Educação Musical Coral

April 25, 2019 | Author: TauanQueiroz | Category: Choir, Learning, Singing, Music Education, Human
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Educação Musical Coral Vanilda L.F. Macedo Godoy Universidade do Estado de Santa Catarina Resumo: Esta comunicação apresenta dados de uma pesquisa realizada em 2005 com

quatro corais de Florianópolis, cujo principal objetivo foi compreender o processo de ensino e aprendizagem coral nos grupos investigados. A pesquisa teve como base a metodologia qualitativa que possibilitou conhecer a realidade dos corais investigados dentro de seu contexto a partir da visão dos regentes e coralistas participantes da pesquisa. O principal instrumento de coleta de dados foi um questionário aplicado aos quatro regentes e outro aplicado a 80 coralistas, pertencentes aos quatro corais. Este texto trata das relações entre regentes e coralistas dentro de um processo de ensino e aprendizagem musical nos grupos corais. A literatura aponta que o coral é um local onde a aprendizagem musical pode ser desenvolvida e onde o regente tem o papel de educador musical. Os questionários buscaram verificar se os regentes se sentem responsáveis pela educação musical dos respectivos grupos que dirigem e se os coralistas reconhecem a si mesmos como aprendizes musicais. Os resultados mostram que os regentes e os coralistas participantes da pesquisa vêem o coral como um ambiente onde ocorre a educação musical e descrevem atividades realizadas nos seus corais em relação ao processo de aprendizagem musical. Mais discussões e reflexões são importantes e necessárias para a ampliação das potencialidades dos grupos corais como ambientes onde ocorre educação musical e muitos indivíduos podem se beneficiar desta experiência educativa. Este trabalho apresenta dados de uma pesquisa realizada em 2005 com quatro corais de Florianópolis, cujo objetivo foi compreender como se dá o processo de ensino e aprendizagem musical nos corais investigados. Os corais participantes – todos formados por adultos – possuem características distintas, sendo um religioso, um de órgão público, um profissional e um que usa o espaço de uma escola, mas sem vínculo com a mesma no sentido que as pessoas são advindas de locais diversos. Os quatro grupos pesquisados possuem acompanhador para tocar o teclado ou o piano. Quanto à preparação vocal, em dois dos corais este trabalho é feito pelo próprio regente; nos outros dois, a orientação vocal é ministrada por outra pessoa. A metodologia qualitativa serviu como base para a realização desta pesquisa. O modelo qualitativo permitiu conhecer a realidade dos corais dentro do seu contexto e a visão dos participantes dos corais pesquisados sobre vários aspectos musicais. O principal instrumento de coleta de dados foi um questionário aplicado com os quatro

regentes e outro aplicado a 80 coralistas ao todo. Os dados coletados foram organizados em cinco categorias para análise: 1) Motivos para cantar em coral; 2) O ensaio coral; 3) Apresentações musicais; 4) Educação musical coral; 5) O estudo dos coralistas. No presente artigo, o foco está dirigido para a categoria Educação musical coral que trata das relações entre regentes e coralistas dentro de um processo de ensino e aprendizagem musical nos grupos corais. O coral como ambiente de aprendizagem musical

