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N IETZSCHE
URORA
COLEÇÃO GRANDES OBRAS DO P ENSAMENTO UNIVERSAL 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54 55 56 57 58 59 60 61 62 63 64 65 66 67
Assim Falava Zaratustra Nietzsche A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado Engels Elogio da Loucura Erasmo de Rotterdam A República (parte I) Platão A República (parte II) Pla tão As Paixões da Alma Descartes A Origem da Desigualdade entre os Homens Rousseau A Arte da Guerra Maquiavel Utopia Thomas More Discurso do Método Descartes Monarquia Dante Alighieri O Príncipe Maquiavel O Contrato Social Rousseau Banquete Dante Alighieri A Religião nos Limites da Simples Razão Kant A Política Aristóteles Cândido ou o Otimismo O Ingênuo Voltaire Reorganizar a Sociedade Comte A Perfeita Mulher Casada Luis de León A Genealogia da Moral Nietzsche Reflexões sobre a Vaidade dos Homens Mathias Aires De Pueris A Civilidade Pueril Erasmo de Rotterdam Caracteres La Bruyère Tratado sobre a Tolerância Voltaire Investigação sobre o Entendimento Humano David Hume A Dignidade do Homem Pico della Miràndola Os Sonhos Quevedo Crepúsculo dos Ídolos Nietzsche Zadig ou o Destino Voltaire Discurso sobre o Espírito Positivo Comte Além do Bem e do Mal Nietzsche A Princesa de Babilônia Volta ire A Origem das Espécies (Tomo 1) Darwin A Origem das Espécies (Tomo II) Darwin A Origem das Espécies (Tomo III) Darwin Solilóquios Santo Agostinho Livro do Amigo e do Amado Lúlio Fábulas Fedro A Sujeição das Mulheres Stuart Mill O Sobrinho de Rameau Diderot O Diabo Coxo Guevara Humano, Demasiado Humano Nietzsche A Vida Feliz Sêneca Ensaio sobre a Liberdade Stuart Mill A Gaia Ciência Nietzsche Cartas Persas 1 Montesquieu Cartas Persas II Montesquieu Princípios do Conhecimento Humano Berkeley O Ateu e o Sábio Volta ire Livro das Bestas Lúlio A Hora de Todos Quevedo O Anticristo Nietzsche A Tranqüilidade da Alma Sêneca Paradoxo sobre o Comediante Diderot O Conde Lucanor Juan Manuel O Governo Representativo Stuart Mill Ecce Homo Nietzsche Cartas Filosóficas Voltaire Carta sobre os Cegos Endereçada àqueles que Enxergam Diderot A Amizade Cícero Do Espírito Geométrico Pensamentos Pascal Crítica da Razão Prática Kant A Velhice Saudável Cícero Dos Três Elementos López Medel Tratado da Reforma do Entendimeno Spinoza Aurora Nietzsche Belfagor, o Arquidiabo A Mandrágora Maquiavel
FRIEDRICH N IETZSCHE
AURORA TEXTO INTEGRAL
TRADUÇÃO ANTONIO C ARLOS BRAGA
Av. P ROFª IDA KOLB, 551 C ASA VERDE CEP 02518-000 S ÃO P AULO SP TEL.: (11) 3855-2100 F AX: (11) 3857-9643 INTERNET: www.escala.com.br E - MAIL:
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NIETZSCHE AURORA TÍTULO ORIGINAL ALEMÃO MORGENRÖTHE
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D IAGRAMAÇÃO: C IBELE LOTITO LIMA R EVISÃO: D ENISE S ILVA R OCHA C OSTA E M ARIA NAZARÉ DE S OUZA LIMA B ARACHO CAPA: C IBELE LOTITO LIMA COLABORADOR: LUCIANO O LIVEIRA D IAS COORDENAÇÃO E DITORIAL: C IRO MIORANZA
C ONTRA C APA Aurora, o d es p er ta r d e u m a n ova m or a lid a d e. E m a n cip a çã o d a r a zã o d ia n t e d a m or a l. Um a vez qu e a m or a lid a d e n ã o é ou tr a cois a qu e a ob ed iên cia a os cos tu m es , d e qu a lqu er n a t u r eza qu e es tes s eja m , Aurora qu er r om p er es s a m a n eir a tr a d icion a l d e a gir e d e a va lia r . Por ta n t o, à m ed id a qu e o s en t id o d a ca u s a lid a d e aumenta, diminui a extensão do domínio da moralidade. De fato, a com p r een s ã o
das
liga ções
efetiva s
da
ca u s a lid a d e
d es tr ói
consid er á vel n ú m er o d e ca u s a lid a d es im a gin á r ia s qu e for a m s en d o ju lga d a s n o d ecu r s o d os tem p os com o fu n d a m en tos d a m or a l. O p od er lib er a d or d a r a zã o t em em s i a ca p a cid a d e d e d es m itifica r
s ign ifica d os
s ocia is
in s titu íd os
p ela
t r a d içã o;
o
in d ivíd u o, em s u a a tivid a d e r a cion a l, s e d es cob r e com o cr ia d or d e n ovos va lor es . O in d ivíd u o é ca p a z, p or ta n t o, d e r om p er o elo h is tór ico qu e u n e tr a d içã o e m or a lid a d e, op on d o-lh e o binômio r a zã o e a fir m a çã o d e s i. Com es s a s p r in cip a is r efer ên cia s , em Aurora,
Nietzs ch e
d is cu te
a
h is tór ia
d os
cos tu m es
e
da
m or a lid a d e, a h is tór ia d o p en s a m en to e d o con h ecim en to, a lém d e ressa lta r os p r econ ceitos cr is tã os qu e va r a r a m a h is tór ia d a h u m a n id a d e. A s egu ir , s e con cen tr a em a n a lis a r a n a tu r eza e a h is tór ia d os s en t im en t os m or a is , d os p r econ ceitos filos óficos e d os p r econ ceitos d a m or a l a lt r u ís ta . Con tin u a d ep ois es ta b elecen d o o contr a p on to en tr e cu ltu r a e cu ltu r a s ou civiliza çã o e civiliza ções , p a r a r es s a lt a r a in ter ven çã o d o. E s t a d o, d a p olítica e d os p ovos n a h is tór ia . Fin a lm en te, p a r ece d iver tir -s e a o a p r es en ta r cois a s es s en cia lm en te h u m a n a s e cor r iqu eir a s e p in ta r o u n iver s o d o p en s a d or . Com o a a u r or a a n u n cia u m n ovo d ia , Aurora, para Nietzs ch e, é ta m b ém u m n ovo d es p er ta r p a r a u m a ver d a d eir a vid a do homem e da humanidade inteira.
ÍNDICE APRESENTAÇÃO
......................................................................
VIDA E OBRAS DO AUTOR P REFÁCIO
8
........................................................
11
............................................................................
14
LIVRO P RIMEIRO
..............................................................
22
LIVRO S EGUNDO
..............................................................
95
LIVRO T ERCEIRO
...........................................................
1 49
LIVRO QUARTO
..............................................................
202
LIVRO QUINTO
...............................................................
2 72
APRESENTAÇÃO Aurora s ign ifica o d es p er ta r d e u m a n ova m or a lid a d e. É a em a n cip a çã o d a r a zã o d ia n t e d a m or a l. Um a vez qu e a m or a lid a d e n ã o é ou tr a cois a qu e a ob ed iên cia a os cos tu m es , d e qu a lqu er n a tu r eza qu e es tes s eja m , Aurora qu er r om p er es s a m a n eir a tr a d icion a l d e a gir e d e a va lia r . Por ta n to, à m ed id a qu e o s en t id o d a ca u s a lid a d e a u m en t a , d im in u i a exten s ã o d o d om ín io d a m or a lid a d e. De fa to, a com p r een s ã o d a s liga ções efetiva s d a ca u s a lid a d e
d es tr ói
con s id er á vel
n ú m er o
de
ca u s a lid a d es
im a gin á r ia s qu e for a m s en d o ju lga d a s n o d ecu r s o d os tem p os com o fu n d a m en tos d a m or a l. O p od er lib er a d or d a r a zã o tem em si a capacidade de desmitificar significados sociais instituídos pela tradição; o in d ivíd u o, em s u a a tivid a d e r a cion a l, s e d es cob r e com o cr ia d or d e n ovos va lor es . O in d ivíd u o é ca p a z, p or ta n to, d e r om p er o elo h is t ór ico qu e u n e tr a d içã o e m or a lid a d e, op on d o-lh e o b in ôm io r a zã o e a fir m a çã o d e s i. O m u n d o d a tr a d içã o é es s en cia lm en te a qu ele em qu e os va lor es d a a u t or id a d e s ã o in d is cu tíveis .
Pa r a
r ever t er
es s a
s itu a çã o,
para
con fer ir
à
h u m a n id a d e u m r en ova d o s ta tu s d e in d ep en d ên cia e lib er d a d e, n a d a m a is d ecis ivo qu e a lou cu r a . Com efeito, n u m m u n d o s u b m is s o à tr a d içã o, id éia s n ova s e d iver gen tes , a p r ecia ções e ju ízos
d e va lor con tr á r io s ó p u d er a m
s u r gir e s e en r a iza r
apresentando-s e s ob a figu r a d a lou cu r a . Qu a s e em tod a p a r te, é a lou cu r a qu e a p la in a o ca m in h o d a id éia n ova , qu e con d en a a im p os içã o d e u m cos tu m e, d e u m a s u p er s tiçã o ven erada , com o
diz o próprio Nietzsche. Den tr o d es s a p er s p ectiva , Aurora s e con figu r a r ea lm en te com o u m n ovo d ea lb a r , com o n ovos a lb or es n a h is tór ia d a in d ivid u a lid a d e n u m con texto s ocia l. Um n ovo s er s e d es en h a . Um a n ova for m a d e p en s a r , d e a gir e d e s e com p or ta r . Um n ovo id ea l d e s i d ia n te d o ou tr o, u m n ovo id ea l d e ca d a u m d ia n te d a sociedade. Um novo tempo. Uma nova vida. É tudo o que o homem qu er . S er e s er ele p r óp r io. As s u m ir o p a s s a d o en qu a n t o p os s a r ep r es en ta r u m a r iqu eza p a r a o p r es en t e e u m a p r ojeçã o p a r a u m fu tu r o livr e, in d ep en d en te
e
d es s a cr a liza d o d a s
im p os ições ,
p r econ ceitos e s u p er s tições d o p a s s a d o ca lca d o n a m or a lid a d e d os cos tu m es . Is s o s ign ifica t a m b ém d es m itifica r a h is tór ia , lib er t á -la d e s eu r om a n tis m o, d e s u a s ilu s ões , d e s u a s cr en ça s e d e s u a s u b m is s ã o a os id ea is im p os t os p ela fé cega e p ela r eligiã o. Is s o s ign ifica a in d a en t r a r em ou t r o ca m p o d a ética e d a es tética , ter ou tr a vis ã o d o m u n d o e d e s u a s a n tiga s
conquistas , com o qu e
m er gu lh a r em n ova p er s p ectiva d o p os s ível r ea l, d o r a cional, d er r ota n d o o ir r a cion a l, o ir r a zoá vel, tu d o o qu e foi im p os to p ela d ita d u r a
do
p en s a m en to
p r econ ceitu os a , d a
u lt r a p a s s a d o,
r eligiã o im p os tor a , n ova
da
id eologia
p er s p ectiva
qu e
d ever ia leva r a r ep en s a r a fin itu d e h u m a n a for a d e tod o en foqu e teológico e, p or con s egu in te, leva r a lib er ta r tod a m or a lid a d e d a qu ilo qu e ela r ep r es en ta , ou s eja , o ôn u s d os cos tu m es , d e u m a tradição milenar, de uma religião sufocante. Com es s a s p r in cip a is r efer ên cia s , em Au rora, Nietzsche d is cu te a h is tór ia d os cos tu m es e d a m or a lid a d e, a h is tór ia d o p en s a m en to e d o con h ecim en t o, a lém d e r es s a lt a r os p r econ ceitos cr is tã os qu e va r a r a m a h is t ór ia d a h u m a n id a d e. A s egu ir , s e con cen tr a em a n a lis a r a n a t u r eza e a h is tór ia d os s en tim en t os m or a is , d os p r econ ceitos filos óficos e d os p r econ ceitos d a m or a l
a ltr u ís ta . Con t in u a d ep ois es t a b elecen d o o con tr a p on to en tr e cu ltu r a e cu ltu r a s ou civiliza çã o e civiliza ções , p a r a r es s a lta r a in ter ven çã o d o E s ta d o, d a p olítica e d os p ovos n a h is tór ia . Fin a lm en te,
p a r ece
d iver tir -s e
ao
a p r es en ta r
coisas
es s en cia lm en te h u m a n a s e cor r iqu eir a s e p in ta r o u n iver s o d o p en s a d or . Com o a a u r or a a n u n cia u m n ovo d ia , Aurora, para Nietzs ch e, é ta m b ém u m n ovo d es p er ta r p a r a u m a ver d a d eir a vid a do homem e da humanidade inteira.
Ciro Mioranza
VIDA E O BRAS DO AUTOR Fr ied r ich Wilh elm Nietzs ch e n a s ceu em Röck en , Alem a n h a , n o d ia 1 5 d e ou tu b r o d e 1 8 4 4 . Ór fã o d e p a i a os 5 a n os d e id a d e, foi in s t r u íd o p ela m ã e n os r ígid os p r in cíp ios d a r eligiã o cr is tã . Cu r s ou teologia e filologia clá s s ica n a Un iver s id a d e d e Bon n . Lecion ou Filologia n a Un iver s id a d e d e Ba s iléia , n a S u íça , d e 1 8 6 8 a 1 8 7 9 , a n o em qu e d eixou a cá t ed r a p or d oen ça . Pa s s ou a r eceb er , a
títu lo d e p en s ã o, 3 .0 0 0
p er m itia m
via ja r
e
fin a n cia r
a
fr a n cos
p u b lica çã o
s u íços de
qu e lh e
s eu s
livr os .
Empreendeu muitas viagens pela Costa Azul francesa e pela Itália, d es fr u ta n d o d e s eu tem p o p a r a es cr ever e con viver com a m igos e in telectu a is .
Nã o
con s egu in d o
leva r
a
t er m o
uma
gr a n d e
a s p ir a çã o, a d e ca s a r -s e com Lou An d r ea s S a lom é, p or ca u s a d a s ífilis con tr a íd a em 1 8 6 6 , en tregou-s e à s olid ã o e a o s ofr im en to, isolando-s e em s u a ca s a , n a com p a n h ia d e s u a m ã e e d e s u a ir m ã . Atin gid o p or cr is es d e lou cu r a em 1 8 8 9 , p a s s ou os ú ltim os a n os d e s u a vid a r eclu s o, vin d o a fa lecer n o d ia 2 5 d e a gos to d e 1 9 0 0 , em Weim a r . Nietzs ch e er a d ot a d o d e u m es p ír ito ir r equ ieto, p er qu ir id or , p r óp r io d e u m gr a n d e p en s a d or . De ín d ole r om â n tica , p oeta p or n a t u r eza , leva d o p ela im a gin a çã o, Nietzs ch e er a o tip o d e h om em qu e vivia r ecu r va d o s ob r e s i m es m o. E m otivo e fa s cin a d o p or tu d o o qu e r es p len d e vid a , er a a o m es m o t em p o s ed en to p or lib er d a d e es p ir itu a l e in telectu a l; leva d o p elo in s tin to ao mundo irreal, ao mesmo tempo era apegado ao mundo concreto e r ea l; r eligios o p or n a tu r eza e p or for m a çã o, er a a o m es m o tem p o
u m d em olid or d e r eligiões ; en tu s ia s t a d efen s or d a b eleza d a vid a , er a ta m b ém cr ítico fer oz d e tod a fr a qu eza h u m a n a ; con h eced or d e s i m es m o, er a s eu p r óp r io a lgoz; s eu es p ír ito er a ca m p o a b er to em qu e ir r om p er a m a s m a is va r ia d a s ten d ên cia s , s ob a in flu ên cia d e sua agitada consciência. Espírito ir r equ ieto e in s a tis feito, con s ciên cia er u p tiva e cr ítica , vivia u m a vid a d e lu ta s con tr a s i m es m o, d e ch oqu es com a humanidade, de paradoxos sem limite. Assim era Nietzsche.
PRINCIPAIS OBRAS A gaia ciência (1882) A genealogia da moral (1887) Além do bem e do mal (1886) A origem da tragédia (1872) Assim falava Zaratustra (1883) Aurora (1881) Ecce Homo (1888) Humano, demasiado humano (1878) O anticristo (1888) O caso Wagner (1888) Crepúsculo dos ídolos (1888) Opiniões e sentenças misturadas (1879) O viajante e sua sombra (1879) Vontade de potência (1901)
AURORA R EFLEXÕES SOBRE OS PRECONCEITOS MORAIS
PREFÁCIO 1 Nes te livr o en con t r a -s e a gin d o u m s er
subterrâneo
que
ca va , p er fu r a e cor r ói. Ver -se-á , d es d e qu e s e ten h a olh os p a r a ta l tr a b a lh o
nas
p r ofu n d eza s ,
com o
a va n ça
len ta m en te,
com
cir cu n s p ecçã o e com u m a s u a ve in flexib ilid a d e, s em qu e s e p er ceb a em d em a s ia a a n gú s tia qu e a com p a n h a a p r iva çã o p r olon ga d a d e a r e d e lu z; p od er -se-ia a té ju lgá -lo feliz p or r ea liza r es s e tr a b a lh o ob s cu r o. Nã o p a r ece qu e a lgu m a fé o gu ie, qu e a lgu m a con s ola çã o o com p en s e? Ta lvez qu eir a ter p a r a ele u m a lon ga
ob s cu r id a d e,
cois a s
qu e
lh e
s eja m
p r óp r ia s ,
cois a s
in com p r een s íveis , s ecr eta s , en igm á t ica s , p or qu e s a b e o qu e t er á em t r oca : s u a m a n h ã s ó p a r a ele, s u a r ed en çã o, s u a aurora?... Certamente voltará: não lhe perguntem o que procura lá em baixo; ele
m es m o
o
d ir á ,
es s e
Tr ofôn io,
es s e
s u b ter r â n ea , u m a vez qu e d e n ovo s e ten h a
s er
de
a p a r ên cia
tor n a d o h om em .
Costuma-s e es qu ecer in t eir a m en te o s ilên cio qu a n d o s e es t eve soterrado tanto tempo como ele, só tanto tempo como ele.
2 Com efeito, m eu s p a cien tes a m igos , vou d izer -lh es o qu e p r ocu r ei lá em b a ixo, vou d izer -lh es n es te p r efá cio t a r d io, qu e p od er ia ter -s e fa cilm en te tor n a d o u m ú ltim o a d eu s , u m a or a çã o fú n eb r e, p ois voltei
e r e-em er gi. Nã o p en s em qu e p r eten d o
envolvê-los em s em elh a n t e em p r es a feliz ou m es m o s om en te em s em elh a n te s olid ã o! De fa t o, qu em p er cor r e ta is ca m in h os n ã o en con tr a n in gu ém : is s o é p ecu lia r a os
ca m in h os p a r ticu la r es .
Ninguém
p r óp r io
vem
em
s eu
a u xílio;
ele
d eve
livr a r -se,
com p leta m en te s ó, d e tod os os p er igos , d e tod os os a ca s os , d e tod a s a s m a ld a d es , d e t od a s a s tem p es ta d es qu e s ob r evêm . De fa t o, tem s eu ca m in h o qu e é próp rio d ele
e, em a cr és cim o, a
a m a r gu r a , p or vezes o d es d ém , qu e lh e ca u s a m es s e
próprio
dele ; d eve-s e en u m er a r , en tr e es s es elem en tos d e a m a r gu r a e d e d es p r ezo, a in ca p a cid a d e, p or exem p lo, em qu e s e en con tr a m s eu s a m igos d e a d ivin h a r on d e ele es tá ou p a r a on d e va i, a p on t o d e p er gu n ta r em à s vezes : Com o? S er á qu e is s o é a va n ça r ? S er á qu e ainda tem
um caminho?
Foi en tã o qu e em p r een d i u m a cois a qu e n ã o p od ia s er p a r a tod os : d es ci p a r a a s p r ofu n d eza s ; p a s s ei a p er fu r a r o ch ã o, com ecei a exa m in a r e a m in a r u m a velh a confiança s ob r e a qu a l, h á a lgu n s m ilh a r es d e a n os , n ós , os filós ofos , tem os o cos tu m e d e con s tr u ir , com o s ob r e o ter r en o m a is fir m e
e r econ s tr u ir
s em p r e, em b or a a té h oje t od a con s tr u çã o ten h a r u íd o: com ecei a m in a r
n os s a
con fia n ça
na
m ora l.
Ma s
s er á
qu e
não
me
compreendem?
3 Foi s ob r e o b em e o m a l qu e a té h oje r efletim os m a is p ob r em en te: es s e foi s em p r e u m tem a d em a s ia d o p er igos o. A con s ciên cia , a b oa r ep u ta çã o, o in fer n o, e à s vezes m es m o a p olícia , n ã o p er m itia m n em p er m it em im p a r cia lid a d e; é qu e, p er a n te a m or a l, com o p er a n te qu a lqu er a u tor id a d e, n ã o é permitido r efletir e, m en os a in d a , fa la r : n es s e p on to s e d eve obedecer! Des d e qu e o m u n d o exis te, n u n ca u m a a u tor id a d e qu is
s er tom a d a p or ob jeto d e cr ítica ; e ch ega r a o p on t o d e cr it ica r a m or a l, a m or a l en qu a n to p r ob lem a , t er a m or a l p or p r ob lem á tica : com o? Is s o n ã o foi
is s o n ã o é
imoral?
A m or a l, con tu d o,
n ã o d is p õe s om en te d e tod a es p écie d e m eios d e in tim id a çã o p a r a m a n ter à d is tâ n cia a s in ves tiga ções e os in s tr u m en t os d e tor t u r a : s u a s egu r a n ça s e b a s eia a in d a m a is n u m a cer ta a r te d e s ed u çã o qu e p os s u i
ela s a b e entusiasmar . E la con s egu e m u ita s vezes
com u m s im p les olh a r p a r a lis a r a von t a d e cr ítica e a té a tr a í-la p a r a s eu la d o, h a ven d o ca s os em qu e a la n ça m es m o con tr a s i p r óp r ia : d e m od o qu e, com o o es cor p iã o, cr a va o a gu ilh ã o em s eu p r óp r io cor p o. De fa t o, h á m u ito tem p o qu e a m or a l con h ece tod a es p écie d e lou cu r a s n a a r te d e p er s u a d ir : a in d a h oje, n ã o h á or a d or qu e n ã o s e d ir ija a ela p a r a lh e p ed ir a ju d a (b a s ta , p or exem p lo, ou vir n os s os a n a r qu is ta s : com o fa la m m or a lm en te p a r a con ven cer ! Ch ega m a té a ch a m a r -s e a s i p r óp r ios
os b on s e os
justos ). É qu e a m or a l, d es d e s em p r e, d es d e qu e s e fa la e s e p er s u a d e s ob r e a t er r a , s e a fir m ou com o a m a ior m es tr a d a sedução
e n o qu e d iz r es p eito a n ós , filós ofos , com o a
verdadeira Circe dos filósofos. Para que serve isso se, desde Platão, tod os os a r qu itet os filos óficos d a E u r op a con s tr u ír a m em vã o? S e tu d o a m ea ça r u ir ou já s e a ch a p er d id o n os es com b r os
tu d o o
qu e eles con s id er a va m lea l e s er ia m en t e com o aere p eren iu s 1 ? Ai! Com o é fa ls a a r es p os ta qu e a in d a s e d á h oje a s em elh a n te pergunta: Por qu e t od os eles n egligen cia r a m a d m itir a h ip ótes e, o exa m e d os fu n d a m en tos , u m a cr ítica d e t od a a r a zã o .
Aí es tá a
n efa s ta r es p os ta d e Ka n t 2 qu e r ea lm en te n ã o n os jogou a n ós , filós ofos , n u m ter r en o m a is fir m e e m en os en ga n a d or ! (
e, d ito
d e p a s s a gem , n ã o s er ia u m p ou co es tr a n h o exigir qu e u m in s tr u m en to s e p u s es s e a cr it ica r s u a p r óp r ia p er feiçã o e s u a p r óp r ia com p etên cia ? Qu e o p r óp r io in telecto reconhecesse seu
valor, sua força, seus limites? Não seria até um pouco absurdo? ). A ver d a d eir a r es p os ta ter ia s id o, a o con t r á r io, qu e tod os os filós ofos con s tr u ír a m s eu s ed ifícios s ob a s ed u çã o d a m or a l, in clu s ive Ka n t à cer teza , à
qu e a in ten çã o d eles s ó a p a r en tem en te s e d ir igia
verdade , m a s n a r ea lid a d e s e d ir igia a majestosos
ed ifícios m ora is : p a r a n os s er vir m os a in d a u m a vez d a in ocen te lin gu a gem d e Ka n t qu e con s id er a va com o s u a ta r efa e s eu tr a b a lh o, u m a ta r efa
m en os b r ilh a n te, m a s n ã o s em m ér ito ,
a p la n a r e con s olid a r o ter r en o on d e s er ia m con s tr u íd os es s es m a jes t os os
ed ifícios
m or a is
(Crítica
da
raz ã o
In felizm en t e, n ã o con s egu iu , b em p elo con t r á r io
pu ra,
II).
é p r ecis o
confessá-lo h oje. Com in ten ções t ã o exa lta d a s , Ka n t er a o d ign o filh o d e s eu s écu lo qu e p od e s er ch a m a d o, m a is qu e qu a lqu er ou tr o, o s écu lo d o en t u s ia s m o: com o Ka n t a in d a o é, e is s o é b om , com r ela çã o a o a s p ecto m a is p r ecios o d e s eu s écu lo (p or exem p lo, p or es s e b om s en s u a lis m o qu e in t r od u ziu em s u a teor ia d o con h ecim en to). Foi a in d a m or d id o p or es s a t a r â n tu la m or a l, qu e er a Rou s s ea u 3 , e ta m b ém s en tia p es a r em s u a a lm a o fa n a tis m o m or a l, d o qu a l ou tr o d is cíp u lo d e Rou s s ea u s e s en tia e s e p r ocla m a va s eu execu tor , refiro-m e a Rob es p ier r e 4 qu e qu er ia fu n d a r n a terra o im p ério d a s a b ed oria , d a ju s tiça e d a v irtu d e (Dis cu r s o d e 7 d e ju lh o d e 1 7 9 4 ). Por ou tr o la d o, com u m ta l fa n a tis m o fr a n cês n o cor a çã o, n ã o er a p os s ível a gir d e m od o m en os fr a n cês , m a is p r ofu n d o, m a is s ólid o, m a is a lem ã o qu e em n os s os d ia s a p a la vr a sentido
se é
alemão a in d a é p er m itid a n es s e
com o o fez Ka n t: p a r a d a r lu ga r a s eu im p ér io m or a l ,
viu-s e ob r iga d o a a cr es cen ta r u m m u n d o in d em on s t r á vel, u m para além lógico
é por isso que teve necessidade de sua crítica
d a r a zã o p u r a ! E m ou tr a s p a la vr a s : ele n ã o teria tid o n eces s id a d e dela, s e n ã o h ou ves s e u m a cois a qu e lh e im p or ta s s e m a is qu e
tudo
tor n a r o
m u n d o m or a l
in a t in gível p a r a a r a zã o
in a t a cá vel, m elh or a in d a ,
p ois ele s en tia com extr em a violên cia a
vulnerabilidade de uma ordem moral perante a razão! Com relação à n a tu r eza e à h is tór ia , com r ela çã o à in a t a imoralidade da n a tu r eza e d a h is tór ia , Ka n t, com o tod o b om a lem ã o, d es d e a or igem , er a u m p es s im is t a ; a cr ed ita va n a m or a l, n ã o p or qu e fos s e d em on s tr a d a p ela n a tu r eza e p ela h is tór ia , m a s a p es a r d e s er in ces s a n tem en t e con tr a d ita p ela n a tu r eza e p ela h is tór ia . Pa ra com p r een d er es t e a p es a r d e , ta lvez s e p od er ia r ecor d a r qu a lqu er cois a s em elh a n te em Lu ter o, es s e ou tr o gr a n d e p es s im is ta qu e, com tod a a in tr ep id ez lu ter a n a , qu is u m d ia tor n á -lo s en s ível a s eu s a m igos : S e s e p u d es s e com p r een d er p ela r a zã o com o o Deu s qu e m os tr a ta n t a cóler a e m a ld a d e p od e s er ju s to e b om , p a r a qu e s er vir ia en tã o a fé?
De fa t o, d es d e s em p r e, n a d a im p r es s ion ou
m a is p r ofu n d a m en te a a lm a a lem ã , n a d a a tentou m a is qu e es ta d ed u çã o, a m a is p er igos a d e tod a s , u m a d ed u çã o qu e con s titu i par a tod o ver d a d eir o la t in o u m p eca d o con tr a o es p ír it o: credo qu ia a b s u rd u m es t 5 . Com ele, a lógica a lem ã en tr a p ela p r im eir a vez na história do dogma cristão; mas ainda hoje, mil anos depois, nós, alemães de hoje, alemães tardios sob todos os pontos de vista p r es s en tim os a lgo d a ver d a d e, u m a possibilidade d e ver d a d e, p or tr á s d o céleb r e p r in cíp io fu n d a m en ta l d a d ia lética , p elo qu a l Hegel6 a ju d ou r ecen tem en te p a r a a vitór ia d o es p ír ito a lem ã o s ob r e a E u r op a
a con tr a d içã o é o m otor d o m u n d o, tod a s a s
cois a s s e con tr a d izem a s i p r óp r ia s
: p or qu e s om os , a té em
lógica, pessimistas.
4 Ma s os ju ízos lógicos n ã o s ã o os m a is p r ofu n d os e os m a is fu n d a m en ta is , p a r a os qu a is p os s a d es cer a cor a gem d e n os s a
s u s p eita : a con fia n ça n a r a zã o, qu e é in s ep a r á vel d a va lidade d es s es ju ízos , en qu a n to con fia n ça é u m fen ôm en o moral... Terá ta lvez o p es s im is m o a lem ã o qu e d a r a in d a u m ú ltim o p a s s o? Ta lvez d ever á
a in d a
uma
vez con fr on ta r
s eu
credo e
s eu
absurdum? E s e este livr o, a t é n a m or a l, a té p a r a a lém d a con fia n ça
na
m or a l,
é
um
livr o
p es s im is ta
não
s er á
p r ecis a m en te n is s o u m livr o a lem ã o? De fa to, ele r ep r es en t a efetiva m en te u m a con t r a d içã o e n ã o tem e es s a con tr a d içã o: denuncia-s e a qu i a con fia n ça n a m or a l
m a s p or qu ê? Por
moralidade! Ou com o d ever ía m os ch a m a r o qu e s e p a s s a n es te livr o, o qu e s e p a s s a
em n ós ?
p ois , p a r a
n os s o gos to
p r efer ir ía m os exp r es s ões m a is m od es ta s . Ma s n ã o h á n en h u m a d ú vid a , ta m b ém a n ós s e d ir ige u m
t u d eves , ta m b ém n ós
ob ed ecem os a u m a lei s ever a a cim a d e n ós
e es s a é a ú ltim a
m or a l qu e a in d a s e t or n a in teligível p a r a n ós , a ú ltim a m or a l qu e, n ós ta m b ém , p od er ía m os a in d a viver, s e em a lgu m a cois a s om os ainda h om en s d e con s ciên cia , é p r ecis a m en te n is s o: p ois , n ã o qu er em os volta r a o qu e con s id er a m os com o u ltr a p a s s a d o e ca d u co, a a lgu m a cois a qu e n ã o con s id er a m os com o d ign o d e fé, qu a lqu er qu e s eja o n om e qu e lh e for con fer id o: Deu s , vir tu d e, ju s tiça , a m or a o p r óxim o; n ã o qu er em os es ta b elecer u m a p on te m en tir os a p a r a u m id ea l a n t igo; t em os u m a a ver s ã o p r ofu n d a con tr a tu d o o qu e em n ós qu is es s e r ea p r oxim a r e s e in tr om eter ; s om os os in im igos d e tod a es p écie d e fé e d e cr is t ia n is m o a tu a is ; inimigos das meias medidas de tudo o que é romantismo e de tudo o qu e é es p ír ito p a tr ioteir o; in im igos t a m b ém d o r efin a m en to a r tís tico, d a fa lta d e con s ciên cia a r tís tica qu e gos ta r ia d e n os p er s u a d ir a a d or a r a qu ilo em qu e já n ã o cr em os artistas;
p ois s om os
in im igos , n u m a p a la vr a , d e t od o feminismo europeu
(ou idealismo, se houver preferência para que eu o diga assim) que
eternamente
a t r a i p a r a a s a ltu r a s
e qu e, p or is s o m es m o,
eternamente
rebaixa . Or a , com o h om en s p os s u id or es d es ta
con s ciên cia , cr em os a in d a r em on ta r à r etid ã o e à p ied a d e a lem ã s m ilen a r es , em b or a s eja m os s eu s d es cen d en tes in cer tos e ú lt im os , n ós , im or a lis ta s e a teu s d e h oje, n os con s id er a m os , em cer t o s en tid o, com o os h er d eir os d es s a r etid ã o e d es s a p ied a d e, com o os execu tor es d e s u a von ta d e in ter ior , d e u m a von ta d e pessimista, com o já in d iqu ei, qu e n ã o tem e em s e n ega r a s i m es m a , p or qu e nega com alegria ! Em nós se cumpre fórmula
no caso de desejarem uma
a auto-ultrapassagem da moral.
5 No fin a l d a s con ta s , con tu d o: p or qu e d evem os p r ocla m a r em a lt a voz e com ta n to a r d or o qu e s om os , o qu e qu er em os e o qu e n ã o qu er em os ? Con s id er em os is s o m a is fr ia m en t e e m a is s a b ia m en te, d e m a is lon ge e d e m a is a lto, va m os d izê-lo com o is s o p od e s er d ito en t r e n ós , com voz t ã o b a ixa qu e o m u n d o in teir o n ã o o ou ça , qu e o m u n d o in teir o n ã o nos ou ça ! An t es d e t u d o, va m os d izê-lo lentamente... E s te p r efá cio ch ega ta r d e, m a is n ã o m u it o ta r d e; qu e im p or ta m , r ea lm en te, cin co ou s eis a n os ? Um ta l livr o e u m ta l p r ob lem a n ã o têm p r es s a ; e, a lém d is s o, s om os a m igos d o lento, eu b em com o m eu livr o. Nã o foi em vã o qu e fu i filólogo, e t a lvez a in d a o s eja . Filólogo qu er d izer p r ofes s or d e leitu r a len ta : a ca b a -s e p or es cr ever ta m b ém len t a m en te. Agor a is s o n ã o s ó fa z p a r te d e m eu s h á b itos , m a s a té m eu gos to s e a d a p tou a is s o
u m gos to m a ld os o ta lvez?
Nã o es cr ever n a d a
que não deixe desesperada a espécie dos homens apressados . De fa t o,
a
filologia
é
es s a
a r te
ven er á vel qu e
exige
de
s eu s
a d m ir a d or es a n tes d e tu d o u m a cois a : m a n ter -s e a fa s t a d o, tom a r tem p o, tor n a r -s e s ilen cios o, tor n a r -s e len to
u m a a r te d e
ou r ives a r ia e u m d om ín io d e ou r ives a p lica d o à p alav ra, u m a a r te qu e r equ er u m tr a b a lh o s u til e d elica d o e qu e n a d a r ea liza s e n ã o for a p lica d o com len tid ã o. Ma s é p r ecis a m en te p or is s o qu e h oje é m a is n eces s á r io qu e n u n ca , ju s ta m en te p or is s o qu e en ca n ta e s ed u z, m u ito m a is n u m a ép oca d e
trabalho : qu er o d izer , d e
p r ecip it a çã o, d e p r es s a in d ecen te qu e s e a qu ece e qu er acabar tu d o b em d ep r es s a , m es m o qu e s e t r a te d e u m livr o, a n tigo ou novo.
E s s a p r óp r ia a r te n ã o a ca b a fa cilm en te com o qu e qu er
qu e s eja , en s in a a ler bem, is to é, len ta m en te, com p r ofu n d id a d e, com p r u d ên cia e p r eca u çã o, com s egu n d a s in ten ções , portas a b er ta s , com d ed os e olh os d elica d os ... Am igos p a cien tes , es te livr o n ã o d es eja p a r a ele s en ã o leitor es e filólogos p er feit os : aprendam a me ler bem!
Ruta, perto de Gênova, outono do ano de 1886.
1
E xp r es s ã o la tin a extr a íd a d e Odes (III, 3 0 .1 ) d o p oeta Qu in tu s Hor a tiu s Flaccus (65-8 a .C.) e qu e s ign ifica m a is p er en e qu e o b r on ze (NT).
2
Im m a n u el Ka n t (1 7 2 4 -1 8 0 4 ), filós ofo a lem ã o; en tr e s u a s ob r a s , A religiã o n os lim ite s d a s im ples raz ã o e Crítica d a raz ã o prá tica já for a m p u b lica d a s n es t a coleção da Editora Escala (NT).
3
Jean-J a cqu es Rou s s ea u (1 7 1 2 -1 7 7 8 ), filós ofo e es cr itor s u íço; en tr e s u a s obras, O con tra to s ocia l e A orige m d a d es igu a ld a d e en tre os h om e n s já foram publicadas nesta coleção da Editora Escala (NT).
4
Ma xim ilien d e Rob es p ier r e (1758-1 7 9 4 ), a d voga d o e p olítico fr a n cês , u m d os principais líderes da Revolução Francesa de 1789 (NT).
5
Fr a s e la tin a d o es cr itor r om a n o e cr is tã o Qu in tu s S ep tim iu s Flor en s Tertulianus (155-2 2 0 ) e qu e s ign ifica cr eio p or qu e é a b s u r d o (NT).
6
Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1831), filósofo alemão (NT).
LIVRO PRIMEIRO
1. R AZÃO ULTERIOR Tod a s a s cois a s qu e d u r a m m u ito tem p o d e ta l m od o s e im p r egn a m a os p ou cos d e r a zã o qu e a or igem qu e tir a m d a d es r a zã o s e tor n a in ver os s ím il. A h is tór ia exa t a d e u m a origem n ã o é qu a s e s em p r e s en tid a com o p a r a d oxa l e s a cr ílega ? O b om h is tor ia d or n ã o es tá , n o fu n d o, in ces s a n tem en t e em contradição com seu meio?
2. P RECONCEITO DOS SÁBIOS Os s á b ios têm r a zã o qu a n d o p en s a m qu e os h om en s d e tod a s a s ép oca s im a gin a va m saber o qu e er a b om e m a u . Ma s é u m p r econ ceito d os s á b ios a cr ed ita r qu e agora estamos m a is b em informados a respeito do que em qualquer outra época.
3. T UDO TEM SEU TEMPO Qu a n d o o h om em a tr ib u ía u m s exo a tod a s a s cois a s , n ã o via n is s o u m jogo, m a s a cr ed ita va a m p lia r s eu en ten d im en to: s ó m u ito m a is ta r d e d es cob r iu , e n em m es m o in teir a m en te a in d a h oje, a en or m id a d e d es s e er r o. De igu a l m od o o h om em a tr ib u iu a tu d o o qu e exis te u m a r ela çã o m or a l, joga n d o s ob r e os om b r os d o m u n d o o m a n to d e u m a significação ética . Um d ia , t u d o is s o n ã o ter á n em m a is n em m en os va lor d o qu e p os s u i h oje a cr en ça n o sexo masculino ou feminino do sol.
4. CONTRA A PRETENSA FALTA DE HARMONIA DAS ESFERAS Devem os
n ova m en t e
fa zer
d es a p a r ecer
do
mu n do
a
a b u n d â n cia d e fa ls a sublimidade, por qu e é con tr á r ia à ju s tiça qu e a s cois a s p od em r eivin d ica r ! Por con s egu in te, é p r ecis o n ã o p r ocu r a r ver o m u n d o com m en os h a r m on ia d o qu e r ea lm en te tem.
5. S EJAM RECONHECIDOS! O gr a n d e r es u lta d o qu e o h om em ob t eve a té h oje é qu e n ã o tem os m a is n eces s id a d e d e viver n o tem or con tín u o d os a n im a is selvagens, dos bárbaros, dos deuses e de nossos sonhos.
6. O PRESTIDIGITADOR E SEU CONTRÁRIO O qu e es p a n t a n a ciên cia é o con t r á r io d o qu e es p a n ta n a a r te d e p r es tid igita d or . De fa to, es te qu er leva r -n os a ver u m a ca u s a lid a d e m u ito s im p les on d e, n a r ea lid a d e, u m a ca u s a lid a d e m u it o com p lica d a es tá em jogo. Pelo con tr á r io, a ciên cia n os ob r iga a a b a n d on a r a cr en ça n a ca u s a lid a d e s im p les , n os ca s os em
qu e tu d o p a r ece extr em a m en te s im p les e em
qu e n ã o
p a s s a m os d e vítim a s d a a p a r ên cia . As cois a s m a is s im p les são muito complicadas
n ã o p od em os es p a n ta r -n os s u ficien tem en te
com elas!
7. MODIFICAÇÃO DO SENTIMENTO DO ESPAÇO S ã o a s cois a s ver d a d eir a s ou a s cois a s im a gin á r ia s qu e m a is con tr ib u ír a m p a r a a felicid a d e h u m a n a ? O qu e é cer to é qu e a d is tâ n cia exis ten te en t r e a m a ior felicid a d e e a m a is p r ofu n d a infelicidade s om en te a s s u m iu tod a a s u a a m plitu d e com o a u xílio das
cois a s
im a gin a d a s .
Por
con s egu in t e,
esta
es p écie
de
sentimento do espaço, sob a influência da ciência, se torna sempre menor: da mesma maneira que a ciência nos ensinou e nos ensina a in d a a ver ter r a com o p equ en a e o tod o o s is tem a s ola r com o u m
ponto.
8. T RANSFIGURAÇÃO S ofr im en to s em supra-terrestres
es p er a n ça , s on h os
con fu s os , en con tr os
a í es tã o os três ú n icos gra u s qu e Ra fa el
es ta b elece p a r a d ivid ir a h u m a n id a d e. Nós n ã o olh a m os m a is o m u n d o d es ta m a n eir a
e ta m b ém Ra fa el n ã o ter ia m a is o d ireito
d e vê-lo a s s im : com
s eu s
p r óp r ios
olh os
ver ia
uma
n ova
transfiguração.
9. CONCEITO DA MORALIDADE DOS COSTUMES S e com p a r a r m os n os s a m a n eir a d e viver com a qu ela d a h u m a n id a d e d u r a n te m ilh a r es d e a n os , con s ta t a r em os qu e n ós , h om en s d e h oje, vivem os n u m a ép oca m u ito im or a l: o p od er d os cos tu m es en fr a qu eceu d e u m a for m a s u r p r een d en te e o s en tid o m or a l s u tilizou e s e elevou d e ta l m od o qu e p od em os m u ito b em d izer qu e s e vola tilizou . É p or is s o qu e n ós , h om en s ta r d ios , tã o dificilmente penetramos nas idéias fundamentais que presidiram a for m a çã o d a m or a l e, s e ch ega r m os a d es cob r i-la s , r ejeita m os a in d a
em
a p a r en t a m
p u b licá -las, t a n to n os ca lu n ia r
a
p a r ecem
m or a lid a d e! Veja -s e,
gr os s eir a s ! Ta n to p or
exem p lo,
a
prop os içã o prin cip a l: a m or a lid a d e n ã o é ou t r a cois a (p or ta n to, a n tes d e tu d o, n a d a m a is ) s en ã o a ob ed iên cia a os cos tu m es , sejam eles quais forem; ora, os costumes são a maneira tradicional d e a gir e d e a va lia r . E m tod a p a r te on d e os cos tu m es n ã o m andam ,
não
há
m or a lid a d e;
e
qu a n t o
m en os
a
vid a
é
d et er m in a d a p elos cos t u m es , m en or é o cer co d a m or a lid a d e. O homem livre é imoral, porque em todas as coisas quer depender de si mesmo e não de uma tradição estabelecida: em todos os estados p r im itivos d a h u m a n id a d e,
mal
é s in ôn im o d e
individual ,
livre , arbitrário , inabitual , imprevisto , imprevisível . Nes s es m es m os es ta d os p r im itivos , s em p r e s egu n d o a m es m a a va liação: s e u m a a çã o é execu ta d a , não p or qu e a t r a d içã o a s s im o exija , m a s p or ou tr os m otivos (p or exem p lo, p or ca u s a d e s u a u tilid a d e in d ivid u a l) e m es m o p ela s r a zões qu e ou tr or a es ta b elecer a m o cos tu m e, a a çã o é cla s s ifica d a com o im or ta l e con s id er a d a com o ta l a té m es m o p or a qu ele qu e a execu ta : p ois es te n ã o s e in s p ir ou n a ob ed iên cia p a r a com a tr a d içã o. E o qu e é a tr a d içã o? Um a a u tor id a d e s u p er ior à qu a l s e ob ed ece, n ã o p or qu e or d en e o útil, m a s p or qu e ordena.
E m qu e es s e s en tim en t o d a tr a d içã o s e
distin gu e d e u m s en tim en to ger a l d o m ed o? É o t em or d e u m a in teligên cia s u p er ior qu e or d en a , d e u m p od er in com p r een s ível e in d efin id o, d e a lgu m a cois a qu e é m a is qu e p es s oa l superstição n es s e tem or .
há
Na or igem , tod a a ed u ca çã o e os
cu id a d os d o cor p o, o ca s a m en to, a m ed icin a , a a gr icu ltu r a , a gu er r a , a p a la vr a e o s ilên cio, a s r ela ções en tr e os h om en s e a s r ela ções com os d eu s es , p er ten cia m a o d om ín io d a m or a lid a d e: es ta exigia qu e p r es cr ições fos s em ob s er va d a s , sem pensar em s i mesmo com o in d ivíd u o. Nos tem p os p r im it ivos , tu d o d ep en d ia , p or ta n to, d o cos tu m e e a qu ele qu e qu is es s e s e eleva r a cim a d os cos tu m es d evia tor n a r -s e legis la d or , cu r a n d eir o e a lgo com o u m semi-d eu s : is to é, d ever ia criar cos tu m es m u it o p er igos a !
cois a es p a n tos a e
Qual é o h om em m a is m or a l? Em prim e iro
lugar, a qu ele qu e cu m p r e a
lei com
m a is
fr eqü ên cia : p or
con s egu in t e, a qu ele qu e, s em elh a n te a o b r â m a n e, em tod a a p a r te e em ca d a in s ta n te con s er va a lei p r es en te n o es p ír ito d e ta l m a n eir a qu e in ven ta con s t a n tem en te oca s iões d e ob ed ecer a es s a lei. Em seguida, a qu ele qu e cu m p r e a lei t a m b ém n os ca s os m a is d ifíceis . O m a is m or a l é a qu ele qu e m a is sacrifica a os cos t u m es ; m a s qu a is s ã o os m a ior es s a cr ifícios ? Res p on d en d o a es t a
pergunta, chega-se a desenvolver várias morais distintas; contudo, a
d ifer en ça
es s en cia l con tin u a
s en d o a qu ela
qu e s ep a r a
a
m or a lid a d e d o cu m p r im en to m a is freqü en te d a m or a lid a d e do cumprimento m a is d ifícil. Nã o n os en ga n em os a cer ca d os m otivos d es s a m or a l qu e exige com o s in a l d e m or a lid a d e o cu m p r im en to d e u m costu m e n os ca s os m a is d ifíceis ! A vitór ia s ob r e s i p r óp r io não é exigid a p or ca u s a d a s con s eqü ên cia s ú t eis qu e tem p a r a o in d ivíd u o, m a s p a r a qu e os cos t u m es , a tr a d içã o a p a r eça m com o d om in a n tes , a p es a r d e tod a s a s veleid a d es con tr á r ia s e tod a s a s vantagens in d ivid u a is : o in d ivíd u o d eve s e sacrificar exige a
m or a lid a d e d os
m or a lis t a s
qu e,
cos tu m es . E m
s em elh a n tes
a os
a s s im o
com p en s a çã o, esses
s u ces s or es
de
Sócrates,
recomendam a o in d ivíd u o o d om ín io d e s i e a s ob r ied a d e, com o suas v an ta gen s mais específicas , com o a ch a ve m a is p es s oa l d e s u a felicid a d e, es s es m or a lis ta s con s titu em a exceção
e se
vem os a s cois a s d e ou tr o m od o é p or qu e s im p les m en te fom os cr ia d os s ob a in flu en cia d eles : tod os s egu em u m a via n ova qu e lh es
va le a
m a is
s ever a
m or a lid a d e d os cos tu m es
r ep r ova çã o d os
r ep r es en ta n tes
da
eles s e exclu em d a com u n id a d e, u m a
vez qu e s ã o im or a is , e s ã o, n a a cep çã o m a is p r ofu n d a d o ter m o, m a u s . Da m es m a for m a qu e u m r om a n o vir tu os o d e velh a es cola con s id er a va com o m a u todo cristão que a s p ir a va , a cim a d e tudo, à
su a
p r óp r ia
s a lva çã o .
Em
tod a
a
p a r te on d e exis te
com u n id a d e e, p or con s egu in te, m or a lid a d e d os cos t u m es , r ein a a id éia d e qu e a p u n içã o p ela viola çã o d os cos tu m es r eca i em p r im eir o lu ga r s ob r e a p r óp r ia com u n id a d e: es ta p en a é u m a p u n içã o s ob r en a tu r a l, cu ja m a n ifes t a çã o e lim ites s ã o tã o d ifíceis d e ca p ta r
para
o es p ír ito, qu e os
a n a lis a
com
um
m ed o
s u p er s ticios o. A com u n id a d e p od e ob r iga r o in d ivíd u o a r ep a r a r , em r ela çã o a ou t r o in d ivíd u o ou à p r óp r ia com u n id a d e, o d a n o
im ed ia to qu e é a con s eqü ên cia d e s eu a to, p od e igu a lm en te exer cer u m a es p écie d e vin ga n ça s ob r e o in d ivíd u o p or qu e, p or ca u s a d ele
com o u m a p r eten s a con s eqü ên cia d e s eu a to
as
n u ven s d ivin a s e a s exp los ões d a cóler a d ivin a s e a cu m u la r a m s ob r e a com u n id a d e
m a s ela con s id er a , n o en ta n t o, a cim a d e
tu d o, a cu lp a b ilid a d e d o in d ivíd u o com o cu lp a b ilid a d e p r óp r ia dela e s u p or ta s u a p u n içã o com o s u a p rópria punição:
Os
cos tu m es es t ã o r ela xa d os , a s s im gem e a a lm a d e ca d a u m , uma vez qu e t a is a t os s e t or n a r a m p os s íveis . Tod a a çã o individual, tod a m a n eir a d e p en s a r in d ivid u a l fa zem tr em er ; é tot a lm en te im p os s ível d et er m in a r
o qu e os
es p ír itos
r a r os , es colh id os ,
or igin a is tiver a m d e s ofr er n o cu r s o d os tem p os p or s er em a s s im s em p r e con s id er a d os com o m a u s e p er igos os , m a is a in d a , por se tere m s em pre eles próprios con s id erad o as s im . S ob o d om ín io d a m or a lid a d e d os cos tu m es , tod a for m a d e or igin a lid a d e tin h a m á con s ciên cia ; o h or izon te d os m elh or es tor n ou -s e a in d a m a is sombrio do que deveria ter sido.
10. MOVIMENTO RECÍPROCO ENTRE O SENTIDO DA MORALIDADE E O SENTIDO DA CAUSALIDADE
À m ed id a qu e o s en tid o d a ca u s a lid a d e a u m en ta , d im in u i a exten s ã o d o d om ín io d a m or a lid a d e: p ois , s em p r e qu e for a m com p r een d id os os efeitos n eces s á r ios , qu e s e ch ega a im a gin á -los is ola d os d e tod os os a ca s os , d e tod a s a s con s eqü ên cia s oca s ion a is (p os t h oc), d e im ed ia to foi d es tr u íd o u m n ú m er o en or m e d e ca u s a lid a d es im a gin á r ia s , d es s a s ca u s a lid a d es qu e, a té en t ã o, er a m con s id er a d a s com o os fu n d a m en t os d a m or a l r ea l é m u ito m en or qu e o m u n d o d a im a gin a ção
o m u n do
a ca d a vez s e
con s egu iu fa zer d es a p a r ecer d o m u n d o u m a p a r te d o t em or e d a coa çã o, a ca d a vez ta m b ém u m a p a r te d a ven er a çã o e d a autoridade de que gozavam os costumes: a moralidade sofreu uma
p er d a em
s eu
con ju n to. Aqu ele qu e, p elo con t r á r io, qu is er
a u m en ta r a m or a lid a d e d eve s a b er evita r qu e os r es u lta d os possam tornar-se controláveis.
11. MORAL POPULAR E MEDICINA POPULAR Desenvolve-s e, n a m or a l qu e r ein a n u m a com u n id a d e, u m tr a b a lh o con s ta n te, a o qu a l ca d a u m p a r t icip a : a m a ior ia d a s pessoas quer acumular exemplos sobre exemplos que demonstrem a p re ten s a relaçã o en tre a cau s a e o efeito, o cr im e e a p u n içã o; con tr ib u em a con fir m a r a s s im a lega lid a d e d es s a r ela çã o e a u m en ta m s eu cr éd it o: a lgu n s fa zem n ova s ob s er va ções s ob r e os a tos e a s con s eqü ên cia s d es s es a tos , tir a m d eles con clu s ões e leis : uma minoria tropeça aqui e acolá e enfraquece a crença sobre este ou a qu ele p on t o. anti-cien tífica
Ma s tod os s e r eú n em n a for m a gr os s eir a e
d e s u a a çã o; qu er s e tr a te d e exem p los , d e
ob s er va ções ou d e r eticên cia s , qu er s e tr a te d a d em on s tr a çã o, d a a fir m a çã o, d a en u n cia çã o ou d a r efu ta çã o d e u m a lei, s ã o s em p r e m a ter ia is s em va lor , s ob u m a exp r es s ã o s em va lor , com o os m a ter ia is e a exp r es s ã o d e tod a m ed icin a p op u la r . Med icin a p op u la r e m or a l p op u la r vã o s em p r e ju n ta s e n ã o d ever ia m m a is , com o s em p r e s e fa z, s er a p r ecia d a s d e for m a t ã o d ifer en te: a m b a s são ciências aparentes da mais perniciosa espécie.
12. A CONSEQÜENCIA COMO COADJUVANTE Ou tr or a s e con s id er a va o s u ces s o d e u m a a çã o n ã o com o u m a con s eqü ên cia d es s a a çã o, m a s com o u m livr e coa d ju va n te vin d o d e Deu s . Pod e-s e im a gin a r con fu s ã o m a is gr os s eir a ? E r a n eces s á r io es for ça r -s e d iver s a m en te em vis ta d a a çã o e em vis ta do sucesso, com práticas e meios totalmente diferentes!
13. P ARA A EDUCAÇÃO NOVA DO GÊNERO HUMANO Cola b or em n u m a ob r a , vocês qu e s ã o p r es ta tivos e lib er a is : ajudem a eliminar do mundo a idéia de punição que em toda parte s e tor n ou in fes ta n te! Nã o h á er va d a n in h a m a is p er igos a ! E s s a id éia foi in t r od u zid a n ã o s om en te n a s con s eqü ên cia s d e n os s a maneira d e a gir
e qu e p od er ia h a ver d e m a is n efa s to e m a is
ir r a zoá vel qu e in ter p r eta r a ca u s a e o efeito com o ca u s a e com o punição!
Ma s
a con t ecim en tos
m u ito
p ior
p u r a m en t e
qu e
for tu itos
is s o
foi feit o
for a m
a in d a ,
p r iva d os
de
os su a
in ocên cia , s er vin d o-s e d es s a m a ld ita a r te d e in ter p r eta çã o p or m eio d a id éia d e p u n içã o. A lou cu r a foi im p elid a a t é m es m o o p on t o d e leva r a ver n a p r óp r ia exis t ên cia u m a p u n içã o.
Dir-se-
ia qu e é a im a gin a çã o extr a va ga n t e d e ca r cer eir os e d e ca r r a s cos que dirigiu até o presente a educação da humanidade!
14. S IGNIFICAÇÃO DA LOUCURA NA HISTÓRIA DA HUMANIDADE S e,
a p es a r
d es s e
for m id á vel ju go d a
m or a lid a d e
d os
costumes , s ob o qu a l viver a m tod a s a s s ocied a d es h u m a n a s , s e d u r a n te m ilên ios a n t es d e n os s a er a e m es m o n o cu r s o d es ta a té n os s os d ia s (n ós m es m os vivem os n u m p equ en o m u n d o d e exceçã o e, d e a lgu m m od o, n a zon a m á ) d iver gen tes ,
a va lia ções
e
ju ízos
de
va lor
id éia s n ova s e con tr á r ios
n u n ca
d eixa r a m d e s u r gir , is s o s ó ocor r eu p or qu e es t a va m s ob a égid e d e u m s a lvo-con d u to ter r ível: qu a s e em tod a p a r te, é a lou cu r a qu e a p la n a o ca m in h o d a id éia n ova , qu e leva n ta a p r oib içã o d e u m cos tu m e, d e u m a s u p er s tiçã o ven er a d a . Com p r een d em p or qu e foi n eces s á r ia a a s s is tên cia d a lou cu r a ? De qu a lqu er cois a qu e fos s e tã o ter r ifica n te e tã o in ca lcu lá vel, n a voz e n os ges tos , com o os ca p r ich os d em on ía cos d a tem p es ta d e e d o m a r e, p or con s egu in te, tã o d ign os com o eles d o tem or e d o r es p eito? De qu a lqu er cois a
qu e leva s s e, com o a s con vu ls ões e a b a b a d o ep ilép tico, o s in a l vis ível d e u m a m a n ifes ta çã o a b s olu ta m en te in volu n tá r ia ? De qu a lqu er cois a qu e p a r eces s e im p r im ir a o a lien a d o o s in a l d e a lgu m a d ivin d a d e, d a qu a l ele p a r eces s e s er com o a m á s ca r a e o porta-voz? De qu a lqu er cois a qu e in s p ir a s s e, m es m o a o p r om otor d e u m a id éia n ova , a ven er a çã o e o tem or d ele p r óp r io e n ã o já r em or s os , e qu e o im p elis s e a s er o p r ofet a e o m á r tir d es s a id éia ? E n qu a n to em n os s os d ia s n os d ã o s em ces s a r a en ten d er qu e o gên io p os s u i, em lu ga r d e u m gr ã o d e b om s en s o, u m gr ã o d e lou cu r a , os h om en s d e ou tr or a es t a va m m u ito m a is p er to d a id éia d e qu e lá on d e h ou ver lou cu r a , h á ta m b ém u m p ou co d e gên io e de sabedoria
qualquer coisa de divino , como se murmurava ao
ou vid o. Ou m elh or , a fir m a va -s e m a is cla r a m en t e:
Por m eio d a
lou cu r a , os m a ior es b en efícios for a m d er r a m a d os s ob r e a Gr écia , dizia Platão1 com toda a humanidade antiga. Avancemos ainda um p a s s o:
a
t od os
es s es
h om en s
s u p er ior es ,
im p elid os
ir r es is tivelm en te a r om p er o ju go d e u m a m or a lid a d e qu a lqu er e a p r ocla m a r leis n ova s , n ã o tiver a m ou tr a s olu çã o, s e n ã o eram re alm en te lou cos , qu e s e tor n a r em lou cos ou s im u la r a lou cu r a . Is s o va le p a r a tod os os in ova d or es em tod os os d om ín ios e n ã o s om en te n a qu eles d a s in s titu ições s a cer d ota is e p olítica s :
até
m es m o o in ven tor d a m étr ica p oética teve d e s e im p or p or m eio d a loucura2 . (Até ép oca s b em m a is tr a n qü ila s , a lou cu r a p er m a n eceu com o u m a es p écie d e con ven çã o en tr e os p oeta s : S ólon r ecor r eu a ela qu a n d o in fla m ou os a ten ien s es p a r a r econ qu is ta r S a la m in a 3 ). Como alguém se torna louco quando não o é e quando não tem a cor a gem d e fin gir qu e o é? Qu a s e tod os os h om en s em in en tes d a s a n tiga s civiliza ções s e en tr ega r a m a es s e es p a n tos o r a ciocín io; u m a d ou tr in a s ecr eta , feita d e a r tifícios e d e in d ica ções d ietética s , s e con s er vou a es s e r es p eit o, a com p a n h a d a d o s en tim en to d a
in ocên cia e m es m o d a s a n tid a d e d e ta l in ten çã o e d e ta l s on h o. As fór m u la s p a r a s e tor n a r homem-medicina en tr e os ín d ios , s a n to en tr e
os
cr is tã os
groenlandeses,
pajé
da
Id a d e
Méd ia ,
anguécoque
en t r e
os
en tr e os b r a s ileir os s ã o, em s u a s lin h a s
ger a is , a s m es m a s ; o jeju m a lém d os lim ites , a p r olon ga d a a b s tin ên cia s exu a l, o r etir o n o d es er to ou n o cim o d e u m a m on t a n h a ou a in d a n o a lto d e u m a colu n a ou ta m b ém p er m a n ên cia n u m s a lgu eir o velh o à m a r gem d e u m la go
a e a
or d em d e n ã o p en s a r em ou tr a cois a s en ã o n a qu ilo qu e p od e d es en ca d ea r o êxt a s e e a d es or d em d o es p ír ito. Qu em ou s a r ia , p or ta n to, la n ça r u m olh a r n o in fer n o d a s a n gú s tia s m or a is , a s m a is a m a r ga s e a s m a is in ú teis , on d e p r ova velm en te d efin h a r a m os h om en s m a is fecu n d os d e tod os os tem p os ! Qu em ou s a r ia es cu ta r os s u s p ir os d os s olitá r ios e d os tr a n s via d os : Ah ! Dêem m e a o m en os a lou cu r a , p od er es d ivin os ! A lou cu r a p a r a qu e ter m in e fin a lm en t e p or a cr ed ita r em m im m es m o! Dêem -me d elír ios e con vu ls ões , h or a s d e cla r id a d e e d e tr eva s r ep en tin a s , aterrorizem-m e com a r r ep ios e a r d or es qu e ja m a is m or ta l a lgu m exp er im en tou , cer qu em -m e d e r u íd os e d e fa n ta s m a s ! Deixem -me u iva r , gem er e r a s teja r com o u m a n im a l: con ta n t o qu e a d qu ir a a fé em m im m es m o! A d ú vid a m e d evor a , m a t ei a lei e ten h o p or lei o h or r or d os vivos p or u m ca d á ver ; s e n ã o s ou m a is d o qu e a lei, s ou o ú ltim o d os r ép r ob os . De on d e vem o es p ír ito n ovo qu e es tá em m im , s e n ã o vem d e vocês ? Pr ovem -m e, p or ta n to, qu e eu lh es pertenço!
S ó a lou cu r a a m im o d em on s t r a . E m u ita s vezes
es s e fer vor a tin gia s eu ob jetivo: n a ép oca em qu e o cr is tia n is m o d a va a m p la m en te p r ova d e s u a fecu n d id a d e, m u ltip lica n d o os s a n tos e os a n a cor eta s , im a gin a n d o a s s im qu e s e a fir m a va a s i m es m o,
h a via
em
J er u s a lém
gr a n d es
es ta b elecim en t os
de
a lien a d os p a r a os s a n tos n a u fr a ga d os , p a r a a qu eles qu e h a via m
sacrificado seu último grão de razão.
15. OS MAIS ANTIGOS MEIOS DE CONSOLAÇÃO Pr im eir a eta p a : o h om em vê em tod o m a l-es ta r , em tod o r evés d a s or te, a lgu m a cois a p ela qu a l d eve fa zer s ofr er qu a lqu er ou tr o, n ã o im p or ta quem
é a s s im qu e s e d á con ta d o p od er qu e
a in d a lh e r es ta e is s o o con s ola . S egu n d a eta p a : o h om em vê em tod o m a l-es ta r e em tod o r evés d a s or te u m a p u n içã o, is to é, a exp ia çã o d a fa lt a e o m eio d e escapar a o feitiço m a léfico d e u m a p a r cia lid a d e r ea l ou im a gin á r ia d o d es tin o. S e p er ceb e es s a v an ta ge m qu e con s igo tr a z a in felicid a d e, d eixa d e a cr ed it a r n a n eces s id a d e d e fa zer s ofr er ou tr o qu a lqu er p or es s a in felicid a d e vai renunciar a esse tipo de satisfação porque agora tem outro.
16. P RIMEIRO PRINCÍPIO DA CIVILIZAÇÃO Nos p ovos s elva gen s h á u m a ca t egor ia d e cos tu m es qu e p a r ece vis a r a t or n a r -s e u m cos tu m e ger a l: s ã o r egu la m en ta ções p en os a s
e, n o fu n d o, s u p ér flu a s
(p or
exem p lo, o cos tu m e
d ifu n d id o en tr e os Ka m tch a d a les d e ja m a is r a s p a r com u m a fa ca a n eve gr u d a d a n os ca lça d os , d e ja m a is u s a r u m a fa ca p a r a a jeita r a s b r a s a s d o fogo, d e n u n ca p ôr u m fer r o n o fogo m or te a tin ge a qu ele qu e in fr in gir es s es cos tu m es !)
e a
m a s es s a s
r egu la m en ta ções m a n têm p er m a n en tem en te n a con s ciên cia a id éia d o cos tu m e, a ob r iga çã o in in t er r u p ta d e ob ed ecer a ele, com o ob jetivo d e r efor ça r o gr a n d e p r in cíp io p elo qu a l a civiliza çã o começa: todo costume vale mais do que a ausência de costumes.
17. A NATUREZA BOA E MÁ Os h om en s com eça r a m p or s u b s t itu ir a n a tu r eza p or s u a própr ia p es s oa : eles s e via m em tod a a p a r t e a s i m es m os , a s eu s
semelhantes, isto é, viam seu caráter mau e caprichoso, escondido d e a lgu m a for m a p or tr á s d a s n u ven s , d a s tem p es ta d es , d os a n im a is
fer ozes , d a s
á r vor es
e das
p la n t a s : foi en tã o qu e
inventaram a n a t u r eza m á . Dep ois d is s o veio ou tr a ép oca em qu e qu is er a m s e d ifer en cia r d a n a tu r eza , a ép oca d e Rou s s ea u 4 : es ta va m
tã o
ca n s a d os
uns
d os
ou tr os
qu e
qu is er a m
a b s olu ta m en te p os s u ir u m r eca n to d o m u n d o em qu e o h om em n ã o p u d es s e s e in com od a r com s u a m is ér ia : in ven tou -s e a natureza boa .
18. A MORAL DO SOFRIMENTO INVOLUNTÁRIO Qu a l é a a legr ia m a is eleva d a p a r a os h om en s em gu er r a nessa pequena comunidade constantemente em perigo, onde reina a m or a lid a d e m a is r igor os a ? Qu er o d izer , p a r a a s a lm a s vigor os a s , vin ga tiva s , od ios a s , p ér fid a s , d es con fia d a s , p r ep a r a d a s p a r a o p ior , en d u r ecid a s p ela s p r iva ções e p ela m or a l? crueldade. De igu a l m od o, em
A a legr ia d a
s em elh a n tes a lm a s , em
ta is
cir cu n s t â n cia s , é u m a virtude s er in ven t ivo e in s a ciá vel n a cr u eld a d e. A com u n id a d e s e d iver te com a s a ções d o h om em cr u el, es qu ece n ele, d e vez, a a u s ter id a d e d o tem or e d a s con tín u a s p r eca u ções . A cr u eld a d e é u m a d a s m a is a n t iga s a legr ia s d a h u m a n id a d e. J u lga -s e, p or con s egu in te, qu e ta m b ém os p r óp r ios d eu s es s e r econ for ta m e s e d iver tem qu a n d o lh es é ofer ecid o o es p etá cu lo d a cr u eld a d e
d e ta l m od o qu e a id éia d o
s en tid o e d o va lor s u p er ior qu e h á n o s ofrim en to volu n tá rio e n o m a r tír io es colh id o livr em en te é in tr od u zid a n o m u n d o. Pou co a p ou co o cos tu m e es ta b elece n a com u n id a d e u m a p r á tica con for m e a es s a id éia : d or a va n te s e d es con fia d e tod o b em -es ta r exu b er a n te e s e r ecob r a con fia n ça ca d a vez qu e s e es t á n u m es ta d o d e gr a n d e d or ; en t ã o s e d iz qu e os d eu s es p od er ia m s er d es fa vor á veis p or
ca u s a d a felicid a d e e fa vor á veis p or ca u s a d a in felicid a d e d es fa vor á veis
e
de
m od o
a lgu m ,
com p a s s ivos ! De
fa t o,
a
com p a ixã o é con s id er a d a d es p r ezível e in d ign a d e u m a a lm a for te e tem ível;
m a s os d eu s es s ã o fa vor á veis p or qu e o es p etá cu lo
d a s m is ér ia s os d iver te e os d eixa d e b om h u m or : p ois , a cr u eld a d e p r od u z s em p r e o m a is volu p tu os o s en t im en to d e p od er . Foi a s s im qu e s e in tr od u ziu n a n oçã o d o homem moral , ta l com o exis te n a com u n id a d e, a vir t u d e d o s ofr im en to fr eqü en te, d a p r iva çã o, d a vid a d ifícil, d a m or tifica çã o cr u el
não, p a r a r ep eti-
lo ainda, como meio de disciplina, de domínio de si, de aspiração à felicid a d e
p es s oa l
m as
com o
uma
vir t u d e
qu e
d is p õe
fa vor a velm en te p a r a a com u n id a d e os d eu s es m a u s , p or qu e ela eleva in ces s a n t em en te a eles a fu m a ça d e u m s a cr ifício exp ia t ór io. Todos os ch efes es p ir itu a is d os p ovos qu e s e m os t r a r a m ca p a zes d e p ôr em m ovim en to o lod o p r egu iços o e ter r ível d os cos tu m es tiver a m n eces s id a d e, a lém d a lou cu r a , d o m a r tír io volu n tá r io p a r a ter crédito
e, com o s em p r e, a n tes e a cim a d e tu d o, cr éd ito n eles
mes m os ! Qu a n to m a is s eu es p ír ito s egu ia n ovos ca m in h os , s en d o con s eqü en tem en t e a t or m en t a d o p or r em or s os e tem or , m a is eles lu t a va m
cr u elm en te con tr a
su a
p r óp r ia
p r óp r ios d es ejos e s u a p r óp r ia s a ú d e
ca r n e, con tr a
s eu s
com o p a r a ofer ecer à
d ivin d a d e u m a com p en s a çã o em a legr ia s , p a r a o ca s o d e ela s e ir r ita r p or ver os cos tu m es n egligen cia d os e com b a tid os em fa vor de
ob jetivos
d em a s ia d a
n ovos .
Nã o
com p la cên cia ,
se qu e
d eve
im a gin a r ,
h oje
es ta m os
con t u d o,
com
in teir a m en te
d es em b a r a ça d os d e s em elh a n te lógica d o s en tim en to! Qu e a s a lm a s m a is h er óica s s e in ter r ogu em a r es p eito em s eu for o ín t im o! O m en or p a s s o à fr en te n o d om ín io d o livr e p en s a m en to e d a vid a in d ivid u a l foi con qu is ta d o, em tod a s a s ép oca s , com tor tu r a s in telectu a is e fís ica s : e n ã o a p en a s a m a r ch a p a r a a fr en te, n ã o!
Tod a es p écie d e m a r ch a , d e m ovim en to, d e m u d a n ça n eces s it ou d e in u m er á veis m á r tir es a o lon go d es s es m ilên ios qu e p r ocu r a va m s eu s ca m in h os e qu e ed ifica va m b a s es , n os qu a is , é cla r o, n ã o s e p en s a qu a n d o s e fa la d es s e es p a ço r id icu la m en te d im in u to n a exis tên cia d a h u m a n id a d e e qu e é ch a m a d o h is tór ia u n iver s a l ; e m es m o n o d om ín io d es s a h is tór ia u n iver s a l qu e n ã o é, n o fu n d o, s en ã o o b a r u lh o qu e s e fa z em tor n o d a s ú ltim a s n ovid a d es , n ã o exis te tem a m a is es s en cia l e m a is im p or t a n te qu e a a ntiga tr a géd ia d os m á r tir es qu e qu er ia m p ôr o lod o em m ov im en to. Nada foi p a go m a is ca r o qu e es s a p equ en a p a r cela d e r a zã o h u m a n a e d e s en tim en to d e lib er d a d e qu e con s titu i h oje n os s o or gu lh o. Ma s é p or ca u s a d es te or gu lh o qu e n os é p r a t ica m en t e im p os s ível hoje ter o s en s o d es s e en or m e la p s o d e t em p o em qu e r em a va a m or a lid a d e d os cos t u m es
e qu e p r eced e a
h is tór ia u n iver s a l ,
época re a l e d ecis iv a, d e p rim ord ial im p ortâ n cia h is tórica, qu e fixou o cará ter d a h u m a n id a d e, ép oca em qu e o s ofr im en to er a u m a vir tu d e, a cr u eld a d e u m a vir tu d e, a vin ga n ça u m a vir tu d e, a n ega çã o d a r a zã o u m a vir tu d e, em qu e, p elo con tr á r io, o b em estar era um perigo, a sede de saber um perigo, a paz um perigo, a com p a ixã o u m p er igo, a in cita çã o à p ied a d e er a u m a ver gon h a , o trabalho u m a ver gon h a , a lou cu r a a lgo d e d ivin o, a m u d a n ça a lgo d e im or a l, p r en h e d e p er igo!
Pen s a is qu e t u d o is s o s e m od ificou
e qu e, p or con s egu in te, a h u m a n id a d e m u d ou d e ca r á ter ? Oh ! con h eced or es
d o cor a çã o h u m a n o, a p r en d a m
a
con h ecer -se
melhor!
19. MORALIDADE E E MBRUTECIMENTO Os cos tu m es r ep r es en ta m
a s exp er iên cia s d os h om en s
anteriores acerca do que consideravam útil ou prejudicial
mas o
s en tim en to d os cos tu m es (m or a lid a d e) n ã o s e r efer e a s u a s
exp er iên cia s , m a s à a n tigu id a d e, à s a n tid a d e, à indiscutibilidade d os cos tu m es . Aí es tá p or qu e es s e s en tim en t o s e op õe a qu e s e fa ça m n ova s exp er iên cia s e s e cor r ija m os cos tu m es : o qu e qu er d izer qu e a m or a lid a d e s e op õe à for m a çã o d e cos tu m es n ovos e melhores: ela embrutece.
20. LIVRES ATORES E LIVRES PENSADORES Os livr es a tor es es t ã o em d es va n t a gem em r ela çã o a os livr es p en s a d or es , p ois os h om en s s ofr em d e m a n eir a m a is vis ível con s eqü ên cia s d os a tos d o qu e con s eqü ên cia s d os p en s a m en t os . Mas se considerarmos que uns e outros procuram sua satisfação e qu e os livr es p en s a d or es já a en con tr a m n o fa t o d e r efletir n a s cois a s
p r oib id a s
e exp r im i-la s , ver ifica m os
qu e, qu a n t o a os
motivos, eles são perfeitamente idênticos; e quanto aos resultados, os livr es a tor es ven cer ã o os livr es p en s a d or es , p a r tin d o d o p r in cip io qu e n ã o ju lga m os d e a cor d o com a vis ib ilid a d e m a is próxima e mais grosseira
isto é, como todo o mundo. Há sempre
lu ga r p a r a r ever a s ca lú n ia s qu e op r im ir a m a qu eles qu e p or s eu s a tos qu eb r a r a m a a u tor id a d e d e u m cos tu m e
geralmente
ch a m a m os es tes d e cr im in os os . Tod os a qu eles qu e s u b ver ter a m a lei m or a l es ta b elecid a s em p r e for a m con s id er a d os em p r im eir o lu ga r com o h om en s m au s : m a s qu a n d o já n ã o er a p os s ível r es ta b elecer es s a lei e qu a n d o a m u d a n ça s e tor n ou u m h á b ito, o a tr ib u to s e tr a n s for m a va p ou co a p ou co;
a h is tór ia tr a ta qu a s e
exclu s iva m en te d es s es h om en s m a u s qu e, m a is ta r d e, for a m declarados bons.
21. CUMPRIMENTO DA LEI Qu a n d o a ob s er vâ n cia d e u m p r eceito m or a l a tin ge u m r es u lt a d o d ifer en te d a qu ele qu e s e h a via p r om etid o e es p er a d o e
não traz ao homem moral a felicidade prometida, mas, contra toda exp ecta tiva ,
a
in felicid a d e
e
a
m is ér ia ,
r es ta
s em p r e
a os
con s cien cios os e a os in qu ietos a d es cu lp a d e d izer : Cometemos u m er r o n a execução.
No p ior d os ca s os , u m a h u m a n id a d e
op r im id a qu e s ofr e p r ofu n d a m en te a ca b a r á m es m o p or d ecr eta r : É im p os s ível execu ta r o p r eceito cor r eta m en te, s om os fr a cos e p eca d or es a té o fu n d o d a a lm a e p r ofu n d a m en t e in ca p a zes d e m or a lid a d e;
p or
con s egu in te,
não
p od em os
ter
n en h u m a
p r eten s ã o à felicid a d e e a o s u ces s o. As p r om es s a s e os p r eceit os morais são para seres melhores do que nós.
22. AS OBRAS E A FÉ Os d ou tor es p r otes ta n tes con tin u a m a p r op a ga r es te er r o fu n d a m en ta l, ou s eja , qu e s ó a fé con ta e qu e a s ob r a s s ã o u m a con s eqü ên cia n a t u r a l d a fé. E s ta d ou t r in a n ã o é a b s olu ta m ente ver d a d eir a ,, m a s t em a a p a r ên cia tã o s ed u t or a qu e já fa s cin ou m u it a s ou tr a s in teligên cia s , a lém d a qu ela d e Lu ter o (p en s o n a s d e S ócr a tes e Pla tã o): a in d a qu e a evid ên cia e a exp er iên cia d e tod os os d ia s p r ove o con tr á r io. O con h ecim en t o e a fé, a p es a r d e tod a s a s p r om es s a s qu e en cer r a m , n ã o p od em d a r n em a for ça n em a h a b ilid a d e n eces s á r ia s à a çã o. Nã o p od em s u b s titu ir o h á b ito d es s e m eca n is m o s u til e com p lexo qu e d ever ia ter s id o p os to em m ovim en to
para
qu e
qu a lqu er
cois a
p os s a
passar
da
representação à a çã o. Pr im eir o e a n tes d e t u d o, a s ob r a s ! Qu er dizer, o exercício, o exercício, e sempre o exercício! A fé adequada surgirá por si própria
estejam certos disso.
23. E M QUE SOMOS MAIS SUTIS Pelo fa to d e, d u r a n te m ilên ios , s e ter con s id er a d o a s coisas (a n a t u r eza , os in s tr u m en tos , a p r op r ied a d e d e tod a es p écie) com o
viva s e a n im a d a s , com a for ça d e p r eju d ica r e d e s u b tr a ir à s in ten ções
hu manas,
o
s en tim en to
de
im p ot ên cia ,
en tr e
os
h om en s , foi m u ito m a is for te e m a is fr eqü en te d o qu e p od er ia ter sido: p ois , er a n eces s á r io m a n t er s ob con tr ole a s cois a s , b em com o os h om en s e os a n im a is , p or m eio d a for ça , d a coa çã o, d a lis on ja , d e p a ctos , d e s a cr ifícios
es ta é a or igem d a m a ior p a r te
d a s p r á t ica s s u p er s ticios a s , qu er d izer , d e u m a p a r t e, ta lvez a preponderante, con tu d o a m a is in u tilm en t e d es p er d iça d a , d a a tivid a d e h u m a n a .
Ma s , u m a
vez qu e o s en t im en to d e
im p otên cia e d e tem or es ta va n u m es ta d o d e ir r ita çã o tã o violen to, tã o con tín u o e qu a s e p er m a n en t e, o s en tim en to d e pod er se d es en volveu d e for m a tã o sutil, qu e o h om em p od e a gor a , n es s a m a tér ia , p es á -lo n a m a is s en s ível d a s b a la n ça s . E s s e s en tim en to s e tom ou s u a in clin a çã o m a is violen ta ; os m eios d es cob er tos p a r a o atingir formam quase a história da cultura.
24. A DEMONSTRAÇÃO DO PRECEITO De for m a ger a l, o va lor ou o n ã o-va lor d e u m p r eceito exem p lo, a qu ele d e a s s a r o p ã o
por
é d em on s tr a d o p elo fa t o d e qu e
o resultado prometido aparece ou não, desde que, no entanto, seja execu ta d o m in u cios a m en t e. Tu d o s e p a s s a d iver s a m en t e com os preceitos morais: pois, nesse caso particular, não é possível dar-se con ta d os r es u lta d os , in ter p r etá -los e d efin i-los . E s tes p r eceitos r ep ou s a m em h ip ótes es d e va lor cien tífico m u ito fr a co, cu ja d em on s tr a çã o
ou
r efu ta çã o
p elos
r es u lta d os
é
igu a lm en te
impossível;
m a s ou tr or a , qu a n d o tod a a ciên cia er a r u d e e
p r im itiva e qu a n d o s e tin h a tên u es p r eten s ões d e con s id er a r u m a cois a com o d em on s tr a d a
ou tr or a o va lor ou o n ã o-va lor d e u m
preceito de moralidade eram determinados da mesma maneira que qu a lqu er
ou tr o p r eceito: in voca n d o os
r es u lt a d os . E n tr e os
in d ígen a s d a Am ér ica r u s s a h á u m p r eceit o qu e d iz: Nã o d eves la n ça r a o fogo os os s os d os a n im a is , n em d á -los a os cã es
e
es te p r eceito é d em on s t r a d o, a cr es cen ta n d o-se: S e o fizer es , n ã o ter á s s or te n a ca ça .
Or a , n u m s en tid o ou em ou t r o, a con t ece
qu a s e s em p r e qu e n ã o s e t em s or te n a ca ça ; n ã o é fá cil, p or ta n to, refutar
d es s a
m a n eir a
o
p r eceito,
s ob r et u d o
qu a n d o
é
a
com u n id a d e in t eir a , e n ã o s om en te o in d ivíd u o, qu e s u p or ta o p es o d a fa lt a ; h a ver á , p or con s egu in te, s em p r e u m a circunstância que parecerá demonstrar o valor do preceito.
25. COSTUMES E BELEZA E m d efes a d os cos tu m es é p r ecis o con fes s a r qu e, em ca d a u m d a qu eles qu e s e s u b m etem tota lm en t e a eles , d o fu n d o d o cor a çã o e d es d e o in ício, os ór gã os d e a ta qu e e d e d efes a e es p ir itu a is
físicos
s e a tr ofia m : o qu e p er m ite a es s e in d ivíd u o tor n a r -
s e s em p r e m a is b elo! De fa to, é o exer cício d es tes ór gã os , e o s en tim en t o cor r es p on d en t e, qu e t or n a m feio e qu e con s er va m a feiú r a . É a s s im qu e o velh o b a b u ín o é m a is feio qu e o jovem , e a jovem fêm ea d e b a b u ín o ta n t o s e p a r ece com o h om em : e é, p or ta n to, a m a is b ela .
Qu e s e tir e d is s o u m a con clu s ã o s ob r e a
origem da beleza da mulher!
26. OS ANIMAIS E A MORAL As p r á tica s qu e s ã o exigid a s n a s ocied a d e m a is r efin a d a , evita r com p r eca u çã o tu d o o qu e é r id ícu lo, b iza r r o, p r eten s ios o, r efr ea r a s vir tu d es b em com o os d es ejos violen tos , mostrar-se s em elh an te a os ou tros , s u bm e ter-s e a regras , d im in u ir-se
tudo
is s o, en qu a n to m or a l s ocia l, s e en con tr a a té n a es ca la m a is b a ixa da espécie animal
e é só neste nível inferior que vemos as idéias
ocu lta s d e tod a s es s a s a m á veis d is p os ições : p r eten d e-s e es ca p a r
a os p er s egu id or es a s er fa vor ecid o n a b u s ca d a p r es a . E p or is s o qu e os a n im a is a p r en d em a d om in a r -s e e a d is fa r ça r -s e d e ta l m a n eir a qu e a lgu n s d eles , p or exem p lo, s e a d a p ta m s u a cor à cor d o a m b ien te (p or m eio d o qu e ch a m a m os a
fu n çã o cr om á tica ),
ch ega m a s im u la r a m or te, a a s s u m ir a s for m a s e a s cor es d e ou tr os a n im a is ou o a s p ecto d a a r eia , d a s folh a s , d os líqu en es , d a s es p on ja s (o qu e os n a tu r a lis ta s in gles es d en om in a m m im icry m im etis m o). E a s s im qu e o in d ivíd u o s e d is s im u la s ob a u n iver s a lid a d e d o ter m o gen ér ico
homem
ou
n o m eio d a
sociedade ou a in d a , s e a d a p ta e s e a s s im ila a os p r ín cip es , à s ca s ta s , a os p a r tid os , à s op in iões d e s eu tem p o ou d e s eu m eio: e a tod a s n os s a s for m a s s u tis d e n os fa zer m os p a s s a r p or felizes , r econ h ecid os , p od er os os , a m á veis , en con tr a r em os fa cilm en te o equ iva len te a n im a l. O s en tid o d a ver d a d e ta m b ém qu e, n o fu n d o, n ã o é ou t r a cois a s en ã o o s en tid o d a s egu r a n ça , o h om em o tem em com u m com o a n im a l: n ã o qu er em os n os d eixa r en ga n a r , n em perder-n os a n ós p r óp r ios , es cu ta m os com
d es con fia n ça os
en cor a ja m en tos d e n os s a s p r óp r ia s p a ixões , d om in a m o-n os e fica m os d es con fia d os con os co m es m os ; tu d o is s o t a m b ém o a n im a l fa z; n ele ta m b ém o d om ín io d e s i p r ovém d o s en tid o d a r ea lid a d e (d a in teligên cia ). De igu a l m od o, o a n im a l ob s er va os efeitos qu e p r od u z n a im a gin a çã o d os ou tr os a n im a is , a p r en d e a olhar-s e a tr a vés d is s o, a con s id er a r -se objetivamente , a p os s u ir , em
cer ta
m ed id a ,
o
con h ecim en to
de
s i.
O
a n im a l ju lga
m ovim en tos d e s eu s a d ver s á r ios e d e s eu s a m igos , a p r en d e d e cor su as
p a r ticu la r id a d es :
con tr a
os
r ep r es en ta n tes
de
cer ta s
es p écies , r en u n cia d efin itiva m en te a o com b a te, t a l com o a d ivin h a à s im p les a p r oxim a çã o a s in t en ções p a cífica s e con cilia d or a s d e m u it a s
es p écies
de
a n im a is .
As
or igen s
in teligên cia , d a p on d er a çã o, d a va len t ia
da
ju s tiça
e
da
n u m a p a la vr a , d e tu d o
o qu e d es ign a m os d e virtudes socráticas
são animais: essas
vir tu d es s ã o u m a con s eqü ên cia d os in s tin tos qu e en s in a m a p r ocu r a r o a lim en to e a es ca p a r d o in im igo. S e con s id er a r m os , pois, que mesmo o homem superior não fez outra coisa que elevars e e s e a p er feiçoa r n a qualidade d e s eu a lim en t o e n a id éia d o qu e con s id er a com o op os t o à s u a n a tu r eza , n a d a p od er á im p ed ir d e qualificar de animal o fenômeno moral por inteiro.
27. VALOR DA CRENÇA NAS PAIXÕES SOBRE-HUMANAS A in s titu içã o d o ca s a m en to m a n tém cr en ça
qu e o a m or , em b or a
s eja
uma
ob s tin a d a m en te a
p a ixã o, é, con t u d o,
s u s cetível d e d u r a r en qu a n to p a ixã o, a cr en ça qu e o a m or d u r a d ou r o, o a m or p or t od a a vid a p od e s er con s id er a d o com o a r egr a . Por es s a ten a cid a d e d e u m a n ob r e cr en ça , m a n tid a a p es a r d a s r efu ta ções t ã o fr eqü en tes qu e s ã o qu a s e a r egr a e qu e fa zem dela, p or con s egu in te, u m a p ia fraus5 , a in s t itu içã o d o ca s a m en to con fer iu a o a m or u m a n ob r eza s u p er ior . Tod a s a s in s t itu ições qu e con ced er a m a u m a p a ixã o a cren ça em s u a d u ração e a tor n a m r es p on s á vel p or es s a d u r a çã o, con tr a a p r óp r ia es s ên cia d a p a ixã o, r econ h ecer a m -lh e u m a n ova or d em : d or a va n te a qu ele qu e é prisioneiro de uma paixão não vê mais nisso, como outrora, uma d egr a d a çã o ou u m a a m ea ça , m a s , p elo con tr á r io, s e s en te eleva d o por ela perante si próprio e diante de seus semelhantes. Pensemos n a s in s titu ições e n os cos tu m es qu e fizer a m d o a b a n d on o fogos o de um instante uma fidelidade eterna, do prazer da cólera a eterna vin ga n ça , d o d es es p er o o lu to eter n o, d a p a la vr a s ú b ita e ú n ica o com p r om is s o eter n o. Por s em elh a n tes
tr a n s for m a ções , m u ita
h ip ocr is ia e m en tir a ca d a vez m a is for a m in tr od u zid a s n o m u n d o: ca d a vez t a m b ém , e a es s e p r eço s om en t e, u m con ceito sobrehumano que eleva o homem.
28. A DISPOSIÇÃO DE ESPÍRITO COMO ARGUMENTO Qu a l é a ca u s a d e u m a a legr e d eter m in a çã o qu e s e a p od er a d e n ós d ia n t e d a a çã o?
E s ta é u m a qu es tã o qu e tem
p r eocu p a d o m u ito os h om en s . A r es p os ta m a is a n tiga , qu e p er m a n ece s em p r e cor r en te, é qu e s e d eve fa zer r em on ta r a ca u s a a Deu s qu e n os p er m ite com p r een d er com is s o qu e a p r ova n os s a d ecis ã o. Qu a n d o ou tr or a s e in t er r oga va m os or á cu los , d es eja va -se tra zer d e lá p a r a s i es ta a legr e r es olu çã o; e tod os r es p on d ia m à s d ú vid a s qu e lh es s ob r evin h a m , qu a n d o s e a p r es en ta m à s u a a lm a d iver s a s a ções p os s íveis , d izen d o: E u qu er o r ea liza r a a çã o qu e for a com p a n h a d a d es s e s en t im en to. Por con s egu in te, os h om en s não s e d ecid ia m p ela s olu çã o m a is r a zoá vel, m a s p elo p r ojeto cu ja im a gem tor n a va a a lm a m a is cor a jos a e ch eia d e es p er a n ça . A b oa d is p os içã o p es a va n a b a la n ça com o u m a r gu m en to m a is d ecis ivo qu e a r a zã o: p or qu e a d is p os içã o d e es p ír ito er a in t er p r eta d a d e forma supersticiosa, como o efeito de um deus que promete o êxito e qu e qu er a s s im leva r a fa la r , à s u a r a zã o, a lin gu a gem d a s a b ed or ia
s u p er ior .
Or a ,
con s id er em
as
con s eqü ên cia s
de
s em elh a n te p r econ ceito qu a n d o h om en s a s tu tos e s equ ios os d e p od er s e s er vir a m dele fa vor a velm en te os es p ír itos !
qu a n d o s e s er vem a in d a !
Dispor
com is s o s e p od e s u b s t itu ir t od os
os argumentos e vencer todas as objeções!
29. OS COMEDIANTES DA VIRTUDE E DO PECADO E n t r e os h om en s d a a n tigu id a d e qu e s e tor n a r a m céleb r es p or s u a vir tu d e h ou ve, p a r ece, u m n ú m er o con s id er á vel d eles qu e representava a com éd ia p a ra s i m es m os : s ob r etu d o os gr egos , es s es com ed ia n tes n a tos , tiver a m d e s im u la r a s s im d e u m m od o in teir a m en te in volu n tá r io e ter ia m a ch a d o qu e er a b om s im u la r .
Por ou tr o la d o, ca d a u m s e via em competição por sua virtude com a vir t u d e d e ou t r o ou d e tod os os ou tr os : com o s er ia p os s ível qu e n ã o u t iliza s s em tod os os a r tifícios p a r a d a r a vir tu d e com o es p etá cu lo
a
si
m es m os
em
p r im eir o
lu ga r ,
fos s e
is s o
simplesmente para se acostumar! Para que servia uma virtude que n ã o p u d es s e s er m os tr a d a ou mostrada!
qu e n ã o s e p r es ta s s e a s er
O cr is tia n is m o p ôs u m fr eio a es s a com éd ia d a
vir tu d e: in ven tou o cos tu m e d e exib ir os p r óp r ios p eca d os d e u m a for m a r ep u gn a n te, d e fa zê-los d es fila r , in tr od u ziu n o m u n d o a culpabilidade afetada (con s id er a d a a té h oje d e b om tom en tr e os bons cristãos).
30. A CRUELDADE REFINADA COMO VIRTUDE Aí es tá
uma
m or a lid a d e qu e r ep ou s a
n eces s id a d e d e s e d is tin gu ir
in teir a m en t e n a
n ã o ten h a m d ela u m a op in iã o
muito b oa ! Qu e in clin a çã o é es s a , p ois , n o fu n d o e qu a l é a s egu n d a in ten çã o qu e a d ir ige? Pr eten d em os qu e n os s o s im p les olhar faça m a l a n os s o vizin h o e a s eu es p ír ito d e in veja , d es p er te nele um sentimento de impotência e de desgraça; queremos fazê-lo saborear a a m a r gu r a d o s eu d es tin o, d er r a m a n d o em s u a lín gu a u m a got a d e nosso m el e, en qu a n to o fa zem os d egu s ta r es s e p r eten s o b en efício, o fit a m os d ir eta m en te n os olh os , fixa m en te e com u m a r d e t r iu n fo. Aí es t á ele qu e s e tor n ou h u m ild e e p er feito a gor a em s u a humildade
p r ocu r em a qu eles qu e, p or s u a
h u m ild a d e, d u r a n t e m u ito tem p o ele lh es p r ep a r ou u m a tor tu r a ; e h a ver ã o d e en con t r á -los fa cilm en t e! E le s e m os tr a Com p a s s ivo p a r a com os a n im a is e n ós o a d m ir a m os
m a s ele p r eten d e
assim dar livre curso à sua crueldade em relação a certas pessoas. Aí
es tá
um
gr a n d e
a r tis ta :
a
volú p ia
qu e
d egu s ta
a n tecip a d a m en te, im a gin a n d o a in veja d os r iva is s u b ju ga d os ,
im p ed iu s u a for ça d e a d or m ecer a t é qu e s e ten h a t or n a d o u m grande
qu a n t os m om en tos a m a r gos n ã o fez p a ga r a ou tros
es p ír it os p a r a a tin gir es s a gr a n d eza ! A ca s tid a d e d a r eligios a : com qu e
olh a r
vin ga d or
con tem p la
as
m u lh er es
qu e
d ifer en tem en te! Qu e a legr ia vin ga d or a h á em s eu s olh os !
vivem O
tem a é cu r t o, m a s a s va r ia ções p od er ia m s er in u m er á veis , s em r is co d e p r ovoca r o en fa d o
p ois é s em p r e u m a n ovid a d e, p or
m a is p a r a d oxa l e d olor os a qu e s eja , qu e a m or a lid a d e d a d is tin çã o n ã o s eja , em ú ltim a in s tâ n cia , s en ã o o p r a zer d e u m a cr u eld a d e r efin a d a . E m ú ltim a in s tâ n cia , qu er o d izer , s em p r e n a p r im eir a ger a çã o. De fa to, qu a n d o o h á b ito d e u m a a çã o qu e d is tin gu e s e torna h ered itá rio, a s egu n d a in ten çã o n ã o s e tr a n s m ite (h er d a m os a p en a s s en tim en tos e n ã o p en s a m en tos ): e, s u p on d o qu e n ã o s eja in tr od u zid a a s egu n d a in ten çã o n ova m en te p ela ed u ca çã o, n a s egu n d a ger a çã o o p r a zer d a cr u eld a d e, n a a çã o qu e d is t in gu e, já n ã o exis t e m a is : m a s s om en t e o p r a zer qu e o h á b ito d es s a a çã o p r op or cion a . Ma s p r ecis a m en te esse p r a zer é o p r im eir o gr a u d o bem .
31. A ALTIVEZ DO ESPÍRITO A altivez d o h om em qu e s e in s u r ge con tr a a tes e d e s u a a s cen d ên cia a n im a l e qu e es ta b elece en tr e a n a tu r eza e o h om em u m gr a n d e a b is m o
es s a a ltivez p r ovém d e u m preconceito sobre
a n a tu r eza d o es p ír ito e es te p r econ ceito é r ela tiva m en te recente. Du r a n te o lon go p er íod o p r é-h is tór ico d a h u m a n id a d e s u p u n h a -s e qu e o es p ír ito es ta va em t od a p a r te e n ã o s e p en s a va d e for m a alguma em venerá-lo como uma prerrogativa do homem. Porque se con s id er a va , p elo con tr á r io, o es p ir itu a l (a s s im com o tod os os in s tin tos , a s m a ld a d es , a s ten d ên cia s ) com o p er t en cen te a t od os , com o, p or ta n to, d e es s ên cia com u m , e n ã o s e tin h a ver gon h a d e
d es cen d er d e a n im a is ou d e á r vor es (a s r a ça s nobres s e s en tia m h on r a d a s com es s a s len d a s ); via -s e n o es p ír ito a qu ilo qu e n os u n e à natureza e não o que dela nos separa. Assim, todos eram criados n a m od és tia
e era também a partir de um preconceito.
32. O ENTRAVE S ofr er m or a lm en te e fica r s a b en d o d ep ois qu e es t a es p écie d e s ofr im en to r ep ou s a n u m er r o, é is s o qu e r evolta . De fa to, h á u m a con s ola çã o ú n ica em a fir m a r , p or m eio d o s ofr im en t o, u m mundo d e ver d a d e m a is p r ofu n d o qu e qu a lqu er ou tr o m u n d o, e é in fin it a m en te preferível s ofr er e s en tir -se superior à r ea lid a d e (p ela con s ciên cia d e s e a p r oxim a r a s s im d es s e m u n d o d e ver d a d e m a is p r ofu n d o ) d o qu e viver s em s ofr im en to e s er p r iva d o desse sentim en t o d e s u p er ior id a d e. Por con s egu in te, a a ltivez e a m a n eir a h a b itu a l d e s a tis fa zê-lo s ã o qu e s e opõem à n ova con cep çã o d a m or a l. Qu e for ça s er á n eces s á r io u t iliza r , p or ta n to, para eliminar esse entrave? Mais altivez? Uma nova altivez?
33. O DESPREZO DAS CAUSAS, DAS CONSEQÜENCIAS E DA REALIDADE E s s es
a ca s os
n efa s tos
qu e
se
a b a tem
s ob r e
uma
com u n id a d e, tem p es ta d es s ú b ita s , s eca s ou ep id em ia s , d es p er ta m em tod os os s eu s m em b r os a s u s p eita d e qu e fa lta s con tr a os cos tu m es for a m com etid a s ou fa zem cr er qu e é p r ecis o in ven ta r n ovos cos tu m es p a r a a p a zigu a r u m n ovo p od er e u m n ovo ca p r ich o d os d em ôn ios . E s te gên er o d e s u s p eit a e d e r a ciocín io evita ju s ta m en t e, p or ta n to, a p r ofu n d a r a ver d a d eir a ca u s a n a t u r a l e con s id er a a ca u s a d em on ía ca com o r a zã o p r im eir a . Há n isso u m a d a s fon tes d a m á for m a çã o h er ed itá r ia d o es p ír ito h u m a n o; e a ou tr a fon te s e en con tr a b em a o la d o, p ois , d e igu a l m od o e também sistematicamente, se presta uma atenção muito menor às
verdadeiras conseqüências n a t u r a is d e u m a a çã o d o qu e a s u a s cons eqü ên cia s s ob r en a tu r a is (o qu e é ch a m a d o d e p u n ições e gr a ça s d a d ivin d a d e). Pr es cr eve-s e, p or exem p lo, tom a r cer tos b a n h os em d eter m in a d os m om en tos : n ã o s e tom a b a n h o p or u m a qu es tã o d e h igien e, m a s p or qu e is s o foi p r es cr ito. Nã o s e a p r en d e a fu gir d a s ver d a d eir a s con s eqü ên cia s d a s u jeir a , m a s o p r eten s o d es con t en t a m en to
qu e
a
d ivin d a d e
ter ia
ao
ver
a lgu ém
n egligen cia r o b a n h o. S ob a p r es s ã o d e u m tem or s u p er s ticios o, suspeita-s e qu e es s e la va r d o cor p o s u jo tem m a is im p or tâ n cia d o qu e o a r , d ep ois s ã o in tr od u zid os s ign ifica d os d e s egu n d a e d e ter ceir a m ã o, es t r a ga -s e a a legr ia e o s en tid o d a r ea lid a d e e s e ter m in a p or n ã o con fer ir a es s e la va r s en ã o en qu a n to pod e s er u m símbolo. As s im , s ob o im p ér io d a m or a lid a d e d os cos tu m es , o h om em
d es p r eza
p r im eir a m en te
as
ca u s a s ,
d ep ois
as
con s eqü ên cia s , em ter ceir o lu ga r a r ea lid a d e e liga tod os os s eu s s en tim en t os eleva d os (d e ven er a çã o, d e n ob r eza , d e a ltivez, d e r econ h ecim en to, d e a m or ) a u m m u n d o im a gin á rio: qu e ch a m a d e m u n d o s u p er ior . E h oje a in d a vem os a s con s eqü ên cia s d is s o: d es d e qu e os s en tim en t os d e u m h om em s e elevam d e u m a for m a ou d e ou tr a , es s e m u n d o im a gin á r io es tá em jogo. É tr is te d izer , m a s p r ovis or ia m en te tod os os s en tim en tos elev ad os d evem s er s u s p eitos a o h om em d e ciên cia , tã o ilu s ór ios e extr a va ga n tes s e mostram. Nã o qu e es s es s en tim en tos d eves s em s er s u s p eitos em s i e p a r a s em p r e, m a s , d e tod a s a s depurações p r ogr es s iva s qu e es p er a m a h u m a n id a d e, a d ep u r a çã o d os s en tim en tos eleva d os será uma das mais lentas.
34. S ENTIMENTOS MORAIS E CONCEITOS MORAIS É evid en t e qu e os s en tim en tos m or a is s ã o tr a n s m itid os p elo fa t o qu e a s cr ia n ça s n ot a m n os a d u ltos p r ed ileções violen ta s e
for tes a n tip a tia s com r ela çã o a cer ta s a ções e qu e, m a ca cos d e nascença, im ita m es s a s p r ed ileções e es s a s a n tip a t ia s ; m a is ta r d e, n o d ecor r er d e s u a exis t ên cia , qu a n d o es t iver em r ep letos d es s es s en tim en t os b em a d qu ir id os e b em exer cid os , a ch a m con ven ien te p r oced er a u m exa m e t a r d io, a u m a es p écie d e exp os içã o d os m otivos qu e ir ã o ju s tifica r es s a s p r ed ileções e d es s a s a n tip a t ia s . Mas es s a
exp os içã o d os m ot ivos
n a d a tem a ver n eles com a
origem nem com a intensidade desses sentimentos: contenta-se de s e p ôr em d ia com a con ven iên cia qu em qu is er qu e u m s er r a cion a l con h eça a s r a zões d e s eu s p r ós e d e s eu s con tr a s , r a zões confessáveis
e
a ceitá veis .
Nes te
s en t id o,
a
h is tór ia
d os
s en tim en t os m or a is é in teir a m en t e d ifer en te d a h is tór ia d os con ceitos m or a is . Os p r im eir os s ã o p od er os os antes d a a çã o, os s egu n d os , s ob r etu d o depois, d efr on te d a
n eces s id a d e d e s e
explicar a respeito dela.
35. OS SENTIMENETOS E SUA PROVENIÊNCIA DOS JUÍZOS Con fia em teu s en tim en to!
Ma s os s en tim en tos n ã o s ã o
n a d a d e d efin itivo, n a d a d e or igin a l; p or tr á s d os s en tim en tos h á os ju ízos e a s a p r ecia ções qu e n os s ã o t r a n s m it id os s ob for m a d e s en tim en t os (p r ed ileções , a n tip a t ia s ). A in s p ir a çã o qu e d ecor r e d e u m s en tim en to é n eta d e u m ju ízo errôneo!
m u ita s vezes d e u m ju ízo
m a s , em qu a lqu er ca s o, n ã o d e u m ju ízo qu e te s eja
p es s oa l! Con fia r n os p r óp r ios s en t im en tos s ign ifica ob ed ecer m a is a o a vô, à a vó e a os a n tep a s s a d os d o qu e ob ed ecer a os d eu s es qu e estão em nós, à nossa razão e à nossa experiência.
36. UMA TOLICE DA PIEDADE REPLETA DE SEGUNDAS INTENÇÕES O qu ê? Os in ven tor es d a s a n tiga s cu ltu r a s , os p r im eir os construtores de utensílios e de cordas, de carroças , d e b a r cos e d e
ca s a s , os
p r im eir os
ob s er va d or es
da
con for m id a d e d a s
celes tes e d a s r egr a s d a m u ltip lica çã o
leis
s er ia m d ifer en tes d os
in ven tor es e d os ob s er va d or es d e n os s o tem p o e s u p er ior es a es tes ? Nã o ter ia m os p r im eir os u m va lor qu e t od a s a s n os s as via gen s , tod a s a s n os s a s n a vega ções cir cu la r es n o d om ín io d a s d es cob er ta s n ã o ch ega r ia m a igu a la r ? As s im fa la a voz d o p r econ ceito;
a s s im
se
a r gu m en ta
para
r eb a ixa r
o
es p ír ito
moderno. E, no entanto, é evidente que outrora o acaso foi o maior in ven tor e o m a ior ob s er va d or , o in s p ir a d or b en evolen t e d es s a ép oca en gen h os a e qu e, p a r a a s m a is in s ign ifica n t es in ven ções qu e or a s e fa zem , exige-s e m a is es p ír ito, m a is en er gia e m a is im a gin a çã o cien tífica
d o qu e h ou ve ou tr or a
d u r a n te lon gos
períodos.
