Michal Kalecki - Três caminhos para o pleno emprego (1944) (inc)

April 22, 2019 | Author: guilmoura | Category: Investing, Taxes, Inflation, Economics, Interest
Share Embed Donate


Short Description

Michal Kalecki - Três caminhos para o pleno emprego (1944) O propósito deste artigo é discutir os métodos para atingir e...

Description

Michal Kalecki - Três caminhos para o pleno emprego (1944)

O propósito deste artigo é discutir os métodos para atingir e manter o pleno emprego numa sociedade capitalista. Vamos considerá-los num sistema económico fechado. Isto não significa que por nos apresentarem as maiores dificuldades práticas na discussão do pleno emprego negligenciamos os problemas do comércio externo. Eles serão tratados num estudo à parte. No entanto, vamos abstrair-nos deles aqui, para podermos deixar claro os problemas teóricos fundamentais do pleno emprego. De forma semelhante, vamos abstrair-nos da questão da mobilidade da mão-de-obra, que também será examinada num artigo específico. No momento, vamos supor que a jornada de trabalho é variável dentro de certos limites, o que proporciona elasticidade suficiente à oferta de força de trabalho no curto prazo, enquanto no longo prazo  pode-se contar com o capacitamento de mão-de-obra, mão -de-obra, para restaurar restaura r o equilíbrio, quando a estrutura da demanda se altera. Primeiro, e principalmente, vamos tratar neste artigo a questão da criação da adequada demanda efectiva para assegurar e manter o pleno emprego, em segundo lugar iremos averiguar o  problema do investimento privado nesse sistema, tanto no curto prazo como no longo prazo. Como o título indica, vamos distinguir três caminhos para atingir e manter o pleno emprego: I. Pela despesa do governo em investimentos públicos (por exemplo, escolas, hospitais, estradas, etc.) ou em subsídios ao consumo popular (do auxílio às famílias, redução da tributação indirecta, subsídios para manter baixos os preços dos bens de subsistência) em que essa despesa é financiada por empréstimos chamaremos esse método abreviadamente de Orçamento Deficitário; II. Pelo estímulo ao investimento privado (através de uma redução na taxa de juros, diminuição do imposto de renda, ou outras medidas que auxiliem o investimento privado); III. Pela redistribuição de renda das classes de mais alta para as de renda mais baixa. Mostraremos que o segundo método, isto é, o estímulo ao investimento privado, não é satisfatório, mas que tanto o primeiro método quanto o terceiro são meios adequados de se manter o pleno emprego. I. Orçamento Deficitário

O Orçamento Deficitário cria demanda efectiva da seguinte maneira: O governo realiza investimentos públicos que não concorrem com o empreendimento privado (por exemplo, constrói escolas, estradas, hospitais, etc.) ou subsidia o consumo popular (pagando auxílios às famílias, reduzindo os impostos indirectos ou dando subsídios para manter baixos os preços dos  bens de subsistência). Esta despesa é financiada por empréstimos, e desta forma fo rma não implica a redução do investimento privado (desde que a taxa de juros seja mantida constante) nem do consumo não-subsidiado, e cria assim demanda efectiva adicional. Deve-se notar que o aumento das rendas provoca, algum tempo depois, um aumento da receita tributária, de modo que o défice orçamental final é menor do que o aumento das despesas governamentais. As questões fundamentais relacionadas com a criação de emprego através do Orçamento Deficitário têm sido amplamente discutidas nos últimos anos. Apesar disso, parece útil recolocar  os principais pontos da discussão. São eles: 1) De onde vem o dinheiro? 2) Tal política não

elevará inevitavelmente a taxa de juros, afectando, portanto adversamente o investimento  privado? 3) Se a taxa de juros se s e mantiver constante, o Orçamento deficitário não criará inflação? 4) Se o défice do orçamento é uma característica permanente como podem ser manejados os encargos da crescente Dívida Pública? Problemas fundamentais De onde vem o dinheiro?

Embora se tenha afirmado repetidamente nas recentes discussões que o défice orçamental se autofinancia, ou seja, que o seu crescimento provoca um aumento das rendas e mudanças na sua distribuição que levam ao aumento das poupanças na medida exacta a financiá-lo, é um ponto que ainda é frequentemente mal-entendido. Vamos demonstrar este teorema fundamental da teoria do défice orçamental por meio de um diagrama. A coluna da esquerda do diagrama representa a Despesa Nacional, isto é, a soma do gasto do governo, do gasto privado em investimento de reposição e expansão do capital (todas as aquisições de novo capital fixo, mais as variações do capital de giro e dos stocks), e despesa com consumo pessoal. É fácil perceber  que numa economia fechada esta despesa deve ser igual à soma de salários, ordenados, lucros (1) (brutos, incluindo depreciação) e tributação indirecta. O preço de qualquer mercadoria adquirida será composto por esses quatro parâmetros. Dessa forma, a coluna da direita, que representa a soma desses quatro parâmetros para a economia como um todo, é igual à coluna da esquerda que representa a Despesa Nacional. A coluna da direita está dividida conforme a utilização que é feita das rendas. Há primeiro a tributação, tanto directa quanto indirecta, paga pelas firmas e indivíduos, há depois o consumo pessoal e o resíduo é a poupança incluindo depreciação. Pois se da renda bruta agregada mais tributação indirecta deduzimos todos os tributos e o consumo  pessoal, o remanescente é a poupança pou pança bruta incluindo depreciação. A área sombreada na coluna da esquerda representa o excesso dos gastos do governo em relação à receita tributária, isto é, o défice orçamental, e retira -se directamente da observação do diagrama que o défice orçamental mais o investimento privado bruto é igual à poupança bruta (2). Se deduzirmos a ambos os lados desta equação a depreciação, veremos que a equação permanece verdadeira, ou seja, estaremos substituindo poupança bruta por poupança líquida e investimento bruto por investimento líquido. Por outras palavras, a poupança líquida é sempre igual ao défice orçamental mais o investimento líquido, qualquer que seja a situação económica geral, qualquer que seja o nível de preços, de salários e da taxa de juros, todo montante de investimento privado e de défice orçamental vai sempre produzir um montante igual de poupança para financiar estes dois parâmetros. Assim, a questão de como será possível aumentar os gastos do governo, se o gasto em investimento  privado e consumo pessoal se reduz, redu z, é respondida pelo facto de que qu e sempre haverá tal aumento na renda de forma a criar um aumento da poupança igual ao aumento do défice orçamental. A taxa de juro

