Estratégias De Medicalização Da Infância: Vigiar E Medicar

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VIGIAR E MEDICAR ESTRATÉGIAS DE MEDICALIZAÇÃO DA INFÂNCIA

Comitê Científico Ary Baddini Tavares (UNIMESP) Daniel Arruda Nascimento (UFF) Deyve Redyson (UFPB) Eduardo Kickhofel (UNIFESP) Eduardo Saad Diniz (USP, Ribeirão Preto) Jorge Miranda de Almeida (UESB) Marcia Tiburi (Mackenzie) Marcelo Martins Bueno (Mackenzie) Maria J. Binetti (CONICET, ARG) Maurício Cardoso (FFLCH – USP) Miguel Polaino-Orts (Universidade de Sevilha) Patrícia C. Dip (UNGS/CONICET, ARG) Saly Wellausen (Mackenzie - Pres.)

Sandra Caponi María Fernanda Vásquez Marta Verdi (organizadoras)

VIGIAR E MEDICAR ESTRATÉGIAS DE MEDICALIZAÇÃO DA INFÂNCIA

1ª edição

LiberArs São Paulo - 2016

Vigiar e medicar. Estratégias de medicalização da infância © 2016, Editora LiberArs Ltda. Direitos de edição reservados à Editora LiberArs Ltda ISBN 978-85-9459-005-3 Editores Fransmar Costa Lima Lauro Fabiano de Souza Carvalho Revisão Ortográfica As organizadoras Editora LiberArs Revisão técnica Cesar Lima Editoração e capa Simone Alauk Imagem da capa Intervenção sobre estudos de Leonardo Da Vinci Impressão e acabamento Gráfica Rotermund Dados Internacionais de Catalogação na Publicação – CIP

Caponi, Sandra (org,) C245v Vigiar e medicar: estratégias de medicalização na infância / Sandra Caponi, María Fernanda Vásquez, Marta Verdi (organizadores) - São Paulo: LiberArs, 2016. ISBN 978-85-9459-005-3 1. Psiquiatria 2. Patologia Mental – Crianças 3. Medicamentos I. Título CDD 616.89 CDU 61

Bibliotecária responsável Neuza Marcelino da Silva – CRB 8/8722 Todos os direitos reservados. A reprodução, ainda que parcial, por qualquer meio, das páginas que compõem este livro, para uso nãoindividual, mesmo para fins didáticos, sem autorização escrita do editor, é ilícita e constitui uma contrafação danosa à cultura. Foi feito o depósito legal.

Editora LiberArs Ltda www.liberars.com.br [email protected]

SUMÁRIO

APRESENTAÇÃO ........................................................................................ 7

TRANSFORMANDO CRIANÇAS EM PACIENTES PSIQUIÁTRICOS: FAZENDO MAIS MAL DO QUE BEM Robert Whitaker .............................................................................................................. 13 VIGIAR E MEDICAR  - O DSM-5 E OS TRANSTORNOS UBUESCOS NA INFÂNCIA Sandra Caponi ................................................................................................................... 29 INFÂNCIAS MEDICALIZADAS: PARA QUÊ PSICOTRÓPICOS PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES? Luciana Caliman .............................................................................................................. 47 “O SEGREDO ESTÁ NO INTERIOR”  A NEUROPOLÍTICA

E A EMERGÊNCIA DAS NEURONARRATIVAS NO CONSUMO DE ANTIDEPRESSIVOS” Angel Martínez-Hernáez .............................................................................................. 61 ECONOMIA POLÍTICA DO SOFRIMENTO João Matheus A. Dallmann .......................................................................................... 73 A PERSONALIDADE DOENTE: HIGIENE MENTAL E MEDICALIZAÇÃO DA INFÂNCIA María Fernanda Vásquez-Valencia .......................................................................... 85 LO NORMAL, LO ANORMAL Y LO MONSTRUOSO: MIRADAS EUGÉNICAS SOBRE EL SUJETO “MEDICALIZABLE”

Marisa A. Miranda ........................................................................................................ 103

LA NIÑEZ COMO SÍNTOMA DE MALES SOCIALES: PERVIVENCIAS DE LA EUGENESIA AMBIENTAL EN ARGENTINA Gustavo Vallejo.............................................................................................................. 115 SOBRE O PAPEL DA AUTORIDADE CULTURAL DA PROFISSÃO MÉDICA NOS PROCESSOS DE MEDICALIZAÇÃO DA VIDA Myriam Mitjavila .......................................................................................................... 133 DISCURSO BIOLÓGICO CEREBRAL E A EXPANSÃO DE DIAGNÓSTICOS PSIQUIÁTRICOS Fabíola Stolf Brzozowski .......................................................................................... 147 MEDICAMENTALIDADE E MEDICALIZAÇÃO DA VIDA COTIDIANA Luis David Castiel........ ................................................................................................. 161 SAÚDE MENTAL EM RISCO: ESTRATÉGIAS PARA INTERVENÇÕES PREVENTIVAS Fernanda Martinhago Oriol Romaní .................................................................................................................. 171 DIRECTRICES ÉTICO/POLÍTICAS EN LA MEDICALIZACIÓN DE LAS INFANCIAS HOY Marisa Germain............................................................................................................. 183 BIOPOLÍTICA E EXPERIMENTAÇÃO ENVOLVENDO CRIANÇAS: A DESPROTEÇÃO COMO PERMANÊNCIA HISTÓRICA Fernando Hellmann Marta Verdi ..................................................................................................................... 199

 APRESENTAÇÃO

A existência inevitável de fronteiras difusas e pouco claras entre normalidade e patologia psiquiátrica tem permitido não só a multiplicação de novos diagnósticos, mas também a aceitação da ideia de que seria possível identificar pequenos signos anunciadores de uma patologia mental grave por vir, afirmando a necessidade de realizar intervenções preventivas no campo da saúde mental. Tais intervenções, dirão, permitem identificar prematuramente os diagnósticos psiquiátricos evitando que uma possível doença psiquiátrica se cronifique. Desse modo a psiquiatria parece estar habilitada a agir antes que um processo patológico efetivamente ocorra. Falar-se-á então de doenças mentais do desenvolvimento, isto é, de patologias que se apresentam na infância com sintomas “subclínicos”, pequenos indícios de que um transtorno do com-

portamento ou da aprendizagem poderá vir a acontecer ou a agravar-se no futuro. Pesquisadores de diferentes países do mundo como Philippe Pignarre, Elisabeth Roudinesco, Ian Hacking, Allan W. Horwitz, Robert Whitaker, junto a grupos internacionais como Stop DSM , ou o coletivo francês denominado Pas  Zero de Conduit , apresentaram sólidas objeções a este modelo de identificação precoce de diagnósticos. No Brasil, de igual modo, se somaram críticas procedentes de campos diversos: intelectuais como Pablo Amarante, Maria Aparecida Moyses, Rui Harayama, dentre muitos outros, individualmente ou reunidos em coletivos engajados e ativos como a  ABRASME , o Fórum Sobre Medicalização da Educação e da Sociedade, ou o grupo Despatologiza. Diversas disciplinas contribuem para analisar o fenômeno crescente da medicalização da infância, dentre outras, a pediatria, a psicologia, a psicanálise, a saúde coletiva e as ciências humanas. Os debates internacionais multiplicaram-se nos últimos anos, algumas críticas tiveram um impacto particularmente importante, como a realizada por Thomas Insel, presidente do National Institute of Mental Health (NIMH). Uma semana após a publicação da quinta versão do Manual, Insel anunciava que o prestigioso Instituto abandonaria a utilização da classificação proposta pela APA ( American Psychiatric Association), argumentando que, por tratar-se de uma lista de sintomas sem sustento científico sólido, o DSM deixaria de ser utilizado como marco de referência para as pesquisas científicas financiadas por esse instituto. Ainda que existem inúmeras vozes críticas que destacam a fragilidade da classificação diagnóstica hegemônica (o DSM), já é bem conhecida a informação alarmante de que Brasil é o segundo maior consumidor de psicotrópicos na 7

