Guia+Prático+de+Hipnose_

December 30, 2018 | Author: Anonymous H3kGwRFiE | Category: Hypnosis, Psychotherapy, Psicologia e ciência cognitiva, Sigmund Freud, Mind
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 Das técnicas básicas  à regressão

Horacio Ruiz

 Das técnicas básicas  à regressão Tradução:

Sandra Martha Dolinsky

DEDICATÓRIA Às vezes, cruzamos paisagens sombrias no devir da vida, perdemos o rumo e não sabemos onde está o norte; o vento, a chuva e o sereno da desolação interior nos desarraigam tanto que caminhamos rumo ao poço som brio da angústia e não encontramos a saída, ou melhor, nem a procuramos. A tristeza e a solidão tornam-se amigas inseparáveis que compartilham cada suspiro e cada batida do coração cansado, e o peso das pernas, os sentidos embotados, a mente confusa e as costas arqueadas por conta do lumbago, e o lastro do passado nos afundam e nos humilham, fazendo-nos recordar nossa miséria e nulidade humanas. Só conseguimos ver um raio de luz e uma lufada de ar fresco que revive nosso ânimo, limpa a mente e desperta a alma quando algum ente querido nos abraça, aceita-nos e nos compreende incondicionalmente, mesmo que não concorde com o rumo que nossa vida tomou.  Nesse abraço nos reconhecemos, em seus olhos e em suas lágrimas, em sua respiração e em seu hálito, e percebemos que sua dor e tristeza são nossa dor e nossa angústia; então, compreendemos que fomos imensamente covardes e lastimosamente egoístas; ele não merece que o tenhamos feito sofrer com nossos desvarios. E mil vezes que eu caia, mil e uma vezes me levanto. Eu lhe devolvo: “Um batalhão de querências e um sorriso”; um coração que bate vigoroso, uma mente limpa e uma voz clara que lhe diz: “obrigado por estar aí quando eu mais precisava”. Agora sei que vivo por você e para você; se você não estivesse aí, eu não poderia me reconhecer aqui. Porque, quando ler estas linhas e se reconhecer, então, com seu sorriso saberá que estou me referindo a você. Obrigado.

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ÍNDICE Prólogo ..........................................................................................9 Origem Deste Livro .....................................................................15 Um Ser Biopsicossocioespiritual .................................................17 Introdução ....................................................................................31 Capítulo 1: Enfoque geral ..........................................................33 Conceito de hipnose .....................................................................33 Funcionamento do cérebro em hipnose ...............................38 O fenômeno hipnótico..........................................................47 Teorias explicativas ..............................................................53 A sugestão ............................................................................65 Exercício 1: O poder da sugestão .........................................68 Terapia versus espetáculo.............................................................70 História da hipnose ......................................................................74 Lembre-se ....................................................................................88 Galeria de fotos históricas ............................................................89 Capítulo 2: Hipnose básica  ........................................................93 Auto-hipnose ................................................................................93 Exercício 2: Auto-hipnose (I) ...............................................95 Exercício 3: Auto-hipnose (II) .............................................97 Hipnose para principiantes...........................................................98 Exercício 4: Desvio da atenção ...........................................102 Exercício 5: Testes de sugestionabilidade ...........................103 Técnicas básicas ..........................................................................109 Exercício 6: Técnicas de indução à hipnose........................109 Processos e fenômenos ...............................................................122 Exercício 7: Processos e fenômenos hipnóticos..................122 Lembre-se ...................................................................................128  – 7  – 

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Capítulo 3: No consultório  .......................................................131

Ser hipnoterapeuta ......................................................................131 Conhecimentos de psicologia..............................................134 A autoimagem .....................................................................138 Terapias .......................................................................................139 Hipnoanálise........................................................................142 Exercício 8: Técnicas de hipnoanálise ................................149 Programação cognitiva ........................................................153 Exercício 9: Programação cognitiva....................................154 Reprogramação e sugestão ..................................................159 Exercício 10: Reprogramação .............................................159 Visualização: os dois hemisférios cerebrais ........................163 Exercício 11: Visualização criativa .....................................165 Empatia com o paciente ..............................................................171 Lembre-se ...................................................................................172 Capítulo 4: Regressão a Vidas Passadas ..................................175 A crença na reencarnação ...........................................................175 Diferentes visões sobre a reencarnação ..............................184 Terapia de regressão hipnótica ....................................................188 Regressão ............................................................................190 Exercício 12: Regressão a possíveis vidas passadas ...........191 Progressão ...........................................................................197 Lembre-se ...................................................................................198 O que se disse sobre a hipnose  .................................................199

