisténcias. Assim, ao invés de escrever a Expressáo (5 ) como fizemos, teriam éles preferido a proposigáo: V

vidro



^ ago

:

:

F

vidro

* F

ago

A razáo das velocidades das bolas de vidro e de ago é comparada com a razáo das fórgas com as quais essas bolas se movem para baixo. Isto equivale á proposigáo geral de que a velocidade da bola de vidro está para a velocidade da bola de ago assim 22

como a fórqa motriz da bola de vidro está para a fórqa motriz da bola de aqo. Estudemos agora a expressáo (6 ), a fim de descobrir algumas das suas limitaqóes. É claro que esta expressáo náo pode ser aplicada de um modo geral, porque, se a fórqa motriz igualasse a resistén­ cia, a equaqáo náo daria o resultado de que a velo­ cidade V seria igual a zero; nem dá um resultado igual a zero quando a fórqa F é menor que a resis­ téncia R. Por conseguinte, a expressáo (6 ) está sujeita á limitaqáo imposta pela expressáo (1 ), e só é verdadeira quando a fórqa é maior que a resistencia . Mas isto equivale a dizer que aquela expressáo náo é uma afirmaqáo universal das condiqoes do movimento. Sustenta-se algumas vézes que esta expressáo pode ter surgido do estudo de uma balanqa de braqos desiguais, digamos, com pesos iguais ñas extremi­ dades dos dois braqos, ou talvez de uma balanqa de braqos iguais com pesos desiguais ñas extremidades dos dois braqos. Neste caso é impossível que F seja menor que R, porque o maior péso é sempre a fórqa motriz, ao passo que o menor péso é sempre a resisténcia. Mais ainda, na balanqa de braqos iguais, se F — R náo náo haverá movimento. Há dois últimos aspectos da lei ^o movimento que devemos aprepentar, antes de deixar o assunto. O primeiro é que a própria lei nada nos diz a respeito dos estágios pelos quais um objeto que cai, a partir de uma posiqáo de repouso, adquire a veloci­ dade V. A lei só nos diz alguma coisa sobre a pró­ pria velocidade, obviamente algo sobre velocidade “ média” , ou velocidade “ final” , já que ela é avaliada pelo tempo gasto para percorrer determinada distáncia D V ce (7 ) T 23

que é válida para a velocidade média ou para mo­ vimento com velocidade constante, mas náo para movimento em que haja aceleraqáo, isto é, que tenha velocidade em constante mudanqa. Náo era do conhecimento de Aristóteles que a velocidade de um corpo que cai partindo do repouso atinge, por estágios gradativos, seu valor final? Movimento dos Corpos que caem através do A r Talvez tenha para nós maior significado do que qualquer dos argumentos anteriores, o resultado de uma outra experiéncia. Até aqui temos dado tipos de experiéncias positivas que nos fariam confiar na lei aristotélica do movimento, mas omitimos uma experiéncia verdaderamente crucial. Voltemos a considerar dois objetos do mesmo tamanho, da mes­ ma forma, mas de pesos diferentes, ou de diferentes fórqas motrizes F. Dissemos que, se fóssem deixados cair simultáneamente através da água ou do óleo, seria observado que o mais pesado desceria mais rápidamente. (O leitor — antes de continuar a 1er o resto déste capítulo e déste livro — deverá parar, e fazer por si mesmo essas experiéncias). Chegamos agora á última experiéncia daquela seqüéncia ante­ rior: consiste ela em deixar cair dois objetos do mesmo tamanho mas de péso desigual, no mesmo meio, mas tomando o ar para meio. Admitamos que o péso de um dos nossos objetos é exatamente o dóbro do péso do outro, o que implicaría, na velha opiniáo, em que a velocidade do objeto mais pesado seria exatamente o dóbro da velocidade do mais leve. Para uma distáncia constante de queda, a velocidade é inversamente proporcional ao tempo, de modo que 1 V oc — (8 ) T ou 24

isto é, as velocidades sao inversamente proporcionáis aos tempos de queda. Conseqüentemente, o tempo de queda da bola mais pesada deveria ser exata­ mente metade do tempo de queda da menor. Para realizar a experiéncia, fique de pé sobre uma cadeira e deixe cair juntamente os dois objetos de modo que batam no chao nu. Uma boa maneira de os deixar cair é segurá-los horizontalmente entre o primeiro e o segundo dedos de uma das maos; abrindo entáo bruscamente os dois dedos, as duas bolas comegaráo a cair juntas. Qual o resultado desta experiéncia? A o invés de descrever os resultados da mesma, permita-me sugerir que a faqa por si mesmo. Com­ pare entáo o seu resultado com os obtidos por Joáo, o Gramático, com a descriqáo dada por Stevin no sáculo X V I, e finalmente com a que foi dada por Galileu no seu famoso livro Duas Novas Ciencias, há pouco mais de 300 anos. Uma pergunta que, neste ponto, vocé deveria fazer a si mesmo é a seguinte: Evidentemente a ex­ pressáo (6 ) náo é válida para o ar, mas vale real­ mente para os outros meios que exploramos? A fim de ver se a expressáo (6 ) é uma afirmaqáo quantitativa exata, pergunte a si mesmo se ela era meramente uma definidlo de “ resisténcia” , ou se há algum outro meio de medir a “ resisténcia” , como sáo medidas as velocidades. É suficiente, para me­ dir a velocidade, usar a expressáo (8 ), e medir o tempo de queda? Em todo caso, a maioria das pessoas, creio, terá achado que, com exceqáo da experiéncia de dois ob­ jetos desiguais caindo através do ar, o sistema aris­

