Livro Geometria Geronimo Valdeni

March 14, 2017 | Author: edscorralbr | Category: N/A
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geometria...

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Geometria Plana e Espacial Um Estudo Axiomático

300 exercícios propostos Mais de 400 ilustrações 150 exemplos

João Roberto Gerônimo Valdeni Soliani Franco

Geometria Plana e Espacial Um Estudo Axiomático

João Roberto Gerônimo Valdeni Soliani Franco

fevereiro de 2006 Maringá – PR

iv

Índice

Apresentação Neste trabalho temos como objetivo apresentar um estudo axiomático da geometria euclidiana plana e espacial. Ele está escrito em termos de geometria clássica, mas utilizando uma linguagem moderna e com um certo rigor nas demonstrações. Salientamos que na Geometria Espacial, admitiremos todos os resultados obtidos na Geometria Plana. O texto está dividido em 16 capítulos sendo que o primeiro capítulo é introdutório, os capítulos de 2 a 9 tratam da geometria plana e os capítulos de 10 a 16 tratam da geometria espacial. Mais especifica-mente, no Capítulo 1, apresentamos uma introdução histórica onde justificamos a abordagem escolhida para o texto. No Capítulo 2, estuda-mos os primeiros axiomas e seus principais resultados na geometria plana. No Capítulo 3, apresentamos os axiomas sobre medidas de segmentos e ângulos. No Capítulo 4, estudamos a congruência entre triângulos. No Capítulo 5, tratamos do principal axioma da Geometria Euclidiana, que por mais de dois mil anos acreditaram que era conseqüência dos outros axiomas. No Capítulo 6, tratamos de áreas de regiões poligonais. No Capítulo 7, estudamos os casos de semelhança em triângulos e como consequência o Teorema de Tales. No Capítulo 8, estudamos as propriedades da circunferência e do círculo. No Capítulo 9, estudamos as relações métricas existentes nos triângulos. No Capítulo 10, apresen-tamos os primeiros axiomas e seus principais resultados relativos ao espaço euclidiano. No Capítulo 11, estudamos as relações de paralelis-mo entre retas e planos e entre planos e planos. No Capítulo 12, estudamos as relações de perpendicularismo entre retas e planos e entre planos e planos. No Capítulo 13, utilizamos as relações de perpendicularismo e paralelismo para definir distâncias, ângulos, diedros e triedros. No Capítulo 14, definimos poliedros e classificamos os v

poliedros regulares e os de Platão. No Capítulo 15, estudamos a esfera e suas propriedades. Para finalizar, no Capítulo 16, estudamos áreas e volumes de figuras geométricas espaciais. No Apêndice A apresentamos um pequeno relato sobre a obra “Os Elementos” de Euclides. No Apêndice B indicamos uma página na internet com a resolução dos exercícios propostos no livro em formato PDF. Deixamos também disponibilizados as figuras encontradas no texto. Para resolver estes exercícios contamos com a colaboração inicial dos exacadêmicos Ademir Pastor Ferreira, Vânia Batista Marinho e Waldir Soares Júnior. Neste texto empregamos uma linguagem contemporânea onde falamos de conjuntos, relações e funções, conceitos que, a priori, não precisam ser compreendidos de forma mais aprofundada, mas utilizando apenas o conhecimento do Ensino Médio. Estes conceitos podem ser vistos com detalhes em [2]. Gostaríamos de registrar nossos agradecimentos aos alunos das turmas de 1999, 2000, 2001, 2002, 2003, 2004 e 2005 do curso de matemática da UEM e ao professor Marcelo Escudeiro Hernandes, pelas sugestões apresentadas. Queremos agradecer também aos alunos de Especialização em Matemática da UEMS – Dourados – MS, pelas sugestões e correções feitas nos capítulos relacionados a Geometria Plana. Maringá, 15 de fevereiro de 2006

Índice

Índice CAPÍTULO 1: INTRODUÇÃO...........................................................1 CAPÍTULO 2: INCIDÊNCIA E ORDEM NO PLANO.....................4 2.1. AXIOMAS DE INCIDÊNCIA..............................................................4 2.2. AXIOMAS DE ORDEM....................................................................4 2.3. ORDENANDO UMA RETA...............................................................4 2.4. POLÍGONOS....................................................................................4 2.5. EXERCÍCIOS...................................................................................4 CAPÍTULO 3: SEGMENTOS, ÂNGULOS E MEDIDAS.................4 3.1. MEDIDAS DE SEGMENTOS.............................................................4 3.2. MEDIDAS DE ÂNGULOS.................................................................4 3.3. CONGRUÊNCIA DE SEGMENTOS E ÂNGULOS.................................4 3.4. EXERCÍCIOS...................................................................................4 CAPÍTULO 4: CONGRUÊNCIA DE TRIÂNGULOS......................4 4.1. O CASO LAL................................................................................4 4.2. O CASO ALA................................................................................4 4.3. O CASO LLL.................................................................................4 4.4. O CASO LAAO...............................................................................4 4.5. O CASO LLA..............................................................................4 4.6. EXISTÊNCIA DE PERPENDICULARES E PARALELAS.......................4 4.7. DISTÂNCIA DE PONTO A RETA E DESIGUALDADE TRIANGULAR. .4 4.8. EXERCÍCIOS...................................................................................4 CAPÍTULO 5: AXIOMA DAS PARALELAS.....................................4 5.1. O AXIOMA DAS PARALELAS.........................................................4 5.2. TRIÂNGULOS E QUADRILÁTEROS..................................................4 5.3. TEOREMA DAS PARALELAS...........................................................4 5.4. EXERCÍCIOS...................................................................................4 CAPÍTULO 6: REGIÕES POLIGONAIS E ÁREAS........................4 6.1. REGIÕES POLIGONAIS...................................................................4 6.2. ÁREAS...........................................................................................4 6.3. TEOREMA DE PITÁGORAS..............................................................4 6.4. EXERCÍCIOS...................................................................................4 CAPÍTULO 7: SEMELHANÇA DE TRIÂNGULOS E O TEOREMA DE TALES.........................................................................4 vii

7.1. SEQUÊNCIAS PROPORCIONAIS.......................................................4 7.2. TEOREMA DE TALES......................................................................4 7.3. SEMELHANÇA................................................................................4 7.4. EXERCÍCIOS...................................................................................4 CAPÍTULO 8: CIRCUNFERÊNCIA E CÍRCULO...........................4 8.1. TANGENTES...................................................................................4 8.2. ÂNGULO INSCRITO........................................................................4 8.3. PERÍMETRO DE UMA CIRCUNFERÊNCIA.........................................4 8.4. ÁREA DE UM CÍRCULO..................................................................4 8.5. EXERCÍCIOS...................................................................................4 CAPÍTULO 9: TRIGONOMETRIA...................................................4 9.1. FUNÇÕES TRIGONOMÉTRICAS.......................................................4 9.2. RELAÇÃO FUNDAMENTAL.............................................................4 9.3. AMPLIANDO O DOMÍNIO...............................................................4 9.4. LEI DOS COSSENOS.......................................................................4 9.5. LEI DOS SENOS..............................................................................4 9.6. EXERCÍCIOS...................................................................................4 CAPÍTULO 10: INCIDÊNCIA E ORDEM NO ESPAÇO.................4 10.1. AXIOMAS DE INCIDÊNCIA............................................................4 10.2. DETERMINAÇÃO DE PLANOS.......................................................4 10.3. AXIOMA DE ORDEM....................................................................4 10.4. ÂNGULOS ENTRE RETAS..............................................................4 10.5. EXERCÍCIOS.................................................................................4 CAPÍTULO 11: PARALELISMO NO ESPAÇO E SUAS CONSEQÜÊNCIAS...............................................................................4 11.1. PARALELISMO ENTRE RETAS E PLANOS......................................4 11.2. PARALELISMO ENTRE PLANOS....................................................4 11.3. TEOREMA DE TALES....................................................................4 11.4. EXERCÍCIOS.................................................................................4 CAPÍTULO 12: PERPENDICULARISMO NO ESPAÇO E SUAS CONSEQÜÊNCIAS................................................................................4 12.1. PERPENDICULARISMO ENTRE RETAS E PLANOS..........................4 12.2. PERPENDICULARISMO ENTRE PLANOS........................................4 12.3. EXERCÍCIOS.................................................................................4 CAPÍTULO 13: PROJEÇÕES, DISTÂNCIAS, ÂNGULOS, DIEDROS E TRIEDROS......................................................................4 13.1. DISTÂNCIA DE PONTO A PLANO..................................................4 13.2. DISTÂNCIA ENTRE RETAS REVERSAS..........................................4

Índice 13.3. ÂNGULO ENTRE PLANOS E ENTRE RETA E PLANO......................4 13.4. DIEDROS......................................................................................4 13.5. TRIEDROS....................................................................................4 13.6. EXERCÍCIOS.................................................................................4 CAPÍTULO 14: POLIEDROS..............................................................4 14.1. FIGURAS POLIÉDRICAS................................................................4 14.2. SUPERFÍCIES POLIÉDRICAS..........................................................4 14.3. POLIEDROS..................................................................................4 14.4. FÓRMULA DE EULER...................................................................4 14.5. POLIEDROS DE PLATÃO...............................................................4 14.6. POLIEDROS REGULARES..............................................................4 14.7. EXERCÍCIOS.................................................................................4 CAPÍTULO 15: SUPERFÍCIE ESFÉRICA E ESFERA...................4 15.1. CONCEITO E PROPRIEDADES.......................................................4 15.2. DETERMINAÇÃO DE UMA SUPERFÍCIE ESFÉRICA........................4 15.3. POSIÇÕES RELATIVAS..................................................................4 15.4. SUPERFÍCIE ESFÉRICA E SUAS PARTES........................................4 15.5. EXERCÍCIOS.................................................................................4 CAPÍTULO 16: ÁREAS E VOLUMES...............................................4 16.1. AXIOMAS.....................................................................................4 16.2. PRISMA........................................................................................4 16.3. PIRÂMIDE....................................................................................4 16.4. CILINDRO....................................................................................4 16.5. CONE...........................................................................................4 16.6. ESFERA........................................................................................4 16.7. EXERCÍCIOS.................................................................................4 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................4 APÊNDICE A: O LIVRO “OS ELEMENTOS” DE EUCLIDES.....4 APÊNDICE B: RESOLUÇÃO DOS EXERCÍCIOS..........................4

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Capítulo 1: Introdução

A geometria1 surgiu há aproximadamente 4.000 anos no Egito e na Babilônia, de uma maneira intuitiva, não sistemática, com uma série de regras práticas sugeridas pela experiência, objetivando principalmente aplicações às medições. De fato, as relações desta sociedade, baseadas na propriedade, impuseram a necessidade de medir. Por outro lado, a geometria com um caráter dedutivo, apoiado em proposições gerais, teve seu início na antiga Grécia, com Tales de Mileto2 e Pitágoras3. Mas foi Euclides4, na sua famosa obra Os Elementos (Ver Apêndice A), o primeiro a apresentar um sistema axiomático para a geometria, ou seja, um sistema formado por noções primitivas, definições, axiomas e teoremas. Os axiomas são o começo dessa cadeia dedutiva e são as afirmações não demonstradas, que Euclides chamou de postulado (aquilo que não se pode). Euclides procurou escolher como postulados e afirmações que, por sua simplicidade, seriam aceitas por qualquer pessoa de bom senso e que eram, em um certo sentido, evidentes por si mesmas.

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“medida”.

Palavra de origem grega: “geo” significa “terra” e “metria” significa

2 Tales de Mileto nasceu por volta de 624 a.C. em Mileto, Ásia Menor (atualmente Turquia) e morreu por volta de 547 a.C. em Mileto. Tales de Mileto foi o primeiro filósofo grego, cientista e matemático conhecido. A ele é creditado cinco teoremas da geometria elementar [0]. 3 Pitágoras de Samos nasceu por volta de 569 a.C. em Samos, Ionia e morreu por volta de 475 a.C. Pitágoras foi um filósofo grego que fez importantes descobertas na matemática, astronomia e na teoria musical. O teorema hoje conhecido como Teorema de Pitágoras era conhecido pelos Babilônios 1000 anos atrás mas ele foi o primeiro a demonstrá-lo [0]. 4 Euclides de Alexandria nasceu por volta de 325 a.C. e morreu por volta de 265 a.C. em Alexandria, Egito. Euclides é o mais notável matemático da antigüidade. Foi mais conhecido pelo tratado sobre geometria denominado Os Elementos [0].

Acontece que os quatro primeiros postulados de Euclides, enunciados a seguir satisfazem essas condições de simplicidade e evidência, mas o quinto nem tanto, como vocês poderão perceber. 1. Dois pontos determinam uma reta. 2. A partir de qualquer ponto de uma reta dada é possível marcar um segmento de comprimento arbitrário. 3. É possível obter uma circunferência com qualquer centro e qualquer raio. 4. Todos os ângulos retos são s iguais.  5. Se uma reta r corta duas outras retas5 s e t (no mesmo plano) de modo que a soma dos ângulos t  interiores ( e ) de um mesmo lado de r é menor que dois retos, r então s e t , quando prolongadas suficientemente, se cortam daquele lado de r. O próprio Euclides deve ter considerado o quinto postulado pouco evidente, tanto que ele retardou o quanto possível o uso deste postulado. Já na Antigüidade, Proclus6 não aceitava o quinto postulado, pois achava que este poderia ser demonstrado a partir dos conceitos básicos da obra euclidiana, sendo, portanto, na realidade um teorema. Mas a maior parte das tentativas de demonstração do quinto postulado admitiam fatos que ou eram equivalentes a ele, ou não podiam ser demonstrados usando unicamente os outros quatro postulados. Grandes nomes na matemática tentaram sem sucesso a demonstração do quinto postulado.

5 No início do capítulo 2 apresentaremos as notações para pontos, retas, ángulos, etc. Os desenhos também farão parte do texto como forma de fixar melhor as idéias e resultados apresentados . 6 Proclus Diadochus nasceu em 8 de fevereiro de 411 em Constantinopla (atualmente Istambul), Byzantium (atualmente Turquia) e morreu em 17 de Abril de 485 em Atenas, Grécia. Proclus não foi um matemático criativo; mas foi um expositor crítico e detalhista, com um bom conhecimento dos métodos matemáticos e um conhecimento detalhado de milhares de anos da Matemática Grega de Tales até os seus dias [0].

1. Introdução

A negação do quinto postulado, e assim sua independência em relação aos outros quatro, levaram a criação de outras geometrias. A primeira geometria não Euclidiana foi publicada de maneira independente e quase simultânea pelo matemático russo N. I. Lobachewsky 7 em 1829 e pelo matemático J. Bolyai 8 em 1832. Tal geometria é hoje chamada geometria hiperbólica. Durante muito tempo distinguiu-se axioma de postulado. Os axiomas eram proposições evidentes por si mesmas e postulados eram proposições que se pediam fossem aceitas sem demonstração. Hoje, axiomas e postulados são designações das proposições admitidas sem demonstração, na verdade, atualmente emprega-se sempre a palavra axioma em lugar de postulado. Existem outras versões para os postulados da geometria plana que são encontrados nos Os Elementos de Euclides. David Hilbert9 construiu um sistema de axiomas para a geometria Euclidiana [0] consistindo de cinco grupos, a saber: I - Axiomas de incidência: Neste grupo são apresentados oito axiomas dos quais três são relacionados ao plano e cinco são relacionados ao espaço. Estes axiomas estabelecem as relações mútuas entre ponto e reta. II - Axiomas de ordem: Neste grupo são apresentados quatro axiomas e com eles é possível fazer a ordenação dos pontos sobre uma reta, um plano e no espaço. 7 Nikolai Ivanovich Lobachewsky nasceu em 1 de dezembro de 1792 em Nizhny Novgorod, Rússia e morreu em 24 de fevereiro de 1856 em Kazan, Rússia. Em 1829 Lobachevsky, publicou sua geometria não-euclidiana, o primeiro tratado deste tema a ser impresso [0]. 8 Jãnos Bolyai nasceu em 15 de dezembro de 1802 em Kolozsvár, Império Austríaco (atualmente, Cluj, Romênia) e morreu em 27 de janeiro 1860 em Marosvásárhely, Império Austríaco (atualmente, Tirgu-Mures, Romênia). Entre 1820 e 1823 Bolyai preparou um tratado sobre um sistema completo de geometria não-euclidiana [0]. 9 David Hilbert nasceu em 23 de janeiro de 1862 em Königsberg, Prussia (atualmente Kaliningrad, Rússia) e morreu em 14 de fevereiro de 1943 em Göttingen, Alemanha. A publicação de Hilbert em geometria foi um dos trabalhos com mais influência nesta área depois de Euclides. Um estudo sistemático dos axiomas da geometria euclidiana levou Hilbert a propor 21 axiomas e suas conseqüências. Ele fez contribuições em muitas áreas da matemática e física [0].

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III - Axiomas de congruência: Neste grupo são apresentados cinco axiomas dos quais três são relacionados a congruência de segmentos, um relacionado a congruência de ângulos e um relacionado a congruência de triângulos. IV - Axioma das paralelas: Este axioma estabele a unicidade de uma reta paralela a uma reta dada passando por um ponto. Neste grupo temos apenas um mas é o mais importante pois é ele que caracteriza a geometria euclidiana. V - Axiomas de continuidade: Este grupo é constituído de dois axiomas a saber: axioma de Arquimedes10 e axioma de Dedekind11. Apresentar a Geometria Euclidiana de forma dedutiva utilizando o sistema apresentado por Euclides ou Hilbert é mais complicado. Aleksei Vasil’evich Pogorelov12, com o objetivo de tornar o texto [0] mais simples dividiu os axiomas em seis grupos13: I. Axiomas de incidência: Este grupo é constituído de quatro axiomas, sendo dois relacionados ao plano e dois relacionados ao espaço. II. Axiomas de ordem: Este grupo é constituído de três axiomas, sendo dois relacionados ao plano e um relacionado ao espaço. III. Axiomas de medidas: Este grupo é constituído de doze axiomas, sendo dois relacionados a segmentos, dois relacionados a ângulos, quatro relacionados a áreas e quatro relacionados a volumes. 10 Arquimedes de Siracusa nasceu em 287 a.C. e morreu em 212 a. C. em Siracusa, Sicília. A maior contribuição de Arquimedes foi em Geometira. Seu método antecipou o cálculo integral 2.000 antes de Newton e Leibniz[0]. 11 Julius Wihelm Richard Dedekind nasceu em 06/10/1831 e morreu em 12/02/1916 em Braunschweig, atual Alemanha. A maior contribuição de Dedekind foi a definição de números irracionais em termos de cortes. Ele introduziu a noção de ideal que é fundamental para a teoria de anéis[0]. 12 Aleksei Vasil’evich Pogorelov nasceu em 3 de março de 1919 na Rússia e morreu em 2002. Sua área de pesquisa é caracterizada por uma rara combinação de talento para a a matemática e engenharia. É autor de mais de 200 publicações incluindo 40 monografias e livro-textos [8]. 13 Estes grupos foram apresentados separadamente para o plano (estudo que chamou de planimetria) e o espaço (estudo que chamou de estereometria).

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1. Introdução

IV. Axioma de existência de um segmento de comprimento dado: Este axioma e garante a construção de segmentos a partir de um número real dado. V. Axioma de Congruência: Este axioma garante a congruência de triângulos e permite obter áreas e volumes de figuras congruentes. VI. Axioma das paralelas: Por último temos o axioma que caracteriza a geometria euclidiana. Se, por um lado, Pogorelov não apresenta o grupo “axiomas de continuidade”, ele acrescenta mais dois grupos relacionados a medidas que de certa forma garantem a validade deste grupo. Nestas notas, utilizaremos uma versão simplificada de Pogorelov que possui a vantagem adicional de poder ser utilizada no ensino básico da geometria. Faremos algumas adaptações, entre elas estão:  Para o estudo de áreas e volumes acrescentamos o axioma do completamento.  Acrescentamos ao grupo de medidas axiomas relacionados a área e volumes. No decorrer do texto faremos a construção das principais figuras geométricas planas e espaciais sem, no entanto, fazer o estudo da construção com régua e compasso. Apesar de fazermos este estudo através da apresentação axiomática, não nos preocuparemos com as questões relacionadas a consistência, independência e completude dos axiomas apresentados. Esta análise está fora do escopo deste livro e pode ser vista nos livros de Hilbert [0] e Pogorelov [0]. Nosso estudo será formado por  Noções primitivas: são os conceitos aceitos sem definição.  Axiomas: são os resultados aceitos sem demonstração.  Definições: são os conceitos apresentados para simplificar a linguagem matemática ou para identificar um novo objeto matemático. 5

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Teoremas: são os resultados que são demonstrados a partir de uma cadeia dedutiva de afirmações.  Proposições: são o mesmo que os teoremas mas que no sistema como um todo não apresenta tanta importância quanto o teorema.  Lemas: são pequenos resultados que também devem ser demonstrados e que simplificam a demonstração de um teorema.  Corolários: são conseqüências imediatas de um teorema e que merece ser evidenciado. Cada uma dessas noções ficará clara no decorrer do estudo. As primeiras noções primitivas que adotaremos são as seguintes: Noção Primitiva 1: Ponto. Noção Primitiva 2: Reta. Noção Primitiva 3: Plano14. Estas noções primitivas nos dizem objetos básicos da geometria euclidiana. geometria euclidiana estudará as relações objetos. As notações que utilizaremos para planos serão as seguintes:

quem serão os Desta forma, a entre esses três pontos, retas e

Pontos: Letras latinas maiúsculas: A, B, C, X, Y,... Retas: Letras latinas minúsculas: a, b, c, x, y,...

14 Das noções primitivas temos um conhecimento intuitivo pela experiência, sensibilidade e observação. Por exemplo, a marca de um toque de grafite num papel, dá a idéia da noção não definida de ponto, apesar que isso é uma representação de ponto, pois ponto não tem dimensão, e a marca no papel tem. É interessante observarmos que Euclides no Livro I de “Elementos” definiu de maneira equivocada estas três noções, por exemplo, ele escreve que “ponto é aquilo que não tem partes” e deixa sem significado o termo “ter partes”.

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1. Introdução

Planos: As seguintes letras gregas maiúsculas 15: , , , , , , , . Nos capítulos de 2 a 9 trabalharemos somente num plano fixado e, portanto, não haverá necessidade da notação de plano. Esta necessidade somente ocorrerá a partir do Capítulo 10. As notações gráficas que utilizaremos para pontos, retas e planos serão as seguintes: Ponto:  Reta: Plano:

É importante observarmos que estas notações gráficas são apenas uma maneira de fixar as idéias com relação a cada um dos objetos trabalhados e que isto, de forma alguma, representa os objetos da teoria apresentada. Em todo o texto serão apresentados desenhos que servirão para fixar as idéias no desenvolvimento de determinado conceito ou resultado. Por outro lado, devemos esclarecer que são apenas ilustrativos e não podem servir para justificar qualquer uma das propriedades geométricas. No texto falaremos de figuras geométricas (planas ou espaciais), ou simplesmente, figuras planas ou figuras espaciais, que são subconjuntos do plano ou do espaço e estaremos apresentando uma classificação das principais figuras.

15 O alfabeto grego maiúsculo é dado por:  (alfa),  (beta),  (gama),  (delta),  (epsílon ou epsilo),  (zeta ou dzeta),  (eta),  (teta),  (iota),  (capa),  (lambda),  (mi ou mu),  (ni), (xi), (ômicron),  (pi),  (rô),  (sigma), (tau), (upsilon),  (fi),  (chi), (psi) e. (ômega).

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Capítulo 2: Incidência e Ordem no Plano

Neste capítulo apresentaremos axiomas de incidência e ordem no plano. Os axiomas de incidência estabelecem as relações mútuas entre ponto e reta e os axiomas de ordem estabelecem uma ordenação dos pontos na reta e no plano.

2.1. Axiomas de Incidência Neste primeiro grupo estudaremos a incidência entre pontos e retas que terá o mesmo significado de interceptar, passar por, estar sobre. Começaremos pelo axioma de existência. Axioma I.1: (de existência) a) Existe ponto. b) Existe reta e qualquer que seja a reta, existem pontos que pertencem à reta e pontos que não pertencem à reta. O mais interessante deste axioma é que ele nos garante a existência dos objetos básicos, ou seja, a geometria não constitui-se de um conjunto vazio e, portanto, fará sentido o estudo da relação entre esses objetos. Axioma I.2: (de determinação): Dados dois pontos distintos existe uma única reta que contém estes pontos. Observações:

2.

Incidência e Ordem no Plano

1. Como dois pontos determinam uma reta, quando falarmos de uma reta que passa por dois pontos distintos A e B, a denotaremos por rAB. 2. Este axioma constitui um bom teste de qualidade das réguas que utilizamos, ou seja, se você conseguir desenhar duas retas distintas passando por dois pontos distintos significa que esta régua não é adequada para esta geometria. 3. Dada uma reta r, que existe pelo Axioma I.1.b, tomamos um ponto P qualquer fora de r e um ponto Q em r, que existem pelo mesmo axioma; unindo P com Q, teremos uma nova reta s que é univocamente determinada pelos pontos P e Q de acordo com o Axioma I.2a. O ponto Q na reta r, é o que chamaremos de interseção de r e s, cuja notação será r  s. Fazendo um abuso de notação, escreveremos r  s = Q ao invés de r  s = {Q}. Isto será feito com o objetivo de simplificá-la. 4. Quando duas retas possuírem um ponto de interseção, diremos que as duas retas se inter-ceptam. Como estamos estudando geome-tria, vamos visualizar geometricamente o con-teúdo das observações 3 e 4. No desenho ao lado temos as retas r e s se interceptando no ponto Q e o ponto P não pertencente a reta r.

r P Q s

Definição 2.3: Se três (ou mais) pontos estão sobre uma mesma reta, diremos que eles são colineares.

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J. R.

Exemplo

r 2.1. No desenho ao lado, os pontos C A, B e C são colineares pertencendo a reta r, os pontos D, E e F são não B colineares, onde D e E pertencem a reta s, D e F pertencem a reta t, e E A e F pertencem a reta q.

F E q

D s

t

Proposição 2.3: Dadas duas retas distintas, possuem no máximo um ponto de intersecção.

elas

Demonstração: Se a interseção de duas retas contiver pelo menos dois pontos distintos, então pelo Axioma I.2 as retas não podem ser distintas, o que é uma contradição. Logo, as duas retas se interceptam no máximo em um ponto.

 Vejamos agora a quarta noção primitiva da geometria euclidiana que permitirá apresentar a noção de segmento de reta. Noção Primitiva 4: Um ponto C estar entre dois pontos A e B de uma reta r, onde A, B e C são distintos. Observemos que dizer “C está entre A e B” é o mesmo que dizer “C está entre B e A”. No desenho ao lado, os pontos A, B e C pertencem a reta r e o ponto C está entre A e B.

B

r

C A

Definição 2.3: Sejam A e B dois pontos de uma reta r. O conjunto constituído pelos dois pontos A e B e pelos pontos que estão entre A e B é chamado de segmento de reta, cuja notação será AB. Os pontos que estão entre A e B são chamados pontos interiores, ou simplesmente pontos do segmento AB; os pontos A e B, são 10

Incidência e Ordem no Plano

2.

denominados extremos do segmento AB. A reta r é denominada reta suporte do segmento AB e será denotada por rAB.16 Exemplos 2.2. No desenho ao lado Extremos B r indicamos o seg-mento AB, o Interiores interior do segmento AB e os extremos A e B na reta suporte r. Obser-vemos que o segmento AB é A formado pela união dos pontos Segmento AB extremos com os pontos interiores. 2.3. A noção de segmento permitirá a construção de várias figuras r B planas conheci-das. Com os conceitos e resultados que temos já C podemos construir os triângulos, que são figuras formadas por três s pontos não colineares A, B e C e pelos segmentos de reta determinados por estes três pontos. A No desenho ao lado, temos um t triângulo construído sobre as retas r, s e t que, duas a duas, se interceptam nos pontos A, B e C, formando os segmentos AB, AC e BC. Os pontos A, B e C são chamados vértices do triângulo e os três segmentos de lados do triângulo. Denotaremos esse triângulo por ABC. Um triângulo é bem determinado pelos seus três pontos pois os segmentos são bem determinados por dois pontos.

16 Não há diferença entre o segmento AB e o segmento BA. Existirá a diferença quando temos um segmento orientado. A notação é a mesma da reta que passa por dois pontos e é razoável que seja assim pois existe uma única reta suporte do segmento e que contém os extremos do segmento.

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Até o momento apresentamos qua-tro classes17 de figuras geométricas planas: pontos, retas, segmentos e triângulos. No pontos retas diagrama ao lado visualizamos estas classes que, conforme se observa, são disjuntas, ou seja, um segmentos ponto não pertence a classe dos triângulos segmentos, um segmento não Figuras pertence a classe dos triângulos, etc. O diagrama apresentado não se preocupa com questões relativas ao tamanho de cada classe mas sim com a questão de conjunto propriamente dita, ou seja, consideramos o conjunto de todas as figuras planas e vamos visualizar este conjunto que está particionado em classes que poderão ser disjuntas ou não.

2.2. Axiomas de Ordem O próximo grupo estabelecerá as relações mútuas entre os pontos numa reta e no plano e pertencem ao segundo grupo de axiomas denominado axiomas de ordem. Axioma II.1: Dados três pontos colineares, um e apenas um deles localiza-se entre os outros dois. Axioma II.2: Dados dois pontos A e B numa reta, sempre existem um ponto C entre A e B e um ponto D, tal que A está entre D e B.

