Materiais Compósitos

September 19, 2017 | Author: Soares Vinícius | Category: Composite Material, Materials, Nature, Engineering, Science
Share Embed Donate


Short Description

Introdução aos materiais Compósitos....

Description

Autores Marcelo F.S.F. de Moura, Alfredo B. de Morais, António G. de Magalhães Título Materiais Compósitos - Materiais, Fabrico e Comportamento Mecânico Editor Publindústria, Edições Técnicas Praça da Corujeira n.º 38 . 4300-144 PORTO www.publindustria.pt Distribuidor Engebook - Conteúdos de Engenharia e Gestão Tel. 220 104 872 . Fax 220 104 871 . E-mail: [email protected] . www.engebook.com DESIGN Publindústria, Produção de Comunicação, Lda.

Copyright © 2010 | Publindústria, Produção de Comunicação, Lda. Todos os direitos reservados a Publindústria, Produção de Comunicação, Lda. Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida, no todo ou em parte, sob qualquer forma ou meio, seja electrónico, mecânico, de fotocópia, de gravação ou outros sem autorização prévia por escrito do autor.

CDU 624 061

Engenharia Estrutural. Materiais Compósitos.

ISBN (eBook) 978-972-8953-73-7 Engebook – Catalogação da publicação Família: Mecânica Subfamília: Materiais/Metalurgia

ÍNDICE

Índice

Prefácio 1. INTRODUÇÃO AOS MATERIAIS COMPÓSITOS 1.1. Perspectiva global dos compósitos e suas aplicações 1.2. Reforços 1.2.1. Fibras de vidro 1.2.2. Fibras de carbono 1.2.3. Fibras aramídicas 1.2.4. Fibras de boro 1.2.5. Outros tipos de reforços 1.3. Formas que podem apresentar os reforços 1.3.1. Roving 1.3.2. Mantas 1.3.3. Tecidos 2D 1.3.3.1. Tecidos entrelaçados (woven fabrics) 1.3.3.2. Tecidos quase unidireccionais 1.3.3.3. Tecidos híbridos 1.3.4. Malhas (knitted fabrics) 1.3.5. Tecidos 3D 1.3.6. Entrançados (braids) 1.3.7. Pré-formas 1.4. Matrizes 1.4.1. Temperaturas de transição 1.4.2. Temperatura de deflexão sob carga 1.4.3. Matrizes termoplásticas

1 1 9 9 11 13 14 15 16 16 16 17 17 18 18 18 19 19 17 21 22 23 24

iii

MATERIAIS COMPÓSITOS

1.4.3.1. Polipropileno (PP) 1.4.3.2. Poliamida (PA) 1.4.3.3. Policarbonato (PC) 1.4.3.4. Poli-éter-éter-cetona (PEEK) 1.4.3.5. Poliimidas termoplásticas 1.4.3.6. Polisufureto de fenileno (PPS) 1.4.4. Matrizes termoendurecíveis 1.4.4.1. Poliesteres insaturados 1.4.4.2. Resinas de vinilester 1.4.4.3. Resinas fenólicas 1.4.4.4. Resinas de epóxido 1.4.4.5. Bismaleimidas 1.4.4.6. Poliimidas termoendurecíveis 1.5. Semi-produtos 1.5.1. Compostos de moldação 1.5.1.1. SMC (sheet molding compound) 1.5.1.2. TMC (thick molding compound) 1.5.1.3. DMC (dough molding compound) 1.5.1.4. Compostos termoplásticos 1.5.2. Pré-impregnados 1.6. Cargas e outros aditivos 1.7. Conclusão Questões Referências 2. PROCESSAMENTO DE MATERIAIS COMPÓSITOS 2.1. Moldação por contacto 2.1.1. Moldação manual 2.1.2. Moldação por projecção 2.2. Moldação por vácuo 2.3. Moldação por compressão 2.3.1. Moldação por compressão a frio 2.3.2. Moldação por compressão a quente 2.4. Moldação por injecção 2.5. Moldação por injecção a baixa pressão e por transferência 2.5.1. RTM (Reaction Transfer Moulding) 2.5.2. SRIM (Structural Reaction Injection Moulding) 2.5.3. RRIM (Reinforced Reaction Injection Moulding) 2.6. Moldação em autoclave 2.7. Enrolamento filamentar 2.8. Pultrusão 2.9. Moldação por centrifugação 2.10. Moldação em contínuo 2.11. Maquinagem de materiais compósitos iv

24 24 25 25 25 26 27 27 28 28 29 29 30 31 31 31 31 32 32 32 33 34 34 35 37 38 38 40 41 43 44 44 45 48 48 50 50 51 54 56 57 58 59

ÍNDICE

2.11.1. Furação de materiais compósitos 2.11.2. Corte de materiais compósitos 2.12. Reciclagem de materiais compósitos Questões Referências

60 62 63 64 64

3. LEIS CONSTITUTIVAS DA CAMADA 3.1. Introdução 3.2. Análise geral de sólidos anisotrópicos 3.3. Ortotropia e isotropia transversal 3.4. Constantes de Engenharia da camada 3.5. Lei constitutiva tridimensional 3.6. Lei constitutiva para estado plano de tensão Referências

67 67 68 71 75 78 82 89

4. ANÁLISE MICROMECÂNICA DA CAMADA 4.1. Introdução 4.2. Análise das constantes de engenharia 4.2.1. Modelos de mecânica dos materiais 4.2.2. Modelo auto-consistente 4.2.3. Limites superior e inferior 4.2.4. Modelos semi-empíricos 4.2.5. Método das células 4.2.6. Conclusão 4.3. Análise das resistências 4.3.1. Resistência longitudinal à tracção 4.3.2. Resistência longitudinal à compressão 4.3.3. Conclusão Referências

91 91 92 93 97 98 101 102 106 108 111 119 126 127

5. CRITÉRIOS DE ROTURA DA CAMADA 5.1. Introdução 5.2. Critérios não-interactivos 5.3. Critérios interactivos 5.4. Critérios parcialmente interactivos 5.5. Conclusão Referências

131 131 132 134 137 143 144

6. ANÁLISE DOS COMPÓSITOS DE FIBRAS CURTAS 6.1. Introdução 6.2. Compósitos de fibras alinhadas 6.2.1. Modelo de Kelly-Tyson 6.2.2. Modelo de Cox 6.3. Compósitos de fibras com orientação aleatória

147 147 148 149 151 156 v

MATERIAIS COMPÓSITOS

Referências

160

7. ANÁLISE DOS LAMINADOS 7.1. Introdução 7.2. Teoria clássica dos laminados 7.2.1. Relações esforços-deformações de alguns laminados 7.2.2. Constantes de engenharia de laminados simétricos 7.2.3. Análise da resistência de laminados 7.3. Teorias avançadas dos laminados 7.3.1. Teorias de deformação globais 7.3.2. Teorias de deformação locais 7.3.3. Teorias de deformação globais-locais Referências

163 163 164 170 175 178 184 184 187 187 188

8. EFEITOS HIGROTÉRMICOS E VISCOELÁSTICOS 8.1. Introdução 8.2. Efeitos higrotérmicos 8.2.1. Degradação de propriedades 8.2.2. Leis constitutivas com efeitos higrotérmicos 8.3. Viscoelasticidade linear 8.3.1. Princípio da sobreposição de Boltzmann 8.3.2. Modelos de comportamento viscoelástico 8.3.3. Análise quase-elástica 8.3.4. Solicitações sinusoidais e notação complexa 8.3.5. Princípio de equivalência tempo-temperatura Referências

191 191 193 193 196 204 204 205 209 210 213 216

9. MECÂNICA DA FRACTURA 9.1. Introdução 9.2. Fundamentos de Mecânica da Fractura 9.2.1. Teoria de Griffith 9.2.2. Extensão da teoria de Griffith 9.2.3. Factor intensidade de tensão e tenacidade à Fractura 9.2.4. Relação entre G e K 9.2.5. Modos de solicitação 9.2.6. Teoria da densidade de energia de deformação 9.3. Aplicação da mecânica da fractura aos compósitos 9.3.1. Fractura intralaminar 9.3.1.1. Factor intensidade de tensão e taxa de libertação de energia 9.3.1.2. Processo de rotura micromecânica em compósitos 9.3.1.3. Teoria da densidade de energia de deformação 9.3.2. Fractura interlaminar 9.3.2.1. Obtenção da taxa crítica de libertação de energia em modo I 9.3.2.2. Obtenção da taxa crítica de libertação de energia em modo II

221 221 222 222 225 226 228 230 234 236 237 237 239 241 243 243 248

vi

ÍNDICE

9.3.2.3. Modo Misto 249 9.4. Métodos numéricos aplicados à fractura interlaminar 9.4.1. Método do fecho virtual de fenda 9.4.2. Elementos finitos de interface Referências

252 252 254 258

10. TÓPICOS AVANÇADOS EM MATERIAIS COMPÓSITOS 10.1. Efeito de bordo 10.1.1. Laminados tipo (0, 90) 10.1.2. Laminados tipo (+T, -T) 10.1.3. Análise teórica de laminados 10.1.4. O ensaio de provetes delaminados nos bordos 10.2. Critérios de rotura para compósitos com furo e entalhes 10.3. Impacto em compósitos 10.3.1. Impacto de baixa velocidade 10.3.1.1. Ensaios de impacto de baixa velocidade 10.3.1.2. Métodos experimentais usados para a detecção do dano 10.3.1.3. Dano causado por impacto de baixa velocidade 10.3.1.4. Modelação 10.3.1.4.1. Força de impacto 10.3.1.4.1.1. Modelo do balanço energético 10.3.1.4.1.2. Modelo de massa e mola 10.3.1.4.1.3. Distribuição espacial da força de contacto 10.3.1.4.2. Previsão do dano causado pelo impacto 10.3.2. Impacto de alta velocidade 10.3.3. Parâmetros fundamentais na resistência ao impacto 10.3.4. Resistência residual após impacto 10.4. Fadiga em compósitos 10.4.1. Mecanismos de dano 10.4.2. Factores que afectam o comportamento à fadiga 10.4.3. Modelos 10.4.3.1. Modelos de previsão da vida à fadiga 10.4.3.2. Modelos fenomenológicos 10.4.3.2.1. Modelos de rigidez residual 10.4.3.2.2. Modelos de resistência residual 10.4.3.2.3. Modelos de dano progressivo Referências

261 261 262 263 264 265 268 273 273 274 276 277 279 279 279 281 282 283 287 289 291 295 295 298 299 300 301 301 302 303 305

11. ENSAIOS MECÂNICOS 11.1. Introdução 11.2. Ensaios de tracção 11.3. Ensaios de compressão 11.4. Ensaios de corte 11.4.1. Ensaio de tracção de laminados ±45º

311 311 312 316 320 320 vii

MATERIAIS COMPÓSITOS

11.4.2. Ensaio de tracção de laminados unidireccionais a 10º 11.4.3. Ensaios de corte em calha 11.4.4. Ensaio Iosipescu 11.4.5. Ensaio de torção de placas 11.4.6. Ensaio de torção de tubos de paredes finas 11.5. Ensaios de flexão 11.6. Medição das propriedades na direcção da espessura 11.7. Ensaios de fractura 11.7.1. Modo I 11.7.2. Modo II 11.7.3. Modo misto I-II 11.7.4. Laminados multidireccionais Referências 12. LIGAÇÕES EM MATERIAIS COMPÓSITOS 12.1. Ligações aparafusadas e rebitadas 12.1.1. Características 12.1.2. Modos de rotura 12.1.3. Modelação 12.2. Ligações coladas 12.2.1. Características 12.2.2. Procedimentos de execução de uma ligação colada 12.2.3. Tipos de adesivos 12.2.4. Modos de rotura 12.2.5. Modelação 12.2.6. Regras de projecto de uma ligação colada 12.3. Ligações por fusão Referências

viii

321 322 324 325 326 327 330 333 333 335 337 338 340 345 346 346 347 349 352 352 354 356 361 363 366 367 368

PREFÁCIO

Prefácio

Os materiais compósitos iniciaram a sua caminhada de sucesso em meados do século 20 e daí em diante a sua expressão industrial não mais parou de crescer. Desde artigos simples, utilizados quotidianamente por todos nós, até aplicações em estruturas e componentes para a indústria aeronáutica e aeroespacial, os materiais compósitos ocupam actualmente um lugar destacado entre os materiais de engenharia. Isto deve-se naturalmente às vantagens que possuem relativamente aos materiais tradicionais, entre as quais sobressaem a facilidade de processamento, a elevada rigidez e resistência mecânica e o baixo peso específico dos compósitos de matriz polimérica. Por conseguinte, são eles o objecto de estudo neste livro. O primeiro capítulo apresenta exemplos particularmente significativos da aplicação de materiais compósitos em diversos domínios e descreve as características dos constituintes principais, com ênfase nos tipos de fibras e de matrizes mais utilizados. Um factor decisivo na disseminação dos compósitos é a existência de técnicas de fabrico que dão ao projectista uma enorme liberdade de concepção e a garantia da competitividade do produto final. As técnicas de processamento são por isso descritas detalhadamente no capítulo 2. Os capítulos 3 a 7 tratam os aspectos essenciais do comportamento mecânico. Os materiais compósitos de alto desempenho são frequentemente constituídos por várias camadas reforçadas com fibras contínuas. No capítulo 3 são formuladas as relações entre tensões e deformações da camada, tratada como um sólido anisotrópico

ix

MATERIAIS COMPÓSITOS

homogéneo, abordagem que se designa por macromecânica. Todavia, a compreensão do comportamento mecânico requer uma análise à escala microscópica, objecto dos modelos micromecânicos que são apresentados no capítulo 4. Além disso, a natureza heterogénea ao nível microscópico é responsável pela existência de vários modos de rotura. O capítulo 5 aborda precisamente a previsão da rotura da camada, matéria de grande complexidade. Sendo a utilização de fibras contínuas fundamental para a obtenção de elevadas propriedades mecânicas, em certas aplicações prevalecem a facilidade de processamento e o menor custo dos compósitos de fibras curtas. Os fundamentos do seu comportamento micro e macromecânico são tratados no capítulo 6, onde se constata que a rigidez e a resistência são muito inferiores aos da camada unidireccional de fibras contínuas na direcção longitudinal. Porém, os laminados unidireccionais apresentam propriedades na direcção transversal relativamente baixas. A solução para este problema passa pela utilização de laminados constituídos por camadas com diferentes orientações. O seu comportamento é descrito habitualmente pela teoria clássica dos laminados, apresentada no capítulo 7. Para além dos esforços mecânicos, os materiais estão geralmente expostos a condições de humidade e temperatura que influenciam o seu comportamento. O estudo dos chamados efeitos higrotérmicos assume particular relevância nos compósitos de matriz polimérica, dado que as matrizes têm um carácter acentuadamente viscoelástico, que se manifesta por exemplo em fenómenos de fluência e relaxação. Estes assuntos são objecto de estudo no capítulo 8. Os progressos nos meios computacionais de projecto e as exigências crescentes de competitividade económica têm diminuído a margem de segurança no projecto de estruturas. Em muitos casos, é actualmente admissível a presença de defeitos, desde que a sua evolução e efeitos na resistência possam ser previstos no sentido de evitar a rotura catastrófica. Isto constitui o domínio da Mecânica da Fractura, cujas aplicações aos compósitos são apresentadas no capítulo 9. Por outro lado, a natureza laminada dos compósitos de elevado desempenho gera um conjunto particularidades no seu comportamento, de que é exemplo significativo a sensibilidade ao impacto. Estes aspectos mais avançados do comportamento mecânico são analisados no capítulo 10. As aplicações estruturais exigem um conhecimento preciso do comportamento mecânico dos materiais, que é geralmente obtido em ensaios de amostras. Há actualmente um conjunto significativo de ensaios que são objecto de normas internacionais. Porém, como veremos no capítulo 11, subsistem dificuldades importantes na determinação de várias vertentes do comportamento mecânico complexo dos compósitos.

x

PREFÁCIO

Finalmente, o capítulo 12 é dedicado às ligações de materiais compósitos. A necessidade de efectuar ligações pode dever-se a razões tão diversas como limitações nas dimensões ou formas das peças, requisitos de desmontabilidade ou realização de reparações. No caso dos laminados, as ligações aparafusadas e rebitadas interrompem a continuidade das fibras e favorecem danos localizados. Por conseguinte, assumem particular importância as ligações coladas com adesivos estruturais. Como se depreende deste breve resumo, este livro descreve detalhadamente o comportamento mecânico e os modelos usados para o cálculo de estruturas compósitas. Trata-se de um assunto que é de relevância crescente para os profissionais das Engenharias Mecânica, Civil, Aeronáutica e outras afins. De facto, a temática dos materiais compósitos consta actualmente dos planos de estudos das licenciaturas e dos mestrados naqueles domínios. A profundidade com que os assuntos são tratados neste livro é consistente com as exigências de uma disciplina de mestrado. Todos os capítulos têm por base uma revisão bibliográfica extensa da literatura internacional, incluindo artigos científicos nas mais prestigiadas revistas sobre materiais compósitos. Por outro lado, este livro pode servir de base à leccionação de disciplinas que tratem os materiais compósitos a outros níveis. Assim, para uma disciplina de introdução aos materiais serão úteis conhecimentos transmitidos nos capítulos 1 e 2. Além disso, os capítulos 4.1, 4.2.1, 6.1 e 6.2.1 proporcionarão um entendimento básico do comportamento mecânico. No caso de uma disciplina de materiais compósitos de licenciatura, recomendam-se os capítulos 1 a 8 e 11.1 a 11.5. A preparação deste livro assenta evidentemente na formação e na experiência de mais de uma década dos autores em materiais compósitos. De facto, sendo todos licenciados e doutorados em Engenharia Mecânica, os seus trabalhos de doutoramento foram dedicados a diferentes aspectos do comportamento mecânico de materiais compósitos. Para além da experiência na leccionação de disciplinas sobre compósitos, os autores têm também realizado vários trabalhos de investigação nesta área publicados em revistas científicas internacionais. Os autores têm também em comum o facto de terem sido alunos de licenciatura e de doutoramento de António Torres Marques, Professor Catedrático da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, Departamento de Engenharia Mecânica e Gestão Industrial. O Professor António Torres Marques tem tido um papel preponderante no desenvolvimento de trabalhos de investigação sobre materiais compósitos em Portugal, sendo reconhecido actualmente como um dos grandes especialistas mundiais na matéria. Os autores querem expressar um voto de agradecimento ao Professor António Torres Marques pela colaboração prestada e pelo interesse na investigação que lhes incutiu.

xi

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

Capítulo 1

Introdução aos materiais compósitos

1.1. Perspectiva Global dos Compósitos e suas Aplicações Um material diz-se compósito quando resulta da combinação de dois ou mais materiais distintos. O exemplo clássico e mais vulgar são os compósitos fibrosos, isto é, que resultam da dispersão de fibras num material aglomerante, que se designa por matriz. A incorporação de fibras para melhorar as propriedades dos materiais tradicionais começou nos primórdios da história da humanidade. Um dos primeiros exemplos, referido no nti o esta ento, são os tijolos de argila reforçados com fibras de palha. Hoje em dia, o conjunto de materiais que se adjectivam de compósitos é muito vasto, e vão desde o vulgar betão armado até aos compósitos de elevado desempenho, à base de resinas de epóxido reforçadas com fibras contínuas de carbono. Uma das razões principais para as excelentes propriedades dos compósitos resulta do facto de as fibras apresentarem propriedades mecânicas muito superiores às dos materiais idênticos na forma maciça. Isto foi pela primeira vez demonstrado por Griffith 1.1 , que constatou que, na forma maciça, o vidro possuía tensões de rotura de cerca de 170 MPa, enquanto fibras de vidro com cerca de 20 μm de diâmetro alcançavam tensões de rotura de 3500 MPa. A tabela 1.1 apresenta propriedades de algumas fibras bem como de materiais na forma maciça, ilustrando de forma clara a importância das fibras na obtenção das elevadas propriedades mecânicas dos compósitos fibrosos.

1

MATERIAIS COMPÓSITOS

Tabela 1.1. Propriedades de fibras e de materiais na sua forma maciça, adaptada de [1.2] e [1.3].

Apesar do papel fundamental no desempenho dos compósitos, devido à pequena secção resistente, as fibras não podem ser directamente utilizadas em aplicações estruturais de engenharia. De facto, cabem à matriz as funções essenciais de dar forma estável ao compósito, de assegurar a distribuição eficiente de carga pelas fibras e de proteger as suas superfícies. Os materiais compósitos podem classificar-se segundo vários critérios, sendo precisamente o tipo de matriz um dos mais relevantes. Podemos então distinguir compósitos de matriz polimérica, metálica, cerâmica e cimentosa. A facilidade do processamento e a baixa densidade dos polímeros fazem com que os compósitos de matriz polimérica sejam actualmente os mais importantes em termos de desempenho e de campo de aplicações. Por conseguinte, são eles o objecto de estudo neste livro, em que se adopta uma perspectiva de caracterização do comportamento mecânico, tendo em vista aplicações estruturais e semi-estruturais. As fibras mais utilizadas em compósitos de matriz polimérica são as fibras de carbono, de vidro e de aramida, cujas características principais são descritas nos capítulos 1.2 e 1.3. Por seu turno, as matrizes podem ser termoplásticos, como o polipropileno, poliamida e o poli-éter-éter-cetena (PEEK), bem como resinas termoendurecíveis de poliester ou epóxidas, entre outras, conforme se verá no capítulo 1.4. As fibras e a matriz podem ser pré-combinadas, dando origem aos chamados semi-produtos (ver capítulo 1.5), que são posteriormente processados para a obtenção da peça compósito final mediante técnicas descritas no capítulo 2. Finalmente, no capítulo 1.6 faz-se referência a um conjunto de aditivos frequentemente presentes nos compósitos, tendo objectivos tão diversos como diminuir o custo, aumentar a tenacidade ou melhorar o comportamento ao fogo. Para concluir 2

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

esta secção, apresentam-se alguns exemplos ilustrativos da variedade e relevância das aplicações actuais dos compósitos. Como é evidente, os materiais compósitos alargam substancialmente o leque de opções que se colocam aos projectistas e engenheiros de materiais 1.4 . portanto com toda a naturalidade que os materiais compósitos se encontram disseminados por diferentes áreas de actividade que incluem indústrias de grande exigência e visibilidade tecnológica como a aeronáutica e as indústrias espacial e de defesa, ou outras como os transportes (com particular destaque para a indústria automóvel), artigos desportivos, componentes eléctricos e electrónicos e a construção civil.

a)

b)

c)

d)

Figura 1.1. Aplicações de materiais compósitos na aeronáutica: a) helicóptero Bell modelo 430 que utiliza materiais compósitos nas pás e no garfo que as sustenta [1.5]; b) o design apresentado pelo pequeno avião M309 seria impensável de realizar sem o recurso em grande escala aos materiais compósitos [1.6]; c) C-17 Globemaster III que apresenta partes importantes da estrutura em materiais compósitos [1.7]; d) Sonic cruiser, avião da Boeing em desenvolvimento que apresentará 60% dos seus materiais em compósitos [1.8].

Na indústria aeronáutica os desafios tecnológicos são permanentes e a sua especificidade resulta de ser um tipo de produção em pequena escala, em que os elevados custos de fabrico podem ser compensados por menores custos operacionais. 3

MATERIAIS COMPÓSITOS

Utilizam-se compósitos de elevado desempenho mecânico, fundamentalmente à base de fibras de carbono, aramida, híbridos de carbono-aramida, e até fibras de boro em aplicações mais específicas. O objectivo é conseguir estruturas onde a elevada resistência específica e a grande leveza se associam a uma enorme liberdade de concepção do produto. A figura 1.1 mostra exemplos que ilustram estes princípios. Esta trajectória dos materiais compósitos na indústria aeronáutica iniciou-se por volta dos anos 60. São de realçar aplicações em aeronaves militares, caso da cobertura dos estabilizadores horizontais dos F-14A e, posteriormente, por ordem histórica, nos estabilizadores verticais e leme dos F-15 e F-16, cobertura das asas dos F-18 e, finalmente, asa completa, estabilizadores e parte da fuselagem exterior do A -8B 1.9 (figura 1.2). Também na aviação comercial a utilização em larga escala de materiais compósitos nas estruturas contribui para uma redução significativa de peso, permitindo deste modo um aumento da lotação dos aparelhos e, consequentemente, uma maior rentabilidade que as diferentes empresas não podem descurar num mercado de forte concorrência. A estrutura típica de um avião pode representar até 30 do peso total, sendo que apenas 10 corresponde a peso útil efectivamente pago. Tomando em conta que aviões comerciais como o Boeing 757 e 767 incorporam apenas 4 em peso de compósitos avançados, percebe-se que o campo de progressão neste domínio é enorme.

a)

b)

c)

d)

Figura 1.2. Aeronaves militares com aplicações significativas de compósitos: a) F15 [1.10]; b) F16 [1.11]; c) F-18 [1.12]; d) AV-8B [1.13].

4

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

A indústria espacial é uma aplicação estrutural de enorme impacto e relevância evidenciando as potencialidades dos materiais compósitos. O custo em combustível para colocação em órbita de qualquer estrutura é elevadíssimo, pelo que qualquer ganho em peso é um factor decisivo na escolha. Algumas antenas incorporadas em veículos espaciais, quando expostas directamente aos raios solares necessitam de manter a sua estabilidade dimensional para se obter um bom desempenho no envio do sinal. A utilização de estruturas de carbono-epóxido, que podem apresentar coeficientes de expansão térmica nulos, são particularmente úteis para esse tipo de aplicações. A figura 1.3 ilustra o lançamento do Space Shuttle Atlantis, um exemplo de utilização diversificada de materiais compósitos.

Figura 1.3. Space Shuttle Atlantis [1.14].

Na indústria automóvel, o constrangimento de custos com que se deparam os construtores determina que a produção se faça adaptada a elevadas cadências e baixos custos. Assim, os compósitos de matriz de poliester e reforço em fibra de vidro ocupam um lugar de destaque. Nos anos 30, a Ford iniciou a aplicação de materiais compósitos em modelos seus, embora o maior sucesso conhecido seja a realização de uma estrutura em fibra de vidro para o Chevrolet Corvette em 1953 (figura 1.4).

Figura 1.4. Chevrolet Corvette de 1953 [1.15, 1.16].

5

MATERIAIS COMPÓSITOS

Os anos 70 e 80 ficaram marcados por grandes esforços no sentido de actualizar técnicas de fabrico aplicáveis aos diversos tipos de materiais que permitem reduções significativas de peso. Contudo, a adesão às técnicas de produção desenvolvidas especificamente para os materiais compósitos ficou aquém das expectativas iniciais, o que se reflectiu naturalmente num crescimento mais lento do número de aplicações. Nos anos 90, assistiu-se a progressos substanciais que tornaram as técnicas de produção compatíveis com as necessidades da produção massificada característica da indústria automóvel. A Ford, por exemplo, demonstrou que a moldação em grande escala de cerca de meia centena de peças a incorporar na estrutura de um seu veículo proporcionava uma economia de cerca de 60 relativamente à utilização de chapa embutida. O progresso conseguido, ano após ano, torna mais próximo o objectivo de produzir automóveis em materiais compósitos ao mesmo preço dos que são produzidos com materiais metálicos 1.17 . Na figura 1.5, por exemplo, pode observar-se um modelo actual onde se introduziram diversos componentes estruturais em materiais compósitos.

Figura 1.5. Aston Martin V12 Vanquish com indicação de locais (a verde) onde se utilizaram compósitos de fibra de carbono [1.18].

Ainda na indústria automóvel, mas num sector muito mais restrito como é o da competição, o custo final tem um peso bastante reduzido. O desenvolvimento de protótipos onde são testadas soluções inovadoras pode gerar uma vantagem tecnológica decisiva em relação aos concorrentes. Até ao início dos anos 50, todos os chassis desenvolvidos para a fórmula 1 eram feitos com perfis tubulares de alumínio, sendo o monobloco revestido por painéis de alumínio. Por esta altura fez-se a introdução de compósitos à base de fibra de vidro, com fibras aleatoriamente distribuídas numa matriz de poliester. Estes materiais cedo se revelaram uma solução técnica e economicamente interessante, tanto mais que se adaptavam com facilidade à produção de peças com geometria complexa. A sua utilização manteve-se até aos anos 80 quando se formou a McLaren international, a primeira equipa a introduzir os compósitos de carbono no chassis do modelo McLaren MP4-1, ilustrado na figura 1.6. Na opinião 6

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

do seu director técnico, Ron Dennis, a introdução de materiais exóticos permitiu um aumento da rigidez torsional estimado em 66 e uma considerável redução de peso. A evolução tecnológica não parou e vários outros componentes foram sendo sucessivamente substituídos por compósitos à base de carbono. Os chassis MP4-6, utilizados pela McLaren em 1991, apresentavam cerca de 75 do seu peso em materiais compósitos. Actualmente, conseguem-se atingir percentagens ainda mais elevadas, o que diz bem das potencialidades reconhecidas a estes materiais 1.9 .

Figura 1.6. MacLaren MP4-1 de 1981 [1.19].

No domínio dos transportes é de salientar ainda outros exemplos paradigmáticos. Barcos, comboios, novos veículos em desenvolvimento, movidos a energias alternativas (figura 1.7) são áreas onde os materiais compósitos desempenham papéis relevantes, com tendência clara para aumentarem a sua influência.

a)

b)

c)

Figura 1.7. Aplicações de materiais compósitos no domínio dos transportes [1.20]: a) barco; b) veículo solar; c) comboio de alta velocidade.

A indústria de componentes eléctricos e electrónicos representa actualmente cerca de 7

MATERIAIS COMPÓSITOS

15 do mercado de materiais compósitos a nível mundial. Exigências de segurança relacionadas com isolamento eléctrico justificam o uso de materiais compósitos em vários componentes, como blindagens, circuitos impressos ou baterias. A figura 1.8 ilustra alguns exemplos de aplicações neste domínio. Outras aplicações comerciais típicas são a produção de artigos desportivos (figura 1.9). A generalização das aplicações em áreas tão díspares tem contribuído significativamente para a redução do preço dos materiais compósitos e, consequentemente, para a sua expansão. A provar que as propriedades mecânicas apresentadas concorrem, com grande vantagem, com os materiais tradicionais de utilização estrutural, está o reforço de colunas de pontes em regiões sismicamente activas, como a Califórnia e o apão, recorrendo a compósitos de carbono epóxido (figura 1.10).

a)

b)

c)

d)

Figura 1.8. Aplicações na área dos componentes eléctricos e electrónicos [1.5]: a) circuito impresso com aplicação de uma resina de epóxido reforçada com fibras de vidro; b) cablagens em fibras ópticas; c) torre de distribuição de energia eléctrica com perfis pultrudidos; d) tambor de máquina de lavar em polipropileno reforçado com fibra de vidro.

8

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

a)

b)

Figura 1.9. Aplicações de materiais compósitos em artigos desportivos: a) garfo de bicicleta que utiliza combinações de fibra de vidro sob a forma de entrançado e fibra de carbono [1.21]; b) raquetes de ténis [1.22]. ´

Figura 1.10. Aplicação de materiais compósitos em pontes [1.5].

1.2. Reforços 1.2.1. FIBRAS DE VIDRO As fibras de vidro constituem o tipo de reforço mais utilizado. A técnica mais comum para produzir fibras de vidro é o estiramento de vidro fundido através de uma fieira em liga de platina-ródio com orifícios de dimensões muito precisas, conforme ilustra a figura 1.11. A temperatura de fusão depende da composição do vidro, mas ronda normalmente os 1260ºC. As fibras de vidro são sujeitas a tratamentos superficiais à saída da fieira, que variam consoante o fim a que se destinam um revestimento têxtil para o fabrico de tecidos sem risco de danificação da fibra um revestimento plástico para permitir a compatibilização da fibra com as diferentes matrizes orgânicas 9

MATERIAIS COMPÓSITOS

existentes. O revestimento plástico contém quatro componentes distintas um ligante que permite manter os filamentos unidos, evitando-se movimento relativo e abrasão os ligantes são constituídos por suspensões ou emulsões de poliacetato de vinilo, resinas de poliester ou epóxido um agente de adesão à base de compostos orgânicos de silício com o objectivo de facilitar a adesão fibra-matriz de resina um lubrificante agentes anti-estáticos e ou agentes de impregnação.

Figura 1.11. Representação esquemática da produção de fibras de vidro.

Segundo estudos recentes, o teor alcalino é o principal responsável pela resistência ao envelhecimento. Fibras com teores alcalinos inferiores a 14 apresentam alterações menos significativas em contacto com agentes atmosféricos ou químicos particularmente desfavoráveis 1.23 . Assim, a fibra do tipo A, fortemente alcalina, foi sendo progressivamente substituída pela fibra do tipo E, um vidro de borosilicato com baixa quantidade de compostos alcalinos, que apresenta boas propriedades eléctricas, mecânicas e químicas. Actualmente, pelo menos três tipos de fibras são produzidas sob a forma de fio, casos dos tipos E, S, e R. As duas últimas são produzidas a partir de vidros de alta resistência e são muito aplicadas na indústria aeronáutica. Na tabela 1.2 são indicadas algumas propriedades que podemos encontrar nas principais fibras de vidro. Tabela 1.2. Propriedades de alguns tipos de fibra de vidro.

10

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

As fibras de vidro são identificadas e classificadas por normas BS ISO. Segundo estas normas, a designação EC 12 40 2400 diz respeito a uma fibra contínua de vidro E, com um diâmetro nominal de 12 μm e com um peso de 40 gramas por cada 1000 metros. Outra forma de classificação utiliza o conceito de e . Este termo designa o peso de 1000 metros de um fio composto por aproximadamente 200 filamentos. Segundo esta terminologia, a designação anterior, corresponderia a um fio com um e de 40.

1.2.2. FIBRAS DE CARBONO Existem dois tipos de fibras agrupáveis no termo mais lato de fibras de carbono as fibras de carbono propriamente ditas, com percentagens de carbono entre 80 e 95 , e as fibras de grafite onde a percentagem de carbono chega aos 99 . Estas são aplicadas em compósitos de elevado desempenho mecânico, em áreas como a aeronáutica e a indústria espacial. A tecnologia mais recente para a produção de fibras de carbono centra-se na decomposição térmica de vários precursores orgânicos, que são essencialmente três a celulose, que dá origem às chamadas ra on fibers , o poliacrilonitrilo (PAN) e o alcatrão ( itc ). Os precursores devem possuir algumas características específicas, tais como possuir resistência apropriada e características de manuseamento necessárias para manter as fibras juntas durante todas as etapas do processo de conversão em carbono não fundir durante qualquer etapa do processo (para isso deve seleccionar-se um precursor não-fusível ou estabilizar o precursor termoplástico antes do processo de conversão) não volatilizar completamente durante o processo de pirólise. Os diferentes precursores conduzem a fibras de carbono com características mecânicas distintas. A produção a partir da celulose, que foi o primeiro dos processos utilizados, conduzia a fibras com baixas propriedades mecânicas e caiu rapidamente em desuso. O método foi posteriormente melhorado e passou-se a obter fibras com propriedades idênticas às obtidas pelos restantes processos. Contudo, são exigidas elevadíssimas temperaturas na grafitização, tornando o processo muito dispendioso. As fibras obtidas a partir do precursor de alcatrão apresentam propriedades mecânicas ligeiramente inferiores, embora, ainda assim, satisfaçam um largo conjunto de mercados, como por exemplo, a indústria automóvel. Apresentam essencialmente vantagens económicas. O precursor actualmente mais utilizado é o poliacrilonitrilo. O processo, 11

MATERIAIS COMPÓSITOS

esquematicamente representado na figura 1.12 , comporta as seguintes etapas oxidação - as fibras são aquecidas até 300 ºC em atmosfera rica em oxigénio, conduzindo à formação de uma estrutura reticular da cadeia molecular o objectivo desta fase é suprimir artificialmente o ponto de fusão das fibras carbonização - a cadeia molecular é aquecida progressivamente até cerca de 1100 ºC num forno de atmosfera neutra permitindo que apenas átomos de carbono permaneçam no final as fibras obtidas apresentam boas propriedades mecânicas e podem ser usadas sem posterior tratamento superficial grafitização - é um processo necessário quando se pretende obter fibras de elevado módulo de elasticidade em atmosfera neutra é feita a pirólise das fibras, obtendo-se um elevado grau de orientação da estrutura tratamento superficial - numa atmosfera de ácido nítrico ou ácido sulfúrico as superfícies são modificadas de forma a atingirem-se elevados níveis de adesão entre as fibras e os vários sistemas de resina empregues como matrizes.

Figura 1.12. Processo esquemático de obtenção de fibras de carbono a partir do poliacrilonitrilo (PAN).

A tabela 1.3 ilustra exemplos de propriedades mecânicas de fibras de carbono obtidas por qualquer um dos processos referenciados. As fibras de carbono são classificadas com base na sua resistência mecânica e comercializadas segundo as seguintes designações 1.24 UHM ( tra i od s) para fibras com módulos superiores a 500 GPa HM ( i od s) para fibras com módulos superiores a 300 GPa e rácio resistência mecânica módulo em tracção inferior a 1 IM (inter ediate od s) para fibras com módulos até 300 GPa e rácio resistência mecânica módulo de cerca de 1 fibras de baixo módulo, com valores inferiores a 100 GPa HS ( i stren t ) para fibras de resistências à tracção superiores a 3 GPa e rácio resistência rigidez entre 0.015 e 0.02.

12

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

Tabela 1.3. Propriedades de alguns tipos de fibra de carbono.

As fibras de carbono apresentam uma particularidade importante no sentido longitudinal têm um coeficiente de dilatação negativo ou quase nulo. Associadas a materiais com coeficiente de dilatação positivo podem dar origem ao aparecimento de tensões prejudiciais na interface. Pelo contrário, conseguindo uma conjugação criteriosa entre a fibra e a matriz, conseguem-se fabricar materiais compósitos com coeficiente de dilatação nulo, o que é útil para aplicações no domínio da metrologia, da óptica e aeroespacial.

1.2.3. FIBRAS ARAMÍDICAS As fibras aramídicas são produzidas a partir de poliamidas aromáticas. A solução de polímero é mantida a baixa temperatura (entre -50ºC e -80ºC), sendo depois extrudida a uma temperatura de aproximadamente 200ºC. Por este método, a cadeia molecular é alinhada conseguindo-se obter uma melhoria das propriedades mecânicas. As fibras aramídicas foram comercializadas pela primeira vez pela Dupont, em 1972, e posteriormente quer a Enke, quer a Teijin desenvolveram fibras similares. Actualmente existem dois tipos de produtos 1.25 as fibras standard, tipo Kevlar 29, T aron ou HM.50 (referência utilizada pela Teijin), com aplicações correntes em cabos, materiais diversos de baixo coeficiente de atrito e objectos de protecção pessoal as fibras de elevado módulo, tipo Kevlar 49 da Dupont ou T aron HM da Enke, com inúmeras aplicações em cascos de barcos, estruturas de aviões, capacetes, coletes de protecção balística e automóveis de competição. Apresentam excelente resistência química, mecânica, óptima relação rigidez-peso, boa resistência ao impacto e à fadiga, boa capacidade de amortecimento de vibrações, boas características dieléctricas, elevada resistência a solventes orgânicos, combustíveis e lubrificantes. Possuem também boa resistência a ácidos e alcalis. O seu coeficiente de dilatação tem um comportamento idêntico ao das fibras de carbono 1.26 , com as consequências que então se referiu. As principais desvantagens são a 13

MATERIAIS COMPÓSITOS

baixa resistência à compressão e à flexão, bem como elevada sensibilidade ao corte interlaminar. Esta desvantagem é normalmente atribuída à fraca ligação interfacial entre a matriz e as fibras, pelo que se desenvolveram diferentes tratamentos superficiais das fibras aramídicas para melhorar a ligação interfacial e a resistência à delaminagem. A tabela 1.4 ilustra algumas propriedades mecânicas características. Tabela 1.4. Propriedades mecânicas de fibras aramídicas.

1.2.4. FIBRAS DE BORO As fibras de boro são produzidas por deposição de boro em fase de vapor sobre um fio de tungsténio ou carbono, que actua como substrato 1.27 . O diâmetro deste é cerca de 12 m e o resultado, após deposição do boro, é uma fibra que pode atingir os 200 μm. As fibras de boro apresentam um módulo de elasticidade cinco vezes superior ao da fibra de vidro mas são ligeiramente mais pesadas do que estas. Utilizam-se na forma de fitas pré-impregnadas numa resina de epóxido, fenólica ou poliimida. Pelo seu elevado custo, os compósitos com fibras de boro aplicam-se sobretudo na indústria aeronáutica. As fibras de boro também podem ser integradas no seio de matrizes metálicas para produzir materiais de utilização a temperaturas muito elevadas. Contudo, o boro tem o inconveniente de reagir com a matriz metálica, destruindo-se. Esta situação é ultrapassada através de uma deposição final de carboneto de boro ou de carboneto de silício, que actua como barreira ao mecanismo de difusão. Esta fibra designa-se por . Propriedades típicas de fibras de boro são indicadas na tabela 1.5. Tabela 1.5. Propriedades mecânicas de fibras de boro em função do seu diâmetro.

14

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

1.2.5. OUTROS TIPOS DE REFORÇOS Existe uma grande variedade de outras fibras que podem ser empregues em estruturas compósitas, maioritariamente associadas a desempenhos de menor exigência. Estão neste caso as fibras de amianto (asbestos), sisal, poliamidas e poliesteres. Amianto - é uma fibra mineral, formada por um silicato complexo de composição variável e possui como principais propriedades 1.28 elevada resistência mecânica a temperaturas elevadas, incombustibilidade, boa qualidade isolante, durabilidade, flexibilidade, resistência elevada aos ataques de ácidos, alcalis e bactérias, e baixo custo, por ser abundante na natureza. Como material para fins industriais teve o seu apogeu no período compreendido entre as duas guerras mundiais, tendo vindo a decair pelo conhecimento de que estava associado ao desenvolvimento de doenças particularmente graves, como cancros de pulmão e outros tumores malignos. Sisal - é constituído por fibras naturais com diâmetros entre 125 e 500 μm e com comprimentos entre 100 e 150 cm, habitualmente. Como reforço em materiais compósitos, as suas propriedades estão francamente abaixo das que se conseguem com reforços em fibra de vidro. Além disso salienta-se o facto de serem bastante higroscópicas. Poliamidas - são mecanicamente resistentes, tenazes e resistentes à abrasão, e bastante resistentes aos solventes orgânicos mais comuns, alcalis e alguns ácidos. São produzidas em filamentos contínuos e podem ser processadas em várias formas para aplicações na indústria têxtil. Apresentam baixo módulo de elasticidade. Poliesteres - As fibras de poliester apresentam propriedades semelhantes às poliamidas, excepto o módulo de elasticidade, que é superior. Os laminados com fibras de poliester comportam-se melhor que os seus congéneres em fibra de vidro nos casos em que se exige resistência ao impacto e à abrasão. Para aplicações a altas temperaturas, são de salientar as fibras cerâmicas obtidas por deposição química em fase de vapor. Trata-se de fibras que combinam uma elevada resistência mecânica e elevado módulo de elasticidade a uma capacidade de resistência a altas temperaturas bastante apreciável. De entre elas, distinguem-se as fibras de alumina e de carboneto de silício. As fibras de natureza cerâmica são normalmente produzidas sob a forma de pequenos w iskers. Os w iskers são constituídos por cristais simples, produzidos em condições de crescimento controlado, conseguindo-se resistências mecânicas equivalentes às fibras de vidro, módulos de elasticidade superiores aos apresentados pelas fibras de boro 1.23 e tolerando alongamentos elásticos de 15

MATERIAIS COMPÓSITOS

3-4 , o que lhes confere propriedades assinaláveis. ários materiais, como os metais, óxidos, carbonetos e compostos orgânicos podem ser preparados sob a forma de w iskers. Estas fibras estão principalmente associadas à produção de compósitos de matriz metálica, pelo que caem fora do âmbito desta publicação.

1.3. Formas que podem apresentar os Reforços 1.3.1. ROVING O rovin , figura 1.13, é basicamente um cordão de filamentos contínuos enrolado helicoidalmente em bobines. Habitualmente o rovin é constituído por fibras com diâmetros de 9 ou 13 μm. Pode destinar-se à produção de fibras curtas (por exemplo para a moldação por projecção), tecidos, ou pode ser processado para a produção de mantas, entrançados, malhas ou híbrido.

Figura 1.13. Bobine de roving [1.5].

1.3.2. MANTAS Nas mantas (figura 1.14) as fibras são distribuídas aleatoriamente e agregadas com um ligante especial em emulsão ou em pó que confere estabilidade e deve ser solúvel na impregnação. Podemos distinguir três tipos fundamentais de mantas as mantas de filamentos cortados, designadas por CSM ( o ed trand at), as mantas de filamentos contínuos designadas por CRM ( ontin o s ando at) e as mantas de superfície. Nas CSM, as fibras apresentam comprimentos típicos menores do que 50 mm e as propriedades mecânicas são baixas. Com o CRM consegue-se melhor conformabilidade e melhores propriedades do compósito. As mantas de superfície caracterizam-se pela sua leveza (20 a 30 g m2) e são constituídas por fibras curtas pré-impregnadas com resina, nas quais se evita o afloramento de fibras à superfície. 16

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

Apresentam bom acabamento superficial e possuem uma maior resistência química.

a)

b)

Figura 1.14. Mantas tipo: a) CSM (Chopped Strand Mat); b) CRM (Continuous Random Mat) [1.29].

1.3.3. TECIDOS 2D Um tecido pode ser do tipo 2D ou 3D e define-se como a confecção de uma ligação entre feixes de fibras longas de carbono, aramida, vidro ou a combinação destas, para aplicações em que se exigem elevadas propriedades mecânicas. Existem em várias larguras, espessuras, orientações e resistências mecânicas. Devem ser suficientemente estáveis para serem manuseados, cortados e aplicados, mantendo contudo uma grande capacidade de conformação à forma do molde (propriedade que se designa por dra abi it ). Os tecidos 3D distinguem-se dos 2D por possuírem fibras orientadas na direcção da espessura, facto que confere melhor resistência interlaminar ao compósito (ver capítulo 9). Porém, a necessidade de garantir a boa impregnação pela resina, limita o teor das fibras orientadas no plano, diminuindo as propriedades mecânicas em relação aos tecidos 2D. Os tecidos são caracterizados pela orientação das fibras, pelos diferentes métodos empregues na sua confecção e classificados pela massa por unidade de área, tal como as mantas.

1.3.3.1. Tecidos entrelaçados (woven fabrics) São produzidos pelo entrelaçamento de fibras segundo direcções perpendiculares, podendo apresentar padrões variados. Os mais comuns são designados por ane weave , twi weave , e satin weave 1.30 . Nos tecidos ane weave , cada fibra orientada a 0º passa, alternadamente, por baixo e por cima de cada fibra orientada a 90º (figura 1.15a). O tecido é simétrico e com boa estabilidade. Nos tecidos twi weave (figura 1.15b), uma ou mais fibras a 0º é tecida, alternadamente, por cima e por baixo de duas ou mais fibras a 90º de uma forma regular ou repetida 1.31 . Os 17

MATERIAIS COMPÓSITOS

tecidos satin weave (figura 1.15c) são basicamente tecidos do tipo twi weave modificados de forma a provocar poucas intersecções entre as fibras a 0º e as fibras a 90º.

a)

b)

c)

Figura 1.15. Diferentes tipos de tecido [1.32]: a) "plane weave"; b) "twill weave"; c) "satin weave".

1.3.3.2. Tecidos quase unidireccionais Estes tecidos caracterizam-se por apresentarem uma elevada predominância de fibras orientadas a 0º (até 95 da massa total). A principal função das fibras na trama é garantir alguma estabilidade, permitindo colocar as fibras, num determinado componente, no local exacto pretendido e nas quantidades necessárias.

1.3.3.3. Tecidos híbridos Os tecidos híbridos resultam de combinações de diferentes tipos de fibras, como por exemplo vidro e carbono ou carbono e aramida. Desta forma, juntam-se as características mais favoráveis de cada tipo de fibra. A utilização de tecidos híbridos permite confeccionar compósitos com algumas vantagens relativamente aos compósitos convencionais, nomeadamente minimização de distorções de origem térmica, melhor compromisso entre resistência mecânica, rigidez e tenacidade ou ainda reduções de peso e ou de custo.

1.3.4. MALHAS (KNITTED FABRICS) São produzidos pela ligação sucessiva de camadas de fibras alinhadas. As diferentes camadas são cozidas em conjunto, como ilustra a figura 1.16. Este tipo de construção facilita a distribuição da carga pelas fibras, permitindo obter elevados módulos em tracção e em flexão. Apresentam ainda excelente conformabilidade e boa resistência 18

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

interlaminar. uando se utilizam diferentes orientações de fibras consegue-se obter um reforço com propriedades quase isotrópicas (ver capítulos 3 e 7).

Figura 1.16. Exemplo de uma malha. É visível a existência de várias camadas cozidas entre si [1.33].

1.3.5. TECIDOS 3D Os tecidos 3D são obtidos por processos especiais de tecelagem (figura 1.17) que ligam múltiplas camadas de fibras com orientações diversas. Esta tecnologia permite a confecção de formas para painéis e perfis com fins estruturais 1.21 . A sua resistência interlaminar é naturalmente boa.

Figura 1.17. Tecido 3D [1.34].

1.3.6. ENTRANÇADOS (BRAIDS) Os entrançados (figura 1.18) são geralmente mais caros do que as mantas devido ao processo de confecção. A sua resistência específica é mais elevada. Os entrançados estão disponíveis em configuração tubular e plana, apresentam boa conformabilidade podendo ser utilizados como forma de reforço no fabrico de produtos diversos como raquetes de ténis, sticks de hóquei ou pás de hélices de avião.

19

MATERIAIS COMPÓSITOS

Figura 1.18. Figura 1.18. Entrançado (braid) em forma tubular [1.32].

