Igreja Forma e Essencia - Gene a. Getz

May 4, 2017 | Author: Éverton Gomes | Category: N/A
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Igreja Forma e Essencia - Gene a. Getz...

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0 CORPO DE CRISTO PELOS ÂNGULOS DAS ESCRITURAS, DA HISTÓRIA E DA CULTURA

Gene A. Getz

IGREJA: FORM AE ESSÊNCIA O CORPO DE CRISTO PELOS ÂNGULOS DAS ESCRITURAS, DA HISTÓRIA E DA CULTURA

Gene A Getz Tradução M árcio Loureiro R e d o n d o

EH

° 1984 de SP Publications, Inc. Título do original: Sharpening the Focus of the Church Traduzido da edição amplamente revisada, publicada por Victor Books (Wheaton, II, EDA) Publicado no Brasil com a devida autorização e com todos os direitos reservados por S o c ieda de R eligio sa E dições Vida N o v a ,

Caixa Postal 21486, São Paulo, SP. 04698-970 Proibida a reprodução por quaisquer meios (mecânicos, eletrônicos, xerográficos, fotográficos, gravação, estocagem em banco de dados, etc.). Permitida a reprodução parcial somente em citações breves em obras, críticas ou resenhas, com indicação de fonte. 2 4 6 8 10 9 7 5 3 1 95 97 98 96 94 ISBN

85-275-0204-6

Printed in Brazil / Impresso no Brasil C o o rd en ação d e p ro d u ção • R obinso N M alkomes Revisão • L ucy Yam akam i e F abia ni M edeiros C o m posição • Valdem ar Kr Óker D iagram ação * R o ger L. M alkomes e J a n ete D . C elestino C apa • Íbis R oxan e Dados internacionais de "M ieação (CIP) (Cârpara Brasileira do Livro, SP, II) Getz, Gene A. | Igreja; forma e essência: o corpo de Cristo pelos ângulos das Escrituras, da história e da cuftura ( Gene A.. Getz ; ( tradução Márcio Lo u re i| Redondo | . — São Paulo : Vida Nova, 1994 , Bibliografia ISBN 85-275-0204-6

1. Igreja 2. Igreja - Renovação 3. Teologia prática I, Título.

94-2817

para catálogo sistemático

lAZINHO RODRIGUES

Prefácio à edição em português 7 Prefácio ã edição em inglês 9 Introdução 11 P r im e ir a P a r t e

Um Dois Três Quatro Cinco Seis Sete Oito Nove

• 0 ângulo das Escrituras

Uma perspectiva da renovação da igreja 15 Uma visão por três ângulos 35 Por que a igreja existe? 53 A formação de discípulos 63 Os princípios de evangelização do Novo Testamento 77 A edificação da igreja 93 As experiências vitais do Novo Testamento 107 Os princípios de edificação do Novo Testamento 123 A liderança na igreja do Novo Testamento — primeira fase 137

Üez Onze Doze Treze Quatorze Quinze Dezesseis

A liderança na igreja do Novo Testamento — segunda fase 153 O corpo em ação 173 Os princípios de liderança do Novo Testamento 187 Os exemplos bíblicos de administração e de organização 209 Os princípios bíblicos de administração e de organização 229 A comunicação no Novo Testamento 249 Os princípios de comunicação do Novo Testamento 267 S e g u n d a P a r t e • O ân gu lo da h istó ria

Dezessete Dezoito

O institucionalismo na história 285 Os reflexos do institucionalismo na igreja evangélica 297 T e r c e ir a P a r t e

Dezenove

• O ângulo da cultura

As implicações culturais para a igreja do século XX 309 Q\járta P arte * O desenvolvimento de m a estratégia contemporânea

Vinte Vinte e um Apêndice a Apêndice b O autor

O desenvolvimento gradual de uma perspectiva correta 327 A formulação de objetivos, alvos e padrões 347 Uma oportunidade de fazer o seu próprio estudo indutivo 359 Atividades e diretrizes — resultados e objetivos 403 419

Todos nós, que já sonhamos e nos compfometemos com o surgimento de uma igreja mais dinâmica e mais pertinente ao seu meio, já depa­ ramos com o mesmo problema: a questão da fotma c da rssêuúâ' Desejamos uma igreja que seja, simultaneamente, a “cara” de nosso povo e fiel aos princípios neotestamentários; desejamos uma igreja de impacto, sem, contudo, sacrificar seu entendimento teológico no processo. Quando li este livro pela primeira vez, há cerca de 12 anos, muitas verdades se esclareceram. Todos sabemos que a Bíblia não nos apresenta formas imutáveis, mas, sim, elementos fundamentais que se revestem (ou, pelo menos, deveriam revestir-se) de roupagem nova em cada situação. Quando não aplicamos essa verdade, criamos igrejas que, por estarem tão apegadas à forma, perdem o contato com sua essência. Nossa mensagem é tão importante, que não nos devemos deixar prender a práticas e costumes que, embora possam ter sido adequados na origem, hoje são, na melhor das hipóteses, inócuos.

Vivemos uma época em que o movimento evangélico está buscando novas fórmulas de sucesso. Muitas vezes temos buscado apenas uma roupa nova ou novas palavras de ordem. Precisamos aprofundar nossa compreensão da essência da igreja, se quisermos ser tudo o que Deus pretende que ela seja. Apesar de ter escrito originariamente em 1974, em outras circunstâncias (EUA), o Dr. Gene Getz, pastor de muitos anos, mostra-se sobremodo atual e pertinente. Igreja: Forma e Essên­ cia vai oferecer-lhe um roteiro pelo qual você poderá desenvolver a filosofia de ministério e a estratégia que Deus tem para sua igreja em seu tempo e lugar. Nós, do Conselho de Igrejas para Desenvolvimento de Líderes ( b il d ), nos consideramos privilegiados por poder facilitar a publicação deste livro em português. Acreditamos que, utilizado com seriedade, ele possa libertar sua comunidade de muitas formas, possibilitando um ministério muito mais aplicável a sua situação e muito mais harmônico com o propósito de Deus para sua igreja. P r . D a n ie l L im a

Igreja Batista do Morumbi

Os livros não cessam de vir à luz. Mas poucos com mensagens bem definidas, pertinentes e orientadoras. É difícil produzir livros assim. Exigem mente imaginativa, criadora. Não desaparecem com a crítica e a depreciação. Desbravam novas trilhas a exploradores corajosos do reino de Deus. E o caso de Igreja: Forma e Essência. Segundo o NT, a igreja é gloriosa. Cristo amou-a e deu-se por ela. Ele a edifica. Caminha entre os candeeiros de ouro. Ela é a sua igreja, e apresentá-la-á a si mesmo sem mácula nem ruga. Mas, na história, essa glória nem sempre se refletiu nas igrejas locais. Deve-se admitir humildemente esse fato trágico. Daí serem muitas delas duramente criticadas, cruelmente atacadas, tristemente ne­ gligenciadas e friamente rejeitadas pelos que as consideram inapli­ cáveis, antiquadas e sem sentido. Em alguns lugares, os edifícios das igrejas quase não passam de monumentos históricos ou museus. Sem dúvida, o julgamento do mundo é cruel; às vezes, injusto. Mas será sem razão? As igrejas têm sido fiéis ao chamado divino, ao

propósito que Deus traçou para elas? Não deveríamos, até, dizer-lhés: “Corrias berr»; quem te impediu...?” . Essa é, assim, a situação hoje. Mas nossc> Senhor não cortou relações com a igreja. Agora caniinha entre os candeeiros. Por sua graça, está levando alguns de seus servos a aplicar as habilidades e o conhecimento no diagnóstico das enfermidades das igrejas e na ajuda para que elas encontrem o ca­ minho da renovação e da reconstrução. Gene Getz foi dirigido p ^ o Senhor nos diagnósticos e nas indicações de saída do dilema. Os três ângulos, Escrituras, história e cultura, aplicam-se com efi­ cácia e coerência, sendo muito reveladores e úteis. Essa abordagem ressalta que'as igrejas não devem viver na)Bíblia,“mas por ela, na his­ tória e no ambiente cultural. E, embora a Bíblia permaneça constante e seja a norma absoluta da vida eclesiástica, a história e a cultura mu­ dam constantemente e requerem alterações na forma e na estrutura, para continuarem relacionadas com o mundo em que atuam. O pro­ cesso de institucionalização pode “congelar” as igrejas em padrões que geram estagnação e morte. A saída é a contínua metamorfose das igrejas, sem ^Iterar a mensagem imutável, nem deixar os padrões, os ideais e os objetivos encontrados na Bíblia. ' A apresentação bíblica das igrejas do NT feita por Getz trata-se eclesiologia prática em forma viva e bem fundamentada na Bíblia. Põe as igrejas locais no centro dos movimentos cristãos e evangélicos — como faz o NT. Define claramente o propósito delas, a função e os cargos nas igrejas, e traça uma linha divisória entre essencial e secuwAino *funcional e estrutural, conteúdo e forma, “çnêumenos” e fe­ nômenos organismo bíblico dinâmico e organização cultural. detalhes sobre as distinções e as definições de palavras como pregação, ensino, evangelização e testemunho e as descrições de c a r g o s e pessoas. Distingue-se entre os ministérios nas (para as) igfejas locais e na (para a) igreja universal, em que as diferenças de opi­ nião e de interpretação são permissíveis sem ser conflitantes. O livro tem uma mensagem para a igreja hoje, e será bom que pen­ semos sobre e^aO

f e r e c e t n ' s e

G e o rg e W. P e te r s

Professor Emérito de Missões Mundiais, Dallas Theological Seminary

Tenho uma grande dívida com inúmeros cristãos que ajudaram a tornar este livro uma realidade. Devo especial reconhecimento a meus alunos e irmãos em Cristo do Dallas Theological Seminary, que me KAYffiüVàràTn àfcm tro e, iwàfíiea\grais atíCft, minha reflexão em torno das necessidades e dos problemas da igreja do século xx. Suas perguntas francas, seus comentários e especial­ mente suas reações positivas diante dos conceitos apresentados nesta obra foram fonte perpétua de estímulo e incentivo. Dois alunos em especial — ambos missionários na Europa, atualmente — tiveram a ousadia de me desafiar a tomar parte na abertura de igrejas. “A teoria parece muito boa” , davam sempre a entender em nossas conversas depois da aula, “mas quando você vai demonstrar que pode funcionar numa situação real?” De início, respondia que era tarefa deles aplicar esses princípios em situações culturais variadas. A minha era pesquisar, ensinar e preparar outros — como eles — para fundar e também renovar igrejas.

Suas palavras, entretanto, martelavam na minha mente. Nem imaginava que, depois de 20 anos como professor de tempo integral, deixaria os meios acadêmicos de estudo sacro para tornar-me pastor de tempo integral. Embora eu ainda lecione em tempo parcial no seminário de Dallas, desde 1973 tenho gastado a maior parte do meu tempo junto às bases, abrindo e pastoreando igrejas. Que grande experiência de aprendizado! Aquilo que descobri alguns anos atrás acerca dos princípios do Novo Testamento quanto à vida da igreja — o tema principal deste livro — ainda creio de todo o coração. No entanto, agora sei bem mais sobre como aplicar esses princípios. E ainda estou aprendendo! E o que estou aprendendo, estou tentando partilhar com outras pessoas. Esta revisão bastante ampla de Escrituras, História e Cultura é um reflexo desse esforço.

O ângulo das Escrituras

A primeira parte tem o propósito de ajudá-lo a ver a igreja de hoje pelo ângulo das Escrituras. É o segmento maior do livro por ser o alicerce. É um estudo bíblico, e escrevi estes capítulos com o propósito de levantar algumas perguntas fundamentais acerca da igreja no Novo Testamento, a elas respondendo, e, depois, procurar princípios que servirão de diretrizes para a igreja do século xx. Quais eram suas funções e quais os resultados? Quais eram suas diretrizes e objetivos? Como a igreja se relacionava com a cultura e a comunidade do século I? Quais eram as experiências significativas dos cristãos do Novo Testamento quando se reuniam para a edifi­ cação? Quem eram seus líderes? Como eram escolhidos e quais eram suas qualificações? Como os membros da igreja do Novo Testamento se comunicavam entre si e com o mundo? Quais eram suas estruturas e formas? Certamente este estudo não é exaustivo, pois quem pode desvendar sozinho as profundezas da eterna Palavra de Deus? Mas espera-se que seja suficientemente abrangente para colocá-lo de frente, de modo novo e vital, com o dinâmico grupo de pessoas que mudou o curso da história — a igreja do século I.

Os três ângulos

!

Uma perspectiva da renovaçao da igreja

O que ocorreu nas igrejas evangélicas nas últimas duas décadas não está desvinculado do que aconteceu com a nossa cultura em geral. Jamais está. A “infiltração cultural” é inevitável. No final da década de 60 e no início da de 70, os Estados Unidos começaram a experimentar um clima antiinstitucional que chegou a ameaçar os próprios alicerces de nossa sociedade. Foi sobretudo nesses anos que os alunos das universidades se rebelaram. Essas agitações e crises culturais de fato “se infiltraram” em nossas subculturas evangélicas. A maioria de nós, que estávamos lecionando em faculdades evangélicas naqueles dias, lembra-se claramente das perguntas ameaçadoras e dos ataques verbais disparados contra as várias instituições em que lecionávamos, bem como das atitudes negativas dos alunos em relação à igreja como instituição (veja a figura 2). Vários educadores, teólogos e clérigos começaram a enfrentar essas perguntas com sinceridade e procuram destrinchar o problema fazendo

separação entre o que era realmente válido nessas reações e o que era simplesmente infelicidade, frustração e desilusão causadas por uma sociedade em crise. O que estava ocorrendo na cultura em geral e de modo particular na subcultura evangélica na época também tinha raízes históricas significativas. Nenhuma crise se dá no vazio. No mundo secular, a “vaca sagrada” da ciência e os resultados por ela prometidos não estavam funcionando. Não havia nenhum indício da “grande so­ ciedade”. Além disso, o mundo adulto estava em processo de modificação de seu sistema de valores morais, o que provocou, de

Figura 2: Infiltração cultural modo especial, uma desilusão entre nossa juventude. Além disso, mais e mais jovens estavam ficando muito insatisfeitos com o que sentiam ser uma sociedade despersonalizada, que os estava devorando, esmigalhando sua individualidade e destruindo seus impulsos criativos. Sentiam-se perdidos em meio a uma imensa máquina cultural que estava ficando descontrolada. Sentiam-se arrasados. O principal recur­ so deles era descarregar a ira nas instituições americanas. E a crise no Vietnã só pôs mais lenha na fogueira. Entrelaçadas de forma intricada com essas instituições nos Estados Unidos estavam as igrejas e as escolas evangélicas. A “infiltração” negativa foi imediata. Mas havia algumas razões válidas. Para muitos, as instituições evangélicas, juntamente com as instituições seculares,

pareciam desprovidas de significado e distantes da realidade. O cristianismo parecia meramente acadêmico e cognitivo, muitas vezes legalista e freqüentemente superficial e irreal. Em sua forma corrente, parecia carecer de soluções aceitáveis para as grandes questões do momento. O fato é que, em muitos casos, nem estávamos falando sobre essas questões.

O movimento de renovação da igreja Foi naqueles dias que os escritores da renovação da igreja começaram a se manifestar acerca desses temas. Os próprios títulos dos livros mostram um perfil sem igual das preocupações básicas que ocupavam o pensamento de muitos líderes cristãos. O Grupo dos Consagrados. No início da década de 60, Elton Trueblood publicou o livro The Company ofth e Committed [O Grupo dos Consagrados]. Citando Karl Heim em Christian Faith and Natural Science [A Fé Cristã e a Ciência Natural], ele viu a igreja como:' Um navio em cujo convés a festa ainda corre solta e se ouve uma música maravilhosa, enquanto bem abaixo da linha de flutuação abriu-se um buraco e grande volume de água está entrando aos borbotões, de modo que a cada hora a embarcação vai afundando um pouco mais, embora as bombas de recalque funcionem dia e noite.1

Em Busca da Vitalidade na Religião. Findley Edge retomou, alguns anos mais tarde, o tema abordado por Trueblood. Experimen­ tando, ele próprio, a desilusão, especialmente com o que sentia ser uma falta de realidade cristã, apesar do contínuo crescimento de sua própria denominação, ele escreveu A Quest fo r Vitality in Religion [Em Busca da Vitalidade na Religião], Afirmou: Atualmente, as igrejas estão experimentando um período de popularidade e prosperidade quase sem precedentes. Normalmente uma situação dessas seria motivo de olimismo e satisfação irrestritos. Por estranho que pareça, não é o que acontece. Muitos líderes religiosos sérios e cristãos leigos maduros manilcstain o crescente tumulto de agitação e ansiedade. A despeito dos edifícios suntuosos, do crescimento no número de membros e do vigor de muitas das atividades realizadas dentro das igrejas, algum

problema muito sério está afetando o cristianismo contemporâneo. Existe alguma coisa errada em seu cerne. Corre o perigo de perder a vida e a dinâmica.2

Um Novo Rosto para a Igreja. Poucos anos depois, a amplitude da preocupação se alargou quando um grupo de educadores evangélicos, representando várias escolas cristãs, encontrou-se no Acampamento de Honey Rock, do Wheaton College, em meados de 1967 e 1968. O resultado foi o livro A New Face fo r the Church [Um Novo Rosto para a Igreja], escrito por Larry Richards, que representa de forma geral o pensamento do grupo de Honey Rock e, de forma particular, o pensamento de seu autor. Para a maioria, o livro era radical e idealista. Conclamava a uma completa avaliação e revisão de nossas formas e estruturas ecle­ siásticas atuais e, caso necessário, a um novo começo. Foi, no entan­ to, um livro instigante. Motivou muitos de nós a voltar para o Novo Testamento, para dar uma nova olhada naquilo que Deus havia dito sobre a igreja.3 A Igreja no Ano 2001. O segundo livro que apareceu no início da década de 70 foi A Igreja no Ano 2001, de autoria do Dr. Francis Schaeffer. Escrevendo com base em sua abrangente compreensão da história e da cultura, abordou diretamente o problema da diferenciação entre os absolutos e os não-absolutos nas Escrituras. “Numa época de ! mudanças rápidas como a nossa”, escreveu, “época de total convulsão como a nossa, fazer absoluto o que não é assegura o isolamento e a morte da igreja organizada e institucional.”4 Esse foi um livro particularmente perspicaz acerca da renovação da igreja. O Problema dos Odres. Também no início da década de 70, começamos a ouvir outra voz. Howard A. Snyder, missionário atuante em São Paulo, no Brasil, começou a enviar artigos para várias revistas americanas. Os próprios títulos revelavam suas preocupações: “The Fellowship of the Holy Spirit” [“A Comunhão do Espírito Santo”],5 “Church Renewal through Small Groups” [A Renovação da Igreja Através de Grupos Pequenos”],6 “Does the Church Suffer an Edifice Complex?” [“A Igreja Padece de um Complexo de Edi­

fícios?”],7 “ ‘The People of God’ — Implications for Church Structure” [‘“ O Povo de Deus’ — Implicações para a Estrutura da Igreja”]8 e “Should the Protestant Pastor Be a Superstar?” [“O Pastor Protestante Deve Ser um Superastro?”].9 Depois de voltar aos Estados Unidos, ele utilizou esses artigos como base para a publicação de um livro intitulado The Problem o f the Wineskins [O Problema dos Odres], “O fato de sair do cenário americano e passar a me envolver com o trabalho da igreja noutra cultura” , escreveu, “levou-me a uma reavaliação fundamental acerca da missão e da estrutura da igreja no mundo de hoje.”10 Tanto as descobertas de Snyder quanto as de Schaeffer estavam diretamente relacionadas com suas experiências com a igreja após deixarem a cultura americana e atuarem no ministério em outra parte do mundo. Essa observação é significativa, porque muitas vezes nossas experiências culturais embaçam nossa visão no que diz respeito à natureza supracultural das Escrituras. Especificamente como pessoas que vivem nos Estados Unidos, com freqüência “americanizamos” a Bíblia e, inadvertidamente, impomos à Bíblia formas e estruturas culturais que não se encontram ali. Schaeffer e Snyder ajudaram á superar alguns desses erros de interpretação. Círculo Completo. Aqui e ali, líderes cristãos fizeram experiências com novas formas e estruturas. David Mains, especialmente inlluenciado pelos escritos de Elton Trueblood, deu início a uma expe­ riência ousada no centro de Chicago. Todos ficamos impressionados c animados com a Igreja do Círculo, que se tornou conhecida pela própria história de Mains, contada no livro Full Circle [Círculo Completo].u Aqueles de nós que acompanharam os esforços de Mains admiramos seu desejo de enfrentar o centro decadente da cidade e os problemas de integração e de diferenças sociais que infestavam não iípcnas nossa sociedade americana, mas também a subcultura evangélica. A experiência, no entanto, não satisfez as expectativas de Mains Uma razão que ele apresenta é quefnão deu atenção ao princípio que eslava sendo proposto pelos especialistas em crescimento da igreja no ijtic diz respeito à necessidade de analisar uma estrutura para alcançar ii "unidade homogênea” . Mais tarde, afirmou que teria sido sábio se llvesse dado atenção a Wagner. Mains escreveu:

Ele me advertiu para não tentar alcançar, numa única igreja, pessoas muito diferentes entre si. Exatamente como ele havia predito, por fim, a congregação se dividiu, em meio à nossa tentativa de estender demais, e muito rápido, o nosso amor imperfeito. Éramos jovens e estávamos obcecados com a idéia de solucionar, em poucos anos, problemas que vinham-se formando havia séculos.12

