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December 20, 2016 | Author: Angela Rojo | Category: N/A
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nSodotoda do Brasil Urbano

Rnthony Leeds e Elizabeth Leeds /iflTROPOLOGifc S O C IA L

Hnthony Leeds e Elizabeth Leeds

ogia

Tradução de M a r ia L a u r a V iv e iro s de C a s tr o

Revisão Técnica de M á rc ia B a n d e ira de M e llo L e ite N u n es

Apresentação de T h a l e s de A zevedo

ZAHAR EDITORES R IO D E JA N EIRO

Copyright

© 1977 by Anthony Leeds and Elizabeth Leeds

capa de J

ane

N enhum a parte deste livro poderá ser reproduzida sejam quais fo rem os m eios em pregados {mirneografi&, x erox » datilografia, gravação, reprodu ção em disco ou em fita ), sem a perm issão por escrito da editora. A os infratores se aplicam as sanções previstas nos artigos 122 e 130 da L ei 5.938 de 14 de dezem bro de 1973

1978

Direitos para esta edição contratados com ZAH AR ED ITO R ES Caixa Postal 207, ZOOO, Rio Im presso n o Brasil

índice Apresentação I. II. r'v ú



T h a les de A zevedo

Introdução



A n t h o .n y L e e d s

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11

Poder Local em Relação com Instituições de Poder Supralocal —

A n th o n y L eeds

26

Introdução, 26; A Comunidade, 29; A Localidade, 31; Caracte­ rísticas da Localidade, 33; As Estruturas e os Recursos de Po­ der, 36; Localidade e Fontes de Poder, 38; Instituições e Estru­ turas Supralocais, 38; O Estada e as Localidades, 39; Estado e Localidade — O Caso da Favela, 42; Favelas como Localidades “versus” Instituições e Estruturas Supralocais, 45; Generali­ zações e Conclusões1 47; Bibliografia, 49. II I,

IV .

Carreiras Brasileiras e Estrutura Social: Uma História de Caso e um Modelo — A n t h o n y L e e d s ...........................................

55

Bibliografia

84

..............................................................................................

O Brasil e o Mito da Ruralidade Urbana: Experiência Urba­ na, Trabalho e Valores nas “Áreas Invadidas” do Rio de Janeiro e de Lima — A n t h o n y e E l iz a b e t h L e e d s ...................

86

Introdução, 86; A Experiência Urbana dos Moradores das Áreas Invadidas, 92; O Nascido na Cidade, 95; Caminhos de Entrada na Cidade, 98; Experiência Ocupacional Anterior, 102; Fatores Que Operam na Seleção para a Vida na Favela, 105; Experiência Urbana no Interior da Área Invadida, 113; Valores Urbanos, 119; Comentários Informais do Autor, 130; Bibliografia, 136. V.

Tipos de Moradia, Arranjos de Vida. Proletarização e a Estru­ tura Social da Cidade — A n t h o n y L e e d s .................................... A Especialização da Moradia no Rio, 145; Arranjos de Vida Alternativos, 156; Conseqüências das Escolhas entre Arran­ jos de Vida, 162; Restrições sobre a Escolha, 168; Clivagem de Elite e Coalisões com Grupos Proletários, 172; Implica­ ções para o Planejamento, 180; Bibliografia, 182.

144

A SocroLOGiA do B r a sil U rbano

6

V I.

Favelas e Comunidade Política: A Continuidade da Estrutu­ ra de Conirole Social — A n t h o n y L e e d s e E l iz a b e t h L e e d s

186

Introdução, 186; Comunidade Histórica na Estrutura do Pro­ blema Habitacional, 189; O “Problema da Favela” Vira Moda, 191; A "Democracia” Pós-Vargas, 198; O Segundo Período de Vargas e os Anos 50, 204; O Papel do Administrador Polí­ tico, 206; A Era do Controle Renovado, Erradicação e Repres­ são, 214; Conclusões, 245; Apêndice I, 248; Apêndice II, 251; Apêndice III, 254; Bibliografia, 257. V II.

Considerações sobre Diferenças Comportamentais: Três Siste­ mas Políticos e as Respostas das Áreas Invadidas por Possei­ ros no Brasil, Peru e Chile — A n t h o n y L e e d s e E l i z a b e t h L e ed s

..........................................................................................................................

Uma Metodologia e um Modelo Holísticos, 266; A Literatura sobre a Politização, 272; As Três Comunidades Políticas, 276; Brasil, 278; Peru, 288; As Respostas Políticas dos Moradores das Áreas Invadidas no Peru, 298; Chile, 301; Á Resposta de Moradores das Áreas Invadidas e “Pobladores”, 312; Conclu­ sões, 319; Bibliografia, 320.

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Apresentação A difícil tarefa de prefaciar um livro torna-se um desafio em casos como o deste conjunto de estudos de Anthony e Liz Leeds. Um desses desafios está em que os braziliamsts — assim denominados principalmente os norte-americanos e ingleses que es­ crevem sobre o Brasil — quase sempre se nos apresentam com monografias no estrito sentido, analisando determinado e bem de­ finido objeto. Aprofundam e esmiuçam, isto é, detalham e decom­ põem em mil elementos para, depois e mediante tal tipo de exame, concluírem — a estrutura, o dinamismo, as funções, os efeitos e as causas de tais ou quais instituições ou fenômenos sociais, políti­ cos ou históricos. Delimitam nitidamente suas temáticas e seus ângulos de visão ainda quando, por tal método — e não isto que estamos discutindo — lançam luz sobre a totalidade da cultura e da, sociedade. Recusam-se, por bem dizer, às análises globais, aos apanhados compreensivos, as generalizações que possam parecer subjetivas, e impressionistas^ em _virtude, as mais das vezes, do rigor empmcista _ do seu indutivismq. Outros especialistas em Brasil — predominantemente europeus e raros norte-americanos — buscam apreender glehalmeii£e a realidade ou totalizar com outros elementos dados relativos a específicos fenômenos ou conjunturas: estes são autores mais intuitivos e inclinados à empatia e à inte­ gração com o país e a sua gente, por uma longa vivência ou por outros compromissos pessoais. Os primeiros^ ajuntam parcelas, não raro preciosas, às sínteses que são as metas finais jjas ciências do homem e da sociedade. Mas podem valer mais pela massa de dados que colhem, pela sistematização de componentes, pela ordenação do conhecimento de particularidades do que como respostas_aos. problemas focalizados. São, as duas, vocações intelectuais e epistemológicas — racionais, científicas e críticas em modos diferentes — que, sem dúvida alguma, prestam serviços à apreensão da com; plexa fenomenologia humana brasileira.

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A S o c io lo g ia do B r a s il U rb a n o

E ste livro não cabe inteiramente em nenhuma das duas ca­ tegorias ideais a que aludimos, embora seja tributário_ de ambas. Não é uma monografia quanto à sua temática, pois abrange uma diversidade de questões dçrivada da ávida curiosidade científica djps autores e da sua experiência da vida brasileira. Basta percor­ rer o sumário para verificá-lo, e até o seu taefòdb: este é algumas vezes descritivo e interprelativo, outras vezes questiona nte e polê­ mico, do que resulta o caráter provocativo do conjunto em bene­ ficio de todo o seu variado conteydo. Com isso lucram as ciências humanas envolvidas — particularmente a Antropologia Social — e a inteligência das coisas brasileiras, mais uma vez evidenciando, como no dito popular, que “ da discussão nasce a luz.” Assim ocorre, por exemplo, com as conceituaçÕes de urbano, de rural, de rurbano e de íavelra^ no Brasil. AbÕrdándõ"'! os mecanismos de\ controle social em perspectivas diaerpnica e sincrônica, cada uma,/ /a seu tempo, ou ía ^ n d o .jncidbf essas,_duas^ oticag_concorrentemeu-f |te sobre a cultura e a organização social nas mencionadas situa-; I ções, qfteScõBrem) continuidades temporais- e existenciais que os im-i . pelem, 'à_eríticà, talvez a contestação, tde conceitos" fixados oiVjia/ . aplicação de determinados métodos. — o marxista, por exemplo — i I em certos momentos da formação da teoria e da análise antropo-i lógica entre cientistas brasileiros. Se é certo que várias dessas crí- j ticas^ em tese como em referência ~ao Brasil, já forãm feii§s~e respondidas, os dados sobre _os quais operam çõnstituem outras 1 tantas contribuições- dos dois autores à constriição de cõrpos teóriçqs que possivelmente estimularão algumas “reavaliações das pro­ blemáticas respectivas, como a das relações de poder em referên­ cia aos modos de ser em situações ecológicas ou de ubicação sócio-territorial diferentes, porém correlacionadas e faseológicas. A análise conjparativá, que fazem com elementos colhidos no Peru e no Chile,“ a reconsideração do método dos estudos de comuni­ dades — de há muito posto em debate, mas trazido de novo a exame sob uma ótica original — , os contrastes factuais, com suas conseqüências teóricas, entre poder local e poder supralocal no tocante às favelas, a retomadà’ do problema dos conflitos de clas­ ses no Brasil/constituem interesse para esta coletânea, — a qual, numa ponderação final, vem am o strar-se mais_ coerente do que poderá indicar o índice do livro. E será, este, mais uma instiga­ ção à reformulação, entre nós, de. políticas demográficas e habi­ tacionais. Obra inevitavelmente polêmica pela natureza de sua temática e pelas posições que os autores adotam criticamente, esta coletânea de artigos, alguns publicados há alguns anos, realiza sua coerên­ cia ou sua coesão, em plano teórico e epistemológico, a partir da

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A presen taçã o

Introdução. Por certo que a autoridade dos autores não decorre apenas do seu tirocínio de pesquisadores preocupados com formu­ lações teóricas, mas também da sua experiência com problemas brasileiros. Anthony Leeds ocupa-se de Brasil a partir de um pro­ longado e repetido contato com nossa sociedade, da mesma ma­ neira que com o P eru e o Chile. Sua carreira acadêmica iniciou-se mesmo com o trabalho de campo, de mais de um ano de duração, que empreendeu na região cacaueira da Bahia em 1951-52, como participante do Program a de Pesquisas Sociais do Estado da Bahia — Columbia University, sob a direção do Prof. Charles Wagley. Sua tese para o doutoramento em Antropologia teve como objetoos padrões de formação fundiária da agricultura do cacau e as relações do sistema de fazendas com a sociedade regional e na­ cional sob as políticas do comércio internacional que comandaram o desenvolvimento daquela lavoura. Depois daquela permanência, várias vezes e por períodos longos voltou ao país em ^itividades 'de pesquisa e de participação acadêmica, trabalhando na compajnhin e com a colaboração de cientistas sociais brasileiros. À marca^ 'do seu espírito inquieto e penetrante é saliente nesta coletânea, de estudos. T h a l e s de A zev ed o

