Contos de Mouros en Trasosmontes

June 8, 2024 | Author: Anonymous | Category: N/A
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Alexandre José Parafita Correia

Mouros Míticos em Trás-os-Montes – contributos para um estudo dos mouros no imaginário rural a partir de textos da literatura popular de tradição oral

Volume II (corpus narrativo)

Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro 1

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ÍNDICE DO CORPUS NARRATIVO Nota Prévia ..................................................................................................................

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Concelho de Alfândega da Fé ..................................................................................... 12 1 – [Os cavaleiros das esporas douradas] 2 – [O Castelo da Marruça] 3 – [A Fonte dos Vilarelhos] 4 – [A Fraga da Tecedeira] 5 – [O segredo da moura] 6 – [A moura das Casas Brancas]

Concelho de Alijó .......................................................................................................... 15 7 – [A moura encantada de Sanfins do Douro] 8 – [Os figos da princesa moura] 9 – A moura do monte do Piolho 10 – Lenda da Anta da Chã 11 – Lenda da Pala Moura

Concelho de Boticas ...................................................................................................... 18 12 – [Os mouros do castro de Sapiãos] 13 – Lenda da moura a cantar 14 – Lenda do Cobriço 15 – [A moura, as palhas e o ouro] 16 – [A moura a catar os piolhos] 17 – [O Côto dos Corvos] 18 – Ponte da cerca do castro 19 – Tenda das lameiras do castro

Concelho de Bragança .................................................................................................. 22 20 – [Ladeira do Pingão] 21 – [A moura, metade homem e metade cabra] 22 – [O tesouro do castro de Caravela] 23 – [A fonte do Castro de Baçal] 24 – A moura encantada no fundo de um poço 25 – O castelo de Rebordãos 26 – [O Cabeço da Velha] 27 – [O Picadeiro dos Mouros] 28 – [O Vale da Moura] 29 – Lenda de S. Pedro de Sarracenos 30 – A Fonte da Moura de S. Julião 31 – Lenda de Santa Colombina de Gimonde 32 – A lenda do Conde de Ariães 33 – Lenda dos Sete Infantes de Lara 34 – A fraga do cavaleiro 35 – Lenda da Fundação de Bragança 36 – O cabeço de S. Bartolomeu

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37 – A Fontela de Candegrelo 38 – O bruxo e a moura 39 – A Cortadura dos Mouros 40 – Lenda da moura do Reboledo 41 – Lenda do Castelo de Pinela

Concelho de Carrazeda de Ansiães ........................................................................... 37 42 – [Lenda do penedo das letras] 43 – O Castelejo 44 – [Figueira Redonda] 45 – Dólmen de Vilarinho de Castanheira 46 – [O Vale da Osseira] 47 – Lenda da Fonte da Moura de Seixo de Ansiães 48 – A menina encantada 49 – Lenda da Fraga de Selim

Concelho de Chaves ...................................................................................................... 42 50 – A Cerca dos Mouros de Vila Verde da Raia 51 – [A vila de Chaves e os mouros] 52 – Lenda do cavalo branco montado por Santiago de Compostela 53 – Lenda do bezerro de ouro 54 – Lenda da grande cobra a guardar o encanto 55 – A mina da Bolideira 56 – O guerreiro e a princesa moura 57 – O monstro do castelo de Monforte 58 – O cavaleiro e a princesa 59 – Os lagares da moura 60 – A moura da Ilha dos Lagartos 61 – A moura do sítio das Colmeias 62 – Lenda do Calhau da Moura 63 – Os figos da Fonte de Vale de Asnos 64 – A parteira e a moura 65 – Lenda do Forte de S. Neutel

Concelho de Freixo de Espada à Cinta .................................................................... 54 66 – Freixo de Espada à Cinta 67 – Fonte da Moira

Concelho de Macedo de Cavaleiros ........................................................................... 55 68 – [Nossa Senhora das Flores] 69 – [Cordão de oiro nas Guímbrias] 70 – [A galinha com pintainhos de oiro] 71 – [Espada nele! Espada nele!] 72 – [A Senhora do Bálsamo na Mão] 73 – A Pedra Baloiçante 74 – O tesouro do monte do Castelujo 75 – A moura e o moleiro de Nozelos 76 – Lenda do Cabeço dos Mouros 77 – Lenda de Latães 78 – Lenda da Pia dos Mouros

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79 – O moleiro, a moura e a cabra 80 – O Vale dos Namorados 81 – O tesouro da serra de Bornes 82 – O mouros do Monte de Morais 83 – O Zé-da-moura

Concelho de Mesão Frio .............................................................................................. 67 84 – [O Castelo dos Mouros em Fontelas] 85 – Os mouros e o convento do Varatojo

Concelho de Miranda do Douro ................................................................................. 68 86 – [O cristão, o mouro e a Senhora do Nazo] 87 – O poço sem fundo 88 – A Fonte do Pingo 89 – O cabreiro e a moura 90 – S. Bartolomeu e os mouros

Concelho de Mirandela ................................................................................................ 73 91 – Basília 92 – [Santa Comba e o rei Orelhão] 93 – A lenda de Dona Chama 94 – A sineta dos mouros 95 – A cisterna da Torre de Dona Chama 96 – [Mil ais] 97 – [O tesouro, a moura e o diabo] 98 – Lenda de Mirandela 99 – A maldição da serra dos Passos 100 – O Monte da Moura 101 – O tesouro dos mouros da Freixeda 102 – O caçador e a moura 103 – Lenda do buraco da Muradelha 104 – O lavrador e a cobra 105 – Lenda da Fonte de Vide 106 – A fraga da mula 107 – Lenda do Regodeiro 108 – A grade de ouro 109 – A velha e o carvão 110 – A chave de ouro 111 – A pocinha do Vale de Amieiro

Concelho de Mogadouro .............................................................................................. 89 112 – [O Castelo de Bouça de Aires] 113 – Capela de Santa Cruz 114 – Os forninhos de Alvagueira 115 – [A moura do castelo de Bemposta] 116 – [O castelo dos mouros de Vilarinho dos Galegos] 117 – [O castelo do Mau Vizinho] 118 – Vilarinho dos Galegos 119 – A lenda da fraga do Poio 120 – A lenda de Vale da Madre

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121 – A Fonte do Ouro 122 – Lenda do Poço do Dourado 123 – O caminho da moura encantada

Concelho de Mondim de Basto ................................................................................... 97 124 – Lenda do Alto dos Palhaços 125 – O pequeno pastor e a moura 126 – A bacia de ouro 127 – O Monte Farinha e a Senhora da Graça 128 – Os mouros e a ferramenta

Concelho de Montalegre .............................................................................................. 101 129 – [A tenda da moura] 130 – O Córrego da Paixão 131 – [O cinto do mouro] 132 – [As mouras dos Rameseiros] 133 – [Crastelos ou Casas dos Mouros] 134 – [A marra dos mouros] 135 – [A força dos mouros] 136 – [Fonte da Moura] 137 – [Altar da Moura] 138 – [Castro de Travassos] 139 – [Lenda do Mosteiro de Pitões das Júnias] 140 – [O castelo de Montalegre] 141 - Lenda da Serra da Mourela 142 – Foge Mouro 143 – A Cova dos Maus 144 – As mouras da Portela do Antigo 145 – Lenda de Parafita 146 – A navalha de ouro 147 – O mouro e a menina da Cidade de Mel

Concelho de Murça ....................................................................................................... 114 148 – O poço da moira 149 – O rochedo da moira 150 – A moura de Sobreda 151 – O cavalo de ouro

Concelho de Peso da Régua.......................................................................................... 116 152 – [A mina de peste e oiro] 153 – A Mina de Dona Mirra 154 Os figos de Dona Mirra 155 – Lenda do Fragão de S. Leonardo 156 – A bola de Dona Mirra 157 – Os lagartos de Dona Mirra 158 – A moura e a giestas 159 – O cavalo de três pernas 160 – Lenda de Moura Morta 161 – Lenda da Moura Encantada do Fontão

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Concelho de Ribeira de Pena ...................................................................................... 122 162 – O tesouro de Lamelas

Concelho de Sabrosa ..................................................................................................... 123 163 – [Os mouros do castelo de S. Domingos] 164 – [O Chão dos Mouros em Donelo] 165 – Lenda de Provezende 166 – O castelo dos mouros 167 – Em busca dos cordões de ouro 168 – O buraco onde urinavam os mouros 169 – A noiva encantada 170 – A lenda da Pala da Moura

Concelho de Santa Marta de Penaguião .................................................................. 128 171 – [Lenda de Penaguião] 172 – Entre S. Pedro e Urval 173 – A fraga da Moura (Alvações do Corgo)

Concelho de Torre de Moncorvo ............................................................................... 131 174 – A lenda da Cabeça do Mouro 175 – [Santo Apolinário e os mouros] 176 – [O buraco dos mouros debaixo da capela] 177 – [A “matança” dos mouros] 178 – A Lenda da Fraga Amarela 179 – A moura encantada de Adeganha 180 – [Chelindrão da Presa] 181 – Lenda do Bezerro de Ouro 182 – Lenda da Fraga da Pindura 183 – A fonte da Chuzaria 184 – A lenda da Fonte de Carvalho 185 – Lenda da Ferrada 186 – A moura e o bezerro de ouro

Concelho de Valpaços ................................................................................................... 141 187 – [O Vale da Batalha] 188 – Pia dos Mouros 189 – A mina da moura 190 – A Fonte da Moura 191 – A fonte fria 192 – A tesoura da moura 193 – A fraga da urze 194 – A parteira das mouras 195 – Lenda do Monte das Fragas 196 – O rio seco 197 – A lâmpada de ouro 198 – A moura e o torgueiro 199 – Lenda da Fonte da Urze 200 – A Fada d'El Rei 201 – O bezerro de ouro de Lebução 202 – As pias dos mouros de Argeriz

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Concelho de Vila Flor ................................................................................................... 151 203 – [O cântaro cheio de novelos de ouro] 204 – [Na fonte do Lameiro de Cima] 205 – [As mouras de Freixiel] 206 – Lenda da Fonte da Crica da Vaca 207 – [Mil Almas e Covas] 208 – Lenda da Fonte das Bestas 209 – A moura das Fragas do Rugido 210 – Lenda da Fonte do Lameiro 211 – A menina e o cordão de ouro 212 – Lenda do Penedo Redondo 213 – Lenda de Vale Frechoso 214 – O choro da moura em Santa Comba da Vilariça 215 – Lenda da Fraga do Pinhal 216 – Lenda da Fonte d'El Rei 217 – A Fraga da Moura de Seixo de Manhoses

Concelho de Vila Pouca de Aguiar ............................................................................ 161 218 – Os três potes 219 – A casa dos mouros de Cidadelha 220 – Lenda dos pintainhos de ouro 221 – Lenda da fraga do gestal 222 – A lenda da fraga das campainhas

Concelho de Vila Real .................................................................................................. 164 223 – O castelo de S. Tomé 224 – Lenda de S. Tomé do Castelo 225 – [As talhas do mouro] 226 – Gruta com feitio de Mesquita 227 – A moira e o carvoeiro 228 – A moura da Ponte da Aradeira 229 – O Vale da Bela Luz 230 – Lenda do Poço de Panóias 231 – Lenda da moura branquinha 232 – A moura, o pássaro e a cobra 234 – [O cristão, o mouro e a Senhora de Guadalupe]

Concelho de Vimioso .................................................................................................... 173 235 – [O mouro e a boieira] 236 – [Lenda do cordão de oiro] 237 – Lenda da Serra do Mó 238 – Lenda do Castelo de Algoso 239 – Lenda da Fonte de S. João 240 – O lagar de ouro de Algoso 241 – O pente e o cabelo da moura 242 – Lenda do Penedo da Abrunheira 243 – O bruxo do castelo de Algoso

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Concelho de Vinhais ..................................................................................................... 178 244 – A tomada de Souane aos mouros 245 – O choro da moura [de Souane] 246 – [A moura encantada e o lenhador] 247 – [A moura e a pastora] 248 – [A moura no rio Mente] 250 – [A lenda de Igreja de S. Facundo] 251 – [O mouro e a igreja de S. Facundo] 252 – [O Serro de Penhas Juntas] 253 – [A Fraga do Pingadeiro] 254 – [Santa Comba de Ousilhão] 255 – A moura e o cavaleiro cristão 256 – A fraga onde Nossa Senhora descansou 257 – A Fraga dos Mouros de Espinhoso 258 – Lenda do Caúnho 259 – Lenda da Torca de Balmeão 260 – As mulheres do linho e as mouras 261 – Lenda das Fragas do Carvalhal 262 – A fraga da Moura de Sobreiró de Cima 263 – O tesouro da Cerca

Índice Remissivo das Fontes do Corpus ................................................................... 191

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Nota Prévia Este volume reúne um corpus de 263 textos narrativos (lendas e mitos) sobre os mouros no imaginário rural de Trás-os-Montes. Não houve a preocupação de reunir todas as narrações de mouros da Região, o que seria impensável, dada a infinidade de microtopónimos associados a explicações lendárias mais ou menos mutiladas, não esquecendo também que, frequentemente, um simples registo lendário se projecta ou fragmenta em muitas outras versões. Houve sim a preocupação de reunir um vasto conjunto de narrações sobre mouros com um vínculo local e geográfico claro, mas também fiável e tão representativo quanto possível da memória oral transmontana. A compilação e a fixação textual respeitam aos 26 concelhos dos distritos de Bragança e Vila Real), elencados por ordem alfabética, e implicou um trabalho longo e persistente de pesquisa, quer junto de fontes secundárias (informação colhida em colectâneas de literatura oral tradicional, monografias, enciclopédias e outras publicações identificadas na Bibliografia), quer junto de fontes primárias (em especial manuscritos pessoais e informações e relatos orais).1 1

No processo de recolha e compilação dos textos orais, contámos com a generosa ajuda de muitos professores e educadoras de infância fixados em diversos concelhos da Região transmontana, tendo alguns mediado os contactos com as “fontes primárias”. Assim, para além do reconhecimento e homenagem que nos merecem todas as pessoas adiante identificadas como informantes, é de elementar justiça aqui exprimir também a nossa gratidão aos seguintes professores e educadoras: Adília Pires Soutelinhos (Montalegre), Albertina Amélia Fernandes (Vimioso), Alcina Maria Saldanha (Macedo de Cavaleiros), António Carlos Correia da Silva (Sabrosa), António Nascimento Moreiras (Mogadouro), Aurora dos Santos Almeida (Bragança), Carminda Aurora Morais (Vila Flor), Cremilde de Fátima Pinheiro (Torre de Dona Chama, Mirandela), Dircea Lázaro Morais (Macedo de Cavaleiros), Ester Fátima Rodrigues (Bragança), Gorete Fernandes (Vila Flor), Isabel Quintas Carvalho (Carlão, Alijó), Isaura N. Fernandes Parafita (Vila Real), Jacinta Inocência D. Fernandes (Mirandela), Judite Elvira Baltasar (Vinhais), Maria Amélia M. Cabeleira (Torre de Moncorvo), Maria Beatriz Silva Correia (Vila Flor), Maria da Conceição Pereira da Lama (Montalegre), Maria da Graça D. Rodrigues (Torre de Moncorvo), Maria da Graça M. Sebastião (Mogadouro), Maria da Graça Gomes (Lebução, Valpaços), Maria da Graça Ferreira Garcia (Mirandela), Maria de Fátima Carneiro Teixeira (Macedo de Cavaleiros), Maria de Fátima Fernandes Alves (Montalegre), Maria de Fátima Cancela (T. Moncorvo), Maria do Amparo Gomes (T. Moncorvo), Maria Fernanda Cardoso Dias (Alijó), Maria Georgina Cordeiro Queijo (Macedo de Cavaleiros), Maria Isabel Alves Domingues (Chaves), Maria Isabel Barja (Chaves), Maria Lucinda Freixinho Peixoto (T. Moncorvo), Maria Raquel Coelho Alves (Mirandela), Maria Vitória Andrade Lázaro (T. Moncorvo), Maria Zita Moura Regente (Macedo de Cavaleiros), Narcisa Lúcia Branco (Vila Flor), Neuza da Conceição Estevinho (Bragança), Olema Natércia Gonçalves (Vilar de Peregrinos, Vinhais), Olímpia Morais (Macedo de Cavaleiros), Rosa Maria Fernandes Martins (Valpaços), Suzana Isabel Quintas de Carvalho (Vinhais).

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Cumpre-nos aqui ressalvar que, na pesquisa realizada em fontes primárias, procurámos afastar as lendas de conteúdo claramente “romanceado” (“lendas de autor”), onde se torna difícil (ou arriscado) potenciar os assuntos e motivos que emanaram das fontes orais originais, distinguindo-os dos impulsos erudito-literários dos seus autores.2 A ideia foi reunir um corpus fiável e representativo no quadro de uma exegese do universo antropológico tradicional. Por isso, importou, acima de tudo, uma busca dos conteúdos da memória que melhor se aproximem do seu fundo essencial, permanente, que provém da lonjura dos tempos.

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Procurámos apresentar todos os textos narrativos sob o título que as respectivas fontes indicavam. Nos casos (de publicações) em que tal indicação não existia, optámos por propor um título, colocando-o entre parêntesis rectos.

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Concelho de Alfândega da Fé

1 – [Os cavaleiros das esporas douradas] Tendo os mouros uma fortaleza no monte do Carrascal, próximo da vila de Chacim, saíram de Alfândega da Fé 25 cavaleiros de esporas douradas, que ajudando os de Chacim e de Castro Vicente, desbarataram os mouros, obrando tais actos de bravura que obtiveram para a sua terra, que se chamava somente Alfândega, o sobrenome que tem3. Diz-se que o alcaide mouro do Carrascal, ufano com o seu castelo, impunha aos cristãos circunvizinhos os tributos que queria, exigindo até tributo de donzelas para o seu harém. Pedindo esse tributo aos cristãos de Castro Vicente, estes pediram socorro aos desta vila [Alfândega da Fé], que, tomando as armas, atacaram o castelo com grande intrepidez, tomando-o, matando o alcaide e livrando o país deste malvado4. Fonte: LEAL, Pinho – Portugal Antigo e Moderno, vol. 2, Lisboa, Livraria Editora de Mattos Moreira & Companhia, 1873, p. 114.