D

A

C

B

Definição 2.3: Seja r uma reta e fixemos um ponto O em r. Consideremos os pontos A e B em r, distintos de O. Se A = B, diremos que A e B estão do mesmo lado em relação ao ponto O. Caso contrário, pelo Axioma II.1, O está entre 17

O sentido que estamos dando para a classe é o usual, ou seja, um conjunto de objetos que possuem uma propriedade em comum.

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Incidência e Ordem no Plano

2.

A e B, ou não. Se O não está entre A e B diremos que A e B estão no mesmo lado em relação ao ponto O. Se O está entre A e B, diremos que A e B estão em lados diferentes em relação ao ponto O. Exemplos 2.4. No desenho ao lado temos as seis possibilidades que podem C B C A B A ocorrer com três pontos sobre uma reta dada. Deixamos subentendida A uma ordem que será vista na C A C B próxima seção. De fato, até o B momento não há diferença entre o A A B B C C primeiro e o sexto caso, segundo e quarto caso, terceiro e quinto caso. 2.5. Nos desenhos ao lado A O O A=B B ilustramos todas as possíveis situações entre dois pontos em B A B relação a um ponto O. No desenho O A O O B A onde A e B estão do mesmo lado, A e B estão do mesmo lado em observemos que ainda não relação a O sabemos a diferença entre o B A segundo e o quarto caso. Da mesma forma com o terceiro e O O quarto caso. Isto também se nota A B quando A e B estão em lados diferentes em relação a O. Na A e B estão em lados diferentes em relação a O realidade, está faltando estabelecer uma ordem nesta reta pois é a ordem que permitirá diferenciar estes casos. O mesmo ocorre com o segundo desenho. A relação entre os pontos, dada pelo ponto O, nos permite particionar a reta:

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Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

Teorema 2.3: Um partição18 da mesma.

ponto

J. R.

numa

reta

fornece

uma

Demonstração: Dado uma reta r e um pon-to O pertencente a r, escolhamos um um ponto arbitrário r A em r distinto de O, que existe pelo A item b) do Axioma I.1. Vamos S denotar por S o conjunto de todos O os pon-tos que se encontram do mesmo lado que A em relação a O, S’ e por S’ o conjunto de todos os pontos que se encontram em lados diferentes de A em relação a O. Considere a família de conjuntos  ={S, S’,{O}}. Vamos mostrar que  é uma partição de r, ou seja: 1. S   e S’  ; 2. S  {O} = , S’  {O} =  e S  S’ = ; 3. S  S’  {O} = r. De fato, vamos demonstrar cada um dos itens de 1 a 3: 1. Pela Definição 2.3, temos que o ponto A está do mesmo lado que A em relação ao ponto O. Logo, A  S e, então, S  . Para demonstrar a segunda parte temos, pelo Axioma II.2, que existe um ponto D tal que O está entre A e D. Logo, pela Definição 2.3, D  S’ e, então, S’  . 2. Pela Definição 2.3, temos que qualquer ponto de S ou S’ é diferente do ponto O. Logo, S  {O} =  e S’  {O} = . Para demonstrar a terceira parte, seja B  S  S’, ou seja, B está do mesmo lado que A em relação a O e B está em lado diferente de A em relação a O, o que pela Definição 2.3 contradiz o Axioma II.1. 3. É claro que S  S’  {O}  r. Para mostrar que r  S  S’  {O} considere um ponto B  r diferente do ponto O. 18 Dado um conjunto A, dizemos que uma família  de conjuntos é uma partição do conjunto A se todos os elementos de  são subconjuntos não vazios de A, quaisquer dois elementos de  são disjuntos e a união de todos os elementos de  fornece o conjunto A.

14

Incidência e Ordem no Plano

2.

Se B = A então B  S, pela Definição 2.3. Se B  A, pelo Axioma II.1 temos B entre O e A, ou A entre O e B, ou O entre A e B. Nos primeiro e segundo casos temos, pela Definição 2.3, temos B  S. No terceiro caso, também pela Definição 2.3 temos B  S’. Logo, r  S  S’  {O} e, portanto r = S  S’  {O}.

 Este teorema garante a existência de uma relação de equivalência em r. Deixamos como exercício a demonstração desta afirmação (Exercício 2.6). Definição 2.3: O conjunto S da demonstração do Teorema 2.3, juntamente com o ponto O é chamado semireta. Analogamente, o conjunto S’ unido com {O} também é chamado semi-reta. O ponto O, é chamado origem da semi-reta. Se um ponto A  S, vamos denotar a semi-reta que contém A por SOA. Analogamente, se um ponto A’  S’, a notação da semiA reta que contém A’ será SOA’. Geometricamente, a semi-reta SOA será representada como no desenho O ao lado. Dizemos que SOA’ é a semireta oposta a SOA e vice-versa. Proposição 2.3: Se B está entre A e C, e C está entre B e D, então B e C estão entre A e D. Demonstração: Consideremos as semi-retas SBA e SBC. Como B está entre A e C, temos

15

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

SBA  SBC = r e SBA  SBC = B. É claro que A  SBA e C  SBC. Se D  SBA então, pela Definição 2.3 e Definição 2.3, temos que B está entre C e D, o que é uma contradição. Logo, D  SBC e, portanto, B está entre A e D. Consideremos, agora as semi-retas SCD e SCB. Como C está entre B e D, temos SCD  SCB = r e SCD  SCB = C. É claro que D  SCD e B  SCB. Se A  SCD então, pela Definição 2.3 e Definição 2.3, temos que C está entre A e B, o que é uma contradição. Logo, A  SCB e, portanto, C está entre A e D.

J. R.

A

B C D B C D

A

 Concluímos até agora que o ponto O, determina exatamente duas semi-retas distintas, cuja interseção é o ponto O. A seguir, vamos dividir os pontos de um plano também em duas classes. Para isso necessitamos da seguinte definição: Definição 2.3: Consideremos uma reta r e dois pontos A e B que não pertencem a esta reta. Se A = B, diremos que A e B estão em um mesmo lado em relação a reta r. Se A  B, temos duas possibilidades, o segmento AB intercepta ou não a reta r. Se intercepta, diremos que A e B estão em lados contrários em relação a reta r, se não intercepta, A e B estão em um mesmo lado em relação a reta r.

16

2.

Incidência e Ordem no Plano

Exemplos 2.6. No desenho ao lado temos que os pontos C e D estão em lados contrários em relação a reta r e os pontos A e B estão do mesmo lado em relação a reta r. Por outro lado, s C e D estão do mesmo lado em relação a reta s e os pontos A e B estão em lados contrários em r relação a reta s.

C

D

A

B

Teorema 2.3: Uma reta fornece uma partição do plano. Demonstração: Seja r uma reta do plano, a demonstração deste teorema é análoga a do Teorema 2.3. Neste caso, tomamos um ponto A não pertencente a r, que existe pelo Axioma I.1.b. Denotamos por  o conjunto de todos os pontos que se encontram do mesmo lado que A em relação a r, e por ’ o conjunto de todos os pontos que se encontram em lados diferentes de A em relação a reta r. Considere a família  = { , ’ ,r}. Devemos mostrar que 1.    e ’  ; 2.   r = , ’  r =  e   ’ = ; 3.   ’  r é igual ao plano. De fato, vamos demonstrar cada um dos itens de 1 a 3. 1. Pela Definição 2.3, temos que o ponto A está do mesmo lado que A em relação a reta r, e assim, A  , donde   . Para a segunda parte, tomamos um ponto O qualquer em r (que existe pelo do Axioma I.2.b); os pontos O e A, fornece uma reta s pelo Axioma I.2.a, cuja interseção com r é o ponto O. Pelo Axioma II.2, existe um ponto B em s, tal que O está entre A e B. Assim O pertence ao segmento AB e pela Definição 2.3, A e B estão em lados diferentes em relação a reta r. Logo B  ’, donde ’  ;

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J. R.

2. Pela Definição 2.3, temos que qualquer ponto de  ou de ’ não está em r. Assim,   r =  e ’  r = . Para mostrar que a terceira interseção é vazia, observamos que se B    ’, então B está do mesmo lado que A em relação a r e B está em lado diferente em relação a r, assim, pela Definição 2.3, temos uma contradição; 3. É claro que   ’  r está contido no plano. Vamos mostrar que todos os pontos do plano estão contidos em   ’  r. Seja B um ponto qualquer do plano, se B  r, temos o desejado. Se B  r, podemos ter B = A, neste caso pela Definição 2.3, B  , e novamente teremos o resultado. Se B  A, consideremos a reta s = rAB. Pela Proposição 2.3, r e s tem no máximo um ponto de interseção. Se r  s é o conjunto vazio, então o segmento AB não intercepta r e assim, pela Definição 2.3, B está do mesmo lado que A em relação a r, ou seja, B  . Se r  s = {O}, então pelo Axioma II.1, ou O está entre A e B, ou não. No primeiro caso, B  ’ e no segundo caso, B  . Assim, esgotamos todas as possibilidades, e em todas elas, temos B  r, ou B   ou B  ’, donde segue o resultado.

 Este teorema garante a existência de uma relação de equivalência no plano. Deixamos como exercício a demonstração desta afirmação (Exercício 2.7). Definição 2.3: Sejam r uma reta e A um ponto que não pertence a r. O conjunto  da demonstração do Teorema 2.3, juntamente com r é chamado de semiplano determinado por r contendo A, e será representado por r,A.

18

r

A

Incidência e Ordem no Plano

2.

Exemplos 2.7. Uma reta r divide o plano em dois semiplanos distintos, a saber: os semipla-nos r,A e r,B, cuja interseção é a reta r. Aqui, o ponto B está do lado contrário de A em relação a reta r. No desenho ao lado, visualizamos estes dois semiplanos. 2.8. Com estes resultados podemos construir os quadriláteros, que são figuras formadas por quatro pontos A, B, C e D (três a três não colineares) e pelos segmentos de reta AB, BC, CD e DA tais que os segmentos podem se interceptar somente em seus extremos. Os pontos A, B, C e D são chamados vértices do quadrilátero e os quatro segmentos são chamados de lados do quadrilátero. Denotaremos o quadrilátero por ABCD. Para construir um quadrilátero, considere uma reta r e pontos A, B e C tais que A, C  r e B  r. A existência destes pontos está garantida pelo Axioma I.1.b. Considere um ponto E  r, que podemos supor entre A e C. Na reta rBE considere a semi-reta oposta SEB e um ponto D pertencente a ela. Afirmamos que os pontos A, B, C e D junto com os segmentos AB, BC, CD e DA formam um quadrilátero. De fato, temos que os pares de segmentos AB e BC, BC e CD, CD e DA, DA e AB se interceptam somente em um dos extremos, pois caso contrário eles seriam iguais pela Proposição 2.3. Resta mostrar que os pares de segmentos AB e CD, AD e BC não se interceptam. Temos que os segmentos AB e BC estão no 19

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

semiplano r,B, CD e AD estão no semiplano r,D. Logo, AB e CD estão em semiplanos opostos determinado por r. Como A, C  r e são distintos temos que AB e CD não se interceptam. Deixamos como exercício a verificação de que AD e BC não se interceptam (Exercício 2.10). 2.9. Dados quatro pontos três a três não colineares, sempre é possível construir um quadrilátero. De fato, sejam A, B, C e D estes pontos e escolhamos dois pontos quaisquer, digamos A e B. Temos duas opções: 1. C e D estão em semiplanos opostos determinados por rAB: Neste caso, basta considerar os segmentos AC, CB, BD e DA. 2. C e D estão no mesmo semiplano determinado por rAB: Neste caso, escolhamos um dos pontos A ou B e um dos pontos C e D, digamos A e C. Temos duas opções: a) B e D estão no mesmo semiplano determinado por AC: Neste caso, basta considerar os segmentos AC, CD, DB e BA.

20

2.

Incidência e Ordem no Plano

b) B e D estão em semiplanos opostos determinados por rAC: Neste caso, basta considerar os segmentos AB, BC, CD e DA.

Com estes resultados o diagrama apresentado anteriormente passa a ter a visualização no diagrama abaixo. Observamos que agora temos sete classes distintas de figuras planas, todas disjuntas: pontos, retas, segmentos, semi-retas, triângulos, semiplanos e quadriláteros.

pontos

retas

semi-retas

triângulos

segmentos

semiplanos quadriláteros Figuras

2.3. Ordenando uma Reta Nosso objetivo agora será utilizar os axiomas anteriores para construir uma relação de ordem sobre uma reta.

21

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

Definição 2.3: Seja r uma reta arbitrária e O um ponto sobre r. Consideremos uma das duas semiretas que tem origem comum em O. Diremos que um ponto A desta semi-reta precede um ponto B, se A está entre O e B. Chamando uma das duas semiretas com origem O de primeira semi-reta ou semi-reta negativa e a outra de segunda semi-reta ou semi-reta positiva, podemos definir uma relação na reta r toda, estabelecendo as seguintes condições:

J. R.

O

C

Dr

B A

1. Sejam A e B dois pontos da semi-reta negativa. Então, na reta r, A é menor do que B se B precede A. 2. Todos os pontos da semi-reta negativa são, na reta r, menores do que o ponto O. 3. Todos os pontos da semi-reta negativa são, na reta r, menores do que todos os pontos da semi-reta positiva. 4. O ponto O, na reta r, é menor do que todos os pontos da semi-reta positiva. 5. Sejam C e D dois pontos da semi-reta positiva. Então, na reta r, C é menor do que D se C precede D. Notação: Se A é menor do que B, escreveremos “A < B” e se A é menor do que ou igual a B, escreveremos “A  B”. Proposição 2.3: A relação “menor do que ou igual a” () é uma relação de ordem total na reta. A relação “menor do que” ( 0, existe um segmento de reta de comprimento d, que pode ser construído a partir da origem de qualquer semi-reta dada. Agora podemos estabelecer uma unidade de medida de segmentos e construir um instrumento que servirá para comparar comprimentos. Esta unidade é denominada metro internacional e é a distância entre dois traços em uma certa barra de metal conservada no Bureau Internacional de Pesos e Medidas perto de Paris. (A barra deve estar à temperatura do gelo fundente: 0ºC). Este é o segmento cuja medida vale 1 metro.22 Para construir uma régua graduada, subdividimos o metro em 1000 partes iguais, fornecendo assim o milímetro. Cada 10 milímetros nos dá 1 centímetro. A foto a seguir ilustra em tamanho natural parte de uma régua graduada de 20 centímetros que corresponde a 200 milímetros, ou seja, 200 partes da divisão dada.

22

Historicamente, em 1790, a Assembléia Constituinte da França, criou uma comissão de cientistas, integrada por Lagrange, Laplace e Monge, entre outros, com o objetivo de analisar e propor soluções para o problema de criar uma unidade de medida de comprimento. Como conseqüência dos trabalhos dessa comissão, em 1795, criou-se uma lei que estabelecia o metro como unidade padrão de comprimento e era definido como: "a décima milionésima parte do quadrante de um meridiano terrestre". Para chegarem a essa relação, dois astrônomos franceses, Méchain e Delambre, mediram o arco de meridiano entre as cidades de Dunquerque, na França, e Barcelona, na Espanha, passando por Paris, sendo então construído um metro de platina para ser utilizado como padrão.

34

Segmentos, Ângulos e Medidas

3.

Exemplos 3.1. Consideremos três pontos A, B e C tais que B esteja entre A e C e AB = 2. Não importa qual seja o valor de BC, o valor de AC é 2 + BC, pelo Axioma III.2. Por exemplo, se BC = 5, teremos AC = 7. 3.2. Se considerarmos os números reais 4 e 6, pelo Axioma IV.1, existem segmentos de reta de comprimento 4 e 6, que podem ser construídos a partir de qualquer ponto da reta. No desenho ao lado, vemos que o segmento AB possui comprimento 1 cm, o segmento CD possui comprimento 0,9 cm e o segmento BC possui comprimento 1,5. Observamos que o segmento AD possui comprimento 3,4. O próximo teorema, que utiliza estes axiomas, permitirá introduzir a noção de coordenada. Teorema 3.4: Sejam r uma reta e IR o conjunto dos números reais. Existe uma função x: r  IR bijetora tal que, se x(A) e x(B) são as imagens de dois pontos A e B, o comprimento do segmento AB será igual a  x(B) – x(A) . Demonstração: Seja O  r um ponto qualquer, pelo Teorema 2.3 e Definição 2.3, O divide r em duas semiretas. Escolhamos uma para ser a semi-reta negativa, denotando-a por SO–, e a outra para ser a semi-reta positiva, denotando-a por SO+. Definamos a relação x = {(A,x(A))|Ar}, onde se A  O  0  x(A)   OA se A  SO   OA se A  S . O  Temos que x é uma função pois Dom x = r, pelo Axioma III.1. Além disso, se A = B temos x(A) = x(B), pois OA = OB 35

Geometria Plana e Espacial J. R. Gerônimo/V. S. Franco e então OA OB. Temos também que x é bijetora. De

fato, x é injetora pois considerando A e B distintos, temos os seguintes casos: 1. A e B em SO–: OA  OB  – x(A)  – x(B)  x(A)  x(B). 2. A e B em SO+: OA  OB  x(A)  x(B). 3. A e B em semi-retas distintas: teremos x(A) e x(B) com sinais distintos e portanto x(A)  x(B). Quanto a sobrejetividade, seja d  IR, pelo Axioma IV.1, existe um segmento de reta de comprimento |d| construído a partir do ponto O. Se d> 0, contruímos o segmento OD na semi-reta positiva SO+, se d 0 e x(D’) = d se d < 0. Logo, para qualquer d  IR, sempre obtemos um ponto P em r tal que x(P) = d, onde  D se d  0  P   O se d  0  D' se d  0. 

Para demonstrar a segunda parte, sejam A, B em r. Se A = B então x(A) = x(B) e, assim, AB = 0 = |x(B) – x(A)|. Se A  B temos os seguin-tes casos: 1. A entre O e B na semi-reta positiva: OB OA AB AB OB OA = x(B) – B O A 1 x(A). 2. B entre O e A na semi-reta positiva: A O B 2 OA  OB BA AB BA OA OB = = x(A)–x(B). 3. A entre O e B na semi-reta O B A 3 negativa: BO BA AO AB BA BO AO= =–x(B) – (–x(A)) =x(A) – x(B).

36

3.

Segmentos, Ângulos e Medidas

4. B entre O e A na semi-reta negativa: AO AB BO AB AO BO = A B = –x(A) – (–x(B)) = x(B) – 4 x(A) 5. A na semi-reta positiva e B na B O negativa: 5 BA BO OA= –x(B) + x(A) = x(A) – x(B). 6. B na semi-reta positiva e A na A O 6 negativa: x(B)– AB AO OB=–x(A)+x(B)= x(A). Assim, em qualquer caso, obtemos AB =  x(B) – x(A)

O

A

B

.

 Definição 3.4: Sejam r uma reta, O  r e a função x: r  IR, dada pelo Teorema 3.4. Dado A  r, o número x(A) é chamado de coordenada do ponto A em relação a O e a função x é denominada um sistema de coordenadas em relação a O para a reta r. Com a relação de ordem entre os pontos de uma reta r, estabelecida no Capítulo 2, os axiomas III.1, III.2, IV.1, e o Teorema 3.4 podemos garantir o seguinte resultado: Corolário 3.4: Dado um número real d e fixado um ponto O de uma reta r, existe um único ponto de r tal que sua coordenada com relação a O é d. Demonstração: Segue diretamente do fato da função x, dada pelo Teorema 3.4, ser bijetora. A existência segue da sobrejetividade e a unicidade segue da injetividade da função x construída no Teorema 3.4.

 37

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

As coordenadas dos pontos caracterizam sua posição na reta. Este é o resultado apresentado na proposição a seguir: Proposição 3.4: Sejam A, B e C pontos de uma mesma reta, cujas coordenadas, são respectivamente a, b e c. O ponto C está entre A e B se, e somente se, o número c está entre os números a e b. Demonstração: Primeiramente, suponhamos que o ponto C esteja entre A e B, então pelo Axioma III.2, temos AB AC CB. Pelo Teorema 3.4, temos AB = |b – a|, AC = |c – a| e CB = |b– c|. Assim, |b – a| = |c – a| + |b – c|. Suponhamos que b>a, então |c – a| < b – a e |b – c| < b – a. Logo, c – a < b – a e b – c < b – a. Portanto, c < b e a < c, ou seja, a < c < b. No caso em que a>b, temos |c – a| < –(b – a) e |b – c| < –(b – a). Logo, c – a > b – a e b – c > b – a. Portanto, c > b e a > c, ou seja, b < c < a. Assim, em ambos os casos o número c está entre os números a e b. Reciprocamente, se a < c < b ou b < c < a, temos |c – a| + |b – c| = |b – a|. Assim, pelo Teorema 3.4, segue que AC CB AB. Em particular, AC AB. Consideremos as semi-retas determinadas pelo ponto A. Se B e C estão em semi-retas opostas, pela definição de coordenadas de pontos, as coordenadas a, b e c não poderiam satisfazer a < c < b ou b < c < a, assim, B e C estão na mesma semireta em relação a A e pela Proposição 3.4, temos que C está entre A e B, como queríamos demonstrar.

 Definição 3.4: Dado um segmento AB, dizemos que um ponto C  AB é A o ponto médio de AB, se AC CB .23.

C

B

23 Utilizaremos os símbolos /, //, ///, ////,  sobre os segmentos para representar que estes possuem o mesmo comprimento. Aqui estamos utilizando no desenho o símbolo “//”.

38

3.

Segmentos, Ângulos e Medidas

A existência e unicidade do ponto médio são garantidas pela proposição a seguir. Proposição 3.4: Qualquer segmento tem um único ponto médio. Demonstração: (Existência) Sejam a e b as coordenadas das extremidades deste segmento. Considere o número (a  b) c . Afirma-mos que o segmento de coordenada c 2 (que existe pelo Axioma IV.1) é o ponto médio desejado. De fato: a b a b   2 2 2 a b a b CB c  b  b   2 2 2 AC  a  c  a 

(a  b) está 2 entre a e b, segue da Proposição 3.4 que C está entre A e B. donde segue que AC CB, e como o número

(Unicidade) Suponhamos que C e D sejam pontos médios do segmento AB, então: CD x(C)  x(D) 

a b (a x(D)) (x(D)  b) AD BD  x(D)   0 2 2 2

. Portanto, x(C) = x(D), pela injetividade da função x dada pelo Teorema 3.4, temos que C = D.

 É importante observar que apenas a condição C  AB não é suficiente para que C seja ponto médio. Se impormos apenas a condição AC CB observe que também não é suficiente pois podemos ter algo como mostra o desenho ao lado onde AC CB e C 39

C

A

B

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J. R.

 AB. Por outro lado, podemos supor somente que C está na reta rAB e teremos como como conseqüência da condição AC CB que C está entre A e B. De fato, se C  AB então temos B entre A e C ou A entre B e C. No primeiro caso, AC AB BC CB e no segundo caso temos CB AC AB AC, o que torna impossível C satisfazer a condição AC CB e, portanto, C está entre A e B. O conceito de distância permite definir circunferência e círculo. Seja O um ponto do plano e r um número real positivo. A r O circunferência de centro O e raio r é o conjunto constituído por todos os pontos C do plano tais que OC r . O conjunto dos pontos C A que satisfazem a desigualdade r OC r é dito ser o círculo de O centro O e raio r (ou disco de centro O e raio r). Se um ponto A B é tal que OA < r, dizemos que A está no interior do círculo. Se um ponto B é tal que OB> r, dizemos que B está no exterior do círculo. As propriedades das circunferências e dos círculos serão estudadas no Capítulo 8.24 A circunferência de centro O e raio r é uma figura plana onde todos os pontos pertencentes a ela distam r de O e qualquer ponto que dista r de O pertence à circunferência. Estas duas propriedades nos levam ao 24 Em geral, os termos circunferencia e disco, em qualquer texto matemático têm sentido bastante claro, ou seja, circunferencia é a linha e disco é a região determinada pela circunferencia. Já para o termo círculo existe uma ambiguidade em vários textos, significando hora circunferencia ou hora disco. Neste texto, seremos rigorosos no uso desses termos, seguindo rigorosamente a definição dada.

40

3.

Segmentos, Ângulos e Medidas

conceito de lugar geométrico segundo uma propriedade , que é uma figura plana  tal que: a) Todos os pontos pertencentes a  satisfazem a propriedade . b) Os únicos pontos do plano que satisfazem a propriedade  pertencem a . O círculo é também um lugar geométrico. No decorrer do texto apresentaremos outros exemplos de lugares geométricos. O conceito de distância permite definir ainda o perímetro de um polígono. Definição 3.4: A soma das medidas dos lados de um polígono qualquer é chamada perímetro do polígono.

3.2. Medidas de Ângulos Da mesma maneira que trabalhamos com segmentos apresenta-remos os principais conceitos e resultados relacionados a ângulos. Definição 3.4: Num semiplano, chamamos de ângulo a figura formada por duas semi-retas com a mesma origem, tal que uma das semi-retas está sobre a reta que determina o semiplano. As semiretas são chamadas de lados do O ângulo e a origem comum, de vértice do ângulo. Um ângulo formado por duas semi-retas distintas de uma mesma reta é chamado de ângulo raso.25

O

25 Alguns livros definem ângulo como a “região” determinada pelas semi-retas. Não existe diferença entre estas escolhas mas devemos lembrar que a cada ângulo determinado por uma definição está associado um ângulo determinado pela outra definição.

41

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Existem várias maneiras distintas de denotar um ângulo. É A muito usual denotar o ângulo da Definição 3.4, por AÔB ou por BÔA. Ao utilizar esta notação, a letra O indicativa do vértice deve sempre aparecer com acento circunflexo B entre as outras duas letras que representam os pontos das semiretas que formam o ângulo. Quando nenhum outro ângulo exibido tem o mesmo vértice, pode-se denotar por Ô, utilizando apenas a letra do vértice com acento circunflexo para designar o ângulo. 26 Voltaremos agora para o grupo III de axiomas para estabelecer medida de ângulos. Axioma III.3: A todo ângulo corresponde um número maior ou igual a zero e menor ou igual a 180. Este número é zero se, e somente se, ele é constituído por duas semiretas coincidentes. Ao ângulo raso corresponderá o número 180. Definição 3.4: Dado um ângulo Â, o número a que se refere este axioma é chamado medida em graus do ângulo  e será denotado por m(Â). Aqui também ao introduzir este axioma, estamos admitindo que podemos fazer esta medida em graus através de algum instrumento conhecido, que definirá uma unidade de medida. Mais adiante veremos como construir e utilizar este instrumento.

26

Note que não estamos diferenciando o ângulo AÔB do ângulo BÔA, isto somente é feito quando se deseja trabalhar com ângulos orientados.

42

Segmentos, Ângulos e Medidas

3.

Quando não há a necessidade de explicitar os elementos de um ângulo, é bem usual a utilização de  letras gregas minúsculas 27 para denotar a medida do ângulo. Neste caso é conveniente escrever a letra grega em questão próxima do seu vér-tice, conforme desenho ao lado. Quando a medida é um número conhecido escreve-se o próprio número no lugar da letra. Não se sabe exatamente quando o homem começou a medir ângulos mas certamente eles já eram medidos por volta de 2.800 a.C. na antiga Mesopotâmia. Conjectura-se que a necessidade de medir ângulos surgiu na Astronomia, sendo talvez o primeiro estudo a incorporar a aplicação da matemática. Por exemplo, se quisesse saber a distância que a Lua estava acima do horizonte utilizava-se os seguintes métodos:  Esticava-se o braço e se calculava quantos dedos comportava o espaço entre a Lua e o horizonte ou  Segurava-se um fio entre as mãos afastadas do corpo e se media a distância. A medida era diferente de um comprimento comum sendo considerado o primeiro passo para medir ângulo. O análogo ao Axioma III.2 para ângulos é dado pelo próximo axioma. Para isto apresentamos a seguinte definição:

27 O alfabeto grego minúsculo é dado por:  (alfa),  (beta),  (gama),  (delta),  (epsílon ou epsilo),  (zeta ou dzeta),  (eta),  (teta),  (iota),  (capa),  (lambda),  (mi ou mu),  (ni),  (xi), (omicron),  (pi),  (rô),  (sigma), (tau), (upsilon),  (fi),  (qui), (psi) e (omega).

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Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

.

Definição 3.4: Sejam SOA, SOB e SOC semi-retas com origem O. Se o segmento AB interceptar SOC, diremos que SOC divide o ângulo AÔB. O

A C

Pode-se mostrar que se o segmento AB interceptar SOC, então B SOC intercepta qualquer segmento com extremos nos lados do ângulo. Deixamos como exercício a demonstração desta afirmação (Exercício 3.12). Axioma III.4: Se uma semi-reta SOC B divide um ângulo AÔB, então a medida do ângulo AÔB é igual a O C soma das medidas dos ângulos AÔC e CÔB, ou seja, A m(AÔB) = m(AÔC) + m(CÔB). Teorema 3.4: Considere um ângulo AÔB e SOC uma semi-reta por O onde C está no mesmo semiplano de B com relação a reta rOA. Nestas condições, temos que ou SOB divide AÔC, ou SOC divide AÔB, e em ambos os casos m(BÔC) =  m(AÔC) – m(AÔB) . Demonstração: Seja A1 um ponto na semireta oposta a SOA. Consideremos o triângulo AA1C. Então pelo Exercício 2.8, como a reta OB corta o lado A1A do triângulo e não passa por nenhum dos seus vértices, (as semiretas são distintas) temos que OB corta AC ou A1C. Veja o desenho ao lado. No primeiro caso AC intercepta SOB, e, assim, pela Definição 3.4 SOB 44

C

B O

A C

B O

A

C B

A1

O

A r

3.