As razões que levam as pessoas a cantar em coral são variadas, relacionadas aos aspectos sociais, de lazer, religiosos, emocionais, entre outros. Mathias (1986) enfatiza os aspectos sociais e as relações humanas referentes à atividade coral, colocando que as “pessoas que se reúnem em um grupo, têm as mais variadas motivações. Portanto, é importante refletir sobre os comportamentos, motivos e necessidades do ser humano” (ibid. p.22). Estes aspectos humanos coletivos, sociais, são extrínsecos à aprendizagem musical porque estão relacionados a fatores externos à música. Embora não pretendamos diminuir a validade destes fatores extrínsecos, acreditamos que é importante compreender a prática coral como um espaço onde ocorre a educação musical. Para Figueiredo (2005, p.6) é “preciso compreender a importância  per se da atividade coral, como uma experiência valiosa na construção de uma consciência musical ampla e diversificada. Cantar em coral é, antes de mais nada, uma experiência musical [...]”. É preciso discutir que tipo de conhecimento pode estar sendo desenvolvido no coral para que se possa ir além das funções extrínsecas – social, recreativa, religiosa, entre outras – à música e partir para a construção do conhecimento musical. Uma breve revisão de literatura mostra que vários autores sugerem que a atividade coral envolve aprendizagem musical. Neste processo, os regentes são, de alguma maneira, responsáveis por esta formação musical. Figueiredo (1990) atribui ao ensaio a possibilidade de construção do conhecimento musical. Para este autor o ensaio é um momento de aprendizagem e o regente tem o papel de educador musical, por isso é importante que se reflita sobre a atividade coral.

Os regentes devem se lembrar de sua função educacional. Através desta reflexão haverá maiores possibilidades de desenvolvimento consistente do conhecimento musical, que conduzirá, seguramente, ao aprimoramento da prática coral. (FIGUEIREDO, 1990, p. 90)

Outros autores ainda concordam com a idéia de que o coral é um ambiente que possibilita a aprendizagem musical e onde o regente exerce esta função educacional. Mathias (1986) afirma que o regente possui uma função educativa quando diz que “cabe ao regente coral realizar o papel de educador musical com os seus coralistas [...]” (p.32). Robinson e Winold (1976) sugerem que “o regente coral precisa ser também um educador competente” 1 (p. 45), onde a prática coral se constitui como um veículo para o desenvolvimento das habilidades e dos conhecimentos musicais. Zander (2003) propõe que o regente deve desenvolver também sua habilidade de ensinar, de se comunicar, de educar musicalmente o grupo que dirige, afirmando que o regente precisa desenvolver uma metodologia de ensino que propicie que os conteúdos musicais sejam reconhecidos e apreendidos pelos coralistas de maneira eficaz. Os autores apresentados concordam entre si no sentido de que o regente é um educador. Além da formação técnica do gestual da regência é preciso que o regente tenha sólidos conhecimentos musicais e que saiba aplicá-los com eficiência (FIGUEIREDO, 1990; ZANDER, 2003; MARTINEZ, 2000). Apresentação e discussão dos dados

Os dados que serão apresentados foram coletados a partir das respostas de um questionário aplicado aos regentes e outro questionário aos coralistas. Os questionários trataram de questões de ensino e aprendizagem musical na prática coral, buscando verificar: a) se o regente se sente responsável pela educação musical do coro e; b) se os coralistas se reconhecem como aprendizes musicais. Para os regentes as perguntas do questionário envolveram tópicos como a relação entre o regente e o educador musical, solicitando um posicionamento do regente a respeito deste assunto. Além disso, foi solicitado aos regentes que descrevessem atividades que realizam com seus corais com objetivo educativo.

1

No original: “The choral conductor must also be a competent educator”.

Entre as questões aplicadas aos coralistas, estavam perguntas relacionadas à sua aprendizagem musical, solicitando que eles apontassem, por exemplo, as atividades que são propostas pelos regentes para ensinar uma música nova e para repassar uma música  já conhecida pelo grupo. Também lhes foi solicitado indicar quais as atividades que, na opinião deles, eram mais eficazes para o seu aprendizado musical. Regentes Os quatro regentes que participaram da pesquisa responderam aos tópicos solicitados. A relação entre o regente e o educador musical foi assim comentada pelos regentes: ‘  Nos ensaios, ele [o regente] transmite conhecimentos, arte, vivência, emoção’ (Regente 1). ‘[...] são repassados conhecimentos a respeito do fazer musical, e não apenas cantar   por cantar. A técnica vocal é bem valorizada, as indicações de como ler a partitura e de como   produzir cada peça. A variação de cantar de formas diferentes a mesma música também  propicia momentos de criatividade, reforça o aprendizado’ (Regente 2).