infância, particularmente metilfenidato (Ritalina®), ficando atrás apenas dos Estados Unidos (EUA). No entanto, no mesmo momento em que tais críticas se multiplicam, se renova o debate em torno a uma legislação que garanta o suposto direito de identificação e detecção precoce de transtornos mentais na infância. Nesse sentido, diversas iniciativas têm se multiplicado em diferentes cenários. No dia 24 de julho de 2012, a Prefeitura de Florianópolis – estado de Santa Catarina – tinha aprovado a Lei nº 9.018/12 que institui a política municipal de prevenção e diagnóstico de distúrbios psicomentais na infância. Meses mais tarde, em outubro de 2013, a Comissão de Educação da Câmara dos Deputados realizou uma audiência pública para discutir o encaminhamento do Projeto de Lei 7.081/10, especificamente para debater estratégias de identificação, intervenção e prevenção de transtornos mentais na infância, definidos de acordo com os critérios do DSM, fundamentalmente TDAH e dislexia. Um processo semelhante teve lugar na França no ano de 2006, quando seguindo uma solicitação do Ministério da Saúde do governo de Sarkozy, o INSERM (Institut National de la Santé et de la Recherche Médicale), que é o maior Instituto Nacional de Saúde e Pesquisa Médica1 da França, elaborou a proposta de criar uma política de identificação e detecção precoce de transtornos mentais em crianças a partir dos três anos de idade. Diversos pesquisadores do campo das ciências humanas e sociais, educadores e grupos sociais se articularam para impedir que esta proposta fosse aprovada. Como resposta a esta proposta um conjunto de reconhecidos pesquisadores de áreas médicas, farmacológicas, epidemiológicas, assim como psicanalistas, filósofos e cientistas sociais, após grandes debates, construíram um Dossier que reúne pesquisas empíricas e argumentos teóricos sólidos, que muito contribuiu para impedir a implementação da proposta. Acreditamos que se impõe a tarefa de analisar e criticar a tentativa de propor um programa de detecção precoce de patologias mentais na infância. Um programa que independentemente de ter recebido duras críticas da comunidade internacional, no entanto continua presente e ativo no âmbito escolar. Considerando estes fatos, o livro que aqui apresentamos busca discutir a partir de diversas perspectivas (ética, sociológica, histórica, cultural) os argumentos, conceitos, teorias, dificuldades e certezas a partir das quais foram construídos os saberes utilizados pelos defensores da “detecção precoce” de

patologias psiquiátricas na infância, particularmente aquelas consideradas de maior prevalência no Brasil, como o TDAH. Analisamos também os diferentes mecanismos e estratégias de prevenção e identificação de supostos transtornos de comportamento e da aprendizagem em crianças principalmente em idade escolar. Trata-se, em fim, de criar um espaço de interação e troca com

1 Para

mais informações, ver http://www.inserm.fr/. 8

pesquisadores brasileiros e estrangeiros interessados em discutir os limites e dificuldades do processo de medicalização da infância. Para isso, resulta necessário articular diversos olhares que agrupamos aqui em torno a três grandes eixos de análise. 1. O DSM e a proliferação de novos diagnósticos: procura indagar sobre a influência do DSM na multiplicação de novos transtornos e os diferentes mecanismos de categorização dos sofrimentos psíquicos. 2.  A medicalização da infância em perspectiva histórica: pretende compreender a partir da análise histórica o processo de criação dos chamados transtornos mentais da infância, o sistema classificatório utilizado, o surgimento dos testes e os modelos estatísticos, assim como as mudanças, continuidades e descontinuidades no saber médico psiquiátrico como parte da medicalização infantil e a detecção de diagnósticos precoces. 3. Ética, indústria farmacêutica e medicalização da infância: busca analisar criticamente o papel da indústria farmacêutica no processo de medicalização infantil, suas implicações éticas e os dispositivos de patologização dos sofrimentos psíquicos. O primeiro eixo temático intitulado O DSM e a proliferação de novos diagnósticos, reúne cinco capítulos que abordam a problemática da medicalização em geral e a medicalização da infância em particular. O primeiro capítulo apresenta um estudo inédito do pesquisador Robert Whitaker, intitulado, Trans formando crianças em pacientes psiquiátricos: Fazendo mais mal do que bem. Esse texto, traduzido ao português pela professora Fabíola Stolf Brzozowski, apresenta uma pesquisa original e rigorosa dedicada a entender uma dimensão das classificações psiquiátricas que, ainda muitas vezes mencionada, poucos pesquisadores abordaram em sua complexidade, proporcionando dados fiáveis. Whitaker apresenta aqui um estudo minucioso dedicado a mostrar este frutífero negócio representado pelas doenças do cérebro, alertando, ao mesmo tempo, para os graves prejuízos que causa a medicação com psicofarmacos. Analisa e põe em evidencia as estratégias concretas utilizadas pela indústria farmacêutica para explorar o milionário mercado aberto com a classificação do DSM. Um negócio milionário que, como indica o autor, produz mais mal do que bem. O segundo capítulo deste eixo, intitulado Vigilar e medicar. O DSM-5 e os transtornos ubuescos na infância, da professora Sandra Caponi analisa as mudanças existentes entre o DSM IV e o DSM-5, particularmente no que diz respeito aos transtornos diagnosticados na infância e adolescência. O capítulo mostra que a desaparição de um agrupamento diagnóstico exclusivamente dedicado aos transtornos da infância no DSM-5, está longe de ser uma boa 9

