O Corpo Incerto. Francisco Ortega

June 17, 2019 | Author: nuila | Category: Subjectivity, Human Body, Books, Ciência, Philosophical Science
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O CORPO INCERTO

O CORPO INCERTO CORPOREIDADE, TECNOLOGIAS MÉDICAS E CULTURA CONTEMPORÂNEA 

Francisco Ortega

Copyright © Francisco Ortega Editora Garamond Ltda Rua da Estrela, 79 3º andar - Cep 20251-021 Rio de Janeiro, RJ, Brasil Telefax (21) 2504-9211 e-mail: [email protected] Revisão 

Nina Barbieri Capa

Renata Negrelly sobre ilustração de Andreas Vesalius Editoração Eletrônica

Renata Negrelly

CIP-BRASIL, CATALOGAÇÃO-NA-FONTE DO SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS

O88c

Ortega, Francisco, 1967O corpo incerto : corporeidade, tecnologias médicas e cultura contemporânea / Ortega Francisco. - Rio de Janeiro : Garamond, 2008. 14x21cm; 256p. Inclui bibliografia ISBN 978-85-7617-140-9 1. Imagem corporal. 2. Corpo humano. 3. Beleza física. 4. Inovações médicas. I. Título. 08-0589.

CDD: 306 CDU: 316.7

A minha filha Luisa, um novo começo.

Gostaria de agradecer a uma série de pes-  soas que de uma maneira ou outra contri-  buíram para a realização deste livro. A minha esposa e companheira, Bethâ-  nia, pelo apoio e estímulo constante e pela vida compartilhada. A meu amigo e colega, Jurandir Freire Costa, pela inspiração constante e pela amizade. Aos amigos, colegas e alunos do Instituto de Medicina Social da UERJ e do Progra-  ma de Pesquisas da Ação e do Sujeito (IMS-UERJ – PEPAS), especialmente a meu amigo e colega Benilton Bezerra Jr. Muitas idéias derivam de nossos cursos e discussões. A meu amigo Fernando Vidal, do Institu-  to Max Planck de História da Ciência de Berlim, e aos funcionários do Instituto, lugar de pesquisa privilegiado, que me forneceu um acesso ao material sem o qual este livro não existiria. A Bernard Andrieu, da Universidade de Nancy, pela disponibilidade e ajuda pres-  tada. A meu amigo, Pepe Duran, pela leitura

cuidadosa de alguns dos textos e pelas ótimas idéias. A Mechthild Fend, do Instituto Max Plan-  ck de História da Ciência de Berlim, pela sua ajuda fundamental na preparação das imagens deste livro. A Lilian Krakowski Chazan, pela leitura atenta de partes do livro. A Susan Aldworth, pela gentileza de ce-  der algumas imagens usadas neste livro. Aos doutores Waldir Leopércio Junior e Gabriel Treiger, pela ajuda quando o corpo me fez interromper a escrita deste livro. A meu amigo, Marcelo Land, que no mo-  mento necessário está sempre presente. Aos amigos Beni, Célia, Claudia, Gabi, Marcelo e Nando, pelos momentos feli-  zes. A minha mãe, Antonia, e ao meu irmão, Luis, presentes na distância. Last but not least, à Divane, Nájla, An-  dré e Nagib, pelo carinho e apoio, e pela hospitalidade pernambucana, que me faz sentir em casa. Nájla, especialmente, sempre me animou a acabar este livro.

Nosso corpo é o exemplo mais destacado do ambíguo.

William James

SUMÁRIO

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Introdução

17

Do corpo submetido à submissão ao corpo

55

Modificações corporais na cultura contemporânea

69

O corpo transparente: para uma história cultural da visualização médica do corpo

187

O corpo entre construtivismo e fenomenologia

231

Referências bibliográficas

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O CORPO INCERTO

INTRODUÇÃO

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O CORPO INCERTO

INTRODUÇÃO

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“N

osso corpo é o exemplo mais destacado do ambíguo”. A observação de William James, escolhida como lema deste livro,

descreve de maneira precisa o estatuto do corpo na cultura contemporânea. Os textos que compõem este volume refletem sobre essa situação e procuram mapear instâncias diferentes, nas quais a ambigüidade corporal se apresenta. Trata-se de analisar os efeitos, na sub jetividade, do que se vem chamando de culto ao corpo, ou de cultura somática, e, em especial, o fato paradoxal de que o aumento de controle e atenção sobre o corpo produz uma maior incerteza sobre ele. Assistimos a numerosas tentativas de mudar o corpo, de personalizá-lo, que abarcam desde o fisiculturismo, as cirurgias plásticas, a arte corporal, até formas mais radicais de modificações corporais, que incluem amputações voluntárias de membros. O corpo tornou-se o espaço da criação e da utopia, um continente virgem a ser conquistado. No fundo, poucos estão totalmente satisfeitos com o corpo que têm, e se podemos melhorá-lo e possuímos a tecnologia e os recursos suficientes, por que não aperfeiçoá-lo? Precisamente devido à sobrevalorização e ao enorme investimento simbólico que vem sofrendo, o corpo tornou-se objeto de desconfiança, receio, angústia, insegurança e mal-estar para muitos: aceitamos apenas o corpo em transformação, em mutação constante. Uma suspeita do corpo que se transfigura em “pavor da carne”, desconfiança da materialidade corporal e desejo de sua superação. O corpo é o abjeto; a abjeção, neste contexto, deve ser entendida como rejeição corporal da corporeidade, que encontramos em vários modelos corporais de nossa cultura: desde os ideais descarnados de pureza digital das modelos fotográficas, das quais a mínima gordurinha é digitalmente eliminada, até os diversos projetos

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O CORPO INCERTO

em realidade virtual, inteligência artificial, pós-humanismos e a arte carnal de Orlan e Sterlac. Este último milita pela obsolescência do corpo e a superação das limitações que a corporeidade nos impõe, prolongando, assim, a longa tradição do pensamento ocidental de desprezo do corpo e de separação da mente e do corpo.  Analogamente, na tecnobiomedicina contemporânea, os corpos são progressivamente virtualizados. O uso crescente de novas tecnologias de visualização, associado ao desenvolvimento de anatomias e clínicas virtuais, se adequa a uma prática médica cada vez mais digitalizada, levando a ultrapassar os limites entre o corpo real e o virtual. O virtual não é mais o oposto do real, aparece como seu prolongamento, e o corpo é basicamente uma imagem que se apresenta dotada de materialidade, em concorrência com a materialidade real do corpo físico. Trata-se de um corpo construído, despojado de sua dimensão subjetiva, descarnado. O corpo obsoleto da arte carnal encontra o corpo obsoleto produzido pelas tecnologias de visualização médica. Também nos debates acerca do estatuto do corpo reencontramos esse mesmo modelo descarnado, presente em diversas variantes do construtivismo social que rejeitam a sua materialidade e experiência subjetiva. Acreditamos que uma certa desconfiança e ansiedade frente a nossa corporeidade estão operando tanto em diversos ideais de corpo disponíveis na nossa cultura, como no corpo fornecido pelas tecnologias médicas e nas reflexões de múltiplas versões de construtivismo. Este livro transita por esses campos diversos – o culto ao corpo, as modificações corporais, a visualização médica e os debates sobre o corpo – refletindo sobre os elementos comuns e alertando sobre os riscos éticos e psicológicos envolvidos no desprezo da corporeidade e seus efeitos na construção subjetiva.

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