Livro Livro Cultura Religiosa IESDE 2009

March 20, 2017 | Author: ed2384 | Category: N/A
Share Embed Donate


Short Description

Download Livro Livro Cultura Religiosa IESDE 2009...

Description

Cultura Religiosa

Autor Douglas Moacir Flor

2009 Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

© 2006 – IESDE Brasil S.A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autorização por escrito dos autores e do detentor dos direitos autorais.

F632c Flor, Douglas Moacir. / Cultura Religiosa. / Douglas Moacir Flor. — Curitiba : IESDE Brasil S.A. , 2009. 160 p.

ISBN: 85-7638-421-3

1. Religião. 2. Grandes Religiões do Mundo. 3. Cristianismo. 4. Reforma Luterana. 5. Ética Cristã. I. Título. CDD 291

Capa: IESDE Brasil S.A. Imagem da capa: IESDE Brasil S.A.

Todos os direitos reservados. IESDE Brasil S.A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482 • Batel 80730-200 • Curitiba • PR www.iesde.com.br

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Sumário Cultura religiosa –um tema controverso...................................................................................9 Resumo.........................................................................................................................................................9 A palavra religião.......................................................................................................................................10 Conhecimento religioso..............................................................................................................................10 Por que estudar as religiões?.......................................................................................................................12 Tolerância religiosa.....................................................................................................................................13 Sincretismo religioso..................................................................................................................................13

O fenômeno religioso..............................................................................................................17

Religião e Arte............................................................................................................................................17 Religião e Moral.........................................................................................................................................22 Religião e Ciência.......................................................................................................................................22 Religião e Filosofia.....................................................................................................................................23 Religião e Economia...................................................................................................................................23 Religião e Educação...................................................................................................................................24

As grandes religiões I..............................................................................................................27

Hinduísmo...................................................................................................................................................27 Budismo......................................................................................................................................................30

As grandes religiões II............................................................................................................35

Confucionismo............................................................................................................................................35 Xintoísmo ..................................................................................................................................................41 Taoísmo .....................................................................................................................................................42 Conclusão ..................................................................................................................................................48

As grandes religiões III...........................................................................................................51

Judaísmo.....................................................................................................................................................51 Islamismo....................................................................................................................................................57

Movimentos religiosos no Brasil ...........................................................................................69 Nova espiritualidade...................................................................................................................................69 Como se caracterizam os movimentos religiosos.......................................................................................70 Religiões africanas . ...................................................................................................................................70 Religiões afro-brasileiras............................................................................................................................72 Espiritismo..................................................................................................................................................75

O Cristianismo I......................................................................................................................79 Conhecer Jesus é fundamental....................................................................................................................79 O amor ágape.............................................................................................................................................79 A história.....................................................................................................................................................80 Jesus – o mestre..........................................................................................................................................81

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

O Cristianismo II.....................................................................................................................87 A Bíblia – livro sagrado do Cristianismo ..................................................................................................87

A Reforma do século XVI.......................................................................................................97 Introdução...................................................................................................................................................97 Lutero..........................................................................................................................................................97

A Reforma Luterana – pensamento.......................................................................................103

A base de Lutero.......................................................................................................................................103 Pensamento de Lutero...............................................................................................................................104 A Igreja tenta silenciar Lutero..................................................................................................................104 A excomunhão de Lutero..........................................................................................................................105 A bula papal..............................................................................................................................................107 Declarado herege......................................................................................................................................108 O exílio.....................................................................................................................................................108 A volta.......................................................................................................................................................109 O casamento de Lutero.............................................................................................................................109 A morte de Lutero.....................................................................................................................................110 A paz de Augsburgo..................................................................................................................................110

A Igreja Luterana e a Educação............................................................................................ 113 Lutero e a Educação..................................................................................................................................113 O Luteranismo pós-reforma......................................................................................................................116 A Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB).......................................................................................117

Questões fundamentais de Ética...........................................................................................125

Questões básicas.......................................................................................................................................125 Ética Social e Ética Religiosa...................................................................................................................127

Princípios de Ética................................................................................................................131

Algumas questões.....................................................................................................................................131 Ética – algumas reflexões de ordem geral ...............................................................................................131 Ética e Moral.............................................................................................................................................131 Consciência . ............................................................................................................................................134 O direito positivo e o senso de justiça .....................................................................................................135 Responsabilidade......................................................................................................................................135 O livre-arbítrio..........................................................................................................................................136

Ética – uma perspectiva cristã...............................................................................................141 Ética – uma abordagem Religiosa e distinção da Social..........................................................................141 Ética – uma perspectiva religiosa cristã....................................................................................................141 Ética Religiosa cristãe Moral Religiosa – os Dez Mandamentos.............................................................144 Ética Social cristã.....................................................................................................................................145

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Ética – assuntos práticos ......................................................................................................147

A ordem da vida: a Ética nas questões da vida . ......................................................................................147 A Ética da corporeidade............................................................................................................................149 A ordem familiar: a Ética na família.........................................................................................................151 A ordem de justiça: a Ética nas questões legais . .....................................................................................153 A ordem civil: a Ética na política.............................................................................................................154

Referências............................................................................................................................157

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Apresentação Caro amigo

E

stamos iniciando uma caminhada. Há mais de 15 anos trabalho com a disciplina de Cultura Religiosa. O começo sempre é difícil. Existe uma resistência natural do aluno em estudar os conteúdos. O “pré-conceito” fica claro quando se define a disciplina como aula de religião. Outros ainda pensam em catequese. Mas não será este o nosso objetivo. Apenas quero caminhar com vocês no sentido de construir uma reflexão madura sobre a vivência e o comportamento religioso das pessoas e a influência que exercem sobre a vida de cada um de nós. Ao final de cada semestre, fico surpreso com a reação dos alunos. A maioria considera a disciplina muito interessante. É claro, que alguns resistentes ficam indiferentes, pois não tiveram a coragem de abrir o coração e aceitar conceitos essenciais para se viver uma boa vida. Trabalho em uma Universidade Confessional, isso significa que a mesma está ligada a uma Instituição Religiosa. Mas nem por isso queremos impor o que pensamos. Vamos apenas debater. Se puder ajudá-los com essa reflexão, com certeza o farei. Você irá encontrar neste livro um panorama das maiores religiões do mundo. Notará a pluralidade religiosa e terá uma idéia da riqueza de pensamento e valores das religiões estudadas. Também iremos estudar mais detalhadamente o Cristianismo e a Reforma Luterana, pois são movimentos que influenciaram diretamente na existência da Universidade Luterana do Brasil. Por fim, estudaremos ética. Particularmente, a ética cristã e os valores que ela pode acrescentar na vida de cada um de nós. Nesta caminhada, muitos dos textos têm a participação de professores de Cultura Religiosa que nesses 15 anos estão ao meu lado. Citamos aqui Ronaldo Steffen, Jonas Dietrich, Valter Kuchenbecker, Egon Seibert, Ricardo Rieth, Valter Steyer, Thomas Heimann, Nereu Haag e Bruno Muller. Além desses, não podemos deixar de citar o Capelão Geral da Universidade Luterana do Brasil, pastor Gerhard Grasel e o Diretor do curso de Teologia da Ulbra, pastor Leopoldo Heimann. São pessoas que têm ajudado não somente a construir esta trajetória em Cultura Religiosa, como têm colaborado com o aprofundamento da reflexão e ajudado muitas pessoas. Douglas Moacir Flor

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Cultura religiosa – um tema controverso Douglas Moacir Flor*

Resumo

V

ocê já deve ter passado por alguma experiência religiosa. Se não passou, alguém ao seu lado já deve ter contado algo que o levou a refletir sobre o assunto. Aqui, vamos ver que a experiência religiosa é mais rica do que se imagina, além de ser universal. A religião está presente no cotidiano por meio de diferentes manifestações. Pode-se, sem entrar em detalhes por ora, mencionar algumas áreas, alguns eventos e algumas práticas pessoais e sociais marcadas por idéias, ritos e símbolos consagrados ao campo religioso. Vamos utilizar alguns pontos trabalhados pelo colega Ronaldo Steffen (2003), estudioso do assunto e professor de Cultura Religiosa, publicado no site da universidade. De uma forma bem simples, podemos reportar o leitor a algumas práticas familiares ligadas à tradição religiosa como o casamento, batismo, morte e velamento. São cerimônias religiosas tão tradicionais que muitas pessoas, sem que se dêem conta, se envolvem. O que dizer de pessoas doentes ou com problemas mais sérios que buscam ajuda divina como alternativa para a cura? No esporte, estamos acostumados, marcadamente no futebol, com a cena de uma oração conjunta antes da entrada no campo. Numa decisão por pênaltis, por exemplo, é comum a imagem de jogadores ajoelhados, rezando ou beijando sua santinha. No campo musical não são raras as menções que se faz a personagens religiosos e até mesmo a sentimentos de ordem religiosa; no campo das artes somos conduzidos a milhares de imagens notadamente carregadas de simbolismo religioso dos mais diversos matizes. A literatura não tem deixado por menos e tem sido o mercado que mais cresce em termos de editoria nos últimos anos. O cinema tem sido pródigo nas temáticas de ordem religiosa. As novelas, fenômeno brasileiro que ganha o mundo, jamais têm deixado de lado alguma alusão, personagem e até mesmo a temática central ligados a fatos eminentemente religiosos. A nossa alimentação está em grande parte determinada por elementos de ordem religiosa; o modo de expressar nossas idéias por meio da linguagem é, igualmente, em grande parte determinada por formas religiosas. O turismo religioso é hoje um grande filão na arrecadação de divisas para um município. A Educação Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Mestrando em Educação pela Universidade Luterana do Brasil. Graduado em Teologia pelo Seminário Concórdia – Instituição da Igreja Luterana do Brasil – e em Jornalismo pela Unisinos. Professor de Cultura Religio-sa e Jornalismo na Ulbra.

Cultura Religiosa

é fortemente marcada pelos valores que ela prega, quase sempre idênticos aos de ordem religiosa. A área da saúde, o trato com a dor, a vida e a morte foram e ainda são construídos com suporte religioso. Nosso calendário, suas datas festivas e grandes eventos têm sua origem no meio eclesiástico. As diversas áreas do conhecimento humano, de uma ou de outra maneira, têm-se ocupado com a temática religiosa, como a Filosofia, a Psicologia, a Sociologia, a Antropologia, a História, a Medicina, a Física, a Arqueologia, a Geografia e assim por diante.

A palavra religião Afinal, o que é religião? No texto a seguir temos uma definição que poderá ajudá-lo a entender o sentido. Etimologicamente, o termo religião surge na história da humanidade através dos autores clássicos, como Cícero, Lactânio e Agostinho, respectivamente, nas palavras re-legere, que significa reler, re-ligare, que significa religar, e re-eligere, que significa reeleger. Todos os conceitos nos dão a idéia de voltar a uma situação anterior, ou seja, ligar novamente a criatura com o criador. É exatamente esta tentativa de religar com o Ser Superior, através de um conjunto de crenças, normas, ritos ou costumes, que dá origem às diversas religiões o fenômeno religioso propriamente dito. (KUCHENBECKER, 2000, p. 18).

Apesar de seguidamente ouvir-se que religião é coisa do passado, as menções acima indicam uma direção contrária. Estão apontando para o fato de que o ser humano preocupa-se com o divino, aqui entendido no sentido daquilo que ocupa lugar de destaque ou o primeiro lugar na vida.

Istock Photo.

Conhecimento religioso

Batismo.

10

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

John Fries.

Cultura religiosa – um tema controverso

Istock Photo.

Peregrinos no rio Ganges.

Ilona M. Lachowski Loewen.

Monge budista.

Celebração judaica.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

11

Cultura Religiosa

Ainda tentando responder o que é religião, podemos dizer que religião é um batismo numa igreja cristã. É um ritual sagrado nas águas do rio Ganges. É a adoração num templo budista. Pode ser um muçulmano ajoelhado e orando para Alá. Ou os mesmos devotos do Islã peregrinando à Meca. Pode ser um judeu diante do Muro das Lamentações em Jerusalém. São tantas as menções que seria impossível citar todas. O que pretendemos fazer é ligar os fatos. As ciências da religião procuram responder o que as atividades citadas acima têm em comum. Nós procuramos, como pesquisadores, investigar os rituais de uma perspectiva externa. Buscamos semelhanças e diferenças. Queremos entender como se dá o processo historicamente e o que isso representa para sociedade hoje.

Por que estudar as religiões? Dependendo da experiência de cada um, as respostas serão diferentes. Talvez você seja um religioso e não precise de tantas explicações. Mas, com certeza, muitas pessoas não se atentaram para a importância do assunto. Jostein Gaarder, em seu O livro das religiões, nos ajuda a responder à pergunta acima: Um rápido olhar para o mundo ao redor mostra que a religião desempenha um papel bastante significativo na vida social e política de todas as partes do globo. Ouvimos falar de católicos e protestantes em conflito na Irlanda do Norte, cristão contra muçulmanos nos Bálcãs, atrito entre muçulmanos e hinduístas na Índia, guerra entre hinduístas e budistas no Sri Lanka. Nos Estados Unidos e no Japão há seitas religiosas extremistas que já praticaram atos de terrorismo. Ao mesmo tempo, representantes de diversas religiões promovem ajuda humanitária aos pobres e destituídos do Terceiro Mundo. É difícil adquirir uma compreensão adequada da política internacional sem que se esteja consciente do fator religião. (GAARDER, 2000, p. 14).

Além disso, explica Gaarder, um conhecimento religioso também pode ser útil num mundo que se torna cada vez mais multicultural. Ainda mais quando falamos em globalização, apesar de que o termo deva ser usado com cuidado. Muitos de nós viajamos pelo Brasil ou mesmo ao exterior, entrando em contato com as diversas culturas religiosas. Esses povos têm costumes diferentes que devem ser respeitados pelos seus visitantes. Se uma mulher estiver num país muçulmano, por exemplo, terá que observar o tipo de roupa que usará nas ruas. É claro que não precisará andar com uma burca, mas terá que cobrir seu corpo com roupas decentes. Finalmente, acreditamos que o estudo das religiões pode ser importante para o desenvolvimento pessoal do indivíduo. As religiões podem responder várias das perguntas existenciais que fazemos, como: de onde viemos? o que somos? para onde iremos?

12

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Cultura religiosa – um tema controverso

Steve Evans/Wikipedia.

Tolerância religiosa

Muçulmanas vestidas com a burca.

Este é um dos pontos mais importantes na nossa caminhada. Tolerância é o respeito pelas pessoas que possuem diferentes pontos de vista em relação à religião. Não significa que precisamos concordar com tudo o que as outras religiões praticam e seguir os mesmos rituais. Cada um tem o direito de seguir aquilo que é melhor para si, pode ter uma fé sólida. Mas a tolerância não é compatível com atitudes como zombar das opiniões alheias ou se utilizar da força e de ameaças. A tolerância não limita o direito de fazer propaganda, mas exige que esta seja feita com respeito pela opinião dos outros (GAARDER, 2000, p. 15). O respeito pela vida religiosa dos outros, pelas suas opiniões e pontos de vista, é um pré-requisito para a nossa aula de Cultura Religiosa. Sem isso, é impossível começar, pois: Com freqüência, a intolerância é resultado do conhecimento insuficiente de um assunto. Quem vê de fora uma religião, enxerga apenas as suas manifestações, e não o que elas significam para o indivíduo que a professa. (GAARDER, 2000, p. 15).

Sincretismo religioso No Brasil, é muito interessante falar sobre religião. Isto porque temos aqui uma pluralidade religiosa bem interessante. Além disso, encontramos o que chamamos de sincretismo religioso. Isso acontece quando misturamos elementos de várias religiões numa só. Sincretismo é o termo que os historiadores denominam de fusão ou associação de religiões, ritos, crenças e personagens cultuais.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

13

Cultura Religiosa

Os cultos afro-brasileiros são um exemplo comprovado de sincretismo religioso. Queremos mostrar como isso acontece através da fala de Riobaldo Tatarana, um personagem sertanejo do Grande Sertão: Veredas. Hem? Hem? O que mais penso, testo e explico: todo-o-mundo é louco. O senhor, eu, as pessoas todas. Por isso é que se carece principalmente de religião: para se desendoidecer, desdoidar. Reza é que sara da loucura. No geral. Isso é que é a salvação-da-alma... Muita religião, seu moço! Eu cá, não perco ocasião de religião. Aproveito de todas. Bebo água de todo rio... Uma só, para mim é pouca, talvez não me chegue. Rezo cristão, católico, embrenho a certo; aceito as preces de compadre meu Quelemém, doutrina dele, de Cardéque. Mas, quando posso, vou no Mindubim, onde um Matias é crente, metodista: a gente se acusa de pecador, lê alto a Bíblia, e ora, cantando hinos belos deles. Tudo me quieta, me suspende. Qualquer sombrinha me refresca. Mas é só muito provisório. Eu queria rezar – o tempo todo. Muita gente não me aprova, acham que lei de Deus é privilégios, invariável. E eu! Bofe! Detesto! O que sou? – o que faço, que quero, muito curial. E em cara de todos faço, executado. Eu? – não tresmalho! Olhe: tem uma preta, Maria Leôncia, longe daqui não mora, as rezas dela afamam muita virtude de poder. Pois a ela pago, todo mês – encomenda de rezar por mim um terço, todo santo dia, e, nos domingos, um rosário. Vale, se vale. Minha mulher não vê mal nisso. E estou, já mandei recado para uma outra, do Vau-Vau, uma Izina Calanga, para vir aqui, ouvi de que reza também com grandes meremerências, vou efetuar com ela trato igual. Quero punhado dessas, me defendo em Deus, reunidas de mim em volta... Chagas de Cristo! (ROSA, 1985).

Quem sabe você conhece alguém que se identifica com este personagem. É comum a gente encontrar situações como esta. Nas aulas de Cultura Religiosa, quando perguntamos se nossos alunos têm alguma religião, muitos respondem: sou católico apostólico romano, não praticante. Isto significa que eles são católicos por tradição, mas não vão à igreja aos domingos. Muitos são católicos, mas não deixam de ir ao terreiro ou ao centro espírita. É importante ressaltar aqui a questão da tolerância. Religião sem o devido respeito perde o sentido. Não é possível pregar algo e praticar outra coisa. Por outro lado, a experiência religiosa é importante na vida de todo o ser humano. Se você ainda não passou por isso, busque entender um pouco mais do assunto. Leia, reflita sempre.

1.

14

Como você analisa a experiência religiosa?

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Cultura religiosa – um tema controverso

2.

Como você vê a religião dos outros?

Busque em jornais e revistas textos que o reporte a algum assunto relacionado à cultura religiosa e reflita sobre ele. Se possível, discuta com seus colegas. Recomendamos a leitura do primeiro capítulo do livro: KUCHENBECKER, Valter. O homem e o sagrado. Canoas: Editora da Ulbra, 2000.



Você já passou por alguma experiência religiosa? Relate uma experiência que o tenha reportado ao mundo religioso.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

15

Cultura Religiosa

16

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

O fenômeno religioso

É

possível perceber a religião como um fenômeno religioso. Mesmo que nos dias atuais, a ciência cada vez mais ocupe o lugar da religião, são muitos os fatores que nos reportam à importância da religião na vida dos povos em todo o mundo. No passado, a religião era o centro do universo. Assim, é possível concordar que: [...] apesar desta mudança de prioridade, o homem sempre e em todos os tempos tem demonstrado a sua preocupação com o divino. Existe no ser humano uma consciência natural que o impulsiona nesta direção. Tal preocupação tem se manifestado de formas diferentes através das diferentes culturas e civilizações. Esta busca e necessidade de relacionar-se com o Ser Superior, o Eterno e o Divino chamamos de fenômeno religioso. No entanto, este fenômeno precisa ser corretamente orientado e conduzido pelo próprio Criador. Caso contrário, levará o homem a falsos deuses. (KUCHENBECKER, 2000, p. 15).

Essa assertiva remete a uma dimensão em que é possível perceber-se a religião como fenômeno humano, tais como os classificados abaixo e expostos pelo Professor Martinho Lutero Hoffmann, em material não-publicado.

Religião e Arte A religião, enquanto fenômeno humano, tem provocado as mais belas obras artísticas. Isso pode ser observado em qualquer religião desde os tempos mais antigos até os mais modernos.

Corel/IESDE.

No antigo Egito, citamos as pirâmides, o templo de Karnac, a esfinge de Gizé e uma quantidade enorme de estátuas.

Esfinge.

Na Grécia Clássica, o Pathernon, as estátuas de Fídias e toda uma série de mitos que até hoje influenciam as artes e até mesmo as ciências. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Istock Photo.

Cultura Religiosa

Pathernon.

Na Palestina, o templo de Salomão, destruído na conquista babilônica do século VI a.C.; o de Herodes, também destruído pelos romanos no ano 70 d.C., mas que subsistem na memória do povo judeu como alguns dos grandes marcos da sua arte; e os livros sagrados, que levaram Augusto de Campos, um dos maiores escritores contemporâneos, a afirmar que Deus é um grande poeta.

Wikipédia.

Na Idade Média européia, as grandes catedrais, prodígios não só de concepção artística, mas também de engenharia e arquitetura; os vitrais dessas mesmas catedrais; a criação da música polifônica; esculturas; e pinturas.

Catedral gótica.

18

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Wikipédia.

O fenômeno religioso

Vitrais.

Wikipédia.

Na Renascença italiana, a catedral de Florença; a basílica de São Pedro, em Roma. As pinturas sobre os mais variados assuntos religiosos, dentre as quais se sobressai o conjunto ímpar da Capela Sistina; as esculturas como a Pietá; a Divina Comédia escrita por Dante Alighieri.

Basílica de São Pedro. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

19

Wikipédia.

Cultura Religiosa

Pietá de Michelângelo.

Em Portugal, os conjuntos de azulejos; os sermões de Antônio Vieira; o monumento monolítico erigido em louvor a Deus, mas cujos rescaldos são mais que suficientes para fazer da Língua Portuguesa uma língua de primeira grandeza.

Beni Jr.

No Brasil, o mesmo Vieira, que nacionalizamos com muito amor, devido ao fato de aqui ter vivido muitos anos; as igrejas barrocas de Minas Gerais, Bahia e Pernambuco; as estátuas e pinturas desse mesmo período; e a catedral de Brasília projetada por Niemeyer.

Igreja barroca de Ouro Preto.

20

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

O fenômeno religioso

Wikipédia.

A música alemã, por sua vez, se torna a mais importante por seus inúmeros gênios, entre os quais avultam Mozart, Beethoven, Buxtehude, Brahms e, principalmente, os 200 compositores da família Bach, um em especial que deu o supremo nome da história musical: Johann Sebastian Bach (1685-1750).

Johann Sebastian Bach.

Corel/IESDE.

Nos Estados Unidos, a música gospel e o negro spiritual. Outras regiões do mundo com outras religiões também contribuíram significativamente para as artes em geral, como os pagodes chineses, os jardins japoneses, os templos hindus, entre outros. Em suma: todo povo e toda religião forneceram à Arte alguma coisa de muito valor que não deve, sob nenhuma hipótese, ser relegada a segundo plano.

Jardim japonês.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

21

Cultura Religiosa

Religião e Moral A Moral vem a ser, num mundo que se vive em sociedade, um de seus pilares imprescindíveis. A convivência de muitas pessoas dentro de um mesmo espaço físico exige regras e leis, deveres e obrigações, direitos e privilégios e, mais que tudo, virtudes e valores. A Moral nos diz o que é certo e o que é errado. Mas o que diz à Moral se algo é certo ou errado, ou qual a hierarquia dos valores e virtudes, é, na maioria das vezes, a religião que as pessoas aceitam. Há, evidentemente, religião sem moral e moral sem religião, mas, na grande maioria dos casos, moral e religião mantêm um casamento mais do que fechado. Quando isso acontece, é a religião que dita as normas e ainda fornece toda a motivação para que as normas sejam plenamente cumpridas.

Wikipédia.

Religião e Ciência

Wikipédia.

Auguste Comte.

Charles Darwin.

22

Se Religião, Arte e Moral formam um trio quase perfeito, Religião e Ciência, há tempos descasados, brigam muito, continuamente. A briga realmente esquentou no século XIX. Auguste Comte (17981857), o fundador do positivismo, afirmou, na teoria dos três estágios do conhecimento, que a Religião era, dos três, o mais antigo e o mais simplório, devendo ceder lugar à Filosofia que, por sua vez, entregaria o posto à Ciência. O incrível de tudo isso é o próprio Comte, depois de haver levantado essa idéia, criar a religião da humanidade, um manual que, a partir da sua filosofia positivista, defende o amor como causa, a ordem como meio e o progresso como fim. O grande problema, no entanto, surge com Charles Darwin (1809-1882) e a Teoria Evolutiva. Até aí não se via nenhuma dificuldade com o relato inicial do primeiro livro de Moisés. Acreditava-se, com toda a candura, na criação do mundo em seis dias e na idade do universo em torno de seis mil anos, como se o relato bíblico fosse uma reportagem dos tempos antigos. O universo ficou mais velho, e a rápida mão do Criador cedeu lugar à lenta evolução. A imagem e a semelhança de Deus atribuída ao homem desmanchou-se em crânios simiescos datados de algumas centenas de milhares de anos.

As perguntas que, pois, se impõem são estas: há no big-bang e na evolução alguma verdade que pode ser considerada final, ou tudo gira no terreno arenoso das hipóteses e da especulação? As narrativas bíblicas têm a pretensão de ser uma afirmativa de caráter científico tal e qual entendemos hoje a ciência com seu meticuloso método, ou foram desde o princípio concebidas na categoria de mitos, como verdades superiores que só podem ser expressas em linguagem sublime e figurada? Sendo assim, podemos abrir mão da literalidade da Criação para injetar nela as categorias da evolução? As respostas a cada uma dessas perguntas dependerão da fé e da compreensão ou ausência de fé tanto em relação à religião como também em relação à própria ciência, visto que essa, para muitos, constitui uma espécie de religião que, além de plantar certezas, garante safras de soluções. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

O fenômeno religioso

Religião e Filosofia Religião e Filosofia são duas retas paralelas que ora divergem, ora se encontram, ora se complementam, ora se anulam. Pode-se afirmar que o surgimento da Filosofia no Ocidente foi um ataque aos mitos gregos. Tales de Mileto (625/4-558/6 a.C.) procura uma explicação fora deles e diz que a origem de tudo é a água. Anaximandro (610/9 -547/6 a.C.) põe no lugar da água o indeterminado, e Anaxímenes (588-528/5 a.C.), o ar. Xenófanes de Cólofon (Jônia, Ásia Menor, 570-528 a.C.) critica a antropomorfização de Deus na poesia de Homero e Hesíodo. Demócrito de Abdera (Trácia, 460-370 a.C.) é o pai do atomismo, afirmando que tudo é formado por substâncias indivisíveis, as quais se combinam ou se separam, formando ou desfazendo uma pessoa ou um objeto. Os sofistas, primeiros professores profissionais da história, tornam tudo relativo segundo a famosa frase de Protágoras: “O homem é a medida de todas as coisas; do ser enquanto existe e do não-ser enquanto não existe”. Sócrates (470-399 a.C.), reagindo ao relativismo sofista, introduz a teoria das idéias inatas, às quais se poderia chegar pela maiêutica (partejamento de idéias). Com as idéias inatas, se pressupunha uma vida anterior, abrindo, assim, caminho para a religião. Platão (428-347 a.C.), aluno de Sócrates, continua na mesma trilha ao propor o mundo das idéias como a autêntica realidade (mito da caverna, corpo prisão da alma). A Idade Média, marcada profundamente pela religião cristã, desenvolve a tese de que a Filosofia é a serva da Teologia (ciência da religião). Vale notar que os eruditos cristãos primeiramente usaram as categorias platônicas e acabaram contaminando-se com um modo platônico de ver as coisas, mas em seguida se apropriaram das concepções aristotélicas, sendo igualmente influenciados por elas (amor ordenado, provas racionais da existência de Deus etc.). Por outro lado, há quem visualize religião (ou teologia) e Filosofia não como concorrentes, mas como dois métodos diferentes, não opostos, para tratar e compreender uma mesma realidade. Martin Heidegger (1889-1976), por exemplo, foi sepultado como católico romano. Edmund Husserl (1859-1938), expoente do fenomenalismo, converteu-se à Igreja Luterana. Em tempo: não se deve confundir religião e teologia. Embora sejam conceitos afins, não são a mesma coisa. Religião é um conjunto de crenças que formam um sistema coeso. Teologia é a reflexão crítica e sistemática sobre os dados oferecidos pela religião. Em outras palavras: teologia é a ciência, e religião é o objeto ou a matéria dessa ciência.

Religião e Economia Toda crença, tão logo se institucionalize, passa a ter uma economia interna. Precisa manter suas propriedades (escolas, templos, creches, asilos, seminários etc.) e pagar seus funcionários. Para tanto, se utiliza de vários expedientes: coEsse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

23

Cultura Religiosa

brança de uma taxa, estabelecimento de um percentual dos ganhos do fiel (o dízimo, por exemplo), ofertas livres, doações ou subvenções do governo. A religião, no entanto, não se limita apenas a isso. Ela, para o bem ou para o mal, influencia a economia da comunidade como um todo, embora nem sempre seja determinante. Max Weber (1864-1920) tentou mostrar que o surgimento do capitalismo se deveu ao protestantismo de cunho calvinista. Sabe-se, porém, que muito antes de Calvino já havia banqueiros e que até os papas se utilizavam dos seus monetários serviços. Certamente, o que se pode afirmar é isto: certas ênfases doutrinárias desta ou daquela religião podem motivar seus adeptos a ter uma ou outra resposta econômica. Contrastando-se o catolicismo medieval e contrareformista com o luteranismo, é possível ver algumas diferenças: no catolicismo a forma de se adorar e servir a Deus passava pela veneração dos santos, orações, jejuns, penitências, peregrinações e culminava em tornar-se monge ou freira; no luteranismo, o servir e adorar a Deus começava pela fé (considerada o supremo culto, prosseguia na participação dos cultos, leitura da Bíblia, oração etc., e concretizava-se no trabalho diário, visto como vocação de Deus, razão pela qual todo trabalho, fosse ele qual fosse, deveria ser bem feito porque era, além de um culto a Deus, um serviço ao próximo). Partindo-se daí, é possível admitir que o progresso dos países luteranos em relação aos católicos tenha uma origem doutrinária. Contudo, pode-se também questionar se outros fatores não intervieram com peso igual ou até superior. Um deles seria o posicionamento assumido pela nobreza medieval em relação ao trabalho, que era de franco desprezo – calcula-se que na Espanha, no século XVI, apenas 3% da população efetivamente se dedicava ao trabalho! Por não ter havido uma quebra de ordem cultural e social nos países em que a visão medieval permaneceu firme, não poderia estar aí também uma resposta?

Wikipédia.

Religião e Educação

Confúcio.

24

Por ser a Religião um conjunto de ensinamentos (note-se o termo), segue-se que ela, para sobreviver, precisa apelar para a Educação. Não é por outro motivo que os primeiros professores foram todos pessoas ligadas a um culto específico. No entanto, o que se quer discutir aqui é se a religião consegue lançar os olhos para a Educação como um todo. Num primeiro exame, observa-se que a religião contribuiu com muito pouco ou mesmo nada nessa direção. Na China, país de cultura milenar, a Educação esbarrava nos milhares de ideogramas que um aluno precisava memorizar, pois era necessário tempo e dinheiro. Ao que tudo indica, não havia nenhum plano de Educação abrangente. No primeiro projeto educacional conhecido, o confuciano (século VI a.C.), a ênfase não era popular, mas elitista, já que Confúcio queria restabelecer o império, o transformado quase numa obra de ficção por causa do ínfimo poder exercido pelo

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

O fenômeno religioso

imperador. O sistema idealizado pelo mestre visava a preparar os funcionários públicos, os mandarins, que seriam a base burocrática do império. Deve-se notar que, embora seja atualmente considerado uma religião, o confucionismo tinha a princípio uma função muito mais política e pedagógica do que propriamente religiosa. Num certo sentido, é a Reforma que ata o nó bem firme da religião com a educação. Lutero achava que ela poderia fazer de alguém um cidadão útil para o Estado. Já nos primeiros anos da Reforma, recomendava aos príncipes e governantes que fundassem escolas e obrigassem os pais a enviar a elas os filhos. Por outro lado, a fim de pôr em prática a noção de sacerdócio universal de todos os crentes, advogava que todo cristão poderia ler a Bíblia e interpretá-la — não aleatoriamente — de modo objetivo, levando em conta as regras da gramática e da retórica e todo o contexto geográfico, histórico, social etc. Pode-se até afirmar, sem nenhum receio, que a educação brasileira não seria hoje o que é sem as escolas confessionais, pois são milhares por toda parte. É interessante analisar a religião no intuito de abrir as lentes para um novo olhar. À medida que conseguimos nos despir de preconceitos, avaliamos de outra maneira e enriquecemos culturalmente. Você vai perceber isso quando se deparar com notícias de jornais e televisão. O assunto “religião” será percebido com mais atenção.

1.

Em grupos formados com quatro pessoas, refletir e listar sobre a influência da religião na vida diária da sua cidade.

2.

Num segundo momento, os grupos apresentam suas respostas e abrem o debate com o grande grupo.



A dica de estudo é prática. Busquem o diálogo. Pesquisem na internet sites que mostrem a relação entre arte e religião.



Ouçam músicas que tenham sido inspiradas pela religião. Pode ser música clássica, gospel ou mesmo popular. Muitos jovens, das mais diversas religiões, costumam compor músicas e graválas em CD.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

25

Cultura Religiosa



26

Com quais aspectos desta aula você se identificou? Escreva o relato sobre uma visita a algum museu, o ouvir de uma música etc., que o tenha reportado à religião.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões I

V

amos partir para uma longa viagem. A idéia é dar a volta ao mundo e estudar as grandes religiões. Se fôssemos numerar todas as religiões existentes no mundo, possivelmente teríamos milhares. Portanto, vamos falar das principais, pois a partir dessas é que surgiram todas as outras. Cada uma das grandes religiões produziu milhares de seitas ou grupos menores que foram se subdividindo durante os séculos. Todas produziram uma grande riqueza cultural e valores fundamentais para a preservação do ser humano.

Hinduísmo É uma religião intrigante em muitos aspectos. Não tem um fundador, apenas um livro sagrado ou regras singulares que nos ajudam a entender facilmente suas crenças e suas tradições. Nasceu há cerca de 4 mil anos, na Índia. É difícil falar dela como uma religião só. O Hinduísmo tem uma infinidade de ramos e divindades. A religião hindu passou por constantes transformações ao longo dos séculos – resultado das sucessivas invasões que marcaram a história deste povo. Apesar da diversidade de deuses e formas de encontrar o caminho, um aspecto é comum entre todos: a vida na Terra é parte de um ciclo de nascimentos, mortes e renascimentos, do qual é preciso se libertar. A reencarnação, determinada pela Lei do Carma, talvez explique a resignação e a satisfação pela vida que levam, mesmo diante de costumes tão diferentes dos nossos e da “pobreza” (do nosso ponto de vista) em que vivem. Origem Não há uma precisão histórica sobre o início do Hinduísmo. Ele é resultado de um processo gradual, provém das religiões primitivas tribais da Índia e toma forma com a invasão deste país, por volta de 1500 a.C., pelos arianos indo-europeus. Seu sistema religioso está organizado em torno de quatro escritos sagrados, conhecidos como Vedas. As tradições religiosas eram inicialmente transmitidas oralmente. A partir de 800 a.C. é que surgem os primeiros escritos. O Rig-Veda é o livro principal. Aos Vedas são acrescentados dois outros livros: os Brahmanas e o Upanishads. As três obras contêm todo o Dharma, as obrigações da casta, uma espécie de lei. A melhor definição é que [...] projeta-se como a religião eterna e se caracteriza por sua imensa diversidade e pela capacidade excepcional que vem demonstrando através da história de abranger novos modos de pensamento e expressão religiosa. (GAARDER, 2000, p. 40).

Por outro lado, encontramos algumas pistas que nos levam a entender o processo de construção e consolidação do Hinduísmo: [...] A invasão dos árias levou à Índia um politeísmo já organizado, como mitos e cultos próprios, de caráter naturalista [...] Para assegurar o predomínio de sua casta, os sacerdotes arianos elaboraram uma doutrina sincretista, em que o conceito de brahman, de alguma forma equivalente ao mana dos melanésios, era elevado a uma ordem superior, absolutizada, que por vezes se identificava com a própria divindade (donde o deus Brahma, personificado). Desta forma, valorizavam a sua mediação sacerdotal, pois pelos ritos sagrados podiam produzir e manipular o brahman (conceito mágico). (PIAZZA, 1991, p. 246). Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Cultura Religiosa

Muitos entendem que os arianos usaram o Hinduísmo para exercer o poder e governar os hindus sem resistência, mas isso é apenas uma hipótese.

O povo hindu Precisamos pensar nas pessoas, no povo hindu, e como a religião funciona no dia-a-dia. Olhando o Hinduísmo como um todo – sua grande literatura, seus rituais complexos, sua difundida cultura popular, sua arte opulenta – podemos resumir tudo numa única frase: “Você pode ter aquilo que deseja.” (SMITH, 1991, p. 30). Pense no que as pessoas buscam na vida: prazer, sucesso mundano (riqueza, fama e poder), serviço e libertação. Os hindus não proíbem nenhuma dessas buscas. Para eles tudo tem o seu momento na vida e se você desejar essas coisas deve buscá-las. Por outro lado também sabem que nem todas as buscas vão trazer os resultados esperados.

Somos pessoas limitadas Sabem os hindus que somos pessoas limitadas na alegria, no conhecimento e na existência. Na alegria, por exemplo, existem restrições como a dor física, a frustração que surge dos impedimentos ao desejo e o tédio com a vida em geral. A dor física é a menos problemática. Como a intensidade da dor se deve, em parte, ao medo que a acompanha, dominar o medo reduzirá a dor. A segunda grande limitação da vida humana é a ignorância. Dizem os hindus que ela pode ser removida. Os Upanishads falam de “conhecer aquilo cujo conhecimento traz o conhecimento de todas as coisas”. Quanto à terceira grande limitação, a existência, o Hinduísmo leva essa idéia um pouco além, propondo um eu extenso, com vidas sucessivas, assim como uma única vida é feita de momentos sucessivos. A literatura hindu é rica em metáforas e parábolas destinadas a nos despertar para as “minas de ouro” que repousam ocultas nas profundezas do nosso ser. Somos como reis que, vítimas de um ataque de amnésia, vagueiam pelo reino vestindo andrajos, sem saber quem realmente são. Ou como um filhote de leão, separado da mãe, que é criado por ovelhas e se acostuma a pastar e balir, acreditando ser também uma ovelha. Somos como o amante que, no sonho, corre o mundo, desesperado em busca da amada, esquecido de que ela está deitada ao seu lado.

Os quatro estágios da vida Segundo a tradição hindu, a vida do homem está dividida em quatro estágios, denominados asramas: Bramacarya – é o estágio da juventude. Fase em que o estudante deve aprender os ensinamentos dos Vedas com um professor mais velho ou com um sábio; 28

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões I

Grihastha – fase adulta, em que ele assume o papel de chefe de família; Vanaprastha – é o estágio do homem idoso. Ele deve gradualmente afastar-se das coisas deste mundo e dedicar-se à reflexão; Samnyasin – nesta fase, o indivíduo deve renunciar ao mundo. A vida da mulher não é dividida em etapas.

Divindades O Hinduísmo possui uma tríade de grandes deuses – Brahma, o criador, Shiva, o destruidor, e Vishnu, o conservador. Além desses, os hindus possuem milhões de divindades, chamadas de divindades dos lares. É a religião no mundo com o maior número de deuses. A única regra universalmente aceita pelo hindu é a de seguir as normas de sua casta, na expectativa de um futuro feliz para si mesmo.