A Igreja nos Lares. Alguns (até mesmo eu) tentaram, no início da década de 70, o conceito de igreja nos lares, e freqüentemente ficávamos desapontados por não levarmos em conta os problemas do século XX. As exigências do estilo de vida imposto às famílias ameri­ canas logo fizeram com que fosse um fardo ter um lar sempre disponí­ vel para uma reunião da igreja, especialmente quando envolviam pes­ soas de todas as idades. Além do mais, nessas experiências não calcu­ lamos o enorme impacto da mentalidade de “igreja-edifício” , que se desenvolveu em nossa cultura e está inegavelmente relacionada com nosso senso de segurança e com a necessidade de estabilidade. Essa experiência ensinou-me como é importante olhar não apenas pelo “ângulo das Escrituras”, mas também pelo “ângulo da cultura”, quando tentamos desenvolver formas e estruturas contemporâneas para a igreja de nossos dias. f Alguns líderes cristãos tentaram desfazer-se dos ministérios educacionais tradicionais voltados para as crianças e para os jovens, passando a concentrar sua atenção na unidade familiar como um todo. Embora fosse um objetivo louvável, mais uma vez essas pessoas desprezaram a cultura. Muitos logo aprenderiam que essa abordagem funcionava somente com pessoas solteiras e com casais jovens sem filhos. Assim que os filhos começavam a nascer, acrescentavam-se programas educacionais ou as pessoas se desculpavam e passavam a freqüentar igrejas mais tradicionais, com berçários e programas educacionais para seus filhos. Embora muitas vezes perdessem a dinâmica gerada por uma estrutura eclesiástica simples, as necessi­ dades dos filhos superavam as suas, na hora de escolher um local de adoração. Com esse êxodo constante ou com a impossibilidade de atrair famílias, ou as duas coisas ao mesmo tempo, geralmente essas novas igrejas eram constituídas de pessoas solteiras ou de casais jovens. Isso

apresentava outro problema. Faltava, nessas igrejas, líderes m aduros, homens e mulheres de mais idade, com famílias bem estruturadas. Além disso, essas igrejas careciam da dinâmica que uma fam ília completa traz para o corpo de fiéis. O Dr. George Peters, grande líder missionário por seus p ró p rio s méritos e uma pessoa que influenciou meus pensamentos mais do que qualquer outro líder evangélico, acredita que, para serem saudáveis, “as igrejas devem ser construídas a partir de unidades fam iliares, e não a partir de cristãos isolados” .13 Irmãos, Fiquem à Vontade. Alguns entusiastas da renovação da igreja reagiram fortemente contra a estrutura em si e tentaram p lanejar igrejas “sem estrutura” e “sem líderes” , cuja melhor ilustração está no livro Brethren, Hang Loose [Irmãos, Fiquem à Vontade], 14 de Bob Girard. Embora Girard na verdade não pensasse ser possível funcionar sem forma ou haver grupos sem líderes, ele parecia carreg ar uma inquietação, quando a igreja começou a se tornar organizada. P or outro lado, sua preocupação com o “funcionamento do corpo” sob a liderança do Espírito Santo é, com certeza, algo elogiável e, em m inha opinião, uma perspectiva bíblica. Mas, na época, representou um a reação excessiva e um ‘ movimento pendular de afastamento da síndrome institucional. Parecia que ele desejava um “organism o” sem “organização” — uma impossibilidade funcional. Corpo Vivo. Nessa época, algumas igrejas tradicionais com eçaram a fazer mudanças significativas. A Península Bible Church, d e Paio Alto, na Califórnia, é um excelente exemplo. Sob a liderança d e Ray Sledman, essa igreja popularizou o culto do “corpo vivo” . O liv ro de Slcdman Igreja: Corpo Vivo de Cristo disseminou o conceito e incentivou várias igrejas tradicionais a incorporar mais as funções de "corpo vivo” em suas estruturas.15 Fui muito inspirado pelo ministério de Stedman. Aliás, passei iilgum tempo naquela igreja, observando o fenômeno e gravando em vlileo os cultos de “corpo vivo” da Peninsula Bible C hurch e mmpartilhando-os com meus alunos no Dallas Theological Sem inary. Logo, porém, tornou-se óbvio que muito da dinâmica na Peninsula liihlc Church estava diretamente relacionado com a cultura d a costa

oeste dos Estados Unidos e com o movimento de Jesus que ganhava impulso rapidamente naquela época. No £ntanto, o ministério de Ray Stedman inspirou muitos líderes cristãos.16

O tradicionalismo reavivado Ironicamente, outro grande movimento começou praticamente ao mesmo tempo em que a busca pela renovação da igreja, que acabamos de descrever. Ao passo que muitos estavftm questionando o conceito tradicional de estrutura eclesiástica, tanto na formação teológica quanto na igreja como um todo, alguns começaram a incentivar a escola dominical tradicional. Quando Richards e muitos outros estavam questionando a validade dos meios educacionais tradicionais e sua contribuição para o fortalecimento da igreja, Elmer Towns, por exemplo, publicava um livro intitulado The Bright Future o f the Sunday School [O Futuro Brilhante da Escola Dominical]}1 No mesmo ano ele publicou The Ten Largest Sunday Schools and What Makes Them Grow [As Dez Maiores Escolas Dominicais e o que as Faz Crescer].1* Esse destaque estava destinado a ser mais do que uma influência sobre a escola dominical. Envolvia pastores, já que uma das descobertas de Towns era que “grandes pastores” criavam “grandes escolas dominicais”, e “grandes escolas dominicais” formavam “grandes igrejas” . Towns conseguiu despertar o interesse de inúmeros líderes religiosos, basicamente porque, naquela época, teve na revista Christian Life [Vida Cristã] um canal para expor publicamente as estatísticas e as conclusões de suas pesquisas. A par com seus próprios escritos, ele começou a divulgar grandes escolas dominicais, seu crescimento estatístico e as classificou tanto por tamanho como por taxa de crescimento. E talvez seja muito significativo que ele tenha identificado cada pastor. Essa foi uma idéia engenhosa, apoiada numa técnica de motivação intrínseca. Lamentavelmente, o principal destaque recaía no cresci­ mento numérico. Isso estimulou uma competição prejudicial e, em alguns casos, gerou relatórios estatísticos pouco éticos; mas gerou uma grande dose de atividades para alcançar novas pessoas com o evangelho.

Uma das coisas mais importantes que resultou dessa ênfase é que os pastores de algumas dessas igrejas grandes têm ministrado cursos com o propósito de motivar pastores jovens, convencendo-os de que também podem ser tão bem-sucedidos no desenvolvimento de uma grande escola dominical e igreja, caso sigam certas técnicas e méto­ dos. Infelizmente, esses líderes têm desconsiderado o meio cultural que contribuiu significativamente para o seu próprio fenômeno de crescimento. Além disso, têm desprezado a força e a singularidade de suas próprias personalidades no crescimento dessas igrejas. William J. Petersen, editor da revista Eternity assinalou que essas “igrejas menores que seguiram o exemplo de evangelização superagressiva e gastaram dinheiro em ônibus, televisão, terrenos & instalações maiores (e até salários para evangelistas da igreja) muitas vezes não se saíram tão bem” .19 O fato é que algumas dessas igrejas íoram à falência.

O movimento de crescimento da igreja No início dal década de 70, começou outro movimento simultâneo ao movimento de renovação da igreja e ao renovado destaque no cres­ cimento da escola dominical. É o que identifico como o movimento “oficial” de crescimento da igreja, com pessoas de destaque como \I)onald A. McGavran, Winfield Arn e Peter Wagner. Escrevendo livros como How to Grow a Church [Como Fazer uma Igreja Crescer],10 Your Church Can Grow [A Sua Igreja Pode Crescer]2' c Ten Steps fo r Church Growth [Dez Passos para o Crescimento da Igreja],22 esses homens fizeram uma abordagem mais elaborada desse processo. Aplicando boas técnicas de pesquisa, trouxeram à tona vários princípios e diretrizes que conduzem ao crescimento da igreja. Embora esses autores ressaltem a necessidade de evangelização e dc edificação e um compromisso com a autoridade das Escrituras, o resultado prático desse destaque ainda se concentra no crescimento quantitativo. Embora tentenyintegrar princípios bíblicos com diretrizes científicas, salientandoy4 necessidade de uma experiência cristã qualilaliva, muitas vezes os aspectos pragmáticos e científicos parecem obscurecer o bíblico. Parece que deliberadamente focalizam princípios ivlesiológicos gerais de modo que possam relacioná-los a uma ampla variedade de igrejas e denominações no mundo religioso.

Pessoalmente, minha principal preocupação é que a maioria dos escritores do movimento de crescimento da igreja não principia com um estudo e uma exposição da Bíblia para sustentar suas posições. Em vez disso, começa com “o que funciona” e depois tenta integrar a base bíblica ao seu sistema pragmático. Freqüentemente, isso resulta numa perspectiva nebulosa daquilo que a Bíblia realmente ensina acerca da igreja. Entretanto, esses homens e muitos que foram inspirados por eles estão exercendo uma influência significativa e contínua sobre igrejas e líderes cristãos. O que estão dizendo não pode e não deve ser subestimado. Valiosas descobertas quanto à cultura e uma elaborada metodologia de pesquisa tornam esse movimento digno de elogios, especialmente em se tratando de ajudar a alcançar mais pessoas para Cristo.

Um momento decisivo No final da década de 70, uma nova dinâmica penetrou na cultura em geral, afetando a vertente principal do movimento de renovação da igreja. Como se delineou há pouco, houve de início um grande volume de atividades, artigos, livros e experiências. Mas, quase simultaneamente, o movimento de renovação da igreja foi obscurecido pelo movimento de crescimento da igreja. Ao mesmo tempo, os movimentos anti-institucionais radicais existentes na cultura em geral começaram a acalmar-se, fazendo até com que alguns evangélicos radicais ficassem mais satisfeitos com a igreja institucional. O movimento de Jesus reforçou o ímpeto dessa tendência, representando em certo sentido, uma espécie de retorno da cultura jovem às estruturas institucionais, em busca de segurança e esperança. O movimento de renovação carismática também fortaleceu bastante essa tendência, particularmente em algumas denominações tradicionais que se caracterizavam pela falta de um bom ensino bíblico e de um cristianismo relacional. De fato, esse movimento vem causando um impacto significativo nas missões e na igreja desde a década de 80. Tem atraído a atenção dos especialistas em crescimento oficial.23 Tornou-se claro para todos que, dentro da sociedade, os evan­ gélicos estavam-se transformando numa força que precisava ser levada em consideração. Em 1978, George Gallup Jr. “predisse um contínuo

crescimento do vigor evangélico” .24 Richard Quebedeaux ampliou essa análise ao escrever: Os evangélicos são tema de conversa em todos os lugares. Suas igrejas em crescimento, seus ministérios bem visíveis nas universidades, a publicação de livros e revistas de espantoso sucesso e outras realizações com o uso dos meios de comunicação, e os improváveis “novos nascimentos” de celebridades nacionais [...] chamam a atenção de protestantes liberais, católicos romanos e jornalistas seculares.25

Para a maioria dos cristãos não era hora de rachar e dividir, mas de esquecer nossas diferenças e nos unir para a glória de Deus. Muitos escritores que haviam criticado a igreja começavam a enxer­ gar, no renascimento do evangelicalismo, as respostas em potencial para suas preocupações. Mas a que leva tudo isso? Como se podia prever, os escritores do crescimento da igreja estão entusiasmados. Vêem nesse ímpeto de atividades o movimento do Espírito de Deus, E quem pode negar que Deus esteja atuando neste mundo? Além disso, com certeza faz bem ao ego o fato de participar de um movimento que tem sido desconsiderado com freqüência. Entretanto, para ser franco, estou preocupado. Estou bem animado com o crescimento da igreja. Eu o experimentei pessoalmente, ajudando a começar várias igrejas nos últimos anos. E, enquanto escrevo este capítulo, pastoreio uma igreja de rápido crescimento no complexo metropolitano de Dallas. Contudo, quando viajo pelo país para participar de reuniões com pastores, quando leio o que se está escrevendo sobre a igreja, quando observo o que está acontecendo com o cristianismo evangélico em geral e quando penso em minha própria experiência pastoral, con­ venço-me de que, normalmente, tanto a igreja quanto as organizações pareclesiásticas realmente não possuem uma compreensão clara do que a Bíblia ensina sobre a igreja. Ainda confundimos função com forma, princípios com padrões, absolutos com não-absolutos e o que deve ser supracultural com o que é estritamente cultural. Muitos líderes cristãos não possuem uma filosofia de ministério claramente definida, firmada numa eclesiologia satisfatória que brote de um estudo cuidadoso das

Escrituras. Sem esse fundamento, muitos líderes cristãos avaliam o sucesso com base na experiência pessoal ou grupai, não na teologia bíblica. Além do mais, a resposta quantitativa ainda parece ser o critério final.26 Hoje, a necessidade de renovação da igreja é igualmente grande, se não maior do que no final da década de 60 e início da de 70. A popularidade dos evangélicos, por mais animadora que tenha sido, só nos desviou daquelas coisas básicas e contribuiu para o avanço do processo de institucionalização. Em muitas igrejas que crêem na Bíblia, prolifera a influência do humanismo, tanto na função como na forma. As preocupações levantadas no início da década de 70 podem ser èxpressas ainda hoje. Em alguns aspectos, demos uma volta completa. O que precisamos, entretanto, não é de teoria, reações .exageradas nem experiências superficiais que caracterizavam as tentativas iniciais de renovação da igreja. Necessitamos de uma perspectiva bíblica abrangente que oriente pastores, missionários e todos os líderes da igreja em meio a um emaranhado de concepções, que freqüentemente causam confusão.

A renovação bíblica Qual seria a perspectiva bíblica acerca da renovação? Paulo foi o único escritor do Novo Testamento a empregar várias formas dessa palavra, mas o conceito subjacente às palavras permeia todos os escritos do Novo Testamento. A renovação está no cerne do cris­ tianismo. É uma palavra ativa e descreve a experiência de conversão, bem como o processo de crescimento em Cristo. A renovação e a salvação. Escrevendo a Tito, Paulo definiu a “renovação” em termos da obra do Espírito Santo na regeneração de um coração não-salvo. Deus “nos salvou” , escreveu, “não por obras de justiça praticadas por nós, mas segundo sua misericórdia [...] mediante o lavar regenerador e renovador do Espírito Santo” (Tt 3.5). A “renovação bíblica” envolve, então, a própria experiência de salvação. É uma obra realizada pelo Espírito de Deus. Nesse sentido, acontece no instante em que pomos nossa fé em Jesus Cristo. Diz respeito a um instante de nossa história pessoal em que passamos das trevas para a luz e nos tornamos membros da família eterna de Deus.

A renovação e o crescimento espiritual. Paulo também empregou a palavra “renovação” para descrever 0 processo de nos ajustarmos à imagem de Cristo, depois de sermos renovados pelo Espírito Santo. A renovação inicial acontece instantaneamente, na hora em que confiamos em Cristo para a salvação. A renovação contínua, que nos conforma à imagem de Cristo, é constante e progressiva. O uso mais vívido e abrangente que Paulo faz da palavra “renovação” , nesse sentido, encontra-se na carta que escreveu aos romanos. Depois de lançar, nos primeiros onze capítulos dessa carta, um amplo alicerce teológico, que ele resumiu em Romanos 12.1 como as “misericórdias de Deus” , Paulo instou esses cristãos a apresentar seus corpos a Deus como sacrifício vivo e santo. “Não vos conformeis com este século” , escreveu, “mas transformai-vos pela renovação da vossa mente”. Esse processo, disse Paulo, é o meio pelo qual o cristão consegue verificar a vontade de Deus (Rm 12.1, 2). Paulo referiu-se ao mesmo processo em suas cartas aos efésios e aos colossenses. “ ... vos despojeis do velho homem” , escreveu aos efésios, “ ... e vos renoveis no espírito do vosso entendimento, e vos revistais do novo homem, criado segundo Deus, em justiça e retidão procedentes da verdade” (Ef 4.22-24; veja também Cl 3.9-11). A renovação — tanto pessoal quanto coletiva. A experiência inicial de renovação é sem dúvida alguma pessoal. Envolve um rela­ cionamento individual com Jesus Cristo. A conversão é uma transação entre cada indivíduo e Deus. No entanto, a renovação progressiva é ao mesmo tempo pessoal e coletiva. Apresentar meu corpo a Cristo é, certamente, uma experiência pessoal. Conformar minha vida a Cristo, mediante a renovação da minha mente, também é uma experiência pessoal. Mas, no contexto, Paulo deixou claro que a renovação também é coletiva. Não são apenas os indivíduos que devem desenvolver a mente de Cristo; a igreja também. É por isso que Paulo falou a toda a congregação de fiéis de Éfeso, exortando-os a que fossem renovados no espírito de sua mente. Também é por isso que as Escrituras falam que os cristãos tinham um coração e uma mente (At 4.32). A renovação pessoal, tal como Deus a planejou, não acontecerá a menos que ocorra no contexto de renovação coletiva. Por outro lado,

a renovação coletiva, tal como Deus a planejou, não acontecerá a menos que envolva a renovação pessoal. Ambas são necessárias. É por isso que vemos o conceito de renovação empregado nas Escrituras às vezes com sentido coletivo e às vezes com sentido pessoal. Pode-se ilustrar uma perspectiva bíblica acerca da renovação com os seguintes círculos: Renovação bíblica

Figura 3: Romanos 12.1, 2 A renovação da igreja. O círculo maior representa a “renovação da igreja” . Esse é o conceito mais abrangente no Novo Testamento e se estende até chegar ao centro do círculo. Na maioria dos casos, as diretrizes bíblicas estão dirigidas às congregações locais de fiéis — não aos cristãos como indivíduos. No entanto, é importante observar que, muito embora Deus quisesse que cada corpo local de cristãos fosse sua unidade de pessoas fundamental e dinâmica na sociedade, o corpo também consiste em unidades sociais menores, independentes, mas inter-relacionadas — o casamento e a família.

A renovação da família. A família (o círculo seguinte) aparece nas Escrituras como a “igreja em miniatura” . Por sua própria natureza, cada igreja local é constituída de várias unidades familiares. Dessa forma, a família cristã é uma parte complexa da igreja local. O que Deus diz à igreja, também diz à família, embora às vezes diga algumas coisas especiais para os membros de cada unidade familiar. (Veja Ef 5 .2 2 -6 .4 ; Cl 3.18-21; 1 Pe 3.1-7). A renovação do casamento. A família, por sua vez, é constituída de uma unidade ainda menor — o marido e a esposa. De fato, o relacionamento entre marido e esposa deve ser um constante lembrete do relacionamento que deve existir entre Cristo e a igreja. Deve ser o mais íntimo de todos os relacionamentos humanos. A renovação pessoal. O círculo central representa a renovação pessoal, que está inseparavelmente ligada a todas as outras unidades básicas. Por exemplo, o casamento é constituído de dois indivíduos distintos que se tornam um. Além disso, a família é formada por pais e filhos, os quais, como uma unidade familiar, também devem refletir a mente de Cristo. E a igreja é formada não apenas de indivíduos, mas também de casais e de famílias. Na perspectiva bíblica, é impossível renovar a igreja sem renovar famílias, cônjuges e indivíduos cristãos. Por outro lado, não é possível renovar indivíduos cristãos sem renovar cônjuges, famílias e a igreja.

O processo de renovação É possível iniciar a renovação bíblica dentro de qualquer uma das diferentes unidades sociais incluídas na figura 3. Mas, não importa por onde você inicie — pela igreja, pelas famílias, pelos cônjuges ou pelos indivíduos — você vai mexer imediatamente com todas as demais unidades sociais do esquema divino. Além disso, a menos que compreendamos as funções e os princípios que Deus estabeleceu para cada unidade, não conseguiremos provocar uma mudança positiva, inspirada no exemplo de Cristo, tal qual Deus planejou. De fato, podemos cometer sérios erros de julgamento e, em alguns casos, “encurralar as pessoas” naquilo que pensamos que Deus está dizendo a determinada unidade social ou a um indivíduo, quando na realidade

temos uma visão bitolada. Por outro lado, podemos inconscientemente ir além dos princípios das Escrituras e dar liberdade excessiva, sem perceber que estamos sendo afetados pela nossa cultura, humanista. Portanto, os princípios bíblicos de renovação devem incluir aquilo que Deus diz primeiramente à igreja, depois a pais e filhos, em seguida a maridos e esposas e>finalmente aos cristãos como indi­ víduos. Isso é importante por ser difícil compreender e discernir as coisas especiais que Deus diz às famílias, aos casais e aos indivíduos cristãos, sem compreender aquilo que disse à igreja. Como se afirmou anteriormente, aquilo que se diz à igreja constitui a maior parte daquilo que Deus diz nas cartas do Novo Testamento. Sem essa perspectiva total, desenvolvemos pontos cegos em nossa filosofia de ministério. Quero ilustrar como uma visão restrita pode levar a uma interpretação incorreta das Escrituras. Certo dia estive conversando com duas pessoas profundamente ativas no processo de renovação matrimonial. Com um estudo das Escrituras, chegaram à conclusão de que o conceito de “cabeça da família” não era bíblico. Ambos acreditavam que Paulo havia ressaltado essa responsabilidade em razão do contexto cultural do Novo Testamento. Insistiram que Jesus jamais tivera a pretensão de mantê-la continuamente daquela forma. Em outras palavras, para eles a liderança masculina dentro do casamento não era um absoluto, mas uma adaptação cultural. Naquela altura perguntei-lhes sobre a autoridade na igreja local. “Que dizer dos presbíteros?”, indaguei. “Que dizer da autoridade delesT A resposta que deram à minha pergunta foi esclarecedora. Não tinham dificuldade com o fato de que os presbíteros devessem ser os líderes da igreja, com uma autoridade conferida por Deus; no entanto, acreditavam que o plano de Deus para o casamento era diferente. Nesse momento ficou claro — pelo menos no meu próprio raciocínio — que a interpretação bíblica dos dois tinha sido influen­ ciada pelo fato de que não haviam desenvolvido uma eclesiologia adequada, isto é, o que o Novo Testamento ensina sobre a igreja. Pareciam não perceber a coerência presente no Novo Testamento. Vemos essa coerência no fato de que os presbíteros devem liderar a igreja, os pais devem liderar suas famílias e os maridos devem ser os

cabeças de suas esposas, assim como Cristo é o cabeça da igreja. Na realidade, é impossível separar a função da família e a função do casamento da função da igreja local. Todas essas unidades sociais estão inter-relacionadas. Não seria lógico que Deus tivesse uma série de princípios supraculturais para a igreja, outra para a família e ainda outra para o relacionamento marido—esposa. Isso ajuda a convergir a atenção para um problema enfrentado por fundadores e líderes de muitas organizações pareclesiásticas que surgem em razão de necessidades específicas do corpo de Cristo em geral. Há muitos exemplos. Uma organização pode surgir em virtude de um senso de responsabilidade na área da evangelização pessoal. Sem uma eclesiologia satisfatória, os líderes freqüentemente negli­ genciam aquilo que a Bíblia diz a respeito da evangelização coletiva. Outra organização pode surgir por causa de um senso de respon­ sabilidade na área do discipulado pessoal. Sem uma eclesiologia satisfatória, os líderes vão negligenciar a importância da atuação do corpo no processo de levar as pessoas à maturidade em Cristo. ' O problema se complica quando algumas organizações iniciam um ministério junto a unidades sociais menores e depois tentam expandi-lo para incluir o conjunto mais amplo abordado nas Escrituras. Por exemplo, estou-me lembrando de certa organização que começou ajudando os jovens a se relacionarem com seus pais. Desenvolveu-se uma série de princípios, sem levar em conta aquilo que a Bíblia diz à igreja local. O passo seguinte foi envolver-se na área do relacio­ namento marido—esposa. De novo, desenvolveu-se uma série de princípios sem levar em conta aquilo que a Bíblia diz sobre a igreja local. Todavia, por causa da necessidade, por fim os princípios foram expandidos para incluir a igreja local. O problema é que, quando partimos do interior para o exterior do círculo, podemos desenvolver “pontos cegos” em nossa interpretação bíblica. Por isso é tão vital desenvolver todos os princípios para dirigir a família, o casamento e os indivíduos, levando em conta os princípios mais abrangentes que Deus estabeleceu para a igreja. Afinal, essa é a essência do Novo Testamento. A maior parte do Novo Testamento foi escrita para o corpo de cristãos, não para os cristãos como indivíduos, nem mesmo para as unidades familiares.

