Jodelet. Alteridade Como Processo e Produto Psicossocial
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Esquema de apresentação do texto Alteridade como processo e produto psicossocial, de Denise Jodelet....
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A alteridade como produto e processo psicossocial Jodelet afirma que a questão da alteridade se insere em várias disciplinas e que interroga certas ciências sociais há muito tempo, como é o caso da antropologia desde os seus primórdios e a sociologia em seu período clássico. No caso da psicologia social, a problemática da alteridade não interessou muito. Essa disciplina preferia lidar com as formas concretas pelas quais a alteridade é percebida, como as relações raciais. Segundo a autora, isso impossibilitou a elaboração de um modelo que permitisse entender a alteridade como produto e processo psicossocial. Essa situação perdurou até a abordagem das representações sociais emergir nesse campo e fornecer os meios de se levar em consideração as dimensões simbólicas da alteridade. Jodelet, nesse capítulo, se baseia num trabalho anterior e tenta mostrar como a alteridade é produto de um duplo processo de construção e de exclusão social, que mantém sua unidade por meio de um sistema de representações. Naquela ocasiação, Jodelet havia diferenciado a alteridade de fora (referente ao longínquo e exótico) e a alteridade de dentro, referida àqueles que se distinguem no seio de um conjunto cultural e social e podem ser considerados uma ameaça ou um mal-estar. Nesse segundo caso, Jodelet havia analisado o jogo de embricação entre representações e práticas. E assim, ela conseguiu ver os processos de produção da alteridade e a construção simbólica e material da diferença dentro de uma sociedade, mas esse estudo não havia levado em conta os patamares e gradações nas relações com o outro (ou outros). É o que ela se propõe a fazer neste capítulo. 1. A alteridade como problema psicossociológico Nessa primeira parte, a autora procura mostrar o modo como a alteridade se firmou no campo da psicologia social. Jodelet afirma que ao designar o caráter do que é outro, a noção de alteridade é sempre colocada em contraponto: o outro é um não-eu de um eu, outro de um mesmo. A noção de alteridade está ligada a uma outra noção, que é a de identidade, pois, conforme Augé, “é sempre a reflexão acerca da alteridade que precede e permite toda definição identitária”. Para compreender o conceito, é necessária, segundo Jodelet, examinar seu tratamento social, ver as operações de classificação e ordenação a que ela corresponde na vida social e como a oposiçao entre o mesmo e o outro se especifica segundo formas diferentes (semelhante/dissemelhante; autóctone/estrangeiro; próximo/longínquo; amigo/inimigo; normal/desviante etc). Essas diferenças estão presentes nas relações entre pessoas e grupos dentro de uma sociedade plural.
Jodelet, então, mostra como a alteridade convoca também a noção de pluralidade, principalmente quando tratamos da alteridade de fora, que se baseia na tríplice experiência da alteridade, pluralidade e identidade. Essa é a perspectiva da antropologia que se funda na evidencia de uma pluralidade espacial, cultural e temporal: o outro se define em vista da identidade do observador, seja em razão de um afastamento geográfico e cultural, seja por estar fora de uma trajetória evolutiva histórica, cujas etapas deveriam levar a uma identidade de civilização. Com as mudanças promovidas no entendimento da alteridade e identidade pela época moderna, a psicanálise e o marxismo, o olhar do pesquisador se voltou para a alteridade de dentro, que é evidente devido à pluralidade cultural e social nas sociedades contemporâneas. (p.50) A autora ressalta que considerada tão somente do ângulo da relação entre o mesmo e o outro, a noção de alteridade permanece genérica demais pra que seja possível utilizá-la na psicologia social. Quando estudado pelas ciências sociais, inclusive pela psicologia social, o objeto encontra-se situado na relação entre um “ego” e um “alter”. Segundo Jodelet, é necessário ir mais longe nessa definição. Ela propõe uma abordagem que dê conta de relacionar os níveis interpessoal e intergrupal, porque o ego e o alter só podem se opor no quadro de um nós: a elaboração da diferença é orientada para o interior visando proteção; e para o exterior, visando a desvalorização e à rotulagem do outro. E essa construção passa por interessas da comunidade que a elabora. 2. A questão da passagem à alteridade Aqui, a autoria procura examinar os gradações do outro na escala que vai do mesmo ao outro. Ela diz que a língua francesa dispõe de dois termos para designar o que não eu: “próximo”, que supõe uma comunidade ou uma proximidade social e o “outro” (alter), que supõe uma diferença ou uma distância social. Assim, a noção de alteridade é problemática, pois não parece pertinente de ser usada em referência ao próximo, que mantém semelhanças com o eu. O termo parece mais conveniente quando se trata de uma distância mais radical. A questão então está em compreender como se passa do próximo para o outro e da diferença à alteridade. Essas questões são simples. (51) No que diz respeito à passagem da diferença para a alteridade, é possível perguntar-se como e quando a diferença se transforma numa ruptura entre duas entidades distintas. Para responder à primeira pergunta (como se passa do próximo para o outro), convém observar que esta passagem implica o social, através do pertencimento a um grupo que é o palco dos processos simbólicos e práticos da transformação em alteridade (exemplo?).