notícia. De acordo com a autora o DSM-5 apresenta uma verdadeira inflação dos transtornos mentais atribuídos à infância, que estão presentes em cada um dos agrupamentos que compõem o Manual. O artigo se detém na análise dos Transtornos Disruptivos de Controle de Impulsos e de Conduta, prestando particular atenção ao Transtorno de Oposição Desafiante (TOD). O terceiro capítulo que compõe este primeiro eixo temático da professora Luciana Caliman se intitula Infâncias medicalizadas: Para quê psicotrópicos  para crianças e adolescentes?   Tal e como o indica o nome deste artigo trata-se aqui de questionar a prescrição de potentes psicotrópicos a crianças e adolescentes, um fato que parece ter sido naturalizado por pais, professores e médicos. O texto procura, especificamente, analisar a experiência de uso de psicotrópicos por crianças e adolescentes, principalmente no que se refere aos processos de psicofarmacologização das infâncias a partir da análise das narrativas apresentadas por pacientes num CAPsi de Vitória. O quarto capítulo escrito pelo professor Angel Martínez Hernáez, aborda uma temática instigante e atual. O texto intitula-se O segredo está no interior. A neuropolítica e a emergência das neuronarrativas no consumo de antidepressivos. Neste texto o antropólogo espanhol nós convida a pensar na temática das neunarrativas, isto é, a refletir sobre uma nova estratégia de construção da subjetividade que se articula em torno a uma narrativa sobre si que aparece mediatizada por explicações neurológicas ou neuroquímicas. O autor denomina esse processo como self   neuronal, e ainda que, segundo afirma, o self não é omnipresente nem hegemônico no pensamento contemporâneo, sem dúvida parece ocupar um lugar central no modo como muitas pessoas pensam sua subjetividade, possibilitando um crescente, imenso e lucrativo mercado dedicado às aflições. Por fim, o quinto e último capítulo deste eixo temático se intitula Economia política do sofrimento, de João Matheus A. Dallmann. Apelando a autores como Michel Foucault, Pierre Bourdieu, Emmanuel Renault e Philippe Pignarre, o autor explora o conceito de economia política do sofrimento, utilizando noções e construindo hipóteses sobre a intrincada relação que existe entre os campos científico, econômico e político. O texto insiste em sublinhar o caráter social do sofrimento psíquico, afirmando que “é a partir de um lugar no mun do que o sujeito sofre”. Na sociedade contemporânea caracterizada pela naturalização dos processos de medicalização das aflições de adultos e crianças, parece ser urgente a tarefa proposta pelo autor: realizar uma crítica a partir da economia política do sofrimento, incorporando os aspectos micro e macro da vida social. Pois, jamais podem ser esquecidos os aspectos psíquicos, sociais e políticos concretos nos quais está inserido o sujeito que sofre. O segundo eixo temático, Medicalização da infância em perspectiva histórica, contém quatro textos relacionados com as mudanças históricas que permitiram o processo de legitimação da medicalização infantil e os transtornos mentais na infância. O primeiro capítulo intitulado  A personalidade doente. 10

Higiene mental e medicalização da infância, da pesquisadora Maria Fernanda Vásquez, analisa de maneira comparativa duas obras médicas, uma colombiana e outra brasileira, para compreender como foi entendida a medicalização da infância em cada uma delas e suas diferenças e semelhanças no marco de consolidação de um campo de saber relativo à psiquiatrização e psicologização dos afetos e do desenvolvimento da personalidade das crianças, assim como das formas de adaptação ou de ajustamento social. O segundo capítulo da pesquisadora argentina Marisa Miranda intitulado Lo normal, lo anormal y lo monstruoso: miradas eugénicas sobre el sujeto “medicalizable” , analisa a maneira como se institui o “sujeito medicalizado” a partir do discurso eugênico. Dito sujeito, segundo a pesquisadora, se entende como uma entidade cuja descendência pode ser “optimizada” para melhorar a aptidão da raça através do uso de algumas estratégias farmacológicas. La niñez como sintoma de males sociales. Pervivencias de la eugenesia ambiental en Argentina, do pesquisador argentino Gustavo Vallejo, terceiro capítulo deste eixo temático, mostra a continuidade de políticas relacionadas, com o que o autor denomina, a “eugenia ambiental” ou controle da sexualidade para o “bom nascer”, próprias da primeira metade do século XX, e que atualmente renascem no novo cenário político argentino. O quarto e último capítulo do segundo eixo, intitulado Sobre o papel da autoria cultural da profissão médica nos processos de medicalização da vida, da professora Myriam Mitjavila, analisa os atributos sobre os quais se apoia a autoridade do saber médico, especificamente em sua dimensão cultural. A autora sublinha que os processos de medicalização e desmedicalização dos objetos sociais são afetados pelo grau de confiança que instituições e atores sociais depositam no saber médico. O terceiro eixo temático, Ética, indústria farmacêutica e medicalização da infância, reúne os textos que buscam analisar criticamente o papel da indústria farmacêutica no processo de medicalização infantil, suas implicações éticas e os dispositivos de patologização dos sofrimentos psíquicos. No primeiro capítulo, Discurso biológico cerebral e a expansão de diagnósticos psiquiátricos, a professora Fabíola Stolf Brzozowski aborda a relação entre o discurso biológico cerebral e a ampliação de diagnósticos psiquiátricos, a partir da análise sobre a legitimação da proliferação de novos diagnósticos e o alargamento de suas fronteiras no contexto das explicações neurobiológicas e tratamentos medicamentosos. Buscando ilustrar sua reflexão, a autora utiliza como exemplo um artigo científico (estudo genético para o TDAH) e uma matéria jornalística de divulgação dos resultados do mesmo estudo. O professor Luis David Castiel assina o segundo capítulo deste eixo, no qual discute a Medicamentalidade e medicalização da vida cotidiana. De modo incisivo, denuncia o insidioso processo de medicalização da vida cotidiana e os interesses da indústria farmacêutica, abordando o que denomina de medicamentalidade numa clara alusão à ideia foucaultiana de governamentalidade entendida como “o encontro entre as técnicas de dominação exercidas sobre os outros e as técnicas de si”. Enfatiza o biopoder mais como uma perspectiva que 11

um conceito, no sentido de se constituir como um espectro de iniciativas mais ou menos racionalizadas desenvolvidas por autoridades no sentido intervir no âmbito da vitalidade humana – seu nascimento, desenvolvimento, adoecimento e morte. O terceiro capítulo Sáude mental em risco: estratégias para intervenções  preventivas traz a contribuição da pesquisadora Fernanda Martinhago e do professor Oriol Romani para o debate da temática do risco no âmbito da atenção à saúde mental. A partir do diálogo com diferentes pesquisadores, os autores buscam promover reflexões sobre algumas práticas de intervenções ditas preventivas. Nesse exercício crítico, emergiram importantes questionamentos, tais como: É possível prever que determinado comportamento de uma criança poderá futuramente ser um transtorno mental? Como uma pessoa que manifesta sentimento de tristeza, de angústia poderá desenvolver futuramente uma depressão? Como podemos prevenir, com base no risco, algo tão subjetivo e algumas vezes transitório, como o uso de drogas e o sofrimento psíquico? Como o risco tornou-se uma estratégia para promover intervenções preventivas no âmbito da saúde mental? No quarto capítulo, a professora argentina Marisa Germain, discute algumas Diretrizes ético-políticas na medicalização das infâncias, em especial, aquelas presentes na recente legislação de Saúde Mental produzida na Argentina. Analisa também as estratégias de proteção infantil, problematizando sua dimensão biopolítica, bem como a relação entre medicalização e desmedicalização operada na Lei de Identidade de Gênero. Por fim, no capítulo quinto do terceiro eixo, Biopolítica e experimentação envolvendo crianças: a desproteção como permanência histórica do professor Fernando Hellmann e da professora Marta Verdi, discute a experimentação envolvendo crianças, na ótica da biopolítica das populações, a permanência histórica da desproteção de uma parcela de crianças submetidas à experimentação científica, mesmo com a proliferação de novas normas “éticas”. Para tanto, são abordados exemplos de pesquisas eticamente questionáveis ocorridas ao longo da história da criação das principais normativas de princípios éticos para as pesquisas envolvendo seres humanos. Esperamos que o presente livro possa contribuir para fortalecer o debate e as reflexões atuais referidas à temática da medicalização e medicamentalização da infância, e que as análises aqui apresentadas possam ser aproveitadas em diversos âmbitos acadêmicos, sociais e culturais. Agradecemos especialmente ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio econômico para a elaboração deste livro, através do financiamento do projeto (408730/2013-7), “Prevenir e medicar: Uma abordagem sóciohistórica à medicalização de transtornos mentais na infância”. Finalmente, agradecemos também às autoras e aos autores que, com suas valiosas contribuições, permitiram a realização deste livro.

