Manual de Trauma Ortopedico

December 26, 2016 | Author: Ricardo Viana | Category: N/A
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Manual de

TRAUMA

ORTOPÉDICO

Co o r d e n a d o r e s : Isabel Pozzi, Sandro Reginaldo, Múcio Vaz de Almeida e Alexandre Fogaça Cristante

Comissão de Educação Continuada 2011

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Expediente 2011 Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (SBOT) Diretoria 2011: Presidente: Osvandré Lech (RS); 1° Vice-presidente: Geraldo Rocha Motta Filho (RJ); 2° Vice-presidente: Flávio Faloppa (SP); Secretário-geral: Jorge dos Santos Silva (SP); 1° Secretário: Marcelo Tomanik Mercadante (SP); 2° Secretário: Ney Coutinho Pecegueiro do Amaral (RJ); 1° Tesoureiro: Adalberto Visco (BA); 2° Tesoureiro: Reynaldo Jesus-Garcia Filho (SP). Comissão de Educação Continuada (CEC): Presidente: Alexandre Fogaça Cristante, SP (2009-2011); Secretário: Marco Antonio Percope, MG (2009-2011); Rogerio Fuchs, PR (20092011); Sandro da Silva Reginaldo, GO (2010-2012); Maria Isabel Pozzi Guerra, RS (2010-2012); Múcio Brandão Vaz de Almeida, PE (2010-2012); Henrique Ayzemberg, SC (2011-2013); Robert Meves, SP (2011-2013); João Mauricio Barretto, RJ (2011-2013); Marcelo Tomanik Mercadante, SP (2008-2010); Pedro Henrique Mendes, RJ (2008-2010); Hélio Alvachian Fernandes, SP (2008-2010). Esta é uma publicação científica, editada pela Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia (SBOT) em 2011. É proibida a reprodução sem a expressa autorização. Coordenação: Maria Isabel Pozzi Guerra, Sandro da Silva Reginaldo, Múcio Brandão Vaz de Almeida e Alexandre Fogaça Cristante. Projeto Gráfico e Diagramação: Wagner G. Francisco. Assistente Editorial (CEC): Samara Nascimento Silva. Apoio Institucional: Dados

Internacionais de Catalogação na Publicação (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Manual de trauma ortopédico / SBOT - Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia ; coordenadores, Isabel Pozzi...[et al.]. -São Paulo : SBOT - Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia, 2011. Outros coordenadores: Sandro Reginaldo, Múcio Vaz de Almeida, Alexandre Fogaça. Vários colaboradores Bibliografia 1. Ortopedia 2. Ortopedia - Manuais 3. Traumatologia - Manuais I. Pozzi, Isabel. II. Reginaldo, Sandro. III. Almeida, Múcio Vaz de. IV. Fogaça, Alexandre.

CDD-617.1 NLM-WE 168

11-04725

Índices para catálogo sistemático: 1. Ortopedia e traumatologia : Medicina

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(CIP)

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O progresso do Trauma Ortopédico Nunca houve, como hoje, um momento com mais informação e menos conhecimentos (George Steiner, ensaísta e crítico francês) A consolidação não pode ser imposta. O osso é como uma planta com suas raízes nos tecidos vivos. Se estes estão lesados, é necessário um cuidado paciente e compreensivo como o de um jardineiro (Gathorne Robert Girdlestone, 1881-1950, notável cirurgião inglês)

A SBOT tem a satisfação de entregar aos seus associados mais uma obra marcante - uma atualização sobre Trauma Ortopédico. O assunto é muito atual, pois ocupa lugar cada vez mais amplo nas agendas. A ONU, em conjunto com a OMS, lança em 11 de maio de 2011 a Década Mundial de Ações para um Trânsito Seguro. A data coincide com a finalização desta obra, além de outras ações já implementadas pela SBOT. Trata-se, portanto, do imediato engajamento dos ortopedistas brasileiros a este esforço global, que foi tomado após estudos concluírem que em menos de 10 anos o acidente de trânsito vitimará mais pessoas do que o câncer e as doenças cardiovasculares, tornando-se a causa mortis número um no mundo, se medidas globais não forem adotadas agora. O número de vítimas fatais a cada ano assusta a todos: cerca de 40.000 no Brasil e 1.300.000 no mundo. Os acidentes de trânsito matam muito mais do que várias guerras simultâneas...! Quadro ainda pior é a relação de uma morte, 11 indivíduos com seqüela permanente e 38 internações hospitalares para cada 380 atendimentos em emergências. O custo Brasil é de R$ 30 bilhões anuais – uma liderança mundial com péssima reputação. Sabemos que para cada grande trauma existem muitos outros médios e pequenos, todos necessitando de uma equipe multidisciplinar, onde o ortopedista tem posição de liderança. Estamos, pois, na linha de frente no atendimento do paciente traumatizado no Brasil e no mundo. Este livro traz indispensável atualização sobre o tema, com novos enfoques produzidos por talentosos membros da SBOT! Agradeço a todos os colaboradores e à coordenação da Comissão de Educação Continuada (CEC), que reuniu informação para se transformar em conhecimento a ser utilizado por mãos hábeis como as de um jardineiro, na preservação da vida e na restauração das funções músculo-esqueléticas, nossa maior missão. Agradeço à contribuição institucional da Hexagon, que protagoniza uma atitude ética e transparente, desejável nas relações entre indústria, profissionais e instituição. Boa Leitura! Osvandré Lech Presidente da SBOT 7

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Colaboradores Adriano Marchetto – Mestre em ortopedia pela FM-USP, Membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia de Ombro e Cotovelo, Chefe do grupo de Ombro e Cotovelo da PUC-Campinas. Alexandre Daher Albieri – Médico assistente do Grupo de Pé e Tornozelo do Hospital de Acidentados Goiânia, GO, Médico assistente do Grupo de Pé e Tornozelo do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da UFGo, Membro titular da SBOT, Membro titular da ABTPé. Alexandre Fogaça Cristante – Docente da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e médico assistente do grupo de coluna cervical e trauma raquimedular do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IOT HC FMUSP). Ana Paula Simões da Silva – Mestre em Ortopedia e Traumatologia pela Santa Casa de São Paulo (Pavilhão Fernandinho Simonsen), Membro da Associação Brasileira de Tornozelo e Pé (ABTpé), Médica assistente do grupo de traumatologia do esporte da Santa Casa de São Paulo. Membro e delegada regional do Comitê de Traumatologia Esportiva (ABTD), Médica da seleção brasileira de futebol feminino sub 20. (CBF). André Bergamaschi Demore – Especialização em Cirurgia do Pé e deformidades ósseas no IOT HC FMUSP. Chefe do núcleo de Cirurgia do pé e trauma do IOT Joinville – SC. André Flávio Freire Pereira – Sócio da Sociedade Brasileira de Coluna, Médico Assistente do Grupo de Coluna do Departamento de Ortopedia e Traumatologia do Hospital Getúlio Vargas Recife –PE. André Soares Rodrigues – Membro da Sociedade Brasileira de Trauma Ortopédico (SBTO), Especialista em cirurgia do quadril, Cirurgião do Hospital Biocor e do Hospital Risoleta Tolentino Neves. Antonio Carlos Arnone – Assistente do grupo de trauma do IOT HCFMUSP e assistente do hospital universitário da USP. Bruno Flúvio Alves da Silva – Cirurgião de Ombro do HC-UFMG. Carlos Henrique Fernandes – Mestre e Doutor pela UNIFESP, Chefe do Grupo de Cirurgia da Mão da UNIFESP, Membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia da Mão (SBCM), International Member AAHS e ASSH. Carlos Roberto Garcia – Membro Titular da Sociedade Brasileira de Ombro e Cotovelo (SBCOC), Médico do Grupo de Cirurgia do Ombro e Cotovelo do Hospital Ortopédico de Goiânia. Carlos Roberto Garcia Filho – Médico Residente do Serviço de Ortopedia e Traumatologia do Hospital Ortopédico de Goiânia/Goiás. Cássio Maurício Telles – Membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia de Ombro e Cotovelo (SBCOC), membro da Sociedade Latino Americana de Ombro e Cotovelo (SLAHOC), membro da Sociedade Brasileira de Terapia por Ondas de Choque (SBTOC), coordenador das especialidades de patologias de membro superior da Clinica Genus, Cuiabá-MT. Christiano Saliba Uliana – Mestrado no Programa de Pós-graduação em Cirurgia da UFPR, Médico Ortopedista do Grupo de Trauma do H. do Trabalhador – UFPR. Claúdio Santili – Doutor em Medicina pela FCMSCSP, Professor adjunto da Faculdade de Ciências Médicas – Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São. Cloris Kessler – Médica ortopedista, Fundação de Saúde Pública de Novo Hamburgo, RS, Mestre em cirurgia, com área de concentração em ortopedia; Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP), SP. Daniel Balbachevsky – Médico Assistente da Disciplina de Traumatologia do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Federal de São Paulo / Escola Paulista de Medicina e Chefe de Plantão do Hospital São Paulo. Daniel de Souza Carvalho – Membro do Comitê ASAMI de Reconstrução e Alongamento Ósseo, Coordenador do Programa de Residência Médica de Ortopedia e Traumatologia do Hospital Regional de São José, grande Florianópolis/ SC. Edilson Forlin – Mestre e doutor pela UNIFESP, Ortopedista pediátrico do Hospital Pequeno Príncipe, Hospital de Clinicas e Centro Hospitalar de Reabilitação, Curitiba – PR. 8

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Edson Barreto Paiva – Membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia do Quadril (SBQ), Preceptor da Residência de Ortopedia do Hospital das Clínicas da UFMG. Eduardo Abdalla Saad – Mestre e Doutor, Chefe do Grupo de Trauma Pediátrico da Disciplina de Ortopedia Pediátrica do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da EPM/UNIFESP. Chefe do Pronto Socorro do Hospital São Paulo – EPM/UNIFESP. Eduardo Hosken Pombo – Membro Titular, Sociedade Brasileira de Cirurgia do Ombro e Cotovelo (SBCOC) e da Sociedade Brasileira de Trauma Ortopédico (SBTO), Especialista em cirurgia do ombro e cotovelo, Clínica SORT e Vila Velha Hospital. Eduardo da Silva Brum – Chefe do Serviço de Ortopedia e Traumatologia do Hospital Beneficência Portuguesa-Porto Alegre RS, Chefe do grupo de reconstrução e alongamento ósseo do Hospital Graças (Canoas-RS). Eduardo Murilo Novak – Mestre, Doutor em Cirurgia pela UFPR, Preceptor da Residência de Cirurgia da Mao do Hospital Universitário Cajuru – PUCPR. Egon Erich Henning – Prof. Livre- Docente de Ortopedia e Traumatologia UFRGS, Membro Emérito da Associação Brasileira de Medicina e Cirurgia do Pé (ABTpé). Eiffel Tsuyoshi Dobashi – Doutor em Ciências, Chefe de Clínica da Disciplina de Ortopedia Pediátrica do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da UNIFESP – Escola Paulista de Medicina, Especialização em Ortopedia Pediátrica e Trauma Pediátrico, Preceptor da Residência Médica em Ortopedia e Traumatologia da UNIFESP e do Hospital IFOR. Emiliano Vialle – Grupo de Cirurgia de Coluna, Hospital Universitário Cajuru, Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Epitácio Leite Rolim Filho – Ortopedista Pediátrica; Mestre e Doutor pela UFPE; Supervisor do Programa de Residência Médica em Traumatologia e Ortopedia do Hospital Getúlio Vargas-PE. Ewerton Renato Konkewicz – Ortopedia e Traumatologia, Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia de Joelho (SBCJ), Preceptor da Residência Médica de Ortopedia e Traumatologia do SOTi, Chefe do Grupo de Joelho do Serviço de Ortopedia e Traumatologia independente (SOTi) – Porto Alegre. Felipe Alves do Monte – Mestre em Ciências da Saúde pela Faculdade de Ciências Médicas – Universidade de Pernambuco (FCM-UPE), Coordenador da residência médica em Ortopedia e Traumatologia do Hospital da Restauração – SUS, Recife – PE, Pesquisador voluntário da Unidade de Pesquisa Clínica (UNIPECLIN) do Complexo Hospitalar HUOC/PROCAPE – Faculdade de Ciências Médicas/ Universidade de Pernambuco (FCM/UPE). Felipe Macri – Membro da Sociedade Brasileira de Trauma Ortopédico (SBTO), Chefe do Grupo do Trauma do Departamento de Ortopedia e Traumatologia do Hospital Governador Celso Ramos, Florianópolis/SC. Giana Silveira Giostri – Chefe do Serviço de Ensino e Treinamento em Cirurgia da Mão, Hospital Universitário Cajuru – Hospital Pequeno Príncipe, Professora da Disciplina de Ortopedia da PUCPr. Gilberto Francisco Brandão – Membro da Sociedade Brasileira Ortopedia Pediátrica (SBOP), Coordenador Ortopedia Pediátrica do Hospital Universitário Risoleta Neves e do Biocor Instituto, Ortopedista Pediátrico do Hospital das Clínicas da Universidade Federal Minas Gerais e do Hospital da Balei, Diretor Clínico do Instituto Mineiro de Ortopedia e Traumatologia. Guilherme Moreira de Abreu e Silva – Professor convidado do Departamento do Aparelho Locomotor da UFMG. Preceptor de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da UFMG e do Hospital Felício Rocho. Guilherme Pelosini Gaiarsa – Médico ortopedista, assistente do grupo de reconstrução e alongamento ósseo do Instituto de Ortopedia e Traumatologia Do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (IOT- HC-FMUSP). Henrique Abreu da Cruz – Médico do Centro de Ortopedia Pediátrica do INTO/MS. Henrique Gomes Noronha – Médico residente da disciplina de coluna vertebral do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IOT–HC–USP). 9

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Ighor Alexander Zamuner Spir – Médico Ortopedista e Traumatologista da Santa Casa de Misericórdia de Presidente Prudente e Clinica Nossa Senhora Aparecida – Presidente Prudente (SP), Brasil, Membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia de Ombro e Cotovelo (SBCOC). Jair Simmer Filho – Membro da SBCOC e SBTO, Especialista em cirurgia do ombro e cotovelo, Clínica SORT e Vila Velha Hospital. Jamil Faissal Soni – Professor de Ortopedia da PUC-Pr, Mestre e Doutor em Medicina pela FCMSC-SP, Chefe do Grupo de Ortopedia Pediátrica do Hospital Universitário Cajuru – PUC-Pr e do Hospital do Trabalhador – UFPR, Fellow AO Kinderspital – Basel – Switzerland. Jefferson Soares Leal – Membro da Sociedade Brasileira de Coluna (SBC). Ortopedista e Especialista em Cirurgia da coluna. Mestre e professor assistente da Faculdade de Medicina da UFMG. Preceptor do Serviço de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas – UFMG e Biocor Instituto. Jorge dos Santos Silva – Médico do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas d Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IOT- HC FMUSP), Diretor Clínico e Chefe do Pronto Socorro. Jorge Rafael Durigan – Assistente do Grupo de Trauma Ortopédico da Santa Casa de São Paulo. José Carlos Souza Vilela – Mestre em Cirurgia, Coordenador do Grupo de Cirurgia de Ombro do Hospital Unimed BH. José Luis Amim Zabeu – Mestre em Ortopedia pela Santa Casa de São Paulo, Chefe de Serviço de Ortopedia da PUC-Campinas. José Octavio Soares Hungria – Mestre em Ortopedia pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, Pós-graduando do curso de nível doutorado em Ciências da Saúde. José Roberto Bevilacqua Guarniero – Médico Ortopedista pela FMUSP. Kodi Edson Kojima – Médico do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do HC FMUSP, Coordenador do Grupo de Trauma. Lucas de Castro Boechat – Membro Titular SOB, Pós-graduação em Ortopedia e Traumatologia Esportiva pela UNIFESP. Luciano Ruiz Torres – Médico Assistente do Grupo de Mão & Micro Cirurgia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IOT HC FMUSP). Luiz Eduardo Moreira Teixeira – Mestre em Cirurgia, Professor Assistente de Ortopedia da UFMG, Coordenador do Grupo de Oncologia Ortopédica do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais (HC-UFMG). Luiz Felipe Albanez Falcão – Médico da Fundação Manoel da Silva Almeida – Hospital Infantil Maria Lucinda – Recife – PE, Médico do Hospital da Restauração – Recife – PE. Médico integrante da clínica C. O. R. E (Centro Ortopédico do Recife) e da Clínica Ciclo – Recife – PE. Luiz Fernando Cocco – Médico assistente da Disciplina de Traumatologia e do Grupo de Ombro e Cotovelo da UNIFESP. Luiz Henrique Penteado da Silva – Membro da Sociedade Brasileira de Quadril (SBQ) e do Grupo de Trauma e Cirurgia da Pelve e Acetábulo, Instrutor da residência médica do serviço do IOT Passo Fundo, fellow serviço de trauma Dr. Jorge Alonso – Alabama – EUA. Médica do IOT – Instituto de ortopedia e traumatologia de Passo Fundo. Luiz Roberto Vialle – Grupo de Lesão Medular, Centro Hospitalar de Reabilitação Ana Carolina Moura Xavier. Marcelo Abagge – Professor Adjunto do Departamento de Cirurgia – Ortopedia UFPR, Chefe do Serviço do Hospital do Trabalhador – UFPR Marcelo Teodoro Ezequiel Guerra – Mestre em Medicina UFRJ, Chefe de Serviço Ortopedia e Traumatologia Hospital Universitário – ULBRA, Regente Módulo de Ortopedia e Traumatologia do Curso de Medicina da ULBRA. 10

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Marcio Eduardo de Melo Viveiros – Mestre em Ortopedia e Traumatologia pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP, Médico assistente de Setor de Ombro e Cotovelo da UNIFESP e chefe do Grupo de Ombro e Cotovelo do Hospital Santa Marcelina. Marco Antônio Percope de Andrade – Professor Adjunto do Departamento do Aparelho Locomotor da UFMG. Chefe do serviço da residência médica do HC-UFMG. Marco Túlio Costa – Médico Assistente do Grupo do Pé e Tornozelo da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Marcos Norberto Giordano – Chefe da Divisão de Traumato-Ortopedia, Hospital da Força Aérea do Galeão, Rio de Janeiro, RJ; Responsável pela Cirurgia do Quadril da Divisão de Traumatologia-Ortopedia, Hospital da Força Aérea do Galeão, Rio de Janeiro, RJ; Membro, Presidente da Sociedade Brasileira de Quadril (SBQ) e Regional Rio de Janeiro (Gestão 2010-2011); Mestre em Medicina (área de Ortopedia e Traumatologia) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Marcos Paulo de Souza – Médico pela Universidade de Caxias do Sul. Preceptor do grupo do trauma da residência em ortopedia e traumatologia da Universidade Luterana do Brasil, RS. Membro do serviço de Traumato-Ortopedia do Hospital Mãe de Deus, Porto Alegre. Maria Isabel Pozzi Guerra – Membro da Sociedade Brasileira e Latino-americana de Ombro e Cotovelo. Chefe do Serviço de Ombro e Cotovelo da Universidade Luterana do Brasil, em Porto Alegre (RS). Marina Juliana Pita Sassioto Silveira de Figueiredo – Especialista em Ortopedia Pediátrica. Mauro Gracitelli – Médico Assistente do Grupo de Ombro e Cotovelo e do Grupo de Trauma do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IOT HCFMUSP), Especialista em Cirurgia do Ombro e Cotovelo pela Sociedade Brasileira de Cirurgia do Ombro e Cotovelo (SBCOC). Miguel Akkari – Mestre e Doutor em Ortopedia, Chefe do grupo de ortopedia pediátrica da Santa casa de São Paulo. Múcio Brandão Vaz de Almeida – Mestre e Doutor em Ortopedia e Traumatologia pela Universidade Federal de Pernambuco-UFPE, Chefe do Departamento de Ortopedia e Traumatologia do Hospital Getúlio Vargas-PE. Nei Botter Montenegro – Professor Colaborador da Faculdade de Medicina da USP Mestre e Doutor pela Faculdade de Medicina da USP Médico Assistente da Disciplina de Ortopedia Pediátrica do Hospital das Clínicas da FMUSP Médico da Clínica de Especialidades Pediátricas do Hospital Israelita Albert Einstein. Ney Coutinho Pecegueiro do Amaral – Chefe do serviço de Ortopedia e Traumatologia do Hospital Municipal Miguel Couto – RJ Mestre em Ortopedia e Traumatologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Membro Titular da Sociedade Brasileira de Medicina do Esporte, Médico do Hospital Universitário da UFRJ- RJ, Médico da Seleção Adulta Masculina de Vôlei. Pedro Henrique Mendes – Chefe do Centro de Ortopedia Pediátrica do INTO/MS, Mestre em Medicina pela UFRJ. Paulo Roberto dos Reis – Médico ortopedista, assistente do grupo de reconstrução e alongamento ósseo do IOT-HC-FMUSP. Rafael Lara de Freitas – Mestrado e Doutorado pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo – USP, Pós Doutorado na Fundação AO – Davos, Suíça, Especialização em Cirurgia do Trauma e do Joelho, SBTO, SBCJ, SBA, AO Trauma, ISAKOS, Médico assistente da Unidade de Emergência do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP. Reinaldo dos Santos Volpi – Médico Assistente do Departamento de Cirurgia e Ortopedia da Faculdade de Medicina de Botucatu, Doutor em Cirurgia pela Faculdade de Medicina de Botucatu. Renato Cesar Raad – Chefe do Grupo de Trauma do Hospital do Trabalhador – UFPR, Chefe do Serviço de Ortopedia e Traumatologia do Hospital Nossa Senhora das Graças. 11

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Ricardo Cardenuto Ferreira – Médico Chefe do Grupo do Pé e Tornozelo da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Ricardo Pereira da Silva – Membro Titular da Sociedade Brasileira de Cirurgia da Mão, Membro Titular da Sociedade Brasileira de Microcirurgia Reconstrutiva, Médico assistente grupo de cirurgia da mão do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da UFG, Médico assistente grupo de cirurgia da mão do Hospital de Acidentados – Goiânia. Roberto Attilio Lima Santin – Prof. Dr. Médico Consultor do Grupo do Pé e Tornozelo da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Robinson Esteves Santos Pires – Mestre pela UNIFESP (EPM). Traumatologista dos Hospitais Felício Rocho, Risoleta Tolentino Neves e Hospital da Baleia (Belo Horizonte-MG). Rodrigo Garcia Vieira – Médico ortopedista do Hospital Ortopédico de Belo Horizonte; Membro da Associação Brasileira de Medicina e Cirurgia do Pé e Tornozelo. Rogério Carneiro Bitar – Médico Assistente do Departamento de Medicina Física e Reabilitação do Aparelho Locomotor do HCFMRP-USP. Rogério de Andrade Gomes – Médico ortopedista membro do grupo de cirurgia do pé e tornozelo do Hospital das Clínicas da UFMG; Membro da Associação Brasileira de Medicina e Cirurgia do Pé e Tornozelo. Rogério Lúcio Chaves de Resende – Membro titular da Sociedade Brasileira de Coluna (SBC). Ortopedista e Especialista em Cirurgia da coluna. Preceptor do Serviço de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas – UFMG, Hospital Universitário Risoleta Tolentino Neves – UFMG e Biocor Instituto. Romero Montenegro Nery – Membro Titular da Associação Brasileira de Medicina e Cirurgia do Tornozelo e Pé, Médico Assistente do Departamento de Ortopedia e Traumatologia – Grupo de Cirurgia do Pé e Tornozelo – do Hospital Getúlio Vargas e do Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira – IMIP / Faculdade Pernambucana de Saúde. Rui Maciel de Godoy Junior – Doutor em Ortopedia e Traumatologia pela USP. Médico assistente da Disciplina de Ortopedia Pediátrica do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da USP. Presidente da Sociedade Brasileira de Ortopedia Pediátrica (SBOP). Sandra Paiva Barbosa – Especialista em ortopedia e traumatologia e especialista em cirurgia da mão, ocupo o cargo atual de chefe da residência medica do Hospital Getúlio Vargas. Sandro da Silva Reginaldo – Chefe do Serviço de Ombro e Cotovelo do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás, Mestre em Ortopedia pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. Sergei Taggesell Fischer – Professor associado mestre e chefe do Grupo de Trauma do Serviço de Ortopedia e Traumatologia do Hospital Universitário Cajuru – PUC/PR. Membro do Grupo de Trauma do Hospital do Trabalhador – UFPR. Silvio Coelho – Ortopedista Pediátrico do Hospital Mãe de Deus de Porto Alegre, Professor da Cadeira de Ortopedia e Traumatologia da ULBRA. Vincenzo Giordano – Coordenador do Programa de Residência Médica do Serviço de Ortopedia e Traumatologia Prof. Nova Monteiro, Hospital Municipal Miguel Couto, Rio de Janeiro, R, Fellow da Divisão de Trauma do Departamento de Ortopedia da Universidade do Alabama em Birmingham; Mestre em Medicina (área de Ortopedia e Traumatologia) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro; Doutorando em Medicina (área de Cirurgia) pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Walter H. C. Targa – Doutor em Ciências pela USP, chefe do grupo de Reconstrução e alongamento ósseo do Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo( IOT-HC-FMUSP). Weverley Valenza – Membro do grupo de Ortopedia Pediátrica do Hospital Universitário Cajuru – PUC-Pr e do Hospital do Trabalhador – UFPR, Fellow Children’s Hospital – San Diego – USA, Fellow AO Inselspital – Bern – Switzerland.

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Índice TRAUMA ADULTO Capítulo

Tema



Princípios das osteossínteses Métodos de fixação das fraturas Utilização de fixadores externos na emergência Politraumatizado: controle de danos Fraturas expostas Antibioticoterapia nas fraturas expostas Antibioticoterapia profilática no tratamento cirúrgico das fraturas fechadas Fraturas da clavícula Fraturas da escápula Fraturas da extremidade proximal do úmero Luxação acromioclavicular Luxação esternoclavicular Luxação traumática do ombro Fraturas diafisárias do úmero Fraturas da extremidade distal do úmero Fraturas do olécrano Luxação do cotovelo / fratura da cabeça do rádio Fraturas do antebraço Fraturas da extremidade distal do rádio Fraturas do escafóide Fraturas dos metacarpianos e falanges Lesões traumáticas do punho (osteoligamentares) Lesões tendinosas da mão Fraturas da pelve Fraturas do acetábulo Luxação traumática do quadril Fraturas do colo do fêmur Fraturas transtrocanterianas do fêmur Fraturas subtrocantéricas do fêmur Fraturas diafisárias do fêmur Fraturas supracondilianas do fêmur Fraturas do planalto tibial Fraturas da patela Fraturas do pilão tibial



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Capítulo Tema 35 Fraturas dos ossos da perna 36 Fraturas do tornozelo 37 Fraturas do tálus 38 Fraturas do calcâneo 39 Fratura-luxação de Lisfranc 40 Lesões traumáticas da coluna cervical 41 Lesões traumáticas da coluna tóraco-lombar 42 Lesado medular 43 Pseudartroses 44 Fraturas com perdas ósseas 45 Osteossíntese em ossos osteoporóticos 46 Trauma ortopédico e trombose venosa profunda 47 Embolia gordurosa 48 Tétano 49 Síndrome compartimental 50 Gangrena gasosa

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TRAUMA INFANTIL



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Novos conceitos no tratamento de fraturas em crianças Criança politraumatizada Síndrome da criança espancada Lesões traumáticas da cintura escapular Fraturas da extremidade proximal do úmero Fraturas supracondilianas do úmero Outras lesões traumáticas do cotovelo Fraturas do antebraço e mão Fraturas da extremidade distal do rádio Lesões traumáticas da coluna cervical Lesões traumáticas da coluna tóraco-lombar Lesões da pelve Fraturas da extremidade proximal do fêmur Fraturas diafisárias do fêmur Lesões traumáticas do joelho Fraturas da perna Lesões traumáticas do tornozelo e pé

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Princípios das osteossínteses Luiz Fernando Cocco

Os princípios de Osteossíntese tiveram na fundação do Grupo AO, nos anos 50, seu grande avanço nos conceitos que na sua maioria continuam aceitos até o momento. Para tanto, foram lançados quatro objetivos básicos, que descreveremos posteriormente. Estes conceitos universais, maiores do que qualquer material de osteossíntese, não predeterminam que implantes ou marcas devam ser escolhidos para que sejam alcançados. O arsenal terapêutico de órteses e próteses aumenta a cada dia, introduzindo materiais novos com a promessa de resultados cada vez mais promissores. Sabemos entretanto, que muitas vezes isso não se traduz em realidade. Os implantes novos devem ser analisados sob o mais criterioso e rigoroso parecer técnico para que não interfiram no resultado do tratamento. Alem disso, cabe ao Ortopedista responsável pelo tratamento, primar por implantes de qualidade técnica, de origem conhecida e difundida, com instrumentais precisos e atualizados. Não deve, por qualquer motivo, levar o paciente a sala cirúrgica sem sentir-se confortável e seguro com o material que utilizará durante a cirurgia.

Esta escolha, entretanto, deve ser individualizada para cada paciente, cada fratura, condições de infra-estrutura hospitalar e claro, experiência da Equipe Ortopédica que fará o tratamento. A mais moderna haste intramedular não terá a menor utilidade se a infra-estrutura hospitalar não constar com aparelhos de radioscopia, mesas cirúrgicas rádio transparente e outros recursos de suporte para sua utilização correta e precisa. Da mesma forma, cirurgiões inexperientes com a técnica ou material, podem ter resultados muito inferiores de equipes treinadas e habituadas a rotina com certos implantes. Algumas vezes fatores limitantes como estes, fazem com que os princípios de osteossíntese devam ser alterados (Estabilidade Absoluta X Relativa) para o tratamento de fraturas muito parecidas, atendidas em hospitais diferentes. A mesma placa DCP por exemplo, pode assumir funções absolutamente diferentes. Pode funcionar como um tutor extra-medular como fixação em ponte, ou agregar estabilidade absoluta em outra situação. Conforme citado anteriormente, os Princípios de Osteossíntese abaixo devem ser considerados a origem da 15

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proposta terapêutica, e darão suporte a escolha do implante.

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sui nas osteossíntese com haste intramedular e placas em ponte, seus maiores exemplos. c) Preservação do Suprimento Sanguíneo – Este conceito está cada vez mais atual,visto que a importância das partes moles na consolidação das fraturas é bastante valorizada. Desta forma é fundamental a execução de uma técnica o mais atraumática possível, preservando os tecidos perifraturários, evitando grandes dissecções e manipulações de fragmentos ósseos. Tais cuidados diminuem sobremaneira a incidência de complicações como infecção, retardo de consolidação, pseudartrose, deiscência de pele etc. d) Mobilização Precoce – Uma vez que os princípios anteriores, em especial o da fixação estável, tenham sido alcançados, o próximo passo consiste em permitir a mobilização precoce do membro e consequentemente criar condições para o restabelecimento rápido da função, diminuindo desta forma os efeitos deletérios da chamada doença fraturaria, bem como ajudando na preservação da vida de pacientes graves, como politraumatizados e polifraturados.

Assim temos: a) Redução Anatômica da Fratura – Atualmente considera-se fundamental nas fraturas articulares, pois muitas vezes desvios residuais maiores que 2 mm cursam com maior índice de osteoartrose pós-traumática. Quanto as demais regiões do osso, procuramos na grande maioria das vezes um alinhamento anatômico, e não mais uma redução anatômica, ou seja, o objetivo consiste em restabelecer o alinhamento, rotação e comprimento ósseo. Faz-se exceção aos ossos do antebraço, mesmo porque pela íntima relação entre o rádio e a ulna, estas fraturas são tratadas como articulares. b) Fixação Estável – A estabilização das fraturas deve ser suficiente para suportar as demandas biomecânicas locais, podendo ser obtida a partir de várias técnicas e tipo de implantes, desde que bem aplicados. Para tanto, esta fixação pode agregar estabilidade absoluta, ou seja, aquela que não permite mobilidade no foco da fratura, ou relativa, que por outro lado, permite tais movimentos. A primeira é obtida a partir do princípio de fixação interfragmentária, que pode ser estática como nos casos de parafusos de tração e placas ou dinâmica a partir das bandas de tensão. A segunda pos-

O conhecimento e familiaridade do Ortopedista com implantes e técnicas variadas não o torna refém de certos materiais, podendo apresentar ao paciente uma gama de possibilidades terapêuticas muito maior. 16

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Reis FB. Fraturas. 2.ed. São Paulo: Atheneu, 2007. 2. Faloppa F, Albertoni WM (coords). Guia de Medicina Ambulatorial e Hospitalar da Unifesp-EPM – Ortopedia e Traumatologia, Barueri: Manole, 2008.

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Métodos de fixação das fraturas Rogério Carneiro Bitar

Toda as vezes que estamos perante a uma fratura, logo pensamos em como podemos fixá-la. Apesar de simples este pensamento, esta decisão envolve diversos fatores, pois uma fratura nunca é igual a outra. Muitas são as variáveis que acompanham a fratura, várias delas determinadas pelo mecanismo e energia do trauma, outras pelo perfil do paciente e/ou a qualidade óssea. Todos estes e outros fatores deverão ser considerados no momento que iremos escolher o melhor método de fixação para aquela fratura, naquele determinado momento e principalmente para aquele paciente. Neste capítulo iremos apresentar, objetivamente, os métodos disponíveis para o tratamento das fraturas e quando devemos empregá-los.

uma estabilidade relativa, a qual acarreta em uma consolidação indireta, com a formação de calo ósseo1. O excesso de movimento no foco de fratura é indicativo de instabilidade e consequentemente uma maior chance de falha no processo de consolidação. Sendo assim, quando desejamos que ocorra uma consolidação direta da fratura, ou seja, sem a formação de calo ósseo, como por exemplo nas fraturas articulares, devemos optar por métodos que promovam a estabilidade absoluta do foco de fratura, sendo o melhor e mais eficaz, o parafuso de tração ou de compressão interfragmentária2. A placa de compressão dinâmica ou a placa acoplada a um dispositivo de compressão e a banda de tensão são métodos de compressão interfragmentária (tabela 1). Por outro lado, quando desejamos que ocorra uma consolidação da fratura através da formação de calo ósseo, devemos utilizar os métodos de estabilidade relativa e que servem como tutores, como por exemplo as hastes intra-medulares, as placas em ponte e os fixadores externos (tabela 1). Uma erro muito comum é a associação direta do implante com o método, que nem sempre é verdadeira.

Métodos de Fixação Os métodos de fixação obedecem a dois princípios básicos1 (tabela 1): 1) 2)

Princípio da compressão Princípio do tutor

O princípio da compressão promove no foco de fratura uma estabilidade absoluta, a qual acarreta uma consolidação direta, sem a formação de calo ósseo1. Por outro lado, o princípio do tutor promove 18

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cortical proximal (furo com o mesmo diâmetro do diâmetro externo do parafuso) e um canal de rosca na cortical oposta (furo com o diâmetro igual ao diâmetro da alma do parafuso). Existem alguns parafusos, em que existe um talo liso e uma porção com rosca, utilizados nas regiões de osso esponjoso, que também promovem compressão. Para que haja a correta compressão no foco de fratura e consequente consolidação direta, é preciso que a redução dos fragmentos seja anatômica1.

Por exemplo, uma placa DCP pode ser utilizada como um método de compressão, mas também pode ser utilizada como um tutor, nos casos de placa em ponte. Caso façamos o raciocínio de trás para a frente, estaremos escolhendo primeiro o implante, onde existe um gama enorme de implantes ortopédicos das mais diversas cores, tamanhos, preços e que podem promover, se empregados sem o princípio correto, um resultado insatisfatório. Métodos de Estabilidade Absoluta Parafusos de tração Qualquer parafuso, independente do seu diâmetro, pode ter a função de um parafuso de tração ou de compressão interfragmentária, desde que se faça um canal de deslizamento na

Placas de compressão dinâmica As placas com o orifício DCP (que possuem uma rampa de deslizamento da cabeça do parafuso) podem promover uma compressão entre os fragmentos da fratura, sendo

Tabela 1: Princípios da Osteossíntese Princípio

Compressão

Tutor

Estabilidade

Absoluta

Relativa

Consolidação

Método

Exemplos de implantes

Primária

1)Parafuso de tração 2)Placa de Compressão 3)Banda de tensão

1)Parafuso 6,5mm rosca 32mm 2)Placa DCP ou LCP 3)Fios de cerclagem + fios de Kirschner

Secun-dária

1)Haste intramedular 2)Placa em ponte 3)Fixador externo

1)HIM fresada e bloqueada 2) Placa DCP 3)Fixador externo modular tubo-a-tubo

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Existem diversas opções de hastes intramedulares, as quais podem ser divididas pelas suas opções de bloqueio, flexibilidade e de necessitarem ou não de fresagem prévia. Com a adição dos parafusos de bloqueio às hastes, além de melhorar as propriedades mecânicas, houve uma ampliação das indicações, fazendo com que as hastes bloqueadas sejam, atualmente, as mais utilizadas no tratamento das fraturas dos ossos longos3. Os bloqueios da haste permitem um melhor controle da rotação, do encurtamento, possibilitando o apoio e a reabilitação mais precoce1. As hastes bloqueadas podem ou não necessitar de fresagem. A fresagem, realizada através de fresas flexíveis, tem a finalidade de aumentar progressivamente o canal medular, para que haja um contato maior entre o implante e o osso, aumentando com isso a estabilidade. Além disso, muitos trabalhos1 mostraram que a fresagem, quando realizada com fresas adequadas e com a técnica correta, proporciona uma melhora no processo de consolidação óssea, seja por “levar” osso até o foco de fratura , seja por aumentar o fluxo sanguíneo periosteal, por uma inversão do fluxo endosteal para periosteal. As hastes flexíveis, como por exemplo as hastes de Ender, estão cada vez mais em desuso, após o advento das hastes bloqueadas, tendo a sua indicação para as fraturas diafisárias em osso imaturo. Deve-se conhecer todos os tipos

um método de estabilidade absoluta, resultando na consolidação direta da fratura. Da mesma forma que o parafuso de tração, é necessário a redução anatômica dos fragmentos . Banda de tensão A técnica de fixação tipo banda de tensão é considerada um método de estabilidade absoluta, pois promove uma compressão dos fragmentos da cortical oposta, articulares ou não, a qual é aumentada com o movimento1. Pode ser conseguida através de uma placa colocada na face de tensão do osso ou uma montagem com fios de Kirschner e cerclagem, colocados na cortical proximal, geralmente junto às inserções tendinosas dos fragmentos fraturados, como por exemplo nas fraturas da patela. Este método, quando bem executado, promove a consolidação direta dos fragmentos, sendo assim, torna-se necessário que não haja cominuição da articulação ou cortical oposta, acarretando em um processo de consolidação direta. Métodos de Estabilidade Relativa Haste Intramedular O encavilhamento intramedular é o principal método de estabilidade relativa para tratamento das fraturas diafisárias, principalmente do fêmur e da tíbia3. Também são utilizadas para tratamento das fraturas do fêmur proximal, como por exemplo, as fraturas transtrocantéricas e subtrocantéricas4. 20

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pois possibilitam diversos tipos de montagens e configurações, podendo ser colocados rapidamente, o que é uma característica fundamental no tratamento das fraturas nas situações de urgência e emergência (controle de danos) e de forma percutânea, com um menor dano aos tecidos moles. Mas os fixadores, quando utilizados por longos períodos, seja como tratamento definitivo da fratura, seja pela dificuldade de conversão para uma síntese interna, apresentam altos índices de infecção nos trajetos dos pinos, perda da redução, retardo de consolidação e consequente necessidade de enxertia óssea6. Em resumo, diversos são os métodos de fixação das fraturas e mais diversos os tipos de implantes para se realizar estes métodos. No entanto, devemos inicialmente escolher qual o melhor princípio para tratar aquela determinada fratura, naquele determinado momento e para aquele paciente.

de hastes intramedulares1, com as suas diversas opções de bloqueio, pontos de entrada, conformações e características para que se determine a melhor opção de tratamento para aquela fratura e aquele paciente. Placas em ponte Qualquer placa pode ser utilizada como um método de fixação que promova uma estabilidade relativa, servindo como um tutor extra-medular, basta que ela seja colocada de uma forma “em ponte”, ou seja, com uma fixação proximal, uma área sem parafusos (também chamada de área de trabalho) e uma fixação distal. Dependendo do tamanho e do tipo da placa, da disposição e do tipo de parafusos, podemos aumentar ou diminuir a rigidez da montagem. Fixador externo Os fixadores externos são os dispositivos de fixação mais versáteis,

Sugestões de Leitura 1. Princípios AO do tratamento de fraturas. Organizado por Thomas P. Ruedi e William M. Murphy; trad. Jacques Vissoky. – Porto Alegre : Artmed, 2002. 2. Perren SM, Cordey J, Baumgart F, et al. Technical and biomechanical aspects of screws used for bone surgery. International Journal of Orthopaedic Trauma, 1992; 2: 31-48. 3. Court-Brown CM, Christie J, McQueen MM (1990) Closed intramedullary tibial nailing. Its use in closed and type I open fractures. J Bone Joint Surg (Br); 72 (4): 605-611. 4. Parker MJ, Handoll HHG. Intramedullary nails for extracapsular hip fractures in adults. Cochrane Database of Systematic Reviews 2006, Issue 3. 5. Muller C, Frigg R, Pfister U. Effect of flexible drive diameter and reamer design on the increase of pressure in the medullary cavity during reaming. Injury 1993, 24 (Suppl 3): 40-47 6. External Fixation: How to Make It Work. Ziran et al. J Bone Joint Surg Am.2007; 89: 1620-1632. 21

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Utilização de fixadores externos na emergência Eduardo da Silva Brum

Consiste em uma solução emergencial versátil e de fácil aplicação, com agressão mínima de tecido ósseo e partes moles. Segundo trabalho realizado pelo departamento de ortopedia e traumatologia da Unifesp, 32% dos ortopedistas brasileiros entrevistados no 36° CBOT optaram pela fixação externa nas fraturas Gustilo tipo I, 52,1% na Gustilo tipo II, 74,4% nas do tipo III A. Esses dados mostram que, existe uma grande tendência do ortopedista brasileiro na utilização da fixação externa como tratamento, seja provisório ou definitivo, em ambientes de emergência. Ao optarmos pelo tratamento com fixadores na emergência, dois questionamentos obrigatoriamente deverão ser analisados, principalmente em se tratando de fraturas da diáfise da tíbia (a mais comum): a) Esse aparelho modular, na instituição em que estou trabalhando, será convertido para tratamento definitivo (hastes, placas ou fixador externo) nos próximos 14 dias? b) Existe a possibilidade de que o tratamento desenvolvido em caráter emergencial possa tornar-se tratamento definitivo, visto a incapacidade da instituição e do sistema

ao qual estou inserido em revisar todos os casos e promover alternativa de tratamento definitivo? Ao avaliarmos o tratamento com fixadores modulares na emergência, muitas vezes percebemos a falta de preocupação maior com questões importantes, como o alinhamento da fratura, a técnica de inserção dos pinos de Shanz, e a estabilidade do fixador. A situação descrita acima leva a uma falsa impressão de que, por tratar-se de um método provisório de tratamento das fraturas, a atenção com a boa técnica pode ser deixada para segundo plano. Importante salientar que, independentemente de o fixador externo ser utilizado para fins de tratamento provisório ou definitivo, a montagem na emergência deverá seguir os preceitos básicos de estabilização da fratura, alinhamento e inserção de barras e pinos de Shanz, observando atentamente as áreas de segurança de inserção de pinos e fios nos diferentes seguimentos. A partir dos conceitos de controle de danos local, o uso dos fixadores externos na emergência, não se restringe apenas no tratamento das fraturas expostas. Pacientes polifraturados, com fraturas fechadas de alta 22

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energia, fraturas de pilão tibial tipo II e III AO, joelho e cotovelo flutuante, lesões em livro aberto do anel pélvico (compressão AP), são passíveis ao uso dos fixadores externos. Técnica correta de inserção do pino de Shanz: A correta colocação do pino de Shanz é elemento fundamental no bom andamento do tratamento com fixador externo, pois diminui o risco de complicações da interface pino osso, como soltura, infecção superficial, osteólise. Faz-se uma incisão de aproximadamente 1 cm ou o suficiente para evitar a tensão entre a pele e o pino. A seguir, com uma pinça é realizada dissecção romba, com objetivo de separar as partes moles até o osso. As duas corticais ósseas deverão ser perfuradas pela broca e o pino introduzido manualmente de forma a evitar necrose térmica pelo uso de perfuradores em alta rotação. O pino deverá possuir sua porção interna cônica, pois permite melhor ancoragem e resistência ao arrancamento do implante, promovendo maior durabilidade da estabilização, diminuindo o numero de reintervenções. Montagem do fixador externo modular tubo a tubo. Existem vários tipos de montagens e configurações dos fixadores externos. Alguns fatores influenciam na escolha por diferentes tipos de montagens: 1. O osso acometido: ossos longos dos membros inferiores necessi-

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tam de montagens mais estáveis quando comparados aos membros superiores. Nesse caso para aumentarmos a estabilidade podemos lançar mão de alguns elementos técnicos tais como: a) o diâmetro da alma do pino de Shanz: pinos com alma de 3,2mm são menos estáveis que pinos com alma 4,5mm na resistência às forças de torção b) a distância entre os pinos: quanto maior a distância entre os pinos de Shanz de um mesmo segmento, maior a estabilidade e resistência da montagem. Quanto menor a distância do pino em relação ao foco de fratura maior a rigidez. c) o número de barras: fixadores externos montados com barra dupla longitudinal resistem melhor às forças de compressão axial, quando comparados com barra única em configurações uni-planares. d) distância barra-osso: quanto menor a distância da barra em relação ao osso, maior a estabilidade, principalmente relativa às forças de compressão (distancia deverá ficar entre 20 e 30 mm da pele e até 60 mm da superfície óssea) observando sempre o conforto do paciente. e) a configuração dos fixadores: montagens uni-planares são de 4 a 7 vezes mais instáveis quando comparados às bi-planares em relação às forças de encurvamento. 23

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f ) pinos cônicos revestidos com hidroxiapatita melhoram a interface pino-osso aumentando a resistência (bastante utilizados em pacientes com osteoporose). 2. a estabilidade intrínseca do osso a) fraturas com maior cominução são naturalmente mais instáveis e necessitam de montagens mais estáveis que fraturas transversas simples. 3. lesões de partes moles e vasculares associadas a) muitas vezes temos de modificar a configuração da montagem objetivando facilitar o acesso a curativos e intervenções vasculares.

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damente 1 cm e sua ponta é fixada ao osso ilíaco de ambos os lados. Após a inserção dos pinos, acoplase os outros componentes do aparelho e faz-se impacção do anel conforme figura abaixo. Figura 1

Montagem do fixador modular tubo a tubo para lesões do anel pélvico:

Figura 2

Tipos de montagem nos diferentes segmentos: Bacia: Clampe de Ganz: diversos trabalhos já demonstraram a eficácia do clampe de Ganz no tratamento emergencial das lesões do anel pélvico com instabilidade hemodinâmica. É de concepção simples e de rápida colocação, facilitando as abordagens abdominais quando necessário e promovendo compressão da região posterior da pelve, local onde ocorrem os maiores sangramentos. Técnica: identifica-se o ponto de penetração no ilíaco que fica de 8 a 10 cm anterolateral à espinha ilíaca póstero-superior, ao longo de uma linha imaginária entre esta e a espinha ilíaca ântero-superior. Faz-se a introdução do pino por uma incisão de aproxima-

Há 2 possibilidades clássicas para a inserção dos pinos de Shanz no anel pélvico conforme demonstração acima.

Supra-acetabular: promove maior estabilidade rotacional à montagem, porém a dificuldade técnica é maior. Alguns autores indicam essa montagem como tratamento definitivo. Toma-se como referência a crista ilíaca ântero-superior, o sítio de entrada fica de 4 a 6 cm em direção caudal e 3 a 4 cm para medial, 24

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a angulação do pino deverá ser de aproximadamente 20 graus em direção cranial e 30 graus em direção a porção interna da pelve. Crista ilíaca: colocar pinos com uma distância mínima de 15 mm dorsal à crista ilíaca ântero-superior, para evitar lesão do nervo cutâneo lateral da coxa. Os pinos são colocados entre as duas corticais da espinha ilíaca em um ângulo de 10 a 20 graus. A compressão é feita pela região anterior ao longo da barra do fixador tubo a tubo conforme figura abaixo.

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Figura 4

Passo 1

Passo 2

Passo 3

Passo 4

Se quisermos aumentar a estabilidade da montagem podemos colocar pinos na face antero-lateral da perna e conectá-los à montagem original ou acrescentar outra barra de conexão entre os dois segmentos. No fêmur, podemos acrescentar uma barra após a redução, unindo os dois segmentos da fratura para aumentar a resistência da montagem. Tanto no fêmur quanto na tíbia do adulto, devem-se utilizar pinos de Shanz cônicos de 6 mm com objetivo de aumentar a estabilidade da montagem.

Figura 3

Tíbia e fêmur: as montagens podem ser uni-planares, bi-planares, híbridas, dependendo de fatores já descritos. A técnica de montagem do aparelho é a mesma para os diferentes segmentos, monta-se o aparelho por segmentos quando a fratura necessita de redução tanto no plano frontal, quanto coronal.

Figura 5

Pilão tibial: A estabilização pode ser feita através de montagem unilateral ou triangular. 25

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As vantagens de montagem triangular com 1 fio de Steinmann transfixando o calcâneo, residem na maior facilidade de promover a técnica de ligamentotaxia, além de prevenir desvios em valgo e varo bastante comuns em montagens unilaterais.

deverá preceder ao vascular com o objetivo de evitar lesões iatrogênicas ao by-pass. Úmero: As montagens para úmero seguem a mesma regra das montagens dos membros inferiores, porém observando com maior atenção às zonas de segurança para inserção dos pinos de Shanz. Na região proximal, o melhor local de inserção fica ântero- lateralmente, e na região distal de póstero-lateral para ânteromedial, evitando assim possível lesão ao nervo radial.

Figura 6

Montagem unilateral

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Figura 7

Montagem triangular

Montagem para joelho flutuante: Em pacientes politaumatizados com fratura de fêmur e tíbia ipsilateral, sem condições de ser submetido ao tratamento definitivo na emergência, a escolha pelo controle de danos através da estabilização com fixador externo trans-articular é a alternativa mais viável. Alguns estudos(Pole GV et al) mostram que a estabilização da fratura nas primeiras 24 horas reduz o risco de eventos pulmonares como embolia gordurosa, pneumonia e SARA em pacientes com trauma cranio encefálico. Se há alguma dúvida em relação a lesão arterial associada, uma angiografia deverá ser solicitada antes da estabilização da fratura. Em relação ao dano vascular que haja necessidade de reparo, em fraturas instáveis, o procedimento ortopédico

Cotovelo flutuante: foi definido primeiramente por Stanitski e Micheli, como sendo uma lesão traumática em criança envolvendo concomitantemente fratura do antebraço e supracondiliana do úmero ipsilateral. Após, essa definição foi estendida para adultos como sendo fratura do úmero e antebraço ipsilateral. 26

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gião distal é de póstero-medial para ântero-lateral angulado 15 graus no plano sagital.

Figura 8

Comentários finais: O método de fixação externa como tratamento provisório ou definitivo na emergência, ainda é o mais utilizado pelo ortopedista brasileiro. É uma técnica consagrada, de fácil aplicação, minimamente invasiva e com mínima agressão às partes moles, porém, para obter sucesso com esse tratamento é necessário seguir os princípios da técnica, com montagens adaptadas para cada tipo de situação, seguindo os preceitos da estabilização e de uma boa redução das fraturas.

A fixação externa nesses casos é utilizada, assim como no joelho flutuante, apenas para controle de danos local, tendo que, obrigatoriamente ser revertida em tratamento definitivo após melhora das comorbidades sistêmicas. Na ulna, a área de segurança para colocação de pino na região proximal é de posterior para anterior e na re-

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Kume, MH. A influência do número de barras na resistência à compressão axial dos fixadores externos mono planares em modelos de tíbias de poliuretano. (dissertação de mestrado) 2010. 2. Mercadante MT, Kojima K, Hungria JOS, Zan RA, Abulasan T, Iamaguchi RB, Mezzalira LG. Estudo mecânico comparativo de quatro montagens de fixador externo mono lateral submetido à força de torção. Rev. Bras Ortop. 2003; 38(3):106 -16. 3. Mercadante MT, Kojima K, Cristian R, Hungria JC, Neto, JSH, Camargo AB, Samano HM. Santos RSF, Vatavuk J, Mello AG, Bertolani AD, Freitas CEB. Avaliação da resistência mecânica de três diferentes pinos de Shanz às forças de torção em montagens do fixador externo mono lateral. Acta ortopédica brasileira. 2005; v.13, nº004, p.183-185. 4. Ming JH, Zhou PH, Zhou JP. Biomechanical analysis of fracture fixation with external fixator in vivo. Chin J Traumatol. 2006; 9(2):100-4. 5. Rotbande I, Ramos MRF. Atualização em fixação externa: conceitos e revisão.Rev Bras Ortop. 2000;35(4):103-08. 6. Sisk DT. General principles and techniques of external skeletal fixation. Clin Orthop Relat Res. 1983;180(11): 96-100. 7. Large and Medium-Size External fixation. Modular rod system (figuras ilustrativas gentilmente cedidas pela Synthes). 27

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Politraumatizado: controle de danos Felipe Macri Daniel de Souza Carvalho

Epidemiologia O politrauma é a principal causa de morte na faixa etária entre 5 e 44 anos, e no decorrer dos últimos anos esta incidência vem aumentando progressivamente. As lesões que acometem o politraumatizado, quando não levam ao óbito, deixam seqüelas permanentes, culminando com enormes custos pessoais e psicológicos, para os familiares e para toda a sociedade. A definição de politrauma é o conjunto de lesões múltiplas simultâneas, de vários segmentos do corpo, em que pelo menos uma ou a combinação de varias é potencialmente fatal, ou ISS (Injury Severity Score) > 18 ( Baker S. et al. J Trauma, 1974). A causa mais freqüente de politrauma é o acidente de trânsito, acometendo duas vezes mais homens que mulheres. Cerca de 80% dos politraumatizados apresentam alguma lesão no aparelho locomotor. A instabilidade do esqueleto torna o paciente imóvel e elimina a opção para selecionar a posição de decúbito mais apropriada para o cuidado intensivo das lesões do encéfalo e do tórax.

tes pacientes deve ser multidisciplinar e criteriosa por toda equipe de plantão, identificando e tratando primeiro o que leva a vida em risco, utilizando o método ATLS – Advanced Trauma Life Support, utilizando a seguinte sequência: a Airway- Desobstrução e manutenção das vias aéreas superiores pérvias e imobilização da coluna cervical b Breathing- Respiração e ventilação pulmonar adequada c Circulation- Controle de hemorragias e manutenção da circulação sanguínea d Disability- Identificação de distúrbios neurológicos e Exposure- Exposição completa do paciente, Os exames de imagem inicias são: Radiografias da coluna cervical em perfil, tórax e bacia na posição ântero-posterior e a ultrassonografia ou FAST do abdome. Após esta abordagem inicial e durante a exposição completa do paciente já provisoriamente imobilizado, as fraturas são identificadas com a realização de duas incidências radiográficas.

Diagnóstico Clínico e Radiológico A avaliação e atendimento à es-

Tratamento O objetivo primário durante o 28

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atendimento inicial ao paciente politraumatizado é a sobrevivência com funções cognitivas normais. Isso pode ser obtido com as medidas do atendimento do protocolo ATLS garantindo uma adequada perfusão e oxigenação de todos os órgãos vitais. A abordagem ortopédica nestes pacientes consiste no controle da hemorragia, manejo das lesões de partes moles e estabilidade provisória das fraturas, de maneira que a fisiologia global do paciente possa melhorar, evitando o agravamento pelo tratamento definitivo denominado de “second hit” ou segundo golpe, (sendo o “primeiro golpe” o trauma causador das lesões). Este é o conceito do controle de danos, em que o principal objetivo é salvar a vida, adiando o reparo definitivo das lesões anatômicas e focando na restauração da fisiologia. O melhor método para o controle de danos é o fixador externo, que facilita a mobilização do acidentado no leito seja em UTI ou enfermaria, a realização dos curativos e observação dos ferimentos, diminui a dor e a necessidade de narcóticos, facilitando a fisioterapia na mobilização precoce e na melhora do estado pulmonar do paciente. No entanto, se existir uma resposta positiva durante o atendimento inicial ao paciente politraumatizado e o mesmo permanecer estável durante a avaliação secundária, o “cuidado total precoce” pode ser realizado de acordo com os prin-

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cípios gerais do tratamento das fraturas específicas. O tratamento definitivo, como cirurgia no primeiro dia, somente é aconselhável quando a condição geral do paciente estiver otimizada. Para a escolha do tratamento, entre o cuidado total precoce e o controle de danos, os pacientes com trauma ortopédico podem ser dividido em 4 grupos: a) Estáveis b) Limítrofes c) Instáveis d) Críticos Somente os pacientes considerados estáveis e os categorizados como limítrofes sem fator de risco associado são candidatos ao tratamento definitivo precoce. Isto devido ao trauma desencadear uma resposta inflamatória sistêmica com ativação do sistema imune e dependendo da intensidade desta resposta o organismo poderá reagir com disfunção de múltiplos órgãos(DMO) e/ou síndrome da angústia respiratória aguda (SARA). Desta forma o tratamento definitivo de imediato ou cuidado total precoce em um paciente limítrofe, instável ou crítico, aumentará a reação inflamatória sistêmica, funcionando como um segundo golpe ao paciente, podendo então levá-lo ao óbito. Existe uma predisposição genética pré-programada para hiperreação ao trauma. Os principais marcadores da atividade inflamatória capazes de predizer a gravidade da 29

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resposta inflamatória ao trauma inicial são IL-6 e HLA-DR II . O esquema abaixo resume a condução inicial mais adequada na abordagem ao paciente politraumatizado.

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O Controle de Danos deve ser realizado em todos pacientes instáveis e críticos e também nos pacientes limítrofes com fator de risco associado. Os fatores associados com risco de desfecho adverso são:

Figura 1. Orientação sumarizada de conduta frente ao paciente politraumatizado

Condição instável ou ressuscitação difícil Coagulopatia (plaquetas < 90,000) Hipotermia ( 800pg/ml) pH< 7,24 Tempo cirúrgico previsto acima 90 minutos politrauma no paciente geriátrico

Os requisitos para cirurgia definitiva precoce (nas primeiras 24hs) são:

Os pacientes considerados limítrofes apresentam pelo menos uma das seguintes características :

CIRURGIA DEFINITIVA PRECOCE (primeiras 24 horas)

PACIENTES LIMITROFES ISS > 40 ISS > 20 com Trauma torácico associado (escore abreviado >2) Lesão do anel pélvico ou Lesão Abdominal e Choque Hemorrágico (escore abreviado > 2)

Estabilidade hemodinâmica

Débito urinário > 1 ml/ Kg/hora

Saturação de O2 estável

Ausência de necessidade de suporte inotrópico

Ausência de distúrbios de coagulação

Lactato < 2 mmol/l

Temperatura normal

Contusão pulmonar bilateral

Após o controle de danos, a cirurgia definitiva das fraturas dos ossos longos deve ser agendada para ser realizada durante a “janela imunológica de oportunidade”, entre o quinto e o décimo dia pós trauma, a fim de

Pressão arterial pulmonar média inicial > 24mmHg Aumento na Pressão arterial pulmonar > 6mmHg na PA durante a fixação intramedular

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Considerações finais Na abordagem ao paciente politraumatizado, o cirurgião deverá não somente evitar as complicações inerentes a cada trauma isoladamente, bem como evitar o dano secundário ao paciente. A tomada de decisão deve ser imediata, devendo priorizar salvar a vida do doente, respeitando o ABC inicial do trauma para depois a resolução dos danos ortopédicos específicos. O uso de fixação externa provisória deve ser encorajado no controle de danos por ser de rápida execução e minimamente invasivo.

evitar o “segundo golpe” Princípios mínimos que deverão ser respeitados na colocação do fixador externo na emergência: Princípios de Fixação Externa na Emergência Fixação temporária Utilize preferencialmente fixação monoplanar (tubo-tubo) Posição dos pinos não atrapalhe o tratamento definitivo Não deixe de utilizar técnica adequada de colocação dos pinos

SUGESTÕES DE LEITURA 1. World health statistics 2010. Ginebra, Organización Mundial de la Salud,(http://www.who.int/ whosis/whostat/es/index.html) consultado em 27 de fevereiro de 2011). 2. Pape HC, Hildebrand F, Pertschy S, et al. Changes in the management of femoral shaft fractures in polytrauma patients: from early total care to damage control orthopedic surgery. J Trauma. 2002; 53:452– 461. 3. Pape HC, Grimme K, Van Griensven M, Sott AH, Giannoudis P, Morley J, Roise O, Ellingsen E, Hildebrand F, Wiese B, Krettek C; EPOFF Study Group. Impact of intramedullary instrumentation versus damage control for femoral fractures on immunoinflammatory parameters: prospective randomized analysis by the EPOFF Study Group. J Trauma. 2003; 55:7-13. 4. Harwood PJ, Giannoudis PV, van Griensven M, Krettek C, Pape HC. Alterations in the systemic inflammatory response after early total care and damage control procedures for femoral shaft fracture in severely injured patients. J Trauma. 2005; 58:446-54. 5. Roberts CS, Pape HC, Jones AL, Malkani AL, Rodriguez JL, Giannoudis PV. Damage control orthopaedics: evolving concepts in the treatment of patients who have sustained orthopaedic trauma. Instru Course Lecture. 2005; 54:447-62. 31

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Fraturas expostas Marcos Paulo de Souza

Introdução As fraturas expostas implicam em comunicação entre o meio ambiente externo e a fratura e têm sido definidas como uma lesão de partes moles, complicada por um osso quebrado. A melhor compreensão da fratura exposta, das técnicas de fixação das fraturas, dos cuidados de partes moles e do tratamento antimicrobiano tem resultado em redução da morbidade e da mortalidade associadas.

Epidemiologia Durante um período de 75 meses, entre janeiro de 1988 e março de 1994 em Edinburgh, Escócia, 1000 fraturas expostas de 933 pacientes foram relatadas, representando uma frequência de 21,3 por 100.000 ano. A taxa mais alta de fraturas diafisárias foi vista na tíbia (21,6 %), seguida pelo fêmur (12,1%), radio e ulna (9,3%) e úmero (5,7%). Microbiologia O efeito imediato de uma lesão de alta velocidade que produz uma fratura exposta é a contaminação dos tecidos moles e duros. Além disso, pode haver choque sistêmico, reduzindo o suprimento sanguíneo para o osso e o músculo durante algum período. O resultado é a oxigenação tecidual deficiente e a desvitalização dos tecidos circundantes incluindo o osso, promovendo um meio perfeito para infecção e multiplicação bacteriana. Em um estudo recente, Patzakis e colaboradores relataram que somente 18 % das infecções eram causadas pelo mesmo organismo inicialmente isolado nas culturas transoperatórias.

Etiologia e mecanismo de lesão As fraturas expostas habitualmente ocorrem como resultado de um trauma direto de alta energia, por acidentes automobilísticos ou quedas de altura. O prognóstico relativo às fraturas expostas será determinado principalmente pelo volume de tecidos moles desvitalizados causados pela lesão e pelo nível e tipo da contaminação bacteriana. A destruição ou perda dos tecidos moles que geralmente recobrem o osso poderá afetar as opções do cirurgião referentes à estabilização da fratura. Os acidentes de alta energia geralmente causam lesões múltiplas e graves a outras partes do corpo (cabeça, tórax e abdome), cujo manejo pode ter precedência sobre uma fratura exposta.

Diagnóstico O diagnóstico destas lesões cos32

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tuma ser imediato. Quando a ferida ocorre no mesmo segmento que a fratura, esta deverá ser considerada exposta até prova em contrário. Antes de avaliar detalhadamente as fraturas expostas, as lesões que colocam a vida em risco deverão ser diagnosticadas e tratadas conforme os princípios do ATLS (Advanced Trauma Life Support). O médico examinador deverá documentar a função neurológica e vascular de cada extremidade. Muitos membros que apresentam sinais de insuficiência vascular antes da redução, recuperam assim que o membro é realinhado. Quando a insuficiência persistir, deverá ser verificada e afastada a hipótese de lesão arterial. Após a avaliação inicial, o ferimento deverá ser coberto com curativo estéril para realização dos exames complementares. Tscherne et al. constataram uma taxa de infecção de 4,3%, nas lesões que foram cobertas imediatamente com um curativo estéril, comparada com uma taxa de 18%, naquelas que ficaram expostas até o momento da cirurgia. As pessoas expostas a fezes ou sujeira das zonas rurais, alertam quanto a uma possível infecção causada por clostrídios e a necessidade de antibióticos adicionais (penicilina), bem como de um desbridamento cirúrgico mais agressivo. As radiografias deverão ser realizadas em ânteroposterior e lateral incluindo a articulação acima e abaixo do foco de fratura. Os tecidos moles das extremidades podem aspirar ar em decorrência de traumatismos contusos ou penetran-

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tes. Os gases poderão ser gerados pelo Clostridium perfringens e por enteropatógenos como Escherichia coli. A tomografia computadorizada (TC) das extremidades lesionadas deverá ser adiada, até que seja concluído o tratamento inicial da fratura exposta. Classificação A classificação proporciona as diretrizes referentes ao prognóstico, permitindo formular alguns conceitos sobre métodos de tratamento. A classificação de fraturas expostas descrita por Gustilo e Anderson e depois modificada por Gustilo é o sistema mais citado na literatura atual. As fraturas expostas são divididas em três tipos, em ordem ascendente de gravidade, com base no dano de tecidos moles e o nível de contaminação. As lesões do tipo I são ocasionadas por traumatismos de baixa energia e têm normalmente menos de 1 cm de comprimento, baixa contaminação bacteriana e padrão da fratura simples. As do tipo II têm mais que 1 cm de comprimento, maior lesão de partes moles, moderado nível de contaminação e padrão de fratura simples. As lesões do tipo III decorrem de traumas de alta energia, maiores que 10 cm, extensa desvitalização dos músculos, grande contaminação da ferida. Consideram-se também outros fatores para classificar uma fratura exposta como tipo III: fraturas ocasionadas por projétil de arma de fogo com alta velocidade, fraturas segmentares expostas, fraturas da 33

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diáfise com perda óssea segmentar, fraturas associadas à lesão vascular que irão exigir reconstrução vascular, lesões em ambientes rurais, fraturas com síndrome compartimental associadas. As do tipo III são subdivididas em: IIIA lesões dos tecidos moles, mas em condições de cobertura óssea; IIIB a desvitalização ou a perda de tecidos irá exigir retalho de pele ou de tecidos para recobrir o osso, tendão ou feixe neurovasculares; IIIC lesão vascular que necessite de reconstrução vascular para salvar a extremidade lesionada. Brumback e Jones relataram uma concordância geral de 60% quando usada a classificação de Gustilo entre cirurgiões ortopédicos. Existem outros sistemas de classificação como: Tcherne, AO e Hannover.

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desbridamento e da irrigação do ferimento é remover material estranho, tecidos desvitalizados bem como o osso, e reduzir a carga bacteriana. A irrigação tradicional é feita com 10 litros de soro fisiológico. Dependendo da extensão da lesão, padrão da fratura, do local e da condição geral do paciente será escolhido uma fixação temporária ou definitiva. A fratura do tipo I de Gustilo pode ser tratada da mesma forma que uma fratura fechada. As fraturas grau II e III são instáveis e desviadas e requerem uma fixação cirúrgica. A seleção do método de fixação permanece controversa. As fraturas articulares requerem redução anatômica com estabilidade absoluta, enquanto o segmento não articular pode ser realinhado e fixado com estabilidade relativa. O fixador externo pode ser usado para manter o comprimento e alinhamento até que o edema diminua e a condição do tecido mole tenha melhorado. Idealmente o fixador deve ser colocado fora da zona de lesão e de cirurgias adicionais. Os principais problemas com a fixação externa são relacionados às infecções do trajeto do pino, alinhamento inadequado, união retardada e pouca cooperação do paciente. Se o plano for tratar temporariamente com a fixação externa para depois realizar a conversão para encavilhamento intramedular deve ser até 15 dias da lesão se não houver infecção no trajeto do pino. O uso de hastes intramedulares bloqueadas tem sido estabelecido como trata-

Tratamento Após o tratamento inicial preconizado pelo ATLS, inicia-se o tratamento das lesões musculoesqueléticas. Os objetivos do tratamento são: prevenção da infecção, estabilização da fratura e cobertura de partes moles. O uso de antibiótico sistêmico precoce é muito importante. Patzakis demonstrou que o uso empírico de uma cefalosporina de primeira geração reduziu a taxa de infecção nas fraturas expostas. A administração profilática não deve ultrapassar 72 horas. O momento ideal para o manejo cirúrgico inicial é de 6 a 8 horas após a lesão, após este período a multiplicação bacteriana pode levar a infecção precoce. O objetivo do 34

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O padrão atual de cuidados para todos os ferimentos de fratura exposta é deixá-los abertos. O fechamento retardado é realizado dentro de 2 a 7 dias. O curativo a vácuo é uma opção para não deixar o leito da ferida exposto. Em lesões de grande energia ou intensa contaminação o desbridamento será realizado a cada 24 a 48 horas até que a viabilidade da ferida seja assegurada.

mento de escolha para a maioria das fraturas diafisárias na extremidade inferior, podendo ser usadas até nas fraturas III A. Existe a preocupação acerca da fresagem do canal causar dano adicional ao suprimento sanguíneo endosteal. Há, contudo, dados mostrando que as hastes sólidas introduzidas sem fresagem têm um risco menor de infecção que as hastes tubulares com grande espaço morto. Por sua vez as hastes fresadas são biomecanicamente mais fortes. O encavilhamento intramedular permite acesso ao membro e facilita o manejo de partes moles. Os ensaios randomizados prospectivos que comparam as hastes fresadas com as não fresadas de fraturas tibiais expostas não demonstram qualquer diferença significativa em relação ao desfecho e ao risco de complicações.

Problemas e complicações O manejo das fraturas expostas graves é demorado e difícil para o paciente. A síndrome compartimental é um risco significativo. A infecção permanece o principal risco e pode levar a união retardada, pseudartrose, consolidação viciosa e perda da função.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Rüedi TP, Buckley RE ,Moran CG, et al (2009) Princípios AO do tratamento de fraturas segunda edição volume 1: Artmed. 2. Bucholz RB, Heckman JD, et al (2006) Rockwood e Green : fraturas em adultos quinta edição volume 1: Manole. 3. Court-Brown CM, Brewster N, (1996) Epidemiology of open fractures.Court-Brown CM, McQueen MM, Quaba AA (eds), Management of open fractures. London: Martin Dunitz, 25-35. 35

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Antibioticoterapia nas fraturas expostas José Luis Amim Zabeu

as cirurgias do trato biliar e orofaringe. c) Feridas contaminadas: feridas acidentais recentes ou quando ocorre contaminação evidente em ambiente previamente limpo de cirurgia eletiva. d) Feridas sujas-infectadas: incisões sobre áreas comprovadamente infectadas. Deste modo, todo paciente vítima de fratura exposta deve receber antibióticos com objetivo terapêutico e não profilático 4.

O uso de antibióticos no tratamento das fraturas expostas é consenso desde 1974, quando Patzakis et al 1 publicaram o primeiro estudo prospectivo, comparativo e randomizado evidenciando que a associação entre o desbridamento adequado e a antibioticoterapia era capaz de reduzir de modo significativo a incidência de infecção nas fraturas expostas. Desde então, o que se busca é a melhor maneira de se administrar o antibiótico, em temos da seleção do medicamento, via de administração e tempo total de utilização 2.

Início de administração do antibiótico Embora haja um conceito generalizado na comunidade ortopédica de que o tratamento cirúrgico da fratura exposta deva se iniciar em até seis horas do trauma, algo não demonstrado com clareza pela literatura, o que se evidencia é que existe diferença significativa em relação ao momento em que se administra a primeira dose de antibiótico. O tempo crítico seria de três horas a partir do trauma, sendo que a incidência de infecção aumenta significativamente se o antibiótico é inicialmente fornecido após este período 5. O papel do antibiótico precoce ganha importância quando se considera que o tempo entre o trauma e

Tratamento profilático ou terapêutico? As fraturas expostas de qualquer grau devem ser consideradas como feridas cirúrgicas classe III, na classificação utilizada pela agência federal americana CDC (Centers for Disease Control and Prevention) a partir do trabalho de Mangram 3: a) Feridas limpas: incisões em áreas não inflamadas e que não atingem os sistemas respiratório, digestório ou urogenital. b) Feridas limpas-contaminadas: incisão realizada em áreas envolvendo os sistemas respiratório, digestório ou urogenital, porém sob condições controladas e sem contaminação excessiva. São exemplos 36

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a entrada no centro cirúrgico não parece ser tão crítico, exceto nas situações de extrema contaminação. Conceitualmente, deve ser considerado que o início da antibioticoterapia em fraturas expostas encerra o período de exposição 6,7.

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para aquelas Gustilo III. Existe como questionamento o fato das quinolonas interferirem negativamente no processo inicial de consolidação da fratura, como foi demonstrado experimentalmente por Hudeleston et al 8 . No Brasil, pelo perfil de resistência que já existe às quinolonas e considerando que as mesmas não têm ação sobre germes anaeróbios esperados no trauma, não devem ser consideradas como opção. Já o uso de cefalosporina de terceira geração, úteis no combate a infecções por gram-negativos, é primeira escolha em pacientes idosos e quando há preocupação quanto à função renal 9. A cefazolina deve ser usada na dose de 1g endovenoso a cada oito horas, devendo dobrar a dose (2g) para pacientes com peso corpóreo maior ou igual a 80 kg. Já o uso de gentamicina se faz na dose de 80 mg a cada oito horas e a amicacina deve ser administrada na dose de 1g a cada 12 horas, tendose sempre o cuidado de monitorizar a função renal. Há evidências que no tecido ósseo a gentamicina tem eficácia quando usada em dose única diária, de 6 mg/kg até 240 mg 10. O uso da clindamicina, que tem boa penetração óssea e espectro semelhante à cefalosporina, tem a vantagem de ser eficaz contra organismos anaeróbios, sendo excelente opção, principalmente quando há antecedente de alergia a penicilina ou cefalosporinas. A dose recomen-

Posologia e seleção do antibiótico Na chegada do paciente à emergência hospitalar, as bactérias que estão na ferida são aquelas que já habitavam a pele do paciente, acrescentadas pelas adquiridas no meio onde houve o acidente. Em geral, são bactérias da comunidade e com baixo perfil de resistência a antibióticos. Deste modo, para o combate às bactérias gram-positivas, é efetivo o uso de cefalosporinas de primeira geração, sendo argumentado por alguns autores que para os traumas de menor energia (Gustilo I e II) o tratamento poderia ser feito somente com esta medicação. Existe, no entanto, o risco de se subestimar a energia do trauma na primeira avaliação, sendo portanto recomendado que para todas as fraturas se utilize o esquema de associação de antibióticos. Para as bactérias gram-negativas, deve ser associado um aminoglicosídeo, como gentamicina ou amicacina. Como opção para este segundo grupo, existem as quinolonas e as cefalosporinas de terceira geração. O uso isolado de quinolonas como o ciprofloxacino mostrou-se adequado para fraturas Gustilo I e II, mas não 37

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dada é de 600 mg a cada seis horas 11 . Uma vez realizado o tratamento inicial, o paciente passa a ser colonizado pelas bactérias hospitalares, o que faz com que eventuais infecções tenham etiologia e resistência a antibióticos com outro perfil. Sabe-se que de 80 a 90% das infecções em fraturas expostas são causadas por bactérias adquiridas no ambiente hospitalar 12. A importância deste fato se dá quando da programação de novos tempos cirúrgicos, onde deve ser discutida a necessidade de administração de antibióticos mais adequados à flora identificada pela Comissão de Infecção Hospitalar de cada hospital. A prevenção contra tétano exige que seja administrado soro antitetânico (imunoglobulina humana) em

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todos os pacientes nos quais não se possa comprovar que tenham sido vacinados contra tétano nos dez anos anteriores ao trauma 13. Qual a efetividade do antibiótico local? O antibiótico usado na forma de solução para lavagem não tem eficácia, como foi demonstrado por Anglen 14. Nos traumas de alta energia que envolvem perda óssea segmentar (defeitos maiores que 5 cm de osso diafisário), estudos sugerem que há diminuição do risco de contaminação por flora hospitalar quando se interpõe cimento ortopédico (polimetilmetacrilato) misturado a antibióticos termorresistentes (vanco-

Antibioticoterapia empírica inicial em fraturas expostas (iot-hcfmusp) TIPO DE FRATURA

DROGAS/DOSE

Fratura exposta tipo I (MMSS e MMII)

Cefazolina 3g/ dia(*)

Fraturas expostas tipo II e III (MMSS e MMII)

Clindamicina 2,4g/ dia (*) + Gentamicina (**) 240mg/dia (*) (dose única diária)

TEMPO TOTAL

CULTURAS

Se alta, tratamento VO com cefalexina 2 a 4g/dia

14 dias

14 dias

PÓS-ALTA HOSPITALAR

Osso (colher na admissão e em todas as limpezas cirúrgicas)

Se alta, tratamento VO com cefalexina 2 a 4g/dia

(*) Doses para adultos com função renal normal (**) Em pacientes idosos ou com história prévia de alteração da função renal, substituir por CEFTRIAXONE 2g de 12/12 horas.

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micina, gentamicina). Esta estratégia envolve a remoção do cimento após a estabilização das condições de partes moles, seguida de enxertia maciça ou transporte ósseo 15.

atendimento inicial são muito diferentes, dependendo da infraestrutura local e treinamento de equipes, deve ser sugerido o uso rotineiro por 14 dias 16.

Duração da antibioticoterapia A questão da duração da antibioticoterapia nas fraturas expostas é tema de polêmica, havendo autores que preconizam um, três ou cinco dias de antibióticos, enquanto outros optam pelo tratamento por duas semanas. No Brasil, onde as condições de seguimento do paciente após o

Sugestão de tratamento Na página anterior, esquema utilizado pelo Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas de São Paulo 17: Os pacientes que evoluírem com infecção na evolução do tratamento da fratura exposta deverão ter o esquema alterado e orientado por culturas ósseas ou microbiota hospitalar local.

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SUGESTÕES DE LEITURA: 1. Patzakis MJ, Harvey JP Jr, Ivler D: The role of antibiotics in the management of open fractures. J Bone Joint Surg Am 1974;56:532-541 2. Lima ALLM. Antibioticoprofilaxia em cirurgia ortopédica. In : Joelho- articulação central dos MMII. MM Amatuzzi. Cap 88, 701-04. Ed. ROCA 2004 3. Mangram AJ, Horan TC, Pearson ML, Silver LC, Jarvis WR; the Hospital Infection Control Practices Advisory Committee. Guideline for prevention of surgical site infection, 1999. Infect Control Hosp Epidemiol. 1999;20(4):250-278. 4. Okike K, Bhattacharyya T: Trends in the management of open fractures. A critical analysis. J Bone Joint Surg Am. 2006 Dec;88(12):2739-48. 5. Patzakis MJ, Wilkins J. Factors influencing infection rate in open fracture wounds. Clin Orthop Relat Res. 1989;243:36-40 6. Werner CM, Pierpont Y, Pollak AN: The urgency of surgical débridement in the management of open fractures. J Am Acad Orthop Surg. 2008 Jul;16(7):369-75. 7. Lima A.L.L.M., Zumiotti A.V., Uip D.E., Silva J.S.: Fatores preditivos de infecção em pacientes com fraturas expostas nos membros inferiores. Acta Ortop Bras 12: 32-39, 2004. 8. Huddleston PM, Steckelberg JM, Hanssen AD, Rouse MS, Bolander ME, Patel R. Ciprofloxacin inhibition of experimental fracture healing. J Bone Joint Surg Am. 2000;82:161-73. 9. Patzakis MJ, Bains RS, Lee J, et al: Prospective, randomized, double-blind study comparing single-agent antibiotic therapy, ciprofloxacin, to combination antibiotic therapy in open fracture wounds. J Orthop Trauma 2000;14:529-533. 10. Sorger JI, Kirk PG, Ruhnke CJ, Bjornson SH, Levy MS, Cockrin J, Tang P. Once daily, high dose versus divided, low dose gentamicin for open fractures. Clin Orthop Relat Res. 1999 Sep;(366):197204. 11. Mueller SC, Henkel KO, Neumann J, et al: Perioper- ative antibiotic prophylaxis in maxillofacial surgery: Penetration of clindamycin into various tissues. J Craniomaxillofac Surg 27(3):172–176, 1999. 12. Carsenti-Etesse H, Doyon F, Desplaces N, Gagey O, Tancrede C, Pradier C, Dunais B, Dellamonica P. Epidemiology of bacterial infection during management of open leg fractures. Eur J Clin Microbiol Infect Dis. 1999;18:315-23. 13. Advisory Committee on Immunization Practices. Diphtheria, tetanus, and pertussis: recommendations for vaccine use and other preventive measures—recommendations of the Immunization Practices Advisory Committee (ACIP). MMWR. 1991;40(No. RR-10):1-38. 14. Anglen JO. Comparison of Soap and Antibiotic Solutions for Irrigation of Lower-Limb Open Fracture Wounds. A Prospective, Randomized Study. J. Bone Joint Surg. Am., July 1, 2005; 87(7): 1415 - 1422. 15. Ostermann PA, Seligson D, Henry SL: Local antibiotic therapy for severe open fractures. A review of 1085 consecutive cases; J Bone Joint Surg Br. 1995 Jan;77(1):93-7. 16. Okike K, Bhattacharyya T: Trends in the management of open fractures. A critical analysis. J Bone Joint Surg. 2006 Dec;88(12):2739-48. 17. Guia de utilização de antiinfecciosos e recomendações para a prevenção de infecções hospitalalares 2009/2011. Grupo e subcomiissões de controle de infecção hospitalar do HCFMUSP. Internet - http:// www.hcnet.usp.br

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Antibioticoterapia profilática no tratamento cirúrgico das fraturas fechadas Sergei Taggesell Fischer

Infecções do sítio cirúrgico são complicações das mais frequentes após tratamentos cirúrgicos ortopédicos. Estima-se que ocorram em cerca de 780.000 novos casos ao ano, nos EUA. (Fletcher N 2007) O uso profilático de antibióticos em cirurgias ortopédicas se mostrou benéfico para diminuir a incidência de infecções em cirurgias eletivas e no tratamento de fraturas fechadas. Estudos controlados com placebo demonstraram menor incidência de infecção com a profilaxia antimicrobiana, entretanto, não há consenso quanto às drogas ou regime ideal de tratamento (Slobogean GP 2008). O conceito básico de profilaxia antibiótica é que a droga deve estar presente no tecido, em concentração suficiente para inibir a ação do germe, antes da contaminação pelo potencial agente infeccioso. Isto implica administração prévia ao início do procedimento operatório (Patzakis MJ 1989). A duração da administração deve se restringir ao mínimo possível, no intuito de evitar o desenvolvimento de resistência bacteriana ao medicamento. A profilaxia da infecção do sítio operatório com drogas antimicrobianas é efetiva e importante, mas não

dispensa ou substitui as demais medidas de prevenção. Escolha do antibiótico A contaminação por bactérias e eventual infecção da ferida operatória se origina de germes existentes na pele ou no ambiente, principalmente hospitalar, que chegam ao sítio operatório pelo ar. Os micro-organismos que mais frequentemente são implicados como causadores de infecção em cirurgias ortopédicas são o Staphylococcus aureus e estafilococos não produtores de coagulase, como o Staphylococcus epidermidis, por exemplo. As cefalosporinas, tanto de primeira geração (cefazolina), quanto de segunda geração (cefuroxima, cefoxitina) têm ação contra esses germes e são usados como profiláticos preferenciais, tanto em artroplastias quanto no tratamento de fraturas e outros procedimentos ortopédicos. Vancomicina ou clindamicina podem ser usados em pacientes alérgicos a antibióticos beta-lactâmicos (penicilinas e cefalosporinas). Não existem estudos comparando a eficácia da clindamicina em relação à vancomicina para profilaxia antiinfecciosa, portanto nenhuma reco41

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mendação pode ser feita favorecendo o uso de um dos agentes. Em pacientes sabidamente colonizados por cepas de Staphylococcus aureus resistentes à meticilina ou em instituições em que haja surto de infecções causadas por esses germes, a vancomicina pode ser utilizada para profilaxia anti-infecciosa. A eficácia desta droga não se mostrou superior à da cefazolina ou cefuroxima na prevenção de infecções operatórias e seu uso deve ser restrito a pacientes com indicações precisas ou fatores de risco identificáveis para infecção por germes meticilina-resistentes, como hospitalização recente, doença renal ou diabetes (Fletcher N 2007).

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são. A administração cuidadosa desta droga é necessária para minimizar os efeitos colaterais ocasionalmente observados, como hipotensão e dor torácica, que podem mimetizar infarto agudo do miocárdio. Posologia O uso de antibióticos com intuito de profilaxia anti-infecciosa deve se restringir às 24 horas iniciais. Há tendência atual de limitar a administração a dose única pré-operatória imediata. Revisão sistemática recente não apontou diferença ao analisar os resultados de 7 estudos, compreendendo dados de 3.808 pacientes, em que se comparou dose única com 24 horas de antibioticoterapia (Slobogean GP 2008). Em nosso meio, a substância mais frequentemente utilizada é a cefazolina, infundida em doses de 1g, com intervalos de 8 horas. Essa deve ser a droga de escolha, salvo se houver desenvolvimento de resistência bacteriana no ambiente hospitalar. Durante a cirurgia, nova dose de 1g deve ser infundida a cada 3 horas. O cefuroxime obedece ao mesmo regime posológico, e a cefoxitina requer e devem ser reservadas para casos específicos. Quando está indicado o uso da vancomicina, se recomenda concentração até 5 mg/ml, e velocidade de infusão até 10 mg/min, ou tempo mínimo de 60 minutos, para diminuir a probabilidade de eventos adversos (Fletcher N 2007). A dose diária usual

Administração O agente antimicrobiano deve ser ministrado por via endovenosa, dentro dos 60 minutos que antecedem a incisão da pele, e se considera ideal que seja o mais próximo possível do início do procedimento, quando se usam cefalosporinas. O uso de garrotes requer a administração do medicamento cerca de 20 minutos antes da exanguinação do membro. Uma segunda dose deve ser dada se a duração da cirurgia exceder uma a duas vezes a meia-vida da droga, ou houver sangramento substâncial durante a cirurgia. Caso o antibiótico selecionado seja a vancomicina, a medicação deve ser iniciada 2 horas antes da incisão, devido ao tempo prolongado de infu42

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Conclusão A profilaxia antimicrobiana tornou-se padrão em cirurgias ortopédicas, e os benefícios do seu uso estão bem demonstrados na literatura. A duração da profilaxia em fraturas fechadas deve se restringir a, no máximo, as 24 horas iniciais.

é de 2 g, que pode ser dividida em 4 de 500 mg ou 1 g a cada 12 horas. Os horários de início da profilaxia, doses usadas e duração devem ser cuidadosamente registrados no prontuário do paciente, garantindo adequada cobertura antibiótica e proteção contra eventuais questionamentos legais.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Fletcher N, Sofianos D, Berkes MB, Obremskey WT. "Prevention of perioperative infection." Journal of Bone and Joint Surgery. 2007; 89(A): 1605-18. 2. Patzakis MJ, Wilkins J. “Factors influencing infection rate in open fracture wounds.” Clínical Orthopedics and Related Research. 1989; 243: 36-40. 3. Slobogean GP, Kennedy SA, Davidson D, O’Brien PJ. “Single versus multiple dose antibioic prophylaxis in the surgical treatment of closed fractures: a meta-analysis.” Journal of Orthopedic Trauma. 2008; 22 (4): 264-9. 43

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Fraturas da clavícula Carlos Roberto Garcia Carlos Roberto Garcia Filho

Introdução A clavícula é um dos ossos mais fraturados do corpo humano. Com seu formato em “S”, achatado lateralmente, tubular medialmente, com inserções musculares e ligamentares nestes extremos, ausência destes no seu terço médio, justifica sua maior fragilidade neste local. É o osso responsável pela largura dos ombros, posicionamento da escápula e direção da glenóide.

do ombro. O desvio inferior do fragmento lateral é determinado pelo peso do membro, e o desvio superior do fragmento medial, pelo músculo esternocleidomastóideo. Todo o membro deve ser examinado, buscando descartar alterações neurológicas e vasculares. O diagnóstico radiográfico pode ser dado por uma única incidência, porém, para melhor avaliação do desvio, recomendam-se duas incidências: AP e AP com 45° de inclinação cranial. Tomografia computadorizada pode ser necessária para adequada visualização das fraturas do terço medial. Lembrar de investigar também o trauma torácico, descartando pneumotórax, hemotórax, e fraturas de costelas.

Epidemiologia As fraturas da clavícula representam de 2,6% a 4% das fraturas dos adultos e 35% das fraturas do ombro. Fraturas diafisárias correspondem de 69% a 82% e fraturas do terço lateral a 21%. O primeiro e maior pico de incidência ocorre em adultos jovens (menores de 30 anos), do sexo masculino e predominantemente no terço médio. O segundo pico, menor que o primeiro, ocorre em idosos, com discreta predominância feminina, e mais nas extremidades da clavícula. É mais comum o trauma direto, sendo as mais complexas nos traumas de alta energia.

Classificação A classificação de Craig (modificada a partir de Allman e Neer) é uma das mais utilizadas, subdividindo as fraturas do terço lateral e medial em vários tipos específicos. A classificação de Robinson, mais recente, leva em consideração o grau de desvio e cominuição, fatores preditores de complicações como pseudartrose. Esta classificação tem mostrado níveis aceitáveis de variação intra-observador, e também subclassifica as fraturas de terço lateral e medial.

Diagnóstico Clínico e Radiográfico A fratura da clavícula produz dor, deformidade, e limitação funcional 44

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Classificação de Craig Grupo I – Terço Médio Gupo II – Terço Distal Tipo I: Com deslocamento mínimo (ligamentos trapezóide e conóide íntegros) Tipo II A: Ligamento conóide e trapezóide fixados Tipo II B: Ligamento conóide dilacerado, trapezóide fixado Tipo III: Fratura intra-articular Tipo IV: Dilaceração da manga periostal (crianças) Tipo V: Fraturas cominutivas, com ligamentos fixados no fragmento inferior Grupo III – Terço Medial Tipo I: Deslocamento mínimo Tipo II: Deslocadas Tipo III: Intra-articulares Tipo IV: Separação epifisária Tipo V: cominutiva

Classificação de Robinson Tipo 1 – Terço Medial (3% das fraturas de clavícula, maioria não deslocadas) Tipo 1A: Não deslocadas Tipo 1A1: Traço Extra-articular Tipo 1A2: Traço Intra-articular Tipo 1B: Deslocadas Tipo 1B1: Traço Extra-articular Tipo 1B2: Traço Intra-articular Tipo 2 – Terço Médio (69% das fraturas, maioria deslocadas e/ou cominutas) Tipo 2A: Alinhamento cortical preservado Tipo 2A1: Não deslocadas Tipo 2A2: Anguladas, com contato cortical Tipo 2B: Deslocadas Tipo 2B1: simples, ou com fragmento único em borboleta Tipo 2B2: Cominutiva ou Segmentar Tipo 3 – Terço Distal (21 a 28%, 3:1 = não deslocadas : deslocadas) Tipo 3A: Não deslocadas Tipo 3A1: Extra-articular Tipo 3A2: Intra-articular Tipo 3B: Deslocadas Tipo 3B1: Extra-Articular Tipo 3B2: Intra-articular

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Tratamento As fraturas do terço médio sem desvio são de tratamento conservador e cursam com bons resultados. Não há diferença dos resultados funcionais e tempo de consolidação entre o uso da tipóia e da imobilização tipo 8. Nenhuma destas reduz o desvio da fratura, e a imobilização tipo 8 tem a desvantagem de ser mais incômoda para o paciente. A imobilização pode ser descontinuada assim que o paciente tiver melhora da dor, o que normalmente ocorre entre 2 e 3 semanas de tratamento, marcando o retorno às atividades habituais sem carga.

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Nos últimos anos há uma tendência de indicar mais tratamento cirúrgico primário para as fraturas desviadas devido aos bons resultados, comparados com o tratamento não cirúrgico. Isto se deve à aquisição de novos materiais de síntese e melhor técnica cirúrgica. Em estudos recentes comparando o tratamento não cirúrgico com o cirúrgico para fraturas desviadas do terço médio da clavícula fixadas com placas, estas apresentaram menor taxa de pseudartrose, melhor resultado funcional, com consolidação em menor tempo. Fixação com placa: Maior rigidez, permite mobilidade precoce com menos dor. Posição mais comum é superior à clavícula, pode ser ânteroinferior (com menor risco de complicações neuro-vasculares, porém de estabilidade biomecanicamente mais pobre). Preferência pelas placas DCP e LCP, uma vez que placas de reconstrução são mais susceptíveis às forças deformantes da fratura, levando a maior taxa de má união. Placas LCP prémoldadas, recentemente introduzidas, apresentam perfil mais baixo, levando a menor necessidade de retirá-las. Fixação intra-medular: Abordagem menos invasiva, preferência por fios rosqueados. Menos indicada que placas, devido dificuldades anatômicas da clavícula, variedade de implantes, fragilidade das hastes, risco de encurtamento nas fraturas cominutivas e de migração quando da utilização dos fios lisos. Fixadores Externos: Estão indicados em fraturas expostas e infectadas.

Indicações relativas – Terço Médio Deslocamento < 2cm Desordem neurológica (Parkinson, convulsões, etc) Trauma múltiplo Previsão de repouso prolongado no leito Ombro flutuante Intolerância à imobilização Fraturas bilaterais Fratura da extremidade superior ipsilateral Razão estética Indicações absolutas – Terço Médio Encurtamento > 2 cm Fratura exposta Ruptura iminente da pele e fratura irredutível Lesão vascular Prejuízo neurológico progressivo Fratura patológica deslocada, com paralisia associada do trapézio Dissociação escapulotorácica

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Gancho-Clavicular, Fios de Kirschner, e fixação córaco-clavicular. Fraturas mediais podem ser de difícil diagnóstico, são raras, extraarticulares em sua maioria e minimamente desviadas. A estabilidade depende principalmente do ligamento costo-clavicular (se rompido, o fragmento lateral desvia anteriormente, e pode cavalgar sobre o fragmento medial). São de tratamento não cirúrgico em sua maioria. O tratamento cirúrgico está indicado quando compromete o mediastino. De preferência usar amarrilhos, que tem a vantagem de dispensar a retirada de material, e não estar relacionada a migração de implante. O tratamento cirúrgico secundário das fraturas de clavícula tem bons resultados, como no tratamento cirúrgico primário.

As fraturas do terço lateral sem desvio também são de tratamento conservador. As fraturas desviadas apresentam indicações cirúrgicas semelhantes às do terço médio, porém com dificuldade de adequar implantes e materiais de síntese ao fragmento distal. As fraturas intraarticulares estão associadas a sintomas persistentes, podendo requerer excisão da extremidade lateral da clavícula (Neer). As fraturas desviadas, com tratamento não cirúrgico, têm alta incidência de não união, deformidade, dor e déficit funcional. Quando acometem os mais idosos, a não união associada a sintomas mínimos ainda está relacionada à satisfação dos pacientes. Indicações Primárias – Terço Lateral Comprometimento do envelope de partes moles da clavícula

Complicações Não união em até 15% nas fraturas desviadas, relacionada a idade avançada, sexo feminino e cominuição do foco. Outras complicações possíveis são restrição de amplitude de movimento, artrite acrômio-clavicular, fraqueza, deformidade cosmética, síndrome do desfiladeiro torácico, lesão neuro-vascular intra-operatória (rara), refratura, consolidação viciosa, cicatriz hipertrófica, infecção. No tratamento das complicações, devemos lembrar de recuperar o comprimento da clavícula, podendo usar enxerto ósseo autólogo (ilíaco ou fíbula vascularizada).

Comprometimento ipsilateral do complexo suspensório do ombro Paciente jovens e ativos, que necessitam rápido retorno às suas atividades

Indicações Secundárias – Terço Lateral Má união / Não união Artrite acrômio-clavicular Sintomas persistentes

Métodos de fixação de fraturas do terço lateral incluem: Placas LCP, Placa 47

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Sergio L. Checchia, Pedro Doneux S., Alberto N. Miyazaki, Luiz A. C. Carvalho, Oyama A. F. Caneca Jr. Fratura da clavícula distal; tratamento e resultado. RBO, março 1996. 2. Sergio L. Checchia, Pedro Doneux S., Alberto N. Miyazaki, Marcelo Fregoneze, Luciana A. da Silva, Fábio S. Cemin, Luciano A. R. Pereira4, Luiz Gustavo Estephanelli. Avaliação dos resultados do tratamento cirúrgico da pseudoartrose de clavícula. RBO, Janeiro/fevereiro 2003. 3. Eduardo Antônio de Figueiredo, Eduardo Junqueira Neves, Haguemu Yoshizawa Júnior, Alfredo Dall`ara Neto, Luiz Fernando Costa Nascimento, Gustavo Henrique da Matta Faria, Wellington Manfio Corrêa. Estudo prospectivo randomizado comparativo entre os tratamentos cirúrgicos utilizando placa anterior e o não cirúrgico das fraturas do terço médio da clavícula. RBO, Outubro 2008. 4. Mark D. Lazarus, Rockwood e Grenn – Fraturas em Adultos – Fraturas da Clavícula, pag. 1041 – 5ª Ed. – Volume I. 2006. 5. L.A. Kashif Khan, Timothy J. Bradnock, Caroline Scott and C. Michael Robinson – Fractures of the Clavicle – J Bone Joint Surg Am. 2009; 91:447-460.

