Microeconomia Aula 1 - José Guilherme Lara Resende

July 11, 2019 | Author: Samuel Barbosa | Category: Microeconomics, Economics, Externality, Market (Economics), Economies
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Notas da aula de microeconomia do professor José Guilherme Lara Resende - UnB....

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Micro economia 1

Notas de Aula

MICROECONOMIA 1 Departamento de Economia, Universidade de Bras´ Bras´ılia Notas de Aula 1 – Gradua¸c˜ c˜ao ao Prof. Jos´e Guilherme de Lara Resende

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´ PREFACIO

O objetivo dessas notas de aula ´e oferecer um material de acompanhament acompanhamentoo para as aulas de Microeconomia 1 do Departamento de Economia Economia da Universidade Universidade de Bras´ Bras´ılia. Essas notas acompan acompanham ham e comp complem lemen enta tam m o curso. curso. O prop´ prop´ osito da disciplina disciplina ´e fornecer uma base microeconˆ omica omica s´olida, olida, que ser´a extensivamente usada em outras disciplinas de economia. Os temas abordados s˜ ao: ao: (i) Teoria do Consumidor, Consumidor, (ii) Teoria da Firma, e (iii) Equil´ Equil´ıbrio Parcial. Parcial . Essas notas s˜ao ao baseadas em diversas fontes. Elas acompanham principalmente a estrutura de apresenta¸c˜ cao a˜o do livro Microeconomia, Microecono mia, Pric´ Pric´ıpios B´ asic as icos os,, de Hal Varian. Varia n. Por´em em a mat´ ma t´eria er ia ´e aqui apresentada de modo mais rigoroso, usando ferramentas de c´ alculo alcul o e t´ecnicas ecnic as de otimiza¸ otimiz a¸c˜ cao a˜o (principalmente o m´etodo etodo de Lagrange).

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Introdu oduc¸˜ ao

A Microeconomia estuda o comportamento e a tomada de decis˜ oes oes de pessoas, fam´ fam´ılias, firmas, governos, entidades diversas. Um termo t´ecnico ecnico que engloba e ngloba todas to das os tipos tip os relacionados ´e agente . Um agente ´e qualquer pessoa ou entidade cujas a¸c˜ c˜oes oes tˆem em conseq con sequˆ uˆencias enc ias na socie so ciedad dade, e, sejam essas consequˆencias encias de cunho puramente econˆ omico ou n˜ao. ao. Por exemplo, quest˜oes oes cl´assicas assicas em economia que podem ser investigadas pelas ferramentas microeconˆ omicas omicas s˜ao: ao: o efeito de um aumento de imposto sobre a sociedade, an´alise alise do efeito do aumento da puni¸c˜ c˜ao ao de certos tipos de crimes, o efeito de uma poss´ poss´ıvel liberaliza¸ c˜ao a o das drogas, a quest˜ao ao de discrimina¸c˜ cao a˜o racial racia l e de gˆenero, ener o, al´em em de muitos outros. outro s. economia?  ia? ”. A primeira primeira pergunta que um estudante estudante de economia economia deve se fazer ´e “o que ´e econom Existem v´arias arias defini¸c˜ coes, o˜es, por´em em a mais utilizada utiliz ada ´e a de que “econom economia ia ´ e o estudo estu do da aloca¸c˜  cao ˜  de recursos escassos ”, elaborada por Lionel Robbins no seu livro “An Essay on the Nature and  ”, publicado em 1932. Vivemos em um mundo com recursos Significance of Economic Science ”, escassos escassos e com demandas por v´ arios arios bens e servi¸cos cos que est˜ est ˜ao ao al´ a l´em em da d a capac ca pacida idade de de d e a socie so ciedad dadee prover esses bens e servi¸cos cos a todas as pessoas. p essoas. Portanto, ´e necess´ nece ss´ ario estabelece estab elecerr crit´ c rit´erios erios para decidir que bens e servi¸cos cos ser˜ao ao produzidos, em que quantidades ser˜ ao ao produzidos e quanto ´ desses bens ou servi¸cos cos caber´ a a cada pessoa. E esse mecanismo de alocar os recursos escassos as `as pessoas que comp˜ oe oe o cerne da ciˆencia encia econˆ omica. omica.