Introdução A n t h o n y L eed s

Toda a minha vida profissional girou em torno de vários problemas básicos — alguns originais, outros não. Tentei reunilos, ao longo dos anos, num único quadro teórico. 0 primeiro deles, mas que talvez ainda persista, é o de dar substância aí) con­ ceito de classe — sobretudo num sentido marxista. Marx, ou M arx e Engels juntos (referir-me-ei a ambos, daqui por diante, simples­ mente como “M arx” , para maior simplicidade), não inventou o conceito, e nem mesmo algumas das interpretações básicas que fa­ zem parte de sua visão. 0 conceito já está estabelecido em seu significado econômico e estrutural em Adam Smith ( 1 7 7 6 ) , num exemplo altamente significativo — significativo porque Smith é, no mesmo trabalho, também ancestral dos economistas clássicos, formalistas, que M arx repetidamente atacou, embora seu próprio pensamento econômico seja intimamente derivado daí e suas supo­ sições desempenhem um papel muito importante na estrutura das explicações marxistas sobre a economia. Todavia, Marx elevou a discussão de classe a uma tentativa sistemática de criar uma teoria de classes e apresentar uma análise de classe substantiva derivada dessa teoria. Em essência, estas análises constituem teorias espe­ ciais de sociedades pós-capitalistas particulares. sO esforço, como o sabemos hoje, foi apenas em parte bem sucedido. Deixou-nos muitos problemas não resolvidos que todo teórico maior do século X X — Weber, Tauney, Lenjn, Luxemburg, Lukács, Millet, Bottomore, Mills, Dahrçndorf, Althiissgr, Poulantzas, para mencionar apenas alguns — enfrentou. Por que o esforço persistente para resolver estes problemas? A resposta não

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é imediatamente auto-evidente, de vez que deve ser dada pergun­ tando-se: “Não será possível que não sejam absolutamente pro­ blemas, mas simplesmente quebra-cabeças criados pela própria teo­ r ia ? ” A julgar pelas suas produções, os teóricos americanos, da estratificação como Kingsley Davis e W . L. Warner, adotaram es­ sencialmente esta visão, A resposta parece estar na sensação que os homens têm_ de que as populações humanas parecem agir como se existissem enti­ dades supra-individuais como atores na sociedade. Vontades, cognições, açÕes e atores individuais são amplamente, se não universal­ mente, vistos como relativamente secundários ou mesmo insignifi­ cantes diante dessas entidades, para as quais existe uma vasta co­ leção de termos — “nós” e “ eles”, o Estado, as classes, os grupos, estados, associações, órgãos, corporações, instituições. Asenjjxladês como atores são sentidas operando segundo padrões estandardiza, dos e modos estruturais que chamamos “instituições” e, na ver­ dade, padrões supra-individuais podem realmente ser diretamente percebidos, como em cerimônias e disposições de lugares. Além disso, em nossas apreensões de como a vida e a experiência se con­ figuram, do conflito, da mudança, sentimos a centralidade dessas entidades. Enfatizo sentir para indicar que as bases epistemológicas de todos esses conceitos e suas supostas referências ontológicas são am­ bíguos, não porque o sentir — nosso único caminho direto para o conhecimento — seja ambíguo, mas porque a maioria de nossas traduções científicas do sentir para proposições empiricamente com­ prováveis, articuladas por formas estandardizadas de lógica verbal, necessitam tornar-se metodologicamente explícitas. Especificamen­ te , isso significa desenvover uma teoria da natureza das ordens supra-individuais que especifique características únicas àquela or­ dem, per se — isto é, não redutíveis aos indivíduos (ver Samueljson, sobre a falácia reducionista, Koestler e Smythies, 1 9 6 9 ) — mas que também explique quais são os processos geradores e mantenedores das ordens supra-individuais. Ela deve explicar co­ mo os indivíduos se articulam com a ordem. Mais ainda, tal teoria deve tornar explícitas suas bases epistemológicas, especialmente as regras ~5e correspondência que ligam o sentir original a seus con­ ceitos e construções subseqüentes, e estes últimos à refinada obser­ vação metodológica. Dito de outro modo, aceito como axiomática a correção daquela apreensão quase que universalmente sentida do mundo, mas aceitando-a, é necessário que eu, então, como cien­ tista, clarifique a metafísica. Devo descobrir seus aspectos pura­ mente especulativos ou filosóficos, recolocando-os com sólidas ba­ ses empíricas, com método e lógica apropriados. Aceito que os pro-

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blemas com os quais M arx lidou sejam realmente problemas, uma vez que tanto nossa experiência ocidental como virtualmente toda experiência humana parece apresentar um sentir comum da natu­ reza do mundo humano. Marx. realizou um empreendimento estupendo ao clarificar o que estava em questão na análise de classe, erradicando muita metafísica especulativa na cíêncI£~sõcíaT que desenvolveu, e ela­ borando muitos aspectos de uma metodologia empiricamente ori­ entada, incluindo conceitos cujas regras de elaboração estão impli­ cadas em suas definições. Ele foi, apesar disso, apanhado — ■ como não podia deixar de ser na sua época da evolução Ua história das idéias — por certas dificuldades J^todológicas que ele, em parte, não viu, e\ em parte, vendo, não pôde resolver. Uma dessas é um dualismo desenfreado que se reflete em sua egeolha de unia lógica — a forma hegeliana de dialética (im pli­ cando mesmo etimologicamente dualismo) — , uipn lógica, cujo empréstimo de Hegcl não^foi compelido por nenhuma necessi3ãijê^ nem mesmo pelo caráter das ideologias existentes na época. Por que Marx optou por uma lógica tão intimamente vinculada à meta ísíc a ocidental, dualista e especificamente cristã? Como estu­ dante de filosofia durante seus anos de universidade, ele conheceu bastante bem as alternativas. J*or que cie optou por uma metalógica que, na verdade, ontologiza a lógica ao fazê-la isomorfa’ aos processos sociais reais (com o em H egcl), como exemplificado na espúria identificação da “contradição” (um a concepção lógica co­ mo seu locus na linguagem) e “conflito” (u m conjunto de rela­ ções humanas) que atormenta todo o pensamento neom arxista?_0 que é visto coWQ_lo%icamciite contraditório, segundo algum axioma subjacente à lógica, poãe ou não envolver_ conflito, e o conflito pode ou não envolver contradição, a menos que sc parta do aprio•, nsmo_ de que eles são identidades. Esta decisão foi puramente axiomática, de forma alguma justificada por critérios independen­ tes. Marx era obviamente conhecedor de muito do que estava en­ volvido metaficamente em Hegcl, tornou-o manifesto em suas atitudes relativas a, e na “inversão” daquele grande filósofo-historiador, mas o compromisso subjacente mais profundo com o dua­ lismo parece ter-lhe escapado — e a tantos de seus descendentes intelectuais. Esta não é uma questão trivial, já que não é absolutamente auto-evidente que as coisas ocorram no universo aos pares, menos ainda em pares cm oposição ou “contradição” (com uma síntese trinitária como resultado). A noção de “ contradição” e, mesmo pior, sua identificação com o conflito é, à luz da metafísica, pro-_.

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fundamente dualista. Estou totalmente convencido de que__godejniQS quase sempre demonstrar que as dualidades, especialmente as oposiçÕes, às quais áemos tão freqüentemente status ontológico, isão um produto de nossos axiomas, categorias e lógica, quando §e vai diretamente ao encontro da experiência. Além disso, o compro­ misso de M arx com a dualidade infundada permeia seus escritos: qualquer leitura intensiva, por exemplo de O Capital, mostra dua­ lidades desnecessárias injustificadas virtualmente em cada pá­ gina. Onde isso criou o maiorjnúmero de problemas para a ciênçia fcociaI~Ioi na análise de classes, pois os critérios de classe na teoria geral dé- classes-' ^ " criadores versus apropriadores de mais valia o a organização interna de cada um desses agregados assim dife­ rençados — leva necessariamente a uma análise de duas classes. Pode-se interpretar muitos dos recentes escritos neomarxistas como - íima tentativa para resolver esse dilema quando confrontado com ordens sociais que “resistem” (isto é, “entram em contradição com a teoria” ), sendo intelectualmente encaixadas num molde dual de classes (v er a tentativa fracassada de Millet, 19)* Muitos . de meus trabalhos tTataram deste problema (especialmente 1964a Cap. 2, neste livro; 1 9 6 7 , 1 9 7 3 ). Um problema relacionado a isso é que a lógica dualista, dia­ lética fez com que se tratasse a presença da classe como axiomá­ tica ao invés de exigir, pelas próprias regras de correspondência originais de Marx, a demonstração. Este apriorismo, que infesta virtualmente toda análise social corrente na tradição marxista e neomarxista, em vez de redefinir e reordenar a análise de classes clarificando problemas epistêmicos e metodológicos, obscureceu a análise tanto da estrutura quanto da dinâmica p o rq u e^ axioma j jtende à análise dos mecanismos criadores de limites e dos processos] ide automanutenção, bem como respostas conflituosas a ambos por outras classes (ver Leeds, 1 9 6 4 b ). Sem nos desfazermos disso, não poderemos entender processos “reais”, materiais, a interação polí­ tica e social real, a motivação real individual e de grupo, as varia­ ções de ideologia reais, menos ainda as mudanças em qualquer uma dessas coisas ao longo do tempo. Meu próprio trabalho envolveu de modo crescente a tentativa explícita de desenvolver, no interior de um quadro de referência do materialismo histórico marxista e da lógica das multiplicidades de “forças sociais” (o termo é de Durlcheim, com seu modelo implícito, indesejável, newtoniano de interação física, mas servirá de momen­ to ), abordagens substantivas e teóricas inais refinadas_e detalhadas

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desses problemas. Como indico abaixo, alguns dos trabalhos neste volume fornecem exemplos desses contínuos esforços. Herdamos outra, dificuldade^ de M arx: sua idenjjficação de bases materiais da sociedade especificamente e apenas na produ­ ção, e, ainda mais, com uma concepção relativamente, estreita, da produção e do produtivo — ambos virtualmente isomorfos àquelas concepções em que aparecem tanto na economia clássica como na neoclássica. Esta é uma identificação axiomaticamente dada, e não empírica. Pode-se questionar por que M arx a adotou. Onde esta difi­ culdade aparece mais fortemente — pela primeira vez nos próprios escritos de M arx — é na aplicação da teoria marxista geral a casos específicos de análise da estrutura de poder. É muito difícil ajus­ tar a teoria geral de poder (amplamente baseada na análise teó­ rica genérica e necessariamente de duas classes de qualquer socie­ dade com propriedade privada) a uma teoria específica da distri­ buição de poder numa dada sociedade, num momento e lugar da­ tis, ou seja, a um conjunto concreto de condições históricas, como diria Marx — por exemplo, a França do 18 Brumário de Luís Bonaparte. Apesar do alerta de Marx nos Grundrisse (c a . 1 8 5 7 ) con­ tra abstrações reifiçadas (c f pp 1 8 ) , e de sua intimação de que baseássemos toda análise em realidades concretas, a teoria geral está cheia de abstrações cuja aplicação na análise de caso jé, na melhor das hipóteses, ambiguamente consistente e, na pior, marcadamente inconsistente, com o uso na teoria geral, por exemplo, do conceito de “ modo de produção” . Por vezes ele parece caracterizar toda uma sociedade. No 18 Brumário, ele caracteriza as bases de várias “classes” e “frações de classes” (nao é nem mesmo claro se havia classes com a amplitude da sociedade cuja apropriação dife­ rencial de mais-valia pareceria necessariamente im plicar) — às vezes parecendo mais grupos de interesse de base ecológica. Essaambigüidade permeia toda a análise marxista subseqüente e ê par-; ticularmente visível no recente ressurgimento de abordagens m ar­ xistas, onde, em instâncias extremas, qualquer variação na organi-; zação da produção torna-se ipso facto “um modo de produção” (c f . Paul Singer, 1 9 7 6 ). Isso me paree; etc., e de um ponto de vista histórico, Morse, 1951, 1958; Poppino, 1953; Stein, 1957.