2 – [O Castelo da Marruça] No sítio chamado Marruça, também dito Castelo de Marruça [em Parada, concelho de Alfândega da Fé], há restos de fortificações, muros, fossos, etc., que dizem ser dos mouros. Perto fica a Fraga do Crato, metida em espesso carrascal, interessante por apresentar a forma de capela e por o povo lhe ligar a lenda de tesouros encantados. No Castelo da Marruça aproveitaram os rochedos para defesa, completando a parte onde faltavam por muros. É quase inacessível, a não ser por um lado, no qual reforçaram o sistema defensivo por outro muro um pouco afastado do recinto e por uma larga faixa de pedras de mais de metro, enterradas com a ponta aguçada para cima. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, p. 149. 3

Pinho Leal refere que ainda em 1650 se conservavam na casa da Câmara de Alfãndega da Fé diversas armas com que o povo se defendia dos árabes e os atacava. E acrescenta terem sido, entretanto, convertidas em “instrumentos agrários” (1873: 114). 4 Esta versão, publicada por Pinho Leal, reproduz, com a respectiva actualização ortográfica, o conteúdo já antes publicado pelo Padre Luiz Cardoso, no Diccionario Geographico, em 1747, em artigo dedicado a Alfândega da Fé (apud Alves, 1934a: 106).

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3 – [A Fonte dos Vilarelhos] Na fonte dos Vilarelhos, termo de Alfândega da Fé, vive uma linda moura em guarda de valiosíssimo tesouro. Um homem a quem apareceu soube-lhe falar e ela prontificou-se a dar-lhe seis vinténs diários, tanto disse bastar-lhe para seu governo sem necessidade de trabalhar, se lá fosse todos os dias ao dar da meia noite. Na verdade, o homem não era peco, e todos os dias, à hora aprazada, encontrava junto à fonte, debaixo de uma pedra, a luzente moeda de prata. Os vizinhos admiravam-se, porque, sendo pobre, vivia à tripa-forra sem trabalhar. Os antigos camaradas de geira chamavam-no ao passar junto da sua porta para o serviço, mas ele dizia sempre que não ia. Por último, aborrecido com a impertinência da chamada, retorquiu escarnecedor e soberbo: – Que não ia trabalhar, Nem de trabalhar precisaria, Enquanto a Fonte de Vilarelhos Lhe desse seis vinténs por dia.

Na noite seguinte voltou à fonte, mas a moeda não estava e nunca mais a viu. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, p. 451.

4 – [A Fraga da Tecedeira] Há lenda da moura encantada e de tesouros encantados em Agrobom [concelho de Alfândega da Fé], no sítio chamado Fontaínhas, onde aparece a moura a tecer em tear de oiro na manhã de São João, e por isso chamam ao sítio Fraga da Tecedeira e ainda Mourim. O tesouro consta de um lagar de oiro. Diz a lenda que para o desencantar já lá foi um padre com o povo fazer esconjuros e rezas. Apareceu o diabo escarnanchado na ponta do peso do lagar, declarando como que violentado e com a horrenda cara de quem é: – O tesouro aqui está. Onde queredes que vo-lo apresente? Tudo fugiu aterrado e o diabo desapareceu com o lagar, sem mais haver notícia dele. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, p. 490

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5 – [O segredo da moura] Na cortinha da Ermanda, no termo de Sendim da Ribeira [concelho de Alfândega da Fé], há uma moura encantada que apareceu a um rapaz, prometendo-lhe imensas riquezas. Para isso devia o rapaz de meter as suas calças no meio de um rochedo que se abria por artes mágicas e se fechava seguidamente, e também de atirar com um ovo à cabeça de uma cobra que sairia rapidamente contra ele. O rapaz devia guardar segredo, nada revelando de quanto lhe disse a moura, mas não teve paciência. Jubiloso como estava com a riqueza prometida pela moura, declarou tudo. – Ah, ladrão, que deste cabo da tua fortuna! – disse-lhe o pai quando soube das inconfidências do filho. E, na verdade, o fragueiro não se abriu e nunca mais viu a moura. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, p. 491

6 – [A moura das Casas Brancas] Há uma moura encantada a tecer em tear de oiro nas Casas Brancas, termo de Vale de Pereiro [concelho de Alfândega da Fé]. Estas casas, muitíssimo pretas, por sinal, são os alicerces de uma aldeia mourisca. Percebem-se ali os restos de algumas casas, que não puderam ser acabadas por causa da expulsão dos mouros. Ali ficou uma moura encantada em horrorosa serpente, e se algum mortal tiver coragem e tempo de dizer certas palavras sacramentais, a cobra desaparecerá para dar lugar a uma moura. Fonte: VILARES, João Baptista (apud ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, pp. 491-492).

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Concelho de Alijó

7 – [A moura encantada de Sanfins do Douro] Ao tempo das longas e sangrentas batalhas que os árabes e os cristãos desenvolveram para o domínio do Algarve, foi uma bela princesa sarracena raptada e trazida [para Sanfins do Douro, concelho de Alijó] por um jovem guerreiro cristão. E longe da sua terra e dos seus carpiu a princesa as mágoas da solidão e as angústias da interminável esperança do regresso ao lar. Inúmeras foram as tentativas que os moiros fizeram para a libertar, baldadas, todas elas, pela vigilância constante a que estava sujeita. Um dia, porém, o antigo apaixonado da infeliz moira, dando como senha de reconhecimento algo que não existia na zona do desterro – os figos do Algarve – resolveu, com risco da própria vida, libertar a sua amada. Em má hora o fez, já que foi descoberto e morto pelos escudeiros do raptor. A aventura romântica do califa, longe de terminar em bem, serviu ainda para maior reclusão da princesa que, desiludida, se fechou nos aposentos e, desfeita em lágrimas, se finou aos poucos. Desde então, porque morrera de amor, ficou encantada à espera de alguém, desditoso nos amores, que fosse capaz de obter o seu desencantamento. É por isso que, nas raras manhãs estivais de nevoeiro, ao subir o monte da Senhora da Piedade, se algum apaixonado encontrar uma velha manta cheia de figos, deve apanhá-los. Se qualquer deles se transformar em libra de oiro, a jovem moirinha recuperará a liberdade. Só quem possuir um espírito puro o conseguirá. E como a ninguém aconteceu algum figo se transformar em oiro, a linda princesa aguarda um novo e intrépido cavaleiro que a liberte do encantamento e a devolva às terras quentes do seu querido Algarve. Fonte: GRÁCIO, Joaquim – Monografia de Sanfins do Douro, Alijó, Câmara Municipal de Alijó, 1990, p.53.

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8 – [Os figos da princesa moura] Conta-se que no tempo em que os mouros habitavam esta região, a filha de um rei mouro foi encantada por uma bruxa má que a tornou invisível por muito tempo. Até que um dia um homem, quando vinha de trabalhar no campo, que ficava num lugar chamado Ribeirinhos e costumava atravessar por um atalho que fica por trás da Senhora da Piedade [Sanfins do Douro], reparou numa rocha que estava cheia de figos. Por momentos ficou confuso, porque não era tempo de figos. Passada a confusão, resolveu pegar num punhado deles, meteu-os ao bolso e foi para casa. Mas o espanto dele ainda foi maior quando chegou a casa e quis mostrar os figos à mulher. Ao meter a mão ao bolso, em vez de figos apareceram libras em ouro. O homem correu até à rocha para apanhar mais libras, mas quando lá chegou já não havia mais nada. E de repente ouviu uma voz que lhe disse: – Tivesse-los levado. Agora já não há mais. Ele então vira-se, e vê uma menina muito bonita com lágrimas nos olhos. Fonte: Jornal Notícias da Pequenada, Escola do 1º Ciclo de Sanfins do Douro, Alijó, Março de 1998.

9 – A moura do monte do Piolho Reza uma lenda antiga que, numa gruta escondida no denso pinhal do monte do Piolho, concelho de Alijó, encontra-se uma princesa moura encantada, que guarda um valioso tesouro e aparece em todas as noites de S. João, logo após a meia noite. Diz-se que é vista sob a forma de serpente tenebrosa, e que ali aguarda desde sempre que um homem de coragem a vá resgatar ao encanto a que está sujeita. O homem que conseguir voltar as costas ao medo e, numa dessas noites, esperar pela chegada da serpente e a beijar quebrar-lhe-á o encanto, casará com ela e ficará com todo o seu tesouro, que é composto por muito ouro e muitas jóias. Um dia um homem das redondezas, cansado de viver pobre e desejoso de casar com a princesa, encheu-se de coragem e disse para os seus vizinhos: – Quem lá vai sou eu, e haveis de ver se trago ou não trago essa tal moira! Todos lhe disseram para não ir, pois isso era perigoso. Se nunca ninguém tinha conseguido ver a princesa moura, porque havia, logo ele, de o conseguir? O homem fez orelhas moucas aos conselhos que lhe deram, e lá foi numa dessas noites de S. João. Primeiro levou algum tempo a procurar a gruta, e, quando a descobriu, esperou que chegasse a meia noite. Nessa altura, apareceu-lhe a serpente

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que lhe subiu pelo corpo acima até ao rosto. Porém, o homem não chegou a beijá-la. Apanhou tamanho susto, que fugiu dali a sete pés, ficando mudo para o resto da vida. Não conseguiu, por isso, contar a ninguém o que quer que fosse sobre a princesa, ou sobre o tesouro. Diz-se ainda que outros o tentaram também ao longo dos tempos, mas que, ou morreram de susto, ou ficaram cegos ao depararem com a serpente, e, por isso, o mistério lá continua. Fonte: PARAFITA, Alexandre – O Maravilhoso Popular – Lendas. Contos. Mitos., Lisboa, Plátano Editora, 2000, p. 165.

10 – Lenda da Anta da Chã Em tempos muito antigos existiu no lugar da Chã, concelho de Alijó, um povo de mouros que, segundo a tradição popular, deixou o seu vestígio numa anta ou dólmen, sendo denominado aquele sítio como "Fonte Coberta". Conta-se que uma jovem moura casou por amor contra a vontade do seu pai, um rei mouro. E por isso pagou caro a sua desobediência, sendo obrigada a trabalhar para sustento da sua família e a construir, sozinha, a sua casa. Foi ela que carregou as pedras da anta à cabeça, e ao colo levava o seu filho ainda bebé. Diz-se que, em noites de luar, ainda há quem ouça os ais da jovem moura a carregar enormes pedras. Fonte: Inf.: Maria Fernanda M. Cardoso Dias, 51 anos; rec.: Alijó, 2001

11 – Lenda da Pala Moura Na manhã de S. João dizem que as mouras aparecem com todos os seus tesouros em frente da Pala Moura, em Carlão, concelho de Alijó, estendendo-se ao sol, para ver se cativam alguém da aldeia que as vá libertar do encanto em que se encontram. Fonte: Inf.: Manuel Carvalho, 70 anos; rec.: Carlão, Alijó, 1999

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Concelho de Boticas

12 – [Os mouros do castro de Sapiãos] O castro de Sapiãos, chamado também “Casas dos Mouros”, fica cerca de 400 metros adiante de Sapiãos [concelho de Boticas]. Corre na tradição que os mouros daquele castro apedrejavam os cristãos quando por ali passavam a caminho da igreja românica de S. Pedro, que fica na margem direita do rio Terva, e a uns 500 metros da base do castro. Fonte: COUTO, Artur Monteiro do – Património Histórico de uma Aldeia Transmontana – Sapiãos, Boticas, C. Municipal de Boticas, 1998, p. 17.

13 – Lenda da moura a cantar A Srª Delfina da Rua disse que a sua amiga Isabel Roseira, que já morreu há muitos anos, ia um dia com as ovelhas e, no sítio da Pedreira, junto do monte do castro de Nogueira [em Bobadela, concelho de Boticas], viu uma moura, toda vestida de branco, a cantar em cima dum penedo. Cantava tão bem e tão lindamente que era um encanto ouvi-la. Quando a Isabel se aproximou, para a ver mais de perto e melhor a ouvir cantar, a moura deixou de cantar e desapareceu. Fonte: MIRANDA JÚNIOR, Avelino; SANTOS, Joaquim Norberto; SANTOS JÚNIOR, Joaquim R. – Castros do Concelho de Boticas - II Campanhas de 1984 e 1985, Boticas, Câmara M. de Boticas, 1986, p. 17.

14 – Lenda do Cobriço Um rapaz que à meia noite vinha da Quintã, ao passar junto do monte do castro de Nogueira, ouviu a voz de uma moura que lhe disse: – Vou aparecer-te na forma dum cobriço muito grande. Vou subir por ti acima até aos ombros e vou dar-te um beijo, mas não tenhas medo: ganharás o tesouro. Tens de me fazer sangue e não falarás em Deus. Espera um pedaço.

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O rapaz, cobiçoso de haver à mão o tesouro prometido pelo falar de moura, parou e aguardou que aparecesse o cobriço. Quando apareceu o cobriço, era um cobrão tão grande e fazia tanto barulho que o rapaz tomado de espanto e apavorado com o tamanho do bicho, não se conteve e, aflito, disse: – Ai, Jesus! Naquele mesmo instante o cobriço desapareceu e, com ele, lá se foi o tesouro, que continua encantado no castro de Nogueira. Fonte: MIRANDA JÚNIOR, Avelino; SANTOS, Joaquim Norberto; SANTOS JÚNIOR, Joaquim R. – Castros do Concelho de Boticas - II Campanhas de 1984 e 1985, Boticas, Câmara Municipal de Boticas, 1986, pp. 17-18.

15 – [A moura, as palhas e o ouro] A uma rapariguinha que levou as vacas a pastar ao Côto dos Mouros [em Vilarinho Seco, concelho de Boticas] apareceu-lhe um moura. Chegou-se à fala com um pucarinho na mão e pediu-lhe se lho enchia de leite. A rapariguinha pousou uma cestinha onde tinha trazido a merenda e prontamente mugiu uma vaca e encheu o púcaro de leite. A moura, em paga do leite, encheu-lhe de palha a cestinha da merenda, recomendando que só abrisse a cesta em casa, e que muito teria que lhe agradecer. A rapariguinha, cheia de curiosidade, na primeira volta do caminho, mal deixou de ver a moura, abriu a cesta e, desejosa de ver o que poderia estar por baixo da palha, foi atirando fora a palha aos punhados. Como nada viu, fez mau juízo da moura. Quando chegou a casa contou tudo o que passara com a moura e mostrou a cesta onde tinham ficado algumas palhas. Espanto da mãe e da filha: as palhas tinhamse transformado em ouro5. Fonte: MIRANDA JÚNIOR, Avelino; SANTOS, Joaquim Norberto; SANTOS JÚNIOR, Joaquim R. – Castros do Concelho de Boticas - II Campanhas de 1984 e 1985, Boticas, Câmara Municipal de Boticas, 1986, pp. 53-54.

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Narrativas idênticas são referenciadas a propósito dos vizinhos castros de Nogueira, em Bobadela, e dos Corvos, em Ardãos, no mesmo concelho, variando apenas alguns dos motivos: em vez das vacas, ovelhas; em vez das palhas, pedaços de carvão (Miranda Júnior, et al., 1986: 18-19 e 74). Aliás, este género de relatos, com idêntica variação de motivos, é comum a outras zonas da Região.

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16 – [A moura a catar os piolhos] Conta-se que um dia, um cristão viu de longe uma moura a catar os piolhos na cabeça do pai [na zona do castro dos Corvos, em Ardãos]. Uns cristãos de instintos maldosos, sem no entanto a lenda explicar a razão daquela maldade, foram-se aproximando cautelosamente, rastejando por entre o mato. A pobre da mourinha, ao ver o mato a abalar, mal teve tempo de dizer ao pai "a urze venteja", pois imediatamente foram mortos o pai e a filha. Fonte: MIRANDA JÚNIOR, Avelino; SANTOS, Joaquim Norberto; SANTOS JÚNIOR, Joaquim R – Castros do Concelho de Boticas - II Campanhas de 1984 e 1985, Boticas, Câmara Municipal de Boticas, 1986, pp. 74-75.

17 – [O Côto dos Corvos] Outra lenda (...) foi-nos dita pelo Sr. António Afonso Fernandes, de 73 anos, e residente na aldeia de Alturas de Barroso. Esta é da guerra com os mouros do Castro de S. Romão. Os do Castro dos Corvos "puseram luzes nos cornos das cabras" e com o luminoso rebanho avançaram de noite sobre o Castro de S. Romão, que fica na base da encosta a sul e perto da Barragem de Pisões. Claro que os do Castro de S. Romão fugiram apavorados. O mesmo Sr. António Afonso Fernandes informou que três homens da aldeia das Alturas foram ao Côto dos Corvos com o livro de S. Cipriano. Em dada altura da leitura "apareceu o encanto em forma de boi" que os fez prontamente fugir, aterrados. Fonte: MIRANDA JÚNIOR, Avelino; SANTOS, Joaquim Norberto; SANTOS JÚNIOR, Joaquim R – Castros do Concelho de Boticas - II Campanhas de 1984 e 1985, Boticas, Câmara Municipal de Boticas, 1986, p. 75.

18 – Ponte da cerca do castro Em tempos muito antigos, os mouros pretenderam fazer uma ponte de pedra da cerca do castro [de Carvalhelhos, concelho de Boticas] para a encosta ou ladeira do Coriçal, onde há os "fornecos dos mouros" e as mamoas. É tradição que neles os mouros coziam o pão.

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Pois bem: tal ponte nunca se pôde fazer, pela razão simples de que a gente de Carvalhelhos ia lá de dia e deitava abaixo tudo o que os mouros tinham construído de noite. A pertinácia destruidora da gente de Carvalhelhos manteve-se firme e os mouros tiveram de desistir do intento. Fonte: SANTOS JÚNIOR, J.R. – O Castro de Carvalhelhos, Porto, Instituto de Antropologia da Universidade do Porto, 1957, p. 51.