37. F ALSAS CONCLUSÕES TIRADAS DA UTILIDADE Qu a n d o s e d em on s tr ou a extr em a u tilid a d e d e u m a cois a , n ã o s e fez a in d a u m p a s s o p a r a exp lica r s u a or igem : o qu e s ign ifica qu e ja m a is s e p od e exp lica r , p or m eio d a u tilid a d e, a n eces s id a d e d a exis tên cia . Ma s é p r ecis a m en te o ju ízo in ver s o qu e d om in ou a t é o p r es en te
e a t é m es m o n o d om ín io d a ciên cia
m a is r igor os a . Os a s tr ôn om os n ã o ch ega r a m a p r eten d er qu e a u tilid a d e (s u p os ta ) n a
econ om ia
d os
s a télites
(s u p r ir a
lu z
en fr a qu ecid a p or u m a d is t â n cia d em a s ia d o gr a n d e d o s ol, p a ra qu e os h a b ita n tes d os a s tr os n ã o tives s em fa lta d e lu z) er a o ob jet ivo fin a l d es s a econ om ia e exp lica va s u a or igem ? Is to fa z lem b r a r ta m b ém o r a ciocín io d e Cr is tóvã o Colom b o: a t er r a é feita p a r a o h om em ; p or t a n to, s e h á ter r a s , ela s d evem s er h a b ita d a s . S er á p os s ível qu e o s ol d er r a m e s eu s r a ios s ob r e o n a d a e qu e a vigília noturna das estrelas seja prodigalizada em vão a mares sem velas e a regiões desabitadas?
38. OS INSTINOS TRANSFORMADOS PELOS JUÍZOS MORAIS O p r óp r io in s t in to s e tor n a u m s en t im en to p en os o d e covardia, s ob a im p r es s ã o d a cen s u r a qu e os cos t u m es fizer a m r ep ou s a r s ob r e ele: ou u m s en tim en to a gr a d á vel d e humildade, se u m a m or a l, com o a cr is tã , o a d otou e o d ecla r ou bom. Qu er d izer qu e es s e in s tin to goza r á s em p r e d e u m a b oa ou d e u m a m á con s ciên cia ! E m
s i, com o tod o in s tin to, é in d ep en d en te d a
con s ciên cia , n ã o p os s u i n em u m ca r á ter , n em u m a d es ign a çã o m or a l e t a m p ou co é a com p a n h a d o d e u m s en tim en to d e p r a zer ou d e d es p r a zer d eter m in a d o: s ó a d qu ir e tu d o is s o com o u m a s egu n d a n a tu r eza , a p a r tir d o m om en to em qu e s e r ela cion a com ou tr os in s tin tos qu e já r eceb er a m o b a tis m o d o b em e d o m a l, ou se é reconhecido como o atributo de um ser que o povo já definiu e a va liou d o p on to d e vis ta m or a l.
As s im , os a n tigos gr egos
tin h a m ou tr a op in iã o s ob r e a in ve ja, d ifer en te d a n os s a : Hes íod o 6 a m en cion a en tr e os efeitos d a boa e b en fa zeja E r is e n ã o fica va ch oca d o com o p en s a m en to d e qu e os d eu s es tives s em a lgu m a cois a d e in vejos o: fen ôm en o com p r een s ível n u m es t a d o d e cois a s em qu e a em u la çã o er a a a lm a ; em u la çã o qu e er a con s id er a d a com o b oa e a p r ecia d a com o ta l. De igu a l m od o, os gr egos s e d is tin gu ia m d e n ós n a a va lia çã o d a esperança: consideravam-na com o cega e p ér fid a ; Hes íod o m os tr ou n u m a fá b u la o qu e s e p od e dizer de mais violento contra ela e o que ele diz é tão estranho, que n en h u m in t ér p r ete n ovo com p r een d eu a lgu m a cois a
p ois é
con tr á r io a o es p ír ito m od er n o qu e a p r en d eu d o cr is t ia n is m o a con s id er a r a es p er a n ça u m a vir tu d e. Ao con t r á r io, p a r a os gr egos o con h ecim en to d o fu tu r o n ã o p a r ecia in t eir a m en te fech a d o e a in ter r oga çã o d o fu tu r o s e tin h a tor n a d o, em in u m er á veis ca s os , um
d ever r eligios o; en qu a n to n ós
n os
con ten ta m os
com
a
es p er a n ça , os gr egos , gr a ça s à s p r ed ições d e s eu s a d ivin h os , tin h a m m u ito p ou ca es t im a p ela es p er a n ça e a r eb a ixa va m a o nível de um mal ou de um perigo.
Os judeus, que consideravam
a cólera d e u m m od o d ifer en te d e n ós , d ecla r a r a m -n a s a gr a d a : é p or is s o qu e coloca r a m a s om b r ia m a jes ta d e qu e a a com p a n h a va n u m gr a u tã o eleva d o qu e u m eu r op eu s equ er p od er ia im a gin a : eles con ceb er a m a s a n tid a d e d e s eu J a vé colér ico s egu n d o a s a n tid a d e d e s eu s p r ofet a s colér icos . Os gr a n d es en coler iza d os en tr e os
eu r op eu s , s e for em
a va lia d os
s egu n d o s em elh a n te
m ed id a , n ã o p a s s a m , d e a lgu m m od o, d e cr ia tu r a s d e s egu n d a mão.
39. O PRECPNCEITO DO ESPÍRITO PURO E m t od a p a r te on d e r ein a a d ou tr in a d a es p iritu alid a d e pu ra , ela d es tr u iu com s eu s exces s os a for ça n er vos a : en s in a va a d es p r eza r
o
cor p o,
a
n egligen ciá -lo
ou
a
a t or m en tá -lo,
a
a tor m en ta r e d es p r eza r o p r óp r io h om em , p or ca u s a d e tod os os s eu s in s tin tos ; p r od u zia a lm a s s om b r ia s , t en s a s , op r im id a s qu e, a lém d is s o, a cr ed it a va m con h ecer a ca u s a d e s eu s en tim en to d e m is ér ia e es p er a va m p od er s u p r im i-la! É n o cor p o qu e ela s e en con tr a ! E s em p r e a in d a d em a s ia d o viços o!
a s s im con clu ía m
eles, en qu a n to n a r ea lid a d e o cor p o, com s u a s d or es , n ã o ces s a va d e s e r eb ela r con tr a o con t ín u o d es p r ezo qu e lh e m os tr a va m . Um extr em o n er vos is m o, qu e s e tor n ou ger a l e cr ôn ico, a ca b a va p or s er o a p a n á gio d es s es vir tu os os es p ír itos p u r os : eles s ó con h ecia m o p r a zer s ob a for m a d e êxta s e e d e ou tr os fen ôm en os d a lou cu r a e s eu s is tem a a tin gia s eu a p ogeu qu a n d o con s id er a va m o êxta s e com o p on to cu lm in a n te d a vid a e com o cr itér io p a r a condenar tudo o que é terrestre.
40. A INCESSANTE REFLEXÃO SOBRE OS COSTUMES Os n u m er os os p r eceitos m or a is qu e er a m extr a íd os , à s p r es s a s , d e u m a con tecim en to ú n ico e in s ólito, a ca b a va m p or tornar-s e r a p id a m en t e in com p r een s íveis : er a tã o d ifícil d ed u zir d eles in t en ções com o r econ h ecer a p en a lid a d e qu e d evia s er a p lica d a a u m a in fr a çã o; a d ú vid a p es a va m es m o n o d es en r ola r d a s cer im ôn ia s ; m a s , en qu a n to t u d o er a con cer ta d o em tor n o d es s e a s s u n to, o ob jeto d e s em elh a n te in ves t iga çã o cr es cia em va lor e o qu e h a via p r ecis a m en te d e a b s u r d o n u m cos tu m e a ca b a va
p or
se
tor n a r
s a cr os s a n to.
Nã o
se
d eve
ju lga r
levia n a m en te a for ça qu e a h u m a n id a d e d es p en d eu n is s o d u r a n te m ilh a r es
d e a n os
s ob r etu d o o efeito qu e p r od u zia m
es s a s
in ces s an tes reflexões s obre os cos tu m es ! Ch ega m os a s s im a u m im en s o ter r en o d e m a n ob r a d a in teligên cia : n ã o s om en te a s religiões n ele s e d es en volvem e s e com p leta m , m a s ta m b ém a ciên cia en con tr a a li s eu s p r ecu r s or es ven er á veis , em b or a a in d a ter r íveis ; é a li qu e o p oeta , o p en s a d or , o m éd ico, o legis la d or cr es cer a m ! O m ed o d o in com p r een s ível qu e, d e u m a for m a equivocada, exige de nós cerimônias revestiu aos poucos o atrativo d o h er m et is m o e, qu a n d o n ã o s e ch ega va a a p r ofu n d a r , s e aprendia a criar.
41. P ARA DETERMINAR O VALOR DA VIDA CONTEMPLATIVA Nã o es qu eça m os , s en d o h om en s d a vid a con t em p la tiva , d e qu e gên er o for a m a s d es gr a ça s e a s m a ld ições qu e a tin gir a m os h om en s d a vid a a tiva p or m eio d os d ifer en tes con tr a golp es d a contemplação
numa palavra, que conta a vida ativa teria de nos
a p r es en ta r , a n ós qu e n os va n glor ia m os com tod o o or gu lh o d e n os s os b en efícios . Em prim e iro lu gar, ela n os op or ia : a s n a tu r eza s ditas religiosas qu e, p or s eu n ú m er o, p r ed om in a m en tr e os
con tem p la tivos e r ep r es en ta m , p or con s egu in te, a es p écie m a is corrente; a gir a m , d es d e s em p r e, d e m od o a tor n a r a vid a d ifícil p a r a os h om en s p r á t icos , a d es gos tá -los com is s o s e p os s ível: obscurecer o céu, apagar o sol, tornar a alegria suspeita, depreciar a s es p er a n ça s , p a r a lis a r a m ã o a t iva
a s s im é qu e ela s for a m
en ten d id a s e p or is s o tiver a m , p a r a a s ép oca s e os s en tim en t os m is er á veis ,
su as
con s ola ções ,
su as
es m ola s ,
su as
m ã os
es ten d id a s e s u a s b ên çã os . Em s egu n d o lu ga r: os a r tis ta s , u m a es p écie d e h om en s d a vid a con tem p la tiva m a is r a r a qu e a r eligios a , m a s a in d a b a s ta n te fr eqü en te; com o in d ivíd u os t êm s id o ger a lm en t e
in s u p or tá veis ,
ca p r ich os os ,
in vejos os ,
violen t os,
b r igu en tos : es s a im p r es s ã o d eve s er d ed u zid a d a im p r es s ã o tr a n qü iliza d or a e exa lt a n te d e s u a s ob r a s . Em terce iro lu gar: os filós ofos , u m a es p écie em qu e s e en con tr a m r eu n id a s for ça s r eligios a s e a r tís t ica s , m a s d e ta l m od o qu e u m ter ceir o elem en to pode s er a cr es cid o, o d ia lético, o p r a zer d e d is cu tir ; es tiver a m n a or igem d os m es m os m a les com o os r eligios os e os a r t is ta s e, a lém d is s o p or
ca u s a
de su a
in clin a çã o d ia lética , p r od u zir a m
o
a b or r ecim en to em m u ita gen te; s eu n ú m er o, con tu d o, foi s em p r e reduzido. Em qu a rto lu ga r: os p en s a d or es e os tr a b a lh a d or es cien t íficos ; r a r a m en te p r ocu r a r a m p r od u zir efeitos , con ten ta n d os e em es ca va r s ilen cios a m en t e s u a s toca s d e tou p eir a , o qu e os levou a s u s cit a r p ou co a b or r ecim en to e p r a zer ; ten d o s id o ob jeto d e h ila r id a d e e zom b a r ia , ch ega r a m a té, s em o s a b er , a a livia r a exis tên cia d os h om en s d a vid a a tiva . Fin a lm en te, a ciên cia a ca b ou por tornar-se uma coisa muito útil para todos: se, por causa dessa u tilid a d e, m u it os h om en s p r ed es tin a d os à vid a a tiva tr ilh a m o caminho d a ciên cia com o s u or d e s eu r os to, n ã o s em m a ld ições e d or es d e ca b eça , a m u ltid ã o d os p en s a d or es e d os tr a b a lh a d or es cien t íficos
n ã o t em
cu lp a
de
s eu s
d is s a b or es : es s e
é um
sofrimento infligido a si próprio .
42. ORIGEM DA VIDA CONTEMPLATIVA Du r a n te a s ép oca s b á r b a r a s , qu a n d o r ein a m os ju ízos p es s im is ta s s ob r e o h om em e o m u n d o, o in d ivíd u o s e a p lica s em p r e,
con fia n d o
na
p len it u d e
de
su a
for ça ,
a
a gir
em
conformidade com esses juízos, isto é, a colocar as idéias em ação, a tr a vés d a ca ça , d a p ilh a gem , d a s u r p r es a , d a b r u ta lid a d e e d os a s s a s s in a tos , a s s im
com o a tr a vés
das
for m a s
en fr a qu ecid a s
d es s a s a ções , a s ú n ica s toler a d a s n o in ter ior d a com u n id a d e. Ma s s e o vigor d o in d ivíd u o d eclin a , s e s e s en te fa tiga d o ou d oen te, m ela n cólico ou
s a cia d o e, portanto, m om en ta n ea m en te s em
d es ejos e s em a p etites , t or n a -s e en tã o u m h om em r ela tiva m en te m elh or , is to é, m en os p er igos o, e s u a s id éia s p es s im is ta s s e exter ior iza m a p en a s em p a la vr a s e r eflexões , r efer en tes , p or exem p lo, a s eu s com p a n h eir os , a s u a m u lh er , a s u a vid a ou a s eu s d eu s es desfavoráveis.
e os ju ízos qu e en tã o va i em itir s er ã o ju ízos Nes s e
es ta d o
de
es p ír it o,
tr a n s for m a -s e
em
p en s a d or e a n u n cia d or , ou en tã o s u a im a gin a çã o va i d es en volver s u a s s u p er s tições , va i in ven ta r n ovos cos tu m es , va i zom b a r d e seus inimigos:
m a s s eja o qu e for qu e p os s a im a gin a r , tod a s a s
p r od u ções d e s eu es p ír ito vã o r efletir n eces s a r ia m en t e s eu es ta d o, qu er d izer , u m a u m en to d e s eu tem or e d e s u a fa d iga , u m a d im in u içã o d e s u a es tim a p ela a çã o e p ela a legr ia ; s er á n eces s á r io qu e o con teú d o d es s a s p r od u ções cor r es p on d a a o es t a d o d e a lm a p oético, im a gin a tivo e s a cer d ota l: o ju ízo d es fa vor á vel d eve p r ed om in a r . Ma is ta r d e t od os os qu e p a s s a r a m a fa zer d e u m a for m a con tín u a o qu e ou tr or a o in d ivíd u o s ó fa zia p or d is p os içã o, a qu eles ,
p ois ,
qu e
em it ia m
ju ízos
d es fa vor á veis ,
vivia m
na
m ela n colia e p er m a n ecia m p ob r es em a ções e for a m ch a m a d os
p oeta s , p en s a d or es , p a d r es ou
milagreiros :
p or qu e n ã o
a tu a va m s u ficien tem en te, d e b oa von t a d e ter ia m s id o d es p r eza d os ou a té exp u ls os d a com u n id a d e ta is h om en s ; m a s h a via n is s o u m perigo
eles tin h a m s egu id o a s p ega d a s d a s u p er s tiçã o e a s
p ega d a s d o p od er d ivin o, p elo qu e n ã o h a via d ú vid a d e qu e p os s u ís s em m eios d e a çã o p r oven ien tes d e for ça s d es con h ecid a s . Nes s a es tim a é qu e s e en con tr a va m a s mais a n tiga s gerações d e n a tu rez a s con te m pla tiv a s
d es p r eza d a s n a m ed id a em qu e n ã o
d es p er t a va m tem or . É s ob es s a for m a d is fa r ça d a , s ob es s e a s p ecto d u vid os o, com u m cor a çã o m a u e u m es p ír ito m u ita s vezes a tor m en ta d o, qu e a con t em p la çã o fez s u a p r im eir a a p a r içã o n a ter r a , d es p r eza d a em s egr ed o e p u b lica m en te cob er ta d e s in a is d e u m r es p eito s u p er s ticios o! Aqu i s e d eve d izer com o s em p r e: pudenda origo7 !
43. QUANTAS FORÇAS O PENSADOR DEVE HOJE REUNIR NELE Tornar-s e es tr a n h o à s con s id er a ções d os s en tid os , eleva r -se a té a a b s tr a çã o
ou tr or a is s o er a con s id er a d o com o u m a
ver d a d eir a eleva çã o: m a s n ã o p od em os m a is ter a s m es m a s op in iões . A em b r ia gu ez cr ia d a p ela s m a is p á lid a s im a gen s d a s p a la vr a s
e
das
cois a s ,
o
com ér cio
com
s er es
invisíveis,
imperceptíveis, intangíveis, eram considerados como existência em ou tr o m u n d o superior, u m a exp er iên cia n a s cid a d o p r ofu n d o d es p r ezo p elo m u n d o p er cep tível a os
s en tid os , es s e m u n d o
s ed u tor e m a u . Lon ge d e n os s ed u zir , es s a s a b s tr a ções p od em d or a va n te n os con d u zir !
a es s a s p a la vr a s s e la n ça va m com o s e
qu is es s em ga lga r os cu m es . Nã o é o con teú d o d es s es jogos espirituais, mas são os próprios jogos que foram a coisa superior n a p r é-h is t ór ia d a ciên cia . Da í a a d m ir a çã o d e Pla t ã o p ela d ia lética e s u a fé en t u s iá s tica n a r ela çã o n eces s á r ia d es t a com o
h om em
b om ,
d ifer en tes
lib er to d os
m a n eir a s
s ep a r a d a m en te
e
a os
de
s en tid os . con h ecer
p ou cos ,
mas
Nã o
for a m
qu e
for a m
ta m b ém
s om en te
as
d es cob er ta s os
m eios
do
con h ecim en to em ger a l, a s con d ições e a s op er a ções qu e n o h om em p r eced em o a to d e con h ecer . E s em p r e p a r ecia qu e a op er a çã o u ltim a m en te d es cob er ta ou os es ta d os d e a lm a n ovos fos s em a p en a s m eios p a r a ch ega r a t od o con h ecim en to, m a s o ob jet ivo d es eja d o, o teor e a s om a d e tu d o o qu e m er ece s er con h ecid o. O p en s a d or tem
n eces s id a d e d a
im a gin a çã o, d o
im p u ls o, d a a b s t r a çã o, d a es p ir itu a liza çã o, d o s en tid o in ven tivo, d o p r es s en tim en to, d a in d u çã o, d a d ia lética , d a d ed u çã o, d a cr ítica , d a r eu n iã o d e m a ter ia is , d o p en s a m en to im p es s oa l, d a con tem p la çã o e d a s ín tes e, e n ã o m en os d e ju s tiça e d e a m or em r ela çã o a
tu d o o qu e exis te
mas
na
h is tór ia
da
v id a
con te m pla tiv a , t od os es s es m eios for a m con s id er a d os , ca d a u m em separado,
com o
ob jetivo
e
com o
ob jetivo
s u p r em o,
e
p r op or cion a r a m a s eu s in ven t or es es s a felicid a d e qu e en ch e a a lm a h u m a n a , qu a n d o é ilu m in a d a com o b r ilh o d e u m ob jetivo supremo.
44. ORIGEM E SIGNIFICAÇÃO Por qu e es s e p en s a m en t o r etor n a s em ces s a r a m eu es p ír ito e t om a cor es s em p r e m a is viva s ? filós ofos ,
qu a n d o
es t a va m
na
O p en s a m en to qu e outrora os via
da
or igem
das
cois a s ,
im a gin a va m s em p r e qu e fa r ia m d es cob er ta s d e u m a s ign ifica çã o in a p r eciá vel p a r a tod a es p écie d e a çã o e d e ju ízo; supunha-se até m es m o
qu e
a
salvação
d os
h om en s
d evia
d ep en d er
do
en ten d im en to qu e p os s u ía d a or igem d a s cois a s : h oje, p elo con tr á r io, qu a n to m a is n os en tr ega m os à p es qu is a d a s or igen s , m en os n os s o in ter es s e p a r ticip a d es s a op er a çã o, a o con t r á r io,
tod a s a s a va lia ções , tod os os
interesses
qu e coloca m os n a s
cois a s com eça m a p er d er s u a s ign ifica çã o à m ed id a qu e r ecu a m os n o con h ecim en to p a r a cer ca r d e p er to a s p r óp r ia s cois a s ; com o en ten d im en to d a origem a in s ign ificâ n cia d a origem a u m en ta : enquanto o que está próximo, o que está em nós e em torno de nós com eça a os p ou cos a s e m os tr a r r ico d e cor es , d e b eleza s , d e en igm a s e d e s ign ifica ções , d a s qu a is a a n tiga h u m a n id a d e n em s equ er ou s a va s on h a r . Ou tr or a os p en s a d or es gir a va m em cír cu lo com o a n im a is p r es os , d evor a d os p or u m a r a iva s ecr eta , la n ça n d os e con tr a es s a s b a r r a s p a r a qu eb r á -la s ; e feliz p a r ecia a qu ele qu e, p or a lgu m a fr es ta , ju lga va ver a lgu m a cois a d e for a , d o a lém e d a s coisas distantes.
45. UM DESFECHO TRÁGICO DO CONHECIMENTO De tod os os m eios d e exa lta çã o, os s a cr ifícios h u m a n os s ã o os qu e, em t od os os tem p os , m a is eleva r a m e es p ir itu a liza r a m o h om em . E t a lvez h a ja u m a s ó id éia p r od igios a qu e, a in d a a gor a , poderia aniquilar qualquer outra aspiração, de modo que obtivesse a vitór ia s ob r e a m a is vitor ios a
qu er o d izer a id éia d a
h u m an id a d e s acrifican d o-s e a s i m es m a . Ma s a qu em d ever ia ela s e s a cr ifica r ? Pod e-s e já ju r a r qu e, s e a lgu m d ia a con s tela çã o d es s a id éia a p a r eces s e n o h or izon te, o con h ecim en to d a ver d a d e s e m a n ter ia com o o ú n ico ob jetivo in gen t e a qu e s em elh a n te s a cr ifício s er ia p r op or cion a l, p or qu e p a r a o con h ecim en to n en h u m s a cr ifício é d em a s ia d o gr a n d e. E s p er a n d o p or is s o, o p roblema nunca foi posto, jamais alguém se perguntou se a humanidade em s eu con ju n to er a ca p a z d e u m m ovim en to p r óp r io p a r a fa zer o con h ecim en to p r ogr ed ir e, m en os a in d a , qu e n eces s id a d e d e con h ecim en to im p elir ia a h u m a n id a d e a s e ofer ecer a s i p r óp r ia em
h oloca u s t o p a r a
m or r er
com
a
lu z d e u m a
s a b ed or ia
a n tecip a d a n os olh os . Ta lvez u m
d ia , qu a n d o s e ch ega r a
con fr a ter n iza r com os h a b ita n t es d e ou t r os p la n eta s , n o in ter es s e d o con h ecim en to, e qu a n d o, a lgu n s m ilh a r es d e a n os a d ia n te, s e tiver con s egu id o com u n ica r o p r óp r io s a b er d e es tr ela em es tr ela , ta lvez en tã o a on d a d e en tu s ia s m o p r ovoca d a p elo con h ecim en to terá atingido semelhante altura!
46. D UVIDAR QUE SE DUVIDA Qu e tr a ves s eir o fofo é a d ú vid a p a r a u m a ca b eça b em feita ! estas palavras de Montaigne8 sempre exasperaram Pascal9 , pois n in gu ém com o ele t in h a exa t a m en te ta n t a n eces s id a d e d e u m travesseiro fofo. A que se referia isso, pois?
47. AS PALAVRAS NOS BARRAM O CAMINHO Em
tod a p a r te on d e os a n t igos d os p r im eir os tem p os
coloca va m u m a p a la vr a cr ed ita va m t er feit o u m a d es cob er ta . E como na realidade isso era diferente!
eles tinham apenas tocado
u m p r ob lem a e, ju lga n d o tê-lo resolvido, h a via m cr ia d o u m obstáculo à sua salvação.
Agor a , p a r a a tin gir o con h ecim en to, é
p r ecis o tr op eça r em p a la vr a s qu e s e tor n a r a m et er n a s e d u r a s com o p ed r a s , e a s p er n a s s e qu eb r a r ã o m a is fa cilm en te qu e a palavra.
48. CONHECE-TE A TI MESMO , ESSA É TODA A CIÊNCIA S ó d ep ois d e con h ecer tod a s a s cois a s é qu e o h om em p od er á
se
con h ecer
a
s i m es m o.
De
fa to,
as
cois a s
são
simplesmente as fronteiras do homem.
49. O NOVO SENTIMENTO FUNDAMENTAL: NOSSA NATUREZA DEFINITIVAMENTE PERECÍVEL
Ou tr or a p r ocu r a va -s e d es p er ta r o s en t im en to d a s ob er a n ia
d o h om em m os tr a n d o s u a origem d ivin a ; is s o tor n ou -s e h oje u m a via in ter d ita d a , p ois n o in ício es tá o m a ca co, cer ca d o d e a lgu m a p es s oa a n im a l a m ed r on ta d or a :
r a n ge os d en tes com o p a r a
d izer : n en h u m p a s s o a m a is n es s a d ir eçã o! S ã o feita s , p or con s egu in t e, ten t a tiva s n a d ir eçã o op os t a : o ca m in h o qu e a humanidade toma d eve s er vir p a r a p r ova r s u a s ob er a n ia e s u a n a tu r eza d ivin a . Ai! is s o ta m b ém n ã o leva a n a d a ! No fin a l d es s e ca m in h o s e en con tr a a u r n a fu n er á r ia d o ú ltim o homem que en ter r a os m or tos (com a in s cr içã o: Nih il h u m an i a m e alien u m puto10). Por m a is a lto qu e s u a evolu çã o p os s a leva r a h u m a n id a d e e ta lvez n o fim s eja in fer ior a o qu e h a via s id o n o in ício!
não
h á p a r a ela p a s s a gem a u m a or d em s u p er ior , ta l com o a for m iga e o m os qu ito n o fim d a s u a
ca r r eir a ter r es tr e
n ã o en tr a m n a
eternidade e no seio de Deus. O futuro arrasta atrás de si o que foi o p a s s a d o: p or qu e d ever ia h a ver , p a r a u m a p equ en a es tr ela qu a lqu er e p a r a u m a p equ en a es p écie viven d o n es s a es tr ela , u m a exceçã o
n es s e
es p etá cu lo
eter n o?
Afa s tem os
de
n ós
es s a s
sentimentalidades!
50. A F É NA E MBRIAGUEZ Os h om en s qu e con h ecem in s ta n tes d e s u b lim e en ca n to e qu e, em m om en tos com u n s , p or ca u s a d o con tr a s te e d a extr em a u s u r a d e s u a s for ça s n er vos a s , s e s en tem m is er á veis e d es ola d os , con s id er a m ta is m om en tos com o a ver d a d eir a m a n ifes ta çã o d e s i m es m os , d e s eu eu ; p elo con tr á r io, a m is ér ia e a d es ola çã o com o o efeito d o não-eu ; é p or is s o qu e p en s a m em s eu m eio, em s u a ép oca , em s eu m u n d o tod o, com s en t im en t os d e vin ga n ça . A em b r ia gu ez p a r ece-lh es s er a ver d a d eir a vid a , o eu a u tên tico: em tu d o o r es to vêem a d ver s á r ios e in im igos d a em b r ia gu ez, qu a lqu er qu e s eja a es p écie d es s a em b r ia gu ez, es p ir itu a l, m or a l, r eligios a
ou a r tís tica . A h u m a n id a d e d eve b oa p a r te d e s u a s d es gr a ça s a es s es em b r ia ga d os en tu s ia s ta s : p ois s ã o in fa tigá veis s em ea d or es d o joio d o d es con ten ta m en to d e s i e d os ou tr os , d o d es p r ezo d e s eu tem p o e d o m u n d o e s ob r etu d o d o ca n s a ço. Ta lvez tod o u m in fer n o d e criminosos n ã o p od er ia p r od u zir es s a s con s eqü ên cia s n efa s ta s e d is ta n tes , es s es efeitos p es a d os e in qu ieta n tes , qu e cor r om p em a ter r a e o a r e qu e s ã o o a p a n á gio d es s a n ob r e p equ en a com u n id a d e d e s er es d es en fr ea d os , extr a va ga n tes e m eio lou cos , gên ios qu e n ã o s a b em s e d om in a r e qu e s ó en con tr a m a legr ia
em
si
p r óp r ios
qu a n d o
se
p er d em
com p leta m en te:
en qu a n to o cr im in os o, p elo con tr á r io, m u ita s vezes d á a in d a prova s d e d om ín io d e s i, d e s a cr ifício e d e s a b ed or ia e m a n t ém viva s es s a s qu a lid a d es n a qu eles qu e o tem em . Por ca u s a d ele a a b ób a d a celes te qu e s e eleva a cim a d a vid a s e t or n a t a lvez p er igos a e ob s cu r a , m a s a a t m os fer a p er m a n ece vigor os a e s ever a . Além d is s o, es s es ilu m in a d os p õem tod a s a s s u a s for ça s p a r a p r op a ga r a fé n a em b r ia gu ez, com o s e fos s e a vid a p or excelên cia ! Pr ecis a m en te com o s e cor r om p e r a p id a m en t e os s elva gen s com a aguardente , qu e os leva a p er ecer , a h u m a n id a d e foi cor r om p id a em s eu con ju n to, len t a e fu n d a m en ta lm en te, p ela a gu a r d en te es p iritu al
d os
s en tim en tos
in eb r ia n tes
e
p or
a qu eles
qu e
m a n tin h a m vivo o d es ejo d ela : ta lvez ter m in e p or p er ecer p or causa disso.
51. T AL COMO SOMOS! S eja m os in d u lgen t es p a r a com os gr a n d es ca olh os !
disse
S tu a r t Mill11: com o s e fos s e p r ecis o p ed ir in d u lgên cia , qu a n d o n os s a a tit u d e h a b it u a l em r ela çã o a eles é feita d e fé e m es m o d e a d m ir a çã o! E u d igo: s eja m os in d u lgen tes p a r a com os h om en s , gr a n d es e p equ en os , d e d ois olh os , p ois , t a l com o s om os , n ã o
chegaremos além da indulgência!
52. ONDE ESTÃO OS NOVOS MÉDICOS DA ALMA? Foram os meios de consolação que deram à vida esse caráter fu n d a m en ta lm en t e m is er á vel n o qu a l a gor a s e a cr ed ita : a m a is gr a ve d oen ça d a h u m a n id a d e n a s ceu d a lu ta con tr a a s d oen ça s e os r em éd ios a p a r en tes p r od u zir a m com o tem p o u m m a l p ior d a qu ele qu e d ever ia m elim in a r . Por ign or â n cia , os r em éd ios er a m con s id er a d os
es tu p efa cien tes
e
en tor p ecen tes
im ed ia ta m en te, o qu e s e cos tu m a va ch a m a r d e
qu e
a gia m
consolações ,
com o cu r a tivos p r op r ia m en te d itos ; n ã o s e n ot a va a té m es m o qu e s e p a ga va m u ita s vezes es s e a lívio im ed ia to p or u m a a lter a çã o d a s a ú d e, p r ofu n d a e ger a l, qu e os d oen tes tin h a m d e s ofr er os efeitos d a em b r ia gu ez, d ep ois d a a u s ên cia d e em b r ia gu ez e fin a lm en t e d e u m s en tim en to d e in qu ietu d e, d e op r es s ã o, d e p er tu r b a ções n er vos a s e d e m a l-es ta r ger a l. Qu a n d o s e ca ía d oen te a té cer to gr a u , a cu r a já n ã o er a p os s ível
os m éd icos d a
a lm a vela va m en tã o en tr e a con fia n ça e a ven er a çã o ger a l.
Com
r a zã o s e d iz qu e S ch op en h a u er 12 foi o p r im eir o a ter tom a d o d e n ovo a s ér io os s ofr im en tos d a h u m a n id a d e: on d e es tá a qu ele qu e fin a lm en t e va i leva r a s ér io os r em éd ios p a r a es s es s ofr im en t os e va i coloca r n o p elou r in h o o in qu a lificá vel ch a r la ta n is m o com o qual até agora, sob os nomes mais sublimes, a humanidade tratou as doenças da alma?
53. ABUSOS PARA COM OS CONSCIENCIOSOS For a m os con s cien cios os e não os s em con s ciên cia qu e tiver a m d e s ofr er ter r ivelm en te s ob o p es o d a s exor ta ções à p en itên cia e d o tem or d o in fer n o, s ob r etu d o qu a n d o er a m ta m b ém h om en s d e im a gin a çã o. Aca b ou -s e, p or ta n t o, p or en tr is tecer a
vid a exa ta m en te d a qu eles qu e tin h a m s er en id a d e e d e im a gen s a gr a d á veis p r óp r io
r econ for to
e
su a
p r óp r ia
m a is n eces s id a d e d e n ã o s om en te p a r a s eu
cu r a ,
mas
para
qu e
a
humanidade pudesse se alegrar com seu aspecto e absorver nela o brilho de sua beleza. Ai! Quanta crueldade gratuita, quantos maus tratos provieram das religiões que inventaram o pecado! E homens qu e, p or m eio d es s a s r eligiões , qu is er a m s a b or ea r a o m á xim o d e seu poder!
54. AS IDÉIAS SOBRE A DOENÇA Tr a n qü iliza r a im a gin a çã o d o d oen te p a r a qu e n ã o ten h a m a is qu e s ofr er com id éia s qu e tem d e s u a d oen ça , mais qu e com a p r óp r ia d oen ça
a ch o qu e já é a lgu m a cois a ! E n ã o é m es m o
pouco! Compreendem agora nossa tarefa?
55. OS CAMINHOS Os pretensos
atalhos
s em p r e exp u s er a m a h u m a n id a d e
a os m a ior es p er igos ; com a b oa n otícia d e qu e u m ca m in h o m a is cu r to foi en con tr a d o, a h u m a n id a d e s em p r e a b a n d on a s eu p r óp r io caminho
e perde seu caminho.
56. O APÓSTATA DE ESPÍRITO LIVRE Qu em p od er ia ter , p ois , a ver s ã o p elos h om en s p ied os os e fir m es em s u a fé? Nã o os olh a m os , p elo con tr á r io, com u m a ven er a çã o s ilen cios a , a legr a n d o-n os com s eu a s p ecto, com o p r ofu n d o p es a r qu e es s es excelen tes h om en s n ã o ten h a m a s m es m a s op in iões qu e n ós ? Ma s d e on d e p r ovém es s a a ver s ã o r ep en tin a e s em r a zã o con tr a a qu ele qu e possuiu t od a a lib er d a d e d e es p ír ito e qu e s e torn ou
crente ? Qu a n d o p en s a m os n is s o,
tem os a im p r es s ã o d e t er vis to u m es p etá cu lo r ep u gn a n te qu e
s er ia n eces s á r io p r ecis o a p a ga r r a p id a m en te d e n os s o espírito! Nã o
volt a r ía m os
as
cos ta s
ao
h om em
m a is
ven er a d o,
se
tivés s em os n es s e a s p ect o a lgu m a s u s p eit a a r es p eito d ele? Nã o cer ta m en te p or u m a con d en a çã o m or a l, m a s p elo d es gos to e p elo r eceio qu e s u b ita m en te s e a p od er a r ia m d e n ós ! De on d e vem es s a severida d e d e op in iã o? Ta lvez tu d o is s o p r eten d er ia n os leva r a en ten d er qu e n o fu n d o n ã o s om os tot a lm en te s egu r os d e n ós m es m os ! Pla n ta m os em tor n o d e n ós , n o m om en t o op or tu n o, a s cercas-viva s d o d es p r ezo m a is es p in h en t o, p a r a qu e, n o m om en to d ecis ivo em qu e a id a d e n os tor n a fr a cos e es qu ecid os , p os s a m os u lt r a p a s s a r
n os s o
p r óp r io
d es p r ezo!
S in cer a m en te,
es ta
s u p os içã o é er r ôn ea e a qu ele qu e a for m u la ign or a t u d o o qu e a n im a e d eter m in a o es p ír ito livr e: com o es te ú ltim o es t á lon ge d e a ch a r a mudança d e s u a s op in iões d es p r ezível em s i! Com o, p elo con tr á r io, a p r ecia a faculdade d e m u d a r s u a op in iã o, qu a lid a d e r a r a e s u p er ior , s ob r et u d o qu a n d o s e con s egu e m a n tê-la a té a velh ice! E s eu or gu lh o (e não s u a p u s ila n im id a d e) ch ega a t é a colh er os fr u tos p r oib id os d o spern ere s e s p ern i e d o s pern ere s e ipsum1 3 , lon ge d e s e d eter n o tem or qu e in s p ir a m a os va id os os e a os tim or a tos . Além d is s o, a d ou tr in a d a in ocên cia d e tod as a s opiniões lh e p a r ece tã o fir m e com o a d ou tr in a d a in ocên cia d e tod a s a s a ções : com o s e p od er ia fa zer o p a p el d e ju iz e d e ca r r a s co dos apóstatas da liberdade intelectual? O aspecto de tal apóstata o toca , p elo con tr á r io, d a m es m a m a n eir a qu e o a s p ecto d e u m a d oen ça r ep u gn a n te toca o m éd ico: o d es gos to fís ico d ia n t e d a qu ilo qu e
é
es p on jos o,
m ole,
p en etr a n te,
p u r u len to,
tr iu n fa
m om en ta n ea m en te s ob r e a r a zã o e a von t a d e d e s ocor r er . As s im n os s a
b oa
von t a d e
é
ven cid a
p ela
id éia
da
m on s tr u os a
deslealdade que deve ter reinado no apóstata de espírito livre, pela id éia d e u m a d egen er es cên cia ger a l qu e cor r ói o ca r á ter a t é a
medula.
57. OUTRO TEMOR, OUTRA CERTEZA O cr is tia n is m o tin h a feit o p la n a r s ob r e a vid a u m a ameaça ilim ita d a e tota lm en te n ova e h a via cr ia d o, igu a lm en te, cer t eza s , a legr ia s , d iver tim en tos tota lm en te n ovos e n ova s a va lia ções d a s cois a s . Nos s o s écu lo n ega , com b oa con s ciên cia , a exis tên cia d es s a a m ea ça : e, n o en ta n to, a r r a s ta a in d a con s igo os velh os h á b it os d a cer teza cr is t ã , d a a legr ia , d o d iver tim en t o, d a a va lia çã o cr is tã s ! E a té m es m o em s u a s a r tes e em s u a s filos ofia s m a is n ob r es ! Com o t u d o is s o d eve p a r ecer fr a co e ga s to, en fer m o e d es a jeita d o, a r b itr a r ia m en te fa n á tico e, a cim a d e t u d o, com o d eve p a r ecer in cer t o tu d o is s o a gor a qu e o ter r ível fr en te a fr en t e d e tu d o is s o s e p er d eu : o on ip oten te temor d o cr is tã o p or s u a salvação eterna!
58. O CRISTIANISMO E AS PAIXÕES No cr is tia n is m o p od em os a in d a ou vir u m gr a n d e p r otes to p op u la r con tr a a filos ofia : a r a zã o d os s á b ios a n tigos tin h a d es a con s elh a d o a o h om em
as
p a ixões , o cr is tia n is m o qu er
restituí-la s . Pa r a is s o, con t es ta tod o va lor m or a l d a vir tu d e, ta l com o o en t en d ia m os filós ofos a p a ixã o
com o u m a vitór ia d a r a zã o s ob r e
con d en a d e m od o ger a l tod a es p écie d e b om s en s o e
con vid a a s p a ixões a s e m a n ifes ta r em em s u a m ed id a m á xim a d e for ça e es p len d or : com o amor d e Deu s , temor d e Deu s , fé fanática em Deus, esperança cega em Deus.
59. O ERRO COMO CORDIAL Ca d a u m d iz o qu e qu is er , m a s é cer to qu e o cr is tia n is m o qu is
lib er ta r o h om em
d o p es o d os
com p r om is s os
m or a is ,
a cr ed ita n d o m os tr a r o ca m in h o m a is cu r to p a r a a p er feiçã o: exa t a m en te com o a lgu n s filós ofos a cr ed ita va m p od er s e s u b tr a ir à d ia lética p en os a e lon ga e à colet a d e fa t os r igor os a m en te con tr ola d os , r em eten d o a u m a
via r ea l em d ir eçã o d a ver d a d e .
Foi u m d u p lo er r o n os d ois ca s os
m a s foi a p es a r d is s o u m
gr a n d e er r o cor d ia l p a r a os d es es p er a d os qu e m or r ia m d e fa d iga no deserto.
60. T ODO ESPÍRITO ACABA POR SE TORNAR REALMENTE VISÍVEL O cr is tia n is m o a s s im ilou in teir a m en te o es p ír it o d e u m n ú m er o in ca lcu lá vel d e in d ivíd u os qu e tin h a m n eces s id a d e d e s u jeiçã o, d e tod os es s es s u tis ou
gr os s eir os en tu s ia s ta s d a
h u m ilh a çã o e d a d evoçã o. As s im s e d es em b a r a çou d e s eu p es o campônio
a qu e s e p en s a , p or exem p lo, viva m en te a o ver a
p r im eir a im a gem d o a p ós tolo Ped r o muito es p iritu al, com
um
p a r a s e tor n a r u m a r eligiã o
r os to m a r ca d o d e m il r u ga s , de
s u b ter fú gios e d e s egu n d a s in ten ções ; d eu es p ír ito à h u m a n id a d e eu r op éia e n ã o s e con ten tou em tor n á -la a s tu ta s ob o p on t o d e vis ta teológico. Nes s e es p ír it o, a lia d o a o p od er e m u ita s vezes à p r ofu n d a
con vicçã o
e
à
lea ld a d e
da
a b n ega çã o,
for jou
as
individ u a lid a d es m a is s u tis qu e ja m a is h ou ve n a s ocied a d e h u m a n a : a s figu r a s d o m a is a lt o cler o ca tólico, s ob r etu d o qu a n d o es ta s s e or igin a va m d e u m a fa m ília n ob r e e tr a zia m , d es d e a or igem , a gr a ça in a t a d os ges t os , a for ça d om in a d or a d o olh a r , b ela s m ã os e p és d elica d os . Ali o r os to h u m a n o a tin ge es s a es p ir it u a liza çã o qu e p r od u z a on d a con tín u a d e d u a s es p écies d e felicid a d e (o s en tim en to d e p od er e o s en tim en to d e s u b m is s ã o), u m a vez qu e u m es t ilo d e vid a m u ito r egr a d o s u b m eteu o a n im a l n o h om em ; a li u m a a tivid a d e qu e con s is te em a b en çoa r , em p er d oa r
os
p eca d os ,
em
r ep r es en ta r
a
d ivin d a d e
m a n tém
p er m a n en tem en te d es p er to n a
a lm a , e m es m o n o corpo, o
s en tim en t o d e u m a m is s ã o s ob r e-h u m a n a ; a li r ein a es s e n ob r e d es p r ezo d a fr a gilid a d e d o cor p o, d o b em -es ta r e d a felicidade, p r óp r ia d os s old a d os d e n a s cen ça ; coloca -s e a p r óp r ia altivez na ob ed iên cia , o qu e é s in a l d is tin tivo d e tod os os a r is tocr a ta s ; encontra-s e o p r óp r io id ea lis m o e a p r óp r ia d es cu lp a n a en or m e im p os s ib ilid a d e
da
p r óp r ia
ta r efa .
A p od er os a
b eleza
e
o
r efin a m en to d os p r ín cip es d a Igr eja s em p r e d em on s tr a r a m en tr e o p ovo a verdade d a Igr eja ; u m a b r u ta liza çã o m om en tâ n ea d o cler o (com o n a ép oca d e Lu ter o) leva s em p r e a cr en ça a o con tr á r io.
E
esse r es u lta d o d a b eleza e d o r efin a m en t o h u m a n os n a h a r m on ia d a figu r a , d o es p ír ito e d a t a r efa s er á a n iqu ila d o a o m es m o t em p o em qu e ter m in a m a s r eligiões ? E n ã o h a ver ia m eio d e a lca n ça r alguma coisa de mais elevado, nem mesmo de sonhar nisso?
61. O SACRIFÍCIO NECESSÁRIO E s s es h om en s s ér ios , s ólid os , lea is , d e u m a s en s ib ilid a d e p r ofu n d a
qu e
a in d a
h oje
são
cr is t ã os
de
cor a çã o:
d evem
exp er im en ta r eles p r óp r ios u m a vez, d u r a n te cer to tem p o, viver s em cr is tia n is m o; d evem à s u a fé fixa r a s s im d om icilio deserto
no
a fim d e a d qu ir ir o d ir eito d e s er ju ízes n a qu es tã o de
s a b er s e o cr is tia n is m o é n eces s á r io. E s p er a n d o, fica m a p ega d os a s u a gleb a e a m a ld içoa m o m u n d o qu e es tá a lém : ir r ita m -s e a té m es m o qu a n d o a lgu ém d á a en ten d er qu e é ju s ta m en te n o a lém que se encontra o mundo inteiro, que o cristianismo não passa, no fin a l d a s con ta s , d e u m r eca n to! Nã o, s eu tes tem u n h o n ã o ter á p es o s en ã o qu a n d o vocês tiver em
vivid o d u r a n te a n os s em
cr is tia n is m o, com u m lea l d es ejo d e p od er , a o con t r á r io, exis tir s em ele: a t é qu e es tiver em lon ge, b em lon ge d ele. E s e n ã o for o m a l d a t er r a qu e os fa ça volta r , m a s u m juízo fu n d a d o n u m a
comparação rigorosa, s eu r egr es s o s ign ifica r á a lgu m a cois a !
Os
h om en s d o fu tu r o a gir ã o u m d ia a s s im com tod os os ju ízos d e va lor d o p a s s a d o; é n eces s á r io revivê-los volu n ta r ia m en t e a in d a u m a vez e d e igu a l m od o s eu s con tr á r ios
p a r a ter , en fim , o
d ire ito de passá-los no crivo.
62. D A ORIGEM DAS RELIGIÕES Com o p od e a lgu ém con s id er a r com o r evela çã o s u a p r óp r ia op in iã o s ob r e a s cois a s ? E s s e é o p r ob lem a d a for m a çã o d a s r eligiões : ca d a vez u m h om em en tr a va em jogo p a r a qu em es s e fen ôm en o er a p os s ível. A con d içã o p r évia er a qu e a cr ed ita s s e já p r eced en t em en te n a s r evela ções . De r ep en te, u m a n ova id éia lh e vem à m en te, sua id éia , e o qu e h á d e in eb r ia n te n u m a gr a n d e h ip ótes e p es s oa l qu e a b r a n ge a exis t ên cia e o m u n d o in teir o p en etr a com ta n t o p od er em s u a con s ciên cia , qu e ele n ã o ou s a julgar-s e o cr ia d or d e u m a ta l felicid a d e, a tr ib u in d o s u a ca u s a , e ta m b ém a ca u s a qu e oca s ion a es s e p en s a m en to n ovo, a s eu d eu s : en qu a n to r evela çã o d es s e d eu s . Com o p od er ia u m h om em s er o autor de tão grande felicidade?
pergunta sua dúvida pessimista.
Além d is s o, ou tr a s a la va n ca s a gem em s egr ed o: p or exem p lo, reforça-se u m a op in iã o d ia n te d e s i m es m o, con s id er a n d o-a com o u m a r evela çã o, elim in a -s e a s s im o qu e ela tem d e h ip ot ético, é s u b tr a íd a à cr itica e m es m o à d ú vid a , e a s s im é tor n a d a s a gr a d a . É verdade que nos rebaixamos desse modo ao papel de órgão, mas n os s o p en s a m en to a ca b a p or s er vitor ios o s ob o n om e d e p en s a m en to d ivin o
es s e s en tim en to d e p er m a n ecer ven ced or
com ele n o fin a l d a s con ta s , es s e s en tim en to ven ce o s en tim en to d e r eb a ixa m en to. Ou tr o s en t im en to s e a gita a in d a n u m s egu n d o p la n o: qu a n d o s e eleva o p r óp r io produto a cim a d e s i, fa zen d o a p a r en t em en te a b s tr a çã o d e s eu
p r óp r io va lor , con s er va -se,
con tu d o, u m a es p écie d e a legr ia d o a m or p a ter n o e or gu lh o paternal que apaga tudo, que faz ainda mais que apagar.
63. ÓDIO DO P RÓXIMO S u p on d o qu e con s id er em os n os s o p r óxim o com o ele s e con s id er a a s i m es m o
o qu e S ch op en h a u er ch a m a com p a ixã o e
qu e s er ia exa ta m en te a u tocom p a ixão
s er ia m os for ça d os a od iá -
lo se, como Pascal, ele próprio se julga odiável. Era precisamente o s en tim en t o ger a l d e Pa s ca l com r ela çã o a os h om en s e ta m b ém a qu ele d o a n t igo cr is tia n is m o qu e, s ob Ner o, foi qu a lifica d o d e odium generis humanis14, como Tácito relata.
64. Os D ESESPERADOS O cr is tia n is m o p os s u i o fa r o d o ca ça d or p a r a tod os a qu eles qu e, d e qu a lqu er m a n eir a qu e s eja , s e p od e a cu a r n o d es es p er o s ó u m a p a r te d a h u m a n id a d e é ca p a z d is s o. E s tá s em p r e n a p er s egu içã o d es t es , s em p r e à es p r eita . Pa s ca l fez a exp er iên cia d e leva r a tod os a o d es es p er o, p or m eio d o con h ecim en to m a is incisivo;
a tentativa fracassou, em seu novo desespero.
65. B RAMANISMO E CRISTIANISMO Há r eceita s p a r a a tin gir o s en tim en to d e p od er : p or u m la d o, p a r a a qu eles qu e s a b em s e d om in a r e p a r a os qu a is , p or is s o, o sentimento de poder já é familiar; por outro lado, para aqueles que s ã o in ca p a zes d is s o. O b r a m a n is m o s e p r eocu p ou com h om en s d o primeiro tipo, o cristianismo, com homens do segundo.
66. APTIDÃO PARA AS VISÕES Durante tod a a Id a d e Méd ia , o s in a l d is tin t ivo e ver d a d eir o d a h u m a n id a d e s u p er ior er a a a p t id ã o p a r a ter vis ões
ou s eja ,
s er p os s u íd o p or u m a p r ofu n d a p er tu r b a çã o m en ta l! E , n o fu n d o, a s r egr a s d e vid a d e tod a s a s n a tu r eza s s u p er ior es d a Id a d e Méd ia (a s n a tu r eza s r eligios a s ) vis a m a t or n a r o h om em capaz d e t er vis ões ! O qu e h á d e es p a n tos o n o fa t o d e a in d a em n os s os d ia s ter p er s is tid o a es tim a exa ger a d a qu e s e tem p ela s p es s oa s m eio d es r egu la d a s , b iza r r a s , fa n á tica s , qu e s e d izem gên ios ? vir a m cois a s qu e os ou tr os n ã o vir a m
Elas
cer ta m en te! E is s o
d ever ia coloca r -n os d e s ob r ea vis o em r ela çã o a ela s e d e for m a alguma tornar-nos crédulos!
67. P REÇO DOS CRENTES Aqu ele qu e fa z qu es t ã o d e ta l for m a qu e s e ten h a fé n ele qu e ga r a n te o céu com o r ecom p en s a p or es s a cr en ça , qu e o ga r a n te a tod os , m es m o a o la d r ã o n a cr u z
es s e d eve ter s ofr id o d e u m a
d ú vid a a tr oz e a p r en d id o a con h ecer cr u cifica ções d e t od o t ip o: ca s o con tr á r io, n ã o p a ga r ia p or s eu s cr en tes u m p r eço tã o elevado.
68. O PRIMEIRO CRISTÃO Tod os a cr ed ita m a in d a n a s p r od u ções liter á r ia s d o Espírito Santo , ou s e r es s en te d os con tr a golp es d es s a cr en ça : qu a n d o a lgu ém a b r e a Bíb lia , é p a r a s e ed ifica r , p a r a en con t r a r em s u a p r óp r ia m is ér ia , gr a n d e ou p equ en a , u m a p a la vr a d e con s olo em r es u m o, n ela ele s e p r ocu r a e s e en con tr a a s i m es m o. Qu e ela tr a ga t a m b ém a h is tor ia d e u m a a lm a d a s m a is a m b icios a s e im p er tin en tes , d e u m es p ír it o t ã o ch eio d e s u p er s tiçã o com o d e a s tú cia , a h is t ór ia d o a p ós tolo Pa u lo
qu em a con h ece, exceto
a lgu n s s á b ios ? E n tr eta n to, s em es s a h is t ór ia s in gu la r , s em a s p er tu r b a ções e a s exp los ões d e ta l es p ír ito, d e ta l a lm a , n ã o h a ver ia m u n d o cr is tã o: ter ía m os a p en a s ou vid o fa la r d e u m a
p equ en a s eita ju d a ica , cu jo m es tr e m or r eu n a cr u z. É ver d a d e qu e, s e s e t ives s e com p r een d id o a tem p o es s a h is tór ia , s e s e tivesse lido, lido realmente, os escritos de são Paulo, não como são lid a s a s r evela ções d o
E s p ír ito S a n to , m a s com u m es p ír it o
in d ep en d en te, r ea l e livr e, s em p en s a r em qu a lqu er a n gú s tia pessoal leitores
d u r a n te m il e qu in h en tos a n os n ã o h ou ve s em elh a n tes há
m u ito
tem p o
qu e
não
se
fa la r ia
m a is
do
cr is tia n is m o: t a n t o is to é ver d a d e qu e es s a s p á gin a s d o Pa s ca l ju d eu p õem a n u a s or igen s d o cr is tia n is m o com o a s p á gin a s d o Pa s ca l
fr a n cês
n os
d es vela m
o
d es tin o
e
as
r a zões
do
aniquilamento fatal. Se o navio do cristianismo lançou por cima de sua borda boa parte do lastro judeu, se entrou, se pôde entrar nas á gu a s d o p a ga n is m o
é à h is tór ia d e u m s ó h om em qu e o d eve,
u m h om em p r ofu n d a m en te a t or m en ta d o, d ign o d e com p a ixã o, d es s e h om em d es a gr a d á vel a os ou tr os e a s i m es m o. E le vivia com u m a id éia fixa , ou m elh or : com u m a p ergu n ta fix a, sempre p r es en te e s em p r e ca n d en te: o qu e er a feit o d a Lei ju d a ica ? Do cumprimento dessa Lei? Em sua juventude, tinha querido segui-la, á vid o d es s a d is tin çã o s u p r em a qu e os ju d eu s s ou b er a m im a gin a r es s e p ovo qu e im p eliu a im a gin a çã o d o s u b lim e m or a l m a is a lto d o qu e qu a lqu er ou tr o p ovo e qu e s ó ele r eu n iu a cr ia çã o d e u m Deu s s a n to, com a id éia d o p eca d o con s id er a d o com o fa lt a con t r a es s a s a n t id a d e. S ã o Pa u lo s e h a via tor n a d o a u m s ó tem p o o d efen s or fa n á tico e o gu a r d a d e h on r a d es s e Deu s e d e s u a Lei. In ces s a n tem en te em lu ta e à es p r eita con t r a os t r a n s gr es s or es d es s a Lei e con tr a a qu eles qu e a p u n h a m em d ú vid a , er a d u r o e im p la cá vel con t r a eles e d is p os to a p u n i-los d a for m a m a is rigorosa. Eis que ele próprio faz a experiência em sua pessoa, pois, u m h om em com o ele r efin a d o n o ód io
violen to, s en s u a l, m ela n cólico, com o er a ,
s e s en tia in ca p az d e cu m p r ir es s a Lei; m a is
a in d a e o qu e lh e p a r eceu m a is es t r a n h o: p er ceb eu qu e s u a a m b içã o d es en fr ea d a er a con tin u a m en te ten ta d a a tr a n s gr ed ir a Lei e qu e s e s en tia p r em id o a ced er a es s e a gu ilh ã o. Qu e d izer ? E r a d e fa to a in clin a çã o ca r n a l qu e s em p r e e d e n ovo o for ça va a tr a n s gr ed ir a Lei? Nã o es ta r ia a n tes , com o s u s p eit ou m a is t a r d e, por trás dessa inclinação, a própria Lei que d ev ia incessantemente p r ova r s eu ca r á t er ir r ea lizá vel e im p elia à t r a n s gr es s ã o com u m en ca n t o ir r es is tível? Ma s n es s e tem p o n ã o d is p u n h a a in d a d es s a es ca p a tór ia . Ta lvez t ives s e n a con s ciên cia , com o o fa z en tr ever , o ód io, o cr im e, a b r u xa r ia , a id ola t r ia , a lu xú r ia , a em b r ia gu ez, o p r a zer n a lib er tin a gem e n a or gia para
a livia r
es s a
con s ciên cia ,
e qu a n to m a is p u d es s e fa zer m a is
a in d a
s eu
d es ejo
de
d om in a çã o, p elo extr em o fa n a tis m o qu e coloca va n a d efes a e n a ven er a çã o d a Lei, t in h a m om en tos em qu e s e d izia : Tu d o é em vã o! A t or tu r a d o d es cu m p r im en to d a Lei é in s u p er á vel. Lutero d eve ter exp er im en ta d o u m s en tim en to a n á logo qu a n d o qu is tornar-s e, em s eu cla u s tr o, o h om em d o id ea l ecles iá s tico e o qu e a con t eceu a Lu ter o
qu e s e p ôs u m d ia a od ia r o id ea l
ecles iá s tico, o p a p a , os s a n tos e tod o o cler o com u m ód io t a n to m a is m or ta l qu e n ã o ou s a va con fes s á -lo
a con teceu ta m b ém a
s ã o Pa u lo. A Lei s e tor n ou a cr u z s ob r e a qu a l s e s en tia p r ega d o: com o ele a od ia va ! Com o lh e gu a r d a va r a n cor ! Com o com eçou a r em exer p or tod os os la d os p a r a en con tr a r u m m eio p r óp r io p a r a aniquilá-la
p a r a n ã o ter d e cu m p r i-la n u n ca m a is ! E is s en ã o
qu a n d o a lu z eclod iu d e r ep en te em s eu es p ír ito, gr a ça s a u m a visão, como não podia ser de outra maneira nesse epiléptico: ele, o fogos o zela d or d a Lei qu e, n o fu n d o d e s u a a lm a , es ta va ca n s a d o d ela a té a m or te, vê a p a r ecer n u m a es tr a d a d es er ta es s e Cr is to com u m b r ilh o d ivin o n o r os to e s ã o Pa u lo ou ve es ta s p a la vr a s : Porque me persegues? Or a , em r es u m o, eis o qu e a con teceu : s eu
espírito ficou repentinamente iluminado e disse para si mesmo: O a b s u r d o é p r ecis a m en te p er s egu ir es s e J es u s ! Aí es tá a s a íd a qu e eu p r ocu r a va , a í es tá a vin ga n ça com p leta , a í e em n en h u m ou t r o vou ter en tr e a s m ã os o d es tru id or d a Le i! Aqu ele qu e s ofr e os p ior es tor m en tos d e or gu lh o s en te-s e s u b ita m en te r es ta b elecid o, o d es es p er o m or a l s e eva p or ou , p ois , a p r óp r ia m or a l s e vola tilizou , aniquilada
is to é, cumprida, lá n o a lto, n a cr u z! At é o p r esente
es s a m or te ign om in ios a lh e h a via s er vid o d e p r in cip a l a r gu m en to con tr a es s a voca çã o m es s iâ n ica d e qu e fa la va m os d is cíp u los d a n ova d ou t r in a : m a s qu e a con tecer ia s e ela tives s e s id o n eces s á ria para abolir a Lei?
As enormes conseqüências dessa idéia súbita,
d es s a s olu çã o d o en igm a , r ed em oin h a m d ia n te d e s eu s olh os e s e tor n a r ep en t in a m en te o m a is feliz d os h om en s
o d es t in o d os
ju d eu s , n ã o, o d es tin o d a h u m a n id a d e in teir a , lh e p a r ece liga d o a esse segundo de iluminação súbita, tem a idéia das idéias, a chave d a s ch a ves , a lu z d a s lu zes ; em tor n o d ele gr a vita d or a va n te a h is tór ia ! Des d e en tã o ele é o a p ós tolo d o a n iqu ila m en to d a le i! Mor r er p a r a o m a l segundo a carne Cristo
is s o qu er d izer m or r er p a r a a Lei; viver é viver segundo a Lei! Ter-se tornado um com o
is s o qu er d izer ter -s e tor n a d o, com o ele, d es tr u id or d a
Lei; morrer em Cristo
isso quer dizer também morrer para a Lei!
Mes m o qu e fos s e a in d a p os s ível p eca r , n ã o s er ia p elo m en os con tr a a Lei;
eu es tou for a d ela , d is s e e a cr es cen ta :
S e eu
qu is es s e a gor a r econ h ecer d e n ovo a Lei e s u b m eter -m e a ela , tor n a r ia Cr is to cú m p lice d o p eca d o ; p ois a Lei exis tia s om en te p a r a ger a r s em p r e o p eca d o, com o o s a n gu e cor r om p id o fa z s u r gir a d oen ça ; Deu s ja m a is ter ia p od id o d ecid ir a m or te d e Cr is to s e o cu m p r im en to d a
Lei tives s e s id o p os s ível s em
es s a
m or te;
d or a va n te, n ã o s om en te tod os os p eca d os s ã o r em id os , m a s o p r óp r io p eca d o é a b olid o; a gor a a Lei m or r eu , a gor a m or r eu o
es p ír it o ca r n a l em qu e ela h a b ita va
ou p elo m en os es s e es p ír ito
es tá p r es tes a m or r er , a en tr a r em d ecom p os içã o. S ó m a is a lgu n s d ia s p a r a viver n o s eio d es s a d ecom p os içã o!
es s e é o d es tin o d o
cr is tã o, a n tes qu e, u n id o com Cr is to, r es s u s cite com Cr is to, participando com Cristo da glória divina, doravante filho de Deus como Cristo.
Aqu i a exa lta çã o d e s ã o Pa u lo es t á em s eu a u ge e
com ela o a t r evim en to d e s u a a lm a
a id éia d a u n iã o com Cr is to
o fez p er d er tod o p u d or , tod a m ed id a , tod a s u b m is s ã o, e a in d om á vel von ta d e d e d om in a çã o s e r evela n u m in eb r ia m en to qu e antecipa a glória divina.
Esse foi o primeiro cristão, o inventor do
cristianismo! Antes dele, só havia alguns sectários judeus.
69. INIMITÁVEL Há u m a en or m e ten s ã o entre a in veja e a a m iza d e, en tr e o d es p r ezo d e s i e o or gu lh o: os gr egos vivia m n a p r im eir a , os cristãos na segunda.
70. P ARA QUE SERVE UM INTELECTO GROSSEIRO A Igr eja cr is tã é u m a en ciclop éd ia d os cu ltos d e ou tr or a , d a s con cep ções d e or igen s m ú lt ip la s , e é p or is s o qu e tem t a n to sucesso com suas missões: ela podia outrora e ela pode ainda hoje ir on d e qu is er , ela s e en con tr a va e s e en con tr a s em p r e n a p r es en ça d e a lgu m a cois a qu e s e a s s em elh a a ela , a qu e p od e s e a s s em elh a r e s u b s tit u ir a os p ou cos s eu s en t id o p r óp r io. Nã o é o qu e ela tem em s i d e cr is tã o, m a s o qu e tem d e u n iver s a lm en te p a gã o em s eu s costumes qu e é a ca u s a d o d es en volvim en to d es s a r eligiã o u n iver s a l; s u a s id éia s , qu e têm s u a s r a ízes a o m es m o tem p o n o es p ír ito ju d a ico e n o es p ír ito h elên ico, s ou b er a m s e elevar desde o início tanto acima das separações e das sutilezas de r a ça s e n a ções com o a cim a d os p r econ ceitos . E m b or a s e ten h a o
direito de admirar essa força de fundir os elementos mais diversos, n ã o s e d eve, con tu d o, es qu ecer a s qu a lid a d es d es p r ezíveis d es s a força
es s a
es p a n tos a
gr os s er ia , es s a
s ob r ied a d e d e s eu
in telecto, n o m om en to em qu e a Igr eja s e for m ou , qu e lh e permitiam acomodar-se desse modo com todos os regimes e digerir as contradições como pedras.
71. A VINGANÇA CRISTÃ CONTRA R OMA Ta lvez n a d a ca n s e m a is d o qu e a vis ã o d e u m p er p étu o vencedor
tinha-s e vis to Rom a s u b m eter , d u r a n te d ois s écu los ,
u m p ovo a p ós ou t r o, o cír cu lo es ta va com p let o, tod o fu t u r o parecia detido, tudo estava preparado para durar eternamente
e
qu a n d o o im p ér io con s tr u ía , con s tr u ía com a s egu n d a in ten çã o d o aere p eren n iu s 15 ; d a s r u ín a s
n ós qu e con h ecem os a p en a s a
melancolia
p od em os , con tu d o, com p r een d er es s a m ela n colia
inteiramente diferente das construções eternas, contra as quais era preciso se defender como se podia Hor á cio. Ou tr os p r ocu r a r a m
por exemplo, com a leveza de
ou tr a s con s ola ções con tr a es s a
la s s id ã o qu e s e a p r oxim a va d o d es es p er o, con tr a a con s ciên cia m or ta l d e qu e tod os os p r oces s os in telect u a is ou s en t im en t a is er a m a p a r tir d a í s em es p er a n ça , qu e p or tod a a p a r te s e es con d ia a en or m e a r a n h a , p r ep a r a d a p a r a b eb er im p ied os a m en te tod o o s a n gu e qu e cor r es s e a in d a .
E s s e ód io m u d o e cen ten á r io d o
exp ecta d or ca n s a d o, es s e ód io con t r a Rom a em tod a p a r te on d e Rom a d om in a va , a ca b ou p or ter livr e cu r s o n o cris tia n is m o que r es u m iu Rom a , o m u n d o e o pecado n u m ú n ico s en tim en to; h ou ve a vin ga n ça con tr a Rom a im a gin a d o p r óxim o e s ú b it o o fim d o m u n d o; h ou ve vin ga n ça con t r a Rom a in tr od u zin d o d e n ovo u m futuro
Rom a tin h a s a b id o tr a n s for m a r tu d o em h is tór ia d e seu
p a s s a d o e d e s eu p r es en te
u m fu t u r o com o qu a l Rom a n ã o
s u p or ta r ia a com p a r a çã o; h ou ve vin ga n ça con t r a Rom a s on h a n d o o juízo final
e o judeu crucificado, símbolo da salvação, aparecia
com o a
m a is
p r ofu n d a
p r etor es
das
p r ovín cia s
r id icu la r iza çã o d ia n t e d os r om a n a s ,
p ois
a
p a r tir
s ob er b os de
en tã o
a p a r ecer a m com o os s ím b olos d a p er d içã o e d o mundo maduro para a derrocada.
72. O ALÉM-TÚMULO O cr is tia n is m o en con tr ou em tod o o im p ér io r om a n o a id éia d os tor m en tos in fer n a is : os n u m er os os cu ltos s ecr etos tin h a m ch oca d o es s a id éia com u m a com p la cên cia tod a p a r t icu la r , com o s e fos s e o ovo m a is fecu n d o em s eu p od er . E p icu r o 16 acreditou n ã o p od er fa zer n a d a d e m elh or em fa vor d e s eu s s em elh a n tes d o qu e extir p a r es s a cr en ça a t é a s r a ízes : s eu tr iu n fo en con tr ou s eu m a is b elo eco n a b oca d e u m d is cíp u lo d e s u a d ou tr in a , o r om a n o Lucrécio17. cr is tia n is m o
In felizm en te p ôs
s ob
s eu su a
tr iu n fo p r oteçã o
veio
m u ito
p a r ticu la r
ced o a
cr en ça
o já
d eclin a n te n os h or r or es s u b ter r â n eos e n is s o m os tr ou -s e h á b il! Como, sem esse golpe de audácia em pleno paganismo, poderia ter obtido a vitória sobre a popularidade dos cultos de Mitra e de Isis? Foi a s s im qu e p ôs os cr éd u los d e s eu la d o
os s egu id or es m a is
en tu s ia s ta s d e u m a n ova fé! Os ju d eu s , u m p ovo qu e a m a va e qu e a m a a vid a com o os gr egos e m a is a in d a qu e os gr egos , tin h a m cu ltiva d o p ou co es s a id éia . A m or te d efin itiva com o p u n içã o d o p eca d or , a m or te s em r es s u r r eiçã o com o a m ea ça extr em a
isso
er a o qu e im p r es s ion a va s u ficien t em en te es s es h om en s s in gu la r es qu e n ã o qu er ia m s e d es em b a r a ça r d e s eu cor p o, m a s qu e, em s eu r efin a m en to egíp cio, es p er a va m s e s a lva r p or tod a a eter n id a d e. (Um m á r tir ju d eu d e qu e s e fa la n o s egu n d o livr o d os Ma ca b eu s 18 n ã o p en s a em r en u n cia r à s es tr a n h a s qu e lh e for a m a r r a n ca d a s ;
faz questão em tê-las para o dia da ressurreição dos mortos
isso
é b em ju d eu !) Os p r im eir os cr is tã os es ta va m b em lon ge d a id éia d a s p en a s eter n a s , p en s a va m es ta r livres da morte e es p er a va m , dia após dia, uma metamorfose e não mais a morte. (Que estranho im p r es s ã o d eve ter p r od u zid o a p r im eir a m or te en t r e es s a s p es s oa s qu e es ta va m à es p er a ! Qu e m is tu r a d e es p a n to, d e a legr ia ,
de
d ú vid a ,
de
p u d or
e
de
p a ixã o!
Esse
é
ver d a d eir a m en te u m a s s u n to d ign o d o gên io d e u m gr a n d e a r tis ta !) S ã o Pa u lo n ã o con s egu iu d izer n a d a m elh or em lou vor d e s eu S a lva d or , a n ã o s er qu e ele tin h a aberto a ca d a u m a s p or ta s da imortalidade
ele n ã o a cr ed ita va a in d a n a r es s u r r eiçã o
d a qu eles qu e n ã o es ta va m s a lvos ; m a is a in d a , em r a zã o d e s u a d ou tr in a d a Lei im p os s ível d e cu m p r ir e d a m or t e con s id er a d a com o con s eqü ên cia d o p eca d o, s u s p eita va a t é qu e n in gu ém r ea lm en te s e h a via tor n a d o a té o p r es en te im or ta l (s a lvo u m r ed u zid o n ú m er o, u m p equ en o n ú m er o d e eleitos p ela gr a ça e s em m ér ito); s om en te a gor a a im or ta lid a d e começava a a b r ir s u a s portas
e p ou cos eleitos ter ia m a ces s o: o or gu lh o d o eleito n ã o
p od e d eixa r d e a cr es cen t a r es s a r es tr içã o.
E m ou tr os lu ga r es ,
on d e o in s tin to d e vid a n ã o er a tã o for te s en ã o en tr e os ju d eu s e os ju d eu s cr is t ã os e qu a n d o a p er s p ectiva d a im or ta lid a d e n ã o p a r ecia s im p les m en te m a is p r ecios a qu e a p er s p ectiva d e u m a m or te
d efin itiva ,
o
a cr és cim o,
p a gã o
é
ver d a d e,
mas
não
tot a lm en te a n ti-ju d a ico, d o in fer n o s e tor n ou u m in s tr u m en t o p r op ício n a s m ã os d os m is s ion á r ios : en tã o s u r giu es s a n ova d ou tr in a s egu n d o a qu a l o p eca d or e o exclu íd o d a s a lva çã o er a m ta m b ém eles im or ta is , a d ou tr in a d a con d en a çã o et er n a e es ta d ou tr in a foi m a is p od er os a qu e a id éia d a m orte d efin itiv a , que com eçou a d eclin a r a p a r t ir d e en tã o. Foi a ciên cia qu e teve d e r econ qu is ta r es s a id éia , r ecu s a n d o s im u lta n ea m en te qu a lqu er
ou tr a r ep r es en ta çã o d a m or te e tod a es p écie d e vid a n o a lém. Tornamo-n os m a is n ob r es em r ela çã o a u m a cois a in ter es s a n te: a vida
d ep ois d a m or te
já n ã o n os in ter es s a !
u m in d izível
b en efício qu e é a in d a d em a s ia d o r ecen te p a r a s er con s id er a d o como tal no mundo inteiro.
E Epicuro triunfa de novo!
73. P ARA A VERDADE ! A ver d a d e d o cr is tia n is m o er a d em on s t r a d a p ela con d u ta vir tu os a d os cr is tã os , s u a fir m eza n o s ofr im en to, s u a fé in a b a lá vel e, a n tes d e tu d o, p ela d ifu s ã o e p elo cr es cim en t o d o cr is tia n is m o a d es p eito d e tod a s a s d ificu ld a d es .
Vocês fa la m a s s im a in d a
h oje! É d e d a r d ó! Ap r en d a m , p or ta n to, qu e t u d o is s o n ã o p r ova n ada,
n em
pró
n em
con tr a
a
ver d a d e,
qu e
é
n eces s á r io
d em on s tr a r a ver d a d e d e ou tr a for m a qu e a ver a cid a d e e qu e a segunda não é absolutamente um argumento a favor da primeira.
74. S EGUNDA INTENÇÃO DO CRISTÃO Os cristãos dos primeiros séculos não teriam tido geralmente es ta s egu n d a in ten çã o: É p r efer ível persuadir-se qu e s e é cu lp a d o d o qu e s e p er s u a d ir qu e s e é in ocen te, p ois , n u n ca s e s a b e com o u m ju iz tã o poderoso p os s a es ta r d is p osto
m a s d eve-se temer
qu e ele n ã o es p er e en con tr a r s en ã o cu lp a d os qu e têm con s ciên cia d e s u a s fa lt a s ! Com s eu im en s o p od er d ever á a n tes p er d oa r u m cu lp a d o qu e d ecla r a r qu e es te es tá em s eu d ir eito.
E s s e er a o
s en tim en t o d os p ob r es p r ovin cia n os d ia n t e d o p r etor r om a n o: Ele é d em a s ia d o a ltivo p a r a qu e ou s em os s er in ocen tes . Por qu e es s e s en tim en t o n ã o t er ia r ea p a r ecid o qu a n d o os cr is tã os qu is er a m imaginar o juiz supremo!
75. NEM EUROPEU NEM NOBRE
Há a lgu m a cois a d e or ien ta l e a lgu m a cois a d e fem in in o no cristianismo: é o qu e r evela , a p r op ós ito d e Deu s , o p en s a m en t o qu em a m a r ea lm en te, ca s tiga ; d e fa to, a s m u lh er es n o or ien te con s id er a m o ca s t igo e o is ola m en to s ever o d e s u a p es s oa , d is ta n te d o m u n d o, com o u m tes tem u n h o d e a m or d a p a r te d e seu marido e elas se queixam quando esse testemunho falta.
76. J ULGAR MAU É TORNAR MAU As
p a ixões
con s id er a d a s
com
se
tor n a m
m a ld a d e
más e
e
p ér fid a s
p er fíd ia .
Foi
qu a n d o a s s im
cr is tia n is m o ch egou a fa zer d e Er os e d e Afr od ite for ça s ca p a zes d e idealidade
são
qu e
o
sublimes
gên ios in fer n a is e es p ír itos
enganadores, criando na consciência dos crentes, a cada excitação s exu a l, r em or s os qu e ch ega va m a té a lou cu r a . Nã o é es p a n tos o tr a n s for m a r s en s a ções n eces s á r ia s e n or m a is em fon te d e m is ér ia in ter ior e t or n a r a s s im , volu n ta r ia m en te, a
m is ér ia
in ter ior
necessária e normal em tod os os h om en s ? Além disso, essa miséria p er m a n ece s ecr eta , m a s ela n ã o t em s en ã o r a ízes m a is p r ofu n d a s : p ois , n em tod os têm , com o S h a k es p ea r e em s eu s s on etos , a cor a gem d e con fes s a r a t r is t eza p r ovoca d a p elo cr is tia n is m o n es s e domínio.
Um a cois a , con t r a a qu a l s e é for ça d o a lu ta r , qu e s e
d eve m a n ter em s eu s lim it es ou m es m o, em cer tos ca s os , elim in á la com p leta m en t e d a ca b eça , d ever ia , p or ta n t o, s er ch a m a d a sempre má? Não é próprio das almas vulgares considerar sempre o inimigo como mau? Tem-se o direito de chamar inimigo a Eros? As s en s a ções s exu a is , d a m es m a for m a qu e a s s en s a ções d e p ied a d e e d e a d or a çã o, têm d e p a r ticu la r qu e o h om em , a o exp er im en tá la s , fa z o b em a ou tr o p or s eu p r a zer
n ã o s e en con tr a m u ita s
vezes n a n a t u r eza d is p os ições tã o b en fa zeja s ! E é ju s t a m en te u m a d ela s qu e é ca lu n ia d a e qu e é cor r om p id a p ela m á con s ciên cia !
Ma s es s a d em on iza çã o d e E r os a ca b ou p or ter u m d es fech o d e com éd ia : o diabo E r os s e tor n ou a os p ou cos m a is in ter es s a n te p a r a os h om en s d o qu e os a n jos e os s a n t os , gr a ça s a os b oa t os e as disposições misteriosas da Igreja em todas as questões eróticas: é gr a ça s a ela qu e a s h is toria s d e a m or s e t or n a r a m o ú n ico in ter es s e ver d a d eir a m en te com u m a todos os m eios
com u m
exa ger o qu e p a r ecer ia in com p r een s ível à a n tigu id a d e
e qu e u m
d ia n ã o d eixa r á d e p r ovoca r a h ila r id a d e. Tod a a n os s a p oes ia , tod o o n os s o p en s a m en to, d o m a is eleva d o a o m a is b a ixo, es tã o m a r ca d os e m a is qu e m a r ca d os p ela im p or tâ n cia exces s iva qu e s e con fer e
ao
a m or ,
a p r es en ta d o
s em p r e
com o
a con tecim en to
p r in cip a l. Ta lvez p or ca u s a d es s e ju ízo a p os ter id a d e h a ver á d e en con tr a r em tod a a h er a n ça d a civiliza çã o cr is tã a lgu m a cois a d e mesquinho e de maníaco.
77. T ORTURAS DA ALMA Pa r a a s m en or es t or tu r a s qu e a lgu ém in flige a u m cor p o es tr a n h o, tod os s e m a n ifes ta m em a lt os b r a d os ; a in d ign a çã o con tr a
um
h om em
ca p a z
de
s em elh a n te
a çã o
exp lod e
es p on ta n ea m en te; ch ega m os a té a t r em er com a s im p les id éia d a tor t u r a qu e p u d es s e s er in fligid a a u m h om em ou a u m a n im a l e nosso sofrimento se torna insuportável ao ouvir falar de um ato de ta l or d em . Ma s es ta m os lon ge a in d a d e t er o m es m o s en tim en to, tão geral e tão determinado, quando se trata de torturas da alma e d a qu ilo qu e têm d e es p a n tos o. O cr is tia n is m o a s colocou em u s o n u m a m ed id a in s ólita e con tin u a p r ega n d o es s e gên er o d e m a r tír io, ch ega n d o a té a d ep lor a r d es er ções e fr ieza qu a n d o d es cob r e u m es ta d o d e a lm a s em es s a s tor tu r a s .
De tu d o is s o
r es u lt a qu e a h u m a n id a d e s e com p or ta a in d a h oje, d ia n te d a s fogu eir a s es p ir itu a is , d a s tor tu r a s e d os in s tr u m en tos d e tor tu r a
d o es p ír ito, com a m es m a p a ciên cia e a m es m a in cer teza tem er os a qu e t in h a ou tr or a d ia n t e d a s cr u eld a d es p r a tica d a s n os cor p os d e h om en s ou d e a n im a is . Cer ta m en t e o in fer n o n ã o s e m a n teve u m a p a la vr a vã ; e a os r ea is t em or es d o in fer n o qu e a ca b a va m d e s er cr ia d os cor r es p on d ia u m a n ova es p écie d e p ied a d e, u m a h or r ível e es m a ga d or a com p a ixã o, ou tr or a d es con h ecid a , p a r a es s es s er es ir r evoga velm en t e con d en a d os , a p ied a d e qu e d em on s t r a , p or exemplo, o conviva de Pedro para com Don Juan e que, durante os s écu los cr is tã os , m u ita s vezes fez gem er a s p ed r a s . Plu ta r co 19 a p r es en ta
uma
im a gem
s om b r ia
do
es ta d o
do
h om em
s u p er s ticios o n o p a ga n is m o: es s a im a gem s e tor n a in ofen s iva s e com p a r a d a com o cr is tã o d a Id a d e Méd ia qu e s u s pe ita qu e n ã o p od er á m a is es ca p a r d os tor m en tos eter n os . Vê a p a r ecer d ia n te d ele es p a n tos os p r es s á gios : ta lvez u m a cegon h a tr a zen d o n o b ico u m a s er p en t e e h es ita n d o em en goli-la . Ou en tã o vê a n a t u r eza inteira empalidecer subitamente ou cores vivas correr sobre o solo. Ou en tã o os fa n t a s m a s d os p a r en tes m or tos a p a r ecem com r os tos m a r ca d os d e ves tígios d e s ofr im en tos h or r íveis . Ou a in d a , a s p a r ed es es cu r a s d o qu a r to d o h om em a d or m ecid o s e ilu m in a m e n os va p or es a m a r ela d os s u r gem instru m en tos d e tor tu r a , u m a m on toa d o d e s er p en tes e d e d em ôn ios s e a git a . Qu e es p a n tos a es ta d a o cr is tia n is m o s ou b e fa zer d es t a ter r a , s im p les m en te exigin d o cr u cifixos p or tod a p a r t e, ca r a cter iza n d o a s s im a ter r a com o u m lu ga r on d e o ju s to é tor t u r a d o a té a m orte ! E qu a n d o o a r d or d e u m gr a n d e p r ega d or a p r es en ta va em p ú b lico os s ecr et os s ofr im en tos d e u m in d ivíd u o, a s tor tu r a s d a qu a n d o
um
Wh itefield 20,
p or
exem p lo,
cela s olitá r ia ,
p r ega va
com o
um
m or ib u n d o a m or ib u n d os , or a ch or a n d o em cop ios a s lá gr im a s , or a b a ten d o violen ta m en te os p és n o ch ã o, fa la n d o com p a ixã o, com u m t om b r u s co e in cis ivo, s em m ed o d e d ir igir tod o o p es o d e
s eu a ta qu e con t r a u m a ú n ica p es s oa p r es en t e, exclu in d o-a d a com u n id a d e com u m a d u r eza exces s iva
com o a t er r a p a r ecia
en tã o a p on t o d e s e t r a n s for m a r ca d a vez n a
p r a d a r ia d a
infelicidade !
em
Via -s e
en tã o
h om en s
a cor r en d o
massa,
es p r em id os u n s con tr a os ou tr os , com o qu e tom a d os d e u m a ces s o d e lou cu r a ; m u itos
er a m
a com etid os
d e cã ib r a s
de
a n gú s tia ; ou tr os ja zia m d es m a ia d os e im óveis ; a lgu n s tr em ia m violen t a m en te ou cor ta va m o a r d u r a n te h or a s com o r u íd o d e s eu s gr itos a gu d os . Por tod a p a r te u m a r es p ir a çã o ofega n te, com o p es s oa s s em i-es tr a n gu la d a s qu e a s p ir a m o a r com r u m or . E , n a ver d a d e, d iz u m a t es tem u n h a ocu la r d e u m d es s es s ermões, qu a s e t od os
os
s on s
qu e fer ia m
os
ou vid os
p a r ecia m
p r ovoca d os p elos a m a rgos s ofrim en tos d os a gon iz a n tes .
s er Não
es qu eça m os qu e foi o cr is tia n is m o qu e fez d o leito d e m orte um leito de tortura e que as cenas que ali vemos desde então, os gritos h or r íveis qu e p ela p r im eir a vez a li for a m p os s íveis , en ven en a r a m os s en tid os e o s a n gu e d e in u m er á veis tes tem u n h os p a r a t od a a s u a vid a e a d e s eu s d es cen d en tes ! Im a gin e-s e u m h om em p a ca to qu e n ã o con s egu e a p a ga r a lem b r a n ça d e p a la vr a s com o es ta s : Ó etern id a d e! S e eu p u d es s e n ã o ter a lm a ! S e eu p u d es s e n u n ca ter n a s cid o! E s tou con d en a d o, con d en a d o, p er d id o p a r a s em p r e! Há s eis d ia s p od ia s ter -m e a ju d a d o. Ma s a gor a tu d o t er m in ou . J á p er ten ço a o d ia b o, qu er o ir com ele p a r a o in fer n o. Pa r ta m -se, p ob r es cor a ções d e p ed r a ! Nã o qu er em ? Qu e m a is s e p od e fa zer com cor a ções d e p ed r a ? S ou con d en a d o p a r a qu e vocês s e s a lvem ! Aí está! Sim, é isso mesmo! Vem, bom demônio! Vem!
78. A J USTIÇA VINGADORA A infelicidade e a falta
estas duas coisas foram postas pelo
cristianismo numa m es m a b a la n ça : d e m od o qu e, qu a n d o a
in felicid a d e qu e s e s egu e a u m a fa lta é gr a n d e, m ed im os , a in d a a gor a , in volu n ta r ia m en t e, a gr a n d eza d a fa lt a a n tiga s egu n d o es s a in felicid a d e. Ma s es ta n ã o é u m a a va lia çã o a n t iga e é p or is s o qu e a tr a géd ia gr ega , on d e s e tr a ta t ã o fr eqü en tem en te d e in felicid a d e e
fa lta ,
em b or a
em
ou tr o
s en t id o,
fa z p a r t e
das
gr a n d es
lib er ta d or a s d o es p ír ito, n u m a m ed id a qu e n em os p r óp r ios a n tigos p od ia m s u s p eit a r . E les er a m a in d a b a s ta n te d es cu id a d os p a r a n ã o es ta b elecer uma r ela çã o a d equ a d a
en tr e a fa lt a e a
infelicidade. A falta de seus heróis trágicos é, para dizer a verdade, a p ed r a qu e os fa z tr op eça r e lh es a con tece even tu a lm en te d e qu eb r a r u m b r a ço ou p er d er u m olh o; e a s en s ib ilid a d e a n tiga comentava: Certamente d ever ia ter s egu id o s eu ca m in h o com u m p ou co d e p r eca u çã o a m a is e com m en os a r r ogâ n cia ! Ma s es ta va r es er va d o a p en a s a o cr is tia n is m o d izer : in felicid a d e
e,
p or
tr á s
d es s a
gr a n d e
Há n is s o u m a gr a n d e in felicid a d e,
d eve
se
en con tr a r u m a gr a ve fa lt a , u m a falta ex tre m a m en te grave, mesmo qu e n ã o a p os s a m os ver cla r a m en te! S e n ã o s en tir es is s o, in feliz, é p or qu e teu cor a çã o s e en d u r eceu
e cois a s m u ito p ior es vã o t e
acontecer! Na a n t igu id a d e, h a via a in d a in felicid a d es ver d a d eir a s , in felicid a d es p u r a s , in ocen tes ; é s om en te com o cr is t ia n is m o qu e tod a p u n içã o s e t or n a p u n içã o m er ecid a : o cr is tia n is m o tor n a igu a lm en te s ofr ed or a a im a gin a çã o d a qu ele qu e s ofr e, d e m od o qu e o m en or m a l-es ta r p r ovoca n es s a vítim a o s en t im en t o d e s er m or a lm en te r ep r ova d o e r ep r een s ível. Pob r e h u m a n id a d e!
Os
gr egos t êm u m a p a la vr a p ecu lia r p a r a exp r es s a r o s en tim en to d e r evolta qu e a in felicid a d e d e ou tr em in s p ir a va : n os p ovos cr is tã os , es s e s en tim en to er a in a d m is s ível e é p or is s o qu e n ã o con fer em um nome a esse irmão mais viril da compaixão.
79.
UMA P ROPOSTA
S e, s egu n d o Pa s ca l e o cr is tia n is m o, n os s o eu é s em p r e odioso, com o p od em os a d m itir e a ceita r qu e ou tr os o a m em fos s em eles Deu s ou h om en s ? S er ia con tr á r io a t od a a d ecên cia deixar-s e a m a r , s a b en d o p er feita m en te qu e s ó s e m erece o ód io p a r a n ã o fa la r d e ou tr os s en tim en t os d e r ep u ls a . ju s ta m en t e o r ein o d a gr a ça .
Ma s es s e é
S eu a m or a o p r óxim o é en tã o
uma gr a ça ? S u a p ied a d e é u m a gr a ça ? Pois b em , s e is s o lh es é p os s ível, d êem u m p a s s o a m a is : a m em -s e a s i m es m os p or gr a ça en tã o n ã o ter ã o m a is n eces s id a d e a lgu m a d e s eu Deu s e t od o o d r a m a d a qu ed a e d a r ed en çã o s e d es en r ola r á em vocês m es m os até seu fim!
80. O CRISTÃO COMPASSIVO A com p a ixã o cr is tã d ia n te d o s ofr im en to d o p r óxim o tem u m r ever s o: é a p r ofu n d a s u s p eita d ia n te d e t od a s a s a legr ia s d o p r óxim o, d a a legr ia qu e ca u s a a o p r óxim o tu d o o qu e ele qu er , tudo o que pode.
81. H UMANIDADE DO SANTO Um s a n t o s e extr a viou en tr e os cr en tes e n ã o con s egu ia s u p or ta r s eu ód io con s ta n t e d o p eca d o. Por fim , d iz: Deu s cr iou toda s a s cois a s , exceto o p eca d o: o qu e h á d e es tr a n h o, s e ele n ã o lh e qu er b em ?
Ma s o h om em cr iou o p eca d o
e r ejeita r ia es s e
filh o ú n ico, s im p les m en te p or qu e d es a gr a d a a Deu s , o a vô d o p eca d o: Is s o é h u m a n o? A tod o s en h or , tod a a h on r a !
Ma s o
coração e o dever deveriam antes de tudo falar em favor do filho e, só depois, em honra do avô!
82. AGRESSÃO ESPIRITUAL Tu d eves d ecid ir is s o p or ti m es m o, p ois é tu a vid a qu e es tá
em jogo! É Lu t er o qu e n os in t er p ela d es s a for m a e a cr ed ita es ta r n os coloca n d o a fa ca n a ga r ga n t a . Ma s n ós o r ejeita m os com a s p a la vr a s d e a lgu ém s u p er ior e m a is com ed id o: Com p ete a n ós n ã o for m a r op in iã o s ob r e es ta ou a qu ela cois a e p ou p a r a s s im n os s a a lm a d a in qu ieta çã o. De fa t o, p or s u a n a tu r eza , a s cois a s não podem nos forçar a ter uma opinião.
83. P OBRE HUMANIDADE! Um a got a d e s a n gu e a m a is ou a m en os n o cér eb r o p od e tor n a r
n os s a
vid a
in d izivelm en te m is er á vel e d u r a , em b or a
s ofr a m os m a is com es s a gota d o qu e Pr om eteu com o a b u tr e 21. Ma s is s o n ã o é ver d a d eir a m en te d e tod o a s s u s t a d or a n ã o s er qu a n d o n em s equ er s e sabe qu e es s a gota é s u a ca u s a . E qu e s e imagina que é o diabo ! Ou o pecado !
84. A FILOLOGIA DO CRISTIANISMO Pode-s e
con s ta t a r
b a s t a n te
b em
com o
o
cr is tia n is m o
d es en volve p ou co o s en t id o d a p r ob id a d e e d a ju s t iça , analisando os es cr itos d e s eu s s á b ios : es tes a p r es en ta m s u a s s u p os ições com ta n t a a u d á cia com o s e fos s em d ogm a s e a in ter p r eta çã o d e u m a p a s s a gem d a Bíb lia r a r a m en te os m er gu lh a n u m em b a r a ço lea l. In ces s a n tem en te s e p od e ler : Ten h o r a zã o p or qu e es tá es cr ito e en tã o é u m a ta l im p er tin ên cia a r b itr a r ia n a in ter p r eta çã o qu e leva u m filólogo a s e d eter en tr e a cóler a e o r is o, p a r a s e p er gu n ta r s em p r e e d e n ovo: S er á p os s ível? Is s o é h on es tid a d e? É p elo m en os d ecen t e? As d es lea ld a d es qu e s ã o com et id a s a es s e r es p eito d o a lto d os p ú lp itos p r otes t a n tes , a for m a gr os s eir a com qu e o p r ega d or exp lor a o fa t o qu e n in gu ém p od e con tes ta r , d efor m a e a com od a a Bíb lia e in cu lca a s s im n o p ovo, d e tod a s a s maneiras, a arte d e ler m a l
t u d o is s o é s u b es tim a d o s om en te
por aquele que nunca vai ou que vai sempre à igreja. Mas, no final d a s con ta s , qu e s e p od e es p er a r d os efeitos d e u m a r eligiã o qu e, n os s écu los em qu e foi fu n d a d a , execu tou es s a extr a or d in á r ia fa r s a filológica em tor n o d o An tigo Tes t a m en to? Refir o-m e à tentativa
d e tir a r o An tigo Tes t a m en to d os
ju d eu s , com
a
ju s tifica tiva qu e s ó con tin h a d ou tr in a s cr is t ã s e qu e n ã o d evia pertencer senão aos cristãos, o verdadeiro povo de Israel, enquanto os ju d eu s a p en a s s e tin h a m a r r oga d o o d ir eito s ob r e ele. Hou ve en tã o u m d elír io d e in t er p r eta çã o e d e in ter p ola çã o qu e n ã o p od ia cer ta m en te s e a lia r -s e à b oa con s ciên cia ; qu a is qu er qu e fos s em os p r otes tos d os ju d eu s , em tod a p a r te, n o An tigo Tes ta m en t o, d evia tratar-s e d e Cr is t o, e n a d a m a is qu e d e Cr is to, n ot a d a m en te d e s u a cr u z, e tod a s a s p a s s a gen s em s e t r a t a va d e m a d eir a , d e va r a , d e es ca d a , d e r a m o, d e a r vor e, d e s a lgu eir o, d e b a s tã o, tu d o is s o s ó p od er ia s er p r ofecia r ela t iva a o m a d eir o d a cr u z: m es m o o erguimento do unicórnio e da serpente de bronze, o próprio Moisés d e b r a ços a b er tos em or a çã o, a té os es p etos em qu e s e a s s a va o cor d eir o p a s ca l
tu d o is s o n ã o p a s s a va d e a lu s ões e, d e a lgu m
m od o, d e p r elú d ios d a cr u z! Aqu eles qu e a fir m a va m es s a s cois a s , a lgu m a vez acred ita ra m n ela s ? A Igr eja n em m es m o r ecu ou d ia n te d a s in ter p ola ções n o text o d a ver s ã o d os S eten ta 22 (p or exem p lo, n o s a lm o 96, ver s ícu lo 1 0 ) p a r a con fer ir em s egu id a à p a s s a gem fr a u d u len ta m en te in ter p ola d a o s en tid o d e u m a p r ofecia cr is t ã . É qu e s e es t a va em guerra e qu e s e p en s a va n os a d ver s á r ios e n ã o na honestidade.
85. S UTILEZA NA PENÚRIA Tom em cu id a d o s ob r etu d o d e zom b a r d a m itologia d os gr egos , s ob o p r etexto d e qu e ela s e a s s em elh a t ã o p ou co à s u a p r ofu n d a m eta fís ica ! Dever ia m a d m ir a r u m p ovo qu e, n es s e ca s o
p a r ticu la r , p ôs u m fr eio à s u a in teligên cia p en et r a n te e teve durante muito tempo o tato suficiente para escapar dos perigos da escolástica e da superstição sofisticada!
86. OS INTÉRPRETES CRISTÃOS DO CORPO Tu d o o qu e p od e p r ovir d o es t ôm a go, d os in t es tin os , d os b a tim en tos d o cor a çã o, d os n er vos , d a b ílis , d o es p er m a
todas
es s a s in d is p os ições , es s a s fr a qu eza s , es s a s ir r ita ções , t od os es s es a ca s os d a m á qu in a , qu e con h ecem os tã o m a l
t u d o is s o u m
cr is tã o com o Pa s ca l con s id er a com o u m fen ôm en o m or a l e r eligios o e s e p er gu n ta s e é Deu s ou o d ia b o, o b em ou o m a l, a s a lva çã o ou a con d en a çã o, qu e é s u a ca u s a . Ai! qu e in tér p r ete in feliz! Com o p r ecis a con t or n a r e tor tu r a r s eu s is tem a ! Com o precisa contornar-se e torturar-se ele próprio para ainda ter razão!
87. O MILAGRE MORAL No d om ín io m or a l, o cr is tia n is m o s ó con h ece o m ila gr e: a m u d a n ça s ú b ita d e tod a s a s a va lia ções , a r en ú n cia r ep en tin a a tod os os h á b itos , a in clin a çã o r ep en tin a e ir r es is tível p a r a p es s oa s e objetos novos. Considera este fenômeno como a ação de Deus e o ch a m a
a to
incomparável
de
r egen er a çã o,
a tr ib u i-lh e
um
va lor
ú n ico
e
Tu d o o qu e d e r es to é ch a m a d o m or a lid a d e e qu e
n ã o t em r ela çã o com es s e m ila gr e s e tor n a d es s e m od o in d ifer en te a o cr is tã o e, en qu a n t o s en tim en to d e b em -es ta r e a ltivez, ta lvez a té m es m o ob jeto d e tem or . O câ n on d a vir t u d e, d o cu m p r im en to d a Lei, é es ta b elecid o n o Novo Tes ta m en to, m a s d e ta l for m a qu e s eja o câ n on d a v irtu d e im p os s ível: os h om en s qu e a in d a aspiram a u m a p er feiçã o m or a l d evem a p r en d er , em r ela çã o a es s e câ n on , a
s e s en tir s em p r e m a is
distantes d e s eu
ob jetivo, d evem
desesperar d a vir t u d e e a ca b a r p or lançar-s e n os braços d o s er
misericordioso
u n ica m en t e es ta
con clu s ã o p er m itir ia
a os
esforços m or a is d o cr is tã o con s er va r u m va lor , n a con d içã o d e qu e es s es
es for ços
p er m a n eces s em
s em p r e
es tér eis , d olor os os
e
m ela n cólicos ; a s s im p od er ia m a in d a s er vir p a r a p r ovoca r es s e in s ta n t e d e êxta s e em qu e o h om em exp er im en ta graça e o m ila gr e m or a l:
a ir r u p çã o d a
en tr eta n to, es s a lu ta p ela m or a lid a d e
n ã o é n eces s á ria , p ois n ã o é r a r o qu e es s e m ila gr e s e a b a t a s ob r e o p eca d or ju s ta m en te n o m om en to em qu e flor es ce, p or a s s im d izer , a lep r a d o p eca d o; o s a lto b r u ta l m a is p r ofu n d o e m a is fu n d a m en ta l p a r a for a d o p eca d o p a r ece m es m o m a is fá cil e ta m b ém , com o p r ova evid en te d o m ila gr e, m a is desejável. Pen etr a r o s en tid o d e s em elh a n t e reviravolta s ú b ita , ir r a cion a l e ir r es is tível, d e s em elh a n te p a s s a gem d a m a is p r ofu n d a m is ér ia a o m a is
p r ofu n d o s en tim en to d e b em -es t a r d o p on to d e vis ta
fis iológico (s er ia ta lvez u m a for m a vela d a d e ep ilep s ia ?)
é
a s s u n to p a r a os p s iqu ia t r a s qu e têm a b u n d a n tem en te oca s iã o p a r a ob s er va r s em elh a n tes milagres (p or exem p lo, s ob for m a d e ob s es s ã o d o cr im e ou d o s u icíd io). O res u lta d o m a is a grad á vel , relativamente pelo menos, no caso do cristão
não constitui uma
diferença essencial.
88. LUTERO, O GRANDE BENFEITOR O r es u lta d o m a is im p or ta n t e d a a çã o d e Lu ter o foi ter d es p er t a d o a d es con fia n ça em r ela çã o a os s a n tos e a t od a a vid a con tem p la tiva : s om en te a p a r tir d e s u a ép oca o ca m in h o qu e leva a u m a vid a con t em p la tiva n ã o cr is tã foi n ova m en te tornado a ces s ível n a E u r op a e u m fr eio foi p os to a o d es p r ezo d a a tivid a d e la ica . Lu t er o, qu e s e m a n teve u m b om filh o d e m in eir o d ep ois d e ter entrado no convento, onde, na falta de outras profundezas e de outros filões , ele d es ceu em s i m es m o p a r a a li ca va r ter r íveis
galerias subterrâneas
Lutero percebeu finalmente que uma vida
s a n ta e con t em p la tiva lh e er a im p os s ível e qu e a atividade que tin h a d es d e o n a s cim en to lh e m in a r ia o cor p o e a a lm a . Du r a n te m u it o tem p o t en t ou en con tr a r à cu s ta d e m or tifica ções o ca m in h o qu e leva à s a n tid a d e
m a s tom ou p or fim u m a d ecis ã o e d is s e
p a r a con s igo; Nã o exis te ver d a d eir a vid a con tem p la tiva ! Nós n os d eixa m os en ga n a r ! Os s a n tos n ã o va lem m a is qu e tod os n ós todos.
E s s a er a , é ver d a d e, u m a m a n eir a b em r ú s tica d e ter
razão
m as, para
os
a lem ã es
d es s a
ép oca , er a
a
ú n ica
ver d a d eir a m en te a p r op r ia d a : com o fica r a m ed ifica d os a o p od er ler no Catecismo de Lutero: Fora dos dez mandamentos, não h á ob r a que p ossa agradar a Deu s
a s ob r a s es p ir itu a is tã o elogiadas
dos santos, são puramente imaginárias!
89. A DÚVIDA COMO PECADO O cr is t ia n is m o fez tu d o o qu e lh e er a p os s ível p a r a fech a r u m cír cu lo em tor n o d ele: d ecla r ou qu e a d ú vid a , p or s i s ó, constituía um pecado. Devemos ser lançados na fé sem a ajuda da r a zã o, p or u m m ila gr e, e a í n a d a r com o n o elem en to m a is lím p id o e m en os equ ivoco: u m s im p les olh a r la n ça d o p a r a a t er r a fir m e, o ú n ico p en s a m en t o d e qu e t a lvez n ã o fôs s em os feitos p a r a n a d a r , o m en or s ob r es s a lto d e n os s a n a t u r eza a n fíb ia
s ã o s u ficien tes
p a r a n os leva r a com et er u m p eca d o! Devem os n ot a r qu e, d es s e m od o, a s p r ova s d a fé e qu a lqu er r eflexã o s ob r e a or igem d a fé s ã o con d en á veis . E xige-s e a cegu eir a e a em b r ia gu ez e u m ca n to eterno sobre as ondas em que a razão se afogou!
90. E GOÍSMO CONTRA EGOÍSMO Qu a n ta gen te h á a in d a qu e r a ciocin a a s s im : A vid a s er ia in s u p or tá vel s e n ã o h ou ves s e Deu s ! (Ou com o s e d iz n os cír cu los
idealistas:
A vid a s er ia in s u p or tá vel s e fa lt a s s e n o fu n d o s u a
s ign ifica çã o ética ! )
Por con s egu in te, é n eces s á r io qu e h a ja u m
Deu s (ou u m a s ign ifica çã o m or a l d a exis tên cia )! Na ver d a d e, a cois a é b em ou tr a . Qu em s e h a b it u ou a es s a id éia n ã o d es eja viver s em ela : ela é, p or ta n t o, n eces s á r ia p a r a s u a s ob r evivên cia
mas
qu e p r es u n çã o em d ecr et a r qu e tu d o o qu e é n eces s á r io à m in h a sobrevivência deve re alm en te ex is tir! Com o s e m in h a s ob r evivên cia fos s e a lgo n eces s á r io! Qu e a con tecer ia s e ou tr os tives s em a op in iã o
con t r á r ia ?
Se
r ecu s a s s em
ju s ta m en t e
viver
na
d ep en d ên cia d es s es d ois a r tigos d e fé e s e, u m a vez r ea liza d a s es s a s con d ições , a vid a n ã o lh es p a r eces s e m a is d ign a d e s er vivida?
E é isso que acontece atualmente!
91. A BOA-FÉ DE D EUS Um Deu s on is cien te e on ip oten te e qu e n em s equ er cu id a s s e para que suas intenções fossem compreendidas por suas criaturas s er ia ele u m Deu s d e b on d a d e? Um Deu s qu e d eixa s u b s is tir d u r a n te m ilên ios in u m er á veis d u vid a s e h es ita ções , com o s e es s a s d ú vid a s e es s a s h es ita ções n ã o t ives s em im p or tâ n cia p a r a a s a lva çã o d a h u m a n id a d e e qu e, n o en ta n to, d eixa p r ever as con s eqü ên cia s m a is es p a n tos a s n o ca s o d e equ ívoco s ob r e a ver d a d e! Nã o s er ia u m Deu s cr u el s e p os s u ís s e a ver d a d e e s e p u d es s e a s s is tir fr ia m en te a o es p etá cu lo d a h u m a n id a d e s e a tor m en ta n d o m is er a velm en te p or ca u s a d ela ? tu d o, s er ia m es m o u m Deu s d e a m or
Ou , a p es a r d e
mas incapaz d e s e
exp r im ir m a is cla r a m en te? Nã o ter ia es p ír ito s u ficien te p a r a is s o? Ou eloqü ên cia ? S er ia m u ito m a is gr a ve! De fa to, en tã o s e ter ia en ga n a d o
ta lvez
n a qu ilo
qu e
ch a m a
su a
verdade
e
se
a s s em elh a r ia m u ito a o p ob r e d ia b o logr a d o ! Nã o d ever ia en tã o s u p or ta r qu a s e os tor m en tos d o in fer n o qu a n d o vê s ofr er a s s im
s u a s cr ia t u r a s e, m a is a in d a , s ofr er p or tod a a et er n id a d e, a o qu er er con h ecê-lo, e qu e ele n ã o p od e n em a con s elh a r n em s ocor r er , a n ã o s er com o u m s u r d o-m u d o qu e fa z t od o tip o d e s in a is in d is tin tos qu a n d o s eu filh o ou s eu cã o es tá cer ca d o d os p er igos
m a is
a s s u s ta d or es ?