P o der L o c a l e P o d er S u p r a l o c a l

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totalmente independente das bases locais. Por exemplo, economistas, tratam do imposto, mas eu não sei áe ocasião alguma em que a mo­ bilização da organização social local para lidar com problemas de imposto, engendrados por uma dada política nacional de taxação,, tenha sido explorada. Apresento o caso extremo, mas no essencial a afirmação é verdadeira. Desde que parece ser axiomático entre os antropólogos que eles devem tratai' de sociedades totais ou sistemas inteiros, eles têm te ra­ tado e conseguiram realmente, descrições do macrocosmo.9 Mas não, foram capazes de tratar adequadamente das instituições supra lo­ cais em si mesmas. Menos adequadamente ainda, se não de forma totalmente inadequada, foraiãi eles capazes de tratar das inter-relações entre essas instituições e as comunidades ou localidades especí­ ficas com as quais elas se articulam. Existem poucas descrições de* tais relações na literatura, com a possível exceção do material Si~ nológico (c f , também Lopes, 1964, 1 9 6 8 ), e praticamente nenhu­ ma proposição geral, hipóteses, ou modelos acerca da natureza de tais inter-relaçÕes (c f , todavia, Adams, 1 9 6 7 ). A seguir, proponho um modelo geral. A Localidade Para os objetivos presentes, prefiro o termo localidade a comu­ nidade, devido às confusões existentes cpm .relação a oste último, usado para designar as etnografias de lugares específicos. Aceitando-se a definição de Arensberg (l96T)""oü aquela bastante diferente dada por Murdock ( 1 9 4 9 :7 9 ) fica claro, então, que, na maior par­ te, os chamados estudos de comunidade são na verdade, dubiamente, ou não são de forma alguma, estudos de comunidades, mas sim de localidades. O status do locus de estudo nesse campo de pes­ quisas como unidade real da ordem social é mais ambíguo no sentido da definição de Arensberg de comunidade. Seja como for* ele define no máximo uma_unidade analítica, não_uma unidade que se relaciona com outras num sistema total. O termo “localidade”, todavia, refere-se, no contexto das dis­ tribuições geográficas humanas, aos loci de organização visivehnen-, te distintos, caracterizados por_coisas tais como um agregado de pes^ spas mais ou menos permanente ou um agregado de casas, geral­ mente incluindo e cercadas por espaços relativamente vazios, em­ bora não necessariamente sem utilização. Conseqüentemente, o a, agosto de 1964). J3 Muitos projetos de reforma agrária não são dc lodo revolucionários neste sentido, mas tendem antes a promover a ossificação de formas an­ tigas da organização Iccal. Muitos dos projetos parccem-me então fadados ao fracasso desde o começo. Urna vez que eles são quase que totalmente formuladas pelo pessoal dos órgãos supralocais, pode-se muito bem in­ dagar acerca da função de tais fracassos.

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tuem uma das mais importantes estruturas da sociedade total, em* bora tenham sido amplamente negligenciadas na literatura. Elas requerem muita pesquisa de base. Fazer tal pesquisa requer a espe­ cificação daquelas formas de estruturas e instituições nacionais que quase sempre são, na melhor das hipóteses, tratadas perifericamente nos estudos antropológicos, embora seja especificamente o cará­ ter süpralocal ou nacional destas entidades que vincula as comuni­ dades ou localidades a um único sistema. Precisa-se, então, de descrições antropológicas conceitualmente bem formuladas das ins­ tituições nacionais, das localidades e comunidades e dos arranjos de suas relações. Apenas então seremos capazes de desenvolver teorias adequadas acerca da mudança e resistência à mudança.

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III Carreiras Brasileiras e Estrutura Social: Uma História de Caso e um Modelo A n t h o n y L e ed s

(Versão revista do trabalho lido para a Sociedade Antropológica de Washington, D .C ., 16 de outubro, 1962)

I A pesquisa que relatei é interessante para mim, não tanto pe­ los dados em si mesmos, embora eles jamais tenham sido apresenta­ dos e tenham uma certa fascinação intrínseca, mas antes porque ela é sobretudo uma confirmação detalhada do que eu já conhecia am­ plamente a partir de reflexões teóricas e algumas observações es­ parsas. Com efeito, eu já havia descrito meus resultados de campo antes de ter ido ao campo: será interessante rever brevemente como isso ocorreu e considerar posteriormente suas implicações mais am­ plas. Durante algum tempo, estive buscando uma tipologia de soçiedades organizadas em Estado que se basearia numa visão sinópti­ ca da ..função, da estrutura total, e da trajetória das sociedades, mais do que, como em certas tipologias anteriores, em um ou alguns tra­ ços ou sintomas.1 O objetivo de tal tipologia é fornecer uma base para comparação com o intuito de investigar as seqüências de de­ senvolvimento, suas regula ridades e buscar leis gerais do desenvol­ vimento sócio-culturaí. 0 exame de casos únicos sem uma tipologia 1

C f. Steward, 1949; Bennett,

et al; Meggers.

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nega a possibilidade de generalização acerca 'dos processos ou meca­ nismos descritos para cada caso e exclui qualquer precisão que não em bases intuitivas. Tais bases são, de qualquer forma, em ge­ ral implicitamente tipológicas, envolvendo afirmações como “ meu povo é semelhante a algum outro povo. . . conseqüentemente, , . n Dois tipos de sociedades organizadas em Estado, parecem ca­ racterizar as últimas fases conhecidas da ( çvoJu^ílo jçuítüráD Cha­ mei-as de "sociedade estático-agrária” e “ sociedade expansivo-industrial” . A primeira é representada pela Europa feudal, a ín d ia pré-colonial, os grandes despotismos orientais, o Haiti, e outros paí­ ses latino-americanos, muitos países do Oriente Próximo e assim por diante; a última pela Alemanha, u r s s ? exja, Inglaterra e ou­ tros a eles semelhantes. Precedendo o_tipo estático-agrário de socie­ dade encontra-se a "sociedade expansivo-agrária” , cujos exemplos, como os primeiros impérios mesopotâmicos, estão extintos. Pode-se sugerir oue um tipo “ estático-industrial” de sociedade sucederá aos expansivo-industriais existentes‘ atualmente, e pode-se tentar deli­ near as características de tais sociedades e o mundo em que elas serão predominantes.2 Sem entrar em detalhes aqui, a sociedade jsstático-agrária pode ser descrita como tendo todos os recursos e riquezas fundamentais, e alocando seus recursos básicos de trabalhos, equipamento técnico e os demais em torno da agricultura. Conseqüentemente, as princi­ pais características sociais — a divisão do trabalho, administração e supervisão, estrutura comunitária, comunicações, estrutura social de guerra e poder, o próprio Estado — moldam-se pela extensa rela­ ção tecnológica com a terra utilizada para plantações. A íntima re­ lação da ordem social total com as localidades e estruturas comuni­ tárias localizadas produz relações próximas de parentesco e pseudoparentesco como mecanismos organizacionais. A sociedade expansivo-industrial obtém sua riqueza e recursos fundamentais e aloea todos os seus recursos básicos em torno da in­ dústria. A agricultura torna-se, primeiro, em certo sentido, gubordinada_ à indústria, econômica, política e ideologicamente, e depois tòrna-se ela mesma industrializada em tecnologia e organização Todas as principais características sociais são moldadas pelas exten­ sas relações tecnológicas com os múltiplos recursos relevantes para^J> consumo industrial (dentre os quais as plantações são importantes como material nao-alimentício). 0 padrão_ ecológico fundamental é multirregional, tendendo ao global, e, conseqüentemente, as so­ ciedades tendem a ser exocêntricas política e economicamente, ten­ 2

Cf. Guardini, 1956.

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dem a maximizar relações translocais às expensas das relações locais e comunitárias, e tendem a operar através de instituições e associa­ ções supra-locais altamente organizadas. Tais características ten­ dem a fazer com que estas sociedades se expandam econômica — o chamado crescimento segundo o modelo do take-off — , demográfica e politicamente. Na expansão elas revelam instituições de imple­ mentação de política características tais como o colonialismo, o in­ vestimento estrangeiro, a hegemonia política internacional e assim por diante. A aparência pura da sociedade expansivo-industrial é a dc um crescimento evolucionista a partir do feudalismo ocidental, através de várias fases, sendo as fases intermediárias, em si mesmas, formas de sociedade substancialmente integradas e coerentes. Todavia, uma vez tendo ocorrido o desenvolvimento puro, todo tipo de justa­ posições de formas societais pode ocorrer em situações de acultura­ ção. Assim, sociedades expansivo-industriais total ou parcialmente desenvolvidas podem encontrar-se em várias formas de contatos de aculturação com sociedade estático-agrárias em diferentes estágios de desenvolvimento, ou em fases iniciais pós estático-agrárias, pro­ duzidas por evolução independente. Podemos, com base nestas ohservaçÕes, considerar várias hipó­ teses.8 À primeira é que onde as culturas destes dois tipos polares estão mais ou menos em contato duradouro e vigoroso, as institui­ ções de amhas operam numa rede de entrelaçamento característica. Poder-se-ia esperar encontrar aspectos característicos da organiza­ ção expansivo-industrial ligados a instituições feudais típicas ou es­ tático-agrárias. Poder-se-ia esperar que aquelas entidades sociais da organização industrial — tais como corporações, instituições públi­ cas ou privadas, sindicatos, sistemas administrativos, escolas voca3 Estas hipóteses foram em parte induzidas pela observação da existên­ cia do autodidata e do ocupante de múltiplas posições no Brasil. Elas são apresentadas aqui com o deduzidas de princípios evolucionistas gerais, uma vez que pretendem ser modelos mais gerais para este tipo de sociedade “ em transição” . Isto é, com base na teoria e nas hipóteses derivadas, deveríamos esperar encontrar fenômenos similares ou relacionados em outras sociedades em transição da estático-agrária para a expansivo-indus­ trial, ambas em situação de aculturação, e também na própria seqüência evolutiva. A s hipóteses acima apresentadas deveriam ser com prováveis na história européia, digamos, nos séculos X V I-X IX . Se os dados confirm am as hipóteses, o argumento teórico se fortalece; se não, pode-se primeiro in­ vestigar as conseqüências da afirm ação de que a evolução de um sistema puro e a aculturação entre dois níveis evolutivos não são a mesma coisa, de form a que diferentes resultados devem ser esperados de cada um. Todavia, personagens com o Michelangelo, Rubens e G oethe sugerem a confirm a­ ção da hipótese.