‘[o regente] contribui para o aprimoramento vocal, musical e cultural dos cantores, bem como procura desenvolver o espírito do “grupo”, etc.' (Regente 3).

‘[...] todos os cantores se espelham no seu regente e usam seus exemplos e explicações como se fossem a única verdade do mundo. Nós regentes temos que ter muito cuidado para não  falarmos nada de forma errada ou equivocada ’ (Regente 4).

A Tabela 1 apresenta os dados apresentados pelos regentes referentes às atividades que eles realizam com corais no sentido de conduzir a aprendizagem musical. Estão indicadas as sínteses das respostas dos regentes com relação ao ensino de músicas novas e de músicas já conhecidas dos grupos. Tabela 1 – Atividades mencionadas pelos regentes

Regente 1

Música nova: ensaia os naipes; toca no piano e canta. Música conhecida: ensaia em conjunto e corrige o que for preciso.

Regente 2

Música nova: analisa a estrutura da peça; lê a letra para contextualização; localiza a melodia nas respectivas vozes; faz vocalização com ‘lá, lá, lá’. Música conhecida: usa a música no aquecimento (com boca fechada e depois com a letra); solicita que os coralistas cantem sem olhar para a letra; forma quartetos.

Regente 3

Música nova: solicita o estudo em casa; faz ensaios de naipes e depois trabalha em conjunto. Música conhecida: repassa a leitura; solicita novamente o estudo em casa; faz ensaios de naipes e trabalha em conjunto.

Regente 4

Música nova: mostra gravação da peça; faz leitura rítmica; fornece CDs com as gravações de cada naipe para estudo em casa. Música conhecida: mistura os naipes e faz jogral.

Coralistas Os dados coletados a partir dos questionários aplicados aos coralistas apresentam pontos relacionados a atividades que o regente aplica durante os ensaios. A Tabela 2 sintetiza estas respostas, sendo que a ordem apresentada representa a freqüência das respostas. Tabela 2 – Estratégias e atividades mencionadas pelos coralistas

Coral 1

Coral 2

Coral 3

Música Nova

Música Conhecida

Toca no piano; Canta cada voz; Fornece uma gravação; Passa primeiro a letra; Canta cada voz; Toca no teclado; Passa primeiro a letra; Fornece uma gravação; Ensaia cada voz separada e depois une; Toca no piano; Canta cada voz; Passa primeiro a letra; Fornece uma gravação;

Dá os tons e o coral canta; Toca as vozes no piano; Canta cada voz; Repassa no teclado; Canta cada voz; Dá os tons e o coral canta; Toca no piano; Dá os tons e o coral canta; Canta cada voz;

Coral 4

Canta cada voz; Toca no teclado; Fornece uma gravação; Passa primeiro a letra;

Dá os tons e o coral canta; Canta cada voz; Toca no piano;

Ao responderem sobre quais das atividades eram mais eficazes para a sua compreensão, os coralistas apresentaram as seguintes atividades, que estão listadas em ordem decrescente de freqüência: - Passagem das vozes com o instrumento e com a voz do regente, ouvindo as partes de cada naipe separadamente para depois cantar com todo o grupo. - Atenção nos gestos do regente. - Detalhamento das peças antes de serem cantadas, incluindo a leitura da letra quando em idioma diferente, discussão de aspectos estéticos das peças e leitura rítmica. - Técnica vocal. - Gravações para o estudo em casa, além da audição da música original. - Repetição da música até aprender. - Diálogo sobre o que se vai fazer em cada ensaio para que os coralistas possam compreender o processo. Considerações