Segmentos, Ângulos e Medidas

divide o ângulo AÔC, portanto pelo Axioma III.4, temos: m(AÔC) = m(AÔB) + m(BÔC)   m(BÔC) = m(AÔC) – m(AÔB) (1)

B C D A1

O

Ar

No segundo caso, temos que OB intercepta A 1C. Chamamos de D esta interseção, e aplicamos novamente o Exercício 2.8, agora no triângulo ADA1 e a reta OC. Observamos que OC intercepta AD, pois caso a interseção fosse em A1D teríamos que a interseção de OC e A 1C seriam dois pontos, o que é absurdo pela Proposição 2.3, já que as retas A1D e OC são distintas. Assim pelo Exercício 3.12, intercepta qualquer segmento com extremos nos lados de AÔB inclusive o segmento AB. Logo, SOC divide o ângulo AÔB e, portanto, pelo Axioma III.4 , obtemos: m(AÔB) = m(AÔC) + m(BÔC)  m(BÔC) = m(AÔB) – m(AÔC) (2) Segue de (1) e (2) que: m(BÔC) =  m(AÔB) – m(AÔC) .

 Proposição 3.4: Dado um número real 0 ≤  ≤ 180, apenas um ângulo AÔB medindo , pode ser colocado em um semiplano determinado pela reta que contém a semireta SOA. Demonstração: Suponhamos que dois ângulos AÔB e AÔC têm medida  graus. Então, pelo Teorema 3.4, SOC divide AÔB ou SOB divide AÔC e em ambos os casos m(BÔC) =  m(AÔC) – m(AÔB) = – =0. Assim, as semiretas SOC e SOB coincidem.

 45

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Vamos agora apresentar o recíproco do Axioma III.3: Teorema 3.4: Para qualquer número real , tal que 0 <  < 180, existe um, e somente um ângulo cuja medida em graus é . Demonstração: (Existência) Em primeiro lugar, afirmamos que existem ângulos cuja medida em graus é arbitrariamente pequena. De fato, seja AÔB um ângulo qualquer e  sua medida em graus. Tomemos um ponto C qualquer no segmento AB, conforme mostra o desenho ao B lado. Por definição, a semi-reta OC, divide o ângulo AÔB e, pelo C Teorema 3.4, m(AÔC) + m(CÔB) = m(AÔB). Assim, a menor das O A medidas em graus entre os ângulos AÔC e de CÔB é menor ou igual a /2. Da mesma maneira construímos ângulos cujas medidas é menor ou igual a /4, /8, etc. Assim, existem ângulos cujas medidas em graus podem ser arbitrariamente pequenas. Consideremos uma reta r e um ponto O arbitrário. Sejam A e A’ pontos em lados distintos em relação ao ponto O, ou seja, existem duas semi-retas opostas SOA e SOA’. Pelo resultado acima, podemos encontrar um ângulo A’ÔB, cuja medida é menor que (180º– ), em um dos semi-pla-nos determinado por r. B Assim, o ângulo AÔB é maior que . X’ X0 Seja X um ponto arbitrário no X segmento AB. Denotemos por M() o conjunto dos pontos X em AB, tal r que o ângulo AÔX é menor ou igual A O A’ a . Seja d o supremo dos comprimentos dos segmentos AX quando X  M() e X0, o ponto de AB tal que AX 0 = d (que existe pelo Axioma III.2). Afirmamos que o ângulo AÔX0 tem medida . De fato, 46

Segmentos, Ângulos e Medidas

3.

1. Suponhamos por absurdo que m(AÔX 0)=  < . Marquemos a partir da semi-reta SOX0 no semi plano

 OX0,B1 , um ângulo X0ÔX’, com medi-da em graus menor que a medida em graus de X0ÔB1 e menor também que .– . Então a medida  do ângulo AÔX’ é menor que a medida  (temos  =  + m(X0ÔX’) <  + (.– ) = ), que é absurdo, pois AX' > AX0 = d e o ponto X’ estaria em M() por definição. 2. Suponhamos agora que m(AÔX 0)=  > . Tomemos um ângulo X0ÔX’ a partir da semi-reta SOX0 no semi-plano  OX0 , A , menor que os ângulos AÔX0 e  – . Então a medida  do ângulo AÔX’ é maior que  (temos  =  – m(X0ÔX’) >  – ( + ) = ). Pela definição de M() e de X0, existe um ponto X”, arbitrariamente próximo de X 0, tal que o ângulo AÔX” tem medida menor ou igual a , e desta forma o ponto X’, está no segmento AX”. Assim, o ângulo AÔX’ tem medida menor que , o que é uma contradição. Por 1. e por 2. , temos que o ângulo AÔX tem medida . (Unicidade) Segue imediatamente da Proposição 3.4.

 Exemplos 3.3. Consideremos três ângulos AÔC, AÔB e BÔC, onde AÔB e BÔC medem 30 o e 40o, respectivamente. Temos, pelo Axioma III.4, que m(AÔC) =m(AÔB) + m(BÔC) = 70. 3.4. Dois ângulos são denominados consecutivos quando possuem um lado em comum. No Teorema 3.4 temos que se SOC divide um ângulo AÔB então AÔC e CÔB são consecutivos com o lado SOC em comum e se SOB divide AÔC temos que AÔB e BÔC são consecutivos com o lado SOB em comum. 47

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J. R.

Agora podemos estabelecer unidades de medida de ângulos e construir um instrumento que servirá para comparar ângulos. Considere o ângulo raso AÔB, cuja medida já sabemos que é 180. Escolhamos um semiplano determinado pela reta AB. Neste semiplano, utilizando a 1 Proposição 3.4 construa um ângulo cuja medida é . 180 Este é o ângulo cuja medida vale 1 grau e que denotamos por 1o. É justamente isto que se faz para construir um transferidor ilustrado na foto a seguir.

3.3. Congruência Ângulos

de

Segmentos

e

Os segmentos e os ângulos estão espalhados por todo o plano. Assim é interessante separá-los em determinadas classes e o critério para fazer será dado pelas suas medidas. Definição 3.4: Dois segmentos são congruentes quando possuem o mesmo comprimento. Proposição 3.4: A congruência entre segmentos é uma relação de equivalência. Demonstração: Segue imediatamente do fato da relação de igualdade entre números reais ser uma relação de equivalência. 48

Segmentos, Ângulos e Medidas

3.

 Definição 3.4: Dois ângulos são congruentes quando possuem a mesma medida. Proposição 3.4: A congruência entre ângulos é uma relação de equivalência. Demonstração: Segue imediatamente do fato da relação de igualdade entre números reais ser uma relação de equivalência.

 Observe a diferença entre a afirmação de que dois segmentos são iguais e que dois segmentos são congruentes. Na geometria a posição de seus objetos é importante e a relação de congruência serve para dividir esses objetos em classes de equivalência segundo uma medida. A mesma diferença ocorre entre igualdade e congruência de ângulos. Definição 3.4: Dois ângulos são ditos suplementares se a soma de A suas medidas é 180o. O suplemento de um ângulo é o ângulo de mesmo vértice, com um C dos lados em comum e o outro lado O é a semi-reta obtida pelo B prolongamento do outro lado, como A mostra o desenho ao lado. Com a D interseção de duas retas r e s, formam-se quatro ângulos, como no O desenho ao lado. Os ângulos AÔB e B DÔC são ditos opostos pelo C vértice. Analogamente para os ângulos AÔD e BÔC. Proposição 3.4: Dois ângulos opostos pelos vértice são congruentes.

49

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Demonstração: Com efeito, A considerando o desenho ao lado, D devemos mostrar que DÔC  BÔA. O De fato, como o ângulo BÔD é raso, então BÔA e AÔD são ângulos C suplementares e, daí B m(BÔA) + m(AÔD) = 180o. (1) Por outro lado, AÔC também é um ângulo raso, então AÔD e DÔC são ângulos suplesuplementares, logo m(DÔC) + m(AÔD) = 180o. (2) Por (1) e (2), temos m(BÔA) + m(AÔD) = m(DÔC) + m(AÔD)   m(BÔA) = m(DÔC) + m(AÔD) – m(AÔD)  m(BÔA) = m(DÔC), obtendo assim o desejado.

 Definição 3.4: Um ângulo, cuja medida é 90o chama-se ângulo reto. Quando duas retas se interceptam, formando ângulo 28 reto , dize-mos que estas retas são perpendiculares.

s

r

O desenho ao lado ilustra como, em geral, é denotado um ângulo reto. Teorema 3.4: Por qualquer ponto de uma reta r passa uma única perpendicular a esta reta.

28

Isto é possível pela Proposição 3.4 e Definição 3.4

50

Segmentos, Ângulos e Medidas

3.

Demonstração: (Existência) Seja s O um ponto qualquer em r. Vimos que r determina dois semiplanos e B pelo Teorema 2.3, O divide r em duas semi-retas. Seja SOA uma das semi-retas que contém um ponto A  r diferente de O. Pelo Teorema 3.4 r podemos construir uma semi-reta O A o SOB que forma um ângulo de 90 com SOA, em um dos semiplanos determinado por r. Como A e B estão em semi-retas distintas, as retas rOA e rOB serão perpendiculares. De fato, sejam SOC e SOB as semi-retas opostas a SOA e SOD respectivamente. Como SOA forma ângulo de 90 o com SOB, e B como AÔB e BÔC são ângulos O suplementares, então BÔC é um ângulo reto, mas como AÔB é A C oposto pelo vértice a CÔD, e BÔC é oposto pelo vértice a DÔA, da D Proposição 3.4, m(CÔD) = 90o e m(DÔA) = 90o. Logo, as retas r e s se interceptam formando angulos retos e, por-tanto, são perpendiculares. (Unicidade) Segue imediatamente da Proposição 3.4.



51

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J. R.

Exemplo

3.5. Dado um segmento AB numa reta r, chamamos de mediatriz do segmento AB, a reta s perpendicular à reta r que passa pelo ponto médio M de AB.

3.6. Dado um ângulo AÔB, a semi-reta SOC tal que m(AÔC) = m(CÔB) é denominada bissetriz do ângulo AÔB. Vamos mostrar que existe uma única bissetriz de um ângulo. De fato, dado um ângulo AÔB, considere ˆ B) m(AO o número real  = . Pela 2 Proposição 3.4, existe um único ângulo AÔC de lado SOA no semiplano OA,B medindo  graus. Como  < m(AÔB) temos que SOC divide AÔB e m(AÔB) = m(AÔC) +m(CÔB). Logo, m(CÔB) = m(AÔB) – m(AÔC) = 2 –  =  = m(AÔC). Para finalizar este capítulo apresentamos a seguir um novo diagrama com todas as figuras que foram apresentadas até agora, já incluídas as definições apresentadas nos Exercícios 3.9 e 3.11. É importante lembrar que na classe de segmentos existem as subclasses determinadas pelas medidas e na classe de polígonos existem as subclasses determinadas pelo número de lados.

52

3.

Segmentos, Ângulos e Medidas

retas

pontos semi-retas segmentos

semiplanos elipses ângulos circunferências

eqüiláteros

isósceles

escalenos

triângulos

polígonos quadriláteros Figuras

3.4. Exercícios 3.1. Sejam M, N e P três pontos de uma reta r, tal que MN 7 , NP 9 e MP 2 . A coordenada de M em relação a um ponto O de r é 3. Quais são as possíveis coordenadas de N e P se a) a coordenada de M é menor que a de N? b) a coordenada M é maior que a de N? 3.2. Sejam M, N e P três pontos de uma reta r, tal que MN 12, NP 7 e MP 5. É possível determinar qual ponto está entre os outros dois? Justifique sua resposta. 3.3. Três sistemas de coordenadas diferentes são fixados em uma mesma reta, denominados I, II e III, com origens O, O’ e O’’ respectivamente, mas todos com a mesma unidade de comprimento. Na reta, há três pontos fixos, A, B e C, que são designados por suas coordenadas da seguinte maneira:  No sistema I a coordenada de A é –6 e a de B é –2 .  No sistema II, as coordenadas de A e C são respectivamente –4 e –3 . 53

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J. R.



No sistema III, as respectivas coordenadas de C e B são 4 e 7. a) Que ponto está entre os outros dois ? b) Determine as possíveis coordenadas de O’ e de O’’, no sistema I. 3.4. Considere em uma reta r um sistema de coordenadas com origem num ponto O, ou seja, nesse sistema o ponto O tem coordenada zero. Seja O’ um ponto de r de coordenada –1 nesse sistema. a) Se considerarmos um novo sistema de coordenadas, no qual o ponto O’ tem coordenada zero, qual a coordenada de O nesse novo sistema de coordenadas? b) Se um ponto A da reta, tem coordenada 3 no 1 o sistema, qual a coordenada de A no 2o sistema? c) Se um ponto B tem coordenada –3 no 2 o sistema qual a coordenada de B no 1o sistema? 3.5. Sejam A e B pontos de uma reta com coordenadas –3 e 5, respectivamente, em relação a um ponto O da reta de coordenada zero. Assuma uma unidade de comprimento e marque estes pontos em r. Em seguida calcule e marque o ponto médio C de AB. Encontre também as coordenadas dos pontos médios de AC e CB, denominados D e E, respectivamente. Quem é o ponto médio de DE ? Justifique. 3.6. Considere um segmento AB. Mostre que existe um  AC

 = k, onde k é único ponto C entre A e B tal que    BC qualquer número real positivo.

3.7. Sejam A, E, K três pontos de uma reta r. As coordenadas de A e K são 2 e  18 , respectivamente. Se AE EK, qual é a coordenada de E? 3.8. Se P é ponto de interseção de duas circunferências de raio r e centros O e O’, demonstre que PO PO' . 54

3.

Segmentos, Ângulos e Medidas

3.9. Um triângulo cujos lados tem o mesmo comprimento é chamado triângulo eqüiláte-ro, se o triângulo contiver dois lados de mesmo comprimento, ele é chamado triân-gulo isósceles, nesse caso os lados iguais são chamados laterais e o terceiro lado de base, e se o triângulo possuir todos os lados distintos ele é denominado triângulo escaleno. Considere uma circunferência de raio r e centro O. Sejam A e B, pontos desta circunferência. O que podemos afirmar sobre o triângulo OAB? Se o triângulo OAB for eqüilátero, o que podemos dizer sobre o segmento AB? 3.10. Em desenho geométrico, temos como únicos instrumentos de construção uma régua não graduada e um compasso. a) Estes instrumentos estão associados a que axiomas? b) Como você faria nesse caso para construir: - Um triângulo escaleno dado os seus três lados? - Um triângulo isósceles, sendo dados um lado e a base? - Um triângulo eqüilátero dado um lado? - Um quadrilátero com todos os lados congruentes ? 3.11. Dados dois ponto F e F’ e um número real d, maior que o comprimento do segmento FF’, o lugar geométrico dos pontos C que satisfazem a propriedade CF CF' =d é denominado elipse, os pontos F e F’, são chamados focos da elipse. Defina nesse caso o que seriam pontos interiores e exteriores a uma elipse. 55

F

F’

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3.12. Demonstre que se o segmento AB interceptar a semi-reta SOC que divide o ângulo AÔB, então S OC intercepta qualquer segmento com extremos nos lados de AÔB. 3.13. Mostre que se um ângulo e o seu suplemento têm a mesma medida então o ângulo é reto. 3.14. Mostre que as bissetrizes de um ângulo e do seu suplemento são perpendiculares. 3.15. Dizemos que um ângulo é agudo se sua medida é menor que 90o. Dizemos que um ângulo é obtuso se sua medida é maior que 90o. Mostre que o suplemento de um ângulo agudo é sempre obtuso. 3.16. Dizemos que dois ângulos são complementares se a soma de suas medidas é 90 o. Um ângulo mede o dobro do seu comprimento menos 30o, calcule a medida deste ângulo? 3.17. Mostre que se a medida do complemento de um ângulo é igual a medida do suplemento de um ângulo, então a diferença entre as medidas destes ângulos é um ângulo reto. 3.18. Desenhe uma poligonal ABCDE, sabendo-se que AB 3 cm, BC CD 2 cm, DE 4 cm e os ângulos m( ˆ D ) = 30o e m( CD ˆC ) = 60o, m( BC ˆ E ) = 45o. Quantas AB poligonais são possíveis construir com estes dados? 3.19. Sejam dois ângulos AÔB e AÔC num semiplano AO,B, tal que m(AÔB) < m(AÔC). Mostre que S OB divide AÔC. 3.20. Considere um ângulo AÔB e um número real positivo k, tal que 0 m( AB ˆC ). Considere E o ponto inicialmente que m(DÂB) >m( AB médio de AB. Na reta CE, marque um ponto F tal que E esteja entre C e F, e de tal modo que CEEF. Tracemos AF. Notemos que BE  AE, CE  EF (por construção) e BÊC  AÊF (opostos pelo vértice). Assim, pelo Teorema 4.5 (Caso ˆ F . Como E ˆ  EA LAL), BEC  AEF. Conseqüentemente, B está entre C e F, afirmamos que a reta AF não corta o segmento BC. De fato, se AF cortasse BC, então, por definição, AF dividiria o ângulo CÂB, e assim pelo Exercício 3.12, AF cortaria CE num ponto Y, logo teríamos que Y  AF e Y  CE = CF e portanto, por F e Y estariam passando as retas AF e CF que são distintas, pois E  CF e E  AF, o que é um absurdo. Assim, considerando o triângulo CBD e o Exercício 2.8, temos que AF corta BD e assim AF divide o ângulo DÂB. B Pelo Axioma III.4, temos G. m(BÂD)=m(BÂF)+m(FÂD)>m(BÂF)= ˆC ). m( AB . Para demonstrar que m(DÂB) >m( C D E A ˆ ), seja E o ponto médio de AC. ACB Tracemos a semi-reta SBE e F marcamos um ponto F em SBE tal que BE  EF e E esteja entre B e F. Tracemos a semi-reta SFA e tomemos algum ponto G em SFA tal que A esteja entre F e G como BE  EF, CE  AE (por construção) e BÊC  FÊA (opostos pelo vértice), temos pelo ˆ E  FÂE. Como Teorema 4.5 que BEC  FEA e, portanto, BC FÂE e DÂG são opostos pelo vértice, pela Proposição 3.4, temos FÂE  DÂG. Como SFASAB, e SFA não intercepta BC, pois se esse fosse o caso teríamos que S FA interceptaria BE em um ponto H e portanto FA e BF teriam os pontos H e F em comum, o que é absurdo. Logo, S FA divide o ângulo 64

Congruência de Triângulos

4.

ˆ B ), DÂB e portanto pelo Axioma III.4 m(DÂB) > m( AC ˆE . pois DÂG  BC

 Exemplos ˆE 4.6. No desenho ao lado, m( AC ˆ ) m(AD ˆ E) , então m(AÊC) > m(DB ˆC) . m(AÊC) > m(AD

65

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J. R.

4.2. O Caso ALA Vamos apresentar o segundo caso de congruência, denotado por ALA (ângulo, lado e ângulo). Teorema 4.5 (Caso ALA): Dados dois triângulos ABC e ˆˆ EFG, se AB  EF,   Ê e B F , então ABC  EFG. Demonstração: Consideremos um ponto D na reta AC, tal que AD  EG, A G F conforme desenho ao lado. Comparando os triângulos ABD e EFG, temos AB  EF (por hipótese), AD  EG (por construção) e   Ê (por hipó-tese), assim pelo Teorema D 4.5 (caso LAL) te-mos que ABD  E EFG. Segue da definição de B C congruência de triângulos que ˆ e, por ˆD  F AB ˆC  F ˆ , assim temos AB ˆD  AB ˆC . Pelo hipótese AB ˆ Teorema 3.4, temos que m( CBD ) = 0, logo, C e D estão nas semi-retas SAC e SBC e, portanto, C e D coincidem. Como já mostramos que ABD  EFG, temos o desejado.

 Exemplos 4.8. Nos desenhos abaixo, os pares de triângulos são congruentes.

66

Congruência de Triângulos

4.

4.9. Novamente devemos observar a importância da correspondência que, neste caso, ocorre entre o lado e os ângulos, ou seja, os lados congruentes devem ser adjacentes aos pares de ângulos congruentes. Considere ˆ é um triângulo ABC com base BC tal que o ângulo B ˆ . Em C considere uma semi-reta menor do que o ângulo C ˆ tal que A C ˆ D  AB ˆ C e seja D a que divide o ângulo C intersecção desta semi-reta com AB. Vemos que, apesar de os pares de ˆ ) e (Â, B ˆ ) serem ângulos (Â, C C congruentes e o lado AC ser comum aos triângulos ABC e ADC, estes não são congruentes. O caso ALA impôs uma condição sobre o lado, ou seja, deverá ser adjacente aos ângulos, o que não acontece com o lado AC no B D triângulo ABC neste caso. Mais A adiante veremos que, apesar de não termos lados adjacentes mas a correspondência entre os elementos congruentes dos triângulos se mantiver obtemos um caso de congruência denominado LAAo. Como conseqüência do Teorema 4.5 temos a recíproca do Corolário 4.5. Corolário 4.5: Num triângulo ABC, se os ângulos relativos a um dos lados são congruentes, então o triângulo é isósceles. ˆ . Vamos ˆC Demonstração: Suponhamos que B comparar o triângulo ABC com ele mesmo. Seja a função f : {A,B,C}  {A,B,C}, tal que f(A) = A, f(B) = C e f(C) = ˆ ˆ ˆ ˆ B. Como B  C , C  B (por hipótese) e BC  CB, segue do Teorema 4.5 (caso ALA) que esta função estabelece uma congruência e assim AC  AB.

 67

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

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Exemplos 4.10. No desenho ao lado temos ˆ D ˆ e =, ou seja, AC é bissetriz B do ângulo BÂD. Vamos mostrar que B  é igual a  e BCCD, assim AC é altura do triângulo ABD e AC é  C mediana de BC. De fato, pelo A    Corolário 4.5, ABD é isósceles e assim AB  AD e como, por hipótese, D ˆ D ˆ , pelo Teorema 4.5 = e B (Caso ALA), ABC  ADC e, portanto, = e BC  CD. Como  +  = 180o, temos  =  = 90o e, portanto, toda bissetriz do ângulo oposto à base num triângulo isósceles é altura relativa à base. De maneira análoga, mostra-se que a bissetriz é mediana e que a altura é bissetriz e mediana no triângulo isósceles (todos em relação à base).

4.3. O Caso LLL Vamos demonstrar agora o caso de congruência em que apenas a congruência dos lados dos triângulos permite a conclusão da congruên-cia entre os triângulos. Este é o terceiro caso de congruência de triân-gulos e chamamos de LLL (lado, lado e lado). Teorema 4.5 (Caso LLL): Se dois triângulos têm três lados correspondentes congruentes, então os triângulos são congruentes.

68

Congruência de Triângulos

4.

Demonstração: Sejam ABC e EFG C dois triângulos que tenham vértices G correspon-dentes por uma função bijetora A B f: {A,B,C}  {E,F,G} tal que E F f (A) = E, f (B) = F e f (C) = G, com D AB  EF, AC  EG e BC  FG. No semiplano determinado por AB, contrário ao vértice C, construímos um ângulo com vértice A e a mesma medida que Ê. Marcamos no lado do ângulo, distinto de AB, um ponto D que dista de A a mesma medida de EG (ver desenho). Nos triângulos ABD e EFG, temos AB  EF (por hipótese), BÂD  FÊG e AD  EG (por construção), assim ABD  EFG pelo Teorema 4.5 (Caso LAL). Observemos agora que ACD e BCD são triângulos isósceles, pois AC  EG  AD e CB  GF  DB. Assim, utilizando o Corolário 4.5 e o Axioma III.4, temos ˆ B  AD ˆ B e portan-to ABC  ABD. Pela Proposição 4.5 AC temos que ABC  EFG.

 Exemplos 4.11. Nas fotos e figura a seguir observa-se a utilização de triângulos.

69

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Isso é comum pois no triângulo, não é possível alterar seus ângulos sem B que se altere também seu lado, o que justifica a rigidez da figura triangular. Veja que isto não ocorre com o quadrilátero pois poderíamos ter dois quadriláteros com 4 lados respectivamente congruentes E mas com ângulos respectivamente não congruentes (veja desenho ao lado). 4.12. Seja BC um segmento e considere A e A’ dois pontos em semiplanos distintos em relação à reta BC, tais que ABA’B e ACA’C. Vamos mostrar que BÂC  BÂ’C. De fato, por hipótese, AB  A’B e AC  A’C e, além disso, BC é comum aos triângulos ABC e A’BC, assim temos 70

A B’ A’ D E’

D’

A

B

C A’

Congruência de Triângulos

4.

pelo Teorema 4.5 (Caso LLL) que ABC  A’BC. Logo, BÂC  BÂ’C. Podemos resolver este problema sem utilizar o Teorema 4.5. Para isto, observa-mos que o triângulo AA’C é isosceles pois AC A'C , por hipótese. Logo, pelo Corolário 4.5, m(CÂA’) = m(CÂ’A). Analogamente, AA’B é isósceles pois, por hipótese, temos AB A'B . Logo, m(BÂA’)=m(BÂ’A). Como AA’ intercepta BC pois A e A’ estão em semi-planos distintos em relação à BC, por hipótese, temos que AA’ divide BÂC e BÂ’C. Logo, m(BÂC)=m(BÂA’) +m(CÂA’)=m(BÂ’A)+m(CÂ’A)=m(CÂ’B). 4.13. (Construção da Bissetriz de um Ângulo) Com a ponta seca do compasso sobre o vértice do ângulo dado e uma abertura qualquer do compasso trace um arco de circunferência que intercepta os lados do ângulo em pontos A e B. Utilizando como centro os pontos A e B trace duas circunferências com raio maior do que a metade da medida do segmento AB. Unindo uma das interseções ao vértice determinamos a bissetriz. No desenho ao lado, podemos ver a justificativa. A reta OC é a bissetriz obtida pois os triângulos OAC e OBC são congruentes pelo Teorema 4.5.

4.4. O Caso LAAo Já apresentamos no Exemplo 4.9, dois triângulos que possuem dois ângulos congruentes e um dos lados também congruentes não sendo, porém, triângulos congruentes. Vamos apresentar agora uma condição para que também ocorra congruência de triângulos quando temos a congruência de um lado e de dois ângulos dos 71

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triângulos. Este é o quarto caso de congruência de triângulos que é chamado de LAA o (lado, ângulo e ângulo oposto). Teorema 4.5 (Caso LAAo): Dados dois triângulos ABC e ˆ G ˆ , então ABC  EFG. EFG, se BC FG,   Ê e C Demonstração: Seja D um ponto G na semi-reta SCA tal que CD  GE C conforme desenho ao lado. Pelo Teorema 4.5 (Caso LAL), temos BCD ˆ B  Ê  Â. Se D  FGE. Assim CD E está entre C e A, temos que D ˆ B é ângulo externo tomando CD no triângulo ABD e  é ângulo A B F interno, e assim este triângulo ABD não pode existir pelo Teorema 4.5. Se A está entre C e D, CÂB é um ângulo externo do ˆ um ângulo interno e novamente o triângulo ADB e D triângulo ADB não existe. Assim A deve coincidir com D.

 Exemplos 4.14. Conforme veremos no Capítulo 7, o caso ânguloângulo-ângulo (AAA) entre dois triângulos não garante a congruência entre dois triângulos. Lá construiremos dois triângulos com os três ângulos congruentes sem, no entanto, serem congruentes. 4.15. No desenho ao lado temos que o segmento AD é altura do ˆ . Pelo ˆC triângulo ABC e B Corolário 4.5, ABC é um triângulo isósceles e assim AB AC. Como, ˆ B  AD ˆ C temos por hipótese, AD pelo Teorema 4.5 (Caso LAAo), que 72

Congruência de Triângulos

4.

ABD  ACD e assim AD é mediana de ABC e AD é bissetriz do ângulo Â. Observemos que juntando o Teorema 4.5, o Exemplo 4.10 e o Exemplo 4.15, obtemos que num triângulo isósceles a mediana, a bissetriz e a altura relativa a base coincidem. 4.16. Quando dois triângulos possuem quatro ou cinco elementos congruentes a congruência entre os triângulos é sempre garantida. No caso de quatro elementos congruentes temos três subcasos: 1. Os triângulos possuem três pares de lados congruentes e um par de ângulos congruentes: Neste caso, os triângulos são congruentes pelo Teorema 4.5 (Caso LLL). 2. Os triângulos possuem dois pares de lados congruentes e dois pares de ângulos congruentes: Neste caso, se um dos pares de ângulos forem adjacentes aos lados então os triângulos serão congruentes pelo Teorema 4.5 (Caso LAL), caso contrário os triângulos serão congruentes pelo Teorema 4.5 (Caso LAAo). 3. Os triângulos possuem 1 par de lados congruentes e três pares de ângulos congruentes: Neste caso, considerando que o par de lados congruentes são adjacentes aos ângulos congruentes correspondentes teremos, pelo Teorema 4.5 (Caso ALA), que os triângulos são congruentes. No caso de cinco elementos congruentes é imediato pois teremos ou três pares de lados congruentes ou três pares de ângulos congruentes com um par de lados adjacentes correspondentes. Com estes casos de congruência encerramos todas as possibili- des que podem ocorrer com dois triângulos tendo três elementos congruentes dos seis que eles possuem. Quando o triângulo é retângulo ocorre um caso particular de congruência que será visto num exemplo da próxima seção. 73

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4.5. O Caso LLA Nesta seção definiremos um triângulo muito importante e por isso recebe o nome especial de triângulo retângulo. Vamos apresentar o único caso de congruência que ocorre quando temos lado, lado e ângulo, que é justamente quando os dois triângulos são retângulos. Para isto, veremos primeiramente uma condição que limita os valores de dois ângulos num triângulo qualquer. Teorema 4.5: A soma das medidas de quaisquer dois ângulos internos de um triângulo é menor que 180 o. Demonstração: Seja ABC um B triângulo qualquer. Sem perda de generalidade, vamos mostrar que ˆ ) < 180 o. Seja D na m(Â) + m( B reta CA tal que A esteja entre C e D. Pelo Teorema 4.5, temos que ˆ ) e assim: m(DÂB) > m( B ˆ ) < m(Â) + m(DÂB) m(Â) + m( B C =180o.