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cionais e profissionais, etc., que são fundamentalmente relacionadas à tecnologia —- quando introduzidas na sociedade estático-agrária, fossem interpenetradas ou articuladas por laços caracteristicamente “ feudais” como o parentesco consanguíneo ou afim, parentesco ri­ tual, amizade, relações de apadrinhamento e uma variedade de con­ tatos próximos interpessoais não-formalizados, qualitativa e quanti­ tativamente diferentes das relações encontradas na sociedade indus­ trial. Uma segunda hipótese diz respeito à expansão transformacional das oportunidades sócio-econômicas. Sob o tipo de relações interculturais aqui descritas, a justaposição de dois (ou mais) amplos complexos de culturas de nível mais elevado e mais baixo produzirá uma rápida e contínua multiplicação de novos setores econômicos, novas ocupações, no vos ^status, na sociedade de nível mais baixo. Esta é, com efeito, a condição da grande maioria dos chamãdosTJãíi> 1(ses subdesenvolvido^) hoje. Segue-se que, em tais condições, esperarse-ia uma constante falta de jpessoal para preencher as posições emergentes da estrutura de oportunidades em expansão, porque as instituições educacionais inexistiriam ou seriam inadequadas para o treinamento. Diferentes soluções para este problema podem ser sugeridas: 1. 2.

3.

importação de pessoal; criação interna de pessoal novo mais ou menos ao acaso, especialmente por auto-instrução ou “ autodidatismo” , até que o treinamento seja curricularizado; a multiplicação das posições ocupadas por qualquer dado indivíduo.

A importação de pessoal é intrinsecamente limitada pela ofer­ ta disponível e pelo custo^da importação, apesar de servir a um número relativamente pequeno de novas posições. Também é ape­ nas uma solução temporária e incerta, uma vez que não é institucionalmente criada no interior do próprio sistema social. Mais fre­ qüentemente, poder-se-ia esperar tanto a ocupação de posições _por pessoas total ou parcialmente autotreinadas, como a ocupação de um número de posições muito diferentes por um único indivíduo, freqüentemente autodidata. Como corolário desta hipótese, esperar-se-ia que .a ocupação de múltiplas posições e o autodidat^mo fossem complementares, uma vez que um homem na posição A, em alguma organização, vendo uma nova oportunidade disponível, B, para a qual não existem 1 ocupantes, pode-se dispor a adquirir certa dose de treinamento que

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o capacitará para preencher a posição B. Em vista da natureza dos vínculos sociais mencionados na primeira hipótese, é de seu interes­ se manter conexões com a primeira organização através de seu car­ go na posição A, ao mesmo tempo em que estabelece novas conexões através da posição B. Além disso, podem existir realmente pressões para o não-abandono de A, uma vez que não há ocupantes disponí­ veis para preencher a posição que ele deixaria. Um segundo corolário é que a entrada para a posição A pode ser vista como preliminar para a entrada na posição B, ou pode preparar tal conexão mesmo quando não prevista. Isto é, A pode servir de trampolim para B. A entrada na posição A pode mesmo envolver a criação da posição A como um prelúdio para o pulo para B. Quando este é o caso, a mudança do ocupante para B faria de­ saparecer seu interesse na posição ou organização A , que morre ou permanece institucionalmente moribunda. Esperaríamos encontrar, no presente ou passado recente, certo número de tais posições ou organizações mortas ou moribundas. ' .4 pesquisarealizada no Brasil durante junho e julho de 1961 pretendeu não apenas mostrar que as instituições descritas nas Hi­ póteses existiam, mas também obter histórias de casos para ilustrar como estas^ instituições funcionam, e como opera a dinâmica inter­ na da organização.

II Podemos agora voltar-nos para a pesquisa propriamente dita. No decorrer de uma estada de duas semanas no Brasil em novembro último, algumas observãçõe^bãstante dissociadas me marcaram. À palavra “ autodidata” começou a registrar-se em meus ouvidos após ser ouvida várias vezes. 0 autodidata começou a aparecer para mim como um importante fenômeno no Brasil, como mostrou sc-lo em muitos outros países~3a América Latina que visitei. Indagando acerca do autodidata e de sua origem, o fenômeno do exercício de múltiplosjcargQs, para o qual os brasileiros têm um termo, o cabide de^ emprego, começou a assumir uma importância teórica cada vez maior. •c Os dois fenômenos pareciam, por intuição, estar significativa­ mente ligados e ambos relacionados a uma estrutura de oportuni­ dades em rápida expansão induzida por aculturação. Em tais con­ dições, tende a haver, em geral, mais posições vagas do que pessoas para ocupá-las. Ambos os fenômenos, o do autodidata e o do cabide, pareciam ser funções desta situação, altamente adaptadas a ela, e

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de grande utilidade para as operações interi^ts da sociedade, não importa como as pessoas se sentissem acerca de seus excessos. Hipoteticamente, argumentei^ gue o cabide deveria representar um vínculo social numa sociedade em que, devido a sua rápida transição, os vínculos contratuais padronizados de uma sociedade industrial totalmente organizada ainda não se desenvolveram ou foram organizados. O cabide se tornaria possível pela ausência do que podemos chamar de trajetórias curricularizadas para os status como as que, em sua maioria, caracterizam a sociedad.e expansivoindustrial avançada. 0^ fenômeno do autodidata pareceria ser fun­ ção desta falta de curriculaxizagão. Üma vez que, hipoteticamente, o cabide parecia ser um vínculo social importante, e a curricularização parecia estar amplamente aysente? levantou-se a questão de quais eram os mecanismos íntimos pelos quais o cabide surgia e como, uma vez surgido, ele operava no sentido de interligar várias entidades organizadas na sociedade brasileira, em grande parte frutos de aculturaça0)ou difusão das so­ ciedades altamente industrializadas, entidades tais como instituicoes burocráticas, novos setores de universidades, estruturas admi­ nistrativas, serviços públicos, etc. Foi para rejeitar ou confirmar as hipóteses e para responder a essa questão que a pesquisa foi em­ preendida. Todavia, uma vez que várias esferas convencionais da socie­ dade, como a burocracia, o Exército, a Igreja, o mundo de negócios, etc. permaneceram praticamente não descritos em sua organização interna ou em suas inter-relaçÕes, foi. necessárioJesenvolver algum tipo_de_ modelo^ operativo para avaliar as atividades do autodidata e 3o cabide. Para este íim, julguei útil o^modelo apresentado pelo Ur. Anísio Teixeini,4 embora na época achasse que ele não correspon­ dia ao que eu conhecia do Brasil a partir de meu trabalho de cam­ po prévio. Apesar disso, já havia, há muito, aprendido que as per­ cepções de Teixeira geralmente davam muitas dicas úteis para qualquer fenômeno em discussão. Além disso, o modelo, por sua própria desarticulação, era estruturalmente compatível com o fenô­ meno do cabide. Assemelhava-se ao diagrama apresentado no Quadro 1. (Concebi os cabides, todo o tempo, como ligando estas oligarquias*, fornecendo sua organização interna e entrelaçando as várias esferas da sociedade acima mencionadas. Ao mesmo tem-

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4 Teixeira, 1962 e conversas. * Na concepção de A nísio Teixeira, as entidades a que ele se refere com o oligarquias e grupos de interesse incluem não apenas "o s poucos” , mas aqueles “ muitos” que estão organizacionalmente ligados aos primei­ ros, Teixeira usou também a expressão “ grupos de pressão” para estas entidades (Teixeira, 1962, Revolução e Educação, m im eo.).

Quadro 1

M odelo do Dr. Anísio Teixeira da Estrutura de Poder Brasileira: Relativa a Grupos Políticos de Pressão

N ota: Deve ser assinalado que cada coluna representa um grupo de pressão ou oligarquia que é descrita com o operando na cúpula acima dela. Devia também ser observado que os indivíduos, qua indivíduos, que com« põem as oligarquias não estão necessariamente em níveis de salários, pres­ tígio e poder comparáveis: estes critérios de estratificação com uns são social-estruturalmente irrelevantes aqui. A s linhas pontilhadas representara os níveis de “ classe” dentro das oligarquias.

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po, eles fornecem os nós sociais cujas interconexpes complexas criam a divisão entre o que, por conveniência, podemos chamar de “ clas­ ses” e “massas” . No_ Brasil, esta divisão entregas “ massas e _as. “ classes1^—foi chamada de “'colonização interna já jjue? em sua essência^ ela está muito próxima da relação entre a naçao colõnizãdora e o jgovo colonizado, ambas ocupando todavia o mesmo território. É uma si­ tuação encontrada em todos os países americanos, inclusive os Es­ tados Unidos, onde grandes populações nativas foram conquistadas, ou nos quais grandes populações escravas forain introduzidas na po­ sição social equivalente àquela das populações conquistadas. _Já que as “ massas” são a base e toda a fonte da economia interna das ^classes” , os sistemas totais são muito mais resistentes a mudança do que no caso das colônias, que constituem uma economia com­ plementar a economia doméstica do país colonizador. Nas condições latino-americanas, o “ colonizado” e os ^colonizadores” não podem separar-se fisicamente um do outro, com a possibilidade subsequen­ te do estabelecimento de inter-relações independentes, simplesmen­ te porque as classes existem no mesmo território que as jnassas e sem outro acesso aos_recursos fundamentais..0 Aqui, estamos preocupados sobretudo _çom_a estrutura interna ' e com a dinâmica das classes, e mais jispecijícamente com a entrada para as2 e com as operações das mais altas posições jao_intcrior dãs classes. As massas estão suficientemente separadas das classes, de modo que sua organização- interna e sua dinâmica são irrelevantes .para a descrição das classes. Elas requerem uma descrição separada, descrição essa que valeria a pena ser feita, uma vez que as massas vsão praticamente desconhecidas no Brasil e em outros países. Nem mesmo sabemos se há diferenciações hierárquicas estruturais no interiõF das jnassas. III Uma vez que as hipóteses gerais afirmam que as conexões en­ tre organizações, as ligações entre oligarquias e a organização in­ terna das classes mantêm-se através de vários tipos de conexões pes5 Teixeira» 1953, 1957, I960, 1962; também conversas, 3951-2, 1961, 1962. Cf* também Leeds, 1957. O term o “ massas” é tom ado de Teixeira, mas o de “ classes” é meu. "Classe” talvez descrevesse melhor a situação, pois não há clara separação em subdivisões. 6 Os Estados Unidos têm ambas as situações, contribuindo para extre­ mas tensões dos dois sistemas que se atravessam um ao outro, em con-

• flito.