1.3.7. PRÉ-FORMAS As pré-formas são produzidas com diversas formas 2D ou 3D (figura 1.19), e tendo fibras curtas ou fibras contínuas. As pré-formas de fibras curtas podem resultar do corte e sobreposição manual de mantas ou da projecção das fibras e de um ligante sobre uma armação perfurada. A sobreposição manual de mantas é um processo de baixa reprodutibilidade que apenas se justifica para pequenas séries. A projecção é um processo automatizável, mais dispendioso, que permite a realização de formas complexas 3D com distribuição planar das fibras. As pré-formas de fibras contínuas resultam da união de camadas bidimensionais de tecidos com várias orientações. Apresentam melhor resistência interlaminar e é possível fazer variar a sua espessura.

a)

b)

Figura 1.19. Exemplos de pré-formas: a) 2D em fibra de carbono [1.29]; b) 3D em fibra de vidro [1.5].

As pré-formas são utilizadas no fabrico de produtos complexos. Depois de colocadas na cavidade de moldação é feita a injecção de resina. As pré-formas são estáveis e oferecem óptima relação resistência - peso.

20

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

1.4. Matrizes As matrizes de natureza polimérica dividem-se em duas categorias principais termoplásticas e termoendurecíveis. As matrizes termoplásticas são constituídas maioritariamente pelos designados plásticos técnicos. Estes plásticos são formados a partir de macromoléculas individuais lineares sem qualquer reticulação entre si. Estas moléculas de grandes dimensões são mantidas nas suas posições à custa de ligações secundárias (forças intermoleculares), tais como forças de van der aals e ligações de hidrogénio. uando se aquecem os polímeros termoplásticos, estas ligações são temporariamente quebradas e passa a existir mobilidade molecular que permite a reconformação. Com o arrefecimento posterior, as moléculas como que congelam nas posições entretanto alcançadas, restabelecendo-se as ligações químicas acima referidas. Em geral, os termoplásticos salientam-se por apresentarem maior resistência ao impacto, maior tenacidade e bastante menor higrospicidade quando comparados com os polímeros termoendurecíveis. São facilmente processados por injecção ou por termoformação e podem ser reciclados, o que constitui um ponto importante nos dias de hoje. A expansão dos compósitos de matriz termoplástica sempre foi condicionada pela maior dificuldade em impregnar completamente os reforços. A produção comercial de grânulos reforçados que ocorreu a partir da década de 60 facilitou o rápido crescimento dos compósitos de matriz termoplástica, estimando-se que representem actualmente cerca de 35 do mercado mundial de materiais compósitos. As matrizes termoendurecíveis são constituídas por polímeros em que as moléculas formam estruturas tridimensionais bastante rígidas. Os termoendurecíveis, ao contrário dos termoplásticos, não podem ser reprocessados. Uma vez aquecidos assumem uma forma permanente. Estes polímeros, vulgarmente designados por resinas termoendurecíveis, são frequentemente fornecidos para processamento sob a forma de uma mistura de dois ou três componentes resina, acelerador e catalisador. uando estes componentes são misturados na proporção adequada, dá-se a polimerização e a constituição da estrutura tridimensional, num processo que se designa habitualmente por cura . Algumas resinas requerem a aplicação adicional de calor e pressão para se efectuar a cura. Noutras, porém, a cura ocorre à temperatura ambiente. Contudo, as propriedades mecânicas das resinas tendem a melhorar com um tratamento de pós-cura a altas temperaturas. Uma das principais vantagens das resinas termoendurecíveis é a maior facilidade de impregnação do reforço, dado que, antes da cura, apresentam viscosidades bastante inferiores às dos termoplásticos. Uma das características fundamentais das resinas é a temperatura limite de funciona21

MATERIAIS COMPÓSITOS

mento. Neste contexto, assumem particular relevância as temperaturas ditas de transição e a temperatura de deflexão sob carga.

1.4.1. TEMPERATURAS DE TRANSIÇÃO No aquecimento ou no arrefecimento de um polímero são observáveis várias fases a que estão associadas te erat ras de transi o . Consideremos a figura 1.20, representativa do andamento do volume específico de polímeros termoplásticos com a temperatura. Os polímeros total ou parcialmente amorfos são caracterizados pela sua temperatura de transição vítrea, . Esta temperatura marca a mudança de um comportamento rígido para um comportamento caracterizado pelo amolecimento. Acima da temperatura de transição vítrea, o módulo reduz-se consideravelmente e os polímeros são dúcteis e facilmente deformáveis. Continuando a aumentar a temperatura atinge-se o estado de líquido viscoso a uma temperatura designada por temperatura de fusão, . Idealmente, um polímero totalmente cristalino não apresenta temperatura de transição vítrea. uando se aproxima da temperatura de fusão, a sua estrutura sofre um colapso catastrófico passando-se a um estado de líquido viscoso, com o consequente aumento brusco do seu volume específico 1.35 .

Figura 1.20. Variação do volume específico de um polímero com a temperatura.

Os polímeros termoendurecíveis não apresentam fusão. A temperaturas elevadas degradam-se de forma irreversível. A sua temperatura de transição vítrea é controlada pelo grau de reticulação da estrutura e, normalmente, as alterações são muito menos acentuadas do que nos termoplásticos 1.36 . A medição da temperatura de transição vítrea em polímeros é realizada recorrendo a métodos como a calorimetria diferencial de varrimento (DSC) ou análise térmica diferencial (DTA).

22

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

Os efeitos da transição vítrea e da fusão no comportamento mecânico dos polímeros são facilmente perceptíveis pela análise da evolução do módulo de elasticidade, , com a temperatura, como ilustra a figura 1.21. Um termoplástico amorfo apresenta uma considerável alteração das propriedades mecânicas para a temperatura de transição vítrea. Assim, a temperatura máxima de utilização de um termoplástico amorfo deve ser inferior a . Um polímero termoendurecível sofre alterações muito menos pronunciadas a esta temperatura, devido ao elevado grau de reticulação. Contudo, a temperatura máxima de utilização não deve exceder , para evitar fenómenos de fluência e relaxação acentuados (ver capítulo 8). Os polímeros semicristalinos apresentam igualmente pequenas variações de propriedades à temperatura de transição vítrea, devido à presença das regiões cristalinas da matriz. Neste caso, é corrente a utilização a temperaturas compreendidas entre e , pois abaixo de os polímeros semicristalinos são geralmente demasiado frágeis.

a)

b)

c)

Figura 1.21. Evolução do módulo de elasticidade em função da temperatura: a) termoplástico amorfo; b) termoendurecível; termoplástico semicristalino.

1.4.2. TEMPERATURA DE DEFLEXÃO SOB CARGA (HEAT DEFLECTION TEMPERATURE, HDT) As características de amolecimento de polímeros não reforçados são determinadas com base na sua temperatura de deflexão sob carga, HDT. Um provete é sujeito a uma tensão de flexão em três pontos de 264 psi (1.82 MPa) e aquecido a taxa constante até se deformar de um valor específico. A esta temperatura, o material apresenta ainda propriedades estruturais aceitáveis. Este procedimento encontra-se descrito pela norma ASTM D648-72. uer a temperatura de deflexão ao calor sob carga, HDT, quer a temperatura de transição vítrea, , dependem da densidade de reticulação de um polímero. Os polímeros que apresentam HDT mais elevada apresentam melhores propriedades a temperaturas altas e melhor resistência química. 23

MATERIAIS COMPÓSITOS

A escolha do agente de cura e o ciclo de cura são os principais factores que a afectam 1.37 .

1.4.3. MATRIZES TERMOPLÁSTICAS Genericamente, podemos dividir os compósitos de matriz termoplástica em duas categorias distintas os compósitos de fibras curtas, produzidos a partir de grânulos contendo fibras de comprimento inferior a 6.4 mm, e os compósitos de fibras longas, que se destacam por apresentarem propriedades mecânicas superiores. Para aplicações não estruturais e semi-estruturais, os polímeros que podemos encontrar mais frequentemente como matriz são polipropilenos, poliamidas, e policarbonatos. Nos compósitos avançados de alta resistência usam-se sobretudo o PEEK (Poli-éter-éter-cetona), Poliimidas e o PPS (Polisulfureto de fenileno).

1.4.3.1. Polipropileno (PP) O polipropileno é um polímero do grupo das poliolefinas, produzido pela primeira vez em 1957. Trata-se de um termoplástico branco e opaco com cristalinidade em torno de 60 a 70 . Apresenta boa resistência ao impacto e rigidez, resistência à distorção e possui excelente resistência ao ataque químico por ácidos, álcalis e sais, mesmo a elevadas temperaturas. As suas propriedades mecânicas dependem largamente do peso molecular médio, da distribuição do peso molecular, da estereoregularidade da cadeia e das condições de processamento. A sua cadeia macromolecular é aparentemente desequilibrada, uma vez que, em átomos alternados da cadeia principal, aparecem grupos laterais de metilo de grande peso molecular em comparação com os átomos de hidrogénio. A temperatura típica de processamento ronda os 200 ºC, o que o torna um dos mais acessíveis ao processamento por técnicas tradicionais.

1.4.3.2. Poliamida (PA) As poliamidas, vulgarmente designadas por Nylons, têm designações específicas (6, 66, 11, entre outras) que se baseiam no número de átomos de carbono do ácido que deu origem à amida-base. As que derivam de aminoácidos são designadas por um único algarismo enquanto as que resultam de diaminas e de diácidos são designadas por dois algarismos. As poliamidas são fortemente higroscópicas, apresentam baixos 24

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

coeficientes de atrito, grande resistência ao desgaste, boa resistência térmica e, nas variedades reforçadas, uma boa resistência mecânica. Como apresentam habitualmente pesos moleculares inferiores aos dos plásticos comuns, a sua viscosidade é menor, o que determina a necessidade de precauções especiais no processamento.

1.4.3.3. Policarbonato (PC) O policarbonato é um termoplástico amorfo que resulta da reacção de compostos de dihidróxido aromático com ácido carbónico. incolor, dimensionalmente estável, durável, com boa resistência térmica, química e à exposição aos agentes ambientais. Salienta-se ainda o facto de se tratar de um polímero retardador de chama, opticamente transparente e pouco higroscópico. A sua resistência ao impacto é elevada, considerando-se mesmo a mais elevada de entre os diversos termoplásticos. bastante utilizado na indústria automóvel, sob a forma de compósitos de fibras longas, para certas aplicações onde a absorção de energia entre -40º C e 80º C é importante. Apresenta temperatura de transição vítrea, , entre 140 e 150 ºC, mas não é recomendável o seu uso em contínuo a temperaturas superiores a 80 ºC. A temperatura típica de processamento é de 200 ºC.

1.4.3.4. Poli-éter-éter-cetona (PEEK) A poli-éter-éter-cetona é um polímero semicristalino, com grau de cristalinidade máximo de 48 , utilizado frequentemente em compósitos para a indústria aeronáutica. Apresenta temperatura de transição vítrea, , próxima dos 143ºC e pode ser usado em contínuo a temperaturas até 250 ºC. Relativamente às resinas de epóxido, tem algumas vantagens importantes, como maior tenacidade e baixa absorção de água (menor do que 0.5 a 23 ºC). Todavia o processamento é mais difícil devido do facto da sua cristalinidade ser variável, e o seu custo é elevado. Para garantir uma boa impregnação dos reforços são necessárias temperaturas e pressões elevadas.

1.4.3.5. Poliimidas termoplásticas As poliimidas termoplásticas caracterizam-se genericamente pela boa resistência a altas temperaturas, que lhes permitem funcionar em contínuo até aos 260 ºC. Ao contrário das poliimidas termoendurecíveis, podem ser reprocessadas por aplicação de calor e pressão. As polietermidas (PEI) e as poliamidas-imidas (PAI) são dois exemplos de poliimidas termoplásticas. São ambas polímeros amorfos, com temperaturas de transição vítrea de 217 ºC e 280 ºC, respectivamente 1.36 . A temperatura 25

MATERIAIS COMPÓSITOS

de processamento é próxima dos 350 ºC. Apresentam elevada resistência mecânica e rigidez a altas temperaturas, estabilidade dimensional e boas propriedades eléctricas. São também retardadoras de chama e resistem bem a agentes químicos como hidrocarbonetos e solventes halogenados. Em alguns casos, a sua elevada resistência à fluência permite substituir metais e outros materiais em muitas aplicações estruturais. Duas outras poliimidas termoplásticas, conhecidas como polímeros K e LARC-TPI (Langley Research Center Thermoplastic Imide), são geralmente disponibilizadas sob a forma de pré-polímeros dissolvidos em solventes adequados. Nesta forma apresentam baixas viscosidades que permitem impregnar as fibras para a produção de pré-impregnados flexíveis. A cura requer temperaturas à volta dos 300 ºC. Dos polímeros K conhecem-se duas versões K-1 e K-2. A poliimida K-1 é um polímero amorfo com temperatura de transição vítrea de 210 ºC, que possui boas propriedades mecânicas, excelente tenacidade, baixa absorção de humidade e boa resistência a diversos agentes químicos. A poliimida K-2 é superior à K-1 em termos de temperatura de transição vítrea (cerca de 270 ºC) e de tenacidade 1.38 . A poliimida LARC-TPI, que pertence ao grupo das poliimidas lineares, foi desenvolvida por laboratórios da NASA e apresenta boa tenacidade, é flexível e tem excelentes características mecânicas e eléctricas para uma larga gama de temperaturas.

1.4.3.6. Polisufureto de fenileno (PPS) O Polisulfureto de fenileno é um polímero semicristalinino, com grau de cristalinidade máximo de 65 , que tem temperatura de transição vítrea a 85ºC. O baixo valor de resulta da ligação bastante flexível entre o sulfureto e os anéis aromáticos. Apresenta elevada resistência mecânica, excelente resistência química e pode ser usado em contínuo a temperaturas até 225 ºC. A tabela 1.6 apresenta algumas propriedades das matrizes termoplásticas acima referidas, e onde se ilustram os benefícios significativos do reforço na resistência e na rigidez.

26

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

Tabela 1.6. Propriedades típicas de alguns termoplásticos [1.39].

A amorfo C semicristalino R reforçado com 30

em peso de fibra curta de vidro NR não reforçado

1.4.4. MATRIZES TERMOENDURECÍVEIS As resinas termoendurecíveis mais utilizadas no fabrico de compósitos para aplicações não-estruturais e semi-estruturais são os poliesteres insaturados, as resinas de vinilester e as resinas fenólicas. Em compósitos avançados de alta resistência, os epóxidos, as bismaleimidas e as poliimidas são as referências mais comuns.

1.4.4.1. Poliesteres insaturados As resinas de poliester classificam-se em duas grandes classes, designadas, respectivamente, por saturadas e insaturadas. No primeiro grupo estão os poliesteres comercializados sob a forma de filme ou fibras, resinas termoplásticas ou plasticizadores poliméricos. As resinas de poliester insaturado são das mais utilizadas no fabrico de materiais compósitos, devido ao seu baixo custo, facilidade de processamento e bom compromisso entre propriedades mecânicas, eléctricas e químicas. A cura tem início imediatamente após adição de catalisadores - habitualmente peróxidos orgânicos - e aceleradores especiais, por exemplo à base de cobalto. O processo desenvolve-se em duas etapas na primeira, a resina líquida transforma-se num material gelatinoso etapa que se designa por ponto de gel a segunda fase conduz ao endurecimento final através de um processo exotérmico (com libertação de calor). A velocidade de reacção depende de vários factores, tais como a reactividade da resina, o teor de acelerador, o teor de catalisador e as condições ambientais. Por ordem crescente de resistência química, as resinas de poliester insaturado dividem-se em três grandes grupos as resinas ortoftálicas, que têm aplicação geral as resinas isoftálicas, que se distinguem por possuírem boa resistência térmica e que 27

MATERIAIS COMPÓSITOS

são aplicadas em meios levemente agressivos, húmidos ou sujeitos a condições ambientais bastante desfavoráveis as resinas bisfenólicas, usadas em meios particularmente agressivos - sobretudo com características ácidas.

1.4.4.2. Resinas de vinilester As resinas de vinilester são produzidas pela reacção de uma resina de vinilester insaturada com uma resina de epóxido. Estas resinas apresentam como características uma excelente resistência química, elevada tensão de rotura, baixa viscosidade e processo de cura rápido. A principal desvantagem é a elevada contracção volumétrica, que pode atingir valores até 10 . uando comparadas com as resinas de epóxido, exibem adesão moderada. As resinas de vinilester foram especificamente desenvolvidas para o fabrico de compósitos com aplicações em ambientes corrosivos e por isso é frequente a sua utilização no fabrico de tubos e tanques para a indústria química.

1.4.4.3. Resinas fenólicas As resinas fenólicas resultam da reacção de fenol com o formaldeído em condições ácidas ou alcalinas, conforme o tipo de resina pretendida. Estas resinas foram primeiramente introduzidas por Beakland, de que resultou o nome de Baquelite para o primeiro tipo de resina fenólica produzida. Podem apresentar-se no estado líquido (resóis) ou no estado sólido (novolacs), dependendo da proporção de cada reagente, do tempo de polimerização, etc. As resinas líquidas, que são soluções ou emulsões em água, álcool ou misturas água - álcool, usam-se para impregnação de materiais diversos, como papéis, tecidos, madeiras, etc. O processo de fabrico dos resóis desenrola-se em meio alcalino ou seco e é usado apenas quando se deseja obter resinas translúcidas ou de cores muito claras. Estas resinas podem curar sem adição de outro material. As resinas sólidas apresentam-se normalmente já formuladas com cargas, plastificantes e outros aditivos, que lhe conferem uma cor escura. O processo de fabrico é designado por ácido ou húmido e a sua reticulação faz-se por adição de um agente endurecedor e aplicação de calor. A resina resultante presta-se bem à moldação por compressão e por transferência. As resinas fenólicas têm geralmente excelente comportamento ao fogo, com baixa emissão de fumos. A principal desvantagem é o facto de haver libertação de voláteis na cura, que faz com que sejam pouco usadas em compósitos de alto desempenho.

28

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

1.4.4.4. Resinas de epóxido As resinas de epóxido apresentam grande variedade de formulações químicas, a maior parte baseadas no diglicidil éter de bisfenol A (DGEBA). O esquema de cura destas resinas passa pela adição de um agente endurecedor apropriado, como aminas alifáticas, aromáticas ou algumas poliamidas. O custo destas resinas é cerca de quatro vezes o preço das resinas de poliester e cerca de duas vezes o custo das resinas de vinilester. Como vantagens principais citam-se a elevada resistência mecânica, resistência à abrasão, resistência química (sobretudo em meios alcalinos), boas propriedades de adesão à fibra, processo de cura sem libertação de voláteis, grande estabilidade dimensional em resultado da sua baixa contracção (2 a 3 ), baixa absorção de água e temperaturas de funcionamento tipicamente entre 100 e 220 ºC. Apresentam boa processabilidade, embora inferior à apresentada pelas resinas de poliester, face às maiores viscosidades iniciais e aos tempos de cura longos. Por outro lado, as formulações de base são algo frágeis, mas esta deficiência é facilmente colmatada através de aditivos de alta tenacidade, tais como alguns termoplásticos como o ABS e borrachas CTBN.

1.4.4.5. Bismaleimidas As resinas bismaleimidas são substâncias de baixo peso molecular (pós secos) contendo estruturas imida já sob a forma de monómero. Estes monómeros podem desencadear várias reacções de poli(adição) entre eles, bem como com outros co-monómeros. Em contraste com as poliimidas, as reacções de poli(adição) nas bismaleimidas não produzem polímeros lineares mas sim reticulações tridimensionais, estruturas termoendurecíveis que também exibem elevada resistência térmica. Além disso, as reacções de poliadição não produzem qualquer tipo de produtos voláteis 1.40 . As resinas bismaleimidas são largamente utilizadas na sua forma mais pura sólida. Em muitas aplicações, elas estão em conjunto com co-monómeros reactivos, por exemplo, vinil e seus compostos, aminas aromáticas, compostos à base de fenol, etc.. A vantagem mais significativa destas misturas sobre a forma original é a melhor processabilidade. Com a ajuda dos co-monómeros, os pós podem ser transformados em pasta e moldados à forma desejada. Contudo, a viscosidade destes sistemas é muitas vezes elevada, pelo que se torna necessário adicionar solventes para facilitar o processamento, ou mesmo para o tornar viável. As resinas bismaleimidas são utilizadas como matrizes para compósitos de elevado grau de desempenho para a indústria aeronáutica e espacial. Apresentam excelente resistência térmica, bom comportamento ao desgaste, baixa flamabilidade e baixa emissão de fumos. No processo de cura, é 29

MATERIAIS COMPÓSITOS

frequente requererem tempos longos e temperaturas elevadas (mais de 200 ºC). São também caras e susceptíveis a ataques por alcalis.

1.4.4.6. Poliimidas termoendurecíveis As poliimidas termoendurecíveis são utilizadas em compósitos aos quais é exigida elevada estabilidade dimensional a temperaturas elevadas. São preparadas fazendo reagir uma diamina com um dianidrido, tornando-se insolúveis e infusíveis após polimerização. As principais vantagens das resinas poliimidas são a sua elevada resistência térmica (260 ºC em funcionamento contínuo, podendo chegar a 460 ºC para curtos períodos, mesmo na presença de solventes), a elevada resistência mecânica, a boa resistência ao impacto, a resistência à oxidação, a boa capacidade de adesão e o baixo coeficiente de atrito. Como desvantagens, citam-se o elevado custo, a tendência para uma elevada absorção de água e a sua difícil transformação. Como consequência do elevado grau de reticulação que é possível atingir, estes materiais são frequentemente frágeis, o que origina alguma tendência para uma excessiva microfissuração. A melhoria da tenacidade passa por adicionar poliimidas termoplásticas 1.37 , o que aumenta o tempo de reacção e melhora a processabilidade, aspectos favoráveis para o fabrico de peças de geometria mais complexa. A tabela 1.7 apresenta algumas propriedades das matrizes termoendurecíveis acima referidas. Tabela 1.7. Propriedades de resinas termoendurecíveis [1.41].

30

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

1.5. Semi-Produtos Os semi-produtos são pré-combinações de fibras e matriz que são posteriormente processados para a obtenção da peça compósito final, através das técnicas descritas no capítulo 2. Há basicamente dois tipos de semi-produtos os compostos de moldação e os chamados pré-impregnados.

1.5.1. COMPOSTOS DE MOLDAÇÃO Os compostos de moldação são produzidos a partir de fibras curtas ou longas impregnadas com resina. Geralmente são utilizados para a moldação por injecção ou moldação por compressão (ver capítulo 2). Existem vários tipos disponíveis, com resinas de base termoendurecível ou termoplástica, sendo os mais comuns designados por s eet o din co o nd (SMC), t ick o din co o nd (TMC), do o din co o nd (DMC) ou b k o din co o nd (BMC) e ass at t er o astic (GMT), respectivamente.

1.5.1.1. SMC (sheet molding compound) A designação SMC refere-se a um composto constituído por fibras e resina (poliester ou vinilester) envolvidas por folhas de polietileno, estando disponíveis com espessuras até 6 mm. Utilizam-se para produção de componentes em que se exige uma elevada cadência de produção e uma resistência mecânica moderada. Os SMC apresentam tipicamente 30 de fibras em peso. Há também SMC especiais, com elevada resistência mecânica e elevada resistência ao impacto, pelo que são designados por i act ou, simplesmente, HMC. Considerando a forma da fibra utilizada, existem três tipos de SMC disponíveis no mercado SMC-R, com fibras curtas dispersas aleatoriamente, SMC-CR, composto formado por fibras contínuas unidireccionais e fibras curtas dispostas aleatoriamente, MC, que consiste numa mistura de fibras curtas dispostas aleatoriamente e fibras contínuas dispostas numa configuração 1.26 .

1.5.1.2. TMC (thick molding compound) Distinguem-se dos compostos SMC porque apresentam espessuras que podem ir até 50 mm. Com este tipo de composto de moldação evita-se a necessidade de utilizar várias camadas de SMC para produzir peças moldadas mais espessas. Devido à sua 31

MATERIAIS COMPÓSITOS

espessura, é reduzida a possibilidade de empilhamento. Nos compostos TMC, as fibras cortadas estão aleatoriamente distribuídas de uma forma tridimensional.

1.5.1.3. DMC (dough molding compound) Os compostos DMC, também designados por BMC ( k o din o o nd), referem-se a uma mistura pastosa de uma resina de poliester ou vinilester com fibras curtas. A percentagem de fibras é de 15 a 20 , tendo comprimentos entre 6 e 12 mm. Devido à menor quantidade de fibras e aos menores comprimentos destas, a resistência mecânica é inferior à dos compostos SMC.

1.5.1.4. Compostos termoplásticos O interesse na utilização de compósitos termoplásticos tem-se acentuado nos últimos anos. Estes materiais oferecem algumas vantagens relativamente aos compósitos de matriz termoendurecível, nomeadamente porque podem ser reprocessados. Genericamente estes compósitos podem apresentar-se nas seguintes formas pré-preparadas GMT (G ass at er o astics) e ATC ( dvanced er o astic o osites). Em princípio, as formulações GMT podem utilizar qualquer tipo de matriz termoplástica, embora 95 das aplicações comerciais sejam à base de polipropileno. O reforço é constituído por fibras curtas de vidro E. A temperatura de utilização destes não excede os 110ºC. O seu domínio de utilização é fundamentalmente a indústria automóvel. Originalmente, os ATC utilizavam termoplásticos amorfos para a matriz, tais como as polietersulfonas e as polietermidas. Hoje em dia outros termoplásticos podem ser usados, como por exemplo PEEK e PPS. O reforço, sob a forma de fibras contínuas, pode ser vidro E (para temperaturas de utilização mais baixas), carbono ou aramida. O seu domínio preferencial de utilização é a indústria aeronáutica.

1.5.2. PRÉ-IMPREGNADOS Os pré-impregnados constituem misturas de fibra e resina para posterior consolidação, geralmente através da moldação em autoclave (ver capítulo 2). São semi-produtos de custo elevado para aplicações de grande exigência, como é o caso da indústria aeronáutica. Existem pré-impregnados de base termoendurecível e 32

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

pré-impregnados de base termoplástica, embora os primeiros sejam de aplicação mais generalizada. Os reforços podem ser à base de vidro, carbono ou aramida na forma de fibras contínuas unidireccionais ou tecidos. Nos pré-impregnados termoendurecíveis, o sistema de resina mais comum é o epóxido. resina são adicionados inibidores que impedem a cura antes do processamento, desde que armazenados a temperaturas baixas. Como características mais importantes salientam-se maneabilidade, auto-adesão de camadas no empilhamento, facilidade de posicionamento, boa conformabilidade a curvaturas do molde, mas validade limitada. Ao invés, os pré-impregnados termoplásticos têm um tempo de validade ilimitado à temperatura ambiente. São processados à temperatura de fusão da resina, cuja elevada viscosidade dificulta a impregnação e consolidação. São também rígidos e mais difíceis de manter em posição no empilhamento. Como não possuem capacidade de auto-adesão de camadas, o processamento posterior exige pré-aquecimento. Os maiores benefícios do uso de pré-impregnados termoplásticos são a sua capacidade de reciclagem, o reduzido tempo de processamento, elevada tenacidade e resistência ao impacto.

1.6. Cargas e outros aditivos Para além do reforço e da matriz os compósitos são constituídos por cargas e outros aditivos que se juntam com o propósito de produzir vários efeitos como diminuição do custo facilidade de manuseamento melhoria das características de moldação melhoria das propriedades pós-cura introdução de motivos decorativos. As cargas mais comuns são obtidas a partir de depósitos naturais, por exemplo mica, feldspato, sílica, quartzo, argila ou cálcio e têm como principal função diminuir o preço do compósito. As suas principais características devem ser a boa dispersabilidade, estabilidade de suspensão, baixa densidade, cor clara, baixa percentagem de humidade, baixa absorção de óleo, resistência ao calor e resistência química. Com o objectivo de melhorar determinadas propriedades específicas são empregues aditivos que, embora em peso tenham uma reduzida percentagem relativamente às cargas e aos reforços, desempenham funções muito importantes, como por exemplo diminuição da contracção da matriz durante o processo de cura melhoria da resistência ao fogo 33

MATERIAIS COMPÓSITOS

diminuição da emissão de voláteis supressão da emissão de estireno, contribuindo para a melhoria da qualidade do ar no ambiente de trabalho condutibilidade eléctrica melhoria da tenacidade estabilizadores de ultravioletas coloração efeitos anti-estáticos.

1.7. Conclusão Neste capítulo foram descritos os constituintes principais dos compósitos de matriz polimérica, os seja, os vários tipos de fibras e de matrizes mais utilizados. Inicialmente, apresentaram-se vários exemplos de aplicações demonstrativos das vantagens dos compósitos em relação aos materiais tradicionais, nomeadamente ao nível das propriedades mecânicas. A caracterização do comportamento mecânico dos compósitos, que está na base do projecto, é tratada em detalhe neste livro a partir do capítulo 3. No entanto, o sucesso dos compósitos deve-se também aos progressos conseguidos nas técnicas de fabrico, que permitem a obtenção de peças de geometria complexa, grandes dimensões, excelentes propriedades mecânicas, com custos de produção cada vez mais competitivos. Por conseguinte, o capítulo que se segue aborda precisamente as técnicas de processamento específicas dos compósitos.

Questões 1.1. O que se entende por material compósito Em sentido lato, a combinação de dois ou mais materiais constitui um compósito. No entanto, os compósitos reforçados com fibras distinguem-se neste contexto genérico na medida em que os constituintes, além de serem diferentes ao nível molecular, são mecanicamente separáveis. 1.2.

ue funções desempenham as fibras e a matriz

As funções principais das fibras são conferir rigidez, resistência mecânica, estabilidade térmica e outras propriedades estruturais ao compósito permitir a condutibilidade eléctrica ou isolamento, dependendo do tipo de fibra utilizada. As funções da matriz são dar forma estável ao compósito assegurar a distribuição eficiente de carga pelas

34

CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO

fibras protecção contra o ataque de agentes ambientais e evitar a danificação mecânica, nomeadamente por atrito permitir uma superfície com bom acabamento. 1.3. O que são compostos de moldação Indique os principais tipos. Os compostos de moldação são misturas de resina e fibras normalmente usados para a moldação por injecção ou moldação por compressão. Existem vários tipos disponíveis, com resinas de base termoendurecível ou termoplástica, sendo os mais comuns designados por SMC, DMC ou BMC e GMT, respectivamente. 1.4. Defina temperatura de transição vítrea. Define-se temperatura de transição vítrea como a temperatura à qual o polímero passa de um estado vítreo a um estado de amolecimento com o aquecimento. A esta temperatura associam-se variações sensíveis das suas propriedades, como é o caso da redução significativa do módulo. 1.5.

ue características devem ter as cargas

As principais características das cargas devem ser boa dispersabilidade, estabilidade de suspensão, baixa densidade, baixa percentagem de humidade, baixa absorção de óleo, resistência ao calor e resistência química.

Referências 1.1. Griffith, A. A., The phenomenon of rupture and flo

in solids, philosophical transactions of the royal

society, 221a 163-198, 1920. 1.2. Agar al, B. D. Broutman, L. ., Analysis and performance of fiber composites, 2nd ed., ohn

iley

Sons, Inc., 1990. 1.3. ASM (Engineering Materials Handbook, vol.1 (composites), ASM International, 2001. 1.4. Magalhães, A. G., Caracterização do comportamento mecânico de compósitos de matriz cimentosa. Tese de Mestrado, FEUP, 1990. 1.5. http

.o enscorning.com.br mapa.asp

1.6. http

.raacomposites.com raacompapps.html

1.7. http

.globalcomposites.com ne s ne s fiche.asp id 384

1.8. http

.globalcomposites.com ne s ne s aeronautics.asp

1.9. Magalhães, A.G., Aplicação das técnicas de emissão acústica e radiografia na caracterização do dano produzido por fluência em juntas de materiais compósitos sujeitas a diferentes condições ambientais. Tese de doutoramento, FEUP, 1999 1.10. http

.af.mil ne s factsheets F 15 Eagle.html

1.11. http

.af.mil ne s factsheets F 16 Fighting Falcon.html

1.12. http

.chinfo.navy.mil navpalib factfile aircraft air-fa18.html

35

MATERIAIS COMPÓSITOS

1.13. http

.history.navy.mil planes av8.htm

1.13. http Url

.boeingphotostore.com source PODDetail.aspx L1 space L2 11853 Return 2fsource 2fPODGallery.aspx 3fL1 3dspace 26L2 3d11853 imageId 1432283

1.15. http

.km77.com marcas chevrolet 0fondos corvette50 01.asp

1.16. http

.lenfrank.com ne page.htm

1.17. ones, R.M., Mechanics of composite materials, 2nd ed. Taylor

Francis, 1999

1.18. Revista Reinforced plastics, p. 41, (2003) 1.19. http

.f1-legend.com histoire voitures 81mclarenmp4-1.htm

1.20. http

.euro-composites.com

1.21. http

.agy.com framesets markets Consumes Consumer 1.htm

1.22. http eng.uab.edu compositesLab e appl1.htm 1.23. Diez, .L. Gonzalez, Materiales Compuestos tecnología de los plásticos reforzados, Madrid, Fondo Editorial de Ingeniería Naval,1995 1.24. Donnet, .B. Bansal, R.C., Carbon Fibers, Marcel Dekker, INC, 1990 1.25. Matériaux composites. Introduction à lúsage des ingénieurs et technicians, Teknea, 1989 1.26. Mazumdar, S.K., Composites Manufacturing Materials, Product and Process Engineering, CRC press, 2002 1.27. http

.eng.uab.edu compositesLab b fiber.htm

1.28. http abrea.com.br 02amianto.htm 1.29. http

.mech.port.ac.uk zyz public html ENIM CD-ROM Module24 Unit 202 content.htm

1.30. http favonius.com soaring materials material.htm 1.31. http

.azom.com details.asp ArticleID 1091

1.32. http

.netcomposites.com education.asp sequence 42

1.33. http secure.o enscorning.net 1.34. http

.mdacomposites.org materials.htm

1.35. Pouzada, A.S., Bernardo, C.A. Introdução à engenharia de polímeros, U.Minho, 1983 1.36. http 1.37. http

.eng.uab.edu compositesLab c matrix.htm inshipmodels.tripod.com resins and materials.htm

1.38. Processing and Fabrication Technology, Dela are Composites Design Encyclopedia, vol.3, 1990 1.39. Chrétien, G. Matériaux composite à matrice organique. Technique et documentations, 1985 1.40. http

.polymerics.de technology bmi en.html

1.41. EUROCOMP Design Code Handbook - Structural Design of Polymers and Composites, Ed. ohn L. Clarke, Chapman and Hall, 1996

36

CAPÍTULO 2: PROCESSAMENTO DE MATERIAIS COMPÓSITOS

Capítulo 2

Processamento de Materiais Compósitos

A designação processamento refere-se aqui ao conjunto de técnicas que conduzem à obtenção ou modificação de peças em materiais compósitos de matriz polimérica. Para além das excelentes propriedades mecânicas, a utilização de componentes compósitos permite uma grande flexibilidade na concepção, facto que constitui uma vantagem importante sobre os materiais tradicionais. Além disso, as técnicas de fabrico propiciam reduções substanciais do número de peças a integrar um determinado conjunto, diminuindo os custos de mão-de-obra associados à montagem. O desenvolvimento tecnológico dos últimos anos tem permitido acentuar o grau de automatização e tornar os diferentes processos de fabrico economicamente mais competitivos. Este factor, aliado ao melhor conhecimento do comportamento em serviço, tem garantido a contínua expansão dos materiais compósitos, impondo-os definitivamente em áreas tão díspares como a aeronáutica, a indústria automóvel, indústrias de componentes eléctricos e electrónicos, construção civil, transportes, desporto e recreio. Os diferentes processos podem ser, genericamente, classificados em dois tipos processos em molde aberto ou processos em molde fechado. Nos primeiros, apenas uma das superfícies tem bom acabamento, limitação que é compensada pela possibilidade de realização de componentes de grandes dimensões e de geometria complexa, pois a pressão exercida é reduzida ou inexistente. Os componentes obtidos por processos com moldes fechados apresentam excelente acabamento nas duas superfícies e óptima reprodutibilidade. Outra vantagem inerente aos moldes fechados é a menor emissão de produtos voláteis, nocivos à saúde, nomeadamente o monómero de estireno,

37

MATERIAIS COMPÓSITOS

presente na maior parte dos processos que envolvem as resinas de poliester. Recentes directivas internacionais impõem limites apertados a estas emissões, facto que tem estimulado o desenvolvimento de novos materiais e métodos de fabrico onde o controlo dessa emissão é maior. Outro factor de diferenciação dos processos é a natureza da matriz, que, como se viu no capítulo anterior, pode ser termoendurecível ou termoplástica. No primeiro caso, os ciclos de aquecimento e arrefecimento são utilizados para iniciar e controlar o processo de cura, de modo a garantir o preenchimento do molde e a consolidação da peça. A elevada fluidez inicial da resina permite a utilização de pressões baixas. Ao invés, com matrizes termoplásticas, o aquecimento inicial provoca o necessário amolecimento e fusão sendo combinado com a aplicação de pressões elevadas. Segue-se naturalmente o arrefecimento do molde para minimizar os ciclos de fabrico, dentro de algumas restrições ligadas ao grau de cristalinidade. Como veremos em seguida, existem vários processos de fabrico disponíveis, cada qual com as suas especificidades que, obviamente, condicionam os tipos de peças que podem ser produzidas. Factores como os requisitos de propriedades mecânicas, dimensões, complexidade das formas, volume e taxa de produção são decisivos na selecção do processo.

2.1. Moldação por Contacto A moldação por contacto sobre a superfície de um molde é o método mais económico e mais comum, sobretudo para compósitos de fibra de vidro. O processo pode ou não ser automatizado, levando a que se faça a distinção entre dois métodos a moldação manual e a moldação por projecção.

2.1.1. MOLDAÇÃO MANUAL Neste método, o empilhamento e a impregnação de sucessivas camadas de reforço (manta, tecido) é feito manualmente em molde aberto. Previamente, sobre a face do molde utilizada, é aplicada uma resina de poliester, designada por e coat cuja função é a de garantir um bom acabamento superficial. Em seguida o e coat é endurecido num forno a uma temperatura de, aproximadamente, 50ºC. Para facilitar a desmoldagem, é aplicado sobre o molde um agente desmoldante. Cada camada de 38

CAPÍTULO 2: PROCESSAMENTO DE MATERIAIS COMPÓSITOS

reforço colocada é impregnada com resina catalisada de viscosidade entre 1000 e 1500 centipoises (cps) e compactada com ajuda de rolos. Tipicamente a percentagem de fibras no produto final realizado por este processo é de 25 . A moldação manual, ilustrada na figura 2.1, adequa-se ao fabrico de pequenas séries (abaixo de 1000 peças por ano) e com uma cadência diária de uma a quatro peças por molde (50 a 200 kg homem dia). Geralmente a mão-de-obra, embora pouco qualificada, tem um peso importante nos custos. Devido à libertação de voláteis, sobretudo estireno, exige-se que seja realizada em locais de boa ventilação. As principais vantagens do método são simplicidade, reduzido investimento inicial, poucas restrições à geometria das peças a realizar (espessuras mínimas de 1 mm e raios de curvatura mínimos de 5 mm). As maiores desvantagens estão associadas à necessidade de uma quantidade de mão-de-obra importante, à forte dependência da habilidade e cuidado do operário, baixa produtividade, bom acabamento superficial numa só face, teor de fibra heterogéneo, necessidade de rebarbagem e acabamento da peça e importante emissão de estireno. Aplicações habituais desta técnica podem ser encontradas no fabrico de pequenos barcos de recreio, figura 2.2a), reparações, reforço de pontes, figura 2.2b), etc.

Figura 2.1. Representação esquemática da moldação manual, adaptação de [2.1].

a)

b)

Figura 2.2. Exemplos de moldação manual: a) aplicação de uma camada de reforço no corpo de um barco [2.2]; b) aplicação de um reforço em carbono no pilar de uma ponte [2.3].

39

MATERIAIS COMPÓSITOS

2.1.2. MOLDAÇÃO POR PROJECÇÃO O processo consiste na aplicação simultânea de resina e fibra, sobre um molde, através de uma pistola de projecção conforme representado na figura 2.3. A resina utilizada tem uma viscosidade entre 500 e 1000 cps e a fibra, sob a forma de roving, é conduzida até à cabeça da pistola de projecção onde é cortada no comprimento desejado e lançada sobre o jacto de resina. A moldação por projecção, de que se ilustram exemplos na figura 2.4, é basicamente similar à moldação manual. Adequa-se ao fabrico de pequenas séries (até 1000 peças) com cadências diárias até 600 kg homem dia. Embora possa ter algum grau de automatização, na maioria dos casos, a projecção é feita por um operário. Normalmente as características mecânicas das peças obtidas são piores do que as que se conseguem na moldação manual, sobretudo porque, tipicamente, se atingem apenas 15 de fibras incorporadas. O processo deve ser realizado em locais arejados devido à libertação de voláteis anteriormente referida.

Figura 2.3. Representação esquemática da moldação por projecção.

a)

b)

Figura 2.4. Aplicações da técnica de moldação por projecção [2.4], [2.5].

40

CAPÍTULO 2: PROCESSAMENTO DE MATERIAIS COMPÓSITOS

2.2. Moldação por Vácuo A moldação por vácuo é semelhante à prensagem a frio, com a vantagem de exigir um investimento menor em moldes e equipamentos. O processo consiste na aplicação de vácuo no interior do molde. A utilização de moldes estanques permite reduzir as emissões de produtos voláteis, nocivos à saúde. A resina é injectada a baixa pressão no interior do molde ou, alternativamente, a resina e o reforço são introduzidos previamente no interior do molde. uando o molde é fechado, aplica-se vácuo no seu interior. Este processo, representado esquematicamente na figura 2.5, permite a obtenção de duas superfícies lisas, com quantidades reduzidas de bolhas de ar e percentagens até 70 de fibras. A figura 2.6 ilustra a sequência operatória deste processo, que é adequado para produzir componentes de médias e grandes dimensões e séries que vão de 500 até 5000 peças por ano. A figura 2.7 ilustra o exemplo de um componente de grandes dimensões produzido por este processo, enquanto a figura 2.8 mostra um barco salva vidas com casco produzido em polipropileno reforçado com fibras de vidro. O fabricante (Halmatic) produz cerca de 500 unidades ano.

Figura 2.5. Representação esquemática da moldação por vácuo.

41

MATERIAIS COMPÓSITOS

a)

b)

c)

d)

Figura 2.6. Etapas da moldação por vácuo [2.6]: a) colocação da resina líquida; b) colocação do roving cortado; c) aplicação de vácuo; d) remoção da peça.

Figura 2.7. Exemplo de um componente produzido por moldação em vácuo [2.7].

42

CAPÍTULO 2: PROCESSAMENTO DE MATERIAIS COMPÓSITOS

Figura 2.8. Barco salva-vidas produzido por moldação em vácuo [2.8].

2.3. Moldação por Compressão A moldação por compressão (figura 2.9) pode ser feita a frio ou a quente, dependendo da necessidade de pré-aquecimento dos moldes utilizados. A moldação por compressão permite obter peças aplicadas nas carrocerias de automóvel, ou outros componentes estruturais para a indústria automóvel, equipamentos eléctricos e electrónicos, materiais sanitários (banheiras, por exemplo) e mobiliário urbano.

Figura 2.9. Representação esquemática da moldação por compressão

43

MATERIAIS COMPÓSITOS

2.3.1. MOLDAÇÃO POR COMPRESSÃO A FRIO Este processo consiste na compressão de reforços em fibra de vidro sobre os quais se deposita posteriormente a resina líquida. As resinas empregues são habitualmente poliesteres insaturados às quais se associa um sistema catalítico bastante activo, fortemente exotérmico, que assegura o aquecimento progressivo do molde e permite ciclos de moldação industriais adequados. As pressões exercidas são baixas - inferiores a 4 bar - e as temperaturas de 30 a 45ºC, o que permite utilizar prensas leves e moldes mais baratos, realizados em compósitos termoendurecíveis de matriz epóxida ou de poliester. Para manter as mesmas condições de moldação em produção são utilizados sistemas de extracção de calor. A compressão a frio é adequada à produção de séries médias de peças (4 a 12 peças por hora), com superfícies simples entre 0.01 e 6 m2 e com acabamentos superficiais pouco cuidados. Devido à contracção, a precisão dimensional é fraca. Além disso, não é aconselhável a presença de ângulos vivos, nervuras ou outras partes verticais relativamente à superfície do molde.

2.3.2. MOLDAÇÃO POR COMPRESSÃO A QUENTE A compressão a quente é um processo similar ao descrito anteriormente. Neste caso, porém, os moldes são pré-aquecidos a temperaturas entre 80º e 170ºC e as pressões desenvolvidas na compressão podem variar entre 0.5 a 15 MPa, o que requer a utilização de moldes metálicos. O ciclo de produção depende da temperatura, complexidade e peso da peça moldada, podendo ser muito rápido, da ordem dos 30 segundos, ou de 2 a 4 minutos, como é mais comum. As cadências de produção, maiores do que na compressão a frio, elevam-se para valores entre 15 e 30 peças por hora. As peças obtidas incorporam maiores quantidades de reforço, o que melhora as propriedades mecânicas conseguidas. A compressão a quente é também utilizada com compostos de moldação do tipo SMC, BMC e GMT (ver capítulo 1). O composto de moldação é colocado no interior de um molde metálico pré-aquecido até 140ºC. Por compressão, o composto flui dentro do molde e preenche a cavidade de moldação expulsando o ar acumulado. A peça fica pronta após um curto processo de cura - 1 a 4 minutos, dependendo da espessura - sob efeito da pressão e da temperatura. Este método está largamente difundido na indústria automóvel na produção de painéis, pisos, coberturas de radiadores, suportes para depósitos, como se exemplifica nas figuras 2.10 e 2.11. De salientar a utilização crescente de GMT (glass mat thermoplastic), face à reciclabilidade e aos menores ciclos de produção (3 1 para moldação de SMC e 2 1 sobre a moldação por injecção). 44

CAPÍTULO 2: PROCESSAMENTO DE MATERIAIS COMPÓSITOS

Figura 2.10. Componente de carroceria de veículo Isuzu produzida por compressão de um composto SMC (produção de 10000 unidades/ano) [2.9].

Figura 2.11. Fabrico do painel frontal GM/Renault-X83 produzido por compressão de um composto termoplástico GMT (86000 unidades/ano) [2.10].

2.4. Moldação por Injecção A moldação por injecção é um processo muito utilizado para a produção de grandes séries de peças. Pode ser aplicado a compostos de moldação de matriz termoendurecível ou termoplástica. No que diz respeito à produção de componentes termoendurecíveis reforçados, podemos distinguir a moldação por injecção 2.11 de granulados reforçados prontos a moldar e de compostos de moldação. Os primeiros apresentam a vantagem de serem facilmente processados em equipamentos convencionais. São essencialmente 45

MATERIAIS COMPÓSITOS

constituídos por matrizes fenólicas ou de poliester reforçadas com fibras de dimensões muito curtas. Os segundos são preparados a partir de uma resina líquida, sobretudo de poliester insaturado. A principal vantagem é o facto do comprimento de fibras (entre 6 e 12 mm) permitir obter compósitos de características mecânicas elevadas. Em ambos os casos, a matéria prima é alimentada através de um êmbolo ou de um parafuso helicoidal para dentro da cavidade de moldação. As duas partes do molde são mantidas sob pressão até que a resina cure. A figura 2.12 a) ilustra esquematicamente uma máquina de injecção convencional, onde se destacam os seguintes componentes principais o molde e a unidade de fecho (1 e 4, respectivamente), a unidade de injecção (2) e a unidade de potência (3). A unidade de fecho, que acomoda o molde, assegura os movimentos da parte móvel do molde e as forças de fecho, aperto e abertura do molde. A unidade de injecção recebe o material da tremonha (5) e transporta-o até ao bico de injecção por acção de um parafuso alternativo, representado na figura 2.12 b). A unidade de potência suporta as unidades de injecção e de fecho e incorpora um sistema de accionamento que fornece a pressão necessária aos diversos movimentos da máquina.

a)

b) Figura 2.12. Representação esquemática de uma máquina de injecção: a) componentes principais; b) detalhe da unidade de injecção.

As máquinas de injecção modernas, controladas por microprocessadores e dotadas e vários sensores, permitem a obtenção de peças de alta qualidade, face à capacidade de monitorização e correcção em tempo real, se necessário, de alguns parâmetros essenciais, por exemplo, a dosagem conveniente da matéria prima, temperatura de injecção, temperatura do molde, velocidade de injecção, pressão de injecção, velocidade de rotação do parafuso, etc. Um ciclo de injecção comporta várias fases, conforme representa a figura 2.13. O 46

CAPÍTULO 2: PROCESSAMENTO DE MATERIAIS COMPÓSITOS

ciclo inicia-se com o fecho do molde. A matéria plastificada é transportada pelo fuso até à câmara de injecção e, após aquecimento e homogeneização suficientes, procede-se à injecção no interior do molde através de um movimento rápido de translação do fuso. Segue-se a fase de pressurização, em que se procura compensar eventuais contracções da peça. A fase de plasticização corresponde à preparação do material para um novo ciclo, enquanto se espera que a peça no interior do molde arrefeça. Finalmente, a peça está a uma temperatura à qual pode ser extraída sem distorção. Depois da extracção da peça e após um período de pausa, por vezes necessário para a execução de algumas operações manuais, começa um novo ciclo.