A

D

 Corolário 4.5: Todo triângulo possui pelo menos dois ângulos internos agudos. Conseqüentemente, todo triângulo tem pelo menos dois ângulos externos obtusos. Demonstração: Se um triângulo possuir dois ângulos internos não agudos, sua soma será maior ou igual a 180 o, o que é impossível pelo Teorema 4.5. Quanto aos ângulos externos, basta considerar os ângulos suplementares.

 Corolário 4.5: Se duas retas distintas r e s são perpendiculares a uma terceira, então r e s não se interceptam. 74

Congruência de Triângulos

4.

Demonstração: Se r e s se interceptassem teríamos um triângulos com dois ângulos internos retos, o que contradiz o Teorema 4.5.

 Exemplos

s 4.17. Duas retas são denominadas paralelas quando não se t interceptam. O Corolário 4.5 garante Q a existência de retas paralelas. De fato, seja r uma reta qualquer e P um ponto pertencente a r. Pelo Teorema 3.4 existe uma reta s r perpendicular a r passando pelo P ponto P. Seja Q um ponto de s não perten-cente a r e, novamente pelo Teorema 3.4 existe uma reta t passando por Q e perpendicular a s. Pelo Corolário 4.5, temos que t é paralela a r. 4.18. No desenho ao lado, tem-se  =  e  +  = 180o. Vamos mostrar r s que as retas r e s são paralelas. De fato, suponhamos por absurdo que r e s se interceptam num ponto P,   então teremos um triângulo cuja soma das medidas dos ângulos internos é maior que 180 o pois  +  é 180o, o que contradiz o Teorema 4.5 e portanto r e s são paralelas. 4.19. Vamos mostrar que qualquer ponto da bissetriz de um ângulo, é eqüidistante dos lados do ângulo. De fato, sejam  um ângulo qualquer,

75

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D um ponto da bissetriz de Â, DE e A DF a distância de D aos lados do ângulo bissecado. Temos que F E o ˆ m(AFD)  90 m(AÊD) = e, D portanto, pelo Teorema 4.5 (Caso LAAo) temos que AED  AFD e portanto ED  DF e assim D equidista dos lados do ângulo. Como conclusão temos que O lugar geométrico dos pontos que eqüidistam dos lados de um ângulo é a sua bissetriz. Podemos agora classificar os triângulos quanto aos ângulos: Definição 4.5: Diremos que um triângulo é acutângulo, se ele possui os três ângulos agudos. Um triângulo que possui um ângulo reto é chamado retângulo, neste caso o lado oposto ao ângulo reto é chamado de hipotenusa e os outros dois lados de catetos32. Se o triângulo possuir um ângulo obtuso, ele recebe o nome de obtusângulo. Vamos apresentar agora uma última condição para que também ocorra congruência de triângulos quando temos a congruência de dois lados em um triângulo retângulo. Este é o quinto e último caso de congruência de triângulos que será chamado de LLA  (lado, lado e ângulo reto). Teorema 4.5 (Caso LLA): Se dois triângulos retângulos possuem hipotenusas congruentes e um dos catetos congruentes, então os triângulos são congruentes. Demonstração: Sejam retângulos, com cate-

ABC

e

DEF

dois

triângulos

32 A palavra “cateto” vem do grego “káthetos” e quer dizer “vertical” ou “perpendicular” e a palavra “hipotenusa” vem do grego “hypoteínousa” e significa “linha estendida por baixo”.

76

Congruência de Triângulos

4.

tos AB e DE e hipotenusas BC e EF F respectivamente congruentes. C G Suponhamos por absurdo que ABC não seja congruente a DEF e sem perda de generalidade que DF AC. Assim existe um ponto G pertencente a reta DF entre D e F, tal que Então A AC DG. B D E pelo Teorema 4.5 (caso ABC DEG LAL). Logo EG BC EF e portanto, o triângulo EFG é isósceles, assim ˆ F . Como EG ˆ F é ângulo externo ao triângulo ˆ F  EG ˆ F)  90o , pelo Teorema 4.5. Assim DEG temos que m(EG ˆ D)  180o , o que contradiz o Teorema 4.5. m(ˆ F)  m(EG Logo ABC DEF.

 4.6. Existência de Perpendiculares e Paralelas Notemos que o Corolário 4.5 não garante a existência de reta paralela a uma reta dada contendo um ponto dado. Para garantir isto precisaremos do seguinte resultado que garante a existência e unicidade de retas perpendiculares: Teorema 4.5: Por um ponto fora de uma reta passa uma única reta perpendicular a reta dada. Demonstração: (Existência) Seja r uma reta qualquer e P um ponto fora dela dado. Considere dois pontos A e B quaisquer de r, que existem pelo Axioma I.1. Trace a reta AP. Se ela for perpendicular a r, a existência estará demonstrada, caso contrário, no semiplano 77

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contrário ao de P, em relação a reta P r, trace uma semi-reta com origem A e que forma um ângulo com r congruente a PÂB. Marque um r ponto P’ nessa semi-reta de tal B A modo que AP’ seja congruente a AP. Assim teremos que AP  AP’ e PÂB  P’ÂB, donde o triângulo PAP’ é P’ isósceles e AB é bissetriz do ângulo PÂP’. Logo, pelo Exemplo 4.10, temos que AB é altura de APP’ em relação a PP’. Portanto PP’ é a perpendicular a r procurada. (Unicidade) Se existissem duas perpendiculares a reta r passando por P, teríamos um triângulo com dois ângulos retos, que é um absurdo pelo Teorema 4.5.

 Corolário 4.5: Por um ponto fora de uma reta passa uma reta paralela a reta dada. Demonstração: Considere uma reta r e um ponto P não pertencente a ela. Pelo Teorema 4.5, pelo ponto P passa uma única reta s perpen-dicular a r. Utilizando o Teorema 3.4 temos que existe uma reta t perpendicular a s passando pelo ponto P. Finalmente, pelo Corolário 4.5 temos que t é paralela a r e passa por P.

 Observe que este corolário não garante a unicidade da reta t mas apenas a sua existência. A unicidade é dada somente pelo Axioma das Paralelas (Grupo VI) que será estudado no próximo capítulo.

78

4.

Congruência de Triângulos

4.7. Distância de Ponto Desigualdade Triangular

a

Reta

e

Vamos determinar a forma mais natural de se definir distância de ponto a reta e apresentar um teorema que é conhecido como desigualdade triangular. Este resultado é o único obstáculo que impede que construamos triângulos com quaisquer tamanhos de lados Definição 4.5: Dado uma reta r e um ponto P fora dela, traçamos a única reta s perpendicular a r passando por P. A interseção r  s = P’ é chamada pé da perpendicular. Se P Q é um ponto qualquer de r distinto de P’, o segmento PQ é dito oblíquo, relativo a r. No desenho ao lado, o segmento QP’ é chamado de projeção do segmento QP sobre a reta r. O comprimento do r segmento PP’ é definido como a Q P’ distância do ponto P a reta r. Proposição 4.5: Se dois lados de um triângulo não são congruentes, então seus ângulos opostos não são congruentes e o maior ângulo é oposto ao maior lado. Demonstração: Pelo Corolário 4.5, temos a primeira parte da proposição demonstrada. Para demonstrar a segunda parte, seja ABC um triângulo tal que BC AC. Pelo Axioma III.1 e Axioma III.2 existe C um ponto D em CB tal que AC  CD. Assim, por construção, o triângulo ACD é isósceles e os ângulos CÂD e ˆ A são congruentes. No-temos CD D que, por definição, a semi-reta SAD di-vide o ângulo CÂB. Logo, ˆ D)  m(CA ˆ B) . ˆ C)  m(CA m(AD ˆ A é um ângulo externo em A Mas CD B 79

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relação a ABD, logo

ˆ B) ˆA)  m(DB ˆA)  m(CD ˆ A)  m(CA m(CB

.

 Proposição 4.5: Se dois ângulos de um triângulo não são congruentes, então os lados que se opõem a estes ângulos têm medidas distintas e o maior lado opõe-se ao maior ângulo. Demonstração: Pelo Corolário 4.5, temos a primeira parte da proposição demonstrada. Para demonstrar a segunda parte, seja ABC um triângulo tal que ˆ B) . Existem três possibilidades para os ˆA)  m(CA m(CB segmentos AC e BC. Ou AC BC, ou AC BC, ou AC BC. A primeira possibilidade não pode ocorrer, pela Proposição 4.5. A segunda não pode ocorrer, pois neste caso o triângulo seria isósceles, o que não se verifica. Logo, temos o desejado.

 Corolário 4.5: Se P’ é o pé da perpendicular, traçada a partir de P, como visto no Teorema 4.5, então qualquer segmento oblíquo PQ tem comprimento maior que o comprimento de PP’. Veja desenho ao lado.

P

Q

r P’

Demonstração: Como PP’ é perpendicular a r, então ˆ P)  90o ˆ'Q)  90o , m(PP m(P'Q daí temos que e o ˆ ˆ m(P'PQ)  90 e portanto PP'Q é o maior ângulo do triângulo PP’Q. Assim, a Proposição 4.5 nos garante que PQ é o maior lado do triângulo PP’Q. Logo, QP PP' .

 É natural definir distância de um ponto até uma reta como sendo a menor distância do ponto a reta. O 80

Congruência de Triângulos

4.

Corolário 4.5 garante que a Definição 4.5 é equivalente a esta. Teorema 4.5: Em todo triângulo, a soma dos comprimentos de dois lados é maior que o comprimento do terceiro lado. Demonstração: Vamos mostrar por exem-plo que AC AB BC. Consideramos um ponto D na reta AB, tal que B está entre A e D e BD  BC. Assim o triângulo BCD é isósceles, e consequentemente os ˆ D, terão mesma ˆ e BC ângulos D medida. A semi-reta ˆ D , pelo modo que foi tomado o SCB, divide o ângulo AC ˆ D)  m(AC ˆ D) . ˆ C)  m(BC ponto D. Portanto temos m(BD Pela Proposição 4.5, temos que AC AD AB BD AB BC.

 Teorema 4.5 (Desigualdade Triangular): Dados três pontos quaisquer A, B e C no plano, tem-se que AC AB BC. A igualdade ocorre se, e somente se, B está no segmento AC. Demonstração: Sejam A, B e C três pontos do plano, podemos supor que são todos distintos pois, caso contrário, o resultado é imediato. Se A, B e C não são colineares, então pelo Teorema 4.5, temos o resultado. Suponhamos então que A, B e C sejam colineares, logo pelo Axioma II.1 temos três casos excludentes:  A  BC: Neste caso, pelo Axioma III.2, temos BC BA AC, ou seja, AC BC BA BC AB BC.  B  AC: Neste caso, pelo Axioma III.2, temos AC  AB BC, ou seja, AC AB BC.  C  AB: Neste caso, pelo Axioma III.2, temos AB AC CB, ou seja, AC AB CB AB AB BC. 81

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Para a segunda parte suponhamos que a igualdade ocorre, então se B não está no segmento AC devemos ter três possibilidades:  A, B e C não são colineares, o que é impossível pois neste caso, pelo Teorema 4.5, não teríamos a igualdade.  A  BC e daí pelo Proposição 3.4 teríamos AC BC AB BC, o que contradiz a hipótese.  C  AB e daí pelo Proposição 3.4 teríamos AC BC AB BC, o que também contradiz a hipótese. Portanto, B  AC. A recíproca é imediata do Axioma III.2.

 Exemplos 4.20. O Teorema 4.5 garante que é impossível construir um triângulo com lados medindo 7, 3 e 2. De fato, 2 + 3 < 7, contradizendo o teorema. É impossível também construir um triângulo com lados medindo 6, 4 e 10 pois 10 = 4 + 6. 4.21. Se uma circunferência de raio r centrada num ponto O e uma circunferência de raio r’ centrada num ponto O’, se interceptam exatamente em dois pontos, podemos estabelecer um limitante para o segmento OO’. Para isto, traçamos OM perpendicular P1P2, onde P1 e P2 são os pontos de interseção das circunferências, então OP1  r e ˆ P1  O M ˆ P2. OP2  r , portanto O M Assim, pelo Corolário 4.5, OP1  OM e OP2  OM. Analogamente temos que, O'P1  O'M e O'P2  O'M.

Assim, OO'  OM O'M  OP1  O'P1  r  r'.

82

4.

Congruência de Triângulos

Portanto,

OO'  r  r' .

4.22. Os lados de um triângulo cujos vértices que estão sobre uma circunferência sempre são menores que duas vezes o raio desta circunferência e um dos lados do triângulo será igual a este produto apenas quando contém o centro da circunferência. Para ver isto basta unir cada vértice de um lado com o centro da circunferência e teremos um triângulo isósceles de lados medindo o raio da circunferência. Aplicando a desigualdade triangular temos o desejado.

4.8. Exercícios 4.1. Sabendo que os pares de triângulos do desenho a seguir são congruentes, utilize a notação de congruência para indicá-las. Por exemplo, no par de triângulos (1) obtemos a seguinte congruência: ADE  BCE. D

C

S

R P

N

I

D

W Z

C

K A E B (1)

P TUQ (2)

M

(3)

O

G K H (4)

A

(5)

B

X

(6)

Y

4.2. Demonstre que se dois segmentos dados AE e DF se interceptam num ponto P que é ponto médio de ambos, então PDA  PFE. 4.3. Suponha que um segmento BQ divida um segmento EA ao meio em um ponto R, mas que BQ  EA. Sejam S e C pontos em ER e em AR, respectivamente, tais que RS  RC, BC é perpendicular a EA e QS é perpendicular a EA. ˆS e ˆC  EQ Tem-se ainda que BÂR  QÊR. Mostre que AB que EA divide BQ ao meio.

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4.4. Considere o desenho ao lado. a) Suponha que tenhamos AE  BC, B A AD  BD e DE  DC. Mostre que Ê  ˆ. C b) Suponha que tenhamos AE  BC, ˆD . Mostre que AD  BD e EÂD  CB D ˆ E  AD ˆC . BD c) Suponha agora que AE  BC, AD  C ˆ . É possível mostrar E BD e que Ê  C que ED  CD? Se for, mostre; caso contrário explique porque. ˆ , DE  DC e BD ˆ E  AD ˆC . É d) Suponha ainda, que Ê  C possível mostrar que AE  BC ? Se é, mostre, caso contrário explique porque. 4.5. No desenho ao lado, ABD e BCD são triângulos isósceles com base DB. Mostre que a reta AC é bissetriz de BÂD e é perpendicular a DB. Mostre que os ângulos ˆC e AD ˆ C são congruentes. AB 4.6. (Construção do ponto médio de um segmento) Considere o seguinte procedimento para determinação do ponto médio de um segmento, utilizando apenas régua e compasso: . “Seja AB um segmento. Com a ponta seca do compasso em A e raio AB, trace uma circunferência. Faça a mesma construção com a ponta seca do compasso em B. Estas duas circunferências se interceptam em dois pontos C e D. O segmento CD intercepta AB no ponto médio de A. a) Justifique porque este procedimento está correto. b) É realmente necessário que as duas circunferências tenham o mesmo raio ? E este raio precisa mesmo ter o comprimento de AB ? c) Mostre que a reta s que determina o ponto médio de AB é perpendicular a AB, ou seja, s é a mediatriz de AB. 84

4.

Congruência de Triângulos

d) Com a idéia dada no procedimento, proponha um método para construir uma perpendicular a uma reta, passando por um ponto dado na reta. E se o ponto não estiver na reta ? 4.7. No desenho ao lado, tem-se que ˆ E  BD ˆC . AD,  DE, Â  DÊC e AD Mostre que os triângulos ADB e EDC são congruentes.

D

A

C

E

B r



4.8. No desenho ao lado temos  = , mostre que r e s são paralelas.



s

4.9. No quadrilátero ABCD ao lado, SAE, SBE e SCE são as bisetrizes dos ˆ, ˆ ângulos Â, e B C respectivamente. Mostre que a ˆ é SDE. bissetriz do ângulo D

4.10. No desenho ao lado um dos ˆ D , pois é ângulos externos é AC ˆ . Mostre suplemento do ângulo C que, se um triângulo têm dois ângulos externos iguais, então ele é isósceles.

A

B

C

D

4.11. Mostre que num triângulo acutângulo o pé da perpendicular a um dos lados passando pelo vértice oposto está entre os dois vértices. O que ocorre com triângulos retângulos e obtsângulos?

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4.12. Mostre que todo triângulo retângulo possui dois ângulos externos obtusos. 4.13. O desenho ao lado é formado E pelos segmentos AC, AE, BE e CF. Determine quais medidas são: a) menores que ; b) maiores que  c) menores que .



 C  D      B F  

A B

4.14. No desenho ao lado, AB  BC  CD. Demonstre que BD AB.

D 4.15. No desenho ao lado os triângulos ABC e EDC são congruentes e o ponto E pertence ao segmento BC e os pontos A, C e D são colineares. Mostre que AD AB. 4.16. No desenho ao lado, suponha que os ângulos B e D são retos e AB é congruente a DC. Mostre que AD  BC.

C

A

A

B

D

C

4.17. Utilize o Teorema 4.5 para demonstrar o seguinte resultado: “Sejam ABC e EFG dois triângulos quaisquer. Dada uma aplicação bijetora f : {A,B,C}  {E,F,G}, tal que f (A) = E, f (B) = F e f (C) = G, se AB  EF, BC  FG e a altura por C é congruente à altura por G, então a correspondência é uma congruência”. 4.18. Seja ABC um triângulo retângulo em C. Se o ângulo B tem medida o dobro do ângulo A, então AB 2BC. (Sugestão: Introduza a bissetriz do ângulo B.) 86

4.

Congruência de Triângulos

4.19. Sejam ABC e DEF dois triângulos tais que AB  DE, ˆ )  m(E ˆ) , mostre que AC DF. Prove a BC  EF e m(B recíproca. 4.20. Um conjunto L de pontos do plano é dito limitado, se existe um círculo C tal que todos os pontos de L estão no interior de C. Caso contrário, L é dito ser ilimitado. De-monstre que: a) Os segmentos de reta são limitados. b) Os triângulos e quadriláteros são limita-dos. c) Os polígonos são limitados.

87

L C

Capítulo 5: Axioma das Paralelas

Vimos no Corolário 4.5 a demonstração da existência de uma reta paralela a uma reta dada passando por um ponto fora dela. Neste capítulo enunciaremos uma versão do polêmico quinto postulado de Euclides (ver Capítulo 1), que colocamos no sexto grupo de axiomas e que garantirá a unicidade desta reta.

5.1. O Axioma das Paralelas Axioma VI: Por um ponto fora de uma reta r, pode-se traçar uma única reta paralela a r. Como conseqüência deste axioma temos o seguinte resultado que estabelece a propriedade transitiva do paralelismo: Proposição 5.6: Se r é paralela a duas retas distintas s e t, então s e t são paralelas. Demonstração: Se s  t = P, teríamos duas retas paralelas a r passando por P, contrariando o Axioma VI.

 Corolário 5.6: Sejam r e s duas retas paralelas. Se t intercepta s, então t intercepta r. Demonstração: Se t não intercepta r, então t e r são paralelas por definição. Como r é paralela a s por hipótese, temos pela Proposição 5.6, que s e t são paralelas, o que é uma contradição.



5.

Axioma das Paralelas

Exemplos 5.1. O Corolário 5.6 garante que não pode ocorrer algo como o desenho ao lado. As retas r e s são paralelas e a reta t interecepta a reta r no ponto A. Assim, a reta t deverá interceptar a reta s e o desenho ao lado está errado.

A

r t s

5.2. Seja R a relação no conjunto das retas paralelas dada por: “x R y se, e somente se, x = y ou x é paralela a y”. Então R é uma relação de equivalência. De fato, é claro que x R x pois x = x. Temos também que se x R y então y R x, pois se x = y então y = x ou se x // y então y // x. Suponhamos agora que x R y e y R z, então x=y ou x é paralela a y e y = z ou y é paralela a z. Se x = y ou y = z a conclusão é imediata. Vamos supor que x é paralela a y e y é paralela a z. Neste caso, temos x paralela a z pois, caso contrário, como x é paralela a y, pelo Corolário 5.6, z interceptaria y. Logo, x R z e, portanto, como R satisfaz as propriedades reflexiva, simétrica e transitiva, temos que R é uma relação de equivalência. 5.3. Uma transversal a duas retas, é uma reta que as interceptam em P dois pontos distintos. A reta t do r Corolário 5.6 é uma transversal as R retas r e s, mas as retas r e s não Q precisam ser necessariamente s paralelas para que uma reta seja t transversal a outras duas retas, conforme é ilustrado no desenho ao lado, onde temos t interceptando r e s nos pontos P e Q, respectivamente, e r e s se interceptando no ponto R.

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J. R.

Definição 5.6: Consideremos duas retas r e s cortadas por uma transversal t, nos pontos P e Q, t E respectivamente. Sejam A, B, C, D, E P e F, conforme desenho ao lado33. Os C r ˆ ˆ pares de ângulos (A P F,E Q B) e (C A ˆ D) ˆ F,E Q são deno-minados P s ângulos alternos internos. Os Q B D ˆ ˆ F,E Q D) e (C pares de ângulos (A P F ˆ ˆ F,E Q B) são denominados P ângulos colaterais internos. ˆ D), (E ˆ C,E Q ˆ B), (C ˆ F,B ˆ A,E Q Os pares de ângulos (E P P P ˆ F) ˆ F) ˆ F,D Q Q e (A P são denominados ângulos correspondentes. Teorema 5.6: Dadas duas retas cortadas por uma transversal, um par de ângulos alternos internos é formado por ângulos congruentes se, e somente se, as retas são paralelas. Demonstração: Sejam r e s duas retas cortadas por uma transversal t nos pontos P e Q, respectivamente. Suponhamos, por absur-do, que r e s não sejam paralelas, ou seja, r  s = R. Considere os pontos A e B tais que P está em r entre A e R e Q está em s entre B e R. Por hipótese, no triângulo RPQ, o ângulo externo B ˆ P é congruente ao angulo interno Q ˆ Q, o que é absurdo pelo RP Teorema 4.5. Logo r e s são retas paralelas. Considerando que os ˆ R e A ângulos alternos internos P Q ˆQ são congruentes, a P demonstração é análoga. 33

t

P

A s

r Q

B t

T

R

r’ P r

V s

Q

S

O desenho apenas facilitará a linguagem pois as posições destes pontos podem ser descritas todas em termos de localização nos semiplanos.

90

Axioma das Paralelas

5.

Reciprocamente, sejam r e s retas paralelas e t uma transversal, interceptando-as em P e Q, respectivamente. Seja S e T pontos em r e s, respectivamente, tais que ˆQ e os ângulos T P ˆ P Q S sejam alternos internos. Suponhamos, por absurdo, ˆ S não sejam congruentes. Construímos ˆ Q e PQ que T P então por P uma reta r’ e marcamos um ponto V  r’ tal ˆ S sejam alternos internos e congruentes. ˆ Q e PQ que V P Pelo item anterior deste teorema, r’ é paralela a s. Mas por hipótese, r é paralela a s. Assim, temos r e r’ passando por P e paralelas a s, contrariando o axioma VI. Logo, temos o desejado.

 Exemplos 5.4. Um par de ângulos correspondentes é formado por ângulos congruen-tes se, e somente se, qualquer par de ângulos alternos internos é formado por ângulos congruentes. De fato, sejam r e s duas retas cortadas por uma tranversal t e os pares t ˆ) de ângulos alternos internos (Â, D ˆ ˆ E ˆ ,B ˆ ) e os pares de ângulos G e (C r ˆ ˆ ,D ˆ ), ( G ˆ ), correspondentes (Ê, B A ˆ C ˆ ,H ˆ ). Suponhamos que (Â, ˆ ˆ F) e (C B ˆ D s ˆ ˆ, Ê B como  e são C ˆ F suplementares temos ˆ H ˆ) m(Â) = 180o – m(Ê) = 180o – m( B ˆ ). Logo,   D ˆ . Como D ˆ é = m( D ˆ suplementar de B ˆ ˆ . Mostra-se de maneira análoga temos também C  B ˆ  D ˆ  H ˆ, ˆ . A recíproca segue o que G Â ˆ F e C mesmo raciocínio. Conseqüente-mente, pelo Teorema 5.6, 91

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

um par de ângulos correspondentes é formado por ângulos congruentes se, e somente se, as retas são paralelas. 5.5. No desenho ao lado, AD é bissetriz do ângulo CÂB e CA  CD. Vamos mostrar que CD é paralelo a AB. De fato,como AD é a bissetriz de CÂB, temos, por definição, que CÂD  DÂB. Além disso temos, por hipótese, que CA  CD, portanto ACD é um triângulo isósceles, assim segue do Corolário 4.5 que, CÂD  A ˆ C. Assim temos que BÂD e D ˆC, AD são ângulos alternos internos congruentes. Logo, pelo Teorema 5.6 temos que CD é paralelo a AB, mostrando assim o desejado. 5.6. Se dois segmentos AB e CD se interceptam em um ponto E, de tal modo que AD  BC e AD é paralelo a BC então AB e CD se dividem ao C B meio em E. De fato, como BC // AD, do Teorema 5.6, temos que DÂB  A ˆ C, pois são ângulos alternos B E internos. De maneira análoga, ˆB  AD ˆ C . Assim pelo Teorema DC 4.5 (Caso ALA), os triângulos AED e A D BEC são congruentes e portanto AE  EB e CE  ED, ou seja, E é o ponto médio dos segmentos AB e CD.

92

5.

Axioma das Paralelas

5.7. Não existe congruência do tipo AAA (ângulo, ângulo, ângulo). De fato, considere um triângulo ABC e um ponto D entre A e C. Traçamos por D uma paralela ao lado AB, que intercepta BC em E. Pelo Teorema ˆ  DÊC 5.6 e pela Proposição 3.4, B ˆ e   E D C. Assim, os triângulos ABC e DEC possuem os três ângulos congruentes e no entanto não são congruentes.

C

D

E

A

B

5.8. Vamos mostrar que o enunciado feito por Euclides no seu quinto postulado é equivalente ao enunciado do Axioma VI feito neste texto, ou seja, 5º. Postulado Se uma reta t corta duas retas r e s de modo que a soma dos ângulos colaterais internos é menor do que 180o, então r e s quando prolongadas se cortam daquele lado. Antes de mostrar a equivalência, observemos que se no desenho ao lado  +  > 180o, então  +  < 180o pois +++=360o+=360o– (+) 0, existe n  IN, tal que .b  a , (1 n ) o que é equivalente a dizer que em IR, o conjunto dos números naturais IN é ilimitado superiormente. Vamos a seguir, demonstrar esta eqüivalência. Vejamos primeiramente que IN é ilimitado superiormente, caso IR satisfaça (1). De fato, para todo a > 0, fazendo b = 1, c 

1 e substituindo em (1) obtemos a

1 1  , ou seja, n > c. Assim, nenhum elemento positivo n c

de IR pode ser limitante superior de IN. Então, IN é ilimitado superiormente. Reciprocamente, se IN é ilimitado superiormente, dados a > 0 e b em IR, existe n  IN tal b 1 que  n e, portanto, .b < a. a n

41 Por este motivo dizemos que IR é um corpo arquimediano. O nome se deve a Arquimedes de Siracusa que nasceu em 287 a.C. em Siracusa, Itália e morreu em 212 a.C. em Siracusa, Sicília. Ele aperfeiçoou métodos de integração que permitiram encontrar áreas, volumes e áreas de superfícies de muitos corpos. Seu mais famoso teorema fornece o peso de um corpo imerso num líquido, conhecido como Prinçipio de Arquimedes. Arquimedes morreu assassinado por um soldado romano.

163

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Agora vamos mostrar que, de fato, IR satisfaz (1). Se IR não for arquimediano, então, pelo que acabamos de ver, IN é limitado superiormente. Seja S um limite superior de IN, então n + 1  S, para todo n IN. Logo, n  S – 1, para todo n IN. Então S – 1 é também um limitante superior de IN. Como S – 1 < S, IN é limitado superiormente mas não existe supremo, o que contradiz o axioma do completamento. Vamos considerar dois subconjuntos dos números reais: um formado pelos perímetros de polígonos convexos inscritos numa circunferência e o outro formado pelos perímetros de polígonos convexos circunscritos na mesma circunferência. A justificativa para considerar estes dois subconjuntos pode ser vista na seguinte construção: Considere um polígono P convexo inscrito numa circunferência, A e B dois de seus vértices consecutivos. Tomemos um ponto C no arco AB e chamemos de P’ o polígono obtido, trocando-se o segmento AB pelos segmentos AC e CB.