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Para determinar a aloca¸c˜ao o´tima dos recursos, a economia analisa o comportamento dos agentes no ambiente econˆ omico. Trˆes tipos de agentes econˆ omicos muito estudados s˜ a o os omicos, tomado de modo consumidores , as   firmas  e o   governo. O estudo dos agentes econˆ individual, ´e objeto de estudo da microeconomia. Os consumidores manifestam suas a¸co˜es na economia por interm´ edio de suas demandas, isto ´e, da quantidade de cada bem que desejam comprar e pela sua oferta de trabalho. Eles manifestam suas demandas e sua oferta de trabalho ao buscar obter a satisfa¸ c˜a o m´axima a partir de sua riqueza e dos pre¸cos dos bens e servi¸cos dispon´ıveis para consumo e dos sal´ arios vingentes. As firmas manifestam suas a¸co˜es na economia por interm´edio de sua demanda por insumos ou fatores de produ¸ca˜o e por sua oferta de bens e servi¸cos produzidos. Elas manifestam essas demandas e ofertas procurando maximizar seu lucro (ou algum outro objetivo, se for o caso) a partir da tecnologia de que disp˜ o em para produzir o bem ofertado e dos pre¸cos dos insumos que comp˜ oem o bem ofertado. Essas ofertas e demandas s˜ ao representadas no mercado. As quantidades demandadas e ofertadas por cada agente dependem, portanto, dos pre¸ cos dos bens e insumos. O mercado funciona cotando pre¸ cos e verificando as quantidades ofertadas e demandadas a cada pre¸co. Quando a quantidade ofertada iguala a quantidade demandada, dizemos que o mercado est´ a em equil´ıbrio. Existem v´arios mercados na economia, um para cada bem ou servi¸co. A an´alise econˆ omica pode ser classificada como positiva ou normativa. A an´ alise de economia positiva descreve o comportamento dos agentes e os resultados da intera¸ ca˜o entre os comportamentos dos agentes. A an´ alise de economia normativa estuda como os resultados deveriam ser e o que fazer para obtˆe-los. Por exemplo, um modelo de economia positiva constata que existe monop´ olio em algum setor da economia. A economia normativa estuda como este monop´olio atinge a sociedade e o que pode ser feito para corrigi-lo. Um outro exemplo pode ser dado com o sal´ ario-m´ınimo. A an´alise positiva pode constatar que a existˆencia de sal´ario-m´ınimo aumenta o desemprego. Uma an´alise normativa pode recomendar a eleva¸ca˜o do sal´ario-m´ınimo. Existem dois princ´ıpios b´ asicos por detr´ a s da economia neocl´ assica, que fundamenta a microeconomia. O primeiro ´e o comportamento maximizador dos agentes econˆ omicos, sujeito a restri¸c˜oes (devido a` escassez de recursos). O segundo ´e o princ´ıpio de equil´ıbrio. Por detr´ as desses dois princ´ıpios est´a a id´eia de racionalidade dos agentes econˆ omicos. Racionalidade em economia n˜ ao significa a exclus˜ao de comportamentos prejudiciais ao pr´ oprio indiv´ıduo, como fumar ou usar drogas. Os agentes econˆ omicos s˜ao racionais no sentido de que suas a¸c˜oes s˜ao coerentes com a busca da sua felicidade ou de seu prop´ osito, mesmo que essa busca resulte em um comportamento prejudicial a` pessoa ou a` sociedade. Uma economia onde o sistema de pre¸cos opera livremente, isto ´e, os pre¸cos se movem sem impedimento, ´e chamada   economia de mercado. O sistema de pre¸cos ´e de fundamental importˆ ancia na aloca¸c˜ao dos recursos de uma sociedade. Ele provˆe informa¸ca˜o e incentivos que coordenam a decis˜ ao de milhares de consumidores e produtores (esse ponto foi brilhantemente argumentado por Hayek, em seu artigo “The use of knowledge in society ”, publicado na revista omico precisa conhecer apenas os American Economic Review , em 1945). Cada agente econˆ pre¸cos dos produtos que afetam o seu ob jetivo. Por isso se diz que a economia ´e descentralizada : cada agente decide o que consumir ou produzir, sem a existˆencia de um “ente” que coordene suas a¸co˜es. Apesar da falta aparente de coordena¸ c˜ao, a forma de mercado conhecida como competi¸c˜ ao perfeita  ´e eficiente do ponto de vista econˆ omico.