Figura 2.13. Representação esquemática de um ciclo de injecção

Os moldes são normalmente em aços tratados de forma a suportarem as elevadas pressões de injecção, sobretudo no caso da injecção de compostos termoplásticos, cujas matrizes podem ser poliamidas, polipropilenos, policarbonatos, etc. As cadências de produção são muito elevadas podendo atingir 20 a 100 peças hora. Os parâmetros que controlam essa cadência são a temperatura de aquecimento da matéria prima (200 a 350ºC), a temperatura do molde (20 a 120ºC) e a pressão de injecção, que pode ir de 300 a 1500 bar. Além disso, os moldes são normalmente dotados de canais de arrefecimento com circulação de água. Uma das maiores vantagens da moldação por injecção de termoplásticos consiste na produção de peças de geometria bastante complexa numa única operação. Reduz-se assim consideravelmente o número de pequenas peças que seriam necessárias para a produção de um determinado componente. Podemos ainda citar a leveza conseguida nas peças, a estabilidade dimensional e algumas propriedades como a rigidez, a resistência à tracção e à flexão. Os inconvenientes principais são a possibilidade de ocorrência de anisotropia material, resultante de forma como a matéria prima flui no interior do molde, bem como os elevados investimentos nas máquinas de injecção e nos moldes. 47

MATERIAIS COMPÓSITOS

2.5. Moldação por Injecção a Baixa Pressão e por Transferência Os processos de moldação por injecção a baixa pressão e por transferência têm adquirido relevância crescente na produção de componentes compósitos de matriz termoendurecível. De facto, a utilização de formulações de baixa viscosidade permite que a injecção seja feita a pressões entre 1 e 5 bar. Por um lado, isto possibilita a utilização de equipamentos mais simples e muito menos dispendiosos do que as máquinas de injecção de fuso (figura 2.12). Além disso, torna-se exequível o reforço por fibras contínuas, previamente posicionadas no molde, com grandes vantagens ao nível das propriedades mecânicas, bem como a realização de peças de grandes dimensões. Todavia, a complexidade de formas que se podem obter, sendo superior à moldação por compressão, não está ao nível da moldação por injecção. As cadências de produção atingidas são também inferiores às da moldação por injecção, facto que se procura compensar recorrendo a resinas altamente reactivas. Relativamente aos processos de moldação manual ou projecção, são nítidas as vantagens ao nível da qualidade (desde logo, duas superfícies lisas) e da reprodutibilidade (pouca influência da mão-de-obra). Os parágrafos seguintes descrevem algumas variantes dos processos de moldação por injecção a baixa pressão e por transferência.

2.5.1. RTM (REACTION TRANSFER MOULDING) O processo é esquematicamente representado na figura 2.14. O reforço é colocado na parte inferior do molde. Fechado o molde, injecta-se resina sob pressão dentro da cavidade de moldação. A resina impregna o reforço e cura, formando o compósito. A figura 2.15 ilustra um molde utilizado para a moldação por transferência de resina.

Figura 2.14. Representação esquemática da moldação por transferência de resina.

48

CAPÍTULO 2: PROCESSAMENTO DE MATERIAIS COMPÓSITOS

Estando tradicionalmente associada a uma técnica com cadências limitadas de produção e baixas taxas de reforço conseguidas, o processo RTM desenvolveu-se significativamente nos últimos anos. Nesta evolução é importante referir o papel da produção automatizada de pré-formas (ver capítulo 1) recorrendo a métodos de corte mais rápidos baseados na tecnologia CNC Computer Numerically Controlled . O desenvolvimento conseguido neste sector e a combinação com o uso de resinas com sistema de cura por ultravioletas permitiu atingir as elevadas taxas de produção actuais, tornando-as compatíveis com uma indústria de referência, como a indústria automóvel. Em componentes de grandes dimensões e geometria complexa, é comum encontrarmos ciclos de uma a duas horas, mas para componentes de pequena dimensão, conseguem-se tempos de ciclo inferiores a três minutos e percentagens de fibras de 50 . A evolução previsível poderá levar a tempos de ciclo inferiores a um minuto e percentagens de reforço próximas de 60 em volume. O interesse do RTM é igualmente visível na indústria aeronáutica, porque permite em alguns casos competir directamente com a moldação em autoclave, permitindo uma redução considerável de custos. Uma variante do processo RTM recorre à utilização de vácuo após a injecção da resina. Este processo, designado por ARTM ( ac ssisted esin ransfer o din ), permite que a resina impregne mais facilmente o reforço, aumentando os teores de fibra até 70 , e minimizando a formação de porosidades. Em 1980, foi patenteada uma versão do processo ARTM com o nome de SCRIMP ( ee ann o osite esin nf sion o din rocess). O processo tem sido utilizado em aplicações de áreas diversas, incluindo a indústria automóvel, a produção de pás de turbinas e barcos, por exemplo. A característica principal está associada à produção de formas estruturais de grande dimensão e virtualmente isentas de vazios.

Figura 2.15. Exemplo de um molde para moldação RTM [2.12].

49

MATERIAIS COMPÓSITOS

2.5.2. SRIM (STRUCTURAL REACTION INJECTION MOULDING) Este processo utiliza um sistema de resina de baixa viscosidade, com dois componentes (isocianato e poliol), os quais são combinados e misturados juntos, conforme ilustra a figura 2.16. Em seguida são injectados na cavidade do molde que contém o reforço. Este reforço é, geralmente, de fibras contínuas. Na cavidade do molde, a resina cura rapidamente. Trata-se de um sistema que permite uma redução do tempo de ciclo, relativamente ao processo RTM. As peças produzidas por este processo são particularmente aplicadas na indústria automóvel e destacam-se por apresentarem geralmente grandes dimensões, leveza e boa resistência ao choque.

Figura 2.16. Representação esquemática da moldação por SRIM.

2.5.3. RRIM (REINFORCED REACTION INJECTION MOULDING) As peças produzidas por este processo apresentam características semelhantes às descritas para o processo anterior. Conforme representado na figura 2.17, o reforço é adicionado aos componentes da resina antes de reagirem. A combinação de resina reforçada é injectada na cavidade do molde, onde a resina reage rapidamente e cura formando o compósito.

50

CAPÍTULO 2: PROCESSAMENTO DE MATERIAIS COMPÓSITOS

Figura 2.17. Representação esquemática da moldação por RRIM.

2.6. Moldação em Autoclave O processo de moldação em autoclave (figura 2.18) consiste em consolidar um componente pré-formado através da aplicação simultânea de temperatura, pressão e vácuo. Os ciclos destas variáveis dependem naturalmente do material a moldar, mas implicam quase sempre uma subida gradual, estágio a valores constantes e diminuição também gradual, estando frequentemente desfasados. Numa primeira fase, procura-se baixar a viscosidade da resina para eliminação de voláteis e promover o fluxo de resina, de modo a garantir teores de fibra elevados e homogéneos. Caso não sejam usados pré-impregnados, a boa impregnação do reforço será também um objectivo fundamental. A aplicação de vácuo no molde é sempre decisiva. A etapa

Figura 2.18. Panorâmica geral de um autoclave [2.13].

51

MATERIAIS COMPÓSITOS

seguinte é a cura e consolidação do componente, na qual a pressão desempenha o papel mais relevante. Este processo de moldação é frequentemente utilizado na produção de laminados. Para tal, começa-se por cortar e empilhar o pré-impregnado sobre o molde, na sequência pretendida e até se atingir a espessura desejada. O conjunto é inserido num saco de vácuo e sujeito a um ciclo de pressão e temperatura devidamente definido. A figura 2.19 ilustra de modo esquemático a montagem necessária para produzir o laminado. erifica-se que o laminado está inserido entre duas películas de Teflon poroso, que permite o escoamento do excesso de resina ao mesmo tempo que facilitam a desmoldagem. O excesso de resina é retido no tecido absorvente, colocado imediatamente antes das placas de moldação. Finalmente, o tecido homogeneizador para promover a uniformização do vácuo a toda a placa. Todo este conjunto está coberto por uma película de Nylon , designada por saco de vácuo, cuja vedação é garantida por tiras de silicone. Todo o conjunto é colocado no interior do autoclave, conforme se representa na figura 2.18.

Figura 2.19. Representação esquemática da obtenção de um laminado.

A moldação em autoclave permite a produção de peças de grandes dimensões e geometria complexa (figura 2.20) com elevada qualidade e excelentes propriedades mecânicas, devido à elevada fracção volúmica de reforço (mais de 60 ).

52

CAPÍTULO 2: PROCESSAMENTO DE MATERIAIS COMPÓSITOS

a)

b)

Figura 2.20. Exemplos de moldes para produção de componentes em autoclave [2.14].

particularmente adequada para o fabrico de pequenas séries de componentes sujeitos aos mais exigentes requisitos de desempenho mecânico e qualidade, como se verifica na indústria aeronáutica e no desporto automóvel. A figura 2.21 a), por exemplo, ilustra a obtenção de um componente de um chassis Renault utilizado em fórmula 1 (figura 2.21 b).

a)

b)

Figura 2.21. a) Moldação em autoclave de componente de um chassis Renault; b) chassis Renault R24 [2.15].

As suas principais desvantagens são o forte investimento inicial e a morosidade na moldação que torna o processo inadequado para a produção em série.

53

MATERIAIS COMPÓSITOS

2.7. Enrolamento Filamentar O enrolamento filamentar, ilustrado na figura 2.22, é um processo que consiste em depositar sobre um mandril em rotação fibra em forma de roving previamente impregnada com resina. As resinas com utilização mais habitual são as resinas termoendurecíveis de poliester, fenólicas, epóxidos, poliimidas ou de silicone, embora também possam utilizar-se resinas termoplásticas, conforme se descreverá adiante. Através de sistemas de guiamento, o reforço é desenrolado sob condições controladas, impregnado em resina e enrolado em várias camadas sobre o mandril em rotação. Durante a fase de enrolamento, as fibras são orientadas em função das solicitações a que a peça estará sujeita em serviço, bastando para tal controlar os movimentos de translação do carro e de rotação do mandril, figura 2.23. O uso de uma tensão controlada na fase de enrolamento permite dar união às fibras e boas características mecânicas às peças obtidas. Após o enrolamento procede-se à polimerização em forno ou através de luzes infravermelhas.

Figura 2.22. Visão global do processo de enrolamento filamentar [2.16].

Figura 2.23. Enrolamento de fibras sobre o mandril. É visível o carro e a orientação concedida às fibras para obtenção das melhores propriedades mecânicas [2.17].

54

CAPÍTULO 2: PROCESSAMENTO DE MATERIAIS COMPÓSITOS

O enrolamento filamentar também pode ser realizado com resinas termoplásticas. Recorre-se a uma fita termoplástica pré-impregnada que é enrolada enquanto se aplica calor e pressão no ponto de contacto com o mandril para promover a fusão e consolidação do termoplástico. Habitualmente, utilizam-se combinações reforço-matriz à base de carbono PEEK, carbono nylon ou carbono PPS. Relativamente ao enrolamento filamentar tradicional, o processo com resinas termoplásticas é mais complicado, embora possua a vantagem de ser um processo mais limpo devido à ausência de emissões de estireno, prejudiciais à saúde. Através do enrolamento filamentar podem ser produzidas peças como reservatórios de pressão, peças esféricas ou cilíndrico-esféricas, tubos cilíndricos, quadrangulares ou hexagonais, com taxas de reforço de 60 a 75 de fibras em peso. A figura 2.24 representa alguns produtos simples obtidos por este processo.

Figura 2.24. Tubos obtidos por enrolamento filamentar [2.18].

As principais vantagens do método são a sua simplicidade, automatização, volume de fibras elevado e portanto peças com boas características mecânicas, possibilidade de orientação do reforço segundo as solicitações previstas, possibilidade de produção de peças de grandes dimensões. As desvantagens mais importantes são limitações na forma das peças, sobretudo no que toca a concavidades, necessidade de maquinagem ou acabamentos posteriores, requer a presença permanente de um operador qualificado para fazer a mudança de bobines ou verificar deslizamentos de 55

MATERIAIS COMPÓSITOS

fibras, dificuldade na obtenção de ângulos baixos (0 a 15º) na orientação das fibras relativamente ao eixo de rotação do mandril.

2.8. Pultrusão A pultrusão (figura 2.25) é um processo contínuo através do qual se produzem perfis de secção constante, ocos ou maciços, de diferentes formas. Os reforços são dispostos de modo a proporcionarem um reforço longitudinal, sendo fibras de vidro, carbono ou aramida, tipicamente na forma de roving, manta ou tecido. O reforço é traccionado através de um recipiente com resina no estado líquido - normalmente resina de poliester - onde se dá a impregnação, e, em seguida, é conduzido através de uma fieira de aço pré-aquecida. Esta, também designada por molde, confere a forma do perfil e polimeriza o reforço impregnado. O perfil pultrudido, figura 2.26, é puxado pelo módulo de arrasto e, no final do processo, um sistema de corte deixa o perfil no comprimento desejado. A velocidade típica da pultrusão é de 0.5 a 2 metros por minuto, dependendo da resina, espessura e complexidade do perfil.

Figura 2.25. Representação esquemática da moldação por pultrusão.

Figura 2.26. Pultrusão de perfis [2.17].

56

CAPÍTULO 2: PROCESSAMENTO DE MATERIAIS COMPÓSITOS

As principais vantagens da pultrusão são a produção contínua e totalmente automática, e portanto com pouca incorporação de mão de obra no produto final, as excelentes características mecânicas na direcção longitudinal dos perfis, em virtude das elevadas percentagens de fibras (30 a 70 ) em peso, e a variedade de secções que se podem obter. Como principais desvantagens citam-se limitação ao fabrico de componentes com secção constante, não ser possível produzir peças com grande rigor dimensional, o reforço está limitado à direcção longitudinal sendo necessário recorrer a tecidos para melhorar as propriedades transversais. No caso de serem usadas resinas termoplásticas (que possuem maior viscosidade) são necessárias maiores forças de arrasto e o processo torna-se mais complexo. Para o fabrico de perfis curvos de secção constante, existe uma variante do processo de pultrusão, conhecida como for in . A sequência operatória para a produção do perfil é semelhante ao descrito anteriormente mas antes de terminada a cura, a peça é curvada 2.19 .

2.9. Moldação por Centrifugação Num molde metálico com forma cilíndrica, que é mantido em rotação, é introduzida uma resina, de poliester ou epóxido, e o reforço sob a forma de roving, tecido, manta ou materiais mais complexos. Por efeito da força centrífuga desenvolvida, a resina impregna o reforço e forma, depois da polimerização, uma estrutura cilíndrica. A velocidade de moldação depende de alguns factores como a quantidade e a natureza do reforço, a espessura e diâmetro da peça a produzir e a viscosidade da resina empregue. O processo, esquematicamente ilustrado na figura 2.27, é adequado para a produção de peças ocas, como por exemplo, tubos para instalações químicas, petrolíferas, de abastecimento de água ou depósitos para armazenamento de vinho, leite ou produtos químicos. O exemplo de um tanque de armazenamento produzido por este processo é ilustrado na figura 2.28. moldação por centrifugação estão associadas algumas vantagens como, por exemplo, a obtenção de duas faces lisas através do uso do e coat, boa reprodutibilidade e controlo do compósito durante o fabrico. A força centrífuga permite a aplicação e manutenção in sit do reforço, a repartição uniforme da resina, a eliminação de bolhas de ar e uma elevada percentagem de reforço.

57

MATERIAIS COMPÓSITOS

Figura 2.27. Moldação por centrifugação.

Figura 2.28. Tanque produzido por centrifugação [2.20].

As principais desvantagens deste método são o investimento na instalação, a limitação na forma das peças (cilíndricas ou cilíndrico-cónicas), a necessidade de mão-de-obra qualificada e a exigência de grande precisão no balanceamento do molde.

2.10. Moldação em Contínuo O processo de moldação em contínuo (figura 2.29), também designado por laminagem contínua, consiste na impregnação contínua de rovings cortados ou de mats de filamentos, cortados ou contínuos, com resina. A camada de resina é introduzida entre duas películas de celulose que servem de molde. Este processo é utilizado para produzir chapas em configurações lisas ou perfiladas cujas principais aplicações estão na construção civil (revestimentos de fachadas e telhados) e no sector agrícola para 58

CAPÍTULO 2: PROCESSAMENTO DE MATERIAIS COMPÓSITOS

a construção de estufas. A conformação faz-se de forma progressiva, ligada a um ciclo de polimerização em estufa, após o qual a chapa é cortada nas dimensões desejadas. As principais vantagens apontadas ao processo são produção contínua e completamente automática, velocidades de produção elevadas (3 a 15 metros por minuto), necessidade de pouca mão-de-obra. A aplicação do e coat ou a colocação do filme adesivo permite obter um bom acabamento superficial e uma boa resistência ao envelhecimento. O elevado investimento inicial e a necessidade de uma área de trabalho com grandes dimensões (1500 a 2000 m2) constituem as principais desvantagens do processo.

Figura 2.29. Moldação em contínuo.

2.11. Maquinagem de Materiais Compósitos A maquinagem em materiais compósitos advém da necessidade de ligar componentes estruturais. A furação é um dos processos de maquinagem mais usado, nomeadamente para o estabelecimento de ligações ou reparações estruturais. Num avião é comum a existência de 250 mil a 2 milhões de furos numa só asa podem existir até 5 mil furos. O desempenho das juntas aparafusadas depende da qualidade dos furos executados. O corte de materiais compósitos é outro processo que deve merecer atenção pelos danos que pode causar. Independentemente do método usado, a maquinagem de materiais compósitos apresenta as seguintes características é uma operação delicada, devido à heterogeneidade e anisotropia dos materiais não se consegue alcançar a mesma qualidade obtida nos materiais metálicos os métodos tradicionais usados nos materiais metálicos devem ser adaptados de modo a reduzir os danos causados por factores térmicos e mecânicos a orientação das fibras tem grande importância no comportamento ao corte a criação de descontinuidade nas fibras afecta o desempenho do componente 59

MATERIAIS COMPÓSITOS

as fibras ficam expostas à humidade e ao ataque por agentes químicos a temperatura durante a operação de corte não deve exceder a temperatura de cura nas resinas termoendurecíveis para evitar a degradação do material as fibras de vidro e aramida apresentam baixa condutividade térmica, o que pode originar excessivo aquecimento localizado no caso de resinas termoplásticas, devem-se evitar temperaturas próximas da temperatura de fusão caso contrário poderá ocorrer a obstrução da ferramenta de corte com consequências para o material circundante a diferença de coeficientes de expansão térmica entre as fibras e a matriz dificulta o rigor dimensional é comum a obtenção de furos de diâmetro inferior ao da broca utilizada é importante o uso de um fluido de arrefecimento adequado durante o corte no caso do aço, 75 do calor gerado dissipa-se nas aparas e apenas 18 e 7 são absorvidos pela ferramenta e pela peça, respectivamente nos compósitos 50 é absorvido pela ferramenta e a outra metade é igualmente absorvida pelas aparas e pela peça por outro lado, a vida da ferramenta aumenta devido à diminuição do coeficiente de atrito a vida da ferramenta é curta em face da natureza abrasiva dos compósitos as ferramentas são usualmente diamantadas ou revestidas por carboneto de tungsténio ou nitreto de titânio para reduzir o seu desgaste é difícil a obtenção de superfícies suaves e com bom acabamento os compósitos de aramida, em particular, são muito tenazes e absorvem bastante energia durante o corte, o que implica uma superfície de corte irregular a maquinagem de materiais compósitos origina delaminagens junto às superfícies de corte a orientação e sequência de empilhamento das camadas têm grande influência neste aspecto. amos de seguida apresentar com mais detalhe as principais características dos dois métodos de maquinagem referidos.

2.11.1. FURAÇÃO DE MATERIAIS COMPÓSITOS A furação dos compósitos recorre geralmente a ferramentas de corte revestidas (carboneto de tungsténio, nitreto de titânio ou diamante) para aumentar o tempo de vida útil. Esta operação pode causar diversos defeitos nas peças, como é o caso da delaminagem, fissuras interlaminares, descolamento fibra matriz e danos de origem térmica (ver figura 2.30).

60

CAPÍTULO 2: PROCESSAMENTO DE MATERIAIS COMPÓSITOS

Figura 2.30. Visualização por radiografia por raios X com líquido contrastante dos danos causados por furação em materiais compósitos.

As delaminagens constituem o dano mais importante. A furação provoca delaminagens quer à entrada quer à saída da broca. entrada, a broca promove o arrancamento das camadas superiores 2.21 (ver figura 2.30), provocado pelo maior filete de corte a partir do momento em que a extremidade da broca corta a primeira camada. saída, a broca actua como um punção e a força de avanço promove delaminagens entre as camadas inferiores 2.22 .

Figura 2.31. Delaminagens causadas pela furação de materiais compósitos.

Estudos realizados por Meade 2.23 mostraram que brocas mais pontiagudas originam uma penetração mais gradual, diminuindo assim a extensão das delaminagens. Tsao et al. 2.24 e Durão et al. 2.25 comprovaram que a força de avanço pode ser substancialmente reduzida através da realização de um pré-furo de menor diâmetro. também universalmente aceite que o apoio do componente a furar sobre suportes de plástico ou de madeira e a diminuinção da velocidade de avanço à saída da broca contribuem para a minimização das delaminagens. Todavia, a diminuição da velocidade de avanço aumenta o tempo de maquinagem e o desgaste da ferramenta, que por vezes contribui para a extensão dos defeitos encontrados nas peças. A orientação das fibras e a sequência de empilhamento também afectam a extensão das delaminagens durante a furação. Os laminados com camadas diferentemente orientadas apresentam melhores superfícies após a maquinagem do que os laminados unidireccionais. Nestes, as fibras tendem a ser arrancadas da matriz nas zonas onde o movimento relativo entre a ferramenta e a peça é paralelo às fibras. 61

MATERIAIS COMPÓSITOS

2.11.2. CORTE DE MATERIAIS COMPÓSITOS O corte de materiais compósitos pode ser executado recorrendo a três métodos diferentes o corte com serra, o corte com jacto de água e o corte com laser. As operações de corte com serra podem ser executadas com diferentes tipos de serra (serras de fita, serras de disco), geralmente diamantadas para melhor resistência ao desgaste. Para uma melhor qualidade de corte, a velocidade de corte deve ser a mais elevada que a matriz possa suportar, no sentido de minimizar as forças de avanço, o que reduz a quantidade de defeitos induzidos pelo corte. ang et al. 2.26 concluíram que a orientação das fibras é fundamental na obtenção de uma boa superfície de corte. Os autores verificaram que uma orientação de fibras de 90º relativamente à direcção de corte correspondia a um valor crítico, a partir do qual a flexão das fibras originava superfícies de corte mais rugosas. No corte por jacto de água, esta é projectada a muito alta velocidade (800 m s) através de um orifício de muito pequenas dimensões (0.25 mm) sobre a superfície a cortar. A pressão da água chega a ultrapassar os 400 MPa. Os parâmetros mais importantes são a pressão da água, a velocidade de corte, a espessura do laminado e o diâmetro do orifício de saída. comum a adição de partículas abrasivas à água para aumentar a velocidade de corte e cortar laminados mais espessos. Hulrburt et al. 2.27 verificaram que quanto menor for o diâmetro do orifício de saída melhor é a qualidade do corte. Todavia, o diâmetro do orifício está condicionado pela espessura da peça a cortar. Constataram ainda que maiores pressões do jacto de água e menores velocidades de corte originam melhores superfícies corte. Este processo de corte apresenta como vantagens o facto de não originar pó prejudicial à saúde do operador, e do nível de ruído associado ser baixo (inferior a 80 dB). Todavia a possibilidade de existência de delaminagens com a consequente absorção de água por parte do laminado não deve ser descurada 2.28 . O corte com laser é executado a partir de um feixe concentrado de luz monocromática focado na peça a cortar. O corte executa-se por fusão, vaporização e degradação química. Este processo de corte geralmente danifica a resina na zona de corte devido ao aquecimento localizado que provoca. Na realidade, as temperaturas de corte exigidas pelas fibras (3300 ºC para as de carbono, 2300 ºC para as de vidro e 950 ºC para as aramídicas) provocam a degradação da matriz. As matrizes termoplásticas fundem localmente ao passo que as termoendurecíveis apresentam vaporização localizada e degradação química. A carbonização dos bordos aumenta com a espessura do laminado a cortar em placas finas pode ser reduzida por aumento da velocidade de corte. 62

CAPÍTULO 2: PROCESSAMENTO DE MATERIAIS COMPÓSITOS

A necessidade de ventilação é importante devido aos fumos emitidos durante este tipo de operação.

2.12. Reciclagem de Materiais Compósitos A utilização crescente de materiais compósitos conduz naturalmente ao aumento de componentes que estão fora de serviço. Actualmente, o depósito em aterro é o destino da maioria dos resíduos de materiais compósitos. Todavia, como os plásticos e os compósitos não são biodegradáveis, quando depositados num aterro apresentam vida quase infinita e causam poluição ambiental. De facto, as sobras e as peças degradadas destes materiais não podem continuar a ser enviadas para aterros, devido à falta de espaço para novos aterros, à opinião pública negativa e à legislação cada vez mais restritiva. Por outro lado, a incineração pura e simples, geralmente num forno municipal, queima materiais com valor económico importante (fibras de carbono e aramida por exemplo) e constitui uma fonte de poluição. Todavia, estas desvantagens podem ser compensadas se a energia obtida a partir dos gases libertados for aproveitada para outros fins. A reciclagem nasce portanto da necessidade de preservar os recursos naturais limitados e de propiciar um melhor ambiente. De salientar que a comunidade europeia estabeleceu recentemente que os plásticos e compósitos devem ser reciclados, não obstante as dificuldades resultantes do facto dos compósitos serem constituídos por dois ou mais materiais diferentes (ver capítulo 1). A reciclagem pode ser dividida em quatro categorias primária, secundária, terciária e quaternária. A reciclagem primária envolve o reprocessamento dos resíduos com o objectivo de obter um produto igual ou similar ao original. Em geral é o que acontece aos componentes fabricados com resinas termoplásticas não reforçadas. Na reciclagem secundária, o produto obtido após reciclagem não apresenta as mesmas propriedades do material original. Isso acontece porque, durante a vida do produto, algumas das suas propriedades degradaram-se e não são recuperáveis. Na reciclagem terciária, os polímeros usados nos compósitos são separados nos seus componentes químicos. Os hidrocarbonetos obtidos podem ser usados como monómeros, polímeros, fuels e outros produtos químicos, contribuindo para a conservação dos recursos petrolíferos. As fibras e cargas obtidas por este processo podem ser usadas para compostos de moldação. Finalmente, na reciclagem quaternária, os resíduos são queimados e a energia obtida a partir do gás ou fuel produzido pelo processo é usada para outras aplicações. 63

MATERIAIS COMPÓSITOS

As técnicas actualmente mais usadas para a reciclagem de compósitos são trituração, pirólise, incineração e dissolução por ácidos. A trituração é um processo de reciclagem secundário em que os resíduos de compósito são cortados num tamanho adequado para servirem como cargas noutras aplicações. No caso dos compósitos de matriz termoplástica, os materiais resultantes são usados nos processos de moldação por injecção ou compressão. Os compósitos de matriz termoendurecível são utilizados como cargas nos compostos de moldação. A pirólise é um processo de reciclagem terciário em que o polímero é decomposto sob temperaturas elevadas e na ausência de oxigénio. Este processo produz hidrocarbonetos reutilizáveis, tais como monómeros, fuels e produtos químicos, o que contribui para a conservação dos recursos petrolíferos. Como as temperaturas atingidas são bastante inferiores à temperatura de queima, as fibras retêm a sua resistência inicial e não se tornam frágeis. Assim, as fibras são separadas e reutilizadas como reforços ou cargas, nomeadamente nos compostos de moldação. A incineração, como já foi referido, pode ser considerada um processo de reciclagem desde que a energia produzida seja aproveitada para outros fins. Finalmente, a dissolução por ácidos, que consiste no uso de produtos químicos para dissolver o polímero. Durante o procedimento forma-se uma mistura de hidrocarbonetos e ácido que requer mais processamento. Em geral este processo não é aceitável do ponto de vista ambiental.

Questões 2.1.

uais os materiais e equipamentos necessários para uma moldação manual

2.2. Compare o processo de injecção de resinas termoplásticas com a injecção de resinas termoendurecíveis. 2.3.

ue potenciais vantagens podem apresentar os processos de moldação em molde fechado

2.4. Indique os principais componentes de uma máquina de injecção.

uais as suas funções

2.5. Descreva sucintamente a moldação em autoclave. 2.6. Indique alguns objectos que possam ser produzidos por centrifugação. 2.7. Indique algumas características específicas da maquinagem de materiais compósitos. 2.8.

uais as principais técnicas utilizadas para a reciclagem de materiais compósitos

Referências 2.1.

.designinsite.dk htmsider pb0102.htm)

2.2.

.galasport.com boats assembly hand lay up.htm

64

CAPÍTULO 2: PROCESSAMENTO DE MATERIAIS COMPÓSITOS

2.3.

.fh a.dot.gov BRIDGE frp seis02.htm

2.4.

.o enscorning.net

2.5.

.prodesignproducts.com comp2.htm

2.6.

.o enscorning.com.br prensagem vacuo.doc

2.7.

.plastech.co.uk ne s details.asp ID 8

2.8.

.conform.nl gb reddi.htm

2.9.

.mitras.co.uk isuzu.htm

2.10.

.mitras.co.uk gm renault.htm

2.11. Chrétien, G. Matériaux composites à matrice organique. Technique et documentation, 1986. 2.12.

.nctm.com nctm nsamples.htm

2.13.

.bondtech.nethtmlcomposite.html

2.14.

.nctm.com nctm nsamples.htm

2.15. http

.renaultf1.com de public flash car chassis pics.php page 7

2.16.

.trival-kompoziti.si ang inding.htm

2.17.

.o enscorning.net

2.18.

.trival-kompoziti.si ang inding.htm

2.19. Sch artz, M.M. Composite Materials Handbook.McGra -Hill, 1984 2.20. http ne .hobas.com at main3 sub1 03169 index.shtml 2.21. Ho-Cheng, H., C. K. H. Dharan. Delamination During Drilling in Composites Laminates. ournal of Engineering for Industry, 112 236-239 (1990). 2.22. Piquet, R., B. Ferret, F. Lachaud, P. S ider. Experimental Analysis of Drilling in Thin Carbon Epoxy Plate using Special Drills. Composites Part A, 31 1107-1115 (2000). 2.23. Roy Meade L. E.

ilson. Machining, Assembly and Assembly Forms. Engineered Materials

Handbook, vol. 1 Composites. ASM International, 9 667-672, (1987). 2.24. Tsao, C. C., Hosheng, H. The Effect of Chisel Length and Associated Pilot Hole on Delamination hen Drilling Composite Materials. International ournal of Machine Tools

Manufacture, 43 1087-

1092 (2003). 2.25. Durão L. M. P., A. T. Marques, A. G. Magalhães, A. M. Baptista. Maquinagem de Materiais Compósitos de Matriz Polimérica. I Congresso Ibero-Americano de Engenharia Mecânica-CIBEM6, Coimbra-Portugal, ol. II, pp. 1073-1078, 15-18 de Outubro de 2003. 2.26.

ang,

. M., L. C.

hang. An Experimental Investigation into the Orthogonal Cutting of

Unidirectional Fibre Reinforced Pplastics. International ournal of Machine Tools

Manufacture, 43

1015-1022 (2003). 2.27. Hurlburt, G. H., . B. Cheung.

aterjet Cutting of Advanced Composite Materials. SME Technical

Paper No. MR -225, Society of Manufacturing Engineers, 1997. 2.28. Mazumdar, S. K. Composites Manufacturing - Materials, Product and Process Engineering. CRC Press, 2002.

65

CAPÍTULO 3: LEIS CONSTITUTIVAS DA CAMADA

Capítulo 3

Leis Constitutivas da Camada

3.1. Introdução Os compósitos de fibras contínuas apresentam rigidez e resistência elevadas, tendo por isso aplicações estruturais de grande exigência. Como vimos nos capítulos precedentes, estes materiais possuem geralmente uma estrutura laminada, isto é, são constituídos por várias camadas nas quais as fibras estão todas alinhadas na mesma direcção. A camada é portanto um bloco elementar cujo comportamento mecânico é fundamental caracterizar. De facto, veremos no capítulo 6 como definir o comportamento mecânico do laminado com base no comportamento da camada, sabendo que os laminados têm normalmente várias camadas diferentemente orientadas. Por outro lado, a camada pode ser considerada um compósito unidireccional. Logo, as leis constitutivas apresentadas neste capítulo são geralmente válidas para compósitos unidireccionais de pultrusão, apesar de estes não possuírem uma estrutura laminada. O mesmo se passa para compósitos reforçados com tecidos bidireccionais, desde que todas as camadas tenham a mesma orientação. Importa desde já definir claramente a escala de análise aqui utilizada. Obviamente, as propriedades mecânicas da fibra e da matriz determinam as distribuições internas de tensões e as propriedades mecânicas efectivas da camada. inclusive de grande interesse ter modelos capazes de prever as propriedades da camada em função do teor e das propriedades dos constituintes. Isto é domínio da chamada icro ec nica, que é assunto do capítulo 4. No entanto, é evidente que, possuindo a camada uma enorme

67

MATERIAIS COMPÓSITOS

quantidade de fibras, é conveniente tratá-la como um sólido homogéneo para descrever o seu comportamento mecânico. esta a abordagem que seguimos neste capítulo. Por conseguinte, as tensões e as deformações que consideramos são quantidades médias de um elemento de volume representativo, cujas dimensões serão necessariamente de ordem de grandeza superior à do diâmetro da fibra. Não obstante trabalharmos com um modelo homogeneizado da camada, o seu comportamento não deixa de ser substancialmente mais complexo do que o dos materiais estruturais mais correntes, como os aços e as ligas de alumínio. Como é sabido, no regime elástico, aqueles materiais são isotrópicos, ou seja, as leis constitutivas são independentes da orientação local. Pelo contrário, devido à grande diferença entre as propriedades da fibra e da matriz, a camada é fortemente anisotrópica. Por exemplo, a rigidez na direcção das fibras é uma ou duas ordens de grandeza superior à rigidez na direcção perpendicular. Outra hipótese básica que admitimos é a de a camada ter comportamento linear elástico. Na realidade, aproximando-se de estados limite, as relações tensão-deformação podem tornar-se não-lineares devido a plastificação e ou à formação gradual de fissuras. Todavia, a análise ao nível da elasticidade, para além de ser fundamental para a compreensão do comportamento dos compósitos, é adequada na grande maioria das situações de projecto de estruturas de materiais compósitos. Neste capítulo começamos pela análise das relações tensão-deformação de sólidos anisotrópicos, desde a anisotropia extrema até a isotropia transversal que a camada apresenta. Admitimos nesta fase que o leitor tem conhecimentos de Mecânica de Sólidos e que está familiarizado com a notação tensorial.

3.2. Análise Geral de Sólidos Anisotrópicos Um dado ponto material pode estar sujeito a um estado de tensão tridimensional (figura 3.1), caracterizado pelo tensor das tensões σi , com i, 1, 2, 3. As equações de equilíbrio ditam a simetria do tensor das tensões 3.1, 3.2 , isto é, (3.1)

68

CAPÍTULO 3: LEIS CONSTITUTIVAS DA CAMADA

Figura 3.1. Estado de tensão tridimensional num elemento de volume de um sólido.

As tensões dão naturalmente origem a um estado de deformação, descrito pelo tensor das deformações, εk , que também é simétrico 3.1, 3.2 , ou seja, (3.2) com k,

1, 2, 3.

Na grande maioria das situações, os sólidos têm comportamento linear elástico, pelo que as relações tensão-deformação podem ser expressas por (3.3) em que i k é o tensor de rigidez. Os seus termos também se designam por onstantes sticas. Da simetria dos tensores das tensões (3.1) e das deformações (3.2), (3.4) Podemos então resumir (3.3) na forma matricial

(3.5)

69

MATERIAIS COMPÓSITOS

ou ainda, procedendo a uma contracção de índices,

(3.6)

De modo análogo, é possível exprimir as relações deformação-tensão por (3.7) em que (3.8) é o chamado tensor de flexibilidade. Na forma matricial,

(3.9)

Aparentemente, (3.5) e (3.9) sugerem que são necessárias 6 × 6 36 constantes elásticas para caracterizar completamente um sólido elástico anisotrópico. Na realidade não é esse o caso, e podemos demonstrá-lo recorrendo ao conceito de densidade de energia de deformação, ou seja, energia de deformação por unidade de volume, (3.10) que, atendendo a (3.3), se pode escrever (3.11) 70

CAPÍTULO 3: LEIS CONSTITUTIVAS DA CAMADA

Se considerarmos um sólido elástico sujeito a várias solicitações, só depende do estado de deformação final, e não da ordem pela qual são aplicadas as diversas deformações parciais. Matematicamente, esta condição exprime-se por

(3.12) No entanto, atendendo a (3.4) e a (3.8), também temos, (3.13) (3.14) Portanto as matrizes de rigidez em (3.5) e de flexibilidade em (3.9) são simétricas, e o número de constantes elásticas independentes fica reduzido a 21.

3.3. Ortotropia e Isotropia Transversal A camada dos laminados é ortotrópica, ou seja, tem 3 planos de simetria mutuamente perpendiculares, facto que permite diminuir o número de constantes elásticas independentes. s rectas de intersecção desses planos são associados os eixos principais de ortotropia 1, 2 e 3 (figura 3.2), estabelecidos de modo que o eixo 1 é o da direcção das fibras, e o eixo 3 é o da direcção perpendicular ao plano da camada.

Figura 3.2. Eixos principais da camada.

uando expresso no referencial 123 , S tem vários elementos nulos, e os termos não nulos têm um significado físico mais claro, sendo relacionáveis com as chamadas onstantes de n en aria, isto é, os módulos de elasticidade e os coeficientes de 71

MATERIAIS COMPÓSITOS

Poisson. Para demonstrarmos estas particularidades, vamos recorrer à lei de transformação dos tensores perante rotação de referencial (figura 3.3).

Figura 3.3. Rotação de referencial em torno do eixo 3.

Assim, podemos obter o tensor das tensões em 123 , σk , através de 3.1, 3.2 ,

, σ , a partir do tensor em (3.15) (3.16)

designa o cosseno do ângulo formado entre os versores dos eixos correspondentes aos índices e k. Por exemplo, se, como sugere a figura 3.3, se obtiver de 123 por rotação de um ângulo θ em torno de 3, teremos

etc., podendo (3.15) ser expressa na forma matricial

72

CAPÍTULO 3: LEIS CONSTITUTIVAS DA CAMADA

(3.17)

onde (3.18) O tensor das deformações transforma-se de forma análoga, (3.19) Suponhamos então que, conhecido o tensor i k , expresso em 123 , pretendemos obter o tensor (figura 3.3), tal que n , expresso em (3.20) Se substituirmos (3.15) e (3.19) em (3.20), obtemos

(3.21) e portanto, da analogia com (3.7), (3.22) Consideremos agora o caso da figura 3.4, em que 1 2 3 se obtém de 123 através de uma rotação θ 180º em torno de 3. evidente que as constantes elásticas têm que ser iguais em ambos os referenciais.

73

MATERIAIS COMPÓSITOS

Figura 3.4. Rotação de referencial em torno do eixo 3 de 180º.

ejamos o que resulta da aplicação de (3.22) a alguns termos. Por exemplo,

em que é necessário considerar o somatório de 81 termos, correspondente a todas as combinações de i, , k e . No entanto, facilmente se vê que

e portanto, como seria de prever,

Se analisarmos agora o termo

é fácil ver que a expressão se reduz a

No entanto, como as direcções dos eixos de 1 2 3 são as mesmas de 123 , as constantes elásticas têm que ser iguais nos dois referenciais, isto é,

pelo que,

Se prosseguíssemos a análise dos outros termos e considerássemos também referenciais 1 2 3 obtidos de 123 por rotações de 180º em torno dos eixos 1 e 2, obteríamos

74

CAPÍTULO 3: LEIS CONSTITUTIVAS DA CAMADA

(3.23)

revelando a existência de apenas 9 constantes elásticas independentes. Na realidade, verifica-se ainda que as fibras estão distribuídas aleatoriamente no plano transversal 23 . A camada apresenta por isso isotropia transversal, ou seja, as suas constantes elásticas são independentes da orientação dos eixos no plano 23 , sendo fácil de mostrar que (3.24) Resumindo, a camada apresenta 5 constantes elásticas independentes. O seu comportamento é portanto bastante mais complexo do que o dos materiais isotrópicos, que, recorde-se, possuem apenas 2 constantes elásticas independentes. Nos cálculos de Engenharia utiliza-se habitualmente o módulo de elasticidade , também conhecido por módulo de oung, e o coeficiente de Poisson. amos agora obter as Constantes de Engenharia da camada.

3.4. Constantes de Engenharia da Camada Consideremos um elemento rectangular de camada sujeito a uma tensão tractiva σ11 (figura 3.5). Atendendo a (3.9) e a (3.23), o elemento sofre uma deformação (3.25) Sabendo que um módulo de elasticidade é o quociente entre uma tensão aplicada única e a deformação resultante na mesma direcção, define-se o módulo de elasticidade longitudinal (3.26)

75

MATERIAIS COMPÓSITOS

O elemento rectangular da figura 3.5 tem ainda deformações transversais ε22 e ε33. O quociente entre uma deformação transversal e a deformação longitudinal é um coeficiente de Poisson. Podemos então definir os seguintes coeficientes de Poisson (3.27) A partir de (3.9), (3.23) e (3.26), obtemos (3.28)

Figura 3.5. Camada sob solicitação longitudinal, incluindo a representação da deformada a tracejado.

Definem-se de modo análogo módulos de elasticidade transversal, cientes de Poisson ν21, ν23, ν31 e ν32.

2

e

3,

e coefi-

Consideremos agora um elemento rectangular de camada sob uma tensão de corte τ12 (figura 3.6). Notar que, em vez de σ, usamos o símbolo τ, habitual em Engenharia para designar tensões de corte. O módulo de corte é o quociente entre uma tensão de corte única e a deformação de corte de Engenharia resultante. Logo, define-se o módulo de corte longitudinal (3.29) importante relembrar a diferença entre a deformação de corte tensorial, εij, e a deformação de corte de engenharia, γi , pois (3.30) Atendendo também a (3.9) e a (3.23), 76

CAPÍTULO 3: LEIS CONSTITUTIVAS DA CAMADA

(3.31)

Figura 3.6. Camada ao corte, incluindo a representação da deformada a tracejado.

A análise de outros casos permite facilmente obter

(3.32)

Da simetria de S, (3.33) enquanto a isotropia transversal (3.24) impõe que (3.34) Portanto, as constantes elásticas independentes necessárias para caracterizar o comportamento tensão-deformação da camada são 5 1 2 ν12 G12 e ν23 ou G23. A tabela 3.1 apresenta alguns valores típicos destas grandezas, obtidas em ensaios de compósitos unidireccionais. Raramente estão disponíveis valores experimentais de ν23 e de G23, mais difíceis de medir, e nem sempre necessários se for admitido estado plano de tensão. Notar também que é sempre medido o coeficiente de Poisson ν12, em detrimento de ν21. De facto, este último assume valores muito baixos, pois

77

MATERIAIS COMPÓSITOS

e 1 2. Por exemplo, com ν21 0.0194.

1

143 GPa,

2

10.3 GPa e ν12

0.27, obtém-se

Tabela 3.1. Propriedades de alguns compósitos [3.3].

3.5. Lei Constitutiva Tridimensional Dada conveniência em usar as deformação de corte ij (3.30), de agora em diante, consideramos na lei constitutiva (3.35) (3.36) (3.37)

(3.38)

78

CAPÍTULO 3: LEIS CONSTITUTIVAS DA CAMADA

Na relação inversa (3.39) a matriz de rigidez é

(3.40)

em que os seus elementos não nulos são dados na tabela 3.2. Tabela 3.2. Fórmulas explícitas para os termos não nulos de C (3.40) [3.4].

Como é evidente, as equações (3.35) a (3.40) só são aplicáveis no referencial principal 123 . Nas aplicações usam-se quase sempre laminados ditos multidireccionais, constituídos por camadas com diferentes orientações e portanto com diferentes referenciais 123 . Como veremos no capítulo 6, para definir o comportamento de um laminado, é necessário obter a lei constitutiva de cada camada num referencial global comum , em que 3. Por outro lado, os critérios de rotura da camada, objecto de estudo no capítulo 5, são expressos em função das tensões em 123 . amos agora tomar como referência precisamente a operação de transformação de tensores em para 123 , com 3 (figura 3.7). Devido à utilização de γi (3.30) em εi (3.36), há que proceder a adaptações na lei de transformação dos tensores (3.22), que permitem escrever

79

MATERIAIS COMPÓSITOS

(3.41)

(3.42)

com (3.43)

Figura 3.7. Mudança de referencial {xyz} para {123}.

Como já referimos, interessa também obter a matriz de rigidez C em de C em 123 , tal que

, a partir (3.44)

Se substituirmos as equações (3.41) e (3.42) em (3.39), obtemos

80

CAPÍTULO 3: LEIS CONSTITUTIVAS DA CAMADA

(3.45) cuja comparação com (3.44) permite verificar que .

(3.46)

Esta matriz tem a forma genérica

(3.47)

em que os seus elementos não nulos são dados na tabela 3.3. Tabela 3.3. Fórmulas explícitas para os termos não nulos de C' (3.47) [3.4].

De modo análogo, é possível demonstrar que, na relação (3.48)

81

MATERIAIS COMPÓSITOS

(3.49) com

(3.50)

em que os seus elementos não nulos são dados na tabela 3.4. Tabela 3.4. Fórmulas explícitas para os termos não nulos de S' (3.47) [3.4].

3.6. Lei Constitutiva para Estado Plano de Tensão Devido às suas excelentes propriedades mecânicas, os laminados utilizam-se geralmente sob a forma de placas relativamente finas. Torna-se então frequentemente legítimo admitir que as camadas estão sob estado plano de tensão, isto é, que as tensões na 82

CAPÍTULO 3: LEIS CONSTITUTIVAS DA CAMADA

direcção da espessura, σ33, τ13 e τ23 têm valores desprezáveis face aos das tensões no plano 12 da camada, σ11, σ22 e τ12. Nestas circunstâncias, a lei constitutiva (3.35) reduz-se a

(3.51)

onde, atendendo a (3.38) (3.52)

Designamos por Q a matriz de rigidez em estado plano de tensão, tal que,

(3.53)

e em que, sendo Q

S-1, os seus termos são

(3.54)

As transformações de referencial (3.41) e (3.42) exprimem-se por

(3.55)

(3.56)

respectivamente. Num referencial xyz , as relações (3.44) e (3.48), reduzem-se a

83

MATERIAIS COMPÓSITOS

(3.57)

(3.58)

respectivamente, sendo os seus termos dados nas tabelas 3.5 e 3.6. Estando já bem definidas no referencial 123 , podemos agora definir as onstantes de n en aria num referencial genérico . Para tal, basta proceder à interpretação dos termos de S , de que resulta

(3.59)

Tabela 3.5. Fórmulas explícitas para os termos não nulos de Q' (3.57) [3.4].

Tabela 3.6. Fórmulas explícitas para os termos não nulos de S' (3.58) [3.4].

84

CAPÍTULO 3: LEIS CONSTITUTIVAS DA CAMADA

Notar a inclusão dos termos η e μ , ditos de acoplamento tracção-corte. De facto, quando solicitada por uma única tensão σ , ou seja, quando

o estado de deformação resultante é

incluindo portanto uma deformação de corte γ não nula, como é esquematicamente representado na figura 3.8. Isto ilustra bem as particularidades do comportamento dos compósitos.

Figura 3.8. Representação esquemática da deformada da camada perante uma tensão axial desviada dos eixos principais.

interessante estudar a variação das Constantes de Engenharia aparentes com o ângulo θ em relação a 123 (figura 3.7). Se igualarmos os termos de (3.59) aos obtidos das fórmulas da tabela (3.6), podemos obter, entre outras, as relações (3.60)

(3.61)

(3.62)

(3.63)

85

MATERIAIS COMPÓSITOS

Estas equações são representadas graficamente na figura 3.9, tendo-se para tal admitido propriedades típicas da camada de um compósito de fibra de carbono 1 140 GPa 10 GPa ν12 0.28 e G12 6 GPa. Devido à grande diferença entre os módulos na 2 direcção das fibras, 1, e na direcção perpendicular, 2, há várias características a salientar o decréscimo acentuado de com θ para valores relativamente próximos de 0º os máximos atingidos por ν e por η para valores de θ relativamente baixos o máximo de G a θ 45º, facilmente interpretado se atendermos à equivalência de estados de tensão da figura 3.10 quando σ σ τ12.

Figura 3.9. Variação típica das Constantes de Engenharia com a orientação da camada para compósitos de fibras de carbono.

86

CAPÍTULO 3: LEIS CONSTITUTIVAS DA CAMADA

Figura 3.10. Estados de tensão equivalentes no comportamento elástico se σx = σy = 12.

Exemplo 3.1. Considere a barra rectangular de compósito unidireccional carbono epóxido solicitada por uma tensão σ 2

100 MPa de acordo com a figura 3.8. Sabendo que θ

10 GPa, ν12

0.28 e G12

30º e admitindo que 1

140 GPa,

6 GPa

a) Determine as tensões no referencial principal. b) Calcule as deformações resultantes. Resolução a) Aplicando (3.55) ao caso presente,

b) Recorrendo a (3.58) e à tabela 3.6, obtemos

e depois

87

MATERIAIS COMPÓSITOS

Notar portanto que, tal como sugere a figura 3.8, para além das contracções de Poisson (ε ), a barra sofre também uma deformação de corte γ

considerável. Logo, para obter efectivamente o estado de tensão uni-

axial σ , o sistema de transmissão de carga teria de permitir a referida deformação de corte, o que, na prática, é difícil de conseguir.

Exemplo 3.2.

oltando à barra rectangular do exercício anterior, calcule agora o estado de tensão no

referencial principal para o valor de ε obtido anteriormente, supondo agora que, por constrangimentos da transmissão de carga, γ

0.

Resolução. Perante a restrição à deformação de corte, obtemos de (3.57),

onde intervêm os termos de matriz de rigidez (tabela 3.5),

Por outro lado, de (3.58) e das condições do problema,

Se substituirmos as relações entre tensões e deformações,

As tensões em

são portanto

enquanto no referencial principal,

estados de tensão substancialmente diferentes dos que foram impostos no exemplo 3.1. Estes exemplos ilustram a importância dos carregamentos e das condições fronteira no comportamento de compósitos.

88

CAPÍTULO 3: LEIS CONSTITUTIVAS DA CAMADA

Referências 3.1. Timoshenko, S. P., . N. Goodier. Theory of Elasticity. McGra -Hill, 1970. 3.2. Malvern, L. E. Introduction to the Mechanics of a Continuous Medium. Prentice Hall, 1969. 3.3. Berenberg, B. Composite Materials Guide. http plastics.about.com , 2002. 3.4. Berthelot, . M. Composite Materials Mechanical Behaviour and Structural Analysis. Springererlag, 1998.

