Entrevista No Contexto Escolar

June 18, 2018 | Author: Rafaella Stangherlin | Category: Educational Psychology, Psychology & Cognitive Science, Interview, Learning, Schools
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Universidade de Caxias do Sul – UCS

ENTREVISTA PSICOLÓGICA NO CONTEXTO ESCOLAR Trabalho avaliativo desenvolvido por Rafaella Ghidini Stangherlin e Junior Cesar Rasador para Disciplina de Princípios da Entrevista Psicológica ministrada pela Professora Clarissa Giuliani Scherer.

Caxias do Sul, 27 de outubro de 2010

Sumário Introdução ......................................................................................................................... 3 Revisão Bibliográfica ....................................................................................................... 4 Estrutura da Entrevista...................................................................................................... 9 Transcrição da Entrevista ............................................................................................... 11 Relatório/ Laudo Psicológico ......................................................................................... 16 Conclusão ....................................................................................................................... 18 Referências Bibliográficas .............................................................................................. 19

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Introdução A entrevista psicológica na escola é um instrumento utilizado pelo psicólogo para alcançar uma melhor compreensão dos fenômenos estudados na instituição. Este trabalho tem como objetivo apresentar como realizar uma entrevista psicológica no contexto escolar, explorando os objetivos, campo de atuação e estruturação da mesma. Para construí-lo realizaremos uma revisão bibliográfica do tema indicado, a partir da documentação indireta de dados secundários. Após, para tornar mais explícita a prática baseada na técnica utilizada pelo profissional da área, construiremos uma simulação da entrevista psicológica no contexto escolar, bem como um relatório/laudo psicológico da mesma. Pretendemos assim aprofundar nossos conhecimentos acerca da entrevista psicológica e de suas áreas de aplicação, o que nos proporcionará maior aptidão na prática do planejamento e execução desta tarefa, ampliando nosso olhar perante suas dificuldades e primazias.

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Revisão Bibliográfica Conforme o site da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional ABRAPEE  –  “psicólogos escolares e educacionais são profissionais que atuam em instituições escolares e educativas, bem como dedicam-se ao ensino e à pesquisa na interface”. Para o Conselho Federal de Psicologia, o Psicólogo Escolar caracteriza-se como o profissional que Atua no âmbito da educação formal realizando pesquisas, diagnóstico e intervenção preventiva ou corretiva em grupo e individualmente. Envolve, em sua análise e intervenção, todos os segmentos do sistema educacional que participam do processo de ensino- aprendizagem. Nessa tarefa, considera as características do corpo docente, do currículo, das normas da instituição, do material didático, do corpo discente e demais elementos do sistema. Em conjunto com a equipe, colabora com o corpo docente e técnico na elaboração, implantação, avaliação e reformulação de currículos, de projetos pedagógicos, de políticas educacionais e no desenvolvimento de novos procedimentos educacionais. No âmbito administrativo, contribui na análise e intervenção no clima educacional, buscando melhor funcionamento do sistema que resultará na realização dos objetivos educacionais.

Assim, para dar conta destas tarefas, as temáticas que este profissional aborda em pesquisas e em sua atuação profissional no campo da psicologia escolar são: os processos de ensino e aprendizagem, o desenvolvimento humano, a escolarização em todos os seus níveis, a inclusão de pessoas com deficiências, as políticas públicas em educação, a gestão psicoeducacional em instituições, a avaliação psicológica, a história da psicologia escolar, a formação continuada de professores, dentre outros. Desta forma, o Psicólogo Escolar busca trabalhar para qualidade e eficiência do processo educacional através da aplicação dos conhecimentos psicológicos. Mas, no período inicial do desenvolvimento da Psicologia Escolar, o psicólogo escolar nem sempre foi visto assim. Segundo João Batista Martins, para Carmen Andaló a psicologia escolar é considerada uma área secundária da psicologia, onde o psicólogo não recebe valorização. Isso ocorre pois “a área escolar foi caracterizada historicamente como um desmembramento da área clínica, gerando uma visão de psicologia escolar clínica”. Esta visão estabelece os parâmetros de atuação em torno da dicotomia saúde x doença, normal x anormal. Ao atuar sob esta perspectiva, baseada no modelo médico, o interesse do psicólogo girava em torno da saúde e da doença mental e do diagnóstico e cura de problemas de comportamento dos alunos. (JOÃO BATISTA MARTINS, 2003) 4