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Duas raz˜ oes favorecem o sistema de pre¸cos como mecanismo de aloca¸ca˜o de recursos. A primeira ´e que, numa economia centralizada, o planejador central precisa conhecer todas as preferˆencias dos consumidores e as tecnologias das firmas para decidir o que e quanto produzir. J´a numa economia de mercado competitiva, cada consumidor precisa conhecer apenas suas preferˆencias e os pre¸cos dos bens e servi¸cos. Por sua vez, cada firma precisa saber a tecnologia e os pre¸cos dos insumos utilizados no processo de produ¸c˜a o, bem como o pre¸co dos bens e servi¸cos que ela produz – esses pre¸cos s˜ao dados pelo mercado. Portanto, existe uma economia fant´ astica de informa¸c˜ao ao utilizar o mecanismo de mercado e decis˜ oes descentralizadas para alocar recursos escassos. A segunda raz˜ ao ´e que, como os consumidores desejam pagar o menor pre¸ co poss´ıvel pelos bens e servi¸cos, eles compram apenas das empresas que podem ofertar mais barato – as que podem oferecer produtos e servi¸cos a pre¸cos inferiores por terem tecnologia mais avan¸cada ou pagarem menos pelos seus insumos. Por outro lado, como as empresas querem vender pelo pre¸co mais caro, elas vender˜ ao para os consumidores dispostos a pagar mais pelo bem ou servi¸ co – aqueles que atribuem o maior valor ao bem. Assim, na economia de mercado, os bens s˜ ao produzidos pelos produtores mais eficientes e consumidos pelos consumidores que atribuem o maior valor ao bem. Esse resultado ´e interpretado como a famosa “m˜  ao invis´ıvel ” de Adam Smith, onde cada agente, agindo de maneira ego´ısta e visando apenas ao seu pr´ oprio bem, num mercado competitivo, acaba gerando o bem comum. Para que a “m˜ao invis´ıvel” de Adam Smith funcione, s˜ ao necess´ arias algumas condi¸c˜oes, como ausˆencia de externalidades, ausˆencia de poder de mercado, entre outras. Quando estas condi¸co˜es n˜ao s˜ao v´alidas, dizemos que existe uma  falha de mercado. Uma externalidade ocorre quando a decis˜ ao de um agente afeta as preferˆencias de outros consumidores ou as tecnologias de outras firmas. Polui¸ ca˜o ´e um exemplo de externalidade. Quando o seu vizinho quer ouvir m´ usica alta at´ e tarde da noite e vocˆ e deseja dormir cedo por ter um compromisso na manh˜ a do dia seguinte, o mercado n˜ ao funciona bem. Neste tipo de situa¸c˜ao, pode ser necess´ a ria a a¸ca˜o do estado, por meio de normas jur´ıdicas e a a¸ c˜a o da pol´ıcia, para garantir a aloca¸ca˜o do direito ao silˆencio de maneira correta. Outro exemplo ´e quando uma f´ a brica polui um rio que abastece de a´gua pot´ avel uma comunidade. Neste caso, h´a necessidade de regula¸ca˜o ambiental para garantir um alto n´ıvel de bem-estar para a comunidade. Poder de mercado ocorre, geralmente, quando existe um ou poucos produtores de um determinado bem. Isto ´e comum nos mercados de infraestrutura (´ agua encanada e esgoto sanit´ ario, eletricidade, transportes, telefonia). Deixadas livres, as firmas operadoras nestes mercados podem elevar demasiadamente seus pre¸cos, al´em do o´timo para a sociedade. O estado, atrav´es da regula¸ca˜o de pre¸cos, pode melhorar a aloca¸c˜ao desses bens e servi¸cos para a sociedade. A microeconomia faz uso constante de modelos econˆ o micos. Modelos s˜ ao simplifica¸co˜es da realidade que a judam a entender um problema complexo. Um “bom” modelo explica o problema em m˜aos, sem complica¸co˜es desnecess´ arias. Um mapa rodovi´ario ´e um bom modelo, pois simplifica a realidade (tamanho muito menor do que a a´rea original) e serve ao prop´ osito desejado: indicar ruas e dire¸co˜es. Portanto modelos s˜ ao simplifica¸c˜oes propositadamente n˜ ao realistas de certo problema que servem para entender como o mundo funciona. A  navalha de Occan  ´e uma regra para a escolha entre modelos: se temos dois modelos que explicam o mesmo fenˆ omeno da mesma maneira, escolhemos o modelo mais simples (dentro do poss´ıvel ´e claro, como Einstein bem colocou: “everything should be made as simple as possible,