89

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

Capítulo 4

Análise Micromecânica da Camada

4.1. Introdução No capítulo anterior, apresentámos as relações tensão-deformação da camada unidireccional dos compósitos de fibras contínuas, em que esta foi tratada como um sólido homogéneo. Esta abordagem, que se designa habitualmente por Macromecânica, é essencial para o projecto com materiais compósitos. Por outro lado, a compreensão do comportamento dos compósitos exige uma análise ao nível dos constituintes, que permita por exemplo justificar os valores típicos das Constantes de Engenharia apresentados em 3.4. Este é o domínio da chamada Micromecânica, cujo objectivo essencial é prever as propriedades da camada a partir do teor e propriedades dos constituintes [4.1-4.3]. Como a camada é constituída por uma infinidade de fibras, a Micromecânica procura geralmente recorrer a modelos do tipo "célula elementar", cujo comportamento seja representativo de toda a camada, e de maneira que a análise conduza a expressões analíticas relativamente simples. Estes objectivos foram já atingidos num número limitado de casos, sendo o exemplo mais significativo o do módulo de elasticidade na direcção das fibras (E1). Todavia, há geralmente obstáculos importantes ao desenvolvimento e aplicação prática de modelos micromecânicos rigorosos. As dificuldades começam na incerteza acerca das propriedades dos constituintes. De facto, é extremamente difícil medir algumas propriedades das fibras, sobretudo quando

91

MATERIAIS COMPÓSITOS

estas são fortemente anisotrópicas, como é o caso das fibras de carbono e de aramida. Normalmente apenas se encontram disponíveis o módulo e a tensão de rotura à tracção longitudinais. As propriedades transversais são frequentemente estimadas a partir de resultados de ensaios de compósitos usando modelos micromecânicos. Também é importante salientar que os valores disponíveis para propriedades das resinas são obtidos com provetes de dimensões muito superiores às das finas camadas de matriz que envolvem as fibras. Como é evidente, a previsão das tensões de rotura é muito mais complexa do que a previsão das constantes elásticas. Para isso contribuem os efeitos da heterogeneidade local e os diferentes modos de rotura. A investigação nesta área é objecto de revisão, com destaque para as resistências longitudinais à tracção e à compressão, cujos elevados valores estão entre as principais vantagens dos compósitos. Por conseguinte, no actual estado da arte, os modelos micromecânicos não substituem a realização de ensaios. Porém, a forte anisotropia da camada faz com que seja necessário realizar um número elevado de ensaios, nos quais é por vezes difícil obter resultados válidos. Há portanto grande interesse no desenvolvimento de modelos micromecânicos rigorosos. Neste capítulo, são apresentados modelos micromecânicos para a camada unidireccional ou para compósitos unidireccionais de fibras contínuas, que são os mais importantes a nível de aplicações estruturais. As expressões obtidas não se aplicam aos compósitos reforçados por tecidos bidireccionais. De facto, a modelação destes é extremamente difícil, resultado da geometria complexa dos feixes de fibras, dos efeitos da curvatura localizada dos mesmos e do escorregamento relativo entre feixes aquando da aplicação de cargas. Não estão ainda bem estabelecidos modelos rigorosos, que serão provavelmente numéricos.

4.2. Análise das Constantes de Engenharia O objectivo dos modelos que apresentamos neste item é prever as Constantes de Engenharia independentes dos compósitos unidireccionais de fibras contínuas, que, como vimos no capítulo 3, são E1, E2, ν12, G12 e G23 ou ν23. Os modelos são de complexidade muito variável, mas baseiam-se quase sempre no seguinte conjunto de hipóteses: › fibra e matriz como únicos constituintes, excluindo vazios e inclusões; › arranjos regulares simplificados para a distribuição espacial das fibras; 92

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

› comportamento linear elástico para fibra e para a matriz, que se admite isotrópica; › perfeita adesão interfacial fibra/matriz. Os parágrafos que se seguem descrevem os princípios básicos em que assentam os principais modelos, escolhidos de acordo com critérios de interesse teórico e de rigor nas previsões. Estes modelos são enquadrados nas seguintes categorias: › modelos de Mecânica dos Materiais; › Modelo Auto-Consistente; › limites superior e inferior; › modelos semi-empíricos; › Método das Células; Os modelos numéricos, como os modelos de elementos finitos, não conduzem às fórmulas explícitas pretendidas, mas são úteis na validação de modelos mais simples, o que justifica uma breve referência neste contexto.

4.2.1. MODELOS DE MECÂNICA DOS MATERIAIS Os modelos de Mecânica dos Materiais são os mais simples, baseando-se na análise de uma célula elementar bidimensional (figura 4.1), constituída por uma só fibra envolvida por duas camadas de matriz. As suas dimensões devem reproduzir a fracção volúmica de fibra do compósito, ou seja, (4.1)

Figura 4.1. Célula elementar das leis das misturas.

Quando solicitada longitudinalmente (figura 4.2), a célula elementar sofre deformações longitudinal e transversal.

93

MATERIAIS COMPÓSITOS

Figura 4.2. Célula elementar sob solicitação longitudinal, incluindo a representação da deformada a tracejado.

Nas zonas suficientemente afastadas dos pontos de aplicação das cargas, a deformação longitudinal é igual para a fibra e para a matriz, isto é, (4.2) Por outro lado, a força total será repartida pela fibra e pela matriz, e portanto, (4.3) que, atendendo a (4.1), podemos reescrever na forma da chamada Lei das Misturas da tensão longitudinal, (4.4) Se admitirmos estado plano de tensão, ou seja: (4.5) obtemos a equação (4.6) também conhecida por Lei das Misturas ou por Modelo de Voigt. Modelos mais sofisticados e os próprios resultados experimentais confirmaram o rigor de (4.6) [4.1-4.3]. Notar que, sendo o módulo da fibra uma ou duas ordens de grandeza superior ao da matriz, e como Vf anda tipicamente entre 0.5 e 0.65,

Logo, há todo o interesse em que o teor de fibra seja elevado, de maneira a obter um compósito mais rígido. Na prática, a necessidade de garantir a boa impregnação das fibras por parte da matriz limita o teor de fibra máximo a cerca de 70 %. Retomando a análise do modelo da figura 4.2, a contracção transversal de Poisson é 94

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

(4.7) Usando agora a lei de Hooke, (4.8) chegamos à equação (4.9) que, não sendo tão rigorosa como (4.6), parece estar em boa concordância com os resultados experimentais, se bem que haja alguma incerteza nos valores de νf12 [4.1-4.3]. Vejamos agora o caso de uma solicitação transversal (figura 4.3).

Figura 4.3. Célula elementar sob solicitação transversal, incluindo a representação da deformada a tracejado.

Admitimos que a tensão transversal é igual na fibra e matriz, isto é, (4.10) bem como estado plano de tensão, (4.11) Substituindo (4.10) e (4.11) em (4.7), que se mantém válida, obtemos (4.12) equação que é conhecida como Modelo de Reuss. Ao contrário de (4.6) e (4.9), esta equação é claramente inadequada, subestimando consideravelmente os valores experimentais [4.1-4.3]. De resto, facilmente se constata que a hipótese de estado plano 95

MATERIAIS COMPÓSITOS

de tensão (4.11) não é correcta, pois dela resultariam diferentes contracções de Poisson na direcção 1 que são inconsistentes com a noção de célula elementar. Por outro lado, admitir contracção uniforme na direcção 1, isto é,

não conduz a uma expressão suficientemente rigorosa para ter interesse prático. Na realidade, a previsão de E2 exige uma célula elementar de geometria mais realista e análises bastante mais complexas, como veremos mais à frente. Finalmente, o módulo de corte longitudinal, G12 é deduzido do modelo da figura 4.4.

Figura 4.4. Célula elementar ao corte longitudinal, incluindo a representação da deformada a tracejado.

A cinemática do modelo traduz-se por (4.13) sendo complementada pela Lei de Hooke, (4.14) e pela hipótese de tensão de corte uniforme (4.15) Obtém-se então (4.16)

equação que, como (4.12), subestima excessivamente o valor experimental [4.1-4.3].

96

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

4.2.2. MODELO AUTO-CONSISTENTE Entre os modelos que fazem apelo a análises do âmbito da Teoria da Elasticidade, adquiriu particular notoriedade o chamado Modelo Auto-Consistente [4.4, 4.5]. Este modelo considera uma célula elementar cilíndrica, embebida num meio homogéneo de propriedades equivalentes iguais às da célula (figura 4.5). Em seguida, são realizadas análises de tensões em coordenadas cilíndricas (r, θ, z) de que apenas expomos as hipóteses básicas e os resultados finais, dada a complexidade dos desenvolvimentos.

Figura 4.5. Representação esquemática do Modelo Auto-Consistente [4.4, 4.5].

Assim, no caso da previsão de E1 e de ν12, admite-se um campo de deslocamentos na fibra e matriz do tipo:

em que F(r) é uma função a determinar e u0 é um deslocamento uniforme. As equações obtidas são [4.3-4.5]: (4.17)

(4.18)

onde k designa o módulo de compressibilidade em estado plano de deformação. Consideremos um elemento cilíndrico de compósito, com o eixo z coincidente com a orientação das fibras, e com os deslocamentos axiais dos topos impedidos, ou seja, εz = 0. Quando sujeito a uma tensão radial σr, o cilindro sofre uma deformação radial εr, sendo então

97

MATERIAIS COMPÓSITOS

Observa-se que (4.17) e (4.18) acrescentam termos algebricamente complicados a (4.6) e (4.9), respectivamente. Facilmente se demonstra que, no campo habitual de propriedades das fibras e das matrizes poliméricas, esses termos são desprezáveis, sobretudo no caso de (4.17). É evidente que a geometria cilíndrica da célula não é adequada para a previsão de E2 nem de ν23, mas sim para k2. Os desenvolvimentos analíticos conduzem a [4.3-4.5] (4.19) No entanto, k2 não é uma Constante de Engenharia conveniente para a análise da camada, se bem que esteja relacionada com as outras constantes através de [4.3-4.5] (4.20)

Finalmente, o Modelo Auto-Consistente permite prever G12, admitindo que actua uma tensão de corte τrz uniforme e o campo de deslocamentos:

sendo U(r,θ) uma função deslocamento a determinar. O resultado, (4.21) é a equação mais importante do Modelo Auto-Consistente, na medida em que se revelou em boa concordância com valores experimentais para compósitos de fibra de vidro [4.3-4.5]. Os resultados também são considerados rigorosos para compósitos de fibra de carbono, se bem que haja incerteza nos valores de Gf12. O Modelo AutoConsistente é portanto um contributo importante para a previsão das Constantes de Engenharia.

4.2.3. LIMITES SUPERIOR E INFERIOR Em face das dificuldades na obtenção de equações rigorosas, foram propostos modelos que permitem determinar os limites inferior e superior das Constantes de Engenharia. Recordemos que a energia de deformação de um dado corpo com volume Φ é dada por (4.22) 98

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

com i = 1, 2, ..., 6. A lei de Hooke generalizada dá origem às equações: (4.23) (4.24) O método dos limites implica admitir campos de tensões ou campos de deformações compatíveis com as condições fronteira do problema, explorando depois os diferentes resultados de (4.23) e (4.24). De facto, segundo o Princípio Variacional da Energia Potencial Mínima, a energia de deformação real, Ur, é sempre sobrestimada, ou seja, (4.25) de onde resultam limites superiores para Sij e Cij. No entanto, como Sij = Cij-1, podemos estabelecer limites inferior (-) e superior (+) para Cij, (4.26) cujos termos são directamente proporcionais às Constantes de Engenharia. Como é evidente, o aspecto crítico desta abordagem é a escolha dos campos de tensão ou de deformação. A título exemplificativo, consideramos os limites ditos "primitivos", que se obtêm admitindo campos uniformes. Se considerarmos então o estado uniaxial de deformação uniforme: (4.27) e aplicarmos (4.23) e (4.25),

(4.28) que é uma expressão muito semelhante à Lei das Misturas (4.6). De facto, quando concretizada para i = j = 1, demonstra-se que o limite superior primitivo é [4.3] (4.29)

99

MATERIAIS COMPÓSITOS

mas, atendendo aos valores típicos das propriedades,

Analogamente, se P for uma qualquer Constante de Engenharia, o seu limite superior primitivo é [4.3] (4.30) Do ponto de vista físico, a hipótese de estado de deformação uniforme resulta num limite superior de P, devido a não se verificar o equilíbrio de forças, e portanto o estado energético ser superior ao real. Quanto ao limite primitivo inferior, podemos obtê-lo admitindo o estado uniaxial de tensão uniforme: (4.31)

resultando de (4.24) e (4.25)

(4.32)

Concretizando agora para i = j = 2, obtemos o limite inferior primitivo (4.33) expressão idêntica a (4.11), sendo também válida a generalização [4.3] (4.34) A interpretação física é que a hipótese de tensão uniforme implica vazios e sobreposições, sendo por isso necessária mais energia para compatibilizar deformações. Na prática, estes limites primitivos estão demasiado afastados para fornecerem estimativas úteis das Constantes de Engenharia. Por exemplo, para um compósito de fibra de vidro-E com Ef = 75 GPa, νf = 0.2, Em = 3 GPa, νm = 0.35, Vf = 0.55, com fibra e matriz isotrópicas, obtemos 6.36 ≤ E2 (GPa) ≤ 42.6, intervalo de valores manifestamente excessivo. 100

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

Recorrendo a técnicas variacionais sofisticadas, é possível gerar campos de tensões e de deformações que dão origem a limites mais apertados [4.3, 4.6, 4.7]. No entanto, as expressões obtidas tornam-se muito complicadas e os limites continuam separados por intervalos demasiado amplos. Por conseguinte, esta abordagem não parece ser a mais indicada.

4.2.4. MODELOS SEMI-EMPÍRICOS O princípio básico destes modelos é o recurso a parâmetros empíricos, cujos valores extremos respeitem os limites superior e inferior. O modelo mais conhecido é claramente o de Halpin-Tsai [4.2], cuja equação base é (4.35) onde P representa uma qualquer Constante de Engenharia e ξ é um parâmetro empírico de valores não negativos (ξ ≥ 0). Este parâmetro é determinado por ajuste de resultados experimentais, e traduz a eficiência do reforço. Facilmente se verifica que o modelo respeita os limites primitivos (4.30) e (4.34), uma vez que:

A figura 4.6 compara este modelo com os limites primitivos para P = E2 de um compósito de fibra de vidro-E. Os resultados experimentais destes compósitos sugerem ξ(E2) = 0.9 a 2 e ξ(G12) = 1, sendo interessante constatar que, neste último caso, (4.35) fica igual à equação (4.21) do Modelo Auto-Consistente. Este tipo de abordagem tem como principais desvantagens a necessidade de calibração experimental do parâmetro empírico e o facto de a equação base não ser rigorosa.

101

MATERIAIS COMPÓSITOS

Figura 4.6. Previsão de E2 de um compósito de fibra de vidro-E com o modelo de Halpin-Tsai, HT(ξ). Estão também representados os limites superior (Voigt) e inferior (Reuss). Admitiu-se fibra e matriz isotrópicas com Ef = 75 GPa, νf = 0.2, Em = 3 GPa, νm = 0.35.

4.2.5. MÉTODO DAS CÉLULAS O chamado Método das Células baseia-se numa análise 3D de uma célula elementar. Na sua forma original, Aboudi [4.8] considerou uma célula quadrada (figura 4.7), dividida em quatro sub-células (figura 4.8) em que se admitem tensões constantes.

Figura 4.7. Arranjo geométrico e célula elementar do Método das Células [4.8].

102

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

Figura 4.8. Sub-células da célula elementar.

A análise envolve a aplicação das condições de equilíbrio, bem como a determinação das propriedades em todas as direcções no plano 23. Em seguida, procede-se ao cálculo dos valores médios de todas as propriedades nesse plano, de forma a satisfazer o requisito de isotropia transversal, ao qual a célula quadrada não obedece "a priori". Daqui resulta uma série de equações extremamente longas, que na prática exigem meios informáticos, e que estão geralmente em boa concordância com os resultados experimentais [4.8]. Esta análise foi objecto de refinamentos posteriores, no intuito de prever aspectos mais complexos do comportamento dos compósitos, por exemplo, a componente viscoplástica [4.9]. Tendo em mente o interesse em obter equações relativamente simples, realizou-se em [4.10] uma análise simplificada da célula quadrada da figura 4.8, na qual se considera apenas uma solicitação na direcção 2 para obter E2. Desprezando as tensões de corte, as equações de equilíbrio são: (4.36) (4.37) (4.38) Para fibras transversalmente isotrópicas, a lei de Hooke pode escrever-se (4.39) com i, j e k = 1,2,3, enquanto a matriz é isotrópica. A compatibilidade geométrica das várias células impõe a uniformidade de ε1 e de ε2, ou seja:

103

MATERIAIS COMPÓSITOS

(4.40) (4.41) (4.42) Falta impor uma condição na direcção 3, que, à partida, deveria ser a de ε3 uniforme,

Todavia, esta hipótese conduz a um sistema de equações complicado e, como já foi referido, torna necessário analisar todas as direcções no plano . Para evitar estes inconvenientes, e para esbater a anisotropia em inerente ao arranjo geométrico considerado, admite-se estado plano de tensão em , (4.43) Nestas circunstâncias, se substituirmos a lei de Hooke (4.39) para a fibra e para a matriz e (4.43) em (4.40) a (4.42), obtemos (4.44)

(4.45) (4.46) (4.47)

(4.48)

Podemos agora resolver o sistema constituído pelas equações (4.37), (4.38) e (4.44) a (4.48). Sabendo que (4.49) e desprezando alguns termos tendo em conta que Ef1 >> Em, facilmente se demonstra que [4.10]:

104

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

(4.50)

e portanto

(4.51)

As previsões desta equação foram comparadas com as de um modelo 3D de elementos finitos, no qual se considerou uma célula elementar do arranjo hexagonal de fibras [4.10] (figura 4.9). Este arranjo é tido como o mais realista para o campo habitual de Vf (55 a 65 %), respeitando a condição de isotropia transversal. Impõe-se à célula um deslocamento uniforme da sua face superior, y = b, e que as restantes faces se mantenham planas. Os erros de (4.51) foram inferiores a 10 % para compósitos de fibra de vidro e de fibra de carbono.

Figura 4.9. Célula elementar de um modelo de elementos finitos, incluindo a representação da deformada a tracejado [4.10].

105

MATERIAIS COMPÓSITOS

4.2.6. CONCLUSÃO Dos modelos micromecânicos que foram apresentados, resultaram um conjunto de equações que permitem prever com bastante rigor as Constantes de Engenharia mais comuns. Trata-se, concretamente, das equações (4.6), (4.9), (4.21) e (4.51) para E1, ν12, G12 e E2, respectivamente. Se for necessário o valor de ν23, podemos obter k2 de (4.19), e, de (4.20), (4.52) No entanto, como já foi referido, uma das principais dificuldades na aplicação dos modelos é a ausência de dados seguros para certas propriedades das fibras anisotrópicas (Ef2, νf12, Gf12, Gf23). Estas têm vindo a ser inferidas dos resultados experimentais dos compósitos, combinados com os modelos micromecânicos. A tabela 4.1 dá intervalos típicos para as propriedades das fibras. Quanto às matrizes, temos habitualmente Em = 2 a 5 GPa e νm = 0.35 a 0.42. Tabela 4.1. Intervalos de valores típicos das propriedades das fibras.

Finalmente, há que ter consciência que, por muito rigorosos que sejam, os modelos micromecânicos nunca substituirão a realização de alguns ensaios de comprovação, para efeitos de projecto com materiais compósitos.

Exemplo 4.1. Estime as Constantes de Engenharia de um compósito unidireccional de fibra de vidro com as seguintes características: Ef = 75 GPa; νf = 0.20; Em = 3 GPa; νm = 0.38 e Vf = 0.55. Resolução. Admite-se normalmente que a fibra de vidro é isotrópica. Aplicando (4.6) e (4.9), obtemos

Da equação (4.51),

106

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

Dada a isotropia da fibra e da matriz:

Podemos agora recorrer à equação (4.21),

Como vimos no capítulo 3, estas Constantes de Engenharia são suficientes para os problemas mais habituais de estado plano de tensão. Caso seja necessária uma análise 3D, então há que calcular os módulos de compressibilidade (4.20):

para então obtermos de (4.19)

e finalmente, de (4.52),

Exemplo 4.2. Considere um compósito carbono/epóxido em que os constituintes têm as seguintes propriedades: Ef1 = 294 GPa; Ef2 = 20 GPa; Gf12 = 40 GPa; νf12 = 0.22; νf23 = 0.28; Em = 3.5 GPa e νm = 0.35. O fabrico de peças através da moldação por autoclave permite, seguindo as instruções do fabricante, obter Vf= 0.65. No entanto, com uma amostra de uma peça fabricada através de moldação por vácuo, obteve-se E1 = 169 GPa nos ensaios de tracção. Preveja as diferenças entre os valores esperados, fornecidos na folha de especificações do fabricante, e os valores que seriam efectivamente medidos das Constantes de Engenharia. Resolução. Se de facto tivéssemos Vf = 0.65,

em relação ao qual o valor medido é 12.1 % inferior. Logo, Vf é necessariamente inferior, podendo ser calculado através de

107

MATERIAIS COMPÓSITOS

Aplicando (4.9), pelo que:

mostrando uma pequena diferença de 3.6 % relativamente ao valor esperado. Recorrendo agora a (4.51),

temos então:

ou seja, o valor medido seria cerca de 13 % inferior ao esperado. Finalmente, no que toca ao módulo de corte (4.21), sabendo que Gm = Em/2(1 + νm) = 1.296 GPa,

obtemos:

sendo portanto de esperar uma diferença de -20 % em relação ao valor esperado. Estas diferenças de valores podem dar origem a erros importantes nos cálculos de dimensionamento. Por isso, é importante estar atento aos valores efectivos do teor de fibra.

4.3. Análise das Resistências A rotura da camada é geralmente um processo complexo, que pode envolver plasticidade e formação e crescimento de fendas localizadas, sendo portanto muito difícil de prever. Apesar disto, a análise Micromecânica permite tirar conclusões úteis acerca dos mecanismos de rotura e das propriedades relevantes dos constituintes. Convém desde já definir os modos básicos de solicitação da camada (figura 4.10), aos quais correspondem as seguintes tensões de rotura: 108

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

› › › › ›

σut1 = tensão de rotura longitudinal à tracção; σuc1 = tensão de rotura longitudinal à compressão; σut2 = tensão de rotura transversal à tracção; σuc2 = tensão de rotura transversal à compressão; σu12 = tensão de rotura ao corte;

para as quais a tabela 4.2 apresenta alguns valores típicos.

Figura 4.10. Os modos básicos de solicitação da camada. Tabela 4.2. Tensões de rotura de alguns compósitos unidireccionais [4.11]

Como se pode constatar, à semelhança do que acontece com os módulos, são grandes as diferenças entre as resistências longitudinais e as transversais. As análises micromecânicas já realizadas permitem facilmente justificar essas diferenças. Por exemplo, retomando a equação (4.4), e como Ef1 >> Em,

o que explica que os elevados valores das resistências longitudinais das fibras se 109

MATERIAIS COMPÓSITOS

reflectem nas resistências nos compósitos. Na realidade, há que refinar esta análise, bem como distinguir as solicitações de tracção das de compressão, pois os mecanismos de rotura são diferentes. Por outro lado, os modelos de 4.2.1 prevêem que, se a matriz for menos resistente que a fibra (o que é geralmente correcto, excepto para os compósitos de fibra de aramida), teremos σut2 = σutm e τu12 = τum. Apesar destes modelos não serem rigorosos, σut2 e σuc2 de compósitos de fibra de vidro e de fibra de carbono são frequentemente semelhantes aos das respectivas matrizes. Aliás, o facto de σuc2 ser superior a σut2 resulta directamente do melhor comportamento à compressão das resinas poliméricas [4.12, 4.13]. Relativamente a τu12, os seus valores são geralmente superiores aos de σut2. Isso deve-se parcialmente ao facto de, nas resinas poliméricas, τum ser muito próximo de σutm [4.14, 4.15]. Outra razão é a maior eficácia do reforço na rigidez ao corte do que à tracção transversal, isto é, o rácio G12/Gm é superior a E2/Em. No entanto, é importante salientar que os valores de τu12 são algo sensíveis às metodologias de ensaio [4.16, 4.17]. Há, porém, uma dificuldade básica na definição de σut2 e τu12: verifica-se que, em compósitos multidirecionais, aquelas dependem das orientações das camadas vizinhas [4.18-4.20]. Por exemplo, σut2 de um laminado unidireccional é inferior a σut2 de uma camada de um laminado multidireccional, cujas camadas vizinhas tenham orientações diferentes. As razões para tal são ainda objecto de investigação, mas estão relacionadas com influência da presença de fendas, com maior probabilidade de existirem e seguramente mais críticas quando há várias camadas com a mesma orientação agrupadas, acabando por constituir uma só camada de maior espessura. Por conseguinte, os valores de σut2 e τu12 obtidos através de ensaios de provetes unidireccionais devem ser encarados com alguma reserva, o mesmo se aplicando naturalmente à previsão micromecânica. Vamos portanto concentrar-nos exclusivamente na análise das resistências longitudinais de tracção e de compressão, que são de resto as mais importantes por duas razões fundamentais. Primeiro, porque são as mais elevadas, visto que beneficiam mais eficazmente do contributo das fibras. Segundo, porque, nos compósitos multidireccionais, há todo o interesse em ter camadas orientadas nas direcções das cargas principais, pois são estas que suportam a maior parte do esforço, dada a sua maior rigidez.

110

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

4.3.1. RESISTÊNCIA LONGITUDINAL À TRACÇÃO A base para a previsão da resistência longitudinal à tracção, σut1, é naturalmente o Modelo de Mecânica dos Materiais da secção 4.2.1. Numa primeira análise, a rotura do compósito inicia-se quando for atingida a deformação de rotura da fibra, εuf1, ou da matriz, εum. Torna-se por isso necessário considerar dois casos: εuf1 > εum (figura 4.11a) e εuf1 < εum (figura 4.11b).

a)

b) Figura 4.11. Representação dos dois casos possíveis de ductilidade relativa dos constituintes e suas repercussões na resistência do compósito.

Do ponto de vista das aplicações estruturais, é claramente desejável a primeira situação (figura 4.11a), para que se aproveite em pleno a elevada resistência das fibras. O segundo caso (figura 4.11b) verifica-se nos compósitos de matriz metálica e de matriz cerâmica, nos quais as preocupações essenciais têm a ver com a rigidez a altas temperaturas ou com a resistência ao desgaste. Na prática, as matrizes poliméricas são mais dúcteis do que as fibras, embora por vezes com valores de εum relativamente 111

MATERIAIS COMPÓSITOS

baixos. Nestas condições, a tensão de rotura do compósito é, numa primeira abordagem, (4.53) sendo σmf a tensão na matriz para εuf1 (figura 4.11a). Deve dizer-se que, apesar de os diagramas da figura 4.11 sugerirem relações tensão-deformação lineares, esta análise mantém-se válida quando tal não se verifica, o que é aliás frequente nas matrizes poliméricas. Por outro lado, a equação (4.53) supõe que σuf1 >> σmf, e que o teor de fibras é suficientemente elevado para que a rotura das fibras implique a rotura imediata do compósito. Podemos, todavia, para efeitos de análise, considerar o caso contrário, no qual a matriz poderia suportar alguma carga após a rotura das fibras, e portanto, (4.54) A figura 4.12 confronta as equações (4.53) e (4.54), revelando a existência de uma fracção volúmica mínima de fibra, Vf,min, a que corresponde σut1 mínima, bem como uma fracção volúmica crítica de fibra, (4.55) acima da qual há ganhos de resistência relativamente à matriz, ou seja, σut1 > σum. Na realidade, como os valores de Vf,crit são muito baixos, tipicamente à volta de 5 %, só têm interesse prático as condições de (4.53).

Figura 4.12. Variação da resistência do compósito com a fracção volúmica de fibra segundo as equações (4.53) e (4.54).

Aparentemente, portanto, a previsão de σut1 seria bastante simples. Contudo, a variabilidade estatística da resistência das fibras complica significativamente o problema, 112

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

como vamos em seguida demonstrar. Recordemos que a distribuição estatística de σuf1 resulta da existência de defeitos ao longo do comprimento das fibras. Aplica-se habitualmente uma distribuição de Weibull [4.1, 4.21-4.27], (4.56) em que P designa a probabilidade acumulada de rotura, L é o comprimento de referência da fibra e σw0 e ρ são parâmetros da distribuição que se obtêm dos resultados experimentais. Logo, para um mesmo nível de probabilidade de rotura P, as tensões de rotura correspondentes para diferentes comprimentos relacionam-se por (4.57) traduzindo uma diminuição da resistência com o comprimento de referência da fibra no ensaio de tracção, até determinado L, naturalmente. A resistência média de uma fibra, que corresponde a P(σuf1) = 0.5, é então (4.58) Por outro lado, se considerarmos um feixe de fibras, todas de comprimento L, a resistência média do conjunto é (4.59) onde

é a tensão máxima suportada pelo feixe, ou seja,

(4.60) e portanto (4.61) sendo e a base do logaritmo de Neper. Esta resistência média do feixe de fibras é evidentemente inferior à resistência média de uma só fibra (4.58). Por exemplo, para fibras de carbono T300, obteve-se uma distribuição estatística (4.56) com σw0 = 6016 MPa, ρ = 7 e L = 25 mm [4.26]. Para o mesmo comprimento de referência, obtemos 113

MATERIAIS COMPÓSITOS

de (4.58),

= 3605 MPa, e de (4.61),

= 2494 MPa.

Num compósito unidireccional, o processo de rotura é bastante mais complexo, pois, à medida que, sob tensões crescentes, vão ocorrendo roturas sucessivas em pontos menos resistentes das fibras, as tensões são redistribuídas pelas restantes zonas das fibras através de dois mecanismos principais: › a transferência de carga gradual para a fibra que partiu, até que esta recupere o valor da tensão que actua nas fibras íntegras suficientemente afastadas do ponto de rotura; › acréscimos de tensões nas restantes fibras, sobretudo nas mais próximas da fibra que partiu, devido à concentração de tensões. Embora modelos analíticos mais simples tenham obtido concentrações de tensões apreciáveis [4.23-4.29], estudos com modelos mais elaborados [4.29-4.32], incluindo modelos 3D de elementos finitos [4.31, 4.32] mostram que este último efeito é altamente localizado, e relativamente modesto em termos de tensão média na fibra. Pelo contrário, os mecanismos de transferência de carga são fundamentais, condicionando o chamado "comprimento ineficiente", li, ao longo do qual a tensão na fibra partida retoma gradualmente a tensão das fibras íntegras. Quanto mais eficiente for a transferência de carga, menor será li, e portanto maior será o número de roturas que cada fibra pode sofrer, permitindo globalmente uma maior tensão de rotura do compósito. Vejamos em mais pormenor o que se passa após a rotura de uma fibra, de acordo com a representação esquemática da figura 4.13. Devido às elevadas tensões aplicadas, as superfícies de fractura da fibra separam-se, gerando instantaneamente na interface fibra-matriz tensões de corte elevadas. A camada de matriz que circunda as superfícies fracturadas da fibra vai estar sujeita às tensões de corte transmitidas pela interface. Logo, se a interface for menos resistente ao corte do que a matriz, dar-se-à a descoesão interfacial. Caso contrário, devido à acção combinada das tensões de corte e das tensões normais, forma-se uma fenda na matriz, seguida de uma zona plástica relativamente extensa. Para analisarmos a transferência de carga, consideremos inicialmente o equilíbrio de forças de um elemento de fibra (figura 4.14), que se traduz por

(4.62)

114

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

sendo df o diâmetro da fibra e τi a tensão de corte longitudinal na interface.

a)

b)

Figura 4.13. Modos de rotura à volta de uma fibra partida: a) descoesão interfacial; b) fissuração da matriz.

Figura 4.14. Equilíbrio de forças de um elemento de fibra à tracção.

Resta estabelecer as condições exactas de transferência de carga, o que fazemos recorrendo ao modelo da figura 4.15 [4.32]. Neste, a camada de matriz à volta da fibra partida é representada por um cilindro de raio exterior rm, tangente às fibras vizinhas de um arranjo hexagonal.

115

MATERIAIS COMPÓSITOS

Figura 4.15. Modelo de cilindros concêntricos para determinação da transferência de carga da matriz para a fibra partida [4.32], aplicável para descoesão interfacial (a) ou fissuração da matriz (b).

Como vimos anteriormente, imediatamente a seguir à superfície fracturada da fibra, ou seja, para 0 ≤ z < zr (figura 4.15), dá-se descoesão interfacial ou forma-se uma zona de cedência plástica da matriz. Admitimos então que a tensão de corte interfacial assume nessa zona um valor constante, τir, igual à tensão de rotura da interface, τui, ou à tensão de cedência da matriz, τpm. Esta última hipótese implica admitir que a matriz tem comportamento elasto-perfeitamente plástico. Assim, sendo a tensão na fibra nula em z = 0, da integração de (4.62), (4.63) equação idêntica à dos modelos de Kelly [4.33] e de Piggott [4.34] para os casos de adesão perfeita e de descoesão interfacial, respectivamente. Em qualquer dos casos, em z ≥ zr, há, obviamente, uma zona de adesão interfacial em que a matriz se mantém elástica. Dada a maior rigidez das fibras, podemos admitir deformação de corte na matriz constante na direcção radial, e que, (4.64) onde wb e wo são os deslocamentos axiais das fibras partida e vizinhas mais próximas (figura 4.15), respectivamente, e, da geometria hexagonal da célula (figura 4.15), (4.65) Se aplicarmos a lei de Hooke, 116

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

(4.66) substituirmos as variáveis em (4.62), e derivarmos esta última, obtemos (4.67) Sendo σfo a tensão remota nas fibras íntegras, (4.68) (4.69) que, substituídas em (4.67), dão origem a uma equação diferencial para σf, cuja solução é (4.70) com (4.71) As condições fronteira a impor são que σf → σfo quando z → ∝, de onde C2 = 0, e que τi(zr) = τir, obtendo-se τi(z) da substituição de (4.70) em (4.62). Obtemos finalmente (4.72) e, da continuidade de σf em z = zr, (4.73) A equação (4.72) é semelhante à de Cox [4.35], que, porém, não considerou nenhuma zona precedente, tornando portanto o seu modelo irrealista. A figura 4.16 mostra a forma típica da curva de evolução da tensão na fibra partida. Dada a evolução assimptótica de σf na zona elástica, define-se normalmente o comprimento ineficiente li anteriormente referido como sendo a distância z na qual se atinge uma percentagem elevada da tensão remota, ou seja, (4.74) Portanto, atendendo a (4.72) e a (4.73), (4.75) 117

MATERIAIS COMPÓSITOS

Como sugere a figura 4.16, li é fortemente condicionado pelas zonas de descoesão interfacial ou de cedência da matriz.

Figura 4.16. Forma típica da distribuição de tensão ao longo da fibra partida.

Exemplo 4.3. Considere um compósito carbono/epóxido unidireccional com as seguintes características: Ef1 = 230 GPa; df = 6 μm; Em = 3.5 GPa; νm = 0.35; τpm = 60 MPa; Vf = 0.6. a) Definindo li como sendo a distância a que a tensão na fibra atinge 98 % da tensão remota e admitindo que τir = τpm, determine li quando

εfo = 1 % e quando εfo = 1.5 %.

b) Resolva a) com τir = 0.5τpm. Resolução a) De (4.65), tm = 1.377 μm, e sabendo que

obtemos de (4.71)

β = 52.24 mm-1. Como

da aplicação de (4.75) resulta

b) Procedendo de modo análogo a a), obtém-se

Este exemplo mostra claramente a importância da boa adesão interfacial para minimizar li, que se traduz em melhoria na resistência à tracção longitudinal. Estudos mais recentes [4.36, 4.37] indicam ser esta a situação mais frequente nos compósitos, dada a utilização de revestimentos das fibras com o objectivo específico de promover boa adesão à matriz. No entanto, em [4.32] é colocada a hipótese de haver roturas inter118

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

faciais devido às elevadas deformações de corte locais a que está sujeita a fina camada de matriz. O exemplo permite também verificar que li é muito mais pequeno do que os comprimentos de referência, L, em que é possível determinar directamente as distribuições estatísticas de resistência das fibras (4.56). É portanto questionável a aplicabilidade destas a segmentos de fibra com comprimento li, problema que é particularmente importante, pois os modelos de previsão da resistência do compósito dividem as fibras em vários segmentos com aquela dimensão. Os modelos mais elaborados recorrem à simulação de Monte Carlo [4.25-4.27], com a resistência de cada segmento gerada aleatoriamente com base na distribuição estatística (4.56). Procede-se então ao acréscimo gradual da carga aplicada, determinando as roturas sucessivas dos vários segmentos de fibra e efectuando as redistribuições de tensões correspondentes, até que não seja possível aumentar mais a carga. Trata-se portanto de modelos que exigem meios computacionais consideráveis, e que não deixam de assentar em algumas hipóteses simplistas, por exemplo, li independente da tensão na fibras, e regras relativamente grosseiras de transferência de carga para as fibras vizinhas [4.25-4.27]. Mais uma vez, face a estas dificuldades, é pertinente a questão da real necessidade da previsão micromecânica de σut1, dado que se trata de uma grandeza que é essencial medir. Por um lado, recordemos que a análise micromecânica permitiu compreender os mecanismos de rotura e identificar os factores relevantes para maximizar σut1, caso da boa adesão interfacial. Por outro lado, há também uma aplicação de grande importância, que são os efeitos de tamanho em σut1, resultantes da distribuição estatística de resistência das fibras. Como veremos no capítulo 6, estes manifestam-se na presença de zonas de concentração de tensões, pois o volume de material sujeito a tensões elevadas é relativamente pequeno. Por conseguinte, a previsão da resistência longitudinal à tracção é uma área de investigação relevante.

4.3.2. RESISTÊNCIA LONGITUDINAL À COMPRESSÃO O interesse na previsão micromecânica da resistência longitudinal à compressão, σuc1, é reforçado pelas dificuldades na medição experimental. De facto, como veremos em mais detalhe no capítulo 9, dos ensaios de compressão de provetes unidireccionais obtêm-se geralmente valores de σuc1 inferiores aos de σut1 [4.38-4.42]. Na verdade, isso deve-se a acentuados efeitos de transmissão de carga, que conduzem a rotura prematura junto às zonas de amarração. Com métodos de ensaio mais recentes, demonstrou-se que, em vários tipos de compósitos, σuc1 era frequentemente superior 119

MATERIAIS COMPÓSITOS

a σut1 [4.41, 4.42]. Diversos estudos experimentais mostraram que o mecanismo de rotura à escala micromecânica é a microencurvadura das fibras, que por vezes dá origem às chamadas bandas de corte (figura 4.17), visíveis após a rotura dos provetes [4.1, 4.43-4.45]. Os modelos de previsão são por isso de dois tipos: › modelos que tratam directamente a microencurvadura das fibras, trabalhando a uma escala verdadeiramente micromecânica; › modelos que consideram a propagação das bandas de corte que surgem em consequência da microencurvadura.

Figura 4.17. Bandas de corte observadas em ensaios de compressão de compósitos unidireccionais.

Dentro da primeira categoria, o modelo de Rosen [4.46] foi a primeira abordagem a adquirir notoriedade. Rosen considerou dois modos de microencurvadura (figura 4.18), que classificou de "extensional" e "de corte", consoante as deformações prevalecentes na matriz. Com base nas análises e nas observações experimentais, verificou-se, como aliás é intuitivo, que é o modo de corte que ocorre nos casos de interesse prático, nos quais os compósitos possuem teores de fibra elevados. O modelo 2D de Rosen assenta fundamentalmente nas seguintes hipóteses: › as fibras estão inicialmente perfeitamente alinhadas com a carga de compressão aplicada; › a flexão das fibras é descrita pela Teoria das Vigas; › a matriz tem comportamento linear elástico.

Figura 4.18. Os modos de microencurvadura: a) extensional; b) de corte.

120

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

A rotura dá-se quando é atingida a tensão limiar de instabilidade da fibra, σfi, sendo a resistência à compressão do compósito σuc1 obtida através de (4.4), na qual podemos desprezar a contribuição da matriz, isto é, (4.76) A energia potencial do sistema é dada por (4.77) em que W é o trabalho realizado pela carga aplicada à fibra, Uf é a energia de deformação de flexão da fibra e Um é a energia de deformação de corte da matriz. Por conveniência, consideramos todas estas quantidades por unidade de espessura do compósito. Tratando-se de uma análise linear, a instabilidade ocorre quando a energia potencial se anula, ou seja, quando (4.78) O trabalho realizado pela carga de compressão é (4.79) onde hf e hm são as dimensões características da fibra e da matriz (figura 4.1) e uc é o deslocamento do ponto de aplicação da carga. Desprezando as deformações de compressão da fibra, (figura 4.19),

(4.80) admitindo pequenos deslocamentos transversais da fibra, y(x).

Figura 4.19. Definição do deslocamento do ponto de aplicação da carga de compressão.

Recorrendo à Teoria das Vigas, a energia de flexão da fibra é dada por [4.47] 121

MATERIAIS COMPÓSITOS

(4.81) em que o momento flector é (4.82) e If é o segundo momento de área da secção, neste caso, If = hf3/12, pelo que (4.81) pode escrever-se (4.83) A energia de deformação de corte da matriz é, genericamente, (4.84) onde a deformação de corte da matriz, γm, é determinada com base nas hipóteses cinemáticas da figura 4.20, ou seja,

(4.85) que, substituída em (4.84), dá (4.86)

Figura 4.20. Cinemática do modelo de modo de corte de microencurvadura [4.46].

Resta agora substituir as equações (4.79), (4.80), (4.83) e (4.86) em (4.78), obtendo-se uma equação diferencial para a deformada da fibra y(x). Demonstra-se [4.46, 4.47] que a solução que dá origem à menor tensão crítica é 122

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

(4.87) do que resulta

(4.88) pois o comprimento de encurvadura, L, é naturalmente muito maior do que hf. Substituindo agora (4.88) em (4.76), obtém-se a conhecida fórmula de Rosen (4.89) na qual é interessante verificar que não intervêm as propriedades da fibra, pois a energia de flexão da fibra é desprezável face à energia de deformação ao corte da matriz. Na realidade, esta expressão prevê valores demasiado elevados para a resistência à compressão, tipicamente entre 3 e 4 GPa, facto que se explica pela influência combinada da ondulação inicial das fibras e do comportamento não-linear da matriz. Vários autores (por exemplo [4.48-4.51]) desenvolveram modelos, baseados na formulação de Rosen, com o intuito de ter em conta aqueles dois factores. Todavia, os modelos rigorosos exigem sempre formulações geometricamente não-lineares e procedimentos numéricos iterativos de resolução das equações [4.52, 4.53]. Uma hipótese para simplificar o problema consiste em admitir que o estado de instabilidade é aproximadamente igual ao de início de cedência plástica da matriz [4.54]. Na presença de ondulações iniciais do tipo sinusoidal (4.90) e supondo que a deformada é, em qualquer instante, (4.91) o trabalho realizado pela carga aplicada é agora dado por

(4.92) 123

MATERIAIS COMPÓSITOS

Por seu turno, a deformação de corte na matriz é (4.93) e, uma vez inserida em (4.84), obtém-se (4.94) Desprezando a energia de flexão da fibra, a energia potencial do sistema (4.77) é apenas

e substituindo (4.92) e (4.94), (4.95) Do Princípio da Energia Potencial Mínima, (4.96) obtemos (4.97)

Resta agora usar um critério de cedência da matriz, que, no caso mais geral, tem que ter em conta o estado biaxial de tensões a que esta está sujeita, incluindo as tensões de compressão, σm. No entanto, se admitirmos que Ef1 >> Em, o que é uma excelente aproximação para compósitos de fibra de carbono, podemos ignorar σm e considerar apenas a tensão de corte

(4.98) depois de substituídas (4.93), (4.90) e (4.91). Atendendo a (4.97), (4.99)

em que θ0 é o ângulo máximo de ondulação da sinusóide, que, sendo bastante pequeno,

124

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

(4.100) Se recorrermos à aproximação elasto-perfeitamente plástica de igual energia de deformação da figura 4.21 e usarmos um módulo de corte médio, Gem = τum/γem, podemos resolver (4.99) para a tensão de rotura (4.101)

Figura 4.21. Aproximação elasto-perfeitamente plástica de igual energia de deformação.

Esta formulação 2D pode ainda ser extendida a 3D substituindo em (4.101) Gem por um módulo equivalente [4.53, 4.54] (4.102) pelo que (4.103)

Como é evidente, é difícil encontrar disponíveis os valores do ângulo de ondulação θ0 e de Gem, que exige o conhecimento de toda a curva τ-γ da matriz. Os valores de θ0 podem ser obtidos por análise da elipticidade das secções das fibras em cortes transversais do compósito [4.55-4.58], ou por reconstituição das trajectórias dos centros das fibras ao longo de cortes transversais sucessivos [4.59]. Os ângulos das ondulações são obviamente sujeitos a variabilidade estatística, e os valores absolutos médios andam à volta de 0.8 a 1º [4.55-4.59]. A tabela 4.3 compara as previsões de (4.95) com resultados experimentais [4.54], revelando geralmente boa concordância.

125

MATERIAIS COMPÓSITOS

Tabela 4.3. Comparação do modelo de previsão com resultados experimentais para compósitos carbono/epóxido [4.44].

Para concluir, uma breve referência à outra abordagem referida, que consiste em modelar a propagação das bandas de corte (figura 4.17), originada pela rotura à flexão das fibras resultante de microencurvadura localizada [4.60-4.67]. Estes modelos tratam o compósito como um sólido homogéneo anisotrópico, não sendo por isso verdadeiramente micromecânicos. O principal modelo deste tipo foi desenvolvido por Budianski [4.60]. Os cálculos são longos e elaborados sobretudo quando são incluídos os desalinhamentos iniciais e o comportamento elasto-perfeitamente plástico da matriz. Uma limitação importante do modelo é necessitar, como dado do problema, do valor do ângulo de inclinação da banda, β (figura 4.17). Segundo a maior parte dos autores [4.60-4.67], β ≈ 15º, valor para o qual se prevê [4.60] (4.104)

em que φ0 é o ângulo de desalinhamento inicial das fibras. É interessante verificar que, não obstante serem diferentes as quantidades envolvidas, são notórias as semelhanças entre as equações (4.96) e (4.95).

4.3.3. CONCLUSÃO Nesta secção, foram apresentadas análises micromecânicas das resistências longitudinais à tracção e à compressão da camada. No primeiro caso, há dificuldades em obter dados experimentais que são essenciais para os modelos. Por outro lado, os modelos até agora propostos são complexos, sem que o rigor possa ser realmente comprovado. Quanto à resistência à compressão, há modelos que se exprimem por equações bastante simples, e cujas previsões se revelaram bastante rigorosas. Todavia, os dados necessários para os aplicar raramente estão disponíveis. Estas limitações, que resultam naturalmente da complexidade dos problemas tratados, poderão ser ultrapassadas com os progressos nas técnicas experimentais, o que 126

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

permitirá aplicar modelos micromecânicos com maiores níveis de confiança.

Referências 4.1. Rosen, B.W., Z. Hashin. Analysis of Material Properties. In: Engineered Materials Handbook, Volume 1 (Composites). ASM International, 1987. 4.2. Halpin, J. C. Primer on Composite Materials: Analysis. Technomic Publishing Co., 1984. 4.3. McCullough, R. L. Micro-Models for Composite Materials - Continuous Fiber Composites. In: Delaware Composites Design Encyclopedia, Volume 2. Technomic Publishing Co., 1990. 4.4. Whitney, J. M., M. B. Riley. Elastic Properties of Fiber Reinforced Composite Materials. AIAA Journal, 4: 1537-1542 (1966). 4.5. Whitney, J. M. Elastic Moduli of Unidirectional Composites with Anisotropic Filaments. Journal of Composite Materials, 1: 188-193 (1967). 4.6. Paul, B. Prediction of Elastic Constants of Multi-Phase Materials. Transactions of AIME, 218: 36-41 (1960). 4.7. Torquato, S. Random Heterogeneous Media: Microstructure and Improved Bounds on Effective Properties. Applied Mechanics Reviews, 44: 37-76 (1991). 4.8. Aboudi, J. Micromechanical Analysis of Composites by the Method of Cells. Applied Mechanics Reviews, 42: 193-221 (1989). 4.9. Paley, M., J. Aboudi. Micromechanical Analysis of Composites by the Generalized Cells Model. Mechanics of Materials 14: 127-139 (1992). 4.10. Morais, A. B. Transverse Moduli of Continuous-Fibre-Reinforced Polymers. Composites Science and Technology, 60: 997-1002 (2000). 4.11. Berenberg, B. Composite Materials Guide. "http://plastics.about.com", 2002. 4.12. Engineered Materials Handbook. Volume 2: Engineering Plastics. ASM International, 1988. 4.13. Young, R. J., P. A. Lovell. Introduction to Polymers. Chapman & Hall, 1991. 4.14. Liu, K., M. R. Piggott. Fracture Failure Processes in Polymers. I: Mechanical Tests and Results. Polymer Engineering and Science, 38: 60-68 (1998). 4.15. Liu, K., M. R. Piggott. Shear Strength of Polymers and Fiber Composites. 1. Thermoplastic and Thermoset Polymers. Composites, 26: 829-840 (1995). 4.16. Adams, D. F, E. Q. Lewis. Experimental Assessment of four Composite Material Shear Test Methods. Journal of Testing and Evaluation, 25: 174-181 (1997). 4.17. Hodgkinson, J. M. Mechanical Testing of Advanced Fibre Composites. CRC Press, 2000. 4.18. Flaggs, D. L., M. H. Kural. Experimental Determination of the In Situ Transverse Lamina Strength in Graphite/Epoxy Laminates. Journal of Composite Materials, 16: 103-116 (1982). 4.19. Crossman, F. W., A. S. D. Wang. The Dependence of Transverse Cracking and Delamination on Ply Thickness in Graphite/Epoxy Laminates. ASTM STP 775, 118-139 (1982).