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Fraturas da escápula Cássio Maurício Telles

INTRODUÇÃO A escápula é um osso plano e faz a conexão entre a extremidade superior e o esqueleto axial, lesões deste complexo osteoligamentar podem causar alterações biomecânicas da cintura escapular. A fratura da escápula geralmente ocorre por traumas de alta energia, mais comumente por trauma direto do que indireto, sendo os acidentes de trânsito a principal causa.

grande mobilidade, que dissipa forças traumáticas. Considerando as regiões envolvidas, 50% das fraturas ocorrem no corpo e espinha, 35% na glenoide (colo 25%, cavidade 10%), no acrômio 8% e 7% no processo coracoide. DIAGNÓSTICO Os sinais e sintomas iniciais das fraturas da escápula muitas vezes são pouco característicos, pode se notar edema local e crepitação anormal, em geral o membro superior está aduzido, com dor e diminuição da mobilidade do ombro como um todo, e o movimento de abdução doloroso.

EPIDEMIOLOGIA A maioria das fraturas da escápula (>90%) são minimamente desviadas, porém a associação com outras fraturas e lesões de partes moles é de 80% a 95%, principalmente no torso ipsolateral. Muitas vezes fraturas de escápula são sinais de alerta de lesões mais graves. Costelas fraturadas ipsilaterais são encontradas em até 54% dos casos. Outras lesões variam desde rupturas musculares com formação de grandes hematomas, pneumotórax, hemotórax, lesão do plexo braquial dentre outras. Na revisão da literatura, estas fraturas representam menos que 1 % de todas as fraturas e somente 3 % a 5% de todas as lesões ósseas do ombro. Esta baixa incidência se deve a sua posição posterior à caixa torácica, ser envolvida por músculos e possuir

EXAMES DE IMAGEM O diagnóstico específico destas fraturas é radiográfico. A “série trauma”- AP verdadeira, perfil de escápula e axilar, é a mais usada, podendo ser complementada pela incidência de frente comparativo com peso, sugerida por Rockwood (1), para avaliar lesão do complexo suspensório superior do ombro e incidência de Striker, que poderá ajudar na suspeita de fratura de processo coracoide. Tomografia computadorizada (TC) pode ser útil para melhor caracterização das fraturas envolvendo a superfície articular da glenoide, havendo o recurso da reconstrução tridimensional. 49

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Complexo Suspensorio Superior segundo Goss

A: vista lateral; B: vista frontal

CLASSIFICAÇÃO: Várias classificações das fraturas da escápula foram propostas, com base na sua localização anatômica e frequência. A classificação mais utilizada é a anatômica, que divide em: fraturas da cavidade glenoidal, fraturas do colo da glenoide, fraturas do corpo da escápula, fraturas do acrômio e espinha da escápula, fraturas isoladas do coracoide e lesões do complexo suspensório superior (CSSO). Goss (1993) chamou de complexo suspensório superior do ombro (CSSO), como um anel composto por tecidos moles e ósseo envolvendo glenoide, coracoide, acrômio, clavícula distal e ligamentos. Sendo que uma ruptura

dupla deste anel criará uma situação potencialmente instável. Fraturas da cavidade glenoidal Correspondem a 10% das fraturas das fraturas da glenoide. São subdivididas em fraturas marginais e fraturas da fossa glenoidal. Fraturas marginais da glenoide são consideradas desviadas se a distância entre os fragmentos for maior ou igual a 1 cm, ou se envolver mais de 20% da borda anterior da glenoide ou mais de 30% da borda posterior da glenoide. As fraturas da fossa da glenoide são consideradas desviadas se o degrau entre os fragmentos for maior ou igual a cinco milímetros. 50

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classificadas em tipo I – sem desvio e tipo II desviadas. Consideramos desvio se a distância entre os fragmentos for maior ou igual a 1cm e o desvio angular maior ou igual a 40 graus. Quando há associação da fratura do colo com lesão do mecanismo suspensório do ombro (CSSO), chamamos de ombro flutuante, que é uma situação potencialmente instável.

Classificação Gross-Idelberg

TIPO I - A

TIPO II - A

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TIPO I - B

TIPO II

Classificação do Ombro Flutuante TIPO III

TIPO IV

TIPO V - A TIPO V - B

TIPO V - C TIPO VI

Gross-Ideberg classifica as fraturas da cavidade glenóidea: Tipo I – fraturas da borda da glenóide; tipo Ia – anterior; e tipo Ib – posterior; tipo II – fratura transversa através da fossa glenóide com fragmento triangular inferior deslocado; tipo III - fratura oblíqua através da glenóide, dirigida para borda superior da escápula e freqüentemente associada à fratura ou luxação acromioclavicular; tipo IV - fratura horizontal da glenóide, dirigida para a borda medial da escápula; tipo Va - combinação dos tipos II e IV; tipo Vb – combinação dos tipos III e IV e tipo Vc – combinação dos tipos II, III, IV; e tipo VI – Fratura cominutiva.

A Tipo IA; B, Tipo IB; C, Tipo II; D, Tipo IIIA: E, Tipo IIIB. Tipo I – Lesão óssea pura, subdiviide-se em Ia – colo + base do coracóide; e IB – colo + clavícula e espinha de escápula ou acrômio. Tipo II – lesão ligamentar pura: colo + ligamentos coracoacromial e coracoclaviculares. Tipo III – lesão óssea e ligamentar; Tipo IIIa – colo + diáfise da clavícula + ligamentos coracoacromiais e coracoclaviculares e IIIb – colo + acrômio ou espinha da escapula + ligamentos coracoclaviculares e coracoacromiais..

Fraturas do acrômio e espinha da escápula A classificação proposta por Kuhn e colaboradores. Tipo I – com mínimo deslocamento; tipo II - deslocadas.

Fraturas do colo da glenoide As fraturas do colo da glenoide são 51

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Fraturas de processo coracoide São classificadas segundo a região anatômica: Tipo I – Fraturas da extremidade; tipo II – Fraturas entre os ligamentos coracoclavicular e coracoacromial; e tipo III – fraturas da base do coracoide, a mais comum.

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vios alteram a relação do espaço subacromial, causando impacto ou mesmo perda de força. A lesão torna-se instável se houver associação com lesão do complexo suspensório necessitando de tratamento cirúrgico na maioria das vezes. Redução aberta e fixação interna (RAFI) do colo da glenoide é uma boa opção. Casos onde a fratura do colo de glenoide se associa com fratura diafisária da clavícula, RAFI da clavícula é a mais indicada pela menor morbidade em relação à cirurgia da escápula. As fraturas intra-articulares da glenoide recebem mais indicações cirúrgicas. São divididas em marginais e da fossa da glenoide. A Tomografia computadorizada (TC) é de grande valia. As chances de evoluir com luxação recidivante glenoumeral, são consideráveis, principalmente em jovens, aumentando as indicações cirúrgicas. As fraturas da fossa da glenoide são cirúrgicas caso desvio seja maior do que 5mm, são tratadas pelos mesmos princípios das fraturas articulares, necessitando de redução adequada da superfície articular, evitando degeneração articular. Fraturas do acrômio tipo II, deslocadas para o espaço subacromial necessitam de cirurgia. Recomenda-se fixação com banda de tensão ou placas e parafusos. Para fratura do processo coracoide isolada a maioria dos autores não recomenda nenhum tipo de tratamento cirúrgico. Em caso de fraturas deslocadas associadas com separação acromioclavicular, é recomendado a fixação acromioclavicular.

TRATAMENTO A maioria das fraturas da escápula são tratadas incruentamente. Fraturas do corpo da escápula e espinha, assim como fraturas sem desvio da glenoide, acrômio e coracoide, são tratadas com imobilização com tipoia por 4 a 6 semanas, incentivando pendulares após a primeira semana, aumentando gradativamente a amplitude de movimento, caso se sinta confortável. Analgésicos na fase aguda da dor e crioterapia, principalmente nas primeiras 48 horas são úteis. Imobilização absoluta poderá ser necessária de 48 horas até duas semanas dependendo da gravidade. Importante o controle radiográfico após duas semanas. A fisioterapia é de grande auxílio, reservamos seu início após a segunda semana, ocasião que se orienta movimentos passivos e auto passivos, pois o paciente já não está na fase aguda da dor. Movimentos ativos após a quarta semana. Nas fraturas do colo da escápula, o tratamento é incruento na maioria das vezes. Distância entre os fragmentos maior ou igual a 1 cm ou 40 graus ou mais de angulação caracterizam desvio significativo, é recomendável tratamento cirúrgico, pois grandes des52

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Charles A. Rockwood, Jr., MD, Frederick A. Matsen, III, MD, Michael A. Wirth, MD and Steven B. Lippitt, MD. The Shoulder, 4th edition; Oct 2008.Pgs 333-380 2. Jacob M. Lantry , Craig S. Roberts, Peter V. Giannoudis . Operative treatment of scapular fractures. A systematic review. 3. Michael J. DeFranco, MD, and Brendan M. Patterson, MD; Journal of the American Academy of Orthopaedic Surgeons; Volume 14, Number 8, August 2006.

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Fraturas da extremidade proximal do úmero Adriano Marchetto

Incidência A fratura proximal do úmero corresponde a 5% das fraturas do esqueleto e é a terceira fratura mais comum em idosos. Em relação ao úmero é a fratura mais comum (45%), podendo chegar a 75% em adultos acima dos 50 anos. Ocorre em dois tipos de pacientes (apresentação bimodal): a) Jovens: predominantemente em homens e em acidentes de alta energia. b) Idosos: predominantemente em mulheres devido a presença de osteoporose. Ocorre em traumatismos de baixa energia com cominuição e/ou impacção óssea.

e a equimose geralmente é evidenciada após 24-48 horas na região lateral do tórax, braço e antebraço. Lesões vasculares são raras e estão mais associadas com as fraturas– luxações. A lesão neurológica mais freqüente é do nervo axilar. É mandatório o exame de sensibilidade na região lateral do deltoide, pois o exame motor normalmente está comprometido devido a fraqueza secundária a dor. Atenção especial deve se ter nos acidentes motociclísticos. O peso do capacete durante o trauma, pode favorecer desde estiramentos do plexo braquial até o arrancamento de raízes junto a medula. Pacientes com história de epilepsia e choque elétrico devem ser avaliados quanto a presença de luxação posterior (mais comum), anterior e fratura-luxação. Lembrar que aproximadamente 50% das fraturas-luxações posteriores não são diagnosticadas no atendimento inicial.

Mecanismo de Lesão Trauma direto por sobrecarga axial ou trauma indireto decorrente de mecanismo de hiperabdução forçada ou após crise epilética ou choque elétrico. Nos dois mecanismos a luxação pode estar presente. Os desvios dos fragmentos estão relacionados aos músculos inseridos nos mesmos.

Diagnóstico por imagem O diagnóstico é feito por meio de radiografias simples (Série Trauma). AP verdadeiro – permite avaliar o desvio superior ou inferior dos fragmentos e nos casos que a luxação está associada há sobreposição da cabeça umeral em relação a glenóide.

Diagnóstico Clínico O sintoma mais comum é a dor, principalmente na área do grande tubérculo maior. Crepitação pode estar presente nos casos em que os fragmentos ósseos estão desviados 54

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Perfil – permite avaliar os desvios dos fragmentos e das luxações no plano ântero-posterior. Axilar – permite avaliar o grau de desvio dos tubérculos e a relação da cabeça umeral com a glenóide (luxação anterior ou posterior). A incidência axilar de Velpeau permite realizar o exame com o membro na tipóia, ou seja, sem que o paciente necessite abduzir o braço. É muito útil nos casos que o paciente não consegue movimentar o braço devido à dor. A TC e a TC-3D podem ser necessárias para avaliar melhor a superfície articular da cabeça umeral, grau de desvio dos fragmentos e a cominuição óssea.

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menos que 1 cm de distância ou 45° de angulação entre os fragmentos), impactadas e nos pacientes sem condições clínicas para cirurgia. -- Fraturas sem desvio ou impactadas: A imobilização (tipóia) deve ser mantida por um período de 15 dias e deve ser iniciada mobilização precoce com ganho de amplitude de movimentos passiva assim que o paciente tenha melhora da dor (7 a 10 dias). Essas fraturas têm menor chance de desviar. -- Fraturas com desvio mínimo: imobilização (tipóia) por 3 semanas. Especial atenção para as fraturas dos tubérculos que apresentam maior chance de desvio durante o tratamento em função das inserções tendinosas (tubérculo maior–supraespinal / tubérculo menor–subescapular). Radiografias em AP e Perfil devem ser realizadas, no mínimo, a cada semana. -- Redução Fechada: As fraturas com desvio ou associadas à luxação podem ser submetidas inicialmente à redução fechada. Quando, após redução, os fragmentos permanecem estáveis e com desvios inferiores aos descritos por Neer, as fraturas podem ser tratadas com imobilização.

Classificação - Neer – é a mais utilizada, embora tenha uma baixa reprodutibilidade intra e inter-observador. Leva em consideração o envolvimento e o deslocamento de quatro fragmentos: superfície articular da cabeça umeral, tubérculo menor, tubérculo maior e a diáfise umeral. A fratura é considerada desviada quando um ou mais fragmentos apresentam distância maior que 1 cm ou angulação maior que 45° entre si.- AO – leva em consideração a vascularização dos fragmentos e a estabilidade. Tratamento Conservador O tratamento conservador está indicado nas fraturas sem desvio, com desvio mínimo (aquelas com

Tratamento Cirúrgico Este tipo de tratamento vem sendo cada vez mais realizado. A melhoria das técnicas e o desenvol55

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vimento de novos implantes têm permitido a melhor fixação das fraturas mesmo naqueles pacientes com qualidade óssea ruim. O objetivo é reconstruir da melhor forma possível a anatomia local e proporcionar mobilidade precoce. As fraturas consideradas instáveis (desvio dos fragmentos maior que 1 cm ou angulação maior que 45°) têm indicação cirúrgica.

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posterior do úmero. Fragmento grande: redução aberta e fixação interna (1 ou 2 parafusos canulados de 4.0mm ou corticais de 3,5mm). Fragmento pequeno: ressecção ou fixação do fragmento junto com o tendão do subescapular (pontos trans-ósseos ou uso de âncoras metálicas ou absorvíveis). -- Tubérculo maior: desvio superior a 5mm é indicativo de cirurgia. Essa fratura pode ocorrer de forma isolada ou associada à luxação anterior do ombro (7-13%). O desvio pode ser superior pela ação do supraespinal, porém às vezes é mais posterior devido a maior ação do infraespinal. Algumas fraturas podem conter parte da superfície articular da cabeça, o que torna a redução anatômica imperativa. O tratamento de escolha é a redução aberta e fixação interna com parafusos canulados ou corticais. A redução fechada e fixação com parafusos percutâneos com auxílio do artroscópio também tem sido descrita. Nos casos de pacientes idosos ou com osso de má qualidade, pode ser acrescentado uma cerclagem em forma de “8” com fio inabsorvível no tendão do supraespinal. As fraturas cujo fragmento do tubérculo maior é muito pequeno funcionam como uma lesão tendinosa e

Fratura em 2 partes -- Colo Cirúrgico: a preferência atual é por redução aberta e fixação interna. Podem ser utilizadas placas anguladas ou placas com parafusos de bloqueio e ângulo fixo. Estas últimas podem ser usadas em pacientes com má qualidade óssea, com resultados melhores. Estas fraturas consolidam bem, já que a vascularização da cabeça esta preservada. -- Colo Anatômico: raras, porém de difícil tratamento. A fixação da fratura é difícil devido a pouca qualidade de osso junto à superfície articular. Redução aberta e fixação interna devem sempre ser tentadas em paciente jovens. Caso a fixação cirúrgica não seja possível, hemiartroplastia está indicada. Grande potencial de necrose avascular, devido à perda do suprimento sanguíneo da cabeça umeral. -- Tubérculo menor: geralmente associado a luxação 56

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devem ser tratadas por excisão ou fixação do mesmo junto ao tendão do supraespinal no seu leito, por meio de pontos transósseos ou com auxílio de âncoras metálicas ou absorvíveis. Fratura em 3 partes: o terceiro fragmento pode ser o tubérculo menor ou maior (mais comum). O tratamento de escolha é a redução aberta e fixação interna. O implante de preferência é a placa com parafusos bloqueados e com ângulo fixo. Deve se ter cuidado com a dissecção de partes moles, pois a incidência de necrose é alta. Quando não reduzidas e/ ou fixadas inadequadamente, podem evoluir com retardo de consolidação e pseudartrose. Fratura em 4 partes: devido ao alto índice de necrose avascular, pseudartrose e retardo de consolidação, os pacientes idosos ou com qualidade óssea ruim devem ser tratados com hemiartroplastia. A redução aberta e fixação interna sempre devem ser tentadas em pacientes jovens e com alta demanda física, bem como nas fraturas impactadas em valgo, devido ao seu baixo índice de necrose avascular. Nessas últimas, o defeito criado pela compressão do osso metafisário após a redução da

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cabeça umeral, deve ser preenchido com enxerto ósseo ou então estabilizado com um implante do tipo espaçador. A utilização de prótese reversa em pacientes idosos ou com má qualidade óssea, tem sido descrita com resultados encorajadores. Fraturas com Divisão da Cabeça Umeral (Head Splitting): são raras e decorrem de trauma de alta energia. Geralmente acompanhadas de fratura do colo cirúrgico e/ou dos tubérculos. A hemiartroplastia é o procedimento de escolha. Em pacientes jovens e com boa qualidade óssea, a redução aberta com fixação interna está indicado. O objetivo é reduzir o mais anatomicamente possível a superfície articular. Vias de Acesso yy Deltopeitoral: mais usada yy Ântero-Lateral yy Transdeltoide (lateral) Complicações: podem decorrer do trauma inicial ou do tratamento instituído. As mais obervadas são: necrose avascular (3 e 4 partes), rigidez articular, retardo de consolidação, pseudartrose, consolidação viciosa e infecção.

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Bigliani, L.U.; Flatow, E.L.; Pollock, R.G.: Fractures of Proximal Humerus. In: Rockwood, C.A. and Matsen III, F.A. (Ed.): The Shoulder (2nd Ed). Philadelphia, Pennsylvania: Saunders, 1998. p. 337-389. 2. Carrera, E.F.: Fraturas Proximais do Úmero. In: Reis, FB (org.): Fraturas. Campinas, SP: Autores Associados, 2000. p 105-114. 3. Handoll Helen, H.G.; Ollivere Benjamin, J.: Interventions for Treating Proximal Humeral Fractures in Adults. Cochrane Database of Syst Rev. 2010; (12): CD000434. 4. Murray, I.R.; Amin, A.K.; White, T.O.; Robinson, C.M.: Proximal Humeral fractures – Current Concepts in Classification, Treatment and Outcomes. J Bone Joint Surgery (Br), 2011; 93-B:1-11. 5. Shrader, M.W,; Sotelo, J.S.; Sperling, J.W.; Rowland, C.M.; Cofield, R.H.: Understanding Proximal Humerus Fractures: Image analysis, classification and treatment. J Shoulder Elbow Surg 2005; 14:497-505.

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Luxação acromioclavicular Maria Isabel Pozzi Guerra Sandro da Silva Reginaldo

Definição A luxação acromioclavicular é a perda de contato entre o acrômio e a clavícula devido à falha dos estabilizadores estáticos e dinâmicos desta articulação. Os estabilizadores estáticos são a cápsula articular e os ligamentos acromioclaviculares, responsáveis pela estabilização no plano horizontal, e os ligamentos coracoclaviculares que estabilizam o plano vertical. Os estabilizadores dinâmicos são a porção anterior do deltoide e o trapézio.

Diagnóstico e Classificação A classificação mais usada é a de Rockwood, que gradua as lesões em seis tipos de acordo com integridade dos estabilizadores ligamentares. Tipo I – Os ligamentos acromioclaviculares e coracoclaviculares estão íntegros. Não há deformidade e as radiografias são normais. Pode haver maior sensibilidade a palpação e edema de partes moles. Tipo II – Há ruptura dos ligamentos acromioclaviculares gerando instabilidade no plano horizontal. Radiograficamente, o espaço acromioclavicular mostra-se alargado devido à rotação medial da escápula e deslocamento posterior da clavícula tracionada pelo trapézio. No exame físico, a extremidade distal da clavícula parece estar discretamente elevada. Tipo III – No tipo III há instabilidade no plano horizontal e vertical causada pela ruptura dos ligamentos acromioclaviculares e coracoclaviculares. Há quebra total do mecanismo suspensor do ombro. Nas radiografias, observamos luxação da extremidade distal da clavícula e aumento do espaço coracoclavicular em torno de 25 a 100% em relação ao lado normal. Há dor à palpação do espaço coracoclavicular.

Epidemiologia A luxação acromioclavicular está comumente envolvida nas lesões traumáticas do ombro e representa 12% das luxações da cintura escapular. É mais frequente nos indivíduos do sexo masculino com idade inferior a 35 anos, sendo responsável por 40% a 50% das lesões sofridas pelo atleta. Mecanismo do Trauma O mecanismo de trauma mais comum é o direto, produzido pela queda sobre o ombro com o braço aduzido. Já o mecanismo indireto acontece nas quedas com o membro superior estendido ou com apoio do cotovelo. 59

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Tipo IV – A principal característica da luxação acromioclavicular tipo IV é o deslocamento posterior da clavícula em direção ao trapézio, inclusive podendo transfixá-lo. Clínicamente, observamos a porção anterior do acrômio proeminente. Deve também ser avaliada a articulação esternoclavicular e o plexo braquial. Tipo V - O tipo V se caracteriza pela ruptura do fáscia deltotrapezoidal . O espaço coracoclavicular aumenta cerca de 100% a 300%. Há queda importante do ombro e a clavícula encontra-se subcutânea. Muitas vezes pode haver tração exagerada do plexo braquial. Tipo VI – Pode ser subacromial ou subcoracoide. Esta lesão está relacionada a traumas de grande energia e portanto, podem estar associadas a múltiplas fraturas de costelas e da clavícula.

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zem informações adicionais. -- Quando há suspeita de fratura do coracoide associada, a incidência de Stryker fornece a melhor avaliação deste local. Tratamento Tratamento Conservador O tratamento conservador tem indicação precisa nos tipos I e II. As medidas visam analgesia, gelo local e repouso do membro superior em tipoia simples até a resolução dos sintomas (7 a 10 dias). Após a melhora do quadro álgico, está indicada fisioterapia para recuperação da mobilidade e força muscular. Esportes de contato devem ser evitados durante 2 a 3 meses. No tipo III, o tratamento conservador permanece controverso. Inicialmente, está reservado para pacientes mais idosos, sedentários e que apresentem baixa demanda funcional.

Avaliação Radiográfica As radiografias de rotina solicitadas para avaliação desta lesão são: -- AP verdadeiro do ombro -- Axilar – especialmente útil nas luxações do tipo IV para observar o deslocamento posterior da clavícula. -- Incidência de Zanca – AP com inclinação cranial do raio entre 10o a 15o. As radiografias devem ser feitas com o paciente em pé com o membro superior pendente. -- As radiografias com stress costumam ser dolorosas, e não tra-

Tratamento Cirúrgico Conforme relatado acima, o tratamento cirúrgico para as luxações acromioclaviculares tipo III é controverso, com grande parte dos autores preferindo o tratamento conservador; optando pela cirurgia em situações de alta demanda (como por exemplo, trabalhadores braçais, lado dominante, atletas de arremesso) ou em casos crônicos nos quais o paciente apresente dor e limitação funcional. Para as luxações tipos IV, V e VI há um consenso sobre a necessidade do tratamento cirúrgico. 60

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Ao se planejar cirurgia, deve-se estar atento para algumas questões:

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Figura 1A e 1B.

a) Via de acesso: aberta (mais utilizada) ou artroscópica (em desenvolvimento, exige experiência e tem alto custo de materiais); b) Ressecção da extremidade lateral da clavícula: apenas quando houver lesão cartilaginosa ou em casos crônicos; c) Reconstrução ligamentar: dos próprios ligamentos rotos (difícil de serem aproveitados), ligamentos “locais” (transferência do ligamento coracoacromial) ou ligamentos “à distância” (mais utilizado é o semitendíneo, do joelho); d) Tipo de fixação: várias são as opções. Amarrilho subcoracóideo com fios inabsorvíveis de alta resistência (figuras 1A e 1B), fixação com âncoras na base do coracóide (boa alternativa ao amarrilho subcoracóideo), endobutton (utilizado na técnica artroscópica, tem alto custo), parafusos de interferência (para fixação de enxertos, por exemplo, do semitendíneo, na clavícula), placa em “gancho” (necessidade de retirada precoce, complicações como quebra da placa e perda da redução). Os fios transacromiais tem tido sua indicação reduzida pelo alto índice de complicações (migração ou quebra dos fios – figura 2, condrólise, infecção no trajeto).

Figuras 1A (extremidade lateral da clavícula, com ligamento rompido) e 1B (vista superior da fixação na clavícula do amarrilho subcoracóideo). (Arquivo pessoal do autor).

Em relação ao pós-operatório, a tipóia deve ser utilizada por 4 a 6 semanas. Exercícios vigorosos com o membro operado ou esportes de contato são liberados após 4 a 6 meses da cirurgia. Complicações As complicações mais comuns após o tratamento conservador são artrose precoce e permanência da 61

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Figura 2.

Figura 2: Migração de fio para ombro contralateral (arquivo pessoal do autor).

instabilidade. No tratamento cirúrgico as complicações estão relacionadas com a técnica escolhida. Quebra ou migração do material de implante,

subluxação acromioclavicular, recorrência da deformidade acompanhada de sintomas residuais.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Charles A. Rockwood, Jr., MD, Frederick A. Matsen, III, MD, Michael A. Wirth, MD and Steven B. Lippitt, MD The Shoulder, 4th Edition 2. Ryan Simovitch, MD; Brett Sanders, MD; Mehmet Ozbaydar, MD; Kyle Lavery, BS; Jon J. P. Warner, MD Acromioclavicular Joint Injuries - Diagnosis and Management. (2009) pp. 1-13 JAAOS 3. J. A. Fraser-Moodie; N. L. Shortt; C. M. Robinson. ASPECTS OF CURRENT MANAGEMENT Injuries to the acromioclavicular joint- JBJS VOL. 90-B, No. 6, JUNE 2008 4. Vieira LAG, Visco A, Fernandes LFD, Cordero NGG. Tratamento artroscópico da luxação acromioclavicular pelo método “Tight Rope” (Arthrex®) . Rev Bras Ortop. 2009:44(1): 52-6 62

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Luxação esternoclavicular Ighor Alexander Zamuner Spir

Introdução: A articulação esternoclavicular é do tipo diartrodial e é composta pela porção esternal da clavícula e pelo manúbrio. A superfície articular da clavícula é côncava no sentido ântero-posterior e convexa no supero-inferior, e sua dimensão são maiores que a do manúbrio. Ambas as superfícies articulares são cobertas por fibrocartilagem (1,4,5). A estabilidade articular é dada pelos ligamentos esternoclaviculares anterior e posterior, costoclaviculares (ou ligamento rombóide), interclavicular, cápsula articular e disco articular (1,3,4,5). Desses, o ligamento costoclavicular é o principal estabilizador (2). A articulação esternoclavicular faz a ligação do membro superior com o esqueleto axial, tendo movimento nos três planos (4). A clavícula é o primeiro osso longo a se ossificar durante a vida uterina, ao redor da quinta semana de gestação, e a sua epífise medial de crescimento costuma fechar entre 18 e 20 anos de idade, porém pode demorar até a idade de 23 a 25 anos (3).

clavicular são decorrentes de acidentes automobilísticos, onde há traumas de alta energia de forma direta ou indireta; ou traumas em atividades esportivas, principalmente esportes de contato (1,3,4). As lesões correspondem a 1% de todas as luxações articulares ou 3% das luxações no membro superior (4). Em nosso meio Lenza et al. relatam que as lesões na cintura escapular e no ombro são bastante freqüentes, sendo que destas 2,5% correspondem às lesões esternoclaviculares(1). As luxações anteriores são muito mais freqüentes que as posteriores, na proporção de 20:1 (1). Quando há lesões fisárias as mais freqüentes são do tipo Salter Harris II (4). Classificação: Podemos classificar as lesões esternoclaviculares de acordo com o degrau em subluxação ou luxação; quanto à direção em anterior e posterior; quanto à etiologia em traumática ou atraumática; e quanto à cronologia em aguda, crônica, recorrente, congênita ou do desenvolvimento (5). Diagnóstico clínico: Inicialmente a história de acidente automobilístico ou de trauma relacionado aos esportes, dependendo da posição do ombro determina a direção do deslocamento (4,5).

Epidemiologia: As luxações esternoclaviculares são raras e estão muitas vezes associadas a outras lesões mais graves (3,4,5). As lesões na articulação esterno63

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Nos casos de subluxação ou distensão ligamentar, dor à palpação é o principal sinal e às vezes podemos notar um pequeno degrau ao nível articular (3,4,5). Nos casos de luxação há dor local importante, com deformidade ao nível da articulação esternoclavicular. Quando a luxação é anterior há formação de proeminência da clavícula e quando é posterior a formação de um sulco no local (3,4,5). Nas lesões posteriores a dor é mais intensa, podendo estar associado à congestão venosa cervical ou no membro superior ipsilateral, rouquidão, tosse, disfagia ou sinais de dificuldade respiratória com compressão do mediastino. Estas necessitam de tratamento de urgência (3, 4, 5).

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derá fazer a diferenciação entre luxações e lesões fisárias (3,4). Nos casos de suspeita de lesão vascular ou compressão do mediastino, a angiografia pode ser necessária (3). Tratamento: -- Subluxação: Inicia–se o tratamento com analgésicos e aplicação de gelo local, imobilização com tipóia até melhora da dor. Orienta-se a proteção do membro contra novos traumas por 6 semanas (3,4). -- Deslocamento anterior: O tratamento não cirúrgico tem demonstrado bons resultados à longo prazo. Redução incruenta: paciente sedado ou sob anestesia geral, em decúbito dorsal horizontal, coloca-se um coxim entre as escápulas, pressiona-se a clavícula medial de anterior para posterior, obtida a redução imobiliza-se o paciente com uma figura em 8 por 6 semanas. Deformidades anteriores, normalmente são assintomáticas, sendo o aspecto estético o único inconveniente. É desaconselhável a redução aberta (3,4). -- Deslocamento Posterior: É recomendável a presença de um cirurgião torácico nas reduções destas lesões. Redução fechada: paciente em decúbito dorsal horizontal sob anestesia geral ou sedação com coxins colocados entre as escápulas, membro ip-

Diagnóstico radiográfico: Em geral nas radiografias de rotina é difícil fazer o diagnóstico das luxações esternoclaviculares. Uma posição radiográfica descrita por Wirth e Rockwood nos auxilia no diagnóstico. O paciente é deitado em posição supina sobre a mesa de raio X, inclina-se o raio 400, centrando-o na articulação esternoclavicular (serendipity view) (3,4,5) . Porém, a maneira mais efetiva de se fazer diagnóstico é através de tomografia computadorizada multiplanar com reconstrução em três dimensões (3, 4, 5). Nas crianças e adultos jovens a ressonância nuclear magnética po64

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diastino. Após a redução, recomendase a ressecção da extremidade articular da clavícula e a transferência do ligamento costoclavicular e cápsula para o canal medular realizando sua fixação na porção superior da clavícula. Mantem-se imobilizado com figura em 8 por 4 semanas e depois com tipóia por 6 a 8 semanas, sendo que os pacientes não devem elevar o braço neste período mais que 600 e somente após 12 semanas e que irão gradualmente realizando atividades da vida diária (3). -- Lesões fisárias: Normalmente as reduções incruentas são realizadas, sendo raros os casos de necessidade de tratamento cirúrgico, sendo exceção as lesões posteriores com compressão do mediastino (3).

silateral colocado fora da maca em abdução de 900, manobra de tração gentil e contra tração com uma faixa no tórax, e faz-se a extensão do membro superior. Se não obtiver sucesso pode-se tentar a manobra de tração com o braço em adução. Após a redução imobiliza-se com uma figura em 8 por 4 semanas. Se não for possível a redução fechada, está indicada a redução aberta: Paciente em decúbito dorsal horizontal, colocado coxim entre as escápulas, envolve-se o membro ipsilateral em campos estéreis para que se possa realizar tração no intra-operatório, realiza-se uma incisão 5 a 7 cm paralela a borda superior da clavícula medial se estendendo até o esterno, manobra de tração/contratração e puxa-se a clavícula anterior tentando causar o mínimo de lesão na cápsula. Não se recomenda a utilização de qualquer material de osteossíntese (fios Kirschnner ou Steimann, placas ou parafusos), para fixação/estabilização da articulação devido ao grande risco de migração destes para o me-

a) b) c) d) e)

Complicações: Deformidades residuais. Dor. Infecção. Artrite pós-traumática. Migração de material de síntese, se utilizados, para o mediastino.

SUGESTÕES DE LEITURA: 1. Lenza M, Carvalho RL., Archeti Neto A, Carrera EF. Relação da veia jugular interna com a articulação esterno clavicular: estudo anatômico. Rev. Bras. de Ortop. 2006; 41 (8):336-40. 2. Carvalho RL, Archeti Neto N, Moraes MJS, Souza MAR, Carrera EF. Bases anatômicas para a ressecção da extremidade esternal da clavícula: estudo em cadáver. Rev. Bras. Ortop., 2007; 42(1/2):33-6. 3. Gordon IG, Wirth MA. Review article - Management of traumatic sternoclavicular joint injuries. J Am Acad Orthop Surg 2011;19(1):1-7. 4. Robinson CM, Jenkins PJ, Marklam PE, Beggs I. Review article - Disorders of the esterno clavicular joint. J Boin Joint Surg [Br] 2008; 90-B(6):685-96. 5. Garretson RB, Willins GR. Clínical evolution of injuries to the acromioclavicular and sternoclavicular joints. Clin Sports Med 2003; 22: 239-254. 65

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Luxação Traumática do Ombro José Carlos Souza Vilela Luiz Eduardo Moreira Teixeira Bruno Fluvio Alves da Silva

Introdução: Instabilidade do ombro é uma das patologias mais complexas e desafiantes que acometem o ombro devido à sua alta frequência e diversidade de apresentações. É também uma das mais antigas patologias do ombro, com relatos de avaliação e tratamentos na Grécia antiga, 2000 anos AC. Mesmo com avanços na compreensão da patofisiologia e das técnicas cirúrgicas, ainda hoje muitos aspectos do tratamento dessa doença são controversos e impõem desafios ao médico assistente.

quentemente acometida está entre 20 e 29 anos, sendo que em 46,8% dos casos os pacientes estão entre 15 e 29 anos. Em 48,3% dos casos, as luxações decorreram de práticas esportivas ou recreacionais. A etnia e o lado de acometimento não influenciaram a incidência. A probabilidade de recorrência apresenta uma associação estatisticamente significante com a idade, apresentando uma taxa de recorrência global de 26%, em pacientes com idade menor que 20 anos a taxa é de 64% e em pacientes com idade maior que 40 anos é de 6%. Não há associação significante com a forma de tratamento não operatório, como tipo e/ou período de imobilização e realização ou não de fisioterapia. Existe controvérsia com relação a prática de esporte e a incidência de recorrência.

Epidemiologia A articulação glenoumeral é uma das mais móveis do corpo, a contrapartida dessa grande mobilidade é a perda da estabilidade intrínseca. Portanto as luxações do ombro são as mais frequentes dentre as grandes articulações e respondem por aproximadamente 45% de todas as luxações, e dessas, 85% são luxações anteriores traumáticas. Nos EUA, a incidência de luxações do ombro é de 23,9/100.000 pessoas/ ano, 71,8% dos casos acometem o gênero masculino, e se estratificada por décadas, a faixa etária mais fre-

Anatomia e Biomecânica A articulação do ombro apresenta uma conformação tipo bola e soquete, a superfície articular do úmero é um terço de esfera, de diâmetro aproximado de 46mm, inclinação superior de 130o a 150o(ângulo cérvico diafisário) e uma retroversão média de 30o. A cavidade glenoidal, tem a forma de uma vírgula invertida com 66

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a parte superior mais estreita e a inferior mais larga, o diâmetro vertical é 35mm e o transverso é 25mm, e a glenoide apresenta uma retroversão média de 7,4 mm, grande parte da instabilidade do ombro é atribuída a essa pequena cobertura óssea da cabeça umeral pela glenoide, que corresponde a aproximadamente 30% da superfície articular umeral, de forma adicional o lábio glenoidal aumenta essa capacidade em 50%. A articulação glenoumeral é envolta por uma cápsula articular sinovial que apresenta três espessamentos que são os ligamentos glenoumerais, com importante papel na estabilização do ombro. O ligamento glenoumeral superior, presente em 97% dos casos, possui pequena participação na estabilidade global, sendo mais atuante quando o membro superior está na posição ao lado do corpo, pendente. O ligamento glenoumeral médio, o mais infrequente de todos, pode estar ausente em até 27% dos casos, apresenta importante papel estabilizador com o membro em semi abdução e nos casos de lesão da banda anterior do ligamento glenoumeral inferior. O ligamento glenoumeral inferior apresenta duas bandas, a anterior e a posterior, é o mais importante estabilizador do ombro, atuando principalmente quando o membro superior está em abdução e rotação externa. A função do ombro requer a integração harmônica das articula-

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ções esternoclaviculares, acromioclaviculares, glenoumerais e escapulotorácicas, além de 30 músculos. Fatores estáticos e dinâmicos interagem de forma complexa para manter a estabilidade do ombro. Esses fatores podem ser modificados pela idade, trauma, variações pessoais e função muscular. Estabilizadores do Ombro Fatores Estáticos

Fatores Dinâmicos

Congruência Articular

Manguito Rotador

Versão Articular (glenoidal e umeral)

Tendão do Bíceps

Adesão e Coesão Pressão negativa

Movimento Escápulo Torácico

Lábio Glenoidal Cápsula e Ligamentos

Classificação e Avaliação A instabilidade glenoumeral engloba um grande espectro de doenças, que podem ser classificadas de acordo com vários critérios: Etiologia: Traumática ou Atraumática Cronologia: Aguda, recorrente ou crônica Grau: subluxação ou luxação 67

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Direção: Anterior, posterior, inferior, bidirecional ou multidirecional Intenção: Involuntária ou Voluntária (posicional, muscular ou desordem psíquica) Nesse capítulo será abordada apenas a luxação traumática anterior.

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Figura 1. Aspecto Clínico do Ombro luxado

Avaliação História e exame físico cuidadosos são essenciais ao diagnóstico e tratamento da instabilidade do ombro. Nos casos de luxação aguda e não reduzidas a clínica e a radiografia demonstrarão o diagnóstico sem dificuldade, porém nos períodos entre as recorrências, o médico deve acreditar basicamente no exame físico e radiológico para o diagnóstico, a radiografia pode mostrar alterações sutis ou mesmo nenhuma alteração, nesses casos podem ser utilizadas a tomografia computadorizada ou ressonância magnética para demonstrar sinais indiretos da instabilidade. O exame sob anestesia e/ou a artroscopia diagnóstica são reservados para os casos atípicos e/ ou duvidosos.

Figura 2. Radiografia do Ombro em Perfil Axilar demonstrando Ombro Luxado

O paciente apresenta dor intensa, incapacitante e o membro superior ao lado do corpo em atitude de proteção. O contorno normal do ombro é perdido, o acrômio fica proeminente (sinal da dragona), e devido a incongruência articular, a movimentação do membro é limitada. Deve-se realizar exame neurológico e vascular pois estima-se lesão do nervo axilar em até 35% dos casos e nos pacientes idosos a lesão vascular pode ser mais frequente, nesse segmento da população também é mandatório a pesquisa de lesão do manguito rotador que pode ocorrer em até 42% da população.

Luxação Traumática Aguda A luxação traumática aguda representa a forma mais dramática da instabilidade do ombro. O mecanismo mais frequente envolve um trauma com o membro superior em abdução e rotação externa. 68

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Radiografias em AP Verdadeiro, Perfil escapular e Perfil Axilar devem ser solicitadas para confirmar a luxação, avaliação da sua direção e pesquisa de fraturas associadas (borda da glenoide, Hill-Sachs, tuberosidade maior). Após o estudo da luxação, devese proceder a redução o mais precocemente possível, preferencialmente na sala de emergência, sob sedação. Nos casos muito recentes, pode-se tentar a redução sem medicação. Há inúmeras técnicas de redução descritas, desde a técnica de Hipócrates, na qual se realizava a redução por tração longitudinal no membro superior e o fulcro do movimento é o calcanhar do médico assistente que deve ser colocado gentilmente na axila do paciente, a técnica de Stimson, na qual 5kg-7kg são atados ao punho do paciente, que deve ficar deitado em decúbito prono e o membro pendente, para a gravidade atuar em 10 min a 15 min, há manobras complexas como a de Milch que objetivam colocar a cabeça do úmero em contato com a glenoide. A técnica ideal é aquela com a qual o cirurgião está familiarizado e deve ser realizada de forma sutil para evitar lesões iatrogênicas, como fratura diafisária do úmero. Radiografias pós redução são necessárias para se comprovar a redução e avaliar eventuais lesões associadas. A maioria dos paciente que apresentam primoluxação traumática

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deve ser tratada de maneira não cirúrgica, que consiste em um período de imobilização, reabilitação fisioterápica e afastamento do esporte. Esse tratamento visa o reparo das lesões associadas para minimizar a probabilidade de recorrência. A posição e duração da imobilização é controversa na literatura, não há suporte científico que demonstre que a posição e duração da imobilização altere a taxa de recorrência. Itoi et al demonstraram que quando o ombro é imobilizado em rotação externa o ligamento roto fica mais próximo do seu local ideal para cicatrização, porém essa modalidade de tratamento não demonstrou superioridade clínica e Hovelius et al em seu estudo clássico demonstrou que a duração da imobilização não interfere no resultado clínico. O período de imobilização deve durar 2 a 3 semanas para resolução da dor. O programa de reabilitação deve reforçar os músculos do ombro e da escápula. O principal fator prognóstico para a recorrência é a idade, pacientes mais novos que 20 anos tem a taxa de recorrência de 80%-90%, entre 21 e 30 anos varia de 40% a 60%, entre 30 e 40 anos varia de 12% a 40% e acima de 40 anos é baixa, menor que 20%. O tratamento cirúrgico na luxação aguda tem indicação nos casos em que há uma fratura associada da glenoide com acometimento maior que 25% do seu diâmetro ântero-posterior, luxação irredutível pelos meios 69

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fechados e recentemente, apesar de muito controverso, tem sido indicado para atletas jovens de desempenho devido a grande probabilidade de recorrências. Essa última indicação obviamente apresenta taxas menores de recorrência mas impõe o risco de operar pessoas que eventualmente não necessitariam de estabilização cirúrgica e consequentes complicações cirúrgicas adicionais.

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Figuras 3A e 3B. Teste da Hiperabdução

O tratamento cirúrgico se divide em dois grandes grupos, o artroscópico e o aberto (padrão ouro), historicamente o tratamento aberto tem sido utilizado com bons resultados, porém com aspectos estéticos, movimento (limitação da rotação externa) e reabilitação menos satisfatórios. Entretanto, nas últimas duas décadas o tratamento artroscópico evoluiu do ponto de vista material e técnico atingindo resultados que se aproximaram do tratamento aberto, mas sua taxa de recorrência ainda é maior e também apresenta complicações. A artroscopia é uma ferramenta importante, ela permite a avaliação da anatomia normal e alterações patológicas “in situ”, propicia o diagnóstico de alterações sutis envolvidas na instabilidade. As três maiores vantagens dessa técnica são: capacidade de corrigir lesões em múltiplos quadrantes do ombro, sem incisões adicionais, reconhecer lesões que até anteriormente eram desconhecidas e preservar o subescapular, principalmente nos casos de revisões. Para

Luxação Anterior Recorrente O tratamento não operatório da instabilidade traumática do ombro envolve modificação da atividade esportiva, quando possível e o programa de reforço da musculatura estabilizadora do ombro e escápula. O uso de órteses restritivas, que limitam a abdução e rotação externa, são úteis para tais pacientes por diminuir o número de luxações, apesar de não interferir na história natural da doença. Apenas 16% dos casos de luxação traumática recorrente apresentam resolução com essa modalidade de tratamento. Os atletas que sofreram lesão no decorrer da temporada esportiva, devem ser submetidos ao tratamento não cirúrgico e frequentemente aguardam o final da temporada para o tratamento cirúrgico. A estabilização cirúrgica visa corrigir as estruturas insuficientes ou compensá-las, o planejamento cirúrgico deve ser orientado pela história, exame físico e radiologias detalhados. 70

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se obter o melhor resultado possível com essa técnica deve-se corroborar a história e exame físico com o inventário articular e correção das eventuais alterações patológicas: Bankart -avulsão cápsulo ligamentar ou óssea ligamentar do rebordo ântero-inferior da glenoide, Hill Sachs – Fratura por impacção da borda póstero-superior da cabeça umeral devido a pressão pelo rebordo glenoidal, Lesão ALPSA – o complexo ligamentar avulsionado cicatriza em posição medial, no colo da glenóide, e se torna incompetente, Lesão HAGL – O ligamento gleno-umeral inferior é avulsionado da cabeça umeral em vez da borda glenoidal. O reparo artroscópico é uma reprodução da técnica aberta através da via artroscópica. A modalidade mais utilizada de tratamento artroscópico é a técnica de Bankart, que é a reinserção do complexo cápsulo-ligamentar à borda da glenoide e fixação por meio de âncoras e fios inabsorvíveis, pode ser utilizada até nos casos em que há a avulsão de pequeno fragmento ósseo junto com o lábio glenoidal. Na técnica são realizados os portais posterior clássico para visualização e um ou dois portais anteriores, dependendo da experiência e habilidade do cirurgião. Segue-se o procedimento com a observação artroscópica do grau de translação do ombro através do teste “Load and Shift”, a 0o e 45o, depois pesquisa-se a presença do Sinal do “Engaging Hill Sachs”, identificação das lesões associadas

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do bíceps (SLAP), lesão de Bankart e da redundância capsular. Figura 4. Ressonância magnética demonstrando Defeito de Hill-Sachs

Figura 5. Ressonancia magnética demonstrando lesão de Bankart Óssea

Após a avaliação minuciosa da alteração anatômica envolvida com a instabilidade uma diversidade de procedimentos artroscópicos podem ser realizados de acordo com a necessidade: 1) Reparo da lesão 71

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de Bankart através de âncoras, para manipulação e fixação do lábio glenoidal, é importante mobilizar o complexo lábio-ligamento, tornar a borda da glenoide cruenta e fixar o complexo ligamentar, há autores que acreditam que o número mínimo de âncoras aceitáveis é três, porém isso depende da característica da lesão. Outro quesito polêmico na literatura é a posição de reinserção do lábio, há autores que preconizam a inserção em seu lugar anatômico, na transição entre a cartilagem e o osso, e outros que defendem a inserção um pouco mais lateral sobre a cartilagem articular, para além do retensionamento da estrutura cápsulo-ligamentar, o lábio cicatrizado exercer um efeito de bloqueio físico (bump), mas estudos que realizaram a revisão artroscópica, sem relato de recorrência, apenas com finalidade acadêmica, demonstraram que o lábio se tornou uma estrutura fina e que perdera essa propriedade, 2) Retensionamento Capsular, nos casos de hiperfrouxidão ligamentar, 3) Fechamento do Intervalo rotador, nos casos de insuficiência desse, quando o paciente apresenta rotação externa do membro ao lado do corpo > 85o, 4) Reparo da avulsão umeral do ligamento, nos casos de lesão tipo HAGL e 5) Preenchimento do defeito de Hill Sachs com partes moles (Remplissage), nos pacientes que apresentam o sinal de “Engaging”.

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Figura 6A e 6B. Lesão de Bankart Visão Artroscópica e Reparo da Lesão de Bankart

As contraindicações ao tratamento artroscópico são os pacientes que apresentam luxação voluntária, que não são cooperativos e glenóides com grande perdas ósseas. A artroscopia pode detectar e corrigir as lesões de partes moles decorrentes da instabilidade, pode compensar pequenas falhas ósseas por meio de retensionamento das partes moles, porém não as falhas estruturais moderadas e grandes (> 25%-30% do diâmetro ântero posterior da glenóide) e os defeitos de Hill Sachs que provocam “Engaging Sign”, que é o travamento da falha da cabeça umeral na glenóide, Wolf descreveu a técnica chamada de “Remplissage” que é o preenchimento da falha óssea de Hill Sachs com o tendão Infraespinal por via artroscópica. Mas pacientes que são atletas de desempenho e contato ou atividade com abdução e rotação externa do ombro são candidatos ao reparo aberto. O paciente deve usar uma tipoia por quatro a seis semanas, os movimentos passivos são iniciados na 72

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ISIS Score

Anamnese

Fatores Prognósticos 20 anos Competitivo Recreacional Contato ou Abdução e Rot Ext Outros

Pontos 2 0 2 0 1 0

Hiperfrouxidão Ombro

Presença de hiperfrouxidão Ausência de hiperfrouxidão

1 0

Hill-Sachs Rx em Ap

Visível em Rot Ext Não Visível

2 0

Perda do contorno da Glenóide Rx AP

Perda do Contorno Ausência de Perda

2 0

Idade Cirurgia Grau de desempenho esportivo

Estudo Radio

Exame

Tipo de Esporte

a falha do tratamento artroscópico, Boileau et al desenvolveram o Instability Severity Index Score (ISIS), que determina que pacientes com o resultado >6 devem ser submetidos ao tratamento cirúrgico aberto, como o bloqueio ósseo por exemplo.

segunda semana, a rotação externa é limitada à 30o por oito semanas, finalmente a retomada dos esportes de contato ocorre entre o quinto e sexto mês dependendo da clínica do paciente. Isis Score A recorrência da luxação é a complicação mais frequente da estabilização cirúrgica do ombro. Com a modernização dos materiais e aprimoramento da técnica os resultados da estabilização artroscópica tem se aproximado da técnica aberta (padrão ouro), porém ainda persiste uma taxa global de recorrência de aproximadamente 5% a 15% nos casos estabilizados por via artroscopica. Com o objetivo de avaliar pré operatoriamente os fatores de risco para

Estabilização aberta Os procedimentos abertos mais utilizados, são genericamente chamados de “bloqueio ósseo”, com várias técnicas descrita e seus respectivos epônimos, Latarjet, Bristow, Patte, etc. Elas diferem basicamente na posição em que é colocado o enxerto do processo coracoide, mas funcionam de forma muito semelhante. Patte descreveu a eficácia do procedimento pelo efeito do “triplo bloqueio” - Fixação estável com parafusos, 73

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Figuras 7 A, B, C e D. Imagem do Peroperatório, Radiografia em AP verdadeiro com o enxerto do coracóide consolidado e resultado clínico final

anterior, com ou sem hiperfrouxidão ligamentar e ombros dolorosos instáveis, com lesões anatômicas inerentes à instabilidade. As contra indicações são subluxação anterior em atletas de arremesso, sem lesão de Bankart e paciente que apresenta luxação voluntária. A taxa de recorrência em mãos experientes varia entre 1% e 5%. A consolidação do enxerto do processo coracoide é condição fundamental para se evitar as complicações, e as recomendações para que isso ocorra são: - Colocar o coracoide na posição “deitada” em vez da “em pé”, para ter melhor contato com a glenóide. - Usar uma broca 3.2mm tanto para o coracoide como para es-

abaixo da linha do equador da glenoide em uma posição justa articular. O enxerto não deve ficar intrarticular e nem mais que 5mm medial à superfície articular. - Preservação das fibras musculo tendinosas do terço inferior do músculo subescapular - Sutura da extremidade lateral do ligamento córaco-acromial à cápsula articular. Um fator adicional pelo qual a cirurgia de bloqueio é eficaz é o efeito de rede que o tendão conjunto exerce na área de projeção onde a cabeça umeral se insinuaria por ocasião da luxação. As indicações são todos os casos de luxação traumática recorrente 74

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cápula e usar o parafuso maleolar para promover a compressão interfragmentar. - Usar dois parafusos e sempre bicorticais - Não usar arruela para evitar impacto com a cabeça umeral - NUNCA, aceitar a sobreposição do enxerto na superfície articular, para evitar a rápida doença degenerativa provocada por tal situação, idealmente o enxerto deve ficar entre 1mm e 2mm medial a glenoide.

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criaram um algorítimo para sistematizar a pesquisa pela causa da falha. Algoritimo para Determinação da Causa da Falha da Estabilização Cirúrgica Manguito Rotador

Estrutural Instabilidade

Instabilidade Glenoumeral: Falhas no Tratamento e Complicações Com o aprimoramento da compreensão das lesões associadas à luxação recidivante do ombro e aprimoramento das técnicas cirúrgicas, houve um aumento na taxa de sucesso do tratamento cirúrgico, porém ainda persiste uma taxa global de falha (recorrência) de aproximadamente 0% - 15%. Uma avaliação meticulosa da história, exame físico e exames de imagens é essencial para se determinar a causa da falha e planejar o tratamento mais adequado. Geralmente, as causas de falha da estabilização cirúrgica são cirurgião dependente (diagnóstico incorreto ou técnica inadequada e insuficiente) ou paciente-dependente (não cooperação ou tecidos de qualidade inadequada). Stehle e Gohlke

Complexo Lábio-CapsulaLigamento Congruência Óssea Controle Muscular

Dinâmica

Dor Reflexa Paresia Trauma

Aguda Infecção Neurogênica Articular Dor

Subacromial Crônica

Inflamatória Síndrome Dolorosa Complexa Regional Manguito Rotador

Rigidez

Complexo Capsulo-ligamentar Inflamatória/Artrofibrose

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queio ósseo, porém ambas as situações são relativamente novas, tecnicamente exigentes e em nossas mãos os resultados não são satisfatórios. As complicações adicionais do tratamento da instabilidade são: - Lesão cartilaginosa, osteoartrose secundária à instabilidade e artropatia pós capsulorrafia (55-50%) - Artrofibrose (2%-10%) - Lesão de nervo periférico ou plexo braquial (15-5%) - Infecção (0,01%-0,5%) - Insuficiência do manguito rotador, especialmente o subescapular, após reparo aberto (0,01%-5%)

Os reparos inadequados do lábio podem ser tratados por revisão artroscópica e reinserção do lábio. Excetuando-se a lesão tipo HAGL, os problemas decorrentes de partes moles podem ser conduzidos por artroscopia. Por outro lado, lesões ósseas maiores são melhor manejadas por procedimentos abertos, a maioria das revisões são devidas à lesões ósseas anteriores da glenoide ou má qualidade tecidual devido a múltiplas cirurgias, em ambos os casos, as cirurgias de bloqueio ósseo podem ser utilizadas com sucesso. Há na literatura relatos de tratamento artroscópico para o reparo da lesão tipo HAGL e cirurgias de blo-

Sugestões de Leitura 1. Epidemiology of shoulder dislocations presenting to emergency departments in the United States.Zacchilli MA, Owens BD. J Bone Joint Surg Am. 2010 Mar;92(3):542-9 2. Hovelius L. Incidence of shoulder dislocation in Sweden. Clin Orthop 1982;166:127-31 3. Predisposing factors for recurrent shoulder dislocation after arthroscopic treatment. Porcellini G, Campi F, Pegreffi F, Castagna A, Paladini P. J Bone Joint Surg Am. 2009 Nov;91(11):2537-42 4. Predicting recurrence after primary anterior shoulder dislocation. Kralinger FS, Golser K, Wischatta R, Wambacher M, Sperner G. Am J Sports Med. 2002 Jan-Feb;30(1):116-20 5. Hill H.A, Sachs M.D. The grooved defect of the humeral head. A frequently unrecognized complication of dislocation of the shoulder joint. Radiolology 35: 690, 1940. 6. Hovelius L, B. Lind, J. Thorling. Non Operative treatment of primary anterior shoulder dislocation in patients forty years of age or younger.A prospective twenty-five year follow-up. J bone joint surg. 2008;90A:945-52 7. Walch G., Boileau P. Latarjet-Bristow procedure for recurrent anterior instability. Techniques in Shoulder and Elbow Surgery 2000; 1: 256-261 8. Gagey O.J., Bonfait H., Gillot C., Mazas F. Anatomie Fonctionelle et Mécanique de l’élévation du bras. Rev Chir Orthop 74: 209, 1988 9. Burkhart S.S., De Beer J. F., Traumatic glenohumeral bone defects and their relationship to failure of arthroscopic Bankart repairs: significance of the inverted pear glenoid and the humeral engaging Hill Sachs lesion. Arthroscopic. 2000 oct; 16(7):677-94 10. Itoi E., Lee S. B., Berglund L.J., Berge L.L., An K.N. The effect of a glenoid defect on anteroinferior stability of the shoulder after Bankart repair: a cadaveric study. J Bone Joint Surg Am 2000; 82: 35-46 76

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11. Stehle J., Gohlke F. Complication management after unsuccessful operative shoulder stabilization. Orthopade 2009; 38(1): 75-8, 80-2 12. Bankart A.S.B. The Patology and treatment of recurrent dislocation of the shoulder joint. Br J Surg 23, 1938. 13. Fabbriciani C., Milano G., Demontis A. Et al. Arthroscopic versus open treatment of bankart lesiono f the shoulder: A propective randomized study. Arthroscopy 2004, 20(5), 456-462 14. Robinson CM, Jenkins PJ, White TO, Ker A, Will E. Primary arthroscopic stabilization for a firsttime anterior dislocation of the shoulder: A randomized, double-blind trial. J Bone Joint Surg Am. 2008;90: 708-721

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Fraturas diafisárias do Úmero Antonio Carlos Arnone

1. INTRODUÇÃO O úmero apresenta como característica importante o farto envoltório muscular, promovendo boas condições de reparação. A massa muscular permite também boa acomodação de possíveis desvios aceitos no tratamento conservador. Por não se tratar de membro de carga as discrepâncias, desde que não excessivas são bem toleradas, sem prejuízo funcional. Os métodos de tratamento vão desde os consagrados tratamentos conservadores, como a pinça de confeiteiro, órteses funcionais passando por vários métodos de fixação interna como placas, hastes intramedulares, fixadores externos, cada qual com suas indicações.

para plano terapêutico. Na avaliação distal é imperioso a avaliação da função do nervo radial, pela sua proximidade com o úmero. O exame de escolha é a radiografia simples em ântero-posterior e perfil. Sempre devemos ter a avaliação da articulação proximal e distal, ou seja, ombro e cotovelo para afastar fraturas associadas ou luxações. As radiografias oblíquas e a tomografia, podem ter alguma indicação se existir extensão para as articulações adjacentes. 3. CLASSIFICAÇÃO As fraturas diafisárias são inicialmente classificadas em fechadas e expostas. O grupo AO dividiu as fraturas num sistema alfanumérico que consegue classificar as fraturas com boa reprodutibilidade inter observadores facilitando os estudos e padronização de condutas. As fraturas diafisárias do úmero são subdivididas em três tipos de acordo com traço de fratura: • A. Traço simples onde existe apenas uma linha de fratura, com contato cortical de mais de 90% após a redução • B. Existência de três ou mais fragmentos, onde os dois maiores têm contato após a

2. DIAGNÓSTICO A avaliação clínica do membro afetado se inicia com a inspeção, onde observamos uma atitude de proteção do membro acometido, segurando o mesmo contra o corpo e suspendendo com a outra mão para não ficar pendente e doloroso. A análise do tegumento em busca de escoriações, lacerações, status neurovascular compõem juntamente com exames radiológicos e história clínica a personalidade da fratura, para permitir o raciocínio completo 78

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• A2. Oblíqua • A3. Transversa

redução, determinando um fragmento em cunha variável • C. Existência de três ou mais fragmentos, onde os dois maiores não têm contato após a redução

B) No grupo B ou em cunha temos: • B1. Cunha espiral • B2. Cunha em flexão • B3. Cunha fragmentada

Cada tipo é subdividido em três grupos em ordem crescente de gravidade.

C) No grupo C ou complexa temos: • C1. Complexa espiral • C2. Complexa segmentar • C3. Complexa irregular

A) No grupo A ou de traço simples temos a subdivisão em: • A1. Espiral

Figura 2. Classificação AO completa da fratura diafisária do úmero

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4. BIOMECÂNICA Temos basicamente três tipos de mecanismos de trauma divididos em: • Força direta • Força indireta • Ação muscular As fraturas causadas pela ação direta tem como característica traços de fratura que são transversos, podendo apresentar associação com cunhas em flexão ou cunhas fragmentadas de padrão irregular. Nos casos com mecanismo de força indireta, o ponto de aplicação da força normalmente é distal o que leva a um padrão de fratura em espiral ou cunhas espirais simples ou complexas. O mesmo ocorre nas fraturas causadas por ação muscular. Os ferimentos por arma de fogo podem variar em gravidade de acordo com a energia cinética do projétil, causando fraturas em geral fragmentadas irregulares com maior ou menor grau de lesão de partes moles de acordo com a área de cavitação do projétil que é determinado pela velocidade da munição. O desvio dos fragmentos é determinado pela posição do traço da fratura em relação a ação de três músculos chave, que são o manguito rotador, o peitoral maior e o deltoide. Se a fratura ocorrer proximal ao peitoral maior teremos um fragmento proximal abduzido e rodado externo pela ação do manguito rotador. No caso de estar distal ao peitoral maior e proximal ao deltoide teremos uma adução do fragmento proximal pela

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ação do peitoral maior. Quando o foco fica distal a inserção do deltoide temos uma grande abdução do fragmento proximal pela ação do mesmo. 5. TRATAMENTO As opções de tratamento, como para qualquer fratura vão desde o tratamento conservador até o cirúrgico. Classicamente, como defendido por Sarmiento (1), o tratamento conservador atinge uma excelente taxa de consolidação, chegando até 95% de bons a excelentes resultados funcionais. Os critérios de aceitação no tratamento conservador são: • Angulação anterior menor que 20 graus • Varo menor que 30 graus • Rotação menor que 40 graus • Nenhuma diástase Os métodos de tratamento conservador são baseados no alinhamento pela ação da gravidade (gesso pendente, pinça de confeiteiro, órtese funcional de Sarmiento) ou na fixação contra o tronco (gesso toracobraquial, enfaixamento ao tronco). O padrão ouro para o tratamento conservador é composto por um curto período de imobilização gessada (pinça de confeiteiro ou gesso pendente) por 1 a 2 semanas seguido por uso da órtese funcional de Sarmiento (1) até a consolidação, o que elimina o problema do gesso toracobraquial ou mesmo do gesso pendente, que é a imobilização do cotovelo. 80

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Outro método de tratamento conservador é o gesso pendende onde um aparelho gessado axilo palmar leve é confeccionado até 1 cm proximal ao foco da fratura, com inclusão de três polias entre o terço médio e distal do antebraço, sendo uma dorsal, uma volar e uma central. A tipóia ficaria presa nestas polias de forma que quando fixada no dorso corrigimos o varo, quando volar o valgo e alongando a tipóia o recurvatum. Com relação ao tratamento cirúrgico temos segundo o Grupo AO indicações absolutas e relativas para fixação cirúrgica:

INDICAÇÕES ABSOLUTAS

• FRATURAS EXPOSTAS • OMBRO OU COTOVELO FLUTUANTE • LESÃO VASCULAR • FRATURAS BILATERAIS • LESÃO SECUNDÁRIA DO NERVO RADIAL

INDICAÇÕES RELATIVAS

• FRATURAS SEGMENTARES • PERDA DA REDUÇÃO NO TRATAMENTO CONSERVADOR • FRATURA TRANSVERSA • OBESIDADE • FRATURA PATOLÓGICA • PSEUDOARTROSE • DÉFCIT NEUROLÓGICO, PARKINSON • LESÃO DE PLEXO BRAQUIAL • LESÃO PRIMÁRIA DE NERVO RADIAL

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Quando nos deparamos com uma fratura de traço simples (espiral A1, oblíqua curta A2 e transversa A3), o princípio da estabilização absoluta é o preferido e o material de escolha é a placa DCP de 4.5 mm estreita com oito corticais proximais e oito distais. No caso de osso osteoporótico podemos alcançar a estabilidade absoluta através das placas LCP utilizando a compressão pela placa na parte deslizante do orifício e complementando o restante com parafusos bloqueados para melhor estabilidade em osso de má qualidade. Além da placa outros autores defendem a haste intramedular a foco fechado. Bhandari (2) em uma Metanálise realizada em 2006 comparou a fixação com placa com a fixação com haste, demonstrando que as duas técnicas são eficientes porém com uma tendência maior a reoperações e complicações referentes a dor no ponto de entrada no ombro, no grupo da fixação intramedular. Nos casos de fraturas com alguma cominuição (B1, B2, B3, C1, C2 e C3), o princípio da estabilidade relativa, por meio de placa ponte ou haste intramedular, alcançam boa estabilidade com mínima agressão facilitando e orientando o processo de consolidação. A fixação com placa ponte (5) utiliza placas 4.5 DCP ou LCP estreitas com tamanhos que muitas vezes fogem do padrão disponível normalmente nas caixas, portanto um bom planejamento é necessário para evitar

*Tabela retirada do livro “Princípios AO do Tratamento de Fraturas“

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cular como para a fixação, o que é muito raro. Quando realizamos a fixação com placa ponte devemos atentar para as janelas de segurança, assim como quando fixamos externamente uma fratura do úmero. Tais janelas nada mais são do que a porção proximal e a distal da via de acesso ântero-lateral, com máxima atenção na porção distal com o nervo radial.

surpresas no ato operatório. Trabalhos recentes mostram que apenas 4 corticais proximais e 4 distais são suficientes em osso de boa qualidade conforme demonstrado por Belangero (3). 6. ANATOMIA CIRÚRGICA As fraturas do terço proximal e médio podem ser acessadas e estabilizadas pela via ântero-lateral com identificação do nervo radial em sua porção distal, com paciente em decúbito dorsal. Já as fraturas do terço distal são melhor acessadas com a via posterior de Henry com o paciente em decúbito ventral ou lateral. Importante é a identificação do nervo radial na sua extensão proximal. Nos casos de lesão vascular associada podemos utilizar a via medial tanto para exploração e raparo vas-

7. COMPLICAÇÕES Dentre as complicações podemos citar: • Não consolidação • Paralisia do nervo radial • Rigidez articular das articulações adjacentes • Lesão iatrogênica do nervo radial • Infecção pós operatória • Consolidação viciosa

SUGESTÕES DE LEITURA 1. “Functional Bracing for the Treatment of Fractures of the Humeral Diaphysis.” Sarmiento, M. D., J. B. Zaganski, M. D., G. A. Zych, D. O., L. C. Latta, PhD. ,C. A. Copps, M. D. J. Boné Joint Surg. AM. 2000; 82:478. 2. “Compression plating versus intramedullary nailing of humeral shaft fractures – a Meta-analysis. Bhandari M, Devereaux PJ, MCKee MD, Schemitsch EH. Acta Orthop. 2006. Apr; 77(2):279-84 3. “Bridging plate osteosynthesis of humeral shaft fractures.” Livani B., Belangero. Injury, 2004: (35): 587-95 4. “Plate fixation or intramedulary fixation of humeral shaft fractures. An updated meta-analysis.” David J. Heineman, Rudolf Poolman, Sean E. Nork, Dees-Jan Ponsen, Mohit Bhandari. Acta Orthop. 2010 Apr; 81 (2):216-223 5. “Minimally invasive plate osteosynthesis. (MIPO) of the humeral shaft fracture: Is it possible? A cadaveric study and priliminary report.” Apivatthakakul. T; Arpornchayanon. O; Bavornratanavech S. Injury. 2005 Apr; 36(4): 530-8 6. AO Principles of Fracture Manegement, 2nd Edition Thomas P. Ruedi, Richard E. Buckley, Christopher G. Moran 7. Rockwood and Green’s Francures in Adults, 7th Edition. Bucholz, Robert W., Heckman, James D., Court-Brown, Charles M., Tornetta, Paul 8. Vias de Acesso em Cirurgia Ortopédica. Segunda edição. Hoppenfeld, Stanley 82

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Fraturas da extremidade distal do úmero Marcio Eduardo de Melo Viveiros

Epidemiologia As fraturas do úmero distal correspondem a 30% das fraturas do cotovelo nos adultos e de 2 a 6% de todas as fraturas. Apesar de não terem uma grande frequência, são responsáveis por graves seqüelas que levam a importantes limitações do membro superior. Têm incidência maior em jovens do sexo masculino e em mulheres nas idades mais avançadas. O prognóstico é pior quanto maior a fragmentação óssea, lesões associadas, fraturas expostas, sínteses instáveis e imobilizações prolongadas.

Classificação Existem várias classificações para as fratura do úmero distal, porém a classificação da AO parece reunir os tipos mais comuns, bem como dar o princípio do tratamento e seu prognóstico. (figura 1) Diagnóstico Lembrar que antes do diagnóstico radiológico, uma história clínica e das lesões associadas se faz necessário. Devemos pesquisar o mecanismo da fratura para estabelecer a quantidade de energia do trauma, a fragmentação óssea e as lesões de partes moles. Pacientes com traumatismos cranianos, demência senil, alcoolismo e dependentes de drogas ilícitas podem levar a um pior prognóstico dessas lesões, por não serem cooperativos no pós-operatório. As lesões neurovasculares, em sua maioria, são alterações transitórias (neuropraxias- sejam por tração, compressão ou contusão). O exame neurológico é indispensável. Devemos pedir para o paciente realizar a flexão, extensão do punho e dos dedos e testar a sensibilidade das pontas dos mesmos. Os pulsos periféricos devem ser sempre palpados. Lembrando que, pulsos palpáveis não eliminam a chance de lesões da arté-

Figura 1.

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ria braquial. Por isso, no exame clínico uma dor muito intensa e a incapacidade de extensão dos dedos ativa ou passiva podem sugerir síndrome compartimental.

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tritivas. A outra posição é o decúbito lateral. No início da cirurgia, recomendase a utilização de um garrote estéril principalmente para a dissecção cuidadosa do nervo ulnar. Nos casos em que a fratura estender para diáfise ou em braços curtos deve ser retirado após a dissecção do mesmo. É importante lembrar que não devemos utilizar o garrote por um período maior que 90 minutos.

Exames de imagem Radiografias simples com boa qualidade nas incidências anteroposterior (AP), lateral (perfil) e, nos casos das fraturas articulares, como do capítulo e da tróclea podem exigir incidências obliquas. A realização de radiografias com tração suave (com sedação ou anestesia) é útil em casos de fragmentação grave e podem ajudar no planejamento cirúrgico. A tomografia computadorizada com cortes sagital, coronal e principalmente com reconstrução 3D tem fornecido informações detalhadas das fraturas, principalmente nas mais fragmentadas.

Via de acesso A via posterior mediana é utilizada nas fraturas do úmero distal tipos A2, A3 e todos os tipos C, realiza-se um desvio na região do olécrano para medial ou lateral conforme a necessidade da fratura. Esta via é bastante versátil e segura, pois evita os grandes vasos e nervos anteriores e permite um acesso amplo ao cotovelo. O nervo ulnar deve ser cuidadosamente dissecado e mobilizado. As fraturas extra-articulares (A2 e A3) podem ser reparadas por um acesso com elevação do tríceps, como a via de Allonso-Llamas, na qual a inserção do tríceps é preservada e o músculo tríceps é elevado nas suas porções lateral e medial. Nas fraturas articulares, a exposição do úmero deve ser realizada por meio de uma osteotomia do olérano. Pode ser do tipo transversa, que é mais instável, ou uma osteotomia do tipo chevron com vértice distal. Esta é a melhor, realizada com serra oscilante e completada com osteótomo, fazendo

Tratamento O tratamento das fraturas articulares do úmero distal no adulto visa restabelecer a congruência articular, manter a estabilidade dos fragmentos e mobilizar precocemente o cotovelo para evitar sua rigidez. Nas fraturas articulares completas (tipo C) dois decúbitos são possíveis. O decúbito ventral facilita a exposição da fratura, sua redução e não há necessidade de um auxiliar para segurar o braço, mas pode ser contraindicada em pacientes obesos, idosos ou com alterações pulmonares res84

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uma fratura do osso subcondral, que facilita a redução dos fragmentos.

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póstero-lateral é usada uma placa DCP de 3,5mm e na região medial pode-se usar uma placa de reconstrução que tem uma maior facilidade de moldar, ou uma LC-DCP biomecanicamente mais forte. As placas tubulares não devem ser utilizadas. Várias placas pré-moldadas para úmero distal foram lançadas no mercado. As melhores são aquelas com parafusos bloqueados que fornecem estabilidade angular a estas placas. São úteis nas fraturas baixas, com grave cominuição metafisária e/ou diafisária ou em ossos osteoporóticos.

Redução da fraturas Duas técnicas são possíveis. Uma é a tradicional, que realiza a osteossíntese com parafuso dos fragmentos articulares, e após, a fixação com placas da porção articular com as colunas lateral e medial do úmero distal. Esta abordagem é muito útil nas fraturas articulares simples ou com pouca fragmentação. Nas fraturas muito fragmentadas e nas fraturas do tipo λ, onde uma coluna é fraturada em um nível bem mais baixo que o outro, a alternativa é fixação provisória com fios de Kirschner dos fragmentos à diáfise. E, então, realiza-se a osteossíntese com placas. Lembrar que a fixação provisória não deve interferir com a colocação das placas.

Tratamento cirúrgico O objetivo do tratamento cirúrgico é a fixação estável para a mobilização precoce do cotovelo, visando evitar a rigidez articular. Assim, estas fraturas requerem estabilização absoluta. A técnica de fixação destas fraturas segue os conceitos da AO, onde devemos ter pelo menos 2 ou de preferência 3 parafusos acima e abaixo da fratura. As placas ortogonais formam um ângulo reto entre elas, o que confere uma maior estabilidade ao sistema. A placa póstero-lateral funciona como banda de tensão quando o cotovelo é fletido. Ela é moldada de acordo com o osso e fixada provisoriamente. Neste momento, se corrige a rotação da superfície articular e fixa-se a placa medial; após isso, a placa lateral é fixada definitivamente. Um longo parafuso medial pode ser utilizado para fixar a superfície ar-

Material de síntese 1. Fraturas tipo A1 (epicôndilos lateral e medial ) podem ser utilizados parafusos 3,5 e 4,0 mm. 2. Fraturas tipo B – para as fraturas isoladas das colunas lateral ou medial, uma placa de reconstrução 3,5mm moldada ou somente parafusos 3,5 e 4,0 mm. Nas fraturas do capítulo ou da tróclea são preferíveis os parafusos tipo Herbert ou mini fragmentos. 3. Fraturas A2 e A3 e as tipo C – são estabilizadas com a utilização de placas 3,5mm colocadas em posição ortogonal; na região 85

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e assistida. Os exercícios contra resistência são iniciados com a consolidação radiológica, que se dá por volta de seis semanas, podendo este tempo variar. A posição da imobilização ainda é motivo de controvérsia. Há autores que preferem imobilizar o cotovelo em extensão com uma órtese noturna devido a dificuldade de se ganhar este movimento. Mas, normalmente, utilizamos a imobilização na posição funcional, com o cotovelo em noventa graus de flexão. A tala deve ser retirada o mais precoce possível, mas nos casos em que a fixação foi insuficiente, devido à complexidade da fratura ou à má qualidade óssea, a mobilização do cotovelo pode ser retardada, pois o manuseio posterior da rigidez é preferível à perda da fixação.

ticular de um lado ao outro, mas na presença de cominuição articular ou de uma falha articular central, este parafuso não pode fazer tração, pois levará a um estreitamento da tróclea, gerando uma incongruência articular. Nos casos de fragmentação articular, pode ser necessário o uso de enxerto para região central. Uma opção é a ponta do olécrano ou, se for necessário uma porção maior, deve-se retirar osso da região doadora do ilíaco. Quando utilizamos as placas bloqueadas (LCP), devemos utilizar a técnica de redução convencional. Estas já vêm moldadas quase que anatomicamente, porém se mal adaptadas ficam proeminentes nas partes moles, levando a dor durante a mobilização do cotovelo, e interferindo na reabilitação. Pós-operatório A mobilização precoce é o objetivo do tratamento. A reabilitação deve ser iniciada o mais precoce possível, com procedimentos para diminuição da dor e do edema e a mobilização gentil do cotovelo, ativa

Complicações As complicações são a rigidez articular, ossificação heterotópica, lesões do nervo ulnar (geralmente transitória) e, mais raramente, a pseudartrose, falhas dos implantes e a infecção.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Benegas E et al. Tratamento cirurgico das fraturas intercondileanas do úmero com osteossíntese estável e mobilização precoce. Rev Bras Ortop 2000; 35: 352-357. 2. Jupiter JB. Complex fractures of distal part of humerus and associated complications. J Bone Surg [Am] 1994; 76: 1252-1263. 3. Holdsworth BJ. Humerus: distal. In AO principles of fratures management. New York: Thiene, 2000, p. 307-320. 4. Holdsworth BJ et al. Fractures of the adults distal humerus. Elbow function after internal fixation. J Bone Joint Surg [Br] 1990; 72(3): 362-365. 5. Matsumoto MH et al. Fraturas do capítulo umeral estudo prospectivo de dez casos. Rev Bras Ortop 1997; 32: 683-690. 86

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Fraturas do olécrano Eduardo Hosken Pombo Jair Simmer Filho

Anatomia: O processo do olécrano se encontra subcutâneo na região posterior do cotovelo, estando mais vulnerável ao trauma direto. Junto com a porção proximal do processo coronóide, o olécrano forma a incisura sigmoide maior da ulna, permitindo movimento de flexo-extensão e conferindo estabilidade à articulação do cotovelo. O centro de ossificação do olécrano surge aos 10 anos e geralmente funde-se ao restante da ulna por volta dos 16 anos (pode persistir na idade adulta, geralmente bilateral e com padrão familiar). Posteriormente o tendão do tríceps se insere no olécrano e sua fáscia se estende medial e lateralmente cobrindo a cápsula articular, inserindo-se na fáscia profunda do antebraço e no periósteo do olécrano e ulna proximal. Na região póstero-medial, o nervo ulnar passa posteriormente ao epicôndilo medial para entrar na superfície volar do antebraço entre as duas cabeças do músculo flexor ulnar do carpo.

cotovelo em flexão ou golpe direto no olécrano, muitas vezes resultando em fraturas multifragmentadas. -- Trauma indireto: queda sobre a mão estendida com o cotovelo em flexão, acompanhado por forte contração do tríceps, podendo resultar em fratura transversa ou oblíqua. -- Trauma direto e indireto combinados. A fratura transversa ou oblíqua ocorre através da incisura semilunar e a quantidade de diástase entre os fragmentos se deve à força de tração do músculo tríceps. O desvio limitado destes fragmentos se deve a possível integridade da aponeurose tricipital e periósteo do olécrano. Em traumas mais violentos, fraturas-luxações podem ocorrer com desvio posterior do olécrano e anterior da ulna. Sinais e sintomas: -- Dor e aumento de volume local. -- Derrame articular (fratura intraarticular). -- Movimento doloroso e limitado. -- Incapacidade de extensão

Mecanismo de trauma: A fratura pode ocorrer de três formas: -- Trauma direto: queda sobre o 87

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ativa contra a gravidade, principalmente nas fraturas com desvio, indica perda da função do mecanismo extensor do cotovelo. -- Sintomas e sinais neurológicos relacionados ao nervo ulnar podem estar presentes.

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rior do cotovelo, sendo que outras fraturas no úmero ou antebraço podem estar associadas). II.D - fraturas-luxações (traço de fratura que se estende próximo à extremidade do processo coronóide, gerando instabilidade do cotovelo, geralmente com desvio anterior).

Avaliação radiográfica: O exame radiográfico bem realizado em posições ântero-posterior e perfil verdadeiro do cotovelo, normalmente são suficientes para o diagnóstico e planejamento de conduta.

- Classificação AO: Fratura 21-A1.1 – fratura extraarticular (fig.1)

Classificação: - Colton em 1973 dividiu as fraturas do olécrano em:

Figura 1

- Tipo I. Fraturas sem desvio (desvio menor que 2 mm e com mecanismo extensor funcionando contra gravidade sem provocar maior desvio da fratura). - Tipo II. Fraturas com desvio. II.A - fraturas por avulsão (pequeno fragmento proximal separado da ulna por traço de fratura transverso, sendo mais comum em idosos). II.B - fraturas oblíquas ou transversas (traço de fratura de articular proximal para dorsal e distal, podendo ocorrer em mais de um plano). II.C - fraturas multifragmentadas (geralmente por traumas diretos na região poste-

Fraturas 21- B1 (fraturas articulares isoladas da ulna proximal acometendo o olécrano ou coracóide). 21-B1.1- fratura articular unifocal (fig.2). 21-B1.2- fratura articular bifocal simples (fig.3). 21-B1.3- fratura bifocal muiltifragmentar (fig.4). 88

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Contra-indicações: - lesões extensas de partes moles.

Figuras 2, 3 e 4

Desvantagens: - risco de rigidez de cotovelo, desvio da fratura, atrofia muscular, úlceras de pressão e compressão nervosa. - Cirúrgico : Indicações: - fraturas desviadas com perda do mecanismo extensor. Contra-indicações: - ausência de condições clínicas para cirurgia. Vantagens: - redução anatômica e mobilização precoce. Desvantagens: - risco de irritação da pele pelo implante, de infecção e complicações de partes moles.

- Classificação de Morrey (Mayo): - Tipo I. Fraturas sem desvio (com traço simples ou multifragmentar)- prognóstico exelente. - Tipo II. Fraturas desviadas, sem luxação- 85%, e com bom prognóstico. - II A: traço simples - II B: multifragmentada - Tipo III. Fraturas com instabilidade articular- prognóstico mais reservado. - IIIA: traço simples - III B: multifragmentada - Tratamento: - Não operatório : tala ou gesso axilo-palmar com o cotovelo em 90 graus de flexão por 3 semanas.

Posicionamento e via de acesso: A abordagem cirúrgica é realizada por uma via de acesso posterior para o cotovelo, estando o paciente em decúbito dorsal, ventral ou lateral, de acordo com a preferência do cirurgião. Atenção deve ser tomada com relação ao nervo ulnar.

Indicações: - fraturas estáveis, sem desvio ou minimamente desviadas. - mecanismo extensor funcional. - risco cirúrgico proibitivo e/ou extrema baixa demanda.

Opções de fixação: - Fixação externa transarticular: situações de controle do dano em pacientes politraumatizados e em pacientes com lesões extensas de partes moles e/ou 89

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perdas ósseas. Não deverá ser utilizado como tratamento definitivo. - Fios com banda de tensão (fig.5): fraturas com traço transverso simples. Contra-indicado em fraturas oblíquas e multifragmentadas. Tem como vantagens a compressão dinâmica da fratura, fácil execução e baixo custo. Tem como desvantagens: risco de pino metálico intra-articular, quebras de implante, irritação de pele e fragmentação óssea em pacientes osteoporóticos.

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Figura 6

- Placa em ponte (fig.7): em fraturas multifragmentadas, sendo contra-indicado em fraturas de traço simples. Podem ocorrer complicações como redução articular insatisfatória e soltura do pequeno fragmento proximal, que são inerentes à dificuldade técnica relacionada à gravidade da fratura.

Figura 5

Figura 7

- Parafuso de tração (fig.6): fraturas oblíquas, sendo contra-indicado em fraturas multifragmentadas e com traço transverso simples. A utilização do parafuso de tração através de uma placa de compressão, confere maior estabilidade à osteossíntese.

OBS: eventualmente retirada de fragmentos inviáveis (principalmente articulares) pode ser necessário, mas tendo o cuidado de não encurtar o olécrano, o que causaria perda do arco de movimento. Complicações: Na maioria das vezes estão relacionadas à gravidade do trauma e/ou 90

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lesões associadas, e podem ser reduzidas pela boa indicação de tratamento e boa técnica cirúrgica, quando esta for necessária. - Perda no arco de movimentos: mais frequente nas fraturasluxações. - Neuropraxia do ulnar.

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- Artrite pós-traumática (20% a 30%), mas estando relacionado(a) com a gravidade do trauma. - Instabilidade. - Pseudartrose. - Irritação de partes moles pelos implantes.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Cabanela ME e Morrey BF. Fractures of the Olecranon. In:Morrey. The Elbow and its Disorders. Philadelphia: Saunders; 2000. p. 365-379. 2. AO TRAUMA (www.aotrauma.org) 3. Hotchkiss RN e Green DP. Fraturas e Luxações do Cotovelo. In: Fraturas em Adultos. São Paulo: Manole; 1993. p. 783-793. 4. Mezera K e Hotchkiss RN. Fraturas e Luxações do Cotovelo. In: Fraturas em Adultos. Barueri: Manole; 2006. p. 934-939. Obs: figuras obtidas à partir do AO Trauma. 91

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Luxação do cotovelo / fratura da cabeça do rádio Mauro Gracitelli

Anatomia O cotovelo é uma articulação estável devido à sua estrutura óssea. A estabilidade do cotovelo é reforçada pela estrutura cápsulo-ligamentar. Além dos ligamentos colaterais, a cápsula anterior e as estruturas músculo-tendíneas também apresentam grande importância. O ligamento colateral lateral (LCL) se origina no epicôndilo lateral. Essa região representa o centro de rotação do cotovelo. O ligamento colateral medial (LCM) se origina no epicôndilo medial. A banda anterior do LCM se insere na base do processo coronoide. O músculo braquial apresenta uma inserção larga que se estende além da ponta do coronoide. Com isso, mesmo em fraturas do coronoide, uma parte da inserção do braqual permanece intacta. A cápsula anterior se insere alguns milímetros além da ponta do coronoide e, mesmo nas pequenas fraturas do mesmo, a cápsula anterior pode estar inserida nesse fragmento.

rádio no capítulo. Isso pode ocorrer com um trauma axial isolado, com a luxação posterior do cotovelo (póstero-lateral rotatória) ou nas fraturas de Monteggia. As luxações do cotovelo seguem em dois principais padrões: Luxação póstero-lateral rotatória No tipo mais comum de luxação do cotovelo, o mecanismo de trauma decorre de queda com a mão espalmada, com um estresse em valgo, compressão axial e força em rotação póstero-lateral. As lesões cápsulo-ligamentares se iniciam na região lateral e progridem para a região medial, através de um mecanismo chamado de “rotatório póstero-lateral”. O’Driscoll descreve diferentes estágios de gravidade progressiva da luxação pósterolateral rotatória. A última estrutura a ser lesada é a banda anterior do ligamento colateral medial. É possível ocorrer a luxação do cotovelo, mesmo com a banda anterior do ligamento colateral medial intacta. Luxação póstero-medial em varo Nesse tipo raro de luxação, a característica mais marcante é a fratura da faceta ântero-medial do processo coronoide associada a lesão do li-

Fisiopatologia As fraturas da cabeça do rádio são causadas por queda com a mão espalmada, com o antebraço discretamente fletido e pronado. A fratura ocorre com a impacção da cabeça do 92

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gamento colateral lateral e/ou a fratura do olécrano. O mecanismo de trauma decorre da queda com a mão espalmada, com estresse em varo, compressão axial e força rotacional póstero-medial. Independente do mecanismo, os ligamentos colaterais laterais (LCL) e mediais (LCM) são tipicamente avulsionados na sua origem nos epicôndilos. Quanto pior a lesão, maior a desinserção associada dos tendões extensores (laterais) ou flexores (mediais). Tríade terrível Denominação dada à associação de fraturas do coronoide, independente do seu tamanho, com a luxação do cotovelo e as fraturas da cabeça do rádio. Aumentam muito a instabilidade do cotovelo e suas potenciais complicações.

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e avalia a integridade do ligamento colateral lateral. Em ambos testes, o cotovelo é testado inicialmente em extensão (mais estável para o valgo e varo devido aos restritores ósseos) e depois em graus progressivamente maiores de flexão até 30° (mais instável). O teste do pivô (ou pivot shift) também auxilia na avaliação do LCL e da instabilidade residual póstero-lateral rotatória. É realizado com o paciente em decúbito dorsal horizontal, ombro fletido, cotovelo supinado e o examinador na cabeceira da maca. Para avaliar o ombro direito, o examinador segura o punho com sua mão esquerda, realizando um estresse axial, e com sua mão direita no cotovelo do paciente, realiza um estresse em valgo. Saindo da extensão para uma flexão de 40°, o teste será positivo quando o paciente apresentar apreensão ou o examinador notar a subluxação póstero-lateral da cabeça do rádio. Fratura da cabeça do rádio Mesmo as fraturas mais inocentes da cabeça do rádio pode produzir um quadro clínico doloroso, devido ao hematoma intra-articular gerado. O edema e equimose local são variáveis de acordo com o grau de lesão ligamentar e de partes moles associadas. É essencial a avaliação de dor no antebraço e na radioulnar distal, que podem significar lesões de partes moles mais graves, como a lesão de Essex-Lopresti (lesão da membrana interóssea do antebraço). Sinais de instabilidade do cotovelo também devem ser descartados. Sinais de bloqueio durante

Diagnóstico Clínico Luxação do cotovelo Dor, equimose e edema estão associados com a deformidade do cotovelo na luxação aguda do cotovelo. A estabilidade do cotovelo deve ser testada após a redução através da extensão progressiva do cotovelo com pronação do cotovelo. Conforme se aproxima da extensão total, o examinador deve avaliar se o cotovelo permanece estável. A instabilidade em valgo é avaliada com o ombro em rotação externa e antebraço pronado e avalia a integridade do ligamento colateral medial. A instabilidade em varo é realizada de modo semelhante, mas com o ombro em rotação interna 93

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Fraturas sem desvio da cabeça do rádio Fraturas sem desvio da cabeça do rádio e as fraturas com desvio inferior a 2mm e sem bloqueio da pronossupinação são tratadas de modo não operatório. Uma tipoia simples é usada para analgesia por 2 a 3 semanas, permitindo ganho de amplitude do cotovelo imediata. Fraturas da cabeça do rádio com desvio ou bloqueio da pronossupinação Nas fraturas com bloqueio da pronossupinação e nas fraturas com desvio da cabeça do rádio superior a 2mm, o tratamento cirúrgico é indicado. As fraturas com menos de 3 fragmentos são reduzidas e fixadas internamente. Nas fraturas com 3 ou mais fragmentos que não forem reparáveis, existem 3 opções: (a) excisão dos fragmentos, se o fragmento for menor que 1/3 da cabeça do rádio e não se articular com a fossa sigmoidea da ulna; (b) excisão da cabeça do rádio, quando o fragmento fraturado se articula com a ulna e for maior que 1/3 da cabeça do rádio e (c) prótese da cabeça do rádio, quando há associação de luxação do cotovelo, fraturas do coronoide, lesões de Essex-Lopresti ou nos pacientes jovens mais ativos. Redução da luxação do cotovelo Realiza-se uma infiltração articular e drenagem do hematoma previamente a redução. Se disponível, a sedação em centro cirúrgico pode permitir maior conforto ao paciente. Para

a pronossupinação podem indicar o tratamento cirúrgico e devem ser cuidadosamente avaliados. Na fase imediata após o trauma, uma punção do hematoma intra-articular seguida de infiltração de anestésico local pode facilitar essa avaliação. Diagnóstico Radiográfico Radiografias em frente e perfil são necessárias na fase aguda e no controle da redução do cotovelo. Para a avaliação de fraturas da cabeça do rádio, a incidência obliqua da cabeça do rádio (perfil com 45° cefálico) facilita a identificação da fratura e avaliação do seu desvio. Tomografia computadorizada tem grande valor na avaliação de padrões mais complexos de fraturas da cabeça do rádio, coronoide ou na suspeita de lesões osteocondrais e corpos livres no cotovelo. Ressonância magnética tem maior importância no planejamento cirúrgico da instabilidade residual do cotovelo. Permite a avaliação de lesões cápsulo-ligamentares associadas. Tratamento Os principais objetivos no tratamento da luxação do cotovelo e das fraturas da cabeça do rádio podem ser resumidos em: permitir uma livre pronossupinação, restaurar a amplitude de movimentos do cotovelo através de uma mobilização precoce, obter estabilidade do cotovelo e diminuir os potenciais riscos de artrose. 94

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à redução do cotovelo, o antebraço deve ser supinado, para reduzir a tensão no bíceps distal e para deslocar a cabeça do rádio da parede posterior do úmero distal. Sugerimos a técnica de Parvin, com o paciente de decúbito ventral e membro superior para fora da maca. Em seguida, são aplicadas forças em 2 direções: (a) no eixo do úmero, contra as forças de contração do bíceps, braquial e tríceps; (b) no eixo longitudinal do antebraço. Deve-se evitar a hiperextensão antes da aplicação dessas forças. Após a redução, o cotovelo é fletido e sua estabilidade é avaliada. Luxação isolada do cotovelo Após a redução do cotovelo e a avaliação de sua estabilidade, a maioria das luxações sem lesões ósseas podem ser tratadas de maneira não operatória. O cotovelo não deve ser imobilizado por tempo prolongado, pois não melhora a estabilidade e pode levar a rigidez de difícil tratamento. Uma tala gessada (ou tipóia nos casos mais leves) é utilizada por 1 semana para analgesia e nova avaliação clínica é realizada. Nos casos em que há sinais de estabilidade clínica (estresse em valgo negativo em qualquer rotação do antebraço em extensão total sem subluxações), permite-se a mobilização completa do cotovelo, utilizando-se uma tipóia por mais 2 ou 3 semanas para analgesia e proteção. Nos casos em que o estresse em valgo é positivo com supinação mas negativo com a pronação do antebraço (tipo 3B de O’Driscoll) indica-se uma órtese articulada, mantendo-se o ante-

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braço em pronação, por 4 a 6 semanas. Eventualmente, nos casos mais instáveis, um bloqueio da extensão final pode ser realizado (até 30°) com o auxílio da órtese articulada. Pequenas subluxações residuais não devem ser tratadas com imobilização gessada prolongada e sim com fortalecimento muscular progressivo, que apresenta bons resultados, mesmo nos casos mais tardios. O tratamento cirúrgico está indicado nos casos em que a instabilidade não permita a mobilidade precoce, mesmo com a proteção de uma órtese articulada. Normalmente isso ocorre nos casos com lesões ósseas associadas ou nos casos com grave lesões de partes moles (expostas ou tipo 3C de O’Driscoll). Nessa situação, a indicação é de reparo ligamentar agudo dos ligamentos colaterais medial e lateral e da cápsula articular anterior, conforme a gravidade do caso. Um fixador externo articulado pode ser utilizado nos casos que permaneçam instáveis apesar do reparo. Instabilidade póstero-medial em varo São lesões de indicação cirúrgica, com reparo de todas estruturas envolvidas. O coronóide deve ser reparado para permitir a estabilidade do cotovelo nessas situações. Tríade Terrível (luxação do cotovelo, fratura da cabeça do rádio e fratura do coronóide) A tríade terrível tem classicamente indicação cirúrgica. A fixação interna da cabeça do rádio ou artroplastia (quando não for passível de fixação) 95

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é realizada, assim como o reparo ligamentar lateral e reinserção da cápsula anterior (avulsionada junto ao fragmento do coronóide). O reparo ligamentar medial pode não ser necessário nos casos que permanecem estáveis em toda amplitude de movimento após o reparo previamente descrito. Se houver instabilidade residual em valgo ou necessidade de fixação de fragmentos grandes do coronóide, a abordagem medial e reparo do ligamento colateral medial é necessária. Em alguns casos, o cotovelo pode permanecer instável apesar de todo o reparo adequado. Nessas situações, o uso de um fixador externo articulado por 6 a 8 semanas é necessário.

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e ligamentos colaterais) associada ao fixador externo articulado é a melhor indicação nas revisões cirúrgicas. Lesões neurovasculares Lesões neurovasculares são raras. Os nervos mais envolvidos são o ulnar e o mediano. A artéria braquial pode estar envolvida, principalmente nas luxações expostas. A síndrome do túnel cubital é uma complicação crônica comum. Outras complicações possíveis são: infecção, artrose e pseudoartrose. Tipo 1. Fraturas sem desvio Tipo 2. Fraturas com desvio (fragmento superior a 30% do diâmetro da cabeça com desvio superior a 2mm) Tipo 3. Fraturas cominutas Tipo 4. Associadas à luxação do cotovelo Estágio 1: lesão completa ou parcial do LCL, que pode resultar em leve subluxação posterior da cabeça do rádio em relação ao capítulo. Estágio 2: lesão completa do LCL e cápsula anterior e/ou posterior, com luxação do cotovelo, mantendo-se o apoio da borda medial da ulna na tróclea (esse apoio parcial gera a imagem do coronoide impactado na tróclea na radiografia em perfil) Estágio 3: (A) Lesão completa cápsulo-ligamentar lateral e medial, com preservação da banda anterior do LCM; (B) Envolvimento de todo LCM e (C) Instabilidade extrema, com lesão extensa de partes moles do úmero distal, com luxação inclusive no gesso.