B

C

O A

Pela

desigualdade triangular temos que , e assim o perímetro de P é menor que o AB AC CB perímetro de P’. Concluímos então que, aumentando o número de vértices de um polígono convexo inscrito numa circunferência, aumenta-se o perímetro. Mas este procedimento não resulta num crescimento ilimitado, pois como vimos no Lema 8.9, o polígono circunscrito tem perímetro maior que qualquer polígono convexo inscrito. Lema 8.9: Dados um número real positivo  e uma circunferência qualquer C de raio r, a) existe um polígono regular circunscrito em C cujo lado tem medida menor que . b) existem polígonos regulares, um inscrito e outro circunscrito em C, tais que a diferença entre os perímetros é menor que . 164

8.

Circunferência e Círculo

Demonstração: a) Dado um A A’ K B polígono regular circunscrito em C com n lados, se todos os lados forem menor que  nada precisa ser feito, caso contrário, seja AB um O lado tal que AB   e seja K o ponto de tangência de AB com a circunferência, conforme desenho. Seja A’ um ponto entre  A e K, tal que A'K  . Por construção SOA’ divide KÔA e 2 assim A’ÔK < AÔK. Pelo fato de IR ser arquimediano 1 ˆ  m(A'OK) ˆ . m(AOK) existe um número n  IN tal que n Considere um polígono regular circunscrito cujo ângulo 2 ˆ , este polígono terá lado menor que m(AOK) central é n  2A'K  2.   . De fato, como A’OK é um triângulo 2 retângulo, tomando-se o lado do polígono regular cujo 2 ˆ , teremos 2 m(AOK) ˆ  2 m(A'OK) ˆ , m(AOK) ângulo central é n n pela Proposição 4.5 o lado do polígono será menor que 2A'K = . b) Sejam dois polígonos regulares, um inscrito e outro circunscrito, B1 com o mesmo número de lados. É fácil mostrar que as medidas dos A1 lados destes polígonos dependem apenas do raio das circunferência, e assim, sem perda de generalidade, r o desenho ao lado pode representar os lados A1A2 e B1B2 do polígono inscrito e do polígono circunscrito, respectivamente. Temos por semelhança de triângulos que: 165

D

B2 A2

O

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

B1B2 OB1 OB1 OB1    r A1A2 OA1 OD Mas se 2pc é o perímetro do polígono circunscrito e 2p i é o pc BB  1 2 , pois os perímetro do polígono inscrito, pi A1A2 polígonos são regulares. p OB1 Assim, c  , logo, pelo Exercício 7.2, pi r





pc  pi OB1  r OB1  r  4 . pi r 4.r Mas pelo Lema 8.9 pi < 4.r, portanto (1) pc – pi < 4.( OB1  r ) Por outro lado, pela desigualdade triangular (2) OB1  B1D  OD. Assim, OB1  r  B1D . De (2) em (1), obtemos que pc  pi  4.B1 D  2.B1 B2 . Pela parte a) é possível obter um polígono regular circunscrito tal que B1B2 

 . Logo 2pc – 2pi < . 4

 Uma propriedade intrínseca deste par de conjuntos nos levará naturalmente ao conceito de perímetro da circunferência. A propriedade é dada pela definição a seguir. Definição 8.9: Dois conjuntos de números reais X e Y formam um par de classes vizinhas, denotado por (X,Y), se satisfizer as seguintes condições: a)  x  X,  y  Y, x < y. b)   > 0,  x  X,  y  Y, tais que y – x < . Temos que num par de classes vizinhas (X,Y), pelo axioma do completamento, X possui supremo e Y possui ínfimo. Na verdade, eles são iguais, ou seja, se a = sup X 166

Circunferência e Círculo

8.

e b = inf Y, então a = b. De fato, pelos itens (a) e (b) da Definição 8.9, temos sup(X – Y) = 0. Porém,42 a – b = sup(X) – inf(Y) = sup(X) + sup(-Y) = sup(X – Y ) = 0. Logo, o par (X,Y) define um único número real e para obter o conceito de perímetro de uma circunferência construiremos um par de classes vizinhas. Teorema 8.9: Se X é o conjunto dos perímetros dos polígonos regulares inscritos e Y é o conjunto dos perímetros dos polígonos regulares circunscritos numa circunferência qualquer, então o par (X,Y) é de classes vizinhas. Demonstração: Temos: a) Pelo Lema 8.9, pi  X e pc  Y, 2pi < 2pc. b) Pelo Lema 8.9,   >0, existem polígonos regulares inscritos e polígonos regulares circunscritos tais que 2p c – 2pi < . Os itens (a) e (b) garantem que (X, Y) são classes vizinhas por definição.

 Definição 8.9: Chama-se comprimento da circunferência ou perímetro da circunferência, ao número real obtido pelo par de classes vizinhas (X,Y) dado pelo teorema anterior. A questão que permanece é como calcular este comprimento. O próximo resultado nos fornece o caminho para obter este valor (pelo menos de forma aproximada). Teorema 8.9: Os comprimentos de duas circunferências são proporcionais às medidas dos respectivos raios. Demonstração: Sejam K e K’ o comprimento de duas circunferências quaisquer, com raios r e r’ 42

Utilizaremos as propriedades do supremo e ínfimo nos números reais: sup(X + Y) = sup(X) + sup(Y) e sup(-Y) = -inf(Y).

167

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

K r  . K' r' Podemos considerar, sem perda de generalidade, que estas duas circunferências são concêntricas, pois o resultado independe de suas posições. Nas duas circunferências inscrevemos e circunscrevemos polígonos com o mesmo número de lados. Temos por semelhança de

respectivamente.

triângulos que

Queremos

mostrar

que

pi r p r  e c  . Tomando x  Kr' , então pi ' r' pc ' r' r

K r  . Assim, x r'

pc p K  i  . Como 2pi < K temos pc ' pi ' x

2pi ' 2pi   1, ou seja, 2pi’ < x. Analogamente, obtemos x K pc’>x. Logo x é limitante superior dos perímetros dos polígonos inscritos e x é limitante inferior dos perímetros dos polígonos circunscritos, pela unicidade de classes K r  vizinhas x = K’. Assim, . K' r'

 Corolário 8.9: A razão entre o comprimento de qualquer circunferência e a medida de seu diâmetro é um número constante. Demonstração: Basta observar que

C r 2.r   , ou C' r' 2.r'

C C'  , para quaisquer duas circunferências de 2.r 2.r' comprimentos C e C’ e raios r e r’.

seja,

 Definição 8.9: A razão constante a que se refere o Corolário 8.9 é designada por  (letra grega que se lê “Pi”).

168

8.

Circunferência e Círculo

Assim, o comprimento da circunferência de raio r é 2r e, para obtermos o comprimento da circunferência, precisamos encontrar um valor (aproximado) para  e o valor do comprimento da circunferência será tão preciso quanto for a aproximação de . Para isto, consideremos um polígono regular de n lados e representemos um lado por ln . Vamos determinar o lado l2n de um polí-gono regular de 2n lados em termos de ln e do raio R da circunferência circunscrita. Acompanhe o desenvolvimento pelo desenho ao ln .B C. lado. Por hipótese o triân-gulo ABC é isósceles (pois o polígono de lado l2n P 2n é regular) e o triângulo ABO . . também é isósceles (OA e OB são A O R raios), logo OC é perpendicular a AB (porque?). Assim pela Proposição . 8.9, AP

ln . 2

D

Como CD é diâmetro, pelo Corolário 8.9, ACD é retângulo em A. Pelo Exercício 7.16a), temos que l22n  2

 ln   .  2 Substituindo CP da primeira igualdade na segunda igualdade obteremos que l2n  2R2  R 4R2  ln2 . CP .(2R)

e pelo teorema de Pitágoras, CP2  l22n  

Utilizando por exemplo o l4 para começar, temos que l4  R 2 (porque?). Assim pelo que obtivemos acima l8  R 2 

2,

l16  R 2 

2

2,

l32  R 2 

2

2

2

e

assim sucessivamente. Isto nos fornece uma tabela. Aqui 2pn é o perímetro do polígono com n lados. n 4 8 16 169

ln 1,41421 . R 0,76537 . R 0,39018 . R

2pn 5,6568 . R 6,1229 . R 6,2428 . R

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32 64 128 256 512

0,19603 0,09814 0,04908 0,02454 0,01227

J. R.

. . . . .

R R R R R

6,2730 6,2806 6,2825 6,2830 6,2831

. . . . .

R R R R R

O número 6,2831 na última linha e última coluna da tabela acima, dividido por 2, fornece um boa aproximação para , ou seja,   3,1415. Sabemos a medida de um arco de circunferência em graus. E o comprimento do arco de uma circunferência de raio R? Para resolver este problema, basta fazer uma simples regra de três. Supondo que o arco mede  graus, temos que 360o corresponde a 2R, qual o comprimento l R do arco que corresponde a  graus? É claro que l = . 180o Definição 8.9: Chama-se radiano (rd) todo arco de circunferência cujo comprimento é igual ao comprimento do raio da circunferência que o contém. Assim uma circunferência (cujo comprimento é 2R) tem 2 radianos. A grande utilidade de se medir ângulos em radianos é que nesse caso estamos trabalhando com números reais, e podemos operá-los sem preocupações com a unidade. Uma boa justificativa para se definir esta nova unidade de medida de ângulo pode ser vista em [11]. Utilizaremos como padrão neste texto o radiano como unidade de medida de ângulo a partir de agora. O comprimento de um arco que mede  radianos é l = R.

170

Circunferência e Círculo

8.

8.4. Área de um Círculo Para obter a área de um círculo utilizaremos o mesmo procedimento: construiremos um par de classes vizinhas. Para isto precisaremos dos seguintes lemas. Lema 8.9: A área de um polígono convexo regular inscrito numa circunferência é menor do que a área de um polígono convexo regular circunscrito. Demonstração: Dados dois polígonos regulares um inscrito e outro circunscrito com perímetros 2p i e 2pc, respectivamente, temos que a área do inscrito A i é piai e do circunscrito Ac é pcac onde ai e ac são os respectivos apótemas, conforme Exercício 6.5. Como, pelo Lema 8.9, pi < pc e sendo ai apótema temos ai < r, segue imediatamente que Ai < Ac.

 Corolário 8.9: A área de qualquer polígono regular inscrito é menor que quatro vezes o quadrado do raio. Demonstração: Considera-se um quadrado circunscrito e assim para qualquer polígono regular inscrito de área A i, temos Ai < 4.r2.

 Lema 8.9: Para todo  > 0, existem dois polígonos regulares convexos, um inscrito e outro circunscrito numa circunferência C de raio r, cujas diferenças entre as áreas é menor que .

171

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

Demonstração: Pelo 7.18, temos que: Ac  OB1    Ai  OA1 



2



Exercício

4OB1 4OA1

2

Ac  Ai 4 OB1  OA1  2 Ai 4OA1

2

J. R.

, assim

  4OB

B2 A2

A1

2 2

D

B1

2

 OA1 4.r2

1

2



O

. Como Ai < 4.r2, pelo Corolário 8.9, segue que



2

2



2





2

2

Ac  Ai  4 OB1  OA1  4 DB1  2DB1  B1B2 , pelo Teorema de Pitágoras. Mas pelo Lema 8.9 a) podemos construir um polígono circunscrito regular, cujo lado B1B2 tem medida menor que  . Portanto, temos Ac – Ai < , como queríamos demonstrar.

 Teorema 8.9: O conjunto X das áreas dos polígonos regulares inscritos e o conjunto Y das áreas dos polígonos regulares circunscritos constituem um par de classes vizinhas. Demonstração: Pela Definição 8.9, devemos demonstrar que a) x X, y Y, x  y. b)   0, x X, y Y , tais que x  y   . O item (a) é imediato pelo Lema 8.9. O item (b) segue imediatamente do Lema 8.9.

 Definição 8.9: Chama-se área do círculo, o número real obtido pelo par de classes vizinhas (X,Y) dado pelo teorema anterior. Para obter o valor da área utilizamos o seguinte resultado: 172

Circunferência e Círculo

8.

Teorema 8.9: A área do círculo é r2, onde r é o raio da circunferência. Demonstração: Temos que 2pi : a) sen (+) = sen .cos  + sen .cos . Para isso utilize o primeiro desenho abaixo. b) sen ( – ) = sen .cos  – sen .cos . Para isso utilize o segundo desenho abaixo.

9.16. Demonstre que os valores do seno e do cosseno de um ângulo independem da semicircunferência utilizada para defini-los. 9.17. Utilize os ângulos para os quais já foram calculadas as funções trigonométricas, juntamente com os exercícios anteriores para calcular valores das funções 19 9 5 4 , , , , trigonométricas para os ângulos 20 10 6 5 3 7 2 3 (em graus, 171o, 162o, 150o, 144o, 135o, , , , 4 10 3 5 126o, 120o, 108, respectivamente). 9.18. Definimos as funções secante, cossecante e 1 cotangente de um ângulo medindo  por sec  , cos 1 1 cossec  e cotg  , respectivamente, desde tg sen que cos , sen  e tg  sejam definidas e diferente de zero. Mostre que: a) 1 + tg2 = sec2 . 195

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

b) 1 + cotg2=cos sec2 . 9.19. Calcule a área do triângulo em função de dois lados e do seno da medida do ângulo compreendido pelos mesmos. 9.20. Mostre que a área de um triângulo ABC pode ser expressa como função de seus lados e do raio r da circunferência circunscrita. Mais exatamente, temos A

AB.BC.AC . 4r

196

Capítulo 10: Incidência e Ordem no Espaço

A partir deste capítulo estudaremos o universo tridimensional da Geometria Espacial e observaremos diversos tipos de limitações. A principal delas é que somos também tridimensionais e isto nos impede de enxergar os objetos geométricos tridimensionais por inteiro a partir de um ponto de observação fixo. O quadrado pode ser visto inteiramente desenhado no plano 43, mas o cubo, não poderá ser visto por inteiro, algumas de suas arestas e faces estarão ocultas. Sendo nossos modelos dos objetos tridimensionais, representados no plano do papel (ou do quadro negro) é impossível ter fidelidade de medidas, pois suas representações fazem uso de perspectivas, projeções, etc, que distorcem ângulos e comprimentos. B Por exemplo, ao afirmarmos que num triângulo equilátero as medianas rela-tivas a quaisquer lados, também são alturas, mesmo sem saber demonstrar tal fato, podemos convencer um estudante A C (a) fazendo o desenho (a) ao lado. A Mas convencê-lo que um tetraedro regular ABCD, tem altura com um dos extremos no circuncentro da base será impossível através o desenho (b) ao lado. Assim, é mais D C fácil convencer os estudantes da (b) necessidade de uma formu-lação B mais rigorosa da geometria espacial que da geometria plana. 43 Veja que se morássemos no plano não conseguiríamos enxergar o quadrado por inteiro a partir de um ponto de observação fixo no plano. Para vêlo inteiro teríamos que nos deslocar em torno dele, que é o que fazemos no espaço tridimensional para poder enxergar todo o cubo.

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Como fizemos um estudo axiomático da geometria plana, vamos admitir conhecidos todos os resultados vistos, aplicados a cada plano do espaço, juntamente com as notações empregadas. Faremos aqui apenas as propriedades adicionais que deverão exprimir as relações fundamentais de pontos, retas e planos no espaço. Assim as noções primitivas, tais como ponto, reta e plano, serão admitidas novamente aqui. Os axiomas I.1 e I.2 da Geometria Plana aparecem aqui de uma maneira completa. Começaremos com o primeiro grupo de axiomas e uma parte destes já foi considerada na axiomatização da Geometria Plana.

10.1. Axiomas de Incidência Os próximos axiomas pertencem ao primeiro grupo de axiomas denominado, axiomas de incidência. Podemos através deles obter os primeiros resultados da geometria espacial. Axioma I.3 (de existência) : a) Existe ponto. b) Existe reta e qualquer que seja a reta, existem pontos que pertencem à reta e pontos que não pertencem à reta.

O ponto A A reta r

c) Existe plano e qualquer que seja o pla-no, existem pontos que pertencem ao plano e pontos que não pertencem ao plano. Axioma I.4 (de determinação) : a) Dados dois pontos distintos no espaço, existe uma única reta que contém estes pontos. 198

r

A

O plano 

 r

A

B

10.

Incidência e Ordem no Espaço

b) Dados três pontos não colineares no espaço, existe um único plano que contém estes pontos, que denotaremos por pl(ABC).

A



B

C

A primeira notação nova que utilizaremos aqui é a notação de plano. Utilizaremos para representar planos as letras gregas maiúsculas , , ..... Apenas para facilitar, abreviaremos no texto a palavra Geometria Plana, por G.P. Proposição 10.11: Se uma reta tem dois de seus pontos em um plano, então ela está contida inteiramente neste plano. Demonstração: Sejam A e B dois pontos de uma reta contida num plano , conforme desenho ao lado. Sabemos da G.P. que existe uma única reta r em  que passa por A e B. O Axioma I.4.a) garante que no espaço existe uma única reta que contém A e B, então esta reta só pode ser r.

. B

r

. A



 A Proposição 10.11 em muitos livros aparece como um axioma, e ele é denominado axioma da inclusão, aqui foi possível demonstrá-lo, porque admitimos conhecidos resultados de G.P. Corolário 10.11: Existem no máximo três posições relativas para uma reta e um plano,  a reta está contida no plano;  a reta tem exatamente um ponto em comum com o plano;  a reta não tem ponto em comum com o plano. 199

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Demonstração: Sejam r uma reta e  um plano. Consideremos r e  como um conjunto de pontos. Analisemos os possíveis casos de interseções de conjuntos. Temos três situações:  Se r   for um conjunto com mais de um elemento, r   terá no mínimo dois pontos, assim segue da Proposição 10.11 que a reta está contida no plano.  Se r   tiver apenas um elemento, então apenas um ponto pertence a reta e ao plano.  Se r   =  não existem elementos em comum entre a reta e o plano. Assim fica demonstrado que existem apenas as possibilidades apresentadas nos itens a), b) e c).

 No caso b) do Corolário 10.11 diremos que a reta e o plano são secantes ou concorrentes e, para demonstrar a existência de reta e planos secantes, basta tomar um ponto A do plano e um ponto B fora dele, conforme Axioma I.3.c, e considerar a reta AB. No caso c) diremos que a reta e o plano são paralelos e, no Capítulo 11, veremos que também este último caso é possível ocorrer. Exemplos 10.1. Estamos em condições de construir o primeiro sólido geométrico espacial: a pirâmide. Em primeiro lugar, observemos que se um conjunHexágono plano to de pontos A1, A2, ..., An estão contidos num plano  então, pela A6 A 5 Proposição 10.11, os segmentos A1 A4 A1A2, A2A3, ..., An-2An-1, An-1An, A2 A3 também estão contidos em , ou  seja, a figura dada por estes pontos 200

Incidência e Ordem no Espaço

10.

e estes segmentos formam uma poligonal P inteira-mente contida no plano. Se a poligonal for um polígono diremos que P é um B polígono plano. Existem polígonos no espaço que não são planos. Para obtê-los é necessário considerar um conjunto de pontos do espa-ço que não estejam A C contidos num mesmo plano. Este D tipo de polígono é denominado Quadrilátero reverso reverso. A existência de polígonos reversos é garantida pelo Axioma I.3.c. Considere um polígono plano P = A1A2...An e V um ponto ex-terior ao plano α, que existe piramidal de base pelo Axioma I.3.c. Traçamos os Figura V Hexagonal e vértice V segmentos VA1, VA2, ...,VAn. Cada dois vértices consecutivos de P determinam com V um triângulo. Os A6 A5 triân-gulos A1A2V, A2A3V, , AnA1V, juntamente com o polígono P, A1 A4 formam uma figura geo-métrica A2 A3 espacial denominada figura  pirami-dal de base P e vértice V.44 A superfície piramidal é a reunião das regiões triangulares A 1A2V, A2A3V, , AnA1V, juntamente com a região poligonal determinada por P. A pirâmide é o conjunto de todos os segmentos de extremidades V e X, onde X pertence a região poligonal determinada por P. Nas pirâmides, as arestas são os segmentos com extremidades V, A1, A2, , An. As arestas que contém V são chamadas arestas laterais. Os 44 Há uma certa despreocupação com o nome que damos às principais figuras geométricas espaciais. Quando se fala em pirâmide pode-se estar falando tanto em sua superfície quanto em sua região interna ou mesmo em sua estrutura de vértices e arestas. Neste texto, daremos nomes diferentes para estas três coisas. A figura piramidal é constituída pelos vértices e arestas, a superfície piramidal é constituída pelas regiões determinadas pelos polígonos e a pirâmide é a região delimitada pela superfície piramidal incluindo ela.

201

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

vértices são os pontos V, A1, A2,...,An, as faces laterais são as regiões triangulares determinadas por VA 1A2, VA2A3, , VAn-1An, VAnA1 e a região determinada por A 1A2An é denominada base. A reunião das faces laterais é denominada superfície lateral. A reunião das faces laterais com a base é denominada superfície total ou piramidal. Uma pirâmide possui uma base, n faces laterais, n arestas laterais, 2n arestas. Conforme a base, a pirâmide recebe alguns nomes: V V V V

B1

A3 A1

B2

A2 Pirâmide triangular ou tetraedro: quando base é um triângulo.

B4 B3

A1 A3

A2

Pirâmide quadrangular:

a quando a base quadrilátero.

é

um

A4 A 1

A6 A 5 A2

A4 A3

Pirâmide hexagonal: quando a base é um hexágono.

As pirâmides são um caso particular de sólidos geométricos denominados poliedros, que serão estudados no Capítulo 15. 10.2. Por definição, a circunferência é uma figura plana. Seguindo o mesmo raciocínio da pirâmide construiremos outra figura geométrica espacial. Considere uma circunferência C num plano  e V um ponto V exterior a , que existe pelo Axioma I.3.c. Traçamos os segmentos VA, onde A perten-ce a C. O conjunto de todos estes segmen-tos juntamente com o círculo determinado por C, formam uma figura geométrica espa-cial C A denominada superfície cônica  circular de base C e vértice V. O cone é o conjunto de todos os 202

10.

Incidência e Ordem no Espaço

segmentos de extremidades V e X, V onde X são pontos pertencentes ao círculo C. Os principais elementos geratriz do cone são:  Base: O circulo C de centro O e raio r.  As geratrizes: Os segmentos C  com uma extremidade em V e a outra na circunferência fronteira de C.  Vértice: O ponto V.  Superfície lateral: É a reunião das geratrizes.

vértice

base

Observe que não existe uma estrutura cônica semelhante ao que ocorre com a figura piramidal. De fato, a figura piramidal está caracterizada pelos vértices (o vértice V e os vértices do polígono) e por segmentos determinados por eles. Por outro lado, definimos a superfície piramidal dada pelas regiões triangulares juntamente com a região poligonal.

10.2. Determinação de Planos Apresentaremos nesta seção as necessárias para a determinação de um plano.

condições

Proposição 10.11: Se uma reta r e um ponto A são tais que A  r, então eles determinam um único plano. Demonstração: (Existência) Tomamos em r dois pontos distintos B e C. Pelo Axioma I.4.c, existe um único plano  contendo A, B e C (por hipótese, não são colineares). Pela Proposição 10.11, r está contido em . (Unicidade) O plano  contém A, B 203

r . C . B



. A

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

e C. Seja ’ um plano que contém A e r. Como B e C foram tomados em r, temos que ’ contém os pontos A, B e C, e assim pelo Axioma I.4.c,  = ’.

 Denotaremos o plano determinado por uma reta r e um ponto A por pl(r,A). Definição 10.11: Se duas retas tem interseção em um único ponto A, dizemos que essas retas são concorrentes em A. Proposição 10.11: Se duas retas r e s são concorrentes num ponto A, então elas determinam um único plano. Demonstração: (Existência) r B. Sejam B um ponto de r e C um ponto de s, distintos de A, conforme desenho ao lado. Pelo Axioma I.4.b), . A . s existe um único plano  contendo C A, B e C. Como A e B são pontos de r, A e C são pontos de s, pela  Proposição 10.11, r e s pertencem a . (Unicidade): Se ’ contém r e s, então ’ contém A, B e C. Logo, pelo Axioma I.4.b), temos  = ’.

 Denotaremos o plano determinado por duas retas r e s concor-rentes por pl(r,s). Definição 10.11: Duas retas no espaço são ditas paralelas quando não tem ponto em comum e estão contidas num mesmo plano. Duas retas são reversas, se não existe plano contendo essas duas retas. Quando duas retas retas r e s forem paralelas escreveremos r // s. 204

10.

Incidência e Ordem no Espaço

r

r s

s

Retas paralelas

Retas reversas

Segue da Definição 10.11, que as retas reversas não tem interseção e que duas retas paralelas r e s determinam um plano, onde “determinar” significa que é único. Deixamos como exercício a verifica-ção desta afirmação (Exercício 10.2). Ainda não está garantida a existên-cia de retas reversas, isto será visto posteriormente. Pelo que vimos anteriormente, existem quatro maneiras de se determinar um plano: 1. Através de três pontos não colineares - Axioma I.4.b). 2. Através de uma reta e um ponto fora dela Proposição 10.11. 3. Através de duas retas concorrentes - Proposição 10.11. 4. Através de duas retas paralelas - Definição 10.11. 1. 2. 3. 4. A



B

r

r . C . B

C



. A

s



r



s

10.3. Axioma de Ordem O próximo teorema garante a validade do Axioma VI no espaço. 205

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Teorema 10.11: Por um ponto A fora de uma reta r podese traçar uma única reta paralela a r.

s’ s Demonstração: Pela Proposição r 10.11 existe um único plano  determinado por r e A. Seja s a . paralela a r em , passando por A. A Suponhamos que exista no espaço uma outra reta s’ passando por A e paralela a r. Logo, por definição,  existe um plano ’ que contém r e s’. Mas A  s’ por construção, e assim, ’ contém r e A, e portanto coincide com . Pelo Axioma VI, ou seja, o quinto postulado de Euclides, s coincide com s’.

 Acrescentaremos agora mais um axioma no segundo grupo de axiomas que são os axiomas de ordem. Antes necessitamos alguns conceitos. Definição 10.11: Consideremos um plano  e dois pontos A e B não pertencentes a  (existem pelo Axioma I.3.c). Diremos que A e B estão do mesmo lado em relação ao plano , se o segmento AB não intercepta . Caso contrário, diremos que A e B estão em lados opostos em relação ao plano , O conjunto de todos os pontos de  e de todos os pontos que estão do mesmo lado que A em relação ao plano  é chamado semi-espaço determinado por  contendo A e será denotado por E, A. 206

A. . B



Do mesmo lado

Incidência e Ordem no Espaço

10.

Axioma II.3: Um plano  determina exatamente dois semi-espaços distintos, cuja interseção é o plano .45 Exemplos 10.3. Utilizando o Teorema 10.11 e o Axioma II.3 construiremos o terceiro sólido geométrico espacial bastante conhecido: o paralelepípe-do ou hexaedro. Consideremos três segmentos não coplanares AB, AD e AE, que existem, pelo Axioma I.3.c. Pelo Axioma I.4.b, A, B e D; A, B e E; A, D e E, determinam três planos distintos. Conduzimos por B e D, retas paralelas a AD (que E r chamamos de r) e a AB (que D chamamos de s) respectiva-mente, C s obtendo assim um paralelogramo A ABCD (pela definição de B pl(ABD) paralelogramo), onde C = r  s. A seguir traçamos três paralelas a H. .G reta AE, passando por B, C e D, F. tomando segmentos sobre estas E. r retas com a mesma medida de AE, D. . no semi-espaço determinado pelo C s plano pl(ABD) e o ponto E, medidos . A. B a partir dos pontos B, C e D; os pl(ABD) outros extremos destes segmentos H assim obtidos denominamos F, G e G H, respectiva-mente. Finalmente, F E traçamos os segmentos EF, FG, GH r e HE. Estes segmentos se situam D C s no mesmo plano, já que as retas EF A e GH são paralelas, pois ABFE e B pl(ABD) CDHG são parale-logramos46. A 45 Podemos dizer que este axioma ordena os pontos do espaço em duas classes, por isso estamos colocando-o no grupo dos axiomas de ordem. 46 O quadrilátero ABFE é um paralelogramo pois como BF foi tomado paralelo a AE e de mesmo comprimento, temos AE  BF e AE // BF. Assim, os segmentos AE e BF são coplanares e portanto, pelo item a) da Proposição 5.6, ABFE é um paralelogramo. De maneira análoga conclui-se que CDHG é um

207

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

intersecção dos semi-espaços determinados por cada um dos paralelogra-mos e um vértice não pertencente a eles, é denominada paralelepípedo ou hexaedro. Observamos que a figura formada pelos vértices e segmentos determinam três obje-tos distintos: a estrutura em si, a superfície formada pelos paralelogramos e o sólido 47 que é o paralelepípedo. O paralelepípedo é um outro caso particular de poliedro. 10.4. A construção do exemplo anterior garante a existência de retas reversas. As retas definidas pelas arestas AE e BC, por exemplo, são reversas, pelo fato que, por construção, E não pertence ao único plano que contém A, B e C, o que mostra que as retas AE e BC não estão situadas em um mesmo plano.

E C A

B

Os sólidos geométricos apresentados até agora são: as pirâmi-des, os cones circulares e os paralelepípedos. Quando falamos destes sólidos estamos falando, na realidade, de classes de sólidos geométri-cos. De fato, podemos construir infinitas pirâmides, infinitos cones e infinitos paralelepípedos utilizando os procedimentos de construção dados, que dependem dos planos, dos segmentos e dos pontos considerados. Na verdade, assim como os tetraedros são uma subclasse das pirâmides, os paralelepípedos são uma subclasse de uma outra classe denominada prisma, que será apresentada no próximo capítulo. Estes exemplos permitem separar os sólidos em duas classes distintas: os sólidos que rolam e os sólidos paralelogramo. 47 A noção de sólido é um conceito primitivo e surge ao imaginarmos regiões do espaço, assim como consideramos as regiões no plano.