Um
cr en te
a n gu s tia d o
qu e
r a ciocin a s s e d es s a for m a s er ia ver d a d eir a m en te p er d oá vel, s e a p ied a d e p elo Deu s s ofr ed or es t ives s e m a is a s eu a lca n ce qu e a p ied a d e p elo próximo
p ois ele d eixa d e s er s eu p r óxim o s e o
m a is s olit á r io, o m a is or igin a l d e tod os os s er es é ta m b ém o m a is s ofr ed or , o m a is n eces s ita d o d e con s ola çã o.
Tod a s a s r eligiões
p os s u em u m in d ício qu e d evem s u a or igem a u m es ta d o d a in telectu a lid a d e h u m a n a d em a s ia d o jovem e s em m a tu r id a d e todas elas tomam extraordinariamente com lev ian d a d e a obrigação d e d izer a ver d a d e: n ã o s a b em a in d a n a d a d o d ever d iv in o d e s e m a n ifes ta r a os h om en s com cla r eza e ver a cid a d e.
Nin gu ém tem
s id o m a is eloqü en te qu e Pa s ca l p a r a fa la r d o Deu s es con d id o e das razões que tem para se manter tão escondido e nunca dizer as cois a s s en ã o p ela m eta d e, s in a l d e qu e Pa s ca l n u n ca p ôd e s e tr a n qü iliza r a es s e r es p eito: m a s fa la com t a n ta s egu r a n ça qu e s e p od er ia cr er qu e s e en con tr ou p or a ca s o n os b a s tid or es . E le suspeita va u m a im or ta lid a d e n o d eu s ab s con d itu s 23 , m a s ter ia tid o ver gon h a e t er ia tid o m ed o d e con fes s á -lo a s i p r óp r io: é p or isso que falava tão alto quanto podia, como alguém que tem medo.
92. NO LEITO DE MORTE DO CRISTIANISMO Os
h om en s
ver d a d eir a m en te a tivos
d is p en s a m
a gor a
o
cr is tia n is m o e os h om en s m a is m od er a d os e m a is con tem p la tivos da
cla s s e
in telectu a l
m éd ia
não
p os s u em
m a is
qu e
um
cr is tia n is m o con ven ien t e, is to é, s in gu la r m en te s im p lifica d o. Um Deu s qu e, em s eu a m or , d is p õe tu d o em vis ta d e n os s o bem fin a l,
u m Deu s qu e n os d á e n os tir a n os s a vir tu d e b em com o n os s a felicid a d e, d e ta l m od o qu e, em s u m a , tu d o ter m in a p or viver b em e qu e n ã o h á m a is r a zã o p a r a en ca r a r a vid a p elo la d o n ega tivo ou m es m o p a r a a cu s á -lo, n u m a p a la vr a , a r es ign a çã o e a h u m ildade eleva d a s a o gr a u d e d ivin d a d e
é is s o o qu e d e m elh or e d e m a is
vivo r es tou d o cr is t ia n is m o. Ma s s e d ever ia p er ceb er qu e, d es s a m a n eir a , o cr is tia n is m o evolu iu p a r a u m d oce moralismo: em vez de Deu s , a lib er d a d e e a im or ta lid a d e , r es tou u m a for m a d e b en evolên cia e d e s en tim en t os h on es tos e ta m b ém a cr en ça qu e, n o u n iver s o in teir o, h a ver ã o d e r ein a r u m d ia a b en evolên cia e os sentimentos honestos: é a eutanásia do cristianismo.
93. O QUE É A VERDADE? Qu em n ã o h a ver ia d e fica r con ten te com a dedução qu e os cr en tes fa zem d e b oa von ta d e: A ciên cia n ã o p od e s er ver d a d eir a , p ois n ega a Deu s ; p or con s egu in te, ela n ã o vem d e Deu s ; logo n ã o é ver d a d eir a , p ois Deu s é a ver d a d e . Nã o é a d ed u çã o, m a s a h ip ótes e p r im eir a qu e con tém o er r o. Com o, s e Deu s n ã o fosse p r ecis a m en te a ver d a d e e s e is s o fos s e r ea lm en te p r ova d o? S e fos s e a va id a d e, o d es ejo d e p od er , a im p a ciên cia , o t em or , a loucura extasiada e assustada dos homens?
94. R EMÉDIO CONTRA O D ESPRAZER S ã o Pa u lo já a cr ed ita va qu e u m s a cr ifício er a n eces s á r io p a r a d is s ip a r o p r ofu n d o d es p r a zer qu e o p eca d o ca u s a a Deu s : e d es d e en tã o os cr is tã os n ã o d eixa r a m d e d er r a m a r s ob r e u m a vítima s eu d es con ten ta m en t o d e s i p r óp r ios mundo ou a
história ou a
qu er s eja o
razão ou a a legr ia ou a in d a a
tranqüilidade d os ou t r os h om en s
é n eces s á r io qu e qu a lqu er ,
m a s qu a lqu er cois a d e bom, m or r a p or s eu s p eca d os (m es m o qu e
fosse somente em efígie)!
95. A REFUTAÇÃO HISTÓRICA COMO REFUTAÇÃO DEFINITIVA Ou tr or a s e p r ocu r a va p r ova r qu e n ã o h á Deu s
h oje s e
m os tr a com o es s a fé n a exis tên cia d e u m Deu s p ôd e s e form a r e p or qu e es s a fé a d qu ir iu p es o e im p or tâ n cia : é a s s im qu e a con tr a p r ova qu e n ã o h á Deu s s e t or n a in ú til. s e h a via r efu t a d o a s
Ou tr or a , qu a n d o
p r ova s d a exis tên cia d e Deu s
qu e tin h a m
sido propostas, uma dúvida continuava persistindo ainda, ou seja, s e n ã o s e p od ia en con tr a r p r ova s m elh or es qu e a qu ela s qu e s e a ca b a va d e r efu ta r : n es s a ép oca os a teu s n ã o s a b ia m fa zer t á b u a rasa.
96. IN HOC SIGNO VINCES!24 Qu a lqu er qu e s eja o gr a u d e p r ogr es s o qu e ten h a a lca n çado a E u r op a em tod a p a r t e, em m a tér ia r eligios a n ã o a tin giu a in d a a in gen u id a d e lib er a l d os a n tigos b r â m a n es , o qu e p r ova qu e n a Ín d ia , h á qu a tr o m il a n os , s e r efletia e s e tr a n s m itia a os d es cen d en tes m a is p r a zer n a r eflexã o d o qu e n ós h oje. De fa to, esses b r â m a n es a cr ed ita va m em p r im eir o lu ga r qu e os s a cer d otes er a m m a is p od er os os qu e os d eu s es e, em s egu n d o lu ga r , qu e er a n os cos tu m es qu e r es id ia o p od er d os s a cer d otes : é p or is s o qu e s eu s p oeta s n ã o s e ca n s a va m d e celeb r a r os cos tu m es (s ú p lica s , cerimôn ia s , s a cr ifícios , ca n tos , m elop éia s ) qu e con s id er a va m com o os ver d a d eir os d is tr ib u id or es d e tod os os b en efícios . S eja qu a l for o gr a u d e s u p er s tiçã o e d e p oes ia qu e s e m is tu r em a is s o, os p r in cíp ios p er m a n ecem verdadeiros! Um p a s s o m a is e os d eu s es seriam joga d os d e la d o
o qu e a E u r op a d ever á igu a lm en te fa zer
u m d ia ! Ain d a ou tr o p a s s o e s e p od er ia ta m b ém d is p en s a r os s a cer d otes e os in ter m ed iá r ios ; veio o p r ofeta qu e en s in a va a
religiã o d a red en çã o por s i m es m a , Buda:
com o a E u r op a es tá
lon ge a in d a d es te gr a u d e cu lt u r a ! Qu a n d o fin a lm en t e tod os os h á b it os e cos tu m es em qu e s e a p óia o p od er d os d eu s es , d os s a cer d otes e d os s a lva d or es for em a n iqu ila d os , qu a n d o, p or ta n to, a m or a l, n o s en tid o a n tigo, tiver s id o m or ta , en tã o vir á vir á
exa t a m en te
en t ã o?
Ma s
não
p r ocu r em os
o qu e
a d ivin h a r ,
p r ocu r em os a n t es a ca p ta r o qu e, n a Ín d ia , n o m eio d es s e p ovo d e p en s a d or es , foi con s id er a d o, h á a lgu n s m ilh a r es d e a n os , com o o m a n d a m en to d o p en s a m en to! Há h oje ta lvez d ez a vin te m ilh ões d e h om en s , en t r e os d ifer en tes p ovos d a E u r op a , qu e a cr ed ita m m a is em Deu s
não
s er á d em a is d es eja r qu e eles se
tra n s form em em s in al? Des d e qu e s e reconheçam a s s im a eles p r óp r ios , fa r -se-ã o con h ecer ta m b ém
s er ã o im ed ia t a m en te u m a
força n a E u r op a e felizm en te u m a for ça entre os p ovos ! E n tr e tod a s a s cla s s es ! E n tr e os p ob r es e os r icos ! E n tr e a qu eles qu e m a n d a m e a qu eles qu e ob ed ecem ! E n tr e os in qu ietos e os pacíficos, os pacificadores por excelência!
1
Platão (427-347 a.C), filósofo grego; a citação é extraída do livro Fedro (NT).
2
Segundo o relata Platão na obra Íon (NT).
3
É o que narra Plutarco (50-125), historiador grego, na vida de Sólon (NT).
4
Jean-J a cqu es Rou s s ea u (1 7 1 2 -1 7 7 8 ), filós ofo e es cr itor s u íço; en tr e s u a s obras, O con tra to s ocia l e A orige m d a d es igu a ld a d e en tre os homens já foram publicadas nesta coleção da Editora Escala (NT).
5
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica p ied os a fr a u d e (NT).
6
Hes íod o (s éc. VIII a .C), p oeta gr ego; a cita çã o d o text o con s t a n a ob r a d es s e poeta, intitulada Os tra b a lh os e os d ia s (NT).
7
Expres s ã o la tin a qu e s ign ifica ver gon h os a or igem (NT).
8
Mich el E yqu em d e Mon ta ign e (1 5 3 3 -1 5 9 2 ), es cr itor e p en s a d or fr a n cês ; a citação é extraída de sua obra Ensaios, III, XIII (NT).
9
Blaise Pascal (1623-1662), matemático, físico e filósofo francês (NT).
10
Fr a s e la tin a qu e s ign ifica Con s id er o qu e n a d a d e h u m a n o m e é es tr a n h o
(NT). 11
12
John Stuart Mill (1806-1 8 7 3 ), filós ofo e econ om is ta in glês ; en tr e s u a s ob r a s , A s u je içã o d as m u lh eres , En s a io s obre a lib erd ad e e O govern o re pres en ta tiv o já foram publicadas nesta coleção da Editora Escala (NT). Arthur Schopenhauer (1788-1860), filósofo alemão (NT).
13
E xp r es s ões la tin a s qu e s ign ifica m d es p r eza r s er d es p r eza d o e d es p r eza r s e a s i m es m o , r es p ectiva m en te (NT).
14
E xp r es s ã o la tin a extr a íd a d a ob r a Annales (XV, 4 4 ) d e Ca iu s Cor n eliu s Tacitus (65-120), historiador romano (NT).
15
E xp r es s ã o la tin a extr a íd a d e Odes (III, 3 0 .1 ) d o p oeta Qu in tu s Hor a t iu s Flaccus (65-8 a .C.) e qu e s ign ifica m a is p er en e qu e o b r on ze (NT).
16 17
18
Epicuro (341-170 a.C), filósofo materialista grego (NT). Titu s Lu cr etiu s Ca r u s (9 8 -5 5 a .C), p oeta la tin o; em s u a ob r a De n a tu ra rerum a n a lis ou a s teor ia s d e p en s a d or es gr egos , com o Dem ócr it o e E p icu r o (NT). Segundo livro dos Macabeus, cap. II, versículos 7, 11 (NT).
19
Plutarco (50-125), escritor e historiador grego; duas obras dele chegaram até nós: Vidas paralelas e Es critos m ora is (NT).
20
Geor ge Wh itefield (1 7 1 4 -1 7 7 0 ), p r ega d or d a efer ves cên cia r eligios a qu e s e difundiu na Inglaterra no século XVIII (NT).
21
S egu n d o a len d a gr ega , Pr om eteu r ou b ou o fogo d os d eu s es e o r ep a s s ou a os h om en s . Por ca u s a d is s o foi ca s tiga d o p or Zeu s qu e o a t ou a u m a r och a , fica n d o exp os t o a os a ta qu es d e u m a b u tr e qu e lh e d evor a va con tin u a m en te o fígado. Depois de 30 eras ou séculos, Hercules o libertou (NT).
22
O tít u lo s e r efer e a os 7 0 s á b ios ju d eu s qu e r es id ia m n o E gito e qu e tr a d u zir a m a Bíb lia h eb r a ica p a r a o gr ego n os s écu los III e II a n tes d e Cr is t o (NT).
23
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica d eu s es con d id o (NT).
24
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica n es te s in a l ven cer á s (NT).
LIVRO SEGUNDO
97. S E AGIMOS DE UMA FORMA MORAL
NÃO É PORQUE S OMOS
MORAIS
A s u b m is s ã o à s leis d a m or a l p od e s er p r ovoca d a p elo in s tin to d e es cr a vid ã o ou p ela va id a d e, p elo egoís m o ou p ela r es ign a çã o, p elo fa n a t is m o ou p ela ir r eflexã o. Pod e s er u m a to d e d es es p er o com o a s u b m is s ã o à a u t or id a d e d e u m s ob er a n o: em s i, nada tem de moral.
98. AS MUDANÇAS EM MORAL Um con s ta n te tr a b a lh o d e tr a n s for m a çã o s e op er a n a m or a l os cr im es d e feliz êxito s ã o a ca u s a d is s o (en tr e eles con to, p or exemplo, todas as inovações nos juízos morais).
99. E M QUE SOMOS TODOS IRRAZOÁVEIS Con tin u a m os s em p r e a tir a r a s con s eqü ên cia s d e ju ízos qu e con s id er a m os fa ls os , d e d ou tr in a s em qu e já n ã o a cr ed it a m os por causa de nossos sentimentos.
100. D ESPERTAR DE UM SONHO Hom en s n ob r es e s á b ios a cr ed ita r a m ou tr or a n a h a r m on ia d a s es fer a s : h om en s n ob r es e s á b ios a cr ed ita m a in d a n o valor moral da existência . Mas há de vir um dia em que essa harmonia, ela
ta m b ém ,
não
s er á
m a is
p er cep t ível
a
s eu s
ou vid os !
Despertarão e perceberão que seus ouvidos haviam sonhado.
101. D IGNO DE REFLEXÃO Aceita r u m a cr en ça s im p les m en te p or qu e é u m h á b ito
aceitá-la preguiçoso!
is s o n ã o s er ia a gir d e m á fé, s er cova r d e, s er A m á -fé, a cova r d ia , a p r egu iça s er ia m , p or ta n to, a
condição primeira da moralidade?
102. OS MAIS ANTIGOS JUÍZOS MORAIS Qu a l é n os s a a tit u d e d ia n t e d os a t os d e n os s o p r óxim o? Pr im eir a m en te con s id er a m os o qu e d eles r es u lt a p a r a n ós s om en te os ju lga m os s ob es te p on to d e vis ta . É esse efeito ca u s a d o s ob r e n ós qu e con s id er a m os com o a intenção d o a to
e,
fin a lm en t e, a s in t en ções a tr ib u íd a s a n os s o p r óxim o s e tor n a m n ele qu a lid a d es permanentes, d e m od o qu e fa zem os d ele, p or exemplo, u m h om em p er igos o . Tr ip lo er r o! Tr ip lo d es p r ezo, velh o como o mundo! Talvez essa herança nos vem dos animais e de sua capacidade de julgar! Não se deve procurar a origem de toda moral n es ta s h or r íveis p equ en a s con clu s ões : O qu e me p r eju d ica é a lgo mau (p r eju d icia l em s i); o qu e m e é ú til, é bom (b en fa zejo e ú t il em s i); o qu e m e p r eju d ica uma ou v ária s vez es é es s en cia lm en te h os til em s i; o qu e m e é ú til uma ou v á ria s vez es é essencialmente fa vor á vel em s i! O pu d en d a origo 1 ! Nã o s ign ifica r á is s o in ter p r eta r a s m is er á veis relações, oca s ion a is e a cid en ta is qu e ou tr o p od e ter con os co com o s e es s a s r ela ções fos s em a es s ên cia e o fu n d o d e seu ser e pretender que para com todos e para consigo mesmo não s eja ca p a z d e r ela ções s em elh a n tes à qu ela s qu e tivem os com ele u m a ou vá r ia s vezes ? E p or tr á s d es s a ver d a d eir a lou cu r a n ã o es ta r á a m a is im od es ta d e tod a s a s s egu n d a s in ten ções : a cr ed ita r qu e n ós p r óp r ios s om os o p r in cip io d o b em , p or qu a n to o b em e o mal são determinados por nós?
103. H Á DUAS MANEIRAS DE NEGAR A MORALIDADE Nega r a m or a lid a d e
is s o p od e s ign ifica r p r im eir a m en te:
n ega r qu e os m otivos éticos invocados p elos h om en s os ten h a m im p elid o ver d a d eir a m en te a s eu s a tos
o qu e equ iva le, p or ta n to,
a a fir m a r qu e a m or a lid a d e é s im p les qu es tã o d e p a la vr a s e qu e fa z p a r te d os en ga n os gr os s eir os ou s u tis (n o m a is d a s vezes en ga n os volta d os p a r a s i m es m o) qu e s ã o p r óp r ios d o h om em , s ob r etu d o t a lvez d os h om en s céleb r es p or s u a s vir tu d es . E em seguida is s o p od e s ign ifica r : n ega r qu e os ju ízos m or a is r ep ou s a m sobre verdades. Nesse caso, admite-se que esses juízos constituem ver d a d eir a m en te os m otivos d a s a ções , m a s ta m b ém qu e s ã o erros, fu n d a m en tos d e tod os os ju ízos m or a is , qu e im p elem os h om en s a a ções m or a is . E s te ú ltim o p on to d e vis ta é o meu: en tr eta n to, n ã o n ego qu e em m u itos ca s os u m a s u til d es con fia n ça à m a n eir a d o p r im eir o p on to d e vis ta , is t o é, n o es p ír ito d e La Rochefoucauld2 , m a n ten h a igu a lm en t e s eu va lor e em tod o o ca s o n ã o s eja d a m a ior u tilid a d e ger a l.
Nego, p or ta n to, a m or a lid a d e
com o n ego a a lqu im ia ; e s e n ego a s h ip ótes es , não n ego qu e t en h a h a vid o
a lqu im is ta s
b a s ea r a m n ela .
qu e
a cr ed ita r a m
n es s a s
h ip ótes es
e
se
Nego igu a lm en te a im or a lid a d e: não qu e h a ja
u m a in fin id a d e d e h om en s qu e s e sentem im or a is , m a s qu e h a ja n a verd a d e u m a r a zã o p a r a s e s en tir em a s s im . Nã o n ego, é evidente
desde que eu não seja insensato
que é preciso evitar
e com b a ter n u m er os a s a ções d ita s im or a is ; d e igu a l m od o qu e é p r ecis o cu m p r ir e en cor a ja r n u m er os a s a ções d it a s m or a is ; p en s o qu e é p r ecis o fa zer u m a e ou tr a cois a por ou tra s ra z ões qu e n ã o a qu ela s com qu e s e a giu a té a gor a . Devem os m u d a r nossa m an e ira d e ver
p a r a ch ega r fin a lm en te, ta lvez d em a s ia d o t a r d e,
a mudar nossa maneira de sentir.
104. NOSSAS APRECIAÇÕES Tod a s a s n os s a s a ções s e liga m a m a n eir a s d e a p r ecia r ;
tod a s a s n os s a s a p r ecia ções d e va lor n os s ã o próprias ou s ã o adquiridas.
Esta s ú ltim a s s ã o a s m a is n u m er os a s . Por qu e a s
a d ota m os ? Por r eceio: is to é, n os s a p r u d ên cia n os a con s elh a ter a p r ed is p os içã o d e t om á -la s com o n os s a s
e n os h a b itu a m os a
es s a id éia , d e t a l m od o qu e ela a ca b a p or s e tor n a r n os s a s egu n d a n a tu r eza . Ter u m a a p r ecia çã o p es s oa l: is s o n ã o s ign ifica m ed ir uma coisa em função do prazer ou desprazer que nos causa, a nós e a n in gu ém m a is
m a is is s o é a lgo extr em a m en te r a r o! É
preciso pelo menos que a apreciação que temos do outro e que nos impele a nos servir, na maior parte dos casos, de suas apreciações p a rta d e n ós e s eja n os s o próprio m otivo d eter m in a n te. Ma s es s a s d et er m in a ções ,
n ós
as
cr ia m os
d u r a n te
n os s a
in fâ n cia
e
r a r a m en te m u d a m os d e op in iã o a s eu r es p eito; n o m a is d a s vezes s om os gu ia d os , p or tod a a vid a , p or ju ízos in fa n tis a os qu a is n os h a b it u a m os , n a s cen d o a s s im a m a n eir a com o ju lga m os o p r óxim o (s eu es p ír ito, s u a p os içã o, s u a m or a lid a d e, s eu ca r á t er , o qu e ele tem d e lou vá vel ou d e con d en á vel) e s en tim o-n os ob r iga d os a render homenagem a suas apreciações.
105. O EGOÍSMO APARENTE A m a ior ia d a s p es s oa s , s eja o qu e for qu e es s a s p es s oa s p os s a m p en s a r e d izer d e s eu egoísmo , n a d a fa zem d u r a n te s u a vid a p or s eu ego, m a s s om en te p elo fa n t a s m a d e ego qu e s e for m ou com eles n o es p ír ito d e s eu m eio a n t es d e s e com u n ica r a eles;
p or
con s egu in te,
vivem
numa
n évoa
de
op in iões
im p es s oa is , d e a p r ecia ções for tu ita s e fictícia s , u m a r es p eito d o ou tr o, e a s s im em s eqü ên cia , u m s em p r e n o es p ír ito d o ou t r o. Estranho mundo de fantasmas que sabe dar-se uma aparência tão r a zoá vel! E s s e n evoeir o d e op in iões e d e h á b itos cr es ce e vive qu a s e in d ep en d en tem en te d os h om en s qu e en volve; d ele d ep en d e
a p r od igios a in flu en cia d os ju ízos d e or d em ger a l s ob r e o h om em tod os es s es h om en s qu e n ã o s e con h ecem u n s a os ou t r os acreditam n es s a cois a a b s tr a ta qu e s e ch a m a
homem , is to é,
n u m a ficçã o; e tod a m u d a n ça ten ta d a n es s a cois a a b s tr a ta p elos ju ízos d e in d ivid u a lid a d es p od er os a s (t a is com o os p r ín cip es e os filós ofos ) p r od u z u m efeito extr a or d in á r io e in s en s a to s ob r e a maioria.
Tud o is s o p or qu e ca d a in d ivíd u o n es s a m a ior ia n ã o
s a b e op or u m ver d a d eir o ego qu e lh e s eja p r óp r io e qu e ten h a a p r ofu n d a d o à p á lid a ficçã o u n iver s a l qu e d es s a m a n eir a h a ver ia de destruir.
106. CONTRA A DEFINIÇÃO DO OBJETIVO MORAL De tod os os la d os s e ou ve h oje d efin ir qu e o ob jetivo d a m or a l é a lgo com o a con s er va çã o e o a va n ço d a h u m a n id a d e; m a s is s o s ign ifica s im p les m en te qu er er p os s u ir u m a fór m u la e n a d a m a is . Con s er va çã o d e qu ê? Deve-s e p er gu n ta r a n t es d e t u d o, avanço em d ireçã o a quê?
Nã o foi es qu ecid o o es s en cia l n a
fór m u la : a r es p os ta a es s e d e qu ê , a es s e em d ir eçã o a qu ê ? O qu e r es u lta d is s o p a r a a d ou tr in a d os d ever es d o h om em qu e n ã o já n ã o ten h a s id o fixa d o t a cita m en te e s em p en s a r ? E s s a fór m u la d iz d e m od o s u ficien te s e é p r ecis o vis a r a p r olon ga r m a is a exis tên cia d a es p écie h u m a n a ou fa zer s a ir , d es d e qu e p os s ível, o h om em d a a n im a lid a d e? Qu ã o d ifer en tes d ever ia m s er os m eios n os d ois ca s os , is to é, a m or a l p r á tica ! S u p on d o qu e s e qu eir a tor n a r a h u m a n id a d e tã o r a zoá vel qu a n t o p os s ível, is s o n ã o ga r a n tir ia cer t a m en te s u a m a ior d u r a çã o! Ou s u p on d o qu e s e pense em sua maior felicidade , para responder a esse de quê , a esse em d ir eçã o a qu ê : p en s a -s e en t ã o n o m a is a lto gr a u d e felicidade qu e a lgu n s in d ivíd u os p od er ia m a t in gir a os p ou cos ? Ou n u m a felicid a d e m éd ia , in d efin id a , m a s qu e tod os p od er ia m
a tin gir ? E p or qu e s e h a ver ia d e es colh er a m or a lid a d e p a r a a lca n ça r es s e ob jetivo? A m or a lid a d e n ã o cr iou , em s eu con ju n to, u m a ta l fon t e d e d es p r a zer qu e s e p od er ia a n tes con s id er a r qu e, com ca d a r efin a m en to d a m or a lid a d e, o h om em s e t or n ou m a is descontente con s igo m es m o, com s eu p r óxim o e com s u a s or te n a exis tên cia ? O h om em qu e a t é o p r es en te foi m a is m or a l n ã o a cr ed itou a ca s o qu e s om en t e o es ta d o d o h om em qu e p os s a s e justificar perante a moral era a mais profunda miséria?
107. NOSSO DIREITO A NOSSAS LOUCURAS Com o s e d eve a gir ? Por qu e s e d eve a gir ?
Pa r a a s
n eces s id a d es p r óxim a s e cotid ia n a s d o in d ivíd u o é fá cil r es p on d er a es ta s p er gu n ta s , m a s qu a n to m a is s e p en etr a n u m d om ín io d e a ções m a is s u tis , m a is ext en s o e m a is im p or t a n te, m a is o p r ob lem a s e t or n a in cer to e s u jeito a o a r b it r á r io. E n tr et a n to, é n eces s á r io qu e p r ecis a m en te a qu i o a r b itr á r io s eja exclu íd o d a decisão!
É o qu e exige a a u tor id a d e d a m or a l: u m tem or e u m
r es p eito ob s cu r os d evem gu ia r o h om em logo a es s es a t os em qu e n ã o p er ceb e imediatamente o ob jetivo e os m eios ! E s s a a u tor id a d e d a m or a l b loqu eia o p en s a m en to n a s cois a s em qu e p od er ia s er p er igos o p en s a r errado: é a s s im p elo m en os qu e a m or a l cos tu m a justificar-s e perigoso
p er a n te
s eu s
a cu s a d or es .
Errado s ign ifica
a qu i
mas perigoso para quem? Geralmente não se trata do
p er igo d a a çã o qu e os d efen s or es d a m or a l a u t or itá r ia t êm em vis ta , m a s d e s eu p róprio p erigo, a p er d a qu e p od er ia m s ofr er s eu p od er e s u a in flu ên cia , a p a r tir d o m om en to em qu e o d ir eito d e a gir s egu n d o a r a zã o p r óp r ia , a m p la ou r es tr ita , fos s e con ced id o a tod os , lou ca e a r b it r a r ia m en te: d e fa to, p or s u a p r óp r ia con t a , eles u s a m s em h es ita r d o d ir eito a o a r b itr á r io e à lou cu r a m es m o qu a n d o a s p erguntas
mandam
com o d evo a gir ?, p or qu e d evo
agir? n ã o p od em s er r es p on d id a s s en ã o com m u ito t r a b a lh o e com m u ita d ificu ld a d e. E s e a razão d a h u m a n id a d e cr es ce com u m a tã o extr a or d in á r ia len tid ã o qu e ch egou a s er p os s ível n ega r à s vezes es s e cr es cim en to n o p r ogr es s o ger a l d a h u m a n id a d e, a qu em s e d ever ia volver , a n ã o s er a es s a s olen e p r es en ça , d ir ia m es m o on ip r es en ça , d e m a n d a m en tos m or a is qu e n ã o p er m item a té m es m o s er p os ta a p er gu n ta individual do p or qu e
e do
como . Nos s a ed u ca çã o n ã o foi con s tr u íd a em vis ta d e evoca r em nós s en tim en tos p a té ticos , p a r a n os leva r a r efu gia r -n os n a ob s cu r id a d e, qu a n d o n os s a r a zã o d ever ia con s er va r tod a a s u a cla r eza
e
tod o
o
s eu
s a n gu e-fr io! Ou
s eja ,
em
tod a s
as
circunstâncias elevadas e importantes.
108. ALGUMAS TESES Ao in d ivíd u o, à m ed id a qu e p r ocu r a s u a felicid a d e, n ã o s e d eve d a r n en h u m p r eceit o s ob r e o ca m in h o qu e leva à felicid a d e: p ois a felicid a d e in d ivid u a l b r ota s egu n d o s u a s p r óp r ia s leis , ign or a d a s p or tod os , d e m od o qu e s ó p od e s er b loqu ea d o e d etid o p or p r eceitos qu e vêm d e for a . morais
Os p r eceitos a qu e ch a m a m os
s ã o n a ver d a d e d ir igid os con tr a os in d ivíd u os e n ã o
d es eja m d e m od o a lgu m s u a felicid a d e. E s s es p r eceitos tem ta m b ém p ou co a ver com a humanidade
felicid a d e e a p r os p er id a d e d a
p ois é a b s olu ta m en te im p os s ível con fer ir a es tes
ter m os u m a s ign ifica çã o p r ecis a e m en os a in d a s er vir -s e d eles com o u m fa r ol n o es cu r o ocea n o d a s a s p ir a ções m or a is .
E um
p r econ ceito a cr ed ita r qu e a m or a lid a d e s eja m a is fa vor á vel a o d es en volvim en to d a r a zã o qu e a im or alidade.
É u m er r o
a cr ed ita r qu e o ob je tivo in con s cien te n a evolu çã o d e tod o s er con s cien te (a n im a l, h om em , h u m a n id a d e, etc.) s eja s u a felicidade suprema : há, pelo contrário, em todas as etapas da evolução uma
felicid a d e p a r ticu la r e in com p a r á vel a a tin gir , n em s u p er ior n em in fer ior , m a s p r ecis a m en te in d ivid u a l. A evolu çã o n ã o qu er a felicid a d e, m a s s ó a evolu çã o e n a d a m a is .
S om en te s e a
humanidade tivesse um objetivo universalmente reconhecido é que p od er ía m os
p r op or
imperativos
em
su a
for m a
de
a gir:
p r ovis or ia m en te, s em elh a n te ob jetivo n ã o exis t e. Nã o s e d eve, p or ta n to, coloca r a s p r eten s ões d a m or a l em r ela çã o com a h u m a n id a d e;
is s o
a b s olu ta m en te h u m a n id a d e: d epen d eria
s er ia
d iver s a es s e
de
lou cu r a s er ia
ob jetivo
n os s a
e
in fa n tilid a d e.
recomendar
s er ia
von ta d e;
um
Coisa ob jetivo
en tã o
a lgu m a
cois a
s u p on d o
qu e
con vies s e
à que à
h u m a n id a d e, ela p od er ia en t ã o d a r -s e a s i m es m a u m a lei m or a l qu e lh e con vies s e. Ma s a té o p r es en te a lei m or a l d evia s er p os ta acima d e n os s a von ta d e: p r op r ia m en te, n ã o s e qu er ia dar-se essa lei, p r et en d ia -se tomá-la em a lgu m lu ga r , descobri-la , d e ix a r-se comandar por ela de onde quer que viesse.
109. AUTODOMÍNIO, MODERAÇÃO E SEUS MOTIVOS DERRADEIROS Vejo a p en a s s eis m étod os p r ofu n d a m en te d ifer en tes p a r a com b a ter a violên cia d e u m in s tin to. E m p r im eir o lu ga r , p od e-se evitar as ocasiões de satisfazer um instinto, enfraquecer e eliminar es s e in s tin to a b s ten d o-s e d e s a tis fa zê-lo d u r a n t e p er íod os m a is ou m en os lon gos . E m s egu n d o lu ga r , p od e-s e es ta b elecer u m a lei d e u m a or d em s ever a e r egu la r n a s a t is fa çã o d os p r óp r ios a p etites : d es s e m od o s ã o s u b m etid os a u m a r egr a , s eu flu xo e r eflu xo é en cer r a d o d en tr o d e lim it es es tá veis , p a r a ga n h a r os in ter va los em qu e n ã o in com od a m m a is ;
p a r tin d o d is s o, s e p od er á ta lvez
p a s s a r a o p r im eir o m étod o. E m ter ceir o lu ga r , p od e-s e en tr ega r -se d elib er a d a m en te
à
s a t is fa çã o
de
um
in s tin t o
s elva gem
e
d es en fr ea d o a té s en tir d es gos to p a r a ob ter , p or m eio d es s e
d es gos to, u m p od er s ob r e o in s t in to: com a con d içã o d e n ã o fa zer com o a qu ele ca va leir o qu e, qu er en d o es fa lfa r s eu ca va lo, a ca b ou p or qu eb r a r o p es coço
o qu e é, in felizm en te, a r egr a em
s em elh a n tes ten ta tiva s . E m qu a r to lu ga r , exis te u m a p r á t ica in telectu a l qu e con s is te em a s s ocia r à s a tis fa çã o u m p en s a m en to d olor os o e com ta n ta in ten s id a d e qu e com u m p ou co d e exer cício a idéia da satisfação se torna também cada vez mais dolorosa. (Por exem p lo, qu a n d o o cr is tã o s e h a b itu a a p en s a r d u r a n te o p r a zer sexual na presença e na zombaria do diabo ou no inferno para um cr im e com et id o p or vin ga n ça ou a in d a n o d es p r ezo qu e in cor r er ia a os olh os d os olh os qu e m a is ven er a s e com etes s e u m r ou b o; d e igu a l m od o a lgu ém p od e r ep r im ir u m violen to d es ejo d e s u icid o qu e lh e veio cem vezes qu a n d o p en s a n a d es ola çã o d e s eu s p a r en tes e d e s eu s a m igos e à s r ecr im in a ções qu e fa r ã o, e é a s s im qu e ele ch ega a s e m a n ter à m a r gem d a vid a :
p ois , a p a r tir d e
en tã o es s a s r ep r es en ta ções s e s u ced em em s eu es p ír ito com o a ca u s a e o efeito). Deve-s e a in d a m en cion a r a qu i o or gu lh o d o h om em qu e s e r evolta , com o fizer a m , p or exem p lo, Byr on e Napoleão3 qu e con s id er a r a m com o a fr on t a a p r ep on d er â n cia d e u m a em oçã o s ob r e a con d u ta e a r egr a ger a l d a r a zã o: d a í p r ovém o h a b ito e o gos to d e tir a n iza r o in s tin to e d e a lgu m a for m a esmagá-lo. ( Nã o qu er o s er es cr a vo d e u m a p et ite qu a lqu er escr evia Byr on em s eu d iá r io). E m qu in to lu ga r : ten ta -s e u m deslocamento das próprias forças acumuladas, dedicando-se a um tr a b a lh o
qu a lqu er
d ifícil
e
p es a d o,
ou
s u b m eten d o-se
d elib er a d a m en te a a tr a tivos e a p r a zer es n ovos , d es via n d o a s s im p a r a ou tr a s d ir eções os p en s a m en tos e a s for ça s fís ica s . Ocor r e o m es m o qu a n d o s e fa vor ece tem p or a r ia m en t e ou tr o in s tin to, dando-lh e fr eqü en tes oca s iões d e s e s a tis fa zer , p a r a t or n á -lo d is p en s a d or d es s a for ça qu e d om in a r ia , em ou tr o ca s o, o in s tin t o
qu e im p or tu n a , p or s u a violên cia , e qu e s e p r eten d e r efr ea r . Ou tr o ta m b ém s a b er ia ta lvez con ter a p a ixã o qu e gos ta r ia d e a gir com o s en h or , con ced en d o a t od os os ou tr os in s tin tos qu e con h ece u m en cor a ja m en to e u m a p er m is s ã o m om en t â n ea p a r a qu e d evor em o a lim en to qu e o tir a n o gos t a r ia d e r es er va r p a r a s i. E fin a lm en te, em s exto lu ga r , a qu ele qu e s u p or ta e a ch a r a zoá vel en fr a qu ecer e oprimir toda a or ga n iza çã o fís ica e p s íqu ica ch ega n a tu r a lm en te d a m es m a for m a a en fr a qu ecer u m in s tin to p a r ticu la r d em a s ia d o violen t o: com o fa z, p or exem p lo, a qu ele qu e m a n tém es fom ea d a s u a s en s u a lid a d e e qu e d es tr ói, n a ver d a d e, a o m es m o tem p o s eu vigor e m u ita s vezes ta m b ém s u a r a zã o, à m a n eir a d o a s ceta . Por ta n to: evit a r a s oca s iões , im p or r egr a s a o in s tin to, p r ovoca r a s a cied a d e e o d es gos to d o in s tin t o, r ela cion á -lo com u m a id éia m a r tir iza n te (com o a d a ver gon h a , d a s con s eqü ên cia s n efa s t a s ou d o or gu lh o ofen d id o), em s egu id a o d es loca m en to d a s for ça s e fin a lm en t e o en fr a qu ecim en t o e o es got a m en t o ger a l
es s es s ã o
os s eis m étod os . Ma s a vontade d e com b a t er a violên cia d e u m in s tin to n ã o es tá em n os s o p od er m a is qu e o m étod o qu e s e a d ota p or a ca s o e o s u ces s o qu e s e p od e a lca n ça r a o a p licá -lo. E m tod o es s e p r oces s o n os s o in t electo n ã o é, a o con tr á r io, s en ã o o in s tr u m en to cego d e ou tro in s tin to qu e é o rival d a qu ele cu ja violên cia n os a t or m en ta , qu er s eja a n eces s id a d e d e r ep ou s o ou o m ed o d a ver gon h a e d e ou tr a s con s eqü ên cia s la m en tá veis ou a in d a o a m or . E n qu a n to ju lga m os la m en t a r a violên cia d e u m in s tin to, p or ta n to, n o fu n d o é u m in s tin to qu e s e qu e ix a d e ou tro in s tin to; o qu e s ign ifica qu e a p er cep çã o d o s ofr im en to qu e ta l violência n os ca u s a p r es s u p õe a exis tên cia d e ou tr o in s tin to igu a lm en te violen to, ou m a is violen to a in d a , e qu e u m a luta se prepara, na qual nosso intelecto deve tomar partido.
110. O QUE SE OPÕE Pod em os ob s er va r em n ós o s egu in te p r oces s o e gos ta r ia qu e fos s e ob s er va d o e con fir m a d o m u ita s vezes . For m a -s e em n ós o fa r o d e u m a es p écie d e prazer qu e n ã o con h ecem os a in d a , d o qu a l b r ota em n ós u m n ovo desejo. Tu d o d ep en d e en tã o d o qu e s e op õe a es s e d es ejo: s e s ã o cois a s e con s id er a ções d e es p écie com u m e ta m b ém d e h om en s qu e es t im a m os p ou co
o ob jetivo d o n ovo
d es ejo va i tom a r a a p a r ên cia d e u m s en tim en to lou vá vel,
d ign o
de
s a cr ifício ,
tod a s
as
n ob r e, b om ,
d is p os ições
m or a is
hereditá r ia s s e in clu ir ã o n is s o, e o ob jetivo s e tor n a r á u m ob jetivo moral
e a p a r tir d e en tã o já n ã o p en s a m os em a s p ir a r a u m
d es ejo, m a s a u m a m or a lid a d e: o qu e a u m en t a m u ito a s egu r a n ça de nossa aspiração.
111. AOS ADMIRADORES DA OBJETIVIDADE Aqu ele qu e n a in fâ n cia ob s er vou n os p a is e con h ecid os , en tr e os qu a is cr es ceu , s en tim en tos d iver s os e for tes , m a s p ou ca fir m eza n os ju ízos e p ou co gos to p ela r etid ã o in telect u a l, a qu ele, p or ta n to, qu e u s ou o m elh or d e s u a for ça e s eu tem p o m a is p r ecios o a im ita r es s es s en tim en tos : es s e ob s er va em s i m es m o, u m a vez a d u lto, qu e tod o ob jet o n ovo, tod o n ovo s er h u m a n o, s u s cit a m n ele im ed ia ta m en te s im p a tia ou a n tip a tia , ou a in d a in veja ou d es p r ezo; s ob o p es o d es s a exp er iên cia p er a n t e a qu a l s e s en te d es a r m a d o, a d m ir a a neutralid a d e d os s en tim en tos , a objetividade com o u m a cois a extr a or d in á r ia , qu a s e gen ia l e d e r a r a m or a lid a d e, e n u n ca ch ega a a cr ed ita r qu e ta m b ém ela é simplesmente filh a d a ed u ca çã o e d o h á b ito.
112. P ARA A HISTORIA NATURAL DO DEVER E DO DIREITO Nos s os d everes
s ã o os d ir eitos qu e os ou tr os têm s ob r e
n ós . Com o os a d qu ir ir a m ? Por qu e n os con s id er a m com o ca p a zes d e es ta b elecer con t r a tos e m a n tê-los , p or qu e n os ver vier a m n a es fer a d e n os s o p od er e n ela d eixa r ia m u m a in flu ên cia d u r a d ou r a se
p elo
dever
não
u s á s s em os
de
r ep r es á lia s ,
is to
é,
se
in ter vier m os n o p od er d eles . Os d ir eitos d os ou tr os s ó p od em s e r efer ir a o qu e es tá em n os s o p od er : s er ia ir r a zoá vel d a p a r te d eles querer de nós qualquer coisa que não nos pertencesse. Dever-se-ia dizer mais exatamente: somente naquilo que eles pensam estar em n os s o p od er , a d m itin d o qu e s eja a m es m a cois a qu e igu a lm en te n ós p en s a m os es ta r em n os s o p od er . O m es m o er r o p od er ia fa cilm en te s e p r od u zir d os d ois la d os . O s en tim en to d o d ever exige que tenhamos em toda a extensão de nosso poder a mesma crença qu e os ou tr os ; is to é, qu e pudéssemos Pr om eter cer ta s cois a s , comprometer-nos a fazê-las ( livre-arbítrio ).
Meus direitos: essa
é a
n ã o s om en te m e
p a r t e d e m eu
p od er qu e os
ou tr os
con ced er a m , m a s qu e qu er em ta m b ém m a n t er p a r a m im . Com o ch ega r a m a is s o? De u m la d o, p or s u a s a b ed or ia , s eu tem or e s u a p r u d ên cia : s eja
p or qu e em
tr oca
es p er a m
d e n ós
a lgo d e
equ iva len te (a p r oteçã o d e s eu s d ir eitos ), s eja p or qu e con s id er a m u m em b a te con os co p er igos o e in op or tu n o, s eja p or qu e vêem em tod a d im in u içã o d e n os s a for ça u m a d es va n ta gem p a r a eles , p ois , n es s e ca s o, s er ía m os in a p tos p a r a u m a a lia n ça com eles con tr a u m a ter ceir a for ça h os til. Por ou tr o la d o, p or m eio d e d oa ções e ces s ões . Nes s e ca s o, os ou tr os d is p õem d e s u ficien te p od er p a ra ced er u m a p a r t e e p a r a p od er tor n a r -s e ga r a n tes d es s a ces s ã o: ca s o em qu e s e p r es s u p õe u m fr a co s en tim en t o d e p od er n a qu ele qu e a ceit a a d á d iva . É a s s im qu e s e for m a m os d ir eitos : gr a u s d e p od er , r econ h ecid os
e ga r a n tid os . S e a s
r ela ções
d e p od er
sofress em u m a m od ifica çã o es s en cia l, d es a p a r ecer ia m a lgu m a s d ir eitos e ou tr os s u r gir ia m
o qu e é com p r ova d o p elo d ir eito d os
p ovos em s eu va ivém in ces s a n te. S e n os s o p od er d im in u i m u ito, o s en tim en t o d a qu eles qu e ga r a n tia m a t é a gor a n os s o d ir eito s e m od ifica : p es a m a s r a zões qu e tin h a m p a r a n os con ced er n os s a a n tiga p os s e. S e es s e exa m e n ã o es t iver em n os s o fa vor , n ega m doravante
n os s os d ir eitos . Do m es m o m od o, s e n os s o p od er
a u m en ta d e for m a con s id er á vel, o s en tim en to d a qu eles qu e o r econ h ecia m a té en tã o e d o qu a l n ã o tem os m a is n eces s id a d e, s e m od ifica ta m b ém : ten ta r ã o r ed u zir es s e p od er à s u a d im en s ã o a n ter ior , qu er er ã o in ter vir em n os s os n egócios , a p oia n d o-s e em s eu d ever
m a s t r a t a -s e d e p a la vr a s in ú t eis . E m tod a p a r te on d e
r ein a o d ir eito, m a n tém -s e u m es ta d o e cer to gr a u d e p od er , rechaça-se todo aumento e toda diminuição. O direito dos outros é u m a con ces s ã o feita p or n os s o s en tim en to d e p od er a o s en tim en to d e p od er d os ou tr os . S e n os s o p od er s e m os tr a p r ofu n d a m en te abalado e quebrado, nossos direitos cessam; pelo contrário, se nos tor n a m os
m u ito m a is
p od er os os , os d ir eitos qu e a té en tã o
h a vía m os r econ h ecid o a os ou tr os d eixa m d e exis t ir p a r a n ós . h om em eqü it a tivo
O
tem , p ois , n eces s id a d e in ces s a n te d o toqu e
s u til d e u m a b a la n ça p a r a a va lia r os gr a u s d e p od er e d e d ir eito qu e, s egu n d o a va id a d e d a s cois a s h u m a n a s , s ó s e m a n t êm em equ ilíb r io m u it o p ou co tem p o e s ó fa zem s u b ir ou d es cer :
ser
eqü it a tivo é, p ois , d ifícil e exige m u ita exp er iên cia , b oa von ta d e e uma carga enorme de espírito.
113. A ASPIRAÇÃO A SE DISTINGUIR Aqu ele qu e a s p ir a a s e d is tin gu ir tem con s ta n tem en te o olh o n o vizin h o e qu er s a b er qu a is s ã o os s en tim en tos d es te: m a s a s im p a tia e o a b a n d on o d e qu e es s a in clin a çã o tem n eces s id a d e p a r a s e s a tis fa zer es tã o m u ito lon ge d e s er in s p ir a d os p ela in ocên cia , p ela com p a ixã o e p ela b en evolên cia . Ten ta m os , p elo
con tr á r io, p er ceb er ou d es cob r ir d e qu e m a n eir a o p r óxim o sofre, in ter n a
e exter n a m en te, a
n os s o a s p ecto, com o p er d e s eu
a u tocon t r ole e ced e à im p r es s ã o qu e n os s a m ã o ou n os s o a s p ecto faz s ob r e ele; e m es m o qu a n d o a qu ele qu e a s p ir a a d is t in gu ir -se d á e qu er d a r u m a im p r es s ã o a legr e, exa lt a n t e ou tr a n qü iliza d or a , o qu e ele goza r ia com es s e s u ces s o n ã o é o fa t o d e t er a legr a d o, exa lt a d o ou tr a n qü iliza d o o p r óxim o, m a s d e ter d eixa d o s u a marca n a a lm a d o ou t r o, d e lh e ter a lter a d o a for m a e d e tê-lo d om in a d o s egu n d o s u a von ta d e. A a s p ir a çã o a s e d is tin gu ir é a a s p ir a çã o a s u b ju ga r o p r óxim o, m es m o qu e s eja d e u m a m a n eir a in d ir eta , m es m o qu e fos s e p elo s en tim en to ou a té m es m o s ó em s on h o. Há u m a lon ga s ér ie d e gr a u s n es s a s ecr eta von ta d e d e d om ín io e p a r a es gota r s u a n om ea çã o s er ia n eces s á r io qu a s e es cr ever u m a h is tór ia d a civiliza çã o, d es d e a p r im eir a b a r b á r ie tosca até a dissimulação do refinamento e da idealidade doentia. A a s p ir a çã o a d is tinguir-s e p r op or cion a s u ces s iva m en te a o próx im o para designar por seus nomes apenas alguns graus dessa longa escala:
p r im eir o a tor t u r a , d ep ois os golp es , d ep ois o p a vor ,
d ep ois o es p a n to a n gu s t ia d o, d ep ois a s u r p r es a , d ep ois a in veja , d ep ois a a d m ir a çã o, d ep ois a ed ifica çã o, d ep ois o p r a zer , d ep ois a a legr ia , d ep ois o r is o, d ep ois a zom b a r ia , d ep ois o gr a cejo, d ep ois os in s u ltos , d ep ois ou t r os golp es d es fer id os , d ep ois tor tu r a s in fligid a s : a li, n o t op o d a es ca la , es tã o coloca d os o asceta e o m á r tir ;
ca d a
um
s en te
a
m a ior
a legr ia ,
ju s ta m en te
com o
con s eqü ên cia d e s u a a s p ir a çã o a s e d is tin gu ir , em s ofr er o qu e s eu op os t o n o p r im eir o gr a u d a es ca la , o bárbaro, in flige a o ou t r o, d ia n t e d o qu a l qu er s e d is t in gu ir . O t r iu n fo d o a s ceta s ob r e s i m es m o, s eu olh a r d ir igid o p a r a d en tr o, p er ceb en d o o h om em desdobrado num ser sofredor e espectador e que, desde então, não con s id er a m a is o m u n d o exter ior s en ã o p a r a a li ju n ta r , d e a lgu m
m od o, len h a p a r a s u a p r óp r ia fogu eir a , es ta ú ltim a t r a géd ia d a n eces s id a d e d e s e d is t in gu ir , em qu e s ó r es ta u m a ú n ica p es s oa qu e s e ca r b on iza em s i m es m a
es s e é o d ign o d es fech o qu e
con vém a ta l com eço: n os d ois ca s os , u m a in d izível felicid a d e com o es pe tá cu lo d a tortu ra ! De fa t o, a felicid a d e con s id er a d a com o s en tim en t o d e p od er d es en volvid o a o extr em o ta lvez n u n ca s e ten h a en con tr a d o n a ter r a d e u m a for m a t ã o in ten s a com o n a a lm a d os a s ceta s s u p er s ticios os . É o qu e exp r im em os b r â m a n es n a h is tór ia d o r ei Viçva m itr a qu e ob tin h a n os exercícios d e pen itên cia de milhares de anos uma tal força que se empenhou em con s tr u ir u m n ovo céu. Cr eio qu e, em tod a es ta ca tegor ia d e exp er iên cia s in ter ior es , s om os h oje gr os s eir os n oviços e t a tea n tes adivinhadores de enigmas; há quatro mil anos sabia-se mais sobre es s es in fa m es r efin a m en tos d a fr u içã o d e s i. A cr ia çã o d o m u n d o foi t a lvez en tã o con ceb id a p or u m s on h a d or h in d u com o u m a op er a çã o a s cética qu e u m d eu s im p ôs a s i m es m o! Ta lvez es s e d eu s t ives s e qu er id o s e en cer r a r n a n a tu r eza em m ovim en t o com o n u m in s tr u m en to d e tor tu r a , p a r a s en tir a s s im d u p lica d os s u a felicid a d e e s eu p od er ! E m es m o s u p on d o qu e fos s e u m d eu s d e a m or : qu e p r a zer p a r a ele cr ia r h om en s sofredores, s ofr er d ia n te d eles d e u m a m a n eir a d ivin a e s ob r e-h u m a n a u m a tor tu r a con tín u a e tir a n iza r -s e a s s im a s i p r óp r io! Ma is a in d a , s u p on d o que n ã o er a s om en te u m d eu s d e a m or , m a s u m d eu s d e s a n tid a d e e d e in ocên cia : qu e d elír io n ã o p od em os im a gin a r n o d ivin o a s ceta qu a n d o cr ia o p eca d o, os p eca d or es e a con d en a çã o et er n a e, s ob s eu céu e a o p é d e s eu tr on o, u m a en or m e m or a d a d e tor m en t os eter n os , d e eter n os gem id os !
Nã o é tot a lm en te
im p os s ível qu e a a lm a d e u m s ã o Pa u lo, d e u m Da n te, d e u m Ca lvin o e d e s eu s s em elh a n tes n ã o t en h a m u m d ia p en etr a d o n os ter r íveis m is t ér ios d es s a volú p ia d e p od er ;
com r ela çã o a
s em elh a n tes es ta d os d e a lm a p od e-s e p er gu n t a r s e o ciclo d a a s p ir a çã o a s e d is t in gu ir voltou ver d a d eir a m en te a s eu p on to d e p a r tid a , s e, com o a s ceta , a tin giu s eu p on to m á xim o. E s s e cír cu lo n ã o p od er á s er p er cor r id o p ela s egu n d a vez, m a n ten d o a id éia fu n d a m en ta l d o a s ceta e a o m es m o tem p o d o d eu s Com p a s s ivo? Qu er o d izer : fa zer m a l a os ou tr os p a r a fa zê-lo a s i próp rio, p a r a d e n ovo tr iu n fa r s ob r e s i e s ob r e s u a com p a ixã o e p a r a goza r d a extr em a volú p ia d o p od er ! a p r es en ta m
a
m eu
Per d oem es t a s d igr es s ões qu e s e
es p ír ito
en qu a n to
p en s o
em
tod a s
as
p os s ib ilid a d es n o va s to ca m p o d os exces s os p s íqu icos , a os qu a is se entregou o desejo de poder!
114. O CONHECIMENTO DAQUELE QUE SOFRE A con d içã o d a s p es s oa s d oen tes , d u r a n t e m u ito tem p o e h or r ivelm en te t or tu r a d a s p elo s ofr im en to, m a s cu ja in teligên cia, a p es a r d is s o, n ã o s e p er tu r b a , n ã o d eixa d e ter va lor p a r a o conhecimento
s em fa la r a té d os b en efícios in telect u a is qu e
tr a zem con s igo tod a s olid ã o p r ofu n d a , tod a lib er ta çã o s ú b ita e lícita d os d ever es e d os h á b itos . Aqu ele qu e s ofr e p r ofu n d a m en te, en cer r a d o d e a lgu m a for m a em s eu s ofr im en to, la n ça u m olh a r gélid o
p a ra
fora ,
s ob r e
as
cois a s :
tod os
es s es
p equ en os
en ca n t a m en tos en ga n a d or es em qu e h a b itu a lm en te s e m ovem a s cois a s , qu a n d o s ã o olh a d a s p or a lgu ém s a u d á vel, d es a p a r ecem p a r a ele: ele p r óp r io p er m a n ece en volt o em s i, s em en ca n to e s em cor . S u p on d o qu e viveu a té a qu i em qu a lqu er p er igos o d eva n eio, o s u p r em o ch a m a m en to à r ea lid a d e d a d or con s t itu i o m eio d e arrancá-lo d es s e d eva n eio: e ta lvez s eja o ú n ico m eio. (É p os s ível qu e o fu n d a d or d o cr is tia n is m o t en h a feit o es ta exp er iên cia n a cr u z, p ois a s p a la vr a s m a is a m a r ga s qu e já for a m p r on u n cia d a s Meu Deu s , p or qu e m e a b a n d on a s t e? en cer r a m , s e in t er p r eta d a s
em tod a a s u a p r ofu n d id a d e, com o s e tem o d ir eito, o tes tem u n h o de uma completa desilusão, a maior clarividência sobre a miragem d a vid a ; n o in s ta n te d o s ofr im en to s u p r em o, Cr is to s e tor n a cla r ivid en te a cer ca d e s i m es m o, p r ecis a m en te com o foi t a m b ém , s egu n d o con t a o p oeta , es s e p ob r e Dom Qu ixot e m or ib u n d o). A for m id á vel ten s ã o d o in telecto qu e p r ocu r a s e op or à d or ilu m in a com is s o tu d o o qu e d iz r es p eit o a u m a n ova lu z: e a in d izível a tr a çã o qu e s em p r e exer cem t od a s a s n ova s ilu m in a ções é m u ita s vezes b a s ta n te p od er os a p a r a r es is tir a t od a s a s s ed u ções d o s u icíd io e p a r a fa zer p a r ecer r ea lm en te d es ejá vel p a r a a qu ele qu e s ofr e a con tin u a çã o d a vid a . Pen s a com d es p r ezo n o m u n d o va go, qu en te
e
con for tá vel,
on d e
o
h om em
s a u d á vel
vive
s em
es cr ú p u los ; p en s a com d es p r ezo n a s ilu s ões m a is n ob r es e m a is ca r a s qu e ou tr or a ele p r óp r io p a r t ilh a va ; s en te ver d a d eir o p r a zer a o evoca r d e qu a lqu er m a n eir a es s e d es p r ezo, com o s e vies s e d a s p r ofu n d eza s d o in fer n o, in fligin d o a s s im à a lm a os m a is a m a r gos s ofr im en tos : é p or es s e con tr a p es o qu e con s egu e r es is tir à d or física
s en te qu e a gor a es s e con tr a p es o é n eces s á r io. Com u m a
im p r es s ion a n te lu cid ez s ob r e s u a p r óp r ia n a tu r eza , excla m a : Sê u m a vez teu p r óp r io a cu s a d or e teu p r óp r io ca r r a s co, tom a teu s ofr im en to com o u m a p u n içã o qu e t i p r óp r io in fliges ! Goza d e tu a s u p er ior id a d e d e ju iz; m elh or a in d a : goza t eu b elo p r a zer , tu a a r b itr á r ia t ir a n ia ! E leva -te a cim a d e tu a vid a com o a cim a d e teu s ofr im en to, con tem p la a fu n d o a s r a zões e a s d es r a zões ! Nosso or gu lh o s e
r evolta
com o
n u n ca
a n t es : s en te
uma
a tr a çã o
in com p a r á vel p a r a d efen d er a vid a con tr a u m tir a n o com o o sofrimento e contra todas as insinuações desse tirano que gostaria d e n os leva r a tes t em u n h a r con t r a a vid a
a repres en ta r a vid a
ju s ta m en t e d ia n t e d o tir a n o. Nes s e es ta d o n os d efen d em os com a m a r gor con tr a tod a es p écie d e p es s im is m o, p a r a qu e es te n ã o
apareça com o u m a con s eqü ên cia d e n os s o es ta d o e n os h u m ilh e com o ven cid os . Nu n ca a ten ta çã o d e s er ju s t o n os ju ízos foi m a ior qu e a gor a , p ois a gor a a ju s tiça é u m tr iu n fo s ob r e n ós m es m os e s ob r e o es ta d o m a is ir r itá vel qu e s e p os s a im a gin a r , u m es ta d o qu e es cu s a r ia t od o ju ízo in ju s to;
m a s n ã o qu er em os s er
d es cu lp a d os , qu er em os m os t r a r a gor a m es m o qu e p od em os fica r s em m a n ch a . Pa s s a m os p or ver d a d eir a s cr is es d e or gu lh o.
E
a gor a a p on ta a p r im eir a a u r or a d e a p a zigu a m en to, d e cu r a
é
qu a s e o p r im eir o efeito com qu e n os d efen d er m os con tr a a p r ep on d er â n cia d e n os s o or gu lh o: con s id er a m o-n os en tã o p a teta s e va id os os
com o s e n os tives s e a con tecid o qu a lqu er cois a d e
ú n ico! Hu m ilh a m os s em r econ h ecim en to a a lt ivez tod o-poderosa qu e n os fez s u p or t a r a d or e r ecla m a m os com violên cia u m a n tíd ot o con tr a a a ltivez: p r ocu r a m os tor n a r -n os es tr a n h os a n ós p r óp r ios , d es p er s on a liza r -n os , p ois a d or n os tor n ou p or m u ito tempo pessoais com
violên cia .
Lon ge d e n ós
es s a
a ltivez,
excla m a m os , ela er a u m a d oen ça e u m a cr is e for te d em ais! Olh a m os n ova m en te os h om en s e a n a tu r eza
com u m olh a r d e
d es ejo: lem b r a m o-n os , s or r in d o com tr is teza , qu e tem os a gor a a respeito deles certas idéias novas e diferentes daquelas de outrora, qu e u m véu ca iu .
Ma s com o n os r econ for ta r ever a s luzes
te m p erad a s d a v id a e s a ir d es s e d ia ter r ivelm en te cr u , n o qu a l, qu a n d o s ofr ía m os , vía m os a s cois a s e a tr a vés d a s cois a s . Nã o n os en coler iza m os con tem p la m os
se a es s e
m a gia
da
s a ú d e r ecom eça
es p et á cu lo
com o
se
s eu
jogo
es tivés s em os
tr a n s for m a d os , ca lm os e ca n s a d os a in d a . Nes s e es ta d o n ã o s e pode ouvir música sem chorar.
115. O QUE CHAMAMOS EU A lin gu a gem e os p r econ ceitos s ob r e qu e s e ed ifica a
lin gu a gem for m a m m u ita s vezes ob s tá cu lo a o a p r ofu n d a m en to d os fen ôm en os in t er ior es e d os in s tin tos : p or qu e n ã o existem p a la vr a s s en ã o p a r a gr a u s s u p erla tivos d es s es fen ôm en os e d es s es instintos.
Or a , es ta m os h a b itu a d os , qu a n d o a s p a la vr a s n os
fa lt a m , a n ã o ob s er va r com r igor , p or qu e é p en os o p en s a r com p r ecis ã o;
ch ega va -s e
a té
m es m o
ou tr or a
a
d ecr eta r
involuntaria m en t e qu e on d e ces s a o r ein o d a s p a la vr a s , ces s a ta m b ém o r ein o d a exis tên cia . Cóler a , ód io, a m or , p ied a d e, d es ejo, conhecimento, alegria, dor
são todos nomes que convêm apenas
a con d ições extr em a s ; os gr a u s m a is p on d er a d os , m a is m ed ia n os n os es ca p a m , m a is a in d a os gr a u s in fer ior es , in ces s a n tem en t e em jogo, e n o en ta n t o s ã o eles qu e tecem a tr a m a d e n os s o ca r á ter e d e n os s o d es tin o. Ocor r e m u ita s vezes qu e es s a s exp los ões extremas
e o p r a zer ou o d es p r a zer m a is m ed íocr es , d os qu a is
somos conscientes, s eja p r ova n d o u m a com id a , s eja es cu ta n d o u m s om , con s titu em ta lvez a in d a , s egu n d o u m a a va lia çã o exa t a , exp los ões extr em a s
r a s ga m a t ela e for m a m en tã o exceções
violen t a s , qu a s e s em p r e con s ecu tiva s a a cu m u la ções : p od em
ela s ,
a
es s e
tít u lo,
in d u zir
o
ob s er va d or
e com o ao
er r o!
E xa t a m en te com o en ga n a m o h om em d e a çã o. Tod os , enquanto somos, não somos o que parecemos ser segundo os únicos estados em qu e tem os con s ciên cia e p elos qu a is tem os p a la vr a s
e, p or
con s egu in t e, a r ecr im in a çã o e o elogio; n ós n os d esconhecemos s egu n d o
es s a s
exp los ões
gr os s eir a s ,
qu e
só
p or
n ós
são
con h ecid a s , tir a m os con clu s ões a p a r tir d e u m a m a tér ia em qu e as exceções ultrapassam a regra, enganamo-nos ao ler esse escrito con fu s o d e n os s o eu , a p a r en tem en te cla r o. E n tr eta n t o, a op in ião qu e te m os d e n ós p róprios , es s a op in iã o qu e for m a m os p or es s e caminho errôneo, o que chamamos eu , trabalha a partir de então para formar nosso caráter e nosso destino.
116. O MUNDO DESCONHECIDO DO SUJEITO Aqu ilo qu e os h om en s têm m a is d ificu ld a d e em com p r een d er é s u a ign or â n cia s ob r e s i m es m os , d es d e os tem p os m a is r em otos a té n os s os d ia s ! Nã o a p en a s em r ela çã o a o b em e a o m a l, m a s ta m b ém em r ela çã o a cois a s m u ito m a is im p or ta n tes ! A a n tiga ilu s ã o s egu n d o a qu a l s a b er ía m os p er feita m en te e em tod os os ca s os com o s e efe tu a a a çã o h u m a n a , con tin u a viva . Nã o s om en te Deu s qu e vê n os cor a ções , n ã o s om en te o h om em qu e a ge e qu e r eflete s ob r e s u a a çã o
m a s t a m b ém qu a lqu er ou tr a p es s oa n ã o
d u vid a r ea lm en te d e qu e com p r een d e o fen ôm en o d a a çã o em qu a lqu er ou tr a p es s oa . S ei o qu e qu er o e o qu e fa ço, s ou livr e e r es p on s á vel d e m eu s a t os , r es p on s a b ilizo os ou tr os p or a qu ilo qu e fa zem , p os s o n om ea r tod a s a s p os s ib ilid a d es m or a is e tod os os m ovim en tos in ter ior es qu e p r eced em u m a a çã o; qu a lqu er qu e s eja a m a n eir a p ela qu a l vocês a gem
n ela m e com p r een d o a m im
m es m o e n ela os com p r een d o a tod os ! p en s a va m
a n tiga m en te,
é
a s s im
qu e
As s im é qu e t od os tod os
p en s a m
a in d a .
S ócr a tes e Pla tã o qu e n es s a m a t ér ia for a m gr a n d es céticos e a d m ir á veis in ova d or es , er a m , con t u d o, in ocen tem en te cr éd u los qu a n to a o p r econ ceito n efa s to, a es s e p r ofu n d o er r o, qu e a fir m a que
o ju s to en ten d im en to d eve s er s egu id o for ços a m en te p ela
a çã o ju s ta .
Com es s e p r in cíp io er a m s em p r e h er d eir os d a
lou cu r a e d a p r es u n çã o u n iver s a is qu e p r eten d em qu e s e con h eça a es s ên cia d e u m a a çã o.
Seria terrível s e a com p r een s ã o d a
es s ên cia d o a to ju s to n ã o fos s e s egu id a p elo a to ju s to
es s a é a
ú n ica for m a qu e p a r ecia n eces s á r ia a es s es gr a n d es h om en s p a r a provar esta idéia; o contrário lhes parecia inimaginável e insensato e, n o en ta n to, es s e con tr á r io r es p on d e à r ea lid a d e n u a e cr u a , d em on s tr a d a cot id ia n a m en t e e a t od a h or a , d es d e s em p r e! Nã o é
es s a p r ecis a m en te a ver d a d e terrível qu e o qu e s e p od e s a b er d e u m a to n ã o b a s t a nunca p a r a r ea lizá -lo, qu e a p on te qu e va i d o en ten d im en to a o a to n ã o foi es ta b elecid a a t é h oje em n en h u m ca s o! As a ções n ã o s ã o nunca o qu e n os p a r ecem s er ! Cu s tou -nos ta n t o a p r en d er qu e a s cois a s ext er ior es n ã o s ã o o qu e p a r ecem pois bem, o mesmo deve ser dito em relação ao mundo interior! Os a tos s ã o r ea lm en te
qu a lqu er cois a d ifer en te
n ã o p od em os
d izer m a is : e tod os os a tos s ã o es s en cia lm en te d es con h ecid os . O con tr á r io é e p er m a n ece a cr en ça h a b itu a l; tem os con tr a n ós o m a is a n tigo r ea lis m o; a té a qu i a h u m a n id a d e p en s a va : Um a a çã o é t a l qu a l n os p a r ece s er .
(Relen d o es ta s p a la vr a s m e vem à
m en te u m a p a s s a gem m u ito s ign ifica tiva d e S ch op en h a u er 4 que gos ta r ia d e cita r p a r a p r ova r qu e ta m b ém ele p er m a n eceu s em p r e a ga r r a d o, s em qu a lqu er es p écie d e es cr ú p u lo a es t e r ea lis m o moral: Na r ea lid a d e, ca d a u m d e n ós é u m ju iz m or a l com p eten te e p er feito, con h ecen d o p r ecis a m en te o b em e o m a l, s a n tifica d o a o a m a r o b em e a o d et es ta r o m a l
ca d a u m é tu d o is s o, u m a vez
qu e n ã o s ã o s eu s p r óp r ios a tos , m a s a tos es tr a n h os qu e es tã o em causa , e qu e p od e s e con t en t a r em a p r ova r ou d es a p r ova r , en qu a n to qu e o p es o d a execu çã o é leva d o p ela s cos t a s d os ou tr os . Ca d a u m p od e, p or con s egu in te, ter com o p r ofes s or o lugar de Deus. )
117. NA PRISÃO Minha vista, quer seja aguda, quer seja fraca, não vê senão a cer ta d is tâ n cia . Vivo e a jo n es s e es p a ço, es s a lin h a d o h or izon te é meu mais p r óxim o d es tin o, gr a n d e ou p equ en o, a o qu a l n ã o p os s o es ca p a r . E m tor n o d e ca d a s er s e es ten d e a s s im u m cír cu lo con cên tr ico qu e lh e é p a r ticu la r . Igu a lm en te o ou vid o n os encerra n u m p equ en o es p a ço, d a m es m a for m a qu e o s en tid o d o t a to. E a
p a r tir d es s es h or izon tes , on d e n os s os s en tid os en cer r a m ca d a u m d e n ós , com o n os m u r os d e u m a p r is ã o, qu e a va lia m os o m u n d o, d izen d o qu e ta l cois a es tá p er to, ta l ou tr a es t á lon ge, ta l cois a é gr a n d e, ta l ou tr a é p equ en a , t a l cois a é d u r a e ta l ou tr a é m ole: chamamos
sensação
s im p les m en te
um
es s a for m a d e m ed ir
er r o em
s i! A p a r tir
e t u d o is s o é da
qu a n tid a d e
de
exp er iên cia s e em oções qu e n os s ã o p os s íveis em m éd ia n u m es p a ço d e t em p o d a d o, a va lia m os n os s a vid a , a a ch a m os cu r ta ou lon ga , r ica ou p ob r e, ch eia ou va zia : em fu n çã o d a m éd ia d a vid a humana, avaliamos aquela de todos os outros seres
e isso, tudo
is s o, é s im p les m en t e u m er r o em s i! S e tivés s em os u m a vis ta cem vezes m a is p en etr a n te p a r a a s cois a s p r óxim a s , o h om em n os p a r ecer ia en or m e; p od er ía m os a té im a gin a r ór gã os p or m eio d os qu a is o h om em p a r ecer ia in com en s u r á vel. Por ou tr o la d o, cer tos ór gã os p od er ia m s er con s titu íd os d e t a l m a n eir a qu e r ed u zir ia m e lim it a r ia m s is tem a s s ola r es in teir os , p a r a tor n á -los s em elh a n tes a u m a ú n ica célu la : e p a r a s er es in ver s a m en te con s titu íd os , u m a ú n ica célu la d o cor p o h u m a n o p od er ia a p r es en ta r -s e em s u a con s tr u çã o, s eu m ovim en to e s u a h a r m on ia com o u m s is tem a s ola r . Os h á b itos d e n os s os s en tid os n os en volver a m n u m tecid o d e s en s a ções en ga n a d or a s qu e s ã o, p or s u a vez, a b a s e tod os os n os s os ju ízos e d e n os s o entendimento
n ã o h á a b s olu ta m en te
s a íd a , n ã o h á es ca p a tór ia , n ã o h á s en d a volta d a p a r a o m u n d o real! E s t a m os
em
n os s a
teia
com o
aran h as
e
a in d a
qu e
a p a n h em os a lgu m a cois a , p od em os a p a n h a r s om en te e s em p r e o que se deixar prender em nossa teia.
118. O QUE É, POIS, NOSSO PRÓXIMO? Qu e com p r een d em os , p ois , d e n os s o p r óxim o, s en ã o s u a s fr on teir a s , is to é, a qu ilo p elo qu a l d e a lgu m m od o coloca s u a
m a r ca
em
n ós ?
Tu d o o qu e
com p r een d em os
d ele
são as
modificações qu e têm lu ga r em n os s a p es s oa e d a s qu a is ele é a causa
o qu e s a b em os d ele s e a s s em elh a a u m espaço oco.
Emprestamos-lh e a s s en s a ções qu e s eu s a tos s u s cita m em n ós e lh e a tr ib u ím os a s s im o r eflexo d e u m a fa ls a p os itivid a d e. Nós o for m a m os d e a cor d o com o con h ecim en to qu e t em os d e n ós m es m os , a fim d e tr a n s for m á -lo n u m s a télite d e n os s o s is tem a : e qu a n d o ele s e ilu m in a ou s e es cu r ece p a r a n ós , s om os n ós , n os d ois ca s os , a ca u s a ú ltim a
ju lga m os , con tu d o, s em p r e o
con tr á r io! Mu n d o d e fa n t a s m a s es te em qu e vivem os ! Mu n d o in ver tid o, vir a d o p a r a b a ixo e va zio e qu e, n o en ta n to, vem os com o em sonho sob um aspecto direto e pleno!
119. VIVER E IMAGINAR Qu a lqu er qu e s eja o gr a u qu e a lgu ém p os s a a tin gir n o con h ecim en to d e s i, n a d a p od e s er m a is in com p let o qu e a im a gem qu e s e fa z d os instintos qu e con s tit u em s eu s er . Ma l s a b e cita r p or s eu s n om es os in s tin tos m a is gr os s eir os : s eu n ú m er o e s u a for ça , s eu flu xo e r eflu xo, s eu jogo r ecíp r oco e, a n t es d e tu d o, a s leis d e su a
n u tr içã o p er m a n ecem
in teir a m en te d es con h ecid os . E s s a
n u tr içã o s e tor n a , p ois , ob r a
d o a ca s o: os
a con tecim en tos
cotid ia n os d e n os s a vid a la n ça m s u a p r es a or a a es s e in s tin t o, or a à qu ele;
ele
os
tom a
a vid a m en te,
mas
o
va ivém
d es s es
a con t ecim en tos s e en con tr a for a d e tod a cor r ela çã o r a cion a l com as necessidades nutritivas do conjunto dos instintos, de modo que ocor r er á s em p r e d u a s cois a s
u n s d es fa lecer ã o e m or r er ã o d e
in a n içã o, ou tr os s er ã o a lim en ta d os em exces s o. Ca d a m om en to d e nos s a vid a fa z cr es cer a lgu n s ten tá cu los d e n os s o s er e fa z s eca r a lgu n s ou tr os , con for m e a n u t r içã o qu e o m om en to tr ou xer ou n ã o. S ob es s e p on to d e vis ta , tod a s a s n os s a s exp er iên cia s s ã o
a lim en tos , m a s d is tr ib u íd os à s cega s , ign or a n d o a qu ele qu e tem fome e quem já está satisfeito. Em conseqüência dessa nutrição de ca d a p a r te, d eixa d a a o a ca s o, o es ta d o d o p ólip o, em s eu d es en volvim en to com p leto, s er á a lgo ta m b ém for tu ito com o s eu d es en volvim en to o foi. Fa la n d o m a is exa ta m en te: a d m itin d o qu e u m in s tin to ch ega a o p on to em qu e exige s er s a tis feito
ou
exercer sua força ou satisfazê-la ou preencher um vazio (para usar im a gen s ): exa m in a r á ca d a a con tecim en to d o d ia p a r a s a b er com o p od e u tilizá -lo p a r a s eu s p r óp r ios fin s : qu a lqu er qu e s eja a condição em que o homem se encontre, que caminhe ou descanse, qu e leia ou fa le, qu e s e za n gu e ou lu te ou qu e s e a legr e, o in s tin to a lter a d o ta teia d e a lgu m m od o ca d a u m a d es s a s con d ições e, n a m a ior ia d os ca s os , n a d a en con tr a r á a s eu gos to; d eve en tã o es p er a r
e
con tin u a r
a
t er
s ed e: u m
in s ta n te
m a is
e
va i
en fr a qu ecer , m a is a lgu n s d ia s ou m es es , s e n ã o for s a tis feito, s eca r á com o u m a p la n ta s em ch u va . Ta lvez es s a cr u eld a d e d o a ca s o s a lta s s e m a is à vis ta com cor es m a is viva s s e tod os os in s tin tos exigis s em s er s a tis feitos t ã o fu n d a m en t a lm en te com o a fome, qu e n ã o s e con ten ta com alim en tos s on h ad os ; m a s a m a ior p a r te d os in s tin t os , s ob r etu d o os ch a m a d os m or a is , s e s a tis faz precis a m en te a s s im
s e for p er m itid o s u p or qu e n os s os sonhos
s er vem p a r a compensar, em cer ta m ed id a , a a u s ên cia a cid en ta l d e alimento d u r a n te o d ia . Por qu e o s on h o d e on tem er a ch eio d e ter n u r a e d e lá gr im a s , o d e a n t eon tem a gr a d á vel e p r es u n ços o, a qu ele ou tr o, m a is a n tigo a in d a , a ven tu r os o e ch eio d e b u s ca s in qu ieta s ? Por qu e n es s e s on h o u s u fr u o d e in d es cr itíveis b eleza s d a m ú s ica , p or qu e em ou tr o p la n o e m e elevo com a volú p ia d a á gu ia a té os cu m es m a is lon gín qu os ? E s s a s im a gin a ções em qu e s e d es ca r r ega m e joga m n os s os in s tin tos d e ter n u r a ou d e zom b a r ia ou d e excen tr icid a d e, n os s os d es ejos d e m ú s ica e d e
cumes
e ca d a qu a l ter á à m ã o exem p los m a is ch oca n tes a in d a
s ã o a s in ter p r eta ções d e n os s a s excit a ções n er vos a s d u r a n te o s on o, in t er p r eta ções m u ito livres , m u ito a r b itr á r ia s d a cir cu la çã o d o s a n gu e, d o tr a b a lh o d os in tes tin os , d a p r es s ã o d os b r a ços e dos cob er tor es , d o s om d os s in os d e u m a igr eja , d o r u m or d e u m cata-ven t o, d os p a s s os d os n ot íva gos e d e ou t r a s cois a s d o gên er o. S e es s e texto qu e em ger a l p er m a n ece o m es m o d e u m a n oite p a r a ou tr a , r eceb e com en tá r ios va r ia d os d o p on t o qu e a r a zã o in ven t iva imagina on t em e h oje causas t ã o d ifer en t es p a r a a s m es m a s excita ções n er vos a s , is s o r es u lta d e qu e a m otiva çã o d es s a r a zã o é h oje d ifer en te d a d e on tem
outro instinto qu is s e s a tis fa zer , s e
m a n ifes ta r , s e exer cer , s e a livia r , s e exp a n d ir
é es s e in s tin to
qu e es t a va n o m om en to m a is for te d e s eu flu xo, en qu a n to on tem er a ou tr o.
A vid a d es p er ta n ã o d is p õe d a m es m a liberdade de
in ter p r eta çã o qu e a vid a d e s on h o e é m en os p oética , m en os desenfreada
m a s s er á p r ecis o d izer qu e d u r a n te o d ia os
in s tin tos ta m b ém n ã o fa zem m a is d o qu e in ter p r eta r a s excita ções nervosas e fixar-lhes as causas segundo suas necessidades? Que en tr e o es ta d o d es p er to e o s on h o n ã o h á d ifer en ça essencial? Que m es m o
com p a r a n d o
lib er d a d e d a
n íveis
m u ito
in t er p r eta çã o d es p er ta
d ifer en tes n u n ca
de é
cu ltu r a ,
a
s em elh a n t e
à
lib er d a d e d o ou tr o n ível em s on h o? Qu e n os s a s a va lia ções e n os s os
ju ízos
m or a is
s ã o s em p r e im a gen s
e fa n ta s ia s
qu e
es con d em u m p r oces s o fis iológico d es con h ecid o a n ós , u m a es p écie d e lin gu a gem con ven cion a l p a r a d es ign a r cer ta s ir r ita ções n er vos a s ? Qu e tu d o o qu e ch a m a m os con s ciên cia n ã o é ou tr a cois a qu e o com en tá r io m a is ou m en os fa n ta s ios o d e u m texto d es con h ecid o, ta lvez in cogn os cível, m a s p r es s en tid o? Tom em os o exem p lo d e u m a p equ en a exp er iên cia vivid a . S u p on h a m os que p er ceb em os u m d ia , en qu a n to a tr a ves s a m os a p r a ça p ú b lica , qu e
a lgu ém r i d e n ós : s egu n d o a qu ele d e n os s os in s tin tos qu e es teja en tã o em s eu p on to cu lm in a n te, es s e in cid en t e ter á p a r a n ós es ta ou
a qu ela
s ign ifica çã o
s egu n d o
o
t ip o
hu mano
a
qu e
pertencemos s er á u m in cid en te tota lm en t e d ifer en te. Um va i recebê-lo com o u m a got a d e ch u va , ou tr o va i s a cu d i-lo p a r a lon ge com o u m in s eto; u m va i p r ocu r a r n is s o u m p r etext o p a r a d is cu tir , ou tr o va i exa m in a r a s r ou p a s p a r a ver ifica r s e s e p r es ta m a o r is o, ou tr o va i m ed ita r s ob r e o r id ícu lo em s i; fin a lm en te, h a ver á ta lvez a qu ele qu e va i s e a legr a r p or ter con tr ib u íd o s em qu er er p a r a a cr es cen ta r u m r a io d e s ol à a legr ia d o m u n d o
e em ca d a u m
d es s es ca s os u m in s tin to con s egu ir á s a tis fa çã o, qu e s eja o d e d es p r ezo,
o
da
com b a tivid a d e,
o
da
m ed ita çã o
ou
o
da
b en evolên cia . E s s e in s tin t o, qu a lqu er qu e s eja , s e a p od er ou d o in cid en te com o d e u m a p r es a : p or qu e p r ecis a m en te es s e? Por qu e, s equ ios o e es fom ea d o, es ta va à es p r eita .
Ultim a m en te, à s on ze
h or a s d a m a n h ã u m h om em d es fa leceu s u b ita m en te d ia n te d e m im , com o fu lm in a d o p or u m
r a io; t od a s a s m u lh er es d a
vizinhança começaram a gritar em desespero; eu mesmo o levantei e p er t o d ele es p er ei qu e r ecob r a s s e a fa la
d u r a n te es s e tem p o
n en h u m m ú s cu lo d e m eu r os to s e m oveu , n ã o fu i tom a d o d e n en h u m
s en tim en to,
n em
de
tem or
n em
de
p ied a d e,
fiz
s im p les m en te o qu e d evia s er feito d e m a is u r gen te e r a zoá vel, con tin u a n d o d ep ois m eu ca m in h o fr ia m en te. S u p on d o qu e m e tives s em a n u n cia d o n a vés p er a qu e n o d ia s egu in te à s on ze h or a s alguém ca ir ia a s s im a m eu s p és , ter ia s ofr id o a n tecip a d a m en te tor m en tos d e tod a es p écie, n ã o ter ia d or m id o a n oit e tod a e n o m om en to d ecis ivo t er ia fica d o ta lvez s em elh a n te a es s e h om em em vez d e s ocor r ê-lo. De fa t o, n o in ter va lo tod os os in s tin tos p os s íveis teria m tid o te m p o d e im a gin a r e com en ta r es s e a con tecim en to diferente.
O qu e s ã o, p ois , os a con tecim en t os d e n os s a vid a ?
Mu ito m a is o qu e n eles p om os d o qu e n eles s e en con t r a ! Ou d ever ía m os a té m es m o d izer : s ã o va zios em s i m es m o? Viver , é imaginar?
120. P ARA TRANQÜILIZAR O CÉTICO Nã o s ei d e m od o a lgu m o qu e faço! Nã o s ei a b s olu ta m en te o que d evo fa z er!
Ten s r a zã o, m a s n ã o ten h a s a r es p eito
n en h u m a d ú vid a : és tu qu e és feito! E m ca d a m om en t o d e tu a vid a ! A h u m a n id a d e d es d e s em p r e con fu n d iu o a tivo e o passivo, esse foi seu eterno erro de gramática.
121. E FEITO E CAUSA S ob r e es te es p elh o passa-s e
qu a lqu er
e n os s o in telecto é u m es p elh o
cois a
qu e
m a n ifes te
r egu la r id a d e,
uma
d et er m in a d a cois a s egu e ca d a vez ou t r a cois a d eter m in a d a
é o
qu e ch a m a m os , qu a n d o o p er ceb em os e qu er em os d a r -lh e u m n om e, ca u s a e efeito ca s o,
tivés s em os
in s en s a tos qu e s om os ! Com o s e, n es s e
com p r een d id o
a lgu m a
cois a ,
p u d és s em os
com p r een d er a lgu m a cois a ! Or a , n a d a vim os a lém d a s imagens dos
efeitos
im a gen s
qu e
e das
causa ! E é p r ecis a m en te es s a vis ã o em
tor n a
im p os s ível
p er ceb er
uma
r ela çã o
m a is
essencial que aquela da sucessão!
122. AS CAUSAS FINAIS NA NATUREZA Aqu ele qu e, s á b io im p a r cia l, es t u d a a h is t ór ia d o olh o e d e s u a s for m a s n a s cr ia tu r a s in fer ior es , p a r a m os tr a r o len t o d es en volvim en to
do
ór gã o
vis u a l,
ch ega r á
for ços a m en te
à
con clu s ã o ím p a r qu e, n a for m a çã o d o olh o, a vis ã o n ã o foi ob jet ivo,
p ois
ela
se
m a n ifes tou
s om en te
qu a n d o
o
acaso
con s tit u iu o a p a r elh o d a vis ã o. Um ú n ico d es s es exem p los e d a s
causas finais nos caem dos olhos como escamas!
123. R AZÃO Com o a r a zã o s u r giu n o m u n d o? De u m a m a n eir a r a cion a l, como seria justo
pelo acaso. Será necessário decifrar esse acaso
como um enigma.
124. O QUE É QUERER? Rim os d a qu ele qu e u ltr a p a s s a o lim ia r d e s u a p or ta n o m om en to em qu e o s ol u lt r a p a s s a o lim ia r d a s u a e qu e d iz: Quero qu e o s ol s e leva n te ; e d a qu ele qu e n ã o p od e fa zer p a r a r u m a r od a e d iz: Quero qu e ela r od e ; e d a qu ele qu e foi d er r u b a d o n u m a lu ta e d iz: E s tou n o ch ã o, m a s quero es t a r n o ch ã o! Mas, a p es a r d os gr a cejos , a gim os a lgu m a vez d e ou tr a for m a qu e u m desses três, quando empregamos a expressão: Eu quero ?
125. S OBRE O REINO DA LIBERDADE Pod em os
p en s a r
p od em os fa zer e viver
m u ita s
cois a s ,
m u it o
m a is
das
qu e
o qu e qu er d izer qu e n os s o p en s a m en to é
s u p er ficia l e s e s a tis fa z com a a p a r ên cia , a p on to d e n em s equ er a n ot a r .
Se
o
in telecto
es tives s e
r igor os a m en te
desenvolvido,
s egu n d o a m ed id a d e n os s a for ça e d o exer cício qu e tem os d e n os s a for ça , ter ía m os com o s u p r em o p r in cip io d e n os s a r eflexão qu e n ã o p od em os com p r een d er s en ã o a qu ilo qu e p od em os fazer s u pon d o qu e, d e u m a m a n eir a ger a l, exis ta u m a com p r een s ã o Aqu ele qu e tem s ed e s en te fa lt a d a á gu a , m a s s eu es p ír ito lh e a p r es en ta in ces s a n tem en te d ia n te d os olh os a im a gem d a á gu a , com o s e n a d a fos s e m a is fá cil d e ob t er
a n a tu r eza s u p er ficia l e
fá cil a con ten ta r d o in telecto n ã o p od e com p r een d er a exis tên cia d e u m a n eces s id a d e ver d a d eir a e s e s en te s u p er ior : or gu lh a -s e d e
p od er m a is , d e cor r er m a is d ep r es s a , d e ch ega r n u m in s ta n te qu a s e a o objetivo
e a s s im o r ein o d a s id éia s , em con tr a s te com
o r ein o d a a çã o, d o qu er er e d o viver , a p a r ece com o o re in o d a liberdade: en qu a n to, com o já d is s e, n ã o é m a is qu e o r ein o d o superficial e da ausência de exigências.
126. O ESQUECIMENTO Nã o foi a in d a d em on s tr a d o qu e o es qu ecim en to exis t e; t u d o o qu e s a b em os é qu e n ã o es tá em n os s o p od er n os r elem b r a r . Pr ovis or ia m en te coloca m os n es s a la cu n a d e n os s o p od er a p a la vr a es qu ecim en to: com o s e is s o fos s e u m p od er a m a is a r egis tr a r . Ma s , a fin a l, o qu e é qu e es tá em n os s o p od er !
S e es s a p a la vr a
s e en con tr a n u m a la cu n a d e n os s o p od er , a s ou tr a s p a la vr a s n ã o s e en con tr a r ia m em ou t r a la cu n a d o con h ecim en to d e n os s o poder?
127. E M VISTA DE UM OBJETIVO De tod os os a tos h u m a n os , os m en os com p r een d id os s ã o certam en te a qu eles qu e s ã o r ea liza d os em vis ta d e u m ob jetivo, p or qu e s em p r e for a m con s id er a d os com o os m a is in teligíveis e qu e, p a r a n os s o en ten d im en to, s ã o os m a is h a b it u a is . Os gr a n d es problemas estão na rua.
128. O SONHO E A RESPONSABILIDADE Qu er em s er r es p on s á veis p or tod a s a s cois a s ! E xceto p or s eu s s on h os ! Qu e la m en tá vel fr a qu eza , qu e fa lt a d e cor a gem lógica ! Na d a lh es é mais p r óp r io qu e s eu s s on h os ! Na d a é m a is sua ob r a ! Ma tér ia , for m a , d u r a çã o, a tor , es p ecta d or
nessas
com éd ia s vocês s ã o r ea lm en t e vocês m es m os ! E é p r ecis a m en te a li qu e vocês têm m ed o e ver gon h a d e vocês m es m os . J á É d ip o, o
s á b io É d ip o, s a b ia con s ola r -s e com a id éia d e qu e n ã o p od em os nada, se não sonharmos esta ou aquela coisa! Disso concluo que a gr a n d e m a ior ia d os h om en s d eve ter d o qu e s e r ecr im in a r p or ter s on h os a b om in á veis . S e fos s e d e ou tr a m a n eir a , com o s e p od er ia ter exp lor a d o s u a p oes ia n otu r n a em fa vor d o or gu lh o d o h om em ! S er á p r ecis o a cr es cen ta r qu e o s á b io É d ip o tin h a r a zã o, qu e n ã o s om os r ea lm en te r es p on s á veis p or n os s os s on h os
mas não
m a is qu e p or n os s o es ta d o d es p er to e qu e a d ou tr in a d o livr ea r b ítr io tem p or p a i e m ã e o or gu lh o d o h om em e s eu s en tim en to d e p od er ? Digo is s o ta lvez d em a s ia d a s vezes : m a s es s a n ã o é u m a razão para que isso seja uma mentira.
129. A PRETENSA LUTA DOS MOTIVOS Fala-s e d e
lu t a d os m otivos , m a s a s s im s e d es ign a u m a
lu t a qu e não é a
lu ta d os m otivos . Qu er o d izer qu e, em n os s a
con s ciên cia d elib er a tiva , a n tes d e u m a a çã o, s e a p r es en t a m a s con s eqü ên cia s d e d ifer en tes a ções qu e ju lga m os p od er executar tod a s ela s e com p a r a m os es s a s con s eqü ên cia s . J u lga m os es ta r d ecid id os
a
uma
a çã o
qu a n d o
con s ta t a m os
qu e
su as
con s eqü ên cia s s er ã o a s m a is fa vor á veis ; a n tes d e ch ega r a es ta con clu s ã o em n os s a s a va lia ções , n os a tor m en ta m os m u ita s vezes lea lm en te
p or
ca u s a
das
gr a n d es
d ificu ld a d es
qu e
há
em
a d ivin h a r a s con s eqü ên cia s , em p er ceb ê-la s em tod a a s u a for ça , tod a s , s em exceçã o: a lém d is s o, es s e cá lcu lo d eve ter ta m b ém s u a p a r te d e a ca s o. Ma s é en tã o qu e vem o m a is d ifícil: tod a s a s con s eqü ên cia s
qu e
d efin im os
s ep a r a d a m en t e,
com
ta n t a
d ificu ld a d e, d evem s er p es a d a s u m a s e ou tr a s n a m es m a b a la n ça ; e m u ita s vezes , p a r a es s a ca s u ís tica d a va n ta gem , n ã o tem os n em b a la n ça n em p es os , p or ca u s a d a s d ifer en ça s d e qualidade entre tod a s a s con s eqü ên cia s im a gin á veis . S u p on d o, con tu d o, qu e n ós
n os exim ís s em os d es s a op er a çã o com o d a s ou tr a s e qu e o a ca s o ten h a p os to em n os s o ca m in h o con s eqü ên cia s r ecip r oca m en te com p a r á veis : en tã o n os r es ta r ia efetiva m en te, n a im a ge m d a s conseqüências d e u m a a çã o d eter m in a d a , u m motivo par a p r a tica r es s a a çã o
sim! Um m ot ivo! Ma s n o m om en to em qu e n os
d ecid im os a a gir , s om os m u ita s vezes d eter m in a d os p or u m a ca tegor ia d e m otivos d ifer en te d a ca tegor ia d es cr it a a qu i, a qu ela qu e fa z p a r ta d a
im a gem d a s con s eqü ên cia s . E n tã o in t er vém o
modo s egu n d o o qu a l n os s a s for ça s têm o h a b ito d e r ep r es en ta r ou a in d a u m leve im p u ls o im p r im id o p or u r n a p es s oa qu e r ecea m os , ven er a m os ou a m a m os , ou a in d a a in d olên cia qu e p r efer e execu ta r o qu e es tá à m ã o, ou fin a lm en te o d es p er ta r d a im a gin a çã o p r ovoca d o n o m om en to d ecis ivo p or u m p equ en o in cid en te qu a lqu er s e a p r es en ta
en tã o a ge t a m b ém o elem en to cor p or a l qu e
s em
qu e s e p os s a
d eter m in á -lo, ou
a in d a
a
d is p os içã o d o m om en to, a ir r u p çã o d e u m a p a ixã o qu a lqu er qu e es tá , p or a ca s o, p r es tes a s a lt a r : n u m a p a la vr a , a gem m otivos qu e n ã o con h ecem os b em ou qu e ign or a m os t ot a lm en t e e qu e, p or ou tr o la d o, n ã o p od em os nunca fazê-los en tr a r d e a n te m ã o em n os s os cá lcu los . É provável qu e en t r e eles ta m b ém h a ja lu t a , tir a teim a , a r r eb a ta m en t os e r ep r es s ã o d os m otivos ;
es s a s er ia a verdadeira luta
qu a lqu er cois a qu e, p a r a n ós , é tot a lm en te
in vis ível e in con s cien te. Ca lcu lei a s con s eqü ên cia s e os r es u lta d os e in s er i a s s im um in s tin to m u it o im p or ta n te n a or d em d e b a ta lh a d os m otivos
m a s es ta or d em d e b a ta lh a es ta b eleço-a t ã o p ou co
com o a p er ceb o: a p r óp r ia lu ta es tá es con d id a e a vitór ia , com o vitór ia , igu a lm en te; p ois , s ei m u ito b em o qu e a ca b o d e fazer, mas n ã o s ei qu a l é o m otivo qu e fin a lm en te s a iu vitor ios o. Estamos, com efeito, h ab itu a d os a não fa zer en tr a r em lin h a tod os es s es fen ôm en os in con s cien tes e a p en s a r a p r ep a r a çã o d e u m a to
a p en a s n a m ed id a em qu e é con s cien te: e é p or is s o qu e confundimos
a
lu ta
d os
m otivos
com
con s eqü ên cia s p os s íveis d e d ifer en tes a ções
a
com p a r a çã o
das
u m a d a s con fu s ões
m a is ch eia s d e con s eqü ên cia s e d a s m a is fu n es ta s p a r a o desenvolvimento da moral!
130. CAUSAS FINAIS? VONTADE? Nós n os a cos tu m a m os a a cr ed ita r em d ois r ein os , o r ein o das cau s a s fin a is e d a vontade e o r ein o d o acaso. Nes te ú ltim o r ein o, tu d o é d es p r ovid o d e s en tid o, tu d o p a s s a , va i e vem , s em qu e a lgu ém p os s a d izer p or qu ê, p a r a qu e fim .
Tem em os es s e
p od er os o r ein o d a gr a n d e im b ecilid a d e cós m ica , p ois a p r en d em os ger a lm en t e a con h ecê-lo qu a n d o ca i n o ou t r o m u n d o, a qu ele d a s ca u s a s fin a is e d a s in ten ções , com o u m a telh a ca i d e u m telh a d o, a tin gin d o s em p r e a lgu m d e n os s os ob jetivos s u b lim es . E s s a cr en ça n os d ois r ein os p r ovém d e u m velh o r om a n tis m o e d e u m a len d a : n ós , a n ões m a lign os , com n os s a von ta d e e n os s a s ca u s a s fin a is , s om os im p or tu n a d os , ca lca d os a os p és , m u ita s vezes fer id os p or giga n t es im b ecis , a r qu i-im b ecis : os a ca s os
mas,
a p es a r d e tu d o, n ã o gos t a r ía m os d e s er p r iva d os d a medonha p oes ia d es s a vizin h a n ça , p ois es s es m on s tr os s ob r evêm m u ita s vezes qu a n d o a exis t ên cia n a te ia d e ara n h a d a s ca u s a s fin a is s e tor n ou d em a s ia d o en fa d on h a e d em a s ia d o p u s ilâ n im e, ca u s a n d on os u m a s u b lim e d iver s ã o qu a n d o s u a m ã o arranca d e u m a vez a teia tod a .
Nã o qu e s eja es s a a in ten çã o d es s es s er es in s en s a tos !
Nem m es m o s e d ã o con t a d is s o. Ma s s u a s m ã os gr os s eir a m en te os s u d a s a tr a ves s a m a t eia com o s e fos s e a r .
Os gr egos
chamavam Moira a es s e r ein o d os im p on d er á veis e d a s u b lim e e et er n a es tr eiteza d e es p ír ito e o coloca va m com o u m h or izon te em tor n o d e s eu s d eu s es , u m h or izon t e for a d o qu a l es tes n ã o p od ia m
n em ver n em a gir : com es s e s ecr eto d es a fio a os d eu s es qu e s e en con tr a em cer to n ú m er o d e p ovos : qu er -s e a d or a r os d eu s es , m a s s e r es er va con t r a eles u m ú ltim o tr u n fo n a s m ã os ; en tr e os h in d u s
e
os
p er s a s ,
p or
exem p lo,
er a m
im a gin a d os
com o
d ep en d en tes d o sacrifício d os m or ta is , d e m od o qu e, em ú ltim a instância, os mortais podiam deixar os deuses morrer de fome e de s ed e; en tr e os es ca n d in a vos , d u r os e m ela n cólicos , cr ia va -s e, p ela id éia d e u m fu tu r o cr ep ú s cu lo d os d eu s es , a a legr ia d e u m a vin ga n ça s ilen cios a , em com p en s a çã o d o tem or p er p étu o qu e es s es d eu s es m a u s in s p ir a va m . Bem d iver s a m en te ocor r e n o cr is tia n is m o, cu ja s id éia s fu n d a m en ta is n ã o s ã o h in d u s n em p er s a s n em gr ega s n em es ca n d in a va s . O cr is tia n is m o qu e en s in ou a a d or a r n o p ó o es p írito d e pod er, qu is a in d a qu e s e a b r a ça s s e a p oeir a d ep ois : d eu a en ten d er qu e es s e tod o-poderoso r ein o d a imbecilidade
n ã o er a tã o im b ecil com o p a r ece, qu e n ós , a o
con tr á r io, s om os os im b ecis , n ós qu e n ã o n ota m os qu e p or tr á s desse reino há
o bom Deus que até o presente foi menosprezado
s ob o n om e d e r a ça d e giga n t es ou d e Moira e qu e ele p r óp r io t ece a t eia d a s ca u s a s fin a is , es s a teia m a is s u til a in d a qu e a qu ela d e n os s a in teligên cia
d e m od o qu e foi n eces s ário qu e n os s a
in teligên cia a a ch a s s e in com p r een s ível e a té m es m o a b s u r d a essa fá b u la con s tit u ía u m a in ver s ã o tã o a u d a cios a e u m p a r a d oxo tã o ou s a d o qu e o m u n d o a n tigo, t or n a d o m u ito fr á gil, foi in ca p a z d e lh e r es is tir , tã o lou ca e con tra d itória p a r eceu a cois a ;
pois,
s eja d ito en tr e n ós , h a via a li u m a con tr a d içã o: s e n os s a r a zã o não p od e d ecifr a r a r a zã o e os fin s d e Deu s , com o fez p a r a d ecifr a r a con for m a çã o d e s u a r a zã o, a r a zã o d a r a zã o e a con for m a çã o d a r a zã o d e Deu s ?
Nos tem p os m a is r ecen tes , p er gu n tou -s e, com
efeito, com d es con fia n ça , s e a telh a qu e ca i d o telh a d o foi la nçada por a m or d ivin o
e os h om en s com eça m a r etom a r a s p ega d a s
a n tiga s d o r om a n tis m o d os giga n t es e d os a n ões . Aprendamos p or ta n to, p or qu e já é t em p o, qu e em n os s o r ein o p a r ticu la r d a s ca u s a s fin a is e d a r a zã o s ã o ta m b ém os giga n tes qu e gover n a m ! E nossas próprias teias são também muitas vezes destruídas por nós mesmos e, igu a lm en te d e m od o gr os s eir o, com o p ela fa m os a telh a . E , s e qu is er em con clu ir : Há , p or ta n to, u m ú n ico r ein o, a qu ele d a im b ecilid a d e e d o a ca s o?
s er ia n eces s á r io a cr es cen ta r : s im ,
ta lvez h a ja a p en a s u m r ein o, t a lvez n ã o h a ja n em von t a d e n em ca u s a s fin a is e ta lvez fom os n ós qu e os im a gin a m os . E s s a s m ã os d e fer r o d a n eces s id a d e qu e a gita m os d a d os d o a ca s o con tin u a m s eu
jogo
in d efin id a m en te:
é,
p ois ,
necessário
qu e
s eja m
p r od u zid os golp es qu e p a r eça m tota lm en te con for m es à fin a lid a d e e à sabedoria. Talvez nossos atos de vontade, nossas causas finais n ã o s eja m ou tr a cois a s en ã o es s es golp es m u it o lim ita d os
e m u it o va id os os
para
e s om os s om en te com p r een d er
n os s a
extr em a es tr eiteza d e es p ír ito qu e n ã o s a b e o qu e n ós m es m os a git a m os com m ã os d e fer r o, o cop o d os d a d os qu e, em n os s os a tos m a is in ten cion a is , n ã o fa zem os ou t r a cois a qu e joga r o jogo d a n eces s id a d e. Ta lvez!
Pa r a ir a lém d es s e talvez, seria
n eces s á r io já ter s id o h ós p ed e d o in fer n o, s en ta d o à m es a d e Perséfone5 , e t er joga d o os d a d os e ter a p os ta d o com a p r óp r ia Perséfone.
131. OS MODOS MORAIS Com o o con ju n to d os ju ízos m or a is s e m od ificou ! E s s a s obras-primas das moralidade antiga, as mais prodigiosos de todas, com o o gên io d e E p itect o 6 , n a d a s a b ia m d a glor ifica çã o h oje cor r en te d o es p ír it o d e s a cr ifício, d a vid a em p r ol d os ou tr os ; s egu n d o n os s os m od os m or a is , s er ia n eces s á r io liter a lm en te ta xá los d e im or a lid a d e, p ois lu ta r a m com t od a s a s s u a s for ça s p or s eu
ego e contra a com p a ixã o qu e os ou tr os n os in s p ir a m (s ob r et u d o em r ela çã o a s eu s s ofr im en tos e s u a s en fer m id a d es m or a is ). Ta lvez eles n os r es p on d es s em : S e s ã o p a r a vocês m es m os ob jeto d e ta m a n h o a b or r ecim en to ou es p etá cu lo t ã o od ios o, fa zem b em em pensar nos outros mais que em vocês!
132. OS ÚLTIMOS ECOS DO CRISTIANISMO NA MORAL S ó s e é b om p ela com p a ixã o: é n eces s á r io, p ois , qu e h a ja a lgu m a com p a ixã o em t od os os n os s os s en t im en tos de hoje! E de onde vem isso?