Complicações Diversas complicações podem ocorrer nas luxações do cotovelo ou nas fraturas da cabeça do rádio. Rigidez Uma perda leve de movimento é esperada em todas as lesões do cotovelo. A perda mais comum é da extensão final. A causa mais comum da rigidez é a imobilização prolongada, que deve ser evitada nas lesões do cotovelo. Evita-se a mobilização passiva do cotovelo nessa situação, que pode gerar complicações no tratamento da rigidez. Instabilidade A instabilidade residual após as luxações do cotovelo está comumente relacionada às lesões ósseas associadas. A reconstrução óssea e ligamentar (cabeça do rádio, coronóide 96

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Bucholz RW, Heckman JD, Court-Brown CM, Tornetta P, editors. Rockwood and Green’s Fractures in Adults. Seventh. Lippincott Williams & Wilkins; 2009. 2. Ruedi TP, Murphy WM. Ao Principles of Fracture Management. Thieme Medical Publishers; 2001. 3. Cohen MS, Hastings H. Acute elbow dislocation: evaluation and management. The Journal of the American Academy of Orthopaedic Surgeons. 1998;6(1):15-23. 4. Morrey BF, editor. Master Techniques in Orthopaedic Surgery: The Elbow. Second. Lippincott Williams & Wilkins; 2002.

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Fraturas do antebraço José Octávio Soares Hungria

Epidemiologia O antebraço é importante conexão do tronco com a mão, permitindo que a mão se movimente no espaço para realizar as funções de preensão, tato, proteção, higiene e alimentação. Devido suas características anatômicas, o antebraço é funcionalmente uma articulação e em seu tratamento esse conceito deve ser lembrado. Em estudo sobre a epidemiologia das fraturas dos ossos do antebraço relataram que 19% das fraturas acometeram a extremidade proximal, 5% a diáfise e 76% a extremidade distal. Das fraturas da diáfise, a maioria dos pacientes foi do sexo masculino com idade média de 29 anos para o sexo masculino e de 60 anos para o sexo feminino. Quanto ao mecanismo de trauma, 35% sofreram queda da própria altura, 30% sofreram trauma direto, 19% foram vítimas de atropelamento, 8% sofreram trauma esportivo e 4% foram vítimas de acidente automobilístico. Nesse estudo, 59% das fraturas foram fraturas de traço simples, 39% fraturas com cunha e 2% fraturas complexas. Quanto ao osso, 48,3% acometeram somente a ulna, 24,8% acometeram somente o rádio e 26,8% acometeram associadamente o rádio e a ulna.

Diagnóstico O diagnóstico deve ser suspeitado sempre que houver trauma no antebraço, principalmente em decorrência de trauma direto. O exame físico geralmente mostra edema e, quando houver envolvimento dos dois ossos do antebraço, desvios angulares são evidentes, associados a dor. Além dos desvios angulares, devemos atentar para lesões associadas das partes moles, estado circulatório e neurológico do membro. Déficits neurovasculares são raros em fraturas fechadas, entretanto, lesões neurovasculares são mais frequentes em fraturas expostas por ferimento por projétil de arma de fogo. No exame neurológico deve-se avaliar a função sensitiva e motora dos nervos radial, mediano e ulnar. As radiografias ântero-posterior e perfil do antebraço são, via de regra, suficientes para fazer o diagnóstico e planejar o tratamento adequado. Nas radiografias devemos afastar lesões associadas nas articulações radiulnar proximal e distal. Tratamento Para assegurar o melhor resultado funcional possível, os objetivos do tratamento das fraturas das diáfises dos ossos do antebraço são: (1) re98

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dução anatômica, com restauração do comprimento ósseo, rotação e do espaço interósseo, para manutenção dos movimentos de pronação e supinação; (2) fixação estável para permitir reabilitação precoce, requisitos fundamentais para o uso pleno das funções da mão. Geralmente, no adulto, essas condições são conseguidas apenas com tratamento cirúrgico. Para tal, utiliza-se as vias de acesso anterior e posterior para o rádio e para a ulna, a via deve ser medial. O tratamento incruento das fraturas dos ossos do antebraço em adultos apresenta dificuldade do controle dos fragmentos, altas taxas de desvio secundários, tempo incerto para consolidação óssea e resultados funcionais ruins. O tratamento incruento pode levar até 27% de consolidação viciosa, pseudartrose e sinostose radiulnar. O tratamento incruento está reservado nas situações que não existam condições clínicas cirúrgicas por parte do paciente; fratura isolada (de um dos ossos) estável sem desvio, desde que estas situações não estejam associadas à fratura exposta, síndrome compartimental, fratura bilateral, fratura associada a fratura da diáfise do úmero. As principais indicações de tratamento cirúrgico das fraturas das diáfises dos ossos do antebraço são todas as fraturas desviadas do rádio e da ulna; fratura isolada desviada do rádio; fratura isolada da ulna com ano gulação maior do que 10 ; todas as fraturas-luxações de Monteggia; todas as

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fraturas-luxações de Galeazzi; todas as fraturas expostas; fraturas associadas à síndrome compartimental; fraturas associadas às fraturas no úmero ipsilateral ou fraturas associadas ao membro superior contralateral. Os melhores resultados são conseguidos com placas e parafusos e reabilitação funcional precoce. Fraturas desviadas dos ossos do antebraço devem ser fixadas o mais precoce possível, preferencialmente nas primeiras 24 - 48 horas. Para fixação das fraturas da ulna a via de acesso utilizada é a medial e a placa deve ser colocada, de preferência, na face dorso-lateral. No rádio, a via de acesso depende do treino do cirurgião e da localização da fratura, mas a preferência é pela via anterior para as fraturas do 1/3 proximal, mas as fraturas dos 1/3 médio e distal, tanto a via de acesso anterior como a posterior podem ser utilizadas. Quanto a técnica cirúrgica, a redução das fraturas das diáfises dos ossos do antebraço deve ser aberta, anatômica e atraumática. O antebraço é uma estrutura de 2 ossos; redução e fixação de um dos ossos apresentará dificuldade para obter redução do outro osso. Consequentemente, é aconselhável expor ambos ossos e reduzir primeiro o osso com a fratura de traço mais simples, segurando a redução temporariamente com placa e pinças de redução. Desta forma, estabiliza-se o comprimento e facilita-se a redução do outro osso. Fixação temporária é realizada no segundo osso e radiografias devem ser realizadas. 99

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angulares, menores do que 10 , não causam grande restrição do movimento de pronação e supinação, mas desvios angulares maiores do que o 20 causam grave restrição do movimento de pronação-supinação(2). A restrição de movimento é maior se a deformidade ocorrer no 1/3 médio(2). Radiograficamente, além da redução anatômica, a simetria do arco radial máximo é fundamental. Geralmente o arco radial máximo é de 15 mm e localiza-se a 60% do comprimento radial, a partir da tuberosidade do rádio. Alteração da localização do arco radial máximo ou de sua magnitude, acarretará diminuição da pronação e supinação(3). Além de desvio angular, os desvios rotacionais também levam a restrição da pronação-supinação. Geralmente deformidade da ulna em supinação resulta pouca alteração na pronaçãosupinação. Deformidade de um dos ossos em pronação resulta em moderada restrição da pronação-supinação, mas se ocorre deformidade em supinação do rádio, a restrição da pronação-supinação é maior. Se os ossos foram fixados com rotação em direção oposta (um em supinação e o outro em pronação) resulta grave restrição da pronação e supinação(4). Na osteossíntese pode-se utilizar placas de compressão dinâmica (DCP) de 3,5 mm, placa de compressão dinâmica com baixo contato (LC-DCP) de 3,5 mm, placa de reconstrução de 3,5 mm, placa com orifícios combinados - parafusos bloqueados e de

Anderson e colaboradores(1) referem que a ulna deve ser fixada primeiro geralmente por ser mais fácil, mas a preferência é pelo osso que apresenta a fratura de fixação mais fácil. Quando se está fixando fratura isolada de um dos ossos, avaliação das articulações proximal e distal é mandatória. O rádio é um osso curvo. Se a opção foi pela via de acesso posterior, a placa deve ser modelada de acordo com o contorno curvo do rádio. Se tratar-se de fratura de traço simples, a placa deve ser pré-tensionada (angulação no centro da placa de aproximadamente 1 mm) (Figura 01). Figura 1. Radiografias de fratura das diáfises dos ossos do antebaço com luxação da articulação radiulnar distal

a) radiografia pré-operatória incidência ântero-posterior; b) radiografia pré-operatória incidência perfil; c) radiografia pós-operatória ântero-posterior; d) radiografia pós-operatória incidência perfil.

No controle intra-operatório para avaliar a redução, o movimento de pronação e supinação livre geralmente é suficiente para garantir uma correta redução. Pequenos desvios 100

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compressão dinâmica (LCP) 3,5 mm e em algumas situações especiais placa 1/3 de tubo. A posição das placas deve ser na face de tensão, sendo no rádio dorsolateral em toda a sua extensão ou na face anterior na extremidade distal. Na ulna a placa deve ser colocada na face posterior. Pelo menos 6 corticais proximais e 6 corticias distais à fratura devem ser fixadas. Existe a necessidade de modelagem da placa à curvatura do rádio, pré-tensionamento da placa nos casos de fratura de traço simples, compressão axial pela placa. A utilização de enxerto ósseo está indicado quando existe fragmentação que acometa mais de 1/3 da circunferência da diáfise(1,5). O pós-operatório das osteossínteses das fraturas das diáfises dos ossos do antebraço consta de colocação de

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dreno aspirativo por 24 - 48 horas, o membro operado deve ser elevado, com enfaixamento leve, a mobilidade ativa e precoce deve ser encorajada sempre que a osteossíntese permitir. COMPLICAÇÕES Se forem seguidas as técnicas de redução e fixação, os resultados funcionais são geralmente muito bons, com baixas taxas de complicações. As principais complicações das fraturas dos ossos do antebraço são pseudoartrose, consolidação viciosa, infecção, refratura após retirada da placa, fratura na extremidade da placa. Lesão neurológica, lesão vascular e síndrome compartimental são complicações mais raras e estão associadas com trauma de alta energia, principalmente por ferimento por projétil de arma de fogo.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Anderson LD, Sisk D, Tooms RE, Park III WI: Compression-plate fixation in acute diaphyseal fractures of the radius and ulna. J Bone Joint Surg. [Am] 1975 Apr;57-A(3):287-97. 2. Tarr RR, Garfinkel AI, Sarmiento S: The Effects of angular and rotational deformities of both bones of the forearm - an vitro study. J Bone Joint Surg. [Am] 1984 Jan;66-A(1):65-70. 3. Schemitsch EH, Richards RR: The Effects of malunion on functional outcome after plate fixation of fractures of both bnes of the forearm in adults J Bone Joint Surg. [Am] 1992 Aug;74A(7):1068-78. 4. Dumont CE, Thalmann R, Macy JC: The Effects of rotational malunion of the radius and the ulna on supination and pronation. An experimental investigation. J Bone Joint Surg. [Br] 2002 Sept;84-B(7):1070-4. 5. Mikek M, Vidmar G, Tonin M Pavlovcic V: Fracture-related and implant-specific factors influencing treatment results of comminuted diaphyseal forearm fractures without bone grafting. Arch Orthop Trauma Surg. 2004 Jul;124(6):393-400. Epub 2004 Apr 24. 101

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Fraturas da extremidade distal do rádio Giana Silveira Giostri

Epidemiologia A fratura no terço distal do rádio é a mais comum das fraturas do membro superior. Em um levantamento epidemiológico feito por três meses no Pronto Socorro do Hospital Universitário Cajuru em Curitiba, a fratura do terço distal do rádio, associada ou não à ulna, correspondeu a 28% das fraturas do membro superior e 5% de todas as fraturas atendidas no setor de ortopedia. O perfil mais comum para essa fratura é a mulher, acima de 50 anos que sofreu queda com a mão espalmada. De sorte que o desvio dorsal é o mais observado e, a maioria das fraturas é extra-articular ou apresenta traço intra-articular simples. Com o aumento dos acidentes de trânsito, ressaltando o número crescente de traumas envolvendo motocicletas, há maior possibilidade de lesões graves que atingem o punho e resultam em fraturas complexas que acometem pacientes cada vez mais jovens. Essas lesões estão comumente associadas a avulsões ligamentares, fraturas dos ossos do carpo, fraturas da ulna e fragmentos articulares, que dificultam o tratamento e têm influencia no prognóstico da lesão.

Figura 1. Representação da Classificação AO para o terço distal do rádio. (Muller ME, Nazarian S, Koch P. AO classification of fractures. Berlin: Springer; 1987)

A. Fraturas isoladas da ulna e extrarticulares do rádio com traço simples e cominutas. B. Fraturas marginais à articulação. São fraturas intrarticulares parciais. Sofrem força de cisalhamento. C. Fraturas intrarticulares de traço simples, intrarticulares cominutas e fraturas com comprometimento metafisário.

tos para classificar as fraturas do terço distal do rádio. Todas apresentam deficiências em relação ao grau de reprodutibilidade intra e interobservadores. Ressaltamos a classificação difundida pela Fundação AO (fig. 1), a classificação Universal (fig.2) e a proposta por Fernandez (fig 3). Essas são as classificações mais citadas na literatura

Classificação Existem vários sistemas descri102

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atual e auxiliam na identificação e comunicação entre os profissionais. A última nos parece bastante completa e relaciona a fratura ao mecanismo da lesão e orienta a sua condução de acordo com o comprometimento dos segmentos do rádio e da ulna no terço distal.

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Figura 3. Representação da Classificação de Fernandez. Relação com o mecanismo de trauma que ocasionou a lesão. Fernandez DL. Fractures of the distal radius. Operative treatment. Instr Course Lect;42:73–88, 1993.

Figura 2. Representação da Classificação Universal. (Cooney WP. Fracture of the distal radius: a modern treatment-based classification. Orthop Clin North Am;24:211–6, 1993).

Tipo 1= Angulação dorsal ou palmar. Tipo 2= Fraturas intrarticulares parciais com força de cisalhamento pela ação do carpo, com fragmento palmar, dorsal ou radial. Tipo 3= fraturas por compressão, envolvendo a articulação e a metáfise. São as mais comuns. Tipo 4= Leões que envolvem pequenos fragmentos avulsionados pelos ligamentos da região. Tipo 5= Fraturas em que houve mais de um mecanismo citado anteriormente

Para que o tratamento seja efetivo, é necessário muito mais do que adotar uma classificação, é importante a compreensão da lesão que passa por outros dados, além do citado mecanismo do trauma. O conhecimento dos parâmetros anatômicos radiográficos do punho e a avaliação inicial do paciente, ob-

Tipo I: Fratura Extrarticular sem desvio Tipo II: Fratura Extrarticular com desvio Tipo III: Fratura Intrarticular sem desvio TipoIV A: Fratura Desviada Intrarticular com traço simples TipoIV B: Fratura Desviada Intrarticular cominuta TipoIV C: Fratura Desviada Intrarticular com fragmento irredutível

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servando a associação com outros traumas e a qualidade óssea ligada intimamente à idade, são fatores imprescindíveis na escolha do tratamento bem sucedido.

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prometimento da articulação, a tomografia computadorizada poderá ser útil. Parâmetros Radiográficos: Incidência em frente (PA):

Diagnóstico radiológico - Compreensão da Lesão As radiografias simples são o método de eleição para o diagnóstico das fraturas do terço distal do rádio. As incidências em frente e perfil trazem os subsídios básicos para o diagnóstico. Associamos as incidências oblíquas, mediopronada e mediosupinada (45º do plano do perfil para a pronação e para supinação), para evidenciar melhor o desvio das fraturas e os possíveis segmentos articulares (fig. 4).

Figura 5. Desenho demonstrando medidas vistas na incidência radiográfica anteroposterior.

A. Altura do rádio: medida entre a extremidade da estilóide do rádio e a base da ulna = 12 mm. B. Inclinação ulnar do rádio = 23º. C. Variância ulnar: diferença entre a base da ulna e a base do rádio = 2 mm.

Figura 4. Utilização das incidências oblíquas no exame radiográfico do punho

- comprimento do rádio: medida entre a extremidade da estilóide do rádio e a base da ulna, aproximadamente 12 mm. (Fig. 5A) - inclinação ulnar do rádio: valor aproximado de 23º. (Fig. 5B) - variância ulnar: diferença entre a base da ulna e a base do rádio de aproximadamente 2 mm (devese comparar a mesma diferença no outro lado). (Fig. 5C) - degrau articular para as fraturas articulares: menor que 1 mm. - afastamento dos fragmentos para as fraturas articulares: me-

A. Incidência em frente. B. Incidência em perfil. C. Incidência mediopronada. Notese a seta preta que indica o fragmento articular dorsoulnar melhor visualizado. D. Incidência mediosupinada

Podemos lançar mão da radiografia do punho contralateral para que a comparação nos traga mais subsídios na identificação da lesão. Nos casos em que há degrau articular ou, seja necessário determinar a extensão do com104

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nor que 2 mmm. - observação das 3 colunas do terço distal do antebraço, coluna radial com forte osso cortical e a fossa do escafóide, coluna intermediária com a faceta do semilnar e a fossa sigmóide e, a coluna ulnar com o Complexo da Fibrocartilagem Triangular. (Fig. 6)

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Figura 7. Desenho do perfil do punho demonstrando o ângulo de inclinação palmar do rádio =11º.

Figura 6. Conceito das colunas.

- imagem em lágrima e ângulo com a diáfise do rádio, de aproximadamente 70º. A imagem em lágrima corresponde ao canto ulnar e palmar do terço distal do rádio (Fig. 8) Figura 8. Ângulo entre a imagem em lágrima e a diáfise do rádio, de aproximadamente 70º. A imagem em lágrima corresponde ao canto ulnar e palmar do terço distal do rádio. Em vermelho: coluna radial com a fossa do escafóide. Em amarelo: coluna intermediária com a faceta do semilunar e a fossa sigmóide. Sem coloração: coluna ulnar com o Complexo da Fibrocartilagem Triangular. (Rikli DA, Regazzoni P. The double plating technique for distal radius fractures. J Bone Joint Surg Br; 78B: 588-592, 1996)

Observação na incidência em perfil: - inclinação palmar do rádio de aproximadamente 11º. (Fig. 7)

- distância anteroposterior do rádio e a relação com o diâmetro do semilunar. A distância ântero105

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padrão da fratura é baseado principalmente na estabilidade e na complexidade que são determinadas pelo mecanismo do trauma e pela qualidade óssea. A associação com outras lesões irá agravar a complexidade da lesão. Nas radiografias iniciais devemos estar atentos a todas as estruturas, e, evitar a visão focada sobre a fratura. Lesões ligamentares, como na articulação entre o escafóide e o semilunar são citadas em cerca de 30% dos casos. Ainda lembramos a associação com outras lesões, como, fraturas do escafóide, lesão do nervo mediano e a exposição da fratura que interferem sobremaneira para a escolha do método de tratamento. Essas associações são comuns nos traumas de alto impacto e contra indicam o tratamento conservador.

posterior do rádio tem medida semelhante ao diâmetro do semilunar no perfil (Fig. 9) Figura 9. Distância ântero-posterior do rádio e a relação com o diâmetro do semilunar. A distância ânteroposterior do rádio tem medida semelhante ao diâmetro do semilunar no perfil.

b. Critérios de instabilidade da fratura A estabilidade da fratura é o principal elemento para sua padronização. A fratura do terço distal do rádio é considerada instável quando apresentar: - cominuição dorsal em mais da metade do plano médio-axial na incidência em perfil da radiografia inicial - angulação dorsal maior que 20º na incidência em perfil da radiografia inicial - envolvimento articular radiocárpico e radiulnar na incidência em frente - fratura do terço distal da ulna as-

Tratamento a. Objetivo Os parâmetros normais apresentados anteriormente devem nortear o objetivo do tratamento: restaurar a anatomia e a função do membro superior anterior à ocorrência da fratura. Os fatores mais relevantes para a escolha do método são: o perfil do paciente, o padrão da fratura e as lesões associadas. Questões como a idade biológica e cronológica, a qualidade de vida, a independência física e mental, a adesão ao tratamento e a expectativa quanto à condução da terapêutica são imprescindíveis para o estabelecimento do perfil do paciente. O 106

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sociada na incidência em frente. Lafontaine descreveu cinco critérios de instabilidade: os quatro citados anteriormente e a idade acima de 60 anos. A idade acima de 60 anos e a cominuição dorsal são os fatores mais importantes para indicar o método de tratamento e o prognóstico da fratura. (Fig. 10)

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dos. As fraturas sem desvio em idosos podem ser imobilizadas parcialmente com tala gessada dorsal, que permita pequeno movimento de flexão do punho e que impeça a extensão. O controle radiográfico deve ser instituído no final da primeira e da segunda semana após a confecção do gesso, pois a perda do alinhamento da fratura ocorre com mais frequência nesse período e permanece até a quinta semana, principalmente nos pacientes com qualidade óssea ruim. Os tendões flexores e extensores dos dedos e do punho podem atuar como forças deformantes na fratura. A inserção do músculo braquioradial age diretamente nos fragmentos distais desviando-os no sentido radial do punho. O tempo de imobilização das fraturas estáveis sem desvio varia de 3 a 6 semanas. - Fraturas com pouco desvio tratadas com Redução e Gesso Para as fraturas com pouco desvio, que foram submetidas à redução incruenta e confecção com gesso, devemos estar atentos aos critérios de instabilidade. A combinação de 3 dos 5 critérios, citados anteriormente, leva ao resultado insatisfatório mesmo que se obtenha redução e estabilização inicial com o gesso. Consideram-se os seguintes índices aceitáveis, tanto após a redução como para o desvio inicial da fratura que se pretende tratar conservadoramente. - Na incidência pósteroanterior da radiografia do punho: - variância ulnar de até 2 mm comparativamente ao lado

Figura 10. Exemplo de fratura do terço distal do rádio instável, articular, cominuta.

Classificada por Fernandes como tipo 3 e como C2 na Classificação AO. Ressalta-se principalmente, o encurtamento do rádio na incidência póstero-anterior, a inversão acentuada do ângulo de inclinação palmar do rádio no perfil e o comprometimento articular nas incidências oblíquas.

c. Tratamento das Fraturas Estáveis As fraturas sem desvio ou com desvio mínimo na radiografia inicial apresentam bons resultados com o tratamento conservador com gesso e órteses. São fraturas Tipo A da Classificação AO, Tipos I e II da Universal e Tipo 1 da Classificação de Fernandez. Preconiza-se gesso bem moldado, leve e antebraquiopalmar. Deve-se observar o limite distal do gesso na prega de flexão palmar e na base do polegar para permitir o movimento amplo dos de107

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não fraturado. - encurtamento radial menor que 5 mm. - inclinação ulnar do rádio maior que 15º. - superfície articular radiocárpica e radiulnar congruente, com degrau articular menor que 2 mm. - Na incidência em perfil da radiografia do punho: - inclinação palmar do rádio menor que 10º comparativamente, ou seja, haverá perda da inclinação palmar do rádio até no máximo 0º (as superfícies, dorsal e palmar do rádio no perfil ficarão na mesma linha). Nos idosos, o limite da inclinação palmar na radiografia em perfil é ampliado para até 20º de desvio dorsal do rádio desde que não haja encurtamento radial maior que 5 mm, principalmente em pacientes com pouca demanda funcional das mãos ou que apresentem alterações clínicas que dificultem procedimentos invasivos.

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Os pinos percutâneos têm melhor resultado se indicados no tratamento das fraturas instáveis extra-articulares, em pacientes com boa qualidade óssea, ou seja, adultos jovens. Corresponde às fraturas do Tipo A na Classificação AO, Tipos I a III na Universal e Tipo 1 de Fernandez. A montagem biomecânica mais recomendada é a fixação cruzada com dois pinos no lado radial. (Fig. 11) A fixação intrafocal com pinos dorsais, a associação de pinos dorsais e pino lateral bloqueando a tendência ao desvio radial do fragmento e, o uso da ulna como auxílio estabilizador (métodos propostos por Kapandji, Ruschel e de Palma) aumentam a estabilidade da síntese e agregam segurança para os casos de fraturas mais complexas. Figura 11. Desenho representativo da fixação percutânea com pinos cruzados sendo dois radiais.

d. Tratamento das Fraturas Instáveis Não há evidências na literatura atual que permita apontar o melhor tratamento para as fraturas consideradas instáveis. As opções para a fixação são métodos cirúrgicos como Pinos Percutâneos, Fixação Externa e Fixação Interna, utilizados isolados ou em conjunto para aumentar a estabilidade da síntese. - Pinos Percutâneos

Essa montagem oferece segurança considerando a questão biomecânica. (Naidu e cols. J Hand Surg; 22A:252-257, 1997)

O uso da fixação percutânea em idosos ou pessoas com má qualidade óssea deve ser parcimonioso e pode trazer bons resultados em alguns ca108

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sos, lembrando que a idade, por si só, é um critério de instabilidade. Alertamos a possibilidade de lesão nervosa iatrogênica inadvertida durante a fixação percutânea. Recordando a anatomia, o ramo sensitivo do nervo radial torna-se subcutâneo a cerca de 5 a 10 cm proximal da estilóide do rádio, entre o braquioradial e o extensor radial longo do carpo. Sua bifurcação distal ao punho ocorre 1 a 3 cm radial ao tubérculo de Lister. - Fixador Externo O fixador externo tem uma boa indicação nos casos de fraturas instáveis expostas ou em pacientes com riscos clínicos que contra-indiquem procedimentos mais complexos. Deve-se considerar a associação com pinos percutâneos ou com enxertia óssea que aumenta a estabilização da síntese. Pode ser uma opção considerável para o tipo C da Classificação AO, tipo IV da Universal e Tipos 3, 4 e 5 de Fernandez. Os pinos distais devem ser colocados através de duas incisões de aproximadamente 1 cm e com angulação de 30 a 45º com o plano frontal da mão. A incisão proximal deve ser feita a 10 cm proximal da prega de flexão do punho, com dissecação entre o extensor radial longo e o extensor radial curto do carpo, protegendo o nervo sensitivo do radial. - Placas e Parafusos a. Placas em T: A indicação mandatória para a utilização de placas e parafusos é a fratura distal do rádio articular parcial (marginal) com força de cizalhamento

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dorsal ou palmar, classificada por Fernandez como Tipo 2 e o Tipo B da Classificação AO. Nos casos de osso de boa qualidade, em jovens, a placa escolhida poderá ser simples, em “T” ou em “L”, sem bloqueio dos parafusos distais. Essas placas têm por objetivo conter a força de cizalhamento. b. Placas volares especiais para terço distal do rádio: O desenvolvimento da indústria de materiais de síntese e o entendimento da anatomia e biomecânica do punho possibilitaram aos pacientes com fraturas instáveis do terço distal do rádio uma opção que estabiliza rigidamente a lesão e permite a mobilização precoce do punho. Observa-se na literatura, a tendência para o tratamento dessas fraturas instáveis com sínteses internas desenhadas especificamente para o rádio, respeitando os contornos do terço distal e as linhas anatômicas de inserção ligamentar e muscular. Essas sínteses com parafusos bloqueados diretamente na placa, inicialmente utilizadas somente para ossos osteopênicos, vêm ganhando cada vez mais espaço no tratamento das fraturas instáveis distais do rádio no adulto de qualquer idade, principalmente por oferecer segurança na estabilidade da fratura e restabelecimento mais rápido da função da mão. Devemos olhar com atenção essa tendência e usufruir desta excelente opção de síntese com uma indicação precisa. As fraturas tipo C da Classificação AO, tipo IV da Universal e Tipos 109

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3 de Fernandez são as fraturas de eleição para a síntese interna com placas anatômicas volares (palmares) para o terço distal do rádio com parafusos bloqueados na placa, que sustentam a região subcondral e permitem que, mesmo com grande cominuição dorsal haja estabilidade suficiente para a consolidação da fratura sem perda da redução (Fig.12).

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sobre os ligamentos radiocárpicos. (Fig. 13). Recentemente, foram ofertados parafusos bloqueados com variações na angulação que permitem alcançar grande parte dos pequenos fragmentos do dorso do rádio, facilitando ainda mais a adequada manutenção da redução da fratura. Figura 13. Representação do terço distal do rádio e da ulna.

Figura 12. Desenho esquemático demonstrando a efetividade dos parafusos bloqueados na placa. Contornos que devem ser respeitados para a adaptação das placas palmares no terço distal do rádio. Círculo preto: Região da tuberosidade do rádio. Linha curva cinza: região de inserção do músculo pronador quadrado. Linha curva vermelha: Região de inserção dos ligamentos radiocárpicos. As placas palmares devem permanecer apoiadas na região da fossa do pronador quadrado (PQ) e da tuberosidade do rádio. Não devem ultrapassar a linha demonstrada em vermelho.

A força do carpo (seta preta) é dissipada ao longo da placa (seta pontilhada em vermelho) e não diretamente sobre a fratura. Em placas sem parafusos bloqueados, a força será dissipada diretamente sobre o foco da fratura que terá tendência ao desvio inicial.

c. Placas especiais dorsais para o rádio: As placas dorsais têm como vantagem a possibilidade de acesso direto ao foco da fratura de forma muito mais simples quando comparada ao acesso palmar. Existem placas desenhadas para o contorno dorsal, respeitando o tubérculo de Lister e permitindo a estabilização das fraturas principalmente as cominutas com desvio dorsal. A desvantagem dessas placas únicas dorsais é a grande exposição da cominuição dorsal que leva

São sínteses que em geral não perturbam as partes moles locais e não necessitam ser retiradas. Recomenda-se o conhecimento da anatomia palmar do terço distal do rádio para que a adaptação dessas placas permaneça com o apoio correto, na região da fossa do pronador quadrado e da tuberosidade do rádio. As placas palmares não devem avançar 110

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com mais frequência à aderência tendinosa e à necessidade de segundo procedimento para retirada da placa. A tendência para minimizar esses problemas são placas dorsais menores, em “L”, “T” ou retas, na coluna radial e na intermediária (ver conceito de colunas na fig. 6). Essas placas podem ser colocadas por acessos menores sobre o fragmento específico que está desviado, diminuindo a agressão cirúrgica. Podem ser colocadas em ângulos de 50 a 70º no primeiro e no quarto compartimento. (Fig. 14) Também para as placas dorsais, existem parafusos bloqueados e com ângulos variáveis para aumentar as opções de estabilização.

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complexas articulares com desvio, como as do Tipo 4 da classificação proposta por Fernandez. Muitas vezes estes fragmentos articulares são a chave para a estabilidade do carpo. O fragmento da imagem em lágrima corresponde ao canto ulnar e palmar do rádio e contém o semilunar e todo o carpo que mantém tendência a deslizar no sentido palmar (Fig. 15). Figura 15. Radiografia em perfil.

Figura 14.

Placas dorsais no 1º e no 4º compartimentos dorsais, com ângulo de 50 a 70º entre si. (Ver Figura 6).

Note-se o Fragmento do canto ulnar e palmar desviado pelo apoio do carpo. Esse fragmento é a chave para a estabilização do carpo.

d. Fixação Específica de Fragmentos Articulares, dorsais e palmares: Outros sistemas foram desenvolvidos para privilegiar os fragmentos articulares que podem ser avulsionados, correspondendo às fraturas

Caso esse fragmento não seja identificado e devidamente estabilizado leva o desastre ao tratamento dessas fraturas. Muitas vezes, mesmo placas desenhadas para avançar mais distal nesta direção não conseguem manter tal fragmento. Sistemas que 111

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incluem parafusos, placas e ganchos de pequeno tamanho objetivam manter a estabilidade desse tipo de lesão instável e de difícil acesso.

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ser avulsionado em conjunto com a estilóide da ulna, principalmente nas fraturas do rádio com grande desvio. As classificações propostas por Fernandez e pela Fundação AO reconhecem a importância e privilegiam essas lesões. (Fig. 16)

e. Fixação por placa em ponte com distração da fratura: Algumas fraturas instáveis com comprometimento da metáfise, cominutas tanto no dorso como na região palmar do rádio, são de difícil estabilização pelos métodos descritos. Correspondem ao Tipo 5 de Fernandez. A fixação por placa longa, 3,5 mm, fixada distal no 3º metacarpo, passada cuidadosamente abaixo do retináculo dos extensores, e, fixada proximal na diáfise do rádio mantém a distração da fratura e configura uma boa opção para alguns casos selecionados de fraturas complexas. Permite o acesso dorsal para a redução dos fragmentos articulares, a colocação de enxerto ósseo quando necessária e a associação com pinos para estabilização de pequenos fragmentos soltos.

Figura 16. Sistema proposto por Fernandez para classificar as lesões que envolvem o Complexo da Fibrocartilagem Ulnar e que podem ocasionar instabilidade na articulação radiulnar distal.

- Articulação Radiulnar Distal Pode haver associação da fratura distal do rádio com fraturas da estilóide da ulna em mais da metade dos casos. A maioria acomete a extremidade da estilóide e não necessita fixação. Porém, quanto mais proximal, na base da estilóide for à fratura, maior será a chance de instabilidade entre a ulna e o rádio. Os ligamentos radiulnares fazem parte do Complexo da Fibrocartilagem Triangular que pode

A: Lesões Consideradas Estáveis. Note-se a fratura da extremidade distal da estilóide ulnar à esquerda. B: Lesões Consideradas Instáveis. Notese a fratura da base da estilóide ulnar à direita. C: Lesões Consideradas Potencialmente Instáveis. Note-se a fratura cominuta envolvendo a base da estilóide e todo o terço distal da ulna à direita.

Portanto, é imprescindível dar atenção especial à articulação radiul112

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nar distal após ter-se fixado a fratura do rádio. Testa-se a estabilidade da radiulnar distal realizando uma manobra semelhante à gaveta, com o antebraço em posição neutra, em pronação e em supinação. Não esquecer que esse teste deve ser comparativo ao lado não acometido pela fratura.

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perda da pronosupinação. (Fig. 17) A consolidação viciosa também poderá determinar alterações neurológicas devido à compressão de nervos e diminuição da força de preensão dos dedos. Figura 17.

- Orientação para a Reabilitação A orientação para que o paciente inicie a movimentação ativa e passiva dos dedos, do cotovelo e do ombro que não estão imobilizados, deve ser iniciada prontamente, nos primeiros dias, seja qual método de tratamento for utilizado. Os sistemas que permitem a mobilização do punho nas primeiras semanas após o trauma, como as placas com parafusos bloqueados, apresentam vantagem na reabilitação precoce. O paciente pode ser estimulado a utilizar o punho acometido em atividades leves, sem carga, após a retirada dos pontos operatórios na segunda semana da cirurgia.

A. Foto do dorso dos punhos e das mãos. Note-se a saliência da ulna no lado esquerdo. B. Incidência póstero-anterior de radiografia do punho. Note-se o encurtamento do rádio e o impacto entre a ulna e o carpo.

Inúmeros fatores interferem na função da mão após o tratamento da fratura distal do rádio e tornam a sua avaliação complexa. Em geral, os bons resultados radiográficos estão diretamente relacionados à boa função, porém os maus resultados radiográficos nem sempre estão em linha direta com a má função. Portanto, é possível um bom resultado subjetivo mesmo sem a restauração da anatomia radiográfica normal, especialmente em pacientes idosos com baixa demanda das mãos.

Complicações Na maioria, os resultados considerados ruins estão ligados à consolidação viciosa da fratura do terço distal do rádio. A incapacidade de restaurar o comprimento e a inclinação palmar do rádio levará ao mau resultado e às queixas pertinentes, como: dor na radiulnar distal devido ao impacto da ulna no carpo, deformidade com desvio radial e dorsal do punho e, saliência no terço distal da ulna com

Lista de complicações descritas: • Perda da redução • Rigidez articular do punho e de 113

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articulações próximas, como as metacarpofalângicas e interfalângicas Diminuição de força de preensão da mão Deformidade Dor, na radiulnar distal, na radiocárpica. Compressão de nervos, em geral neuropraxias, principalmente do nervo mediano e do ulnar. Ruptura tendinosa, que pode ocorrer tanto por fragmentos ósseos como por parafusos salientes. Dor Complexa Regional do Membro Superior tipo I, conhecida anteriormente como Distrofia Simpático Reflexa

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Considerações Finais O tratamento de uma fratura distal do rádio envolve o conhecimento profundo de anatomia, biomecânica e fisiologia articular do punho. Além desses aspectos técnicos, deve-se levar em conta as particularidades de cada paciente, como demanda funcional, nível de cognição, idade e qualidade óssea. A partir daí é que se pode definir qual a melhor terapêutica, dentre as várias opções disponíveis, sem olvidar, evidentemente, de trazer o paciente para auxiliar na condução do tratamento, tanto na escolha do método como na dedicação à importante etapa da reabilitação.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Ilyas AM, Jupiter JB. Distal radius fractures--classification of treatment and indications for surgery. Orthop Clin North Am. 2007 Apr;38(2):167-73, v. 2. Leite NM, Belloti JC, Faloppa F, Angelini LC, Fernandes CH, Reis FB, et al. Fratura de rádio distal em adulto. In: SBOTCBR, editor. Projeto Diretrizes: Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina; 2007. p. 1-11. 3. Wolff S. Distal Radius Fractures. In: Green DP, Hotchkiss RN, Pederson WC, Wolfe SW eds. Green’s Operative Hand Surgery. 6nd ed. Philadelphia: Churchill Livingstone: cap. 17, 2010. 114

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Fraturas do escafóide Carlos Henrique Fernandes

vasculares que vão se adelgaçando à medida que se aproximam da periferia do osso. Os sistemas vasculares látero-volar (aparentemente o principal) e dorsal são responsáveis por suprir os dois terços proximais do escafoide, e o sistema distal é responsável por suprir a região da tuberosidade. Devido à pobre circulação no polo proximal, as fraturas localizadas nesta região apresentam pior prognóstico e uma chance maior de evoluírem com necrose asséptica1-2. As fraturas do escafoide quando não tratadas, fatalmente desenvolverão pseudartroses3-5.

As fraturas do escafoide são as fraturas mais comuns entre os ossos do carpo e a segunda mais frequente do punho, após as fraturas da extremidade distal do rádio. Podem se apresentar nas formas isoladas ou associadas. As associações mais frequentes são com fraturas de outros ossos do carpo, da extremidade distal do rádio e da cabeça do radio. Podem ocorrer também concomitantemente a lesões ligamentares do carpo1. O formato e localização do escafoide são responsáveis por essa fratura ser tão frequente. A forma mais comum de trauma ocorre durante uma queda da própria altura. Inconscientemente, o paciente para proteger outros segmentos do corpo, estende o membro superior e sofre o impacto com o punho em extensão e a mão espalmada. Aproximadamente, 80% da superfície externa do escafoide são revestidos por cartilagem articular. Ele apresenta articulação com o rádio, semilunar, capitato, trapézio e trapezoide. Sua nutrição ocorre pela penetração de três vasos. Estes foram denominados látero-volar, dorsal e distal, sendo todos provenientes da artéria radial e/ou de seu ramo palmar superficial, em diferentes níveis. A circulação interna é realizada por arcadas

DIAGNÓSTICO A importância do diagnóstico precoce da fratura do escafoide reside no fato da sua frequência e ser muitas vezes de difícil diagnóstico. A história clínica de queda com trauma no punho em hiper-extensão pode fornecer suspeita de fratura. Os sintomas frequentemente são discretos. Podemos observar, durante a inspeção estática um pequeno edema do punho. Na Inspeção dinâmica o paciente refere dor na articulação do punho, sobretudo na região da tabaqueira anatômica que aumenta aos movimentos e estes geralmente estão limitados pela dor. Na palpação podemos encontrar dor durante a palpação do tubérculo 115

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do escafoide e durante a manobra de pistonagem. Muitos pacientes, devido a pouca intensidade dos sintomas não procuram atendimento médico. Na suspeita clínica deve ser solicitado os raios X nas incidências em perfil absoluto, ântero-posterior, póstero-anterior com desvio ulnar do punho e dedos em flexão e as duas oblíquas, uma em pronação de 30 graus e outra em supinação de 30 graus3. Muitas fraturas não são visíveis no dia do trauma e podem não apresentar evidências na radiografia simples até quatro semanas após o trauma. Os pacientes com suspeita diagnóstica de fratura devem ser tratados com imobilização e submetidos a novas radiografias no período de 2 a 4 semanas. Após este período de tempo, devido a absorção óssea no foco de fratura, o diagnóstico radiográfico poderá ser realizado4. As fraturas do escafoide apresentam índice de consolidação superior a 90% quando diagnosticadas precocemente e tratadas corretamente. Aquelas com desvio ou associadas a instabilidades cárpicas apresentam pior resposta ao tratamento clínico. Uma vez feito o diagnóstico deveremos classificar a fratura. Esta atitude poderá nos orientar com relação ao tipo de tratamento e ao prognóstico. As fraturas podem ser divididas quanto à localização do traço em, (1) articular distal, (2) tuberosidade, (3) distal, (4) cintura ou médio e (5) proximal (figura 1).

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Figura 1. Classificação quanto ao local da fratura

Quanto ao tipo do traço em relação ao maior eixo do escafoide, as fraturas são divididas em transversa, oblíqua horizontal e oblíqua vertical2. As fraturas do terço proximal, com pior vascularização, e aquelas que apresentam traço oblíquo vertical, mais instáveis, são as de pior prognóstico com relação à consolidação e ao desenvolvimento de complicações. Para confirmação diagnóstica precoce podemos utilizar outros métodos complementares, como Cintilografia óssea ou Ressonância Magnética ou Tomografia computadorizada. Yin e colaboradores6, realizaram uma revisão sistemática e meta-análise comparando Ressonância Magnética, Tomografia Computadorizada e Cintilografia. Encontraram uma ligeira superioridade da ressonância magnética. Em outro estudo, os autores compararam a tomografia com a ressonância magnética e não encontraram diferenças estatisticamente significantes entre os métodos 116

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quanto a sensibilidade, especificidade e acurácia7.

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As desvantagens do tratamento cirúrgico são os riscos inerentes a este tratamento e o alto custo8. Os trabalhos randomizados comparando o tratamento cirúrgico com o conservador são conflitantes. Os resultados quanto à força de preensão, amplitude de movimentos, tempo de consolidação e retorno ao trabalho variam em cada trabalho9,10,11,13,. Arora e colaboradores9 concluíram que os pacientes submetidos a fixação percutânea com parafuso canulado tiveram um menor tempo de consolidação e um retorno mais rápido ao trabalho. Com estes achados, consideram que os custos indiretos do tratamento conservador acabam sendo maiores que os custos diretos do tratamento cirúrgico. Dias e Colaboradores10 por outro lado observaram um tempo maior para consolidação nos pacientes operados além de riscos desnecessários com a cirurgia. Bond e colaboradores 14 estudando militares profissionais americanos encontraram vantagens na fixação percutânea. O tratamento cirúrgico pode ser indicado naqueles pacientes em que não suportarão três meses de imobilização por razões esportivas, sociais ou trabalho1,15,16,17. A fixação percutânea do escafoide pode ser realizada sob anestesia geral ou bloqueio. O paciente é colocado em posição supina na mesa cirúrgica. Na fixação via volar, utilizando o intensificador de imagens, realiza-se uma incisão de 0,5 cm na pele e com

TRATAMENTO DA FRATURA AGUDA Fraturas do escafoide, sem desvio, visíveis nas radiografias iniciais, podem ser tratadas com aparelho gessado axilo-palmar com 20º de extensão e 15º de desvio radial do punho, incluindo polegar, liberando a articulação interfalangeana, por seis semanas (Figura 2). Após este período, gesso antebraquio-palmar englobando o polegar por três semanas ou até a consolidação radiológica4. Assim muitas vezes necessitamos de longos períodos de imobilização gessada. Figura 2. Gesso axilopalmar incluindo o polegar

As desvantagens do tratamento conservador são a necessidade de prolongado tempo de imobilização e consequente afastamento do trabalho e potencial rigidez articular. A fratura sem desvio pode ser submetida a fixação percutânea com parafuso canulado com assistência artroscópica ou não. 117

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uma pinça Kelly faz-se a dissecção profunda até identificar o polo distal do escafoide. Posiciona-se então o guia com direção ao longo eixo do escafoide. Com um perfurador, realiza-se a passagem do fio guia. Confirma-se a posição com auxílio da radioscopia. Um segundo fio é passado para evitar rotação dos fragmentos durante a inserção dos parafusos. Realiza-se a medição do tamanho do parafuso e insere-se o

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parafuso canulado sob controle radioscópico. Retiram-se os fios guias (Figura 3A e 3B). Pode-se utilizar a artroscopia para confirmar a redução antes e depois da passagem do parafuso. Esta verificação da redução é observada pela articulação médio-cárpica. Utilizamse os portais mediocárpico ulnar para colocação do instrumental e o médio-cárpico radial para introdução da ótica (figura 4).

Figura 3A. Raios X mostra parafuso canulado fixando a fratura do escafóide passado percutaneamente via volar

Figura 3B. Fotos mostrando a cicatriz, a flexão e extensão do punho após 3 meses de PO de fixação percutânea via volar

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tendem a desenvolver retardos de consolidação e pseudartrose, que também ocorrem em fraturas diagnosticadas tardiamente6,16. Nestes casos é recomendada a redução fechada ou aberta do foco de fratura e fixação percutânea ou aberta . A redução pode ser realizada com auxilio da artroscopia18. A redução e a fixação podem ser realizadas por acesso volar ou dorsal. A fixação da fratura pode ser realizada com fios de Kirschner ou se possível com parafusos canulados que permitirão ao paciente uma movimentação precoce do punho19,20. As fraturas que não consolidem até o terceiro mês de tratamento, para efeitos práticos, são consideradas como pseudartrose7. Na Casa da Mão, centro de tratamento da UNIFESP temos observado um crescente aumento de fraturas do escafoide associadas a fraturas da extremidade distal do rádio. Nestes casos temos optado pelo tratamento cirúrgico de ambas as fraturas. Nos casos da fratura do rádio serem tratadas com placa volar, ampliamos um pouco a incisão e fazemos a fixação do escafoide com parafuso canulado. Nos casos da fratura do rádio ser tratada com fixador externo, fazemos inicialmente a redução fechada e a fixação percutânea do escafoide.

A pele é fechada e utiliza-se uma imobilização até a retirada do ponto e inicia-se o tratamento fisioterápico. Na fixação via dorsal, realizamos uma pequena incisão no dorso do punho na topografia do polo proximal. Identificamos o ligamento escafo-semilunar e o mais próximo possível a este passamos nosso fio guia direcionando-o para sair pela pele volar da base do polegar. Realizamos uma radioscopia em perfil e uma em flexão e pronação como descrito por Slade e colaboradores17. Confirmado a boa posição do fio ele é totalmente passado para a região volar até que seja possível colocar o punho em posição neutra. Nova radioscopia é realizada e novamente confirmada a posição do fio guia. Realiza-se a flexão do punho e o fio guia é então passado novamente para a região dorsal. Um novo fio é passado para evitar rotação da fratura. Mede-se o tamanho do parafuso este é introduzido. Confirmada pela radioscopia a posição dos parafusos, retiram-se os fios guias. A pele é fechada e utiliza-se uma imobilização até a retirada do ponto e inicia-se o tratamento fisioterápico. Fraturas com desvios radiográficos maiores do que 1mm têm indicação de intervenção cirúrgica pois

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Fernandes CH, Faloppa F, Leite VM, Albertoni WM. Fraturas do escafoide. In Compacta Ortopédica Traumatológica-Mão. 1992. 2. Fernandes CH, Faloppa F, Leite VM, Santos JBG, Caporrino FA, Nakachima, LR, Belloti JC. Fratura do Escafóide. In Seminários em Ortopedia-Trauma do Membro Superior,. 2003. 3. Munk B, Frokjaer J, Larsen CF, et al. Diagnosis of scaphoid fractures. A prospective multicenter study of 1,052 patients with 160 fractures. Acta Orthop Scand 1995; 66:359-60. 4. Langhoff O, Aandersen JL. Consequences of late immobilization of scaphoid fractures. J Hand Surg 1988; 13:77-9. 5. Herbert TJ, Fisher WE. Management of the fractured scaphoid using a new bone screw. J Bone Joint Surg 1984; 66:114-23. 6. Yin ZG, Zhang JB, Kan SL, Wang XG. Diagnosing suspected scaphoid fractures: a systematic review and meta-analysis. Clin Orthop Relat Res. 2010 Mar;468(3):723-34. 7. Mallee W, Doornberg JN, Ring D, van Dijk CN, Maas M, Goslings JC. Comparison of CT and MRI for diagnosis of suspected scaphoid fractures. J Bone Joint Surg Am. 2011 Jan 5;93(1):20-8. 8. Bond CD, Shin AY, McBride MT, et al. Percutaneous screw fixation or cast immobilization for nondisplaced scaphoid fractures. J Bone Joint Surg 2001; 83: 483-8. 9. Arora R, Gschwentner M, Krappinger D, Lutz M, Blauth M, Gabl1 M. Fixation of nondisplaced scaphoid fractures: making treatment cost effective Prospective controlled trial. Journal Archives of Orthopaedic and Trauma Surgery 2007; 127: 39-46. 10. J.J. Dias, C.J. Wildin, B. Bhowal, J.R. Thompson. Should Acute Scaphoid Fractures Be Fixed? A Randomized Controlled Trial. The Journal of Bone and Joint Surgery. 2005;87:2160-2168. 11. Bedi A, Jebson PJ, Hayden RJ, Jacobson JA, Martus JE. Internal fixation of acute, nondisplaced scaphoid waist fractures via a limited dorsal approach: an assessment of radiographic and functional outcomes.J Hand Surg [Am]. 2007; 32(3):326-33. 12. Saeden, B.; Tornkvist, H.; Ponzer, S.; Hoglund, M. Fracture of the carpal scaphoid: a prospective, randomised 12-year follow-up comparing operative and conservative treatment. The Journal of Bone and Joint Surgery. 2001; 83-B: 230-234. 13. Adolfsson L, Lindau T, Arner M.Acutrak screw fixation versus cast immobilisation for undisplaced scaphoid waist fractures. J Hand Surg [Br]. 2001 Jun;26(3):192-5. 14. Bond CD, Shin AY, McBride MT, Dao KD. Percutaneous screw fixation or cast immobilization for nondisplaced scaphoid fractures. J Bone Joint Surg Am. 2001 Apr;83-A(4):483-8. 15. Yin Z, Zhang J, Kan S, Wang P.Treatment of Acute Scaphoid Fractures: Systematic Review and Meta-analysis. Clin Orthop Relat Res. 2007 16. Folberg CR , Ruschel PH, Pignataro MB, Perea CEF, Caputo GV. Fixação percutânea das fraturas do terço médio do escafóide. Rev Bras Ortopedia. 2004. 17. Slade JF 3rd, Grauer JN, Mahoney JD. Arthroscopic reduction and percutaneous fixation of scaphoid fractures with a novel dorsal technique. Orthop Clin North Am.2001. 32(2): 247-61. 18. Shih JT, Lee HM, Hou YT, Tan CM. Results of arthroscopic reduction and percutaneous fixation for acute displaced scaphoid fractures. Arthroscopy. 2005 May;21(5):620-6 19. Cooney WP. Scaphoid fractures: current treatments and techniques. Instr Course Lect. 2003;52:197-208. 20. Dos Reis FB, Koeberle G, Leite NM, et al.Internal fixation of scaphoid injuries using herbert screw through a dorsal approach. J. Hand Surg 1993; 18:792-7.

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Fraturas dos metacarpos e falanges Sandra Paiva

Fraturas da cabeça do metacarpo São raras, geralmente intra-articulares e resultam de trauma axial ou direto. McElfresh e Dobyns apontaram oito tipos de fraturas da cabeça do metacarpo: epifisárias, avulsão ligamentar, osteocondral, fratura em duas partes, fratura cominutiva, boxer intra-articular, fratura com perda de substância e fratura compressão oculta (com subsequente necrose avascular). O tratamento das fraturas com desvio maior que 1mm consiste na redução e fixação com fios de Kirschner ou parafusos de microfragmentos .Se a fratura for cominuta usamos o fixador externo para realizar a redução por ligamentotaxia .As complicações encontradas são necrose avascular e rigidez articular.

Fraturas dos metacarpos e falanges são as mais comuns da extremidade superior representando cerca de 10 % das fraturas do membro superior e 80% das fraturas da mão. Ocorre com maior frequência no sexo masculino entre a segunda e terceira década de vida DIAGNÓSTICO CLÍNICO E RADIOLÓGICO No diagnóstico clínico, o examinador deve avaliar a atividade profissional do paciente, a mão dominante, as deformidades prévias, as lesões de partes moles e o grau do desvio. Na flexão ativa, as extremidades dos dedos apontam para o tubérculo do escafóide. Nas fraturas dos metacarpos, a cada 5 graus de desvio rotacional temos uma sobreposição de 1,5cm no dedo adjacente ao dedo fraturado. A avaliação radiográfica é suficiente para diagnosticar a maioria das fraturas. Devemos incluir as incidências pósteroanterior, perfil e oblíqua. A tomografia computadorizada fica reservada para complementar a avaliação em casos mais complexos como nas fraturas intra-articulares.

Fraturas do colo do metacarpo São mais comuns no colo do quarto e quinto metacarpos. Têm como mecanismo trauma direto com a mão fechada contra uma superfície dura. O desvio rotacional não é aceito. Fraturas agudas do quarto e quinto metacarpo com angulação palmar podem ser reduzidas pela manobra de Jahss, porém a posição da imobilização não deve ser a mesma da redu-

FRATURAS DOS METACARPOS EXCLUINDO O POLEGAR 121

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ção pelo risco de necrose de pele..A imobilização deve ser feita com 70 graus de flexão da MF e IFP com no máximo 20 graus de flexão. Fraturas com mais de 10 dias e desvio palmar do segundo e terceiro metacarpo até 10 a 15 graus e quarto e quinto metacarpo menor que 30 graus podem ser tratadas conservadoramente já que estes desvios permitem boa função da mão. As fraturas com grandes desvios têm como opção de tratamento a redução fechada e osteossíntese com fios de Kirschner intramedular. Redução aberta e fixação interna com fios, placas e parafusos são indicadas quando a manipulação para restaurar o desvio angular ou rotacional falha.

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curtamento de 2 a 3mm e angulação para o segundo e terceiro metacarpo de até 10 graus e para o quarto e quinto até 20 graus. Desvio rotacional não é permitido. Quando a imobilização gessada não é possível, devemos optar por métodos de fixação interna com fios de Kirschner, parafusos ou placas tendo cuidado na fixação com fio intramedular que pode não evitar a rotação e encurtamento. Fraturas cominutivas geralmente estão associadas a lesões de partes moles. As Fraturas não desviadas devem ser tratadas com imobilização gessada por quatro a cinco semanas As desviadas são difíceis de tratar com redução aberta e fixação interna. Nestes casos, fixação transmetacárpica é realizada para manter o alinhamento e evitar o encurtamento. Fixação externa está indicada nas grandes cominuições, nas fraturas expostas com lesão de partes moles e nas grandes perdas ósseas.

Fraturas da diáfise do metacarpo As fraturas transversas não desviadas podem ser tratadas conservadoramente . Fraturas com desvio rotacional e angulação dorsal maior que 30 graus no quinto metacarpo, mais de 20 graus no quarto metacarpo e qualquer valor no segundo e terceiro metacarpos devem ser reduzidas. Fraturas transversas com desvio rotacional, cavalgamento e encurtamento podem ser reduzidas e estabilizadas com fio intramedular.. Redução aberta e osteossíntese com placa e parafusos são indicadas nas fraturas múltiplas e instáveis e quando não se consegue resultados satisfatório com os fios de Kirschner. Fraturas oblíquas ocorrem por mecanismo rotacional. É aceitável en-

Fratura da base dos metacarpos Geralmente é causada por trauma direto. Na maioria das vezes são fraturas estáveis sem desvios. Fraturas da base do segundo e terceiro metacarpo são mais estáveis que as do quarto e quinto metacarpos. Nas fraturas luxações o tratamento indicado é a redução e a fixação. Fraturas do primeiro metacarpo Green e O´Brien classificaram es122

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tas fraturas em: Tipo I - fratura luxação de Bennettfratura: intra-articular com fragmento interno unido na base do 2o metacarpo pelo ligamento intermetacárpico. Redução aberta e fixação com fio de Kirschner está indicado se existir um deslocamento maior que 1 a 2mm ou deslocamento dos fragmentos maior que 20 por cento da superfície articular . Tipo II - fratura de Rolando: fratura intra-articular com traço em t ou y. O tratamento consiste em redução anatômica aberta ou fechada e estabilização com fios, parafusos ou placa. Tipo IIIA - fratura extra-articular com traço transverso. É aceito até 30 graus de desvio angular. Acima deste, a fratura deve ser reduzida e fixada. Tipo IIIB - fratura extra-articular com traço oblíquo. Deve ser reduzida e fixada. Tipo IV - fratura epfisiólise: ocorre no osso imaturo sendo do tipo II ou III de Salter –Harris . A do tipo II corresponde ao Bennett do adulto. São raras e se não tratada deixam deformidades.O tratamento inclui redução fechada e fixação com fio de Kirschner

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Classificação de Green e O’Brein

FRATURAS DE FALANGES São frequentes na falange distal do dedo médio e do polegar. De acordo com a localização anatômica identificamos as que acometem a falange proximal a média e a distal. A classificação AO reconhece para as fraturas da falange proximal e média quatro tipos: fraturas diafisárias transversas, espirais, obliquas,cominutivas unicondilares e bicondilares da base Para as fraturas da falange distal Kaplan definiu três tipos :longitudinal, cominutiva; e transversa. Classificação de Kaplan

WEISS e HUSTINGS classificou as fraturas condilares em obliqua, sagital longa,coronal dorsal e coronal volar. Nas fraturas diafisárias: não se deve aceitar mais que 10 graus de angulação em qualquer plano assim 123

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como qualquer desvio rotacional.

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redução aberta e fixação interna. Deixar de estabilizar a fratura geralmente leva a grandes desvios com deformidade e incongruência da superfície articular. Fratura da base volar da falange média É resultante de trauma axial. As mais comuns são as fraturas da base volar no local da inserção da placa volar. Quando o comprometimento é menor que 30% a 50% por cento da superfície articular são consideradas fraturas estáveis e o tratamento consiste na redução fechada e imobilização com tala de bloqueio dorsal com a IFP em flexão. Se o comprometimento articular da base da falange média for maior que 30% a 50% a redução aberta e fixação interna apresentam melhores resultados. Quando os fragmentos forem cominutivos temos como opção a tração dinâmica e a artroplastia da placa volar. Fratura da base dorsal da falange média Representam ruptura da inserção da banda central do mecanismo extensor são consideradas fratura em botoeira aguda. O tratamento consiste em imobilização com tala em extensão até seis semanas deixando a IFD livre. Quando associada a luxação volar da falange média e a redução fechada for bem sucedida devemos fixar a articulação com fio de Kirschner transarticular por 3 semanas se, o fragmento dorsal for grande ou a redução fechada falha redução aberta e fixação estão indicados.

Classificação de WEISS e HUSTINGS

Nas fraturas da falange proximal, o fragmento proximal é flexionado pelos interósseos que se inserem na base da falange proximal, enquanto a tração ocorre no fragmento distal pela ação do capuz extensor resultando na deformidade típica de angulação volar e desvio dorsal. Nas fraturas da falange média, a inserção do tendo flexor superficial na falange média determina a angulação da fratura. Quando o traço de fratura for distal, a inserção do tendão flexor superficial à deformidade apresenta angulação volar e desvio dorsal. Já quando o traço for proximal, a inserção do TFS a deformidade será com angulação dorsal e desvio volar. Fraturas intra-articulares São fraturas que atingem um ou ambos os côndilos da falange proximal ou média. O tratamento na maioria das vezes necessita de fixação que pode ser com pinos percutâneos ou, se a redução fechada não for possível, 124

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Neto PJP. Fraturas de metacarpianos. In: Pardini A. Freitas A. Traumatismos da mão, 4 ed; Rio de Janeiro: Medbook, 2008:555-22; 2. Stern PJ. Fractures of the metacarpals and phalanges In: Green DP, Hotchkiss RN, Pederson WC (eds.). Green’s operative hand surgery. 5 ed., Philadelphia: WB Saunders, 2005:227-08; 3. Kaplan EB. Functional and surgical anatomy of the hand. 2 ed., Philadelphia: J. B. Lippincott, 1965

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Lesões traumáticas do punho (osteoligamentares) Rafael Lara

Rádio distal Epidemiologia De todas as articulações do membro superior, o punho é a mais susceptível a lesões traumáticas. A incidência relatada é de aproximadamente 1:500 pessoas e é contabilizada como um sexto de todas as fraturas vistas em salas de emergência. Este capítulo destina atenção especial às lesões osteoligamenteres pós-traumáticas do punho. Anatomia A metáfise do terço distal do rádio é composta basicamente de osso trabeculado, com corticais delgadas, especialmente na região dorso–radial. A superfície articular apresenta uma característica bicôncava voltada para a fileira proximal do carpo (fossa do escafóide e do semilunar). Anatomia Funcional 80% da carga axial é distribuída para o terço distal do rádio, 20% na Fibrocartilagem Triangular (FCT). A articulação entre o rádio com o escafóide e o semilunar forma a articulação radiocarpal, responsável pela maioria da flexo-extensão do punho. Não há contato direto da ulna com os ossos do carpo, estes apresentam a FCT interposta entre a ulna distal e o osso piramidal. In-

versão do impacto palmar normal transfere parte da carga para a FCT, a força restante é distribuída de forma excêntrica pelo rádio distal e concentricamente no aspecto dorsal da fossa do escafóide. Anatomia Ligamentar Geralmente permanece intacta nos traumas, permitindo a redução das fraturas através da ligamentotaxia. Mecanismo de Trauma Biomecânica dos padrões de fratura: 1) Flexão: a metáfise falha em tensão (Fratura de Colles e Smith); 2) Compressão: fratura da superfície articular com impacção de osso subcondral e metafisário (Die-punch); 3) Cisalhamento: fraturas da superfície articular (Fratura de Barton); 4) Fraturas avulsões; 5) Fraturas combinadas: ocorre em casos de alta energia Relações radiográficas normais. 1) Inclinação radial: média de 23° (13-30°); 2) Comprimento do rádio: média 13 mm (8-18mm); 3) Inclinação volar: média de 11° (1-21°) Padrões de Fratura 1) Fratura de Colles (90%): originalmente descrita para fraturas extraarticulares, no presente, empregada para situações intra e extraarticulares do rádio distal demonstrando várias 126

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angulações de desvios dorsais, inclinação radial e encurtamento do rádio. Mecanismo de trauma: queda sobre a mão estendida, desvio radial do punho com o antebraço em pronação. Fraturas intraarticulares são frequentemente encontradas em pacientes jovens resultantes de trauma de alta energia. Podem estar associadas a outras lesões como: neurovasculares, dos ossos do carpo e da ulna distal, estando mais frequente associada a fratura das articulações radiocárpica e radioulnar distal. 2) Fratura de Smith: descreve uma fratura com afundamento em flexão palmar. Mecanismo de trauma: queda sobre a mão estendida com o antebraço em supinação. São fraturas notoriamente instáveis, e geralmente requerem redução aberta e fixação interna devido a dificuldade de manutenção em redução fechada. 3) Fratura de Barton: fratura subluxação do punho. Mecanismo de trauma: queda sobre punho dorsifletido com o antebraço fixo em pronação. Tanto os desvios dorsais quanto volares foram descritos por Barton. O volar é mais frequente. São fraturas instáveis que também requerem redução aberta e fixação interna com uma placa de suporte devido a instabilidade e dificuldade de manutenção em redução fechada. 4) Fratura da estiloide ulnar (Chauffer): também chamada de fratura de Hutchinson. Ocorrem em decorrência da avulsão dos ligamentos extrínsecos que permanecem aderidos ao fragmento da estiloide radial. Mecanismo de trauma: compressão

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do escafoide contra a estiloide radial com o punho e dorsiflexão e desvio ulnar. Pode envolver toda a estilóide, segmento volar ou dorsal. Geralmente estão associadas a lesões dos ligamentos intercarpais (ex. Dissociação escafossemilunar, luxação perissemilunar). Em geral, também requerem redução aberta e fixação interna. Classificação Frykman: baseada no padrão de envolvimento intraarticular. Tipos I e II: extraarticulares; Tipos III e IV: envolvem a articulação radiocárpica; Tipos V e VI: envolvem a articulação radioulnar distal; Tipos VII e VIII: envolvem a articulação radiocárpica e radioulnar distal; Tipos I, III, V e VII: Estilóide ulnar intacta; Tipos II, IV, VI e VIII: Estiloide ulnar fraturada. Melone: também baseada no padrão de envolvimento intraarticular, porém com um mecanismo consistente de impacção do semilunar. Tipo I: estável, sem cominução; Tipo II: die-punch instável dorsal ou volar IIA: Redutível ou IIB: Irredutível; Tipo III: fratura spike com contusão das estruturas volares; Tipo IV: cisalhamento; fratura do complexo medial com desvio dorsal e palmar com fragmentos separados e desviados; Tipo V: fratura por explosão, severa cominuição com danos de partes moles intensos. AO/ASIF: baseado na severidade do trauma e grau de cominuição: 1) Tipo A: extraarticular; 2) Tipo B: articular parcial; 3) Tipo C: intraarticular completa. 127

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Tratamento: Fatores: personalidade de fratura: 1) Locais: qualidade óssea, lesão de partes moles, cominuição associada, em extensão da fratura e energia do trauma. 2) Paciente: idade fisiológica, estilo de vida, ocupação, membro dominante, lesões associadas e obediência. Fraturas estáveis: 75-80% = Redução fechada e imobilização gessada. Punho em 20 graus de flexão volar e desvio ulnar. Deve confeccionar um gesso bem moldado. Obs: posição do antebraço, tempo de imobilização e necessidade por um gesso longo permanecem em controvérsias, nenhum estudo prospectivo demonstrou superioridade de um método em relação ao outro. Evitar flexão extrema – promove aumento da pressão no túnel do carpo com consequente compressão do nervo mediano e rigidez digital. Fraturas instáveis: 1) Fixação percutânea com fios: primariamente usada para fraturas extraarticulares ou intraarticulares em 2 partes. 2 ou 3 fios posicionados atraves da linha de fratura, geralmente da estiloide radial para proximalmente e na face dorsoulnar do segmento radial proximal. 2) Fixação percutânea com fios e gesso: relatos de sucesso e baixo índice de complicações no passado, divergem de outros métodos atuais. Com resultados elevados de complicações, especialmente relacionados aos fios, apesar disto,

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ainda continua sendo realizado. 3) Fixadores externos: tem aumentado em popularidade baseado em estudos com baixos índices de complicação. O tipo de configuração não e crítico, porém montagens quadriláteras são desnecessárias, deve-se estar atento para evitar distração em excesso. Fixadores articulados e convencionais permitem dinamização e fácil ajuste, por isso vem ganhando popuplaridade. Recomenda-se o uso por período de 6-8 semanas conforme o padrão de fratura. Complicações: distrofia simpático reflexa, rigidez do punho, fratura no sítio dos pinos, neurite do nervo sensitivo radial, isto pode ser evitado posicionando o pino de Shanz após visualização direta do nervo. A ligamentotaxia restaura o comprimento e inclinação radial, porém, raramente restabelece a angulação volar. Em geral, são empregados provisoriamente para promover ligamentotaxia em fraturas abertas. 4) Redução aberta limitada: Pode ser útil em casos de degraus articulares (> 2 mm) persistentes apos redução fechada e tração; geralmente asssociada a desvio da faceta do semilunar. É preconizado por alguns autores uma redução aberta limitada usando fios de K e enxerto ósseo. 5) Redução aberta e fixação interna: é necessária para certos tipos de fratura, especialmente de cisalha128

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mento vertical, frequentemente Barton dorsal ou volar, assim como nos casos de fraturas de Smith. Fraturas articulares complexas podem ser tratadas com redução aberta e fixação interna após cuidadoso planejamento préoperatório e adequado estudo radiográfico. Placa e parafusos: para fraturas com envolvimento articular, respeitando técnica de redução anatômica e estabilidade absoluta na articulação. Podem ser usados parafusos convencionais, canulados ou placas com parafusos de ângulo fixo, principalmente em casos de fragmentação e ossos de má qualidade. Complicações: aproximandamente 30%. Segundo algumas séries, mas pode variar de acordo com os padrões de fratura e tratamento. 1) Alterações do nervo mediano: porém o manuseio destas lesões pode ser controverso, algumas considerações podem ser feitas: lesão completa sem melhora após redução da fratura requer exploração cirúrgica do nervo. 2) Lesão do nervo após manipulação fechada: liberar a imobilização gessada e posicionar o punho em neutro. Se não houver melhora, considerar exploração do nervo e neurólise. 3) Em casos de lesões incompletas, a intervenção cirúrgica é necessária, mais indicada a liberação cirúrgica. 4) Não consolidação. 5) Artrite pós traumática, radiocárpica e radioulnar. 6) Distrofia simpático reflexa. 7) Rigidez digital, punho e antebraço.

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8) Ruptura tendinosa (mais comum extensor longo do polegar). 8) Instabilidade mediocárpica (tipo VISI com angulaçao dorsal). 9) Infecção (trajeto do pino, profunda). 10) Contratura isquêmica de Volkmann. Punho Generalidades O rádio distal apresenta duas facetas articulares separadas por uma crista para articulação do escafóide e semilunar. A fossa sigmóide articula com a ulna distal e o processo estilóide serve como inserção para a FCT. Ossos do carpo: fileira distal: o trapézio, trapezóide, capitato e hamato são conectados entre eles e na base dos metacarpianos por ligamentos fortes, fazendo deles uma fileira relativamente imóvel. Fileira proximal: escafóide (uma estrutura oblíqua que alonga-se para as duas colunas), semilunar, piramidal e pisiforme. Articulações: radioulnar distal, radiocarpal e mediocárpica. Relações anatômicas normais 1) 10° de angulação volar no perfil; 2) 20° de inclinação ulnar na incidência ântero-posterior; 3) 12 mm da estilóide radial ate a superficie articular do rádio; 4) 0° de ângulo capitato-semilunar – uma linha estreita direcionada da diáfise do terceiro metacarpo, capitato, semilunar e diáfise do rádio quando o punho se encontra em posição neutra. 5) 47° ângulo escafossemilunar (ângulo normal 3070°) menos de 2 mm do espaço escafosemilunar 129

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Ligamentos do punho Os ligamentos extrínsecos conectam o rádio distal ao ossos do carpo e o carpo aos metacarpos. Os ligamentos intrínsecos conectam os ossos do carpo entre eles (ex: escafosemilunar e semilunopirimidal). Em geral, os ligamentos dorsais são mais fracos que os ligamentos volares. Os importantes ligamentos volares são: 1) Radioescafocapitato (controla a cinemática do escafóide); 2) Radioescafosemilunar (estabiliza a articulação escafosemilunar); 3) Radiossemilunar; 4) Radiosemilunopiramidal (mantém a fileira proximal, estabiliza as articulações radiosemilunar e semilunopiramidal). Espaço de Poirer: área livre de ligamentos no espaço semilunocapitato – potencial fraqueza. Complexo fibrocartilginoso triangular (FCT): o principal estabilizador do carpo ulnar e articulação radioulnar distal. A FCT absorve 20% da carga axial através da articulação do punho. Este complexo de estruturas consiste em muitos elementos, incluída o ligamento radiopiramidal (menisco), disco articular, ligamento semilunoulnar e ligamento colateral ulnar. Vascularização As artérias radial, ulnar e interóssea anterior formam um rede de pequenas artérias transversais tanto dorsal quanto ulnar. O suprimento sanguíneo para o escafóide é proveniente da artéria radial tanto dorsal quanto volar. Os ramos volares suprem 20-30% do escafóide enquanto os ramos dorsais

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suprem com 70-80% do segmento proximal. O semilinar recebe suprimento sanguíneo da sua superfície dorsal e volar na maioria dos casos (80%). Aproximadamente 20% do semilunar tem apenas um ramo volar. Cinemática Em função da complexidade entre articulações e ligamentos, a mecânica do punho é muito complicada (tabela com dados). O escafóide repousa no ligamento radioescafocapitato como uma cinta. Fazendo deste ligamento um eixo, ele roda a partir de uma flexão volar de uma posição perpendicular para uma posição dorsofletida longitudinal. Punho em desvio radial

Punho em desvio ulnar

Fileira proximal

Fletido, translação ulnar

Extendido, translação radial

Escafóide

Encurtado

Alongado

Semilunar

Triangular

Trapezoidal

Alterações biomecânicas Classicamente, o rádio, o semilunar e o capitato foram descritos como uma conexão central colinear com o plano sagital. O escafóide atua como elemento de conexão. Algum momento em flexão transmitido através do escafóide é balanceado com um momento em extensão no piramidal. Quando o escafoide é desestabilizado por uma fratura ou lesão li130

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gamentar, o semilunar e o piramidal assumem a posição de dorsiflexão excessiva (padrão DISI) e o ângulo escafossemilunar ficam absurdamente elevado (70°). Quando o piramidal está desestabilizado (geralmente por ruptura do complexo ligamentar semilunopiramidal) o padrão contrário acontece (VISI) visto como segmento intercalado fletido volar. Mecanismo de trauma O mecanismo de trauma mais comum é a queda sobre a mão estendida, que produz forças em extensão, desvio ulnar e supinação intercarpal. Um padrão de fratura visto progredindo do lado radial do carpo para o mediocarpo e finalmente para o carpo ulnar. Lesão do grande arco: geralmente resulta em transescafoide ou transescafo- transcapitato-perissemilunar fratura luxação. Lesão do pequeno arco: resulta em luxação semilunar ou perissemilunar. A sequência progressiva da instabilidade perissemilunar é vista da seguinte maneira: a partir da articulação escafossemilunar – articulacão mediocárpica – semilunopiramidal – ligamento radiossemilunopiramidal – luxação volar do osso semilunar. Tratamento Diagnóstico precoce e acurado das fraturas carpais e lesões ligamentares é crucial. É muito importante corrigir os desvios da fratura e identificar que o desvio da fratura está associado com significante lesão ligamentar. Imobilização efetiva é mandatória para evitar não consolidação. Peque-

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nas avulsões ósseas (ex. Piramidal, estilóide radial) não devem ser consideradas como lesões triviais ou não relevantes. Sabendo que os ossos do carpo são largamente cobertos por cartilagem e apresentam múltiplos complexos ligamentares e articulares, o princípio da restauração da congruência articular com redução aberta e fixação interna frequentemente é aplicado. Escafoide É o osso do carpo mais frequentemente fraturado. O mecanismo mais comum é a queda sobre a mão espalmada que induz a dorsiflexão forçada, desvio ulnar e supinação intercarpal. Anatomicamente o escafoide é dividido em polo proximal e distal, um tubérculo e uma cintura. Achados clínicos incluem dor no punho, edema e dor na tabaqueira anatômica. Classificações: Russe: horizontal oblíqua, tansversa e vertical oblíqua. Por localização: terço distal, terço médio (cintura = mais comum) e terço proximal. Geralmente o rx é evidente, com incidências oblíquas do escafoide com desvio ulnar e radial do punho. Quado o exame clínico é sugestivo de fratura porém o rx não diagnostica, uma imobilizaçao pode ser realizada e seguimento do paciente por período de 1-2 semanas para realização de novo exame radiográfico com confirmação do diagnóstico. Fraturas desviadas geralmente requerem redução aberta e fixação interna. Fraturas não desviadas podem ser tratadas conservadoramente com gesso longo por 6-12 131

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podem ser úteis em casos especiais. Tratamento de fraturas não desviadas inicia-se com imobilização gessada. Excisão do fragmento pode ser necessária em casos de desvio e não consolidação. Complicações: diagnóstico tardio, não consolidação dolorosa, neuropatia ulnar ou mediano, ruptura tendinosa por atrito com os tendões flexores do 5° dedo da mão. Capitato Pode ser consequência de um trauma isolado ou resultante de lesão do grande arco (transescafóide, fratura luxação transcapitato perissemilunar). Complicações de fraturas do capitato são resultado de desvio do polo proximal, que leva ao colapso do capitato e artrose mediocarpal. A maioria das fraturas requer redução aberta e fixação interna para o restabelecimento da anatomia normal.

semanas. A via de acesso volar entre o tendão flexor radial curto e a artéria radial oferece boa exposição para redução aberta e reparo do ligamento radioescafossemilunar. O acesso volar é menos lesivo para o suprimento sanguíneo do vulnerável polo proximal. Complicações: retardo de consolidação e pseudoartrose, assim como necrose avascular, especialmente do polo proximal. Tubérculo do hamato É uma fratura comum em atividades desportivas com o uso da palma para empunhar objetos (baseball, golf e hoquei). Os achados clínicos são dor e edema sobre o tubérculo do hamato. Neuropatia do ulnar e mediano podem ser encontradas. O exame radiográfico pode ser realizado com incidências em túnel e oblíquas com desvio radial e semipronação. Tomografia computadorizada e cintilografia

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Wrist anatomy. Richard A. Berger. In: The Wrist : Diagnosis and Operative Treatment. William P. Cooney. Lippincott Williams & Wilkins 2010, 25-76. 2. Carlsen BT, Shin AY. Wrist instability. Scan J Surg 2008;97(4):324-32. 3. Distal radius fractures. Liporace FA, Adams MR, Capo JT, Koval KJ. J Orthop Trauma 2009 NovDec;23(10):739-48. 4. Radiocarpal fracture-dislocations. Ilyas AM, Mudgal CS. J Am Acad Orthop Trauma 2008 Nov;16(11):647-55. 5. Complications of Distal Radius Fracture Fixation. Patel VP, Paksima N. Bulletin of the NYU Hospital for Joint Diseases 2010;68(2):112-8. 132

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Lesões tendinosas da mão Ricardo Pereira

Lesões dos tendões flexores Os tendões têm por finalidade realizar a tração do esqueleto e provocar o movimento articular. Por ser a mão um instrumento de trabalho e o tendão uma estrutura superficial sua lesão é bastante frequente.

Figura 1. Divisão da mão em zonas

Anatomia Ao passar pelo túnel carpal, o flexor longo do polegar penetra numa abertura na parede lateral deste túnel e se insere na falange distal, sendo sua bainha reforçada por um sistema de três polias. Em relação aos outros dedos ao passarem pelo túnel, os mesmos seguem separadamente, um flexor profundo e um superficial que na altura da metacarpofalangiana se divide (Quiasma de Camper), para penetração do flexor profundo até as respectivas inserções nas falanges média e distal. Verdan1 propôs uma divisão anatômica da mão em cinco zonas (figura 1) para facilitar a classificação das lesões tendinosas. Zona I

Parte distal a IFD

Zona II

Polia A1 até a inserção do flexor superficial

Zona III

Parte distal do túnel cárpico até polia A1

Zona IV Zona V

Kleinert cita a presença das cinco polias anulares e quatro cruzadas (figura 2) e a importância, sobretudo, das polias A2 e A4 (mais largas) que devem ser sempre preservadas ou reconstruídas durante o ato cirúrgico, evitando transtornos biomecânicos com a formação do arco de corda e consequente diminuição da força de flexão do dedo. Figura 2. As cinco polias anulares e as quatro cruzadas

Túnel carpiano Zona proximal ao túnel

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Smith descreve duas fontes de nutrição para o tendão, uma vascular representada pelos vasos da palma da mão, pelo ponto de inserção ósseo e pelo sistema de vínculas curta e longa e outra sinovial (figura 3).

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Fatores que influenciam a formação de aderências (cicatrização extrínseca). yy Traumas de tendão e bainha; yy Lesão inicial e cirurgia reparadora; yy Isquemia; yy Imobilização prolongada; yy Gap no sitio de reparo; yy Excisão dos componentes da bainha.

Figura 3. Desenho esquemático da nutrição do tendão flexor

Diagnóstico. Paciente apresenta uma incapacidade de fletir a interfalangiana distal nas lesões do flexor profundo, uma incapacidade de fletir a interfalangiana proximal nas lesões do flexor superficial e mantém uma atitude de extensão total do dedo nas lesões dos flexores superficial e profundo. Lesões associadas dos nervos digitais com alterações de sensibilidade e Tinel, lesões das artérias digitais com perda da perfusão e fraturas devem ser consideradas e também reparadas.

Cicatrização Gelberman mostra em seus trabalhos uma sequência biológica para cicatrização dos tendões (cicatrização intrínseca) (figura 3). yy 1 semana: resposta inflamatória. yy 3 semanas: proliferação fibroblástica. yy 8 semanas: colágeno maduro.

Tratamento As lesões tendinosas mais comuns são decorrentes de acidentes com materiais perfurocortantes e exigem um atendimento de urgência que deve ocorrer até a primeira semana, para evitarmos complicações como retrações excessivas dos cotos tendinosos, fechamento dos túneis, formação de aderência e rigidez. Classicamente Brunner5 sugeriu um acesso volar em ziguezague com ângulos de 90 graus colocados nas pregas de flexão dos dedos, evitando sofrimento

Figura 3. Desenho esquemático da sequência biológica dos tendões

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Lesões crônicas São consideradas lesões com mais de 8 a 10 semanas de evolução, onde quase sempre nos deparamos com fechamento do túnel osteofibroso e um tendão no seu segmento distal bastante degenerado. Nesta situação indicamos a cirurgia em dois tempos. 1o tempo: colocação do espaçador de silicone e reconstrução das polias A2 e A4 com enxerto de tendão ou parte do retináculo dos extensores. 2o tempo: três meses depois, retirada do silicone e tenoplastia com enxerto do palmar longo ou do plantar delgado e fixação distal com pullout (figura 5)

vascular e formações de bridas. Strickland listou as características ideais para o reparo primário: yy Suficientemente forte; yy A vascularização não poderá ser lesada; yy A superfície tem que permanecer lisa; yy Técnica atraumática; yy Material não deverá ser irritante. As lesões na zona II “terra de ninguém”, são consideradas lesões de prognóstico mais reservado, pois a presença de um túnel osteofibroso mais longo e espesso predispõe a formação de aderências e por isso merece uma atenção especial. Trabalhos mais recentes mostram a necessidade de realizarmos suturas cada vez mais resistentes (figura 4), que nos permitam realizar uma reabilitação precoce e com isso diminuir o risco de formação de aderências permitindo o deslizamento do tendão com mínimo de atrito possível. A tenólise está indicada quando não temos uma excursão adequada do tendão, em decorrência da formação de aderências após quatro a seis meses de reabilitação.

Figura 5. Pull-out

Lesão dos tendões extensores Por se tratar de uma estrutura anatômica superficial as lesões envolvendo os tendões extensores também são muito frequentes. Como em toda área da mão o conhecimento da anatomia do aparelho extensor é crucial para o entendimento das lesões e seu tratamento.

Figura 4. Exemplos de suturas com duas e quatro passagens

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Anatomia do aparelho extensor.

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Figura 2. Anatomia do aparelho extensor (vista lateral)

Figura 1. Anatomia do aparelho extensor (vista dorsal)

Figura 2. Anatomia do aparelho extensor (vista lateral)

Lesão na zona I - DEDO EM MARTELO A lesão do tendão extensor terminal acarreta uma deformidade em flexo da intefalangeana distal (IFD), podendo ou não estar associado a uma fratura avulsão do dorso da falange distal. Classificação do dedo em martelo segundo Albertoni. 136

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Figura 2. Anatomia do aparelho extensor (vista lateral)

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Figura 5. Técnica de bloqueio dorsal para tratamento do dedo em martelo com fratura associada

Nas lesões crônicas, consideradas com mais de 15 dias de evolução, a melhor indicação é a tenodermodese utilizando a técnica de Brooks-Graner (fig.6).

Nas lesões agudas com flexo da IFD até 300 tratamento conservador com uma splint mantendo a IFD em extensão por 6 a 8 semanas. Nas lesões agudas com flexo acima de 300 a melhor indicação é o tratamento cirúrgico com bloqueio da IFD em extensão por 6 semanas com fio de Kirschner. Nos casos associados a fratura avulsão do dorso da falange distal e deformidade em flexo acima de 300, o bloqueio da articulação e redução da fratura é realizado utilizando o seguinte método (fig. 5).3

Figura 6. Técnica de BrooksGraner

Lesão na zona II Nessa zona não há grande retração e a sutura primária (fig. 7) é a melhor indicação, podemos realizar o bloqueio da IFD com fio de Kirschner ou com 137

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uma splint metálica por 6 semanas.

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bluxadas passam a exercer uma força de flexão sobre a IFP (fig. 8). Nas lesões agudas o tratamento conservador com uma splint metálica mantendo a IFP em extensão por 6 semanas é a melhor opção, alguns autores recomendam o bloqueio da articulação IFP com fio de Kirschner. Nas lesões crônicas recomendamos o tratamento cirúrgico utilizando a técnica de Matev 4 (fig.9). A tenotomia do aparelho extensor terminal também pode ser indicado para alguns casos de botoeira crônica bem como a secção mais distal das bandeletas laterais procurando preservar o ligamento retinacular oblíquo e relaxar o aparelho extensor5.

Figura 7. Técnicas de sutura do aparelho extensor

Figura 8. A, Lesão do tendão extensor central.B, Subluxação anterior das bandeletas laterais com flexão da IFP e extensão da IFD ( dedo em botoeira)

Figura 9. Técnica de Matev para tratamento dedo em botoeira crônico

Nas lesões envovendo as zonas IV, V,VI,VII os tendões apresentam pouca espessura e as suturas do tipo chuleio ou pontos em forma de “U” são indicadas com fios inabsorvíveis e com agulha cilíndrica, na zona VIII os tendões são calibrosos e permitem suturas de aproximação e epitendinosas como nos tendões flexores.

Lesão na zona III - DEDO EM BOTOEIRA É a lesão da banda central do aparelho extensor na articulação IFP com subluxação das bandeletas laterais para volar mais lesão do ligamento triangular. As bandeletas laterais su138

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Albertoni WM, Leite VM. Lesões dos tendões extensores. In: Pardini Jr AG . Traumatismo da Mão . 3 ed ., Rio de Janeiro: MEDSI, 2000; 351-80. 2. Albertoni WM. In: Tubiana R. The Hand. 1 ed ., WB. Saunders, 1988:97-100. 3. Giostri GS, Santos JBG. Lesão tendões extensores. In: Pardini Jr AG. Traumatismo da Mão 4 ed.,2008; 347-360. 4. Matev I:transposition of the lateral slips of the aponeurosis in treatment of long –standing “Boutonniere deformity” of the fingers, Br J Plast Surg. 1964; 17:281-286. 5. Mattar Jr.R. Lesão do aparelho extensor. In: Silva JB. Crurgiada mão – trauma. Rio de Janeiro. REVINTER, 2003:149-63. 6. Verdan C. Pratical considerations for primary and secondary repair in flexor tendon injuries.Surg Clin North Am 1964;44:951-70. 7. Kleinert HE, Mears A. In quest of solution to severed flexor tendons. Clin Orthop Rel Res 1974: 104:23-9. 8. Smith JW. Blood supply of tendon. J Surg 1968;109:272-6. 9. Gelberman RH, Berg JS, Lundborg GN, Akeson WH. Flexor tendon healing and restoration of the gliding surface. J Bone Joint Surg 1983: 65:70-80. 10. Brunner JM. The zig-zag volar-digital incision for flexor tendon surgery.Plast Reconstr Surg 1967; 40: 571-4. 11. Strickland JW. Flexortendon repair . Hand Clin 1985 ; 1:55-68. 12. Zumioti AV, Ohno PE, Guarnieri MV et al. O emprego da tenólise em reimplante de dedos. Ver Bras Ortop 1993;28(10):737-42.

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Fraturas da pelve Daniel Balbachevsky

INTRODUÇÃO As fraturas instáveis do anel pélvico, que podem cursar com instabilidade hemodinâmica do paciente, são cada vez mais frequentemente atendidas pelos ortopedistas nos pronto-socorros de nosso país. A melhoria do atendimento pré-hospitalar, o aumento de proteção aos traumatismos cranianos e torácicos nos automóveis e o aumento do poder aquisitivo das pessoas em geral, contribuem para que a ocorrência destas lesões aumentem, e que os pacientes cheguem com vida nos centros de atendimento hospitalar. O tratamento destes pacientes é multidisciplinar, pois geralmente ocorrem lesões associadas de outros órgãos. Apenas 0,16% dos pacientes com fraturas expostas, por exemplo, apresentam-se com a fratura isolada. Portanto as diversas lesões devem ser tratadas por uma equipe multidisciplinar, de forma hierarquizada, conforme a gravidade das lesões e prioridade de riscos à vida do paciente. Muitas vezes é difícil definir qual a lesão mais grave, seja torácica, abdominal ou ortopédica, a ser tratada prioritariamente. Mas é indispensável a presença do ortopedista na sala de emergência, na chegada deste paciente, para que seja feito mesmo que de forma provisória, o controle do san-

gramento da pelve, com a diminuição de seu volume de forma mecânica, para que aumente as chances de que o paciente restabeleça a estabilidade hemodinâmica, para que possa chegar ao centro cirúrgico ou para que consiga realizar exames diagnósticos para outras lesões. A função imediata do ortopedista nestas lesões é identificar os pacientes propensos a ter fraturas da pelve, diagnosticá-las precocemente, assim como suas lesões associadas e suas particularidades, como exposição óssea, lesão vesical e neurológica, por exemplo, e realizar procedimentos para a salvação destes pacientes. Os procedimentos constam basicamente de métodos de estabilização óssea e diminuição do volume da pelve, quando aumentado, e realizar ou indicar procedimentos adicionais de tamponamento pélvico ou angiográfico de embolização seletiva. DIAGNÓSTICO A radiografia na incidência ânteroposterior associada ao exame físico são suficientes para diagnosticar uma lesão importante do anel pélvico, que justifique a alteração hemodinâmica do paciente. As radiografias complementares da pelve, para o diagnóstico mais preciso de fratura da pelve, só devem ser 140

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realizadas após a estabilidade hemodinâmica e respiratória do paciente. Deve-se fazer uma série de radiografias que incluem a incidência AP, a incidência AP com inclinação de 60° craniocaudal (inlet) e a AP com inclinação caudocranial de 45° (outlet). Estas radiografias mostram as alterações rotacionais e ajudam a avaliar o anel pélvico. As incidências oblíquas alar e obturatriz completam a série de radiografias e avaliam as asas dos ilíacos e os acetábulos apropriadamente. Atualmente a tomografia computadorizada deve ser realizada para estudar com maior precisão as lesões posteriores, proporcionando um melhor entendimento, principalmente com as reconstruções tridimensionais. Nas avaliações das fraturas que incluem o sacro, as articulações sacroilíacas e o acetábulo, estes exames são extremamente úteis.

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que não foi constatado sangramento abdominal ou torácico, devemos partir para o tratamento ortopédico com fechamento do anel pélvico na emergência, com a utilização do fixador externo, com isso diminuímos o volume da pelve e fazemos hemostasia por diminuição do espaço na região retroperitonial. Paralelamente, devemos intervir com reposição hidroeletrolítica adequada ao paciente. Caso essa primeira providência não surta efeito, podemos lançar mão de outros recursos. A embolização arterial pode ser conseguida com uma angiografia digital, porém é um recurso que muitas vezes não está disponível em muitos hospitais. Outra opção amplamente difundida na Europa e Estados Unidos da América, é a realização do tamponamento com compressas (pelvic packing), com colocação de conjuntos de compressas na região retropúbica e sacroilíacas, provisoriamente, para conter o sangramento de forma mecânica, na tentativa de restabelecer o controle hemodinâmico do paciente. A maioria das lesões pélvicas associadas à instabilidade hemodinâmica do paciente apresenta melhora após a estabilização da pelve com fixador externo e fechamento do anel pélvico. Nas lesões Tipo C, muitas vezes é necessário a utilização de tração no membro inferior para redução e estabilização da ascensão da hemipelve. Após o tratamento de emergência o paciente deve ser encaminhado à unidade de terapia intensiva, se ne-

TRATAMENTO Estes pacientes são, por via de regra, politraumatizados e como tais devem ter uma avaliação multidisciplinar. Muitas vezes apresentam lesões associadas que devem ser tratadas antes ou até mesmo concomitantemente com as lesões da pelve. Principalmente naqueles pacientes que apresentam quadro hemodinâmico instável, deve-se suspeitar de sangramento retroperitonial provocado pela lesão de vasos e pelo próprio sangramento do ilíaco, podendo levar o paciente ao choque hipovolêmico. Nestes pacientes, em 141

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(parafusos da asa do ilíaco, sacroilíaco e placa transilíaca).

cessário, e reoperado após a melhora de suas condições clínicas, preferencialmente antes da segunda semana após a lesão inicial.

CONSIDERAÇÕES FINAIS As fraturas da pelve são lesões relativamente raras, porém com capacidade de causar extrema instabilidade hemodinâmica e até a morte, visto que a taxa de mortalidade gira em torno de 10 a 15% nas lesões fechadas, e a até 50% nas fraturas expostas. O rápido diagnóstico, entendimento da lesão e tratamento adequado, são essenciais para a sobrevida dos pacientes e para o bom resultado funcional. Uma equipe bem treinada, com experiência no tratamento destas fraturas; um centro de trauma equipado com equipamentos de imagem, equipe multidisciplinar e retaguarda de UTI; e o instrumental e implantes de boa qualidade, são também essenciais para a fixação cirúrgica, e de suas possíveis complicações.

Técnicas Minimamente Invasivas Como já citado anteriormente, os pacientes vítimas de fraturas da pelve, são geralmente politraumatizados em estado clínico grave, que necessitam tratamento urgente e de preferência com mínima agressão cirúrgica adicional, seja por dissecção de partes moles, ou por sangramento e tempo cirúrgico prolongado. As técnicas mais utilizadas percutaneamente são os fixadores externos e os parafusos sacro-ilíacos, porém outras técnicas podem ser utilizadas, seja para as lesões anteriores (parafusos de ramos púbicos e placa infrapectínea) ou para as lesões posteriores

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Tile M. Fractures of the pelvis and acetabulum. 3rd ed. Philadelphia: Williams & Wilkins, 2003. 2. Rothenberger D, Velasco R, Strate R, Fischer RP, Perry JF. Open Pelvic Fracture: A Lethal Injury. J Trauma. 1978; 18(3):184-7. 3. Suzuki T, Smith WR, Moore EE. Pelvic packing or angiography: competitive or complementary? Injury. 2009; 40: 343-53. 142

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Fraturas do acetábulo Vincenzo Giordano Marcos Giordano

ANATOMIA E EPIDEMIOLOGIA O acetábulo corresponde a uma cavidade hemisférica incompleta, formada pela união dos três ossos pélvicos, ílio, púbis e ísquio, unidos durante a fase embrionária, pela cartilagem trirradiada. Ao longo do período de imaturidade esquelética, a cartilagem trirradiada mantém-se aberta, com seu ápice representando o fundo do acetábulo, ocorrendo a fusão dos três ossos entre 18 e 23 anos de idade. Apresenta uma superfície articular em forma de ferradura (“U” invertido), recoberta por cartilagem hialina, circundando uma parte central sem cartilagem, a fossa cotilóide. A superfície articular cartilaginosa possui uma área mais superior, denominada de teto ou abóbada, responsável pela maior concentração de carga nesta articulação, uma área mais anterior e outra mais posterior na ferradura, denominadas, respectivamente, de reborda anterior e reborda posterior, e uma área mais medial, denominada de fundo, que corresponde à lâmina quadrilátera ou superfície quadrangular (Figura 1) (1). Importantes estruturas neurovasculares atravessam a região pélvica, sendo seu conhecimento fundamental na avaliação e no manejo do

Figura 1

Visão externa da pelve (modelo plástico). Notar a cavidade acetabular com a superfície articular em forma de ferradura (“U” invertido) e a parte central sem cartilagem (fossa cotilóide).

paciente com fratura do acetábulo. Na incisura isquiática maior, ocorre a emergência dos nervos isquiático, glúteo superior, glúteo inferior, pudendo interno e cutâneo posterior da coxa, além dos nervos para os músculos quadrado femoral e obturador externo. Nesta região encontram-se também as artérias e veias pudenda interna, glútea inferior e glútea superior (que junto com o nervo glúteo superior deixa a pelve na parte mais alta da incisura isquiática maior). Anteriormente, os nervos femoral e cutâneo lateral da coxa e a artéria e a veia ilíacas externas encontram-se em risco, principalmente durante a realização das abordagens cirúrgicas 143

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à esta região. Grande atenção deve ser dada à corona mortis, anastomose entre os vasos ilíacos internos e externos, e que pode estar presente em até 84% da população de forma arterial, venosa ou de ambas. Em geral, a anastomose se dá entre os vasos obturatórios e os epigástricos inferiores na borda pósterosuperior do púbis, aproximadamente seis centímetros lateralmente à sínfise púbica. Antes da era motorizada, as fraturas do acetábulo eram basicamente causadas por traumas de baixa energia, relacionados na maioria das vezes a quedas sobre a face lateral do quadril. Com a introdução dos veículos automotivos, observou-se gradualmente um incremento no número destas lesões (1). Atualmente, os acidentes automobilísticos de alta energia e o descumprimento às leis de trânsito, como a utilização regular do cinto segurança e o desrespeito à sinalização, são as principais causas do aumento na incidência das fraturas do acetábulo. Aproximadamente 2/3 de todas às lesões traumáticas do acetábulo, incluindo a fratura-luxação traumática do quadril, ocorrem em indivíduos jovens, abaixo dos 40 anos de idade. A intensidade e a localização do trauma inicial e a posição do quadril no momento do acidente são decisivos na determinação do padrão de fratura e da ocorrência de lesões associadas (2). No momento do impacto, o vetor de força exercido sobre o quadril transforma a cabeça femoral

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Figura 2

O impacto do vetor de força exercido sobre o quadril transforma a cabeça femoral em um martelo dentro do acetábulo, resultando disto o tipo de fratura, seu grau de fragmentação e os desvios observados.

em um martelo dentro do acetábulo, resultando disto o tipo de fratura, seu grau de fragmentação e os desvios observados (Figura 2). Lesões associadas são comuns, incluindo principalmente outras lesões do anel pélvico fora da região acetabular, fratura da cabeça do fêmur, luxação do quadril, trauma craniencefálico, rotura de órgãos abdominais sólidos e hematoma retroperitoneal (2) . Têm-se observado que o risco de lesões associadas aumenta quantitativamente e em gravidade quando o trauma no quadril é exercido lateralmente, em geral na região do grande trocanter. 144

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Como resultado, cerca de 40% a 75% dos pacientes com fratura do acetábulo são polifraturados ou politraumatizados, produzindo enorme gasto aos cofres públicos e privação à sociedade e aos familiares (1,2). A adoção de vigorosas medidas preventivas, como a criação de leis mais rígidas na condução do trânsito e o desenvolvimento de sistemas eficientes de segurança nos veículos automotivos, poderia reduzir drasticamente o número de vítimas e o consequente ônus socioeconômico gerado.