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TRANSFORMANDO CRIANÇAS EM PACIENTES PSIQUIÁTRICOS: FAZENDO MAIS MAL DO QUE BEM 2 ROBERT WHITAKER

O fato de medicar crianças e adolescentes com medicamentos psiquiátricos é apresentado pela psiquiatria americana como uma história de avanço médico. Pesquisadores passaram a entender que crianças podem sofrer de TDAH, depressão e transtorno bipolar, e determinaram que medicamentos psiquiátricos devem ser prescritos para tratar essas “doenças” do cérebro. Esta

narrativa fala tanto de um avanço diagnóstico quanto de um avanço no tratamento de doenças que até então não eram detectadas, e, portanto, de uma prática médica que seria benéfica para as crianças. Porém, como revela uma revisão da história e da ciência, esta prática, que primeiro tomou conta dos Estados Unidos e depois, gradualmente, foi exportada para outros países “desenvolvidos” em todo o mundo, é melhor compreendida como uma empresa de

negócios, que causa danos consideráveis quando estudados seus resultados a longo prazo.  A ASCENSÃO DE UMA ALIANÇA PROFANA Essa narrativa do comércio começa com a publicação, pela Associação Americana de Psiquiatria –  American Psychiatric Association (APA), da terceira edição de seu Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais (Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders), em 1980. Este foi o momento em que a APA adot ou o que é chamado de “modelo médico” para categorizar os transtornos psiquiátricos. Eles agora são vistos como doenças do cérebro, com diagnósticos sendo feitos na presença de “sintomas”. Em seu livro de 1984, The Título original do artigo: “Turning children into psychiatric patients: doing more   harm than good”. Tradução do inglês por Fabíola Stolf Brzozowski. 2

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broken brain, Nancy Andreasen, que por muitos anos foi editora-chefe do  American Journal of Psychiatry , explicou o novo pensamento da APA: Os principais transtornos psiquiátricos são doenças. Eles deveriam ser considerados doenças médicas, assim como são o diabetes, a doença cardíaca e o câncer. (Cada) doença tem uma causa específica diferente. Existem muitos indícios de que a doença mental se deve a desequilíbrios químicos no cérebro e seu tratamento implica corrigir esses desequilíbrios (ANDREASEN, 1984, p. 29-30).

Essa é uma ideia que naturalmente leva à conclusão de que medicamentos psiquiátricos devem ser a primeira linha de tratamento para esses transtornos. Qualquer substância que poderia reduzir o sintoma alvo de uma “doença” mais

do que o placebo seria visto como um tratamento efetivo. Como confessou, mais tarde, Robert Spitzer, que presidiu a Força Tarefa da APA que criou o DSM-III, “As empresas farmacêuticas ficaram encantadas” com o DSM -III (RONSON, 2011). As companhias farmacêuticas mostraram seu encantamento, a partir de 1980, ao canalizar quantidades crescentes de dinheiro para a APA. Isso foi feito das seguintes formas:  





Patrocinaram simpósios científicos na reunião anual da APA. Ajudaram a financiar programas de treinamento de mídia da APA, que ensinaram os psiquiatras em todo o país como falar sobre este novo modelo médico para o público. Ajudaram a pagar pelas campanhas de relações públicas da APA, que repetiam regularmente a mensagem de que transtornos psiquiátricos são doenças do cérebro, que são “sub -reconhecidas e subtratadas”  e que os medicamentos para essas doenças são altamente efetivos. Forneceram ajuda financeira a psiquiatras da Europa, da Ásia e da América do Sul para comparecem às reuniões anuais da APA e assim aprender sobre este novo paradigma de cuidado.

Graças a tal influxo de dinheiro farmacêutico, o rendimento anual da APA aumentou de U$$ 10,5 milhões em 1980 para U$$ 24,9 milhões em 1990, e então para U$$ 50,2 milhões em 2000. A receita da APA superou os U$$ 65,3 milhões em 2008 (APA, 1980-2012). Além disso, após a publicação do DSM-III, os laboratórios farmacêuticos começaram a pagar psiquiatras de faculdades de medicina para serem seus “líderes de opinião”. Como investigações do Congresso revelaram mais tarde,

os psiquiatras que ajudaram as companhias farmacêuticas a criar mercados para os novos medicamentos, ganharam centenas de milhares de dólares para serem porta-vozes, assessores e consultores. Por sua vez, os líderes de opinião 14

criaram a narrativa social que levou à expansão dramática da prescrição de medicamentos psiquiátricos para todos os segmentos da sociedade americana, incluindo as crianças. Os líderes de opinião: Trabalham para os comitês da APA que estabelecem os critérios para o diagnóstico. Conduzem ensaios clínicos de novos medicamentos em pesquisas financiadas pelas indústrias farmacêuticas. São autores de artigos sobre esses estudos (frequentemente autores fantasmas). Discursam sobre a validade dos transtornos psiquiátricos e sobre a eficácia do tratamento em simpósios científicos, cursos de Educação Médica Continuada e outros cursos profissionais. Definem diretrizes para a prática clínica. Escrevem livros didáticos de psiquiatria. 







  

Servem como “especialistas” que são citados pela mídia.

Assim, logo após a publicação do DSM-III, o dinheiro da indústria fluiu para a APA e para psiquiatras de instituições acadêmicas pelos Estados Unidos (e eventualmente para psiquiatras em países de todo o mundo). “Nosso campo

como um todo vem sendo progressivamente comprado de cima a baixo pelas indústrias farmacêut icas”, disse o psiquiatra Daniel Carlat, em 2007. “Isto inclui o diagnóstico, as diretrizes de tratamento e as reuniões nacionais”  (GOLDBERG, 2007).  A HISTÓRIA DO TDAH: UM ESTUDO DE CASO DA CONSTRUÇÃO DE UM MERCADO PARA MEDICAMENTOS Ao mesmo tempo em que a APA buscava refazer seu manual diagnóstico, durante os anos de 1970, queria ter certeza de que haveria um diagnóstico para qualquer um que procurasse ajuda de um psiquiatra. A profissão começou a prescrever metilfenidato (Ritalina) para crianças “hipercinéticas” e isso for-

neceu uma razão para a força tarefa do DSM-III criar um diagnóstico, que apelidaram de “transtorno do déficit de atenção”, para tais crianças. Os sintomas

principais deste mais novo transtorno construído eram desatenção, impulsividade e hiperatividade, embora um diagnóstico poderia ser feito mesmo sem a presença da hiperatividade. Uma criança que “frequentemente não consegue terminar as coisas que ele ou ela começa” ou “frequentemente age antes de pensar” era uma candidata para este diagnóstico, que se dizia afetar três por

cento das crianças pré-adolescentes nos Estados Unidos (APA-DSM III, 1980, p. 42). Em 1987, quando a APA publicou a versão revisada do DSM-III, o diagnóstico foi renomeado para “transtorno do déficit de atenção com hiperatividade”