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soais, e também que se esperaria o movimento de posição para po­ sição e a ocupação de muitas posições por uma única pessoa, seguiuse que a maneira mais incisiva de descobrir os mecanismos inter­ nos do sistema era acompanhar as carreiras dos indivíduos enquan­ to se movem através de suas histórias de vida, estabelecendo cone­ xões e movendo-se de entidade social para entidade social. Conse­ qüentemente, a primeira técnica de pesquisa consistiu em entrevis­ tas com informantes selecionados possuindo as características do cabide e freqüentemente autodidatas. Era nosso plano selecionar casos de todas as esferas importantes ou de todas as oligarquias im­ portantes. Desejávamos também selecionar representantes de cada_ gera­ ção, de formada, mostrar o aumento da clirricularizaçao em qualquer esfera a partir do momento em que tal esfera se tenha estabelecido. A hipótese pode ser aqui apresentada através do diagrama do Qua­ dro 2, Tomando representantes, digamos, de três gerações de carrei­ ras com relação a qualquer tipo de atividade, deveríamos ser capazes de documentar o processo real de mudança da sociedade no sentido de uma maior organização, do qual o treinamento curricularizado para posições sociais é um sintoma., conforme aumenta a dedicaçãoaos fins intrínsecos à carreira. Em terceiro lugar, dado que até muito recentemente o Brasil possuía províncias e estados relativamente autônomos, ecológica, eco­ nômica e historicamente muito diferentes, segue-se que as estruturas sociais em si mesmas e como contextos para carreiras deveriam dife­ rir amplamente. Na verdade, elas podem ser colocadas numa escala hipotética de desenvolvimento e atraso. Poder-se-ia esperar que uma ordenação dos estados brasileiros fornecesse uma representa­ ção espacial do desenvolvimento da organização social brasileira, en­ quanto que as carreiras estudadas numa seleção de tais estados re­ fletiriam esta ordenaçao. Escolhemos as cidades de Sao Paulo, Rio de Janeiro, Belo Ho­ rizonte, Recife e Salvador como representando supostamente uma série de estados decrescentemente desenvolvidos em termos indus­ triais, financeiros e políticos, ou crescentemente arcaicos em compor­ tamentos, costumes, e ideologias. Incluímos também Brasília em nossa amostra, uma vez que é a sede do poder do qual fluem todas as boas coisas brasileiras, e nenhuma realidade brasileira pode ser entendida sem um exame da “ cúpula” , tal como passou a ser chama­ da popularmente no Brasil de hoje. Em cada cidade, estabelecemos contatos com um ou mais cida­ dãos bem informados de posição proeminente que foram persuadi­ dos a dar-nos listas dos cabides locais importantes, com tanta infor-

Quadro 2 A Evolução do Treinamento e dos Objetivos das Carreiras

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mação quanto possível acerca de cada um com relação às suas cone­ xões — uma descrição sumária dc sua carreira, passada e presente, e de sun genealogia social. Sempr^ qugpoMÍyej, tentávamos obter uma introdtii;ã0 wpes5i>aL ou ao menos escrita, ou marcar encontros através 'de-intermediários 'que nos conheciam tanto cpianto aos jn formantes. Onde este procedimento foi seguido, a cooperação nun­ ca falhou; onde não foi — onde, por exemplo, tínhamos que nos apresentar nós mesmos — éramos geralmente evitadas. A_ influênfciadas apresentações pessoaia_e.de. intermediários foi uma das me(Ihores evidências da significação dos. laças_ pessoais na sociedade (brasileira, pois que foi forte e suficiente pura abrir portas que le­ varam a considerável intimidade mesmo entre estrauhos totais. Cada entrevista sc iniciava pela minha explicação do que está­ vamos tentando descobrir e pelo pedido de cooperação dos infor­ mantes. Em algum ponto desta ,troca~introdutórijf, o informante in­ troduzia invariavelmente algum aspccto de sua própria experiên­ cia. Usávamos isso como uma brecha para penetrar na história da vida inteira. Uma entrevista ideal consistia de muitas sessões, com o intervalo de alguns dias para termos tempo de rever nossas notas e de formular questões que queríamos respondidas. Algumas en­ trevistas tiveram que ser feitas em uma unica sessão. Estas estao, invariavelmente, cheias de lacunas. Q grupo^e pesquis^ composto por dois psicólogos brasileiro^) c .por_mim, conseguiu em seis semanas reunir quinze entrevistas com­ pletas, muitas entrevistas mais curtas, e um ou dois relatos de car­ reiras bastante detalhados acerca de certas pessoas a partir de seus conhecidos. Sempre que possível, tentávamos conferir os dados dos informantes a partir de outros informantes que os conheciam c de quem geralmente possuíam também dados adicionais substanciais.. Três outras fontes de dados deveriam ser mencionadas, cada uma das quais forneceu uma verificação de todas as outras e das entrevistas. Eu_recoito_ya-sistematicamente jornais, por um lado para dados relacionados às oligarquias e esferas sociais,^ por ou­ tro lado, para dados acerca das carreiras e carreiristas e suas ope­ rações. Curiosamente, os jornais eram geralmente muito generosos em seu suprimento de material sobre carreiras. Todo domingo, durante um ano, o Jornal do Comércio de Recife publicou algumas biografias de carreiras. O principal jornal de ürasilía~tmha uma coluna diária que dava biografias curtas de carreiras. A puhlicação de histórias de carreiras ocorria com algumas freqüência na maioria dos jornais brasileiros. Em segundo lugar, tentamos encontrar informantes que pa­ recessem muito bem relacionados corn a organização econômica, so-

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ciai e política local e com aqueles que ocupassem posições nesta or­ ganização. Destas pessoas, tentamos obter o ipaior número possível de informações acerca das operações, sociais locais, através de casos e relatos sobre o comportamento do pessoal em questão. Este tipo 4e informação mostrou-se, com efeito, geralmente muito mais^rico, já que, por motivos explicados mais adianle^muitas das operações e ãto$_ pessoais tornavam-se conhecidos através dos vínculos mais ^al! tos, apesar de sua aparente privacidade — uma privacidade que é, na verdade,_sempre potencialmente e propositalmente pública. 1 ATterçeira fonte^de informação foi o materialjgublicajp. Aqui podem ser incluidos, certamente, estudos da organização econômica e social brasileira. Todavia, mais úteis são itens como õs anais do Congresso, em cujas discussões publicadas podem ser discernidos os principais grupos de interesse do país; análises da organização bu­ rocrática e política do país; estudos do comportamento eleitoral, e assim por diante. De grande interesse também são livros com moti­ vos inconfessos, como o elogio de Niemeyer a Juscelino Kubitschek sob o pretexto de discussão de suas experíências~em Brasília, 7^_e rç^ vistas cujos artigos principais_são pagos por grupos de interesse. 1 r.: i~.~~ ' IV A seguir, tentarei apresentar uma sinópse dos nossos achados e discutir suas implicações. Em primeiro lugar, devia ser observado que o conceito e a palavra cabide existem apenas na comunicação informal. No de­ correr da pesquisa, além disso, dçscobri que havia_toda^ j.uua lin* guagem existente apenas na com unicado JnformaL da carreira o de seus aspectos estruturais. Todavia, a carreira e o cabide não eram as únicas unidades estruturais a serem descritas no discurso informal, familiar a qualquer um. Descobri. Jambém_a j)arielinha> çijja relajao com as carreiras c os cabides ninguém observara an'teriormen|e._Por_ora, a panelinha pode ser definida como um gru­ po relativamente fechado, çmnplelamentc informal, reunido por la­ ços de amizade, contato pessoal ou interesse comum, agindo para fins comuns e incluindo uma relação de todas as posições sócio-po(lítico-econômicas chaves,. " " Õ fato deéjsas unidades sócio-estruturaiã) que são tão vitais no Brasil, serem conhecidas apenas pelo discurso informal é em si mesmo um reflexo da faj.t§^4®- purricu]ãrízaçao e fprrna]izaçap_ uma área de lati­ fúndio da zona monocultora no Sul da Bahia; o segundo estudo envolveu o trabalho em uma série de cidades, o estudo de elites, e o terceiro foi nas áreas da classe trabalhadora urbana. Em outras palavras, trabalhei em vários setores da sociedade tentando obter diferentes perspectivas da estrutura institucional total, escolhendo vários pontos do sistema^total. “— —

* A fílha de Flexa Ribeiro é casada com um dos filhos de Carlos Lacer­ da. (N . da R . )

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® que tento fazer nos comentários que se seguem é dizer alfum a fioisa sobre o quadro geral que empreguei, que é também n á ef& ie^ à ra a questão da relação entre as áreàs agrícolas e urh&m& S(L$jaç;ente a muito do meü pensámento neste tópico está de que as distinções geralmente feitas entre os • sfifnrw, e urbanos da sociedade sao errôneas. m . "Ê m e i-ê e mais nada, sugiro que o grande mercado de trabaÉ o metrpjpplitapo da cidade é um mercado de trabalho nacional, ítfu seja* Se configura a partir da política total e por vezes de além ideia A utilizaçao por Andrew Pearse do termo “ vendendo traba­ lh o à distância” reflete muUo bem o que tenho em mente. Creio que i muito característico das cidades o fato do que, na verdade, èlas séjam mercado de trabalho ao menos para todo um segmento do estado, ou de todo o próprio estado; a migração internacional estã associada ao fato de sereni elas mercados de trabalho para áreas ainda maiores. Meu segundo ponto é •**I o