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No cenário de um paciente politraumatizado, inconsciente ou instável hemodinamicamente, são essenciais à inspeção visual da pele e os toques retal e vaginal. A presença de fratura aberta, lesão por desenluvamento interno (Morel-Lavallé) ou de sinais de síndrome compartimental pode passar despercebida, devendo sempre ser lembrada durante a avaliação hospitalar índex do paciente com fratura do acetábulo. Lesões não ortopédicas são comuns, haja vista que cerca de 75% dos pacientes são politraumatizados. Em uma das publicações de Matta, 56% dos pacientes apresentaram ao menos uma lesão associada (19% trauma cranioencefálico, 18% lesão torácica, 8% lesão abdominal e 6% lesão genitourinária) (2).

DIAGNÓSTICO CLÍNICO A presença de uma fratura do acetábulo é geralmente acompanhada de extremo quadro doloroso e incapacidade de apoio do membro afetado ao solo. A extremidade lesionada pode adotar uma posição viciosa em consequência do sintoma álgico ou de uma luxação do quadril. A força necessária para produzir uma fratura do acetábulo é frequentemente transmitida ao quadril pelo pé, joelho ou face lateral da coxa ipsilateral. Portanto, é fundamental que se faça um exame completo de todo o membro inferior acometido, incluindo a avaliação do status neurovascular. Aproximadamente 35% dos pacientes têm outra lesão na extremidade traumatizada, 35% a 39% apresentam luxação do quadril ipsilateral e 12% têm lesão traumática do nervo isquiático (1,2) Fratura vertebral e lesão raquimedular são vistas em 4% dos pacientes com fratura do acetábulo.

DIAGNÓSTICO RADIOLÓGICO Na interpretação das radiografias simpl é fundamental o conhecimento da anatomia óssea e sua correspondência nas três incidências realizadas de rotina (ântero-posterior (AP), alar e obturatriz). Judet et al. descreveram seis pontos de referência que devem ser observados na incidência AP (1,3). A interrupção de algum destes pontos representa uma solução de continuidade numa determinada região do acetábulo. Na Figura 3 são demonstrados estes pontos de referência e sua correlação com a anatomia óssea. A realização das incidências radiográficas oblíquas de Judet, alar e obturatriz, não é fácil, principalmente 145

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Figura 3

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Figura 4

Incidências radiográficas de Judet, alar e obturatriz, do quadril direito, mostrando os pontos de referência observados nestas incidências. Na alar, a asa do ilíaco, o rebordo anterior e a coluna posterior. Na obturatriz, o forame obturador, o rebordo posterior e a coluna anterior.

Radiografias do quadril esquerdo em AP, mostrando os seis pontos de referência: (A) linha iliopectínea – coluna anterior do acetábulo, (B) linha ilioisquiática – coluna posterior do acetábulo, (C) gota de lágrima de Köhler – placa quadrilateral, (D) teto acetabular, (E) reborda anterior do acetábulo, e (F) reborda posterior do acetábulo.

Aproximadamente 10mm acima do teto acetabular, estendendo-se até o término da cavidade acetabular, as fatias devem ser de no máximo 2mm,

pela presença da dor local potencializada pela execução de manobras de rotação do corpo. Na incidência alar, o paciente é rodado 45o sobre o lado lesado, colocando a asa do ilíaco de frente para a ampola de raios-X. Na incidência obturatriz, o paciente é rodado 45o sobre o lado íntegro, posicionando o forame obturador frontalmente à ampola de raios-X (Figura 4). A tomografia computadorizada (TC) demonstra de forma mais detalhada a presença de impacção marginal nas rebordas acetabulares, o número e a posição dos fragmentos ósseos, e a existência de fratura da cabeça femoral e de fragmentos intraarticulares. O corte axial deve iniciarse na altura da crista ilíaca e terminar logo abaixo da tuberosidade isquiática. As fatias devem ser de até 10mm.

Figura 5

Corte tomográfico axial de um quadril direito normal, com a representação das linhas representativas dos traços transverso (linha vertical – T), das colunas (linha horizontal – C) e dos rebordos (linha oblíqua – R).

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para que se possa obter a maior quantidade possível de imagens da área do teto (1,3). Com a cabeça femoral reduzida sob o teto acetabular, por meio de linhas traçadas vertical, horizontal e obliquamente podem ser identificadas fraturas transversas, das colunas e das rebordas, respectivamente (Figura 5). Reconstruções bi e tridimensionais podem ser feitas após o estudo axial.

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rebordo anterior, coluna anterior, rebordo posterior e coluna posterior. A fratura transversa, embora interrompa as linhas iliopectínea (coluna anterior) e ilioisquiática (coluna posterior), está incluída no grupo das elementares, muito provavelmente pela “simplicidade” de sua configuração. As fraturas associadas representam combinações dos tipos elementares e apresentam maior dificuldade em termos de diagnóstico e tratamento (Figura 6).

CLASSIFICAÇÃO A classificação universalmente aceita e empregada para as fraturas do acetábulo foi descrita por Judet e Letournel, em 1964, dividindo estas lesões em elementares e associadas (1,3). As fraturas elementares consistem em lesões que interrompem a continuidade de apenas uma das estruturas de suporte do acetábulo, quais seja,

TRATAMENTO O tratamento cirúrgico deve ser considerado em todas as fraturas desviadas do acetábulo e que não preenchem os critérios de tratamento não cirúrgico (1,3-5). O tratamento cirúrgico das fraturas do acetábulo é tecnicamente exigente e requer uma longa curva de experiência e treinamento, devendo ser preferencialmente realizadas em centros específicos de trauma. Descreveremos a seguir alguns aspectos importantes na osteossíntese percutânea e na osteossíntese aberta. A colocação de parafusos de forma percutânea ao redor do acetábulo requer experiência e conhecimento anatômico detalhado. Existe grande risco de penetração articular e de lesão de estruturas neurovasculares durante o procedimento percutâneo, principalmente pela pequena área seccional dos corredores de segurança. O uso de radioscopia, nas incidências de Judet e nas de Pennal, é fundamental durante toda a cirur-

Figura 6

(Linha de cima) Fraturas elementares: rebordo anterior, coluna anterior, rebordo posterior, coluna posterior e transversa. (Linha de baixo) Fraturas associadas: coluna posterior com rebordo posterior, transversa com rebordo posterior, em “T”, anterior com hemitransversa posterior e dupla coluna (acetábulo flutuante”).

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gia. Outra grande dificuldade desta técnica é a obtenção de redução fechada da fratura do acetábulo. Em geral, as técnicas mais empregadas nas fraturas do acetábulo são o parafuso da coluna anterior e o parafuso da coluna posterior. Na maioria dos casos busca-se estabilidade absoluta com parafuso de tração. Devido ao risco de falso trajeto durante a realização dos túneis ósseos, os autores preferem realizar somente o túnel de deslizamento, deixando que o parafuso faça o restante do trajeto. Normalmente são empregados parafusos extralongos, canulados ou não. O parafuso da coluna anterior pode ser feito de forma anterógrada ou retrógrada (5). Na forma anterógrada, o parafuso é introduzido do ramo iliopúbico até o corpo do ilíaco. Durante a introdução do parafuso, utiliza-se uma visão obturatriz com o intensificador de imagem. A colocação do parafuso da coluna anterior de forma anterógrada requer, normalmente,

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a realização de pequeno acesso do tipo Kocher-Langenbeck e segue a mesma técnica descrita acima. O parafuso da coluna posterior é feito de forma retrógrada, sendo introduzido na parte mais lateral do ísquio, direcionando-se para a região da incisura isquiática maior. O quadril deve estar fletido e aduzido durante o procedimento. Pelo risco de lesão do nervo isquiático, esta técnica é menos utilizada do que a anterior (Figura 7). Na osteossíntese aberta, a escolha da(s) via(s) de acesso é determinada pelo padrão da fratura do acetábulo. O acesso de Kocher-Langenbeck (KL) é preferido para as fraturas do rebordo posterior e/ou da coluna posterior e para a maioria das fraturas transversas. O acesso ilioinguinal é usado para as fraturas do rebordo anterior e/ou coluna anterior, para o padrão anterior com hemitransversa posterior e para a maioria das fraturas da dupla coluna. As fraturas em “T” normalmente são abordadas por duplo acesso ou por acessos ampliados. Alguns autores recomendam o uso de acessos ampliados para as fraturas transversas transtectais; a preferência dos autores, nestes casos, é pela realização do acesso de KL com osteotomia do grande trocanter (4). Para o acesso de KL, o paciente é posicionado em decúbito ventral ou em decúbito lateral, dependendo da preferência do cirurgião. Os pontos de reparo são a espinha ilíaca pósterosuperior, o grande trocanter e a diáfise femoral. Divide-se o glúteo máximo e

Figura 7

Osteossíntese percutânea da pelve e do acetábulo. Radiografias em AP da pelve e obturatriz e alar do quadril esquerdo, mostrando a fixação com parafusos canulados de grandes fragmentos e fixador externo supra-acetabular.

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biana. Durante a dissecação, o ligamento inguinal é aberto para se expor a pelve e dividir a abordagem nas suas três janelas clássicas. Para a colocação da placa pela coluna anterior, deve-se abrir a fáscia iliopectínea para ter passagem à pelve verdadeira.

abre-se o trato iliotibial em linha com a incisão cutânea, expondo-se a musculatura do glúteo médio. Afasta-se esta anteriormente, junto com o glúteo mínimo, e secciona-se os tendões do piriforme e do gêmeos e do obturador interno, protegendo-se o nervo isquiático. Não se deve seccionar o quadrado femoral pelo risco de dano vascular à cabeça femoral. Deve-se tomar extremo cuidado com dissecações muito proximais, acima da incisura isquiática maior, para não lesar a artéria glútea superior. O acesso ilioinguinal é realizado com o paciente em decúbito dorsal. Deve-se introduzir uma sonda vesical no paciente antes de se iniciar o procedimento operatório. Os pontos de reparo são a crista ilíaca, a espinha ilíaca ântero-superior e a sínfise pu-

COMPLICAÇÕES São relacionadas ao trauma inicial, pelo dano à cartilagem articular ou à vascularização da cabeça femoral, ou ao tratamento efetuado, podendo ser agudas ou crônicas. As mais comuns são a osteonecrose da cabeça femoral e a osteoartrose pós-traumática. A ocorrência de ossificação heterotópica é mais frequente no paciente jovem e do sexo masculino, submetido a abordagens posteriores ou alargadas (1,3).

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Alonso JE, Volgas DA, Giordano V, Stannard JP. A review of the treatment of hip dislocations associated with acetabular fractures. Clin Orthop Rel Res. 2000;(377):32-43. 2. Porter SE, Schroeder AC, Dzugan SS, Graves ML, Zhang L, Russell GV. Acetabular fracture patterns and their associated injuries. J Orthop Trauma. 2008;22:165-70. 3. McMaster J, Powell J. Acetabular fractures. Curr Orthop. 2005;19:140-54. 4. Giordano V, Amaral NP, Franklin CE, Pallottino A, Albuquerque RP, Giordano M. Functional outcome after operative treatment of displaced fractures of the acetabulum: a 12-month to 5-year follow-up investigation. Eur J Trauma Emerg Surg. 2007;33:520-7. 5. Rommens PM. Is there a role for percutaneous pelvic and acetabular reconstruction? Injury. 2007;38:463-77. 149

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Luxação traumática do quadril Edson Barreto Paiva André Soares Rodrigues

O quadril é uma articulação muito estável que requer força consideravelmente alta para que ocorra a luxação. Por isso, a maioria dos casos de luxação é resultante de um trauma de alta energia, que pode ser acompanhada de outras lesões, devidamente avaliadas por meio de um exame físico minucioso e exames complementares de imagem. Entre as causas mais comuns estão os acidentes de trânsito, atropelamentos e quedas de altura. Cerca de dois terços das fraturas-luxações do quadril ocorrem em adultos jovens do sexo masculino, possivelmente relacionados à combinação de imaturidade, inexperiência e desobediência às regras do trânsito. O prognóstico depende da lesão cartilaginosa, do dano ao suprimento vascular, e do tempo decorrido entre a luxação e a redução. Por isso, a luxação coxofemoral é considerada uma urgência ortopédica, devendo ser reduzida incruentamente ou cirurgicamente assim que o diagnostico é feito.

ligamentares e fraturas da patela são comuns associadas à luxação posterior devido ao mecanismo de trauma. Tabela 1. Lesões associadas mais comuns Lesões associadas mais comuns Fraturas do anel pélvico Fratura do colo femoral Fraturas do acetábulo Fraturas da cabeça do fêmur Lesões ligamentares do joelho Lesões da coluna Fraturas da diáfise do fêmur

História e exame físico Por se tratar de um trauma de alta energia, o protocolo de atendimento ATLS (Advanced Trauma Life Support) deve inicialmente comandar as ações no momento do exame físico. Após a avaliação inicial, devemos nos atentar para o membro acometido e realizar o exame neurológico, a palpação dos ossos longos e dos pulsos. A disfunção do nervo ciático é relatada em 19% dos pacientes e, é mais comum após a fratura luxação. A avaliação da função deste nervo após redução é fundamental, tornando-se uma urgência ortopédica com necessidade

Sinais e sintomas Mais de 95% dos pacientes com luxação do quadril apresentam lesões associadas, que podem ser intra-abdominais, torácicas, cerebrais ou fraturas de outros ossos longos. Lesões do joelho como luxação posterior, lesões 150

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de cirurgia aberta caso haja disfunção após a redução.

bulo, ao passo que na hiperabdução, extensão e rotação externa, pode ocasionar mais comumente uma luxação anterior. As luxações posteriores são bem mais frequentes que as anteriores, chegando a alguns estudos a 9:1. O mecanismo típico da luxação posterior é o acidente automobilístico em que o paciente se encontra com o joelho e o quadril fletidos colidindo contra o painel do automóvel. O primeiro exame radiológico a ser solicitado é a radiografia ânteroposterior (AP) da bacia, que é um exame sempre solicitado juntamente com as radiografias de tórax e coluna cervical na avaliação inicial dos pacientes politraumatizados. O diagnóstico da luxação é fácil de ser feito, com a perda da congruência da cabeça femoral em relação ao acetábulo. Na radiografia da bacia em AP, a cabeça femoral luxada aparece maior que o lado contralateral na luxação anterior, e menor nos casos de luxação posterior. O achado mais comum na luxação posterior é uma cabeça menor que sobrepõe o teto acetabular. Na luxação anterior a cabeça pode aparecer medial ou inferior ao acetábulo. As demais incidências e a tomografia computadorizada devem ser realizadas após a redução da articulação, a menos que seja irredutível incruentamente. Deste modo, a melhor opção é realizar uma tomografia computadorizada de urgência para uma completa avaliação do que está impedindo a redução, e realizar portanto, um planejamento cirúrgico bem elaborado. Após a redução o estudo radiológico

Diagnóstico clínico e radiológico O diagnóstico da luxação do quadril pode ser feito pela radiografia simples de bacia. No entanto podemos suspeitar de tal lesão pela descrição do mecanismo do trauma e exame físico do paciente, de acordo com a posição do membro inferior no momento do exame na ausência de fratura da diáfise do fêmur ou do fêmur proximal. Podemos classificá-las de acordo com a localização da cabeça do fêmur em relação ao acetábulo. Deste modo, pode ser posterior ou anterior, esta última ainda podendo ser subdividida em obturatória ou púbica. Tabela 2. Posição do membro correlacionando com o tipo de lesão Posição do membro X Lesão Flexão, adução e rotação interna

Luxação posterior sem fratura

Flexão parcial, pouca adução e rotação interna

Fratura-luxação posterior

Hiperabdução, extensão e rotação externa

Luxação anterior

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A posição do membro combinada com o vetor força aplicado no momento do trauma é o determinante da direção da luxação. Quanto maior a flexão, adução e rotação interna, maior as chances de ocorrer luxação posterior sem fratura da cabeça e/ou acetá151

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deve ser completado. Devemos solicitar todas as cinco incidências básicas para avaliação da pelve. São elas: AP, oblíquas de Judet (ilíaca e obturatória), in let e out let. A comparação da congruência articular do lado afetado e o contralateral, é fundamental para detectarmos uma provável redução não congruente. Após a realização destas incidências, a tomografia computadorizada (TC) pode ser realizada. Ela possui uma boa sensibilidade na detecção de pequenos fragmentos intrarticulares, pequenas fraturas da parede posterior do acetábulo e da cabeça do fêmur, fraturas por impacção da cabeça femoral e na avaliação detalhada da congruência articular. A TC nos auxilia também no planejamento pré-operatório.

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mente Stewart e Milford, ambos com descrição de fraturas associadas. Esta última classificação adiciona a estabilidade pós-redução como um dos critérios nos casos de fratura do acetábulo. Já o tipo 5 de Epstein é subdividido por Pipkin em quatro tipos de acordo com a localização da fratura da cabeça femoral e a associação com fratura do colo femoral e do acetábulo. A despeito de qual esquema de classificação forem utilizados, os critérios mais importantes na avaliação da luxação coxofemoral são a presença ou não de lesões associadas e a estabilidade da articulação após a redução. Esta deve ser sempre testada fazendo a flexão do quadril a 90 graus mantendo rotação interna e externa em posição neutra e em seguida aplicando-se uma força em direção posterior. Deste modo, podemos identificar uma articulação estável ou instável, dando continuidade à propedêutica.

Classificação Algumas classificações foram descritas para as luxações traumáticas do quadril, e incluem subtipos que levam em consideração as lesões associadas. A primeira distinção é em relação à posição anterior ou posterior. As luxações anteriores são muito menos frequentes e são descritas de acordo com a localização anatômica e estão mais relacionadas à lesão da cabeça femoral por impacção, que é visualizada melhor na TC. Por exemplo, obturatória. As luxações posteriores, como já dito, são muito mais frequentes que as anteriores. Dois esquemas de classificação foram propostos para estas lesões. Thompson e Epstein e subsequente-

Tabela 3. Classificação Thompson e Epstein Thompson e Epstein Tipo I

Luxação pura ou com pequeno fragmento

Tipo Luxação com fragmento grande único II da parede posterior Luxação com fragmento cominuído Tipo da parede posterior, com ou sem um III grande fragmento principal Tipo Luxação com fratura do fundo IV acetabular Tipo Luxação com fratura da cabeça V femoral

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assistente estabiliza a pelve fazendo compressão nas espinhas ilíacas ântero-superiores em direção a mesa cirúrgica. O cirurgião flete o joelho e o quadril para relaxar os músculos isquiotibiais. Tração longitudinal é aplicada ao membro acometido, em rotação interna e adução. Enquanto tração é aplicada, realiza-se rotação do membro acometido em extensão, permitindo deste modo a redução. Após a redução é necessário um bom exame neurológico. Caso haja alteração da função neurológica pos redução ou a redução não seja obtida por métodos fechados, impõe-se a redução aberta de urgência.

Tabela 4. Calssificação de Stewart e Milford Stewart e Milford Tipo I

Luxação sem fratura

Tipo II

Luxação com um ou mais fragmentos da parede acetabular, porém estável após a redução

Tipo III

Luxação com fratura da parede acetabular com articulação instável

Tipo IV

Luxação com fratura da cabeça ou do colo femoral

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Tratamento O tratamento inicial para a maioria das luxações é a tentativa de redução fechada em ambiente cirúrgico com o paciente sob sedação e um bom relaxamento muscular. Fraturas associadas do colo femoral sem desvio e outras fraturas do membro inferior que impossibilitem a manipulação do quadril acometido são contra-indicações para tentativa de redução incruenta. Nas luxações sem fraturas associadas com uma redução congruente, o tratamento não cirúrgico é indicado. No entanto, nos casos de luxações irredutíveis, redução não congruente ou na presença de fraturas associadas, pode ser necessário procedimento cirúrgico. Várias manobras de redução incruenta para luxação posterior foram descritas, a mais comumente utilizada é a manobra de Allis (FIG 2). Ela é realizada com o paciente em decúbito dorsal, um

Complicações Necrose avascular (NAV): Mais comum após luxação posterior e se correlaciona com o tempo decorrido até a redução. Estudos mostram de 1,7% até 40% de NAV. Ela pode ocorrer principalmente nos primeiros 2 anos de seguimento, porém há relato de aparecimento até 5 anos após o trauma. Artrose: É a complicação mais comum. As luxações com fratura associada da cabeça femoral evoluem mais frequentemente para este tipo de complicação, cerca de 50% dos casos. Nos casos em que foi necessária a redução aberta alguns autores encontraram uma incidência de 71% de artrose em comparação com 48% nos casos em que a redução foi realizada de maneira fechada. 153

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Yang, R.S., Yang, H.T., Hang, Y.S. & Liu, T.K. Traumatic dislocation of the hip. Clínical Orthopaedics & Related Research. 1991; 265: 218-227. 2. Rockwood and Green´s. Fractures in adults. 7a edição. 3. Advanced Trauma Life Support Student Manual. Chicago, American College of Surgeons, 1997. 4. Goddard, Nicholas J. MB,BS,FRCS. Classification of Traumatic Hip Dislocation. Clínical Orthopaedics & Related Research. 2000; 377:11-14. 5. Tornetta P 3rd, Mostafavi HR. Hip dislocation: current treatment regimens. J Am Acad Orthop Surg. 1997;5(1):27-36.

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Fraturas do colo do fêmur Luiz Henrique Penteado da Silva

As fraturas do colo femoral, embora comuns no dia a dia, podem levar ao ortopedista, dificuldades no seu manejo e a resultados não satisfatórios em função da sua anatomia, como fragmento proximal pequeno, com forças biomecânicas importantes no local, suprimento sanguíneo deficitário além de usualmente osteoporóticas. Com estas características, o tratamento ideal da fratura do colo femoral é um desafio ao ortopedista. São menos frequentes no adulto jovem, mas quando ocorrem, resultam de alta energia. Já nos idosos, ocorrem com maior frequência, e a associação de outras comorbidades levam a maior morbidade e mortalidade. A maioria dos pacientes apresenta queixas de dor na região inguinal do quadril afetado, geralmente idosos com o membro inferior levemente encurtado e em atitude de rotação externa.

com trauma direto no grande trocânter ou uma rotação externa máxima com a cabeça femoral apoiada na parede posterior do acetábulo. Devem sempre ser lembradas ou pesquisadas em fraturas de diáfise do fêmur pós trauma grave. Microfraturas no osso osteoporótico decorrentes a fadiga também devem ser pesquisadas mesmo em trauma de baixa significância, com exames adequados. O desvio de 10 graus ou menos em qualquer direção, as identificam como sendo fratura não deslocada ou sem desvio, chegando a 26%. O tratamento a ser proposto se baseia no grau de deslocamento da fratura, na idade e na condição clínica do paciente. O tratamento com osteossíntese foi sempre considerado a melhor forma de tratamento, mas nos pacientes fisiologicamente idosos com pouca qualidade óssea e muitas comorbidades, os procedimentos de artroplastias (hemi ou totais), atualmente proporcionam melhores resultados. Mas sempre se recomenda a preservação da cabeça femoral com a fixação nos casos não deslocados e pacientes fisiologicamente jovens, com redução anatômica e fixação interna.

EPIDEMIOLOGIA Frequentemente em pacientes idosos, no entanto, mais jovens do que vemos nos pacientes com fraturas transtrocanterianas, e rara nos adultos jovens, sendo nestes provocados por trauma de maior energia, correspondendo a menos de 3% das fraturas no paciente abaixo de 50 anos. Geralmente causada por queda

HISTÓRIA A história deve ser obtida na presença de familiares e ou cuidadores, 155

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pois 90% destes pacientes apresentam uma, e 35% apresentam três ou mais comorbidades clínicas, entre as quais, diabetes, alterações cardiovasculares, pulmonares, renais e hepáticas. Portanto se faz necessário o conhecimento de todas as medicações em uso, ciente de que muitos podem apresentar-se anticoagulados.

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pleta que não apresenta nenhum deslocamento, GARDEN 3 uma fratura completa que apresenta deslocamento parcial promovendo desvio em varo com perda de alinhamento das trabéculas ósseas entre a cabeça femoral com as do ilíaco e GARDEN 4 uma fratura completa que está totalmente deslocada, não havendo mais contato entre os fragmentos, mas que mantêm o alinhamento entre as trabéculas ósseas da cabeça femoral com as do ilíaco. Mas no final acabam sendo agrupadas em não deslocadas ou estáveis ( GARDEN 1 e 2 ) e deslocadas ou instáveis ( GARDEN 3 e 4 ).

RADIOLOGIA Radiografia simples da pelve em ântero-posterior (AP), deve ser obtida com o intuito de avaliar comparativamente ao lado não sintomático. Contudo o lado fraturado estando em rotação externa, não favorecerá uma melhor visão do colo femoral por sobreposição do grande trocânter. Uma incidência do quadril lesado em rotação interna gentil sob tração, pode melhor revelar as lesões. A incidência obliqua obturador de Judet também pode ser útil. Tomografias computadorizadas podem ser úteis nas fraturas impactadas e sem deslocamentos enquanto a ressonância nuclear magnética pode ser necessária nas fraturas por estresse do colo femoral.

Garden 1 e 2

Garden 3 e 4

CLASSIFICAÇÃO Existem três tipos de classificações mais amplamente utilizadas. A classificação de GARDEN, que se baseia no desvio dos fragmentos, e tem a preferência da maioria . Esta se divide em quatro grupos, sendo GARDEN 1 uma fratura incompleta impactada em valgo, GARDEN 2 uma fratura com-

PAUWELS classificou as fraturas do colo conforme a orientação da linha de fratura e seu grau de verticalidade com relação a horizontal da pelve, en156

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tendo que, com maior verticalidade apresenta maior índice de complicação: PAUWELS 1 apresenta ângulo menor de 30 graus, PAUWELS 2 com ângulo de fratura entre 30 e 50 graus e PAUWELS 3 apresentando ângulo de 50 graus ou maior. Esta orientação do traço de fratura pode aumentar a chance de complicações do tipo pseudartrose e de necrose avascular de cabeça femoral ( NAV ).

0% pseudartrose 13% NAV

8% pseudartrose 30% NAV

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pois a literatura demonstra que 20% das fraturas consideradas impactadas ou não deslocadas, apresentarão desvios em seis semanas e a restrição de marcha, e o paciente mais tempo acamado apresenta maior índice de complicações pulmonares, úlceras de decúbito e tromboembolismo, e apenas 25% destes voltam a caminhar como anteriormente à lesão, portanto a indicação de tratamento conservador fica restrita a pacientes que não tenham condições clínicas de serem anestesiados por apresentarem alterações clínicas graves, essencialmente não deambuladores. Cirúrgico Em função do que foi apresentado anteriormente, as fraturas do colo do fêmur são tratadas de forma cirúrgica em todos os pacientes. As fraturas impactadas em valgo ou não deslocadas são consideradas estáveis ( GARDEN 1 e 2 ) devendo ser fixadas in situ, enquanto que as deslocadas ou instáveis ( GARDEN 3 e 4 ) costumam ser tratadas com redução e fixação interna em pacientes mais jovens ( < 65 anos ) ou algum tipo de artroplastia nos pacientes mais velhos ( > 65 anos ). Deve-se levar em consideração que tipo de deambulação ou atividade tinha este paciente antes da lesão, que ou quais comorbidades clínicas apresenta e avaliar a qualidade óssea para definição de tratamento adequado. A idade cronológica nem sempre reflete a idade fisiológica e assim o parâmetro de 65 anos não pode ser o único guia de decisão de conduta.

12% pseudartrose 35% NAV

A classificação AO une a localização da fratura no colo do fêmur com a verticalidade de seu traço e está referendada como sendo do tipo 31-B e em suas subdivisões o grupo B1 contém as fraturas impactadas em valgo ou não desviadas, já o grupo B2 apresenta as fraturas basocervicais e o grupo B3 têm as fraturas deslocadas. TRATAMENTO Conservador O manejo das fraturas impactadas ou não deslocadas independem da idade do paciente e quando o paciente apresenta lesão do tipo GARDEN 1, normalmente vem à consulta ainda com certa marcha 7 a 10 dias do trauma. O tratamento conservador passa a ser de difícil definição, 157

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Paciente Jovem A literatura relata que esta fratura ocorre em 1 a 3% dos pacientes com menos de 50 anos e de que a fixação com parafusos é universalmente aceita como método de tratamento nestes casos, visto que a qualidade óssea é considerada normal. O que se discute atualmente é o vetor da verticalidade ou o chamado ângulo de cisalhamento do traço de fratura, reconhecido como fator de instabilidade maior, levando a maior estresse sobre o material de fixação ou promovendo ainda pós fixação, desvio em varo e posterior do fragmento da cabeça femoral. Nas lesões do tipo 3 de Pauwels, alguns autores tem recomendado o uso de um parafuso fixado na região do cálcar colocado perpendicularmente ao traço de fratura ( parafuso em varo ). Quando o paciente apresenta ângulo de cisalhamento menor ( Pauwels 1 ), a fratura costuma ser mais estável e sofre compressão no foco de fratura com a possibilidade de carga precoce, então permitindo nestes casos a fixação com parafusos esponjosos ou canulados. Não há evidência de que o tipo de parafuso usado faça diferença na estabilidade da fratura, mas há relatos de que três parafusos têm certa preferência do que dois. A redução anatômica é essencial com os três parafusos canulados em configuração triangular normal ou invertida, desde que com parafuso em posição justacortical no colo femoral. Em relação ao cálcar e

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colo posterior e a ponta do mesmo deve estar a menos de 1cm da superfície articular.

Assim como nas lesões citadas e em especial nas fraturas mais basocervicais do colo do fêmur, pode se fazer uso de implantes de ângulo fixo, como por exemplo, o parafuso deslizante do quadril (DHS), mas este tipo de dispositivo obriga a adição de um parafuso superior anti-rotatório, além da desvantagem de maior exposição cirúrgica e removem maior quantidade de osso da cabeça femoral. A redução é avaliada pelos índices de Garden, onde o alinhamento normal das trabéculas da cabeça femoral e a cortical medial faz um ângulo de 160 graus na radiografia em AP e de 180 graus com a diáfise no perfil, buscando sempre a restauração do contorno curvilíneo da parte posterior do colo femoral.

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Paciente idoso É no paciente idoso com fratura deslocada que a controvérsia existe no tratamento ideal. A afirmação de que a própria cabeça femoral do paciente seria melhor do que qualquer tipo de artroplastia é pouco contestado, mas a literatura mostra fixação interna com pobres resultados e índices de reoperação chegando a 42% dos casos. A mortalidade é similar na artoplastia e na fixação interna, mas nas reoperações é muito maior. Baseado na literatura e avaliando a idade fisiológica e qualidade óssea é que se tem indicado artroplastia para fratura nos idosos, em preferên-

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cia acima dos 65 anos. A decisão a seguir em relação a artroplastia total ou hemiartroplastia deve ser baseada em fatores referentes ao paciente como atividade, qualidade da superfície articular acetabular e expectativa de vida. Como complicação maior nas artroplastias encontramos a luxação, que nas hemiartroplastias varia de 2 a 3% enquanto que nas totais podem chegar a 11%. Entretanto a reoperação nas totais são de 4%, já as hemiartroplastias chegam a 18%. Não há diferenças significativas em relação à TVP, embolia e mortalidade. Quanto à dor e função, as totais são melhores.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Bhandari, M. et al. Operative management of displaced femoral neck fractures in elderly patients. An international survey. J Bone Joint Surg Am. 2005; 87: 2122-2130. 2. Holt, G. et al. Gender differences in epidemiology and outcome after hip fracture. J. Bone Joint Surg. 2008. 3. Weinlen, J. Schmidt, AH. What’s new in orthopaedic trauma fractures of proximal parto f the femur. J Bone Joint Surg, september 2010. 4. Gurusamy, K. et al. The complications of displaced intracapsular fractures of the hip, J Bone Joint Surg. 2005. 87B: 632-4. 5. Giannoudis, PV.: What’s new in the management of proximal femoral fractures? Injury. 2008; 39: 1309-13018. 159

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Fraturas transtrocanterianas do fêmur Múcio Brandão Vaz de Almeida

INTRODUÇÃO / EPIDEMIOLOGIA As fraturas transtrocanterianas são lesões frequentes, correspondendo a 55% das fraturas do terço proximal do fêmur. Acometem principalmente pacientes idosos com osteoporose, predominando em indivíduos com mais de setenta anos de idade. São geralmente decorrentes de traumas de baixa energia, onde as mulheres são mais acometidas que os homens, numa proporção de 3:1. Nos pacientes jovens, as fraturas são derivadas de traumas de grande energia, ocorrendo principalmente em pacientes abaixo dos 40 anos de idade e do gênero masculino. Afora a idade do indivíduo, outros fatores de risco incluem raça branca, comprometimento neurológico, desnutrição, deficiência da visão, e falta de atividade física. A área do fêmur envolvida nestas fraturas é de osso esponjoso, estando os fragmentos com boa irrigação sanguínea. Geralmente há consolidação óssea quando a fratura é reduzida e fixada adequadamente. Apesar da consolidação viciosa ser um problema, são raras as complicações tardias. O índice de mortalidade é de 10 a 30% no primeiro ano da fratura. Após um ano a mortalidade é a esperada para a idade.

DIAGNÓSTICO CLÍNICO Estes pacientes comumente apresentam dor e incapacidade para deambular após trauma. São em sua maioria decorrentes de trauma de baixa energia, pois acometem principalmente os pacientes idosos. Os traumas de maior energia são vistos principalmente nos indivíduos mais jovens, com quadros graves e fraturas cominutivas. A dor está localizada na parte proximal da coxa e é exarcebada à flexão ou rotação, ativa ou passiva, do quadril. Clínicamente observa-se nas fraturas desviadas, encurtamento do membro e deformidade em rotação externa, quando comparada com o lado oposto. Nas fraturas ocultas, não se evidencia dor à mobilização do quadril nem crepitação óssea. Existe sim, uma correlação de fratura oculta e dor no quadril quando imposta carga axial ao membro. DIAGNÓSTICO POR IMAGEM Geralmente o diagnóstico destas fraturas é feito através de radiografias convencionais nas incidências de frente (AP) e de perfil (P). Nas fraturas cominutivas e decorrentes de traumas de grande energia, radiografias com tração e rotação interna devem ser realizadas, pois possibilita a escolha do melhor implante a ser utilizado. Nos raros casos de dúvida quanto 160

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ao diagnóstico de fratura, oculta ou fratura incompleta, em um paciente com histórico de queda, incapacidade funcional e quadril doloroso, pode-se utilizar a cintilografia óssea, tomografia computadorizada ou a ressonância magnética (RNM). Estes métodos têm demonstrado excelente sensibilidade na identificação destas lesões, sobretudo a RNM na fase T1. Em termos de comparação com os pacientes portadores de fratura do colo femoral, verifica-se que os pacientes com fraturas intertrocantéricas são mais idosos, menos ativos, com maiores dificuldades de deambulação e encontram grandes dificuldades em realizar as suas atividades da vida diária. Apresentam, portanto, um prognóstico mais sombrio.

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ção e as subtrocantéricas. A classificação de Boyd e Griffin é dividida em quatro tipos: tipo 1- fraturas que se estendem ao longo da linha intertrocantérica, sem desvio; tipo 2- fraturas que se estendem ao longo da linha intertrocantérica com fraturas múltiplas na cortical, desviadas; tipo 3- fraturas basicamente subtrocantéricas, onde a linha de fratura atravessa a extremidade proximal da diáfise, no trocânter menor ou imediatamente distal a esse; e o tipo 4- fraturas da região trocantérica e da proximal, com fratura em pelo menos dois planos. Evans dividiu as fraturas trocantéricas em grupos estável e instável. Se baseou na potencial redução anatômica da fratura e possível estabilização da mesma após a sua redução. No grupo I (estável), a linha de fratura estende-se para cima e para fora, a partir do trocânter menor e no tipo II

CLASSIFICAÇÃO A classificação das fraturas transtrocanterianas se baseia na estabilidade da fratura, pois esta é a chave para se instituir o tratamento e avaliar de forma mais precisa o prognóstico da lesão. Uma fratura é reconhecida como estável, quando a parte póstero-medial permanece intacta ou quando encontra-se minimamente cominuída, enquanto é considerada instável, quando apresenta um grande fragmento póstero-medial fraturado e cominuto, com tendência ao varismo. As classificações propostas por Boyd e Griffin e por Evans se baseiam na divisão de fraturas estáveis sem cominuição, com mínima cominui-

Figura 1. Classificação AO

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(instável), as com traço reverso, onde a linha de fratura principal estendese para fora e para baixo. A classificação, segundo o grupo AO, divide as fratura em estáveis(A1) e instáveis (A2- instáveis com traço de fratura padrão e A3- instáveis com traço de fratura invertido), e suas subdivisões(Figura 1).

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mesa de tração ou mesmo em mesa comum, com redução da fratura por tração manual. Existem dois grupos de implantes: a síntese extramedular com pino cérvico-cefálico deslizante (DHS, DMS, Richards) e a haste cefalomedular (Gamma Nail, PFN, TFN). O sistema pino deslizante é considerado como o melhor implante a ser utilizado nos tipo A1 e A2 (classificação AO), enquanto é vantajosa a utilização da haste quando a fratura tiver traço reverso (A3). Existem alguns entraves no emprego desses dois tipos de implantes em fraturas instáveis: a placa lateral apresenta problemas quanto à impacção do fragmento, penetração articular e perda da fixação proximal com arrancamento do pino (cutout). Na haste cefalomedular existe maior chance de ocorrer fratura da diáfise femoral (Figura 2).

TRATAMENTO O tratamento indicado para as fraturas transtrocanterianas é cirúrgico, não existindo mais indicação para o tratamento não cirúrgico, salvo em condições especiais, onde o paciente encontra-se incapacitado para suportar qualquer cirurgia ou nos raros casos de fratura incompleta ou oculta, que pode ser optado por tratamento conservador e acompanhamento periódico do paciente, seguindo de perto a sua evolução. O paciente precisa ser operado o mais rápido possível, no entanto o mesmo só deverá ser submetido ao procedimento proposto quando estiver clínicamente equilibrado. Para que o tratamento cirúrgico seja bem sucedido, é imperioso que haja uma correta escolha do implante, que se consiga uma boa redução dos fragmentos fraturados e que a implantação do material siga uma rigorosa técnica cirúrgica. A redução da fratura é realizada através de tração longitudinal, e movimentos rotacionais e de abdução do fragmento distal. Esta redução pode ser realizada com o paciente em

Figura 2.

A) Osteossíntese com parafuso deslizante; B) Osteossíntese com haste cafalomedular.

Não é mais recomendada a utilização do parafuso de compressão da 162

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placa lateral, quando da fixação das fraturas transtrocanterianas, sobretudo nos ossos com grave osteoporose, pelo risco de migração do parafuso e desvio em varo do fragmento. A utilização de placa DHS com técnica minimamente invasiva no tratamento de fraturas transtrocanterianas, leva a menor agressão às partes moles, menor perda sanguínea, menor tempo cirúrgico, menos dor no pós operatório e liberação de carga mais precoce. Alguns autores têm utilizado no sistema de placa lateral e pino deslizante, sobretudo em pacientes com osteoporose mais intensa, um revestimento de hidroxiapatita em seus componentes, visando um incremento na fixação da fratura. Outros referem bons resultados no emprego de cimento ósseo como auxiliar na fixação de fraturas cominutivas e instáveis.

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A necrose avascular da cabeça femoral é extremamente rara, não ocorrendo em mais de 1% dos pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico. Caso seja necessário novo procedimento cirúrgico para tratamento de uma pseudartrose, deve-se buscar maior valgização e fixação adequada, com chances de 90% de êxito. Na utilização de hastes femorais, uma complicação frequente é a posição em varo dos fragmentos proximais por falhas técnicas, e uma outra complicação possível é a fratura da diáfise femoral, ocasionada pela haste curta. COMENTÁRIOS FINAIS Como descrito anteriormente, as fraturas transtrocanterianas, estáveis ou instáveis, devem ser tratadas de forma cirúrgica com osteossíntese. Em casos bastante selecionados pode ser realizada a artroplastia do quadril. Há vários métodos com diferentes materiais de implante, com sistemas intra e extramedulares, no entanto o DHS tem se mostrado como o método com melhores resultados até o momento. Parece ser vantajoso o emprego de hastes cefalomedulares em fraturas com grande instabilidade e com traço reverso.

COMPLICAÇÕES Não são muitas as complicações resultantes da fixação de fraturas transtrocanterianas, quando comparadas a outras fraturas do quadril. O índice de infecção nas fraturas transtrocanterianas gira em torno de 1% a 2%, quando se utiliza a antibioticoprofilaxia.

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Canale ST. Cirurgia Ortopédica de Campbell, vol 3,10 ed,São Paulo; Editora Manole; 2007. 2. Canto RST, Sakaki M, Susuki I, Tucci P, Belangero W, Kfuri Jr M, Skaf AY. Fratura Transtrocanteriana. In Jatene FB, Nobre MRC, Bernardo WM. Projeto Diretrizes. 1 ed, vol VII. Brasília: Câmara Brasileira do Livro. 2008; p. 231-8. 3. Chapman MW. Chapman’s Orthopaedic Surgery. 3rd edition. Lippincott Williams & Wilkins Publishers; 2001. 4. Christian RW. Fratura Transtrocanteriana do fêmur. In Kojima KE. Novos Conceitos em Osteossíntese.1 ed. Rio de Janeiro: Editora Guanabara Koogan; 2008. p. 89-94. 5. Guimarães JAM. Fratura Trocantérica. In Gomes LSM. O Quadril. 1 ed. São Paulo: Editora Atheneu; 2010. p.311-20. 6. Russell TA. Intertrochanteric Fractures. In Bucholz RW, Heckman JD, Court-Brown CM.; Tornetta P. Rockwood And Green’s Fractures In Adults, 7th Edition. Lippincott Williams & Wilkins, cap 48. 2010.

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Fraturas subtrocantéricas do fêmur Marcelo Teodoro Ezequiel Guerra

DEFINIÇÃO A fratura subtrocantérica é uma fratura que ocorre na extremidade proximal da diáfise do fêmur numa região tipicamente localizada entre o pequeno trocânter e cinco centímetros abaixo deste. Esta região é uma das localizações que concentram mais estresse mecânico no esqueleto humano, com forças que excedem várias vezes o peso do próprio corpo.

membro muito rodado. Já nos casos de pacientes idosos, necessitamos de alto nível de suspeição. Um idoso com dor na região proximal da coxa após trauma de baixa energia, deve realizar uma investigação completa e detalhada desta região. Paciente idoso com dor no quadril após trauma de baixa energia tem fratura até que se prove em contrário. Radiográfico Geralmente, uma radiografia simples é suficiente para realizar o diagnóstico, classificar e propor tratamento. Isto é principalmente válido para as fraturas de alta energia. Porém, estas imagens devem ser criteriosamente adquiridas. O exame radiográfico deve mostrar tanto a extremidade proximal do fêmur quanto as características anatômicas da diáfise. A largura e o comprimento do canal femoral têm que ser estudados para podermos planejar corretamente nosso procedimento. Como regra, o quadril e o fêmur contralateral necessitam ser vistos, para que possamos entender a anatomia normal do paciente. Nos traumas de baixa energia, se houver suspeita clínica de fratura, deve-se lançar mão de TC ou RMN da região, para excluir fraturas incompletas e não desviadas. As observações de casos de fraturas

EPIDEMIOLOGIA A curva epidemiológica das fraturas subtrocantéricas do fêmur é bimodal. Apresenta um pico no adulto jovem, com fraturas tipicamente de alta energia, e outro pico no idoso, com fraturas de baixa energia. Recentemente, têm sido relatados casos de fraturas subtrocantéricas de estresse, em pacientes em tratamento para osteoporose com bifosfonados. DIAGNÓSTICO Clínico As fraturas de alta energia cinética muitas vezes estão contextualizadas num paciente politraumatizado. Por esta razão, após o período de ressuscitação do paciente, é muito importante a avaliação de certos sinais indicativos de fratura do fêmur e em especial da extremidade proximal de sua diáfise: grandes encurtamentos e 165

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subtrocantéricas com pacientes que fazem uso crônico de bifosfonados, mostram que, um alargamento da cortical lateral do terço proximal do fêmur, podem ser indicativos de fraturas incompletas ou de alto risco de fraturas nesta região.

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mais em saber que tipo de fixação proximal a haste, quando indicada, deve ter e não definir se usaremos placa ou haste. Por exemplo, a classificação de Russel-Taylor tem uma lógica de recomendação de tipo de síntese bastante interessante e que pode orientar o tipo de síntese (Quadro 1).

CLASSIFICAÇÃO Toda classificação tem como propósito tanto o bom registro da lesão quanto auxílio para estabelecer tratamento e determinar prognóstico. O registro pode ser realizado com qualquer tipo de classificação existente, porém, as classificações que graduam gravidade da lesão podem ser um guia de tratamento e prognóstico do caso. Algumas classificações podem auxiliar na indicação do tipo de tratamento ou implante que pode ser utilizado.

Quadro 1. Tratamento baseado na Classificação de Russel-Taylor Tipo Descrição

TRATAMENTO O tratamento deste grave tipo de lesão depende da personalidade da lesão. Evidentemente, se estamos frente a uma lesão de alta energia, o paciente deve ser categorizado para estabelecermos se o tratamento cirúrgico definitivo será imediato (Early Total Care) ou retardado (Damage Control). Tem que ser frisado que falamos do tratamento definitivo. Ou seja, alguma forma de estabilização da lesão terá que ser instituída imediatamente. O uso de haste ou placa dependerá do treinamento e preferência do cirurgião. As classificações ajudam

Indicação

IA

Com fossa piriforme e pequeno trocânter intactos

Haste estândar (parafusos proximais transversais na região do pequeno trocânter)

IB

Fossa piriforme intacta e pequeno trocânter fraturado

Haste de reconstrução (Parafusos proximais oblíquos no colo do fêmur)

IIA

Fossa piriforme fraturada e pequeno trocânter intacto

DCS ou Haste de reconstrução

IIB

Tanto a fossa piriforme quanto o pequeno trocânter estão fraturados

DCS associado a enxerto ou Haste de reconstrução

Em realidade, a tendência atual é a de usarmos fixação intramedular. No entanto, apenas a filosofia de fixação biológica é mandatória. Ou seja, pode-se usar placas como o DCS, a placa angulada 95o ou ou166

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tros dispositivos com estas características, desde que estes implantes sejam colocados respeitando a biologia da região. No caso de estarmos frente a uma lesão de baixa energia cinética, o tratamento deverá ser realizado logo após a estabilização clínica do paciente. Como regra geral, a equipe deve atuar no sistema ‘Co-Gestão’ entre o clínico/geriatra e o cirurgião ortopedista. O objetivo desta equipe deve ser o de fixar a fratura nas primeiras 24 horas da lesão. Os implantes para fixação das fraturas por insuficiência óssea podem ser intra ou extra-medulares. A recomendação é a de que eles sejam longos e colocados com técnicas de fixação biológica.

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osteotomia e fixação com placa angulada. A pseudartrose é rara (o percentual de consolidação chega a 99%), porém, quando ocorre é de difícil tratamento. Os métodos de tratamento incluem a simples troca da haste por um tamanho maior e diferentes fixações no segmento proximal quando não há desvios, até a substituição de todo o segmento proximal por uma prótese nos casos mais graves. Geralmente, a troca do material de síntese, remoção da fibrose e enxertia são necessários. Nos casos com infecção, o tratamento dependerá da estabilidade do sistema de fixação e da gravidade da infecção. Se o sistema estiver estável, a região deverá ser desbridada rigorosamente e antibióticos apropriados têm que ser iniciados, pelo período correto. Se o sistema não estiver estável, deve haver a retirada do material de síntese, seguida do desbridamento da região e do tratamento com antibióticos apropriados. A fratura deve ser fixada provisoriamente com fixador externo ou com espaçador interno. Após a confirmação de que a infecção foi debelada, a fratura deve ser fixada de forma definitiva. Entendo que o acompanhamento de infectologista familiarizado com infecções ortopédicas é muito importante

Complicações As principais complicações são a consolidação viciosa, a pseudartrose ou a infecção. A consolidação viciosa pode ser em varo ou apresentar componente rotacional. A consolidação em varo leva a perda de força do aparelho abdutor do quadril e diminuição do comprimento do membro. A quantidade de deformidade em varo que pode ser bem tolerado não está definida. O cirurgião deve personalizar a complicação e avaliar a necessidade ou não de correção. O tratamento, se necessário, será realizado através de

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Haidukewych JH and Langford J. Subtrochanteric Fractures. In: Bucholz RW, Court-Brown CM, Heckman JD, Tornetta III P. Rockwood and Green’s Fractures in Adults (2010) (7th. Ed) pp. 16421654 2. LaVelle David G. Fractures and Dislocation of the Hip. In: S. Terry Canale & James H Beaty. Campbell’s Operative Orthopaedics. (2008) vol. 3 (11th. Ed) pp. 3237-3308 3. Wolinsky P and Stephen DJG. Femur, Shaft (incl. subtrochanteric fractures). In: Rüedi TP, Buckley RE, Moran CG. AO Principles of Fracture management (2010) vol. 2 (2nd. Ed) pp. 767-785 4. Guerra MTE and Schwartsmann C. Fratura Fechada Traumática Subtrocanteriana do Fêmur no Adulto. In: Projeto Diretrizes (2008) vol. 2 pp. 1-8 5. Krettek et al. Minimally invasive percutaneous plate osteosynthesis (MIPPO) using the DCS in proximal and distal femoral fractures. Injury (1997) vol. 28 Suppl 1 pp. A20-30 6. Rizzoli et al. Subtrochanteric fractures after long-term treatment with bisphosphonates: a European Society on Clínical and Economic Aspects of Osteoporosis and Osteoarthritis, and International Osteoporosis Foundation Working Group Report. Osteoporosis International: a journal established as result of cooperation between the European Foundation for Osteoporosis and the National Osteoporosis Foundation of the USA (2010) pp. 7. Kuzyk et al. Intramedullary versus extramedullary fixation for subtrochanteric femur fractures. Journal of orthopaedic trauma (2009) vol. 23 (6) pp. 465-70 8. Lundy. Subtrochanteric femoral fractures. The Journal of the American Academy of Orthopaedic Surgeons (2007) vol. 15 (11) pp. 663-71

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Fraturas diafisárias do fêmur Robinson Esteves Santos Pires

EPIDEMIOLOGIA O fêmur possui um envoltório muscular bem vascularizado que auxilia na consolidação da maioria das fraturas. As fraturas diafisárias do fêmur são lesões graves, decorrentes de forças violentas, muitas vezes associadas ao comprometimento de outros órgãos, e que podem determinar deformidades e sequelas ao paciente, em razão de complicações imediatas ou tardias. Ocorrem, geralmente, por trauma de alta energia e acometem, principalmente, adultos jovens, homens (55%), havendo discreta predominância do lado direito (52%). Apesar da alta morbidade provocada pela fratura diafisária do fêmur, o índice de mortalidade é relativamente baixo, podendo resultar da embolia gordurosa, de extensos ferimentos com sangramentos vultosos ou da falência múltipla de órgãos decorrentes dos politraumatismos.

o status neurovascular do membro acometido. Especial atenção deve ser dada ao exame do joelho ipsilateral à fratura da diáfise do fêmur. Vangsness et al1, em estudo artroscópico de 47 joelhos de pacientes portadores de fratura diafisária fechada do fêmur, encontraram 50% de lesões meniscais associadas, sendo que o número de rupturas complexas e radiais superava as rupturas em alça de balde e as periféricas. O teste clínico ligamentar deverá ser realizado após a estabilização cirúrgica da fratura, com o paciente ainda anestesiado. O exame radiográfico inicial compreende as incidências em ânteroposterior e perfil de toda a extensão do fêmur. A qualidade do exame radiográfico pode ter influência direta na escolha do tratamento. Radiografias da pelve são também importantes devido à possibilidade de lesões associadas, como as fraturas proximais do fêmur (colo e transtrocantérica) que, quando em associação com as fraturas da diáfise, apresentam-se sem desvio ou pouco desviadas, o que pode dificultar seu diagnóstico com a análise somente da radiografia simples do fêmur. Radiografias do joelho também são importantes e podem surpreender com o diagnóstico de uma fratura-avulsão por lesão ligamentar.

DIAGNÓSTICO Os sinais e sintomas causados pela fratura diafisária do fêmur são edema, encurtamento e deformidade no membro, crepitação palpável no foco da fratura e dor intensa. O médico responsável pelo atendimento deve examinar minuciosamente o paciente como um todo, em busca de lesões associadas, além de avaliar 169

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TRATAMENTO Para que o tratamento seja instituído, é necessário o planejamento pré-operatório adequado, com correta interpretação da classificação da fratura. Como qualquer sistema de classificação, o que se busca é um método simples, reprodutível, capaz de indicar o prognóstico e orientar a condução do tratamento. A classificação AO é constituída por um sistema de codificação baseado na localização (proximal, médio ou distal), no traço de fratura e no grau de cominuição. São distinguidos vinte e sete tipos no total. A classificação de Winquist leva em consideração o grau de cominuição e indica o tipo de tratamento. Tipo I (fratura com traço simples ou com mínima cominuição); Tipo II (cominuição de até 50% da circunferência da diáfise); Tipo III ( cominuição de 50 a 100% da diáfise); Tipo IV (cominuição circunferencial da diáfise, sem contato entre os dois fragmentos maiores depois da redução). Pires et al2, avaliando a reprodutibilidade das classificações AO-ASIF e Winquist-Hansen para as fraturas diafisárias do fêmur, encontraram elevado índice de concordância interobservadores pelos critérios de Landis e Koch para ambos os sistemas. O tratamento das fraturas diafisárias do fêmur é eminentemente cirúrgico, porque permite a reabilitação precoce do paciente e diminui o risco de complicações sistêmicas. É consenso que as fraturas diafi-

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sárias do fêmur devam ser operadas precocemente (nas primeiras 24 horas), principalmente devido às possíveis complicações pulmonares inerentes às fraturas de ossos longos. Dentre os métodos de tratamento das fraturas diafisárias do fêmur, podemos citar as hastes intramedulares bloqueadas ou não, fresadas ou não, com ponto de entrada na fossa piriforme ou lateral (grande trocânter), anterógradas ou retrógradas; as placas de compressão com técnica aberta ou em ponte; os fixadores externos, uni ou multiplanares; e métodos alternativos praticamente abandonados, como a tração esquelética e a imobilização com gesso. A osteossíntese com placas de compressão, permitindo mobilização ativa do membro e consolidação primária por fixação rígida, foi introduzida por Danis. Diversos autores publicaram seus resultados com o uso das placas no tratamento das fraturas diafisárias do fêmur, enfatizando que as complicações aumentam quando o contato da cortical oposta à da placa não pode ser obtido. Trata-se de um método que promove desvitalização dos tecidos e, consequentemente, maior índice de infecção e pseudartrose3. O conceito de fixação biológica das fraturas foi introduzido por Krettek, quando popularizou o termo “MIPPO” (minimally invasive percutaneous plate osteosynthesis), que consiste na colocação de placas por meio de incisões proximal e distal ao foco da 170

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cional na fossa piriforme não está isento de complicações como lesão do nervo glúteo superior e da musculatura abdutora (marcha claudicante) e lesão da artéria circunflexa medial, com dano ao suprimento vascular da cabeça femoral5. Outros autores chamaram a atenção para o menor tempo cirúrgico quando o ponto de entrada escolhido foi o grande trocânter. É importante salientar que a escolha do ponto de entrada será determinada pelo desenho da haste (grau de inclinação lateral), pois a colocação de uma haste convencional tendo como ponto de entrada o grande trocânter, pode levar ao desvio em varo da fratura. A osteossíntese com haste intramedular retrógrada apresenta algumas vantagens em relação às anterógradas, nas seguintes situações: pacientes obesos; gestantes; politraumatizados; fraturas bilaterais da diáfise do fêmur; fraturas ipsilaterais do fêmur proximal e tíbia (joelho flutuante). Parece não haver diferença com relação ao tempo de consolidação e índice de pseudartrose. Os fixadores externos encontram aplicabilidade principalmente em pacientes politraumatizados hemodinamicamente instáveis, na abordagem inicial das fraturas expostas com extensa contaminação e nos casos infectados e/ou com perda óssea. Pacientes politraumatizados portadores de trauma torácico grave, choque hemorrágico, instabilidade hemodinâmica durante outros proce-

fratura, bem como a manipulação indireta dos fragmentos fraturados3. No tratamento das fraturas multifragmentárias da diáfise do fêmur, tanto as hastes intramedulares bloqueadas como as placas em ponte permitem bons resultados clínicos, com alto índice de consolidação e poucas complicações. A literatura considera este método (estabilidade relativa com tutor extramedular – placa em ponte), como alternativa confiável para a fixação de fraturas diafisárias do fêmur, principalmente em locais onde não há acesso aos implantes intramedulares3. Outra questão controversa é a utilização ou não da mesa de tração para a realização da osteossíntese. Stephen et al4, observaram que não houve diferença estatisticamente significante com relação a tempo de cirurgia e qualidade de redução em um total de 87 pacientes randomizados quanto ao uso ou não de mesa de tração. Atualmente, tem-se dado preferência à fixação biológica (a foco fechado) das fraturas diafisárias do fêmur com as hastes intramedulares bloqueadas. Há evidência na literatura de que a fresagem do canal medular reduz os índices de pseudartrose nas fraturas de ossos longos dos membros inferiores. Muito se tem discutido sobre o ponto de entrada ideal para a haste intramedular anterógrada do fêmur. Apesar de bem estabelecido na literatura, o ponto de entrada conven171

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dimentos cirúrgicos e trauma craniano grave têm maior incidência de complicações respiratórias e óbito quando submetidos à fixação definitiva precoce da fratura da diáfise do fêmur. Nestas circunstâncias, a fixação externa temporária (controle ortopédico de danos) é preferível. Após a estabilização clínica do paciente (entre o 5o e o 8o dias do trauma inicial), realiza-se a fixação definitiva das fraturas. O pós-operatório de um paciente portador de fratura da diáfise do fêmur submetido ao tratamento cirúrgico definitivo com o princípio de estabilidade relativa (seja com um tutor intra ou extra-medular) compreende exercícios respiratórios e circulatórios, ga-

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nho de amplitude de movimento no joelho e no quadril e treino de marcha precoce e com carga progressiva. COMPLICAÇÕES Dentre as complicações imediatas, podemos citar o choque hipovolêmico, lesões vasculares e nervosas, a síndrome compartimental e as complicações pulmonares como a síndrome da embolia gordurosa. Como complicações tardias, destacam-se a pseudartrose, a consolidação viciosa, a rigidez articular, a osteomielite e também as complicações pulmonares decorrentes do repouso prolongado (atelectasia, pneumonia e fenômenos tromboembólicos).

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Vangsness CT Jr, De Campos J, Merritt PO, Wiss DA. Meniscal injury associated with femoral shaft fractures. An arthroscopic evaluation of incidence. J Bone Joint Surg Br. 1993; 75:207-9. 2. Pires RES, Reis FB, Simões CE, Santos LEN, Rodrigues VB, Andrade MAP, Pires Neto PJ. Fratura diafisária do Fêmur: reprodutibilidade das classificações AO-ASIF e Winquist. Acta Ortopédica Brasileira. 2010; 28(4):197-9. 3. Pires RES, Fernandes HJA, Belloti JC, Balbachevsky D, Faloppa F, Reis FB. Como são tratadas as fraturas diafisárias fechadas do fêmur no Brasil? Estudo Transversal. Acta Ortopédica Brasileira. 2006; 14(3):165-9. 4. Stephen DJ, Kreder HJ, Schemitsch EH, Conlan LB, Wild L, McKee MD. Femoral intramedullary nailing: comparison of fracture-table and manual traction. A prospective, randomized study. J Bone Joint Surg AM. 2002; 84:1514-21. 5. Moein AC, Duis HJ, Oey L, Kort G, Meulen W, Vermeulen K, Werken C. Functional Outcome After Antegrade Femoral Nailing: A Comparison of trochanteric fossa versus tip of greater trochanter entry point. J Orthop Trauma. 2011; 25(4):196-201. 172

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Fratura supracondiliana do fêmur Jorge Rafael Durigan

A fratura supracondiliana do fêmur, devido ao aumento da energia envolvida no trauma, constitui-se atualmente num desafio para o cirurgião ortopédico, enquanto no passado, até cerca de 1970, o tratamento conservador era tido como primeira opção no manejo dessa fratura. As fraturas da região distal do fêmur representam apenas 6-7% das fraturas femorais. Apresenta uma incidência etária bimodal, com maior incidência em adultos jovens, geralmente decorrentes de acidentes com veículos automotores e motocicletas, ou seja, traumas de alta energia. Um segundo grupo corresponde aos idosos, com lesões tipicamente decorrentes de trauma de baixa energia, geralmente queda ao solo com joelho fletido. No primeiro grupo geralmente ocorrem fraturas com grandes desvios, cominuição articular, fraturas expostas com grande lesão do envoltório de partes moles e múltiplas lesões associadas. Neste grupo o manejo inicial corresponde ao controle de danos e tratamento estagiado das fraturas. No segundo grupo, o padrão da fratura é basicamente helicoidal e espiral, com baixa lesão do envoltório muscular, o que permite o tratamento definitivo de forma mais precoce. Podemos considerar também um terceiro grupo (ou sub-grupo dos

idosos), que corresponde às fraturas periprotéticas, que apresentam uma crescente incidência nos últimos anos ( 2%); estas fraturas apresentam uma maior dificuldade no tratamento, devido a osteoporose intensa, diversidade dos modelos de prótese e reabilitação desses pacientes. A região distal do fêmur inclui a zona condilar (epifisária) e supracondilar (metafisária), correspondendo aos 7 a 15cm distais do fêmur. O estudo anatômico dessa região é essencial para o entendimento correto da fratura e seu tratamento. O eixo anatômico do fêmur é cerca de 6-7 graus em valgo no homem e 8-9 graus na mulher, sendo necessária a manutenção do valgismo durante o tratamento da fratura. O côndilo femoral medial estende-se mais distalmente e é mais convexo que o lateral, sendo responsável por esse valgismo fisiológico. Alem disso temos um formato trapezoidal no fêmur distal, e inclinação no córtex lateral de 10 graus e medial de 25 graus, dado importante para o correto posicionamento dos implantes. Os desvios tipicamente encontrados na fratura supracondiliana do fêmur são encurtamento femoral e desvio posterior do fragmento distal, decorrente da ação de grupos musculares específicos (figura 1). Nas 173

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fraturas com acometimento articular, intercondiliana, geralmente observase desvio rotacional dos fragmentos no plano frontal. O músculo gastrocnêmio flexiona o fragmento distal levando a um desvio posterior. O quadríceps femoral e os tendões dos isquiotibiais exercem tração levando a encurtamento da fratura.

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lógica em 1%. A síndrome compartimental é rara, mas deve ser lembrada na presença de edema volumoso. O exame das estruturas ligamentares só deve ser realizado com o paciente anestesiado antes e após a estabilização da fratura. O diagnóstico radiográfico inclui radiografia ântero-posterior e perfil do joelho e do fêmur. Radiografias com tração manual, ou após a fixação externa no controle de danos, são importantes para um melhor entendimento da fratura e sua classificação. As radiografias oblíquas em 45 graus são pouco utilizadas atualmente, devido a maior facilidade de acesso à tomografia computadorizada, que demonstra com clareza o acometimento articular, lesões osteocondrais e por impacção, facilitando o planejamento cirúrgico; sendo indispensável nas fraturas articulares. Na presença de luxação de joelho associada, a arteriografia pode estar indicada, pois em cerca de 40% dos casos ocorrem rupturas vasculares. A classificação da fratura bem realizada propicia ao cirurgião decidir sua tática cirúrgica, via de acesso, método e tipo de implante, assim como o prognóstico da lesão. Existem diversas classificações descritas; Neer e cols. (1967) dividiu em três tipos de acordo com o desvio da fratura, Sensheimer e cols.(1980) classificou em quatro tipos sendo tipo I e II decorrentes de osteopenia, sem acometimento articular e tipo III e IV com comprometimento articular em

Figura 1

A maioria das fraturas decorre de trauma axial associada a forças em varo, valgo ou rotacionais. Diagnóstico ClÍnico e Radiológico O paciente tipicamente é incapaz de deambular, apresentando edema, deformidade e dor à palpação da região acometida. O exame clínico de toda a extremidade acometida é mandatório, devendo excluir fraturas acetabulares, luxação do quadril, fraturas do colo e diáfise femoral e fraturas da patela, assim como lesão neurovascular. A lesão vascular é encontrada em 3% das fraturas dessa região e neuro174

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adultos jovens. Essas classificações são basicamente descritivas e não fornecem dados quanto à gravidade e prognóstico da lesão. A classificação AO é preferida; divide as fraturas em extra-articular (tipo A), articular parcial - unicondilar (tipo B) e articular completa - bicondilar (tipo C), portando graduada de acordo com a complexidade da fratura e subdividida em subgrupos conforme a figura 2.

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gessada, geralmente insuficiente para correção das deformidades em varo e acarretando rigidez articular com mau prognóstico de marcha para esses pacientes. Esse tratamento gera custos elevados com internações prolongadas, cuidados de enfermagem, além de ser pouco tolerado pelos pacientes com lesão única e impraticável no paciente politraumatizado. O repouso prolongado traz riscos decorrentes do imobilismo do paciente como trombose venosa profunda, tromboembolismo pulmonar, pneumonia, escaras e sepse. Os objetivos do tratamento cirúrgico são redução anatômica articular, restauração do alinhamento e comprimento do membro, fixação interna estável que possibilite mobilização precoce. O surgimento de novos implantes de fixação e a melhor compreensão da personalidade da fratura tem gerado um melhor resultado funcional para o paciente. O tratamento cirúrgico pode

Figura 2

Figura 3

Tratamento O tratamento padrão consiste em redução cirúrgica e estabilização da fratura, sendo o tratamento conservador reservado às fraturas extraarticulares impactadas, sem desvio e em pacientes inoperáveis por falta de condições clínicas. O tratamento conservador consiste em repouso no leito, utilização de tração esquelética, seguida da imobilização 175

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ser realizado de modo estagiado, inicialmente através do controle de danos de partes moles com a fixação externa transarticular,(figura 3), seja no paciente com lesão única ou politraumatizado sem condições de abordagem definitiva na emergência. O manejo inicial para o sucesso do tratamento cirúrgico consiste em planejamento operatório adequado, através da escolha da via de acesso, mesa cirúrgica, posicionamento do paciente, tática de redução e por último a escolha do implante. As vias de acesso utilizadas são basicamente quatro: 1) anterolateral, utilizada nas fraturas tipo A e C1/C2; 2) parapatelar lateral, para fraturas tipo C3, permitindo ampla visibilização articular; 3) parapatelar medial, utilizada na fixação com tutor intramedular, com ou sem traço de fratura articular; 4) posterior, geralmente na impossibilidade de redução e acesso adequado a uma fratura tipo B3. A escolha da via de acesso e a necessidade de incisão percutânea ou ampla, dependem do correto planejamento e do comprometimento articular existente no fragmento distal. O posicionamento do paciente com joelho fletido (45-60 graus), com auxílio de coxim ou suporte próprio, anula as forças do gastrocnêmio corrigindo o recurvato do fragmento. A utilização de um fio de Steinman em alavanca (joy stick), auxilia na redução da flexão do fragmento distal. A utilização de tração manual, ou uso

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do distrator corrige o encurtamento, muitas vezes difícil de restabelecer nas fraturas com grave cominuição. Métodos de Osteossíntese Fixador Externo A utilização do fixador externo oferece rápida estabilização, e restauração do comprimento com mínima agressão tecidual. Pode ser utilizado fixador uni ou multiplanar (circular) ou híbrido, com vantagens em relação ao baixo tempo operatório, menor sangramento e mínima lesão periosteal. Devemos considerar seu uso em pacientes com grave lesão de partes moles, baixo potencial de cicatrização de pele, politraumatizados, e fraturas graves que não passiveis de reconstrução com redução aberta e fixação interna. A redução do bloco articular, com mínimo acesso e fixação externa associada, também torna-se opção de tratamento na falta de condições de partes moles. Haste Intramedular (HIM) A utilização da HIM retrógrada permite estabilização da fratura com mínima lesão dos tecidos e periósteo próximo a fratura. Historicamente seu uso estava reservado para fraturas extra-articulares, tipo A, porém com a melhoria no desenho do implante e opção de múltiplos bloqueios distais, tornou-se uma ferramenta valiosa na fixação das fraturas articulares tipo C1/2, combinada à utilização de parafusos de tração 3,5mm longos, o 176

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que torna a fratura um bloco articular único, facilitando a inserção da haste. O comprimento da haste deve atingir o pequeno trocânter, minimizando o stress sobre a região subtrocantérica e diminuindo o risco de fratura local. A principal desvantagem é o acesso articular ao joelho e risco de infecção, no entanto seu uso tem demonstrado baixo índice de pseudartrose. (figura 4)

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gem cuidados adicionais na perfeita introdução da placa e juntamente com o DCS podem ainda ser úteis em fraturas com bom estoque ósseo. A utilização das placas bloqueadas e metodologia pouco invasiva ( LISS - Less Invasive Stabilisation System), facilita o manejo das fraturas supracondilianas, especialmente as periprotéticas e tipos C2/C3, com extensa cominuição meta-diafisária. A sua utilização tem demonstrado bons índices de consolidação 92- 100%, em cerca de 14-16 semanas e baixa taxa de infecção 3,2%. Além de permitirem múltiplos bloqueios distais, combinando parafusos bloqueados e convencionais, dependendo da necessidade do cirurgião. Utiliza técnica percutânea, em ponte, permitindo baixa agressão tecidual, e parafusos bloqueados em toda extensão, diminuindo as chances de arrancamento e fadiga do implante uma vez obtida redução satisfatória com bom alinhamento e comprimento. Outra tática a ser utilizada na melhoria da fixação

Figura 4

Placas e parafusos Atualmente as placas de ângulo fixo são as mais utilizadas nas fraturas supracondilianas, por apresentarem a vantagem de aumentar a estabilidade angular ao implante, promovendo estabilidade no plano coronal e varo/ valgo, tornando obsoletas as placas condilares (de sustentação). Tem sua indicação mais precisa em fraturas do idoso, com osteoporose e, principalmente nas fraturas periprotéticas. As tradicionais placas anguladas (95º) com perfil em “U”, associadas ou não aos parafusos esponjosos, exi-

Figura 5

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resultado. As complicações no tratamento das fraturas femorais distais incluem pseudartrose, infecção, consolidação viciosa, soltura do implante, desvios rotacionais e rigidez articular, sendo esta última a mais comum. Apesar dos avanços no tratamento das fraturas da extremidade distal do fêmur na última década, a escolha do implante adequado, o manejo das lesões do aparelho extensor, a utilização de enxerto ósseo, o uso do polimetilmetacrilato como adjuvante na fixação, assim como os cuidados pós-operatórios requerem maior investigação e estudo.

seria o uso do polimetilmetacrilato (cimento ósseo) como adjuvante da fixação em ossos osteoporóticos e com grave cominuição.(Figura 5) Complicações As complicações decorrentes do tratamento cirúrgico das fraturas supracondilianas do fêmur são, na sua maioria, inerentes à gravidade do trauma inicial. Apesar do conceito atual de acesso biológico e melhoria no desenvolvimento de implantes para fixação, a experiência do cirurgião e a personalidade da fratura, são fatores determinantes para um bom

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Mary J. Albert, MD Supracondylar Fractures of the Femur J Am Acad Orthop Surg 1997;5:163-171 2. F. Winston Gwathmey, Jr, MD ,Sean M. Jones-Quaidoo, MD David Kahler, MD Shepard Hurwitz, MD Quanjun Cui, MD, MS Distal Femoral Fractures:Current Concepts J Am Acad Orthop Surg 2010;18:597-607 3. Thomson AB, Driver R, Kregor PJ, Obremskey WT: Long-term functional outcomes after intraarticular distal femur fractures: ORIF versus retrograde intramedullary nailing. Orthopedics 2008;31 (8):748-750. 4. Kregor PJ, Stannard JA, Zlowodzki M, Cole PA: Treatment of distal femur fractures using the less invasive stabilization system: Surgical experience and early clínical results in 103 fractures. J Orthop Trauma 2004;18(8):509-520. 5. Heiney JP, Barnett MD, Vrabec GA, Schoenfeld AJ, Baji A, Njus GO: Distal femoral fixation: A biomechanical comparison of trigen retrograde intramedullary (i.m.) nail, dynamic condylar screw (DCS), and locking compression plate (LCP) condylar plate. J Trauma 2009;66(2):443-449. 6. Zlowodzki M, Bhandari M, Marek DJ, Cole PA, Kregor PJ: Operative treatment of acute distal femur fractures: Systematic review of 2 comparative studies and 45 case series (1989 to 2005). J Orthop Trauma 2006;20(5): 366-371. 7. Hutson JJ Jr, Zych GA: Treatment of comminuted intraarticular distal femur fractures with limited internal and external tensioned wire fixation. J Orthop Trauma 2000;14(6):405-413. 8. Nork SE, Segina DN, Aflatoon K, et al: The association between supracondylar-intercondylar distal femoral fractures and coronal plane fractures. J Bone JointSurg Am 2005;87(3):564-569. 178

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Fratura do planalto tibial Guilherme Moreira de Abreu e Silva Marco Antônio Percope de Andrade

Epidemiologia A anatomia do joelho e da região proximal da tíbia deve ser lembrada no tratamento desta fratura. O ângulo médio de 5 a 6 graus de valgismo e a forma côncava do platô medial e convexa do lateral propiciam maior acometimento do platô lateral (55 a 70% dos casos). A inclinação posterior do platô (slope tibial) de 7 a 10 graus, bem como o maior diâmetro da superfície articular do platô medial são fatores relevantes. Ocorre mais comumente em homens entre a 3a e 4a década de vida, secundária ao trauma de alta energia (acidentes de trânsito) ou após a 6a década de vida em mulheres vítima de quedas (baixa energia). Mecanismo de trauma Fraturas bicondilares são associadas à carga axial com estresse em valgo (fratura do planalto tibial lateral) ou em varo (fratura do planalto tibial medial). Fraturas bicondilares são associados à carga axial com graus variados de flexão do joelho. Quanto mais fletido o joelho, maior o acometimento da região posterior (fraturas bicondilares posteriores, por exemplo). Lesões associadas Lesão de partes moles sempre está presente, deve ser avaliada e estratificada. Lesões meniscais ocor-

rem em mais de 50% dos pacientes, podendo o menisco ficar encarcerado no foco de fratura nos casos associados a cisalhamento. Lesão do ligamento colateral medial está presente em 7 a 43% das fraturas (lesão com estresse em valgo do joelho). Lesão do ligamento cruzado anterior ocorre em 23% dos casos. Lesões vasculares podem ocorrer, sendo estatisticamente mais associadas às fraturas isoladas do planalto tibial medial. Diagnóstico Dor, aumento de volume e incapacidade de marcha. Aumento de volume local pode variar desde mínimo edema de partes moles até a grande lesão muscular e síndrome de compartimento (de acordo com o grau de energia cinética envolvida). Avaliação dos pulsos periféricos, perfusão capilar, tensão dos compartimentos da perna, devem observados de rotina. O índice tornozelo-braço pode ser utilizado como parâmetro clínico de insuficiência arterial do membro (por síndrome compartimental ou por lesão vascular direta). Índice menor que 0,9 aumenta o grau de suspeição e exames complementares devem ser realizados. 179

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Exames complementares Radiografias em ântero-posterior, perfil e oblíquas interna e externa devem ser realizadas. Tomografia computadorizada para estudo da superfície articular, presença de traços secundários e planejamento préoperatório tem se tornado rotina. A ressonância magnética para detecção de lesões associadas apresenta indicação dispendiosa e sem comprovação de seu benefício através de estudos clínicos recentes. Na suspeita de lesão vascular, avaliação por duplex-scan e por arteriografia deve ser empregada.

f ) dissociação metáfiso-diafisária. Tscherne: avaliação de partes moles 0 - sem comprometimento de partes moles evidente 1 - comprometimento superficial de pele e derme através de escoriação e leve edema local. 2 - comprometimento de pele, derme e plano muscular através de contusão muscular, edema local moderado, escoriação e maceração de pele. 3 - grave comprometimento do compartimento, com contusão e hemorragia local, grande aumento de volume, desenluvamento de partes moles, presença de flictemas, fase précompartimento.

Figura 1. classificação de Schatzker do planalto tibial

a) b) c) d) e)

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Tratamento O tratamento inicial depende principalmente das condições de partes moles envolvidas. Pacientes com trauma de alta energia e lesão importante de partes moles (Tscherne II e III) devem ser tratados provisoriamente com fixador externo transarticular até melhora das condições locais. O tempo médio de espera para conversão da osteossíntese, de acordo com a literatura, varia entre 2 a 4 semanas. Os pacientes com boas condições de partes moles devem ser tratados através de fixação definitiva o mais precocemente possível. A fixação definitiva das fraturas

Classificação Schatzker: classificação das fraturas do planalto tibial (figura 1). cisalhamento lateral puro cisalhamento lateral com afundamento da superfície articular depressão central do planalto tibial cisalhamento medial fratura bicondilar 180

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do planalto deve ser analisada de acordo com cada padrão de fratura, porém em qualquer técnica empregada, o cuidado com as partes moles é fundamental. Redução anatômica articular, fixação rígida e mobilização precoce são princípios a ser seguidos. Serão descritas, separadamente, as opções de fixação de acordo com a classificação de Schatzker: Tipo I: as fraturas por cisalhamento puro podem ser tratadas conservadoramente na ausência de desvio articular (menor que 2-3 mm), na presença de estabilidade (estresse em valgo e varo com abertura menor que 5 graus) e alargamento articular menor que 10 mm. O tratamento conservador deve permitir mobilização precoce articular, não devendo se estender por mais de 6 semanas o período de imobilização. Descarga de peso no membro acometido é iniciado após 8 semanas. Nas fraturas com desvio articular inaceitável e ou na presença de instabilidade articular (abertura maior que 10 graus de varo/valgo), a redução e fixação cirúrgica deve ser indicada. Fixação através de tração com ou sem placa de neutralização lateral pode ser utilizado. No insucesso da redução indireta, redução aberta e fixação são realizados. Tipo II: as fraturas com componente de impacção (afundamento) não podem ser reduzidas indiretamente, portanto a redução aberta dever ser realizada através de acesso parapatelar lateral com abordagem

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submeniscal ou transmeniscal através de sua desinserção do ligamento coronário anterior. Elevação da superfície articular, enxertia óssea para sustentação e fixação com placa de neutralização lateral devem ser utilizadas nestes casos. Tipo III: fratura associada frequentemente à osteoporose. O tratamento é feito por método de redução fechada, com uso de radioscopia e artroscopia, visualização direta, elevação articular e enxertia autóloga ou sintética. Após elevação articular, parafusos subcondrais de menor diâmetro (preferencialmente 3,5 mm) sustentarão o fragmento osteocondral elevado e escorado pelo enxerto autólogo ou sintético. Tipo IV: tratamento cirúrgico é a regra. Perda de redução em varo é bem descrita na literatura nos casos tratados conservadoramente. Um tipo específico de fratura do planalto medial que merece abordagem diferenciada é a presença de um fragmento póstero-medial. Esta ocorre em até 60% dos casos de fratura bicondilar. Neste caso, há a necessidade de abordagem cirúrgica posterior ou póstero-medial, com o posicionamento da placa na face póstero-medial do planalto. Tipo V e VI: geralmente são fraturas tratadas inicialmente através de fixador externo temporário até melhora das condições de partes moles, sendo convertido para fixação definitiva após melhora local. Duas abordagens podem ser utilizadas como tratamento definitivo, o uso 181

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da complexidade e lesão de partes moles associadas. a) Infecção superficial (3-38%) e profunda (2-9,8%): complicação precoce temida. Acessos amplos, fratura exposta e lesão grave de partes moles aumentam sua incidência. b) Trombose venosa profunda (2-10%) e embolia pulmonar (1-2%). c) Dor relacionada ao implante (254%): complicação tardia mais comum. d) Artrose pós-traumática: associada a incongruência articular residual e ao dano condral do trauma. e) Pseudoartrose: complicação incomum. f ) Artrofibrose: complicação freqüente, associada a fraturas graves e reabilitação inadequada. O melhor tratamento é a sua prevenção.

de dupla placa ou de placa unilateral bloqueada. Condição indispensável para utilização da placa bloqueada é a ausência de cominuição metafisária medial. Nos casos de uso da dupla placa, cuidado com as partes moles deve ser observado, para não haver desvitalização óssea excessiva (“sanduíche de osso morto”). Acesso anterior único é desaconselhado pela literatura atual. Fraturas expostas O protocolo de tratamento deve seguir os mesmos princípios de tratamento das fraturas expostas. Fixação definitiva imediata pode ser realizada nos casos com boas condições locais, mínima exposição e contaminação. Complicações: Incidência varia muito de acordo com a literatura (2-54%), dependendo

Algoritmo sugerido para tratamento das fraturas do planalto tibial CLA

SSIF

Avaliação inicial - radiografias AP, perfil e oblíquas e tomografia ICA

R

Classificar partes moles e a fratura

BOAS CONDIÇÕES Fechada

MÁ CONDIÇÃO LOCAL DE PARTES MOLES

Aberta

Fixador externo provisório

Imobilização provisória incruento

cruento

Platô lateral: < 3 mm depressão ou < 10 mm de alargamento, estável (80%)

II. Baixa Energia

Diagnóstico Clínico e Radiológico A suspeita diagnóstica já se inicia pela história típica de trauma com carga axial, envolvendo alta energia, e um exame clínico rico em al-

Epidemiologia As fraturas do pilão tibial representam menos de 1% das fraturas 187

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terações no envelope de cobertura do 1/3 distal dos ossos da perna. No entanto, deve-se estar atento para as modalidades menos comuns de apresentação, como nas situações em que o mecanismo de trauma é eminentemente rotacional, ou, numa situação de baixa energia aplicada sobre um osso de pior qualidade. As radiografias simples do tornozelo confirmam o diagnóstico, e elas devem incluir nitidamente o tálus e o calcâneo, pois lesões associadas desses ossos podem estar presentes3 . Avaliação por TC é útil no planejamento pré-operatório, permitindo ao cirurgião identificar lesões ocultas, avulsões ósseas ( como do tubérculo de Chaput ), rupturas da sindesmose, traços de fraturas, cominuição articular e metafisária, nos planos sagital, coronal e axial. Naqueles casos em que existe um maior grau de cominuição, a TC deve ser realizada após o membro ter sido estabilizado, preferencialmente por um fixador externo transarticular. Tornetta mostrou que o estudo tomográfico pode modificar a opção pela via de acesso em até 64% das vezes quando comparado com o estudo radiográfico isolado3,5.

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estas intenções. Ruedi, em 1969, propôs uma classificação simples e reprodutível levando em consideração o desvio articular e o grau de cominuição. O tipo I representa as fraturas articulares sem desvio. O tipo II são fraturas articulares desviadas com pouca cominuição. Por último, o tipo III representa as fraturas com o maior grau fragmentação articular (fig.2). Figura 2. Rüedi e Algower

Outras classificações surgiram para tentar abranger outros padrões de fratura não contémplados na classificação de Ruedi, como a de Maale e Seligson, que inclui o tipo espiral da tíbia distal e a classificação de Ovadia e Beals, que detalha sobre os defeitos metafisários3. Mas é o sistema descritivo da AO o mais utilizado e que melhor informa sobre o prognóstico da lesão. A AO definiu, através de um sistema alfanumérico três tipos principais, cada um com três subtipos evolutivos quanto a gravidade e prognóstico da fratura da tíbia distal. O tipo A compreende as fraturas extra-articulares,

Classificações Ao se propor uma classificação de fraturas, o que se tenta é criar parâmetros que estabeleçam nível de gravidade, auxiliem na escolha do tratamento e acenem para o prognóstico da lesão. Várias classificações foram criadas para as fraturas do pilão tibial com 188

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os tipos B e C representam as fraturas propriamente ditas do pilão tibial. São fraturas articulares, parciais (sem dissociação metáfiso-diafisária) e totais respectivamente. (fig. 3)

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auxilia a programação do momento mais apropriado e do método de tratamento a ser realizado. TSCHERNE Grau 0 – Lesão desprezível de partes moles Grau 1 – Escoriações ou contusões superficiais Grau 2 – Importante contusão muscular e escoriações profundas Grau 3 – Esmagamento extenso, com desenluvamento do subcutâneo e risco de lesão vascular e/ou síndrome de compartimento Os graus 0 e 1 são decorrentes de trauma de baixa energia e os graus 2 e 3 são fruto de trauma de alta energia, comumente por trauma direto local.

Figura 3. AO

Tratamento As fraturas do pilão tibial merecem cuidados preliminares, desde o local do acidente, que incluem princípios básicos como restauração do alinhamento e comprimento do membro, estabilização do tornozelo e elevação moderada da extremidade. A seguir, após avaliação das condições clínicas do paciente (do status vascular e dos danos às partes moles da perna) e dos estudos radiológicos (radiografias e TC), faz-se a decisão sobre o tratamento definitivo . Ele poder ser cirúrgico ou conservador (não-operatório). O tratamento conservador é uma escolha de exceção, indicado para aqueles pacientes com fraturas sem desvio, com mínima ou nenhuma co-

É essencial também abordar o dano ao envelope de partes moles do terço distal da perna. Sabemos que neste segmento a cobertura muscular do osso é menor que nas outras partes da perna, e portanto a irrigação desta parte é deficiente em relação aos outros segmentos. Este menor aporte vascular aumenta o risco de problemas de cicatrização de partes moles e consolidação da fratura. Tscherne, em 1984, elaborou uma classificação para graduar o dano as partes moles associado às fraturas fechadas4. Esta classificação 189

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minuição, ausência de falha metafísária, ou para aqueles muito debilitados. Os métodos conservadores seriam a tração esquelética pelo calcâneo, confiando-se no princípio da ligamentotaxia para redução e estabilização da fratura, e a imobilização gessada. A desvantagem do tratamento conservador, mesmo para as fraturas sem desvio, é o maior a rigidez articular, osteodistrofia, inatividade prolongada, e reabilitação mais difícil3. O tratamento cirúrgico é dotado de uma variedade de métodos, que se aperfeiçoaram e evoluíram sempre no sentido de uma maior atenção e cuidado às partes moles. Portanto, o bom resultado do tratamento operatório das fraturas do pilão tibial é função direta da preservação (ou mínima agressão) do envelope de cobertura óssea. Nos casos mais simples, como nos tipos B e C1, com menor fragmentação e desvio articular, além das boas condições de partes moles, pode optar-se, nas primeiras 6 a 12h após o trauma, por redução aberta e fixação interna com placas e parafusos. Já nos casos de maior complexidade da fratura, com cominuição importante, encurtamento e desalinhamento do membro, e conseqüentemente maior sofrimento de partes moles, as opções recaem sobre o uso dos fixadores externos, em diferentes maneiras. Uma delas seria o uso do fixador externo transarticular (spanning) em um primeiro tempo ,por um período de 10 a 14 dias, com o objetivo de restauração do alinhamento e comprimento do

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membro, redução indireta da fratura, e melhora das condições de partes moles2,7. (fig. 4) Figura 4

Num 2o tempo, em condições ideais, realiza-se, por meio de acessos convencionais ou minia cessos, a redução aberta (anatômica da superfície articular) e fixação interna, com placa e parafusos, de preferência de baixo perfil e bloqueadas. (fig. 5) Figura 5

Outra estratégia seria o uso, de maneira definitiva, de fixadores externos híbridos ou articulados (Orthofix), associados à redução aberta superfície articular, por acessos convencionais ou minia cessos, e fixação com 190

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parafusos ou fios percutaneamente6. Por fim, para aqueles casos de extrema cominuição, grave dano de partes moles, ou múltiplas lesões (politrauma) que exigem procedimentos rápidos, o uso isolado e de maneira definitiva do fixador externo spanning articulado (Orthofix) é a melhor opção. (fig.6)

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as complicações tardias, como osteomielite, distrofias osteoarticulares, falha do material de fixação, pseudartrose e consolidação viciosa, e artrite pós-traumática. Cada uma delas deve ser prontamente reconhecida e tratada por métodos específicos. Opções de tratamento cirúrgico

Figura 6

• RAFI (6-12h, se boas condições de pele) Boraiah S , JBJS Am 2010 Dunbar JOT Jul 2008 • FE híbrido Ristiniemi ACTA ORTHOPAEDICA 2007 • FE híbrido + parafusos percutâneos/ mini acesso Thordarson FA I 1996 /Tornetta JOT 1993/ Saleh M Injury 1993 • Fixação em 2 tempos 1º: RAFI fíbula + FE transarticular 2º: Fixação minimamente invasiva da tíbia com placa e parafusos , ou RAFI Roy Sanders J Orthop Trauma Sept 2004/ Harris AM, FAI 2006

Complicações Existem as complicações precoces tais como problemas com feridas operatórias, infecções superficiais, e

• FE transarticular (Orthofix) sem redução articular Marsh JL Foot Ankle 1993

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Boraiah, S.; Kemp,T.J.; Erwteman, A; Lucas,P.A.; Asprinio,D.E.Outcome following open reduction and internal fixation of open pilon fractures. Journal of bone and joint surgery – American volume 2010 vol. 92 no 2 346-352. 2. Borens, O.; Kloen, P.; Rishmond, J; Roederer, G.; Levine, D.; Helfet, D. L. Minimally invasive treatment of pilon fractures with a low profile plate: preliminare results in 17 cases. Archives of orthopeadic and trauma surgery 2009 vol:129,no 5, 649-659. 3. Browner, B D; Levine, AM; Jupiter, J B; Trafton, P G. Traumatismos do Sistema Músculoesquelético, 2a ed., 2295-2325. 4. Conroy, J; Agarwal, M; Giannoudis, P V; Matheus, S J E. Early Internal Fixation and soft Tissue Cover of Severe open Pilon Fractures. International Orthopaedics 2003 vol:27,343-347 5. Coughlin, M J; Mann, R A; Saltzman, C L. Surgery of the Foot and Ankle, 8th ed. 2007, vol lI, 1941-1971. 6. Pugh, K. J.; Wolinsky, P. R.; Mcandrew, M. P.; Johnson, K. D. Tibial pilon fractures: a comparison treatment methods. Journal of Trauma – Injury and critical care 1999 vol 47 no 5 937-941 7. Sirkin, M.; Sanders, R.; Dipasquale, T.; Herscovici, D. A Staged Protocol for soft tissue management in the treatment of complex pilon fractures.Journal of orthopaedic trauma 2004 vol:18, no 8 suppl. S 32-38.

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Fraturas dos ossos da perna André Bergamaschi Demore

EPIDEMIOLOGIA As fraturas da tíbia são as mais freqüentes entre os ossos longos. Normalmente causadas por traumas de alta energia, têm como fator complicador o fato de a tíbia ser subcutânea. Isso interfere de duas maneiras na gravidade da fratura – maior propensão a fraturas expostas e menor cobertura muscular, que torna deficitária a vascularização1. Acomete, principalmente, indivíduos jovens, do sexo masculino (84,5%), decorrentes de acidente de trânsito (94%), metade destes em motociclistas, com fratura concomitante da fíbula em 74% dos casos. A maioria é fratura exposta, sendo que o tipo II de Anderson e Gustilo é o mais frequente, acometendo o terço médio do osso. Mais da metade dos casos são fraturas de traço simples (oblíquas ou transversas)2.

ciona-se a pele (abrasões, ferimentos), verifica-se alinhamento ou deformidades, locais de edema. Verificamos os pulsos pediosos e tibiais, aferimos a sensibilidade cutânea. Avaliamos a movimentação ativa dos dedos do pé ipsilateral. Palpamos as proeminências ósseas do joelho e tornozelo, para afastar acometimentos epifisários, e a superfície da tíbia anterior, à procura de crepitações que possam indicar fraturas. Avaliamos a musculatura da perna lateral, anterior e posterior, para afastar turgência muscular, sugerindo síndrome compartimental. É imperativo que se afaste a ocorrência desta complicação, pois as consequências de um diagnóstico tardio são por demais desastrosas ao paciente. O diagnóstico é feito na observância das características mais evidentes – dor discrepante à gravidade do trauma, agravada por mobilização ativa ou passiva dos dedos, endurecimento da musculatura, retardo do retorno venoso. O diagnóstico é essencialmente Clínico, porém pode-se lançar mão de medidas de pressão intracompartimentais, pelo método de Whitesides ou catéteres de medição eletrônica. Não devemos esquecer-nos de avaliar todos os compartimentos musculares da perna.

DIAGNÓSTICO Clínico O diagnóstico clínico das fraturas da tíbia se faz através da semiologia ortopédica. Inicialmente, questiona-se sobre detalhes do trauma, como ocorreu, em que ambiente, energia despendida, se existem outras partes do corpo com dor ou limitação. Expõe-se o paciente, com especial atenção à estabilização do membro para evitar dor ou agravamento da lesão. Inspe-

DIAGNÓSTICO RADIOLÓGICO Após avaliarmos clínicamente o 193

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paciente, são solicitados os exames radiográficos, que incluem radiografias da perna nas incidências em anteroposterior e perfil. Não podemos nos contentar com radiografias diafisárias, pois as fraturas podem estar em metáfises ou epífises. Outra razão para que as articulações estejam presentes nas radiografias é afastar a ocorrência de luxações. Com base nas radiografias, podemos classificálas. Desde o inicio da traumatologia, várias classificações foram sugeridas para as fraturas da tíbia. Pela universalidade que o grupo AO (Arbeitsgemeinschaft für  Osteosynthesefragen) possui, ultimamente se tem usado sua classificação. Esta classificação numera a fraturas da tíbia (4) e da diáfise (2). Portanto, todas as fraturas diafisárias se iniciam com o numero 42. A letra “A” significa fratura simples, a “B” fratura com um 3º fragmento e a “C” cominutiva.

