Introdução a Etnobiologia - Degustacao_introducao

December 1, 2018 | Author: Douglas Barros | Category: Biodiversity, Conservation Biology, Ecology, Homo Sapiens, Environmental Social Science
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introdução aetnobiologia...

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INTRODUÇÃO À

INTRODUÇÃO À

ULYSSES PAULINO DE ALBUQUERQUE (ORGANIZADOR)

1ª Edição • 2014 Recife/PE

Primeira edição publicada em 2014 por NUPEEA www.nupeea.com Copyright© 2014 Impresso no Brasil/Printed in Brazil  Diagramação e capa: Canal 6 Projetos Editoriais Revisão língua portuguesa: Grupo Revisar  Tradução do inglês para o português dos capítulos 5 e 25: Grupo Revisar  Revisão de normas técnicas: os autores Editor chefe: Ulysses Paulino de Albuquerque

I61957

Introdução à etnobiologia / Ulysses Paulino de Albuquerque (org.). - - Recife, PE: NUPEEA, 2014. 189 p. ; 23 cm. ISBN 978-85-63756-23-7 1. Ecologia Humana. 2. Introdução à Etnobiologia. I. Albuquerque, Ulysses Paulino de. II. Título. CDD: 304.2 Copyright© NUPEEA, 2014

É proibida a duplicação ou reprodução deste volume, no todo ou em parte, sob quaisquer formas ou por quaisquer meios (eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia, distribuição na Web e outros), sem permissão expressa do editor. NUPEEA Recife – Pernambuco – Brasil

AUTORES Alejandro Casas Universidad Nacional Autónoma de México, Centro de Investigaciones en Ecosistemas, Morelia, Mexico.

Diego Batista de Oliveira Abreu Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Ana Haydeé Ladio Laboratório Ecotono, Universidade Nacional del Comahue, Argentina.

Ernani Machado de Freitas Lins Neto Universidade Federal do Vale do São Francisco. Pesquisador associado ao Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco.

André Luiz Borba do Nascimento Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco. Andrêsa Suana Argemiro Alves Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco. André Sobral Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco. Andrew Barker Department of Biological Science, University of North Texas, USA. Angelo Giuseppe Chaves Alves Departamento de Biologia, Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Fábio José Vieira Departamento de Biologia, Universidade Estadual do Piauí. Pesquisador associado ao Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Universidade Federal Rural de Pernambuco. Gustavo Taboada Soldati Universidade Federal de Juiz de Fora. Pesquisador associado ao Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA) da Universidade Federal Rural de Pernambuco. Ivanilda Soares Feitosa Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco. Joabe Gomes de Melo Instituto Federal de Alagoas. Pesquisador associado ao Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA) da Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Flávia Rosa Santoro Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Jonathon Dombrosky  Department of Geography, University of North Texas, USA.

Flávia dos Santos Silva Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco.

José Ribamar de Sousa Júnior Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Gilney Charll dos Santos Instituto Federal do Piauí. Pesquisador associado ao Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA),

Josivan Soares da Silva Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Juliana Loureiro de Almeida Campos Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco. Julio Marcelino Monteiro Universidade Federal do Piauí. Pesquisador associado ao Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco. Letícia Zenobia de Oliveira Campos Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco. Lucilene Lima dos Santos Instituto Federal de Pernambuco. Pesquisadora associada ao Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco. Marcelo Alves Ramos Universidade de Pernambuco (UPE). Pesquisador associado ao Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco. Maria Clara Bezerra Tenório Cavalcanti Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Pesquisadora associada ao Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Patrícia Muniz de Medeiros Universidade Federal do Oeste da Bahia. Pesquisadora associada ao Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Thiago Antônio de Sousa Araújo Pesquisador associado ao Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Reinaldo Farias Paiva de Lucena Laboratório de Etnoecologia, Universidade Federal da Paraíba. Pesquisador associado ao Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Ulysses Paulino de Albuquerque Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Rosemary da Silva Sousa Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco. Rômulo Romeu da Nóbrega Alves Departamento de Biologia, Universidade Estadual da Paraíba. Sandrine Gallois Institut de Ciència i Tecnologia Ambientals, Universitat Autònoma de Barcelona, Espanha. Steve Wolverton Department of Geography, University of North Texas, USA. Taline Cristina da Silva Pesquisadora associada ao Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Victoria Reyes-García Institució Catalana de Recerca i Estudis Avançats, Barcelona, Espanha. Viviany Teixeira do Nascimento Universidade do Estado da Bahia. Pesquisadora associada ao Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco. Washington Soares Ferreira Júnior Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco. Wendy Marisol Torres-Avilez Laboratório de Etnobiologia Aplicada e Teórica (LEA), Universidade Federal Rural de Pernambuco.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos ao apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), CAPES e Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Pernambuco (FACEPE) pelas diferentes formas de apoio que permitiram aos autores produzir esta obra. O editor agradece particularmente ao CNPq pela bolsa de produtividade em pesquisa concedida. Os autores do capítulo 5 agradecem ao editor pela oportunidade de escrever o capítulo. Os dados da Figura 2, desse capítulo, são de pesquisa da Fundação Nacional de Ciência Arqueométrica, Concessão de Desenvolvimento Técnico nº 1.112.615. Os autores do capítulo 25 agradecem o apoio financeiro do Conselho Europeu de Investigação no âmbito do Sétimo Programa da União Europeia (FP7/2007-2013)/ERC convenção da subvenção nº FP7-261987-LEK para a redação desse capítulo. Também agradecem aos Tsimané, aos Baka e aos Punan por sua acolhida e paciência.