é a m or a l
O homem que realiza ações sociais
simpáticas, d es in t er es s a d a s , d e in ter es s e com u m , é con s id er a d o h oje com o o h om em m ora l
es s e ta lvez é o efeito m a is ger a l, a
tr a n s for m a çã o m a is com p leta qu e o cr is tia n is m o p r od u ziu n a E u r op a : a in d a qu e is s o n ã o es tives s e em s u a s in ten ções n em em s u a d ou tr in a . Ma s foi o r es íd u o d a m en ta lid a d e cr is tã qu e p r eva leceu
qu a n d o
a
cr en ça
r igor os a m en te egoís ta , d e qu e
fu n d a m en ta l,
m u ito
op os ta
e
u m a s ó cois a é n eces s á r ia , a
cr en ça n a im p or tâ n cia a b s olu ta d a s a lva çã o eter n a pessoal, assim com o os d ogm a s n os qu a is s e a p oia va , for a m p ou co a p ou co r ecu a n d o, e qu e a cr en ça a ces s ór ia n o
amor , n o
a m or d o
próximo , d e a cor d o com a m on s tr u os a p r á tica d a ca r id a d e ecles iá s tica , vin h a a s s im ocu p a r o p r im eir o p la n o. Qu a n to m a is s e a p r ofu n d a va a s ep a r a çã o d es s es d ogm a s , m a is s e p r ocu r a va d e a lgu m m od o justificar es s a s ep a r a çã o p or u m cu lto d e a m or à h u m a n id a d e: n ã o fica r a t r á s em r ela çã o a o id ea l cr is t ã o, m a s passar-lh e à fr en te s e p os s ível, es s e foi o s ecr eto a gu ilh ã o d os livr es p en s a d or es fr a n ces es , d e Volta ir e e Au gu s to Com te 7 : e es te ú lt im o, com s u a céleb r e m á xim a m or a l
v iver p ara os ou tros ,
s u p er cr is tia n izou , com efeito, o cr is tia n is m o. S ch op en h a u er n a Alem a n h a , J oh n S tu a r t Mill n a In gla ter r a 8 , con fer ir a m a m a ior
celeb r id a d e
à
d ou tr in a
d os
s en tim en tos
s im p á ticos
e
da
com p a ixã o ou d a u tilid a d e p a r a os ou t r os , com o p r in cíp io d e a çã o: m a s eles n ã o for a m s en ã o ecos
es s a s d ou tr in a s s u r gir a m em
tod a p a r t e a o m es m o tem p o, s ob for m a s s u tis ou gr os s eir a s , com uma
vita lid a d e extr a or d in á r ia , d es d e a
ép oca
da
Revolu çã o
Fr a n ces a a p r oxim a d a m en t e, e tod os os s is tem a s s ocia lis ta s s e coloca r a m com o qu e in volu n ta r ia m en te n o t er r en o com u m d es s a s d ou tr in a s . Nã o exis te ta lvez h oje p r econ ceito m a is d ifu n d id o qu e a qu ele d e im a gin a r qu e sabemos o qu e con s titu i verdadeiramente a cois a m or a l. Ca d a u m p a r ece h oje ou vir com s a tis façã o qu e a s ocied a d e es tá p r es tes a a d a p t a r o indivíduo à s n eces s id a d es ger a is e qu e a felicid a d e as s im com o o s a crifício d e cad a u m con s is te em con s id er a r -s e m em b r o ú til e in s tr u m en to d e u m tod o: en tr eta n to, h es ita -s e m u it o a in d a n es te m om en to p a r a s a b er on d e é p r ecis o p r ocu r a r es s e tod o, s e n a or d em es t a b elecid a ou n a or d em a s er fu n d a d a , s e n a n a çã o ou n a fr a ter n id a d e d os p ovos , ou ainda em novas pequenas comunidades econômicas. Há hoje, a es s e r es p eito, m u ita s r eflexões , h es ita ções , lu ta s , m u ita excita çã o e paixão: mas singular e unânime é a harmonia na exigência que o ego d eve s e a p a ga r a té qu e r eceb a d e n ovo, s ob for m a d e a d a p ta çã o a o tod o, s eu cír cu lo fixo d e d ir eitos e d e d ever es
até
qu e s e ten h a t or n a d o qu a lqu er cois a d e n ovo e tot a lm en te d ifer en te. Nã o qu er em os n a d a m en os não
qu e
uma
tr a n s for m a çã o
qu er o con fes s em os ou fu n d a m en ta l,
qu e
um
en fr a qu ecim en to a té, qu e u m a s u p r es s ã o d o indivíduo: n ã o n os ca n s a m os d e en u m er a r e d e a cu s a r tu d o o qu e h á d e m a u , d e h os til, d e p r ód igo, d e d is p en d ios o, d e lu xu os o n a exis tên cia in d ivid u a l, p r a tica d a a t é es te d ia , e es p er a m os in s ta u r a r u m a econ om ia m a is equ ilib r a d a , m en os p er igos a e m a is u n id a , qu a n d o n ã o exis tir em m a is d o qu e gran d es corpos e s eu s membros.
Con s id er a m os com o bom tu d o a qu ilo qu e, d e u m a for m a ou d e ou tr a , cor r es p on d e a es s e in s tin to d e a gr u p a m en to e a s eu s in s tin tos a u xilia r es ; es ta é a corren te fu n d a m en ta l n a m or a l d e n os s a
ép oca ; a
s im p a tia
e os
s en t im en tos
s ocia is
n ela
se
con fu n d em . (Ka n t 9 p er m a n ece a in d a for a d es s e m ovim en to: ele en s in a exp r es s a m en te qu e d evem os s er in s en s íveis a o s ofr im en t o d os ou tr os , s e n os s os b en efícios d evem t er u m va lor m or a l
o
qu e S ch op en h a u er ch a m a , com u m a ir r it a çã o m u ito con ven ien te de sua parte, as fu tilid a d es k an tia n a s ).
133. NÃO PENSAR MAIS EM SI S er ia n eces s á r io r efletir s ob r e is s o s er ia m en te: p or qu e s a lta m os à á gu a p a r a s ocor r er a lgu ém qu e es tá s e a foga n d o, em b or a n ã o ten h a m os p or ele qu a lqu er s im p a tia p a r ticu la r ? Por com p a ixã o: s ó p en s a m os n o p r óxim o
r es p on d e o ir r efletid o. Por
qu e s en tim os a d or e o m a l-es ta r d a qu ele qu e cos p e s a n gu e, em b or a n a r ea lid a d e n ã o lh e qu eir a m os b em ? Por com p a ixã o: n es s e m om en to n ã o p en s a m os m a is em n ós ir r efletid o. A ver d a d e é qu e n a com p a ixã o
r es p on d e o m es m o qu er o d izer , n o qu e
cos tu m a m os ch a m a r er r a d a m en te com p a ixã o
n ã o p en s a m os
cer ta m en te em n ós d e m od o con s cien te, m a s inconscientemente p en s a m os e p en s a m os m u ito, d a m es m a m a n eir a qu e, qu a n d o es cor r ega m os ,
execu t a m os
in con s cien tem en te
os
m ovim en t os
contrários que restabelecem o equilíbrio, pondo nisso todo o nosso b om s en s o. O a cid en te d o ou tr o n os toca e fa r ia s en tir n os s a im p otên cia , t a lvez n os s a cova r d ia , s e n ã o o s ocor r ês s em os . Ou en tã o tr a z con s igo m es m o u m a d im in u içã o d e n os s a h on r a p er a n te os ou tr os ou d ia n te d e n ós m es m os . Ou a in d a vem os n os a cid en tes e n o s ofr im en to d os ou tr os u m a vis o d o p er igo qu e ta m b ém n os es p ia ; m es m o qu e fos s e com o s im p les in d ício d a
in cer teza e d a fr a gilid a d e h u m a n a s qu e p od e p r od u zir em n ós u m efeito p en os o. Rech a ça m os es s e t ip o d e m is ér ia e d e ofen s a e respondem os com u m a to d e com p a ixã o qu e p od e en cer r a r u m a sutil defesa ou até uma vingança. Podemos imaginar que no fundo é em n ós qu e p en s a m os , con s id er a n d o a d ecis ã o qu e tom a m os em tod os os ca s os em qu e podemos evita r o es p etá cu lo d a qu eles qu e s ofr em , gem em e es tã o n a m is ér ia : d ecid im os n ã o d eixa r d e evita r , s em p r e qu e p od em os vir a d es em p en h a r o p a p el d e h om en s for tes e
s a lva d or es ,
cer tos
da
a p r ova çã o,
s em p r e
qu e
qu er em os
exp er im en ta r o in ver s o d e n os s a felicid a d e ou m es m o qu a n d o es p er a m os
n os
d iver tir
com
n os s o
a b or r ecim en to.
Fa zem os
con fu s ã o a o ch a m a r com p a ixã o (Mitle id ) a o s ofr im en to (Leid) que n os ca u s a u m ta l es p etá cu lo e qu e p od e s er d e n a tu r eza m u ito va r ia d a , p ois em tod os os ca s os é u m s ofr im en to d e qu e es t á isento a qu ele qu e s ofr e d ia n t e d e n ós : d iz-nos r es p eito a n ós ta l com o o d ele d iz r es p eito a ele. Or a , s ó n os lib er ta m os d es s e s ofrim en to pes s oal qu a n d o n os en tr ega m os a a tos d e com p a ixã o. Tod a via , n u n ca a gim os a s s im p or u m s ó m otivo: t ã o cer to é qu e qu er em os a s s im n os lib er ta r d e u m s ofr im en to, com o é certo ta m b ém qu e, p ela m es m a a çã o, ced em os a u m im pu ls o d e praz er p r a zer p r ovoca d o p elo a s p ecto d e u m a s itu a çã o con tr á r ia à n os s a , à id éia d e qu e p od em os a ju d a r s e o qu is er m os , a o p en s a m en to d os elogios e d o r econ h ecim en to qu e r ecolh er em os n o ca s o d e a u xilia r m os ; p r ovoca d o p ela p r óp r ia a tivid a d e d e a ju d a r , n a m ed id a em qu e é o a to t en h a êxito (e o s u ces s o ca u s a p r ogr es s iva m en te
p r a zer
p or
si
m es m o
ao
execu t or ),
mas
s ob r etu d o p r ovoca d o p elo s en tim en to d e qu e n os s a a çã o p õe ter m o a u r n a in ju s tiça r evolta n te (d a r livr e cu r s o à p r óp r ia in d ign a çã o já é s u ficien te p a r a r econ for ta r ). Tu d o is s o, in clu in d o elem en tos a in d a m a is s u tis , fa z p a r t e d a compaixão :
com qu e
p es o a lín gu a s e la n ça , com es ta p a la vr a con tr a u m or ga n is m o tã o complexo!
Qu e, p elo con tr a r io, a com p a ixã o s eja u m a s ó com o
s ofr im en to, cu jo a s p ecto a s u s cita ou qu e ten h a p or es t a u m a com p r een s ã o p a r ticu la r m en t e s u til e p en etr a n te a fir m a ções em glor ificou
a
con tr a d içã o com
com p a ixã o
s ob
são du as
a experiência e a qu ele qu e
es s es
d ois
a s p ectos
carece de
exp er iên cia s u ficien te n o d om ín io d a m or a l. É p or is s o qu e leva n to d ú vid a s a o ler a s cois a s in cr íveis qu e S ch op en h a u er es cr eve s ob r e a com p a ixã o: ele qu e gos ta r ia com is s o n os leva r a cr er n a gr a n d e n ovid a d e d e s u a d es cob er ta , s egu n d o a qu a l a com paixão
essa
com p a ixã o qu e ob s er va tã o im p er feita m en te e qu e d es cr eve tã o m a l d es cr it a
s er ia a fon t e d e tod a a çã o m or a l p r es en te e fu tu r a
e ju s ta m en te gr a ça s à s a t r ib u ições qu e teve d e com eça r a inventar para ela.
O que é que distingue, no final das contas, os
h om en s s em com p a ixã o d os h om en s com p a s s ivos ? An tes d e t u d o p a r a d a r a p en a s u m es b oço em gr a n d es lin h a s
eles n ã o t êm
a im a gin a çã o ir r ita d iça d o tem or , a s u til fa cu ld a d e d e p r es s en tir o p er igo; p or is s o é qu e s u a va id a d e é fer id a m en os d ep r es s a s e ocor r er a lgu m a cois a qu e t ives s em p od id o evita r (a p r eca u çã o d e s u a a ltivez lh es or d en a qu e n ã o s e m eta m in u tilm en te n os a s s u n tos a lh eios , e gos t a m m es m o qu e ca d a u m a com eça r p or eles s e a ju d e a s i p r óp r io e jogu e s u a s p r óp r ia s ca r t a s ). Além disso, es tã o ger a lm en te m a is h a b it u a d os qu e os com p a s s ivos a s u p or ta r a d or e n ã o lh es p a r ece in ju s to qu e ou tr os s ofr a m , p ois eles m es m os já s ofr er a m . E n fim , o a s p ecto d os cor a ções s en s íveis lh es ca u s a p en a , com o o a s p ecto d a es tóica im p a s s ib ilid a d e a ca u s a a os h om en s com p a s s ivos ; n ã o têm , p a r a os cor a ções s en s íveis , s en ã o p a la vr a s d es d en h os a s e tem em qu e s eu es p ír it o vir il e s u a fr ia b r a vu r a es teja m em p er igo, es con d em s u a s lá gr im a s d ia n te d os ou tr os e a s en xu ga m , ir r ita d os con s igo
m es m os . Fa zem p a r te d e outro tip o d e egoís t a s , d ifer en tes d os compassivos;
m a s ch a m á -los m a u s n u m s en tid o d is tin tivo e
bons os h om en s com p a s s ivos , is s o n ã o p a s s a d e u m a m od a m or a l qu e fa z ép oca : p r ecis a m en t e com o a m od a con tr á r ia teve s u a época, uma época muito longa!
134. E M QUE MEDIDA É NECESS ÁRIO PRECAVER-S E CONTRA A COMPAIXÃO
A compaixão, por pouco que crie verdadeiramente sofrimento e is s o d eve s er a qu i n os s o ú n ico p on to d e vis ta
é uma
fr a qu eza com o t od o a b a n d on o a u m a a fetivid a d e nociva. Ela a u m en ta
o
s ofr im en t o
con s eqü ên cia d a
no
m u n d o:
com p a ixã o, u m
s e,
a qu i ou
a colá ,
em
s ofr im en to é in d ir eta m en te
a ten u a d o ou s u p r im id o, n ã o d eve s er p er m itid o exp lor a r es s a s con s eqü ên cia s
oca s ion a is ,
tota lm en te
in s ign ifica n t es
em
s eu
con ju n to, p a r a ju s tifica r a s for m a s d e com p a ixã o qu e ca u s a m d a n o. S u p on h a m os qu e es s a s for m a s p r ed om in em , m es m o qu e fos s e
p or
um
d ia
s om en te,
im p elir ia m
im ed ia ta m en t e
a
h u m a n id a d e p a r a s u a p er d içã o. Por s i m es m a a com p a ixã o n ã o p os s u i u m ca r á ter m a is b en eficen te qu e qu a lqu er ou tr o in s tin to: é s om en te qu a n d o é exigid a e elogia d a
e is s o a con t ece qu a n d o
n ã o s e com p r een d e o qu e n ela tr a z p r eju ízo, m a s qu e n ela s e descobre u m a fon te d e pra z er
qu e ela r eves te u m a es p écie d e
b oa con s ciên cia ; é s om en te en tã o qu e n os a b a n d on a m os a ela e qu e n ã o r ecea m os s u a s con s eqü ên cia s . E m ou tr a s cir cu n s tâ n cia s , em qu e s e com p r een d er qu e ela é p er igos a , é con s id er a d a com o u m a fr a qu eza : ou m elh or , com o er a o ca s o p a r a os gr egos , com o u m p er iód ico a ces s o d oen tio, d e cu jos p er igos p od ia m s e p r even ir , dando-lh e livr e cu r s o d e qu a n d o em vez.
Aqu ele qu e já fez a
exp er iên cia d e p r ocu r a r d u r a n te cer to tem p o a s oca s iões d e com p a ixã o em s u a vid a p r á tica e qu e con s id er a con s ta n tem en te
em s eu ín tim o t od o o in for tú n io qu e s e lh e ofer ece à s u a volta , torna-s e in evita velm en te d oen te e m ela n cólico. Ma s a qu ele qu e quer, n u m s en tid o ou em ou tro, s er vir d e m éd ico à h u m a n id a d e d ever ia u s a r d e m u ita p r u d ên cia em r ela çã o a es te s en tim en to qu e o p a r a lis a em tod os os m om en tos d ecis ivos , b loqu eia s eu saber e sua mão hábil e compassiva.
135. S USCITAR A COMPAIXÃO E n t r e os s elva gen s , evoca -s e com u m a r r ep io m or a l a id éia d e qu e s e p os s a s er ob jeto d e com p a ixã o: s er ia a p r ova d e qu e s e es tá p r iva d o d e tod a vir tu d e. Ter com p a ixã o equ iva le a d es p r eza r : n ã o s e d es eja ver u m s er d es p r ezível s ofr er , is s o n ã o p r op or ciona qu a lqu er p r a zer . E m com p en s a çã o, ver u m in im igo s ofr er , in im igo qu e s e r econ h ece com o igu a l em a lt ivez e qu e n ã o a b a n d on a s u a a ltivez s ob tor t u r a , e em ger a l ver s ofr er tod o s er qu e r ecu s a fa zer a p elo à com p a ixã o, is to é, à h u m ilh a çã o m a is ver gon h os a e m a is p r ofu n d a , es s e é o p r a zer d os p r a zer es , com is s o a a lm a d o s elva gem s e ed ifica a té a a d m ir a çã o: a ca b a p or m a t a r s em elh a n te b r a vo, qu a n d o es tiver em s eu p od er , e lh e r en d e, a es s e inflexível, a s d er r a d eir a s h on r a s . S e tives s e gem id o, s e s eu r os to tivesse p er d id o s u a exp r es s ã o d e fr io d es d ém , s e ele s e tives s e m os tr a d o d ign o d e d es p r ezo u m cã o
p ois b em , p od er ia con tin u a r viven d o com o
n ã o t er ia m a is excita d o a a ltivez d o es p ecta d or e a
compaixão teria tomado o lugar da admiração.
136. A FELICIDADE NA COMPAIXÃO S e, com o os ín d ios , coloca r m os o ob jetivo d e t od a a t ivid a d e in telectu a l n o con h ecim en t o d a m is éria h u m a n a e s e, d u r a n te vá r ia s
ger a ções , n os
m a n tivés s em os
fiéis
a
es s e
es p a n tos o
p r eceito, a compaixão a ca b a r ia p or ter , a os olh os d e s em elh a n tes
h om en s d o p es s im is m o h ered itá rio, u m va lor n ovo com o va lor conservador da vida, que ajuda a suportar a existência mesmo que es ta m er eces s e s er r ejeita d a com d es gos to e h or r or . A com p a ixã o s e tor n a o a n tíd ot o d o s u icid a , n a m ed id a em qu e es con d e u m prazer e fa z p r ova r , em p equ en a s d or es , u m s en tim en to d e s u p er ior id a d e: ela n os d es via d e n ós m es m os , fa z o cor a çã o tr a n s b or d a r , d is s ip a
o m ed o e o en tor p ecim en to, in cit a
p a la vr a s , à s qu eixa s e à s a ções
às
é u m a felicid a d e rela tiv a se
com p a r a d a à m is ér ia d o con h ecim en to qu e, d e t od os os la d os , em p u r r a o in d ivíd u o p a r a u m s om b r io im p a s s e e lh e cor t a o fôlego. A felicid a d e, qu a lqu er qu e s eja , d á a r , lu z e m ovim en tos livres.
137. P OR QUE DUPLICAR O EU ? Ob s er va r os a con tecim en tos d e n os s a vid a com os m es m os olhos com qu e ob s er va m os os a con tecim en tos d a vid a d e ou tr o tr a n qü iliza m u ito e é u m r em éd io r ecom en d á vel. Ob s er va r e a colh er , p elo con tr á r io, os a con tecim en tos d a vid a d os ou tr os com o s e fos s em os n os s os compaixão
exigên cia d e u m a filos ofia d a
is s o n os d es tr u ir á tot a lm en te em m u ito p ou co
tem p o; qu e s e fa ça , p ois , a exp er iên cia s em m a is d elon ga s . Cer ta m en te, a p r im eir a m á xim a é a lém d is s o m a is con form e com a r a zã o e com u m a b oa von ta d e r a zoá vel, p ois ju lga m os m a is ob jet iva m en t e o va lor e o s en tid o d e u m a con tecim en to qu a n d o ocor r e com os ou t r os e n ã o a n ós : p or exem p lo, o va lor d e u m fa lecim en to, d e u m a p er d a d e d in h eir o, d e u m a ca lú n ia . A com p a ixã o com o p r in cip io d e a çã o com es s a exigên cia : s ofr e o m a l d o ou tr o como ele p r óp r io o s ofr e , leva r ia , p elo con trário, for ços a m en te o p on t o d e vis ta d o eu, com s eu exa ger o e s eu s d es vios , a s e tor n a r ta m b ém o p on to d e vis ta d o ou tr o, d o
Com p a s s ivo: d e t a l m a n eir a qu e t er ía m os d e s ofr er a o m es m o tem p o d e n os s o eu e d o eu d o ou tr o, ca r r ega n d o-n os a s s im , voluntariamente, d e u m d u p lo a b s u r d o, em lu ga r d e t or n a r o p es o do nosso tão leve quanto possível.
138. T ORNAR-SE MAIS TERNO Qu a n d o
a m a m os ,
ven er a m os
e
p er ceb em os d e r ep en te qu e ele sofre
a d m ir a m os
a lgu ém
e
s em p r e com gr a n d e
s u r p r es a , p ois n ã o p od em os d u vid a r qu e a felicid a d e qu e d ele s e exp a n d e s ob r e n ós n ã o ten h a or igem n u m a in es gotá vel felicid a d e pessoal
n os s o s en tim en to d e a m or , d e ven er a çã o e d e
a d m ir a çã o s e tr a n s for m a em s u a es s ên cia : torna-s e m a is terno, isto é, o fosso que nos separa parece se nivelar, parece produzir-se cer ta a p r oxim a çã o d e igu a l p a r a igu a l. S ó en tã o ju lga m os p os s ível retribuir-lh e, en qu a n to qu e a n tes o im a gin á va m os b em lon ge d e n os s o r econ h ecim en to. E s t a fa cu ld a d e d e r etr ib u ir n os com ove e n os d á u m gr a n d e p r a zer . Pr ocu r a m os d es cob r ir o qu e p od er ia a ca lm a r a d or d e n os s o a m igo e o d a m os a ele; s e qu is er p a la vr a s , olh a r es , a ten ções , s er viços , p r es en tes con s ola d or es
n ós os
d a m os a ele; m a s , a n t es d e tu d o, s e ele d es eja r qu e s ofr a m os p or s eu s ofr im en to, n ós n os d a m os com o s ofr ed or es , p ois is s o n os p r op or cion a a n tes d e tu d o as d elícia s d o recon h ecim e n to a tivo: o que não passa, numa palavra, de uma boa vingança. Se não quiser a ceit a r e n ã o a ceita n a d a d e n ós , n os r etir a m os fr ios e tr is tes , qu a s e ofen d id os : é com o s e n os s o r econ h ecim en to fos s e r ecusado e, n es s e p on to d e h on r a , o m elh or d os h om en s fica m elin d r a d o. De tu d o is s o s e d eve con clu ir qu e, m es m o n o m elh or d os ca s os , h á a lgu m a cois a d e d egr a d a n te n o s ofr im en to e, n a com p a ixã o, a lgu m a cois a qu e eleva e con fer e s u p er ior id a d e; o qu e s ep a r a eternamente esses dois sentimentos.
139. P RETENSAMENTE SUPERIOR ! Vocês d izem qu e a m or a l d a com p a ixã o é u m a m or a l superior à do estoicismo? Provem-no! Mas notem bem que, sobre o qu e é
superior e inferior em m or a l, n ã o s e d eve n ova m en te
d ecid ir s egu n d o a va lia ções m or a is : p ois n ã o h á m or a l a b s olu ta . Pr ocu r em , p or t a n t o, em ou tr os lu ga r es s eu s p a d r ões
fiquem
atentos!
140. E LOGIO E RECRIMINAÇÃO S e u m a gu er r a tem u m d es en la ce in feliz, p er gu n ta -s e d e qu em é a culpa ; s e t er m in a n u m a vitór ia , elogia -s e o a u tor . E m tod a p a r te on d e h ou ver fr a ca s s o p r ocu r a m os a cu lp a , p ois o in s u ces s o tr a z con s igo u m d es con ten ta m en to, con tr a o qu a l em p r ega m os in volu n ta r ia m en te u m ú n ico r em éd io: u m a n ova excita çã o d o s en tim en to d e pod er
e es ta s e en con tr a n a
condenação do culpado . E s te cu lp a d o n ã o é, com o p od er ía m os cr er , o b od e exp ia tór io p a r a a cu lp a d os ou tr os : é a vit im a d os fr a cos , d os h u m ilh a d os , d os r eb a ixa d os qu e p r ocu r a m u m m eio qu a lqu er p a r a p r ova r qu e a in d a têm for ça . Con d en a r -s e a s i m es m o p od e s er ta m b ém u m m eio d e r ecu p er a r , d ep ois d o fr a ca s s o, u m s en tim en to d e for ça .
In ver s a m en te a glor ifica çã o
do autor é m u it a s vezes o r es u lta d o t ot a lm en te cego d e ou tr o in s tin to qu e exige s u a vítim a
e n es s e ca s o, o s a cr ifício p a r ece
m es m o a gr a d á vel e s ed u tor p a r a a vítim a:
is s o ocor r e qu a n d o o
s en tim en t o d e p od er d e u m p ovo, d e u m a s ocied a d e, é cu lm in a d o p or u m s u ces s o tã o gr a n d e e p r od igios o qu e s ob r evém u m a fadiga d a v itória e a b a n d on a m os u m a p a r te d e n os s o or gu lh o: s u r ge en tã o u m s en tim en t o d e abnegação qu e p r ocu r a u m ob jeto. Qu er
s eja m os
elogiados ou recriminados, s om os
ger a lm en te
s om en te p r etextos p a r a n os s os vizin h os e m u ita s vezes p r etext os a r b itr a r ia m en te a ga r r a d os p elos ca b elos , p a r a d a r livr e cu r s o à s n eces s id a d es d e r ecr im in a çã o ou d e elogio a cu m u la d a s n eles : n os d ois ca s os , d is p en s a m os -lh es u m b en efício p a r a o qu a l n ós n ã o temos mérito e eles não têm reconhecimento.
141. MAIS BELO, MAS DE MENOR VALOR Mor a lid a d e p itor es ca : é a m or a lid a d e d os s en tim en tos qu e s e eleva m em lin h a s a b r u p t a s , a titu d es e ges tos p a téticos , in cis ivos , ter r íveis e s olen es . E s s e é o gr a u semi-selvagem d a m or a lid a d e: n ã o n os d eixem os ten ta r p or s eu en ca n t o es tético, p a r a lh e conferir um grau superior.
142. S IMPATIA S e, p a r a com p r een d er n os s o p r óxim o, is to é, p a r a reproduzir s eu s s en tim en tos em n ós , r em on ta m os m u ita s vezes a o fu n d o d e s eu s
s en tim en tos , d eter m in a d os
d es ta
ou
d a qu ela
perguntando-nos, por exemplo: por que está triste? tor n a r m os tr is tes n ós m es m os p ela m es m a r a zã o
m a n eir a ,
a fim de nos é m u ito m a is
fr eqü en te evita r m os a gir a s s im e p r ovoca m os es s es s en tim en t os em n ós s egu n d o os efeitos qu e s u s cita m e s ã o vis íveis em n os s o p r óxim o, r ep r od u zin d o em n os s o cor p o a exp r es s ã o d e s eu s olh os , d e s u a voz, d e s eu a n d a r , d e s u a a ltitu d e (p elo m en os a té u m a leve s em elh a n ça d o jogo d os m ú s cu los e d o en er va m en to) ou m es m o o r eflexo d e tu d o is s o n a p a la vr a , n a p in tu r a , n a m ú s ica . E n t ã o s u r ge em n ós u m s en tim en to a n á logo, a p a r t ir d e u m a velh a a s s ocia çã o d e m ovim en tos e d e s en tim en tos qu e é leva d a a a gir n os d ois s en tid os . Leva m os m u ito lon ge es s a h a b ilid a d e em com p r een d er os s en tim en tos d os ou tr os e em p r es en ça d e a lgu ém exer cem os s em p r e e qu a s e in volu n ta r ia m en te es s a h a b ilid a d e:
observe-s e s ob r etu d o o jogo d os tr a ços n u m r os to fem in in o, com o fr em e e s e ilu m in a in teir a m en te s ob o d om ín io d e u m a con s ta n te im ita çã o, r ep r od u zin d o in ces s a n tem en te os s en tim en tos qu e s e a git a m em tor n o d ele. Ma s é a m ú s ica qu e n os m os tr a m a is cla r a m en te com o n os tor n a m os m es t r es n a a d ivin h a çã o r á p id a e s u til d os s en tim en t os e n a s im p a t ia : p elo m en os s e a m ú s ica é efetiva m en te a im ita çã o d e u m a im ita çã o d e s en tim en tos e s e, a p es a r d o qu e h a ja n is s o d e d is ta n te e va go, n os fa z m u ita s vezes p a r ticip a r a in d a d es s es s en tim en tos , d e m od o qu e n os tor n a m os tr is tes s em ter o m en or m otivo p a r a tr is t eza , com o fa zem os loucos, s im p les m en te p or qu e ou vim os s on s e r it m os qu e lem b r a m va ga m en t e a en ton a çã o e o m ovim en to d a qu eles qu e es tã o d e lu to ou m es m o s eu s cos t u m es . Con ta -s e d e u m r ei d in a m a r qu ês qu e ficou en leva d o com a m ú s ica d e u m m en es tr el e ficou p os s u íd o d e ta l en tu s ia s m o gu er r eir o qu e s e p r ecip itou d o tr on o e m a tou cin co pessoas de sua corte reunida em torno dele: não havia guerra nem in im igos , m u ito p elo con t r á r io, m a s a for ça qu e rem on ta d o s en tim en to à cau s a foi s u ficien tem en te gr a n d e p a r a ven cer a evid ên cia e a r a zã o. Or a , es s e é qu a s e s em p r e o efeito d a m ú s ica (s u p on d o, é cla r o, qu e ela t en h a u m efeito
) e n ã o s e t em
n eces s id a d e d e ca s os t ã o p a r a d oxa is p a r a s e d a r con ta d is s o: o es ta d o s en tim en ta l em qu e a m ú s ica n os m er gu lh a es tá qu a s e s em p r e em con tr a d içã o com a evid ên cia d e n os s a s it u a çã o r ea l e d a r a zã o qu e r econ h ece es s a s itu a çã o r ea l e s u a s ca u s a s .
Se
p er gu n ta r m os com o s e tor n ou tã o cor r en te a r ep r es en ta çã o d os s en tim en t os a lh eios , a r es p os t a n ã o d eixa qu a lqu er d ú vid a : u m a vez qu e o h om em é a cr ia tu r a m a is r eceos a d e t od a s , gr a ça s à s u a n a tu r eza d elica d a e fr á gil, en con tr ou em s u a d is pos içã o receos a a in icia d or a
d es s a
s im p a tia ,
d es s a
r á p id a
com p r een s ã o
d os
s en tim en t os d os ou tr os (m es m o d os a n im a is ). Du r a n te m ilên ios
viu u m p er igo em tu d o o qu e er a es tr a n h o, em t u d o o qu e s e agitava: desde que semelhante espetáculo se oferecia a seus olhos, im ita va os tr a ços e a a titu d e d a qu ilo qu e via d ia n te d ele e tir a va s u a s con clu s ões s ob r e a n a tu r eza d a s m á s in ten ções es con d id a s por trás desses traços e dessa atitude. Essa interpretação de todos os m ovim en tos e d e tod os os tr a ços em fu n çã o d e intenções, o h om em a a p licou à n a t u r eza d a s cois a s in a n im a d a s
levado
com o es ta va p ela ilu s ã o d e qu e n ã o exis tia n a d a d e in a n im a d o. Pen s o qu e tu d o a qu ilo qu e ch a m a m os s en tim en to d a n a tu reza e qu e n os toca a o a s p ecto d o céu , d os ca m p os , d os r och ed os , d a flor es ta , d a s tem p es t a d es , d a s es tr ela s , d os m a r es , d a s p a is a gen s , d a p r im a ver a , en con tr a a qu i s u a or igem . S em a velh a p r á t ica d o temor que nos forçava a ver tudo isso sob um sentido secundário e d is ta n te, es ta r ía m os p r iva d os h oje d a s a legr ia s d a n a tu r eza , p r ecis a m en te com o o h om em e os a n im a is n os d eixa r ia m s em p r a zer ,
se
não
tivés s em os
tid o
es s a
in icia d or a
de
tod a
com p r een s ã o, o tem or . Por ou tr o la d o, a a legr ia e a a gr a d á vel s u r p r es a e, en fim , o s en tim en to d o r id ícu lo, s ã o os filh os d a s im p a tia , os ú ltim os filh os e os ir m ã os m u ito m a is joven s d o temor.
A fa cu ld a d e d e com p r een s ã o r á p id a
qu e s e b a s eia ,
p or ta n to, n a fa cu ld a d e d e s im u lar ra p id a m en te h om en s
e n os
p ovos
a ltivos
d im in u i n os
e s ob er a n os , p ois
s ã o m en os
tem er os os : em com p en s a çã o, t od a s a s va r ied a d es d e com p r een s ã o e d e s im u la çã o s ã o fa m ilia r es a os p ovos tem er os os ; a li a in d a s e en con tr a
a
ver d a d eir a
inteligência superior.
p á tr ia
das
a r tes
de
im ita çã o
e
da
Se, a partir dessa teoria da simpatia como
a p r op on h o a qu i, p en s o n a teor ia , h oje goza n d o d e fa vor e con s a gr a d a , d e u m
p r oces s o m ís t ico, p or
m eio d o qu a l a
compaixão, d e d ois s er es , fa z u m s ó e t or n a p os s ível a u m a com p r een s ã o im ed ia ta d o ou t r o: s e r ecor d o qu e u m es p ír ito tã o
lú cid o com o o d e S ch op en h a u er s e d elicia va com s em elh a n tes in u tilid a d es exa lta d a s e m is er á veis e qu e tr a n s m itiu es s e p r a zer a ou tr os es p ír itos lú cid os ou s em i-lú cid os : m in h a es tu p efa çã o e minha tristeza não têm limites. Como deve ser grande o prazer que n os p r op or cion a m a s in com p r een s íveis tolices ! Com o o h om em s e en con tr a a in d a p er to d a in s en s a tez a o a u s cu lta r s eu s secretos d es ejos in telectu a is !
(Por qu e raz ã o s e s en tia S ch op en h a u er tã o
ch eio d e r econ h ecim en to p a r a com Ka n t, tã o p r ofu n d a m en te agradecido? Um a vez o r evelou s em equ ívocos . Algu ém h a via fa la d o d a for m a p ela qu a l a qu alita s occu lta 10 p od ia s er r etir a d a d o im p er a t ivo
ca tegór ico
de
Ka n t
para
tor n á -lo
inteligível.
Aí
S ch op en h a u er exp lod iu : In teligib ilid a d e d o im p er a tivo ca t egór ico! Id éia p r ofu n d a m en te er r ôn ea ! Tr eva s d o E gito! Deu s n os livr e d e qu e s e tor n e in t eligível Qu e exis te ju s ta m en te a lgo d e in in teligível, qu e n os s o m is erá vel ju íz o com s eu s con ceitos s eja lim ita d o, con d icion a d o, fin it o, en ga n a d or : é es s a cer teza qu e é a gr a n d e aquisição de Kant.
Deixo pensar, se alguém tiver a boa vontade
de conhecer a s cois a s m or a is , qu a n d o a n t ecip a d a m en t e s e exa lta com a cr en ça em s u a inteligibilidade! Algu ém qu e a in d a cr eia lea lm en te n a s ilu m in a ções d o a lt o, n a m a gia e n a s a p a r ições e n a feiúra metafísica do sapo!)
143. AI DE NÓS SE ESSA TENDÊNCIA SE DESENCADEIA! S u p on d o qu e a ten d ên cia a o d evota m en to e à s olicitu d e p a r a com os ou tr os ( o s en tim en to d e s im p a tia ) s eja d u a s vezes m a is for te d o qu e r ea lm en te é, a p er m a n ên cia n a ter r a s e tor n a r ia intolerável. Qu e s e p en s e s om en t e n a s t olices qu e ca d a u m com ete tod os os d ia s e a tod o m om en to p or d evota m en to e p or s olicitu d e p a ra con s igo m es m o e qu e in s u p or tá vel es p et á cu lo en tã o s e ofer ece: qu e a con tecer ia s e nos tornássemos p a ra os ou tros o
ob jet o d es s a s tolices e d es s a s in op or tu n id a d es qu e a té a gor a s e r es er va r a m u n ica m en te p a r a s i p r óp r ios ! Nã o d ever ía m os en tã o p a r tir
cega m en te
em
fu ga ,
s em p r e
qu e
um
p r óxim o
se
aproximasse d e n ós ? E n ã o h a ver ía m os d e cob r ir a a feiçã o d e s im p a tia com a s m es m a s p a la vr a s in ju r ios a s com qu e cob r im os hoje o egoísmo?
144. D ISTANCIAR-SE DA MISÉRIA DOS OUTROS Se
n os
d eixa r m os
a ca b r u n h a r
p ela
m is ér ia
e
p elos
s ofr im en tos d os ou tr os m or ta is e cob r ir m os d e n u ven s n os s o céu , qu em
s u p or ta r á
as
con s eqü ên cia s
d es s e
en s om b r a m en to?
Certa m en te os ou t r os m or ta is e es te s er á u m p es o a a cr es cen t a r a s u a s ou tr a s ca r ga s ! Nã o p od em os s er p a r a eles n em compassivos, nem recon forta n tes , s e qu is er m os s er o eco d e s u a m is ér ia e ta m b ém s e qu is er m os s em ces s a r d a r ou vid os a es s a m is ér ia
a
m en os qu e a p r en d a m os a a r te d os olím p icos e qu e p r ocu r em os doravante edificar-nos com a in felicid a d e d os h om en s em vez d e s er m os in felizes com ela . Ma s is s o é u m t a n to d em a s ia d o olím p ico p a r a n ós : em b or a , com a fr u içã o d a tr a géd ia , já ten h a m os d a d o um passo à frente em direção a esse canibalismo ideal dos deuses.
145. NÃO EGOÍSTA E s te es tá va zio e gos t a r ia d e es ta r ch eio, a qu ele es tá ch eio e gos ta r ia d e s e es va zia r um
a m b os s e s en tem im p elid os a p r ocu r a r
in d ivíd u o qu e p os s a a ju d á -los n is s o. E es s e fen ôm en o,
inter p r eta d o n u m s en tid o s u p er ior , leva n os d ois ca s os o m es m o nome: Amor.
Como? O amor seria alguma coisa de não egoísta?
146. OLHAR PARA ALÉM DO PRÓXIMO Com o? A es s ên cia d a qu ilo qu e é ver d a d eir a m en t e m or a l
con s is tir ia , p a r a n ós , em ter s em p r e à vis t a a s conseqüências próximas e imediatas que podem ter nossas ações para os outros e em t om a r d ecis ões s egu n d o es s a s con s eqü ên cia s ? E s ta n ã o p a s s a d e u m a m or a l es tr eita d e p equ en os b u r gu es es , em b or a a in d a ch egu e a s er u m a m or a l: m a s m e p a r ece qu e s er ia p r óp r io d e um p en s a m en to s u p er ior
e m a is
s u til olh ar p ara
a lém
dessas
con s eqü ên cia s im ed ia ta s p a r a o p r óxim o, a fim d e p r om over ob jet ivos m a is d is ta n tes , m es m o com o r is co d e fa zer s ofr er os outros
p or exem p lo, p r om over o con h ecim en to, m es m o a
despeito da certeza de que nossa liberdade de espírito lançará logo os ou tr os n a d ú vid a , n a a n gú s tia e em a lgo p ior a in d a . Nã o tem os o d ir eito d e tr a ta r o p r óxim o p elo m en os d a m es m a m a n eir a com o n os t r a t a m os a n ós m es m os ? E s e n ã o p en s a m os p a r a n ós m es m os d e u m a m a n eir a tã o es tr eita e p equ en o-b u r gu es a n a s con s eqü ên cia s e n os s ofr im en tos im ed ia t os , p or qu e s er ia m os forçados a
a gir
a s s im
para
n os s o
p r óxim o?
S u p on d o
qu e
ten h a m os p a r a n ós m es m os o s en tid o d o s a cr ifício: o qu e n os im p ed ir ia d e s a cr ifica r o p r óxim o con os co?
como fizer a m a té
a gor a os E s t a d os e os s ob er a n os , s a cr ifica n d o u m cid a d ã o em p r oveito d os ou tr os , p a r a o in t er es s e ger a l , com o s e d izia . Ma s também nós temos interesses gerais e talvez sejam interesses mais ger a is a in d a : p or qu e n ã o d ever ía m os ter o d ir eito d e s a cr ifica r alguns indivíduos da geração atual em favor das gerações futuras? De
m od o
d es es p er os ,
qu e s eu s
su as er r os
d ificu ld a d es , e
su as
su as
h es ita ções
in qu ietu d es , fos s em
s eu s
ju lga d a s
n eces s á r ia s , p or qu e u m n ovo a r a d o d eve a b r ir o s olo e t or n á -lo fecu n d o p a r a tod os ?
E fin a lm en te, com u n ica m os a o p r óxim o
u m s en tim en to qu e o leva a s e con s id era r com o vítim a e o p er s u a d im os a a ceita r a ta r efa p a r a a qu a l o u tiliza m os . S om os , p or ta n to, s em com p a ixã o? S e, en t r eta n to, p ara além d e n os s a
compaixão, quisermos ob t er u m a vitór ia s ob r e n ós m es m os , n ã o s er ia es s a u m a a t itu d e m or a l m a is eleva d a e m a is livr e qu e a qu ela em qu e n os s en t im os a o a b r igo qu a n d o d es cob r im os qu e u m a a çã o fa z bem ou m a l a o p r óxim o? De fa to, p elo s a cr ifício incluímos, nós e n os s o próximo
em n os
for ta lecer ía m os e eleva r ía m os o
s en tim en t o ger a l d o poder h u m a n o, s u p on d o m es m o qu e n ã o conseguíssemos nada mais. Mas isso já seria um aumento positivo da felicidade. n en h u m a
n o fin a l d a s con ta s , s e is s o fos s e m es m o... m a s
p a la vr a
m a is !
Um
olh a r
b a s ta ,
vocês
me
compreenderam.
147. CAUSA DO ALTRUÍSMO Os h om en s têm em s u m a fa la d o d o a m or com t a n ta ên fa s e e id ola tr ia p or qu e n u n ca o tivera m em d e m a s ia e p or qu e n u n ca p od ia m fica r s a cia d os com es s e a lim en to: é a s s im qu e a ca b a p or s e tor n a r p a r a eles
a lim en to d ivin o . S e u m p oeta qu is es s e
m os tr a r a im a gem r ea liza d a d a u top ia d o a m or u n ivers a l d os homens, cer ta m en te d ever ia d es cr ever u m es ta d o a tr oz e r id ícu lo d e qu e n u n ca s e viu igu a l n a ter r a
ca d a u m s er ia a s s ed ia d o,
im p or tu n a d o, e d es eja d o, n ã o p or u m s ó s er a m a n t e, com o is s o acontece hoje, mas por milhares e mesmo por todos, graças a uma ten d ên cia
ir r es is tível
qu e
s er á
in s u lta d o
en tã o,
qu e
s er á
a m a ld içoa d o com o o fez a h u m a n id a d e a n t iga com o egoís m o; e os p oeta s d es s a n ova ép oca , s e lh es d eixa r em o tem p o p a r a com p or ob r a s , s on h a r ã o a p en a s com o feliz p a s s a d o s em a m or , com o d ivin o egoís m o, com a s olid ã o qu e ou tr or a a in d a er a p os s ível n a ter r a , com a tr a n qü ilid a d e, com o es ta d o d e a n tip a tia , d e ód io, d e d es p r ezo e qu a is qu er qu e s eja m os n om es qu e s e qu is er d a r à infâmia da cara animalidade em que nós vivemos.
148. OLHAR PARA O LONGE S e s ó s ã o ch a m a d a s m or a is , com o o qu er u m a d efin içã o, a s a ções feit a s p or ca u s a d o p r óxim o e u n ica m en te p or ca u s a d o p r óxim o, en tã o n ã o h á a ções m or a is ! S e s ó s ã o m or a is , com o o qu er ou tr a d efin içã o, a s a ções r ea liza d a s s ob a in flu ên cia d e u m a von ta d e livr e, en tã o n ã o h á igu a lm en te a ções m or a is !
O qu e é,
p ois , qu e s e chama a s s im e qu e, n o en t a n t o, exis te r ea lm en te e exige, p or con s egu in te, s er exp lica d o? S ã o os efeitos d e a lgu n s equ ívocos in telectu a is .
E , s u p on d o qu e n os livr á s s em os d es s es
er r os , qu e s e tor n a r ia m a s a ções m or a is ?
E m vir tu d e d es s es
er r os , a t é a gor a con ced em os a a lgu m a s a ções u m va lor s u p er ior ao que possuem realmente: nós as dividimos em ações egoístas e ações não-livres . S e a gor a a s ju n ta m os n ova m en te a es ta s , com o d evem os fa zer , diminuímos cer ta m en te s eu va lor (o s en t im en to d e s eu va lor ), r eb a ixa n d o-a s m a is d o qu e é ju s to, p ois a s a ções egoístas e não-livres for a m a va lia d a s m u ito b a ixo a té h oje, p or ca u s a d es s a p r eten s a d ifer en ça ín tim a e p r ofu n d a . p or ta n to,
d es d e
en tã o,
r ea liza d a s
m en os
Serão,
fr equ en tem en te,
p or qu a n to, d es d e en tã o s er ã o a va lia d a s d e va lor m en or ?
É
in evitá vel! Pelo m en os p or cer to tem p o, en qu a n to a b a la n ça d o sentimento d os va lor es s ofr er a r ea çã o d a s fa lt a s a n tiga s ! Ma s em con tr a p a r tid a d a r em os a os h om en s a cor a gem p a r a a s a ções d ep r ecia d a s com o egoís ta s e r es ta b elecer em os a s s im s eu valor n ós lh es tirare m os a m á con s ciên cia ! E com o a té h oje a s a ções egoís ta s for a m a s m a is fr eqü en tes e a in d a o s er ã o p or tod a a et er n id a d e, tir a r em os d a im a gem
d a s a ções e d a vid a s u a
a p a rên cia m á ! E s s e é u m r es u lt a d o s u p er ior ! Qu a n d o o h om em não mais se considerar mau, deixará de sê-lo!
1
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica ó ver gon h os a or igem (NT).
2
Fr a n çois , d u qu e d e La Roch efou ca u ld (1 6 1 3 -1 6 8 0 ), es cr itor fr a n cês , a u t or d e Reflexões ou s en ten ça s e m á x im a s m ora is , u m d os livr os p r efer id os d e Nietzsche e mais citados em seus escritos (NT).
3
Geor ge Gor d on , d ito Lor d Byr on (1 7 8 8 -1 8 2 4 ), p oeta in glês ; Na p oleã o Bonaparte (1769-1851), militar e político francês, dominou a cena política da Fr a n ça e d a E u r op a d e 1 7 9 5 a 1 8 1 4 , in clu s ive com o im p er a d or d os franceses (NT).
4
Arthur Schopenhauer (1788-1860), filósofo alemão (NT).
5
Na mitologia grega, deusa que presidia os infernos, rainha dos infernos (NT).
6
Epicteto (50-130), filósofo grego, fundador do estoicismo (NT).
7
Fr a n çois Ma r ie Ar ou et, d it o Volta ir e (1 6 9 4 -1 7 7 8 ), es cr itor e filós ofo fr a n cês ; d en tr e s u a s ob r a s , Ca rta s filos óficas , Câ n d id o ou o otim is m o, O in gên u o, Zad ig ou o d es tin o, A p rin ce s a d e B a b ilôn ia , Tra ta d o s obre a tole rân cia já for a m p u b lica d a s n es ta coleçã o d a E d itor a E s ca la ; Au gu s te Com te (1 7 9 8 1 8 5 7 ), filós ofo fr a n cês , fu n d a d or d o p os itivis m o; d en tr e s u a s ob r a s , Reorgan iz a r a s ociedade e Dis cu rs o s obre o e s pírito pos itiv o já for a m publicadas nesta coleção da Editora Escala (NT).
8
Ar th u r S ch op en h a u er (1 7 8 8 -1 8 6 0 ), filós ofo a lem ã o; J oh n S t u a r t Mill (1 8 0 6 1 8 7 3 ), filós ofo e econ om is ta in glês ; d en tr e s u a s ob r a s , A s u je içã o d a s mulheres , En s a io s obre a liberd ad e e O govern o repres en ta tivo já for a m publicadas nesta coleção da Editora Escala (NT).
9
Im m a n u el Ka n t (1 7 2 4 -1 8 0 4 ), filós ofo a lem ã o; d en tr e s u a s ob r a s , A religiã o n os lim ite s d a s im ple s ra z ão e Crítica d a raz ã o prá tica já for a m p u blicadas nesta coleção da Editora Escala (NT).
10
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica qu a lid a d e ocu lta (NT).
LIVRO TERCEIRO
149. P EQUENAS AÇÕES DIVERGENTES SÃO NECESSÁRIAS ! E m qu es tões d e cos t u m es , a gir u m a ú n ica vez qu e s eja a o encontro d a qu ilo qu e r ep u ta m os p r efer ível; ced er a qu i, n a p r á tica , con s er va n d o, con tu d o, a lib er d a d e in t electu a l; com p or ta r -s e com o tod os e m a n ifes ta r a s s im , a t od os , u m a a m a b ilid a d e e u m a b on d a d e p a r a com p en s á -los d e a lgu m a for m a d a s d iver gên cia s d e n os s a s op in iões :
tu d o is s o é con s id er a d o, en t r e os h om en s u m
p ou co in d ep en d en tes , n ã o s om en te com o a d m is s ível, m a s ta m b ém como
honesto ,
humano ,
tolerante ,
n ada
p ed a n te
e
qu a is qu er qu e s eja m os ter m os qu e s e u s a p a r a a d or m ecer a con s ciên cia
in t electu a l: e é a s s im
qu e u m
t a l fa z batizar
cristãmente seu filho apesar de ser ateu, outro cumpre seu serviço m ilit a r com o t od os , em b or a con d en e s ever a m en te o ód io en tr e os povos, e um terceiro se apresenta à igreja com uma mulher porque ela é d e p ied os a fa m ília e fa z p r om es s a s d ia n te d e u m p a d r e s em s en tir ver gon h a d e s u a in con s eqü ên cia . Is s o n ã o tem im p ortâ n cia s e a lgu m d e n ós fa z o qu e tod os fa zem e s em p r e fizer a m
assim
fala o precon ceito gr os s eir o! E o er r o grosseiro! Pois n a d a é m a is im p orta n te qu e con fir m a r u m a vez m a is o qu e já é poderoso, tr a d icion a l
e
r econ h ecid o
s em
r a zã o,
p elo
ato
de
a lgu ém
r econ h ecid a m en te s en s a t o: é a s s im qu e s e con fer e a es s a cois a , a os olh os d e tod os a qu eles qu e d ela ou vem fa la r , a s a n çã o d a p r óp r ia r a zã o! Mil r es p eitos p or s u a s op in iões ! Ma s pequenas ações divergentes têm mais valor!
150. O ACASO DOS CASAMENTOS
S e eu
fos s e u m
d eu s
e um
d eu s
b en evolen te, n a d a
p r ovoca r ia m a is m in h a im p a ciên cia qu e os casamentos dos h om en s . Um in d ivíd u o p od e p r ogr ed ir m u ito n os s eten ta ou m es m o tr in ta a n os d e s u a vid a
isso é r ea lm en te s u r p r een d en te,
m es m o p a r a os d eu s es ! Ma s s e vir m os en tã o com o em p r ega a h er a n ça e os lega d os d es s a lu ta e d es s a vitór ia , os lou r os d e s u a h u m a n id a d e, n o p r im eir o loca l em qu e ch ega , on d e u m a jovem p od e r ecolh ê-los ; s e vir m os com o s e d ed ica b em a ga n h a r e m a l a con s er va r ,
com o es t á
lon ge
de
im a gin a r
qu e
p od er á ,
p ela
p r ocr ia çã o, p r ep a r a r u m a vid a a in d a m a is vit or ios a : en tã o fica m os im p a cien tes e d izem os : A lon go p r a zo, a h u m a n id a d e n ã o p od e ch ega r a lu ga r a lgu m , os in d ivíd u os s ã o d es p er d iça d os , o acaso d os ca s a m en tos tor n a im p os s ível qu a lqu er r a zã o d e u m gr a n d e p r ogr es s o d a h u m a n id a d e;
d eixem os d e s er os es p ecta d or es
assíduos e os tolos desse espetáculo sem fim!
Nessa disposição
d e es p ír ito, os d eu s es d e E p icu r o s e r etir a r a m ou tr or a p a r a s u a tr a n qü ilid a d e e s u a b ea t itu d e d ivin a : es ta va m ca n s a d os d os homens e de suas intrigas amorosas.
151. H Á AQUI UM NOVO IDEAL A INVENTAR Nã o d evia s er p er m itid o, qu a n d o es ta m os a p a ixon a d os , tom a r u m a d ecis ã o qu e com p r om eta p a r a a vid a e fixa r u m a vez p or tod a s , p or ca u s a d e u m ca p r ich o violen to, o ca r á ter d a s ocied a d e em qu e vivem os : d ever -se-ia d ecla r a r p u b lica m en te s em valor os juramentos dos apaixonados e impedi-los de se casar:
e
is s o p or qu e s e d ever ia con fer ir a o ca s a m en to u m a im p or tâ n cia m u it o m a ior ! De m od o qu e, n os ca s os em qu e a té o p r es en t e er a con clu íd o, n ã o s e con clu ir ia m a is ! A m a ior p a r te d os ca s a m en t os n ã o é feita d e ta l m od o qu e n ã o s e d es eja p or tes tem u n h a u m a ter ceir a p es s oa ? E es s a ter ceir a p es s oa ger a lm en te n ã o fa lt a
é o
filho
ele é mais que testemunha, é o bode expiatório!
152. F ÓRMULA DE JURAMENTO S e m in to a gor a , n ã o s ou m a is u m h om em h on es t o e t od os d evem ter o d ir eito d e m e d izê-lo n a ca r a .
Recom en d o es ta
fór m u la em lu ga r d o ju r a m en to ju r íd ico e d a u s u a l in voca çã o a Deus: ela é mais forte. O próprio homem piedoso não tem qualquer r a zã o p a r a r ecu s á -la : d e fa t o, d es d e qu e o ju r a m en to h a b itu a l n ã o serve m a is d e m od o s u ficien te, é n eces s á r io qu e o h om em p ied os o es cu te s eu Ca tecis m o qu e lh e p r es cr eve: Nã o in voca r á s em v ã o o nome do Senhor, de Deus!
153. UM DESCONTENTE É
um
d es s es
velh os
d es con ten tes :
ir r ita -s e
con tr a
a
civiliza çã o p or qu e p en s a qu e ela vis a a tor n a r a ces s íveis tod a s a s cois a s
b oa s
h on r a r ia s , tes ou r os , b ela s
m u lh er es
aos
covardes como aos bravos.
154. CONSOLAÇÕES NOS PERIGOS Os gr egos , n u m a vid a em qu e os gr a ves p er igos e os ca ta clis m a s es ta va m s em p r e p r óxim os , p r ocu r a va m n a m ed ita çã o e n o con h ecim en to u m a es p écie d e s egu r a n ça em ocion a l e u m ú lt im o
r efu gio.
Nós
qu e
vivem os
numa
qu ietu d e
in com p a r a velm en te m a ior , leva m os o p er igo p a r a a m ed ita çã o e p a r a o con h ecim en to, e é n a v id a qu e n os r ep ou s a m os e n os acalmamos ante esse perigo.
155. CETICISMO EXTINTO Os em p r een d im en tos a r r is ca d os s ã o m a is r a r os n os tem p os m od er n os qu e n a a n tigu id a d e e n a Id a d e Méd ia
provavelmente
porque os tempos modernos deixaram de acreditar nos presságios, n os or á cu los , n os a s tr os e n os a d ivin h os . Is s o s ign ifica qu e n os tor n a m os in ca p a zes d e acred ita r n u m fu tu ro que nos é r es er va d o, como o faziam os antigos que
ao contrário de nós
eram muito
m en os céticos em r ela çã o a o qu e v in h a a con te cen d o d o qu e a o qu e já ex is tia .
156. MAU POR ORGULHO... Um a vez qu e n ã o n os s en tim os r ea lm en te m u ito b em ! es s e er a o tem or s ecr eto d os gr egos d a b ela ép oca . É p or is s o que pregavam a moderação! E nós também!
157. CULTO DA VOZ DA NATUREZA Qu e s ign ifica d o tem o fa t o d e n os s a cu ltu r a n ã o s ó d a r p r ova s d e toler â n cia com r ela çã o à s m a n ifes ta ções d e d or , com r ela çã o à s lá gr im a s , à s qu eixa s , à s r ecr im in a ções , à s a titu d es d e r a iva ou d e h u m ild a d e, com o ta m b ém o fa to d e lh es d a r s u a a p r ova çã o e in clu í-la s en tr e a s cois a s n ob r es e in evit á veis ? en qu a n to o es p ír ito d a filos ofia a n tiga a s con s id er a va com desdém e n ã o lh es r econ h ecia n eces s id a d e a lgu m a ? Lem b r em o-n os , p ois , d a m a n eir a com o Pla t ã o desumanos
qu e n ã o er a u m d os filós ofos m a is
fa la d o Filocteto d a cen a tr á gica . Nos s a civiliza çã o
m od er n a ter ia fa lta t a lvez d e
filosofia ? S egu n d o a a va lia çã o
d es s es a n t igos filós ofos , t od os n ós fa r ía m os p a r te ta lvez d a plebe ?
158. CLIMA DO BAJULADOR Atu a lm en te já n ã o é n eces s á r io p r ocu r a r os b a ju la d or es s em es cr ú p u los n a s r od a s d os p r ín cip es
es tes ú lt im os p os s u em
tod os o es p ír ito m ilita r qu e n ã o t oler a o b a ju la d or . Ma s es s a flor
desabrocha agora nas rodas dos banqueiros e dos artistas.
159. OS EVOCADORES DOS MORTOS Cer tos h om en s va id os os p r efer em u m fr a gm en to d o p a s s a d o a p a r tir d o m om en to em qu e p od em r evivê-lo s en t im en ta lm en te (s ob r etu d o s e is s o é d ifícil), gos ta r ia m m es m o, n a n eces s id a d e, d e fazê-lo r es s u s cita r d en tr e os m or tos . Um a vez qu e o n ú m er o d os vaidos os é s em p r e con s id er á vel, o p er igo d os es tu d os h is tór icos n ã o é r ea lm en te d os m en or es , s em p r e qu e s ã o a p lica d os a tod a u m a ép oca : d es p er d iça m os en tã o d em a s ia d a for ça p a r a tod a s a s r es s u r r eições im a gin á veis . Ta lvez s e p od er á com p r een d er m elh or todo o movimento do romantismo partindo desse ponto de vista.
160. VAIDOSO, ÁVIDO E POUCO SÁBIO S eu s d es ejos s ã o m a ior es qu e s u a r a zã o e s u a va id a d e é a in d a m a ior qu e s eu s d es ejos
a h om en s d e s u a es p écie é
con ven ien te r ecom en d a r fu n d a m en ta lm en te m u ita p r á tica cr is tã e, além disso, um pouco de teoria schopenhaueriana!
161. B ELEZA ADEQUADA À ÉPOCA S e n os s os es cu lt or es , n os s os p in tor es e n os s os m ú s icos qu is es s em exp r im ir o s en tid o d e s u a ép oca , d ever ia m m os t r a r a b eleza em p ola d a , giga n tes ca e n er vos a : p r ecis a m en te com o os gr egos , s ob o d om ín io d e s u a m or a l d a m od er a çã o, via m e r ep r es en ta va m a b eleza n o Ap olo d e Belved er e. Nós d ever ía m os , em s u m a , a ch á -lo feio! Ma s os classicistas p ed a n tes n os tir a r a m toda a lealdade!
162. A IRONIA DOS HOMENS DE HOJE E s tá a tu a lm en t e em m od a en tr e os eu r op eu s tr a ta r tod os os
gr a n d es in t er es s es com ir on ia , p or qu e, à for ça d e n os a ta r efa r m os a seu serviço, não temos tempo para levá-los a sério.
163. CONTRA R OUSSEAU1 S e é ver d a d e qu e n os s a civiliza çã o é, p or s i m es m a , a lgo d e deplorável, vocês têm a p os s ib ilid a d e d e p r os s egu ir com s u a s con clu s ões com Rou s s ea u : E s ta civiliza çã o d ep lor á vel é ca u s a d e nossa má moralidade , ou d e con clu ir in ver ten d o a fór m u la d e Rousseau:
Nossa boa m or a lid a d e é ca u s a
d es ta
d ep lor á vel
civiliza çã o. Nos s os con ceitos s ocia is d o b em e d o m a l, fr a cos e efem in a d os , s u a d es m es u r a d a p r ep on d er â n cia s ob r e o cor p o e a a lm a , a ca b a r a m p or en fr a qu ecer tod os os cor p os e tod a s a s a lm a s e p or a lqu eb r a r os h om en s in d ep en d en tes , a u tôn om os , s em p r econ ceitos , os ver d a d eir os p ila r es d e u m a civiliza çã o forte: em tod a p a r t e on d e a in d a h oje en con tr a m os a má m or a lid a d e, vem os a s ú ltim a s r u ín a s d es s es p ila r es . Há , p or t a n to, p a r a d oxo con tr a p a r a d oxo! A ver d a d e n ã o p od e es ta r , a qu a lqu er p r eço, d os d ois la d os : es ta r á ela em ger a l d e u m la d o ou d e ou tr o? Con vém examinar!
164. T ALVEZ PREMATURO Pa r ece qu e a tu a lm en te, s ob d ifer en tes n om es equ ivoca d os qu e in d u zem em er r o e, n a m a ior ia d a s vezes , com gr a n d e fa lta d e cla r eza , a qu eles qu e n ã o s e s en tem liga d os a os cos tu m es e à s leis estabelecidas fa zem a s p r im eir a s ten ta tiva s p a r a s e or ga n iza r e p a r a s e cr ia r a s s im u m direito: en qu a n to a té a gor a tod os os cr im in os os , os livr es p en s a d or es , tod os os h om en s im or a is e celer a d os vivia m d es a cr ed ita d os e for a d a lei, p er ecen d o s ob o peso da má consciência. Em suma, se deveria aprovar isso e achálo bom, m es m o qu e tor n e p er igos o o s écu lo fu tu r o e ob r igu e ca d a
u m d e n ós a p ôr a s a r m a s à s cos ta s :
m es m o qu e fos s e s om en te
p a r a h ou ves s e u m a for ça d e op os içã o qu e r elem b r e s em p r e qu e n ã o h á m or a l a b s olu ta e exclu s iva e qu e t od a m or a lid a d e qu e s e a fir m a à exclu s ã o d e qu a lqu er ou tr a d es tr ói m u it a for ça viva e cu s ta m u ito ca r o à h u m a n id a d e. Os d iver gen tes , qu e s ã o tã o fr eqü en tem en te in d ivíd u os in ven tivos e fecu n d os , n ã o d evem m a is ser s a cr ifica d os ; n ã o s e d eve m a is con s id er a r com o ver gon h os o afastar-s e d a m or a l em a ções e p en s a m en t os ; d eve-s e fa zer n u m er os a s t en t a t iva s n ova s d e exis t ên cia e d e com u n id a d e; é n eces s á r io qu e u m p es o en or m e d e m á con s ciên cia s eja s u p r im id o do m u ndo
é n eces s á r io qu e es s es ob jetivos ger a is s eja m
r econ h ecid os e im p lem en t a d os p or tod a s a s p es s oa s lea is qu e procuram a verdade!
165. A MORAL QUE NÃO ABORRECE Os
p r in cip a is
con s ta n t em en te
para
m a n d a m en tos qu e
s eja m
qu e
um
en s in a d os
p ovo e
p r ocu r a
p r ega d os
se
r ela cion a m com s eu s p r in cip a is d es lizes e é p or is s o qu e n ã o os con s id er a
a b or r eced or es .
Os
gr egos ,
qu e
p er d ia m
tã o
fr eqü en tem en te a m od er a çã o, o s a n gu e-fr io, o s en tid o d a ju s tiça e em geral a sabedoria, davam ouvidos às quatro virtudes socráticas p ois d ela s ta n t o p r ecis a va m , u m a vez qu e ju s ta m en te a ela s tã o pouco se devotavam!
166. NA ENCRUZILHADA Qu e ver gon h a ! Vocês qu er em en tr a r n u m s is t em a em qu e é n eces s á r io s er u m a en gr en a gem , p len a e t ot a lm en te, s ob p en a d e s er es m a ga d o p or es s a en gr en a gem ! Dis s o d ecor r e evid en tem en te qu e ca d a u m é o qu e s eu s s u p er ior es fazem d ele! On d e a ca ça à s relações fa z p a r te d os d ever es n a tu r a is ! On d e n in gu ém s e s en te
ofen d id o
qu a n d o
o
tor n a m
a t en cios o
para
com
a lgu ém ,
ob s er va n d o qu e p od e lh e s er ú til ! On d e n in gu ém t em ver gon h a d e fa zer u m a vis ita p a r a s olicita r a in ter ces s ã o d e a lgu ém ! On d e n in gu ém
s u s p eita
s equ er
qu e,
p or
uma
s u b or d in a çã o
tã o
in ten cion a l a s em elh a n tes cos tu m es , s e cla s s ifica , d e u m a vez p or tod a s , en tr e a s vis va s ilh a s d a n a tu r eza qu e os ou tr os p od em u tiliza r e qu eb r a r à von ta d e, s em exp er im en ta r com is s o u m gr a ve s en tim en t o d e r es p on s a b ilid a d e, com o s e s e qu is es s e d izer : Gente d e m in h a es p écie n u n ca h a ver á d e fa lt a r : s ir va m -s e, p or t a n to, d e mim, sem cerimônia!
167. AS HOMENAGENS INCONDICIONAIS Qu a n d o p en s o n o filós ofo a lem ã o m a is lid o, n o m ú s ico a lem ã o
m a is
ou vid o,
no
h om em
de
E s ta d o
a lem ã o
m a is
con s id er a d o, s ou ob r iga d o a con fes s a r : s e a t u a lm en te s e tom a a vid a m u ito d u r a p a r a os a lem ã es , es s e p ovo d os s en tim en t os a b s olu tos , is s o é d evid o a s eu s gr a n d es h om en s . Nos t r ês ca s os , o espetá cu lo é es p lên d id o p a r a con tem p la r : é ca d a vez u m r io, tã o p od er os a m en te a gita d o n o leit o qu e ele p r óp r io ca vou , qu e s e p od er ia m u ita s vezes a cr ed ita r qu e qu er es ca la r a m on ta n h a . E , no entanto, por mais longe que seja levada a admiração, quem não gostaria d e s er , n o fin a l d a s con ta s , d e outro es t ilo qu e o d e Schopenhauer2 ! E qu em gos ta r ia d e com p a r tilh a r a gor a , n a s gr a n d es e n a s p equ en a s cois a s , a s op in iões d e Wa gn er 3 ?
por
m a is ju s ta qu e p os s a s er a ob s er va çã o d a qu ele qu e d is s e qu e, s em p r e qu e Wa gn er d á ou tom a u m im p u ls o, u m p r ob lem a es tá escondido
va m os a d ia n t e, n ã o é ele qu e va i tr a zê-lo à lu z.
E,
finalmente, quantos não haveria que gostariam, de todo o coração, es ta r d e a cor d o com Bis m a r ck 4 , com a con d içã o qu e ele es tives s e d e a cor d o con s igo m es m o ou qu e p elo m en os a p a r en ta s s e s ê-lo
d or a va n te! Cer ta m en te: n ão h á p rin cíp ios , m a s in s tin tos , um es p ír it o flexível a s er viço d e violen tos in s tin tos d om in a n tes e p or is s o s em p r in cíp ios
is s o n ã o d ever ia s er n a d a s u r p r een d en te
n u m h om em d e E s ta d o, m a s d ever ia a n tes s er con s id er a d o com o ju s to e n or m a l. Ai! is s o foi a t é a gor a tã o p ou co a lem ã o! Tã o p ou co como o ruído em torno da música, as dissonâncias e o mau humor em tor n o d o m ú s ico! Tã o p ou co com o a n ova e extr a or d in á r ia p os içã o es colh id a p or S ch op en h a u er : nem acima d a s cois a s , n em d e joelh os d ia n te d ela s alemão
n os d ois ca s os , is s o ter ia s id o a in d a
mas contra as coisas! Incrível e desagradável! Colocar-se
no mesmo n ível d a s cois a s , m a s s er , a p es a r d is s o, s eu a d ver s á r io e, no final das contas, o adversário de si próprio!
Que deve fazer
o a d m ir a d or in con d icion a l com s em elh a n te m od elo? E s ob r etu d o de três desses modelos que nem mesmo mostram o desejo de estar em p a z en tr e s i! Aí es tá S ch op en h a u er , a d ver s á r io d a m ú s ica d e Wa gn er ,
e
Bis m a r ck ,
Wa gn er , a d ver s á r io
a d ver s á r io de
tod o
da
p olít ica
de
wa gn er is m o
Bis m a r ck , e
de
e
tod o
s ch op en h a u er is m o! Qu e r es ta fa zer ? On d e s e r efu gia r com s u a s ed e d e
ven er a çã o em b loco ? S er ia p os s ível ta lvez es colh er n a
m ú s ica d o com p os itor a lgu m a s cen ten a s d e b oa s m ed id a s qu e toqu em o cor a çã o e qu e s e gos te d e ter n o cor a çã o p or qu e têm coração
s er ia p os s ível ir em b or a com es s e p equ en o es p ólio e
es qu ecer t od o o r es to? E p r ocu r a r s em elh a n te a r r a n jo com o filós ofo e com o h om em d e Estado
es colh er , gu a r d a r n o cor a çã o
e, s ob r etu d o, es qu ecer o res to? S im , s e n ã o fos s e tã o d ifícil es qu ecer ! E r a u m a vez u m h om em m u ito or gu lh os o qu e, a n en h u m p r eço, qu er ia a ceita r n a d a qu e n ã o fos s e d e s i p r óp r io, ta n t o n o b em com o n o m a l: m a s qu a n d o t eve n eces s id a d es d o esquecimento, n ã o p ôd e d á -lo a s i p r óp r io e foi for ça d o a con ju r a r os es p ír itos p or tr ês vezes ; eles vier a m , ou vir a m s eu p ed id o e
d is s er a m n o fim : E ju s ta m en te a ú n ica cois a qu e n ã o es t á em n os s o
p od er !
Os
a lem ã es
não
d ever ia m
tir a r
p r oveit o
da
exp er iên cia d e Manfredo? Pa r a qu e con ju r a r p r im eir o os es p ír itos ! É in ú til, n ã o s e es qu ece qu a n d o s e qu er es qu ecer . E com o s er ia importante o r es to
p a r a es s es tr ês gr a n d es h om en s d e n os s o
tem p o, a fim d e p od er p er m a n ecer s eu a d m ir a d or em b loco! S er ia , p or ta n to, p r efer ível a p r oveita r a oca s iã o p a r a ten ta r a lgo d e n ovo: quero dizer, progredir na lealdade para consigo mesmo e tornar-se, em vez d e u m p ovo qu e r ep ete d e u m a for m a cr éd u la e qu e od eia m a ld os a e cega m en te, u m p ovo d e a p r ova çã o con d icion a l e d e op os içã o b en evolen te; m a s
a p r en d er a n tes
d e tu d o qu e a s
h om en a gen s in con d icion a is p a r a com a s p es s oa s s ã o a lgo d e r id ícu lo, qu e m u d a r d e op in iã o a r es p eito n ã o s er ia d es on r os o, m es m o p a r a os a lem ã es , e qu e exis te u m a m á xim a p r ofu n d a , d ign a d e s er s egu id a : O qu e im p orta n ão s ão a s pes s oa s , m a s a s coisas. E s ta m á xim a é, com o a qu ele qu e a p r on u n ciou , gr a n d e, h on es ta , s im p les e s ilen cios a republicano.
a s s im com o Ca r n ot 5 , s old a d o e
Ma s p od e-s e a gor a fa la r a s s im d e u m fr a n cês a
a lem ã es , e m a is a in d a d e u m r ep u b lica n o? Ta lvez n ã o e ta lvez n ã o se tenha até mesmo o direito de lembrar o que Niebuhr6 pôde dizer ou tr or a a os a lem ã es : qu e n in gu ém com o Ca r n ot lh e tin h a d a d o a impressão da verdadeira grandeza.
168. UM MODELO De qu e é qu e gos to em Tu cíd id es 7 , qu e é qu e fa z com qu e eu o es tim e m a is qu e Pla tã o 8 ? E le t em o p r a zer m a is a m p lo e m a is livr e d e p r econ ceitos com tu d o o qu e h á d e típ ico n o h om em e n os a con t ecim en tos
e a ch a
qu e a
ca d a
tip o cor r es p on d e cer t a
qu a n tid a d e d e bom s en s o: é es s e b om s en s o qu e ele ten ta d es cob r ir . Pos s u i u m a m a ior ju s tiça p r á tica qu e Pla tã o; n ã o
ca lu n ia n em r eb a ixa os h om en s qu e n ã o lh e a gr a d a m ou qu e lh e ca u s a r a m d a n o n a vid a . Pelo con tr á r io: a cr es cen ta e in tr od u z a lgo d e gr a n d e em tod a s a s cois a s e em t od a s a s p es s oa s , ven d o em tod a p a r te a p en a s tip os ; com efeito, qu e im p or ta à p os ter id a d e, à qu a l ele d ed ica s u a ob r a , o qu e não é típ ico! É a s s im qu e es s a cu ltu r a d o m a is livr e con h ecim en to d o m u n d o ch ega n ele, o pensador-h om em , a u m flor es cim en to m a r a vilh os o, es s a cu ltu r a qu e t em em S ófocles 9 s eu p oeta , em Pér icles 10 s eu h om em d e E s ta d o, em Hip ócr a t es 11 s eu m éd ico, em Dem ócr ito 12 s eu s á b io n a tu r a lis ta : es s a cu ltu r a qu e m er ece s er b a tiza d a com o n om e d e s eu s m es tr es , os sofistas, e qu e in felizm en te, d es d e o m om en to d e s eu b a t is m o, com eça a s e tor n a r d e r ep en t e p á lid a e in a ces s ível p a r a n ós
p or qu e d es d e logo s u s p eit a m os qu e es s a cu ltu r a , p or
ter s id o com b a tid a p or Pla t ã o e p or tod a s a s es cola s s ocr á tica s , d evia s er b em im or a l! A ver d a d e é tã o com p lica d a e en r ed a d a qu e n os r ep u gn a d es en r os cá -la : qu e o velh o er r o (error verita te simplicior13) siga pois seu velho caminho!
169. O GÊNIO GREGO NOS É MUITO ESTRANHO Or ien ta l ou m od er n o, a s iá tico ou eu r op eu : com p a r a d o a o gr ego, tu d o is s o s e ca r a cter iza p elo ta m a n h o e p elo gos to d a s gr a n d es m a s s a s , com o lin gu a gem d o s u b lim e, en qu a n to qu e em Paestum14, em Pom p éia e em Aten a s n os s u r p r een d em os , d ia n te d a a r qu itetu r a gr ega , a o ver a té qu e p on to, com qu a is pequ en a s massas, os
gr egos
sublimes.
De igu a l m od o, com o n a Gr écia os h om en s er a m
s im p les
id éia
na
s a b ia m
que d e
e
gostavam d e
s i m e s m os
se
exp r im ir
cois a s
fa z ia m ! Com o os
u lt r a p a s s a m os n o con h ecim en to d os h om en s ! Com o p a r ecem ch eia s d e la b ir in tos n os s a s a lm a s e n os s a s r ep r es en ta ções d a a lm a , em com p a r a çã o com a s d eles ! S e qu is és s em os ten ta r u m a
a r qu itet u r a con for m e à n a t u r eza d e nossa a lm a (s om os d em a s ia d o fr ou xos p a r a is s o):
o la b ir in to d ever ia s er n os s o m od elo! A
m ú s ica qu e n os é p r óp r ia e qu e n os exp r im e ver d a d eir a m en te já p er m ite a d ivin h a r o la b ir in to (p ois , n a m ú s ica os h om en s s e d eixa m leva r p or qu e im a gin a m qu e n ã o h á n in gu ém ca p a z d e vêlos através de sua música).
170. OUTRAS PERSPECTIVAS DO SENTIMENTO Qu e s ign ifica a n os s a t a ga r elice s ob r e os gr egos ? Qu e en ten d em os , p ois , d e s u a a r te, cu ja a lm a é a p a ixã o p ela b eleza viril nua!
É s ó a p a rtir d a í qu e eles tin h a m o s en tim en to d a
beleza fem in in a . Tin h a m , p or ta n to, p a r a es ta , u m a p er s p ect iva b em d ifer en te d a n os s a . Ocor r ia o m es m o com s eu a m or p ela mulher: veneravam de outra forma, desprezavam de outro modo.
171. A ALIMENTAÇÃO DO HOMEM MODERNO O h om em m od er n o s e d ed ica a d iger ir m u ita s cois a s e m es m o a d iger ir qu a s e tu d o
es s a é a va id a d e típ ica d ele: m a s
s er ia d e u m a es p écie s u p er ior s e, ju s ta m en t e, não s e d ed ica s s e a is s o: o h om o p a m p h agu s 15 n ã o é o qu e h á d e m a is r efin a d o. Nós vivem os en tr e u m p a s s a d o, qu e tin h a u m gos to m a is d elir a n te e b iza r r o qu e o n os s o, e u m fu tu r o, qu e ta lvez ter á u m gos to m a is seleto
vivemos demasiadamente no meio-termo.
172. T RAGÉDIA E MÚSICA Os h om en s d e u m a d is p os içã o d e es p ír ito gu er r eir a , com o os gr egos d a ép oca d e É s qu ilo 16, s ã o d ifíceis d e com over e qu a n d o a com p a ixã o t r iu n fa u m a vez s ob r e s u a d u r eza , u m a es p écie d e vertigem se apodera deles, semelhante a uma força demoníaca eles s e s en tem en tã o con s t r a n gid os e a b a la d os p or u m a em oçã o
r eligios a . A s egu ir , exp er im en ta m u m a r eticên cia em r ela çã o a es s e es ta d o; en qu a n to es tã o m er gu lh a d os n ele, u s u fr u em d o êxta s e qu e lh es p r op or cion a a em b r ia gu ez e o m a r a vilh os o, m es cla d o
ao
a b s in to
ver d a d eir a m en te u m a
m a is
a m a r go
b eb id a
pa ra
do os
s ofr im en to:
es s a
é
gu er r eir os , a lgo r a r o,
p er igos o, d oce e a m a r go qu e n ã o s e p a r tilh a fa cilm en te.
A
tr a géd ia s e d ir ige à s a lm a s qu e s en tem d es s e m od o a com p a ixã o, à s a lm a s d u r a s e gu er r eir a s qu e d ificilm en te ven cem os , s eja p elo tem or , s eja p ela com p a ixã o, m a s p a r a a s qu a is é ú til s er abrandadas d e tem p os em tem p os . Ma s qu e p od e d a r a t r a géd ia à qu eles qu e es tã o a b er tos a os
s en tim en tos s im p á ticos
com o a
vela o es tá a o ven t o? Qu a n d o os a ten ien s es s e tor n a r a m m a is ter n os e m a is s en s íveis , n a ép oca d e Pla tã o
a h ! com o es ta va m
a in d a lon ge d a fa ls a s en s ib ilid a d e d os h a b ita n tes d e n os s a s gr a n d es e d e n os s a s p equ en a s cid a d es !
os filós ofos já s e
qu eixa va m , con tu d o, d o ca r á ter nocivo d a t r a géd ia . Um a ép oca cheia de perigos, como aquela que começa neste momento, em que a
b r a vu r a
e a
vir ilid a d e a u m en t a m
d e p r eço, t a lvez t or n e
lentamen te a s a lm a s b a s t a n te d u r a s , p a r a qu e p oeta s tr á gicos lh es
s eja m
supérfluos
n eces s á r ios : m a s , en tr em en tes , es tes
s ã o a n tes
p a r a u tiliza r o ter m o m a is m od er a d o.
Talvez
ch egu e a s s im p a r a a m ú s ica u m a ép oca m elh or (s er á cer ta m en te mais maldosa!), aquela em qu e os a r tis ta s m ú s icos tiver em d e s e d ir igir a h om en s r igor os a m en te p es s oa is , d u r os em s i m es m os , dominados pela seriedade sombria de sua paixão própria: mas que p od e tr a zer a m ú s ica a es s a s a lm a zin h a s d e h oje, n a s cid a s com uma
id a d e
feita ,
exces s iva m en te
a gita d a s ,
de
cr es cim en to
imperfeito, pessoais pela metade, curiosas e ávidas de tudo?
173. OS APOLOGISTAS DO TRABALHO
Na glor ifica çã o d o
trabalho , n os in fa tigá veis d is cu r s os
s ob r e a b ên çã o d o tr a b a lh o , vejo a m es m a s egu n d a in ten çã o qu e n os elogios d os a tos im p es s oa is e d e in ter es s e ger a l: o tem or d e tu d o o qu e é in d ivid u a l. Agor a n os d a m os r ea lm en te con ta , p er a n te o tr a b a lh o noite
is to é, d es s a d u r a a tivid a d e d a m a n h ã à
qu e es s a é a m elh or p olícia , p ois ela m a n t ém ca d a u m
com r éd ea s cu r ta s e s e em p en h a vigor os a m en te a evita r o d es en volvim en to
da
r a zã o,
d os
d es ejos ,
do
gos to
da
in d ep en d ên cia . De fa t o, o tr a b a lh o u s a a for ça n er vos a em proporções extraordinárias e a subtrai à reflexão, à meditação, aos s on h os , a os d es ejos , a o a m or e a o ód io, coloca s em p r e d ia n te d os olh os u m ob jetivo m es qu in h o e a s s egu r a s a tis fa ções fá ceis e r egu la r es . As s im , u m a s ocied a d e em qu e s e tr a b a lh a s em ces s a r d u r a m en te ter á m a ior s egu r a n ça : e é a s egu r a n ça qu e h oje s e adora como divindade suprema.
E aí está (ó horror!) justamente
o trabalhador qu e s e tor n ou perigoso! Os in d ivíd u os p er igos os for m iga m ! E
a tr á s
d eles
es tá
o
p er igo
d os
p er igos
o
individuum17!
174. MODA MORAL DE UMA SOCIEDADE MERCANTIL Por tr á s d es s e p r in cip io d a a tu a l m od a m or a l:
As a ções
m or a is s ã o a s a ções d e s im p a tia p a r a com os ou tr os , vejo d om in a r o in s tin to s ocia l d o tem or qu e a s s u m e a s s im u m d is fa r ce in telectu a l: es s e in s tin to p õe com o p r in cíp io s u p er ior , o m a is im p or ta n te e o m a is p r óxim o, qu e é n eces s á r io r etir a r d a vid a o caráter perigoso qu e p os s u ía ou tr or a e qu e cad a u m d eve a ju d a r n is s o com tod a s a s s u a s for ça s . É p or es s a r a zã o qu e u n ica m en te a s a ções qu e vis a m à s egu r a n ça coletiva e a o s en tim en to d e s egu r a n ça d a s ocied a d e p od em r eceb er o a tr ib u to d e
bom !
Qu ã o p ou cos p r a zer es d evem d es d e logo ter os h om en s p a r a
con s igo m es m os , p a r a qu e ta l tir a n ia d o tem or lh es p r es cr eva a lei m or a l
s u p er ior ,
para
qu e
se
d eixem
a s s im
in tim a r
s em
con tes ta çã o p a r a n ã o tir a r ou d es via r o olh a r d e s u a p r óp r ia p es s oa , m a s ter olh os d e lin ce p a r a tod a m is ér ia , p a r a tod o s ofr im en to d os ou tr os ! Com n os s a in ten çã o, im p elid a a té o extr em o, d e qu er er a p a r a r tod a s a s a s p er eza s e tod os os â n gu los da
vid a ,
não
es ta m os
no
ca m in h o
cer to
para
r ed u zir
a
h u m a n id a d e a té tr a n s for m á -la em a reia ? E m a r eia ! Um a a r eia fin a , tên u e, gr a n u los a , in fin ita ! É es te s eu id ea l, ó h er óis d os s en tim en t os s im p á ticos ?
E n tr et a n to, r es ta s a b er s e p or ven tu r a
s e s er ve mais a o p r óxim o cor r en d o im ed ia ta m en t e e s em ces s a r em s eu s ocor r o e ajudando-o
o qu e s ó p od e s er feito m u ito
superficialmente, a m en os qu e s e s e tor n e p en h or a tir â n ica
ou
fazendo d e s i m es m o a lgo qu e o p r óxim o vê com p r a zer , p or exem p lo, u m b elo ja r d im tr a n qü ilo e fech a d o qu e p os s u a a lta s m u r a lh a s con tr a a s tem p es ta d es e a p oeir a d a s gr a n d es es tr a d a s , mas também uma porta acolhedora.
175. P ENSAMENTO FUNDAMENTAL DE UMA CULTURA DE COMERCIANTES Vem os h oje for m a r -s e, em d iver s os lu ga r es , a cu ltu r a d e u m a s ocied a d e em qu e o comércio é a a lm a , p r ecis a m en te com o o com b a te s in gu la r er a a a lm a d a cu lt u r a en tr e os a n tigos gr egos , e a gu er r a , a vit ór ia e o d ir eit o en tr e os r om a n os . Aqu ele qu e exer ce o com ér cio s e d ed ica a t a xa r tu d o s em p r od u zir , a ta xa r segundo a s n eces s id ad es d o con s u m id or e n ã o s egu n d o s u a s n eces s id a d es p es s oa is ; n o n egócio d ele a p er gu n t a d a s p er gu n t a s é s a b er que p es s oa s e qu a n t a s p es s oa s con s om em is s o? E m p r ega , d es d e logo, p or ta n to, in s tin tiva m en te e s em ces s a r es s e t ip o d e ta xa çã o: a tu d o, p or ta n t o t a m b ém à s p r od u ções d a s a r tes e d a s ciên cia s , d os p en s a d or es , d os s á b ios , d os a r tis ta s , d os h om en s d e E s ta d o, d os
p ovos , d os p a r tid os e m es m o d e ép oca s in teir a s : ele s e in for m a a r es p eito d e tu d o o qu e s e cr ia , d a ofer ta e d a p r ocu r a , a fim d e fix ar p a ra s i m es m o o v alor d e u m a cois a . Isso, erigido em princípio d e tod a u m a cu ltu r a , es tu d a d o d es d e o ilim ita d o a té o m a is s u til e imposto a toda espécie de querer e de saber, isso será o orgulho de vocês , h om en s d o p r óxim o s écu lo: s e os p r ofeta s d a cla s s e d os com er cia n t es t êm r a zã o em lh es p r om eter a p os s e! Ma s ten h o p ou ca fé n es s es p r ofeta s . Cred a t ju d a eu s Apella 18
p a r a falar
com Horácio.
176. A CRÍTICA DOS PAIS Por que já suportamos agora a verdade sobre o passado mais r ecen te? Por qu e exis te s em p r e u m a n ova ger a çã o qu e s e s en te em contradição com es s e p a s s a d o e qu e s a b or eia , n es s a cr ítica , p r im ícia s d o s en tim en to d e p od er . An tiga m en t e, p elo con tr á r io, a ger a çã o n ova qu er ia s e basear n a a n tiga e com eça va a ter con s ciên cia d e s i m es m a n ã o s om en te a ceit a n d o a s op in iões d os p a is , m a s d efen d en d o-a s com m a is rigor a in d a , s e p os s ível. Cr itica r a a u tor id a d e p a ter n a er a ou tr or a u m vício: h oje os joven s idealistas começam por isso.
177. APRENDER A SOLIDÃO Oh ! p ob r es d ia b os , vocês qu e h a b ita m a s gr a n d es cid a d es d a p olítica
m u n d ia l,
a cr ed ita m
qu e
é
acontecim en tos (
joven s s eu
d ot a d os ,
d ever
dar
tor tu r a d os s eu
p a lp it e
p ela em
a m b içã o, tod os
os
p ois s em p r e a con tece a lgu m a cois a )! Vocês
a cr ed ita m qu e, a o leva n ta r a s s im p oeir a e fa zer b a r u lh o, s ã o a ca r r oça d a h is tór ia ! Vocês es p ia m s em p r e e es p er a m s em ces s a r o m om en to em qu e p od er ã o joga r s u a p a la vr a a o p ú b lico e p er d em a s s im tod a ver d a d eir a p r od u tivid a d e! Qu a lqu er qu e s eja s eu
d es ejo d e gr a n d es ob r a s , o p r ofu n d o s ilen cio d o a m a d u r ecim en t o n u n ca ch ega a t é vocês ! O a con tecim en to d o d ia os exp u ls a d e s u a fr en te com o p a lh a leve, en qu a n to vocês têm a ilu s ã o d e a p a n h a r o acontecimento
pobres d ia b os !
S em p r e qu e s e qu er s er u m
herói na cena, não se deve nem pensar em saber como atua o coro.
178. AQUELES QUE UTILIZAMOS COTIDIANAMENTE E s s es
joven s
n ã o t êm
fa lt a
n em
d e ca r á ter , n em
de
d is p os içã o, n em d e a p lica çã o: m a s n u n ca lh es d em os tem p o p ara se
d a r em
a
si
m es m os
uma
d ir eçã o,
p elo
con t r á r io,
os
h a b it u a m os , d es d e s u a m a is ten r a id a d e, a r eceb er u m a d ir eçã o. Qu a n d o es ta va m m a d u r os p a r a s er em a gim os d e m od o d ifer en te
en via d os a o d es er to ,
n ós os u tiliza m os , os s u b tr a ím os a s i
p r óp r ios , os cr ia m os p a r a s er em u s a d os cotid ia n a m en te, fizemos disso um dever e um princípio para eles
e agora eles não podem
p a s s a r s em is s o e n ã o qu er em qu e s eja d e ou tr a for m a . Ma s a es s a s p ob r es b es ta s d e ca r ga n ã o s e d eve r ecu s a r s u a s férias a s s im é qu e s e d es ign a es s e id ea l for ça d o d e u m s écu lo es gota d o: fér ia s em qu e s e p od e u m a vez fica r p r egu iços o com o cor a çã o cheio de alegria, ser estúpido e infantil.
179. T ÃO POUCO E STADO QUANTO POSSÍVEL! Tod a s a s s itu a ções p olítica s e s ocia is n ã o m er ecem qu e s eja m ju s ta m en t e os es p ír itos m a is d ota d os qu e t en h a m o d ir eito d e s e ocu p a r d ela s e qu e s eja m for ça d os a is s o: u m ta l d es p er d ício d os es p ír itos é n o fu n d o m a is gr a ve qu e u m es ta d o d e m is ér ia . A p olítica é o ca m p o d e tr a b a lh o p a r a cér eb r os m a is m ed íocr es e es s e ca m p o d e tr a b a lh o n ã o d ever ia es ta r a b er to a ou tr os : qu e a m á qu in a s e qu eb r e a n tes em m il p ed a ços d e u m a vez p or tod a s ! Ma s com o a s cois a s s e a p r es en ta m h oje, qu a n d o n ã o s om en te
tod os cr êem d ever saber ca d a d ia o qu e s e p a s s a , m a s qu a n d o cada um quer intervir ativamente a todo instante e abandona para is s o s eu p r óp r io tr a b a lh o, tu d o s e tr a n s for m a n u m a gr a n d e e r id ícu la lou cu r a . A es t e p r eço, p a ga m os ca r o d em a is a segurança pública : e o que há de mais louco é que desse modo engendramos ca d a vez m a is o con tr á r io d a s egu r a n ça p ú b lica , com o n os s o excelen te s écu lo es tá d em on s tr a n d o: com o s e is s o n u n ca tives s e s id o feito! Da r à s ocied a d e a s egu r a n ça con tr a os la d r ões e con tr a os in cên d ios , t or n á -la in fin it a m en t e côm od a p a r a t od a es p écie d e com ér cio e d e r ela ções e tr a n s for m a r o E s ta d o em p r ovid ên cia , n o b om e n o m a u s en tid o
es s es s ã o ob jet ivos in fer ior es , m ed íocr es
e d e m od o a lgu m in d is p en s á veis , a qu e n ã o s e d ever ia vis a r com os meios e os instrumentos mais nobres que se tenha
meios que
d ever ia m p r ecis a m en te s er r es er va d os a os fin s s u p er ior es e a os excep cion a is ! Nos s a ép oca , em b or a fa le m u ito d e econ om ia , é dissipadora: dissipa o que há de mais precioso: o espírito.
180. AS GUERRAS As gr a n d es gu er r a s con tem p or â n ea s s ã o o r es u lta d o d os estudos históricos.
181. GOVERNAR Un s gover n a m p elo p r a zer d e gover n a r , ou tr os p a r a n ã o serem governados:
entre dois males, escolheram o menor.
182. A LÓGICA GROSSEIRA Diz-s e d e a lgu ém , com o m a is p r ofu n d o r es p eito: h om em d e ca r á ter !
É um
S im ! S e exib ir u m a lógica gr os s eir a , u m a
lógica qu e s a lta a os olh os m en os cla r ivid en tes ! Ma s qu a n d o s e tr a ta d e u m es p ír ito m a is s u til e m a is p r ofu n d o, con s eqü en te à
s u a m a n eir a , a m a n eir a s u p er ior , os es p ect a d or es n ega m a exis tên cia d o ca r á ter . É p or is s o qu e os h om en s d e E s ta d o a s tu t os ger a lm en t e r ep r es en ta m s u a com ed ia s ob a m á s ca r a d a lógica grosseira.
183. OS VELHOS E OS JOVENS Há a lgo d e im or a l n a exis tên cia d os p a r la m en tos p en s a a in d a es t e ou a qu ele
assim
p ois tem os o d ir eito d e a li exp or
ta m b ém op in iões con tr a o gover n o!
Devem os ter s em p r e s ob r e
a s cois a s a op in iã o qu e n os s o m es tr e e s en h or or d en a !
é o
d écim o p r im eir o m a n d a m en to d e cer tos b r a vos cér eb r os velh os , s ob r etu d o n a Alem a n h a d o n or t e. Rim os d is s o com o d e u m a m od a a n tiqu a d a : m a s a n t iga m en te er a es t a a m or a l! Ta lvez u m d ia ta m b ém va m os r ir d a qu ilo qu e, n a ger a çã o n ova ed u ca d a n o p a r la m en ta r is m o, p a s s a a gor a p or m or a l: qu er o d izer , coloca r a p olítica d os p a r t id os a cim a d a s a b ed or ia p es s oa l e r es p on d er a cada pergunta que se refere ao bem público segundo o vento que é n eces s á r io p a r a en fu n a r a s vela s d o p a r tid o. Deve-s e ter a es s e r es p eito a op in iã o qu e a s it u a çã o d o p a r tid o exige
es s es s er ia m
os ter m os d o câ n on . Agor a fa zem os , a s er viço d e s em elh a n te moral, toda espécie de sacrifícios, até a vitória sobre nós mesmos e o martírio.
184. O E STADO, UM PRODUTO DOS ANARQUISTAS Nos p a ís es em qu e os h om en s s ã o d is cip lin a d os , s u b s is tem s em p r e b a s ta n tes r et a r d a tá r ios n ã o d is cip lin a d os : im ed ia ta m en te s e ju n ta m a os ca m p os s ocia lis ta s , m a is qu e em qu a lqu er ou t r o lu ga r . S e es tes vies s em u m d ia a d it a r leis, pode-s e es p er a r qu e s e im p or ia m cor r en tes d e fer r o e qu e exer cer ia m u m a d is cip lin a terrível:
eles s e con h ecem ! E s u p or ta r ia m es s a s leis com a
con s ciên cia d e qu e eles p r óp r ios a s p r om u lga r a m
o s en tim en to
d e p od er , e d es s e p od er , é d em a s ia d o r ecen te n eles e d em a s ia d o sedutor para que não sofram tudo por amor dele.
185. MENDIGOS É n eces s á r io s u p r im ir os m en d igos , p ois n os ir r ita m os a o lhes dar e ao não lhes dar.
186. H OMENS DE NEGÓCIOS S eu s n egócios
es s es s ã o s eu s m a ior es p r econ ceitos , p ois
eles os liga m a o loca l em qu e vocês es tã o, à s u a s ocied a d e, a s eu s gos tos . Ap lica d os n os n egócios
m a s p r egu iços os n o qu e d iz
r es p eito a o es p ír ito, s a tis feitos com s u a in s u ficiên cia , o b a lcã o d o d ever fixa d o a es s a s a tis fa çã o: é a s s im qu e vocês vivem , é a s s im que querem que seus filhos sejam!
187. UM FUTURO POSSÍVEL Não se poderia imaginar um estado social em que o malfeitor s e d ecla r a s s e ele p r óp r io cu lp a d o, p r on u n cia s s e ele p r óp r io publicamente sua pena, como o sentimento orgulhoso que honra a lei qu e ele p r óp r io fez, qu e exer ce s eu p od er p u n in d o-s e, o p od er d o legis la d or ? Pod e fa lh a r u m a vez, m a s p or s u a p u n içã o volu n tá r ia s e eleva a cim a d e s eu d elito; n ã o s om en te o a p a ga p or s u a fr a n qu eza , p or s u a gr a n d eza e p or s u a t r a n qü ilid a d e, m as acrescenta-lh e a in d a u m cr im in os o d e u m
b en efício p ú b lico.
E s s e s er ia o
fu tu r o p os s ível, qu e s u p õe, é ver d a d e, a
exis tên cia d e u m a legis la çã o d o fu t u r o com a id éia fu n d a m en ta l: E u m e s u b m et o s om en te à lei qu e eu m es m o p r om u lgu ei, n a s gr a n d es e n a s p equ en a s cois a s . Mu ita s ten ta t iva s d evem a in d a ser feitas! Muitos futuros devem ainda ver o dia!
188. E MBRIAGUEZ E NUTRIÇÃO Os p ovos s ó s ã o t ã o en ga n a d os p or qu e procuram s em p r e u m en ga n a d or , is to é, u m
vin h o excita n te p a r a
s eu s
s en tid os .
Con t a n to qu e p os s a m ob ter es s e vin h o, con t en ta m -s e com p ã o d e má
qu a lid a d e.
alimentação
A
em b r ia gu ez
lh es
in ter es s a
m a is
qu e
a
es ta é a is ca com qu e s em p r e s e d eixa m p es ca r !
Qu e s ign ifica m p a r a eles h om en s es colh id os em s u a s fileir a s m es m o qu e fos s em os es p ecia lis ta s m a is com p et en t es de
con qu is ta d or es
ilu s tr es ,
de
velh a s
e
a o la d o
s u n tu os a s
ca s a s
p r in cip es ca s ? Com o m ín im o s er ia n eces s á r io qu e o h om em d o p ovo, p a r a ter s u ces s o, lh es a b r is s e a p er s p ect iva d e con qu is ta s e d e a p a r a to: is s o o leva r ia ta lvez a con s egu ir cr éd ito. Os p ovos ob ed ecem s em p r e e vã o m a is lon ge a in d a , com a con d içã o d e p od er em b r ia ga r -s e! Nã o tem os a té m es m o o d ir eito d e lh es ofer ecer o p r a zer s em a cor oa d e lou r os , cu ja for ça en lou qu ece. Ma s es s e gos to p op u la r es co qu e con s id er a a e m bria gu ez m a is importa n te qu e a n u triçã o n ã o s u r giu
d e m od o a lgu m
das
p r ofu n d eza s d o p op u la ch o: foi, p elo con tr á r io, tr a n s p or ta d o e tr a n s p la n ta d o p a r a cr es cer ta r d ia m en t e com m a is a b u n d â n cia , em b or a ten h a s u a or igem n a s in teligên cia s m a is a lta s , on d e flor es ceu d u r a n t e m ilh a r es d e a n os . O p ovo é o u lt im o terreno in cu lto on d e daninha. con fia r a
p od e
a in d a
p r os p er a r
es s a
es p len d or os a
er va
Com o! E é ju s ta m en te a o p ovo qu e s e gos ta r ia d e p olítica ? Pa r a
qu e n ela
a lim en t e s u a
em b r ia gu ez
cotidiana?
189. S OBRE A GRANDE POLÍTICA Qua lqu er qu e s eja a p a r t e qu e tom em , n a gra n d e política , o in ter es s e e a va id a d e d os in d ivíd u os com o d os p ovos , a for ça m a is
viva qu e os im p ele a a va n ça r é a n eces s id a d e d e pod er qu e, n ã o s om en te n a a lm a d os s ob er a n os e d os p od er os os , m a s ta m b ém , e n ã o em m ín im a p a r t e, n a s ca m a d a s in fer ior es d o p ovo, b r ota d e tem p os em tem p os d e fon tes in es gotá veis . O m om en t o volta s em p r e on d e a s m a s s a s es tã o p ron ta s a s a cr ifica r s u a vid a , s u a Ch ega s em p r e u m m om en to em qu e a m a s s a es t á d is p os ta a arriscar a sua vida, sua fortuna, sua consciência, sua virtude para ob ter es s e p r a zer s u p er ior e p a r a r ein a r , com o n a çã o vitor ios a e tir a n ica m en te a r b itr á r ia , s ob r e ou tr a s n a ções (ou p elo m en os p a r a im a gin a r qu e r ein a m ). E n t ã o os s en tim en tos d e p r od iga lid a d e, d e s a cr ifício, d e es p er a n ça , d e con fia n ça , d e a u d á cia extr em a , de en tu s ia s m o b r ota m com ta l a b u n d â n cia qu e o s ob er a n o a m b icios o ou p r evid en te com s a b ed or ia p od e tom a r o p r im eir o p r etexto p a r a u m a gu er r a e s u b s tit u ir à s u a ju s tiça a b oa con s ciên cia d o p ovo. Os grandes conquistadores sempre tiveram nos lábios a linguagem p a tética d a vir tu d e: es ta va m s em p r e r od ea d os d e m a s s a s qu e s e en con tr a va m em es ta d o d e exa lt a çã o e s om en te qu er ia m ou vir d is cu r s os exa lt a d os . E s tr a n h a lou cu r a d os ju ízos m or a is ! Qu a n d o o h om em exp er im en ta u m s en tim en to d e p od er , ele s e ju lga e s e declara bom: e é ju s ta m en te en tã o qu e os ou tr os , s ob r e os qu a is é ob r iga d o a desencadear s eu p od er , o d ecla r a m mau!
Hesíodo19,
em s u a fá b u la d a s id a d es d o h om em , d es cr eveu d u a s vezes s egu id a s a m es m a ép oca , a qu ela d os h er óis d e Hom er o, e é a s s im qu e d e uma s ó ép oca fez duas: vis ta p or a qu eles qu e for a m s u b m etid os a o d om ín io ter r ível, à es p a n tos a p r es s ã o d es s es h er óis a ven tu r eir os d a for ça ou qu e d eles h a via m ou vid o fa la r s eu s antepassados, essa época aparecia como má: mas os descendentes d es s a s ger a ções ca va leir es ca s ven er a va m n ela u m b om velh o tem p o, qu a s e feliz. É p or is s o qu e o p oeta n ã o con s egu iu ter ou tr a s a íd a s en ã o a qu ela qu e a p r es en tou
p ois tin h a p r ova velm en te
em torno dele ouvintes dos dois tipos!
190. A ANTIGA CULTURA ALEMÃ Qu a n d o os a lem ã es com eça r a m a s e tor n a r in ter es s a n tes p a r a os ou tr os p ovos d a E u r op a tem p o d ep ois d is s o
e n ã o s e p a s s ou a in d a m u ito
foi gr a ça s a u m a cu lt u r a qu e h oje já n ã o
p os s u em , d a qu a l s e lib er t a r a m com u m a r d or cego, com o s e fos s e uma d oen ça : e n o en ta n t o n ã o s ou b er a m coloca r n a d a m elh or em s eu lu ga r d o qu e a lou cu r a p olítica e n a cion a l. É ver d a d e qu e com is s o a ca b a r a m p or s e tor n a r m u ito m a is in ter es s a n tes a in d a p a r a os ou tr os p ovos d o qu e ou tr or a tin h a m s id o p or s u a cu lt u r a : deixemos -lh es , p or ta n to, es s a s a tis fa çã o! É , n o en t a n to, in egá vel qu e es s a cu ltu r a a lem ã en ga n ou os eu r op eu s e qu e ela n ã o er a d ign a n em d e s er im ita d a n em d o in t er es s e qu e d es p er ta r a e m en os a in d a d o a n s eio qu e h a via em cop iá -la . Ten tem os n os in for m a r
h oje
s ob r e
S ch iller ,
Wilh elm
von
Hu m b old t,
S ch leier m a ch er , Hegel, S ch ellin g 20, ler s u a s cor r es p on d ên cia s e ten tem os n os in tr od u zir n o va s to cír cu lo d e s eu s d is cíp u los : qu e têm eles d e com u m , qu a l d eles n os im p r es s ion a , ta l com o s om os h oje, or a d e u m a for m a tã o in s u p or tá vel, or a d e u m a m a n eir a tã o toca n te e d ign a d e p en a ? Por u m la d o, a â n s ia d e p a r ecer a qu a lqu er p r eço m or a lm en te comovido; p or ou tr o la d o, o d es ejo d e u m a u n iver s a lid a d e b r ilh a n te e s em con s is tên cia , a s s im com o a in ten çã o d elib er a d a d e ver tu d o b elo (ca r a cter es , p a ixões , ép oca s , costumes)
in felizm en te es s e
belo
cor r es p on d ia a u m m a u
gos to va go qu e, n o en ta n to, s e va n glor ia va d e s er d e or igem gr ega . É u m id ea lis m o ter n o, b on a ch ã o, com r eflexos p r a tea d os , qu e a cim a d e t u d o qu er ter a titu d es e jeitos n ob r em en te d is fa r ça d os , a lgo d e p r eten s ios o com o d e in ofen s ivo, a n im a d o d e u m a cor d ia l a ver s ã o con tr a a r ea lid a d e
fria ou seca , con tr a a a n a t om ia ,
con tr a a s p a ixões com p leta s , con tr a tod a a es p écie d e con tin ên cia e
de
cet icis m o
filos ófico,
mas
es p ecia lm en te
con tr a
o
con h ecim en to d a n a tu r eza , p or p ou co qu e p os s a s er vir a u m s im b olis m o r eligios o. Goeth e 21 a s s is tia à s u a m a n eir a a es s a s a git a ções d a cu ltu r a a lem ã : coloca n d o-s e à p a r t e, r es is tin d o s u a vem en te, s ilen cios o, a fir m a n d o-s e s em p r e m a is em s eu p r óp r io ca m in h o m elh or . Um p ou co m a is ta r d e, t a m b ém S ch op en h a u er a s s is tiu
a is s o
s egu n d o ele, u m a b oa p a r te d o m u n d o
ver d a d eir o e d a s d ia b r u r a s d o m u n d o h a via m n ova m en te s e tor n a d o
vis íveis
e
fa la va
d is s o
com
ta n t a
gr os s er ia
en tu s ia s m o: p ois n es s a s d ia b r u r a s h a via b eleza !
com o
E , n o fu n d o, o
qu e foi qu e s ed u ziu os es tr a n geir os e os im p ed iu d e s e com p or ta r com o Goeth e e S ch op en h a u er ou s im p les m en t e d e s e a fa s t a r em ? E r a es s e b r ilh o en fr a qu ecid o, es s a en igm á t ica cla r id a d e d e Via Lá ctea qu e r es p la n d ecia em tor n o d es s a cu ltu r a : is s o leva va os es tr a n geir os a d izer : Aí es tá a lgo qu e es t á m u ito, m u ito lon ge d e n ós ; p er d em os a vis t a , o ou vid o, a com p r een s ã o, o s en tid o d a a legr ia e d a a va lia çã o; m a s , a p es a r d e tu d o, p od er ia m m u it o b em s er es tr ela s ! Os a lem ã es ter ia m d es cob er to em s ilên cio u m p equ en o ca n to n o céu on d e s e ter ia m in s ta la d o? É p r ecis o ten ta r s e a p r oxim a r d os a lem ã es . E a p r oxim a r a m -s e d eles ; m a s p ou co tem p o d ep ois , es s es m es m os a lem ã es com eça r a m a t er t r a b a lh o p a r a s e d es em b a r a ça r d es s e b r ilh o d e Via Lá ctea : eles s a b ia m muito bem que não tinham estado no céu
mas numa nuvem!