 Não será errado supor que qu e o investimento privado permanecerá o mesmo quando o défice orçamental aumentar? O crescimento do défice orçamental não pressionará a taxa de juros de tal forma que o investimento será reduzido, na mesma medida em que cresce o défice orçamental, contrabalançando assim o efeito estimulante que o gasto do governo tem sobre o emprego? A resposta é que a taxa de juros pode ser mantida num nível estável por maior que seja o défice

orçamental, desde que se tenha uma adequada política bancária. A taxa de juros tenderá a elevar-se, se o público não absorver as apólices governamentais à venda, através das quais o défice é financiado, por preferir aplicar suas poupanças em depósitos bancários, e se os bancos, com insuficiente base de caixa (papel-moeda e contas no Banco Central), sem capacidade de expansão dos seus depósitos, não comprarem as apólices governamentais em lugar do público, nessa situação a taxa de juros deverá, de facto, ser elevada o suficiente para induzir o público a investir suas poupanças em apólices governamentais. Se, no entanto, o Banco Central expandir a  base de caixa dos bancos privados, o suficiente para os capacitar cap acitar a expandir seus empréstimos, mantendo simultaneamente o encaixe monetário exigido, não surgirá a tendência à elevação da taxa de juros. Consideramos até aqui a taxa de juros em geral. Na realidade, o assunto é um pouco mais complicado, porque devemos distinguir entre a taxa dos empréstimos de curto prazo e a de longo  prazo. Pois se os bancos decidem d ecidem expandir os seus depósitos, a um u m nível dado da taxa de juros de curto prazo, que seja o suficiente para atender à demanda do público, enquanto que o governo está emitir obrigações de longo prazo, estes passam a absorver os activos de curto prazo. Assim, a taxa de juros de longo prazo acabaria por se elevar, em relação à taxa de curto prazo, de modo a levar o público a absorver as obrigações lançadas correntemente pelo governo. Isto, no entanto,  pode ser evitado com facilidade através de d e uma política apropriada de emissão das obrigações obri gações  por parte do governo. Um bom exemplo ex emplo é fornecido pela política do governo britânico durante esta guerra. O governo tem obrigações de longo e médio prazo, rendendo juros de 2,5 a 3,0%. O  público compra com suas poupanças a quantidade de obrigações que quiser e o restante do défice orçamental é coberto por um aumento da dívida flutuante, isto é, pela emissão de letras de curto  prazo. Desta forma, ambas as taxas tax as de juros, de longo e curto prazo, praz o, são mantidas constantes (a constância da última é baseada, obviamente, na política do Banco da Inglaterra). Esse método  para manutenção das taxas de juros constantes pode ser utilizado em época de paz. paz . Não há nada de extraordinário que o torne apenas adequado a uma época de guerra, excluindo-o de utilização  para financiar investimento público ou subsidiar o consumo popular. Podemos assim concluir que, desde que o Banco Central expanda a base de caixa dos bancos  privados conforme a demanda pelos depósitos bancários e que o governo emita obrigações de longo e médio prazo, tanto a taxa de juros de curto prazo quanto a de longo prazo podem ser  estabilizadas, qualquer que seja o montante do défice orçamental. O perigo da inflação

Se a taxa de juros é mantida constante, o crescente défice orçamental não irá causar inflação, isto é, uma espiral viciosa de preços e salários? A resposta é que a inflação só ocorrerá se a demanda efectiva crescer tanto que provocará uma escassez geral de força de trabalho ou equipamento (ou ambos). Até um determinado ponto, as curvas de oferta de curto prazo são horizontais ou levemente ascendentes para a maior parte das mercadorias. Mas quando a demanda efectiva cresce significativamente além desse ponto, as secções acentuadamente crescentes das curvas de oferta de curto prazo tornam-se relevantes. Como resultado, há uma elevação geral de preços, desproporcional aos custos primários médios, e desta forma inicia-se a viciosa espiral de preços e salários. Para evitar a inflação o governo deve portanto tomar precauções para não levar o Orçamento Deficitário além do ponto indicado de plena utilização de trabalho e equipamento.