Exercício 13: Modelo de indução em auto-hipnose (naturalista ou ericksoniana) ........................200 Exercício 14: Modelos ou sugestões de auto-hipnose ........200 Exercício 15: Na mesma linha de induções naturalistas e processos tanto conscientes quanto inconscientes, modelamos hetero-hipnose ...205 Exercício 16 ......................................................................207 Exercício 17 ......................................................................211 Conclusões ..................................................................................215 Orto-hipnose ...............................................................................217 Bibliografia recomendada ...........................................................219

PRÓLOGO Para Horacio. Conheci Horacio graças a meu nunca esquecido amigo Fernando Jiménez del Oso; em um programa meu de rádio com o qual ele colaborava, disse-me que na semana seguinte viria com um hipnoterapeuta com quem trabalhava às vezes. Como ele sabia de meu ceticismo generalizado, não se espantou com minha pergunta imediata:  – Trabalha com você-psiquiatra ou com você-parapsicólogo? Falava o psiquiatra, e Horacio completou, uma semana depois, um  programa desses “redondos”. A hipnose é um tema seguro no rádio e na televisão; funciona sempre, mas também sempre provoca o mesmo conflito pessoal: será que fiz divulgação ou espetáculo a baixo preço? Fazia muito tempo que eu mesmo havia escrito um artigo pedindo – inutilmente, claro – às redes de televisão que proibissem sessões de hipnose dentro de programas de espetáculos porque, das duas, uma: se fossem truque, era uma falta de respeito pelos telespectadores; e, se fossem verdadeiros, parecia-me uma falta de respeito para com a dignidade das “vítimas” dos hipnotizadores. Conto todos esses precedentes para deixar claras minhas reticências a baixar a hipnose ao terreno do mórbido. Não foi o caso de Horacio, naturalmente, que não só nos esclareceu – como faz neste livro  – as diferenças entre hipnoterapia e espetáculo, como também provocou minha curiosidade e respeito por uma realidade certamente quase tão antiga quanto o homem. Mais adiante, fiz um de seus cursos intensivos com o professor Jiménez del Oso e um bom número de interessados por muitos diversos motivos. Aquele fim de semana foi um cúmulo de descobertas, de sur presas e de constatações libertadoras importantes; aprendi que ninguém  pode ser hipnotizado contra sua vontade porque, definitivamente, é a  – 9 – 

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 própria pessoa quem entra nesse estado e o terapeuta só acompanha e dirige esse caminho apaixonante no qual o ego deixa de encobrir o que está mais escondido em algum lugar do nosso cérebro: nossa consciência. Este livro, por último, dirige-se a muitas pessoas com diferentes curiosidades: serve para conhecer mais a história da hipnose com suas verdades e seus mitos, serve para adentrar a quantidade de utilidades que essa técnica tem e serve para que, quem quiser, faça suas “atuações”, se não como hipnotizador – quem sabe –, ao menos como ator ou diretor de um relaxamento intenso em um mundo agitado. O melhor que se pode dizer deste livro e de seu autor é algo sim ples, mas importante: os dois são sérios, profissionais e úteis e, ao mesmo tempo, são divertidos, amenos e tratam de algo apaixonante com rigor e sem arrogância.  Andrés Aberasturi 

HORACIO COM O DOUTOR FERNANDO JIMÉNEZ DEL OSO Conheci o dr. Jiménez del Oso em Desojo (Navarra). Ele me pediu que o levasse a uma regressão. A partir desse primeiro encontro, estabelecemos uma profunda e enriquecedora amizade. Um dia, ele me ligou – naquela época eu morava em Logroño –, e com aquela voz tão agradável sua me disse: “Cara, venha trabalhar comigo em meu consultório em Madri”, naquela época situado na rua Aralar, em frente ao

Prólogo

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famoso Pirulí* da TVE. Foram mais de dez anos compartilhando amizade, jantares, programas de rádio e televisão e pacientes, que ele me encaminhava para que eu os tratasse com hipnose quando o caso assim requeria. Tive, inclusive, o prazer de ajudar seus filhos Pablo e Fernando em seus estudos de hipnose para potencializar a memória, concentração e preparação para provas. Também colaboramos juntos na investigação de fenômenos psíquicos e na revista  Enigmas, que ele dirigiu até o dia em que faleceu. Pediu-me que colaborasse escrevendo um curso teórico-prático sobre hipnose e suas aplicações terapêuticas; fiz isso em colaboração com Guillermo Martinez Estrada. Esse foi o começo de minha colaboração com a revista  Enigmas. Uns meses antes de nos deixar, visitei Fernando em seu consultório. Ele insistiu várias vezes – com um tom de voz que não esquecerei jamais – que queria fazer regressão hipnótica a vidas passadas. Disse que tinha verdadeira necessidade de se aprofundar nessa experiência. De alguma forma, suponho que ele intuía alguma coisa. Eu sei que Fernando, meu querido e saudoso mestre, do Além, de alguma maneira, continua me ajudando; e sei muito bem o que digo. Várias pessoas, que não se conhecem entre si, transmitiram-me praticamente a mesma mensagem: ele quer que realize alguns dos projetos sobre os quais tantas vezes em vida conversamos. A publicação deste livro é um deles. Querido Fernando, algum dia tornaremos a nos abraçar. Esteja onde estiver, obrigado; você e eu sabemos por quê. Ah, e diga a nosso querido amigo Joaquín Gómez Burón que não me esqueci dele. Imagino que vocês se reencontraram e devem estar falando de suas coisas. Agora já sabem o que há do outro lado.