A renovação bíblica — e a evangelização Devemos recordar que a renovação bíblica não é um fim em si. O corpo de Cristo deve edificar-se em amor, de maneira que a unidade resultante sirva de ponte para trazer até Jesus Cristo o mundo perdido — seja como indivíduos, casais, famílias ou a igreja como um todo. Essa foi a essência da oração de Cristo em favor dos fiéis: “Que eles sejam levados à plena unidade, para que o mundo saiba que tu me enviaste, e os amaste como igualmente me amaste” (Jo 17.23, NVI).

Resumo A renovação baseada na bíblia é um processo abrangente. É a essência do cristianismo, o objetivo principal da igreja e a mensagem fundamental da Bíblia. Abarca todos os segmentos da comunidade cristã. Portanto, a primeira tarefa diante de nós é descobrir aqueles princípios que Deus estabeleceu para a igreja. A partir daí, podemos focalizar os princípios bíblicos de renovação para a família, para o relacionamento marido—esposa e para o crescimento pessoal em Cristo. Há um meio de alcançar esses objetivos — é o tema do nosso próximo capítulo.

Notas 1 Elton T r u e b LOOD, The company of the committed, Harper Brothers, p. 5., apud Karl H e i m , Christian faith and natural science, Harper Brothers, p. 2 4 . 2 Findley B. E d g e , A quest for vitality in religion, Broadman, p . 9. 3 Larry R i c h a r d s , A new face for the Church, Zondervan, p . 9. [Larry Richards continua escrevendo sobre a questão da renovação da igreja. Embora tenha em Larry um bom amigo e colega e admire sua capacidade como escritor, pessoalmente acredito que ele tem-se desviado cada vez mais para a estrada do idealismo. Suas concepções sobre liderança, em especial, e sobre o funcionamento do corpo da igreja não se baseiam numa experiência realista. Levada a sério, sua teoria de liderança é inexeqüível, especialmente numa igreja em expansão. Aliás, sob certas circunstâncias, pode acabar levando ao caos e à divisão na igreja. Veja “A Biblical Style of Leader­ ship?”, artigo em que rebato Larry Richards na questão da liderança, na revista Leadership (vol. 2 , número 2 , primavera de 1981), p . 68-78. Veja

também os livros de Richards A Theology of Church Leadership, Zondervan, e Teologia do Ministério Pessoal, Vida Nova. 4 Francis SCHAEFFER, A igreja no ano 2001, APLIC, p. 90. 5 Howard S n y d e r . The fellowship of the Holy Spirit, Christianity Today, p. 4-7. 6 Idem, Church renewal through small Groups, United Evangelical Action, verão 1971, p. 29-31. 7 Idem, Does the Church suffer an edifice complex?, World Vision, Sept. 1971, p. 4s. 8 Idem, ‘The people of God’ — implications for Church structure, Christianity Today, 27 Oct. 1972, p. 6-11. 9 Idem, Should the protestant pastor be a superstar?, The Other Side, Mar.Apr. 1973, p. 8-11. 10 Idem, The problem of the wineskins, Intervarsity, p. 11. 11 David M a i n s , Full circle, World Book, p. 22. 12 Idem, A balanced stride, Christianity Today, 18 Aug. 1971, p. 22. 13 George W. PETERS, Saturation evangelism, Zondervan, p. 153. 14 Robert G i r a r d , Brethren, hang loose, Zondervan. 15 Ray S t e d m a n , Igreja, corpo vivo de Cristo, Mundo Cristão. 16 Abaixo alguns dos livros escritos durante esse período que contam a história de várias igrejas que estavam fazendo mudanças significativas em suas estruturas: Dan B a u m a n n , All originality makes a dull Church, Vision; Bernard P a l m e r , Pattern for a total Church, Victor Books; Larry R i c h a r d s , Three Churches in renewal, Zondervan; Mike T u c k e r , The Church that dared to change, Tyndale; Frank TlLLAPAUGHT, The Church unleashed, Regal. 17 Elmer T o w n s , The brightfuture of the Sunday School, F. C. Publications. 18 Idem, The ten largest Sunday Schools and what makes them grow, Baker. 19 William J. P e t e r s e n , Thinking Big, Eternity, Feb. 1978, p. 21. 20 Donald A . M c G a v r a n , H o w to grow a Church, Regal. 21 C. Peter W a g n e r , Your Church can grow, Regal. 22 Donald A . M c G a v r a n & Winfield A r n , Ten steps for Church growth, Harper and Row. 23 Veja na revista Christian Life de outubro de 1982, um número dedicado ao movimento carismático e ao crescimento da igreja. 24 Albert J. M e n e n d e z , Who are the evangelicals?, Christianity Today, 27 Jan. 1978, p. 42. 25 Richard Q u e b e d e a u x , The worldly evangelicals, Harper and Row, p . 3 .

26 Para um ótimo estudo que trata dessas preocupações, veja George W. P eters, A theology of Church growth, Zondervan,

Crédito: Mazinho Rodrigues Doação Exdusiva

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Uma visão por três ângulos

Sempre que há pessoas, há função. E, sempre que você encontrq. ‘anção, você encontra forma. Ou seja, a “forma” e a “estrutura” sãq inevitáveis. Em outras palavras, não se pode ter “organismo” sem organização” . Sempre que se tenta alcançar um objetivo ou aplicaium princípio, precisa-se desenvolver um procedimento ou um padrãq para fazê-lo. Não se consegue comunicar uma “mensagem” sem “método” . Não se consegue ensinar uma “verdade” sem desenvolvei algum tipo de “tradição” . E, citando o Dr. George Peters, “Sempreque houver ‘pnêumenos’, haverá ‘fenômenos’” . I A igreja local não foge à regra. Sempre que houver pessoa^ ativamente atuantes em várias funções, haverá forma e estrutura. Um^ 1 pressupõe a outra Atenção!nÉ possível descrever a ati.idaae sem descrevei a forma. Os escritores da Bíbiia fizeram isso o tempo todo Mas você podç estar certo de que, no exercício das funções do Novo Testamento.1 sempre houve algum tipo de forma cultural. ^

A inc ispensabilidade da forma

PESSOAS

\

FUNÇÃO

-------- v1

\

FORMA

Figura 4 Todos nós podemo-nos identificar com es§a realidade. Vivemos dentro do círculo da forma e da estrutura (veja a figura 5). É o que nos dá sensação de segurança. Mas a pergunta importante diante de cada líder de igreja é: Que tipo de forma e estfutura devemos ter em nossa igreja?

Figura 5: O círculo da fortna

Uma filosofia de ministério adequada Não temos condições de responder a essa pergunta, para nós mesmos ou para qualquer outra pessoa, sem que tenhamos uma filosofia de

ministério adequada, que levanta uma pergunta fundamental: “por quê?” . Por que fazemos o que fazemos? Mesmo como indivíduos, temos uma filosofia que determina a maneira como atuamos na vida. Talvez não a tenhamos explicitado ou articulado para nós mesmos ou para os outros. Mas está presente, determinando as nossas ações e a maneira como agimos. Acontece o mesmo com a igreja. Todos os líderes de igreja possuem mna^filosofia de ministério. Embora talvez não seja óbvio para os próprios líderes nem para as congregações em que atuam, ela está presente, determinando como cada igreja atua (veja a figura 6). Minha preocupação ao escrever este livro é ajudar os cristãos £

Figura 6: A filosofia de ministério desenvolver uma filosofia bíblica de ministério. Só assim poderemos estruturar e organizar devidamente as nossas igrejas. Só assim poderemos escolher métodos e padrões que ajudarão a igreja a tornarse aquilo que Deus planejou que ela fosse neste mundo. É interessante que os que escrevem sobre o “crescimento da igreja” ressaltem a importância de os líderes da igreja darem atenção à sua filosofia de ministério, a fim de experimentarem crescimento numérico. Entretanto raramente especificam, pelo menos com minú­ cia, qual deve ser essa filosofia. Aliás, muitas vezes reconheceiri várias filosofias de ministérios como válidas e aceitáveis.1

{ Será possível desenvolver uma filosofia de ministério verda< deiramente bíblica — algo reconhecido como aquilo que as Escrituras ( ilustram e ensinam? Creio que sim — se empregarmos uma metodologia de pesquisa adequada que nos ajude a ter uma idéia nítida do que Deus está dizendo. Embora tenhamos diferenças de opinião acerca de questões secundárias, creio que certamente ,é possível compreender o plano específico de Deus para as igrejas locais da mesma forma que é possível descobrir a verdade a respeito da ) divindade de Cristo, da Trindade, da salvação — e de outras doutrinas (bíblicas importantes. Para desenvolvermos uma filosofia de ministério adequada — endossada por Deus — precisamos olhar pelo menos por três ângulos (veja a figura 7). O primeiro é básico e fundamental — o ângulo das Escrituras. Em seu conteúdo, os ângulos da história e da cultura não estão dissociados do ângulo das Escrituras, mas também revelam percepções extrabíblicas e são muito importantes para evitar uma “visão bitolada” e uma miopia eclesiástica à medida que desen—volvemos uma filosofia pessoal de ministério. Ou, falando positivamente e levando adiante nossa analogia, os três ângulos podem auxiliar-nos no desenvolvimento de uma visão 6/6 acerca do plano de Deus para a igreja. Como podemos chegar aos três ângulos? Esse é o propósito deste livro. O que temos depois deste capítulo são os resultados desse processo. Todavia, o que temos logo a seguir, neste capítüfõ", é uma \expi icâçãoj íustradasobre como utilizar esse processo. Nesse sentido, a abordagem dos três ângulos compreende um método de pesquisa bíblica, histórica e cultural. (JO ângulo das Escrituras. E aí que se começa a formular uma filosofia bíblica, de ministério. Vamos ilustrar. Examine as seguintes exortações na Epístola aos Hebreus: Não deixemos de nos reunir como igreja, segundo o costume de alguns, mas encorajemo-nos uns aos outros, ainda mais quando vocês vêem que se aproxima o Dia (Hb 10.25, nvi).

Figura 7: Os três ângulos Essa passagem bíblica delineia claramente duas diretrizes e funções do Novo Testamento. Os cristãos devem^“reunir-se regularmente” a fim d e '“encorajarem-se uns aos outros” . No entanto, também está claro que esse versículo não menciona nenhuma_ “ forma” ou “estrutura” para essas duas funções. Isso não significa que para o autor dessa epístola os cristãos deveriam reunir-se sem nenhuma forma. Eles também não poderiam “animar-se uns aos outros” sem algum tipo de estrutura. Vamos olhar a primeira diretriz com mais cuidado (veja a figura 8). Esses cristãos deviam Treunir-se regularmente. Entretanto, a passagem não especifica quando deviam reunir-se, com que freqüência V deviam reunir-se, onde deviam reunir-se nem a ordem específica de qdto que deviam seguir quando se reunissem. Se olharmos mais atentamente para o contexto maior do Novo Testamento — aspecto muito importante numa interpretação precisa da Bíblia — encontraremos exemplos que nos indicam quando a igreja se reunia, com que freqüência ela se reunia e onde ela se reunia. Em

proporção menor, encontraremos algumas referências à maneira como estruturavam seus cultos. Entretanto, ao se aprofundar na questão, você vai observar algo bem significativo. Em primeiro lugar, muitas vezes o Novo Testamento descreve funções e diretrizes, sem descrever formas, exatamente como na passagem de Hebreus. Por exemplo, Lucas registrou no livro de Atos que os apóstolos “não deixavam de ensinar e proclamar que Jesus é o Cristo” (At 5.42). “Ensinar” e “pregar” são fimçôes. Embora Lucas tenha feito referência a essas funções, não descreveu a metodologia (forma) de ensino e de pregação utilizada pelos apóstolos; entretanto, sabemos ser impossível “ensinar” e “pregar” sem alguma espécie de forma e de metodologia.

A função no século 1

A função no _ ___ século xx

Reuniam -se regularmente

A forma variava

Função

Princípio

I 1

I 1

Reúnem-se regularmente

Liberdade na forma

(AbsoJuto)

(Não-Abso!uto)

Figura 8: Função e forma Em segundo lugar, quando existe alguma descrição de forma, é sempre parcial ou incompleta. Nunca é possível copiar com exatidão a forma e a estrutura bíblica porque sempre faltam certos pormenores e informações no texto bíblico. Por exemplo, Lucas registrou na mesma passagem que os apóstolos “não deixavam de ensinar e proclamar ” à medida que iam “de casa em casa” (5.42b). Ir “de casa

em casa” é, sem dúvida alguma, forma e estrutura. Entretanto, q processo não é delineado com minúcia. Será que paravam em cada casa? Ou iam somente aos lares daqueles que já acreditavam em Cristo? Será que as pessoas convidavam os vizinhos para ir ouvir os apóstolos? Os apóstolos “entravam na casa”, “ficavam do lado de fora” ou “iam ao terraço” como seria possível naquela cultura? Não sabemos as respostas a essas perguntas, porque a forma descrita (ir “de casa cm casa") é incompleta e parcial. Em terceiro lugar, -a forma e a estrutura descritas parcialmente variam de um cenário do Novo Testamento para outro. De fato, encontramos variações dentro do texto que estamos observando. Os apóstolos não apenas ensinavam e pregavam de casa em casa, mas também iam ao “templo” (5.42a, nvi). Imediatamente, surge um problema. Em algumas culturas talvez não seja muito problemático ir “de casa em casa” para ensinar o evangelho de Cristo. Entretanto, teríamos de escolher cuidadosamente nossa metodologia, pois, caso empregássemos a abordagem apostólica descrita nos Atos dos Apóstolos, provavelmente violaríamos a legislação de muitas cidades e teríamos problemas com as autoridades locais.2 O jro b lern a das restrições culturais em relação ao cristianismo causou um forte impacto em mim há alguns anos, quando eu estava compartilhando princípios da vida da igreja neotestamentária com pastores atrás da cortina de ferro. Nesse país, era ilegal grupos de pessoas se reunirem em residências. Nem mesmo parentes podiam reunir-se em grande número. Não era uma determinação dirigida apenas a cristãos. Essa política governamental havia sido estabelecida para evitar qualquer possibilidade de conspiração contra a autoridade do Estado. Naturalmente, restringia bastante os cristãos, impedindo-os de usar seus lares para qualquer tipo de reunião religiosa que envolvesse mais do que os parentes mais próximos. Entretanto, nosso maior desafio, em qualquer cultura da atualidade, seria ensinar o evangelho no “pátio do templo” . Esse fenômeno cultural era exclusivamente judaico, relacionado com os primeiros dias do cristianismo. Todavia não levou muito tempo para que o “templo” fosse vedado aos cristãos judeus. Vamos resumir.

• Com freqüência, a Bíblia ensina função sem descrever a forma. • Quando chega a descrever a forma, ela é parcial e incompleta. A forma descrita varia de uma situação para outra. A Isso conduz a uma conclusão muito importante. Em conferências sobre renovação da igreja, muitas vezes me perguntam [como é possível fazer distinção entre absolutos e não-absolutos nas Escrituras. Ã resposta está nessas três observações a respeíto da forma no Novo V Testamento.^ Não é possível tornar absoluto algo que não esteja) í ■!descrito, que esteja sempre incompleto e que esteja sempre mudando l ; de um contexto para outro. É por isso que a forma e as estruturas não j são absolutas na Bíblia. Não encontrei uma que não se encaixasse^ nesse critério tríplice. De fato, existe somente uma estrutura, em toda a Bíblia, descrita circunstanciadamente — ,o tabernáculo no Antigo Testamento. Mas, mesmo assim, não é possível reconstruir esse local de adoração do Antigo Testamento sem acrescentarmos alguns pormenores nossos. v Por outro lado, as funções e os princípios são absolutos — se aparecem invariavelmente ao longo de j oda a história do Novo Testamento e não são circunstanciais.3(^josso desafiõ é “olhar pelo ^ ângulo das Escrituras” e isolar aquelas fiinções e diretrizes absolutas e supraculturais. /A

ângulo da história, Observe, antes de mais nada, que podemos sobrepor o ângulo das Escrituras ao da história. As Escrituras são< história, isto é, história divina, história inspirada ou história “soprada por Deus” . É aqui que encontramos diretrizes e funções absolutas que nos permitem lançar os alicerces de uma filosofia bíblica de ministério. . Além disso, podemos aprender lições valiosas com nossos antepas­ sados..Paulo ilustrou essa questão em sua primeira epístola aos corín­ tios, quando escreveu: “Estas cousas lhes sobrevieram [aos filhos de Israel] como exemplos, e foram escritas [no Antigo Testamento] para advertência nossa, de nós outros sobre quem os fins dos séculos têm chegado” (1 Co 10.11). Hoje, os cristãos têm não apenasta história do Antigo Testamento, mas tambénAa história do Novo Testamento — a história divinamente inspirada da igreja. Ela também foi registrada para nossa instrução, para nos ensinar a dirigir sua igreja.

Uma visão por três ângulos 43 ' j ^ ' } i. -A1 •i'>- ;y‘ Entretanto, há/um a história que se estende além das páginas sagradas das Escrituras i A história da igreja está repleta de lições para os cristãos do século XX. É esse jângulo que nos permite voltar os holofotes para a igreja do final do século I e de todos os séculos que se seguiram. É esse processo que noí proporciona uma compreensão que nos permitirá/ressaltar o que oy cristãos têm feito acert|damente, / eliminar (assim se espera) o que temos feito de errado e/corrigir o que temos feito mal. Esse processo, à semelhança do estudo da igreja nas Escrituras, não tem limites. Existe, entretanto, um tipo, especial de história que também pode ser estudado e oferece descobertas incomuns para os cristãos. Vamos ilustrar. Não é de surpreender queivos historiadores sociais tenham < descoberto que em ^qualquer lugar em que haja pessoas, haverá y função,fe em qualquer lugar em que houver função, haverá forma,// Mas eles descobriram outra coisa extremamente cabível à nossa preocupação principal neste livro.

P E S S O A S ---------► F U N Ç A O fixação crise

|

FORM A

\

Começa a ocorrer uma mudança... Figura 9: Fixação, crise e mudança ■.