19 – Tenda das lameiras do castro Conta-se que, em tempos muito antigos, nas lameiras da base do castro [de Carvalhelhos, concelho de Boticas], andava uma rapariga a pastar o gado quando viu uma tenda muito bonita com muitos objectos de ouro. Brincos, anéis, cordões e arrecadas eram em tal quantidade que metia espanto. Nessa tenda, espécie de lojinha, estava uma velhinha que pediu à rapariga uma panela de leite. Se lha trouxesse, em paga lhe daria toda aquela riqueza. Deslumbrada, a rapariga não teve perna manca e foi a casa buscar uma panela de leite que a velhinha teria bebido com boa sede e grande aprazimento. Em paga encheu a panela de qualquer coisa que a rapariga não pôde ver o que era. Ao entregar-lha disse-lhe que até casa não visse o que a panela tinha. A meio do caminho, porém, a curiosidade levou a rapariga a destampar a panela. Foi enorme o seu desapontamento ao ver singelíssimos carvões, que foi deitando fora. Em casa desabafou com a mãe. A velhinha prometera-lhe a riqueza toda e, no fim de contas, dera-lhe apenas carvões que ela arremessara indignada. A mãe podia certificar-se: ainda restavam dois ou três no fundo da panela. A mãe foi ver a panela e verificou, espantada, que os bocados do carvão de sobejo se haviam transformado noutras tantas magníficas libras em ouro. Mãe e filha apressaram-se a percorrer o caminho em busca do carvão que a filha levianamente arremessara. Nada encontraram. Dos carvões, da tenda e da velhinha, nem o menor vestígio. A minha informadora rematou: "A rapariga depois bem se arrepelava derretida em lágrimas, mas já de nada lhe valia". A curiosidade, atributo bem feminino, fizera com que ela perdesse tanta riqueza. Fonte: SANTOS JÚNIOR, J.R. – O Castro de Carvalhelhos, Porto, Instituto de Antropologia da Universidade do Porto, 1957, p. 52.

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Concelho de Bragança

20 – [Ladeira do Pingão] Na ladeira do Pingão, no termo de Espinhosela [concelho de Bragança], há um tesouro encantado [de que a moura é guarda], que só pode ser desencantado, isto é descoberto, pelas cabras a arranhar a terra. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, p. 492.

21 – [A moura, metade homem e metade cabra] No vale de Sio, termo de Parada de Infanções [concelho de Bragança], saiu uma moura encantada, metade homem e metade cabra, a um tal António Alves, dizendo-lhe: – Anda cá, António Alves, que levarás para ti, filhos, netos e tetranetos. Mas o homem assustou-se, fugiu e o encanto sumiu-se. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, 493.

22 – [O tesouro do castro de Caravela] No termo de Caravela, concelho de Bragança, para a parte do poente, nas vizinhanças de uma pequena ribeira, acham-se vestígios de uma fortaleza, que segundo a tradição é do tempo dos mouros. É o castro de Caravela (...). Diz a lenda que neste castro há um grande tesouro, constituído por um tear de oiro enterrado no ponto onde bate primeiro o sol na manhã de São João. Mas como o cabeço onde está o castro é banhado todo ao mesmo tempo, seria preciso revolver tudo e ninguém se atreve a tanto. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, pp. 142-143.

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23 – [A fonte do Castro de Baçal] O sítio do termo de Baçal, concelho de Bragança, chamado Castro, fica no extremo norte do mesmo, um quilómetro do povoado, a despenhar-se para o rio Pepim, que lhe corre aos pés a duzentos metros de profundidade, talhado quase a prumo. (...) Cem metros abaixo fica a Fonte do Castro, de boa água, que rega uma pequena horta, na qual, segundo a lenda, está uma moura encantada, por alguém já vista nas manhãs de S. João a pentear-se com pentes de ouro ou pressentida nas mesmas manhãs, antes do sol-nado, a tecer em tear de ouro. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Porto, vol. IX, 1934, pp. 122-123

24 – A moura encantada no fundo de um poço Uma vez três amigos souberam que estava uma moura encantada no fundo de um poço [em Rio de Onor, concelho de Bragança] e resolveram ir desencantá-la. O primeiro desceu num cesto, mas a certa altura era tal a escuridão que ele tocou a campainha e os outros puxaram-no cá para fora. O segundo foi mais fundo, mas eram tantos os mosquitos que ele também tocou e foi içado. O terceiro disse que se tocasse era para o descerem ainda mais. Quando ia a meio viu-se muito aflito, mas por mais que tocasse, os outros iam-no sempre descendo. Por fim, chegou ao fundo e encontrou uma linda moura encantada, que lhe disse: – Ó homem, tu que fizeste? Tu estás perdido! O diabo é quem me guarda, e ele vem aí já e mata-te! Olha, ele vai desafiar-te para um duelo e mostrar-te espadas muito lindas e uma feia. As lindas são de vidro e tu deves pegar na outra. Assim sucedeu. O diabo apareceu e, cheio de fúria, desafiou o homem para um duelo. O homem pegou na espada ferrugenta que era a de ferro, enquanto que o diabo teve de ficar com a de vidro. Vai o homem e zás, cortou uma orelha ao diabo, que deu um berro e deitou a fugir. A moura ficou toda contente e disse: – Bem, já estamos livres dele, agora somos livres! Mas o homem não sabia o que havia de fazer. Então a moura disse: – Tu tens aí a orelha dele e desde que a mordas tens tudo quanto queiras.

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O homem mordeu a ponta da orelha e logo lhe apareceu o diabo a perguntar o que é que ele queria. Ele disse que queria que os tirasse dali para fora. Logo baixaram o cesto os companheiros e a moura subiu. Mas mal esta chegou lá acima, estes ficaram com ela e deixaram o companheiro sozinho no fundo do poço6. Fonte: DIAS, Jorge – Rio de Onor – Comunitarismo Agro-Pastoril, Lisboa, Ed. Presença, s/d, p.172.

25 – O castelo de Rebordãos Versão A:

Diz a tradição que este castelo [situado no concelho de Bragança] fora mansão de um régulo mouro, a quem as povoações pagavam de tributo certo número de donzelas; e aponta-se, em confirmação, para o lameiro da vela acesa, que fica perto, ao lado, porque foi nele que uma serva colocou, altas horas da noute, uma vela acesa, sinal da traição para com seu amo e de aviso, para avançar, aos inimigos que queriam dar morte, como deram, ao exactor de tão negro tributo. (...) Notável é que, para perpetuar o facto, não se haja erguido sobre essas ruínas uma capela ou ermida dedicada à Virgem, por intervenção da qual os guerreiros ressuscitavam para continuarem a luta em defesa da virgindade ofendida. Versão B:

Dois quilómetros a noroeste de Rebordãos [concelho de Bragança], caminhando para o santuário da Senhora da Serra, sito no cume da Serra da Nogueira, distante quilómetro e meio, fica o local chamado Castelo de Rebordãos, constituído por enormes fragueiros, apenas acessível pela nascente sul. Apresentando os outros dois lados uma rampa a pique de mais de quatrocentos metros. (...) Vivia neste castelo um potentado mouro, a quem as povoações limítrofes pagavam o tributo de certo número de donzelas para o seu harém; mas uma delas, certa noite, quando ele dormia, deu sinal, segundo combinara, colocando uma vela acesa no prado, ainda hoje, por isso, chamado da Vela Acesa, e o régulo foi atacado, morto, o castelo destruído e as donzelas libertas. Versão C (O rei mouro e a pipa dos pregos):

Num morro próximo de Rebordãos, concelho de Bragança, há um castro arruinado conhecido como o “castelo dos mouros”, onde, há muitos e muitos anos, viveu um rei mouro que subjugava pela força toda a população das redondezas. Quanto às moças, antes de serem possuídas por qualquer homem, eram obrigadas a frequentar o seu harém e satisfazer os seus prazeres. 6

Jorge Dias acrescenta ao texto a indicação de que “a história devia ter continuação, mas [os informantes, não indicados] não sabiam mais”.

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Um dia, uma jovem cristã, irmã do famoso Conde de Ariães, tendo-se recusado a seguir este destino, foi raptada pelo rei mouro e levada para o castelo. Aí, o tirano tentou fazê-la ceder aos seus desejos, e, como ela continuasse a recusá-lo, o rei mandou buscar uma pipa e cravejou-a de pregos de fora para dentro, a fim de meter a moça lá dentro e pô-la a rolar pela encosta do morro abaixo. O Conde de Ariães, ao saber do rapto, conseguiu chegar ao alto do morro, no momento em que o rei se preparava para lançar a pipa no despenhadeiro. Travou uma luta com o tirano, venceu-o, e, por castigo, meteu-o a ele dentro da pipa, mandando-a pela encosta abaixo. E assim o povo se libertou, de vez, do jugo dos mouros. Versão D (O Prado da Vela Acesa)

Perto da aldeia de Rebordãos, no concelho de Bragança, existia um castelo onde vivia um rei mouro muito poderoso, que obrigava as povoações vizinhas a pagarem, como tributo, um certo número de donzelas para o seu harém. Uma das donzelas, que era muito corajosa, não aceitou ser sujeita a tal infâmia, e combinou um estratagema com o povo para matarem o rei mouro. Assim, pela calada da noite, enquanto ele dormia, a donzela saiu do castelo e foi acender uma vela no lugar que tinham combinado, que era um lameiro próximo. E ao sinal da vela acesa, o povo armado deslocou-se ao castelo a fim de matar o rei. Depois de morto o rei, o castelo foi destruído e as donzelas foram libertadas. E o lugar onde foi colocada a vela ainda hoje é designado como o "Prado da Vela Acesa", havendo quem o conheça também como o "Lameiro da Talvela". Fonte – versão A : LOPO, Albino Pereira – "O castelo de Rebodãos", in O Arqueólogo Português, vol. 3, n.ºs 5 e 6, Lisboa, 1897, pp. 116117. Fonte – versão B: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Porto, vol. x, 1934, pp. 8-9. Fonte – versão C: Inf.: Virgílio do Vale, 59 anos; rec.: Vila Boa, Vinhais, em 2000. Fonte – versão D: Inf.: Maria José Santos Salgueiro, 35 anos; rec.: Bragança, 2000.

26 – [O Cabeço da Velha] Na base poente do Cabeço da Velha [em Labiados, concelho de Bragança], junto à margem do rio Contense, sítio chamado Rachas, fica a Pala dos Mouros, também dita Pena Veladeira, sob a qual há uma gruta, a pala no dizer do povo, que pode acobertar um rebanho de quarenta ovelhas (...) Pelos anos de 1860 foram desencantar a riqueza do Cabeço da Velha uns quantos sonhadores de tesouros, naturais de Baçal e Sacoias, acompanhados de um padre e de uma bruxa (...). Ainda conheci o padre, a bruxa (tia Martinha, de Sacoias) e os homens o tio Vicente e o tio Nicolau, aquele de Sacoias e este empregado na máquina de destilação de vinhos de Baçal.

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O padre era natural de Baçal, onde faleceu em 1892, e muitas vezes me contou o caso. Ele lia, lia no Livro de S. Cipriano, o autêntico, um códice antigo, manuscrito, se bem me recordo, pois os modernos, impressos, nada valem, dizia ele, e exorcismava sem cessar (é também condição indispensável), metido dentro de um pentalfa inscrito num círculo que traçou no terreno, do qual não podia sair, sob pena de ficar tudo sem efeito; a bruxa, dentro de um signo Salomão, fazia conjuros e deitava as varinhas do condão e os homens cavavam, cavavam, sem parar e calados. Tudo corria admiravelmente, indicando que o tesouro estava prestes a sair. Neste comenos surge na escavação um sapo enorme, colossal (era o diabo, guarda do tesouro), a abrir e fechar a boca, num gesto de os papar a todos. Os homens aterram-se, o padre recua um pouco, saindo do círculo, a bruxa faz o mesmo e de repente a trincheira esboroa-se, apanhando o Nicolau pelas pernas; o tesouro, uma enorme bola de oiro, maior que a roda de um carro, reginga pela ladeira abaixo, até se esfrangalhar no rio, sentindo-se nitidamente o tilintar do oiro nos fraguedos e lajes das margens, e um medonho tufão arrasta os sonhadores, por cima de carrascos e fraguedos, a muitos metros de distância, deixando-os assaz maltratados e sem poderem regressar a casa no mesmo dia ou só muito tarde. A bruxa, porém, foi vista logo em Sacoias, sã e escorreita, com a cantarinha debaixo do braço a ir buscar água à fonte. É sempre assim! O tesouro lá está, dizem os da carolice; falta, porém, a coragem precisa para o desencantar. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Porto, vol. IX, 1934, pp. 631-632

27 – [O Picadeiro dos Mouros] Um pouco abaixo da Pena Veladeira [em Labiados, concelho de Bragança], no sítio chamado Vale de Madeiro, no cume de um cabeço, há uma esplanada a que chamam Picadeiro dos Mouros, pois segundo a lenda, era ali que iam exercitar os cavalos. Um outro tesouro encantado está logo ali ao pé no sítio chamado Penados. Na Pena Veladeira haviam gravado um corvo, que muita gente diz ter visto, e, segundo a mesma [lenda], o corvo estava voltado na direcção do tesouro e a olhar para ele, mas os galegos destruíram-no ao arrancar a panela de dinheiro que lá estava. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Porto, vol. IX, 1934, pp. 632-633

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28 – [O Vale da Moura] Há no termo desta povoação [Pinela, concelho de Bragança] um cabeço que apresenta restos de fortificações, compostos de muros, fossos, etc. Chama-lhe Castelo de Avelina (...) Encerra grandes tesouros guardados por uma moura encantada. (...) O povo tem má fé com as trovoadas vindas do Vale da Moura, sítio perto do Castelo de Avelina, porque – diz ele – são pavorosas em granizo e pedra destruidora das searas. Deste castelo partia uma galeria subterrânea por onde os mouros iam levar os cavalos a beber a um regato distante. Também lhe aplicam a lenda do tributo das donzelas. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Porto, vol. IX, 1934, pp. 149-150.

29 – Lenda de S. Pedro de Sarracenos Diz a tradição popular que o actual termo de S. Pedro, no concelho de Bragança, foi, noutros tempos, habitado pelos sarracenos, ou mouros. E que, quando veio a reconquista, os cristãos investiram contra eles para os expulsarem. A batalha deu-se em "Oliveiras do Bispo", um sítio que ainda hoje tem esse nome. Conta-se que, durante a luta, os cristãos tinham com eles a imagem de S. Pedro, que era o seu padroeiro. E que, de repente, tanto os mouros como os cristãos ficaram imobilizados e depuseram as armas. Não chegou a haver vencedores, nem vencidos. Tanto os cristãos como os mouros encararam isso como um milagre de S. Pedro. E que era vontade deste santo não continuarem a batalha. Passaram por isso a viver em paz e coabitar a mesma terra, que passou a chamar-se S. Pedro de Sarracenos. Fonte: Inf.: António João, de 81 anos; rec.: S. Pedro de Sarracenos, Bragança, 2001.

30 – A Fonte da Moura de S. Julião Na aldeia de S. Julião, concelho de Bragança, havia uma fonte conhecida como a "Fonte da Moura" e também lhe chamavam "Fonte de Cima da Trembla", pois situava-se no cimo de uma lameira com esse nome.

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Dizem as pessoas de idade que à meia noite era costume ouvir-se ali tecer um tear. E que numa madrugada de S. João, uma mulher foi à fonte e entrou-lhe a ponta de um cordão para o cântaro. Ela pegou nele e começou a dobar até fazer um novelo grande, tão grande que já não lhe cabia nas mãos. E como só com muita dificuldade conseguia dobar mais, resolveu partir o cordão. Nesse mesmo instante o novelo desapareceu-lhe das mãos, e ouviu uma voz que disse: – Marota, que me encantaste para toda a minha vida! E o tear então nunca mais se ouviu. Dizem que a voz era de uma moura encantada. Se a mulher não tem partido o cordão, a moura teria aparecido na figura de serpente e não fazia mal a ninguém. Bastaria que a mulher lhe tivesse deitado um pouco de saliva na cabeça para ela ficar desencantada e em figura de uma jovem muito bonita. E traria com ela toda a sua riqueza. Fonte: Inf.: Raquel de Lassalete Vaz Rodrigues, 52 anos; rec.: Bragança, 2000.

31 – Lenda de Santa Colombina de Gimonde Há muito, muito tempo, havia uma jovem chamada Colombina, que era filha de um rei mouro, e que foi pedida em casamento por um cavaleiro rico. O pai ficou muito satisfeito e não hesitou em conceder-lhe a mão da jovem. Porém, Colombina ficou aflita, porque, sem o pai saber, estava prometida a Jesus Cristo. Assim, não podia aceitar o casamento acordado por seu pai, e não podia também dizer-lhe as razões do impedimento. Resolveu por isso fugir. Andou muito tempo fugida, correndo sem destino, até que chegou a uma terra chamada Gimonde (situada no concelho de Bragança). E em sua perseguição vinha o noivo. Atormentada e já sem forças, a jovem pediu ajuda a uma fraga que encontrou junto à aldeia: – Abre-te fraga, que serás a minha morada! E o milagre deu-se. A fraga abriu-se, Colombina escondeu-se dentro, e ali passou a viver. Mais tarde apareceu a uma mulher que ia a passar, pedindo-lhe para construírem, naquele local, uma capela. O pedido foi aceite e o povo construiu a capela, que hoje lá existe. E Santa Colombina continua a ser ali muito venerada pelo povo, especialmente pela mocidade. Fonte: Inf.: Raquel de Lassalete Vaz Rodrigues, 52 anos; rec.: Bragança, 2000.