totélico parece bastante razoável e pode ser aceito. Náo há para nós motivo para condenar indevidamente, seja Aristóteles, seja qualquer físico aristo­ télico que nunca tivesse realizado a experiéncia de soltar no ar dois objetos de pesos desiguais. A Impossibilidade de wma Terra em Movimento Mas, podemos aínda perguntar — o que tem a ver tudo isto com o fato de estar a Terra em repouso ao invés de em movimento? Para obter a resposta, voltemo-nos agora para o livro de Aristóteles Nos Céus. Ali se acha a afirmaqáo de que alguns con­ sideran! que a Terra está em repouso, enquanto ou­ tros consideram que ela se move. Há, contudo, muitas razóes pelas quais a Terra náo se pode mo­ ver. flA fim de ter uma rotaqáo ao redor de um eixo, cada parte da Terra teria de se mover num círculo, diz Aristóteles; mas o estudo do comportamento real de suas partes mostra que o movimento terrestre natural é ao longo de uma linha reta, em diregáo ao centro. “ O movimento, portanto, sendo forjado (violento) e antinatural, náo poderia ser eterno; mas a ordem do.mundo é eterna” .^ O mo­ vimento natural de todas as partículas da materia terrestre é em direcáo ao centro do universo, que coincide com o centro da Terra. Como “ prova” de que os corpos terrestres se movem de fato em direqáo ao centro da Terra, diz Aristóteles, “ vemos que os corpos que se movem em diregáo á Terra náo se movem em linhas paralelas” , mas aparente­ mente sob algum ángulo, uns em relacao aos outros. “ As nossas razóes anteriores” , nota éle entáo, “ po­ demos acrescentar que objetos pesados, se lanqados para cima em linha reta, com emprégo da fórqa, voltam ao seu ponto de partida, mesmo que a fórqa os arremesse a uma distáncia ilimitada” . Assim, se um corpo fósse lanqado para cima em linha reta, e 26

depois caisse em linha reta, estas diregóes determina­ das em relagáo ao centro do universo, éle náo tocaría a Terra exatamente no ponto em que foi langado, se a Terra se movesse, se se afastasse durante o intervalo de tempo. É isto uma conseqüéncia direta da qualidade “ natural” do movimento em linha reta para objetos terrestres. Os argumentos precedentes mostram como os principios aristotélicos de movimento natural e vio­ lento (antinatural), podem ser aplicados para pro­ var a impossibilidade de movimento terrestre. E a respeito da “ lei de movimento” aristotélica, dada na expressáo (6 ) ou na equaqáo (9 ) ? Como se rela­ ciona isso específicamente com o fato de estar a Terra em repouso? A resposta é dada claramente no coméqo do “ Almagesto” de Ptolomeu, o antigo trabalho padráo sobre Astronomía geocéntrica. Ptolomeu escreveu, seguindo os principios de Aris­ tóteles, que, se a Terra tivesse movimento, “ ela se adiantaria em relagáo a qualquer outro corpo que caisse, em virtude da sua enorme diferenga de tamanho, e os animais e todos os pesos separados serr n deixados paja tras flutuando no ar, enquanto a Terra, por sua vez, com a sua grande velocidade, cairia fora do próprio universo” . Isto decorre ple­ namente da nogáo de que os corpos caém com velo­ cidades proporcionáis aos seus respectivos pesos. E muito dentista deve ter concordado com o comentário final de Ptolomeu: “ Na verdade, basta pensar um po- ,o nessa possibilidade, para ver que ela é completamente ridicula” .

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C a p ít u l o 3

A T E R R A E O U N IV E R SO

Muito freqüentemente considera-se o ano de 1543 como o ano de nascimento da Ciéncia moderna. Nesse ano foram publicados dois livros de grande importancia, que levaram a mudanqas significativas no conceito humano da Natureza e do mundo :^um fo if'S ó ir e a R evolugño dq¿-Esferas Qelestes” , do clérigo polonés Nicolau Copérnico e outro “ Sobre a fístrutura do Corpo Humano” , do flatnengo André Vasalius. O último tratou do corpo humano sob o ponto de vista da exata observaqáo anatómica, e assim reintroduziu na Fisiología e na Medicina o esprito de experimentaqáo que tinha caracterizado os escritos dos anatomistas e fisiologistas gregos, dos quais o último e o maior tinha sido Galeno. í O li­ vro de Copérnico introduziu um novo sistema de Astronomía, que se chocava com as noqóes geralmente aceitas de que a Terra estava em repouso^ Será nosso propósito aqui discutir sómente alguns aspectos escolhidos do sistema de Copérnico, notadamente' algumas conseqüéncias de considerar a Terra, animada de movimento. Náo consideraremos com qualquer pormenor as vantagens ou desvantagens do sistema como um todo, nem mesmo compa­ raremos os seus méritos, passo a passo, com os do sistema mais antigo. Nossa primeira consideraqáo é explorar que conseqüéncias teve o conceito de uma Terra em movimento, para o desenvolvimento de uma nova ciéncia — a Dinámica. 28