191. H OMENS MELHORES Dizem-m e qu e n os s a a r t e s e d ir ige a os h om en s d e h oje, á vid os , in s a ciá veis , in d om á veis , d es gos tos os , a t or m en ta d os e qu e lh es
m os tr a
uma
im a gem
da
b ea titu d e,
da
eleva çã o,
da
s u b lim id a d e, a o la d o d a im a gem d e s u a feiú r a : a fim d e qu e
p os s a m d e u m a vez p or tod a s es qu ecer e r es p ir a r livr em en te, ta lvez a té m es m o extr a ir d es s e es qu ecim en to u m in cen tivo à fu ga e à con ver s ã o. Pob r es a r tis ta s , qu e t êm s em elh a n te p ú b lico! Com ta is s egu n d a s in ten ções , d ign a s d o p a d r e e d o m éd ico p s iqu ia t r a ! Qu a n to m a is feliz er a Cor n eille 22
o gr a n d e Cor n eille , com o
excla m a va Ma d a m e d e S évign é 23, com o tom d a m u lh er d ia n te d e um homem completo
como era superior seu público, para o qual
ele p od ia fa zer o b em com a s im a gen s d a s vir tu d es ca va leir es ca s , d o d ever r igor os o, d o s a cr ifício gen er os o, d a h er óica d is cip lin a d e s i m es m o! Qu ã o d iver s a m en te u m e ou tr o a m a va m a exis tên cia , n ã o cr ia d a p or u m a
vontade
cega e in cu lta , qu e m a ld izem os
porque n ã o con s egu im os d es t r u í-la , m a s com o u m lu ga r em qu e a gr a n d eza e a h u m a n id a d e s ã o p os s íve is a o m es m o tem p o e on d e a té m es m o a coa çã o m a is s ever a d a s for m a s , a s u b m is s ã o a o b om p r a zer p r in cip es co ou ecles iá s tico, n ã o p od em s u foca r a a ltivez nem o sentimento cavaleiresco nem a graça nem o espírito de cada in d ivíd u o, m a s s ã o a n tes con s id er a d os com o u m encanto a m a is e um estimulante cuja oposição r efor ça o d om ín io d e s i e a n ob r eza inata, o poder hereditário da vontade e da paixão!
192. D ESEJAR ADVERSÁRIOS PERFEITOS Nã o s e p od er ia con tes t a r a os fr a n ces es qu e for a m o p ovo m a is cris tã o d a ter r a : n ã o qu e n a Fr a n ça a d evoçã o d a s m a s s a s ten h a s id o m a ior qu e em ou tr os lu ga r es , m a s a s for m a s m a is d ifíceis d e r ea liza r o id ea l cr is tã o a li s e en ca r n a r a m em h om en s e não p er m a n ecer a m n o es ta d o d e con cep çã o, d e in ten çã o, d e es b oço im p er feito. Veja -s e Pa s ca l24, n a u n iã o d o fer vor , d o es p ír ito e d a lea ld a d e, o m a ior d e tod os os cr is tã os
e qu e s e p en s e em
tudo o qu e s e tr a t a r ia d e u n ir a qu i! Veja -s e Fén elon 25, a exp r es s ã o m a is p er feita e s ed u tor a d a cu ltu ra ecles iá s tica s ob tod a s a s s u a s
for m a s : u m equ ilíb r io s u b lim e, d o qu a l, com o h is tor ia d or , s e es ta r ia t en t a d o a d em on s tr a r s u a im p os s ib ilid a d e, en qu a n to qu e n a r ea lid a d e s ó foi u m a p er feiçã o d e u m a d ificu ld a d e e d e u m a impr ob a b ilid a d e in fin it a s . Veja -s e Ma d a m e d e Gu yon 26, en tr e s eu s semelhantes, os quietistas franceses: e tudo o que a eloqüência e o a r d or d o a p ós tolo Pa u lo ten ta r a m a d ivin h a r d o es ta d o m a is s u b lim e, m a is a p a ixon a d o, m a is s ilen cios o, m a is exta s ia d o e, n u m a p a la vr a , s em i-d ivin o d o cr is tã o, a qu i t u d o s e tor n ou ver d a d e, d es p oja n d o-s e d es s a in op or tu n id a d e ju d a ica d e qu e s ã o Pa u lo d á m os tr a s p a r a com Deu s , r ejeita n d o-a gr a ça s a u m a in gen u id a d e d e p a la vr a s
e ges tos , a u ten tica m en te fem in in a ,
r efin a d a e d is tin ta com o a con h ecia a a n t iga Fr a n ça . Veja -s e o fu n d a d or d a Or d em d o Tr a p is t a s 27, o ú ltim o qu e levou a s ér io o id ea l a s cético d o cr is tia n is m o, n ã o qu e ele fos s e u m a exceçã o en tr e os fr a n ces es , m a s , p elo con tr á r io, com o ver d a d eir o fr a n cês : p ois , a t é h oje, s u a s om b r ia cr ia çã o n ã o con s egu iu s e a clim a t a r e p r os p er a r s en ã o en tr e os fr a n ces es ; ela os s egu iu n a Als á cia e n a Ar gélia . Nã o es qu eça m os d os h u gu en otes 28: d ep ois d eles n ã o h ou ve a in d a m a is b ela u n iã o d o es p ír ito gu er r eir o e d o a m or a o tr a b a lh o, d os cos tu m es r efin a d os e d a a u s ter id a d e cr is tã . Veja -se a in d a Por t-Royal29, on d e s e ver ifica o ú ltim o flor es cim en to d a gr a n d e er u d içã o cr is tã : n o t oca n te a es s e flor es cim en to, n a Fr a n ça os gr a n d es h om en s com p r een d em m elh or is s o qu e os d e qu a lqu er ou tr o lu ga r . Lon ge d e s er s u p er ficia l, u m gr a n d e fr a n cês con s er va s em p r e s u a s u p er fície, u m en volt ór io n a tu r a l qu e en cob r e s eu con teú d o e s u a p r ofu n d id a d e
en qu a n to qu e a p r ofu n d id a d e de
u m gr a n d e a lem ã o es tá ger a lm en te en cer r a d a n u m a es p écie d e fr a s co es tr a n h a m en t e
en volvid o,
com o
um
elixir
qu e
ten ta
proteger-s e d a lu z e d a s m ã os fr ívola s com s eu d u r a e s in gu la r envoltório.
Qu e s e ten te a d ivin h a r , d ep ois d is s o, p or qu e es s e
p ovo, qu e p os s u i os m a is com p letos d a cr is t a n d a d e, ger ou n eces s a r ia m en te t a m b ém os tip os con t r á r ios m a is com p letos d o livr e p en s a m en to a n ticr is tã o! O es p ír ito livr e fr a n cês , em s eu for o ín tim o, s em p r e lu tou com gr a n d es h om en s e n ã o s om en te com d ogm a s e com s u b lim es a b or tos , com o os es p ír itos livr es d os outros povos.
193. E SPÍRITO E MORAL O a lem ã o qu e p os s u i o s egr ed o d e s er a b or r ecid o com espírito (Geist), s a b er e s en tim en to e qu e s e h a b itu ou a con s id er a r o a b or r ecim en to com o m or a l
o a lem ã o exp er im en ta n o es pírito
fr a n cês o m ed o qu e es te a r r a n qu e os olh os d a m or a l
e es s e
m ed o é s em elh a n te, n o en ta n t o, a o tem or e a o p r a zer d o p a s s a r in h o d ia n t e
da
ca s ca vel.
E n tr e
os
a lem ã es
nenhum talvez tenha tido mais es pírito que Hegel
céleb r es ,
mas tinha um
m ed o a lem ã o t ã o gr a n d e, qu e es s e m ed o cr iou n ele u m es t ilo p a r ticu la r m en te d efeit u os o. O es p ecífico d es s e m a u es tilo consiste em en volver u m n ú cleo, en volvê-lo a in d a e s em p r e, a té qu e m a l tr a s p a s s e, a r r is ca n d o u m olh a r ver gon h os o e cu r ios o
com o o
olh a r d e u m jovem a t r a vés d e s eu véu , p a r a fa la r com E s qu ilo, es s e velh o in im igo d a s m u lh er es :
m a s es s e n ú cleo é u m a
saliên cia es p ir it u a l, m u ita s vezes im p er tin en t e, s ob r e u m a s s u n t o d os m a is in telectu a is , u m a com b in a çã o d e p a la vr a s , s u til e ou s a d a , com o con vém n u m a s ocied ad e d e p en s a d ores , como a ces s ór io d a ciên cia
m a s a p r es en ta d o com es s e r eves t im en to é
a própria ciência abstrusa e o mais completo aborrecimento moral! Os a lem ã es en con tr a r a m n is s o u m a for m a d e es pírito qu e lh es er a p er m itid a e a u s u fr u ír a m com u m en tu s ia s m o tã o d es en fr ea d o que a inteligência penetrante de Schopenhauer ficou estupefata de surpresa
durante t od a
a
su a
vid a
es b r a vejou
con tr a
o
es p etá cu lo qu e lh e ofer ecia m os a lem ã es , m a s n u n ca s ou b e explicá-lo a si.
194. VAIDADE DOS MESTRES DE MORAL O s u ces s o, n o fin a l d a s con ta s m ed íocr e, d os m es tr es d e m or a l s e exp lica p elo fa to qu e qu er ia m m u ita s cois a s d e u m a s ó vez, is to é, er a m m u ito a m b icios os : gos ta va m d em a is d e d ita r preceitos p a ra tod os . Ma s is s o e d iva ga r n a con fu s ã o e fa zer d is cu r s os a os a n im a is p a r a d eles fa zer h om en s : qu e es p a n tos o s e os a n im a is a ch a r em is s o a b or r ecid o! S er ia n eces s á r io es colh er círculos restritos, procurar e encorajar neles certa moral, fazer por exem p lo d is cu r s os a os lob os p a r a fa zer d eles cã es . E n tr eta n to, o gr a n d e s u ces s o fica ger a lm en t e r es er va d o à qu ele qu e n ã o qu er ed u ca r tod os n em cír cu los r es tr itos , m a s u m s ó in d ivíd u o e que n ã o olh a
à
d ir eita
n em
à
es qu er d a . O s écu lo p a s s a d o é
p r ecis a m en te s u p er ior a o n os s o p or qu e p os s u ía ta n t os h om en s ed u ca d os in d ivid u a lm en te, b em com o ed u ca d or es n a m es m a proporção que tinham encontrado nisso a vocação de sua vida
e
com a vocação também a dignidade perante si próprios e diante de qualquer outra boa companhia .
195. O QUE SE COSTUMA CHAMAR EDUCAÇÃO CLÁSSICA Des cob r ir
qu e
a
n os s a
vid a
es tá
consagrada
ao
con h ecim en to; qu e n ós a d es p er d iça r ía m os , n ã o! qu e a ter ía m os d es p er d iça d o, s e es s a con s a gr a çã o n ã o n os p r oteges s e d e n ós mesmos; recitem-se muitas vezes e com emoção estes versos: Destino, eu te sigo! Se não o quisesse, Eu teria de fazê-lo, mesmo em lágrimas! E a gor a , volt a n d o p elo ca m in h o d a vid a , d es cob r ir igu a lm en te qu e ele é a lgo d e ir r ep a r á vel: a d is s ip a çã o d e n os s a
ju ven tu d e, qu a n d o n os s os ed u ca d or es n ã o em p r ega r a m es s es a n os a r d en tes e á vid os d e s a b er p a r a n os gu ia r em d ir eçã o a o conhecimento d a s cois a s , m a s qu e os u tiliza r a m p a r a a educação clássica !
A
d is s ip a çã o
de
n os s a
ju ven tu d e,
qu a n d o
n os
in cu lca va m , com ta n t a fa lt a d e h a b ilid a d e com o com b a r b á r ie, u m s a b er im p er feito, s ob r e os gr egos e os r om a n os , b em com o s ob r e s u a s lín gu a s , a gin d o em d etr im en to d o p r in cip io s u p er ior d e tod a cu ltu r a qu e exige qu e s ó s e d ê a lim en to à qu ele qu e es tá com fome! Qu a n d o n os im p u n h a m , à for ça , a m a tem á tica e a fís ica , em lu ga r d e p r im eir a m en t e n os fa zer p a s s a r p elo d es es p er o d a ign or â n cia e r ed u zir n os s a p equ en a vid a cotid ia n a , n os s a s ocu p a ções , e tu d o o qu e s e p a s s a d a m a n h ã à n oite em ca s a , n o escritório, no céu e na n a tu r eza , com m ilh a r es d e p r ob lem a s h u m ilh a n tes , ir r it a n tes
p r ob lem a s tor tu r a n tes ,
p a r a m os tr a r en tã o a n os s os d es ejos
qu e a cim a d e t u d o tem os necessidade d e u m s a b er m a tem á tico e mecânico e nos ensinar então o primeiro entusiasmo científico que a lógica a b s olu ta d es s e s a b er p r op or cion a ! S e n os tives s em en s in a d o u n ica m en te o res pe ito p or es s a s ciên cia s ; s e tives s em feito tremer de emoção nossa alma, mesmo que uma só vez, diante d a s lu ta s , d a s d er r ota s , d os r etor n os a o com b a t e d os grandes h om en s , d ia n te d o m a r tir ológio, qu e é a h is t or ia d a ciên cia exa t a ! Pelo con tr á r io, ér a m os tom a d os d e cer to d es p r ezo p er a n te ciên cia s ver d a d eir a s em p r oveito d os es tu d os
históricos , d a
instrução
p r óp r ia p a r a d es en volver o es p ír ito e d o classicismo ! E n ós n os d eixa m os
en ga n a r
tã o
fa cilm en te!
In s t r u çã o
p r óp r ia
pa ra
desenvolver o espírito! Não teríamos podido apontar com o dedo os m elh or es p r ofes s or es d e n os s os colégios e p er gu n ta r r in d o: Onde está, pois, essa instrução própria para desenvolver o espírito? E se não
exis t ir ,
com o
p od er ia m
en s in á -la?
E
o
cla s s icis m o!
Ap r en d em os a lgu m a cois a com a qu ilo qu e ju s t a m en te os gr egos
en s in a va m à s u a ju ven tu d e? Ap r en d em os a fa la r com o eles , a es cr ever com o eles ? E xer cita m o-n os s em d es ca n s o n a es gr im a d o diá logo, n a d ia lética ? Ap r en d em os a m over -n os com b eleza e a ltivez, a r iva liza r n a lu ta , n o jogo, n o p u gila t o, com o eles ? Ap r en d em os a lgu m a cois a d o a s cetis m o p r á tico d e tod os os filós ofos gr egos ? Fom os exer cit a d os n u m a ú n ica vir t u d e a n tiga e d a for m a com qu e os a n t igos s e exer cita va m n ela ? Nã o fa lt ou in teir a m en te à n os s a ed u ca çã o t od a m ed ita çã o s ob r e a m or a l, e logo, com m a ior r a zã o o qu e con s titu i s u a ú n ica cr itica p os s ível, es s a s ten ta tiva s s ever a s e cor a jos a s d e viver s egu n d o es ta ou a qu ela m or a l? Ten ta m os , p or p ou co qu e fos s e, d es p er ta r em n ós u m d os s en tim en tos qu e os a n tigos es tim a va m m a is qu e os m od er n os ? Ap r es en ta va m -n os a d ivis ã o d o d ia e d a vid a e os ob jet ivos
qu e
um
es p ír ito
a n tigo
pu n ha
a cim a
da
vid a ?
Ap r en d em os a s lín gu a s a n tiga s com o a p r en d em os a s lín gu a s viva s is to é, p a r a fa la r , p a r a fa lá -la s cor r eta m en t e e b em ? E m lu ga r a lgu m u m a a p tid ã o r ea l, u m a fa cu ld a d e n ova , com o r es u lta d o d es s es a n os d ifíceis ! Ma s u n ica m en t e in for m a ções s ob r e o qu e os h om en s s a b ia m e p od ia m fa zer ou tr or a ! E qu e in for m a ções ! An o a p ós a n o, n a d a m e p a r ecia m a is evid en te qu e o m u n d o gr ego e a n tigo, a p es a r d a s im p licid a d e e d a n otor ied a d e em qu e p a r ece s e exib ir d ia n te d e n ós , é m u ito d ifícil d e com p r een d er e p ou co a ces s ível e qu e a fa cilid a d e h a b itu a l com qu e s e fa la d os a n tigos é r ea lm en te
a
levia n d a d e
ou
a
velh a
va id a d e h er ed itá r ia
da
ir r eflexã o. A s em elh a n ça d a s p a la vr a s e d a s id éia s n os en ga n a : m a s p or tr á s d eles s e ocu lta s em p r e u m s en tim en to qu e d everia parecer es tr a n h o e in com p r een s ível p a r a a s en s ib ilid a d e m od er n a . E s s es er a m os d om ín ios em qu e a s cr ia n ça s tin h a m o d ir eito d e s e d iver tir ! J á b a s t a qu e o t en h a m os feit o qu a n d o cr ia n ça s e qu e ten h a m os a n ga r ia d o qu a s e u m a a n tip a tia d efin itiva con tr a a
a n tigu id a d e,
a n tip a tia
n a s cid a
de
uma
fa m ilia r id a d e
a p a r en t em en te d em a s ia d o gr a n d e! De fa t o, a ilu s ã o d e n os s os ed u ca d or es clá s s icos , qu e p r eten d ia m d e a lgu m a for m a es t a r d e p os s e d os a n tigos , é t a m a n h a qu e r es p la n d ece n a qu eles qu e eles ed u ca m com a id éia qu e, em b or a n ã o s eja feita p a r a t or n a r felizes , es s a p os s e p od e p elo m en os b a s ta r a p ob r es velh os r a tos d e b ib liot eca , b r a vos e tolos .
Qu e eles gu a r d em s eu tes ou r o, qu e
cer ta m en te é d ign o d eles !
com
es s a s ilen cios a s egu n d a
in ten çã o s e com p letou n os s a ed u ca çã o clá s s ica . irreparável
Tu d o is s o é
p elo m en os p a r a n ós ! Ma s n ã o p en s em os s om en te
em nós!
196. AS PEGUNTAS MAIS PESSOAIS SOBRE A VERDADE O qu e é qu e r ea lm en te faço? Qu e p r eten d o a lca n ça r exa t a m en te com is s o?
es s a é a qu es tã o d a ver d a d e, qu e n ã o s e
en s in a n o es ta d o a tu a l d e n os s a cu lt u r a e qu e, p or con s egu in te, n ã o a coloca m os , p ois n ã o s e d is p or ia d e tem p o. Por ou tr o la d o, d izer tolices à s cr ia n ça s em vez d e lh es fa la r a ver d a d e, d izer a m a b ilid a d es à s m u lh er es e n ã o lh es fa la r a ver d a d e, fa la r a os joven s d e s eu fu tu r o e d e s eu s p r a zer es e n ã o d a ver d a d e is s o en con tr a m os tem p o e p r a zer ! s eten ta a n os !
para
Ma s ta m b ém , o qu e s ã o
p a s s a m d ep r es s a ; im p or ta tã o p ou co qu e a on d a
s a ib a p a r a on d e a leva o m a r ! Pod er ia a té m es m o h a ver n is s o alguma prudência ao não o saber.
Admitamos: mas é uma falta
d e b r io n ã o qu er er s equ er s e informar, n os s a civiliza çã o n ã o t or n a os homens altivos.
Tanto melhor.
Realmente tanto melhor?
197. A HOSPITALIDADE DOS ALEMÃES CONTRA O ILUMINISMO Pa s s em os em r evis ta a s con tr ib u ições qu e, p or s eu t r a b a lh o intelectual, os alemães da primeira metade deste século trouxeram
p a r a a cu ltu r a ger a l e, em p r im eir o lu ga r , os filós ofos a lem ã es : a lca n ça r a m o gr a u p r im itivo d a es p ecu la çã o, p ois s e s a tis fa zia m com con ceitos em vez d e exp lica ções , com o os p en s a d or es d a s ép oca s vis ion á r ia s
ressus cita r a m u m a es p écie d e filos ofia p r é-
cien t ífica . E m s egu n d o lu ga r , os h is tor ia d or es e os r om â n ticos a lem ã es : s eu s es for ços ger a is for a m or ien ta d os n o s en tid o d e colocar em lu ga r d e h on r a s en tim en tos a n tigos e p r im itivos , p a r ticu la r m en te
o cr is tia n is m o,
a
a lm a
p op u la r ,
as
len d a s
p op u la r es , a lin gu a gem p op u la r , a Id a d e Méd ia , a a s ces e or ien ta l, o h in d u ís m o. E m t er ceir o lu ga r , os s á b ios : lu t a r a m con tr a o es p ír it o d e Newton 30 e d e Volta ir e 31 e t en t a r a m r es ta b elecer , com o Goeth e e S ch op en h a u er , a id éia d e u m a n a tu r eza d ivin iza d a ou s a ta n iza d a , e a s ign ifica çã o tot a lm en te m or a l e s im b ólica d es s a id éia . A p r in cip a l ten d ên cia d os a lem ã es s e op u n h a , em s eu con ju n to, a o Ilu m in is m o e ta m b ém à r evolu çã o d a s ocied a d e qu e, p or u m gr os s eir o m a l-en ten d id o, p a s s a va p or s er conseqüência d a qu ele: a
p ied a d e
p ela s
cois a s
es ta b elecid a s
ten d ia
a
se
tr a n s for m a r em p ied a d e p or tu d o o qu e h a via s id o es ta b elecid o ou tr or a , u n ica m en t e p a r a p er m itir qu e o cor a çã o e o es p ír ito reencontrassem u m a vez m a is s u a p len itu d e e n ã o d es s em m a is esp a ço a p er s p ectiva s fu tu r a s e in ova d or a s . O cu lt o d o s en tim en to foi er gu id o n o lu ga r d o cu lto d a r a zã o e os m ú s icos a lem ã es , en qu a n to a r tis ta s d o in vis ível, d a exa lta çã o, d o len d á r io, d o d es ejo in fin ito, a ju d a r a m a con s tr u ir o n ovo tem p lo, com m a is s u ces s o qu e t od os os a r tis ta s d a p a la vr a e d o p en s a m en to. Mes m o ten d o em con ta o fa t o d e qu e, n o d eta lh e, in ú m er a s cois a s b oa s for a m d ita s e d es cob er ta s e qu e a lgu m a s d es d e en tã o for a m ju lga d a s m a is equ ita tiva m en t e qu e ou tr or a , é n eces s á r io, con tu d o, con clu ir que o con ju n to con s titu ía u m perigo pú blico e, n ã o p ou ca s , o p er igo d e r eb a ixa r , s ob a a p a r ên cia d e u m con h ecim en to tot a l e
d efin itivo d o p a s s a d o, o con h ecim en to em sentimento e função
ger a l a b a ixo d o
para falar com Kant que assim definia sua própria
reab r ir o ca m in h o à fé, fixa n d o s eu s a o s a b er .
Respiremos de novo o ar livre: a hora deste perigo passou! E, coisa es tr a n h a : os es p ír itos qu e os a lem ã es evoca va m ju s ta m en te com ta n t a eloqü ên cia s e tor n a r a m com o tem p o os a d ver s á r ios m a is p er igos os d os d es ígn ios d e s eu s evoca d or es
a h is tór ia , a
com p r een s ã o d a or igem e d a evolu çã o, a s im p a tia p elo p a s s a d o, a p a ixã o r es s u s cita d a d o s en t im en to e d o con h ecim en to, t u d o is s o, d ep ois d e t er s id o p os to d u r a n te a lgu m tem p o a s er viço d o es p ír ito ob s cu r ecid o, exa lt a d o, r etr ógr a d o, r eves t iu u m d ia ou tr a n a tu r eza e a gor a s e eleva , com a s a s m a is a m p la s , s ob os olh os d e seus a n tigos evoca d or es , e s e tom a o gên io for t e e n ovo, justamente d es s e
Ilu m in is m o, con tr a
o
qu a l h a via
s id o
evoca d o.
Ilu m in is m o, com p ete a n ós a gor a fazê-lo p r ogr ed ir im p or ta r m os d e qu e h ou ve u m a
gr a n d e r evolu çã o
E s te
s em n os e ta m b ém
uma gr a n d e r ea çã o con tr a ela , e qu e ta n t o a r evolu çã o com o a r ea çã o exis tem s em p r e: is s o n ã o é, a fin a l, s en ã o jogo d e even tu a is on d a s , em com p a r a çã o com a on d a ver d a d eir a m en te gr a n d e qu e nos arrasta e na qual queremos estar!
198. CONFERIR UMA POSIÇÃO A SEU POVO Ter m u ita s gr a n d es exp er iên cia s in ter ior es e r ep ou s a r n ela s e a cim a d ela s o olh a r d o es p ír ito
a s s im fa zem os h om en s d e
cu ltu r a qu e con fer em u m a p os içã o a s eu p ovo. Na Fr a n ça e n a It á lia , es s e er a o p a p el d a n ob r eza , n a Alem a n h a , on d e a té o p r es en te a n ob r eza s e coloca va , em s eu con ju n to, en t r e os p ob r es de espírito (talvez não continue assim por muito tempo), esse era o papel dos padres, dos professores e de seus descendentes.
199. NÓS SOMOS MAIS NOBRES Fid elid a d e, gen er os id a d e, p u d or d a b oa r ep u ta çã o: es t a s tr ês cois a s r eu n id a s n u m s ó s en tim en t o
é a is to qu e ch a m a m os
n obre, d is tin to, n is s o u ltr a p a s s a m os os gr egos . A n en h u m p r eço qu er em os r en u n cia r a is s o, s ob o p r etext o d e qu e os ob jet os a n tigos d es s a s vir tu d es d eca ír a m em n os s a con s id er a çã o (e com r a zã o), m a s gos ta r ía m os d e s u b s titu ir com p r eca u çã o ob jet os novos a essa herança, a mais preciosa de todas. Para compreender qu e os m a is n ob r es s en tim en tos d os gr egos , n o m eio d e n os s a n ob r eza s em p r e ca va leir es ca e feu d a l, d ever ia m s er vis tos com o m ed íocr es e a p en a s con ven ien tes , é n eces s á r io lem b r a r -s e d es ta s p a la vr a s d e con s olo qu e s a em d a b oca d e Ulis s es n a s s itu a ções ignominiosas:
S u p or ta
is s o, qu er id o cor a çã o! J á
s u p or ta s te
m u it a s ou t r a s cois a s , m a is d etes tá veis a in d a ! Com o u m cã o!32 Pode-s e coloca r em p a r a lelo, com o exem p lo d e a p lica çã o d o m od elo m ítico, a h is t ór ia d a qu ele oficia l a t en ien s e qu e, d ia n t e d e tod o o es ta d o-m a ior , a m ea ça d o com u m b a s tã o p or ou tr o oficial, s a cu d iu a ver gon h a com es t a s p a la vr a s . Bate-m e! Ma s es cu ta -me também! (Foi o qu e fez Tem ís tocles 33, es te h á b il Ulis s es d a ép oca clá s s ica , qu e er a m u ito h om em p a r a d ir igir a s eu
querido
coração , n es s e m om en to ign om in ios o, es ta s p a la vr a s d e con s olo na
a fliçã o).
Os
gr egos
es t a va m
m u ito
lon ge
de
en ca r a r
levia n a m en te a vid a e a m or te p or ca u s a d e u m u lt r a je, com o n ós fa zem os
gr a ça s
a
um
es p ír ito d e
a ven tu r a ,
ca va leir es co e
h er ed itá r io, e d e cer ta n eces s id a d e d e s a cr ifício; m u ito lon ge também estavam de procurar ocasiões de arriscar honrosamente a vid a e a
m or te com o n os
d u elos ; ou
a in d a d e es tim a r a
con s er va çã o d e u m n om e s em m a n ch a (h on r a ) m a is qu e a m á r ep u ta çã o, qu a n d o es ta é com p a tível com a glór ia e o s en tim en to d e p od er ; ou a in d a d e s er fiel a os p r econ ceitos e a os a r tigos d e fé
de uma casta, se com isso corriam o risco de impedir a chegada de u m tir a n o. De fa t o, es te é o s egr ed o p ou co n ob r e d e tod o b om a r is t ocr a ta gr ego: p or u m p r ofu n d o ciú m e tr a t a ca d a u m d os s eu s com p a n h eir os
de
cla s s e
em
pé
de
igu a ld a d e,
mas
es tá
con s ta n t em en te p r on t o a s a lt a r com o u m tigr e s ob r e a p r es a s ob r e o p od er d es p ótico: qu e lh e im p or ta m en tã o a m en tir a , o cr im e, a tr a içã o, a p er d a volu n tá r ia d e s u a cid a d e n a ta l! A ju s tiça er a ext r em a m en te d ifícil a os olh os d es s a es p écie d e h om en s , p a s s a va qu a s e p or qu a lqu er cois a d e in cr ível;
o ju s t o , es ta
p a la vr a s oa va a os ou vid os d os gr egos com o o s a n t o a os ou vid os d os cr is tã os . Ma s qu a n d o S ócr a tes ch ega va a p on to d e d izer
O
h om em vir tu os o é o m a is feliz , n ã o s e a cr ed ita va n os próprios ou vid os , p en s a va -s e t er ou vid o qu a lqu er cois a d e lou co. Por qu e a im a gem d o m a is feliz d os h om en s evoca va em ca d a cid a d ã o d e extr a çã o n ob r e a a u s ên cia t ot a l d e con s id er a çã o, a p er feiçã o d ia b ólica d o tir a n o qu e tu d o e a t od os s a cr ifica à s u a a r r ogâ n cia e a s eu p r a zer . Nos h om en s qu e em s eu s s on h os s ecr etos e s elva gen s s e en ca n t a va m com ta l felicid a d e, a ven er a çã o d o E s ta d o n ã o p od ia s er im p la n t a d a com b a s t a n te p r ofu n d id a d e m a s , n a m in h a op in iã o, os h om en s cu jo d es ejo d e p od er já n ã o con h ece es s a r a iva cega p r óp r ia d es s es n ob r es gr egos n ã o tem h oje t a n t a n eces s id a d e d es s a id ola tr ia d o con ceito d e E s ta d o, graças ao qual púnhamos outrora um freio a seu desejo.
200. S UPORTAR A POBREZA A gr a n d e s u p er ior id a d e d a or igem n ob r e é qu e ela p er m ite suportar melhor a pobreza.
201. F UTURO DA NOBREZA As a tit u d es d o m u n d o a r is tocr á tico m os tr a m qu e em t od os
os s eu s m em b r os o s en tim en to d o p od er joga con s ta n t em en te s eu jogo en ca n t a d or . É a s s im qu e o in d ivíd u o d e n ob r es cos tu m es , h om em ou m u lh er , n ã o s e d eixa leva r a ges tos d e a b a n d on o, evita pôr-s e à von ta d e d ia n te d e tod os , p or exem p lo, n o t r em evita encostar-s e n o es p a ld a r d o a s s en to, p a r ece n ã o s e ca n s a r qu a n d o p er m a n ece d u r a n te h or a s d e p é n o cor r ed or , n ã o con s tr ói s u a ca s a ten d o em vis ta n ã o o con for to, m a s p a r a qu e p r od u za a im p r es s ã o d e a lgo va s to e im p on en te, com o s e ela s e d es tin a s s e à m or a d a d e s er es m a ior es (qu e vivem m a is tem p o), r es p on d e a p a la vr a s p r ovoca n tes com d ign id a d e e cla r eza d e es p ír ito, n ã o com o
se
es tives s e
d es con t r ola d o,
a n iqu ila d o,
en ver gon h ado,
ofega n t e, à m a n eir a d os p leb eu s . As s im com o s a b e con s er va r a a p a r ên cia d e u m a for ça fís ica s u p er ior , s em p r e p r es en te, d es eja igu a lm en te m a n ter , com u m a s er en id a d e e d elica d eza con s ta n t es , m es m o n a s s itu a ções m a is p en os a s , a im p r es s ã o qu e s u a a lm a e seu es p ír ito es tã o à a ltu r a d os p er igos e d a s s u r p r es a s . Um a cu ltu r a a r is t ocr á tica p od e p a r ecer , d o p on to d e vis t a d a s p a ixões , qu er a o ca va leir o qu e exp er im en ta u m violen to p r a zer em fa zer m a r ch a r em p a s s o es p a n h ol u m a n im a l d is tin to e fogos o lembremo-nos da época de Luis XIV
quer ao cavaleiro que sente
s eu ca va lo fu gir d eb a ixo d ele com o u m a for ça d a n a tu r eza e qu e a m b os n ã o es t ã o lon ge d e p er d er a ca b eça , m a s qu e s e s oer gu em com a ltivez, u s u fr u in d o p r a zer os a m en te d e s eu a n d a r : n os d ois ca s os , a cultura a r is tocr á tica r es p ir a o p od er e s e fr eqü en tem en te, em s eu s cos tu m es , n ã o exige m a is qu e a a p a r ên cia d o s en tim en to d e p od er , en tr eta n to, o ver d a d eir o s en t im en to d e s u p er ior id a d e cr es ce s em ces s a r p ela im p r es s ã o qu e es s e jogo p r od u z n a qu eles qu e n ã o s ã o n ob r es e p elo es p et á cu lo d es s a im p r es s ã o.
Essa
felicid a d e in con tes tá vel d a cu ltu r a a r is t ocr á tica , ed ifica d a s ob r e o s en tim en t o d e s u p er ior id a d e, com eça a gor a a eleva r -s e a u m n ível
a in d a s u p er ior , p or qu e, gr a ça s a t od os os es p ír itos livr es , é d or a va n te p er m itid o à qu eles qu e n a s cer a m e for a m ed u ca d os n a n ob r eza
p en etr a r
s em
en fr a qu ecim en to
na
es fer a
do
con h ecim en to, p a r a a li p r ocu r a r con fir m a ções m a is es p ir itu a is e a p r en d er u m a cor t es ia s u p er ior ; é p er m itid o t a m b ém olh a r p a r a es s e id ea l d e s a b ed oria v itorios a que n en h u m a ép oca con s egu iu a in d a p r op or a s i m es m a com tã o b oa con s ciên cia com o a ép oca qu e es tá p r es tes a s u r gir . E , em ú ltim o lu ga r , d e qu e s e ocu p a r ia d e a gor a em d ia n t e a n ob r eza , s e p a r ece ca d a d ia m a is evid en te que é indecente ocupar-se de política?
202. CUIDADOS A TER COM A SAÚDE Ma l com eça m os a r eflet ir s ob r e a fis iologia d os cr im in os os e logo n os en con tr a m os , con tu d o, d ia n te d a im p er ios a cer teza qu e en tr e os cr im in os os e os d oen tes m en ta is n ã o h á d ifer en ça es s en cia l: p os to qu e consideremos a m a n eira corrente d e p en s a r com o a m a n eir a d e p en s a r p r óp r ia d a s aú d e in telectu al. Nenhuma crença é hoje tão bem aceita como esta. Não deveríamos, portanto, ter r eceio d e ext r a ir d a í a s d evid a s con s eqü ên cia s e tr a ta r o cr im in os o com o u m d oen te m en ta l: s ob r etu d o d e n ã o tr a tá -lo com u m a p ied a d e a r r oga n te, m a s com u m a s a b ed or ia e u m a b oa von ta d e d e m éd ico. E le n eces s ita d e m u d a n ça d e a r es e d e s ocied a d e, d e u m a fa s ta m en to m om en tâ n eo, t a lvez d e s olid ã o e d e n ova ocu p a çã o
p er feito! Ta lvez ele veja va n ta gen s em viver cer to
tem p o s ob vigilâ n cia a fim d e en con tr a r d es s e m od o p r ot eçã o con tr a s i p r óp r io e s eu in côm od o in s tin to tirân ico
p er feito! É
n eces s á r io a p r es en ta r -lh e cla r a m en te a p os s ib ilid a d e e os m eios d a cu r a (d e extir p a r , d e tr a n s for m a r , d e s u b lim a r es s e in s tin to) e m es m o, n o p ior d os ca s os , a im p r ob a b ilid a d e d es s a cu r a ; d eve-se ofer ecer a o cr im in os o in cu r á vel, qu e tem h or r or d e s i m es m o, a
op or tu n id a d e d e s e s u icid a r . Per m a n ecen d o is s o r es er va d o, com o u m m eio extr em o d e ob ter a livio, n a d a s e d eve n egligen cia r para, a cim a d e tu d o, r es titu ir m u ita cor a gem e lib er d a d e d e es p ír ito a o cr im in os o; d eve-s e a p a ga r d e s u a a lm a t od os os r em or s os , com o s e is s o foi qu es tã o d e lim p eza , e s u ger ir -lh e os m eios p a r a r em ed ia r e a té com p en s a r la r ga m en te o p r eju ízo qu e ele ca u s ou a a lgu ém p or m eio d e u m b en efício feito a ou t r em , b en efício qu e ta lvez s u p er e o er r o. Tu d o is s o com extr em a ca u t ela e s ob r et u d o no
a n on im a t o
ou
u tiliza n d o
n ovos
n om es ,
com
fr eqü en tes
m u d a n ça s d e r es id ên cia , p a r a qu e a in tegr id a d e d a r ep u t a çã o e a vid a fu tu r a d o cr im in os o cor r a m o m ín im o r is co p os s ível. É ver d a d e qu e a tu a lm en te a qu ele qu e s e s en te p r eju d ica d o qu er sempre vingar-se, a b s tr a çã o feit a d a m a n eir a com o s e p od er ia r em ed ia r es s e p r eju ízo, e s e d ir ige p a r a is s o a os tr ib u n a is
é is to
qu e a s s egu r a a in d a p r ovis or ia m en te a m a n u ten çã o d o n os s o a b om in á vel cód igo cr im in a l, com s u a b a la n ça d e m er ceeir o e sua von ta d e d e com pen s a r a falta com a pen a . Ma s n ã o d ever ía m os s er ca p a zes d e u ltr a p a s s a r is s o? Com o fica r ia a livia d o o s en tim en t o ger a l d a vid a s e, com a cr en ça n a fa lt a , n os p u d és s em os n os d es em b a r a ça r d o velh o in s tin t o d e vin ga n ça e s e con s id er á s s em os qu e é u m a s u til s a b ed or ia d os h om en s felizes a b en çoa r os in im igos , com o fa z o cr is tia n is m o, e faz er o bem à qu eles qu e n os ofen d er a m ! E xp u ls em os d o m u n d o a id éia d e pecado
e
en viem os a tr á s d es te a id éia d e punição! Qu e es s es d em ôn ios em exílio vã o viver d or a va n te lon ge d os h om en s , ca s o ten h a m m es m o qu e
viver
e
não
m or r er
d es gos tos os
de
si
m es m os !
Con s id er em os n o en ta n to, qu e os d a n os ca u s a d os à s ocied a d e e a o in d ivíd u o p elo cr im in os o s ã o a b s olu t a m en te id ên ticos a os d a n os
qu e
os
d oen tes
lh es
ca u s a m : os
d oen tes
es p a lh a m
p r eocu p a çã o, m a u h u m or , n ã o p r od u zem n a d a e con s om em os
r en d im en tos d os ou tr os , n eces s ita m d e vigila n tes , d e m éd icos , d e s u s ten to m a ter ia l e vivem à cu s ta d o t em p o e d a s for ça s d a s p es s oa s s a u d á veis . E n tr eta n to, tr a ta r ía m os com o d es n a t u r a d o quem quisesse vingar-se de tudo isso contra os doentes. É verdade que antigamente se agia assim; nos estágios rústicos da civilização e a in d a h oje, em cer tos p ovos s elva gen s , o d oen te é efetiva m en te tr a ta d o com o cr im in os o, com o p er igo p a r a a com u n id a d e e com o m or a d a d e a lgu m s er d em on ía co qu a lqu er qu e n ele s e en ca r n ou em con s eqü ên cia d e u m a fa lt a ;
o qu e s ign ifica : tod o d oen te é
u m cu lp a d o! E n ós , n ã o es ta r ía m os a in d a a m a d u r ecid os p a r a a con cep çã o con tr á r ia ? Nã o ter ía m os a in d a o d ir eito d e d izer : tod o culpado
é u m d oen te?
Nã o, a in d a n ã o ch egou a h or a .
S ob r etu d o a in d a n ã o exis t em m éd icos p a r a os qu a is a qu ilo qu e a té a gor a d es ign a m os p or m or a l p r á tica s e tor n e u m ca p ítu lo d a a r te ou d a ciên cia d e cu r a r ; fa lta a in d a d e u m m od o ger a l es s e in ter es s e á vid o p or es s a s qu es tões qu e ta lvez u m d ia p a r eça b a s ta n te s em elh a n te a o S tu rm u n d Dra n g 34 qu e ou tr or a a r eligiã o p r ovoca va ; a s igr eja s a in d a n ã o es t ã o n a s m ã os d a qu eles qu e cuidam dos doentes; o estudo do corpo e do regime sanitário ainda n ã o fa z p a r te d a s m a t ér ia s ob r iga tór ia s em t od a s a s es cola s p r im á r ia s ou s u p er ior es ; a in d a n ã o exis tem s ocied a d es d is cr eta s d e h om en s qu e s e tives s em com p r om et id o a r en u n cia r a o a uxílio d os tr ib u n a is , a s s im com o à p u n içã o e à vin ga n ça d a s ofen s a s r eceb id a s ; n en h u m p en s a d or t eve a in d a a cor a gem d e m ed ir a s a ú d e d e u m a s ocied a d e, e d os in d ivíd u os qu e a com p õem , s egu n d o o n ú m er o d e p a r a s ita s qu e ela p od e s u p or ta r ; a in d a n ã o foi en con tr a d o n en h u m h om em d e E s ta d o qu e ten h a gu ia d o s u a ch a r r u a n o es p ír ito d es ta s p a la vr a s ch eia s d e gen er os id a d e e doçura: S e qu er es cu ltiva r a ter r a , cu lt iva -a com a ch a r r u a : fa r á s en tã o a a legr ia d o p á s s a r o e d o lob o qu e vã o a tr á s d a ch a r r u a
farás a alegria de todas as criaturas.
203. CONTRA O MAU REGIME For a com a s r efeições qu e os h om en s h oje fa zem , t a n t o n os r es ta u r a n tes com o on d e qu er qu e viva a cla s s e a b a s ta d a d a s ocied a d e! Mes m o qu a n d o os s á b ios r ep u ta d os , s ã o cos t u m es s em elh a n tes qu e ca r r ega m s u a m es a , p r ecis a m en te com o a qu ela d os b a n qu eir os : s egu n d o o p r in cíp io d a m a ior a b u n d â n cia e d a multiplicidade
d is s o s e s egu e qu e os m a n ja r es s ã o p r ep a r a d os
em vis ta d o efeito e n ã o d a s con s eqü ên cia s e qu e a s b eb id a s excita n tes d evem con tr ib u ir p a r a tir a r o p es o d o es tôm a go e d o cér eb r o. For a com a d is s olu çã o e com a s en s ib ilid a d e exa ger a d a qu e tu d o is s o a ca r r et a ! For a com os s on h os qu e es s es ta is d evem ter ! For a com a s a r tes e os livr os qu e d evem s er vir d e s ob r em es a a es s es b a n qu etes ! E qu e a ja m com o qu is er em , s eu s a tos s er ã o r egid os p ela p im en ta e p ela con tr a d içã o ou p elo ca n s a ço d o m u n d o! (As
cla s s es
r ica s
na
In gla ter r a
n eces s ita m
d e s eu
cr is tia n is m o p a r a p od er s u p or ta r s u a m á d iges tã o e s u a s d or es d e ca b eça ). No fin a l d a s con t a s , p a r a d izer n ã o s om en te tu d o o qu e is s o tem d e d es gos tos o, m a s ta m b ém d e d iver tid o, es s es h om en s n ã o s ã o d e m od o n en h u m b oêm ios ; n os s o s écu lo e s eu tip o d e a tivid a d e têm m a is p od er s ob r e a s extr em id a d es d o qu e s ob r e o ven tr e. Qu e s ign ifica m en tã o es s es b a n qu etes ? Ma is o qu e, s a n to Deu s ? A cla s s e s ocia l? cla s s es a ca b a r a m ! S ó exis t e, o
Representam!
Nã o, o d in h eir o: a s
indivíduo ! Ma s o d in h eir o
s ign ifica p od er , glór ia , p r eem in ên cia , d ign id a d e, in flu ên cia ; o d in h eir o a tr ib u i a gor a a u m h om em , em fu n çã o d e qu a n to ele p os s u i, a gr a n d eza ou a p equ en ez d o p r econ ceito! Nin gu ém qu er es con d er s eu d in h eir o, n in gu ém qu er exib i-lo s ob r e a m es a ; é n eces s á r io, p or ta n to, qu e o d in h eir o ten h a u m r ep r es en ta n t e qu e
se possa pôr sobre a mesa: vejam nossas refeições!
204. D ÂNAE35 E o D EUS OURO De on d e vem es s a exces s iva im p a ciên cia qu e fa z a tu a lm en te d o h om em u m m a lfeitor , em s itu a ções qu e m elh or exp lica r ia m ten d ên cia s con tr á r ia s ? Pois , s e es te u tiliza p es os fa ls os , s e a qu ele p õe fogo à s u a ca s a d ep ois d e tê-la s egu r a d o a cim a d e s eu va lor , s e u m t er ceir o é im p lica d o n a fa b r ica çã o d e m oed a fa ls a , s e t r ês qu a r tos d a a lt a s ocied a d e s e d ed ica m à fr a u d e lícita e s e ca r r ega m a con s ciên cia d e op er a ções d a b ols a e d e es p ecu la ções : o qu e os impele? Não é a autêntica necessidade, sua vida não é tão precária assim, eles com em e b eb em s em p r eocu p a çã o
m a s o qu e os
im p ele, d ia e n oit e, é u m a im p a ciên cia ter r ível qu a n d o vêem o d in h eir o a cu m u la r -s e d em a s ia d o len ta m en te e a a legr ia e o a m or igu a lm en te t er r íveis qu e d es p er ta n eles o d in h eir o a cu m u la d o. Nes s a
im p a ciên cia
e
n es s e
a m or ,
con tu d o,
r ea p a r ece
es s e
fa n a tis m o d o d es e jo d e pod er qu e in fla m ou ou t r or a a cr en ça d e es ta r d e p os s e d a ver d a d e, es s e fa n a tis m o qu e u s a va t ã o b elos n om es qu e s e p od ia ou s a r s er h u m a n o com b oa con s ciên cia (qu eim a r ju d eu s , h er eges e b on s livr os e exter m in a r in teir a m en te civiliza ções s u p er ior es com o a s d o Per u e d o México). Os m eios u tiliza d os p elo d es ejo d e p od er m u d a r a m , m a s o m es m o vu lcã o fer ve s em p r e, a im p a ciên cia e o a m or d es m es u r a d o r ecla m a m s u a s vítim a s : o qu e ou tr or a s e fa zia p or a m or a Deu s , h oje s e fa z por amor do dinheiro, isto é, daquilo que hoje confere o sentimento de poder mais elevado e a boa consciência.
205. S OBRE O POVO DE ISRAEL Entre os espetáculos para que nos convida o próximo século, é p r ecis o coloca r o r egu la m en to d efin itivo d o d es tin o d os ju d eu s
eu r op eu s . É d e tod o evid en te a gor a qu e eles la n ça r a m s eu s d a d os , qu e a tr a ves s a r a m o Ru b icã o 36: n ã o lh es r es ta s en ã o s e tor n a r em os s en h or es d a E u r op a ou p er d er a E u r op a com o p er d er a m ou tr or a o E gito, on d e s e h a via m d ep a r a d o com s em elh a n te a lter n a tiva . Na E u r op a , p or ém , t iver a m u m a es cola d e d ezoito s écu los , cois a qu e n en h u m ou tr o p ovo p ôd e p r eten d er , e is s o d e ta l m a n eir a qu e n ã o foi t a n to a com u n id a d e, m a s s ob r etu d o os in d ivíd u os qu e lu cr a r a m com a s exp er iên cia s d es s e es p a n tos o p er íod o d e p r ova s . A con s eqü ên cia d is s o é qu e, en tr e os ju d eu s a tu a is , os r ecu r s os d a a lm a e d o es p ír ito s ã o ext r a or d in á r ios ; en tr e tod os os h a b ita n tes d a E u r op a s ã o eles qu e, n a d es gr a ça , têm mais raramente o recurso à bebida ou ao suicídio para sair de u m em b a r a ço p r ofu n d o
o qu e é tã o ten ta d or p a r a qu a lqu er
p es s oa m en os ca p a cita d a . Tod o ju d eu en con tr a n a h is tór ia d e s eu s p a is e d e s eu s a n tep a s s a d os u m a fon t e d e exem p los d e r a ciocín io fr io e d e p er s ever a n ça em s itu a ções ter r íveis , d a m a is s u til u tiliza çã o d a d es gr a ça e d o a ca s o p ela a s tú cia ; s u a cor a gem s ob a ca p a d e u m a s u b m is s ã o h u m ilh a n te, s eu h er oís m o d o s pern ere s e s pern i37 u ltr a p a s s a a s vir tu d es d e tod os os s a n t os . Du r a n te d ois m il a n os s e qu is tor n á -los d es p r ezíveis tr a ta n d o-os com d es p r ezo, im p edindo-lh es o a ces s o a tod a s a s h on r a s , a t u d o o qu e exis te d e h on r os o, im p elin d o-os p elo con tr á r io p a r a b a ixo, p a r a os tr a b a lh os m a is s ór d id os
p a r a d izer a ver d a d e, es s e
p r oced im en to n ã o os t or n ou m a is d ecen tes . Ma is d es p r ezíveis , ta lvez? E les m es m os n u n ca d eixa r a m d e s e con s id er a r vota d os à s m a ior es cois a s e a s vir tu d es d e tod os a qu eles qu e s ofr em n u n ca d eixa r a m d e em b elezá -los . A m a n eir a com o eles h on r a m os p a is e os filh os , a r a zã o qu e p r es id e a s eu s ca s a m en tos e a s eu s h á b itos m a tr im on ia is os d is tin gu e en t r e t od os os eu r op eu s . Além d is s o, eles s e em p en h a r a m em extr a ir p r ecis a m en te u m s en tim en to d e
p od er e d e vin ga n ça eter n a d os t r a b a lh os qu e d eixá va m os p a r a eles (ou à s qu a is n ós os a b a n d on á va m os ); é p r ecis o a té d izer em d es con t o
de
su a
u su ra,
qu e
s em
es s a
t or tu r a
de
s eu s
d ep r ecia d or es , à s vezes a gr a d á vel e va n t a jos a , d ificilm en te ter ia m ch ega d o a con s id er a r -s e a s i p r óp r ios d u r a n te ta n t o t em p o. De fa t o, a es tim a p or n ós m es m os es tá liga d a à p os s ib ilid a d e d e fa zer o b em e o m a l. Com is s o, os ju d eu s n ã o s e d eixa r a m leva r m u ito lon ge p ela vin ga n ça ; p ois , tod os eles têm a lib er d a d e d e es p ír ito e também a da alma que produzem no homem a mudança freqüente d e lu ga r , d e clim a , o con ta to com os cos t u m es d os vizin h os e d os opressores; possuem a maior experiência de todas as relações com os h om en s e, m es m o n a p a ixã o, con s er va m a p r u d ên cia n a s cid a d es s a
exp er iên cia . E s t ã o t ã o s egu r os
de su a
m a lea b ilid a d e
in telectu a l e d e s u a h a b ilid a d e qu e n u n ca têm n eces s id a d e, m es m o n a s s itu a ções m a is d ifíceis , d e ga n h a r o p ã o p ela força fís ica ,
com o
tr a b a lh a d or es
r ú s ticos ,
ca r r ega d or es ,
es cr a vos
a gr ícola s . Vem os a in d a p or s u a s m a n eir a s qu e n u n ca lh es in cu lca m os s en tim en tos ca va leir es cos e n ob r es n a a lm a , n em lh es p u s em os b ela s a r m a d u r a s em s eu cor p o: a lgo d e in d is cr et o a lter n a com u m a d efer ên cia m u ita s vezes ter n a e qu a s e s em p r e p en os a . Ma s a gor a , qu e a n o a p ós a n o s e a lia r a m in evita velm en te com a m elh or n ob r eza d a E u r op a , logo ter ã o con qu is ta d o u m a h er a n ça con s id er á vel n a s b oa s m a n eir a s d o es p ír it o e d o cor p o: d e m od o qu e, d en t r o d e cem a n os , já ter ã o o p or te s u ficien tem en te a r is t ocr á tico p a r a n ã o p r ovoca r , com o s en h or es , a vergonha d a qu eles qu e lh es s er ã o s u b m is s os . E é is s o qu e im p or ta ! É p or is s o qu e u m a r egu la m en ta çã o d e s eu ca s o é a in d a p r em a tu r a ! E les s ã o os p r im eir os a s a b er qu e n ã o s e tr a ta p a r a eles d e u m a con qu is ta d a E u r op a n em d e qu a lqu er tip o d e violên cia : m a s s a b em ta m b ém qu e a E u r op a , com o u m fr u to m a d u r o, d ever á ca ir
um
d ia
em
su as
m ã os ,
b a s ta n d o
para
ta n t o
es t en d ê-las.
E s p er a n d o, é n eces s á r io p a r a eles s e d is tin gu ir em t od os os d om ín ios d a d is tin çã o eu r op éia e s e p os icion a r en t r e os p r im eir os , a té qu e s eja m eles p r óp r ios a d eter m in a r o qu e d is tin gu e. S er ã o en tã o os in ven tor es e os gu ia s d os eu r op eu s e n ã o ofen d er ã o m a is o p u d or d es tes . É es s a a b u n d â n cia d e gr a n d es im p r essões acumuladas que constitui a história judaica para todas as famílias ju d ia s , es s a a b u n d â n cia d e p a ixões , d e vir tu d es , d e d ecis ões , d e r en u n cia s , d e com b a tes , d e vitór ia s d e tod a es p écie
a qu e
d ever á ch ega r fin a lm en te com gr a n d es ob r a s e com gr a n d es h om en s in telectu a is ! E n tã o, qu a n d o os ju d eu s p u d er em m os tr a r com o s u a ob r a d e p ed r a s p r ecios a s e d e ta ça s d e ou r o, ta is qu e os p ovos eu r op eu s d e exp er iên cia m a is cu r ta e m en os p r ofu n d a n ã o podem nem puderam produzir
quando Israel tiver transformado
sua vingança eterna em bênção eterna da Europa: então retornará es s e s ét im o d ia em qu e o velh o Deu s d os ju d eu s p od er á s e a legr a r con s igo m es m o, p or s u a cr ia çã o e p or s eu p ovo eleito
e t od os
nós, todos, queremos nos alegrar com ele!
206. A IMPOSSÍVEL CLASSE Pob r e, a legr e e in d ep en d en te!
es s a s qu a lid a d es p od em
estar reunidas numa única pessoa; pobre, alegre e escravo! ta m b ém é p os s ível
isso
e eu n ã o p od er ia d izer n a d a d e m elh or a os
op er á r ios es cr a vos d a s fá b r ica s : s u p on d o qu e is s o n ã o lh es p a r eça em ger a l com o u m a vergonha d e s er em utilizados, qu a n d o is s o ocor r e, com o o p a r a fu s o d e u m a m á qu in a e d e a lgu m m od o com o tapa-b u r a co d o es p ír it o in ven tivo d os h om en s . Com os d ia b os a cr ed ita r qu e, p or u m s a lá r io m a is eleva d o, o qu e h á d e es s en cia l em s u a d es gr a ça , is to é, s u a s u b s er viên cia im p es s oa l, p u d es s e s er s u p r es s o! Com
os d ia b os d eixa r -s e con ven cer qu e, p or u m
a u m en to d es s a im p es s oa lid a d e n o m eio d a s en gr en a gen s d e u m a n ova s ocied a d e, a ver gon h a d o es cr a vo p u d es s e s er tr a n s for m a d a em vir tu d e! Com os d ia b os t er u m p r eço m ed ia n te o qu a l s e d eixa d e s er u m a p es s oa p a r a p a s s a r a s er u m a en gr en a gem ! Vocês s ã o cú m p lices d a lou cu r a a tu a l d a s n a ções qu e n ã o p en s a m s en ã o em p r od u zir m u ito e em en r iqu ecer o m a is p os s ível? S u a t a r efa s er ia d e lh es a p r es en ta r ou tr o a b a tim en to, d e lh es m os tr a r qu e gr a n d es s om a s d e va lor in ter ior s ã o dissipadas p a r a u m ob jetivo tã o exter ior ! Ma s on d e es t á s eu va lor in t er ior , s e vocês n ã o s a b em m a is o qu e é r es p ir a r livr em en te? S e m a l s a b em s e p os s u ir vocês m es m os ? S e es t ã o ca n s a d os d em a is d e vocês m es m os , com o u m a b eb id a qu e p er d eu s eu fr es cor ? S e p r es ta m a ten çã o a os jor n a is e es p ia m s eu vizin h o r ico, d evor a d os d e in veja a o ver a s u b id a e a qu ed a r á p id a d o p od er , d o d in h eir o e d a s op in iões ? S e n ã o têm m a is fé n a filos ofia es fa r r a p a d a , n a lib er d a d e d e es p ír ito d o h om em s em n eces s id a d es ? S e a p ob r eza volu n tá r ia e id ílica , a a u s ên cia
de
p r ofis s ã o
e
o
celib a t o,
qu e
d ever ia m
con vir
p er feita m en te a os m a is in telect u a is d en tr e vocês , s e t or n a r a m ob jet o d e zom b a r ia ? E m com p en s a çã o, a fla u t a s ocia lis t a d os a p a n h a d or es d e r a tos lh es r es s oa s em p r e a os ou vid os
esses
a p a n h a d or es d e r a tos qu e qu er em in fla m á -los em es p er a n ça s a b s u r d a s ! Qu e lh es d izem d e es ta r prontos e n a d a m a is , p r on t os d e h oje p a r a a m a n h ã , d e m od o qu e vocês es p er a m a lgo d e for a , es p er a m s em ces s a r , viven d o d e r es to com o s em p r e
a té qu e
es s a es p er a s e tr a n s for m a em fom e e s ed e, em feb r e e lou cu r a , e qu e s e er gu e fin a lm en te, em tod o o s eu es p len d or , o d ia d a b es t a triunfante!
Pelo con tr á r io, ca d a u m d ever ia p en s a r p or s i:
An tes em igr a r , p a r a p r ocu r a r tor n a r -m e s en h or em r egiões s elva gen s e in t a ct a s d o m u n d o e s ob r etu d o p a r a m e t or n a r s en h or d e m im m es m o; m u d a r d e lu ga r m a l u m s in a l d e es cr a vid ã o
con tr a m im s e m a n ifes te; n ã o evita r a a ven tu r a e a gu er r a e, n o p ior d os a ca s os , es ta r p r on to p a r a m or r er : con ta n to qu e n ã o s eja n eces s á r io s u p or ta r m a is es s a in d ecen te s er vid ã o p a r a n ã o m e tor n a r ven en os o e con s p ir a d or ! E s te é o es ta d o d e es p ír ito qu e con vir ia ter : os op er á r ios n a E u r op a d ever ia m s e con s id er a r doravante como uma verdadeira impossibilidade como classe e não com o
a lgo
de
d u r a m en te
con d icion a d o
e
im p r op r ia m en te
or ga n iza d o; d ever ia m s u s cita r u m a ép oca d e gr a n d e en xa m e p a r a for a d a colm éia eu r op éia , com o n u n ca a n t es vis ta , e p r ot es ta r p or m eio d es s e a to d e lib er d a d e d e es ta b elecim en to u m a to d e gr a n d e es tilo con tr a a m á qu in a , o ca p ita l e a a lter n a tiva qu e h oje os ameaça: dever es colh er en tr e s er es cr a vo d o E s ta d o ou es cr a vo d e u m p a r tid o r evolu cion á r io. Pu d es s e a E u r op a livr a r -s e d e u m qu a r to d e s eu s h a b ita n tes ! S er ia u m a lívio p a r a ela e p a r a eles . S om en te a o lon ge, n os em p r een d im en tos d os colon os p a r tin d o a os en xa m es p a r a a a ven t u r a , s e p od er ia fin a lm en te r econ h ecer qu a n to d e b om s en s o e d e equ id a d e, qu a n ta s ã d es con fia n ça a m ã e E u r op a in cu lcou em s eu s filh os
n es s es filh os qu e n ã o
podia m m a is s u p or ta r viver a o la d o d ela , es s a velh a m u lh er em b r u tecid a , e qu e cor r ia m o r is co d e s e tor n a r em m ela n cólicos , ir r ita d iços e goza d or es com o ela . For a d a E u r op a , s er ia m a s virtudes da Europa que viajariam com esses trabalhadores e o que n a p á t r ia com eça va a d egen er a r em p er igos o d es con ten ta m en to e em
ten d ên cia s
cr im in os a s ,
for a
d ela
ga n h a r ia
s elva gem e b elo e s er ia ch a m a d o h er oís m o.
um
ca r á ter
As s im é qu e u m a r
m a is p u r o s op r a r ia fin a lm en te s ob r e a velh a E u r op a , a tu a lm en te s u p er p ovoa d a e d ob r a d a s ob r e s i m es m a ! E qu e im p or ta s e en tã o n os fa lt a r á u m p ou co d e lem b r a r ía m os
en tã o
qu e
braços n os
p a r a o t r a b a lh o! Ta lvez n os h a b it u a m os
a
n u m er os a s
n eces s id a d es s om en te d es d e qu e s e tor n ou fácil satisfazê-las
b a s ta r ia es qu ecer a lgu m a s n eces s id a d es ! Ta lvez ir ía m os en tã o introduzir chineses: e es tes tr a r ia m a m a n eir a d e p en s a r e d e viver qu e
con vêm
às
for m iga s
tr a b a lh a d or a s .
S im ,
no
con ju n to,
p od er ia m a té m es m o con tr ib u ir p a r a in fu n d ir n o s a n gu e d a E u r op a t u r b u len ta e qu e s e exten u a u m p ou co d e ca lm a e d e con tem p la ções a s iá tica s e necessário
o qu e cer ta m en te é b em m a is
um pouco de pers is tên cia asiática.
207. COMO SE COMPORTAM OS ALEMÃES DIANTE DA MORAL Um a lem ã o é ca p a z d e gr a n d es cois a s , m a s é p ou co p r ová vel qu e a s r ea lize, p ois ele ob ed ece on d e pod e, com o con vém a os es p ír it os p r egu iços os p or n a t u r eza . S e for coloca d o n u m a s itu a çã o p er igos a d e fica r s ó e s a cu d ir s u a p r egu iça , s e n ã o lh e for m a is p os s ível es con d er -s e
com o u m
n ú m er o n u m a
s om a
(n es s a
qu a lid a d e tem in fin ita m en t e m en os va lor qu e u m fr a n cês ou u m inglês)
d es cob r ir á s u a s for ça s : tor n a -s e en tã o p er igos o, m a u ,
p r ofu n d o, a u d a cios o, e tr a z à lu z d o d ia o t es ou r o d e en er gia la ten te qu e con s er va em s i, u m tes ou r o n o qu a l, p or ou tr a , n in gu ém a cr ed ita (n em s equ er ele p r óp r io). Qu a n d o, n u m ca s o desse gên er o, u m a lem ã o ob ed ece a s i p r óp r io exceção
é a gr a n d e
ele o fa z com o m es m o p es o, a m es m a in flexib ilid a d e, a
m es m a r es is tên cia qu e a p lica h a b itu a lm en te a ob ed ecer a s eu s ob er a n o e a s eu s d ever es p r ofis s ion a is : em b or a , com o d izía m os , ele ten h a en tã o en ver ga d u r a p a r a fa zer gr a n d es cois a s qu e n ã o têm qu a lqu er r ela çã o com a
fr a qu eza d e ca r á ter
qu e ele ju lga
p os s u ir . Ma s h a b itu a lm en te r eceia d ep en d er a p en a s d e s i, receia improvisar
(é
p or
is s o
fu n cion á r ios e ta n t a tin t a ).
qu e
a
Alem a n h a
con s om e
ta n t os
A leveza d e ca r á ter lh e é es tr a n h a , é
m u it o tem er os o p a r a s e a b a n d on a r a ela ; m a s em s itu a ções tot a lm en te n ova s , qu e o a r r a n ca m d e s eu tor p or , é qu a s e d e
espírito fr ívolo; u s u fr u í en tã o d a r a r id a d e d e s u a n ova s itu a çã o com o d e u m a b eb ed eir a , e ele s e r econ h ece n a b eb ed eir a ! As s im , o a lem ã o é h oje qu a s e fr ívolo em p olítica : s e b em qu e a í ta m b ém ele ten h a p or s i o p r econ ceito d a p r ofu n d id a d e e d a s er ied a d e, qu e ele n ã o d eixa d e exp lor a r em s u a s r ela ções com a s ou tr a s for ça s p olítica s , e es tá , con tu d o, ch eio d e u m a a r r ogâ n cia s ecr eta , com a id éia d e p od er fin a lm en t e d iva ga r , s egu ir os ca p r ich os e s eu s gos tos d e n ovid a d es , m u d a r p es s oa s , p a r tid os e es p er a n ça s com o s e fos s em m á s ca r a s .
Os s á b ios a lem ã es , qu e p a r ecia m s er a t é
a gor a os m a is a lem ã es d os a lem ã es , er a m e s ã o t a lvez a in d a tã o b on s com o os s old a d os a lem ã es , gr a ça s à s u a ten d ên cia p r ofu n d a e qu a s e in fa n til p a r a a ob ed iên cia em tod a s a s cois a s exter ior es , gr a ça s ta m b ém à n eces s id a d e d e s e en con t r a r em m u ita s vezes is ola d os n a ciên cia e d e ter em d e r es p on d er a m u ita s cois a s ; s e eles sabem proteger seu estilo orgulhoso, simples e paciente, e sua in d ep en d ên cia d a s lou cu r a s p olítica s em tem p os em qu e o ven to s op r a em ou t r a s d ir eções , é a in d a p os s ível es p er a r d eles gr a n d es cois a s ;
ta l
com o
são
(ou
er a m )
r ep r es en ta m ,
em b r ion á r io, qu a lqu er cois a d e superior.
em
es ta d o
A va n ta gem e a
d es va n ta gem d os a lem ã es , m es m o en t r e s eu s s á b ios , é qu e s e en con tr a va m
a té a gor a m a is p r óxim os d a s u p er s t içã o e d a
n eces s id a d e d e cr er qu e os ou tr os p ovos ; s eu s vícios con t in u a m a s er, hoje como ontem, a embriaguez e a tendência ao suicídio (este ú lt im o é u m s in a l d o p es o d e u m es p ír ito qu e s e d eixa fa cilm en te leva r a a b a n d on a r a s r éd ea s ); o p er igo p a r a eles r es id e em tu d o o qu e b loqu eia a s for ça s d a r a zã o e d es en ca d eia a s p a ixões (com o o u s o exces s ivo d a m ú s ica e d a s b eb id a s a lcoólica s ): p ois a p a ixã o a lem ã s e volta con tr a o qu e lh e p es s oa lm en te ú til, é p or s i m es m a destrutiva, como aquela da embriaguez. O próprio entusiasmo tem menos valor na Alemanha que em outros lugares, pois é estéril. Se
um alemão realizou qualquer coisa de grande, foi sob a pressão do p er igo, n u m m om en t o d e b r a vu r a , com os d en tes cer r a d os , o es p ír it o ten s o e m u it a s vezes com u m a in clin a çã o à gen er os id a d e. Poder-se-ia a con s elh a r a coloca r -s e em con ta t o fr eqü en te com os a lem ã es
p ois ca d a a lem ã o tem qu a lqu er cois a a d a r , s e s e
s ou b er con d u zi-lo a
encontrá-la, a reencontrá-la (p ois
fu n d a m en ta lm en t e d es or d en a d o).
ele é
Ma s s e u m p ovo d es s e gên er o
s e ocu p a d e m or a l: qu a l s er á a m or a l qu e ju s ta m en te o h a ver á d e s a tis fa zer ? An tes d e tu d o, ele va i qu er er cer ta m en te qu e s u a tendência cordial a obedecer pareça idealizada. O homem deve ter qu a lqu er cois a a qu e p os s a obedecer s em con d ições
es s e é u m
s en tim en t o
a lem ã :
a lem ã o,
uma
con s eqü ên cia
da
lógica
é
en con tr a d o n a b a s e d e t od a s a s d ou tr in a s m or a is a lem ã s . Com o é d ifer en te a im p r es s ã o qu e s e s en te d ia n te d e tod a a m or a l a n tiga ! Tod os os p en s a d or es gr egos , p or d iver s a qu e s eja a im a gem qu e nos é proposta, parecem semelhantes, enquanto moralistas, a esse p r ofes s or d e gin á s tica qu e exor ta u m jovem :
Vem ! S egu e-me!
Confia-t e à m in h a d is cip lin a ! Ch ega r á s ta lvez en tã o a a lca n ça r u m mérito maior do que todos os gregos. A distinção pessoal
esta é
a vir tu d e a n tiga . S u b m eter -s e, ob ed ecer p u b lica m en te ou em segredo
es ta é a vir tu d e a lem ã .
Mu ito tem p o a n tes d e Ka n t e
d e s eu im p er a tivo ca tegór ico, Lu ter o h a via d ito, gu ia d o p elo m es m o s en tim en to, qu e d evia exis tir u m s er n o qu a l o h om em p u d es s e con fia r d e m od o a b s olu to
es ta er a s u a prova da
exis tên cia d e Deu s ; ele qu er ia , m a is r u d e e m a is p leb eu qu e Ka n t, qu e s e ob ed eces s e cega m en te n ã o a u m a id éia , m a s a u m a p es s oa e, n o fin a l d a s con ta s , Ka n t efetu ou s eu d es vio p ela m or a l a p en a s p a r a ch ega r à ob ed iên cia p a ra com a p es s oa: é exa t a m en te o cu lto d o a lem ã o, qu a lqu er qu e s eja o tr a ço im p er cep tível d e cu lto qu e ten h a r es ta d o em s u a r eligiã o. Os gr egos e os r om a n os tin h a m
ou tr os s en tim en tos e t er ia m r id icu la r iza d o u m ta l deve h a ver u m ser : er a p r óp r io d e s u a lib er d a d e d e s en t im en to tot a lm en te m er id ion a l
se
p r eca ver em
con tr a
a
con fia n ça
a b s olu ta
e
con s er va r n o ú ltim o r ed u to d o cor a çã o u m leve ceticis m o em relação a tudo e a todos, fosse ele deus, homem ou idéia. O filósofo a n tigo va i m a is lon ge a in d a ! Nil ad m ira ri38
n es ta fr a s e ele vê
tod a a filos ofia . E u m a lem ã o, p en s o em S h op en h a u er , ch ega a o p on t o d e d izer o con tr á r io: Ad m ira ri, id es t ph ilos op h a ri39.
Que
s e p a s s a r á en tã o, s e u m d ia , com o a con t ece à s vezes , o a lem ã o s e en con tr a r n a s it u a çã o em qu e é ca p a z d e gran d es cois a s ? Se ch ega r a h or a d a exceção, a h or a d a d es ob ed iência?
Nã o cr eio
qu e S ch op en h a u er ten h a r a zã o a o d izer qu e a ú n ica va n ta gem d os a lem ã es s ob r e os ou tr os p ovos r es id e n o fa to d e qu e en tr e eles h á m a is a teu s d o qu e en tr e os ou tr os
m a s s ei d e u m a cois a :
qu a n d o o a lem ã o es t á n a s itu a çã o em qu e é ca p a z d e gr a n d es coisas, ele s e eleva s em p re acim a d a m oral! E p or qu e n ã o o fa r ia ? E a gor a es tá n a s itu a çã o d e fa zer a lgu m a cois a d e n ovo, is t o é, comandar
a s i ou a os ou tr os ! Or a , é ju s ta m en te com a n d a r qu e
s u a m or a l a lem ã n ã o o en s in ou ! A a r te d e com a n d a r es tá n ele esquecida!
1
Jean-J a cqu es Rou s s ea u (1 7 1 2 -1 7 7 8 ), filós ofo e es cr itor s u íço; en tr e s u a s obras, O con tra to s ocia l e A orige m d a d es igu a ld a d e en tre os h om e n s já foram publicadas nesta coleção da Editora Escala (NT).
2
Arthur Schopenhauer (1788-1860), filósofo alemão (NT).
3
Richard Wagner (1813-1883), compositor alemão (NT).
4
Otto Bismarck (1815-1898), estadista alemão (NT).
5
Lazare Carnot (1753-1823), político e cientista francês (NT).
6
Berthold Georg Niebuhr (1776-1831), diplomata e historiador alemão (NT).
7
Tucídides (465-395 a.C), historiador grego (NT).
8
Pla tã o (4 2 7 -3 4 7 a .C), filós ofo gr ego; d en tr e s u a s ob r a s , A repú blica já foi
publicada nesta coleção da Editora Escala (NT). 9
Sófocles (496-406 a.C), poeta trágico grego (NT).
10
Péricles (495-429 a.C), estadista ateniense (NT).
11
Hipócrates (460-377 a.C), médico grego (NT).
12
Demócrito (460-370 a.C), filósofo grego (NT).
13
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica o er r o é m a is s im p les qu e a ver d a d e (NT).
14
His t ór ica cid a d e gr ega d o s u l d a Itá lia , fu n d a d a n o s écu lo VII a n tes d e Cr is t o; p er ten cia à Ma gn a Gr écia e foi con qu is ta d a p elos r om a n os n o a n o 2 7 3 a .C; in exis ten te h oje com o cen tr o u r b a n o, a lem b r a n ça gr ega , con tu d o, p er s is te em s u a s r u ín a s , d es ta ca n d o-s e os tem p los , con s id er a d os os m a is bem con s er va d os d a ép oca d a colon iza çã o h elên ica d a Itá lia m er id ion a l. A cid a d e d e Pom p éia , cita d a a s egu ir , foi fu n d a d a p elos os cos n o s écu lo VI a n tes d e Cr is to, m a s foi d om in a d a ta m b ém p elos gr egos e p elos etr u s cos ; a n exa d a a Rom a em 2 9 0 a .C, foi t ota lm en t e d es tr u íd a n o a n o 7 9 d e n os s a era por uma violenta erupção do Vesúvio (NT).
15
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica h om em com ilã o ; n a r ea lid a d e, o ter m o latino ph a go, ph a gon is (tom a d o d o gr ego phágon, d er iva d o d e ph á ge in , com er ) já s ign ifica va com ilã o; com p os to com o p r efixo gr ego pan (tudo), pamphagus s ign ifica Con cr eta m en te com e t u d o (NT).
16
Ésquilo (525-456 a.C), poeta trágico grego (NT).
17
Vocá b u lo la tin o qu e s ign ifica in d ivíd u o (NT).
18
19 20
Fr a s e extr a íd a d a ob r a Satirae (I, 5 , 1 0 0 ) d o p oeta la tin o Qu in tu s Hor a tiu s Fla ccu s (6 5 -8 a .C.) e qu e s ign ifica O ju d eu Ap ella qu e o cr eia ou Qu e o ju d eu Ap ella a cr ed ite n is s o (NT). Hesíodo (séc. VIII a.C), poeta grego (NT). Fr ied r ich von S ch iller (1 7 5 0 -1 8 0 5 ), es cr itor a lem ã o; Wilh elm von Hu m b old t (1767-1835), lin gü is ta e p olítico a lem ã o; Fr ied r ich Da n iel E r n s t S ch leier m a ch er (1 7 6 8 -1 8 3 4 ), teólogo p r otes ta n te a lem ã o; Geor g Wilh elm Fr ied r ich Hegel (1 7 7 0 -1 8 3 1 ), filós ofo a lem ã o; Fr ied r ich Wilh elm J os ep h von Schelling (1775-1854), filósofo alemão (NT).
21
Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832), escritor alemão (NT).
22
Pierre Corneille (1606-1684), poeta dramático francês (NT).
23
Ma r ie d e Ra b u tin -Ch a n ta l, m a d a m e d e S évign é (1 6 2 6 -1 6 9 6 ), es cr itor a francesa (NT).
24
Bla is e Pa s ca l (1 6 2 3 -1 6 6 2 ), m a tem á tico, fís ico d a m or te n u m a cid en te d e ca r r u a gem qu a n d o m u n d a n a e d ecid iu en tr ega r -s e in teir a m en te a u m m ís tico, em b or a n u n ca t en h a d eixa d o científicas (NT).
25
Fr a n çois d e S a lign a c d e La Moth e Fén elon (1 6 5 1 -1 7 1 5 ), es cr itor fr a n cês , b is p o d e Ca m b r a i; teve p r ob lem a s com o Va tica n o p or ca u s a d e s eu a p oio a Madame de Guyon (NT).
26
Jeanne-Ma r ie Bou vier d e La Motte, d ita Ma d a m e Gu yon (1 6 4 8 -1717), m ís tica fr a n ces a , d ifu n d iu o qu ietis m o, d ou tr in a teológica qu e a fir m a va a p r es en ça con tín u a d e Deu s n a a lm a e p r ega va u m a b a n d on o tota l a ele;
e filós ofo fr a n cês ; es ca p a n d o tin h a 3 1 a n os , la r gou a vid a Deu s , p a s s a n d o a viver com o d e la d o s u a s exp er iên cia s
con d en a d a s p ela Igr eja , a d ou tr in a e Ma d a m e d e Gu yon , es ta foi p r es a e exilada (NT). 27
Ar m a n d J ea n Le Bou th illier d e Ra n cé (1 6 2 6 -1700) foi o fu n d a d or d a Or d em m on á s tica d os Tr a p is ta s ; n a ver d a d e, foi o r efor m a d or d es s a Or d em qu e, n a or igem , er a b en ed itin a , im p on d o u r n a r egr a extr em a m en te s ever a , ca r a cter iza d a es p ecia lm en te p elo s ilên cio p er p étu o; o d es ign a tivo tr a p is ta s deriva do nome do mosteiro que se chama Notre-Dame de la Trappe (NT).
28
As s im er a m ch a m a d os p elos ca t ólicos os p r otes ta n t es fr a n ces es d u r a n te a s gu er r a s d e r eligiã o n os s écu los XVI e XVII; o ter m o h u gu en ote é u m a corruptela do vocábulo alemão Eidgenossen que significa confederados (NT).
29
Port-Roya l er a u m m os teir o fem in in o qu e s e celeb r izou p or a d ota r a d ou tr in a ja n s en is ta (p r ega d a p elo b is p o J a n s ên io) qu e s e ca r a cter iza va p or u m a ob s er vâ n cia es tr ita e u m r igor is m o extr em a d o; o m os teir o s e tor n ou u m cen tr o d e cu ltu r a r eligios a e a t r a iu m u it os s olitá r ios , en tr e eles Pa s ca l; o ja n s en is m o foi con d en a d o p ela Igr eja e Pa s ca l ten tou d efen d ê-lo, m a s em vão; as monjas foram expulsas e o mosteiro foi demolido (NT).
30
Isaac Newton (1642-1727), físico, matemático e astrônomo inglês (NT).
31
Fr a n çois Ma r ie Ar ou et, d ito Volt a ir e (1 6 9 4 -1 7 7 8 ), es cr itor e filós ofo fr a n cês ; d en tr e s u a s ob r a s , Ca rta s filos óficas , Câ n d id o ou o otim is m o, O in gên u o, Zad ig ou o d es tin o, A p rin ce s a d e B a b ilôn ia , Tra ta d o s obre a tole rân cia já foram publicadas nesta coleção da Editora Escala (NT).
32
Cita çã o extr a íd a d a ob r a Od is s éia (XX, 1 8 ) d o p oet a gr ego Hom er o, qu e ter ia vivido no século IX a.C. (NT).
33
Tem ís t ocles (5 2 8 -4 6 2 a .C), es ta d is ta a ten ien s e qu e tr a n s for m ou Aten a s n a maior potência naval da época (NT).
34
Tem p es ta d e e impetuosidade.
35
S egu n d o a m itologia gr ega , Dâ n a e er a filh a d e Acr is io, r ei d e Ar gos ; com o o or á cu lo h a via p r ed ito qu e ela ter ia u m filh o qu e m a ta r ia o a vô, Acrisio m a n d ou en cer r á -la n u m a p r is ã o s u b ter r â n ea ; Zeu s s e en ca n tou d e ta l for m a com a b eleza d e Dâ n a e, qu e p en etr ou n a p r is ã o d is fa r ça d o em ch u va d e ou r o, fecu n d a n d o a jovem qu e foi m ã e d e Per s eu ; es te, a n os m a is t a r d e, matou involuntariamente o avô nos jogos públicos (NT).
36
Rubicão (Ru b icon e, em ita lia n o) é o n om e d e r io d a Itá lia ; n a ép oca d a Rep ú b lica r om a n a m a r ca va a fr on teir a en tr e a Gá lia Cis a lp in a e a Itá lia ; n o a n o 4 9 a n tes d e Cr is t o, J ú lio Cés a r , qu e er a gover n a d or d a Gá lia , atravessou-o ilega lm en te p a r a m a r ch a r com s eu exér cito s ob r e Rom a , p r ovoca n d o a gu er r a con tr a Pom p eu , con fr on to b élico qu e d ep ois s e tr a n s for m ou em gu er r a civil. Cés a r , n o fim , levou a m elh or e s e tor n ou o p r im eir o im p er a d or d e Rom a . S u b s is te a in d a h oje a exp r es s ã o a trav es s a r o Rubicão qu e s ign ifica s u p er a r u m a d ificu ld a d e en or m e ou tom a r u m a decisão audaciosa e irrevogável (NT).
37
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica p or s er m en os p r eza d o (NT).
p r es s ã o ,
com
o
s en tid o
figu r a d o
de
tita n is m o,
d es p r eza r d e s er d es p r eza d o, m en os p r eza r
38
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica n ã o s e s u r p r een d er com n a d a (NT).
39
Fra s e la t in a qu e s ign ifica s u r p r een d er -s e, is to é, filos ofa r (NT).
LIVRO Q UARTO
208. QUESTÃO DE CONSCIÊNCIA E , em
r es u m o, qu e qu er em
a fin a l d e n ovo?
Não
qu er em os m a is qu e a s ca u s a s s eja m p eca d os e os efeit os , carrascos.
209. A UTILIDADE DAS TEORIAS MAIS SEVERAS Somos indulgentes com as fraquezas morais de um homem e s e o p a s s a r m os p or u m cr ivo, é s om en te p ela m a lh a la r ga d es te qu e
ele
con fes s a
s em p r e
su a
fé
numa
moral s ever a .
Em
com p en s a çã o, s em p r e exa m in a m os n o m icr os cóp io a vid a d os m or a lis t a s d e es p ír it o livr e: com a s egu n d a in ten çã o d e qu e u m p a s s o em fa ls o n a vid a s er ia o m elh or a r gu m en t o con tr a u m conhecimento indesejável.
210. O QUE É EM SI Ou tr or a p er gu n ta va -s e: o qu e é qu e fa z r ir ? Com o s e h ou ves s e, for a d e n ós m es m os , cois a s cu ja p r op r ied a d e fos s e fa zer rir e então as pessoas se perdiam então em conjeturas (um teólogo ju lga va m es m o qu e fos s e
a in gen u id a d e d o p eca d o ). Hoje
costuma-s e p er gu n ta r : o qu e é o r is o? Com o s e p r od u z? Refletiu s e e fin a lm en te s e d eter m in ou qu e em s i n ã o h á n a d a d e bom, n a d a d e b elo, n a d a d e s u b lim e, n a d a d e m a u , m a s a n tes es ta d os d e a lm a qu e leva m a a tr ib u ir à s cois a s for a d e n ós m es m os es s es qualificativos. Retiramos en tã o es s es a t r ib u tos à s cois a s ou p elo m en os r ecor d a m os qu e fom os n ós qu e os atribuímos a ela s : cuidemos para que esta convicção não nos faça perder a faculdade
d e a tr ib u ir , cu id em os p a r a n ã o n os t or n a r m os a o m es m o t em p o mais ricos e mais avaros.
211. P ARA AQUELES QUE SONHAM A IMORTALIDADE Des eja m , p or ta n to, a d u raçã o e tern a d es s a b ela con s ciên cia d e vocês m es m os ? Nã o é ver gon h os o? E s qu ecem tod a s a s ou tr a s cois a s qu e, p or s u a vez, ter ia m d e s u p or tá -los p or tod a a et er n id a d e com o os s u p or ta r a m a t é a gor a com u m a p a ciên cia m a is
qu e
cr is tã ?
Ou
ju lga m
qu e
s eu
a s p ecto p os s a
lh es
p r op or cion a r u m s en tim en to d e b em -es ta r et er n o? Um ú n ico h om em im or ta l n a ter r a b a s ta r ia p a r a in s p ir a r a tu d o o qu e o en volves s e u m ta l desgosto qu e d ele r es u lta r ia u m a ver d a d eir a ep id em ia d e s u icíd io! E vocês , p ob r es h a b ita n tes d a ter r a com o s ã o, com s eu s p equ en os con ceit os d e a lgu n s m ilh a r es d e m in u tos n o tem p o, qu er em es ta r et er n a m en te d ep en d en tes d a exis tên cia et er n a e u n iver s a l! Há a lgo d e m a is in op or tu n o?
Ma s , n o fin a l
d a s con ta s , s eja m os in d u lgen t es com u m s er d e s eten ta a n os ! E le n ã o p ôd e exer cer a im a gin a çã o p a r a d es cr ever s eu próprio aborrecimento eterno
faltou-lhe tempo!
212. E M QUE NOS CONHECEMOS Des d e qu e u m a n im a l p er ceb e ou tr o, m ed e-s e com ele em p en s a m en to: os h om en s d a s ép oca s s elva gen s a gia m d a m es m a m a n eir a . De on d e s e s egu e qu e qu a s e ca d a h om em s ó a p r en d e a conhecer-se com relação à sua força de defesa e de ataque.
213. OS HOMENS DE VIDA FALHA Algu n s s ã o m od ela d os d e ta l m a t ér ia qu e é p er m itid o à sociedade fazer d eles is to ou a qu ilo: s ob tod os os a s p ectos eles s e s en tir ã o b em e n ã o ter ã o d e s e qu eixa r d e u m a vid a fa lh a . Ou t r os
s ã o m od ela d os d e u m a m a tér ia m u ito es p ecia l
n ã o é p r ecis o
qu e s eja p a r ticu la r m en t e n ob r e, m a s a p en a s m a is r a r a
para
qu e p os s a m n ã o s e s en tir in s a tis feitos , s a lvo n u m s ó n o ca s o, a qu ele em qu e p od er ia m viver s egu n d o s eu s ú n icos ob jetivos qu e lh es é p os s ível t er :
em tod os os ou tr os ca s os , a s ocied a d e s ofr e
o p r eju ízo. De fa t o, tu d o o qu e a p a r ece a o in d ivíd u o com o vid a fa lh a , s em êxito, tod o o s eu fa r d o d e d es en cor a ja m en to, d e im p otên cia , d e d oen ça , d e ir r ita b ilid a d e, d e a vid ez, ele la n ça s ob r e a s ocied a d e
e é a s s im qu e s e for m a em tor n o d ele u m a
a tm os fer a vicia d a e p es a d a ou , n o ca s o m a is fa vor á vel, u m a nuvem de tempestade.
214. P ARA QUE CONSIDERAÇÃO! Vocês s ofr em e exigem qu e s eja m os in d u lgen tes p a r a com vocês qu a n d o s eu s ofr im en to os leva a s er em in ju s tos com a s cois a s e com os h om en s ! Ma s qu e im p or ta a con s id er a çã o qu e tem os ! Vocês d ever ia m , con tu d o, s er m a is circunspectos em s eu próprio interesse! Que bela maneira de se indenizar do sofrimento, u s a n d o es te a cr és cim o d e prejuíz o em s eu ju lga m e n to! É s ob r e vocês m es m os qu e r eca i s u a vin ga n ça qu a n d o d ifa m a m a lgu m a cois a ; p er tu r b a m a s s im s u a vis ta e n ã o s ó a d os ou tr os : vocês s e habituam a ver torto e de viés!
215. A MORAL DAS VÍTIMAS Sacrificar-s e com en tu s ia s m o , imolar-s e a s i p r óp r io es s es s ã o os clich ês d e s u a m or a l e a cr ed ito d e b oa von ta d e qu e, com o vocês o d izem , es tã o d e b oa fé : m a s eu os con h eço m elh or que vocês mesmos, se sua boa fé é capaz de andar de braço dado com s em elh a n te m or a l. Olh a m d o m a is a lto es s a ou tr a m or a l s ób r ia qu e exige o d om ín io d e s i, a s ever id a d e, a ob ed iên cia , vocês
ch ega m a ch a m á -la egoís ta e cer ta m en te!
vocês são sinceros
com vocês m es m os a o d izer qu e ela lh es d es a gr a d a
é n eces s á rio
qu e lh es d es a gr a d e! De fa to, a o s a cr ifica r -s e com en tu s ia s m o, a o imolar-s e a vocês m es m os , u s u fr u em com em b r ia gu ez d a id éia d e n ã o s er m a is qu e um com o p od er os o, s eja d eu s ou h om em , a o qu a l vocês s e con s a gr a m : s a b or eia m o s en tim en to d e s eu p od er qu e t or n a a a fir m a r -s e com u m s a cr ifício. Na r ea lid a d e, s ó s e sacrificam n a a p arên cia , s u a im a gin a çã o os t or n a d eu s es e u s u fr u em d e vocês m es m os com o s e fos s em d eu s es . Ava lia d a d o p on t o d e vis t a d es s a fr u içã o, com o lh es p a r ece fr a ca e p ob r e es s a moral
egoísta
d a ob ed iên cia , d o d ever , d a r a zã o: d es a gr a d a
p or qu e a qu i é p r ecis o s a cr ifica r e im ola r d e ver d a d e, sem qu e o a u tor
do
s a cr ifício
m eta m or fos ea d o
em
ten h a
com o
d eu s .
Nu m a
vocês p a la vr a ,
a
ilu s ã o
de
vocês qu er em
s er a
em b r ia gu ez e o exces s o, e es s a m or a l qu e d es p r eza m s e er gu e contra a em b r ia gu ez e contra o exces s o
cr eio r ea lm en te qu e ela
lhes causa desprazer!
216. OS MAUS E A MÚSICA A p er feita felicid a d e d o a m or qu e h á n a con fian ça a bs olu ta ter ia a lgu m d ia p od id o a con tecer a p es s oa s qu e n ã o fos s em p r ofu n d a m en t e d es con fia d a s , m á s e ir r ita d iça s ? De fa t o, es ta s goza m n o a m or d e u m for m id á vel es t a d o d e exceção d e s eu es p ír it o, qu e lh es p a r ece in cr ível e n o qu a l ja m a is a cr ed ita r a m . Um b elo d ia s ã o s u b m er gid os p or es s e s en tim en to ilim ita d o, s em elh a n te a u m a vis ã o, con tr a s ta n d o com tod o o r es to d e s u a vid a s ecr eta e vis ível: com o u m d elicios o en igm a , u m a m a r a vilh a com cen telh a s d ou r a d a s , u ltr a p a s s a n d o tod a s a s p a la vr a s e tod a s a s im a gen s . A con fia n ça a b s olu t a tor n a m u d o; h á a t é u m a es p écie d e s ofr im en to e d e p es o n es s e feliz m u tis m o; é p or is s o qu e es s a s
a lm a s , op r im id a s p ela felicid a d e, exp er im en ta m ger a lm en t e m a is r econ h ecim en to p a r a com a música d o qu e tod a s a s ou tr a s , a in d a qu e m elh or es : p ois , p or m eio d a m ú s ica , vêem e ou vem , com o n u m a n u vem color id a , s eu a m or tor n a d o d e a lgu m m od o m a is distante, mais comovente e menos pesado; a música constitui para es s a s a lm a s o ú n ico m eio d e s er espectadora d e s eu es ta d o d e exceçã o e d e p a r t icip a r d e s eu a s p ecto, com u m a es p écie d e a fa s t a m en to e d e a lívio. Qu a lqu er a m a n te p en s a , a o ou vir m ú s ica : Ela fala de mim, fala em meu lugar, ela sabe tudo!
217. O ARTISTA Os a lem ã es qu er em s er tr a n s p or ta d os p elo a r tis ta a u m a es p écie d e p a ixã o s on h a d a ; os it a lia n os qu er em , gr a ça s a ele, d es ca n s a r d e s u a s p a ixões ver d a d eir a s ; os fr a n ces es qu er em qu e lh es ofer eça u m a oca s iã o d e com p r ova r s eu ju ízo e u m p r etexto para discorrer. Sejamos, pois, equilibrados!
218. AGIR COMO ARTISTA COM AS PRÓPRIAS FRAQUEZAS S e é a b s olu ta m en te n eces s á r io qu e ten h a m os fr a qu eza s e qu e ten h a m os ta m b ém d e r econ h ecê-la s com o leis a cim a d e n ós , desejo a cada um suficientes capacidades artísticas para saber dar r elevo a s u a s vir tu d es p or m eio d e s u a s fr a qu eza s , d e m od o a n os tor n a r , p or s u a s fr a qu eza s , á vid os d e s u a s vir tu d es : foi o qu e os gr a n d es m ú s icos s ou b er a m fa zer n u m gr a u tã o excep cion a l. Há com fr eqü ên cia n a m ú s ica d e Beeth oven 1 u m tom gr os s eir o, p r es u m id o, im p a cien t e; em Moza r t 2 , u m a jovia lid a d e d e h om em h on es to, cu jo cor a çã o e es p ír ito d evem con ten ta r -s e; em Rich a r d Wagner3 , u m a in qu ietu d e fu ga z e in s in u a n te, em qu e o p a cien te está ap on to d e perder s eu b om h u m or : m a s é en tã o qu e o com p os itor r etom a s u a for ça , com o os p r im eir os . Tod os cr ia r a m
em n ós , p or s u a s fr a qu eza s , u m a fom e d evor a d or a d e s u a s vir tu d es e tor n a r a m n os s o p a la d a r d ez vezes m a is s en s ível a ca d a gota de espírito sonoro, de beleza sonora, de bondade sonora.
219. O DISPARATE NA HUMILHAÇÃO Ca u s a s te, p or tu a d es r a zã o, u m s ofr im en to in fin it o a teu p r óxim o e d es tr u ís te ir r em ed ia velm en te s u a felicid a d e; a gor a vences tua vaidade e vais te humilhar junto dele, renuncias diante d ele à t u a d es r a zã o e p en s a s qu e, d ep ois d es s a cen a d ifícil, extr em a m en te p en os a p a r a ti, t u d o es tá r es olvid o, qu e o d a n o volu n tá r io d e tu a
h on r a
com p en s a
o d a n o in volu n tá r io d a
felicid a d e d o ou t r o: r ep leto d es s e s en t im en to, tu te a fa s t a s , r econ for ta d o, com a vir t u d e r econ qu is t a d a . Ma s o ou tr o con s er vou a p r ofu n d a d or qu e t in h a a n tes , n ã o h á n a d a d e con s ola d or p a r a ele n o fa t o d e s er es ir r a zoá vel e o ter es con fes s a d o; ele s e lem b r a até do penoso espetáculo que lhe ofereceste quando te desprezaste d ia n t e d ele, com o d e u m a n ova fer id a d e qu e te é d eved or ; m a s n ã o p en s a n a vin ga n ça e n ã o com p r een d e com o, en tr e ti e ele, a lgu m a cois a p od er ia s er reparada. No fu n d o, r ep r es en ta s te es s e p a p el d ia n t e d e ti m es m o e p a r a ti m es m o: con vid a s t e u m a tes tem u n h a , n ova m en t e p or tu a ca u s a e n ã o p or ca u s a d ele não te iludas!
220. A DIGNIDADE E O TEMOS As cer im ôn ia s , os cos tu m es d e a p a r a to e d e d ign id a d e, os r os tos s ér ios , os a r es s olen es , os d is cu r s os in d ir etos e tu d o o qu e, em ger a l, s e ch a m a d ign id a d e: é a for m a d e d is s im u la r p r óp r ia d a qu eles qu e ca r r ega m o t em or n o fu n d o d e s i m es m os ; qu er em d es s e m od o in s p ir a r tem or
(d eles
r ep r es en ta m ). Os h om en s s em tem or
p r óp r ios
ou
d a qu ilo qu e
is to é, or igin a r ia m en te
a qu eles qu e s ã o s em p r e e in d u b ita velm en te ter r íveis
n ã o t êm
n eces s id a d e d e d ign id a d e n em d e cer im ôn ia s ; p or s u a s p a la vr a s e a titu d es s u s ten ta m o b om e m a is a in d a o m a u r en om e d a h on es tid a d e e d a lea ld a d e, p a r a in d ica r qu e têm con s ciên cia d e seu caráter terrível.
221. MORALIDADE DO SACRIFÍCIO A m or a lid a d e qu e s e a va lia s egu n d o o es p ír ito d e s a cr ifício é aquela d e u m a s em i-s elva ger ia . A r a zã o d eve ob ter u m a vitór ia d ifícil e s a n gr en ta n o ín tim o d a a lm a , d eve a b a t er ter r íveis in s tin tos con tr á r ios ; is s o n ã o é p os s ível s em u m a es p écie d e crueldade, como nos sacrifícios exigidos pelos deuses canibais.
222. ONDE O FANATISMO É DESEJÁVEL Nã o s e p od e en tu s ia s m a r a s n a t u r eza s fleu m á tica s s em fanatizá-las.
223. O OLHO REMÍVEL Nã o h á n a d a qu e os a r tis ta s , os p oeta s , os es cr itor es r eceiem m a is qu e o olh o qu e p er ceb e s u a. pequ en a frau d e, qu e p er ceb e imediatamente qu e m u ita s vezes s e d etiver a m n o lim ite, a n tes d e s e en tr ega r à in ocen te a legr ia d e s e con ten ta r a s i m es m os ou d e ca ir n os efeitos fá ceis ; o olh o qu e ver ifica s e n ã o h á p equ en a s cois a s qu e qu is er a m ven d er m u ito ca r o, s e n ã o ten t a r a m exa lt a r e em b eleza r , s em s er eles p r óp r ios exa lt a d os ; o olh o qu e, p or m eio d e tod os os a r tifícios d e s u a a r te, vê o p en s a m en to com o s e a p r es en ta va
in icia lm en te
d ia n te
d eles ,
ta lvez
com o
uma
en ca n t a d or a vis ã o d e lu z, m a s ta lvez t a m b ém com o u m p lá gio p er p etr a d o à cu s ta d e t od os , com o u m p en s a m en to b a n a l qu e qu er em es ten d er , en cu r ta r , color ir , d es en volver , tem p er a r , p a r a
fa zer d ele a lgu m a cois a .
Oh ! es s e olh o qu e r econ h ece em s u a
ob r a tod a a s u a in qu ietu d e, s u a es p ion a gem e s u a a vid ez, s u a im ita çã o e s eu exa ger o (qu e n ã o p a s s a d e im ita çã o in vejos a ), qu e con h ece o r u b or d e s u a ver gon h a com o s u a a r t e d e d is s im u la r esse rubor e de lhe conferir outro sentido diante de vocês mesmos!
224. O QUE HÁ DE EDIFICANTE NA INFELICIDADE ALHEIA E le es tá
in feliz e eis
qu e ch ega m
os
apiedados , os
compassivos , qu e lh e a r r a n ca m a in felicid a d e.
Qu a n d o vã o
em b or a , n o fim , s a tis feitos e ed ifica d os , es tã o r ep letos d o es p a n to d o in feliz com o d e s eu p r óp r io es p a n to e p a s s a r a m u m a b ela tarde.
225. MEIO DE SER RAPIDAMENTE DESPREZADO Um
h om em
qu e
fa la
d ep r es s a
e
m u it o
ca i
extr a or d in a r ia m en te b a ixo em n os s a es tim a , d en tr o d e m u ito p ou co tem p o, m es m o s e fa la d e m od o s en s a to
e não só na
p r op or çã o d o a b or r ecim en to qu e n os ca u s a , m a s m u ito m a is b a ixo. De fa to, p en s a m os qu e já s e tor n ou in op or t u n o a m u ita gen te e a cr es cen ta m os a o d es p r eza r qu e n os ca u s a t od os os outros desprazeres que supomos que nos tenha causado.
226. D AS RELAÇÕES COM AS CELEBRIDADES A B
Mas por que evitas este grande homem? Nã o gos t a r ia d e a p r en d er a ign or á -lo! Nos s os d efeitos
n ã o con cor d a m ju n t os : eu s ou m íop e e d es con fia d o, e ele u s a os diamantes falsos com tanto prazer como os verdadeiros.
227. ACORRENTADOS Cu id a d o com tod os os es p ír itos a cor r en ta d os ! Por exem p lo,
com m u lh er es in teligen tes qu e o d es tin o con fin ou n u m loca l mesquinho e limitado, onde envelhecem. Elas estão lá, deitadas ao s ol, a p a r en tem en te p r egu iços a s e m eio cega s : m a s ca d a p a s s o es tr a n h o, t od a es p écie d e im p r evis to a s leva a s e s ob r es s a lta r e a m os tr a r os d en tes ; vin ga m -s e d e tu d o o qu e con s egu iu es ca p a r d e seu canil.
228. VINGANÇA NO ELOGIO Aí es tá u m a p á gin a ch eia d e elogios e vocês d izem qu e ela é d es in t er es s a n t e: m a s s e d es cob r em qu e h á vin ga n ça d is s im u la d a n es s es elogios , vã o a ch a r es s a p á gin a qu a s e m u it o s u t il e vã o s e d iver tir m u it o com s u a r iqu eza d e p equ en os tr a ços e figu r a s audaciosas. Não é o próprio homem, mas sua vingança que é sutil, tão rica e tão inventiva; ele próprio mal se dá conta disso.
229. ALTIVEZ Ai! n en h u m d e n ós con h ece o s en t im en t o qu e exp er im en ta o tor t u r a d o d ep ois d a tor tu r a , qu a n d o foi r econ d u zid o à s u a cela com s eu s egr ed o!
E le o gu a r d a a in d a en tr e os d en tes . Com o
querem conhecer o júbilo da altivez humana!
230. UTILITÁRIO Hoje, os s en tim en tos s e en tr ecr u za m n a s qu es tões d e m or a l, a p on to d e, p a r a u m , d em on s tr a r m os a m or a l p or s u a u tilid a d e e, para outro, a refutarmos precisamente por sua utilidade.
231. D A VIRTUDE ALEMÃ Com o u m p ovo d eve s er d egen er a d o em s eu gos to, s er vil d ia n t e d a s d ign id a d es , d a s ca tegor ia s s ocia is , d os cos tu m es , d a pompa e do aparato, para considerar o que é simples como mau, o
h om em s im p les (schlicht) com o h om em m a u (schlecht)! É p r ecis o op or s em p r e a o or gu lh o m or a l d os a lem ã es es ta p equ en a p a la vr a mau e nada mais!
232. E XTRATO DE UMA DISCUSSÃO A
Meu amigo, você ficou rouco de tanto falar!
B
Estou, portanto, refutado. Não falemos mais disso!
2 33. Os CONSCIENCIOSOS Not a r a m qu a is er a m os h om en s qu e con fer ia m a m a ior im p or tâ n cia à con s ciên cia m a is s ever a ? Aqu eles qu e con h ecem m u it os s en tim en tos m is er á veis , qu e p en s a m em s i m es m os com r eceio e qu e t êm m ed o d os ou tr os , a qu eles qu e qu er em es con d er o m elh or p os s ível s eu in tim o
tentam s e im p or a s i próprios por
es s a s ever id a d e con s cien cios a e es s e r igor d o d ever , gr a ça s à im p r es s ã o
s ever a
e
du ra
qu e
os
ou tr os
(s ob r et u d o
os
subordinados) devem ter deles.
2 34. R ECEIO DA CELEBRIDADE A
Qu e a lgu ém s e fu r te à p r óp r ia celeb r id a d e, qu e ofen d a
d elib er a d a m en te
s eu s
elogia d or es ,
qu e
r eceie
p r on u n cia d os con tr a ele, p or m ed o d o elogio is s o ex is te B
ou vir
ju ízos
is s o s e en con tra ,
quer você acredite ou não! Isso s e en con tr a , is s o exis te! S ó u m p ou co d e p a ciên cia ,
jovem arrogante!
235. R ECUSAR AGRADECIMENTOS Pode-s e m u ito b em r ecu s a r u m p ed id o, m a s n u n ca s e tem o direito de recusar agradecimentos (ou, o que é o mesmo, aceitá-los fr ia m en te
e
de
m a n eir a
con ven cion a l).
Is s o
ofen d er ia
profundamente
e por quê?
236. P UNIÇÃO Qu e cois a es tr a n h a n os s a m a n eir a d e p u n ir ! Nã o p u r ifica o cr im in os o, n ã o é u m a exp ia çã o: p elo con tr á r io, s u ja m a is qu e o próprio crime.