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ao necessariamente o modelo mais realista ´e melhor, mas but not one bit simpler ”). Ou seja, n˜ sim o modelo mais simples. Portanto julgamos um modelo pela capacidade de suas previs˜ oes e n˜ao pelo realismo de suas hip´oteses. Algumas id´eias s˜ao primordiais no racioc´ınio econˆomico e seu claro entendimento facilita a compreens˜ao de diversos modelos econˆ omicos. Vamos apresent´ a-las a seguir.

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Postulados B´ asicos de Economia

Postulado 1: Escassez ´ imposs´ıvel todos terem Escassez significa que os recursos da sociedade s˜ ao limitados. E todas as coisas que querem. Sem escassez n˜ ao existe problema econˆ omico. Quando se toma uma decis˜ ao econˆ omica, geralmente se paga alguma coisa, devido a` escassez de recursos. Um indiv´ıduo, ao vender uma casa, paga em bens, entregando a casa, j´ a o indiv´ıduo que compra a casa, paga em dinheiro. Qual o custo de comprar a casa? O valor pago? Esta ´e uma primeira aproxima¸c˜ao, mas o custo pode incluir o tempo da negocia¸ c˜ao, a perda de renda que o valor pago pela casa poderia render em aplica¸co˜es alternativas, etc. Podemos argumentar que o custo da casa ´e muito pr´oximo do valor pago por ele e este valor serve muito bem como primeira aproxima¸ca˜o desse custo. Mas, em algumas decis˜ oes econˆomicas, o custo do bem pode ser muito diferente do valor pago. Por exemplo, qual o custo de se fazer uma gradua¸c˜ao? O custo da mensalidade ´e apenas um deles, talvez pequeno, pois a faculdade pode ser gratuita, como ´e o caso das universidades federais do Brasil. Mas o sacrif´ıcio de n˜ao poder trabalhar ou trabalhar em hor´ ario reduzido gera uma perda de renda corrente, e este custo pode ser consider´ avel. Isso motiva a seguinte defini¸ca˜o de custo: o verdadeiro custo de algum bem ou servi¸ co ´e o valor da melhor alternativa de uso dos recursos utilizados para se adquirir esse bem. No exemplo do curso superior, o custo de uma universidade p´ ublica gratuita, que s´ o oferece cursos diurnos e com hor´ a rio disperso ao longo do dia, pode ser muito maior que o custo de uma universidade privada noturna, mesmo com mensalidade alta. Este custo econˆ omico ´e chamado custo de oportunidade .

Postulado 2: Escolha (tradeoffs) Escassez imp˜ oe a necessidade de escolher entre alternativas poss´ıveis. Se queremos produzir mais de um bem, teremos que produzir menos de outro bem. A palavra tradeoff    ilustra essa situa¸ca˜o em que para se obter alguma coisa deve-se sacrificar outra. Por exemplo, um casal tem diversos programas para fazer no domingo: ir ao cinema, ao teatro, visitar amigos etc. A escolha de um programa implica a n˜ao realiza¸c˜ao de outros. Os economistas usam a frase ”n˜  ao existe almo¸co gr´  atis ” para ilustrar a profundidade dos tradeoffs. Muitas vezes algu´em nos convida para um almo¸co gratuito, mas, na verdade, n˜ ao ´e: sacrifica-se pelo menos tempo para ir ao almo¸co, mas outros sacrif´ıcios podem estar impl´ıcitos, como, por exemplo, a perda da oportunidade de almo¸car com outras pessoas. Se o almo¸co “gr´ atis” ´e oferecido por algu´em que quer obter algo do convidado, ent˜ ao, pode-se at´e medir mais facilmente o verdadeiro custo desse almo¸co supostamente gr´ atis. As firmas est˜ao, tamb´em, sempre se defrontando com escolhas. Uma situa¸ c˜ao clara de Jos´e Guilherme de Lara Resende

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tradeoffs ´e quando uma firma tem recursos e necessita decidir se investe em aperfei¸ coamento da linha de produtos atuais ou no desenvolvimento de uma nova linha de produtos. oes e manteiga ” e o tradeoff  Dois tradeoffs cl´assicos em economia s˜ ao o tradeoff entre “canh˜  entre  eficiˆencia e equidade .