Copérnico e o Nascimento da Ciencia Moderna Mesmo na antiga Grecia foi sugerido que a Ter­ ra poderia ter uma rotagáo diária em torno do seu eixo e fazer uma revolugáo anual numa vasta órbita ao redor do Sol. Proposto por Aristarco no século III A.C., éste sistema do universo foi vencido por outro, segun­ do o qual a Terra estava em repouso. Mesmo quan­ do, quase 2000 anos depois, Copérnico publicou sua explicaqáo de um sistema do universo baseado nesses dois movimentos terrestres, náo houve assentimento geral. Por fim, naturalmente, o livro de Copérnico provou ser a semente de toda a revolugáo científica que culminou na magnífica fundamentagáo da Física de Isaac Newton. Olhando para trás, podemos ver como a aceitagáo do conceito formula­ do por Copérnico, de uma Terra em movimento implicava necessáriamente numa Física náo-aristotélica. Por que nenhuma destas conseqüéncias apareceu diante dos olhos dos contemporáneos de Copér­ nico? E por que o próprio Copérnico náo proporcionou essa revolugáo científica, que a tal ponto alterou o mundo, que ainda náo percebemos comple­ tamente todas as suas conseqüéncias? Vamos expli­ car neste capítulo estas questóes e em particular veremos porque a proposigáo de Copérnico, de um sistema do mundo em que se sustentava estar a Terra em movimento e o Sol em repouso náo era por si só suficiente para a rejeigáo da velha Física. De inicio devemos deixar bem claro que Copérni­ co (1473-1543) era, sob vários aspectos, mais um conservador que um revolucionário. yMuitas das idéias que éle introduziu já existiam na literatura, e repetidamente seu avango foi tolhido pelo fato de que éle era incapaz de ir além dos principios bási­ cos da Física aristotélica. & Quando hoje falamos do “ Sistema de Copérnico” , entendemos comumente 29

um sistema do universo completamente diferente do que vem descrito na sua obra “ De revolutionibus orbium caelestium” , para dar o título original la­ tino do livro. A razáo de tal procedimento está em que desejamos honrar Copérnico pelas suas inovaqóes, e o fazemos á custa da exatidáo, referindo-nos ao sistema/heliocéntrico, como “ Sistema de Copérnico” . 0 Sistema das Esferas Concéntricas Porém, antes de descrever o sistema de Copérni­ co, estabeleqamos alguns aspectos básicos dos dois principáis sistemas anteriores. Um, atribuido a Eudóxio, foi melhorado por um outro astrónomo grego, Callipus, e recebeu de Aristóteles os retoques fi­ náis. É éste o sistema conhecido como o das “ esfe­ ras concéntricas” . Nesse sistema, cada planéta, o Sol e a Lúa, eram considerados como fixos aos equadores de esferas separadas, que giravam em torno de seus eixos, ficando a Terra estacionária no centro. Enquanto cada esfera girava, as extremida­ des do eixo de rotaqáo estavam fixas em outra es­ fera, que também girava com um período diferente e em torno de um eixo que náo tinha a mesma orientaqáo que o eixo da esfera interior. Para alguns planétas poderia haver até quatro es­ feras, cada uma envolvida na seguinte, com o resul­ tado de que haveria vários tipos de movimento. Por exemplo, uma dessas esferas poderia ser responsável pelo fato de que, qualquer que fósse a posiqáo do planéta entre as estrélas, éle seria levado a dar uma volta ao redor da Terra em cada 24 horas. Have­ ria outra esfera idéntica para mover o Sol na sua aparente revoluqáo diária, outra para a Lúa, e ou­ tra para as estrélas fixas. O conjunto de esferas interiores para cada planéta explicaría o fato de que um planéta náo parece mover-se através dos 30

céus sórnente com um movimento diário, mas tambérn muda sua posigáo día a dia, relativamente ás estrélas fixas. “ Assim, um planéta é visto algumas vézes, ora numa constelado, ora em outra. Como éles viam os planétas a vagar entre as estré­ las fixas, de noite para noite, atribuíram a origem dt> nome “ planéta” ao vocábulo grego que significa “ vagar” . Uma das características observadas désse “ vagar” é que a diregáo náo é constante. A dire­ gáo habitual do movimento é progredir lentamente em diregáo leste, mas, uma vez ou outra, o pla­ néta interrompe o seu movimento para leste (chegando a um ponto estacionário) e entáo (Fig. 3)

se move num curto espago de tempo em diregáo oeste, até atingir outro ponto estacionário, após o qual retoma a originária diregáo para leste através dos céus. O movimento paras leste é conhecido como “ direto” e o movimento para oeste, “ retró­ 31

grado” . Por uma conveniente combinaqáo de es­ feras, Eudóxio pode construir um modélo para mostrar como combinaqoes de movimentos circula­ res podiam produzir o movimento observado dos planétas, direto e retrógrado. É o mesmo con­ junto de “ esferas” que aparece no título do livro de Copérnico. Após o declínio da Grecia, a Ciencia caiu ñas máos dos astrónomos islámicos ou árabes. Alguns apuraram os trabalhos de Eudóxio e Aristóteles, e introduziram muitas outras esferas, a fim de fazer com que as previsóes do sistema concordassem mais exa­ tamente com a observado. Essas esferas, ganhando realidade, acreditava-se que fóssem de cristal; o sistema recebeu o título de “ esferas cristalinas” . Como se sustentava que a orientaqáo das estrélas e planétas tinha influéncia considerável nos negocios dos homens, acreditou-se que a influéncia do pla­ néta emanava, náo do próprio objeto, mas da esfera a que estava ligado. Nesta crenqa podemos ver a origem da expressáo “ esfera de influéncia” , ainda hoje usada em sentido político e económico. Ptolomeu e o Sistema de Epiciclos e Deferentes O outro grande sistema rival da Antiguidade foi elaborado por Cláudio Ptolomeu, um dos maiores astrónomos do mundo antigo, e era baseado, de certo modo, em conceitos que tinham sido introduzidos pelo geómetra Apolónio de Perga e o astrónomo Hiparco. O produto acabado, geralmente conhecido como sistema de Ptolomeu, ou ptolomaico, em con­ traste com o sistema de esferas homocéntricas (de centro comum) de Eudóxio-Aristóteles tinha enor­ me flexibilidade e, em conseqüéncia, enorme complexidade. Os dispositivos básicos eram usados em várias combinaqóes. Antes de tudo, consideremos um ponto P movendo-se uniformemente em círculo, 32