208

10.

Incidência e Ordem no Espaço

que não rolam. Os primeiros são também denominados corpos redondos48. A segunda classe constitui exatamente do complementar da primeira classe. Assim temos o diagrama a seguir:

hexaedros

prismas

tetraaedros

pirâmides

Corpos que não rolam Cones circulares

sólidos

Corpos que rolam

10.4. Ângulos entre Retas O Teorema 10.11 permite definir ângulos entre retas quaisquer no espaço. Definição 10.11: Se duas retas são paralelas então a medida do ângulo entre elas é zero. Se duas retas são concorrentes num ponto O (e assim coplanares pela Proposição 10.11) então a medida do ângulo entre elas é a medida do menor ângulo formado por suas semi-retas definidas por O. r Se duas retas são reversas o t ângulo entre elas é definido pelo s u ângulo formado por duas retas concorrentes, paralelas às retas dadas. As retas do espaço que formam um ângulo reto são chamadas retas ortogonais. 48 Temos que utilizar aqui um pouco da intuição para diferenciar entre essas duas classes. Uma maneira seria considerar como noção primitiva a de corpo redondo.

209

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Retas perpendiculares são retas ortogonais coplanares (portanto concorrentes). Para que este ângulo esteja bem definido, é necessário que ele independa das paralelas escolhidas, e de fato isto ocorre conforme mostra o teorema a seguir. Teorema 10.11: Sejam (r,s) e (r’,s’) dois pares de retas concorrentes, tais que r e r’ são paralelas entre si e, s e s’ também são paralelas entre si, então o ângulo formado por r e s é igual ao ângulo formado por r’ e s’. A

s

2 Demonstração: Sejam A o ponto A de inter-seção de r e s e, B o ponto A1 r de interseção de r’ e s’. Sobre r e s, semi-retas de menor ângulo com vértice A, tomemos pontos A1 e A2, s’ B2 conforme o desenho ao lado e tracemos paralelas A1B1 e A2B2 à B1 B r’ reta AB. Por construção, A1B1B2A2, ABB2A2 e AA1B1B são paralelogramos. De fato, como s contém os pontos A e A2, s’ contém os pontos B e B2 e, por hipótese, s // s’ temos que AA2 // BB2. Como A2B2 foi tomado paralelo a AB, por construção, temos AB // A2B2. Logo ABB2A2 é um paralelogramo. De maneira análoga temos que AA 1B1B é um paralelogramo. Quanto ao quadrilátero A1B1B2A2 temos A1B1 // A2B2 pois A1B1 // AB e A2B2 // AB. Como AA1B1B e ABB2A2 são paralelogramos (provado anteriormente) temos A1B1  A2B2. Logo, pelo item a) da Proposição 5.6, A1B1B2A2 é um paralelogramo. Assim, temos AA 1 BB1, AA2  BB2 e A1A2  B1B2. Logo, os triângulos AA1A2 e BB1B2 são congruentes pelo caso LLL, o que mostra que os ˆ são congruentes. E assim, por definição, o ângulos  e B ângulo entre as retas r e s é congruente ao ângulo entre as retas s’ e r’.

 210

Incidência e Ordem no Espaço

10.

Teorema 10.11: Se dois planos  e ’ são distintos e têm um ponto P comum, então, a interseção desses planos é uma única reta que passa por P. Demonstração: (Existência) Pelo ' Axioma II.3,  determina dois semiA Q espaços E,A e E,B, onde A e B estão em lados distintos em relação ao P P’ plano . Como  e ’ são dois planos distintos existe um ponto Q  em ’ que não está em . Pelo B R Axioma II.3, Q está em um dos semi-espaços E,A ou E,B. determinado por . Só para fixar a idéia suponhamos que Q esteja, por exemplo, em E ,A (o outro caso é análogo). Por hipótese P    ’. Assim r = QP é uma reta de ’. O ponto P divide r em duas semi-retas, tomemos R um ponto na semi-reta oposta a S PQ. Pela definição de semi-espaço, R está em E,B.Seja C um ponto qualquer de ’ fora de r (existe pelo Axioma I.3.b). Existem três possibilidades para C, ou ele pertence aos dois semi-espaços, ou ele está apenas em E,A, ou ele está apenas em E,B. 1º Caso : C está nos dois semi-espaços : Neste caso, temos que C está em , e assim tomamos a reta i = PC que estará na interseção de  e ’, pela Proposição 10.11. 2º Caso: C está apenas em E,A: Considere a reta s = RC, que estará em ’ e é distinta de r, pois C não está em r. Como nesse caso C está em E ,A e R está em E,B, pela Definição 10.11, s intercepta  num ponto P’ distinto de P. Seja i = PP’ que estará na interseção de  e ’, pela Proposição 10.11. 3o Caso: C está apenas em E,B: Analogamente, se obtém P’ = QC  , com P’ distinto de P e a construção da interseção é como no caso anterior. (Unicidade) Seja X    ’, um ponto tal que X  i, assim pela Proposição 10.11, existe um único plano  contendo i 211

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

e X. Mas i e X estão em  e ’, logo  =  = ’, absurdo. Assim os únicos pontos da interseção de  e ’, são os pontos de i.

 Corolário 10.11: a) Para obter a interseção de dois planos distintos, é suficiente encontrar dois pontos distintos comuns a esses planos. b) Três ou mais pontos são colineares, quando são comuns a dois planos distintos. Demonstração: a) Sejam A e B dois pontos comuns a dois planos  e ’. Pelo Teorema 10.11, se encontrarmos dois pontos comuns a  e ’, a interseção é a única reta que contém estes pontos. b) Por definição, três ou mais pontos são colineares se pertencem a uma mesma reta. Mas se três ou mais pontos pertencem a dois planos distintos, pelo Teorema 10.11, eles pertencem à reta interseção, logo são colineares.

 10.5. Exercícios 10.1. Na Geometria Plana foi demonstrado que numa reta existem infinitos pontos. Num plano, existem infinitas retas? No espaço, existem infinitos planos? 10.2. Demonstre que as retas reversas não têm interseção e que duas retas paralelas r e s determinam um plano. 10.3. Determine as posições relativas entre duas retas. 10.4. Classifique as afirmações abaixo em verdadeiras ou falsas, justificando brevemente sua resposta (uma afirmação só é verdadeira se ela sempre se verifica). 212

Incidência e Ordem no Espaço

10.

a) Três pontos distintos determinam um plano. b) Três pontos distintos não são colineares. c) Três pontos não colineares são dois a dois distintos. d) Duas retas ou são coincidentes ou são distintas. e) Duas retas ou são coplanares ou são coincidentes. f) Duas retas concorrentes têm um ponto em comum. g) Duas retas concorrentes têm um único ponto comum. h) Duas retas que têm um ponto comum são concorrentes. i) Duas retas distintas não paralelas são reversas. j) Duas retas que não tem ponto comum são paralelas. l) Para obter uma reta é suficiente obter dois pontos distintos da reta. m) Três retas distintas, duas a duas paralelas, determinam três planos distintos. n) Duas retas distintas determinam um plano. o) Quatro pontos distintos e não colineares determinam um quadrilátero reverso. 10.5. a) Quantos planos passam por uma reta? E por dois pontos distintos? Quantos planos passam por quatro pontos distin-tos dois a dois? 10.6. Mostre que as diagonais de um quadrilátero reverso são reversas. 10.7. Num plano  há dois pontos A e B pertencentes a uma reta r e dois pontos C e D pertencentes a uma reta s, onde r e s são concorrentes. Considere um ponto P fora de . Determine a interseção entre os planos pl(A,B,P) e pl(C,D,P)? 10.8. Sejam r e s duas retas reversas. Em r há um ponto R e em s, um ponto S. Encontre a interseção entre os planos pl(r,s) e pl(s,R). 10.9. a) Suponha que as retas que contém os lados de um triângulo ABC, interceptam um plano  em três pontos M, N e Q. Mostre que estes três pontos são colineares. 213

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

b) Dois triângulos não coplanares ABC e A’B’C’ têm as retas AB e A’B’ concorrentes em O, AC e A’C’ concorrentes em P e BC e B’C’ concorrentes em R. Mostre que O, P e R são colineares. 10.10. Considere uma pirâmide quadrangu-lar de base ABCD e vértice V como no desenho ao lado. Os extremos das arestas laterais opostas VA e VC determinam um plano , e os extremos das arestas opostas VB e VD determinam um A plano ’. Encontre a interseção dos planos  e ’. (Sugestão: considere o encontro das diagonais do quadrilátero da base).

V

D

C B

10.11. Considere um conjunto de pelo menos três retas distintas. Mostre que, se quaisquer duas retas deste conjunto são concorrentes, então elas estão todas num mesmo plano ou passam todas pelo mesmo ponto. 10.12. Duas retas r e s são concorrentes em um ponto O. Fora do plano determinado por r e s tomamos um ponto P qualquer. Qual é a interseção do plano definido por r e P com o plano definido por s e P? 10.13. a) Mostre que duas retas distintas paralelas a uma mesma reta são paralelas entre si. b) Duas retas distintas ortogonais a uma terceira reta são sempre paralelas entre si? 10.14. Seja r uma reta qualquer e s uma reta não paralela a r. Mostre que todas as retas paralelas a s e concorrentes com r estão contidas no mesmo plano. 10.15. Sejam A, B, C e D pontos quaisquer do espaço. Sejam M, N, P e Q os pontos médios de AB, BC, CD e DA, respectivamente. mostre que MNPQ é um paralelogramo. 214

Incidência e Ordem no Espaço

10.

10.16. Mostre que os três segmentos que unem os pontos médios das arestas opostas de um tetraedro qualquer ABCD se encontram em um mesmo ponto. 10.17. Sejam r e s duas retas reversas. Sejam A e B pontos distintos de r, C e D pontos distintos de s. Mostre que as retas AC e BD são reversas. 10.18. Mostre que se três planos são distintos e dois a dois secantes segundo três retas distintas, então: ou essas retas interceptam-se num só ponto ou elas são paralelas duas a duas. 10.19. Mostre que duas circunferências de raios iguais, centro em comum e contidas em planos secantes têm dois pontos em comum. 10.20. Suponha que dois planos se cortam e contém, respectivamente duas retas paralelas e distintas, mostre que a interseção desses planos é paralela às retas.

215

Capítulo 11: Paralelismo no Espaço e suas Conseqüências

O Corolário 10.11 garante que existem apenas três posições possíveis para uma reta r e um plano  do espaço. Se a reta possuir dois pontos em comum com o plano, então ela estará inteiramente contida no plano, porém como sabermos se a reta tem um ou nenhum ponto em comum com o plano? O Teorema 10.11 estabelece que se dois planos distintos possuir um ponto em comum então ele terá como interseção uma reta. Existem critérios que ajudam a verificar se dois planos distintos têm ou não pontos em comum? Neste capítulo daremos vários resultados que respondem estas duas perguntas.

11.1. Paralelismo Planos

entre

Retas

e

Iniciaremos com uma condição de paralelismo entre retas e planos. Primeiramente definiremos reta paralela a plano: Definição 11.12: Dizemos que uma reta e um plano são paralelos se eles não possuem pontos em comum. Teorema 11.12: Um plano  e uma reta r não contida em  são paralelos se, e somente se, existe uma reta s paralela a r e contida em .

11.

Paralelismo de Retas e Planos

Demonstração: Suponhamos que r e  sejam paralelos. Seja A um r ponto qualquer de , e consideremos o plano ’ = pl(r,A) (desenho ao lado). Os planos  e ’ A são distintos e possuem o ponto A em comum. Logo, pelo Teorema  10.11 eles tem uma reta s em ' comum. Como r e s estão em ’, elas são coplanares, mas r e  são paralelos por hipótese, logo r não intercepta s, e assim r e s são paralelas e s está em . Reciprocamente, suponhamos que uma reta s de  seja paralela a r. r Seja ’ = pl(r,s). Os planos  e ’ são distintos (pois r está em ’ e A s não está em ) e possuem a reta s  em comum. Como, por construção, r está contida em ’, se ela ' cortasse o plano , seria necessariamente um ponto da interseção s de  e ’, mas isso é impossível, pois r e s são paralelas. Logo, r é paralela a .

 Este resultado paralelas a planos.

mostra

a

existência

de

retas

Teorema 11.12: (Critério de paralelismo entre retas no espaço): Sejam  e ’ dois planos que se cortam segundo uma reta s. Se r é uma reta de ’ e é paralela a , então r é paralela a s.

217

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

Demonstração: Como r é paralelo a , temos que r não intercepta . Logo r e s não se interceptam. Como s é a interseção dos planos  e ’, s pertence a ’ e, por hipótese, r pertence a ’. Assim temos duas retas em ’, que não se interceptam. Por-tanto r e s são paralelas.

J. R.

r

'

s



 Exemplo 11.1. No paralelepípedo, por construção, o segmento AD é paralelo aos segmentos EH e BC. Logo, pelo Teorema 11.12, AD é paralelo aos planos EFGH e BCFG. Analogamente, se conclui com os outros segmentos em rela-ção aos planos que não se interceptam.

H

G F

E D A

C B

Os segmentos BC e FG são paralelos pois FG é paralelo ao plano ABCD e BC é a interseção de ABCD e BCFG.

11.2. Paralelismo entre Planos Vamos agora estudar o caso de paralelismo entre planos. Definição 11.12: Dois planos são chamados paralelos se não possuem pontos em comum. Até agora não mostramos que pode ocorrer a existência de dois planos paralelos. A seguinte construção tem este objetivo. 218

Paralelismo de Retas e Planos

11.

Construção: 1. Tomemos um plano  e um ponto O’ fora de , que existe pelo Axioma I.3.c. 2. Construímos em  duas retas r e s, concorrentes num ponto O. Esta construção foi feita em G.P. 3. Construímos por O’ duas retas r’ e s’ , paralelas a r e a s respectivamente, (Axioma VI). 4. Por construção, as retas r’ e s’ são concorrentes em O’ e portanto pela Proposição 10.11 determinam um plano ’, que afirmamos ser paralelo a . A demonstração de que  e ’ são paralelos é dado pelo seguinte teorema: Teorema 11.12: Se por um ponto O’ fora de um plano , conduzirmos duas retas r’ e s’ respectivamente paralelas a duas retas r e s concorrentes em um ponto O desse plano, então r’ e s’ determinam um novo plano ’ paralelo ao primeiro . Demonstração: Temos, por s’ O’ hipótese, que r// r’ e s // s’. Assim, pelo Teorema 11.12, r’ e s’ são  ' r’ t paralelas a . Suponhamos, por s absurdo, que  e ’ não são O r paralelos. Assim, eles se  interceptam segundo uma reta t, pelo Teorema 11.12, r’ é paralela a t e s’ é paralela a t. Logo, por O’ existem duas retas paralelas a uma reta, o que contradiz o Teorema 10.11. Assim,  e ’ são paralelos.

 Na verdade o Teorema 11.12 engloba os seguintes resultados: 219

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

a) Dados dois planos, se um deles contém duas retas concorrentes respectivamente paralelas a duas retas concorrentes do outro, então esses planos são paralelos entre si. b) Se duas retas concorrentes de um plano são paralelas a um outro plano, então esses planos são paralelos entre si. Exemplo 11.2. Vamos voltar ao paralelepípedo pois as relações de paralelismo no espaço estão intimamente ligadas a este sólido. Por construção, o segmento AD é paralelo ao segmento EH e o segmento AB é paralelo ao segmento EF. Logo, pelo Teorema 11.12, ABCD é paralelo ao plano EFGH. Resultados semelhantes se obtém com os outros segmentos em relação aos outros pares de planos.

H F

E D A

G

C B

O resultado a seguir é bastante útil. Teorema 11.12: Dados dois planos paralelos, se r é uma reta qualquer de um dos planos então existe uma reta s no outro plano que é paralela a r. Demonstração: Sejam  e ’ dois planos paralelos e r uma reta qual-quer de . Seja O’ um ponto qualquer de  e ’ = pl(r,O’). Temos, O’ ’, logo, pelo Teorema 10.11, ’   é uma reta s. Como  e  são paralelos temos r //  e r  ’, por construção, assim pelo Teorema 11.12, r // s e s  .

 220

Paralelismo de Retas e Planos

11.

O próximo resultado é análogo ao axioma das paralelas para planos: Teorema 11.12: Por um ponto O’ exterior a um plano  dado, existe um único plano  paralelo a . Demonstração: (Existência) A existência foi feita no Teorema 11.12. (Unicidade) Suponhamos que existam dois planos distintos 1 e 2 passando por O’ e paralelos a . Como os planos são distin-tos e ambos passam por O’, 1  2 = s, pelo Teorema 10.11. Tomamos uma reta r em , tal que r não seja paralela a s. Isto é possível pois basta construirmos um plano =pl(s, A), onde A é um ponto qualquer de  e, pelo Teorema 10.11, temos    = t. Tome r concorrente a t em A, como t//s, pois s // , temos que r e s são reversas. Consideremos o plano ’ = pl (r,O’). Como ’ passa por O’ que está em 1  2 = s, pelo Teorema 10.11, ’  1 = t1 e ’  2 = t2, mas como 1 e 2 são paralelos a , t1 e t2 são paralelas a r, passando por O’, o que é um absurdo, pelo Axioma VI, e, assim, 1 e 2 são necessariamente coincidentes.

 Teorema 11.12: Se uma reta corta um plano, corta também qualquer plano paralelo a este. Se um plano corta uma reta, corta também qualquer reta paralela a ela. Demonstração: Para demonstrar a primeira parte do teorema sejam  e ’ dois planos paralelos e r uma reta que intercepta ’ em O. Existem três possíveis posições relativas para r e . O caso de r estar contida em  é 221

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

impossível pois O não está em . No caso de r ser paralela a , r consideramos u em  paralela a r r’ (possível pelo Teorema 11.12) e O uma reta r’ paralela a u em ’, que ' r’’ é paralela a  (r’ é paralela a  pois, caso contrário, existiria A  r’  . Como  e ’ são paralelos, teríamos um absurdo). Mas em ’ u  existe uma reta r” paralela a r’ passando por O. Assim teremos duas paralelas a u passando por O, o que contradiz o Axioma VI. Logo esse caso tamr bém é impossível. Resta assim a  r’ última possibilidade, que é o caso de r interceptar , encerrando a primeira parte do teorema. Para s O demonstrar a segunda parte, suponha que uma reta r intercepta  um plano  e seja r’ uma reta paralela a r. Considere o plano =pl(r,r’). Como r corta , então  intercep-ta  segundo uma reta s, pelo Teorema 10.11. Como s intercepta r, temos que s intercepta r’ (a reta s intercepta r’, pelo Corolário 5.6, pois r, r’ e s estão no plano ). Logo r’ intercepta .

 Este teorema garante que situações como as dos desenhos abaixo não podem acontecer.

222

11.

Paralelismo de Retas e Planos

r

r  

s 

Teorema 11.12: Se um plano  corta um plano  segundo uma reta r, ele corta um plano ’ paralelo a  segundo uma reta paralela a r. Demonstração: Temos que  é s distinto de ’ ( corta um plano ' paralelo a ’) e não é paralelo a ’, r pois caso contrário por um ponto qualquer de r, passariam dois  planos paralelos a ’, que é um  absurdo pelo Teorema 11.12. Logo,  corta ’ segundo uma reta s. Mas, r e s estão em  e não possuem pontos em comum, pois  e ’ são paralelos por hipótese, então r e s são paralelos por definição.

 s O desenho ao lado ilustra uma situação que este teorema não permite que ocorra.

' 



223

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Exemplos 11.3. Utilizando os resultados até aqui apresentados é possível construir os prismas, uma classe de sólidos geométricos interessante e que está muito presente em nosso cotidiano49. Sejam A1A2...An um polígono contido em um plano  e B1 um ponto qualquer não pertencente a . Por B1 traçamos o único plano ’ paralelo B B a . Pelos demais vértices A2, ..., An B ' B traçamos retas paralelas a A1B1 que, pelo Teorema 11.12 cortam ’ nos pontos B2, ..., Bn, respectiva-mente. Tomemos dois segmentos A A consecuti-vos assim determinados, A  A por exemplo, A1B1 e A2B2. O quadrilátero A1B1B2A2 é plano, pois por construção, A1B1 é paralelo a A2B2. Mas isso significa que os outros dois lados A 1A2 e B1B2 também são paralelos, pois estão contidos em planos paralelos. Portanto, por definição, o quadrilátero é um paralelogramo e o polígono B1B2...Bn é congruente ao polígono A 1A2...An. Os paralelogramos assim determina-dos, juntamente com os polígonos A1A2...An e B1B2...Bn determina uma figura geométrica espacial denominada figura prismática. A superfície prismática é a reunião das regiões poligonais determinadas pelos paralelogramos e pelos polígonos. O prisma é a reunião de todos os segmentos XY, onde X pertence a região poligonal determinada por A 1A2...An e Y é a interseção da reta paralela a A 1B1 com o plano ’. Os pontos Ai e Bi, onde i varia de 1 a n, são denominados vértices. As regiões determinadas pelos polígonos A1A2...An e B1B2...Bn são denominadas bases. As regiões determinadas pelos paralelogramos são denominadas faces laterais. Os segmentos AnBn, AnA1, BnB1, AiBi, AiAi+1 e BiBi+1, onde i varia de 1 a n-1, são denominados 1

4

2

3

1

4

2

49

Caixas longa vida, embalagens de mercadorias, etc.

224

3

Paralelismo de Retas e Planos

11.

arestas. Os segmentos AiBi, onde i varia de 1 a n, são denominados arestas laterais. Os segmentos determinados por vértices pertencentes a faces distintas são denominados diagonais. Um prisma possui 2 bases, n faces laterais, n arestas laterais e 3n arestas. Conforme a base o prisma recebe alguns nomes:

Prisma triangular: Prisma hexagonal: quando a base for um Prisma quadrangular: quando a base for um quando a base for um triângulo. hexágono. quadrilátero.

Os prismas formam uma subclasse da classe de sólidos geométricos denominada poliedros, que serão estudados no Capítulo 15. Um caso particular de prisma ocorre quando a base é um paralelogramo, no qual obtemos um paralelepípedo que já foi construído anteriormente. Existem também os prismas construídos a partir de uma base não convexa. O desenho ao lado apresenta um prisma cuja base é um octógno não convexo. A seção de um prisma é um polígono plano que contém exatamente um vértice em cada aresta lateral do prisma. Quando o plano da seção de um prisma é paralelo aos planos das bases, a seção é congruente as bases. Deixamos como exercício a prova desta afirmação (Exercício 11.11). A reunião de todas as faces laterais é denominada superfície lateral do prisma. A reunião da superfície lateral com as regiões poligonais das bases é denominada superfície do prisma. 225

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

11.4. Seguindo a mesma construção do exemplo anterior, o que faremos agora é considerar uma circunferência ao invés de um polígo-no. Os conceitos de cilindro e prisma são originados de um conceito mais geral que é o de superfície cilíndrica regrada. Este conceito depen-de exclusivamente do conceito de curva, o qual não temos elementos suficientes para apresentá-lo. Sendo assim, falaremos apenas sobre um caso particular, que são as superfícies cilíndricas circulares. Consideres mos uma circunferência C, situada ’ num plano  e B um ponto qualquer B não per-tencente a . Por B traçamos o único plano ’ paralelo a  e uma reta s interceptando o  C plano . Os pontos de interseções das retas paralelas a s passando por C formam uma circunferência congruente a C’ Deixaremos como exercício a demonstração desta afirmação (Exercício 11.18). A superfície cilíndrica é a reunião de todos os segmentos paralelos a s com uma extremidade em C e outra em C’. O cilindro é a reunião de todos os segmentos paralelos a s com uma extremidade no círculo determinado por C e outra no círculo determinado por C’. Os principais elementos do cilindro são:  Duas bases: São os círculos congruentes situados nos planos paralelos  e ’.  Geratrizes: São os segmentos paralelos à reta s dada que passam por C.  Superfície lateral: É a reunião dos segmentos cujas extremidades estão nas circunferências bases.  Superfície Cilíndrica: É a reunião da superfície lateral com as bases.

226

11.

Paralelismo de Retas e Planos

11.3. Teorema de Tales O Teorema de Tales pode ser generalizado para planos: Definição 11.12: Um conjunto de planos distintos, todos paralelos entre si, é chamado feixe de planos paralelos. Uma reta que intercepta todos os planos de um feixe de planos paralelos é chamada transversal desse feixe. Dois segmentos que estão entre dois planos escolhidos de um feixe de planos paralelos e cada um desses segmentos com uma extremi-dade nesses dois planos, são chamados segmentos correspondentes. Teorema 11.12: (de Tales para planos): Se um feixe de planos paralelos tem duas transversais, então, a razão entre dois segmentos quaisquer de uma é igual a razão entre os segmentos correspondentes da outra. Demonstração: Se as duas transversais são coplanares, a demonstração recai no mesmo teorema da G.P. que foi visto. Se as duas transversais r e s são reversas, construímos uma reta r’ concorrente com r e paralela a s (basta tomar em r um ponto P qualquer, e pelo Teorema 10.11, existe uma única reta paralela a s que contém P). O resultado agora segue aplicando duas vezes o Teorema de Tales da G.P. e a transitividade.

r’ r s



227

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Exemplos 11.5. Consideremos uma pirâmide de base A1A2...An e vértice V. Tracemos um plano  paralelo à base, que corta as arestas laterais da pirâmide segundo o polígono B1B2...Bn e que divide a pirâmide em dois sólidos: um deles é a pirâmide de base B1B2...Bn com vértice V e o outro chamado tronco de pirâmide de bases A1A2...An e B1B2...Bn. Notemos que se traçamos por V um outro plano paralelo a base A1A2...An , teremos um feixe de três planos paralelos cortado pelas transversais VA1, VA2, ..., VAn e assim podemos utilizar o teorema de Tales para concluir que: VB1 VB2 VBn   ...   k. VA1 VA2 VA n

V

B4

B1

B3 B2

A4

A3 A2

A1

B4 B3 B2

B1 A4 A1

A3 A2

tronco de pirâmide

Dizemos então que as duas pirâmides obtidas são semelhantes com razão de semelhança k. Temos também que o plano da base e o plano  (paralelos) são cortados Pelos planos pl(VA1A2), pl(VA2A3), , pl(VAnA1) e para cada um dos pla-nos transversais temos, pelo Teorema 11.12, que as interseções são retas paralelas, a saber, B 1B2 // A1A2, B2B3 // A2A3, , BnB1 // A2A1. Assim teremos que VB1B2 ~ VA1A2, VB2B3 ~ VA2A3, , VBnB1 ~ VAnA1. Logo, B1B2 BB BB  2 3  ... n 1 , donde segue que as bases do A1A2 A2A3 AnA1 tronco da pirâmide mantém a razão de semelhança k.

228

11.

Paralelismo de Retas e Planos

11.6. Consideremos um cone cuja base é uma circunferência C de centro O e raio r, com vértice V, conforme definido no Exemplo 10.1. Tracemos um plano ’ paralelo ao plano  da base que intercepta o cone num ponto distinto de V. Afirmamos que a interseção de ’ com o cone é uma circunferência. De fato, seja P um ponto qualquer de C e consideremos as retas OV e VP. Pelo Teorema 11.12 OV intercepta ’ num ponto O’ e VP intercepta ’ num ponto P’. Como O’ e P’ pertencem ao plano pl(OPV),  e ’ são paralelos, temos que OP e O’P’ são paralelos e portanto, os triângulos OPV e O’P’V são semelhantes. Assim, OP OV   k, O'P' O' V OP k.O'P' . Como

ou

seja,

Como P está em C, temos que OP= r e, portanto, a distância entre O’ e P’ é sempre a mesma independentemente do ponto P. Assim, por definição, a interseção de ’ com o cone é uma circunferência C’ de centro O’ e raio O'P' . O cone original fica dividido então em duas partes, um cone com base C’ e vértice V e outra parte chamada tronco de cone com bases C e C’. Dizemos então que os dois cones obtidos são semelhantes com razão de semelhança k.

229

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

11.4. Exercícios V 11.1. Considere uma pirâmide VABCD, em que a base ABCD é um paralelogramo. Mostre que a reta CD é paralela ao plano pl (VAB).

D

C

A

B H

11.2. Considere um paralelepípedo ABCDEFGH. Mostre que a interseção r dos planos pl (AE,CG) e pl (BF,DH) é paralela a reta AE.

F

E D

A

G

C B

11.3. Mostre que uma reta é paralela a dois planos secantes se, e somente se, ela é paralela à reta de interseção dos dois planos. 11.4. Suponha que três planos ,  e , tenha exatamente um ponto em comum. Mostre que não existe nenhuma reta simultaneamente paralela a ,  e . 11.5. Sejam r e s duas retas reversas. Construa, justificando a construção, um plano contendo r e paralelo a s. 11.6. Construa por um ponto A, um plano paralelo a duas retas não paralelas r e s. Justifique a construção. Esta construção é sempre possível?

230

Paralelismo de Retas e Planos

11.