Deste modo, é evidente que um pré-requisito para o pleno emprego é uma relação adequada entre o equipamento existente e a força de trabalho disponível. O volume de equipamento deve ser  adequado para empregar a mão-de-obra disponível e permitir ainda capacidade de reserva. Se a capacidade máxima do equipamento é insuficiente para absorver a mão-de-obra disponível, como é o caso dos países menos desenvolvidos, a imediata obtenção do pleno emprego é certamente impossível. Se a capacidade de reserva não existe ou mesmo se esta for insuficiente, uma vez que a estrutura do equipamento não se combina com a estrutura da demanda, a tentativa de assegurar o pleno emprego a curto prazo pode facilmente levar a tendências inflacionárias em amplas secções da economia. E mesmo se a estrutura do equipamento combinar com a estrutura de demanda de pleno emprego no momento inicial, a deficiência de reservas causará subsequentemente problemas quando ocorrerem deslocamentos na demanda.  Numa economia onde o capital de equipamento é insuficiente, será ser á necessário haver um período de industrialização ou reconstrução, durante o qual o equipamento existente seja expandido a uma taxa um tanto mais elevada. Neste período pode ser necessário exercer controlos semelhantes aos utilizados numa época de guerra. Somente depois do processo de expansão do capital tenha sido levado suficientemente adiante, será possível uma política de pleno emprego do tipo descrito acima. Outro fenómeno pode ocorrer no pleno emprego que, embora não seja inflação no sentido acima, resulta da desproporção entre a demanda e a oferta de bens de consumo, e pode provocar um contínuo aumento dos preços. Numa situação de pleno emprego o poder de negociação dos sindicatos será fortemente intensificado. Assim, pode haver uma tendência espontânea ao aumento das taxas de salários nominais, que conduz ao aumento dos preços e do custo de vida, o que, posteriormente, por sua vez, leva a um aumento dos salários e assim sucessivamente.  Na medida em que o aumento das taxas salariais s alariais é igual ao aumento da produtividade do trabalho, o problema da “espiral viciosa” não aparece, porque o custo de salário por unidade de  produto permanecerá estável e assim não n ão haverá razão para um aumento aum ento dos preços. Se, no entanto, as taxas salariais crescerem mais do que a produtividade do trabalho, devem ser tomadas medidas para impedir que os preços disparem. Se não se tomarem tais medidas, os trabalhadores como um todo não serão beneficiados, pois o aumento das taxas de salários nominais será contrabalançado pelo consequente aumento de preços. Além disso, um rápido movimento ascendente de preços será um factor de perturbação numa economia de pleno emprego. Como  poderão ser aumentados os salários s alários nominais sem causar um aumento dos preços será indicado, mais adiante, na secção sobre Redistribuição de Renda. Por enquanto, é suficiente mencionar que numa economia de pleno emprego um aumento das taxas de salários reais que não tenha paralelo no crescimento na produtividade implica a redução do investimento ou do consumo dos não-salariados. Pois, de outra forma, a demanda agregada excederia a oferta agregada e, nesse caso, o aumento dos preços acabaria por acontecer ou, no caso de serem preços controlados, resultaria em escassez e distribuição desordenada. O encargo da Dívida

Se o pleno emprego é mantido por um Orçamento Deficitário, a Dívida Pública expande-se continuamente e a “carga” dos juros sobre ela tenderá a aumentar. Não limitará, este “encargo” crescente, o Orçamento Deficitário como meio para atingir o pleno emprego? Talvez seja bom

começar por esclarecer dois populares mal-entendidos no que respeita ao “encargo” da Dívida. Em primeiro lugar, o juro sobre uma crescente Dívida Pública (como também sobre toda a Dívida) não pode ser um encargo para a sociedade como um todo, porque na sua essência constitui uma transferência interna. Em segundo lugar, numa economia em expansão e nas existentes alíquotas dos tributos, esta transferência não precisa necessariamente de crescer numa  proporção maior do que a receita rec eita tributária. Não será necessário elevar-se a existente alíquota de imposto sobre a renda para financiar o montante crescente de juros sobre a Dívida Pública se a taxa de expansão da renda nacional for suficientemente alta, como resultado de um aumento da  população trabalhadora e do progresso prog resso técnico. Contudo, mesmo se nos abstraímos abs traímos deste factor, é bastante fácil imaginar um sistema de tributação para resolver o problema da Dívida que não envolva qualquer perturbação no produto e emprego. Imaginemos, por exemplo, que o juro da Dívida Pública é financiado por um tributo anual sobre o capital, cobrado às empresas e pessoas (ações e obrigações ao portador são excluídas da avaliação da riqueza, para impedir a dupla tributação do capital das empresas). A renda corrente, após o pagamento do imposto sobre o capital, como consequência do aumento do juro da Dívida Pública, será mais baixa para alguns capitalistas e mais alta para outros. Mas a sua renda agregada permanecerá inalterada e o seu consumo agregado não se deverá alterar  significativamente. Além disso, o rendimento do investimento não é afectado por um imposto sobre o capital, uma vez que ele é pago sobre qualquer tipo de riqueza. Se certo montante é mantido em dinheiro, em apólices do governo ou é investido na construção de uma fábrica, é  pago sobre ele o mesmo imposto sobre sobr e o capital e desse modo não se altera a sua vantagem vanta gem comparativa. No caso de o investimento ser financiado por um empréstimo, o seu o rendimento obviamente não será afectado por um imposto sobre o capital, porque um empréstimo não significa um aumento da riqueza do empresário investidor. Assim, nem o consumo dos capitalistas nem o rendimento do investimento são afectados pelo aumento da Dívida Pública se o juro sobre ela for financiado por um imposto anual sobre o capital. Vamos agora considerar a ordem de magnitude de tal imposto. Se imaginarmos que o tributo é lançado para financiar o juro sobre a Dívida Pública incorrida após certa data fixada (o juro sobre a “velha dívida” já estando incluído no orçamento) e estando o juro médio relevante sobre a Dívida Pública na Grã-Bretanha em torno de 2%, este será aproximadamente o custo médio actual do empréstimo (de curto prazo e longo prazo), e não há razão para supor que se elevará no futuro. A taxa do imposto anual sobre o capital será então substancialmente menor do que 2 %,  porque o imposto para financiar o juro sobre sob re a “dívida extra” será cobrado cobr ado de todos os tipos de capital privado, dos quais a “dívida extra” constitui apenas um item. Se, por exemplo, esta “dívida extra” se elevasse à metade de todos os activos privados, o imposto anual sobre o capital atingiria o montante de 1 % (4). Como alternativa ao imposto sobre o capital, é possível imaginar um imposto "modificado" sobre a renda, cuja influência sobre a economia nacional, como um todo, seria mais ou menos equivalente ao do imposto sobre o capital. O imposto sobre a renda, ao contrário do imposto sobre o capital, reduz a taxa de lucro líquida, enfraquecendo assim o incentivo a investir. A seguinte modificação pode remover esse efeito adverso. Imagine-se que o imposto sobre a renda é lançado sobre a renda bruta, isto é, antes da dedução da depreciação. Por outro lado, todo o investimento em capital fixo, seja por motivo de reposição ou de expansão, é deduzido do

montante tributável (se exceder a renda tributável, o excesso é levado para dedução nos anos subsequentes). É fácil demonstrar que tal imposto não afecta a taxa de lucro esperada sobre o novo investimento. Por exemplo, suponhamos que um empresário espera de cada 100 Libras investidas em capital fixo um lucro bruto de 10 Libras por ano. Com um imposto sobre a renda de um xelim por libra reduz esse lucro esperado para 9,5 Libras por ano. Mas por cada 100 Libras investidas o empresário obtém uma dedução de 5 Libras ao seu imposto sobre a renda actual, e assim o custo do investimento é reduzido para 95 Libras e, consequentemente, a taxa de lucro bruta esperada permanece em 10% ao ano, como se o imposto não existisse. Orçamento Deficitário e investimento Quanto investimento privado?