perigeu

Fie. 4

ao redor do ponto E, como na Fig. 4A. Aqui está uma ilustradlo de movimento circular uniforme que náo permite pontos estacionários nem de retroaqáo. Nem explica o fato de que os planétas náo tém velo­ cidade constante, quando parecem mover-se em tor­ no da Terra. Quando muito, tal movimento só po­ dia ser observado no comportamento das estrélas fi­ xas, porque Hiparco tinha visto o próprio Sol moc ver-se com velocidade variável, observaqáo esta ligagada ao fato de que as estaqóes náo tém a mesma duragao. Na Fig. bB, a Terra náo est^í exatamen­ te no centro C do círculo, mas excéntrica, no ponto E. É entáo claro que, se o ponto P corresponde a um planéta (ou ao Sol), náo parecerá mover-se uni­ formemente em relaqáo as estrélas fixas quando vis­ to da Terra, embora seu movimento ao longo do círculo seja de fato uniforme. Se a Terra e os corpos celestes formassem um tal sistema ^excéntrico, ao invés de um sistema^homocéntrico, haveria períodos em que o Sol ou o planéta estariam muito perto da Terra (perigeu), e perío­ dos em que o Sol ou o planéta estariam muito longe da Terra (apogeu). Assim, devemos esperar uma 33

variaqáo no brilho dos planétas, o que de fato é observado. A seguir, apresentaremos um dos principáis arti­ ficios de Ptolomeu para explicar o movimento dos planétas. Vamos admitir que, enquanto o ponto P se move uniformemente num círculo, ao redor do centro C (Fig. 5 ), um segundo ponto Q se move

/ ' Epiciclo

♦_____ •

y

^ deferente

F ig. S. O esquema de Ptolomeu para explicar os desvíos dos planétas admitia uma complicada combinagáo de movi­ mentos. O planéta Q viajava ao redor de P num círculo (linhas pontilhadas), ao passo que P se movía em círculo ao redor de C. A linha cheia com lagos é o caminho que seguiría Q no movimento combinado.

num círculo ao redor do ponto P. O resultado será gerar uma curva, com uma série de laqos ou cúspi­ des. O grande círculo em que se move P é chama­ do o círculo de referéncia. ou o deferente, e o pe­ queño círculo em que se moye Q é chamado epici34

cío. Assim, o sistema ptolomaico é muitas vézes descrito como baseado no deferente e no epiciclo. É claro que a curva resultante da combinadlo de epi­ ciclo e deferente é uma curva em que o planéta algumas vézes está mais perto do centro do que outras; nela há também pontos estacionários e quando o planéta está na parte interior de cada arco, um observador em C vé-lo-á mover-se com movimento retrógrado. Para que o movimento concorde com o que se observa, basta escolher os tamanhos rela­ tivos do epiciclo e deferente, e as relativas veloci­ dades de rotaqáo dos dois círculos, de modo a torná-los concordes com as aparéncias. Resulta claramente do livro, que Ptolomeu nunca se empenhou na questáo de saber se havia “ real­ mente” verdadeiros epiciclos e verdadeiros deferen­ tes nos céus. Como podemos concluir da leitura, parece muito mais provável que para éle o sistema que descreveu era um “ modélo” do universo, e náo necessáriamente a “ verdadeira” descriqáo — seja o que fór que estas palavras possam significar. Isto é, era o ideal grego, atingindo seu ponto mais alto nos escritos de Ptolomeu, de construir um mo­ délo que habilitasse o astrónomo a predizer as observares ou — para usar a expressáo grega — “ salvar as aparéncias” . Embora freqüentemente menos elaborada, esta maneira de encarar a Ciéncia é muito semelhante á do físico do século X X , cuja ambiqáo é também produzir um modélo que resulta em equaqáo capazes de predizer os resultados da experiéncia — e muitas vézes éle é obrigado a se contentar com equaqóes, na auséncia de um “ modélo” , que possa ser construido. Alguns outros aspectos do velho sistema de Pto­ lomeu podem ser abreviadamente ressaltados. A Terra náo precisa estar no centro do círculo deferen­ te ou, em outras palavras, o círculo deferente (Fig. 35

©

©

®

F ig. 6. Com epiciclo e deferente (e engenho) os as­ trónomos podiam descrever quase todos os movimentos observados nos planétas, sem sair dos limites do sistema ptolomaico. Em ( A ) o ponto P se move num círculo com centro em C, o qual se move num círculo menor, com centro em X . Em (B ) o efeito da com binado de deferente e epiciclo é mudar o centro aparente da órbita de P , de C para C’. Em (C ) a com binado gera uma curva elíptica. A figura em (D ) é o caminho de P , movendo-se ao longo de um epiciclo; o centro do círculo de P é R, que se move num círculo, cujo centro Q está num círculo cujo centro é C.

36

6 A ) poderia ser excéntrico em vez de homocéntrico, isto é, com um centro diferente do centro da Terra. Mais aínda, embora o ponto P se mova no grande círculo de referéncia, ou deferente (Fig. 6B ), seu centro C podia estar se movendo num pequeño cír­ culo, combinagáo que náo precisa produzir retroagáo, mas que poderia ter o efeito de deslocar o círculo ou mudá-lo de posiqáo, ou produzir movimento elíptico (Fig. 6C ). Finalmente, havia um artificio chama­ do “ equante” (Fig. 7 ). Era éste um ponto, nao

F ig. 7. O equante era um artificio ptolomaico para explicar aparentes mudangas na velocidade de um planéta. Embora o movimento de P , de A para A ', de B a B ’ e de C a Cv náo seja uniforme relativamente ao centro do círculo, C, sé-lo-ia relativamente a um outro ponto, T, o equante, porque os ángulos a,(5,y sao iguais. O planéta percorre os arcos A A ’, B B ’, CC’, em intervalos de tempos iguais, porém, obviamente, com diferentes velocidades.