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tacional), ou posterior a uma redução incruenta de uma fratura desviada. Fatores complicadores são a atrofia muscular e óssea que acompanham um tempo prolongado de imobilização. Para minimizar este problema, a possibilidade de apoio no gesso deve ser considerada assim que houver formação de calo ósseo, assim como a confecção de gesso PTB, conforme preconizado por Sarmiento. Outro fator complicador pode ser uma fratura fechada, porem com lesão contusa da pele – Tscherne 1 ou 2 -, que evolui para necrose e pode expor a fratura dias após o trauma (fig.2)4. Os problemas com o posicionamento dos fragmentos e o prolongado tempo de inatividade do paciente são os principais fatores que tornaram o tratamento conservador cada vez menos freqüente. Fraturas expostas não devem ser tratadas com imobilização gessada, pois a imobilização não é efetiva, e o movimento do foco, agredindo partes moles, é fator de risco para infecção 4; além de o gesso não permitir inspeção diária do ferimento. Desde o início dos estudos das fraturas da tíbia, ficou evidente que a carga era um fator primordial na consolidação das fraturas. Portanto, os estudos se direcionaram para tratamentos que permitissem esta carga o mais precoce possível. A redução aberta, fixação interfragmentária e colocação de placa rígida, conforme preconizada por Ruedi e Muller tinham índices de sucesso semelhan-

TRATAMENTO Por muitas décadas o tratamento de escolha foi o conservador, principalmente após os trabalhos de Sarmiento, que foram bastante enfáticos, mostrando excelentes resultados, complicações raras, consolidação em breve espaço de tempo¹. Atualmente, o tratamento conservador pode ser uma opção de tratamento de uma fratura em boa posição (até 1 centímetro de encurtamento, menos de 5 graus de desvio em varo ou valgo, e menos de 10 graus de desvio em ante e recurvato, nenhum desvio ro194

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tes ao conservador. Já chamavam atenção para as complicações frequentes no tratamento das fraturas expostas. Os resultados do grupo AO não conseguiram ser repetidos mundo afora, onde a ocorrência aumentada de infecção, pseudo-artroses e problemas de pele foram muito altas. Foram necessários muitos anos de estudo e experimento para se desenvolver placas cada vez melhores e menos agressivas, mecanismos de fixação mais eficazes e que não lesassem o periósteo, metalurgia de materiais mais bio-compatíveis. A evolução das placas culminou com as placas de parafuso bloqueados, também chamadas fixadores internos. Estas placas têm inúmeras vantagens. Por não serem comprimidas contra o osso, não causam isquemia periosteal nem causam a substituição do osso cortical por esponjoso. Podem ser aplicadas subcutaneamente, minimizando o dano a partes moles, e os parafusos colocados percutaneamente, através de guias externos. A utilização dos fixadores externos tornou o tratamento das fraturas expostas muito mais adequado, pois não se colocava material metálico dentro da ferida (diminuindo os índices de infecção), gerava boa estabilização (permitindo mobilização), diminuía a dissecção de partes moles, deixava a ferida à disposição para inspeção e possíveis abordagens de cirurgia plástica e vascular, permitia ajustes posteriores, distração do

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Fig 2. Classificação de Tscherne para fraturas fechadas e expostas Classificação de Tscherne fratura fechada Grau 0 Fratura fechada, sem lesão de partes moles Grau 1 Trauma indireto, contusão de dentro, laceração superficial Grau 2 Usualmente, trauma direto com abrasão profunda, contaminada, ou trauma direto grave com formação de bolhas e grande edema; síndrome compartimental iminente Grau 3 Usualmente, trauma direto com contusão extensa ou esmagamento; dano muscular possivelmente extenso; dano vascular ou síndrome compartimental

Classificação de Tscherne fratura exposta Grau 1 laceração cutânea por fragmento ósseo perfurante; nenhuma ou pouca contusão da pele; fratura usualmente simples Grau 2 qualquer tipo de laceração cutânea com contusão simultânea circunscrita ou contusão de partes moles e moderada contaminação; qualquer tipo de fratura Grau 3 grave dano a partes moles, frequentemente com lesão vasculonervosa concomitante, fraturas acompanhadas de isquemia e grave cominuição; acidentes em ambientes rurais e contaminados com material orgânico; síndrome compartimental Grau 4 amputação traumática total ou subtotal, necessitando reparo arterial para manter vitalidade do membro distalmente

foco, etc. Também teve indicação em fraturas fechadas instáveis. É muito utilizado em politraumatizados, com instabilidade hemodinâmica, que ne195

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cessitam intervenções abdominais, torácicas, neurocirúrgicas ou que necessitem UTI imediata. Antigamente, ao se instalar um fixador externo, este era mantido até o final do tratamento. Estudos mostraram que isto não era benéfico ao paciente, tanto pelo alto índice de infecções nos pinos, quanto altos índices de pseudo-artroses. Portanto, atualmente, o fixador externo instalado na urgência é trocado por síntese interna (de preferência haste intramedular bloqueada) assim que as condições clínicas do paciente permitam. Com o surgimento das hastes intramedulares, as complicações do tratamento cirúrgico baixam em incidência. Porem, até o advento das hastes bloqueadas, as indicações eram muito limitadas. As hastes bloqueadas permitiram a disseminação do uso por maior controle rotacional e maior estabilidade. Atualmente, as hastes estão com seus parafusos de bloqueio bastante proximal e distalmente, permitindo uso em fraturas metafisárias. A grande discussão está em uso de hastes fresadas ou não fresadas. Sabe-se que, após uma fratura, a vascularização da tíbia provém, principalmente, da periostal. A fresagem da tíbia parece fornecer substrato ósseo ao foco de fratura, diminuindo a chance de pseudoartrose. Atualmente, a fixação das fraturas da tíbia por haste intramedular é o padrão ouro, e deve ser o objetivo do cirurgião ortopédico. Em fraturas expostas, sua utilização está indicada

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mesmo e fraturas grau 3 A e B de Anderson e Gustilo. Na impossibilidade do uso de haste no tratamento de emergência, a fixação externa é uma excelente opção. Porém, deve ser convertida em fixação intramedular o mais breve possível. COMPLICAÇOES As complicações da fratura da tíbia são a pseudo-artrose, a consolidação viciosa, a perda funcional de partes moles adjacentes, a necrose tecidual, a síndrome compartimental, a infecção. O sucesso do tratamento depende de evitar estas complicações. A pseudo-artrose e a consolidação viciosa têm sua incidência diminuída por fixação biológica, anatômica e estável, apoio e arco de movimento precoce. A perda funcional pode ser minimizada com redução fechada, evitando trauma a tecidos musculares, vasculares e nervosos. Obviamente, a grande perda de partes moles é decorrente do trauma inicial, principalmente em fraturas expostas. A necrose tecidual é evitada ao realizarmos redução fechada da fratura. A síndrome compartimental é evitada ao não acrescentarmos trauma maior à tíbia, ao reconhecimento e tratamento precoce com fasciotomia. A infecção de partes moles e osteomielite é evitada com limpeza, debridamento e assepsia adequada, antibioticoprofilaxia de fraturas fechadas e expostas com drogas e tempo adequado para cada grau de exposição3. 196

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Operative Orthopaedics. Michael W.Chapman vol 1 Ed. J.B. Lippincot. Philadelphia. Pag. 435442. 2. II Congresso Brasileiro de Medicina de Emergência (2009) EPIDEMIOLOGIA DAS FRATURAS DA DIÁFISE DA TÍBIA. NETO, J.S.C.; DE AZEVEDO, M.A.; BRANCO MOURÃO, A.E.C.C.; BRAGA JÚNIOR, M.B. UFC, FORTALEZA, CE, BRASIL. 3. Projeto diretrizes, AMB – SBOT – fratura exposta da tíbia no adulto.12-11-2007. Kojima KE, Santin RAL, Bongiovani JC, Fichelli R, Rodrigues FL, Lourenço PBT, Rocha T, Castro WH, Skaf AY 4. Revista Brasileira de Ortopedia e Traumatologia Agosto – 2001 Fraturas expostas CLÉBER A.J. PACCOLA 5. Revista Brasileira de Ortopedia e Traumatologia Outubro – 2000 Fraturas da diáfise dos ossos da perna JOSÉ CARLOS AFFONSO FERREIRA

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Fraturas do tornozelo Alexandre Daher Albieri

Anatomia O tornozelo é uma articulação complexa, composta por três ossos: tíbia, fíbula e o tálus e estabilizada por três importantes complexos ligamentares. O domus talar articula-se com a superfície inferior da tíbia, sendo esta superfície côncava tanto de antero-

posterior como latero-lateral, mais larga anteriormente. O maléolo medial é formado por um prolongamento ântero-medial da tíbia, que termina distalmente em duas proeminências: os colículos anterior e posterior, nos quais se origina o ligamento deltoide que se insere no navicular, calcâneo e tálus. O ligamento deltoide é responsável pela estabilização medial do tornozelo. O maléolo lateral (ML) articula-se com a faceta lateral do tálus, sendo mais posterior e distal ao maléolo medial. O complexo ligamentar lateral é composto por três ligamentos: o fibulo-talar anterior (FTA) é o menos resistente e projeta-se da face anterior do ML ao colo do tálus, estabilizando a rotação interna e varização do mesmo. O fíbulo-calcâneo (FC) origina-se da ponta do ML e insere

Figura 1

Figura 2

As fraturas do tornozelo são fraturas complexas, relativamente frequentes em que o mecanismo de trauma indireto é mais comum (96,1%) e que apresentam vários tipos de lesões. Ocorre comprometimento da pinça articular, com seus maléolos, superfície articular da tíbia e ligamentos, podendo haver instabilidade com luxações e subluxações articulares. O objetivo do tratamento é o restabelecimento anatômico e funcional da articulação.

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no calcâneo, limitando varização e também estabilizando a articulação subtalar. O último é o fíbulo-talar posterior (FTP) que é o mais resistente deles e se insere no processo posterior do tálus. Estabilizando a fíbula à tíbia está a sindesmose que é composta por quatro ligamentos. Anteriormente está o ligamento tíbio-fibular anterior que une o ML ao tubérculo de Tillaux-Chaput da tíbia. Entre a tíbia e a fibula está o ligamento interósseo que é o principal estabilizador da sindesmose e suas fibras tem continuidade com a membrana interóssea. Na face posterior o ligamento tibio-fibular posterior é bastante resistente e inferior a este, está o ligamento transverso. O eixo de flexo-extensão do tornozelo tem arco de movimento de 20° de flexão dorsal a 45° de flexão plantar, mas o arco funcional para marcha é de 10° dorsal a 20° plantar. A dorsiflexão está associada a rotação lateral do tálus e translação póstero-lateral da fíbula, enquanto a flexão plantar é acompanhada da rotação medial do tálus. Devido a estas características o tratamento está baseado em perfeita congruência articular.

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Figura 3A

Figura 3B

ferimentos. À palpação nota-se crepitações. O paciente normalmente é incapaz de apoiar e deambular no PS (critérios da Universidade de Ottawa). O próprio exame determina a presença de instabilidade articular, com manobras como a gaveta anterior e stress varo e valgo. A avaliação radiográfica em três incidências, antero-posterior (AP), perfil (P) e AP com 20° de rotação interna (mortise), é suficiente para diagnosticar a maioria das lesões anatômicas, assim como os mecanismos que as produziram. Em casos duvidosos deve-se realizar radigrafias em oblíquo e radiografias com estresse.

Diagnóstico O exame físico é importante para avaliação clínica do tornozelo traumatizado. Deve-se observar a presença de edema e equimoses localizadas, flictenas, escoriações e 199

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Na incidência de “mortise”, observa-se um espaço claro medial, que deve ser menor que 4 mm. A inclinação do tálus (tilt talar) deve ser menor que 2 mm, a subluxação talar menor que 1 mm e as superfícies condrais devem estar paralelas. Na incidência em AP avalia-se a integridade da sindesmose, espaço claro tibiofibular (incisura fibular da tíbia e borda medial do ML), não devendo ultrapassar 5 mm. Observa-se também a sobreposição tibiofibular (overlap), devendo ser maior que 10 mm.

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lares, fraturas com impacção medial, presença de lesões condrais e fragmentos articulares, facilitando o planejamento cirúrgico. Classificação Lauge-Hansen em 1948 propôs uma classificação que considerava o mecanismo do trauma para diferenciar os tipos de fratura. É composta por dois nomes: o primeiro equivale a posição do pé no instante do trauma e o segundo a direção da força aplicada. A vantagem desta classificação é que ela permite identificar as lesões anatômicas existentes baseado no tipo da fratura encontrada. Desta forma foram descritos quatro tipos, subdivididos em estágios, de acordo com a evolução do trauma:  supinação-adução: 1º lesão lateral, 2º lesão medial (fratura MM ou lesão deltoide)  supinação-rotação lateral: 1º lesão FTA, 2º fratura ML, 3º lesão posterior da tíbia e 4º lesão medial  pronação-rotação lateral: 1º lesão medial, 2º lesão sindesmose, 3º fratura ML e 4º posterior da tíbia (Volkmann)  pronação-abdução: 1º lesão medial, 2º sindesmose, 3º fratura ML A classificação de Danis-Weber divide as fraturas do tornozelo em três tipos de acordo com a localização do traço de fratura do maléolo lateral. No tipo A a fratura é distal à sindesmose, no tipo B ao nível da sindesmose e no tipo C proximal a sindesmose.

Figura 4

A incidência em perfil avalia com clareza a subluxação anterior do tálus. Nas incidências em oblíquo nota-se diastases das fraturas não vistas em incidências habituais. Nas posições com estresse em varo e valgo é testada a integridade dos estabilizadores laterais e mediais. A tomografia computadorizada é útil na avaliação de fraturas articu200

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A classificação da AO originou-se da de Danis-Weber, sendo subdividida em subtipos: A1: fratura isolada da fíbula A2: A1 + maléolo medial A3: A2 + tíbia distal B1: fratura da fíbula B2: # fíbula + sindesmose + lesão medial B3: B2 + Volkmann C1: # fíbula + lesão deltoide C2: # fíbula + MM C3: # alta da fíbula + lesão medial (Maisoneuvve)

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extenso edema, presença de flictenas e ferimentos, pode-se optar pela instalação de fixador externo transarticular, para tratamento das partes moles até a cirurgia definitiva, que se dará após diminuição do edema, surgimento de rugas e cicatrização das lesões. O objetivo principal do tratamento de uma fratura do tornozelo é o restabelecimento da superfície articular, com redução anatômica, correção do comprimento da fíbula e rotação e translação talar e estabi-

Figura 5

Figuras 6 e 7

Tratamento Na urgência a fratura quando não pode ser fixada definitivamente, deverá ser imobilizada após redução da luxação ou subluxação, para alívio da dor e preservação de partes moles, com descompressão e melhoria da perfusão tecidual. Em caso de traumas graves de alta energia, com 201

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lidade absoluta para permitir mobilidade precoce. As fraturas consideradas sem desvios e estáveis poderão ser tratadas conservadoramente. Fraturas sem desvios aquelas com menos de 2 mm de deslocamento e estáveis são as que o ligamento e o maléolo oposto ao fraturado estão íntegros. As mais comuns para este tipo de tratamento são as do tipo A e B. Devemos sempre estar atentos para avaliação do ligamento deltoide, pois a lesão deste pode instabilizar as fraturas e causar um desvio em um segundo tempo. No tratamento cirúrgico, a redução anatômica é realizada via aberta com visualização direta do foco de fratura. Para a fixação do ML, a via de acesso é sobre a fíbula distal, sendo que esta permite a visualização da sindesmose tibiofibular anterior. Se a intenção é de colocação de uma placa posterior na fíbula ou fixação do maléolo posterior, a via deverá ser realizada sobre a borda posterior da mesma. Cuidados devem ser tomados com os nervos cutâneos sensitivos, o sural e o fibular superficial, nesta via de acesso. As fraturas do ML podem ser do tipo avulsão, flexão ou torção. As do tipo A geralmente são por avulsão, com traço transverso, devendo ser fixadas com parafusos perpendiculares ao foco de fratura, bandas de tensão ou placas semitubulares (terço de cana). As fraturas do tipo B, que possuem

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Figura 8

traço oblíquo de antero-inferior para póstero-superior, devem ser tratadas com parafusos interfragmentários (tração), associado ou não a placas laterais ou de suporte póstero-lateral. Quando utilizados apenas parafusos, estes devem ser no mínimo em número de dois a uma distância de 1cm entre eles. Nas lesões cominutivas da fíbula, a redução pode ser indireta com preservação da superfície articular lateral e fixação com placa em ponte. As fraturas do tipo C podem ser fixadas com placas e parafusos e podem ser utilizadas placas do tipo DCP, por serem fraturas mais proximais, com boa cobertura de partes moles. Quando a fratura é no terço proximal da fíbula (Maisonneuve), a redução é indireta, com correção da rotação e do comprimento da fíbula, fixando-se a sindesmose com dois parafusos. 202

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nos podem ser fixados com bandas de tensão. As fraturas por cisalhamento têm um traço vertical e podem ter associação com impacção medial da superfície tibial. A fixação deve ser realizada por parafusos horizontais, perpendiculares ao traço da fratura, ou mesmo com uma placa de suporte no vértice da fratura (parafuso com arruela faz mesma função). Quando existir impacção, esta deve ser desfeita e colocado enxerto ósseo. As vias de acesso podem ser tanto sobre o MM ou curvilínea de anterior para posterior quando for necessário inspecionar a articulação.

Figura 9

Figura 10 As fraturas do maléolo posterior normalmente possuem um fragmento triangular, póstero-lateral, avulsionado pelo ligamento posterior da sindesmose. Tem indicação de fixação quando a fratura compromete mais de 25% da superfície articular, ou se mesmo após fixação dos maléolos lateral e medial, o complexo tibio-tarsico permanecer instável. A fixação deve ser realizada com parafuso, comumente passado de anterior para posterior. As fraturas do maléolo medial são de dois tipos, avulsão e cisalhamento, sendo a primeira mais comum. As fraturas por avulsão têm traço transverso e podem ser fixadas com parafusos de tração, perpendiculares ao foco. Fragmentos peque-

Não existe necessidade de sutura do ligamento deltoide após fixação das fraturas, se o tornozelo ficar estável e a reconstrução for anatômica. Se ainda houver, no controle radiográfico, aumento do espaço claro medial, este deverá ser explorado para desbridamento de tecidos in203

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Figura 11

Figura 12

terpostos e retirada de fragmentos osteocondrais e/ou sutura do ligamento deltoide. A sindesmose deve ser fixada sempre que houver instabilidade. Sabe-se que raramente estará lesada nas fraturas do tipo A, às vezes nas fraturas do tipo B e quase sempre nas do tipo C. O diagnóstico deve ser realizado no intra-operatório, tracionando-se a fíbula com um gancho (teste de Cotton) (fig 12). Normalmente quando se restabelece a estabilidade medial, lateral e posterior, a aposição da fíbula na incisura se mantém adequada. A fixação da sindesmose é feita com parafusos, não havendo concordância em relação ao número de parafusos, um ou 2 e o tamanho destes, 3,5mm com três corticais ou 4,5mm com quatro corticais, ou se acima ou

ao nível da sindesmose. Um aspecto importante é que a fixação deve ser realizada da fíbula para tíbia com uma angulação anterior de 25° à 30°, e estes parafusos não devem ser de compressão e sim de estabilização articular. Estes parafusos podem ser retirados ou não, mas se forem nunca antes de 12 semanas. No pós operatório imediato o paciente deve ficar imobilizado e o membro elevado para ser evitados posição rígida em eqüino e edema do tornozelo. Carga parcial protegida por órtese deve ser iniciada após cicatrização de partes moles, assim como estímulo para mobilidade total articular. Carga total é liberada após consolidação da fratura, com aproximadamente oito semanas. 204

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Complicações Consolidação viciosa: encurtamento e/ou rotação externa da fíbula, levando a uma incongruência articular. Artrose pós traumática que podem chegar à 90% em fraturas mal reduzidas yy Distrofia simpático reflexa: raras yy Sinostose tibio-fibular: geralmente assintomáticas. yy Pseudoartrose do maléolo medial yy Infecção de partes moles yy Osteomielite

Figura 13

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Walling,AK; Sanders RW. Ankle Fractures. In: Coughlin,MJ; Mann, RA; Saltzman,CL. Surgery of the Foot and Ankle. Philadelphia: Mosby Elsevier, 2007. p. 1973-2016 2. Miller, AN; Carrol, EA; Parker, RJ; Boraiah, S; Helfet, DL; Lorich, DG. Direct visualization for stabilization of ankle fractures. Foot & Ankle Int. 2009; 30: 419-426 3. Tejwani, NC; Pahk, B; Egol, Kenneth. Effect os posterior malleolus fracture on outcome after unstable ankle fracture. The Journal of Trauma. 2010; 69: 666-669 4. Gardner, MJ; Demetrakopoulos, D; Briggs, SM; Helfet, DL; Lorich, DG. Malreduction of the tibiofibular syndesmosis in ankle fractures. Foot & Ankle Int. 2006; 27: 788-792 5. Sakaki, MH; Fraturas Maleolares. Orto&Trauma A revista do trauma ortopédico, São Paulo, v. 9, p. 12-22, janeiro 2011 205

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Fraturas do tálus Romero Montenegro Nery

INTRODUÇÃO O aumento no número de acidentes de trânsito vem mudando o perfil de determinadas fraturas que antes não eram tão observadas nas emergências. Um dos maiores exemplos dessa verdade diz respeito às fraturas do tálus que, apesar de ainda serem raras, vêm sofrendo um aumento na quantidade e complexidade com que são encontradas nos dias de hoje. Suas complexas anatomias, óssea e vascular, tornam algumas fraturas de prognóstico não muito satisfatório, mesmo quando o tratamento cirúrgico adequado for realizado. Além disso, as fraturas do tálus são às vezes subdiagnosticadas no primeiro atendimento, devido ao perfil dos pacientes politraumatizados e pela falta de experiência do médico em avaliar uma radiografia do pé. As fraturas do tálus ocupam o segundo tipo mais comum em relação aos ossos do tarso, perdendo apenas para o calcâneo. No total, corresponde a 3% das fraturas do pé. Não há um método de tratamento padrão para esse tipo de lesão. Cada caso deve ser estudado e abordado individualmente, levando em consideração a gravidade e a complexidade da fratura.

ANATOMIA Algumas características anatômicas são peculiares ao tálus, como o fato de ser o único osso do corpo a não apresentar inserções tendíneas ou musculares. É formado por três partes principais: cabeça, colo e corpo, e tem 60% da sua superfície coberta de cartilagem articular. Existem alguns acidentes ósseos importantes que podem ser alvo de fraturas, como o processo lateral, o tubérculo deltoide e o processo posterior do tálus, sendo este último formado pelos tubérculos lateral e medial, por onde passa o tendão do músculo flexor longo do hálux. Quando o tubérculo póstero-lateral apresenta um osso acessório ligado por estruturas cápsulo-ligamentares, é chamado de “os trigonum”, ocorrendo em uma frequência de 3% a 8% da população. Quando esse osso é fundido ao resto do tálus é chamado de processo de Stieda, o que acontece em 50% dos casos. Um dos pontos mais importantes da anatomia do tálus diz respeito a sua vascularização. De uma maneira geral, o tálus é irrigado por três fontes principais: artéria do seio do tarso, artéria do canal do tarso e artéria deltoidea. A primeira se origina da artéria dorsal do pé, artéria maleolar lateral e/ou artéria fibular perfurante. A segunda deriva 206

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da artéria tibial posterior. Já a artéria deltoidea é ramo da artéria do canal do tarso, originária da tibial posterior.

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vítimas desses tipos de acidentes. Dor intensa, edema importante e deformidade local podem estar presentes conjuntamente, mesmo nas fraturas com deslocamento mínimo. A depender da energia envolvida no trauma, pode haver uma exposição do foco de fratura e/ou da articulação envolvida. Também se deve investigar o aspecto neurovascular do pé, pois nas lesões graves do tálus, a síndrome compartimental pode se instalar rapidamente no membro afetado. Outro aspecto importante é procurar lesões associadas às fraturas do tálus, como fraturas do maléolo medial, fraturas do calcâneo e lesões osteocondrais.

FRATURAS DO COLO DO TÁLUS Cerca de 50% das fraturas do tálus ocorrem no seu colo. Associações com outras lesões estão presentes em até 70% dessas fraturas, sendo a mais comum a fratura do maléolo medial. Exposição óssea ocorre em até 20% dos casos, sendo a região mais comum a ântero-lateral do tornozelo. No início do século passado, esse tipo de lesão era conhecido como “astrágalo do aviador”, pois se acreditava que nos acidentes da aviação o pé estava apoiado no pedal do leme do avião, provocando uma hiperflexão dorsal na articulação do tornozelo no momento do acidente, o que ocasionaria um impacto do colo do tálus contra a borda anterior da tíbia. Porém, em laboratório, não foi possível reproduzir essa teoria. O mecanismo mais aceito hoje em dia é aquele em que o pé é levado a uma inversão forçada contra o maléolo medial. Claro que outros mecanismos de lesões existem, e o grau de desvio das fraturas e das luxações vão depender da energia do trauma.

Diagnóstico por Imagem As radiografias devem ser o primeiro exame solicitado. Elas vão servir para diagnosticar a fratura, outras lesões associadas e classificar de acordo com o desvio. As incidências inicialmente solicitadas são o ântero-posterior, perfil e Mortise (AP com rotação interna de 15º) do tornozelo, e ânteroposterior, perfil e oblíquo do pé. Em algumas situações, as fraturas do colo do tálus não são bem observadas nas radiografias convencionais. Canale e Kelly desenvolveram uma incidência em que o colo do tálus é mais bem visualizado em seu perfil, evitando a sobreposição do calcâneo na imagem. A radiografia é realizada com o tornozelo em flexão plantar, pronação do pé em 15º com o mesmo apoiado no filme e a ampola direcio-

Achados Clínicos Atualmente, as fraturas do tálus são provocadas principalmente por acidentes de trânsito ou quedas de altura. Adultos jovens do sexo masculino e ativos no trabalho são as principais 207

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xação do corpo tanto na articulação tíbio-társica como na talocalcânea. Canale e Kelly modificaram a classificação de Hawkins e associaram o Tipo IV, que teria além da luxação do corpo na tíbio-társica e subtalar, o desvio também da cabeça do tálus na articulação talo-navicular. Já Inokuchi acrescentou o Tipo V, em que o corpo está sem desvio, e só a cabeça do tálus está desviada na articulação talo-navicular (Figura 2).

nada 75º de distal para proximal (Figura 1). Figura 1. Incidência de Canale e Kelly

Figura 2. Classificação de Hawkins (Tipo I, II e III) As incidências de Broden e Anthonsen são utilizadas para melhor visualização da articulação talocalcânea, na sua face póstero-lateral e ânteromedial, respectivamente. A tomografia computadorizada já é realidade em vários centros hospitalares e tem um papel importantíssimo no estudo das fraturas do tálus. As imagens revelam os desvios dos fragmentos e das luxações, a extensão do traço de fratura para as articulações e a presença de microfragmentos.

Tipo IV de Canale. Variação de Inokuchi.

Tratamento Cada fratura deve ser abordada individualmente, com estudo detalhado do tipo de lesão, para que a técnica cirúrgica utilizada se torne mais fácil, desde o local da incisão ao tipo de fixação utilizado. Nas fraturas Tipo I de Hawkins o estudo tomográfico é importante para avaliar o grau de desvio da fratura. Pode-se utilizar uma imobilização gessada suropodálica durante oito a dez semanas, sem poder dar

Classificação As fraturas do colo do tálus são mais bem classificadas por Hawkins, e levam em consideração a articulação que sofreu a luxação. Tipo I: fratura do colo sem desvio dos fragmentos e das articulações. Tipo II: fratura do colo com luxação do corpo na articulação talocalcânea. Tipo III: fratura do colo com lu208

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carga por seis semanas. Após esse período se inicia a fisioterapia para reabilitação. Alguns cirurgiões optam pela fixação objetivando diminuir o risco de rigidez articular. Necrose avascular pode chegar a 13% nas fraturas Tipo I. O Tipo II apresenta desvio dos fragmentos e da articulação subtalar, logo, o objetivo principal é a redução anatômica com fixação interna rígida, o mais precoce possível. Esse pensamento reduz o risco de necrose avascular do tálus. Pode-se tentar essa redução de maneira incruenta, com fixação percutânea utilizando parafusos canulados ou até fios de Kirschner. Porém, é mais confiável uma redução aberta e avaliar diretamente a fratura. A necrose avascular pode variar de 20% a 50% dos casos. As fraturas Tipo III são tratadas cirurgicamente, salvo raríssimas exceções, onde a redução fechada é conseguida. Às vezes a osteotomia do maléolo medial é necessário para facilitar a redução e a fixação da fratura. Nesses casos, a exposição óssea é mais comum, devendo-se ficar atento para as lesões de pele e o maior risco de infecção. Necrose avascular ocorre em 70% a 100% dos casos, o que torna o prognóstico pior. Fraturas Tipo IV e V levam o mesmo pensamento das fraturas Tipo III, e com o mesmo objetivo de redução anatômica, precoce e estável. Vale reforçar que o tipo de via, o material utilizado, o uso da osteotomia de maléolo e o tempo de carga e

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imobilização têm que ser estudados individualmente. Complicações As complicações das fraturas do tálus estão intimamente relacionadas ao grau de desvio dos fragmentos e articulações, energia do trauma envolvido e lesões associadas. À consolidação viciosa é uma complicação comum quando a dupla via não é utilizada, pois o cirurgião só visualiza um lado da redução, podendo o outro lado estar impactado ou rodado. É mais comum a consolidação viciosa em varo, quando ocorre impactação medial do colo, e o parafuso de compressão medial encurta a cortical medial. Para se evitar essa complicação, é imprescindível a redução anatômica e o restabelecimento do alinhamento das corticais medial e lateral do colo do tálus. Retardo de consolidação ocorre em até 10% dos casos, e acontece quando a consolidação não acontece antes dos 6 meses. Já a pseudoartrose ocorre em apenas 4% dos casos e é diagnosticada quando não há consolidação antes de 12 meses. A necrose avascular é a mais importante das complicações da fratura do tálus, e vai depender do grau de desvio local. A classificação de Hawkins tem um valor prognóstico, por isso sua importância. O diagnóstico radiográfico da osteonecrose é conseguido entre a sexta e oitava semanas após o trauma, utilizando o “sinal de Hawkins”, que é indicativo de bom 209

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FRATURAS DO CORPO DO TÁLUS As fraturas que acometem o corpo do tálus lesam principalmente a superfície articular do domus e da subtalar posterior. Representam cerca de 20% das lesões talares, sendo associadas ao alto índice de complicações. Pode acontecer nos planos coronal, sagital e axial, ou levar microfragmentos para dentro da articulação, por isso a importância do estudo tomográfico. O objetivo do tratamento é o mesmo das fraturas do colo do tálus, com redução anatômica precoce e fixação estável. A utilização da osteotomia do maléolo medial é mais comumente utilizada, pois facilita o acesso e a visualização do corpo talar. Em relação às complicações, observou-se que a incidência de necrose avascular e artrose pós-traumática são mais elevadas comparadas com as fraturas do colo tálus, o que torna o prognóstico mais complicado.

prognóstico. Porém, o melhor recurso para o diagnóstico dessa complicação é, sem dúvida, a ressonância magnética, que define a presença e a extensão da necrose. Outras complicações como necrose de pele, infecção, artrose póstraumática e distrofia simpático-reflexa também podem acontecer. FRATURAS DA CABEÇA DO TÁLUS A cabeça do tálus é uma região incomum para ocorrência de fraturas, representando apenas 5% a 10% das fraturas desse osso. Normalmente ocorre na superfície articular, o que pode ocasionar uma artrose pós-traumática. O mecanismo de lesão principal ocorre com o pé em flexão plantar máxima e a força é transmitida longitudinalmente no eixo do pé, dos metatarsos, cunhas e navicular, comprimindo a cabeça do tálus. Radiografia ântero-posterior, perfil e oblíqua do pé normalmente revelam a fratura, porém uma tomografia computadorizada é de grande validade nesse tipo de fratura para avaliar a extensão do traço ou na dúvida daignóstica. O tratamento conservador é utilizado naqueles casos em que não há desvio da fratura. Utiliza-se imobilização gessada por 6 semanas, com posterior carga de acordo com a tolerância à dor. Nos casos em que o desvio está presente, o tratamento cirúrgico é preconizado para restabelecer a superfície articular.

FRATURAS DOS PROCESSOS LATERAL E POSTERIOR DO TÁLUS As fraturas do processo lateral do tálus são conhecidas como “fraturas do snowboarder” pela sua elevada incidência na prática desse esporte. Essas lesões raramente são diagnosticadas, pois o mecanismo de trauma é o mesmo das entorses do tornozelo, a inversão e flexão plantar. As radiografias simples dificilmente mostram a lesão, então, nos pacientes que apresentam uma dor persistente na região 210

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podem acometer os dois tubérculos (póstero-lateral e póstero-medial) ou apenas um deles. São ocasionadas ou por uma flexão plantar exagerada ou por uma avulsão ligamentar local. Normalmente, o tratamento é conservador com imobilização até a consolidação e melhora da dor. Quando há uma dor persistente e a falta de consolidação, preconiza-se a ressecção dos fragmentos. Deve-se ficar atento para não confundir uma fratura do processo posterior com o “os trigonum”.

inferior do maléolo lateral após um trauma torcional e radiografias normais, deve-se lançar mão da TAC para o diagnóstico. O tratamento vai depender do tamanho do fragmento e do seu desvio. Fraturas sem desvio devem ser tratadas com imobilização. Já as fraturas desviadas com fragmentos grandes devem ser reduzidas cirurgicamente e fixadas. Quando a fratura é cominutiva ou há um quadro de dor persistente, os fragmentos devem ser excisados. As fraturas do processo posterior

SUGESTÕES DE LEITURA 1. 2. 3. 4. 5.

Canale ST, Kelly FB. Fractures of the neck of the talus. J Bone Joint Surg 1978; 60A: 143-156. Hawkins LG. Fractures of the neck of the talus. J Bone Joint Surg 1970:52A: 991-1002. Juliano PJ, Dabbah M, Harris TG. Talar neck fractures. Foot Ankle Clin N Am 2004; 9: 723-736 Mulfinger GL, Trueta J. The blood supply of the talus. J Bone Joint Surg 1970; 52B: 160-169. Penny JN, Davis LA. Fractures and fracture dislocations of the neck of the talus. J Trauma 1980; 20: 1020-1037. 211

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Fraturas do calcâneo Egon Erich Henning

Epidemiologia As fraturas do calcâneo constituem em torno de 2% de todas as fraturas e são as mais frequentes do tarso. A maior parte delas (70%) são fraturas articulares deslocadas, envolvendo a articulação subtalar, com mais frequência, e a articulação calcâneo-cuboídea. Como as fraturas são devidas a queda de altura ou impacto violento contra o pé em colisão veicular ou explosões sob o piso, coexistem lesões e fraturas da coluna vertebral em 10% dos casos, e 26% apresentam outras fraturas. A população mais atingida são adultos ativos, na faixa etária dos 20 aos 40 anos. A recuperação, independente do tipo de tratamento, é lenta, podendo demorar mais de 3 anos, com consequente incapacidade laboral prolongada..

zindo fraturas articulares. Como a superfície articular inferior do talo tem a forma de cunha larga (ou V aberto) produz-se inicialmente uma fratura oblíqua ao plano sagital que separa o sustentaculum tali do restante do calcâneo (fratura primária). Quando a energia não se dissipa neste instante, a cunha talar comprime e afunda a faceta articular póstero-lateral para dentro do osso esponjoso do corpo e da tuberosidade do calcâneo. A pressão resultante provoca uma “explosão” separando a parede lateral e alargando o osso e diminuindo sua altura.. A porção tuberoarticular, liberada da sua continuidade com o sustentaculum, gira em varo e eqüino pela ação do tendão calcaneano. Figura 1. Mecanismo das fraturas articulares

Mecanismo da lesão Forças de torção, ou tração pela contração súbita do tendão calcaneano, estando o pé em dorsiflexão forçada, produzem fraturas extrarticulares na tuberosidade. Quando a força atua longitudinalmente, o impacto é transmitido ao calcâneo através do talo nas quedas em pé, ou pela compressão do calcâneo contra o talo, se a força incide diretamente no calcâneo (colisão, explosão), produ212

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Quanto maior a energia do impacto, maior a fragmentação. O fragmento sustentacular medial, entretanto, continua preso pelos ligamentos capsulares e interósseo em sua relação normal com a superfície articular inferior do talo, e serve de referência para o reposicionamento e fixação dos demais fragmentos na ocasião do tratamento (Figura 1).

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com aspectos radiográficos (Figura 2): A – simples cisalhamento, fratura primária; B – compressão vertical da faceta posterior; C – impacto com pé dorsifletido: depressão e rotação da faceta articular póstero-lateral; D – impacto com pé em flexão plantar: fratura em língua; E – cisalhamento e compressão, produzindo fraturas secundárias com mais fragmentos; F – fratura cominutiva grave

Classificações Como a variedade e complexidade das fraturas é grande, foram criadas muitas classificações com o propósito de orientar o tipo de tratamento nas diferentes modalidades. As mais usadas são as de Essex-Lopresti (1952), Soeur e Rémy (1975), Zwipp (1989), e Sanders (1992). Segundo Essex-Lopresti, com base em imagens radiográficas, as fraturas podem ser: a)sem comprometimento da articulação subtalar, como as fraturas de parte da tuberosidade, por impacto localizado, ou arrancamento tendíneo, ou ligamentar, e as fraturas do processo anterior do calcâneo (“nariz de papagaio”), por torção; b)com comprometimento da articulação subtalar, que se distinguem em fraturas em língua (com um fragmento tuberoarticular longo, geralmente rodado com abertura posterior), e fraturas com afundamento da porção talâmica pósterolateral, causando perda de altura e comprimento e alargamento do calcâneo. Soeur e Rémy , também sistematizaram as fraturas articulares de acordo

Figura 2. Classificação de Soeur e Rémy

A classificação de Zwipp foi a primeira a utilizar-se de imagens de tomografia computadorizada (TC) juntamente com o número de fragmentos, número de articulações e dano às partes moles. Entretanto, a classificação proposta por Sanders, que se baseia nas imagens de TC em cortes coronais e transversos do calcâneo, é atualmente a mais usada para orientar o tratamento das fraturas articulares. Considera as possibilidades de fragmentação da articulação subtalar em dois ou mais fragmentos por até três traços de fratura: o traço A divide o terço lateral da superfície articular, o traço B passa pelo centro da mesma, e o traço C se situa junto 213

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• Sufusão ou hematoma na planta do pé, eventualmente flictenas • Dificuldade ou incapacidade de movimentação subtalar • Verificação sistêmica visando existência de lesões associadas, principalmente outras fraturas, lesão vascular ou neural.

ao sustentáculo. As fraturas sem deslocamento são tipo I, as que têm um fragmento articular deslocado são tipo II, subdividido em IIA, IIB ou IIC conforme a localização do traço de fratura; quando são dois os traços de fratura, trata-se do tipo III, com as variantes IIIAB, IIIAC, IIIBC; as fraturas cominutivas são tipo IV (figura 3) Figura 3. Classificação de Sanders

Diagnóstico clínico: • História de queda de altura ou acidente veicular • Dor referida ao retropé e outras regiões, em especial coluna vertebral, pelve, etc • Incapacidade de apoio do pé (salvo em alcoolizado). • Alargamento e aumento de volume do retropé • Diminuição do arco plantar

Diagnóstico radiológico: • Obtenção de radiografias de frente do tornozelo, perfil do pé, axial de calcâneo e as incidências de Brodén (decúbito supino, tornozelo em flexão neutra e perna e pé rodados medialmente a 45°, raio central dirigido para o seio do tarso e inclinado sucessivamente em 10, 20, 30 e 40º no sentido caudo-craneal dentro do plano vertical. Este conjunto de incidências permite uma boa visualização do talo e calcâneo e da articulação subtalar. • Sempre que estiver disponível deve ser feita tomografia computadorizada com cortes nos planos coronal e transverso, que permitam uma correta avaliação do número de fragmentos e seus deslocamentos, bem como o enquadramento na classificação de Sanders. Tratamento Conservador Indicado em fraturas extra-articu-

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lares sem deslocamento, ou redutíveis incruentamente através de manipulação ou com auxílio de pinos de Kirschner ou Steinmann percutâneos. Aí se incluem fissuras ou fraturas minimamente deslocadas da tuberosidade, do tubérculo medial ou lateral, do processo anterior e as fraturas articulares com depressão menor que 2mm e também as fraturas de estresse. Usa-se uma contenção elástica bem acolchoada (tipo Jones) e elevação da perna por tempo suficiente para reduzir o edema e, depois, alguma imobilização removível para prática de exercícios de tornozelo, até que haja tolerância para apoio com descarga parcial, usando bengalas. O mesmo tratamento vale para as fraturas de estresse. Nas fraturas em língua, em que a faceta articular póstero-lateral é contínua com o fragmento tuberositário, pode-se obter uma boa redução com um pino de Steinmann, introduzido axialmente de posterior para anterior no fragmento, usando-o como alavanca, sob controle de intensificador de imagens. Para isto, deve-se manipular o pino com o tríceps sural relaxado (joelho em flexão), fazendo o fragmento tuberoarticular girar no sentido plantar para baixá-lo posteriormente e corrigindo o varo. Constatada a boa aposição das superfícies articulares, faz-se o pino progredir para dentro do corpo do calcâneo ou mesmo até o cubóide. .A seguir corta-se a parte excedente do pino a vários milímetros da pele e coloca-

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se bota gessada acolchoada e fendida longitudinalmente, devendo o paciente ficar em observação com a perna elevada por alguns dias e sem apoio de marcha durante 6 a 8 semanas. O pino pode ser retirado geralmente após 4 semanas, quando pode-se passar ao uso de imobilização removível (tipo “robobota”), iniciando exercícios controlados. Tratamento Cirúrgico A melhor oportunidade para realização de tratamento cirúrgico, principalmente de fraturas abertas, é nas primeiras seis horas. Depois disso, o hematoma e o edema distendem e infiltram as partes moles e a pele fica distendida, aumentando o risco de deiscências e necroses com conseqüente infecção. Então, deve-se postergar o ato cirúrgico até que ocorra a regressão do edema, mantendo o membro inferior elevado. É necessário, porém, vigilância quanto a síndrome compartimental. Fraturas extrarticulares com deslocamento importante, como acontece no caso das fraturas em bico aberto da tuberosidade, ou as fraturas do processo anterior, são abordáveis por pequenas incisões, respectivamente posterior ou lateral, para redução e fixação do fragmento com parafuso e/ou cerclagem com fio de aço (figura 4) As fraturas articulares dos tipos II e III de Sanders são abordadas por incisão lateral, que pode ser a clássica incisão curvilínea por 215

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mantém o retalho afastado para cima e se obtém boa visão da face lateral do calcâneo e da articulação subtalar. O fragmento da parede lateral é afastado para baixo e, então, com ajuda de um descolador se reduz primeiramente a fratura primária, posicionando o fragmento tuberoarticular em relação correta com o fragmento sustentacular; fixação provisória com fio de Kirschner; reduzem-se os fragmentos articulares levantando-os de encontro ao sustentáculo e à superfície inferior do talo; acosta-se e comprimese o fragmento cortical da parede lateral; convém controlar a redução com intensificador; uma placa em Y ou de vários ramos, conforme necessário, é então modelada e aplicada com tantos parafusos quantos

Figura 4. Fratura em bico

baixo do maléolo fibular e sobre o seio do tarso prolongando-se até o cubóide, ou por uma incisão em ângulo reto, formato em L, cujo lado vertical se situa ao meio do espaço entre a borda posterior da fíbula e o tendão calcaneano, e o lado horizontal é paralelo à planta do pé a meia distância entre a ponta do maléolo fibular e a superfície plantar (figura 5). No caso da incisão clássica, os tendões fibulares e o nervo sural são afastados para baixo e a visualização da face lateral do calcâneo é mais restrita dificultando a redução dos fragmentos articulares e a colocação de placa e parafusos. Por essa razão a incisão em L está sendo preferida, Nela a incisão vai até o periósteo, sem dissecção de planos, e o retalho de partes moles é levantado por inteiro, incluindo os tendões fibulares, nervo sural e o ligamento fibulocalcaneano. Um ou dois pinos, introduzidos no talo,

Figura 5. Tratamento de fratura articular

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necessários para uma boa fixação de todos fragmentos. Um trabalho experimental recente constatou que as placas usuais com ramos dão maior resistência ao redeslocamento do que as novas placas com parafusos bloqueados, por serem aquelas comprimidas contra a parede lateral dando maior resistência ao bloco ósseo. Nas fraturas cominutivas tipo IV de Sanders é praticamente impossivel restaurar a superfície articular e uma cirurgia imediata é quase sempre contraindicada devido ao grande comprometimento das partes moles. O tratamento inicial é de elevação do membro, contenção elástica, gelo e suporte clínico, até que melhorem as condições locais e gerais (15 dias no máximo), quando então o tratamento recomendável é cirúrgico, com restabelecimento da largura, altura e comprimento do calcâneo e artrodese subtalar primária (ou até tríplice artrodese do tarso) Havendo contraindicação cirúrgica por problemas locais (necroses, infecção) ou de ordem clínica (idade avançada, diabete, etc.) deve-se ao menos tentar melhorar o formato anatômico do calcâneo por manipulação e/ou através de fixador externo.O tratamento pós-operatório requer elevação do membro por mais de uma semana e contenção ou imobilização por período variável dependendo da estabilização conseguida, geralmente por 4 a 6 semanas. Com síntese sólida

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devem iniciar-se exercicios de mobilização ativa o mais cedo possível;. Complicações A dor no apoio costuma perdurar por muito tempo, frequentemente até 2 ou 3 anos, mesmo com boa reconstituição da superfície articular, devido ao dano e degeneração da cartilagem. Infecções surgem com alguma frequência quando ocorrem deiscências ou necroses e após fraturas expostas, Consolidações viciosas, com deformidade importante, necessitam por vêzes cirurgia reparadora, com osteotomia para correção de varo ou valgo e rebaixamento da tuberosidade e artrodese subtalar com interposição de blocos de osso corticoesponjoso, bem como ressecção de abaulamento da parede lateral, causadora de compressão dos tendões fibulares sob o maléolo fibular. Não são raras as lesões do nervo sural, que requer cuidado nas abordagens laterais. Quando o talo permanece horizontalizado, o impacto contra a borda anterior da tibia, além de limitar a dorsiflexão do pé, causa artrose tibiotalar e dor e pode também provocar degeneração na articulação talonavicular. Neste caso é importante realizar atrodese subtalar com distração posterior entre calcaneo e talo e inserção de cunhas ósseas de base posterior afim de restaurar a inclinação normal do talo e aliviar a articulação tibiotalar.Nos casos de artrose peritalar é indicada a tripla artrodese.

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Banerjee R. et al.: Management of Calcaneal Malunion. JAAOS 19-1: 27-36, 20011 2. Fernandes T.D., Santos A.L.G.: “Fraturas dos ossos do pé no adulto”. In: Ortopedia e Traumatologia – Principios e Prática. Porto Alegre, Artmed, p. 1528-1533, 2009. 3. Paula S. S, et al.:Tratamento cirúrgico das fraturas articulares do calcâneo: comparação dos resultados clínico-funcionais entre a técnica aberta clássica e a percutânea. Rev. ABTPé 3-2: 68-74, 2009. 4. Sanders R.: “Fractures and Fracture-Dislocations of the Calcaneus”. In:Suurgery of the Foot and Ankle. St. Louis, Mosby, vol.2 p:1422-1464, 1999. 5. Viana S., Viana V.:”Fraturas do Calcâneo”. In:Cirurgia do Pé e Tornozelo.Rio de Janeiro, Revinter, p. 127-137, 2005.

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Fratura-luxação de Lisfranc Ana Paula Simões da Silva

INTRODUÇÃO A fratura-luxação da articulação tarsometatarsiana (Lisfranc) representa 0,2% de todas as fraturas; é uma lesão rara, provocada por trauma de alta energia e frequentemente não é diagnosticada, principalmente em pacientes politraumatizados, nos quais é dada maior atenção ao quadro geral do que a lesão do pé. 1,2 Muitos autores relatam como seqüela, alterações artrósicas incapacitantes nesses pacientes, mas o diagnóstico mais apurado e os novos métodos de fixação tem melhorado o prognóstico dessas fraturas.1

A estabilidade dessa região é baseada na arquitetura óssea e no suporte ligamentar. Trazendo grande estabilidade ao sistema, estão os cuneiformes e as bases metatarsais, que tem a forma trapezoidal e a face mais larga no dorso. ( figura 1B).

ANATOMIA As bases dos cinco ossos metatarsais, os três ossos cuneiformes e o cubóide compõem as articulações tarsometatarsais (Lisfranc) figura 1A:

Os ligamentos interósseos plantares e o ligamento de Lisfranc (base do segundo osso metatarsal – cunha medial) auxiliam na estabilidade no plano transverso. As inserções do tendão fibular longo e do tendão tibial posterior fornecem o suporte dinâmico da região.3

1B. Suporte ligamentar

Figura 1A. Arquitetura óssea

MECANISMO DE LESÃO O mecanismo de trauma pode ser direto ou indireto: • O trauma direto no pé e os acidentes automobilístico são frequentemente associados à fraturas cominutivas, lesão de partes moles e síndrome com219

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partimental; complicação a qual também pode não ser diagnosticada no quadro agudo.4 • O trauma indireto é onde ocorre a maioria das fraturasluxações de Lisfranc. É causada quando a força é aplicada no eixo longitudinal, com o pé apoiado em eqüino leve e o corpo projetado pra frente em rotação e abdução, formando um padrão de lesão (Figura 2):

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As relações radiográficas normais das articulações tarsometatarsiana são: • Na visão ântero-posterior : a cortical medial do segundo metatarso está alinhada com a cortical medial do cuneiforme intermédio ( Figura 3A) • Na visão oblíqua: a cortical lateral do terceiro metatarso está alinhada com a cortical lateral do cuneiforme lateral e a cortical medial do quarto metatarso está alinhada com a cortical medial do cubóide.

Figura 2. Trauma axial característico da lesão de Lisfranc

Figura 3A. radiografia AP comparativa

DIAGNÓSTICO DA FRATURALUXAÇÃO DE LISFRANC O diagnóstico requer atenção do examinador em alto grau. O paciente politraumatizado deve ser avaliado com radiografias nas incidências ântero-posterior, lateral e oblíqua interna, simulando apoio plantar (se possível), para permitir avaliar pequenos deslocamentos entre os ossos. As radiografias do lado contralateral são úteis para comparação.

• Na vista lateral, a cortical dorsal dos metatarsos está alinhada com a cortical dorsal dos respectivos cuneiformes. A redução é considerada anatômica se estas relações estiverem preservadas. Desalinhamentos maiores do que 2 mm são 220

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caracterizadas como redução não-anatômica2 ( Figura 3B).

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teral e o tipo divergente. TRATAMENTO O tratamento das lesões da articulação Lisfranc é baseado na manutenção de uma redução anatômica estável. Tratamento conservador: está reservado as lesões ligamentares isoladas do mediopé, geralmente só identificadas após ressonância magnética. O paciente é imobilizado por 6 a 8 semanas com carga sendo liberada progressivamente. Nas lesões com desvio maior do que 2mm estão indicadas a redução anatômica e fixação estável. 1 Tratamento cirúrgico: é método de escolha, cujo objetivo é uma redução anatômica e fixação estável 1,2,4-6.O fator mais importante na melhor oportunidade para indicar a cirurgia é a condição das partes moles. Quando a cobertura cutânea é inadequada, a fratura pode ser mantida com fios percutâneos ou fixador externo. A redução anatômica incruenta e a fixação percutânea são possíveis, mas tecnicamente difíceis nas fraturas- luxações. As lesões do ligamento de Lisfranc com pequenos deslocamentos podem ser reduzidas com uma pinça forte com controle de intensificador de imagem e fixadas com parafusos canulados .

Figura 3B. perfil mostrando a lesão evidenciada no pé E

A tomografia computadorizada identifica aumento do espaço entre o primeiro e o segundo metatarsais nas lesões do ligamento de Lisfranc. E a ressonância magnética pode auxiliar na identificação de lesões isoladas de ligamentos entre os ossos cuneiformes (lesão de Turco) onde não é observado lesão óssea. 3 Figura 4. classificação de Quenú e Kuss

Classificação Muitos métodos para classificação foram derivados da classificação de Quenú e Kuss, de 1909 (figura 4) ( hard castle et al 1982 e Myerson et al 1009). A lesão pode ser de incongruência total (homolateral), parcial (isolada), sendo o desvio: medial, la-

VIA DE ACESSO A via indicada é a dorsal com inci221

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sões longitudinais, sendo uma medial para abordar o primeiro metatarso, evitando-se a primeira artéria dorsal e uma dorsal entre o segundo e o terceiro raios.

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A partir do quarto mês a retirada do material síntese pode ser feita, mas nos casos de dúvida sobre a estabilidade da lesão, a fixação é mantida. Órteses/ palmilhas para suporte do arco longitudinal e calçados de solado rígido são mantidos por 4 a 6 meses.

FIXAÇÃO Existe muita controvérsia quanto ao melhor método de fixação desta lesão e não existe nenhum estudo comparando os vários métodos de fixação: fios de Kirschner, parafusos AO, placa + parafusos, fixador externo, etc. 5 Muitos autores estabilizam a coluna lateral com fios de Kirschner para facilitar a retirada e a movimentação precoce dessa região. Esses fios são retirados na sexta semana para permitir a carga. A fixação preferencial é com parafusos canulados nas colunas medial e central.

COMPLICAÇÕES O tratamento conservador está relacionado a maior incidência de maus resultados1 A cirurgia realizada após seis semanas está associada a um pior resultado clínico, sendo o sucesso da reconstrução tardia dependente da gravidade e da extensão de incongruência articular. Quando não tratada adequadamente, a fratura luxação de Lisfranc é uma lesão que evolui com perda do alinhamento do pé e artrose grave. Mesmo com a redução anatômica e fixação estável frequentemente evolui com maus resultados e exige a artrodese, que é um procedimento de salvação3

PÓS-OPERATÓRIO Assim que o edema regride e a dor melhora, nos casos com fixação estável, o paciente deambula com órtese removível por 4 a 6 semanas. SUGESTÕES DE LEITURA

1. Ly TV, Coetzee JC. Treatment of primarily ligamentous Lisfranc joint injuries: primary arthrodesis compared with open reduction and internal fixation. A prospective, randomized study. J Bone Joint Surg Am 2006;88:514-20. 2. Kuo RS, Tejwani NC, Digiovanni CW, Holt SK, Benirschke SK, Hansen ST Jr, et al. Outcome after open reduction and internal fixation of Lisfranc joint injuries. J Bone. Joint Surg Am 2000;82A:1609-18. 3. Richter M, Wippermann B, Krettek C, Schratt HE, Hufner T, Therman H. Fractures and fracture dislocations of the midfoot: occurrence, causes and long-term results. Foot Ankle Int 2001;22:392-8. 4. Teng AL, Pinzur MS, Lomasney L, Mahoney L, Havey R. Functional outcome following anatomic restoration of tarsalmetatarsal fracture dislocation. Foot Ankle. Int 2002;23:922-6. 5. Pereira CJ, Canto RST, Tramontini JL, Canto FRT. Fratura-Luxação Tarsometatarsiana (Lisfranc) Projeto Diretrizes, Associação Médica Brasileira e Conselho Federal de Medicina.2007 222

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Lesões traumáticas da coluna cervical Marco Túlio Costa

EPIDEMIOLOGIA O trauma da coluna cervical é responsável por metade das 50.000 lesões medulares que ocorrem nos Estados Unidos a cada ano e 40% das lesões cervicais estão associadas a algum tipo de déficit neurológico. Existe uma distribuição bimodal quanto à idade com o primeiro pico entre 15 e 24 anos e o segundo pico após os 55 anos.

Ressonância magnética A TC e principalmente as radiografias apresentam uma limitação quanto à avaliação de partes moles da coluna cervical. Apesar de se constituir num exame caro, de alta tecnologia e de longo tempo de aquisição de imagem, a ressonância permite a avaliação detalhada de lesões ligamentares, disco intervertebral e edema medular.

DIAGNÓSTICO Radiografia Qualquer paciente vítima de trauma de alta energia deve ser submetido ao estudo da coluna cervical com três incidências radiográficas (AP, perfil e trans-oral). Achados do exame físico e neurológico orientam a solicitação de exames complementares adicionais (Tomografia e/ ou Ressonância). Tomografia computadorizada (TC) Na presença de radiografias aparentemente normais, 5 a 8% dos pacientes apresentam fraturas cervicais. A TC tem indicação formal em pacientes intoxicados com suspeita de lesão cervical, pacientes alertas, porém com achados clínicos positivos para lesão cervical, na impossibilidade de realização de radiografias adequadas e naqueles com achados suspeitos nas radiografias.

TRATAMENTO • Fratura do côndilo occipital Normalmente secundário a compressão axial, pode ocorrer de forma isolada ou em associação com luxação atlanto-occipital. Lesões neurológicas não são comuns, porém quando ocorrem comprometem particularmente os pares cranianos IX, X, XI e XII. TC geralmente é indicada na suspeita desta lesão. Classificação de Anderson e Montesano: Tipo I - Impactada (cominutiva) Tpo II - Fratura da base do crânio Tipo III - Avulsão do ligamento alar As fraturas tipo 1 e 2 são estáveis e necessitam de colar cervical tipo Filadélfia por 2 a 3 meses. As fraturas tipo 3 necessitam de pelo menos o halo e nos casos de instabilidade, cirurgia (artrodese). 223

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• Luxação atlanto-occipital Lesão associada à alta mortalidade, é duas vezes mais frequente na criança que no adulto. Comprometimento neurológico está presente na maioria dos casos e o aumento do índice de Powers (BC/OA) acima de 1.0 é indicativo de luxação anterior e abaixo de 0.8 sugere deslocamento posterior.

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Tipo I - Fratura do arco posterior (mais comum) Tipo II - Fratura da massa lateral Tipo III - Fratura explosão (Jefferson) A estabilidade desta fratura é determinada pela integridade do ligamento transverso. O deslocamento das massas laterais do atlas acima de 6.9 mm, assim como o aumento do intervalo atlanto-odontoide (IAO) acima de 4 mm é indicativo de ruptura deste ligamento. As fraturas do atlas, portanto, sem ruptura do ligamento transverso (estáveis) devem ser tratadas com imobilização com halo por 8 a 12 semanas, enquanto que aquelas com lesão do ligamento devem ser tratadas com artrodese C1-C2.

Figura 1.

• Subluxação atlanto-axial O mecanismo usual destas lesões é uma combinação de flexão, extensão e rotação. Limitação de movimento e dor suboccipital são comuns assim como a postura em rotação cervical em uma direção com inclinação da cabeça para a direção oposta. Nas radiografias podem ser observados o desvio do processo espinhoso e a assimetria das massas laterais. Tanto a tomografia quanto a ressonância são úteis na confirmação diagnóstica.

A luxação ainda pode ser longitudinal, porém o tipo anterior é o mais comum (50%). A TC é essencial para confirmação diagnóstica. Em função do elevado grau de ruptura ligamentar, o tratamento definitivo com fusão occipito-cervical é obrigatório. • Fratura do atlas Representam 10% das fraturas cervicais e em mais de 50% dos casos estão associados a outras lesões cervicais. Compressão axial é o mecanismo proposto. Lesões neurológicas são raras e as queixas são inespecíficas, como dor suboccipital, cefaléia e limitação de movimentos.

Classificação de Fielding e Hawkins Tipo I – IAO < 3 mm (transverso intacto)

Classificação de Levine e Edwards: 224

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Tipo II – IAO 3 a 5 mm (transverso insuficiente) Tipo III – IAO > 5 mm (ruptura completa) Tipo IV – Luxação posterior (artrite reumatoide) Tração cervical tipo mentoneira, seguida de colar Filadélfia estão indicados nas lesões tipo I. A falha nesta abordagem inicial é indicação de tração esquelética por duas semanas seguida de halo-vest ou artrodese C1-C2 nos casos não responsivos. As lesões tipo II e III são consideradas instáveis e, portanto, exigem fusão atlanto-axial.

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o tratamento cirúrgico (artrodese C1C2 ou fixação isolada do dente) em função do risco de pseudartrose. • Espondilolistese traumática do axis A maioria está associada a acidentes automobilísticos e apresentam uma mortalidade de 25 a 40%. Classificação de Levine e Edwards Tipo I - Lesão da pars articulars com deslocamento < 3 mm Tipo II - Deslocamento > 3 mm com angulação IIa – Angulação acentuada com pequeno deslocamento Tipo III – Fratura- luxação (uni ou bilateral) C2-C3 A fraturas tipo I são estáveis e podem ser tratadas com colar cervical por 3 meses. As fraturas tipo III são de indicação cirúrgica com instrumentação posterior C2-C3. As lesões tipo II e IIa tem indicação de tração seguida de imobilização tipo halo-vest e redução com compressão-extensão seguido de halo-vest.

• Fratura do odontoide Representam 5 a 15% das fraturas cervicais com lesão neurológica em 25% dos casos. Déficits neurológicos são incomuns e os sintomas são inespecíficos. Classificação de Anderson e D´Alonzo: Tipo I - Avulsão do ápice do odontoide (avulsão do ligamento alar) Tipo II - Fratura da base do odontoide/ IIa Cominuição associada Tipo III - Fratura com extensão para o corpo de C2 O tratamento da fratura tipo I envolve o uso de colar cervical por 12 semanas. Fraturas tipo II com desvios menores que 5 mm e angulações inferiores a 10° podem ser tratadas com colar ou halo-vest porém, pacientes idosos com cominuição associada apresentam melhores resultados com

• Fratura da coluna cervical baixa Biomecanicamente diferente do segmento cervical alto, a coluna subaxial é responsável por 50% da flexão, extensão e rotação. As causas mais comuns de lesão são os acidentes automobilísticos, seguidos pelos acidentes desportivos, mergulho em água rasa e ferimentos por arma de fogo 225

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corpo, enquanto que a via posterior tem indicação nas luxações irredutíveis (pós-tração), luxações crônicas e nas lesões primárias ligamentares.

Classificação de Allen e Ferguson (mecanismo de lesão) Tipo I – Flexo-compressão Tipo II – Compressão vertical Tipo III – Flexo-distração Tipo IV – Compressão-distração Tipo V – Distração- extensão Tipo VI – Flexão lateral

COMPLICAÇÕES Podem ser inerentes ao trauma inicial, como déficit neurológico (completo e incompleto), lesão dos pares cranianos, instabilidade e dor, assim como secundários ao tratamento proposto. A aplicação do halo, por exemplo, apresenta como complicações infecção e soltura dos pinos, úlceras de pressão e lesão dural. Tanto a via posterior quanto a via anterior também estão associadas à complicações, sendo esta última relacionada a disfagia, disfonia (lesão do nervo laríngeo recorrente) e fístula traqueo-esofágica.

Classificação de Nazarian (compreensiva) Tipo A – Compressão Tipo B – Distração Tipo C - Rotação Instabilidade e piora do quadro neurológico direcionam para o tratamento cirúrgico. A via anterior prevalece na necessidade de descompressão do canal por hérnia discal traumática ou fraturas explosão do

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Gregg R. Klein, Alexander R. Vaccaro. Cervical Spine Trauma: Upper and Lower In: Vaccaro (ed.) Pinciples and Practice of Spine Surgery. Mosby 2003: 441-467. 2. Vaccaro A R. Fractures Of The Cervical, Thoracic And Lumbar Spine. Marcel Dekker 2003 3. Barros Filho TEP. Clínica Ortopédica. Traumatismos da Coluna Vertebral. MEDSI 2000 226

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Lesões traumáticas da coluna tóraco-lombar Rogério Lúcio Chaves de Resende Jefferson Soares Leal

INTRODUÇÃO E EPIDEMIOLOGIA As fraturas da coluna tóraco-lombar apresentam grande importância tanto devido à sua frequência quanto às repercussões funcionais e morbidade das mesmas. Algum tipo de déficit neurológico está presente em até 20% destes pacientes [1]. São as fraturas mais comuns do esqueleto axial e correspondem a aproximadamente 90% das fraturas da coluna [1]. Aproximadamente 2/3 ocorre na transição tóraco-lombar, entre T11 e L2 [2] e isso se dá pela mudança brusca do segmento torácico rígido, mais estável e cifótico para a coluna lombar, um segmento mais flexível, menos estável e lordótico [3]. Apresentam distribuição bimodal. O primeiro pico ocorre entre 20 e 40 anos de idade, sendo mais comum em homens (2/3) e resultante geralmente de traumas de alta energia (quedas de alturas, acidentes de trânsito, etc.). Já o segundo pico ocorre na população geriátrica e frequentemente resultante de traumas de muito baixa energia (quedas da própria altura, etc.) [1].

AVALIAÇÃO E DIAGNÓSTICO A avaliação deve consistir da história clínica (queixas do paciente, diagnósticos prévios, detalhes do trauma, evolução dos sintomas, etc.), exame físico detalhado e estudos de imagem adequados. Alguns pacientes podem não ser capazes de informar sobre o trauma e nem mesmo sobre seus sintomas, sendo assim, diante de um paciente politraumatizado, este deve ser considerado como portador de uma fratura de coluna e de déficit neurológico até prove o contrário. Aproximadamente 24% das fraturas tóraco-lombares não são identificadas na primeira avaliação [1]. O exame físico deve consistir da avaliação geral, avaliação neurológica completa e exame específico da lesão. Como todo paciente vítima de trauma, o exame geral deve seguir o protocolo estabelecido pelo “ATLS” (Advanced trauma life suport). Especial atenção deve-se reservar para afastar lesões torácicas e abdominais. No exame do local da lesão, escoriações, hematomas e equimoses locais sugerem trauma grave possivelmente com importante lesão tecidual. Dor a palpação posterior na li227

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pedículos da mesma vértebra, distanciamento entre os processos espinhosos de vértebras adjacentes e outras alterações são sinais de lesões da coluna e devem ser atentamente pesquisados. A realização de tomografia computadorizada (TC), idealmente com reconstruções nos planos sagital e coronal, é essencial e deve fazer parte rotineira da propedêutica. A TC é importante para classificar as lesões, avaliar e mensurar o acometimento do canal vertebral por algum fragmento ósseo, detalhar a morfologia das lesões e definir a conduta terapêutica [4]. O papel da ressonância magnética (RM) ainda não é consenso. É certo que sua realização não é necessária em todos os pacientes. A RM é o exame ideal para avaliação das lesões de partes moles. As indicações mais aceitas atualmente são: déficit neurológico não compatível com o nível da lesão óssea, déficit neurológico sem alterações nos exames prévios (raio X e TC) e avaliação de lesão do CLP quando não for possível esta definição com o exame físico e os exames de imagem prévios [4].

nha média, localizada, é sugestivo de lesão do complexo ligamentar posterior (CLP). Pode-se, em casos mais graves, palpar uma deformidade local (“stepoff”), alterações de alinhamento, distanciamento e/ou crepitações entre os processos espinhosos. No exame neurológico deve ser caracterizado claramente o status neurológico do paciente e classificálo tanto pelo sistema de “Frankel” (Quadro 1) quanto pelo sistema “ASIA” (American Spinal Injury Association). Não é objetivo de este texto descrever sobre a abordagem do Trauma raqui-medular. Quadro 1. Classificação de Frankel de lesão medular Tipo A B C D E

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Descrição Função motora e sensitiva ausente Sensibilidade presente, motora ausente Sensibilidade presente, motora presente porém não útil (Até M3/M5) Sensibilidade presente, motora presente e útil (Força M4/M5) Função sensitiva e motora normais

O diagnóstico das lesões da coluna tóraco-lombar é realizado por radiografias (raio X) em pelo menos duas incidências – ântero-posterior (AP) e perfil. Alterações no alinhamento dos corpos vertebrais, rotação entre eles, irregularidades dos platôs vertebrais, acunhamento, alteração da angulação sagital (cifoses, etc.), distanciamento entre os

CLASSIFICAÇÕES Existem diversas classificações para fraturas tóraco-lombares e não há consenso sobre qual usar. As mais comumente aplicadas na prática clínica são: a classificação de Denis (1984) e a classificação de Magerl e 228

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Quadro 2. Classificação de Denis Tipo

Mecanismo de trauma

Colunas acometidas

Compressão

Carga axial com flexão

Falha da coluna anterior por compressão, preservação da coluna média, podendo haver ou não falha da coluna posterior por tensão

Explosão

Carga axial

Falha por carga axial das colunas anterior e média, podendo haver ou não falha da coluna posterior

Flexo-distração

Fratura-luxação

Falha da coluna posterior por tensão, podendo haver ou não falha também Flexão e distração com fulcro na por tensão da coluna média e podendo coluna média ou anterior haver ou não falha da coluna anterior por compressão Rotação ou cisalhamento (trans- Falha, por definição, das três colunas – lação) ou flexo-distração. altamente instáveis

Quadro 3. Classificação de Magerl et al. (Adotada pela AO-ASIF) Tipo

Mecanismo de trauma

A

COMPRESSÃO

B

DISTRAÇÃO

C

ROTAÇÃO

Subtipos A1 A2 A3 B1 B2 B3 C1 C2 C3

Gertzbein (1994) adotada pelo grupo AO-ASIF [1]. A classificação de Denis é baseada no conceito das três colunas (anterior, média e posterior) e consiste de 4 grupos chamados: compressão, explosão, flexo-distração e fraturaluxação (Quadro 2) (Figura 1). A classificação de Magerl et al.

Impactadas Split (separação) Explosão Lesão posterior ligamentar Lesão posterior óssea Lesão anterior - hiperextensão Tipo A + rotação Tipo B + rotação Cisalhamento – rotação (Slice)

adotada pela AO-ASIF consiste de três grandes grupos (A, B e C) que depois se subdividem em 9 subgrupos maiores (Quadro 3). Os tipos são relacionados ao mecanismo de trauma (força aplicada) e se correlacionam com o grau de instabilidade e a gravidade das fraturas. Elas se tornam progressivamente mais gra229

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Quadro 4. Score “TLICS” (Thoracolumbar Injury Classification and Severity Score). Parâmetro

Qualificadores

Pontuação

Morfologia (Tipo da lesão)

Compressão Explosão Translação/rotação Distração

1 2 3 4

Intacto

0

Suspeito/Indeterminado

2

Lesado Intacto Lesão de raiz

3 0 2 2

Integridade do complexo ligamentar posterior (ruptura por tensão, rotação ou translação)

Status neurológico

Lesão de medula ou cone medular Cauda equina

Completo Incompleto

3 3

uma pontuação igual ou maior a 5 é melhor conduzido cirurgicamente. Se a somatória for igual a 4 a conduta deve ser individualizada.

ves e mais instáveis do tipo A1 para o C3 [1]. Mais recentemente, num esforço para tornar mais objetivo a classificação das lesões e a tomada de decisões em relação ao tratamento, Vaccaro et al. [5] (2005) criaram a classificação chamada “Thoracolumbar Injury Classification and Severity Score” (TLICS) (Quadro 4). Trata-se mais especificamente de um score que avalia cada caso em relação à morfologia da fratura, ao status neurológico e em relação à integridade ou não do CLP. Estes parâmetros são pontuados e o total da pontuação vai ser levado em consideração para a definição da conduta. Um score de 3 ou menos sugere tratamento conservador enquanto

DECISÃO TERAPÊUTICA, TRATAMENTOS E COMPLICAÇÕES. A decisão a respeito da melhor forma de tratar uma lesão traumática tóraco-lombar é muitas vezes complexa e não é consenso. Esta decisão deve ser individualizada em relação a cada paciente e sua fratura. Os objetivos de toda estratégia terapêutica são os mesmos; independente do tratamento: manter ou restaurar a estabilidade da coluna; evitar, corrigir ou minimizar deformidades 230

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nos planos sagital e coronal; evitar déficits neurológicos ou otimizar a capacidade de recuperação de déficits já estabelecidos; melhora da dor e permitir reabilitação precoce [1]. Os fatores mais importantes no processo decisório sobre o tratamento são o status neurológico do paciente, a estabilidade da coluna, o grau de deformidade e a presença ou não de lesões associadas. As indicações absolutas para tratamento cirúrgico são: a deterioração do status neurológico na presença de compressão neural persistente e lesão com ruptura completa do complexo ligamentar associada à luxação caracterizando instabilidade grosseira. É prática universal a indicação de cirurgia para os pacientes com déficits neurológicos, mesmo quando já estabelecido e não progressivo. O conceito prático e objetivo de estabilidade da coluna, ainda são controversos e por isso gera dúvida sobre quais lesões são instáveis e de indicação cirúrgica. Sinais de lesão do CLP, translação e rotação vertebral são indicativos de lesões instáveis que devem ser operadas. A presença de cifose segmentar maior que 20 a 30 graus e acunhamento vertebral maior que 50% são indicações usuais de intervenção cirúrgica e também são sinais sugestivos de lesão do CLP. O comprometimento do canal vertebral maior que 40 a 50%, mesmo em pacientes sem déficits neurológicos, é uma indicação cirúrgica. Veja abaixo a maneira

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de realizar as medidas destes parâmetros [5]. Figura 1.

Medida do comprometimento do canal vertebral realizada nos cortes axiais da TC. Mede-se a distância ântero-posterior nos níveis adjacentes ao da fratura, faz-se uma média e compara-se com a medida do nível da lesão.

O score “TLICS” é uma maneira objetiva e simples de ponderar os fatores mais importantes na escolha do tratamento e vem sendo progressivamente mais usado. Quando optado pelo tratamento conservador, este geralmente é realizado usando-se órteses para imobilização. As órteses mais usadas são o colete de “Jewett” e o chamado “OTLS” (órtese tóraco-lombo-sacra). Elas são eficazes no tratamento conservador de fraturas de T6 a L4. Para fraturas proximais a T5 deve-se prescrever uma extensão cervical e para fraturas de L5 deve-se usar uma extensão para uma das coxas imobilizando uma das articulações coxo-femorais junto com o tronco. Geralmente se usa por perí231

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odo de 12 semanas. Não é indicado repouso absoluto, o paciente pode deambular e movimentar-se em uso da órtese. O tratamento cirúrgico pode ser realizado tanto por via posterior (VP) quanto anterior (VA) e, menos frequentemente, por dupla abordagem. Os objetivos são a correção da deformidade, estabilização, descompressão do tecido neural quando há déficit neurológico e realização de artrodese do segmento instável. A abordagem mais comum é a fixação e artrodese por VP e o material de síntese mais utilizado é a fixação com parafusos pediculares associado a hastes posteriores. Sempre se tenta fixar o mínimo de segmentos possíveis e realizar artrodese curta (um nível acima e um nível abaixo da fratura). Em ossos osteoporóticos é indicado não realizar artrodeses curtas. A VA é uma opção menos freqüente e geralmente reservada para os casos de necessidade de descompressão direta do tecido neural através da retirada de fragmentos ósseos retropulsados para o canal vertebral e para aqueles casos onde, devido à importante destruição do corpo vertebral, se necessita de suporte anterior para sustentação de carga. Com o objetivo de definir quando

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seria necessário complementar a fixação curta com um suporte anterior ou estender a fixação posterior para mais de um nível, Gaines et al. (1994) criaram a “Load Sharing Classification” que é um score que leva em consideração a cominuição óssea, o desvio dos fragmentos e a deformidade final na fratura para avaliar se este nível ainda pode ser considerado um suporte anterior. Segundo estes autores, uma pontuação maior ou igual a 7 indicaria a necessidade de complementação da fixação por VA ou extensão da artrodese posterior [6]. Devido à complexidade destas fraturas, várias complicações são descritas acompanhando estes quadros. Independente do tratamento, estes pacientes podem apresentar: tromboembolismo pulmonar; siringomielia; dor e deformidade residual; e em pacientes com déficits neurológicos, úlceras de pressão, infecções urinárias e pulmonares de repetição, etc. Em relação ao tratamento cirúrgico, a principal complicação é a infecção do sítio cirúrgico que pode se desenvolver em até 10% dos casos. Uma grave complicação é a deterioração do status neurológico que pode acontecer em até 1% dos pacientes operados. Outras são pseudartrose, falha de fixação, fístulas liquóricas e etc. [1].

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. VACCARO A. R; WHANG P G; Thoracolumbar Spine Fractures and Dislocations. In: ROCKWOOD And GREEN’S. Fractures in adults. 7ª ed. Philadelphia; Lippincott Williams & Wilkins, 2010. Cap 43. 2. DEFINO L A D; Fraturas da coluna torácica e lombar. In: DEFINO L A D. Lesões traumáticas da coluna vertebral. 1ª ed. São Paulo; Bevilacqua Editora, 2005. Cap 5. 3. HEINZELMANN M; WANNER G A; Thoracolumbar Spinal Injuries. In: AEBI B and BOOS N. Spinal Disorders – Fundamentals of Diagnosis and Treatment. 1ª ed. Berlin; Springer-Verlag Berlin Heidelberg; 2008. Cap. 31. 4. FRANCE J.C.; BONO C.M.; VACCARO A.R. Initial Radiographic Evaluation of the Spine After Trauma: When, What, Where, and How to Image the Acutely Traumatized Spine. J. Orthop. Trauma. Vol 19, Number 9 640-649, 2005. 5. KEYNAN O. et al. Radiographic Measurement Parameters in Thoracolumbar Fractures: A Systematic Review and Consensus Statement of the Spine Trauma Study Group. Spine. Vol 31. N 5. E156-E164, 2006. 6. VACCARO A.R. et al. A New Classification of Thoracolumbar Injuries : The Importance of Injury Morphology, the Integrity of the Posterior Ligamentous Complex, and Neurologic Status. Spine. Vol 30. N20. 2325-2333, 2005. 7. McCORMACK T.; KARAIKOVIC E.; GAINES R.W. The Load Sharing Classification of Spine Fractures. Spine. Vol 19. N 15. 1741-1744, 1994.

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Lesado medular André Flávio Freire Pereira

INTRODUÇÃO O trauma medular é uma lesão devastadora para a vítima, um grande sofrimento para a família e representa um custo elevado para os programas de apoio social. A lesão medular é frequentemente irreversível, resultando na paralisia ou até mesmo na morte do indivíduo. A história natural da cascata bioquímica que se segue ao trauma cinético inicial resulta na deterioração inevitável e rápida dos tecidos neuronais, definindo uma janela potencial de oportunidade (primeiras 8 horas), na qual os efeitos da lesão medular podem ser amenizados, com a seleção de agentes farmacológicos eficazes. Uma intervenção cirúrgica adequada pode melhorar o ambiente fisiológico, bem como permitir a recuperação neurológica máxima possível.

ainda são os maiores causadores do trauma raquimedular. Infelizmente no Brasil, não temos uma notificação que permita estimar o número de pessoas, a média de idade, o agente causador e o custo do cuidado com o trauma raquimedular na fase aguda e/ou na manutenção do paciente paralítico. FISIOPATOLOGIA A lesão medular típica tem duas fases distintas. A lesão neurológica primária devido à energia cinética do traumatismo e a lesão secundária causada pela cascata bioquímica progressiva após a agressão à medula espinhal2. Esta lesão secundária é mediada pela isquemia ,excitotoxicidade, inflamação, peroxidação lípidica e apoptose1. A regeneração axonal que seria necessária para a restauração da conectividade através da medula lesionada é impedida por moléculas inibitórias que estão na mielina do SNC. Estas moléculas estão representadas pelo NOGO, glicoproteínas ligadas à mielina e oligodentrócitos. Além destes, os astrócitos são responsáveis pelo crescimento de uma cicatriz glial, a qual também contém substâncias que inibem o crescimento axonal1 . Finalmente, é frequente na lesão medular algum grau de cavitação

EPIDEMIOLOGIA A cada ano cerca de 12.000 pessoas sofrem com uma lesão medular aguda, só nos EUA, juntando-se a outros 1.275.000 que já vivem com paralisia crônica naquele país. A média de idade de pacientes que sofrem uma lesão medular aguda aumentou de 29 anos em 1970 para 40 anos em 20051. O sexo masculino é o mais acometido e os acidentes de trânsito 234

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cística no sítio da lesão e na periferia desta, causando a desmielinização de axônios que de alguma maneira haviam escapado da lesão cinética inicial1. As pesquisas mais atuais no tratamento do Traumatismo Raquimedular têm visado melhorar este ambiente hostil que inibe o crescimento e a regenração axonal.

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ceber uma designação do índice motor pela escala de ASIA e um grau de Frankel (tabela 1): Tabela 1. Escala de Frankel

AVALIAÇÃO INICIAL DO LESADO MEDULAR A avaliação neurológica do paciente que sofreu um traumatismo raquimedular é o passo inicial para o diagnóstico preciso e para a instituição de medidas de suporte e tratamento. Devem ser documentados os níveis sensitivos e motor da lesão, ou seja, o último metâmero e/ou grupo muscular que o paciente sente ou movimenta os membros. A lesão da medula espinhal pode ser completa ou incompleta. O exame retal e a presença do Reflexo Bulbocavernoso são importantes neste diagnóstico. A ausência do reflexo Bulbocavernoso indica que o paciente ainda está em choque medular, e assim é impossivel determinar se a lesão neurológica é completa ou incompleta. Após o retorno do reflexo, o exame retal determina se há poupança sacral, ou seja, se há sensibilidade na região perianal, evidenciando que as últimas raízes sacrais (S3 a S5) estão preservadas, e logo se trata de uma lesão incompleta. Nesta fase o paciente deverá re-

FRANKEL A

Nenhuma sensibilidade ou função motora abaixo da lesão. Não há poupança sacral. (LESÃO COMPLETA)

FRANKEL B

Alguma sensibilidade presente. Nenhuma função motora.

FRANKEL C

Função motora presente, mas não útil. Os grupos musculares-chave têm força menor que 3 na escala de Kendall.

FRANKEL D

Função motora presente e útil. Os grupos musculares-chave têm força maior ou igual a 3 na escala de Kendall.

FRANKEL E

Sensibilidade e motricidade normais.

As síndromes incompletas da medula espinhal podem ser divididas em Anterior, Central, Síndrome de BrownSequard e Posterior da medula. Síndromes mistas não são incomuns e possuem características neurológicas que impedem sua classificação dentre as Síndromes clássicas da medula. A síndrome anterior da medula é a de pior prognóstico, ocorre comprometimento da motricidade e da sensibilidade térmico e dolorosa. Os tratos posteriores e o corno posterior da medula são poupados e assim a pressão profunda, a propriocepção e a vibração permanecem. 235

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Na síndrome central da medula ocorre comprometimento neurológico maior nos membros superiores, em comparação aos membros inferiores; É a síndrome incompleta mais comum da medula, frequentemente acomete pacientes de mais idade com alterações espondilíticas subjacentes e possui um prognóstico favorável para o retorno da função. A síndrome de Brown-Sequard é a de melhor prognóstico dentre todas as síndromes incompletas da medula e caracteriza-se pelo comprometimento motor e sensitivo ipsilateral à lesão, além da perda da sensibilidade térmica e dolorosa contralateral. A síndrome posterior da medula tem prognóstico incerto e se caracteriza pela preservação da função motora e comprometimento dos tratos posteriores, ocorrendo perda da sensibilidade abaixo do nível da lesão. No traumatismo raquimedular ocorre comprometimento da inervação simpática, deixando a inervação parassimpática, via Nervo Vago, sem oposição. Esta liberação parassimpática leva à bradicardia, vasodilatação, hipotensão arterial e aumento da capacidade venosa. Em caso de choque neurogênico a hipotensão arterial está associada a bradicardia, ou até parada sinusal, com boa resposta à administração de Atropina. Ainda sobre a avaliação cardiovascular no lesado medular, após semanas ou meses da lesão inicial, estímulos nociceptivos como distensão vesical e abdominal, ou até movi-

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mentos mais bruscos, podem causar a Disrreflexia Autônoma, caracterizada pela hipertensão, cefaléia, rubor facial e aumento de temperatura. Estes sintomas melhoram com a remoção do estímulo doloroso e medicamentos antihipertensivos como a Nifedipina. Alterações respiratórias com o aumento das secreções e diminuição da capacidade de eliminação das mesmas; comprometimento dos esfincteres vesical e retal, levando a quadros de retenção urinária e constipação intestinal; Ossificação heterotópica que pode ocorer em até 30% dos lesados medulares; Osteoporose, contraturas musculares; e úlceras de pressão, merecem atenção especial desde a avaliação inicial do traumatismo raquimedular3,4. EXAMES RADIOLÓGICOS O diagnóstico do Traumatismo Raquimedular é clínico, os exames de imagem confirmam as estruturas anatômicas lesionadas, sendo que as radiografias e a tomografia computadorizada auxiliam no diagnóstico de fraturas e luxações, e a ressonância magnética (RNM) documenta as lesões medulares, discais e ligamentares. A imagem da ressonância pode ser um fator preditivo quanto ao prognóstico da lesão. A contusão medular produz um edema que aparece na RNM com um sinal isointenso ou ligeiramente hipointenso em relação ao tecido nervoso normal na sequência em T1, e mais brilhante que o tecido nervoso normal na sequência 236

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em T2. Este tipo de lesão tem um melhor prognóstico que as lesões que produzam hematomas5. Quando a hemorragia é significativa dentro da medula a intensidade do sinal depende da fase do trauma; Na fase aguda, dentro dos primeiros sete dias, o sangue aparece escuro na sequência em T2; Depois dos primeiros sete dias do trauma, quando a membrana do eritrócito é quebrada, o sangue desenvolve um alto sinal em ambas as sequências, T1 e T2. Estas lesões são de pior prognóstico segundo Kulkarni et al5.

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O uso de bloqueadores dos canais de cálcio, como a Nifedipina, inibe o vasoespasmo e mantêm suprimento sanguíneo eficaz para a medula. Várias pesquisas têm buscado substâncias que atuam como agentes neuroprotetores, funcionando como receptores antagonistas a moléculas que inibam a regeneração axonal (anti-Nogo, Cethrin). Outros pesquisam drogas que tenham a capacidade de inibir a apoptose celular (Minocyclina). Medidas sistêmicas, como a hipotermia moderada (30-33o C), têm demonstrado em modelos animais, ação neuroprotetora, por diminuir a atividade enzimática básica, reduzindo assim o consumo de energia, e mantendo as concentrações intracelulares de ATP; além de reduzir os níveis de Glutamato extracelular, inibir a apoptose, e atenuar a neuroinflamação1. O uso de corticosteróides com o intuito de diminuir o dano secundário da fase inflamatória da lesão foi extensivamente estudado pela série NASCIS (I,II e III), e permanece nos dias atuais, ainda que pela falta de uma terapêutica mais eficaz no traumatismo raquimedular. Uma dose inicial de metilprednisolona deve ser administrada, em bolus de 30 mg/kg na primeira hora, seguida por mais 23 horas de 5,4 mg/kg/h, se iniciado nas primeiras três horas após o trauma, ou mais 48 horas de 5,4 mg/kg/h de metilprednisolona se o tratamento foi inciado entre 3 e 8 horas após a lesão. Não há indicação clínica para

TRATAMENTO Tratamento Clínico do Traumatismo Raquimedular O impacto do mecanismo de lesão sobre a medula espinhal no momento do trauma causa um significante dano primário no tecido neural, e este é rapidamente seguido por uma série de processos patofisiológicos, os quais incluem isquemia, excitotoxicidade, inflamação e estresse oxidativo. O aumento no conhecimento de como este processo influencia o dano secundário em volta do epicentro da lesão, tem guiado estratégias neuroprotetoras, com o intuito de atenuá-lo1. O reconhecimento que a isquemia pode piorar o dano secundário tem levado a adoção de medidas que visam evitar agressivamente a hipotensão e promover perfusão sanguínea efetiva para a medula, através de uma pressão arterial elevada. 237

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após o trauma. O momento ideal para a realização deste procedimento ainda não está clínicamente demonstrado. Experimentalmente, o grau de hiperemia precoce por reperfusão, após a descompressão neural, é inversamente proporcional ao intervalo até a cirurgia e proporcional à recuperação eletrofisiológica. A descompressão medular promove condições para a restauração do fluxo sanguíneo, que deve ser estimulada por manutenção dos níveis pressóricos elevados (Pressão Arterial Média > 85 mmHg); Enquanto a estabilização, além de facilitar os cuidados e a movimentação do paciente paralítico, evita novas agressões ao tecido nervoso.

o início de corticosteróides após 8 horas do traumatismo. O uso do corticosteróide deve ser acompanhado com proteção da mucosa gástrica, através do uso do omeprazol (40 mg/dia) e da ivermectina, a fim de evitar disseminação parasitária. As fraturas expostas, a gravidez, epífises de crescimento abertas e risco iminente de morte, constituem contra indicações para o uso da metilprednisolona. Tratamento Cirúrgico do Traumatismo Raquimedular O tratamento cirúrgico no lesado medular consiste na remoção de pressões extrínsecas (descompressão) e estabilização do segmento da coluna vertebral instável

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Kwon BK et al.: Emerging Repair, Regeneration, and Translational Research Advances for Spinal Cord Injury, Spine 35(215) Supplement S263-S270, 2010 2. Vaccaro AR, Betz RR & Zeidman SM: Principles and Practice of Spine Surgery 407-413, 2003 3. An HS: Synopsis of Spine Surgery 107-119; 263-267, 2001 4. Pardini & G. de Souza: Clínica Ortopédica, Traumatismos da Coluna Vertebral, vol 1/4 727-738, Dezembro 2000 5. Uhlenbrock D: MR Imaging of the Spine and Spinal Cord 437-465, 2004 238

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Pseudartroses Guilherme Pelosini Gaiarsa Paulo Roberto dos Reis Walter H. C. Targa

“Pseudartrose, pseudo-artrose, pseudoartrose, retardo de consolidação, não união, se eu não sei nem o nome, como poderei tratar ? “ Walter Targa. Utilizamos para fins de pesquisa a definição fornecida pelo FDA para estudos clínicos e de novos dispositivos, que considera um retardo de consolidação uma fratura que não consolida em seis meses, e uma nãounião aquela que completa nove meses, sem evolução radiográfica nos últimos três meses. A melhor definição, sem autor definido, “é uma fratura que não consolidou e não apresenta sinais clínicos ou radiológicos de que irá consolidar, não aguarde nove meses antes de agir”

Da parte mecânica, as pseudartroses hipertróficas denotam mobilidade do foco de fratura, ou falta de estabilidade, levando a um calo que aumenta sua área de contato em busca de estabilidade. Epidemiologia é variável segundo a fonte, mas acredita-se que seja em torno de 5% de todas as fraturas de ossos longos no adulto, mais prevalente na transição metáfise-diáfise da tíbia distal e proximal, e na região subtrocanteriana do fêmur. Sua prevalência aumenta com traumas de alta energia, com cobertura de partes moles pobre, e com infecção. CLASSIFICAÇÃO: Utilizamos duas classificações que definem a característica biológica e a falha óssea, e com isto o tratamento. A primeira, biológica, define a viabilidade das margens ósseas,Weber and Cech 1976, hipertrófica, com calo abundante, alargado, e linha de fratura bem definida, fratura biologicamente viável, porem com imobilização ou síntese instável, normotrófica, fratura com calo normal, pouco visível, mas sem sinais de consolidação, e atrófica, ou chama de vela, a fratura que biologicamente não tem

Etiologia: Classicamente, considera-se como principais etiologias as de caráter biológico ou mecânico, ou seja, estabilidade da fratura. As características biológicas, a vascularização local, são definidos pela energia do trauma, com necrose dos fragmentos envolvidos, ou pelas condições do paciente, como diabéticos, tabagistas, que podem ter alterações da microvascularização local, levando a dificuldades na consolidação. 239

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nehuma condição de consolidação, muitas vezes sem contato ósseo entre as partes, neste grupo se incluem os casos onde se forma uma cápsula fibrosa que pode vir a ter liquido no seu interior, a verdadeira pseudartrose. Por este motivo, as atróficas são divididas em 4 tipos, A,B,C e D; A, cunha de torção, onde existe um fragmento intermediário com deficiência vascular, que consolidou em um dos fragmentos principais mas não consolidou no outro, comum em fraturas de tíbia tratadas com placas e parafusos; B: Cominutas, caracterizadas por fragmentos intermediários inviáveis ou necróticos; C; com perda segmentar, independente da viabilidade inicial dos fragmentos, a distância entre eles impede a formação de osso, e D, atróficas, quando as bordas dos fragmentos restantes evoluiu para atrofia e osteoporose de desuso. A outra classificação, criada por Catagni, publicada por Paley, podendo levar um ou ambos os nomes, foi criada para a tíbia, sendo difícil utiliza-la em outros ossos; leva em consideração a perda óssea, a deformidade, a estabilidade, e encurtamento. Divide-se em tipos A e B, tipo A com perda óssea menor que um centímetro, A1-móvel, A2-rígida, A2.1sem deformidade, A2.2 deformidade rígida, e Tipo B, com perdas ósseas maiores, que a depender d integridade da fíbula, podem se enquadrar em um dos 3 tipos, B1-defeito ósseo sem encurtamento, B2- encurtamento sem defeito ósseo (fíbula en-

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curtada ou perdida) B3- defeito ósseo com encurtamento. Tratamento O tratamento da não união deve ser planejado com base no exato diagnóstico etiológico e classificação, pensando também nos procedimentos prévios, condições de partes moles, comorbidades, e principalmente, se existe ou não infecção local. Quando há infecção, a ressecção total dos tecidos necróticos e infectados é o primeiro passo, e os procedimentos de reconstrução óssea e de partes moles devem ser planejados juntamente com o controle da infecção. Os métodos de tratamento dependem das caracterísitcas biológicas e mecânicas, como visto nas classificações expostas. O método de correção mecânica deve ser escolhido com base nas características do paciente e da doença, mas o mais comum é o uso de fixadores externos devido a sua maior versatilidade, permitindo correções de deformidades, alongamentos, encurtamentos, e evitando a presença de materiais de síntese internos que podem favorecer a manutenção de um quadro infeccioso. Temos como maior princípio, no caso das osteossínteses, não lesar as duas fontes de vascularização do osso, ou seja, se já foi utilizada uma haste intramedular, e há perda da circulação endosteal, evitamos ao máximo trocar por uma placa, que pode associar dano à circulação pe240

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riosteal e vice versa. Podemos utilizar hastes de maior diâmetro associada a fresagem de canal, quando existe uma haste no local, sem infecção: ou podemos trocar de placa de estabilidade relativa por absoluta, mas sempre visando não piorar as características vasculares locais, não nos importa o princípio, se estabilidade relativa ou absoluta, importa evitar trocar de material devido à vascularização do osso; agregamos estabilidade, ou estimulamos a biologia, evitando trocar de tipo de síntese. Do ponto de vista biológico, além dos cuidados ao definir os métodos mecânicos, podem ser utilizadas diversas técnicas de estímulo biológico quando assim for necessário. O enxerto ósseo autólogo continua sendo o padrão ouro como fator biológico na consolidação das fraturas, sendo sua fonte mais comum as cristas ilíacas; Outras fontes de enxerto autólogo podem ser os côndilos femorais, planalto tibial, olecrano, e mais recentemente o fresado de canal medular por um sistema de fresagem-aspiração, com o qual não temos experiência. Nos casos de não união com boa estabilidade da síntese, diástase pequena, onde radiograficamente é difícil definir sua causa, a descorticação, ou seja, com um formão delicado realizar múltiplas espículas corticais circunferenciais ao redor de uma falha diafisária leva a estímulo biológico local suficiente para a consolidação.

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A aspiração de medula óssea e injeção local também é efetiva em casos de defeitos pequenos, sendo um procedimento menos invasivo, mas tecnicamente delicado e não isento de riscos. Nos casos de falhas maiores que três centímetros temos por hábito utilizar a distração osteogênica descrita por Ilizarov, mesmo que a literatura considere que falhas de até 6cm podem ser enxertadas, preferimos o transporte ósseo nestes casos. PARTES MOLES A boa cobertura de partes moles, com pele estável, músculos viáveis, são importantes no tratamento da pseudartrose, e deve ser planejado antes, ou em conjunto com o tratamento definitivo. Retalhos miocutâneos, ou fasciocutâneos devem fazer parte do arsenal de tratamento das pseudartroses, por serem parte primordial da cura de uma grande parte dos casos de traumas graves. Sua indisponibilidade no tratamento inicial das fraturas de alta energia também deve ser considerado como um fator etiológico para a não união, uma vez que a boa cobertura é importante para a consolidação óssea. Retalhos de rotação locais, principalmente para a parte proximal e anterior da tíbia devem fazer parte do arsenal terapêutico do ortopedista afeito ao tratamento das pseudartroses, ou disponíveis no serviço que se 241

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propõe a tratar deste problema. A indisponibilidade de equipe de microcirurgia ou cirurgia plástica levou a diversos artigos na literatura com fixação externa das fraturas em deformidades a fim de obter boa sutura de partes moles restantes , e correção progressiva das deformidades com fixadores externos alongando as partes moles juntamente com a correção.

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Em nosso meio dispomos de dois métodos diferentes, a estimulação por ultrassom de baixa energia, que atua percutaneamente, sobre o local da fratura, geralmente 20 minutos por dia, a estimulação por ultrassom leva a modificação das cargas elétricas locais, estimulando a consolidação. A estimulação por campo eletromagnético pulsátil, PEMF, atua ao redor do membro, geralmente por Períodos de três horas diárias, de forma pulsátil, simula as variações de cargas elétricas da marcha normal, o que estimula a mudança de ph na superfície do osso, estimulando os osteoclastos, e segundo alguns estudos de ciências básicas, estimulando a transformação de células mesenquimais em osteoclastos. Alguns centros tem investido no uso de ondas de choque extracorpóreas no tratamento das pseudartroses, baseados em uma teoria de que este processo causa microfraturas com estímulo vascular local, as evidências da eficiência deste método ainda são poucas na literatura, mas nos parece um método promissor como adjuvante no tratamento das pseudartroses.

TRATAMENTO NÃO CIRÚRGICO O tratamento das não uniões não é obrigatoriamente cirúrgico, desde que não haja perda segmentar, existem métodos efetivos para as falhas ósseas menores que um centímetro com estabilidade e sem infecção. Todos os métodos não cirúrgicos se baseiam em princípios eletromecânicos, estimulando as características piezoelétricas dos ossos. Durante a marcha normal, a superfície de tração do osso acumula cargas positivas, enquanto a de compressão acumula cargas negativas, este fenômeno está diretamente envolvido na estimulação dos osteoblastos e osteoclastos na remodelação óssea.