Após ter considerado as possíveis objecções à obtenção do pleno emprego através de um Orçamento Deficitário, vamos examinar agora, mais detalhadamente, o funcionamento de tal sistema. O seu princípio é o aumento dos gastos do governo em investimentos públicos e subsídios ao consumo popular, sem modificação nas alíquotas dos tributos, até ao ponto em que a demanda efectiva criada directa e indirectamente por essa despesa (através da aumento da renda) estabelece o pleno emprego. Dado que o governo mantém o emprego nesse nível, o que acontecerá com o investimento  privado? A) Permanecerá o investimento privado sujeito a variações cíclicas? B) Qual será o nível de “equilíbrio” do investimento privado? A) É evidente que o nível do investimento privado sob um regime de pleno emprego será estável. As violentas flutuações cíclicas do investimento privado no regime de laissez-faire devem-se às violentas flutuações dos lucros (5). Em pleno emprego, no entanto, a produção e os lucros apresentarão apenas modificações de longo prazo, resultantes do crescimento populacional (6) e aumento da produtividade do trabalho (7). Podem ocorrer, certamente, flutuações acidentais na taxa de investimento privado, como resultado, por exemplo, de progresso técnico descontínuo. Tais flutuações acidentais podem muito bem ser neutralizadas por uma programação adequada do investimento público. B) A questão do nível de “equilíbrio” do investimento privado que se desejaria no regime de  pleno emprego requer algumas observações obs ervações preliminares, relativas ao conceito con ceito de grau de utilização do equipamento, pelo qual entendemos a relação entre a produção real e a capacidade máxima do equipamento. O grau de utilização não deve ser nem muito pequeno nem excessivo. Se for muito pequeno, haverá capacidade não utilizada que significa desperdício de recursos  produtivos, no caso oposto, a capacidade capacidad e de reserva do equipamento será se rá pequena demais para  permitir a elasticidade suficiente para ajustes. Vamos agora supor que partimos de uma posição em que o grau de utilização do equipamento se situa no nível que consideramos desejável. Consequentemente, queremos que este grau de utilização seja mantido no período seguinte. Mas no período seguinte o nível de produção de  pleno emprego será maior, devido ao aumento da d a população trabalhadora e da produtividade produ tividade do trabalho (como resultado do progresso técnico). Assim, para manter o grau de utilização do equipamento, a capacidade deste deve expandir-se proporcionalmente ao aumento da população trabalhadora e da produtividade do trabalho. Isto dá-nos a solução para qual deveria ser o nível de investimento privado. O investimento privado deve situar-se no nível adequado para expandir  a capacidade do equipamento pari passu com o aumento da população trabalhadora e a

 produtividade do trabalho, isto é, proporcionalmente proporcionalmen te ao nível de produção de pleno emprego.  No caso de um aumento da população trabalhadora, trabalhado ra, esta afirmação é óbvia, mas talvez alguma explicação seja necessária no caso de um aumento da produtividade do trabalho. Imagine-se que uma máquina velha seja substituída por uma nova, que requer menos trabalho para produzir uma dada quantidade. A oferta de mão-de-obra cresce assim proporcionalmente ao aumento da  produtividade média e, se o pleno emprego é mantido, man tido, é necessária uma expansão proporcional propor cional da capacidade do equipamento, para não ocorrer um aumento no seu grau de utilização. Controlo do investimento privado

Para que o investimento privado se estabeleça no nível correspondente à regra acima, inúmeros métodos podem ser utilizados. Sabe-se que uma redução (aumento) na taxa de juros causa coeteris paribus um acréscimo (queda) na taxa de investimento privado, porque aumenta (diminui) a rentabilidade líquida esperada do investimento. Isso também é verdade para a alíquota de imposto sobre a renda. Assim, quando o investimento privado tende a ser “muito baixo”, pode ser estimulado por uma redução da taxa de juros e da alíquota do imposto sobre a renda, e inversamente. Contudo a aplicação de ambos esses métodos envolve sérias dificuldades. Conseguir uma redução apreciável na taxa de juros de longo prazo, que é a de maior relevância para o investimento, é um processo um tanto lento (9). Além disso, e mais importante, há limites para a redução da taxa de juros de longo prazo, porque (em períodos longos) esta taxa sempre excede em certa margem a taxa de curto prazo e esta não pode cair abaixo de zero. As modificações na alíquota do imposto sobre a renda implicam, no pleno emprego, uma redistribuição do consumo e é inconveniente tentar simultaneamente influenciar o investimento. Por exemplo, a aplicação deste método implica redistribuição do consumo das classes de renda mais baixa para as de renda mais alta, sempre que o investimento privado é estimulado. O melhor método parece ser a substituição de parte do imposto existente sobre a renda pelo imposto “modificado" sobre a renda, descrito anteriormente, que não afecta a rentabilidade líquida do investimento. (A substituição do imposto sobre a renda por um imposto sobre o capital também pode ser utilizada) Se, por exemplo, a alíquota fixada de imposto sobre a renda num dado momento é 7 xelins por  libra, podemos proceder à modificação desta alíquota para 3 xelins. Isso remove o efeito adverso do imposto sobre a renda com relação à taxa de lucro líquida. Assim, restarão 4 xelins para exercer sua pressão normal sobre o investimento. Quanto maior for o deslocamento do imposto normal sobre a renda para o imposto “modificado" sobre a renda, mais será estimulado o investimento. Empresa estatal