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32 – A lenda do Conde de Ariães Num castelo que havia além naquele cabeço, entre Bragança e o Castro de Avelãs, vivia o Conde de Ariães. Naquele tempo só havia ali o castelo e pouco mais. E aqui, em Castro de Avelãs, havia um convento de monges. O Conde de Ariães vivia no castelo com a sua mãe, e tinham lá também uma moça – Alcina era como se chamava – com quem ele andava para casar. Nessa altura, na Serra da Nogueira havia outro castelo e também outro conde. Chamava-se Conde Redemiro. Mas era uma pessoa diferente. Era mau. Tão mau que até exigia umas sete ou oito donzelas todos os anos para o castelo dele, para as ter lá ao seu dispor. E tinha muitos ciúmes pela moça do Conde de Ariães. Bem lha queria roubar, mas não podia. Ora, certa ocasião o Conde de Ariães foi para uma batalha. E quando regressou ao castelo já não encontrou a noiva. A mãe tinha-a deixado raptar numa noite, quando vieram uns, a mando do Conde da Serra da Nogueira, e varreram com ela. E para onde? Para o castelo do Conde Redemiro. O Conde de Ariães ficou tão aborrecido com a sua mãe que lhe soltou os leões. E como ela era uma velha, sem forças, já se está a ver o que lhe aconteceu. Desfizeram-na. Mais tarde ele arrependeu-se. E foi então pedir aos monges do mosteiro do Castro de Avelãs que lhe dissessem que castigo deveria receber por ter deixado que a mãe fosse devorada pelos leões. E o que lhe disseram eles? Que criasse uma cobra que depois o devorasse também a ele, tal como deixou devorar a mãe. Ele assim fez. Criou uma cobra e sepultou-se com ela num túmulo que ainda hoje existe. E ali foi devorado. Quando o Conde estava já no túmulo, travou-se uma batalha entre cristãos e mouros na Serra da Nogueira, onde os cristãos mataram o Conde Redemiro, com a ajuda de uma criada que ele lá tinha, e ganharam a batalha. E logo libertaram a moça, a Alcina. Ela fugiu então para o castelo de cá. Só que quando chegou já o conde estava sufocado. Mas ainda travaram palavras, até que ele morreu. E com o desgosto, a moça morreu junto dele. Dizem também que os ais dela eram tão grandes, que se ouviam nas terras ao redor. E uma dessas terras ficou até com o nome "Grandais", por causa dos grandes ais que se ouviam. O túmulo do conde está no mosteiro de Castro de Avelãs, onde viveram durante muito tempo os monges beneditinos7. Fonte: Inf.: Lúcia Gonçalves, de 75 anos; rec.: Castro de Avelãs, Bragança, 2001.

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No muro do adro deste mosteiro estão igualmente representados em pedra os leões que devoraram a idosa. Um deles está sem cabeça, o que, na tradição popular, também é justificado: foi o conde quem lha cortou após se arrepender do que aconteceu à sua mãe.

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33 – Lenda dos Sete Infantes de Lara Há muitos e muitos anos, houve na aldeia de Parada [de Infanções], concelho de Bragança, uma mulher, chamada Dona Sancha, que teve sete filhos de um só ventre. E viu-se tão envergonhada com isso8 que combinou com a criada para que lhe fosse afogar seis, tendo escolhido um para criar. Quando a criada ia com os meninos metidos numa canastrinha a caminho do rio, encontrou o patrão, o famoso Conde Gonçalves, que andava à caça. Ao vê-la, perguntou-lhe: – Que levas nessa canastrinha? E a criada respondeu: – Levo cãezinhos de uma cadela que pariu lá em casa. A senhora apenas quis um e mandou afogar estes. Diz-lhe então o Gonçalves: – Pois não quero que os afogues. Volta para casa com eles e diz à senhora que fui eu que mandei. A criada alterou-se contra o patrão, e não lhe queria obedecer. Dizia que eram ordens da patroa. E essas é que valiam. Então o conde, mais arreliado ainda, tira-lhe a canastrinha das mãos e vê lá os meninos. E diz-lhe: – Valha-me Deus, mulher, que isto é parte do meu coração! E assim o conde salvou os filhos. Mandou então a criada embora, dizendo-lhe que guardasse segredo junto da patroa. Que ele faria igual. A seguir foi espalhar os seis irmãos pelas aldeias das redondezas9, para que lhos criassem. Quando atingiram a idade de sete anos, resolveu juntá-los novamente e apresentá-los à mãe. Vestiu-os todos de igual e meteu-os numa sala, juntamente com o que ela tinha. Depois chamou a mulher e disse: – Vai visitar o teu filho. E vê se o reconheces entre os demais. Mal a mulher olhou para eles, caiu redonda no chão, desmaiada. Quando acordou pediu perdão ao marido e aos filhos e passaram a viver unidos e felizes. Os anos correram e, num certo dia, o Conde Gonçalves, a mulher e os sete infantes, foram convidados pelo Rei Blasques10, para o casamento de uma filha. Como eram família, lá foram então ao casamento. E quando estavam na festa, um dos sete infantes, que era o mais brincalhão, atirou uma pulha à noiva. Ela não gostou e foi 8

Havia outrora a crença de que uma mulher só poderia gerar um filho de cada vez. De contrário, estaria a denunciar uma relação havida com mais do que um homem. Assinale-se a semelhança deste relato, na sua fase inicial, com a lenda de Maria Mantela, narrada na tradição oral da zona de Chaves. 9 Segundo a tradição, foram criados nas aldeias de Vila Boa, Pinela, Paílhe, Carocedo, Paredes e Grijó 10 Comparada esta lenda com versões que correm em Espanha, este nome, aqui transcrito tal como é pronunciado na tradição oral popular transmontana, corresponde a Velásquez, de Rui Velásquez. Da mesma forma, que Gonçalves corresponde a Gonzalo Gustios, o famoso conde de Lara.

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queixar-se ao rei, pedindo-lhe vingança. E o rei para se vingar resolve esperar por melhor ocasião. Dali a dias, mandou o Conde Gonçalves com uma embaixada ao rei mouro. Fez uma carta, fechou-a, e disse ao conde que fosse levá-la a Córdova, ao rei mouro. E que esperasse pela resposta. O conde assim fez. Levou a carta, só que não sabia o que ela dizia. Por isso não lhe passava pela cabeça que a carta o denunciava como traidor. E que pedia ao rei mouro que castigasse o mensageiro com a morte. O rei mouro, ao ler a carta. mandou logo encerrar o Conde Gonçalves nas masmorras, esperando mandá-lo matar na hora própria. Entretanto, o tempo passou, e, como o conde nunca mais regressava a sua casa, os sete irmãos, desconfiando que tivessem feito mal a seu pai, foram lá para o resgatar. E travaram uma batalha, sozinhos, contra quinze mil mouros. Uma batalha que não puderam vencer. Acabaram todos eles mortos e degolados. Depois o rei mouro mandou pôr as sete cabeças numa bandeja e deu ordens para que as levassem às masmorras, ao pai dos infantes. A vida do Conde Gonçalves, depois disto, foi terrível no cativeiro do rei mouro. Valeu-lhe uma filha deste que, sabendo do sucedido, teve pena do prisioneiro e afeiçoou-se a ele. Às escondidas do rei, a jovem protegeu-o como pôde. E um dia disse-lhe: – Se negares a tua religião e professares a minha, posso salvar-te. Ao que o conde lhe respondeu: –Antes sofrer mil mortes! A princesa moura, ao aperceber-se da força tamanha que tinha a fé do prisioneiro, dispondo-se a dar por ela a sua própria vida, ainda se afeiçoou mais a ele. Passou a ser mais que sua protectora. Enamoraram-se. E com isto arranjaram um filho, ao qual puseram o nome Mudarra. Quando ele cresceu e soube a verdade sobre o seu pai e sobre a morte dos seus irmãos, resolve vingar-se, matando o Rei Blasques e outros que com ele colaboraram. Depois, procurou nas masmorras o Conde Gonçalves. Como não o conhecia, perguntou a um homem velho e cego que encontrou: – Há aqui um tal Gonçalves? O velho respondeu: – Eu lhe darei razão dele. Fale-me aqui ao ouvido, e diga-me o senhor quem é. Tornou-lhe então Modarra: – Sou filho duma moura, mas por Gonçalves fui gerado! O velho conde, comovido, abraçou-se ao jovem e disse: – Sou esse que procuras! Modarra tirou o pai da prisão e levou-o para a sua casa em Parada. E ali passou a viver com ele, sob as leis do cristianismo. A casa ainda lá existe. E a aldeia é conhecida como Parada de Infanções, em memória dos sete infantes.11 11

Este relato, tal como aqui se apresenta, é, segundo a nossa informante, apenas o resumo de um auto muito antigo e muito extenso ouvido em criança. Refira-se que a mesma lenda é igualmente conhecida em Espanha, em versões que não só contrariam as preocupações toponomásticas das versões

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Fonte: Inf.: Neuza da Conceição Estevinho, 50 anos; rec.: Bragança, 2001.

34 – A fraga do cavaleiro Há em Freixedelo, no concelho de Bragança, uma fraga a que o povo chama a "Fraga do Cavaleiro". Diz-se que, há muitos e muitos anos, se ouvia ali, nos dias 1, 2 e 3 de Maio, um tear a trabalhar e que aparecia uma menina muito bonita. E que esta menina, depois de aparecer na forma de gente, transformava-se em serpente. Por isso nem todas as pessoas tinham coragem de ir lá. E conta-se que uma vez um cavaleiro famoso não disse nada a ninguém e foi lá nos três dias. Ao terceiro dia, viu então a menina, e a ela se dirigiu. Ela disse-lhe que se ia transformar numa serpente e que, se ele não tivesse medo, ficava muito rico. Mas o cavaleiro, quando a viu transformar-se, teve medo. Dizem que por ter medo lhe dobrou o encanto e, por isso, desde aí nunca mais ninguém a voltou a ver nem ouviu bater o tear. Fonte: Inf.: Maria José Santos Salgueiro, 35 anos; rec.: Bragança, 2000.

35 – Lenda da Fundação de Bragança Versão A:

Bragança, ao tempo circunscrita ao cabeço onde hoje chamam vila, foi abandonada no período da invasão dos Mouros. Conquistada a terra aos usurpadores muitos anos depois, os cristãos voltaram à sua Bragança. Os pastores apascentavam os seus rebanhos num espesso sardoal (o mesmo que carrascal) que se estendia pela planície situada imediatamente a N. do dito cabeço. Aconteceu que um certo dia os pastores foram encontrar a imagem de Nossa Senhora pousada num sardão (ou seja num carrasco). Com toda a devoção a tomaram em suas mãos e levaram-na para o seu povoado onde a recolheram na sua capela. Verificaram, porém, que a imagem voltara para o antigo lugar. Muito admirados com o acontecido, novamente a conduziram para a Capelinha do povo. E mais vezes se repetiu o caso, ao mesmo tempo que se repetiam os milagres que a Senhora fazia a todos aqueles que a Ela recorriam nas suas aflições. Em consequência de tudo isto, transmontanas, como diferem também na relação parental entre personagens importantes. Por exemplo, na versão espanhola que consta na Crónica Geral de Espanha de 1344, estudada por Lindley Cintra, o herói Mudarra não é neto do rei Almançor mas seu sobrinho (apud Pinto-Correia, 2002: 1999). De notar também que, naquele país é, essencialmente, através do romanceiro que este célebre relato é transmitido. Sobre ele se debruçaram, entre outros, Menendez Pidal (1991).

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deliberaram erigir uma Capela no sítio do sardão e ali ficou a imagem de Nossa senhora para sempre, e os habitantes mudaram-se para junto dela, e assim se deu princípio à cidade de Bragança. Versão B (Lenda da Senhora do Sardão):

Há muitos e muitos anos, quando se construiu a igreja de Santa Maria, em Bragança, a cidadela era frequentemente invadida por mouros. Então o povo, como tinha grande devoção por Nossa Senhora, resolveu escondê-la no tronco de um sardão, num sardoal que havia logo por trás do castelo, pois os inimigos podiam roubá-la e destruí-la. Entretanto o tempo foi passando, as pessoas foram morrendo e Nossa Senhora ali ficou escondida. Até que, num certo dia, andava um pastor a guardar o seu rebanho, quando, ao escurecer, viu duas luzinhas que brilhavam ao longe. Ficou muito assustado e foi chamar outra gente para verem o que seria tal coisa. Foram então na direcção das luzinhas e descobriram Nossa Senhora no tronco do sardão. Diz o povo que as luzinhas eram os seus olhos. Fez-se então uma grande procissão para levar a imagem para a igreja de Santa Maria, dentro das muralhas do castelo. Por esta razão, a igreja de Santa Maria ainda hoje é chamada pelas pessoas mais idosos Igreja de Nossa Senhora do Sardão. Fonte – versão A: NETO, Joaquim Maria – O leste do território Bracarense, Torres Vedras, s/ed., 1975, pp. 187-188. Fonte – versão B: Inf.: Maria Emília Alves, 46 anos; rec.: Bragança, 2000.

36 – O cabeço de S. Bartolomeu Dizia-se antigamente que havia no cabeço de S. Bartolomeu, em Bragança, uma mata com grandes fragas, e a maior delas estava rachada de um lado ao outro. Dizia-se que essa fraga, à meia noite, costumava abrir-se e sair de lá uma luz e uma cobra a falar. – Quem quer entrar? Quem quer entrar? Era isto que lhe ouviam dizer. O povo dizia que a cobra era uma moura encantada, mas todos tinham medo de lá ir. Um dia foi lá um homem, a quem chamavam "Maluquinho", e que dizia que não tinha medo a nada. Dizia que se a cobra lhe falasse, então era mesmo uma mulher e ficava com ela. Outros homens seguiramno de longe. Dizem então que viram a fraga a abrir-se e a engolir o "Maluquinho". Nunca mais ninguém deu fé dele. Houve quem acreditasse que, ao entrar lá, quebrou o encanto, ficou rico e nunca mais voltou. Fonte: Inf.: Maria do Carmo Lopes, 39 anos; rec.: Bragança, 2000.

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37 – A Fontela de Candegrelo Conta-se em Grijó, concelho de Bragança, que um homem, que ambicionava ser muito rico, sonhou numa noite que havia um tesouro na Fontela de Candegrelo e que estava lá um figurão12 a guardá-lo. E no sonho também lhe foi dito que o tesouro seria seu se fosse de sua casa até à fontela sempre a ler, na ida e volta, o livro de S. Cipriano, e que bastaria dizer ao figurão onde queria que ele lhe levasse o tesouro. O homem assim fez. Chegou lá, aparece-lhe então o figurão que lhe diz: – Onde queres que te leve o tesouro? – Leva-o à minha quinta. O figurão pegou no tesouro e seguiu-o na direcção da quinta. E o homem lá continuava sempre a ler o livro de S. Cipriano. Acontece que, antes de chegar à quinta, o homem emocionou-se de tal modo por sentir a grande riqueza que sonhara já ali tão perto, que acabou por se enganar na leitura do livro. E ao enganar-se, diz-se que se abriu um grande buraco na terra onde entrou ele, o figurão e o tesouro. Nunca mais o voltaram a ver. Fonte: Inf.: Ana Maria Amaral Faria, 36 anos; rec.: Bragança, 2000.

38 – O bruxo e a moura No cabeço de S. Bartolomeu, em Bragança, deu-se uma grande batalha com os mouros, quando estes iam a abandonar estas terras a caminho do norte de África. Conta-se que ia então um rei mouro com a sua comitiva e que levava grandes tesouros. E com ele ia também a sua filha, uma jovem muito bela. Quando os mouros avistaram os inimigos, o rei escondeu os tesouros em local que só ele conhecia, e preparou-se para a luta. Só que os inimigos eram muitos, pelo que os mouros acabaram por ser derrotados e muitos deles mortos. O rei foi um dos que morreu, mas antes confessou a sua filha onde escondera os tesouros. Quando os inimigos capturaram a jovem e os mouros que sobreviveram, o chefe dos vencedores dirigiu-se à princesa dizendo: –Serás livre se nos disseres onde estão os tesouros. E a jovem respondeu-lhe: – Podes fazer de mim o que quiseres, mas o segredo de meu pai não o terás. 12

O figurão representa, neste comunidade, uma das referências do maravilhoso popular, cuja simbologia harmoniza com o mouro mítico.

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– Se assim é, ficarás aqui prisioneira para sempre – sentenciou o chefe. Palavras tais não era ditas, ouve-se então um grito medonho, que a todos assustou, dizendo: – Prisioneira?! Nunca! Era um bruxo que saiu de entre os mouros cativos, e lançou sobre a princesa uma tal bruxaria que ela se transformou de repente numa asquerosa serpente. E perante os olhos espantados de todos, a serpente escapou-se por entre as fragas e desapareceu. Tanto o bruxo como os mouros foram encerrados nas masmorras, onde apodreceram. Quanto à princesa diz-se que ainda por lá anda, encantada. Fonte: Inf.: Ana Maria Amaral Faria, 36 anos; rec.: Bragança, 2000.

39 – A Cortadura dos Mouros No termo de Gimonde, no concelho de Bragança, há do lado direito do rio Sabor um cabeço com o nome de Monte Guieiro e que faz uma grande cova que é conhecida como “Cortadura dos Mouros”. Diz-se que foram os mouros que a fizeram. Segundo a lenda, os mouros, quando estavam subjugados pelos cristãos, depois da reconquista, apostaram que, em apenas uma noite, faziam passar por ali o rio Sabor. Se o conseguissem, os cristãos não os expulsariam. Tentar, bem tentaram, mas não chegaram ao fim. Diz o povo que se têm mais uma hora ganhavam a aposta. Como não ganharam, tiveram de ir embora. E o corte lá ficou, chamando-se por isso mesmo “Cortadura dos Mouros”. Fonte: Inf.: Francisca Teresa Fernandes Moreno, 47 anos; rec.: Bragança, 2000.

40 – Lenda da moura do Reboledo Perto da aldeia de Santa Comba de Rossas, concelho de Bragança, existe um altinho denominado Reboledo, coroado por um amontoado de rochas. Conta a lenda que havia lá um encanto que costumava aparecer a um rapaz que era pastor. E que esse encanto tinha a forma de uma velha muito feia que lhe comia a merenda. Um dia o rapaz, farto de ficar com forme, pensou: "Hoje não me comes a merenda, pois vou pró Picoto!" E assim fez. Só que também ali a velha lhe apareceu. Desta vez, porém, ela trazia às costas um grande cesto repleto de boa comida e ofereceu-lho. O moço não quis saber de mais nada. Atirou-se ao farnel com quantas barrigas tinha. Então a velha contou-lhe:

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– Sou uma donzela e estou encantada no Reboledo. Vem até lá, ao sítio onde está uma cruz, faz um sino saimão e mete-te lá. Hão de aparecer-te muitos bichos. A cobra sou eu. Se lhe deres um beijo quebras-me o encanto e ficarás rico. O rapaz disse-lhe logo que sim. Mas ao chegar a hora e ao ver tantos bichos... ah pernas! E nunca mais lá voltou com o gado. Fonte: Inf.: Maria Antónia Machado Ferro, 77 anos; rec.: Santa Comba de Rossas, Bragança, 2001.