*N.T.: Torrespaña, torre de transmissão de propriedade da TVE, popularmente conhecida como Pirulí (pirulito).

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HORACIO E ANDRÉS ABERASTURI Foi uma madrugada de primavera do ano de 1999. Fernando me ligou e disse: “Venha me buscar, vamos para a Rádio Nacional. O amigo Andrés nos espera para entrevistá-lo em seu programa ‘La Leyenda Continúa’ so bre hipnose, as regressões, enfim, sobre tudo que você faz”. Assim conheci Andrés Aberasturi. O programa recebeu muitas ligações de ouvintes. Voltamos em uma segunda ocasião, e o programa suscitou tanto interesse ou mais que o primeiro. Andrés tornou a nos ligar. Nessa terceira vez, queria falar de regressão a vidas passadas e, ainda, que realizasse uma experiência de regressão ao vivo para todos os ouvintes da Rádio Nacional. Andrés me confessou que, alguns anos antes, em certa ocasião, de madrugada, ouviu pela Onda Cero uma regressão que eu havia realizado no programa dirigido por Concha García Campoy, com o dr. Jiménez del Oso, e pensou que gostaria de realizar a mesma experiência. Fiquei surpreso ao ver que Andrés, durante os três programas realizados com ele e Fernando, mostrava interesse em aprender hipnose, e ele me disse que o avisasse assim que desse um curso sobre a técnica.  Na terceira ocasião, diante de sua insistência, eu disse: “Andrés, se realmente está interessado, vou organizar um curso para você”. Fernando disse: “Se organizar um curso e Andrés for fazer, conte comigo, irei também”. O curso aconteceu em 1  de maio de 1999. Tive a honra e o prazer de contar com tão excelentes e carinhosos “alunos”. Parte do curso foi gravado e transmitido pelo Canal 9, na série “La otra realidad”, dirigida pelo dr. Jiménez del Oso com a colaboração de Andrés Aberasturi. º

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Prólogo

Escrita xenográfica realizada em transe por Elena García.

HORACIO NA ONDA IMEFE R ADIO COM ELENA G ARCÍA Elena García é uma mulher bastante singular; também nos une uma antiga amizade. Tive a oportunidade de realizar muitas experiências hipnóticas com ela junto com o dr. Jiménez del Oso e em programas de televisão, como “Misterios en la Intimidad” e “La otra realidad”, e também em “Alerta 112”, da Antena 3 TV. Elena sempre colaborou conosco, e tivemos a oportunidade de mostrar o resultado dessas experiências e comprovar algumas de suas faculdades. Por exemplo, Elena recorda algumas vidas passadas suas. Narra acontecimentos vividos, que guardam perfeita concordância com as circunstâncias de sua vida atual. Umas das experiências mais extraordinárias é o fenômeno da xenoglossia, isto é, falar um idioma desconhecido em sua vida atual; ou, o mais interessante ainda, a xenografia, ou seja, escrever em um idioma que não se conhece. Em algumas ocasiões, Elena escreveu em árabe.

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Quando mostrei ao dr. Jiménez del Oso sua primeira escrita xenográfica, ele demonstrou muito interesse. Consultou um filólogo arabista e ele confirmou que, de fato, estava correta, e parecia ter sido escrita  por três personalidades diferentes. “A escrita é muito culta, como se nós escrevêssemos em latim agora”, comentou.

PROGRAMA ONDA IMEFE Através das ondas radiofônicas, ao vivo diante de mais de duzentas pessoas, Julio Barroso, diretor do programa “La Luz del Misterio”, apresenta e dirige uma experiência excepcional: trata-se de convidar os presentes e ouvintes da comunidade de Madri a participar de uma experiência de regressão hipnótica a vidas passadas. Minha tarefa consiste em hipnotizar individualmente Elena García e depois dirigir uma regressão coletiva tanto com os presentes ao ato quanto com os que acompanham o programa pelo rádio. Como convidados especiais na sala onde se realiza a experiência estão o dr. Fernando Jiménez del Oso, Lorenzo Fernández, Iker Jiménez, Pablo Villarrubia, Jesús Callejo; participam, ainda, a dra. Cora, coordenadora do mestrado em Hipnose da Universidade Complutense de Madri, o dr. Rodríguez Delgado, a psicóloga Maria José Domínguez, dentre outros profissionais da ciência. Centro cultural Boavista. Ano 2001.