Um bom exemplo é fornecido pela remoção de bairros-de-lata. As autoridades retiraram gradualmente de utilização certo número de edificações obsoletas, e aumentam assim o nível de investimento necessário para manter a capacidade de alojamento. Elas mesmas preencheram então a necessidade, construindo novas edificações, ao invés de estimular a iniciativa privada de construção. Além de estimular ou desencorajar o investimento privado, também a intervenção directa do

governo na esfera do investimento privado pode ser utilizada. A diminuição do investimento privado pode ser feita através de controlos directos, como por  exemplo, o licenciamento do investimento. Isto terá uma vantagem especial em comparação com os métodos “globais” acima descritos, se o investimento é bastante “elevado” (isto é, se cria grande capacidade ociosa) em determinado sector. Por outro lado, se o investimento privado é inadequado, a deficiência pode ser sanada pela entrada do próprio governo nessa esfera. Empresas de propriedade do Estado podem ser criadas, e executarão a sua função na medida em que as empresas privadas sejam incapazes de fazê-lo. Este método tem também uma vantagem  particular quando a deficiência de investimento privado pr ivado tem pronunciado carácter sectorial. Investimento público versus subsídios ao consumo

O nível da taxa de investimento privado no longo prazo, discutido acima, tem uma importante influência sobre o montante da despesa governamental necessária para atingir o pleno emprego, nas alíquotas de tributação existentes (10). A despesa programada do governo deve situar-se numa escala que, em combinação com o investimento adequado para expandir a capacidade  produtiva pari passu com o aumento populacional e de produtividade do trabalho, estabeleça o  pleno emprego. Vamos agora, por outro lado, considerar como se pode distribuir a despesa programada entre investimento público, em sentido estrito (estradas, hospitais, escolas, etc.) (11) e subsídios ao consumo privado. Afirma-se frequentemente que o programa de despesa deve ser totalmente destinado ao investimento público e não há objecção a este ponto de vista quanto ao aspecto da criação de suficiente demanda efectiva. Mas o hiato a ser coberto por esta despesa governamental pode ser  tão grande que o investimento público logo se tornará totalmente, ou quase totalmente, inútil. Em tal caso seria absurdo restringir o programa de despesa do governo ao investimento público, quando um padrão de vida mais elevado pode ser atingido destinando-se uma parte dessa despesa ao aumento do consumo. O princípio geral deveria ser o de que as prioridades sociais devem decidir a natureza do  programa de despesa governamental. gov ernamental. Ter de se decidir, por exemplo, ex emplo, o que é mais importante num determinado ano, se construir mais piscinas ou fornecer mais leite às crianças. Estas decisões podem ser, em grande medida, afectadas por factores políticos. Apesar disso, o  princípio das prioridades sociais eliminará, em todos casos, projectos tais como a construção de cinco pontes num único braço de rio com o mero propósito de criar emprego. Deve-se acrescentar que se o investimento no “sector privado” (no qual o governo até pode ter   participação) aumenta, digamos, por exemplo, como resultado da remoção de bairros-de-lata, o montante da despesa do governo em investimento público “puro” e subsídio ao consumo, necessário para atingir o pleno emprego, será diminuído pro tanto. II) Estímulo ao investimento privado O processo e suas consequências

Vamos agora considerar o estímulo ao investimento privado como um caminho para se atingir e manter o pleno emprego. Dentro desta concepção, o investimento privado será estimulado (por 

um dos métodos acima descritos) em tal grau, que a demanda efectiva criada directa e indirectamente (efeito multiplicador) por ele estabelece o pleno emprego. Já mostrámos que, se o  pleno emprego é atingido por meio do gasto deficitário, podem p odem ser necessárias medidas adicionais para estimular o investimento privado. No entanto, esta assistência ao investimento  privado não tem como objectivo criar demanda efectiva, efe ctiva, essa meta é atingida pelo Orçamento Deficitário, a sua finalidade é garantir que o nível de investimento expandisse a capacidade  produtiva proporcionalmente ao crescimento a longo lon go prazo do nível de produção em pleno emprego. Mas não existe uma razão a priori para que o nível desta taxa de investimento “de equilíbrio” no longo prazo seja exactamente igual ao da taxa de investimento necessária para gerar suficiente demanda efectiva e estabelecer o pleno emprego. Até aqui temos suposto que quando este último nível é mais elevado, o que parece ser o caso mais provável, e que a diferença seria coberta pela despesa do governo financiada por empréstimos.  Na concepção acima considerada, o nível de d e investimento privado é levado até o ponto no qual cria demanda efectiva adequada para assegurar o pleno emprego. É claro que, se este nível exceder o necessário para expandir a capacidade produtiva  proporcionalmente ao produto de pleno emprego empre go haverá uma queda contínua do grau de utilização do equipamento e, portanto, uma elevação contínua da capacidade ociosa. Assim, uma  parte do investimento privado será desperdiçada. desperd içada. Além disso, a queda do grau de utilização do equipamento se reflectirá num declínio da taxa de lucro, que tenderá a deprimir o investimento  privado. Para evitar a queda da taxa de investimento, inv estimento, o que implicará, se não for compensada  pelo gasto do governo, uma depressão depress ão cumulativa da produção e do emprego, empr ego, será necessário fornecer um novo estímulo ao investimento (reduzir ainda mais a taxa de juros ou o imposto sobre a renda, ou então substituir num grau crescente o imposto de renda normal pelo imposto de renda “modificado”). Mas após certo período este problema reaparecerá e outra redução da taxa de juros, ou alguma outra medida, será necessária para estimular o investimento. Chegamos assim à conclusão de que para atingir o pleno emprego apenas através do investimento privado,  poderá ser necessário estimulá-lo de forma cumulativa (isto se o nível de investimento que cria demanda efectiva for mais elevado que o nível de investimento que expande o equipamento pari  passu com a produção de pleno emprego). A “intensificação” de capital