237. P ERIGO NUM PARTIDO Em quase todos os partidos há uma aflição ridícula, mas que n ã o é d es p r ovid a d e p er igo: s ofr em com ela tod os a qu eles qu e d u r a n te lon gos a n os for a m fieis e d ign os d efen s or es d a op in iã o d o p a r tid o e qu e u m d ia p er ceb em s u b ita m en te qu e a lgu ém m u ito m a is p od er os o s e a p od er ou d a tr om b eta . Com o p od er ia m s u p or ta r serem reduzidos ao silêncio? E é por isso que levantam o tom e, às vezes, até mesmo o alteram.
238. A ASPIRAÇÃO À ELEGÂNCIA S e u m a n a tu r eza vigor os a n ã o tem in clin a çã o à cr u eld a d e e não
se
ocu p a
con s ta n tem en te
involunta r ia m en t e à elegância
de
si
p r óp r ia ,
é sua m a rca d is tin tiv a . Os
ca r a cter es fr a cos , a o con tr á r io, a m a m os ju ízos r u d es a s s ocia m
a os
ca lu n ia d or es
h er óis da
do
exis tên cia ,
a s p ir a
d es p r ezo r eligios os
da ou
eles s e
h u m a n id a d e, filós ofos ,
ou
a os se
en tr in ch eir a m a tr á s d os cos tu m es s ever os e d e u m a es tr ita vocação : é a s s im qu e p r ocu r a m s e cr ia r u m ca r á ter e u m a espécie de vigor. E isso também, eles fazem involuntariamente.
239. ADVERTÊNCIA AOS MORALISTAS Nos s os m ú s icos fizer a m u m a gr a n d e d es cob er ta : a ch a r a m a feiú ra in teres s an te, ela ta m b ém er a p os s ível em s u a a r te! É p or
is s o qu e s e p r ecip ita m com em b r ia gu ez n o ocea n o d a feiú r a e n u n ca foi tã o fá cil fa zer m ú s ica . Agor a con qu is ta m os o ú ltim o p la n o ger a l t en eb r os o, n o qu a l o m a is leve cla r ã o d e m ú s ica a d qu ir e o b r ilh o d o ou r o e d a es m er a ld a ; a gor a ou s a m os p r ovoca r n o ou vin te a p er tu r b a çã o e a r evolt a , d eixá -lo s em fôlego, para lhe dar
em
s egu id a ,
num
m om en to
de
en fr a qu ecim en to
e
de
apaziguamento, um sentimento de beatitude que dispõe a apreciar m ú s ica . Des cob r im os o con tr a s te: é a gor a qu e os efeitos m a is p od er os os s ã o p os s íveis , e por bom p reço: n in gu ém m a is r ecla m a boa música. Mas é preciso se apressar! A arte tem pouco tempo de vid a
d es d e qu e s e fez es s a
d es cob er ta .
Ah ! s e n os s os
pensadores tivessem ouvidos para escutar, através de sua música, o qu e s e p a s s a n a a lm a d e n os s os m ú s icos ! At é qu a n d o s er á p r ecis o
es p er a r
para
r een con tr a r
s em elh a n t e
oca s iã o
de
s u r p r een d er o h om em in ter ior em fla gr a n t e d elit o d e m a ld a d e, com et id a com tod a a in ocên cia ! De fa to, n os s os m ú s icos es tã o bem lon ge d e s u s p eita r qu e tr a n s p õe em m ú s ica s u a p r óp r ia h is tór ia , h is tór ia d o en fea m en to d a a lm a . Ou t r or a u m m ú s ico er a qu a s e for ça d o p or s u a a r te a s e t or n a r u m h om em b om .
E
agora!
240. D A MORALIDADE DO PALCO Engana-s e a qu ele qu e im a gin a qu e o efeito p r od u zid o p elo tea tr o d e S h a k es p ea r e 4 é m or a l e qu e a vis ã o d e Ma cb eth a fa s ta d efin itiva m en te d os p er igos d a a m b içã o: en ga n a -s e u m a s egu n d a vez qu a n d o p en s a qu e o p r óp r io S h a k es p ea r e teve a m es m a im p r es s ã o qu e ele. Aqu ele qu e é ver d a d eir a m en te p os s u íd o p or uma a m b içã o fu r ios a con t em p la com alegria es s a im a gem d e s i m es m o; e qu a n d o o h er ói p er ece, vítim a d e s u a p a ixã o, es s e é p r ecis a m en te o in gr ed ien te m a is p ica n te n a b eb id a a r d en te d es s a
a legr ia . O p oeta s en tiu , p ois , d e ou t r a m a n eir a ? Com qu e a ltivez r ea l, s em n a d a d e lib er tin o, o a m b icios o p er cor r e s u a ca r r eir a , u m a vez p er p etr a d o s eu a u d a cios o cr im e! É s om en te a p a r tir desse momento que atrai diabolicamente e que impele à imitação a s n a tu r eza s s em elh a n t es ;
d ia b olica m en te qu er d izer a qu i: com
revolta contra o in t er es s e e a vid a , em b en efício d e u m a id éia e d e um
in s tin to.
Acr ed it a m ,
p or ta n t o,
qu e
Tr is t ã o
e
Is old a 5
testemunharam contra o a d u lt ér io p or qu e a m b os m or r em ? S er ia vir a r os p oeta s d e ca b eça p a r a b a ixo, eles qu e, s ob r etu d o com o S h a k es p ea r e, s ã o a p a ixon a d os p ela p a ixã o em s i e d e m od o a lgu m pela disposição mórbida que gera: quando o coração não se segura mais à vida do que como uma gota na borda do copo. Não é a falta e s u a s con s eqü ên cia s qu e os in ter es s a m , t a n t o S h a k es p ea r e com o Sófocles6 (em Ája x, Filocte to, Éd ipo): m es m o qu e tives s e s id o fá cil n os
ca s os
in d ica d os , fa zer d a
fa lt a
a
a la va n ca
do dram a,
ju s ta m en t e com o p r ocu r a r a m evitá -lo. De igu a l m od o, o p oeta trágico, por suas imagens da vida, não quer prevenir contra a vida! Pelo con tr á r io, excla m a : É o en ca n to d e tod os os en ca n tos es s a exis tên cia a gita d a , m u tá vel, p er igos a , s om b r ia e m u ita s vezes a r d en tem en te en s ola r a d a ! Viver é u m a aventura, tom em es t e ou a qu ele p a r tid o n a vid a , ela s em p r e con s er va r á es s a ca r a cter ís t ica ! É a s s im qu e fa la n u m a ép oca in qu ieta e vigor os a qu e in eb r ia e a tor d oa p ela m eta d e s u a s u p er a b u n d â n cia d e s a n gu e e d e en er gia , n u m a ép oca m a is m a ld os a qu e a n os s a : a í es tá p or qu e temos n eces s id a d e d e modificar e d e ad a p ta r o ob jetivo d e u m drama de Shakespeare, isto é, de não conseguir compreendê-lo.
241. MEDO E INTELIGÊNCIA S e é ver d a d e o qu e s e a fir m a h oje ca tegor ica m en t e, qu e n ã o é p r ecis o p r ocu r a r n a lu z a ca u s a d o p igm en to n egr o d a p ele, es s e
fen ôm en o p od er ia s er o ú ltim o efeit o d e fr eqü en tes a ces s os d e r a iva (e d e a flu xos d e s a n gu e s ob a p ele) a cu m u la d os d u r a n te s écu los ?
E n qu a n to
en tr e
ou tr a s
r a ça s
m a is
inteligentes, o
fen ôm en o d a p a lid ez e d o m ed o, ta m b ém m u ito fr eqü en tes , ter ia con tr ib u íd o p a r a p r od u zir a cor b r a n ca d a p ele?
De fa to, o gr a u
d e tem or é u m a m ed id a d a in teligên cia : e o fa t o d e s e a b a n d on a r m u it a s vezes a u m a r a iva cega é o s in a l d e qu e a a n im a lid a d e es tá a in d a b em p r óxim a e ten ta s e im p or d e n ovo
castanho
a cin zen t a d o, es s a ta lvez s er ia a cor p r im itiva d o h om em qualquer coisa que lembra o macaco e o urso, como seria justo.
242. INDEPENDÊNCIA A in d ep en d ên cia (ch a m a d a
lib er d a d e d e p en s a m en to , em
s u a d os e m a is fr a ca ) é a for m a d e r en ú n cia qu e o es p ír ito d om in a d or a ca b a p or a ceita r
ele qu e h á m u it o p r ocu r a va o qu e
dominar e não encontrou nada senão ele mesmo.
243. AS DUAS DIREÇÕES S e ten ta r m os con tem p la r o es p elh o em s i, a ca b a m os p or n ã o d es cob r ir s en ã o os ob jet os qu e n ele s e r efletem . S e qu is er m os a ga r r a r es s es ob jetos , volt a m os a ver s om en te o es p elh o.
Essa é
a história geral do conhecimento.
244. O PRAZER QUE A REALIDADE CAUSA Nos s a ten d ên cia a tu a l d e en con tr a r p r a zer n a r ea lid a d e quase todos a temos
não pode ser compreendida de outra forma
qu e a d m itin d o qu e, d u r a n te m u ito tem p o e a t é a s a cied a d e, en con tr a m os n os s o p r a zer n a ir r ea lid a d e. E s s a ten d ên cia , ta l com o s e a p r es en ta h oje, s em es colh a e s em s u tileza , n ã o é is en ta de perigos:
seu menor perigo é a falta de gosto.
245. S UTILEZA DO SENTIMENTO DE PODER Na p oleã o fica va exa s p er a d o p or fa la r m a l e n es s e a s p ect o ele n ã o m en tia a s i p r óp r io: m a s s eu d es ejo d e d om in a r qu em n ã o p er d ia n en h u m a oca s iã o p a r a s e m a n ifes ta r e s e m os tr a va m a is s u til qu e s eu es p ír it o s u til im p elia -o a fa la r a in d a p ior d o qu e re alm en te
p od ia . É
a s s im
qu e
se
vin ga va
de
su a
p r óp r ia
exa s p er a çã o (er a ciu m en to d e tod a s a s s u a s p a ixões , p or qu e ela s tinham poder) p a r a u s u fr u ir d e s eu b elo pra z er a u tocr á tico. E m s egu id a , u s u fr u ía u m a s egu n d a vez d es s e b elo p r a zer com r ela çã o a os ou vid os e a o ju ízo d e s eu s ou vin tes : com o s e fos s e m u ito b om p a r a eles d e lh es fa la r a s s im . Reju b ila va -se m es m o em s egr ed o com a id éia d e p er tu r b a r o ju ízo e d e es tr a ga r o gos to p elo b r ilh o e p elo tr ovã o d a m a is a lta a u tor id a d e p od er com a gen ia lid a d e;
qu e r es id e n a u n iã o d o
en qu a n to s eu ju ízo e s eu gos to
con s er va va m n ele p r óp r io a con vicçã o d e qu e fa la va mal. Na p oleã o, com o tip o com p leto, tot a lm en te d es eja d o e r ea liza d o p or um
ú n ico
in s tin to,
características
p er ten ce
à
h u m a n id a d e
a n tiga ,
cu ja s
a con s t r u çã o s im p les e o d es en volvim en to
en gen h os o d e u m s ó e d e u m p equ en o n ú m er o d e m ot ivos
são
bastante fáceis de identificar.
246. ARISTÓTELES E O CASAMENTO Nos filh os d os gr a n d es gên ios exp lod e a lou cu r a ; n a qu eles d os gr a n d es vir tu os os , a es tu p id ez
ob s er va Ar is tóteles 7 . Qu er ia ,
desse modo, convidar ao casamento os homens excepcionais?
247. ORIGEM DO MAU TEMPERAMENTO A in ju s tiça e a in s ta b ilid a d e em ocion a l d e cer tos h om en s , s u a d es or d em e fa lta d e m ed id a , s ã o a s ú ltim a s con s eqü ên cia s d e
inúmeras inexatidões lógicas, falta de profundidade, de conclusões a p r es s a d a s d e qu e s eu s a n tep a s s a d os s e tor n a r a m cu lp a d os . Os h om en s d e b om tem p er a m en to, em com p en s a çã o, d es cen d em d e r a ça s r eflet id a s e s ólid a s , qu e er gu er a m b em a lto a r a zã o
que
isso tenha sido para fins louváveis ou não, isso não conta muito.
248. S IMULAÇÃO POR DEVER A b on d a d e
foi
p a r ticu la r m en te
d es en volvid a
p or
uma
s im u la çã o p er s is ten te qu e qu er ia p a r ecer b oa : p or tod a a p a r te on d e exis tia u m gr a n d e p od er , r econ h eceu -s e a n eces s id a d e p a r ticu la r d es s a es p écie d e s im u la çã o
ela in s p ir a a s egu r a n ça e
a con fia n ça e cen tu p lica a s om a r ea l d e for ça fís ica . A m en tir a é, s en ã o a m ã e, p elo m en os a a m a d a b on d a d e. De igu a l m od o, a h on es tid a d e foi cr ia d a es p ecia lm en te p ela exigên cia d e u r n a a p a r ên cia
de
h on es tid a d e
e
de
lea ld a d e:
na
a r is t ocr a cia
h er ed itá r ia . Do exer cício con s ta n te d e u m a s im u la çã o a ca b a p or nascer a natureza: a s im u la çã o, a lon go p r a zo, s e s u p r im e a s i p r óp r ia , ór gã os e in s tin tos s ã o os fr u tos in es p er a d os d o ja r d im d a hipocrisia.
249. QUEM NUNCA ESTÁ SÓ! O h om em r eceos o n ã o s a b e o qu e é es ta r s ó; h á s em p r e u m in im igo a tr á s d e s u a ca d eir a .
Ah! qu em , p or t a n to, p od er ia n os
contar a historia desse sentimento sutil que se chama solidão!
250. NOITE E MÚSICA Foi s om en te n a n oite e n a s em i-ob s cu r id a d e d a s s ób r ia s flor es ta s e d a s ca ver n a s qu e o ou vid o, ór gã o d o m ed o, p ôd e s e d es en volver tã o a b u n d a n tem en t e com o o fez, gr a ça s à m a n eir a d e viver da idade do medo, isto é, da mais longa das épocas humanas
qu e h ou ve: à lu z, o ou vid o é m u it o m en os n eces s á r io. Dis s o decorre a característica da música, arte da noite e da penumbra.
251. D E MANEIRA ESTÓICA Há u m a s er en id a d e p ecu lia r n o es t óico qu a n d o s e s en te s ob p r es s ã o n o cer im on ia l qu e ele p r óp r io p r es cr eveu a s u a s a ções ; ele sente prazer então em si mesmo como dominador.
252. P ENSEMOS NISSO! Aqu ele qu e é p u n id o n u n ca é o m es m o qu e com eteu o a t o. É sempre o bode expiatório.
253. E VIDÊNCIA É
tr is t e
d izer ,
mas
há
uma
cois a
qu e
é
n eces s á r io
d em on s tr a r com m a is r igor e ob s tin a çã o, é a evid ên cia . De fa t o, a m a ior ia
das
p es s oa s
n ã o tem
olh os
para
vê-la . Ma s
es s a
demonstração é tão aborrecida!
254. AQUELES QUE ANTECIPAM O qu e d is tin gu e a s n a tu r eza s p oética s , m a s é ta m b ém u m p er igo p a r a ela s , é s u a im a gin a çã o qu e esgota d e a n t em ã o: a im a gin a çã o qu e a n tecip a o qu e va i ocor r er ou p od er ia ocor r er , qu e s e a legr a ou s ofr e com is s o d e a n tem ã o, e qu e, n o m om en to fin a l d o a con t ecim en to ou d a a çã o, já es tá fatigado. Lor d Byr on 8 , qu e con h ecia is s o m u ito b em , es cr evia em s eu d iá r io: S e a lgu m d ia tiver u m filh o, ele d ever á s e tor n a r a lgu m a cois a d e tota lm en te prosaico
jurista ou pirata .
255. CONVERSA SOBRE A MÚSICA A
Que é que você acha desta música?
B
E la m e s u b ju gou , n ã o ten h o a b s olu ta m en t e n a d a a
dizer. Escute! Ela recomeça! A
Ta n t o m elh or ! Va m os tom a r cu id a d o p a r a qu e a gor a
sejamos nós qu e a s u b ju ga m os . Pos s o a cr es cen ta r a lgu m a s p a la vr a s a es ta m ú s ica ? E m os tr a r -lhe ta m b ém u m d r a m a qu e talvez não tenha querido ver na primeira audição? B
J á es tou es cu t a n d o! Ten h o d ois ou vid os e m a is qu e is s o
se for necessário. Venha para bem perto de mim! A
Nã o é a in d a is to qu e ela n os qu er d izer , a t é a qu i,
p r om ete s om en t e qu e qu er d izer a lgu m a cois a , a lgu m a cois a d e in a u d ito, com o o d á a en ten d er a tr a vés d es tes ges tos . Com o fa z s in a is ! Com o s e en d ir eita ! Com o ges ticu la ! E eis qu e p a r ece ter ch ega d o o m om en t o d e ten s ã o s u p r em a : a in d a d u a s fa n fa r r a s e va i a p r es en ta r s eu tem a s ob er b o e a d or n a d o, s oa n d o com o p ed r a s p r ecios a s . É u m a b ela m u lh er ? Ou u m b elo ca va lo? Logo, ele olh a em tor n o d ele, a r r eb a ta d o, p ois h á olh a r es d e en ca n t o a r ecolh er ; s om en te a gor a s eu tem a lh e a gr a d a com p leta m en t e, s om en te a gor a s e t or n a in ven tivo, ou s a tr ech os n ovos e a u d a cios os . Com o va lor iza s eu tem a ! Ah ! p r ep a r e-se!
E le n ã o s e d ed ica s om en t e a
or n a r , m a s t a m b ém a pintá-lo! E le s a b e m u ito b em qu a l é a cor d a s a ú d e e s e em p en h a a fa zê-la a p a r ecer
é m a is s u til n o
con h ecim en to d e s i d o qu e eu p en s a va . E a gor a cr ê já ter con ven cid o s eu s ou vin tes , a p r es en ta s u a s in ven ções com o s e fos s em a s cois a s m a is im p or ta n t es s ob o s ol, a p on t a s eu tem a com u m d ed o in s olen t e, com o s e fos s e d em a s ia d o b om p a r a es te mundo.
Ah ! com o é d es con fia d o! Tem m ed o d e qu e n os
cansemos ! É p or is s o qu e en volve s u a s m elod ia s em açúcar a gor a a p ela m es m o p a r a os m a is gr os s eir os d e n os s os s en tid os , p a r a n os com over e n os m a n t er d e n ovo s ob s eu p od er ! E s cu te com o evoca a for ça elem en ta r d os r itm os , d a t em p es ta d e e d o
tr ovã o! E a gor a qu e p er ceb eu d e qu e es tes r itm os n os p os s u em , nos estrangulam e estão prestes a nos matar, ele ousa misturar de n ovo s eu t em a a o jogo d os elem en tos p a r a n os convencer, a n ós qu e es t a m os s em i-es tu p efa tos e a b a la d os , qu e n os s a es tu p efa çã o e n os s a em oçã o s ã o os efeitos d e s eu tem a m ir a cu los o. E a p a r tir d a qu i os ou vin t es lh e d ã o cr éd ito: d es d e qu e o tem a r es s oa u m a lem b r a n ça d es s es com oved or es efeit os elem en ta r es n a s ce em s u a memória
e o t em a a p r oveita a gor a d es s a lem b r a n ça
a í es tá
ele, qu e s e tor n a demoníaco ! Qu e con h eced or d a a lm a h u m a n a , es te m ú s ico! E le n os d om in a com os a r tifícios d e u m or a d or popular.
Mas a música emudece!
B
E o fa z p er feita m en te b em ! Pois n ã o p os s o m a is
suportar ouvi-lo! Prefiro dez vezes me deixar enganar que conhecer uma vez a verdade à sua maneira! A
Is s o é o qu e eu qu er ia ou vir d e você. Os m elh or es s ã o
h oje feit os à s u a im a gem : você fica s a tis feito p or s e d eixa r en ga n a r ! Você vem a qu i com ou vid os gr os s eir os e á vid os , m a s n ã o tr a z a con s ciên cia d a a r te d e es cu ta r . Pelo ca m in h o, você jogou for a s u a m a is s u til boa fé! É a s s im qu e você cor r om p e a a r te e os a r tis ta s ! S em p r e qu e a p la u d e e a cla m a , você tem en tr e a s m ã os a con s ciên cia d os a r tis ta s
e in felizes d eles s e p er ceb er em qu e
você n ã o s a b e d is tin gu ir en tr e m ú s ica in ocen t e e m ú s ica cu lp a d a ! Não quero realmente falar de boa e de má música
há de uma
e d e ou t r a n a s d u a s es p écies ! Ma s ch a m o m ú s ica in ocen te aquela qu e p en s a exclu s iva m en te em s i, a cr ed ita a p en a s em s i e qu e, p or ca u s a
d ela
m es m a ,
es qu eceu
o
m u ndo
a
r es s on â n cia
espontânea da mais profunda solidão que fala de si mesma para si m es m a e qu e n ã o s a b e m a is qu e h á lá for a ou vin t es à es cu ta , efeitos, mal-entendidos e insucessos.
Em resumo: a música que
a ca b a m os d e ou vir é p r ecis a m en te d es s a es p écie n ob r e e r a r a e
tu d o o qu e d is s e d ela er a m en tir a
d es cu lp e m in h a m a ld a d e, s e
quiser! B
Ah ! Você gos ta en t ã o desta m ú s ica ? E n tã o m u itos
pecados lhe serão perdoados!
256. F ELICIDADE DOS MAUS E s s es
h om en s
s ilen cios os ,
s om b r ios
e
mau s
p os s u em
a lgu m a cois a qu e n ã o p od em d is p u ta r com eles , u m p r a zer r a r o e singular no dolce farniente9 , u m a tr a n qü ilid a d e d e cr ep ú s cu lo e d e s ol s e p on d o, com o s ó o con h ece u m cor a çã o qu e foi m u ita s vezes devorado, dilacerado, e envenenado pelas paixões.
257. P ALAVRAS PRESENTES EM NOSSO ESPÍRITO Só s a b em os exp r im ir n os s os p en s a m en tos com a s p a la vr a s qu e tem os à m ã o. Ou m elh or , p a r a exp r im ir tod a s a s m in h a s s u s p eita s : a ca d a in s ta n t e t em os s om en t e o p en s a m en t o p a r a o qu a l tem os p r es en t es n a m em ór ia a s p a la vr a s qu e p od em exp r im ilo aproximativamente.
258. ACARICIAR O CÃO Ba s t a a ca r icia r u m a vez o p êlo d o cã o: logo ele s e p õe a vib r a r e a la n ça r fa ís ca s com o fa r ia qu a lqu er ou tr o b a ju la d or
e
é espiritual à sua maneira. Por que não haveríamos de suportá-lo?
259. O ANTIGO ELOGIADOR E le s e ca la p or m in h a ca u s a , em b or a s a ib a a gor a a ver d a d e e qu e p od er ia d izê-la . Ma s s oa r ia com o u m a vin ga n ça estima tanto a verdade, esse homem tão digno de estima!
260. AMULETO DOS HOMENS DEPENDENTES
e ele
Aqu ele qu e d ep en d e in evita velm en t e d e u m m es tr e d eve p os s u ir a lgu m a cois a qu e in s p ir a o m ed o e m a n t ém o m es tr e com r éd ea s cu r ta s , p or exem p lo, a p r ob id a d e ou a fr a n qu eza ou a in d a a má língua.
261. P OR QUE TÃO SUBLIME! Ai! vocês conhecem essa espécie animal! É verdade que gosta m a is d e s i qu a n d o a va n ça er gu id a s ob r e d u a s p er n a s com o u m deus
m a s qu a n d o r eca i s ob r e s u a s qu a tr o p a t a s , é a m im qu e
agrada mais: isso lhe é incomparavelmente mais natural!
262. O DEMÔNIO DO PODER Nã o é a n eces s id a d e, n ã o é o d es ejo
n ã o, é o a m or a o
p od er qu e é o d em ôn io d os h om en s . Ain d a qu e s e lh es d ê tu d o, s a ú d e,
a lim en to,
a loja m en to,
d is tr a ções
eles
con tin u a m
infelizes e caprichosos, pois o demônio espera e espera sempre, ele qu er s er s a tis feito. Tir em os t u d o a os h om en s e s a tis fa ça m os o d em ôn io, e eles fica r ã o qu a s e felizes
tã o felizes qu a n to o p od em
s er h om en s e d em ôn ios . Ma s p or qu e eu r ep etir ia is s o? Lu ter o já o disse, e melhor que eu, nos versos: Se nos tirarem o corpo e bens, h on r a , m u lh er e filh os : d eixem -n os fa zer is s o
o Rein o r es ta r -
nos-á de qualquer modo! Sim, sim! o Reino !
263. A CONTRADIÇÃO TORNADA CORPO E ALMA Na qu ilo qu e s e ch a m a gên io h á u m a con tr a d içã o fis iológica : o gên io p os s u i, p or d es or d en a d o,
um
in volu n tá r io
la d o, m u ito m ovim en to s elva gem , e,
p or
ou tr o
fin a lid a d e s u p er ior n es s e m ovim en to
la d o,
uma
gr a n d e
com is s o tem com o
p r óp r io u m es p elh o qu e m os tr a os d ois m ovim en tos , u m a o la d o d o ou tr o, en tr ela ça d os , m a s com
m u ita fr eqü ên cia ta m b ém
op os tos , u m con tr a o ou tr o. A con s eqü ên cia d es s e a s p ecto é qu e o gên io é m u ita s vezes in feliz e, s e ele s e s en te m a is feliz n a cr ia çã o, é p or qu e es qu ece qu e ju s t a m en te en tã o, em
su a
a tivid a d e
s u p er ior , fa z a lgu m a cois a d e im a gin á r io e d e n ã o r a zoá vel (tod a arte é assim)
e é necessário que o faça.
264. QUERER ENGANAR-SE Os h om en s in vejos os qu e têm u m fa r o s u til n ã o p r ocu r a m con h ecer d e p er to s eu r iva l, a fim d e p od er s e s en tir s u p er ior es a ele.
265. O TEATRO TEM SEU TEMPO Qu a n d o a im a gin a çã o d e u m p ovo d eclin a , n a s ce n ele o gos to d e r ep r es en ta r n o p a lco s u a s len d a s , suportando a p a r t ir d e en tã o os gr os s eir os s u b s titu tos d a imaginação
m a s pa ra a
ép oca à qu a l p er ten ce a r a p s ód ia , o tea tr o e o a t or d is fa r ça d o em h er ói s ã o u m en tr a ve em vez d e u m a a s a d a im a gin a çã o: m u ito p r óxim os , m u it o d efin id os , m u it o p es a d os , m u ito p ou co s on h o e vôo de pássaro.
266. S EM GRAÇA E le n ã o t em gr a ça e s a b e: Oh ! com o s e d ed ica a m a s ca r a r is s o! Com u m a s ever a vir tu d e, com o olh a r s om b r io, com u m a desconfiança adquirida em relação aos homens e à existência, com ges tos gr os s eir os , com o d es p r ezo d e u m m od o d e vid a r efin a d o, com o pathos e a s exigên cia s , com u m a filos ofia cín ica
sim,
s ou b e m es m o t or n a r -s e u m ca r á ter n a con s ciên cia con tín u a d o que lhe faltava.
267. P OR QUE TÃO ALTIVO?
Um ca r á t er n ob r e s e d is t in gu e d e u m ca r á t er vu lga r p or qu e n ã o tem a s eu alca n ce, com o es te, cer t o n ú m er o d e h á b itos e d e p on t os d e vis ta : o a ca s o qu is qu e n ã o os tives s e con s egu id o n em por herança nem por educação.
268. CARIBDE E CILA10 DO ORADOR Com o er a d ifícil em Aten a s fa la r d e m a n eir a a ga n h a r os ou vin tes p a r a u m a ca u s a , s em r ech a çá -los p ela form a ou s em afastá-los d a ca u s a com a for m a ! Com o é d ifícil a in d a n a Fr a n ça escrever da mesma maneira!
269. OS DOENTES E A ARTE Con tr a t od a es p écie d e tr is teza e d e m is ér ia d a a lm a , é n eces s á r io a n tes d e tu d o ten ta r u m a m u d a n ça d e r egim e e u m d u r o tr a b a lh o fís ico. Ma s os h om en s es tã o h a b itu a d os n es s e ca s o a r ecor r er a m eios qu e p r ovoca m em b r ia gu ez: p or exem p lo, à a r te p a r a s u a in felicid a d e e ta m b ém p a r a a qu ela d a a r te! Nã o r ep a r a m qu e, s e vocês r ecor r em à a r te, en qu a n t o d oen t es , tor n a m a arte doente?
270. T OLERÂNCIA APARENTE Aí es tã o b oa s p a la vr a s , b en evolen tes e com p r een s íveis , s ob r e a ciên cia e em fa vor d a ciên cia , m a s ! m a s ! eu olh o atrás d e s u a toler â n cia p a r a com a ciên cia ! Nu m ca n to d o cor a çã o vocês p en s a m , a p es a r d e tu d o, qu e ela n ã o lh es é n eces s ária , qu e é p or pura gen er os id a d e d e s u a p a r te a d m iti-la e s er a té m es m o a d voga d o d ela , t a n to m a is qu e a ciên cia n ã o t em , d e s u a p a r te, es s a m a gn a n im id a d e a r es p eito d a op in iã o d e vocês ! S a b em qu e vocês n ã o têm n en h u m d ir eito a exer cer es s a toler â n cia ? Qu e es s e ges to d e con d es cen d ên cia é u m u ltr a je m a is gr os s eir o à h on r a d a
ciên cia d o qu e o fr a n co d es d ém qu e s e p er m ite a r es p eito d ela a lgu m
padre
ou
a lgu m
a r tis t a
im p etu os o?
Fa lta -lh es
es s a
con s ciên cia r igor os a p a r a o qu e é ver d a d eir o e r ea l; vocês n ã o s e s en tem a tor m en t a d os n em m a r tir iza d os p or ver a ciên cia em con tr a d içã o com s eu s s en tim en tos , vocês ign or a m o d es ejo á vid o d o con h ecim en to qu e os gover n a r ia com o u m a lei, n ã o s en tem u m d ever n a n eces s id a d e d e es t a r p r es en tes com os olh os em tod a p a r te on d e s e qu e é
conhece , p a r a n ã o d eixa r es ca p a r n a d a d a qu ilo
conhecido . Vocês ignoram o qu e tr a ta m com ta n ta
b en evolên cia ! E é s om en te porque o ign or a m qu e con s egu em a s s u m ir u m a a p a r ên cia tã o b en evolen te! Vocês , exa t a m en t e vocês , ter ia m u m olh a r d e ód io e d e fa n a t is m o s e a ciên cia qu is es s e u m d ia ilu m in a r a fis ion om ia d e seus olhos! qu e s eja m toler a n tes a nosso respeito!
Qu e n os im p or t a , p ois ,
p a r a com u m fan ta s m a ! E d e m od o a lgu m
E que isso importa para nós!
271. A DISPOSIÇÃO DE FESTA É
ju s ta m en te
para
es s es
h om en s
qu e
a s p ir a m
m a is
im p etu os a m en te a o p od er qu e é in fin ita m en t e a gr a d á vel s en t ir -se subjugados! Afundar-s e s u b ita m en t e n o fu n d o d e u m s en t im en to com o n u m tu r b ilh ã o! Deixa r a r r a n ca r a s r éd ea s d a s m ã os e s er es p ect a d or d e u m m ovim en to qu e va i leva r n ã o s e s a b e on d e! S eja qu em for , s eja o qu e for qu e n os p r es t e es s e s er viço
presta-nos
u m gr a n d e s er viço: es ta m os tã o felizes e es ta fa d os e s en tim os em tor n o d e n ós u m s ilên cio excep cion a l, com o n o m a is p r ofu n d o centro da terra. Estar uma vez inteiramente sem poder! Joguete de for ça s p r im or d ia is ! Há u m r ep ou s o n es s a felicid a d e, u m a lívio d o gr a n d e fa r d o, u m a d es cid a s em fa d iga , com o qu e en t r egu es a u m p es o cego. É o s on h o d o h om em qu e es ca la a s m on ta n h a s e qu e, ten d o fixa d o o top o com o objetivo, a d or m ece u m in s t a n te p elo
camin h o, ch eio d e fa d iga e s on h a a felicid a d e con trá ria
d e r ola r
s em d ificu ld a d e m on ta n h a a b a ixo. Des cr evo a felicid a d e com o a im a gin o em n os s a s ocied a d e a tu a l d a E u r op a e d a Am ér ica , a o m es m o tem p o exten u a d a e s ed en ta d e p od er . Por a qu i e p or lá os h om en s qu er em r eca ir n a impotência
a s gu er r a s , a s a r tes , a s
r eligiões , os gên ios lh es ofer ecem ta m b ém es s e p r a zer . Qu a n d o n os a b a n d on a m os a u m a im p r es s ã o m om en tâ n ea qu e d evor a e a n iqu ila t u d o
es s a é a d is pos içã o d a fes ta m od er n a ! Volta m os a
tornar-n os m a is livr es , m a is leves , m a is fr ios , m a is s ever os e aspiramos então, sem repouso, a alcançar o contrário: o poder.
272. A PURIFICAÇÃO DA RAÇA Nã o h á p r ova velm en te r a ça s p u r a s , m a s s om en t e r a ça s d ep u r a d a s e es ta s s ã o ext r em a m en te r a r a s . O qu e h á d e m a is difundido s ã o a s r a ça s m is ta s , n a s qu a is , a o la d o d os d efeitos d e h a r m on ia n a s for m a s cor p or a is (p or exem p lo, qu a n d o os olh os e a b oca n ã o com b in a m ) s e en con tr a n eces s a r ia m en t e for ços a m en te d efeitos
de
h a r m on ia
n os
h á b itos
e
n os
ju ízos
de
va lor .
(Livingstone11 ouviu u m a vez d izer : Deu s cr iou os b r a n cos e os n egr os , m a s p r od u zem
o d ia b o cr iou
s em p r e,
ao
os
m es m o
m es tiços . ) As tem p o
qu e
r a ça s
cu ltu r a s
m is ta s m is ta s ,
m or a lid a d es m is ta s : s ã o ger a lm en te m a is m a ld os a s , m a is cr u éis , m a is in s t á veis . A p u r eza é o r es u lta d o fin a l d e in u m er á veis a s s im ila ções , a b s or ções e elim in a ções , e o p r ogr es s o em d ir eçã o à p u r eza s e m a n ifes ta n o fa to qu e a for ça p r es en te n u m a r a ça s e restringe, ca d a vez m a is , a a lgu m a s fu n ções es colh id a s , en qu a n to a n tes tin h a d e r ea liza r , com m u ita fr eqü ên cia , m u ita s cois a s con tr a d itór ia s : s em elh a n te r es t r içã o ter á s em p r e a p a r ên cia s d e empobrecimento e n ã o s e d eve ju lgá -la s en ã o com p r u d ên cia e m od er a çã o. Ma s fin a lm en te, qu a n d o o p r oces s o d e p u r ifica çã o
ob teve êxito, tod a s a s for ça s qu e ou tr or a s e p er d ia m n a lu ta en tr e a s qu a lid a d es s em h a r m on ia , s e en con tr a m a gor a à d is p os içã o d o con ju n to d o or ga n is m o: é p or is s o qu e a s r a ça s d ep u r a d a s s e tor n a r a m s em p r e m a is fortes e m a is belas. ofer ecem
Os gr egos n os
o m od elo d e u m a r a ça e d e u m a cu ltu r a a s s im
depuradas: d evem os es p er a r qu e a cr ia çã o d e u m a r a ça e d e u m a cultura européias puras tenha igualmente êxito um dia.
273. OS ELOGIOS Per ceb es qu e a lgu ém qu er te elogiar: m or d es os lá b ios , teu cor a çã o s e a p er t a , a i! qu e es s e cálice s e a fa s te d e ti! Ma s n ã o s e afasta , s e a p r oxim a ! Beb a m os , p ois , a d oce im p er tin ên cia d o b a ju la d or , ven ça m os o d es gos to e o p r ofu n d o d es p r ezo qu e n os in s p ir a o es s en cia l d e s eu s elogios , en r u gu em os o r os to n u m a exp r es s ã o d e a legr ia r econ h ecid a !
E le qu er ia s er a gr a d á vel! E
a gor a qu e es tá feito, s a b em os qu e s e s en te m u ito exa lt a d o, ob t eve u m a vitór ia s ob r e n ós
e ta m b ém s ob r e ele p r óp r io, o cã o!
pois, não lhe foi fácil extorquir de si esses elogios.
274. D IREITO E PRIVILÉGIO DO HOMEM Nós , h om en s , s om os a ú n ica cr ia t u r a qu e, qu a n d o n ã o tem êxit o, p od e s e a u to-s u p r im ir , com o u m a fr a s e m a l ela b or a d a a gim os a s s im , s eja p ela h on r a d a h u m a n id a d e ou p or com p a ixã o para com ela, seja ainda por aversão contra nós mesmos.
275. O HOMEM TRANSFORMADO Agor a s e tor n a vir t u os o, u n ica m en te p a r a fer ir os ou tr os . Não olhem tanto para seu lado!
276. F REQÜENTE! MAS INESPERADO!
Qu a n tos h om en s ca s a d os vir a m d es p on t a r a m a n h ã em qu e p er ceb ia m qu e s u a jovem m u lh er es ta va a b or r ecid a , m a s ela a p a r en t a va o con tr á r io! Pa r a n ã o fa la r d es s a s m u lh er es cu ja ca r n e está pronta, mas o espírito é fraco!
277. VIRTUDES ARDENTES E FRIAS A cor a gem , com o d ecis ã o fr ia e in a b a lá vel, e a cor a gem , com o b r a vu r a fogos a e s em i-cega
p a r a es s a s d u a s cor a gen s h á
u m a s ó p a la vr a ! Com o s ã o d ifer en tes , n o en ta n to, a s v irtu d es fria s das virtu d es ard en tes ! E lou co s er ia qu em im a gin a s s e qu e a qualidade
d a vir tu d e s ó é a u m en t a d a p elo a r d or , m a is lou co
a in d a qu em a a tr ib u ís s e exclu s iva m en t e à fr ieza ! Pa r a d izer a verdade, a humanidade julgou muito útil a coragem de sangue-frio ou fogos a e, a lém d o m a is , m u ito p ou co fr eqü en te p a r a n ã o fa zê-la brilhar entre suas jóias sob duas cores diferentes.
278. A MEMÓRIA COMPLACENTE Aqu ele qu e ocu p a u m a p os içã o eleva d a fa r á b em a o a d qu ir ir para si uma memória complacente, isto é, reter nas pessoas todo o b em possível e em seguida fechar a conta: assim as mantém numa a gr a d á vel d ep en d ên cia . O h om em p od e ta m b ém p r oced er d a m es m a for m a con s igo m es m o: ten h a ou
n ã o u m a m em ór ia
com p la cen te, é o p on to d ecis ivo p a r a ju lga r s u a a titu d e p a r a con s igo m es m o, s u a n ob r eza , s u a b on d a d e ou d es con fia n ça n a ob s er va çã o d e s u a s t en d ên cia s e d e s u a s in ten ções e fin a lm en te a própria qualidade de suas tendências e de suas intenções.
279. E M QUE NOS TORNAMOS ARTISTAS Aqu ele qu e fa z d e a lgu ém s eu íd olo ten ta s e ju s tifica r d ia n te de s i m es m o, eleva n d o-o n o id ea l; ele s e fa z a r tis ta , n a p es s oa d e
s eu íd olo, p a r a ter b oa con s ciên cia . S e s ofr e, n ã o s ofr e p or s u a ignorância, m a s p or ca u s a d a m en tir a qu e s e con ta a s i m es m o, s im u la n d o ign or â n cia . semelh a n te h om em feit os a s s im
A m is ér ia e a a legr ia in ter ior es d e e tod os a qu eles qu e a m a m com p a ixã o s ã o
n ã o p od em s e es gota r com b a ld es d e d im en s ã o
normal.
280. INFANTIL Aqu ele qu e vive com o a s cr ia n ça s
a qu ele, p or ta n t o, qu e
n ã o lu ta p a r a ga n h a r s eu p ã o e n ã o a cr ed ita qu e s u a s a ções tenham uma significação definitiva
esse permanece infantil.
281. O EU QUER POSSUIR TUDO Pa r ece qu e o h om em a ge em ger a l a p en a s p a r a p os s u ir : p elo m en os a s lín gu a s qu e n ã o con s id er a m tod a a çã o p a s s a d a com o con flu in d o p a r a u m a p os s e p er m item es s a s u p os içã o ( falei, lutei, venci , is s o qu er d izer : a gor a es tou d e p os s e d e m in h a p a la vr a , d e m in h a lu ta , d e m in h a vitór ia ). Com o o h om em s e m os tr a á vid o! Nem o passado quer deixar escapar, deseja tê-lo ainda, até ele!
282. P ERIGO NA BELEZA E s ta m u lh er é b ela e in teligen te; a i! com o s e ter ia tor n a d o mais inteligente se não fosse bela!
283. P AZ DA CASA E PAZ DA ALMA Nos s o es ta d o d e es p ír ito h a b itu a l d ep en d e d o es ta d o d e espírito em que sabemos manter nossas companhias.
284. APRESENTAR UMA NOVA NOTÍCIA COMO SE FOSSE ANTIGA Mu itos p a r ecem fica r ir r ita d os qu a n d o s e lh es con t a u m a
n ovid a d e; s ã o s en s íveis à p r ep on d er â n cia qu e a n ot ícia con fer e àquele que a sabe por primeiro.
285. ONDE TERMINA O EU ? A m a ior ia d a s p es s oa s tom a s ob s u a p r oteçã o u m a cois a qu e sabem, com o
se
s a b ê-la
fos s e
s u ficien te
para
d efin ir
su a
p r op r ied a d e. O d es ejo d e a p r op r ia çã o d o s en t im en to d o eu n ã o tem lim ites : os gr a n d es h om en s fa la m com o s e tives s em a tr á s d eles t od a s a s id a d es d o tem p o e eles fos s em a ca b eça d es s e im en s o cor p o, e a s qu er id a s m u lh er es tom a m s ob r e s i o m ér ito d a b eleza d os filh os , d e s eu ves tu á r io, d e s eu cã o, d e s eu m éd ico, d e s u a cid a d e, m a s ela s n ã o ou s a m d izer : E u s ou tu d o is s o . non ha, non è12
Chi
como se diz na Itália.
286. ANIMAIS DOMÉSTICOS E DE APARTAMENTO Há cois a m a is r ep u gn a n t e d o qu e a s en tim en ta lid a d e em r ela çã o à s p la n ta s e a os a n im a is p or p a r te d e s er es qu e, d es d e a or igem , p r oced er a m a d eva s ta ções n o m eio d eles , com o s e fos s em s eu s in im igos m a is fer ozes e qu e a ca b a m p or qu er er d em on s tr a r a té
m es m o
s en tim en tos
ter n os
para
com
su as
en fr a qu ecid a s e m u tila d a s ? Dia n t e d es s a es p écie d e
vítim a s
natureza ,
im p or ta qu e o h om em s eja a n tes d e t u d o sério, s e for u m h om em que pensa.
287. D OIS AMIGOS E les er a m a m igos , m a s d eixa r a m d e s ê-lo e r om p er a m s im u lta n ea m en te d e p a r t e e d e ou tr a , u m p or qu e s e ju lga va d es p r eza d o d em a is , o ou tr o p or qu e s e ju lga va con s id er a d o d em a is e n is s o a m b os s e en ga n a r a m ! conhecia suficientemente a si próprio.
p ois , n en h u m d eles s e
288. COMÉDIA DOS HOMENS NOBRES Aqu eles qu e fr a ca s s a m n a fa m ilia r id a d e n ob r e e cor d ia l ten ta m d eixa r a d ivin h a r a n ob r eza d e s u a n a tu r eza p ela r es er va , p ela s ever id a d e e p or cer to d es p r ezo d a fa m ilia r id a d e: com o s e o s en tim en t o violen to d e s u a con fia n ça tives s e ver gon h a d e s e mostrar.
289. ONDE NADA SE PODE DIZER CONTRA UMA VIRTUDE E n t r e cova r d es é d e m a u gos to d izer a lgu m a cois a con tr a a b r a vu r a ; is s o s u s cita o d es p r ezo; e os h om en s s em con s id er a çã o s e m os tr a m ir r ita d os qu a n d o s e d iz a lgu m a cois a con t r a a compaixão.
290. UM DESPERDÍCIO Nas naturezas irritadiças e impulsivas, as primeiras palavras e os p r im eir os a tos n ã o significam geralmente nada qu a n to a s eu verdadeiro ca r á t er (s ã o in s p ir a d os p ela s cir cu n s t â n cia s e s ã o, d e a lgu m a for m a , im ita ções d o es p ír ito d e cir cu n s tâ n cia ), m a s u m a vez qu e es s a s p a la vr a s for a m d ita s e es s es a tos for a m execu ta d os , as palavras e os atos que se seguem, e verdadeiramente conformes com o ca r á t er , s ã o m u ita s vezes sacrificados p a r a a ten u a r e fa zer esquecer os primeiros.
291. P RESUNÇÃO A p r es u n çã o é u m a a ltivez r ep r es en ta d a e fin gid a ; m a s é precisamente próprio da altivez não poder nem querer representar, s im u la r ou fin gir
n es s e s en tid o a p r es u n çã o é a h ip ocr is ia d a
in ca p a cid a d e d e fin gir , a lgu m a cois a d e m u ito d ifícil qu e é qu a s e s em p r e m a l s u ced id a . S u p on d o, p or ém , qu e, com o a con tece
ger a lm en t e, o p r es u n ços o s e tr a i em s u a r ep r es en ta çã o, u m tr ip lo desgosto o espera: queremos-lhe mal porque procura enganar-nos, queremos-lh e m a l p or qu e qu is m os tr a r -s e s u p er ior a n ós fin a lm en t e, r im os podemos,
d ele p or qu e fa lh ou
p or ta n to,
d es a con s elh a r
n os
de
d ois
m od o
e,
ca s os . Nã o s u ficien t e
a
presunção!
292. UMA ESPÉCIE DE DESCONHECIMENTO Qu a n d o ou vim os a lgu ém fa la r , b a s t a à s vezes o s om d e u m a s ó con s oa n t e (p or exem p lo, d e u m r ) p a r a n os in s p ir a r d ú vid a s s ob r e a lea ld a d e d e s eu s s en tim en tos : n ã o es ta m os h a b it u a d os a esse som e seríamos obrigados a prestar atenção para reproduzi-lo parece-nos
artificial . E s s e é o d om ín io d o m a is gr os s eir o
d es con h ecim en to: ocor r e o m es m o com o es t ilo d e u m es cr itor cujos hábitos não são os de todos. Só ele pode sentir seu natural com o ta l, e é ju s ta m en te com o qu e ele p r óp r io con s id er a com o artificial
porque nisso uma vez cedeu à moda e ao bom gosto
que talvez possa agradar e despertar a confiança.
293. R ECONHECIMENTO Um n a d a d e r econ h ecim en to e d e com p a ixã o em d em a s ia : e s ofr em os
d is s o com o d e u m
vício, a p es a r
d e t od a
su a
independência e sua vontade, sucumbimos à má consciência.
294. S ANTOS S ã o os
h om en s
m a is
s en s u a is
que fogem d ia n t e d a s
mulheres e são obrigados a torturar o corpo.
295. S ERVIR COM SUTILEZA Na grande arte de servir, uma das tarefas mais sutis consiste
em s er vir u m a m b icios o d es en fr ea d o qu e, em b or a s en d o em tod a s a s cois a s o egoís t a m a is in cor r igível, n ã o qu er ter s ob h ip ótes e a lgu m a p a s s a r p or is s o (es s a é p r ecis a m en te p a r te d e s u a amb içã o), qu e exige qu e tu d o s eja feito s egu n d o s u a von ta d e e s eu s ca p r ich os e, n o en ta n t o, s em p r e d e m a n eir a a d a r a im p r es s ã o d e qu e s e s a cr ifica e qu e r a r a m en te qu er a lgu m a cois a para si.
296. O DUELO Con s id er o u m a va n t a gem , d izia a lgu ém , p od er p r ovoca r um d u elo, qu a n d o ten h o im p er ios a n eces s id a d e d is s o, p ois h á s em p r e b r a vos ca m a r a d a s em tor n o d e m im . O d u elo é o ú n ico m eio d e s u icíd io a b s olu ta m en te h on r os o qu e n os r es ta , in felizm en te é u m caminho indireto e ainda não é totalmente seguro.
297. NEFASTO A m a n eir a m a is s egu r a d e es tr a ga r u m jovem é in citá -lo a es tim a r
m a is
qu em
p en s a
com o
ele
do
qu e
qu em
p en s a
diversamente.
298. O CULTO DOS HERÓIS E SEUS FANÁTICOS O fa n á tico d e u m id ea l feito d e ca r n e e d e s a n gu e tem ger a lm en t e r a zã o en qu a n to nega
e, em s u a n ega çã o, é ter r ível:
con h ece o qu e n ega tã o b em com o a s i m es m o, p ela r a zã o elem en ta r d e qu e ficou r ed u zid o a is s o, qu e s e s en te b em a s s im e qu e s em p r e r eceia s ecr eta m en te s er ob r iga d o a volt a r a is s o; qu er se tornar o retorno impossível pela maneira como nega. Mas desde o m om en to em qu e a fir m a , cer r a p ela m eta d e os olh os e com eça a id ea liza r (m u ita s vezes com o fim d e ca u s a r d a n o a os qu e fica r a m n a ca s a qu e a b a n d on ou ); ta lvez s e p od er á ch a m a r a r tís tica a
for m a d e s u a a fir m a çã o
m u ito b em , m a s ela t em t a m b ém a lgo
d e d es lea l. Aqu ele qu e id ea liza u m a p es s oa s itu a es s a p es s oa tã o lon ge d ele qu e n ã o p od e m a is vê-la d e for m a d is tin t a e d ep ois interpreta como belo o que ainda pode perceber, isto é, considera disso a simetria, as linhas indefinidas, a falta de precisão. Como, a p a r tir d e en tã o, va i qu er er a d or a r es s e id ea l qu e p la n a n a d is tâ n cia e n a s a ltu r a s , d eve con s tr u ir p a r a ele, a fim d e p r otegêlo contra o profanum vulgus13, um templo para sua adoração. Leva p a r a o loca l tod os os ob jet os ven er á veis e s a n tifica d os qu e a in d a p os s u i, p a r a qu e s eu id ea l s e b en eficie d e s u a m a gia e qu e es s e alimento o fa ça cr es cer e tor n a r -s e s em p r e m a is d ivin o. No fin a l d e tu d o, con s egu iu ver d a d eir a m en te a p er feiçoa r s eu d eu s , m a s , infeliz dele! há alguém que sabe como tudo isso se passou con s ciên cia in t electu a l
é sua
e h á ta m b ém a lgu ém qu e, tot a lm en te
inconsciente, começa a protestar
é o próprio divinizado que, sob
o efeito d o cu lto, d os lou vor es e d o in cen s o, s e tor n a a gor a com p leta m en te in s u p or tá vel e tr a i, d a m a n eir a m a is evid en te e m a is
h or r ível,
su a
n ã o-d ivin d a d e
e
su as
qu a lid a d es
d em a s ia d a m en t e h u m a n a s . E n t ã o n ã o r es ta p a r a n os s o fa n á tico s en ã o u m a s a íd a : ele s e d eixa p a cien tem en te m a ltr a t a r , a s i e a s eu s s em elh a n tes , e s e p õe a in ter p r et a r tod o es s e in for tú n io, ainda in m a jore m d e i gloria m 14, p or m eio d e u m a n ova es p écie d e en ga n o e d e n ob r e m en tir a ; tom a p a r tid o con tr a s i p r óp r io e exp er im en ta , a s s im m a ltr a t a d o e com o in tér p r ete d es s es m a u s tratos, algo como um mártir presunção.
dessa maneira atinge o topo de sua
Hom en s d es s a es p écie vivia m , p or exem p lo, n os
cír cu los d e Napoleão: s im , t a lvez ten h a s id o p r ecis a m en te ele quem suscitou no espírito deste século essa prostração romanesca d ia n t e d o gênio e d o herói , tã o es tr a n h a a o es p ír it o r a cion a lis ta d o ú ltim o s écu lo, ele, d ia n te d e qu em u m Byr on n ã o tin h a
ver gon h a d e d izer qu e fór m u la s
de
er a u m ver m e a o la d o d e t a l s er . (As
s em elh a n te
p r os tr a çã o
for a m
en con tr a d a s
p or
Th om a s Ca r lyle 15, es s e velh o r a n zin za con fu s o e p r eten s ios o, qu e ga s tou tod a a s u a lon ga exis tên cia p a r a tor n a r r om â n tica a r a zã o de seus ingleses: em vão!).
299. APARÊNCIA DE HEROÍSMO Lançar-s e n o m eio d os in im igos p od e s er u m s in a l d e covardia.
300. B ENEVOLENTE PARA COM O LISONJEADOR A última palavra de astúcia dos ambiciosos insaciáveis é não d eixa r ver o d es p r ezo d os h om en s qu e o a s p ecto d os lis on jea d or es lh es in s p ir a : m a s p a r ecer b en evolen t es m es m o p a r a com eles , como um deus que não pudesse ser senão benevolente.
301. CHEIO DE CARÁTER O qu e d is s e u m a vez, eu o fa ço
es s a m a n eir a d e p en s a r
p a r ece ch eia d e ca r á ter . Qu a n t a s a ções r ea liza m os , n ã o p or qu e a s es colh em os p or s er em m a is r a zoá veis , m a s p or qu e, n o m om en to em qu e tivem os a id éia , s u s cita r a m , d e u m a m a n eir a ou d e ou tr a , a a m b içã o e a va id a d e, d e m od o qu e n os d et em os p a r a r ea lizá -las cega m en te! As s im ela s a u m en ta m em n ós a fé em n os s o ca r á t er e em n os s a b oa con s ciên cia , p or ta n to, em r es u m o, em n os s a força: en qu a n to qu e a es colh a d a a çã o m a is r a zoá vel m a n têm cer to ceticis m o em r ela çã o a n ós m es m os e, n a m es m a m ed id a , u m sentimento de fraqueza.
302. UMA, DUAS, TRÊS VEZES VERDADEIRO Os h om en s m en tem com in d izível fr eqü ên cia , m a s logo
depois não pensam mais nisso e em geral não acreditam nisso.
303. P ASSATEMPO DO CONHECEDOR DE HOMENS E le ju lga m e con h ecer e s e ju lga s u til e im p or ta n te qu a n d o a ge d es ta ou d a qu ela m a n eir a em s u a s r ela ções com igo: eu m e a b s ten h o d e d es en ga n á -lo. De fa to, ele m e fa r ia p a ga r ca r o is s o, en qu a n to a gor a
m e qu er bem , p or qu e lh e p r op or cion o u m
s en tim en t o d e s u p er ior id a d e con s cien t e. qu e eu
n ã o m e in t er es s e em
Há ou tr o qu e r eceia
con h ecê-lo e is s o o leva
a
exp er im en ta r u m s en tim en to d e in fer ior id a d e. É p or is s o qu e s e com p or t a com igo d e m a n eir a b r u s ca e in con s eqü en te e p r ocu r a me afastar dele
para se elevar novamente acima de mim.
304. OS DESTRUIDORES DO MUNDO Aqu ele qu e é in ca p a z d e r ea liza r cer ta cois a , a ca b a p or excla m a r ch eio d e r evolta :
Qu e o m u n d o in t eir o p er eça ! Este
s en tim en t o od ios o é o cú m u lo d a in veja qu e gos ta r ia d e d ed u zir : u m a vez qu e n ã o p os s o ter u m a cois a , o m u n d o in teir o n ã o d eve ter nada! O mundo inteiro deve não ser!
305. AVAREZA Nos s a a va r eza , qu a n d o fa zem os u m a com p r a , a u m en ta com o p r eço b a ixo d o ob jeto
p or qu ê? S er á p or qu e s ã o a s
m es qu in h a s d ifer en ça s d e Pr eço qu e s u s cita m o olh a r m es qu in h o da avareza?
306. IDEAL GREGO O qu e os gr egos a d m ir a va m em Ulis s es ? An tes d e tu d o a fa cu ld a d e d e m en tir e d e r es p on d er p or r ep r es á lia s a s tu t a s e terríveis; depois, estar à altura das circunstâncias, parecer, se isso
for n eces s á r io, m a is n ob r e qu e o m a is n ob r e; s a b er s er t u d o o qu e s e qu er, a ten a cid a d e h er óica ; a a r te d e u t iliza r t od os os m eios ; ter espírito
o es p ír it o d e Ulis s es ca u s a a a d m ir a çã o d os d eu s es qu e
s or r ia m qu a n d o p en s a va m n is s o:
tu d o is s o con s titu i o ideal
grego! O mais curioso nisso tudo é que não se sente em absoluto a contradiçã o en t r e ser e parecer e qu e, p or con s egu in te, n ã o s e con fer e
a
is s o
n en h u m
va lor
m or a l.
Hou ve
a lgu m a
vez
comediantes tão completos?
307. F ACTA! S IM, FACTA FICTA16! O h is t or ia d or n ã o tem qu e s e ocu p a r d os a con tecim en tos com o s e p a s s a r a m n a r ea lid a d e, m a s s om en te com o s e s u p õe qu e ten h a m ocor r id o: d e fa to, é a s s im qu e p r od u zir a m s eu efeito. De igual modo, só tem que se ocupar dos supostos heróis. Seu objeto, o qu e s e ch a m a h is tór ia u n iver s a l: o qu e é, s en ã o op in iões s u p os ta s s ob r e a ções s u p os ta s qu e, p or s u a vez, d er a m lu ga r a op in iões
e
a ções
cu ja
r ea lid a d e,
con tu d o,
se
im ed ia ta m en te e n ã o age m a is s en ã o com o u m va p or
eva p or ou é um
con tín u o p a r to d e fa n ta s m a s s ob r e a s p r ofu n d a s n u ven s d a im p en et r á vel r ea lid a d e. Tod os os h is tor ia d or es con ta m cois a s qu e n unca existiram, salvo na representação.
308. É NOBRE NÃO SE DEDICAR AO COMÉRCIO Nã o ven d er a p r óp r ia vir tu d e s en ã o p elo p r eço m a is a lto ou m es m o s e en tr ega r à u s u r a com ela , com o p r ofes s or , fu n cion á r io ou a r tis ta
é o qu e fa z d o ta len to e d o gên io u m n egócio d e
m er ceeir o. Deve-s e vigia r p a r a n ã o qu er er s er hábil com a p r óp r ia sabedoria!
309. T EMOR E AMOR
O temor fez progredir o conhecimento geral dos homens mais qu e o a m or , p ois o tem or qu er d es cob r ir qu em é o ou tr o, o qu e s a b e, o qu e qu er : en ga n a n d o-se s e cr ia r ia u m p er igo ou u m p r eju ízo. In ver s a m en te, o a m or é leva d o s ecr et a m en te a ver n o ou tr o cois a s tã o b ela s qu a n to p os s ível ou ta m b ém eleva r o ou t r o ta n t o qu a n d o p u d er : s er ia p a r a ele u m a a legr ia e u m a va n ta gem enganar-se a respeito
é por isso que o faz.
310. OS INDULGENTES Os in d u lgen tes a d qu ir ir a m s u a ca r a cter ís tica p elo tem or p er p étu o
qu e
as
antepassados
in va s ões
es tr a n geir a s
in s p ir a va m
a
s eu s
eles a t en u a va m , tr a n qü iliza va m , im p lor a va m ,
p r even ia m , d is tr a ía m , lis on jea va m , s e h u m ilh a va m , d is s im u la vam a d or e o d es p eito, d is fa r ça va m os tr a ços d o r os to
e fin a lm en t e
tod o es s e m eca n is m o, d elica d o e b em con for m a d o, foi t r a n s m it id o a seus filhos e descendentes. Um destino mais clemente não expõe es tes a u m tem or p er p étu o: m a s n ã o toca m m en os con tin u a m ente seu instrumento.
311. O QUE SE CHAMA ALMA A s om a d os m ovim en tos in ter ior es qu e s ã o fáceis p a r a o h om em e qu e, p or con s egu in te, execu ta d e b oa von ta d e e com gr a ça , es s a s om a s e ch a m a a lm a ; d es p r ovid o
de
a lm a
qu a n d o
d eixa
o h om em p a s s a p or es ta r tr a n s p a r ecer
qu e
s eu s
movimentos interiores lhe são penosos e duros.
312. OS ESQUECIDOS Na s exp los ões d a p a ixã o e n os d elír ios d o s on h o e d a lou cu r a , o h om em r ed es cob r e s u a h is tór ia p r im it iva e a qu ela d a h u m a n id a d e: a animalidade e s eu s ges tos s elva gen s ; en tã o sua
m em ór ia
r etor n a
b a s ta n t e
lon ge
para
trás,
en qu a n to,
p elo
con tr á r io, s eu es ta d o civiliza d o s e h a via d es en volvid o gr a ça s a o es qu ecim en to
d es s a s
exp er iên cia s
or igin a is ,
is t o
é,
ao
en fr a qu ecim en to d es s a m em ór ia . Aqu ele qu e, h om em es qu ecid o d e es p écie s u p er ior , s em p r e ficou m u it o lon ge d es s a s cois a s , não com preen d e os h om en s
m a s é u m a va n t a gem s e, d e tem p os em
tem p os , h á in d ivíd u os qu e
n ã o os com p r een d em , in d ivíd u os
ger a d os d e a lgu m a for m a p ela s em en t e d ivin a e coloca d os n o mundo pela razão.
313. O AMIGO QUE NÃO SE DESEJA MAIS Pr efer im os ter p or in im igo o a m igo cu ja s es p er a n ça s n ã o podemos satisfazer.
314. E M COMPANHIA DE PENSADORES No m eio d o ocea n o d o d evir , d es p er ta m os n u m a ilh ota n ã o m a ior qu e u m a b a r ca , n ós a ven t u r eir os e a ves m igr a n tes , e lá olham os u m in s ta n te em tor n o d e n ós : com t a n t a p r es s a e cu r ios id a d e qu a n to p os s ível, p ois u m ven to p od e a qu a lqu er m om en to n os leva r ou u m a on d a n os va r r er d a ilh ota , d e ta l m od o qu e n a d a m a is r es ta r ia d e n ós ! Ma s a qu i, n es s e p equ en o es p a ço, en con tr a m os ou tr a s a ves m igr a n t es e ou vim os fa la r d e a ves m a is a n tiga s
a in d a
e
a s s im
tem os
um
m in u to
d elicios o
de
con h ecim en to e d e d es cob er ta , ch ilr ea n d o ju n tos e b a ten d o a legr em en te a s a s a s , en qu a n to n os s o es p ír ito va gu eia s ob r e o oceano, não menos altivo que o próprio oceano!
315. D ESPOJAR-SE Ab a n d on a r p a r t e d e s u a p r op r ied a d e, r en u n cia r a s eu d ir eito is s o d á p r a zer qu a n d o é o in d ício d e gr a n d es r iqu eza s . A
generosidade é dessa ordem.
316. S EITAS FRACAS As seitas que sentem que se manterão fracas em número vão à ca ça p a r a d es cob r ir a lgu n s d is cíp u los in t eligen tes e ten ta m s u p r ir p ela qu a lid a d e o qu e lh es fa lta em qu a n tid a d e. Há n is s o, para a inteligência, um perigo que não se deveria negligenciar.
317. O JUÍZO DA TARDE Aqu ele qu e r eflete s ob r e s u a ob r a d o d ia ou d a vid a , qu a n d o ch egou
ao
fim
e
es tá
ca n s a d o,
se
en t r ega
ger a lm en t e
a
con s id er a ções m ela n cólica s : m a s n ã o s e d eve d a r im p or tâ n cia a o d ia n em à vid a , m a s a o ca n s a ço.
E m p len a a t ivid a d e cr ia d or a
n ã o tom a m os ger a lm en te tem p o p a r a ju lga r a vid a e a exis tên cia e m en os a in d a em p len o p r a zer : m a s s e a ca s o n os d etem os u m d ia , d eixa m os d e d a r r a zã o à qu ele qu e es p er ou o s étim o d ia e o r ep ou s o p a r a a ch a r m u ito b om tu d o o qu e exis te
ele d eixou
passar o momento melhor.
318. CUIDADO COM OS SISTEMÁTICOS! Há u m a com éd ia d os s is tem á ticos : qu er en d o p r een ch er u m s is tem a e a r r ed on d a n d o o h or izon te tot a lm en te em tor n o d es te, d evem t en t a r a p r es en ta r s u a s fr a ca s qu a lid a d es n o m es m o es t ilo qu e s u a s qu a lid a d es for tes
qu er em a p a r ecer com o n a tu r eza s
completa e unidamente fortes.
3 19. H OSPITALIDADE O s en tid o qu e s e d eve con fer ir a os u s os d a h os p ita lid a d e é d e p a r a lis a r n o es tr a n h o a in im iza d e; d es d e qu e, n ele, n ã o s e p r es s in ta m a is , a n tes d e tu d o, o in im igo, a h os p it a lid a d e r egr id e;
ela floresce à medida que florescem as más suposições.
320. D O BOM E DO MAU TEMPO Um tem p o m u ito excep cion a l e in cer to t or n a ta m b ém os h om en s d es con fia d os u n s p a r a com os ou tr os ; tor n a m -s e á vid os d e in ova ções , p ois é p r ecis o qu e m u d em s eu s h á b itos . É p or is s o que os déspotas gostam de todas as regiões onde o tempo é moral.
321. P ERIGO NA INOCÊNCIA Os in ocen tes s ã o eter n a s vitim a s , p ois s u a in ocên cia os im p ed e d e d is t in gu ir en t r e a m ed id a e o exa ger o, d e s e m os tr a r em a tem p o p r u d en tes d ia n te d e s i m es m os . É a s s im qu e a s joven s in ocen tes , is to é, ign or a n tes , s e h a b itu a m a p r a zer es a fr od is ía cos fr eqü en tes e, m a is ta r d e, es s es p r a zer es lh es fa zem cr u elm en te falta quando os maridos adoecem ou envelhecem antes da idade; é ju s ta m en t e p or qu e, câ n d id a s e con fia n t es , im a gin a m qu e a s relações freqüentes são a regra e um direito que elas são levadas a u m a n eces s id a d e qu e a s exp õe m a is t a r d e à s ten ta ções m a is violen t a s e p ior a in d a . Ma s , p a r a s e s itu a r n u m p on t o d e vis ta m a is ger a l e m a is eleva d o: a qu ele qu e a m a u m s er h u m a n o ou u m a cois a , s em con h ecê-lo, tor n a -s e p r es a d e qu a lqu er cois a d e qu e n ã o gos t a r ia s e p u d es s e vê-la . Por t od a a p a r te on d e a exp er iên cia ,
as
p r eca u ções ,
os
m ovim en t os
p r u d en tes
são
n eces s á r ios , o in ocen te s ofr e m a is cr u elm en te, p ois d eve b eb er cega m en te a b or r a e o ven en o m a is s ecr eto d e u m a cois a . Con s id er em os a s p r á tica s d e tod os os p r ín cip es , d a s igr eja s , d a s s eita s , d os p a r tid os , d a s cor p or a ções : n ã o s e em p r ega s em p r e o in ocen te com o is ca p r efer id a n os ca s os m a is d ifíceis e m a is desacreditados?
Com o Ulis s es u tiliza o in ocen te Neop t olem o
p a r a r ou b a r o a r co e a s s et a s d o velh o er em ita d oen te d e Lem n os .
O cr is tia n is m o, com s eu d es p r ezo d o m u n d o, fez d a ign or â n cia uma virtude, ta lvez p or qu e o r es u lta d o m a is fr eqü en te d es s a in ocên cia Pa r ece s er , com o o in d iqu ei, a fa lta , o s en tim en to d a fa lt a , o d esespero, p or ta n to, u m a vir tu d e qu e leva a o céu p elo d es vio d o in fer n o: p ois , s om en te en tã o a s s om b r a s d o p or ta l d a s a lva çã o cr is tã p od em s e a b r ir , s om en te en tã o a p r om es s a d e u m a s egu n d a in ocên cia p ós tu m a s e t or n a efica z:
é u m a d a s m a is
belas invenções do cristianismo!
322. VIVER SE POSSÍVEL SEM MÉDICO Parece-m e qu e u m d oen te vive m a is levia n a m en te qu a n d o tem u m m éd ico d o qu e qu a n d o ele p r óp r io cu id a d e s u a s a ú d e. No p r im eir o ca s o, b a s t a s er s ever o p a r a com t u d o o qu e lh e é p r es cr ito; n o s egu n d o, ob s er va m os com m a is con s ciên cia a qu ilo a qu e s e d ir igem es s a s p r es cr ições , qu er o d izer , à n os s a s a ú d e, notamos mais coisas, nos ordenamos e nos proibimos mais do que fa r ia a in ter ven çã o d o m éd ico.
Tod a s a s r egr a s têm es s e efeito:
d es via m d o ob jet ivo qu e s e es con d em a tr á s d a r egr a e s u s cita m m a is d es cu id o.
Ma s o d es cu id o d a h u m a n id a d e s e ter ia eleva d o
a té o d es en ca d ea m en to e à d es tr u içã o, s e t ives s e u m a vez a b a n d on a d o tu d o, com p leta e lea lm en te, n os b r a ços d a d ivin d a d e seu médico, segundo a fórmula se Deus quiser !
323. OBSCURECIMENTO DO CÉU Vocês con h ecem a vin ga n ça d os s er es tím id os qu e s e com p or t a m
em
s ocied a d e
com o
se
t ives s em
r ou b a d o
s eu s
membros? A vingança das almas humildes, à moda cristã que, por tod a a p a r te n a t er r a , n ã o fa zem s en ã o d es liza r fu r tiva m en te? A vin ga n ça d a qu eles qu e ju lga m s em p r e im ed ia t a m en te e qu e s em p r e im ed ia ta m en te r eceb em u m d es m en tid o? A vin ga n ça d os
b êb a d os d e tod o tip o, p a r a qu em a a u r or a é o m om en to m a is n efa s to d o d ia ? De igu a l m od o a qu ela d os d oen tes d e tod o tip o, d oen tios e d ep r im id os qu e n ã o têm m a is cor a gem d e s e cu r a r ? O n ú m er o d es s es p equ en os s er es á vid os d e vin ga n ça e, com m a ior r a zã o,
o
n ú m er o
de
s eu s
p equ en os
a tos
de
vin ga n ça ,
é
in ca lcu lá vel; tod o o a r vib r a s em ces s a r com o s ilvo d a s s eta s e s etin h a s d is p a r a d a s p or s u a m a ld a d e, d e m od o qu e o céu e o s ol da vida ficam obscurecidos por elas
não somente para eles, mas
ta m b ém p a r a n ós , p a r a os ou tr os : o qu e é m a is gr a ve d o qu e s e n os a r r a n h a s s em a p ele e o cor a çã o. Nã o negamos a lgu m a s vezes o s ol e o céu , s im p les m en t e p or qu e fa z m u ito tem p o qu e n ã o os vemos?
Portanto: solidão! Por causa disso também, solidão!
324. F ILOSOFIA DOS ATORES Um a ilu s ã o qu e fa z a felicid a d e d os gr a n d es a tor es é a d e cr er qu e os p er s on a gen s h is tór icos qu e in ter p r eta m es ta va m ver d a d eir a m en te n o m es m o es ta d o d e es p ír ito qu e a qu ele em qu e s e en con tr a m
d u r a n te s u a
in ter p r eta çã o;
mas
n is s o s e
en ga n a m r ed on d a m en t e: s eu p od er d e im ita çã o e d e a d ivin h a çã o qu e gos ta r ia m d e ver p a s s a r com o u m p od er extr a -lú cid o p en etr a d e for m a s u ficien tem en te d is ta n t e p a r a exp lica r os ges tos , a s en ton a ções , os olh a r es e, em ger a l, tu d o o qu e é exter ior : o qu e qu er d izer qu e eles ca p t a m a s om b r a d e u m gr a n d e h er ói, d e u m h om em d e E s ta d o, d e u m gu er r eir o, d e u m a m b icios o, d e u m ciu m en to, d e u m d es es p er a d o, p en etr a m a té m u ito p er to d a a lm a , m a s n ã o a té qu a s e o es p ír ito d e s u a in d ivid u a lid a d e. E s s a s er ia ver d a d eir a m en te u m a b ela d es cob er ta , s e b a s ta s s e s er a t or cla r ivid en te, em vez d e p en s a d or , con h eced or , es p ecia lis ta , p a r a es cla r ecer a p r óp r ia es s ên cia d e u m es ta d o m or a l qu a lqu er ! Nã o esqueçamos, pois, nunca, cada vez que semelhantes pretensões se
a p r es en ta m qu e o a tor é a p en a s u m m a ca co id ea l, e d e ta l m od o m a ca co qu e n em s equ er é ca p a z d e a cr ed ita r n a essência e n o essencial : tu d o p a r a ele s e tor n a r ep r es en ta çã o, en tonação, gesto, cena, bastidores e público.
325. VIVER E ACREDITAR NO AFASTAMENTO O m eio d e s e tor n a r o p r ofeta e o ta u m a tu r go d e s u a ép oca é h oje o m es m o a in d a d e ou tr or a : é p r ecis o viver a fa s ta d o, com p ou cos con h ecim en tos , a lgu m a s id éia s e m u ita p r es u n çã o a ca b a m os en tã o p or im a gin a r qu e a h u m a n id a d e n ã o p od e p r es cin d ir d e n ós , p or qu e é a b s olu ta m en te cla r o qu e n ós p od em os p r es cin d ir d ela . Des d e qu e es teja m os con victos d es s a cr en ça , encontramos também crédito. E para acabar, um conselho a quem o qu is er s egu ir (foi d a d o a Wes ley 17 p or Böh ler , s eu m es tr e espiritual):
Pr ega a fé a t é qu e a ten h a s en con tr a d o, en tã o a
pregarás porque a tens!
326. CONHECER AS PRÓPRIAS CIRCUNSTANCIAS Pod em os a va lia r n os s a s for ça s , m a s n ã o n os s a força. Não s ã o s om en t e a s cir cu n s t â n cia s qu e a m os tr a m a n ós e a ocu lta m a lter n a d a m en te,
mas
a in d a
as
p r óp r ia s
cir cu n s t â n cia s
a
en gr a n d ecem ou a d im in u em . É p r ecis o con s id er á -la com o u m a gr a n d eza
va r iá vel,
cu ja
ca p a cid a d e
p r od u tiva
p od e,
em
cir cu n s t a n cia s fa vor á veis , a tin gir o qu e h á d e m a is eleva d o: é p r ecis o, p ois , r eflet ir s ob r e a s cir cu n s t â n cia s e n ã o p ou p a r sacrifícios para observá-las.
327. UMA FÁBULA O Don J u a n d o con h ecim en to: n en h u m filós ofo, n en h u m p oeta a in d a o d es cob r iu . E le n ã o t em a m or p ela s cois a s qu e
d es cob r e, m a s tem es p ír ito e volú p ia e s en t e p r a zer n a ca ça e n a s in tr iga s d o con h ecim en t o d is ta n tes es tr ela s !
qu e p er s egu e a t é a s m a is a lt a s e
a té qu e fin a lm en te n ã o lh e r es ta m a is n a d a
p a r a ca ça r , a n ã o s er o qu e h á d e a b s olu ta m en te doloroso no con h ecim en to, com o o b eb er r ã o qu e a ca b a b eb en d o a b s in to e a gu a r d en te. É p or is s o qu e a ca b a p or d es eja r o in fer n o
é o
ú lt im o con h ecim en to qu e o seduz. Ta lvez ele t a m b ém o d es a p on te com o tu d o o qu e lh e é con h ecid o! E n tã o d ever ia s e d eter p or tod a a eter n id a d e, p r ega d o n a d ecep çã o e tr a n s for m a d o ele p r óp r io em con viva d e p ed r a , a s p ir a n d o a u m ja n t a r d o con h ecim en to qu e n u n ca lh e s er á s er vid o!
De fa to, o m u n d o in teir o d a s cois a s n ã o
vai mais encontrar um bocado para esse esfomeado.
328. O QUE AS TEORIAS IDEALISTAS DEIXAM ADIVINHAR E n con tr a m os a s teor ia s id ea lis ta s m a is cer t a m en te n os h om en s r es olu ta m en te p r á t icos , p ois es tes têm n eces s id a d e d o b r ilh o d es s a s teor ia s p a r a s u a r ep u ta çã o. E les s e a p od er a m d ela s in s tin tiva m en te e s em exp er im en ta r o m en or s en tim en to d e h ip ocr is ia : p r ecis a m en te tã o p ou co com o u m in glês s e s en te h ip ócr it a
com
s eu
cr is tia n is m o e
s eu
d om in go s a n tifica d o.
In ver s a m en te: a s n a tu r eza s con tem p la tiva s , qu e d evem s e cu id a r con tr a tod a es p écie d e im p r ovis a çã o e qu e t em em a r ep u ta çã o d e exa lt a çã o,
se
s a tis fa zem
u n ica m en t e
com
as
du ras
teor ia s
r ea lis ta s : ela s s e a p od er a m d ela s com a m es m a n eces s id a d e instintiva e sem perder com isso sua honestidade.
329. OS CALUNIADORES DA ALEGRIA Os h om en s p r ofu n d a m en te fer id os p ela vid a coloca r a m s ob s u s p eita tod a a legr ia , com o s e ela fos s e s em p r e in fa n til e p u er il e s e r evela s s e u m a d es r a zã o cu jo a s p ecto n ã o p od er ia p r ovoca r
s en ã o com p a ixã o e en ter n ecim en to, com o o s en tim en to qu e s e exp er im en ta qu a n d o u m a cr ia n ça , à s p or ta s d a m or t e, a ca r icia a in d a os b r in qu ed os em s u a ca m a . Ta is h om en s vêem , s ob tod a s a s r os a s d os tú m u los es con d id os e d is s im u la d os ; a s a legr ia s , a a lga za r r a , a m ú s ica a legr e p a r ecem -lh es s em elh a n tes à s ilu s ões volu n tá r ia s d e u m h om em gr a vem en te d oen te qu e qu er a in d a s a b or ea r , p or u m m om en to, a em b r ia gu ez d a vid a . Ma s es s e ju ízo s ob r e a a legr ia n ã o é ou t r a cois a s en ã o a r efr a çã o d es ta s ob r e o fu n d o ob s cu r o d o ca n s a ço e d a d oen ça : ele p r óp r io é a lgo d e toca n te, d e ir r a zoá vel qu e in cita à com p a ixã o, a lgo d e in fa n t il, a té d e p u er il, m a s qu e p r ovém d es s a s egu n d a in fâ n cia qu e s e s egu e à velhice e que precede a morte.
330. NÃO É O BASTANTE AINDA! Nã o b a s t a p r ova r u m a cois a , é p r ecis o a in d a in d u zir a is s o os h om en s ou a elevá -los a té ela . É p or is s o qu e o in icia d o d eve a p r en d er a dizer s u a s a b ed or ia : e m u ita s vezes d e m a n eir a qu e soe como uma loucura!
331. D IREITO E LIMITE O a s cet is m o é a m a n eir a d e p en s a r p a r a a qu eles qu e d evem exter m in a r s eu s in s tin t os ca r n a is , p or qu e es s es in s tin tos s ã o animais ferozes. Mas somente esses!
332. O ESTILO REDUNDANTE Um a r tis ta qu e n ã o con s egu e coloca r s eu s s en tim en tos s u b lim es n u m a ob r a , p a r a a livia r -s e d eles d es s a m a n eir a , m a s qu e p r eten d e, p elo con tr á r io, com u n ica r s eu
s en t im en t o d e
elevação, se torna inchado e seu estilo, redundante.
333. H UMANIDADE Nã o con s id er a m os os a n im a is com o s er es m or a is . Ma s vocês p en s a m , p ois , qu e os a n im a is n os con s id er a m s er es m or a is ? Um
a n im a l qu e
s a b ia
fa la r ,
d is s e:
A h u m a n id a d e
é
um
preconceito de que nós, animais, pelo menos não sofremos .
334. O HOMEM CARIDOSO O h om em ca r id os o s a tis fa z u m a n eces s id a d e d e s u a a lm a qu a n d o fa z o b em . Qu a n to m a is violen ta for es s a n eces s id a d e, m en os ele s e p õe n o lu ga r d a qu ele qu e a ju d a e qu e lh e s er ve p a r a s a tis fa zer s u a n eces s id a d e; ele s e t or n a a r r oga n te e m es m o in ju r ios o em cer tos ca s os . (A b en evolên cia e a ca r id a d e ju d a icas têm es ta r ep u ta çã o: s a b e-s e qu e ela s s ã o u m p ou co m a is violen ta s que aquelas dos outros povos).
335. P ARA QUE O AMOR SEJA CONSIDERADO COMO AMOR Tem os n eces s id a d e d e s er m os fr a n cos p a r a con os co m es m os e d e n os con h ecer m os p a r a p od er exer cer com r ela çã o a os ou t r os es s a s im u la çã o b en evolen te qu e cos tu m a m os ch a m a r a m or e bondade.
336. D E QUE SOMOS CAPAZES? Algu ém tin h a s id o a tor m en ta d o o d ia in t eir o p elo filh o m a u e in d is cip lin a d o, a p on to qu e o m a tou n a ta r d e s egu in te e d is s e a o r es to d a fa m ília , d a n d o u m s u s p ir o d e a lívio: Fin a lm en te va m os p od er
d or m ir
tr a n qü ila m en te!
S a b em os
a té
on d e
as
circunstâncias podem nos impelir?
337. NATURAL Ser natural p elo m en os n os p r óp r ios d efeitos
é ta lvez o
ú lt im o elogio qu e s e p os s a fa zer a u m a r tis ta a r t ificia l, comediante e a r te d e qu a lqu er ou tr a es p écie. É p or is s o qu e ta l s er d a r á sempre descaradamente livre curso a seus defeitos.
338. CONSCIÊNCIA DE TROCA Cer to h om em p od e s er a con s ciên cia d e u m ou tr o e is s o é particularmente importante quando o outro não tem nenhuma.
339. T RANSFORMAÇÃO DOS DEVERES Qu a n d o os d ever es d eixa m d e s er u m cu m p r im en to d ifícil, qu a n d o s e tr a n s for m a m , d ep ois d e lon go exer cício, em gos t os a gr a d á veis e em n eces s id a d es , os d ir eit os d os ou tr os a qu e s e r efer em n os s os d ever es , e a gor a n os s os gos t os , s e tor n a m ou tr a cois a : qu er o d izer qu e s e tor n a m a oca s iã o d e s en tim en t os a gr a d á veis p a r a n ós . Des d e en tã o, o
outro , gr a ça s a s eu s
d ir eitos , s e tor n a d ign o d e s er a m a d o (em lu ga r d e s er s om en te ven er á vel e t er r ível com o a n tes ). Pr ocu r a m os n os s o prazer quando r econ h ecem os e s u s ten ta m os a gor a o d om ín io d e s eu p od er . Qu a n d o
os
qu ietis ta s
não
s en tir a m
m a is
o
p es o
de
s eu
cr is tia n is m o e n ã o en con tr a r a m em Deu s m a is qu e p r a zer , a d ota r a m p or d ivis a : Tu d o p a r a a glór ia d e Deu s ! S eja o qu e for qu e fizes s em n es s e s en tid o, n ã o er a m a is u m s a cr ifício; is s o s e tor n a va a m es m a cois a qu e d izer : Tu d o p a r a n os s o p r a zer ! Exigir qu e o d ever s eja s em p r e u m p ou co in côm od o, com o o fa z Ka n t 18, é exigir qu e n u n ca fa ça p a r te d os h á b ito e d os cos tu m es : n es s a exigência, há ainda um pequeno resto de crueldade ascética.
340. A EVIDÊNCIA É CONTRA O HISTORIADOR É cois a m a is d o qu e p r ova d a qu e os h om en s s a em d o ven tr e da mãe: apesar disso, os filhos quando grandes e estando de pé ao
lado da mãe fazem parecer totalmente absurda essa hipótese: ela é a evidencia contra si.
341. VANTAGEM DO DESCONHECIMENTO Dizia a lgu ém qu e em s u a in fâ n cia h a via u m ta l d es p r ezo p elos ca p r ich os e p elos tr ejeitos d o tem p er a m en to m ela n cólico qu e ign or ou a té a m eta d e d e s u a vid a qu a l er a s eu tem p er a m en to: er a ju s ta m en t e o tem p er a m en to m ela n cólico. E le d ecla r a va qu e es s a era a melhor de todas as ignorâncias possíveis.
342. NÃO CONFUNDIR S im ! E le exa m in a a cois a d e tod os os la d os e vocês p en s a m qu e es s e é u m ver d a d eir o p es qu is a d or d o con h ecim en to. Ma s ele quer apenas fazer baixar o preço
quer comprá-la!
343. P RETENSAMENTE MORAL Vocês n u n ca qu er em es ta r d es con ten tes com vocês m es m os , n u n ca s ofr er p or s u a ca u s a
e ch a m a m a is s o s u a ten d ên cia
m or a l! Pois b em ! ou tr o d ir ia qu e es s a é s u a cova r d ia . Ma s u ma cois a é cer t a : n u n ca fa r ã o a via gem em volta d o m u n d o (qu e s ã o vocês m es m os ) e fica r ã o em vocês m es m os , u m a ca s o, u m lote d e ter r a p r es o a u m lote d e ter r a . Pen s a m , p or ta n to, qu e n ós , qu e s om os d e ou tr o p a r ecer , n os exp or ía m os p or p u r a lou cu r a à viagem a tr a vés d e n os s os p r óp r ios d es er tos , d e n os s os ch a r cos e d e n os s os cu m es d e gelo, qu e es colh em os volu n ta r ia m en te a s dores e o desgosto como os anacoretas estilitas?
344. S UTILEZA NO EQUÍVOCO S e Hom er o 19, com o s e d iz, a d or m ecia à s vezes , er a m a is s á b io d o qu e tod os os a r tis ta s d a a m b içã o in s on e. Deve-s e d eixa r
r etom a r fôlego a os a d m ir a d or es , tr a n s for m a n d o-os d e t em p os em tem p os
em
cen s or es ; p ois , n in gu ém
s u p or ta
uma
b on d a d e
in in t er r u p ta , b r ilh a n te e d es p er t a ; e em vez d e s er b en évolo, u m m es tr e d es s e tip o s e tor n a u m ca r r a s co qu e od ia m os en qu a n to caminha diante de nós.
345. NOSSA FELICIDADE NÃO É UM ARGUMENTO PRÓ OU CONTRA Mu itos h om en s n ã o s ã o ca p a zes s en ã o d e u m a felicid a d e m ín im a : n ã o é u m a r gu m en to con tr a s u a s a b ed or ia s e es ta n ã o p od e lh es d a r m a is felicid a d e, t ã o p ou co com o é u m a r gu m en to con tr a a m ed icin a s e cer tos h om en s s ã o in cu r á veis e ou tr os s em p r e d oen tios . Qu e ca d a u m p os s a ter a s or te d e en con tr a r a con cep çã o d e vid a qu e lh e p er m it a r ea liza r s eu m á xim o d e felicid a d e: is s o n ã o p od er ia im p ed ir s u a vid a d e s e m a n ter miserável e pouco invejável.
346. INIMIGOS DAS MULHERES A m u lh er é n os s a in im iga
a qu ele qu e, com o h om em , fa la
assim a outros homens, esse faz falar o instinto indomado que não somente se odeia a si próprio, mas também odeia seus meios.
347. A ESCOLA DO ORADOR Qu a n d o n os ca la m os d u r a n te u m a n o, d es a p r en d em os a con ver s a fú t il e a p r en d em os a p a la vr a . Os p it a gór icos er a m os melhores homens de Estado de seu tempo.
348. S ENTIMENTO DE PODER Dis tin ga m os b em : a qu ele qu e qu er a d qu ir ir o s en tim en t o d e p od er s e a p od er a d e tod os os m eios e n ã o d es p r eza n a d a d a qu ilo qu e p os s a n u tr ir es s e s en tim en to. Ma s a qu ele qu e o p os s u i s e
tor n ou m u ito d ifícil e n ob r e em s eu gos t o; é r a r o qu e a lgu m a cois a o satisfaça ainda.
349. NÃO TÃO IMPORTANTE Qu a n d o a s s is tim os a u m fa lecim en t o, s u r ge r egu la r m en te u m p en s a m en to qu e r ep r im im os im ed ia ta m en te p or m eio d e u m fa ls o s en tim en to d e con ven iên cia : p en s a m os qu e o a t o d e m or r er é m en os im p or ta n te d o qu e o p r eten d e o con s en s o u n iver s a l e qu e o m or ib u n d o p r ova velm en te p er d eu d u r a n te a vid a cois a s m a is es s en cia is d o qu e a qu ela s qu e es tá p r es tes a p er d er n es s e momento. O fim, aqui, não é certamente o objetivo.
350. COMO SE PROMETE O MELHOR Qu a n d o fa zem os u m a p r om es s a , n ã o é a p a la vr a qu e p r om ete, m a s o qu e h á d e in exp r es s o p or tr á s d a p a la vr a . As p a la vr a s en fr a qu ecem a té m es m o u m a p r om es s a , lib er a n d o e d is s ip a n d o u m a for ça qu e é p a r te d es s a for ça qu e p r om ete. Ten tem , p or ta n to, leva n ta r a m ã o e coloca r u m d ed o s ob r e a b oca é assim que são feitos os votos mais seguros.
3 51. GERALMENTE MENOSPREZADO Na con ver s a , n ot a m os qu e u m s e a p lica a p r ep a r a r u m a a r m a d ilh a n a qu a l o ou tr o ca i, n ã o p or m a ld a d e, com o s e p od er ia p en s a r , m a s p elo p r a zer qu e lh e d á s u a p r óp r ia m a lícia : ou tr os p r ep a r a m ta m b ém u m gr a cejo p a r a qu e o ter ceir o o d iga e d is p õem
a a r gola p a r a qu e, p u xa n d o-a , d ê o n ó: n ã o p or
b en evolên cia , com o s e p od er ia p en s a r , m a s p or m a ld a d e e p or d a inteligência grosseira.
352. CENTRO
E s te s en tim en to E u s ou o cen tr o d o m u n d o! s e m a n ifes ta com m u ita in ten s id a d e qu a n d o es t a m os r ep en tin a m en te ch eios d e ver gon h a ; fica m os en tã o com o a tu r d id os n o m eio d os r ecifes e n os s en tim os com o cega d os p or u m s ó olh o en or m e qu e olh a d e tod os os lados, em nós e no fundo de nós mesmos.
353. LIBERDADE DE PALAVRA A verdade deve ser dita, ainda que o mundo se parta em mil pedaços!
a s s im excla m a com s u a voz p oten te o gr a n d e
Fichte20!
Concorde-s e, m a s s er ia n eces s á r io a in d a p os s u ir es s a
verdade!
Ma s ele p en s a qu e ca d a u m d ever ia d a r s u a op in iã o,
m es m o s ob o r is co d e con fu n d ir com p leta m en te tod o o s en tid o. Isso me parece pelo menos discutível.
354. CORAGEM DE SOFRER Ta l com o s om os feitos h oje, s om os ca p a zes d e s u p or ta r cer ta d os e d e d es p r a zer e n os s o es tôm a go es t á h a b itu a d o a es s es a lim en tos in d iges tos . S em eles , ta lvez a ch á s s em os in s íp id o o b a n qu et e d a vid a : e s em a b oa von ta d e d e s ofr er s er ía m os obrigados a deixar escapar muitas alegrias!
355. ADMIRADOR Aqu ele qu e a d m ir a a p on t o d e cr u cifica r a qu ele qu e n ã o a d m ir a é con ta d o en t r e os ca r r a s cos d e s eu p a r tid o
evitamos
até de lhe estender a mão, mesmo se somos de seu partido.
356. E FEITO DA FELICIDADE O p r im eir o efeito d a felicid a d e é o s en tim en to d e pod er: este efeito qu er s e m a n ifes ta r, s eja d ia n t e d e n ós m es m os , s eja d ia n te d os ou tr os h om en s , s eja a in d a d ia n te d e r ep r es en ta ções ou s er es
imaginários. As maneiras mais correntes de se manifestar são: dar p r es en tes , zom b a r , d es tr u ir
a s tr ês d ecor r em d e u m com u m
instinto fundamental.
357. MOSCÕES MORAIS E s s es m or a lis ta s d es p r ovid os d e a m or a o con h ecim en to e qu e s ó con h ecem a a legr ia d e fa zer mal
es s es m or a lis ta s t êm o
es p ír it o e o a b or r ecim en to p r ovin cia n os ; s eu p r a zer , tã o cr u el com o la m en tá vel, con s is t e em ob s er va r os d ed os d o vizin h o e lh e p r es en tea r in op in a d a m en te u m a a gu lh a p a r a qu e s e p iqu e. Guardaram alguma coisa da maldade dos meninos que não podem se divertir sem perseguir e maltratar qualquer ser, vivo ou morto.
358. AS RAZÕES E SUA FALTA DE RAZÃO S en t es a ver s ã o a s eu r es p eito e a p r es en ta s a b u n d a n tes r a zões p a r a es s a a ver s ã o
m a s a cr ed ito a p en a s em tu a a ver s ã o e
n ã o em t u a s r a zões ! E m b eleza s a s cois a s a teu s p r óp r ios olh os , apresentando-te e a p r es en ta n d o-m e com o u m a d ed u çã o lógica o que se faz instintivamente.
359. APROVAR ALGUMA COISA Ap r ova m os o ca s a m en to, p r im eir o p or qu e a in d a n ã o o con h ecem os , d ep ois p or qu e es ta m os h a b itu a d os a ele e, em ter ceir o lu ga r , p or qu e já o con tr a ím os
qu er d izer qu e é a s s im
em qu a s e tod os os ca s os . E , n o en ta n to, n a d a fica a s s im comprovado acerca do valor do casamento em geral.
360. D E MODO ALGUM UTILITARISTAS O p od er d e qu e fa la m os m u ito m a l va le m a is qu e a im p otên cia , à qu a l s ó a con tece cois a b oa
es te er a o s en t im en to
d os gr egos . O qu e qu er d izer qu e en tr e eles o s en tim en t o d o p od er er a es tim a d o com o s u p er ior a tod a es p écie d e u tilid a d e ou d e b oa reputação.
361. P ARECER FEIO A tem p er a n ça s e vê a s i m es m a com o b ela ; n a d a p od e fa zer s e, a os olh os d os in tem p er a n tes , ela p a r ece gr os s eir a e in s íp id a , por conseguinte, feia.
362. D IFERENTES NO ÓDIO Algu n s s ó com eça m a od ia r qu a n d o s e s en tem fr a cos e fa tiga d os ; d e ou tr o m od o, s ã o eqü ita tivos e s u p er ior es . Ou tr os s ó com eça m a od ia r qu a n d o en tr evêem a p os s ib ilid a d e d a vin ga n ça : d e ou tr o m od o, evita m t od a cóler a , r efr ea d a ou p ú b lica , e d es via m quando se apresenta a ocasião.
363. H OMENS DO ACASO E m t od a in ven çã o, a m a ior p a r te ca b e a o a ca s o, m a s a maioria dos homens não consegue encontrar esse acaso.
364. E SCOLHA DO CÍRCULO DE CONVIVÊNCIA Livremo-n os d e viver n u m cír cu lo em qu e n ã o p od em os n os ca la r d ign a m en te n em d a r a con h ecer n os s a s id éia s s u p er ior es , d e m od o qu e n ã o n os r es ta ou tr a cois a a com u n ica r s en ã o n os s a s queixas, nossas necessidades e toda a história de nossas misérias. Tornamo-n os a s s im d es con ten tes con os co m es m os e d es con ten tes com es s e cír cu lo
e o d es p eito d e s en t ir qu e n os qu eixa m os
p er m a n en tem en te, a u m en ta a in d a a in felicid a d e qu e n os leva va a n os
qu eixa r m os .
Devem os
viver ,
ao
con tr á r io,
on d e
tem os
vergonha d e fa la r d e n ós e on d e n ã o tem os es s a n eces s id a d e.
Ma s qu em p en s a em s em elh a n tes cois a s , n u m a escolha em semelhantes coisas! Falamos de nosso destino , enchemos o peito e suspiramos: Que infeliz Atlas sou21!
365. VAIDADE A va id a d e é o r eceio d e p a r ecer or igin a l; é, p or t a n to, u m a fa lt a
de
a ltivez,
mas
não
n eces s a r ia m en te
uma
fa lt a
de
originalidade.
366. MISÉRIA DO CRIMINOSO O cr im in os o qu e foi d es cob er t o n ã o s ofr e p or s eu cr im e, m a s p ela ver gon h a ou p elo d es p eit o qu e lh e ca u s a u m a a s n eir a com et id a ou p ela p r iva çã o d e s eu elem en t o h a b itu a l, e é p r ecis o ter u m a r a r a s u t ileza p a r a s a b er d is cer n ir n es s e ca s o. Tod os a qu eles qu e fr eqü en ta r a m m u it o a s p r is ões e a s ca s a s d e cor r eçã o s e s u r p r een d em com o r a r a m en te n ela s s e en con tr a u m remorso in equ ívoco: m a s
m u ito m a is
fr eqü en tem en te a
n os t a lgia
do
querido velho crime, mau e adorado.
367. P ARECER SEMPRE FELIZ Qu a n d o a filos ofia er a a s s u n to d e com p et içã o p ú b lica , n a Gr écia d o s écu lo III, h a via cer to n ú m er o d e filós ofos qu e t or n a va feliz a s egu n d a in ten çã o d o d es p eito qu e d evia excita r s u a felicid a d e n a qu eles qu e vivia m s egu n d o ou tr os p r in cíp ios e a í en con tr a va m s eu t or m en to: p en s a va m r efu ta r a es tes com a felicid a d e, m elh or d o qu e com qu a lqu er ou tr a cois a e a cr ed ita va m qu e, p a r a a lca n ça r es s e ob jetivo, lh es b a s ta va p a r ecer s em p r e felizes ;
mas
es s a
a titu d e
d evia ,
a
lon go
p r a zo,
torná-los
verdadeiramente felizes! Essa foi, por exemplo, a sorte dos cínicos.
368. A RAZÃO QUE MUITAS VEZES NOS LEVA A DESCONHECER A m or a lid a d e d a for ça n er vos a em a u m en to é a legr e e agitada; a moralidade da força nervosa em declínio, à tarde ou nas p es s oa s d oen tes e n os a n ciã os , im p ele à p a s s ivid a d e, à ca lm a , à es p er a e à m ela n colia , à s vezes , à s id éia s s om b r ia s . Con for me p os s u ím os
uma
ou
ou tr a
d es s a s
m or a lid a d es ,
não
compreendemos aquela que nos falta e a interpretamos nos outros como imoralidade ou fraqueza.
369. P ARA SE ELEVAR ACIMA DA PRÓPRIA NULIDADE Aí
es tã o
a ltivos
in d ivíd u os
qu e,
para
es ta b elecer
o
s en tim en t o d e s u a d ign id a d e e d e s u a im p or tâ n cia , t êm s em p r e n eces s id a d e d e ou tr os h om en s qu e p os s a m m a ltr a t a r e violen ta r : d a qu eles cu ja im p otên cia e cova r d ia p er m item qu e a lgu ém tom e im p u n em en te, d ia n te d eles , a tit u d es s u b lim es e fu r ios a s !
É
p r ecis o qu e s eu cír cu lo d e con vivên cia s eja m is er á vel p a r a qu e p os s a m s e eleva r u m m om en to a cim a d e s u a n u lid a d e!
Há
a qu eles qu e p a r a is s o têm n eces s id a d e d e u m cã o, ou tr os d e u m a m igo, ou tr os a in d a d e u m a m u lh er ou
d e u m p a r tid o e,
finalmente, em casos muito raros, de uma época inteira.
370. E M QUE MEDIDA O PENSADOR AMA SEU INIMIGO Nu n ca te r ep r im a s n em te ca les d ia n te d e ti m es m o d a qu ilo qu e s e p od er ia op or a teu s p en s a m en tos ! J u r a -o! Is s o fa z p a r te d a lea ld a d e fu n d a m en ta l. Deves fa zer ca d a d ia ca m p a n h a con tr a t i m es m o. Um a vit ór ia ou a tom a d a d e u m r ed u to n ã o s ã o m a is d e tu a con t a , m a s d izem r es p eito à ver d a d e também não é mais de tua conta!
371. A MALDADE DA FORÇA
en tr eta n to, a d er r ota
É n eces s á r io com p r een d er a violên cia r es u lta n te d a p a ixã o, p or exem p lo d a cóler a , d o p on to d e vis ta fis iológico, com o u m a ten ta tiva p a r a evita r u m a ces s o d e s u foca m en to qu e a m ea ça . In u m er á veis a tos d e u m a a r r ogâ n cia qu e s e d es en ca d eia s ob r e ou tr a s p es s oa s for a m os d er iva tivos d e con ges tões s ú b ita s , p or m eio d e u m a violen t a a çã o m u s cu la r : e ta lvez s e d eva con s id er a r s ob es s e p on to d e vis ta t od a a m a ld a d e d a for ça . (A m a ld a d e d a for ça fer e os ou tr os , s em qu e s e r ep a r e n is s o
é n eces s ário que
ela apareça; a maldade da fraqueza quer fazer mal e contemplar as marcas do sofrimento).
372. E M HONRA DOS CONHECEDORES Des d e qu e a lgu ém , s em s er con h eced or , fa z, con t u d o, o p a p el d o ju iz, é p r ecis o p r otes ta r im ed ia ta m en te, s eja es s e a lgu ém h om em ou m u lh er . O en tu s ia s m o ou o a r r eb a ta m en t o, d ia n te d e u m a cois a ou d e u m h om em , n ã o s ã o a r gu m en tos : a a ver s ã o e o ódio tampouco.
373. R ECRIMINAÇÃO REVELADORA E le n ã o con h ece os h om en s
is s o qu er d izer n a b oca d e
alguns: Ele n ã o con h ece a b a ixeza ; e n a b oca d e ou tr os : E le n ã o conhece o que é excepcional e conhece demais a baixeza.
374. VALOR DO SACRIFÍCIO Qu a n to m a is con tes t a m os a os E s ta d os e a os p r ín cip es o d ir eito d e s a cr ifica r o in d ivíd u o (n a m a n eir a d e fa zer ju s tiça , d e recrutar os exércitos, etc.), mais aumentará o valor do sacrifício de si.
375. F ALAR MUITO CLARAMENTE
Há vá r ia s r a zões p a r a a r ticu la r cla r a m en t e a o fa la r : p or u m la d o, a d es con fia n ça em r ela çã o a s i m es m o n o u s o d e u m a lín gu a n ova e p ou co fa m ilia r e, p or ou tr o la d o, a d es con fia n ça em r ela çã o a os
ou tr os
p or
ca u s a
de
su a
es tu p id ez ou
de
su a
len ta
com p r een s ã o. E ocor r e o m es m o com cois a s es p ir it u a is : n os s a com u n ica çã o é p or vezes d em a s ia d o cla r a , d em a s ia d o m eticu los a , porque, se fosse de outro modo, aqueles a quem nos dirigimos não n os en ten d er ia m . Por con s egu in te, o es t ilo p er feito e leve s ó é perm itid o diante de um auditório perfeito.
3 76. D ORMIR MUITO Qu e fa zer p a r a s e es tim u la r qu a n d o s e es tá fa tiga d o e d es gos tos o con s igo m es m o? Um r ecom en d a a m es a d e jogo, ou t r o o cr is tia n is m o, u m ter ceir o a a git a çã o. Ma s o qu e h á d e m elh or , m eu ca r o m ela n cólico, a in d a é d orm ir m u ito, n o s en tid o p r óp r io e n o figu r a d o! É a s s im qu e s e a ca b a r á p or r een con tr a r a p r óp r ia m a n h ã ! A h a b ilid a d e d a a r te d e viver é s a b er in ter ca la r n o momento oportuno o sono sob todas as suas formas.
377. O QUE SE DEVE CONCLUIR DE UM IDELA FANTASIOSO Lá
on d e s e en con tr a m
n os s a s
la cu n a s
é qu e n os s a s
exa lt a ções vã o s e p er d er . O p r in cíp io fa n ta s ios o inimigos!
a m em s eu s
d eve ter s id o in ven ta d o p or ju d eu s , os m elh or es
odiadores qu e ja m a is h ou ve, e a m a is b ela glor ifica çã o d a castidade foi escrita por aqueles que, em sua juventude, levaram a vida mais libertina e mais abominável.
378. MÃO PRÓPRIA E MURO PRÓPRIO Nã o s e d eve p in ta r n o m u r o n em Deu s n em o d ia b o. As s im se estragaria o próprio muro e a própria vizinhança.
379. VEROSSÍMIL E INVEROSSÍMIL Um a m u lh er a m a va s ecr eta m en te u m h om em , o eleva va muito acima dela e dizia para si mesma cem vezes em segredo: Se semelhante homem me amasse seria uma graça diante da qual me d ever ia p r os tr a r a té o ch ã o! E o m es m o ocor r ia com o h om em , ju s ta m en t e em r ela çã o à m es m a m u lh er e à p a r t e, n o s egr ed o d e s eu s er , r ep etia p a r a s i p a la vr a s s em elh a n t es . Qu a n d o fin a lm en te a s lín gu a s d os d ois s e s olta r a m e p u d er a m con fes s a r o qu e a m b os gu a r d a va m n o cor a çã o, p r ofu n d a m en te s ecr eto, h ou ve u m s ilên cio e cer t a h es ita çã o. Dep ois a m u lh er a b r e a b oca com u m a voz fr ia : E n tã o é p er feita m en t e cla r o qu e n ã o s om os , n em u m n em ou tr o, o qu e a m a m os ! S e tu és o qu e d izes e n a d a m a is , eu m e r eb a ixei em vã o p a r a te a m a r : o d em ôn io m e s ed u ziu p r ecis a m en te com o a ti.
E s ta h is t ór ia m u ito ver os s ím il n ã o a con t ece n u n ca
p or
quê?