SUMÁRIO

 APRESENTAÇÃO ............................................................................................................................ 13

PARTE 1: HISTÓRIA, ABORDAGENS E CONCEITOS O QUE É ETNOBIOLOGIA? ..............................................................................................................17 Ulysses Paulino de Albuquerque & Angelo Giuseppe Chaves Alves

HISTÓRIA DA ETNOBIOLOGIA ........................................................................................................23  André Sobral & Ulysses Paulino de Albuquerque

ETNOBIOLOGIA OU ETNOECOLOGIA? ...........................................................................................29  Angelo Giuseppe Chaves Alves & Ulysses Paulino de Albuquerque

ETNOBIOLOGIA URBANA ...............................................................................................................35  Ana Haydée Ladio & Ulysses Paulino de Albuquerque

PALEOETNOBIOLOGIA ...................................................................................................................43 Steve Wolverton, Jonathon Dombrosky & Andrew Barker 

PARTE 2: A PERCEPÇÃO DA NATUREZA O QUE É PERCEPÇÃO AMBIENTAL? ...............................................................................................55 Taline Cristina da Silva & Ulysses Paulino de Albuquerque

BASES BIOLÓGICAS E EVOLUTIVAS DA PERCEPÇÃO HUMANA SOBRE O AMBIENTE NATURAL ....59 Washington Soares Ferreira Júnior, Taline Cristina da Silva & Ulysses Paulino de Albuquerque

PERCEPÇÃO DE RISCO..................................................................................................................65 Taline Cristina da Silva, Washington Soares Ferreira Júnior, Flávia Rosa Santoro, Thiago Antônio de Sousa Araújo & Ulysses Paulino de Albuquerque

 A RELAÇÃO ENTRE AS PERCEPÇÕES E O APROVEITAMENTO DOS RECURSOS NATURAIS ...........69 Taline Cristina da Silva, Letícia Zenobia de Oliveira Campos, Josivan Soares da Silva, Rosemary da Silva Sousa & Ulysses Paulino de Albuquerque

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PARTE 3: A CLASSIFICAÇÃO DA NATUREZA COMO E POR QUE AS PESSOAS CLASSIFICAM OS RECURSOS NATURAIS? ................................77  Andrêsa Suana Argemiro Alves, Lucilene Lima dos Santos, Washington Soares Ferreira Júnior & Ulysses Paulino de Albuquerque

 VISÕES ALTERNATIVAS SOBRE AS CLASSIFICAÇÕES

FOLK  ..........................................................83

Washington Soares Ferreira Júnior, Reinaldo Farias Paiva de Lucena & Ulysses Paulino de Albuquerque

PARTE 4: O APROVEITAMENTO DA NATUREZA PLANTAS MEDICINAIS ..................................................................................................................91 Thiago Antônio de Sousa Araújo, Joabe Gomes de Melo & Ulysses Paulino de Albuquerque

PLANTAS ALIMENTÍCIAS...............................................................................................................99 Viviany Teixeira do Nascimento, Letícia Zenóbia de Oliveira Campos & Ulysses Paulino de Albuquerque