41 – Lenda do Castelo de Pinela A meio caminho entre Rossas e Pinela, no concelho de Bragança, há um montão de rochas que a tradição baptizou com o nome de Castelo de Pinela. Diz o povo que nesse castelo viveram os mouros e que, ao sentirem-se vencidos pelas hostes da cristandade, enterraram valiosos tesouros nos subterrâneos do castelo, ali ficando à guarda de belas mouras encantadas. Estas mouras, reza a tradição, costumam fazer-se ouvir, ao meia dia e à meia noite de S. João, soltando tristes ais e repicando sinos. Conta-se que numa ocasião uns rapazes de Rossas resolveram ir, na noite de S. João, em busca desses tesouros. Acontece que, ao chegarem lá, foram assaltados por uma horda de bichos muito feios e apareceram-lhes umas damas a fumar charuto. Então elas ofereceram charutos aos rapazes e, consoante eles pegavam neles, eram atirados pelo ar para muito longe com pernas e braços partidos. Nunca mais tiveram vontade de lá ir. Nem eles nem ninguém. Fonte: Inf.: Maria Ângela Almeida, 72 anos; rec.: Santa Comba de Rossas, Bragança, 2001.

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Concelho de Carrazeda de Ansiães

42 – [Lenda do penedo das letras] Entre o Cachão da Rapa e a Pesqueira do Marulho, [no concelho de Carrazeda de Ansiães] está um grande penedo, próximo da corrente do rio, mas onde não chegam as águas dele. (....) Ao fundo do penedo, da parte que olha para o Douro, existe um portal que parece obra da natureza e dá entrada para uma grande sala, com assentos em redor, e no meio uma grande mesa, tudo em pedra. Nesta sala há uma porta, que provavelmente conduz a outras interiores, que ninguém tem querido examinar. Consta que o padre Domingos Mendes, na manhã de S. João, no ano de 1678, com sobrepeliz e estola, pretendeu penetrar nestas concavidades, em busca de tesouros encantados, mas que, entrando na segunda sala, sentiu um cheiro tão pestilente, e teve tal medo, que fugiu tremendo, e ficou mentecapto o resto dos seus dias, que foram poucos. Também se diz que pouco depois de sair deste antro, lhe caíram todos os dentes. (...) A esta penha ainda o povo chama o penedo das letras.13 Fonte: LEAL, Pinho – Portugal Antigo e Moderno, vol. 8, Lisboa, Livraria Editora de Mattos Moreira & Companhia, 1878, pp. 49-50

43 – O Castelejo Versão A:

No lugar do Pombal [concelho de Carrazeda de Ansiães], sobranceiro à estrada que vai para S. Lourenço, do lado direito, existe um Castelejo que não é mais que um amontado de penedos que a Natureza ali colocou. Há quem diga que deriva de um castelo ou de um castro que em tempos remotos ali existiu. Contam que no dito castelo está uma moura encantada com o seu tear de ouro. A lenda diz também que na noite de S. João, da meia noite até antes do sol nascer, ouviam bater o tear, a ponto de uma pessoa, ingénua e ao mesmo tempo ambiciosa, num certo dia de S. João, dentro do raio de um sino saimão, foi rezar, implorar e pedir um pouco desse ouro. Só que, lenda ou não, contam que essa pessoa foi tão maltratada 13

É assim designado pelo povo por nele existirem inscrições, hoje já imperceptíveis

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por forças estranhas e invisíveis, que tremeu sezões e nunca mais se atreveu a ir cobiçar a tal suposta riqueza. 2ª versão (A moura do Castelejo):

Na aldeia de Pombal de Ansiães, concelho de Carrazeda de Ansiães, num monte sobranceiro ao rio Tua, e junto às águas termais de S. Lourenço, há um conjunto de fragas muito bem alinhadas a que o povo chama Castelejo. O povo diz também que em noites de lua cheia ali se ouve o bater de um tear e, às vezes, o choro triste de uma moura encantada. Há quem tenha conhecido na aldeia um pastor que, ao passar ali numa certa noite, viu a moura a pentear os seus longos e belos cabelos. Cheio de curiosidade, e porque lhe parecia uma mulher muito bonita, aproximou-se para meter conversa com ela. Só que nessa altura pôde vê-la melhor, e descobriu que ela apenas era mulher da cintura para cima. Daí para baixo era uma cobra. O pastor arrepiou-se todo e deu então três passos atrás, pronto para fugir. Mas ela chamou-o, dizendo: – Não tenhas medo da minha triste sina. Estou neste estado, mas sou uma mulher bela. E se tens dúvidas, vem cá na noite de S. João, e ver-me-ás, tal como sou, a banhar-me nestas águas. Diz-se que o pastor lá foi nessa noite, e que a viu a tomar banho nas águas de S. Lourenço. E que era tão bela como nenhuma outra mulher. Também se diz que, durante muito tempo, era costume as moças da aldeia, nas noites de S. João, irem banhar-se nessas águas, na crença de que ficariam belas e sedutoras. Fonte – versão A: TEIXEIRA, Flora – "O Castelejo", in O Pombal, Carrazeda de Ansiães, Associação Rec. e Cultural de Pombal de Ansiães, Setembro de 1997. Fonte – B: Inf.: Maria da Conceição Félix Fonseca, 43 anos; rec.: Zedes, Carrazeda de Ansiães, 2000.

44 – [Figueira Redonda] No sítio da Figueira Redonda, termo de Môgo de Malta, concelho de Carrazeda de Ansiães, há um bloco enorme de granito, forma esferóide, de muitos milhares de toneladas de peso, que, diz a lenda, foi trazido à cabeça por uma mulher fiando na roca (outros dizem pelo diabo) do sítio de Cabreira, num percurso de três quilómetros, por uma íngreme ladeira acima, cheia de ravinas e despenhadeiros, eriçadas de fragas, onde com dificuldade se anda a pé. Contíguo a este, há outro de configuração discóidea achatada, que, no dizer da lenda, era a rodela onde assentava o bloco maior que a mulher trazia à cabeça. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, p. 454.

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45 – Dólmen de Vilarinho de Castanheira Em Vilarinho de Castanheira, concelho de Carrazeda de Ansiães, há um dólmen chamado Cova da Moira. Diz a lenda que na noite de S. João vem a moira dançar dentro dele. Quantas voltas a moira dá, tantas dá a tampa do dólmen, a qual se vê mexer, acompanhando o movimento da moira, que dança por baixo. Fonte: VASCONCELOS, J. L. – “Dólmen de Vilarinho de Castanheira”, in O Arqueólogo Português”, vol. XXIV, 1919 e 1920, p. 237.

46 – [O Vale da Osseira] [O castelo de Carrazeda da Ansiães] esteve em poder dos moiros, os quais foram investidos e atacados, sendo expulsos e perseguidos até a um vale próximo, ao ocidente de Vilarinho da Castanheira, onde foram batidos e trucidados. Pelo avultado número de moiros que ali se enterraram ficou a chamar-se Vale da Osseira. Fonte: LEAL, Silva – “Os Pelourinhos de Traz-os-Montes – Freixo de Espada à Cinta”, in Ilustração Transmontana, Porto, 1910, p. 171.

47 – Lenda da Fonte da Moura de Seixo de Ansiães No lugar da Fonte da Moura, em Seixo de Ansiães, concelho de Carrazeda de Ansiães, há um grande tesouro guardado por uma moura encantada que os mouros abandonaram quando foram expulsos de Portugal. Diz-se que nas manhãs de S. João ela vem estender ao sol uma barrela de ouro que tece num tear também de ouro, cujo som só é perceptível pelo bater dos canais. De sete em sete anos a moura aparece a alguns mortais a quem promete imensas riquezas se lhe quebrarem o encanto. Mas, apesar de as cobiçarem, ninguém se atreve na aventura. É que a moura surge sempre à meia noite transformada em serpente ou leão, e tenta beijar quem lá vai. Nessa altura tudo foge com medo, e assim se renova, por mais sete anos, o encantamento da pobre moura.

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De quando em quando, a moura aparece na mesma fonte transformada num cordão de ouro muito comprido que entra para a boca da pessoa que ali vai beber. Só que esta ao tentar dobrá-lo para o guardar, apercebe-se que ele nunca mais acaba e, achando-se já com riqueza bastante, resolve cortá-lo. Nesse momento desaparece tudo, ficando nas mãos da pessoa apenas uns míseros carvões. Também se diz que o tesouro está enterrado numa grande panela de barro, e que à sua volta estão outras panelas com peste, que matariam meio mundo se alguém as abrisse. E assim, ninguém se atreve a ir lá desenterrá-lo, com receio de não dar com a panela certa. Razão porque a moura lá continua eternamente à espera. Fonte: Inf.: Maria Arminda Teixeira Rodrigues, 43 anos; rec.:Carrazeda de Ansiães, 1999.

48 – A menina encantada Dizem que no sítio da Costa, termo de Mogo de Malta, do concelho de Carrazeda de Ansiães, é costume ouvir-se à meia noite uma menina a chorar. É uma menina encantada. E para se lhe tirar o encanto é preciso ir lá, à meia noite, e ler o livro de S. Cipriano. E quem o ler não se pode enganar, nem ter medo. Caso contrário, a pessoa que se aventure ficará tolhida. Ainda não houve até à data quem tivesse coragem para lá ir. Mas bem gostariam, porque a pessoa que fizesse como manda a lenda ficaria muito rica. Fonte: Inf.: Maria José Teixeira Almeida, 45 anos; rec.: Vila Flor, 1999.

49 – Lenda da Fraga de Selim Havia antigamente um padre que paroquiava as aldeias de Mogo e Zedes, no concelho de Carrazeda de Ansiães, e costumava ir a pé de uma aldeia para a outra sempre que tinha de ir rezar missa. Num certo domingo, em dia de Inverno, quando ia para rezar uma das missas, passou num sítio onde há uma fraga chamada Selim, e onde os antigos dizem que há uma moura encantada, e aí encontrou um tendal de figos a secar. Muito espantado, disse: – Credo! Um tendal de figos?! Ora, a admiração do padre era porque, sendo Inverno, não podia haver figos a secar. E pensou então:

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– Pecado sei que é, mas vou meter três ao bolso. Meteu-os ao bolso e seguiu caminho. Quando acabou a missa apeteceu-lhe um figo e meteu a mão ao bolso para o tirar. E qual não foi o seu espanto ao ver que em vez dos figos, o que tinha no bolso eram três libras de ouro. Sem dizer nada a ninguém, foi rapidamente ao lugar onde tinha encontrado os figos a secar para tirar mais, mas quando lá chegou já não achou nada. E ao meter a mão ao bolso, para assegurar-se de que, pelo menos, teria as três libras de ouro, apenas achou três carvões. Fonte: Inf.: Maria José Teixeira Almeida, 45 anos; rec.: Vila Flor, 1999.

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Concelho de Chaves

50 – A Cerca dos Mouros de Vila Verde da Raia A Cerca dos Mouros é uma espécie de fortaleza que existe perto da povoação de Vila Verde da Raia [concelho de Chaves], formada por pedras lousas, colocadas a esmo, duma forma tosca, que mais parece obra da natureza do que trabalho dos homens. O seu perímetro tem uma superfície de cerca de cem metros quadrados. Desconhece-se a verdadeira história da sua origem. Mas o povo não tem dúvidas: é uma obra feita pelos mouros que ali se refugiaram e por lá se deixaram ficar. Para melhor se defenderem, construíram essa fortaleza. E, para poderem resistir aos cercos prolongados, cavaram minas subterrâneas, através das quais podiam entrar e sair sem serem descobertos, à procura de água e de alimentos. Quando as guerras terminaram, entregaram-se à tarefa de derreter o oiro, que possuíam em grande quantidade. Com ele, construíram teares que trabalham, dia e noite, no fabrico de vestuário, também de oiro. Outrora, quem passava por lá perto, de dia ou de noite, podia ouvir distintamente o tim-tim dos martelos nas bigornas e o truque-truque das lançadeiras nos teares. Agora, já nada disso se ouve, mas os mouros lá continuam a manipular o seu oiro, embora de uma maneira silenciosa. Fonte: FERREIRA, Joaquim Alves – Literatura Popular de Trásos-Montes e Alto Douro, V Volume – Lendas e Contos Infantis, Vila Real, edição do autor, 1999, pp. 51-52.

51 – [A vila de Chaves e os mouros] A vila de Chaves (...) foi destruída duas vezes pelos mouros que não deixaram pedra sobre pedra, somente a ponte da Madalena que sempre ficou intacta e foi obra dos romanos como consta dos seus antigos padrões. No ano de 1160, reinando em Portugal Dom Afonso Henriques, foi restaurada e tirada do poder dos mouros por dois cavaleiros portugueses, esforçados soldados e irmãos chamados Rui Lopes e Garcia Lopes, ficando senhores desta praça, renovaram os muros até que a fecharam com

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chaves, de que tomou seu nome, porque antigamente se chamava Águas Cálidas, por causa das caldas que tem muito quentes. 14 Fonte: PEREIRA, Pe. João Barroso – Livro de antigas memórias da freguesia de Salto, lugar da Seara e outras partes vizinhas (livro manuscrito), Curros - Valpaços, 1730 pp. 128-129.

52 – Lenda do cavalo branco montado por Santiago de Compostela Conta-se que foi Santiago de Compostela, “montado num cavalo branco muito corredor”, que escorraçou os mouros do castelo do Mau Vizinho [situado na freguesia de Cimo de Vila da Castanheira, concelho de Chaves]; e que um mouro daquele castelo berrara a Santiago “que não fugisse tanto”. Ao ouvir tal remoque, o santo deu um forte puxão ao freio; o cavalo, empinado, foi bater com as patas dianteiras a meia ladeira da rampa que dá subida para o alto do picoto. Ali ficaram marcadas as patas do grande cavalo, que se pode considerar, além de grande corredor, também um grande saltador, pois as “marcas das patas” estão, pelo menos, 6 a 7 metros acima da base do rochedo.15 Fonte: SANTOS JÚNIOR, J. R.; et al. – “O Santuário do Castelo do Mau Vizinho”, Separata da Revista de Guimarães, vol. 99, Guimarães, 1991, p. 42.

53 – Lenda do bezerro de ouro Versão A:

É corrente no povo, não só na aldeia de Cimo de Vila [da Castanheira, concelho de Chaves], mas também de outras aldeias à roda do Castelo do Mau Vizinho, a crença de lá existir um encanto, que é, nada mais nada menos, um bezerro de ouro maciço. 14

Esta é apenas uma das versões – a mais antiga que encontrámos – da lenda dos irmãos Rui e Garcia Lopes, apresentando uma hipótese, bastante discutível, sobre a toponomástica da actual cidade de Chaves. Poderíamos apresentar outras versões entretanto publicadas, contudo, por serem excessivamente romanceadas, optámos por omiti-las neste trabalho. 15 O castelo do Mau Vizinho situa-se no topo de uma escarpa, onde se ergue “como cabeça de víbora (...), pontiaguda, ameaçadora, quase inacessível, a desafiar os ares” (Eira, 1973: 346). Segundo o povo – diz António da Eira – este castelo “é património do Pecado; e aqui Pecado é sinónimo de Diabo, portanto o castelo do Mau Vizinho é castelo do Diabo” (1973: 348). É de admitir que a profunda impressão causada por esta singular disposição mesológica esteja na origem da multiplicidade de lendas que o povo preservou, as quais assumem, ao mesmo tempo, justificações etiológicas para algumas das marcas mais exuberantes que o homem primitivo ou a natureza ali deixaram.

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Conta-se que um ambicioso português, ansioso por deitar as unhas ao bezerro de ouro, contratou um galego para ir com ele quebrar o encanto, com a condição expressa de não se falar em Deus. Com o livro de S. Cipriano fizeram as rezas obrigatórias. A dada altura surgiu o bezerro, tão alentado que o galego não conteve o seu espanto admirativo e disse: – Jesus...! Foi o bastante para que o bezerro rebentasse em carvões. Versão B:

Um português cobiçoso do tesouro encantado em forma de bezerro de ouro combinou com um padre, armado de estola, e munidos de uma panela com unguento humano, irem quebrar o encanto. Lá foram com o indispensável e famoso livro de S. Cipriano. Feita a leitura do texto apropriado ao caso, surgiu o bezerro guiado pelo inimigo. A atarantação foi tão grande, tanto do padre leitor como do adjunto português cobiçoso, que se entornou a panela e o unguento foi escaldar o padre em vez de escaldar o inimigo. A um “valha-me Deus” o bezerro e o diabo que o guiava desapareceram num ápice. Fonte – versões A e B: SANTOS JÚNIOR, J. R. et al. – “O Santuário do Castelo do Mau Vizinho”, Separata da Revista de Guimarães, vol. 99, Guimarães, 1991, p. 40.

54 – Lenda da grande cobra a guardar o encanto A Srª Josefa Gigante, cujo pai foi tamanqueiro em Orjais [aldeia próxima de Cimo de Vila da Castanheira, concelho de Chaves], diz que os seus avós e os velhos de Orjais contavam ter visto muitas vezes uma grande cobra de enorme cabeça sair do rio Mouce que circunda o picoto do Mau Vizinho. Viram-na subir e passear pelo castelo do Mau Vizinho. Mas quando alguém subia ao castelo ela prontamente se afastava. Num pincho, atirava-se do alto e vinha enfiar-se na ola do rio que há acima da praseira, paredão que atravessa o rio para ele represar. A tal cobra era a guarda do encanto. Quando aparecer alguém que, em vez de escorraçar a cobra ou fugir dela assustado, tiver a coragem de ficar quedo e de ser deixar beijar pela cobra, esta transformar-se-á, acto contínuo, em pessoa humana. Deste modo se quebra o encanto e o corajoso receberá o tesouro que o fará muito rico. Fonte: SANTOS JÚNIOR, J. R. et al. – “O Santuário do Castelo do Mau Vizinho”, Separata da Revista de Guimarães, vol. 99, Guimarães, 1991, p. 41.