Alguns economistas podem objectar que levar o nível de investimento além do necessário para expandir a capacidade produtiva pari passu com a produção de pleno emprego irá criar  capacidade ociosa, mas que levaria ao invés a uma maior utilização de capital em relação ao trabalho. E, argumentariam eles, que isso resultará num aumento da produtividade do trabalho e consequentemente do padrão de vida. A ideia de que a redução da taxa de juros estimula a aplicação de mais capital por trabalhador   baseia-se no pressuposto que a produção planejada do empresário empres ário investidor é dada. Sob esta condição, uma menor taxa de juros torna mais lucrativa a utilização de mais capital e menos trabalho. Se contudo supormos que o capital disponível para uma firma financiar seu investimento é dado, quando se planeja o investimento a redução da taxa de juros não tem influência sobre a escolha do método de produção, porque irá afectar os lucros líquidos esperados de modo igual, qualquer que seja o método de produção adoptado. De facto, as condições reais são representadas por algo intermediário entre essas duas alternativas, porque a imperfeição do mercado de produtos limita em certa medida a produção planejada e a

imperfeição do mercado de capitais limita o capital disponível. Assim, a redução da taxa de juros tenderia, teoricamente, a induzir mais o investimento de capital-intensivo, mas de forma alguma na extensão que frequentemente se supõe. Na prática, mesmo esta influência é duvidosa. O  principal estímulo à utilização de mais capital por trabalhador é dado pelas novas invenções. A vantagem que elas oferecem é normalmente tão elevada que serão adoptadas a qualquer que seja, dentro de certo intervalo, o nível da taxa de juros. Isto explica por que as fábricas construídas em  países atrasados, onde a taxa tax a de juros é elevada, são normalmente tão modernas quanto as dos velhos países capitalistas onde a taxa de juros é bastante mais baixa. Em tais condições é duvidoso se as reduções moderadas da taxa de juros estimularão a aplicação de mais capital por  trabalhador, em grau considerável. Temos suposto até aqui que o investimento é estimulado pela redução da taxa de juros. Entretanto, mostrou-se anteriormente que este método não é muito eficiente, porque a taxa de  juros de longo prazo se modifica bastante bas tante lentamente e (mais importante) não pode ser reduzida reduz ida além de certo limite. Por esta razão, sugerimos anteriormente que uma forma mais eficiente de estimular o investimento privado seria reduzir a pressão do imposto sobre a renda,  particularmente substituindo-o por um imposto “modificado" sobre a renda ou um imposto sobre o capital. É fácil perceber que, se o investimento é estimulado desta forma, não há influência sobre a intensidade de capital de modo algum. Com efeito, se a produção planejada pelos empresários investidores ou o capital disponível para financiar o investimento é dado, a redução da pressão do imposto de renda não afectará a escolha do tipo de equipamento. Pois o método de  produção que propícia o lucro mais elevado elev ado antes da tributação, dará também o lucro líquido mais elevado após o imposto sobre a renda. Tentámos mostrar acima que uma redução da taxa de juros ou da pressão do imposto de renda não parece contribuir significativamente para a “intensificação” de capital. Apesar de isso, uma aceleração do aumento de produtividade pode ser obtida subsidiando-se a modernização do equipamento, por exemplo, fornecendo crédito barato para projectos submetidos à aprovação de um órgão governamental. Mas esta não é a única forma de se atingir a modernização desejada. Podem ser criadas empresas modernas de propriedade estatal para forçar, através da concorrência, uma melhoria dos métodos de produção das firmas privadas. Mas tais actividades não se devem guiar unicamente pelo desejo de se atingir o pleno emprego através do investimento no “sector privado”. É apenas para que a aceleração da modificação técnica tenha  prioridade social, sobre o investimento público (em sentido s entido estrito) e subsídios ao consumo, que tais esquemas devem ser utilizados. As deficiências do método

As dificuldades encontradas para se atingir o pleno emprego através do estímulo ao investimento  privado reflectem o erro fundamental desta concepção. O papel próprio do investimento privado é o de fornecer instrumentos para a produção de bens de consumo, e não o de propiciar trabalho suficiente para empregar toda a mão-de-obra disponível. Há uma estreita analogia entre este  problema e a questão do investimento público versus subsídio ao consumo no programa de gasto governamental. O investimento, público e privado, deve ser efectuado apenas na medida em que é considerado útil. Se a demanda efectiva criada dessa forma não leva à obtenção do pleno emprego, o hiato deve ser preenchido pelo aumento do consumo e não por uma indesejada

acumulação de capital público ou privado. Além desse ponto fundamental, deve-se mencionar uma desvantagem técnica, mas importante, desse método. A despesa do governo nunca deixará de atingir imediatamente o efeito desejado sobre o emprego, se for de escala suficientemente grande, pois cria demanda efectiva directamente. Os efeitos dos estímulos ao investimento privado dependem, entretanto, da reacção dos empresários, e é bem possível que, estando estes com uma disposição muito pessimista, não respondam até mesmo a estímulos consideráveis. Isto pode acontecer, por exemplo, se não sentem confiança na situação política. Concluímos assim que, seja por motivos de princípio, seja por motivos técnicos, uma política que tente atingir o pleno emprego num país industrial exclusivamente pelo estímulo ao investimento privado não pode ser vista como satisfatória. III) Redistribuição de renda Redistribuição e demanda efectiva