127

MATERIAIS COMPÓSITOS

4.20. Chang, F. K., M. H. Chen. The In Situ Ply Shear Strength Distributions in Graphite/Epoxy Laminated Composites. Journal of Composite Materials, 21: 708-733 (1987). 4.21. Padget, W. J., S. D. Durham, A. M. Mason. Weibull Analysis of the Strength of Carbon Fibers using Linear and Power Law Models for the Length Effect. Journal of Composite Materials, 29: 1873-1884 (1994). 4.22. Deng, S., L. Ye, Y. M. Mai, H. Y. Liu. Evaluation of Fibre Tensile Strength and Fibre/Matrix Adhesion using Single Fibre Fragmentation Tests. Composites Part A, 29A: 423-434 (1998). 4.23. Shih GC, Ebert LJ. Theoretical Modelling of the Effect of the Interfacial Shear Strength on the Longitudinal Tensile Strength of Unidirectional Composites. Journal of Composite Materials, 21: 207-224 (1987). 4.24. Gao, Z., K. L. Reifsnider, G. Carman. Strength Prediction and Optimization of Composites with Statistical Fiber Distributions. Journal of Composite Materials, 26: 1678-1705 (1992). 4.25. Curtin, W. A., N. Takeda. Tensile Strength of Fibre-Reinforced Composites: I. Model and Effects of Local Fiber Geometry. Journal of Composite Materials, 32: 2042-2059 (1998). 4.26. Curtin, W. A., N. Takeda. Tensile Strength of Fibre-Reinforced Composites: II. Application to Polymer Matrix Composites. Journal of Composite Materials, 32: 2060-2081 (1998). 4.27. Durham, S. D., J. D. Lynch, W. J. Padgett, T. J. Horan, W. J. Owen, J. Surles. Localized Load-Sharing Rules and Markov-Weibull Fibers: A Comparison of Microcomposite Failure Data With Monte Carlo Simulations. Journal of Composite Materials, 31: 1856-1882 (1997). 4.28. Landis, C. M., M. A. McGlockton, R. M. McMeeking. An Improved Shear Lag Model for Broken Fibers in Composite Materials. Journal of Composite Materials, 33: 667-680 (1999). 4.29. Landis, C. M., R. M. McMeeking. Stress Concentrations in Composites with Interface Sliding, Matrix Stiffness and Uneven Fibre Spacing using Shear Lag Theory. International Journal of Solids and Structures, 28: 4333-4361 (1999). 4.30. Landis, C. M., R. M. McMeeking. A Shear-Lag Model for a Broken Fiber Embedded in a Composite with a Ductile Matrix. Composites Science and Technology, 59: 447-457 (1999). 4.31. Nedele, M. R., M. R. Wisnom. Three-Dimensional Finite Element Analysis of the Stress Concentration at a Single Fibre Break. Composites Science and Technology, 51: 517-524 (1994). 4.32. Morais, A. B. Stress Distribution along Broken Fibres in Polymer-Matrix Composites. Composites Science and Technology, 61: 1571-1580 (2001). 4.33. Kelly, A., W. R. Tyson. Tensile Properties of Fibre Reinforced Metals: Copper/Tungsten and Copper/Molybdenum. Journal of the Mechanics and Physics of Solids, 13: 329-350 (1965). 4.34. Piggott, M. R. Load Bearing Fibre Composites. Pergamon Press, 1980. 4.35. Cox, H. L. The Elasticity and Strength of Paper and other Fibrous Materials. British Journal of Applied Physics, 3: 72-79 (1952). 4.36. van den Heuvel, P. W. J., M. K. Wubbolts, R. J. Young, T. Peijs. Failure Phenomena in Two-Dimensional Multi-Fibre Model Composites: 5. A Finite Element Study. Composites Part A, 29A: 1121-1135 (1998). 4.37. van den Heuvel, P. W. J., T. Peijs, R. J. Young. Failure Phenomena in Two-Dimensional Multi-

128

CAPÍTULO 4: MICROMECÂNICA DA CAMADA

Fibre Microcomposites: Part 4: A Raman Spectroscopic Study on the Influence of the Matrix Yield Stress on Stress Concentration. Composites Part A, 31A: 161-171 (2000). 4.38. Häberle, J. G, F. L. Matthews. An Improved Test Technique for Compression Testing of Unidirectional Fibre-Reinforced Plastics, Development and Results. Composites, 25: 358-371 (1994). 4.39. Kim, R. Y., A. S. Crasto. A Longitudinal Compression Test for Composites using a Sandwich Specimen. Journal of Composite Materials, 26: 1915-1929 (1992). 4.40. Welsh, J. S., D. F. Adams. An Experimental Investigation of the Mini-Sandwich Laminate as used to obtain Unidirectional Composite Compression Strengths. Journal of Composite Materials, 31: 293-314 (1997). 4.41. Vautey, P., J. Dartyge, A. Horoschenkoff, R. Aoki, S. Hitchen, W. 't Hart, P. Sigety, G. DeGeorges, A. Marques. Axis of Development to improve Composites Compressive Strength. International Symposium on Advanced Materials for Lightweight Structures 94 (1994). 4.42. Welsh, J. S., D. F. Adams. Testing of Angle-Ply Laminates to obtain Unidirectional Composite Compression Strengths. Composites Part A, 28A: 387-396 (1997). 4.43. Greszczuk, L. B. Compressive Strength and Failure Modes of Unidirectional Composites. ASTM STP 321, 192-217, 1973. 4.44. Greszczuk, L. B. On Failure Modes of Unidirectional Composites under Compressive Loads. in Fracture of Composite Materials. Edited by G. Sih and V. Tamuzs. Martinus Nijhoff, 1982. 4.45. Naik, N. K., R. S. Kumar. Compressive Strength of Unidirectional Composites: Evaluation and Comparison of Prediction Models. Composite Structures, 46: 299-308 (1999). 4.46. Rosen, B. W. Mechanics of Composite Strengthening. In: Fiber Composite Materials. ASM, 1965. 4.47. Timoshenko, S. P., J. M. Gere. Theory of Elastic Stability. McGraw-Hill, 1975. 4.48. Steif, P. S. A Simple Model for the Compressive Failure of Weakly Bonded, Fiber-Reinforced Composites. Journal of Composite Materials, 22: 818-828 (1988). 4.49. Frost, S. R. Compressive Behaviour of Long-Fibre Unidirectional Composites. Journal of Composite Materials, 26: 1151-1172 (1992). 4.40. Lin, K. Y., X. J. Zhang. Effect of Fiber Waviness on the Compressive Strength of Laminated Composites. Proccedings of the 2nd International Symposium on Composite Materials and Structures, 120-125 (1992). 4.51. Xu, Y. L., K. L. Reifsnider. Micromechanical Modeling of Composite Compressive Strength. Journal of Composite Materials, 27: 572-588 (1993). 4.52. Morais, A. B. Modelling Lamina Longitudinal Compression Strength of Carbon Fibre Composite Laminates. Journal of Composite Materials, 30: 1115-1131 (1996). 4.53. Morais, A. B., A. T. Marques. A Micromechanical Model for the Prediction of the Lamina Longitudinal Compression Strength of Composite Laminates. Journal of Composite Materials, 31: 1397-1412 (1997). 4.54. Morais, A. B. Prediction of the Layer Longitudinal Compression Strength. Journal of Composite Materials, 34: 1808-1820 (2000). 4.55. Mrse, A., M. R. Piggott. Relation between Fibre Divagation and Compressive Properties of Fibre

129

MATERIAIS COMPÓSITOS

Composites. Proceeding of the 35th International SAMPE Symposium, 2236-2244 (1990). 4.56. Camponeshi, E. T. Lamina Waviness in Thick Composites and its Effect on their Compression Strength. Proceedings of ICCM 8, 30-F (1991). 4.57. Camponeshi, E. T., J. W. Gillespie, D. J. Wilkins. Kink Failure Analysis of Thick Composites in Compression. Journal of Composite Materials, 27: 471-490 (1992). 4.58. Paluch, B. Analysis of Geometric Imperfections in Unidirectionally Reinforced Composites. Proceedings of ECCM 6, 305-310 (1993). 4.59. Clarke, A. R. G. Archenhold, N. C. Davidson. A Novel Technique for Determining the 3D Spatial Distribution of Glass Fibers in Polymer Composites. Composites Science and Technology, 55: 7591 (1995). 4.60. Budianski, B. Micromechanics. Computers & Structures, 16: 3-12 (1983). 4.61. Budianski, B., N. A. Fleck. Compressive Failure of Fibre Composites. Journal of Mechanics and Physics of Solids, 41: 183-211 (1993). 4.62. Steif, P. S. A Model for Kinking in Fibre Composites - I. Fibre Breakage via Micro-buckling. International Journal of Solids and Structures, 26: 549-561 (1990). 4.63. Steif, P. S. A Model for Kinking in Fibre Composites - II. Kink Band Formation. International Journal of Solids and Structures, 26: 563-569 (1990). 4.64. Chaudhuri, R. A. Prediction of the Compressive Strength of Thick-section Advanced Composite Laminates. Journal of Composite Materials, 25: 1244-1276 (1992). 4.65. Lagoudas, D. C., A. M. Saleh. Compressive Failure due to Kinking of Fibrous Composites. Journal of Composite Materials, 27: 83-106 (1993). 4.66. Hsu, S.-Y., T. J. Vogler, S. Kyriakides. Compressive Strength Predictions for Fibre Composites. Journal of Applied Mechanics, 65: 7-16 (1998). 4.67. Barbero, E. J. Prediction of Compression Strength of Unidirectional Polymer Matrix Composites. Journal of Composite Materials, 32: 483-502 (1998).

130

CAPÍTULO 5: CRITÉRIOS DE ROTURA DA CAMADA

Capítulo 5

Critérios de Rotura da Camada

5.1. Introdução No capítulo anterior (vide 4.3), foram apresentados os modos básicos de solicitação da camada, bem como valores típicos das tensões de rotura correspondentes. No entanto, é fundamental saber prever a rotura nas situações mais gerais, em que uma camada integra um compósito multidireccional, sujeito a solicitações multiaxiais. É precisamente este o objectivo dos critérios de rotura. Como é evidente, trata-se de um assunto cuja complexidade é incompatível com uma análise micromecânica nos moldes do capítulo 4. Volta-se por isso a considerar a camada como um sólido homogéneo anisotrópico, como foi feito no capítulo 3. Ficaram então patentes as vantagens em recorrer às leis constitutivas no referencial principal 123 , e daí os critérios de rotura serem sempre expressos em função das tensões neste referencial. Por conseguinte, a obtenção destas tensões através das operações descritas no capítulo 3 é o primeiro passo para avaliar a integridade da camada. Atendendo ao actual estado da arte e à sua importância prática, continuamos, no seguimento de 3.6, a admitir estado plano de tensão na direcção da espessura da camada. Idealmente, os critérios de rotura deveriam obedecer a dois requisitos fundamentais algo contraditórios: › interactividade plena, ou seja, a capacidade de ter em conta os efeitos de todas as componentes das tensões;

131

MATERIAIS COMPÓSITOS

› permitir a identificação do modo de rotura ao nível micromecânico, o que é particularmente importante ao nível da distinção básica entre roturas de fibras e roturas da matriz, pois são as primeiras que comprometem decisivamente a integridade global do laminado, como veremos no capítulo 7. Outro ponto importante é o compromisso entre complexidade e rigor. De facto, os critérios mais elaborados exigem geralmente mais dados experimentais, nomeadamente resultados de ensaios biaxiais. Todavia, estes ensaios são de execução delicada, estando sujeitos a problemas de rotura prematura junto aos sistemas de amarração e a dispersões estatísticas consideráveis (ver capítulo 10). O desenvolvimento de critérios de rotura tem merecido grande atenção dos investigadores, não sendo possível rever exaustivamente todos os critérios propostos. Vamos portanto restringir-nos principalmente aos que têm demonstrado ser os mais rigorosos, tendo porém em mente que não existe actualmente um critério que se possa afirmar ser claramente superior a outros.

5.2. Critérios Não-Interactivos Tal como o nome indica, os critérios não-interactivos não têm em conta os efeitos combinados das várias componentes do tensor das tensões [5.1, 5.2]. A limitação principal destes critérios é que as previsões não são geralmente conservadoras, sobretudo perante estados de tensão que se desviam bastante da uniaxialidade. No entanto, há autores que preferem este tipo de critérios, na medida em que possibilitam uma identificação imediata do modo de rotura, e porque não está efectivamente demonstrado que sejam menos rigorosos que os critérios interactivos [5.3-5.6]. Pertence a este grupo o chamado critério da tensão máxima, que prevê a rotura quando uma das componentes do tensor das tensões atinge a tensão de rotura correspondente. Deste modo, para evitar a rotura há que garantir que se verificam as seguintes desigualdades: (5.1)

onde os valores numéricos das resistências à compressão são considerados positivos.

132

CAPÍTULO 5: CRITÉRIOS DE ROTURA DA CAMADA

Zinoviev et al [5.3, 5.4] usaram este critério num estudo internacional recente em que foi disponibilizado um vasto conjunto de resultados experimentais [5.7]. Apesar da não-interactividade, o critério da tensão máxima revelou-se um dos mais rigorosos [5.7]. Outro critério não-interactivo é o critério da deformação máxima, segundo o qual a rotura se dá quando uma das deformações atinge o respectivo valor de rotura. A condição de integridade exprime-se agora por

(5.2)

Recorrendo à lei constitutiva (3.51), pode-se exprimir este critério em termos de tensões. A figura 5.1 compara as curvas de rotura previstas pelos critérios da tensão máxima e da deformação máxima numa situação de carregamento biaxial com σ1 e σ2, admitindo propriedades típicas da camada de um compósito de fibra de carbono.

Figura 5.1. Curvas de rotura previstas pelos critérios de tensão máxima (TM) e da deformação máxima (DM). Admitiu-se E1 = 140 GPa, E2 = 10 GPa, ν12 = 0.28, G12 = 6 GPa, σut1 = 2000 MPa, σuc1 = 1800 MPa, σut2 = 60 MPa,

σuc2 = 180 MPa e τu12 = 75 MPa.

Este critério não apresenta vantagens significativas em relação ao da tensão máxima, e tem como limitação a necessidade de recorrer à lei constitutiva, o que dificulta a aplicação a processos de degradação progressiva das camadas em laminados multidireccionais. Hart-Smith [5.5, 5.6] introduziu algumas alterações ao critério com o intuito de melhorar as suas previsões. Porém, quando confrontados com um vasto conjunto de resultados experimentais, as diversas variantes do critério revelaram-se claramente inferiores ao critério de Zinoviev et al, bem como a alguns critérios interactivos. 133

MATERIAIS COMPÓSITOS

5.3. Critérios Interactivos Os critérios de rotura interactivos mais importantes são quadráticos, isto é, exprimem-se em função das tensões sob a forma de polinómios do 2º grau. Um dos mais utilizados é o chamado critério de Tsai-Hill [5.1, 5.2, 5.8], que deriva do critério de Hill de cedência plástica dos metais. Este, por sua vez, foi desenvolvido a partir do critério de cedência de von Mises para metais isotrópicos, com o objectivo de descrever a anisotropia resultante do encruamento. No caso mais geral de solicitações tridimensionais, a fórmula do critério de Hill é (5.3) em que as constantes A, , , F são determinadas com base nas tensões de cedência σ0,ij, medidas em ensaios sob solicitações uniaxiais:

(5.4)

Admitindo estado plano de tensão e substituindo as tensões de cedência por tensões de rotura, obtém-se o critério de Tsai-Hill, que prevê a rotura quando (5.5) Notar que o critério de Hill admite que as tensões de cedência são iguais em tracção e em compressão, mas tal não se aplica às tensões de rotura da camada. Na prática, esta dificuldade é contornada adoptando a resistência correspondente ao sinal da tensão. Por exemplo, se σ1 > 0 e σ2 < 0, devem-se usar em (5.5) σut1 e σuc2. A figura 5.2 mostra a curva de rotura prevista para estados de tensão biaxiais com σ1 e σ2, comparando-a com o critério da tensão máxima.

134

CAPÍTULO 5: CRITÉRIOS DE ROTURA DA CAMADA

Figura 5.2. Curvas de rotura previstas pelos critérios da tensão máxima (TM) e de Tsai-Hill (TH). Admitiu-se σut1 = 2000 MPa, σuc1 = 1800 MPa, σut2 = 60 MPa, σuc2 = 180 MPa e τu12 = 75 MPa.

Apesar de ter tido alguma popularidade, o critério de Tsai-Hill apresenta várias deficiências ao nível da sua base teórica. De facto, são evidentes as inconsistências com a formulação inicial de Hill de que deriva, e que contrariam os resultados experimentais para compósitos. Nomeadamente, é sabido que, nos metais, estados de tensão hidrostáticos não provocam cedência plástica, facto que motiva a utilização exclusiva de termos quadráticos das tensões em (5.3), que obviamente se mantém em (5.5). Na realidade, verifica-se que os compósitos unidireccionais podem sofrer rotura sob estados de tensão hidrostáticos. Hoffman [5.9] prop s um critério que incorpora termos lineares nas tensões. Na realidade, trata-se de um caso particular da formulação de Tsai e Wu [5.10], na qual a superfície de fractura é descrita pelo polinómio tensorial quadrático (5.6) em que Fi e Fij são tensores de resistência a determinar experimentalmente e i, j = 1, 2, ... , 6, recorrendo portanto à notação contraída definida no capítulo 3. Admitindo estado plano de tensão e excluindo o termo linear em σ6 = τ12, desnecessário porque a resistência ao corte não depende do sinal, obtém-se a fórmula do critério dito de Tsai-Wu, (5.7) Facilmente se constata que a inclusão dos termos lineares em σ1 e em σ2 permite ter em conta as diferentes resistências à tracção e à compressão, o que torna o critério naturalmente consistente com o comportamento real dos compósitos. As situações de carregamento uniaxial podem ser usadas para determinar quase todos os parâmetros 135

MATERIAIS COMPÓSITOS

de (5.7). Por exemplo, os parâmetros F1 e F11 são obtidos considerando os casos de tracção e de compressão longitudinais, resolvendo o sistema de equações

Procedendo deste modo, facilmente se obtêm:

(5.8)

continuando a assumir valores algebricamente positivos para as resistências à compressão. A excepção é F12, cuja determinação rigorosa exige a realização de ensaios biaxiais com tensões σ1 e σ2. Como já foi referido, estes são difíceis de executar, e os resultados apresentam dispersões consideráveis. Isto afecta o rigor dos valores de F12 e, consequentemente, das previsões do critério. Wu [5.11] sugeriu por isso processos elaborados de optimização do rácio σ1/σ2 a adoptar no ensaio biaxial de modo a minimizar o erro na determinação de F12. Para assegurar que (5.7) delimita uma superfície fechada, deve verificar-se que (5.9) Por outro lado, a concretização do valor de F12 permite também encarar outros critérios propostos como casos particulares do critério de Tsai-Wu. Por exemplo, no critério de Hoffman [5.9], (5.10) enquanto Tsai e Hahn [5.12] sugeriram (5.11) dando origem ao chamado critério de von Mises generalizado. Resultados experimentais indicam que, para a maior parte dos materiais [5.13, 5.14], (5.12) sendo que o limite inferior (5.11) se ajusta bem ao comportamento dos compósitos 136

CAPÍTULO 5: CRITÉRIOS DE ROTURA DA CAMADA

de fibra de carbono. Como se pode constatar na figura 5.3, as previsões do critério são bastante sensíveis ao valor de F12 no intervalo definido por (5.12). Notar também que, quando F12/(F11.F22)1/2 = -1/2, o critério prevê um aumento substancial da resistência no domínio da compressão biaxial, ou seja, quando σ1 e σ2 < 0, facto para o qual não há comprovação experimental [5.7]. Apesar destas limitações, o critério de Tsai-Wu é considerado um dos melhores critérios actualmente disponíveis, à luz de um estudo internacional realizado recentemente [5.7]. É ainda possível melhorar as capacidades de previsão dos critérios interactivos recorrendo a polinómios tensoriais cúbicos [5.15]. Todavia, acentuam-se as dificuldades na determinação dos parâmetros experimentais necessários, e subsiste uma limitação inerente aos critérios interactivos: a impossibilidade de identificar claramente o modo de rotura.

Figura 5.3. Curvas de rotura previstas pelo critério Tsai-Wu com F12/(F11.F22)1/2 = -1/2 e 0. Admitiu-se σut1 = 2000 MPa, σuc1 = 1800 MPa, σut2 = 60 MPa, σuc2 = 180 MPa e τu12 = 75 MPa.

5.4. Critérios Parcialmente Interactivos Estes critérios visam atingir um compromisso entre interactividade e capacidade de distinguir modos de rotura, sobretudo a nível de roturas de fibras e roturas de matriz. Por conseguinte, procura-se uma base micromecânica, que, como vimos no capítulo 4, assenta geralmente em duas hipóteses simplificadoras: › as tensões longitudinais são suportadas essencialmente pelas fibras; › as tensões transversais e de corte tendem a provocar roturas da matriz, uma vez que esta é menos resistente que a fibra. 137

MATERIAIS COMPÓSITOS

Descrevemos aqui os critérios de Hashin-Rotem [5.16] e de Puck [5.17, 5.18], que foram recentemente objecto de avaliação favorável [5.7]. O critério de Hashin-Rotem é idêntico ao critério da tensão máxima no que toca à rotura das fibras, ou seja, a condição de integridade é (5.13) Por seu turno, a rotura da matriz é prevista quando (5.14) sendo que σu2 = σut2 se σ2 > 0 e σu2 = σuc2 se σ2 < 0. A figura 5.4 representa a curva de rotura correspondente. Este critério foi implementado por Sun et al [5.19, 5.20], tendo-se verificado bons níveis de concordância com os resultados experimentais do estudo internacional já mencionado [5.7].

Figura 5.4. Curva de rotura de matriz prevista pelo critério de Hashin-Rotem. Admitiu-se σut2 = 60 MPa, σuc2 = 180 MPa e τu12 = 75 MPa.

O critério de Puck [5.17, 5.18] vai mais longe na análise da rotura transversal, que é genericamente designada por rotura entre fibras, de forma a incluir eventuais roturas interfaciais ou das próprias fibras. Puck considera a hipótese de o ângulo de fissuração da camada, α, poder variar conforme as solicitações que actuam na camada (figura 5.5), sendo o critério expresso em função das tensões σn, τnt e τnl, que actuam na face da fenda, e das respectivas resistências, Rn, Rnt e Rnl. Concretamente, Puck e Sch rmann [5.17, 5.18] propõem

138

CAPÍTULO 5: CRITÉRIOS DE ROTURA DA CAMADA

(5.15) em que c1, c2, pnt e pnl são parâmetros empíricos a determinar por ajuste de resultados experimentais. Do equilíbrio de forças do elemento representado na figura 5.5, obtêm-se as tensões σn, τnt e τnl em função de σ2 e τ12:

(5.16)

Figura 5.5. Tensões na face da fenda que são consideradas no critério de Puck.

De forma análoga, é possível relacionar as resistências Rn, Rnt e Rnl com σut2, σuc2 e τu12, atendendo também à isotropia transversal da camada. Por exemplo, é fácil ver que Rn = σut2, e que Rnl = τu12. Como é evidente, a aplicação deste critério exige também um cálculo prévio do ângulo de fissuração α, que, perante um estado de tensão conhecido (σ2 e τ12), consiste em achar o máximo da função Fu(α), dada por

(5.17)

139

MATERIAIS COMPÓSITOS

Puck distingue então 3 modos de fissuração (figura 5.6): › modo A, que se dá para σ2 ≥ 0 com α = 0º; › modo B, no qual α = 0º e σ2 < 0; › modo C, que se observa para σ2 < 0 e com ≠ 0 em compósitos relativamente espessos. Trata-se portanto de um critério de aplicação mais complexa, e que envolve um conjunto significativo de parâmetros empíricos. Os seus valores, bem como simplificações adicionais, são justificadas em [5.17, 5.18]. Pode-se também constatar que o critério de Puck é claramente mais optimista do que o de Hashin-Rotem na zona de σ2 < 0 (figuras 5.4 e 5.6). A comparação com resultados experimentais permitiu que o critério de Puck fosse considerado um dos melhores actualmente disponíveis [5.7].

Figura 5.6. Forma típica de uma curva de rotura transversal prevista pelo critério de Puck, e correspondência com os modos de rotura definidos. Para efeitos de comparação, incluiu-se a curva do critério de Hashin-Rotem.

Exemplo .1. Uma placa em compósito unidireccional vidro/epóxido está submetida a um estado de compressão biaxial, tal que ε2 = 3ε1. As propriedades do compósito são: E1 = 40 GPa; E2 = 8 GPa; ν12 = 0.30; G12 = 4 GPa; σut1 = 1100 MPa; σuc1 = 800 MPa; σut2 = 40 MPa; σuc2 = 130 MPa e τu12 = 70 MPa, calcule as tensões no compósito quando se der a rotura, de acordo com as previsões dos critérios de Tsai-Hill, Tsai-Wu e Hashin-Rotem. Resolução. Como vimos em 3.6, nomeadamente nas equações (3.51) e (3.52),

140

CAPÍTULO 5: CRITÉRIOS DE ROTURA DA CAMADA

não sendo relevantes para este caso as tensões e deformações de corte. Como os critérios de rotura estão expressos em função das tensões, é conveniente definir pelo que, atendendo aos dados do problema (ε2 = 3ε1),

Começando pelo critério de Tsai-Hill, a equação (5.5) reduz-se a

Recorrendo à relação entre as tensões e atendendo a que se trata de compressão biaxial, obtém-se facilmente

No que toca ao critério de Tsai-Wu (5.7), na ausência de tensões de corte, onde, de (5.8) e (5.11):

Trata-se agora de resolver para σ2 a equação polinomial quadrática, considerando apenas o caso de σ2 < 0, e de obter posteriormente σ1. O resultado: é um pouco mais optimista que o anterior. Finalmente, o critério de Hashin-Rotem (5.13) prevê rotura das fibras para

A rotura da matriz (5.14) ocorreria quando

141

MATERIAIS COMPÓSITOS

sendo portanto crítica. Notar que, neste caso particular, o critério de Hashin-Rotem é idêntico ao da tensão máxima (5.1).

Exemplo .2. Um laminado multidireccional de carbono/epóxido está sujeito a uma tensão normal σx. Pretende-se prever a rotura de uma das suas camadas que está orientada a 45º relativamente à tensão aplicada. A natureza do laminado e das condições fronteira permitem admitir que εy = γxy = 0. As propriedades da camada medidas foram: E1 = 140 GPa; E2 = 10 GPa; ν12 = 0.28; G12 = 6 GPa; σut1 = 2000 MPa;

σuc1= 1800 MPa; σut2 = 60 MPa; σuc2 = 180 MPa e τu12 = 75 MPa. Calcule a tensão σx crítica segundo os critérios da tensão máxima, Tsai-Hill, Tsai-Wu e Hashin-Rotem. Resolução. A primeira fase do problema consiste em obter as tensões na camada. Assim, começamos por determinar as constantes de rigidez no referencial principal recorrendo a (3.54), de onde:

Em seguida, obtemos os termos da matriz de rigidez no referencial xyz , aplicando as fórmulas da tabela 3.5 com c = cos 45º e s = sin 45º, tal que:

Da lei constitutiva (3.57):

Agora há que obter as tensões no referencial principal aplicando (3.55), de onde resultam com α1 = 1.5914, α2 = 0.14265 e α6 = -0.13298. Estamos finalmente em condições de aplicar os critérios de rotura. Do critério da tensão máxima (5.1),

142

CAPÍTULO 5: CRITÉRIOS DE ROTURA DA CAMADA

sendo o segundo rácio o crítico, ou seja, prevê-se rotura à tracção transversal. O critério de Tsai-Hill (5.5) prevê

valor claramente mais conservador. Quanto ao critério de Tsai-Wu (5.7), de (5.8) e (5.11):

Resolvendo a equação polinomial quadrática,

resultado muito próximo do critério de Tsai-Hill. Finalmente, o critério de Hashin-Rotem (5.13) prevê rotura das fibras para

Da condição de rotura da matriz (5.14),

5.5. Conclusão Apresentaram-se neste capítulo os critérios de rotura actualmente mais utilizados, tendo sido feita a sua apreciação à luz dos resultados de um estudo internacional recente. Apesar do esforço que tem sido feito no sentido de desenvolver e validar critérios, é evidente que se está longe de poder apontar o mais rigoroso. As dificuldades são muitas, não só a nível das formulações, mas também a nível experimental, entre as quais salientamos: › modos de rotura indesejados, como é o caso da encurvadura em ensaios de compressão; › deformações plásticas e não-linearidade geométrica consideráveis em solicitações de 143

MATERIAIS COMPÓSITOS

› › › ›

compressão transversal e ao corte de certos tipos de compósitos, que tornam difícil definir um ponto de rotura; incertezas quanto ao estado de tensão real, em virtude de efeitos de tensões residuais de fabrico, que podem ser particularmente significativas, como veremos no capítulo 7; problemas na detecção da fissuração transversal em laminados multidireccionais, uma vez que estes continuam geralmente a poder suportar cargas crescentes; dependência das resistências à tracção transversal e ao corte da orientação das camadas vizinhas, fenómeno que já foi referido no capítulo 4; dispersões muito consideráveis nos resultados experimentais, que resultam essencialmente da natureza heterogénea dos compósitos.

São estes problemas que justificam o facto, à partida paradoxal, de, com base nos mesmos resultados experimentais [5.7], se tenha concluído acerca do bom desempenho de critérios tão diferentes como os de Zinoviev [5.3, 5.4], Tsai-Wu [5.13, 5.14] e Puck [5.17, 5.18]. Naturalmente, o desempenho destes variou conforme a situação, embora não se tenham verificado tendências sistemáticas. É também importante salientar que alguns dos critérios recorrem a vários parâmetros empíricos, facto que pode disfarçar deficiências fundamentais. No actual estado da arte, há que distinguir claramente duas situações, no caso mais comum de laminados multidireccionais: a primeira rotura de camada; e a rotura catastrófica final. O projecto com base na prevenção da primeira rotura de camada pode ser excessivamente conservador. No entanto, pode-se revelar a abordagem mais apropriada em situações em que seja fundamental garantir a durabilidade, por exemplo, sob cargas variáveis susceptíveis de causar fadiga. Neste caso, recomenda-se a utilização de critérios interactivos. Em situações nas quais a rotura é desencadeada por sobrecargas, é particularmente importante determinar o estado limite correspondente à rotura catastrófica. Torna-se então fundamental distinguir modos de rotura, facto que favorece os critérios não-interactivos ou parcialmente interactivos. No entanto, na modelação do processo de danificação progressiva, é necessário considerar a degradação de propriedades de rigidez e de resistência. Este assunto será desenvolvido no capítulo 7.

Referências 5.1. Rosen, B. W. In: Engineered Materials Handbook, Volume 1 (Composites). ASM International, 1987. 5.2. Hashin, Z. Failure Criteria for Unidirectional Fiber Composites. Journal of Applied Mechanics, 47: 329-334 (1980).

144

CAPÍTULO 5: CRITÉRIOS DE ROTURA DA CAMADA

5.3. Zinoviev, P. A., S. V. Gregoriev, O. V. Lebedeva, L. P. Tairova. The Strength of Multilayered Composites under a Plane-Stress State. Composites Science and Technology, 58: 1209-1223 (1998). 5.4. Zinoviev, P. A., O. V. Lebedeva, L. P. Tairova. A Coupled Analysis of Experimental and Theoretical Results on the Deformation and Failure of Composite Laminates under a State of Plane Stress. Composites Science and Technology, 62: 1711-1723 (2002). 5.5. Hart-Smith, L. J. Predictions of the Original and Truncated Maximum-Strain Failure Models for certain Fibrous Composite Laminates. Composites Science and Technology, 58: 1151-1178 (1998). 5.6. Hart-Smith, L. J. Expanding the Capabilities of the Ten-Percent Rule for predicting the Strength of Fibre-Polymer Composites. Composites Science and Technology, 62: 1515-1544 (2002) 5.7

Hinton, M. J., A. S. Kaddour, P. D. Soden. A Comparison of the Predictive Capabilities of Current Failure Theories for Composite Laminates, judged against Experimental Evidence. Composites Science and Technology, 62: 1725-1797 (2002)

5.8. Tsai, S. W. Strength Theories of Filamentary Structures. In: Fundamental Aspects of Fiber Reinforced Plastic Composites, Wiley Interscience, New York, 1981. 5.9. Hoffman, O. The Brittle Strength of Orthotropic Materials. Journal of Composite Materials, 1: 200206 (1967). 5.10. Tsai, S. W., E. M. Wu. A General Theory of Strength for Anisotropic Materials. Journal of Composite Materials, 5: 58-80 (1971). 5.11. Wu, E. M. Optimal Experimental Measurements of Anisotropic Failure Tensors. Journal of Composite Materials, 6: 472-489 (1972). 5.12. Tsai, S. W., H. T. Hahn. Introduction to Composite Materials. Technomic Publishing Co., Lancaster, 1980. 5.13. Liu, K. S., S. W. Tsai. A Progressive Quadratic Failure Criterion for a Laminate. Composites Science and Technology, 58: 1023-1032 (1998). 5.14. Kuraishi, A., S. W. Tsai, K. S. Liu. A Progressive Quadratic Failure Criterion. Part B. Composites Science and Technology, 62: 1683-1695 (2002). 5.15. Tenysson, R. C., D. McDonald, A. P. Nanyaro. Evaluation of the Tensor Polynomial Failure Criterion for Composite Materials. Journal of Composite Materials, 12: 63-75 (1978). 5.16. Hashin, Z., A. Rotem. A Fatigue Failure Criterion for Fibre Reinforced Materials. Journal of Composite Materials, 7: 448-464 (1973). 5.17. Puck, A., H. Sch rmann. A Failure Analysis of FRP Laminates by means of Physically based Phenomenological Models. Composites Science and Technology, 58: 1045-1067 (1998). 5.18. Puck, A., H. Sch rmann. A Failure Analysis of FRP Laminates by means of Physically based Phenomenological Models. Composites Science and Technology, 62: 1633-1662 (2002). 5.19. Sun, C. T., J. Tao. Prediction of Failure Envelopes and Stress/Strain Behaviour of Composite Laminates. Composites Science and Technology, 58: 1125-1136 (1998). 5.20. Sun, C. T., J. Tao, A. S. Kaddour. Prediction of Failure Envelopes and Stress-Strain Behaviour of Composite Laminates: Comparison with Experimental Results. Composites Science and Technology, 62: 1673-1682 (2002).

145

CAPÍTULO 6: ANÁLISE DOS COMPÓSITOS DE FIBRAS CURTAS

Capítulo 6

Análise dos Compósitos de Fibras Curtas

6.1. Introdução Os capítulos 3 a 5 foram dedicados aos compósitos de fibras "longas", que são de facto os mais interessantes para aplicações estruturais. Os compósitos de fibras "curtas" apresentam valores do módulo e da resistência bastante inferiores. Isso deve-se em parte às fracções volúmicas de reforço substancialmente inferiores, tipicamente 20 %, contra cerca de 65 % nos compósitos de fibras longas. Como vimos no capítulo 2, a limitação ao teor de fibra resulta da necessidade de garantir boas condições de processabilidade. Por outro lado, as fibras curtas tendem a distribuir-se de forma mais ou menos aleatória ao longo do volume do compósito, o que impede que se atinjam os elevados valores dos módulos e das resistências dos compósitos unidireccionais na direcção das fibras. Neste caso, porém, a menor anisotropia simplifica o projecto, que se faz frequentemente de forma análoga à dos materiais estruturais correntes. Outra vantagem importante dos compósitos de fibras curtas é a facilidade com que obtêm formas complexas, através da moldação por injecção, do RTM ou da moldação por compressão, processos que permitem altas taxas de produção (ver capítulo 2). Por estas razões, os compósitos de fibras curtas possuem actualmente um vasto conjunto de aplicações (ver capítulo 1). Como veremos nos parágrafos seguintes, a previsão rigorosa das propriedades mecânicas exige modelos numéricos complexos, o que, na prática, nem sempre se justifica. O objectivo deste capítulo é portanto transmitir um entendimento básico das propriedades mecânicas destes materiais,

147

MATERIAIS COMPÓSITOS

recorrendo para tal a análises micro e macromecânica relativamente simples.

6.2. Compósitos de Fibras Alinhadas Conforme foi dito nos capítulos 1 e 2, as fibras são geralmente cortadas com comprimentos entre 3 e 10 mm para efeitos de incorporação em semi-produtos (DMC, SMC e GMT) [6.1]. No entanto, as elevadas tensões a que estes são sujeitos durante o processamento provocam roturas de fibras, que frequentemente reduzem o comprimento médio das fibras a valores inferiores a 1 mm [6.1]. Facilmente se compreende que a eficácia de reforço das fibras depende, em certa medida, do seu comprimento. É isto que vamos de seguida demonstrar através de uma análise micromecânica de compósitos com fibras alinhadas. Consideremos um elemento de volume cilíndrico, contendo uma fibra completamente envolvida por resina (figura 6.1). Quando o elemento é sujeito a tracção, dáse transferência de carga da matriz para a fibra através de tensões de corte na interface, de uma forma semelhante à descrita em 4.3.1. Do equilíbrio de forças de um elemento infinitesimal de fibra, concluímos que (6.1) sendo df o diâmetro da fibra e τi a tensão de corte longitudinal na interface

Figura 6.1. Elemento de volume usado para a análise da transferência de carga em compósitos de fibras curtas.

Se desprezarmos as tensões nos topos, a tensão na fibra escreve-se (6.2) 148

CAPÍTULO 6: ANÁLISE DOS COMPÓSITOS DE FIBRAS CURTAS

Para melhor compreensão do fenómeno da transferência de carga, vamos recorrer a modelos simplificados que admitem uma adesão interfacial perfeita.

6.2.1. MODELO DE KELLY-TYSON Kelly e Tyson [6.2] consideraram a matriz rígida-perfeitamente plástica (figura 6.2), o que faz com que a integração de (6.2) conduza a (6.3) traduzindo uma distribuição linear da tensão na fibra, necessariamente simétrica em relação a x = Lf/2 (figura 6.3). Conclui-se portanto que a tensão máxima na fibra, (6.4) aumenta com o seu comprimento. Na realidade, este aumento tem um limite, que é o valor da tensão na fibra num compósito de fibras longas, obtido da equação (4.5) da Lei das Misturas, (6.5)

Figura 6.2. Comportamento rígido-perfeitamente plástico admitido para a matriz em [6.2].

Figura 6.3. Comportamento rígido-perfeitamente plástico admitido para a matriz em [6.2]

149

MATERIAIS COMPÓSITOS

O comprimento mínimo da fibra que permite que se atinja σf1max (6.5) designa-se por comprimento ineficiente, e é dado por (6.6) O comprimento ineficiente, cujo conceito já foi abordado em 4.3.1, diz respeito à zona ao longo da qual a tensão na fibra adquire o valor máximo. Para comprimentos de fibra Lf Li, existe uma zona central de tensão constante (figura 6.4). Por outro lado, para se tirar pleno partido da alta resistência da fibra, a tensão máxima nesta deve atingir a tensão de rotura à tracção, σuf1. Caso contrário, a rotura do compósito será provocada pela rotura da matriz, ocorrendo a tensões mais baixas. Assim, resulta da equação (6.4) que as fibras devem ter um comprimento não inferior ao comprimento cr tico (6.7)

Figura 6.4. Distribuições de tensões na interface e na fibra segundo o modelo de Kelly-Tyson [6.2] se Lf > Li.

Por conseguinte, o Modelo de Kelly-Tyson permite facilmente justificar a necessidade de as fibras possuírem um comprimento mínimo para maximizar a resistência do compósito. No entanto, do ponto de vista quantitativo, os resultados não são rigorosos, em virtude das simplificações inerentes ao modelo. Relembre-se ainda que se admitiu adesão interfacial perfeita, isto é, que a tensão de rotura ao corte da interface, τui, é igual à tensão de cedência ao corte da matriz, o que nem sempre se verifica. De facto, a expressão (6.7) é frequentemente utilizada em sentido inverso para obter (6.8)

150

CAPÍTULO 6: ANÁLISE DOS COMPÓSITOS DE FIBRAS CURTAS

nos chamados ensaios de fragmentação [6.3]. Nestes ensaios, o provete consiste numa única fibra embebida numa matriz translúcida, sendo sujeito a cargas de tracção ao mesmo tempo que é observado em microscópio. medida que a carga aumenta, a fibra vai-se partindo em segmentos de comprimento Lc.

6.2.2. MODELO DE COX Voltando à análise do elemento de volume da figura 6.1, em termos de tensões médias, aplica-se obviamente a Lei das Misturas (6.9) e se ε1 for a deformação imposta ao elemento de volume, o seu módulo é dado por (6.10) admitindo tensão constante na matriz. Como a tensão média na fibra é proporcional ao seu comprimento (figuras 6.3 e 6.4), é evidente que o módulo de um compósito de fibras curtas depende do comprimento destas. Para analisarmos quantitativamente este efeito, vamos recorrer ao modelo de Cox [6.4]. Este modelo admite que a matriz se mantém elástica e que a tensão de corte interfacial em determinado ponto é proporcional à diferença entre o deslocamento da fibra, uf1, e o deslocamento ug1 que esse ponto teria caso o elemento de volume fosse inteiramente de resina. Nestas circunstâncias, a equação 6.1 escreve-se agora (6.11) em que designa uma função da geometria e das propriedades dos materiais que é definida de seguida. Derivando (6.11), (6.12) onde surgem (6.13)

(6.14)

151

MATERIAIS COMPÓSITOS

que, substituídas em (6.12), dão origem a uma equação diferencial para σf1, cuja solução se pode escrever na forma (6.15) com (6.16) Impondo as condições fronteira: σf1 = 0 em x = 0 e em x = Lf; obtém-se após algumas manipulações algébricas (6.17) e substituindo em (6.1), a tensão de corte na interface é dada por (6.18) estando estas distribuições de tensões representadas na figura 6.5.

a)

b) Figura 6.5. Distribuições de tensões a) na interface b) na fibra segundo o modelo de Cox [6.4]. As tensões foram normalizadas pela quantidade Ef1ε1.

152

CAPÍTULO 6: ANÁLISE DOS COMPÓSITOS DE FIBRAS CURTAS

Recorrendo a uma análise das deformações da matriz, Cox [6.4] demonstrou ainda que (6.19) em que é o diâmetro exterior do elemento de volume da figura 6.1. Recorrendo a (6.17), a tensão média na fibra é então (6.20) e, a sua substituição em (6.10), (6.21) mostra claramente o efeito do comprimento das fibras no módulo (figura 6.6).

Figura 6.6. Efeito do comprimento das fibras no módulo E1 de um compósito unidireccional de fibras curtas segundo o modelo de Cox [6.4]. E1 foi normalizado pelo valor previsto pela lei das misturas (equação 4.6)

Mais uma vez, apesar de o modelo de Cox possibilitar uma análise relativamente simples do efeito do comprimento da fibra no módulo, as equações não são efectivamente rigorosas. Ao longo dos anos, foram apresentados vários modelos analíticos substancialmente mais elaborados, nos quais o problema é tratado em termos de cálculo tensorial [6.5-6.8]. Um dos modelos mais conhecidos é o de Mori-Tanaka [6.6], que foi originalmente desenvolvido para tratar o problema de um sólido com inclusões elipsoidais alinhadas e uniformemente distribuídas. Trata-se porém de um modelo complexo, cuja descrição está fora do âmbito deste texto. No entanto, foi com base no modelo de Mori-Tanaka que Tandon e Weng [6.7] concretizaram um conjunto de expressões analíticas para as constantes elásticas de compósitos de fibras curtas isotrópicas e alinhadas. Estas expressões continuam a ser complicadas e a necessitar de soluções iterativas para o coeficiente de Poisson ν12 e para o módulo de compressibilidade em estado plano de deformação, k2, embora tenha sido sugerido 153

MATERIAIS COMPÓSITOS

um procedimento para evitar as iterações [6.5]. Não sendo possível a validação com resultados experimentais, dada a impossibilidade de produzir compósitos de fibras curtas verdadeiramente unidireccionais, a avaliação dos modelos tem sido feita por comparação com modelos de elementos finitos [6.5]. Tucker e Liang [6.5] demonstraram que o modelo de Mori-Tanaka [6.6] é o melhor actualmente disponível. Todavia, há que salientar um conjunto importante de simplificações admitidas, entre as quais citamos: a) a necessidade de definir a geometria exacta do modelo, isto é, o diâmetro exterior e o comprimento do elemento de volume cilíndrico (figura 6.1), que estão apenas condicionados pela fracção volúmica do reforço (ver exemplo 6.1); b) as possíveis interacções entre os vários elementos de volume, que podem ser tidas em conta admitindo uma disposição espacial idealizada, por exemplo, um arranjo hexagonal semelhante ao da figura 4.9; c) a utilização de um comprimento único médio para as fibras, quando na realidade o comprimento das fibras num compósito não é uniforme; d) a ausência de cedência plástica da matriz ou de descoesão interfacial das fibras junto às extremidades destas, aspectos que, em rigor, não podem ser ignorados. Atendendo à complexidade deste problema, Halpin [6.9] sugeriu que o módulo longitudinal de um compósito unidireccional de fibras curtas pode ser previsto pela equação de Halpin-Tsai (4.35), (6.22) usando neste caso ξ = 2Lf/df. A comparação com modelos de elementos finitos revelou que as previsões da equação (6.22), sendo conservadoras, são geralmente aceitavelmente rigorosas [6.5]. Verificou-se também, conforme Halpin tinha concluído, que E2, G12 e ν12 são praticamente independentes do comprimento da fibra.

Exemplo .1. Um compósito unidireccional de fibras curtas de carbono tem as seguintes características: Ef1 = 230 GPa; Em = 3.0 GPa; Gm = 1.1 GPa; df = 7 μm; Lf = 500 μm; Vf = 0.2; σuf1 = 3500 MPa;

σpm = 60 MPa; τpm = 50 MPa. Usando os modelos acima expostos, preveja o módulo e a tensão de rotura longitudinais do compósito. Resolução. O módulo E1 pode ser estimado recorrendo às fórmulas do modelo de Cox (6.21) e de Halpin-Tsai (6.22). No primeiro caso, é necessário determinar β (6.19), o que exige o cálculo de

. Se o

elemento de volume da figura 6.1 tiver um comprimento L, então a fracção volúmica de fibra é dada por

154

CAPÍTULO 6: ANÁLISE DOS COMPÓSITOS DE FIBRAS CURTAS

Isto demonstra alguma sensibilidade do modelo à geometria exacta do elemento de volume, como já foi anteriormente referido. Se admitirmos uma distribuição uniforme de volume de matriz, isto é, que o volume de matriz nos topos do elemento é igual ao volume de matriz à volta da fibra, o que se traduz por

obtemos

e aplicando a equação (6.19),

Estamos agora em condições de usar a equação (6.21),

Recorrendo à fórmula de Halpin-Tsai (6.22) com ξ = 2Lf/df = 142.9,

Ambos os modelos prevêem resultados inferiores à Lei das Misturas (4.6)

Por outro lado, o comprimento das fibras é claramente superior ao comprimento crítico do modelo de Kelly (6.7),

Logo, como a deformação de rotura das fibras é inferior à deformação de plastificação da matriz, ou seja,

a tensão de rotura do compósito é dada por

de onde resultam os valores 662 e 533 MPa para os modelos de Cox e de Halpin-Tsai, respectivamente, enquanto a Lei das Misturas prevê 737 MPa. A tensão de rotura de compósitos de fibras curtas é muito inferior a qualquer destes valores, pois estes compósitos não são realmente unidireccionais.

155

MATERIAIS COMPÓSITOS

6.3. Compósitos de Fibras com Orientação Aleatória A influência da orientação da fibra nas propriedades elásticas é extremamente difícil de avaliar em moldes semelhantes aos de 6.2. Por isso recorre-se habitualmente ao seguinte procedimento: a) prever os módulos do compósito unidireccional de fibras curtas, E1, E2, G12, ν12 e ν23, admitindo isotropia transversal; b) obter a matriz de flexibilidade (3.38) e/ou a matriz de rigidez (3.40); c) aplicar as leis de transformação das referidas matrizes perante rotações de referencial (equação 3.22) para obter e/ou . Num compósito, as fibras têm uma distribuição espacial estatística, sendo portanto necessário o cálculo de constantes elásticas médias. Há dois casos principais a distinguir, conforme a relação entre o comprimento das fibras Lf e a espessura da peça t [6.9, 6.10]. Se Lf for bastante inferior a t, situação que ocorre geralmente nos compósitos fabricados por injecção, então as fibras têm uma distribuição espacial tridimensional. Numa primeira abordagem, poder-se-ia admitir uma distribuição aleatória, o que daria origem a um material isotrópico. Assim, a matriz de rigidez seria obtida calculando os valores médios para todas as orientações espaciais (figura 6.7), (6.23)

em que os termos da matriz dependem apenas de um módulo e de um coeficiente de Poisson.

Figura 6.7. Definição da orientação tridimensional das fibras.

Christensen e Waals [6.10] obtiveram

156

CAPÍTULO 6: ANÁLISE DOS COMPÓSITOS DE FIBRAS CURTAS

(6.24)

(6.25) equações relativamente complicadas, e que necessitam ainda da determinação de E1, E2, G12, ν12, G23 e k2 aplicando as equações micromecânicas apropriadas (ver capítulos 4.2 e 6.2). Na realidade, a distribuição da orientação das fibras não é aleatória, dado que estas tendem a alinhar-se segundo as linhas de escoamento [6.5, 6.11-6.16]. De facto, as elevadas pressões e os fluxos pronunciados no processo de injecção fazem com que a própria matriz seja anisotrópica. Por outro lado, como já foi referido, existe também uma distribuição estatística de comprimentos de fibras, cuja gama de valores afecta o módulo E1. As distribuições estatísticas do comprimento e da orientação das fibras podem ser obtidas recorrendo a técnicas microscópicas de análise de imagem de secções do compósito [6.1, 6.13-6.16]. As medições efectuadas servem de base a abordagens de modelação numéricas bastante elaboradas, que envolvem a geração automática de malhas de elementos finitos contendo centenas de fibras, cujas orientações são geradas através de simulação [6.13, 6.14]. O problema é normalmente simplificado admitindo que todas as fibras têm o comprimento médio. Obviamente, são necessários meios computacionais poderosos para implementar estes modelos. Se Lf for de ordem de grandeza não inferior à de t, as fibras tendem a distribuir-se aleatoriamente em planos paralelos à espessura, e portanto o compósito apresenta isotropia planar. É esta a situação habitual na moldação por compressão e no RTM, em que se usam mantas de fibras aleatórias. Nestas circunstâncias, a matriz de rigidez no plano de isotropia obtém-se de (figura 6.8) (6.26)

Figura 6.8. Definição da orientação das fibras no plano.