( A resistência a mudanças. Os historiadores sociais fizeram duas observações importantes (veja a figura 9). Em primeiro lugar, ao estudar as pessoas e as estruturas sociais, descobriram que as pessoas

têm a tendência de se fixarem por um período de tempo — espe­ , cialménte nas formas. As pessoas não desejam mudanças. Estudos 1 revelam que existe uma constante na história. Essa constante é a fixidez. f Todavia, os estudos sociológicos também assinalam quetaspessoas na verdade operam mudanças em suas formas e estruturas na sociedade, basicamente sob uma condição alguma espécie de crise. Então, e só então, as pessoas estão abertas a uma mudança. Geral­ mente essa crise surge porque as formas e as estruturas já não são aplicáveis. Já não servem de meio eficaz para atender às necessidades das pessoas daquela determinada sociedade. ,z:- d Recentemente isso vem sendo ilustrado de forma incomum em nossa própria sociedade e também em outras. Há anos estamos ^construindo a economia de nosso país com base em fontes energéticas importantes, tais como ftpetróJeo, a gasolina e o carvão. Compreendese que esses recursos vão-se esgotar um dia. Que aconteceu? Essa crise energética precipitou amplos projetos de pesquisa para superar esse problema. Se o Senhor tardar, sem dúvida alguma desenvolveremos novas formas de energia; talvez cheguemos, por fim, a substituir totalmente as antigas. Já aprendemos maneiras novas e diferentes de utilizar jjeneigia solar, e aperfeiçoaremos esse processo nos próximos anos. O fato importante é que não estaríamos explorando novas fontes ,\ energia se não tivéssemos enfrentado crises nacionais e internacionais. -J=r E o mesmo acontece com a igreja. Os cristãos pouco diferem das ( demais pessoas em sua constituição psicológica. /A s estruturas „ i proporcionam uma sensação de segurança. E, quando interferimos nas £ 1estruturas da sociedade, estamos interferindo na estabilidade emocional k ; das pessoas. Isso provoca ansiedade, e a ansiedade sempre resulta em h resistência a mudanças. " Permita-me ilustrar essa questão com uma experiência pessoal. Alguns anos atrás deixei as sagradas salas do saber — o seminário teológico. Depois de quase 20 anos como professor, primeiramente no Moody Bible Institute, em Chicago, e depois no Dallas Theological Seminary, decidi tornar-me pastor de tempo integral. Ajudei a fundar a Fellowship Bible Church (Igreja Bíblica Comunitária) em Dallas e, desde então, várias igrejas têm surgido em conseqüência da primeira

igreja em 1972. Embora naqueles primeiros dias eu estivesse apreciando muito essa experiência, por vários meses também experi­ mentei uma ansiedade incomum. Não conseguia entender por quê. Então, certo dia, obtive a resposta àquela pergunta. De repente ficou claro para mim que, depois de 20 anos dentro de um tipo de estrutura (estrutura que eu conhecia muito bem), eu havia feito uma mudança radical. De fato, eu estava pastoreando uma igreja de renovação que havia começado primeiramente com as funções . ) .'deixando que as forrpas se desenvolvessem naturalmente em nosso próprio contexto cultural. Eu conhecia as formas de uma igreja tradicional de cor e salteado. Já havia trilhado esse caminho. Mas lá estava eu, trocando as formas da vida acadêmica pelas formas de uma igreja local, as quais eram novas e inovadoras. Eu ainda não havia trilhado esse caminho. Se tivesse parado para pensar antes de fazer a mudança, poderia ter predito a ansiedade que se seguiu. Era natural. Assim que compreendi a origem de minha ansiedade, pude lidar com ela e, por fim, desenvolver uma segurança dentro das novas formas que eu estava ajudando a criar. , Vejo com freqüência esse fenômeno psicológico (em pessoas que participam de nossos cultos pela primeira vez, especialmente se mais enraizadas em estruturas eclesiásticas tradicionais do que o normal. Inicialmente, sentem-se pouco à vontade. É uma reação emocional compreensível. ..Falta de compreensão ' Precisamos, portanto./compreender por que as pessoas resistem a mudanças. Mas também precisamos compreen­ der que às vezes os cristãos enfrentam um “problema dobrado” . Por crermos que há coisas que nunca devem mudar, é comum confundirmos não-absolutos (aquelas coisas que devem mudar) com absolutos (coisas que não devem mudar). Muitas vezes essa resistência tem raízes na insegurança e no medo, conduzindo à racionalização. Afinal, qual a melhor maneira de racionalizar, senão p ensar que < estamos defendendo a verdade das Escrituras? Muitos cristãos, no entanto, resistem a mudanças porque estão realmente confusos.(Não compreendem as diferenças entre absolutos e não-absolutos. Colocam “iniciar o culto com a doxologia” na mesma categoria do “nascimento virginal” . Ou então pensam que “reunir-se às onze da manhã no domingo” é tão significativo quanto o que a

Bíblia ensina acerca da “segunda vinda de Cristo” . Embora eu esteja falando de forma hiperbólica, essas ilustrações apontam para o problema. f% importante ajudar os cristãos a compreender a diferença entre ' absolutos e não-absoíutos (veja a figura 10), entreJunções e formas, entre princípios e padrões, entre verdade e tradição, entre organismo organização, entre mensagem e método, entre aquilo que é supra_cultural e aquilo que é puramente cultural. E por essa razão que é importante observar com cuidado as igrejas do Novo Testamento pelo ângulo das Escrituras. E, conforme foi ilustrado, o ângulo da história vai ajudar-nos a descobrir quando acertamos e quando erramos no passado, ao estabelecer essas distinções. » _ Além disso, na qualidade de líderes cristãos,/temos um meio dado por Deus para provocar, na vida dos cristãos £crises'que podem trazer mudanças significativas. Falo da Palavra de Deus. Em qualquer lugar e em qualquer época em que a verdade de Deus seja ensinada, ela deve criar uma crise dirigida pelq/Espírito, na vida de cada cristão que está em desarmonia com aquela verdade. Se desejamos estar dentro da vontade de Deus, devemos mudar nossas atitudes e comportamento e conformar nossas vidas à Palavra de Deus. Por isso é importante usar o ângulo das Escrituras para ajudar os cristãos a compreender oplano de Deus para a igreja. À medida que começarem a entender o que é absoluto e o que não é absoluto, o que é supracultural e o que é cultural, e à medida que compreenderem que a Bíblia ensina “liberdade na forma” para cumprir com eficácia a grànde comissão de nossopenhor Jesus Cristo em todos os lugares do mundo e em qualquer momento da história, a maioria deles estará pronta para mudar em. áreas onde deve mudar. Ao mesmo tempo, estarão seguros quanto ao fato de que não estão mudando aquelas coisas que Deus desejava que permanecessem. Quando isso acontecer, vão compreender aquilo que Paulo realmente quis dizer quando escreveu: “Procedi, para com os judeus, como judeu, a fim de ganhar os judeus [...]. Aos sem lei, como se eu mesmo o fosse [...]. Fiz-me tudo para com todos, com o fim de, por todos os modos, salvar alguns” (1 Co 9.20-22).

ABSOLUTOS

Função Princípio Organismo Verdade Mensagem SUPRACULTURAL

NÃO-ABSOLUTOS

Forma Padrão Organização Tradição Método CULTURAL

Figura 10: Absolutos versus não-absolutos /

[O ângulo da cultura.; Mais uma vez, esse ângulo está claramente relacionado com os ângulos das Escrituras e da história. Não se pode estudar a Bíblia sem que se veja a influência da cultura. E não se pode estudar a história — especialmente a história social — sem se deparar com a cultura. Jesus desenvolveu seu ministério dentro de várias culturas e compreendeu muito bem essas culturas. Isso está ilustrado de modo impressionante no encontro que teve com a mulher samaritana, junto ao poço de Jacó. A cultura dela era diferente. A visão que tinha acerca da religião e da vida em geral era bem diferente da concepção de um indivíduo de formação tipicamente judaica. Jesus empregou seu conhecimento cultural para comunicar-se eficazmente com essa mulher. Isso teve efeito visível em sua metodologia ao aproximar-se dela e ensinar-lhe a verdade divina. Também teve efeito inegável na resposta que ela deu. Paulo, mais que qualquer outro apóstolo, ilustrou como é impor­ tante compreender a cultura. É o que esperávamos, visto que seu ministério esteve voltado basicamente para os gentios. Conforme veremos em nosso capítulo sobre as funções e os princípios de lide­

rança no Novo Testamento, o conhecimento que Paulo tinha das cul­ turas grega e romana influenciaram, por exemplo, sua maneira de se expressar. Dessa forma, a partir do próprio ângulo da Escritura, podemos elaborar um forte argumento que revela a importância da compreensão da cultura e como ela afeta a maneira de as pessoas pensarem e sentirem em relação à vida. Mas, assim como ocorre na história, precisamos olhar além das Escrituras para obtermos uma compreensão da cultura e vermos suas implicações. O analista secular Alvin Toffler ajudou a todos nós a melhor compreender a influência da cultura. Seu livro O Choque do Futuro foi um estudo instigante sobre o rumo que a história está tomando. No entanto, seu livro A Terceira Onda foi particularmente útil para mim, sobretudo por me ajudar a compreender como a cultura afeta a forma e a estrutura. É interessante que li boa parte desse livro, pela primeira vez, enquanto viajava para Quito, no Equador, para falar a missionários sobre os princípios da igreja no Novo Testamento. Achei úteis as idéias de Toffler quando entrei nesse contexto para ministrar a líderes cristãos atuantes em diferentes culturas, todas muito diferentes da minha própria.4 Toffler assinalou que, durante muitos anos, grande parte da civilização sobreviveu numa cultura agrícola. As formas e as estruturas da sociedade eram relativamente pequenas porque a forma “conforma-se” ao número de pessoas de determinada situação. Falando em termos gerais, isso descreve a cultura bíblica, embora certamente haja exceções, especialmente no Império Romano, que se orgulhava de possuir cidades bem grandes. Mesmo assim, a maior parte das estruturas era relativamente pequena, à exceção dos anfiteatros e de alguns templos religiosos. Toffler ainda afirma que tudo isso estava destinado a mudar há algumas centenas de anos. Passamos da “onda agrícola” para a “onda industrial” , que provocou a centralização da população, que por sua vez gerou as grandes estruturas sociais — tais como vilas, cidades e comunidades residenciais. Esses centros populacionais também gera­ ram fábricas, universidades, hospitais e ainda igrejas. Surgiram grandes formas e estruturas para acomodar funções que envolviam milhares de habitantes de determinada área geográfica.

Essa é uma percepção cultural significativa. Em minha própria experiência de abertura de igrejas na área metropolitana de Dallas, durante algum tempo decidi manter pequenas as estruturas da igreja, com o intuito de estimular a função de “corpo vivo” . Para atingir esse objetivo, utilizamos os edifícios de diversas maneiras e demos início a certo número de igrejas filiais. No entanto, quanto mais abríamos igrejas, maior era o crescimento que experimentávamos, fundamen­ talmente porque estávamos numa área de crescimento populacional. As igrejas que iniciamos em outras áreas da cidade não solucionavam o problema de crescimento da nossa igreja sede. Aconteceram algumas coisas diretamente relacionadas à cultura. Em primeiro lugar, logo esgotamos os horários culturalmente aceitáveis para os períodos de adoração e de ensino. Em segundo, em cerca de quatro anos esgotamos as áreas geográficas que ofereciam boas perspectivas para iniciar novas igrejas, especialmente em relação à nossa igreja sede. Em terceiro lugar, logo atingimos o número máximo de pessoas que podíamos acomodar em nosso próprio edifício. Em quarto, isso começou a causar uma “mentalidade introspectiva” — um desejo de parar de alcançar novas pessoas. Também começamos a recusar pessoas, provocando sentimentos negativos nos recém-chegados, bem como nos freqüentadores regu­ lares. Foi então que percebi que estávamos começando a violar os próprios princípios em que críamos — por exemplo, o de que a forma segue a função. Para solucionar o problema, tivemos de mudar a forma — em resumo, tivemos de construir um edifício maior. Isso, por sua vez, afetaria a forma do culto. E, nesse aspecto, as pessoas do “crescimento de igreja” também fizeram um comentário cultural significativo. À medida que a igreja crescia em tamanho, foi necessário passar a ter a “celebração” quando a igreja se reunia como corpo. O desafio que encontramos foi o de estimular e desenvolver formas que continuassem a acomodar a função de “corpo vivo” . Com esse objetivo, desenvolvemos células nos lares, que denominamos “famílias de comunhão” e mini-igrejas. No fundo, estou dizendo que você não pode obrigar as estruturas da igreja a permanecer pequenas, quando você está situado num contexto cultural saturado de pessoas e de grandes estruturas. Isto é,

não dá para você permanecer pequeno caso esteja envolvido nos negócios de nosso Pai para alcançar pessoas para Cristo. E, se você está alcançando essas pessoas, precisa planejar estruturas que acomodem essas pessoas em seu próprio ambiente cultural, sem violar os princípios neotestamentários para a vida da igreja.

Resumo Este é um livro escrito com o propósito de ajudar a igreja a desenvolver formas e estruturas eficazes no cumprimento da grande comissão em qualquer meio cultural. Não é um livro sobre forma e estruturas. É um livro que, antes de tudo, focaliza as diretrizes e as funções encontradas no Novo Testamento, que, por sua vez, podem ser traduzidas em princípios absolutos aplicáveis em qualquer cultura do mundo desde o século I. Nesse sentido, se forem focalizadas corretamente, tornam-se diretrizes supraculturais normativas para todas as épocas. O ângulo das Escrituras é fundamental na formulação desses princí­ pios. O ângulo da história e o ângulo da cultura nos proporcionam mais percepção, especialmente ao nos ajudarem a discernir e aplicar esses princípios bíblicos. Juntos, os três ângulos ajudam qualquer pessoa que queira formular uma filosofia adequada de ministério. É esse tipo de filosofia que capacitará cada líder de igreja a desenvolver formas e estruturas e a usar métodos e técnicas atualizados e contextualizadas, mas em harmonia com os absolutos bíblicos. Essa é a combinação que cria igrejas dinâmicas que refletem os propósitos e os planos de Deus em qualquer cultura do mundo, em qualquer momento da história.

Notas 1 Veja C. Peter W agner, Leading your Church to growth, Regai Books, p.

175-181, 214-216. 2 Não há dúvida de que os apóstolos se viram em apuros por pregarem o evangelho. Aliás, alguns acabaram na prisão. Foram, no entanto, encar­ cerados por desafiarem teologicamente seus compatriotas judeus e líderes

religiosos. No século xx, na maioria dos casos as leis civis têm o propósito de garantir aos cidadãos da localidade o direito à privacidade. Nesse sentido, estaríamos violando a admoestação de Paulo a que obedeçamos às autoridades e aos magistrados locais (Rm 13.1-7). 3 Uma função ou diretriz circunstancial não pode ser repetida. Por exemplo, Paulo pediu a Timóteo que trouxesse sua capa e seus pergaminhos (2 Tm 4.13). 4 Alvin T o f f l e r , A terceira onda, Record.

Por que a igreja existe?

Quem quer que tente formular uma filosofia bíblica do ministério e desenvolver uma estratégia e uma metodologia contemporânea fir­ memente alicerçada em fundamentos bíblicos deve fazer algumas perguntas bem fundamentais e a elas responder. Por que a igreja existe? Qual é seu propósito principal? Por que, antes de qualquer coisa, Deus a deixou no mundo? Jesus Cristo, antes de subir ao Pai, tratou diretamente dessas questões. Certo dia, numa montanha na Galiléia, falou usando uma linguagem clara e simples: “Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as cousas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à consumação dos séculos” (Mt 28.19-20). Anteriormente, havia dito na presença dos discípulos, mais especificamente a Pedro: edificarei a minha igreja, e as portas do inferno [o poder da morte] não prevalecerão contra ela” (Mt 16.18).

Agora, antes de deixá-los dando continuidade à sua obra e cum­ prindo suas palavras proféticas, disse-lhes o que deviam fazer: “FAZEI d is c íp u l o s d e t o d a s a s n a ç õ e s !” . A ordem é clara, concisa, abran­ gente! Primeiramente, deviam aguardar em Jerusalém a vinda do Espírito Santo (At 1.4, 5). Depois receberiam “poder” e se tornariam suas “testemunhas tanto em Jerusalém, como em toda a Judéia e Samaria, e até aos confins da terra” (1.8). Os discípulos começaram a entender. Atos demonstra isso, sem nenhuma sombra de dúvida. O documento de Lucas é um registro preciso das atividades e das realizações dos discípulos à medida que cumpriam, de forma séria e sistemática, a ordem de marcha dada por Jesus Cristo.

Um exame mais atento Examine com mais cuidado o conteúdo dessa ordem tremenda. Eles deviam fazer discípulos — um imperativo. No versículo 19, a palavra “ide” no texto original é um particípio, tal como os dois outros particípios do versículo 20, “batizando” e “ensinando” . Mas todas essas formas verbais implicam ação e descrevem com mais minúcia o que Cristo queria que fizessem. No fundo, Jesus estava dizendo: “Enquanto forem, façam discípulos, batizem esses discípulos e ensinem-lhes o que ensinei a vocês” . Expressando-o de forma ainda mais simples, naquele dia os discípulos ouviram Jesus dizer: “Vão a todos os lugares e ganhem pessoas para Cristo [isto é, façam cristãos], e depois os batizem e ensinem a esses cristãos a verdade que tenho ensinado a vocês” . Os que se tornavam seguidores de Cristo eram imediatamente identificados como “discípulos” . Só vieram a ser chamados de cristãosquando foi fundada a igreja de Antioquia (At 11.26). Em Atos 14.21, 22a vê-se uma clara ilustração do cumprimento das instruções de Jesus de fazer discípulos e ensinar-lhes: “E, tendo anunciado o evangelho naquela cidade [Derbe], e feito muitos discípulos, voltaram para Listra, e Icônio e Antioquia, fortalecendo as almas dos discípulos, exortando-os a permanecer firmes na fé ...” .1 Em outras palavras, na primeira viagem missionária de Paulo, ele e Barnabé pregaram o evangelho e ganharam muitos para Cristo (fizeram muitos discípulos). Posteriormente, na mesma viagem,

retornaram a Listra, a Icônio e a Antioquia, e fortaleceram os novos cristãos (os discípulos) — um cumprimento direto da comissão dada por Cristo em Mateus 28.19-20. A igreja existe, portanto, para cumprir duas funções fundamentais — a evangelização (fazer discípulos) e a edificação (ensinar-lhes). Por sua vez, essas duas funções respondem a duas perguntas — primeira: “por que a igreja existe no mundo?” e segunda: “por que a igreja existe como comunidade congregada?” . Quando você indaga “Por que a igreja existe no mundo?” , você está perguntando o que Deus espera realizar por meio de seu povo à medida que este entra em contato com o mundo incrédulo! Quando você indaga “Por que a igreja existe como comunidade congregada?” , você está indagando o que Deus espera que aconteça aos fiéis à medida que se reúnem como membros do corpo de Cristo.2

Uma visão geral A evangelização e a edificação são funções distintas, mas inter­ relacionadas no Novo Testamento. Os dois tipos de atividade são bem claros e observáveis, mas nem sempre se excluem mutuamente. A igreja como “comunidade congregada” é apresentada como algo com atividades e objetivos bem delimitados. De modo análogo, a igreja, enquanto ministra ao mundo, possui atividades e objetivos bem definidos. Isso fica mais claro com o quadro seguinte (figura 11), intitulado “Por que a igreja existe?” . Embora as limitações de espaço impeçam uma apresentação completa de todo o conteúdo do Novo Testamento que ilustra como a igreja primitiva cumpriu a grande comissão de nosso Senhor, a maior parte das referências e das passagens bíblicas fundamentais está classificada nesse quadro, de modo que você possa fazer o seu próprio estudo. As duas tarefas, evangelização e edificação, estão classificadas em duas colunas. Foram incluídos textos bíblicos que ilustram tanto as funções e as diretrizes (isto é, como essas tarefas foram realizadas), quanto os resultados e os objetivos alcançados. Em alguns casos, as funções de evangelização e de edificação encontram-se tão entre­ laçadas no registro de Lucas, que são indistinguíveis. Nesses casos, os textos bíblicos aparecem no meio do quadro.

Ao examinar o Novo Testamento tendo em mente essas duas per­ guntas básicas (quais sejam, “por que a igreja existe no mundo?” e “por que a igreja existe como comunidade congregada?”), você descobrirá que as cartas, que constituem grande parte do Novo Testamento, foram escritas tendo por propósito básico a edificação. Essas cartas deviam ser lidas e estudadas na igreja, tendo em vista o crescimento e o desenvolvimento espiritual. Portanto, todo esse conteúdo bíblico poderia ser incluído na segunda coluna do quadro. Conseqüentemente, cada epístola é identificada (apenas pelo nome) em algum ponto do quadro. Entretanto, muitas epístolas incluem material biográfico e outras informações e instruções que ilustram, de modo todo especial, alguns aspectos da evangelização e da edificação. Dessa forma, além de incluir o nome de cada epístola na coluna edificação, também in­ cluímos textos selecionados das epístolas nas duas colunas.3

Resumo É por aqui que devemos começar um estudo acerca da igreja do Novo Testamento. Em termos gerais, a comissão de Cristo declara por que ele deixou a igreja na terra. Atos dos Apóstolos e as epístolas demonstram, primeiramente, que seus discípulos levaram a sério as instruções de Cristo e, depois, a maneira como cumpriram sua ordem. Mateus 28.19, 20 esboça as tarefas básicas, e o restante do Novo Testamento completa esse esboço com exemplos dinâmicos e outras instruções, que nos ajudam a compreender de modo mais abrangente o que Cristo tinha em mente para sua igreja na terra. Os capítulos de 4 a 8 deste livro trazem uma apresentação e uma interpretação pormenorizadas das passagens bíblicas esboçadas no quadro a seguir. Entretanto, antes de passar a ler as minhas inter­ pretações, faça o seu próprio estudo indutivo. O modelo de pesquisa ilustrado na figura 11 vai ajudá-lo a compreender como ir até o fim desse processo estimulante. Para ajudá-lo em seu próprio estudo indutivo, o “Apêndice A ” apresenta, por escrito, uma compilação das passagens bíblicas esboçadas no gráfico que segue. São também oferecidas instruções específicas sobre como realizar esse estudo.

Por Que

a

I g r e ja E x is t e ?