11.7. Dadas três retas r, s e t, reversas duas a duas, construa se possível (justificando a construção) uma reta paralela a t e que intercepta r e s. Quando é impossível? 11.8. Classifique as afirmações abaixo em verdadeiras ou falsas, justificando brevemente sua resposta: a) Dadas duas retas reversas, qualquer reta que encontra uma, encontra a outra. b) Se dois planos têm um ponto comum, então eles têm uma reta comum que passa pelo ponto. c) Dois planos que tem uma reta comum são secantes. d) Se dois planos são secantes, então toda reta de um encontra o outro. e) Duas retas distintas reversas a uma terceira são reversas entre si. f) Duas retas reversas e uma concorrente com as duas determinam dois planos. g) Se duas retas são paralelas entre si e um plano contém uma, então ele é paralelo ou contém a outra. h) Se duas retas distintas são paralelas a um plano, então elas são paralelas entre si. i) Dadas duas retas distintas, sempre existe um plano contendo uma e paralelo à outra. j) Se uma reta é paralela a um plano, ela não é paralela a todas as retas do plano. k) Se uma reta é paralela a um plano, ela é paralela a infinitas retas do plano. l) Dados uma reta e um plano, sempre é possível traçar no plano uma reta paralela à reta dada. m) Uma condição necessária e suficiente para uma reta ser paralela a um plano é ser paralela a uma reta do plano e não estar nele. n) Uma condição necessária e suficiente para que dois planos secantes sejam paralelos a uma reta ou a contenha é essa reta ser paralela à interseção. 11.9. Se dois planos são paralelos, mostre que cada reta de um é paralela ao outro. 231

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

11.10. Mostre que todas as arestas laterais do prisma são paralelas e de mesmo comprimento. 11.11. Mostre que as bases do prisma são congruentes. Mais geralmente, quando o plano da seção de um prisma é paralelo aos planos das bases, a seção é congruente as bases. 11.12. Classifique as afirmações abaixo em verdadeiras ou falsas, justificando brevemente sua resposta: a) Se uma reta é paralela a dois planos então esses planos são paralelos. b) Por uma reta dada pode-se conduzir um plano paralelo a um plano dado. c) Por qualquer ponto é possível conduzir uma reta que se apoia em duas retas reversas dadas. d) Dadas duas retas reversas, sempre existe reta que se apoia em ambas. e) Dadas duas retas reversas, qualquer plano que passa por uma encontra a outra. f) Uma condição suficiente para que dois planos sejam paralelos é que duas retas de um sejam paralelas ao outro. g) Se duas retas concorrentes de um plano são respectivamente paralelas a duas retas de outro plano, então esses planos são paralelos. h) Se dois planos são paralelos, então toda reta de um é paralela a qualquer reta do outro. i) Se dois planos são paralelos, toda reta paralela a um é paralela ou está contida no outro. j) Se dois planos são paralelos, toda reta que tem um ponto comum com um, tem um ponto comum com o outro. 11.13. Mostre que dois pares de planos secantes, respectivamente paralelos, têm interseções paralelas. 11.14. Seja um tetraedro qualquer, no qual A’, B’, C’ e D’ são os baricentros das faces opostas aos vértices A, B, C e 232

Paralelismo de Retas e Planos

11.

D. Mostre que as retas AA’ e BB’ são concorrentes num ponto X e que este ponto é tal que

XA' XB' 1   . XA XB 3

Conclua que as retas AA’, BB’, CC’ e DD’ se encontram no ponto X.

11.15. Seja P um ponto exterior a um plano . Para cada ponto Q de  seja X o ponto do segmento PQ que o divide na razão

XP  k . Qual é o lugar geométrico do ponto X XQ

quando Q percorre o plano . 11.16. Dada uma reta r secante a um plano  e um ponto P que não está em r nem em , construir um segmento cujos extremos estão em r e , e cujo ponto médio seja P. 11.17. Dadas as retas reversas r, s e t, encontrar uma reta que as encontre nos pontos R, S e T, respectivamente, de modo que S seja ponto médio de RT. 11.18. Consideremos uma circunferência C, situada num plano  e B um ponto qualquer não pertencente a . Por B traçamos o único plano ’ paralelo a  e uma reta s interceptando o plano . Mostre que os pontos de interseções das retas paralelas a s passando por C formam uma circunferência congruente a C’. 11.19. Duas retas r e s são paralelas. Sejam A e B dois pontos fora do plano pl(r,s). Estudar a interseção t dos planos pl(A,a) e pl(B,b). 11.20. Dados um plano , uma reta r não paralela a  e um ponto P que não pertence nem a r nem a , trace uma reta concorrente r, paralela a  que passe por P.

233

Capítulo 12: Perpendicularismo Espaço e suas Conseqüências

no

Neste capítulo introduziremos o conceito de perpendicularismo entre retas e planos. Uma das construções fundamentais talvez seja a de conduzir uma reta perpendicular a um plano por um ponto (ou o seu caso dual, que é o de conduzir um plano perpendicular a uma reta). Aqui mostraremos que é possível tal construção. Veremos também sob que condições dois planos são perpendiculares.

12.1. Perpendicularismo entre Retas e Planos Iniciaremos com a definição de perpendicularismo entre retas e planos: Definição 12.13: Dizemos que uma reta é perpendicular a um plano quando ela é ortogonal a toda reta contida no plano. A interseção P de uma reta perpendicular a um plano é chamada traço da perpendicular ao plano.

r

r

s P 



Podemos determinar o perpendicularismo entre reta e plano através de uma condição equivalente:

Perpendicularismo de Retas e Planos

12.

Proposição 12.13: Uma reta é perpendicular a um plano se, e somente se, ela é perpendicular às retas de  que passam pelo seu traço. Demonstração: Se uma reta é perpendicular a um plano então por definição ela é ortogonal a toda reta contida no plano, assim, em particular, ela é perpendicular às retas de  que passam pelo seu traço. Reciprocamente, seja r uma reta que é perpendicular a todas as retas de  que passam pelo seu traço P. Dada uma reta qualquer s de , consideremos s’, a reta por P paralela a s. Por hipótese r é perpendicular a s’, assim por definição de reta ortogonal, s é ortogonal a r. Como s é qualquer, temos por definição que r é perpendicular a .

 Exemplo 12.1. Na construção civil se você tiver uma superfície plana nivelada e segurar um prumo, o barbante se esticará formando uma perpendicular com a superfície plana. É claro que a caracterização de reta perpendicular a plano dada na Proposição 12.13 é mais fácil de ser utilizada e muitas vezes assim será feito. Proposição 12.13: Se uma reta r e um plano  são perpendiculares entre si, então: a) Toda reta r’ paralela a r é perpendicular a ; b) Todo plano ’ paralelo a  é perpendicular a r.

235

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Demonstração: a) Sabemos que se r é perpendicular ao plano  no traço A então, pela Proposição 12.13, r é perpendicular a todas as retas de  que passam por A. Seja A’ o traço de r’ com . Seja s’ uma reta de  passando por A’, então existe uma reta s passando por A paralela a s’, que é perpendicular a r. Pelo Teorema 10.11,temos que r’ e s’ são perpendiculares entre si. Como s’ foi tomada arbitrariamente, temos que toda reta em , passando por A’ é perpendicular a r’ e assim pela Proposição 12.13, temos que r’ é perpendicular a . b) Seja r a reta perpendicular a um plano , seja ’ um plano paralelo a . Considere-mos A o traço de r no plano  e A’ a inter-secção de r com plano ’ que existe pelo Teorema 11.12. Consideremos s’ uma reta em ’ que passa por A’. Pelo Teorema 11.12 existe s em , passando por A paralela a s’. Pela Proposição 12.13, temos que r e s são perpendiculares. As retas r, s e s’ são coplanares logo, pelo Teorema 5.6, r e s’ são perpendiculares e como s’ é qualquer reta que passa por A’ temos da Proposição 12.13 que ’ é perpendicular a r.

 Proposição 12.13: a) Duas retas distintas r e r’ perpendiculares a um mesmo plano, são paralelas. b) Dois planos distintos  e ’ perpendiculares a uma mesma reta são paralelos.

236

Perpendicularismo de Retas e Planos

12.

Demonstração: a) Sejam r e r’ r’ duas retas perpendiculares a um s r plano  e suponha-mos por absurdo que r e r’ não sejam para-lelas. t Traçamos por A, traço de r’ com , uma reta s paralela a r (ver desenho ’ A ao lado). Como r’ não é paralela a r,  temos que s e r’ são duas retas distintas passando pelo ponto A, assim determinam um plano ’ = pl (r’,s), que intercepta o plano  segundo uma reta t.Como r e s são paralelas e r é perpendicular a , temos, pela Proposição 12.13, que s é perpendicular a . Assim, pela Proposição 12.13, temos em ’, r’ e s perpendiculares a t em A, o que é absurdo. Logo, r e r’ são paralelas. b) Sejam  e ’ planos perpendiculares a uma mesma reta r. Suponhamos, por absurdo, que  e ’ não sejam paralelos. Então eles se interceptam segundo uma reta t. Seja A o traço de r sobre  e A’ o traço de r sobre ’. Consideremos um ponto B  t e tracemos o triân-gulo AA’B. Como A e A’ são traços então temos m(Â) = m(Â’) = 90o, o que é absurdo pois, pelo Teorema 4.5, a soma de dois ângulos de um triângulo é sempre menor do que 180o. Logo,  e ’ são paralelos.

 Ao definirmos retas perpendiculares a plano, surge a seguinte pergunta: o conjunto dessas retas não é vazio? Ou seja, será que dado um plano qualquer sempre existe pelo menos uma reta perpendicular a ele? De acordo com a Proposição 12.13, se houver uma, haverá infinitas, pois toda reta paralela a essa perpendicular ao plano, também será perpendicular ao plano. Nossa intuição diz que dado qualquer plano sempre existe uma reta perpendicular a ele, mas vamos ser bem preciso demonstrando sua 237

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

existência construindo-a. O próximo fundamental para tal construção.

J. R.

teorema

será

Teorema 12.13: Se uma reta r é ortogonal a um par de retas concorren-tes de um plano , então r é perpendicular a . A

1 Demonstração: Sejam s’ e t’ um r s’ par de re-tas concorrentes e v ortogonais a r em . Seja A o ponto s Su de interseção de r com . TraçaA U T mos por A, retas s e t, paralelas a s’ t t’ e t’, respectivamente. Por definição  de retas or-togonais, s e t são A2 perpendiculares a r. De-vemos mostrar que toda reta u, passando por A é perpendicular a r. Se u coincide com s ou t,então temos o desejado. Vamos supor então que u seja distinta de s e t. Tomemos em  uma reta v, de tal modo que a interseção U de v e u esteja entre a interseção T de v com t e a interseção S de v com s (isto é possível pois sendo s e t retas distintas temos Ss e Tt distintos de A. Considere U no segmento ST e a reta u que passa pelos pontos A e U). Em cada semi-espaço determinado por , consideremos pontos em r, A1 e A2 em semi-retas opostas em relação a A de tal modo que AA 1  AA2. Os triângulos retângulos A1TA e A2TA são congruentes (pois AA1  AA2, AT é comum aos dois triângulos e como t é perpendicular a r, temos m(A 1ÂT) = m(A2ÂT) = 90o. Assim pelo caso LAL temos o desejado) e assim A 1T  A2T. Analogamente temos que A1S  A2S. Logo os triângulos A1ST e A2ST são congruentes pelo caso LLL. Segue que os triângulos A1SU e A2SU são congruentes pelo caso LAL. Assim A1U  A2U, e novamente pelo caso LLL temos que os triângulos A1AU e A2AU são congruentes, donde segue que A1ÂU  A2ÂU. Como A, A1 e A2 são colineares temos que esses ângulos são retos, como queríamos demonstrar.

238

12.

Perpendicularismo de Retas e Planos

 Vamos agora perpendiculares.

construir

retas

e

planos

Teorema 12.13: a) Por um ponto P dado, se pode traçar um único plano  perpendicular a uma reta r dada. b) Por um ponto P dado, se pode traçar uma única reta r perpendicular a um plano  dado. Demonstração: a) (Existência) Traçamos dois planos distintos 1 e 2 passando por r (porque existem?). Seja B um ponto qualquer de r e consideremos duas retas s e t perpendiculares a r por B nos planos 1 e 2 respectivamente. O plano pl(s,t) contém as duas retas s e t concorrentes em B, perpendiculares a r, logo pelo Teorema 12.13 este plano é perpendicular a r. Utilizamos agora o Teorema 11.12 para traçar um plano  paralelo a pl(s,t) passando pelo ponto P. A Proposição 12.13 garante que r é perpendicular a . (Unicidade) Seja ’ outro plano perpendicular a r, passando por P. Pela Proposição 12.13,  e ’ são paralelos, o que é um absurdo. b) (Existência) Consideremos em , duas retas s e t concorrentes em um ponto A e traçamos dois planos distintos 1 e 2 perpendiculares a estas retas por A (possível pelo item a)). Seja r’ a reta interseção de 1 e 2. Por definição e construção temos que r’ é perpendicular a s e a t (s está em  e é perpendicular a 1, e t está em  e é perpen239

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

perpendicular a 2). Assim, pelo Teorema 12.13, r’ é perpendicular a . Consideremos agora uma reta r paralela a r’, passando por P. Pela Proposição 12.13, temos que r é perpendicular a . (Unicidade): Se existisse outra reta perpendicular a  passando por P, esta reta seria paralela a r’. O Teorema 10.11 garante que r é a única reta paralela a r’, passando por P.

 Exemplos 12.2. Uma pirâmide tal que sua base é um polígono regular e o seu vértice se situa sobre a perpendicular traçada pelo centro da base é dita uma pirâmide regular. Se a base de uma pirâmide é triangular e possui as seis arestas congruentes, então ela é chamada tetraedro regular. 12.3. Um cone tal que seu vértice se situa sobre a perpendicular traçada pelo centro da base é dito um cone reto ou cone de revolução. 12.4. Podemos fazer uma classificação dos prismas de acordo com o comportamento das bases e das arestas laterais. Quando as arestas laterais de um prisma são perpendiculares as bases o denominaremos prisma reto, caso contrário, será chamado prisma oblíquo (desenhos abaixo). Se o prisma for reto e as bases forem polígonos regulares, o denominaremos prisma regular. (desenhos abaixo).

240

Perpendicularismo de Retas e Planos

Prismas Retos

Prismas Oblíquos

Prismas Regulares

Um paralelepípedo é um prisma cujas bases são paralelogramos. Quando o prisma é reto o denominamos paralelepípedo reto. Se o paralelepípedo reto tiver bases retangulares o chamaremos paralelepípedo reto-retângu-lo ou paralelepípedo retângulo (ou ainda ortoedro) . Se as arestas de um paralelepí-pedo forem congruentes ele será chamado de romboedro. Um romboedro que é um paralelepípedo reto é chamado de romboedro reto, caso contrário, será chamado romboedro oblíquo. Quando o romboedro for um paralelepípedo retângulo o denominaremos cubo.

241

12.

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Apresentamos no diagrama ao lado as subclasses da classe dos prismas:

12.5. Um cilindro reto é um cilindro cuja reta geratriz é perpendicular aos planos das bases. 12.6. Considere três segmentos de reta AB, CD e EF, congruentes, mutuamente perpendiculares, que se cortam no ponto médio O de cada um deles conforme desenho ao lado. Unimos os extremos destes segmentos entre si (por exemplo, A com B, C, D, E e F). O octaedro regular é a interseção dos semiespaços determinados pelos planos ACE, ADE, DBE, BCE, ADF, ACF, BDF e BCF contendo o ponto O juntamente com estas regiões triangulares. O termo regular segue do fato que os segmentos EA, EB, EC, ED, FA, FB, FC e FD são todos congruentes. Deixamos como exercício a demonstração desta propriedade.

242

12.

Perpendicularismo de Retas e Planos

O tetraedro regular, o cubo e o octaedro regular são exemplos de poliedros regulares, que serão estudados e classificados no Capítulo 15.

12.2. Perpendicularismo entre Planos Para finalizar o capítulo, vamos definir perpendicularismo entre planos e verificar em que condições dois planos são perpendiculares entre si. Definição 12.13: Tomemos dois planos secan-tes  e . Considere um plano  perpendicu-lar a r= . Sejam s =  e t = . O ângulo entre s e t independe da escolha de , pela Proposição 12.13, pelo Teorema 11.12 e pelo Teorema 10.11, e é denominado ângulo entre os planos  e . Quando s e t formam um ângulo reto, dizemos que os planos  e  são perpendiculares

t 



r s



Observe que se  e  são perpendiculares, então a reta s de  é perpendicular às retas r e t de . Logo, s é uma reta de  que é perpendicular a , pelo Teorema 12.13. O teorema seguinte garante que ter uma reta nestas condições é uma condição necessária e suficiente para que os planos sejam perpendiculares. Teorema 12.13: Dois planos  e  são perpendiculares se, e somente se, um deles contém uma reta perpendicular ao outro. Demonstração: A Reciprocamente, su243

primeira

parte

foi

feita

acima.

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

ponhamos que uma reta r de  seja  perpendicular a . O plano  corta o r plano  segundo uma reta t, que é ortogonal a r, pela definição de reta t perpendicular a plano. Como t está em  também, r e t são s perpendiculares entre si. Pelo ponto  de interseção de r e t, traçamos uma reta s, contida em  e perpendicular a t. O plano  = pl (r,s) é perpendicular a t, pelo Teorema 12.13, pois contém duas retas concorrentes perpendiculares a t. Assim temos  = r e  = s, mas r e s são perpendiculares entre si, de novo pela definição de reta perpendicular a plano já que, por hipótese, r é perpendicular a  e assim ortogonal a todas as retas de . Portanto  e  são de fato perpendiculares, por definição. Exemplos 12.7. No prisma reto temos que os planos das faces laterais são perpendiculares aos planos das bases. 12.8. No octaedro os planos perpendiculares ao plano ABC.

CDE

e

ABE

são

Como sabemos traçar uma reta r perpendicular a um plano, utilizando o Teorema 12.13 é fácil construir planos perpendiculares a plano. Basta construir um plano qualquer contendo r. Sabendo da existência de planos perpendiculares, vamos estabelecer mais alguns resultados. Teorema 12.13: Se um plano  é perpendicular a um plano  e uma reta r de  é perpendicular à reta de interseção de  e , então r é perpendicular a .

244

Perpendicularismo de Retas e Planos

12.

Demonstração: Suponhamos que s a reta r de  seja perpendicular a reta t que é a interseção de  e . t Pelo ponto de interse-ção de r e t, r traçamos uma reta s, contida em   e perpendicular a t. Como  e  são perpendiculares por hipótese, r e s  são perpendiculares, por definição de planos perpendiculares. Assim, r é perpendicular a um par de retas concorrentes s e t de , e então, pelo Teorema 12.13, é perpendicular a .

 Corolário 12.13: Se uma reta r e um plano  são ambos perpendiculares a um mesmo plano , então r é paralela a  ou está contida em . Demonstração: Existem apenas três posições relativas entre uma reta r e um plano , r  , r //  ou r   = P. Seja s a reta interseção entre os planos  e  e r   = Q e vamos supor que r seja secante a  em um ponto P. Tracemos agora por P uma reta s’  s, onde s  s’= P’ considere o plano ’ determinado por s’ e r. Em ’ temos o triângulo PP’Q com dois ângulos retos, o que é absurdo, logo r não pode ser secante a . Portanto, ou r   ou r // , como queríamos demonstrar.

 Teorema 12.13: Por uma reta r não perpendicular a um plano  existe um único plano  perpendicular ao plano .

245

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

Demonstração: (Existência) Seja A um ponto qualquer de r. Tracemos por A uma reta s perpendicular a  (possível pelo Teorema 12.13). Como r não é perpendicular a , temos que s e r são concorrentes em A, e portanto determinam um plano . Mas s está em  e é perpendicular a , logo pelo Teorema 12.13,  e  são perpendiculares.

J. R.

s r 

A



(Unicidade) Se ’ é um plano que contém r e é perpendicular a , ele deve conter s, pois pelo Corolário 12.13, s deve ser paralelo ou estar contido em ’, mas como A está em s, temos que s está em ’. Assim r e s estão em ’, logo ele deve coincidir com , pela Proposição 10.11.

 Terminamos este capítulo apresentando um diagrama geral dos principais sólidos geométricos até agora estudados:

246

12.

Perpendicularismo de Retas e Planos

Prismas oblíquos

Octraedros Troncos de pirâmides

romboedros cubos Prisma regular

tetraedros

Prismas retos

Sólidos que não rolam

Cones circulares

sólidos

Cilindros

pirâmides

Tronco de Cones circulares

Sólidos que rolam

12.3. Exercícios 12.1. Dado um tetraedro regular, mostre que: a) duas retas perpendiculares as bases, passando por dois de seus vértices são coplanares. b) as quatro retas perpendiculares as bases, passando pelos vértices se encontram num único ponto, que é eqüidistante dos quatro vértices. 12.2. Mostre que por um ponto dado se pode traçar uma única reta ortogonal a duas retas distintas não paralelas. 12.3. Demonstre o seguinte resultado, denominado Teorema das três perpendiculares: Sejam A, B e C pontos não colineares. Se as retas AB, AC são ortogonais a uma reta r, então BC também é ortogonal a r. 12.4. Dois triângulos ABC e BCD são retângulos em B. Mostre que se o cateto AB é ortogonal à hipotenusa CD então o cateto BD é ortogonal à hipotenusa AC. 247

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

12.5. Seja r uma reta do espaço e P um ponto exterior a r. Qual é o lugar geométrico dos traços das perpendiculares por P aos planos que contém r? 12.6. Mostre que os centros das faces de um cubo são vértices de um octaedro regular e que os centros das faces de um octraedro regular são vértices de um cubo. 12.7. Mostre que os centros das faces de um tetraedro regular são vétices de um outro tetraedro regular. Qual é a razão entre as arestas dos dois tetraedros? 12.8. Mostre que se duas retas são reversas e ortogonais, então existe um único plano por uma, perpendicular à outra. 12.9. Se os segmentos AB e CD são ortogonais, então vale a equação: (AC)2  (AD)2  (BC)2  (BD)2 . 12.10. Mostre que uma reta e um plano perpendiculares a uma segunda reta em pontos distintos são paralelos. 12.11. Dados um ponto, uma reta e um plano, traçar pelo ponto uma reta paralela ao plano e ortogonal ou perpendicular à reta dada. 12.12. Um plano, uma reta e um ponto são dados. Conduzir pelo ponto, um plano paralelo à reta e perpendicular ao plano dado. H

12.13. Dado um cubo ABCDEFGH, consideremos o plano diagonal pl(BD,FH). Mostre que a diagonal AC da face ABCD é perpendicular a este plano.

F

E D

A

248

G

C B

Perpendicularismo de Retas e Planos

12.

12.14. Com o mesmo desenho do Exercício 12.13, mostre que o único plano que contém a diagonal BH e é perpendicular ao plano da face ABCD é o plano diagonal pl (BD,FH). 12.15. Mostre que dois planos são perpendiculares se, e somente se, duas retas perpendiculares a cada um deles são ortogonais. 12.16. Mostre que se um plano  contém uma reta perpendicular a um plano , então o plano  contém uma reta perpendicular ao plano . 12.17. Mostre que um plano é perpendicular a dois planos secantes se, e somente se, ele é perpendicular à reta de interseção dos dois planos. 12.18. Em um cubo como do Exercício 12.13, mostre que os planos diagonais pl (AC,EG) e pl (BD,FH) são perpendiculares. 12.19. Classifique as afirmações abaixo em verdadeiras ou falsas, justificando brevemente sua resposta : a) Dois planos distintos perpendiculares a um terceiro são paralelos entre si. b) Se uma reta e um plano são perpendiculares, então todo plano que contém a reta é perpendicular ao plano dado. c) Uma reta e um plano, perpendiculares a um segundo plano, são paralelos. d) Uma condição necessária e suficiente para que dois planos secantes seja perpendiculares, é que toda reta de um deles, perpendicular a interseção, seja perpendicular ao outro. e) Se um plano é perpendicular a outro, então ele é perpendicular a qualquer reta desse outro. f) Se dois planos são perpendiculares então toda reta de um forma ângulo reto com qualquer reta do outro. g) Por uma reta passa um plano perpendicular a um plano dado. 249

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

h) Se dois planos são paralelos, todo plano perpendicular a um é perpendicular ao outro. 12.20. Construir por um ponto perpendicular a dois planos dados.

250

dado,

um

plano

Capítulo 13: Projeções, Distâncias, Ângulos, Diedros e Triedros

Nesse capítulo, utilizaremos os conceitos e resultados vistos nos capítulos anteriores para definir distâncias entre ponto e plano, entre reta e plano paralelo, entre planos paralelos e entre retas reversas. Veremos ainda como medir ângulos entre reta e plano e ângulos entre planos e trabalharemos com diedros e triedros.

13.1. Distância de Ponto a Plano Para definir distância de ponto a plano precisamos do conceito de projeção ortogonal sobre um plano. Definição 13.14: Chama-se projeção ortogonal de um ponto P sobre um plano ao traço P’ da perpendicular ao plano por P. Chama-se projeção ortogonal de uma figura F sobre um plano, ao conjunto F’ das projeções ortogonais dos pontos da figura sobre o plano



P

F

P’

P’

F’



O Teorema 12.13.b garante a existência de P’. Proposição 13.14: Sejam r uma reta e  um plano. a) Se r é perpendicular a , sua projeção ortogonal sobre  é o traço P de r em .

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

b) Se r não é perpendicular a , a projeção ortogonal de r sobre  é a reta r’, interseção de  com , onde  é o plano perpendicular a  que passa por r. Demonstração: a) Seja X um ponto qualquer de r. Suponhamos, por absurdo, que a projeção ortogonal de X sobre  não seja o traço P, ou seja, a projeção ortogonal de X sobre  seja um ponto Q  P. Logo, temos que as retas r e XQ contém X e são perpendiculares a , o que contradiz o Teorema 12.13. Como X é qualquer então a projeção de r sobre  é o traço P de r em . b) Se r e  não são perpendiculares, trace-mos por r o plano  perpendicular a , dado pelo Teorema 12.13. Seja r’ a interse-ção   . Para cada X  r, seja x a reta que passa por X e é perpendicular a . Afirmamos que x  . De fato, como x é perpendicular a  e  é perpendicular a , pelo Corolário 12.13, x //  ou x  . Mas X  x e X  r  , então x  . Por definição, a projeção ortogo-nal X’ do ponto X é o traço de x em . Como x   e X’  , temos que X’     = r’. Pelo fato de termos tomado X arbitrário em r, temos que a projeção de r é a reta r’.

 Já vimos na G.P. que a distância entre dois pontos A e B é, por definição, o comprimento do segmento AB. Como a unicidade da reta AB é garantida também no espaço, a distância entre dois pontos no espaço também é o comprimento do segmento AB. A distância entre um ponto e uma reta no espaço também pode ser obtida como em G.P., pois uma reta r e um ponto P determinam um único plano = pl(r,P), de acordo com a Proposição 252

Ângulos, Diedros e Triedros

13. Projeções, Distâncias,

10.11 e assim a distância de P a r é o tamanho do segmento PP’, onde P’ é o pé da perpendicular a r por P em . Antes de definirmos novas distâncias vamos aplicar esses conhecimentos no seguinte exemplo: Exemplo: 13.1. Dado um paralelepípedo retângulo ABCDEFGH de lados AB =a, AD =b e AE =c a distância entre o ponto H e a reta BD é c (por que?). Como o triângulo ABD é retângulo temos, pelo Teorema de Pitágo-ras, BD = a2  b2 , assim, a distância entre B e D é por definição a2  b2 . Mas o triângulo BDH é retângulo em D (porque ?) e assim novamente por Pitágoras a distância entre B e H é a2  b2  c2 . Conhecido então a distância entre dois pontos e sua medida, podemos perguntar qual é o lugar geométrico dos pontos que eqüidistam de dois pontos A e B dados? Em G.P., vimos que a resposta no plano é a mediatriz do segmento AB. No espaço ocorre algo semelhante. Considere o plano  perpendicular a reta AB pelo ponto médio M do segmento AB ( que é único pelo Teorema 12.13.a). Dado um ponto P em , temos que a reta PM é perpendicu-lar a reta AB em M (pela definição de reta perpendicular a plano). Pelo caso LAL, temos que PMA  PMB e assim PA  PB. Por outro lado se P é um ponto no espaço tal que PA  PB, então PAB é isósceles e assim PM é perpendicular a AB. Logo, P está em . 253

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Definição 13.14: O plano  descrito acima é chamado plano mediador. Agora podemos mostrar a seguinte proposição: Proposição 13.14: As arestas opostas de um tetraedro regular são ortogonais. Demonstração: Primeiramente afirmamos que para quaisquer pontos A, B, C e D distintos no espaço satisfazendo AB = AD e CB = CD , então AC e BD são ortogonais. De fato, sob essas condições A e C estão no plano mediador de BD. Então AC está contida num plano perpendicular a BD e assim, por definição, de perpendicularismo entre reta e plano, AC e BD são ortogonais. Portanto, como o tetraedro regular satisfaz essas condições, temos o desejado.

 Vamos agora definir distância entre ponto e plano. Definição 13.14: A distância de um ponto P a um plano  é a medida do segmento PP’, onde P’ é a projeção ortogonal de P sobre . O próximo resultado garante que a distância de P a  é a menor distância entre P e os pontos de , ou seja, esta definição está de acordo com o que se espera de uma distância entre ponto e plano. Proposição 13.14: Se Q é um ponto qualquer do plano  e P   então PQ ≥ PP ’, a igualdade ocorre apenas se P’ = Q.

254

Ângulos, Diedros e Triedros

13. Projeções, Distâncias,

P Demonstração: Se P’  Q, então PP’Q é um triângulo retângulo em P’, logo PQ é hipote-nusa e PP’ é cateto, assim PQ > PP' .