ORIGEM DESTE LIVRO Com base na exploração e prática da psicologia transpessoal e do tra balho de pesquisa durante quase 30 anos no campo da psicoterapia utilizando a hipnose, escrevi cinco livros sobre o apaixonante mundo do hipnotismo e todas as suas variantes (auto-hipnose, regressões, hipnoterapia, PNL, visualização, etc.). Também divulguei os usos terapêuticos da hipnose em muitos meios de comunicação, mostrando seu lado terapêutico e lúdico em programas de rádio, na imprensa e na televisão, inclusive com programas especiais e dedicados exclusivamente aos usos terapêuticos dessa técnica ancestral. Considero a hipnose também um método de autoconhecimento e desenvolvimento pessoal de valor incalculável. Não é à toa que podemos considerar a hipnose como um amplificador ou potencializador de habilidades psicológicas. Qualquer terapia que seja realizada no estado ou contexto hipnótico é mais eficaz e mais eficiente, segundo estudos de metanálise. Há anos, mais ou menos em 1994, o psiquiatra Fernando Jiménez del Oso me pediu que escrevesse um livro sobre hipnose. Estranhei e lhe perguntei como deveria fazer isso, o que contaria e que formato deveria ter o livro. “Simplesmente escreva um livro no qual conte coisas das quais não se envergonhe depois” –, respondeu ele com aquele seu sorriso irônico. “O que faz em seus cursos e em seu consultório de hipnoterapia, as técnicas que utiliza, a metodologia que aplica, aquilo que funciona no terreno da psicoterapia, curando e aliviando o sofrimento humano; isso que você pode demonstrar por meio dos pacientes e alunos com quem se relaciona. Isso e nada mais que isso você deve contar e transmitir àqueles que estejam como você, empenhados no autoconhecimento e desenvolvimento pessoal.” Assim procurei fazer a partir daquele dia. O dr. del Oso nos deixou há alguns anos, mas sua lembrança permanece indelével em alguns,  – 15 – 

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como eu, dos que desfrutaram de sua amizade. Ele era uma dessas pessoas doces que, quando as conhecemos, reconciliamo-nos com o ser humano e sabemos que vale a pena confiar em algumas pessoas. Ele sabia ser amigo e mestre com seu peculiar senso de humor que nos fazia sentir como se o conhecêssemos a vida inteira. As palavras que me vêm à mente para defini-lo são: Fernando era um “ser humano”. Eu me considero muito sortudo por tê-lo conhecido e por ter compartilhado tanta experiência com ele. A maior satisfação do autor de um livro é, suponho, quando se esgota a primeira edição e o editor comunica que lançará uma segunda.  No meu caso específico, isso prova várias coisas: que o conteúdo deste livro recebeu a aprovação das pessoas interessadas no apaixonante mundo da hipnose; que é um livro sério e ameno, como diz Andrés Aberasturi no prólogo; e que o pedido que me fez o dr. Jiménez del Oso foi atendido.

UM SER  BIOPSICOSSOCIOESPIRITUAL Em primeiro lugar, antes de expor minhas ideias sobre os usos tera pêuticos da hipnose, acho que seria bom e esclarecedor explicar minha versão acerca do ser humano. Afinal de contas, falar de hipnose é falar da mente, da psique, de nós mesmos. Isso permitirá a todos vocês saber de que ponto de vista estou falando e como concebo o tema apaixonante da hipnose e tudo que deriva dela. Em princípio, podemos conceber o ser humano como uma entidade biopsicossocioespiritual. Evidentemente, somos ou temos uma  biologia, o físico, o fisiológico, processos químicos, bioelétricos, hormonais, os processos homeostáticos, etc. Evidentemente, também somos uma entidade psicológica; temos pensamentos, emoções, sonhos, fantasias, desejos, ódios, paixões, tristeza, ou seja, temos uma mente capaz de raciocinar, discernir, operar todos os funcionalismos cognitivos. E, nessa ordem de ideias, também é fácil reconhecer que somos seres sociais, ou estamos em relação com a sociedade, somos indivíduos que não vivem sozinhos em uma ilha. É evidente que não, e vemos,  portanto, a extensão social, as inter-relações sociais com os membros da família, vizinhos, cidadãos, etc. E, como observação final, quem pode negar que temos uma dimensão espiritual? Não me refiro necessariamente às crenças religiosas, e sim à necessidade, como algo inerente ao ser humano, do transcendente, do espírito de solidariedade, do amor à natureza, à vida, aos seres humanos, do sentimento do mágico, do transpessoal, chame-se Deus ou como quer que o queiramos chamar. Portanto, se a experiência evidente desses quatro aspectos da natureza humana nos indica ou mostra que somos algo mais que um corpo e um cérebro, por lógica consequência, a exploração do am plo e vasto território da psique humana, da mente, tem de nos levar a vivenciar esses quatro aspectos mencionados.  – 17  – 