Em uma perspectiva de “psicologia escolar clínica” os problemas emergentes no contexto escolar são todos depositados nos alunos, assim o psicólogo tem como função tratar os alunos „problemáticos‟ e devolve-los à classe quando „ajustados‟. Ao realizar um trabalho clínico nas escolas, o psicólogo escolar abre espaço para possíveis discriminações ou estigmatizações dos alunos por ele atendido. Assim, ao atuarem conforme o princípio de normatização, baseados em um modelo clínico, os psicólogos escolares rotulavam os alunos enquadrando-os em categorias como „adequado‟ e „esperado‟ ;

através da utilização de testes para medir a

capacidade dos alunos, classificavam-nos em aptos ou não-aptos, consolidando um pensamento excludente. Com o passar do tempo, os testes cederam lugar aos diagnósticos ou laudos psicológicos. Para Souza (1997): a maioria dos psicólogos que emitem laudos psicológicos a respeito das crianças com dificuldades escolares desconhecem a força desse instrumento no meio escolar. Como avaliou Patto, ao estudar casos de multi-repetentes, a avaliação de um profissional de psicologia sela destinos. (p.26) (ANDRADA, 2005 apud SOUZA, 1997)

Ao atuar com base no modelo médico, o profissional ocasiona uma atuação alheia a conjuntura que a escola está inserida, pois torna seu ofício eminentemente clínico. Porém, Martins aponta que para Andaló, o psicólogo não deve excluir as contribuições da psicologia clínica, mas em sua atuação deveria “em

vez de abordar os problemas escolares centrando seu olhar sobre os alunos, o psicólogo

atuaria sobre as relações que se estabelecem neste contexto, levando em consideração o meio social em que estas relações estão inseridas e o tipo de clientela que atende, assim como os grupos que a compõem. Ele atuaria, portanto, sobre a instituição escolar ” (JOAO BATISTA MARTINS, 2003).

Além disso, apesar das produções atuais buscarem um caminho que possa ser seguido pelos psicólogos na instituição escolar, postulando diversas funções que o mesmo pode assumir, deve-se ter consciência que a atuação do psicólogo no contexto escolar não pode ser delimitada, pois exige ser contextualizada, devendo partir das necessidades e prioridades emergentes de cada escola. Assim, não é possível padronizar procedimentos da atuação deste profissional. Porém, alguns direcionamentos podem auxiliar a prática do profissional. Para poder compreender os sujeitos inseridos na instituição que está atuando, o profissional deve ter clareza da necessidade de realização de uma análise institucional, que envolva todos os setores e indivíduos inseridos ali, bem como as inter-relações existentes. A partir deste exercício é possível verificar o funcionamento da escola: observar as relações ali 5

existentes, detectar os referenciais teóricos que norteiam os professores e dirigentes, bem como a coerência entre o discurso e a prática dos profissionais. Desta forma, é possível ir além das queixas iniciais, que tendem a depositar os problemas no aluno. Destarte, segundo Correia, Lima e Araújo são enfatizados três pontos como sendo os mais relevantes para a prática do psicólogo no contexto educacional: 1) iniciar a ação pela análise da instituição, visto que cada escola é específica e apresentará prioridades também específicas; 2) não esquecer que o processo ensino-aprendizagem é dinâmico, em constante transformação; logo, não dispõe de procedimentos rígidos; 3) ter sempre em mente que o processo educacional apresenta-se como multidimensional, requisitando trabalho “em equipe”. (CORREIA, LIMA E  ARAÚJO, 2001)

Neste contexto, a partir da necessidade de pensar o indivíduo  –  e a instituição  –  em seu contexto sócio-histórico-cultural, torna-se prudente refletir sobre a escola fundamentando-se no olhar de Vygotsky acerca da elaboração social dos processos psíquicos superiores. Conforme Andrada “ Vygotsky elaborou todo um conhecimento acerca de como aprendemos, igualando todos os seres humanos no seu processo de aprendizagem, independente das possíveis limitações orgânicas e/ou fí sicas.”