RECURSOS MADEIREIROS ..........................................................................................................105  Marcelo Alves Ramos, Maria Clara Bezerra Tenório Cavalcanti & Fábio José Vieira

RECURSOS ANIMAIS ................................................................................................................... 115 Rômulo Romeu Nóbrega Alves

FUNGOS ...................................................................................................................................... 121 Washington Soares Ferreira Júnior & Ulysses Paulino de Albuquerque

PARTE 5: O MANEJO E A DOMESTICAÇÃO DA NATUREZA DOMESTICAÇÃO DE PLANTAS ....................................................................................................127 Ernani Machado de Freitas Lins Neto, José Ribamar Sousa Júnior,  Alejandro Casas & Ulysses Paulino de Albuquerque

DOMESTICAÇÃO ANIMAL ............................................................................................................137 Rômulo Romeu Nóbrega Alves

O EXTRATIVISMO DE RECURSOS VEGETAIS ...............................................................................143  Juliana Loureiro de Almeida Campos, Ivanilda Soares Feitosa,  Julio Marcelino Monteiro, Gilney Charll dos Santos & Ulysses Paulino de Albuquerque

PARTE 6: FATORES QUE AFETAM O CONHECIMENTO BIOLÓGICO TRADICIONAL  A TRANSMISSÃO DO CONHECIMENTO LOCAL OU TRADICIONAL E O USO DOS RECURSOS NATURAIS ...........................................................................................151 Gustavo Taboada Soldati

CONHECIMENTO E USO DE PLANTAS EM CONTEXTOS DE MIGRAÇÃO .......................................157 Patrícia Muniz de Medeiros, Diego Batista de Oliveira Abreu & Ulysses Paulino de Albuquerque

GÊNERO E IDADE.........................................................................................................................163 Wendy Torres-Avilez, André Luiz Borba do Nascimento, Leticia Zenobia de Oliveira Campos, Flávia dos Santos Silva & Ulysses Paulino de Albuquerque

ETNIA, RENDA E ESCOLARIDADE................................................................................................169 Patrícia Muniz de Medeiros, Juliana Loureiro de Almeida & Ulysses Paulino de Albuquerque

URBANIZAÇÃO E SERVIÇOS PÚBLICOS ....................................................................................... 175 Washington Soares Ferreira Júnior, Flávia Rosa Santoro & Ulysses Paulino de Albuquerque STATUS  SOCIAL

E CONHECIMENTO ECOLÓGICO TRADICIONAL ..................................................181

Victoria Reyes-García & Sandrine Gallois

 APÊNDICE I: DECLARAÇÃO DE BELÉM ............................................................................................................187  APÊNDICE II: PRINCIPAIS REVISTAS CIENTÍFICAS QUE PUBLICAM TRABALHOS EM ETNOBIOLOGIA ..............189

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APRESENTAÇÃO

Apesar dos grandes avanços da etnobiologia, mundialmente ainda carecemos de livros e textos que possam servir de referência para o seu ensino. Não há dúvidas de que nos últimos anos apareceram muitas obras que vieram preencher lacunas no ensino e na pesquisa em etnobiologia. Neste sentido, esta obra tem, então, a proposta de subsidiar o ensino inicial de etnobiologia na graduação e pós-graduação. A ideia foi produzir capítulos curtos que introduzissem o leitor às principais ideias sobre o assunto abordado. Obviamente que, dada a complexidade da etnobiologia, não nos foi possível apresentar todos os pontos de vista e abordagens sobre o tema. Por isso, esta obra é, de fato, uma breve introdução ao tema. Dividimos o livro em seis partes, cada uma delas cobrindo os aspectos que  julgamos relevante para facilitar a leitura e o aprendizado. Na primeira parte, tivemos a preocupação de trabalhar os aspectos mais históricos e conceituais da etnobiologia. Dois capítulos são particularmente oportunos, pois tratam de abordagens relativamente recentes ou pouco debatidas, pelo menos no Brasil: a paleoetnobiologia e a etnobiologia urbana. A apropriação da natureza, nos mais variados aspectos, passa inicialmente pela forma como a percebemos. Por isso, a segunda parte do livro aborda justamente essa etapa inicial do relacionamento entre seres humanos e natureza. A terceira parte, por sua vez, traz à tona o debate clássico e os principais aportes teóricos sobre como a nossa espécie classifica a natureza percebida. Já na quarta parte do livro tratamos de um dos aspectos mais trabalhados na etnobiologia: a utilização dos recursos naturais 1. Optamos aqui por tratar apenas os recursos mais estudados pelos etnobiólogos, como uma introdução muitos simples e direta a cada um desses recursos. A quinta parte configura-se como um desdobramento muito natural desta, pois trata das consequências dessa nossa relação utilitária com a natureza. Optamos, então, nessa quinta