(TDAH) e os limites diagnósticos foram reconfigurados, para torná-lo mais fácil 15

de diagnosticar. O boom  do TDAH estava oficialmente instalado. Ao final dos anos de 1980, 600.000 jovens nos Estados Unidos foram diagnosticados com TDAH. Então, em 1994, quando a APA publicou o DSM-IV, expandiu os seus limites diagnósticos novamente. Dizia-se agora que o transtorno consiste de três subtipos: somente desatento, somente hiperativo/impulsivo e aqueles que apresentam os dois tipos de sintomas. Se uma criança tinha seis de nove sintomas ditos característicos de cada subtipo, um diagnóstico de TDAH poderia ser realizado. Considera-se hoje que o TDAH afeta até 5% de todas as crianças americanas (LAHEY, 1994). Com o diagnóstico expandido em mãos, o psiquiatra do Harvard Medical School , Joseph Biederman, que tinha sido um membro do grupo de trabalho do DSM-IV para transtornos pediátricos, começou a produzir artigo após artigo sobre o TDAH. Sua pesquisa falou sobre como o TDAH na verdade afeta até 9 por cento das crianças americanas em idade escolar e que era um transtorno real, com um componente genético aparente e que havia de fato subtipos distintos, assim como o DSM-IV declarou. Se os jovens assim diagnosticados não forem tratados com estimulantes, escreveu Biederman, eles estariam em alto risco para vários desfechos ruins: baixo desempenho escolar, fracasso no ambiente de trabalho, abuso de substâncias e transtornos do humor. Os estimulantes reduziriam os sintomas do TDAH e melhorariam a “autoestima, a cognição e a função social e familiar”, ele disse (WILENS, 1995; KOLATA, 1996). 3

Biederman foi ricamente recompensado por seu trabalho. De 1996 a 2011, recebeu honorários por palestras, honorários por consultorias e financiamentos para pesquisas de mais de 24 indústrias, incluindo Shire, Janssen e Eli Lilly, que vendiam três dos medicamentos mais populares para o TDAH (KOTTE, 2013). Tudo isso levou a um aumento constante no diagnóstico do TDAH nos Estados Unidos e, em 2012, 10 por cento dos jovens de 4 a 18 anos tinham sido diagnosticados4. Nos anos de 1980 e início dos anos de 1990, o diagnóstico de TDAH foi majoritariamente um fenômeno americano. Entretanto, a APA, em acordo com as companhias farmacêuticas, começaram então a exportar para os países desenvolvidos de todo o mundo, com sucesso, os seus diagnósticos (ELLISON, 2015). Por exemplo: 





3

Na Alemanha, as taxas de diagnóstico do TDAH aumentaram 381 por cento de 1989 a 2001. No Reino Unido, as prescrições para o TDAH aumentaram 50% entre 2007 e 2012. Em Israel, as prescrições para o TDAH duplicaram entre 2005 e 2012.

A PubMed search of “Biederman ADHD” produces a record of 604 articles from 1984 to 2013,

with Biederman, J. listed as an author or coauthor. Some of these articles are on other pediatric disorders, such as conduct disorder or bipolar disorder, and thus not all are focused on ADHD. 4  U.S. Centers for Disease Control. Summary Health Statistics for U.S. Children: National Health Survey, 2012. 16



Em 2007, países fora dos Estados Unidos representaram 17% do uso mundial de Ritalina. Até 2012, esta porcentagem cresceu para 34%.

Este foi o diagnóstico que abriu caminho para a medicalização da infância no Brasil, e para a criação de um mercado global para os estimulantes como tratamentos para esse transtorno. Em 2013, as vendas globais das medicações para TDAH atingiram U$$ 11,5 bilhões, um número que era indício de uma empreitada bem-sucedida, que havia tido seu início em 1980.  A BIOLOGIA DO TDAH Ainda que o TDAH seja apresentado ao público como uma doença cerebral, os pesquisadores normalmente fracassam em encontrar qualquer patologia característica em crianças diagnosticadas. Esse tema é repetido muitas vezes, como pode ser observado nestes pronunciamentos: 

1991: “Tentativas para definir uma base biológica para o TDAH

foram consistentemente mal sucedidas. A neuroanatomia do cérebro, como demonstrado por estudos de imagem, é normal.” –

Gerald Golden, neurologista pediátrico (GOLDEN, 1991). 

1997: “Os esforços para identificar um desequilíbrio neuroquímico seletivo (em crianças com TDAH) foram decepcionantes.” – Li-

vro didático de neuropsiquiatria (BREGGIN, 2001, p. 180). 

1998: “Após anos de pes quisa e experiência clínica com o TDAH,

nosso conhecimento sobre sua causa ou suas causas continua amplamente especulativo” –  NIH Consensus Development Conference5. 

2012: A vasta maioria dos estudos de neuroimagem, até o momento, demonstra diferenças relativas, quantitativas, entre o TDAH e os grupos controles com desenvolvimento típico, que não são nem suficientemente grandes nem específicos para serem úteis caso a caso como biomarcadores diagnósticos ou de tratamento” – Relatório do Consenso do Grupo de Trabalho em Marcadores de Neuroimagem dos Transtornos Psiquiátricos da APA6.

5  NIH

Consensus Development Conference statement, Diagnosis and treatment of attention deficit hyperactivity disorder , Nov. 16-18, 1999. 6  American Psychiatric Association, Consensus report of the APA, Work Group on Neuroimaging Markers of Psychiatric Disorders, 2012. 17

Esses achados podem parecer surpreendentes para um público para o qual geralmente se diz que os pesquisadores descobriram que o cérebro TDAH é diferente de um cérebro normal. O que o público pode achar ainda mais surpreendente é que toda essa pesquisa foi comprometida pelo fato de que os jovens com TDAH estudados foram expostos aos estimulantes ou estavam tomando medicações quando seus cérebros foram examinados. Na verdade, quando esta pesquisa foi revisada, em 2012, pelo Grupo de Trabalho em Marcadores de Neuroimagem da APA, o grupo fez uma revelação surpreendente: Os estudos de tratamento que contrastam diferenças morfométricas antes e depois dos tratamentos medicamentosos estão notavelmente ausentes na literatura sobre neuroimagem estrutural que examina biomarcadores do TDAH. Até onde sabemos, nenhum estudo clínico controlado averiguou o efeito dos estimulantes nas anormalidades cerebrais estruturais em jovens com TDAH, sugerindo uma área crítica para pesquisas futuras (APA, 2012).