Pela teoria Sócio- Histórica de Vygostsky ter se revelado como um dos pilares da nossa compreensão sobre „como o ser humano aprende‟, e fu ndamentar

muitos projetos

educacionais contemporâneos, utilizaremos esta abordagem teórica para embasar nosso estudo a respeito da entrevista psicológica no contexto escolar. Assim, escolhida a abordagem teórica que será utilizada, elucidaremos abaixo, de forma sucinta, alguns dos principais conceitos desta perspectiva, que nortearão a construção do trabalho. Apesar de desenvolvida após a Revolução Russa de 1917, no Brasil a teoria de Vygotsky passou a ser discutida e amplamente divulgada apenas no final da década de 80 e início dos anos 90. A teoria Sócio- Histórica é em essência, dialética, ou seja, não pode ser compreendida sem considerar a interdependência entre os conceitos propostos. A base do pensamento de Vygotsky postula que todo conhecimento é produzido dentro de um contexto histórico, por um homem igualmente contextualizado e inserido em um tempo histórico. As principais idéias de Vygotsky referem-se: (1) à relação dialética entre indivíduo-sociedade, nas quais originam-se as características tipicamente humanas. O homem transforma o seu meio e, ao mesmo tempo, transforma-se a si mesmo; (2) às funções psicológicas superiores, que se originam nas relações entre o indivíduo e seu contexto sócio-cultural, ou, em outras palavras, têm uma origem cultural; (3) à relação com o mundo, que seria mediada por “ferramentas” criadas pelo homem; (4) ao cérebro como a base biológica de tais funções mentais. Mas o 6

cérebro não seria imutável ou fixo, podendo- se falar em “plasticidade cerebral”. A partir  dessa reflexão entende- se que “os processos psicológicos complexos se diferenciam dos mecanismos mais elementares e não podem, portanto, ser reduzidos à cadeia de reflexos” ( CORREI, LIMA, ARAUJO, 2001 apud Rego, 1998).

Para Vygotsky o conhecimento se dá pela mediação de instrumentos (objetos do mundo físico, que mediam a ação do homem sobre a natureza) e signos (instrumentos psicológicos que mediam o próprio pensamento). A linguagem se constitui como o signo fundamental, tendo o poder de representar simbolicamente objetos e eventos; além disso, mais do que comunicar o pensamento, a linguagem tem a função de organizá-lo e estruturá-lo, influenciando a constituição das funções mentais superiores. Neste contexto, a escola, que tem como função comunicar às novas gerações os saberes socialmente produzidos, aparece como elemento mediador na apropriação, pelo indivíduo, do saber historicamente acumulado ao longo do desenvolvimento da humanidade. Para adquirir determinados conceitos científicos, a criança precisa ter consolidada a compreensão dos cotidianos que lhes dêem suporte, pois os conceitos cotidianos facilitam o desenvolvimento dos científicos ao relacioná-los com o dia-a-dia. Os conceitos científicos, por sua vez, permitem uma maior generalização aos cotidianos. Assim, por serem imprescindíveis e complementares para o processo educacional, é preciso que a escola não “descontextualize” os conceitos por ela trabalhados, levando em consideração que o aluno tem um acervo de experiências e conhecimentos anteriores que podem servir como suporte para a construção de novos conhecimentos. O aluno necessita entender a necessidade e utilidade daquela aprendizagem. Isso tem implicações tanto do ponto de vista cognitivo quanto do afetivo e motivacional. Ao valorizar as experiências dos estudantes e discuti-las no contexto da sala de aula, o aluno sente-se mais valorizado e os conhecimentos escolares tornam-se mais funcionais. Desta forma, a escola torna-se um ambiente interessante e prazeroso, ao invés de fragmentado e tecnicista. Para Vygotsky, o ensino precisa se adiantar ao desenvolvimento, pois precisa atingir a Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP)  –  compreendida como a distância entre o que o aluno é capaz de realizar sozinho, já consolidado em seu desenvolvimento (nível real) e aquilo que ele não pode fazer sozinho, mas consegue realizar na interação com o outro mais experiente  –  é que efetiva o aprendizado. Desta forma, a escola deve valorizar as interações entre os diferentes, pois interações heterogêneas implicam em 7