Brahma, o criador Nascido de uma flor-de-lótus que brotava do umbigo de Vishnu, Brahma é o criador, o responsável pela construção do Universo. Ele é casado com Sarasvati, a deusa do conhecimento. Embora seja central na mitologia hindu, Brahma não é muito cultuado porque já realizou sua tarefa e só voltará na próxima criação do mundo.

Shiva, o destruidor Esse possui dois aspectos principais, aterrorizante e benevolente, aparece sob muitas formas e recebe mais de mil nomes. O primeiro é Rudra, um deus violento, o deus das tempestades. Durante a dinastia Gupta, Shiva era ao mesmo tempo o deus do amor e da destruição. Suas manifestações podem ser divididas em cinco categorias: o jovem asceta, o dançarino cósmico, o senhor da destruição, o demônio Brairava e o marido amoroso. Ele é representado vestido ou nu, com o cabelo longo preso em um coque ou usando uma coroa.

Vishnu, o protetor Conhecido como deus preservador, Vishnu representa a força criadora que une todo o universo e possibilita a luz e a vida. Ele incorpora o amor divino e controla o destino humano. Pode ser reconhecido pela sua cor azul-escura e pelos quatro braços, que sugerem sua capacidade de alcançar os quatro cantos do mundo. Vishnu é muito popular, principalmente sob a forma de avatares – suas diversas encarnações.

Reencarnação Os hindus acreditam na reencarnação ou transmigração das almas. É um processo de infinitas encarnações com o fim de ser absorvido o espírito pelo absoluto Brahma. Isto significa que as almas nunca morrem, desde que façam parte do indestrutível tudo, Brahma. A alma de um homem de baixa posição social poderá renascer como uma cobra ou até como um objeto não pertencente ao plano humano, depenEsse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

29

Cultura Religiosa

dendo da segunda crença, a Lei do Carma. Entendem que o homem é hoje resultado de suas ações anteriores a esta vida. Os hindus dividem o povo em castas. O grupo de maior valor era formado pelos Brâmanes ou líderes religiosos, também chamados de videntes. Logo abaixo aparecem os príncipes ou administradores, depois os agricultores ou vassalos seguidos dos servos. Fora das castas estão os párias, ou intocáveis, uma espécie de mendigos e miseráveis. Desta forma, para eles, é impossível questionar, duvidar ou aspirar a qualquer posição social nessa existência. Uma das explicações para a questão das castas é que os arianos (invasores europeus) mantinham ligação com algumas religiões, como a grega, a romana e a germânica. Eles davam importância significativa ao sacrifício e faziam diversas oferendas a seu panteão de deuses, a fim de conquistar favores e manter sob controle as forças sobrenaturais. As crenças e os ritos, já existentes na região, foram incorporados ao sistema religioso dos invasores e originaram novos cultos. Aí está um exemplo de sincretismo religioso, como também aconteceu no Brasil com as religiões africanas.

Animais sagrados Ouvimos muitas histórias sobre animais sagrados na Índia, especialmente sobre a vaca. Realmente existe o culto aos animais. A vaca é um animal sagrado, simbolicamente vista como Alimentadora Sagrada. Não pode ser morta sob nehuma circunstância. A pessoa que toca a vaca fica ritualmente limpa, por isso o leite e todos os seus derivados, como a manteiga, são utilizados em cerimônias de purificação. Até seus excrementos são sagrados e podem ser usados como agentes de purificação. Também são considerados sagrados animais como a cobra, o crocodilo e o macaco. Normalmente os hindus não gostam de tirar a vida dos animais e muito menos comer sua carne, o que tornou a maioria dos fiéis vegetarianos. Para concluir, é importante ressaltar que extraímos apenas algumas partes importantes que nos dão uma idéia da religião. Mas entender em que os hindus acreditam é difícil, como nos conta o historiador: É difícil descrever o Hinduísmo. É preciso vivenciar. Os sábios hindus parecem mais sábios do que nós; têm mais força, mais alegria. Parecem ser mais livres no sentido de não se confinarem à ordem natural. Parecem serenos, até mesmo radiantes. Pacifistas por natureza, seu amor flui para o mundo, para todos sem distinção. O contato com eles fortalece e purifica. (SMITH, 1991, p. 41).

Budismo Um príncipe hindu rico, possuidor de todos os bens necessários para uma vida agradável, sem problemas e pertencente a uma das maiores castas. Bem que Siddartha Gautama poderia desfrutar tudo isso e viver sua vida com sua esposa, sua filha recém-nascida, nos palácios de seu pai. Mas faltava alguma coisa. Os problemas existenciais o levaram a abandonar tudo em busca de uma solução para 30

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões I

superar o sofrimento humano. Passou a ser conhecido como Buda ou “Iluminado”. Espalhou suas descobertas por toda a Índia dando origem a uma das religiões mais influentes do mundo. Hoje, são mais de 400 milhões de adeptos. Para se compreender o Budismo é necessário muita leitura. É uma religião complexa devido às muitas seitas, escolas e pensamentos existentes, sempre de caráter nacionalista regionalizado. O Budismo começou no século VI a.C. como uma dissidência do Hinduísmo, nas proximidades do Himalaia. Siddartha Gautama, o fundador, foi um príncipe que não concordou com o poder salvador dos Vedas, com os rituais e com a ascendência dos sacerdotes nas questões religiosas. Deixou tudo o que tinha e durante seis anos procurou o verdadeiro caminho da salvação ou o sentido mais elevado e permanente da vida. Dentre as suas tentativas, buscou experiências que lhe respondessem aos anseios da vida. Tentou os caminhos dos sacerdotes e do ascetismo, chegando próximo à morte por causa do sofrimento ao seu corpo. Não foi nesse momento que encontrou a paz de espírito. Como um ascético, testava-se a si mesmo, chegando ao extremo de comer suas próprias fezes para testar sua autodisciplina. Depois de várias tentativas, veio a resposta: a salvação pode ser conquistada por um caminho intermediário entre o desejo e a mortificação. Assim chegamos à idéia do “caminho do meio”.

As quatro verdades Buda desenvolveu o seu pensamento em torno de quatro verdades, como mostra Steffen (2000, p. 42): a primeira verdade é que o sofrimento é universal; a segunda identifica a causa do sofrimento (o desejo interno); a terceira indica a necessidade de dominar o desejo e aniquilar a ambição; a quarta verdade vai mostrar o caminho (os oito caminhos) para aniquilar a ambição.

Os oito caminhos Fé justa Resolução justa Palavra justa Conduta justa Ocupação (trabalho) justa Esforço justo Pensamento justo Meditação justa

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

31

Cultura Religiosa

Com isso, alcança-se nirvana, que é o estado mental livre de paixões. Assim Gautama anulou todo o sistema de castas1 do Hinduísmo, os rituais brâmares e toda a concepção de divindade. Manteve, no entanto, a doutrina do carma e da reencarnação. A filosofia budista pode ser resumida pela afirmação de que há um caminho do meio. Buda dizia que os excessos, tanto de prazeres sexuais como de ascetismo, eram evidências externas do desejo latente – desejo de vida material ou desejo de glória espiritual futura.

Os dez preceitos O Budismo é rico em preceitos, cuidados a serem adotados para uma vida equilibrada. Quem seguir determinadas regras vai encontrar benefícios no caminho com a finalidade de chegar à salvação. Os dez preceitos incluem desde ordenamentos para não se destruir a vida até a abster-se da promiscuidade, enfatizando a necessidade de só possuir o que for dado como presente, afastar-se da mentira, não beber álcool, fazer refeições apenas depois do surgimento da lua, além de regulamentar o uso de ornamentos e metais preciosos. Quando Gautama morreu, por volta dos 80 anos, o movimento já estava institucionalizado. No livro O homem e o sagrado, o autor do texto que fala sobre o Budismo, Professor Ronaldo Steffen, faz uma referência interessante de Buda. Diz ele: Buda era um humanista. Embora afirmasse a existência de uma multidão infinita de deuses e espíritos menores, era seu parecer que essas divindades não tornavam os seres humanos melhores, pois eram seres finitos e sujeitos a todas as fraquezas da natureza humana. Não acreditava num ser supremo nem em rituais puramente cerimoniais. Também não via importância no ato de orar e na existência de sacerdotes. Ensinava seus seguidores a dependerem de si mesmos, mas permanecendo benevolentes e amorosos com a humanidade. Aceitava, no entanto, a crença da transmigração das almas e a lei do carma. Acreditava que os erros do passado poderiam ser superados por uma vida exemplar e que a alma nada mais era do que a inter-relação de cinco energias, que se desintegravam quando o ser físico morria. (STEFFEN, 2000, p. 43).

O Budismo e suas diversas seitas

1

Castas: derivam de quatro grandes classes da antiga Índia: Brâmares (sacerdotes), Kshatriyas (governantes), vaisyas (agricultores, comerciantes etc.) e Sudras (escravos, párias), que representavam a instituição social e religiosa da sociedade hindu. Cada uma delas é presidida por um conselho com poder extraordinário. Nas escrituras hindus, o primeiro dever religioso é observar as regras da casta.

32

O Budismo hoje é formado por diversas seitas. Com o passar do tempo seus seguidores foram introduzindo novos ingredientes nos rituais. Por este motivo, o Budismo não pode ser totalmente explicado sem uma leitura mais aprofundada. O paradoxo é que Gautama, que não acreditava em Deus, tornou-se um para seus seguidores. Três séculos após sua morte, já havia pelo menos 16 seitas distintas de Budismo. É necessário estudar um pouco da expansão territorial do Budismo para entender o surgimento destas seitas. Esta expansão ocorre no século III a.C., quando Asoka, talvez o mais importante imperador da Índia, envia missionários às nações estrangeiras para convertê-las ao Budismo. Desta forma, encontramos hoje o Budismo chinês, com ênfase no culto aos ancestrais; o Budismo japonês, que inclui o antigo deus Shinto em sua lista de divindades; e o Budismo tibetano, que enfatiza a vida monástica e o princípio da não-quebra do poder eclesiástico.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões I

Algumas seitas budistas Seitas da “Terra Pura”, que seguem tenazmente o objetivo último de atingir o paraíso. Ensinam que as obras não têm importância e que, para garantir os resultados desejados na vida, basta crer e executar os rituais. Seitas dos “Intuitivos”, que perseguem os benefícios da contemplação vivendo vida simples e autodisciplina. Seitas “Racionalistas”, que se utilizam de processo sincrético, alegando que não há um único caminho a ser observado. Seitas da “Palavra Pura”, que depositam sua fé em salvadores cuja boa vontade deve ser buscada em complexas observações ritualísticas. Seitas “Sociopolíticas”, que desenvolvem, como no Japão, um forte sentimento nacionalista como doutrina central. (STEFFEN, 2000, p. 44)

O Budismo pode ser analisado a partir de suas duas maiores escolas de pensamento: a Hinayana, predominantemente monástica e não-teísta, e a Mahayana, que ensina que o universo é habitado por numerosos espíritos e deuses ansiosos por ajudarem os homens em suas necessidades. As duas religiões têm algumas características bem definidas. Mas é bom lembrar que o Hinduísmo é uma dissensão do Budismo. Buda não concordava com a situação de resignação, principalmente dos párias. Para ele, a vida não tinha sentido se fosse compreendida dessa maneira. Ao mesmo tempo fica claro que para Buda não há a necessidade de um deus que supra todas as necessidades do homem, pois o ser humano, por suas próprias forças, pode encontrar o caminho e chegar ao nirvana.

1.

No que o pensamento hinduísta difere do pensamento ocidental?

2.

Quais as lições que podemos tirar dos hindus para a nossa vida?

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

33

Cultura Religiosa

3.

Qual a ligação de Sidharta Gautama com o Hinduísmo?

4.

Quando falamos em reencarnação, qual religião da atualidade está relacionada a este pensamento e como isso acontece?

Recomendo para estudo a leitura dos capítulos 2 e 3 do livro: SMITH, Huston. As religiões do mundo. São Paulo: Cultrix, 1991.



34

Como você encararia a vida se tivesse que viver como os hindus e eles dissessem que você pertencesse aos párias?

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões II Confucionismo

V

amos caminhar por terras orientais. Uma volta pela China é o nosso compromisso neste momento. Vocês já devem ter observado que a China está despontando em todo o mundo pelo seu crescimento econômico e aos poucos vem sendo reconhecida como uma grande potência mundial. Talvez, o que você não saiba é que, “até 1911, a China foi uma potência imperial, onde o imperador reinava acima de tudo. O imperador era considerado o representante do país diante do supremo deus Céu”. (GAARDER, 2000, p. 77). O que havia por traz de tudo isso era uma ideologia confucionista. O conjunto de pensamentos, regras e rituais sociais confucionistas, foi desenvolvido pelo filósofo K’ung-Fu-Tzu (551-479 a.C.). No Brasil, o conhecemos como Confúcio. Além disso, Confúcio formulou normas para a vida religiosa, para os sacrifícios e os rituais. Segundo Gaarder, o confucionismo era, na verdade, uma religião estatal praticada pela elite e pelas classes dominantes, a qual, no entanto, nunca se disseminou muito entre as massas, as camadas mais amplas da população. Da mesma forma que o imperador, em seu palácio em Pequim, ficava remotamente afastado das pessoas comuns, o Céu era remoto e impessoal para a grande massa dos chineses pobres, trabalhadores e camponeses. A religião dos pobres era a adoração dos espíritos, particularmente dos antepassados, religiosidade carregada de magia e traços de outras religiões. (GAARDER, 2000, p. 77).

Quem foi Confúcio Confúcio nasceu em 551 a.C., filho de pessoas pobres, e desde cedo demonstrou um grande interesse no que se referia à vida. Diz a história que “após iniciar sua carreira pública como um oficial de segunda classe no estado de Lu, aos 18 anos, tornou-se professor e começou a ensinar História, Filosofia, Ética, Música, Poesia e boas maneiras” (STEFFEN, 2000, p. 48). A idéia era mostrar aos seus alunos os princípios necessários naquele momento de decadência da ordem feudal chinesa. Num outro texto, lemos o seguinte: Embora suas lembranças da infância contenham referências nostálgicas à caça, à pesca e ao arco, sugerindo com isso que ele foi tudo menos uma traça de livro, Confúcio dedicou-se cedo aos estudos e se saiu bem. Chegando aos quinze anos de idade, forcei a minha mente ao aprendizado.” Com vinte e poucos anos, depois de ter ocupado vários cargos públicos insignificantes, depois de ter feito um casamento não muito bem sucedido, ele se estabeleceu como professor particular. Essa era obviamente a sua vocação. A reputação de suas qualidades pessoais e sabedoria prática espalhou-se com rapidez, atraindo um Circulo de discípulos entusiasmados. (SMITH, 1991, p. 156).

A carreira de Confúcio não foi um sucesso. Sua ambição era bem maior. Alguns biógrafos chegaram a criar a lenda de que, por volta dos 50 anos, Confúcio realizou uma brilhante administração durante cinco anos, avançando rapidamente de ministro de Obras Públicas para ministro da Justiça e primeiro-ministro, e fazendo de Lu uma província modelo. “A verdade é que os governantes da época tinham medo da franqueza e da integridade de Confúcio, tanto medo que nunca o designariam para qualquer posição de poder” (SMITH, 1991, p. 156).

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Cultura Religiosa

Os escritos Confúcio compilou alguns materiais, os quais foram utilizados em sua filosofia de vida. Dentre os materiais, encontramos: Shih Ching (Livro de poesias), Li Chi (Livro dos ritos), I Ching (Livro das transformações), Shu Ching (Livro de história) e Ch’um Ch’íu (os anais da primavera e do outono).

A filosofia de Confúcio A questão central na filosofia de Confúcio está no termo li. Significa cortesia, reverência, ritos e cerimônias e o posicionamento ideal na vida pública e privada. “O chinês mais moderno entende por ‘li’ uma ordem social ideal, com tudo em seu devido lugar e com todas as pessoas prestando respeito e reverência aos outros na hierarquia social”. (STEFFEN, 2000, p. 48). De uma certa forma, a idéia era estabelecer a ordem e acabar com a queda do respeito desencadeada pela ordem feudal. Confúcio acreditava que, se cada um soubesse o seu lugar, poderia haver um comportamento de reciprocidade como um guia de vida. É aqui que vai surgir o dito “não faças aos outros o que não queres que te façam”. Político fracassado, Confúcio foi, sem dúvida, um dos maiores professores do mundo. Preparado para ensinar história, poesia, governança, propriedade, matemática, música, adivinhação e esportes, ele foi, à moda de Sócrates, um homem Universidade. Seu método de ensino também era socrático. Sempre informal, ele não fazia preleções; preferia conversar sobre os problemas propostos pelos seus alunos, citando leitura e fazendo perguntas. Ele se apresentava aos alunos como um companheiro de viagem, comprometido com a tarefa de se tornar plenamente humano, mas modesto. Quanto ao ponto a que chegou no cumprimento dessa tarefa, ele mesmo cita: Há quatro coisas no Caminho da pessoa profunda, nenhuma das quais fui capaz de fazer. Servir ao meu pai, como esperaria que um filho me servisse. Servir ao meu governante, como esperaria que meus ministros me servissem. Servir ao meu irmão mais velho, como esperaria que meus irmãos mais novos os servissem. Ser o primeiro a tratar os amigos como esperaria que eles me tratassem. Essas coisas não fui capaz de fazer. (CONFÚCIO).

Homem simples e humilde Não havia nada de sobrenatural nele. Confúcio gostava de estar com as pessoas, de jantar fora, de cantar em coro uma bela canção e de beber, mas não em excesso. Seus discípulos relataram que, nas horas de folga, o Mestre tinha um comportamento informal e alegre. Ele era afável, mas firme; digno, mas agradável. Estava sempre pronto para defender a causa das pessoas comuns contra a nobreza opressiva de sua época; nas suas relações pessoais, ele rompia escandalosamente as linhas de classe impostas pela sociedade e nunca menosprezava os alunos mais pobres, mesmo quando não podiam pagar as aulas. Era gentil, mas capaz de sarcasmos quando achava merecido. Falando daquele que começava a criticar suas 36

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões II

companhias, Confúcio observou: “É evidente que Tzu Kung tornou-se perfeito. Ele tem tempo para esse tipo de coisa. Eu não tenho tempo livre”. Confúcio nunca lamentou a escolha que fez. Ele dizia que com alimento ordinário para comer, água para beber e o braço dobrado como travesseiro, ainda existia alegria em meio a isso e a tudo. As riquezas e honrarias adquiridas por meios iníquos não significaram para ele mais do que as nuvens flutuantes. A glorificação veio após a sua morte. Entre seus discípulos, o gesto foi imediato. Disse Tzu Kung: “Ele é o sol, a luz, aos quais não há meios de se subir. A impossibilidade de igualarmos nosso Mestre é como a impossibilidade de alcançarmos o céu subindo por uma escada”. Em poucas gerações, Confúcio era visto em toda a China como o “mentor e modelo de dez mil gerações”. O que mais lhe teria agradado foi a atenção dada às suas idéias. Durante dois mil anos – até o século XX – toda criança chinesa chegou à sala de aula, toda manhã, e lavantou as mãozinhas postas na direção de uma mesa que tinha uma placa com o nome de Confúcio. Praticamente, todo estudante chinês estudou cuidadosamente os provérbios de Confúcio, durante horas a fio; o resultado é que eles se tornaram parte da mente chinesa, chegando até aos analfabetos na forma de provérbios. O governo chinês também foi influenciado por essas idéias, mais profundamente do que qualquer outra pessoa.

Alguns provérbios Verdadeiro filósofo não será aquele que, mesmo sendo reconhecido, jamais guarda ressentimento? Não faças aos outros o que não queres que te façam. Não me entristece que os outros não me conheçam. Entristece-me não conhecer os outros. Não esperes resultados rápidos nem procures pequenas vantagens. Se buscares resultados rápidos, não alcançarás a meta final. Se te deixares desviar por pequenas vantagens, nunca realizarás grandes feitos. As pessoas mais nobres primeiro praticam o que pregam e depois pregam de acordo com a sua prática. Se quando olhas dentro do teu coração não vês nada de errado, por que te preocupas? O que há para temeres? Quando conheces uma coisa, reconhecer que tu a conheces; e quando não a conheces, saber que tu não sabes – isso é conhecimento. Ir longe demais é tão mau quanto ficar aquém. Quando vês um homem digno, pensa quando poderás emulá-lo. Quando vês um homem desprezível, examina o teu próprio caráter. Riqueza e posição, eis o que as pessoas desejam; mas se não as conseguirem da maneira correta, nunca as possuirão. Sê bondoso com todos, mas íntimo apenas dos virtuosos. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

37

Cultura Religiosa

Pano de fundo É claro que os provérbios, por si só, não explicam o sucesso de Confúcio. É necessário compreender o que havia de errado na sociedade em que ele vivia. A Antiga China não era nem mais nem menos turbulenta do que as outras terras. Do oitavo ao terceiro século a.C., porém, a China testemunhou o colapso da dinastia Chou, que foi um governo de paz e ordem. Baronatos rivais ficaram em liberdade para fazer o que bem entendiam, criando uma situação idêntica à da Palestina no período dos juízes: “Naqueles dias não havia rei em Israel; cada homem fazia o que parecia certo a seus próprios olhos”. A guerra quase contínua desse período começou dentro dos padrões do cavalheirismo. O carro de guerra era sua arma, a cortesia era o seu código e os atos de generosidade conferiam honra. Diante da invasão, o barão arrogante enviaria um comboio de provisões ao exército invasor. Ou, para provar que seus homens estavam além do medo e da intimidação, ele enviaria, como mensageiro, soldados que cortariam a própria garganta diante do invasor. Tal como na era de Homero, guerreiros de exércitos inimigos se reconheciam, trocavam desdenhosos cumprimentos do alto de seus carros de guerra, bebiam juntos e às vezes trocavam armas antes de entrar em combate. Na época de Confúcio, porém, a guerra interminável degenerava; de cavalheiresca, tornara-se o terror desenfreado do período dos Estados combatentes. O horror chegou ao auge no século seguinte à morte de Confúcio. Os combatentes entre carros de guerra deram lugar à cavalaria, com seus ataques de surpresa e reides súbitos. Em vez do ato nobre de manter os prisioneiros até receber o resgate, os conquistadores promoviam execuções em massa. Populações inteiras, capturadas nos azares da guerra, eram decapitadas, incluindo velhos, mulheres e crianças. Lemos descrições de chacinas de 60 mil, 80 mil e até de 400 mil pessoas. Há relatos de vencidos atirados em caldeirões de água fervente e seus familiares forçados a beber aquela “sopa” humana. A pergunta, nessa época, era: por que continuamos nos destruindo? Talvez aí esteja a resposta para compreendermos o poder do Confucionismo. Confúcio viveu numa época em que a coesão social havia se deteriorado até o ponto crítico. Confúcio insistia que o amor ocupa um lugar importante na vida; mas também que o amor deve ser apoiado por estruturas sociais e por um etos coletivo. Bater exclusivamente na tecla do amor é o mesmo que pregar os fins sem os meios. Quando perguntaram à Confúcio certa vez, “devemos amar nossos inimigos, aqueles que nos causam mal?”. Ele respondeu: “De modo algum. Respondei ao ódio com a justiça e ao amor com a benevolência. Caso contrário, estaríeis desperdiçando vossa benevolência.”

38

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões II

Respeito às tradições O que chama a atenção nas religiões orientais é o respeito que todos cultivam pelos mais velhos. A idade não é um peso, mas uma bênção. A experiência é importante para os mais novos, que a buscam nas pessoas de maior vivência. Assim também são conservadas as tradições, transmitidas pelos mais velhos. Sobre a socialização, o próprio Confúcio ensinou: Deve ser transmitida dos velhos para os jovens, enquanto os hábitos e as idéias devem ser conservados como uma teia ininterrupta de memória entre os portadores da tradição, geração após geração. [...] Quando a continuidade das tradições de civilidade se rompe, a comunidade é ameaçada. A menos que essa ruptura seja consertada, a comunidade se esfacelará em [...] guerras de facções. Isso porque, quando a continuidade é interrompida, a herança cultural não está sendo transmitida. A nova geração se defronta com a tarefa de redescobrir, reinventar e reaprender, por tentativa e erro, a maior parte daquilo que precisa saber. [...] Essa não é tarefa para uma única geração (CONFÚCIO).

A tradição deliberada A tradição deliberada segue, no esquema de Confúcio, cinco termos chaves: Jen: Etimologicamente uma combinação dos caracteres correspondentes a “ser humano” e “dois”, designa o relacionamento ideal que deve existir entre as pessoas. Traduzido das mais variadas formas (bondade, fraternidade, benevolência e amor), talvez a melhor maneira de transmitir a idéia seja pela expressão: “sensibilidade do coração humano”. Jen envolve simultaneamente um sentimento de compaixão pelos outros e de respeito por si mesmo, um sentimento indivisível da dignidade da vida humana, onde quer que ela apareça. Chun Tzu: Se jen é o relacionamento ideal entre seres humanos, chun tzu refere-se ao termo ideal nesses relacionamentos. Esse conceito tem sido traduzido como homem superior e o melhor da humanidade. Talvez pessoa amadurecida seja uma tradução tão fiel quanto qualquer outra. É o oposto de pessoa estreita, da pessoa mesquinha, da pessoa de espírito pequeno. Somente quando aqueles que formam a sociedade se transformarem em chun tzus é que o mundo poderá caminhar na direção da paz. Se houver honra no coração, haverá beleza no caráter. Se houver beleza no caráter, haverá harmonia no lar. Se houver harmonia no lar, haverá ordem no país. Se houver ordem no país, haverá paz no mundo. Li: O terceiro conceito, li, tem dois significados. Seu primeiro significado é propriedade, a maneira pela qual as coisas devem ser feitas. As pessoas

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

39

Cultura Religiosa

precisavam de modelos, e Confúcio queria direcionar a atenção delas para os melhores modelos oferecidos pela sua história social. Propriedade é um conceito com amplo alcance, mas podemos perceber o âmago do interesse quando ele diz que: Se as palavras não forem correta [...] a linguagem não estará de acordo com a verdade das coisas. Se a linguagem não estiver de acordo com a verdade das coisas, os negócios não poderão ser concluídos com sucesso. [...] Portanto, um homem superior considera necessário que os nomes por ele utilizados sejam falados apropriadamente, e também que aquilo que ele fala possa ser transmitido apropriadamente. O que o homem superior requer é que em suas palavras nada haja de incorreto.

Todo o pensamento humano avança por meio de palavras; logo, se as palavras forem oblíquas, o pensamento não conseguirá avançar em linha reta. Aí é importante aquilo que Confúcio chamava de “retificação dos nomes”. A “retificação dos nomes”, na doutrina do meio, nas relações constantes, no respeito pela idade e pela família, esboça importantes aspectos específicos de li no seu primeiro significado: propriedade ou o que é certo. O outro significado da palavra é ritual, que transforma o certo – no sentido daquilo que é correto fazer – em rito. Quando o comportamento correto é detalhado em minúcias confucionistas, a vida inteira do indivíduo se estiliza numa dança sagrada. A vida social foi coreografada. Te: O quarto conceito axial que Confúcio procurou elaborar para seus conterrâneos foi te. Significa poder. Especificamente, o poder por meio do qual os homens são governados. Ele estava convencido de que nenhum governante consegue reprimir todos os seus cidadãos o tempo todo, nem mesmo grande parte deles na maior parte do tempo. O governo precisa contar com uma aceitação da sua vontade, uma confiança apreciável naquilo que está fazendo. Confúcio acrescentou que a confiança popular era de longe a mais importante, pois “se o povo não tiver confiança em seu governo, este não se sustentará”. Para ele, somente são dignos de governar aqueles que prefeririam não ter de governar. Quando o Barão de Lu perguntou-lhe como governar, Confúcio respondeu: Governar é manter-se reto. Se tu, senhor, dirigires teu povo em linha reta, qual de teus súditos se arriscará a sair dessa linha? Wen: O conceito final na estrutura confucionista é wen. Refere-se às “artes da paz”, enquanto diferenciadas das “artes da guerra”, à música, à arte, à poesia, à soma da cultura no seu modo estético e espiritual. Confúcio considerava apenas semi-humanas as pessoas que eram indiferentes à arte. Mas o que atraía seu interesse não era a arte pela arte. Era o poder da arte de transformar a natureza humana na direção da virtude que o impressionava – seu poder de facilitar o interesse pelos outros.

40

Pela poesia, a mente é despertada; pela música, recebe-se o acabamento. As odes estimulam a mente. Elas induzem à autocontemplação. Ensinam a arte da sensibilidade. Ajudam a evitar o ressentimento. Fazem-no acreditar no dever de servir ao país e ao príncipe. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões II

Corel/IESDE.

Xintoísmo

Templo xintoísta.

Não vamos nos ater muito a esta religião. Apenas para cultura geral vamos tecer algumas considerações sobre o Xintoísmo, que tem uma influência muito grande sobre a cultura japonesa. A partir desta religião é que poderemos entender um pouco mais a força desse povo, sua seriedade, seus compromissos e sua devoção.

O caminho dos deuses Quando falamos do Xintoísmo, normalmente nos reportamos aos japoneses, ricos pela sua forma de pensar, por sua cultura e também pelos seus valores religiosos. Primitivamente, a religião Xintoísta era chamada de Kami-no-michi, que é traduzido por “o caminho dos deuses”. Em chinês, a mesma expressão é shen-tao, de onde procede a palavra shinto (em português, xinto). O Xintoísmo é uma religião peculiar por sua expressão de amor japonês pelo seu país e suas instituições. Este aspecto da história sagrada está descrito no Kojiki, datado do século VIII. (STEFFEN, 2000, p. 50).

O Kojiki diz que as ilhas japonesas foram criadas por Izanami e Izanagi, que também habitaram a terra como numerosas divindades, das quais os japoneses são descendentes. A família real é descendente de Jimmu Tenno ( cerca de 660 a.C.), o primeiro imperador humano, neto de Ni-ni-go, neto de Amaterasu, a divindade feminina Sol. No Shinto, Amaterasu é reconhecida como a primeira no panteão das divindades, mas não é a única. É apenas uma entre muitos. O Xintoísmo primitivo via o Japão como a terra dos deuses, o que explica o caráter nacionalista da religião. Acreditam que todos os japoneses têm origem divina, mas em especial o imperador, que é descendente da própria deusa do sol. A partir de 500 d.C., o Xintoísmo enfrentou dura competição com o Budismo, e as duas religiões acabaram por influenciar uma à outra. Não é raro, no Japão, o uso alternando de várias religiões. É tanto que o país é chamado por muitos de laboratório religioso. Diferente de outras religiões, como o Cristianismo e o Islamismo, o Xintoísmo não tem um fundador. É tipicamente uma religião nacional. Não conta com nenhum credo ou código de ética expressamente formulado. A sua essência está na cerimônia e no ritual, que mantêm o contato com o divino. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

41

Cultura Religiosa

O Shinto, “o caminho dos deuses”, pode ser descrito como um modo ideal de comportamento. O seu sistema ético inclui os seguintes preceitos: lealdade ao imperador; gratidão; coragem diante da morte; o serviço aos outros está acima dos interesses próprios; verdade; polidez até mesmo com os inimigos; controle das manifestações de sentimentos e honra, que significa o ato de preferir a morte do que a desgraça. Os acontecimentos da Segunda Guerra Mundial nos mostram um pouco desses conceitos quando os pilotos japoneses foram capazes de jogar seus próprios aviões para atingir o alvo e acabar com o inimigo.

Principais idéias O mito da origem japonesa parece ser uma resposta animista primitiva à natureza. A multiplicidade de deuses japoneses pode ser atribuída a condições civis primitivas, quando a nação era habitada por um grande número de clãs independentes, cada um com seus próprios deuses e práticas religiosas. As idéias confucionistas introduziram o culto aos ancestrais, segundo o qual, quando as pessoas morrem, adquirem poderes sobrenaturais. Acredita-se que os mortos são instrumentos de ajuda e proteção aos vivos, razão que leva os vivos a honrálos e reverenciá-los, tanto nos rituais fúnebres como nos santuários domésticos. As cerimônias religiosas ajudam a evitar acidentes, promovem a cooperação e o contato com os Kamis, e geram o contentamento e a paz para o indivíduo e a sociedade. As cerimônias são feitas tanto no próprio lar, como nas grandes festas anuais do templo – Morada dos Kamis. Quatro elementos estão sempre presentes nestas cerimônias: purificação; sacrifício; oração; e refeição sagrada.

Taoísmo É interessante observar que toda a filosofia chinesa está voltada para o social. Os problemas éticos, sociais e políticos estão no centro das discussões da maioria das religiões orientais. É basicamente a preocupação constante com o bem estar das pessoas. É a opção pelo ser e não pelo ter. Se as idéias de Confúcio 42

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões II

são estimulantes para governantes sérios, o Taoísmo apresenta uma visão transcendente das preocupações com a vida. Apresenta uma visão diferente da vida. É uma cultura oposta ao que estamos acostumados a viver no ocidente. Aqui apresentaremos um resumo do Taoísmo. Serão recomendadas leituras complementares para quem tiver interesse maior em conhecer melhor as idéias de Lao-tsé – o grande e velho mestre.

O Velho Mestre

Lao-tsé se traduz como “o velho”, “o velho amigo”, ou “o grande e velho mestre”. Era contemporâneo de Confúcio. Um historiador chinês relata que Confúcio ficou intrigado com o que ouvira a respeito de Lao-tsé e, certa vez, o visitou. Sua descrição sugere que aquele estranho homem o desconcertou, enchendo-o, porém, de respeito.

Wikipédia.

A origem do Taoísmo é apresentada com o nome de um homem chamado Lao-tsé. Supostamente nascido por volta de 604 a.C., as histórias sobre a vida deste homem são muito variadas. Alguns historiadores não têm nem certeza se ele realmente existiu. Algumas lendas são fantásticas, como aquela que diz “ter sido ele concebido por uma estrela cadente, permaneceu no ventre materno por 82 anos e já nasceu velho, sábio e com os cabelos brancos.” (SMITH, 1991, p. 193).

Eu sei que um pássaro pode voar; sei que um peixe pode nadar, sei que os animais podem correr. Criaturas que correm podem ser apanhadas em redes; as que nadam, em armadilhas de vime; as que voam, atingidas por flechas. Mas o dragão está além do meu conhecimento; ele sobe ao céu nas nuvens e no vento. Hoje vi Lao-tsé, e ele é como o dragão. (Confúcio).

O Tao Te King

Lao-tsé.

Uma boa idéia do início do Taoísmo, como conta a tradição, é o que lemos no texto de Huston Smith, que assim coloca: A história tradicional conta que Lao-tsé, entristecido com o seu povo pela relutância em cultivar a bondade natural que ele pregava e buscando maior solidão para os seus últimos anos de vida, montou nas costas de um búfalo e galopou para o oeste, na direção do atual Tibete. No passo de Hankao, uma sentinela, percebendo o caráter incomum daquele viajante, tentou convencê-lo a retornar. Não obtendo êxito, pediu ao velho que, ao menos, deixasse um registro de suas crenças para a civilização que estava abandonada. Lao-tsé, concordando com o pedido, recolheu-se durante três dias e retornou com um magro volume de 5.000 caracteres intitulado Tao Te King, ou O Caminho e o seu Poder. O livro pode ser lido em meia hora ou durante toda a vida, e continua a ser, até os dias de hoje, o texto básico do pensamento Taoísta. Um livrinho de apenas 25 páginas e 81 capítulos. (SMITH, 1991, p. 194).

É interessante fazer um paralelo entre Lao-tsé e Confúcio. O Velho Mestre não pregava, não organizava, nem promovia. Escreveu algumas páginas a pedido, foi embora e não ficou para dar respostas. Confúcio teve que infernizar príncipes e barões tentando um cargo administrativo para pôr em prática as suas idéias. Alguns acreditam que o Tao Te King foi escrito por mais de uma pessoa e afirmam que o livro só alcançou a forma hoje conhecida na segunda metade do século III a.C. Não importa. O Taoísmo hoje está tão presente na cultura que é mais importante a essência das palavras deixadas no Tao Te King. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

43

Cultura Religiosa

O Tao e seus três significados No Taoísmo tudo gira em torno do Tao, que literalmente significa caminho. Este caminho pode ser entendido de três maneiras: o Tao é o caminho da realidade última. É demasiado vasto para que a realidade humana possa sondá-lo. De todas as coisas, o Tao certamente é o maior; o Tao é o caminho do universo, a norma, o ritmo, o poder propulsor de toda a natureza, o princípio ordenador por trás de toda a vida; o Tao se refere ao caminho da vida humana, quando ela se harmoniza com o Tao do universo. O Tao Te King tem sido traduzido como O Caminho e seu Poder. O objetivo do Taoísmo Filosófico é alinhar a vida cotidiana da pessoa ao Tao. O caminho básico para fazê-lo é aperfeiçoar uma vida de wu wei. Wu wei significa pura eficácia e quietude criativa. O conceito mais tradicional significa nãoação ou inação, mas devemos cuidar para não entender como atitude vazia, ócio. O Taoísmo, na concepção de muitos, implica passividade e não atividade. Para um sábio taoísta, a ação mais importante é a “não-ação”. Enquanto Confúcio desejava educar o homem por meio do conhecimento, Lao-tsé preferia que as pessoas permanecessem ingênuas e simples, como crianças. Enquanto Confúcio ansiava por regras e sistemas fixos na política, Lao-tsé acreditava que o homem deveria interferir o mínimo possível no desdobramento natural dos fatos. Confúcio queria uma administração bem ordenada, mas Lao-tsé acreditava que qualquer administração é má. “Quanto mais leis e mandamentos existirem, mais bandidos e ladrões haverá”, diz o Tao Te King. O Estado ideal de Lao-tsé era a pequena comunidade (a aldeia ou a cidade pequena) que, segundo ele, já existia nos tempos antigos. Ali as pessoas viviam em paz e contentes, sem interesse em guerrear contra seus vizinhos, como fizeram mais tarde as províncias chinesas. O líder devia ser um filósofo, e sua única tarefa era que sua passividade e seu distanciamento servissem de exemplo para os outros. Praticar a caridade não tem sentido para um Taoísta. Mas ele tem uma boa vontade sem limites para com os outros, sejam eles bons ou maus.

Alguns trechos do Tao Te King Para pensar um pouco, veja algumas das idéias de Lao-tsé ao escrever o Tao Te King.