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peeializados que devem estar numa contiguidade imediata entre si. Economicamente, a cidade é o ponto mais denso de transação «ntre especialistas. Na verdade, evidentemente, a cidade compre­ ende a interação de todas essas especializações, de modo que há interações sociais, tecnológicas e econômicas ocorrendo ao mesmo tempo. Minha tese é de que elas são mais efetivamente valorizadas no menor espaço possível; em geral, este, então, é um argumento que se refere ao que se pode chamar de intensividade espacial de atividade. A cidade, ecologicamente e em termos de localização, encontra-se em algum ponto geograficamente muito adequado a certos conjuntos ou a um conjunto preeminente de especializações. Por exemplo, com a substituição do transporte por terra pelo trans­ porte por mar, um porto se desenvolve, com um conjunto de es­ pecializações girando em tomo de atividades de navegação e pro­ cessamento, e com as especializações econômicas e sociais corres­ pondentes ligadas a elas, possivelmente com o serviço de recursos de embarque e outras atividades comerciais a ele vinculadas. Então, há o ponto (mais ou menos óbvio, mas que é útil co­ locar) de que o aparato físico de todas essas especializações — os edifícios, sistemas de transportes e instrumentos importantes • — são os elementos visualmente marcantes que prontamente reco­ nhecemos como uma cidade, e por vezes mesmo definimos como uma cidade, erroneamente, creio, porque são apenas propriedades físicas e não as meras características essenciais “ do que é” uma cidade. Em suma, uma importante característica da sociedade em geral e a de que ela é feita de especializações. Através de proces­ sos evolutivos, mais e mais especializações se desenvolvem e, con­ seqüentemente, há mais e mais concentrações de especializações de modo espacial-intensivo. Quanto mais especializações existem, maior a concentração espacial-intensiva, maior a massa e maior a pene­ tração em áreas não espacial-intensivas. Volto-me agora para as áreas que sao espacial-extensivas. Existem poucas especializações importantes, no interior da gama total de especializações culturais, que não podem, sob qualquer tecnologia atualmente conhecida, ser limitadas a áreas pequenas nem localizadas tendo como referência os determinantes ecológi­ cos de localização urbana. Há basicamente três delas — agri­ cultura, mineração e pesca. Sob as atuais condições, elas são ne­ cessariamente espacial-extensivas. Todavia, eu argumentaria que as transações mais importantes que envolvem essas atividades não estão nas áreas físicas de especialização, nas áreas rurais e agrá-

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rias, mas nas cidades. A maioria das decisões políticas e as ins­ tituições de coordenação mais importantes da agricultura estão concentradas nas cidades; tais instituições são urbanas (assumin­ do momentaneamente que a dicotomia rural-urbano tenha algum valor) e de forma alguma instituições propriamente rurais. Segue-se que os traços essenciais — os controles, as decisões, as políticas básicas, as instituições monetárias centrais, o sistema de créditos e mercados para a produção agrícola — devem ser buscados nas cidades, e nao nas áreas de especialização espacial-extensivas. Esta última não pode ser entendida sem uma rigorosa descrição da primeira. Isto é, nunca se compreenderá plenamente um sistema agrícola se não se observar o que está ocorrendo com relação àquele sistema nas áreas de coordenação que sao as cida­ des. Mesmo o sistema de posse da terra não pode ser plenamen­ te entendido sem referência às transações fundamentais e de con­ trole nas cidades. Através da evolução do tempo, torna-se “ útil“ desenvolver instituições de coordenação a que chamamos “ governo” e “ admi­ nistração” . Mesmo entre estas, há elevados níveis de instituições de coordenação, a que chamamos “ governo” e “ administração” . Ora, estes órgãos de coordenação central estão também refletidos nas estruturas da cidade, de modo que encontramos, por exemplo, cidades administrativas que podem estar ou não ligadas ao siste­ ma de transação total da sociedade. Por exemplo, Brasília é uma cidade muito peculiar no sentido de que as especializações admi­ nistrativas e de coordenação estão mais ou menos separadas do resto das especializações da sociedade. Lá não existe praticamente nem uma indústria e nenhum comércio, exceto pequenos negó­ cios e lojas para consumo. Camberra é outro exemplo, e Was­ hington, DC, um terceiro. Novamente, sem a compreensão de onde e como as funções administrativas se concentram, é impossível, dar uma explicação coerente da situação da agricultura em qual­ quer época ou espaço particular. Assim, em vez de ver a agricultura como um setor separa­ do, idéia que nosTói- fõrmilmènlê impingida pela dicotomia entre Sociologia Rural e Sociologia Urbana (embora tenha mudado con­ sideravelmente nos últimos anos), vejo uma única estrutura na .qual a agricultura é simplesmente outro elemento do sistema toí/ tal de especializações da sociedade. Conforme a sociedade^ se torna jmãis urbanizada a agricultura também se torna mais urbanizada^ 1Creio que é correto falar de agricultura urbanizada, por exemplo, com relação à agricultura americana, na medida em que institui­ ções tais como o Departamento de Agricultura e todas as institui­

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çÕes importantes do governo nacional, as universidades, mercados e outras instituições centradas na cidade penetram no campo. Resumindo, creio que toda a noçao de “ urbano” foi histori­ camente jconcçfcida. basicamente, em termos do aparato físico da cidade, mais do que da estrutura institucional da sociedade. Par. rece mais próximo da_verdade dizer que muitos subsistemas espe­ cializados de uma sociedade nao são nem urbanos nem , rurais., mas societais, e que conforme a sociedade se urbaniza, o mesmo acontece com os subsistemas. Bibliografia Nota: 37.° iça refere-se a um grupo de trabalhos lidos em um sim­ pósio sobre Antropologia Urbana no 37.° Congresso Interna­ cional de Americanistas, Setembro, 1966, em Mar del Plata, Argentina. Estes trabalhos, mais o de Modesto, seráo publica­ dos sob a direção de A. Leeds, pelo Instituto de Estudos La­ tinos Americanos, Universidade do Texas. Abrams, Charles 1966 Squatter Sttlements: The Problem and the Opportunity. Washington: Departament of Housing and Urban Develop­ ment, Div. of International Affairs. Bonilla, Frank 1967 “ Power and Social Class11, in A . Leeds, org., Social Struc­ ture, Stratification and Mobility. Washington: Pan American Union, Bonilla, Frank 1961 “ Rio’s Favelas: The Rural Slum within the City” , Reports Service 8 ( 3 ) : 1-15, Amer. Universities Field Staff. 1962 “ The Favelas of Rio: The Rundoon Rural Bairro in the City” Dissent, 9:383-386. Briones, Guillermo 1963 “ Movilidad Occupacional y Mercado de Trabajo en el Peru” . America Latina 6(3):67-76. Browning, Harley e Waltraut Feindt 1967 “ Natives versus Migrants: A False Dichotomy?” , Popula­ tion Research Center, University of Texas. Browning, Harley e Elizabeth e Jorge Balan 1967 Movilidad Social? Migracion y Fecundidad en Monterey Metropolitano. Monterey e Austin: Centro de Investigaciones Económicas de la Universidad de Nuevo León e Population Research Center, University of Texas. Caplow, Theodore, Sheldon Stryker e Samuel Wallace

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V Tipos de Moradia, Arranjos de Vida, Proletarização, e a Estrutura Social da Cidade 1 A nthony

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Conforme se examina a literatura de várias disciplinas sobre as cidades* observa-se que elas tendem a ser concebidas, como na arquitetura ou no planejamento urbano, como entidades físicas e aparatos (edifícios, espaços abertos, sistemas de esgoto, redes de comunicação, etc.) ou, nas ciências sociais, como o pano de fundo diante do qual várias categorias de interesse para as respectivas disciplinas (parentesco, migração, comportamento político, vida associativa, etc.) devem ser observadas, ou ainda, nas disciplinas estéticas, como expressões na forma e no desenho de tendências ideológicas maiores de uma sociedade. Minha própria visao orientou-se de modo crescente no sen­ tido de ver aquilo que chamamos de “ uma cidade” , a localidade mais ou menos discretamente delimitada, pequena ou grande, como uma combinação de estruturas sócio-político-econômicas e do aparato físico (acima citado) utilizado no seu funcionamento. O aparato físico reflete a ordem social e ideológica, se bem que sem­ pre de modo lento, porque sua mera concretização física se presta à perpetuação, enquanto a ordem social está mudando a sua volta. Conseqüentemente, o interesse primordial no estudo das cidades, exceto talvez paxa a estética, é não tanto o aparato físico, mas a es­ trutura social da cidade e a estrutura societal que, como um todo, lhe é subjacente. 1 Publicado originalmente in Lotin America Vrban Research, vol. IV, 1974, Wayne Cornelius e Felicity Tineblood, orgs.

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Um tema deste trabalho, então, é mostrar, ao menos para al­ guns casos, que o aparato físico é, num grau abrangente, um re­ flexo ou cristalização da ordem societal e de seu subsistema cida­ de. Um segundo tema é seguir que as ordens societais de socie­ dades construídas de acordo com o capitalismo e suas manifesta­ ções sócio-estruturais nas cidades envolvem necessariamente a proletarização, embora a proletarização seja, em si mesma, um pro­ cesso dual por ser amplamente um resultado da luta pela automanutençao das elites d a (s) classe(s) capitalista(s) e da compe­ tição capitalista pela propriedade privada como meios de auto-engrandecimento pessoal e de controle social. Algumas conseqüên­ cias secundárias desse processo total serão enfatizadas no decorrer da discussão. Um terceiro tema é sugerir, como conseqüência do argumen­ to precedente, que as políticas e planos para cidades criados por seus próprios órgãos políticos ou por aqueles de nível mais eleva­ do são necessariamente não-efetivos, irrelevantes, ou mesmo de­ sastrosos, e que o planejamento urbano pode, na melhor das hipó­ teses, ter apenas uma eficácia muito limitada se, por um lado, não lida explicitamente com as estruturas sociais globais da cidade na primeira linha de ataque, e, por outro, com as condições nacionalsocietais que afetam o sistema da cidade, como pressões, restrições e exigências. Volto-me, primeiramente, para alguns aspectos físicos, espe­ cialmente a habitação, do Rio de Janeiro e outras cidades, e, en­ tão, para alguns dos aspectos sócio-estruturais envolvidos na mora­ dia e sua localização diferencial na cidade. A Especialização da Moradia no Rio Uma das coisas marcantes no Rio, da mesma forma que em grande número de cidades da América Latina, como Lima, Cara­ cas, Bogotá, e Santiago,2 é a especialização dos tipos de moradia. Para a maioria dos leitores, os tipos familiares compreendem as “ melhores áreas residenciais” , os bairros sabidamente de “ clas­ 2 Estas estão citadas na ordem da minha intimidade de conhecimento, seja em virtude do trabalho de campo, ou da revisão intensiva da litera­ tura. Também visitei algumas outras cidades como Salvador, San Juan, Ciudad Guyana, Bela Horizonte, São Paulo, Curitiba, R ecife, o suficiente para ter um quadro mais ou menos detalhado, embora algo superficial, de cada uma.