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Há mais de 30 anos me dedico à exploração teórico-prática de tudo que tenha a ver com o campo psicológico, a psicoterapia, ou seja, o conhecimento de si mesmo. Nesses anos de estudo, exploração e prática  pessoal com clientes ou alunos, pude comprovar o velho axioma que diz: “Não há nada de novo sob o sol”. Essas técnicas, ou métodos, de autoconhecimento e desenvolvimento pessoal (autorrealização) existem desde sempre e em todas as latitudes espirituais do mundo. Com diversos nomes e formas diferentes de explicá-las, mas, no fundo, e como não podia deixar de ser, os processos internos são os mesmos. A maioria das psicoterapias realizadas atualmente em nosso hemisfério ocidental é muito antiga, e podemos encontrar suas origens no ioga milenar, no Budismo e em outras fontes filosóficas ou místicas de crescimento e desenvolvimento espiritual. Outro detalhe importante é que, embora essa seja uma versão particular minha, evidentemente muitos outros pesquisadores, em diferentes campos de pesquisa, concordam comigo (ou eu com eles) na mesma ou parecida visão e versão acerca do que é o ser humano. Isso me leva a outro postulado: “a visão transpessoal do psiquismo humano”. Essa teoria psicológica está magnificamente postulada, estudada, explorada e divulgada por grandes pesquisadores que, partindo dos paradigmas estreitos e limitantes da chamada ciência oficial (acadêmica), desenvolveram todo esse campo extraordinário de pesquisas e  práticas que definiram como “A quarta corrente da psicologia: a psicologia transpessoal”. Alguns dos mais eminentes cientistas dessa corrente psicológica são: Carl Gustav Jung, Stanlislav Grof, Ken Wilber, Abraham Maslow, Anthony Sutich, James Fadiman, Joseph Campbel, Christina Grof, Swami Muktananda Paramahansa, Gregory Bateson, Fritjof Capra, Elmer e Alice Green, Stanley Kripner, Rupert Sheldrake, Charles Tart Arrien, Jack Kornfield, Ralph Metzmer, Frances Vaugham, Roger Walsh, Michael Murphy, Richard Price, Roger Woolger e Patrick Drouot. Esses e outros médicos, psiquiatras, psicólogos, antropólogos,  psicanalistas, etc., foram enunciando um novo movimento psicológico centrado no estudo da consciência que reconhecesse o significado da “dimensão espiritual” da psique, escola que denominaram “Psicologia transpessoal”. Portanto, conforme estou explicando, para explorar o mundo da  psique e o da hipnose bebo em águas fecundas e profundas do saber humano no campo da psicoterapia, de tal maneira que tenho essas auto-

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ridades como modelo e, até certo ponto, como guias, sabendo que eles traçaram o mapa do psiquismo humano para que outros pudessem continuar explorando e descobrindo territórios, novos para nós, mas que sempre estiveram aí disponíveis para ser explorados isentos de medos e preconceitos. Técnicas e metodologias para quem não teme conhecer a si mesmo nas possibilidades psicológicas que possuímos, como almas ou consciências que esperam o despertar espiritual. Essa é uma técnica psicológica para os terapeutas que buscam o alívio do sofrimento humano mantido por culpa dos preconceitos e temores que tanto nos limitam. Esclarecida essa visão transpessoal minha, também devo dizer que minha forma de trabalho em psicoterapia é claramente eclética, ou seja,  bebe de diferentes fontes. Não excluo nada que sirva para conhecer a mim mesmo mais profundamente e que me permita viver de forma mais equilibrada. Não desprezo nada que me sirva como ferramenta para aliviar o sofrimento dos clientes e alunos que depositam em mim sua confiança, seu tempo e seu dinheiro para que os ajude a resolver seus  problemas e atingir seus objetivos de realização profissional e pessoal. Portanto, só falta dizer qual é a principal ferramenta que utilizo em meu trabalho. Além das diversas técnicas aprendidas na prática do ioga, zen-budismo, psicodrama, iniciação xamânica no México (Yucatán) com iniciados na arte ritual do peiote; além de estudos de psicanálise freudiana e vários cursos de formação em hipnose ericksoniana na Universidade de Valência, também recebi formação em PNL, a qual pratico regularmente em meu consultório com meus clientes e nos cursos que ministro. Mas a base fundamental de minha exploração e investigação sobre mim mesmo e os outros, meu trabalho como psicoterapeuta é a fonte mãe onde beberam todos os grandes nomes da ciência no último século no Ocidente: a hipnose. Vou explicar algumas das principais teorias sobre o que é a hipnose do ponto de vista clínico e terapêutico. Como já disse, a hipnose é a fonte mãe onde beberam todos os grandes nomes da psicologia neste último século no Ocidente. De Mesmer a Charcot, passando por Jung, Freud, Erickson e até o Prêmio No bel de Medicina Santiago Ramón y Cajal, sem esquecer Braid, Liebault, Janet e muitos outros mais, todos os grandes nomes da psicologia, neurologia, psiquiatria, etc. Todos navegaram na hipnose. Não fosse pela hipnose, vários deles – Freud, por exemplo, ou o próprio Jung – não  poderiam ter desenvolvido muitas das bases teórico-práticas de seus sistemas em psicologia ou psicoterapia.