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SUGESTÕES DE LEITURA: 1. Paley,D.,Catagni,M.,Argnani,F.et al:Ilizarov treatment of tibial non- union with bone loss. Clin Orthop 24: 146-151, 1989. 2. Mercadante, M.T.,Santin, R.A.L.: Tratamento da pseudartrose da tibia com falha óssea pelo método de ilizarov. Rev. Bras. Ortop. Vol. 32, 8:591-9 Agosto, 1997. 3. Dos Reis F.B., Hungria Neto J.S., Pires R.E.S.: Pseudartrose Rev. Brás. Ortop. Vol Março de 2005. 4. GUIDANCE DOCUMENT FOR INDUSTRY AND CDRH STAFF FOR THE PREPARATION OF INVESTIGATIONAL DEVICE EXEMPTIONS AND PREMARKET APPROVAL APPLICATIONS FOR BONE GROWTH STIMULATOR DEVICES-FDA - march 18-1998 disponível em http://www.fda.gov/ cdrh/ode/bgsguide.html 5. Kevin Tetsworth, K, Cierny Ill G: Osteomyelitis Debridement Techniques: CLIN. ORTHO REL RESEARCH Number 360, pp 87-96.

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Fraturas com perdas ósseas Reinaldo Volpi

ETIOLOGIA As perdas ósseas segmentares traumáticas decorrem de perdas agudas imediatamente no trauma, após o debridamento cirúrgico primário ou, secundariamente, após ressecção óssea decorrente de infecção ou necrose.

específico, em geral, não abordado nas revisões. O diferencial é o comportamento da falha óssea, para as quais, as propostas de tratamento convencional não se aplicam isoladamente. Avaliação inicial do dano e a possibilidade de salvar o membro Os traumas de alta energia, particularmente nas extremidades inferiores e com perda de substância óssea, representam um grande desafio para o cirurgião. A decisão de amputar ou salvar o membro gravemente lesado é difícil. Diversos índices tem sido propostos para guiar tais decisões: Mangled Extremity Severity Score (MESS); the Predictive Salvage Index (PSI) ; the Limb Salvage Index (LSI) ; the Nerve Injury, Ischemia, Soft-Tissue Injury, Skeletal Injury, Shock, and Age of Patient (NISSSA) Score ; and the Hannover Fracture Scale-97 (HFS-97) . Sua utilidade, no entanto, tem sido questionada e não devem ser o único critério para indicar a amputação. Adicionalmente, estudos indicam que os custos, a longo prazo, são maiores nas amputações do que nas reconstruções dessas graves lesões .

EPIDEMIOLOGIA A incidência anual de fraturas expostas de ossos longos é estimada em 11.5 por 100.000 individuos. O membro inferior responde por 40% delas. A tíbia é o osso mais frequentemente afetado sendo um dos mais difíceis de se tratar e omais frequentemente lesado com perdas segmentares. Em mais de 40% das fraturas expostas da tíbia ocorre perda óssea significativa . As fraturas da perna tendem a ser mais graves quando comparadas com as do braço devido ao grau de lesões dos tecidos moles e a frequência de lesões músculo esqueléticas associadas. As fraturas expostas do fêmur são incomuns, habitualmente resultado de trauma de alta energia associadas à lesões múltiplas, frequentemente cominutivas, raramente com perdas ósseas. CLASSIFICAÇÃO As fraturas com perda de substância óssea estão dentro das Gustilo III mas constituem grupo de tratamento

TRATAMENTO Medidas iniciais A estabilização da fratura é de fun244

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damental importância e idealmente deve ser realizada no momento do primeiro debridamento por meio de fixação interna ou externa. Este procedimento restaura o alinhamento do membro, elimina movimentos bruscos no foco de fratura limitando lesões adicionais de partes moles e contaminação bacteriana. Melhora a perfusão arterial e o retorno venoso, reduzindo o edema pós traumático e a dor . O tratamento das lesões de partes moles para garantir a melhor cobertura possível deve ser iniciado.

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e osso, promover a substituição daquela osteossíntese. Existe um limite dentro do qual uma lesão óssea, com perda de substância, ainda que estável, possa ser espontaneamente reconstituída. Acima deste limite, denominado falha óssea crítica , ocorre a necessidade de alguma intervenção para que a reparação possa ser levada a cabo. Enxerto ósseo autólogo ou homológo O enxerto osseo autólogo pode ser utilizado, preferencialmente, para falhas inferiores a 6 cm. O tempo para a incorporação do enxerto é prolongado e sua quantidade limitada. A ocorrência de infecção no leito a ser enxertado e cicatrizes do envelope de partes moles comprometem a revascularização do enxerto. O osso ilíaco é a principal fonte de enxerto e a via de acesso para a sua aplicação depende da reparação realizada nas partes moles, sendo a póstero lateral uma boa escolha para a tíbia. Enxertos homólogos tem sido utilizados em grande variedade de situações clínicas, mas existe preocupação com respeito às reações imunológicas, com o risco de transmissão de doenças infecciosas, além da perda do potencial biológico ou da integridade biomecânica como resultado de variados métodos de preservação e esterilização. Mais recentemente outros substitutos ósseos também tem sido empregados, como as distintas formas de fosfatos de cálcio.

Planejamento do tratamento da perda óssea Após as medidas imediatas indicadas para o tratamento da fratura exposta, a falha óssea deve ser dimensionada e minucioso planejamento cirurgico deve ser realizado levando em consideração os recursos disponíveis para sua execução. Espera-se obter o preenchimento da falha, mantendo-se o comprimento original do membro, por tecido ósseo que se integre aos cotos remanescentes, adquira resistência semelhante ao osso normal e tenha capacidade de suportar carga durante a deambulação. Na reconstrução das perdas ósseas a estabilização da fratura é condição essencial. Pode ser mantida a fixação interna ou externa empregada na fase aguda do tratamento, ou, consoante as condições das partes moles e ósseas e da tática cirúrgica eleita para o tratamento de ambos, partes moles 245

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Fíbula vascularizada A reparação das perdas ósseas com enxerto de fíbula vascularizada, em geral do membro contra lateral, é opção bem documentada. Necessita de um bom leito de partes moles e vasos adequados para anastomose microcirúrgica, a ser realizada por equipe especializada. O tempo de consolidação é prolongado, necessitando de osteossíntese interna ou externa até que o enxerto possa suportar carga total.

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nitude. A possibilidade de se alongar os membros, em extensão considerável, está fartamente documentada e permite a equalização subsequente do membro Transporte ósseo. Uma forma especial de se promover a regeneração óssea foi detalhada por Ilizarov. Postulou que a aplicação de tração gradual em tecidos vivos cria um estresse que pode estimular e manter a regeneração e crescimento ativo de certas estruturas teciduais. Denominou-o de “Lei da Tensão-Estresse”, onde, tecidos submetidos a constante e vagarosa tração tornam-se metabolicamente ativados, um fenômeno caracterizado pela estimulação tanto das funções celulares proliferativas como das biosintéticas. Esta maneira de se induzir a regeneração óssea, promovendo tração gradual das células do tecido imaturo do calo ósseo, também chamada de osteogênese por tração (distraction osteogenesis, em língua inglesa) permite o tratamento de falhas ósseas e alongamento ósseo em magnitudes jamais imaginadas antes da sua concepção. As bases para que este fenômeno biológico seja potencializado também foram muito bem descritas: osteotomia de baixa energia, preferencialmente metafisária, com máxima preservação dos tecidos moles, periósteo e endósteo; fixação estável com carga precoce; observação do tempo de latência antes do início da tração; tração com ritmo e amplitude específicos. A observação destes

Encurtamento agudo O encurtamento agudo dos membros como alternativa terapêutica para as perdas ósseas segmentares aparece na literatura mais recentemente. Decorre, principalmente, da potencial capacidade de se reconstruir o membro encurtado através de alongamento subsequente. Uma das grandes questões suscitadas por este método de tratamento, e que ainda não apresenta resposta na literatura, diz respeito à magnitude suportável de encurtamento, sem comprometimento da perfusão tecidual. Outra dúvida importante é a interferência resultante na função do membro devido à variação de comprimento das partes moles, particularmente dos músculos. A maior parte dos autores concorda que encurtamentos agudos de dois ou três centímetros podem ser realizados com segurança, e deveriam ser mesmo o tratamento de escolha nas perdas ósseas de pequena mag246

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tadas e expandidas para satisfazer a necessidade de regeneração óssea na área a ser reparada.

conceitos é o que de ainda mais novo se apresenta, com extensa comprovação clínica, no campo da regeneração óssea, especialmente no esqueleto apendicular. As modificações mais recentes e significativas, já incorporadas na prática clínica, encontram-se nas formas de estabilização (externa ou interna).A despeito da eficiência desta forma de regeneração óssea, o tempo dispendido e as complicações ainda são fatores críticos, mas previsíveis. A osteogênese por tração cria um ambiente de prolongada demanda por células formadoras de osso. Em contraste com a consolidação de uma fratura não complicada, que pode estar completa em cerca de seis semanas, na osteogênese por tração a neo formação óssea deve continuar por meses. Durante este tempo, células formadoras de osso devem ser recru-

Encurtamento parcial seguido de transporte e alongamento Nas grandes falhas o encurtamento agudo parcial auxilia na cobertura da ferida por tecidos moles, diminuindo a tensão e o espaço na ferida aberta, permitindo, em alguns casos, o fechamento primário tardio ou a cicatrização por segunda intenção ou mesmo enxerto de pele simples, prescindindo-se de extensivos enxertos livres. O espaço remanescente entre os fragmentos ósseos pode ser reparado com transporte ósseo e a dismetria, resultado do encurtamento, por alongamento. O uso de fixadores externos circulares ou não é condição indispensável nesta técnica.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Giannoudis, P V, Papakostidis, Roberts, C: A review of the management of open fractures of the tibia and femur Journal of Bone and Joint Surgery - British 2006; 88-B (3): 281-289. 2. Alonso, J E, Regazzoni, P: The use of the Ilizarov concept with the AO/ASIF tubular fixateur in the trestment of segmental defects. Ortho.Clin.North. Am. 1990; 21 (4): 655-665. 3. DeCoster, TA, Gehlert, RJ, Mikola, EA, Pirela-Cruz, MA: Manangement of posttraumatic segmental bone defects. J. Am. Acad. Orthop. Surg. 2004; 12: 28-38. 4. Bosse M J, MacKenzie E J, Kellam, J F, Burgess A R, Webb L X , Swiontkowski M F , Sanders R W, Jones A L, McAndrew M P, Patterson B M, McCarthy M L, Cyril J K: A Prospective Evaluation of the Clínical Utility of the Lower-Extremity Injury-Severity Scores . JBJS, 2001, 83:3 6 5. Ilizarov, G A. The tension – stress effect on the genesis and growth tissues. Part I . The influence of stability and soft tissue preservation . Clin. Orthop. Rel. Res.1989; 238: 249-281. 6. Ilizarov, G A. The tension – stress effect on the genesis and growth tissues. Part II . The influence of the rate and frequency of distraccion. Clin. Orthop. Rel. Res. 1989; 239: 263-285. 247

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Osteossíntese em ossos osteoporóticos Ney Coutinho Pecegueiro do Amaral Vincenzo Giordano

Com o aumento da expectativa de vida da população, as lesões relacionadas com a osteoporose têm aumentado no mundo todo. Dentre essas lesões, as fraturas relacionadas estão entre as mais comuns. Pacientes com fraturas em ossos osteoporóticos são os que apresentam maior risco de novas fraturas, comumente no primeiro ano após a fratura. Portanto, doenças que levam à fragilidade óssea devem ser investigadas e tratadas.

em ossos com baixa DMO. Fraturas osteoporóticas estão associadas com um grande aumento da morbidade e da mortalidade quando comparadas com as mesmas em osso não osteoporóticos. Metade dos pacientes com fratura osteoporótica de quadril vão apresentar incapacidade a longo prazo. O fator de risco mais importante para uma fratura osteoporótica é fratura osteoporótica prévia. Objetivos gerais de tratamento O objetivo principal do tratamento do paciente idoso com osteoporose é o pronto restabelecimento o mais rápido possível. Devido às co-morbidades que esses pacientes apresentam a fixação inadequada ou a prolongada imobilização com o tratamento conservador aumentam os riscos de tromboembolismo, complicações pulmonares, úlceras de decúbito e deterioração musculoesquelética generalizada, fazendo com que o tratamento conservador tenha poucas indicações e que o tratamento cirúrgico, quando indicado, seja realizado por um cirurgião com experiência na fixação de ossos osteoporóticos. Como podemos ver, o tratamento cirúrgico está indicado na grande maioria dos casos.

Epidemiologia Essas fraturas, em ossos fragilizados, têm sido denominadas de fraturas osteoporóticas. Cerca de 50% das mulheres e 30% dos homens vão apresentar fraturas por osteoporose durante a vida. Segundo Linvelline, nos Estados Unidos da América do Norte, ocorre cêrca de 1,5 milhão de fraturas relacionadas à osteoporose, com 700 mil fraturas de coluna vertebral, 300 mil fraturas de quadril e 250 mil fraturas da extremidade distal do rádio. A osteoporose acomete mais ossos com grande área de superfície, com uma taxa de reabsorção anual de 8% nos ossos trabeculares e 0,5% nos ossos corticais. As fraturas osteoporóticas são definidas como fraturas que ocorrem 248

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O ideal é que esses pacientes sejam tratados nas primeiras 24-48 horas, pois é quando encontram-se em melhores condições clínicas. Porém, se alguma doença colocar em risco o paciente, esta deve ser tratada e o paciente equilibrado antes da cirurgia. O procedimento deve ser o mais simples possível para diminuir o tempo operatório, perda sanguínea e o stress fisiológico. Porém, sempre que possível, visando conseguir estabilidade suficiente para a mobilidade precoce e deambulação com apoio. Apesar de a redução anatômica ser importante nas fraturas articulares, as fraturas metafisárias e diafisárias devem buscar mais a estabilidade. Os princípios biológicos de tratamento das fraturas devem ser aplicados, evitando-se o descolamento desnecessário dos fragmentos ósseos para preservar o suprimento sanguíneo no foco fraturário. As técnicas de cirurgia minimamente invasivas têm sido as de escolha na atualidade. Soltura dos implantes com falha óssea e não a quebra dos implantes é o modo principal de falha da osteossíntese nos ossos osteoporóticos. Como a DMO se correlaciona diretamente com o poder de “pega” do parafuso, os ossos osteoporóticos não têm resistência por si só para segurar esses parafusos. Os pacientes idosos com fraturas proximais do úmero e proximais e distais do fêmur apresentam uma taxa de soltura de implantes que variam de 10-25% quando utilizados

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implantes convencionais. Nesse sentido o surgimento das chamadas placas com parafusos bloqueados trouxe um novo impulso no tratamento das fraturas osteoporóticas. Fixação dos implantes nos ossos osteoporóticos A diminuição da massa óssea, a fragilidade cortical e as mudanças estruturais com o alargamento do canal medular, devem ser levadas em consideração no momento de se escolher o melhor método de fixação interna e a ser usado. Também deve ser levado em conta que pacientes com osteoporose têm uma diminuição da expectativa de vida e uma baixa demanda física, portanto as complicações a longo prazo das artroplastias não vão acontecer nestes pacientes. Isto tem feito com que as artroplastias sejam cada vez uma opção no tratamento dessas fraturas. Com a maior utilização das artroplastias tem aumentado a incidência das fraturas peri-protéticas .Os princípios de tratamento que regem as fraturas osteoporóticas devem também ser aplicados nas fraturas periprotéticas. O maior problema no tratamento cirúrgico dos pacientes com osteoporose é a fixação do implante ao osso, que vai depender a interface do implante ósseo. Parafusos convencionais A resistência à soltura de um parafuso colocado no osso depende do 249

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tamanho do parafuso, do diâmetro da rosca e da qualidade do osso. Estudos recentes mostraram que a orientação do trabeculado ósseo é importante. Parafusos colocados paralelos ao padrão trabecular são mais resistentes à soltura do que os colocados através do padrão trabecular. A qualidade óssea é a principal determinante do poder de pega do parafuso. Portanto, para que posamos ter a maior resistência de um parafuso à soltura em um osso osteoporótico, o parafuso deve: 1- ser colocado o mais paralelo possível ao trabeculado esponjoso, 2- ter o maior diâmetro possível e 3- deve ser fixado em osso cortical. O osso cortical tem uma densidade mineral maior e portanto maior resistência à soltura, do que o osso esponjoso. Assim, em um osso osteoporótico, um parafuso de menor diâmetro fixado na cortical terá maior resistência do que um parafuso de esponjosa de maior diâmetro mas que não ancora na cortical. Em casos de osteoporose severa, um outro recurso que pode ser utilizado é o reforço do parafuso com o uso de cimento ósseo de polimetilmetacrilano. Este cimento é injetado no orifício dos parafusos que não se fixaram e o parafuso é inserido no cimento.

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depende da “pega” do parafuso no osso (fig. 1). Outros fatores que afetam a resistência da montagem com placas é o contato entre os fragmentos ósseos, e o número e a posição de parafusos colocados na placa. Assim sendo, em ossos osteoporóticos, devem ser usadas placas longas, com parafusos espaçados, sempre que possível com parafusos ancorados em cortical e a placa de modo antideslizante e procurar sempre o contato ósseo entre os fragmentos, muitas vezes as custas de uma impacção controlada. Quando uma grande instabilidade está presente, pode se utilizar a fixação com dupla placa ou enxerto de fíbula intramedular. Figura 1. Placas convencionais

Placas bloqueadas As placas com orifícios rosqueados, que permitem que os parafusos sejam rosqueados na própria placa, foram o maior avanço no tratamento atual das fraturas osteoporóticas. Ao contrário das placas convencionais, essas placas não dependem do atrito da placa com a cortical óssea e da pega do parafuso

Placas convencionais A resistência do sistema de fixação, quando se utiliza uma placa convencional, depende do atrito entre a placa e a superfície óssea, que por sua vez 250

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no osso fragilizado, pois uma vez que os parafusos são atarraxados na placa, isto cria um sistema de ângulo fixo que aumenta a resistência ao arrancamento do sistema placa-parafuso, o que é de fundamental importância nos ossos osteoporóticos. Esses sistemas devido a sua semelhança mecânica com os fixadores externos são denominados de fixadores internos (fig. 2)

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com o uso de parafusos bi corticais, associada às técnicas cirúrgicas minimamente invasivas, melhorou muito o resultado e diminuiu a taxa de complicações nas fraturas osteoporóticas. Figura 2. Placas bloqueadas

Figura 2. Placas bloqueadas

Hastes intramedulares As hastes intermediares bloqueadas são o tratamento de escolha para as fraturas diafisárias do fêmur e da tíbia, em ossos osteoporóticos. As hastes mantêm grande área de contato ósseo, dividem a carga e, em circunstâncias especiais, oferecem fixação suficiente para permitir o apoio precoce do membro afetado. Com o surgimento de novos modelos de hastes, estas tem permitido a extensão de indicação para algumas fraturas metafisárias. As hastes intramedulares, devido as suas características biomecânicas, tem maior resistência à falha do que as placas, o que as tornam de grande valia nas fraturas diafisárias dos ossos com osteoporose, principalmente naquelas em que não existe contato ósseo e falha na cortical oposta. O ponto mais

A maioria dos dispositivos de placas bloqueadas existentes hoje possui um orifício combinado que permite que o parafuso seja colocado de forma bloqueada ou convencional (fig. 3), expandindo a utilização desse sistema e tornando os muito versáteis, o que é de fundamental importância nos ossos osteoporóticos. As placas bloqueadas aumentam muito a estabilidade da montagem, uma vez que a estabilidade depende mais da interface placaparafuso com estabilidade angular do que a interface placa-osso. A utilização das placas bloqueadas 251

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fraco, e que mais apresenta problemas na fixação intramedular de ossos osteoporóticos, é o parafuso de bloqueio. A melhoria da fixação dos parafusos de bloqueio pode ser conseguida com o bloqueio em vários ângulos diferentes, com o uso de arruelas, com o reforço com cimento ortopédico e com a utilização de novos modelos de hastes que apresentem parafusos bloqueados nas hastes, criando também um sistema de ângulo fixo.

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opção para essa função, entretanto, devido as baixas densidades ósseas e ao fraco potencial biológico, além de poucas quantidades disponíveis nesses pacientes, outras formas têm sido utilizadas como o reforço com cimento ósseo de polimetilmetacrilato, os cimentos feitos com fosfato de cálcio, que adere melhor ao osso, mas que não tem características mecânicas para dar suporte, devendo ser utilizado para preencher cavidades. Outros substitutos ósseos têm sido utilizados na tentativa de reforçar e estimular a consolidação, entre eles o enxerto de cadáver, matriz óssea desmineralizada e o sulfato de cálcio, entre outros.

Banda de tensão A técnica da banda de tensão é geralmente utilizada nas fraturas transversas de regiões onde vigorosos tendões tendem a tracionar os fragmentos. Essa técnica consegue uma fixação rígida e segura para permitir a mobilidade precoce. A banda de tensão tem vantagens adicionais nos ossos osteoporóticos, uma vez que parte da fixação é feita nos tendões e ligamentos conectados às fraturas e que usualmente são mais resistentes do que o osso fragilizado. As fraturas de patela, olecrânio, proximal do úmero e maléolo medial tem sido tratadas com sucesso por esta técnica.

Cuidados pósoperatórios Os cuidados pós-operatórios devem incluir, não só a terapia física como também a reabilitação psicossocial. A depressão é um achado comum entre esses pacientes, e, por isso, eles devem ser estimulados a participar dos programas de reabilitação. Esses pacientes devem ser acompanhados por uma equipe multidisciplinar, uma vez que muitos deles apresentam-se desnutridos, com doenças sistêmicas descompensadas como diabetes, hipertensão arterial e imunossuprimidos, o que tem levado a uma alta taxa de complicações. Uma albumina seria menor do que 35mg/dl indica desnutrição crônica o que aumenta, consideravelmente, a taxa de infecção. Um grande número de pacientes apresenta déficit

Reforço e suporte Devido as fracas condições mecânicas do osso osteoporótico, e, por consequência, fraturas multifragmentares e com falha óssea, várias técnicas de reforço e suplementação tem sido utilizadas para estimular a consolidação e suporte dessas fraturas. Os enxertos ósseos autólogos são a primeira 252

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tratamento de ossos osteoporóticos devem ser empregados. Esses princípios são: a) cirurgia minimamente invasiva. b) placas em ponte c) hastes intramedulares bloqueadas d) impacção controlada e) reforço ósseo f ) artroplastias Por fim, o tratamento da osteoporose deve fazer parte do tratamento das fraturas.

cognitivo o que torna difícil conseguirem deambular com o apoio parcial, fazendo-se necessária a retirada completa do apoio até que a fratura esteja em condições de suportar carga total. Em conclusão, com o aumento da osteoporose ao redor do mundo, devemos acreditar que a osteoporose será uma epidemia nos próximos anos. Todo paciente de meia idade, com uma fratura de baixa energia, deve ser encarado como um paciente com osteoporose e os princípios de

SUGESTÕES DE LEITURA. 1. Cornell C.N., Internal Fracture Fixation in Patients with Osteoporosis. J.Am Acad Orthop Surg.2003;11:109-119 2. Ruedi T.P.,Burckley R.E e Moran C.G. AO Principles of Fracture Management. AO publishing 2007. 3. Smith W.R., Ziran B.H., Anglen J.O., Stahel P.F. Lockin Plates: Tip an Tircks, J.Bone Joint Surg Am. 2007; 89 2298-2307. 4. Schmidt A,H, Teague D,C, Orthopaedic Knowledge Update-trauma.AAOS – 2010. 5. Bucholz . R.W, Heckman J.D,Court-Brown C, Rockwood and Green`s, Fractures in Adults, Lippincott Williams &Wilkins 2006;613 253

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Trauma ortopédico e trombose venosa profunda Kodi Edson Kojima Jorge dos Santos Silva

Fisiopatologia O paciente vítima de trauma tem um risco aumentado de desenvolver a trombose venosa profunda (TVP), pois afeta diretamente a tríade de Virchow (estase venosa, lesão endotelial e hipercoagulabilidade). A lesão do endotélio vascular estimula a agregação das plaquetas e a liberação de tromboplastina tecidual, que ativa o sistema extrínseco da cascata da coagulação. Ao mesmo tempo outras substâncias teciduais ativam o sistema intrínseco da coagulação, via fatores XIa e XIIa. O caminho comum de ambos os sistemas é a ativação do fator X, que converte o fator II (protrombina) em fator IIa (trombina), que convertem o fibrinogênio em fibrina formando o trombo.

monar (TEP), que é decorrente do desprendimento do trombo das veias profundas dos membros e a oclusão de vasos pulmonares, ocasionando morte em 66% dos pacientes nos primeiros 30 minutos após a embolia. As TVP proximais têm maior chance de desprendimento que as TVP distais. Felizmente 84% das TVP ocorrem nas veias profundas da panturrilha e menos de 40% nas veias mais proximais. Devemos ter cuidado porque o trombo pode progredir das veias profundas para as mais proximais em 25% dos pacientes. Os pacientes vítimas de trauma que têm aumento na incidência de TVP/TEP, são os que apresentam associação com fratura da coluna, lesão raquimedular, fratura da pelve, dos ossos longos dos membros inferiores e politraumatizados.

Epidemiologia Aproximadamente 10% dos pacientes com fratura no quadril têm evidência de trombose venosa profunda (TVP) assintomática nos primeiros dias da internação. O retardo no início da profilaxia faz com que a incidência aumente para 55%. Com a profilaxia medicamentosa a incidência de TVP cai para 1 a 2%. O maior problema relacionado com a TVP é a tromboembolia pul-

Diagnóstico O diagnóstico clínico da TVP é muito difícil, pois os sinais clínicos são inespecíficos e mais de dois terços dos pacientes apresentam a patologia de forma silenciosa. O sinal de Homan (dor na região poplítea à dorsiflexão forçada do pé) tem a acurácia variando de 8 a 56%. A venografia com contraste era o 254

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exame de eleição para o diagnóstico da TVP, mas por não poder ser feito de maneira seriada, causar flebite em 4 a 24% dos pacientes e poder provocar reação alérgica, não é mais o método de escolha. Além disso, pode apresentar dificuldade de interpretação por problemas técnicos. Atualmente o exame padrão é o Doppler venoso não invasivo, pois é de fácil realização, pode ser feito de maneira seriada e com a experiência do examinador reduz os resultados falso-positivos. A acurácia é de aproximadamente 94%. Uma modalidade diagnóstica com alta sensibilidade e alta especificidade é a venografia por ressonância magnética. Também tem como vantagem a detecção de TVP em locais de difícil acesso para a ultrassonografia ou a venografia. Entretanto, tem como desvantagens o alto custo e a dificuldade com pacientes obesos, politraumatizados e pacientes com fixador externo. Os sinais clínicos da TEP incluem dispnéia, dor torácica, hemoptise, falha do coração direito e hipotensão. A TEP é fatal em 66% dos casos. O exame de escolha para o diagnóstico da TEP é a tomografia computadorizada helicoidal, preferencialmente com injeção de contraste intravenoso.

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de prolongamento da internação e a terceira causa de aumento da mortalidade e custos hospitalares. O mais importante é o tratamento preventivo, porque a não prevenção da TVP aumenta a mortalidade, morbidade a curto e médio prazo, o custo e os recursos utilizados no tratamento dos pacientes com alto risco. E também porque há evidências de que a profilaxia adequada reduz a incidência de TVP e TEP, sem provocar significativo aumento do sangramento. As recomendações de tromboprofilaxia para os casos de fratura do quadril abaixo discriminadas foram retiradas do oitavo guia prático da American College of Chest Physician Evidence-Based Clínical Practice ACCP. a) Está recomendado o uso de tromboprofilaxia em todos os pacientes com fratura do quadril. A profilaxia pode ser feita com fondaparinux, heparina de baixo peso molecular (HBPM) ou antagonista da vitamina K (warfarina - INR alvo de 2,5). b) Nos pacientes com fratura do quadril não está recomendado o uso isolado de ácido acetil salicílico (AAS). c) Nos pacientes com fratura do quadril que terão sua cirurgia retardada, é recomendado iniciar a profilaxia com HBPM ou heparina fracionada desde a internação. d) Nos pacientes com alto risco de sangramento recomenda-se o uso de métodos mecânicos como compressão pneumática intermitente.

Tratamento Em pacientes vítima de trauma a TVP foi a segunda complicação médica mais frequente, a segunda causa 255

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e) Assim que o risco de sangramento diminuir, deve-se substituir ou agregar a profilaxia medicamentosa ao mecânico. f ) Para pacientes submetidos a osteossíntese do quadril recomendase que a profilaxia se estenda além de 10 dias, até 35 dias após a cirurgia. g) Para pacientes com fratura isolada distal ao joelho não está recomendado o uso rotineiro de tromboprofilaxia.

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por dia e da deltaparina é de 5.000 unidades por dia. Antagonistas da vitamina K - warfarina - inibe a carboxilação das proteínas dependentes da vitamina K (II, VII, IX, X) e as proteínas anticoagulantes C e S. Atinge nível plasmático em 1,5 hora e tem meia-vida de 2 a 3 dias. A profilaxia deve ser iniciada com 5mg por dia, e no quarto dia avaliar o INR, que deve estar em 2,5 ± 0,5. Nos casos de necessidade de anticoagulação mais rápida, pode se iniciar com 10mg por dia, mas o controle do INR deve ser diário. Pentassacarídeos (PS) - fondaparinux - análogos sintéticos da sequência pentassacarídica antitrombínica encontrada na HBPM. Inibe seletivamente a atividade do fator Xa e também inibe a formação de trombina. A dose recomendada é de 2,5mg por dia, via subcutânea.

Heparina de baixo peso molecular (HBPM) - enoxiparina e deltaparina - polímero de polissacarídeos mais específicos para a inibição do fator Xa. É bem absorvida por via subcutânea e tem vida média de 3 a 12 horas. Como a excreção é renal, deve-se ter cuidado nos pacientes com insuficiência renal. A dose profilática da enoxiparina é de 40mg SC

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Geerts WH, Bergqvist D, Pineo GF, et al. Preventions of venous thromboembolism: American College of Chest Physicians Evidence-Based Clínical Practice Guidelines (8th Edition). Chest. 2008; 133:381S-453S. 2. Kearon C. Natural history of venous thromboembolism. Circulation. 2003;107 (Supll23):22I-30I. 3. Caprini JA, Arcelus JI, Maksimovic D, et al. Thrombosis prophylaxis in orthpedic surgery: current clínical considerations. J South Ortho Assoc. 2002;11:190-196. 4. Rogers FB, Cipolle MD, Velmahos G, et al. Practice management guidelines for the prevention of venous thromboembolism in trauma patients: the EAST Practice Management Guidelines Work Group. J Trauma. 2002;53:142-164. 5. Wile-Jorgeson P. New therapeutic options in DVT prophylaxis. Orthopedics. 2000;23:S639S642. 6. Goldharber SZ. Pulmonary embolism. Lancet. 2004;363:1295-1305. 256

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Embolia gordurosa Marco Túlio Costa Roberto A Lima Santin Ricardo Cardenuto Ferreira

O número de procedimentos ortopédicos relacionados a artroplastias e tratamento de traumas agudos está aumentando, assim como a expectativa de vida da população. É também de se esperar o aumento do número de complicações decorrentes destas cirurgias1, como infarto do miocárdio, pneumonia, infecção no local da cirurgia, trombose venosa profunda e embolia pulmonar sendo as mais comuns. No entanto, uma das complicações mais graves é a síndrome da embolia gordurosa1. A real incidência da embolia gordurosa não é conhecida. Portanto, toda vez que um paciente com fratura apresentar sinais de dificuldade respiratória e/ou alteração mental, o diagnóstico de embolia gordurosa deve ser pensado, embora não seja o mais comum1-3.

embolia gordurosa. Os principais sinais são insuficiência respiratória, confusão mental e petéquias cutâneas, que em geral aparecem em até 24 horas após o trauma1, 2. Gurd e Wilson2, 4 publicaram um critério para definir e diagnosticar a síndrome da embolia gordurosa. Segundo os autores, é necessária, para o diagnóstico, a presença de dois sinais denominados maiores (insuficiência respiratória, acometimento cerebral e petéquias cutâneas) ou a presença de um sinal maior associado a quatro dos seguintes sinais: pirexia, taquicardia, alterações na retina, icterícia, oligúria ou anúria, presença de gordura na urina ou escarro, queda inexplicada do hematócrito ou número de plaquetas. Gurd e Wilson receberam críticas por não incluir gasometira arterial em seus critérios1. Epidemiologia Como não existe um critério uniforme para diagnóstico da síndrome da embolia gordurosa, sua incidência varia muito na literatura (0,25% a 35%)1. Acredita-se que é quatro vezes mais comum em homens, especialmente em jovens entre 10 e 40 anos de idade2. É muito mais comum após fraturas dos ossos longos, principalmente do fêmur1, 2. Quando a fratura

Definição Embolia gordurosa é a presença de gotículas de gordura na microcirculação periférica e/ou no pulmão, com ou sem sintomas clínicos1. Portanto, não é toda embolia gordurosa que progride para síndrome da embolia gordurosa. A síndrome da embolia gordurosa é caracterizada por sintomas clínicos graves, decorrentes da 257

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do fêmur é bilateral, acredita-se que a incidência seja ainda maior. É também mais comum nas fraturas fechadas do que nas expostas2, após a realização de próteses bilaterais no mesmo procedimento e após o uso de hastes intramedulares fresadas quando comparada às não fresadas. No entanto, o uso de hastes não fresadas não protege o paciente contra a síndrome da embolia gordurosa1. A demora na estabilização da fratura e nas reduções fechadas, também leva a um aumento na incidência. Embora rara, pode surgir após instrumentação da coluna, queimaduras ou traumas no tecido gorduroso1.

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tema nervoso central leva a alteração cerebral. No entanto, ainda não está claro como os êmbolos passam pelos capilares pulmonares e vão obstruir a circulação no cérebro. É provável que o aumento da pressão no lado direito do coração, force os êmbolos a se deformarem e alcançarem a circulação sistêmica1. A outra teoria, conhecida como biomecânica, afirma que ocorrem alteração físico-químicas quando os êmbolos de gordura sofrem ação de uma proteína conhecida com lipoproteína lipase, resultando na liberação de substâncias tóxicas que vão causar lesões nos capilares pulmonares, aumentando sua permeabilidade e levando a insuficiência respiratória. Na teoria biomecânica, também há obstrução capilar, aumentando ainda mais a lesão1.

Etiologia A causa mais comum da embolia gordurosa é o trauma, principalmente relacionado a dois fatores: movimento de fragmentos ósseos instáveis e fresagem do canal medular, que eleva a pressão intra-canal1. O movimento dos fragmentos ósseos leva a lesão da medular óssea e a infiltração da mesma na circulação. O aumento da pressão intra-canal pela fresagem força a medula óssea, gordura e pequenos fragmentos ósseos para a via venosa do osso. O mecanismo exato da fisiopatologia não é completamente conhecido2. Há duas teorias1, 2. A mecânica afirma que o aumento da pressão intra-medular empurra gordura e medula óssea para os canais venosos do osso. Isto leva a formação de êmbolos de gordura, que vão obstruir os pequenos vasos no pulmão e demais órgãos, causando sua insuficiência. A embolização do sis-

Quadro Clínico A síndrome da embolia gordurosa é uma desordem multisistêmica. Taquicardia, taquipnéia e febre são os sinais clínicos e normalmente surgem entre 12 até 72 horas após o trauma2, 5 . Os sintomas podem ser inicialmente leves, mas podem progredir para a forma mais agressiva da síndrome, principalmente durante a manipulação de ossos longos, colocação de próteses ou redução fechada de fraturas. Os órgãos mais afetados são os pulmões e o cérebro, mas pode haver acometimento cardiovascular e cutâneo. A síndrome da embolia gordurosa sem sintomatologia pulmonar é rara1. Normalmente há taquipnéia e algum grau 258

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de hipoxemia. As alterações cerebrais, em geral se iniciam com confusão mental, são atribuídas ao edema cerebral, que decorre da hipóxia, isquemia e lesão vascular cerebral causada por toxinas. Felizmente, estas alterações, na maioria dos casos são reversíveis1. É importante descartar lesões cerebrais causadas pelo trauma2. As alterações cardiovasculares ocorrem após o acometimento pulmonar pelos êmbolos. Pode ocorrer aumento da pressão na artéria pulmonar, hipotensão, diminuição da função cardíaca e arritmias. Alterações cutâneas acontecem entre 25% e 95% dos casos1. Em geral há petéquias na região anterior do tórax, pescoço, axila, mucosa oral e conjuntiva. As petéquias permanecem por 24 horas em média.

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congestão cardíaca. A ressonância do cérebro pode mostrar edema cerebral1. Tratamento Não há tratamento definido para a síndrome da embolia gordurosa1. Normalmente o tratamento é sintomático, e busca corrigir ou amenizar as alterações provocadas pela síndrome2, 3. Antes do aparecimento do quadro é possível tomar medidas preventivas para evitar ou diminuir a sua gravidade. A estabilização precoce das fraturas dos ossos longos talvez seja a medida preventiva mais eficaz1-3, 5. Em pacientes com condições clínicas ruins para a fixação definitiva, uma boa alternativa é o emprego da fixação externa. A instalação de um “respiro” durante a fresagem óssea, pode diminuir a pressão intra-canal e também auxiliar na prevenção1. A lavagem e curetagem do canal medular ósseo antes da inserção de uma prótese também podem ajudar, porque diminui a quantidade de medula óssea disponível para embolização. O uso de corticóides no tratamento ainda é controverso1-3, 5. A maior morbidade da síndrome da embolia gordurosa está relacionada com a disfunção pulmonar. Pacientes com acometimento do sistema nervoso central tem pior prognóstico quando comparado com os que não têm esse tipo de sintoma1. Com uma terapia sintomática de suporte mais eficiente, assim como a fixação precoce e definitiva das fraturas, o prognóstico da síndrome da embolia gordurosa tem melhorado significativamente .1

Diagnóstico O diagnóstico da síndrome da embolia gordurosa não é fácil devido a variedade de apresentações clínicas. Não há sinal patognomônico. O conjunto de sinais e sintomas, associado com exames laboratoriais e exclusão de outras afecções é que confirmam o diagnóstico. Todo paciente com fratura de um osso longo, em especial do fêmur, que apresentar hipoxemia, confusão mental e petéquias, o diagnóstico de síndrome da embolia gordurosa deve ser lembrado2. A hipoxemia pode ser confirmada com a gasometria arterial. Glóbulos de gordura podem ser notados no sangue, escarro ou urina. A radiografia do tórax pode mostrar infiltração alveolar e perihilar, e sinais de 259

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Akhtar S. Fat embolism. Anesthesiol. Clin. 2009;27: 533-50, table of contents. 2. Roberts C, Gleis G, Seligson D. Diagnosis and Treatment of Complications. In: Browner B, Levine A, Jupiter J, Trafton P, Krettek C, eds. Skeletal Trauma: Basic Science, Manegement, and Reconstruction: Saunders Elsevier, 2009: p. 545-88. 3. Bederman S, Bhandari M, Mckee M, Schemitsch E. Do Corticosteroids Reduce the Risk of Fat Embolism Syndrome in Patients with Long-bone Fractures? A Meta-Analysis. J Can Chir. 2009;52: 386-93. 4. Gurd AR, Wilson RI. The fat embolism syndrome. J Bone Joint Surg Br. 1974;56B: 408-16. 5. Peltier L. Fat Embolism. Clin Orthop Rel Res. 2004: 148-53.

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Tétano Marcelo Abagge Christiano Saliba Uliana

Introdução O tétano acidental é uma doença infecciosa não-contagiosa que acomete principalmente a população de países em desenvolvimento, por conta de precárias condições de assistência à saúde, que inclui a vacinação. Diferencia-se da sua outra apresentação, o tétano neonatal, por ser adquirido após um trauma que promove a exposição e contato com o microorganismo causador, o Clostridium tetani. Este capítulo abordará os aspectos epidemiológicos, clínicos, de prevenção e tratamento do tétano acidental.

período, ocorreu a redução de 72% dos casos (Gráfico 1).

Epidemiologia Estima-se que a incidência do tétano acidental seja de 500 mil a 1 milhão de casos, com marcante diferença entre os países desenvolvidos e os em desenvolvimento. A doença é pouco frequente nos países ricos principalmente devido a políticas eficientes de vacinação e elevado nível cultural da população1. No Brasil, a patologia é um problema de saúde pública, visto que existe associação entre cobertura vacinal e baixos níveis de desenvolvimento humano2. Porém tem-se observado a tendência de diminuição dos casos absolutos, como mostra o gráfico que abrange os anos de 2000 a 2008. Neste

Particularmente em 2008, foram 331 casos absolutos em todo território nacional, sendo: 39 na região Norte (12%); 110 no Nordeste (33%); 74 no Sudeste (22%); 72 no Sul (22%) e 36 no Centro-oeste (11%). A prevalência é maior na região Nordeste, sabidamente um local onde as condições sócio-econômicas são mais desiguais. Nesta região, ocorre por volta de metade das infecções de tétano neonatal e metade dos casos de tétano acidental do país3. A região Sudeste apresenta a maior redução do número de casos, hoje com uma incidência de 0,01 por 100 mil habitantes. As séries de casos descrevem uma prevalência maior em indivíduos do

Gráfico 1

Número de casos e coeficiente de incidência de tétano acidental. Brasil, 2000-2008.

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sexo masculino. Na literatura nacional, Lima e cols. descreveram uma série de 53 pacientes com diagnóstico de tétano acidental, dos quais 64% eram do sexo masculino4. Feijão e cols levantaram os casos no Estado do Ceará entre 2002 e 2005. O estudo identificou 121 casos de tétano confirmados, dos quais 84,8% eram do sexo masculino5. Esta preferência pode ser parcialmente atribuída à maior exposição a ferimentos perfurantes e cortantes por parte dos homens. Neste sentido, observouse que as ocupações mais relacionadas à infecção por tétano são agricultores, profissionais da área da construção civil e de limpeza, ofícios geralmente desenvolvidos por homens. A menor prevalência na população feminina pode em parte ser explicada pela vacinação obrigatória no período neonatal. Medidas de maior abrangência de vacinação deveriam ser tomadas em um esforço de se diminuir os casos de tétano. Dentre elas, citam-se incluir a vacinação em centros de prontoatendimento, nas consultas regulares de prevenção do câncer de colo uterino, bem como a inclusão do conceito de “oportunidade perdida”, isto é, vacinar a população, por exemplo, em situações de renovação da carteira de identidade ou regularização de título de eleitor. A faixa etária mais acometida situa-se entre 25 e 54 anos. Segundo o Ministério da Saúde, 51% dos casos encontram-se neste grupo. Pacientes com 55 ou mais representam o segundo grupo mais acometido,

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com um percentual de 17%. Lima e cols identificaram dois picos epidemiológicos. O primeiro corresponde a pacientes jovens moradores da zona rural, e o segundo, a pacientes idosos moradores da zona urbana. Na população geriátrica, o tétano é associado à maior mortalidade4. Pagliuca e cols descreveram dois casos de infecção em idosos que não haviam sido vacinados e ambos evoluíram com óbito6. Dados de literatura apontam que 62 a 93,2% dos casos ocorrem na área urbana. Vale destacar que, segundo Rouquairol , definem-se moradores de área urbana e suburbana aqueles residentes nas áreas das cidades (sedes municipais), vilas (sedes distritais) e também aglomerações definidas como urbanas pelos órgãos oficiais1. Isto implica que áreas que tem atividades estritamente de agricultura e pecuária podem ser inseridas no contexto “urbano”, justificando a aparência discordante entre atividades ocupacionais e procedência dos casos. No Brasil, a letalidade do tétano acidental situa-se na faixa de 20 a 34%. Se avaliados individualmente, indivíduos idosos e abaixo dos cinco anos apresentam taxas ainda maiores. Nos países desenvolvidos, a letalidade é menor, variando de 10 a 17%.2 Microbiologia O Clostridium tetani é um bacilo Gram-positivo esporulado e anaeróbio. Tem morfologia semelhante a um alfinete de cabeça, com 4 a 10µ 262

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Quadro clínico Para que haja infecção, com instalação do quadro clínico, primeiro há necessidade de ocorrer um desequilíbrio entre os mecanismos imunológicos de defesa e a virulência e número de microorganismos. Fatores que predispõem a evolução da contaminação para a doença incluem características relacionadas ao hospedeiro e ao trauma7. Atualmente sabe-se que a presença de choque, desnutrição, politransfusão, diabetes, imunossupressão, alcoolismo, baixa temperatura do corpo e necrose tecidual são fatores relacionados ao hospedeiro que aumentam a chance de haver infecção. Em relação ao trauma, ferimentos lacerantes, com descolamento de tecidos e perda de substância predispõem ao desenvolvimento da doença. Queimaduras e incisões cirúrgicas também já foram descritas como porta de entrada para o Clostridium5. A manifestação clínica mais comum são as espasticidades motoras, sendo o trismo o sinal mais encontrado. No estudo de Feijão e cols, este sintoma esteve presente em 86,2% dos casos. Outros estudos relatam até 92% de trismo nos casos diagnosticados4. O riso sardônico é outro sinal relacionado como a espasticidade do masseter. Outros músculos que podem ser acometidos são os da faringe (disfagias), do esqueleto apendicular (hiperextensão), abdomen em tábua, paravertebrais (opistótono) e diafragma, podendo haver evolução para insufi-

de comprimento. É encontrado comumente na pele e intestinos dos animais, bem como na terra, areia, poeira, águas putrefatas e instrumentos enferrujados. A característica de poder sobreviver por longos tempos no ambiente, advém da capacidade de produção de esporos. Quando em contato com o hospedeiro, estes esporos transformam-se em formas vegetativas, responsáveis pela patogenia. Esta transformação se dá em ambientes propícios para a anaerobiose, como tecidos desvitalizados, corpos estranhos, isquemia e infecções. O período de incubação varia de três a 21 dias e não há transmissibilidade entre indivíduos. A transmissão ocorre quando, na vigência de uma solução de continuidade da pele, há contato do hospedeiro com o Clostridium. Todas as pessoas são susceptíveis, independentemente do sexo ou idade. A doença não produz imunidade. Ela só é adquirida através da vacinação com 3 doses, mais reforço a cada 5 ou 10 anos. Fisiopatologia Após a transformação para a forma vegetativa, o Clostridium produz uma neurotoxina chamada tetanospasmina. Ela atua nos neurotransmissores causando hiperexcitabilidade do sistema nervoso central que resulta em graves contraturas e espasticidades. Concentrações tão baixas quanto 2,5 nanogramas por quilograma de peso já podem ser letais. 263

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ciência respiratória. Os espasmos são ocasionados por estímulos de menor ou maior intensidade, como sons, luminosidade, toque ou injeções. A rigidez de nuca está relacionada com maior índice de mortalidade8. O paciente apresenta febre baixa ou ausente, sem rebaixamento do nível de consciência, o que é importante quando se levam em conta os diagnósticos diferenciais.

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riodontite, osteomielite de mandíbula. h) Doença do soro – o trismo é devido à artrite têmporo-mandibular. Há lesões de pele maculopapulares, disfunção renal e artrites. Exames complementares Não há necessidade de confirmação laboratorial com isolamento do micro-organismo, pois o diagnóstico é baseado em clínica e epidemiologia. Os exames laboratoriais podem ajudar no acompanhamento das complicações renais ou respiratórias. Pode haver alteração do hemograma na vigência de infecção associada, mas habitualmente é normal. Radiografias de tórax e coluna são úteis para exclusão de fraturas e pneumonias. Caso haja infecção secundária, hemocultura e culturas de secreção e urina, estão indicadas.

Diagnóstico diferencial a) Intoxicação por estricnina – não há trismo e hipertonia generalizada durante os intervalos dos espasmos. b) Meningites – nestas condições, a febre é alta desde o início do quadro. Sinais de irritação medular presente (Kernig e Brudzinsky), cefaléia e vômitos. c) Tetania – espasmos de extremidades, sinal de Trousseau e Chvostek, hipocalcemia. d) Raiva – trauma que envolve animais (arranhaduras, mordeduras). Também não há trismos. Presença de convulsão, com alteração do comportamento. e) Histeria – ausência de ferimentos. Desaparecimento dos sintomas quando o paciente se distrai. f ) Intoxicação por metoclopramida ou neurolépticos – história de ingestão dos medicamentos, ausência de ferimentos. Também pode levar a trismos. g) Processos infecciosos de boca e faringe – abscessos dentários, pe-

Prevenção e Tratamento Prevenção O tétano é uma doença que se previne através da vacinação. Definese uma pessoa como adequadamente vacinada aquela que tomou três doses do toxóide tetânico (DPT, DT, dT, TT), tendo sido a última dose há menos de dez anos. Recomenda-se a vacinação desde a infância. Nesta faixa etária, a recomendação do Ministério da Saúde é que sejam dadas três doses no primeiro ano de vida e reforços aos 15 meses, 4 e 6 anos de idade. No Brasil, para os menores de 12 meses, a vacina tetravalente é a recomendada 264

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Tabela 1. Esquema e orientações para vacinação. Fonte MS.

Tabela 2. Esquema de condutas profiláticas de acordo com o tipo de ferimento e situação vacinal. Fonte: MS.

(difteria, tétano, coqueluche e Haemophilus influenzae tipo b). A vacina dT (conhecida como dupla adulto, composta por associação de toxóide diftérico e tetânico), quando conservadas em condições ideais, tem uma eficácia de quase 100%. O esquema de vacinação do Ministério da Saúde

é demonstrado na tabela 12. São considerados ferimentos com risco mínimo de tétano os ferimentos superficiais, limpos, sem corpos estranhos ou tecidos desvitalizados. Nos ferimentos com alto risco de tétano incluem-se os ferimentos profundos ou superficiais sujos; com corpos es265

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tranhos ou tecidos desvitalizados; queimaduras; feridas puntiformes ou por armas brancas e de fogo; mordeduras; politraumatismos e fraturas expostas. O esquema de prevenção frente a cada tipo de ferimento é descrito na tabela 22. Tratamento Todos os pacientes que serão tratados por tétano acidental devem ser internados. Em casos mais graves, unidades de terapia intensiva estão indicadas. A equipe multidisciplinar deve ter experiência e ser bem treinada. Os cuidados com a ferida não devem ser negligenciados. Deve-se realizar desbridamento de todos os tecidos

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necróticos, drenagem de hematomas e diminuição de espaços mortos. Recomenda-se sedar os pacientes com benzodiazepínicos como midazolan, diazepam ou clorpromazina. A imunoglobulina humana antitetânica (IGHAT) é usada para neutralização da toxina tetânica. No Brasil a apresentação é intramuscular e deve ser administrada em dois grupos musculares diferentes, como glúteos, vasto lateral da coxa ou deltoide. Na falta da (IGHAT), deve-se administrar o soro antitetânico (SAT), este disponível tanto intramuscular quanto endovenoso (tabela 3)2. Para erradicação do Clostridium

Tabela 3. Recomendação para uso profilático do soro antitetânico. Fonte: MS.

Tabela 4. Recomendação para uso do antibiótico. Fonte: MS.

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tetani, a medicação de escolha é a penicilina G cristalina, tendo-se como opção o metronidazol (tabela 4)2.

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mesma forma, deve-se, dependendo das características da lesão, orientar o paciente e prescrever a profilaxia antitetânica. Frente a ferimentos com alto risco de tétano, como fraturas expostas, mordeduras, ferimentos por armas brancas ou de fogo, independentemente da ocasião e local do atendimento, é de fundamental importância a atenção do médico assistente na prevenção do tétano acidental.

Conclusão Cirurgiões ortopedistas frequentemente se deparam com lesões de pele, associadas ou não a fraturas. Na prática clínica diária, particularmente em serviços de emergência, é papel do ortopedista investigar ativamente se o paciente possui história de vacinação contra tétano acidental. Da

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Rouquairol MZ, Almeida Filho N. Epidemiologia e Saúde. 6ª edição, Medsi Editora Médica e Científica Ltda, Rio de Janeiro, 2003. 2. Ministério da Saúde. Guia Brasileiro de Vigilância Epidemiológica. Brasília, p. 17-26, 2009. 3. Sistema Único de Saúde. Banco de dados DATASUS. Série histórica de casos de doença de notificação compulsória por unidade federada (1980-2003) HTTP://portalweb02.saude.gov.br/ portal/sus/visualizar_texto.cfm? Acesso em 16 mar 2011. 4. Lima VM, Garcia MT, Resende MR, Nouer AS, Campos EO, Papaiordanou PM, da Silva LJ. Accidental tetanus: clínical and epidemiological profile of inpatients at a university hospital. Ver Saúde Publica. 1998; 32(2):166-71. 5. Feijão AR, Brito DM, Peres DA, Galvão MTG. Tétano acidental no Estado do Ceará, entre 2002 e 2005. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical. 2007;40(4):426-430. 6. Pagliuca LM, Feitoza AR, Feijão AR. Tetanus in the geriatric population: is it a collective heath problem? Rev Lat Am Enfermagem. 2001;9(6):69-75. 7. Zillioto Jr A. Infecção em cirurgia de emergências e trauma: prevenção, dignóstico e tratamento. Cirurgia de Urgência e Trauma. 2007; 40(3):329-34. 8. Greco JB, Tavares-Neto J, Greco Jr J, Accidental tetanus: prognosis evaluation in a historical series at a hospital in Salvador, Bahia. Revista do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo. 2003; 45:35-40. 267

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Síndrome compartimental Luciano Ruiz Torres

Introdução Dentre as urgências ortopédicas, a Síndrome Compartimental (SC) é talvez aquela que possa ser negligenciada pelo especialista em ortopedia com maior frequência. Associada a trauma, infecção, queimaduras, acidentes com animal peçonhento e lesão vascular com frequência sem perda da perfusão; pensar na sua possibilidade é a forma mais segura de se evitar atraso ou erro no diagnóstico. É definida como um complexo de sintomas causado pela pressão tecidual elevada dentro de um compartimento ósteo-fascial fechado, que interfere na circulação para os músculos e nervos situados nesse compartimento. Tem importância porque o atraso no diagnóstico e na instauração do tratamento (fasciotomia) leva a resultados ruins podendo chegar a uma contratura isquêmica de Volkmann e amputação do membro. E como não bastasse o prejuízo ao paciente, vale lembrar que é uma das causas mais comuns de processos contra médicos nos EUA 1. Templeman em 1993 demonstra que o valor médio da indenização judicial por uma SC não diagnosticada (“malpractice awar“) é de aproximadamente $280,000.

e a pele são tecidos extensíveis, contudo a partir de determinado momento inelásticos a um maior volume intra-compartimental solicitado. A partir de um evento que determina lesão tecidual (fratura/queimadura) temos hemorragia, subsequente edema e pressão tecidual aumentada. Esta pressão aumentada determina diminuição de drenagem linfática e venosa, alimentando mais o edema. Determinado momento, a pressão dentro do compartimento impede que as perfurantes e arteríolas perfundam o músculo. Vale ressaltar que toda esta cascata de eventos pode ocorrer com manutenção de pulso e perfusão distal do membro. O ciclo vicioso se retro-alimenta e o dano pode ser completo. Uma vez instalada, somente a fasciotomia pode tratar a SC. Sintomatologia e exame físico Dor ao estiramento passivo dos músculos daquele compartimento é o sintoma mais fidedigno. Se a suspeita está em compartimento anterior do antebraço após redução de uma fratura supra, a manobra pesquisada é a extensão do punho e dedos. Se for uma fratura exposta de tíbia com acometimento maior do compartimento anterior da perna, flexão plantar passiva deve ser realizado no tornozelo.

Fisiopatologia É importante lembrar que a fáscia 268

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Em um esmagamento de mão numa criança, adução e abdução passiva dos dedos e extensão-abdução do polegar devem ser pesquisadas respectivamente para compartimentos interósseos e tenar. A dor é desproporcional, tem início abrupto muitas vezes horas após o trauma. A palpação do compartimento pode demonstrar tensão excessiva. Palidez, parestesia, poiquilotermia, paresia podem estar presentes 2. Uma vez que a obstrução arterial é tardia e incomum, a ausência do pulso não é um sinal fundamental no momento adequado para se fazer o diagnóstico. Todavia, indica gravidade e possibilidade de lesão vascular associada. Embora ultrassonografia possa demonstrar tensão fascial e cintilografia baixa perfusão muscular, não há espaço nem tempo para diagnóstico radiológico em síndrome compartimental.

fratura e tensão na musculatura que inicia dor com estiramento passivo para se fazer a fasciotomia. O método de Whitesides 3, talvez o mais mencionado pelos antigos quando o assunto é SC, em estudos bem controlados 4 carece da precisão necessária para uso clínico. Como ponta do transdutor, agulha simples tem risco de obstrução pelo músculo e aferição inadequada. Recomendase uso de cateter com abertura lateral, ou com ponta em pavio (wick) ou o cateter fendido (slit) de Rorabeck 5. O manômetro de linha arterial, aquele utilizado pelos anestesistas para medir PAM é bastante preciso. Os aparelhos comercializados pela Stryker ® (STIC) e Synthess ® (ETTC) são também bastante precisos. Este tipo de aparato acredita-se esteja ausente em quase 100% dos pronto-socorros de ortopedia do país e definitivamente não é essencial.

Métodos invasivos A primeira coisa a se dizer quando nos referimos aos métodos invasivos é que o diagnóstico da SC é clínico e não há necessidade deles para indicação e realização de uma fasciotomia. Seu uso é relegado somente para pacientes em coma ou não cooperativos, com dificuldades de comunicação como estrangeiros, pacientes com lesão nervosa grave, como plexo braquial total com suspeita de SC na parte distal do membro. Não há necessidade de se medir a pressão dentro do compartimento em um paciente com uma

Tratamento Músculos toleram bem até 4 horas de isquemia. Por volta de 6 horas o resultado é incerto. Após 8 horas, o dano é irreversível 3. A fasciotomia é o tratamento da SC e deve ser feita imediatamente após diagnóstico. O uso do garrote pneumático é filosoficamente errado porque mais isquemia piorará o quadro, porém deixá-lo posicionado na raiz do membro é útil nos casos em que se identifica lesão vascular concomitante. Deve ser feita dermatofasciotomia, ou seja, seccionar pele e fáscia, a incisão deve ser ampla com quebras 269

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da cicatriz e fáscias dos compartimentos mais profundos devem ser exploradas. As formas preferidas pelo autor para antebraço e mão, perna e tornozelo e pé estão discriminadas nas figuras abaixo:

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Figura 2

Figura 1 Adotamos a técnica de Mubarak com 2 incisões: A ântero-lateral libera compartimentos anterior e lateral. A pósteromedial libera os compartimento posteriores superficial e profundo. A facilidade técnica sobrepões técnicas de uma incisão como a fibulectomia e a parafibular.

Figura 3

Embora não contenha formalmente músculos, a abertura do ligamento transverso do carpo é mandatória na SC de mão, através desta incisão volar se acessa também a fáscia que recobre os compartimentos tenar e hipotenar. A confecção de cortes adicionais para estes(técnica de 5 incisões) nos parecem desnecessário. No dorso incisão longitudinal sobre 2o e 4o metacarpianos permite acessar os compartimentos interósseos, lateralmente e medialmente aos tendões extensores. O prolongamento volar para o antebraço proximal segue a linha de S suaves quebrando na prega palmar do punho buscando fornecer acesso a artéria ulnar e se prolongando para o braço os vasos braquiais. Modificações podem e devem ser adotadas a depender da onde se presuma uma lesão vascular eventual.

Talvez se encontre, no tornozelo e pé, a maior controvérsia para incisões. A semelhança do túnel do carpo, é importante abrir na face anterior do tornozelo os ligamentos do retináculo extensor. Embora demonstrado por Myerson que somente incisões dorsais sobre 2o e 4o metacarpiano ou no cavo sobre a transição da pele plantar com dorsal permitem a liberação de todos compartimentos do pé. Todavia, a associação de ambas técnicas como proposto por Strauch, reduz a tensão circular cutânea e evita o aprofundamento demasiado sobre cada uma delas.

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Dicas yy Retire a imobilização gessada. Esta é a única medida conservadora efetiva para se evitar a completa instalação de uma SC incipiente. Não há espaço para elevação, gelo e corticóide, o único tratamento eficaz é a fasciotomia 9. yy Em cirurgia geral existe o termo Apendicectomia “Branca“, ou seja, para o Serviço estar diagnosticando adequadamente todos pacientes, em torno de 10 % dos pacientes operados devem apresentar apêndice saudável a exploração cirúrgica. Não é opinião do autor que se deva fazer uma fasciotomia sem a devida necessidade, contudo, vale lembrar que nem toda seqüela de uma Síndrome compartimental será uma contratura isquêmica de Volkmann, mas danos funcionais e perda de força muscular definitiva do membro são complicações graves. A cicatriz cutânea deve ser encarada como uma complicação bem menor que qualquer disfunção do membro. Conversar com o doente e família sobre o procedimento adotado sempre que for possível. yy Muita atenção com as fraturas do pilão, calcâneo e do pé. yy A fasciotomia passou pela sua cabeça... Faça-a! Alguém da equipe sugeriu... Faça-a!

O tratamento subsequente da ferida pode incluir o fechamento primário tardio, enxerto de pele ou mesmo segunda intenção a depender da tensão muscular residual. Fisioterapia e terapia de mão são fundamentais para rápido deslizamento músculotendíneo, diminuição das aderências e tratamento da cicatriz. Armadilhas yy O ferimento da fratura exposta não descomprime os compartimentos! yy A incidência de Síndrome Compartimental do MI é de 6 % nas fraturas expostas de tíbia e 1,2 % nas fraturas fechadas 6. yy Após a manipulação de fratura desviada, a criança não sentirá dor. A maioria das crianças fica confortável logo após o término da redução. As que precisam de analgesia freqüente ou se queixam de muita dor devem ser examinadas minuciosamente 7. yy A confecção de fasciotomias percutâneas ou endoscópicas não são procedimentos mais elegantes, nem tão pouco evolução das “fasciotomias de pele“. Havig 8 demonstrou que fasciotomia endoscópica isolada não retorna as pressões do compartimento aos valores normais. O estudo concluiu que “dermatomias“ são necessárias para descomprimir completamente os compartimentos. 271

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Em Volpon JB. Síndrome Compartimental . Editores Herbert S, Xavier, Barros F° . 3ª edição 2. Bourne RB, Rorabeck CH. Compartment syndrome of the lower leg. Clin Orthop Rel Res 1989;240: 97-104 3. Griffths DLL. Volkmann´s ischemic contracture. Br j Surg 1940;28:239-60 4. Whitesides, Heckman. Acute Compartment Syndrome: update on diagnosis and treatment. J Am Acad Orthop Surg1996; 4: 209 -218 5. Boody AR, Wongworawat MD. Accuracy in the measurement of compartment pressures: A comparison of three commonly used devices. J Bone Joint Surg 2005; 87:2415-22 6. Rorabeck CH . A practical approach to compartment syndromes. Part III. Management . In Evarts CM ( editor ): American Academy of Orthopedic Surgeons Instructional Course Lectures , Vol 32, St Louis CV Mosby, pages 88-113, 1983 7. Delee JC, Stiehl JB. Open tibia fracture with compartment syndrome. Clin Orthop Rel Res 1981;160:175-84 8. Willis RB, Rorabeck CH. Treatment of compartment syndrome in children. Orthop Clin North Am 1990;21:401-12 9. Havig MT, Leversedge FJ, Seiler JG 3rd. Forearm compartment pressures: an in vitro analysis of open and endoscopic assisted fasciotomy. J Hand Surg 1999;24A:1289-97 10. Rowland SA: Fasciotomy: The treatment of compartment syndrome. In Green DP,Hotchkiss RN, Pederson WC (eds): Green’s Operative Hand Surgery, 4th ed. NewYork, Churchill Livingstone, 1999, pp 689–710.

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Gangrena gasosa Renato Cesar Raad Eduardo Murilo Novak

Gangrena gasosa é a morte tecidual em decorrência de infecção bacteriana que pode levar à morte. Geralmente a bactéria responsável pela infecção é o Clostridium perfringens. Entretanto, outros agentes podem ser responsáveis, como Staphylococcus aureus, Vibrio vulnificus, Clostridium septicum, Clostridium sporogenes, Clostridium novyi, Clostridium fallax, Clostridium histolyticum e Clostridium tertium.

pois é responsável pela destruição das células por meio da hidrólise de componentes da membrana celular, causando a lise de eritrócitos, leucócitos, plaquetas, fibroblastos, células e músculos. A contaminação com esporos de clostrídios nas lesões pós-traumáticas ou pós-operatória estabelece a fase inicial da infecção. As condições locais da ferida são mais importantes que o grau de contaminação no desenvolvimento de gangrena gasosa, visto que feridas extensas ou tecido necrosado fornecem as condições ideais para a a germinação dos esporos. A presença de corpos estranhos, uma sutura prematura de ferida ou a presença de músculos desvitalizados também contribuem para a germinação de esporos. O período de incubação típico de gangrena gasosa é curto, geralmente menos de 24h, mas períodos de incubação de uma hora a seis semanas têm sido relatados. Conforme ocorre a progressão da necrose muscular e da gordura da tela subcutânea, progride também a trombose dos vasos sanguíneos, aumentando o edema e comprometendo ainda mais o fornecimento de sangue para a região. Uma infecção rapidamente pro-

FISIOPATOLOGIA O modo de contaminação pode ser pela via traumática, atraumática, ou até mesmo ocorrer em feridas cirúrgicas. Os casos decorrentes de trauma são os mais frequentes. Os atraumáticos geralmente ocorrem em pacientes com problemas vasculares, como os decorrentes de diabetes ou aterosclerose. A bactéria causadora da gangrena gasosa produz gás, quando está se reproduzindo. Se o tecido em que estiver ocorrendo essa proliferação for pouco oxigenado, então haverá a produção de exotoxinas. O Clostridium perfringens produz pelo menos 20 dessas toxinas. O papel preciso destas particulas tóxicas na patogênese da gangrena gasosa não é claro, porém a toxina alfa é de extrema importância, 273

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gressiva pode rapidamente resultar em choque. O mecanismo de choque não está bem determinado, mas a hipótese plausível é de que as toxinas podem gerar mediadores químicos responsáveis por alterações cardíacas.

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o ruído característico semelhante ao ato de pressionar bolhas (enfisema subcutâneo). A febre de baixo grau pode se fazer presente. A pele caracteristicamente se transforma em uma cor de bronze. Na evolução, progride para uma cor azul-escura com flictenas serosas e hemorrágicas. A crepitação torna-se presente em decorrência da produção gasosa ou edema muscular, apresentando muitas vezes uma dor desproporcional às lesões aparentes Na sequência, conforme evolui a enfermidade, pode aparecer hipotensão, taquicardia, insuficiência renal, bem como alteração do estado mental

EPIDEMIOLOGIA Nos EUA ocorrem cerca de 3000 casos por ano. Estudos mostram que usuários de drogas injetáveis graves infecções clostridial (C. novyi perfringens, por exemplo), complicada por uma alta taxa de mortalidade (97%). A maioria desses pacientes relatou injetar heroína por via intramuscular. As taxas de mortalidade variam amplamente, com uma taxa ao redor de 25% na maioria dos estudos. A taxa de mortalidade se aproxima de 100% em indivíduos com gangrena gasosa espontânea e naqueles nos quais o tratamento é retardado. Nao existe predileção quanto ao sexo. Embora a idade não seja um fator prognóstico, indivíduos com idade avançada e comorbidades correspondem a um maior risco de mortalidade

Figura 1

DIAGNÓSTICO Alem das características clínicas mencionadas, outros exames laboratoriais e de imagem podem ser solicitados. Pode ocorrer rápido desenvolvimento de anemia hemolítica, com um aumento da LDH. Pode não ocorrer leucocitose, no entanto pacientes com síndrome do choque tóxico de-

EVOLUÇÃO CLÍNICA O início repentino da dor é normalmente o primeiro sintoma. Também sinais inflamatórios no local e edema geralmente surgem a seguir, juntamente com a presença de gases ao se comprimir o local, o que produz 274

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do tratamento da gangrena gasosa. É absolutamente não recomendável permanecer aguardando resultados de exames laboratoriais para só então intervir cirurgicamente. A indicação cirúrgica é primordialmente feita com base na clínica, e secundariamente laboratorial. Historicamente, a penicilina G na dose de 10-24 milhões U / dia foi a droga de escolha. Atualmente, a associação de penicilina e clindamicina é amplamente usada. Estudos recentes mostram que os inibidores da síntese de proteínas (por exemplo, a clindamicina, cloranfenicol, rifampicina, tetraciclina) podem ser mais eficazes, porque inibem a síntese de exotoxinas. Uma combinação de clindamicina e metronidazol é uma opção recomendável para pacientes alérgicos à penicilina. Como outras bactérias são freqüentemente encontradas nas culturas doa tecidos, ampla cobertura antimicrobiana adicional é indicada. O uso da oxigenoterapia hiperbárica adjuvante pode estar indicada, mas sempre acompanhado dos desbridamentos cirúrgicos necessários e da antibioticoterapia adequada, colaborando para reduzir o alto índice de mortalidade Descompressão de compartimentos (fasciotomia) para tratamento da síndrome compartimental pode ser necessária e não deve ser postergada nos pacientes com acometimento de extremidade. Deve-se acompanhar atentamente a evolução da lesão. Se necessário, in-

vido podem mostrar leucocitose e hemoconcentração em níveis extremos. Menos de 1% das culturas de sangue apresentam crescimento de clostrídeos. Também podem ocorrer acidose metabólica e insuficiência renal. A radiografia pode ajudar a delinear o padrão típico de difusão do gás nas partes moles, circundando os tecidos (figura). Contudo, não é patognomônico da lesão, e sua ausência não exclui o diagnóstico. Muitas vezes a TAC/RNM é útil e auxilia no diagnóstico. Figura 2

A exploração cirurgica confirma o diagnóstico de mionecrose. O músculo afetado apresenta-se pálido e não apresenta contratilidade. Os achados histopatológicos incluem mionecrose generalizada, destruição de outros tecidos conjuntivos, e uma escassez de neutrófilos na zona infectada. Agregados de leucócitos são encontrados nas regiões periféricas. TRATAMENTO A remoção cirúrgica imediata da lesao é mandatória. A combinação de debridamento cirúrgico agressivo e terapia antibiótica eficaz é o fator determinante para o sucesso 275

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gústia respiratória, choque e óbito.

dica-se debridamento diário, a fim de remover todo o tecido necrosado. A amputação da extremidade pode ser necessária.

CONCLUSÃO A gangrena gasosa em decorrência de infecção por clostrídeo demanda intervenção rápida, objetiva e agressiva. A falha em fornecer um diagnóstico precoce, a indicação tardia de uma cirurgia ou um procedimento cirúrgico inadequado são os erros mais comuns na condução dos casos de gangrena gasosa. Esses fatores terminarão por ditar o resultado final. Quanto antes houver a intervenção médica apropriada, melhor o prognóstico do paciente.

COMPLICAÇÕES Pode ocorrer hemólise maciça, o que pode exigir transfusões sanguíneas repetidas. Também, se houver coagulação intravascular disseminada (CIVD), poderá haver hemorragias graves, o que dificulta o desbridamento cirúrgico agressivo. Além disso, pode-se desenvolver insuficiência renal aguda, síndrome da an-

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Lima, Edgard de Barros; Bernardes, Carlos Henrique A; Martins, Antônio Carlos Giometti; Marcondes, Carla M. O papel da oxigenoterapia hiperbárica no tratamento da gangrena gasosa clostridiana e da fasciite necrotizante / The role of hyperbaric oxygen therapy in the treatment of clostridial gas gangrene and necrotizing fasciitis. J. vasc. bras;2(3):220-224, set. 2003. 2. Treatment Outcome of Nonclostridial Gas Gangrene at a Level 1 Trauma Center. Takahira, Naonobu*; Shindo, Masateru*; Tanaka, Keiji*; Soma, Kazui*; Ohwada, Takashi*; Itoman, Moritoshi 3. Prevention and Treatment of Gas Gangrene - JAMA. William A. Altemeier, MD; William D. Fullen, MD 4. Journal of Trauma-Injury Infection & Critical Care: November 1983 - Volume 23 - Issue 11 > Gas Gangrene: I. A Collective Review 5. Orthop Rev. 1990 Apr;19(4):333-41. Gas gangrene. A review. Present DA, Meislin R, Shaffer B. Department of Orthopaedic Surgery, Hospital for Joint Diseases, New York, New York 6. Postgrad Med. 1996 Apr;99(4):217-20, 224. Gas gangrene: potential for hyperbaric oxygen therapy. Stephens MB. Naval Hospital Bremerton, WA 98312, USA 276

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Novos conceitos no tratamento de fraturas em crianças Claúdio Santili Marina Juliana Pita Sassioto Silveira de Figueiredo

As fraturas nas crianças têm aumentado em quantidade e em gravidade nos últimos anos, devido principalmente à violência urbana e ao aumento da velocidade no trânsito. As características das fraturas nas crianças são diferentes das fraturas dos adultos especialmente pelas diferenças anatômicas em relação à presença da cartilagem epifiseal e, particularmente, quanto à vascularização. Os vasos não ultrapassam a fise e formam duas redes vasculares, uma epifisária, importante enquanto a fise está aberta, e outra metafisária, que permanecerá ativa na fase adulta. A fise possui quatro camadas (Figura 1), sendo que a mais susceptível ao trauma é a camada hipertrófica, devido à grande quantidade de matriz osteóide extracelular entre as células que estão com seu volume aumentado. Outra característica anatômica importante na criança é que o periósteo, por ser espesso e mais resistente, limita o desvio quando ocorre a fratura.

Figura 1. Características anatômicas da cartilagem da fise.

(In: Tachdjian’s Pediatric Orthopaedic, 7ª Edição, pág. 2359).

tos epifisários, as fraturas em galho verde, as deformidades plásticas e as fraturas por impacção (tórus ou toro). O diagnóstico é suspeitado pela anamnese, pelo histórico de trauma e pelo exame físico acurado, pois nem sempre as lesões são facilmente identificáveis em exames convencionais. O aumento de volume e a deformidade podem estar presentes.

Diagnóstico Quatro tipos de fraturas são características das crianças: os descolamen277

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Figura 2.

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Radiografias mostrando os tipos de fratura comuns na infância. A: Descolamento epifisário da extremidade distal do rádio; B: fratura em galho verde dos ossos do antebraço; C: deformidade plástica da ulna; D: tórus do rádio distal.

As fraturas em galho verde são as que frequentemente apresentam grande deformidade, e os fragmentos estão unidos por um periósteo íntegro na concavidade. Nos descolamentos epifisários, o mais comum é o aumento de volume, porém a deformidade pode ser mais característica (dorso de garfo) nos tipo II da classificação de Salter-Harris. Já as crianças com fraturas do tipo “tórus”, que ocorrem como um abaulamento na transição metaepifisária, apresentam dor local à palpação, leve aumento de volume e pouca ou nenhuma deformidade. As deformidades plásticas ocorrem pelas características biomecânicas do osso imaturo, que se deforma antes de quebrar, estando presente o encurvamento ósseo com

leve aumento de volume local. É mais frequente nos ossos do antebraço. Na maioria dos casos, a radiografia é suficiente para a confirmação diagnóstica, sempre em duas incidências e, eventualmente, acrescentar as projeções oblíquas quando houver suspeita de comprometimento articular. Classificação Existem várias classificações para os descolamentos epifisários (Poland, Bergenfeldt, Aitken, Peterson, Ogden, Rang), sendo a mais aceita e utilizada a de Salter-Harris, de 1963, classicamente com cinco tipos. Em 1969, Mercer Rang acrescentou o sexto tipo, descrevendo a lesão com avulsão do anel pericondral na Zona de Ranvier. 278

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Figura 3. Classificação de Salter-Harris.

(In: Tachdjian’s Pediatric Orthopaedic, 7ª Edição, pág. 2359).

Tratamento No antebraço, as fraturas sem desvio devem ser tratadas com imobilização gessada. Atualmente, para o tratamento das fraturas da extremidade distal dos ossos do antebraço, podem ser utilizados tanto os aparelhos gessados antebraquiopalmares como os axilopalmares, sem alteração significativa no resultado final. Assim como a manutenção do antebraço em supinação ou pronação, também pouca influência exercem nas fraturas diafisárias do antebraço. O mais importante é a confecção de um aparelho gessado bem moldado. Essa moldagem pode ser mensurada através da divisão da medida do diâmetro do contorno interno do gesso no foco da fratura na incidência de perfil pela mesma medida na incidência de frente. Esse índice de moldagem deve ser inferior a 0,7 para a obtenção de resultados satisfatórios. Aquelas com desvios inaceitáveis devem ser reduzidas e imobilizadas quando acometerem crianças de baixa idade (até 7 anos) ou fixadas com fios de Kirschner

ou hastes flexíveis nas crianças mais velhas. As manipulações para redução devem ser suaves e não devem ultrapassar três tentativas para evitar as lesões iatrogênicas. As manipulações ou o tratamento cirúrgico cruento são excepcionais após 7 a 10 dias do trauma, pois o risco de lesão da camada germinativa é maior que a possibilidade de uma osteotomia para a correção ulterior de uma deformidade residual que não remodelou. A remodelação da deformidade residual é maior nas crianças de menor idade e também nas fraturas com angulação mais próxima da fise (metáfisárias). No joelho, as lesões dos tipos II, com esporão de Thurston-Holland, III e IV de Salter-Harris, após a redução, devem ser fixadas com parafusos canulados paralelos à fise preferencialmente, ou com fios lisos cruzados na impossibilidade de serem utilizados os parafusos, pois frequentemente sofrem desvios quando tratadas com imobilizações gessadas. Nos tipos III e IV, exigem redução anatômica por se279

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rem articulares, além de objetivarem a restituição do alinhamento da placa de crescimento. As fraturas supracondilianas classificadas como Gartland II e III, devem ser reduzidas incruentamente e fixadas com fios de Kirschner, devido ao risco aumentado de perda de redução durante o seguimento. A orientação é que na necessidade de anestesia para a manipulação ou manutenção de flexão além de 90º, a fratura deve ser fixada percutaneamente. Somente as fraturas sem desvio (Gartland I) devem ser tratadas apenas com imobilizações gessadas. As fraturas em flexão, pela dificuldade na redução dos fragmentos, pode ser reduzida de forma cruenta no insucesso da redução fechada. A via de acesso é da preferência do cirurgião, lembrando que a via anterior é melhor indicada nos casos de lesão do nervo mediano e/ou da artéria braquial. As fraturas do colo do fêmur nas crianças merecem atenção especial, pois a grande maioria apresenta deslocamento entre os fragmentos e necessita de tratamento cirúrgico. Apenas as fraturas incompletas ou sem desvios, em crianças de baixa idade, devem ser tratadas com imobilizações gessadas imediatas. Nas crianças mais velhas, mesmo as fraturas sem desvio devem ser fixadas percutaneamente pela chance de deslocamento durante o seguimento. As fraturas com desvio devem ser manipuladas suavemente sob anestesia geral para

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a redução incruenta e fixação percutânea com parafuso canulado metafisário (sem atravessar a fise) e na falha deste método, redução cruenta e fixação dos fragmentos com parafusos ou fios de Steimann. As hastes intramedulares flexíveis de titânio e também mais recentemente as de aço revolucionaram o tratamento de algumas fraturas nas crianças. As fraturas diafisárias dos ossos do antebraço em crianças acima de 5 anos de idade também podem ter indicação de estabilização com hastes elásticas intramedulares após redução fechada, na dependência da estabilidade da fratura e do grau de lesão das partes moles. Os diâmetros utilizados são de 1,5mm a 2,5mm, com entrada pela metáfise distal do rádio, pelo olécrano da ulna ou preferencialmente, pela metáfise lateral da extremidade proximal da ulna. As fraturas diafisárias do fêmur, em crianças de 5 a 11 anos, podem ser tratadas com as hastes intramedulares elásticas. As limitações do método são as crianças com peso maior que 50Kg e fraturas com traços instáveis (oblíquos longos ou cominutivos). A redução normalmente é conseguida de forma incruenta e as fixações podem ser anterógradas e retrógradas, sendo estas últimas, as preferidas pela maior facilidade. Os pontos de entrada distais devem ser feitos 2 a 3cm proximalmente à cartilagem de crescimento e os pontos proximais, a cerca de 3cm do ápice 280

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mentos que acontecem nas fraturas do tipo III de Salter-Harris no joelho e no capítulo ou naquelas do tipo I da classificação de Delbet-Colonna com luxação da epífise femoral. Outras complicações são as infecções, as falhas na síntese e as síndromes compartimentais, mais comuns associadamente com as fraturas supracondilianas.

do trocanter maior. O tamanho da haste é calculado pelo produto entre o menor diâmetro da diáfise do fêmur multiplicado pelo fator 0,4. As hastes devem ser retiradas após a formação do calo ósseo e a vizibilização radiográfica da recanalização da medular óssea. A retirada precoce aumenta a chance de refratura. Complicações e Prognóstico As fraturas nas crianças podem levar a alterações no crescimento, gerando deformidades, tanto pela energia do trauma, como também pelo tratamento instituído. As principais complicações são deformidades angulares e déficit de crescimento pela formação de barra óssea. O tratamento dessa complicação irá depender da magnitude da deformidade e do estudo completo das condições de cada caso, seja de deformidade ou de discrepância do membro afetado. Pode ocorrer também a necrose da epífise por manipulações excessivas ou particularmente pelos desloca-

Síndrome de Silverman É importante no atendimento de qualquer criança com história de fratura, que o profissional esteja atento para a compatibilidade e coerência entre a lesão e o trauma. Ainda é comum a lesão por espancamento ou abuso físico infantil, popularizada por Silverman em 1953. Quase 80% dos casos envolvem crianças menores de três anos. O diagnóstico é suspeitado pela constatação de fraturas em vários estágios de consolidação, comprometendo múltiplos ossos, associadas com outras lesões, especialmente com queimaduras na pele.

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Beaty JH, Kasser JR. Rockwood and Wilkins Fractures in Children. Lippincott Williams & Wilkins. 7ª Edição. 2010. 1057 p. 2. Herring JA. Tachdijian’s pediatric Orthopaedic. 4ª Edição. Sauders Elsevier. 2008. 2787 p. 3. 3. Salter RB, Harris WR. Injuries involving the epiphyseal plate. J Bone Joint Surg Am 1963;45:587–622. 4. Webb GR, Galpin RD, Armstrong DG. Comparison of short and long arm plaster casts for displaced fractures in the distal third of the forearm in children. J Bone Joint Surg Am 2006;88:9-17. 5. Santili C, Akkari M, Waisberg G, Camargo AA, Nogueira FP, Prado JCL. Haste flexível de titânio na fratura de fêmur na criança. Rev Bras Ortop 2002;37(5):176-81. 6. Santili C, Waisberg G, Akkari M, Mota RMV, Leite LMB, Prado JCL. Fraturas do terço distal do rádio na criança. Rev Bras Ortop 1999;34(1):9-13. 7. Bergamaschi JPM, Alcântara T, Santili C, Braga SR, Waisberg G, Akkari M. Análise de fraturas diafisárias do fêmur em crianças menores de 3 anos de idade. Acta Ortop Bras 2007;15:72-5. 8. Waisberg G, Santili C, Soni JF . Fraturas dos ossos do antebraço na criança. In: Hebert S, Barros Filho TEP, Xavier R, Pardini Junior AG e col. Ortopedia e Traumatologia: Princípios e Prática. 4ª ed. Porto Alegre: Artmed Editora S.A., 2009;51, p. 1174-80.

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Criança politraumatizada Rui Maciel de Godoy Junior

Politraumatismo é um conjunto de lesões traumáticas simultâneas, que podem acometer diversas regiões, sistemas ou órgãos. Além disso, pelo menos uma dessas lesões coloca a vida em risco. Os traumatismos são responsáveis pelo maior número de mortes em crianças acima de um ano de idade. Quando abordamos o assunto trauma em criança, devemos diferenciar o acidente da violência. O acidente não é intencional. A violência contra a criança apresenta aspectos característicos, às vezes não detectados se o ortopedista não estiver alerta para esse diagnóstico. As crianças vítimas de violência frequentemente são atendidas por ortopedistas. Ressaltamos que nos casos em que o diagnóstico não é realizado, em geral ocorrem novas agressões contra a criança e os casos mais graves podem até terminar em óbito. As regiões anatômicas mais atingidas pelos traumatismos nas crianças são: o membro superior (34%); o crânio (32%); tórax e abdome (16%) e membro inferior (14%). As principais causas de traumatismos em crianças são: quedas (26%); atropelamentos (23%) e a violência com (5%). As causas de óbito mais comuns são: o trauma crânio-encefálico (61%);

trauma hepático (14%); trauma vascular (8%) e outros (17%). Algumas dessas mortes são inevitáveis devido à gravidade dos ferimentos, mas grande parte pode ser evitada com tratamento adequado. Os óbitos relacionados aos politraumatismos têm uma distribuição trimodal. Os que ocorrem na primeira hora, os que ocorrem nas primeiras quatro horas e os que ocorrem dias ou semanas após o trauma. Na primeira hora após o trauma ocorrem as mortes por lacerações do cérebro, do tronco cerebral, da medula, do coração e dos grandes vasos. Em geral são traumas muito graves, a criança não chega a ser removida para o ambiente hospitalar e a morte é inevitável. Nas primeiras quatro horas ocorrem as mortes por hemorragias graves no sistema respiratório, nos órgãos abdominais e no sistema nervoso central. Essas lesões são quase sempre passíveis de tratamento e o óbito evitável desde que seja realizado um atendimento adequado desde o local do acidente até o ambiente hospitalar. Os óbitos que ocorrem dias ou semanas após o trauma em geral são provocados por infecções e falência múltipla de órgãos. O atendimento a toda criança politraumatizada deve ser multidisciplinar 283

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e começar no local do trauma, passando pelo transporte da criança até o ambiente hospitalar. As lesões do sistema músculo-esquelético, em geral, não são as que provocam a morte, entretanto todos os médicos que atendem vítimas de politraumatismos devem estar familiarizados com as peculiaridades deste atendimento. Os princípios de tratamento são os do ATLS (Advanced Trauma Life Support). As crianças possuem uma série de características anatômicas e fisiológicas que as diferenciam dos adultos. Essas devem ser consideradas no atendimento em caso de politraumatismo, pois elas determinam uma resposta ao trauma diferente da dos adultos. As lesões mais frequentes nas crianças ocorrem na cabeça e nas vísceras. A cabeça da criança é relativamente grande em relação ao tronco, sendo o local que é acometido em primeiro durante os traumas de alta energia. As lesões viscerais ocorrem com maior frequência, porque a musculatura abdominal é mais frágil e o tecido subcutâneo mais fino. Os ossos têm uma flexibilidade maior e grande capacidade de absorver os impactos. As fraturas de costelas e do esterno são raras. As fraturas de bacia ocorrem nos traumas de alta energia. Lembrar que mesmo as fraturas sem desvio da bacia, são consequência de traumas de alta energia e não devem ser subestimadas. A criança em geral não apresenta

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doenças pré-existentes e têm uma grande reserva cárdio-pulmonar. Uma hipovolemia pode ocorrer sem alteração da pressão arterial. A taquicardia pode ser o primeiro sinal de hipovolemia, antes mesmo da queda da pressão arterial. A hipotermia pode se instalar após o politrauma de maneira rápida nas crianças. Isso ocorre devido à grande superfície corporal das crianças em comparação com a sua massa corpórea. O atendimento da criança politraumatizada deve começar pelo “ABC...” do ATLS. A – Vias aéreas: A manutenção das vias aéreas pérvias deve ser realizada com cuidado, evitando-se manipulações intempestivas da coluna cervical. Até que uma lesão cervical seja afastada, o atendimento da criança deve ser realizado como se houvesse realmente uma lesão. Preconiza-se a utilização de colar cervical até que uma eventual lesão cervical tenha sido descartada. A coluna cervical da criança tem maior mobilidade do que a do adulto. Pode ocorrer uma lesão medular mesmo sem que haja uma fratura ou luxação associada. Essa lesão é conhecida como “SCIWORA” do inglês ( Spinal Cord Injury WithOut Radiographic Abnormality), ou seja, lesão da medula espinal sem correspondente alteração radiográfica. As diferenças anatômicas entre as crianças e os adultos tornam muitas vezes difícil a manutenção de vias aéreas permeáveis. A cavidade oral 284

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é pequena, a língua é grande e o ângulo da mandíbula é maior. Lembrar que o tamanho relativamente grande da cabeça faz com que a criança deitada na maca do resgate ou no pronto atendimento, fique com a coluna cervical em flexão. Essa posição dificulta a permeabilidade das vias aéreas e uma eventual intubação. A posição de flexão da coluna cervical pode ser corrigida com macas apropriadas para a criança onde há uma depressão para acomodar a cabeça ou então, colocando-se um coxim na região dorsal. Para manter as vias aéreas desobstruídas, deve-se retirar corpos estranhos da boca e da orofaringe, tais como: comida, sangue, muco, pedaços de dente, vômito etc. A colocação de uma sonda naso-gástrica previne aspiração de restos alimentares. A intubação pode ser necessária quando a criança estiver com a consciência rebaixada. Após o item “A” prossegue-se com o item “B” (breathing) avaliando-se a respiração do paciente. Verifica-se a expansibilidade dos pulmões, afastando e/ou tratando eventuais hemo/pneumotórax. O item “C” vem a seguir, com a avaliação da circulação. Lembrar mais uma vez nesse item que a criança pode manter uma pressão arterial normal mesmo na presença de perda sanguínea significativa. A taquicardia em geral é o primeiro sinal de perda sanguínea. As hemorragias que podem levar a criança ao óbito em geral

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provêm de vísceras sólidas. Hemorragias com risco de vida devido à fratura de bacia ou fraturas de extremidades são raras na criança. Enquanto realizamos os itens “A, B e C”, deve-se também obter um bom acesso venoso. A reposição de fluidos é importante e deve ser iniciada assim que possível. Lembrar que as crianças têm uma grande reserva cárdio-pulmonar e as eventuais perdas sanguíneas podem ocorrer sem uma correspondente queda da pressão arterial. O primeiro sinal da perda sanguínea, em geral, é a taquicardia. No caso de taquicardia pode-se começar com a infusão de cristalóides na dosagem de 20 ml/kg. O total de sangue circulante em uma criança é de aproximadamente 80 ml/kg. Quando sabemos a idade, mas não o peso da criança, podemos usar a fórmula: peso em quilos = o dobro da idade (em anos) mais 8. Por exemplo: uma criança de 4 anos deverá pesar aproximadamente, 8 + 8 = 16 Kg. Se após a administração de cristalóides houver persistência de sinais de hipovolemia pode-se repetir a dose e se necessário continuar a reposição volêmica com sangue e/ou concentrado de hemácias. Uma sondagem vesical de demora deve ser realizada para a monitorização da diurese. A seqüência “A, B e C” é completada com uma história clínica curta e objetiva, onde constem o tipo de acidente, os antecedentes, eventuais alergias, as medicações em uso e os 285

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tratamentos efetuados antes de chegar ao hospital. Passa-se então aos itens “D” e “E”. No item “D” faz-se a avaliação neurológica através da escala de coma de Glasgow. A monitorização do paciente deve ser contínua e qualquer piora dos sinais vitais ou neurológicos deve ser prontamente atendida. Pode ser necessária a avaliação urgente do neurocirurgião ou do cirurgião de trauma. A complementação da avaliação pode requerer a realização de exames complementares como: Tomografia de crânio, radiografias do tórax, da bacia e da coluna cervical. No item “E” é realizada a exposição completa do paciente à procura de eventuais lesões do sistema músculoesquelético. O ortopedista deve ser extremamente cuidadoso para realizar uma avaliação completa. Se necessário deve realizar a avaliação por mais de uma vez para se assegurar que não haja lesões não diagnosticadas. Essa avaliação deve prosseguir nas primeiras 24 a 48 horas, sempre no sentido de não se deixar lesão sem diagnóstico. Diferentemente do adulto a criança politraumatizada não necessita de mobilização precoce, entretanto o tratamento ortopédico deve visar o melhor para a criança e facilitar dentro do possível, o atendimento dos demais membros da equipe multidisciplinar. Os dois maiores erros que se pode cometer ao tratar uma criança politraumatizada são:

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1 – Pensar que uma fratura de um osso longo é uma lesão isolada. Procurar sempre outras lesões realizando o exame minuciosamente e se necessário por mais de uma vez. Solicitar avaliação do cirurgião de trauma e do neuro-cirurgião, sempre que a criança tiver sofrido um trauma de alta energia. 2 – Achar que o paciente tem uma lesão grave sem chance de sobreviver. Sempre devemos tratar uma criança da maneira mais completa possível, mesmo aquelas com trauma craniano muito grave. Lembrar que a criança possui um alto grau de recuperação e mesmo os casos mais graves podem nos surpreender favoravelmente. Finalmente, acreditamos que o pensamento da comunidade médica e ortopédica em especial deve ser no sentido da prevenção. Nos países desenvolvidos cada vez mais ocorrem menos acidentes. Isso ainda não é a realidade nos países em desenvolvimento como o Brasil. A SBOT(Sociedade Brasileira de Ortopedia e Traumatologia) através de suas Regionais e de seus comitês tem efetuado várias campanhas educativas de prevenção de acidentes. Essa também é uma preocupação constante da SBOP(Sociedade Brasileira de Ortopedia Pediátrica). A sociedade civil e outras sociedades médicas como a de Pediatria também acolhem essa ideia realizando diversas campanhas educativas e de 286

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informação à população leiga. Creditamos também especial importância aos estudos epidemiológicos, principalmente os que têm envolvimento dos estudantes de medicina. Além do caráter científico(proporcionando dados para entendermos melhor o problema), têm também o cunho de chamar a atenção dos jovens para o problema. Conhecendo a gravi-

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dade do problema e suas eventuais seqüelas esses jovens podem agir como propagadores de métodos preventivos aos acidentes, dos quais, infelizmente, muitas vezes também são vítimas. Acreditamos ser esse um bom caminho. Devemos unir forças e lutar contra esse mal dos tempos modernos.

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Síndrome da criança espancada Miguel Akkari

Introdução O termo síndrome da criança espancada é empregado para designar uma situação específica na qual uma criança é vitima de trauma físico deliberado infligido por um maior cuidador. Esta situação particular esta incluída em um termo mais amplo designado como síndrome dos maus tratos nas crianças, definida de forma mais abrangente, englobando não só o trauma físico, como também a agressão psicológica, sexual e ainda formas de negligencia em relação aos cuidados das crianças e dos adolescentes. Consiste em uma situação de notificação obrigatória pelo estatuto da criança e do adolescente de 1990 e pelo código penal brasileiro de 1940. O Ministério da Saúde determinou em 2001 a obrigatoriedade da notificação de qualquer forma de violência contra crianças e adolescentes para todos os profissionais da área da saúde. A violência contra as crianças e adolescentes é um problema muito antigo. O infanticídio foi praticado em muitas civilizações motivado por crenças, rejeição à criança ou quando portadoras de malformações. Algumas sociedades antigas apresentavam em suas leis instruções aos pais em como castigar os filhos indisciplinados podendo estes castigos chegar à morte.

Um dos primeiros autores a utilizar o termo “criança espancada” foi Tardieu em 1860 na França; quase um século depois Caffey (1946) relata a associação de hematomas subdurais e alterações ósseas. Posteriormente Silverman em 1953 descreve situações semelhantes às descritas por Caffey, porém atribuiu como fator etiológico traumas provocados. Em 1961 Kempe descreve a síndrome da criança espancada, baseando o diagnóstico em aspectos clínicos e radiográficos. Epidemiologia Os maus tratos contra as crianças e adolescentes são um problema mundial, independente do nível sócio econômico ou cultural. Nos Estados Unidos estima-se cerca de 1 500 000 de casos de maus tratos ao ano, destes 20% correspondiam a abuso físico, sendo estimada mais de 2000 mortes ao ano. Em nosso país a violência contra as crianças é subnotificada, dificultando uma análise mais minuciosa sobre este tipo de problema em nosso meio. Muitos estudos mostram que os agentes agressores mais comuns são os próprios pais, atuando isoladamente ou em conjunto, correspondendo a quase 90% dos casos. Outras pessoas que fazem parte do convívio 288

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da criança como tios, avós, irmãos também são implicados em menor porcentagem.

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lesões cutâneas são fortes indicativos de agressão, como marca de dedos, socos, cintos, fivelas, sapatos, queimaduras por pontas de cigarro ou imersão, mordidas, lesões circulares no pescoço ou membros, hematomas com diferentes colorações, ou ainda lesões em regiões naturalmente protegidas como face interna das coxas, região genital, mamas, pescoço. Também devemos estar atentos a lesões mais graves como lesões abdominais com roturas de vísceras, lesões torácicas, hematomas intracranianos. Os profissionais envolvidos no atendimento destas crianças estejam atentos a este problema para que busquem subsídios clínicos ao diagnóstico, pois muitos destes sinais desaparecem com o tempo.