Por que a igreja existe no mundo

Por que a igreja existe como “comunidade congregada”

I n d o — F a z e i D is c íp u l o s

B a t iz a n d o — E n s in a n d o -l h e s

E v a n g e l iz a ç ã o

E d if ic a ç ã o

1

Funções e i Diretrizes i Atos 1.8

i

Resultados e Objetivos

Funções e Diretrizes

i Resultados e ■ Objetivos

Atos 2.41, 42 Atos 2 46, 47 Atos Atos Atos Atos Atos Atos Atos Atos Atos Atos Atos Atos Atos

4.1, 2, 4 4.31 5.12-14 5.19-21a 5.25 5.27, 28 5.42 6.4, 7 8.16-4 8.5 8.25 8.35 9.20

Atos 4.32

Atos 8.12 Atos 8.36, 38 Atos 9.31

Atos 10.42, 43 Atos 11.19-21

Atos 11.22-26 Atos 12.24

Atos 13.5a Atos 13.13-16, 42-44 Atos 13.45-49 A EPÍSTOLA DE TiAGO

Tiago 3.1, 2 Atos 14.1 Atos 14.5-7 Atos 14.19-21«

Atos 14.216-23

Atos 14.26-28 Atos 15.2-4 Atos 16.33-34 , 40

Atos 14.25 Atos 16.31, 32 Atos 17.2-4

As EPÍSTOLAS AOS TESSALONICENSES (escritas em Corinto) 1 Tessalonicenses 2,7-12 1 Tessalonicenses 3.1-5 1 Tessalonicenses 3.10-13 1 Tessalonicenses 5.11 1 Tessalonicenses 5.14, 15

1 T essalo n icen ses 1.5-10

2 Tessalonicenses 3.1 Atos Atos Atos Atos

17.10-12 17.16, 17 17.22, 34 18.4, 5 Atos 18.8-11 AS EPÍSTOLAS AOS CORÍNTIOS

(escritas em Éfeso e na Macedonia) 1 Coríntios 1.10 1 Coríntios 4.17

1 Coríntios 1.17 1 Coríntios 1.21-24 1 Coríntios 2.1-5 1 Coríntios 5,9, 10 1 Coríntios 9.16 1 Coríntios 11.26 1 Coríntios 14.23-25 1 Coríntios 15.58 2 Coríntios 1.9 2 Coríntios 4.5 2 Coríntios 5.18-20 Atos 18.19-21

Atos Atos Atos Atos

18.22, 23 18.24-28 19.1-7 19.9

Atos 19.8

Romanos 1.8

I Atos 19.10, 20

Atos 19.23; 20.1, 2

A EPÍSTOLA AOS ROMANOS Romanos 1.9-13 Romanos 1.14-16

Romanos 13.8-10 Romanos 16.25-27 Atos 20.6, 7 Atos 20.17-21 Atos 20.25-35

Atos 20.22-24 Atos 22—26 (testemunho de Paulo em Jerusalém, diante de Félix, Festo e Agripa) Atos 28.23, 24 Atos 28.30, 31

AS EPÍSTOLAS DA PRISÃO Filemom Efésios 3.8, 9

Efésios Efésios Efésios Efésios

1.15~19a; 3.14-19 2.19-22 4.11-16 6.1-4

Colossenses 1.25-28a Colossenses 4.5, 6

Colossenses Colossenses Colossenses Colossenses Colossenses

1.9-12 1.286-29 2.2-5 3.16 3.18-23

Filipenses 1.12-14 Filipenses 1.27, 28 Filipenses 2.1-4 Filipenses 2.19-24 Filipenses 4.9 AS EPÍSTOLAS PASTORAIS

1 Timóteo 2.1-7

1 Timóteo 1.3-7

1 Timóteo 4.11-16 1 Timóteo 5.17 1 Timóteo 6.2

1 Timóteo 6.1

2 Timóteo 2 Timóteo 2 Timóteo 2 Timóteo

1.6-11 2.2 3.14-17 4.1, 2

2 Timóteo 4.4, 5 Tito 1.5 Tito 2.1-15 O utras

c o r r e s p o n d ê n c ia s

Hebreus Hebreus Hebreus Hebreus 1 Pedro 1 Pedro 1 Pedro 1 Pedro

2.12 2.18 3.1, 2 3.15

3.12-14 5.12-14 6.1 10.24, 25

1 Pedro 2.1-5 1 Pedro 4.10-11 1 Pedro 5.1-3 2 Pedro

1 João 1.1, 2

1 João 1.2-4 2 João 3 João Judas 3 Judas 20-21 Judas 24 Apocalipse 1—3

A lista das epístolas na coluna “edificação” não tem o objetivo de apresentar uma ordem absolutamente cronológica e seqüencial. Em alguns casos apresenta tal ordem; em outros, essas epístolas são mencionadas de modo que estejam junto ao registro em Atos da fundação daquela igreja específica. A cronologia geral baseia-se, no entanto, na obra de Merrill C. Tenney, O Novo Testamento: sua Origem e Análise, publicado por Edições Vida Nova.

Notas 1Observe que, no Novo Testamento grego, as expressões “fazei discípulos”, em Mateus 28.19, e “tendo [...] feito [...] discípulos”, em Atos 14.21, apresentam a mesma forma verbal. 2 Mais tarde se verá que a “igreja congregada” existe para desempenhar mais que uma mera função didática. Entretanto, o ensino é o primeiro passo no desenvolvimento de um corpo de cristãos maduros. Isso é demonstrado claramente em Atos. 3 Um raro exemplo disso encontra-se em 1 Tessalonicenses, especialmente nos capítulos 1 e 2, em que Paulo reflete acerca de seu ministério em Tessalônica, onde a igreja fora fundada inicialmente (veja Atos 17). Em 1 Tessalonicenses, Paulo expressa idéias e conceitos que muito bem ilustram tanto seu trabalho evangelístico entre eles (1 Ts 1), quanto seu ministério junto aos novos convertidos, conduzindo o processo de edificação (1 Ts 2).

formação de discípulos

Antes de ler este capítulo, termine o estudo indutivo do “Apêndice A ” e depois estude o “Apêndice B” . Esse estudo lhe dará base bíblica para o material que se segue.

Uma vista panorâmica Jesus Cristo passou três anos e meio ministrando aqui na terra. Foi a todo lugar, pregando o reino de Deus às multidões, ensinando âs pessoas sobre quem ele era e demonstrando sua divindade mediante a operação de milagres (Jo 20.30, 31). Mas ele também gastou boa parte de seu tempo com doze homens que havia selecionado e, depois, treinado cuidadosamente, não numa situação formal de educação mas numa experiência de aprendizado “no campo” , em situações reais. Os discípulos associaram-se a ele rio ministério e viram-no demonstrar, com sua própria vida, como fazer a obra de Deus. Por fim, ele enviou-os para agir por si mesmos e

depois, com todo o cuidado, ajudou-os a aprender com os sucessos e os fracassos.1 Ao fim desses três anos e meio, Jesus havia alcançado basicamente dois alvos importantes tratando-se de estratégia: havia saturado a mente das multidões com seus ensinamentos e preparado um pequeno grupo de homens afundo, para participarem de seu trabalho e fazerem a colheita (4.35-38). Depois de sua morte e ressurreição (o propósito básico de sua vinda a este mundo), deu a seus seguidores uma grande tarefa evangelística: “Fazei discípulos!” . E eles obedeceram! Imediatamente edificaram sobre os alicerces que Jesus havia lançado. Começaram por Jerusalém, onde ele havia ensinado, morrido e ressuscitado. Foram a todos os lugares — ao templo, de casa em casa, perante o Sinédrio, às sinagogas e às ruas.2 Os corações estavam preparados. O Espírito Santo operou com poder! A colheita foi grande! ... tão grande que os líderes judeus sentiram-se ameaçados e reagiram com ódio e contra-ataques. Entretanto, essa reação só serviu para cumprir o plano máximo de Deus, porquanto os fiéis foram espalhados por toda a Judéia, e por Samaria, e até pelas regiões mais remotas do mundo conhecido na época. Por todos os lugares levavam a mensagem da morte e da ressurreição de Cristo e de que ele verdadeiramente era o Messias prometido — não apenas para os judeus, mas também aquele mencionado tantos anos antes a Abraão — aquele em quem seriam “benditas todas as famílias da terra” (Gn 12.3). “Ainda tenho outras ovelhas” , Jesus disse, “não deste aprisco; a mim me convém conduzilas; elas ouvirão a minha voz; então haverá um rebanho e um pastor (Jo 10.16)” . Tanto judeus como gentios entraram na família de Deus depois que a igreja aumentou sua área de atuação e seu impacto no mundo. Em conseqüência disso, surgiu um novo fenômeno — algo inexistente enquanto Cristo estava na terra. Começou em Jerusalém após a ascensão de Cristo e, em seguida, espalhou-se por todo o mundo do Novo Testamento. Onde quer que os cristãos fizessem discípulos, ali surgiam igrejas. Pessoas de várias comunidades e culturas foram reunidas para estabelecer novos relacionamentos. Tornaram-se irmãos e irmãs em Cristo — membros da família de Deus. Surgiu uma nova força, não na forma de “grupo itinerante” ,

mas de povo “estabelecido em comunidade” , na qual viviam, trabalhavam e desempenhavam outras atividades rotineiras da vida. E, à medida que eram ensinados e edificados, logo descobriam que tinham duas responsabilidades básicas — uma “para com o mundo” e outra “para com os irmãos” . O poder do amor. É interessante notar que as epístolas contêm poucas instruções acerca da evangelização direta, tal como era praticada por aqueles que “viajavam” no livro de Atos. Deu-se grande importância à responsabilidade “do corpo” . O destaque na “apre­ sentação verbal” do evangelho estava subordinada à “manutenção de um relacionamento dinâmico dentro da igreja” e à “manutenção de um relacionamento amoroso e exemplar” com as pessoas do mundo. As oportunidades de apresentar verbalmente o evangelho de Cristo deviam surgir naturalmente, em conseqüência da saturação que ocorreu na comunidade, saturação que refletia “amor e interesse por todos os homens” . Os estilos de vida deviam ser tão diferentes; e transformados por Cristo de forma tão impressionante, que os incrédulos não pudessem deixar de perceber e perguntar o que havia causado a diferença. Acima de tudo, o amor que existia entre o grupo local de fiéis devia ser tão intenso que os incrédulos pudessem perceber que se tratava de discípulos de Jesus Cristo. E, mais, que pudessem convencer-se de que Jesus realmente era o que dizia ser. Certa ocasião, ao se aproximar o dia de sua crucificação, Cristo comentou com seus discípulos: “Novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros; assim como eu vos amei, que também vos ameis uns aos outros” . Repare no objetivo que se segue a essa diretriz dada pelo Senhor Jesus: “Nisto conhecerão todos que sois meus discípulos, se tiverdes amor uns aos outros” (Jo 13.34, 35). A evangelização da comunidade devia ser precedida de um exemplo coletivo de “amor” entre os fiéis. Seria uma “prova positiva” de que os discípulos de Cristo estavam presentes naquele lugar. Pois nenhuma seita, religião ou grupo jamais foi capaz de atingir o nível de amor que era potencialmente possível na verdadeira família de Deus. E, sem sua existência, os esforços evangelísticos seriam frustrados.

O poder da unidade. Mas há aqui outro fator fundamental na evangelização da comunidade. É, na realidade, um reflexo do “amor” . Francis Schaeffer chamou-o de “a apologética final” .3 Jesus falou a respeito disso em João 17.21,23, enquanto orava pelos seus discípulos. Ele pediu ao Pai: “que todos sejam um; e como és tu, ó Pai, em mim e eu em ti, também sejam eles em nós; para que o mundo creia que tu me enviaste. [...] eu neles e tu em mim, a fim de que sejam aperfeiçoados na unidade, para que o mundo conheça que tu me enviaste, e os amaste como também amaste a mim” . Aqui Cristo fala dos resultados do amor — a saber, unidade e harmonia. Ao verem o amor, os não-cristãos viriam a saber e a entender que aquelas pessoas eram cristãs, seguidoras de Jesus Cristo. Mas, ao observarem a unidade e a harmonia, ficariam convencidos de que Cristo realmente veio da parte de Deus, que verdadeiramente era o Filho de Deus, o Salvador do mundo. Esse fenômeno foi demonstrado com vigor no livro de Atos. Foi o amor e a unidade entre os cristãos de Jerusalém que serviu de base para um testemunho eficaz. E essa idéia, como se demonstrou anteriormente, é reforçada repetidas vezes no transcorrer das epístolas. Mas vai-se tornar ainda mais evidente quando, posteriormente, examinarmos o processo de edificação, conforme é ilustrado pelas igrejas do Novo Testamento.

Um exame mais atento A transmissão do evangelho no livro de Atos. Embora várias palavras sejam utilizadas para relatar as atividades e as funções evangelísticas dos cristãos do século I, Lucas utilizou algumas palavras básicas para descrever o processo da comunicação com os não-cristãos. As apresentadas a seguir aparecem com maior freqüência e, embora similares no significado, cada uma, conforme utilizada no contexto, contribui para nossa compreensão de como o mundo não-salvo era alcançado com o evangelho de Cristo no século I. Eles falavam. Uma das palavras mais comuns é o verbo traduzido por “falar” ou “anunciar” . A palavra laleõ significa apenas “conversar” ou “contar” . Lemos que Pedro e João estavam no templo e “falavam [...] ao povo” (At 4.1). Mais tarde, quando o grupo dos

discípulos recebeu a plenitude do Espírito Santo, todos, “com intrepidez, anunciavam a palavra de Deus” (4.31).4 Embora essa palavra (laleõ) seja a mais usada para descrever a maneira como a mensagem do cristianismo era apresentada, podemos aprender algumas lições acerca desse processo a partir do contexto em que a palavra foi empregada. Freqüentemente as Escrituras nos dizem que eles “anunciavam a palavra” (a mensagem deles) falavam “em nome de Jesus” (a autoridade deles) e anunciavam “com intrepidez” (a maneira deles). Eles deviam anunciar “todas as palavras desta Vida” e “falaram de tal modo que veio a crer grande multidão” . Eles evangelizavam. Muitas vezes, essa palavra é traduzida pela expressão “pregavam o evangelho” ou “traziam boas novas” . Ao contrário da palavra “falar” , esta palavra (euangelizõ) possui um “conteúdo” próprio. Refere-se à mensagem que estava sendo dita, bem como ao processo de comunicação. Em Atos 5.42, Lucas registrou que “todos os dias, no templo e de casa em casa, não cessavam [...] de pregar Jesus, o Cristo”, isto é, não cessavam de anunciar as Boas Novas: Jesus é o Salvador Prometido.5 Esse processo era desenvolvido por grupos e por indivíduos. Era desenvolvido por todos os cristãos; acontecia no templo, de casa em casa, de vila em vila, de cidade em cidade, numa estrada no deserto, e seu alcance se estendia constantemente a regiões ainda mais distantes. Eles iam a todos os lugares, anunciando as boas novas. Eles ensinavam. Embora didaskõ (que significa ensinar) seja uma das palavras mais usadas no Novo Testamento para descrever a edificação, é também utilizada para descrever a evangelização. Neste último sentido, a palavra aparece com maior freqüência nos capítulos iniciais de Atos e, em algumas ocasiões, foi empregada num contexto de desagrado e insatisfação por parte dos judeus. Eles ficaram “ressentidos por ensinarem eles [Pedro e João] o povo” (4.2).6 Depois que os apóstolos foram libertados sigilosamente da prisão, todos, “ao romper do dia, entraram no templo e ensinavam” (5.21). Surpreendido com sua aparição, alguém apressou-se em ir contar ao sumo sacerdote que os homens a quem haviam trancafiado na prisão no dia anterior estavam agora “no templo, ensinando o povo” (5.25).

Imediatamente os apóstolos foram mais uma vez levados em custódia e, consternado, o sumo sacerdote disse: “Expressamente vos ordena­ mos que não ensinásseis nesse nome, contudo enchestes Jerusalém de vossa doutrina [isto é, ensino]”1 (5.28). Talvez a observação mais significativa acerca do processo de ensino aos não-cristãos nos primeiros dias da igreja é que ele foi utilizado basicamente pelos apóstolos. Isso pode deixar implícito que se trata de um processo mais complexo do que simplesmente “falar” ou “evangelizar” , requerendo maior habilidade e conhecimento. Obviamente acarretava mais do que apenas apresentar o evangelho de Cristo, incluindo, certamente, a apresentação da mensagem total das Escrituras (veja 5.21, 22). É claro que os apóstolos encontravam-se numa situação singular para comunicar essa mensagem, depois de passarem três anos e meio sendo treinados pelo maior Mestre que já existiu. E significativo que as autoridades e os escribas viram “a intrepidez de Pedro e João” , e perceberam “que eram homens iletrados e incultos” . Em conseqüência, “admiraram-se e reconhe­ ceram que haviam eles estado com Jesus” (4.13). Observe também que o ensino dos apóstolos entre os não-cristãos ocasionou resultados tanto positivos quanto negativos. Os resultados positivos eram conversões, inicialmente entre os leigos judeus. Por conseguinte, os resultados negativos partiram dos líderes religiosos deles. Aqui havia um grupo de líderes religiosos em oposição a outro grupo de líderes religiosos, falsos mestres reagindo a verdadeiros mestres. Os apóstolos estavam apresentando a verdade, que colocava a descoberto os pecados e as idéias infundadas dos sacerdotes e dos líderes de Israel. Eles ficaram enciumados e irados, e reagiram com veemência. Curiosamente, porém, depois dessa perseguição, lemos no capítulo seguinte que, quando os apóstolos solucionaram os problemas materiais em Atos 6 e conseguiram manter a prioridade de ensinar as Escrituras, “muitíssimos sacerdotes” também aceitaram o evangelho (6.7). Aqui encontramos o verdadeiro teste do ensino eficaz entre os nãocristãos. Os apóstolos não apenas ganharam os leigos para Cristo, mas, no final, também ganharam muitos líderes religiosos.

Eles proclamavam ou pregavam. A palavra kerussõ significa gritar ou proclamar como um arauto. “Filipe, descendo à cidade de Samaria, anunciava-lhes a Cristo. As multidões atendiam, unânimes, às coisas que Filipe dizia (8.5, 6).”8 A palavra “pregar” é empregada basicamente com respeito às atividades de certas pessoas-chave no livro de Atos, especificamente, o evangelista Filipe, o apóstolo Pedro e o apóstolo Paulo. Tal como o “ensino” , a responsabilidade de exercer essa atividade entre nãocristãos também parecia recair sobre certos indivíduos capacitados que haviam sido escolhidos por Deus para proclamar o evangelho de Cristo de modo especial (veja Atos 10.40-42). É claro que todos os cristãos falavam de Cristo e testemunhavam a seu respeito, mas nem todos pregavam a Cristo de maneira formal. Eles anunciavam. Uma palavra de sentido bem próximo ao de kerussõ é katangellõ, que significa “anunciar publicamente” ou “proclamar e contar minuciosamente” . À semelhança de kerussõ, essa palavra é utilizada em Atos para descrever a comunicação dos líderes apostólicos, especialmente o ministério de Paulo.9 Na maioria dos casos, essa palavra era usada para descrever a comunicação nas várias sinagogas judaicas. Ali, nesses centros religiosos de ensino e adoração, Paulo “proclamou” e “anunciou plenamente” a Palavra de Deus. Eles testificavam solenemente. Uma palavra comum para testificar é martureõ, que tem o sentido de “dar testemunho” (1.8). No entanto, em todo o livro de Atos também se empregou alguma forma do verbo diamarturomai para descrever o processo evangelístico; esse verbo pode ser traduzido por “testificar solenemente” . Significa “afirmar e atestar veementemente” e tem fortes conotações intelectuais e emocionais. A Palavra de Deus estava sendo apresentada de maneira séria, cuidadosa e com determinação. Se martureõ significa “dar testemunho” , diamarturomai significa “dar um testemunho minu­ cioso” . Esse conceito apareceu pela primeira vez em Atos no sermão de Pedro no Dia de Pentecoste, quando “com muitas outras palavras deu testemunho [solene; “conjurava-os” na B J], e exortava-os dizendo:

Salvai-vos desta geração perversa” (2.40). E, por fim, apareceu no último capítulo de Atos, quando encontramos Paulo em Roma. “Uma vez em Roma, foi permitido a Paulo morar por sua conta, tendo em sua companhia o soldado que o guardava” (28.16). Paulo reuniu os líderes judeus e relatou os acontecimentos ocorridos desde Jerusalém. Os judeus marcaram uma data para Paulo apresentar todo o seu argumento. E naquele dia “vieram em grande número ao encontro de Paulo na sua própria residência. Então”, naquele dia, “desde a manhã até a tarde, lhes fez uma exposição em testemunho [solene] do reino de Deus, procurando persuadi-los a respeito de Jesus, tanto pela lei de Moisés, como pelos profetas” (28.23).10 A medida que você acompanha o uso dessa palavra através do livro de Atos, ela vai adquirindo uma forte síndrome “apologética” . Tanto Pedro quanto Paulo, os dois apóstolos cuja comunicação foi descrita com essa palavra, estavam tentando convencer seus ouvintes de que Jesus Cristo era verdadeiramente o Messias prometido no Antigo Testamento. Não estavam simplesmente apresentando o evangelho, mas estavam atestando e dando provas de que Jesus era o Cristo, a partir do Antigo Testamento e de suas próprias experiências pessoais. Eles arrazoavam. A palavra dialegomai, que significa “arrazoar, argumentar ou discutir”, é empregada exclusivamente em relação à comunicação de Paulo com o mundo não-cristão. E, além disso, a palavra não aparece em Atos antes de Paulo chegar a Tessalônica. Aqui nós o encontramos indo à sinagoga, e “por três sábados arrazoou com eles, acerca das Escrituras, expondo e demonstrando ter sido necessário que o Cristo padecesse e ressurgisse dentre os mortos” (17.2, 3).11 Ao observar o processo de comunicação que se deu nessa nova dimensão que envolvia amplo diálogo e interação, repare que o ministério de Paulo levava-o cada vez mais a um ambiente pagão saturado pelo pensamento e pela cultura grega e romana. Tanto os judeus como os gregos ignoravam totalmente o que de fato havia ocorrido na terra da Palestina ao longo dos últimos anos. Para os judeus religiosos, o Messias prometido não era uma idéia nova, mas provavelmente pouco sabiam sobre Jesus de Nazaré. Sem sombra de dúvida, o que eles tinham ouvido fora influenciado por interpretações

tendenciosas. Os gregos, é claro, teriam um conhecimento ínfimo, se é que sabiam de alguma coisa, tendo a comunidade judaica por única fonte de informações. . Repare também que Lucas começou a registrar dados relativos ao tempo, no contexto em que essa palavra foi empregada. Por exemplo, Paulo permaneceu em Corinto um ano e meio (18.11)eem Éfeso dois anos (19.10). Levando em consideração a mentalidade dessas pessoas, sua forma­ ção cultural, seu total desconhecimento do cristianismo, bem como o método de comunicação a que estavam acostumadas, a implicação é óbvia. Paulo adotou uma metodologia evangelística que poderia alcançar essas pessoas com maior eficácia. Além do mais, ele sabia não haver nenhum alicerce sobre o qual pudesse construir. Conse­ qüentemente, estabeleceu-se nessas localidades estratégicas, pôs-se a conhecer a maneira de pensar dessas pessoas e ensinou a fundo as Escrituras, levando em conta a estrutura emocional e mental delas.