Em resumo, 30 anos depois da APA ter construído este diagnóstico e o conceituado como uma doença, não tem havido nenhum esforço por parte da área de conhecimento para descobrir se havia uma anormalidade em jovens não expostos a estimulantes. Mesmo assim, a área com frequência apresentou PET scans  complexos, contando como o cérebro TDAH funcionou de formas diferentes do cérebro “normal”, um espetáculo que, claro, ajudou a vender o

transtorno para o público. Na ausência de marcadores biológicos, o diagnóstico é feito de acordo com avaliações subjetivas do comportamento inf antil. O diagnóstico nos EUA surge primariamente de preocupações dos professores, já que pesquisadores descobriram que “apenas uma minoria das crianças com o transtorno exibe sintomas durante uma consulta médica”  (MAYERS, 2008). Pesquisadores Canadenses também determinaram que, em uma sala de aula, as crianças mais novas têm 30% mais chance de serem diagnosticadas com TDAH do que crianças mais velhas, evidência de que a data de nascimento da criança, em relação às outras em sua classe, pode ser um sintoma desta “doença” (MORROW, 2012). O EFEITO DA RITALINA NO CÉREBRO O metilfenidato e outros estimulantes aumentam a atividade da dopamina no cérebro. O metilfenidato, comercializado como Ritalina, faz isso bloqueando as moléculas que removem a dopamina da fenda sináptica entre neurônios e transportando-a de volta para o neurônio pré-sináptico. A cocaína aumenta a atividade da dopamina do mesmo jeito e, como Nora Volkow relatou a potência do metilfenidato em bloquear o processo de recaptação é similar à da cocaína (VOLKOW, 1999). Entretanto, o metilfenidato bloqueia a recaptação da dopamina por horas, ao contrário da breve interrupção dessa função realizada pela cocaína. Em resposta à perturbação da função da dopamina causada pelo metilfenidato, o cérebro passa por uma série de adaptações compensatórias projeta18

das para manter o equilíbrio homeostático, isto é, o funcionamento normal do sistema dopaminérgico. Os neurônios pré-sinápticos podem começar a liberar menos dopamina, enquanto que a densidade dos receptores dopaminérgicos nos neurônios pós-sinápticos pode diminuir. O fármaco acelera a atividade da dopamina no cérebro e o cérebro responde através da regulação de tal atividade. Não houve uma boa pesquisa sobre se, após a descontinuação do medicamento, o sistema da dopamina de uma criança se normaliza. Entretanto, em um estudo em ratos pré-adolescentes expostos ao metilfenidato por duas semanas, houve uma diminuição dramática na densidade de receptores de dopamina no corpo estriado que persistiu até a idade adulta (MOLL, 2001). Ainda que o cérebro humano possa ser bastante diferente, este estudo em ratos forneceu razões para se preocupar com as mudanças compensatórias induzidas pela exposição a fármacos, que podem não ser totalmente reversíveis após a retirada do medicamento.  A EFICÁCIA DOS ESTIMULANTES A questão chave agora é esta: as mudanças na forma como o cérebro funciona, induzidas por medicamentos, fornecem um benefício para as crianças, tanto a curto quanto a longo prazo? Dado que a prática de prescrever estimulantes para jovens com TDAH é feita desde 1980, poder-se-ia esperar que há evidências abundantes que esse é o caso. Os estimulantes, de fato, produzem uma mudança característica nas crianças. Crianças assim tratadas se movem menos e socializam menos e sua atenção pode se tornar mais focada em uma tarefa específica (como aritmética). Esta mudança é vista como uma redução nos sintomas do TDAH. Como investigadores do Instituto Nacional de Saúde Mental (National Institute of Mental Health) escreveram em 1995: os estimulantes são muito efetivos em (...) reduzir dramaticamente um grande espectro de sintomas centrais do TDAH, tais como atividade independente de taregas (por exemplo, tamborilar os dedos, inquietação, movimento motor fino, comportamento independente da tarega durante a observação direta) e perturbação na sala de aula (RICHTERS, 1995).

Ao mesmo tempo, pesquisadores descreveram as seguintes mudanças no “comportamento global” em crianças medicadas: 

Há um “aumento pronunciado relacionado ao medicamento em

brincadeiras solitárias e uma redução correspondente na iniciação de interações sociais” ( BARKLEY, 1978). 

O medicamento reduz a “curiosidade da criança sobre o ambiente” (FIEDLER, 1983). 19





Às vezes, a criança medicada “perde o seu brilho” (DAVY, 1989). Crianças medicadas frequentemente se tornam “passivas, submissas” e “isoladas socialmente”. Psicólogos da UCLA,

1993(GRANGER, 1993). 

Os estimulantes restringem a hiperatividade por “reduzir o número de respostas comportamentais”. Oxford Textbook of Clinical

Psychology and Drug Therapy (BREGGIN, 2001, p. 92). Tais descrições sugerem que as mudanças no comportamento, induzidas por medicamentos, enquanto vistas como evidência de efetividade em um estudo clínico, podem ser danosas à criança. Na mesma linha, estudos anteriores fracassaram em provar que os estimulantes ajudam crianças a irem melhor na escola. A Ritalina melhora o desem penho em “tarefas repetitivas, rotinei

ras, que requerem atenção continuada”, mas “o raciocínio, a solu-

ção de problemas e a aprendizagem não parecem ser afetadas positivamente” (SROUFE, 1973). 

A Ritalina não gera nenhum benefício para os estudantes em termos de “vocabulário, leitura, ortografia ou matemática”, e esconde suas habilidades em solucionar problemas. “As reações das

crianças sugerem fortemente uma redução no comprometimento, do tipo que parece ser fundamental para a aprendizagem”  (RIE, 1976). 

O principal efeito dos estimulantes parece ser uma melhora da manuseabilidade em sala de aula mais do que do desempenho acadêmico. (BARKLEY, 1978).

Ao mesmo tempo, pesquisadores dos anos de 1980 também falhavam em encontrar evidências de que o tratamento medicamentoso auxilia as crianças a longo prazo. Em 1994, o livro texto de psiquiatria da Associação Americana de Psiquiatria ( American Psychiatric Associations Textbook of Psychiatry ) resumiu os achados desapontadores: “Os estimulantes não produzem melhoras   duradouras da agressividade, transtorno de conduta, criminalidade, sucesso educacional, desempenho no emprego, relações conjugais ou adaptação a longo prazo” (BREGGIN, 1993). Deste modo, enquanto que o diagnóstico do TDAH já estava sendo utilizado, os pesquisadores, até aquele momento, falharam em provar que o trata20

mento medicamentoso para o transtorno fornecia um benefício a longo prazo e, mesmo em curto prazo, seus méritos eram questionáveis. Em 1994, com esta questão dos méritos dos estimulantes pairando no ar, o NIMH montou um estudo, conhecido como Estudo de Tratamento Multimodal e Multicêntrico de Crianças com TDAH (Multisite Multimodal Treatment Study of Children with  ADHD), para investigar melhor seus efeitos a longo prazo. No início, os pesquisadores reconheceram explicitamente que, até o momento, “a eficácia a longo prazo da medicação estimulante não foi demonstrada para nenhum domínio do funcionamento infantil”  (RICHTERS, 1995). Este era para ser o estudo que, de fato, colocaria em teste a questão dos méritos a longo prazo dos estimulantes. No estudo, as crianças foram randomizadas para um dos quatro grupos de tratamento: somente o medicamento, como prescrito por especialistas em psiquiatria infantil; terapia comportamental; medicação mais terapia comportamental; ou cuidados de assistência social. Ao final de 14 meses, parece que a psiquiatria finalmente tinha evidências de um benefício a longo prazo. A “administração cuidadosa de medicamentos” provou ser superior ao tratamento

comportamental na redução dos principais sintomas do TDAH e houve também um indício de que as crianças medicadas foram melhores em testes de leitura”. Os investigadores concluíram que agora havia evidências para o “tratamento contínuo” (MTA study group, 1999).