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55 – A mina da Bolideira Conta-se que um dia andava um homem à caça com o seu cão na zona da Bolideira [concelho de Chaves]. A dada altura o cão viu um coelho e correu atrás dele. Só que o coelho meteu-se num buraco entre duas fragas e o cão entrou lá também. E atrás do cão entrou o caçador. Era uma mina. O homem andou, andou, e, de repente, viu que estava no meio dum prado, onde havia um belo lago e também um altar de ouro guardado por uma serpente. Ao aproximar-se do altar, logo a serpente lhe disse: – Não passes daí, senão morres! O caçador ficou de tal modo assustado que nem um passo mais avançou. Tratou mas foi de voltar para trás, e muito ligeiro. E ao chegar à sua aldeia fez constar o que lhe tinha acontecido naquela mina. Isto tornou-se por isso conhecido em toda a parte, acabando por chegar também aos ouvidos de um príncipe que costumava andar por ali a caçar. Como era muito destemido, entrou sem medo pela mina adentro e lá foi dar, também ele, ao mesmo prado onde havia um lago e um altar de ouro guardado pela serpente. Esta, quando viu que ele se preparava para avançar, disse-lhe: – Não passes daí, senão morres! Mas o príncipe não se assustou, e, olhando bem para os olhos da serpente, respondeu-lhe: “– Ó serpente que te arrastas Dia e noite nesse pranto, Levanta-te desse chão, Desfaça-se o teu encanto!”

E à medida que ia dizendo estas palavras, a serpente ia-se transformando numa bela menina, pois mais não era que uma moura que tinha sido encantada por uma fada má. Diz-se que o príncipe e a moura casaram e passaram a viver ali, onde, em certas noites, ainda se ouvem cantigas e risos de alegria. Fonte: Inf.: Maria da Graça Oliveira Gomes, 54 anos; rec.: Lebução, Valpaços, em 1999;

56 – O guerreiro e a princesa moura Conta-se que, há muitos e muitos anos, quando nas terras do norte se travou uma grande batalha entre cristãos e mouros, um jovem guerreiro cristão raptou uma linda princesa moura e fugiu com ela para o castelo de Monforte [no concelho de Chaves]. E o pai da jovem, ao ver em que mãos ela ia, lançou-lhes uma maldição tal,

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que, quando chegaram ao castelo, o que o guerreiro levava consigo já não era a princesa moura mas sim uma enorme serpente. Ora o guerreiro, sem saber o que fazer com ela, resolveu fechá-la numa torre do castelo. Passou então a ouvir-se ali durante a noite uma voz de menina a gemer e a chorar. E o guerreiro, que se tinha apaixonado por ela, ao ouvir aquele choro, subia sempre à torre na esperança de a encontrar na figura da princesa que trouxera. Mas enganava-se. O que lá encontrava era a serpente e nada mais. O jovem cristão não sabia como tratá-la. Passou por isso a viver numa grande tristeza. Até que, certa noite, em que o choro da serpente o atormentou demais, foi lá visitá-la e, condoído da sua dor, disse-lhe estas palavras enquanto a afagava e a beijava: “– Trouxe-te linda princesa Para contigo casar, Agora se olho p’ra ti Só me apetece chorar! Quem me dera ter poder P’ra te quebrar o encanto, E poder olhar p’ra ti P’ra te enxugar o teu pranto!”

E eis que, acabadas estas palavras, a serpente aparece transformada na bonita menina que era antes. O guerreiro quebrara-lhe o encanto. E depois casaram. Fonte: Inf.: Maria da Graça Oliveira Gomes, 54 anos; rec.: Lebução, Valpaços, em 1999.

57 – O monstro do castelo de Monforte Conta o povo que o castelo de Monforte [no concelho de Chaves] foi em tempos propriedade dos mouros, e que lá dentro vivia uma jovem chamada Basília, na companhia de seu pai e de muitos criados. A alturas tantas começaram a chegar ao castelo notícias de um jovem guerreiro, chamado D. Telmo, que era cristão e combatia os mouros para ajudar os da sua raça. Como os feitos deste guerreiro eram tão heróicos, a jovem Basília apaixonou-se por ele, mesmo não o conhecendo. E apesar de saber que era grande inimigo de seu pai cada dia se sentia mais apaixonada ele. O pai, ao saber desta paixão, pensou que o melhor era casá-la com um dos mouros ricos da região. Mas a jovem recusou o casamento e fechou-se nos seus aposentos, onde nunca mais quis ver ninguém. O pai, revoltado com a atitude da filha, e para evitar que alguma vez se viesse a unir a esse tal D. Telmo, resolveu encantá-la, transformando-a num bicho horrendo. Passou então a falar-se nas redondezas de um monstro que em certas noites se

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arrastava no castelo. Diz o povo que, em noites de lua cheia, há quem tenha ouvido suspiros de amores perdidos vindos de lá de dentro e que são os suspiros da jovem Basília. Fonte: Inf.: Maria da Graça Oliveira Gomes, 54 anos; rec.: Lebução, Valpaços, em 1999;

58 – O cavaleiro e a princesa Conta-se que um cavaleiro cristão se apaixonou por uma princesa moura, e o pai da jovem, querendo contrariar esse amor, fechou-a a sete chaves no Castelo de Monforte. O cavaleiro passou assim a ir, vezes sem conta, rondar o castelo, na esperança de a ver. Só que ela era guardada por um gigante, que não a deixava sequer olhar para fora do castelo. Um dia, o cavaleiro encheu-se de coragem e entrou pelo castelo dentro de espada na mão e matou quantos mouros encontrou pela frente. Ao chegar junto da princesa deu de frente com o gigante, atravessando-lhe o coração com a espada. E o sangue que jorrou transformou-se numa enorme passadeira que lhes mostrou o caminho para a fuga. Conseguiram assim fugir, e foram viver num castelo cristão, onde casaram. Diz o povo que o rei mouro, com o desgosto, nunca mais saiu do seu castelo. E a gente de Águas Frias [concelho de Chaves], quando o vento sopra de feição, costuma ouvir a voz triste de um homem a cantar assim: “ – Minha filha, meu amor, Com olhos cor de luar, Quem te arrebatou de mim, Onde foste tu parar?” Fonte: Inf.: Maria da Graça Oliveira Gomes, 54 anos; rec.: Lebução, Valpaços, em 1999;

59 – Os lagares da moura Versão A:

Na serra da Pastoria, no concelho de Chaves, existe um lugar chamado Muro, onde os antigos dizem que há uma mina que vai dar ao castro da Curalha, e que estão lá enterrados dois lagares16, um de ouro e outro de peste. Quem lá for procurá-los, se 16

É de referir que a serra da Pastoria, nos anos de 1979 e 1980, foi alvo de escavações arqueológicas, tendo sido encontradas, no lugar do “Muro”, duas pias de granito e algumas moedas [informação prestada pela professora do 1º Ciclo do Ensino Básico Maria Isabel da Silva Barjas].

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encontrar o de ouro fica muito rico, mas se encontrar o de peste espalhará a miséria e a infelicidade pelas redondezas. Conta-se que, há muitos e muitos anos, viveu naquela serra uma moura que ia pela mina fora para se encontrar, às escondidas, com o seu amante, um rapaz cristão que vivia no castro da Curalha. Acontece que, numa ocasião, houve gente que entrou na mina à procura dos lagares e os dois amantes foram descobertos. Por isso nunca mais puderam voltar a encontrar-se. Mas o pior é que as pessoas que foram à procura dos lagares encontraram o da peste. Diz o povo que nesse ano houve grande mortandade na aldeia e a miséria passou a ser constante. Acredita-se também que a aldeia ainda hoje é pobre, vivendo da pastorícia e de uma agricultura de subsistência, devido à descoberta do lagar da peste. E também se diz haver quem, ao passar no alto da serra, tenha ouvido a moura a chorar de saudades do jovem cristão. Diz também o povo que, ainda hoje, no alto da serra ouve-se a moura a chorar com saudades do jovem cristão. Versão B (Os potes dos mouros):

Nos lugares onde hoje se situam as aldeias de Casas Novas e Pastoria, do concelho de Chaves, havia antigamente dois potes enterrados pelos mouros, um deles com ouro e outro com porcaria. Quem encontrasse o de ouro ficava rico e quem encontrasse o de porcaria ficava pobre. Os de Casas Novas encontraram o de ouro e os de Pastoria encontraram o de porcaria. Por isso a aldeia de Casas Novas é rica. Tem casas fidalgas, bonitas, e daí lhe vem o nome. Quanto à aldeia de Pastoria, essa é pobre. Os habitantes vivem da pastorícia, e daí lhe vem também o nome. Em Casas Novas existe a figura de um pote escavado numa rocha. O povo diz que é o pote de ouro dos mouros que os antigos encontraram. Fonte – versão A: Inf.: Maria Celeste da Silva, 78 anos; rec.: Pastoria, Chaves, em 2000. Fonte – versão B: Inf.: Maria Isabel da Silva Barja, 44 anos; rec.: Chaves, 2000

60 – A moura da Ilha dos Lagartos Entre Casas dos Montes e Granjinha, no concelho de Chaves, há um lugar ermo a que o povo chama Ilha dos Lagartos, e onde existe uma fonte que é conhecida como a Fonte da Moura. Conta o povo que um dia uma mulher muito bela apareceu naquela fonte a um lavrador, quando ia a passar com o seu carro de bois, e disse-lhe:

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– Se vieres aqui à meia noite com o teu carro de bois, levá-lo-ás para casa carregado de ouro. E para o conseguires só tens de me beijar. O lavrador aceitou e à meia noite lá foi com o carro de bois. Só que, ao aproximar-se da fonte, apareceu-lhe uma cobra que começou a subir por ele acima, esperando que a beijasse. O homem ficou cheio de medo e sacudiu a cobra para o chão, fugindo dali a sete pés. E à medida que fugia, alguém lhe atirava com pedras, o que o obrigava a fugir ainda mais. Deixou por isso lá os bois e o carro. E o ouro nem vê-lo. Diz o povo que o homem, após este encontro, foi afectado pelas sezões e nunca mais foi o mesmo. Até que morreu. E também se diz que, em certas noites, quem passar na Ilha dos Lagartos ouve gemidos de mulher vindos daquela fonte. É a moura que ainda não foi desencantada e por isso continua a chorar o seu triste fado. Fonte: Inf.: Maria Hermínia Tomás, 39 anos; rec.: Chaves, em 2001.

61 – A moura do sítio das Colmeias Diz o povo à boca cheia que no sítio das Colmeias, entre os povos de Vilarinho e Vila Meã, no concelho de Chaves, há uma moura encantada no alto de um penedo. E que guarda um valioso tesouro, todo em ouro e pedras preciosas. Um dia um lavrador que ia a passar resolveu descansar à sombra fresca do penedo. Era dia de São João. E viu então aparecer uma mulher muito bonita, de cabelos negros, longos e belos, e um pente de ouro, que resplandecia muito com os raios de sol. – Sou uma moura e chamo-me Zaida. Vivo aqui há um ror de anos. Sob este penedo há um palácio onde eu tenho estado encantada. Ajudas-me? – Ajudo. – E o que queres em troca: os meus cabelos ou o meu pente? O lavrador hesitou. O cabelo era belo, mas o pente era melhor. Era de ouro. Por isso apontou para ele. – Estragaste tudo! – reagiu ela – A mim, dobraste-me o encanto! E a ti, a ambição fez-te perder! Dito isto desapareceu. E o lavrador viveu pobre toda a vida. Fonte: Inf.: Maria Fernanda Farinha Martins, 46 anos; rec.: Chaves, 2001.

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62 – Lenda do Calhau da Moura Junto ao rio Tâmega e perto da aldeia de Arcossó, no concelho de Chaves, há uma fraga que é conhecida como o "Calhau da Moura". E sobre ela o povo conta uma bonita lenda. Diz-se que andava um dia uma pastora com o seu rebanho, numa das margens do rio, quando avistou uma mulher muito bonita sentada numa fraga a fiar. E os fios que usava eram de ouro. Puseram-se então a olhar uma para a outra, e de repente a fiandeira levantou-se da fraga e caminhou na direcção da pastora, dizendo-lhe: – Dás-me um pouco de leite? A pastora disse logo que sim, e, abeirando-se de uma das ovelhas, encheu uma vasilha de leite e deu-lho. Mas, porque era curiosa, tratou também de perguntar à desconhecida: – E a senhora quem é? E o que faz naquela fraga? – Sou uma moura encantada – respondeu –, e vivo ali. A pastora não ficou muito esclarecida, mas também não pôde fazer mais perguntas, porque a moura não estava para grandes conversas. Só lhe disse, ao mesmo tempo que lhe dava para as mãos uma caixa: – Toma lá, e não faças mais perguntas. E esta caixa só a abras quando chegares a casa. A seguir a moura voltou para a sua fraga e desapareceu. Entretanto, a pastora tocou as ovelhas para casa, mas pelo caminho pôs-se a pensar: – Que terá ela posto nesta caixa? Abro? Não abro?... E a curiosidade foi tanta que não resistiu. Abriu a caixa, ali mesmo, no caminho. E o que viu lá? Ouro, fios de ouro, libras de ouro?... Nada disso. Apenas bocados de carvão. Pôs-se então a chorar, desiludida, pois criara demasiadas esperanças naquele presente. E deitou fora os bocados de carvão e a caixa, seguindo o seu caminho. Acontece que, mal andou uma dúzia de passos, olhou para trás, e o que viu? A moura em silêncio apanhava para a caixa os bocados de carvão que ela havia deitado fora. E reparou também que os bocados de carvão, mal ela os apanhava do chão, se iam transformando em moedas de ouro. Largou as ovelhas e correu atrás da moura, a pedir-lhe desculpa. Só que ela já nem a ouviu. Desapareceu de repente com a caixa e com o ouro. Até hoje. E a testemunhar isto, segundo o povo, já só lá está a fraga, que ficou a chamar-se "Calhau da Moura". Fonte: Inf.: Maria Fernanda Farinha Martins, 46 anos; rec.: Chaves, 2001.

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63 – Os figos da Fonte de Vale de Asnos Contam os mais velhos que nas manhãs de S. João aparece uma moura próximo de Outeiro Seco, no concelho de Chaves, junto a uma fonte a que chamam "Fonte de Vale de Asnos". E que aparece a estender uma manta branca de figos maduros e apetitosos. Ora, numa dessas manhãs foi uma mulher de Outeiro Seco à fonte. E, como a pobreza em sua casa era muita, ia pelo caminho a rilhar uma côdea dura de pão. Eis senão quando, à sua frente, se lhe depara estendida uma grande manta de figos. – Bô?! Tantos figos?! Quem os teria aqui deixado? Deitou fora a côdea de pão e tratou de meter uns poucos de figos numa cesta, dizendo: – Por hoje já me governo. Depois encheu o cântaro da água e voltou para casa. Ao chegar a casa, como a fome apertava, foi à cesta dos figos e despejou-os na mesa. Qual não é então o seu espanto, ao ver que, em vez de despejar figos, estava a despejar moedas de ouro. Passou-lhe logo a fome. Depois lembrou-se que na fonte tinham ficado ainda figos que davam para encher mais uma ou duas cestas iguais àquela. Vai daí, agarra na maior cesta que tinha em casa e voltou lá para trazer todos os que houvesse. Mas bem se enganou. Ao chegar lá, já não viu figos nenhuns. E ouviu então uma voz, cantando uma melodia triste, que dizia: "– Não passes neste lugar Em manhãs de S. João, Não te perdeu a pobreza Mas perde-te a ambição!"

Era a voz da moura que lá está encantada. A mulher ficou descoroçoada e regressou a casa, contando, pelo menos, encontrar as moedas de ouro que lá deixara. Mas também nisso se enganou, pois em casa apenas achou bocados de carvão. Pôs-se então a lamentar a sua sorte. Lamentou até ter deitado fora a côdea de pão que levava quando foi à fonte. Dizem os velhos que o que esta mulher deveria ter feito era contentar-se com as moedas de ouro que encontrou ao chegar a casa, e não fosse tentada a ir buscar mais. Ficaria ela bem e teria quebrado o encanto da moura. Fonte: Inf.: Maria da Graça de Oliveira Gomes, 54 anos; rec.: Lebução, Valpaços, em 1999;

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64 – A parteira e a moura Na margem do rio Tâmega, onde hoje existe a conhecida Quinta dos Machados, diz a tradição ter vivido uma moura muito rica no seu palácio encantado. E quando estava para a dar à luz mandou um criado chamar uma parteira a Chaves, ordenando que viesse com os olhos vendados. A parteira lá foi, e ajudou a moura a dar á luz uma linda mourinha. Foi grande a alegria no palácio e, em paga pelos serviços da parteira, a moura entregou-lhe um cofre para as mãos, dizendo: – Aqui tens a paga pelo favor que me fizeste. Mas só amanhã é que podes abrir o cofre. Ora, a parteira, ao ver tanta riqueza no palácio, regressou a casa bem contente, pois pensava ela que o que estaria no cofre só podia ser coisa muito valiosa. Contudo, a curiosidade foi tanta que não aguentou esperar pelo dia seguinte. Logo que chegou a casa tratou de abrir o cofre. E qual não foi o seu espanto ao ver que o cofre apenas continha bocados de carvão. Irritada com o desplante da moura, pegou nos carvões e atirou-os para o quinteiro. No dia seguinte, pegou de novo no cofre para lhe dar alguma utilidade... e o que viu ela? No fundo do cofre estavam a reluzir alguns pedacinhos de ouro. Logo se arrependeu de ter deitado fora os outros carvões e foi saber deles ao quinteiro. Só que já lá não encontrou nada. Fonte: Inf.: Maria Fernanda Farinha Martins, 46 anos; rec.: Chaves, 2001.