Diagnóstico O diagnóstico da síndrome da criança espancada é baseado em aspectos clínicos e radiográficos. O médico deve ser cauteloso antes de firmar o diagnóstico, pois algumas vezes o diagnóstico é duvidoso podendo ser confundido com outras afecções como osteogênese imperfeita, raquitismo, analgesia congênita, hipovitaminoses, infecções congênitas (sífilis), doença de Caffey, doenças hematológicas, tumores metastáticos entre outras. O médico deve estar atento a vários detalhes que podem auxiliá-lo no diagnóstico, como a história relatada pelos acompanhantes incompatível com o quadro clínico, o atraso injustificado na procura de auxilio médico. Além disso, algumas fraturas são muito características; fraturas múltiplas em estágios evolutivos distintos denotando trauma em momentos diferentes, fraturas acometendo as placas de crescimento, fraturas de costelas, das escápulas, dos ossos longos em crianças de baixa idade incompatíveis com o desenvolvimento motor da criança, fraturas acometendo diferentes segmentos do corpo como crânio, tórax e membros .É fundamental um minucioso exame da pele onde deve-se procurar hematomas, equimoses, lacerações, queimaduras ou cicatrizes antigas. Muitas destas

Tratamento O tratamento da síndrome da criança espancada deve inicialmente priorizar o correto tratamento das lesões, devendo-se estar atento a lesões menos evidentes como hematomas intracraniano ou traumas abdominais fechados. Concomitante ao tratamento, devemos prover a segurança destas crianças, para isso sempre que se julgar necessário a criança deverá ser institucionalizada, afastando-a assim do seu ambiente hostil. Estima-se que cerca de 50% das agressões serão recorrentes caso a criança retorne ao seu ambiente. Faz-se obrigatório a comunicação da suspeita ou a confirmação de maus tratos às autoridades competentes 289

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para que medidas legais possam ser tomadas, sob pena de punição na ausência da notificação. A notificação pode ser feita ao Conselho Tutelar da região, ao Ministério Público através da Promotoria de Justiça da Infância e Juventude ou a Delegacia de Polícia. Cabe a estas instituições zelar pela defesa dos direitos das crianças e adolescentes, tomando as providên-

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cias cabíveis de acordo com a gravidade de cada caso. Vale ressaltar que a denúncia de maus tratos pode não se confirmar após a investigação pelos órgãos públicos, porém temos que lembrar que o transtorno gerado com toda a investigação é totalmente justificável, pois visa apenas a proteção das crianças.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Pires, A. L. D; Miyazaki, M.C.O.S; Maus-tratos contra crianças e adolescentes: revisão daliteratura para profissionais da saúde, Arq Ciênc Saúde 2005 jan-mar;12(1):42-9 2. Schneider, I. Maus tratos, Ortopedia Pediátrica SBOT, Revinter, pag 355-63, 2004 3. Pascolat, G; Santos, C. F.L; Campos, E.C.R; Valdez, L.C.O; Busato, D.; Marinho, D.H.; Abuso físico: o perfil do agressor e da criança vitimizada. J Pediatr (Rio J) 2001; 77(1): 35-40 4. Rockwood, C.A., Wilkins, K.E. & King, R.E.: “Abuso infantil”, in Fraturas em crianças, São Paulo, Manole, 1993. p. 279. 5. Ruaro, A.F.; Meyer, A.T.; Aguilar, J.A.G.; Hellu, J. J.; Custódio, M. D.; Síndrome da criança espancada: aspectos legais e clínicos: relato de um caso. Rev. bras. Ortop.32(10):835-8, 1997 290

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Lesões traumáticas da cintura escapular Epitacio Leite Rolim Filho

OBJETIVOS: • Estudar as fraturas e os deslocamentos epifisários da clavícula e escápula; • Estudar as luxações acromioclaviculares, esternoclaviculares e as luxações escapulotorácicas.

dadeiras acrômio-calviculares e esternoclaviculares são muito mais raras do que as fraturas ou disjunções epifisárias das extremidades da clavícula, podendo, não infrequentemente passarem despercebida, ou confundidas com deslocamento epifisário, principalmente nas crianças cuja epífise ainda não ossificou. Diante do exposto, é importante compreender a formação embrionária da clavícula e dos aspectos anatômicos. A formação deste osso dá-se por um padrão de ossificação misto, que inicialmente é intramembranosa e posteriormente endocondral através de dois centros de ossificação secundária, um em cada extremidade da clavícula. A epífise lateral ossifica aos 17 anos de idade e fecha-se por volta dos 19 anos de idade e a epífise medial ossifica-se em torno dos 12 a 19 anos de idade e fundi-se aos 22 a 25 anos de idade. Esta epífise é responsável por 80% do crescimento longitudinal da clavícula, e isso é um dos fatores que contribuem para o tratamento conservador das lesões claviculares neste nível. Lateralmente a clavícula forma com o acrômio a articulação acromioclavicular (A-C) e medialmente, com o esterno, a articulação esternoclavicular (E-C). A sua porção distal esta coberta por uma espessa bainha de

1. Introdução As lesões da cintura escapular que serão estudadas a seguir serão divididas da seguinte forma: I. Lesões da clavícula: • Fraturas no terço médio, distal e medial • Deslocamento epifisário / luxações da extremidade lateral e medial da clavícula II. Lesões da escápula: • Fraturas da escápula • Dissociação e luxações escapulotorácicas 2. Lesões da clavícula 2.1. Introdução e Epidemiologia A fraturas da clavícula é uma das mais frequentes da criança, perfazendo cerca de 8 a 15% de todas as fraturas do esqueleto imaturo e até 90% das fraturas decorrentes de tocotraumatismo (fraturas obstétricas do recém-nascido). Por outro lado, devido as peculiaridades anatômicas e mecânicas do esqueleto imaturo, as luxações ver291

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periósteo que se estende até o acrômio. Os ligamentos coracoclaviculares (conóide e trapezóide), que são os estabilizadores primários da A-C, estão inseridos na porção inferior e lateral deste periósteo. Esses ligamentos geralmente permanecem inseridos na porção inferior do periósteo íntegro ou em um pequeno fragmento epifisário nas lesões da extremidade lateral da clavícula. Fica fácil entender o porquê de tais lesões serem confundidas com as luxações A-C e E-C verdadeiras em crianças, são as chamadas pseudoluxações A-C ou E-C. As luxações A-C em crianças são muito raras e geralmente não ocorrem antes dos 16 anos de idade. Na prática, ocorre disjunção epifisária ou fratura metafisária lateral, e como a epífise lateral da clavícula ossifica após 17 ou 19 anos de idade, essas lesões são erroneamente diagnosticadas como luxação acromioclavicular (pseudoluxação A-C). Por isso que a verdadeira incidência dessas lesões não é conhecida, pois muitas delas representam deslocamento epifisário, e não luxações A-C. Esse fato ocorre semelhantemente na extremidade medial da clavícula (articulação E-C). A elasticidade inerente ao osso imaturo, faz com que a maior parte das fraturas em crianças abaixo dos 12 anos de idade sejam incompletas. Por fim, é importante enfatizar a relação anatômica das estruturas adjacentes a clavícula. Posterior e inferiormente, passam o plexo braquial, veia jugular, traquéia esôfago,

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nervos vago e frênico, artéria e veia subclávia, ápice superior do pulmão. As lesões dessas estruturas são relativamente incomuns, pela provável proteção fornecida pelo espesso periósteo da porção inferior da clavícula o qual permanece intacto durante tais lesões. 2.2. Mecanismo de Trauma O trauma direto após queda sobre o ombro é o mecanismo mais comum. a) Fraturas do terço médio (diáfise): geralmente decorrem de uma queda sobre o ombro b) Lesões da extremidade lateral da clavícula: geralmente são decorrentes de trauma direto sobre o acrômio. Isso ocasiona lesão longitudinal da porção superior da bainha do periósteo através da qual a clavícula desprende-se. Assim, os ligamentos conóide e trapezóide quase nunca sofrem lesão, permanecendo inseridos na porção ínfero-medial intacta do periósteo. Os ligamentos acromioclaviculares também permanecem inseridos na epífise lateral da clavícula durante essas lesões. c) Tocotraumatismos: geralmente ocorrem em partos normais laboriosos por mecanismo direto, em que a cintura escapular é diretamente comprimida entre as paredes do canal do parto, causando mais frequentemente fratura da diáfise da clavícula. d) Extremidade medial: trauma direto 292

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ou indireto (fraturas, disjunções ou luxações esternoclaviculares).

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3.2.1. Radiografias simples. a) Indidência ânterio-posterior: geralmente é suficiente para dar o diagnóstico b) Outras incidências: c) Inclinação cefálica de 35-40º: para avaliar o grau do desvio d) Incidência oblíqua apical: é a melhor incidência para dar o diagnóstico das lesões da extremidade medial da clavícula (ou luxações esternoclaviculares) e) Ântero–posterior do tórax: afastar lesões intratorácicas e fraturas de costelas. f ) Incidência AP sob estresse (peso de 2,5 a 5 kg) de ambos os ombros: importante para o diagnóstico das luxações A-C ou deslocamento epifisário. As incidências da série trauma do ombro (incidências em ânteroposterior, axilar e escapular em “y”) são utilizadas para auxiliar no diagnóstico dessas lesões

III. Diagnóstico 3.1. Clínico O diagnóstico, principalmente no recém-nascido (RN) pode passar despercebido ou ser dado tardiamente, quando já houve formação de calo ósseo percebido à inspeção ou palpação. O RN permanece com o membro superior ipsilateral à fratura sem mobilidade (pseudoparalisia obstétrica) e o reflexo de Moro é assimétrico. Nas crianças mais velhas o diagnóstico é mais facilmente realizado. No local da lesão há edema, dor, crepitação, equimose (freqüente), impotência funcional e perda do contorno do ombro (comparar com o lado contralateral), sinais estes, também presentes no RN. As lesões da clavícula podem mimetizar o quadro clínico de outras lesões obstétricas e infecções, como por exemplo: a paralisia obstétrica, fraturas do úmero proximal, luxações gleno-umeral, torcicolo congênito, artrite séptica e osteomielite. Além dessas afecções, a disostose cleidocraniana e a pseudartrose congênita da clavícula devem ser incluídas no diagnóstico diferencial. Deve-se afastar lesões neurológicas, vasculares, pulmonares, cardíaca e do mediastino. As fraturas da extremidade medial podem estar associadas a lesão da traquéia e esôfago. 3.2. Radiológico

3.2.2. Ultrassonografia Ajuda a elucidar lesões epifisárias (disjunções) no recém nascido 3.2.3. Tomografia computadorizada Avaliar fraturas e lesões associadas. Devem ser solicitadas nos casos duvidosos, para elucidar o diagnóstico. IV. Classificação As classificações são geralmente baseadas na localização anatômica, 293

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na exposição ou não da fratura, no desvio, na angulação e no tipo de fratura. A classificação de Allman, descrita a seguir, é baseada na localização anatômica e divide as fraturas da clavícula em três tipos: • Tipo I: fraturas do terço médio (80%): são as fraturas localizadas medialmente aos ligamentos coracoclaviculares e lateralmente ao músculo esternoclavicular. • Tipo II: lesões laterais (10 – 15%): comumente localizadas lateralmente aos ligamentos coracoclaviculares. • Tipo III: Lesões proximais (35%): localizadas medialmente ao músculo esternocleidomastóideo. As fraturas do tipo II são classificadas por Dameron e Rockwood em seis tipos. Essa classificação considera o fato que a extremidade distal da clavícula desvia-se através da lesão longitudinal da porção superior do periósteo, sem haver lesão dos ligamentos conóide e trapezóide que permanecem inseridos na porção ínfero-medial do periósteo intacto (figura 1). As lesões claviculares do tipo III, são classificadas de acordo com Salter-Harris. Praticamente todas essas lesões são do tipo I e II de Salter-Harris. De acordo com a direção dos desvio podem ser divididas em anterior (mais frequente) e posterior. Os deslocamentos posteriores estão mais

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associados a lesões das estruturas localizadas posteriormente (traquéia, esôfago, nervos vago e frênico, estruturas do mediastino).

Figura 1. Classificação de Rockwood para lesões acromioclaviculares.

Tipo I—Entorse do ligamento, sem lesão do periósteo. Tipo II—lesão parcial do periósteo. Tipo III—Lesão longitudinal do periósteo com desvio superior da extremidade lateral da clavícula. Tipo IV—lesão extensa do periósteo com deslocamento posterior da clavícula. Type V—Lesão completa do periósteo com deslocamento da clavícula através do deltoide e tecido celular subcutâneo. Tipo VI— deslocamento inferior da clavícula, sob o tendão conjunto do processo coracóide.

V. Tratamento A maioria das lesões claviculares 294

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são tratadas conservadoramente. - Deve-se considerar a idade do paciente e a localização da fratura: • Recém-nascido (RN) até 2 anos de idade: o No RN o objetivo principal é promover o conforto da crianca. Geralmente uma tipóia é suficiente por 10 dias, quando ocorre consolidação da fratura. o A imobilização em “8” pode ser usada em crianças maiores por 2-3 semanas. • Dos 2 – 12 anos de idade: geralmente conservador com tipóia e imobilização em “8” por 2-4 semanas. • Acima dos 12 anos de idade: o Tratamento conservador com imobilização em “8” por 2-4 semanas. Nos casos onde há desvios significativos, com risco de exposição do fragmento, devese considerar a redução aberta ou fechada com ou sem osteossíntese. - As indicações cirúrgicas estão reservadas para as seguintes situações: Fraturas ou fraturas-luxações expostas, comprometimento neurovascular, fragmento proeminente na pele (“pele em tenda”), estética. - Lesões da extremidade lateral (tipo II): O tratamento depende da idade e do tipo da lesão (classificação de RockWood): o Tipos I, II e III: conservador com imobilização por 4-6 semanas

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o Tipos IV, V e VI: redução e fixação associada ao reparo da bainha periosteal. Imobilização no pós – operatório com tipóia. - Lesões da extremidade medial (tipo III): o Recém-nascidos: tratamento conservador o Crianças mais velhas: geralmente conservador com imobilização externa , com ou sem redução fechada prévia. As lesões com desvio anterior e posterior sem evidência de comprometimento neurovascular e do mediastino podem ser tratadas com imobilização em “8” ou tipóia associada a analgésicos. Caso contrário, redução fechada ou aberta é necessária. Nas lesões com deslocamento posterior com comprometimento das vias aéreas, esôfago, compressão neurovascular, inicialmente pode se realizar redução fechada. Caso não se obtenha o resultado esperado, a redução aberta imediata deve ser realizada, com fixação através de suturas. Os fios de Kirschner sabidamente estão associados a índices elevados de complicações (migração do fio). Os resultados comumente são muito bons. A imobilização em “8” além de não ser bem tolerada pelo paciente, pode ocasionar edema, compressão dos vasos axilares e plexopatia axilar. Por isso, e somado ao fato que os resultados finais não diferem daqueles tratados apenas com tipóia, alguns autores preferem o uso deste tipo de imobilização do que a i imobilização em “8”. 295

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οο O tratamento cirúrgico está indicado nas seguintes situações: yy Desvios grandes com risco iminente de exposição óssea; yy Lesões/compressões vasculares; yy Lesões expostas; yy Comprometimento do plexobraquial; yy Lesões associadas da escápula que comprometam a sua estabilidade (CSSD).

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ao tratamento cirúrgico com redução aberta. yy Fraqueza muscular no ombro/ msd: é infrequente. yy Luxação rotatória atlantoaxial. Deve ser diferenciada do torcicolo. II. FRATURAS DA ESCÁPULA/ DISSOCIAÇÃO E LUXAÇÃO ESCAPULOTORÁCICA 1. Introdução e Epidemiologia As fraturas da escápula são raras em crianças, perfazendo cerca de 1% de todas as fraturas. A importância dessas lesões deve-se ao fato de estarem associadas a traumas de alto impacto e, consequentemente, ocasionando lesões de outras estruturas e órgãos que comprometem a vida do paciente (como lesões de grandes vasos, pulmão e coração). A incidência de lesões associadas varia de 35 a 98%. As mais frequentes são: fraturas associadas das costelas, clavícula, esterno e lesões do ombro; pneumotórax (11-55%); lesões nervosas – plexo braquial; avulsões vasculares; lesões da coluna vertebral, na seguinte ordem decrescente: coluna torácica (76% dos casos) coluna cervical (20% dos casos ) e coluna lombar (4% dos casos). A escápula está localizada na parte posterior e lateral do tórax, protegida por este e pela massa muscular que a envolve. A formação embrionária desse osso ocorre por ossificação intramembranosa, sendo que o corpo e a espinha ossificam-se

VI. Complicações 6.1. Precoces: - Lesões neurovasculares: plexo braquial, artéria e veia subclávias. Essas lesões são raras em crianças, pois a porção inferior do periósteo (espesso) comumente permanece intacta, fornecendo proteção às estruturas adjacentes; - Lesões Pulmonares (pneumotórax), traquéia, mediastino, esôfago e coração: geralmente ocorrem nos casos de trauma direto na direção ântero-posterior. 6.2. Tardias: yy Lesões proeminentes, em tenda podem evoluir com exposição do fragmento ósseo. yy Consolidação viciosa: são raras, entretanto, raramente causam deformidades estéticas; yy Pseudartrose: é rara, ocorrendo em cerca de 3% dos casos. Não é observada antes dos 12 anos de idade. Está mais relacionada 296

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Quadro 1. Sequência de ossificação e fusão dos núcleos da escápula de acordo com a estrutura anatômica. Estrutura anatômica Corpo e espinha Processo coracóide centro Glenóide Base e ¼ superior ¾ inferior Acrômio Borda vertebral Ângulo inferior

Idade de ossificação Intra-uterina 1º ano 1º ano Cerca de 10 anos puberdade 2-5 centros: puberdade puberdade puberdade

antes do nascimento (Quadro 1). O complexo suspensor superior do ombro (CSSO) é formado por inserções circulares ósseas e ligamentares: acrômio, glenóide, coracóide, ligamentos coracoclaviculares e clavícula distal (Figura 2). Esta estrutura mantém a integridade da escápula. Lesões neste complexo podem levar a instabilidade escapulotorácica.

Idade de fechamento 15 anos 15-16 anos 22 anos 22 anos 22 anos 22 anos

Figura 2. Complexo suspensor superior do ombro (CSSO).

2. Mecanismo de Trauma a) As fraturas comumente decorrem de trauma direto de alta energia, geralmente associadas a lesões de outras estruturas ou órgãos adjacentes. b) Fraturas da cavidade glenoidal e do acrômio podem resultar de trauma direto ou através de forças transmitidas através da cabeça umeral. Outros mecanismos indiretos são ocasionados por contração excêntrica dos músculos da região. Assim, a contração da cabeça longa do bíceps pode

causar fratura-avulsão do rebordo inferior da glenóide (1/4 superior da glenóide). Da mesma forma, a contração da cabeça curta do bíceps e coracobraquial podem avulsionar o processo coracóide. c) A maioria das fraturas-avulsões está associada às lesões glenoumerais. Elas são comuns na fise 297

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da base do processo coracóide e quarto superior da glenóide. d) Fraturas do acrômio são raras e geralmente decorrem de trauma direto.

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cápula do tórax. O desvio mais comum é o lateral, raramente o desvio é medial. Quando a DS está associada a lesão neurovascular, denomina-se de amputação traumática escapulotorácica. Na luxação escapulotorácica ocorre apenas desvio da junção inferior.

3. Classificação As classificações das fraturas da escápula são adaptações das fraturas de adultos. A classificação descrita no quadro 2 é baseada na localização anatômica da fratura (figura 2). Na dissociação escapulotorácica (DE) há completa separação da es-

3. Diagnóstico 3.1. Diagnóstico Clínico Considerando que mais de 80% das fraturas da escápula está associada a outras lesões que podem ser potencialmente fatais, causando

Quadro 2. Classificação das fraturas da escápula de acordo com a localização anatômica. Tipos – localização anatômica A. Fraturas do corpo (35%) e colo da glenóide (27%)

Subgrupos Tipo I: Isoladas ou associadas a lesões da clavícula Tipo II: Com ou sem desvio Tipo I-A: Fratura por avulsão anterior

Tipo I-B: Avulsão da borda posterior Tipo II: Transversa com fragmento livre inferior B. Fraturas da Glenóide (classificação Tipo III: 1/3 superior + coracóide de Idiberg e Goss). Tipo IV: fratura horizontal com extensão para o corpo Va: II e IV Tipo V: Combinação dos tipos II, III e IV Vb: III e IV Vc: II, III e IV VIa: fechada Tipo VI: cominutiva da fossa glenoidal VIb: exposta C. Fraturas Coracóideas Isoladas ou associadas a lesões acromioclaviculares IA: avulsão Tipo I: sem desvio IB: traumatismo direto D. Fraturas Acromiais Tipo II: desviadas sem estreitamento do espaço subacromial Tipo III: desviadas com estreitamento do espaço subacromial

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yy Outras incidências podem ser necessárias: οο Incidência Axilar: é a melhor incidência para identificação de fraturas do acrômio e da borda da glenóide οο Incidência de Stryker: identificação de fraturas do coracóide οο Rx do tórax: avaliar lesões intratorácicas e fraturas de costelas οο Rx da coluna

mortalidade em mais de 15% dos casos, o exame inicial dessas crianças deve ser realizado, a fim de excluir essas lesões que põem em risco a vida e que necessitam de cuidados emergenciais (ATLS). No exame ortopédico pode ser encontrado: edema, dor referida e perda do contorno da cintura escapular. A dor geralmente é referida no cíngulo da escápula, principalmente durante a abdução do ombro. Deve-se avaliar o membro ipsilateral para identificar possíveis lesões neurovasculares. Nos casos de fratura isolada da escápula, deve-se aventar a possibilidade de maus tratos, principalmente se a história clínica (mecanismo do trauma) não for compatível com o grau da lesão.

3.2.2. Tomografia computadorizada (TAC) A TAC é utilizada principalmente para a identificação e o estudo das fraturas da cavidade da glenóide. 3.2.3. Arteriografias Devem ser solicitadas nas suspeitas de lesões vasculares do membro ipsilateral.

Figura 3.

3.3. Diagnóstico diferencial e condições associadas 3.3.1. Os-acromiale É uma falha de fechamento da apófise ântero-inferior do acrômio. Está presente em 3 – 10% da população, sendo bilateral em 60% dos casos. Nas radiografias convencionais observa-se uma estrutura separada na porção ântero-inferior do acrômio. 3.3.2. Hipoplasia glenoidal ou displasia do colo da escápula Está associada a anormalidades da cabeça umeral e acrômio. É semelhante a impactação glenoidal. 3.3.3. Dissociação escapulotorácica É uma lesão rara, geralmente de-

Incidências série trauma. A – Incidência em AP verdadeiro. B – Incidência em perfil da escápula. C – Incidência axilar.

3.2. Radiológico 3.2.1. Radiografias convencionais As incidências da série trauma em ânteroposterior (AP) verdadeira, axilar e lateral verdadeira (escapular em “y”) (figura 3), geralmente são suficientes para dar o diagnóstico. 299

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οο Fraturas do acrômio - Sem desvio: imobilização com tipóia - Fraturas com desvios associadas a impacção acromial: redução aberta e osteossíntese com parafuso ou placa οο Fraturas do colo da glenóide - Indicação de cirurgia: - Fraturas do colo da glenóide associadas a subluxação da cabeça do úmero: indica-se redução aberta e fixação. - Fraturas do colo associada a fraturas ipsilaterais da clavícula ou espinha da escápula. οο Fraturas intrarticulares da glenóide: - Indicação cirúrgica: yy Tipo I: com desvio importante, comprometimento de mais de ¼ da cavidade glenoidal (redução aberta e osteossíntese com parafuso de compressão) yy Tipo II: diástase superior a 5mm: redução aberta e fixação yy Tipo III: redução difícil yy Tipos IV, V e VI: a redução é difícil. Geralmente há indicação de redução aberta e osteossíntese Nos demais casos o tratamento é conservador com imobilização 5. Complicações 5.1. Precoces • Lesão nervosa; • Nervo axilar: nas fraturas da glenóide; • Nervo supraescapular: nas fraturas do processo coracóide,

corrente de intensas forças de tração do membro superior. Quase que invariavelmente está associada a lesões nervosas (plexo braquial), de grandes vasos e de outras estruturas que podem comprometer a vida do paciente. A incidência de mortalidade descrita na literatura varia de 10 a 20%. O tratamento tem como objetivo o reparo das lesões vasculares e neurológicas. Entretanto os resultados funcionais são pobres. Por isso que na presença de lesões do plexo braquial e vascular a amputação deve ser considerada como tratamento primário. 4. Tratamento A maior parte das fraturas da escápula é tratada conservadoramente. Por se tratar de lesões de rara ocorrência em crianças, alguns autores consideram os parâmetros utilizados em pacientes adultos para indicar o tratamento, conservador ou cirúrgico. οο Fraturas do corpo: Comumente o tratamento é conservador, sendo mais direcionado a proporcionar conforto ao paciente. O tratamento cirúrgico é reservado para as fraturas com grandes desvios (1 cm de diástase) , pseudartrose e nos casos de comprometimento neurovascular ou outras estruturas. οο Fraturas do coracóide - Sem desvio ou minimamente desviadas: imobilização com tipóia - Com desvio e associadas a luxação acromioclavicular ou fraturas laterais da clavícula: indicado redução aberta e osteossíntese 300

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corpo (incisura supraescapular) e colo; • Avulsões vasculares e síndrome compartimental: nas dissociações escapulotorácicas; • Outras fraturas: costelas, clavícula, esterno e ombro; • Outras: pneumotórax, lesões do mediastino, vias aéreas e esôfago.





5.2. Tardias As complicações tardias são aquelas que comprometem a função do membro superior ipsilateral • Consolidação viciosa do corpo e da espinha: ocasiona fraqueza e dor durante os movimentos do membro superior. A incidência de dor pode variar de 50 a





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100% dos casos de fratura do corpo da escápula. Fraqueza em 40 a 60% nas fraturas desviadas do colo da escápula, fraturas cominutivas da espinha, fraturas intrarticulares da glenóide. Esses sintomas geralmente são atribuídos ao impacto e disfunção Impacto subacromial: decorrente da fratura do acrômio e causa limitação funcional do membro ipsilateral; Subluxação ou luxação glenoumeral: decorrente da fratura da glenóide viciosamente consolidada; Pseudartroses: são muito raras, mas relativamente frequentes na fratura do coracóide.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. SARWARK, F.F.; KING E.C.; JANICKI J.A. Proximal Humerus, Scapula, and Clavicle. In: ROCKWOOD & WILKINS. Fractures in Children. Editor 7ª ed., 2010. cap 17. 2. TACHDJIAN´S by John A. Herring, MD. Upper Extremity Injuries. In: Tachdjian’s Pediatric Orthopaedics. 3ªed. v. 3. Cap 42. 2008. p. 2423-2434. 3. PRICE, C.T. & FLYNN, J.M. Management of Fractures. In: LOVELL & WINTER’s. Pediatric Orthopaedics. Copyright Â. 6. Th, 2006. v. 2. Cap. 33. p. 1443 – 1447. 4. KRAUS R, WESSEL L. The Treatment of Upper Limb Fractures in Children and Adolescents. Dtsch Arztebl Int. 2010 Dec;107(51-52):903-10. 301

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Fraturas da extremidade proximal do úmero Silvio Coelho

EPIDEMIOLOGIA Fraturas do terço proximal do úmero na criança não são freqüentes, tendo uma incidência de 1.2 a 4.4 em 1000 por ano, menos de 5% de todas as fraturas infantis. Os mecanismos de lesão vão desde o trauma obstétrico durante um parto vaginal até traumas diretos e indiretos em crianças maiores (1). As fraturas podem envolver as várias regiões do úmero, epífise, fise, metáfise e diáfise ou combinações como nas fraturas epifisiólises. O trauma direto constitui-se, normalmente, em golpe na região do ombro e o indireto, uma queda ao solo com apoio na mão espalmada. Cerca de 50% das fraturas ocorrem na prática esportiva e nas atividades diárias. Traumas de grande energia, como nos acidentes automobilísticos, também podem produzir fraturas mais graves com grandes desvios. Fraturas patológicas podem evidenciar lesões ósseas como um cisto ósseo simples. Maus tratos concorrem, eventualmente, para fraturas do terço proximal do úmero e sempre se deve pensar nesta hipótese quando houver uma desproporção entre a lesão e a história narrada do trauma.

CARACTERÌSTICAS CLÌNICAS Em recém nascidos e crianças pequenas o sinal clínico mais evidente é a imobilidade do membro afetado e o desconforto do paciente à mobilização do braço. Nas crianças maiores que verbalizam a dor e relatam o trauma, é mais fácil fazer o diagnóstico. Edema, hematoma e deformidade nas fraturas deslocadas são achados clínicos de fraturas da região aqui estudada. DIAGNÓSTICO Na maioria dos casos o diagnóstico é feito através da radiografia simples. Em recém-nascidos e lactentes com lesão fisária, estudos ultrassonográficos podem fornecer informações importantes já que a epífise umeral proximal só aparece após os 6 meses de idade. Tomografia computadorizada é de grande valia nos casos de fraturas com deslocamentos posteriores. A RM pode identificar fraturas ocultas. CLASSIFICAÇÃO As fraturas em crianças ainda são classificadas de acordo com a região afetada do osso e o tipo de lesão. Em particular, no terço proximal do úmero, as fraturas podem compro302

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ossos longos em crianças criada pelo grupo pediátrico da AO, define 3 segmentos: proximal (E-epífise e Mmetáfise), diáfise e distal (M-metáfise e E-epífise). Inclui também códigos próprios para o esqueleto em crescimento como, p.ex., nas fraturas epifisiólises levando em consideração a classificação de Salter-Harris (E/I a E/4) (2). Não entraremos em detalhes desta classificação por não ser ainda de uso corrente entre os ortopedistas pediátricos.

meter a fise, metáfise e as tuberosidades da cabeça umeral. A classificação de Salter-Harris é aplicada nas fraturas epifisiólises da região. As do tipo I são mais comuns em crianças abaixo de 5 anos, enquanto aquelas do tipo II estão presentes em crianças maiores, acima de 11 anos. Lesões do tipo III podem vir acompanhadas de luxações glenoumerais. As fraturas envolvendo a metáfise ocorrem na faixa etária entre os 5 e 12 anos. Para determinar os limites da área metafisária que na criança se estende à diáfise, sugerimos o uso do método do quadrado criado pela AO, cujos lados tem a mesma largura da parte mais larga da fise (fig.1). Nesta área as fraturas podem apresentar-se como subperiósticas, completas com traço simples e completas multifragmentárias.

TRATAMENTO Fraturas na região proximal do úmero na criança têm um grande potencial de consolidação e remodelam com facilidade, devido à proximidade da zona de crescimento e a grande espessura do periósteo. Isto faz com que a maioria das fraturas tenha um tratamento conservador usando-se apenas imobilização do membro afetado por um tempo pequeno de 2-3 semanas ou até 6 semanas, de acordo com o tipo de fratura e a idade do paciente. Em crianças abaixo de 11 anos, desvios e angulações maiores podem ser tolerados. Poucos são os casos que requerem manipulação para realinhamento da fratura. Nos maiores de 11 anos em que o potencial de remodelação começa a diminuir, reduções fechadas ou abertas de fraturas deslocadas, com fixação percutânea com fios lisos ou rosqueados, é método preferencial. As manobras de redução devem anular as forças musculares que promovem os desvios como os músculos

Figura 1.

A classificação das fraturas dos 303

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que formam o manguito rotador, o deltoide e o peitoral maior. As reduções devem ser realizadas no bloco cirúrgico sob anestesia geral, em mesa própria para uso de intensificador de imagens. Quando o alinhamento é obtido, fios de Kirschner 2.0 ou 2.5, lisos ou rosqueados para evitar migração, são introduzidos pela cortical lateral do úmero, junto à inserção do deltoide e direcionados à epífise umeral proximal. No mínimo 2 fios devem ser inseridos e após cerca de 4 semanas podem ser removidos (fig. 2 e 3).

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Eventualmente, estruturas como o periósteo, cápsula articular ou o tendão longo do bíceps podem se interpor no foco de fratura impedindo a redução e obrigando a abertura do foco. Nestas situações, após a redução, procede-se da mesma forma a fixação com fios. O mais frequente é termos a interposição do tendão bicipital (3). COMPLICAÇÔES Não são frequentes complicações nas fraturas aqui discutidas. Consolidação viciosa com grande desvio posterior, lesões do plexo braquial e lesões vasculares em traumas de grande energia, infecção no trajeto dos fios de fixação são algumas das complicações a serem citadas. Lesões do plexo braquial são raras e ocorrem quando o fragmento distal da diáfise umeral se desloca superior e medialmente em direção a axila no momento do trauma produzindo neuropraxia (mais comum) ou axonotmesis (4).

Figuras 2 e 3.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Sarwark JF, Erik CK, Scott JL. Fractures of the proximal humerus, chapter 17,704-715. Rockwood and Wilkins, Fractures in Children. 2. Slongo TF, MD, Audigé L, DVM, PhD. Fracture and Dislocation Classification Compendium for Children. J Orthop Trauma. Volume 21, Number 10 Supplement:135-159.Nov/Dec 2007. 3. Bahrs C. MD; Zipplies S. MD; Ochs BG.MD; Rether J. MD; Oehm J. MD; Eingartner C. MD; Rolauffs B. MD; Weise K. MD. Proximal Humeral Fractures in Children and Adolescents. J Ped Orth, 29(3): 238-242, April/May 2009. 4. Hwang RW. MD; Meng BAE DS. MD; Waters PM. MD. Brachial Plexus Palsy Following Proximal Humerus Fracture in Patients who are Skeletally Immature. J Orth Trauma, 22(4):286-290, April 2008. 304

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Fraturas supracondilianas do úmero Pedro Henrique Mendes Henrique Cruz

Epidemiologia A fratura supracondiliana do úmero é a fratura mais comum do cotovelo da criança1, correspondendo a cerca de 58% dos casos. O pico na incidência ocorre entre 5 a 6 anos, em função da presença de frouxidão ligamentar, da relação da articulação que permite um mecanismo de gaveta, e da imaturidade esquelética. Historicamente é maior no sexo masculino porém, estudos recentes demonstram uma equalização no acometimento entre os sexos. O lado esquerdo ou o não dominante é o mais afetado. O mecanismo de lesão mais comum é do tipo em extensão e corresponde a 97 - 99% das fraturas. O desvio do fragmento distal se dá pela ação do tríceps braquial e ocorre por queda com o cotovelo em extensão máxima.

póstero medial o mais acometido é o nervo radial. A lesão mais comum é a neuropraxia. No exame vascular a ausência de pulso radial distal pode corresponder a um vaso espasmo da artéria braquial. Nestes casos quando a perfusão distal estiver preservada a observação está indicada. Porém em caso de má perfusão das extremidades distais uma lesão da artéria braquial deve ser suspeitada e o cirurgião vascular contatado para avaliação e provável reparo vascular. O sinal de kirmisson (hematoma na região anterior do cotovelo) representa a lesão da musculatura braquial causada pelo desvio anterior do fragmento metafisário, alertando o cirurgião para a dificuldade na redução da fratura. Na avaliação radiográfica as incidências anteroposterior e perfil são suficientes. O sinal do coxim gorduroso (hipotransparência na região anterior do cotovelo) corresponde a uma elevação do periósteo pelo hematoma, representando uma fratura oculta. Tomografia computadorizada e ressonância magnética não são necessários.

Diagnóstico (Clínico e Radiológico) O diagnostico é feito pelo exame físico e radiográfico. Na avaliação clínica devemos realizar um exame neurológico e vascular minucioso. O dano nervoso é causado, na maioria das vezes, pelo fragmento metafisário proximal. Portanto, no desvio póstero lateral o nervo mediano é o mais acometido enquanto que no desvio

Classificação A classificação mais utilizada é 305

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a de GARTLAND, que divide em três tipos: a) Sem desvio b) Desviada, porém com cortical posterior intacta c) Desviada, sem contato das corticais

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drome compartimental. A redução preferencialmente deve ser realizada a foco fechado. A forma de fixação é controversa. Basicamente existem 2 configurações: dois fios laterais ou cruzados. Estudos biomecânicos mostraram que os fios cruzados (medial e lateral), fornecem maior estabilidade principalmente quanto a estabilidade rotacional2.. Em trabalho publicado recentemente no tratamento das fraturas tipo III, a fixação cruzada e a com fios laterais promovem estabilidade suficiente para o tratamento da fratura. Quando realizado a fixação cruzada existe, mesmo que pequeno (3,3%), o risco de lesão do nervo ulnar3. Para minimizar essa complicação realizamos um pequeno acesso medial com o cotovelo em flexão de aproximadamente 30 graus. Nos casos das fraturas com cominuição medial, pode-se adicionar um terceiro fio lateral, que em estudos biomecanicos4 evidenciou estabilidade semelhante aos fios cruzados. O mais importante para um bom resultado é a qualidade da redução. Cuidado com o desvio rotacional, pois esses levam a uma perda do contato dos pilares lateral e medial predispondo ao desvio em varo ou valgo5. Quando a redução fechada não é alcançada após 2 a 3 tentativas, devemos realizar a redução aberta. A via de acesso preferencial é a via anterior, já que a musculatura anterior (braquial) já esta lesionada pelo trauma.

Tratamento: No tipo I o tratamento deve ser realizado com imobilização gessada com cotovelo a 90 graus. O tempo de imobilização deve ser de 3 a 4 semanas No tipo II o tratamento não cirúrgico pode ser utilizado. O tratamento cirúrgico está indicado quando uma linha traçada na cortical anterior do úmero não cruzar o capitelo na incidência em perfil. No tipo III a fratura é considerada uma urgência ortopédica e o tratamento cirúrgico está indicado. O retardo no tratamento aumenta a probabilidade de evolução para síndrome compartimental. No preparo pré operatório o uso do intensificador de imagens é desejável. O anestésico deve ser de curta duração para melhor avaliação de síndrome compartimental no pósoperatório. Inicialmente reduzimos a fratura no plano ântero posterior, com tração longitudinal (acompanhada de contra-tração) e correção do desvio varo/valgo. Em seguida realizamos a flexão do cotovelo e com o polegar ao nível do olecrano, reduzimos no perfil. Devemos evitar movimentos bruscos e muitas tentativas, pois aumenta o risco de sín306

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Complicações: As complicações mais comuns são: Síndrome compartimental: Evitada com tratamento precoce e com pouca manipulação

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Lesão neurológica: Cuidado principalmente na fixação cruzada Consolidação viciosa: O cúbito varo ou valgo é esperado quando a redução apresenta desvios rotacionais ou fixação insuficiente.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Otsuka NY, Kasser JR. Supracondylar fractures of the humeros in children. J Am Acad Orthop Surg. 1997;5:19-26 2. Lyons JP, Ashley E, Hoffer MM. Ulnar nerve palsies after percutaneous cross-pinning of supracondylar fractures in children`s elbows. J Pediatric Orthop. 1998;18:43-45 3. R. Glenn Gaston, MD, Taylor B. Cates, MD, Dennis Devito, MD. Medial and lateral pin versus lateralentry pin fixation for type 3 supracondylar fractures in children. J Pediatric Orthop. Volume 30, number 8, December 2010 4. Loren Larson, MD, Keikhosrow Firoozbakhsh, PhD, Ralph Passarelli, MD, and Patrick Bosch, MD. Biomechanical Analysis of Pinning Techniques for Pediatric Supracondylar Humerus Fractures. J Pediatr Orthop & Volume 26, Number 5, September/October 2006 5. Skaggs David L., MD : Supracondylar Humeral Fractures in Children. J Bone Joint Surg Am. 2008;90:1121-32 307

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Outras lesões traumáticas do cotovelo Eiffel Tsuyoshi Dobashi

1. FRATURAS DO CÔNDILO LATERAL 1.1. Epidemiologia Estas lesões afetam a região lateral do côndilo no esqueleto imaturo que atravessam a placa de crescimento podendo comprometer também parte da tróclea. Representam 16,9% de todas as fraturas distais do úmero e geralmente ocorrem aos 6 anos de idade. Estas podem estar associadas com a luxação de cotovelo ocasionada pela lesão epifisária do côndilo lateral ou fraturas geralmente em galho verde do olécrano. Podem ser ocasionadas por mecanismo de tração ou avulsão (adução e supinação do antebraço com o cotovelo estendido), por flexão (queda com a mão espalmada e o antebraço em valgo onde a cabeça do rádio empurrando o côndilo lateral) ou por trauma direto no olécrano. 1.2. Diagnóstico clínico e radiográfico O diagnóstico clínico pode ser difícil especialmente se o desvio entre os fragmentos fraturados for mínimo. Há aumento do volume do cotovelo produzido pelo hematoma da fratura. No estágio I de deslocamento pode haver apenas dor local que aumenta com a flexão forçada do punho. No estágio II podemos reconhecer crepitação local pelo movimento do

fragmento do côndilo lateral. A limitação funcional está relacionada com a extensão da linha de fratura para a superfície articular. Como o plano de clivagem destas fraturas é geralmente oblíquo, são necessárias especialmente as radiografias oblíquas. Quando há dúvida diagnóstica podemos utilizar a artrografia ou Ressonância Magnética. As fraturas da placa de crescimento do côndilo lateral são consideradas como lesões Salter e Harris do tipo IV embora apresentem características semelhantes às do tipo II. Nas fraturas do tipo I de Milch a linha de fratura se origina na metáfise, cruza a fise em sentido oblíquo e atravessa o centro de ossificação da epífise do côndilo lateral para sair na área da incisura capitulotroclear. No tipo II a linha de fratura geralmente se origina na metáfise póstero-lateral onde há um fragmento de tamanho variável; a partir desse ponto, segue por um trajeto dentro do centro de crescimento, alcançando o fundo da tróclea. A linha de fratura não atravessa a epífise do côndilo lateral nem o centro de ossificação. 1.3. Tratamento Aproximadamente 40% destas lesões apresentam desvio menor do que 2mm e podem ser tratadas com imobilização axilopalmar por aproximadamente 3 semanas. Um 308

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seguimento criterioso nos primeiros dias deve ser realizado acompanhado de controle radiográfico, pois devemos considerar que um desvio pode ocorrer neste tipo de fratura determinado pela lesão dos tecidos moles adjacentes e pelo dano da cartilagem articular da tróclea. Para fraturas estáveis com desvios entre 2mm e 4mm recomendamos a fixação percutânea com fios de Kirschner lisos. Para lesões instáveis abordamos cirurgicamente a fratura por uma via lateral no intervalo entre o músculo braquiorradial e o tríceps. Ressaltamos que os tecidos posteriores devem ser mantidos intactos e após redução direta devemos realizar a fixação inserindo 2 fios de Kirschner passados entre 45° e 60° através do côndilo, cruzando a fise e a metáfise, e penetrando a cortical medial do úmero. O membro superior é colocado numa tala gessada com o cotovelo mantido fletido entre 70° e 90° por 2 a 3 semanas quando os fios devem ser removidos caso a união tenha ocorrido adequadamente. Em seguida é iniciado o processo de reabilitação. 1.4. Complicações Podem ocorrer: retardo de consolidação, pseudartrose, consolidação viciosa em varo ou valgo, deformidade em cauda de peixe (fenda entre o centro de ossificação da fise do côndilo lateral e o centro de ossificação medial da tróclea ocasionada pela má redução e formação de barra óssea ou pela necrose da parte lateral da crista medial da tróclea), lesão

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neurológica aguda (lesão do nervo interósseo posterior, neuropraxia radial), paralisia tardia do nervo ulnar, fechamento fisário, osteonecorse do fragmento condilar (decorrente da lesão ou iatrogênica). 2. FRATURAS DO CAPÍTULO 2.1. Incidência São bastante raras e difíceis de diagnosticar, pois existe muito pouco tecido ossificado no cotovelo imaturo. São descritos dois padrões de fratura sendo o de Hahn-Steinthal o mais comum que contém uma grande porção de osso esponjoso do côndilo lateral onde a crista lateral da tróclea pode também estar incluída. O segundo tipo, o de Kocher-Lorenz , caracteriza-se por uma fratura articular pura com pouco ou nenhum osso subcondral inserido. O mecanismo de lesão mais aceito é que a cabeça do rádio provoca o dano sobre a superfície articular anterior do côndilo lateral. 2.2. Diagnóstico clínico e radiográfico Geralmente o aumento do volume do cotovelo é mínimo e geralmente é acompanhado pela limitação funcional. Se o fragmento fraturado for grande, este poderá ser visualizado nas radiografias simples. Entretanto, se o fragmento for pequeno serão necessárias incidências oblíquas para a sua visualização. Devemos considerar a coexistência de fraturas da cabeça ou do colo do rádio (31%) . Entretanto em crianças mais novas podem ser neces309

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sárias a artrografia, tomografia computadorizada ou ressonância magnética. 2.3. Tratamento As formas mais comuns de tratamento são a excisão do fragmento, o que é realizado pela maioria dos autores, e a redução aberta com reinserção. A redução fechada geralmente não é acompanhada de bons resultados. Nos casos em que há possibilidade de reinserção a estabilidade da fratura é proporcionada por fios de Kirschner ou por parafusos de Herbert introduzidos pela da face posterior do côndilo lateral. 2.4. Complicações A principal complicação é a necrose avascular do fragmento do capítulo retido. A artrite degenerativa pós-traumática é outra complicação potencial assim como uma discreta perda funcional.

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com instabilidade em valgo ou varo da articulação do cotovelo e parestesia do nervo ulnar. Quando existe um grande fragmento metafisário, as radiografias simples evidenciam o envolvimento de todo o côndilo. Ressaltamos que as fraturas isoladas do epicôndilo medial são extra-articulares e geralmente não apresentam sinal do coxim adiposo positivo. Nos casos de difícil diagnóstico podemos utilizar a artrografia ou a ressonância magnética. A fratura Milch tipo I é a mais freqüente onde a linha de lesao atravessa o ápice da tróclea; no tipo II esta atravessa a incisura capitulotroclear. Kilfoyle descreveu três padrões de deslocamento onde no tipo I, a linha de fratura na metáfise do côndilo medial estende-se até a fise. No tipo II a fratura estende-se da fise ao côndilo medial. No tipo III, ocorre rotação e deslocamento do fragmento condilar. 3.3. Tratamento Nas fraturas sem desvio do tipo I de Kifoyle está indicado o tratamento conservador com imobilização gessada. Para as fraturas com desvio o tratamento consiste da redução indireta ou direta (o que ocorre na maioria dos casos) pela via póstero-medial que permite boa exposição da fratura e proteção do nervo ulnar e fixação com fios lisos de Kirschner ou parafusos. 3.4. Complicações Fraturas com desvio não tratadas resultam em pseudartrose com deformidade em cúbito varo. Os casos tratados pela redução aberta e fixa-

3. FRATURAS DO CÔNDILO MEDIAL 3.1. Epidemiologia São fraturas raras (< 1% de todas as fraturas que acometem o cotovelo imaturo) e ocorrem em crianças entre 8 e 12 anos de idade por queda acidental sobre o cotovelo flexionado ou estendido. 3.2. Diagnóstico clínico e radiográfico Tanto no exame clínico como no radiográfico, a lesão da fise do côndilo medial é frequentemente confundida com a fratura do epicôndilo medial. Podemos encontrar aumento de volume medial associado 310

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ção interna podem ser seguidos de distúrbios do suprimento vascular ocasionando osteonecrose condilar medial. O cúbito valgo pode decorrer da estimulação secundária ou do crescimento excessivo do fragmento do côndilo medial. Neuropatia ulnar parcial também foi descrita como complicação.

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dução entre os fragmentos. Em neonatos podemos imobilizar o membro superior em flexão de 110° ou 120° mantendo o antebraço em pronação. Em outras faixas etárias realizamos a redução indireta e a fixação percutânea com 2 fios de Kirschner laterais. Quando a ossificação do fragmento epifisário é mínima podemos realizar uma artrografia intra-operatória para avaliar a qualidade da redução. Os fios e a imobilização são removidos após 3 semanas. Se o tratamento for iniciado após 3 ou 5 dias e a epífise não apresentar movimento o cotovelo deve ser simplesmente imobilizado e uma eventual deformidade futura deve ser corrigida por meio de uma osteotomia supracondilar. 4.4. Complicações São citadas as lesão neurovasculares permanentes ou temporárias, a pseudartrose, a consolidação viciosa e a osteonecrose.

4. FRATURAS DA TRÓCLEA 4.1. Epidemiologia Fraturas osteocondrais que envolvem apenas a porção articular da tróclea são raríssimas em crianças esqueleticamente e podem ocorrer em neonatos ou nos 2 ou 3 primeiros anos de vida. Decorrem de partos difíceis ou maus tratos e provavelmente são provocadas por forças de cisalhamento rotativas ou pela extensão do cotovelo. 4.2. Diagnóstico clínico e radiográfico Há dor, aumento do volume do cotovelo e crepitação. A relação entre os epicôndilos e o olécrano geralmente está mantida. O diagnóstico radiográfico pode ser difícil, principalmente nos neonatos, pois o centro de ossificação do côndilo lateral não é visível. Luxações do cotovelo são raras. 4.3. Tratamento As fraturas recentes são tratadas por redução fechada onde o cotovelo é inicialmente manipulado na extensão para obter-se a correção do desvio medial. Em seguida, o cotovelo é flexionado e o antebraço pronado para obtermos a estabilização da re-

5. FRATURAS DA APÓFISE DO EPICÔNDILO MEDIAL 5.1. Epidemiologia Correspondem a 11,5% de todas as fraturas do cotovelo e a 14,1% das fraturas da porção distal do úmero. Incidem em 79% dos indivíduos do sexo masculino, numa proporção de 4:1 na idade de 9-12 anos. Há associação com luxação do cotovelo em 30% - 55% (15%-18%, envolvem encarceramento da apófise do epicôndilo). Ocorrem por traumas agudos diretos, mecanismos de avulsão e pela luxação do cotovelo. Podem es311

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tar associadas com o encarceramento crônico ou com fraturas do colo do rádio, do olécrano ou do processo coronoide. 5.2. Diagnóstico clínico e radiográfico Devemos avaliar a estabilidade do cotovelo pelo estresse em valgo com o paciente mantido em decúbito dorsal, o braço abduzido em 90°, o ombro rodados lateralmente em 90°, o cotovelo em flexão de 15° para eliminar a força estabilizadora do olécrano. Se o cotovelo estiver instável, a simples força da gravidade abrirá o lado medial. A função do nervo ulnar deve ser cuidadosamente avaliada. O alargamento ou a irregularidade da linha apofisária pode constituir-se no único indício de fratura. Quando há encarceramento do fragmento este pode ser ocultado pela ulna ou pelo úmero distal. 5.3. Tratamento Fraturas sem desvio ou com desvio mínimo são tratadas conservadoramente. A associação da lesão do nervo ulnar constitui-se de uma indicação cirúrgica relativa, pois sua recuperação pode ocorrer espontaneamente exceto numa disfunção completa. A indicação absoluta para o tratamento cirúrgico relaciona-se com o encarcerado irredutível desta apófise na articulação do cotovelo. Também devemos estabilizar o epicôndilo medial cirurgicamente nos atletas de alto desempenho físico com um único parafuso esponjoso. A mobilidade ativa precoce é essencial

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mas devemos evitar uma fisioterapia agressiva. 5.4. Complicações Poucas são as complicações atribuídas a esta fratura. Estas resultam da perda da função do cotovelo, pela falha na identificação do fragmento encarcerado, e da disfunção do nervo ulnar ou mediano. Limitação da extensão do cotovelo, miosite ossificante, calcificação dos ligamentos colaterais, defrormidades, pseudartrose em atleta de alto desempenho também são complicações citadas. 6. FRATURAS CONDILARES EM T 6.1. Epidemiologia Nas lesões condilares em T a linha de fratura se origina na incisura central da tróclea e percorre um trajeto proximal ao olécrano e às fossas coronóideas, onde se divide e separa as colunas ósseas medial e lateral da porção distai do úmero. Essa fratura é bastante rara em crianças esqueleticamente imaturas e incidem principalmente nos adolescentes. O principal mecanismo de lesão desta fratura é o efeito de cunha da superfície articular do olécrano contra a extremidade distai do úmero. Acredita-se que o mecanismo mais comum desse padrão de trauma direto na região posterior do cotovelo quando a criança cai diretamente sobre o cotovelo fletido. Eventualmente, Esporadicamente, esta pode ser causada por uma queda sobre o braço estendido com o cotovelo apenas em leve flexão. 312

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6.2. Diagnóstico clínico e radiográfico Essas fraturas são confundidas com fraturas supracondilares deslocadas do tipo em extensão pela posição estendida do cotovelo e o grande aumento de volume que são praticamente idênticos nos dois casos. Nas crianças mais velhas, é preciso diferenciar a fratura condilar em T de uma fratura supracondilar cominutiva. 6.3. Tratamento É necessário restabelecer a congruência da superfície articular e proporcionar estabilidade. Geralmente métodos fechados não produzem resultado aceitável. O tratamento cirúrgico com redução anatômica e osteossíntese determina bons resultados.

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A abordagem posterior poupando o tríceps com ou sem osteotomia do olécrano é preferencial para estas fraturas especialmente quando há grande cominução articular. Quando optamos por fixação com placa e parafusos utilizamos um aparelho gessado por 5 ou 7 dias para analgesia. Após este período são iniciados os movimentos ativos assistidos até obter-se a completa recuperação do paciente. 6.4. Complicações Por se tratar de fratura grave pode ocorrer rigidez e perda de movimento do cotovelo, independentemente do tratamento empregado. Pode ocorrer a interrupção parcial ou total do crescimento, pseudartrose, necrose da tróclea e falha de fixação interna.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Beaty, JH; Kasser, JR. Rockwood & Wilkins’ Fractures in Children, 6th Edition, 2006 Lippincott, Williams & Wilkins 2. Canale, ST; Beaty, JH. Campbell’s Operative Orthopaedics, 11th Edition, 2008 Mosby, Elsevier. 3. Herring, JA. Tachdjian’s Pediatric Orthopaedics, 4yh Edition, 2008 Saunders, Elsevier. 313

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Fraturas do antebraço e mão Nei Botter Montenegro

FRATURAS DO OLÉCRANO Estas são provocadas por quedas com cotovelo flexionado com ação abrupta e conjunta do tríceps braquial, o qual provoca tração e avulsão do fragmento proximal da fratura. O diagnóstico destas fraturas não oferece problemas. Na vigência de fraturas com deslocamento discreto do fragmento proximal, o diagnóstico é mais difícil e exige estudo radiográfico comparativo. O núcleo de ossificação do olécrano aparece depois dos oito anos de idade. Nas fraturas que não apresentam desvio encontramos o periósteo intacto e o tratamento é conservador, com imobilização gessada axilo-palmar, mantendo o cotovelo semiflexionado por quatro semanas. Nas fraturas com deslocamento do fragmento proximal a indicação de tratamento cirúrgico é absoluta. O método de escolha é a redução anatômica e fixação pelo sistema de banda de tensão. No caso de associação com lesão da cabeça do rádio devemos também nos preocupar com este deslocamento e procurar a melhor posição de redução possível. Em geral estas fraturas evoluem bem e sem complicações.

existe um componente em valgo no momento do trauma, o traço tende ser oblíquo e, nesta situação, a luxação associada da cabeça do rádio ocorre, chamada de lesão de Monteggia. O diagnóstico radiográfico muitas vezes não é realizado, causando uma grave situação. São escritos também casos mais raros de deformação plástica da ulna com a luxação da cabeça radial, dificultando ainda mais a percepção deste deslocamento. É mais comum nos adolescentes, acima dos 10 anos idade, sendo usada a classificação de Salter-Harris: (Classificação das fraturas da placa epifisária) Grau 1: fratura com alargamento da placa epifisária, entando a distância entre a epífise e a metáfise aumentada. O periósteo está preservado, sendo o diagnóstico é feito radiologicamente quando comparativamente ao lado bom ocorrendo separação completa da epífise sem fratura. Grau 2: fratura da placa epifisária com ruptura do periósteo, sendo mais instável, com fragmento metafisário triangular preso à epífise um; são fraturas de bom prognóstico. Grau 3: fratura da placa epifisária em que o traço de fratura compromete exclusivamente a epífise, com avulsão nesta região anatômica. Grau 4: o traço de fratura com-

Fratura de Monteggia Nas fraturas do olécrano, quando 314

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promete a epífise e se prolonga pela metáfise. Todas as fraturas com desvio e perda do mecanismo extensor são de tratamento cirúrgico, devendo os pais serem informados da possibilidade de evolução para desvio angular, independente do resultado da redução. Nas crianças, nunca se retira a cabeça do rádio, já que a mesma é responsável pelo crescimento ósseo.

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Classificação de Judet Desvio:

Mínimo ou ausente

Inclinação:

Mínima ou ausente

Desvio:

Até a ½ da superfície da diáfise

Tipo I

Tipo II

FRATURA DA CABEÇA DO RÁDIO As fraturas da cabeça do rádio ocorrem com relativa frequência na infância e adolescência. Elas podem ser divididas em fraturas do colo do rádio e fraturas que atingem a placa epifisária. A cabeça do rádio, como a cabeça do fêmur, tem um suprimento vascular distinto. Os vasos sanguíneos estão localizados na cápsula articular e, por isto, fraturas com desvios graves que lesam a cápsula são potencialmente graves, podendo levar à necrose do tecido ósseo ou interrupção do suprimento sanguíneo para a placa epifisária proximal do rádio. A classificação mais utilizada para as fraturas do colo do rádio é a de Judet. Esta divide as fraturas em quatro tipos, levando em consideração o desvio lateral e a inclinação da cabeça do rádio em relação à diáfise, tendo importância prática, porque permite considerar a gravidade do dano vascular, planejar o tratamento e prever o prognóstico.

Tipo III

Tipo IV

Inclinação:

Até 30º

Desvio

Maior que ½ da diáfise

Inclinação

De 30º a 60º

Desvio

Completo

Inclinação

De 60º a 90º

Ligamento anular rompido

O tratamento varia desde a imobilização gessada por duas a três semanas nos tipos I e II, após redução sob anestesia geral. As fraturas do tipo I e II em geral evoluem bem, porque a lesão da cápsula e do periósteo é parcial e o suprimento sanguíneo não está comprometido. No tipo III, caso o tratamento incruenta não tenha sucesso, redução e osteossíntese percutânea ou redução aberta e osteossíntese com fios de Kirschner são indicados. No tipo IV, a redução cirúrgica anatômica e síntese são sempre indicados devido ao grande risco de necrose. Os pais devem ser informados desta possibilidade, assim como da deformidade progressiva em valgo pela parada do crescimento proximal do rádio. Tam315

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bém é descrita a sinostose radio-ulnar proximal como possível complicação.

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meninos e entre 8 e 11 anos nas meninas, sendo mais prevalente no sexo masculino em todas as idades. Quanto ao mecanismo de trauma, a maioria é indireto, por queda da própria altura ou de pequena altura sobre o membro superior com o cotovelo e punho em extensão sobre a mão espalmada, em atividades recreativas e nos esportes. O lado não dominante corresponde a 60% das mesmas. As fraturas dos ossos do antebraço, como anteriormente citadas, são classificadas de acordo com sua localização em fraturas do terço proximal, do terço médio e do terço distal. De acordo com o tipo de acometimento das corticais ósseas elas são ditas completas ou incompletas. As incompletas são subdivididas em subperiosteais e em “galho verde”. De acordo com a angulação, elas podem ser dorsais ou volares, associadas ou não à rotação e translação. Cada um destes tipos de fraturas tem suas peculiaridades, que devem ser levadas em consideração no momento do diagnóstico e tratamento. O diagnóstico de um modo geral não é difícil. A história clínica seguida de um exame físico detalhado confirma a suspeita, principalmente nos casos de fraturas com desvio. Nestas, é importante a palpação dos pulsos arteriais e identificação de possíveis lesões de nervos periféricos, assim como a detecção de sintomas da Síndrome Compartimental (como na fratura supracondiliana do úmero) .

Pronação dolorosa ou “cotovelo de babá” O ligamento anular envolve a cabeça do rádio, a qual na criança é de tecido cartilaginoso até os 5 anos de idade, não estando o mecanismo que a estabiliza totalmente formado. Quando o cuidador puxa a criança pelo antebraço, ocorrendo tração, leva o ligamento anular para dentro da articulação entre o rádio e o úmero, correspondo à pronação dolorosa. Sendo também sintoma da fratura da cabeça do rádio, toda pronação dolorosa deve ser reduzida e radiografada, (radiografias do antebraço, incluindo cotovelo e punho). A redução é realizada em supinação e flexão do antebraço sobre o braço promovendo a relocação do ligamento anular à sua posição anatômica. Não há necessidade de imobilização em supinação, a não ser para as crianças com deslocamento a mais de um dia, ou com muita dor, mesmo após a redução ser realizada. FRATURAS DO ANTEBRAÇO As fraturas do antebraço correspondem a cerca de um terço de todas as fraturas nas crianças. No antebraço, 75% são do 1/3 distal e 18% do 1/3 médio. O número de fraturas aumentou de 263.3 para 100.000 habitantes entre 1969 a 1971 para 372.9 entre 1999 a 2001 (141%). A maior incidência acontece entre 11 e 14 anos nos 316

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Radiografias em ântero-posterior e perfil são necessárias e geralmente suficientes para o diagnóstico destas lesões. O objetivo do tratamento é conseguir a consolidação da fratura em boa posição e manter a amplitude normal dos movimentos do cotovelo, do punho e de prono-supinação. A remodelação óssea permite aceitar determinados desvios. Inicialmente, a imobilização por calha gessada não circular diminui a possibilidade do edema fisiológico estabelecido nas primeiras 72 horas levar ao garroteamento do membro, complicação sempre temida no uso do gesso circular, com compressão e morte tecidual das partes moles, principalmente muscular (isquemia de WOLKMAN).

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verificamos tendência à recidiva da deformidade. Outros trabalhos querem demonstrar menor índice de refraturas quando estas são completadas na redução. Deve-se ter o cuidado de não criar um desvio em translação com uma manobra mais intempestiva. Na redução destas fraturas é necessária a correção desta rotação por meio de aplicação de forças no sentido oposto à que promoveu a deformidade. Processo mneumônico para tal é rodar a palma da mão no sentido do vértice angular. supinando quando for ventral e pronando quando dorsal. Como diagnóstico diferencial, devemos sempre lembrar da possibilidade da síndrome de maus tratos à criança e da osteogênese imperfeita. Nas fraturas diafisárias completas, o desvio depende da localização do traço de fratura e da ação muscular. No terço médio o rádio pode estar pronado e com desvio ulnar pela ação do pronador quadrado; no terço proximal, este osso fica pronado distalmente e supinado no fragmento proximal por ação dos supinadores e bíceps braquial. Tal rotação deve ser corrigida inicialmente. O tratamento conservador é tratamento padrão para as fraturas abaixo de 10 anos, com resultados excelentes. A qualidade dos resultados com o tratamento conservador em fraturas com desvio nos pacientes com idade entre 10 e 16 não é aceitável, já que as fraturas diafisárias apresentam re-

FRATURAS DA DIÁFISE Nas fraturas em “galho verde” a rotação do antebraço faz patre da gênese da fratura e pode ser melhor identificada pela verificação da posição do vértice angular da fratura. Quando este aponta para a região ventral, houve força rotacional em supinação; quando aponta para dorsal, a rotacional foi realizada em pronação. Autores defendem que na técnica de redução deste tipo de fratura deve-se completar a fratura antes da correção do desvio, com a criança sob anestesia geral em ambiente cirúrgico. O que observamos é que nem sempre é mandatória esta prática, a não ser quando, na redução, 317

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modelação apenas até os 10 anos. A redução incruenta deve ser realizada por manipulação em ambiente cirúrgico e sob anestesia geral. O cavalgamento de só um ou de ambos ossos do antebraço pode ser corrigido pela hiperdeformação da fratura. No caso de cavalgamento irredutível, o mesmo pode ser aceito em crianças menores de 6 anos, desde que o espaço da membrana interóssea esteja aberto, modelando-se este no gesso axilopalmar definitivo. As imobilizações gessadas devem ser realizadas com apoio em três pontos com moldagem interóssea, mantida por pelo menos 6 semanas. Em crianças maiores com fraturas irredutíveis ou instáveis após redução, fraturas com lesões vasculares, refraturas com desvio e fraturas segmentares tem indicação cirúrgica, podendose optar por fixação percutânea com hastes intramedulares flexíveis em titânio ou com fios de Kirschner, em um ou ambos os ossos do antebraço, associado à imobilização com meio gesso (Figura 1). Estudos demonstram baixo índice de complicações e os resultados positivos neste tipo de tratamento. O portal para a entrada do fio radial é geralmente proximal à fise distal, pela face dorsolateral do mesmo. Já a ulna, há autores que prezam a apófise do olécrano, fazendo o portal pela face dorso radial proximal, porém, a passagem do pino intramedular pelo olécrano, na prática, não promove o fechamento precoce desta fise.

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Figura 1. Fratura da diáfise do antebraço em menino de 13 anos com fixação com hastes flexíveis de titânio.

Nas fraturas expostas, o tratamento dependerá do grau de exposição e contaminação, tipo de fratura e idade do paciente. Devem ser tratadas como outras fraturas com exposição, cuja síntese imediata deve ser pensada com bom senso. Raramente há necessidade de fixação externa. Os desvios angulares aceitáveis variam de acordo com a idade da criança e o nível da fratura. Em crianças até 8 anos de idade são considerados aceitáveis desvios inferiores a 15 graus de angulação na incidência AP e 20 graus em perfil. Acima dos nove anos de idade são considerados aceitáveis desvios de 10 graus de angulação nas incidências em AP e perfil (fraturas proximais do terço médio). Nas fraturas distais são aceitáveis desvios de 15 318

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graus na incidência em AP e 20 graus em perfil. As fraturas diafisárias tem risco oito vezes maior de refratura. O tempo médio em que ocorreram as refraturas é de oito semanas após a retirada da imobilização ou da síntese. A imobilização por até 6 semanas reduz o risco de refratura entre 4 a 6 vezes. A análise do desvio rotacional foi mais relacionada com as limitações de movimentos que os desvios angulares. As remodelações nos 1/3 médio e distal ocorrem e podem ser previstas pela análise do desvio rotacional, sendo menor que 5 graus no momento da redução de fraturas do antebraço em crianças, independente a posição da fratura.

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analgésica, bastando a imobilização antebraquiopalmar, limitando os movimentos do punho. Todas as outras fraturas desta região do antebraço, devem ser imobilizadas com gesso axilopalmar estando o cotovelo fletido a 90º e punho com rotação de neutra nas fraturas estáveis e em pronação nas instáveis. Quando ha desvio de angulação ou de translação, este deve ser reduzido sob anestesia geral através de movimentos de rotação, angulação e hiperdeformação quando necessitar da translação dos fragmentos para contato das corticais. Na imobilização axilopalmar as articulações metacarpofalangeanas devem ficar livres, de modo a impedir a flexão e extensão do punho, sendo esta moldada com leve arqueamento dorsal e apoio em três pontos. Como já referido, e’ necessário moldar a membrana interóssea. No cotovelo, a modelagem da forma do mesmo, sem pressionar a fossa antecubital evita movimentação nesta região. Com o membro já imobilizado, o mesmo deve ser elevado, bem como estimulada a movimentação dos dedos com estímulo da drenagem venosa, evitando garroteamento pelo edema local. No caso de dor `a extensão passiva dos dedos, por tração da musculatura flexora profunda, haverá suspeita da instalação de síndrome compartimental, devendo-se priorizar sempre a circulação do membro em detrimento do tratamento do desvio da fratura, devendo-se fender o gesso, retira-lo e medir a pressão no compar-

FRATURAS DO TERÇO DISTAL DO ANTEBRAÇO A área de maior frequência de fraturas no antebraço e’ a região metafisária do rádio distal, onde os descolamentos epifisários do tipo II de Salter-Harris são as lesões usualmente vistas. Desvios discretos nas fraturas metafisarias são aceitáveis, a não ser nas lesões da placa epifisária. Por vezes a redução pode ser dificultada na região metafisária pelo periósteo roto interposto, assim como do músculo pronador quadrado. O tratamento destas fraturas dependera’ do tipo, idade do paciente, tipo e desvio. As fraturas subperiostais não apresentam desvios importantes ou são instáveis a pronosupinacao. Portanto, a imobilização torna-se 319

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timento volar profundo. No caso de dúvida, proceder realizando a fasciotomia DOS compartimentos do antebraço de urgência. Em ate’ quinze dias ha’ possibilidade da perda da redução, intervalo este onde de 5 a 7 dias e em 14 dias deve-se realizar raio X de controle do posicionamento. Mantida a redução, a imobilização axilopalmar pode ser mantida seis semanas, ou trocada nas duas ultimas por uma luva gessada. Quando ha’ deslocamento demonstrando instabilidade apos a redução, novo procedimento deve ser acompanhado da fixação com um fio de Kirschner, passado do processo estilóide radial `a cortical ulnar proximal ao traço de fratura. O mesmo poderá ser removido apos controle radiográfico com 3 a 4 semanas. A área de secção ocupada por fio de 2 mm e’ considerada pequena para causar epifisiodese local. A remodelação óssea no sentido da flexo extensão do punho torna desvios angulares de até 20º aceitáveis em pacientes ate 8 anos; acima desta idade, a remodelação não suplantara’ desvios maiores que 10º.

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fácil determinação ao exame clínico e radiológico, mascarando fraturas dos ossos do carpo. Pacientes com dor na tabaqueira anatômica devem ser investigados. Com a baixa incidência da fratura do escafóide no esqueleto em crescimento, associada ao fato de ser de difícil visualização, esta dificilmente e’ descoberta, podendo sua incidência estar subestimada. Alem deste fato, a fratura, como no adulto, pode ser visualizada ao RX apenas 2 semanas depois. Relatos de diagnostico por Ultrassom e por Ressonância Magnética tiveram a persistência da dor como razão para sua realização. A fratura do escafoide pode estar associada `a do radio ou de outro osso carpal. O diagnóstico tardio só ocorre quando há complicação, como pseudartrose, mesmo apos anos do trauma. O seu núcleo de ossificação aparece aos cinco anos de vida; tanto a incidência quanto o diagnostico aumentam de frequência com o amadurecimento do esqueleto, com média de idade em torno de 12,5 anos, acometendo o pólo distal, na maioria em meninos. Esta localização anatômica explica também o bom prognostico destas fraturas Quando feito o diagnostico, a imobilização clássica para este tipo de fratura por 6 a 8 semanas, com inclusão do polegar ao longo do eixo do antebraço costuma dar bons resultados. Mesmo casos de retardo de consolidação e pseudoartroses em fraturas não diagnosticadas podem consolidar com imobilização prolongada. Sintomas como estalidos po-

FRATURAS DA MÃO Fratura do escafoide Por serem constituídos de grande quantidade de cartilagem, os ossos do carpo na criança dificilmente sofrem fraturas. Entretanto, as forças resultantes de trauma (indireto, por queda sobre a mão espalmada no solo) são transmitidas ao rádio distal, causando a fratura dessa região, sendo esta de 320

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dem ser encontrados. Nas crianças sintomáticas, o tratamento com enxerto autólogo é indicado.

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incompatível com boa função, em pacientes na adolescência. Os fios de Kirschner são a opção de síntese mais utilizada; atualmente, mini hastes de titânio (TEN) podem ser indicadas para síntese intramedular. As complicações possíveis são, consolidação viciosa, cujos graus aceitáveis variam com o raio em questão e raramente rigidez articular provisória. Apenas nos traumas de maior energia ou de esmagamento dos dedos, poderiam resultar em fraturas expostas, comunicando por vezes o meio externo apenas com o hematoma da como na lesão da ponta dos dedos, podendo ser chamado nas crianças menores de “lesão das portas nos dedos”, pelo alto índice deste tipo de acidente domestico, necessitando muitas vezes atendimento de urgência. O principal problema para o tratamento com terapia ocupacional são as lesões por esmagamento que podem causar fraturas dos metacarpos que resultam em dor e edema. Além disso, pode haver grave dano nos tecidos moles, que podem afetar músculos, vasos sanguíneos e nervos. O encurtamento pode ocorrer com cominuição ou em fraturas obliquas instáveis. O tratamento das fraturas das falanges e’ conservador, necessitando nos descolamentos epifisários de adolescentes, por vezes, redução e tala metálica para dedos, alem de tala metálica, raramente necessitando síntese com fios de Kirschner em casos especiais instáveis, como na perda da redução.

FRATURA DOS DEDOS As fraturas dos metacarpos e das falanges correspondem a 10% das fraturas dos membros superiores e a 80% das fraturas da mão, apresentando maior incidência do primeiro e do quinto raios. O mecanismo de trauma mais comum e’ o direto, em acidentes domésticos, na pratica de esportes e nas quedas. A classificação e’ pelo ponto anatômico fraturado, podendo acometer a cabeça (epífise) , o colo (descolamento epifisário, geralmente do tipo II de Salter Harris. A diáfise (fraturas obliquas na sua maioria) e da base, em mecanismos de trauma por esmagamento ou sobre o polegar. Quando este e’ acometido, descolamento epifisário do primeiro metacarpo corresponde `a fratura de Bennett do adulto, devendo ser reduzida e imobilizada com abdução do polegar. Quando instável, a osteossíntese com fios de Kirschner se faz necessária. O tratamento conservador e’ o mais comum, com imobilização de todos os dedos em posição “intrínseca plus”, mantendo a metacarpofalangiana fletida a cerca de 70 graus e interfalangianas em 10 graus de flexão, por cerca de 4 semanas. O tratamento cirúrgico e’ raramente indicado, em fraturas diafisárias com encurtamento grande ou angulação 321

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Baldy Reis FB. Traumatologia infantil. São Paulo: universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), 1999, p.59-74. 2. Beaty JH, Kasser JR. In Rockwood and Wilkins (ed). Fractures in Children.Baltimore: Lippincott Williams and Wilkins, 2001. 3. Bloem, J.J.A.: Fracture of the carpal scaphoid in a child age 4. Arch Chir Neerl 23: 91, 1971. 4. Blount WP, Fractures in Children. Baltimore: The Williams & Wilkins Company, 1955. 5. Cheng JCY, Yine SY, Lam PKW. A 10.year study of the changes in the pattern and treatment of 6, 493 fractures. J. Ped Ort 1999; 19:344-350. 6. Cockshott, W.P.: Distal avulsion fracture of the scaphoid. Br J Radiol 53: 1037-1040, 1980. 7. Cristodoulou, A.G. & Colton, C.L.: Scaphoid fractures in children. J Pediatr Orthop 6: 37-39, 1986. 8. Cunha FM, Braga GF, Abrahão LC, Vilela JCS. Fraturas exposta em crianças e adolescentes. Rev Br Ort 1998; 33:6 9. Gamble, J.G. & Simmons, S.C.: Bilateral scaphoid fractures in a child. Clin Orthop 162: 125-128, 1982. 10. Greene, W.B. & Anderson, W.J.: Simultaneous fracture of the scaphoid and radius in a child. J Pediatr Orthop 2: 191-194, 1982. 11. Grundy, M.: Fractures of the carpal scaphoid in children: a series of eight cases. Br J Surg 56: 523, 1969. 12. Larson, B., Light, T.R. & Ogden, J.A.: Fracture and ischemic necrosis of the immature scaphoid. J Hand Surg [Am] 12: 122-127, 1987. 13. Müssbichler, H.: Injuries of the carpal scaphoid in children. Acta Radiol 56: 361-368, 1961. 14. O’Brien, O.T.: “Fraturas da mão e da região do punho”, in Rockwood Jr., C.A., Wilkins, K.E. & King, R.E.: Fraturas em crianças, São Paulo, Manole, 1993. Cap. 4, p. 309-402. 15. Price, CT Philips JH, DeVito, DP. Management of Fractures In; Morrissy RT, Weinstein SL. Lovel and Winter´s Pediatric ortropaedics, 5.ed. Philadelphia: Lippincott, 2001, p. 1372-422. 16. Rockwood Jr, CA, Wilkian KE, Beaty JH. Fractures in children. Philadelphia. Lipincott Raven, 1996, p.1147-428. 17. Southcott, R. & Rosman, M.A.: Non-union of the carpal scaphoid fractures in children. J Bone Joint Surg [Br] 59: 20-23, 1977. 18. Tachdjian MO. Pediatric Orthopaedics, 2 ed. Philadelphia: Saunders Company, 1990, p. 331-336. 19. Taleisnick, J. & Kelly, P.J.: The extraosseous and intraosseous blood supply of the scaphoid bone. J Bone Joint Surg [Am] 48: 1125-1137, 1966. 20. Vahvanen, V. & Westerlund, M.: Fracture of the carpal scaphoid in chil- dren. Acta Orthop Scand 51: 909-913, 1980. 21. Weber BG, Brunner Ch et al. Treatment o fractures in children and adolescents. Berlin: SpringerVerlag, 1980. 22. Wilson-MacDonald, J.: Delayed union of the distal scaphoid in a child. J Hand Surg [Am] 12: 520-522, 1987.

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Fraturas da extremidade distal do rádio Edilson Forlin

As fraturas da extremidade distal do radio (FDR) são comuns e correspondem a um quarto das fraturas da infância. São mais freqüentes em crianças acima de cinco anos com pico entre 10 e 14 anos. Fraturas incompletas são mais características de crianças com menos de 10 anos, fraturas epifisárias após os 10 anos e fraturas completas em adolescentes. A maioria ocorre secundária a quedas com o punho em extensão causando, portanto, um desvio dorsal. Quedas com punho em flexão podem resultar em desvio dorsal. A fratura da ulna é menos comum e raramente ocorre isoladamente. Na fratura de Galeazzi clássica ocorre o deslocamento da epífise distal da ulna e uma variante mais grave apresenta deslocamento da extremidade distal da ulna.

dor em face volar, radial e dorsal do punho. Quando há fratura associada da ulna, também há dor na face ulnar. A região carpo ulnar deve ser cuidadosamente avaliada pelo risco de fratura de Galeazzi, clássica ou variante. O médico deve estabelecer se a dor localiza-se na metáfise, na projeção da epífise ou há deslocamento da extremidade distal da ulna. Quando comprometida há deformidade, edema e dor a palpação. Deve ser avaliada também a clavícula, cotovelo e antebraço procurando-se lesões adicionais associadas. Atenção deve ser prestada a circulação e edema da mão e dedos. Em crianças menores de 3 anos, e especialmente nas menores que 1 ano de idade devemos lembrar do diagnóstico de maus-tratos, fazendo uma avaliação compatível com tal suspeita.

Diagnóstico O diagnóstico é baseado em história clara de trauma com o punho em extensão ou flexão e queixas de dor que piora à tentativa de mobilização do punho e à pronosupinação. Na inspeção, a criança protege a extremidade de movimento e pode haver edema ou deformidade. A palpação deve ser feita de forma calma e cuidadosa. Em geral, o paciente refere

Avaliação radiográfica A radiografia deve ser solicitada de todo o antebraço permitindo visualização do cotovelo e punho em AP e perfil. Deve ter uma imagem de qualidade, pois uma das situações que levam a não diagnóstico é a dificuldade na avaliação da radiografia. Isto é especialmente claro nas fraturas subperiosteais e nas lesões fisárias 323

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menos intensas. Uma técnica de avaliação é o seguimento da cortical para identificar qualquer irregularidade (degrau). Na avaliação da radiografia devem ser estabelecidos o grau e a direção do desvio no plano sagital e coronal, pois o tratamento deverá depender dessas variáveis. Como afirmado, o desvio mais comum é o dorsal. Importante não se descuidar do aspecto que as lesões fisárias são classificadas segundo Salter e Harris.

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Em muitos anos de experiência com residentes de serviços que primordialmente atendem trauma em adultos notamos uma tendência de tratar as fraturas com conceitos do tratamento de adultos. Esta forma de pensar tende a indicar tratamentos mais agressivos e desnecessários e com potencial de riscos que poderiam ser evitados. Imobilização Nas fraturas subperioesteais não há muita dificuldade e o tratamento com imobilização por 3 a 4 semanas é suficiente. Alguns referem que quando há dor na prono-supinação deve ser confeccionado gesso braquiopalmar. No entanto a luva gessada e o uso associado da tipóia, tanto confeccionada na unidade quanto a do comércio, por alguns dias alivia a dor aos movimentos do antebraço e evita o importante desconforto da imobilização do cotovelo. Em crianças pequenas, de 1 a 3 anos o problema da luva é que ela literalmente pode cair. Por isso, nesses pacientes nossa preferência é o gesso braquiopalmar. Nas fraturas desviadas é que há maior controvérsia e desinformação. Como já referido, muitos tendem a tratar como adultos não aceitando desvios, mesmo que mínimos. No entanto a literatura não deixa dúvidas quanto ao alto potencial de remodelação e que desvios moderados tem capacidade de remodelação completa. Outro fato é que mesmo com desvios residuais a função pode estar

Tratamento Antes de discutir o tratamento, são importantes algumas considerações retiradas da prática clínica e de vários estudos sobre o assunto: 1. A extremidade distal do rádio é responsável por cerca de 80% do crescimento do antebraço e isto implica em alta capacidade de remodelação. 2. Os conceitos de tratamento dos adultos não se aplicam a crianças. 3. Devem ser evitados tratamentos excessivos. 4. A placa de crescimento pode ser lesada por manipulações excessivas e intempestivas. 5. O uso de pinos está sujeito a complicações. 6. Fraturas do rádio distal em crianças podem ser adequadamente tratadas de modo conservador. 7. A maioria das fraturas desviadas é estável após a redução. 324

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totalmente normal. Fratura com até 15 graus de angulação e translocação de até 30% em qualquer idade tendem a remodelar completamente e rapidamente (até 9 meses) e não necessitam de redução. Critérios para indicação de redução não são consenso. Stutz e Mencio em recente revisão apresentam os seguintes critérios de indicação: angulação maior que 15 graus em qualquer idade, translocação maior que 30% e encurtamento de mais de 1 cm. Já Noonan e Price aceitam angulação de até 20 graus (quando há pelo menos dois anos de potencial de crescimento) e translocação de 100% (posição de baioneta). Em nosso serviço temos aceitado desvios até 30 graus em crianças com potencial de crescimento de pelo menos 2 anos sem observar problemas estéticos e funcionais. No tratamento conservador a qualidade da imobilização é fundamental. O gesso deve ser bem moldado e justo, mas nunca apertado ou desconfortável. Nos primeiros dois dias deve ser priorizado o repouso, dormindo e permanecendo alguns períodos com o membro elevado. Uso de antiinflamatório e analgesia moderada é útil nas primeiras 48 horas. Deve-se evitar uso de analgésicos potentes para evitar mascarar compressões pela imobilização. Independente do critério do tratamento inicial, radiografias de controle com uma, duas e até três semanas são recomendadas. Há potencial de

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perda de posição especialmente nas fraturas com maior desvio inicial. Redução incruenta Quando no atendimento inicial é observado desvio acima do aceitável para imobilização, estará indicada a redução. A rotina dos serviços varia quanto à forma deste tratamento. Pode ser tanto no setor de emergência quanto internado. Tradicionalmente a redução pode ser “a frigore”, sob anestesia no foco de fratura, sob anestesia plexular ou troncular e sob anestesia geral. Atualmente procedimento sob ação do oxido nitroso é outra opção. Cada uma dessas modalidades tem vantagens e desvantagens, facilidades e dificuldades. Além da rotina da instituição, fatores como idade da criança, grau do desvio, preferência do cirurgião e opinião dos pais influem na decisão. Em nosso hospital as reduções são feitas no centro cirúrgico sob anestesia geral e o paciente fica internado cerca de 12 horas para observação do quadro. A redução deve ser suave com tração e contra-tração efetiva e manobra cuidadosa. Outra diferença entre os serviços é quanto a indicação de fixação das fraturas. Estudos demonstram que perto de 30% das fraturas reduzidas tendem a perder a posição na evolução e por isso muitos autores indicam a fixação destas fraturas com fios de Kirschner. Um dos principais fatores associados a perda da redução é o desvio inicial, especialmente desvio 325

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maior de 30 graus e translocação superior a 50%. Deve ser lembrado que o uso de pinos também está associado a complicações. Miller e cols. comparando pacientes submetidos a redução incruenta encontraram que houve 39% de perda de posição nos pacientes tratados somente com gesso e 38% de infecção nos pinos nos tratados com fixação. Portanto, o cirurgião deve considerar os riscos e vantagens de cada modalidade. No tratamento sem fixação é essencial observar os cuidados com a confecção de aparelho gessado já referidos no item anterior.

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graus em pré-adolescentes (em crianças abaixo de 10 anos temos aceitado desvios até 30 graus). Redução deve ser suave, utilizando tração e contra tração e sem emprego de força excessiva para evitar dano na placa de crescimento. Em geral a redução é estável, no entanto em casos de instabilidade fixação com fio de Kirschner (geralmente 1 fio) é uma opção. Diferentemente das fraturas metafisárias, nas lesões epifisárias contraindicamos a redução em fraturas com mais de uma semana de evolução pelo potencial de lesão da placa de crescimento Fraturas tipo Salter Harris III ou IV são incomuns e devem seguir o princípio de tratamento destes tipos de lesão.

Redução cirúrgica É uma indicação de exceção e deve ser reservada para casos de fratura exposta, fraturas irredutíveis por interposição de tecidos moles e nas raras situações de lesão nervosa ou vascular.

Complicações Perda da redução A perda da redução está associada principalmente às fraturas instáveis com desvios iniciais acentuados (como já discutido) e à técnica deficiente de confecção e posicionamento da imobilização. O gesso deve ficar confortável e bem moldado. O posicionamento do antebraço é geralmente neutro, mas para fraturas instáveis a imobilização em pronação quando o desvio é dorsal e em supinação quando o desvio é volar pode contribuir para a estabilidade. Outro fator que pode facilitar a ocorrência de perda da redução é fratura isolada do rádio sem fratura, ou com deformidade plástica, da ulna.

Descolamento Epifisário do Rádio Ocorrem em sua maioria em pacientes pré-adolescentes (sendo 80% delas em pacientes acima de 10 anos). O tipo mais comum é o grau II de Salter Harris (a lesão grau I é de difícil documentação). O potencial de remodelação das lesões epifisárias é ainda maior que nas fraturas metafisárias. Desvios de até 15 graus corrigem rapidamente mesmo nos adolescentes. A redução incruenta deve ser reservada para desvios acima de 15 326

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Infecção nos pinos Pode ocorrer em até um terço dos casos. Geralmente é superficial e regride com a retirada dos pinos. Pelo risco de infecção alguns autores recomendam que os pinos não fiquem expostos, mas isto acarreta dificuldades para a retirada, com a necessidade de anestesia e novo procedimento.

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Lesões vásculo nervosas São incomuns complicações ou lesões nervosas e vasculares associadas. Há relatos de lesão do nervo mediano pela compressão do fragmento distal. A redução anatômica e a estabilização promovem regressão dos sintomas. Quadro de síndrome do túnel carpeano pode ocorrer raramente em pacientes maiores. Caso haja persistência dos sintomas, a exploração cirúrgica está indicada. Embora a ocorrência de síndrome compartimental nas fraturas distais do antebraço seja extremamente rara, a sua gravidade justifica a suspeita em casos de dor intensa, parestesia, alterações de cor e temperatura que não respondem a medidas para alívio da compressão. Uma orientação importante para os casos de suspeita de compressão em pacientes com aparelho gessado, que não respondem rapidamente a repouso, elevação da mão e antiinflamatórios não hormonais é a abertura do gesso. Temos observado que muitos ortopedistas a realizam de forma não efetiva. Para real alívio da pressão acreditamos que é importante a retirada de uma faixa de dois centímetros de gesso em sentido longitudinal, assim como do algodão e corte da malha. A pele deve ser visualizada e o gesso realmente folgado em toda sua extensão (muitas imobilizações são espessas e mesmo abrindo o gesso ele não folga).

Lesão da placa de crescimento Surpreendentemente o bloqueio do crescimento da ulna é mais comum que no rádio. Também deve ser observado que a lesão da placa de crescimento pode ocorrer em fraturas metafisárias, sendo possivelmente devida a associação com uma lesão tipo V de Salter Harris. A lesão pode ocorrer no momento do trauma, mas também ser relacionada ao tratamento. Recomenda-se que toda a fratura de punho deva ser acompanhada pelo potencial desta lesão. Desvios progressivos do punho ou encurtamento de um dos ossos devem ser investigados para a presença de ponte óssea metafiso-epifisária. Quando há parada de crescimento da fise distal radial, causando alteração funcional ou estética, a epifisiodese da extremidade distal da ulna ou encurtamento cirúrgico da ulna são métodos simples que promovem retorno da função do punho e melhora estética. Já nos casos de parada do crescimento da ulna, a epifisiodese do rádio ou o alongamento em um só tempo da ulna com fixação com placa e enxerto ósseo são nossa preferência. 327

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Stutz C, Mencio GA. Fractures of the Distal Radius and Ulna: Metaphyseal and Physeal Injuries. J Pediatr Orthop, 30: S85-S89, 2010. 2. Bohm ER, Bubbar V, Yong Hing K, et al. Above and below-the-elbow plaster casts for distal forearm fractures in children. A randomized controlled trial. J Bone Joint Surg Am. 2006;88:1–8. 3. Miller BS, Taylor B, Widman RF, et al. Cast immobilization versus percutaneous pin fixation of displaced distal radius fractures in children: a prospective, randomized study. J Pediatr Orthop. 2005;25:490–494. 4. Borges JLB, Laghi R, Pitagoras T, Calieron LG: Fraturas isoladas do terço distal do rádio na criança. Rev Bras Ortop, 35: 88-93, 2000. 5. Santili C, Waisberg G, Akkari M, Mota RMV, Leite LMB, Prado JCL: Fraturas do terço distal do rádio na criança. Rev Bras Ortop, 34: 9-13, 1999.

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Lesões traumáticas da coluna cervical Alexandre Fogaça Cristante Henrique Gomes Noronha

EPIDEMIOLOGIA As lesões traumáticas da coluna vertebral em crianças são raras, devido a sua flexibilidade e capacidade de absorver forças em maior número de segmentos vertebrais. Totalizam cerca de 1% das fraturas em crianças. As causas mais freqüentes são o trauma neonatal, espancamento, acidente automobilístico e queda de altura. A incidência de lesão traumática da coluna varia de 2 a 13,2% e a grande maioria das lesões espinais em crianças ocorre na coluna cervical.

O exame neurológico inclui os exames motor, sensitivo e reflexos profundos e superficiais. No exame neurológico é mais utilizado o protocolo da ASIA, que confere ao paciente um índice motor e sensitivo. Figura 1.

DIAGNÓSTICO CLÍNICO Todo paciente com suspeita de fratura de coluna deve ser encarado como um paciente politraumatizado e ser avaliado segundo as normas da academia americana de cirurgiões. (ATLS/SAVT). Nas crianças menores incapazes de informar ou naquelas que apresentam alterações do nível de consciência e traumatismos de face ou couro cabeludo, deve-se sempre avaliar a coluna vertebral. Todo paciente deve ser transportado com colar cervical. Na avaliação hospitalar, o paciente deve ser mobilizado por pelo menos três pessoas. O médico deve coordenar a ação, ficando responsável pela coluna cervical.

Esquema de exame físico dos níveis sensitivos.

DIAGNÓSTICO POR IMAGEM Devemos iniciar os exames subsidiários com as radiografias nas incidências frente, perfil e trans-oral. RX dinâmico, tomografia computadorizada e ressonância magnética são solicitados subsequentemente. 329

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Figura 2.

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Figuras 3A e 3B.

3A – Radiografia de coluna cervical de criança com déficit neurológico após queda sem alteração óssea. 3B – Ressonância magnética cervical revela lesão não observada na radiografia.

A linha de Wackenheim.

Algumas medidas na radiografia em perfil são utilizadas: a linha de Wackenheim deve tangenciar posteriormente o clivus e a região superior e posterior do odontoide (Fig 2). Na articulação atlanto-axial a distância entre a borda anterior do dente do áxis e a borda posterior do arco anterior do Atlas é normal até 4,5 mm, devido à cartilagem não ossificada do odontoide. Os critérios de instabilidade da coluna cervical no RX são: angulação entre os processos espinhosos adjacentes > 11 graus e translação entre os corpos vertebrais de 3,5 mm, no perfil, aumento do espaço intervertebral e mau alinhamento dos processos espinhosos, na incidência anterior. Crianças podem apresentar lesão medular sem evidência radiográfica de lesão óssea (SCIWORA), devido à grande mobilidade da coluna nas crianças. Figura 3A e B. A pseudo-subluxação entre C2C3, normalmente notada no RX dinâmico, é considerada normal e não deve ser confundida com lesões verdadeiras. Figura 4

Figura 4.

Pseudoluxação C2-C3 fisiológica é melhor percebida na radiografia cervical dinâmica em flexão.

FRATURAS DO CONDILO OCCIPITAL As fraturas do côndilo occipital são raras na criança, devendo ser investigada quando na presença de déficit de nervo craniano. Três tipos de fraturas occipitais foram descritos: tipo I, fratura por impactação; tipo II, fratura de base do 330

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LESÕES ATLANTO-AXIAIS Fraturas do Odontoide O odontoide é um local freqüente de fraturas da coluna cervical em crianças, ocorrendo em média aos 4 anos de idade, acometendo geralmente a sincondrose distal de C2 na base do odontoide, como uma lesão fisária Salter I. Figura 5

crânio estendendo para occipício; tipo III, fratura por avulsão. O tipo I e II são tratadas com órtese cervical. O tipo III deve ser tratado com halo vest ou artrodese occipitocervical. INSTABILIDADE ATLANTOOCCIPITAL A luxação atlanto-occipital traumática é uma afecção geralmente fatal, decorrente da desaceleração súbita da cabeça, mais freqüente em acidentes automobilístico e atropelamentos. O diagnóstico é feito pela anormalidade da razão de Powers (distância entre a borda anterior do forâmen magno e o arco posterior do Atlas dividido pela distância entre borda posterior do forâmen magno e o arco anterior do Atlas, normal entre 1 e 0,7). O tratamento cirúrgico com artrodese occipito-axial é o de escolha.

Figura 5.

FRATURA DO ATLAS A fratura do Atlas é rara nas crianças, sendo causada principalmente por carga axial e raramente apresenta déficit neurológico associado. A instabilidade baseia-se na lesão do ligamento transverso, que pode ser avaliada pelo aumento maior que 7 mm na radiografia trans-oral ânteroposterior da distância entre as massas laterais de C1. O tratamento consiste na imobilização cervical (colar Filadélfia, gesso Minerva ou halo-gesso). A tração com halo é recomendada na lesão do ligamento transverso, seguida de halogesso.

Fraturas do Odontoide. Observe o acometimento da sincondrose base do odontoide e o desvio anterior.

Ocorre geralmente em associação com trauma crânio encefálico decorrente de queda de altura, trauma leve ou acidente de automóvel. Presença de déficit neurológico é raro. O tratamento é geralmente conservador com órtese ou gesso cervical. Em casos de falha de redução, o uso de tração com halo está indicado, 331

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seguido de halo gesso. Raramente o tratamento cirúrgico é necessário. Distúrbio de crescimento não é freqüente. O diagnóstico diferencial deve ser feito com . Ruptura Traumática do Ligamento Transverso O ligamento transverso é um estabilizador primário do odontoide. O aumento maior que 4,5mm entre odontoide e o arco anterior do Atlas demonstra a insuficiência deste ligamento. Ocorre em 10% das lesões cervicais das crianças. Nas avulsões com componente ósseo (menos comum), o tratamento é conservador com halo gesso, gesso Minerva ou órtese cervical. Nas lesões ligamentares, indica-se artrodese posterior C1-C2. Subluxação Rotatória Atlantoaxial A subluxação rotatória atlantoaxial, também chamada de síndrome de Grisel, freqüentemente é causa de torcicolo na criança, geralmente precedida por trauma ou infecção do trato respiratório superior. Classificação de Fielding e Hawkins: Tipo 1: (mais comum) subluxação facetária unilateral anterior < 3mm Tipo 2: subluxação facetária unilateral anterior com desvio de 3 a 5 mm Tipo 3: subluxação facetária bilateral anterior com desvio > 5 mm Tipo 4: subluxação posterior

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Nas raras formas tipo 3 e 4, déficit neurológico pode estar associado. A tomografia computadorizada com reconstrução, se disponível, está indicada para elucidação diagnóstica. Fig 6

Figura 6.

Fraturas do Odontoide. Observe o acometimento da sincondrose base do odontoide e o desvio anterior.