?/

no centro do círculo, ao redor do qual o movimento podia ser “ uniformizado” . Isto é, considere-se um ponto P, movendo-se num círculo com centro em C. O ponto P move-se de tal modo que uma reta de P ao enquante varre ángulos iguais em tempos iguais; isto é equivalente a dizer que P só parece se mover uniformemente ao longo do seu caminho circular para um observador que esteja localizado no equan­ te. Éstes artificios podiam ser usados em muitas combinares diferentes. O resultado era um siste­ ma de muita complexidade. Muito homem de saber nao podia crer que um sistema de quarenta ou mais “ rodas dentro de rodas” poderia talvez estar rodan­ do no céu, que o mundo fósse táo complicado. Conta-se que Afonso X , rei de L elo e Castela, chamado Afonso o Sabio, que manteve um famoso grupo de astrónomos, náo podia acreditar que o sistema do universo fósse táo intrincado. Quando a principio lhe ensinaram o sistema ptolomaico, comentou éle, segundo a lenda “ Se o Senhor Todo Poderoso me tivesse consultado antes de comegar a criaqáo, eu teria recomendado alguma coisa mais simples. Em parte alguma foram táo claramente expressas as dificuldades de entender o sistema de Ptolomeu, como aconteceu com o poeta John Milton no seu famoso poema “ O Paraíso Perdido” . Milton tinha sido professor, tinha ensinado real­ mente o sistema de Ptolomeu, e conhecia portanto aquilo sobre o que escrevia. Nestes seus versos o anjo Rafael está respondendo ás perguntas de Adáo ^sóbre a construqáo do universo e dizendo que Deus certamente deve achar graga ñas atividades dos ho­ mens : 38

. . . quando quiserem construir um modelo do céu E estudar as estrélas, como irao tratar O grandioso sistema, como irao construir, demolir, maquinar Para salvar as aparéncias, como irao cingir o universo, Com tragados de círculos concéntricos e excéntricos, Ciclo e Epiciclo, Órbita em Órbita... < Antes de abordarmos as inovaqóes de Copérnico, faremos algumas observaqóes fináis sobre o velho sistema de Astronomía. Em primeiro lugar, é claro que parte da complexidade surge do fato de que as curvas que representam os movimentos aparentes dos planétas (Fig. 5) sao combinaqóes de círculos. Se se pudesse ter usado uma equaqáo para uma curva com cúspide, tal como a lemniscata, o trabalho teria sido grandemente simplificado. Deve-se contudo ter em mente que nos dias de Ptolomeu náo havia Geometría analítica nem se usavam equaqóes para representar curvas e que se tinha criado uma tradiqáo, sancionada tanto por Aristóteles como por Platáo, de que o movimento dos corpos celestes deve ser explicado em termos de um sistema natural de movimento, talvez pelo argumento de que um movi­ mento circular náo tinha,coméqo nem fim, e era portanto mais adequado para os imutáveis, incorruptíveis planétas, eternamente em movimento. Em todo caso, como veremos, a idéia de explicar o mo­ vimento planetário sómente por combinaqóes de círculos, continuou em Astronomía por longo tempo. A parte o fato de que o sistema ptolomaico funcionou ou poderia ter funcionado, náo é desprezível a circunstáncia de que éle se ajustava perfeitamente também ao sistema da Física aristotélica. As es­ trélas, planétas, Sol e Lúa, moviam-se em círculos ou em combinaqóes de círculos, seu “ movimento na­ 39

tural” , enquanto a Terra náo participava do movi­ mento, estando no seu “ lugar natural” , no centro do universo, e em repouso. No sistema ptolomaico náo havia assim necessidade de procurar um novo sistema de Física, diferente daquéle que se ajustava ao sis­ tema de esferas homocéntricas. Éstes dois siste­ mas sáo algumas vézes descritos como “ geostáticos” , porque em ambos a Terra está em repouso; a expressáo mais comum é “ geocéntricos” , porque em ambos os sistemas a Terra está no centro do universo.

©

Sol

Q

©

q

Mercurio

Venus

y

Terra

y

fe

|

Júpiter

Saturno

Urano

ó

Lúa

^ Netuno

Marte

B Plutáo

F ig. 8. As origens dos mais velhos símbolos planetarios se perdem na antiguidade, mas as derivagóes comumente aceitas sao originárias das Mitologías latina e grega. O símbolo do Sol representava provávelmente um escudo com saliéncia central O símbolo de Mercurio representava o seu caduceu, seu bastáo, ou o seu barrete alado. O símbolo de Venus era o espelho, associado á deusa do Am or e da Beleza. Para o símbolo de Marte, deus da Guerra, foi tomada uma reprodugáo, ou da cabera de um guerreiro com o elmo e a pluma ondeante, ou um dardo e escudo. O símbolo de Júpiter também tem derivagóes alternadas, ou um grosseiro hieróglifo da águia, “ ave de Jove” , ou a primeira letra de Zeus, o nome grego de Júpiter. O símbolo de Saturno é uma antiga foice, emblema do deus do Tempo. O símbolo de Urano é a primeira letra de seu descobridor, Sir William Herschel (1738-1822), com o planéta suspenso da barra transversal. O tridente foi sempre carregado por Netuno, deus do Mar. O símbolo de Plutáo é obviamente um monograma. É interessante notar que os alquimistas usavam o símbolo de Mercúrio para o metal mercurio, e o símbolo de Venus para o cobre. H oje, os geneticistas designam a fémea com o símbolo de Vénus e o macho com o símbolo de Marte.