65 – Lenda do Forte de S. Neutel Conta-se que, há muitos anos atrás, um homem da zona do Barroso, quando vinha trabalhar para estes lados, ao passar de noite ao pé do Forte de S. Neutel [em Chaves], costumava ver uma menina muito bela a pentear os cabelos com um pente dourado, junto de uma figueira grande, que ainda lá existe, embora hoje mais pequena e já muito velha. Contou então a um amigo, só que este não se quis fintar. Por isso resolveram ir lá os dois numa certa noite para tirarem tudo a limpo. Chegaram ao forte e puseram-se à espera a uma certa distância da figueira. Esperaram, esperaram, até que, chegada a meia noite, vêem vir duas estátuas de pedra, uma de um lado, outra do outro, como se viessem para ali se juntarem.

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Um dos homens ficou tão assustado com o que viu que se benzeu duas vezes, dizendo: – Jesus, credo em cruz! Jesus, credo em cruz! Dito isto, as estátuas desapareceram, e ouve-se então uma voz de menina a choramingar e a dizer: – Ai que me dobraste-me a fada! E os dois amigos fugiram a sete pés. Fonte: Inf.: Francisco Gomes Carvalho, 81 anos; rec.: Bairro da Caixa, Chaves, 2001.

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Concelho de Freixo de Espada à Cinta

66 – Freixo de Espada à Cinta Um cavaleiro cristão17, perseguido por uma horda de aventureiros18, viu-se em grande perigo de sofrer morte afrontosa, porque se achava desacompanhado. Sentindo perto os inimigos, cingiu a espada a um freixo e ocultou-se entre os ramos, aguardando um milagre. Foi recompensada com efeito a sua fé, não porque a árvore se servisse da espada em defesa dele, mas porque os perseguidores, vendo o freixo cingindo armas, se tomaram de tal medo que fugiram em completa debandada. Esta é a razão porque se lançaram os fundamentos da povoação e porque o fundador tomou por armas o freixo e o montante, e porque ao lugar se deu o nome de Freixo de Espada à Cinta. Fonte: LEAL, Silva – “Os Pelourinhos de Traz-os-Montes – Freixo de Espada à Cinta”, in Ilustração Transmontana, Porto, 1910, p. 109.

67 – Fonte da Moira Assim é designado um lugar campestre da aldeia de Fornos [no concelho de Freixo de Espada à Cinta], que abrange vários prédios rústicos. As uvas ali criadas amadurecem consideravelmente mais cedo do que as dos restantes vinhedos da freguesia. Crê o povo que esta precocidade se deve à influência do calor do Norte de África, ali guardado, para lhe fazer companhia, pela bela Princesa Moura encantada, que se viu inibida de fugir à perseguição cristã da reconquista. Fonte: TEIXEIRA, António J. – “Freixo de Espada à Cinta lendário e supersticioso”, in Brigantia, vol. 2, nº 2/3, Abril/Setembro, Bragança, 1982, Arquivo Distrital de Bragança, p. 310.

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O autor identifica-o como sendo um primo de S. Rosendo, de apelido Feijão, que morreu em 977 (Leal, 1910: 109). 18 Trata-se de uma alusão implícita aos mouros, pois a lenda relativa à origem desta vila, não sendo matéria considerada muito aceitável pelos historiadores, contém, no entanto, algo aparentemente inquestionável: o contexto das lutas entre cristãos e muçulmanos (Pintado, 1992: 73).

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Concelho de Macedo de Cavaleiros

68 – [Nossa Senhora das Flores] Diz a tradição ou lenda que a imagem de Nossa Senhora das Flores, venerada numa capela no termo de Sezulfe, concelho de Macedo de Cavaleiros, foi escondida pelos cristãos, quando da invasão dos mouros, debaixo de um monte de pedras, que ao depois, com o tempo, cobriram de todo as silvas e outras plantas silvestres. Depois da expulsão dos mouros, foi encontrada, não se sabe como, e é venerada com muita devoção. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, pp. 456-457.

69 – [Cordão de oiro nas Guímbrias] Nas Guímbrias, termo de Corujas [concelho de Macedo de Cavaleiros], havia uma povoação, mas enquanto os cristãos estavam à missa vieram os mouros lançaramlhe fogo e despovoou-se, ficando apenas a capela e vestígios de casas. Diz a lenda que um homem achou aqui um cordão de oiro e dobou, dobou, dobou... [Por fim] cansado de tanto dobar (...) entendendo que já tem riqueza bastante para si, filhos, netos e tetranetos, corta o cordão. No mesmo instante, ouve-se a voz a desaparecer de uma moura, que clama dolente: – Ah, ladrão, que me dobraste o encanto. O cordão dobado converte-se em carvão ou esvai-se e nada mais se vê.19 Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, pp. 494-48920.

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Segundo nos informou Ermelinda Olívia Ferreira (professora), os mais antigos tomam esta lenda como uma espécie de documento identitário da comunidade. Daí que a aldeia de Corujas ainda hoje seja conhecida como terra de “carvoeiros”. Noutros tempos faziam muito carvão e brasas (estas mais finas, feitas de estevas) para as gentes da vila de Macedo. O carvão era carregado em burros, mas as brasas eram as mulheres (chamavam-lhes as "carvoeiras") que as transportavam à cabeça, em sacos de lona, durante dez quilómetros a pé, indo vendê-las de porta em porta nas casas da vila. 20 Embora tendo início na pág. 494, esta narrativa prossegue, por indicação do autor, com um tronco comum a outros do mesmo tipo, que encontrámos na pág. 489.

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70 – [A galinha com pintainhos de oiro] Na Pedra Furada, termo de Ferreira [concelho de Macedo de Cavaleiros], (...) há uma gruta ou galeria, por onde os mouros iam levar os cavalos a beber ao local chamado Seixo ou Seixinho. Houve quem visse aqui uma galinha com pintainhos de oiro; mas quando esse alguém ia para os apanhar, desapareceu tudo, e da mesma forma lhe desapareceu uma cabra de oiro que ia berrando de fragueiro em fragueiro. – Grande bruto – disse a mãe ao filho, quando este lhe relatou o sucedido, – era a moura encantada a querer que a desencantasses e a preparar-te a tua fortuna. Mas tudo se foi por não lhe saberes falar. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, p. 494.

71 – [Espada nele! Espada nele!] Versão A:

No sítio chamado Vila dos Mouros, termo de Espadanedo, concelho de Macedo de Cavaleiros, situado no cume de um outeiro, onde ainda se divisam restos de fortificações, fossos e pedregulhos derrubados, vivia um mouro poderoso, que exigia anualmente dos povos cristãos vizinhos um certo número de donzelas para o seu harém. Um dia, resolvidos a acabar com tão vexatório tributo, revoltaram-se ao grito de “Espada nele! Espada nele!”, [ou seja] “mata-o, passa-o à espada”. De onde, segundo a etimologia popular, veio à povoação o nome Espadanedo. Segundo a mesma lenda, o mouro tinha um caminho subterrâneo para levar os cavalos a beber ao ribeiro que longe corre no fundo do outeiro. Versão B (O rei mouro e as doze donzelas):

Dizem os antigos que a norte da aldeia de Bousende, concelho de Macedo de Cavaleiros, viveram os mouros num sítio a que chamam Fragão. E que se refugiavam ali para verem melhor ao longe e se defenderem dos cristãos. Dizem também que nesse lugar abriram uma passagem secreta por debaixo da terra até à ribeira, onde levavam os animais a beber sem ninguém os ver. Ora, no sítio do Fragão há ainda hoje uma pedra em cima das outras, a qual era usada pelos mouros para comunicarem a grandes distâncias. Bastava que a puxassem e ela emitia um som muito forte. Conta-se também que este som era o sinal do rei mouro quando queria comunicar com os seus servos, e que, mal o ouviam, reuniam-se rapidamente para receberem ordens.

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Um dia o rei ordenou-lhes que fossem ter com os cristãos para lhes exigirem doze donzelas para o seu harém. Só que os cristãos não cederam. Travou-se então uma grande batalha. E diziam: – Espada nele! Espada nele! Diz-se que foi com este grito que os cristãos ganharam ânimo e venceram. Por isso aquela terra ficou com o nome de Espadanedo. Fonte – versão A: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, p. 191. Fonte – versão B: Inf.: Ermelinda Olívia Ferreira, 48 anos; rec. Ferreira, Macedo de Cavaleiros, 2001.

72 – [A Senhora do Bálsamo na Mão] Versão A:

É tradição que, no lugar onde hoje está o convento [de Balsamão, junto a Chacim, concelho de Macedo de Cavaleiros] existira, no IX ou X século, o castelo de um rei mouro, o qual entre outras opressões que fazia aos seus vassalos cristãos, era uma (de certo a pior) possuir todas as noivas, no primeiro dia do seu casamento. Um habitante da vila de Alfândega da Fé, ao qual chegou a vez de ser noivo, não esteve pelos autos, e, proclamando aos seus patrícios, se revoltaram contra o tirano. Sabendo o tal rei desta conspiração, veio esperar os rebeldes nos campos de Chacim e aí se deu um renhido combate, em que os cristãos, por serem muito menos do que os mouros, iam de vencida; porém, Nossa Senhora lhes apareceu e, com um vaso de bálsamo na mão, lhes curava todas as feridas e dava novo alento, pelo que eles venceram os mouros, matando o rei e quase todos os seus. Depois foram ao castelo e o arrasaram. Em memória disto e em acção de graças a Nossa Senhora, edificaram uma capela no sítio onde tinha sido o castelo e lhe deram a invocação de Nossa Senhora do Bálsamo na Mão (e lá está a Senhora com uma ânfora ou vaso na mão) e a que o povo por abreviatura chama Nossa Senhora de Balsamão. A ermida foi depois ampliada e é hoje uma igreja, sob a mesma invocação. Fazse-lhe anualmente uma grande romaria no domingo de Pascoela, conhecida pelo nome de Festa de Cara Mouro, porque Nossa Senhora, animando os cristãos na tal batalha, lhes dizia: Cara aos mouros!21. (...) E ao sítio onde teve lugar a batalha, que degenerou em chacina, se deu o nome de Chacim. 21

A expressão “Cara aos mouros” como base de justificações etiológicas ou toponímicas é igualmente referenciada noutros pontos do país. Serve, por exemplo, para explicar uma origem mítica da povoação de Caramós, no concelho de Felgueiras. De facto, segundo a tradição popular, no sítio onde hoje existe esta povoação teve em tempos o conde D. Nuno Mendes uma grande batalha com mouros, na qual – diz Pinho Leal –, “oprimidos os cristãos com o grande número de inimigos, lhe viraram as costas e fugiram.

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Versão B:

Uma das lendas mais consistentes que se ouvem sobre o Monte Carrascal é a de Nossa Senhora de Balsamão. Segundo o que nos foi relatado pelos Padres Marianos, nos tempos de D. Afonso Henriques22 erguia-se no Monte Carrascal uma fortaleza mourisca, de onde um poderoso e desalmado sultão explorava vergonhosamente os cristãos com os mais desumanos impostos, entre os quais figurava o animalesco “Tributo das Donzelas”. Os cristãos viviam um dia a dia desesperado, à espera de ocasião para sacudirem o jugo sarraceno. O golpe seria dado logo após o casamento do esbelto Casimiro23, filho do ousado chefe dos Cavaleiros das Esporas Douradas24, de Alfândega, com a encantadora Teolinda, filha única do mais aguerrido adversário do emir, natural de Castro [Castro Vicente]. Numa manhã quente de Julho, saía o cortejo nupcial da igreja de Castro e encaminhava-se para a casa da noiva, quando, subitamente, irrompem os soldados do emir e raptam Teolinda, lançando por terra o noivo. Os sinos do povo tocam logo a rebate, são enviados emissários aos povoados vizinhos, e dali a pouco eis que no horizonte surgem os Cavaleiros das Esporas Douradas dispostos a fazer justiça. O combate dá-se no Monte Carrascal e os cristãos sofrem pesadas baixas. É então que, no campo de batalha, aparece uma mulher, vestida de branco, trazendo um vaso de bálsamo numa mão e um ramo de flores na outra. A misteriosa mulher limpa as feridas aos cristãos, deposita nelas um pouco de bálsamo e desaparece. Então os cristãos adquirem novas forças e ganham a batalha. A partir daí o povo passou a venerar a Senhora de Bálsamão (bálsamo na mão). Debalde D. Nuno empregou todos os meios para conter os seus; mas quando as coisas estavam neste estado, eis que aparece S. Martinho, montado em um cavalo branco, armado de uma formidável lança, espetando com ela mouros sem dó nem piedade, e gritando aos cristãos: – Cara aos mouros! Cara aos Mouros! Outros dizem que foi o conde que gritou: – Cara aos mouros! Cara aos mouros, que S. Martinho é connosco! Os portugueses, vendo que o santo era por eles, viraram a cara aos mouros valorosamente e os puseram em completa derrota. (...) É de Cara aos Mouros que procede, por abreviatura, Caramós” (Leal, 1873: 100-101) 22 Assinale-se a incoerência histórico-temporal das duas versões: na primeira os factos são situados entre os séculos IX e X e na segunda refere-se os “tempos de D. Afonso Henriques” (portanto, no séc. XI). 23 Não será por acaso o nome Casimiro, nesta versão “alimentada” pelos Padres Marianos, que administram o mosteiro de Balsamão. Na verdade, é o nome do fundador da congregação: Frei Casimiro Wysynski, nascido na Polónia, em 1700, e falecido naquele mosteiro, em 1755, sendo ainda hoje conhecido como o “Santo Polaco”. 24 Os Cavaleiros das Esporas Douradas são referenciados na tradição transmontana como uma espécie de legião, constituída por cerca de quarenta homens, que, há muitos séculos atrás, teria a incumbência de zelar pela segurança das populações, a partir de um castelo da zona onde estaria aquartelada. Estes cavaleiros, segundo alguns autores, embora não tivessem nobreza herdada, e tivessem sido anteriormente simples peões, gozavam de vários privilégios, um dos quais era não pagar “jugada” (contribuição em vigor). Segundo Viterbo, “não só em pinturas se tem visto, mas ainda dentro de sepulturas se tem achado, esporas douradas e que sem dúvida faziam a distinção destes cavaleiros” (apud Pereira, 1908: 56).

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Versão C:

No monte Carrascal, no concelho de Macedo de Cavaleiros, havia uma grande mesquita e perto dela estava o castelo de um rei mouro que governava uma grande área à volta. Este rei era muito mau, obrigando os cristãos a pagar pesados tributos, e caso a tal se recusassem, mandava cortar-lhes os braços. Um desses tributos era o de possuir todas as noivas na noite do casamento. Um dia, um jovem cristão que morava onde hoje se chama Alfândega da Fé, ao casar com uma bela rapariga da sua terra, resolveu opor-se ao tributo, e, para isso, na noite do casamento envergou ele o vestido de noiva, cobriu a cabeça com um véu, e foi ter ao castelo em lugar dela. Ao chegar aos aposentos do rei mouro, este retirou-lhe o véu, e qual não é o seu espanto ao ver que tinha sido enganado. Ficou furioso e gritou pelos seus guardas. Mas nada mais pôde fazer. O jovem, que trazia um punhal escondido, espetou-lho no coração, matando-o. Aos seus gritos acudiram todos os mouros do castelo e o jovem cristão só teve tempo de despir o vestido de noiva e saltar por uma das janelas, fugindo pelo monte Carrascal abaixo, com os mouros na sua perseguição. Entretanto, alguns amigos, vizinhos e familiares seus, incluindo a noiva, vinham de Alfândega da Fé para lhe acudirem. Deu-se então o encontro e houve grande luta entre eles. Só que as hipóteses dos cristãos se salvarem era poucas, pois os mouros eram muitos. De repente, segundo conta o povo, a noiva ajoelhou-se e pediu socorro a Nossa Senhora. E assim, quando os cristãos estavam já quase vencidos, ganharam novo ânimo, mais coragem, mais força, e venceram os mouros. Estes fugiram e deixaram as armas. Diz o povo que houve quem visse, no meio da batalha, o vulto de uma mulher desconhecida, com um vasilha de bálsamo e umas folhas na mão esfregando as feridas dos cristãos. E que estes, depois disso, ficavam curados e se erguiam para combater de novo. Dizem que era Nossa Senhora. Primeiro chamaram-lhe a Senhora do Bálsamo na Mão e hoje é conhecida como Nossa Senhora de Balsamão. E tem lá um importante santuário. Fonte – Versão A: LEAL, Pinho – Portugal Antigo e Moderno, vol. 2, Lisboa, Livraria Editora de Mattos Moreira & Companhia, 1873, p. 265. Fonte – versão B: PARAFITA, Alexandre – “A Imponência do Monte Carrascal – Acontece em Balsamão: Fé e Turismo de mãos dadas”, in O Comércio do Porto, 29 de Junho de 1982, p. 21. Fonte – versão C: Inf.: Mabilde da Conceição Afonso, 47 anos: rec.: Macedo de Cavaleiros, 2009.

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73 – A Pedra Baloiçante A nordeste de Bouzende, concelho de Macedo de Cavaleiros, coisa de um quilómetro do povo, no cume de um cabeço coroado por uma longa fiada de fraguedos graníticos chamados de Penha Mourisca, que marcam a divisória entre os termos de Bouzende e Soutelo Mourisco, fica a Fraga do Berço, também dita Sino dos Mouros e ainda Embanadouro. (...) Oscila a um pequeno impulso, inclinando-se para um e outro lado, mas colocando-se um homem em cima dela e calcando alternadamente ora com o pé direito ora com o esquerdo, produz tão grande som que dizem ouvir-se em Ferreira, povoação distante dez quilómetros. De onde vem, segundo a lenda, que essa pedra oscilante foi um sino primitivo dos cristãos que, não podendo utilizar os de metal, se serviam dele para chamar os fiéis à oração, sem despertar a perseguição dos mouros. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, pp. 124-125.