A transmissão do evangelho nas epístolas Quando se estuda o processo de comunicação ao longo do livro de Atos, a ênfase naturalmente se concentra nas atividades e nas funções dos cristãos do século I à medida que falavam de Cristo, anunciavam as boas novas, ensinavam, proclamavam, testificavam aos incrédulos e arrazoavam com eles. Mas, quando se passa a estudar as epístolas, as atividades tornam-se diretrizes. Isso, é claro, é o que seria de esperar. O propósito de Lucas foi registrar os “atos” dos seguidores de Cristo, e as epístolas foram escritas para ensinar e nutrir aqueles que reagiram favoravelmente ao evangelho. Há também uma inegável mudança de destaque. As epístolas acrescentam uma nova dimensão à maneira como as igrejas formadas realizavam a evangelização. É claro que a investida evangelística iniciada em Atos devia continuar nas comunidades em que as igrejas locais se haviam estabelecido. Paulo ficou muito satisfeito com o impacto das igrejas em Tessalônica e em Roma (1 Ts 1.9; Rm 1.8). Ao que parece, em todos os lugares por onde passava recebia relatórios positivos acerca do testemunho desses cristãos.

Mas, quando você percorre as epístolas tendo em mente a questão da “evangelização” , logo descobre que, para se estabelecer numa comunidade, é necessário mais do que mera verbalização. Em rigor, a comunicação deve estar perfeitamente alinhada a um estilo de vida cristão — tanto no plano individual como no plano coletivo. Esse estilo de vida cristão deve ficar demonstrado nos vários contextos da vida — na vida profissional do cristão, sua vida social, sua vida familiar, sua vida na igreja e sua vida em geral. Vida profissional. Paulo admoestou especialmente os tessa­ lonicenses a conduzir seus negócios de modo correto. Alguns deles estavam usando a doutrina da segunda vinda de Cristo como desculpa para a preguiça. “Procurai [...] tratar dos vossos próprios negócios, e trabalhar com vossas próprias mãos” , exortou Paulo (1 Ts 4.11, ibb ), e depois explicou o motivo disso — “a fim de que andeis dignamente para com os que estão de fora, e não tenhais necessidade de coisa alguma” (4.12, ib b ). Paulo ensinou que, quando o cristão passa por necessidades materiais por causa de preguiça, isso traz má reputação para o evangelho e para a igreja de Jesus Cristo. Se quisessem evangelizar eficazmente seus semelhantes não-salvos, com certeza não poderiam levar vidas irresponsáveis para poderem transmitir o evangelho com proveito. Tanto Paulo quanto Pedro preocupavam-se com o fato de que os cristãos deviam manter um bom testemunho perante seus senhores não-salvos. “Considerem dignos de toda honra os próprios senhores, para que o nome de Deus e a doutrina não sejam blasfemados” (1 Tm 6.1). “Sede submissos [...] aos vossos senhores” , disse Pedro (1 Pe 2.18). Que maneira de atacar os males da escravidão! Em muitos casos eles ganharam seus senhores não-salvos para Cristo e também ganharam sua liberdade. Naqueles dias, uma atitude oposta teria provocado perseguição imediata e, talvez, até mesmo a morte. Mas, acima de tudo, teria prejudicado a causa de Cristo. Acerca da perspectiva de Paulo quanto ao problema da escravidão, Merrill Tenney comenta sucintamente:

Em parte alguma dos seus escritos é atacada ou defendida a escravatura. Segundo as cartas de Paulo às igrejas da Ásia, havia, entre os crentes, tanto escravos como donos de escravos. Os escravos eram exortados a obedecer aos seus senhores, e aos senhores mandava-se que não fossem cruéis para com eles. Tal era, no entanto, o poder da sociedade cristã, que a escravatura foi gradualmente enfraquecendo sob seu impacto e, finalmente, desapareceu.12

Vida social. Para viver numa comunidade dia após dia e semana após semana, é necessário manter os relacionamentos. Muitos dos convertidos do Novo Testamento eram provenientes de uma sociedade cujo estilo de vida era impróprio para um cristão. Tendo em vista seus amigos não-salvos, os cristãos foram admoestados por Paulo a não se tornarem “causa de tropeço nem para judeus, nem para gentios” na vida social que levavam. “Portanto” , disse Paulo, “quer comais, quer bebais, ou façais outra coisa qualquer, fazei tudo para a glória de Deus [...] para que sejam salvos (1 Co 10.31-33).” Tendo em vista a cultura pagã de Corinto, não é difícil entender essas palavras. A maneira de ganhar as pessoas para Cristo não era falar-lhes a respeito de Jesus Cristo e depois participar de suas atividades imorais e anticristãs, fosse dentro da igreja, fosse fora, na comunidade. Isso apenas escandalizaria o incrédulo e criaria decepção com a verdadeira mensagem do cristianismo. “Mantendo exemplar o vosso procedimento no meio dos gentios” , escreveu Pedro, “para que [•••] glorifiquem a Deus no dia da visitação” (1 Pe 2.12). Ele também escreveu: “fazendo-o [...] com boa consciência, de modo que [...] fiquem envergonhados os que difamam o vosso bom procedimento em Cristo” (3.16). Pedro não estava afirmando que todos aceitariam o evangelho. Mas, sim, que, quando o Espírito Santo começa sua obra no coração dc um homem, tal pessoa necessita do contexto de um estilo de vida crUlAo para poder avaliar objetivamente as exigências do cristianismo. Além ilo mais, Pedro estava dizendo que aqueles que não aceitassem lliitilam "envergonhados" ou seriam silenciados. Vida familiar. Nos dias do Novo Testamento, havia aqueles que eram casados com pessoas incrédulas. Seus cônjuges, especialmente quando se tratava de maridos, ainda não tinham vindo a Cristo.

Será que essas esposas cristãs deviam bombardear verbalmente seus maridos não-salvos com o evangelho? Será que deviam ir atrás deles para levá-los à igreja, a fim de que ouvissem o pastor ou um evangelista visitante? Será que deviam falar a respeito das virtudes de outros homens cristãos, especialmente dos líderes da igreja? De modo algum! “Mulheres, sede vós [...] submissas a vossos próprios maridos” , escreveu Pedro, “para que, se alguns deles ainda não obedecem à palavra, sejam ganhos sem palavra alguma, por meio do procedimento de suas esposas (1 Pe 3.1).” O apóstolo estava declarando uma verdade profunda! Não é uma montanha de palavras que convence os cônjuges incrédulos de que necessitam de Cristo, mas, sim, o impacto de um estilo de vida cristão permanente, que reflete a realidade da habitação do Espírito Santo (3.2-7). Vida na igreja. Quase nada se diz no Novo Testamento sobre a pregação de mensagens do evangelho quando os fiéis se reuniam para a edificação. Por outro lado, os cristãos deviam dedicar-se ao “ensino dos apóstolos” , isto é, ao aprendizado da Palavra de Deus. Deviam dedicar-se à “comunhão” com os irmãos e com Deus. E, nesse processo, contariam “com a simpatia de todo o povo” , isto é, de todo o mundo não-salvo. Vemos esse modelo na primeira igreja, a igreja de Jerusalém (At 2.42-47). E, conforme se verá mais tarde, encontramos essa ênfase ao longo das epístolas. A igreja de Corinto destaca-se como um exemplo negativo. As reuniões da igreja eram caóticas. As pessoas falavam em línguas — uma atrás da outra — sem nenhum intérprete. Não há dúvida de que mais de um falava ao mesmo tempo, e é óbvio que as mulheres estavam produzindo grande parte desse falatório. “No caso de entrarem indoutos ou incrédulos, não dirão, porventura, que estais loucos?” , indagou Paulo (1 Co 14.23). É por essa razão que ele enfatizou que as profecias nas reuniões da igreja e a Palavra de Deus deviam ser enunciadas de modo claro e ordeiro. Para serem salvos, os incrédulos têm de compreender a Palavra (1 Co 14.25). A igreja também devia tomar parte em outro ministério evangelístico importante — o da oração. Devia orar a favor de todas as

pessoas para que fossem salvas (1 Tm 2.1-4). Também devia orar a favor daqueles que foram especialmente chamados a pregar o evangelho em outros locais, fora de suas comunidades. Em várias ocasiões Paulo pediu orações a favor de seu próprio ministério evangelístico, “para que a palavra do Senhor se propague, e seja glorificada” (2 Ts 3.1). Vida em geral. Embora as epístolas dêem destaque a situações e contextos especiais em que os cristãos devem manter um bom testemunho, também tratam da vida em geral. “Vós sois a nossa carta [...] conhecida e lida por todos os homens” , disse Paulo aos coríntios (2 Co 3.2). “Amarás ao teu próximo como a ti mesmo” , escreveu aos romanos (Rm 13.9). “Portai-vos com sabedoria para com os que são de fora; aproveitai as oportunidades” , admoestou os colossenses. “A vossa palavra séja sempre agradável, temperada com sal, para saberdes como deveis responder a cada um” (Cl 4.5, 6). A isso, Pedro acrescenta: “estando sempre preparados para responder a todo aquele que vos pedir razão da esperança que há em vós” (1 Pe 3.15). Os filipenses receberam a ordem de se comportarem de “modo digno do evangelho” (Fp 1.27).

Resumo O livro de Atos e as cartas do Novo Testamento não deixam margem a dúvidas de que o grande impacto evangelístico de um grupo de cristãos em determinada comunidade baseava-se, antes de qualquer coisa, num testemunho individual e coletivo diante do mundo nãosalvo, refletindo amor, unidade e uma vida piedosa. Isso devia tornarse uma moldura para um testemunho verbal vital que devia ser partilhado com aqueles que eram influenciados diariamente, à medida que os cristãos realizavam seus negócios na comunidade, relacio­ navam-se com os não-salvos por meio de contatos sociais, demons­ travam uma vida familiar dinâmica em cada comunidade específica, refletiam amor, unidade e maturidade como corpo local de fiéis e, em geral, levavam uma vida cristã, tanto naquilo que diziam quanto naquilo que faziam.

Notas 1 No que se refere a um ótimo estudo de como Jesus trabalhou com os doze, veja Robert E. C o l e m a n , O plano mestre de evangelismo, Mundo Cristão. 2 O “Apêndice B ” fornece uma compilação das funções e dos resultados, bem como das diretrizes e dos objetivos bíblicos, fruto de um estudo indutivo das passagens bíblicas esboçadas no capítulo 2 e compiladas no “Apêndice A”. 3 Francis S c h a e f f e r , A igreja no ano 2001, a p l i c , p. 176. 4 Veja também Atos 5.20, 40; 11.19, 20; 14.1, 25; 16.13, 32. 5 Veja também Atos 8.4, 25, 35; 11.20; 14.5, 7, 21; 16.10. 6 Veja também Atos 5.41, 42; 28.30, 31. 7O substantivo didachê (etimologicamente derivado de didaskõ) é geralmente traduzido por “doutrina”. 8 Veja também Atos 9.20; 10.39, 42; 20, 25; 28.30, 31. 9 Veja Atos 4.2; 13.5, 38; 15.36; 17.3. 10 Veja também Atos 10.42; 18.5; 20.24; 23.11. 11 Veja também Atos 17.17; 18.4, 19; 19.8-10; 24.24, 25. 12Merrill C. T e n n e y , O Novo Testamento: sua origem e análise, Vida Nova, p. 80.

princípios de evangelização do Novo Testamento O que um estudo sobre a evangelização no século I tem a dizer à igreja do século xx, onde quer que ela esteja? Que princípios abran­ gentes podemos tirar desse estudo, que possam, por sua vez, ser estabelecidos como propósitos para a igreja de hoje, em qualquer cultura ou subcultura? A seguir há sete princípios-chave que surgem naturalmente do estudo das atividades e das funções evangelísticas descritas no livro de Atos e das diretrizes apresentadas nas epístolas.

Formar uma base de evangelização Em primeiro lugar, cada corpo local de cristãos é responsável pela saturação de sua comunidade com amor e pela demonstração de uma unidade e de uma harmonia que forneçam uma base de comunicação verbal, pela demonstração de um estilo de vida cristão em todos os relacionamentos humanos, a fim de criar uma base sobre a qual se discuta acerca daquele que transforma vidas, Cristo.

Esse princípio evidencia-se nas atividades dos cristãos do Novo Testamento e nas diretrizes que as epístolas dão aos grupos locais de cristãos. Começaram por Jerusalém e, depois, à medida que se abriam as igrejas em outras comunidades e países, os cristãos eram instruídos a viver como Jesus Cristo em cada relacionamento humano, de modo que pudessem partilhar vigorosamente o evangelho. Com freqüência, as igrejas locais negligenciam as próprias comunidades. Um forte programa de missões estrangeiras substitui a evangelização local. As ofertas missionárias tomam o lugar da evangelização “na praça” . Missionários fora do país, sustentados pela igreja, passam a substituir o engajamento na evangelização da própria comunidade. Isso não pode ser assim! Não podemos negligenciar nossa própria “Jerusalém” . O campo é o mundo — é claro — mas o mundo começa em nosso próprio quintal, em nossa própria cidade, em nossa própria comunidade. Essa foi a história dos cristãos do Novo Testamento. Sem dúvida, eles deram o exemplo para o trabalho de missões estrangeiras, mas eles viam o mundo pelo ângulo certo. Incluíam “Jerusalém” , “Judéia”, “Samaria” e depois “os confins da terra” (At 1 . 8).

É verdade que uma das maiores realizações do cristianismo evangélico foi seu esforço em missões estrangeiras. Isso é digno de elogio! E deve ser mantido e expandido. Mas as palavras de Jesus se aplicam nessa questão: “devíeis [...] fazer estas cousas, sem omitir aquelas” (Mt 23.23). É importante sublinhar mais uma vez que, quando Jesus Cristo esteve na terra, as pessoas puderam vê-lo e ouvi-lo. Seus milagres e seu estilo de vida tornaram-se o meio pelo qual os descrentes podiam avaliar suas exigências (Jo 20.20-31). Mas quando voltou para o céu, seu corpo, a igreja, tornou-se o meio visível mediante o qual as pessoas podiam avaliar a mensagem de Cristo. (Leia mais uma vez João 13.13-15; 17.19-23.) Um dos desafios que encontramos no complexo metropolitano de Dallas é como aplicar esse princípio. Fizemos algumas tentativas. Primeiramente, trabalhamos duro para criar uma atmosfera de calor humano e de amor quando a igreja se reúne como corpo. Tanto os dirigentes quanto os participantes de qualquer culto são estimulados a

encarar o local em que nos reunimos como uma sala de estar ampla e confortável. Isso, por sua vez, influencia a maneira como agimos e nos comportamos no púlpito, e também influi na atitude de nosso povo para com as outras pessoas — especialmente os recém-chegados. Queremos que as pessoas sintam que somos gente de carne e osso, que nos importamos uns com os outros e com elas, mesmo que sejam novas na igreja. Também estruturamos um grupo denominado “equipe de hospi­ talidade” . Esse grupo, treinado e incentivado para alcançar espe­ cialmente as novas pessoas, não negligencia, todavia, os que vêm à igreja regularmente. Após cada culto, apresentamos as novas pessoas e pedimos que os voluntários se encontrem com cada visitante depois do culto para uma xícara de café (de chá, ou de qualquer outra coisa) numa área designada para comunhão.

A evangelização coletiva é fundamental Isso nos conduz a um segundo princípio do Novo Testamento: a evangelização coletiva é fundamental para a evangelização pessoal. No Novo Testamento, o corpo de Cristo em ação preparava o cenário para o testemunho pessoal. É por isso que Jesus disse “Novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros” , e assim “conhecerão todos que sois meus discípulos” (Jo 13.34, 35). É por isso que Paulo disse “Amarás ao teu próximo como a ti mesmo” (Rm 13.9). Pedro exortou os fiéis a manter um procedimento “exemplar [...] no meio dos gentios” (1 Pe 2.12). A evangelização pessoal assume significado fora do comum quando realçado por um corpo amadurecido de fiéis locais — cristãos que estão causando um impacto em suas comunidades em razão de sua integridade (1 Ts 4.11, 12), seu comportamento altruísta (Rm 13.7), sua conduta ordeira (1 Co 6.1), sua humildade (1 Pe 2.18) e, ao mesmo tempo, seu testemunho claro a favor de Jesus Cristo (3.15). É difícil testemunhar em isolamento. Muitas vezes, isso é necessário, mas o plano geral de Deus é que a evangelização da comunidade ocorra no contexto de um cristianismo dinâmico e de um “corpo vivo” cheio de vigor. A igreja local, unida, funcionando em todas as suas partes, pode causar poderoso impacto numa comunidade pagã. Assim, não são

tanto os indivíduos extrovertidos que muitas vezes são exaltados como os “mais espirituais” pelo fato de testemunharem, mas, se torna um ministério de toda a igreja, em que todos partilham da alegria e da recompensa dos que têm o privilégio de “lançar a rede” para Cristo. A aplicação desse princípio no século xx requer estruturas eclesiásticas exclusivas. A maioria das formas tradicionais não pro­ porciona as melhores oportunidades de demonstrar o amor em ação. É verdade que podemos criar uma atmosfera agradável, receptiva, quando a igreja se reúne, mas, à medida que a igreja cresce, logo se torna necessariamente difícil manter o “corpo vivo” em ação. Ademais, muitas pessoas não-salvas, que necessitam ver o corpo agindo em amor e em unidade, não entram em uma igreja. Entretanto, muitos virão a uma reunião numa casa. Nesse sentido, podemos levar o “corpo em ação” até o mundo — mediante estudos bíblicos evangelísticos em lares, encontros para discussões abertas e aquilo que, em nosso próprio ministério, chamamos mini-igrejas. Esse tipo de “estrutura” tem grande potencialidade para aplicar os princípios do Novo Testamento recém-apresentados. Pessoalmente, sinto que ainda nem começamos a implementar esse princípio nesse tipo de “contexto familiar” .

Evangelizar com amor Em terceiro lugar, quando possível, a apresentação do evangelho aos não-salvos deve ocorrer sobre o pano de fundo de um corpo amoroso e unido de cristãos. As Escrituras não sugerem que os não-cristãos devam ser excluídos da “igreja congregada” . Ao contrário, a Bíblia ensina que os incrédulos devem ser expostos à igreja congregada como um corpo ordeiro e unido. Esse foi outro problema de Corinto. Os incrédulos que entrassem poderiam interpretar mal o que estava acontecendo, dada a falta de ordem. Mas Paulo também se referiu a não-cristãos que poderiam entrar, e ser convencidos, e chegar até Cristo (1 Co 14.23-25).1 Observe nessa passagem que o incrédulo será “por todos convencido, e por todos julgado” (14.24). Aqui há uma referência clara à “evangelização pelo corpo”. Era a igreja toda em ação que devia ser usada pelo Espírito Santo para ganhar essa pessoa para Cristo.

Repare também que ela não viria a Cristo por uma mensagem evangelística especial, pregada no púlpito por um pastor, destinada aos não-salvos ali presentes. Ao contrário, ela seria tocada pelos próprios cristãos, por seu comportamento e pelo processo de edificação mútua.2 Recordo-me de um homem de negócios não-cristão que estava freqüentando uma nova igreja, nos seus primeiros dias, que eu estava pastoreando. Ele me perguntou se podia conversar comigo acerca da sua situação espiritual. Mais tarde, quando entrou em meu gabinete, contou-me como estava impressionado com o amor e o interesse manifestados pelos membros dessa nova igreja. “Já estive em muitas igrejas” , disse, “e fui membro da diretoria de várias delas, mas nunca experimentei o tipo de cristianismo que estou vendo nesta nova igreja” . Então declarou abertamente estar certo de que não conhecia pessoalmente a Cristo. . É interessante que não me disse o quanto tinha ficado impres­ sionado com as minhas mensagens, embora eu soubesse que ele as apreciava. Na verdade, ele estava impressionado com o “corpo” . Sim, tive o privilégio de conduzi-lo a Cristo, mas foi o corpo local de cristãos em ação que foi usado por Deus para trazer convencimento a esse homem. O Novo Testamento apresenta, então, a “igreja congregada” como uma situação em que não-cristãos podem ver e experimentar as realidades do cristianismo — amor, unidade e vida semelhante à de Cristo. E, dentro disso, o Espírito Santo tem condições de operar arrependimento e despertar um desejo de adorar o mesmo Deus e conhecer o mesmo Salvador. A evangelização no Novo Testamento se deu não apenas na igreja como “comunidade congregada” , mas também quando ela foi “dispersada” pelo mundo — no trabalho, nas localidades onde os cristãos viviam, em seus lares. De fato, parece que foi nessas situações que o evangelho de Jesus Cristo com mais freqüência foi apresentado verbalmente aos não-cristãos.