indivíduos com diferentes ZDPs, interatuando uns nas ZDPs dos outros. O aluno menos experiente é auxiliado pelo mais experiente, pois este pode ajudá-lo em elaborações que ele não consegue realizar individualmente. O mais experiente, por sua vez, se beneficia reorganizando e reestruturando suas próprias concepções ao ajudar o outro a desenvolver novos conceitos. Além disso, ao considerar o conceito de ZDP, o professor torna-se o suporte para que a aprendizagem do educando a um conhecimento novo seja satisfatória; pois este tem de interferir na ZDP do aluno, segundo Vygotsky, por meio da linguagem. Após esta breve explanação da teoria Sócio-histórica de Vygostky, percebemos que nela encontramos elementos que dão suporte à análise constante do processo educativo, através de diversos olhares. Assim, o psicólogo escolar é o profissional que deve suscitar e instigar esta análise no cenário escolar, sempre considerando as contribuições dos diversos setores deste e da prática dos profissionais que formam a escola.

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Estrutura da Entrevista Indicaremos nesta etapa do trabalho, possíveis questões que possam nortear o entrevistador na hora de conduzir a entrevista. Conforme apontado anteriormente, a entrevista será baseada na perspectiva Sócio-Histórica de Vygotsky, porém alguns aspectos, abordados abaixo, independem da teoria na qual a entrevista se sustenta, e devem ser praticados por todos os profissionais. Inicialmente, é importante destacar que para realizar uma entrevista de qualidade o entrevistador precisa estar integralmente disponível ao entrevistado no momento da entrevista. Além disso, existem características imprescindíveis que o psicólogo deve desenvolver, entre elas: respeito  –  mostrando ao entrevistado que este pode participar ativamente do processo dentro do seu tempo; consideração positiva  –  aceitando o entrevistado, independente de seu perfil ou ações; empatia  –  compreender o paciente a partir da perspectiva dele; autenticidade – agindo com liberdade e espontaneidade. Quanto à estrutura da entrevista que pode ser utilizada no contexto escolar, segundo Silva, Ribeiro e Marçal (2004) “cabe ao profissional decidir o tipo de entrevista mais pertinente”.

As estruturas existentes são:

Livre ou não-estruturada  –  busca o discurso espontâneo do entrevistado, conforme o fluxo natural de suas idéias. Semi-estruturada ou semidirigida – é livre porém enfoca um tema bem específico, ou, se guia por uma relação de pontos de interesses que o entrevistador vai explorando ao longo do seu curso. O entrevistador faz poucas perguntas diretas e deixa o entrevistado falar livremente sobre as pautas definidas. Estruturada ou fechada  – Padronizada, utiliza de perguntas fixas com ordem invariável Independente da estrutura de entrevista utilizada, o profissional deve realizar uma investigação durante seu transcurso, baseada no discurso verbal e não-verbal do entrevistado. O entrevistador deve, baseado nas suas observações, construir uma hipótese, para em seguida verificá-la. Dentre os teóricos que estudam as o desenvolvimento de entrevistas, existe um consenso quanto às fases da entrevista que devem surgir durante seu transcorrer. São elas: Introdução: Neste momento o psicólogo deve compreender a razão de o entrevistado estar buscando sua ajuda, ou, quando este for encaminhado, deve situá-lo quanto ao

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motivo pelo qual sua presença foi solicitada. Nesta fase deve-se estabelecer um vínculo com o entrevistado, através da confiança. Exploração: Neste momento o profissional deve desenvolver uma hipótese, baseando-se em suas observações, a partir do seu referencial teórico. Teste da hipótese: Após formular uma hipótese, deve-se realizar investigações adicionais e examinar outros aspectos da vida do entrevistado, para explorar o indivíduo na sua dimensões bio-psico-social, e assim, verificar a veracidade de sua hipótese. Feedback: Nesta fase deve-se dar um retorno ao entrevistado em relação aos aspectos discutidos e avaliados durante a entrevista. Para tentar compreender uma determinada situação no contexto escolar, o psicólogo pode utilizar a técnica de entrevista com os alunos da escola, seus pais ou responsáveis, com os professores, além dos demais funcionários da escola, conforme a especificidade do caso. Porém, é importante lembrar que a entrevista constitui apenas um dos instrumentos para compreensão dos fenômenos investigados, e o profissional pode e deve complementar sua investigação com outros instrumentos. Questões norteadoras para realização da entrevista com o aluno(em ordem inespecífica): *Nesta simulação o aluno do ensino médio, de 16 anos, foi encaminhado para a Psicóloga pela professora, com a queixa manifesta de atrapalhar consideravelmente as aulas, por conversar excessivamente. Nesta etapa a professora já foi entrevistada pela Psicóloga. Após entrevistar o aluno, a Psicóloga entrevistará os pais do adolescente.