O tradeoff entre canh˜ oes e manteiga ´e uma met´afora sobre a escolha que a sociedade tem que fazer sobre quanto investir em seguran¸ca e quanto investir na produ¸c˜ao de alimentos. Quanto mais investir em seguran¸ca, menos se tem para investir na produ¸c˜ao de alimentos e vice-versa. O tradeoff entre equidade e eficiˆencia ocorre porque, geralmente, para a sociedade obter equidade, entende-se que ela deve sacrificar eficiˆencia, e vice-versa. Por exemplo, se todos ganharem a mesma remunera¸ ca˜o, independentemente do cargo e dedica¸ ca˜o ao trabalho, poucas pessoas ir˜ao querer ocupar os cargos de maior responsabilidade ou dedicar-se-˜ ao com afinco a`s suas tarefas. O resultado pode levar a uma queda de produ¸ c˜a o, ocorrendo perda de bemestar e eficiˆ encia. Por outro lado, para se gerar eficiˆ encia, deve-se remunerar bem as pessoas mais produtivas e inventivas, pois elas produzem riqueza para a sociedade. Todavia, essa diferencia¸ca˜o de remunera¸c˜ao pode levar a` desigualdade social. O governo pode tentar diminuir essa desigualdade por meio de impostos, como, por exemplo, por meio de um imposto de renda progressivo, em que a al´ıquota do imposto aumenta com a renda. Assim, quem ganha pouco, perde pouco da sua renda, e quem ganha muito, perde parte maior de sua renda para o governo. O resultado ´e uma maior equidade social, assumindo que o governo distribui essa receita para os mais pobres. Por´em, mesmo nesse caso, a redu¸ c˜ao no incentivo a` pessoa produtiva pode acarretar perda de eficiˆencia. Outro exemplo se d´ a quando a sociedade introduz o seguro-desemprego. O seguro-desemprego reduz a desigualdade de renda entre o empregado e o desempregado, por´em, pode desincentivar o desempregado a buscar um novo emprego, causando perda de eficiˆencia.

Postulado 3: Comportamento Individual Maximizador. Os agentes econˆ omicos tomam decis˜oes com algum ob jetivo em mente, e essas decis˜ oes s˜ao tomadas para se alcan¸car esse objetivo. Ressaltamos nesse postulado a id´eia de individualidade. A raz˜ao para estudarmos agentes individuais e n˜ ao grupos ´e pr´ atica. Existem teorias bem estabelecidas sobre o comportamento individual, enquanto a teoria de comportamento em grupo n˜ ao ´e t˜ ao bem desenvolvida. Isso n˜ao ´e raz˜ao para n˜ao estudarmos decis˜ oes em grupos. Pelo contr´ ario, decis˜oes em grupo s˜ ao fundamentais em macroeconomia e em certos campos de microeconomia.

Postulado 4: Substitui¸ c˜ ao Substitui¸c˜ao significa que as pessoas est˜ao dispostas a fazer as escolhas que a escassez de recursos exige. Esse postulado diz que entre quaisquer dois bens A e B que desejamos, estamos dispostos a abrir m˜ a o de um pouco de A para receber um pouco de B. Esse postulado pode soar in´ocuo, por´em ´e bastante geral: estamos dispostos a abrir m˜ ao de um pouco do bem A para recebermos um pouco do bem B, quaisquer que sejam os bens A e B. Essa substitui¸ca˜o normalmente envolve pequenos incrementos dos bens. Esses pequenos incrementos s˜ ao chamados de marginais  pelos economistas. Por exemplo, para decidir o quanto um indiv´ıduo investe em educa¸ca˜o, ele pensa primeiro nos benef´ıcios e custos da educa¸ c˜ao prim´aria. Se os benef´ıcios dessa educa¸c˜ao forem maiores que seus custos, ele far´a o prim´ario (neste caso, a decis˜ a o pode ser dos respons´ aveis e n˜ao do indiv´ıduo propriamente dito, mas Jos´e Guilherme de Lara Resende