Buscar os adultos (ou as famílias) Em quarto lugar, o alvo principal da evangelização devem ser os adultos e, conseqüentemente, as famílias inteiras. Em lugar algum do Novo Testamento existem exemplos de “evangelização de crianças” , tal como costumamos praticar hoje, ou seja, ganhar as crianças da comunidade para Cristo, fora do ambiente familiar. Mas não interprete mal. Isso não significa que não se ressalte a importância da vida da criança e da conversão dela. O próprio Jesus Cristo deu o exemplo supremo em sua atitude para com as crianças. Também Paulo escreveu a Timóteo, lembrando-o de sua herança religiosa: “ ... desde a infância sabes as sagradas letras que podem tornar-te sábio para a salvação pela fé em Cristo Jesus” (2 Tm 3.15). Os dados do Novo Testamento são também sustentados pelos exemplos formidáveis do Antigo Testamento acerca da criação de filhos. Aliás, quando a Escritura trata da família, parece que ela fala mais dos filhos — suas necessidades e sua importância — do que de qualquer outro aspecto da vida familiar.3 O padrão do Novo Testamento é claro! O alvo da conversão eram os adultos. Jesus escolheu doze homens feitos — não crianças. Ele falou às multidões (sem dúvida havia crianças nas multidões), mas eram comentários dirigidos aos adultos. De modo análogo, antes de qualquer coisa, os apóstolos ganhavam adultos para Cristo. Não iam atrás das crianças como o alvo principal, com a esperança de fazer uso disso como meio de chegar aos pais, nem iam atrás das crianças por serem elas mais suscetíveis a influências ou por ser mais fácil alcançá-las para Cristo. Não. Eles inverteram o processo. Foram atrás dos adultos — sabendo que a conversão dos pais significava alcançar toda a família. Dr. George Peters chega a ponto de dizer em seu excelente livro Saturation Evangelism [.Evangelização pela Saturação] que a “evangelização de famílias e a salvação de famílias são o ideal e a norma bíblica no que diz respeito à evangelização e à salvação” .4 Com isso, não quer dizer que as crianças se tornam cristãs porque os pais crêem. Nem quer dar a entender uma “idéia de aliança” , que ensina que os filhos de pais cristãos experimentam a regeneração mediante o “batismo infantil”, ou que, mediante esse rito, a criança estabeleça um relacionamento com Deus, de alguma maneira singular

que a torna candidata real e potencial à conversão mais tarde em sua vida.5 A conversão não é automática para nenhum ser humano. É uma questão individual baseada numa decisão inteligente e responsável: receber a Cristo como Salvador pessoal. A salvação da família implica, todavia, alcançar primeiramente os pais e, por conseguinte, alcançar a família toda para Cristo. O Novo Testamento dá algumas ilustrações excelentes desse processo. Em Filipos, Paulo primeiramente falou a Lídia, à beira do rio. Ela se converteu e, em seguida, toda a sua família veio a Cristo (At 16.15). Mais tarde, na mesma cidade, o carcereiro filipense creu em Cristo e, por conseqüência, toda a sua casa se converteu (16.31-34). Outros exemplos no Novo Testamento incluem Zaqueu e o oficial do rei nos evangelhos (Lc 19.9; Jo 4.53). Em Atos e nas epístolas vemos Cornélio (At 10), Crispo (18.8), Estéfanas (1 Co 1.16), Onesíforo (2 Tm 1.16) e Filemom (Fm 1). Na realidade, as igrejas nos lares, freqüentemente mencionadas tanto em Atos quanto nas epístolas, eram, sem dúvida alguma, o resultado da conversão de famílias inteiras. Existem algumas vantagens bem práticas em alcançar adultos para Cristo e, conseqüentemente, toda a família. Em primeiro lugar, muitas vezes é psicologicamente frustrante que uma criança pequena se torne cristã sem que haja a compreensão e a bênção do pai e da mãe e dos demais membros da família. Aliás, a necessidade básica de uma criança é a “aceitação” e o “amor” dentro do ambiente familiar, e experimentar esse tipo de rejeição pode ser algo psicologicamente devastador. Em geral uma criança é emocionalmente incapaz de suportar esse tipo de “perseguição familiar” . Em segundo lugar, os pais que também são cristãos tornam-se o principal meio de crescimento espiritual da criança após a conversão. Se os adultos necessitam de cuidado e de ajuda após a conversão (como necessitam), quanto mais as crianças. A família é o ventre espiritual natural para o crescimento e o desenvolvimento espiritual. Em terceiro lugar, uma família inteira alcançada para Cristo pode causar enorme impacto numa comunidade. Cada membro da família torna-se, por sua vez, uma influência para ganhar outras famílias para Cristo.

Em quarto lugar, as “unidades familiares” são tijolos para a construção de uma igreja saudável. Mais uma vez, o Dr. Peters chama nossa atenção: Só as igrejas edificadas a partir de unidades sociais básicas possuem saúde de verdade e a potencialidade para um rápido crescimento e uma firme expansão. A questão decisiva na fundação de uma igreja não é quantas pessoas estão interessadas no projeto, mas quantas famílias constituem o alicerce da igreja. As igrejas fundadas por famílias têm o potencial para florescer.6

No entanto, para concluir, quero dizer que isso não significa que não se devam alcançar as crianças para Cristo antes que os pais sejam alcançados. Embora os exemplos bíblicos não apóiem a seqüência, isso certamente também não elimina tal possibilidade. O Senhor está interessado nas crianças; ele quer que elas venham a conhecê-lo pessoalmente. Contudo, o que os exemplos bíblicos afirmam é que, quando a criança é alcançada para Cristo por meio de um cristão ou mediante uma igreja, devem-se empreender todos os esforços para também alcançar os pais para Cristo e, ao fazê-lo, tentar não prejudicar a unidade e a harmonia da família. Isso também pode significar que a igreja deve proporcionar, de alguma forma, um “pai (ou mãe) substituto” , quando os pais não-cristãos não respondem ao evangelho e especialmente se são hostis a ele. A própria natureza da criança torna isso quase um imperativo, a fim de evitar que a experiência traumática de rejeição dos pais crie problemas psicológicos que poderão até mesmo afetar a vida adulta e, talvez, levar a pessoa a finalmente se voltar contra o cristianismo. E, por fim, isso significa que os cristãos não devem deixar que a dificuldade de alcançar os adultos e o medo de serem rejeitados os levem a dedicar todos os esforços para ganhar crianças, por serem mais receptivas e por ser mais fácil “conseguir decisões” . Uma razão pela qual as estatísticas mostram ser maior o número de crianças que aceitam Cristo é que não estamos ganhando os adultos de form a eficaz. As estatísticas apenas refletem nosso fracasso. Se famílias inteiras puderam ser alcançadas para Cristo na comunidade

pagã do século I, podemos alcançar famílias inteiras no século XX. Nossa tarefa é desenvolver a estratégia e a abordagem correta que funcionem na América do Norte pagã. Entretanto, precisamos notar que a cultura americana em particular e a cultura ocidental em geral são bem diferentes da cultura do Novo Testamento. Quando um pai e uma mãe aceitam Cristo, não significa que automaticamente os filhos se tornarão cristãos, especialmente se forem maiores. Além disso, se um marido aceita Cristo, não significa que a esposa também se converterá, ou vice-versa. Vi essa diferença cultural ilustrada de modo impressionante certa ocasião, quando uma família vietnamita veio para os Estados Unidos e entrou em contato com um dos membros de nossa igreja. O pai tornou-se cristão, contou à sua esposa, e ela imediatamente também quis aceitar Cristo. E então todos os filhos que tinham idade suficiente para entender fizeram automaticamente o mesmo. Aí vimos a cultura “bíblica” ou “oriental” em ação na nossa sociedade ocidental, que, com tanta freqüência, estimula decisões individualistas e não coletivas. De qualquer forma, a influência do adulto sobre a criança é bem maior do que a da criança sobre o adulto — mesmo na cultura ocidental. O destaque bíblico é ainda normativo e transcende a cultura.

Identificar missionários Em quinto lugar, a igreja tem a responsabilidade de identificar os que têm um desejo todo especial de levar as boas novas à comunidade e, além da comunidade imediata, talvez “aos confins da terra Conforme ressaltamos anteriormente, o caráter inigualável da igreja, com seu potencial de amor e de unidade mútuos, proporciona oportunidades ilimitadas para um ministério “apologético” entre os não-salvos. Mas dentro do corpo existem certas pessoas que sentem uma responsabilidade especial pelo trabalho evangelístico. Essas pessoas devem ser estimuladas a empregar seus talentos e representar o corpo local num ministério especial de evangelização. Eles, porém, não devem tornar-se substitutos de outros membros da igreja; pelo contrário, devem atuar como pessoas especialmente habilitadas para apresentar Cristo a diversos grupos e indivíduos. Vemos esse princípio demonstrado claramente em Atos. Muitos cristãos “falavam” sobre a mensagem de Cristo, e todos os cristãos

pareciam estar de alguma forma “anunciando as boas novas” , mas foram especialmente os apóstolos que tomaram parte no ensino e na pregação evangelística. Foram Pedro e, principalmente, Paulo que se envolveram num ministério evangelístico de características diferentes, pois “testificavam solenemente” aos incrédulos e “arrazoavam” com eles. Além disso, a igreja tem a responsabilidade de orar, pedindo a bênção de Deus sobre essas pessoas, e, em alguns casos, de sustentálos financeiramente quando tomam parte num ministério evangelístico ou missionário de tempo parcial ou integral. A igreja de Antioquia deu exemplo desse princípio quando separou Barnabé e Saulo e os comissionou para um ministério evangelístico (At 13.1, 2). A igreja, contudo, deve ser cuidadosa nessa questão! Ela tem a tendência de olhar além de sua comunidade imediata e desprezar aqueles que fazem parte de seu grupo de fiéis e não se sentiram levados a deixar a comunidade e percorrer os sete mares. Esses são os que devem ser estimulados, treinados e usados de modo especial para alcançar a comunidade que circunda a igreja e conduzir as pessoas a Cristo. Entretanto, não se deve fazer como um trabalho de “uns poucos indivíduos” isolados, mas de forma que todo o corpo participe, saturando a comunidade com as realidades do cristianismo e a mensagem do evangelho. Talvez nem todos consigam “puxar a rede” com facilidade, mas todos têm a capacidade de amar as pessoas e de “semear” e preparar o caminho para aqueles que conseguem. Uma das maneiras que encontramos para criar uma sede de evangelização e de missões é incentivar os jovens a participarem de ministérios no exterior, especialmente em caráter temporário. A organização missionária Teen Missions7 oferece ótima oportunidade tanto para os jovens quanto para a igreja. Os jovens podem passar o verão ajudando missionários veteranos, e a igreja pode sustentá-los financeiramente. Vi os efeitos dessa oportunidade em minha própria família. Meu filho passou dois verões com Teen Missions, um na Suécia e o outro na Suíça. Nas duas vezes, participou de uma equipe de trabalho, mas teve oportunidades de atuar na evangelização. Foi enorme o impacto na sua vida.

Integrar os novos convertidos Em sexto lugar, devem-se integrar os novos convertidos na vida da igreja local o mais rápido possível. Mais tarde vamos discutir com mais minúcia o que significa fazer parte de uma igreja, mas no momento é importante ressaltar — e ressaltar bem — que, fora do ambiente da igreja e da experiência de depender de outros membros do corpo, a pessoa recém-nascida em Cristo não crescerá até se tornar um discípulo de Jesus Cristo maduro e responsável. Seria impossível, pois ela não partilha das experiências básicas que Deus estabeleceu por absolutamente essenciais para o crescimento espiritual. Há quem interprete essas idéias como críticas contra organizações e atividades pareclesiásticas. Deixe-me esclarecer! Creio que Deus levantou muitas organizações, primeiramente, para suplementar o trabalho da igreja local e, em segundo lugar, para fazer aquilo que, em muitos casos, as igrejas não estão conseguindo fazer. Mas creio firmemente que essas organizações não podem desprezar os exemplos e os princípios bíblicos, pois, nesse caso, as mais ricas bênçãos de Deus não estarão sobre elas. O exemplo e princípio mais óbvio é que Deus determinou que a igreja local seja o principal lugar onde os fiéis devam ser alimentados e edificados. Cada novo cristão necessita do corpo de Cristo a fim de ser edificado na vida cristã. Cada organização pareclesiástica deve examinar seriamente seu relacionamento com a igreja local. Deve ensinar essa doutrina bíblica, promovê-la como algo fundamental ao crescimento cristão e esforçarse por corrigir os erros teológicos e funcionais da igreja com amor e cautela. Não deve substituir a igreja local, nem deve ter atitude antagônica em relação a ela. Deve cooperar, de todas as formas, para promover o ministério e a expansão desse plano determinado por Deus.

Desenvolver novos métodos Em sétimo lugar, a igreja do século x x deve desenvolver seus próprios métodos e abordagens evangelísticas atualizadas utilizando como diretrizes bíblicas os princípios expostos acima. Uma coisa torna-se clara com o estudo das funções da igreja do Novo Testamento. O que eles diziam é constante; a maneira como

diziam e a. forma como saíam evangelizando variam de situação para situação. Eles consideravam as diretrizes absolutas. Mas seus métodos eram relativos e serviam, ap en as, de meio para alcançar os objetivos divinos. Esse é o caráter distintivo das Escrituras. Elas deixam as pessoas livres para criar propostas singulares e idealizar métodos exeqüíveis em qualquer cultura e em qualquer momento da história. Quer se estude a estrutura das mensagens de Pedro, quer se acompanhe Paulo afastando-se da comunidade judaica em direção ao mundo gentílico, uma coisa é certa: esses homens não estavam presos a uma única proposta ou a uma única maneira de apresentar a mensagem divina. Variavam a metodologia de acordo com as circunstâncias. Por conseqüência, conforme já observamos, à medida que Paulo ia entrando no mundo pagão e se afastava mais e mais do ambiente previamente saturado com os ensinos de Jesus Cristo, ia mudando seus métodos de comunicação. Aquilo que antes fora uma proposta de “pregação” deu lugar a uma que se caracterizava por “diálogo” e “interação” . No trabalho inicial, Paulo podia, pelo menos, presumir a existência de uma crença básica em Deus e na revelação divina, mas no mundo pagão não podia presumir nem uma coisa, nem outra. Havia necessidade de tratar o evangelho de forma diferente, apologética. Desse modo, a nova cultura, a nova mentalidade, a diferença de percepção, tudo isso serviu para ajudar Paulo a decidir os métodos que devia utilizar para alcançar tais pessoas com o evangelho de Cristo. É verdade que ele sem p re transmitiu o “evangelho simples” e o fez “com humildade”, mas isso diz respeito à mensagem e à atitude, não aos métodos. Um dos problemas-chave da igreja evangélica no século xx é que deixamos que os não-absolutos se tornassem absolutos. Permitimos que o “jeito de fazer as coisas” se tornasse norma. De um lado pegamos padrões bíblicos (que variam considera­ velmente através de toda a Bíblia) e nos fixamos naquele que achamos o certo — talvez aquele com que nos sentimos mais à vontade. Em vez de encarar todos os exemplos bíblicos como recursos divinos que fornecem princípios e diretrizes absolutos, desenvolvemos uma visão bitolada e nos deixamos prender a um único método.

Além do mais, temos deixado que padrões e formas puramente humanos desenvolvidos nos últimos 50 ou cem anos se tornem abso­ lutos. Chegamos a crer que algumas das maneiras como fazemos as coisas atualmente sejam normas bíblicas. Exemplo típico do modo de ver puramente humano que acabou tornando-se absoluto é o que pensamos acerca do culto evangelístico do domingo à noite (ou, nesse sentido, qualquer outro culto evangelístico da igreja). Muitos cristãos realmente acreditam que essa é a maneira como a igreja do Novo Testamento funcionava, embora não tenhamos um único exemplo desse padrão, nem uma alusão a isso. Na realidade, como já foi assinalado, todas as reuniões da igreja mencionadas no Novo Testamento tinham o propósito de edificar os cristãos, não de “pregar” aos incrédulos. Quer dizer, então, que é errado ter um culto evangelístico no domingo à noite? É claro que não. Com certeza, o Novo Testamento permite que tenhamos essa liberdade. Mas é bom lembrar que esse método foi desenvolvido nos Estados Unidos na virada do século e funcionou muito bem em virtude de uma situação cultural e uma mentalidade religiosa completamente diferentes. Hoje em dia, em muitos lugares dos Estados Unidos, o culto evangelístico do domingo à noite é um fracasso total, pois os incrédulos já não vêm à igreja. E, assim mesmo, alguns pastores continuam pregando suas mensagens evangelísticas do domingo à noite a uma multidão de cristãos e chegam a se sentir culpados só de pensar em mudar a forma e a ênfase do culto. A igreja evangélica não pode e não deve deixar-se prender a formas e padrões — do século i ou do século XX — elaborados como meio de alcançar os objetivos bíblicos. Toda igreja em toda cultura e subcultura precisa desenvolver seus próprios métodos particulares para a evangelização da comunidade. Sob a liderança criativa do Espírito Santo e empregando todos os recursos humanos disponíveis, preci­ samos desenvolver igrejas dinâmicas, dignas do século xx, que estejam criando estratégias evangelísticas atualizadas, fundamentadas nos princípios e nas diretrizes do Novo Testamento.

Resumo Por que a igreja existe no mundo é fácil de ver! Deus está convocando um povo para ser o seu próprio povo. Um dia Cristo voltará para levar a igreja para estar com ele. Mas por que ele não voltou? Essa pergunta foi feita até pelos céticos do século l (2 Pe 3.4). Observe a resposta de Pedro! “Não retarda o Senhor a sua promessa, como alguns a julgam demorada; pelo contrário, ele é longânimo para convosco, não querendo que nenhum pereça, senão que todos cheguem ao arrependimento” (3.9). Como sua igreja está se saindo na tarefa de alcançar pessoas para Jesus Cristo — primeiramente em sua própria “Jerusalém” e depois “em toda a Judéia e Samaria, e até aos confins da terra”? Os seguintes princípios do Novo Testamento orientá-lo-ão na execução desse aspecto da grande comissão: 1. 2. 3.

4. 5.

6. 7.

Todo corpo de cristãos deve ser responsável principalmente por sua própria comunidade. A evangelização corporativa é fundamental para a evangelização pessoal. Quando possível, a apresentação do evangelho aos não-salvos deve ocorrer sobre o pano de fundo de um corpo amoroso e unido de cristãos. O alvo principal da evangelização devem ser os adultos e, conse­ qüentemente, famílias inteiras. A igreja tem a responsabilidade de identificar que têm um desejo todo especial de levar as boas novas à comunidade e para além da comunidade imediata, talvez até “aos confins da terra” . Devem-se integrar os novos convertidos na vida da igreja o mais rápido possível. A igreja do século xx deve desenvolver seus próprios métodos e propostas evangelísticas atualizadas, utilizando como diretrizes bíblicas os princípios e as diretrizes expostos acima.

Notas 1Repare que essa é a única ilustração específica no Novo Testamento acerca da evangelização “na igreja”. 2 Isso não significa que é “errado” pregar uma mensagem evangelística num culto de igreja. Deus usou e continua a usar esse método. Na verdade, porém, significa que o Novo Testamento não apresenta esse método como modelo de desempenho da evangelização na igreja local. 3Veja Gene G e t z , A medida de umafamília espiritual, Literatura Evangélica Internacional. [A Editora Vida editou algumas das obras do autor e reeditou outras, a saber: A Estatura de um Cristão (Filipenses e Tito), A Estatura de

um Homem Espiritual, A Estatura de uma Igreja Espiritual, A Estatura de uma Mulher Espiritual. As indicações feitas neste livro referem-se às edições da Literatura Evangélica Internacional.] 4 George W. PETERS, Saturation evangelism, Zondervan, p. 160. O Dr. Peters, professor emérito de Missões Mundiais do Dallas Theological Seminary, discute essa idéia a fundo nas páginas de 147 a 167 desse livro. 5 Ibid., p. 148-9. 6 Ibid., p. 155. 7 P. O. Box 1056, Merrit Island, FL 32952, United States of America.

edificação da igreja

Os discípulos deviam ser ensinados! Essa é a segunda grande tarefa expressa na comissão de Cristo. Os cristãos deviam reunir-se como uma “comunidade congregada” a fim de se tornarem um organismo maduro. Assim como há uma variedade de palavras empregadas para descrever as atividades dos discípulos quando saíam “evangelizando” , também há uma porção de palavras diferentes empregadas para relatar seu ministério de “edificação” . É claro que eles batizavam e ensinavam os novos convertidos, conforme Jesus havia ordenado na grande comissão. Mas nesse processo de crescimento e desen­ volvimento também tinham comunhão uns com os outros, partiam o pão, uniam os corações em oração e louvor a Deus. Eles foram incentivados, fortalecidos, instados, exortados, admoestados e firmados na fé. Também recebiam relatórios verbais que descreviam os resultados da ação evangelística em outras partes do mundo. Também recebiam

várias cartas (as epístolas) instruindo-os em como levar a vida cristã. Sempre que necessário também havia discussão e dissensão, quando os apóstolos e líderes enfrentavam outros cristãos culpados de causar confusão entre os irmãos em conseqüência de um ensino falso e incorreto. Atos dos Apóstolos descreve da seguinte forma os resultados dessa atividade: os discípulos estavam de “comum acordo” , eram “unidos de coração e alma” e se “edificavam” . Lemos que “as igrejas eram fortalecidas na fé” e “a palavra do Senhor crescia e prevalecia poderosamente” . Também experimentavam “alegria” , “singeleza de coração” e “grande alegria” . Por exemplo, quando os discípulos de Antioquia receberam a carta vinda de Jerusalém, “sobremaneira se alegraram, pelo conforto recebido” (At 15.31). Quando se deixa o estudo das funções e dos resultados entre os convertidos em Atos e se passa a analisar as epístolas, novamente as funções muitas vezes se tornam diretrizes e os resultados muitas vezes se tornam objetivos. “Consolai-vos uns aos outros” , “edificai-vos reciprocamente” , “admoesteis os insubmissos” , “ampareis os fracos” e “sejais longânimos para com todos” são exemplos de diretrizes paulinas para a igreja local (1 Ts 5.11-15). Todos os fiéis deviam tomar parte no processo de edificação, ministrando uns aos outros. Deviam ser “sempre abundantes na obra do Senhor” (1 Co 15.58) e instruir-se e aconselhar-se “mutuamente [...] com salmos e hinos e cânticos espirituais” (Cl 3.19). Timóteo, sendo um pastor jovem, também recebeu diretrizes específicas: “Prescreve [...] estas coisas” , “procure dedicar-se à leitura em público das Escrituras Sagradas, à pregação do evangelho e ao ensino cristão” (B L H ) . Ele devia pregar “a palavra” , agir “quer seja oportuno, quer não” , corrigir, repreender e exortar. Tito, por sua vez, devia pôr “em ordem as coisas restantes”, constituir “presbíteros” e falar “o que convém à sã doutrina” . Os presbíteros deviam pastorear “o rebanho de Deus”, e todos os cristãos deviam batalhar “diligentemente pela fé que uma vez por todas foi entregue aos santos”. Os maridos receberam a seguinte ordem: “ ... amai vossas mulheres”; e as esposas: “ ... sede submissas aos próprios maridos” . Os pais: “ ... não provoqueis vossos filhos à ira” e “não irriteis os vossos filhos” , para evitar que ficassem “desanimados” . Em vez disso, deviam criá-los “na disciplina e na admoestação do Senhor” .