1. Como é a sua relação com as suas professoras? 2. Como é a sua relação com os seus colegas? 3. O que você pensa sobre vir à escola? 4. Como são as suas aulas? Você se interessa? 5. De que formas você compartilha com sua família sua vida de estudante (trabalhos, temas, notas, provas)? 6. Que tipo de aluno você é? 7. Como é a sua rotina? 8. O que você faz nas horas livres? 9. Quais as dificuldades que você encontra na escola? 10. Quais as suas facilidades e preferências aqui na escola? 11. O que você pensa sobre ter sido encaminhado para mim (psicólogo)? Como você vê a situação? O que você pensa a respeito do motivo pelo qual foi encaminhado? 10

Transcrição da Entrevista

Antes de transcrever a simulação da entrevista realizada com o adolescente, contextualizaremos de forma sucinta a entrevista realizada com a professora do aluno que solicitou seu encaminhamento. No terceiro mês do período letivo, a professora de Língua Inglesa encaminhou o adolescente Joséfio Barbosa, estudante da última série do ensino médio, ao serviço psicológico. Sua queixa era a de que o rapaz, apesar de alcançar excelentes notas nas avaliações, apresenta um comportamento que não condiz com seus escores: dorme em sala de aula e, quando acorda conversa excessivamente tumultuando o ambiente e prejudicando a aprendizagem de seus colegas. A professora conversou com o aluno, mas diz que o rapaz „só sabe criticar‟ o

seu trabalho e dos demais professores.

O aluno foi chamado realizar uma entrevista com a psicóloga. A mesma encontra-se relatada a baixo: Ao chegar na sala da psicóloga, o aluno aguardou em média 10 minutos para ser atendido, os quais ocupou lendo. Após, o aluno foi chamado e convidado a sentar-se. A psicóloga preparou para aquele momento uma estrutura semi-dirigida, ou seja, com algumas questões norteadoras, mas aberta ao fluxo do indivíduo. Psicóloga: Olá Joséfio, fique a vontade para se sentar como você se sente mais confortável. Tudo bem com você?  Aluno:

Tudo.

Psicóloga: Meu nome é Teresa, acho que você ainda não me conhece, eu sou a Psicóloga da Escola. E, eu te chamei aqui hoje, pra gente poder conversar um pouquinho. Você pode ficar seguro que aquilo que conversarmos aqui hoje não será exposto para mais ninguém, manteremos o sigilo ético necessário.  Aluno:

Certo.

Psicóloga: Primeiramente, eu gostaria de saber se você tem conhecimento do motivo pelo qual foi encaminhado até mim? 11

 Aluno:

Acredito que sim, até onde eu sei, estou aqui porque a professora de Inglês acha

que bagunço demais na aula dela. Psicóloga: E como você vê esta queixa?  Aluno:

Ah, sei lá, eu sei que atrapalho, mas tipo, converso bastante porque... tipo, não

tem o que fazer na aula dela. Já sei tudo que ela vai ensinar, a aula dela é um saco, sempre a mesma coisa. É difícil participar assim, ai eu aproveito pra tirar o sono atrasado, ou sei lá, trocar uma idéia com meus amigos. E na real, se tu for ver, minhas notas são as melhores da turma. Eu sei o conteúdo, eu gosto da matéria, mas estudo em casa, porque na aula é ridícula a maneira como ela ensina. E eu sei que o inglês é importante, uso bastante ele pra conseguir descobrir as manhas do play3. E tipo, quero fazer intercâmbio ano que vem, então me puxo pra deixar meu inglês bom, sabe? Psicóloga: Como você estuda em casa?  Aluno:

Bah, tipo, além de estudar em casa eu faço um cursinho de inglês. E to na última

etapa do curso. Daí assim, meu inglês já é tri bom, e em casa, tenho um amigo que veio pra cá ano passado, fazer intercâmbio na escola, e agora converso com ele pelo skype daí tipo, conversamos em inglês. Ai tipo, a gente joga RPG on-line, que é de um servidor americano, aí o jogo é todo em inglês e tipo, pra ti avançar no jogo tem que conversar com os outros jogadores em inglês. Mas tipo, as outras matérias estudo daquele jeito mais tradicional sabe, faço as atividades que as „ssoras‟ pedem, busco

informações na internet quando o negócio me interessa. Essas coisas. Sei lá, eu gosto de estudar, e meus pais sempre me incentivaram, acho que isso ajuda. Psicóloga: Como teus pais te incentivam?  Aluno:

Bah, tipo, meus pais são professores na Universidade, então eles estão nesse

meio, entende? Ai, tipo, direto perguntam que que eu to vendo nas aulas e, gostam de ver os trabalhos que faço, as minhas provas. De vez em quando to lá no meu quarto fazendo algum tema e minha mãe senta lá comigo pra me ajudar e tals. Eles também sempre me dão muitos livros, me ensinaram esse hábito de ler, e cara, é viciante. E acho que lendo você aprende muito também. Lá em casa também temos o hábito de tipo, 12

assistir documentários juntos e ai depois sempre rola as discussões entre a galera. Essas coisas. Psicóloga: Então, pelo que você ta me dizendo, você gosta de estudar.  Aluno:

É, tipo, eu gosto, sabe, mas tipo, gosto de conhecer essas coisas q tem a ver com

o que ta acontecendo agora, sabe? Que te deixam curioso, tipo, essas coisas que fazem parte da tua vida, que tu usa e tals. Psicóloga: E, o que você pensa sobre vir à escola?  Aluno:

Sinceramente? A melhor coisa da escola é a troca de idéias com teus amigos,

sabe? Ela é importante sim, mas hoje em dia ela não ta se ligando pra saber como chamar atenção dos alunos. Ai tipo, se você busca as coisas por conta própria, beleza; senão o cara se ferra se depender só da escola. As vezes, não desmerecendo os professores, aprendo mais conversando com algum amigo do que prestando atenção nas aulas mecânicas que os „ssores‟ dão.

Os professores parece que não querem te escutar,

querem dar a aula deles e deu. Psicóloga: E como é a sua relação com as suas professoras?  Aluno:

Ah, eu respeito elas, fico na minha, mas tipo, nunca troquei uma idéia com elas.

Elas chegam, dão a aula e saem. Psicóloga: E, nessas aulas que a professora chama a tua atenção por estar conversando demais, e estar atrapalhando a turma, como você responde?  Aluno:

Ah, ai... é que assim, se você tivesse lá, você ia me entender. Tipo, ela começa a

aula, da a aula sempre da mesma forma, nunca faz coisas diferentes, ai troco uma idéia com algum amigo perto, ai ela chama atenção e eu paro. Dali a pouco, não agüento ficar ali parado, sem fazer nada, escutando tudo que eu já sei. Ai converso mais um pouco, so que ai, mais algum colega tá entediado e começa a papear com a gente, mas aí não tenho culpa sabe? E quando vê tem uma galera ai conversando. Só que eu sei que eu sei

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o que a „ssora‟ ta tentando ensinar, mas a galera nem sempre sabe, ai eles se ferram

depois, né. Mas sei lá, as vezes tento dormir, mas ai ela acha que to faltando respeito. Psicóloga: E o que você acha que teria que acontecer pra aula ser diferente? Pra te chamar atenção, e envolver a ti e teus colegas?  Aluno:

Bah... Deixa eu pensar... Acho que tipo, a professora tem que tentar ver o que a

gente gosta, sabe? Se ela começar a explicar o inglês por motivos que nos interessam, é claro que vamos participar mais. E, sei lá, fazer umas atividades diferentes, sabe? Pra gente aprender se divertindo um pouco. Senão é sempre a mesma coisa, ela fica lá falando, falando, falando e os alunos parados, copiando as coisas ou então viajando, sabe? Pensando em outras coisas. Psicóloga: Então tu acha que se a professora mudar a postura dela na sala de aula, tudo vai mudar, inclusive a participação dos alunos?  Aluno:

É, não sei. Tipo, não to querendo dizer que a culpa é só da professora, sabe?