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o racioc´ınio ´e o mesmo). Uma vez tendo decidido fazer o prim´ ario, o indiv´ıduo pensa se os benef´ıcios s˜ao maiores que os custos do ensino m´edio. E o indiv´ıduo vai aplicando este racioc´ınio at´e chegar ao ponto em que o benef´ıcio marginal da educa¸ c˜ao fica igual ou menor que o custo marginal da educa¸c˜ao. Para as firmas, o racioc´ınio na margem tamb´em ´e bastante util ´ na tomada de decis˜ ao econˆomica. O quanto produzir geralmente ´e decidido com a resposta a este tipo de racioc´ınio. Uma firma vai produzir at´e o ponto em que o acr´escimo de receita pela venda do ultimo ´ bem produzido (benef´ıcio para a firma) for maior que o custo marginal de produzi-lo (perda para a firma).

Implica¸co ˜es dos Postulados As pessoas e firmas tomam decis˜ oes dependendo dos custos e benef´ıcios destas decis˜ oes. Assim, se houver altera¸ca˜o nestes custos e benef´ıcios, as decis˜ oes se modificam. Portanto, podem ser colocados incentivos na economia para induzir as pessoas ou firmas a tomarem certas decis˜ oes. Por exemplo, se o pre¸co do combust´ıvel aumentar, os consumidores reduzem o uso do autom´ ovel. O reconhecimento de que os agentes econˆ omicos (pessoas e firmas) respondem a incentivos ´e de fundamental importˆancia em economia. Por exemplo, o desenho de pol´ıticas p´ ublicas deve levar em conta que as pessoas podem alterar seu comportamento devido a uma nova lei, e essa mudan¸ca pode ter efeitos n˜ ao desej´ a veis. Os Estados Unidos, nos anos 20, se interessaram em reprimir o consumo de bebidas alco´ olicas, onde um dos objetivos era diminuir a criminalidade, pois se argumentava que esta vinha em parte acompanhada pelo uso abusivo da bebida. Todavia, os agentes econˆ omicos responderam a esta repress˜ a o via aumento da produ¸ca˜o e distribui¸c˜ao ilegal de bebida e, com o incremento da renda das atividades ilegais (agora com o novo mercado de bebidas alco´ olicas compondo o grupo destas atividades ilegais), veio o aumento do crime organizado, mais perigoso que os crimes gerados pelo excesso de consumo de a´lcool. O resultado l´ıquido para a sociedade da redu¸ c˜a o de um grande n´ umero de pequenos crimes provocados por bˆebados e o aumento dos crimes violentos provocados pelo aumento do crime organizado n˜ ao ´e f´acil de ser determinado. Mas sabemos que os Estados Unidos rapidamente desistiram de proibir o consumo de bebidas alco´ olicas.

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Exemplo do Problema Econˆ omico de Escassez

Imagine uma economia que produz dois bens apenas, X  e Y . Na figura abaixo abaixo, a quantidade do bem X   ´e mostrada no eixo horizontal e a quantidade do bem Y  ´e mostrada no eixo vertical. Dados os recursos limitados (terras, n´ umero de trabalhadores, f´ abricas existentes, etc) dessa economia, a quantidade que pode ser produzida de X  e Y   tamb´em ´e limitada.

Defini¸ca ˜o: A fronteira de possibilidade de produ¸c˜ ao (FPP) mostra a quantidade m´ axima do bem Y  (digamos vinho) que a sociedade pode produzir, para qualquer quantidade do bem X  (digamos p˜ao) produzida. A figura abaixo mostra uma poss´ıvel FPP para a economia descrita acima.