44

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões II

A pessoa precisa deixar o Tao fluir para dentro e para fora de si mesma, até toda a sua vida se tornar uma dança na qual não há febres nem desequilíbrios. Wu wei é a vida vivida acima da tensão: Encha a tigela até a borda E ela vai derramar Fique sempre afiando a faca E ela vai cegar Wu wei é a materialização da maleabilidade, da simplicidade, da liberdade – uma espécie de pura eficácia na qual não se desperdiçam movimentos em discussões ou exibições externas. A pessoa pode caminhar tão bem que nunca deixa pegadas Falar tão bem que a língua nunca comete deslizes, Calcular tão bem que não precisa de ábaco. (cap. 27) Uma eficácia dessa ordem obviamente exige uma capacidade extraordinária, o que é transmitido pela lenda taoísta do pescador: com um simples fio, ele conseguia puxar para a terra peixes enormes, porque o fio havia sido fabricado com tanta perfeição que não tinha um “ponto fraco”. A capacidade taoísta raramente é notada porque, vista de fora, wu wei – nunca forçando, nunca sob tensão – parece não exigir praticamente nenhum esforço. O segredo está na maneira pela qual ele busca os espaços vazios na vida e na natureza, e se move por meio deles. A água era o paralelo mais próximo ao Tao do mundo natural. Era também o protótipo do wu wei. Os chineses observavam a maneira pela qual a água se adapta ao ambiente e procura os lugares mais baixos. Por isso: O bem supremo é como a água, Que alimenta todas as coisas sem esforço. Ela se contenta com os lugares baixos, que as pessoas desdenham. Por isso, ela é como o Tao. (cap. 8) Mas a água, apesar de se acomodar, tem um poder que não é conhecido pelas coisas duras e quebradiças. A água abre caminho além das fronteiras e por baixo dos muros divisórios. Seu fluxo suave acaba dissolvendo as rochas e levando embora as orgulhosas montanhas que pensamos eternas. Nada no mundo É tão suave e maleável como a água No entanto, para dissolver o duro e inflexível Nada a suplanta. O suave supera o duro; O gentil supera o rígido.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

45

Cultura Religiosa

Todos sabem que isso é verdade, Mas poucos o põem em prática. A pessoa que incorpora estas virtudes, diz o Tao Te King, “trabalha sem trabalhar”. Ela age sem tensão, persuade sem argumentação, é eloqüente sem floreios e alcança resultados sem violência, coerção ou pressão. Enquanto o agente mal seja percebido, sua influência é de fato decisiva. Quando o bom líder governa, O povo mal percebe que ele existe. O bom líder não fala, age. Quando ele termina o trabalho, O povo diz: “fomos nós que fizemos sozinhos”. (cap. 17) Uma última característica da água, que torna apropriada sua analogia com o wu wei, é a clareza que ela alcança ficando parada. “Água lodosa deixada parada”, diz o Tao Te King, “ficará limpida.”

Mais valores taoístas O taoísta rejeita todas as formas de auto-afirmação e competição. O mundo está cheio de pessoas determinadas a ser alguém ou causar problemas; pessoas que querem avançar, se destacar. O Taoísmo não vê utilidade nessa ambição. “O machado abate primeiro a árvore mais alta”. Aquele que se põem na ponta dos pés Não tem firmeza. Aquele que se apressa Não vai longe. Aquele que tenta brilhar Tolda sua própria luz. (cap. 24) As pessoas deveriam evitar a estridência e a agressividade não só em relação aos outros, mas também em relação à natureza. No taoísmo existe um naturalismo profundo e um respeito muito grande pela natureza. Tanto que quando falamos na escalada do Everest, por exemplo, nós ocidentais dizemos que o Everest foi conquistado. Os orientais diriam que este ato foi o de fazer amizade com o Everest. Aqueles que querem dominar o mundo E moldá-lo à sua vontade Nunca, percebo, terão sucesso. O mundo é como um vaso, tão sagrado Que, à mera aproximação do profano, Se danifica, E quando estendem a mão para pegá-lo, ele se perdeu. (cap. 29)

46

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões II

Yin/yang

Outra característica do Taoísmo é a sua noção da relatividade de todos os valores e, como idéia correlata, a identidade dos opostos. Nesse aspecto, o taoísmo está ligado ao tradicional símbolo chinês do yin/yang: Essa polaridade resume todas as oposições básicas da vida: bem/mal, ativo/passivo, positivo/negativo, claro/escuro, verão/inverno, masculino/feminino. Mas as metades, embora estejam em tensão, não são francamente opostas; elas se contemplam e se equilibram uma à outra. Cada uma invade o hemisfério da outra e faz sua morada no recesso mais profundo do domínio de sua parceira. E, no fim, ambas se resolvem no círculo que os cerca, o Tao em sua totalidade. A vida não se dobra sobre si mesma, e chega, completando o círculo, à percepção de que tudo é um e tudo está bem. (SMITH, 1991, p. 210).

O Taoísmo segue seu princípio da relatividade até seu limite lógico, colocando a vida e a morte como ciclos complementares no ritmo do Tao. Há o globo, O alicerce de minha existência física Ele me gasta com trabalho e deveres, Dá-me repouso na velhice, E me dá paz na morte. Pois quem me deu o que necessitei na vida Também me dará o que necessito na morte. (Chuang Tzu) Assim nós terminamos esta caminhada por estas religiões sapienciais. Naturalmente, cada uma tem um vasto material para ser lido e analisado. A nossa idéia é dar apenas um panorama para que você compreenda que existem pensamentos muito diferentes daquilo que estamos acostumados a ver no Brasil. Aliás, no nosso país quase não encontramos movimentos ligados a estas três religiões.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

47

Cultura Religiosa

Conclusão Foram abordadas três religiões que nos apresentam valores interessantes. É difícil aplicarmos estes valores no nosso dia-a-dia porque se diferenciam do nosso modo de vida. Na confusão em que vivemos, é difícil fazer comparações com a tranqüilidade dos orientais.

48

1.

Após a leitura dos textos, procure identificar o que difere as religiões abordadas do nosso pensamento ocidental.

2.

Você considera possível aplicar os valores aqui encontrados na nossa vida? De que forma?

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões II

3.

Como você interpreta a palavra equilíbrio?

Nossa indicação de estudos é a leitura dos capítulos que falam sobre estas três religiões no livro: PIAZZA, Valdomiro. Religiões da humanidade. São Paulo: Loyola, 1991.



Das filosofias de vida destacadas no texto, o que melhor se encaixa com você. Faça uma relação de pontos que o agradaram.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

49

Cultura Religiosa

50

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões III

V

Wikipédia.

amos trabalhar duas grandes religiões do mundo. São religiões importantes no contexto internacional. Ao mesmo tempo, são duas religiões que dividem o mesmo espaço e têm como cidade santa Jerusalém. Não é e nunca foi fácil manter a paz nesta cidade, já que ela é povoada também por religiosos fundamentalistas, o que torna a tolerância um exercício de difícil execução.

Jerusalém.

Judaísmo Hoje é fundamental você saber um pouco mais sobre o Judaísmo. Os judeus estão espalhados pelo mundo. São importantes na história da humanidade e colaboraram muito para o desenvolvimento de todos os lugares em que passaram. Foram perseguidos em muitas situações, mas na dispersão sempre levaram a sua fé na certeza da existência de um Deus forte, que os acompanha, assim como acompanhou o povo com Moisés na fuga do Egito em direção à Terra Prometida. É uma religião intimamente ligada à história. Aqui, religião e nacionalismo se misturam, assim como acontece também no Islamismo. Queremos levar você a alguns estudos. O principal dele é entender hoje os conflitos entre judeus e palestinos, matéria apresentada diariamente pelos meios de comunicação de todo o mundo. Embarque agora nessa leitura.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Wikipédia.

Cultura Religiosa

Muro das Lamentações.

História A história do povo judaico começa por volta de 1700 a.C., com Abraão, que parte de Ur da Caldéia, na Babilônia, para Canaã, e depois para o Egito. Abraão gerou Isaac este gerou Jacó, que teve 12 filhos homens que deram origem às 12 tribos que constituíram a descendência de Abraão. Jacó se estabeleceu no Egito, onde seu filho José era o primeiro-ministro do Faraó. Após a morte de José, o povo descendente de Jacó e seus filhos foram oprimidos e escravizados. A libertação se dá através de Moisés, líder escolhido por Deus para livrar o seu povo. Foram 40 anos de caminhada pelo deserto até a chegada ao Monte Sinai, neste local recebem os Dez Mandamentos (Decálogo) e as leis cerimoniais e civis a serem observadas (Torá). Recomendamos aqui uma leitura interessante. Na Bíblia você encontra a história completa no Êxodo1. É um panorama bem interessante sobre o povo judeu. De 1200 a 1000 a.C., ocorre, em Canaã, o estabelecimento das tribos nômades hebraicas, numa espécie de ocupação da terra prometida. Entre 1000 a 587 a.C., ocorre a fase da monarquia, destacando-se os reis Davi, Salomão e o profeta Samuel. A época é difícil, pois o povo, encantado com as constantes vitórias e conquistas contra os povos vizinhos, esquece com facilidade o Deus que os protegera e criara até então. É então que surgem os profetas, com a finalidade de recordar o povo da aliança feita com Deus. Os profetas denunciam os desvios dos reis e do povo, anunciando juízos divinos, numa tentativa de fazê-los retornar à fé. Neste período também é estabelecida a existência de dois reinos entre os descendentes de Jacó: o reino do Norte ou Israel, com capital em Samaria, e o reino do Sul, com capital em Jerusalém. O reino do Norte, já em 722 a.C., deixa de existir ao cair sob o poder dos assírios. (KUCHENBECKER, 2000).

1

Segundo livro da Bíblia, no Antigo Testamento.

52

Seguindo o curso da história, vamos para 539 a.C., quando ocorreu o chamado cativeiro babilônico. Depois, de 587 a 539 a.C., o reino do Sul caiu em poder Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões III

dos babilônicos e sua população foi simplesmente deportada para a Babilônia, de onde só foram libertados em 539 a.C., quando o imperador Ciro conquistou a Babilônia. Com sua volta à terra prometida, observa-se que a grande maioria era pertencente à tribo de Judá (um dos filhos de Jacó), sendo, por isso, identificados como judeus. Seu modo de cultuar passa a ser reconhecido como judaísmo. O ano de 63 a.C. determina o começo do período de dominação romana. Na ocasião, os judeus já estavam dispersos por todo o mundo conhecido. A dispersão é interessante porque ajuda na expansão do Judaísmo pelo mundo. Jerusalém continuava sendo o grande centro de adoração e o ponto de referência do Judaísmo, enquanto religião e identificação do povo. Em 70, os romanos destruíram o templo de Jerusalém e, mais uma vez, os judeus remanescentes são dispersos, perdendo não só o seu ponto de referência, mas o completo controle da Terra Santa. Só em 1948 os judeus obtiveram (pela Organização das Nações Unidas – ONU) o reconhecimento mundial e sua terra, com a criação do Estado de Israel. Jerusalém, o grande centro religioso judaico, é também centro de dois outros grandes movimentos religiosos: o Cristianismo e o Islamismo. No decorrer de toda a sua história, o povo judeu desenvolveu a convicção de ser o povo eleito, o povo do Deus que sempre dirigiu os seus escolhidos mesmo nos momentos mais críticos. É especialmente a partir do cativeiro babilônico que se desenvolveu no judaísmo uma forte esperança de um futuro melhor. Será quando Deus mesmo governará o seu povo através do Messias. Muitos judeus, ainda hoje, aguardam a chegada desse momento.

Pontos principais Deus criou e governa todos os seres. Deus é uno. Deus não tem corpo. Deus é eterno. Deus deve ser o único a ser adorado. Todas as palavras dos profetas são verdadeiras. Moisés é o maior dos profetas. Toda a Torá (conjunto de leis) é a que foi dada a Moisés. Esta lei não pode ser alterada. Deus conhece todas as ações e todos os pensamentos dos homens. Deus recompensa os que observam os seus mandamentos e pune os que os transgridem. Deus fará vir o Messias. Deus fará reviver os mortos. (STEFFEN, 2000).

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

53

Cultura Religiosa

Wikipédia.

Quatro tendências

Judeu ortodoxo.

O Judaísmo de hoje está marcado por quatro grandes tendências: o Judaísmo ortodoxo: observa toda a Torá, conforme foi dada a Moisés; o Judaísmo conservador: a Torá deve ser adaptada, conforme os tempos e situações; o Judaísmo reformador: a Torá é apenas fonte de ética, não revelação divina; a era messiânica começou com a criação do Estado de Israel; o Judaísmo liberal: o Reino de Deus na Terra deve se realizar pelo exemplo de vida do povo de Israel. O Judaísmo é de fundamental importância para o Cristianismo, pois este entenderá que o Messias prometido aos judeus é Jesus Cristo, que, na realidade, vem estabelecer um reinado divino não terreno, mas espiritual. (STEFFEN, 2000, p. 67).

Costumes Os judeus têm costumes muito antigos relativos ao ciclo da vida. São os seguintes: Circuncisão – é feita oito dias após o nascimento. Somente os meninos são circuncidados, de acordo com a Torá: “Deveis circuncidar a pele do prepúcio, e este será o sinal da aliança entre nós”. A cerimônia é acompanhada pelos padrinhos. Junto são feitas orações numa cerimônia de alegria e celebração. Bar-Mizvá – aos treze anos, o menino judeu passa a ser um Bar-Mitzvá. A expressão significa “filho do mandamento”. A cerimônia acontece na sinagoga (templo judaico) no primeiro sábado após o seu 13.º aniversário. Antes, ele recebe aulas com um rabino para aprender as leis e os costumes judaicos. Também aprende um trecho da Torá, que será lido no sábado. A partir daí, o menino passa a ser membro da congregação, com todas as responsabilidades. 54

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Istock Photo.

As grandes religiões III

Bar-Mitzvá.

A menina se torna automaticamente uma Bat-Mitzvá quando completa 12 anos. Por volta dos 15 anos, as meninas aprendem história e costumes judaicos, principalmente as regras alimentares, que são responsabilidade da mulher. Casamento – a família, como não poderia deixar de ser, desempenha um papel especial no Judaísmo. O casamento é considerado o modo de vida ideal, instituído por Deus. É o único tipo de coabitação que existe. É tradição que um judeu case com uma judia, apesar de que hoje é comum vermos casamentos mistos. A cerimônia do casamento chama muito a atenção, especialmente pelo seu ritual. O contrato de casamento é chamado de Ketubá. Ele é lido durante o ritual. Nele estão registrados todos os deveres do noivo para com a noiva. O casamento começa com a leitura de sete bênçãos especiais depois disso o casal toma vinho. O noivo então quebra uma taça com o pé, em memória da destruição do templo. Após o casamento, os noivos são levados a um quarto particular, onde podem quebrar o jejum e ficar a sós. O divórcio é permitido se sancionado por um tribunal rabínico e selado pelo marido, que dá à esposa a carta de divórcio. Enterro – o enterro deve ocorrer o mais rápido possível depois da morte em consideração às condições do corpo. São contrários à cremação. Não usam flores nem música na cerimônia. Note que os cemitérios judaicos não são ornamentados. Mesmo assim, são bem cuidados, pois lá os corpos descansarão até a ressurreição.

Festas judaicas As festas judaicas estão ligadas ao calendário judaico e são fundamentadas em acontecimentos históricos. O calendário se apóia no ano lunar e tem 12 meses de 29 ou 30 dias, com 354 dias ao todo. Acrescenta-se um mês extra sete vezes durante cada ciclo de dezenove anos, para alinhar o ano lunar pelo ano solar.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

55

Cultura Religiosa

Desta forma, as datas festivas mudam a cada ano. O tempo é contado em relação à criação do mundo, a qual, segundo o nosso calendário, ocorreu em 3761 a.C. O Ano-novo (Rosh Hashaná, em hebraico): é celebrado em setembro ou outubro, diferente do ano-novo cristão, os judeus comemoram a passagem do ano judaico. É o momento de refletir sobre a vida, sobre as ações e uma oportunidade para melhorar o que não saiu muito bem. Nesta passagem de ano é feita uma grande refeição preparada em casa, com diversos pratos simbólicos. Não faltam as orações de arrependimento. A festa de ano-novo também comemora Deus como Criador e Rei. O Dia do Perdão, Iom Kipur (Dia da Expiação): termina o período de dez dias de arrependimento iniciado no ano-novo. O Dia da Expiação era o único dia do ano em que o sumo sacerdote entrava no Santo dos Santos, o recinto mais sagrado do templo. Isso se dava após o sacrifício de um carneiro, como sinal de expiação pelos pecados do povo. Hoje, o sacrifício já não é mais feito. Os pecados são confessados na sinagoga e o indivíduo pede perdão a Deus depois de ter se reconciliado com seus semelhantes. A Festa dos Tabernáculos, Sukot (festa das tendas): acontece poucos dias depois do Dia do Perdão. A festa acontece em memória das tendas nos quais os judeus moraram durante a peregrinação no deserto e do cuidado que Deus dedicou a eles. Para comemorar a data, os judeus constróem cabanas de folhas no jardim da casa ou próximo à sinagoga. No último dia se conclui o ciclo anual da leitura da Torá, e um novo ciclo se inicia, recomeçando a leitura a partir do Gênesis. A Festa da Inauguração (Chanuká): é comemorada em novembro ou dezembro, durante um período de oito dias. A festa acontece em comemoração a uma grande vitória dos judeus ocorrida em 165 a.C., quando inauguraram novamente o Templo de Jerusalém, depois que os invasores sírios os haviam profanado e proibido o culto judaico. A Páscoa: em hebraico é chamada Pessach, que significa “passar por cima”. É uma referência ao relato da Torá sobre o anjo do Senhor que, ao levar a décima praga ao Egito, “passou por cima” das casas dos israelitas e, desse modo, só os primogênitos egípcios morreram. Esta festa é comemorada em março ou abril e comemora o êxodo os judeus da escravidão do Egito. Como ritual, antes da festa, os judeus devem fazer uma limpeza na casa, usam um serviço especial de pratos para a comida e não podem comer nem beber nada que contenha grãos ou farinha fermentada. Os pratos feitos para a refeição da Páscoa têm um significado simbólico. São mergulhados ramos de salsa numa tigela com água salgada, simbolizando as lágrimas dos judeus no Egito. As ervas amargas lembram a infelicidade da escravidão sob o domínio do faraó. Festa das Semanas (Slavuot): a Festa de Pentecostes. Comemorada em maio ou junho. É a lembrança do momento em que a Torá foi dada ao povo no Monte Sinai. 56

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões III

Veja como a cultura judaica tem fatos interessantes. Anualmente vemos em jornais e revistas matérias sobre os costumes judaicos. Bom é entender o porquê deste ritual. Vale a pena lembrar que os judeus levam muito a sério estas comemorações. Toda a família participa, é um fator de integração. Como os judeus hoje estão espalhados pelo mundo, é claro que encontramos estes mesmos costumes entre nós, aqui no Brasil.

Istock Photo.

Islamismo

Mesquita.

Você vai ler e gostar desta história. É impressionante a tradição e a cultura islâmicas. Depois dos atentados de 11 de setembro, milhões de pessoas no mundo desejam ler mais sobre o Islamismo. Querem entender do fundamentalismo religioso, da coragem de homens prontos a morrer pelo seu Deus. Mas cuidado! Somente 15% dos muçulmanos são radicais. Afinal, o Islã continua sendo a religião da paz.

Primeiras considerações A fé islâmica é a que está mais próxima do Ocidente, tanto em termos geográficos como ideológicos. Isto porque em termos religiosos pertence à família das religiões abraâmicas e, em termos filosóficos, baseia-se nos gregos. Mesmo assim é a religião mais difícil de ser compreendida pelos ocidentais. Em certas épocas e lugares, cristãos, muçulmanos e judeus conviveram harmoniosamente – basta pensar na Espanha Moura. Mas durante boa parte dos últimos 14 séculos, o Islã e a Europa estiveram em guerra e as pessoas raramente formam uma imagem justa de seus inimigos. O termo maometismo não é aceito pelos muçulmanos. Além de inexato é ofensivo. Isso porque para eles Maomé não criou essa religião; Deus a criou. Maomé foi apenas o portavoz de Deus. Além disso, é ofensivo porque transmite a impressão de que o Islã se concentra num homem e não em Deus. Derivado da raiz s-l-m, que basicamente significa “paz”. Num sentido secundário, “entrega”, sua plena conotação é “a paz que vem quando a pessoa entrega sua vida nas mãos de Deus”. (SMITH, 1991, p. 261).

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

57

Cultura Religiosa

Pano de fundo Se perguntarmos como surgiu o Islamismo, eles vão responder que não foi com Maomé na Arábia do século VI, mas com Deus. “No princípio Deus...”, diz o livro de Gênesis. O Alcorão concorda. A única diferença está no uso da palavra Alá. Alá é formado pela união do artigo definido al (que significa o) com Alah (Deus). Literalmente, Alá significa “o Deus”. Não um Deus, porque existe apenas um. Deus criou o mundo e, depois, os seres humanos. O nome do primeiro homem era Adão. A descendência de Adão chegou a Noé, que teve um filho chamado Sem. É daqui que provém a palavra “semita”; literalmente, semita é do descendente de Sem. Abraão desposou Sara. Como Sara não teve filhos, Abraão, querendo continuar sua linhagem, tomou Agar como segunda esposa. Agar deulhe um filho, Ismael. Depois, Sara concebeu e teve um filho, chamado Isaac. Sara então exigiu que Abraão banisse Ismael e Agar da tribo. Chegamos aqui à primeira divergência entre os corânicos e bíblicos. Segundo o Alcorão, Ismael foi para o local onde se ergueria Meca. Seus descendentes, florescendo na Arábia, tornaram-se muçulmanos; enquanto os descendentes de Isaac, que permaneceram na Palestina, eram hebreus e se tornaram judeus.

O selo dos profetas Na segunda metade do século VI d.C, aparece Maomé, o profeta por meio de quem o Islamismo alcançou sua forma definitiva. Houve autênticos profetas de Deus antes dele, mas ele foi o apogeu; por isso é chamado de “Selo dos Profetas”. Nenhum profeta genuíno surgirá depois dele. O mundo em que nasceu Maomé é descrito por gerações de muçulmanos com uma única palavra: ignorância. As condições no deserto não eram boas, a escassez de bens materiais fazia do banditismo uma instituição regional. No século XV, a estagnação política e o colapso da justiça na influente cidade de Meca agravaram uma situação já caótica. Embriaguez e orgias eram comuns, o impulso do jogo corria descontrolado. A religião predominante observava a tudo, inativa. Religião esta que era uma espécie de politeísmo animista, que povoava as amplidões arenosas com espíritos brutais, denominados jinn (demônios). Esses demônios não inspiravam nem sentimentos elevados nem restrições morais. A época pedia um libertador. Este libertador surge na pessoa do profeta Maomé.

Maomé Nasceu na influente tribo de Meka, os Koreisch, aproximadamente em 570 d.C. e recebeu o nome de Maomé, “altamente louvado”. A vida foi marcada por tragédias. Perdeu o pai poucos dias antes de nascer; perdeu a mãe quando tinha oito anos. Foi adotado por um tio que, em declínio, forçou o jovem a trabalhar duro cuidando dos rebanhos da casa. Mesmo assim foi recebido calorosamente pela nova família. 58

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões III

A descrição de Maomé, segundo a tradição, é a de um jovem puro de coração e amado pelos seus. Diz-se dele que tinha um temperamento meigo e gentil. Mais tarde era reconhecido como “o verdadeiro”, “o reto”, “o fidedigno”. Ele permanecia afastado dos outros, de uma sociedade corrupta e degenerada. Aos 21 anos começou a trabalhar para uma viúva chamada “Khadija”. Ela ficou impressionada com a sua prudência e aos poucos a relação se aprofundou, tornando-se afeição e depois amor. Embora 15 anos mais velha do que ele, acabaram casando e tornaram-se felizes em todos os sentidos. Depois disso, seguiramse mais 15 anos de preparação. Na caverna do monte chamado Hira, Maomé, precisando de solidão, começou a freqüentá-la. Sondando os mistérios do bem e do mal, incapaz de aceitar o barbarismo, a superstição e o fratricídio que eram vistos como coisas normais, estendia suas mãos a Deus. Por volta de 610, o profeta recebe a sua missão: na mesma caverna, depois de muitas visitas e horas de meditação, uma voz desce do céu e diz: “Tu és o escolhido”. Naquela noite, dizem os muçulmanos, o livro foi aberto para uma alma já preparada. Nessa primeira noite de poder, estava Maomé sentado no chão da caverna, com a mente absorta na mais profunda contemplação, quando chegou até ele um anjo em forma de homem. O anjo lhe disse: “Proclama!” e ele respondeu: “Não sou um proclamador.” Então, como o próprio Maomé relataria, o anjo me tomou nos braços e apertou-me até alcançar o limite da minha resistência. Ele então me libertou e novamente disse: “Proclama!”. Mais uma vez disse eu: “Não sou um proclamador”. E ele novamente me apertou em seu abraço. Quando mais uma vez alcançou o limite da minha resistência, ele disse: “Proclama!”. E quando novamente eu protestei, ele me apertou em seus braços pela terceira vez, dizendo agora: Proclama em nome do teu Senhor que criou! Criou o homem de um sangue coagulado. Proclama: Teu Senhor é o mais generoso, Que ensina com a pena; Ensina ao homem o que este não sabia. Alcorão 96: 1-3. (SMITH, 1991).

Despertando do transe, Maomé sentiu que as palavras que ouvira tinham sido marcadas com ferro em brasa na sua alma. Contou para a esposa que de início resistiu. Mas ouvindo toda a sua história, tornou-se o primeiro caso de conversão. Os muçulmanos relatam freqüentemente este fato afirmando que “se há quem entenda o verdadeiro caráter de um homem, esse alguém é sua mulher”. “Rejubila-te, caro esposo meu, e enche teu coração de alegria”, disse ela. “Serás o profeta deste povo”.

A missão Numa época carregada de sobrenaturalismo, em que os milagres eram aceitos como as ferramentas características do santo mais comum, Maomé se recusou Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

59

Cultura Religiosa

a fomentar a credulidade humana. Para os idólatras famintos de milagres que buscavam sinais e portentos, ele esclareceu a questão: “Deus não me enviou para fazer milagres. Ele me enviou para pregar a vós. Sou apenas um pregador das palavras de Deus, o portador da mensagem de Deus para a humanidade. Somente os tolos pedem sinais aos céus, pois a criação, em si, já é a maior prova! Maomé reivindicou apenas um único milagre: o próprio Alcorão. Produzir essa obra da verdade, unicamente com seus próprios recursos, era a única hipótese naturalista que ele não aceitava. (SMITH, 1991, p. 221).

Oposição à sua missão As reações foram violentamente hostis. Seu monoteísmo irredutível ameaçava as crenças politeístas e a renda considerável que entrava nos cofres de Meca com as peregrinações a seus 360 santuários. Seus ensinamentos morais exigiam o fim da licenciosidade a que se agarravam os cidadãos. Seu conteúdo social desafiava uma ordem injusta. Numa sociedade dividida por distinções de classe, o novo profeta pregava uma mensagem intensamente democrática. Maomé insistia que, aos olhos de seu Senhor, todas as pessoas eram iguais. Dessa forma resolveram não apoiá-lo. Ridicularizaram, deram gargalhadas zombeteiras, insultos, vaias e escárnios. Depois jogaram lixo sobre eles, difamaram, atiraram-lhes pedras, bateram neles com bastões, jogaram-nos na prisão e tentaram matá-los de fome recusando-se a vender-lhes comida. Tudo em vão. A perseguição apenas fortaleceu a vontade dos seguidores de Maomé. No início, a balança pesava tão fortemente contra ele que poucas foram as conversões; três anos de esforços sofridos produziram menos de 40. Mas depois, passada uma década, várias centenas de famílias o aclamavam como autêntico porta-voz de Deus.

A fuga que levou à vitória Maomé recebe a visita de uma delegação composta pelos principais cidadãos de Yathrib, cidade situada a 450 quilômetros ao norte de Meca. A cidade enfrentava rivalidades internas que exigiam um líder forte e imparcial, um homem de fora, e Maomé parecia ser este homem. Maomé recebeu um sinal de Deus para aceitar o encargo. Em Meca, sabendo disso, tentaram matar Maomé, mas ele fugiu de Meca por uma fenda ao sul da cidade. Quase descobriram Maomé. Abu Bakr, desesperado disse: “Somos apenas dois”. “Não, somos três”, respondeu Maomé, “Porque Deus está conosco”. Corria o ano de 622. A fuga de Maomé de Meca, conhecida em árabe como Hijra (Hégira, “a migração”), é vista pelos muçulmanos como o ponto de mutação da história mundial: 622 d.C. é o ano a partir do qual é datado o seu calendário. 60

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões III

Yatrib logo passaria a ser conhecida como Medinat al-Nabi, a cidade do profeta e, por contração, simplesmente Medina, “a cidade”. Em Medina assumiu o papel de administrador. O pregador desprezado tornou-se um político magistral; o profeta foi transformado em estadista. O povo via nele um mestre a quem era tão difícil não amar quanto não obedecer. Ele possuía “o dom de influenciar os homens, e também a nobreza de só influenciá-los para o caminho do bem”. Ele conseguiu despertar nos cidadãos um espírito de cooperação, desconhecido na história da cidade. Sua reputação se espalhou e as pessoas começaram a vir de todas as partes da Arábia para ver o homem que tinha realizado aquele milagre.

Wikipédia.

A caminho da famosa Caaba (o templo cúbico que se diz ter sido construído por Abraão e que Maomé reconsagrou a Alá e adotou como foco central do Islamismo) ele aceitou a conversão em massa de praticamente toda a cidade de Meca. E então voltou para Medina.

Caaba.

Dez anos depois, em 632 (ou 10 d.H., “depois da Hégira”), Maomé morreu tendo praticamente toda a Arábia sob o seu controle. A combinação incomparável de influência secular e religiosa intitula Maomé a ser considerada a pessoa mais influente da história humana. A explicação dos muçulmanos para esse veredicto é simples: toda a obra de Maomé, dizem eles, foi obra de Deus.

O milagre permanente Maomé não foi apenas pastor, mercador, eremita, exilado, soldado, legislador, profeta-sacerdote-rei e místico; foi também um órfão, o marido durante muitos anos de uma mulher bem mais velha do que ele, o pai que sofreu a morte de muitos dos seus filhos, um viúvo e finalmente um marido com várias esposas, algumas bem mais jovens do que ele. Em todos estes papéis, ele foi exemplar. Dizem os muçulmanos em gratidão: “que a paz esteja sobre ele”. Mas o centro terreno da fé dos muçulmanos é o Alcorão. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

61

Cultura Religiosa

Istock Photo.

O Alcorão

Alcorão.

É interessante falar sobre o livro sagrado do Islamismo. O Alcorão é o livro mais recitado no mundo, segundo alguns pesquisadores. A revelação de todo o livro a Maomé nos chama a atenção: Literalmente, a palavra árabe al-qur’na (de onde provém “corão”) significa leitura, recitação. Talvez seja o livro mais recitado e lido no mundo. É, com certeza, o livro mais memorizado e, possivelmente, o que exerce maior influência sobre quem o lê. Para eles, o livro é um milagre permanente. O fato de o próprio Maomé com tão pouca escolaridade a ponto de ser analfabeto e mal conseguir escrever o seu nome ter sido capaz de produzir um livro que oferece os alicerces de todo o conhecimento, sendo ao mesmo tempo, gramaticalmente perfeito e de poesia inigualável – isso, no entender de Maomé e de todos os muçulmanos, é algo que desafia a crença. (SMITH, 1991, p. 225).

Com um tamanho que corresponde a 4/5 de Novo Testamento, o Alcorão se divide em 144 capítulos, ou suras, que (com exceção do primeiro, um capítulo muito curto que figura nas preces diárias dos muçulmanos) se arranjam em ordem descrescente de tamanho. A sura 2 tem 286 versículos, a sura 3 tem 200, e assim por diante, até chegar à sura 114, com apenas seis versículos. As palavras do Alcorão chegaram até Maomé em segmentos de fácil manejo, ao longo de 23 anos por meio de vozes que, de início, pareciam variar e às vezes soavam como a “reverberação dos sinos”, mas que gradualmente se condensavam numa única voz que se identificou como a de Gabriel. As palavras que Maomé exclamava nesses freqüentes estados de “transe” eram memorizadas por seus seguidores e registradas em ossos, cascas de árvores, folhas e pedaços de pergaminho, com Deus preservando sua acuraria do início ao fim. O Alcorão continua o Antigo Testamento e o Novo Testamento, primeiras revelações de Deus, e se apresenta como a sua culminação. “Fizemos uma aliança com os filhos de Israel e em nada vos apoiais enquanto não observardes a Torá e os Evangelhos”. (SMITH, 1991). 62

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões III O ritmo, a cadência melódica e a rima produzem um numeroso efeito hipnótico. Deste modo, o poder da revelação corânica não está apenas no significado literal de suas palavras, mas também na língua em que se incorporou esse significado, incluindo o seu som. É por isso que os muçulmanos sempre preferiram ensinar aos outros povos a língua na qual, segundo a sua crença, Deus falou pela última vez, com força e clareza incomparáveis. (SMITH, 1991).

No Alcorão, Deus fala na primeira pessoa. Alá se descreve e torna conhecidas suas leis. O Alcorão não fala da verdade: ele é a verdade. É um memorando para o fiel, um lembrete para os atos diários e o repositório da verdade revelada. É um manual de definições e garantias e, ao mesmo tempo, um mapa rodoviário para a vontade. Finalmente, é uma colação de máximas para a meditação em particular, aprofundando infinitamente nosso senso da glória divina. “Perfeita é a Palavra de teu Senhor, na justiça e na verdade”. (Sura 6:115).

Conceitos teológicos Com poucas exceções, os conceitos teológicos básicos do Islamismo são praticamente idênticos aos do Judaísmo e do Cristianismo, seus predecessores. Deus é imaterial e, portanto, invisível. Os muçulmanos temem Alá. O bem e o mal têm importância. As escolhas têm conseqüências, e desdenhá-las seria tão desastroso quanto escalar uma montanha de olhos vendados. A crença no Alcorão ocupa lugar tão decisivo por ser análoga à avaliação do monte Everest pelo alpinista: sua majestade é evidente, mas também são evidentes os perigos que apresenta. Qualquer erro seria desastroso. O mundo foi criado por um ato deliberado da vontade de Alá. Ele criou céus e terra. Ele criou o homem, lemos na Sura 16:4, e a primeira coisa que observamos nessa criação é a sua constituição perfeita. A idéia de entrega (rendição, capitulação) está tão carregada de conotações militares que precisamos fazer um esforço consciente para perceber que ela também significa uma absoluta e sincera doação de nós mesmos. Para eles, ser um escravo de Alá significa libertar-se de outras formas de escravidão. Abraão é decididamente a figura mais importante do Alcorão: ele passou no teste último de estar pronto a sacrificar o filho, se isso lhe fosse pedido. Toda vida é individual; não existe uma vida universal. Deus é, Ele próprio, um indivíduo; Ele é o indivíduo mais singular. “Ó Filho de Adão, tu morrerás sozinho, entrarás sozinho em teu túmulo e sozinho serás ressuscitado, e será contigo, contigo sozinho, que se fará o ajuste de contas.” “Quem cometer delitos, comete-os apenas por sua própria responsabilidade. Quem se desvia carrega consigo toda a responsabilidade por seu desnorteamento”. (Sura 4:111 e Sura 10:103). O Alcorão apresenta a vida como uma oportunidade breve, mas imensamente preciosa, que oferece

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

63

Cultura Religiosa

uma escolha “única para sempre”. Dependendo da maneira como se sai em seu julgamento, a alma será encaminhada ao céu ou ao inferno.

Os cinco pilares São como uma ordem aos islâmicos. Seguem esses pilares diariamente por toda a vida. São eles: caminho da retidão – Deus é um só e Maomé o profeta; praticar as orações; praticar a caridade. As pessoas que têm muito devem ajudar a aliviar o fardo dos menos afortunados; observar o mês de Ramadã. O jejum: jejuar obriga a pessoa a pensar; ensina a autodisciplina; faz relembrar nossa fragilidade e dependência; sensibiliza a compaixão; Istock Photo.

a peregrinação.

Peregrino em Meca.

Existem outras coisas que eles não podem fazer: jogar, roubar, mentir, comer carne de porco, ingerir álcool e praticar a promiscuidade sexual.

A economia Enquanto as necessidades básicas do corpo não forem satisfeitas, os interesses mais elevados não conseguem florescer. O Islã não faz objeção ao lucro, à concorrência econômica ou à ousadia empresarial. Vêem o Alcorão como um manual de administração de empresas. A herança deve ser partilhada por todos os herdeiros, filhas tanto quanto filhos. Um versículo do Alcorão proíbe a cobranças de juros. 64

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões III

A posição social das mulheres Depois de Maomé a posição social das mulheres mudou. Antes as mulheres eram vistas como pouco mais que escravas ou bens móveis, de quem pais e maridos dispunham como bem lhes aprouvesse. As filhas não tinham direito de herança e muitas vezes eram enterradas vivas logo ao nascerem.

Istock Photo.

Proibiram o infanticídio. Exigiram que as filhas fossem incluídas na herança – não em pé de igualdade. O Alcorão abre à mulher a possibilidade de plena igualdade ao homem – educação, voto e carreira. O Islamismo santificou o casamento, transformando-o como único lugar legal para a prática do ato sexual. O Alcorão exige que uma mulher dê seu livre consentimento antes de se casar; nem mesmo um sultão poderá se casar sem a aprovação expressa de sua noiva. (SMITH, 1991, p. 237).

Relações raciais O Islã enfatiza a igualdade racial. Abraão é um modelo para eles. Ele desposou Hagar, uma mulher de raça negra que é vista no Islã como a segunda esposa de Abraão e não como uma concubina.

Mulher islâmica.

O uso da força O Alcorão ensina a perdoar e a retribuir o mal com o bem quando as circunstâncias o permitirem. “Afastai-vos o mal com algo melhor”, mas isso é diferente de não resistir ao mal. Quando se estende o princípio de justiça para a vida coletiva, temos, por exemplo, a jihad, o conceito muçulmano de Guerra Santa, cujos mártires têm assegurado o paraíso. “Defendei-vos contra vossos inimigos, mas não o ataqueis primeiro: Deus não ama o agressor”. (Sura 2:190). O Islamismo, embora em certos momentos tenha sido difundido pela espada, difundiu-se principalmente pela persuasão e pelo exemplo. Eles negam que o registro de intolerância e agressão do Islã seja maior que as outras grandes religiões. Jihad significa, literalmente, esforço. (SMITH, 1991, p. 245).

Divisão A principal divisão histórica foi entre os sunitas (tradicionalistas, de Sunnah – tradição), que compreedem 87% de todos os muçulmanos e os xiitas (lite-

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

65

Cultura Religiosa

ralmente partidários de Ali, o genro de Maomé) que deveria ter sido o sucessor direto de Maomé, mas foi preterido três vezes e, quando finalmente indicado líder muçulmano, foi assassinado. Xiitas – Irã, Iraque. Sunitas – Oriente Médio, Turquia e África, Paquistão e Bangladesh, Malásia, Indonésia, onde há mais muçulmanos do que em todo mundo árabe. Há indicativos de que o Islã está despertando de muitos séculos de estagnação, exacerbada sem dúvida pela colonização. Contando com mais de 900 milhões de fiéis numa população global de seis bilhões, hoje em dia uma pessoa em cada cinco ou seis pertence a esta religião.

66

1.

Quais são as similaridades entre o Judaísmo e o Islamismo?

2.

Qual é a relação entre o Islamismo e o Cristianismo?

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

As grandes religiões III

3.

Faça uma relação de valores que mais lhe agradaram neste texto.

Recomendo a leitura dos capítulos 6 e 7 do seguinte livro: SMITH, Huston. As religiões do mundo. São Paulo: Cultrix, 1991.

1.

Lendo o material apresentado, quais os preceitos do Judaísmo você conseguiria seguir sem mudar seu estilo de vida?

2.

Em que sentido todas as leis do Islamismo mudariam o seu estilo de vida?

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

67

Cultura Religiosa

68

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Movimentos religiosos no Brasil

E

ncontramos milhares de religiões no mundo todo. Cada uma das grandes religiões proporcionou material para a formação de novos movimentos religiosos que vêm crescendo a cada ano. Vamos analisar neste texto como esses movimentos se formam e ainda algumas religiões presentes no Brasil.