Sintomas agudos são tratados com antiinflamatórios e colar para conforto. Acima de uma semana orienta-se tração craniana e, em casos mais crônicos (1 mês) necessita-se de halo gesso para manter redução. Nos casos irredutíveis é preconizado a artrodese posterior entre C1-C2. ESPONDILOLISTESE TRAUMÁTICA DO ÁXIS Também chamada de fratura do enforcado, ocorre por mecanismo de hiper-extensão. Ocorre mais freqüen332

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as causas mais importantes. A classificação mundialmente empregada é a de Magerl, adotada pelo grupo AO/ASIF e pela maioria dos serviços. Temos três tipos de fraturas: Tipo A envolve traumas em compressão, acometendo somente as estruturas anteriores (corpo), podendo ser tratada com colete gessado em extensão na maioria dos casos. A fratura do tipo B envolve traumas em distração, levando a uma lesão anterior associada a lesões posteriores, sendo cirúrgica na maioria dos casos. A fratura do tipo C envolve as duas colunas e está associada a um mecanismo rotacional, necessitando estabilização anterior e posterior.

temente em crianças menores que 2 anos de idade. História de abuso deve sempre ser considerada. Déficit neurológico é raro. O tratamento é conservador com imobilização com gesso de Minerva, halo gesso ou órtese cervical por 8 a 12 semanas. FRATURAS E LUXAÇÕES DA COLUNA CERVICAL BAIXA Quanto ao mecanismo, trauma de parto e maus-tratos são os responsáveis nos pacientes menores de 2 anos. Dos 3 aos 7 anos, quedas e acidentes automobilísticos. E, nos maiores de 7 anos, traumas esportivos, mergulho em água rasa, ferimentos por arma de fogo e acidentes automobilísticos são

SUGESTÕES DE LEITURA 1. BEATY, JAMES H; KASSER, JAMES R. Rockwood and Wilkins Fractures in Children, 7th Edition, Lippincott Williams & Wilkins, 2010 2. CANALE, S T; BEATY, J H. Campbell’s Operative Orthopaedics, 11th edition, Mosby, 2007 3. RUEDI, THOMAS P; BUCKLEY, RICHARD E; MORAN, CHRISTOPHER G. Princípios AO do tratamento de fraturas, 2ª edição, Artmed, 2009 333

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Lesões traumáticas da coluna tóraco-lombar Emiliano Vialle Luiz Roberto Vialle

INTRODUÇÃO Lesões da coluna em crianças representam 1–2% de todas as fraturas pediátricas, e na sua maioria envolvem a coluna cervical. Lesões da coluna toracolombar em crianças são menos frequentes do que na população adulta, com incidência variável na literatura. Reddy et al tentaram determinar a incidência de fratura da coluna na população pediátrica, relacionando nível e mecanismo da lesão. A região torácica (T2-T10) foi a mais afetada (47 fraturas, 28.7%) seguida da lombar (L2–L5) com 38 casos (23.2%), a coluna cervical baixa com 31 fraturas (18.9%), a junção toracolombar com 24 fraturas (14.6%), a transição cervicotoracica com 13 fraturas (7.9%), e a junção craniocervical, com 11 fraturas (6.7%). Não houve relação clara com sexo ou mecanismo da lesão. A incidência relatada pode ser artificialmente baixa, pois pacientes com traumatismos graves o suficiente para causar uma fratura de coluna podem morrer de lesões associadas. Causas de lesão da coluna em crianças incluem quedas, atividades esportivas, violência doméstica e acidentes de trânsito. Metade destes pacientes apresenta lesão associada ao trauma vertebral.

Um exame físico minucioso é fundamental quando se avalia uma criança politraumatizada, e não é incomum que as fraturas em crianças passem despercebidas. O exame físico pode revelar dor, aumento de volume, equimose, ou um defeito palpável entre os processos espinhosos. A presença de marca do cinto de segurança no abdome, ou a presença de lesão a um órgão abdominal devem aumentar o grau de suspeita. Qualquer déficit motor ou sensitivo deve ser documentado. O trauma raquimedular é menos frequente em crianças devido à flexibilidade aumentada, que por sua vez pode produzir a síndrome conhecida como SCIWORA (spinal cord injury without radiographic abnormality). O prognóstico para recuperação neurológica é melhor em crianças. Um estudo recente de Wang et al revisaram 30 casos de lesão medular pediátrica, sendo 20 considerados como lesão completa (ASIA A). Destes, seis apresentaram recuperação, com cinco recuperando a deambulação, num período entre quatro a 50 semanas. Anatomia e classificação As vertebras torácicas e lombares 334

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possuem três centros de ossificação principais, um para cada metade do arco neural, e um para o corpo vertebral. A junção dos arcos com o corpo vertebral ocorre na sincondrose neurocentral, sendo visível radiograficamente até os seis anos de idade. Fica pouco anterior à base do pedículo, podendo ser mal interpretada como uma malformação ou fratura. Centros de ossificação secundários ocorrem nas placas vertebrais superior e inferior do corpo vertebral, sendo responsáveis pelo crescimento longitudinal. A ossificação destes centros por volta dos 8 anos de idade dá a impressão de um sulco nos vértices do corpo vertebral, e nesta região ocorre inserção ligamentar e discal, formando um anel apofisário. Este anel forma seu próprio centro de ossificação por volta dos 12 anos, unindo-se ao restante da vértebra quando da maturidade esquelética. Não há uma classificação específica para fraturas em crianças. Nem a teoria das três colunas de Denis ou a classificação compreensiva de Magerl foram validadas para a população pediátrica, mas os autores utilizam esta última, com atenção a lesões específicas desta faixa etária. Adolescentes mais velhos apresentam lesões similares às dos adultos, e devem ser tratados como tal. A maioria das fraturas toracolombares em crianças são estáveis e sem déficit neurológico. Repouso e retomada gradual das atividades geralmente são suficientes. Em atletas, com fratura aguda do pars

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interarticularis, recomenda-se o uso de órtese toracolombosacra por seis a oito semanas, numa tentativa de obter consolidação. Figura 1.

Tipo 1: fragment arqueado; tipo 2: avulsão do bordo posterior do corpo vertebral; tipo 3: pequeno fragmento localizado numa irregularidade da placa vertebral.

Fraturas por compressão (tipo A1) A maioria destas fraturas ocorre na coluna torácica, não sendo infrequente a ocorrência de múltiplas fraturas. Quando o acunhamento da vertebra é inferior a 10 graus, o tratamento consiste de repouso e analgesia. Se for superior a 10 graus e houver Risser inferior a três, recomenda-se imobilização em hiperextensão por dois meses, seguido de um colete até o sexto mês. Estabilização cirúrgica está indicada quando a compressão for superior a 50% da altura do corpo vertebral, para compressão lateral superior a 15 graus ou em adolescentes próximos da maturidade esquelética. A remodelação do acunhamento não ultrapassa 20 a 30 graus, e se houver lesão da placa vertebral, pode haver piora da deformidade. 335

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Fraturas por explosão (tipo A3) Estas lesões podem ser tratadas conservadoramente se a coluna posterior está intacta, e se não há lesão neurológica. O tratamento consiste de imobilização em hiperextensão por dois a três meses, com colete até o sexto mês. Cirurgia com descompressão e estabilização está indicada para pacientes com déficit neurológico. A instrumentação posterior com distração pode obter descompressão indireta através de ligamentotaxia e redução de fragmentos no canal medular. A abordagem anterior com descompressão pode ser utilizada na presença de inversão da cortical posterior (sinal de ruptura do ligamento longitudinal posterior) ou em cominuição importante do corpo vertebral. Lalonde et al compararam o tratamento das fraturas A3 em adolescentes, observando progressão da cifose no grupo de tratamento conservador, porém sem diferença funcional a longo prazo (nove anos).

Fratura límbica (fratura apofisária) Fratura encontrada no adolescente ou adulto jovem pode apresentar-se clínicamente como uma hérnia discal. Pode ocorrer ao levantar um objeto pesado, quedas ou trauma envolvendo torção do tronco. Há relatos de radiculopatia aguda após o deslocamento do fragmento. Takata et al descreveram três tipos de lesão (figura 1), mas o tratamento conservador tem baixa taxa de sucesso, independente do tipo. Uma vez que o diagnóstico seja confirmado uma ressonância magnética deve ser utilizada para determinas a localização e formato da lesão, seguida de excisão cirúrgica do fragmento límbico.

Fraturas do cinto de Segurança (lesões tipo B) Esta lesão por flexão distração está associada ao uso de cinto de segurança em dois pontos [45], com dano neurológico raro (4-30%), porém com lesões intra-abdominais (até 50% dos casos) que podem retardar o diagnóstico da lesão na coluna. Apesar de esta ser uma lesão instável na

Complicações As complicações são raras, a não ser que a lesão esteja acompanhada por déficit neurológico. Fraturas graves são imprevisíveis, podendo se remodelar e apresentar deformidade tardia. Esta é mais comum após laminectomia sem instrumentação. Dor lombar é infrequente após fraturas da coluna.

maioria das vezes, pode-se tentar o tratamento conservador se o deslocamento é mínimo e a lesão ocorre através do osso. A estabilização cirúrgica por via posterior está indicada na presença de luxação, lesão ligamentar ou déficit neurológico.

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Reddy SP, Junewick JJ, Backstrom JW (2003) Distribution of spinal fractures in children: does age, mechanism of injury, or gender play a significant role? Pediatr Radiol; 33(11):776–781. 2. Pouliquen JC, Kassis B, Glorion C, et al (1997) Vertebral growth after thoracic or lumbar fracture of the spine in children. J Pediatr Orthop; 17(1):115–120. 3. Takata K, Inoue S, Takahashi K, et al (1988) Fracture of the posterior margin of the lumbar vertebral body. J Bone Joint Surg Am; 70(4):589–594. 4. Vialle LR, Vialle E. (2005) Pediatric spine injuries. Injury. Jul;36 Suppl 2:B104-12.

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Lesões da pelve José Roberto Bevilacqua Guarniero

LESÕES DA CINTURA PÉLVICA As lesões da cintura pélvica na criança podem ser divididas em: • Fraturas da Bacia • Disjunção da Sínfise Púbica • Fraturas do Acetábulo

um número significativo de melhores resultados. Em dados coletados no período de 1982 a 1992, no Instituto de Ortopedia e Traumatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, foram tratados 68 casos de lesões da cintura pélvica em crianças. A maior incidência ocorre em pessoas com cerca de 20 anos. Portanto, o adulto jovem é o paciente mais acometido por essas lesões. Pacientes idosos também são freqüentemente acometidos devido à fraqueza da estrutura óssea desses indivíduos, geralmente acometidos por osteoporose. Desse modo temos uma distribuição bimodal dessas lesões com dois picos de incidência, nos adultos jovens e nos idosos.

1. Introdução Lesões da cintura pélvica são raras na infância, e geralmente estão associadas a traumatismos de alta energia, em decorrência de acidentes com veículos, quedas de altura, atropelamentos, etc. A incidência dessas lesões é de aproximadamente 37:100.000 (fraturas/crianças). Há, portanto, pouca experiência e muita controvérsia na Literatura médica. Vitale, em 2002, fez uma análise retrospectiva de 1190 fraturas nos Estados Unidos da América (EUA), no período de 1994 a 2000. Nestes casos, observou um índice de mortalidade de 7,2%. Observou ainda uma média de 15,5 no “Injury Severity Score” (variando de 2 a 75), sendo que os valores acima de 15 são considerados graves. Com relação ao “Glasgow Coma Scale”, encontrou média de 14,5 (valores entre 3 e 15). Uma importante constatação deste estudo foi de que as crianças tratadas em grandes Centros de Trauma, e com Programas de Especialização em Pediatria, tiveram

2. Anatomia da Bacia A estrutura da bacia na criança é completamente diferente da do adulto. A pelve imatura é mais maleável, as articulações são mais flexíveis e há maior quantidade de cartilagem. Como conseqüência, temos que a bacia da criança, em relação à do adulto, lida, de forma mais eficiente, com a energia do trauma. Portanto, as fraturas geralmente têm desvio menor e são mais estáveis. Devemos observar que pequenos desvios podem ser en338

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ganosos; o trauma foi de alta energia, e, devido à elasticidade dos tecidos, pode ter havido redução dos fragmentos. Devemos estar atentos para as lesões associadas, porque mesmo fraturas com pequeno ou nenhum desvio são causadas por trauma de grande energia. Como é necessário muito mais energia para produzir lesões da pelve na criança, geralmente elas ocorrem associadas a fraturas da coluna cervical, traumatismo cranioencefálico, lesões abdominais e lesões intrapélvicas.

número maior de fraturas de corpos vertebrais, assim como um número absoluto maior de fraturas. 3. Lesões da Cintura Pélvica • Mecanismo: são causadas por traumatismos de alta energia - 67 a 78% dos casos são provocados por acidentes automobilísticos. • Sexo: masculino 60%. • Lesões associadas ocorrem em 75% dos casos. São freqüentes devido à alta quantidade de energia envolvida (tanto no local quanto à distância). • Atenção! Investigar fratura cervical, TCE, lesões abdominais e intrapélvicas. • Complicações: alto índice de mortalidade (8%). Vitale(2002) - 7,2% “melhores resultados em grandes centros de trauma”. • 45% das fraturas de bacia - acidente automobilístico. • Lesões associadas podem ser fatais! A mortalidade é por volta de 12%, geralmente provocada por um TCE. • Aparelho gênito-urinário (57%) – principalmente em lesões do anel pélvico anterior. • Ruptura de bexiga (4%), lesão renal (6%), lesão de uretra (2%). • TCE ou lesão cervical em 40-75%. • Mortalidade: em geral devido ao TCE. • Outras fraturas em 20 a 40% dos casos. • Trauma abdominal associado (8 a 19%).

2.1. Diferenças anatômicas entre a pelve da criança e a do adulto

Criança

Há uma maior quantidade de cartilagem, o periósteo é mais espesso, sofre deformação elástica e as forças são dissipadas com maior facilidade.

Adulto

Há uma pequena quantidade de cartilagem em comparação com a criança, o periósteo é mais fino, o osso é mais quebradiço e a energia tende a causar fraturas com maior facilidade.

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Em trabalho apresentado em 1999, Sawyer et al. encontraram padrões diferentes de fraturas em 110 crianças que sofreram queda de uma altura superior a três metros. Assim, as crianças de 3 a 10 anos apresentaram um número maior de fraturas de ossos longos, enquanto na faixa etária de 11 a 21 anos ocorreu um 339

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• Antero Posterior; • Inlet (40º de inclinação caudal) e Outlet (40º de inclinação cranial); • Alar e Obturatriz (utilizadas principalmente quando há fraturas de acetábulo); • Tomografia Computadorizada; • Silber et al. (2001): estudando 103 pacientes com fraturas de bacia observaram que cinco pacientes necessitaram de tratamento cirúrgico. A indicação de cirurgia foi feita através das radiografias. Sugerem que a Tomografia Computadorizada não é essencial para definir o tipo de tratamento a ser realizado. Na nossa experiência, a Tomografia Computadorizada tem papel fundamental para o diagnóstico preciso das lesões, principalmente quando há suspeita de comprometimento do anel posterior. (Figura 2)

• Lesão nervosa é rara, ocorre em 1% dos casos. Podem ser lesões do plexo lombossacro provocando uma anestesia em sela ou do nervo ciático. As lesões nervosas geralmente ocorrem nas lesões do anel pélvico posterior, e fraturas comprometendo o sacro e a articulação sacro-ilíaca. • Hematoma retroperitonial (46%). • A laparotomia exploradora é freqüente nesses casos, pois o sangramento retroperitonial pode ser difícil de diagnosticar. 3.1. Avaliação de Lesões da Cintura Pélvica • História • Exame Físico: o Inspeção o Palpação óssea o Partes Moles (exame retal e vaginal) Na figura 1 apresentamos o sinal de Destot. Figura 1. Sinal clínico de Destot. (Fonte: IOT/HC/FMUSP)

Figura 2. Tomografia Computadorizada e radiografia (Fonte: IOT/HC/FMUSP))

3.1.1. Exames de Imagem • Radiografias: várias incidências, de acordo com o caso;

3.2. Classificações de Lesões da Cintura Pélvica A classificação mais utilizada para as fraturas nas crianças é a de Torode e Zieg (Quadro 1). 340

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utilizada é a de Key e Conwells (Quadro 3).

Quadro 1. Classificação de Torode e Zieg (1985) Tipo I

• Fratura tipo Avulsão

Tipo II

• Asa do Ilíaco

Tipo III

• Anel Pélvico Estável

Tipo IV

• Anel Pélvico Instável

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3.3. Tratamento das Lesões da Cintura Pélvica O tratamento das lesões da cintura pélvica a ser instituído vai depender dos seguintes fatores: a) Idade da criança b) Estabilidade da fratura c) Condições gerais da criança (em politraumatizados o confinamento ao leito não é desejável)

A classificação de Tile (Quadro 2) é mais utilizada para as fraturas dos adultos, porém em alguns casos descreve melhor o tipo de fratura, principalmente nos adolescentes porque eles têm padrões de fraturas muito semelhantes às dos adultos. Outra classificação que pode ser

Vários tipos de tratamento têm sido preconizados para o tratamento dessas lesões. Como são fraturas raras

Quadro 2. Classificação de Tile Tipo A

• Estáveis. A1 - Avulsão. A2 – Sem desvio (sem comprometer anel pélvico) – por exemplo, a fratura da asa do ilíaco ou fraturas menores dos ramos não associadas a lesão do anel posterior. A3 – Transversais, sacro e cóccix.

Tipo B

• Parcialmente estáveis. Têm instabilidade rotacional, porém são estáveis quanto ao componente vertical. B1 - “Livro aberto”. B2 - Compressão lateral. B3 - Compressão bilateral. Lembrar que as diastases púbicas maior que 3 cm estão associadas a lesão dos ligamentos sacro-ilíacos anteriores.

Tipo C

• Instáveis. Têm instabilidade vertical e rotacional. Podem estar associadas a fraturas do acetábulo. C1 - Fraturas unilaterais (ilíaco-fratura-luxação sacro-ilíaca). C2 - Fraturas bilaterais. C3 - Lesões bilaterais.

Quadro 3. Classificação de Key e Conwells Tipo I

• Fraturas marginais por avulsão. São fraturas estáveis.

Tipo II

• Traço único no anel pélvico envolvendo os ramos ou a sínfise. Também são fraturas estáveis.

Tipo III

• Traços duplos incluindo fraturas de ramos bilaterais, comprometimento do anel anterior e posterior, componente vertical e fraturas múltiplas.

Tipo IV

• Qualquer fratura associada à fratura de acetábulo.

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e há pouca experiência no manejo das mesmas, não há um consenso na Literatura. Blasier et al., em 2000, estudaram 189 pacientes com lesões da cintura pélvica em um período de 10 anos. Dessas fraturas, 57 eram instáveis segundo as classificações de Tile e a de Torode e Zieg. Conseguiram avaliar, em longo prazo, 43 pacientes; 30 tinham sido submetidos a um tratamento conservador e 13 passaram por tratamento cirúrgico. Não houve diferença significativa entre os dois grupos, com relação a: diferença de comprimento dos membros inferiores, dor, claudicação, e satisfação com o tratamento. De um modo geral, podemos dizer que as fraturas estáveis e os pacientes de menor faixa etária, podem ser submetidos a tratamento conservador. Portanto, no Tipo A da Classificação de Tile, o tratamento é conservador com repouso ou aparelho gessado. Nas lesões do Tipo B, o tratamento pode ser com aparelho gessado após a utilização do balancim. A tração pode ser utilizada para a instabilidade vertical, porém, não é efetiva para reduzir a hemiascenção. A redução da hemiascenção é particularmente difícil acima dos oito anos de idade, e a discrepância leva a um mau resultado funcional. As lesões do Tipo C são usualmente de tratamento cirúrgico. Da mesma maneira, as fraturas expostas também devem ser tratadas de modo cirúrgico. Deve-se aguardar de 48 a 72 horas para a estabilização do

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hematoma antes da intervenção nas fraturas fechadas. A diastase da sínfise púbica pode ser reduzida e fixada com placas e parafusos ou com fixador externo. Nas fraturas com instabilidade vertical, estabilização posterior com placas ou parafusos, através da sacro-ilíaca. A lesão anterior é estabilizada com placas e parafusos no púbis, ou fixador externo. Em alguns casos, a estabilização de uma região do anel pélvico permite tratar a outra lesão com redução incruenta e gesso. Hemorragia é menos frequente em crianças do que em adultos. Entretanto, pode ocorrer nas lesões anteriores e posteriores instáveis, necessitando a instalação de fixador externo com urgência. Angiografia com embolização, após a fixação externa, pode ser utilizada (se necessário). Temos obtido bons resultados no tratamento das fraturas com instabilidade rotacional isolada com o uso de tração e balancim, seguido ou não de imobilização gessada. Alguns casos de lesões instáveis em crianças abaixo de dez anos de idade podem ser tratados conservadoramente, desde que não ocorra associação com fratura desviada do acetábulo. As fraturas instáveis em crianças acima dos dez anos e principalmente as fraturas comprometendo o acetábulo e com desvio são geralmente de indicação cirúrgica. Em resumo, os métodos de tratamento das Lesões da Cintura Pélvica nas crianças incluem: 342

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Tratamento conservador: Sintomático yy Aparelho gessado yy Tração esquelética yy Balancim

4.2. Tratamento 4.2.1. Tratamento conservador Balancim (tração) e a seguir imobilização em aparelho gessado.

Tratamento cirúrgico: yy Fixador externo anterior (Figura 3) yy Fixação interna.

4.2.2. Tratamento cirúrgico Osteosíntese com placa e parafusos após a redução cruenta. Possibilidade de utilização de fixação externa.

Figura 3. Fixador externo anterior (Fonte: IOT/HC/FMUSP)

5. Fraturas do Acetábulo Geralmente são fraturas sem desvio. É comum observarmos fraturas lineares associadas às fraturas da bacia. Podem estar associadas à luxação do quadril em 50% dos casos e quando isso ocorre são em geral fraturas marginais pequenas, fraturas por avulsão ou fraturas lineares sem desvio. A fratura luxação central é rara. Os adolescentes têm fraturas semelhantes às dos adultos, que podem ser classificadas, como Letournel descreveu em: fraturas da parede posterior, da parede anterior, da coluna anterior, da coluna posterior, fraturas transversas ou combinações dessas. Para uma avaliação adequada e consequente tratamento, as radiografias nas incidências Alar e Obturatriz são essenciais. Na incidência Alar, observamos: coluna posterior, parede anterior do acetábulo e a asa do ilíaco. Na Obturatriz, são observados: coluna anterior, parede posterior do acetábulo e forame obturador. As fraturas sem desvio são trata-

4. Disjunção da sínfise púbica 4.1. Etiologia O tipo de traumatismo é geralmente um impacto de alta energia. Conforme dados coletados no IOT/ HC no período já citado, foram encontrados: οο Acidente de automóvel = 3 (passageiros) οο Atropelamento = 21 οο Acidente de moto = 1 οο Queda de altura = 1 343

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acetabular, com consequente subluxação.

das de maneira conservadora. Utilizamos a Tomografia Computadorizada para a comprovação do grau de desvio da fratura. Em geral, as fraturas com desvio maior que 2 mm são de tratamento cirúrgico. As fraturas de acetábulo podem estar associadas a uma lesão da cartilagem de crescimento do acetábulo (cartilagem trirradiada). Quando isso ocorre em crianças abaixo dos dez anos pode ocorrer uma displasia

5.1. Tratamento 5.1.1. Tratamento conservador Tração e aparelho gessado. Repouso no leito e aparelho gessado. 5.1.2. Tratamento cirúrgico Redução mais osteossíntese com placa e parafusos.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Bryan WJ, Tulos HS. Pediatric pelvic fractures: review of 52 patients. J Trauma. 1979; 19:799-805. 2. Kellam JF, Browner BD. Fracture of the pelvic ring IN Browner BD, Jupiter JB, Levine AM & Trafton MD. Skeletal trauma. Philadelphia, Saunders, 1992. 3. Reichard SA, Helikson MA, Shorter N, White RI, Sherwitz AW, Haller JA. Pelvic fractures in children: review of 120 patients with a new look at general management. J Ped Surg. 1980; 15: 727-734. 4. Routt MLC Jr. Pelvic fractures IN Hansen ST Jr, Swionthowski MF. Orthopaedic trauma protocols. New York, Raven Press, 1993. 5. Swionthowski MF. Fractures and dislocations about the hip and pelvis IN Green NE, Swionthowski MF. Skeletal trauma in children. Philadelphia, Saunders, 1994. 6. Torode I, Zieg F. Pelvic fractures in children. J Pediatr Orthop. 1985; 5: 76-84. 7. Guarniero R. Pelvic lesions in chilidren In Seminar Book. Children’s fractures an update. Madri: Seminar Book,1994. Pp110-114. 8. Guarniero R, Adachi PP, Pedreira JLTS, Luzo CAM. The experience of “Hospital das Clínicas” in the management of pelvic lesions in chilidren In Seminar Book. Children’s fractures aan update. Madri: Seminar Book,1994. Pp115-122. 344

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Fraturas da extremidade proximal do fêmur Cloris Kessler

As fraturas do fêmur proximal no esqueleto imaturo são raras e representam aproximadamente 1% de todas as fraturas pediátricas; freqüentemente resultantes de trauma de alta energia como nos acidentes automobilísticos ou quedas de altura. Em 30% dos casos ocorrem lesões associadas no tórax, cabeça e/ou abdome, que podem por em risco a vida do paciente. Outros mecanismos de lesão incluem as crianças vítimas de abuso infantil e as que sofrem fraturas patológicas através de lesão pré-existente, como por exemplo, cisto ósseo ou displasia fibrosa. As fraturas do quadril pediátrico apresentam alto índice de sequelas significativas, podendo resultar em necrose avascular da cabeça do fêmur, consolidação viciosa, coxa vara, pseudartrose, lesão fisária com diminuição do crescimento e condrólise (3,6). Cabe ao ortopedista considerar as diferentes opções de tratamento e os possíveis problemas relacionados com cada fratura, em curto e longo prazo.

formando a placa de crescimento do fêmur proximal. A parte lateral formará a placa de crescimento do trocânter maior, ocorrendo a sua ossificação em torno dos 4 anos de idade. Portanto, o fêmur proximal apresenta dois centros de ossificação, o da cabeça femoral e o da apófise trocantérica. A placa de crescimento do fêmur proximal é responsável pelo crescimento metafisário do colo femoral, contribuindo com 13% do comprimento total do fêmur (0,3 cm de comprimento femoral por ano) (16). Vascularização No nascimento, a vascularização da epífise femoral proximal é oriunda dos vasos metafisários que cruzam o colo, derivados das artérias circunflexas, medial e proximal. A artéria dominante para a irrigação da cabeça femoral é constituída pelos vasos epifisários laterais póstero-superiores e póstero-inferiores, que têm origem na artéria circunflexa femoral medial; e se localizam no nível do sulco intertrocantérico, onde penetram na cápsula e avançam proximalmente ao longo do colo femoral na direção da cabeça. O sistema circunflexo lateral pode irrigar a região anterior da cabeça femoral até os 2 a 3 anos de idade; depois irrigará principalmente a metáfise.

ANATOMIA No nascimento, o fêmur proximal é uma grande placa de crescimento cartilaginosa. Aproximadamente aos 4 meses de idade ocorre a ossificação da parte medial dando origem ao centro epifisário da cabeça femoral, 345

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A partir dos 14 a 18 meses de idade, o desenvolvimento da fise do fêmur proximal constitui uma barreira natural ao fluxo sanguíneo para a irrigação metafisária; diminuindo de forma significativa a penetração desses vasos na cabeça femoral; explicando a elevada incidência de necrose avascular em crianças (5,14). Em torno dos 4 anos de idade, a contribuição dos vasos metafisários no suprimento sanguíneo da cabeça femoral é quase nula. Os vasos retinaculares póstero-superiores e pósteroinferiores, originados das artérias epifisárias laterais, tornam-se a principal via de nutrição sanguíneo desta região. Após os 8 anos, os vasos do ligamento da cabeça femoral mostram contribuição para a vascularização da epífise, enquanto que a circulação metafisária persiste interrompida. Na puberdade, após o fechamento da cartilagem epifisial, a nutrição da epífise femoral se faz por suas três fontes vasculares, sendo elas a metafisária, a epifisária lateral e do ligamento da cabeça do fêmur (1,20). O padrão vascular do anel arterial extra-capsular permanece inalterado por toda a vida, algumas modificações no suprimento vascular ocorrem com a idade pelo crescimento da epífise e do colo femoral (5). A irrigação vascular do fêmur proximal em desenvolvimento fica ameaçada por essas fraturas, e sua lesão afetará no resultado final. A magnitude da separação inicial dos fragmentos da fratura é determinante im-

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portante da lesão vascular. As fraturas sem deslocamento possuem uma incidencia menor de necrose avascular, quando comparadas às fraturas com deslocamento, seja por oclusão ou lesão da rede vascular. Na literatura, o hematoma originado pela fratura também contribui para o aumento do índice de necrose avascular do fêmur (4,11,13). CLASSIFICAÇÃO A classificação de Delbet, relatada por Colonna em 1929, tem sua importância para o tratamento e prognóstico das fraturas femorais proximais (12) (Fig. 1). Figura 1. Fraturas do tipo I

Fraturas do tipo I são separações transfisárias com ou sem deslocamento da cabeça femoral em relação ao acetábulo, comumente re346

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sultado de trauma de alta energia ou de lesão intencionalmente infligida. Estas fraturas são menos frequentes e tendem a ocorrer em idades menores em comparação com as fraturas dos tipos II, III e IV. Aproximadamente 50% das fraturas transfisárias apresentam desvio da epifise femoral e, frequentemente, interrupção do crescimento femoral proximal. Portanto, na presença de deslocamento, o desvio inicial da epifise femoral proximal parece afetar diretamente o risco de necrose avascular; perfazendo uma incidência aproximada de 100% (12). Crianças abaixo de 2 anos de idade tem melhor prognóstico que crianças mais velhas; estas cursam com necrose avascular, cerca de 80% dos casos; já a incidência de osteonecrose é muito mais baixa em crianças de pouca idade. As fraturas-separação obstétricas tem excelentes resultados clínicos, apesar do diagnostico frequentemente tardio e da ausência de tratamento (19).

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adolescentes, uma discrepância no comprimento dos membros é um problema potencial. Fraturas do tipo III são fraturas que ocorrem na regão cervicotrocantérica (basocervical) do colo femoral. Este é o segundo local mais comum das fraturas do colo de fêmur em crianças. A necrose avascular ocorre em torno de 25% a 30% das fraturas com deslocamento, e a taxa de consolidação viciosa em varo é 20%. A pseudartrose ocorre em torno de 10% desses pacientes (2,10). Fraturas do tipo IV são fraturas intertrocantéricas e representam o menor risco de lesão da vascularização da cabeça femoral, consequentemente com menor taxa de sequelas; quando comparadas com os demais tipos de fratura do colo femoral. A incidência de necrose avascular situa-se entre 0 e 10%. Deformidade em varo é a complicação mais provável, mas em crianças de baixa idade a deformidade é corrigida espontaneamente com o crescimento (7). A consolidação viciosa ocorre em aproximadamente 30%, sendo mais comum em fraturas tratadas com métodos fechados (6,12).

Fraturas do tipo II são fraturas transcervicais, ocorrem no colo femoral. São o tipo mais frequente, constituem aproximadamente metade de todas as fraturas do fêmur proximal, e as complicações são comuns (6). A incidência de necrose avascular e a interrupção do crescimento da fise se aproximam de 50% a 60%. A percentagem de pseudartrose é de 15%. Em crianças mais velhas e pré-

TRATAMENTO As fraturas do femur proximal devem ser tratadas como urgência, preferencialmente dentro das primeiras 12 horas após a lesão. Caso necessário retardar o tratamento, alguns 347

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autores recomendam aspiração da articulação do quadril, para que seja reduzido o risco de tamponamento da circulação. O objetivo do tratamento está direcionado para obtenção da redução anatômica da fratura, tanto por redução fechada ou aberta. O deslocamento do fragmento e o retardo na redução da fratura podem representar fatores importantes, afetando na incidência de necrose avascular.

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Se a redução fechada não for conseguida ou se a epífise sofreu luxação, optar por redução aberta. Se o desvio for posterior, usar uma abordagem posterior; mas se o desvio for anterior, preferir uma abordagem anterior ou anterolateral. A fixação pode ser feita tanto com fios lisos, como com parafusos que, necessariamente, devem cruzar a fise. O seguimento deve ser realizado com gesso pelvipodálico. É importante considerar que a maturidade esquelética das meninas é mais precoce do que nos meninos, para indicação de fios lisos ou parafusos.

Fraturas do tipo I Nos partos de apresentação pélvica podem ocorrer epifisiolistese femoral proximal. No diagnostico precoce, tratamento com tração cutânea até a formação de calo ósseo visível radiograficamente. Após, recomendase imobilização gessada. Crianças com idade menor de 2 anos e nas fraturas com deslocamento parcial, o tratamento deve consistir em redução fechada com tração longitudinal, abdução e rotação interna (8). Nesses pacientes a redução pode ser relativamente estável, pode ser usado aparelho gessado pelvipodálico. Se a estabilidade não tiver sido obtida, a fixação interna deve ser realizada. Em crianças de 2 a 12 anos de idade, a estabilização da fratura reduzida pode ser conseguida com dois pinos lisos, complementados por um gesso pelvipodálico. Em adolescentes, ocasionalmente quando há necessidade de melhor estabilidade, são usados parafusos através da placa fisária.

Fraturas do tipo II Em pacientes com menos de 6 anos de idade, fraturas sem deslocamento podem ser tratadas satisfatóriamente com aparelho gessado pelvipodálico  e seguimento rígido; na tentativa de se evitar perda de redução e consequente coxa vara (6). As fraturas com deslocamento, geralmente podem ser reduzidas por métodos fechados, mas uma pequena incisão para abrir a cápsula coxofemoral é recomendada, reduzindo o risco de necrose avascular. A manobra de redução fechada do deslocamento da fratura consiste em tração e abdução (4,13). A fixação é feita com dois ou três parafusos canulados percutâneos na região metafisária do fragmento proximal, os quais não deverão cruzar a fise. Se não for obtida uma fixação firme, preferir usar fios lisos através da placa de crescimento; possibilitando assim o crescimento subsequente (10). 348

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Raramente, há necessidade de redução aberta para alinhamento apropriado dos fragmentos fraturados. Se o tratamento cirúrgico for necessário, está recomendada uma abordagem anterolateral e capsulotomia anterior, com o objetivo de evitar a lesão da rede vascular posterior. Preferencialmente, a fixação interna deve evitar a fise, mas em alguns casos, é necessário cruzá-la para obter estabilidade. Em crianças menores são usados parafusos canulados de 4 ou 4,5mm de diâmetro, e para crianças maiores e adolescentes optar pelos parafusos canulados de 6,5 a 7mm. Acima dos 12 anos de idade, parafusos rosqueados podem ser aplicados através da placa de crescimento para se obter uma fixação rígida. Um aparelho gessado pelvipodálico é usado para auxiliar a fixação.

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quadril durante a tração. Em seguida, realiza-se rotação interna e abdução do membro acometido. A fixação é feita com dois parafusos ósseos canulados que proporcionam compressão do foco fraturado. Deve-se ter cautela ao usar parafusos de compressão no quadril de crianças devido o risco de necrose térmica do colo femoral, no momento da fresagem. Após, a estabilidade deve ser complementada com aparelho gessado pelvipodálico. A redução aberta ântero-lateral está indicada quando não se pode tratar a lesão com métodos fechados. Fraturas do tipo IV Fraturas sem deslocamento nessa região são incomuns, mas essas lesões podem ser tratadas conservadoramente com tração, seguidas da colocação de aparelho gessado pelvipodálico com o membro em abdução; e cuidadoso seguimento em crianças mais novas. Fraturas com deslocamento em bebês e crianças que estão começando a andar podem ser tratadas com imediata redução fechada e colocação de gesso, desde que o ângulo colodiafisário femoral não se encontre menor que 115°. Em crianças mais velhas, essas fraturas podem ser tratadas por tração transesquelética, seguida por aplicação de aparelho gessado, mas usualmente o período de hospitalização é prolongado. Na presença de deslocamento, e a redução fechada não for satisfatória; deve ser realizada a reduçaõ cruenta com

Fraturas do tipo III Fraturas com alinhamento anatômico, especialmente da cortical medial, em crianças de baixa idade podem ser tratadas com aparelho gessado pelvipodálico. A monitorização através de radiografias seriadas é primordial, devido a possível migração da fratura, que levaria a uma consolidação viciosa em varo. Fraturas sem deslocamento em crianças de mais idade ou em adolescentes devem ser tratadas com fixação interna para evitar o desalinhamento tardio. Essas fraturas exigem uma redução cuidadosa por meio da flexão do 349

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fixação interna rígida, com o objetivo de prevenir deformidade em varo. Acima dos 6 anos de idade, prefere-se redução aberta com fixação interna através de parafusos interfragmentares ou um parafuso para quadril pediátrico com uma placa lateral, ou uma placa angulada. Os adolescentes são tratados como os adultos, com fixação interna estável através da placa de crescimento; usando um parafuso deslizante para quadril ou placa laminar angulada. Nesse procedimento não há necessidade de complementar o tratamento com uso de aparelho gessado. Essas fraturas não requerem a urgência das fraturas dos tipos I, II e III  ; mas no politraumatizado, o tratamento cirúrgico deve ser considerado, com fixação interna rígida através de placas e parafusos. A fixação não deve atingir a fise, se possível. A estabilização dessa lesão melhora as condições gerais do tratamento.

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devido aos diferentes métodos de tratamento. Na literatura, há consenso em que uma redução anatômica imediata, descompressão da articulação, fixação interna associada, se necessário, e imobilização adequada diminuem as taxas de complicações (2,13). Necrose avascular da cabeça ou do colo do fêmur A necrose avascular ocorre em aproximadamente 30% a 47% de todas as fraturas do quadril pediátrico; frequentemente com resultados insatisfatórios (10). Importante ressaltar que o deslocamento inicial da fratura parece afetar mais diretamente o risco da necrose avascular do fêmur proximal em crianças. Nos pacientes abaixo dos 18 meses, a consolidação mais rápida e o restabelecimento da vascularização transfisária podem ajudar a prevenir essa complicação. O seu diagnóstico deve ser precoce através de Ressonância nuclear magnética ou cintilografia óssea. Abaixo dos 12 anos de idade, os pacientes podem ser tratados por não sustentação do peso no membro acometido, durante um longo período de tempo. Mas, para as crianças mais velhas, o prognóstico é considerado sombrio. A artroscopia do quadril por se tratar de um procedimento minimamente invasivo, tem espaço cada vez maior no tratamento da necrose avascular; sendo utilizada conjunta-

COMPLICAÇÕES Fraturas do quadril no esqueleto imaturo apresentam sequelas em torno de 60% dos pacientes. As complicações mais frequentes, após uma fratura do fêmur proximal em crianças, são necrose avascular da cabeça do fêmur, consolidação viciosa e pseudoartrose. Outras complicações relatadas são infecções, fechamento prematuro da placa de crescimento do fêmur proximal e condrólise. As incidências exatas de complicações são difíceis de serem determinadas 350

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aplicação de enxerto ósseo, fixação interna rígida e aplicação de gesso pelvipodálico durante 3 meses (9,10).

mente à descompressão de necroses sintomáticas (1,15,17). Pseudartrose A pseudartrose ocorre em 6% a 10% das fraturas do fêmur proximal em crianças, pois a inibição da consolidação pode resultar devido às forças de cisalhamento sobre a linha vertical da fratura. Esta complicação pode ser minimizada pela redução precisa da fratura (10). Recomenda-se o tratamento imediato, tão logo tenha sido feito o diagnóstico.O tratamento preferido é o cirúrgico, através de uma osteotomia valgizante subtrocantérica com

Consolidação viciosa e coxa vara A prevalência da consolidação viciosa e coxa vara na literatura é de aproximadamente 20% dos pacientes descritos, mas tem menor incidência nos casos em que foi utilizada fixação interna rígida (10). Em pacientes com baixa idade, pode ocorrer remodelação espontânea (7). Recomenda-se osteotomia subtrocantérica para deformidades persistentes.

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Akkari M, Santili C, Braga SR. Artroscopia do quadril na criança e no adolescente. In: Sizinio H. Ortopedia e traumatologia: princípios e prática. 4ª ed. São Paulo: Artmed; 2009. p. 390-9. 2. Azouz E, Karamitsos C, Reed M, et al. Types and complications of femoral neck fractures in children. Pediatr Radiol.1993; 23:415. 3. Canale S, Bourland W. Fracture of the neck and intertrochanteric region of the femur in children. J Bone Joint Surg Am. 1977; 59:431. 4. Cheng J, Tang N. Descompression and stable internal fixation of femoral neck fractures in children can affect the outcome. J Pediatr Orthop. 1999; 19:338. 5. Chung S. The arterial supply of the developing proximal end of the human femur.J Bone Joint Surg. 1976; 58(A):961. 6. Davison B, Weinstein S. Hip fractures in children: a long-term follow-up study. J Pediatr Orthop 1992; 2:335. 7. DeLuca F, Keck C. Traumatic coxa vara: a case report of spontaneous correction in a child. Clin Orthop. 1976; 116:125. 8. Forlin E, Guille J, Kumar S, et al. Transepiphyseal fractures of the neck of the femur in very young children. J Pediatr Orthop. 1992; 12:164. 9. Huang C. Treatment of neglected femoral neck fractures in young adults. Clin Orthop 1986; 206:117 10. Hughes L, Beaty J. Current concepts review: Fractures of the head and neck of the femur in children. J Bone Joint Surg Am. 1994; 76:283. 11. Lam S. Fractures of the neck of femur in children. J Bone Joint Surg Am. 1971; 53:1165. 12. Morrissy R. Hip fractures in children. Clin Orthop. 1980; 152:202 13. Ng G, Cole W. Effect of early hip descompression on the frequency of avascular necrosis in children with fractures of the neck and femur. Injury 1996; 27:419. 14. Ogden J. Changing patterns of the proximal femoral vascularity. J Bone Joint Surg Am. 1974; 56:941. 15. O’Leary JA, Berend K, Vail TP. The relationship between diagnosis and outcome in arthroscopy of the hip. Arthroscopy: the Journal of Arthroscopy and Related Surgery. 2001; 17(2):181. 16. Raney E, Ogden J, Grogan D. Premature greater trochanteric epiphysiodesis secondary to intramedullary femoral roddinng. J Pediatr Orthop. 1993; 13:516. 17. Roy DR. Arthroscopy of the hip in children and adolescents. J Child Orthop. 2009;3:89. 18. Swiontkowski M, Winquist R. Displaced hip fractures in children and adolescents. J Trauma 1986; 26:384. 19. Theodorou S, Ierodiaconou M, Mitsou A. A obstetrical fracture-separation of the upper femoral epiphysis. Acta Orthop Scand. 1982; 53:239. 20. Trueta J. The normal vascular anatomy of the human femoral head during growth. J Bone Joint Surg. 1957; 49(B):358.

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Fraturas diafisárias do fêmur Eduardo Abdalla Saad

EPIDEMIOLOGIA As fraturas femorais na criança representam 1-2% das fraturas pediátricas, sendo mais freqüentes no sexo masculino (2:1) e nos extremos de idade (2 anos e 12 anos). São ocasionadas por trauma de alta energia, principalmente acidentes de trânsito. É pouco freqüente abaixo de 1 ano de idade, devendose pensar em maus tratos ou doença osteometabólica neste período.

CLASSIFICAÇÃO Para definição da melhor conduta nas fraturas femorais pediátricas é importante classificarmos a fratura e o paciente, podendo assim eleger qual a melhor conduta para determinado paciente. - A fratura: Fechada ou exposta Isolada ou associada a outras fraturas ou traumas Proximal , media e distal transversa, obliqua, espiral, cominutiva Encurtamento e desvios

DIAGNÓSTICO CLÍNICO E RADIOLÓGICO Dor, deformidade e edema do membro acometido com incapacidade para deambulação, associado a trauma de grande porte, são características da fratura femoral. Por se tratarem de trauma de alta energia, com até 40% de lesões associadas, protocolos de avaliação do ATLS devem ser realizados e prioridades estabelecidas, bem como para as fraturas femorais expostas e nas lesões neurovasculares associadas. Nas fraturas isoladas, imobilização provisória com tração cutânea e talas removíveis podem ser realizadas e radiografias em duas incidências, antero posterior e perfil, incluindo o quadril e o joelho ipsilateral, são suficientes para o diagnóstico e programação terapêutica.

-

O paciente: Idade Peso traumas associados Doenças pré-existentes fatores sócio econômico Fatores psicológicos

TRATAMENTO O tratamento visando o mínimo de agressividade, menor tempo de internação, buscando o melhor resultado, deve ser sempre o preconizado para a criança. Devido as propriedades biológicas do osso imaturo que permitem uma rápida consolidação e remodelação óssea, é importante o conhecimento deste potencial pelo 353

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– crianças mais novas, encurtamento inicial menor de 2cm, menos de 30kg, fraturas isoladas. - Haste flexível – crianças maiores, encurtamento inicial maior de 2cm, acima de 30kg, fraturas ou traumas associados. - fixador externo – fraturas instáveis, lesões extensas - placa ponte – fraturas femorais proximais e distais, fraturas instáveis. - tração esquelética – pacientes com impossibilidade de tratamento cirúrgico e previamente ao gesso por 7-14 dias nas fraturas com encurtamento inicial maior de 2 cm. Todos esses métodos tem mostrado bons resultados clínicos, porem nossa escolha nessa faixa etária seria pelo método cirúrgico com haste intramedular flexível.

especialista, nas diferentes idades, para a escolha do melhor método de tratamento, permitindo desvios e encurtamentos aceitáveis nas diferentes idades. Na escolha do melhor tratamento é importante levarmos em consideração: idade, peso, características da lesão, tipo de fratura, traumas associados, doenças pré-existentes, fatores sócio-econômicos, fatores psicológicos, experiência do cirurgião. Idade

Plano frontal

Plano sagital

Dismetria

0-1a

25º

30º

1,5 cm

2- 6a

15º

20º

2,0 cm

7-12a

10º

15º

2,0 cm

> 12a



10º

1,5 cm

Abaixo de 7 anos - gesso pelvipodálico imediato deve ser o tratamento de escolha nesta faixa etária. Encurtamentos iniciais maiores de 2 cm, realizar o gesso em 90º/90º do quadril e joelho. Quando necessário tração cutânea previa por curto período de tempo pode ser indicado. Tratamento cirúrgico esta indicado em poucas ocasiões (fratura exposta, traumas associados e obesidade). Nos primeiros meses de vida apenas imobilizações inguinopodalicas ou aparelho de pavlik são suficientes. 7-12a - gesso pelvipodalico

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Acima de 12a - haste intramedular bloqueada anterógrada trocantérica ou secundariamente na fossa piriforme. - Haste intramedular flexível em pacientes até 50 quilos. Como regra devemos dar preferência ao método de tratamento que temos mais familiaridade e disponibilidade, quando existe a possibilidade de escolha em determinada idade. A confecção do gesso pelvipodálico imediato deve ser muito criteriosa, necessitando muitas vezes mais experiência e dedicação do especialista que o tratamento cirúrgico.

imediato 354

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As vantagens de cada método devem ser muito bem analisadas para cada paciente individualizado, avaliando aspectos clínicos, sócio econômicos e psicológicos. Pacientes que tenham indicação de tração esquelética previa ao gesso, indicamos tratamento cirúrgico com haste flexível, diminuindo tempo de internação, ausência da criança na escola e custos para a família e sociedade.

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quisar alteração osteometabólica. - Necrose avascular da cabeça femoral – geralmente associada ao tratamento cirúrgico, na haste intramedular rígida com entrada na fossa piriforme, comprometendo a circulação femoral proximal. Hastes trocantéricas diminuem este risco. - Perda de redução após aplicação do gesso pelvipodálico imediato – na duvida ou pouca experiência com o método, optar por tração previa ao gesso ou tratamento cirúrgico. - Hastes flexível saliente no joelho causando dor – realizar orifício de entrada 3 cm acima da fise distal do fêmur, não deixar a extremidade saliente mais que 2 cm e não curvá-la. - Dificuldade de estabilização nas fraturas proximais, distais e cominutas – fraturas de extremidades e instáveis são de difícil estabilização com duas hastes flexíveis, devendo ser usado uma terceira haste, ou dispositivo distal de estabilização da haste flexível (end cap), fixador externo ou placa ponte.

COMPLICAÇÕES A maioria das complicações no tratamento das fraturas femorais são decorrentes da escolha ou aplicação inadequada do método para determinado paciente, ocasionando novas internações e procedimentos desnecessários. - Desvios angulares e rotacionais – desvios no eixo articular (eixo sagital) são mais aceitos, sendo considerado resultado insatisfatório acima de 10º de desvio sagital ou coronal, no resultado final do tratamento. - Encurtamento e sobrecrescimento – resultado insatisfatório deve ser considerado quando maior que 2cm de dismetria no resultado final do tratamento. Quando presente, o paciente deve ser acompanhado por longo período e programação de tratamento com palmilha, alongamento ósseo e epifisiodese.contralateral. - Não consolidação e pseudoartrose – raro na criança, devendo-se pes-

yy yy yy yy yy yy 355

Evitando complicações com o gesso: Idade abaixo de 9 anos. Peso abaixo de 30kg. Fratura isolada. Encurtamento inicial até 2cm. Preferir desvio em valgo. Acompanhamento.

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yy Conhecer bem o método. yy Programação cirúrgica previa. yy Acompanhamento.

Evitando complicações com a cirurgia: yy Idade acima de 7 anos. yy Fratura associada. yy Encurtamento inicial acima de 2cm.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Flynn JM, Luedtke LM, Ganley TJ, et al. Comparison of titanium elastic nails with traction and a spica cast to treat femoral fractures in children. J Bone Joint Surg Am. 2004; 86-A(4):770-777. 2. Kasser JR, Beaty JH. Femoral Shaft Fractures. In: Beaty JH, Kasser JR, 7th eds. Rockwood and Wilkins’ Fractures in Children. Philadelphia, PA: Lippincott Williams & Wilkins, 2009. 3. Saad EA. Avaliação clínica e radiográfica de 31 pacientes com idade entre 8 e 16 anos no tratamento de 32 fraturas do fêmur pela fixação intramedular com hastes flexíveis. Tese de Doutorado, UNIFESP, 2003. 4. Santiili C, Akkari M, Waisberg G, Alcântara T, Abulasan T, Barreto SL, Prado JCL. Tratamento incruento das fraturas diafisárias do fêmur nas crianças. Acta Ortop Bras. 2005; 13(5):249-52. 5. Stans AA, MorissyRT,Renwick SE. Femoral shaft fracture treatment in patients age 6 to 16 years. J Pediatr Orthop 1999; 19:222-8. 6. Sink EL; Faro F; Polousky J; Flynn K; Gralla J. Decreased complications of pediatric femur fractures with a change in management. J Pediatr Orthop 2010; 30(7): 633-7. 7. Wright JG. The treatment of femoral shaft fractures in children: a systematic overview and critical appraisal of the literature. Can J Surg. 2000; 43(3):180-189. 356

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Lesões traumáticas do joelho Gilberto Francisco Brandão Lucas de Castro Boechat

Introdução Traumatismos do joelho são comuns em crianças, principalmente naquelas que participam de atividades esportivas. É importante avaliar as características da anatomia do joelho imaturo nas suas diversas fases durante o crescimento. As fraturas com lesões fisárias e avulsões ósseas dos ligamentos intra ou extra-articulares do joelho predominam frente às lesões ligamentares puras, ao contrário dos adultos. O paciente pediátrico que se apresenta ao pronto socorro com história de trauma na região do joelho deve ser cuidadosamente avaliado para deformidades traumáticas ou constitucionais, história de lesões ou alterações prévias, lesões de partes moles e neurovasculares, presença de hemartrose e incapacidade funcional. Sempre que necessário, devem ser requisitadas radiografias em AP, perfil e axial de patela. Na presença de hemartrose pós-traumática no joelho diante de radiografias normais, há grande suspeição de lesões ligamentares ou fraturas subcondrais1.

representam menos de 1% do total de fraturas das crianças. Normalmente são resultantes de traumas de grande energia, portanto com possíveis lesões de partes moles associadas. Lesões ligamentares e meniscais associadas podem ocorrer2. A classificação mais utilizada é a de Salter-Harris. O traço de fratura mais comum nesta região é do tipo II, que diferentemente das fraturas que ocorrem em outras fises, não apresenta um comportamento benigno, às vezes evolui com deformidade angulares no joelho. O lado do joelho que recebe a carga causadora da fratura é o que normalmente apresenta a linha de fratura metafisária. O lado oposto é submetido à tração, o que leva à abertura da fise com avulsão do periósteo que pode se interpor na abertura pelo efeito de vácuo no momento do trauma. Fraturas do tipo III podem estar relacionadas a avulsões dos ligamentos colaterais, o que no adulto normalmente causaria lesão da substância do ligamento. As fraturas do tipo V costumam ser diagnosticadas tardiamente com o distúrbio do crescimento. Radiografias em ântero-posterior (AP) e em perfil do joelho são geralmente suficientes para diagnosticar e propor

Fratura Epifisária do Fêmur Distal As fraturas fisárias do fêmur distal 357

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com a retirada de partes moles interpostas. Fraturas do tipo I ou do II com traço metafisário muito pequeno requerem fios de Kirschner transfisários lisos. Fratura do tipo II com um triângulo metafisário maior podem ser fixadas com parafusos evitando a fise. As fraturas desviadas dos tipos III e IV são classicamente submetidas à redução aberta e fixação interna. Os pacientes devem permanecer sem apoio até a evidência de consolidação radiográfica.

tratamento. Radiografias com stress podem auxiliar nas fraturas com mínimo desvio, assim como incidências oblíquas. A tomografia computadorizada (TC) pode ser de auxílio em suspeitas de fraturas não desviadas ou de traços complexos. A ressonância magnética (RM) pode ser usada em suspeitas de lesões ligamentares e meniscais associadas. Para crianças muito novas que ainda apresentam pouca calcificação do fêmur distal pode ser realizada radiografia contralateral, artrografia, RM ou ultrassom3.

Complicações Distúrbios do crescimento e deformidades angulares podem ocorrer, portanto, o ortopedista deve alertar os pais e acompanhar as crianças ao longo do crescimento. Irregularidades na espessura da fise e linhas de ParkHarris assimétricas são indicadores precoces de formação de barra óssea, antes que deformidade angular do osso se desenvolva. Estímulo do crescimento ósseo também pode ocorrer após fratura fisária, provocando assimetria dos membros. A presença de barra óssea menor que 50% da largura da fise em pacientes com ao menos dois anos de crescimento restantes pode ser tratada por ressecção. A deformidade angular do membro pode ser tratada por osteotomia e/ou hemiepifisiodese de acordo com a angulação observada e a previsão de crescimento restante. Rigidez articular após imobilização pode ocorrer por artrofibrose, contratura da cápsula ou contratura

Tratamento O tratamento deve objetivar a redução anatômica de traços articulares e alinhamento adequado do membro, evitando-se maior lesão à fise do que a já causada pelo trauma. Fraturas sem desvio podem ser tratadas conservadoramente com imobilização por gesso inguino-podálico ou pelvipodálico por 4 a 6 semanas com o joelho em 15 a 20 graus de flexão. Quando há traço intra-articular deve-se ter especial cuidado nas orientações e no seguimento do paciente, ou mesmo pode-se optar pelo tratamento cirúrgico por fixação percutânea. Fraturas Salter-Harris tipos I e II desviadas devem ser submetidas à tentativa de redução fechada sob anestesia. Deve se exercer tração no membro enquanto se realizam as manobras no sentido reverso do trauma para evitar maior lesão fisária. Quando a redução não puder ser obtida, deve-se realizar redução aberta 358

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muscular. Ganho de movimento com manipulação vigorosa deve ser evitado por risco de novas fraturas e lesões da fise. Medidas fisioterápicas devem ser inicialmente tentadas e, em caso de falha, artrolise cirúrgica pode ser necessária.

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gesso longo por 4 a 6 semanas. Desvios irredutíveis de maneira fechada e desvios intra-articulares devem ser submetidos à redução aberta e fixação interna. Se for necessário cruzar a fise para fixação, deve ser dada a preferência para fios de Kirschner lisos. Em caso de lesão da artéria poplítea, a osteossíntese deve sempre ser realizada para proteger o reparo da artéria.

Fratura da Epífise Proximal da Tíbia Dada a maior estabilidade proporcionada pela configuração tridimensional da fise proximal da tíbia, fraturas desta região são mais raras que as do fêmur distal e normalmente são causadas por traumas de maior energia. A avaliação do paciente não foge à regra de se observar possíveis déficits neurológicos e vasculares distais à área de dor e deformidade. Porém, a artéria poplítea está em maior risco nas fraturas da tíbia proximal, podendo ser comprimida por um fragmento, encarcerada ou tracionada no caso de uma lesão em hiperextensão e merece especial atenção. Radiografias simples em AP e em perfil geralmente são suficientes para diagnosticar, classificar e propor o tratamento destas fraturas. TC e RM podem ser usadas para ver traços intra-articulares e/ou complexos e lesões associadas. Radiografias com stress podem ajudar a diagnosticar lesões ocultas ou ligamentares.

Complicações O prognóstico destas fraturas é bom em geral, com baixo índice de deformidades ou assimetria de membros. Falta de pulsos distais e a presença de cianose à admissão não requerem Doppler, arteriografia ou exploração imediatos, pois podem se resolver com a redução da fratura. Contudo, trombose por lesão da íntima e síndrome compartimental podem ser observados até alguns dias após o trauma, portanto estes pacientes devem ser acompanhados de perto durante os primeiros 2 a 3 dias após a lesão4. Fratura – avulsão da Tuberosidade Tibial Anterior As fraturas da tuberosidade tibial anterior (TTA) são mais freqüentes em adolescentes do sexo masculino durante a prática esportiva. Os mecanismos mais prováveis de lesão são pela contração do quadríceps durante extensão do joelho no salto ou pela ação excêntrica do mesmo na recepção do salto5.

Tratamento O tratamento das fraturas fisárias da tíbia proximal segue as diretrizes das fraturas do fêmur distal. Fraturas sem desvio podem ser tratadas com 359

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Alguns pacientes podem apresentar extensão ativa do joelho em fraturas do tipo I, mas o habitual é a incapacidade de realizar a elevação da perna reta. A patela encontra-se alta proporcionalmente ao grau de desvio do fragmento. A classificação mais utilizada para fraturas da TTA é a de Watson-Jones modificada por Ogden. A fratura do tipo I atravessa o centro de ossificação da TTA, sendo que o subtipo IA é sem desvio e o tipo IB apresenta desvio do fragmento. No tipo II, o traço de fratura passa pela junção dos centros de ossificação da apófise da TTA e da epífise proximal da tíbia, com os subtipos IIA (sem cominuição) e IIB (cominutivo). As fraturas do tipo III atravessam a epífise proximal da tíbia atingindo a articulação. Na avaliação radiográfica a lesão é mais bem visualizada na radiografia lateral com rotação interna da perna para mostrar o perfil verdadeiro da TTA. Quando há dúvida sobre a extensão do traço ou não até a articulação, a TC pode ajudar.

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vadas e reparadas se lesadas. No pósoperatório recomenda-se gesso ou imobilizador em extensão do joelho por 4 a 6 semanas. Complicações O tratamento adequado das fraturas-avulsões da TTA tem baixo índice de complicações. A ocorrência de recurvato não é uma preocupação no típico paciente adolescente pelo pequeno crescimento restante. Pode haver queixa relativa a cabeças de parafusos protuberantes sob a pele devido a pouca cobertura de partes moles na região. Fratura da Espinha da Tíbia Fraturas da espinha da tíbia são mais comuns em crianças e adolescentes do que em adultos e o equivalente da ruptura do ligamento cruzado anterior (LCA) em adultos. Este grupo de fratura geralmente ocorre em indivíduos com idade ente oito e 14 anos. Classificação mais utilizada é de Meyers e Mckeever6 e é baseada no grau de desvio do fragmento, sendo a tipo I com desvio mínimo, com mínima elevação margem anterior da espinha da tíbia, tipo II maior elevação da margem anterior, porém com algum contato posterior e tipo III o fragmento completamente desviado.

Tratamento As fraturas tipo IA podem ser tratadas por imobilização gessada em extensão total do joelho por 4 a 6 semanas. As fraturas com desvio e com extensão intra-articular são melhores tratadas por redução aberta e fixação interna com fios de Kirschner ou parafusos através da TTA e metáfise proximal. Nas fraturas do tipo III as inserções meniscais devem ser obser-

Tratamento As fraturas do tipo I não necessitam de redução e o joelho pode ser 360

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pacientes com consolidação viciosa podem apresentar limitação da extensão do joelho.

estabilizado com gesso ínguino-podálico ou tala gessada posterior com o joelho em torno de 150 de flexão por período de 4 a seis semanas7. Este período é seguido de exercícios para ganho do arco de movimentos (ADM), alongamentos musculares e retorno gradual as atividade físicas. As fraturas do tipo II necessitam de redução. Aspiração da hemartrose seguida de infusão de anestésicos podem facilitam a redução. Tentativa de redução é feita com o joelho em completa extensão, seguida por imobilização gessada por 4 a 6 semanas. Imobilização em hiperextensão deve ser evitada. Quando a redução incruenta não é alcançada é indicado tratamento cirúrgico similar ao empregado nas fraturas do tipo III7. Recomenda redução cruenta e estabilização para as fraturas do tipo III. A redução pode ser feita através da artroscopia do joelho e a estabilização pode ser alcançada com parafusos intra-epifisário ou banda de tensão. Com estabilização estável não há necessidade de imobilização pósoperatória.

Fratura da Patela As fraturas da patela são raras em crianças por ser predominantemente cartilaginosa e bastante móvel. Porém, podem acometer o adolescente próximo ao termo do crescimento com o mesmo padrão e propostas de tratamento do indivíduo adulto. O paciente pode ou não ser capaz de realizar a extensão ativa do joelho em fraturas sem desvio ou com os retináculos preservados. Devemos ficar atentos a avulsão cartilaginosa do pólo inferior e mais raramente do pólo superior da patela. Trata-se de uma lesão incomum e de diagnóstico difícil. O mecanismo da lesão é a contração vigorosa do quadríceps. Uma fratura da borda medial da patela pode indicar uma avulsão do ligamento femoropatelar medial numa luxação espontaneamente reduzida, mesmo que o paciente não relate com precisão este trauma. Este paciente geralmente apresenta dor em todo o retináculo medial e sinal da apreensão positivo. As radiografias em AP, perfil em semiflexão e axial de patela costumam ser o suficiente para diagnosticar e classificar a fratura segundo sua localização anatômica e tipo de traço. As avulsões ligamentares e cartilaginosas costumam carregar pequenos fragmentos ósseos e

Complicações Perda de alguns graus do movimento e instabilidade ligamentar após fratura da espinha da tíbia são comuns. Estes problemas são geralmente mínimos e raramente interferem com a função do joelho. Artrofibrose pode ocorrer após a artroscopia para redução do fragmento da espinha da tíbia. Ocasionalmente 361

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causar patela alta ou baixa. Devese ter cuidado para não confundir uma fratura aguda com uma patela bipartida, que costuma localizar-se no canto superolateral da patela e ter bordas arredondadas. RM pode ser usada se suspeição de avulsão e desenluvamento da patela.

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perda de extensão ativa total, patela alta e artrose precoce. Lesões condrais da patela ou da tróclea no trauma também podem ser causadoras de dor e artrose precoce. Lesões Osteocondrais As lesões osteocondrais agudas do joelho estão mais relacionadas a trauma direto anterior no joelho fletido ou a luxações femoropatelares. No impacto direto poderá haver lesão em espelho da cartilagem patelar e troclear de acordo com o ângulo de flexão e com a direção da força. Na luxação femoropatelar tipicamente podem ocorrer no fragmento inferomedial da patela e/ou a borda lateral da tróclea femoral. O paciente apresenta dor aguda e derrame articular, que se puncionado terá glóbulos de gordura sobrenadante. Radiografias simples podem estar normais ou mostrar o fragmento solto. Artrografia, TC ou RM demonstram melhor o fragmento e o seu local de origem.

Tratamento Assim como no adulto, devese buscar uma superfície articular anatômica e mecanismo extensor funcional. Fraturas sem desvio em pacientes com mecanismo extensor íntegro podem ser tratadas com imobilização gessada em extensão. As demais devem ser submetidas à redução aberta com osteossíntese. As fraturas transversas são bem tratadas por técnicas de banda de tensão, as longitudinais por parafusos interfragmentários, as fraturas estreladas por cerclagem. Avulsões ósseas pequenas podem ser ressecadas e o tendão reinserido por técnica de sutura trans-óssea8. Os desenluvamentos devem ser reduzidos anatomicamente e estabilizados por banda de tensão incluindo as partes moles tendíneas para melhor manter a redução. Os retináculos devem ser também reparados. Patelectomia total ou parcial deve ser reservada para fratura com cominuições graves.

Tratamento Recomenda-se tratamento cirúrgico como regra, com ressecção de fragmentos pequenos e osteossíntese de fragmentos maiores, podendo ser usado parafusos simples ou de Herbert. Lesões Ligamentares do Joelho Sabe-se que indivíduo com a fise aberta tem maior propensão a lesões

Complicações As complicações de fraturas mal reduzidas ou não reduzidas são dor, 362

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ósseas do que ligamentares na região do joelho. Isso se deve à maior resistência tênsil dos ligamentos em relação ao osso em desenvolvimento, que se apresenta mais poroso e com mais cartilagem. Tem sido observado um grande aumento na incidência de lesões ligamentares traumáticas no joelho e tornozelo de crianças e adolescentes nas últimas duas décadas. Tal fato provavelmente se deve ao aumento da participação e da competitividade de jovens em esportes de alto rendimento e também à maior atenção dada pelos ortopedistas, que passaram a diagnosticar casos que antes passavam despercebidos

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Procede-se à radiografia simples para ver possíveis fraturas, avulsões ósseas e alterações congênitas ou do desenvolvimento. A RM demonstra alta acurácia para lesões do LCA em pacientes com o esqueleto imaturo e auxilia na visibilização de lesões associadas, como meniscais, condrais e de outros ligamentos. O tratamento conservador era opção antiga de tratamento, mas atualmente é pouco utilizado como escolha definitiva. Alguns autores argumentam que se deve esperar certa maturação esquelética até a realização da cirurgia. Porém, tem sido observado grande índice de dor, lesões meniscais e degeneração articular em jovens sem LCA. Existem várias técnicas de reconstrução do LCA em pacientes com a fise aberta. A reconstrução extra-articular era usada para evitar atravessar a fise, porém não é anatômica e falha em recriar a biomecânica do ligamento original, tendo sido praticamente descartada. As técnicas intra-articulares e anatômicas têm o revés de trazer preocupação com a lesão da fise. Pode-se tentar fazer os túneis de maneira totalmente epifisária ou atravessar a fise evitando-se deixar matérias de fixação ou plugues ósseos na linha da fise. Mesmo com a técnica perfeita o paciente e seus pais devem ser alertados para o risco de distúrbio de crescimento. Cerca de 70% das lesões agudas do LCA em crianças são acompa-

Lesão do Ligamento Cruzado Anterior (LCA) Em pacientes com a fise aberta, a ruptura do LCA em sua substância é mais prevalente após os 12 anos de idade (80 % dos casos). Em menores de 12 anos a avulsão óssea do LCA na espinha da tíbia é mais comum (90%)9. A avulsão femoral é extremamente rara. O mecanismo de trauma e o quadro clínico são semelhantes ao do adulto. O paciente costuma relatar estalido audível no momento do trauma, seguido de hemartrose e limitação funcional do joelho acometido. O ortopedista deve sempre realizar o exame contralateral para diferenciar uma ruptura de LCA de frouxidão ligamentar fisiológica e considerar a possibilidade de ausência congênita de LCA. 363

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Complicações Ressecção ou inviabilidade de fragmentos cartilaginosos grandes e da área de carga pode levar a dor e artrose precoce. Pacientes com luxação femoropatelar podem ter recidiva do quadro relacionado ao dano causado pelo primeiro episódio e pelos fatores predisponentes.

nhadas de lesão meniscal, sendo a maior dela passíveis de reparo, o que deve ser feito no mesmo ato cirúrgico. Lesões do ligamento colateral medial ocorrem em cerca de 7% (LCM) e devem ser tratadas de maneira conservadora10.

SUGESTÕES DE LEITURA 1. Wessel LM, Scholz S, Rüsch M. Characteristic Pattern and Management of Intra-articular Knee Lesions in Different Pediatric Age Groups. J Pediatr Orthop 21:14–9, 2001. 2. Eid AM, Hafez MA. Traumatic injuries of the distal femoral physis. Retrospective study on 151 cases. Injury 33:251-5, 2002. 3. Naranja RJ Jr, Gregg JR, Dormans JP, Drummond DS, Davidson RS, Hahn M: Pediatric fracture without radiographic abnormality: Description and significance. Clin Orthop 342:141-6, 1997. 4. Zionts LE. Fractures around the knee in children. J Am Acad Orthop Surg 10:345-55, 2002. 5. Mosier SM, Stanitski CL. Acute tibial tubercle avulsion fractures. J Pediatr Orthop 24:181–4, 2004. 6. Meyers MH, Mckeever FM. Fracture of the intercondylar eminence of the tíbia. J Bone Joint Surg Am 52:1677-84, 1970. 7. Tudisco C, Giovarruscio R, Febo A, Savarese S. Intercondylar eminence fracture in children: Long-term follow-up of 14 cases at the end of skeletal growth. J Pediatr Orthop B 19:403-08, 2010. 8. Schmai H, StRohm PC, Neimeyer P, Reising K, Kuminack K, Sudkamp NP. Fractures of the patella in children. Acta Orthop Belg 76:644-50, 2010. 9. Kellenberger R, yon Laer L. Nonosseus lesions of the anterior cruciate ligaments in childhood and adolescence. Prog Pediatr Surg 25:123-31, 1990. 10. Samora WP, Palmer R, Klingele KE. Meniscal Pathology Associated With Acute Anterior Cruciate Ligament Tears in Patients With Open Physes. J Pediatr Orthop 31:272–6, 2011. 364

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Fraturas da perna Felipe Alves do Monte Luiz Felipe Albanez Falcão

óssea e destas 75 a 80% estão relacionadas com acidente automobilístico. As lesões associadas a atividades esportivas correspondem a uma importante parcela deste grupo de fraturas acontecendo mais frequentemente em adolescentes.1

As fraturas da diáfise dos ossos da perna estão entre as mais frequentes do esqueleto em desenvolvimento, sendo a terceira mais comum entre os ossos longos, depois da fratura dos ossos do antebraço e do fêmur. Correspondem a aproximadamente 15% das fraturas da criança e do adolescente e têm um pico de incidência por volta dos 8 anos de idade sendo mais comum no sexo masculino. 1,2

Diagnóstico clínico e radiológico Através do relato clínico se obtém informações importantes sobre o mecanismo do trauma – direto ou indireto e o seu grau de energia. Crianças menores tendem a não apresentar deformidades no local havendo a necessidade de palpar a região para delimitar a área acometida. Por outro lado, crianças maiores sofrem trauma direto e apresentam um quadro clínico mais evidente, com fraturas completas, deformidade e edema significativos. 1 O exame radiográfico deve ser realizado nas incidências em AP e perfil da perna, incluindo joelho e tornozelo, em filme único. Em crianças de baixa idade, pode ser necessário radiografias da perna contralateral para melhor avaliar fraturas incompletas ou sem desvio. Em alguns casos pode ser necessário a realização de outros exames de imagem para elucidar o diagnóstico, como por exemplo, a

MECANISMO DO TRAUMA As fraturas dos ossos da perna da criança podem ser por trauma direto e indireto.1 Em indivíduos até os quatro anos de idade é comum a fratura em espiral ou oblíqua provocada por trauma indireto decorrente de queda de própria altura ou lesão do raio da bicicleta. Em crianças maiores de quatro anos é frequente a lesão por trauma direto decorrente de atropelamentos, o que tende a provocar fraturas cominutivas e com significativa lesão de partes moles devido a traumas de alta energia.1 Os maus tratos são responsáveis por menos de 5% das fraturas de ossos da perna em crianças e a tíbia é o segundo osso mais fraturado neste grupo de pacientes. 1 Aproximadamente 8% das fraturas da tíbia estão associadas a exposição 365

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cintilografia óssea que pode ser usada para diagnosticar lesões ocultas ou na suspeita de maus tratos.1 Deve-se ter atenção na abordagem de lesões oriundas de trauma em raios de bicicleta, além do exame clínico do pé e tornozelo, também deve ser avaliada a perna pois a tíbia pode ser acometida, geralmente em seu 1/3 distal, apresentando uma fratura oblíqua ou em espiral sem desvio ou deformidades aparentes.1,2

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com o joelho em extensão. A forma mais comum de apresentação é a fratura em galho verde com o córtex medial fraturado e o lateral intacto (fratura de Cozen). A fíbula comumente não está fraturada, exceto em traumas de alta energia. Na maioria das vezes, os pacientes apresentam edema leve na região do trauma com mínimo ou nenhum desvio.1,2,3 Tratamento Na maioria dos casos é conservador. Quando existe algum grau de desvio da fratura, geralmente em valgo, preconiza-se a redução com discreta hipercorreção e colocação de aparelho gessado coxo-podálico (gesso longo). O joelho deve ser mantido com 0 a 10 graus de flexão e moldado os três pontos. Devem ser feitas radiografias seriadas nas 2 ou 3 primeiras semanas para acompanhar a manutenção do alinhamento; o aparelho gessado longo é mantido em média por 5 a 7 semanas. Após este período o gesso é removido e liberada carga total sobre o membro com reavaliações a cada 3 a 6 meses.1,2 Excepcionalmente, o tratamento é cirúrgico devido a fratura ser desviada e de difícil redução incruenta por motivo de interposição de partes moles (tendões da pata de ganso, periósteo e ligamento colateral medial). Após a realização do procedimento cirúrgico imobiliza-se o membro acometido com gesso longo, podendo ser necessário a estabilização da fra-

Classificação As fraturas não fisárias da tíbia e da fíbula são melhor classificadas de acordo com a região anatômica e combinações dos ossos fraturados.1,2 Segundo a região anatômica elas podem ser: metafisária proximal, diafisária (terço proximal, médio e distal) e metafisária distal. Ainda podem ser agrupadas conforme a configuração da fratura em: torus, galho-verde e fratura completa. Na abordagem destas fraturas, também se avalia a angulação, a translação, a direção dos desvios, o grau de cominuição e o comprometimento de partes moles.1 FRATURAS DA METÁFISE PROXIMAL DA TÍBIA São mais comuns na faixa etária entre 3 e 6 anos de idade e são geralmente fraturas completas sem desvio ou em galho-verde.1,2 Decorrem, frequentemente, de força torcional na face medial da perna ou trauma direto na face lateral 366

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Tratamento não cirúrgico A grande maioria das fraturas de tíbia na criança podem ser tratadas com aparelho gessado coxo-podálico.1,2 Fraturas da tíbia sem desvio, obliquas ou espirais, com a fíbula intacta: Comum em pacientes menores de 6 anos (Toddler’s Fracture). Devem ser imobilizadas com gesso longo por 3 a 4 semanas.1 Fraturas da tíbia com desvio, com a fíbula intacta: ordinariamente acomete crianças mais velhas e tende a sofrer desvio em varo secundário a ação dos músculos da região antero-lateral da perna. Inicialmente é realizada redução mais confecção de um aparelho gessado abaixo do joelho. O alinhamento é considerado aceitável quando os desvios são menores que 5 a 10 graus em todos os planos . Após a confirmação de uma boa redução por meio de exames radiográficos, é confeccionado o complemento do aparelho gessado (gesso coxo-podálico). O paciente deve permanecer com o gesso longo sem carga por 4 a 6 semanas e após este período deve ser trocado por um aparelho gessado suro-podálico com carga por mais 2 ou 3 semanas. Nas primeiras 3 semanas devem ser feitas radiografias semanais para avaliar o alinhamento da fratura. Se durante o acompanhamento da fratura houver uma angulação em varo maior que 5 graus, recomenda-se manipulação para melhora da redução.1 Fraturas da tíbia e da fíbula com

tura com fios de Kirchner cruzados, parafusos canulados, fixador externo ou mesmo placas.1-4 Complicações A mais comum é a deformidade em valgo, cujo tratamento é conservador, uma vez que a correção espontânea e gradual da deformidade é comum. A cirurgia pode está indicada nos pacientes que apresentem a deformidade há mais de 18 meses após o trauma inicial e desvio do eixo mecânico além de 10 graus.2 FRATURAS DA DIÁFISE DA TÍBIA E DA FÍBULA Podem ser com ou sem desvio dependendo da idade e do mecanismo do trauma.1 Dentre as fraturas da diáfise da tíbia na criança, 13% são do 1/3 proximal, 45% do 1/3 médio e 42% do 1/3 distal.1 Em crianças menores de 11 anos as fraturas são frequentemente sem desvios ou com desvios mínimos, sem fratura associada da fíbula. Em crianças abaixo dos seis anos é comum a fratura em espiral e por trauma indireto. Em crianças entre 6 e 11 anos de idade as fraturas desta região estão mais associadas a um trauma direto sendo a fratura da tíbia transversa simples, com ou sem fratura da fíbula. Em adolescentes, os traumas de alta energia são mais frequentes, por isso, a associação de fratura de tíbia e fíbula é comum, e se comporta como em adultos.1 367

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desvio: comum em indivíduos maiores de 11 anos, são mais instáveis por estarem associadas à fratura da fíbula. Os desvios aceitáveis após a redução são de pelo menos 50% de contato, menos de 8 graus de angulação nos planos sagital e coronal, até 5 graus de desvio rotacional e até 1 cm de encurtamento. Estas fraturas tendem a sofrer desvio em varo e posterior do fragmento distal; para prevenir esta ocorrência, molda-se o gesso em 3 pontos e se realiza a flexão plantar do tornozelo de 15 a 20 graus durante a confecção do gesso. Assim como nas fraturas da tíbia com desvio e com a fíbula intacta, o gesso deve ser confeccionado em duas etapas, porém, na segunda etapa do gesso, o joelho deve ser mantido fletido de 30 a 45 graus para controlar desvios rotacionais e facilitar a restrição da carga. Logo após segue-se a mesma conduta das fraturas desviadas sem acometimento da fíbula. 1,2

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estabilização do foco de fratura pode ser obtida por meio de hastes intramedulares flexíveis, fios de Kirschner, fixador externo, placa e parafusos e haste intramedular bloqueada.1,5 Existe uma tendência atual de realizar a redução incruenta e síntese com haste intramedular flexível anterógrada em fraturas fechadas da diáfise da tíbia que necessitem de tratamento cirúrgico.1,2,5 Outra forma de tratamento consiste no uso do fixador externo por 4 a 6 semanas em fraturas com grande instabilidade, até que se forme um calo ósseo significativo e, assim, possa substituir o material de síntese por um gesso suro-podálico com carga por mais 3 a 4 semanas.1 Alguns autores têm contra-indicado o uso de placa e parafusos, visto que a técnica provoca maior desperiostização, tem maior risco de infecção e pseudartrose e por haver a necessidade de novo procedimento para sua retirada.1 As hastes intramedulares bloqueadas ficam restritas aos adolescentes com o esqueleto maduro.1-3

Tratamento cirúrgico Necessário em menos de 5% das fraturas fechadas de tíbia. As indicações são: instabilidade com dificuldade de manutenção da redução em aparelho gessado; perda da redução que não seja possível correção por meio de cunhas; cominuição e encurtamento significativos que não possam ser corrigidos por meio de redução incruenta.1 As fraturas de necessidade cirúrgica podem ser tratadas com redução incruenta ou cruenta, e a

Complicações As complicações associadas às fraturas da diáfise dos ossos da perna são: síndrome compartimental; infecção; desconforto, dor e irritação de partes moles pelo material de síntese; retardo de consolidação ou pseudartrose; anisomelia; deformidades angulares e rotacionais. As fraturas isoladas da tíbia sem comprometimento da fíbula podem pro368

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vocar consolidação viciosa em varo; por outro lado, as fraturas associadas da tíbia e da fíbula tendem a evoluir com consolidação em valgo. 1-4

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apresentar excelente potencial de remodelação, devem ser inicialmente conduzidas por meio de protocolos semelhantes aos utilizados para adultos, com a administração de antibiótico endovenoso, irrigação da ferida com solução salina e desbridamento, seguidos de estabilização da fratura.1 Os modos de estabilização mais utilizados nas fraturas expostas de tíbia em crianças e adolescentes são o aparelho gessado coxo-podálico com janela no local da ferida, as hastes intramedulares flexíveis e o fixador externo.1,2 O gesso longo tem sido utilizado em fraturas expostas grau I de Gustilo e algumas grau II (ferimentos menores) que não precisem, a principio, de nova limpeza em bloco cirúrgico. Nas lesões grau II (ferimentos maiores) e III tem se advogado o uso do fixador externo e hastes intramedulares flexíveis. Esta última tem seu uso questionado especialmente nos traumas de alta energia e com grande contaminação. Os pacientes que são tratados com fixador externo, tendem a ter o material de síntese substituído por um aparelho gessado suro-podálico após a formação de um bom calo ósseo.1

FRATURAS DA METÁFISE DISTAL DA TIBIA São do tipo torus ou galho verde assim como as da metáfise proximal. A fratura em galho verde é a mais comum, onde o córtex posterior está fraturado e o anterior sofre compressão. Para as fraturas sem desvio ou minimamente desviadas, que geralmente ocorrem em menores de 6 anos, podem ser tratadas com aparelho gessado suro-podálico por 4 a 6 semanas. Em crianças maiores ou em fraturas desviadas aplica-se um aparelho gessado coxo-podálico com joelho fletido 40 graus por 3 a 4 semanas seguido de gesso curto por mais 2 ou 3 semanas. Habitualmente é necessário manter o tornozelo em flexão plantar de 20 graus para uma manutenção da redução e prevenção do recurvato. O prognóstico é bom e dificilmente se observa deformidade residual como nas fraturas metafisárias proximais.1,2 FRATURAS EXPOSTAS DA DIÁFISE DA TÍBIA Mais benigna na criança por

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SUGESTÕES DE LEITURA 1. Herring JA. Tachdjian´s Pediatric Orthopaedics from the Texas Scottish Rite for Children. 4ª ed. Herring JA, editor. Philadelphia: Saunders Elsevier; 2008. 2. Beaty JH, Kasser JR. Rockwood and Wilkins Fractures in Children. 7ª ed. Flynn JM, Skaggi DL, Waters PM, associate editors. Philadelphia: Lippincott & Wilkins; 2010. 3. Morrisy RT, Weinstein SL. Lovell & Winter’s Pediatric Orthpaedics. 6ª ed. Hurley R, editor. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2006. 4. Flynn JM, Wiesel SW. Operative Techniques in Pediatric Orthopaedics. 1ª ed. Flynn JM, Wiesel SW, editors. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2011. 5. Volpon JB. Osteossíntese das fraturas diafisárias da crianca com hastes intramedulares flexiveis. Rev Bras Orto 2008. 43(7):261-270.

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Lesões traumáticas do tornozelo e pé Jamil F. Soni Weverley Valenza

FRATURAS DO TORNOZELO Epidemiologia: Fraturas da tíbia e fíbula distal correspondem a 5% de todas as fraturas pediátricas. Geralmente ocorrem entre os 10 e 15 anos, sendo a incidência discretamente maior no sexo masculino.

Tillaux, Fratura Triplanar, Misto. Spiegel : Grupo I: baixo risco de lesão fisária, fratura avulsão e tipo I e II de Salter-Harris. Grupo II: alto risco, tipo III e IV de Salter-Harris. Grupo III: fraturas transicionais (Tillaux e triplanar).

Diagnóstico: O mecanismo do trauma é, em geral, por torção (trauma indireto). O paciente apresenta dor a palpação na região fisária, edema e incapacidade para marcha. Exame complementar: radiografias AP, AP verdadeiro e perfil. Tomografia computadorizada para quantificar desvio e planejamento pré-operatório. Ressonância Nuclear Magnética é solicitada para o diagnóstico de lesão fisária tardias, sendo rara sua aplicação na emergência.

Tratamento Grupo I: Fraturas sem desvio da fíbula distal: bota gessada com apoio por quatro semanas. Fraturas sem desvio da tíbia distal: bota gessada sem apoio por quatro semanas seguidas de bota gessada com apoio por mais duas semanas. Fraturas com desvios da tíbia distal: redução sob anestesia, manobra de redução é o mecanismo contrário do trauma (classificação de Dias e Tachdjan). Gesso inguino-pédico por quatro semanas, seguido de bota gessada por mais duas semanas, controles radiográficos com 7 e 14 dias. Se após a redução permanecer desvio maior que 2 mm, pensar em interposição de partes moles, principalmente o periósteo, nesse caso pode ser necessário redução aberta, retirar periósteo interposto e fixação,

Classificação: Dias e Tachdjan definem a lesão pela classificação de Salter-Harris, traço de fratura e orientação do desvio, em tipos: Fratura supinação-inversão, Fratura supinação-flexão, Fratura supinação-rotação externa, Fratura pronação-eversão-rotação externa, Fratura compressão axial, Fratura 371

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em geral com fios Kirschner, controles radiográficos com 1 e 2 semanas, retirar imobilização e fios Kirschner com 6 semanas. Grupo II: Fraturas com até 1 mm de desvio, podem ser tratadas de forma conservadora, gesso inguino-pédico por quatro semanas, seguido de bota gessada por mais duas semanas, controles radiográficos com 7 e 14 dias. Fraturas com desvios maiores que 1 mm, devem ser tratadas de forma cruenta. Deve ser feita redução aberta e fixação interna do fragmento epifisário, geralmente com parafuso canulado de 3,5 ou 4 mm (ou fios de Kirschner). O acesso tanto pode ser o tradicional pra fraturas do maléolo medial em adultos, como o acesso proposto por Lintecum e Blasier, pequena artrotomia anterior, visualização e redução do fragmento epifisário, fixação percutânea da fratura com parafuso canulado, usando intensificador de imagem.

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teral tem o seu fechamento 18 meses após a fise medial e nesse período a epífise tibial está suscetível a essa lesão. Devem ser solicitadas radiografias em Ap, perfil e Ap verdadeiro. Solicitamos TAC de rotina para quantificar o desvio e em casos onde há suspeita diagnóstica. Fraturas até 2 mm de desvio, são tratadas de forma conservadora. Imobilização com gesso inguinopédico por 4 semanas, seguido de bota gessada por 2 semanas, controles radiográficos com uma e duas semanas. Fraturas com mais de 2 mm de desvio: Tratamento cirúrgico, redução incruenta e fixação percutânea, com parafuso canulado de 4 mm, com auxílio do intensificador de imagem e em alguns casos do artroscópio. Se a redução anatômica não foi conseguida é feita a redução cruenta da fratura através de um acesso ântero lateral, seguida de fixação com parafuso compressão.

Fratura de Tillaux É definida como fratura da porção ântero-lateral da epífise tibial, classificada como uma lesão de Salter-Harris tipo III. Ocorre por mecanismo de rotação externa do tornozelo, sendo o ligamento tibiofibular anterior que provoca o desvio do fragmento. A fratura se torna possível devido ao fechamento assimétrico da fise, que se inicia na região central, seguido da região medial e finalmente a porção lateral. A fise la-

Fratura triplanar: As fraturas ocorrem pelo fechamento assimétrico da fise, elas não são fraturas comuns, ocorrem em adolescentes um pouco mais jovens que os pacientes com as fraturas tipo Tillaux. O trauma é em rotação externa com o pé em flexão plantar. A configuração triplanar deve-se a presença de traços de fratura em 3 planos espaciais: 1. Coronal: ocorre da metáfise 372

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distal da tíbia em sua porção posterior, visto em perfil, é classificada como tipo II ou IV de Salter-Harris. 2. Transversal: epifisiólise através da porção anterior e lateral da fise 3. Sagital: fratura na radiografia em AP é classificada como tipo III de Salter-Harris. O diagnóstico é feito com radiografias em Ap, Ap verdadeiro e perfil, pedimos TAC em todos os casos para um melhor estudo de quantos fragmentos possuem, bem como para quantificar o desvio. O tratamento é conservador para as fraturas com desvio menor que 2 mm. Gesso inguino-pédico por 4 semanas, seguido de bota gessada por 2 semanas, controles radiográficos em 7 e 14 dias. O tratamento cirúrgico está reservado para fraturas com desvio maior que 2 mm. Pode ser feita uma redução incruenta com mecanismo inverso ao que causou a fratura, seguida de fixação percutânea com parafuso canulado de 4.0 mm. Um de frente para posterior e um de lateral para medial. Quando a redução incruenta não é conseguida, faz-se a redução cruenta com acesso ântero lateral e se fratura tiver 3 ou 4 fragmentos pode ser acrescentado um acesso póstero medial, podendo ser acompanhada de visão artroscópica.

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tornozelo na criança estão relacionadas a fechamento prematuro da cartilagem de crescimento, discrepância de comprimento, deformidades angulares e irregularidades articulares. FRATURAS E LUXAÇÕES NO PÉ Fraturas do tálus As fraturas do colo do tálus são raras em crianças e ocorrem por um mecanismo de dorsiflexão. Quando associada à fratura do maléolo medial sugere um componente de supinação associado. Classificação: Letts e Gibeault Tipo I: fratura com mínimo desvio distal ao colo do tálus – baixa incidência de necrose; Tipo II: fratura com mínimo desvio proximal ao colo ou corpo – risco de necrose baixo Tipo III: fratura desviada do colo ou corpo – provável risco de necrose Tipo IV: fratura do colo do tálus com luxação do fragmento do corpo – a necrose é esperada. Tratamento: Fraturas com angulação abaixo de cinco graus na incidência AP e desvio menor que 2mm podem ser tratadas conservadoramente. O pé deve ser imobilizado em uma discreta flexão plantar, ao contrário do mecanismo o trauma, sem carga até que haja consolidação, normalmente em 6 semanas. Após essas seis semanas confecciona-se um gesso com apoio

Complicações: As complicações das fraturas do 373

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por aproximadamente 2 a 4 semanas. Fraturas desviadas devem ser tratadas cirurgicamente com redução fechada e fixação percutânea ou redução aberta de preferência com acesso ântero-medial e fixação. A fixação deve ser feita com fios de Kirschner ou parafusos canulados.

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EstágioII

– fratura incompleta, sem desvio, com um subtipo com cisto subcondral Estágio III - fratura completa, com fragmento não desviado Estágio IV – fratura completa, desviada.

Complicações A necrose avascular é a principal complicação e depende do local da fratura e do grau do desvio inicial. Semelhante ao adulto, o sinal de Hawkins (radioluscência no corpo do tálus 6 a 8 semanas pós fratura) também aparece na crianças e indica que o corpo do tálus está vascularizado.

Tratamento O tratamento das fraturas osteocondrais depende do desvio do fragmento. Nos casos em que a fratura é incompleta ou sem desvio é possível tratar conservadoramente por 6 a 8 semanas, caso se tornem sintomáticos, há indicação cirúrgica posterior. Nas fraturas desviadas sintomáticas existe indicação cirurgia, com fixação, curetagem ou ressecção do fragmento, via artroscópica.

Fraturas osteocondrais do tálus Mecanismo de lesão As fraturas osteocondrais do tálus ocorrem geralmente por um trauma em supinação do pé, onde ocorre a fratura do bordo medial ou lateral do corpo do tálus. As lesões póstero mediais resultam de inversão, flexão plantar e rotação externa e as lesões ântero laterais resultam da inversão e dorsiflexão do pé.

Fraturas do calcâneo As fraturas do calcâneo podem ser extra-articulares ou intra-articulares; as extra-articulares são mais freqüentes nas crianças mais jovens e as intraarticulares atingem adolescentes. Mecanismo de trauma As fraturas do calcâneo resultam de um trauma de alta energia como por exemplo:queda de altura ou acidente automobilístico.

Classificação Berndt e Hardy, modificada por Anderson para incluir os achados da RNM: Estágio I – identificação com RNM, consiste de fratura subcondral sem colapso.

Diagnóstico: Exame físico: dor, edema, equimose, claudicação ou incapacidade para deambular. 374

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Fraturas e luxações do médio As fraturas isoladas do médio pé são extremamente raras, em geral resultam de trauma direto. O resultado do tratamento conservador a longo prazo é, na maioria dos casos, satisfatório.

Exames complementares: radiografias nas incidências AP, perfil e axial de calcâneo, e TAC. Classificação Schmidt e Weiner Tipo 1 A - Fratura da tuberosidade ou apófise B - fratura do sustentáculo do talo C - fratura do processo anterior D - fratura do processo anterior ínfero lateral E - fratura por avulsão Tipo 2 - fratura da parte posterior e/ou superior do túber Tipo 3 - fratura linear não envolvendo a articulação subtalar Tipo 4 - fratura linear através da articulação subtalar sem deslocamento Tipo 5 - fratura por compressão através da articulação subtalar com deslocamento. A - tipo lingüeta B - tipo depressão da articulação Tipo 6 - Não classificada ou lesão grave de partes moles, perda óssea e perda da inserção de tendão de Aquiles.

Lesões tarso metatarsianas (LISFRANC) Mecanismo de lesão Traumas de alta energia; o mais comum é a flexão plantar combinada com forças de rotação. Outro mecanismo que pode ocorrer é o trauma direto. Classificação Hardcastle Tipo A - incongruência de toda articulação Tipo B - instabilidade parcial, medial ou lateral Tipo C - divergência parcial ou instabilidade total. Diagnóstico Clínicamente observamos dor, aumento de volume, equimose, dor à palpação e instabilidade local. O estudo radiográfico deve ser feito comparativamente com o lado normal, nas incidências de AP, perfil e oblíquas. Os achados radiográficos mais sugestivos de lesão tarso metatarsiana são fratura da base do primeiro metatarso, fratura do segundo metatarso, fratura da base do segundo ao quarto metatarso, fratura do cubóide e fratura do cuneiforme medial .

Tratamento O tratamento das fraturas extraarticulares sem desvio consiste na imobilização com gesso por 4 a 6 semanas. As fraturas intra articulares desviadas tem indicação de tratamento cirúrgico realizado como no paciente adulto. 375

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Tratamento O tratamento conservador é indicado quando a fratura ou a luxação forem sem desvio, com imobilização gessada por 3 a 7 semanas. Nos casos em que o desvio for inaceitável, o tratamento indicado é redução incruenta e fixação percutânea com fios de Kirschner. Nos casos irredutíveis a redução aberta está indicada.

Tratamento O tratamento das fraturas dos metatarsos sem desvio ou com discreto desvio é conservador com bota gessada por 4 a 6 semanas, com apoio. O tratamento cirúrgico está indicado nas fraturas expostas, fraturas com desvio da cabeça do metatarso e fraturas intra-articulares desviadas. A fixação pode ser feita com fio de Kirschner.

Complicações Necrose de pele, artrose tarsometatarsiana e dor ao deambular.

Mecanismo de lesão O mecanismo de lesão mais frequente é o trauma direto ou o entorse de pé. Traumas de alta energia podem causar fraturas de vários metatarsos e evoluir para síndrome compartimental.

Fraturas da base do 5 º metatarso As fraturas da base do quinto metatarso frequentemente são avulsões pela tração exercida pelo tendão do fibular curto. A fratura transversa na região metáfisio- diafisária é chamada fratura de Jones e apresenta uma alta incidência de retardo de consolidação ou pseudartrose. O diagnóstico é clinico com dor, edema , equimose, sendo que a radiografia em AP, perfil e oblíquas são solicitadas rotineiramente. O tratamento da fratura da base do quinto metatarso é conservador, com tala ou bota gessada por uma média de 4 semanas.

Diagnóstico O diagnóstico é realizado pela anamnese e pela presença de dor, edema, equimose, claudicação ou incapacidade de deambular. A avaliação radiográfica deve ser feita nas incidências AP, perfil e obliquas. Recomenda-se radiografia do pé contralateral como comparação.

Fraturas das falanges As fraturas das falanges nas crianças são menos comuns quando comparadas aos adultos e são causadas por trauma direto ou por chutar” uma estrutura mais resistente que o dedo. No exame físico estão presentes dor, edema, equimose e, eventualmente, deformidades. Solicita-se as radiogra-

Fraturas dos metatarsianos As fraturas dos metatarsianos são relativamente comuns (5 a 7%). O segundo, terceiro e quarto metatarsianos são os mais atingidos.

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fias em AP, Perfil e oblíqua para diagnóstico. A imobilização com esparadrapo por aproximadamente 3 semanas está indicado na maioria das fraturas,

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eventual redução incruenta prévia pode ser necessária . O tratamento cirúrgico está indicado nas fraturas expostas, fraturas intra articulares desviadas, principalmente no hálux.

SUGESTÕES DE LEITURA: 1. Crawford, H., Fractures and Dislocation of the Foot. Rockwood and Wilkins, Fractures in Children, 7h Edition, LW&W 2010 2. Cummings R.J., Shea K.G., Distal Tibial and Fibular Fractures. Rockwood and Wilkins, Fractures in Children, 7h Edition, LW&W 2010 3. Herring, J. A. Tachdjian’s Pediatric Orthopedics. Philadelphia: WB Saunders Company. 2002 4. Soni J.F., Valenza W.R, Schelle G.C., Fraturas e lesões do tornozelo e do pé na criança. Ortopedia e Traumatologia: princípios e prática 4 ed. , Sizínio Hebert. Artmed 2009 5. Spiegel, P. G., D. R. Cooperman, et al. Epiphyseal fractures of the distal ends of the tibia and fibula. A retrospective study of two hundred and thirty-seven cases in children. J Bone Joint Surg Am, v.60, n.8, Dec, p.1046-50. 1978. 377

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