Historia e Verdade Paul Ricoeur

February 6, 2017 | Author: cristine20 | Category: N/A
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HISTóRIA E VERDADE PAUL RICOEUR PAUL RicOEUR, professor de Filo­ sofia na Faculdade de Letras de Paris, foi um estudioso de GABRIEL MARCEL JASPERS e HusSERL e, presentemente, é um ,dos mais autorizados intérpretes da nossa estrutura cultural e do entendi ..... m·ento que o homem moderno possui da própria vida. Ao longo de mui­

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tos anos de labor constante e tendo publicado os seus resultados em revis_. tas como Esprit e a Reuue lnternatio_. nale de Philosophie, o autor reconhe ..... ceu o relativo encadeamento dessa obra dispersa e resolveu reuni-la em livro a que deu o título de História e Verdade, que foi editado em 1955. Oúze anos depois, aumentou a primeira edição com seis novos ensaios e fêz algumas alterações na ordem de apresentação. Foi esta nova edição que a Editôra Forense traduziu e apresenta agora ao público brasileiro. Segundo pa1avras do autor, o rea� grupamento dos ensaios foi feito em

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tôrno de dois pólos: o pólo metodo­ lógico e o ético. A primeira parte con� têm os artigos consagrados à signif!� cação da atividade histórica e vão

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COMPANHIA EDITóRA Rro DE JANEIF

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Primeira edição brasileira: 1968 traduzido de HISTOIRE ET VÉRITÉ Copyright

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PREFACIO DA PRIMEIRA EDIÇAO (1955)

1955, by Editions du Seuil

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Todos os estudos aqui reunidos são escritos de ocasião: não procedem do desenvolvimento interno de uma reflexão que do­ mina os temas e, sobretudo, o respectivo encadeamento; têm todos por origem determinado acontecimento: · uma discussão em grupo de trabalho, um colóquio ou congresso, um aniversário comemorado na dor ou na alegria. E todavia êsses textos de­ sarmônicos I a mim me parecem suscetíveis de certa ordem, graças ao parentesco de ritmo e 'tema, e graças, sobretudo, a certa consonância involuntária cuja ....regra procuro aqui desco­ brir, criticando-me a mim mesmo. Foi possível reagrupar êstes textos em tôrno de dois pólos: um pÓlo metodológico e um pólo ético (no sentido mais amplo da palavra). Contém a primeira parte os artigos consagrados à significação da atividade histórica e que se escalonam desde o ofício de historiador no sentido estrito, com sua exigência de objetividade. - até o problema filosófico-teológico ae uma sig­ nificação total ou final da história. Os estudos da segunda parte vinculam-se àquilo que eu denominaria uma crítica çla civiliza­ ção; procuro nêle um reexame reflexivo de certas propulsões civilizadoras de nossa época; orientam-se todos êsses textos para uma pedagogia política cujo sentido determino nas páginas con­ sagradas a Emmanuel Mounier. Se foi todavia possível dividir em dois grupos êsses diversos ensaios, o que mais importa a meu ver é, antes de mais nada, aquilo que chamei de início o parentesco de ritmo; um ritmo

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Tradução de: F. A. RmEIRO

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1 Deixamos de lad.o três espécies de textos: em primeiro lugar os estudos de caráter filosófico muito técnico, um dos quais, aliás, se refere diretamente ao tema central desta coletânea: Husserl e o sentido da História (Revue de Métaphysique et de Morale, 1950); em seguida, as crônicas filosóficas que apresentam de modo manifesto o caráter de c!"ítica de livros ou obras contemporâneas; e por fim, os ensaios rela­ CiOnados com minha Philosoplzie de la volonté, e particularmente com o preparo do segundo tomo: Finitude et Culpabilité.