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se média e média-alta” de Copacabana, Flamengo, e algumas ou­ tras partes da Zona Sul do Rio, à margem do Atlântico, bem como a Tijuca c o Grajaú, na Zona Norte; e as “ favelas” ou áreas inva­ didas por posseiros.3 Diferenciações paralelas devem ser encontra­ das em cada uma das cidades acima mencionadas, embora repou­ sem em categorias e terminologias de folk que variam de lugar para lugar, A favela no Brasil e, mais geralmente, as áreas invadidas por posseiros em qualquer lugar do inundo são mencionadas como rnn “ problema” de modo análogo aos “ problemas” dos “ guetos urbanos” das áreas pobres, dos “ imigrantes rurais” , da “ marginalização” , das minorias étnicas, e da “ cultura da pobreza” , tão freqüentemente encontrados nas mentes e falas dos povos em ques­ tão por todo o mundo. Essencialmente, tudo isso se refere a as­ pectos diferentes do mesmo problema — a proletarização discuti­ da neste trabalho. As favelas são concebidas como um problema •— como o fo­ ram as bairiadas de Lima, os arrabales de San Juan, os ranchos ou barrios de Caracas, as callampas de Santiago, as villas misérias de Buenos Aires, etc. — porque, presume-se, suas populações se constituem, num dos extremos do mal, de assassinos, ladrões, as­ saltantes, maconheiros e viciados em drogas; em um outro extre­ mo do mal, de comunistas e outros tipos de ameaças em termos políticos e sociais; num terceiro e mais brando extremo, de pobres ignorantes, não-educados, mal-adaptados, imigrantes rurais caipi­ ras; ou, no melhor dos extremos, de seres humanos razoáveis, mas tristes e pobres, morando em cabanas, criando promiscuidade um câncer social e urbanístico na cidade.4 Mostrei alhures5 que quase todas estas concepções são falsas ou distorções drásticas das realidades, mas quero realmente enfa­ tizar que as favelas, “shanty-towns”, “ áreas invadidas” , áreas ur­ banas de moradia não autorizada, chamem-nas como quiserem, são geralmente a forma visível mais marcante de moradia a ser obser­ vada.

3 Cada um dos termos locais está grafado em itálico em sua primeira utilização; se usado mais vezes no trabalho, é tratado subseqüentemente com o uma palavra comum. Definição e discussão extensivas sobre favelas podem ser encontradas em Leeds (9 6 9 ), e não serão repetidos aqui. 4 Para documentação de tais visões, ver Leeds e Leeds (1972), especial­ mente os apêndices. 5 lbid,, também em Leeds (1969, 1970 — com E. Leeds — , 1971, 1873b).

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Não tão visível e geralmente visualmente difícil de ser des­ coberta e distinguida é uma série de outros tipos de construção de baixa renda ou de bairros residenciais que permanecem — como se não existissem — quase que totalmente nao-descritos, não apenas na literatura relativa ao Rio, mas naquela relativa a outras cidades latino-americanas, onde habitações equivalentes existem.6 Em primeiro lugar, dentre estes tipos de moradia, comprcepdendo cerca de um quarto a meio milhão de pessoas, ou por volta de 5 % da população do Rio e uma percentagem muito maior em Lima, estão as casas de cômodos ou cabeças de porco, no Brasil, e casas subdivididas, em Lima. Estes termos referem-se a uma única cons­ trução grande, de vinte, oitenta, ou mesmo cem apartamento de um ou dois quartos. São geralmente ocupados por lares compostos de famílias nucleares, subnucleares ou levemente nuclear-extensas* e raramente por indivíduos ou pelo que no Rio se chamam “ repúbli­ cas” — grupos de pessoas solteiras do mesmo sexo dividindo o alu­ guel ou todas as despesas do lar. A maior parte deste tipo de cons­ trução, no Rio, originou-se no século passado, mas algumas se trans­ formaram a partir de outros tipos de construção ou ampliaram-se vá­ rias vezes neste século até o presente. Sao construções destinadas quer originalmente, quer em sua conversão, a habitação de renda muito baixa, especialmente para explorar pessoas ou grupos de pes­ soas que precisam estar próximas do mercado de trabalho, mas não podem pagar por outros tipos de acomodação, ou não tinham, como se argumentará abaixo, capital para acomodações em áreas invadi­ das, e, deste modo, eram forçadas a pagar aluguel. Seja no Rio, lJma ou alhures, essas casas apenas recentemente começaram a ser estudadas, de modo que não sabemos praticamente nada a seu res­ peito, embora a impressão indique que internamente têm alguns Iraços comunitários.7 Um segundo tipo de construção no Rio, talvez constituindo ou­ tros 5 % , é a chamada avenida ou vila, com vários adjetivos qualifi­ cativos tais como proletária, de lavadeiras, etc.8 Em Lima, o equiva­

6 Ver Lewis (1959 e outros); Patch (1961); Selmen (1971); Azevedo (cerca de 1891); Ecksteín (1972); Banco Obrero (1959). 7 Isto parece claro a partir de alguns escritos de Oscar Lewis — por exemplo, Lewis (1969). 8 Um tipo relacionado a este é o cortiço, hoje quase extinto, discutido mais adiante no texto. Outro ainda encontrado tanto no R io, com o em Lima, é a quinta, casas muito pequenas ou grandes apartamentos ligados em torno de um jardim ou pátio central.

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lente é o callejón; no México, a vecindad;9 no Chile, o conventillo; em Santo Antonio, o corrál (e em Midlands da Inglaterra, onde talvez se originou, o “ back-lo-back''), etc. Consiste numa série hori­ zontal de unidades de um ou dois quartos alugáveis, servidos todos por três ou quatro banheiros e um número semelhante de bicas e tanques de lavar. Há o que deve ser uma área comum — o pátio central, alongado, e as entradas. No Rio, esse tipo é quase que to­ talmente não estudado, e falta informação acerca dos poucos estudos, tais como o de Patch para Lima e o de Lewis para a cidade do Méxi­ co, uo que se refere a aspectos como a área de uso comum, distribui­ ção interna, e assim por diante.10 No Rio, a mais antiga variante co­ nhecida, chamada de cortiços , herança do século passado, tinha uma proporção bastante elevada de ocupantes solteiros em muitos dos apartamentos, especialmente no segundo andar. O tamanho médio das famílias é de 3 pessoas, em contraste com 4,6-4,7% das favelas, e um tamanho quase sinjilar para as casas de cômodo.11 Aqui, como nas casas de cômodos, pagam-se aluguéis. Um terceiro tipo no Rio é o parque proletário , ou, no Chile e em outros países, a vila de em ergência — habitação governamental temporária (com maior freqüência “ temporária” ), cujo objetivo é proporcionar tetos e paredes a pessoas sem abrigo devido aos reno­ vados ou drásticos acidentes urbanos que ocorrem com as áreas invadidas, como enchentes e incêndios. Há pouco ou nenhum dado ô O termo vecindad significa “ bairro", mas é usado nos trabalhos de Lewis referindo-se a muitos tipos diferentes de moradia. Aquele do qual ele dá de longe a maior quantidade de dados é o tipo descrito no texto. Ver Lewis (1959, 1969). 10 Minhas fotografias dos callejones em Lima, e visitas a casas de côm o­ dos e avenidas no R io, pobremente documentadas em termos fotográfi­ cos» indicam muita atividade econômica nesses locais: lojas» casas de consertos, serviços, pequenas indústrias, com o sapateiros e tipógrafos, e assim por diante. Creio que a descrição de Patch (1961) ou foi distorcida ou era de um callejón atípico. As descrições de Lewis tendem a superesti­ mar o dramático, o digno de piedade e compaixão, e subestimar a eco­ nomia e as estruturas sociais dos lugares que ele descreve, mas mesmo em suas referências rascunhadas e no material do texto encontram-se indi­ cações de tais economias internas, embora não o bastante para avaliar sua importância qualitativamente. 11 Para detalhes sobre as casas de cômodos, ver Salmen (1971); o tama­ nho médio da unidade familiar para os cortiços foi retirado das estatístU* cas obtidas em um survey de cortiços feito por dois estudantes do Museu Nacional, Departamento de Antropologia, R io. Praticamente toda esta­ tística demográfica de favela apresenta os númeroe 4,6 — 4,7. Os dados das casas de cômodos foram extraídos de um survey feito por dois outroi estudantes da Antropolgia do Museu, e de Salmem (1971:156).

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paia o Rio referente a este tipo,12 e não sei de nenhum para outros países. Nem mesmo estou certo de que se pague aluguel, embora te­ nha a impressão de que, oficialmente, o aluguel deve ser pago, mes­ mo que, na prática, freqüentemente não o seja. Não vi nenhuma estimativa do número de pessoas nos parques proletários. As unida­ des habitacionais, como nas favelas, são ocupadas principalmente por grupos familiares, mas entrar nelas é um problema complexo que envolve a solicitação a burocratas ou instituições para a cessão de uma unidade habitacional — um procedimento muito mais cons­ trangedor do que entrar para uma favela, embora não se exija cnpitaL Um quarto tipo chama-se, no Rio, conjunto, com termos equi­ valentes em outros países. Há vários tipos de arranjos habitacionais chamados conjuntos, mas o termo sempre se refere a um estabeleci­ mento multiunitário de algum tipo. Restringi-lo-ei aqui a um único edifício de muitos andares ou um conjunto de edifícios compostos de múltiplas unidades alugáveis como as unidades vacinales de Lima ou os famosos (ou infames) superhloques de Caracas — o equiva­ lente dos altos projetos habitacionais urbanos norte-americanos cons­ truídos pelas companhias de seguro. Ao outro sentido do termo con­ junto —- tipo de habitação multiunitária, cada unidade ocupada por uma única família — voltarei mais adiante (ver vila). Os conjuntos no Rio, Lima, Caracas e outras cidades têm algu­ mas características que os tornam particularmente interessantes e, freqüentemente, levam à fusão como categoria para análise, embora aqui, novamente, exista muito pouca literatura além do estudo finan­ ciado pelo Banco Obrero de Venezuela (1 9 5 9 ). A primeira é que o termo conjunto é sociologicamente bastante enganoso, porque o pes­ soal morador é muito diverso no que se refere a qualquer categoria sociológica padrão, como classe, estrato, grupo étnico, ou salário, quando se observa o universo dos conjuntos. Os conjuntos, como tal, podem abrigar qualquer tipo de categoria social e o termo factual­ mente nada denota em termos sociológicos. Um estudo dos conjuntos teria que diferenciá-los segundo categorias sociologicamente relevan­ tes. Interessam aos objetivos deste estudo os conjuntos de baixo nível dc renda do Rio, espalhados aqui e ali, basicamente na Zona Norte, industrial, da cidade. Uma característica importante dos conjuntos habitados por pes­ soas de baixo nível de renda no Rio e, como eu vejo, em outros lu­ gares, é a sua especialização ocupacional, porque cada um foi cons­ truído separadamente por um órgão, sindicato, associação ou outro 12 Caldas de Moura (1969); ela também era estudante de Antropologia do Museu.