40

Inovagdes de Copérnico O sistema de Copérnico, de acórdti com a descriqáo do próprio autor, tem muitas semelhanqas com o sistema de Ptolomeu. Copérnico admirava enor­ memente Ptolomeu; na organizado do seu livro, na ordenaqáo dos capítulos e na escolha da seqüén­ cia em que sao apresentados os vários tópicos éle seguiu o de Ptolomeu. A transferéncia de um sistema geostático para um sistema .heljostático (Sol imóvel) envolvía certas ex­ planares novas (Fig. 8 A ). Piara verificá-las, come-

Fig. 8 - a . Éste diagrama do sistema de Copérnico foi extraído de “ A Perfit Description of the Caelestial Orbes” de Thomas Digges, (1576), que dá uma tr a d u jo em inglés de uma parte do D e Revolutionibus de Copérnico. Digges acrescentou ao sistema mais urna característica, tornando infinita a esfera das estrélas fixas.

41

cemos como o féz Corpérnico, por considerar a mais simples forma do universo heliostático. O Sol está no centro, fixo e imóvel, e ao seu redor, movendo-se em círculo, nesta ordem: Mer­ curio, Vénus, a Terra com sua lúa, Marte, Júpiter, Saturno. Corpérnico explicou os movimentos diários aparentes do Sol, Lúa, estrélas e planétas com fundamento no giro da Terra em torno do seu eixo, uma vez por dia. Outros fatos mais importantes derivavam, dizia éle, de um segundo movimento da Terra, que era uma revoluqáo orbital ao redor do Sol, exatamente como as órbitas dos outros planétas. Cada planéta tem um período diferente de revoluqáo, sendo tanto maior o período quanto mais afastado o planéta está do Sol. Assim, o movimento retrógrado é fácilmente explicável. Consideremos Marte (Fig. 9 ), que se move mais lentamente que a Terra ao redor do Sol. Sete posiqóes da Terra e de Marte sáo mostradas, numa situaqáo em que a Terra está passando Marte, estando Marte em oposiqáo, isto é, quando uma linha do Sol a Marte passa através da Terra. Ver-se-á que uma linha tirada da Terra a Marte, em cada uma das sucessivas posigóes mover-se-á primeiro para a frente, depois para trás, e de novo para a frente. Assimi, Copérnico náo só podia explicar “ naturalmente” de que maneira ocorre o movimento retrógrado, como tamibém mostrar porque esta retroaqáo é observada sámente quando Marte está em oposiqáo, o que é equivalente ao fato de que o planéta transpóe o meridiano, á meia-noite. Em oposiqáo, o planéta está no lado oposto ao da Terra em relaqáo ao Sol. É por isso que éle atingirá a posiqáo mais alta no céu á meia-noite, ou atravessará o meridiano á meia■^noite. De maneira semelhante (Fig. 10) pode-se ver que, para um planéta inferior (Mercurio ou Vénus), a retroaqao só ocorreria numa conjunqáo 42

43

44

inferior, o que corresponde á travessia do meridiano pelo planéta ao meio-dia. (Quando Vénus ou Mer­ curio se encontra numa linha reta entre a Terra e o Sol, a posigáo se chama conjungáo. Ésses pla­ nétas estáo no centro de retroagóes em conjungáo inferior quando se encontram entre a Terra e o Sol. Atravessam entáo o meridiano juntamente com o Sol ao meio-dia). Éstes dois fatos fazem sentido perfeito num sistema heliocéntrico ou heliostático, mas se a Terra fósse o centro do movi­ mento, como no sistema ptolomaico, por que de­ pendería a retroagáo dos planétas da sua orientagáo relativamente ao Sol?Atendo-nos ainda ao modelo simplificado de órbitas circulares, observemos, a seguir, que Co­ pérnico pode determinar a escala do sistema solar. Consideremos Vénus (Fig. 11). Vénus é visto sómente como estréla da tarde ou estréla da manhá, porque está um pouco adiante ou um pouco atrás do Sol, mas nunca 180 graus afastado do Sol, como pode estar um planéta superior. O sistema de Ptolo­ meu (Fig. 11A ) levara isto em conta sómente pela hipótese arbitrária de que os centros dos epiciclos de Vénus e Mercurio estavam permanentemente fixados numa linha da Terra ao Sol; o que equi­ vale a dizer que as deferentes de Mercurio e V é­ nus, exatamente como o Sol, moviam-se ao redor da Terra uma vez em cada ano. No sistema de Copérnico, tínhamos meramente que admitir que as órbitas de Vénus e Mercurio (Fig. 11B) estivessem dentro da órbita da Terra. No sistema de Copérnico, além disso, poderíamos computar a distáncia de Vénus ao Sol. Observagoes feitas noite após noite indicariam quando Vénus podia ser vista na sua mais afastada elongagáo (distáncia angular) do Sol. Quando ocorresse éste 45

©

© F ig. 11

evento, a separaqáo angular podia ser determinada. Como se pode ver na Fig. 12, ocorre a elongaqáo máxima quando uma linha da Terra a Vénus é tangente á órbita de Vénus e, assim, perpendicular a uma linha do Sol a Vénus. Por simples trigono­ metría podemos escrever esta equaqáo e, de uma tábua de tangentes, calcular fácilmente o compri­ mento TS. VS ---------- = TS 46

seno a

(1 )

S

/ /

^ \

órbita de Vénus

\

^'^v.orbita da T e rra F ig. 12. Calcular a distáncia de Vénus ao Sol, tornou-se possivel no sistema de Copérnico. Quando a distáncia angular (isto é, o ángulo a de Vénus a partir do Sol) atinge o máximo, a linfaa de visada da Terra a Vénus ( T V ) é tangente á órbita de Vénus e, portanto, per­ pendicular ao raio VS. Calcular V S é um problema fácil de trigonometría elementar. Em qualquer outra orientado, digamos V ’, a distáncia anguláf náo é máxima.