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Com honestidade, Freud escreveu: “Nunca se ponderará o bastante a im portância do hipnotismo para a história da gênese da psicanálise. Tanto em seu sentido teórico quanto terapêutico, a psicanálise administra uma herança que o hipnotismo lhe transmitiu”.

E a sofrologia do dr. Caycedo, o controle mental de Silva e até a  própria PNL têm uma dívida impagável para com sua mãe original: a hipnose. . O dr. Milton Erickson e sua extraordinária escola de psicotera peutas revolucionaram o mundo das psicoterapias graças a essa técnica ancestral para provocar mudanças nos estados de consciência, facilitando a emersão das potencialidades da mente inconsciente, verdadeira artífice dos processos curativos do corpo e da alma. São muitos os livros e documentários escritos e realizados sobre a hipnose. A literatura, a televisão e o cinema dão uma ideia distorcida e falsa sobre o que é a hipnose e o que supostamente se pode fazer com ela quando hipnotizamos outros seres humanos.  Nada há de novo sob o sol. Nem Bandler ou Grinder (criadores da PNL), nem Freud, nem Erickson, e muito menos a faculdade de psicologia de qualquer universidade criaram ou inventaram nada de novo que não fosse já praticado há milênios.  Na Antiguidade, os sábios gregos e de outros locais trabalhavam com imagens mentais e visualizações voltadas à solução de problemas e conflitos daqueles que se punham sob sua direção terapêutica. Narrações filosóficas, relatos e mitos, fábulas e histórias para crianças são, desde os alvores da humanidade, transmitidos de pais a filhos para gerar estratégias de pensamento, mudanças na forma de pensar e sentir; são formas de transmitir valores filosóficos, mudanças na forma de perce ber e sistemas para mudar os estados da consciência. As famosas parábolas de Jesus, Buda e outros grandes da filosofia e da religião foram, desde sempre, fonte inesgotável de sabedoria para transmitir estratégias e valores de pensamentos criativos. A hipnose, o estado hipnótico, ou transe hipnótico é um fenômeno  puramente psicológico ou mental. A mente, a consciência humana é um mistério e um enigma que provavelmente o homem, o ser humano, nunca esclarecerá nem conhecerá em toda a sua dimensão. O “Conhece a ti mesmo” socrático continua sendo uma matéria  pendente para a humanidade. Por lógica consequência, a hipnose como elemento mental ou psicológico é, e sempre será, um enigma, a matéria  pendente.