157

MATERIAIS COMPÓSITOS

Para este caso, as soluções de Christensen e Waals [6.10] são (6.27) com (6.28)

equações que se revelaram em boa concordância com resultados experimentais [6.9]. Por outro lado, Tsai e Pagano [6.17] propuseram as equações (6.29) que têm a vantagem de ser claramente mais simples. Relembre-se que é sempre necessário obter os módulos do compósito unidireccional. Relativamente à previsão das resistências, trata-se evidentemente de um problema muito complexo, não havendo actualmente modelos rigorosos. Foram já desenvolvidos modelos que exprimem a resistência de compósitos com isotropia planar em função das resistências de compósitos unidireccionais. Por exemplo, Lees [6.18] prop s a equação (6.30) onde (6.31) Para além das simplificações admitidas, este tipo de modelos sofre das limitações dos modelos micromecânicos dos compósitos unidireccionais (ver capítulo 4).

Exemplo .2. Um compósito de fibras curtas de vidro tem as seguintes características: Ef = 75 GPa; νf = 0.2; Em = 2.7 GPa; νm = 0.35; df = 10 m; Lf = 6 mm; Vf = 0.15. Admitindo isotropia planar, preveja as propriedades elásticas do compósito.

158

CAPÍTULO 6: ANÁLISE DOS COMPÓSITOS DE FIBRAS CURTAS

Resolução. Trata-se de aplicar as expressões (6.27) e (6.28) de Christensen e Waals e as equações (6.29) de Tsai e Pagano. Em ambos os casos, há que determinar as propriedades do compósito unidireccional. Como o comprimento das fibras é apreciável, podemos ignorar o seu efeito no módulo E1. Aplicando sucessivamente as equações (4.6), (4.9) e (4.51), obtemos:

Resta agora recorrer às equações (4.19) e (4.21), que necessitam do cálculo prévio do módulo de corte e do módulo de compressibilidade em estado plano de deformação da fibra e da matriz. Sendo estas isotrópicas (ver equação 4.20),

de onde resultam Gm = 1.0 GPa, Gf = 31.25 GPa, km = 3.33 GPa, kf = 52.08 GPa, e posteriormente:

Da equação (4.52),

e da condição de isotropia transversal (equações 3.34),

Estamos finalmente em condições de aplicar as equações (6.27) e (6.28), das quais resultam:

159

MATERIAIS COMPÓSITOS

Por outro lado, as equações (6.29) e a condição de isotropia planar permitem obter:

É notório que o valor previsto para o coeficiente de Poisson é algo irrealista, face aos valores de f e de m, e que a previsão do módulo é mais optimista do que a de Christensen e Waals. Por conseguinte, apesar de mais complicadas, é de preferir as equações de Christensen e Waals.

Referências 6.1. Short Fibre Polymer Composites. Edited by S. K. De and J. R. White. Woodhead Publishing Limited, Cambridge, England, 1996. 6.2. Kelly, A., W. R. Tyson. Tensile Properties of Fibre Reinforced Metals: Copper/Tungsten and Copper/Molybdenum. Journal of the Mechanics and Physics of Solids, 13: 329-350 (1965). 6.3. Deng, S., L. Ye, Y. M. Mai, H. Y. Liu. Evaluation of Fibre Tensile Strength and Fibre/Matrix Adhesion using Single Fibre Fragmentation Tests. Composites Part A, 29A: 423-434 (1998). 6.4. Cox, H. L. The Elasticity and Strength of Paper and other Fibrous Materials. British Journal of Applied Physics, 3: 72-79 (1952). 6.5. Tucker III, C. L., E. Liang. Stiffness Predictions for Unidirectional Short-Fiber Composites: Review and Evaluation. Composites Science and Technology, 59: 655-671 (1999). 6.6. Mori, T., K. Tanaka. Average Stress in Matrix and Average Elastic Energy of Materials with Misfitting Inclusions. Acta Metallurgica, 21: 571-574 (1973). 6.7. Tandom, G. P., G. J. Weng. The Effect of Aspect Ratio of Inclusions on the Elastic Properties of Unidirectionally Aligned Composites. Polymer Composites, 5:323-333 (1984). 6.8. Bienveniste, Y. A New Approach to the Application of Mori-Tanaka's Theory in Composite Materials. Mechanics of Materials, 6: 147-157 (1987). 6.9. Halpin, J. C. Stiffness and Expansion Estimates for Oriented Short Fiber Composites. Journal of Composite Materials, 3: 732-734 (1969). 6.10. Christensen, R.M., F. M. Waals. Effective Stiffness of Randomly Oriented Fibre Composites. Journal of Composite Materials, 6: 518-532 (1972). 6.11. Fu, S.-Y., B. Lauke. The Elastic Modulus of Misaligned Short-Fiber Reinforced Polymers. Composites Science and Technology, 58: 389-400 (1998). 6.12. Fu, S.-Y., B. Lauke. An Analytical Characterization of Anisotropy of the Elastic Modulus of Misaligned

160

CAPÍTULO 6: ANÁLISE DOS COMPÓSITOS DE FIBRAS CURTAS

Short-Fiber Reinforced Polymers. Composites Science and Technology, 58: 1961-1972 (1998). 6.13. Hine, P. J., Lusti, H. R., A.A. Gusev. Numerical Simulation of the Effects of Volume Fraction, Aspect Ratio and Fibre Length Distribution on the Elastic and Thermoelastic Properties of Short Fibre Composites. Composites Science and Technology, 62: 1445-1453 (2002). 6.14. Lusti, H. R., P. J. Hine, A.A Gusev. Direct Numerical Predictions for the Elastic and Thermoelastic Properties of Short Fibre Composites. Composites Science and Technology, 62: 1927-1934 (2002). 6.15. Jung, S. W., S. Y. Kim, H. W. Nam, K. S. Han. Measurements of Fiber Orientation and ElasticModulus Analysis in Short Fiber Composites. Composites Science and Technology, 61: 107-116 (2001). 6.16. Eberhardt, C., A. Clarke. Fibre-Orientation Measurements in Short-Glass-Fibre Composites. Part I: Automated-High-Angular-Resolution Measurement by Confocal Microscopy. Composites Science and Technology, 61: 1389-1400 (2001). 6.17. Tsai, S. W., N. J. Pagano. Invariant Properties of Composite Materials. In: Composite Materials. Workshop. Edited by S. W. Tsai, J. C. Halpin and N. J. Pagano. Technomic Publishing Co, Lancaster, 1968. 6.18. Lees, J. K. A study of the Tensile Strength of Short Fiber Reinforced Plastics. Polymer Engineering and Science, 8: 195-201 (1968).

161

CAPÍTULO 7: ANÁLISE DOS LAMINADOS

Capítulo 7

Análise dos Laminados

7.1. Introdução Até aqui, o estudo do comportamento mecânico dos compósitos de fibras contínuas restringiu-se à camada unidireccional, ou aos laminados unidireccionais (capítulos 3 e 4). No entanto, devido às propriedades transversais relativamente fracas destes, utilizam-se laminados multidireccionais na maioria das aplicações. Tal como o nome indica, estes laminados são constituídos por camadas com diferentes orientações, dispostas segundo sequências diversas na direcção da espessura. É evidente que o número, as orientações e as sequências de empilhamento das camadas são variáveis de projecto adicionais relativamente aos materiais estruturais correntes, que conferem uma enorme flexibilidade à concepção de estruturas compósitas. Por outro lado, é também notória a conveniência em prever o comportamento dos laminados a partir do comportamento da camada, tratada como um sólido homogéneo e anisotrópico (ver capítulo 3). O objectivo deste capítulo é precisamente apresentar os modelos que permitem determinar o comportamento dos laminados multidireccionais segundo esta metodologia. Começamos pela chamada Teoria Clássica dos Laminados, modelo que está largamente difundido, sendo depois objecto de referência algumas teorias mais avançadas. Em ambos os casos, trata-se de modelos que são aplicados a placas compósitas, se bem que possam ser generalizados a cascas. Neste capítulo, porém, limitamo-nos a deduzir as relações entre esforços mecânicos e deformações de placas laminadas. De

163

MATERIAIS COMPÓSITOS

facto, a resolução de problemas do domínio da análise estrutural exige quase sempre métodos numéricos. Antes de iniciarmos a exposição das teorias dos laminados, há que estabelecer algumas convenções para a designação destes. A base da designação é a lista entre parêntesis rectos das orientações das camadas da superfície superior para a inferior, separadas pelo traço "/". No sentido de contrair a designação, introduzem-se várias simplificações ilustradas nos exemplos da figura 7.1: › nos laminados simétricos, a lista inclui apenas as camadas até meia-espessura, recorrendo-se ao índice "s" para indicar simetria, e colocando um traço superior na camada central quando o laminado tiver número ímpar de camadas, para indicar que aquela não se repete; › utilização de índices numéricos para descrever repetições de camadas ou de conjuntos de camadas. No caso de laminados compósitos híbridos, que são constituídos por camadas de diferentes materiais, deverão ser usados índices suplementares para os identificar.

Figura 7.1. Alguns exemplos de sequências de empilhamento e designações correspondentes.

7.2. Teoria Clássica dos Laminados A Teoria Clássica dos Laminados foi sendo desenvolvida por vários investigadores [7.1, 7.2] com base na Teoria das Placas de Kirchhoff para materiais isotrópicos [7.3]. Admite-se que o laminado é uma placa rectangular relativamente fina, ou seja, que a espessura h, constante, é muito inferior às restantes dimensões a e b (figura 7.2). Para efeitos de análise, posiciona-se o referencial xyz de modo que o plano coincida com o plano médio da placa, que é frequentemente o único representado nos esquemas. 164

CAPÍTULO 7: ANÁLISE DOS LAMINADOS

Figura 7.2. Placa rectangular com indicações das dimensões e do referencial utilizado.

A Teoria das Placas de Kirchhoff estabelece relações entre as curvaturas da placa e os momentos flectores e torçores internos, que são normalmente gerados por cargas transversais concentradas ou distribuídas. A figura 7.3 representa um elemento de volume de uma placa, que está geralmente sujeito a uma carga distribuída, (x,y), aproximadamente constante no elemento, e aos seguintes esforços internos: › momentos flectores Mx, My, e momento torçor Mxy = Myx, que designaremos genericamente por "esforços de flexão"; › esforços de corte transversal Vx e Vy.

Figura 7.3. Elemento de volume de uma placa sujeito a uma carga distribuída q(x,y) e aos esforços internos indicados, representados separadamente para maior clareza.

Notar que o índice atribuído a cada esforço coincide com o do eixo perpendicular à face em que aquele actua, e não com a sua projecção no sistema de eixos. Por exemplo, o momento Mx é assim designado por actuar numa face perpendicular ao eixo dos x, apesar de ser um momento segundo o eixo y. De salientar ainda que qualquer dos esforços referidos está distribuído ao longo da face em que actua, sendo por isso 165

MATERIAIS COMPÓSITOS

expresso por unidade de largura daquela. As equações que relacionam os esforços com as tensões escrevem-se (7.1) (7.2) Face à hipótese de h a, b (figura 7.2), facilmente se compreende que os momentos flectores e torçores prevaleçam claramente sobre os esforços de corte transversal. De facto, a Teoria das Placas de Kirchhoff admite que as tensões σz, τxz e τyz são desprezáveis relativamente a σx, σy e τxy. Nestas circunstâncias, as deformações εz, γxz e γyz são igualmente desprezáveis em relação a εx, εy e γxy. A hipótese de εz ≈ 0 implica que o deslocamento na direcção da espessura, w, é independente da coordenada z. Por outro lado, sendo u e os deslocamentos segundo x e y, respectivamente, as hipóteses relativas às deformações de corte transversal,

(7.3)

conduzem a (7.4) ou seja, os deslocamentos variam linearmente ao longo da espessura da placa. Portanto, qualquer secção recta da placa, inicialmente paralela a z, permanece recta após a aplicação dos esforços, sofrendo rotações (7.5) conforme se ilustra na figura 7.4. Obviamente, a aplicação destas hipóteses cinemáticas às placas laminadas pressupõe que existe uma adesão perfeita entre camadas e que se despreza a contribuição da fina camada interlaminar, rica em resina.

Figura 7.4. Representação da deformada de flexão de uma placa no plano .

166

CAPÍTULO 7: ANÁLISE DOS LAMINADOS

Em geral, para além dos esforços de flexão, as placas estão também sujeitas aos chamados esforços de membrana (figura 7.5), que são provocados por cargas paralelas ao plano médio. Os esforços de membrana são as forças normais x e y, e as forças de corte xy = yx, todas distribuídas ao longo das faces em que actuam, e que se relacionam com as tensões através de (7.6) Estes esforços dão naturalmente origem a deslocamentos independentes de z, u0(x,y) e 0(x,y).

Figura 7.5. Esforços membrana que podem actuar numa placa.

Por conseguinte, quando actuam simultaneamente esforços de flexão e esforços membrana, o campo de deslocamentos é expresso por

(7.7)

Em regime de pequenos deslocamentos, as deformações obtêm-se substituindo as equações (7.7) em

(7.8)

Daqui resulta a equação base das deformações da Teoria Clássica dos Laminados, (7.9) onde 167

MATERIAIS COMPÓSITOS

(7.10)

é o vector de deformações membrana e

(7.11)

é o vector de curvaturas. Tendo definido as relações cinemáticas, resta agora introduzir a natureza laminada do material nos esforços membrana e de flexão. Se designarmos por zk-1 e zk as coordenadas das superfícies superior e inferior da camada k de um laminado com n camadas (figura 7.6), as equações (7.6) e (7.1) podem ser reescritas na forma (7.12) (7.13) respectivamente, definidos os vectores e sendo σ'k as tensões na camada k.

e

,

Figura 7.6. Sistema de numeração das camadas e das respectivas superfícies.

Devemos agora recorrer à lei constitutiva da camada (equação 3.57), fazendo nela intervir o campo de deformações (7.9), tal que 168

CAPÍTULO 7: ANÁLISE DOS LAMINADOS

(7.14) com zk-1 ≤ z ≤ zk. De salientar que, sendo os campos de deformações contínuos, a diferença de propriedades elásticas das camadas ( k) faz com que as tensões σ'k sejam descontínuas nas interfaces (ver exemplo 7.1). Da substituição de (7.14) em (7.12) e (7.13) e da integração destas, resultam as equações fundamentais da Teoria Clássica dos Laminados, (7.15) (7.16) Note-se desde já a existência de "acoplamento" membrana-flexão, isto é, esforços de membrana podem provocar deformações de flexão, assim como esforços de flexão podem gerar deformações de membrana. As equações (7.15) e (7.16) são normalmente condensadas na forma matricial (7.17) onde surgem a matriz de rigidez de membrana (7.18) a matriz de acoplamento membrana-flexão (7.19) e a matriz de rigidez de flexão (7.20) De salientar que o comportamento membrana é independente da sequência de empilhamento das camadas de um laminado. Por exemplo, os laminados [0/90/ 45]s e [ 45/0/90]s têm a mesma matriz . Todavia, as matrizes e são sensíveis à sequência de empilhamento. A forma expandida da equação (7.17) é 169

MATERIAIS COMPÓSITOS

(7.21)

Em muitas situações, são conhecidos os esforços e pretende-se calcular as deformações e curvaturas. Isto pode ser feito invertendo a equação (7.17), (7.22) onde (7.23)

7.2.1. RELAÇÕES ESFORÇOS-DEFORMAÇÕES DE ALGUNS LAMINADOS Há certos tipos de laminados que merecem atenção especial por serem representativos de muitas aplicações e/ou porque apresentam certas particularidades na relação esforços-deformações. O caso específico de maior relevância é claramente o dos laminados simétricos. Estes laminados apresentam simetria de orientações, materiais e espessuras das camadas em relação ao plano (ver figuras 7.1 e 7.2). Logo, por cada camada k de orientação θ, do material M e com superfícies de coordenadas zk-1, zk ≥ 0, há sempre uma camada m, também de orientação θ, do material M e com superfícies de coordenadas zm-1 = −zk e zm = −zk-1. Como k = m, facilmente se constata na equação (7.19) que = , isto é, à semelhança do que sucede nas placas de materiais isotrópicos, deixa de haver acoplamento membrana-flexão. A equação (7.22) fica também bastante mais simples, pois = , = -1 e = -1. Para além da simplificação da relação esforços-deformações, os laminados simétricos têm a vantagem de não sofrer os empenamentos associados às tensões residuais pós-fabrico ou às variações higrotérmicas, tema que é abordado no capítulo 8. Em algumas aplicações, são utilizados laminados anti-simétricos, frequentemente do 170

CAPÍTULO 7: ANÁLISE DOS LAMINADOS

tipo [( θ)p], que se designam na literatura anglo-saxónica por angle-ply laminates, ou simplesmente angle-plies. Num laminado anti-simétrico, por cada camada k de orientação θ, do material M e com superfícies de zk-1, zk ≥ 0, há sempre uma camada m, de orientação -θ, do material M e com superfícies de coordenadas zm-1 = −zk e zm = −zk-1. Note-se que um laminado só pode ser considerado anti-simétrico se não tiver camadas orientadas a 0º nem a 90º. Por exemplo, o laminado [( 45)4], representado na figura 7.1 é anti-simétrico. Atendendo às leis de transformação da matriz de rigidez da camada (tabela 3.5), verifica-se que 16(θ) = − 16(−θ), 26(θ) = − 26(−θ) e 66(θ) = 66(−θ). Logo, resulta da anti-simetria e das equações (7.18) a (7.20) que A16 = A26 = 0, 11 = 12 = 22 = 66 e 16 = 26 = 0. É portanto evidente que estes laminados apresentam baixos níveis de acoplamento membrana-flexão. Além disso, não possuem acoplamentos corte-tracção nem flexão-torção, o que é muito favorável em situações que envolvam esforços consideráveis de corte e/ou de torção. Também têm aplicação muito frequente os laminados ditos quase-isotrópicos. Esta designação justifica-se pelo facto da matriz ser de facto equivalente à de um material isotrópico, isto é, A22 = A11, A16 = A26 = 0 e A66 = (A11 - A12)/2 (ver exemplo 7.4). Todavia, as matrizes e não têm geralmente a forma equivalente à dos materiais isotrópicos. Os laminados quase-isotrópicos são constituídos por blocos de m camadas adjacentes com orientações que diferem de 180º/m, por exemplo, [(60/0/-60)3], [(0/45/90/-45)2] e [0/90/ 45]2s.

Exemplo .1. Uma placa laminada [(0/90)2]s de 1.2 mm de espessura é constituída por camadas de vidro/epóxido com E1 = 39 GPa, E2 = 8.6 GPa, nas camadas quando actuam os esforços: a)

x

12

= 0.28 e G12 = 3.8 GPa. Desenhe os gráficos das tensões

= 60 N/mm e

y

= 30 N/mm; b) Mx = 24 N e My = 6 N.

Resolução. Estamos na presença de um laminado de camadas cruzadas a 0º e a 90º, que na literatura anglosaxónica se designa por cross-ply laminate. A primeira etapa da resolução consiste em determinar as matrizes de rigidez das camadas no referencial global (tabela 3.5),

Podemos agora calcular as matrizes de rigidez do laminado, sabendo desde já que

, dado tratar-se de um

laminado simétrico. A espessura da camada é hc = 1.2/8 = 0.15 mm, e portanto teremos z0 = 0.6 mm, z1 = 0.45 mm, , z8 = -0.6 mm. Das equações (7.18) e (7.20) obtemos:

171

MATERIAIS COMPÓSITOS

Na matriz

observamos que A11 = A22, pois o laminado tem igual número de camadas a 0º e a 90º e o

comportamento membrana é independente da sequência de empilhamento. Por outro lado, superior a

11

é bastante

22. De facto, a contribuição de cada camada para a rigidez à flexão é proporcional à sua dis-

tância ao plano médio, e neste caso há camadas a 0º nas superfícies do laminado, que possuem

'11 >

'22.

Notar também que a rigidez ao corte A66 é muito inferior a A11, o que indica que este laminado não é apropriado quando há tensões de corte significativas. Isto seria de esperar da análise da rigidez da camada realizada no capítulo 3, onde se concluiu serem as orientações 45º as que maximizam a rigidez ao corte (figura 3.9). A situação é análoga à torção, face ao baixo valor de simétrico, temos

66.

Tratando-se de um laminado

, e (equações 7.23)

onde as elevadas flexibilidades ao corte a66 e à torção d66 confirmam a análise anterior. Vejamos agora os dois casos de carregamento propostos: Da equação (7.22) obtemos

o que nos permite calcular as tensões em cada camada a partir da equação (7.14). A figura E7.1 mostra as distribuições das tensões σx e σy, sendo que τxy = 0.

172

CAPÍTULO 7: ANÁLISE DOS LAMINADOS

Figura E7.1. Distribuições das tensões σx e σy ao longo da espessura do laminado (hc é a espessura da camada).

Introduzindo os novos valores dos esforços na equação (7.22), obtemos

As tensões nas camadas são determinadas usando a equação (7.14), estando representadas graficamente na figura E7.2 (τxy = 0).

Figura E7.2. Distribuições das tensões σx e σy ao longo da espessura do laminado (hc é a espessura da camada).

173

MATERIAIS COMPÓSITOS

Exemplo .2. Uma placa laminada [( 45)6] de 1.5 mm de espessura é constituída por camadas de carbono/PEEK com E1 = 135 GPa, E2 = 9.0 GPa,

12

= 0.28 e G12 = 5.2 GPa. a) Determine as deformações

da placa quando esta é sujeita a Mxy = 50 N. b) Calcule os esforços a aplicar para obter torção pura com o valor de κxy obtido em a). Resolução.

Trata-se de um laminado anti-simétrico do tipo angle-ply. As matrizes de rigidez das camadas

são (tabela 3.5)

Sendo a espessura média da camada hc = 1.5/12 = 0.125 mm, as coordenadas das interfaces são z0 = 0.75 mm, z1 = 0.625 mm, , z12 = -0.75 mm. Recorrendo às equações (7.18) a (7.20) obtemos

onde as unidades dos termos de

,

e

são N/mm, N e Nmm, respectivamente. Pode-se observar os

valores nulos de vários coeficientes de acoplamento, conforme a análise anterior. Da equação (7.23),

Atendendo aos esforços aplicados, as deformações e curvaturas são (equação 7.22)

o que mostra que a aplicação de um momento torçor provoca também deformações membrana, se bem que bastante pequenas no caso presente.

174

CAPÍTULO 7: ANÁLISE DOS LAMINADOS

Pretende-se agora que as deformações e curvaturas sejam

Logo, da equação (7.17) concluímos que é necessário aplicar os esforços

onde o valor de Mxy difere em menos de 2 % do anterior, resultado de acoplamentos membrana-flexão modestos.

7.2.2. CONSTANTES DE ENGENHARIA DE LAMINADOS SIMÉTRICOS Como vimos anteriormente, nos laminados simétricos podemos considerar separadamente o comportamento membrana do comportamento à flexão. No primeiro caso, definimos tensões médias (7.24) que substituimos na equação (7.22),

(7.25)

Podemos agora interpretar os termos da matriz h à luz das definições das Constantes de Engenharia (equação 3.59), isto é:

(7.26)

É possível medir os valores destas Constantes de Engenharia em ensaios de provetes cortados das placas laminadas. Todavia, a caracterização sistemática do comportamento dos laminados por esta via é manifestamente inconveniente e dispendiosa, face à infinidade de sequências de empilhamento que é possível construir a partir de camadas de um determinado material. A abordagem de projecto que é habitualmente seguida consiste por isso em caracterizar o comportamento mecânico da camada, e, posteriormente, prever o comportamento dos laminados com base numa teoria de 175

MATERIAIS COMPÓSITOS

laminados. Não obstante, é boa prática realizar um conjunto limitado de ensaios de laminados, por exemplo, para medir o módulo Ex, no sentido de confirmar os valores calculados. Convém relembrar que diferenças nos processos e/ou nos parâmetros de fabrico podem conduzir a alterações significativas do teor de fibras, e, consequentemente das propriedades mecânicas. Em geral, satisfeitos estes requisitos, verifica-se que os valores medidos das Constantes de Engenharia estão em muito boa concordância com os valores calculados através da Teoria Clássica dos Laminados [7.1, 7.2]. De referir também que se podem definir módulos de flexão, Efx e Efy. Recordemos que, quando uma placa isotrópica de módulo E e coeficiente de Poisson ν está sujeita a um único momento Mx, verifica-se que a curvatura resultante é [7.3] (7.27) onde Iy = h3/12 é o momento estático de segunda ordem da placa por unidade de largura e Ef = E/(1−ν2) é o módulo aparente de flexão. Por conseguinte, a analogia com os termos da matriz da relação momentos-curvaturas (7.22),

(7.28)

permite definir os módulos à flexão (7.29)

Exemplo .3. Calcule os valores das Constantes de Engenharia e dos módulos de flexão do laminado analisado no exemplo 7.1. Resolução. Tendo já obtido a matriz , as equações (7.26) permitem obter:

Mais uma vez, tendo o laminado igual número de camadas a 0º e a 90º e sendo o comportamento membrana independente da sequência de empilhamento, Ex seria necessariamente igual a Ey. Por outro lado, nota-se ainda os baixos valores de Gxy, que é igual a G12, e de νxy, que se deve à resistência à contracção das camadas a 90º.

176

CAPÍTULO 7: ANÁLISE DOS LAMINADOS

Quanto aos módulos de flexão, há que usar nas equações (7.29) os termos de

já calculados, tal que

De salientar que Efx não é igual a Ex nem a Efy, reflectindo a importância da sequência de empilhamento no comportamento à flexão.

Exemplo .4. Uma placa laminada [0/90/ 45]s de 1.12 mm de espessura é constituída por camadas de carbono/epóxido com E1 = 177 GPa, E2 = 11.0 GPa,

12

= 0.27, G12 = 7.6 GPa. a) Mostre que o lami-

nado é quase-isotrópico e obtenha as suas Constantes de Engenharia. b) Calcule os módulos de flexão. Resolução.

Como nos exemplos anteriores, começamos por calcular as matrizes de rigidez correspon-

dentes às várias orientações de camadas (tabela 3.5):

Usando a espessura da camada hc = 1.12/8 = 0.14 mm, temos z0 = 0.56 mm, z1 = 0.42 mm, , z8 = -0.56 mm, o que permite obter as matrizes de rigidez do laminado (equações 7.18 a 7.20)

sendo que

, pois o laminado é simétrico. Logo, da equação (7.23),

Das equações (7.26) obtemos:

onde o carácter quase-isotrópico do laminado se manifesta por Ex = Ey e por Gxy = Ex/2(1 + νxy).

177

MATERIAIS COMPÓSITOS

Usando os termos da matriz

já calculados, resulta das equações (7.29)

valores diferentes entre si e de Ex e Ey.

7.2.3. ANÁLISE DA RESISTÊNCIA DE LAMINADOS Uma placa compósita deve ser concebida escolhendo materiais, número e orientações de camadas de maneira a obter a rigidez e resistência necessárias para suportar os valores pretendidos dos esforços e . No âmbito da Teoria Clássica dos Laminados, a avaliação da resistência deve ser feita camada a camada através do seguinte procedimento: › calcular as deformações ε e as curvaturas κ a partir da equação (7.22); › obter as tensões em cada camada no referencial global xyz , σ' , usando a equação (7.14); › calcular as tensões em cada camada no respectivo referencial principal 123 , σ , recorrendo à equação (3.55); › aplicar um critério de rotura da camada (ver capítulo 5). No decurso deste exercício, temos que distinguir claramente duas situações: a chamada primeira rotura de camada (First Ply Failure) e a rotura global do laminado. De facto, a primeira rotura de camada é frequentemente uma rotura transversal, que ocorre a esforços bastante inferiores aos que provocam a rotura final. A título ilustrativo, representa-se esquematicamente na figura 7.7 uma curva tensão média (σ0x = x h)-deformação (ε0x) de um laminado [0/ 45/90]s [7.1]. Sob cargas crescentes, inicia-se a fissuração transversal das camadas a 90º, seguindo-se a formação de fendas transversais nas camadas a 45º, e, finalmente, a rotura das fibras das camadas a 0º. Note-se que as roturas transversais se manifestam sob a forma de "cotovelos" na curva tensão-deformação, associados a perdas de rigidez.

Figura 7.7. Representação esquemática da curva tensão-deformação de um laminado [0/±45/90]s, com indicação dos pontos de início de fissuração das camadas a 90º e a ±45º [7.1].

178

CAPÍTULO 7: ANÁLISE DOS LAMINADOS

A previsão da primeira rotura de camada é relativamente expedita, conforme se ilustra nos exemplos 7.5 e 7.6. Ao contrário, a previsão da rotura final, incluindo o processo de danificação progressiva, é muito mais difícil. O primeiro problema que surge é definir a degradação de propriedades da camada após rotura. Como base da discussão deste assunto, consideremos o caso de um laminado [0/90]s sujeito a uma força x crescente (figura 7.8). A determinado valor de x, formam-se algumas fendas transversais nas zonas das camadas a 90º onde a resistência é estatisticamente menor. Nas faces das fendas, a tensão σx é obviamente nula. Porém, à medida que nos afastamos daquelas, a tensão σx na camada aumenta graças à transferência de carga das camadas a 0º mediante tensões de corte interlaminares τxz (este fenómeno é semelhante ao de transferência de carga para uma fibra partida, analisado no capítulo 4). Sob esforços crescentes, as tensões σx nas camadas a 90º provocam a formação de mais fendas, até se atingir uma densidade de fendas máxima, ou de saturação. A concentração de tensões interlaminares nas extremidades das fendas transversais pode provocar a formação local de delaminagens, isto é, de descolamentos entre as camadas a 0º e a 90º. Torna-se claro que a tensão σx média nas camadas a 90º, e consequentemente a rigidez equivalente desta, depende da densidade de fendas, sendo por isso muito difícil de prever de forma rigorosa. Sabe-se ainda que a fissuração transversal de uma dada camada é fortemente condicionada pela orientação das camadas vizinhas [7.4-7.6]. Por exemplo, um maior número de camadas adjacentes da mesma orientação favorece o aparecimento de fissuras transversais, fenómeno que se julga dever à maior probabilidade de existência de defeitos, e portanto de locais de menor resistência. Por exemplo, sob este ponto de vista, é de preferir o laminado [(0/90/ 45)3]s ao [03/903/( 45)3]s, de igual espessura.

Figura 7.8. Processo gradual de fissuração transversal num laminado [0/90]s sujeito a uma força Nx (Nx,2 > Nx,1).

Têm sido desenvolvidos modelos mais ou menos elaborados para prever a degradação da rigidez da camada associada à fissuração transversal [7.7-7.18]. Estes modelos requerem como dado de entrada a densidade de fendas, ou fazem apelo à Mecânica da Fractura (ver capítulo 9), o que inviabiliza a sua implementação a este 179

MATERIAIS COMPÓSITOS

nível de análise. Em alternativa, foram também propostos modelos empíricos de degradação de propriedades, que são bastante mais simples de utilizar [7.19-7.21]. Não obstante, tais modelos podem atingir elevado nível de sofisticação, como é o caso dos modelos aplicados por Chang et al. [7.19-7.20] a laminados com furos. De facto, esses autores consideraram vários sub-modos de rotura de fibras e de matriz, sendo que, no primeiro caso, todas as propriedades da camada foram degradadas, enquanto na segunda situação apenas as propriedades mais dependentes da matriz (E2, G12 e ν12) foram afectadas. O nível de degradação que permite o ajuste dos resultados experimentais variou desde o anular efectivo de um determinado módulo até à adopção de factores de degradação empíricos. Os modelos de Chang et al. [7.197.20] incorporam também relações τ12-γ12 não-lineares e resistências τut2 e σu12 dependentes das camada vizinhas. Por seu turno, Tan [7.21] prop s um modelo muito mais simples, que envolve o recurso ao critério da tensão máxima (5.13) e ao critério de Tsai-Wu (5.7) para prever roturas de fibras e de matriz, respectivamente. Independentemente do modo de rotura, o modelo de degradação escreve-se: (7.30) onde o índice d significa dano e 1, 2 e 6 são factores empíricos de degradação, de valor compreendido entre 0 e 1. Com base num estudo experimental da resistência de placas com furos, Tan [7.21] sugere para laminados carbono/epóxido 1 = 0.07 e 2 = 6 = 0.20. Estas abordagens ao processo de danificação progressiva devem ser encaradas com bastantes reservas pelas seguintes razões: › Trata-se efectivamente de modelos algo grosseiros e que, de certa forma, são inconsistentes com as hipóteses subjacentes à Teoria Clássica dos Laminados. Por exemplo, junto às fendas, é evidente que não haverá deformações membrana nem curvaturas uniformes através da espessura. Além disso, a existência de fissuras induz por vezes uma não-linearidade pronunciada. › Podem-se formar delaminagens mais ou menos extensas a partir das extremidades das fendas transversais, sobretudo perante carregamentos de flexão. As delaminagens são particularmente prejudiciais ao comportamento à compressão, na medida em que promovem fenómenos de instabilidade localizada (ver capítulo 10). › Embora a presença de fissuras transversais possa não afectar consideravelmente a capacidade de carga "quase-estática", acaba por potenciar fenómenos de degradação higrotérmica (ver capítulo 8) e de fadiga (ver capítulo 10). Há portanto grande interesse em modelar correctamente os processos de danificação 180

CAPÍTULO 7: ANÁLISE DOS LAMINADOS

progressiva para que se possa tirar melhor partido das excelentes propriedades mecânicas dos laminados compósitos.

Exemplo . . A placa laminada do exemplo 7.4 vai estar sujeita a esforços membrana variáveis, tais que x

=

y,

ambos de tracção, e

xy

= 0.25

x.

Sabe-se ainda que as resistências da camada são σut1 = 1600

MPa, σuc1 = 1600 MPa, σut2 = 50 MPa, σuc2 = 160 MPa e τu12 = 70 MPa. a) Determine os valores dos esforços conducentes à primeira rotura de camada usando os critérios de Tsai-Wu e de Hashin-Rotem. b) Preveja os valores dos esforços de colapso final do laminado, recorrendo ao critério de Hashin-Rotem e admitindo que a rotura de matriz numa camada implica anular E2, G12 e Resolução.

Tendo já obtido a matriz de flexibilidade

12.

do laminado no exemplo 7.4, e atendendo às

relações entre os esforços aplicados, as deformações membrana são (equação 7.22)

Calculamos agora as tensões nas camadas utilizando a equação (7.14) com as matrizes

k

já determi-

nadas:

onde

x

deve estar expresso em N/mm para se obterem tensões em MPa. Em seguida, há que determinar

as tensões no referencial 123 , aplicando a transformação (3.55), de que resultam:

Estamos finalmente em condições de aplicar os critérios de rotura. No caso do critério de Tsai-Wu, é necessário calcular primeiro os seus parâmetros (equações 5.8 e 5.11):

Se substituirmos na equação (5.7) os valores das tensões em cada camada, obtemos os respectivos valores de

x

de rotura:

181

MATERIAIS COMPÓSITOS

Conclui-se portanto que a primeira rotura ocorre nas camadas orientadas a -45º quando N/mm e

xy

x

=

y

= 447.3

= 111.8 N/mm.

Quanto ao critério de Hashin-Rotem, no caso da rotura de fibras (equação 5.13), os esforços limite previstos são:

enquanto para a rotura da matriz (equação 5.14) temos:

Portanto é prevista uma primeira rotura de matriz na camada a -45º quando xy

x

=

y

= 307.9 N/mm e

= 77.0 N/mm, valores bastante mais conservadores do que os obtidos do critério de Tsai-Wu.

O procedimento a seguir consiste na aplicação cíclica das seguintes etapas: 1. Aplicar o critério de Hashin-Rotem para determinar os esforços que provocam a próxima rotura de camada e: terminar o processo se se tratar de uma rotura de fibras; fazer E2 = G12 = 0 e

12

= 0 para roturas de matriz, e prosseguir o cálculo; e , as deformações ε0 e as tensões σ k e σk.

2. Recalcular sucessivamente as matrizes

Neste caso, depois das primeiras roturas de matriz das camadas a -45º, seguem-se: › roturas de matriz das camadas a 0º e a 90º para › roturas de matriz das camadas a 45º para › rotura de fibras das camadas a 45º para

x x

x

=

=

y y

=

y

= 354.3 N/mm e

= 516.3 N/mm e

= 597.3 N/mm e

xy xy

xy

= 88.6 N/mm;

= 129.1 N/mm;

= 149.3 N/mm;

que ditam a rotura final do laminado. É interessante notar que os valores destas forças são praticamente o dobro dos valores de primeira rotura de camada.

Exemplo . . Resolva o exemplo 7.5 considerando agora a placa sujeita a Mx e My = 0.2Mx. Resolução.

A matriz de flexibilidade

do laminado já foi obtida no exemplo 7.4. Face aos momentos

aplicados, as curvaturas são (equação 7.22)

As tensões nas camadas são obtidas usando na equação (7.14) estas curvaturas e as matrizes

k

calculadas

no exemplo 7.4. Em seguida, calculam-se as tensões no referencial 123 de cada camada recorrendo à transformação (3.55). Os resultados estão representados graficamente na figura E7.3.

182

CAPÍTULO 7: ANÁLISE DOS LAMINADOS

Figura E7.3. Distribuições das tensões σ1, σ2 e τ12 nas várias camadas (hc é a espessura da camada).

Com base no critério de Tsai-Wu, verifica-se que a primeira rotura ocorre na superfície z = z1 da camada a 90º superior quando Mx = 194.5 N e My = 38.9 N. Por seu turno, o critério de Hashin-Rotem prevê na mesma zona rotura de matriz para Mx = 132.0 N e My = 26.4 N. O procedimento é análogo ao do exemplo 7.5, com o ponto 2 a consistir agora no recalcular das matrizes

e , das curvaturas κ e das tensões σ k e σk.

Assim, após a primeira rotura de matriz na camada a 90º superior, seguem-se: › rotura de matriz da camada a 0º superior em z = z0 para Mx = 185.1 N e My = 37.0 N; › rotura das fibras da camada a 0º superior em z = z0 para Mx = 206.8 N e My = 41.4 N; que implica a rotura final do laminado.

183

MATERIAIS COMPÓSITOS

7.3. Teorias Avançadas dos Laminados A Teoria Clássica dos Laminados é de facto o modelo mais utilizado na análise de laminados, devido à sua simplicidade e rigor em muitas situações. Como vimos em 7.2, uma das condições fundamentais para a aplicabilidade da Teoria Clássica dos Laminados é que as placas sejam relativamente finas, de modo a que sejam válidas as hipóteses cinemáticas da Teoria de Kirchhoff. Os valores limite de a h e b h (figura 7.2) dependem do tipo de compósito e da sequência de empilhamento do laminado, mas são geralmente superiores aos dos materiais isotrópicos. Isto deve-se à menor rigidez ao corte transversal dos laminados compósitos, que resulta dos valores relativamente baixos dos módulos da camada G13 e G23. Naturalmente, face ao custo relativamente elevado dos materiais compósitos, há todo o interesse em usar laminados finos, cuja viabilidade é muitas vezes assegurada pela elevada rigidez à flexão. No entanto, os progressos na tecnologia dos compósitos e a generalização das suas aplicações têm conduzido à utilização crescente de laminados espessos. Nestas condições, torna-se importante recorrer a teorias de laminados mais elaboradas, cujo desenvolvimento tem sido objecto de vários estudos [7.22-7.36]. Estas teorias distinguem-se principalmente pelas hipóteses admitidas no que toca à variação dos deslocamentos com na direcção z da espessura do laminado (figura 7.2), podendo ser divididas em três grandes grupos [7.23, 7.26, 7.27]: › teorias de deformação globais, nas quais os deslocamentos são descritos por funções de z aplicáveis a toda a espessura do laminado, ou seja, para -h/2 ≤ z ≤ h/2; › teorias de deformação locais, por vezes designadas por teorias "zig-zag", em que os deslocamentos são aproximados por funções definidas localmente em cada camada do laminado; › teorias de deformação globais-locais, que recorrem simultaneamente a funções globais e a funções locais para caracterizar o campo de deslocamentos.

7.3.1. TEORIAS DE DEFORMAÇÃO GLOBAIS Nestas teorias, o campo de deslocamentos pode escrever-se genericamente na forma

(7.31)

onde u0, 0 e w0 representam os deslocamentos do plano médio do laminado e φk, ϕk e ψk são funções das coordenadas x e y, com k = 1, 2, ..., n. A Teoria Clássica dos 184

CAPÍTULO 7: ANÁLISE DOS LAMINADOS

Laminados é, obviamente, um caso particular, pois o campo de deslocamentos definido pela equação (7.7) obtém-se de (7.31) fazendo ψk(x,y) = 0 para k = 1 até n e φk(x,y) = ϕk(x,y) = 0 para k = 2 até n. Além disso, as funções φ1 e ϕ1 coincidem com as rotações θx e θy da secção (figura 7.4), que se relacionam com os deslocamentos transversais w através das equações (7.5). Trata-se portanto de uma teoria de deformação global de 1 ordem, cuja principal limitação consiste em não ter em conta as deformações de corte transversal. Esta deficiência pode ser eliminada nas teorias de 1 ordem usando (7.32)

em que as rotações θx e θy da secção deixam de obedecer às equações (7.5), sendo definidas com base na condição de igualdade entre o trabalho realizado pelos momentos flectores Mx e My e as componentes da energia de deformação correspondentes, isto é, (7.33) Na realidade, as funções rotação podem exprimir-se por

(7.34)

onde fx(x,y) e fy(x,y) são funções dependentes do problema concreto em análise e x e y são constantes que resultam das propriedades elásticas e do número e sequência de empilhamento das camadas do laminado. No caso de placas de materiais isotrópicos, as funções fx(x,y) e fy(x,y) coincidem com os esforços de corte transversal Vx(x,y) e Vy(x,y) (figura 7.3), respectivamente, e x = y = 5Gh/6, sendo G o módulo de corte do material [7.3]. Esta Teoria de 1 Ordem com Corte Transversal fornece geralmente resultados satisfatórios, sendo por isso adoptada na generalidade dos códigos de elementos finitos. Não obstante, têm sido utilizadas com alguma frequência teorias de 3 ordem [7.23-7.28], isto é, com n = 3 nas equações (7.31). Independentemente da ordem n, as teorias de deformação globais têm limitações importantes no cálculo das tensões fora do plano da camada, ou seja de σz, τxz e τyz. Como é evidente, qualquer modelo baseado numa teoria de placas não permite obter resultados rigorosos para σz. Para isso são necessários modelos verdadeiramente tridi185

MATERIAIS COMPÓSITOS

mensionais. Contudo, reveste-se de particular importância obter valores rigorosos das tensões de corte τxz e τyz nas interfaces entre camadas. De facto, como veremos nos capítulos 9 e 10, estas tensões podem provocar descoesões entre camadas, ou seja, delaminagens. Em princípio, tendo obtido o campo de deslocamentos (7.31) e posteriormente o tensor das deformações ε através de

(7.35)

as tensões na camada k do laminado podem ser calculadas da equação (3.44) (7.36) Como se viu em 7.2, face à continuidade das deformações, havendo diferenças nas matrizes de rigidez k e k+1 de camadas adjacentes k e k+1 por estas possuírem diferentes orientações, as tensões σ k e σ k+1 serão necessariamente descontínuas. Isto pode verificar-se para as tensões no plano da camada σx, σy e τxy, mas não é aceitável para as tensões fora do plano σz, τxz e τyz, pois viola a condição de equilíbrio de forças entre camadas. De modo a contornar esta limitação, as tensões τxz e τyz são calculadas à posteriori a partir das equações de equilíbrio tridimensional nas direcções x e y [7.23, 7.24],

(7.37)

usando as tensões σx, σy e τxy previamente obtidas. Isto é, as distribuições de tensões ao longo da espessura do laminado são dadas por (7.38) (7.39) de onde resultam valores suficientemente rigorosos para muitas aplicações.

186

CAPÍTULO 7: ANÁLISE DOS LAMINADOS

7.3.2. TEORIAS DE DEFORMAÇÃO LOCAIS As teorias de deformação locais baseiam-se em funções deslocamento definidas camada a camada. Em geral, o campo de deslocamentos numa camada k de um laminado é descrito por equações do tipo [7.23, 7.29, 7.30]

(7.40)

com hk-1 ≤ z ≤ hk (figura 7.6). Estas teorias têm a vantagem de assegurar simultaneamente as condições de continuidade dos deslocamentos e das tensões fora do plano, nas interfaces. Como é evidente, quanto maior for a ordem n da teoria, melhores serão os resultados. Todavia, aumenta também o esforço de cálculo, que é precisamente a grande limitação das teorias puramente locais, pois o número de variáveis utilizado nas equações (7.40) é proporcional ao número de camadas de um laminado. Por isso, os modelos baseados nestas teorias têm geralmente aplicações limitadas aos materiais sandwich, em que as "peles" e o núcleo são modeladas por 3 camadas. Neste caso, as diferenças nas espessuras e nas propriedades das peles e do núcleo justificam a natureza local da aproximação. Por razões de custo computacional, n ≤ 3, e admitem-se geralmente deslocamentos transversais w independentes de z.

7.3.3. TEORIAS DE DEFORMAÇÃO GLOBAIS-LOCAIS Estas teorias visam atingir um compromisso entre a eficiência computacional das teorias globais e o rigor das teorias locais. Nesse sentido, o campo de deslocamento é obtido sobrepondo funções globais e funções locais. Para evitar que o número de variáveis se torne dependente do número de camadas do laminado, utilizam-se geralmente apenas dois termos locais, uma vez que as variáveis correspondentes podem ser previamente eliminadas pelas condições de continuidade dos deslocamentos u e e das tensões fora do plano τxz e τyz. Assim, as teorias globais-locais usam geralmente campos de deslocamentos com a forma [7.23, 7.29, 7.31-7.36]

(7.41)

onde ξk é uma coordenada local na direcção da espessura da camada k. Relativamente 187

MATERIAIS COMPÓSITOS

aos termos locais, o mais importante parece ser o termo de ordem 1, enquanto o menos relevante é o de ordem 0, que é bem representado pela componente global [7.23]. Por conseguinte, nas equações (7.41) são de preferir as combinações p =1 e = 2 ou p = 1 e = 3, sendo que esta última tende a ser mais rigorosa no cálculo das tensões interlaminares, dado que contempla as variações parabólicas locais de τxz e de τyz. Como é evidente, a utilização destas teorias na solução de problemas de interesse prático requer a implementação prévia em programas de elementos finitos.

Referências 7.1. Halpin, J. C. Primer on Composite Materials: Analysis. Technomic Publishing Co., Lancaster, PA, 1984. 7.2. Whitney, J. M. Structural Analysis of Laminated Plates. Technomic Publishing Co., Lancaster, PA, 1987. 7.3

Timoshenko, S. P., S. Woinowski-Krieger. Theory of Plates and Shells. McGraw-Hill International Editions, 1959.

7.4. Flaggs, D. L., M. H. Kural. Experimental Determination of the In Situ Transverse Lamina Strength in Graphite/Epoxy Laminates. Journal of Composite Materials, 16: 103-116 (1982). 7.5. Crossman, F. W., A. S. D. Wang. The Dependence of Transverse Cracking and Delamination on Ply Thickness in Graphite/Epoxy Laminates. ASTM STP 775, 118-139 (1982). 7.6. Chang, F. K., M. H. Chen. The In Situ Ply Shear Strength Distributions in Graphite/Epoxy Laminated Composites. Journal of Composite Materials, 21: 708-733 (1987). 7.7. Nuismer, R. J., S. C. Tan. Constitutive Relations of a Cracked Composite Lamina. Journal of Composite Materials, 22: 306-321 (1988). 7.8. Tan, S. C., R. J. Nuismer. A Theory for Progressive Matrix Cracking in Composite Laminates. Journal of Composite Materials, 23: 1029-1046 (1989). 7.9. Gudmunson, P., S. Ostlund. First Order Analysis of Stiffness Reduction due to Matrix Cracking. Journal of Composite Materials, 26: 1009-1029 (1992). 7.10. Talreja, R., S. Yalvac, L. D. Yats, D. G. Wetters. Transverse Cracking and Stiffness Reduction in Cross Ply Laminates of Different Matrix Toughness. Journal of Composite Materials, 26: 1644-1663 (1992). 7.11. Guild, F. J., S. L. Ogin, P. A. Smith. Modelling of 90º Ply Cracking in Crossply Laminates, including Three-Dimensional Effects. Journal of Composite Materials, 27: 646-667 (1993). 7.12. McCartney, L. N. Predicting Transverse Crack Formation in Cross-Ply Laminates. Composites Science and Technology, 58: 1069-1081 (1998).