A distáncia TS, ou o tamanho médio do raio da órbita da Terra, no sistema de Copérnico é conhecida como “ unidade astronómica” . Assim, a Equaqáo (1 ) pode ser reescrita como VS =

(seno de a) X 1 U A

(2 )

Pelo uso déste método simples, Copérnico podia determinar as distancias planetárias (em unidades

astronómicas) com grande exatidáo, como podemos ver na tabela seguinte, que mostra os valores de Copérnico e os valores atualmente aceitos para as distancias dos planétas ao Sol. C O M P A R A g A O D O S V A L O R E S D E C O PÉ R N IC O E M O D E R N O S P A R A O S E L E M E N T O S DO S IS T E M A S O L A R Período Si­ nódico (* ) Médio

Planfta

C

M

Venus .......... Terra ____ Marte .......... Júpiter ___ ..

116d 584d

116d 584d

780d 399d

780d 399d

. .. ..

378d

378d

Mercurio ....

Saturno

Distáncia Média ao Sol (* * )

Período Sideral C 88d 225d 365 l/4 d 687d

M

C

M

87,9 Id

0,36

225,00d 365,26d

0,72

0,391 0,721

686,98d

12a

11,86a

30a

29,51a

1,0 1,5 5 9

1,000 1,52 5,2 9,5

Além disso, Copérnico pode determinar com igual exatidáo o tempo necessário a cada planéta para completar uma revolugáo de 360 graus ao redor do Sol, ou o seu período sideral. Como Copérnico conhecia os tamanhos relativos das órbitas planetá­ rias e os períodos siderais dos planétas, éle era ca­ paz de predizer com érro tolerável as posigóes futuras dos planétas. No sistema de Ptolomeu, as distancias dos planétas náo representavam papel algum, uma vez que náo havia meio de determinálas por observagóes. Desde que os tamanhos reía(*) Períodos sinódicos sao os tempos entre conjuncoes dos mesmos corpos. (**) Expresso em unidades astronómicas.

48

tivos e períodos relativos de movimento sobré'a deferente e o epiciclo fóssem os mesmos, as obser­ v a r e s ou aparéncias seriam idénticas, como pode­ mos ver na Fig. 13.

F ig. 13. N o sistema de Ptolomeu, as previsoes das posigóes planetarias se assentavam na medida dosVLngulos, nao ñas distancias. Esta ilustragáo mostra que as observagoes seriam as mesmas independentemente da distáncia, se os períodos relativos de movimento fóssem os mesmos.

Que o sistema ptolomaico tratava principalmente com ángulos ao invés de distáncias, pode ser visto muito claramente no exemplo da Lúa. Era um dos principáis aspectos do sistema ptolomaico, que a posiqáo aparente da Lúa podia ser descrita com grau relativamente alto de exatidáo. Mas isto requería um artificio especial, e se a Lúa tivesse realmente 49

seguido tal caminho, deveria sofrer uma enorme variaqáo no seu tamanho aparente, muito maior do que o observado. Dissemos antes que o sistema de um só círculo para cada planéta, com um único círculo para a Lúa, e dois movimentos diferentes para a Terra, constituía uma versáo simplificada do sistema de Copérnico. O fato é que tal sistema náo está de acórdo com a observaqáo, a náo ser de um modo grosseiro. A fim de tornar seu sistema mais exato, Copérnico achou necessário introduzir um certo número de complexidades, muitas das quais recordam os artifcios do sistema ptolomaico. Por exem­ plo, era obvio para Copérnico (como o inverso tinha sido obvio para Hiparco) que a Terra náo se pode mover uniformemente segundo um círculo, tendo o Sol no centro.* Assim, Copérnico colocou o Sol, náo no centro da órbita da Terra, mas afastado, a certa distáncia. O centro do sistema solar e do universo, no sistema de Copérnico, nao era assim o Sol, e sim um “ sol medio” , ou o centro da órbita da Terra. Daí ser preferível chamar ao sistema de Copérnico, sistema heliostático ao invés de sis­ tema heliocéntrico. * Copérnico féz sérias objeqóes ao sistema do equante, introduzido por Ptolomeu. Para o seu sistema era necessário, como o tinha sido para os antigos astrónomos gregos, que os planétas se movessem uniformemente ao longo de círculos. ^ A fim de imaginar órbitas planetárias ao redor do Sol, que dessem resultados conformes com a observaqáo real, Copérnico acabou por introduzir círculos movendo-se em círculos, de modo muito semelhante ao que Ptolomeu tinha feito.#, A principal diferenqa aqui, é que Ptolomeu tinha introduzido tal combinagáo de círculos também para levar em conta o movimento retrógrado, enquanto que Copémico (Fig. 14) levava em conta o movimento 50