A redistribuição de renda é o terceiro caminho frequentemente sugerido para se atingir o pleno emprego. A ideia subjacente é a de que quando a renda é transferida dos que recebem renda mais elevada para os que recebem renda mais baixa, o consumo total aumenta, porque o pobre tem maior propensão a consumir do que o rico. Se, por exemplo, aumentarmos o imposto sobre a renda dos ricos e simultaneamente reduzirmos a tributação dos bens essenciais ou semi-essenciais de consumo na mesma extensão, ou se pagarmos igual montante de auxílios às famílias, aumentamos a propensão média a consumir. O factor de complicação que frequentemente é deixado fora de consideração é a influência depressiva que a elevação do imposto de renda exerce sobre o investimento privado. Levaremos em conta essa influência, no argumento subsequente. Deve-se notar que, se os recursos  provenientes do imposto sobre a renda são s ão utilizados, não para subsidiar o consumo con sumo privado, mas  para investimento público, isto também aumentará a demanda efectiva, ef ectiva, desde que o investimento  privado não seja afectado. Pois, Pois , enquanto uma parte da renda afectada pelo novo tributo era  poupada, todos os recursos recurs os provenientes do tributo são gastos em bens b ens de investimento. Assim, a demanda por bens de investimento cresce mais do que caiu a demanda por bens de consumo. O uso do imposto “modificado”

Começamos as nossas considerações a partir do facto de já sabermos antecipadamente qual deveria ser o nível de investimento privado no pleno emprego. O nível deve ser tal que elevasse a capacidade do capital de equipamento pari passu com o aumento da população e da  produtividade do trabalho. Agora, é fácil perceber perceb er quais as duas condições que devem ser   preenchidas para que se atinja a tinja o pleno emprego através da incidência de um maior imposto sobre s obre a renda: 1) o imposto sobre as rendas mais elevadas deve ser fixado num nível tal que o seu estímulo sobre a demanda efectiva conjugado com o nível de investimento privado, acima especificado, produza o pleno emprego; 2) o investimento privado deve ser mantido no nível especificado, ou através de uma a taxa de juros fixada o suficientemente baixo (o que pode ser  difícil) ou, em alternativa, preferivelmente, através a cobrança de parte suficiente do imposto de renda sob a forma modificada (ou substituíção por um imposto sobre o capital).

Imagine-se, por exemplo, um aumento conjunto da população e da produtividade do trabalho de 2,5 % ao ano. Assim, nosso objectivo quanto ao investimento privado deve ser tal que ele expanda a capacidade do equipamento de capital também a 2,5 % ao ano. Imagine-se ainda que, existindo esse nível de investimento privado, um imposto de renda de 10 xelins, dos quais 5 xelins por libra são postos numa base modificada, estabelecerá a demanda efectiva adequada  para assegurar o pleno emprego. e mprego. Além disso, a “modificação” do imposto de renda numa num a medida de 5 xelins permitirá, suponhamos a manutenção do investimento privado no nível requerido. É claro que num caso desses nosso problema está resolvido. Os Limites da tributação

Vemos que um imposto de renda suficientemente elevado fornece uma solução praticável para o  problema do pleno emprego, sob a condição condiç ão de que uma parte adequada do imposto seja colocada numa base “modificada” (ou substituída por um imposto sobre o capital). Deve-se notar  que o montante de gasto do governo necessário para criar o pleno emprego, ceteris paribus, é mais elevado no “sistema do imposto de renda” se comparado ao caso em que se utiliza o gasto deficitário. Pois a tributação, ao contrário do gasto deficitário, tende a reduzir o consumo das  pessoas tributadas e assim apenas estimula a demanda d emanda efectiva na medida em que recai sobre a  poupança. A vantagem do “sistema do imposto de renda” sobre uma “política de défice orçamental” pode ser vista no facto de que ele não assegura apenas o pleno emprego, mas ao mesmo tempo  proporciona maior igualdade na distribuição de renda re nda (após a tributação). Mas claramente por essa razão, o “pleno emprego através da tributação” deve provavelmente encontrar uma oposição muito mais forte do que uma “política de défice orçamental”. Não se  pode, portanto, fazer qualquer escolha es colha definitiva entre o método de défice do orçamento e o método do imposto de renda. O imposto de renda pode ser levado tão longe quanto for   praticamente possível, mas, depois que isso tenha sido feito, não se deve hesitar em ter  adicionalmente o défice orçamental se este ainda for necessário para atingir e manter o pleno emprego. A questão salarial

O problema dos aumentos de salário acima do aumento da produtividade do trabalho está estreitamente ligado às matérias discutidas nesta secção. Imagine-se que partimos de uma posição em que, além da influência do imposto de renda existente, algum défice orçamental é necessário para manter o pleno emprego. Imagine-se, além disso, que ocorreu um aumento nas taxas salariais maior que o aumento na produtividade do trabalho. Para que os preços possam permanecer estáveis dão-se subsídios para contrabalançar o aumento dos custos salariais. Esses subsídios são financiados pelo imposto sobre a renda. É fácil  perceber que haverá, apesar ap esar disso, algum aumento do consumo. consumo . Pois o consumo dos assalariados crescerá mais que a redução do consumo dos que recebem rendas mais altas (afectados pelo imposto de renda), uma vez que a propensão a consumir destes últimos é mais baixa que a dos assalariados. Em outras palavras: a redistribuição de renda das classes de rendas mais altas para as de renda mais baixa aumenta a demanda efectiva. Por outro lado, a oferta de bens de consumo numa economia de pleno emprego só pode ser aumentada à custa do investimento que, no entanto, se pode supor, esteja fixado no nível considerado necessário para o avanço normal da

economia. Assim, para contrabalançar a tendência ao crescimento do consumo, o novo imposto sobre a renda deve ser mais elevado apenas o necessário para financiar os subsídios; o défice orçamental cairá na medida desse excesso. A elevação de salários com os preços mantidos num nível estável causará um deslocamento da “política de défice orçamental” para o “sistema de imposto de renda”. O aumento do imposto de renda deve, obviamente, ser acompanhado de medidas que evitem que o investimento privado seja afectado. Esta discussão mostra que, provavelmente, a negociação por salários tem o seu carácter alterado no pleno emprego. Ela terá de estar ligada à “exigência” por um maior imposto sobre as rendas mais elevadas, e assim relacionará, mais estreitamente, a política dos sindicatos com a política económica geral. Veremos abaixo que isto também é verdade quando os preços são mantidos constantes não por subsídios mas por controlo de preços. A “compressão” das margens de lucro