As respostas dos regentes indicam que os mesmos reconhecem sua função de educadores, concordando com a literatura da área que discute as funções do regente (FIGUEIREDO, 1990; MATHIAS, 1986; ROBINSON e WINOLD, 1976; ZANDER, 2003). Os regentes pesquisados sentem que exercem influência sobre os cantores do seu grupo e por isso há a necessidade de terem cuidado com o que falar e como agir. Cada regente utiliza estratégias que visam o aprendizado musical dos coralistas, mostrando a sua preocupação com a condução da aprendizagem musical. As estratégias apontadas por estes regentes como exemplos de sua atuação frente aos corais são diferentes para cada um. Tocar no instrumento de teclado e cantar para os coralistas as suas vozes, a técnica vocal, as gravações para estudo, e orientações gerais sobre as peças musicais são tipos de estratégias mencionadas por estes regentes que também são relatadas pelos coralistas. Estes últimos, por sua vez, demonstram perceber que fazem parte de um processo educativo em seus corais quando reconhecem estratégias de

ensino aplicadas por seus regentes. As atividades mais eficientes apresentadas pelos cantores em relação ao ensino musical nos corais mostram que há uma compreensão de que existe um conhecimento sendo mediado pelos regentes e diferentes meios para se chegar à assimilação de tais conhecimentos. A literatura aponta para a função educacional do coro e sobre a necessidade de que o regente esteja preparado para conduzir os ensaios de maneira a garantir uma aprendizagem musical e fugir do mero treinamento ou ficar só na parte social ou recreativa. É importante que a educação musical coral seja abordada mais amplamente nos cursos de bacharelado onde se formam regentes, e também nos cursos de licenciatura, onde a regência é normalmente oferecida como parte da formação do educador musical. Teixeira (2005) enfatiza “a necessidade de uma abordagem sobre a didática coral durante a formação superior” (p. 150). Acreditamos que mais deve ser discutido, escrito e refletido sobre a prática coral, como sugere Teixeira (2005, p. 11): “ainda são escassos os estudos que examinam a formação e a atuação do educador musical/regente inserido em diferentes espaços”. Consideramos, então, que este tópico tem grande importância para a educação musical em contextos não-formais. A atividade coral é um espaço onde ocorre educação musical e muitos indivíduos podem se beneficiar desta experiência educativa. Os aspectos vistos neste trabalho não esgotam as possibilidades de estudos sobre o ensino e aprendizagem musical na prática coral. Existem muitos outros elementos presentes na realização coral que merecem ser abordados e discutidos. Para isso é preciso que sejam feitas mais pesquisas nesta área no sentido de ampliar a produção de material e difundir o conhecimento acerca desta prática musical que é o canto coral.

Referências:

BOGDAN, Robert; BIKLEN, Sari.   Investigação qualitativa em educação: uma introdução à teoria e aos métodos. Tradução de Maria João Alvarez, Sara Bahia dos Santos e Telmo Mourinho Baptista. Porto – Portugal: Porto Editora, 1994. FIGUEIREDO, Sergio Luiz Ferreira. O ensaio coral como momento de aprendizagem : a prática coral numa perspectiva de educação musical. Porto Alegre: UFRGS, 1990. [Dissertação de mestrado]

FIGUEIREDO, Sergio Luiz Ferreira. A prática coral na formação musical: um estudo em cursos superiores de licenciatura e bacharelado em música. In: Congresso da ANPPOM, 15, 2005, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro: UFRJ, 2005. [CD-rom] MARTINEZ, Emanuel.   Regência Coral: princípios básicos. [colaboradores: Denise Sartori; Pedro Goria; Rosemari Brack]. Curitiba: Dom Bosco, 2000. MATHIAS, Nelson. Coral: um canto apaixonante. Brasília: Musimed, 1986. ROBINSON, Ray; WINOLD, Allen. The choral experience: literature, materials, and methods. New York: Harper’s College Press, 1976. TEIXEIRA, Lúcia Helena Pereira. Coros de empresa como desafio para a formação e a atuação de regentes corais: dois estudos de caso. Porto Alegre: UFRGS, 2005. [Dissertação de mestrado] ZANDER, Oscar. Regência coral. 5ª ed. Porto Alegre: Movimento, 2003.

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