Psicóloga: Como assim?  Aluno:

Não, é que tipo, os alunos também precisam ajudar, sabe? Precisam se envolver.

Acho que tipo, se a professora tentar escutar a gente, se a gente conseguir conversar com ela  –  sem que ela se sinta ofendida e desconte nota da gente  –  acho q a turma e a professora poderiam decidir juntos o que fazer pra mudar, sabe? Psicóloga: E o que você acha que você poderia fazer para ajudar nesse processo?  Aluno:

Eu? Bah. (silêncio). Acho que assim, tipo, se a professora tiver disposta a

escutar a turma e fazer algumas coisas que a gente propor, eu posso ajudar ela, sei lá como. Psicóloga: Ok, então deixe-me ver se eu entendi: você compreende que a maneira como você se comporta nas aulas atrapalha a aprendizagem dos seus colegas, e você me disse que tem este comportamento porque as aulas são desinteressantes, já que você já 14

domina o conteúdo proposto. Você acredita que se a professora alterar a didática dela, propondo atividades diferenciadas, é possível captar a sua atenção e dos demais colegas da classe; e por fim, você está disposto a auxiliá-la a realizar estas atividades diferenciadas para que todos possam ter um melhor aproveitamento da aula. É isso?  Aluno:

É, acho que posso tentar.

Psicóloga: Então, vou conversar com a professora, e depois podemos realizar um encontro entre nós três. O que você acha?  Aluno:

Por mim pode ser.

Psicóloga: Ta certo então Joséfio, assim que eu conversar com a professora entro em contato contigo. Tens mais alguma coisa que tu gostaria de me dizer antes de encerrarmos?  Aluno:

Não.

Psicóloga: Então encerramos por hoje.

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Relatório/ Laudo Psicológico

Segundo o Conselho Federal de Psicologia o relatório ou laudo psicológico apresenta a descrição de situações ou condições psicológicas e suas determinações históricas, sociais, políticas e culturais, investigadas durante uma avaliação psicológica. Sua finalidade é a de fazer uma explanação do processo da avaliação psicológica, relatando informações acerca do encaminhamento, intervenções, diagnóstico, prognóstico e evolução do caso, orientação e sugestão de projeto terapêutico.

SIMULAÇÃO DE MODELO DE LAUDO/RELATÓRIO PSICOLÓGICO 1. Identificação Autor: Teresa da Silva – CRP01/11021 Interessado: Colégio Estadual José Maria Rita Assunto: Medida Disciplinar – Advertência para problemas de conduta em sala de aula. 2. Descrição da Demanda O adolescente Joséfio Barbosa, 17 anos, foi encaminhado à avaliação psicológica em decorrência de dificuldade em participar das aulas, apresentando comportamentos como dormir ou conversar excessivamente. Segundo a professora, quando o aluno não estpa dormindo, gera tumulto na sala de aula e atrapalha o rendimento da classe. Além disso, salienta que o aluno, apesar da não participação, apresenta excelentes notas nas avaliações. A família, até o atual momento, não foi investigada. 3. Procedimento Foi realizada uma entrevista em um encontro de 1 (uma) hora de duração com a professora da instituição, solicitante de auxílio; e uma entrevista em um encontro de 1 (uma) hora de duração com o aluno encaminhado. 4. Análise A professora responsável pela solicitação de encaminhamento demonstrou, durante a entrevista realizada com ela, desmotivação, cansaço e estresse. No seu ponto de vista o adolescente é culpado pelo fracasso de suas aulas, pois segundo ela lidera a turma fazendo com que ela perca o controle da situação. Na sessão de avaliação o examinando 16