380. CONSELHO EXPERIMENTADO De t od os os m eios d e con s ola çã o, n en h u m fa z t ã o b em à qu ele qu e t em n eces s id a d e d ela qu e a a fir m a çã o d e qu e em s eu ca s o n ã o exis t e con s ola çã o. E le en con tr a n is s o u m a t a l d is tin çã o que, sem tardar, endireita a cabeça.
381. CONHECER SUA PARTICULARIDADE E s qu ecem os com d em a s ia d a fr eqü ên cia qu e, a os olh os d os es tr a n h os qu e n os vêem p ela p r im eir a vez, s om os u m a cois a inteiramente diferente daquilo que nós mesmos pensamos ser: não vem os ger a lm en te ou tr a cois a s en ã o u m a p a r ticu la r id a d e qu e s a lta a os olh os e qu e d eter m in a a im p r es s ã o. É a s s im qu e o m a is p a cífico d os h om en s e o m a is r a zoá vel, ca s o tives s e u m gr a n d e
b igod e, p od er ia d e a lgu m m od o s en ta r -s e à s om b r a d es s e b igod e e fica r tot a lm en te tr a n qü ilo
os olh os com u n s vêem n ele o
acessório d e u m gr a n d e b igod e, is to é, u m ca r á ter m ilita r qu e s e exa lt a fa cilm en te e p od e ch ega r a té a violên cia
e diante dele nos
comportamos de acordo.
382. J ARDINEIRO E JARDIM Nos d ia s ú m id os e s om b r ios , n a s olid ã o, a s p a la vr a s s em a m or qu e n os s ã o d ir igid a s ger a m conclusões s em elh a n tes a cogu m elos : n ós a s vem os a p a r ecer d ia n te d e n ós , n u m a m a n h ã , sem que saibamos de onde vêm e nos olham, cinzentas e morosas. In feliz o p en s a d or qu e n ã o é o ja r d in eir o, m a s s om en te o ter r en o de suas plantas!
383. A COMÉDIA DA COMPAIXÃO Seja qual for a parte que tomamos na sorte de um infeliz, em s u a p r es en ça s em p r e fa zem os u m p ou co d e com éd ia , n ã o d izem os m u it a s qu e p en s a m os e com o a s p en s a m os , com a cir cu n s p ecçã o de um médico na cabeceira de um enfermo em perigo de morte.
384. H OMENS ESTRANHOS Há p es s oa s p u s ilâ n im es qu e n ã o d ã o n en h u m a im p or tâ n cia a o qu e h á d e m elh or em s u a a tivid a d e e qu e n ã o con s egu em tr a n s m itir qu a l o a lca n ce d ela : m a s , p or u m a es p écie d e vin ga n ça , ta m p ou co s e in t er es s a m p ela s im p a tia d os ou tr os e a té m es m o n ã o a cr ed ita m n a s im p a tia ; têm ver gon h a d e p a r ecer m u ito con ten tes
con s igo
m es m os
e
p a r ecem
ob s tin a çã o, em tor n a r -s e r id ícu los . encontram nos artistas melancólicos.
se
com p r a zer ,
com
E s s es es ta d os d e a lm a s e
385. OS VAIDOSOS S om os com o vitr in es d e loja s , on d e p a s s a m os n os s o t em p o a arru m ar, a
es con d er , a
coloca r em
qualidades que os outros nos concedem
evid ên cia
as
p r eten s a s
para nos enganarmos a
nós mesmos.
386. OS PATÉTICOS E OS INGÊNUOS É t a lvez u m h á b ito s em n ob r eza n ã o d eixa r p a s s a r nenhuma oca s iã o d e s e m os tr a r p a tético: p elo p r a zer d e im a gin a r o es p ect a d or qu e b a te n o p eit o e s e s en te ele p r óp r io p equ en o e desprezível. Por conseguinte, é talvez também um sinal de nobreza b r in ca r com a s s itu a ções p a tética s e com p or ta r -s e n ela s s em d ign id a d e. A velh a n ob r eza gu er r eir a d a Fr a n ça p os s u ía es te gênero de distinção e de sutileza.
387. COMO REFLETIR ANTES DO CASAMENTO S u p on d o qu e ela m e a m a , com o va i m e im p or t u n a r com o tem p o! E s u p on d o qu e n ã o m e a m a , h a ver á r a zões m a ior es p a r a qu e com o tem p o m e im p or tu n e a in d a m a is ! de duas espécies de incômodo
Trata-s e s om en te
casemo-nos pois!
388. A VIGARICE COM BOA CONSCIÊNCIA É extr em a m en te d es a gr a d á vel s er en ga n a d o n a s p equ en a s com p r a s , p or exem p lo, n o Tir ol22, p or qu e, a lém d o m a u n egócio, é precis o s u p or ta r a in d a
a
má
figu r a
e a
cob iça
b r u ta l d o
com er cia n t e tr a p a ceir o, b em com o m á con s ciên cia e gr os s eir a in tim id a d e qu e s e m a n ifes t a n o com er cia n te em r ela çã o a n ós . E m Ven eza , p elo con tr á r io, o viga r is ta s e a legr a im en s a m en te p elo golp e qu e a p licou com s u ces s o e n ã o s e d á d e for m a a lgu m a à zom b a r ia , m a s es tá m es m o com p leta m en te d is p os to a d em on s tr a r
a m a b ilid a d es a o logr a d o e s ob r etu d o a r ir com ele, ca s o es tives s e também disposto a isso.
Em resumo: é preciso ter espírito e boa
con s ciên cia p a r a s er tr a p a ceir o: is s o p r a tica m en te r econ cilia o enganado pela trapaça.
389. UM TANTO PESADO DEMAIS Pes s oa s m u it o cor a jos a s , qu e s ã o u m p ou co p es a d a s p a r a s er p olid a s e a m á veis , p r ocu r a m r es p on d er im ed ia ta m en te a u m a gen tileza p r es ta n d o u m s er viço s ér io ou leva n d o o a p oio d e s u a for ça . É toca n te ob s er va r a tim id ez com qu e ofer ecem s u a s p eça s de ouro quando outro lhes ofereceu suas moedas de ouro.
390. E SCONDER O ESPÍRITO Qu a n d o s u r p r een d em os a lgu ém es con d en d o d ia n te d e n ós s eu es p ír ito, n ós o tr a t a m os com o m a u : com m a ior r a zã o s e s u s p eita m os qu e foi im p elid o a is s o p ela a m a b ilid a d e e p ela benevolência.
391. O MAU MOMENTO As n a tu r eza s viva s n ã o m en tem s en ã o n u m m om en to: mentiram então a si mesmas e permanecem convictas e honestas.
392. CONDIÇÕES DA POLIDEZ A p olid ez é u m a b oa cois a e r ea lm en t e u m a d a s qu a t r o vir tu d es ca r d ea is (em b or a s eja a ú ltim a ): m a s p a r a qu e n ã o n os im p or tu n em os u n s a os ou tr os com ela , é n eces s á r io qu e a qu ele com qu em t en h o n egócios t en h a u m gr a u d e p olid ez a m a is ou a m en os qu e eu
d e ou tr a for m a a ca b a r em os p or tom a r r a ízes ,
pois o bálsamo não somente embalsama, mas nos cola também no local.
393. VIRTUDES PERIGOSAS E le n ã o es qu ece n a d a , m a s p er d oa tu d o. d u p la m en te
od ia d o,
p ois
en ver gon h a
E n t ã o s er á
d u p la m en t e,
com
su a
memória e com sua generosidade.
394. S EM VAIDADE Os h om en s a p a ixon a d os p en s a m p ou co n o qu e os ou tr os pensam, seu estado os eleva acima da vaidade.
395. A CONTEMPLAÇÃO Nes te
p en s a d or
o
es ta d o
con tem p la tivo
p r óp r io
d os
p en s a d or es s egu e s em p r e o es ta d o d e m ed o, n a qu ele outro, s em p r e o es ta d o d e d es ejo. No p r im eir o, a con tem p la çã o s e a lia , p or ta n to, a o s en t im en t o d e segurança; n o s egu n d o, a o s en tim en to de saciedade
o qu e qu er d izer qu e a qu ele exp er im en ta u m
sentimento de coragem e este, de desgosto e de neutralidade.
396. À CAÇA E s te va i à ca ça p a r a a p a n h a r ver d a d es a gr a d á veis , a qu ele ver d a d es d es a gr a d á veis . Por is s o o p r im eir o tem m a is p r a zer n a caça do que no espólio.
397. E DUCAÇÃO A ed u ca çã o é u m a con tin u a çã o d a p r ocr ia çã o e m u ita s vezes uma espécie de paliativo ulterior desta.
398. COMO SE RECONHECE O MAIS FOGOSO De d u a s p es s oa s qu e lu ta m ju n ta s ou qu e s e a m a m ou s e a d m ir a m , a
m a is
fogos a
a s s u m e s em p r e a
p os içã o m en os
confortável. Ocorre o mesmo com dois povos.
399. D EFENDER-SE Cer tos h om en s têm p len o d ir eito d e a gir d es t a ou d a qu ela m a n eir a ;
mas
qu a n d o
qu er em
acreditamos mais que seja assim
d efen d er
su a
con d u ta ,
não
e não temos razão.
400. R ELAXAMENTO MORAL Há n a tu r eza s m or a is ter n a s qu e têm ver gon h a d e ca d a u m de seus sucessos e dos remorsos de cada insucesso.
401. E SQUECIMENTO PERIGOSO Com eça m os p or d es a p r en d er a a m a r os ou t r os e a ca b a m os p or n ã o en con tr a r em n ós m es m os n a d a qu e s eja d ign o d e s er amado.
402. UMA TOLERÂNCIA COMO OUTRA Fica r u m m in u to a m a is s ob r e b r a s a s a r d en tes e queimar-se um pouco
isso n ã o fa z m a l n em a os h om en s n em à s ca s ta n h a s !
E s s a p equ en a a m a r gu r a e es s a p equ en a d u r eza p er m item s en tir en fim com o o cor a çã o é d oce e m a cio.
S im ! É a s s im qu e vocês
julgam, vocês, gozadores! Sublimes antropófagos!
403. ALTIVEZ DIFERENTE S ã o a s m u lh er es qu e em p a lid ecem com a id éia d e qu e s eu am ado
p od er ia
não
s er
d ign o
d ela s ; s ã o
os
h om en s
qu e
em p a lid ecem com a id éia d e qu e p od er ia m n ã o s er d ign os d e s u a am ada.
Tr a ta -s e
a qu i
de
m u lh er es
com p leta s ,
de
h om en s
com p letos . Da qu eles h om en s qu e p os s u em , em te m p os n orm a is , a con fia n ça em s i e o s en tim en to d o p od er , s en tem , em es ta d o d e
paixão, uma espécie de timidez e uma espécie de dúvida a respeito de
s i m es m os ; d a qu ela s
m u lh er es
qu e,
p elo
con tr á r io,
se
con s id er a m s em p r e com o s er es fr a cos , p r on ta s a o a b a n d on o, mas n a exceçã o s u b lim e d a p a ixã o, en con tr a m s u a a ltivez e s eu s en tim en t o d e p od er
m u itos p er gu n ta m en tã o: qu em , p ois , é
digno de mim?
404. A QUEM RARAMENTE SE FAZ JUSTIÇA Cer tos h om en s n ã o p od em s e en tu s ia s m a r com qu a lqu er cois a d e b om e d e gr a n d e s em com eter , d e u m la d o e d e ou t r o, uma grave injustiça: é seu tipo de moralidade.
405. Luxo O gos to d o lu xo es tá a r r a iga d o n a s p r ofu n d eza s d e u m h om em : ele r evela qu e é n a s on d a s d a a b u n d â n cia e d o s u p ér flu o que sua alma nada mais à vontade.
406. T ORNAR IMORTAL Qu e a qu ele qu e qu er m a t a r s eu a d ver s á r io con s id er e s e es s a não seria uma forma de eternizá-lo em si mesmo.
407. CONTRA NOSSO CARÁTER Quando a verdade que temos a dizer vai contra nosso caráter com o is s o ocor r e m u ita s vezes
n ós n os com p or ta m os , a o
dizê-la , com o s e n ã o s ou b és s em os m en tir e d es p er ta m os a desconfiança.
408. ONDE É NECESSÁRIA MUITA DOÇURA Cer ta s n a tu r eza s n ã o têm ou tr a es colh a s en ã o d e s er em malfeitores públicos ou secretos carregadores de cruz.
409. D OENÇA Por d oen ça é p r ecis o en t en d er : a a p r oxim a çã o d e u m a velh ice p r ecoce, d a feiú r a e d os ju ízos p es s im is t a s : tr ês cois a s qu e caminham junto.
410. OS SERES TEMEROSOS S ã o p r ecis a m en te os s er es d es a jeita d os e tem er os os qu e s e tor n a m fa cilm en t e cr im in os os : n ã o s e con ten ta m com a d efes a ou a vin ga n ça p r op or cion a l a s eu ob jet ivo; p or fa lt a d e es p ír ito e d e p r es en ça d e es p ír ito, s eu ód io n ã o con h ece ou tr a s a íd a s en ã o o aniquilamento.
411. S EM ÓDIO Qu er es te d es p ed ir d e tu a p a ixã o! Pod es fa zê-lo, m a s sem ódio contra ela! Senão te sobrevirá uma segunda paixão.
A alma
d o cr is tã o qu e s e lib er tou d o p eca d o s e arruína ger a lm en te d e im ed ia to p elo ód io a o p eca d o. Con t em p la os r os tos d os gr a n d es cristãos! São rostos cheios de grande ódio.
412. E SPIRITUAL E LIMITADO E le n ã o s a b e a p r ecia r n a d a for a d e s i m es m o; e qu a n d o qu er es tim a r ou tr a s p es s oa s , tem s em p r e d e com eça r p or tr a n s for m á las em si mesmo. Mas para fazer isso, é espiritual.
413. OS ACUSADORES PRIVADOS E PÚBLICOS Olh a d e p er to tod o o h om em qu e a cu s a e in t er r oga
ele
r evela n is s o s eu ca r á ter : or a , n ã o é r a r o qu e es s e ca r á t er s eja p ior qu e a qu ele d a vítim a cu jo cr im e in ves tiga . O a cu s a d or im a gin a in ocen tem en te qu e o in im igo d o cr im e e d o m a lfeitor d eve
for ços a m en te ter , p or n a tu r eza , u m b om ca r á ter ou p elo m en os p a s s a r p or b om
d e ta l m od o qu e ele s e d eixa leva r , ou m elh or :
se enfurece.
414. OS CEGOS VOLUNTÁRIOS Há u m a es p écie d e d ed ica çã o exa lt a d a , leva d a a o extr em o, p or u m a p es s oa ou p or u m p a r tid o, qu e d en u n cia qu e n os s en tim os s ecr eta m en te s u p er ior es a es s a p es s oa ou a es s e p a r tid o e qu e, p or ca u s a d is s o, gu a r d a m os cer to r a n cor . Nós n os cega m os d e cer to m od o volu n ta r ia m en te p a r a p u n ir n os s os olh os p or ter em visto demais.
415. R EMEDIUM AMORIS23 Na m a ior p a r te d os ca s os , o qu e h á a in d a d e m a is efica z contra o amor é o velho remédio radical: o amor partilhado.
416. ONDE ESTÁ O PIOR INIMIGO? Aqu ele qu e s a b e d efen d er b em
s u a ca u s a e qu e tem
con s ciên cia d is s o, m a n ifes t a ger a lm en te u m es p ír ito con cilia d or em r ela çã o a os a d ver s á r ios . Ma s a cr ed ita r qu e lu t a m os p ela b oa ca u s a e s a b er qu e não somos h á b eis p a r a d efen d ê-la
is s o é qu e
leva vocês a p er s egu ir s eu s a d ver s á r ios com u m ód io s ecr et o e implacável.
Qu e ca d a u m ca lcu le, a p a r tir d is s o, on d e d eve
procurar seus piores inimigos!
417. LIMITES DE TODA HUMILDADE Ma is qu e u m já ch egou à h u m ild a d e qu e d iz: cred o qu ia a b s u rd u m es t 24, e qu e ofer ece s u a r a zã o em h oloca u s t o: m a s n in gu ém , p elo m en os
qu e eu
s a ib a , ch egou
a in d a
a
es s a
h u m ild a d e qu e, n o en t a n to, n ã o es tá m u ito d is ta n t e d a p r im eir a e
que diz: credo quia absurdus sum25.
418. COMÉDIA DO VERDADEIRO Há a qu eles qu e s ã o s in cer os
n ã o p or qu e d etes tem s im u la r
s en tim en t os , m a s p or qu e n ã o con s egu ir ia m s im u la r d e m a n eir a con vin cen te. E m r es u m o, n ã o têm con fia n ça em s eu ta len to d e comediantes e preferem a sinceridade, a comédia do verdadeiro .
419. CORAGEM NA RESOLUÇÃO As p ob r es ovelh a s d izem a s eu con d u tor : Va i s em p r e em fr en te, e n ós n u n ca d eixa r em os d e ter cor a gem p a r a te s egu ir . Ma s o p ob r e con d u tor p en s a con s igo m es m o: Sigam-m e s em p r e e eu nunca deixarei de ter coragem de conduzi-las.
420. ASTÚCIA DA VÍTIMA É u m a tr is te a s tú cia qu er er s e ilu d ir com a lgu ém p or qu em n os s a cr ifica m os , d a n d o-lh e oca s iã o em qu e ele p os s a p a r ecer ta l como gostaríamos que fosse.
421. ATRAVÉS DE OUTROS Há h om en s qu e n ã o qu er em d e m a n eir a n en h u m a s er vis tos d e ou tr a for m a qu e p r ojeta n d o s eu s r a ios a tr a vés d e ou t r os . É marca de grande sabedoria.
422. D AR PRAZER AOS OUTROS Por qu e d a r p r a zer é s u p er ior a tod os os ou tr os p r a zer es ? Por qu e d es s a for m a s e p od e d a r p r a zer d e u m a s ó vez a cin qü en ta d e s eu s p r óp r ios in s t in tos . E p od em s er ta lvez a lgu m a s a legr ia s m u it o p equ en a s : m a s s e for em r eu n id a s tod a s n u m a s ó m ã o, ter se-á a mão mais cheia que nunca
e o coração também.
1
Ludwig Van Beethoven (1770-1827), compositor alemão (NT).
2
Wolfgang Amadeus Mozart (1756-1791), compositor austríaco (NT).
3
Rich a r d Wa gn er (1 8 1 3 -1 8 8 3 ), com p os it or a lem ã o; Nietzs ch e e Wa gn er er a m gr a n d es a m igos , m a s d ep ois r om p er a m r ela ções d e for m a r a d ica l e ir r evogá vel, fa t o qu e Nietzs ch e d es cr eve em s eu op ú s cu lo O cas o W a gn er (NT).
4
Willia m S h a k es p ea r e (1 5 6 4 -1 6 1 6 ), d r a m a t u r go e p oeta in glês ; Macbeth é o título e o personagem principal de uma de suas peças teatrais (NT).
5
Len d a celta d a Id a d e Méd ia , Tris tã o e Is old a, teve m u it a s ver s ões em p r os a e ver s o; a len d a n a r r a a p a ixã o p r oib id a e fa ta l en tr e Tr is t ã o e Is old a ; a qu i Nietzs ch e s e r efer e à len d a em s i, m a s ta lvez r elem b r e o d r a m a m u s ica l em três atos com este título e de autoria de Richard Wagner (NT).
6
S ófocles (4 9 6 -4 0 6 a .C), p oet a t r á gico gr ego; en tr e p a r ên tes is s ã o cita d a s t r ês obras dele (NT).
7
Pen s a m en to extr a íd o d a ob r a Retórica (II, 1 5 ) d e Ar is t óteles (3 8 4 -3 2 2 a .C), filósofo grego (NT).
8
George Gordon, Lord Byron (1788-1824), poeta inglês (NT).
9
Na r ea lid a d e, d olce far n ie n te , exp r es s ã o ita lia n a qu e s ign ifica liter a lm en te d oce fa zer n a d a , com o s en tid o ger a l d e o b elo ócio, a vid a fá cil s em problemas e preocupações, sem trabalho algum (NT).
10
Mon s tr os m a r in h os d a m it ologia gr ega , gu a r d iões d o es tr eito d e Mes s in a (loca liza d o en tr e a ilh a d a S icília e a Itá lia con tin en ta l). Na r ea lid a d e, s ã o os d es ign a tivos d e u m s or ved ou r o e d e u m r och ed o, m u ito tem id os p elos m a r in h eir os . Os n a vega d or es qu e con s egu ia m es ca p a r d e u m , ger a lm en te n ã o s e s a fa va m d o ou tr o. Des s a len d a e d es s a r ea lid a d e s e con s er va r a m a s expressões escapar de Cila e cair em Caribde, estar entre Cila e Caribde (NT).
11
Da vid Livin gs ton e (1 8 1 3 -1 8 7 3 ), m is s ion á r io e exp lor a d or in glês ; a tr a ves s ou o cen tr o d a Áfr ica d o oes te p a r a les te e, en tr e a s s u a s m u it a s d es cob er ta s , está a das cataratas de Vitória (NT).
12
Qu em n ã o tem , n ã o é ou qu em n ã o p os s u i, n ã o exis te (NT).
13
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica vu lgo, p ovo p r ofa n o (NT).
14
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica p a r a a m a ior glór ia d e Deu s (NT).
15
16 17
Th om a s Ca r lyle (1 7 9 5 -1 8 8 1 ), h is t or ia d or , cr ítico e es cr itor es cocês ; en t r e s u a s ob r a s d es ta ca -se S ob re os h eróis , o cu lto d os h eróis e o h e róico n a h is tória (NT). E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica fa tos , fa t os fictícios (NT). J oh n Wes ley (1 7 0 3 -1 7 9 1 ), teólogo in glês , filh o d e p a s tor a n glica n o; r om p eu com a Igr eja e p a s s ou -se p a r a o p r otes t a n tis m o, on d e fu n d ou a Igr eja m etod is ta (d es ign a tivo or igin a d o d o ca r á t er r igor os o, d is cip lin a d o e or d eir o d es s a cor r en te cr is tã ), d es en volven d o u m tr a b a lh o p r ofícu o d e p r ega çã o e d e
evangelização (NT). 18
Im m a n u el Ka n t (1 7 2 4 -1 8 0 4 ), filós ofo a lem ã o; d en tr e s u a s ob r a s , A re ligiã o n os lim ite s d a s im ple s raz ão e Critica d a raz ão prá tica já for a m p u b lica d a s nesta coleção da Editora Escala (NT).
19
Hom er o (s éc. IX a .C), p oeta ép ico gr ego, a u tor d a s ob r a s -primas Ilíada e Od is s é ia ; a in for m a çã o d e qu e a d or m ecia com fr eqü ên cia s e en con tr a n a obra Ars p oe tica (ver s o 3 5 9 ) d e Qu in t u s Hor a tiu s Fla ccu s (6 5 -8 a .C), p oet a latino (NT).
20
Johann Gottlieb Fichte (1762-1814), filósofo alemão (NT).
21
S egu n d o a m it ologia gr ega , Atla s er a u m giga n te qu e s e a liou a os Tit ã s n a lu t a con tr a os d eu s es . Com o ca s tigo, Zeu s o con d en ou a s u s ten ta r o m u n d o sobre os ombros (NT).
22
Regiã o d o s u l d a Áu s tr ia e d o extr em o n or te d a Itá lia ; er a tota lm en te a u s tr ía ca a té 1 9 1 9 , d a ta em qu e, a o tér m in o d a p r im eir a Gu er r a Mu n d ia l, parte dela foi anexada ao território italiano (NT).
23
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica r em éd io d o a m or (NT).
24
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica cr eio p or qu e é a b s u r d o (NT).
25
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica cr eio p or qu e s ou a b s u r d o (NT).
LIVRO Q UINTO
423. NO GRANDE SILÊNICO Aí es tá o m a r , a qu i p od em os es qu ecer a cid a d e. É ver d a d e qu e toca m a in d a a Ave Ma ria
é es s e r u íd o fú n eb r e e in s en s a to,
m a s s u a ve, n a en cr u zilh a d a d o d ia e d a n oite
es p er em u m
m om en to a in d a ! Agor a tu d o s e ca la ! O m a r s e es t en d e p á lid o e cin tila n te, m a s n ã o p od e fa la r . O céu joga com cor es ver m elh a s , amarelas e verdes seu eterno e mudo jogo do crepúsculo, não pode fa la r . Os p equ en os es colh os e os r ecifes qu e cor r em n o m a r , com o p a r a en con tr a r o loca l m a is s olitá r io, tod os n ã o p od em fa la r . E s s e en or m e m u tis m o qu e d e r ep en te n os s u r p r een d e, com o é b elo e cr u el p a r a d ila t a r a a lm a !
Ai! qu e d u p licid a d e h á n es s a m u d a
beleza! Como poderia falar bem, e mal também, se o quisesse! Sua lín gu a p r es a e a felicid a d e s ofr ed or a m a r ca m s eu r os to, tu d o is s o n ã o p a s s a d e m a lícia p a r a zom b a r d e tu a com p a ixã o!
Que
im p or ta ! Nã o m e en ver gon h o d e a tr a ir o r is o d e s em elh a n tes for ça s . Ma s ten h o d ó d e ti, n a t u r eza , p ois ten s d e te ca la r , m es m o qu e fos s e s om en te tu a m a lícia qu e te p r en d e a lín gu a : s im , ten ho d ó d e ti, p or ca u s a d e tu a m a lícia !
Ai! o s ilên cio a u m en ta m a is
a in d a e m eu cor a çã o s e d ila t a d e n ovo: es p a n ta -s e com u m a n ova verdade, ele ta m bém n ão p od e fa la r, s e p õe d e a cor d o com a n a tu r eza d es a fia r , qu a n d o a b oca qu er la n ça r p a la vr a s n o m eio dess a b eleza , ele p r óp r io goza d a d oce m a lícia d o s ilên cio. A p a la vr a , o p r óp r io p en s a m en to s e t or n a m od ios os p a r a m im : n ã o s er á qu e ou ço, p or tr á s d e ca d a p a la vr a , r ir e n ã o es cu to o er r o, a im a gin a çã o e o es p ír ito d e ilu s ã o? Nã o d evo zom b a r d e m in h a compaixão? Que eu zombe de minha zombaria?
Ó mar! Ó tarde!
Vocês s ã o m es t r es m a licios os ! E n s in a m o h om em a deixar d e s er homem! E le d eve s e a b a n d on a r a vocês ? Deve tor n a r -s e com o vocês s ã o a gor a , p á lid os , cin tila n t es , m u d os , im en s os , r ep ou s a n d o em si mesmos? Deve elevar-se acima de si mesmo?
424. P ARA QUEM A VERDADE? Até o p r es en te, os er r os for a m a s for ça s m a is ricas em con s ola çã o: a gor a s e es p er a os m es m os s er viços d a s ver d a d es reconhecidas, mas elas se fazem esperar um pouco demais. Como, a s ver d a d es n ã o s er ia m ta lvez a s m a is a p r op r ia d a s p a r a con s ola r ? E s s e s er ia , p ois , u m a r gu m en to con tr a a s ver d a d es ? Qu e têm ela s d e com u m com o es t a d o d oen t io d os h om en s s ofr ed or es e d egen er a d os , p a r a qu e s e p os s a exigir d ela s qu e lh es s eja m ú teis ? Nã o s e p r ova n a d a con tr a a verdade d e u m a p la n t a a o con s t a t a r qu e ela n ã o con tr ib u i d e a lgu m a m a n eir a p a r a a cu r a d os h om en s d oen tes . Ma s ou tr or a h a via a con vicçã o d e qu e o h om em er a o ob jet ivo d a n a t u r eza , a p on to d e a d m it ir s em cer im ôn ia qu e o con h ecim en to n ã o p od ia r evela r n a d a qu e n ã o fos s e s a lu ta r e ú til a o h om em e, m a is a in d a , qu e n ã o p od er ia , a n en h u m preço, haver ou tr a cois a n o m u n d o.
Ta lvez d e t u d o is s o s e p od er ia con clu ir
qu e a ver d a d e, com o en tid a d e e con ju n to, s ó exis te p a r a a s a lm a s con tem p or a n ea m en te
p od er os os
e
d es in ter es s a d a s , a legr es
e
p a cífica s (com o er a a d e Ar is tóteles ), e qu e es s a s a lm a s s er ia m a s ú n ica s a procurá-la r ea lm en te: p ois os ou tr os p r ocu r a m remédios p a r a s eu u s o, qu a lqu er qu e s eja , a liá s , o or gu lh o qu e têm p a r a vangloriar-s e d e s eu in telecto e d a lib er d a d e d es s e in telecto
eles
não p r ocu r a m a ver d a d e. Aí es tá p or qu e a ciên cia p r op or cion a tã o p ou ca a legr ia ver d a d eir a a es s es h om en s qu e a r ecr im in a m p or s u a fr ieza , p or s u a a r id ez e p or s u a d es u m a n id a d e: es s e é o ju ízo d os d oen t es s ob r e a d is p os içã o d a qu eles qu e s ã o s a u d á veis .
Os
d eu s es d a Gr écia ta m b ém n ã o tin h a m gr a n d e tin o p a r a con s ola r ; qu a n d o o p ovo gr ego a ca b ou p or ca ir d oen te, ele ta m b ém foi u m a das razões por que semelhantes deuses pereceram.
425. NÓS, DEUSES NO EXÍLIO! Por erros s ob r e s u a or igem , s u a s itu a çã o ú n ica , s eu d es tin o e p or exigên cia s fu n d a d a s n es s es er r os , a h u m a n id a d e s e elevou m u it o a lt o e ela s e ultrapassou-s e a s i m es m a s em ces s a r : m a s , p or es s es m es m os er r os , s ofr im en tos in d izíveis , p er s egu ições , s u s p eita s e d es con h ecim en tos r ecíp r ocos e u m m a ior n ú m er o a in d a d e m is ér ia s d o in d ivíd u o, em s i e cob r e s i, en tr ou n o mundo. Os homens se tornaram criaturas sofredoras por causa de suas morais: o que obtiveram foi, em resumo, o sentimento de que er a m
fu n d a m en ta lm en te
d em a s ia d o
b on s
e
d em a s ia d o
im p or ta n tes p a r a a ter r a , on d e s ó es ta va m d e p a s s a gem . or gu lh os o qu e s ofr e
O
es tá a in d a lá , p r ovis or ia m en te, o tip o
superior da humanidade.
426. CEGUEIRA DOS PENSADORES EM RELAÇÃO ÀS CORES Os gr egos via m a n a tu r eza d e m a n eir a d ifer en te d a n ossa, p ois , d evem os a d m itir qu e s eu olh o er a cego p a r a o a zu l e p a r a o ver d e e qu e via m , em vez d o a zu l, u m ca s t a n h o m a is ca r r ega d o, em vez d e ver d e, u m a m a r elo (d es ign a va m , p ois , com a m es m a p a la vr a , a cor d e u m a ca b eleir a es cu r a , a qu ela d o m ir tilo e a qu ela d o m a r es m er id ion a is , e a in d a , p ela m es m a p a la vr a , a cor d a s p la n t a s ver d es e d a p ele h u m a n a , d o m el e d a s r es in a s a m a r ela s : d e m od o qu e s eu s m a ior es p in tor es , com o foi d em on s tr a d o, n ã o p u d er a m r ep r od u zir o m u n d o qu e os cer ca va s en ã o p elo p r eto, p elo b r a n co, p elo ver m elh o e p elo a m a r elo).
Com o lh es d evia
p a r ecer d ifer en te a n a tu r eza e m a is p r óxim a d o h om em , p ois a
s eu s olh os a s cor es d o h om em p r ed om in a va m igu a lm en te n a n a tu r eza e es ta , p or a s s im d izer , s e b a n h a va n o ét er color id o d a h u m a n id a d e! (O a zu l e o ver d e d es p oja m a n a t u r eza d e s u a h u m a n id a d e m a is qu e qu a lqu er ou tr a cor ). Foi p or es s e d efeit o qu e s e d es en volveu a fa cilid a d e in fa n til, p ecu lia r d os gr egos , d e con s id er a r os fen ôm en os d a n a tu r eza com o d eu s es e s em i-deuses, is to é, d e vê-los s ob for m a humana.
Ma s qu e is s o s ir va d e
s ím b olo a ou tr a h ip ót es e. Tod o p en s a d or p in ta s eu
mu n do
p a r ticu la r d ele e a s cois a s qu e o cer ca m com m en os cor es d o que a s qu e ex is te m , e é cego a a lgu m a s . Nã o é a p en a s u m d efeito. Gr a ça s a es s a a p r oxim a çã o e a es s a s im p lifica çã o, ele em pres ta à s coisas h a r m on ia s d e cor es extr em a m en te qu e têm u m gr a n d e en ca n t o e qu e p od em p r od u zir u m en r iqu ecim en to d a n a tu r eza . Ta lvez s eja m es m o p or es s a via s om en te qu e a h u m a n id a d e aprendeu a usufruir d o es p etá cu lo d a vid a : gr a ça s a o fa to d e que a exis tên cia lh e foi in icia lm en te a p r es en ta d a com u m a ou d u a s ton a lid a d es e, p or con s egu in t e, d e u m a for m a m a is h a r m on ios a : ela s e h a b itu ou , p or a s s im d izer , com es s es ton s s im p les , a n tes d e p a s s a r a n u a n ces m a is va r ia d a s . Ain d a h oje, cer tos in d ivíd u os s e es for ça m p a r a s a ir d e u m a cegu eir a p a r cia l p a r a ch ega r a u m a vid a m a is r ica e a u m a d ifer en cia çã o m a ior ; fa zen d o is s o, n ã o en con tr a m s om en te n ovos p r a zer es , m a s s ã o for ça d os ta m b ém a abandonar e perder alguns antigos.
427. O EMBELEZAMENTO DA CIÊNCIA Da m es m a for m a qu e a a r t e d os ja r d in s r ococó n a s ceu d o sentimento: a n a t u r eza é feia , s elva gem , a b or r ecid a va m os em b elezá -la!
igu a lm en te n a s ceu d o s en tim en to:
ciên cia é feia , á r id a , d es es p er a d a , d ifícil, a b or r ecia va m os em b elezá-la!
p ois b em ! a
p ois b em !
p r ovoca s em p r e e d e n ovo a lgu m a cois a
qu e s e ch a m a filosofia. E s t a qu er o qu e qu er em tod a s a s a r tes e tod a s a s ob r a s p oét ica s : divertir, a n t es d e qu a lqu er ou tr a cois a , Ma s ela qu er is s o em con for m id a d e com u m or gu lh o h er ed itá r io, d e u m a m a n eir a s u p er ior e m a is s u b lim e, d ia n te d os es p ír itos d e elite. Cr ia r p a r a ela u m a a r te d os ja r d in s , cu jo en ca n to p r in cip a l s er ia , com o p a r a os es p ír itos
m a is vu lga r es , cr ia r u m a ilusão
visual (p or m eio d e tem p los , d e p er s p ectiva s , d e gr u ta s , d e la b ir in tos , d e ca s ca ta s , p a r a u tiliza r m et á for a s ), a p r es en ta r a ciên cia em r es u m o com tod a s a s es p écies d e lu zes m a r a vilh os a s e r ep en tin a s , in cor p or a r n is s o a lgo d e b a s ta n te va go, d e d es r a zã o e d e s on h o, p a r a qu e p os s a m os a li p a s s ea r
com o n a n a tu r eza
selvagem , m a s s em cu s to e s em a b or r ecim en to
es ta n ã o é u m a
ambição modesta: aquele que está possuído por ela, sonha mesmo em tor n a r s u p ér flu a a r eligiã o, r eligiã o qu e, p a r a os h om en s d e ou tr or a , a p r es en ta va a for m a s u p r em a d a a r te d o d iver tim en to. Dor a va n t e is s o s egu e s eu cu r s o p a r a a tin gir u m d ia s eu p on to culminante: já hoje começam a ser ouvidas vozes hostis à filosofia, vozes qu e gr ita m : Retor n o à ciên cia , à n a tu r eza e a o n a tu r a l d a ciência!
anunciando ta lvez u m a ép oca qu e va i d es cob r ir a
beleza mais poderosa, justamente nas partes selvagens e feias da ciên cia , d a m es m a m a n eir a qu e s ó d ep ois d e Rou s s ea u 1 nós d es cob r im os o s en tid o d a b eleza d o a lto d a s m on ta n h a s e d os desertos.
428. D UAS ESPÉCIES DE MORALISTAS Ver e ver com p leta m en t e, p ela p r im eir a vez, u m a lei d a n a tu r eza , is to é, demonstrar es s a lei (p or exem p lo, a qu ela d a qu ed a d os cor p os , d a r eflexã o d a lu z e d o s om ), is s o é cois a tot a lm en te d ifer en te d o qu e explicá-la e t a m b ém a s s u n to d e espíritos bem diferentes. É assim que se distinguem também esses
moralist a s qu e vêem e com en ta m a s leis e os h á b itos h u m a n os m or a lis t a s n otá veis p elo ou vid o, n a r iz e olh os s u tis qu e exp lica m
o qu e ob s er va r a m . E s tes
sobretudo in ven tivos
e p os s u ir u m a
ú ltim os
daqueles d evem
s er
im a gin a çã o isenta pela
sagacidade e pelo saber.
429. A NOVA PAIXÃO Por qu e tem em os e d etes ta m os a p os s ib ilid a d e d e u m r etor n o à b a r b á r ie? S er ia ta lvez p or qu e a b a r b á r ie tor n a r ia os h om en s m a is in felizes d o s ã o? De m od o a lgu m ! Os b á r b a r os d e tod a s a s ép oca s for a m mais felizes : n ã o n os ilu d a m os !
Mas
n osso in s tin to d e con h ecim en to é m u it o d es en volvid o p a r a qu e p os s a m os a in d a a p r ecia r a felicid a d e s em con h ecim en to ou a felicid a d e d e u m a ilu s ã o s ólid a e vigor os a ; s ó s ofr em os com a s im p les id éia d e s em elh a n t e es ta d o d e cois a s ! A in qu iet a çã o d a d es cob er ta e d a s olu çã o en con tr a d a tor n ou -s e p a r a n ós t ã o s ed u tor a e tã o in d is p en s á vel com o, p a r a o a m a n t e, s eu a m or in feliz: p or n en h u m p r eço gos ta r ia d e tr ocá -lo p or u m es ta d o d e indiferença;
s im , ta lvez ta m b ém n os s eja m os a m a n tes in felizes !
O con h ecim en to s e tr a n s for m ou em n ós em p a ixã o qu e n ã o tem e nenhum sacrifício e não tem no fundo senão um único receio, o de s e extin gu ir a s i p r óp r ia ; a cr ed ita m os s in cer a m en te qu e tod a a h u m a n id a d e, a ca b r u n h a d a s ob o p es o dessa p a ixã o, d eve s en tir s e m a is n ob r e e m a is con fia n te d o qu e a n t es , qu a n d o n ã o tin h a a in d a u lt r a p a s s a d o a s a tis fa çã o m a is gr os s eir a qu e a com p a n h a a b a r b á r ie.
A p a ixã o
do
h u m a n id a d e a p er ecer !
con h ecim en to
ta lvez
leve
m es m o
a
es te p en s a m en t o t a m b ém é d es p r ovid o
d e qu a lqu er p od er s ob r e n ós ! O cr is tia n is m o s e a s s u s tou a lgu m a vez com id éia s s em elh a n tes ? A p a ixã o e a m or te n ã o s ã o ir m ã s ? S im , od ia m os a b a r b á r ie
tod os p r efer im os ver a d es t r u içã o d e
tod a a h u m a n id a d e a n tes qu e ver o con h ecim en to r egr ed ir s ob r e s eu s p a s s os ! E , a fin a l d e con ta s : s e a paixão n ã o leva a h u m a n id a d e
a
p r efer im os ?
E s ta
p er ecer , é
a
ela
va i
p er ecer
qu es tã o es s en cia l.
de
fraqueza:
Des eja m os
que
qu e
a
humanidade acabe no fogo e na luz ou na areia?
430. ISSO TAMBÉM É HERÓICO Fa zer a s cois a s m a is m a lch eir os a s d e qu e n em s equ er s e ou s a fa la r , m a s qu e s ã o ú t eis e n eces s á r ia s
is s o ta m b ém é
h er óico. Os gr egos n ã o tiver a m ver gon h a d e in clu ir n os gr a n d es trabalhos de Hércules a limpeza de uma estrebaria.
431. AS OPINIÕES DOS ADVERSÁRIOS Para avaliar como se mostram naturalmente sutis e fracos os cér eb r os , m es m o os m a is in teligen tes , é p r ecis o ob s er va r a m a n eir a p ela qu a l con ceb em e r ep r od u zem a s op in iões d e s eu s a d ver s á r ios : n is s o s e r evela a m ed id a n a tu r a l d e tod o in telecto. O s á b io p er feito eleva , s em qu er er , s eu a d ver s á r io a u m a a ltu r a idea l on d e d es em b a r a ça s u a s ob jeções d e tod os os d efeitos e d e todas as contingências: só quando o adversário se tornou um deus de armas brilhantes inicia o combate com ele.
432. P ESQUISADOR E EXPERIMENTADOR Nen h u m m ét od o cien tifico é o ú n ico a p od er d a r a ces s o a o con h ecim en to! Devem os p r oced er com a s cois a s p or ten ta tiva s , s eja m os or a b on s or a m a u s em r ela çã o a ela s , a gin d o ca d a u m a p or s u a vez com ju s tiça , p a ixã o e fr ieza . Um s e en volve com a s cois a s com o p olicia l, ou t r o com o con fes s or , u m ter ceir o com o viaja n t e e com o cu r ios o. Pod er -se-á ch ega r a a r r a n ca r u m a p a r cela d ela s , s eja p ela s im p a tia , s eja p ela violên cia ; u m é
im p elid o p a r a fr en te, im p elid o a ver cla r o p ela ven er a çã o qu e lh e in s p ir a m s eu s s egr ed os , ou tr o, p elo con t r á r io, p ela in d is cr içã o e p ela m a lícia n a in ter p r eta çã o d os m is t ér ios . Nós , p es qu is a d or es , com o tod os os con qu is ta d or es , tod os os n a vega d or es , tod os os a ven tu r eir os , s om os d e u m a m or a lid a d e a u d a cios a e d evem os estar preparados para passar, no fim de tudo, por maus.
433. VER COM OLHOS NOVOS Ad m it in d o qu e p or b eleza n a a r te s e en ten d e s em p r e a configuração do homem feliz
e eu acho que é verdade
segundo
a id éia qu e u m a ép oca , u m p ovo, u m gr a n d e in d ivíd u o qu e fixa s u a s leis p or s i m es m o, têm d e u m h om em feliz: qu e in d ica ções a a r te d os a r tis t a s a tu a is , ch a m a d a realismo, va i d a r s ob r e a felicid a d e d o n os s o tem p o? É cer to qu e esse é o gên er o d e b eleza qu e ca p ta m os a gor a m a is fa cilm en te e qu e m a is a p r ecia m os . Por con s egu in t e, é p r ecis o a d m it ir qu e a
felicid a d e a tu a l, es s a
felicid a d e qu e nos é p r óp r ia , en con tr a s u a r ea liza çã o n o r ea lis m o, com s en tid os tã o p en etr a n tes qu a n to p os s ível e u m a con cep çã o tã o fiel qu a n to p os s ível d o qu e é r ea l, p or t a n t o, d e m od o a lgu m na r ea lid a d e, m a s n o s ab er d a re alid a d e. Os r es u lt a d os d a ciên cia já a tin gir a m t a l p r ofu n d id a d e e ta l a m p lit u d e qu e os a r tis ta s d es te s écu lo s e tor n a r a m , s em qu er er , os glor ifica d or es d a
suprema
felicidade científica!
434. INTERCEDER As
r egiões
s em
p r eten s ões
es tã o lá
para
os
gr a n d es
p a is a gis ta s , a s r egiões s in gu la r es e r a r a s p a r a os p equenos p in tor es . Is s o s ign ifica qu e a s gr a n d es cois a s d a n a tu r eza e d a h u m a n id a d e d evem in ter ced er em fa vor d a qu eles qu e, en tr e s eu s a d m ir a d or es , s ã o p equ en os , m ed íocr es e va id os os
en qu a n to o
gran d e artis ta intercede um favor das coisas simples.
435. NÃO PERECER IMPERCEPTIVELMENTE Nã o é
numa
ú n ica
vez, m a s
s em
ces s a r
qu e
n os s a
ca p a cid a d e e n os s a gr a n d eza s e es gota m ; a veget a çã o m in ú s cu la qu e cr es ce em tod a p a r te, qu e s e in tr od u z en tr e a s cois a s e ch ega a espalhar-se arruína o qu e h á d e gr a n d e em n ós
a mesquinhez
de nosso círculo de convivência, o que temos sob os olhos todos os d ia s e a tod a h or a , a s m il r a ízes m in ú s cu la s d e t a l s en tim en to m es qu in h o qu e cr es cem em t or n o d e n ós em n os s a s fu n ções , em n os s a s r ela ções , em n os s o em p r ego d o tem p o. S e n ã o p r es tarmos a ten çã o a es s a p equ en a er va d a n in h a , ela n os leva r á a p er ecer imperceptivelmente!
E s e qu is er em a b s olu ta m en te p er ecer ,
en tã o qu e s eja d e u m s ó golpe e s u b ita m en te: ta lvez s u b s is ta m d o qu e vocês for a m , ru ín as alta n e ira s ! E n ã o, com o s e r eceia h oje, m on t es d e d etr itos ! Com r elva e er va s d a n in h a s cr es cen d o s ob r e eles , ven ced or es m in ú s cu los , tã o h u m ild es com o a qu eles r ecen tes e mesmo demasiado mesquinhos para triunfar.
436. CASUÍSTICA Há u m a a lter n a tiva a m a r ga qu e a b r a vu r a e o ca r á t er n ã o p er m item a tod o o h om em en fr en ta r : d es cob r ir , com o p a s s a geir o d e u m n a vio, qu e o ca p it ã o e o p iloto com etem er r os p er igos os e qu e s om os s u p er ior es a eles em con h ecim en tos n á u ticos
e
perguntar-n os en tã o: Com os d ia b os ! S e lid er a s s es u m m ot im con tr a eles e os fizes s es p r is ion eir os ? Tu a s u p er ior id a d e n ã o fa z d is s o u m d ever ? E d o la d o d eles , n ã o ter ã o o d ir eito d e te p r en d er p or qu a n to m in a s a ob ed iên cia ?
E s te é u m s ím b olo para
s itu a ções m a is im p or ta n tes e m a is d ifíceis : e, a fin a l d e con ta s , uma pergunta permanece sempre aberta, isto é, quem garante, em
s em elh a n tes ca s os , n os s a s u p er ior id a d e, n os s a a u tocon fia n ça ? O sucesso? Mas então é preciso justamente realizar imediatamente a a çã o qu e en cer r a tod os os p er igos
e n ã o s om en te p er igos p a r a
nós, mas também para o navio.
437. P RIVILÉGIOS Aqu ele qu e s e p os s u i ver d a d eir a m en te, is to é, a qu ele qu e s e conquistou d efin itiva m en te, p a s s a a con s id er a r com o p r ivilégio s eu punir-s e, p er d oa r -s e, a p ied a r -s e d e s i m es m o: ele n ã o tem n eces s id a d e d e tr a n s fer ir is s o a n in gu ém , m a s p od e também livr em en te r ecor r er a ou tr o, p or exem p lo, a u m a m igo
ele s a b e,
con tu d o, qu e es t á a s s im ou tor ga n d o u m direito e qu e s ó a p os s e do poder permite outorgar direitos.
438. O HOMEM E AS COISAS Por que o homem não vê as coisas? E que ele próprio impede o caminho: ele esconde as coisas.
439. S INAIS DISTINTIVOS DA FELICIDADE Tod a s a s s en s a ções d e felicid a d e têm d u a s cois a s em com u m , a plenitude d o s en tim en to e a pe tu lâ n cia qu e d ele r es u lta ; d e m od o qu e n os s en tim os em n os s o elem en to com o u m p eixe n a água e qu e n ele n os a git a m os . Bon s cr is tã os com p r een d er ã o o qu e é a exuberância cristã.
440. NÃO ABDICAR! Ren u n cia r a o m u n d o s em con h ecê-lo, com o u m a freira
é
ter m in a r n u m a s olid ã o es tér il, ta lvez m ela n cólica . Is s o n a d a tem em com u m com a s olid ã o d a vid a con tem p la tiva d o p en s a d or : qu a n d o ele es colh e es s a s olid ã o n ã o qu er d e m od o n en h u m
r en u n cia r ; s er ia p a r a ele, p elo con tr á r io, a b a n d on o, m ela n colia , d es tr u içã o d e s i p r óp r io d ever p er s is tir n a v id a p rá tica
ele
r en u n cia a es ta , p or qu e a con h ece, p or qu e s e con h ece. É a s s im qu e d á u m m er gu lh o em sua á gu a , é a s s im qu e con qu is ta sua serenidade.
441. P OR QUE O PRÓXIMO S E TORNA PARA NÓS CADA VEZ MAIS DISTANTE
Qu a n to m a is p en s a m os s ob r e tu d o o qu e foi e t u d o o qu e s er á , m a is n os p a r ece a t en u a d o o qu e for tu ita m en te s e encontra n o p r es en te. S e vivem os com m or tos e m or r er m os d a m or te d eles , o qu e s ã o en tã o p a r a n ós os próximos ? Nós n os t or n a m os m a is solitários
e is s o porque a on d a in teir a d a h u m a n id a d e r es s oa
em tor n o d e n ós . O a r d or qu e qu eim a em n ós p or t u d o o qu e é humano aumenta sem cessar
é por isso que olhamos tudo o que
n os cer ca com o s e s e tives s e tor n a d o m a is in d ifer en t e, m a is semelhante a um fantasma.
Mas a frieza de nosso olhar ofende!
442. A REGRA Pa r a m im , a r egr a é s em p r e m a is in t er es s a n te qu e a exceção
a qu ele qu e p en s a a s s im es tá m a is a va n ça d o n o
conhecimento e faz parte dos iniciados.
443. P ARA A EDUCAÇÃO Pou co a p ou co fu i ven d o m a is cla r a m en te o d efeit o m a is d ifu n d id o d e n os s a m a n eir a d e en s in a r e d e ed u ca r . Nin gu ém aprende, ninguém aspira, ninguém ensina
a suportar a solidão.
444. A SURPRESAM QUE A RESISTÊNCIA CAUSA Por qu e u m a cois a a ca b ou p or n os p a r ecer t r a n s p a r en te, im a gin a m os qu e d a í em d ia n te ela n ã o p od er á n os ofer ecer
resistência
e fica m os s u r p r es os en tã o p or qu e p od em os ver
através dela, mas não podemos atravessá-la! É a mesma loucura e a m es m a s u r p r es a qu e s e a p od er a d e u m a m os ca d ia n te d e u m a vidraça.
445. E M QUE OS MAIS NOBRES SE ENGANAM Aca b a m os p or d a r a a lgu ém o qu e tem os d e m elh or , n os s o tesouro
e a gor a o a m or n ã o tem m a is n a d a p a r a d a r : m a s
a qu ele qu e a ceita is s o n ã o en con tr a a li o qu e ele tem , ele próprio, d e m elh or e, p or con s egu in te, fa lt a -lh e es s e p len o e d er r a d eir o reconhecimento, sobre o qual conta aquele que dá.
446. CLASSIFICAÇÃO Há , em p r im eir o lu ga r , p en s a d or es s u p er ficia is ; em s egu n d o lu ga r ,
p en s a d or es
p r ofu n d os
p r ofu n d eza s d a s cois a s ;
d a qu eles
qu e
d es cem
nas
em ter ceir o lu ga r , p en s a d or es r a d ica is
que querem descer até o último vestígio de uma coisa
o que tem
m u it o m a is va lor d o qu e s im p les m en te d es cer em s u a p r ofu n d eza ! Fin a lm en te, h á p en s a d or es qu e m er gu lh a m a ca b eça n o la m a ça l: o qu e n ã o d ever ia s er s in a l n em d e p r ofu n d id a d e n em d e p en s a m en to
p r ofu n d o! S ã o
n os s os
qu er id os
p en s a d or es
do
subsolo.
447. MESTRE E ALUNO Um m es tr e d eve coloca r s eu s d is cíp u los em a ler ta con tr a ele próprio; isso faz parte de sua humanidade.
448. H ONRAR A REALIDADE Com o p od em os con tem p la r es s a m u ltid ã o d e p ovo em jú b ilo s em lá gr im a s e s em a p la u s os ! Ou tr or a p en s á va m os com d es p r ezo
n o ob jeto d e s u a a legr ia e s er ia a in d a a s s im se n ã o tivés s em os vivid o n ós m es m os es s a s a legr ia s ! A qu e os a con tecim en t os p od em , p or ta n to, n os a r r a s ta r ! A qu e op in iões n os fa zem ch ega r ! Pa r a n ã o n os p er d er m os , p a r a n ã o p er d er m os a razão, devemos fugir diante das experiências. Foi assim que Platão fugiu diante da r ea lid a d e e n ã o qu is m a is con tem p la r cois a s , a n ã o s er a s p á lid a s im a gen s id ea is ; ele er a ch eio d e s en s ib ilid a d e e s a b ia qu ã o fa cilm en te a s on d a s d a s en s ib ilid a d e r eb en ta va m em s u a r a zã o. O s á b io d ever ia , p or con s egu in te, d izer a s i m es m o: Quero h on r a r a realidade, m a s vir a n d o-lh e a s cos ta s , porque a con h eço e a t em o? d ever ia a gir com o cer ta s tr ib os a fr ica n a s d ia n t e d e s eu s ob er a n o: n ã o s e a p r oxim a n d o d ele s en ã o d e cos ta s e s a b en d o testemunhar sua veneração ao mesmo tempo que seu temor?
449. ONDE ESTÃO OS INDIGENTES DE ESPÍRITO? Ah ! Com o m e
r ep u gn a
impor a
ou t r o m eu s
p r óp r ios
p en s a m en tos ! Qu er o m e r egozija r com ca d a p en s a m en t o qu e m e vem , com ca d a r etor n o s ecr eto qu e ocor r e em m im , on d e a s id éia s d os ou tr os p a s s a m a t er va lor em d etr im en to d a s m in h a s ! Ma s , d e tem p os em tem p os , s ob r evém u m a fes ta m a ior a in d a , qu a n d o é expandir o p r óp r io b em
es p ir itu a l, s em elh a n te a o con fes s or
s en ta d o n u m ca n to, a n s ios o p or ver ch ega r a lgu ém qu e ten h a necessidade d e con s olo, qu e fa la d a m is ér ia d e s eu s p en s a m en t os, a fim de lhe encher de novo o coração e as mãos e aliviar sua alma inquieta! Não somente o confessor não quer ter glória com isso: ele gos ta r ia a t é d e s e fu r t a r a o r econ h ecim en to, p ois , é in d is cr eto e s em p u d or d ia n te d a s olid ã o e d o s ilên cio. Ma s viver s em n om e s em n om e ou exp os to a leve t r oça , m u ito ob s cu r a m en te p a r a d es p er t a r a in veja ou a in im iza d e, a r m a d o d e u m cér eb r o s em feb r e, d e u m p u n h a d o d e con h ecim en tos e d e u m a b ols a ch eio d e
exp er iên cia s , s er p a r a o es p ír it o u m a es p écie d e m éd ico d os pobres e a ju d a r u m e ou tr o qu a n d o s u a ca b eça es tá perturbada por op in iões , s em qu e p er ceb a com cer teza a qu em a ju d ou ! Nã o procurar ter razão diante dele e celebrar uma vitória, mas falar-lhe d e m a n eir a qu e, a p ós u m a p equ en a in d ica çã o im p er cep tível ou u m a ob jeçã o, ele en con tr e p or s i m es m o o qu e é ver d a d eir o e qu e s e vá or gu lh os a m en te p or ca u s a d is s o! S er com o u m a h u m ild e es ta la gem qu e n ã o r ecu s a n in gu ém qu e p r ecis e, m a s qu e d ep ois é logo es qu ecid a e r id icu la r iza d a ! Nã o ter va n ta gem em n a d a , n em m elh or a lim en ta çã o, n em a r m a is p u r o, n em es p ír ito m a is a legr e m a s s em p r e ofer ecer , r es tit u ir , com u n ica r , tor n a r -s e m a is p ob r e! S a b er s er p equ en o p a r a s er a ces s ível a m u ita gen te e n ã o h u m ilh a r n in gu ém ! Tom a r s ob r e s i m u ita s in ju s tiça s e ter r a s teja d o com o ver m es p or tod a es p écie d e er r os , p a r a p od er p en etr a r , em ca m in h os s ecr et os , em m u ita s a lm a s es con d id a s ! S em p r e n u m a m es m a es p écie d e a m or e s em p r e n u m m es m o egoís m o e n u m a m es m a a legr ia d e s i! Pos s u ir a u tor id a d e, m a s manter-s e
a o m es m o tem p o ocu lt o, r en u n cia d or ! Ma n ter -se
con s ta n t em en te es t en d id o a o s ol d a a m en id a d e e d a gr a ça , m a s saber que o acesso do sublime está ao alcance da mão!
Aí está o
que seria uma vida! Aí está uma razão para viver muito tempo!
450. A SEDUÇÃO DO CONHECIMENTO Nos es p ír itos a p a ixon a d os , u m olh a r la n ça d o p ela p or ta d a ciên cia , a ge com o a s ed u çã o d a s s ed u ções ; é d e s e p r ever qu e es s es es p ír itos s e tor n a r ã o a s s im s on h a d or es e, n o ca s o m a is fa vor á vel,
p oeta s :
ta m a n h o
é
s eu
d es ejo
da
con h ecim en to. Nã o n os t om a p or tod os os s en tid os
felicid a d e
do
es s e tom d e
d oce s ed u çã o qu e a ciên cia a s s u m e p a r a a n u n cia r s u a b oa n ova , com cem p a la vr a s e m a is m a r a vilh os a m en te com a cen tés im a
primeira: Libertem-s e d a ilu s ã o e o in feliz d e m im ! desaparecerá a o m es m o tem p o; e com o in feliz d e m im ! va i em b or a ta m b ém a dor (Marco Aurélio).
451. AQUELES QUE TÊM NECESSIDADE DE UM BOBO DA CORTE Os s er es m u ito b elos , m u ito b on s , m u ito p od er os os qu a s e n u n ca ca p ta m a ver d a d e com p leta e com u m , s eja qu a l for o assunto
p ois , em s u a p r es en ça , m en te-s e in volu n ta r ia m en te
um p ou co, p or qu e s e es t á s ob s u a im p r es s ã o e, con for m e es s a im p r es s ã o, s e a p r es en ta o qu e s e p od er ia d izer d e ver d a d e s ob for m a d e a d a p ta çã o (falsifica-s e, p or ta n to, a cor e o gr a u d os fa t os e s u p r im e-s e o qu e n ã o s e d eixa a d a p t a r ). S e p es s oa s d es s a espécie qu er em , a p es a r d e tu d o, ou vir a qu a lqu er p r eço a ver d a d e, p r ecis a m a r r a n ja r u m b obo d a corte
u m s er qu e p os s u a o
privilegio da loucura de não poder se adaptar.
452. IMPACIÊNCIA Há u m gr a u d e im p a ciên cia n os h om en s d e p en s a m en to e d e a çã o qu e, a o m en or insucesso, os faz passar em seguida ao campo con tr á r io, os im p ele a a p a ixon a r -s e e la n ça r -s e a í em n ova s empresas
a té qu e, ta m b ém a li, s eja m a p a n h a d os p or u m a
h es it a çã o d o s u ces s o: é a s s im qu e va gu eia m , a ven tu r eir os e violen t os , a tr a vés d a p r á tica d e m u itos r ein os e d e n a tu r eza s va r ia d a s e p od e ocor r er qu e fin a lm en te s e t or n em , gr a ça s a o con h ecim en to u n iver s a l d os h om en s e d a s cois a s qu e d eixa n eles a p r od igios a exp er iên cia d e s u a s a ven tu r a s e, a ten u a n d o u m p ou co s eu in s tin to
h om en s p r á ticos p od er os os . É a s s im qu e
uma fraqueza de caráter se torna uma escola de gênio.
453. INTERREGNO MORAL
Qu em s er ia ca p a z d e d es cr ever já a gor a o qu e u m d ia vai s u bs titu ir os s en tim en tos e os ju ízos m or a is ?
em b or a p os s a m os
ver
em
com
cer teza
qu e
es tes
se
b a s eia m
fu n d a m en tos
in teir a m en te d efeitu os os e qu e s eu ed ifício é ir r ep a r á vel: s eu ca r á ter im p er a tivo d im in u i for ços a m en t e d ia a p ós d ia , à m ed id a qu e o ca r á ter im p er a tivo d a r a zã o n ã o d im in u i! Recon s tr u ir a s leis d a vid a e d a a çã o
p a r a r ea liza r es s a t a r efa , n os s a s ciên cia s d a
fis iologia , d a m ed icin a , d a s ocied a d e e d a s olid ã o n ã o es t ã o a in d a m u it o s egu r a s d e s i: en tr eta n t o, é s om en te d ela s qu e p od em os tir a r a s p ed r a s fu n d a m en ta is d e u m n ovo id ea l (s e n ã o for es s e p r óp r io id ea l). Vivem os , p or t a n to, d e u m a exis tên cia preliminar ou re ta rd a tá ria , s egu n d o n os s os gos tos e n os s os t a len t os , e o qu e p od em os fa zer d e m elh or , n es s e in ter r egn o, é s er m os , t a n to qu a n to p os s ível, n os s os p r óp r ios r eis e fu n d a r m os p equ en os Es ta d os experim e n ta is . S om os exp er iên cia s : va m os s ê-lo d e b om grado.
454. INTERRUPÇÃO Um livr o com o es te n ã o é feito p a r a s er lid o a p r es s a d a m en te d e p on t a a p on t a , n em p a r a s er lid o em voz a lt a ; d eve s er a b er to m u it a s vezes , es p ecia lm en te d u r a n te u m p a s s eio ou u m a via gem ; é p r ecis o p od er m er gu lh a r n ele, d ep ois olh a r p a r a os la d os e n ã o encontrar mais nada de usual em torno de si.
455. A PRIMEIRA NATUREZA Da m a n eir a com o n os cr ia m h oje, com eça m os p or r eceb er uma s egu n d a n a tu rez a: e n ós a p os s u ím os qu a n d o o m u n d o n os d ecla r a qu e ch ega m os à m a tu r id a d e, em a n cip a d os , u t ilizá veis . S ó u m r ed u zid o n ú m er o é s u ficien tem en t e s er p en te p a r a s e d es p oja r d es s a p ele, n o m om en to em qu e, s ob es s e in vólu cr o, s u a prim e ira
natureza ch egou à m a tu r id a d e. Ma s n a m a ior ia d a s p es s oa s o germe foi sufocado.
456. UMA VIRTUDE EM DEVIR Afir m a ções e p r om es s a s com o a qu ela s d o filós ofo a n tigo sobre a harmonia entre a virtude e a beatitude ou aquelas que nos fa z o cr is tia n is m o, d izen d o: Pr ocu r em a n tes d e tu d o o r ein o d e Deu s e tod o o r es to lh es s er á d a d o em a cr és cim o 2 !
nunca
for a m for m u la d a s com u m a s in cer id a d e a b s olu ta , m a s s em p r e s em m á con s ciên cia : es s a s p r op os ições , qu e s e d es eja va ter p or ver d a d eir a s , er a m a p r es en ta d a s a u d a cios a m en te com o s e fos s em a
p r óp r ia
ver d a d e, em b or a
es tives s em
em
op os içã o com
a
a p a r ên cia , e is s o s em ter r em or s o d e con s ciên cia r eligios o ou moral
pois, in h on orem m a jorem 3 d a vir tu d e ou d e Deu s a
ver d a d e h a via s id o tr a n s gr ed id a , s em a m en or in ten çã o egoís t a ! Mu ita s p es s oa s h on es ta s a in d a s e a ga r r a m a es s e grau d e veracidade:
qu a n d o
se
sentem
d es in ter es s a d a s ,
se
ju lga m
autoriza d a s a tom a r a ver d a d e com m a is levez a. Notem os qu e, n em en tr e a s vir tu d es cr is tã s n em en tr e a s vir tu d es s ocr á tica s , a lealdade es tá p r es en te; es ta é u m a d a s vir tu d es m a is r ecen tes , a in d a p ou co m a d u r a , m u ita s vezes con fu n d id a e d es con h ecid a ; a p en a s
con s cien te d e s i m es m a , ela
d es en volve,
qu e
p od em os
a celer a r
ou
é uma r efr ea r ,
cois a
qu e s e
s egu n d o
as
tendências de nosso espírito.
457. ÚLTIMA DISCRIÇÃO Há h om en s a qu em ocor r e a a ven tu r a d os ca ça d or es d e tes ou r os : d es cob r em p or a ca s o n u m a a lm a es tr a n h a a s coisas guardadas em segredo e delas extraem um saber que muitas vezes é d ifícil d e ca r r ega r ! E m cer ta s cir cu n s t â n cia s , p od em os con h ecer
os vivos e os m or tos , ter a r evela çã o d a a lm a d eles a p on to qu e s e tor n a p en os o exp lica r -n os d ia n te d os ou tr os : ca d a p a la vr a n os d eixa r eceos os d e s er m os in d is cr etos .
E u p od er ia im a gin a r
facilmente o historiador mais sábio tornando-se mudo de repente.
458. A SORTE GRANDE E xis te u m a cois a d e exces s iva m en te r a r o e qu e n os d eixa a r r eb a ta d os :
qu er o
a d m ir a velm en te
me
r efer ir
for m a d o qu e
ao
h om em
p os s u i ta m b ém
de
es p ír ito
o ca r á ter , a s
in clin a ções e fa z em s u a vid a a s experiên cia s p es s oa is que correspondem a isso.
459. A GENEROSIDADE DO PENSADOR Rou s s ea u e S ch op en h a u er
a m b os for a m s u ficien tem en te
or gu lh os os p a r a es colh er com o d ivis a d e s u a exis tên cia : v ita m im p en d ere vero 4 . E com o d evem t er s ofr id o a m b os em s eu or gu lh o p or n ã o ter em con s egu id o veru m im p en d ere v ita e 5 ! com o o en ten d ia ca d a u m d eles
Verum, tal
ver s u a vid a cor r er a o la d o d e
s eu con h ecim en to, com o u m a n ot a b a ixa ca p r ich os a qu e n ã o qu er s e h a r m on iza r com a m elod ia !
Ma s o con h ecim en to es ta r ia em
tr is te s itu a çã o s e n ã o fos s e ta lh a d a p a r a o p en s a d or com o s e a d a p ta a s eu cor p o! E o p en s a d or es ta r ia em tr is te s itu a çã o, s e s u a va id a d e fos s e tã o gr a n d e qu e ta l a ju s te fos s e o ú n ico qu e p u d es s e s u p or ta r ! É n is s o es p ecia lm en te qu e b r ilh a a m a is b ela vir tu d e d o gr a n d e p en s a d or : a gen er os id a d e qu e o d is p õe a oferecer-s e a s i m es m o, a ofer ecer s u a p r óp r ia vid a em s a cr ifício, qu a n d o p r ocu r a o con h ecim en t o, m u ita s vezes h u m ilh a d o, m u ita s vezes com uma suprema ironia e
460. UTILIZAR AS HORAS PERIGOSAS
sorrindo.
Ap r en d em os a con h ecer d e u m m od o tota lm en te d ifer en te u m h om em e u m a s itu a çã o qu a n d o ca d a m ovim en to p õe em p er igo, p a r a n ós e p a r a os n os s os p r óxim os , a h on r a , a vid a ou a m or te: a s s im
Tib ér io 6 , p or exem p lo, d eve ter r eflet id o m a is
p r ofu n d a m en t e e ter s a b id o m a is cois a s s ob r e a n a tu r eza ín tim a d o im p er a d or Au gu s to 7 e d e s eu gover n o d o qu e ter ia s id o p os s ível ao
m a is
s á b io
h is tor ia d or .
Or a ,
n ós
vivem os
tod os ,
comparativam en te, n u m es ta d o d e s egu r a n ça m u ito m a ior p a r a p od er m os n os tor n a r b on s con h eced or es d a a lm a h u m a n a : u m con h ece p or d ileta n tis m o, ou tr o p or a b or r ecim en to, o ter ceir o p or h á b it o, m a s ja m a is d izem :
Con h ece ou p er ece!
E n qu a n to a s
ver d a d es n ã o s e gr a va m em n os s a ca r n e a golp es d e fa ca , con s er va m os d ia n te d ela s , cer ta r es er va qu e s e a s s em elh a a o d es p r ezo: p a r ecem -n os
a in d a
m u ito s em elh a n tes
a
sonhos
emplumados , com o s e p u d és s em os a lca n çá -la s ou n ã o, a n os s o bel-prazer
com o s e p u d és s em os n os despertar dessa s ver d a d es
da mesma maneira que de um sonho!
461. HIC R HODUS, HIC SALTA8 Nos s a m ú s ica qu e p od e t om a r tod a s a s for m a s e qu e d eve s e tr a n s for m a r , p or qu e, com o o d em ôn io d o m a r , em s i n ã o tem ca r a cter ís tica p r óp r ia : es s a m ú s ica fr eqü en tou ou tr or a o es p ír ito do eru d ito cris tã o, t r a d u zin d o em h a r m on ia s o id ea l d es te: p or qu e ela n ã o p od er ia fin a lm en te en con tr a r es s a s h a r m on ia s m a is cla r a s , m a is a legr es , m a is u n iver s a is , qu e cor r es p on d em a o pen s a d or id e a l?
u m a m ú s ica qu e p od er ia fin a lm en te s e in s ta la r
fa m ilia rmente s ob a s va s ta s a b ób a d a s flu tu a n tes d e sua alma? Nossa música foi até o presente tão grande, tão boa: com ela, nada er a im p os s ível. Qu e m os tr e, p ois , qu e é p os s ível s en tir a o m es m o tempo estas três coisas: grandeza, luz profunda e quente, e alegria
d a suprema lógica.
462. CURAS LENTAS As d oen ça s cr ôn ica s d o cor p o s e for m a m , com o a qu ela s d a a lm a , m u ito r a r a m en te em con s eqü ên cia d e u m a ú n ica fa lh a gr os s eir a d a r a zã o d o cor p o e d a a lm a , m a s ger a lm en te p or ca u s a d e in u m er á veis p equ en a s n egligên cia s im p er ceptíveis.
Aquele
qu e, p or exem p lo, d ia a p ós d ia , n u m gr a u in s ign ifica n te, r es p ir a d e m od o m u ito fr a co e a s p ir a m u it o p ou co a r p a r a os p u lm ões , d e m od o qu e, em s eu con ju n t o, ele n ã o lh es exige u m es for ço s u ficien te e n ã o os exer cita b a s ta n te, a ca b a p or con tr a ir u m a p n eu m on ia cr ôn ica : n u m ca s o d es s e gên er o, a cu r a n ã o p od e s er a lca n ça d a d e ou tr o m od o qu e cor r igin d o, in s en s ivelm en te, os maus h á b itos p or h á b itos con tr á r ios e p equ en os exer cícios , es ta b elecen d o, p or exem p lo, com o r egr a a s p ir a r u m a vez a ca d a qu a r to d e h or a , for te e p r ofu n d a m en te (s e p os s ível, d eita d o d e cos ta s n o ch ã o; s er ia n eces s á r io en t ã o d is p or d e u m r elógio qu e m a r qu e os s egu n d os e qu e toqu e os qu a r tos d e h or a ). Tod a s es s a s curas são lentas e minuciosas; e aquele que quiser curar sua alma d eve, ele p r óp r io, p en s a r em m od ifica r s eu s m en or es h á b itos . Algu ém d ir ige d ez vezes p or d ia u m a p a la vr a fr ia e d es a gr a d á vel a os qu e o cer ca m e p ou co s e p r eocu p a com is s o, n ã o p en s a n d o s ob r etu d o qu e a o fin a l d e a lgu n s a n os cr iou , s em d a r -s e con ta , uma lei d o h á b ito qu e o obriga, a p a r t ir d a í, a in d is p or d ez vezes p or d ia a qu eles qu e o cer ca m . Ma s p od e ta m b ém h a b itu a r -s e a fazer o bem a eles dez vezes por dia!
463. O SÉTIMO DIA E logia m is s o com o cria çã o m in h a ? E u m e lim itei a exp u ls a r d e m im o qu e m e in com od a va ! Min h a a lm a es tá a cim a d a va id a d e
d os cr ia d or es .
E logia m is s o com o m in h a resignação? E u m e
lim it ei a exp u ls a r d e m im o qu e m e in com od a va ! Min h a a lm a es tá acima da vaidade dos resignados.
464. P UDOR DAQUELE QUE DÁ Há u m a ta l fa lt a d e gen er os id a d e n o fa to d e r ep r es en ta r incessantemente o papel daquele que dá e difunde seus benefícios, mostrando-s e em tod a p a r te! Ma s d a r e d er r a m a r b en efícios , ocu lta n d o ta n t o o n om e com o o fa vo! Ou n ã o ter n om e a lgu m , com o a n a tu r eza cega qu e n os r econ for t a a n tes d e tu d o p or qu e não encontramos mais nela, enfim!, alguém que dê e derrame seus b en efícios , a lgu ém d e r os to b en evolen te !
É ver d a d e qu e vocês
n os es t r a ga m ta m b ém es s e r econ for to p or qu e coloca r a m u m d eu s n es s a n a tu r eza
e eis qu e tu d o volta a s er s em lib er d a d e e ch eio
d e op r es s ã o! Com o? Nã o t er ja m a is o d ir eit o d e es t a r s ó con s igo m es m o? S em p r e vigia d o, ob s er va d o, tu tela d o, gr a tifica d o? S e h á s em p r e u m ou t r o em tor n o d e n ós , a m elh or cor a gem d o m u n d o e a m elh or b on d a d e s e t or n a m im p os s íveis n o m u n d o. Nã o s er íamos ten ta d os a ir p a r a os d ia b os d ia n t e d es s a in d is cr içã o d o céu , diante desse inevitável vizinho sobrenatural?
Mas é inútil, foi só
um sonho! Despertemos, portanto!
465. E NCONTRO A B
Para onde olhas? Há já muito tempo que te vejo imóvel. É s em p r e a m es m a cois a , s em p r e n ova p a r a m im ! O
in ter es s e qu e u m a cois a s u s cit a m e leva a p er s egu i-la t ã o lon ge qu e a ca b o p or ch ega r a o fu n d o e p er ceb er qu e ela n ã o va lia t od o o tr a b a lh o qu e m e d ou . No fim d e tod a s es s a s exp er iên cia s , r es ta u m a es p écie d e tr is teza e d e es tu p or . Is to m e a con tece tr ês vezes por dia com relação à menor das coisas.
466. P ERDA NA CELEBRIDADE Qu a l
a
va n ta gem
de
p od er
fa la r
a os
h om en s
com o
d es con h ecid o! Os d eu s es n os tir a m a m eta d e d e n os s a s vir tu d es quando nos tiram do incógnito e nos tornam célebres.
467. D UPLA PACIÊNCIA! Tu ca u s a s a s s im s ofr im en to a m u ita gen te.
E u s ei e s ei
ta m b ém qu e d evo s ofr er d u p la m en t e, p r im eir o p or ca u s a d a com p a ixã o qu e s eu s ofr im en to m e in s p ir a e d ep ois p or ca u s a d e s u a vin ga n ça con tr a m im . Ma s , a p es a r d is s o, é n eces s á r io a gir assim.
468. O IMPÉRIO DA BELEZA É MAIOR Do m es m o m od o qu e p a s s ea m os n a n a tu r eza , s u tis e con ten tes , p a r a d es cob r ir em tod a s a s cois a s s u a b eleza p r óp r ia , com o em fla gr a n te d elito, d o m es m o m od o qu e, or a a o s ol, or a s ob u m céu tem p es tu os o, fa zem os u m es for ço p a r a ver ta l es p a ço d a cos ta com s eu s r och ed os , com s u a s cer ca s , s u a s oliveir a s e s eu s p in h eir os , s ob u m a s p ecto d e p er feiçã o e d e d om ín io: a s s im ta m b ém d ever ía m os p a s s ea r en tr e os h om en s , com o exp lor a d or es e p es qu is a d or es , t r a tando-os b em e m a l p a r a qu e s e m a n ifes te a b eleza qu e lh es é p r óp r ia , en s ola r a d a n es te, tem p es tu os a n a qu ele, sem desabrochar num terceiro a não ser ao meio-dia e sob um céu ch u vos o. É , p or ta n to, p r oib id o usufruir d o h om em mau com o d e u m a p a is a gem s elva gem com s u a s lin h a s a u d a cios a s e s eu s efeitos d e lu z, en qu a n to es s e m es m o h om em , qu a n d o fin ge s er b om e ob s er va n t e d a lei, p a r ece a n os s o olh a r com o u m er r o d e d es en h o e u m a ca r ica tu r a qu e n os a flige com o u m a m a n ch a n a natureza?
Certamente, isso é proibido: até hoje só era permitido
p r ocu r a r a b eleza n a qu ilo qu e é m oralm en te bom
razão
s u ficien te p a r a qu e s e ten h a en con t r a d o tã o p ou ca b eleza e qu e s e ten h a
s id o
a té
a gor a
im a gin á r ia s , s em
con s t r a n gid o
ca r n e n em
os s o!
a
r ecor r er As s im
a
b eleza s
com o exis tem
s egu r a m en te cem es p écies d e felicid a d e en tr e os m a u s , d o qu e os vir tu os os n ã o d u vid a m , a s s im ta m b ém exis tem en tr e eles cem espécies de beleza: e muitas delas ainda não foram descobertas.
469. A DESUMANIDADE DO SÁBIO Ao la d o d o p es a d o a n d a r d o s á b io qu e qu eb r a t u d o e qu e, com o d iz o h in o b u d is ta , ca m in h a s olitá r io com o o r in ocer on te é n eces s á r ia , d e tem p os em tem p os , a m a r ca d e u m a h u m a n id a d e con cilia d or a
e a d ocica d a ; e n ã o a p en a s
com
es s es
p a s s os
a celer a d os , com es s es jeitos d e es p ír ito fa m ilia r es , n ã o s omente com es s a s s a íd a s e com cer ta ir on ia d e s i p r óp r io, m a s ta m b ém d e cer ta
con t r a d içã o,
de
um
r etor n o
oca s ion a l
a os
a b s u r d os
d om in a n tes . Pa r a n ã o s e a s s em elh a r a o r olo com p r es s or qu e a va n ça com o o d es t in o, é n eces s á r io qu e o s á b io qu e qu er en s in a r utilize s eu s d efeitos p a r a s e em b eleza r a s i m es m o e, a o d izer desprezem-me! , im p lor a o fa vor d e s er o d efen s or d e u m a verdade usurpada. Ele quer levá-los às montanhas, talvez ponha a vid a
de
vocês
em
p er igo:
é
p or
is s o
qu e
os
a u tor iza
volu n ta r ia m en te a vin ga rem-s e, a n tes ou d ep ois , d e s em elh a n te guia
a es s e p r eço s e r es er va o p r a zer d e ca m in h a r n a fr en t e d os
ou tr os , com o ch efe d a fila.
Lembram-s e d o qu e lh es veio a o
es p ír it o qu a n d o u m d ia ele os con d u zia n u m a ca ver n a es cu r a p or u m a tr ilh a es cor r ega d ia ? O cor a çã o d e vocês b a tia e s e d izia com humor: E s te gu ia p od er ia ter feito m elh or qu e r a s t eja r p or a qu i! Per ten ce a u m tip o d e p r egu iços os ch eios d e cu r ios id a d e:
não
lh e d a m os m u ita h on r a , p a r ecen d o r econ h ecer s eu va lor , p elo
simples fato de segui-lo?
4 70. NO BANQUETE DA MULTIDÃO Com o fica m os felizes qu a n d o es ta m os b em a lim en ta d os , com o os p á s s a r os p ela m ã o d e u m s ó h om em qu e lh es joga os gr ã os s em exa m in á -los d e p er t o, s em s a b er exa ta m en te s e s ã o d ign os d es s a com id a ! Viver com o u m p á s s a r o qu e vem e voa em b or a e qu e n ã o t em n om e em s eu b ico! É m in h a a legr ia s a cia r me assim no banquete da multidão.
471. OUTRO AMOR AO PRÓXIMO O a n d a r a git a d o, r u id os o, d es igu a l, n er vos o, é o op os t o d a gran d e p a ix ã o: es ta , in s t a la d a n o fu n d o d o h om em com o u m b r a s eir o s ilen cios o e s om b r io, a cu m u la n d o a í tod o o ca lor e tod a a im p etu os id a d e, p er m ite a o h om em con tem p la r o m u n d o exter ior com
fr ieza
e
in d ifer en ça
e
im p r im e
a os
t r a ços
cer ta
im p a s s ib ilid a d e. Hom en s a s s im s ã o b em ca p a zes d e m a n ifes ta r ocasionalmente a m or a o p róx im o
m a s es s e a m or é d e ou tr a
n a tu r eza qu e a qu ele d a s p es s oa s s ociá veis e d es ejos a s d e a gr a d a r : ele s e a fir m a n u m a d oce b en evolên cia , con tem p la tiva e ca lm a . E s s es h om en s olh a m d e a lgu m m od o d o a lto d e s u a t or r e, qu e é s u a for ta leza e, p or is s o m es m o, s u a p r is ã o:
com o lh es fa z b em
lançar o olhar para fora, para o que é estranho e outro!
472. NÃO SE JUSTIFICAR A B
Mas por que não te queres justificar? Pod er ia fa zê-lo n is s o e em m il ou tr a s cois a s , m a s
d es p r ezo o p r a zer qu e h á n a ju s tifica çã o: p ois tu d o is s o p ou co m e im p or ta e p r efir o t r a zer m a n ch a s em m im d o qu e p r op or cion a r a es s es m es qu in h os o p ér fid o p r a zer d e d izer :
E le d á m u ita
im p or tâ n cia a es s a s cois a s ! É is s o ju s ta m en te qu e n ã o é ver d a d e! Ta lvez fos s e n eces s á r io qu e eu d es s e m a is im p or tâ n cia a m im m es m o p a r a ter o d ever d e r etifica r a s id éia s fa ls a s qu e m e d izem respeito;
s ou d em a s ia d o in d ifer en t e e d em a s ia d o in d olen te em
r ela çã o a m im e, p or con s egu in te, t a m b ém a o qu e é p r ovoca d o p or mim.
473. ONDE SE DEVE CONSTRUIR A PRÓPRIA CASA S e te s en tes gr a n d e e fecu n d o n a s olid ã o, a s ocied a d e d os h om en s t e d im in u ir á e te tor n a r á es tér il: e in ver s a m en te. Um a p od er os a d oçu r a com o a qu ela d e u m p a i:
on d e es s e s en tim en t o
se apoderar de ti, é lá que deverás edificar tua morada
quer seja
no tumulto ou no silêncio. Ub i p a ter s u m , ib i p a tria 9 .
474. OS ÚNICOS CAMINHOS A d ia lética é o ú n ico ca m in h o p a r a ch ega r a s er d ivin o, p a r a ch ega r a t r á s d o véu d a s a p a r ên cia s
é o qu e Pla tã o p r eten d ia
com ta n t a s olen id a d e e p a ixã o com o S ch op en h a u er o p r eten d ia , a o con t r á r io, d a d ia lética
e a m b os es ta va m er r a d os . De fa t o,
a qu ilo cu jo ca m in h o qu er em in d ica r n ã o exis te d e for m a a lgu m a . E tod a s a s gr a n d es p a ixões d a h u m a n id a d e n ã o for a m a té h oje, com o es ta , p a ixões p or u m n a d a ? E tod a s a s s u a s s olen id a d es solenidades por um nada?
475. T ORNAR-SE PESADO Vocês n ã o o con h ecem : ele p od e ca r r ega r m u itos p es os com ele, ele os leva tod os , con tu d o, p a r a a s a ltu r a s . E vocês ju lga m , com s eu s p equ en os vôos , qu e ele qu er fica r em b a ixo p orqu e carrega esses pesos com ele.
476. A FESTA DA COLHEITA DO ESPÍRITO Is s o a u m en t a e s e a cu m u la d ia a p ós d ia , exp er iên cia s , a con t ecim en tos p r ovoca m
da
vid a ,
es s a s r eflexões
r eflexões
s ob r e
eles ,
s on h os
qu e
u m a r iqu eza in com en s u r á vel e
exa lt a n te! O a s p ecto d es s a r iqu eza d á ver tigen s ; n ã o com p r een d o mais com o p od em s er ch a m a d os felizes os p ob r es d e es p ír ito! Ma s eu
os in vejo à s vezes , qu a n d o es tou
ca n s a d o: p ois a
administração de semelhante riqueza é uma coisa difícil e não raro s u a d ificu ld a d e es m a ga tod a es p écie d e felicid a d e. possível s e con ten ta r em
Ah ! s e fos s e
con t em p la r a p r óp r ia r iqu eza ! S e
fôssemos somente avaros do próprio conhecimento!
477. LIVRE DE CETICISMO A
Ou tr os
s a em
de u m
ceticis m o m or a l u n iver s a l
a b or r ecid os e fr a cos , r oíd os e cor r oíd os , e m es m o qu a s e d evor a d os pela metade
mas eu saio mais corajoso e mais sadio que nunca,
com in s tin tos r econ qu is ta d os . Qu a n d o a b r is a é cor ta n te, o m a r a lto, qu a n d o n ã o h á p equ en os p er igos a s ob r ep u ja r , com eço a m e s en tir à von ta d e. Nã o m e tor n ei u m ver m e, em b or a m u ita s vezes tenha tido que trabalhar e roer como um verme. B
É que deixaste de ser cético, pois, negas!
A
E com isso reaprendi a dizer sim .
478. VAMOS ADIANTE! Administrem-n o!
Deixem -n o
em
su a
s olid ã o!
Qu er em
destruí-lo com p leta m en t e? E le s e fen d eu com o u m cop o em qu e despejamos u m líqu id o m u ito qu en t e matéria tão preciosa!
479. AMOR E VERACIDADE
e er a u m cop o d e u m a
Nós n os tor n a m os , p or a m or , p er igos os cr im in os os p a r a com a ver d a d e, r ecep ta d or es e la d r ões in veter a d os qu e p r ocla m a m m a is ver d a d es d o qu e a d m item
é p or is s o qu e é n eces s á r io qu e
o p en s a d or p on h a em fu ga , d e tem p os em tem p os , a s p es s oa s qu e a m a (n ã o s ã o exa t a m en te a qu ela s qu e o a m a m ), a fim d e qu e ela s m os tr em s eu a gu ilh ã o e s u a m a ld a d e e d eixem d e seduzi-lo. É p or is s o qu e a b on d a d e d o p en s a d or ter á s u a lu a d e qu a r to cr es cen te e de quarto minguante.
480. INEVITÁVEL Qu e lh es a con teça o qu e vocês qu is er em : a qu ele qu e n ã o lh es qu er b em ver á n a qu ilo qu e lh es a con t ece u m p r etext o p a r a diminuí-los! Suportem as mais profundas reviravoltas do espírito e d o con h ecim en to e ch egu em , fin a lm en te, com o u m con va les cen te, com u m s or r is o d olor os o, à lib er d a d e e à lu z s ilen cios a : s em p r e
a lgu ém
para
d izer :
E s te
tom a
su a
d oen ça
haverá com o
a r gu m en to, s u a im p ot ên cia com o p r ova d a im p ot ên cia d e tod os ; é b a s ta n te va id os o p a r a ca ir d oen te, a fim d e s en tir a p r oem in ên cia d a qu ele qu e s ofr e.
E , s u p on d o qu e a lgu ém r om p a s eu s la ços ,
ferindo-s e gr a vem en t e, ou tr o fa r á a lu s ã o a is s o p or gr a cejo e d ir á . Qu ã o gr a n d e é s u a im p er ícia ; is s o va i a con t ecer s em p r e com u m h om em a cos tu m a d o a s eu s la ços e b a s ta n te lou co p a r a r om p êlos!
481. D OIS ALEMÃES Se compararmos Kant e Schopenhauer, com Platão, Spinoza, Pa s ca l, Rou s s ea u , Goet h e n o qu e d iz r es p eito à a lm a e n ã o a o es p ír it o,
os
d ois
p r im eir os
p en s a d or es
es tã o
em
p os içã o
d es va n ta jos a : s u a s id éia s n ã o r ep r es en ta m a h is t ór ia a p a ixon a n te d e u m a a lm a , n ã o h á a í r om a n ce, cr is es , ca tá s tr ofes e h or a s d e
a n gú s tia , s eu p en s a m en to n ã o é a o m es m o t em p o a b iogr a fia in volu n tá r ia d e u m a a lm a , m a s n o ca s o d e Ka n t, a d e u m cérebro, n o ca s o d e Sch op en h a u er , a d es cr içã o e o r eflexo d e u m caráter ( d o im u tá vel! ) e a a legr ia ob tid a n o p r óp r io espelho , is t o é, n u m in telecto excep cion a l. Ka n t s e a p r es en ta , qu a n d o tr a n s p a r ece em s u a s id éia s , cor a jos o e h on r a d o n o m elh or s en tid o d o ter m o, m a s in s ign ifica n te: fa lt a -lhe en ver ga d u r a e for ça : ele n ã o viveu a s s im e sua maneira de trabalhar lhe tira o tempo de viver seja o que for p en s o
evid en tem en te
não
n os
gr os s eir os
acontecimentos
exter ior es , m a s n os d es tin os e s ob r es s a lt os a qu e es t á s u b m etid a a vid a m a is s olitá r ia e m a is s ilen cios a , s e tem tem p o e s e s e con s om e n a p a ixã o d e p en s a r . S ch op en h a u er tem u m a va n t a gem sobre ele: possui, pelo menos, certa feiúra violenta da natureza, no ód io, n os d es ejos , n a va id a d e, n a d es con fia n ça , tem d is p os ições u m p ou co m a is fer ozes e, d e s u a p a r te, tin h a o t em p o e a in clin a çã o p a r a es s a fer ocid a d e. Ma s fa lt a va -lh e a
evolução ,
p r ecis a m en te com o ela fa zia fa lta a s eu h or izon te in t electu a l; ele não tinha história .
482. E SCOLHER A CONVIVÊNCIA S er á exigir d em a is qu er er con viver com h om en s qu e s e tor n a r a m d oces , s a b or os os e n u tr itivos com o ca s ta n h a s qu e for a m colocadas no forno a tempo e retiradas do fogo no momento exato? Qu em es p er a p ou co d a vid a e p r efer e r eceb ê-la d e p r es en te qu e merecê-la , com o s e os p á s s a r os e a s a b elh a s a tives s e tr a zid o a ele? Qu em é s u ficien tem en te or gu lh os o p a r a n u n ca s e s en tir r ecom p en s a d o? E m u ito s ér io em s u a p a ixã o d o con h ecim en to e d a r etid ã o p a r a ter a in d a tem p o e d is p os içã o p a r a a glór ia ? Hom en s com o es s es , n ós os ch a m a m os filós ofos : m a s encontrarão sempre para eles um nome mais modesto.
eles
483. E STAR FARTO DO HOMEM A
Pr ocu r a o con h ecim en to! S im ! Ma s s em p r e com o
h om em ! O qu ê? S er s em p r e es p ect a d or d a m es m a com éd ia , r ep r es en ta r s em p r e u m p a p el n a m es m a com éd ia ? Nã o p od er con tem p la r ja m a is a s cois a s com ou tr os olh os s en ã o es tes ? E qu a n tos in u m er á veis s er es d eve h a ver , cu jos ór gã os s ã o m a is p r óp r ios p a r a o con h ecim en to! O qu e a h u m a n id a d e ter á ch ega d o a con h ecer n o fim d e tod o o s eu con h ecim en to?
s eu s ór gã os ! E
is s o s ign ifica t a lvez: im p os s ib ilid a d e d e con h ecim en to! Mis ér ia e desgosto! B
É s vítim a d e u m a ta qu e m a lign o
é a raz ã o qu e te
a t a ca ! Ma s a m a n h ã r ecu p er a r á s p len a m en te teu con h ecim en to e, p or is s o m es m o, p len a m en te ta m b ém a d es r a zã o, qu er o d izer , a a legria que te causa tudo o que é humano. Vamos para o mar!
484. NOSSO CAMINHO Qu a n d o d a m os o p a s s o d ecis ivo e n os com p r om etem os n o ca m in h o qu e é
n os s o ca m in h o , en t ã o u m s egr ed o s e r evela
r ep en tin a m en te a n ós : t od os a qu eles qu e er a m n os s os a m igos e familiares
tod os s e h a via m a té en tã o a r r oga d o s uperioridade
s ob r e n ós e d e r ep en te s e s en tem ofen d id os . Os m elh or es d en tr e eles s ã o in d u lgen tes e es p er a m p a cien t em en te qu e r een con tr em os o
ca m in h o cer to
qu e eles con h ecem tã o b em ! Os ou tr os
zom b a m e fin gem a cr ed ita r n u m a ces s o d e lou cu r a p a s s a geir a ou d en u n cia m a m a r ga m en te u m s ed u tor . Os p ior es n s d ecla r a m es s en cia lm en te lou cos e p r ocu r a m in cr im in a r os m otivos d e n os s a con d u ta ; o p ior d e tod os vê em n ós s eu p ior in im igo, qu e u m a longa dependência alimentou a vingança
e ele tem medo de nós.
Qu e fa zer en tã o? Is s o: in a u gu r a r n os s o r ein o a s s egu r a n d o d e
a n tem ã o p or u m a n o a n is t ia p len a a n os s os a m igos p or tod a espécie de pecados.
485. P ERSPECTIVAS DISTANTES A
Mas por que essa solidão?
B
Nã o es t ou za n ga d o com n in gu ém . Qu a n d o es tou s ó, n o
en ta n to, p a rece-m e qu e vejo m eu s a m igos s ob u m a lu z m a is fa vor á vel d o qu e qu a n d o es tou com eles ; e qu a n d o gos ta va m a is d a m ú s ica , qu a n d o a com p r een d ia m a is exa t a m en t e, eu vivia lon ge
d ela .
Pa r ece
qu e
ten h o
n eces s id a d e
de
p er s p ectiva s
distantes para ter boa opinião das coisas.
486. OURO E FOME Aqu i e a colá en con tr a -s e u m h om em qu e tr a n s for m a em ou r o tu d o o qu e t oca . Um b elo d ia a ca b a r á p or d es cob r ir qu e es s e jogo o fa r á m or r er d e fom e. Tu d o o qu e o cer ca é b r ilh a n te, m a gn ífico, id ea l e in a ces s ível, e a gor a a s p ir a a en con tr a r cois a s qu e lh e s er ia tota lm en te im p os s ível tr a n s for m a r em ou r o aspira a ela s ! Com o u m fa m in t o a s p ir a p or a lim en to!
e com o Que
poderá apanhar?
487. VERGONHA Aí es tá u m b elo cor cel qu e b a te com os ca s cos e r elin ch a , es tá im p a cien te p ela cor r id a e gos t a d a qu ele qu e h a b it u a lm en t e o monta cansado.
m a s , ó ver gon h a ! o ca va leir o n ã o ch ega a m on ta r , es tá Ta l é a ver gon h a d o p en s a d or , ca n s a d o d ia n te d e s u a
própria filosofia.
488. CONTRA A PRODIGALIDADE NO AMOR Nã o cor a m os qu a n d o n os s u r p r een d em os em fr a gr a n te d elito
d e a ver s ã o violen ta ? Ma s d ever ía m os cor a r igu a lm en te d e n os s a s s im p a tia s violen ta s , p or ca u s a d a in ju s tiça qu e ela s en cer r a m . Ma is a in d a : h á p es s oa s cu jo cor a çã o s e fech a e qu e s e s en tem com o op r im id a s qu a n d o a lgu ém n ã o lh e d em on s tr a s u a simpatia senão retirando u m a p a r te d ela a os ou tr os . Qu a n d o d es cob r em pelo tom de voz que é a eles que se escolhe, que se prefere, ah! não s ou r econ h ecid o p or es s e tip o d e es colh a , p er ceb o qu e r eceb o com fr ieza a qu ele qu e m e qu er d is t in gu ir a s s im : ele n ã o d eve gos ta r d e m im à cu s ta d os ou tr os ! E m u it a s vezes ten h o o cor a çã o tr a n s b or d a n t e e m otivos d e exu b er â n cia
a qu em p os s u i is s o
n ã o s e d eve ofer ecer o qu e os ou tr os têm n eces s id a d e, cr u elm en te necessidade!
489. AMIGOS NA DESGRAÇA Às vezes n os a con tece ob s er va r qu e u m d e n os s os a m igos es tá m a is liga d o com ou tr o d o qu e con os co, qu e s u a d elica d eza s e a tor m en ta p or es s a es colh a e qu e s eu egoís m o n ã o es tá à a lt u r a d es s a d ecis ã o: en tã o é p r ecis o fa cilita r -lh e a s ep a r a çã o e ofendê-lo por s e afa s ta r d e n ós .
Isso é igu a lm en te n eces s á r io qu a n d o
p a s s a m os a u m a m a n eir a d e p en s a r qu e lh e s er ia fu n es ta : n os s a a feiçã o p or ele d eve n os im p elir , p or u m a in ju s tiça d e qu e n os r es p on s a b iliza m os ,
a
d a r -lh e
b oa
con s ciên cia
para
r om p er
conosco.
490. AS PEQUENAS VERDADES Vocês con h ecem tu d o is s o, m a s n u n ca o viver a m a ceit o s eu tes tem u n h o. E s s a s
p equ en a s ver d a d es !
lh es p equ en a s p or qu e n ã o a s p a ga r a m com s eu s a n gu e!
não
parecemMas
s er ia m , p ois , gr a n d es p elo m ot ivo d e ter em s id o p a ga s p or alto p r eço? E o s a n gu e é s em p r e a lto p r eço!
Ach a m ?... Com o vocês
são avaros de seu sangue!
491. P OR CAUSA DISSO TAMBÉM, SOLIDÃO! A
Queres então voltar para teu deserto?
B
Nã o s ou á gil, t en h o d e m e es p er a r a m im m es m o
fica
ca d a vez m a is ta r d e a té qu e a á gu a d o p oço d e m eu eu s u b a a té a lu z e, m u ita s vezes , ten h o qu e p a s s a r fom e p or m a is tem p o qu e m in h a p a ciên cia s u p or ta . E p or is s o qu e vou p a r a a s olid ã o p a r a n ã o b eb er d a s cis ter n a s qu e es tã o d is p os ta s p a r a tod os . No m eio d a m u ltid ã o vivo com o a m u ltid ã o e n ã o p en s o com o p enso; d ep ois d e cer to tem p o, ten h o s em p r e a im p r es s ã o d e qu e qu er em me exilar de mim mesmo e roubar-me a alma
passo a me tornar
m a u p a r a tod os e a tem er a tod os . Ten h o en tã o n eces s id a d e d o deserto para voltar a ser bom.
492. S OB OS VENTOS DO SUL A a
Não m e en ten d o m a is ! Ain d a on tem , eu s en tia em m im
t em p es t a d e,
a lgu m a
cois a
de
qu en te
e
de
en s ola r a d o,
extr em a m en te cla r o. E h oje tu d o é tr a n qü ilo, va s t o, m ela n cólico e s om b r io, com o a la gu n a d e Ven eza :
n ã o qu er o n a d a e n ã o s olto
u m s u s p ir o d e a livio e, con tu d o, es tou s ecr eta m en te in d ign a d o com es s e n ã o qu er er n a d a :
a s s im a s on d a s vã o e vêm a qu i e
acolá no lago de minha melancolia. B
Des cr eves com is s o u m a leve d oen ça a gr a d á vel. O
próximo vento do nordeste vai te livrar dela! A
Por que, pois?
493. S OBRE SUA PRÓPRIA ÁRVORE A
Nen h u m a id éia d e u m p en s a d or m e d á ta n to p r a zer
com o a s m in h a s : é ver d a d e qu e is s o n ã o p r ova n a d a em s eu fa vor ,
mas
s er ia
lou cu r a
d e m in h a
p a r te qu er er d es ca r ta r fr u tos
s a b or os os p a r a m im , s ob o p r etexto d e qu e eles p or a ca s o em minha árvore! B
E outrora cometi essa loucura.
Pa r a ou tr os , é o con tr á r io qu e a con tece: e is s o n ã o
p r ova n a d a qu a n t o a o va lor d e s u a s id éia s n em es p ecia lm en te contra seu valor.
494. ÚLTIMO ARGUMENTO DO CORAJOSO Nes s es a r b u s tos h á s er p en tes . m eio d es s es a r b u s tos e m a t á -las. delas e não elas as tuas!
Bom , vou p en etr a r n o Ma s ta lvez s eja s t u vítim a
Que importância tenho eu!
495. NOSSOS MESTRES Du r a n te n os s a ju ven tu d e, es colh em os n os s os m es tr es e n os s os
gu ia s
no
p r es en te
e
n os
m eios
qu e
p or
a ca s o
freqüentamos: temos a irrefletida convicção de que o presente deve p os s u ir os m es tr es qu e p od em n os s er vir m a is qu e qu a lqu er ou t r o e qu e p r ecis a m os en con tr á -los s em p r ocu r a r m u ito. Ma is ta r d e p a ga r em os ca r o es s a in fa n tilid a d e: terem os qu e exp iar os mestres em n ós m es m os . E n tã o p er cor r er em os t a lvez o m u n d o in teir o, p r es en te e p a s s a d o, à p r ocu r a d e ver d a d eir os gu ia s
m a s ta lvez
s eja ta r d e d em a is . E , n o p ior d os ca s os , d es cob r im os qu e eles viveram quando éramos jovens
e que então nos enganamos.
496. O PRINCÍPIO MAU Platão10 m os tr ou d e m od o m a r a vilh os o com o o p en s a d or filos ófico, em con s id er a d o
tod a com o
s ocied a d e con s titu íd a , s er á o
p r otótip o
de
tod a
for ços a m en te
p er ver s id a d e:
p ois ,
en qu a n to cr itico d os cos tu m es , é o op os to d o h om em m or a l, e s e não ch ega a s er o legis la d or d e n ovos cos t u m es , s u a lem b r a n ça
p er m a n ece
na
m em ór ia
d os
h om en s
s ob
o d es ign a tivo d e
p r in cíp io m a u . Pod em os d ed u zir d is s o com o a cid a d e d e Aten a s , b a s ta n te lib er a l e in ova d or a , p r ocu r ou
m a n ch a r em
r ep u ta çã o d e Pla tã o: qu a l a s u r p r es a s e es te p r óp r io d izia , tin h a o
in s tin to p olítico
vid a a
qu e, com o ele
n o s a n gu e
fez tr ês
ten ta tiva s d e r efor m a n a S icília , on d e p a r ecia en tã o s e or ga n iza r ju s ta m en t e u m E s ta d o m ed iter r â n eo p a n -h elên ico? Nes s e E s ta d o, e gr a ça s a ele, Pla tã o p en s a va fa zer p a r a os gr egos o qu e fez m a is ta r d e Ma om é 11 p a r a os á r a b es : fixa r os gr a n d es e p equ en os cos tu m es e s ob r et u d o o m od o d e vid a cotid ia n o d e ca d a u m . A realização de suas idéias era possível como o foi aquela de Maomé: n ã o d em on s tr ou qu e id éia s m u ito m a is in cr íveis , com o a s d o cr is tia n is m o, er a m r ea lizá veis ? a ca s os a m a is
Algu n s a ca s os a m en os , a lgu n s
e o m u n d o ter ia a s s is t id o à p la ton iza çã o d o s u l
d a E u r op a : e, s u p on d o qu e es s e es ta d o d e cois a s d u r a s s e m a is , é p r ová vel qu e h oje ven er a r ía m os em Platão o p r in cíp io b om . Ma s faltou-lh e o s u ces s o: e foi a s s im qu e con s er vou a r ep u ta çã o d e s on h a d or e u top is ta
os ep ítetos m a is d u r os d es a p a r ecer a m com
a antiga Atenas.
497. O OLHAR PURIFICADOR S er ia n eces s á r io d e p r efer ên cia fa la r d e gênio a p r op ós it o d e h om en s com o Pla tã o, S p in oza , Goeth e 12, n os qu a is o es p ír ito parece n ã o s e liga r s en ão d e m a n e ira m u ito relaps a a o ca r á ter e a o tem p er a m en to, com o u m s er a la d o qu e s e s ep a r a fa cilm en te d eles e qu e p od e en tã o eleva r -s e m u it o a cim a d eles . Pelo con t r á r io, a qu eles qu e a s s u m ir a m com m a is in s is tên cia seu
gênio
são
p r ecis a m en te a qu eles qu e n u n ca ch ega r a m a s e a ga r r a r a s eu tem p er a m en to e p r et en d er a m lh e em p r es ta r a exp r es s ã o m a is es p ir it u a liza d a , m a is va s ta e m a is ger a l, u m a exp r es s ã o cós m ica ,
m es m o em cer ta s cir cu n s tâ n cia s (p or exem p lo, S ch op en h a u er ). E s s es gên ios n ã o p u d er a m voa r a lém d e s i m es m os , m a s ju lga r a m encontrar-s e, r een con tr a r -s e p or tod a a p a r t e p a r a on d e d ir igia m s eu vôo
es s a é s u a grandeza , s e is s o pode s er u m a gr a n d eza !
Os ou t r os , a qu em s e a tr ib u i m a is exa t a m en t e es s e n om e, p os s u em o olh a r pu ro, pu rifica n te, qu e n ã o p a r ece p r ovir d e s eu tem p er a m en to e d e s eu ca r á ter , m a s qu e, livr e d es t es e com m a is fr eqü ên cia n u m a d oce con tr a d içã o com eles , con tem p la o m u n d o com o s e fos s e u m d eu s , e u m d eu s qu e ele a m a s s e. Ta m b ém a eles es s e olh a r n ã o é d a d o d e u m a s ó vez. Há u m a p r ep a r a çã o e uma
a p r en d iza gem
na
a r te
de
ver
e
a qu ele
qu e
tem
ver d a d eir a m en te s or t e en con tr a ta m b ém a tem p o u m m es tr e d o olhar puro!