51

retrógrado, pelo fato de que os planétas se movem em suas respectivas órbitas com velocidades dife­ rentes ( * ) . Uma comparado das duas figuras re­ presentando os sistemas de Ptolomeu e de Copérnico náo mostra que um era, á primeira vista, “ mais simples” que o outro. Copérnico versus Ptolomeu í^ u a is eram as vantagens e desvantagens do sis­ tema de Copérnico, comparado ao de Ptolomeu? Em primeiro lugar, uma decidida vantagem do sistema de Copérnico era a relativa facilidade com que explicava o movimento retrógrado ,dos plané­ tas e mostrava porque suas posiqSes, relativamen­ te ao Sol, determinavam o movimento retrógrado. Uma segunda vantagem do sistema de Copérnico era que éle forneceu uma base para determinar as dis­ tancias dos planétas ao Sol, bem como a Terra, if Diz-se algumas vézes que o sistema de Copérnico foi uma grande simplificado, mas isto é baseado num mal-entendido. Se o sistema de Copérnico for considerado sob a forma rudimentar de um só círculo para cada planéta ao redor do Sol, entáo a suposigáo será válida, mas quando consideramos que éle teve que usar círculo sobre círculo, exata­ mente como o féz Ptolomeu, entáo a simplificado maior é que os círculos necessários para as rotaqóes diárias aparentes do Sol, estrélas, planétas e Lúa, no sistema de Ptolomeu, podiam ser eliminados admitindo-se que a Terra gire diariamente ao re­ (*) Uma complexidade final do sistema do Copérnico surgiu das dificuldades que. éle experimentou ao levar em conta o fato de que o eixo da Terra girante permanece fixo na sua orientaAa'^>At Os dados seguintes, obtidos em experiencias* reais, mostram que a aceleragáo varia com a latitude: 192 -

I * Latitude 0o (equador) 20° 40° 60° 90°

Aceleraqáo da queda livre 978,039 cm/seg2 978,641 980,171 981,918 983,217

Nos dias de Newton, a aceleraqáo em queda livre era determinada a partir do comprimento de um péudulo de segundos — péndulo que tem perío­ do de dois segundos. A equaqáo para o período T de um péndulo comum oscilando ao longo de um arco suficientemente pequeño é : T = 2 ix, \/~T 9 onde l é o comprimento do péndulo (calculado até o centro da pequeña esfera amarrada ao fio) e g é a aceleraqáo de queda livre. Halley, quando foi de Londres a Santa Helena, verificou que era necessário encurtar o comprimento do -«seu péndulo, a fim de que éle continuasse a bater segundos. A mecánica de Newton nao só explica essa variaqáo, mas leva a uma previsáo da forma da Terra, uma esferoide oblonga, achada nos póles, bojuda no equador. As variaqóes de g, a aceleraqáo da queda livre, levam a variaqóes no péso de qualquer objeto, físico transportado de uma a outra latitude. Uma análise completa desta variaqáo de péso exige a consideraqáo de um segundo fator, a fórqa que surge da rotaqáo do objeto juntamente com a Terra. O fator que entra aqui é v2fr, onde v é a . velocidade linear ao longo de um círculo de raio r. Em diferentes latí193

tudes haverá diferentes valores tanto para v como para r. Além disso, para relacionar o efeito da rotacáo com o peso, devemos tomar uma componente ao longo de uma reta tragada do centro da Terra á posigáo em questáo, visto que o efeito da rotagáo ocorre no plano do movimento circular, ou ao longo de um paralelo de latitude. Devido á agáo dessas fórgas de rotagáo é que, de acórdo com a Física newtoniana, a Terra adquiriu a sua forma. * Uma segunda conseqüéncia do bójo equatorial é a precessáo dos equinóxios. Em dados numéricos, a diferenga entre os raios polar e equinoxial da Terra pode náo parecer muito grande raio equatorial = 6.378,388 km raio polar — 6.356,909 km Mas se representamos a Terra por um globo de 18 centímetros, a diferenga entre os diámetros menor e maior seria de cérca de 1/16 de centímetro^.Newton mostrou que a precessáo se dá porque a Terra gira em torno de um eixo inclinado em relagáo ao plano da sua órbita, o plano da eclítica.^ Além da atragáo gravitacional que mantém a Terra em sua órbita, o Sol exercp uma agáo sobre a parte inais saliente, tendendo assim a endireitar o eixo. O Sol age no sentido de tornar o eixo da Terra perpendicular ao plano da eclítica (Fig. 33A ), ou a fazer o plano do “ b ójo” coincidir com o plano da eclítica. A o mesmo tempo, a Lúa age no sentido de tornar o plano do “ b ójo” coincidente com o plano de sua órbita (in­ clinado cérca de 5.° em relagáo á eclítica). Se a Terra fósse perfeitamente esférica, as agóes do Sol e da Lúa seriam simétricas e náo haveria tendéncia para o eixo “ endireitar-se” ; as linhas de fórga das agóes gravitacionais do Sol e da Lúa passariam pelo centro da Terra. 194

Ora, é um resultado da Física newtoniana que, se uma fórqa é exercida no sentido de mudar a orientaqáo do eixo ao redor do qual um corpo está gi­ rando, o efeito é que o próprio eixo, ao invés de

/orea de _ . atracQo do sol

mudar sua orientaqáo, fica submetido a um movi­ mento cónico. Éste efeito pode ser observado num piáo que gira. O eixo de rotaqáo nao é geralmente vertical. O péso do piáo tende, portanto, a inclinar o eixo de rotaqáo, de modo a torná-lo horizontal. O péso tende a produzir uma rotaqáo cujo eixo esteja em ángulo reto com o eixo de rotaqáo do piáo, e o resultado é o movimento cónico que mostra a Fig. 33B. O fenómeno da precessáo foi descoberto no sáculo II A.C., por Hiparco, mas sua causa era totalmente desconhecida antes de Newton. A explicaqáo de Newton, náo apenas resolveu um antigo mistério, mas é um exemplo de como era 195

possível explicar a forma precisa da Terra, apli­ cando a teoria ás observares astronómicas. Foram verificadas as previsóes de Newton, quando o matemático francés P'ierre L. M. de Maupertuis mediu o comprimento de um grau de arco ao longo de um meridiano na Lapónia e comparou o resultado com o comprimento de um grau ao longo do meri­ diano, mas num local mais próximo do equador. O resultado foi uma vitória impressionante para a nova Ciéncia. Outra realizaqáo ainda da teoria de Newton íoi uma explicadlo geral das marés, relacionando-as com a a
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