Este resultado ainda é apresentado ao público como indicação de que os estimulantes fornecem um benefício a longo prazo. Entretanto, este não foi o final do estudo. Os pesquisadores continuaram a acompanhar as crianças e, ao final de três anos, o uso de medicamentos “foi um marcador significante, não de resultados benéficos, mas de deterioração. Isto é, de fato, os participantes que usaram medicação por um período de 24 a 36 meses mostraram aumento da sintomatologia durante o intervalo relativo à não tomada dos medicamentos” (JENSEN, 2007)7. Crianças medicadas também se tornaram um pouco mais baixas e apresentaram maiores índices de delinquência (MOLINA, 2007). Os resultados de 6 anos foram ainda piores: o uso de medicamentos foi “associado

com piora dos sintomas de hiperatividade-impulsividade e compotamento desafiador opositivo” e com maior “dano funcional global”  (MOLINA, 2009). Tais achados negativos não foram publicizados e de fato não foram apresentados nos resumos dos artigos publicados. Podem ser encontrados somente a partir de uma leitura minuciosa do texto de cada artigo. Entretanto, em uma entrevista num jornal, um dos pesquisadores, o psicólogo William Pelham, da Universidade de Buffalo (University of Buffalo) resumiu os resultados corretamente: Nós pensávamos que as crianças medicadas por mais tempo teriam melhores desfechos. Não foi o que aconteceu neste caso. Não houve efeitos benéficos, ne7 Ver

a tabela na página 9997 sobre o uso da medicação. 21

nhum. No curto prazo, [a medicação] ajuda a criança a se comportar melhor; no longo prazo não. E esta informação deve estar muito clara aos pais (MIRANDA, 2007).

Outros estudos de longo prazo com crianças medicadas para o TDAH produziram resultados semelhantes, a saber: 

Em uma revisão de 14 estudos, que duraram pelo menos três meses, envolvendo 1.379 jovens, pesquisadores canadenses concluíram que há “pouca evidência da melhora do desempenho acadê-

mico com estimulantes” (SACHAR, 2002). 





Em uma revisão com 2.287 estudos, pesquisadores da Universidade de Ciência e Saúde de Oregon (Oregon Health and Science University ) e seus colegas concluíram que “não há evidências de boa qualidade sobre o uso de medicamentos que afetem os desfechos relacionados ao desempenho acadêmico global, às consequências dos comportamentos de risco, às realizações sociais, etc.” (McDONAGH, 2006). Em uma pesquisa de dez anos, realizada pelo Departamento de Saúde do Oeste Australiano (Western Australian Department of Health), crianças com TDAH medicadas tinham dez vezes mais chances de serem identificadas pelos professores como tendo um desempenho abaixo do nível para a sua idade, nos trabalhos escolares, do que crianças com TDAH não medicadas. As crianças medicadas apresentavam também sintomas piores de TDAH e pressão diastólica elevada. Os pesquisadores concluíram que o uso de medicação não se traduz em benefícios a longo prazo para desfechos sociais e emocionais da criança, desempenho na escola ou melhora dos sintomas (WADH, 2009) Pesquisadores no Quebec, Canadá, relataram, em 2013, que o uso a longo prazo de medicamentos para TDAH tem consequências negativas em vários domínios: aumento da infelicidade, deterioração na relação com os pais, deterioração dos resultados educacionais, um aumento da probabilidade, entre os meninos, de desistirem da escola e aumento na probabilidade, entre as meninas, de serem diagnosticadas com outros transtornos mentais ou emocionais (CURRIE, 2013).

Em 2012, Alan Sroufe, um professor emérito de psicologia da Universidade de Minnesota (University of Minnesota), que começou seus estudos com 22

crianças hiperativas nos anos de 1970, resumiu sua história de pesquisa em uma entrevista para o New York Times: Medicamentos para déficit de atenção aumentam a concentração no curto prazo, motivo pelo qual eles funcionam tão bem para estudantes em épocas de exames. Porém, administrado em crianças, por longos períodos de tempo, não melhoram o sucesso escolar nem reduzem os problemas de comportamento ( …) até hoje, nenhum estudo encontrou algum benefício a longo prazo da medicação para déficit de atenção no desempenho acadêmico, relações com os pares ou problemas de comportamento, as primeiras coisas que gostaríamos de melhorar ( …) os medicamentos podem ter também efeitos adversos sérios, incluindo déficit de crescimento (SROUFE, 2012).

Como qualquer medicamento, há uma análise de risco-benefício a ser feita e a expectativa é a de que os benefícios superem os riscos. Porém, no caso dos estimulantes como tratamento para o TDAH, não há benefício a ser encontrado a longo prazo, o que significa que somente há riscos como resultantes desta equação, e sendo assim, uma análise de risco-benefício só mostraria os danos causados. Os efeitos adversos conhecidos dos estimulantes podem ser classificados como segue: 





Físicos: sonolência, perda de apetite, letargia, insônia, dores de cabeça, dor abdominal, anormalidades motoras, tiques, cerramento da mandíbula, problemas de pele, doenças no fígado, perda de peso, déficit de crescimento, hipertensão e morte súbita. Emocionais: depressão, apatia, fraqueza geral, mudanças de humor, crises de choro, irritabilidade, ansiedade e um sentimento de hostilidade do mundo. Psiquiátricos: sintomas obsessivos compulsivos, mania, paranoia, episódios psicóticos e alucinações.

Após a retirada: sintomas do TDAH (excitabilidade, impulsividade, tagarelice) podem ser tornar piores do que nunca. O comportamento pode rapidamente se agravar. Estudos em animais fornecem mais motivos para se preocupar com os danos. Ratos pré-adolescentes expostos ao metilfenidato se tornaram ratos adultos ansiosos e depressivos, com um “déficit no comportamento sexual”   (BOLAÑOS, 2003). Em macacos, exposições repetidas a baixas doses de anfetaminas fez com que eles exibissem “comportamentos aberrantes”, que permanece-

ram por longo tempo após cessar a exposição (CASTNER, 1999). Tais achados levam os pesquisadores a concluir que a exposição de adolescentes ao metilfenidato provoca “consequências neurocomportamentais persistentes”, incluin-

do menor tolerância ao estresse e sensibilidade diminuída às recompensas naturais (MARCO, 2011). 23

Há ainda o risco de o estimulante induzir mudanças de humor que levam ao diagnóstico de bipolaridade. Os estimulantes produzem efeitos excitatórios e disfóricos, que são os próprios sintomas utilizados para diagnosticar o transtorno bipolar em jovens. Não é de surpreender que vários estudos com jovens diagnosticados com transtorno juvenil estabeleceram que dois terços usavam estimulantes “antes do aparecimento de um episódio afetivo”. Assim, um dos