Nas epístolas, muitas vezes as diretrizes referentes à edificação eram seguidas imediatamente de uma declaração dos “resultados esperados” ou objetivos, assim como na área da evangelização. Paulo escreveu aos coríntios que ele, juntamente com Timóteo e Silas, havia exortado, e incentivado, e suplicado que “cada um andasse conforme Deus o tem chamado” . Mais tarde ele disse que oravam cons­ tantemente para tornar a ver os tessalonicenses de modo que pudessem “completar” o que faltava em sua fé. Paulo instou os cristãos de Roma a se apresentarem a Deus, para que experimentassem “qual seja a [...] vontade de Deus” . Orou a favor dos efésios para que fossem “tomados de toda a plenitude de Deus” . Instruiu os colossenses a estarem “frutificando em toda boa obra” . “Deixemo-nos levar para o que é perfeito” , disse o autor de Hebreus. Por que, então, a igreja existe como comunidade congregada? A resposta a essa pergunta está bem clara no Novo Testamento. A igreja deve tornar-se um organismo maduro, mediante o processo de edificação, para honrar e glorificar a Deus, e, ao fazê-lo, deve tornarse uma testemunha dinâmica no mundo. Lucas registrou que “a igreja [...] tinha paz por toda a Judéia, Galiléia e Samaria, edificando-se” (At 9.31). Paulo informou-nos que a igreja ganhou os líderes capacitados para equipar todos os cristãos ao serviço, de modo que o corpo de Cristo fosse edificado (Ef 4.11, 12, 16). “Edificai-vos reciprocamente” , exortou os tessalonicenses (1 Ts 5.11). Algumas formas da palavra “edificação” aparecem mais vezes na carta aos coríntios (especialmente na primeira) que em qualquer outro livro do Novo Testamento (1 Co 8.1; 10.23; 14.4, 5, 12, 17, 26; 2 Co 12.19). Isso, é claro, não nos surpreende, pois dentre todas as igrejas do mundo do Novo Testamento, ela era a mais carnal e imatura, e a que mais necessitava de crescimento e desenvolvimento espirituais (1 Co 3.1-3). A edificação deve conduzir à maturidade ou perfeição em Cristo. Nós o “anunciamos” , escreveu Paulo aos colossenses, “advertindo a todo homem e ensinando a todo homem em toda a sabedoria, a fim de que apresentemos todo homem perfeito [maduro] em Cristo” (Cl 1.28). A preocupação primordial do apóstolo, em relação ao corpo de Cristo, era que todos chegassem “à unidade da fé e do pleno conhe­

cimento do Filho de Deus, à perfeita varonilidade, à medida da estatura da plenitude de Cristo” (Ef 4.13).

Uma igreja madura — que é isso? Como se pode reconhecer uma igreja madura? Com que critérios podemos medir a nós mesmos como corpo local, para verificar se chegamos a um nível de perfeição? O Novo Testamento é, mais uma vez, muito claro. “Agora, pois, permanecem a fé, a esperança e o amor, estes três: porém o maior destes é o amor” (1 Co 13.13). A maturidade no corpo de Cristo pode ser identificada pelas virtudes permanentes. O grau de perfeição pode ser medido pelo grau em que a igreja manifesta fé, esperança e amor. Isso fica bem claro nos escritos de Paulo, visto que empregou freqüentemente essas três virtudes para medir o nível de maturidade das igrejas do Novo Testamento.1 Observe estes parágrafos introdutórios nas cartas que escreveu às várias igrejas. A PR IM EIR A CA RTA AOS TESSA LO N ICEN SES

Damos sempre graças a Deus por todos vós, mencionando-vos em nossas orações, e sem cessar recordando-nos, diante do nosso Deus e Pai, da operosidade da vossa FÉ, da abnegação do vosso a m o r e da firmeza da vossa e s p e r a n ç a em nosso Senhor Jesus Cristo... (1 Ts 1.2, 3) A SE G U N D A C A RTA AOS TESSA LO N ICEN SES

Irmãos, cumpre-nos dar sempre graças a Deus no tocante a vós outros, como é justo, pois a vossa FÉ cresce sobremaneira, e o vosso mútuo a m o r de uns para com os outros, vai aumentando a tal ponto que nós mesmos nos gloriamos de vós nas igrejas de Deus, à vista da vossa constância e FÉ, em todas as vossas perseguições e nas tribulações que suportais... (2 Ts 1.3, 4) A C A R T A AOS COLOSSENSES

Damos sempre graças a Deus, Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, quando oramos por vós, desde que ouvimos da vossa FÉ em Cristo Jesus, e do AMOR que tendes para com todos os santos; por causa da e s p e r a n ç a que vos está preservada nos céus, da qual antes ouvistes pela palavra da verdade do evangelho... (Cl 1.3-5)

A C A R T A AOS E FÉ SIO S

Por isso também eu, tendo ouvido a FÉ que há entre vós no Senhor Jesus, e o a m o r para c o m todos os santos, não cesso de dar g ra ç a s p o r v ó s , fazendo menção de vós nas minhas orações, para que o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glória, vos conceda espírito de sabedoria e de revelação no pleno conhecimento dele, iluminados os olhos do vosso coração, para saberdes qual é a e s p e r a n ç a do seu chamamento, qual a riqueza da glória da sua herança nos santos... (Ef 1.15-18) A PR IM E IR A CA RTA A T IM Ó T E O

Ora, o intuito da presente admoestação visa o a m o r que procede de coração puro e de consciência boa e de FÉ sem hipocrisia (1 Tm 1.5)

Pedro também faz referência a essa trilogia: ... Cristo, conhecido, com efeito, antes da fundação do mundo, porém manifestado no fim dos tempos, por amor de vós, que, por meio dele, tendes FÉ em Deus, o qual o ressuscitou dentre os mortos e lhe deu glória, de sorte que a vossa FÉ e e s p e r a n ç a estejam em Deus. Tendo purificado as vossas almas, pela vossa obediência à verdade, tendo em vista o AMOR fraternal não fingido, amai-vos de coração uns aos outros ardentemente... (1 Pe 1.20-22) A C A R T A AOS H EBREU S

... aproximemo-nos, com sincero coração, em plena certeza de FÉ [ . . . ] . Guardemos firme a confissão da e s p e r a n ç a [...]. Consideremo-nos também uns aos outros, para nos estimularmos ao a m o r e às boas obras (Hb 10.22-24).

Está claro quais são os critérios do Novo Testamento para saber com precisão o nível de maturidade de um corpo local de cristãos. Em primeiro lugar, existe amor que se manifesta para com os outros membros do corpo de Cristo? Em segundo, existe um a/é forte e vital? Em terceiro, existe demonstração de esperança? Mas talvez essas palavras não passem de conceitos teológicos. Que significam? Só quando reforçamos o significado e o conteúdo dessas palavras é que temos a idéia completa. Mais uma vez o Novo Testamento fala com desenvoltura.

O amor “O maior destes é o amor”, conclui Paulo (1 Co 13.13). Nas cartas às igrejas, constantemente o apóstolo traz à lembrança essa verdade que corresponde à exortação de Cristo registrada em João 13.34: “que vos ameis uns aos outros” . A C A R T A AOS COLOSSENSES

Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos e amados, de temos afetos de misericórdia, de bondade, de humildade, de mansidão, de longanimidade. Suportai-vos uns aos outros, perdoai-vos mutuamente, caso alguém tenha motivo de queixa contra outrem. Assim como o Senhor vos perdoou, assim também perdoai vós; a c im a d e tu d o is to , p o r é m , e s te ja o a m o r , que é o vínculo da perfeição (Cl 3.12-14). A PR IM EIR A CA RTA AOS TESSA LO N ICEN SES

Ora, o nosso mesmo Deus e Pai, com Jesus, nosso Senhor, dirijam-nos o caminho até vós, e o Senhor vos faça c re sc e r, e a u m e n ta r n o a m o r uns para com os outros e para com todos, como também nós para convosco... (1 Ts 3.11, 12) A C A R T A AOS FIL IPE N SES

E também faço esta oração: que o vosso AMOR a u m e n te m a is e m a is em pleno conhecimento e toda a percepção, para aprovardes as cousas excelentes e serdes sinceros e inculpáveis para o dia de Cristo... (Fp 1.9, 10). A C A R T A AOS EFÉSIOS

... para que não mais sejamos como meninos, agitados de um lado para outro, e levados ao redor por todo vento de doutrina, pela artimanha dos homens, pela astúcia com que induzem ao erro. Mas, s e g u in d o [ f a la n d o ] a v e r d a d e em AMOR, cresçamos em tudo naquele que é o cabeça, Cristo, de quem todo o corpo, bem ajustado e consolidado, pelo auxílio de toda junta, segundo a justa cooperação de cada parte, e fe tu a o s e u p r ó p r i o a u m e n to p a r a a e d ific a ç ã o d e s i m e sm o em a m o r (Ef 4.14-16).

O apóstolo Pedro também eleva o amor ao “nível mais alto” quando diz: “Acima de tudo, porém, tende a m o r intenso uns para com os outros, porque o amor cobre multidão de pecados” (1 Pe 4.8). E não se questiona a preocupação de João a esse respeito, pois só em

sua primeira epístola ele declara quatro vezes que os cristãos devem “amar uns aos outros” (1 Jo 3.11, 23; 4.7, 11). Mas que é o amor? Como se manifesta? Como pode ser reconhecido no corpo de Cristo? A mais destacada passagem que apresenta os aspectos particulares do amor é, obviamente, 1 Coríntios 13. Nela, Paulo esclarece para a imatura igreja de Corinto exatamente o que é o amor — como deve ser manifestado pelo corpo de Cristo. Infelizmente, esse “magnífico capítulo sobre o amor” é, com freqüência, desviado de seu contexto e utilizado isoladamente. Para ter o significado e o impacto completo das palavras de Paulo, você precisa ver sua descrição do amor à luz de toda a epístola aos coríntios e interpretar suas definições à luz da carnalidade de Corinto. Depois, também precisamos observar as palavras de Paulo em 1 Coríntios 13 em relação ao corpo de Cristo, não apenas em relação aos cristãos como indivíduos. Repare, primeiramente, que os coríntios não tinham falta de “nenhum dom” (1 Co 1.7). Assim mesmo, eram uma igreja imatura. Paulo classificou-os como “crianças em Cristo” (3.1), carnais (3.3). Obviamente, a manifestação de dons espirituais numa igreja local não é sinônimo de espiritualidade e maturidade. Certamente não era o caso em relação aos coríntios. Essa é a declaração principal de Paulo em 1 Coríntios 13. Não há dúvida de que, na igreja de Corinto, havia mais indivíduos que falavam em línguas que em qualquer outra igreja no Novo Testa­ mento; apesar disso, havia falta de amor, e, conseqüentemente, eles eram “como o bronze que soa, ou como o címbalo que retine” (13.1). Esses coríntios também possuíam os dons de profecia, sabedoria, conhecimento e fé, mas não possuíam amor, e, por conseguinte, Paulo deixou implícito, eles eram “nada” (13.2). Sem dúvida, alguns desses cristãos de Corinto possuíam o dom de “dar” e estavam até mesmo dispostos a sacrificar fisicamente a vida em gestos de martírio, mas, sem amor, disse Paulo, esse tipo de comportamento é totalmente inútil (13.3). Em contraste com o uso dos dons espirituais, Paulo então descreveu como reconhecer o amor no corpo de Cristo:

• O amor é paciente (13.4). Em outras palavras, é o oposto daquilo que os coríntios estavam demonstrando. Eles eram impacientes uns com os outros, e havia dissensões e divisões entre eles (1.10). • O amor é benigno e não arde em ciúmes (13.4). Antes, nessa mesma carta, Paulo havia escrito a respeito de “ciúmes e contendas” entre os coríntios (3.3). • O amor não se ufana nem se ensoberbece (13.4). Paulo teve de advertir os coríntios contra a vanglória (1.29). “Se alguém dentre vós se tem por sábio neste século, faça-se estulto para se tornar sábio [...]. Portanto, ninguém se glorie nos homens [...]. Que tens tu que não tenha recebido? e, se o recebeste, por que te vanglorias, como se o não tiveras recebido?” (3.18, 21; 4.7). • O amor não se conduz inconvenientemente (13.5). Havia imoralidade na igreja de Corinto, “e imoralidade tal, como nem mesmo entre os gentios” (5.1; 6.15-20). Além do mais, estavam comportando-se de modo muito inconveniente à mesa do Senhor — alguns chegavam a comer e a beber além dos limites — a ponto de ficarem embriagados (11.20, 21). • O amor não procura os seus interesses, não se exaspera, não se ressente do mal (13.5). Ali havia cristãos que estavam levando uns aos outros aos tribunais (6.1-7). Estavam fazendo o mal uns contra os outros e defraudando uns aos outros (6.8). Eram também insensíveis em relação aos membros mais fracos do corpo de Cristo, e alguns permitiam que sua liberdade em Cristo se tornasse “tropeço para os fracos” (8.9). Aliás, alguns chegavam a participar de idolatria (10.14). • O amor não se alegra com a injustiça, mas regozija-se com a verdade (13.6). É difícil conceber que cristãos com tantos dons se vangloriassem da imoralidade na igreja, mas Paulo declara enfaticamente: “Andais vós ensoberbados [quanto a essa imoralidade], e não chegastes a lamentar” (5.2). Após definir o amor e contrastar seus ingredientes com aquilo que tanto faltava aos coríntios, Paulo fez algumas declarações positivas so­ bre o amor (13.7). "... tudo sofre” (isto é, fica firme em meio à pres­ são e ao sofrimento). "... tudo crê” (isto é, está “sempre desejoso de acreditar no que é melhor” [Moffatt]). “ ... tudo espera” (isto é, demonstra confiança no futuro, não pessimismo irremediável). “ ... tu­

do suporta” (isto é, permanece firme e permite que o cristão prossiga em meio ao fragor da batalha). Os coríntios, é claro, eram culpados em todos os aspectos. Não estavam suportando uns aos outros; estavam prontos a crer em afirmações falsas, mesmo acerca do apóstolo Paulo (4.3-5; 9.1-3); eram negativos em suas atitudes e estavam sucumbindo às pressões do mundo e ao seu sistema. Agora, ao nos aproximarmos dos versículos de 8 a 12 de 1 Coríntios 13, alguns aspectos das afirmações de Paulo tornam-se um tanto quanto difíceis de compreender. Mas, no contexto, certas verdades tornam-se muito óbvias. Paulo conclui de forma natural e lógica que o “amor jamais acaba” (13.8). Os dons são temporários, mas o amor permanece para sempre (13.8). “ ... porque” , diz Paulo, “em parte conhecemos, e em parte profetizamos. Quando, porém, vier o que é perfeito, então o que é em parte será aniquilado” (13.9, 10). . A que Paulo está-se referindo? Observe as palavras e expressões que empregou nesses versículos citados logo acima, em contraste com as que se seguem (ou seja, nos versículos de 9 a 12): E M PA R T E OU PA R C IA L «------------------- ►P E R F E IT O O U C O M PL E T O

menino (infantil) vemos obscuramente, como num espelho conheço em parte

■*------------------------------------►homem «----------------------------------►(maduro) ■*------------------- ►veremos face a face ------------ ►conhecerei perfeitamente

Olhando para toda a primeira carta aos coríntios e comparando-a às epístolas que Paulo escreveu às outras igrejas, destacam-se algumas conclusões. Esses cristãos não haviam atingido o grau de maturidade e de perfeição que outras igrejas do Novo Testamento haviam atingido. Ainda eram crianças ou recém-nascidos. Eram infantis no comportamento. Haviam progredido muito pouco em se conformarem à imagem de Jesus Cristo.2 No desenvolvimento espiritual, ainda não haviam atingido um ponto que permitisse a Paulo escrever-lhes tal como havia escrito aos tessalonicenses, aos colossenses, aos efésios e aos filipenses e dar graças a Deus por sua fé, esperança e amor. Ao

contrário, parecia que, como corpo local de cristãos, estavam quase desprovidos dessas virtudes. Estavam vivendo num estado de “parcialidade” , “infantilidade” e “obscuridade” na vida espiritual.3 A fim de corrigir a situação, Paulo admoestou-os a que revissem suas prioridades. Em primeiro lugar, orientou-os a lutar por “um caminho sobremodo excelente”; deviam buscar o amor (12.31; 14.1) e depois procurar, “com zelo, os melhores dons” (12.31).4

Fé e esperança A fé e a esperança, as duas outras virtudes apresentadas como padrões pelos quais podemos medir o nível de maturidade da igreja local, são também descritas no Novo Testamento de forma toda especial. Embo­ ra não haja uma passagem central que descreva essas virtudes, tal como 1 Coríntios faz em relação ao amor, existem várias palavras e frases descritivas, empregadas pelos escritores do Novo Testamento, que adicionam sentido e conteúdo a essas palavras. A seguir há algumas dessas frases: FE

ESPE R A N Ç A

Operosidade da fé (1 Ts 1.3) Couraça da fé (1 Ts 5.8) Fé em Cristo Jesus (Cl 1.4) Fé no Senhor Jesus (Ef 1.15) Fé em Deus (1 Pe 1.21) A vossa fé cresce sobremaneira (2 Ts 1.3) Fé sem hipocrisia (1 Tm 1.5) A fé que tens para com o Senhor Jesus e todos os san­ tos (Fm 5) Plena certeza da fé (Hb 10.22)

Firmeza da esperança (1 Ts 1.3) Esperança da salvação (1 Ts 5.8) Esperança que vos está pre­ servada (Cl 1.5) Para saberdes qual é a espe­ rança do seu chamamento (Ef 1.18) Esperança em Deus (1 Pe 1.21) Guardemos firme a confissão da esperança, sem vacilar (Hb 10.23) Cristo Jesus, nossa esperança (1 Tm 1.1) Temos posto a nossa esperança no Deus vivo (1 Tm 4.10)

Nem depositem a sua esperança na instabilidade da riqueza, mas em Deus (1 Tm 6.17) Esperança da vida eterna (Tt 1.2) Aguardando a bendita esperança (Tt 2.13) Nos regenerou para uma viva esperança (1 Pe 1.3) Ponham toda sua esperança na bênção que será dada a vo­ cês quando Jesus Cristo for revelado (1 Pe 1.13, b l h )

Mesmo uma leitura rápida dessa lista revela que fé e esperança estão intimamente relacionadas quanto ao significado. O escritor de Hebreus esclarece esse relacionamento quando afirma que a “fé é a certeza de coisas que se esperam, a convicção de fatos que se não vêem” (11.1). A fé diz respeito aos próprios cristãos — suas personalidades — isto é, suas mentes, suas atitudes, suas vontades. Acarreta convicções e certeza íntimas. O objeto básico de nossa fé é Deus Pai e seu Filho Jesus Cristo, mas também inclui fé em nossos irmãos cristãos (1 Co 13.7; Fm 5). A esperança, por outro lado, embora ligada à fé, diz respeito ao objeto e ao conteúdo da fé. É empregada com maior freqüência para referir-se à salvação e ao livramento final deste mundo, para estarmos na presença de Jesus Cristo quando ele vier de novo. A palavra esperança também é empregada para descrever a condição dos cristãos. É utilizada em conexão com palavras e expressões como “firmeza” (1 Ts 1.3), “sem vacilar” (Hb 10.23), “pôr” , “colocar” ou “depositar” (1 Tm 4.10; 6.17; 1 Pe 1.13). É empregada para descrever “certeza” e “estabilidade” . Concluindo, é óbvia a razão de Paulo referir-se à/é, à esperança e ao amor como as virtudes básicas pelas quais podemos medir o nível de maturidade de uma igreja local. O amor diz respeito aos relacionamentos moldados segundo Cristo, entre os membros do corpo

e para com todas as pessoas — uma atitude que cria unidade e unanimidade. A f é diz respeito à confiança que o corpo de Cristo tem em seu Cabeça, o Senhor Jesus Cristo. Existe aquela convicção e certeza unânime de que Deus existe, responde às orações e é nossa fonte divina de vida e existência. A presença da esperança manifesta-se em estabilidade, firmeza e certeza e, de modo particular, olha além do presente, para aquele dia p m m i? Tp s iis P r i s t n v ir á rlp n n v n n a r a su a ia r p ia

n a ra p s ta h p lp r p r «pn

reino eterno.

Resumo Por que, então, a igreja existe como con tó id ad e congregada'? A4grem>' deve tornar-se um organismo m aá^ ^ m & lísíite o processg de edifi­ cação, e essa maturidade rçflete-se,: antes de tudo, no amor que existe no corpo de Crjsto e, em segundo lu^ . , nojgráu de fé e de esperança manifesta põjetivãmente. “Cada u m edifica!” , advertftj Paulo. A igreja pode ser fraca e imatura — construída co m ^áâeteâ, feno e palha. Ou pode ser forte^m am u-a — feita de oura? .prata e pedras preciosas (1 Co 3.10a s k # i m a t u r a , reflete
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