Reservados os direitos de propriedade desta tradução pela COMPANHIA EDITõRA FORENSE mo Braga, 299 - 1.0-2.0 - Rio de Janeiro de São Francisco, 20 - Loja - São Paulo

Impresso no Brasil Printed in Brazil

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J7""'·. umco mantém com efeito unidas as duas preocupações acima evocadas e cuja proporção apenas se inverte na primeira e na segunda partes. Recuso-me energicamente a dissociar a eluci­ dação dos conceitos diretores segundo os quais procuramos pensar na linha da verdade nossa inserção na história, da preo­ cupação de intervir ativamente na crise de nossa civilização, por um testemunho na linha da verdade, da fôrça e da eficácia da reflexão. Nada mais estranho à (/maneira" dêstes ensaios que a alegada oposição entre o pensamento comprometido e o pensamento desembaraçado; cada qual tomado isoladamente, e todos, tomados em conjunto, desejam êstes ensaios dar teste­ munho contra a futilidade de tal querela; seria preciso riscar essas duas expressões e riscá-la ao mesmo tempo; a oposição, não tão em moda, porém mais radical, introduzida por Marx entre o pensamento que apenas observa e contempla e uma praxis que transforma o mundo, parece-me deva ser repudiada ainda com mais vigor. Como se procura exprimir de muitas ma­ neiras em diversos dêstes textos, a própria aparição de um pen­ samento contemplativo à maneira de Parmênides, de Platão e do neoplatonismo (para tormarmos um exemplo extremo), trans­ formou o mundo dando-nos, com a denegação das aparências sensíveis e das manipulações, a matemática euclidiana, em se­ guida a física matemática, e, por intermédio da medida e do cálculo, o mundo das máquinas e a civilização técnica. A unidade de ritmo à qual faço alusão aqui parece bastante explicitada no ensaio intitulado Trabalho e Palavra. Busco na própria operação do dizer esta alternância de contato e afasta­ mento que torno a encontrar em todo comportamento respon­ sável dum "intelectual" em face de qualquer problema. Eis por que a reflexão de cunho mais metodológico dos três pri­ meios ensaios é inseparável da percepção ético-política das rela­ ções humanas para a qual tendem os estudos da segunda parte; em sentido inverso, a maneira filosófica de me achar presente à minha época parece-me vinculada a uma capacidade de rein­ terpretação das intenções remotas e dos pressupostos radicais de ordem cultural subjacentes aquilo que há pouco eu denomi­ n-awi propulsões civilizadoras de nossa época. Assim a reflexão sôbre o acontecimento me recambia a essa pesquisa das signifi­ cações e encadeamentos nacionais que ocupa os primeiros textos. em outras palavras, é preciso não ter vergonha de ser l(intelec­ lúal", como o Socrates de Valéry em Eupalinos, votado ao pesar 8

de nada haver jeito com suas próprias mãos. Creio na eficiên­ cia da reflexão, pois creio que a grandeza do homem está na dia­ lética do trabalho e da palavra; o dizer e o fazer, o significar e 0 agir estão por demais misturados para que se possa estabelecer oposição profunda e duradoura entre theoria e praxis. A palavra é meu reino e disso não me envergonho; ou, melhor, envergo­ nho-me na medida em que minha palavra participa da culpabi­ lidade de uma sociedade injusta, que explora o trabalho; não me envergonho originàriamente e, sim, tendo em vista o seu destino. - Creio, na qualidade de universitário, na eficácia da palcvra docente; como alguém que analisa a história da filoso­ fia, creio na fôrça esclarecedora, mesmo para uma política, du­ mr palavra consagrada à elaboração de nossa memória jilosó­ ji< !; como membro do grupo Esprit, creio na eficácia da palavra c re retoma de modo reflexivo os temas geradores de uma civili­ , JÇão em marcha; como ouvinte da pregação cristã, creio que a Jalavra pode transformar o "coração", isto é, o núcleo de onde brotam nossas preferências e nossas atitudes decisivas. De certo modo, todos êstes ensaios são a glorificação da palavra que re­ flete com eficácia e que age mediante reflexão.

O título dado a êstes ensaios parece ambicioso, se se espe­ ;·asse uma abordagem sistemática dessas duas noções capitais: /erdade e História. A êle, entretanto, me apeguei, porque per­
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