Consideramos até aqui a redistribuição de rendas por meio da tributação. No entanto, também é  possível redistribuir a renda, antes da tributação, através do controlo de preços. Se os preços dos  bens de consumo são reduzidos, red uzidos, enquanto os salários permanecem constantes, cons tantes, haverá um deslocamento dos lucros reais para os salários reais, mais ou menos equivalente àquele que seria obtido se os preços dos bens de consumo se mantivessem constantes e os salários aumentassem de forma correspondente. Assim tal política, desde que acompanhada de medidas para manter o investimento privado num nível adequado, será tão efectiva quanto o imposto de renda para atingir o pleno emprego. No entanto, este método aplicado como política geral, será do ponto de vista administrativo, inferior ao da redistribuição de rendas pela tributação, que resolve o  problema de uma só vez. Por outro lado, se os monopólios industriais ficarem sob controlo de preços haverá grandes oportunidades de se reduzirem suas margens de lucro e a medida em que isso ocorrer no sector  de bens de consumo mais contribui para a solução do problema do pleno emprego. A função deixada para o imposto de renda e para a despesa do governo, financiada por empréstimos, será então correspondentemente menor. As margens de lucro podem ser reduzidas não apenas pelas reduções de preços, mas também  pelo aumento dos salários, enquanto que os preços são mantidos constantes. constantes . Na página anterior  consideramos o problema dos aumentos salariais numa economia de pleno emprego e adoptamos o pressuposto que os preços eram mantidos constantes através de subsídios financiados pelo imposto de renda. Uma alternativa é manter os preços constantes através do controle de preços. A sua desvantagem é que a pressão por salários mais elevados provavelmente não se restringirá às indústrias onde as margens de lucro são relativamente altas, e, desta forma, manter os preços constantes, sem subsidia-los, pode ser frequentemente difícil. Contudo podemos imaginar uma mistura das duas políticas e deste é modo importante perceber quais serão as implicações dos aumentos salariais com os preços mantidos constantes numa economia de pleno emprego. Como no caso anterior, em que os preços eram mantidos através de subsídios financiados pelo imposto de renda, ocorrerá uma redistribuição de renda dos grupos de renda mais elevada para os de renda mais baixa, os salários ficaram mais altos e os lucros cairão pro tanto. Isto tenderá a aumentar a demanda efectiva e, portanto, em pleno emprego, será necessário cortar o consumo

dos grupos de rendas mais elevadas. Assim, adicionalmente ao deslocamento de lucros para salários, deve ser cobrado um imposto de renda adequado para reduzir portanto o défice orçamental. Aqui há uma perfeita analogia com o caso alternativo de subsídios contrabalançando os aumentos salariais. Ao deslocamento de renda dos contribuintes do imposto de renda (pelos quais os subsídios são financiados) para os assalariados, corresponde agora, no caso considerado de controlo de preços, a um deslocamento directo dos lucros para os salários. O excesso do novo imposto de renda, além do nível necessário para financiar os subsídios, corresponde agora à incidência do imposto de renda em adição ao necessário para o controlo de preços. Em ambos os casos o défice orçamental é reduzido pelo montante de imposto de renda “extra” que se tem de cobrar para contrabalançar o efeito da redistribuição de renda sobre o consumo. O caso presente também envolve o relacionamento da negociação dos sindicatos com a negociação económica geral. Então: A) deve-se impedir o aumento dos preços, através do controle de preço, embora os custos sejam elevados; B) o imposto de renda deve ser cobrado adicionalmente. Conclusões

O Orçamento Deficitário, como consequência do investimento público e dos subsídios ao consumo popular, quer seja através do “gasto deficitário” ou através de financiamento por um aumento do imposto de renda, é sempre capaz de assegurar o pleno emprego. A despesa deve ser  maior no último caso devido à pressão do imposto de renda sobre o consumo dos contribuintes.  Na prática, o financiamento da despesa pelo p elo imposto de renda, que tem a vantagem de não assegurar apenas mais empregos mas também de reduzir a desigualdade na distribuição da renda (após a tributação), deveria ser levado tão longe quanto fosse politicamente possível e se for  insuficiente para assegurar o pleno emprego, a Despesa deveria ser expandida o quanto fosse necessário por meio de empréstimo. O corte das margens de lucro sob a forma de redução do  preço dos bens de consumo consu mo ou de aumentos salariais com preços constantes, cons tantes, compreendido dentro do quadro do controle de preços, também aumentará a demanda efectiva e tomará, assim, mais fácil a tarefa do gasto do governo para assegurar o pleno emprego. O investimento privado deve ser empurrado até o nível suficiente para expandir a capacidade  produtiva pari passu com o aumento da população e produtividade do trabalho. Isto pode ser  conseguido tornando uma parte do imposto de renda sujeita à modificação que elimina a sua influência adversa sobre a rentabilidade líquida (ou substituir parte do imposto de renda por um imposto sobre o capital) (12). Além disso, pode ser vantajoso ou mesmo necessário para o governo levar a cabo investimentos no sector privado (por exemplo, remoção de bairros-de-lata). O gasto do governo, em investimento público ou em subsídios ao consumo popular (financiados  por imposto de renda ou por empréstimos), empréstimos ), deve ser tal que, em combinação com esse nível n ível de investimento privado, crie o pleno emprego. A distribuição da despesa governamental entre investimento público e subsídio ao consumo deve-se basear no princípio das prioridades sociais.

View more...

Comments

Copyright ©2017 KUPDF Inc.
SUPPORT KUPDF