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A hipnose recebe, ainda, certa rejeição por parte da classe médica e, principalmente, dos psicólogos, em virtude da ignorância que realmente se tem acerca dessa metodologia terapêutica. A principal pro blemática consiste nos falsos estereótipos (mitos) que dela se mantêm entre os não especializados nessa técnica ancestral, que, embora com outros nomes ou definições, existe desde a origem da vida do homem na Terra; ou seja, desde que o homem alcançou sua capacidade de pensar e sua consciência se expandiu sobre si mesmo e sobre a natureza das coisas. A partir desse momento, podemos dizer que a capacidade de transe ou diversidade de estados de consciência começou também. A hipnose sempre constituiu um enorme campo de investigação, e acredita-se que existam mais de 100 mil estudos ou pesquisas acerca dessa técnica milenar. Infelizmente, é uma área totalmente prezada pelas faculdades de psicologia. Inexplicavelmente, um recém-formado em  psicologia não sai devidamente preparado na metodologia hipnótica. Parece que o exemplo do Prêmio Nobel de Medicina Santiago Ramón y Cajal, fiel praticante da hipnose, não serviu de exemplo para os estudantes da ciência. Provavelmente, a máxima autoridade mundial conhecida no uso da hipnose seja o dr. Milton Erickson. Desenvolveu-se toda uma escola magistral de psicoterapia inspirada em seus ensinamentos e em sua genial forma de conceber o inconsciente como fonte de criatividade e de recursos internos que, atualizados no contexto apropriado, são a chave  para que o paciente resolva seus conflitos e alcance seus objetivos. Os estudos clínicos a apresentam como uma técnica de intervenção eficaz, visto que aumenta ou potencializa outros tratamentos realizados no contexto (ou estado) hipnótico. A evidência prática mostra que “a hipnose, como procedimento terapêutico, pode ser considerada uma das técnicas mais antigas que se conhecem para provocar mudanças nos  processos cognitivos, psicofisiológicos, perceptuais e comportamentais”, conforme disse Edmonson em 1986. Segundo estudos de metanálise (Smit, Spirstein, Kirsh e outros), qualquer psicoterapia realizada em um contexto hipnótico tem sua eficácia aumentada, seja cognitiva, comportamental, psicodinâmica ou sistêmica. Esses estudos desenvolvidos e as qualidades da investigação clínica com a hipnose permitem augurar um extraordinário futuro em sua  prática terapêutica. Outra razão pela qual a hipnose deveria ser aplicada com mais regularidade é sua eficiência. Isso quer dizer que a metodologia hipnótica

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é muito mais curta em duração que a maioria das outras intervenções. Permite aprofundar mais no inconsciente do sujeito que pede ajuda e seu custo financeiro é menor. São necessárias menos sessões, e como já indicamos, é adaptável a outras técnicas ou tratamentos, não entra em contradição com nenhuma (geralmente). É, inclusive, um método que  pode ser utilizado tanto individualmente quanto em grupo. Quero dizer com isso que, muitas vezes, hipnotizar uma pessoa  pressupõe levá-la a um estado alterado (positivo) de consciência. Como afirma William Kroger, ao hipnotizar uma pessoa, muitas vezes se dá o seguinte fenômeno psicológico: O significado das palavras (semântica) influi de maneira efetiva sobre o estado e atividade de estruturas corticais e subcorticais, provocando atividades emocionais que podem ser benéficas ou nocivas para o organismo. Isso, da maneira aduzida por Pavlov, é especialmente adequado para a interpretação da base sobre a qual se produzem as respostas hipnóticas.

Minha posição – e existem importantes pesquisas a respeito – é que a metodologia empregada (hipnotismo) utilizando especialmente os cinco sentidos de percepção inibe o córtex cerebral (mente racional e vontade), e, por sugestão, ativa respostas subcorticais, respostas talâmicas, ou seja, ativa-se o inconsciente, fonte de recursos, de criatividade, de novas opções e habilidades que, utilizadas no contexto da terapia,  permitem resolver com relativa facilidade problemas de anos, que se mostraram resistentes às terapias mais racionais ou analíticas. Algumas posições conceituais como essa mencionada são mantidas também por especialistas em hipnoterapia, como o próprio Erickson e os seguidores de sua escola de psicoterapia. Como hipótese, defendo (existem muitas pesquisas a respeito) que, com a terapia que leva o hipnotizado a um estado de profundo relaxamento, se potencializam ou ativam-se os funcionalismos do hemisfério cerebral direito (sede da imaginação, criatividade, intuição e lugar onde emergem os sonhos, e,  por extensão, o cérebro do inconsciente), e é esse inconsciente, repito, fonte de recursos e potencialidades, como bem indicavam Erickson, Jung, Deshimaru e outros pesquisadores no campo da mente.  Nesse estado cerebral existe uma grande emissão de ondas cere brais alfa e teta (relaxamento profundo, maior concentração, imaginação, intuição e centramento dos dois hemisférios; uma percepção mais holística). As ondas teta são emitidas especialmente na zona talâmica e  provêm da parte posterior do cérebro. Isso não quer dizer que o cérebro todo esteja em alfa ou teta; simplesmente, há uma maior emissão dessas ondas cerebrais e seu