188

CAPÍTULO 7: ANÁLISE DOS LAMINADOS

7.13. Smith, P. A., S. L. Ogin. On Transverse Matrix Cracking in Cross-Ply Laminates Loaded in Simple Bending. Composites Part A, 30: 1003-1008 (1999). 7.14. Pradhan, B., N. V. Kumar, N. S. Rao. Stiffness Degradation Resulting from 90 degrees Ply Cracking in Angle-Ply Composite Laminates. Composites Science and Technology, 59: 1543-1552 (1999). 7.15. Joffe, R., J. Varna. Analytical Modeling of Stiffness Reduction in Symmetric and Balanced Laminates due to Cracks in 90 degrees Layers. Composites Science and Technology, 59: 1641-1652 (1999). 7.16. Kashtalyan, M., C. Soutis. The Effect of Delaminations induced by Transverse Cracks and Splits on Stiffness Properties of Composite Laminates. Composites Part A, 31: 107-119 (2000). 7.17. Johnson, P., F. K. Chang. Characterization of Matrix Crack-induced Laminate Failure - Part I: Experiments. Journal of Composite Materials, 35: 2009-2035 (2001). 7.18. Johnson, P., F. K. Chang. Characterization of Matrix Crack-induced Laminate Failure - Part II: Analysis and Verifications. Journal of Composite Materials, 35: 2037-2074 (2001). 7.19. Chang, F.-K., L. B. Lessard. Damage Tolerance of Laminated Composites Containing an Open Hole and Subjected to Compressive Loadings: Part I- Analysis. Journal of Composite Materials, 25: 2-43 (1991). 7.20. Chang, K.-Y., S. Liu, F.-K. Chang. Damage Tolerance of Laminated Composites Containing an Open Hole and Subjected to Tensile Loadings. Journal of Composite Materials, 25:274-301 (1991). 7.21. Tan, S. C. A Progressive Failure Model for Composite Laminates Containing Openings. Journal of Composite Materials, 25: 536-577 (1991). 7.22. Noor, A. K., W. S. Burton. Assessment of Shear Deformation Theories for Multilayered Composites Plates. Applied Mechanics Reviews, 41: 1-12 (1989). 7.23. Liu, D., X. Li. An Overall View of Laminated Theories based on Displacement Hypothesis. Journal of Composite Materials, 30: 1539-1561 (1996). 7.24. Lo, K. H., R. M. Christensen, E. M. Wu. Stress Solution Determination for Higher Order Plate Theory. International Journal of Solids and Sructures, 14: 655-662 (1978). 7.25. Reddy, J. N. A Simple Higher-Order Theory for Laminated Composite Plates. Journal of Applied Mechanics, 51: 745-752 (1984). 7.26. Di Sciuva, M. An Improved Shear Deformation Theory for Moderately Thick Multilayered Anisotropic Shells and Plates. Journal of Applied Mechanics, 54: 589-596 (1987). 7.27. Reddy, J. N. A Generalization of Two-Dimensional Theories of Laminated Composite Plates. Communications of Applied Numerical Methods, 3: 173-180 (1987). 7.28. Toledano, A., H. Murakami. A High-Order Laminated Plate Theory with Improved In-Plane Responses. International Journal of Solids and Sructures, 23: 111-131 (1987). 7.29. Reddy, J. N. On Refined Computational Models of Composite Laminates. International Journal of Numerical Methods in Engineering, 27: 361-362 (1989). 7.30. Barbero, E. J., J. N. Reddy. An accurate Determination of Stresses in Thick Laminates using a Generalized Plate Theory. International Journal of Numerical Methods in Engineering, 29: 1-14 (1990). 7.31. Lee, K. H, N. R. Senthilnathan, S. P. Lim, S. T. Chow. An Improved Zigzag Model for the Bending of Laminated Composite Plates. Composite Structures, 15: 137-148 (1990).

189

MATERIAIS COMPÓSITOS

7.32. Di Sciuva, M. Multilayered Anisotropic Plate Models with Continuous Interlaminar Stresses. Composite Structures, 22: 149-167 (1992). 7.33. Lee, C. Y., D. Liu. An Interlaminar Stress Continuity Theory for Laminated Composites Analysis. Computers and Structures, 42: 69-78 (1992). 7.34. Soldatos, K. A General Laminated Plate Theory accounting for Continuity of Displacements and Transverse Shear Stresses at Material Interfaces. Composite Structures, 20: 195-211 (1992). 7.35. Cho, M., R. R. Parmeter. Efficient Higher Order Composite Plate Theory for General Lamination Configurations. AIAA Journal, 31: 1299-1306 (1993). 7.36. Li, X., D. Liu. A Laminate Theory based on Global-Local Superposition. Communications of Numerical Methods in Engineering, 11: 633-641 (1995).

190

CAPÍTULO 8: EFEITOS HIGROTÉRMICOS E VISCOELÁSTICOS

Capítulo 8

Efeitos Higrotérmicos e Viscoelásticos

8.1. Introdução Os capítulos 3 a 7 foram dedicados à análise do comportamento puramente mecânico dos materiais compósitos, sob perspectivas micro e macromecânica. Estes conhecimentos constituem efectivamente a base para o projecto de estruturas compósitas. No entanto, é importante ter em conta a influência de outros factores no comportamento mecânico, tais como a exposição mais ou menos prolongada a temperaturas e humidades elevadas, cujos efeitos combinados se designam por higrotérmicos. De facto, as propriedades mecânicas dos polímeros são bastante sensíveis a estes efeitos, e, como vimos nos capítulos anteriores, certas componentes do comportamento dos compósitos são particularmente dependentes das propriedades da matriz. Para além da degradação de propriedades, os efeitos higrotérmicos manifestam-se também sob a forma de expansões ou contracções, que causam tensões internas nos compósitos, dadas as diferentes propriedades higrotérmicas das fibras e da matriz. Os efeitos higrotérmicos constituem um tópico de investigação particularmente relevante, em que a caracterização experimental continua a assumir o papel principal. Neste capítulo, são revistas as conclusões principais desses estudos e apresentados modelos relativamente simples para ter em conta os efeitos higrotérmicos numa fase inicial de projecto. Por outro lado, as matrizes poliméricas possuem um carácter acentuadamente viscoelástico, que, obviamente, também se reflecte nos compósitos. Nos materiais

191

MATERIAIS COMPÓSITOS

estruturais de utilização mais comum, como os aços e as ligas de alumínio, os fenómenos viscoelásticos só se tornam relevantes a temperaturas relativamente elevadas, ou seja, acima de metade da temperatura de fusão. Ao invés, os materiais poliméricos têm um comportamento claramente viscoelástico, mesmo a temperaturas inferiores à temperatura de transição vítrea, g (ver capítulo 1). Como é evidente, há uma ligação entre efeitos viscoelásticos e factores higrotérmicos. A natureza viscoelástica manifesta-se sob quatro formas principais, conforme se exemplifica na figura 8.1 para uma barra sob carga axial. Na primeira situação, em que a barra está sujeita a uma tensão constante (figura 8.1a), depois da resposta elástica inicial, verifica-se um aumento gradual da deformação da barra, fenómeno que se designa por flu ncia. Por outro lado, se for imposta à barra uma deformação constante (figura 8.1b), dá-se uma relaxa o progressiva da tensão em relação ao valor inicial. Na terceira situação (figura 8.1c), a barra é sujeita a um carregamento oscilatório, e a curva tensão-deformação forma um ciclo de histerese. A área delimitada pelo referido ciclo define a energia dissipada. Este fenómeno é particularmente importante nos materiais elastoméricos, cuja função é frequentemente o amortecimento de vibrações. Finalmente, o comportamento tensão-deformação dos materiais viscoelásticos é sensível à taxa de deformação imposta (figura 8.1d).

a)

b)

c)

d)

Figura 8.1. Manifestações de comportamento viscoelástico: a) fluência; b) relaxação; c) histerese; d) sensibilidade à taxa de deformação.

Este capítulo apresenta os fundamentos teóricos da viscoelasticidade dita linear, que 192

CAPÍTULO 8: EFEITOS HIGROTÉRMICOS E VISCOELÁSTICOS

é frequentemente utilizada no projecto de estruturas compósitas. É dada particular atenção aos fenómenos de fluência e de relaxação, que condicionam em grande medida a durabilidade estrutural. Todavia, são também salientadas as actuais limitações na previsão rigorosa destes fenómenos, que fazem com que este assunto continue a ser objecto de investigação.

8.2. Efeitos Higrotérmicos 8.2.1. DEGRADAÇÃO DE PROPRIEDADES Sob exposição higrotérmica, as matrizes poliméricas podem ver as suas propriedades mecânicas degradar-se substancialmente. Naturalmente, as propriedades transversais da camada dos laminados de fibras contínuas e as propriedades dos compósitos de fibras curtas são as mais afectadas [8.1-8.11]. Pelo contrário, exceptuando as fibras aramídicas, as propriedades das fibras são geralmente pouco sensíveis aos factores higrotérmicos, o mesmo sucedendo com o módulo longitudinal e com a resistência à tracção longitudinal da camada. Todavia, a resistência à compressão longitudinal é algo afectada [8.9, 8.10], pois a resistência e rigidez da matriz também desempenham um papel relevante no fenómeno da microencurvadura das fibras (ver capítulo 4). A avaliação rigorosa dos efeitos higrotérmicos exige programas experimentais que poderão ser extensos e dispendiosos, face à anisotropia dos compósitos. Em princípio, atendendo a que estes se devem essencialmente à matriz polimérica, pode ser delineada a seguinte metodologia [8.6, 8.7]: a) caracterização experimental dos efeitos higrotérmicos na matriz; b) previsão das propriedades dos compósitos recorrendo aos modelos micromecânicos apresentados nos capítulos 4 e 6. Recorde-se porém que, como se viu nesses capítulos, o actual estado da arte na modelação micromecânica faz com que esta abordagem só seja verdadeiramente rigorosa para as propriedades elásticas. No que toca à primeira etapa, Chamis et al. [8.6, 8.7] propuseram para descrever a degradação higrotérmica das propriedades de rigidez ou de resistência da matriz a equação (8.1)

193

MATERIAIS COMPÓSITOS

em que: › Pm,c é a propriedade da matriz à temperatura e com concentração de água absorvida c (massa de água por massa de resina seca num elemento de volume infinitesimal); › Pm,r é a propriedade da matriz à temperatura de referência r após secagem para eliminação total de humidade; › g,c é a temperatura de transição vítrea da matriz com concentração de água absorvida c; › g,r é a temperatura de transição vítrea da matriz após secagem. Segundo vários estudos experimentais [8.1, 8.7, 8.8],

g,c

pode ser estimada por (8.2)

com c em %. A aplicação das equações (8.1) e (8.2) exige naturalmente o conhecimento da temperatura e da concentração de água no compósito. Quando se coloca um compósito seco num ambiente com temperatura a e humidade ca (figura 8.2), este adquire gradualmente condições estacionárias mediante processos de condução térmica e de difusão de água. Apesar da baixa condutividade térmica dos polímeros e dos compósitos de matriz polimérica, verifica-se que estes materiais atingem a temperatura ambiente a cerca de 1 milhão de vezes mais rapidamente do que a concentração de humidade final, ce, dita de saturação [8.12]. Portanto, para efeitos de análise, é legítimo admitir que a temperatura do compósito é igual a a, e estudar depois o processo de difusão de água.

Figura 8.2. Compósito exposto a condições ambientais Ta e ca. Representação esquemática da distribuição de humidade ao longo da espessura (equação 8.4).

Em geral, o estudo da difusão de água é um problema tridimensional [8.12]. Porém, na grande maioria dos casos de interesse prático, a superfície exposta da peça nos 194

CAPÍTULO 8: EFEITOS HIGROTÉRMICOS E VISCOELÁSTICOS

bordos laterais é muito menor do que a das faces superior e inferior. Logo, consideramos apenas a difusão através da espessura da peça (figura 8.2), ou seja, uma concentração de água local c(z, t). Admitindo que a difusividade z é independente de c, a Segunda Lei de Fick escreve-se (8.3) Sendo ci a concentração de água inicial uniforme, a solução de (8.3) pode ser expressa pela série [8.11] (8.4) Na prática, é muito difícil medir as concentrações locais de água [8.13, 8.14], pelo que, nos estudos experimentais mais comuns, regista-se a evolução da concentração média de água através de pesagens da amostra após determinados tempos de exposição às condições higrotérmicas. A massa total de água na amostra pode ser dada por (8.5) onde A é a área das faces expostas. Em face de (8.4), a variação relativa de massa de água é (8.6) em que mi é a massa inicial de água na amostra e me a massa de água de saturação. A figura 8.3 mostra a forma típica de uma curva de massa absorvida de água, onde se nota um troço inicial linear, seguido de uma evolução mais lenta para um valor de saturação.

Figura 8.3. Forma típica de uma curva de absorção de água de acordo com o modelo de Fick.

A aplicação da equação (8.6) a dados experimentais permite obter a difusividade z a partir do declive inicial da curva de absorção e a massa de água de saturação me, 195

MATERIAIS COMPÓSITOS

desde que seja de facto válida a Segunda Lei de Fick. Na realidade têm sido registados alguns desvios nos estádios finais do processo de absorção, que se devem a relaxação progressiva da matriz [8.15, 8.16] e/ou ao aparecimento de microfissuras resultantes de carregamento e de processos degradação higrotérmica [8.13, 8.17]. É também importante salientar que a difusividade é bastante sensível à temperatura, sendo normalmente válida uma lei do tipo (8.7) onde zo é uma difusividade característica do material, Δ uma energia de activação, também propriedade do material, R é a constante universal dos gases perfeitos (8.314 JK-1mol-1) e é a temperatura em graus K.

Exemplo .1. z

= 1.2

10-4

temperatura ambiente, um compósito de espessura h = 3 mm tem uma difusividade

mm2/h.

Sabendo que o compósito possuía inicialmente cerca de 10 % da massa de água de

saturação, me, determine a massa de água absorvida em % de me ao fim de 1 mês e de um ano de exposição. Resolução. Começamos por aplicar a equação (8.6),

Quando t = 30 dias (720 h), os cálculos mostram que basta usar os 3 primeiros termos da série para obter g(t) = 0.221. Para t = 365 dias (8760 h), verifica-se que o primeiro termo é suficiente para determinar g(t) = 0.744. Da equação (8.6) obtém-se ainda

Como no caso presente mi me = 10 %, facilmente concluímos que m(t)/me = 30 % e 77 % para t = 30 dias e para t = 365 dias, respectivamente. É portanto evidente a lentidão dos processos de difusão de água à temperatura ambiente.

8.2.2. LEIS CONSTITUTIVAS COM EFEITOS HIGROTÉRMICOS Consideremos uma camada unidireccional de um compósito de fibras contínuas sem quaisquer constrangimentos às suas deformações. Quando a camada é sujeita a uma variação de temperatura Δ , verifica-se que sofre deformações

196

CAPÍTULO 8: EFEITOS HIGROTÉRMICOS E VISCOELÁSTICOS

(8.8) com i, j = 1, 2 e 3, e sendo αij os coeficientes de expansão térmica. No referencial principal de ortotropia, sabe-se ainda que as variações de temperatura não geram deformações de corte, isto é, αij = 0 se i ≠ j, pelo que basta considerar os coeficientes de expansão térmica α1, α2 e α3. A condição de isotropia transversal impõe também que α2 = α3. Tal como sucede com os módulos de elasticidade, a anisotropia na expansão térmica da camada é elevada, dado que as fibras possuem coeficientes de expansão térmica α1f substancialmente menores do que as matrizes poliméricas. No caso das fibras de carbono, os valores de α1f são mesmo negativos, o que faz com que α1 tenha valores próximos de zero [8.18-8.20] (tabela 8.1). Isto constitui uma propriedade particularmente interessante para estruturas aeroespaciais. Os coeficientes de expansão térmica podem ser objecto de previsão micromecânica, recorrendo a modelos semelhantes aos do capítulo 4 [8.20]. Pela sua simplicidade, rigor e interesse prático, há que referir a Lei de Misturas para α1, que facilmente se deduz da lei constitutiva termomecânica uniaxial (8.9) Substituídas as tensões em todos os constituintes na equação (4.4), (8.10) e atendendo às equações (4.2) e (4.6), obtemos (8.11) Em geral, a relação deformação-variação de temperatura não é exactamente linear. Todavia, os erros da linearização são relativamente pequenos para as variações de temperatura habituais em compósitos de matriz polimérica. Tabela 8.1. Propriedades higrotérmicas de alguns laminados unidireccionais [8.21].

197

MATERIAIS COMPÓSITOS

A absorção de humidade causa deformações análogas às variações de temperatura (8.12) sendo βij coeficientes de expansão higroscópica, que, no referencial principal de ortotropia são βij = 0 se i ≠ j, resultando ainda da isotropia transversal que β2 = β3. A tabela 8.1 apresenta alguns valores típicos, onde se assinala a diferença entre os valores de β1 e de β2, face à menor absorção de humidade das fibras. Recorrendo a uma análise micromecânica análoga à da expansão térmica, demonstra-se facilmente que (8.13) Geralmente, a relação linear deformação-concentração de água (8.12) é uma aproximação aceitável, embora menos rigorosa do que (8.8). Os coeficientes de expansão térmica e higroscópica são eles próprios afectados por e c. Neste caso, porém, a variação é em sentido inverso à dos módulos e das resistências, tendo Chamis et al. [8.6, 8.7] proposto a equação (8.14) também aplicável ao rácio βm,c/βm,r. É portanto evidente que seriam necessários procedimentos iterativos relativamente complicados para se ter conta de forma rigorosa os efeitos higrotérmicos. Na prática, admitem-se valores médios para os coeficientes de expansão térmica e higroscópica no cálculo das deformações das camadas e, consequentemente, dos laminados. Outra hipótese fundamental é a de que a temperatura e a concentração de humidade são uniformes no laminado. Considerando a camada linear elástica, pode-se sobrepor as deformações de origem higrotérmica com as deformações mecânicas (equações 3.51, 8.8 e 8.12), (8.15) que, no referencial principal e sob estado plano de tensão se escrevem

(8.16) Num referencial genérico xyz (figura 3.7), as deformações são dadas por 198

CAPÍTULO 8: EFEITOS HIGROTÉRMICOS E VISCOELÁSTICOS

(8.17)

em que os vectores de expansão térmica e higroscópica se obtêm aplicando a lei de transformação das deformações (equação 3.56). Por exemplo, no caso da expansão térmica, (8.18)

onde c = cosθ e s = sinθ, estando θ definido na figura 3.7. Conhecidas as deformações da camada, as tensões determinam-se através de (8.19) No âmbito da Teoria Clássica dos Laminados, vimos que o campo de deformações é dado pela equação (7.9), e portanto as tensões na camada k são (8.20) Recorrendo novamente à equação do esforço membrana (7.12), (8.21) a substituição de (8.20) permite escrever (8.22) onde e são as matrizes definidas pelas equações (7.18) e (7.19), respectivamente, e onde surgem o esforço membrana de térmico, (8.23) e o esforço membrana higroscópico, (8.24) Analogamente, a substituição de (8.20) na equação dos momentos (7.13), 199

MATERIAIS COMPÓSITOS

(8.25) permite obter (8.26) onde e são as matrizes definidas pelas equações (7.19) e (7.20), respectivamente, e onde surgem os momentos térmicos, (8.27) e os momentos higroscópicos, (8.28) Se definirmos os esforços efectivos totais (8.29) (8.30) as equações base da Teoria Clássica dos Laminados são análogas às equações (7.17) e (7.22), isto é, (8.31) (8.32) Como já foi anteriormente referido, desenvolvem-se tensões internas de origem térmica após o fabrico, e que se designam por tensões residuais. Logo, haverá também geralmente esforços e momentos no laminado, que provocam deformações ε0 e curvaturas κ. Estas últimas traduzem-se em empenamentos inconvenientes que interessa evitar. Isso consegue-se recorrendo a laminados simétricos, para os quais as matrizes e são nulas (ver 7.2.1), anulando e κ. As tensões residuais de origem térmica podem ter uma influência relevante na integridade estrutural, sobretudo na promoção de roturas transversais [8.22, 8.23], o que torna importante estimar os seus valores. Para isso, considera-se uma temperatura de referência 0, à qual não existem tensões residuais. Numa primeira aproximação, algo conservadora, admite-se normalmente que 0 é igual à temperatura de cura, c, no caso da matriz ser termoendurecível. Recorre-se então às equações (8.23) e (8.27) para calcular os esforços de origem térmica. Em seguida, obtém-se o campo de defor200

CAPÍTULO 8: EFEITOS HIGROTÉRMICOS E VISCOELÁSTICOS

mações a partir das equações (8.32), o que possibilita a determinação das tensões residuais através da equação (8.20). Na realidade, o valor de 0 é geralmente inferior a c, na medida em que, durante algum tempo após a cura, a temperatura do laminado se mantém suficientemente elevada para que a matriz seja ainda pouco rígida e para que sejam relevantes processos de relaxação viscoelástica e viscoplástica. No sentido de determinar 0, vários autores [8.11, 8.24-8.27] recorreram à determinação experimental baseada na relação curvatura-esforços térmicos de laminados assimétricos. Os laminados [0n/90n] são particularmente convenientes, dado o número elevado de termos nulos nas matrizes , e , bem como da igualdade de propriedades elásticas nas direcções 1 e 2 das camadas. Nestas circunstâncias, 0 pode ser obtida aquecendo os provetes e determinando a temperatura à qual os provetes retomam a forma plana. Em alternativa, medições experimentais da curvatura combinadas com as equações (8.31) permitem determinar 0, desde que sejam conhecidos os valores correctos das constantes elásticas e dos coeficientes de dilatação térmica (ver exemplo 8.2). Neste caso, foram propostas formulações geometricamente não-lineares [8.24, 8.25], uma vez que podem verificar-se grandes deslocamentos.

Exemplo .2. Estabeleça a relação que permite calcular 0 a partir de medições da curvatura de laminados do tipo [0n/90n], com espessura h. Resolução. Sem perda de generalidade, começamos por considerar um referencial xyz cujos eixos x e y coincidem com os eixos 1 e 2 das camadas a 0º, e admitimos que vai ser medida a curvatura κx. Recorrendo à tabela 3.5, obtemos as matrizes de rigidez das camadas a 0º e a 90º:

Recordemos que os valores de

ij

são dados em função das constantes elásticas pelas equações (3.54).

Independentemente do número n de camadas, a aplicação das equações (7.18) a (7.20), conduz a

201

MATERIAIS COMPÓSITOS

onde:

Neste caso, os únicos esforços são de origem térmica, e resulta das equações (8.23) e (8.27),

com

Recorrendo agora às equações (8.29) a (8.31),

sendo ainda evidente que, face à natureza do laminado, ε0y = ε0x e κy = −κx. Podemos então obter

Finalmente, substituindo as expressões dos esforços térmicos,

e sendo Δ =

amb



0,

Exemplo .3. Uma placa laminada [0/90]2s com h = 1.1 mm é solicitada por esforços

x.

Algumas pro-

priedades da camada são E1 = 140 GPa, E2 = 10 GPa, ν12 = 0.28, G12 = 6 GPa, α1 = -0.3 μ/ºC, α2 = 30 μ/ºC,

σut2 = 60 MPa e τu12 = 75 MPa. Recorrendo ao critério de Hashin-Rotem, calcule o valor do esforço que provoca a fissuração das camadas a 90º nas seguintes condições: a) ignorando tensões residuais; b) admitindo Δ = 160 ºC. Resolução. 202

Tratando-se de um laminado simétrico, consideramos apenas esforços e deformações

CAPÍTULO 8: EFEITOS HIGROTÉRMICOS E VISCOELÁSTICOS

membrana. Podemos usar as fórmulas do exemplo anterior para as matrizes matriz

e para os elementos da

, tal que:

Analisando agora o caso a), resulta da equação (7.23),

sendo que, na camada a 90º, ε1 = ε0y, ε2 = ε0x, e portanto as tensões são

Dada a ausência de tensões de corte, o critério de Hashin-Rotem (5.14) é igual ao critério da tensão máxima (5.1), pelo que

Quanto aos esforços térmicos, a aplicação da equação (8.23),

permite obter dando origem a deformações As tensões residuais na camada a 90º são então

Trata-se de valores baixos, mesmo considerando a variação de temperatura relativamente elevada, que corresponderia a uma temperatura de cura de cerca de 180 ºC. O valor limite do esforço obtém-se de

que é 91 % do valor calculado sem tensões residuais.

203

MATERIAIS COMPÓSITOS

8.3. Viscoelasticidade Linear 8.3.1. PRINCÍPIO DA SOBREPOSIÇÃO DE BOLTZMANN Um dado material tem um comportamento viscoelástico linear quando obedece a relações tensão-deformação lineares, nas quais os factores de proporcionalidade dependem do tempo [8.28-8.30]. As leis constitutivas de viscoelasticidade linear podem ser expressas de forma geral através do Princípio da Sobreposição de Boltzmann. Consideramos para já o caso de uma barra solicitada por uma tensão uniaxial variável no tempo. Esta solicitação pode ser sempre aproximada por uma série de incrementos Δσi aplicados nos tempos t'i (figura 8.4). A deformação resultante em t > t'n é dada por (8.33) onde S(t) se designa por flexibilidade de fluência.

Figura 8.4. Solicitação por incrementos de tensão de um material viscoelástico e deformação resultante.

Fazendo o número de incrementos de tensão tender para infinito, obtém-se o integral de Sobreposição de Boltzmann [8.28-8.30] (8.34) onde S(t − t') = 0 se t < t'. Esta expressão é generalizável a estados de tensão triaxiais, (8.35) com j = 1, 2, 204

, 6.

CAPÍTULO 8: EFEITOS HIGROTÉRMICOS E VISCOELÁSTICOS

De modo análogo, perante uma solicitação em deformação uniaxial, a resposta em tensão pode escrever-se (8.36) onde C(t) se designa por módulo de relaxação, sendo tal que C(t − t') = 0 se t < t'. Em solicitações triaxiais, (8.37) As matrizes de flexibilidade de fluência (t) e de rigidez de relaxação (t) são propriedades do material análogas às matrizes e , definidas no capítulo 3 para comportamento linear elástico "quase-estático". No entanto, deve-se salientar que, em geral, não se aplica a equação (3.8), isto é, (8.38) Na realidade, o domínio viscoelástico linear nos polímeros está limitado a tensões relativamente baixas, como aliás sucede com o comportamento tensão-deformação quase-estático. Há portanto grande interesse na descrição geral do comportamento viscoelástico, no sentido de um melhor aproveitamento das características dos materiais. Foram já propostos vários modelos de viscoelasticidade não-linear [8.31-8.35], de complexidade considerável, mas os estudos experimentais ainda não apontam claramente para uma abordagem de referência.

8.3.2. MODELOS DE COMPORTAMENTO VISCOELÁSTICO Um material viscoelástico possui características intermédias entre as dos sólidos elásticos ideais e as dos fluidos Newtonianos ideais. Recorde-se que os sólidos elásticos ideais armazenam toda a energia de deformação que lhes é fornecida, enquanto os fluidos Newtonianos ideais, à excepção dos estados de tensão hidrostáticos, dissipam toda a energia transmitida. É portanto possível construir modelos uniaxiais de comportamento viscoelástico combinando os modelos físicos básicos dos sólidos elásticos e dos fluidos Newtonianos, que são as molas e os amortecedores, respectivamente. A figura 8.5a mostra o modelo de Maxwell, que é um dos mais simples. Tratando-se de uma associação em série, a deformação total ε é igual à soma das deformações da mola, εm, e do amortecedor, εa. Se k for a constante de rigidez da mola e μ a viscosidade do fluído, 205

MATERIAIS COMPÓSITOS

(8.39)

(a)

(b)

(c)

Figura 8.5. Modelo de Maxwell (a) com as correspondentes curvas de fluência (b) e relaxação (c).

O comportamento em fluência obtém-se admitindo que actua uma tensão σ = σ0 constante e integrando (8.39), de onde resulta (8.40) em que a constante de integração é determinada a partir da condição inicial, C1 = ε(0) = σ0/k. A flexibilidade de fluência prevista, (8.41) cresce linearmente com o tempo (figura 8.5b). Na realidade, verifica-se que S(t) decresce ao longo do tempo, conforme sugere a representação da figura 8.1a, pelo que o Modelo de Maxwell não descreve correctamente o comportamento à fluência. Relativamente à relaxação, sob deformação ε = ε0 constante, resulta da integração da equação (8.39) (8.42) onde a condição inicial σ(0) = σ0 permite obter C2, e, em seguida, o módulo de relaxação (figura 8.5c) (8.43) que está geralmente em concordância com o tipo de comportamento observado experimentalmente. Outro modelo muito simples é o de Voigt-Kelvin, em que mola e amortecedor estão associados em paralelo (figura 8.6a). A tensão total é igual à soma das tensões nos 206

CAPÍTULO 8: EFEITOS HIGROTÉRMICOS E VISCOELÁSTICOS

dois elementos, ou seja, (8.44)

(a)

(b)

(c)

Figura 8.6. Modelo de Voigt-Kelvin (a) com as correspondentes curvas de fluência (b) e relaxação (c).

Através de uma análise idêntica à do modelo de Maxwell, demonstra-se facilmente que este modelo prevê (8.45) (8.46) para fluência e relaxação, respectivamente (figuras 8.6b e 8.6c). A curva de fluência está em boa concordância com as observações experimentais, exceptuando a falta de uma resposta elástica inicial. Por outro lado, o modelo de Voigt-Kelvin não prevê a ocorrência de relaxação, o que é claramente irrealista. O modelo de Zener incorpora um modelo de Maxwell em paralelo com uma mola (figura 8.7a), e o seu comportamento é regido pela equação diferencial (8.47) As curvas de fluência e de relaxação previstas são (8.48) (8.49) respectivamente (figuras 8.7b e 8.7c), com (8.50)

207

MATERIAIS COMPÓSITOS

(a)

(b)

(c)

Figura 8.7. Modelo de Zener (a) com as correspondentes curvas de fluência (b) e relaxação (c).

Embora a forma das curvas prevista seja semelhante às medições experimentais, o modelo de Zener não permite em geral um ajuste quantitativamente rigoroso ao comportamento dos polímeros, na medida em que as constantes de tempo ρ1 e λ1 são insuficientes. Estes materiais apresentam um espectro contínuo de constantes de tempo ρi e λi, devido à complexidade microestrutural (por exemplo, a distribuição de peso molecular). Para se conseguir uma boa aproximação ao comportamento real, são necessários modelos com várias molas e amortecedores, como é o caso dos modelos ditos de Zener melhorados (figura 8.8). Com base na análise dos modelos em série e em paralelo, as curvas de fluência e de relaxação podem agora escrever-se (8.51) (8.52) respectivamente, onde ρi = μi/ki e λi = μi/ki. Estas expressões podem ser generalizadas a solicitações triaxiais (8.53) (8.54) Como é evidente, a modelação rigorosa do comportamento viscoelástico exige um elevado esforço experimental, devido aos muitos parâmetros necessários, e porque estes são muito sensíveis à temperatura. Há que referir que, em alternativa às equações (8.53) e (8.54), alguns autores recorrem a leis empíricas mais simples 208

CAPÍTULO 8: EFEITOS HIGROTÉRMICOS E VISCOELÁSTICOS

[8.33-8.35]. Em qualquer caso, Sij(t) e Cij(t) obedecem às mesmas leis de transformação perante rotação de referencial do que as propriedades elásticas correspondentes, possuindo também as mesmas simetrias.

(a)

(b)

Figura 8.8. Modelos de Zener melhorados: a) em série; b) em paralelo.

8.3.3. ANÁLISE QUASE-ELÁSTICA Consideremos uma solicitação triaxial de fluência em que as tensões impostas se mantêm constantes ao longo do tempo. Em princípio, é necessário ter em conta os tempos que as componentes do tensor das tensões demoram a atingir os valores estacionários, escrevendo (8.55) onde j = 1, 2,..., 6 e (t) é a função Heaviside, representada na figura 8.9. No entanto, demonstra-se [8.28] que a substituição de (8.55) na equação (8.35) permite obter (8.56) relação que é idêntica à Lei de Hooke generalizada. De modo análogo, perante solicitações triaxiais de relaxação com deformações impostas (8.57) a tensão resultante é dada por (8.58)

209

MATERIAIS COMPÓSITOS

Figura 8.9. Representação da função Heaviside, na qual ξ → 0

Se as solicitações forem aproximadamente constantes ao longo do tempo, é possível fazer uma análise dita quase-elástica, baseada nas equações (8.56) ou (8.58). Noutras situações, há que utilizar a metodologia a seguir exposta.

8.3.4. SOLICITAÇÕES SINUSOIDAIS E NOTAÇÃO COMPLEXA As solicitações sinusoidais constituem um caso particular de grande interesse, na medida em que estabelecem um quadro para a determinação do comportamento viscoelástico em situações gerais de carregamento. Por conveniência de exposição, consideramos para já uma solicitação em deformação uniaxial sinusoidal (8.59) A resposta em tensão pode ser obtida do integral de Boltzmann (8.36), no qual fazemos a mudança de variável s = t - τ, (8.60) Esta equação mostra claramente que a resposta em tensão tem uma componente "em oposição de fase" à deformação imposta (equação 8.59) e outra componente "em fase" com aquela, traduzindo o facto já referido de os materiais viscoelásticos possuírem um comportamento intermédio entre os fluidos Newtonianos ideais e os sólidos ideais. Tratando-se de solicitações sinusoidais, a notação complexa é particularmente conveniente. Uma solicitação em deformação pode escrever-se (8.61) sendo a resposta em tensão

210

CAPÍTULO 8: EFEITOS HIGROTÉRMICOS E VISCOELÁSTICOS

(8.62) Define-se então o módulo complexo de relaxação (8.63) que tem duas componentes, (8.64) C (ω) é a componente real, elástica, também designada por componente de armazenamento, e C (ω) é componente imaginária, de dissipação de energia. Outra grandeza viscoelástica importante é o chamado factor de perda (8.65) O módulo complexo de relaxação pode ser determinado experimentalmente para um vasto conjunto de frequências ω através de técnicas de análise dinâmica, DMA ( ynamic Mechanical Analysis) ou, atendendo a que é função da temperatura, usando a DMTA ( ynamic Mechanical hermal Analysis). O campo de frequências típico é de 0.01 a 100 Hz, pois as medições a frequências inferiores a 0.01 Hz são geralmente excessivamente morosas, enquanto acima de 100 Hz há o risco de ressonância, conforme o tipo de ensaio e as dimensões do provete [8.36]. Os equipamentos oferecem actualmente um conjunto de dispositivos que permitem medir as características viscoelásticas em tracção, flexão e torção. Tendo medido o módulo complexo de relaxação, é possível prever a resposta em tensão a qualquer tipo de solicitação em deformação, pois, recorrendo à análise de Fourier, é sempre possível escrever (8.66) e substituindo no integral de Boltzmann (8.36), (8.67) onde se recorreu novamente à variável s = t - τ, e se considerou como limite inferior do integral -∞ por mera conveniência formal, pois C(s) = 0 para s < 0. De facto,

211

MATERIAIS COMPÓSITOS

(8.68) é a transformada de Fourier do módulo complexo de relação. É possível aplicar esta metodologia a solicitações em tensão, considerando uma flexibilidade complexa de fluência, S (ω), que, uma vez determinada experimentalmente, permite obter a resposta em deformação a uma qualquer solicitação em tensão (8.69) recorrendo ao integral de Boltzmann (8.34), (8.70) onde surge a transformada de Fourier da flexibilidade de fluência (8.71) Em ambos os casos, as equações são generalizáveis a solicitações triaxiais, sendo evidente que a implementação destas metodologias é bastante exigente do ponto de vista de cálculo. Na prática, recorre-se a programas comerciais para realizar a análise e transformadas de Fourier.

Exemplo .4. Admitindo que o comportamento em relaxação de um material pode ser aproximadamente descrito pelo modelo de Maxwell, determine as componentes real e imaginária do módulo de relaxação que se obteriam da DMA. Neste caso, não é necessário recorrer à transformada de Fourier. Resolução. Vamos utilizar o integral de Boltzmann para relaxação (8.36), substituindo neste a equação (8.43) do módulo de relaxação do modelo de Maxwell, e a deformação sinusoidal imposta de que resulta

O recurso a uma tabela de integrais mostra que

212

CAPÍTULO 8: EFEITOS HIGROTÉRMICOS E VISCOELÁSTICOS

e portanto a resposta em tensão é dada por

Comparando as componentes em fase e em oposição de fase com solicitação, conclui-se que

8.3.5. PRINCÍPIO DE EQUIVALÊNCIA TEMPO-TEMPERATURA As peças compósitas devem ser projectadas de maneira que os processos de relaxação ou de fluência sejam lentos (vários anos), ainda que possam não ser desprezáveis. Nestas circunstâncias, os ensaios de caracterização que permitiriam obter S(t) e/ou C(t) deveriam também ser lentos, o que é evidentemente inaceitável. É portanto fundamental recorrer a ensaios de curta duração cujos resultados sejam extrapoláveis para as condições de funcionamento. É aqui que desempenha um papel importante o chamado Princípio de Equivalência tempo-temperatura [8.29], segundo o qual é possível reduzir o tempo t dos ensaios aumentando a temperatura a que estes são realizados. Este princípio assenta na hipótese de que os materiais viscoelásticos têm um comportamento reologicamente simples, isto é, que todas as propriedades viscoelásticas têm a mesma dependência da temperatura. Assim, se P designar uma qualquer propriedade viscoelástica, o Princípio de Equivalência tempo-temperatura pode ser traduzido pela equação (8.72) em que

r

é uma temperatura de referência e (8.73)

representa um tempo reduzido, onde intervém o factor de translação a . No domínio da frequência, a equação deste Princípio é (8.74) com ωr = ωa . A aplicação do Princípio de Equivalência tempo-temperatura requer a escolha de uma temperatura de referência, r, bem como a obtenção das curvas de comportamento a 213

MATERIAIS COMPÓSITOS

várias temperaturas i. Em seguida, constrói-se a chamada curva mestra a r, deslocando na escala de tempo as curvas medidas dos respectivos factores a ( ). Este procedimento é ilustrado nas figuras 8.10 e 8.11 para o módulo de relaxação e para a flexibilidade de fluência, respectivamente. A curva mestra serve posteriormente de base à previsão do comportamento em relaxação noutras condições. A determinação experimental do factor a ( ) é essencial para a aplicação do Princípio de Equivalência tempo-temperatura. Para temperaturas acima da transição vítrea g, este factor é dado pela equação de Williams-Landel-Ferry (WLF) [8.29] (8.75) onde c1 e c2 são constantes empíricas. Verificou-se ainda que, para r ≈ g + 50 ºC, os valores c1 = 8.86 e c2 = 101.6 são válidos para um vasto conjunto de polímeros amorfos. A temperaturas inferiores a g, verifica-se geralmente uma lei do tipo Arrhenius [8.31], (8.76) em que R é a constante universal dos gases perfeitos (8.314 JK-1mol-1) e Δ é uma energia de activação. Alguns autores [8.34, 8.37, 8.38] constataram que a equação (8.79) se pode usar para resinas epóxidas e seus compósitos unidireccionais abaixo e acima de g, desde que se adoptem dois valores distintos de Δ .

Figura 8.10. Construção de uma curva mestra de relaxação.

214

CAPÍTULO 8: EFEITOS HIGROTÉRMICOS E VISCOELÁSTICOS

Figura 8.11. Construção de uma curva mestra de fluência.

No caso de um material estar sujeito a temperaturas variáveis ao longo do tempo, a resposta viscoelástica pode ser determinada modificando os integrais de Boltzmann: (8.77) (8.78) sendo (8.79) É de referir que foram também propostos outros princípios de equivalência [8.30, 8.38-8.40], caso do Princípio de Equivalência tempo-humidade (8.80) com (8.81) assim como um Princípio de Equivalência tempo-temperatura-humidade (8.82) em que (8.83) Neste último caso, foi avançada a hipótese da independência dos efeitos da temperatura e da humidade, ou seja, (8.84)

215

MATERIAIS COMPÓSITOS

Estes princípios não estão tão bem estudados como o Princípio de Equivalência tempo-temperatura, que tem sido aplicado com sucesso a muitos materiais poliméricos quando os tempos envolvidos são relativamente curtos (da ordem dos meses). Todavia, este Princípio falha quando é aplicado a escalas de tempo da ordem da vida útil das peças, sobrestimando S(t) e subestimando C(t). Isto deve-se ao fenómeno de envelhecimento físico [8.41-8.43], que está associado a movimentos moleculares muito lentos que conduzem à redução gradual do volume livre e a um aumento da rigidez. Por conseguinte, a aplicação dos princípios de equivalência a processos longos deve ser encarada com bastantes reservas.

Exemplo . . Admitindo que o comportamento do material em relaxação pode ser descrito pelo modelo de Zener, verifique que, no âmbito do Princípio de Sobreposição tempo-temperatura, os parâmetros viscoelásticos têm a mesma dependência da temperatura. Resolução. Se aplicarmos a equação (8.73) ao tempo de relaxação λ1 da equação (8.49), então isto é, com tr = t a , que é precisamente a equação (8.72) do Princípio de Sobreposição tempo-temperatura para P = C.

Referências 8.1. Browning, C. E., G. E. Husman, J. M. Whitney. Moisture Effects in Epoxy Matrix Composites. Composite Materials Testing and Design: Fourth Conference, ASTM STP 617, p. 481-496. American Society for Testing Materials, Philadelphia PA, 1977. 8.2. Shen, C. H., G. S. Springer. Effects of Moisture and Temperature on the Tensile Strength of Composite Materials. Journal of Composite Materials, 12: 2-16 (1977). 8.3. Shen, C. H., G. S. Springer. Environmental Effects in the Elastic Moduli of Composite Materials. In: Environmental Effects on Composite Materials, Technomic Publishing Co., 1981. 8.4. Gibson, R. F., A. Yau, E. W. Mende, W. E. Osborn. The Influence of Environmental Conditions on the Vibration Characteristics of Chopped Fiber Reinforced Composite Materials. Journal of Reinforced Plastics and Composites, 1: 225-241 (1982). 8.5. Dorey, G. Environmental Degradation of Composites. In : Practical Considerations of Design,

216

CAPÍTULO 8: EFEITOS HIGROTÉRMICOS E VISCOELÁSTICOS

Fabrication and and Tests for Composite Materials. AGARD Lecture Series nº 124. AGARD, NATO, 1982. 8.6. Chamis, C. C., J. H. Sinclair. Durability/Life of Fiber Composites in Higrothermomechanical Environments. Composite Materials Testing and Design: Sixth Conference, ASTM STP 787, p. 498-512. American Society for Testing Materials, Philadelphia PA, 1982. 8.7. Chamis, C. C. Simplified Composite Micromechanics Equations for Mechanical, Thermal and Moisture-related Properties. In: Engineer's Guide to Composite Materials, ASM International, Materials Park, OH, 1987. 8.8. Delasi, R., J. B. Whiteside. Effect of Moisture on Epoxy Resins and Composites. Advanced Composite Materials - Environmental Effects, ASTM STP 658, pp. 2-20. American Society for Testing Materials, Philadelphia, PA, 1987. 8.9. Selzer, R., K. Friedrich. Mechanical Properties and Failure Behaviour of Carbon Fibre-Reinforced Polymer Composites under the Influence of Moisture. Composites Part A, 28A: 595-604 (1997). 8.10. Soutis, C., D. Turkmen. Moisture and Temperature Effects of the Compressive Failure of CFRP Unidirectional Laminates. Journal of Composite Materials, 31: 832-849 (1997). 8.11. Morais, J. J. L. Influência do Meio Ambiente no Comportamento ao Dano de Estruturas em Materiais Compósitos. Tese de Doutoramento. Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD), 1998. 8.12. Shen, C. H., G. S. Springer. Moisture Absorption and Desorption of Composite Materials. Journal of Composite Materials, 10: 2-70 (1976). 8.13. Whiteside, J. B., R. J. Delasi, R. L. Shulte. Distribution of Absorbed Moisture in Graphite/Epoxy Laminates after Real-Time Environmental Cycling. Long-Term Behaviour of Composites, ASTM STP 813, p. 192-205, American Society for Testing Materials, Philadelphia, PA, 1983. 8.14. Summerscales, J. Non-Destructive Measurement of the Moisture Content in Fibre Reinforced Plastics. British Journal of NDT, 36: 64-72 (1994). 8.15. Cai, L. W., Y. Weitsman. Non-Fickian Diffusion in Polymeric Composites. Journal of Composite Materials, 28: 130-154 (1994). 8.16. Bao, L.-R., A. F. Yee. Moisture Diffusion and Hygrothermal Aging in Bismaleimide Matrix Composites - Part I: Uni-Weave Composites. Composites Science and Technology, 62: 2099-2110 (2002). 8.17. Weitsman, Y. Moisture in Composites: Sorption and Damage. In: Fatigue of Composite Materials, Elsevier Science Publishers, pp. 385-429, 1990. 8.18. Cairns, D. S., D. F. Adams. Moisture and Thermal Expansion Properties of Unidirectional Composite Materials and the Epoxy Matrix. In: Environmental Effects on Composite Materials: Volume 2. Technomic Publishing Co., Lancaster, PA, 1984. 8.19. Ishikawa, T., K. Koyama, S. Kobayashi. Thermal Expansion Coefficients of Unidirectional Composites. Journal of Composite Materials, 12: 153-168 (1978). 8.20. Rosen, B.W., Z. Hashin. Analysis of Material Properties. In: Engineered Materials Handbook, Volume 1 (Composites). ASM International, 1987.

217

MATERIAIS COMPÓSITOS

8.21. Berenberg, B. Composite Materials Guide. "http://plastics.about.com", 2002. 8.22. McCartney, L. N. Predicting Transverse Crack Formation in Cross-ply Laminates. Composites Science and Technology, 58: 1069-1081 (1998). 8.23. Fiedler, B., A. Hojo, S. Ochiai. The Influence of Thermal Residual Stresses on the Transverse Strength of CFRP using FEM. Composites Part A, 33: 1323-1326 (2002). 8.24. Hyer, M. W. Calculation of the Room-Temperature Shapes of Unsymmetrically Laminated Composites. Journal of Composite Materials, 15: 296-311 (1981). 8.25. Hamamoto, A., M. W. Hyer. The Effects of Moisture Induced Swelling upon the Shapes of AntiSymmetric Cross-Ply Laminates. Journal of Composite Materials, 21: 36-48 (1987). 8.26. Cowley, K. D., P. W. R. Beaumont. The Measurement and Prediction of Residual Stresses in Carbon-Fibre/Polymer Composites. Composites Science and Technology, 57: 1445-1455 (1997). 8.27. Gigliotti, M., M. R. Wisnom, K. D. Potter Development of Curvature during the Cure of AS4/8552 [0/90] Unsymmetric Composite Plates. Composites Science and Technology, 63: 187-197 (2003). 8.28. Christensen, R. M. Theory of Viscoleasticity: An Introduction. Academic Press, New York, 1982. 8.29. Ferry, J. D. Viscoelastic Properties of Polymers. John Wiley and Sons, New York, 1970. 8.30. McCullough, R. C. Introduction to Viscoleasticity. In: Delaware Composites Design Encyclopedia, Vol. 2, pp. 145-186, Technomic Publishing Co., 1990. 8.31. Dillard, D. A. Viscoelastic Behaviour of Laminated Composite Materials. In: Fatigue of Composite Materials, pp. 339-384. Elsevier Science Publishers, 1990. 8.32. Brinson, H. F. A Non-Linear Viscoelastic Approach to Durability Predictions for Polymer Based Composite Structures. In: Durability of Polymer Based Composite Systems for Structural Applications, pp. 46-64. Elsevier Science Publishers, 1990. 8.33. Schapery, R. A. Characterisation of Non-Linear, Time-Dependent Polymers and Polymeric Composites for Durability Analysis. In: Progress in Durability of Composite Systems, pp. 21-38, Balkema, 1996. 8.34. Guedes, R. M. Previsão da Vida

til de Materiais Compósitos de Matriz Polimérica. Tese de

Doutoramento, Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, 1997. 8.35. Papanicolaou, G. C., S. P. Zaoutsos, A. H. Cardon. Prediction of the Non-Linear Viscoelastic Response of Unidirectional Fiber Composites. Composites Science and Technology, 59: 1311-1319 (1999). 8.36. http://www.triton-technology.co.uk/dmatheory.htm. 8.37. Yeow, Y. T., D. H. Morris, H. F. Brinson. Time-Temperature Behavior of a Unidirectional Graphite/Epoxy Composite. Composite Materials Testing and Design: Fifth Conference, ASTM STP 674, pp. 263-281, 1979. 8.38. Nakada, M., Y. Miyano, T. Kimura. Time and Temperature Dependencies of the Tensile Strength in the Longitudinal Direction of Unidirectional CFRP. In: Progress in Durability Analysis of Composite Systems, pp. 189-194, Balkema, 1996. 8.39. Crossman, F. W., A. D. Wang. Stress Field Induced by Transient Moisture Sorption in Finite-Width Composite Laminates. Journal of Composite Materials, 12: 2-18 (1978).

218

CAPÍTULO 8: EFEITOS HIGROTÉRMICOS E VISCOELÁSTICOS

8.40. Daniel, I. M., G. Yaniv, G. Peimanidis. Hygrothermal and Strain Rate Effects on Properties of Graphite/Epoxy Composites. Journal of Engineering Materials Technology, 110: 169-173 (1988). 8.41. Struik, L. C. E. Physical Aging in Amorphous Polymers and other Materials. Elsevier, Amsterdam, 1978. 8.42. Janas, V. F., R. L. McCullough. The effects of Physical Aging on the Viscoelastic Behavior of a Thermoset Polyester. Composites Science and Technology, 30: 99-118 (1987). 8.43. Sullivan, J. L. Creep and Physical Aging of Composites. Composites Science and Technology, 39: 207-232 (1990).

219

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

Capítulo 9

Mecânica da Fractura

9.1. Introdução A Mecânica da Fractura é uma área do conhecimento interdisciplinar que visa caracterizar o comportamento dos materiais à fractura e, com base nessa caracterização, avaliar a integridade das estruturas. Inicialmente, a sua aplicação restringiu-se ao estudo de fractura de construções aeroespaciais realizadas em ligas metálicas de alta resistência, dando origem à Mecânica da Fractura Linear El stica. Posteriormente, desenvolveu-se a aplicação a construções soldadas de aço, originando a Mecânica da Fractura Elasto-Pl stica. Mais recentemente, com a generalização do uso de materiais compósitos tem vindo a aumentar o interesse da aplicabilidade da Mecânica da Fractura nestes materiais. Nas teorias de resistência e critérios de rotura analisados nos capítulos anteriores, considera-se que o material está isento de defeitos. Em contrapartida, na Mecânica da Fractura assume-se que a estrutura não é necessariamente um meio contínuo, podendo conter defeitos causados pelo próprio processo de fabrico ou por um qualquer acidente durante o seu funcionamento. O objectivo é saber se os defeitos existentes serão susceptíveis de causar a rotura catastrófica, ou se, durante o período de vida da estrutura as suas dimensões se mantêm inferiores às críticas, embora se possam propagar de uma forma estável.