Q

.

.P’

 Exemplos 13.2. Considere uma pirâmide de vértice V. Seja V’ a projeção ortogonal de V sobre plano da base, a altura da pirâmide é o segmento de extremidades V e V’.

V

D A

B

V’

C

13.3. Da mesma maneira definimos altura de um cone. Considere um cone de vértice V e base B. Seja V’ a projeção ortogonal de V sobre a base B, a altura do cone é o segmento de extremidades V e V’.

Proposição 13.14: Se uma reta r é paralela a um plano , então todos os pontos de r são equidistantes de .

255

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Demonstração: Sejam P, Q  r, r .P .Q por P e Q traçamos perpendiculares a  obtendo P’ e Q’ como traços. Temos: - PP’ paralelo a QQ’, logo PP’QQ’ . . P’ estão num mesmo plano. Q’ - Como r é paralela a , a reta PQ  não intercepta a reta P’Q’ e assim são paralelas. - PP’ e QQ’ são perpendiculares a P’Q’, por definição de perpendicula-rismo entre reta e plano. Assim PQQ’P’ é um retângulo e portanto PP’  QQ’.

 Proposição 13.14: Se dois planos são paralelos, todos os pontos de um são equidistantes do outro. Demonstração: Sejam  e  dois planos paralelos, X e Y pontos quaisquer de  e r a reta que passa por X e Y. Pelo Exercício 11.9 temos que r é paralela a . Logo, pela Proposição 13.14 todos os pontos de r são eqüidistantes de , em particular, X e Y. Como os pontos X e Y foram tomados arbitrariamente em , temos que todos os pontos de  são eqüidistantes de . Analogamente, todos os pontos de  são equidistantes de .



256

Ângulos, Diedros e Triedros

13. Projeções, Distâncias,

Exemplo 13.4. Considere um prisma e uma reta r perpendicular aos planos das bases do pris-ma. Sejam A e B os pontos de intersecção de r com os planos da base. Uma altura do prisma é o segmento AB. Pela Proposição 13.14, temos que todas as alturas do prisma terão a mesma medida.

r A

B

13.5. Da mesma maneira definimos altura de um cilindro: Dado um cilindro e r uma reta perpendicular aos planos das bases do cilin-dro, sejam A e B os pontos de interseção de r com os planos das bases. Uma altura do cilindro é o segmento AB. Pela Proposição 13.14, temos que todas as alturas do cilindro terão a mesma medida.

A 13.6. Seja ABCD um tetraedro regular de aresta a. Vamos calcular a distância do verti-ce A ao plano BCD, ou seja, a altura do te-traedro. Seja A’ a projeção ortogonal de A D sobre o plano BCD. Como os A’ triângulos AA’B, AA’C e AA’D são H congruentes, pois são triân-gulos B C retângulos que possuem hipotenusas AB, AC e AD congruentes e o lado AA’ comum, temos que A’B, A’C e A’D são congruentes e assim A’ é o circuncentro do triângulo equilátero BCD (conforme citado na Introdução). Consideremos o triângulo retângulo 257

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

AA’B. Conhecemos AB =a e A' B =

a 3 , pois é raio da 3

circunferência circunscrita num triângulo equilátero. Assim, utilizando o Teorema de Pitágoras, obtemos que AA ’

=

a2 

3a2 = 9

9a2  3a2 = 9

a 6 6a2 = . 3 9

O teorema a seguir foi proposto no Exercício 12.3, mas devido a sua utilidade vamos reenunciá-lo a seguir: Teorema 13.14 (das três perpendiculares ): Se três pontos não colinea-res A, B e C são tais que as retas AB e AC são ambas ortogonais a uma certa reta r, então a reta BC também é ortogonal a r.

 Corolário 13.14: Sejam  um plano e P  . Traçamos por P a perpendicular a , cujo traço é P’. Considere um ponto Q  , com Q  P’. Traçamos por Q uma reta r   perpendicular a P’Q. Então r é perpendicular a PQ.

P



Q.

.P’ r

Demonstração: Como PP’ é perpendicular a , temos pelo Teorema 12.13 que o plano  determinado pelos pontos P, P’ e Q é perpendicular a . Como P’ e Q pertencem a  e a  temos pela Proposição 10.11 que   = rP’Q. Como r está contida em  e é perpendicular a P’Q, temos que r é per-pendicular a  (Teorema 12.13). Temos PP’ perpendicular a  e r  , então PP’ é ortogonal a r e r, por hipótese, é perpendicular a rP’Q. Assim, pelo Teorema 13.14, temos que r e PQ são perpendiculares em Q.

 258

Ângulos, Diedros e Triedros

13. Projeções, Distâncias,

13.2. Distância entre Retas Reversas Com o objetivo de obter a distância entre duas retas reversas vamos demonstrar a seguinte proposição: Proposição 13.14: Se duas retas r e s são reversas, então existe uma única perpendicular comum a essas retas. Demonstração: (Existência) Pelo Exercício 11.5 existe um plano  contendo r e paralelo a s. Pelo Teorema 12.13 existe um único plano  perpendicular a  passando por s. Seja t =   , como s é paralela a , temos que s é paralela a t e , além disso, r e t são concorrentes, digamos num ponto A. Por A traçamos a reta x perpendicular a t no plano . Como s é paralela a t e x é perpendicular a t temos que x é perpendicular a s. Além disso,  é perpendicular a  e t é a interseção de  e , logo, pelo Teorema 12.13, x é perpendicular a . Como r passa pelo traço de x em , temos pela Proposição 12.13 que x é perpendicular a r. (Unicidade) Sejam B = x  s e uma reta x’  x tal que x’ é perpendicular a r e a s em C e D, respectivamente. Temos então x’ ortogonal a t e, pelo Teorema 12.13, x’ é perpendicular a . Vimos, na demonstração de existência, que x é perpendicular a . Assim, pela Proposição 12.13, x // x’ ou x = x’. Se x // x’ consideramos o plano pl(x,x’), logo temos que 259

x

x’

. .B D

s

.

.

A C



t

r

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

A, B, C, D  pl(x,x’). Assim as retas r e s pertencem ao plano pl(x,x’), o que é aburdo pois r e s são reversas, logo x = x’.

 Teorema 13.14: Se duas retas r e s são reversas, então de todos os segmentos que tem uma extremidade em cada uma das retas, o menor é aquele que está contido na perpendicular comum. Demonstração: Sejam A e B como na Proposição 13.14, A’ em s e B’ em r. Dividiremos em dois casos: 1o Caso: A = A’ ou B = B’, então A’B’ é hipotenusa e AB cateto, logo A' B' > AB . 2o Caso: A  A’ e B  B’: Traçamos B’C perpendicular a t em . Pelo Teorema 12.13, B’C é perpendicular a . Assim, B’C é perpen-dicular a A’C e o triângulo A’B’C é retângulo em C, logo A' B' > B' C . Mas B’C  AB pois r e t são paralelas, portanto A' B' > AB.

B.



B’ .

r t

C. A’ A. . s



 Agora reversas:

podemos

definir

distância

Definição 13.14: Chama-se distância entre duas retas reversas a medida do segmento contido na perpendicular comum, com uma extremidade em cada uma das retas.

entre

A

r d s

B

260

retas

Ângulos, Diedros e Triedros

13. Projeções, Distâncias,

Exemplo

13.7. Considere o paralelepípedo ilustra-do no desenho ao lado. A distância entre as retas reversas AD e BF, por definição, é exatamente a medida da aresta AB.

13.3. Ângulo Reta e Plano

entre

Planos

e

entre

Vamos agora introduzir os conceitos de ângulos entre plano e plano e entre reta e plano. Quando definimos perpendicularismo entre planos, introduzimos uma forma de se definir o ângulo entre dois planos secantes  e . Vejamos como medir este ângulo e, para isto, considere  um plano perpendicular a reta r =   . Sejam as retas s =    e t =   , como na Definição 12.13. Definição 13.14: Se dois planos  e  são paralelos ou coincidentes, a medida do ângulo entre eles é igual a zero. Se  e  são secantes, a medida do ângulo entre  e  é a medida do ângulo entre as retas s e t.

 



.  A

t

s

r

Assim temos que a medida do ângulo entre dois planos varia entre 0o e 900.

261

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Proposição 13.14: O ângulo formado por dois planos é igual ao ângulo formado por duas retas respectivamente perpendiculares a estes planos. Demonstração: Sejam t e s como na Definição 13.14. No desenho a seguir, os planos  e  são perpendiculares à página deste livro, passando por s e t, respectivamente. Seja A um ponto de  não pertencente a t nem a s. Traçamos por A perpendiculares v e u a t e s, respectivamente, ambas no plano  da página.

Observe que nos dois casos possíveis os ângulos BÂD e ˆ D são ângulos suplementares e assim, por definição BC de ângulos entre retas, temos o desejado.

 Queremos agora, para concluir este capítulo, definir ângulo entre reta e plano. Obviamente, queremos que este ângulo seja 90o quando a reta é perpendicular ao plano e 0o quando a reta estiver contida no plano. Para apresentar a definição vamos precisar do seguinte resultado: Proposição 13.14: Se uma reta r não é perpendicular a um plano  e o intercepta em um ponto A, então o ângulo agudo de r com sua projeção ortogonal r’ sobre  é menor que o ângulo agudo de r com qualquer reta de  que passa por A.

262

Ângulos, Diedros e Triedros

13. Projeções, Distâncias, r

Demonstração: Por um ponto P P. qualquer de r construimos PP’ perpendicular a , e por definição P’ r’. Seja s uma reta qualquer em .. r’  que passa por A. Em s tomamos P’ A. s Q um ponto Q tal que AP’  AQ. Nos  triângulos APP’ e APQ temos o seguinte, AP é comum, AP’  AQ, por construção, e PP' < PQ , pela Proposição 13.14. Segue da recíproca proposta no Exercício 4.19 que PÂP’ < PÂQ.

 Definição 13.14: O ângulo entre uma reta r e um plano  é igual ao menor ângulo formado por r e uma reta qualquer do plano . Pela proposição anterior o ângulo entre a reta r oblíqua a , é o ângulo agudo que a reta forma com sua projeção ortogonal sobre o plano. Obviamente, se r é perpendicular a , o ângulo entre r e qualquer reta de  é sempre 90o, assim o ângulo entre r e  será 90o como desejado. Se r estiver contida no plano , o menor ângulo será o ângulo formado entre r e sua projeção, que é r, assim 0º. Exemplos 13.8. As arestas laterais de um prisma qualquer formam ângulos congruentes com o plano da base.

263

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

  

J. R.

 

 V

13.9. As arestas laterais de uma pirâmide regular formam ângulos congruentes com o plano da base.

D 

 



C

B A 13.10. As geratrizes de um cilindro formam ângulos congruentes com o plano da base.

C

264

     



Ângulos, Diedros e Triedros

13. Projeções, Distâncias,

13.4. Diedros No próximo capítulo definiremos os poliedros convexos. Para isto necessitaremos de alguns conceitos importantes, que daremos nesta seção. Aresta do diedro Definição 13.14: Dados uma reta r e os pontos A e B não pertencentes A B a r, um diedro, denotado por di(r,A,B), é a figura formada pelos dois semiplanos r,A e r,B de origem Face do diedro Face do diedro comum r. A reta r é denominada r,A r,B r aresta do diedro. Os semiplanos r,A e r,B são denominados faces do diedro (veja desenho ao lado). Uma seção de um diedro é a interseção do diedro com um plano secante à aresta, ou seja, se o plano secante intercepta r em O, uma seção de um diedro é o ângulo no plano secante com vértice O. Assim, se C  r,A e D  r,B são pontos do ângulo formado pelas semi-retas SOC e SOD denotaremos a seção como a notação de ângulo, neste caso, por CÔD. Quando o plano secante é perpendicular à aresta, dizemos que a seção é normal ou reta. Exemplos 13.11. Uma pirâmide possui 2n diedros, onde n é o número de lados do polígono da base. De fato, n deles são formados pelas arestas da base, os outros n com as arestas laterais. 13.12. Os cones e os cilindros não apresentam diedros, ou seja, não há interseção entre planos.

265

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Vejamos agora algumas relações entre as seções de um diedro: Proposição 13.14: Dado um diedro qualquer temos que: a) Duas seções paralelas são congruentes. b) Seções normais são congruentes. Demonstração: a) Segue imediatamente do Teorema 10.11. b) Sejam  e  dois planos distintos e perpendiculares a aresta de um diedro. Como  e  são ambos perpendiculares a aresta, temos pela Proposição 12.13 que  e  são paralelos. Logo, pelo item a) temos o desejado.

 Esta proposição permite definir congruência de diedros. Definição 13.14: Dois diedros di(r,A,B) e di(r’,A’,B’) são congruentes, e escreveremos di(r,A,B)  di(r’,A’,B’), quando uma seção normal de um é congruente a uma seção normal do outro. O ângulo diedro é qualquer seção normal do diedro. A medida do diedro é a medida do ângulo diedro. Dizemos que o diedro é reto se o ângulo diedro for reto; agudo se o ângulo diedro for agudo e obtuso se o ângulo diedro for obtuso. Observações: 1) O ângulo diedro pode variar entre 0o e 180º. 2) O ângulo entre dois planos secantes é igual a medida do menor diedro formado por eles.

266

Ângulos, Diedros e Triedros

13. Projeções, Distâncias,

Definição 13.14: Sejam di(r,A,B) e di(r’,A’,B’) dois diedros e considere-mos, respectivamente, duas seções C ˆ E e C’ D ˆ ’E’. Diremos que C D ˆ E e C’ D ˆ ’E’ são D igualmente inclinadas sobre as arestas r e r’, se os ˆ E com uma ângulos formados pelos lados da seção C D das semi-retas em r com origem D, são respectivamente congruentes aos ângulos formados pelos lados da seção ˆ ’E’ com uma das semi-retas de r’ com origem D’. C’ D A

D

E

C r,A

B

r

r,B

A’

D’

E’

C’ r’,A’

B’

r’

r’,B’

As seções igualmentes inclinadas nos fornecem condições para a congruência de diedros: Teorema 13.14: Dois diedros são congruentes se, e somente se, possuem seções igualmente inclinadas congruentes. Demonstração: Consideremos dois diedros congruentes di(r,A,B) e di(r’,A’,B’) e duas seções ˆ ˆ igualmente inclinadas C D E e C’ D ’E’. Sejam F e F’ pontos em r e r’, respectiva-mente, tais que . Temos dois casos a DF D'F' considerar: ˆ F e ED ˆ F, C’ D ˆ ’F’ e E’ 1O Caso: C D ˆ ’F’ são ângulos agudos. D Consideremos as seções normais G ˆ F H e G’ ˆ F ’H’. Assim, temos que GDF  G’D’F’ e HDF  H’D’F’ pelo caso ALA, pois as seções são 267

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

igualmente inclinadas por hipótese. Logo, temos GD  G’D’, GF  G’F’, DH  D’H’ e HF  H’F’. Como por hipótese os diedros são congruentes, temos que os ângulos G ˆ FH e ˆ' H’ são congruentes. Portanto pelo caso LAL, temos G’ F que GFH  G’F’H’. Dessa congruência segue que GH  G’H’ e assim pelo caso LLL temos a congruência GDH  G’D’H’, o que demonstra o teorema para esse caso. ˆ F ou E D ˆ F, C’ D ˆ 2o Caso: C D ˆ ’F’ são ângulos retos ’F’ ou E’ D ou obtusos. Por F e F’, tracemos semi-retas que encontram os lados das seções em pontos M e N no primeiro diedro e M’ e N’ no segun-do diedro, de tal forma que os ângulos ˆM  D'F ˆ'M' e DF ˆ ˆ DFN  D'F'N' sejam agu-dos. Assim, pelo caso ALA, por constru-ção e hipótese, teremos as congruên-cias FMD  F’M’D’ e FND  F’N’D’. Assim, segue que FM  F’M’; FN  F’N’, MD  M’D’ e ND  N’D’. Como os diedros são congruentes temos, pelo 1O ˆ M e N’ Caso, que as seções N F ˆ F ’M’ igualmente inclinadas,por construção, são congruentes, pelo caso LAL. Assim, MN  M’N’, donde pelo caso LLL, MDN  M’D’N’. Portanto ˆ N  M'D ˆ 'N' e as seções são congruentes. MD

Reciprocamente, suponhamos que duas seções igualmente inclinadas de dois diedros são congruentes, devemos mostrar que os diedros são congruentes. 268

Ângulos, Diedros e Triedros

13. Projeções, Distâncias,

1O Caso: Com as mesmas considerações do 1º. Caso da parte direta do teorema obtemos as congruências GDF  G’D’F’ e DHF  D’H’F’, pois as seções são igualmente inclinadas. Logo, GD  G’D’, GF  G’F’, DH  D’H’ e HF  H’F’. Mas, por hipótese, as seções igualmente inclinadas ˆ H  G’ D ˆ ’H’. Logo, GDH  são congruentes, assim G D G’D’H’, pelo caso LAL. Assim, pelo caso LLL, GFH  G’F’H’ e, portanto, as seções normais G ˆ F H e G’ ˆ F ’H’ são congruentes, o que mostra a congruência dos diedros para o 1O Caso. 2O Caso: Com as considerações do 2O Caso da parte direta do teorema, obtemos as congruências FMD  F’M’D’ e FND  F’N’D’. Segue que os triângulos MFN e M’F’N’ são congruentes, pois temos FMD  F’M’D’ e FND  F’N’D’ implica DMD’M’ e DND’N’ e como, por hipótese, as seções igualmente inclinadas são congruentes, temos ˆ N  M'D ˆ 'N e, assim, a congruência segue do caso MD LAL. Isto implica na congruência MN  M’N’ e, assim os triângulos MFN e M’F’N’ são congruentes e portanto, como Mˆ FN  M'ˆ F'N ’, agora estamos com ângulos agudos como no 1O Caso da recíproca, logo os diedros são congruentes.

 13.5. Triedros O conceito de triedro surge naturalmente ao considerarmos três planos que tenham um ponto em comum. De fato, considere três planos distintos dois a dois, teremos as seguintes situações: - Os três planos são paralelos entre si; - Dois planos são paralelos e o terceiro intercepta um deles; 269

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Os planos se interceptam dois a dois; Este último caso é o que nos interessa, pois temos que dois planos quando se interceptam eles possuem uma reta em comum, e nos ajudará entender melhor ângulo das figuras geométricas espaciais. -

Definição 13.14: Sejam V um V ponto, SVA, SVB, SVC três semi-retas de mesma origem V não coplanares. Chamamos de triedro ou ângulo triedro e denotamos C por V(A,B,C), a interseção dos semi- A B espaços Epl(VAB),C, Epl(VAC),B e Epl(VBC),A. Chamamos V de vértice do triedro, as semi-retas SVA, SVB, SVC de arestas do triedro e as regiões VA,B  VB,A, VA,C  VC,A e VB,C  VC,B são denominadas faces do triedro, e denotadas por F(AB), F(AC) e F(BC). Observações: 1. Observe que um triedro determina três diedros: a) Determinado pelos semiplanos VA,B e VA,C, denotado por di(A). b) Determinado pelos semiplanos VB,A e VB,C, denotado por di(B). c) Determinado pelos semiplanos VC,A e VC,B, denotado por di(C). 2. Cada uma das faces de um triedro determina um ˆ B, a face ângulo. A face F(AB) determina o ângulo A V ˆ F(AC) determina o ângulo A V C e a face F(BC) determina ˆ C. o ângulo B V

270

Ângulos, Diedros e Triedros

13. Projeções, Distâncias,

Exemplos

 13.13. Um dos triedros mais importante é o que possui três  diedros retos. Ele é denomi-nado triedro tri-retângulo ou triedro tri-retangular.



13.14. Um tetraedro possui 4 triedros. que são determinados pelos seus vértices. Os triedros são A(V,B,C), B(V,A,C), C(V,B,A) e V(A,B,C)

V

C A B

13.15. Uma pirâmide cuja base é um polígono com n lados (n > 3) possui n triedros que são determinados pelos vértices da base. Em particular, na pirâmide quadrangular ao lado temos os triedros A(V,B,D), B(V,A,C), C(V,B,D) e D(V,A,C) 13.16. Um prisma cuja base é um n-ágono, possui 2n triedros. Em particular, no prisma hexagonal (veja desenho ao lado) temos 12 triedros, a saber: A(A’,B,F), B(B’,A,C), C(C’,B,D), D(D’,C,E), E(E’,D,F), F(F’,A,E), A,(A,B’,F’), B’(B,A’,C’), C’(C,B’,D’), D’(D,C’,E’), E’(E,D’,F’) e F’(F,A’,E’). 271

V

D

C B

A

F’

E’

A’

D’ C’

B’

F

E

A

D B

C

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

13.17. Veja que os cones e os cilindros não apresentam triedros, ou seja, não há interseção entre três planos. Num triedro, um triângulo ABC com um vértice em cada aresta é denominado seção. As seções nos triedros não são tão relevantes quanto nos diedros. Para o estudo das propriedades do triedro começaremos com as relações entre as faces: Teorema 13.14: Em todo triedro, o ângulo de qualquer face possui medida menor que a somas das medidas dos ângulos das outras duas. Demonstração: Seja V(A,B,C) um triedro. Se os ângulos de todas as faces são congruentes, o resultado é imediato. Se os ângulos de duas faces são congruentes e maior que a medida do ângulo da terceira, o resultado também é imediato. Suponhamos então que uma das faces têm ângulo maior que as medidas dos ângulos das outras duas, por exemplo, suponhamos que F(AC) é a face cujo ângulo tem a maior medida. Devemos mostrar que ˆC)  m(AV ˆB)  m(BV ˆC) . Considere em m(AV ˆ C um ângulo D V ˆ C tal que AV V ˆ ˆ DVC  BVC (1). Tomando B’ em SVB e D’ em SVD tais que VB' = VD' e C’ A’ D’ ˆ ’C’ considerando uma seção A’ B B’ contendo o ponto D’, teremos: a) D'C'  B'C ’, pois os triângulos C D’VC’ e B’VC’ são congruentes, A D B pelo caso LAL. b) No triângulo A’B’C’, temos A'C' < A'B' + B'C'  A'D' + D'C' < A'B' + B'C'  A'D' < A'B' Desta relação segue do Exercício 4.19 que ˆD)  m(AV ˆB) (2). Utilizando (1) e (2), obtemos m(AV ˆD)  m(DV ˆC)  m(AV ˆB)  m(BV ˆC)  m(AV ˆC)  m(AV ˆB)  m(BV ˆC). m(AV

272

Ângulos, Diedros e Triedros

13. Projeções, Distâncias,

Como F(AC) é a face cujo ângulo possui a maior medida, temos o resultado.

 O próximo resultado apresenta um limitante para a soma das medidas dos ângulos das faces. Teorema 13.14: A soma das medidas dos ângulos das faces de um triedro qualquer é menor que 2  . Demonstração: Seja V(A,B,C) um triedro, devemos mostrar que

V

A’

ˆB)  m(AV ˆC)  m(BV ˆC)  2 m(AV

Para isto, considere a semi-reta SVA’ oposta a SVA (veja desenho ao lado). Temos que V(A’,B,C) é um triedro e pelo Teorema 13.14,

A

C B

ˆC)  m(BV ˆA')  m(CV ˆ A') m(BV

(1) ˆB e ˆA' Os ângulos são adjacentes e AV BV suplementares, o mesmo ocorrendo com os ângulos ˆB)  m(BV ˆA')   ˆC e ˆA' . Logo, m(AV e AV CV ˆ ˆ m(AVC)  m(CVA')   . Assim, ˆB)  m(BV ˆA')  m(AV ˆC)  m(CV ˆA')  2 . m(AV Pela relação (1) temos

ˆB)  m(AV ˆC)  m(BV ˆC)  m(AV ˆB)  m(AV ˆC)  m(BV ˆA')  m(CV ˆA')  2, m(AV

como queríamos demonstrar.

 Definição 13.14: Um triedro V(A,B,C) é congruente a um triedro W(D,E,F,) se existir uma correspondência biunívoca entre suas arestas, tal que: a) Os respectivos diedros são congruentes. b) As respectivas faces têm ângulos congruentes.

273

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

Proposição 13.14: Dois triedros opostos pelo vértice (simétricos em relação a um ponto) são congruentes. Demonstração: Como os diedros opostos pela aresta são congruentes (Exercício 13.14) e, além disso, os ângulos das faces dos dois triedros são, respectivamente, ângulos opostos pelo vértice e, portanto, congru-entes, temos, pela Definição 13.14, que os triedros são congruentes.

 Vamos agora definir triedros polares. A maioria das proprieda-des dos triedros são obtidas através deles. Definição 13.14: Dizemos que um triedro V(A,B,C) é polar do triedro V’(A’,B’,C’) quando: a) V=V’. b) VA, VB, VC são perpendiculares aos planos pl(V’,B’,C’), pl(V’,A’,C’) e pl(V’,A’,B’), respectivamente. ˆ A', BV ˆB' e ˆC' são agudos. c) Os ângulos AV CV Pela unicidade da perpendicular a um plano por um ponto, temos que o triedro tri-retângulo coincide com seu polar. Neste caso, diremos que ele é autopolar. Proposição 13.14: A propriedade de ser polar é simétrica, ou seja, se V(A,B,C) é polar de V’(A’,B’,C’) então V’(A’,B’,C’) é polar de V(A,B,C). 274

Ângulos, Diedros e Triedros

13. Projeções, Distâncias,

Demonstração: Segue imediatamente do fato de ser simétrica a relação de perpendicularidade, ou seja, r  s  s  r.

 Apresentaremos a seguir fundamental de triedros polares:

a

propriedade

Teorema 13.14: Se dois triedros são polares, o ângulo da face de cada um é suplementar da seção reta do diedro oposto no polar. Para demonstrar seguinte lema:

este

teorema

utilizaremos

o

Lema 13.14: Se por um ponto V da aresta r de um diedro di(,, r) conduzirmos as semi-retas: a) SVA, perpendicular a , onde A pertence ao semi-espaço que contém . b) SVB, perpendicular a , onde B pertence ao semi-espaço que contém . ˆB é suplemento da seção normal do Então, o ângulo AV diedro di(,, r). Demonstração: Dividiremos em três casos: i) O diedro é obtuso. ii) O diedro é reto. iii) O diedro é agudo. Para o caso i), observemos que  VA    VA  r  .   VB   VB r

Logo, r é perpendicular ao plano =pl(VAB) e então   di(,, r) = ˆD é a seção normal do diedro CV di(,, r). Como, por cons-trução, AV é perpendicular a  e CV está em 275

Geometria Plana e Espacial Gerônimo/V. S. Franco

J. R.

 . Neste caso, por hipótese, 2  ˆB)  m(AV ˆB)   . ˆ D) m(CV m(C V > , assim 2 2  ˆ B) Analogamente, m(D V = e assim 2 ˆB)  m(AV ˆD)   . m(AV Logo, 2 ˆB)  m(AV ˆB)  m(AV ˆB)  m(AV ˆD)   e, portanto, m(CV ˆB)  m(CV ˆD)   , como queríamos demonstrar. m(AV Para o caso ii) temos SVA   e SVB  . Como  e  são perpendiculares temos que ˆB)  m(CV ˆD)   . m(AV   2 Logo, V ˆB)  m(CV ˆD)   , m(AV D como queríamos. Para o caso iii), B C A ˆD é a como VA e CV seção r  normal e mede menos que , 2 ˆC)   e da temos que m(AV 2 ˆD)   . Assim, mesma forma m(BV 2 ˆC)  m(BV ˆD) =, m(AV ou seja, ˆ A) = , temos que m(C V

ˆD)  m(DV ˆC)  m(BV ˆC)  m(DV ˆC) m(AV

=. ˆB)  m(DV ˆ C)   , como Logo, m(AV queríamos demonstrar.

 Demonstração: (do Teorema 13.14): Segue imediatamente da definição de triedros polares e do Lema 276

Ângulos, Diedros e Triedros

13. Projeções, Distâncias,

anterior, bastando observar que o diedro oposto no triedro polar corresponde as semi-retas SVA e SVB consideradas no Lema 13.14.

 Corolário 13.14: a) Se dois triedros são congruentes entre si então seus polares também são congruentes entre si. b) Em qualquer triedro a medida de um diedro aumentada de  rd supera a soma dos outros dois. c) A soma das medidas dos diedros de um triedro está compreendida entre  rd e 3 rd. Demonstração: a) Sejam V(A,B,C) e W(D,E,F) dois triedros congruen-tes, consideremos V(A’,B’,C’) e W(D’,E’,F’) seus respectivos polares. Pelo item a) da Definição 13.14, di(A)  di(D) e, utilizando o Teorema 13.14, temos

ˆC')  m(di(A))   m(E' WF')  m(di(D)) B' V ˆC' E'W ˆ F' m(B' V

ˆC  EV ˆF . Utilizando Pelo item b) da Definição 13.14, BV o Teorema 13.14, temos

ˆ C)  m(di(A'))   m(EV ˆ 'F)  m(di(D')) di(A')  di(D') m(BV

. De modo análogo, se obtém congruências no triedro polar.

as

outras

quatro

b) Sejam dA, dB e dC as medidas dos diedros de um triedro V(A,B,C) e f1, f2 e f3 as medidas dos ângulos das respectivas faces no polar. Pelo Teorema 13.14 temos f1 < f2 + f3 e pelo Teorema 13.14 temos f1 =  – dA, f2 =  – dB e f3 =  – dC. Logo,    dA      dB      dC   dB  dC    dA . Analogamente, obtemos dA + dC
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