Nova espiritualidade Com a evolução tecnológica e científica do último século e com explicações não religiosas para o curso dos eventos, pode-se pensar que o homem tenha deixado a religião de lado e buscado novas alternativas para a sua vida. É bom lembrar que estamos num processo de secularização. Com isso, notamos que também os conceitos éticos ensinados pelas religiões não afetam mais as questões sociais. Mas será que as religiões estão mesmo perdendo a força? Talvez isso esteja acontecendo com as religiões tradicionais. Mas a cada ano novas seitas e novos movimentos vêm surgindo, e, como no Brasil há liberdade de culto religioso, nada impede que se invente uma nova religião a cada dia. Por outro lado, os problemas sociais e as necessidades do ser humano fazem com que ele ainda recorra à religião. Hoje, as igrejas cristãs têm de lutar não só contra a discriminação, mas também contra uma série de diferentes tendências religiosas, entre elas algo que pode ser chamado de esoterismo. (GAARDER, 1989, p. 253). É verdade também que as pessoas preferem falar sobre nova “espiritualidade”. É a palavra da moda, fugindo especialmente das igrejas tradicionais. Gaarder (1989, p. 254), falando sobre isso, explica que o conceito de nova espiritualidade é muito abrangente, pois compreende: novas campanhas missionárias de religiões antigas como o Hinduísmo e o Budismo; novas seitas cristãs; novas seitas religiosas não cristãs, que adotam idéias de uma ou de mais de uma das principais religiões do mundo; antigas noções esotéricas; novo “conhecimento”, que com freqüência é uma mistura de ciência moderna com antigos conceitos religiosos.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Cultura Religiosa

Como se caracterizam os movimentos religiosos Cada movimento religioso tem a sua característica. Cada um busca modificar o seu ritual, adaptando-o ao gosto dos seus fiéis e também atendendo às suas necessidades. Mas encontramos em alguns autores características que nos ajudam a analisar estes movimentos. Normalmente, foram fundados por alguém com forte personalidade, que teve uma revelação da divindade e se sente chamado a liderar uma igreja. Pode ser uma “figura messiânica” a quem as pessoas recorrem em épocas de crises espiritual, cultural ou política. Mas também pode ser, como em vários movimentos, inspirados pelo Hinduísmo, um “guru” (mestre religioso) que exige a completa obediência e devoção de seus discípulos. O guru em si não é necessariamente divino, mas representa o divino e, portanto, pode receber oferendas de seus seguidores (GAARDER, 1993, p. 256). Outras características comuns aos novos movimentos religiosos é que eles sempre se dizem universais e aplicáveis para todos. Aparecem como a solução de todos os problemas e oferecem uma vida próspera aos seus fiéis. Ao mesmo tempo, é muito comum que sejam usados os nomes de grandes líderes religiosos para aprofundar ou melhorar a sua propaganda. Assim usam, sem nenhum medo, o nome de Jesus, Moisés, Maomé e Buda e os tomam como precursores. Normalmente, os novos movimentos não repudiam as outras religiões, mas as consideram antiquadas. Normalmente, eles exageram na busca pela experiência interior do indivíduo e ignoram os dogmas e as leis das religiões tradicionais. “A experiência interior, segundo eles, propicia uma liberdade total, que promove a tranqüilidade, a harmonia e a felicidade.” (GAARDER, 1993, p. 256). O problema está no fato de que o indivíduo pode encontrar a si mesmo, muitas vezes sem a necessidade da presença de Deus, contrariando assim a maioria das religiões. Portanto, sempre lembrem-se de que precisamos buscar o equilíbrio nas práticas religiosas e não chegar ao fanatismo religioso.

Religiões africanas O tráfico de escravos O fato negativo é que por mais de três séculos milhares de pessoas morreram nas mãos de homens gananciosos. Os povos da África foram arrancados de suas nações e levados à escravidão nos países da América.

A colonização do Novo Mundo, a partir do século XVI, mudou para sempre a história da África. Vulneráveis, entre outros motivos devido a uma sucessão de lutas tribais, os negros africanos tornaram-se presas fáceis dos exploradores do tráfico de escravos. Conquistadores da França, da Inglaterra, da Holanda e de Portugal disputavam essa mão-de-obra, importante para o aproveitamento das riquezas naturais e para o cultivo de terras na América. 70

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Movimentos religiosos no Brasil

Inicialmente, os negros eram capturados pelos muçulmanos que os trocavam com os portugueses por prisioneiros de conquistas marítimas. Aos poucos, o tráfico de escravos organizou-se e deixou de ser ilegal, contando com o apoio e a proteção de todos os governos. O comércio de negros só terminaria com a Revolução Industrial na Europa, que deu origem a um novo modelo econômico.

A captura de negros Vemos também que os mouros eram os intermediários entre os portugueses e os grandes fornecedores de escravos. Todavia, com o decorrer do tempo, as negociações passaram a ser feitas diretamente com os régulos (chefes tribais) nas aldeias. Os negros eram quase sempre caçados pelos próprios mercadores, mediante o pagamento de um tributo aos régulos. Eles eram arrastados até o litoral e embarcados em navios negreiros. Antes de cruzarem os mares em direção aos novos domínios, eram marcados com ferro em brasa no ombro, no peito ou na coxa. Muitos não sobrevivam à viagem devido às péssimas condições da travessia. Calcula-se que de 3 a 5 milhões de africanos tenham morrido confinados em cubículos nos portos, nos porões dos navios e nas guerras tribais ocasionadas pelo comércio escravagista. O tráfico negreiro durou três séculos. Nesse período, cerca de 10 a 15 milhões de africanos chegaram à América. Estima-se que de 500 a 7 mil deles foram levados para a América do Norte. Os demais foram trazidos para as Américas do Sul e Central.

A origem dos escravos O trecho da costa africana localizado entre Cabo Verde (Senegal) e Luanda (Angola) tornou-se uma reserva de escravos para as plantações do Novo Mundo. Dos cerca de um milhão de africanos aprisionados pelos portugueses no início do século XVII, mais da metade era de Angola, do Congo e de Benin. Os demais escravos foram capturados na Costa do Ouro (Gana) e da Senegâmbia (entre o rio Senegal e as ilhas Sherbo, em Serra Leoa). A história mostra que no ano de 1640, quando se libertou da dominação espanhola, a monarquia portuguesa conservava apenas algumas possessões africanas e o Brasil. As colônias africanas passaram a ser meras fornecedoras de escravos para as plantações brasileiras de cana-de-açúcar, que representavam, naquela época, a mais importante fonte de divisas para Portugal.

Chegada ao Brasil Os portugueses tinham autorização para escravizar índios. Mesmo sendo um fato negativo, muitos o fizeram. Mas, como o tráfico de negros mostrou-se altamente lucrativo, eles deram preferência à escravização de africanos. O lucro chegava a 600%. Todos ganhavam: a burguesia européia, que montou entrepostos de escravos na costa africana; a Coroa Portuguesa, que cobrava altos impostos dos senhores de engenho, não só pela importação de escravos, como também pela exportação do açúcar produzido pela mão-de-obra negra; e os próprios colonizadores, que tinham à disposição trabalhadores escravos, que podiam ser negociados como mercadoria. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

71

Cultura Religiosa

Os primeiros escravos chegaram ao Brasil em 1549. Dez anos depois, cada senhor de engenho a recebeu um Alvará Real com permissão para adquirir 120 negros, pagando um terço de seu valor como imposto de importação. Os escravos vinham de Angola, de Moçambique, da Costa do Marfim, de Serra Leoa, de Gâmbia, da Nigéria, da Libéria, do Congo, de Cabinda e de Bissau. Entre eles havia integrantes de culturas diversas e milenares como nagôs, jejes, minas, mandingas, hauçás, fulas, benguelas, tapas e angicos. Estima-se que no século XVI tenham chegado ao país cerca de 100 mil escravos negros – número superior ao de brancos que viviam aqui naquela época. Até o fim do tráfico negreiro para o Brasil, em 1850, calcula-se que entre 4 e 5 milhões de escravos chegaram ao país, onde o regime de escravatura só foi abolido em 1888.

Religiões afro-brasileiras Apesar de lamentarmos profundamente o tráfico de escravos, foi por meio dele que recebemos no país uma riqueza enorme de cultura. A fusão de crenças e costumes africanos, católicos e indígenas deu origem a uma nova cultura religiosa, representada principalmente pela Umbanda e pelo Candomblé. Na época da escravidão, os cultos africanos foram condenados e perseguidos pela Igreja Católica. As práticas, quase sempre clandestinas, e a natureza secreta de alguns rituais deixaram poucos registros dos costumes religiosos dos negros africanos no Brasil. A documentação sobre esses rituais, produzida por autoridades, desqualificou e reduziu a religiosidade negra à mera feitiçaria. Ainda hoje, quando o número de praticantes e simpatizantes chega a 70 milhões de pessoas, segundo a Federação Nacional de Tradição e Cultura Afro-brasileira, os cultos afro-brasileiros enfrentam preconceitos, críticas e ataques de alguns segmentos da sociedade.

O Candomblé Essa é a religião afro-brasileira mais influente no país. A base de sua prática é a reverência e o culto aos orixás. Olorum é considerado o ser supremo, o princípio das coisas. Os orixás, emanações de Olorum, originaram-se dos ancestrais dos clãs africanos, divinizados há mais de 5 mil anos. Embora sejam associados aos santos cristãos, possuem características humanas como a vaidade, a raiva, a força e o ciúme. As diferentes origens dos escravos explicam a multiplicidade de manifestações do Candomblé pelo território brasileiro. Em cada canto do país, pratica-se um tipo de culto, mas preserva-se certa unidade em torno da liturgia e das crenças originais, trazidas pelos africanos.

Rituais e pedidos Os cultos do Candomblé são realizados no terreiro, também denominados “roça” ou “casa-de-santo”, usado simultaneamente como templo e moradia. Du72

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Movimentos religiosos no Brasil

rante os rituais, o terreiro é decorado de acordo com as cores do orixá cultuado, os participantes entoam cantos de louvor e fazem diversas oferendas a essa divindade. Algumas cerimônias, especialmente quando há oferenda de animais sacrificados, são restritas aos iniciados. Tanto os devotos de orixás como os simpatizantes do Candomblé recorrem aos terreiros em busca de proteção, de saúde, de prosperidade, de paz e de ajuda para a resolução de problemas existenciais, como o desemprego e as desilusões amorosas. Muitas pessoas procuram os terreiros para enviar ou desfazer um “trabalho de demanda” (magia para prejudicar). No Candomblé, a consulta aos orixás é feita principalmente por meio da leitura de jogos divinatórios, como os búzios. A resolução do problema apresentado exige a utilização de ebós, oferendas, orações e rituais africanos, de acordo com a complexidade de cada caso.

Os terreiros Nessa espécie de templo, o dia-a-dia dos mortais mistura-se com os rituais dos orixás. Em muitos casos, a divisão dos espaços de um terreiro lembra os egbes – antigas habitações coletivas dos clãs dos povos de língua iorubá. Nos quartosde-santo ficam os pejis (altares) e os assentamentos (as representações com objetos e símbolos dos orixás). O espaço do santuário, no qual se fixa o axé, a força do sobrenatural, é extremamente sagrado. Alguns orixás possuem quartos dentro da casa, enquanto outros, apenas na área externa. As festas que reúnem os fiéis e as divindades do Candomblé são promovidas no barracão.

Orixás e sincretismo no Candomblé Essas divindades estão ligadas à força da natureza e possuem um equivalente entre os santos do catolicismo. Oxalá, deus da criação, equilibrado e tolerante, mantém sincretismo com Nosso Senhor do Bonfim. Oxóssi, deus da caça, pode representar São Jorge ou São Sebastião. Ogum, deus da guerra e do ferro, equivale a Santo Antônio ou São Jorge. Omolu ou Obaluaê, deus das doenças, é relacionado a São Lázaro e São Roque. Xangô, deus do fogo e do trovão, corresponde a São Jerônimo ou São Pedro. Iansã, deusa dos ventos e das tempestades, relaciona-se com Santa Bárbara. Oxum, deusa das águas doces, da fecundidade e do amor, equivale a Nossa Senhora da Conceição ou Nossa Senhora das Candeias. Oxumaré, deus da chuva e do arco-íris, representa São Bartolomeu. Ossaim, deus da folhas e ervas medicinais, corresponde a São Benedito. Nanã, deusa da lama e do fundo dos rios, representa Nossa Senhora Santana.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

73

Wikipédia.

Cultura Religiosa

Iemanjá, deusa dos mares e oceanos, corresponde a Nossa Senhora da Conceição ou Nossa Senhora da Glória. Exu, que aparece nas experiências do candomblé, não é um orixá, mas um intermediário entre este e os seres humanos.

Liderança religiosa O processo ritualístico do candomblé é comandado por um pai-de-santo, chamado de babalorixá, ou por uma mãe-desanto, chamada yalorixá. A função dos dois, além de incorporar o seu orixá, é dar licença aos seus seguidores para que levem diante dele seus pedidos e desejos.

A Umbanda Iemanjá.

A Umbanda surgiu na década de 1920, no Rio de Janeiro. Com o passar dos anos, foi se propagando pelo Brasil e tomando conotação de “religião universal” (GAARDER, 2000, p. 298). A preocupação dos umbandistas não é manter ou preservar as raízes africanas, mas sim pensar suas raízes como brasileiras. É afro, mas afro-brasileira. Assim, encontramos nesta religião uma característica importante a ser ressaltada: [...] a Umbanda também pode ser dita religião brasileira porque é resultante de um encontro histórico único, que só se deu no Brasil: o encontro cultural de diversas crenças e tradições religiosas africanas com as formas populares de Catolicismo, mais o sincretismo hindu-cristão trazido pelo Espiritismo Kardecista de origem européia. Eis aí a Umbanda, um sincretismo religioso originalmente brasileiro. (GAARDER, 2000, p. 299).

Na Umbanda, a divindade maior é adorada sob vários nomes, especialmente Zambi, que é tido como perfeito e não criado ou concebido. Notem o sincretismo. Logo a seguir, vem o Orixá-maior, chamado de Oxalá, identificado com Jesus Cristo e que está no comando dos orixás (semelhante aos anjos no catolicismo romano) e dos santos (espíritos evoluídos e desencarnados, semelhantemente ao pensamento Kardecista). Os orixás e os santos têm como função comandar as linhas (faixas de vibração espiritual correspondentes a cada elemento da natureza, semelhantes à vivência religiosa indigenista) e os chefes de falange (entidades espirituais evoluídas que servem como guias a um conjunto de espíritos de menor evolução em relação aos orixás e que vibram na mesma linha espiritual; são também conhecidos como entidades). Os espíritos de menos evolução guiados pelos chefes de falange são como guias espirituais, espécie de mensageiros dos orixás e santos, que se manifestam como caboclo (espírito dos índios), pretos velhos (espíritos de escravos africanos) e crianças, a fim de trazerem aos homens ainda encarnados as mensagens dos orixás. (STEFFEN, 2000, p. 62).

Os terreiros são organizados em sete linhas tradicionais: de Oxalá, de Iemanjá, de Oxóssi, de Xangô, do Oriente ou das crianças, africanas ou das almas e de Ogum. Na Umbanda, a consulta é feita por meio de um médium, e os “trabalhos” são realizados pelo espírito que está incorporado nele durante os rituais.

74

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Movimentos religiosos no Brasil

A liderança religiosa O pai-de-santo e a mãe-de-santo são quem comandam os rituais. Eles fazem parte da chamada hierarquia espiritual. O pai/mãe-de-santo, ao incorporar seu orixá/guia, deixa-se levar pela incorporação, permitindo que ele se manifeste dentro de suas qualidades específicas. Fazem parte de suas funções: incorporar o espírito protetor, identificar os espíritos que baixam, riscar o ponto, explicar a doutrina, dar os passes, curar as doenças e adivinhar pelos búzios. (STEFFEN, 2000, p. 64).

Assim temos uma idéia de como funciona a Umbanda e os seus rituais. É claro que existem muitos pontos que podem ser aprofundados, mas nossa intenção aqui é a de resumir as características mais importantes.

Espiritismo Os alunos sempre pedem para que falemos sobre o Espiritismo, pois principalmente no Brasil encontramos muitas pessoas adeptas a essa religião. Aliás, a pergunta é: o espiritismo é uma religião? Muitos espíritas fazem questão de dizer que espiritismo não é religião, mas ciência.

O Espiritismo surgiu na França com Leon Hippolyte Denizard Rivail, conhecido como Allan Kardec (1804 – 1869). Foi ele quem “sistematizou uma série de conhecimentos religiosos e deflagrou um movimento que se definia, ao mesmo tempo como ciência, filosofia e religião”. (STEFFEN, 2000, p. 38). Allan Kardec foi quem trouxe em sua sistematização os milenares conhecimentos evolucionistas. Retoma a reencarnação e a Lei do Carma, como no Hinduísmo. Também fala sobre a pluralidade dos mundos, isto é, a existência de vários planos habitados, já que a Terra não é o único mundo habitado, mas um planeta material e distante da perfeição. Esses pensamentos distanciaram o Espiritismo do Cristianismo, já que são contrários ao pensamento cristão.

Wikipédia.

Origem do Espiritismo

Como o Espiritismo entende o ser humano A visão do Espiritismo sobre o ser humano é tridimensional. Os elementos são os seguintes:

Allan Kardec.

o corpo: sem valor em si mesmo, é a parte menos nobre do ser humano e só adquire valor na medida em que possibilita uma relação com o planeta Terra; o espírito ou alma: de criação divina, é o princípio inteligível responsável pelo pensamento, vontade e senso moral; é portador do livre-arbítrio, ou seja, da capacidade de escolher quais atos executar (os atos bons privilegiam a caridade, enquanto os maus, a materialidade). A união do espírito com o corpo se dá a partir da concepção, iniciando assim a possibilidade de decidir por atos que permitirão ou não a evolução da dimensão espiritual;

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

75

Cultura Religiosa o perispírito: é a condensação de um fluido universal, normalmente invisível, que possibilita e explica as aparições nas sessões espíritas. É como se fosse um envoltório do espírito, necessário para a união das duas dimensões anteriores e razão pela qual o perispírito não é só material e nem só espiritual. (STEFFEN, 2000, p. 40).

Como o Espiritismo entende o mundo O mundo é concebido em dois planos: o material, onde habitam os espíritos encarnados ou aqueles a quem chamamos de seres humanos vivos; e o espiritual, onde habitam os espíritos desencarnados. A comunicação entre os dois planos só é possível graças ao médium, que tem a função de intermediar e interpretar os espíritos por meio de diferentes aptidões, que o tornam capaz de captar e transmitir as mensagens recebidas. Os sinais podem ser emitidos de várias maneiras como: com efeitos físicos – batidas, levitação, transporte de objetos; auditivos – sons; artísticos – pintura, desenho, poesia, romance, musicais; e psicográficos – captação da escrita desenvolvida por um espírito desencarnado. Finalmente, Espiritismo é um assunto atual. As novelas vêm há muito tempo discutindo vários assuntos sobre fenômenos espíritas. Freqüentemente, vemos ou ouvimos falar das experiências de “quase-morte”. Muitas pessoas que já estiveram próximas da morte afirmam que a sua alma deixou o corpo. São as experiências extracorporais. O exemplo mais citado é o de pessoas que, deitadas na mesa de operação, foram puxadas para um estado espiritual, voltando depois para o corpo. As religiões que vimos neste capítulo são interessantes de serem estudas e pesquisadas. Encontramos milhares de brasileiros adeptos a elas. Nossa questão aqui não é dizer se é certo ou errado praticar o Candombé, a Umbanda ou o Espiritismo. Apenas é bom ressaltar que é difícil praticar o Catolicismo, por exemplo, e ao mesmo tempo optar por estes rituais. As concepções de origem, sentido da vida e destino são muito diferentes.

1.

76

Você já observou a diversidade de movimentos religiosos que encontramos no Brasil? Faça uma relação dos que você conhece.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Movimentos religiosos no Brasil

2.

Como você analisa a questão do sincretismo religioso?

3.

No seu entender, Espiritismo é ciência ou religião? Explique.

Existe um livro interessante e de linguagem fácil sobre o assunto desta aula: ZICMAN, Renée; MOREIRA, Alberto. Misticismo e novas religiões. Petrópolis: Vozes, 1994.



Como você avalia os movimentos afro-brasileiros e de que forma você detecta traços da Umbanda e do Candomblé na cidade onde mora?

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

77

Cultura Religiosa

78

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

O Cristianismo I

A

maior de todas as grandes Religiões. Jesus surpreendeu com sua mensagem, uma proposta de vida nova para seus seguidores. Uma esperança ligada não somente a esta vida, mas também à eternidade. É difícil falar do Cristianismo sem vivê-lo. Quem o vê de fora muitas vezes não compreende o quanto ele pode mudar a vida de alguém. Isso porque ser cristão exige fé acima de tudo. Neste texto você vai ler um pouco sobre a história do Cristianismo. Mas, apesar de todos os dados históricos, é fundamental entender a essência desta religião.

Conhecer Jesus é fundamental Wikipédia.

Note como são interessantes as anotações do historiador Huston Smith, um dos grandes estudiosos das religiões. Retiramos estas frases do seu livro As religiões do mundo (1991). Jesus convidou o povo a ver as coisas de um modo diferente, certo de que, se elas o fizessem, seu comportamento mudaria de acordo com a nova visão. Jesus usou particularidades que faziam parte do mundo das pessoas: grão de mostarda e solo rochoso, servos e senhores, casamentos e vinhos. Essas particularidades deram aos seus ensinamentos um toque de realidade; ele estava falando de coisas que realmente faziam parte do mundo de seus ouvintes. Jesus Cristo.

Nós vimos a sua glória. Existe no mundo, escreveu Dostoiévski, somente uma figura de beleza absoluta: Cristo. Essa figura infinitamente bela é um milagre infinito.

Toda a sua vida foi de humildade, doação de si e de um amor totalmente altruísta. A prova suprema de sua humildade é a impossibilidade de descobrirmos exatamente o que Jesus pensava de si mesmo. Jesus gostava das pessoas e elas, por sua vez, gostavam dele. Elas o amavam; amavam-no intensamente, e eram muitas. Chegou um momento em que eles sentiram que, olhando para Jesus, olhavam para algo semelhante a Deus em forma humana. Nós vimos a sua Glória [...] cheio de graça e verdade. (João 1.14).

O amor ágape1 Uma das primeiras observações sobre os cristãos feitas por um estranho é “Veja como esses cristãos amam-se uns aos outros”. Uma parte integrante dessa Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

1

Ágape: é o amor fraternal entre os cristãos, ordenado por Jesus no Novo Testamento, que se expressava de três maneiras práticas: na doação de esmolas – daí ágape ser traduzido por caridade –, em reuniões da igreja e saudações cristãs – demonstradas pelo ósculo (beijo) –, e nas refeições nas quais os crentes participavam.

Cultura Religiosa

atenção mútua era a ausência total de barreiras sociais; tratava-se de uma confraria de iguais, como definiu uma estudiosa do Novo Testamento. Ali estavam homens e mulheres que não só diziam que todos eram iguais aos olhos de Deus, mas também viviam de acordo com essa afirmação. Ficar triste na presença de Jesus era uma impossibilidade existencial. Essa era uma qualidade dos cristãos. Também, as palavras de Jesus foram claras: “que a minha alegria esteja convosco e a vossa alegria seja completa”. (João 15.11). Os estranhos ficavam perplexos. Aqueles cristãos, espalhados aqui e ali, não eram numerosos, não eram ricos nem poderosos. Na verdade, enfrentavam mais adversidades do que o indivíduo médio. Porém, em meio às provações, haviam encontrado uma paz interior que se expressava numa alegria que parecia exuberante. O único poder capaz de realizar transformações como essa que descrevemos é o amor. O amor só cria raízes nas crianças quando chega até elas. É um fenômeno reativo e, literalmente, uma resposta. Deus amou primeiro. Não é difícil imaginar a mudança que teria se processado nos primeiros cristãos ao se descobrirem amados por Deus. O amor que as pessoas aprenderam com Cristo envolvia pecadores e marginais, samaritanos e inimigos. Completamente convencidos disso, os discípulos saíram para conquistar um mundo que, acreditavam, Deus já conquistara para eles.

A história No início do século I, quando surge o Cristianismo, toda a região do mar Mediterrâneo está sob o poder de Roma. A história dessa religião está ligada à história do Império Romano e à do povo hebreu. Aliás, para se conhecer a história do Cristianismo é necessário também um bom conhecimento do Judaísmo. Os profetas do Antigo Testamento já anunciaram, muitos anos antes, a vinda do Messias, de um libertador. A Palestina, Terra Prometida por Deus aos hebreus, sofreu, ao longo dos anos, um enfraquecimento político e social. O povo, que havia passado por anos de prosperidade e de unidade sob os reinados de Davi e Salomão, estava abalado pelas disputas internas entre diversas tribos. Após a morte do Rei Salomão, em 931 a.C., a Palestina foi dividida em reino do norte (Israel) e do sul (Judá) e sofreu sucessivas invasões até cair em poder dos romanos, por volta de 60 a.C.

O nascimento de Jesus Os evangelhos relatam que Jesus foi concebido pela força do Espírito Santo e foi dado à luz por Maria, uma jovem virgem pertencente à tribo de Judá e à descendência de Davi. O menino-Deus dos cristãos nasceu na cidade de Belém quando Herodes governava a Judéia (antigo reino de Judá). Ele cresceu em Nazaré, pequena cidade da região da Galiléia, na atmosfera simples de uma casa de carpinteiro. Não encontramos nos evangelhos um relato sobre a juventude de Jesus. O último relato acontece no templo, em Jerusalém, quando Jesus, aos 12 anos, é encontrado conversando com os doutores da lei. Depois 80

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

O Cristianismo I

disso o evangelho resume: “E crescia Jesus em sabedoria e graça diante de Deus e dos homens”.

A pregação Jesus começa a pregar após ser batizado por João Batista. A sua pregação é o anúncio de um novo reino. Ele chama o povo ao arrependimento e anuncia o perdão de Deus. Arrependimento significa transformação. É mudança de vida. O cristão que se arrepende dos seus pecados muda a sua forma de viver. Vive para o próximo, vive pela fé em Deus – o Criador, e ama como Deus ama o seu povo. O objetivo dos evangelhos não era a veracidade histórica, e sim a proclamação de uma mensagem. Eles explicam o sentido da morte de Jesus, do seu sacrifício e da sua ressurreição. Os evangelhos mostram que Jesus de fato tinha autoridade divina e que de fato ressuscitou. A fé cristã não pode ser justificada por meios científicos, nem refutada com base nesses métodos.

Jesus – o mestre

As parábolas se constituíram numa das melhores formas de ensinar. As histórias de Jesus sempre foram usadas para dar um sentido às perguntas dos discípulos e dos demais seguidores. Para que vocês tenham uma idéia dos ensinos de Jesus, há três parábolas encontradas na Bíblia Sagrada, no Novo Testamento, livro de Mateus, que resumem de modo magistral o seu ensino a respeito do amor de Deus para com a humanidade, do amor que seus seguidores têm a ponto de perdoar seus ofensores e do amor que olha para o lado e os move a assistir quem dele necessita.

2

Analogias, comparações por meio das quais se apresentava um fato do cotidiano com significado celeste.

Wikipédia.

Jesus era chamado rabi – “mestre” ou “professor”. Não foi por acaso que ele reuniu multidões de pessoas. Suas parábolas2 e sermões eram preciosos. Falava por meio de máximas, por meio de conversas com os discípulos ou com pessoas que encontrava. Leia, posteriormente, a conversa que Jesus teve com o jovem rico. Ela está no evangelho de Mateus, capítulo 19, versículos 16 a 26. Outro método de pregar era por meio de sermões. O mais interessante é o Sermão da Montanha.

A morte de Jesus A ação de Jesus, sua mensagem, a maneira de lidar com as pessoas, seus milagres, a quebra de muitas tradições, também criaram sentimento de ódio nos seus opositores. As críticas de Jesus não eram baseadas em questões econômicas ou políticas; sua preocupação maior e fundamental estava na autenticidade das relações humanas e na sinceridade de propósitos com as quais as pessoas

A morte de Jesus.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

81

Cultura Religiosa

esperavam cultuar a Deus. Por isso criticou o templo, os sacerdotes, os mestres de lei, os escribas. Poucas pessoas compreenderam a essência da sua mensagem. Por isso, também foi levado a morrer numa cruz. Foi considerado um desordeiro, um perigo para a sociedade e para os interesses dos governantes e religiosos. O que precisamos compreender é que a morte de Jesus, para os cristãos, era algo anunciado pelos profetas no Antigo Testamento. Ele é visto como verdadeiro homem, mas também como verdadeiro Deus. Segundo a Bíblia, Jesus assumiu a forma de homem para sofrer e morrer, pagando a culpa pelos pecados de toda a humanidade. Ao que crer nele, é assegurado o perdão de pecados, a ressurreição do seu corpo para a vida eterna.

A ressurreição Este é o ponto-chave, a mensagem cristã. Jesus morreu, mas ressuscitou dentre os mortos. Um simples homem não faria isso. É algo racionalmente impossível para qualquer ser mortal, mas não para Deus. Deus mostra à humanidade que é maior do que a morte. Jesus venceu a morte e está na presença do Pai. A ressurreição é que dá legitimidade ao Cristianismo. Sem ela, a vida e a obra de Jesus não fariam sentido. Por isso os cristãos anunciam que “Cristo vive”. Uma das piores coisas do mundo é perder alguém que se ama. A morte é cruel, é dura. Ela ceifa a vida de pessoas idosas, de meia-idade, de jovens e de crianças por meio de doenças incuráveis como o câncer ou a aids, infartos, acidentes e assim por diante. Ela liquida com sonhos de trabalho, estudo, namoro, casamento, viagens etc. Deus não a criou. Ela é conseqüência direta da desobediência dos primeiros homens, Adão e Eva. É o salário do pecado (Romanos 6.23). E como cada ser humano tem cometido pecados por meio de pensamentos, desejos, palavras e ações, todos, dia mais, dia menos, morrerão. Para muitos, a morte é o fim de todas as coisas. Contudo, a Bíblia Sagrada diz que tudo não termina com ela, que existe a ressurreição. A ressurreição de Lázaro (João 11.1-46) é prova disso. Certa vez, este amigo de Jesus, Lázaro, estava doente. Suas irmãs, Maria e Marta, imediatamente mandam avisá-lo, dizendo: “Está enfermo aquele a quem amas”. Jesus não sai imediatamente do lugar em que se encontrava para auxiliá-lo. Lázaro morre e é sepultado. Quatro dias depois de ter sido sepultado, Jesus chega à Betânia. Marta vem ao seu encontro e lhe diz: “Se estivesse aqui, meu irmão não teria morrido”. Jesus retrucou dizendo que ele iria ressuscitar. Maria o crê, só que para o fim dos tempos, no último dia. Jesus, porém, afirma: “Eu sou a ressurreição e a vida, quem crê em mim, ainda que morra, viverá”. O que Jesus estava dizendo era que ele era Senhor sobre a morte, e que ele ressuscitaria a seu amigo Lázaro. De fato, aquilo que parecia impossível aos olhos de todos, aconteceu: Lázaro ressuscitou depois de quatro dias de sepultamento. 82

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

O Cristianismo I

Jesus ressuscitou, segundo os evangelhos, muitas pessoas. Entre elas citamos Lázaro, o filho de uma viúva da cidade de Naim, e a filha de Jairo. Ele próprio ressuscitou ao terceiro dia e prometeu que no último dia todos ressuscitarão. Todos os cristãos sabem que irão morrer. O que eles não sabem é quando isso acontecerá. Talvez dentro em breve, repentinamente. Talvez depois de doença prolongada, ou depois de atingirem uma idade avançada. Vivendo pouco ou muito, eles crêem que ressuscitarão e isso os consola. Para eles, esta é a mensagem central da Igreja Cristã: existe ressurreição porque Cristo ressuscitou. Ele, Jesus, vive; portanto, eles também viverão. E é esta a mensagem que tem consolado cristãos de todas as idades quando precisam se despedir de alguém que amam. Nossa sugestão é que você faça uma leitura de um dos evangelhos. É o relato fiel do nascimento, vida e morte de Jesus. A fé do cristão está baseada nestes relatos. A Igreja Cristã acredita que estes textos são revelados por Deus. Por isso também são inquestionáveis. Pegue uma Bíblia, abra no Novo Testamento e escolha entre os evangelhos de Mateus, Marcos, Lucas ou João. Não podemos esquecer que a história do cristianismo é uma continuação da História do povo judeu. Jesus é o Messias prometido pelos profetas já no Antigo Testamento e suas características fecham com os textos de Isaías, por exemplo.

1.

Como você entende a questão do nascimento de Jesus, gerado pelo Espírito Santo?

2.

Qual a importância da ressurreição de Jesus para o Cristianismo?

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

83

Cultura Religiosa

3.

Após a leitura do texto, procure discutir com os colegas e amigos o sentido da morte de Jesus.

Recomendo, para um conhecimento maior do tema, a leitura de um dos Evangelhos que conta a história de Jesus. Pode ser os Evangelhos de Mateus, Marcos ou Lucas. BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Revisada e atualizada. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.



84

O que você entende ser importante na mensagem do Cristianismo? Que tipo de aplicação prática é possível fazer para uma vida mais feliz?

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

O Cristianismo I

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

85

Cultura Religiosa

86

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

O Cristianismo II

V

amos fazer neste texto uma reflexão maior sobre o Cristianismo e como a fé cristã pode ser colocada em prática. Praticamente todo o texto foi trabalhado por um colega nosso da disciplina de Cultura Religiosa, o professor Egon Seibert, que escreve do coração.

Istock Photo.

A Bíblia – livro sagrado do Cristianismo

A palavra Bíblia significa conjunto de livros, o que ela na verdade é, sendo que se divide em dois grandes blocos, o Antigo (AT) e o Novo (NT) Testamentos. A palavra testamento lembra aliança ou acordo, estabelecidos entre Deus e os seres humanos. No caso do AT, o mesmo refere-se a Abraão, que recebeu a promessa de vir a ser uma grande nação, de onde viria o Messias, o Redentor de todos os homens. Também lembra a libertação da escravidão do Egito através do sangue do cordeiro. Quanto ao NT, é lembrado o cumprimento da promessa de que o Messias veio na pessoa de Jesus, que ele salva os homens da morte eterna com o derramar do seu sangue – o sangue da nova aliança – e envia seus mensageiros ao mundo para pregar seu evangelho. Para facilitar a sua leitura, a Bíblia foi dividida em capítulos e versículos. (SEIBERT, 2002).

Antigo Testamento É formado por 39 livros, escritos em hebraico e aramaico pelos profetas, de mais ou menos 1260 até 400 a.C.

Livros Livros da Lei (Pentateuco); Históricos – Josué até Ester;

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Cultura Religiosa

Poéticos – Jó até Cantares de Salomão; Profetas maiores – Isaías até Daniel; Profetas menores – Oséias até Malaquias.

Conteúdo do Antigo Testamento Destacamos: Criação do mundo em seis dias; Queda em pecado pelos primeiros homens; Promessa do Messias, Redentor; Formação e história do povo de Israel; Profecias sobre Jesus: Gênesis 3.15, 12.2; Isaías 7.14, 53.4-11; Miquéias 5.2; Salmo 16.10.

Novo Testamento É formado por 27 livros, escrito em grego pelos evangelistas e apóstolos entre 50 até 100 d.C.

Conteúdo do Novo Testamento Destacamos: quatro evangelhos que narram vida, ensinos, milagres, sofrimento, morte, ressurreição e ascensão de Jesus; atos dos Apóstolos: iniciando pela ascensão, narra o Pentecostes, a formação da Igreja Cristã, o seu desenvolvimento, as suas atividades e as perseguições que Jesus sofreu; cartas: Paulo (13), Pedro, Judas, Tiago; Hebreus (não se sabe o autor), João; profecia: Livro de Apocalipse – Revelação. A Bíblia contém duas grandes doutrinas, a Lei e o Evangelho. Veja as suas diferenças no quadro abaixo:

88

A Lei

O Evangelho

Ensina o que nós devemos fazer ou deixar de fazer.

Ensina o que Deus fez e ainda faz pela nossa salvação.

Manifesta o nosso pecado e a ira de Deus.

Manifesta o nosso Salvador e a graça de Deus.

Exige, ameaça e condena eternamente quem não cumpre os mandamentos.

Promete, dá e sela o perdão, vida e Salvação e crê em Jesus.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

O Cristianismo II

A Lei

O Evangelho

Provoca a ira no homem e o afasta de Deus.

Chama e atrai para Cristo, opera a fé.

Deve ser pregada aos impenitentes.

Anuncia-se aos atemorizados.

A lei serve como freio (impedindo que o mal tome conta do mundo), espelho (revelando os erros humanos), e norma (mostrando ao ser humano como agir).

O Evangelho é a boa-nova da graça do amor de Deus em Cristo Jesus (João 3.16), e motiva o cristão à prática das ações que agradam.

Esse é o livro sagrado do Cristianismo, a Bíblia. Os cristãos a lêem e nela meditam porque a aceitam como a palavra de Deus. Eles a crêem porque: ela diz de si mesma que é a palavra de Deus (2Timóteo 3.16: “Toda a Escritura é inspirada por Deus”); ela não se contradiz, pois sempre apresenta o mesmo remédio para a enfermidade chamada pecado: a fé em Cristo; suas profecias se cumpriram e cumprem. Exemplos: queda em pecado – conseqüências; dilúvio; cativeiro e desterro de Israel; a vinda do Salvador Jesus; destruição de Jerusalém (Tito, ano 60); perseguições; fim dos tempos – Marcos 13.31: “Passarão céus e terra, mas as minhas palavras não passarão”; ela dá uma explicação às perguntas como: donde vim, para onde vou, por que vivo? (Efésios 2.8-10); seu estudo convence da verdade, de que Jesus é o caminho que conduz à vida eterna (João 14.6). Lema da Ulbra: Ueritas uos liberabit! (João 8.3132): “Se vós permanecerdes na minha palavra, conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará.” (SEIBERT, 2002).

Ensinos de Jesus e a sua prática entre os cristãos sobre o amor para com o que retorna arrependido A Parábola do filho pródigo (Lucas 15.11-32) Para muitos, em vez de O filho pródigo, a parábola deveria receber o título de O pai que espera ou O pai amoroso, porque na verdade retrata o amor de Deus Pai para com aqueles que se afastam dele e retornam arrependidos. A parábola nos apresenta três personagens que queremos analisar: 1.ª O filho mais moço: pede ao pai a sua parte da herança1 que este não tinha obrigação nenhuma de lhe dar.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

1

De acordo com os costumes de então, um terço dos bens do pai. Depois de recebê-la não teria mais direitos sobre aquilo que o pai viesse a adquirir.