498. NÃO EXIGIR! Vocês n ã o o con h ecem ! É ver d a d e qu e ele s e s u b m ete fá cil e livr em en te a os h om en s e à s cois a s e qu e é b om p a r a a m b os tu d o o qu e p ed e é qu e o d eixem em p a z
m a s s om en te en qu a n to
os h om en s e a s cois a s n ã o ex igem s u b m is s ã o. Tod a exigên cia o torna arrogante, desconfiado e belicoso.
499. O MAU Tod o s olitá r io é m a u , excla m a va Did er ot 13: e logo Rou s s ea u s e s en tiu vis a d o e s e s en tiu m or ta lm en te fer id o. O qu e p r ova qu e a d m itiu qu e Did er ot tin h a r a zã o. É ver d a d e qu e t od o m a u in s tin to é forçado a impor, na sociedade e nas relações sociais, semelhante coa çã o, é for ça d o a es con d er -s e a tr á s d e ta n t a s m á s ca r a s , a deitar-s e t a n t a s vezes n o leito d o Pr ocu s to 14 d a vir tu d e qu e, com r a zã o, s e p od er ia fa la r d e u m m a r tír io d o h om em m a u . Na s olid ã o, tu d o is s o d es a p a r ece. Aqu ele qu e é m a u , o é m a is n a s olid ã o: e
ta m b ém m elh or
p or con s egu in te, p a r a a qu ele cu jos n ã o vêem
em tod a p a r te s en ã o es p etá cu lo, é a li ta m b ém qu e o é com m a ior perfeição.
500. E M SENTIDO CONTRÁRIO Um p en s a d or p od e s e ob r iga r d u r a n te a n os a p en s a r em s en tid o con tr á r io: qu er o d izer , n ã o s egu ir os p en s a m en tos qu e s e a p r es en ta m a ele, vin d os d e s eu in ter ior , m a s a qu eles qu e p a r ecem ob r igá -lo a u m em p r ego, u m h or á r io p r es cr ito, u m a for m a a r b itr á r ia d e s e a p lica r . Ma s a ca b a p or ca ir d oen te: p ois es s a
a p a r en t e coa çã o m or a l d es tr ói s u a
for ça
n er vos a
tã o
r a d ica lm en te qu e p od er ia fa zer d ele u m a p er ver s ã o, d a qu a l s e teria feito uma regra.
501. ALMAS MORTAIS! S ob o a s p ecto d o con h ecim en to, a con qu is ta m a is ú til qu e p os s a t er s id o feit a é ter r en u n cia d o à cr en ça n a a lm a im or ta l. Agor a a h u m a n id a d e p od e es p er a r , a gor a n ã o t em n eces s id a d e d e s e p r ecip ita r e a ceit a r id éia s m a l exa m in a d a s , com o d evia fa zer ou tr or a . De fa t o, en tã o a s a lva çã o d a p ob r e
a lm a im or ta l
d ep en d ia d e s eu s con h ecim en tos d u r a n t e a cu r ta vid a , tin h a d e decidir-s e d e u m d ia p a r a ou tr o im p or tâ n cia es p a n tos a !
o conhecimento tin h a u m a
Recon qu is ta m os a cor a gem d e er r a r , d e
ten ta r , d e a ceita r p r ovis or ia m en te importância!
tu d o is s o t em
m en os
e é ju s ta m en te p or is s o qu e in d ivíd u os e ger a ções
inteiras podem conceber tarefas tão grandiosas que outrora teriam p a r ecid o lou cu r a e d es a fio com o céu e o in fer n o. Tem os o d ir eito d e fa zer exp er iên cia s con os co m es m os ! A h u m a n id a d e in teir a tem o mesmo direito! Os maiores sacrifícios ainda não foram oferecidos ao
con h ecim en to
s im ,
o
s im p les
fa to
de
s u s p e ita r de
p en s a m en tos s em elh a n t es a os qu e h oje p r eced em n os s os a tos , já ter ia con s titu íd o ou tr or a u m s a cr ilégio e u m a r en ú n cia à s a lva çã o eterna.
502. UMA SÓ PALAVRA PARA TRÊS ESTADOS DIFERENTES Nes te, a p a ixã o fa z ir r om p er o a n im a l s elva gem , h or r ível e in toler á vel; a qu ele, gr a ça s a o a n im a l, s e eleva a u m a a ltu r a , a u m a gr a n d eza e a u m es p len d or d e a titu d e qu e fa zem p a r ecer m es qu in h a s u a exis tên cia h a b itu a l. Um ter ceir o, es s en cia lm en te n ob r e, p er m a n ece n ob r e em s u a im p etu os id a d e e r ep r es en ta, nesse estado, a natureza selvagem e bela, encontrando-se somente u m gr a u a b a ixo qu e a gr a n d e n a t u r eza t r a n qü ila e b ela qu e ele representa habitualmente: mas os homens o compreendem melhor n a p a ixã o e o ven er a m m a is p or ca u s a d es s es m om en tos
ele s e
encon tr a en tã o u m p a s s o m a is p r óxim o d eles e s e a s s em elh a m a is a eles . S en t em u m a r r eb a ta m en t o e u m es p a n to d ia n te d e semelhante aspecto e o designam nesse instante preciso: divino.
503. AMIZADE E s s a ob jeçã o à vid a filos ófica s egu n d o a qu a l o in d ivíd u o s e torna in ú til a s eu s a m igos n u n ca ter ia p a s s a d o p ela ca b eça d e u m h om em m od er n o: é u m a ob jeçã o a n tiga . A a n tigu id a d e viveu p r ofu n d a e for tem en te a n oçã o d a a m iza d e, leva n d o-a qu a s e p a r a o tú m u lo. É s u a va n ta gem s ob r e n ós : n ós p od em os lh e op or o a m or s exu a l id ea liza d o. Tod a s a s gr a n d es cois a s r ea liza d a s p ela h u m a n id a d e a n tiga en con t r a va m s u a for ça n o fa to d e qu e o h om e m a poia v a o h om em e qu e n en h u m a m u lh er p od ia t er a p r eten s ã o d e s er p a r a o h om em o ob jeto d o a m or m a is p r óxim o e m a is eleva d o ou m es m o o ob jeto único
com o o en s in a a p a ixã o.
Ta lvez n os s a s á r vor es n ã o cr es ça m ta n to d evid o à h er a e à vin h a
que a elas se agarram.
504. CONCILIAR! Dever ia s er t a r efa d a filos ofia con cilia r a qu ilo qu e a cria n ça a p r en d eu com a qu ilo qu e o homem r econ h eceu ? A filos ofia s eria s er en tã o a ta r efa d os joven s , qu e es t ã o a m eio ca m in h o en tr e a criança e o homem e têm necessidades medianas? Pareceria quase que fosse assim, se consideramos a que idade os filósofos têm hoje o cos tu m e d e for m a r s u a s con cep ções : qu a n d o é ta r d e d em a is para crer e cedo demais para saber.
505. AS PESSOAS PRÁTICAS Ca b e a n ós , p en s a d or es , o d ir eit o d e fixa r o b om gos to de tod a s a s cois a s e d e d ecr etá -lo d e a cor d o com a n eces s id a d e. As p es s oa s p r á tica s r eceb em -n o d e n ós e s u a in d ep en d ên cia d e n ós é incrivelm en te gr a n d e; es s e é o es p etá cu lo m a is r id ícu lo qu e s e p os s a ver , em b or a qu eir a m ign or a r es s a d ep en d ên cia e gos tem d e n os tr a ta r com a ltivez com o p es s oa s d es p r ovid a s d e s en s o p r á tico: ch ega r ia m
m es m o
a
d es p r eza r
su a
vid a
p r á t ica
se
n ós
qu is és s em os d es p r ezá-la : a o qu e u m leve d es ejo d e vin ga n ça poderia de tempos em tempos nos incitar.
506. O NECESSÁRIO DESSECAMENTO DE TUDO O QUE É BOM O qu ê? Ser ia n eces s á r io com p r een d er u m a ob r a exa ta m en te com o a ép oca qu e a p r od u ziu ? Ma s t em os m a is p r a zer , m a is admiração, tr a n s m ite-n os m a is en s in a m en tos s e ju s ta m en te n ã o con s id er a r m os a s s im ! Nã o r ep a r a r a m qu e qu a lqu er ob r a n ova e b ela p os s u i s eu va lor m a is b a ixo qu a n d o es tá exp os ta à a tm os fer a ú m id a d e s eu tem p o, p r ecis a m en te p or qu e a in d a gu a r d a s ob r e ela a t a l p on to o od or d a p r a ça p ú b lica , d a p olêm ica , d a s op in iões
r ecen tes e d e tod o o efêm er o qu e p er ece en tr e h oje e a m a n h ã ? Ma is ta r d e ela d es s eca s u a atualidade , s e d is s ip a e en tã o tom a s eu b r ilh o p r ofu n d o, s eu p er fu m e e, s e for d es tin a d a a is s o, s eu calmo olhar de eternidade.
507. CONTRA A TIRANIA DO VERDADEIRO Mes m o qu e fôs s em os b a s ta n te in s en s a tos p a r a con s id er a r com o ver d a d eir a s tod a s a s n os s a s op in iões , n ã o d es eja r ía m os , con tu d o, qu e fos s em a s ú n ica s a exis tir :
n ã o s ei p or qu e s er ia
n eces s á r io d es eja r a on ip ot ên cia e a tir a n ia d a ver d a d e: b a s ta -me s a b er qu e a ver d a d e p os s u i u m gra n d e pod er. Ma s é p r ecis o qu e ela p os s a lutar e qu e ten h a u m a op os içã o, qu e s e p os s a d e tem p os em tem p os descansar d ela n o n ã o-verdadeiro
s en ã o s e tor n a r ia
p a r a n ós a b or r ecid a , s em gos to e s em for ça , e n os tor n a r ia a s s im também.
508. NÃO ASSUMIR UM TOM PATÉTICO O qu e fa zem os em n os s o interesse n ã o d eve n os r en d er elogios m or a is , n em d a p a r t e d os ou tr os n em d a n os s a ; ta l com o o qu e fa zem os p a r a n os alegrar. Recu s a r n es s es ca s os a s a tom a r as coisas num tom patético e abster-se a si mesmo de todo patético, é d e b om tom em tod os os h om en s s u p er ior es : e a qu ele qu e s e habituou a isso reencontra o dom da ingenuidade.
509. O TERCEIRO OLHO O qu ê? Ain d a ten s n eces s id a d e d o tea tr o? É s a in d a tã o jovem ? Sê r a zoá vel e p r ocu r a a t r a géd ia e a com éd ia on d e s ã o m a is b em r ep r es en ta d a s ! No loca l on d e is s o s e p a s s a d e m a n eir a m a is in t er es s a n te e m a is in ter es s a d a ! Cer ta m en te, n ã o é fá cil p er m a n ecer a li com o es p ecta d or s om en te
m a s a p r en d e-o! E em
qu a s e t od a s a s s itu a ções qu e te p a r ecer em d ifíceis e p en os a s , en con tr a r á s u m a s a íd a p a r a a a legr ia e u m r efú gio, m es m o qu a n d o for es a s s a lt a d o p or tu a s p r óp r ia s p a ixões . Ab r e teu olh o tea tr a l, o gr a n d e ter ceir o olh o qu e olh a o m u n d o a tr a vés d os d ois outros!
510. E SCAPAR DE SUAS VIRTUDES Qu e va le u m p en s a d or qu e n ã o s a b e n a oca s iã o op or tu n a es ca p a r d e s u a s p r óp r ia s vir tu d es ? De fa t o, ele n ã o d ever s er somente um ser moral !
511. A TENTADORA A h on es tid a d e é a gr a n d e ten ta d or a d e tod os os fa n á ticos . Aqu ilo qu e p a r ecia s e a p r oxim a r d e Lu ter o s ob a for m a d o d ia b o ou d e u m a b ela m u lh er , e d os qu a is s e d efen d eu d e u m a m a n eir a tã o gr os s eir a , d evia s er r ea lm en te a h on es t id a d e e ta lvez a té mesmo, em casos mais raros, a verdade.
512. CORAJOSO DIANTE DAS COISAS Aquele que, de acordo com sua natureza, é cheio de atenções e d e tem or d ia n te d a s p es s oa s , m a s qu e p os s u i im en s a cor a gem d ia n t e d a s cois a s , r eceia a s r ela ções n ova s e a s n ova s in tim id a d es e restringe as antigas, para que seu incógnito e seu radicalismo na verdade se confundam.
513. LIMITAÇÃO E BELEZA Procuras homens de bela cultura? Deves aceitar então, como qu a n d o p r ocu r a s b ela s r egiões , p on t os d e vis ta e p er s p ectiva s lim ita d a s .
Cer ta m en te, h á ta m b ém h om en s p a n or â m icos , s ã o
instrutivos e surpreendentes: mas desprovidos de beleza.
514. AOS MAIS FORTES E s p ír itos for tes e or gu lh os os , n ã o lh es p ed im os s en ã o u m a cois a : n ã o n os im p on h a m n ova ca r ga , m a s tom em s ob r e s u a s cos ta s p a r te d e n os s o fa r d o, vocês qu e s ã o os m a is for tes ! Ma s gos ta m t a n to d e fa zer o con tr á r io: p ois , vocês qu er em leva n ta r s eu vôo e é p or is s o qu e d evem os a cr es cen ta r s eu fa r d o a o n os s o: qu er dizer, nós temos que rastejar!
515. AUMENTO DE BELEZA Por qu e a b eleza a u m en ta com a civiliza çã o? Por qu e n os h om en s civiliza d os , os tr ês m otivos d e feiú r a s e tor n a m ca d a vez m a is
r a r os : p r im eir o,
as
p a ixões
em
su as
exp los ões
m a is
s elva gen s ; s egu n d o, o es for ço fís ico leva d o a o ext r em o; ter ceir o, a n eces s id a d e d e in s p ir a r o m ed o p or s eu a s p ecto, es s a n eces s id a d e qu e, n os es tá gios in fer ior es e m a l es ta b elecid os d a cu ltu r a , é tã o gr a n d e e tã o fr eqü en te qu e ch ega a fixa r a s a tit u d es e a s cerimônias e faz da feiúra um dever.
516. NÃO FAZER ENTRAR SEU DEMÔNIO NO PRÓXIMO Mantenhamo-n os s em p r e n es ta ép oca fiéis à op in iã o d e qu e a b en evolên cia e os b en efícios con s tit u em o h om em b om ; m a s n ã o d eixem os d e a cr es cen t a r :
com a con d içã o d e qu e com ece a
u tiliza r s u a b en evolên cia e s eu s b en efícios em prove ito próp rio! Pois, d e ou tro m od o s e s e p r eju d ica
s e foge d ia n te d e s i m es m o, s e s e d etes ta e
n ã o s er á cer ta m en te u m h om em b om . E então
n ã o fa r á ou tr a cois a qu e s a lva r -s e a s i m es m o n os ou tros : qu e os ou tr os cu id em d e s i p a r a qu e n ã o lh es a con t eça n a d a d e m a l, a p es a r d e tod o o b em qu e ele p a r ece lh es qu er er !
Ma s é
exa t a m en te is s o: fu gir e od ia r s eu eu, viver em e p a r a os ou tr os e
p ara os outros
que se chama até hoje, com tanta desrazão como
segurança, altruísta e, por conseguinte, bom !
517. INDUZIR AO AMOR Devem os tem er a qu ele qu e s e od eia a s i m es m o, p ois s er em os a s vítim a s d e s u a ir a e d e s u a vin ga n ça . Pr ocu r em os , pois, induzi-lo ao amor de si próprio!
518. R ESIGNAÇÃO O qu e é a r es ign a çã o? É a p os içã o m a is con for tá vel p a r a u m d oen te qu e, d u r a n t e m u ito t em p o, s e a gitou em s eu s s ofr im en t os para encontrá-la e qu e, ten d o-se a s s im fa tiga d o
en tã o a
encontrou!
519. S ER INGÊNUO A p a r tir d o m om en to em qu e qu er es a gir , d eves fech a r a s p or ta s à d ú vid a
d izia u m h om em d e a çã o.
dessa maneira, ser ingênuo!
E n ã o tem es ,
respondeu um contemplativo.
520. A ETERNA CERIMÔNIA FÚNEBRE Ao es cu ta r a h is t ór ia in teir a , p od er ía m os cr er qu e ouvimos uma
in in ter r u p ta
con tin u a m os
a
or a çã o
fú n eb r e:
en t er r a r a in d a
s em p r e
o qu e t em os
en ter r a m os d e m a is
e
ca r o,
p en s a m en tos e es p er a n ça s , r eceb em os e con tin u a m os a r eceb er em tr oca or gu lh o, gloria m u n d i15, is to é, a p om p a d a oração fú n eb r e. Con s id er a -se qu e is s o r ep a r a
tu d o! E
a qu ele qu e
p r on u n cia a or a çã o fú n eb r e p er m a n ece s em p r e o m a ior b en feit or público!
521. VAIDADE DE EXCEÇÃO
E s te h om em p os s u i u m a gr a n d e qu a lid a d e qu e s er ve p a r a s eu p r óp r io con s olo; s eu olh a r p a s s a com d es p r ezo s ob r e o r es to d e s eu ser
e qu a s e tu d o fa z p a r t e d es s e r es t o! Ma s ele s e
r ep ou s a d e s i m es m o qu a n d o s e a p r oxim a d es s a m a n eir a d e s eu s a n tu á r io; o ca m in h o qu e o leva a té lá já lh e p a r ece com o u m a es ca d a d e d egr a u s la r gos e d oces :
e, cr u éis qu e vocês s ã o!,
gostariam de chamá-lo vaidoso por causa disso.
522. A SABEDORIA SEM ORELHAS Ou vir d ia r ia m en te o qu e s e d iz d e n ós ou m es m o ten ta r d es cob r ir o qu e s e p en s a d e n ós
is s o a ca b a p or a n iqu ila r o
homem mais forte. E por isso que os outros nos deixam viver, para ter ca d a d ia r a zã o con tr a n ós ! Nã o s u p or ta r ia m s e tivés s em os r a zã o con tr a eles e, m en os a in d a , s e qu is és s em os ter ra z ã o! Numa p a la vr a , fa ça m os es t e s a cr ifício p a r a o b om en ten d im en to ger a l, n ã o es cu tem os qu a n d o fa la m d e n ós , qu a n d o n os elogia m ou n os r ecr im in a m , qu a n d o exp r es s a m d es ejos e es p er a n ça s a n os s o respeito, nem sequer pensemos nisso!
523. P ERGUNTAS INSIDIOSAS A p r op ós ito d e t u d o o qu e u m h om em d eixa tr a n s p a r ecer , p od em os p er gu n ta r : qu e é qu e ele qu er es con d er ? De qu e qu er d es via r a a ten çã o? Qu e p r econ ceito qu er evoca r ? E a in d a : a té on d e va i a s u tileza d es s a d is s im u la çã o? E a té qu e p on to com ete um equívoco?
524. CIÚME DOS SOLITÁRIOS E n t r e a s n a tu r eza s s ociá veis e a s n a tu r eza s s olitá r ia s , h á es ta
d ifer en ça
(a d m itin d o
qu e
am bas
t en h a m
es p ír ito):
as
p r im eir a s fica m s a tis feita s ou qu a s e com u m a cois a , qu a lqu er qu e
s eja , a p a r t ir d o m om en to em qu e d es cob r ir a m em s eu es p ír ito u m a n u a n ce feliz e com u n icá vel a r es p eito
is s o a s r econ cilia
com o p r óp r io d ia b o! As n a tu r eza s s olitá r ia s , p elo con t r á r io, en con tr a m em qu a lqu er cois a u m p r a zer s ilen cios o ou ela lh es ca u s a u m a d or s ilen cios a , d etes ta m a exp os içã o es p ir itu a l e b r ilh a n t e d e s eu s p r ob lem a s ín t im os , b em com o d etes ta m p a r a s u a b em -a m a d a u m a m a qu ia gem m u ito r eb u s ca d a : olh a m -na en tã o d e m a n eir a m ela n cólica com o s e s u s p eit a s s em qu e qu is es s e a gr a d a r a ou tr os ! E s s e é o ciú m e qu e tod os os p en s a d or es s olitá r ios , qu e tod os
os
s on h a d or es
a p a ixon a d os
con s er va m
perante o espírito.
525. O EFEITO DOS ELOGIOS Um
gr a n d e elogio tor n a a lgu n s en ver gon h a d os , ou tr os ,
impertinentes.
526. NÃO QUERER SERVIR DE SÍMBOLO Eu lastimo os príncipes: não lhes é permitido se anularem de tem p os em
tem p os n a s ocied a d e e a s s im n ã o a p r en d em a
con h ecer os h om en s a n ã o s er n u m a p os içã o d es con for tá vel e n u m a con s ta n te d is s im u la çã o; a con tín u a ob r iga çã o d e significar a lgu m a cois a a ca b a p or tr a n s for m á -los efetiva m en te em s olen es nulidades.
E a s s im va i a con tecer a tod os a qu eles qu e têm o
dever de ser símbolos.
527. OS HOMENS ESCONDIDOS Vocês n u n ca en con tr a r a m d es s es h om en s qu e r etêm e com p r im em o en t u s ia s m o d e s eu cor a çã o e p r efer em tor n a r -se m u d os qu e p er d er o p u d or d a m ed id a ?
E es s es h om en s
in côm od os e m u ita s vezes tã o b on a ch ões n ã o os en con tr a r a m
a in d a , es s es h om en s qu e n ã o qu er em s er r econ h ecid os e qu e a p a ga m s em p r e s u a s p ega d a s n a a r eia , qu e ch ega m a t é a s e enganar, eles e os outros, para permanecer escondidos?
528. R ARÍSSIMA ABSTINÊNCIA É m u ita s vezes u m s in a l d e h u m a n id a d e, qu e n ã o é s em im p or tâ n cia , n ã o qu er er ju lga r a lgu ém e r ecu s a r -s e a p en s a r s eja o que for a seu respeito.
529. COMO BRILHAM OS HOMENS E OS POVOS Qu a n ta s
a ções
es s en cia lm en te
individuais
ficam
em
suspenso s om en te p or qu e a n tes d e execu tá -la s con s ta t a m os qu e s er ia m m a l in ter p r eta d a s ou r ecea m os qu e o s eja m r ea lm en t e! s ã o a s a ções , p or t a n t o, qu e ju s t a m en te t êm u m va lor verdadeiro par a o b em e p a r a o m a l. Por con s egu in te, qu a n t o m a is u m a ép oca ,
um
p ovo,
es tim a m
os
in d ivíd u os ,
m a is
d ir eito
e
p r ep on d er â n cia lh es s ã o con ced id os , m a is a ções d es s e gên er o ou s a r em os u m d ia fa zer
e a s s im u m a es p écie d e cla r ã o d e
h on es tid a d e, d e fr a n qu eza , n o b em e n o m a l, a ca b a p or s e d ifu n d ir n a s ép oca s , em p ovos in t eir os , d e m od o qu e, com o ocor r eu com os gr egos , con t in u a m , s em elh a n tes a cer ta s es tr ela s , a p r ojeta r s eu s r a ios a in d a , d u r a n t e m ilh a r es d e a n os a p ós s eu desaparecimento.
530. D ESVIOS DO PENSADOR E m a lgu n s h om en s , a m a r ch a d o p en s a m en to in teir o é r igor os a e in flexivelm en te a u d a cios a , ch ega n d o m es m o, em cer tos ca s os , a s er a t é cr u el con s igo m es m a , m a s n os d et a lh es es s es h om en s s ã o d oces e m a leá veis ; d ã o d ez volta s em t or n o d e u m a cois a com u m a h es ita çã o b en evolen te, m a s a ca b a m p or con tin u a r
s eu r igor os o ca m in h o. S ã o r ios com n u m er os os m ea n d r os e com er em itér ios is ola d os ; h á loca is d e s eu s cu r s os on d e a s á gu a s joga m d e es con d e-es con d e con s igo m es m a s e s e p er m item , a o p a s s a r , b r eves id ílios com ilh ot a s , com á r vor es , gr u ta s e ca s ca ta s : d ep ois r et om a m s eu cu r s o, a ca r icia n d o os r och ed os e a b r in d o passagem entre as rochas mais duras.
531. S ENTIR A ARTE DE MANEIRA DIFERENTE Des d e qu e s e vive com o er em ita , d evor a d or e d evor a d o, com a ú n ica com p a n h ia d e p en s a m en tos p r ofu n d os e fecu n d os , n ã o s e qu er m a is s a b er a b s olu t a m en te n a d a d e a r t e ou s e exige d ela ou tr a cois a tot a lm en te d iver s a d e a n tiga m en te
is to é, m u d a -se
d e gos to. De fa to, ou tr or a , p or m eio d a a r t e, tod os qu er ía m os p en etr a r p or u m m om en to n o elem en to em qu e h oje vivem os p er m a n en tem en te; en tã o evocá va m os em s on h o o en ca n to d e u m a p os s e e a gor a p os s u ím os . Pelo con tr á r io, la n ça r lon ge d e s i o qu e s e tem a gor a e s on h a r qu e s e é p ob r e, m en d igo e lou co
isso
pode agora nos agradar ocasionalmente.
532. O AMOR TORNA IGUAIS O a m or qu er p ou p a r a qu ele a o qu a l s e vota t od o s en tim en to de estranheza, p or con s egu in te, é ch eio d e d is s im u la çã o e d e a s s im ila çã o, en ga n a con s t a n tem en te e r ep r es en t a u m a igu a ld a d e qu e n ã o exis te n a r ea lid a d e. E is s o a con tece tã o in s tintivamente qu e m u lh er es a m a d a s n ega m es s a d is s im u la çã o e es s e d oce e con tín u o en ga n o e p r et en d em a u d a cios a m en te qu e o a m or torna iguais (o qu e s ign ifica qu e fa z u m milagre!).
E s s e fen ôm en o é
s im p les qu a n d o u m a p es s oa s e d e ixa a m a r e n ã o ju lga n eces s á r io fin gir , d eixa n d o is s o à ou tr a p es s oa a m a d a : m a s n ã o exis te com éd ia m a is en r ed a d a e m a is in extr icá vel d o qu e qu a n d o a m b os
es tã o em p len a p a ixã o r ecíp r oca e qu e, p or con s egu in te, ca d a u m r en u n cia a s i m es m o e ten ta igu a la r -s e a o ou tr o, id en t ifica r -se com ele em tudo: então nenhum dos dois sabe o que deve imitar, o qu e d eve fin gir , a qu e d eve s e en tr ega r . A b ela lou cu r a d es s e es p etá cu lo é m u ito lin d a p a r a es te m u n d o e m u ito s u til p a r a os olhos humanos.
533. NÓS, OS ESTREANTES Qu a n ta s cois a s d es cob r e e vê u m a tor qu a n d o vê ou tr o r ep r es en ta r ! E le s a b e qu a n d o n u m ges t o u m m ú s cu lo s e r ecu s a a tr a b a lh a r , is ola es s es p equ en os d eta lh es a r t ificia is qu e for a m exer cid os s ep a r a d a m en te e d e s a n gu e-fr io d ia n te d o es p elh o e qu e n ã o con s egu em s e fu n d ir n o con ju n to; s en te qu a n d o o a tor fica s u r p r es o em cen a p or s u a p r óp r ia in ven çã o e qu e, em s u a surpresa, estraga o efeito d ela .
Com o u m p in tor olh a d e for m a
d ifer en te u m h om em qu e s e p os icion a d ia n te d ele! Vê s ob r et u d o m u it a s cois a s qu e n ã o exis tem n a r ea lid a d e, p a r a p od er completar o qu e es tá em s u a p r es en ça e levá -lo a lh e con fer ir s eu p len o efeito; ten ta m en t a lm en te vá r ia s ilu m in a ções d o m es m o ob jeto, d ivid e o efeito d e con ju n to p or u m con tr a s te a cr es cen ta d o.
Se
s om en te tivés s em os o olh o d es s e a tor e d es s e p in tor em tod o o reino da alma humana!
534. AS PEQUENAS DOSES S e u m a tr a n s for m a çã o d eve s e p r oces s a r ta n t o qu a n to p os s ível em p r ofu n d id a d e, é p r ecis o a d m in is t r a r o r em éd io em p equ en a s d os es , m a s s em in t er r u p çã o, p or u m lon go p er íod o d e tem p o! O qu e p od em os cr ia r d e gr a n d e n u m a s ó vez? E vita r em os , p ois , tr oca r , p r ecip it a d a m en te e com violên cia , a s con d ições m or a is à s qu a is es ta m os h a b itu a d os , p or u m a n ova a va lia çã o d a s
coisas
p elo con tr á r io, qu er em os con tin u a r a in d a a viver m u ito
tem p o n es s a s con d ições
a té qu e, p r ova velm en te m u ito ta r d e,
percebamos que a n ov a a v a lia çã o se tornou preponderante em nós e qu e a s p equ en a s d os es à s qu a is , a p artir d e a gora , d evem os n os h ab itu ar, p r od u zir a m em n ós u m a n ova n a t u r eza .
Começamos
ta m b ém a d a r -n os con ta qu e a ú ltim a t en t a tiva d e grande m od ifica çã o n a s a va lia ções políticas
aquelas qu e s e r efer em à s cois a s
quero dizer, a grande Revolução
n ã o foi n a d a mais
que um patético e sangrento ch arla ta n is m o que, por meio de crises s ú b ita s , s ou b e in cu lca r à cr éd u la E u r op a a es p er a n ça d e u m a cura repentina
tornando assim até nossos dias todos os doentes
políticos impacientes e perigosos.
535. A VERDADE TEM NECESSIDADE DO PODER E m s i, a ver d a d e n ã o é d e for m a a lgu m a u m p od er qu e for qu e d iga m ger a lm en t e os r id ícu los r a cion a lis tas!
s eja o Pelo
con tr á r io, ela d eve a tr a ir o p od er p a r a s eu la d o ou d ever á coloca r s e d o la d o d o p od er , d e ou t r a for m a p er ecer á s em p r e d e n ovo! Is s o foi demonstrado à saciedade!
536. AS ALGEMAS Aca b a m os p or fica r r evolta d os a o ver com qu e cr u eld a d e ca d a
um
in ces s a n t em en te
fa z p a ga r
su as
p ou ca s
vir tu d es
p es s oa is a os ou tr os qu e, p or a ca s o, s ã o d es p r ovid os d ela s ; a o ver com o os a t or m en ta e os tor tu r a com es s a s vir tu d es . S eja m os , p or ta n to, h u m a n os ta m b ém n ós , com o s en s o d e h on es tid a d e , qu a lqu er qu e s eja n os s a cer teza d e p os s u ir n ele a lgem a s p r óp r ia s p a r a tor tu r a r a t é o s a n gu e tod os es s es egoís ta s gr a n d ios os qu e a gor a a in d a qu er em im p or s eu cr en ça a o m u n d o in teir o: experimentamos essas algemas em nós mesmos!
n ós já
537. D OMÍNIO O d om ín io é a lca n ça d o qu a n d o, n a execu çã o, n ã o n os enganamos, n em h es ita m os .
538. ALIENAÇÃO MORAL DO GÊNIO Pode-s e ob s er va r n u m a cer ta ca tegor ia d e gr a n d es es p ír itos um espetáculo penoso e às vezes assustador: seus momentos mais fecu n d os , s eu s vôos p a r a o a lt o e p a r a lon ge n ã o p a r ecem estar con for m es
a o con ju n to d e s u a
con s tit u içã o e com
is s o a
u lt r a p a s s a r d e a lgu m a for m a ou d e ou tr a s u a s for ça s , d e m od o qu e s em p r e p er m a n ece u m a d eficiên cia e qu e d ela r es u lt a , com o tem p o, u m d efeito d a m á qu in a , o qu a l, p or s u a vez, s e tr a d u z, em natureza s d e tã o eleva d a in t electu a lid a d e, em t od a s a s es p écies d e s in tom a s m or a is e in telectu a is , m u ito m a is r egu la r m en te d o qu e em m is ér ia s fís ica s . E s s es a s p ectos in com p r een s íveis d e s u a n a tu r eza , o qu e têm d e tem er os o, d e va id os o, d e od ios o, d e in vejos o, d e con s tr a n gid o e d e con s tr a n ged or , e qu e s e m a n ifes ta d e r ep en te n eles , tod o o la d o exces s iva m en te p es s oa l e d e coa çã o em n a tu r eza s com o a s d e Rou s s ea u e d e S ch op en h a u er , p od er ia m u it o b em s er a con s eqü ên cia d e u m a p er iód ica d oen ça d o cor a çã o: es ta , con tu d o, s en d o con s eqü ên cia d e u m a d oen ça n er vos a e es ta , p or fim , con s eqü ên cia d e... E n qu a n to o gên io h a b it a em n ós , s om os ch eios d e in tr ep id ez, s om os com o lou cos e p ou co liga m os à s a ú d e, à vid a e à h on r a ; a tr a ves s a m os o d ia com n os s o vôo m a is livr es qu e u m a á gu ia e, n a es cu r id ã o, n os s en tim os m a is s egu r os qu e u m a cor u ja . Ma s d e r ep en te o gên io n os a b a n d on a e logo u m tem or p r ofu n d o n os in va d e: n ã o n os com p r een d em os m a is a n ós m es m os , s ofr em os com tu d o o qu e n ã o vivem os , é com o s e es tivés s em os n o m eio d e r och ed os n us
d ia n t e d a t em p es t a d e e a o m es m o tem p o s om os com o la m en t á veis a lm a s d e cr ia n ça qu e s e a ter r or iza m p or qu a lqu er r u íd o e s om b r a . Tr ês qu a r tos d o m a l com etid o n a t er r a a con tecem p or cova r d ia : e isso é, antes de tudo, um fenômeno fisiológico!
539. S ABEM PELO MENOS O QUE QUEREM? Nu n ca for a m a t or m en ta d os p ela a n gú s tia d e n ã o s er em ca p a zes d e r econ h ecer t u d o o qu e é ver d a d eir o? A a n gú s tia d e qu e seus sentidos estejam demasiado embotados e mesmo sua sutileza vis u a l m u it o gr os s eir a ? S e vocês p u d es s em n ota r u m a s ó vez qual von ta d e d om in a p or tr á s d e s u a vis ã o! Por exem p lo, com o on t em qu er ia m ver mais d o qu e ou tr o e h oje qu er em ver d e m an e ira diferente que esse outro ou como desde o princípio aspiram a ver a con fir m a çã o ou o con tr á r io d o qu e a té a í s e ju lga va en con tr a r ! Ó ver gon h os os d es ejos ! Qu a n ta s vezes es tã o à es p r eit a d o qu e tem p od er os os efeitos ou a in d a d o qu e tr a n qü iliza
p ois , vocês já
es tã o ca n s a d os ! S em p r e r ep letos d e p r es s en tim en tos s ecr et os s ob r e o que d eve s er a ver d a d e p a r a qu e vocês , ju s ta m en te vocês, p os s a m a ceitá -la ! Ou a cr ed ita m qu e h oje, p or qu e es tã o gela d os e secos como uma clara manhã de inverno e que nada preocupa seu cor a çã o, a cr ed ita m qu e s eu s olh os s ã o m elh or es ? Nã o s er á n eces s á r io ca lor e en tu s ia s m o p a r a fa zer justiça a u m a cois a d o pensamento?
e é p recis a m en te a is s o qu e s e ch a m a ver! Como
s e fos s em em ger a l capazes d e ter com a s cois a s d o p en s a m en to r ela ções d ifer en tes d a qu ela s qu e vocês têm com os h om en s ! Há n es s a s r ela ções a m es m a m or a lid a d e, a m es m a h on r a d ez, a m es m a s egu n d a in ten çã o, a m es m a cova r d ia , o m es m o tem or tod o o s eu
eu
a m á vel e d etes tá vel! S u a s fr a qu eza s fís ica s
con fer ir ã o à s cois a s cor es en fr a qu ecid a s , s u a feb r e fa r á d ela s m on s tr os ! S u a m a n h ã n ã o ilu m in a a s cois a s d ifer en tem en te d e
s eu en t a r d ecer ? Nã o r eceia m en con t r a r n a ca ver n a d e tod o con h ecim en to s eu p r óp r io fa n t a s m a , véu em qu e s e en volve a ver d a d e p a r a s e d is fa r ça r d ia n te d e vocês ? Nã o é u m a com éd ia a s s u s ta d or a
em
qu e
vocês
qu er em
d es em p en h a r ,
tã o
levianamente, seu papel?
540. APRENDER Michelangelo16 via em Ra fa el17 o es tu d o, em s i m es m o via a n a tu r eza : n u m a a rte a pren d eu , n o ou tr o, o d om n a tu ral. Isso, porém, é pedantismo, seja dito sem querer faltar de respeito com o gr a n d e p ed a n te. O qu e é o d om , s en ã o o n om e qu e s e d á a u m estudo anterior, a u m a exp er iên cia , a u m exer cício, a u m a a p r op r ia çã o, a u m a a s s im ila çã o, es t u d o qu e r em on ta ta lvez a os tem p os d e n os s os p a is ou m a is lon ge a in d a ! Ma is a in d a : a qu ele qu e a p r en d e cria s eu s próprios d on s
m a s n ã o é fá cil aprender e
n ã o s om en te u m a qu es tã o d e b oa von t a d e: é p r eciso poder a p r en d er . Nu m a r tis ta , é a in veja qu e m u ita s vezes s e op õe ou es s a a ltivez qu e, d es d e qu e a p a r ece o s en tim en to d o es t r a n h o, s e p õe im ed ia t a m en te em es ta d o d e d efes a , em vez d e s e d is p or em es ta d o r ecep tivo. Ra fa el n ã o tin h a n em es s a in veja n em es sa a ltivez, p r ecis a m en te com o Goeth e, e é p or is s o qu e a m b os for a m grandes aprendizes e n ã o a p en a s os exp lor a d or es d es s es filões d evid os à s for ça s telú r ica s e à h is t ór ia d os a n tep a s s a d os d eles . A n os s os olh os Ra fa el d es a p a r ece n o m om en to em qu e a in d a es tá a p r en d en d o, ocu p a d o com o es ta va em a s s im ila r o qu e s eu gr a n d e r iva l ch a m a va sua natureza : es s e n ob r e la d r ã o leva va t od os os d ia s
um
p ed a ço;
mas,
a n tes
de
Mich ela n gelo p a r a s u a ca s a , m or r eu
ter
t r a n s p or ta d o
tod o
o
e a ú ltim a s ér ie d e s u a s
obras, inicio d e u m n ovo p la n o d e es tu d o, é m en os p er feita e d e m en or qu a lid a d e em ter m os a b s olu tos : ju s ta m en te p or qu e o
gr a n d e a p r en d iz foi p er tu r b a d o p ela m or te n a r ea liza çã o d e s u a tarefa mais difícil e levou com ele o último objetivo justificador que tinha em vista.
541. COMO DEVEMOS NOS PETRIFICAR Tornar-s e d u r o, len ta m en te, len ta m en te, com o u m a p ed r a preciosa
e fin a lm en te fica r a s s im tr a n qü ila m en te, p a r a a legr ia
da eternidade.
542. O FILÓSOFO E A VELHICE Nã o é s á b io d eixa r qu e a ta r d e ju lgu e o d ia : p ois com m u ita fr eqü ên cia o ca n s a ço s e t or n a ju s ticeir o d a for ça , d o s u ces s o e d a b oa von t a d e. Igu a lm en te a m a is extr em a p r u d ên cia d ever ia s er im p os ta à velhice e a s eu ju lga m en to s ob r e a vid a , vis to qu e a velh ice,
p r ecis a m en te
com o
a
ta r d e,
gos ta
de
m a n ter
as
aparência s d e u m a n ova e s ed u tor a m or a lid a d e e s a b e h u m ilh a r o d ia p elo ver m elh o d e s eu oca s o, s eu s cr ep ú s cu los , s u a ca lm a p a cífica ou n os tá lgica . O r es p eit o qu e tes tem u n h a m os a o velh o, s ob r etu d o s e es s e a n ciã o é u m velh o p en s a d or e u m velh o s á b io, n os tor n a fa cilm en te cegos a r es p eito d o en velh ecim en to d e s eu espírito e é s em p r e n eces s á r io coloca r à lu z os sintomas de s em elh a n te en velh ecim en to e ca n s a ço, is to é, m os tr a r o fen ôm en o fisiológico que esconde atrás do juízo e do preconceito moral, a fim d e n ã o n os tor n a r m os os tolos d a p ied a d e e d e n ã o p r eju d ica r o con h ecim en to. De fa to, n ã o é r a r o qu e a ilu s ã o d e u m a gr a n d e r en ova çã o m or a l e d e u m a r egen er a çã o s e a p od er e d o a n ciã o e qu e, a p a r tir d es s e s en tim en to, es te em ita , s ob r e a ob r a e o d es en volvim en to d e s u a vid a , ju ízos qu e p od er ia m leva r a cr er qu e a ca b a d e ch ega r p r ecis a m en t e à cla r ivid ên cia : en tr eta n to, a in s p ir a d or a d es s e b em -es t a r e d es s e ju ízo ch eio d e s egu r a n ça n ã o
é a sabedoria, mas o cansaço. O sinal mais perigoso dessa fadiga é cer ta m en te a cren ça n o gênio qu e ger a lm en te n ã o s e a p od er a , s en ã o a p a r tir d es s a id a d e d a vid a , d os gr a n d es e s em i-grandes h om en s d o p en s a m en to: a cr en ça n u m a p os içã o excep cion a l e em d ir eitos excep cion a is . O p en s a d or qu e p os s u i es s e gên io s e con s id er a en tã o livr e p a r a leva r a s coisas com s u p erficialid a d e e d ecr et a r m a is d o qu e d em on s tr a r ; m a s é p r ová vel qu e s eja p r ecis a m en te a n eces s id a d e d es s a s u p er ficia lid a d e qu e com p r ove o ca n s a ço d o es p ír it o, qu e é a p r in cip a l fon te d es s a cr en ça , qu e a p r eced e n o tem p o, em b or a n ã o p a r eça . Além d is s o, qu er em os u s u fr u ir n es s e m om en to r es u lta d os d e n os s os p en s a m en tos , em con for m id a d e com a n eces s id a d e d e fr u içã o com u m a tod os os ca n s a d os e a tod os os a n ciã os ; em lu ga r d e exa m in a r n ova m en te esses resultados e recomeçar a semeá-los, temos necessidade para is s o
de
p r ep a r á -los
para
um
gos to
n ovo,
para
tor n á -los
com es tíveis e t ir a r -lh es a s ecu r a , a fr ieza e a fa lta d e s a b or : é o qu e fa z com qu e o velh o p en s a d or s e eleve a p a r en tem en te a cim a d a ob r a d e s u a vid a , en qu a n to n a r ea lid a d e ele a es tr a ga p ela exa lt a çã o, p ela s d oçu r a s , p elos a zed u m es , p elo n evoeir o p oético e p ela s lu zes m ís tica s qu e lh e m is tu r a . O qu e a con teceu a Pla tã o foi o qu e a ca b ou p or a con t ecer a es s e gr a n d e fr a n cês ín t egr o, a o la d o d o qu a l os a lem ã es e in gles es d es te s écu lo n ã o p od em colocar ninguém exatas
n in gu ém com o ele s ou b e tom a r e d om in a r a s ciên cia s Au gu s to Com te 18. Ter ceir o s in tom a d e ca n s a ço: es s a
ambição que agitava o peito do grande pensador quando era jovem e que então não encontrava em parte alguma como satisfazer, essa amb içã o ta m b ém en velh eceu ; com o a lgu ém qu e n ã o tem m a is n a d a a p er d er , ela s e a p od er a d os m eios d e s a tis fa çã o m a is gr os s eir os e m a is im ed ia tos , is t o é, a qu eles d a s n a tu r eza s a tiva s , d om in a d or a s , violen ta s , con qu is ta d or a s : a p a r t ir d e en tã o qu er
fu n d a r in s titu ições qu e levem s eu n om e, em vez d e fu n d a r ed ifícios d e id éia s . Qu e lh e im p or ta m a gor a a s vitór ia s e a s h on r a s etéreas no reino das demonstrações e das refutações! O que é para ele u m a im or ta lid a d e p elos livr os , u m a eu for ia tu m u lt u os a n a a lm a d e u m leitor ! E m com p en s a çã o, a in s t it u içã o é u m tem p lo ele b em o s a b e, e u m tem p lo d e p ed r a , con s tr u íd o p a r a d u r a r , m a n ten d o s eu d eu s em vid a m u ito m a is s egu r a m en t e qu e o s a cr ifício d e a lm a s ter n a s e r a r a s . Ta lvez en con tr e ta m b ém , n es s a ép oca , p ela p r im eir a vez es s e a m or qu e s e d ir ige m a is a u m d eu s que a um homem, então todo o seu ser se acalma e se amolece aos r a ios d es s e s ol, com o u m fr u to n o ou ton o. S im , ele s e tor n a também mais divino e mais belo, o grande ancião
e é, apesar de
tu d o, a id a d e e a fa d iga qu e lh e perm ite m a m a d u r ecer a s s im , tornar-s e s ilen cios o e r ep ou s a r n a id ola tr ia r a d ios a d e u m a m u lh er . Agor a con s egu iu fa zer d e s eu a n t igo d es ejo a lt a n eir o d is cíp u los ver d a d eir os , d es ejo s u p er ior a té m es m o a s eu p r óp r io eu , d is cíp u los qu e s er ia m o ver d a d eir o p r olon ga m en t o d e s eu p en s a m en to, is to é, a d ver s á r ios : es s e d es ejo tin h a s u a fon te n u m a for ça in t a cta , n a a ltivez con s cien te e n a cer teza d e p od er tor n a r s e, ele t a m b ém , a t od o m om en to, o a d ver s á r io e o in im igo ir r econ ciliá vel d e s u a p r óp r ia d ou tr in a
a gor a n eces s ita d e
p a r tid á r ios r es olu tos , ca m a r a d a s s em es cr ú p u los , a r a u tos , u m cortejo pomposo. Agora não é mais capaz de suportar o isolamento ter r ível em qu e vive tod o o es p ír ito qu e tom a s eu vôo s em p r e à fr en te d os ou tr os , cer ca -s e a p a r tir d e en tã o d e ob jetos d e ven er a çã o, d e com u n h ã o, d e en ter n ecim en to e d e a m or , qu er fin a lm en t e goza r d os m es m os p r ivilégios qu e tod os os h om en s r eligios os e celeb r a r o qu e ven er a n a comunidade; ir á a té o p on to d e in ven ta r u m a r eligiã o p a r a ter es s a com u n id a d e. É a s s im qu e vive o velh o s á b io e a ca b a p or ca ir im p er cep tivelm en te n u m a
vizin h a n ça tã o a flit iva d os exces s os cler ica is e p oéticos qu e m a l s e ou s a p en s a r em s u a ju ven tu d e s á b ia e s ever a , em s u a r ígid a m or a lid a d e
cer eb r a l
de
en tã o,
em
s eu
h or r or
vir il
p ela s
ilu m in a ções s ú b ita s e d iva ga ções . Ou tr or a , qu a n d o s e com p a r a va com ou t r os p en s a d or es m a is velh os , er a p a r a m ed ir s er ia m en te s u a fr a qu eza em r ela çã o à for ça d eles e p a r a s e tor n a r m a is fr io e m a is livr e com r ela çã o a s i p r óp r io: a gor a n ã o s e en tr ega m a is a es s a com p a r a çã o a n ã o s er p a r a s e em b r ia ga r com s u a p r óp r ia ilu s ã o. Ou tr or a p en s a va com con fia n ça n os p en s a d or es d o fu tu r o e via -s e a s i m es m o com d eleite d es a p a r ecer u m d ia em s u a lu z m a is b r ilh a n te: a gor a es tá a tor m en ta d o p ela id éia d e n ã o p od er s er o ú ltim o, p en s a n os m eios d e im p or a os h om en s , com a h er a n ça
qu e lh es
lega , u m a
lim ita çã o d e s eu
p en s a m en to
s ob er a n o, r eceia e ca lu n ia a a ltivez e a s ed e d e lib er d a d e d os es p ír it os in d ivid u a is ;
d ep ois d ele, m a is n in gu ém d eve d a r livr e
cu r s o a s eu in telecto; ele p r óp r io qu er s er p a r a s em p r e o d iqu e onde batem sem cessar as ondas do pensamento
esses são seus
d es ejos m u ita s vezes s ecr etos e n em s em p r e con fes s a d os ! Ma s a d u r a r ea lid a d e qu e s e es con d e p or tr á s d es s es d es ejos é qu e ele mesmo s e d e teve d ia n te d e s u a d ou tr in a , com ela tr a çou p a r a s i u m lim ite, u m
a t é a qu i e n ã o m a is lon ge . Canonizando-se,
r ed igiu ta m b ém s u a s en ten ça d e m or te: d a í em d ia n te s eu es p ír ito n ã o tem m a is o d ir eito d e s e d es en volver , s eu tem p o ter m in ou , o p on t eir o p a r ou . Qu a n d o u m gr a n d e p en s a d or qu er fa zer d e s i m es m o u m a in s titu içã o, coop ta n d o a h u m a n id a d e d o fu tu r o, pode-s e a d m itir com cer teza qu e ele a lém d o a p ogeu d e s u a for ça , que está muito cansado e muito próximo de seu declínio.
543. NÃO FAZER DA PAIXÃO UM ARGUMENTO EM FAVOR DA VERDADE! O fa n á ticos d e b om ca r á ter , fa n á ticos m es m o n ob r es , eu os
con h eço! Qu er em ter r a zã o d ia n te d e n ós e, a n tes d e tu d o, d ia n te d e vocês m es m os !
e u m a m á con s ciên cia s u til e ir r ita d iça os
im p ele m u ita s vezes ju s ta m en te contra s eu fa n a tis m o! Com o fica m en tã o ch eios d e es p ír ito p a r a lu d ib r ia r e p a r a a d or m ecer es s a con s ciên cia ! Com o d etes t a m a s p es s oa s h on es ta s , s im p les e p u r a s ! Com o evita m s eu s olh os in ocen t es ! E s s a certe z a con trá ria d e qu e elas s ã o r ep r es en ta n tes e d a qu a l ou vem , em vocês m es m os , a voz qu e d u vid a d a cr en ça d e vocês
com o p r ocu r a m
torná-la s u s p eita s ob o n om e d e m a u h á b it o, d e d oen ça d a ép oca , d e n egligên cia e d e con ta m in a çã o d e s u a p r óp r ia s a ú d e! Vocês ch ega m a té o ód io d a cr itica , d a ciên cia , d a r a zã o! S en tem -se ob r iga d os a fa ls ifica r a h is tór ia p a r a qu e ela tes tem u n h e em s eu fa vor , s en tem -s e ob r iga d os a n ega r vir tu d es p a r a qu e ela s n ã o r ejeitem n a s om b r a a s vir tu d es d e s eu s íd olos e d e s eu id ea l! Im a gen s color id a s ju s ta m en te on d e h a ver ia n eces s id a d e d a s r a zões d a r a zã o! O a r d or e o p od er d a exp r es s ã o! Nevoeir o p r a tea d o! Noit es d e a m b r os ia ! Vocês s e em p en h a m em ilu m in a r e em es cu r ecer , es cu r ecer com a lu z ! E , n a ver d a d e, qu a n d o s u a p a ixã o s e d es en ca d eia , ch ega u m m om en t o em qu e vocês d izem : agora conquistei u m a b oa con s ciên cia , a gor a s ou m a gn â n im o, cora jos o, d es in t er es s a d o, gr a n d ios o, a gor a s ou h on es t o! Com o vocês são ávidos desses momentos em que sua paixão lhes confere u m d ir eito p len o e a b s olu to d ia n te d e vocês m es m os , lh es con fer e d e a lgu m m od o a in ocên cia , d es s es m om en tos em qu e, n a lu ta , a embriagu ez, a cor a gem , a es p er a n ça , es tã o for a d e vocês m es m os e a cim a d e tod a s a s d ú vid a s , on d e vocês d ecr eta m : Aqu ele qu e, com o n ós , n ã o es tá for a d e s i n ã o p od e d e m od o a lgu m s a b er o qu e é a ver d a d e, on d e es t á a ver d a d e!
Com o s ã o á vid os p or
en con tr a r h om en s d e s u a cr en ça qu e es tã o n es s e es ta d o d eprav a çã o d o in telecto
o da
e d e a tiça r s eu fogo a o in cên d io d eles !
Ma ld içã o a o m a r tír io d e vocês ! Ma ld içã o a s u a vitór ia d a m en t ir a santifica d a ! S er ia p r ecis o ca u s a r tanto m a l a vocês m es m os ? Seria preciso?
544. COMO SE FAZ FILOSOFIA HOJE Not o qu e n os s os joven s , n os s os a r tis ta s e n os s a s m u lh er es qu e
qu er em
filos ofa r
p ed em
h oje
à
filos ofia
de
lh es
dar
p r ecis a m en te o con tr á r io d o qu e d ela r eceb ia m os gr egos ! Qu em n ã o p er ceb e jú b ilo con s t a n te qu e a tr a ves s a tod a s a s p r op os ições e r ép lica s d e u m d iá logo d e Pla tã o, o jú b ilo qu e ca u s a a n ova d es cob er ta d o p en s a m en to racional, qu e com p r een d e a fin a l d e Pla tã o, d a filos ofia a n tiga ? Nes s es tem p os a s a lm a s s e en ch ia m d e a legr ia qu a n d o s e en tr ega va a o jogo r igor os o e á r id o d a s id éia s , d a s gen er a liza ções , d a s refutações
com es s a a legr ia qu e ta lvez
con h ecer a m t a m b ém os gr a n d es m es tr es a n tigos d o r igor os o e á r id o con tr a p on to. Nes s a ép oca , n a Gr écia s e tin h a a in d a em r ela çã o à lín gu a es s e ou tr o gos to m a is a n tigo e ou tr or a tod op od er os o: e a o la d o d es s e gos to, o gos to n ovo a p a r ecia com t a n to en ca n t o qu e s e p a s s a va a ca n ta r e a b a lb u cia r a d ia lética , a arte divina , como se se estivesse inebriado de amor. O gosto antigo era o p en s a m en to es cr a vo d a m or a lid a d e p a r a a qu a l n ã o exis t iam s en ã o ju ízos fixos , fa t os d eter m in a d os e n en h u m a ou tr a r a zã o qu e a qu ela d a a u t or id a d e: d e m od o qu e p en s a r n ã o er a repetir e t od o prazer do discurso e do diálogo só podia residir na forma. (Em toda a p a r te on d e o con teú d o é con s id er a d o com o eter n o e ver d adeiro em s u a gen er a lid a d e, exis te a p en a s u m a gr a n d e m a gia : a qu ela d a for m a m u tá vel, is to é, d a m od a . Ta m b ém n os p oet a s , d es d e a ép oca d e Hom er o e m a is ta r d e n os es cu ltor es , os gr egos n ã o apreciavam a originalidade, mas seu contrário). Foi Sócrates quem des cob r iu o en ca n to op os t o, o d a ca u s a e d o efeit o, d a r a zã o e d a
con s eqü ên cia : e n ós , h om en s m od er n os , es t a m os d e ta l m od o h a b it u a d os à n eces s id a d e d a lógica e ed u ca d os n a id éia d es s a n eces s id a d e, qu e s e a p r es en ta a n ós com o o gos t o n or m a l e qu e, como tal, desagrada forçosamente aos foliões e aos pretensiosos. O qu e s e d ifer en cia d o gos to n or m a l os a r r eb a ta ! S u a a m b içã o m a is s u til s e p er s u a d e qu e s u a a lm a é excep cion a l, qu e eles n ã o s ã o s er es d ia léticos e r a cion a is , m a s ... p or exem p lo, s er es in t u itivos dota d os d e u m s en tid o in t er ior ou d e u m a in tu içã o in t electu a l . Ma s a n tes d e tu d o qu er em s er gên io n a
ca b eça
e
um
n a tu r eza s a r tís tica s , ten d o u m
d ia b o n o cor p o e
p os s u in d o, p or
con s egu in t e, ta m b ém d ir eitos excep cion a is p a r a es s e m u n d o e para
o
n ou tr o,
incompreensíveis.
e
s ob r etu d o
o
d ivin o
p r ivilégio
de
s er em
E tudo isso constitui hoje filosofia! Receio que
n ã o p er ceb a m u m d ia qu e s e en ga n a r a m
o qu e eles qu er em é
uma religião!
545. MAS NÓS NÃO ACREDITAMOS EM VOCÊS! Vocês gos ta r ia m d e s e p a s s a r p or con h eced or es d e h om en s , m a s n ã o es ca p a r ia m d is s o fa cilm en te! Com o n ã o h a ver ía m os d e n ot a r qu e vocês s e r ep r es en ta m com o os m a is exp er ien tes , m a is p r ofu n d os , m a is p er s p ica zes d o qu e r ea lm en te s ã o!? E xa t a m en te com o s en tim os qu e, n es s e p in tor , h á p r es u n çã o já n a m a n eir a com o m a n eja o p in cel: ta l com o ou vim os , n es s e m ú s ico, p ela m a n eir a com o in tr od u z s eu tem a , qu e gos ta r ia d e fa zer -nos crer qu e es s e tem a é s u p er ior a o qu e é. Vocês viver a m a história no fu n d o d e vocês m es m os , a s com oções e os tr em or es , lon ga s e vas ta s tr is teza s , tr ovões d e a legr ia ? For a m lou cos com gr a n d es e p equ en os lou cos ? S u p or ta s tes r ea lm en te a ilu s ã o e a d or d os h om en s b on s ? E ta m b ém a d or e o tip o d e felicid a d e d os m a u s ? Falem-me então de moral, de outro modo, não!
546. E SCRAVO E IDEALISTA O h om em d e E p icteto n ã o a gr a d a r ia cer ta m en te à qu eles qu e h oje a s p ir a m a o id ea l. A con s t a n te t en s ã o d e s eu s er , o in fa tigá vel olh a r volta d o p a r a o in ter ior , o qu e s eu s olh os têm d e fech a d o, p r u d en te, r es er va d o qu a n d o lh e a con tece d e s e volt a r p a r a o m u n d o exter ior ; e t a m b ém s eu s ilên cio e s u a s p a la vr a s la côn ica s : tu d o is s o s ã o s in a is d a cor a gem m a is r igor os a
qu e s er ia m p a r a
n os s os id ea lis ta s qu e s ã o a n tes d e tu d o á vid os d e expansão! Com tu d o is s o, ele n ã o é fa n á t ico, d etes ta a com icid a d e e a ja ct â n cia d e nos s os id ea lis ta s : s eu or gu lh o, p or m a ior qu e s eja , n ã o qu er , con tu d o, in com od a r os ou tr os ; a d m ite u m a cer ta a p r oxim a çã o b en evolen te e n ã o qu er es tr a ga r o b om h u m or d e n in gu ém
ele
s a b e a té m es m o s or r ir ! Há m u ito d e h u m a n id a d e a n tiga n es s e id ea l! Ma s o m a is b elo é qu e lh e fa lt a t ot a lm en te o tem or d e Deu s , a cr ed ita es tr ita m en te n a r a zã o e n ã o exor t a à p en itên cia . E p ictet o era um escravo: seu homem ideal não pertence a qualquer classe e é p os s ível em tod a s a s con d ições s ocia is , m a s d ever em os p r ocu r á lo s ob r etu d o n a s m a s s a s p r ofu n d a s e in fer ior es , on d e s er á o h om em s ilen cios o qu e s e b a s t a a s i m es m o n o m eio d e u m a s er vid ã o ger a l, in ces s a n tem en te em s itu a çã o d e d efes a con tr a o exter ior e m a n ten d o-s e n a m a is eleva d a a titu d e d e cor a gem . Distingue-s e s ob r etu d o d o cristão n a m ed id a em qu e es te vive n a es p er a n ça d e
in d izíveis felicid a d es , a ceita p r es en tes , es p er a e
r eceb e o qu e h á d e m elh or d a gr a ça e d o a m or d ivin os : en qu a n to E p icteto n ã o es p er a n a d a e n ã o d eixa qu e lh e ofer eça m o qu e h á d e m elh or
já o p os s u i, já o tem fir m e n a s m ã os e o d efen d er ia
con tr a tod os s e qu is es s em tir á -lo d ele. O cr is tia n is m o er a feit o p a r a ou tr a es p écie d e es cr a vos a n tigos , fr a cos d e von ta d e e d e razão, portanto, a grande massa dos escravos.
547. OS TIRANOS DO ESPÍRITO A marcha da ciência já não é contrariada, como o foi durante m u it o
tem p o,
p elo
fa to
a cid en ta l
de
qu e
o
h om em
viva
a p r oxim a d a m en te s eten ta a n os . Ou tr or a s e p r eten d ia ch ega r a o top o d o con h ecim en to d u r a n te es s e es p a ço d e tem p o e os m étod os de
con h ecim en to er a m
a p r ecia d os
em
fu n çã o d es s e
d es ejo
u n iver s a l. As p equ en a s qu es tões e exp er iên cia s es p ecia is er a m con s id er a d a s d es p r ezá veis , b u s ca va -s e o caminho m a is cu r to, acreditava-s e, u m a vez qu e tod o es s e m u n d o t er r en o p a r ecia organizado em função do homem, que a perceptibilidade das coisas es ta va t a m b ém a d a p ta d a a u m a m ed id a h u m a n a d o t em p o. Tu d o r es olver d e im ed ia to e com u m a s ó p a la vr a
es s e er a o d es ejo
s ecr eto: o p r ob lem a er a r ep r es en ta d o s ob o a s p ect o d o n ó gór d io ou d o ovo d e Colom b o; es ta va -s e p er s u a d id o qu e er a p os s ível, n o d om ín io d o con h ecim en to, a tin gir o ob jetivo, à
m a n eir a d e
Alexa n d r e ou d e Colom b o e elu cid a r tod a s a s qu es t ões com u m a s ó r es p os ta . Há u m enigma a r es olver : a s s im é qu e a vid a s e a p r es en ta va a os olh os d o filós ofo; er a p r ecis o p r im eir o en con tr a r o enigma e con d en s a r o p r ob lem a d o m u n d o n a fór m u la m a is s im p les . A a m b içã o s em lim ites e a a legr ia d e s er o d ecifr a d or d o mundo
p r een ch ia m os s on h os d o p en s a d or ; n a d a lh e p a r ecia
va ler a p en a n es te m u n d o s e n ã o fos s e en con tr a r o m eio d e tu d o con d u zir a b om ter mo p ara ele! A filos ofia er a a s s im u m a es p écie d e lu ta s u p r em a p ela tir a n ia d o es p ír ito
n in gu ém d u vid a va qu e
es ta n ã o fos s e r es er va d a a a lgu ém m u ito feliz, s u til, in ven tivo, a u d a cios o e p od er os o
a u m s ó!
e m u itos , o ú lt im o en t r e eles
S ch op en h a u er , im a gin a r a m qu e er a m es s e s ó e ú n ico.
Disso
r es u lt a qu e, em r es u m o, a ciên cia ficou a té a gor a p a r a tr á s em con s eqü ên cia d a
es tre ite z a m oral d e s eu s d is cíp u los e qu e
d or a va n te é p r ecis o en tr ega r -s e a ela com u m a id éia d ir etr iz m a is eleva d a e m a is gen er os a .
Qu e im p or ta eu !
Is s o é qu e s e
encontra gravado sobre a porta dos pensadores futuros.
548. A VITÓRIA SOBRE A FORÇA S e con s id er a r m os tu d o o qu e a té a gor a foi ven er a d o s ob o n om e d e
es p ír ito s ob r e-humano , d e gênio , ch ega m os à tr is te
con clu s ã o qu e, em s eu con ju n t o, a in telect u a lid a d e h u m a n a d eve ter s id o qu a lqu er cois a d e m u ito b a ixo e p ob r e: tã o p ou co es p ír ito er a p r ecis o a té a gor a p a r a s e s en tir con s id er a velm en t e s u p er ior a ela! O que é a glória fácil do gênio ! Com que rapidez seu trono foi erguido! S u a a d or a çã o s e t or n ou cos tu m e! S em p r e a d or a m os d e joelh os a força
s egu n d o o velh o h á b ito d os es cr a vos
e, n o
en ta n to, qu a n d o s e tr a ta d e d eter m in a r o gr a u d e venerabilidade, s ó o gr a u d e ra z ã o n a força é d et er m in a n te: é n eces s á r io a va lia r em qu e m ed id a a for ça foi u lt r a p a s s a d a p or qu a lqu er cois a d e s u p er ior , à qu a l ob ed ece d es d e en tã o com o in s tr u m en to e com o m eio! Ma s p a r a ta is a va lia ções n ã o h á a in d a olh os s u ficien tes , chega-s e a té m es m o a con s id er a r com o s a cr ilégio a a va lia çã o d o gên io. As s im , o qu e h á d e m a is b elo s e p a s s a ta lvez s em p r e n a ob s cu r id a d e e, a p en a s n a s cid o, d es m or on a n a n oite eter n a refiro-m e a o es p etá cu lo d a for ça qu e u m gên io a p lica , n ão em obras, m a s p a r a o d es en volvim en t o d e s i m es m o com o obra, is to é, para o domínio de si, para a purificação de sua imaginação, para a ordenação e a escolha nas inspirações e nas tarefas que sobrevêm. O gr a n d e h om em s e m a n t ém s em p r e in vis ível com o u m a es tr ela d is ta n te, n o qu e h á d e m a ior , qu e exige a d m ir a çã o: s u a v itória s ob re a força fica s em t es tem u n h a s e, p or con s egu in te, ta m b ém s em s er glor ifica d o e ca n t a d o. A h ier a r qu ia n a gr a n d eza n ã o foi ainda estabelecida para toda a humanidade passada.
549. A FUGA DIANTE DE SI MESMO E s s es
h om en s
s u jeit os
às
con vu ls ões
in telectu a is ,
im p a cien tes com r ela çã o a s i m es m os e s om b r ios , com o Byr on 19 ou Alfr ed d e Mu s s et 20 qu e, em tu d o o qu e fa zem , s e a s s em elh a m a ca va los es p a n ta d os , es s es h om en s qu e em s u a p r óp r ia ob r a n ã o en con tr a m s en ã o u m a b r eve a legr ia e u m a r d or qu e qu a s e fa z a r r eb en ta r a s veia s e, a s egu ir , a fr ia es ter ilid a d e e o d es en ca n to: com o es s es h om en s s u p or ta r ia m eles próprios s e a p r ofu n d a r ? E les têm s ed e d e s e a n iqu ila r n u m fora d e s i ; s e, com t a l s ed e, s om os cr is tã os , vis a r ía m os a n os a n iqu ila r em Deu s , a n os id en tifica r m os
com
con ten ta r ía m os
em
ele; s e
fôs s em os
a n iqu ila r -n os
S h a k es p ea r e, n ã o n os
nas
im a gen s
da
vid a
a p a ixon a d a ; s e fôs s em os Byr on , ter ía m os s ed e d e ações porque es ta s
n os
d es via m
de
n ós
m es m os
m a is
a in d a
qu e
os
p en s a m en tos , os s en tim en tos e a s ob r a s . A n eces s id a d e d e a çã o não seria então, no fundo, senão uma fuga diante de si mesmo? p er gu n ta r ia Pa s ca l21. E , com efeito, os r ep r es en ta n tes m a is n ob r es da
n eces s id a d e
de
a çã o p r ova r ia m
es s a
a s s er çã o: b a s ta r ia
con s id er a r com a ciên cia e a exp er iên cia d e u m p s iqu ia tr a , bem entendido
qu e os qu a tr o h om en s qu e, em tod os os tem p os ,
for a m os m a is s ed en tos d e a çã o er a m ep iléticos (citei Alexa n d r e, Cés a r , Ma om é e Na p oleã o): exa ta m en te com o Byr on qu e, ta m b ém ele, sofria desse mal.
550. CONHECIMENTO E BELEZA S e os h om en s r es er va m
s em p r e s u a ven er a çã o e s eu
s en tim en t o d e felicid a d e p a r a a s ob r a s d a im a gin a çã o e d a id éia , n ã o é d e es p a n ta r s e, d ia n te d o op os to d a im a gin a çã o e d a id éia , s in ta m fr ieza e d es p r a zer . O a r r eb a ta m en to qu e s e m a n ifes ta a o
m en or p a s s o à
fr en te, s egu r o e d efin itivo, qu e é feito no
con h ecim en to, n o p on to em qu e or a es ta m os n a ciên cia , é fr eqü en te e qu a s e u n iver s a l
m a s s u s cita p r ovis or ia m en te a
incredulidade d e tod os a qu eles qu e s e h a b itu a r a m a n ã o s e a r r eb a ta r em s en ã o a b a n d on a n d o a r ea lid a d e, m er gu lh a n d o n a s p r ofu n d eza s d a a p a r ên cia . Acr ed ita m qu e a r ea lid a d e é feia : n ã o p en s a m qu e o con h ecim en to d a r ea lid a d e, m es m o a m a is feia , é b ela e qu e a qu ele qu e con h ece m u ito e fr eqü en tem en te a ca b a p or es ta r lon ge d e a ch a r feio o con ju n to d a r ea lid a d e qu e lh e p r op or cion ou ta n t a felicid a d e. Ha ver á en t ã o a lgo d e b elo em s i ? A felicidade daqueles que conhecem aumenta a beleza do mundo e tor n a m a is en s ola r a d o tu d o o qu e exis te; o con h ecim en to n ã o s e lim it a a en volver a s cois a s com s u a b eleza , m a s a in tr od u z, d e u m a m a n eir a d u r a d ou r a , n a s cois as;
p os s a a h u m a n id a d e d o
fu tu r o tes tem u n h a r em fa vor d es ta a fir m a çã o! À es p er a d is s o, lembremo-n os
de
uma
velh a
exp er iên cia : d ois
h om en s
tã o
es s en cia lm en te d ifer en tes com o Pla t ã o e Ar is tóteles s e p u s er a m d e a cor d o s ob r e o qu e con s titu i a . felicid ad e s u prema, n ã o s om en te para eles e para os homens, mas a felicidade em si mesma para os d eu s es
das
ú ltim a s
b ea titu d es :
eles
a
en con tr a r a m
no
conhecimento, n a a tivid a d e d e u m a razão exer cid a qu e d es cob r e e qu e in ven ta (e d e m od o a lgu m na
intuição , com o fizer a m os
teólogos e os s em i-teólogos a lem ã es , d e m od o algu m n a vis ã o, com o fizer a m os m ís ticos , e m es m o d e m od o algu m n o tr a b a lh o, como fizeram todos os práticos). Descartes22 e Spinoza23 pensaram o mesmo: como todos eles devem ter desfrutado o conhecimento! E qu e r is co h a via p a r a s u a h on es tid a d e d e s e t or n a r em a s s im louvadores das coisas!
551. D AS VIRTUDES DO FUTURO
Por qu e r a zã o, qu a n to m a is com p r een s ível s e t or n ou o m u n d o, m a is foi d im in u íd a t od a es p écie d e s olen id a d e? Ter ia s id o p or qu e o m ed o foi tã o fr eqü en t em en te o elem en to fu n d a m en ta l d es s a ven er a çã o qu e s e a p od er a va d e n ós d ia n t e d e t u d o o qu e n os
p a r ecia
d es con h ecid o,
m is ter ios o,
e
n os
leva va
a
n os
p r os ter n a r e p ed ir gr a ça d ia n t e d o in com p r een s ível? E p elo fa to d e n os ter m os tor n a d o m en os r eceos os , n ã o ter ia o m u n d o p er d id o p a r a n ós s eu en ca n to? Ao m es m o t em p o n os s a d is p os içã o a o tem or , n os s a p r óp r ia d ign id a d e, n os s a s olen id a d e, n os s a própria a p tid ã o a a terroriz a r n ã o ter ia m d im in u íd o? Nã o es tim a r em os ta lvez m en os o m u n d o e a n ós m es m os , d es d e qu e tem os , a r es p eito d ele e a o n os s o, p en s a m en tos m a is cor a jos os ? Vir ia ta lvez u m m om en to, n o fu tu r o, em qu e es s a cor a gem d o p en s a d or tives s e cr es cid o ta n to qu e t ives s e o s u p r em o or gu lh o d e s e s en tir s u p er ior a os h om en s e à s cois a s
em qu e o s á b io, s en d o o m a is
cor a jos o, s er ia a qu ele qu e s e vis s e a s i m es m o e a exis tên cia com p leta a b a ixo d ele?
E s s e gên er o d e cor a gem qu e n ã o s e
a fa s t a d e u m a exces s iva gen er os id a d e tem a té a gor a feito fa lt a à h u m a n id a d e. Ah ! os p oeta s n ã o qu eir a m tor n a r -s e n ova m en te o qu e for a m ta lvez ou t r or a : visionários qu e n os d izem a lgu m a cois a d a qu ilo qu e é possível! Hoje, qu e lh es r etir a m os d a s m ã os e qu e é n eces s á r io s em p r e m a is lh es r etir a r d e s u a s m ã os o r ea l e o passado
p ois já p a s s ou o t em p o em qu e in ocen t em en te s e
cu n h a va m oed a fa ls a !
d ever ia m n os d izer a lgu m a cois a d a qu ilo
qu e toca a s v irtu d es d o fu tu ro! Ou d a s vir tu d es qu e n ã o exis t ir ã o n u n ca n a ter r a , em b or a p os s a m exis tir em a lgu m a p a r te d o mundo
a s con s t ela ções p u r p ú r ea s e a s im en s a s via s lá ctea s d o
belo! Onde estão vocês, astrônomos do ideal?
552. O EGOÍSMO IDEALISTA
Ha ver ia u m es ta d o m a is s a gr a d o d o qu e a qu ele d a gr a vid ez? Fa zer tu d o o qu e fa zem os com a con vicçã o ín t im a d e qu e, d e u m a m a n eir a ou d e ou tr a , is s o d eve s er vir a o qu e es tá em n ós em es ta d o d e d evir ! Qu e is s o d eve aumentar s eu va lor s ecr eto, n o qu a l p en s a m os com a r r eb a ta m en to d o m is tér io qu e ca r r ega m os em n ós . É en tã o qu e evit a m os m u ita s cois a s s em s er m os for ça d os a n os
coa gir
d u r a m en te!
Rep r im im os
uma
p a la vr a
violen ta ,
es ten d em os a m ã o em t om con cilia d or : a cr ia n ça d eve n a s cer d o qu e h á d e m elh or e m a is d oce. Nós n os a s s u s ta m os com n os s a violên cia e com n os s a r is p id ez, com o s e d er r a m a s s em , p a r a o ca r o d es con h ecid o, u m a gota d e in felicid a d e n o cop o d e s u a vid a ! Tu d o é vela d o, ch eio d e p r es s en tim en tos , n ã o s a b em os com o isso a con t ece, es p er a m os e p r ocu r a m os es ta r preparados. Ao m es m o tem p o,
um
s en tim en to
pu ro
ir r es p on s a b ilid a d e r ein a em
e
p u r ifica d or
de
p r ofu n d a
n ós , u m s en tim en to s em elh a n te
à qu ele qu e exp er im en ta o es p ecta d or d ia n te d e u m a cor tin a abaixada
isso cresce, isso vem à lu z, não t em os n a d a n a s m ã os
p a r a d eter m in a r s eu va lor ou a h or a d e s u a vin d a . E s ta m os in teir a m en te r ed u zid os à s in flu ên cia s in d ir et a s b en feitor a s e defensivas.
Há a li qu a lqu er cois a qu e cr es ce, qu a lqu er cois a
m a ior
n ós
qu e
p r ep a r a m os
tu d o
es s a em
é
vis ta
n os s a de
s eu
m a is
s ecr eta
s u r gim en to
es p er a n ça : e
de
su a
p r os p er id a d e: n ã o s om en te tu d o o qu e é ú til, m a s ta m b ém o s u p ér flu o, os r econ for tos e a s cor oa s d e n os s a a lm a .
É nessa
a tm os fera s a gra d a qu e é p r ecis o viver ! Qu e p os s a m os n ela viver! Qu er es teja m os à es p er a d e u m p en s a m en to ou d e u m a a çã o diante de toda realização essencial não podemos nos comportar de ou tr a for m a qu e d ia n te d e u m a gr a vid ez e d ever ía m os es p a lh a r a os qu a t r o ven tos a s p r eten s ios a s exp r es s ões qu e fa la m d e querer e de criar ! É o ver d a d eir o egoís m o id e alis ta s em p r e ter
cu id a d o d e vigia r e d e m a n ter a a lm a em r ep ou s o p a r a qu e n os s a fecundidade ten h a plen o s u ces s o. As s im vigia m os e tom a m os cu id a d o, d e u m a for m a in d ir et a , p a r a o b em d e tod os ; e o es ta d o d e es p ír ito em qu e vivem os , es s e es ta d o d e es p ír ito a lta n eir o e d oce é u m b á ls a m o qu e s e d ifu n d e p a r a lon ge em tor n o d e n ós , m es m o n a s a lm a s in qu ieta s . estranhas!
S eja m os ,
p ois ,
Ma s a s m u lh er es gr á vid a s s ã o es tr a n h os
n ós
ta m b ém
e
não
r ecr im in em os os ou tr os p or ter em d e sê-lo ta m b ém ! E m es m o s e is s o n ã o d er cer to e s e tor n a r p er igos o, em n os s a ven er a çã o d ia n te d e tu d o o qu e n a s ce, n ã o fiqu em os a tr á s d a ju s tiça t er r es tr e qu e n ã o p er m ite a u m ju iz ou a u m ca r r a s co p ôr a s m ã os n u m a mulher grávida!
553. COM DESVIOS Aon d e qu er ch ega r es s a filos ofia com tod os os s eu s d es vios ? Fa r ia a lgo m a is d o qu e tr a n s p or n a r a zã o, d e a lgu m a for m a , u m in s tin to con s ta n t e e for te qu e r equ er u m s ol b en éfico, u m a a tm os fer a lu m in os a e a git a d a , p la n t a s m er id ion a is , b r is a d o m a r , u m a a lim en ta çã o leve com p os t a d e ca r n e, ovos e fr u ta s , á gu a qu en te p a r a b eb er , p a s s eios s ilen cios os d u r a n te d ia s in teir os , con ver s a p ou co fr eqü en te, p ou ca s leitu r a s e feita s com p r eca u çã o, u m a h a b ita çã o s olitá r ia , h á b itos d e lim p eza s im p les e qu a s e m ilit a r es , n u m a p a la vr a , tod a s cois a s qu e s ã o p r ecis a m en te m a is d e m eu gos to, qu e s ã o p a r a m im ju s ta m en te m a is s a lu ta r es ? Um a filos ofia qu e é, n o fu n d o, o in s tin to d e u m r egim e p es s oa l? Um in s tin to qu e p r ocu r a m in h a a tm os fer a , m in h a a tit u d e, m in h a tem p er a tu r a , a s a ú d e d e qu e n eces s ito, p or m eio d e u m d es vio d e m eu es p ír ito? Há m u ita s ou t r a s s u b lim id a d es d a filos ofia e ta m b ém m u ita s s u b lim id a d es m a is a lt a s a in d a m a is s om b r ia s e m a is exigen tes qu e a m in h a
e n ã o t od a s n ã o s er ã o ta lvez,
ta m b ém t od a s ela s , d es vios in telectu a is d e s em elh a n tes in s t in tos pessoais?
E n qu a n to r eflito n is s o, ob s er vo com u m n ovo olh a r o
vôo m is ter ios o e s olitá r io d e u m a b or b oleta , lá n o a lto, p er t o d a s falésias do lago, onde crescem tantas belas plantas: voa de cá para lá , s em s e im p or ta r qu e s u a vid a n ã o va i d u r a r m a is qu e u m d ia e qu e a n oite s er á m u ito fr ia p a r a s u a fr a gilid a d e a la d a . Pod er ía m os fa cilm en te en con tr a r ta m b ém p a r a ela u m a filos ofia , em b or a m e pareça difícil que seja a minha.
554. UM PASSO ADIANTE Qu a n d o s e elogia o progresso n ã o s e fa z ou tr a cois a d o qu e elogia r o m ovim en to e a qu eles qu e n os im p ed em d e fica r n o m es m o lu ga r
e, em cer tos ca s os , já é m u ito, p a r t icu la r m en te
qu a n d o s e vive en tr e os egíp cios . Na E u r op a a git a d a , con t u d o, on d e o m ovim en t o (com o s e d iz) va i p or s i
a i! s e p elo menos
n ós en t en d ês s em os a lgu m a cois a s d is s o!
a p r ovo o passo
adiante e a qu eles qu e vã o em fr en te, is t o é, a qu eles qu e s e d eixa m a s i m es m os con s ta n tem en te p a r a tr á s e qu e d e m od o a lgu m s e p r eocu p a m em s a b er s e a lgu ém p od e s egu i-los. E m t od a p a r te on d e p a r o m e en con t r o s ozin h o: p a r a r p a r a qu ê? O d es er to é grande!
es s e é o s en tim en t o d es s es h om en s qu e r ea lm en te vã o
em frente.
555. OS MAIS MEDÍOCRES SÃO SUFICIENTES É p r ecis o evita r os a con tecim en tos qu a n d o s a b em os qu e os mais medíocres d eixa m em n ós u m a m a r ca b a s ta n te for te estes não podemos escapar.
O pensador deve ter nele um cânon
aproximativo de todas as coisas que quer ainda viver.
556. AS QUATRO VIRTUDES
e a
Leais p a r a con os co m es m os e p a r a a qu ele qu e a in d a é n os s o amigo; corajosos d ia n t e d o in imigo; generosos p a r a com o ven cid o; civilizados
s em p r e: é a s s im qu e n os qu er em a s qu a tr o vir tu d es
cardeais.
557. NA FRENTE DO INIMIGO Com o a m á m ú s ica e a s m á s r a zões s oa m b em qu a n d o marchamos na frente do inimigo!
558. NÃO SE DEVE TAMPOUCO ESCONDER SUAS VIRTUDES! Gos to d os h om en s qu e s ã o com o a á gu a tr a n s p a r en te e qu e, p a r a fa la r com Pop e 24, d eixa m ver a s im p u r eza s n o fu n d o d e s u a corrente . Mes m o p a r a eles h á a in d a u m a va id a d e, s em d ú vid a d e n a tu r eza r a r a e s u b lim e: a lgu n s d en tr e eles qu er em qu e s ó veja m os
es s a s
im p u r eza s
e qu e
n ã o levem os
em
con ta
a
tr a n s p a r ên cia d a á gu a qu e p er m ite es s a vis ã o. O p r óp r io Bu d a im a gin ou a va id a d e d es s e r ed u zid o n ú m er o n a fór m u la : Deixem qu e tod os veja m s eu s p eca d os e es con d a m s u a s vir tu d es ! is s o é ofer ecer a o m u n d o u m es p etá cu lo m u ito d es a gr a d á vel
Mas é
uma falta de gosto.
559. NADA DEMAIS! Qu a n ta s vezes a con s elh a m os o in d ivíd u o a fixa r p a r a s i u m ob jet ivo qu e n ã o p od e a tin gir e qu e es t á a cim a d e s u a s for ça s , a fim d e qu e a tin ja p elo m en os a qu ilo qu e s u a s for ça s p od em r en d er s ob a m a is alta ten s ão! Ma s é is s o r ea lm en te tã o d es ejá vel? Os m elh or es h om en s qu e vivem s egu n d o es s e p r in cíp io e os m elh or es a tos n ã o t om a m a lgu m a cois a d e exa ger a d o e d e exces s ivo, ju s ta m en t e p or qu e h á n eles t en s ã o d em a is ? Um s om b r io véu de insucesso n ã o s e es ten d e s ob r e o m u n d o p elo fa t o d e qu e vem os
s em p r e a t leta s em lu t a , ges tos m on s t r u os os e em p a r te a lgu m a um vencedor coroado e alegre com sua vitória?
560. O QUE NOS É PERMITIDO Pod em os u s a r os in s tin t os com o u m ja r d in eir o e, o qu e pou ca s p es s oa s s a b em , cu ltiva r a s s em en tes d a cóler a , d a p ied a d e, d a s u tileza , d a va id a d e, d e m a n eir a a tor n á -la s tã o fecu n d a s e p r od u tiva s com o os b elos fr u tos d e u m a latada; p od em os fa zê-lo com o b om ou m a u gos to d e u m ja r d in eir o e, p or a s s im
d izer , n o es tilo fr a n cês , in glês , h ola n d ês , ou
ch in ês ;
podemos também deixar a natureza trabalhar e cuidar somente de p ôr a qu i e a colá u m p ou co d e lim p eza e d e a s s eio; p od em os , en fim , s em qu a lqu er s a b er n em r a zã o d ir etr iz, d eixa r cr es cer a s p la n t a s
com
su as
va n ta gen s
e s eu s
ob s tá cu los
abandoná-la s à lu ta qu e tr a va m en tr e ela s
n a tu r a is
e
p od em os m es m o
en con tr a r p r a zer n u m ta l ca os e p r ocu r a r p r ecis a m en te es s e p r a zer , a p es a r d o a b or r ecim en to qu e s e p os s a t er . Tu d o is s o n os é p er m itid o: m a s qu a n tos s om os a qu eles qu e o s a b em ? Qu a s e tod os os
h om en s
não
a cr ed ita m
n eles
m es m os ,
com o
em
fa t os
realizados, ch ega d os à s u a m a tu rid ad e! Gr a n d es filós ofos n ã o p u s er a m s u a m a r ca n es s e p r econ ceit o com s u a d ou tr in a d a imutabilidade do caráter?
561. F AZER BRILHAR SUA PRÓPRIA FELICIDADE Do m es m o m od o qu e os p in tor es qu e d e m a n eir a a lgu m a p od em a tin gir o t om p r ofu n d o e lu m in os o d o céu , ta l com o exis te n a n a tu r eza , s ã o ob r iga d os a tom a r tod a s a s cor es d e qu e têm n eces s id a d e p a r a s u a p a is a gem , a lgu n s ton s m a is b a ixos qu e a qu eles qu e a n a tu r eza lh es m os tr a : d o m es m o m od o qu e con s egu em
a tin gir
p or
es s e
a r tifício
uma
s em elh a n ça
na
lu m in os id a d e e u m a
h a r m on ia
d e ton s
qu e cor r es p on d e à
n a tu r eza : a s s im ta m b ém é n eces s á r io qu e os p oeta s e os filós ofos , a os qu a is o b r ilh o lu m in os o d a felicid a d e é in a ces s ível, s a ib a m u s a r d e exp ed ien t es . Con fer in d o a tod a s a s cois a s u m color id o d e a lgu n s ton s m a is s om b r ios qu e os r ea is , a lu z qu e con h ecem d á u m efeito qu a s e en s ola r a d a e s e a s s em elh a à lu z d a p len a felicidade.
O p es s im is ta , qu e con fer e a tod a s a s cois a s a s cor es
m a is n egr a s e m a is s om b r ia s , u s a a p en a s ch a m a s e cla r ões , glór ia s celes tes e tu d o o qu e p os s u i u m a for ça lu m in os a m u ito viva e qu e tor n a os olh os h es ita n tes ; n ele a cla r id a d e exis te s im p les m en te p a r a a u m en ta r o t em or e d eixa r p r es s en tir n a s coisas mais terror do que elas contêm na realidade.
562. OS SEDENTÁRIOS E OS HOMENS LIVRES É s om en te n os in fer n os qu e n os é m os tr a d a a lgu m a cois a d o s om b r io p a n o d e fu n d o d e tod a es s a felicid a d e d e a ven tu r eir o qu e en volve Ulis s es e s eu s com p a n h eir os luminosidade
com o d e u m a
eter n a
d es s e p a n o d e fu n d o qu e n u n ca m a is p od em os
es qu ecer : a m ã e d e Ulis s es m or r eu d e d es gos to e d o d es ejo d e r ever s eu filh o! Um é im p elid o d e lu ga r p a r a lu ga r e é is s o qu e p a r te o cor a çã o d o ou tr o, d o s er t er n o e sedentário! A a fliçã o parte o cor a çã o d a qu eles qu e vêem s eu en te m a is qu er id o a b a n d on a r a s id éia s e a fé d o p a s s a d o es p ír it os livr es criam
tu d o is s o fa z p a r te d a t r a géd ia qu e os es s a tr a géd ia d e qu e es tes a lgu m a s vezes
têm conhecimento! E n tã o d ever á ocor r er d e s er em for ça d os , com o Ulis s es , a d es cer en tr e os m or tos p a r a lh es a livia r s eu d es gos to e tranqüilizar sua ternura.
563. A ILUSÃO DA ORDENAÇÃO MORAL DO MUNDO Não h á qu alqu er n eces s id ad e e te rn a qu e exija qu e tod a a
fa lt a
s eja
exp ia d a
e
p a ga
cr er
n es s a
p r ecis a m en te u m a ter r ível ilu s ã o, a p en a s ú til:
n eces s id a d e
er a
d o m es m o m od o
qu e é u m a ilu s ã o cr er qu e tu d o o qu e é con s id er a d o com o fa lt a é na realidade uma. Não são as coisas que perturbaram de tal forma os homens, mas as opiniões sobre coisas que não existem.
564. LOGO APÓS A EXPERIÊNCIA! Mes m o os gr a n d es es p ír itos n ã o têm u m a experiência mais la r ga d o qu e cin co d ed os
logo d ep ois ces s a a r eflexã o e s eu
vazio indefinido, suas asneiras, começam.
565. A PONDERAÇÃO ALIADA A IGNORANCIA Por tod a p a r te on d e com p r een d em os , tornamo-n os gen tis , felizes ,
in ven tivos
e
p or
tod a
a
p a r te
on d e
a p r en d em os
s u ficien tem en te e on d e ed u ca m os a vis t a e o ou vid o, n os s o es p ír it o s e m os tr a
ch eio d e d es em b a r a ço e d e gr a ça . Ma s
com p r een d em os tã o p ou ca s cois a s e s om os tã o m is er a velm en te instruíd os qu e r a r a m en te a con tece qu e a b r a cem os u m a cois a e a o m es m o tem p o n os tor n em os d ign os d e a m or : a n tes , r ígid os e in s en s íveis , a tr a ves s a m os a cid a d e, a n a tu r eza e a h is tór ia e n os or gu lh a m os d es s a a t itu d e e d es s a fr ieza , com o s e ela s fos s em o efeito d a s u p er ior id a d e. Nos s a ign or â n cia e n os s a m ed íocr e s ed e d e s a b er s e d is p õem m u it o b em p a r a a s s u m ir a m á s ca r a d a dignidade e do caráter.
566
VIVER FACILMENTE O m elh or m od o d e viver d e m od o fá cil e d es p r eocu p a d o é
a qu ele d o p en s a d or : p ois , p a r a d izer d e im p r ovis o a s cois a s m a is im p or ta n tes , tem s ob r etu d o n eces s id a d e d a s cois a s qu e os ou tr os d es d en h a m e a b a n d on a m .
De r es to, ele s e a legr a fa cilm en te e
d es con h ece os cu s tos os m eios d e a ces s o a o p r a zer ; s eu tr a b a lh o n ã o é d u r o, m a s , d e a lgu m a for m a , m er id ion a l; s eu s d ia s e s u a s n oites n ã o s ã o es t r a ga d os p elo r em or s o; ele s e m ove, com e, b eb e e d or m e, ob s er va n d o u m com ed im en to qu e con vém a s eu es p ír ito, p a r a qu e es t e s e tor n e s em p r e m a is tr a n qü ilo, for te e lú cid o; s eu cor p o é p a r a ele fon t e d e a legr ia e n ã o tem n en h u m a r a zã o p a r a temê-lo; n ã o tem n eces s id a d e d e com p a n h ia , a n ã o s er d e tem p os em tem p os , p a r a em s egu id a a b r a ça r com m a is t er n u r a a in d a s u a s olid ã o; os m or tos t êm p a r a ele o lu ga r d e vivos e a t é m es m o p a r a substituir seus amigos, evocando entre os mortos os melhores que a lgu m d ia viver a m .
Qu es tion em os d e u m a vez, s e n ã o s ã o os
d es ejos e os h á b itos op os tos qu e tor n a m cu s tos a a vid a d os homens e, por conseguinte, penosa e muitas vezes insuportável. E m ou tr o s en tid o, n o en ta n t o, a vid a d o p en s a d or é a m a is custosa
nada
é
b om
d em a is
para
ele;
e
s er
p r iva d o
precisamente do melhor seria para ele uma privação insuportável.
567. E M CAMPANHA Devem os
tom a r
as
cois a s
m a is
a legr em en te
do
qu e
m er ecem ; es p ecia lm en te p or qu e a s leva m os a s ér io m a is tem p o d o qu e
o
m er ecem .
As s im
fa la m
os
b r a vos
s old a d os
do
conhecimento.
568. P OETA E PÁSSARO A Fên ix m os tr ou a o p oeta u m r olo in fla m a d o qu e s e r ed u zia a cin za s .
Nã o te a s s u s tes , d is s e, é tu a ob r a ! E la n ã o tem o
es p ír it o d o tem p o e a in d a m en os o es p ír ito d a qu eles qu e vã o con tr a o tem p o: p or con s egu in te, é n eces s á r io qu e s eja qu eim a d a . Mas é bom sinal: há muitas espécies de auroras.
569. AOS SOLITÁRIOS S e n ã o p ou p a m os a h on r a d os ou tr os ta n to em n os s os Solilóquios como em publico, somos desonestos.
570. P ERDAS Cer ta s p er d a s com u n ica m à a lm a u m a s u b lim id a d e qu e a leva a se abster de toda queixa e caminhar em silêncio, como altos ciprestes negros.
571. F ARMÁCIA MILITAR DA ALMA Qual é o remédio mais eficaz?
A vitória.
572. A VIDA DEVE NOS TRANQÜILIZAR S e, com o o p en s a d or , vivem os h a b itu a lm en te n a gr a n d e corrente das idéias e dos sentimentos e mesmo que nossos sonhos d u r a n te a n oite s iga m es s a cor r en te, p ed im os à vida, ca lm a e silêncio
en qu a n t o ou tr os qu er em ju s t a m en te d es ca n s a r d a vid a
quando se entregam à meditação.
573. MUDAR DE PELE A s er p en te qu e n ã o p od e m u d a r d e p ele, m or r e. De igu a l m od o os es p ír itos qu e im p ed im os d e m u d a r d e op in iã o d eixa m d e ser espíritos.
574. NÃO ESQUECER! Qu a n to m a is n os eleva m os , m en or es p a r ecem os a os olh os daqueles que não sabem voar.
575. NÓS, AERONAUTAS DO ESPÍRITO Tod a s es s a s ou s a d a s a ves qu e voa m p a r a es p a ços d is ta n tes ,
s em p r e m a is d is ta n tes
vir á cer ta m en te u m m om en t o em qu e
n ã o p od er ã o ir m a is lon ge e vã o p ou s a r s ob r e u m m a s tr o ou s ob r e u m á r id o r ecife
b em felizes a in d a p or en con tr a r em es s e
m is er á vel r efú gio! Ma s qu em ter ia o d ir eito d e con clu ir d is s o qu e d ia n t e d ela s n ã o s e a b r e u m a im en s a via livr e e s em fim e qu e voa r a m p a r a t ã o lon ge qu a n t o é p os s ível voa r ? E n t r eta n to, t od os os
n os s os
gr a n d es
in icia d or es
e tod os
os
n os
p r ecu rsores
a ca b a r a m p or p a r a r e o ges to d a fa d iga qu e p á r a n ã o é d a s a titu d es m a is n ob r es e m a is gr a cios a s : is s o va i a con tecer t a n to p a r a m im com o p a r a ti! Ma s qu e m e im p or ta e qu e te im p or ta ! Ou tra s a ves voarã o m a is lon ge! E s te p en s a m en t o, es s a fé qu e n os anim a , t om a s eu im p u ls o, r iva liza com ela s , voa s em p r e m a is lon ge, m a is a lt o, s e la n ça d ir eta m en te p a r a o a r , a cim a d e n os s a ca b eça e d a im p otên cia d e n os s a ca b eça e d o a lto d o céu vê n a im en s id ã o d o es p a ço, vê a gr u p a m en tos
d e a ves
b em
m a is
p od er os a s qu e n ós e qu e s e la n ça r a m n a d ir eçã o p a r a a qu a l n os la n ça m os , on d e tu d o a in d a é s ó m a r , m a r , e s em p r e m a r !
Para
on d e en tã o qu er em os ir ? Qu er em os ultrapassar o m a r ? Pa r a on d e n os a r r a s t a es s a p od er os a p a ixã o qu e p a r a n ós con ta m a is qu e qu a lqu er ou tr a p a ixã o? Por qu e es s e vôo p er d id o n es s a d ir eçã o, p a r a o p on to on d e a t é a gor a t od os os s óis declinaram e s e extinguiram? Dir-se-á ta lvez u m d ia qu e n ós ta m b ém , d ir igin d on os
s em p r e
desconhecida
p ara
o
oes te ,
es p erá v a m os
a tin gir u m a
Ín d ia
m a s qu e er a n os s o d es tin o en ca lh a r d ia n t e d o
infinito? Ou então, meus irmãos, Ou então?
1
Jean-J a cqu es Rou s s ea u (1 7 1 2 -1 7 7 8 ), filós ofo e es cr itor s u íço; en tr e s u a s obras, O con tra to s ocia l e A orige m d a d es igu a ld a d e en tre os h om e n s já foram publicadas nesta coleção da Editora Escala (NT).
2
Evangelho de Mateus, VI, 33 (NT).
3
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica p a r a a m a ior h on r a (NT).
4
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica con s a gr a r a vid a à ver d a d e (NT).
5
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica con s a gr a r a ver d a d e à vid a (NT).
6
Tib er iu s J u liu s Ca es a r (4 2 a .C.-3 7 d .C), filh o a d otivo d e Au gu s t o, foi imperador romano de 14 a 37 d.C. (NT).
7
Ca iu s J u liu s Ca es a r Octa via n u s Au gu s t u s (6 3 a .C.-1 4 d .C), im p er a d or romano de 31 a.C. a 14 d.C, antecessor de Tibério (NT).
8
Expressão latina que significa Aqu i es tá Rod es , d a n ça a qu i! (NT).
9
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica On d e s ou p a i, lá es tá m in h a p á t r ia (NT).
10
Pla t ã o (4 2 7 -3 4 7 a .C), filós ofo gr ego; d en tr e s u a s ob r a s , A r ep ú b lica já foi publicada nesta coleção da Editora Escala (NT).
11
Ma om é (5 7 0 -632 ), r eligios o á r a b e, fu n d a d or d o is la m is m o ou d a r eligiã o muçulmana (NT).
12
Ba r u ch d e S p in oza (1 6 3 2 -1 6 7 7 ), filós ofo h ola n d ês d e or igem p or tu gu es a ; en tr e s u a s ob r a s , Tra ta d o p ara a reform a d o en te n d im e n to já foi p u b lica d a n es ta coleçã o d a E d it or a E s ca la ; J oh a n n Wolfga n g von Goeth e (1 7 4 9 -1832), escritor e erudito alemão (NT).
13
Den is Did er ot (1 7 1 3 -1 7 8 4 ), filós ofo e liter a to fr a n cês ; d en tr e s u a s ob r a s , O s obrin h o d e R a m e au , Parad ox o s obre o com e d ia n te , Cartas s ob re os cegos en d ereçad a à qu eles qu e en xerga m e Ca rta s obre os s u rd os e m u d os en d ereçad a à qu eles qu e ou ve m e fala m já for a m p u b lica d a s n es ta coleçã o d a Editora Escala (NT).
14
Len d á r io m a lfeitor gr ego qu e a s s a lta va e s eqü es tr a va s u a s vítim a s , submetendo-a s t od a s a u m s u p lício s in gu la r , ou s eja , d eita va -a s n u m leit o d e fer r o e cor t a va -lh es a s p er n a s ou lh es es tica va o cor p o p a r a qu e s e ajustassem ao tamanho desse leito (NT).
15
E xp r es s ã o la tin a qu e s ign ifica glór ia d o m u n d o (NT).
16
Mich ela n gelo Bu on a r r oti (1 4 7 5 -1 5 6 4 ), es cu lt or , p in tor e a r qu itet o ita liano, gên io d a Ren a s cen ça ; en tr e s u a s ob r a s m a is céleb r es , cu m p r e r elem b r a r , n a p in tu r a : a Cap ela S is tin a n os p a lá cios d o Va tica n o; n a es cu lt u r a : a Pie tà , exp os t a d en tr o d a b a s ílica d e S ã o Ped r o n o Va tica n o; Moisés, exp os t a n a igr eja S a n Pietr o in Vin coli, p er to d o Colis eu em Rom a ; Davi, estátua conservada na cidade de Florença (NT).
17
Ra ffa ello S a n zio (1 4 8 3 -1 5 2 0 ), p in tor e a r qu iteto ita lia n o; s eu tr a b a lh o principal foi decorar salas e galerias dos palácios do Vaticano (NT).
18
Au gu s te Com te (1 7 9 8 -1 8 5 7 ), filós ofo fr a n cês , fu n d a d or d o p os itivis m o; d en tr e s u a s ob r a s , Reorga n iz a r a s ocie d a d e e Dis cu rs o s obre o es pírito pos itiv o já foram publicadas nesta coleção da Editora Escala (NT).
19
George Gordon, dito Lord Byron (1788-1824), poeta inglês (NT).
20
Alfred d e Mu s s et (1 8 1 0 -1 8 4 7 ), r om a n cis ta e d r a m a t u r go fr a n cês , u m d os mais destacados representantes do Romantismo (NT).
21
Bla is e Pa s ca l (1 6 2 3 -1 6 6 2 ), m a tem á tico, fís ico e filós ofo fr a n cês ; a lgu n s d e s eu s textos filos óficos (s ob o títu lo Do es p irito geom é trico Pensamentos) foram publicados nesta coleção da Editora Escala (NT).
22
Ren é Des ca r tes (1 5 9 6 -1 6 5 0 ), filós ofo e m a tem á t ico fr a n cês ; en tr e s u a s obras, Dis cu rs o d o m é tod o e As p a ix ões d a alm a já for a m p u b lica d a s n es ta coleção da Editora Escala (NT).
23
Baruch d e S p in oza (1 6 3 2 -1 6 7 7 ), filós ofo h ola n d ês d e or igem p or tu gu es a ; en tr e s u a s ob r a s , Tra ta d o p ara a reform a d o en te n d im e n to já foi p u b lica d a nesta coleção da Editora Escala (NT).
24
Alexander Pope (1688-1744), poeta inglês (NT).
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Este livro foi digitalizado e distribuído GRATUITAMENTE pela equipe Digital Source com a intenção de facilitar o acesso ao conhecimento a quem não pode pagar e também proporcionar aos Deficientes Visuais a oportunidade de conhecerem novas obras. Se quiser outros títulos nos procure http://groups.google.com/group/Viciados_em_Livros, será um prazer recebê-lo em nosso grupo.
COLEÇÃO GRANDES OBRAS DO P ENSAMENTO UNIVERSAL 1 Assim Falava Zaratustra Nietzsche 2 A Origem da Família, da Propriedade Privada e do Estado Engels 3 Elogio da Loucura Erasmo de Rotterdam 4 A República (parte I) Platão 5 A República (parte II) Pla tão 6 As Paixões da Alma Descartes 7 A Origem da Desigualdade entre os Homens Rousseau 8 A Arte da Guerra Maquiavel 9 Utopia Thomas More 10 Discurso do Método Descartes 11 Monarquia Dante Alighieri 12 O Príncipe Maquiavel 13 O Contrato Social Rousseau 14 Banquete Dante Alighieri 15 A Religião nos Limites da Simples Razão Kant 16 A Política Aristóteles 17 Cândido ou o Otimismo O Ingênuo Voltaire 18 Reorganizar a Sociedade Comte 19 A Perfeita Mulher Casada Luis de León 20 A Genealogia da Moral Nietzsche 21 Reflexões sobre a Vaidade dos Homens Mathias Aires 22 De Pueris A Civilidade Pueril Erasmo de Rotterdam 23 Caracteres La Bruyère 24 Tratado sobre a Tolerância Voltaire 25 Investigação sobre o Entendimento Humano David Hume 26 A Dignidade do Homem Pico della Miràndola 27 Os Sonhos Quevedo 28 Crepúsculo dos Ídolos Nietzsche 29 Zadig ou o Destino Voltaire 30 Discurso sobre o Espírito Positivo Comte 31 Além do Bem e do Ma! Nietzsche 32 A Princesa de Babilônia Volta ire 33 A Origem das Espécies (Tomo 1) Darwin 34 A Origem das Espécies (Tomo II) Darwin 35 A Origem das Espécies (Tomo III) Darwin 36 Solilóquios Santo Agostinho 37 Livro do Amigo e do Amado Lúlio 38 Fábulas Fedro 39 A Sujeição das Mulheres Stuart Mill 40 O Sobrinho de Rameau Diderot 41 O Diabo Coxo Guevara 42 Humano, Demasiado Humano Nietzsche 43 A Vida Feliz Sêneca 44 Ensaio sobre a Liberdade Stuart Mill 45 A Gaia Ciência Nietzsche 46 Cartas Persas I Montesquieu 47 Cartas Persas II Montesquieu 48 Princípios do Conhecimento Humano Berkeley 49 O Ateu e o Sábio Volta ire 50 Livro das Bestas Lúlio 51 A Hora de Todos Quevedo 52 O Anticristo Nietzsche 53 A Tranqüilidade da Alma Sêneca 54 Paradoxo sobre o Comediante Diderot 55 O Conde Lucanor Juan Manuel 56 O Governo Representativo Stuart Mill 57 Ecce Homo Nietzsche 58 Cartas Filosóficas Voltaire 59 Carta sobre os Cegos Endereçada àqueles que Enxergam Diderot 60 A Amizade Cícero 61 Do Espírito Geométrico Pensamentos Pascal 62 Crítica da Razão Prática Kant 63 A Velhice Saudável Cícero 64 Dos Três Elementos López Medel 65 Tratado da Reforma do Entendimeno Spinoza 66 Aurora Nietzsche 67 Belfagor, o Arquidiabo A Mandrágora Maquiavel
F UTUROS LANÇAMENTOS: Dicionário Filosófico Voltaire Filosofia da Miséria Proudhon A Miséria da Filosofia K. Marx Crítica da Razão Pura I. Kant A Cidade do Sol Campanella Dos Delitos e das Penas Beccaria Utilitarismo Stuart Mill
IMPRESSÃO E ACABAMENTO: O CEANO IND. G RÁFICA 2007
(11) 4446-6544
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