Um Ser Biopsicossocioespiritual

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correspondente potencial, medido em microvolts. Esse processo pode ser compreendido melhor se levarmos em conta o que já dizia Milton Erickson: “A hipnose é uma técnica de comunicação mediante a qual se tem disponível o vasto campo das aprendizagens adquiridas, cuja utilidade reside principalmente no fato de que se manifestam sob forma de respostas automáticas. Refletindo profundamente nesses complexos assuntos da arte e ciência da prática hipnótica, a pergunta-chave é: O que transforma o transe hipnótico em um instrumento tão eficaz e eficiente, ou seja, tão útil em psicoterapia”. Conta essencialmente com a cooperação do paciente antes e durante o processo. E, como apontou repetidas vezes o dr. Kroger, destaca-se também o poder curativo e sugestivo da palavra e suas ações negativas ou positivas sobre os níveis corticais e subcorticais. “A palavra pode curar” (dr. Yapko), e, de fato, assim é. Usada no contexto apropriado e de maneira positiva. Pois bem, pensamos alguma vez – por nós mesmos, e não segundo os dogmas acadêmicos da corrente de psicologia à qual pertencemos  – o que faz despertar ou ativar esse imenso potencial do trabalho hipnótico? De onde provém o fator curativo e transformador da hipnose? De que lugar profundo do ser humano surge esse poder ou habilidade magistral de operar mudanças? É evidente e demonstrável – e isso é sabido por todos os psicoterapeutas que trabalham regularmente na prática clínica (e não só teorizadores ou estatísticos) – que toda pessoa tem dentro de si, na mente inconsciente, um potencial que surge facilmente nesse estado hipnótico  particular, que muitos denominam estado de transe. Quando se está nesse estado psicofisiológico de absorção interior, dizemos que estamos “no inconsciente”; outros dirão “no eu superior ou supraconsciente”, “no mestre interno”, etc. Provavelmente, o trabalho hipnótico seja a ferramenta psicológica mais dinâmica e poderosa para despertar em cada  pessoa esse potencial a serviço de sua cura e evolução pessoal. Utilizamos a palavra inconsciente como conceito ou metáfora, visto que não existe na psicologia acadêmica outra forma para definir ou explicar esse lado desconhecido da psique. Obviamente, não é o mesmo conceito do inconsciente freudiano. A hipnose, seja ou não um estado de transe, pode ser muito interessante para os debates acadêmicos de mentes quadriculadas. Mas o que é realmente importante quando um cliente pede ajuda  para seu mal-estar é que o terapeuta seja habilidoso e capaz de levá-lo do estado mental criador e mantenedor de seu conflito a outro estado

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Guia Prático de Hipnose

(transe ou não) no qual se possam modificar padrões de comportamentos negativos e substituí-los por outros mais habilidosos e potencializadores de saúde, bem-estar, segurança, confiança, lucidez de ideias, e geradores de novos recursos. A técnica e sua eficácia estão ligadas ao contexto, ao poder curativo da palavra (semântica), às crenças e âmbitos de referência e ao tipo de relação que se mantenha com tudo isso. Vejamos, agora, o que nos diz o eminente dr. William Kroger em sua magistral obra Clinical and Experimental Hypnosis: “Existe já em pleno desenvolvimento uma consciência de que todas as escolas de psicoterapia (mais de 400?) – incluindo, entre elas, a hipnose – rendem aproximadamente iguais benefícios; portanto, parece provável ou plausível que exista um efeito psicológico comum, um placebo. Por isso – e isso se faz notar enfática e repetidamente nesse livro – a base de uma psicoterapia bem-sucedida depende mais da força da relação interpessoal que da metodologia usada, e a sugestão, em todos os diversos níveis de consciência, é empregada voluntária ou involuntariamente nessa atividade. Visto que ninguém é capaz de diferenciar o final da sugestão e o começo da hipnose, a base real da psicoterapia resulta ser “hipnose em câmera lenta”.

Outras pesquisas clínicas e estatísticas nos dizem o seguinte: Professor Luis García García: A hipnose é um estado psicofisiológico induzido por meio de sugestões diretas ou indiretas. Chega-se a elas bloqueando  primeiro a atenção. Ao fazer isso, produz-se uma dissociação da consciência, em alguns casos, bloqueio total. Aumenta-se a sugestionabilidade. O sujeito assume ou integra as sugestões ou ordens de tipo sensorial, motor e perceptuais. Nesse estado, podem ocorrer na área cognitiva alucinações, amnésias, analgesias, regressões, perda parcial ou total da capacidade volitiva, analítica e dedutiva da realidade. Martínez Perigod y Asís: A hipnose é um estado alterado da consciência no qual as ideias são aceitas por sugestão, em vez de argumento ou dedução lógica. Outros clínicos definem a hipnose como um conjunto de estados  psicofísicos nos quais, uma vez submersa a pessoa hipnotizada, provocase nela um sono artificial por meio de diferentes procedimentos, ordens sugestivas, fixação do olhar em um ponto brilhante, olhos do hipnotizador,  pêndulo, etc.

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