89

Cultura Religiosa

O jovem parte e gasta tudo de maneira dissoluta, extravagante e imoral. Quando o dinheiro acaba, por coincidência surge grande fome. Procura empregos e o que lhe sobra é tornar-se porqueiro. Aceita o emprego porque imagina que ali pudesse alimentar-se com alfarrobas – vagens gigantes, que eram dadas para os porcos comer. Ninguém, no entanto, lhe dá alguma coisa. Caindo em si lembra-se da casa do pai, na qual a situação dos escravos era melhor que a sua. Resolve voltar, pedir-lhe desculpas e suplicar-lhe que o aceite de volta como escravo. 2.ª O pai: algo interessante Jesus registra – o Pai estava aguardando a volta do filho. Ao vê-lo na estrada o reconhece e vai ao seu encontro. Compadece-se dele, abraça-o e beija. O filho reconhece sua situação: não tinha nenhum direito, nada para exigir. Só uma súplica: aceita-me como um dos teus escravos. Aí vem a surpresa: o pai reintegra o filho na família – melhor roupa, anel no dedo, sandálias nos pés, novilho cevado, música, danças, festa. Por quê? Este meu filho estava morto e reviveu, estava perdido e foi achado. 3.ª O irmão mais velho: este volta do campo depois de uma jornada de trabalho. Ouve o som da música, gritos de alegria. Intrigado, pergunta o que estava acontecendo. Ao saber do que se tratava, uma reação estranha para aquele momento: indignado, não quer entrar nem participar da festa. O pai o procura e o irmão mais velho quer repreender o pai: estou a tanto tempo contigo e nem um cabrito preparas para festejar comigo. Mas este teu filho (não é seu irmão), que foi embora e gastou tudo, volta e é recebido com festas? Até o novilho cevado (engordado na estrebaria) é abatido para festejar? O pai então o chama à realidade: tudo isso aqui é teu. Nada perdeste; a herança continua sendo tua. Mas era preciso que nos alegrássemos, pois este teu irmão estava morto e reviveu, estava perdido e foi achado. O ensino dessa parábola: Jesus, na presente parábola, narra de uma maneira bem clara que Deus é o Pai que recebe o pecador que o busca em arrependimento sincero. Os que retornam, por piores que tenham sido as suas ações do ponto de vista humano, serão por ele recebidos (Quem vem a mim, de modo algum o lançarei fora). Ele, porém, aponta para as atitudes, por vezes hipócritas, de quem se julga de sua família e que se dá o direito de discriminar quem errou e que, arrependido, deseja voltar a este convívio. Ao invés de lamentar que alguém volta arrependido e é aceito por Deus em sua família, cristãos deveriam alegrar-se, pois o que Deus mais deseja é que todos se arrependam dos seus pecados e vivam. (SEIBERT, 2002).

Sobre o perdão ao próximo O credor incompassivo, sem misericórdia (Mateus 18.21-35) Jesus é colocado diante de uma questão intrigante: quantas vezes alguém deve perdoar ao seu próximo? Alguns admitiam até sete vezes. Jesus, porém diz 90

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

O Cristianismo II

que devem ser 70 vezes 7, com o que deseja mostrar que seus seguidores perdoam sempre. É neste contexto que ele conta a parábola do credor incompassivo para ensinar a sua vontade a respeito do perdão. Na parábola, Jesus fala sobre um rei ajusta contas com os seus servos. Um deles lhe deve 10 mil talentos, o equivalente a 480 mil quilos de ouro. Isso hoje representaria no mínimo um valor de 5,5 bilhões de reais. Como o devedor não tem como que pagar, o rei manda que seja vendido tudo o que ele tem, bem como ele próprio e seus familiares. Desesperado, este se lança aos pés do rei e suplica por misericórdia. E não é que o rei o atende e perdoa? Depois de tamanha generosidade, o perdoado sai aliviado da presença do rei e encontra um conservo seu que lhe devia 100 denários. Um talento, 48 quilos de ouro, equivalia a 10 mil denários. Cada denário por sua vez correspondia a 4,8 gramas de ouro, o que resultaria num valor de cerca de mais ou menos R$ 5.500,00. Que diferença. O que podia se esperar? Que o que fora perdoado também perdoasse. E aí a surpresa: ele lança seu companheiro na prisão de onde só sairia depois de haver pago a dívida. Os amigos deste por sua vez o delatam ao rei que agora, irado, o chama de servo malvado e o lança na prisão, entregando-o aos verdugos (carrascos ou algozes). Através desta parábola, Jesus quer ensinar que a nossa dívida (de pecados, de erros) diante de Deus é tão grande que não podemos resgatá-la. É verdade, muitos o querem fazer. No entanto, segundo Jesus isso é impossível. Eis porque o apóstolo Paulo ensinou que é por graça que se é salvo (Efésios 2.8-9). O que fazer com os nossos pecados? Apelar para o amor de Deus que, por causa de Cristo, nos perdoa. O apóstolo João recomenda em 1João 1.9: “Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar e purificar de toda a injustiça.” Assim como Deus nos perdoa devemos também perdoar aqueles que pecam contra nós, que nos ofendem. É fácil? Não é não. Mas esta é a vontade de Deus e seu amor, somente ele pode mover-nos a agir em amor. Alguns motivos que podem levar alguém a não perdoar: falta de humildade diante de Deus; desejo de vingança (o outro precisa pagar – muitos casais estragam sua vida por esta causa); desconhecimento da enormidade do amor divino, que sempre está pronto a perdoar. Recomendamos que leiam na Bíblia, Efésios 4.31-5.2, através do site da Sociedade Bíblica do Brasil. (SEIBERT, 2002).

Sobre o amor ao próximo O bom samaritano (Lucas 10.25-37) Um intérprete da lei perguntou certo dia a Jesus o que deveria fazer para herdar a vida eterna. Jesus lhe disse: o que está escrito na lei? Ele respondeu: Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

91

Cultura Religiosa

ama a Deus de todo o coração, alma e entendimento e ama ao próximo como a ti mesmo. Jesus, por sua vez, falou: faze isto e viverás. Como que se desculpando, o intérprete da lei perguntou: quem é o meu próximo? Foi aí que Jesus lhe contou a parábola do bom samaritano. Um homem fora assaltado, deixado semimorto na estrada. Na estrada de Jerusalém a Jericó passam pelo assaltado um sacerdote e um levita. Nenhum o assiste. Finalmente Jesus diz que também veio um samaritano, inimigo de Israel. E este cuida do homem ferido, leva-o até um pequeno hotel onde paga o atendimento que lhe é prestado e promete voltar para pagar todo o tratamento. É então que Jesus pergunta quem foi o próximo do que fora assaltado? E o intérprete da lei, muito contrariado, precisa reconhecer que fora o que usara de misericórdia com ele. Diante disso, Jesus lhe diz: vai e procede tu de igual modo. O amor ao próximo foi uma das características dos cristãos da Igreja Primitiva. Havia entre eles, especialmente em Jerusalém, muitos pobres. A Igreja, através de ofertas voluntárias, sustentava seus pobres. Especialmente as viúvas recebiam seu rancho semanal. De repente surge um problema. As viúvas de origem grega senten-se prejudicadas. Começam a receber menor auxílio que as de origem judaica. Reclamam. Pedro então convoca as lideranças e ordena que sejam eleitos sete diáconos, sete homens fiéis que cuidem da distribuição do alimento entre os pobres. Ele e os demais apóstolos iriam dedicar-se ao que foram incumbidos pelo Senhor Jesus: o ofício da oração e da pregação do Evangelho. A diaconia é o serviço amoroso que o cristão presta ao seu próximo em resposta ao amor de Deus. Ela lida com as conseqüências e causas do pecado: doenças, sofrimentos, pobreza, miséria, ganância, preguiça, exploração, luto, solidão, violência (assaltos, estupros, homicídios), guerra, catástrofes naturais, fome, vícios, insensibilidade, solidão, morte. Sugestões de como se pode demonstrar amor ao próximo: visitando doentes em seus lares e hospitais (câncer, aids, lepra); visitando idosos (nossos avós ou pais) para conversar, passear (asilos, casas-lares, creches, orfanatos); visitando os que sofrem (enlutados, órfãos); visitando os presos; auxiliando os pobres (alimentos, roupas, remédio, estudo, emprego); encaminhando dependentes de drogas ou de álcool às instituições especializadas; olhando pelos portadores de deficiências físicas (hospitais), mentais (APAE), visuais (doação de córneas), auditivas etc; lutando contra a poluição, preservando a natureza (lixo, inseticida, biodegradáveis), rios, ar, florestas, solo; 92

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

O Cristianismo II

lutando pela justiça social e contra qualquer tipo de discriminação (igualdade no trato com a lei); lutando pelo direito à vida (contra o aborto); apoiando o pacifismo (não à violência, à guerra); lutando contra a corrupção – não sendo corruptor nem corrupto; ajudando e orientando migrantes e desempregados; organizando palestras sobre higiene, saúde, drogas, em associações de bairros; participando da vida política do país. O cristão busca inspiração em Jesus e no seu amor. Ele ensinou no Evangelho de João 15.12: Amai-vos como eu vos amei. No Evangelho de Mateus 25.31-46 é mostrado que os que creram e produziram os frutos terão a vida eterna. No livro O Homem e o Sagrado, o professor Jonas Dietrich descreve a pessoa de Jesus e o seu ensino. Diz: “No ensino de Jesus, encontramos a expressão mais íntima de seu extraordinário sentimento de amor para com todas as pessoas. Este amor (ágape) é, sem dúvida, a lição mais dura e desafiadora que Deus, na pessoa de Jesus, deixou como exemplo aos seus discípulos, para que estes atuassem como instrumentos retransmissores deste sentimento às demais pessoas em palavras, pensamentos e atos”. (SEIBERT, 2002).

Muitos acham entediante fazer a leitura da Bíblia. Tem gente que tem até vergonha de carregar a Bíblia. Mas por outro lado, podemos encontrar neste livro temas interessantes para o nosso dia-a-dia. Lá nós encontramos a palavra de Deus. Aliás, como afirmam os cristãos, a Bíblia é a palavra de Deus. Lá nós encontramos aquilo que Deus deseja para cada um. Não conheço nenhum livro que tenha uma mensagem tão bonita como esta.

1.

Leia na Bíblia Sagrada o Salmo 23 e relate o que descobriu nesta poesia.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

93

Cultura Religiosa

94

2.

Leia também o texto de Provérbios, capítulo 1, e escreva sobre o sentido do texto em, no máximo, dez linhas.

3.

O que a Parábola do Filho Pródigo nos ensina para a vida? Lucas 15.11-32.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

O Cristianismo II

Ler pelo menos uma das parábolas de Jesus e refletir: como aplicar esta parábola no século XXI.



Como é possível a experiência de perdoar o próximo e amá-lo, mesmo depois de saber que aqui incluímos também os nossos inimigos?

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

95

Cultura Religiosa

96

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

A Reforma do século XVI

N

o século XVI, causas religiosas, políticas, econômicas e sociais deram origem à Reforma Luterana. Com isso, chegamos à segunda grande divisão do Cristianismo e o fim da hegemonia da Igreja Católica no Ocidente. O personagem principal desta história chama-se Martin Luther (Martinho Lutero – 1483-1546). Doutor em Teologia, Lutero estudou a Bíblia e lutou para retornar à essência do Cristianismo. Notou os desvios do catolicismo e chamou a Igreja à reforma. Queria reformar a sua própria Igreja, a Igreja Católica Apostólica Romana. As resistências, as discussões teológicas e a sua excomunhão levaram ao surgimento de um novo movimento: o Luteranismo.

Introdução Nos séculos XV e XVI, a Europa viveu um período de intensas mudanças políticas, científicas e culturais, que marcaram a transição da Idade Média para a Era Moderna. O sistema feudal estava em crise, as cidades floresciam e a burguesia ganhava força como classe social. O movimento renascentista, iniciado no século XIV, influenciava a arte e o pensamento europeus. A invenção da Imprensa por Gutenberg, em 1450, possibilitava a popularização de textos clássicos e da Bíblia, cujos estudos e a leitura, até então, eram restritos ao clero. A Inquisição, comandada pela Igreja Católica Romana, condenava à fogueira todos aqueles que ameaçavam sua doutrina ou seu poder político. Portugueses, espanhóis e ingleses davam início às grandes navegações, já que a tomada de Constantinopla pelos turco-otomanos, em 1453, havia fechado o caminho mais curto para as Índias, onde mercadores europeus buscavam especiarias – esse fato foi marcante para o descobrimento da América, em 1492, por Cristóvão Colombo, e do Brasil, em 1500, por Pedro Álvares Cabral. O período foi marcado também pelo fortalecimento das monarquias nacionais, o que suscitava uma oposição cada vez mais forte às ingerências da Igreja Católica na vida política e civil dos europeus. Este é o quadro que encontramos na época de Lutero, por volta de 1500. É um resumo histórico de uma época que nos leva a horas de leitura agradável, notando a mudança de mentalidade de um mundo oprimido pela estagnação da história.

Wikipédia.

Lutero Pode ser que você não tenha lido nada sobre ele, mas vai descobrir na sua história que a vida e as coisas não são mero acaso. Ele acreditava que por trás de suas ações, dos seus escritos e das suas decisões, Deus estava presente e o conduziu à Reforma de 1517. Aqui vai um breve resumo da sua história.

Martinho Lutero. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Cultura Religiosa

O meio familiar e a educação Lutero nasceu no dia 10 de novembro de 1483 em Eisleben, uma pequena cidade da Alemanha. Seus pais eram de origem camponesa e eram religiosos tradicionais. Seu pai adquiriu, pouco a pouco, certo bem-estar por seu trabalho na extração mineira. Não havia na família nem sacerdotes nem monges. Segundo depoimentos do próprio Lutero, sua educação foi severa e algumas vezes foi castigado fisicamente a ponto de fugir de seu pai. Disse ainda que numa determinada vez, por ter pegado uma noz indevidamente, apanhou de sua mãe até sangrar. Sua formação escolar ocorreu em três etapas: de 1488 a 1497, freqüentou a escola municipal de Masfeld. Ali aprendeu os rudimentos do latim, o canto e, com toda a certeza, as expressões principais da fé cristã: os dez mandamentos, o pai-nosso, a ave-maria, o credo. Os métodos empregados na escola eram os tradicionais, fundados em particular na memorização e sem excluir o uso freqüente de pancadas; de 1498 a 1501, foi aluno em Eisenach. Ali freqüentou a “escola do Trívio”, uma escola que ensinava as três disciplinas fundamentais: a gramática, a retórica e a dialética; em 1501, Lutero iniciou seus estudos universitários em Erfurt, uma das principais universidades alemãs da época. A Faculdade de Direito, à qual o pai de Lutero o encaminhou, tinha uma boa reputação. Como era de costume, diferente das Universidades hoje, ele começou estudando durante três anos na Faculdade de Artes. Nesse ciclo, se formou nas disciplinas tradicionais: gramática, dialética e retórica, que constituíam o trívio; geometria, aritmética, música e astronomia (quadrívio). Teve que participar também de cursos de ética e de metafísica. A familiaridade de Lutero com a lógica aristotélica e seus conhecimentos da ética e da metafísica, do mesmo Aristóteles, remontam ao ensino recebido durante esses anos. Em 1502 tornou-se bacharel, o que lhe permitiu ensinar aos principiantes a gramática, a retórica e a lógica. A 7 de janeiro de 1505 recebeu o grau de mestre. Durante esse tempo, participou de cursos e ministrou outros. Era igualmente incumbido de tomar parte em debates acadêmicos, exercício tradicional das universidades na época.

O monge Como Lutero tornou-se monge se estava estudando Direito? Lutero mesmo conta a sua história, mais tarde, numa das conversas à mesa. Referiu-se ao temporal que o surpreendera a 2 de julho de 1505 perto de Stotternheim. Aterrorizado por um raio que quase o fulminara, o jovem homem exclamara: “Ajuda-me, Santa Ana, que me tornarei monge”. De volta a Erfurt, o estudante despediu-se de seus amigos e submergiu, a 17 de julho de 1505, no convento dos agostinianos da cidade. 98

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

A Reforma do século XVI

Existem outros dados que podem explicar a ida de Lutero ao convento. Melanchton relatou acerca da morte súbita de um amigo pouco antes do acontecimento. Outra fonte diz que Lutero teria sido ferido nos meses precedentes por um golpe de espada. A verdade é que havia por trás dos fatos um sentimento de culpa, um medo da severidade de Deus, como alguém que diariamente cobra das pessoas pelos seus pecados. Numa de suas prédicas, em 1534, ele relata: Fui monge por quinze anos, sem contar o que tinha vivido antes. Li com zelo todos os seus livros e fiz tudo quanto estava ao meu alcance. Em nenhum momento consegui achar consolo em meu batismo; ao contrário, pensava continuamente: Ó, quando finalmente poderás tornar-se piedoso e fazer o suficiente, para teres um Deus misericordioso? Através de pensamentos como esse, fui incitado em direção à mongeria, tendo me atormentado e supliciado através do jejum, do frio e da vida severa. (LUTERO, 1995).

O sacerdote Entrando para o convento e seguindo a tradição dos monges agostinianos, Lutero tornou-se um sacerdote. Em 27 de fevereiro de 1507, Lutero foi consagrado diácono, e em 3 de abril ordenado sacerdote. No dia 2 de maio celebrou sua primeira missa na presença de seu pai. Na parte central da celebração, no momento do ofertório, Lutero foi tomado por uma angústia súbita. “Quem é aquele com quem tu falas?”. Teria dito ele para si mesmo, segundo seu testemunho de 1540. “A partir desse momento li a missa com um intenso pavor.” Ao que parece, tratouse do temor de aproximar-se de maneira direta da majestade de Deus. A angústia continuou por um tempo. Lutero sentia o peso de uma imagem de Cristo esboçada essencialmente como juiz.

Os estudos para o ensino de Teologia Estudar Teologia foi o caminho para Lutero encontrar respostas às suas angústias. Foi também o caminho para descobertas importantes e para a Reforma de 1517. Começou seus estudos em 1507. De outubro de 1508 ao outono de 1509, mudou-se para Wittenberg, a fim de aí prosseguir seus estudos e assumir cursos na faculdade de Artes. Em março de 1509, tornou-se bacharel em Bíblia na Faculdade de Wittenberg. Em outubro de 1512, obteve o grau de Doutor e começou a ensinar. Passou a comentar a Bíblia para os estudantes da Faculdade de Teologia de Wittenberg. Entre 1513 a 1518, seu ensino abordou sucessivamente os Salmos, depois as Epístolas aos Romanos, aos Gálatas e aos Hebreus. Depois de 1509, utilizou-se uma nova tradução de Aristóteles. Havia um cuidado especial no ensino do grego e do hebraico, sobretudo a Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

99

Cultura Religiosa

partir de 1517-1518, quando foram fundadas novas cátedras para essas disciplinas. A partir de 1511, foi-lhe confiada a pregação em seu convento. Pouco depois tornou-se subprior e regente de estudos. Vigário de distrito após 1515, passou a ser o responsável por 10 a 20 conventos em Meissen e na Turíngia.

A crise interior A entrada na vida monástica não acalmou Lutero. Não encontrava paz interior, vivia angustiado. Num de seus relatos ele mesmo diz: Eu me martirizava com a oração, o jejum, as vigílias, o frio. [...] Que procurava com isso, senão a Deus? Ele sabe com quanto zelo observei minha regra (monástica) e que vida severa eu levava [...] Pois eu não confiava em Cristo, antes o tomava por nada além de um juiz severo e terrível, tal como se costuma pintá-lo assentado sobre o arco-íris. (LIENHARD, 1998).

A chave para o problema de Lutero foi encontrada com muito estudo das Escrituras (Bíblia). Compreendeu que a justiça de Deus, da qual nos fala o Evangelho, não é aquela de Deus juiz, mas a aceitação do ser humano pecador por Deus, a dádiva de Cristo concedida por Deus ao ser humano. É unido a Cristo na fé que o ser humano poderá viver, ou seja, subsistir diante de Deus. Foi na carta do Apóstolo Paulo aos Romanos que Lutero encontrou um versículo desafiador que diz: “O Justo viverá por fé”. A justiça de Deus, que é dada pela fé, que está assentada tão-só em Deus e em sua misericórdia.

O conflito com a Igreja tradicional O nome de Lutero começou a aparecer na Igreja a partir de 1517, quando ele atacou pela primeira vez a questão das indulgências. Para ele, elas desferiam um duro golpe na sinceridade da penitência.

O que eram as indulgências? Eram entendidas como a remissão, pela Igreja, de uma pena que tinha sido imposta ao penitente, depois que ele tinha confessado sua falta e recebido a absolvição. Isso, por sua vez, baseava-se na idéia de que um ato pecador compreendia não apenas uma falta, mas também uma pena que o pecador devia cumprir sobre a terra ou no purgatório. A prática das indulgências existia desde o século XI. No início, só abrangiam as penas impostas pela Igreja na vida terrena. Posteriormente foram estendidas àquelas do purgatório, abrangendo aí também aquelas que se referiam às pessoas já falecidas. As indulgências ajudavam a enriquecer o tesouro da Igreja e veio com o tempo atender às necessidades financeiras do papado. A indulgência contra a qual Lutero iria se levantar tinha sido promulgada em 1506 e renovada em 1517. As somas recolhidas estavam destinadas a financiar a construção da basílica de São Pedro em Roma. Uma percentagem cabia ao arcebispo Alberto de Mogúncia, que organizava na Alemanha a venda das indulgências, empregando os serviços de Tetzel. A aquisição de uma indulgência custava 1 florim para o artesão e 25 florins para 100

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

A Reforma do século XVI os reis, príncipes e bispos. Para se ter uma idéia, o custo de subsistência de uma pessoa importava em 1 florim para uma semana. (LIENHARD, 1998).

Para Lutero, o cristão precisava de um arrependimento verdadeiro. A indulgência não poderia dispensá-lo, pois em caso contrário o cristão tornar-se-ia vítima de uma falsa segurança. Por isso, quando escreve as 95 teses, de 31 de outubro de 1517, Lutero escreve: “Ao dizer: fazei penitência, [...] nosso Senhor e Mestre Jesus Cristo quis que toda a vida dos fiéis fosse penitência” (tese número 1). “Seja excomungado e maldito quem falar contra a verdade das indulgências apostólicas” (tese 71), mas não se deveria aí depositar sua confiança (teses 32, 49, 52), e, sim, “ensinar aos cristãos que, dando ao pobre ou emprestando ao necessitado, procedem melhor do que se comprassem indulgências” (tese 43). Lutero chegou à base da doutrina das indulgências, ao definir o tesouro da Igreja. Não estariam em questão os méritos excedentes de Cristo e dos santos, mas “o verdadeiro tesouro da Igreja é o Santíssimo Evangelho da glória e da graça de Deus”. Resumindo, indulgência era um documento que vendia perdão dos pecados. As pessoas poderiam comprar perdão para si ou para qualquer outra pessoa, amigo, familiar, mesmo que já estivessem mortos. Foi a gota d’água para que Lutero publicasse, no dia 31 de outubro de 1517, as 95 teses, que falam sobre os abusos da Igreja. Ele deseja uma reforma, uma revisão das posições teológicas da mesma. Para Lutero, qualquer cristão verdadeiramente arrependido tem direito à remissão plena de pena e culpa, mesmo sem carta de indulgência. Lutero não tinha uma idéia clara da repercussão que teriam as suas teses e o eco que isso causaria, mas tinha uma convicção: não estava falando nada que fosse contra os princípios bíblicos. Ele mesmo diz: Em primeiro lugar, protesto que absolutamente nada quero dizer ou sustentar senão o que é e pode ser sustentado primeiramente nas Sagradas Escrituras e a partir delas, depois em e a partir dos Pais da Igreja aceitos e até agora conservados pela Igreja Romana e, por fim, a partir dos cânones e das decretais pontifícias. (LUTERO, 1995).

Sempre gostei de ler sobre Lutero. Especialmente porque sempre achei seus textos atuais, por parecer que está falando dos problemas da nossa época. Interessante é que Lutero sempre encontrou respostas para suas aflições nas Escrituras Sagradas. Era a sua fonte de vida, fonte de inspiração. Lutero mostrou que aí está um manual seguro de orientação para a vida.

1.

Como você analisa a presença de Deus na trajetória de Lutero?

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

101

Cultura Religiosa

2.

Na sua visão, a idéia de Lutero era ser um novo Papa ou seu desejo era somente corrigir erros teológicos da Igreja a qual ele pertencia?

3.

Qual foi a importância da Reforma para a evolução do pensamento humano?

A indicação de leitura são as obras de Lutero já traduzidas para o português. Já existem nove livros traduzidos com as principais idéias do reformador. LUTERO, Martinho. Obras Selecionadas. Porto Alegre: Concórdia, 1995.

Numa reflexão mais aprofundada é possível considerar a Reforma Luterana como uma obra atual. Quais os aspectos possíveis de se aplicar no nosso cotidiano?

102

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

A Reforma Luterana – pensamento

H

oje, quando falamos em Reforma Luterana, buscamos entender alguns aspetos importantes que nos reportam para o século XXI. Quando falamos em causas da ruptura com o catolicismo, podemos aventar várias possibilidades. Seriam causas econômicas, políticas, nacionalismo, individualismo renascentista e uma preocupação crescente pelos abusos eclesiásticos. Tudo isso se percebe. Mas o fato é que a causa básica foi a religiosa. Lutero tinha a intenção única de reformar a sua querida Igreja, que era a Igreja Católica Apostólica Romana. Como não foi compreendido e acabou excomungado, a solução foi seguir com os seus simpatizantes para um outro caminho. Surge assim o Luteranismo. Lutero não desejava esse nome. Ele mesmo disse: “peço que deixem de lado o meu nome e não se chamem luteranos, mas cristãos”. (LUTERO, 1995).

A base de Lutero Todos os fundamentos doutrinários de Lutero são bíblicos. Estudioso da Bíblia e professor de Teologia, ele estava convicto de que a palavra de Deus era fonte para a vida. É com base neste conjunto de livros que ele busca força para contrapor todos os abusos cometidos pela Igreja de sua época. Foi da Bíblia, no livro de Romanos, que Lutero entende a justificação pela fé: “Visto que a justiça de Deus se revela no evangelho, de fé em fé, como está escrito: o justo viverá por fé” (Romanos 1.17). Significa que o homem é justificado por Deus pela fé e não pelas obras. Isso se opõe à idéia de que o povo precisava comprar as indulgências para ser salvo. O grande diferencial apontado por ele nos textos é a insistência nas palavras de ordem: “apenas Deus; apenas as escrituras e apenas a Graça”. Esta última só é conseguida mediante a conscientização e fé nas duas anteriores. A justificação pela fé move e alicerça o Protestantismo. Porém, esta graça nos vem de graça, nos é dada de forma gratuita por Deus, sem intermediários ou simonias. “Para recebermos a salvação pela graça que vem apenas por meio do Senhor Jesus é preciso que haja uma sinceridade e absoluta confiança em Deus e na Sagrada Escritura”. (MARQUES, 2005, p. 203).

Na dieta1 de Worms, em março de 1521, Lutero foi convidado a se retratar. Pediu um prazo para dar a resposta e quando voltou “falou como um profeta de Deus: se não lhe provassem pela Escritura Sagrada que tinha escrito algo contrário à doutrina cristã, não se retrataria”. (STEYER, 2000, p. 130).

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

1

Dieta: Assembléia Legislativa que reunia todas as forças políticas da Alemanha, convocada pelo imperador, com a finalidade de discutir assuntos de interesse civil e religioso.

Cultura Religiosa

Pensamento de Lutero Além do sucesso da Reforma do século XVI, Lutero foi um incansável escritor. Depois de ser excomungado, em 26 de maio de 1521, ele foi “seqüestrado” por um amigo seu, Frederico, o sábio. Assim: Durante aproximadamente dez meses no Castelo de Wartburgo, escreveu diversas obras teológicas, destacando-se, porém, a sua tradução do Novo Testamento do original grego para o alemão. Uma obra mestra, pois graças ao seu talento e conhecimento lingüístico, conseguiu unificar os cerca de duzentos dialetos existentes numa única língua padrão. (STEYER, 2000, p. 130).

A Igreja tenta silenciar Lutero Apesar da alegria de muita gente em ter visto Lutero atacar o comércio de indulgências, naturalmente, outras pessoas o odiaram. Principalmente os amigos dominicanos de Tetzel, um dos grandes interessados em arrecadar dinheiro. Os mesmos começaram a espalhar mentiras sobre Lutero. Ao ouvir essas mentiras, o imperador Maximiliano I escreveu para o papa instando com ele para que fizesse alguma coisa a respeito de Lutero. A situação começou a ficar difícil para o monge. Para piorar, ele acabara de pregar um sermão vigoroso sobre a excomunhão, afirmando que uma pessoa excomungada iria para o Céu caso conservasse a fé no coração. Se o povo acreditasse nisso, a Igreja perderia a sua mais potente arma. Assim, o papa Leão X tomou providências e convocou Lutero para apresentar-se em Roma, a fim de ser examinado. Em seguida, o papa modificou esta ordem e disse ao cardeal Caetano que prendesse Lutero. Posteriormente, o papa deu instruções no sentido de que, se Lutero se arrependesse de seus ataques, fosse liberado; caso contrário, a Igreja devia puni-lo com a excomunhão. Pelo menos Lutero tinha um protetor. Tratava-se do eleitor Frederico, o sábio, da Saxônia. Frederico tinha em alta estima o seu professor de religião. Muitos dos seus oficiais, incluindo o pregador da corte, George Spalatin, estavam do lado dele e de Frederico. O eleitor estava decidido a fazer com que Lutero tivesse um julgamento justo, o que não aconteceria se seus inimigos conseguissem pôr as mãos nele. Assim sendo, Frederico, engenhosamente, tornou ineficazes todas as suas tentativas de retirar Lutero de sua proteção. Em outubro de 1518, Lutero teve três encontros com o cardeal Caetano. O cardeal tinha ordens expressas de Roma para não entrar em debate público com Lutero. Ele seria simplesmente solicitado a retratar-se, ou seja, desdizer o que havia declarado oralmente ou por escrito. Se fizesse isso, seria perdoado e voltaria a ser novamente um “verdadeiro filho da Igreja”. Caso contrário, outras medidas seriam tomadas. Lutero tomou uma postura humilde diante de Caetano, mas mesmo assim não chegaram a um acordo. Lutero disse que não iria se retratar, a menos que alguém mostrasse, pela Bíblia, que ele estava errado. Caetano não podia fazer isso. Por fim, o cardeal zangou-se e ordenou que Lutero se retirasse e só se apresentasse novamente quando estivesse pronto a se retratar. 104

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

A Reforma Luterana – pensamento

Dias depois, Lutero viu a cópia de um anúncio feito pelo papa, no qual era chamado de herege, ou seja, aquele que acredita ou ensina doutrina falsa. O papa o tinha declarado culpado sem nem mesmo ouvir as suas razões. Caetano escreveu a Frederico chamando Lutero de herege e pedindo que ele fosse mandado a Roma ou forçado a abandonar a Saxônia. Lutero defendeu-se das acusações de Caetano e disse que apelaria para um concílio geral da Igreja. Frederico estava numa enrascada. Não sabia se entregava Lutero ou não. Voltou-se para os seus professores universitários à procura de conselho. Praticamente todos eles estavam ao lado de Lutero. Frederico queria cumprir o seu dever cristão. Se Lutero estivesse certo, ele cometeria um pecado contra Deus por entregá-lo aos seus inimigos. Se estivesse errado, então certamente haveria homens bastante instruídos na Igreja para demonstrar os erros dele. Mas isso só poderia ser feito se dessem a Lutero uma boa chance para explicar e defender as suas idéias. Conversando com o papa, Frederico conseguiu fazer com que um representante seu visitasse a Saxônia e conversasse com Lutero. O homem escolhido foi Charles Von Miltitz. Ele era da Saxônia e parente de Frederico. Enquanto atravessava a Alemanha, Miltitz foi descobrindo que muita gente estava ao lado de Lutero e que Frederico não o entregaria. Após conversar com Lutero, Miltitz disse que faria um relatório favorável ao papa. Lutero prometeu que pararia de pregar contra as indulgências se seus inimigos parassem de atacá-lo. Também permitiu que um bispo alemão examinasse seus ensinos e apontasse neles quaisquer erros. Os dois homens se despediram em paz. Com o relatório entregue em Roma, o papa perdoou Lutero e lhe deu as boas vindas de reingresso na Igreja. Ele estava ansioso para acabar de vez com as dificuldades na Alemanha, porque outros problemas lhe ocupavam a mente. Inesperadamente, porém, morreu o imperador Maximiliano. As questões eclesiásticas foram esquecidas por um pouco, enquanto um novo imperador tinha sido escolhido. Deus estava dando a Lutero um pouco mais de tempo.

A excomunhão de Lutero Lutero havia concordado em permanecer em silêncio se os seus oponentes também o fizessem. Mas eles não cumpriram a parte deles no acordo. O primeiro debate sobre as teses de Lutero foi marcado para a cidade de Leipzig. O doutor Carlstadt, de Wittenberg, e o doutor Eck, de Ingolstadt, seriam os debatedores. Este último, naturalmente, estava disposto a atacar e acabar com Lutero, que foi junto com Carlstadt na esperança de que pudesse ter uma chance de tomar parte no debate e defender-se contra as acusações de Eck. Em junho de 1519, Lutero cavalgou as 40 milhas (cerca de 65 quilômetros) até Leipzig, junto com vários outros professores de Wittenberg. Duzentos estudantes com espadas e alabardas foram juntos para protegê-lo. O debate foi realizado no castelo do duque George. Segundo as regras, um dos contendores devia levantar-se e falar durante meia hora. Em seguida, seria a vez do outro. Estas notas seriam enviadas a várias Universidades para avaliação. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

105

Cultura Religiosa

Durante a primeira semana, Eck disputou com Carlstadt. Confiando em sua memória extraordinária, Eck não fazia uso de notas nem de livros. Carlstadt, pelo contrário, consultava uma pilha de livros à medida que falava. Isso era cansativo para a audiência, mas os argumentos de Carlstadt pareceram mais consistentes quando os registros foram mais tarde lidos e julgados. Notando isso, Eck solicitou que as regras do debate fossem alteradas, de modo que nenhum livro pudesse se consultado durante a discussão. A audiência apoiou a idéia. Daí para frente, Carlstadt começou a perder terreno no debate. Lutero assumiu o lugar de Carlstadt em 4 de julho de 1519. O ponto principal da discussão era: “Como e quando o papa tornou-se o cabeça da igreja cristã?” Eck insistia em que Cristo mesmo fez de Pedro o primeiro papa. Lutero, até historicamente, mostrava que depois de Cristo passaram-se centenas de anos sem que houvesse papa algum. Pedia a Eck, acima de tudo, argumentos da escritura. Eck fazia referência aos escritos dos pais da Igreja Primitiva e às leis e decretos dos concílios. Lutero disse: “com todo o respeito devido aos pais, prefiro ater-me às sagradas escrituras”. Ao ver que Lutero estava levando a melhor no debate, Eck comparou-o a João Huss. Huss tinha sido queimado como herege em 1415, mas os seus seguidores mantinham vivas as suas idéias. O povo desta parte da Saxônia odiava os hussitas porque eles tinham freqüentemente invadido terras saxônicas e destruído muitas propriedades. Quando Lutero replicou que algumas das idéias de Huss eram corretas, muitos da audiência ficaram contra ele. Depois de mais algum debate sobre a penitência, indulgências e purgatório, a discussão chegou ao fim. Os partidários de Eck achavam que ele tinha ganho o debate e, depois disso, o papa passou a considerá-lo um paladino na luta contra as falsas doutrinas. Os amigos de Lutero, por sua vez, estavam igualmente orgulhosos do seu campeão; afinal, ele não tinha arrefecido diante do grande João Eck. Este debate levou Lutero a compreender o quanto ele tinha se afastado dos ensinos de Roma. Para ele, a Bíblia era infinitamente mais importante do que todos os escritos dos pais eclesiásticos. Na Escritura era Deus quem falava, não os homens. Viesse o que viesse, a consciência de Lutero estava cativa à palavra de Deus. Em 1520, Lutero escreveu vários tratados importantes. Ele disse que o papa não estava acima dos governantes terrenos. Disse também que qualquer cristão, estudando cuidadosamente, poderia compreender a Escritura tão bem quanto o papa e censurou ainda as vidas dissolutas de muitos dos líderes da Igreja.

Algumas controvérsias teológicas A Igreja Católica Romana ensina que há sete sacramentos. Lutero afirmou que na realidade há apenas três – Batismo, Ceia do Senhor e Penitência – e ele não estava muito certo acerca deste último. A Igreja ensinava que o único caminho para Deus era por meio de mediação do

106

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

A Reforma Luterana – pensamento

sacerdote. Lutero disse que todos os homens são sacerdotes e podem ir diretamente a Deus. A Igreja Romana ensinava que na Ceia do Senhor o pão e o vinho são transformados pelo sacerdote no corpo e sangue de Cristo. O sacerdote, pois, “sacrifica” o corpo e o sangue de Cristo pelos pecados do povo. Lutero negou isso e mostrou, com base na Bíblia, que a morte de Cristo na cruz pagou por todos os pecados uma vez e para sempre, e que seu corpo não necessita ser sacrificado novamente. A escritura também deixa claro que no sacramento do altar, o pão e o vinho permanecem, mas o crente recebe com eles também o verdadeiro corpo e sangue de Jesus. Lutero argumentava que ao povo devia ser dado não apenas o pão, mas também o vinho, porque foi desta maneira que Jesus ministrou a Santa Ceia aos seus discípulos. Lutero mostrou como um cristão devia ser “um senhor livre, não sujeito a ninguém” e, ao mesmo tempo, “servo de todos, a todos sujeito”. Em nos dando o Céu como presente, Deus nos libertou de todos os temores. Em agradecimento a Deus por esta liberdade, o Cristão não pode deixar de servir aos outros por meio de obras de amor e benevolência.

A bula papal Enquanto Lutero escrevia, Eck encontrava-se a caminho de Roma. Lá chegando, fez um relatório sobre o debate de Leipzig. A cúria, ou corte da Igreja, realizou então uma reunião especial. Com a ajuda de Eck e Caetano, redigiram uma lista de 41 erros cometidos por Lutero. Foi, então, enviada a ele uma bula ou carta papal, exigindo que se retratasse dos seus falsos ensinos dentro de 60 dias, caso contrário, seria excomungado. Se o papa pensava que essa bula amedrontaria Lutero e o reduziria ao silêncio, estava enganado. Muita gente estava alegre porque Lutero teve a coragem de pôr a descoberto as coisas que estavam erradas no seio da Igreja. Frederico, o Sábio, tinha decidido proteger Lutero. Mais importante que tudo, Lutero não podia parar de proclamar ousadamente a verdade do evangelho. Eck foi encarregado da perigosa tarefa de anunciar a bula papal na Alemanha. O povo rasgou os seus cartazes e o ameaçou, de modo que se deu por satisfeito em retornar vivo a Ingolstadt. Alguns dos inimigos de Lutero queimaram seus livros em praça pública. Quando Lutero soube disso, fez ele próprio também a sua fogueira. No dia 10 de dezembro de 1520 – fim do prazo dado pelo papa para que ele se retratasse, distribuiu o anúncio de sua própria queima de livros. Fora dos muros de Wittenberg, Lutero queimou os livros de direito canônico e dos escritos dos padres. Aproveitou também para queimar a bula papal. O rompimento de Lutero com a Igreja tinha acontecido finalmente.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

107

Cultura Religiosa

Declarado herege Em janeiro de 1521, o papa declarou Lutero herege e o excomungou. Isso significava que ele, à semelhança de um galho morto, solto da árvore, estava desvinculado da Igreja. Seus livros foram queimados e os seus seguidores foram exortados a abandoná-lo. Aleander, o mensageiro do papa na Alemanha, tentou conseguir que o novo imperador, Carlos V, declarasse Lutero um fora-da-lei. Se isso fosse feito, ele seria caçado e morto como um animal. Lutero foi convidado para ir à cidade de Worms. Lá aconteceria uma Dieta, uma espécie de Concílio, onde ele seria examinado e interrogado, mas não lhe seria permitido argumentar ou explicar seus ensinos. O imperador enviou a ele um salvo-conduto, uma carta prometendo que estaria em segurança. No dia 17 de abril de 1521, Lutero foi levado ao palácio do bispo, onde o imperador e a Dieta estavam reunidos. O recinto estava lotado. Ao longo das paredes havia soldados espanhóis e alemães em formação. Havia príncipes, eleitores, bispos e cavaleiros por todos os lados. Todos sabiam o que estava por trás desta reunião. O poder do papa tinha sido desafiado. Se o papa quisesse manter sua autoridade, Lutero devia confessar que estava errado. O inquiridor lançou uma pergunta dupla a Lutero: “Dr. Lutero, o senhor admite que escreveu estes livros e que estava errado no que escreveu?” Um a um, os títulos dos 25 livros que estavam empilhados sobre uma pequena mesa foram lidos em voz alta. Então Lutero respondeu à primeira pergunta: “Sim, estes livros são meus; eu os escrevi, e escrevi ainda outros”. Quanto à pergunta sobre a retratação, Lutero disse: “Esta pergunta diz respeito a Deus, à sua palavra e à salvação de almas. Peço que me dêem algum tempo para pensar no assunto”. (LUTERO, 1995). O imperador deu-lhe um dia para pensar e responder. No outro dia sua resposta foi clara e simples: “A menos que me convençam, pela escritura ou por razões claras, de que estou errado, eu permaneço constrangido pelas escrituras. Não posso me retratar. Deus me ajude. Amém” (LUTERO, 1995). Um grande rumor de vozes eclodiu na sala. O imperador abandonou a sala e a reunião foi encerrada. Enquanto muitos dos amigos de Lutero o aplaudiam, seus inimigos pediam para que ele fosse queimado como herege. Houve outras tentativas de convencer Lutero a retratar-se, mas sempre em vão. Sua resposta era sempre a mesma: convençam-me pela Escritura. No dia 26 de abril, Lutero e seus três amigos deixaram Worms e retornaram a Wittenberg. A qualquer momento poderiam dar fim a sua vida, mas ele colocava-se inteiramente nas mãos do seu Criador.