riscos em ser diagnosticado com TDAH é que o tratamento medicamentoso levará a um diagnóstico bipolar, que é entendido como uma condição crônica, severa e para toda a vida (DelBELLO, 2001; PAPOLOS, 1999). Isso é evidência de um processo trágico, de um diagnóstico e subsequente tratamento que podem tornar uma criança “hiperativa” em um paciente mental crônico. Essa é a história do TDAH. É uma história de um diagnóstico que foi construído em 1980 e então comercializado para o mundo, e de grande sucesso comercial. Isso ocorreu mesmo que as pesquisas tenham falhado em identificar qualquer patologia característica nas crianças diagnosticadas, e na ausência de qualquer evidência de que o tratamento medicamentoso fornece um benefício a longo prazo, em qualquer domínio ou função. A única evidência que emerge dos estudos de longo prazo do TDAH é a de uma prática que faz mais mal do que bem. ISRSS E ANTIPSICÓTICOS TAMBÉM PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES O restante dessa história, dessa patologização da infância, desdobrou-se em sintonia com a comercialização dos antidepressivos ISRS e antipsicóticos atípicos. Assim como foi o caso da criação de um mercado para os estimulantes, o modelo de doença da APA tornou possível a venda de antidepressivos e antipsicóticos para crianças. Antes do DSM-III, a depressão maior era vista majoritariamente como uma doença da meia idade e da velhice. Os problemas de humor em crianças eram vistos como normativos e autolimitados. Entretanto, o DSM-III forneceu critérios baseados em sintomas para diagnosticar a depressão, com pouca investigação sobre se os eventos da vida poderiam ser a origem de tais sintomas, e crianças e adolescentes podem agora ser vistos como tendo depressão maior se tiverem esses sintomas. Além disso, a APA identificou a irritabilidade como um sintoma principal da depressão em crianças e, com a construção deste diagnóstico, os pesquisadores logo relataram que 12% dos adolescentes sofreriam uma crise de “depressão maior” até os 18 anos   (MERIKANGAS, 2010). No início dos anos de 1990, os fabricantes de antidepressivos ISRS identificaram crianças e adolescentes como um mercado inexplorado para seus medicamentos. Pagaram psiquiatras acadêmicos nos Estados Unidos para conduzir ensaios pediátricos para seus produtos e, até 2004, eles tinham nove estudos publicados que falavam da segurança e da eficácia dos ISRS para tratar a 24

depressão em crianças. Com tais relatos aparecendo na literatura médica, a prescrição de ISRSs para jovens decolou, pelo menos dos Estados Unidos, e até 2004, uma em cada 40 crianças em idade escolar na América tomava antidepressivo (DELATE, 2004). Um dos “líderes de opinião” que ajudou a construir este mercado, Martin Keller, da Universidade de Brown (Brown University ), recebeu aproximadamente US$ 1 milhão entre 1997 e 1998 por seus serviços para as companhias farmacêuticas (BASS, 1999). A literatura científica pode ter afirmado que os medicamentos são eficazes, porém, como o FDA anunciou em 2004, 12 de 15 ensaios clínicos pediátricos com ISRS, de fato, não conseguiram provar que os medicamentos proporcionaram algum benefício. O FDA rejeitou o pedido de seis produtos ISRS que solicitaram rotulagem pediátrica. O órgão só aprovou a fluoxetina (Prozac) para o uso em adolescentes (LAUGHREN, 2004). Fica claro que os relatos publicados em periódicos médicos contavam uma história corrupta, e agora conhecemos a extensão dessa corrupção: havia um viés no próprio desenho dos estudos; os resultados publicados não correspondiam aos dados reais; os efeitos adversos foram minimizados ou omitidos; e estudos negativos permaneceram não-publicados ou foram transformados em positivos. Como a Lancet  editorou em 2004, “A história da pesquisa sobre o uso de inibidores seletivos

da recaptação de serotonina para depressão em crianças é uma história de confusão, manipulação e falência institucional”8. Os dados do FDA também indicaram os danos causados. Ainda que não haja evidências da eficácia dos ISRS em crianças (com a possível exceção da fluoxetina) houve muitos riscos registrados, incluindo um aumento no risco de comportamento suicida e conversão para transtorno bipolar, uma grande quantidade de efeitos adversos físicos, emocionais e psiquiátricos, e, ao longo do tempo, um risco de apatia induzida por medicamentos (disforia tardia), danos cognitivos e de disfunção sexual na vida adulta. Enquanto que tudo isso reduz a prescrição dos ISRSs para crianças e adolescentes em muitos países, nos Estados Unidos sua prescrição continua sendo uma prática comum, com um em cada 30 adolescentes dos EUA tomando antidepressivos, em 2010 (JONAS, 2013). A prescrição de antipsicóticos atípicos para adolescentes nos Estados Unidos disparou em meados de 1990, logo após a segunda geração de antipsicóticos – Risperdal, Zyprexa e etc. – serem lançados no mercado. Esses novos medicamentos foram prescritos para controlar a agressão e para tratar o transtorno bipolar, uma doença que, até então, não se pensava ocorrer em crianças pré-adolescentes. Porém, tais distúrbios do humor começaram a aparecer de forma um pouco regular em jovens para os quais foram prescritos estimulantes e ISRS, e então, em meados de 1990, logo quando os antipsicóticos atípicos chegaram ao mercado, Joseph Biederman anunciou que muitas crianças com 8

Ver: Editorial, “Depressing research.” Lancet , vol. 363, 2004, p. 1335. 25

TDAH possuíam comorbidade com doença bipolar, e esse novo diagnóstico decolou, pelo menos nos Estados Unidos (BIEDERMAN, 1996). Em 2010, um por cento dos adolescentes dos EUA utilizavam um antipsicótico (HOWIE, 2014). Nos Estados Unidos, mais de sete por cento das crianças entre 6 e 17 anos agora utilizam pelo menos um medicamento psiquiátrico diário, evidência de como a indústria farmacêutica, em colaboração com a Associação Americana de Psiquiatria, construiu um mercado que conta com a patologização da infância. Esta prática foi exportada dos Estados Unidos para grande parte do restante do mundo desenvolvido, embora com graus variados de sucesso. Nos Estados Unidos, um marcador do dano causado por esta prática vem das estatísticas de incapacidade: o número de jovens com menos de 18 anos recebendo pagamentos por incapacidade, devida a doenças mentais, cresceu de 16.700 em 1988 para perto de 800.000 em 2011 e, quando esses jovens atingem os 18 anos, uma porcentagem significante entra direto nos de incapacidade na idade adulta9. A patologização da infância, pelo menos nos Estados Unidos, levou à criação de uma nova carreira para muitos, o que quer dizer uma vida como deficiente mental. E esta é apenas a evidência mais visível do grande dano que está sendo causado por essa indústria. REFERÊNCIAS ANDREASEN, N. The Broken Brain. New York: Harper & Row, 1984. APA- American Psychiatric Association, Consensus report of the APA Work Group on Neuroimaging Markers of Psychiatric Disorders, 2012. APA. American Psychiatric Association’s annual financial reports, 1980-2012. APA. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders , third edition, Washington DC: American Psychiatric Association, 1980. BARKLEY, R. Do stimulant drugs improve the academic performance of hyperkinetic children? Clinical Pediatrics, vol. 8, 1978, p.137-46. BARKLEY, R. Do stimulant drugs improve the academic performance of hyperkinetic children? Clinical Pediatrics, vol. 8, 1978, p. 137-46. BASS, A. Drug companies enrich Brown professor . Boston Globe, Oct. 4, 1999. BIEDERMAN, J. Attention-deficit hyperactivity disorder and juvenile mania.  J of American Academy of Child & Adolescent Psychiatry , vol. 35, 1996, p. 997-1008. BOLAÑOS, C. Methylphenidate treatment during pre- and periadolescents alters behavioral responses to emotional stimuli at adulthood. Biol Psychiatry , vol. 54, 2003, p. 1317-29. BREGGIN, P. Psychostimulants in the treatment of children diagnosed with ADHD. Int J of Risk & Safety in Medicine, vol. 12, 1993, p. 3-35. BREGGIN, P. Talking Back to Ritalin. Cambridge, MA: Perseus publishing, 2001. BREGGIN, P. Talking Back to Ritalin. Cambridge, MA: Perseus publishing, 2001. 9 Ver:

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