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Bem Y  

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  Fronteira de Possibilidade de Produ¸c˜ ao

                A                Y  0                      C                        B       Y  1               

X 0

X 1

Bem X 

Figura 1: Fronteira de Possibilidade de Produ¸c˜ao Linear Pontos na FPP representam a quantidade m´ axima de vinho que pode ser produzida para certa quantidade de p˜ a o. Por exemplo, se a economia produz X 0   unidades de p˜ ao, ent˜ ao a produ¸ca˜o m´axima poss´ıvel de vinho para o per´ıodo de tempo em quest˜ ao (digamos um ano) ´e Y 0  litros de vinho. Obviamente, essa sociedade pode produzir menos vinho dada a quantidade ao, escolhendo o ponto C  da figura, onde s˜ao produzidos X 0  de p˜ao e Y 1   de vinho. O X 0  de p˜ ponto C   ´e no interior da regi˜ao definida pela FPP, o que indica que nem todos os recursos da economia est˜ ao sendo plenamente usados e algum desperd´ıcio est´ a ocorrendo. A FPP tem inclina¸ca˜o negativa devido a` escassez de recursos. Se estamos no ponto a e queremos produzir mais p˜ ao, precisamos abrir m˜ a o de um pouco de vinho (a sociedade realoca alguns dos recursos usados na produ¸ca˜o de vinho para a produ¸ca˜o de p˜ ao). Portanto, o postulado da escassez implica que a FPP ´e negativamente inclinada. Por´em A FPP n˜ ao necessariamente tem que ser uma linha reta. Outras formas importantes s˜ ao FPP cˆoncava e FPP convexa. A figura abaixo ilustra uma FPP cˆ oncava. Bem Y  

  Fronteira de Possibilidade de Produ¸c˜ ao Cˆ oncava

         

 Bem X 

Figura 2: Fronteira de Possibilidade de Produ¸c˜ ao Cˆ oncava Jos´e Guilherme de Lara Resende

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O formato da curva da FPP reflete como o custo marginal de um bem muda com a quantidade do outro bem sendo produzida. Vamos primeiro definir o que ´e o custo marginal.

Defini¸ca ˜o:  Custo Marginal. O custo marginal do bem X   ´e o custo de produzir uma unidade adicional de  X , expresso em unidades do outro bem que deixa de ser produzido. Matematicamente,  CM gX,Y   = −

dY   dX F P P 

Esse custo de oportunidade marginal da FPP ´e chamado  taxa marginal de transforma¸cao ˜  dos bens . Essa taxa mede a taxa na qual um bem pode ser transformado em outro, no sentido de que os fatores de produ¸c˜ao s˜ao realocados da produ¸ca˜o de um dos bens para a produ¸ca˜o do outro bem. No caso de nossa economia com dois bens, o custo marginal ´e dado pela inclina¸ c˜a o da FPP. Uma FPP com inclina¸ca˜o constante (isto ´e, uma reta, como na primeira figura) significa que o custo marginal ´e constante, independente da quantidade produzida. Para produzir mais uma unidade de vinho, temos que abrir m˜ ao sempre da mesma quantidade de p˜ ao. Uma FPP cˆoncava significa que o custo marginal do bem aumenta quanto mais desse bem ´e produzido. Ou seja, quanto maior a produ¸c˜ao de vinho, para produzir mais um litro, temos que abrir m˜ao de uma quantidade maior de p˜ao. Uma FPP convexa significa que o custo marginal do bem diminui quanto mais desse bem ´e produzido. Ou seja, quanto maior a produ¸ c˜ao de vinho, para produzir mais um litro, temos que abrir m˜ao de uma quantidade menor de p˜ ao. Qual forma da FPP ´e mais razo´ avel? Depende da tecnologia de produ¸ca˜o da ind´ ustria em considera¸ca˜o. Uma FPP convexa ilustra uma situa¸ ca˜o onde os custos marginais decrescem com a quantidade produzida, situa¸ca˜o em que se configuram economias de escala. Quanto mais produzimos, maior a economia na unidade adicional produzida. Um prov´ avel exemplo de uma ind´ ustria com economia de escala ´e a de software. Dado que o software foi desenvolvido, a produ¸ca˜o de uma c´ opia adicional ´e praticamente nula. Analisaremos esses pontos com mais detalhe na parte da teoria da firma.

Leitura Recomendada 1. Varian, cap. 1 - “O Mercado”. 2. Pindick e Rubinfeld, cap. 1 - “Aspectos Preliminares” e 2 - “Os Fundamentos da Oferta e da Demanda”. 3. Hall e Lieberman, cap. 1 - “O que ´e Economia” e 2 - “Escassez, Escolha e Sistemas Econˆomicos”. 4. Nicholson e Snyder, cap.1 “Economic Models”. 5. F.A. von Hayek, Economics and Knowledge (1937,  Economica  4: 33-54).

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