demonstrou tranqüilidade, paciência, boa capacidade comunicativa, extroversão, simpatia, cordialidade, interesse e segurança. O sujeito possui objetivos traçados e apresenta auto-estima positiva. O indivíduo diz ter um ótimo relacionamento com os pais, que lhe incentivam e participam ativamente de seu processo educativo. Observouse total conhecimento da realidade vivida por ele. O sujeito afirma que prefere dormir nas aulas ou conversar com colegas, pois devido seu interesse nas matérias e estudos extra-escolares, já domina os conteúdos abordados em sala de aula, além disso, em sua opinião eles são apresentados de forma dissociadas do cotidiano. O sujeito acredita que a alteração da didática utilizada pela professora, com o desenvolvimento de atividades diferenciadas e diversificadas pode contribuir para melhorar tanto a sua participação em sala de aula, bem como a de seus colegas. Assim, o sujeito compromete-se em auxiliar a professora, caso ela requisite, a realizar estas atividades para que todos possam ter um melhor aproveitamento da aula. O processo de investigação ainda não está concluído. 5. Conclusão Através dos dados coletados até o presente momento, e sua análise pelo viés da perspectiva Sócio-Histórica, percebe-se que o professor não atinge a zona de desenvolvimento proximal do aluno durante suas aulas, desta forma o aluno atua conforme seu nível de desenvolvimento real (solução independente de problemas), o que impossibilita seu desenvolvimento. As interações precárias entre aluno e professora, e a dissociação realizada por ela entre o conhecimento científico e o conhecimento cotidiano, contribuem para o desinteresse apresentado pelo aluno, o que motiva más condutas em sala de aula. O ser humano se produz na e pela linguagem, ou seja, é apartir da interação com outros indivíduos que formas de pensar são construídas por meio da apropriação do saber da comunidade em que está inserido o sujeito. Desta forma, faz-se necessário prosseguir as investigações, incentivando a comunicação entre ambas as partes – aluno e professora – para concretizar as intervenções propostas.

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Conclusão

Através da elaboração deste trabalho foi possível aprofundar nossos conhecimentos a respeito da entrevista psicológica no âmbito escolar, bem como desvendar alguns dos fundamentos iniciais da Psicologia Escolar em si, e da prática do psicólogo neste contexto. Percebemos que a prática da psicologia escolar baseada no modelo clínico demonstra-se uma prática excludente, que rotula os indivíduos e marginaliza-os. Assim, o profissional que atua na escola deve manter uma visão multirreferencial nas suas investigações, sempre considerando a relação dialética entre escola e indivíduo, bem como o contexto sócio-histórico-cultural intrínseco em cada situação. Desta forma, cada escola é uma escola  –  possui demandas específicas, condições únicas e públicos distintos  –  o que torna impossível a padronização do trabalho do psicólogo. Além disso, com a construção deste trabalho foi possível fixar a aprendizagem da construção de laudos psicológicos, que antes limitava-se ao aspecto teórico. Por fim, concluímos o trabalho destacando a escassez de produções que referenciem a entrevista psicológica no contexto escolar

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Referências Bibliográficas

ANDRADA, Edla Grisard. Novos paradigmas na prática do psicólogo escolar. Psicologia, Reflexão e Crítica, Porto Alegre: v. 18, n. 2, p. 196-199, 2005 CORREIA, Mônica F. B. ; LIMA, Anna Paula Brito ; ARAÚJO, Claudia Roberta de. As contribuições da psicologia cognitiva e a atuação do psicólogo no contexto escolar. Psicologia reflexão e crítica, Porto Alegre: v. 14, n. 3, p. 553-561, 2001. CUNHA, Jurema Alcides e col. (1993). Psicodiagnóstico-R. Porto Alegre: Artes Médicas MARTINS, João Batista . A atuação do Psicólogo Escolar: multirreferencialidade, implicação e escuta clinica. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 8, n. 2, p. 39-45, 2003 SILVA, Silvia Maria Cintra da, RIBEIRO, Maria José and MARÇAL, Viviane Prado Buiatti. Entrevistas em psicologia escolar: reflexões sobre o ensino e a prática . Psicol. esc. educ. vol.8, no.1, p.85-90, 2004. Site: http://www.abrapee.psc.br/opsicologo.htm

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