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Nesta obra a expressão “recursos naturais” é empregada várias vezes como sinônimo de biota, não tendo, portanto, conotações econômicas ou utilitárias.

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parte, por abordar o extrativismo de produtos florestais e a domesticação de plantas e animais. Por fim, a sexta parte é uma síntese sobre o que afeta a nossa experiência com os recursos naturais, dito de outro modo, sobre quais variáveis afetam o conhecimento biológico tradicional (CBT). Embora não tratemos de tudo o que pode influenciá-lo, oferecemos ao leitor um conjunto de informações que, sem dúvida alguma, servem como uma aproximação ao assunto. Assim, acreditamos que esta obra, possa auxiliar os professores de etnobiologia e estudantes a terem uma aproximação relativamente amena ao tema. A lista de referências bibliográficas complementa a obra, permitindo aos leitores o aprofundamento dos temas abordados.

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PARTE 1:

HISTÓRIA, ABORDAGENS E CONCEITOS

CAPÍTULO 1

O QUE É ETNOBIOLOGIA? Ulysses Paulino de Albuquerque & Angelo Giuseppe Chaves Alves

O termo etnobiologia remete a uma união de competências que abarcam do cultural ao biológico, compreendendo o estudo de relações muito diversas. É desafiante a tarefa de definir um campo tão complexo como esse, que comporta diferentes abordagens e problemas teóricos. A etnobiologia classicamente tem sido definida como o estudo das interações das pessoas e dos grupos humanos com o ambiente. Isso faz com que, por algumas vezes, o termo apareça associado com a ecologia humana e com a etnoecologia1. Darrell Posey (1987a), um dos grandes nomes da etnobiologia, entende-a como o estudo dos conhecimentos e conceitos desenvolvidos por qualquer cultura sobre a biologia. Há duas abordagens clássicas em etnobiologia, a cognitiva e a econômica, que não são, necessariamente, excludentes. Todavia, a tabela 1 apresenta outras abordagens que, ao longo do tempo, foram surgindo e que podem se relacionar direta ou indiretamente com as duas anteriores2. Por seu enfoque cognitivo, a etnobiologia ocupa-se de conhecer o modo como as culturas percebem e conhecem o mundo biológico; por seu enfoque econômico, considera o modo como estas convertem os recursos biológicos em produtos úteis.

1

Este capítulo é uma versão revisada e atualizada da “Introdução” publicada na obra “Etnobiologia e Biodiversidade” (Albuquerque 2005). *  Neste sentido, para aprofundamento do debate, ver Begossi (1993; 2004) e Alves et al . (2010). No capítulo 3 deste livro, introduzimos uma discussão sobre as relações entre etnobiologia e etnoecologia.

2

O leitor pode ampliar seus conhecimentos sobre algumas dessas abordagens consultando a literatura disponível em língua portuguesa. Ver, por exemplo, Medeiros (2010) e Albuquerque (2013). Para diferentes definições no campo de etnobiologia, ver o Dicionário Brasileiro de Etnobiologia e Etnoecologia (Medeiros & Albuquerque 2012).

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O QUE É ETNOBIOLOGIA?

As informações etnobiológicas foram durante muito tempo coletadas a partir de estudos sobre como populações consideradas “primitivas” utilizavam seus recursos  vegetais e animais (Castetter 1944). Muito embora ainda insuficientemente conhecida pelos conservacionistas, ambientalistas, ecólogos, biólogos e outros pesquisadores e apesar do reconhecimento que vem obtendo, em especial nos últimos dez anos, a etnobiologia tem contribuído com informações para a conservação da biodiversidade e o seu uso sustentável (cf. Toledo et al. 2003; Moller et al. 2004; Donovan & Puri 2004). Nos últimos anos, o número de publicações cresceu consideravelmente, evidenciando, assim, as implicações das pesquisas etnobiológicas na conservação dos ecossistemas tropicais (ver Albuquerque et al. 2013). Tabela 1.