O exílio Um mês depois, no dia 26 de maio de 1521, o imperador Carlos V assinou o Edito de Worms. Este documento fazia de Lutero um fora-da-lei, um proscrito. 108

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

A Reforma Luterana – pensamento

Ninguém devia ter qualquer negócio com ele. Todo cidadão estava no dever de capturá-lo e entregá-lo às autoridades. Ele podia ser morto se avistado. Mas um amigo seu, Frederico, seqüestrou Lutero e o escondeu no castelo de Wartburgo até que as coisas se acalmassem. No castelo, Lutero aproveitou para trabalhar. Escreveu livros, panfletos e cartas que eram levados a uma impressora; as cópias logo começaram a ser espalhadas por toda a Alemanha. O povo lia com alegria, pois isso significava que Lutero ainda estava vivo e escrevia para eles. Deu início ao trabalho de tradução do Novo Testamento grego para o alemão. Em 11 semanas o trabalho estava concluído. Agora, muito mais gente poderia vir ao conhecimento de Jesus por meio da Bíblia, como tinha acontecido com ele próprio. Escreveu também um catecismo com dicas para a melhor vivência cristã.

A volta A Câmara Municipal de Wittenberg enviou uma carta a Lutero para que ele voltasse do exílio. Havia acontecido algumas confusões, principalmente por parte de homens que queriam adiantar o processo de reforma e impostores que se diziam profetas do Senhor. De volta ao seu próprio púlpito, Lutero pregou uma série de contundentes sermões ao seu povo, urgindo com os moradores da cidade a que fossem pacientes e deixassem a palavra de Deus operar nos corações dos homens. “Quando tivermos conquistado os corações dos homens, os males morrerão por si mesmos”. Nunca devemos usar a força. A vida inteira do cristão deve ser de fé e amor, disse ele aos seus ouvintes. Nunca foi intenção de Lutero fundar uma nova Igreja. Seu estudo da Bíblia o convenceu de que muita coisa ensinada pela Igreja do seu tempo era de invenção humana. Lutero desejava que a Igreja parasse de ensinar esses erros e retornasse à doutrina pura, conforme ensinada por Cristo e seus apóstolos.

O casamento de Lutero O celibato obrigatório fora introduzido por Gregório VII, em 1075. É de origem pagã. A Escritura Sagrada, tanto do Antigo como do Novo Testamento, ordena o casamento para os sacerdotes. “É necessário que o bispo seja irrepreensível, esposo de uma só mulher. E que governe a sua própria casa, criando os filhos sob a disciplina, com todo o respeito” (1Timóteo 3.2). Lutero casou-se com Catarina von Bora, ex-freira. Catarina entrou no convento contra a sua vontade. Sem vocação, abandonou a vida religiosa e, aos 26 anos, casou-se com Lutero, que tinha 42 anos. Tiveram seis filhos: João, Elisabeth, Madalena, Martin, Paulo e Margarete. Foi um lar feliz, com muito respeito, amor, muita música e canto. Mas foi de lágrimas também, quando o casal perde a pequenina Elisabeth, com menos de um ano de idade e mais tarde a outra filha, Madalena, com apenas 13 anos de idade. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

109

Cultura Religiosa

A morte de Lutero E um dia teria de acontecer. O importante é que Lutero fez a sua parte. Era hora de descansar, depois de longos anos de trabalho, como diz o texto: A longa vida monástica entre jejuns e vigílias, as múltiplas horas de estudo, aulas, conferências, entrevistas, as penosas viagens realizadas, a enorme produção literária e, sobretudo, a responsabilidade da liderança espiritual da Reforma, bem como a ameaça constante do espectro do Edito de Worms, abalaram a sua saúde física. Assim, aos 62 anos de idade, Lutero veio a falecer. (STEYER, 2000, p. 137).

E continua o texto: Na madrugada de 18 de fevereiro de 1546, assistido pelo seu confessor, doutor Justo Jonas, e pelo capelão Célio, de Masfeld, confessou sua fé em Cristo Jesus. Recitou por três vezes o versículo bíblico de João 3.16: “Porque Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu filho unigênito (Jesus Cristo), para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna”, e com as palavras do Salmo 31.5 “Nas tuas mãos entrego o meu espírito; tu me remiste, Senhor, Deus da Verdade”, entregou sua alma nas mãos do criador. (STEYER, 2000, p. 138).

Seu corpo foi sepultado ao lado do púlpito da Catedral de Wittenberg, do alto do qual por tantos anos anunciara o evangelho do amor de Deus em Cristo Jesus.

A paz de Augsburgo A paz assinada em Augsburgo, no ano de 1555, concretiza o reconhecimento oficial da Reforma por parte do Sacro Império Romano Germânico. Carlos V convoca uma dieta para a cidade de Augsburgo (Alemanha). Presidida por Fernando, o irmão de Carlos V, a dieta caracterizou-se pelo bom senso, pois se procurou achar um modus vivendi. Assim, foi assinada a Paz de Augsburgo, na data histórica de 25 de setembro de 1555, que concedia direitos iguais tanto a católicos como a luteranos. (STEYER, 2000, p. 140).

Foi uma batalha. Não com armas. Talvez o modelo de batalha que o mundo deveria adotar, substituindo as armas. Lutero usou apenas a palavra, mas seu argumento foi forte. Foram 38 anos de longos debates, desde o momento em que Lutero afixou as 95 teses na porta da Igreja de Wittenberg até a assinatura da paz de Augsburgo. Isso que a idéia inicial era apenas a simples intenção de conter o abuso da venda de indulgências. Como diz o texto: “Trinta e oito anos que alteraram o curso da história, pois devolveu ao homem a mais nobre das liberdades, a liberdade da consciência”. (STEYER, 2000, p. 140).

110

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

A Reforma Luterana – pensamento

1.

Qual foi a base utilizada por Lutero nas discussões da Reforma?

2.

Você já conhecia a história da Reforma? O que mais chamou a sua atenção no decurso do texto?

3.

Qual é a diferença em dizer que “o homem é salvo pelas obras” ou “que o homem é salvo pela fé”?

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

111

Cultura Religiosa

Nossa sugestão é a leitura do livro: LIENHARD, Marc. Martim Lutero: tempo, vida e mensagem. São Leopoldo: Sinodal, 1998.



112

Reflita sobre a situação social, econômica e política na época da Reforma e relacione questões ainda não resolvidas na nossa sociedade atual.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

A Igreja Luterana e a Educação Lutero e a Educação

M

uitos alunos perguntam qual a relação entre a disciplina de Cultura Religiosa e a Universidade Luterana. Outros querem saber se realmente é importante esse tipo de conteúdo no contexto social em que vivemos hoje. Respondemos dizendo que a Ulbra é uma instituição confessional. Surgiu de uma comunidade luterana e tem um papel muito importante na educação do jovem hoje. A Universidade tem uma filosofia luterana de educação. O aluno que estuda nessa instituição durante vários anos e consegue a colação de grau será inquirido por amigos e familiares sobre essa filosofia. Por isso, é importante que pelo menos quatro créditos sejam destinados ao conhecimento da Universidade e de sua filosofia religiosa, com propostas definidas de educação. Mas para entender essa preocupação pela educação, é necessário um retorno às origens. Vamos voltar mais uma vez ao século XVI e ver que Martinho Lutero teve uma preocupação constante com a educação do povo alemão, principalmente das crianças e dos jovens. O reformador não estava preocupado somente com a existência de escolas e boas universidades, mas também com a qualidade de ensino. Para entender bem esse aspecto, é preciso reler alguns textos nessa área e tirar, em ordem cronológica, as principais idéias de Lutero quanto à educação. Por volta de 1500, a Igreja Cristã ainda se resumia em Católica Apostólica Romana e Igreja Ortodoxa, resultado do Cisma de 1054. A Reforma Luterana estava longe de acontecer. Martinho Lutero era um jovem de 17 anos e nem sabia que um dia entraria para alguma ordem religiosa e seguiria a vida monástica. Ele estava concluindo a escola secundária e o desejo do pai era fazer de seu filho um grande doutor em Direito. Foi para isso que Lutero entrou na Universidade de Erfurt, uma das melhores da Alemanha, com aproximadamente dois mil alunos. Sua preparação foi suada, incluindo leituras dos escritos de romanos famosos e de grandes pensadores gregos. Mas valeu a pena, pois em setembro de 1502, Lutero recebeu o diploma de bacharel em Artes. A Reforma aconteceu em 1517. Mas já em 1501, Lutero teve o primeiro contato com a Bíblia. Em 1505, recebeu o título de mestre em Artes e, no mesmo ano, decidiu ser monge, entrando, assim, para a ordem dos agostinianos em Erfurt. Sua decisão é surpreendente, difícil de explicar. As razões estão em algumas crenças populares, no seu medo de Deus e em alguns fatos ocorridos anteriormente. Em 1507, como sacerdote, Lutero reza a primeira missa. Em 1508, torna-se pastor em Wittenberg e um ano depois inicia suas lições sobre a Bíblia. Em 1510, vai a Roma e se decepciona com o que vê? Em 1512, recebe o título de doutor em Teologia. Em 1513, expõe os livro de Salmos; em 1515, o livro de Romanos e em 1516, o livro de Gálatas. Em 1517, Lutero dá início à Reforma, com a publicação das 95 teses. Lutero viveu num sistema de educação bem diferente do atual. Ele entrou na escola com quatro anos e meio. Os meninos aprendiam a ler e falar a língua latina. Os sacerdotes ou estudantes universitários que os ensinavam eram muito rigorosos. Se um menino se comportasse mal ou não soubesse a Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Cultura Religiosa

lição, seu nome era escrito numa lousa chamada de “lista do lobo”. Semanalmente o professor apagava a lista, depois de dar uma varada no aluno cujo nome constava na lousa. Certa vez, Martinho teve uma semana nada fácil – seu nome apareceu quinze vezes na “lista do lobo”. Outro fato interessante aconteceu em Eisenach, na Escola da Igreja de São Jorge, quando Lutero estava fazendo sua preparação para a universidade. Ele gostava especialmente do diretor, o mestre João Trebonius, que tratava seus alunos com amor e respeito. Um escritor conta que sempre que Mestre Trebonius entrava na classe, esse tirava o chapéu e fazia uma inclinação de cabeça para os estudantes. Quando perguntaram-lhe por que fazia isso, respondeu: “Entre estes jovens discípulos, sentam-se alguns a quem Deus pode fazer nossos futuros líderes e homens eminentes. Ainda que não os conheçamos agora, é perfeitamente adequado que os honremos”. (LIENHARD, 1998). Histórias como essas fazem-nos pensar que essa convivência nas escolas e universidades tenha dado ao reformador um gosto saboroso pela educação. Para ele, aí estava o segredo para a liberdade do Homem. Sua preocupação com os jovens alemães sempre foi muito forte e sua crítica ao modelo educacional de muitas instituições, principalmente universidades, era procedente. Vamos ver, em seguida, alguns de seus artigos publicados, os quais questionavam e chamavam a atenção dos governantes para a importância da educação. Em 1520, Lutero propõe a reforma nas universidades como parte de um programa de reforma geral e da sociedade política. Com o tema À nobreza cristã da nação alemã, acerca da melhoria do estamento cristão, o reformador coloca as Escrituras Sagradas em primeiro lugar como objeto de estudo, tanto nas escolas superiores, como nas inferiores. Para entendê-la, era preciso estudar as línguas e as artes liberais. Aproveitou para criticar os religiosos que pregavam a Palavra sem conhecer a língua original (o hebraico e o grego). Para ele, a partir do desconhecimento, muitos textos da Bíblia eram mal interpretados. Em 1522, acontece a publicação do Novo Testamento na língua alemã. Foi o resultado da preocupação didática de oferecer ao povo, na própria língua, os textos que fundamentavam os argumentos para que a Reforma continuasse. Em 1534, toda a Bíblia já havia sido traduzida e distribuída ao povo, graças ao conhecimento do Doutor Martinho Lutero. Podemos lembrar aqui que Lutero foi beneficiado com o surgimento da imprensa, pouco antes de 1500. Graças a isso, foi possível espalhar com rapidez entre o povo todo o seu trabalho.

114

Em 1524, mostrando preocupação e zelo pela educação, Lutero escreve a Carta aberta aos conselhos de todas as cidades da Alemanha para que criem e mantenham escolas cristãs. Também argumenta em favor dos estudos clássicos com vistas à formação de lideranças para a Igreja e o Estado. Caracteriza a educação como obra do amor cristão, que atende às necessidades individuais e coletivas dos seres humanos. Lutero constatou que em todas as partes da Alemanha as escolas estavam no abandono, as universidades eram pouco freqüentadas e os conventos estavam em declínio. Então, convocou os pais e todas as autoridades para aconselhar a juventude (isso como solução para todos). O argumento principal foi o seguinte: Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

A Igreja Luterana e a Educação Se anualmente é preciso levantar grandes somas para armas, estradas, pontes, diques e inúmeras outras obras semelhantes para que uma cidade possa viver em paz e segurança temporal, por que não levantar igual soma para a pobre juventude necessitada, sustentando um ou dois homens competentes como professores? (LUTERO, 1995).

O reformador põe mais lenha na fogueira e faz um desafio. Para ele, cada cidadão deveria pensar na quantidade de dinheiro que gastou com indulgências, missas, vigílias, doações, espólios testamentários, missas anuais por falecimento, ordens mendicantes, fraternidades, peregrinações e toda confusão de outras tantas práticas desse tipo. Para Lutero, agora que todos estavam livres dessa ladroeira e doações para o futuro, eles deveriam doar, por agradecimento e para a glória de Deus, parte disso para a escola, para educar as pobres crianças. Mas a maior crítica foi quanto à falta de escolas cristãs. Nelas é que os jovens encontrariam a verdadeira educação e os valores adequados para a vida. A tese era de que a universidade até então não colaborava praticamente em nada; pelo contrário, corrompia a nobre juventude. Lutero chega ao ponto de perguntar o que se aprendeu até o momento nas universidades e conventos e afirma que houve quem estudasse 20, 40 anos e não soubesse nem latim nem alemão, quer dizer, muitos não dominavam nem a própria língua. O vergonhoso era a necessidade de estimular os pais a educar os filhos e a juventude, buscando o melhor para eles. Vergonhoso, porque a própria natureza os deveria incentivar em vários sentidos. Para ilustração desse pensamento, Lutero falou o seguinte: Não existe animal irracional que não cuide de seus filhotes e não lhes ensine o que lhes convêm, com exceção da avestruz, que é tão rigorosa com seus filhotes como se não fossem seus, deixando os ovos abandonados no chão. Em primeiro lugar, há pais que sequer são leais e conscientes para educarem seus filhos, ainda que tivessem condições para tanto. Como as avestruzes, também eles endurecem-se contra seus filhos, contentando-se com o fato de terem se livrado dos ovos e de terem gerado filhos; além disso, nada mais fazem. (LUTERO, 1995).

Mas se as crianças deveriam viver na cidade entre o povo, como poderia a razão, e em especial o amor cristão, tolerar que elas crescessem sem educação? Para Lutero, as crianças sem educação essencial seriam veneno para as outras crianças, de sorte que, por fim, se arruinaria uma cidade inteira. Também era de concordância do reformador que a maioria das pessoas mais velhas, por não terem sido ensinadas, não tinham aptidão e não sabiam educar crianças; isso porque para ensinar bem era necessário gente especializada. E mesmo que os pais fossem aptos e quisessem assumir essa tarefa, não teriam tempo nem espaço, em face de outras atividades e dos serviços domésticos. Aí surgiu a necessidade de se manterem educadores comunitários para as crianças, a não ser que cada qual quisesse manter um em particular. Isso, porém, seria oneroso demais para um simples cidadão e, uma vez mais, muitos excelentes alunos seriam prejudicados por serem pobres. Interessante é a visão futurista de Lutero. Ele afirma a importância da educação para o progresso de uma cidade, dizendo que esse progresso não depende apenas do acúmulo de grandes tesouros, da construção de muros, de casas bonitas, de muitos canhões e da fabricação de muitas armaduras. Antes de tudo isso, Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

115

Cultura Religiosa

o melhor e mais rico progresso para uma cidade é quando possui homens bem instruídos, muitos cidadãos ajuizados, honestos e bem-educados. Assim, eles poderiam acumular, preservar e usar corretamente riquezas e todo tipo de bens. Para terminar, podemos ver ainda o modelo de educação proposto por Lutero. Ele cita a educação na cidade de Roma. Lá, os meninos eram educados de tal maneira que aos 15, 18 ou 20 anos dominavam perfeitamente o latim, o grego e toda sorte de artes liberais. As artes liberais eram o conjunto das sete disciplinas que constituíam pré-requisitos para a formação específica. Ao lado do estudo das línguas, que compreendia gramática, dialética e retórica, exigia-se aritmética, música, geometria e astronomia. A partir dessa educação, Roma tinha gente apta e preparada para todas as atividades. Depois dos estudos concluídos, os jovens passavam diretamente para o serviço militar e para o serviço público. Disso resultavam homens sensatos e ajuizados, com conhecimento e experiência. Por fim, Lutero tinha plena consciência de que Deus proveu o seu povo com riqueza de artes, pessoas doutas e livres e que isso precisava ser aproveitado. Eis a responsabilidade da universidade, hoje. A seguir, veremos alguns pontos importantes sobre o Luteranismo pós-Reforma e sobre as Igrejas Luteranas hoje. Depois de falar sobre a Igreja Luterana, é importante ligar a primeira parte deste capítulo com a Universidade Luterana do Brasil.

O Luteranismo pós-reforma Muitos países aderiram ao movimento iniciado por Martinho Lutero: boa parte da Alemanha, a Finlândia, a Suécia, a Noruega, a Dinamarca, a Boêmia, a Morávia, hoje República Tcheca; com características próprias, a Inglaterra, a Escócia, a Holanda, a Suíça; e, em parte, a França, a Áustria e a Hungria. A Reforma Luterana provocou a Contra-reforma, também chamada de Reforma Católica. O Concílio de Trento (1546-1563) procurou pôr ordem na casa. Há quem admita que, provocando a Contra-reforma, Lutero tenha salvado a própria Igreja Católica. Em decorrência da Reforma, surgiu na Europa uma nova ordem social caracterizada pelo pluralismo confessional, respeito à consciência, ética, desenvolvimento social e progresso científico. A sociedade, vendo-se livre da tutela papal, avançou o sinal e emancipou-se de Deus, o Criador. Lutero contribuiu para a sociedade moderna, mas não imaginou nem quis uma sociedade como esta que se apresentava como ateísta, agnóstica, amoral, sem-vergonha, exploradora, corrupta e violenta. Mesmo assim, ainda existia esperança e tempo para lutar. O reformador acreditava, e isso é bom ser lembrado, que o Evangelho continuava eficaz para transformar homens egoístas em cristãos altruístas e, assim, a Igreja permaneceria para sempre. Porque o homem acreditou nessas idéias é que a Igreja Luterana continua viva ainda hoje em todo o mundo, na tentativa de transformar o próprio Homem em nova criatura. 116

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

A Igreja Luterana e a Educação

Martinho Lutero, padre da Igreja Católica, doutor em Teologia e catedrático, não tinha nenhuma intenção de fundar uma nova Igreja. Sua preocupação era chamar a atenção de seus superiores para os erros doutrinários que eles vinham cometendo e reformar internamente a sua Igreja. Queria uma Igreja que voltasse à verdade bíblica e seguisse os fundamentos da Igreja Cristã Primitiva e à mensagem salvadora de Jesus Cristo, pregando o amor e perdoando o próximo. Também não era sua intenção fundar uma Igreja com seu nome. Quanto a isso, ele mesmo diz, em 1522, na exortação contra tumulto e rebelião: Peço que deixem de lado o meu nome e não se chamem luteranos, mas cristãos. O que é Lutero? Pois não é minha doutrina, tampouco fui crucificado por quem quer que seja. São Paulo não admitia que os cristãos se chamassem paulinos ou petrinos, mas cristãos. Como poderia eu, miserável saco de vermes, encorajar os filhos de Cristo a chamarem-se pelo meu nome amaldiçoado? Não, meus amigos, vamos acabar com os nomes de partidos e chamar-nos cristãos, pois é de Cristo a nossa doutrina. Os papistas, sim, têm nome de partido, com toda a razão, pois não se contentam com a doutrina e o nome de Cristo. Querem ser papistas também. Pois deixe-os serem do papa, que é mestre deles. Eu não sou nem pretendo ser mestre. Compartilho, com a comunidade cristã, a única doutrina comum de Cristo, que é somente ele – o Mestre. (LUTERO, 1995).

Mesmo não querendo dividir a Igreja, isso acabou acontecendo. Os líderes da Igreja Católica Romana do século XVI achavam que ela nunca poderia errar. Por conseguinte, concluíram que Lutero devia ser um falso mestre e não lhe deram ouvidos. Seus inimigos espalharam mentiras acerca dele, o papa o excomungou e, pelo Edito de Worms, o imperador Carlos V declarou-o proscrito. Fora da própria Igreja, Lutero só viu uma maneira de continuar com a Reforma: criar uma nova comunidade religiosa. Hoje, a Igreja Luterana encontra-se espalhada por todos os cinco continentes. Espalhou-se pela Europa, caminhou para os Estados Unidos e mais tarde para outros países, chegando à América Latina e ao Brasil no final do século XIX. No Brasil, encontramos duas denominações luteranas. A Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB) e a Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB). São igrejas com poucas diferenças teológicas. Estão separadas porque surgiram de missões diferentes. A IECLB é resultado da fusão de alguns sínodos e do trabalho de missionários vindos da Alemanha, em 1824, para atender às necessidades espirituais dos imigrantes. A IELB surgiu com o esforço de missionários mandados pelo Sínodo de Missouri, dos Estados Unidos, em 1900. Apesar de não terem a mesma administração, essas igrejas trabalham juntas em alguns setores, como é o caso da literatura.

A Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB) A Igreja Evangélica Luterana do Brasil é originária do trabalho missionário desenvolvido a partir de 1900 pelo Sínodo Evangélico Luterano de Missouri-Ohio e outros estados, conhecido, desde 1847, como The Lutheran Church – Missouri Synod. Já completou cem anos de trabalho missionário no Brasil. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

117

Wikipédia.

Cultura Religiosa

Wikipédia.

Ulrico Zwinglio.

Este sínodo foi fundado em 1847. Formou-se sob a direção do pastor Carl Ferdinand Wilhelm Walther, que, em 1838, havia emigrado da Alemanha para os Estados Unidos por razões de consciência. Em 1817, o rei da Prússia, Frederico Guilherme III, no intuito de pôr fim ao que definia como querela religiosa, decretara a união da Igreja Luterana com a Igreja Reformada, fundada por Zwinglio e Calvino, formando a Igreja Evangélica Unida. Muitos luteranos, revoltados com essa ingerência do trono na vida da Igreja e inconformados com a teologia racionalista que lhe dava sustentação, decidiram abandonar a pátria e emigrar para os Estados Unidos. Aí esperavam desfrutar da liberdade de consciência e culto, privilégios garantidos pela constituição democrática daquele país. Unidos, grupos de imigrantes luteranos formaram a Igreja Luterana – Sínodo de Missouri, com a qual a IELB hoje se identifica.

João Calvino.

O trabalho no Brasil começou com uma resolução em fins de abril de 1899, na convenção daquele sínodo. Uma das moções recomendava o início da missão daquele sínodo na América do Sul, especialmente no Brasil e na Argentina. Alguns anos antes, um pastor que já estava no Brasil escreveu para os luteranos nos Estados Unidos, pedindo ajuda. Era o pastor Johann F. Brutschin, enviado ao Brasil em 1867. O navio em que estava naufragou na costa do Rio Grande do Sul. Os passageiros se salvaram, perdendo, no entanto, toda a bagagem. Brutschin primeiro serviu como pastor assistente em São Leopoldo/RS. Em 1868, tornou-se pastor da paróquia de Dois Irmãos/RS. Também chegou a ser membro da diretoria do Sínodo Rio-grandense, que reunia imigrantes evangélicos alemães. Este sínodo, mais tarde, reuniu-se com outros grupos sinodais para formar a atual Igreja Evangélica de Confissão Luterana do Brasil (IECLB). Mas o desejo de um sínodo levou Brutschin a desligar-se do Sínodo Rio-grandense. Mais tarde – por meio de correspondência à revista oficial do Sínodo de Missouri, Der Lutheraner – ele descobriu e gostou da posição doutrinária expressa nos textos, pedindo, assim, filiação àquela denominação. O primeiro missionário enviado ao Brasil foi o pastor C. J. Broders, com um bom currículo, inclusive com passagem como capelão do exército americano na guerra contra a Espanha, trabalhando em Cuba. No Brasil, depois de muita pesquisa, esse pastor descobriu que na colônia de São Pedro, no Rio Grande do Sul, havia várias famílias desejosas de fundar uma congregação luterana. Broders rumou a São Pedro, fundando ali a primeira congregação missuriana no Brasil, denominada Comunidade Evangélica Luterana São João. O primeiro núcleo congregacional foi organizado em 1.º de julho de 1900, com 17 famílias. Aos poucos, foram surgindo novas congregações e pontos de missão. O trabalho foi crescendo graças à presença de imigrantes alemães, que solicitavam

118

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

A Igreja Luterana e a Educação

atendimento de pastores evangélicos – a mesma doutrina espiritual deixada para trás no país de origem. No dia 24 de junho de 1904, foi fundado oficialmente o 15.º Distrito do Sínodo de Missouri, hoje Igreja Evangélica Luterana do Brasil. Até aquela data, este sínodo já atuava em três áreas no Rio Grande do Sul: no sul, com as congregações de São Pedro, Santa Eulália, Santa Coleta, Bom Jesus e Morro Redondo; em Porto Alegre, com as congregações de Estância Velha, São Leopoldo e Dois Irmãos; no centro-oeste, com as congregações de Jaguari, Rincão dos Vales e Rincão São Pedro. Graças a esse trabalho, hoje a Igreja Evangélica Luterana do Brasil tem comunidades espalhadas por todo o país e algumas missões no exterior. É uma Igreja independente administrativamente. Sua administração central fica em Porto Alegre. Possui um seminário para a formação teológica de seus pastores: em São Leopoldo/RS, hoje ligado à Universidade Luterana do Brasil. As decisões da Igreja são tomadas em convenção nacional com os seus pastores e os representantes das congregações.

Principais doutrinas da IELB A IELB é um conjunto de cristãos que confessa o nome de Cristo conforme o claro ensino da Bíblia. Essa Igreja afirma que a Sagrada Escritura é a palavra de Deus. Palavra verdadeira e infalível; clara, simples e completa. Tudo o que Deus queria que os homens conhecessem para a sua salvação está escrito na Bíblia. Não há necessidade de novas revelações. Por isso, a Escritura é a única fonte e norma para todos os ensinos da Igreja Cristã. As doutrinas básicas da Igreja Evangélica Luterana são as seguintes:

Deus A igreja crê, ensina e confessa que o conhecimento natural que o Homem possui a respeito de Deus é imperfeito e insuficiente para a sua salvação. Conhecimento correto e salvífico o Homem adquire somente pela Escritura Sagrada, na qual Deus se revela como o Deus verdadeiro: Pai, Filho e Espírito Santo. Assim ele se revelou e quer ser adorado. Qualquer outro culto é idolatria e abominação ao Senhor (Romanos 1.19-20; 2.14-15; Deuteronômio 6.4; Mateus 28.19; João 5.23; 1Coríntios 8.4-8).

Homem A Igreja crê, ensina e confessa que o Homem foi criado por Deus conforme a imagem divina, a qual consistia em bem-aventurado conhecimento de Deus, perfeita justiça e santidade. Esta imagem se perdeu com a queda em pecado. Agora, o Homem nasce com o pecado original, isto é, o pecado que herdamos de Adão, a completa corrupção de toda a natureza humana, privada da justiça original, inclinada para todo o mal e sujeita à condenação (Gênesis 1.17, 2.7, 3.1-16; Salmo 51.5-12; Romanos 5.12; Salmo 143.3; Isaías 64.6). Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

119

Cultura Religiosa

Pecado A Igreja crê, ensina e confessa que toda e qualquer transgressão da santa lei de Deus é pecado. Cada pensamento, palavra ou ato contrário à vontade de Deus é pecado. O pecado é a causa de toda a miséria neste mundo. O Homem é responsável diante de Deus e terá de prestar contas de sua vida, sendo que Deus julgará a todos (Ezequiel 18.23-30; Romanos 8.7; 1João 3.4; Gênesis 8.4; Hebreus 9.27; Romanos 6.23).

Evangelho A Igreja crê, ensina e confessa que Deus, em seu infinito amor, não abandonou os homens em sua ruína, mas resolveu salvá-los pela obediência, paixão e morte de seu Filho unigênito, Jesus Cristo. O Evangelho é a boa notícia dessa salvação. Nele, Deus oferece perdão dos pecados, vida e salvação a todos os homens. Todo o pecador arrependido que confia nas promessas do Evangelho tem o que estas palavras lhe dizem e prometem: “perdão dos pecados, vida e eterna salvação” (João 3.16; Romanos 1.16; Gálatas 3.5; 2Coríntios 5.19).

Salvador A Igreja crê, ensina e confessa que Jesus Cristo é verdadeiro Deus e verdadeiro Homem. Como Filho de Deus, gerado do Pai desde a eternidade, é, em todos os sentidos, igual ao Pai e ao Espírito Santo. Como verdadeiro Homem, nasceu da Virgem Maria. Nasceu sem pecado e é, em todos os sentidos, verdadeiro homem. Como nosso substituto, cumpriu a lei de Deus, padeceu por nossos pecados e, por seu sacrifício e morte, consumou a obra de reconciliação. Desceu ao inferno para mostrar sua vitória sobre todos os nossos inimigos. Pela ressurreição dos mortos, Deus declarou ter aceito o sacrifício de Jesus. Jesus Cristo é o único Salvador da humanidade. Fora dele, não há salvação. Jesus voltará, visível ao mundo para julgar os vivos e os mortos (João 1.1; Mateus 1.18-25; 1Pedro 2.22; 2Coríntios 5.19; 1João 2.2; Colossenses 2.15; Romano 1.14; Atos 10.42).

Conversão A Igreja crê, ensina e confessa que a conversão de um pecador compreende contrição e fé. A conversão não é mera reforma moral ou a resolução solene de corrigir a vida, mas é a completa mudança de toda a vida do Homem, é o renascimento espiritual do pecador, é uma transformação milagrosa, efetuada pelo poder do Espírito Santo e operada pelos meios da graça: a palavra de Deus e os sacramentos. Sendo espiritualmente cego, morto e inimigo de Deus, o Homem não se inclina a Deus nem pode se dispor à graça ou aceitá-la. Por isso, a conversão é um ato exclusivo de Deus, no qual o Homem pode resistir. A Bíblia lembra que o Homem é salvo unicamente pela graça de Deus mediante a fé em Cristo e que Deus quer a salvação de todos. O que é salvo, é salvo pela graça. O que se perde, perde-se por culpa própria (Jeremias 31.18; João 1.12-13; Romanos 10.17; Atos 11.21; Efésios 2.1-5).

Fé A Igreja crê, ensina e confessa que a fé salvadora não é simples assentimento aos ensinos da Escritura, mas é a confiança de um pecador arrependido no perdão 120

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

A Igreja Luterana e a Educação

de Cristo. Tal fé não é um ato de obediência ou decisão da vontade humana, mas um ato da graça divina. Mesmo sendo um ato divino, não é o Espírito Santo quem crê em nós. Nós é que cremos. A pessoa que não tiver esta confiança em Cristo não pode ser salva; permanece sob a escravidão de Satanás, sob a ira divina e caminha para a condenação infernal. Aquele que está em Cristo é nova criatura e busca, sob a ação do Espírito Santo, estreita comunhão com o Salvador. Por contrição e arrependimento diários, afoga as inclinações pecaminosas de sua carne e, pela graça de Cristo, erguese diariamente para uma nova vida com Jesus. Luta diariamente com muitas fraquezas, mas busca a perfeição em Cristo, a qual gozará na eternidade em toda a sua plenitude (Tiago 2.19; Isaías 55.6-7; Marcos 1.15; João 1.12; 1Coríntios 12.2; Romanos 10.7; Atos 16.31; João 3.36; Filipenses 3.14; Efécios 4.15-16; Romanos 12.1-3).

Ministério A Igreja crê, ensina e confessa que o ministério pastoral é um ofício ordenado por Deus para administrar publicamente a palavra de Deus e os sacramentos. Os ministros não constituem uma classe especial de pessoas, como os sacerdotes do Antigo Testamento. Sendo todos os cristãos sacerdotes reais, ninguém tem o direito de se sobrepor aos outros. Por isso, só o chamado de uma comunidade torna alguém um ministro. O ministro exerce publicamente as funções que todos os cristãos exercem em particular (Atos 6.2; 1Pedro 2.9; Tito 1.5-7; Atos 20.17-28; 1Coríntios 14.34-40; 1Timóteo 2.11).

Batismo A Igreja crê, ensina e confessa que o sacramento do santo batismo foi ordenado por Jesus como meio da graça pelo qual o Espírito Santo opera a remissão dos pecados, livra da morte e dá a vida eterna a quantos crêem. Pelo batismo, as crianças recebem a fé e se tornam filhos de Deus; aos adultos, o batismo sela o perdão dos pecados. Enquanto alguém permanece na fé, desfruta das bênçãos do batismo. O batismo deve ser administrado uma vez só, em nome do Deus Triúno: Pai, Filho e Espírito Santo (Mateus 28.19; Tito 3.5; Marcos 10.14; Marcos 7.4, 16.16; Atos 22.16).

Santa Ceia A Igreja crê, ensina e confessa que na Santa Ceia o Senhor Jesus Cristo, de acordo com sua palavra, nos dá o seu corpo e sangue para remissão dos pecados. Os elementos materiais, pão e vinho, não se transformam em corpo e sangue. Mas por ordem e promessa de Deus, recebemos na Santa Ceia, com e sob o pão e o vinho, o verdadeiro corpo e sangue de Cristo. Os que crêem, o recebem para fortalecimento de sua fé. Os que participam sem arrependimento e fé, recebem igualmente o verdadeiro corpo e sangue de Cristo, mas para juízo. A Santa Ceia é a mesa do Senhor, na qual recebemos conforto e consolo. Ela nos dá o perdão dos pecados e nos fortalece na esperança da ressurreição (Mateus 26.26-28; Marcos 14.24; 1Coríntios 11.24-29). Por fim, a Igreja crê, confessa e ensina que Deus determinou um dia no qual julgará o mundo com justiça, mas ninguém sabe quando será. Nesse dia, Jesus voltará visível e glorioso. Céu e Terra se desfarão. Todos os mortos ressuscitarão. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

121

Cultura Religiosa

Todos serão julgados por Jesus. Aos incrédulos, Jesus dirá: “apartai-vos de mim, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus seguidores”. Aos fiéis, que terão um corpo glorioso, dirá: “vinde, benditos de meu Pai, e entrai no gozo de vosso Senhor que vos está preparado desde a fundação do mundo”. Então serão criados os novos céus e a nova terra, nos quais habitará a justiça (João 5.28-29; Atos 10. 42; 1Coríntios 15.51-52; Romanos 8.18; Mateus 10.28; Isaías 66.24; Jó 19.25-27; Mateus 26.31-46; 2Pedro 3.10-13; Apocalipse 21.1-8.).

A Universidade Luterana do Brasil (Ulbra) Em janeiro de 1988, o Presidente da República, senhor José Sarney, autorizou pelo Decreto 95.623 a criação da Universidade Luterana do Brasil, a partir das Faculdades Canoenses, pela via da autorização. A idéia de fundar uma universidade luterana era antiga. Na assembléia geral extraordinária de 13 de agosto de 1972, o então presidente da Igreja Evangélica Luterana do Brasil, pastor Elmer Reimnitz, que havia sido pastor da Comunidade Evangélica Luterana “São Paulo”, de Canoas, de 1954 a 1962, apresentou à Comunidade um plano de criação de diversas faculdades, que resultariam em uma universidade luterana. Este empreendimento seria uma ação conjunta entre a IELB e a Celsp. Só que a idéia não foi levada adiante. O pastor Ruben Becker, com muita luta, conseguiu levar o projeto adiante a partir das escolas de primeiro e segundo graus. A universidade é fruto da Reforma, das missões vindas ao Brasil e da Comunidade Evangélica Luterana São Paulo, de Canoas/RS, vinculada à Igreja Evangélica Luterana do Brasil. Neste contexto todo, encontramo-nos hoje. O papel da universidade é de responsabilidade perante a sociedade. Foi possível observar que Lutero via a educação como serviço que pais e autoridades, pastores e mestres prestam a Deus. Educar as novas gerações é cooperar, voluntariamente ou não, com o regime ou governo secular de Deus sobre o mundo. Educá-los cristamente é, ademais, participar voluntária e espontaneamente no governo espiritual de Deus, que visa à redenção da humanidade. A diferença da educação cristã é que nela existe a esperança de uma renovação da sociedade humana pelo amor decorrente da fé. A universidade luterana, de certa maneira, precisa recuperar a ética do amor e da solidariedade cristã. A filosofia de trabalho que tem orientado a atuação da comunidade se acha muito bem expressa nos estatutos da Fundação Luterana. De acordo com os artigos 8.º e 9.º, que tratam, respectivamente, do fundamento doutrinário e das finalidades, todo o trabalho é regido pela doutrina luterana, que se fundamenta nos livros canônicos da Escritura Sagrada e se acha exposta nos documentos confessionais da Igreja Evangélica Luterana, reunidos no Livro de Concórdia, de 1580.