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grupo corporativo atendendo a seus membros. Desta forma, há o conjunto dos bancários, dos marinheiros, da Marinha, do iapi (o Boje extinto Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Industriários), do iapc (o hoje extinto Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Comerciários), do Pedregulho ( ftmcionários públicos), e assim por di,, ante. Assim, por todo o Rio e outras cidades, espalham-se enclaves ocupacionais residenciais. Este fato ganha significação especial em vista dos salários estabelecidos para a força de trabalho brasileira, que tendem a impor parâmetros bastante claros para a renda fami­ liar ou recursos de capital familiar, dos quais quantias igualmente estabelecidas são subtraídas através de aluguéis ou amortizações. Em contraste, não se encontra nem especialização ocupacional, nem uma faixa de renda nas favelas e outros tipos de moradia, um ponto ao qual voltarei adiante. Não existe qualquer estimativa de quantas pessoas vivem nos conjuntos, de um modo geral, menos ainda na­ queles de baixo nível de renda. Minha impressão é de que isso é da ordem de 10% da população do Rio. Um quinto tipo é constituído por vastas vilas populares — ou seja, proletários (no Rio chamam-se também conjuntos, mas mais comumente vilas), resplandecendo em nomes como Vila Aliança, Vila Kennedy, Vila Esperança, Cidade de Deus, e*mais recente e muito ironicamente, Vila Paciência e outras, no Rio; Ciudad Kennedy em Bogotá; Caja de Água e Ventanilla em Lima, e assim por (diante. As populações dessas vilas foram removidas de outras par­ tes da cidade por ato do homem ou de Deus — pela remoção da favela, renovação urbana, enchente, deslizamento de encosta, ou outro desastre. Nessas vilas, as chamadas casas “ embrião” são ven­ didas aos moradores, selecionados em virtude de sua suposta “ capa­ cidade para pagar” — as taxas calculadas de amortização baseiam-se nos custos de construção governamental — mas que são incapazes de obter melhor moradia para substituir aquela que perderam. As­ sim, os influxos de capital familiar dos moradores têm limites bas­ tante estreitos e além deles, há, aparentemente, os pagamentos» de amortização. Digo “ aparentemente” porque nas vilas do Rio cerca de 60 a 80% não o fizeram até o momento. Todas as vilas, ou um total de cerca de 250.000 pessoas ou mais, constituem cerca de 5 a 7 % da população do Rio. Deve-se observar que as principais vilas do Rio estão a 50, 60 km do centro da cidade e dos principais lo­ cais de trabalho, exigindo duas ou três conexões de ônibus ou trem e, geralmente, de uma hora e meia, a três horas de viagem de ida e volta. Praticamente nenhum mercado de trabalho, qualquer quç seja, desenvolveu-se próximo a elas. Em Lima, a distância, o custo e o cansaço do transporte são bem menos severos, mas ó mercado

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de trabalho perto de Caja de Água e Ventanilla ê praticamente inexistente. A mesma queixa era feita com relação a Ciudad Kennedy, há alguns anos, embora ela se situe a apenas 8 km do centro da cidade. Um sexto tipo compreende o que é localmente referido no Rio como “ subúrbios” , caracterizados em geral por vasto número de casas privadas separadas, bastante humildes, situadas em ruas ofi­ ciais que têm pouca ou nenhuma pavimentação, onde freqüente­ mente não há luz, o suprimento de água é pobre, há pouco ou ne­ nhum serviço de esgoto ou outros serviços urbanos. Situam-se em grande parte em regiões da cidade mais distantes do centro, mas não são propriamente subúrbios no sentido norte-americano do ter­ mo, uma vez que estão totalmente dentro dos limites jurídicos da cidade central, o Rio de Janeiro, Cada casa, geralmente, tem seu quintal ou jardim com espaço para árvores frutíferas, vegetais, ga­ linhas, porcos, e assim por diante, possibilitado pelo loteamento mais ou menos oficializado, realizado por especuladores de terra, com maior ou menor grau de observância das normas jurídicas se­ gundo sua honestidade. As áreas de subúrbio assemelham-se aos pequenos povoados municipais do interior do Brasil que se con­ fundem com as áreas agrárias circundantes, mas, no Rio, os su­ búrbios são, evidentemente, cercados pela cidade. As estimativas populacionais podem apenas ser conjeturadas, uma vez que as esta­ tísticas não são inferidas de acordo com a categoria. Eu arriscaria 10 a 15% da população do Rio. Um sétimo tipo consiste das áreas pobres propriamente ditas (tugúrios) — áreas de habitação e serviços urbanos outrora bons, hoje decadentes; quartos alugados, apartamentos, e casas; pensões, quartos e refeições sobretudo para homens, hotéis baratos para via­ jantes, bordéis, e assim por diante. Há vastas áreas assim em to­ das as maiores cidades latino-americanas, grandes extensões no Rio e talvez maiores ainda em Lima, e todas, pelo que sei, rigorosamen­ te não estudadas. Nenhuma estimativa do número de pessoas em tais habitações existe, ao que me consta: meu cálculo seria de 10% da população do Rio e talvez consideravelmente mais em Lima.13 O oitavo tipo compreende as áreas invadidas por posseiros, das quais darei aqui apenas uma descrição sumária ( ver referências acima). O único critério uniforme que distingue as áreas invadi­ das dos outros tipos de moradias na cidade é o fato de constituí*3 Há estatísticas para tugúrios em geral, mas elas não distinguem outros tipos além das áreas invadidas com o opostos ao resto, A menos que se reconheça que há uma significação para os tipos — ou seja, estratégias diferenciais de vida — > não liá razão para lhes dar estatísticas diferenciais.

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rem uma ocupação “ ilegal” da terra, já que sua ocupação não sc baseia nem na propriedade da terra nem em seu aluguel aos pro­ prietários legais. Todos os outros critérios freqüentemente usados para distin­ guir as áreas invadidas dos outros tipos de moradia apenas aplicamse parcialmente ou não-freqiientemenle. Além da ocupação, elas geralmente também não são planejadas. Isto ê quase que unifor­ memente o que ocorre no Rio, em São Paulo, e outras cidades brasi­ leiras, embora em Salvador alguns dos alagados ou invasões de la­ gos pareçam ter tido um traçado pré-concebido. Os barrios de Ca­ racas também parecem não planejados. Bogotá as tem tanto plane­ jadas como não-planejadas. Lima, todavia, é notável pelo número e tamanho de barriadas “ ilegais” que foram planejadas antes da in­ vasão, e algumas que parecem ter sido “ reguladas” antes de im­ plantação ocorrer. Devido ao padrão de desenvolvimento de melhorias habitacio­ nais encontrado nelas, é errôneo, seja no Rio, Lima, Caracas ou Bogotá, por exemplo, chamar as áreas invadidas de shantytowns,* embora muitas o sejam e outras, que nao o sao primordialmente, tenham vizinhanças que o sejam. Em alguns casos, as áreas inva­ didas, com o decorrer do tempo, transformam-se em partes regula­ res da cidade com construção padrão, através de seus próprios mo­ radores.14 Raramente é verdadeiro que suas populações sejam primordi­ almente migrantes “ verdadeiramente rurais” , apesar de muitas pessoas terem vindo de áreas mais ou menos rurais, ria maioria através de migração gradativa. Não se trata também de populações uniformemente compostas de trabalhadores marginais, lumpenproletários ou meros proletários mas, antes, tais populações apre­ sentam uma gama de estratificação que alcança até os níveis pro* fissionais, burocráticos e de negócios médios-superiores em algumas das maiores e mais evoluídas áreas invadidas, como o Jacarezinhò no Rio e San Martin de Porras (com seus bancos e instituições go­ vernamentais em Lima. Não se trata também de comunidades uni~ formes e unidas, mesmo naquelas áreas que têm associações de mo­ radores mais estruturadas. Em suma, embora as áreas invadidas por posseiros compreen­ dem um único tipo de moradia, em virtude de sua origem e da * O termo shantytcwns refere-se a áreas urbanas deterioradas, como, por exemplo, áreas onde o tipo de moradia predominante é composto de cortiços. (N. da R .T .) 14 Ver, nesta conexão, Mangin (1963); Turner (1963, 1968, 1969, 1970); Uzzel (1972).

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característica comum da ocupação ilegal da terra, e, conseqüente­ mente de seu estatuto jurídico especial diante da lei e da autorida­ de pública, como um universo, elas apresentam uma gama muito mais variada para todas as categorias de interesse sociológico do que qualquer outro dos tipos de moradia, e, individualmente, a maior parte delas é composta de áreas sociais e habitacionais bas­ tante heterogênas. Talvez 20% da cidade jurídica do Rio e 22 a 25% da comirbação do Rio (R io, Niterói, São Gonçalo, Caxias. Nilópolis, São João de Meriti, etc. — todos, exceto a primeira, que tem cerca de 4.00 0 .00 0 de pessoas, têm por volta de 400.000600.000 habitantes — um total hoje de cerca de 8.000.000) mo­ ram atualmente em áreas invadidas. Em Lima, hoje, mais de 40% da população total de cerca de 3.00 0 .00 0 vivem nas barriadas, en­ quanto que aproximadamente 50% dos 1.200.000 habitantes de Caracas vivem nos barrios.15 Finalmente, existem no Rio muitos tipos menores, como o cortiço de que falei acima e a estalagem (equivalente ao solar limeno — uma espécie de casa de cômodos) que existem apena» como remanescentes do passado; a favela de quintal, equivalente ao corralón em Lima. Os dois últimos termos referem-se a constru­ ções do tipo do barraco e outras abaixo do padrão e não autoriza­ das, erguidos com a permissão dos proprietários das casas oficial­ mente registradas na rua, geralmente como meio de obter renda através da imposição de aluguéis pela terra. Outro tipo ainda é a azotea? construída no topo de uma casa oficialmente registrada em Lima, e que não tem análogo no Rio. Nenhuma estimativa exis­ te de quantas pessoas moram em tais construções especializadas, mas provavelmente nao mais do que 1% no Rio, e u l d pouco mais em Lima. 15 Estes dados podem parecer altos. Todavia, além do fato de que as áreas invadidas na maioria das cidades crescem num ritmo tão rápido com o o da cidade com o um todo, e multo mais rápido do que as outras partes da cidade, os dados do censo quase sempre subestimam o número de moradores nas áreas invadidas, talvez porque o censo de unidade do­ méstica a unidade doméstica seja mais difícil para pessoas que não sejam antropólogos obsessivos, talvez porque mapear tais locais para fazer um censo de unidades doméstica a unidade doméstica ou de amostragens seja com freqüência excessivamente difícil, talvez porque seja por vezes po­ liticamente desejável subestimar o tamanho dessas populações. Todavia, se acrescentamos as estimativas tiradas de várias fontes, se as conferi­ mos com o nosso próprio julgamento visual, os dados mais elevados pa­ recem mais do que razoáveis.. Acreditamos mais neste tipo de estimativa por sua correspondncia com dados derivados de áreas invadidas, a partir de um survey de unidade a unidade doméstica, cuidadosamente rea­ lizado.

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testa forma, aproximadamente 70% da população da cidade _jó de Janeiro e uma percentagem comparável em Lima e Caranioram em habitações que, com exceção de algumas áreas mais uídas, sã° quase
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