Jodelet diz que é levando em conta os processos simbólicos e práticos de marginalização que se pode estudar a alteridade como forma específica de relação social, superando sua definição puramente negativa de que o outro não é o mesmo (o eu). 3. A articulação entre identidade e diferença (52) Nesse ponto, a autora concorda com a antropóloga F. Héritier, que coloca a articulação entre identidade e diferença na base dum processo cognitivo fundamental – a categorização – cujas variações se declinam segundo códigos culturais. Para essa autora, a observação da diferença dos sexos estaria na base de todo pensamento, tradicional e científico. (53) A partir dessa lógica da diferença, é possível mostrar como o jogo de representações estabelece nas relações de gênero uma diferença entre os sexos, que não é natural, é cultural, e expressa uma relação orientada que conduz à dominação social do princípio masculino. Essa diferenciação dos sexos é importante, segundo Jodelet, por duas razões: primeiro porque ela considera que as relações entre o eu e o outro são regidas pelas instituições e sistemas de representação e pensamento; e também porque ela permite mostrar a passagem da diferença à alteridade, em que as posições sociais seriam definidas por “manipulações simbólicas e concretas que recaem sobre os indivíduos”. Outra questão apontada por Jodelet refere-se aos modelos de ligação social pensados no âmbito das ciências humanas. Nem todos pressupõem o estabelecimento de uma alteridade, mas permitem ver as gradações na passagem do próximo ao outro. A autora afirma que voltar a esses modelos é importante, porque permite precisar as modalidades de instituição da alteridade. 4. Diferenciação e outro-semelhante (54) Jodelet, aqui, afirma que a psicologia social dedicou-se a demonstrar a ligação entre identidade e diferença, e o quanto a necessidade de diferenciação supera a de afirmação da semelhança. Nesse sentido, a autora cita algumas pesquisas, dentre as quais as que se situam na linha de pensamento da Mead, na qual o outro aparece como uma força constitutiva, que permite ao sujeito construir-se, aceder à identidade e ao simbólico. Jodelet cita também as correntes contemporâneas da psicanálise, que fazem do “outro-semelhante” o mediador da identidade, da representação e do conhecimento. Nesse caso, o sujeito remete ao “outro-semelhante”, que lhe é exterior, uma parte daquilo que reside nele próprio. (55) É o mesmo caso quando o social e o cultural integram uma constituição da identidade apoiada no outro. Essa perspectiva faz surgir a necessidade de referir a relação com o próximo ou com o outro a uma totalidade mais
ampla, a um contexto plural e lugar potencial de conflitos e disputas do qual pode decorrer a definição de alteridade. Podem-se achar instrumentos para a abordagem de tal dinâmica na sociologia. 5. formas de sociabilidade e instauração da alteridade Os sociólogos vão estudar a relação com a alteridade tanto no quadro de uma microssociologia das formas de sociabilidade quanto no de uma reflexão sobre os encontros entre a alteridade e a identidade. No primeiro caso, desenham-se as grandes linhas de uma abordagem da alteridade. Certos defensores de uma concepção formalista das relações sociais reconduzem o estudo das relação inter-humanas ao das “formas puras” do laço social. Estas formas, que se estruturam em torno de binômios como distância/proximidade, permanecem abstratas, sem referência ao conteúdo material das manifestações de sociabilidade. Jodelet cita, então, os estudos de Simmel sobre o estrangeiro, em que é possível ver essa relação entre proximidade e distância e as consequências disso no modo como o estrangeiro se relaciona com o grupo. Esse autor ilustra essa visão com a oposição gregos vs. bárbaros (57), que é um caso extremo de colocação em situação de alteridade, que se aproxima do racismo.
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