122

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

A Igreja Luterana e a Educação

A Fundação tem por finalidade a educação em todos os níveis, graus e áreas, o aprimoramento e divulgação da cultura brasileira, a expansão da pesquisa nos domínios da ciência e da técnica, a comunicação social, a promoção do bem-estar social, a divulgação da mensagem cristã. A universidade deve ser o campo de ensaio de novas formas de convívio social em termos de liberdade, respeito mútuo e cooperação. Deve ser uma alavanca para o desenvolvimento, tanto da região como do país. Deve ser um mercado de soluções para problemas que afligem a sociedade em nosso tempo. Entre os objetivos da Ulbra, podemos citar, nos termos da Lei 5.540/68, a pesquisa, o desenvolvimento das ciências, das letras e das artes, a formação de profissionais de nível universitário, bem como a difusão e a preservação da cultura. A universidade é, ela própria, expressão e repositório de cultura. Na formação cristã do aluno, ela procurará habilitá-lo à compreensão de si mesmo e do mundo, à atuação responsável na sociedade, ao trabalho como forma de realização pessoal e como meio de produção dos bens necessários à vida e ao lazer, como fruto da livre expressão do ser humano. Quanto ao saber científico, a universidade tem por alvo reunir, selecionar, organizar e testar todo o conhecimento que possa ter significado para a vida em sociedade. Visto ser o conhecimento relativo à experiência que lhe deu origem, a universidade procura relacionar o saber científico com as condições originárias, com vistas a revisá-lo, sempre que possível, mediante processos experimentais. Esta Universidade busca seguir a proposta educacional de Lutero e, com muita seriedade, quer encontrar alternativas para educar bem o cidadão. A disciplina de Cultura Religiosa cumpre a função de mostrar um caminho mais seguro para a vida em sociedade e de definir o perfil de comportamento ético àqueles que aqui se formam. A idéia é preparar educadores e líderes capazes de, futuramente, conduzir outros com a mesma segurança. Lutero sabia muito bem qual o ser humano que importa formar: o cristão que é livre de tudo e de todos pela fé em Deus, mas que, por isso mesmo, é servo de todos pelo amor. Tendo abraçado pela fé o Deus que é amor e como amor se revela em Jesus Cristo, o ser humano é transformado à imagem deste Deus e não pode senão tornar-se um ser amoroso, que ama, generosa e gratuitamente, assim como é amado. Da mesma forma, a educação se faz no contexto da ética do amor. Por fim, podemos dizer que o papel da Universidade é colaborar com a sociedade na formação de homens sensatos, ajuizados e excelentes, munidos de conhecimento e experiência. Como disse Lutero: Deus proveu o seu povo com riqueza de artes, pessoas doutas e livres. É hora de aproveitar tudo isso, ceifar e recolher o melhor que pudermos e de ajuntar tesouros, para preservar algo para o futuro destes anos dourados. (LUTERO, 1995, . 324).

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

123

Cultura Religiosa

1.

Para você, qual é a importância das escolas confessionais na formação de crianças e jovens?

2.

Como você analisa o sistema educacional proposto por Lutero, para os nossos dias?

3.

Como você vê a posição de Lutero em querer que a nova Igreja não usasse o seu nome para identificar os fiéis?

Busquem na internet sites denominados Luteranos e identifiquem a relação com a presença dessas denominações no país e a Reforma Luterana do século XVI. Sugestões: www.ulbra.br www.ielb.com.br

Se você fosse um educador, qual idéia de Lutero usaria para qualificar as escolas brasileiras? 124

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Questões fundamentais de Ética

É

necessário entender Ética, uma palavra muito usada nos dias de hoje, mas pouco praticada.

Com a finalidade de entendermos as questões fundamentais de Ética Aplicada veremos, num primeiro momento, as bases antropológicas da Ética; definição e objetivos da Ética; e os aspectos que distinguem a Ética Social da Ética Religiosa.

Questões básicas Bases antropológicas da Ética Como a Ética está voltada exclusivamente ao ser humano, vamos ver quais os primeiros problemas encontrados em conseqüência da diversidade. Ética é um problema exclusivamente antropológico porque somente o ser humano tem a necessidade de tomar decisões éticas, visto que suas ações, na relação com a natureza e a sociedade, não são neutras, mas sempre possuem reflexos que podem ser positivos ou negativos, benéficos ou maléficos, certos ou errados. Assim, veremos algumas características principais do ser humano que têm vinculação direta com suas decisões e ações éticas: cada ser humano é uma pessoa, isto é, um indivíduo, um ser único, diferente de qualquer outro, e isso vem a ser uma grande dificuldade para entendê-lo. Nisso está o problema central de todas as questões éticas; o ser humano é racional, pensa por si próprio e de maneira autônoma. Por isso, não pensa segundo padrões preestabelecidos, mas de acordo com suas próprias idéias. A estrutura racional do ser humano está subdividida em três aspectos básicos: a) cognitivo, ou seja, ele realiza aprendizados: o Homem não nasce sabendo, mas precisa aprender tudo na vida, inclusive a viver de modo ético; b) volitivo, ou seja, cada ser humano tem uma vontade própria, pois há no íntimo de cada pessoa um núcleo exclusivamente seu que o determina a agir dessa ou daquela maneira, segundo suas próprias motivações ou interesses; c) afetivo, ou seja, há em cada ser humano sentimentos e sensibilidade próprios. O sentir é universal, mas a forma de sentir é única e especial em cada indivíduo. Os sentimentos humanos são muito complexos e variam de pessoa para pessoa, o que torna as questões éticas muito difíceis de serem entendidas e solucionadas. (HAAG, 2000, p. 190-191).

Por outro lado, há uma teleologia em todas as ações humanas; tudo é feito visando um determinado fim, que pode ser consciente ou inconsciente. Mesmo podendo estar equivocado, cada ser humano, ao agir, pensa que está fazendo o melhor possível. O que vale para a Ética é a consciência social, e não o que o indivíduo pensa ser bom apenas para si.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Cultura Religiosa

O ser humano é egocêntrico; cada um tem o seu “eu”, que lhe dá as características pessoais. Contudo, cada ser humano, a partir do seu “eu”, torna-se um egoísta, ou seja, sempre pensa, em primeiro lugar, em si, buscando a satisfação de seus próprios interesses e necessidades, não abrindo mão de nada que julga ser seu e não dando a mínima importância às necessidades alheias. O egoísmo é a mola propulsora de todos os problemas éticos. O ser humano é também um ser social. Precisa de outros para viver e conviver. Ele é um ser de pluralidade. Ao mesmo tempo em que é uma pessoa individual, é também um ser de relações sociais. Os problemas éticos surgem a partir do momento em que o indivíduo não supera seus egoísmos e vaidades, fazendo prevalecer os interesses pessoais em detrimento dos da coletividade. Diante dessas características, o homem é o único ser que tem a necessidade de equilibrar suas relações com o outro e com a natureza, determinando normas de convivência para dar parâmetros à conduta, o que se denomina moral. Aqui parte-se do pressuposto de que o Homem é um ser surpreendente, extraordinário, porém, contraditório. Distingue-se dos animais por sua faculdade racional. Isto pode ser visto como uma vantagem, mas, por outro lado, apresenta uma grande desvantagem. Com a razão, o Homem está aberto para infinitas possibilidades, mas também está condicionado a limites muito estreitos. Com a razão, o Homem abre-se ao conhecimento de uma variedade muito grande de conteúdos, mas não pode conhecer todas as coisas e nem sempre conhece suficientemente a si mesmo e aos outros. Com a razão, busca o infinito, mas está rigorosamente limitado ao seu mundo finito. A Ética parte dessas tensões humanas e busca uma solução para as mesmas. Contudo, por ser humana, a Ética necessita conviver com as contingências e precariedades da vida humana, mas sempre se esforçando para superá-las e resolvê-las. (HAAG, 2000, p. 192).

Conceito de Ética A partir do que foi visto anteriormente, podemos chegar a algumas definições de Ética. Vejamos três apresentas pelo professor Nereu: 1.° a Ética pode ser definida como um saber íntimo e aprofundado dos princípios que orientam a conduta das pessoas de uma coletividade, de acordo com as normas morais vigentes, com o objetivo de alcançar o bem comum; 2.° a Ética tem como objetivo despertar a consciência de cada ser humano para que suas ações visem ao bem comum. Ele deve buscar um convívio estável, equilibrado e de mútua aceitação, tendo como base os princípios sociais e os valores espirituais. Por isso, cada pessoa precisa saber quais são as ações que, de fato, são boas ou más, certas ou erradas; 3.° para que isso se efetive, a pessoa precisa aprender a tomar decisões segundo uma consciência ética bem orientada, ou seja, precisa ter um conhecimento mais profundo das ações que são moralmente válidas e socialmente corretas. Por isso, a Ética não é normativa, mas pedagógica ou educativa. (HAAG, 2000, p. 192-193).

Podemos dizer aqui que Ética e Moral têm sentidos distintos. A Moral se relaciona com as ações do indivíduo, com a conduta real, enquanto a Ética é formada por princípios ou juízos que originam essas ações. A Ética faz a avaliação teórica da Moral dos indivíduos, ocupando-se com tudo o que é consi126

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Questões fundamentais de Ética

derado moralmente bom. Ela estuda o modo como os indivíduos se relacionam moralmente na sociedade. Portanto, a Ética se ocupa com o estudo dos fins da moral do homem no meio de seu contexto social. Ela analisa, por exemplo, se um homem, ao agir moralmente, agiu bem ou mal diante dos demais semelhantes, tendo como referência os valores do contexto social (religiosos, filosóficos, entre outros). A ética tem o compromisso de ser, acima de tudo, humana. Eis, porque, via de regra, ela se identifica com o humanismo, que, como expressa o termo, centraliza-se no Homem e busca sua afirmação. O humanismo se subdivide em dois ramos principais: o natural e o cristão. O primeiro parte do pressuposto de que ele é um ser imanente à natureza e ao mundo, e por isso, sua afirmação se dará a partir do desenvolvimento de suas capacidades e potencialidades naturais, ou seja, humanas (racionais) e sociais (políticas). O segundo considera que ele é um ser que transcende ao mundo e, por isso, sua afirmação está na relação com Deus através de Cristo e seu Evangelho. A partir daí, o Homem deverá desenvolver seus dons espirituais mediante os quais efetivará os ideais éticos que se identificam com a esperança e a fé numa vida eterna após a morte. (HAAG, 2000, p. 193).

Ética Social e Ética Religiosa Como nossa disciplina é Cultura Religiosa, vamos naturalmente fazer uma distinção entre Ética Social e Religiosa. Até porque entendemos que a Ética Religiosa oferece ótimos subsídios para as relações humanas saudáveis. Pode-se dizer que a Ética Social distingue-se da Ética Religiosa em três aspectos fundamentais, quanto ao que cada uma delas coloca como pressuposto. Primeiro os princípios: na Ética Social, os princípios que fundamentam a ação do indivíduo são extraídos da própria convivência humana, a partir das idéias filosóficas que traduzem os anseios e as expectativas da sociedade. Por isso, diz-se que é uma Ética situacionista, razão porque estes princípios são flexíveis e se adaptam às mudanças históricas. Na Ética Religiosa, os princípios que orientam a conduta da pessoa são extraídos das doutrinas que fundamentam a religião, sendo, portanto, uma ética perenealista e não-situacionista, razão porque seus princípios são mais rígidos e dificilmente admitem mudanças históricas. (HAAG, 2000, p. 194).

Em segundo lugar, distingue-se quanto aos meios: para efetivar seus princípios, os meios de que a Ética Social dispõe estão baseados no próprio sistema cultural, sobre o qual atuam as mais diversas instituições sociais, como as famílias, as escolas, as igrejas, as empresas, os meios de comunicação, os partidos políticos etc., onde cada uma dessas instituições tem seus interesses e ideologias. Já a religião, para efetivar seus princípios doutrinários, dispõe do que está fundamentado na lei moral divina, buscando, a partir dela, determinar o que é o melhor para a sociedade humana. (HAAG, 2000, p. 194).

Em terceiro lugar, distingue-se quanto aos fins: a finalidade última da Ética Social é atingir o bem comum, ou seja, aquilo que é o melhor para toda a sociedade. Por isso, ela é uma ética imanente, ou seja, restrita aos limites humanos, temporais e sociais. A ética religiosa tem como fim último atingir o bem maior que existe, o bem supremo, Deus, que, para a religião, é princípio e fim de toda a existência do Homem e do mundo. Por isso, ela é uma ética transcendente, isto é, projeta o Homem para além deste mundo material, buscando um sentido eterno para sua vida. (HAAG, 2000, p. 194). Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

127

Cultura Religiosa

O fundamento da Ética Religiosa Se a característica mais importante que fundamenta a Ética Social é a liberdade, o princípio mais importante que fundamenta a Ética Cristã é o amor. Mas o amor é um termo muito mal-entendido e usado erroneamente muitas vezes. As pessoas têm dificuldade de definir a palavra amor. Isso porque ela possui vários sentidos. Vamos definir aqui qual o tipo de amor que realmente serve para fundamentar a ética cristã. As definições a seguir são extraídas do grego. No Novo Testamento, a palavra amor aparece de três formas distintas: A primeira definição está na palavra eros: eros, do qual se derivou o termo português erótico (amor sexual). Essa forma de amor é marcada por atração e intimidade física, e está sujeita às instabilidades emotivas das pessoas, pois manifesta-se através de paixões, às vezes, incontroláveis. Por isso, o amor meramente erótico tem se tornado uma forma de amor bestial e desumano, na qual o parceiro sexual não passa de um objeto de prazer egoísta. O amor eros, sem dúvida nenhuma, nunca poderá ser o fundamento da ética cristã, mas infelizmente é tolerado na ética social. (HAAG, 2000, p. 195).

A segunda definição nós encontramos no termo filos: filos, do qual temos em português o termo filantropia (caridade). O amor de tipo filos é aquele que se dá entre pais e filhos, irmãos e irmãs, e entre parentes ou pessoas unidas por laços afetivos sem que entre elas exista relação sexual (amor eros). Contudo, o amor filos está sujeito ao egoísmo humano, pois “amamos” preferencialmente as pessoas que nos são afetivamente mais íntimas e excluímos as demais. Assim, este também não serve de fundamento para a ética cristã. (HAAG, 2000, p. 195).

E a terceira definição, para nós a mais importante, está representada pela palavra ágape: ágape é uma forma toda especial de amor, que transcende aos dois tipos anteriores e aponta para o amor divino (amor de Deus), que naturalmente não se encontra no ser humano a não ser que tenha sido comunicado ao homem da parte de Deus pelo vínculo da fé. Ao receber Dele esse amor, o homem passa a estar apto a relacionar-se como seu semelhante. O amor ágape tem como característica uma forma de amor na qual as pessoas estabelecem entre si uma relação de intimidade espiritual, ou seja, amam-se sem qualquer busca de interesse ou vantagem pessoal, mas buscando o bem da pessoa amada. Por isso, o amor ágape é aquela forma de amor em que o perdão está acima de tudo, e se é capaz de aceitar aqueles com quem não simpatizamos. Essa forma de amor foi magistralmente sintetizada por Cristo quando, na cruz, perdoou a seus algozes orando a Deus, dizendo: “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”; ou quando Cristo ensinou uma prática ética na qual afirma: “se te baterem numa face, oferece também a outra”. Tudo isso Cristo sintetizou na expressão: “Amai-vos uns aos outros como eu vos amei”. (HAAG, 2000, p. 196).

Sabemos que o amor ágape não é fácil de ser entendido e, menos ainda, de ser praticado. Olhe para você e imagine-se praticando este tipo de amor. Busque situações concretas na sua vida, em que o perdão foi necessário, e você teve dificuldades para praticá-lo. Essa forma de amor é a única válida para a fundamentação da ética cristã. Quando trabalharmos a questão ética, buscaremos sempre esta definição de amor para fundamentar nossas ações. O primeiro passo para avaliarmos com clareza se o nosso procedimento moral é correto é buscar entender a Ética. Mas não só entender. Precisamos usar 128

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Questões fundamentais de Ética

a ética como instrumento de avaliação da moral. Não existem normas definidas para isso. Lembre que neste sentido a ética é educativa, é pedagógica.

1.

Você consegue distinguir Ética de Moral? Como?

2.

Suas ações morais são sempre éticas? Explique.

3.

Como você avalia a Ética fundamentada no amor ágape?

Para estudo sugiro uma atividade prática. Uma análise mais aprofundada das nossas ações morais e o que nos leva a proceder dessa ou daquela maneira. Dica de leitura: FORELL, George W. Ética da decisão. São Leopoldo: Sinodal, 1983.

A partir da leitura do texto, como a idéia de que o egoísmo é a mola propulsora de todos os problemas éticos pode levar você a uma mudança de ação?

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

129

Cultura Religiosa

130

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Princípios de Ética

Q

ueremos, nesta aula, fazer mais algumas reflexões sobre ética, buscando subsídios para entender o assunto. Pela diversidade do pensamento humano, também é difícil chegar a conclusões definitivas sobre ética, por isso, a reflexão e a introspecção são fatores importantes. O que podemos fazer para transformar a sociedade? De quem é a responsabilidade de estabelecer um convívio estável?

Algumas questões A mentira é sempre errada? Quando eu desejo fazer algo, mas a sociedade diz que está errado, como posso decidir o que fazer? Por que é errado tentar uma expansão da consciência por meio das drogas, por exemplo? Quem realmente possui a autoridade para estabelecer o que é certo e errado? É a consciência individual um guia seguro para a vida? É o ato egoísta, embora repleto de satisfação pessoal, que determina o que é certo e errado? Os valores são relativos ou absolutos? (HONER, 1973, p. 100).

Ética – algumas reflexões de ordem geral Cada religião, à sua maneira, segue o que denominamos de filosofia de vida, os princípios ideais que normatizam o seu modo específico de pensar. Por vezes, no entanto, parece difícil conciliar os ideais com a realidade. No campo religioso, o problema assume proporções ainda maiores, pois somos inclinados a pensar que tanto o movimento religioso como seus seguidores são perfeitos e não se desviam nunca de sua pregação. Não raro, para indicar nossa indignação, usamos expressões como: isso é uma imoralidade! Ou isso é antiético!

Ética e Moral As palavras ética e moral, embora usadas indiferentemente, possuem significados distintos. A moral se relaciona às ações, isto é, à conduta real. A ética são os princípios ou juízos que originam essas ações. Nessa dimensão, a ética e a moral são como a teoria e a prática. A ética é a teoria moral ou a filosofia moral.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Cultura Religiosa Todo mundo tem uma moral, pois todos praticam ações que podem ser examinadas eticamente. Mas nem todo mundo já levou em consideração a ética. (HELLERN; NOTAKER; GAARDNER, 2000).

Ética descritiva e ética normativa A ética descritiva retrata as noções éticas predominantes nas diversas culturas. Utiliza métodos científicos fundamentados na objetividade, sem julgar o que é certo e errado no que foi observado. Normalmente a ética descritiva pode ser observada nas pesquisas de opinião que são feitas com as pessoas no intuito de identificar seus pontos de vista sobre assuntos como sexualidade, aborto, impostos, roubos, violência e outros.

Perigo: a ética descritiva pode gerar uma “moralidade estatística”, ou seja, a noção de que aquilo que a maioria faz deve estar certo. A ética normativa procura mostrar quais ações são certas e quais são eticamente inaceitáveis. Ela repousa sobre determinados valores e fornece normas para as ações. Sua busca não é pelo que é, mas pelo que deve ser. Nesse sentido, os Dez Mandamentos são um exemplo de ética normativa.

Valores Quais valores fornecem as normas para nossas ações? Qual valor é mais importante para cada um de nós? Dinheiro? Carro? Lazer? Saúde? Liberdade? Amizade? Amor? Não esquecer: alguns valores são apenas meios para se alcançar outros valores. Considere como exemplo o dinheiro: ele não tem valor intrínseco, mas pode ser usado para se obter alguma outra coisa. Fato 1: ao tomarmos nossas decisões cotidianamente, estamos sempre priorizando valores, mesmo sem ter consciência. Fato 2: ao priorizar valores, é comum que nossos interesses entrem em conflito com interesses alheios. Nossa boa sorte não pode ser o infortúnio alheio. O ato de se preocupar apenas com a própria sorte é chamado de egoísmo ético.

132

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Princípios de Ética

A natureza dos valores (alternativas teóricas) e a justificação para os julgamentos valorativos (alternativas metódicas) – uma visão filosófica Teoria emotiva Método de justificação: sentimento e envolvimento Os defensores da teoria emotiva, também identificados como subjetivistas, dizem que todos os valores são relativos e individuais. O que determina o que tem ou não algum valor repousa simplesmente no fato do indivíduo gostar ou aprovar alguma coisa. A única justificação para um julgamento valorativo assenta-se em como um indivíduo sente ou o quanto ele envolve-se com uma determinada situação. Dessa forma, diferentes pessoas valorizam diferentes coisas e cada um tem direito a sua opinião. Nesta categoria, enquadram-se tanto os existencialistas quanto os lingüistas, pois defendem a relatividade dos valores individuais. Para a teoria emotiva, a justificativa das ações repousa exclusivamente nos sentimentos pessoais.

Teoria do relativismo cultural Método de justificação: autoridade social Conforme essa perspectiva, o que é certo e errado está determinado pela cultura particular na qual o fato ou a circunstância ocorre. O relativismo cultural justifica, assim, os julgamentos valorativos pelo apelo à autoridade social de uma cultura particular. Assim, o certo e o errado é o que uma determinada sociedade sanciona. Nessa perspectiva, podemos enquadrar Freud (o certo e o errado são idéias que introjetamos a partir da sociedade e de nossos pais), bem como a psicologia comportamentalista ou behaviorista, que condiciona o comportamento dos indivíduos aos valores sociais.

Teoria absolutista Método de justificação: razão e/ou autoridade divina Conforme essa visão (também identificada como objetivista), o que tem valor independe do que o indivíduo gosta ou pensa, bem como independe do que uma sociedade sanciona. Essa perspectiva se opõe ao relativismo. Assevera que as leis morais são universais e eternamente verdadeiras, independentemente de qualquer coisa.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

133

Cultura Religiosa

Nessa perspectiva, enquadra-se a lei moral dos Dez Mandamentos, cujos valores são universais e repousam sobre a autoridade de Deus.

Teoria do relativismo objetivo Método de justificação: evidência empírica O amor é tido como um alto valor; quebrar uma promessa por razões egoístas é considerado errado. Conforme a teoria do relativismo objetivo, o amor é considerado um alto valor não pelo fato de ser uma regra moral absoluta, e a conservação das promessas não é um princípio universal estabelecido pela razão. Para a teoria, o que está em jogo é a produção das melhores conseqüências e satisfação humana a serem obtidas com uma determinada atitude. A teoria é denominada de “relativa” por defender que todos os valores dependem da satisfação humana. Ao mesmo tempo, é considerada “objetiva” por insistir no teste das conseqüências a serem obtidas – a produção do máximo de satisfação. Enquadram-se nessa teoria o utilitarismo, o pragmatismo e as correntes psicológicas defendidas por Erich Fromm, Abraham Maslow e Carl Rogers.

Teoria da escolha racional Método de justificação: escolha livre, imparcial e informada A teoria da escolha racional nega a tese do relativismo cultural, sustentando que um determinado modo de vida é claramente melhor que outro se a escolha for determinada por um processo racional. É verdade que, em última análise, é o indivíduo quem faz a escolha do que é certo e errado a partir do que sente ou prefere. No entanto, o mesmo indivíduo, por ser racional, deve reconhecer que os sentimentos são fidedignos somente se forem livres, imparciais e frutos das informações.

Consciência O Livro das religiões assim se expressa: Consciência é a capacidade que temos de reagir ao certo e ao errado. Podemos dizer que a consciência é um cão-de-guarda normativo. Se infringimos uma de nossas normas, a consciência começa a rosnar. Em casos mais flagrantes, seu peso pode nos derrubar; ou ela pode nos forçar a recuar, modificar nossas ações, pedir desculpas a alguém. (HELLERN; NOTAKER; GAARDNER, 2000, p. 267).

O fato: podemos fugir ou nos esconder de tudo e de todos, mas não de nossa consciência. A problemática:

134

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Princípios de Ética

De onde a consciência vem? Todos têm a mesma consciência? Há, pelo menos, três formas de responder à primeira pergunta. É inata no ser humano: assim pensa o Cristianismo, por exemplo. É imposta pelo ambiente externo: o ser humano é moldado pelas condições culturais externas, como pensam a psicologia e as ciências sociais. É inata no ser humano, mas recebe informações externas: nessa dimensão ela equivaleria a um tribunal. Julga e decide o que é certo e errado a partir de alguma informação externa sobre o que é certo e o que é errado. Ela pune as pessoas quando rompem as normas, mas não determina absolutamente essas normas (STEFFEN, 2002).

O direito positivo e o senso de justiça Toda sociedade se baseia numa determinada ética, manifestada num código de leis. Violar as leis implica na quebra da harmonia social. Ainda assim, podemos observar que nem sempre o que cada um pensa sobre o certo e o errado corresponde às leis sociais. A título de exemplificação, relembremos a questão do aborto, da eutanásia, do pagamento dos impostos, em particular do imposto sobre a renda, do trabalho de menores, da compra de produtos contrabandeados. Ou ainda, de profissionais que se recusam a cumprir determinada função em razão de sua consciência. Relembrar: em 2002, um tratorista baiano, empregado de uma empresa contratada para cumprir mandato judicial que determinava a derrubada de casas erguidas numa área invadida, recusou-se, por questão de consciência pessoal, de mover o trator para cima das mesmas e foi preso em flagrante por desobediência à ordem judicial. (STEFFEN, 2002).

Tecnicamente, denominamos de desobediência civil quando uma pessoa ou um grupo passa a desafiar e infringir o direito positivo (o sistema jurídico acordado) de maneira plenamente intencional (senso de justiça).

Responsabilidade A questão da ética centra-se no senso de responsabilidade: por quem e pelo que nos sentimos responsáveis? A título de reflexão, podemos vislumbrar duas possibilidades, que se completam, de pensar a responsabilidade: responsabilidade individual: o indivíduo é responsável por si e pelo que o rodeia; responsabilidade coletiva: a sociedade é responsável pelas ações que o indivíduo não consegue fazer por si só.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

135

Cultura Religiosa

Perigo: ninguém assumir, nem o indivíduo nem a sociedade, a responsabilidade pelo que está acontecendo. Chama-se esse comportamento de diluição de responsabilidade. Alternativa: assumir mutuamente, indivíduo e sociedade, suas responsabilidades. Chama-se esse comportamento de trabalhar pela solidariedade.

O livre-arbítrio O pressuposto: admitir que as pessoas possuem alternativas entre as quais podem escolher livremente. Há duas correntes que conduzem a discussão do tema: o determinismo: nossas escolhas são determinadas pelos elementos externos, herdados dos pais ou do ambiente no qual vivemos. Nesse caso, a sensação de livre-arbítrio é ilusória. Não raro ouve-se que é preciso pensar a discussão sobre a violência; antes de responsabilizar seus praticantes é preciso mudar as condições econômico-sociais. Há, nesse momento, a discussão sobre a diminuição da idade para responsabilizar judicialmente os praticantes de delitos contra a pessoa e o patrimônio; o indeterminismo: nossas escolhas são fruto de vontade individual. Nos tornamos aquilo que escolhemos ser. Aqui encontramos alguns pontos importantes para reflexão. Até que ponto sou responsável por uma ação moral que passe pela boa avaliação da ética? A verdade é que não podemos esperar pelos outros. As ações partem de nós mesmos. A nossa consciência, com certeza, já está nos perturbando. A ética serve para a vida pessoal do indivíduo e, conseqüentemente, vai ser aplicada na vida profissional. À medida que aguçamos nossa consciência, melhoramos também os nossos relacionamentos.

Uma pausa para coisas do cotidiano que contribuem para uma perspectiva ética Ética e mochila escolar (TIBA, 1998)

É quando o discípulo está pronto que o mestre aparece. É um velho ditado hindu. Muitas vezes o mestre não é uma pessoa, mas um episódio do cotidiano. 136

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Princípios de Ética

A Psicologia Educacional está presente nos pequenos atos, que podem passar despercebidos. Venha comigo observar, à porta de uma escola qualquer, a hora da chegada das crianças com as respectivas mães. Observe: quem carrega a mochila escolar? Na maioria das vezes é a mãe. Essa mãe, por hipersolicitude e num gesto de amor, carrega a mochila do filho para poupá-lo desse esforço. Há mãe exagerada: leva três mochilas nas costas, segura ou carrega o filho menor, enquanto vai cuidando para que os outros filhos não fiquem se matando pelo caminho. E, quando chegam ao portão da escola, o que acontece? O filho foge para dentro da escola e a mãe tem de correr atrás dele para entregar-lhe a mochila e, já com os lábios estendidos, dar-lhe um beijinho de despedida... Por que um filho, nessa despedida, não beija sua mãe? Qualquer ser humano, ao se separar de alguém, pelo menos por educação se despede dele. Os enamorados beijam-se tão demoradamente que é impossível saber se estão se despedindo, “ficando”, ou até mesmo se chegando... Somente quando não usufruímos a companhia é que “saímos de fininho”, isto é, sem nos despedirmos dela. Portanto, se um filho não beija sua mãe é porque não usufruiu prazerosamente sua companhia. Significa também que o filho não reconheceu a ajuda que a mãe lhe deu. Ajudar é muito nobre e um gesto de amor, ao qual mãe nenhuma se furta. Mas, se não ficar claro que a mãe o está ajudando, o filho pode entender que é responsabilidade dela carregar sua mochila. Assim se perpetua que quem vai à escola é ele, mas quem deve carregar a mochila é a mãe. Para que carregar sua mochila se, até então, isso é obrigação da mãe? Essa é uma das melhores maneiras de um filho não adquirir responsabilidade pela própria vida. Mas o pior é quando o filho acredita que é obrigação dos pais carregar as “mochilas da vida” e que a ele só cabe viver o prazer. O filho se deforma transformando-se em “folgado”, enquanto os pais se “sufocam”. Assim vai se organizando uma falta de ética em que o respeito a quem o ajuda passa a não existir e a responsabilidade pelos próprios compromissos a se diluir. Quem não respeita a própria mãe não tem por que respeitar outras pessoas: pai, professores, autoridades sociais ou qualquer ser vivente, seja mendigo, seja índio... Quem não se responsabiliza pelos próprios atos não tem por que se preocupar com o que faz ou deixa de fazer... Tudo isso pode ocorrer se carregar a mochila do filho for extensão social do que a mãe faz dentro de casa, isto é, se ela carrega também a casa toda... Carregar a mochila do filho é um erro de amor. Cometido por amor, pode ser até aceitável, mas não se justifica. O maior amor é criá-lo e educá-lo para a vida. E a vida exige qualidade, ética, liberdade e responsabilidade. Ainda bem que nossa psique é plástica e os comportamentos podem ser mudados a qualquer momento, desde que estejamos realmente mobilizados para isso. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

137

Cultura Religiosa

Na primeira oportunidade esta mãe deveria fazer o esforço “sobrematerno”, que é maior que o sobre-humano, para não carregar a mochila do filho. Vai ser uma briga interna muito grande contra a sensação de estar sendo má, incompetente e omissa... Mas a mãe tem de saber que o que sempre fez, pensando estar ajudando, na realidade prejudicou o filho e tem que acreditar que pode mudar. Portanto, essa mudança de atitude tem a finalidade de educar saudavelmente o filho, porque só o amor não é suficiente para uma boa educação. O filho tem de sentir todo o peso de sua mochila. Cabe à mãe oferecer ajuda. Se ele, por birra, já que nunca carregou peso algum, recusar a ajuda, ótimo! A mãe não deve sentir-se inútil. Pelo contrário, deve usufruir o filho, que está começando a assumir a própria responsabilidade, e curtir essa felicidade. A mãe não deve incomodar-se com os olhares indignados de outras mães, querendo dizer: “Que mãe desnaturada, que deixa o filho soterrado sob a mochila”. A mãe precisa devolver os olhares dizendo quão cegas e submissas elas estão sendo aos próprios filhos, que logo irão chamá-las de “escravas”, e perceber nelas já uma pontinha de inveja por alguém estar conseguindo o que elas sempre desejaram... É bem provável que já no dia seguinte essa mãe encontre algumas parceiras, para sua felicidade. Chegará uma hora em que o próprio filho, não agüentando mais carregar a mochila, dirá, com aquele ar de súplica que desmonta qualquer coluna vertebral materna: “Manhêêê, me ajuda?” Esta é a hora sagrada que Deus arrumou para a mãe tentar reparar as falhas educativas anteriores. Portanto, não a deve perder de forma alguma. Carregar todo o peso da mochila outra vez, jamais! Mesmo que tenha de lutar com todas as forças contra o “determinismo do instinto materno”. É chegada a hora de efetivamente ajudar o filho no que ele precisa. Portanto, nesse exato momento cabe à mãe abrir a mochila, que ele mesmo deve, ou deveria, ter arrumado, e deixá-lo pegar o que consegue carregar. Se ele quiser levar a mochila com menos cadernos, ótimo! Se quiser carregar alguns cadernos, ótimo também! Mesmo que seja pouco, se o filho começar a carregar alguma coisa, já é ótimo. Até agora o que ele aprendeu é que levar a mochila é obrigação da mãe. Portanto, vamos devagar, até ele reaprender que essa obrigação é dele, e a sua mãe só o está ajudando. Se de pequenino o filho carrega alguns cadernos, à medida que vai crescendo pode levar mais cadernos, até chegar o dia em que conseguirá carregar toda a mochila. Educar é preparar o filho para a alegria da liberdade sem depender de ninguém para “carregar suas mochilas”. Nesse novo processo, o mais importante é que o filho, ao chegar ao portão da escola, sente na própria pele a ajuda de sua mãe, medida e quantificada pelo peso da mochila que deixou de carregar. Nessa hora, seu coraçãozinho se enche de gratidão, e vem espontaneamente o tão desejado

138

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Princípios de Ética

beijo do qual ela tanto correu atrás. É um sentimento de reconhecimento do esforço que sua mãe sempre fez e ao qual ele nunca deu valor. Esse reconhecimento dá ao filho o sinal da existência da mãe. Se existe, a mãe deve ser respeitada. Assim, o filho, carregando a própria mochila, sendo auxiliado pela mãe nessa pesada tarefa, cria dentro de si respeito pela pessoa que o ajuda. Essa gratidão entra em seu quadro de valores e penetra fundo em seu modo de ser. Quem tem respeito à própria mãe também respeita seus semelhantes. É dessa maneira que um filho pequeno adquire a ética que vai torná-lo um cidadão na sociedade.

Destaques 1. Quem não se responsabiliza pelos próprios atos não tem por que se preocupar com o que faz ou deixa de fazer... 2. A vida exige qualidade, ética, liberdade e responsabilidade. Ainda bem que nossa psique é plástica e os comportamentos podem ser mudados a qualquer momento, desde que estejamos realmente mobilizados para isso. 3. Só o amor não é suficiente para uma boa educação. 4. Quem tem respeito à própria mãe também respeita seus semelhantes. É dessa maneira que um filho pequeno adquire a ética que vai torná-lo um cidadão na sociedade.

1.

Faça uma relação dos seus valores e classifique-os por prioridade. Depois, discuta com os colegas suas escolhas.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

139

Cultura Religiosa

2.

Como está a sua consciência? Ela o “cutuca” quando você faz uma ação eticamente inaceitável? Explique.

3.

Quem é responsável por estabelecer um convívio estável: a sociedade ou o indivíduo? Escreva sobre isso.

Faça a sua reflexão sobre os seus valores. Qual seria a melhor ordem de valores para melhorar as condições de vida de cada um? 140

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Ética – uma perspectiva cristã

P

or que a Ética Social é diferente da Ética Religiosa? A resposta está na fonte. Na ética social está a mão do homem, enquanto na religiosa está a mão de Deus. É por isso que as pessoas não gostam do debate sobre determinados assuntos. A ética religiosa é rígida, nada foi mudado nela. Alguns dizem que é antiquada, pois as pessoas mudaram e o mundo está diferente. Mas, ele mudou para melhor? Continuamos com muitos problemas e o homem parece não encontrar solução definitiva para nenhum deles.

Ética – uma abordagem Religiosa e distinção da Social Ética Social Princípios: extraídos da convivência humana, a partir das idéias filosóficas que traduzem os anseios e as expectativas da sociedade. São situacionistas por serem flexíveis e se adaptarem às mudanças históricas. Resultam do anseio pela liberdade. Meios: partem do próprio sistema cultural sobre o qual atuam as diversas instituições sociais (família, escola, igreja, empresas, meios de comunicação, partidos políticos etc.).

Fins: atingir o bem comum. Por isso, é imanente, ou seja, restrita aos limites humanos, temporais e sociais.

Ética Religiosa Princípios: extraídos das doutrinas que fundamentam a religião. São perenalistas por serem mais rígidos e dificilmente admitem mudanças históricas. Resultam do amor.

Meios: a lei moral que busca determinar o que é melhor para o ser humano.

Fins: atingir o bem superior. Por isso, é transcendente, ou seja, projeta o ser humano para além deste mundo material, buscando um sentido eterno para sua vida.

(KUCHENBECKER, 2000, p. 194).

Ética – uma perspectiva religiosa cristã Como todos os pensamentos religiosos, o Cristianismo também possui sua perspectiva ética. É verdade que a diversidade do pensamento cristão faz-nos perceber que não há um único modo cristão de entender o tema. Respeitadas as diferenças de compreensão, de uma forma geral a abordagem religiosa cristã da ética não pode fugir de sua centralidade: o Cristo, retratado no Novo Testamento, parte do texto sagrado dos cristãos. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Cultura Religiosa

Cristocentrismo: Jesus Cristo e sua ação de salvação são os centros da discussão e fonte de orientação ética e de poder de transformação. Fundamentação novo-testamentária: a Bíblia é a fonte e norma, tanto do ensino como das práticas cristãs. (STEFFEN, 2002).

Ética religiosa cristã: algumas críticas Em razão das afirmações do item anterior, o Cristianismo elaborou críticas a sistemas éticos que fogem dos seus pressupostos, como vemos a seguir: Princípio Hedonismo: o prazer é o critério maior. O bem é o que dá prazer e o mal é o que causa a dor. Individualista: busca-se o prazer individual. Universalista: o bem maior para o maior número de pessoas.

Crítica Cristã Os outros não entram em consideração. Os outros são excluídos por suas deficiências numa sociedade que não perdoa a imperfeição. Mas é bom lembrar que são todos seres humanos, criaturas de Deus. Quem julgar sua ação digna de um bem maior para um número de pessoas encontra sua justificativa para executá-la.

Naturalismo: a natureza é o princípio válido para todos em todos os tempos. A

Como ficam os fracos e doentes, raças tidas com baixo

sobrevivência é o bem maior a ser buscado e

nível de evolução? Vale a lei do mais forte?

o que a dificulta deve ser eliminado. Relativismo: como cada situação é única, não há princípio experimental que defina o que é bom e mau.

Defender a inexistência de verdades absolutas torna-se uma verdade absoluta.

Esteticismo: o que entra em consideração

O que importa é o aqui e o agora.

não é o ato em si, mas o resultado dele

Auto-realização individual ou grupal sem medir o ato

obtido. Os sentidos e emoções são utilizados

em si.

para dar significado à vida e transformar

A existência aqui e agora se sobrepõe a qualquer

insignificância em beleza.

outro valor.

Idealismo: é a busca de um ideal fora do ser humano e da Natureza. Intuicionismo: todos têm um conhecimento intuitivo do que é certo e errado. Racionalismo: o certo e o errado dependem do uso exato do raciocínio.

Se o senso moral está na consciência, onde está a Consciência? Se o senso de dever se sobrepõe por meio do raciocínio, os mais capazes estabelecem os melhores deveres.

(FORELL, 1983, p. 40).

Ética Religiosa cristã: crítica interna Há duas posturas comumente praticadas dentro do Cristianismo. Uma mais negativa (legalista) e outra mais positiva (pedagógica).

142

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Ética – uma perspectiva cristã

Legalista: a lei de Deus é vista de forma inflexível, e deve ser cumprida em sua plenitude. Caso a pessoa não a cumpra, o infrator só é redimido do erro mediante punição e penitência. É prática coercitiva e baseada no medo. Pedagógica: a lei de Deus é um método educativo que visa orientar a conduta humana dentro de princípios, movidos pelo amor e pelo desejo de proteger o indivíduo dos perigos morais. Pressupõe livre aceitação dos princípios cristãos, sem coerção. (STEFFEN, 2002).