221

MATERIAIS COMPÓSITOS

9.2. Fundamentos de Mecânica de Fractura 9.2.1. TEORIA DE GRIFFITH [9.1] A nível atómico, a resistência de um material à tracção pode ser obtida a partir das forças interatómicas (ver figura 9.1), cuja lei tensão-separação pode ser aproximada por uma função seno (ver figura 9.2), (9.1) em que x representa a variação da distância entre os átomos que se encontram a uma distância de equilíbrio interatómico inicial b (ver figura 9.1), e σc é a resistência à tracção.

Figura 9.1. Modelo atómico para a resistência à tracção.

Admitindo que a área circunscrita à curva sinusoidal corresponde à energia necessária para a total separação dos átomos, pode-se calcular o parâmetro λ fazendo, (9.2) em que γs representa a energia necessária à criação de uma unidade de superfície no sólido, e é uma propriedade do material. O factor 2 explica-se pelo facto da propagação de uma fissura implicar a criação de duas novas superfícies. Substituindo a equação (9.1) em (9.2) obtém-se (9.3)

222

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

Figura 9.2. Curvas real e aproximada da relação tensão-separação do modelo interatómico.

Admitindo valores muito pequenos para x1 pode-se rescrever (9.1), (9.4) e, por outro lado, também se pode considerar que (9.5) sendo (9.6) Igualando as equações (9.4) e (9.5) e fazendo intervir (9.3) e (9.6), obtém-se (9.7) que se verifica exceder largamente os valores experimentais da resistência à tracção dos materiais. Por outro lado, Griffith constatou, após uma série de ensaios experimentais em fibras de vidro com diferentes diâmetros, que a tensão de rotura aumentava à medida que diminuía o diâmetro. Na curva tensão de rotura versus diâmetro de fibra, verificou-se que os valores de resistência à tracção mais próximos dos da equação (9.7) surgiam para diâmetros extremamente pequenos. Contudo, para diâmetros superiores, obtinham-se valores de resistência similares aos obtidos nos ensaios de tracção de provetes normalizados. Estas observações levaram Griffith à conclusão de que as dimensões superiores das fibras se traduziam numa maior 1 Recorda-se que

223

MATERIAIS COMPÓSITOS

presença de defeitos e de maior tamanho. Concluiu então, que todos os corpos contêm uma distribuição de defeitos e que a fractura ocorrerá a partir do mais crítico.

Figura 9.3. Fissura interna a toda a espessura do sólido.

Para demonstrar esta hipótese, Griffith recorreu a um balanço energético que, para um material elástico e frágil, como é o caso do vidro, se pode escrever (9.8) em que W representa o trabalho realizado pelas forças exteriores, U a energia de deformação interna do sólido e dA é a variação de superfície da fissura (dA=4 da no exemplo da figura 9.3). A equação (9.8) traduz uma igualdade entre a variação da energia potencial (W-U) devido a um incremento de propagação de fissura e a resistência a essa propagação. Note-se que esta equação é similar à do eorema dos rabalhos Virtuais da eoria das Estruturas. Na realidade, na ausência de propagação de fissura, γs é nulo, o que significa que o trabalho realizado pelas forças exteriores é igual à variação da energia interna de deformação, que é o enunciado do referido teorema. A abertura da fissura no caso da figura 9.3, que representa uma placa fina de dimensões w e L muito superiores ao tamanho da fissura, submetida a uma tensão σR normal à fissura, pode ser dada pela solução de Westergaard [9.2], que, para estado plano de tensão, adquire a seguinte forma (9.9) estando (x) representada na figura 9.3. Para uma fissura de comprimento 2a e abertura 2 (x), a variação de energia potencial durante um incremento de propagação, 224

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

pode-se calcular como sendo [9.3] (9.10) Regressando à equação (9.8), obtemos (9.11) que representa o valor crítico de tensão para um dado valor de a. Comparando as equações (9.7) e (9.11) obtém-se uma relação aproximada de , o que mostra que os valores teóricos da resistência só seriam atingidos, caso o tamanho da fissura a, se aproximasse da distância interatómica b. Defeitos de tão pequena dimensão só poderiam ocorrer para diâmetros de fibra extremamente reduzidos, o que justifica o aparente efeito de tamanho detectado por Griffith. Sempre que uma fissura se propaga formam-se duas novas superfícies. A energia de superfície por unidade de largura devido à propagação da fissura de uma quantidade da, será assim 2γs da. A equação (9.8) também se pode escrever (9.12) Este parâmetro G (em homenagem a Griffith) designa-se por Energia de eforma o. Caso haja propagação

axa de Liberta o de

(9.13) e está-se em presença da axa Cr tica de Liberta o de Energia que é uma propriedade do material e que se costuma designar por Gc.

9.2.2. EXTENSÃO DA TEORIA DE GRIFFITH A eoria de Griffith foi desenvolvida para materiais idealmente frágeis. Na realidade, mesmo nos ditos frágeis, existem sempre mecanismos de dissipação de energia associados a deformação inelástica na extremidade da fissura. É o caso da plastificação nos metais e dos fenómenos de viscoelasticidade nos polímeros. A zona na extremidade da fissura onde estes processos ocorrem, denomina-se por zona de processo, que deverá ser substancialmente menor do que a para que a Mecânica da Fractura Linear 225

MATERIAIS COMPÓSITOS

Elástica seja aplicável. Nos materiais compósitos, os mecanismos de dissipação de energia na zona de processo incluem roturas de fibras e de matriz, plastificação local da matriz, descoesão interfacial fibra/matriz, arrancamento de fibras e ponte de fibras, como se verá em detalhe mais adiante. Em todos os casos, estes mecanismos de dissipação podem ser englobados numa energia por unidade de superfície da fissura, γf, que é várias ordens de grandeza superior à energia de superfície γs. Por conseguinte, a taxa de libertação de energia é (9.14) A partir de (9.12) e (9.14), pode-se escrever (9.15) e, para uma placa de espessura constante

, (9.16)

que traduz o facto de a energia de fractura, ou axa de Liberta o de Energia de eforma o, ser igual à variação da energia potencial devido a um incremento de propagação de fissura. Como já foi referido, na ausência de propagação da fissura o trabalho das forças exteriores é igual ao aumento da energia interna de deformação. Num sólido elástico ideal, não há dissipação de energia, e toda a energia de deformação é recuperada após a remoção das solicitações exteriores. No entanto, quando há propagação da fissura, parte da energia interna de deformação liberta-se, o que justifica a denominação de taxa de libertação de energia de deformação para G. A propagação ocorrerá quando for atingida a axa Cr tica de Liberta o de Energia Gc, que é uma propriedade do material.

9.2.3. FACTOR INTENSIDADE DE TENSÃO E TENACIDADE À FRACTURA A equação (9.11) pode-se escrever da seguinte forma (9.17) sendo σR a tensão remota aplicada (ver figura 9.3). Verifica-se que o primeiro membro da equação depende da solicitação e do tamanho da fenda, ao passo que o segundo membro depende unicamente das propriedades do material. Define-se então o Factor Intensidade de ens o como sendo 226

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

(9.18) Saliente-se o carácter localizado deste parâmetro que funciona como um factor de escala definidor da alteração do estado de tensão na vizinhança da extremidade da fissura. Quando a tensão atinge o seu valor crítico, σc, obtemos no primeiro membro da equação (9.17) a Tenacidade à Fractura (9.19) que é uma propriedade do material. Caso a tenacidade e a tensão aplicada sejam conhecidas, a equação (9.18) pode ser usada para a obtenção do comprimento crítico da fissura, ac, a partir do qual se dá um crescimento catastrófico da mesma. As inspecções à estrutura devem ser executadas no sentido de se verificar se existem defeitos cujo tamanho se aproxime de ac. Alternativamente, se ac for conhecida, podemos determinar a tensão crítica que origina o colapso da estrutura. Neste caso, as solicitações devem ser especificadas no sentido de não se atingir esse valor. As equações (9.18) e (9.19) são válidas para a solicitação e geometria da figura 9.3. No caso geral, o segundo membro vem multiplicado por um factor adimensional que é função da geometria e distribuição de carga, (9.20) A referência [9.4] apresenta o valor de

para inúmeros casos de interesse prático.

Um dos ensaios experimentais mais usados na determinação da tenacidade é o do provete CTS ("Compact ension Specimen"). A figura 9.4 representa esquematicamente o provete, que, para garantir a existência de um estado plano de deformação, requer que a sua largura e comprimento de fissura a obedeçam à relação (9.21) onde σced representa a tensão de cedência do material. O provete deve ser previamente submetido a uma solicitação de fadiga para provocar o aparecimento de uma fissura inicial a partir do entalhe maquinado. O valor da carga máxima nesta solicitação deve estar condicionado, de modo a que a zona plástica na extremidade da fissura durante a propagação, seja de dimensões reduzidas. A determinação da tenacidade faz-se a partir da curva força-deslocamento. A propagação da fissura está relacionada com um desvio da curva relativamente à linearidade, que pode ou não 227

MATERIAIS COMPÓSITOS

coincidir com a força máxima.

Figura 9.4. Provete CTS para a determinação da tenacidade.

Exemplo .1. Um laminado quase-isotrópico de tenacidade

1/2 Ic=30MPa.m

e resistência à tracção de

500 MPa é usado no fabrico de uma placa com uma fenda central de 6 mm (ver figura 9.3). Perante uma solicitação uniaxial σR, determine o valor crítico da tensão que origina a propagação instável da fenda. Compare este valor com a resistência do material, que não contabiliza a presença de fendas. Resolução. Da equação (9.19) podemos obter o valor da tensão correspondente à propagação instável da fenda

Comparando este valor com os 500 MPa da resistência à tracção constata-se que a presença da fenda reduz em cerca de 40% a tensão admissível relativamente à placa sem defeito.

9.2.4. RELAÇÃO ENTRE G E K Foram já introduzidos os dois parâmetros que descrevem o comportamento de fissuras num sólido: a taxa de libertação de energia e o factor intensidade de tensão. O primeiro quantifica a variação de energia potencial relacionada com a propagação da fissura e o segundo caracteriza o estado de tensão na vizinhança da fissura. Para uma fissura a toda a espessura num sólido de dimensões infinitas (ver figura 9.3) obteve-se para G e os resultados das equações (9.13) e (9.18), respectivamente. Substituindo as equações (9.18) e (9.13) em (9.17) obtém-se para estado plano de tensão, (9.22) Esta relação também é válida para Gc e c. Uma vez que as equações (9.13) e (9.18) foram obtidas para um caso particular (fissura a toda a largura num sólido de dimensões infinitas), é necessário provar que (9.22) é válida em todas as situações. Irwin [9.5], 228

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

recorreu a uma análise de fecho irtual de fenda para o demonstrar. Para tal, é necessário conhecer o estado de tensão localizado na vizinhança da fissura (ver figura 9.5) e ao longo do eixo desta. Sabe-se que, para 0 ≤ x ≤ a, σy(x) será nulo, e que apresentará valores elevados na vizinhança das extremidades da fissura, devido à singularidade por ela criada. Para valores de x muito superiores a a, a tensão σy(x) tenderá para a tensão remota aplicada σR. Uma função que satisfaz estes requisitos é (9.23)

Figura 9.5. Modelo de Irwin.

Interessa-nos relacionar σy(x) com escrever (9.23) como

. Para isso consideremos ξ = x - a, o que permite

(9.24) Uma vez que estamos particularmente interessados em estudar a distribuição de tensões na vizinhança da extremidade da fissura, ou seja para ξ 0 e, consequentemente, um mínimo para Sd, (9.46) A tensão aplicada que originará o início do crescimento da fissura é dada por, (9.47) de onde se conclui que, para fissuras em propagação auto-semelhante, se pode escrever (ver equações (9.19) e (9.46)), (9.48) o que permite estabelecer uma relação entre estas duas propriedades do material. Por outro lado, como se vê na equação (9.42), Sd depende dos factores intensidade de tensão, o que reforça a relação entre as duas teorias. Todavia, o conceito de densidade de energia de deformação apresenta a vantagem adicional de englobar a determinação da direcção da iniciação e a condição de propagação. Neste método, não é necessário assumir a direcção de propagação como acontece no método clássico, não requer a presença de uma fissura inicial e remove as dificuldades sentidas nos problemas de Modo Misto.

9.3. Aplicação da Mecânica da Fractura aos Compósitos A rotura dos materiais compósitos pode-se dividir em duas formas distintas: intralaminar e interlaminar. No primeiro caso, trata-se da rotura das camadas do compósito, que pode acontecer sob a forma de rotura da matriz, rotura das fibras e descoesão fibra/matriz. A fractura interlaminar designa-se habitualmente por delaminagem, e normalmente ocorre entre camadas diferentemente orientadas. Vamos, de seguida, apresentar os métodos mais usados na abordagem destes dois tipos de rotura.

236

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

9.3.1. FRACTURA INTRALAMINAR Os fundamentos da Mecânica da Fractura apresentados foram desenvolvidos para materiais isotrópicos e homogéneos. Os compósitos de fibras curtas podem ser considerados isotrópicos numa escala macroscópica, pelo que as suas leis de comportamento são análogas às dos materiais homogéneos. Os compósitos de fibras contínuas apresentam um comportamento mecânico que, a nível macroscópico, pode ser considerado como o de um meio homogéneo e anisotrópico. Tal como nos materiais homogéneos, vamos recorrer ao factor intensidade de tensão, à taxa de libertação de energia e à teoria da densidade de energia de deformação como técnicas de abordagem do problema da fractura em materiais compósitos.

9.3.1.1. Factor Intensidade de Tensão e Taxa de Libertação de Energia Para os compósitos de fibras contínuas unidireccionais, considerados homogéneos e anisotrópicos, o desenvolvimento das equações (9.38) para a situação retratada na figura 9.8 permite escrever [9.7]

(9.49)

sendo (9.50) em que S1 e S2 são as raízes complexas da equação característica (9.51) que é obtida quando as equações de equilíbrio de tensões e compatibilidade de deformação são representadas em termos da função de tensão de Airy [9.8]. Os parâmetros bij (i, j = 1, 2, 6) são iguais aos coeficientes de flexibilidade, Sij (ver equação (3.51)) para estado plano de tensão e bij = Sij - Si3Sj3/S33 para estado plano de deformação. 237

MATERIAIS COMPÓSITOS

As raízes complexas podem-se escrever como, (9.52) sendo α1, α2, β1 e β2 funções das constantes elásticas do material e da orientação da fissura relativamente aos planos principais de simetria elástica. Considerações energéticas mostram que estas raízes são ambas complexas ou ambas puramente imaginárias, não podendo ser reais. Assim, as quatro raízes separam-se em duas séries de diferentes complexos conjugados. As raízes S1 e S2 correspondem às que apresentam partes imaginárias positivas. Constata-se que, ao contrário do que sucedia nos materiais isotrópicos, onde o valor das tensões para um dado ponto (r, θ) dependia exclusivamente dos factores intensidade de tensão (ver equações (9.30) a (9.32)), nos materiais anisotrópicos existe também uma dependência relativamente a S1 e S2. Note-se que as tensões resultantes de solicitações normais ou de corte podem ser separadas em componentes normal e tangencial, como sucedia nos materiais isotrópicos. Todavia, no caso de uma fissura inclinada relativamente à solicitação (figura 9.8), existe uma interacção entre as componentes normal e tangencial da deformação. Logo, a solicitação normal produz deslocamentos de Modo I e de Modo II, o mesmo sucedendo com a solicitação tangencial. As relações entre e G (ver equação (9.22)) deixam de ser válidas e, tendo em conta o significado do factor intensidade de tensão, torna-se questionável o seu uso. Contudo, quando a fissura está orientada segundo uma das direcções principais de simetria do material, a referida interacção deixa de existir. Nesse caso, uma solicitação normal origina exclusivamente deslocamentos em Modo I, e uma solicitação tangencial em Modo II. As raízes S1 e S2 adquirem então uma das três formas seguintes,

(9.53)

As equações (9.29) são neste caso, válidas e o problema resolve-se de uma forma similar ao dos materiais isotrópicos. Um procedimento análogo ao descrito no capítulo 9.2.4 para materiais isotrópicos, permite a obtenção das relações entre G e para os três modos. Considerando o material ortotrópico e com a fissura a propagar-se num plano de simetria material, tem-se que [9.9],

238

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

(9.54)

Vários autores [9.10, 9.11] estudaram a aplicabilidade do conceito de tenacidade à fractura no comportamento dos compósitos unidireccionais. De um modo geral, constataram que a tenacidade à fractura é uma constante do material [9.12], dependendo no entanto da orientação das fibras. Relativamente aos compósitos de fibras curtas, os trabalhos realizados [9.13, 9.14], apontam também para que a tenacidade seja uma propriedade constante do material. Todavia, a propagação de fissura admitida na análise de Griffith não ocorre nos compósitos. Devido à heterogeneidade destes materiais, Gaggar [9.15] prop s um conceito alternativo denominado por zona de dano na vizinhança da extremidade da fenda. Na realidade, o processo de fractura nos compósitos não se baseia na simples propagação de uma fissura preexistente. Antes progride pela formação e propagação de uma zona de dano na vizinhança da extremidade da fissura causada por um elevado número de microfissuras devido ao descoesão fibra/matriz, rotura de matriz e rotura de fibras. Para que a Mecânica da Fractura Linear Elástica seja aplicável num compósito, o tamanho da fissura deve ser muito superior ao da zona de dano.

9.3.1.2. Processo de rotura micromecânica em compósitos A análise macroscópica que utilizámos até aqui ignora a natureza heterogénea dos compósitos e o modo como ela afecta a propagação do dano. De facto, relativamente aos materiais isotrópicos e homogéneos, apenas se recalcularam as equações dos factores intensidade de tensão considerando comportamento anisotrópico do material. As tenacidades são geralmente consideradas propriedades do material que podem ser medidas experimentalmente. Existe no entanto, uma abordagem alternativa que consiste numa análise semi-empírica dos detalhes microestruturais na vizinhança da extremidade da fissura num compósito unidireccional. Nos compósitos, os principais mecanismos de dano (ver figura 9.10) incluem plastificação e rotura de fibras e matriz, descoesão interfacial fibra/matriz, atrito fibra/matriz após a descoesão

239

MATERIAIS COMPÓSITOS

interfacial, redistribuição de tensões, arrancamento de fibra (fibre pull-out) e ponte de fibras (fibre bridging). Todos eles contribuem para a energia total dissipada no processo de fractura. Como se pode observar na figura 9.10, existem algumas fibras intactas na zona fissurada. A alguma distância da extremidade da fissura poderá haver fibras fracturadas, embora não necessariamente no plano da fissura. Isto gera o fenómeno do arrancamento de fibras, que se dá com consumo de energia devido ao atrito fibra/matriz. Por outro lado, as tensões na vizinhança da extremidade da fissura podem originar a descoesão interfacial fibra/matriz antes da sua rotura. Durante este processo existe movimento relativo entre os dois componentes (fibra e matriz) que é responsável por alguma dissipação de energia por atrito. Após a rotura a fibra relaxa, o que origina uma redistribuição da energia de deformação da fibra para a matriz. O relaxamento local da zona fracturada da fibra implica a retoma do seu diâmetro inicial, e, consequentemente, atrito adicional durante a sua extracção da matriz. É ainda possível que algumas fibras continuem intactas durante a propagação da fissura, traduzindo-se no processo conhecido por ponte de fibras e que contribui para a tenacidade do material. A tabela 9.1 [9.16] apresenta algumas equações do trabalho por unidade de área transversal às fibras dissipado nos mecanismos de dano mais importantes. Tabela 9.1. Trabalho dissipado nos mecanismos de dano nos materiais compósitos.

− comprimento de descoesão − Fracção volúmica de fibras Ef − Módulo de elasticidade da fibra σuf , σum − Resistência à tracção da fibra e ld

Vf

matriz respectivamente

τui − Resistência ao corte da interface τm − Resistência ao corte da matriz Δεfm − Diferença de deformação entre a fibra e a matriz df

− Diâmetro da fibra − Energia absorvida na rotura da matriz

Vm

240

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

Em geral, estes processos ocorrem simultaneamente, sendo que a quantidade de energia consumida depende do tipo e velocidade de solicitação, tamanho da fissura e sua orientação, geometria e temperatura. Dependendo do material, por vezes um dos processos predomina face aos restantes ou nem todos ocorrem. Conclui-se assim, que o valor da tenacidade não pode ser obtido pela simples adição de efeitos relativos a cada um dos mecanismos de dano envolvidos. Para tentar ultrapassar esta dificuldade, Kanninen [9.9] desenvolveu um modelo híbrido que associa análises micro e macromecânica. Um compósito contendo um defeito é dividido em duas zonas: local e global. A primeira, também conhecida como Região Heterogénea Local (RHL), está localizada na vizinhança do defeito e é tratada a nível microscópico considerando o material como heterogéneo. A segunda é exterior à RHL e considera o material como homogéneo e ortotrópico. Na RHL consideram-se três componentes: a fibra, a resina e a interface fibra/resina. É necessário conhecer as relações constitutivas para cada uma delas, bem como as respectivas taxas críticas de libertação de energia. Foram simulados vários tamanhos de fissura com diferentes orientações em compósitos unidireccionais, admitindo um comportamento elástico e frágil dos constituintes. Os autores conseguiram modelar com sucesso, comparando com resultados experimentais, a ocorrência dos diferentes mecanismos de dano durante o aumento gradual da carga e antes da rotura catastrófica, em provetes com entalhe, unidireccionais de carbono-epóxido. Na referência [9.16], é feita uma revisão das teorias micromecânicas de fractura mais importantes que, na generalidade, se baseiam na discussão dos mecanismos de dano predominantes para um determinado compósito.

Figura 9.10. Representação esquemática dos mecanismos de rotura micromecânica.

9.3.1.3. Teoria da Densidade de Energia de Deformação aplicada aos compósitos A aplicação deste método aos compósitos faz-se de uma forma similar à dos materiais isotrópicos, já descrita. Assim, admitindo que o material é homogéneo e anisotrópico, 241

MATERIAIS COMPÓSITOS

(ver figura 9.8), substituem-se as equações (9.49) em (9.39) transformando o referencial (x, y, z) em (1, 2, 3), o que origina (9.55) sendo I e II dados pelas equações (9.37), e αij (i, j = 1, 2) funções das constantes elásticas e do ângulo θ através de Ψ1 e Ψ2 (ver equações (9.49) e (9.50)), que são dadas por

(9.56)

onde

(9.57)

Diferenciando a equação (9.55) relativamente a θ e igualando a zero obtêm-se os valores de θ0 correspondentes a Sd mínimo em função de β. Assim, para cada valor de inclinação de fissura β, pode-se determinar a direcção de propagação da fissura θ0 e, por substituição de θ0 em (9.55) o valor mínimo de Sd que, quando comparado com o respectivo valor crítico Sdc, permite aquilatar da possível existência ou não, de propagação.

Exemplo .2. Considere uma placa infinita com uma fenda de comprimento 2a submetida a tensões de corte paralelas à fenda. Admitindo que se trata de um compósito de fibras curtas, obtenha a equação que permite prever a direcção de propagação. Resolução. Como se trata de um compósito de fibras curtas podemos admitir que estamos em presença de um material isotrópico e escrever

242

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

Recorrendo à teoria da densidade de energia de deformação e às equações (9.42) e (9.41) pode-se escrever

Derivando a equação anterior em relação a θ e igualando a zero tem-se,

Dois aspectos merecem realce: › o ângulo de propagação previsto depende do coeficiente de Poisson, ou seja de uma propriedade do material; › a teoria da densidade de energia de deformação prevê que a propagação se dê numa direcção que não é colinear com a fenda inicial.

9.3.2. FRACTURA INTERLAMINAR A grande dificuldade da aplicação da Mecânica da Fractura Linear El stica aos materiais compósitos está relacionada com a sua heterogeneidade que, em muitas situações, impede a propagação de fissuras de uma forma auto-semelhante. Todavia, a delaminagem que consiste num descolamento entre duas camadas contíguas, representa um tipo de dano em que a propagação está confinada a um plano. Estão portanto cumpridos os requisitos da teoria clássica, o que faz com que a fractura interlaminar seja considerado um domínio de aplicação natural da Mecânica da Fractura. De seguida, apresentam-se os principais métodos usados na determinação das taxas críticas de libertação de energia em Modo I, II e Modo Misto.

9.3.2.1. Obtenção da taxa crítica de libertação de energia em modo I A figura 9.11 representa esquematicamente o ensaio " ouble Cantile er eam" (DCB) usado para a caracterização dos materiais em Modo I. É introduzida uma pré-fenda de comprimento a0 a meio da espessura do provete de largura , que se propaga sob a acção das forças P. Sem perda de generalidade, vamos recorrer ao ensaio DCB para obter a taxa crítica de libertação de energia em função das grandezas medidas directamente nos ensaios.

243

MATERIAIS COMPÓSITOS

Durante a propagação da fenda em regime linear elástico a energia de deformação interna U é dada por [9.3], (9.58)

Figura 9.11. Representação esquemática do ensaio DCB.

Define-se a flexibilidade C como sendo (9.59) em que δ representa o deslocamento do ponto de aplicação da força P. Substituindo (9.59) em (9.58) tem-se que (9.60) Derivando relativamente ao comprimento de fenda a obtém-se, (9.61) Em relação ao trabalho realizado pelas forças exteriores, duas situações se podem colocar: 1. A existência de propagação de fenda com os montantes da máquina de ensaios fixos (δ = 0). Neste caso, (9.62) ou seja, (9.63) A partir da equação (9.59), (9.64) o que, tendo em conta (9.63), permite obter (9.65) 244

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

Substituindo (9.65) em (9.61), e esta e (9.62) em (9.16) tem-se finalmente (9.66) 2. A existência de um acréscimo de comprimento de fissura δa sob carga constante. Neste caso tem-se que, (9.67) e (9.68) que, recorrendo a (9.64) se pode escrever, (9.69) Substituindo (9.69) e (9.61) em (9.16) obtém-se o mesmo resultado de (9.66), o que permite concluir que a taxa de libertação de energia é independente do tipo de solicitação. Saliente-se que, quando aplicada ao ensaio DCB, a equação genérica (9.66) permite a obtenção de uma expressão simples para GI, recorrendo a uma análise de Mecânica dos Materiais. Assim, considerando que cada um dos braços do provete é uma viga encastrada com comprimento igual ao comprimento da fenda (ver figura 9.11), obtém-se, recorrendo à equação da elástica (d2y/dx2 = Mf/(EI)), (9.70) sendo E o módulo axial e I = bh3/12 o momento estático de segunda ordem da secção da viga. A flexibilidade é então (9.71) e, após derivação (9.72) o que, tendo em conta a equação (9.66) origina (9.73) Fazendo intervir a equação (9.71) tem-se finalmente (9.74)

245

MATERIAIS COMPÓSITOS

Para valores de P que promovam a propagação da fenda obtém-se a axa Cr tica de Liberta o de Energia (GIc). Todavia, verifica-se que este modelo restringe demasiado o movimento das vigas não contabilizando a rotação existente na extremidade da fenda. Para incluir este efeito, Kanninen [9.17] usou um modelo de uma viga sobre uma fundação elástica (Modelo de Viga Corrigido) e obteve (9.75) sendo Δ um factor de correcção do comprimento de fenda, que se determina a partir da regressão linear de (C)1/3 versus a conforme se ilustra na figura 9.12.

Figura 9.12. Determinação da correcção Δ na equação (9.75).

Caso se justifique, pode-se ainda usar um factor de correcção (F) para grandes deslocamentos e um factor ( ) que contabilize a presença de blocos que são normalmente colados ao provete para transmissão de carga (figura 9.13) [9.18]. Neste caso, a equação (9.75) escreve-se, (9.76) com (9.77)

e onde l1 e l2 são dados na figura 9.13. Nestas condições, Δ deve ser obtida da regressão linear da relação (C )1/3 versus a.

246

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

Figura 9.13. Dimensões usadas nos factores de correcção no ensaio DCB.

Exemplo .3. Mostre que num ensaio DCB em que a largura do provete seja variável (ver figura 9.14), a expressão que permite a obtenção da taxa de libertação de energia não depende de a.

Figura 9.14. Provete DCB de largura variável.

Resolução. A largura do provete em qualquer ponto pode ser dada por,

Usando a equação da elástica podemos escrever,

que, após dupla integração, permite a obtenção do deslocamento na extremidade da viga (ver equação (9.70)),

A derivada da flexibilidade relativamente a a é então

Recorrendo à equação (9.66) tem-se

247

MATERIAIS COMPÓSITOS

o que mostra que neste tipo de ensaio, GI não depende de a. Assim, sempre que haja propagação pode-se determinar GIc a partir do registo do valor da solicitação.

9.3.2.2. Obtenção da taxa crítica de libertação de energia em modo II A taxa crítica de libertação de energia em modo II (GIIc) pode ser obtida recorrendo ao ensaio "End otched Flexure" (ENF), cuja representação esquemática se pode ver na figura 9.15. A fenda está localizada a meio da espessura do provete (eixo neutro), o que significa que a propagação da delaminagem é controlada pelas tensões de corte, traduzindo assim um efeito de modo II. Assume-se a hipótese de que a secção delaminada do provete actua como duas vigas independentes, cada uma delas suportando metade da carga aplicada (ver figura 9.16). Como consequência, o momento estático de segunda ordem da secção de cada uma das vigas é 1/8 do do provete. Desprezando a energia de deformação ao corte, a energia de deformação em flexão escreve-se [9.3], (9.78)

Figura 9.15. Representação esquemática do ensaio ENF.

Figura 9.16. Diagrama de corpo livre do ensaio ENF.

No caso da figura 9.16 tem-se que, (9.79) Aplicando o teorema de Castigliano que estabelece que o deslocamento δi do ponto de aplicação da força Pi, projectado sobre a direcção da força, é igual à derivada parcial da energia de deformação U, escreve-se

248

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

(9.80) o que permite a imediata obtenção da flexibilidade C (equação (9.59)). Recorrendo à equação (9.66) obtém-se finalmente, (9.81) Este resultado é válido para a ≤ L. Para a > L uma análise similar à descrita origina, (9.82)

9.3.2.3. Modo Misto Os dois ensaios descritos (DCB e ENF) são utilizados para a obtenção das propriedades em Modo I e Modo II, respectivamente. Todavia, a generalidade das aplicações práticas caracterizam-se por solicitações onde estes dois modos coexistem, originando situações de Modo Misto. Torna-se assim fundamental caracterizar o comportamento de compósitos em tais situações, sobretudo nas que envolvem Modos I e II. O ensaio mais utilizado para este fim é o "Mixed-Mode ending" (MMB) desenvolvido por Reeder e Crews [9.18], e cuja ideia base é a combinação das solicitações presentes nos ensaios DCB e ENF (ver figura 9.17). A figura 9.18 evidencia os diagramas de corpo livre do sistema. Assim, a análise do equilíbrio do braço de carregamento (corpo 1) origina a determinação das solicitações no provete em modo misto. Por sua vez estas são separadas em componentes de Modo I e Modo II, que quando comparadas com as figuras 9.11 e 9.17 facilmente permitem obter o valor das solicitações para cada um dos modos,

(9.83)

249

MATERIAIS COMPÓSITOS

Figura 9.17. Representação esquemática do ensaio MMB.

Figura 9.18. Diagrama de corpo livre do ensaio MMB.

Substituindo PI e PII nas equações (9.74) e (9.81), obtemos os respectivos valores de GI e GII. O rácio entre os dois modos depende da geometria do provete e do braço de carregamento e não depende de a, sendo dado por (9.84) Isto permite a obtenção de diferentes combinações de solicitação, bastando para tal variar a posição do ponto de carregamento (parâmetro c). Devido à interacção de modos é necessário o uso de um critério de rotura específico. O mais comum é o critério energético linear de interacção entre as taxas de libertação de energia, que se escreve (9.85) sendo GIc e GIIc as respectivas taxas críticas de libertação de energia do material, previamente determinadas.

250

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

Exemplo .4. Um laminado compósito unidireccional foi submetido a um ensaio MMB. Sabendo que GIIc ≅ 2GIc, e que a relação α entre GI e GII é também conhecida, obtenha a relação β existente entre as forças previstas para a propagação usando o critério linear (equação (9.85)) e o critério energético quadrático (GI/GIc)2 + (GII/GIIc)2 = 1. Resolução. O critério linear pode-se escrever

Substituindo GII pela equação (9.81) obtém-se

Quanto ao critério quadrático,

Após a substituição de GII obtém-se

e a relação β vem,

O estudo da função revela que para valores de α entre 0 e 1 o valor de β é sempre inferior à unidade apresentando um mínimo para α = 0.5 (ver figura 9.19). Isto significa que o critério linear prevê valores para a solicitação de propagação inferiores ao critério quadrático, sendo portanto mais conservativo.

Figura 9.19. Evolução da função β = PL/PQ em função de α = GI/ GII.

251

MATERIAIS COMPÓSITOS

9.4. Métodos Numéricos Aplicados à Fractura Interlaminar Os problemas de Mecânica da Fractura em materiais compósitos susceptíveis de resolução por via analítica são limitados devido à complexidade envolvida. A alternativa são os métodos numéricos, nomeadamente os elementos finitos que, pela sua versatilidade, rapidamente se tornaram imprescindíveis na análise de problemas mais complexos. O conceito fundamental do método dos elementos finitos, é que, qualquer variável de campo contínua, como é o caso dos deslocamentos na análise estrutural, pode ser aproximada por um modelo discreto composto por uma série de variáveis de campo contínuas definidas sobre um número finito de subdomínios, conhecidos por elementos. Estes elementos estão interligados em pontos específicos designados por n s ou pontos nodais. Uma vez que a variação da variável de campo não é conhecida, são necessárias algumas funções aproximação para descrever esta variação. Estas funções aproximação, também conhecidas como fun es interpola o, são definidas a partir dos valores da variável de campo nos nós. Uma vez escritas as equações de campo para a estrutura completa, as incógnitas são os valores nodais da variável de campo. A resolução destas equações, que geralmente apresentam a forma de matrizes em banda, permite a obtenção dos valores nodais da variável de campo através da acoplagem dos elementos. Existem vários tipos de elementos finitos para a resolução de problemas bidimensionais ou tridimensionais. Para mais detalhes o leitor deve recorrer à referência [9.19]. Neste capítulo vamos apresentar os dois métodos mais usados para modelar a fractura interlaminar de compósitos; o M todo do Fecho Virtual de Fenda e os Elementos Finitos de Interface.

9.4.1. MÉTODO DO FECHO VIRTUAL DE FENDA Este método é vulgarmente conhecido como VCCT (do inglês "Virtual Crack Closure echni ue") e foi inicialmente desenvolvido por Rybicki e Kanninen [9.20]. Baseia-se na hipótese de Irwin já referida no capítulo 9.2.4, segundo a qual, quando uma fenda se propaga, a energia de deformação libertada no processo é igual ao trabalho necessário ao fecho da fenda para o seu comprimento anterior à propagação. Consideremos o problema plano retratado na figura 9.20, em que a fenda se propagou do nó l para o nó i. Existem duas formas de aplicação do método. A primeira consiste em realizar duas etapas: começa-se por considerar o nó l fechado e 252

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

determinam-se as forças que lá se geram por aplicação da solicitação exterior; de seguida abre-se este mesmo nó (originando os nós l1 e l2) e, com a aplicação da mesma solicitação exterior, determinam-se os deslocamentos relativos no mesmo nó nas respectivas direcções. A segunda forma pretende, através de uma aproximação, eliminar uma das etapas referidas na hipótese anterior. Assim, usando uma malha minimamente refinada considera-se que, através de um só carregamento se podem obter as forças no nó i e multiplicá-las pelos deslocamentos relativos no nó l (diferença de deslocamentos entre l2 e l1 na figura 9.20), para se obter a energia necessária para fechar a fenda de Δa, (9.86) sendo i, i as forças no nó i que se encontra fechado e Δul, Δ l a diferença de deslocamentos no nó l. As respectivas taxas de libertação de energia escrevem-se

(9.87)

onde ΔA representa a superfície da fenda gerada pela propagação e segundo z.

a dimensão

Figura 9.20. Método do Fecho Virtual de Fenda.

Usando, por exemplo, o critério linear energético da equação (9.85), admite-se a existência de propagação quando os valores de GI e GII obtidos em (9.87) satisfizerem o critério. O método é facilmente aplicável a problemas tridimensionais onde o Modo III pode ser obtido de uma forma similar à descrita para os outros dois modos. 253

MATERIAIS COMPÓSITOS

Todavia, implica a existência prévia de uma fenda e o conhecimento da sua direcção de propagação. A referência [9.21] faz uma revisão exaustiva do uso deste método em diferentes aplicações estruturais.

9.4.2. ELEMENTOS FINITOS DE INTERFACE Os elementos finitos de interface constituem actualmente um dos métodos mais eficazes no estudo do problema da iniciação e propagação de delaminagens entre camadas nos materiais compósitos [9.22-9.25]. Estes elementos finitos caracterizam-se por possuir espessura nula e promover a ligação entre dois elementos sólidos, representativos de camadas contíguas susceptíveis de delaminar. A figura 9.21 apresenta um esquema de um elemento finito de interface para problemas tridimensionais [9.22]. As duas superfícies (inferior e superior) encontram-se artificialmente separadas para melhor visualização. Assim, os respectivos pontos homólogos (por exemplo 14 e 5) encontram-se inicialmente fechados, podendo abrir caso seja satisfeito um critério de rotura previamente estabelecido, promovendo desta forma a propagação de dano. A formulação baseia-se no cálculo das tensões que se geram entre os pontos homólogos a partir dos deslocamentos relativos entre esses mesmos pontos, (9.88)

onde s e t representam as direcções tangenciais e n a direcção normal. As tensões resultantes dos deslocamentos relativos são dadas por (9.89) onde (9.90)

sendo di os parâmetros de rigidez tangencial (ds, dt) e normal (dn). Os parâmetros de rigidez óptimos são os maiores valores que não conduzem a problemas numéricos, uma vez que valores baixos originam interpenetrações.

254

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

Figura 9.21. Elemento finito de interface de 18 nós para problemas tridimensionais.

Quando as tensões num ponto satisfazem o critério adoptado, o processo de rotura deve ser gradual pois a anulação abrupta das tensões provoca instabilidades numéricas. Fisicamente, isto significa que a rotura não ocorre instantaneamente e que a energia associada se dissipa com o crescimento da fenda. Isto é feito considerando um Modelo de ano [9.23], baseado no uso indirecto da Mecânica da Fractura, através de uma relação de relaxação das tensões/deslocamentos relativos (ver figura 9.22). Considerando a existência de um único modo de propagação (I, II ou III), a área definida pela curva tensão/deslocamento relativo pode ser igualada à respectiva taxa crítica de libertação de energia. Como a tensão limite (σu,i) e a taxa crítica de libertação de energia (Gkc) são propriedades do material determináveis experimentalmente, pode-se obter o deslocamento relativo máximo (δu,i). Note-se que este processo de rotura gradual é sustentado pelo modo de rotura típico dos compósitos. De facto, e como já foi referido, existe uma zona de processo na extremidade da fissura onde a energia de rotura se dissipa de uma forma gradual segundo os mecanismos de rotura micromecânica.

Figura 9.22. Relação tensão/deslocamento relativo para modos puros (I, II ou III).

A equação (9.89) representa a relação entre tensões e deslocamentos relativos até se atingir a tensão limite (σu,i). Os pontos (δo,i , σu,i) e (δu,i , 0) correspondem à iniciação e rotura completa, respectivamente. A relação de relaxação entre estes dois pontos é dada por (9.91)

255

MATERIAIS COMPÓSITOS

onde representa a matriz identidade e E é a matriz diagonal, cujos termos são os parâmetros de dano (9.92) Nos modos puros, as outras duas componentes das tensões são desprezáveis e podem ser anuladas abruptamente igualando a 1 os respectivos elementos da matriz diagonal E. Em situações de Modo Misto I, II e III a iniciação do dano é prevista recorrendo a um critério quadrático baseado em tensões [9.25],

(9.93)

assumindo que as tensões normais de compressão não contribuem para o dano e que σf,i (i = n, s, t) representam as tensões correspondentes ao início do dano (ver figura 9.23). Considerando o caso de σn ≥ 0, as equações (9.93) e (9.89), permitem escrever (9.94) onde δp,i traduz o deslocamento correspondente ao início do dano em cada uma das direcções. Definindo um deslocamento resultante de Modo Misto (9.95) e rácios de Modo Misto (9.96) e, aplicando estas equações ao deslocamento crítico em Modo Misto δp,m que promove a iniciação, pode-se obter, recorrendo à equação (9.94) (9.97) e 256

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

(9.98) A equação (9.97) identifica o deslocamento resultante em Modo Misto correspondente à iniciação do dano em função das relações de Modo Misto existentes no problema, e a equação (9.98) o deslocamento em cada uma das direcções para a mesma situação. Para estabelecer as condições de propagação, recorre-se a um critério energético, baseado nas taxas críticas de libertação de energia, como por exemplo, o já referido critério linear. Assume-se então que o processo de rotura está completo quando (9.99)

Figura 9.23. Modelo de Modo Misto I, II e III.

A energia libertada na rotura completa em cada um dos modos é dada por (9.100) com k = I, II, III. Substituindo (9.89) para σf,i e (9.98) para δf,i (transformando o índice p em f), pode-se escrever (9.101) onde δf,m representa o deslocamento resultante em Modo Misto correspondente à rotura completa. Substituindo (9.101) em (9.99) tem-se (9.102)

257

MATERIAIS COMPÓSITOS

e (9.103) que representa o deslocamento, segundo cada uma das direcções, correspondente à rotura. Substituindo (9.103) e (9.98) em (9.92) pode-se calcular o parâmetro de dano correspondente a cada um dos modos e, consequentemente o estado de tensão a partir de (9.91). Concluindo, os elementos de interface permitem modelar a iniciação e a propagação do dano interlaminar através da inclusão de um modelo de dano adequado. Para a iniciação considera-se um critério quadrático de tensões e para a propagação um critério linear energético. A vantagem deste método reside no facto de não ser necessário assumir a existência de uma pré-fenda, bem como de uma propagação auto-semelhante.

Referências 9.1. Griffith, A. A. The Phenomenon of Rupture and Flow in Solids, Philosophical Transactions of the Royal Society, 221A: 163-198 (1920). 9.2. Westergaard, H. M. Bearing Pressures and Cracks. Journal of Applied Mechanics, 6: 49-53 (1939). 9.3. Branco, C. A. G. M. Mecânica dos Materiais. Edição da Fundação Calouste Gulbenkian, 1985. 9.4. Tada, H. P. C. Paris, G. R. Irwin. The Stress Analysis of Crack Handbook, Del Research Corporation, Hellertown, PA 1973. 9.5.

Irwin, G. R. Analysis of Stress and Strains Near the End of a Crack Traversing a Plate, Transactions of ASME, Journal of Applied Mechanics, 24: 361-364 (1957).

9.6. Sih, G. C. Mechanics of Fracture Initiation and Propagation. Kluwer Academic Publishers, 1991. 9.7. Lekhnitskii, S. G. Anisotropic Plates, Tradução para Inglês da 2 edição Russa por S. W. Tsai, T. Cheron. Gordon and Breach Science Publishers, New York, 1968. 9.8. Cherepanov, G. P. Mechanics of Brittle Fracture. Tradução de Russo para Inglês por A. L. Peabody. Edição de R. De Wit , W. C. Cooley, McGraw-Hill, 1977. 9.9. Kanninen, M. F., C. H. Popelar. Advanced Fracture Mechanics. Oxford University Press, 1985. 9.10. Wu, E. M. Fracture Mechanics of Anisotropic Plates. S. W. Tsai, J. C. Halpin, N. J. Pagano (eds), Composite Materials Workshop, 20-43, Technomic Publishing Co. Lancaster, PA, 1968. 9.11. Konish, H. J., J. L. Swedlow, T. A. Cruse. Experimental Investigation of Fracture in an Advanced Composite. Journal of Composite Materials, 6: 114-124 (1972). 9.12. Parhizgar, S., L. W. Zachary, C. T. Sun. Application of the Principles of Linear Fracture Mechanics

258

CAPÍTULO 9: MECÂNICA DA FRACTURA

to the Composite Materials, International Journal of Fracture, 20: 3-15 (1982). 9.13. Alexander, R. M., R. A. Schapery, K. L. Jerina, B. A. Sanders. Fracture Characterization of a Random Fiber Composite Material. B. A. Sanders (ed) Short Fiber Reinforced Composite Materials, ASTM STP 772, 208-224, Philadelphia, PA, 1982. 9.14. Sun, C. T., R.L: Sierakowski. Fracture Characterization of Composites with Chopped Fiberglass Reinforcement. SAMPE Quartely, 11: 15-21 (1980). 9.15. Gaggar, S. K., L. J. Broutman. The Development of a Damage Zone at the Tip of a Crack in a Glass Fiber Reinforced Polyester Resin. International Journal of Fracture, 10: 606-608 (1974). 9.16. Kim, J. K., Y. M. Mai. High Strength, High Fracture Toughness Fibre Composites with Interface Control - A Review. Composites Science and Technology, 41: 333-378 (1991). 9.17. Kanninen, M. F. An Augmented Double Cantilever Beam Model for Studying Crack Propagation and Arrest. International Journal of Fracture, 9: 83-92, (1973). 9.18. Reeder, J. R. and J. H. Crews. Nonlinear Analysis and Redesign of the Mixed-Mode Bending Delamination Test. NASA Technical Memorandum 102777, (1991). 9.19. Zienkiewicz, O. C. The Finite Element Method in Engineering Science. McGraw-Hill, London, 1977. 9.20. Rybicki, E. F., M. F. Kanninen. A Finite Element Calculation of Stress Intensity Factors by a Modified Crack Closure Integral. Engineering Fracture Mechanics. 9: 931-938, (1977). 9.21. Krueger, R. The Virtual Crack Closure Technique: History, Approach and Applications. Nasa/CR2002-211628, Icase Report No. 2002-10, (2002). 9.22. de Moura, M. F. S. F., J. P. M. Gonçalves, A. T. Marques, P. M. S. T. de Castro. Modeling Compression Failure After Low Velocity Impact on Laminated Composites Using Interface Elements, Journal of Composite Materials. (31), p. 1462-1479, (1997). 9.23. Gonçalves, J. P. M., M. F. S. F. de Moura, P. M. S. T. de Castro, A. T. Marques. Interface Element Including Point-to-Surface Constraints for Three-Dimensional Problems with Damage Propagation. Engineering Computations: International Journal for Computed-Aided Engineering and Software. 17: 28-47, (2000). 9.24. Mi, Y., M. A. Crisfield, G. A. O. Davies. Progressive Delamination Using Interface Elements. Journal of Composite Materials, 32: 1246-1272, (1998). 9.25. Dávila, C. G., P. P. Camanho, M. F. S. F. de Moura. Mixed-Mode Dechoesion Elements for Analysis of Progressive Delamination. 42nd AIAA/ASME/ASCE/AHS/ASC Structures, Structural Dynamics and Materials Conference and Exhibit, Seattle, WA, A01-25226, AIAA-01-1486, (2001).

259

CAPÍTULO 10: TÓPICOS AVANÇADOS EM MATERIAIS COMPÓSITOS

Capítulo 10

Tópicos Avançados em Materiais Compósitos

Os materiais compósitos de alto desempenho (carbono-epóxido, boro-epóxido, kevlarepóxido, etc.), têm vindo a ser cada vez mais usados em aplicações estruturais de elevado risco, como é o caso das aplicações na aeronáutica e aeroespacial. Como consequência, torna-se relevante a análise do comportamento destes materiais em situações específicas susceptíveis de causar dano e que, de algum modo, possam afectar a sua resistência residual em funcionamento. Iniciaremos a abordagem aos tópicos avançados com um problema comum nestes materiais, e que se relaciona com a presença de tensões interlaminares nos bordos. De seguida, estudar-se-á a aplicação dos critérios de Whitney-Nuismer a placas de material compósito contendo um furo ou um entalhe. A susceptibilidade dos materiais compósitos a solicitações de impacto será abordada com algum detalhe, devido à importância que este fenómeno adquire na redução da resistência residual das estruturas, nomeadamente quando estas estão submetidas a solicitações de compressão. Analisar-se-á ainda, o desempenho dos compósitos sob solicitações de fadiga e, a finalizar, uma referência ao comportamento em fluência destes materiais, que se justifica pelo carácter tipicamente viscoelástico das resinas que os constituem.

10.1. Efeito de Bordo O efeito de bordo é um fenómeno típico dos laminados compósitos, que consiste no

261

MATERIAIS COMPÓSITOS

aparecimento de tensões interlaminares, ignoradas pela Teoria Clássica dos Laminados, junto aos bordos livres1. De facto, esta teoria, apresentada no capítulo 7, só é adequada em regiões suficientemente afastadas dos bordos livres, nas quais é válida a hipótese de estado plano de tensão. Todavia, o estado de tensão junto a um bordo livre não é um estado plano de tensão, mas sim um estado tridimensional devido às tensões interlaminares. A principal razão da sua existência está relacionada com as diferenças existentes entre os coeficientes de Poisson (νxy) e os termos de acoplamento de corte (ηxy) de duas camadas contíguas diferentemente orientadas. Os laminados dos tipos [0/90] e [+θ, -θ] constituem dois casos extremos, onde se verifica só um dos dois efeitos referidos, merecendo por isso atenção especial. Qualquer outra combinação de orientações intermédia está obviamente associada ao aparecimento dos dois efeitos referidos.

10.1.1. LAMINADOS TIPO [0/90] Neste tipo de laminados, os efeitos de bordo decorrem apenas da diferença dos coeficientes de Poisson entre as camadas a 0º e 90º. Se estas duas camadas não estivessem ligadas e pudessem deformar-se livremente, uma solicitação axial σx daria origem a deformações εy = -ν12εx na camada a 0º, e εy = -ν21εx na camada a 90º, sendo estas últimas bastante inferiores, pois ν21
View more...

Comments

Copyright ©2017 KUPDF Inc.
SUPPORT KUPDF