Algumas das diferentes abordagens na pesquisa etnobiológica. As definições apresentadas,

necessariamente, não representam consenso entre os especialistas.

Abordagem

Definição

Etnobiologia evolutiva

Estuda a história evolutiva dos padrões de comportamento e conhecimento humano sobre a biota, considerando aspectos históricos e contemporâneos que influenciam esses padrões.

Etnobiologia ecológica

Estuda as inter-relações entre pessoas e biota a partir dos referencias teóricos e metodológicos da ecologia.

Etnobiologia histórica

Estuda a inter-relação entre seres humanos e biota a partir de evidências passadas preservadas em documentos históricos.

Etnobiologia médica

Estuda os sistemas médicos tradicionais a partir do uso, manejo e conhecimento da biota nesses sistemas.

Etnobiologia quantitativa

Envolve o uso de técnicas de estatística multivariada para explorar diferentes aspectos das inter-relações entre pessoas e biota.

Etnobiologia preditiva

Foca a elaboração de modelos quantitativos que permitam predizer o comportamento dos sistemas formados pela inter-relação entre pessoas e biota.

Etnobiologia urbana

Estuda a relação entre pessoas e biota nos ecossistemas urbanos.

Um dos objetivos da etnobiologia tem sido associar os conhecimentos das ciências naturais aos das humanas para registrar toda a amplitude de conhecimentos, de

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Ulysses Paulino de Albuquerque & Angelo Giuseppe Cha ves Alves 

classificação e de uso dos recursos naturais oriundos das sociedades tradicionais (Posey 1987b). Um dos campos da etnobiologia que mais tem concentrado trabalhos na América Latina é o da etnobotânica, ao lado de outros que vêm crescendo em número de publicações, como a etnozoologia e a etnoecologia (ver Albuquerque et. al. 2013). Os etnobiólogos ocupam-se de entender o chamado conhecimento tradicional ou conhecimento local. Na literatura também vamos encontrar as expressões “conhecimento biológico tradicional” e “conhecimento ecológico tradicional”. Entendemos conhecimento tradicional como experiências e saberes acumulados por um grupo humano em relação aos recursos naturais. Esse conhecimento é dinâmico e mutá vel. O termo tradicional vem sendo muito discutido. McClatchey (2005) pondera que os termos, embora usados com conotações positivas pelos etnobiólogos, são vagos e muitas vezes equivocados. Para situar o leitor sobre o debate, transcrevemos algumas considerações de Santos et al. (2005): “os termos ‘conhecimento local’, ‘conhecimento indígena’, ‘conhecimento tradicional’ ou mesmo ‘etnociência’ têm surgido com frequência na última década, com o objetivo de chamar a atenção para a pluralidade de sistemas de produção de saberes no mundo e para a sua importância nos processos de desenvolvimento (...)”.

O adjetivo local, apesar de suas limitações, tem uma vantagem: serve para indicar de onde estão falando e agindo as pessoas cujos saberes são retratados nas pesquisas; serve para mostrar qual é o lugar, qual é o espaço e qual é o tempo nos quais essas populações manifestam seus saberes, suas culturas e suas relações com o ambiente. Ninguém é onipresente. Todo mundo, seja pesquisador ou membro de população tradicional, fala a partir de um ponto. Por outro lado, o termo tradição relaciona-se, etimologicamente, com transição, indicando o seu potencial intrínseco para incorporar mudanças, inovações e experimentações realizadas por membros de populações indígenas e/ou camponesas 3. Nas últimas décadas, intensificou-se a busca por alternativas para conter a de vastação dos recursos naturais, bem como o desenvolvimento de sistemas de manejo sustentáveis para a manutenção da diversidade biológica. Formas de manejo sustentá vel dos ecossistemas têm sido propostas ao longo do tempo. No entanto, muitas delas caracterizam-se pela desvinculação das populações humanas que vivem tradicionalmente nos diversos ecossistemas. Várias pesquisas têm se dedicado a revelar o co-

3

Nós já tivemos a oportunidade de discutir a respeito do uso dos termos tradicional e local (Alves & Albuquerque 2010) e, por isso, convidamos o leitor interessado a consultar esse material.

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