Ética Religiosa cristã e o Amor Os significados que o Amor apresenta na linguagem comum são múltiplos e quase sempre mal compreendidos, em razão de pouco se pensar sobre este termo. Acreditamos que Amor é um sentimento e como tal não se explica. A história da Filosofia, no entanto, tem demonstrado diferente: pode-se pensar o Amor mas, atualmente, nos desacostumamos a isso. O Cristianismo, regra geral, afirma que o amor é o fundamento maior de seu princípio ético. Para defini-lo como fundamento ético, essa religião costuma diferenciar o tema a partir de três concepções. Amor

Sentido Toda e qualquer relação humana resultante da funcionalidade das sensações (sentidos físicos). Nesse sentido entende-se amor como força unificadora e harmonizadora, tanto sexual como política, resultante dos sentidos físicos. Quando os sentidos funcionam em sua normalidade biológica, é possível falar em sensualidade. Quando essa normalidade é quebrada, ficando fora de controle, fala-

Eros

se em paixão. Normalmente, esse modo de amor identifica-se com a sexualidade, tendo em vista que, ao sermos despertados para alguém, nossa sensualidade descontrola-se e, se correspondida, somos conduzidos à paixão que culmina no completo descontrole dos sentidos, a sexualidade. Não se identifica com a base cristã para a Ética. Toda e qualquer relação humana resultante de atitudes concordantes e afetos positivos (solicitude, cuidado, piedade etc.). O termo é semelhante com a noção de afeição e amizade. Nesse sentido,

Filia

é possível dizer que a dimensão desse amor se dá por escolha, é seletivo, e por concordância ou, se preferirmos, por concórdia, o que implica abrir mão de juízos valorativos condenatórios. Não se identifica com a base cristã para a Ética.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

143

Cultura Religiosa

Amor

Sentido Toda e qualquer relação humana resultante da ação de Deus e que se estende a todo o “próximo”. Ela se caracteriza pela aceitação mútua. Nesse sentido é possível falar que ágape é a disposição à igualdade verificada quando Deus, na criação, tornou o ser humano igual a Ele

Ágape

e quando, na redenção, Ele mesmo torna-se, em Cristo, Ser Humano para resgatar nossa dignidade pela compreensão e perdão. Essa é a ação de Deus em nós e que se estende, por nós, a todo o “próximo”. Nós amamos porque Ele nos amou primeiro. Essa é a base cristã para a Ética.

Ética Religiosa cristã e Moral Religiosa – os Dez Mandamentos Para os cristãos, os Dez Mandamentos, mais do que um manual de comportamento humano e social, apontam uma sugestão de cumprimento de papéis ou funções para o bom exercício do Amor (ágape) enquanto aceitação mútua que compreende e perdoa. Costuma-se dividir os Dez Mandamentos em dois grupos: a) Amar a Deus “Eu sou o Senhor, teu Deus. Não terás outros deuses diante de mim”. Confiança em Deus acima de todas as coisas. “Não tomarás em vão o nome do Senhor teu Deus, porque o Senhor não terá por inocente o que tomar o seu nome em vão”. Em nome de Deus não amaldiçoar, jurar, praticar a feitiçaria, mentir ou enganar, mas invocá-Lo em todas as necessidades, orar, louvar e agradecer. “Santificarás o dia do descanso”. Não desprezar a pregação e a palavra de Deus, mas considerá-la santa, gostar de ouvi-la e estudá-la. b) Amar o próximo “Honrarás a teu pai e a tua mãe, para que te vás bem e vivas muito tempo sobre a Terra”. Não desprezar e nem irritar pais e superiores, mas honrá-los, servi-los, obedecer-lhes, amá-los e querer-lhes bem. “Não matarás”. Não causar dano ou mal algum ao corpo do próximo, mas ajudá-lo e favorecê-lo em todas as necessidades. “Não cometerás adultério”. Levar uma vida casta e decente em palavras e ações, cada um amando e honrando seu parceiro.

144

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Ética – uma perspectiva cristã

“Não furtarás”. Não tirar do próximo o dinheiro ou seus bens e nem apoderar-se deles por meio de mercadorias falsificadas ou negócios fraudulentos, mas ajudá-lo a melhorar e conservar seus bens e seu meio de vida. “Não dirás falso testemunho contra o teu próximo”. Não mentir com falsidade, trair, caluniar ou difamar o próximo, mas desculpá-lo, falar bem dele e interpretar tudo da melhor maneira. “Não cobiçarás a casa do teu próximo”. Não pretender adquirir, com astúcia, a herança ou a casa do próximo, nem se apoderar dela sob a aparência de direito, mas ajudar-lhe e servi-lo para conservá-la. “Não cobiçarás a mulher do teu próximo, nem os seus empregados, nem o seu gado, nem coisa alguma que lhe pertença”. Não apartar, desviar ou aliciar a mulher do próximo, os seus empregados ou o seu gado; mas aconselhá-los para que fiquem e cumpram o seu dever.

Ética Social cristã Os cristãos estão cientes que hoje a maioria dos cidadãos, dentro de suas liberdades individuais, não fazem parte do Cristianismo. Apesar disso, eles entendem que seu modo de perceber o universo e o ser humano pode contribuir para relações sociais mais harmônicas e igualitárias. A base cristã para essa percepção encontra-se no fato de todos os seres humanos serem filhos criados e amados por Deus, em Cristo Jesus, que podem viver digna e harmoniosamente, com justiça, em paz, com solidariedade e perdão, dentro de ordens adequadas ao grupo de convivência. Emergem dessa intenção dois modos, convergentes, de aplicar a Ética Social cristã: ama a teu próximo como a ti mesmo: embora nem sempre vivamos de acordo com essa regra, a maioria das pessoas concorda que deveríamos fazê-lo; trata os outros como gostarias de ser tratado: é o princípio da reciprocidade (STEFFEN, 2002). Acredito que aqui encontramos ótimos fundamentos para a Ética. Você pode refletir em todas estas situações e chegar às conclusões necessárias para a mudança de comportamento, ou pode continuar igual. Talvez os seus princípios já estejam bem definidos e não haja necessidade de reflexão. Mas considero a humildade uma virtude. Acreditamos que nossa mudança pode ser contínua. Agora, atenção: cuide para não sair por aí pensando que é o melhor, que está por cima. Lembre que na ética cristã o ser humano não está sozinho, pois Deus está com ele nas suas decisões e nas suas ações.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

145

Cultura Religiosa

1.

Se você tivesse que optar entre Ética Social ou Ética Cristã, qual seria sua escolha? Justifique.

2.

Discuta com seus colegas, ou mesmo em casa com sua família, o princípio do amor ágape. Escreva o que você entendeu sobre isso.

3.

Sobre os Dez Mandamentos, a lei de Deus, é possível cumpri-los na íntegra no mundo em que vivemos? Justifique.

Indico um livro interessante que trata sobre Ética e envolve as nossas decisões diárias. FORELL, George W. Ética da decisão. São Leopoldo: Sinodal, 1983.

146

A partir da leitura do texto, o que você pode fazer para aplicar a Ética nas suas ações? Qual modelo utilizar? Faça seu parecer descritivo. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Ética – assuntos práticos

V

amos trabalhar na prática alguns assuntos-chave do nosso meio. São problemas éticos que encontramos diariamente e estão sempre expostos para discussão. É difícil chegarmos a uma definição para estes problemas. Não cabe aqui definir o que é certo e errado. Precisamos refletir sobre as causas e conseqüências das ações humanas e, através da ética, procurar canalizar as nossas ações para o bem.

A ordem da vida: a Ética nas questões da vida A Ética e a Ciência na origem da vida A coisa mais valiosa e insubstituível que o ser humano possui é a vida. O que é vida? É muito difícil definir vida, devido à sua natureza abstrata. Vida não é o ar que respiramos, pois sob o ponto de vista biológico, respirar, comer e tantas outras coisas das quais necessitamos para viver são apenas meios ou condições de nos mantermos vivos. Mas o ser humano é composto por duas dimensões distintas, porém, unidas entre si, ou seja, ele é matéria e espírito. Sobre a vida material, física e biológica, já possuímos inúmeras informações. O mais difícil é definir o que é vida no sentido espiritual, porque pouco ou nada conhecemos sobre este aspecto de nossa natureza íntima. E o pouco que conhecemos sobre a dimensão abstrata e espiritual da vida sofre grandes restrições por parte da cultura moderna, muito positivista e empirista. (HAAG, 2000, p. 197).

O importante é destacar aqui que, do ponto de vista da ética religiosa, a vida é um dom ou presente de Deus. E como todo presente que se recebe, a vida deve ser bem cuidada, porque, como se entende no senso comum, não se devolve e nem se joga fora um presente recebido pelo simples fato de que isto indicaria menosprezo e ofensa à pessoa que deu o presente.

A bioética Um dos mais novos campos que está se abrindo para a Filosofia e a Teologia é a reflexão em torno da ética da vida (bioética), em virtude das mais recentes pesquisas da ciência genética. Enquanto a ciência se ocupa com um objeto específico, a ética preocupa-se com aspectos gerais que afetam o homem e a sociedade, no que diz respeito aos aspectos positivos ou negativos das ações da ciência sobre a vida. E estas questões interessam tanto à Filosofia quanto à Teologia. À Filosofia interessa em virtude de que se ocupa com a moral a partir do enfoque racional, e à Teologia, porque aborda a mesma questão a partir da fé. Apesar das diferenças, ambos os enfoques convergem para o mesmo ponto: a defesa da vida como bem maior do homem. (HAGG, 2000, p. 198).

Constatamos aqui uma preocupação. Até que ponto a religião pode barrar o progresso da ciência? Pensamos que nem é bom fazer isso. Desde que os princípios utilizados para a pesquisa sejam bons. Devemos inclusive apoiar o avanço científico. Deus dotou o homem de capacidade para desvendar muito dos mistérios deste mundo. Mas é importante salientar que a nossa opção é sempre pela preservação da vida humana.

A eugenia Este termo deriva da língua grega e é composto pelo prefixo eu, que significa “novo”, e pelo termo genos, que significa “vida”. Portanto, o termo “eugenia” significa “nova vida”. A eugenia está relacionada com as mais recentes pesquisas no campo da Biologia e da Genética. A Ciência da Genética está fazendo progressos gigantescos nas pesquisas que dizem respeito a melhorias e transformações nos genes humanos e animais que são responEsse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Cultura Religiosa sáveis por doenças somáticas e defeitos físicos. Eliminando-se tais genes causadores de problemas, teremos, como conseqüência, pessoas mais sadias, isto é, livres de doenças hereditárias e imunes a doenças maléficas que possam ser adquiridas posteriormente. Não há a mínima dúvida de que tais contribuições da ciência sempre são bem-vindas. Mas, infelizmente, sabe-se também que o uso e a aplicação de tais conhecimentos podem ser voltados não para o benefício do homem e da sociedade, mas para interesses egoístas, como a dominação e a exploração econômica. (HAAG, 2000, p. 199).

Temos recentes notícias de avanços nestas pesquisas. O projeto genoma, por exemplo, que busca mapear o DNA, está num processo bem avançado. Também não deve demorar para que cientistas anunciem a clonagem humana. E então, a partir dos interesses humanos, surgem as dúvidas: tem a ciência esse direito de reproduzir em série os seres humanos? Quem será o modelo ou protótipo ideal? Do ponto de vista filosófico podemos perguntar: poderá a clonagem reproduzir também as idéias e a moral da pessoa? Surge a pergunta teológica: a clonagem reproduzirá também os pecados da pessoa? A fé e as virtudes são transmitidas junto com a clonagem? É claro que não vamos responder as questões. Mas estão aí para analisarmos a complexidade dessa discussão.

Bebê de proveta O termo técnico mais adequado é inseminação artificial in vitro, ou seja, a fecundação (união do óvulo com o espermatozóide) é feita num tubo de ensaio em laboratório e depois o embrião é introduzido no útero da mulher. Esta é uma técnica que resolve os casos em que a gravidez não ocorre por problemas circunstanciais que impedem a fecundação. É relativamente simples e não envolve maiores problemas éticos. A questão mais importante é que a inseminação artificial não resolve problemas congênitos de infecundidade, tendose, por isso, que utilizar outros meios, como a “barriga de aluguel”, na qual surgem vários problemas éticos. (HAAG, 2000, p. 200).

Vejam que hoje este assunto não é mais novidade. As pessoas que buscam esta técnica estão buscando a solução para um problema antes sem solução. Claro que aí surgem outras indagações. Questiona-se de um lado se isso não poderia ser resolvido com a adoção, já que encontramos milhares de pessoas abandonadas no mundo. Mas é apenas uma reflexão.

Barriga de aluguel (mãe substituta) Barriga de aluguel é um termo genérico para designar a figura da “mãe substituta” na gestação de um ser humano. Barriga de aluguel consiste na seguinte situação: por impossibilidade de uma mulher poder gerar seu próprio filho, ela “aluga” o útero de outra, que se dispõe a gerar o óvulo fecundado daquela que não pode ter seu próprio filho. Uma clínica especializada faz a fecundação in vitro e instala o embrião na mãe substituta. A mãe genética assiste e acompanha a mãe substituta, garantindo-lhe todos os recursos para que a criança se desenvolva dentro da normalidade e nasça sadia e forte. (HAAG, 2000).

Podemos analisar o problema do ponto de vista legal usando os Códigos Civil e Penal. Estes apenas permitem que bens materiais sejam objeto de compra e venda. Pessoas não podem ser alvo de valor comercial, como no caso de adoção de crianças, exploração de menores para a prostituição, emprego de mão-de-obra escrava, entre outros. Além disso, temos todos os outros problemas relacionados à mãe geradora da criança, os problemas psicossomáticos, a consciência. 148

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Ética – assuntos práticos

Eutanásia O termo “eutanásia” deriva da língua grega e é composta pelo prefixo eu (boa) e do substantivo tánatos (morte), que, portanto, significa “boa morte”, ou uma morte sem sofrimento. Há dois tipos de eutanásia: a ativa e a passiva. A eutanásia ativa caracteriza-se pelo uso de meios diretos para interromper a vida e antecipar a morte. Essa forma é legalmente condenada. Nenhum médico poderá praticar tal intervenção, pois no juramento de Hipócrates (primeiro médico), há um compromisso de salvar vidas, e não de condenar à morte. A dúvida ética repousa sobre a eutanásia passiva, ou seja, a intervenção que se faz desligando os aparelhos que mantêm viva a pessoa que está clinicamente morta (morte cerebral), não havendo mais, neste caso, a mínima chance de vida. A questão é a seguinte: pode-se, nesse caso, como gesto de piedade, livrar a pessoa dessa situação, e, quem sabe, livrar também os familiares de uma situação deprimente? (HAAG, 2000, p 202).

Apesar das mais diversas opiniões, a decisão nunca deverá ser tomada de forma isolada e arbitrária. De acordo com a ética religiosa, Deus é o doador da vida e só a ele pertence o direito de determinar o seu fim. Por isso, ninguém, nem mesmo um profissional da saúde, pode decidir de forma arbitrária e praticar a eutanásia. Toda e qualquer decisão em termos de eutanásia passiva deverá passar por um conselho de ética, que a maioria dos hospitais possui, composta por uma equipe multidisciplinar. É importante que os familiares sejam ouvidos, e deverá sair daí uma decisão clara, transparente, convicta, unânime e consciente quanto ao que será feito em favor da pessoa clinicamente morta.

A Ética da corporeidade A sexualidade humana O ser humano, tal qual os animais e as plantas, é um ser sexuado. A diferença é que o ser humano não age por instintos, porém seu comportamento sexual está submetido à dimensão racional (cognitiva, volitiva e afetiva) e espiritual (moral e religiosa). Os animais têm o comportamento sexual determinado pelos instintos para a preservação da espécie e não possuem a mínima consciência do que tal ato representa. O ser humano, mesmo tendo instintos muito elementares, não é determinado por eles, mas pela sua dimensão racional, e, por isso, pode e deve ter consciência do que o ato sexual representa para si, para seu parceiro e para a sociedade. O ser humano precisa ter consciência das múltiplas implicações, boas ou más, certas ou erradas, positivas ou negativas que tal ato tem sobre si, sobre a outra pessoa, sobre a sociedade e diante da vontade de Deus. Além disso, há que se considerar também que o ato sexual não é apenas uma relação de amor do tipo eros, mas envolve também o amor do tipo filos (afetivo) e do tipo ágape (espiritual). Equivocadamente, há os que entendem que sexo é uma necessidade fisiológica. O ato sexual é um ato físico, mas nem por isso é uma necessidade fisiológica. Os aspectos mais significativos na relação sexual humana estão relacionados com os aspectos afetivos e espirituais que tal relação envolve. As pessoas não se unem por causa do sexo, mas porque querem ter um(a) companheiro(a), um(a) amigo(a), alguém em quem possam confiar e com quem possam compartilhar os bons e os maus momentos da vida. O sexo apenas complementa essa relação afetiva e espiritual. (HAAG, 2000, p. 205).

Por isso é importante discutir este tema com muita seriedade. Aula de sexualidade nas escolas não deve ensinar somente o funcionamento dos órgãos reprodutores, mas principalmente a responsabilidade e o controle que as pessoas devem ter sobre o sexo. Principalmente porque pode causar problemas maiores como: a Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

149

Cultura Religiosa

gravidez indesejada e doenças sexualmente transmitidas, como a aids, por exemplo, pois ainda não existe remédio para a cura total. Os pais devem conversar com os filhos sobre isso, um papo franco e aberto, sem tabus. Vemos um problema sério na questão da sexualidade nos dias atuais: passamos muito rapidamente de um extremo ao outro, ou seja, de um período em que sexo era um tabu, algo proibido e condenado, para um período no qual, por causa do excesso de restrição, passouse para o excesso de permissividade. Um erro não justifica o outro. É preciso encontrar o equilíbrio para o bem do próprio ser humano, que recebeu de Deus este maravilhoso presente: a sexualidade dentro da dimensão afetiva e espiritual, privilégio do qual plantas e animais não desfrutam. (HAAG, 2000, p. 207).

A prostituição A partir da visão da ética social, entende-se que o ser humano tem plena liberdade de fazer as opções que melhor lhe couberem. Hoje se pensa que se alguém escolheu a prostituição como modo de vida, ninguém tem nada a ver com isso, pois ninguém deve intrometer-se na vida alheia. Porém, a partir da visão da ética religiosa, o princípio que vigora não é a liberdade, mas o amor ágape. Então, a pergunta que se faz a partir desse ponto de vista da ética religiosa é: as pessoas têm, de fato, liberdade de usar seu corpo como objeto econômico? É certo alguém “comprar” o corpo de uma outra pessoa para satisfazer suas necessidades sexuais? (HAAG, 2000, p. 208).

O ser humano não é coisa, não é produto, não é mercadoria. Ele tem alma, sentimentos e coração. Neste nível, o que deve falar mais alto e valer muito mais é o amor mútuo. Quando alguém chega ao ponto de “vender” o seu corpo é porque algo muito grave está acontecendo com ele e com a sociedade. Tal pessoa precisa ser tratada com amor e não ser explorada na sua necessidade ou fraqueza. Pesquisas nos mostram que a grande maioria das pessoas que vivem na prostituição está nesse meio não por opção livre, mas por questões econômicas, familiares, psíquicas, afetivas e educacionais. Assim, também, a grande maioria delas gostaria de mudar de vida e viver como pessoas normais, dentro de um ambiente familiar harmonioso. O que estas pessoas mais gostariam de ter na vida é o amor e uma chance que nunca tiveram: serem respeitadas. Muitas delas se sentem rejeitadas e inferiorizadas pelo fato de viverem em tais condições subumanas: sem carinho, sem afeto e sem dignidade, pois todos vêem nelas um objeto que se compra, e não uma pessoa que reclama por melhores oportunidades na vida, que reclama para ser alguém. (HAAG, 2000, p.208).

Uso e dependência de drogas Este é mais um dos problemas preocupantes na nossa sociedade. Quantos pais perdem filhos para a droga? Um dos problemas humanos e sociais de maior gravidade é o problema que envolve o uso e a dependência de drogas, que traz conseqüências físicas e psíquicas a curtíssimo prazo e, geralmente, irreversíveis. A pergunta inquietante que surge é: o que faz com que pessoas optem pelas drogas, sabendo que se autodestruirão? Será que são livres para tomar uma decisão que implica renúncia à vida? (HAAG, 2000, p. 209).

Não podemos sair condenando os jovens por este comportamento. Eles precisam de ajuda. Aliás, precisam de amor. Não fizeram uma opção simples e livre.

150

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Ética – assuntos práticos

Há causas mais profundas de ordem psíquica e afetiva que os influenciam a entrar no “mundo” das drogas. Muitos buscam nas drogas uma forma de se punir ou de fugir de algum problema que têm medo de enfrentar. Há o caso daqueles que querem chamar a atenção dos pais, como forma de reclamar atenção e afeto. Há casos em que a pessoa é levada às drogas pela curiosidade ou como forma de desafiar o perigo, tentando mostrar que é forte, mas isso também revela um tipo de insegurança e falta de afeto ou atenção. Mas é importante dizer que quando falamos em droga, não falamos somente em drogas ilícitas, como a maconha, a cocaína, o crack, entre outros. Falamos também das lícitas, como o cigarro e a bebida. A bebida que está aí. A televisão está cheia de propagandas convencendo as pessoas a beber. Os jovens adolescentes já não vão mais a uma festa sem a cerveja. Não tem graça. Aí é que muitos se iniciam no mundo das drogas. A droga atinge todas as faixas etárias, não esqueça. Não são somente os jovens.

A ordem familiar: a Ética na família A família: sua constituição O que é família hoje? Um grupo de pessoas vivendo debaixo de um mesmo teto? Um casal legalmente unido com direito a ter e criar seus próprios filhos? Uma relação de pessoas que têm uma base econômica estável? Um casal que jurou ser fiel um ao outro até que a morte os separe? Então vamos ver: Para a ética social, a família é constituída a partir do momento em que duas pessoas decidem viver juntas. Mas, na maioria das vezes, a motivação dessa união está baseada na idéia de que o casamento dá a tão sonhada liberdade de praticar livremente o sexo sem as inconvenientes restrições morais e sociais. Percebe-se em tais situações que o que motivou essa união foram apenas os interesses egoístas de cada um, sem se considerar a pessoa humana do outro. Quando isso acontece, não se pode dizer que aí há uma família. O vínculo familiar pressupõe uma ligação honrosa e digna com a pessoa do outro, e não que o outro seja um objeto de uso que, quando não serve mais, torna-se descartável. (HAAG, 2000, p. 211).

Mas aqui é importante analisar a família também a partir da Ética Religiosa. Vejam que encontramos uma conotação diferente da ética social: Para a ética religiosa, a constituição da família não se dá a partir da vontade humana, mas a partir da vontade divina. Pois, para a religião, homem e mulher são criaturas de Deus e ele mesmo os uniu e abençoou para completarem-se física e psicologicamente na vida a dois. Por isso, na visão da religião, a família é constituída e fundamentada sob a vontade divina, que é expressa nas doutrinas que fundamentam a religião, na qual homem e mulher não são vistos como objetos de mero prazer sexual, mas como pessoas criadas conforme a imagem e semelhança de Deus, a fim de viverem de modo digno, fraterno e humano. (HAAG, 2000, p. 212).

A família deve dar condições para que o ser humano tenha um desenvolvimento como pessoa e ser social num ambiente que lhe permita isso. A família é,

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

151

Cultura Religiosa

como já diziam há vários séculos os latinos, “a célula-mãe da sociedade”. Tudo depende da família. É no seio familiar que os filhos são educados para a vida. A ação ética de cada um vai depender muito do que foi aprendido e vivido entre pais e irmãos.

Casamento, divórcio, recasamento O casamento, bem como a família e o lar, atravessam juntos a mesma crise de valores éticos do mundo contemporâneo, marcado pelo individualismo, liberalismo e pragmatismo hedonista. A partir da visão da ética social, o casamento não passa de um contrato formal entre duas pessoas, que, “se não derem certo”, desfarão a “empresa” e tentarão novamente com um outro “sócio”, como se o casamento fosse uma S.A. (Sociedade Anônima). A ética religiosa, mesmo tendo sido taxada de arcaica, tem se posicionado como voz discordante das “novas tendências” do mundo moderno e tem insistido na visão de que o casamento é de origem divina e, portanto, deve fundamentar-se sobre os princípios éticos do amor ágape. Casamento não é loteria, mas um projeto de vida que assumimos perante Deus e a sociedade, devendo, por isso, ser encarado com responsabilidade, porque as pessoas não são objetos dos quais podemos dispor para fazer experiências temporárias. Casamento não é um contrato, mas um projeto de vida para o qual deve haver a bênção de Deus. (HAAG, 2000, p. 213).

A família parece estar em crise. O casamento está em crise. É o que dizem as pessoas. Mas a crise é ética e moral, ou seja, houve a perda dos valores fundamentais pela pessoa, como por exemplo, o amor e o respeito ao próximo. O divórcio, conforme a ética protestante, não é uma regra, mas uma exceção. O princípio que a ética protestante defende é o da indissolubilidade do matrimônio, pois a Bíblia (norma de fé e vida) diz: “o que Deus uniu, não o separe o Homem”. Porém, como é inevitável que aconteçam problemas e desentendimentos entre casais, a ética protestante postula os seguintes procedimentos frente a tais problemas: que o casal esgote todas as possibilidades na busca da solução para superarem seus problemas e permanecerem unidos; mesmo que resolvam separar-se, façam a experiência por breve tempo, dando prioridade para a reconciliação; só em último caso recorram ao rompimento definitivo e que, então, primeiro legalizem a situação anterior para só depois disso começarem vida nova, cumprindo as formalidades legais e o que determina a lei de Deus. (HAAG, 2000, p. 215).

É importante ainda citar o recasamento, ou seja, o recomeço de uma nova vida conjugal, mesmo sendo admitido pela ética protestante, deve ser feito com muito cuidado. O catolicismo, não admitindo o divórcio como forma legal de separação, também não admite haver uma forma legal para o recasamento. Já o protestantismo admite a legalização do divórcio nos casos previstos anteriormente e, por isso, também nestes casos, admite a legalização do novo casamento, bem como a bênção religiosa para uma nova união matrimonial (pois, caso contrário, condenar-se-ia ao adultério ou ao concubinato a parte inocente). É de direito e da natureza humana que pessoas jovens, mesmo divorciadas em situações legítimas, sejam amparadas (e não condenadas) pela religião, a fim de terem uma vida digna, honesta e cristã.

152

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Ética – assuntos práticos

A ordem de justiça: a Ética nas questões legais A pena de morte Definimos a pena de morte como a punição máxima aplicada a um infrator, eliminando a pessoa do convívio social e tirando-lhe a vida com a aplicação da pena capital. Aqui se levantam muitas questões de ordem legal e religiosa. No Brasil, no período do Império, havia a pena de morte, mas ela foi abolida por causa de um erro judiciário no qual se tirou a vida de um inocente. A partir de lá, não se tem mais na lei brasileira a prática legalizada da pena de morte. Já foram feitas várias tentativas para a reimplantação no Código Penal do artigo que faculta o uso de tal lei. Os debates em torno do assunto bipolarizam-se de tal maneira que há argumentos a favor e contra. Argumentos a favor: diante do medo da punição com morte, haveria diminuição da violência e da criminalidade;

o Estado não teria tantos gastos com a manutenção de presídios (verdadeiras universidades do crime).

Argumentos contrários:



possibilidade de erro judiciário e, com ele, a condenação de um inocente; uso político e ideológico da pena, sendo, nesse caso, uma arma na mão de maus governantes que se voltam contra o próprio cidadão; estatísticas em países em que há a pena de morte revelam que ela foi aplicada, na maior parte das vezes, contra pobres, negros e índios. Foram raros os casos de ricos e/ou brancos a serem condenados;

a pena de morte não diminuiu a criminalidade, apenas a refreou num primeiro momento;

é falso o argumento econômico, porque os gastos para evitar erro judicial são muito altos e maiores do que os gastos com a manutenção dos presídios.

Do ponto de vista da Ética Religiosa, o assunto também é controverso, pois há teólogos que, baseados em textos bíblicos, defendem a pena de morte, e outros que são contra ela, porque entende que só Deus tem autoridade de punir com a morte, por ser ele o autor da vida. Pessoalmente, sou contra a pena de morte, visto que ela seria usada como um instrumento que apenas atingiria os efeitos, ficando as causas do problema sem serem atingidas. As ondas de corrupção que afetam governantes e autoridades no Brasil não lhes dão idonei-

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

153

Cultura Religiosa dade moral para serem os depositários fiéis de uma lei tão severa e drástica. Num país no qual apenas “ladrões de galinha” vão para a cadeia e os criminosos de “colarinho branco” ficam impunes, fica desautorizada a validade da implantação da lei da pena de morte. (HAAG, 2000, p. 221).

O aborto É um assunto que merece atenção especial e é difícil de discutir, pois envolve culpa, consciência. Mas todos os casos devem ser tratados com muito cuidado. Vejo que aqui, a questão do amor cristão é fundamental para chegarmos a alguma conclusão. A lei brasileira considera crime a prática do aborto, sendo, portanto, sujeito a sanções penais. Mas há uma disseminação de clínicas que fazem a prática clandestina do aborto, sem a devida coibição das autoridades. A lei brasileira admite duas exceções: 1.º) em caso de risco de vida para a mãe; 2.º) se a gravidez foi proveniente de estupro. Em ambos os casos, o médico fica autorizado a fazer o aborto, desde que seja realizado até o terceiro mês de gravidez. (HAAG, 2000, p. 222).

Os problemas morais que provêm da prática do aborto, segundo a ética religiosa, dizem respeito a questões que envolvem a concepção teológica de vida. Como já vimos antes, a vida é considerada um presente de Deus e ninguém tem o direito de atentar contra a vida de quem quer que seja, especialmente de um ser indefeso dentro de um útero. A ética cristã, mesmo que o aborto venha a ser legalizado, sempre orientaria o cristão a não se valer de tal lei, porque nem tudo o que é legal é, automaticamente, moral. A moral do cristão, em tudo, sempre será orientada pela vontade de Deus. Porque esse mundo, com suas paixões e concupiscências, passará, mas a vontade de Deus permanecerá para sempre. (HAAG, 2000, p. 223).

A ordem civil: a Ética na política O ser humano, entre todos os seres da natureza, é o único que desenvolve formas organizadas de vida social. Os animais, nas suas mais diferentes espécies, mesmo vivendo em grupos, não possuem uma forma organizada de vida. Nas espécies animais, as relações grupais são determinadas pelos instintos, a fim de garantir a reprodução e a sobrevivência da espécie. Por isso, cada espécie possui um padrão próprio de vida grupal. Há regras naturais que determinam a função e o comportamento de cada “membro” que compõe a espécie. (HAAG, 2000, p. 224).

A política Este é um termo muito desgastado hoje e, por isso, para muitos, tem um significado pejorativo. Porém, tanto o significado semântico como o filosófico do termo “política” é muito significativo. Ele provém da palavra pólis, que significa cidade-estado. Cada cidade da Grécia formava um Estado independente que estava unido numa confederação de cidades, formando, assim, a nação grega. Cada cidade-estado era autônoma e, por isso, tinha vida e cultura próprias. Cada uma possuía suas próprias leis. E as leis de cada cidade eram feitas a partir da discussão pública dos problemas que a afetavam. Todos os cidadãos livres tinham vez e voz nas assembléias públicas onde eram tomadas as decisões “políticas”, ou seja, aquilo que dizia respeito à pólis. Daí provém o termo política, ou seja, a discussão e a administração das coisas públicas, cujo objetivo é a manutenção do bem comum. Não havia nada mais importante para o homem grego do que a pólis, pois era o 154

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Ética – assuntos práticos lugar onde vivia. E este era o maior bem comum que todos possuíam. Por isso, na Grécia antiga, política era uma atividade que envolvia todos os cidadãos de uma cidade-estado. (HAAG, 2000, p. 225).

Religião e política Dizem que são dois assuntos que não se discute. O tema é vasto realmente, e neste texto é impossível aprofundar o assunto. Mas o importante é que o meio acadêmico discuta estas questões e busque sempre alternativas para uma sociedade mais equilibrada. Política é uma atividade que deve envolver a todos, e não apenas àqueles que vêem na “politicagem” um meio de obter vantagens em tudo, infelizmente às custas do bem comum.

O luteranismo, a política e a economia Não poderíamos terminar o texto sem falar em Lutero. Pela sua clareza em seus escritos e pela forma de pensar, inspirado pela Bíblia, Lutero deixa um modelo claro de sociedade com fundamentos sólidos: O reformador Martinho Lutero, em seus escritos, fez questão de distinguir a ordem política da ordem religiosa, ou seja, fez a separação entre Igreja e Estado. O poder eclesiástico é distinto e separado do poder civil. Ambos cumprem funções diferentes, embora devam ser convergentes para o mesmo fim: a realização da vontade de Deus na promoção do bem-estar espiritual e material do Homem. À Igreja cumpre a função de cuidar do bem-estar espiritual, e ao Estado cumpre a função de cuidar do bem-estar social e material do Homem. Igreja e Estado deveriam, segundo Lutero, ser independentes um do outro, ou seja, um não se metendo nos negócios do outro. Porém, por outro lado, Igreja e Estado não poderiam estar divorciados um do outro, por terem um objetivo comum: o bem-estar do Homem criado à semelhança de Deus. (HAAG, 2000, p. 229).

São todos os temas muito interessantes. Levam-nos a horas de reflexão e estudo. Não podemos fugir deles, pois encontraremos nesta reflexão fôlego para preservar a vida. Sei que muitos pensam ser utopia pensar em um mundo melhor. Mas se não sonhamos, buscamos tornar estes sonhos realidade.

1.

Dos temas apresentados, de qual você mais gostou? Justifique.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

155

Cultura Religiosa

2.

Como você pode utilizar essa reflexão para a sua vida pessoal?

3.

Converse e busque o diálogo desses temas com os seus colegas e sua família.

Minha sugestão é a leitura de alguns textos de Lutero sobre estas abordagens. É um livro em que o reformador fala sobre Economia, Política e educação: LUTERO, Martinho. Obras selecionadas. Porto Alegre: Concórdia, 1995. v. 7.

156

Sobre a prática das ações morais na sua vida, em que casos, dos citados acima, você se deu conta que pode haver uma reflexão maior e que possa ajudá-lo? Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Referências BÍBLIA. Bíblia Sagrada. Tradução de: Almeida. Revista e atualizada. São Paulo: Sociedade Bíblica de Brasil, 1999. BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Edição revisada e atualizada. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1991. BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Revista e atualizada. São Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 1999. CRISTO PARA TODOS, folheto informativo da IELB. Porto Alegre: Concórdia, 1994. FORELL, George W. Ética da decisão. São Leopoldo: Editora, 1983. GAARDER, Jostein. O livro das religiões. São Paulo: Cia. das Letras, 2000. GAARDER, Jostein; HELLERN, Victor; NOTAKER, Henry. O livro das religiões. São Paulo: Cia. das Letras, 2000. HAAG, Nereu. Questões fundamentais de ética aplicada. In: KUCHENBECKER, Valter. O homem e o sagrado. Canoas: Editora da Ulbra, 2000. HELLERN, Victor; NOTAKER, Henry; GAARDER, Jostein. O livro das religiões. São Paulo: Cia. das Letras, 2000. HOFFMANN, Martinho Lutero. O fenômeno religioso. Texto inédito, mas usado nas aulas de Cultura Religiosa da Universidade Luterana do Brasil, 2002. HONER, Stanley M. Invitation to philosophy. California: Wadsworth Publishing Company, 1973. KUCHENBECKER, Valter. O homem e o sagrado. 5. ed. Canoas: Editora da Ulbra, 2000. LIENHARD, Marc. Martim Lutero: Tempo, vida e mensagem. São Leopoldo: Sinodal, 1998. LUTERO, Martinho. Obras selecionadas. Porto Alegre: Concórdia, 1995. v. 7. MARQUES, Leonardo Arantes. História das religiões e a dialética do sagrado. São Paulo: Editora Madras, 2005. PIAZZA, Waldomiro. Religiões da humanidade. São Paulo: Editora Loyola, 1991. ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985. RUDNICK, M. L. Ética cristã para hoje. Rio de Janeiro: Juerp, 1991. SEIBERT, Egon. O Cristianismo. Texto inédito, mas usado nas aulas de Cultura Religiosa da Universidade Luterana do Brasil, 2002. SMITH, Huston. As religiões do mundo. São Paulo: Cultrix, 1991. STEFFEN, Ronaldo. As grandes religiões do mundo. In: KUCHENBECKER, Valter. O homem e o sagrado. 5. ed. Canoas: Editora da Ulbra, 2000. STEFFEN, Ronaldo. Reflexões sobre Ética. Canoas: Editora da Ulbra, 2002.

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Cultura Religiosa

STEYER, Walter O. Da igreja primitiva até a Reforma. In: KUCHENBECKER, Valter. O homem e o sagrado. Canoas: Editora da Ulbra, 2000. TIBA, Içami. Amor, felicidade e companhia. Coletânea de textos. São Paulo: Gente, 1998. VAZQUEZ, A. S. Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1984. VIDAL, M. Moral de atitudes: ética fundamental. Aparecida: Santuário, 1978. ZICMAN, Renée; MOREIRA, Alberto. Misticismo e novas religiões. Petrópolis: Vozes, 1994.

158

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Hino Nacional Poema de Joaquim Osório Duque Estrada Música de Francisco Manoel da Silva

Parte I

Parte II

Ouviram do Ipiranga as margens plácidas De um povo heróico o brado retumbante, E o sol da liberdade, em raios fúlgidos, Brilhou no céu da pátria nesse instante.

Deitado eternamente em berço esplêndido, Ao som do mar e à luz do céu profundo, Fulguras, ó Brasil, florão da América, Iluminado ao sol do Novo Mundo!

Se o penhor dessa igualdade Conseguimos conquistar com braço forte, Em teu seio, ó liberdade, Desafia o nosso peito a própria morte!

Do que a terra, mais garrida, Teus risonhos, lindos campos têm mais flores; “Nossos bosques têm mais vida”, “Nossa vida” no teu seio “mais amores.”

Ó Pátria amada, Idolatrada, Salve! Salve!

Ó Pátria amada, Idolatrada, Salve! Salve!

Brasil, um sonho intenso, um raio vívido De amor e de esperança à terra desce, Se em teu formoso céu, risonho e límpido, A imagem do Cruzeiro resplandece.

Brasil, de amor eterno seja símbolo O lábaro que ostentas estrelado, E diga o verde-louro dessa flâmula – “Paz no futuro e glória no passado.”

Gigante pela própria natureza, És belo, és forte, impávido colosso, E o teu futuro espelha essa grandeza.

Mas, se ergues da justiça a clava forte, Verás que um filho teu não foge à luta, Nem teme, quem te adora, a própria morte.

Terra adorada, Entre outras mil, És tu, Brasil, Ó Pátria amada!

Terra adorada, Entre outras mil, És tu, Brasil, Ó Pátria amada!

Dos filhos deste solo és mãe gentil, Pátria amada, Brasil!

Dos filhos deste solo és mãe gentil, Pátria amada, Brasil!

Atualizado ortograficamente em conformidade com a Lei 5.765, de 1971, e com o artigo 3.º da Convenção Ortográfica celebrada entre Brasil e Portugal em 29/12/1943. Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

Esse material é parte integrante do Curso de Atualização do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.iesde.com.br

View more...

Comments

Copyright ©2017 KUPDF Inc.
SUPPORT KUPDF