74 – O tesouro do monte do Castelujo Passou uma vez uma mulher junto a umas fragas no monte do Castelujo, em Peredo, concelho de Macedo de Cavaleiros, e disse: – Eu não sei o que sinto aqui! Só sei que é um barulho... Era o barulho dum tear. Mas como não via tear nenhum, ela não acreditava. E como continuava a ouvi-lo, disse, agora cheia de medo: – Ai, Jesus, que eu não sei o que sinto aqui! Em resposta, ouviu uma voz que lhe disse: – Vai andando, que eu cá fico tecendo o meu ramal. Então o que havia de ser? Dizem que era uma princesa encantada, que estava ali condenada a tecer enquanto não fosse descoberto um tesouro que estava enterrado no Castelujo. E dizem também que as pancadas do tear só se sentiam no mês de S. João, antes do nascer do sol. Fonte: Inf. : Ilda de Jesus Paredes, 69 anos; rec.: Peredo, Macedo de Cavaleiros,1999

75 – A moura e o moleiro de Nozelos Perto de Nozelos, no concelho de Macedo de Cavaleiros, havia há muito tempo, à beira do rio, um moinho onde vivia o moleiro. Numa manhã, o moleiro encontrou junto a uma fraga que ainda lá existe um pente de ouro. Apanhou-o e ficou todo o contente.

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Nisto apareceu-lhe uma donzela muito bonita, que lhe disse: – Esse pente é meu, mas, se o quiseres, pode ser teu. E posso ainda dar-te mais riquezas. Só tens de me desencantar, pois eu sou uma moura e estou encantada numa cobra. E explicou-lhe como tinha de fazer. Ir lá num determinado dia, a uma determinada hora e esperar que a cobra viesse e subisse por ele acima, até lhe dar um beijo. E também lhe disse que se tivesse medo, estragaria tudo. O moleiro aceitou e à hora combinada lá foi. Sentou-se na dita pedra e esperou. De repente, sentiu atrás de si um barulho a roçar nas ervas, o que o fez tremer de susto. A seguir olhou para trás e já nada viu. Apenas uma voz: – Ah, maroto, que me dobraste o encanto! E nunca mais encontrou nem a moura, nem a cobra. Fonte: Inf.: Eugénia Gonçalo, 58 anos; rec.: Nozelos, Macedo de Cavaleiros, 2000.

76 – Lenda do Cabeço dos Mouros Versão A:

No tempo em que os mouros viviam na Península, diz-se que se instalaram no cimo de uma montanha no termo das Arcas, concelho de Macedo de Cavaleiros, que passou a chamar-se "Cabeço dos Mouros". Como no sopé desta montanha passa um rio, os mouros, para conseguirem uma melhor estratégia militar, trataram de dividir o seu curso, de maneira que o rio ficasse a passar metade de um lado da montanha e metade do outro. E assim ficaram mais isolados e protegidos. É essa a explicação que a tradição dá para um extenso fosso, com cerca de trinta metros de profundidade, que ainda hoje se pode ver no local. Diz também o povo que, quando os mouros foram expulsos, ficou no cabeço uma princesa encantada de rara beleza, que costuma estar a tecer num tear de ouro. Esta princesa apareceu numa noite de S. João, em forma de serpente, a um moleiro das Arcas, ao qual pediu um beijo a fim de tentar libertar-se do encantamento que ali a aprisionava. Só que o moleiro assustou-se ao aproximar-se dele tão repugnante animal e fugiu. E ela exclamou: – Ah, cão, que me dobraste o encanto! Versão B (Lenda da Cobra das Drobas):

Nas Drobas das Arcas, concelho de Macedo de Cavaleiros, num sítio a que chamam "Cabeço dos Mouros" há um mistério qualquer. Quando eu era rapaz íamos para lá com o gado e lembra-me haver um buraco, onde atirávamos com as pedras e sentíamo-las tilintar lá em baixo. Agora o que lá havia não sei.

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Só sei o que me contou um homem, chamado Zé Moleiro. E isso passou-se com ele, já lá vão uns cinquenta anos, ou mais. Ia então esse homem a passar por lá, ao correr do rio, e tocava um animal para beber água. De repente viu uma menina, que estava conforme Deus a botou ao mundo. Estava à borda do rio, a lavar-se e a pentearse com um pente de ouro. O homem passou e disse para ela: – Bom dia, menina. Que está por aqui a fazer? – Ando a saber de quem me queira levar. – Nesse caso vou buscar roupa e levo-a – disse o homem. – E então como é que a menina aparece aqui assim? – Deixaram-me aqui despida – disse ela. Puseram-se então a falar um com o outro e dali a nada já se tratavam por tu. Diz-lhe então ela: – Tu serás capaz de me vir buscar. Amanhãs às tantas horas passas por aqui e levas-me. Mas não tenhas medo. Vem uma serpente, e na serpente fico eu. Quando subir por ti acima, e te beije, fico mulher como estou agora aqui. Ele concordou. Mas antes de ir embora botou-lhe as mãos e tirou-lhe o pente de ouro. E levou-o. No dia seguinte, à hora combinada, lá tornou o homem a passar no sítio do "Cabeço dos Mouros". Esteve à espera, à espera, até que lhe veio um monstro, que era uma cobra. E ele quando viu a cobra fugiu-lhe. Teve-lhe medo. A rapariga veio a ela e chamou por ele, a dizer que lhe tinha dobrado o encanto. Que estava encantada e que estava lá cheia de ouro, que queria ser desencantada, mas dobrou-se-lhe o encanto. O homem diz que ainda voltou para trás a ver se a agarrava, só que ela escondeu-se e nunca mais a viu. Esse homem era pobre, e com esse pente que vendeu não sei que riqueza apanhou. Só sei que até à data em que encontrou essa mulher nem tinha sequer uma junta de bois, tinha apenas uma burrita. E dali para diante comprou juntas de bois a uns e outros. Fonte – versão A: Inf.: Mabilde da Conceição Afonso, 47 anos; rec.: Macedo de Cavaleiros, 1999. Fonte – versão B: Inf.: Manuel Rodrigues, 65 anos; rec.: Arcas, Macedo de Cavaleiros, 2000.

77 – Lenda de Latães A aldeia de Latães, situada nas fraldas da serra de Corujas e pertencente à freguesia de Amendoeira, concelho de Macedo de Cavaleiros, tem a origem do seu nome ligada às lendas das lutas entre cristãos e mouros. Dizem os mais antigos que os mouros dominaram estas terras durante muito tempo. Depois vieram os cristãos e moveram-lhes uma luta feroz até que os expulsaram. Os habitantes serranos, ao saberem desta vitória, ficaram todos satisfeitos e foram atrás do chefe cristão, para lhe dizerem:

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– Já que nos livraste dos mouros, vimos pedir-te que dês agora um nome cristão à nossa terra. O chefe cristão, que estava cheio de pressa para ir em perseguição dos mouros que continuavam a dominar outras terras, não lhes ligou nenhuma. Os serranos foram então embora, mas um ficou a combater ao lado dos cristãos. E como insistisse em pedir um nome cristão para a sua terra, o chefe das tropas acabou por mandá-lo embora dizendo: – Vai-te embora, que quando lá chegares lá o tães. O serrano ao chegar ao pé dos seus vizinhos transmitiu-lhes as palavras do chefe cristão. E estes, tanto as repetiram para tentarem entender que nome seria esse, que acabaram por ficar no ouvido com o nome "Laotães", que, depois de muito usado, veio a dar em Latães. Fonte: Inf.: Ângelo José Morais, 47 anos; rec.: Macedo de Cavaleiros, 1999.

78 – Lenda da Pia dos Mouros Próximo da aldeia de Ala, no concelho de Macedo de Cavaleiros, há um campo chamado Parafita, onde está aquilo que o povo diz ser a Pia dos Mouros, e onde a tradição também diz haver uma moura encantada. A pia é, afinal, um enorme buraco numa rocha, que tem gravadas duas patas de um cavalo. E quando chove armazena-se ali muita água. Segundo a tradição, a moura mandava os criados com os cavalos a beber nesse buraco, por isso lhe foi dado o nome de Pia dos Mouros. Ainda hoje há quem recorde uma cantiga que diz: " – Há em Parafita uma grande pia, que os mouros fizeram p'ra beber a cria"

Também se diz que há lá um tear de ouro e que já lá foram escavar a ver se o encontravam. Só que a determinada altura as ferramentas não conseguem penetrar, e por isso se diz que é impossível encontrá-lo. Conta-se que essa moura se apaixonou por um jovem cristão. Mas teve sempre de encontrar-se com ele às escondidas do seu pai, que a tinha destinada a casar com um da sua raça. Entretanto, o tempo passou e, quando os mouros iam ser expulsos destas terras, ela encontrou-se com o jovem cristão, dizendo-lhe: – Eu não posso cá ficar, tu não podes ir comigo, mas também não posso ficar sem ti. Sabes como resolver isto? – Não sei – responde o jovem.

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– Mas sei eu – torna-lhe a moura. – Ora ajuda-me a encher esta pia. Encheram-na. E no fim disse a moura: – Esta pia será a nossa cama de núpcias. Abraçaram-se então, deram um grande beijo e lançaram-se à água, onde morreram afogados. Diz o povo que, mais tarde, se encontraram naquele local os cristãos com os mouros. Os cristãos à procura dele e os mouros à procura dela. E o que viram eles? No fundo da pia os dois jovens estavam ainda de mãos dadas e com os lábios colados um no outro. Ao verem tal, cristãos e mouros resolveram não se guerrear mais. Fonte: Inf.: Ângelo José Morais, 47 anos; rec.: Macedo de Cavaleiros, 1999.

79 – O moleiro, a moura e a cabra Conta-se na aldeia de Vila Nova da Rainha, do concelho de Macedo de Cavaleiros, que houve um moleiro daquela povoação que, quando era novo, encontrou uma menina sentada numas fragas que há por ali perto, e que esta estava a pentear-se com um pente de ouro. Ao vê-la, e porque era muito bonita, pôs-se a olhar para ela. E a menina perguntou-lhe: – Ó moleiro, tu és solteiro? – Sou - disse ele. – Então casa comigo, e verás como ficas muito rico. Vem aqui amanhã, para eu te dizer o que tens a fazer. O moleiro ficou todo contente. E no dia seguinte lá foi. Só que nas mesmas fragas, onde esperava encontrar a menina, encontrou uma cabra. E, como se tal não bastasse, a cabra ainda se pôs a olhar para ele, com olhos de quem lhe queria dizer qualquer coisa. Então o moleiro, como ainda era novo, acagaçou-se todo, e fugiu. E nas suas costas, ouviu a cabra a dizer: – Ah, maroto, que dobraste o meu encanto! O moleiro parou, e só então percebeu que aquela voz, embora saísse da boca da cabra, era a voz da menina que lhe prometera casamento. Por isso retrocedeu para ir ter com ela. Mas já nada adiantou. A menina nada quis com ele. E disse-lhe que não voltasse a passar por ali, senão acontecer-lhe-ia uma grande desgraça. Por isso o moleiro – diz quem o conheceu – nunca mais por lá passou. E dizem ainda que, sempre que ele contava esta história a alguém, acontecia-lhe logo alguma coisa de mal. Fonte: Inf.: Maria Teresa Afonso Malta, 45 anos; rec.: Macedo de Cavaleiros, 1999.

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80 – O Vale dos Namorados Há um lugar perto da aldeia de Grijó, concelho de Macedo de Cavaleiros, a que chamam Vale dos Namorados e onde se diz que existe um encanto. Esse encanto é uma capelinha em oiro e uma grande cobra que está em cima dela. Quem quiser quebrar o encanto e ficar com a capelinha tem que ter muita coragem. Deverá ir ao Vale dos Namorados, à meia noite e sozinho, e esperar que lhe apareça a cobra. Esta subir-lhe-á pelo corpo acima e beijará a pessoa na boca. Se não tiver medo, a cobra transformar-se-á numa moura rica, e a pessoa ficará com a capela. Se a pessoa estremecer com medo, a cobra diz: – Ah, maldito, dobraste-me o encanto. E a moura ficará encantada, como cobra, mais cem anos. Já muitas pessoas foram a esse local, mas quando chega a meia noite fogem com medo. Fonte: Inf.: Belizanda dos Anjos, 95 anos; rec.: Grijó, Macedo de Cavaleiros, 2000.

81 – O tesouro da serra de Bornes Versão A:

Segundo os antigos, quando os mouros abandonaram a serra de Bornes, no concelho de Macedo de Cavaleiros, deixaram lá enterrado um grande tesouro. E dizem também que no sítio onde ele está enterrado passa um braço de mar. Já muitos lá têm ido procurar o tesouro. Esgaravatam aqui, escavam ali, mas todos desistem sempre com medo de encontrarem primeiro o braço de mar. É que se isso acontecesse ficaria tudo alagado. Versão B (A fraga dos Corvos):

Há também uma grande fraga em Vilar do Monte, a que chamam a Fraga dos Corvos. Diziam os antigos que aquela fraga segura um braço de mar que está debaixo da serra de Bornes, e que prestes ao fim do mundo o mar vai rebentar por ali e inundar tudo sete léguas em redor. Nesta fraga antigamente viviam os mouros, que fizeram uma passagem subterrânea até à aldeia de Chacim, a uns quatro quilómetros de distância, a qual permitia que os mouros de Chacim e de Vilar do Monte se encontrassem. Nessa passagem nunca ninguém conseguiu entrar, pois se alguém o tentasse a luz que levava imediatamente se apagava. Fonte – versão A: Inf. Maria Virgínia Pires Torres, 38 anos; rec.: Castelãos, Macedo de Cavaleiros, 2000. Fonte – versão B: Inf.: Maria do Rosário Pinto, 34 anos; rec.: Macedo de Cavaleiros, 1999.

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82 – O mouros do Monte de Morais Antigamente a aldeia de Morais ficava situada no lugar da Senhora do Monte, onde ainda existem as ruínas da igreja. Diziam os antigos que os habitantes tiveram de sair de lá, pois os mouros, que viviam no cimo do monte, atiravam-lhes com enormes pedras e bolas de ferro, destruindo as casas da povoação e a igreja. Os habitantes resolveram então ir construir as suas casas no sopé do monte, em lugar abrigado, dando origem à aldeia de Morais. Tiveram de abandonar a igreja, mas, ao menos, não voltaram a ser incomodados pelos mouros. Dizem também que aos mouros do Monte de Morais nunca ninguém os via, pois tinham lá uma entrada que dava para debaixo da terra, onde desapareciam com os seus cavalos. Fonte: Inf.: Ana Lázaro, 75 anos, 2001; rec.: Morais, Macedo de Cavaleiros, 2000.

83 – O Zé-da-moura Conta-se que os mouros que viviam no Monte de Morais, quando foram expulsos destas terras, uns iam doentes, outros feridos, e muitos não aguentaram a fuga. Entre eles estava uma jovem moura, que, de tão cansada, acabou por esconder-se numas fragas e lá ficou. Mais tarde, andava por ali um caçador, que a encontrou. Ao vê-la cheia de medo, apiedou-se dela e levou-a para sua aldeia, recolhendo-a em sua casa. E como era rapaz solteiro, resolveu casar com ela, mesmo enfrentando o falatório dos seus vizinhos, que andavam sempre a dizer: – O Zé casou com uma moura! O Zé casou com uma moura! Ficou por isso conhecido por “Zé-da-moura”. Depois tiveram muitos filhos e dizem que foi assim que nasceu a família dos Mouras, um apelido muito conhecido na região e que perdura há muitas gerações. Fonte: Inf.: Alzira Correia Alves da Veiga, 67 anos; rec.: Bagueixe, Macedo de Cavaleiros, 2001.

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Concelho de Mesão Frio

84 – [O Castelo dos Mouros em Fontelas] Nas abas da serra, onde o ribeiro [de nome Cabril, situado em Fontelas, no concelho de Mesão Frio] se precipita furioso, existe na sua margem direita, bem descoberto, um formidável morro de granito, a que o povo daqui dá o nome de Castelo dos Mouros. Tem a forma de uma mamoa celta. Crê o povo que dentro dele está uma moura encantada, guardando ricos tesouros em grutas subterrâneas. Fonte: LEAL, Pinho – Portugal Antigo e Moderno, vol. 5, Lisboa, Livraria Editora de Mattos Moreira & Companhia, 1875, p. 373

85 – Os mouros e o convento do Varatojo Na vila de Mesão Frio, no local onde está o convento dos Franciscanos do Varatojo, que hoje funciona como Câmara Municipal, existe, segundo a tradição oral, uma escada subterrânea que vai dar a uma mina muito funda e muito comprida, que atravessa o rio Douro até às terras do Douro Sul. Diz-se que a mina foi construída, há muitos e muitos anos, pelos mouros e que estes levavam por lá os cavalos a beber. Diziam os mais velhos que a mina vai dar ao convento de Barrô, em S. Martinho de Mouros, que fica do outro lado do rio. Mas não consta que alguém lá tenha conseguido entrar alguma vez para saber ao certo que género de mina será esta. Fonte: Inf.: Bernardino Vieira de Oliveira, 50 anos; rec.: Barqueiros, Mesão Frio, 2001.

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Concelho de Miranda do Douro

86 – [O cristão, o mouro e a Senhora do Nazo] Versão A:

Em certo tempo um homem destes sítios [povoação da Póvoa, concelho de Miranda do Douro] estava cativo pelos mouros em Argel, e com tanto rigor o tratavam que, apesar de o terem sempre guardado com sentinela à vista, ainda o traziam preso com fortes grilhões de ferro, e à noite era fechado dentro de uma arca para isso apropriada. Em cima da arca dormia o mouro que o guardava. E, em uma noite que implorava a Nossa Senhora do Nazo que o livrasse de tão penoso cativeiro, com tanta fé lhe pediu que nessa mesma noite, de madrugada, apareceu à porta deste templo tal qual estava no cativeiro, isto é, ainda preso com as correntes de ferro, dentro da arca, e o mouro a dormir em cima. Era Domingo ou dia de festa, e o mouro acordou surpreendido com o repicar dos sinos, e vendo-se em terra estranha e desconhecida, soltou logo o cristão e pediulhe que lhe não fizesse mal. O cristão não era muito inimigo do mouro, apesar de o ter tido por guarda de cativeiro, ainda assim, por castigo, lhe mandou abrir um poço, ao pé do templo. O mouro pôs logo mãos à obra com tanta felicidade, que a pequena fundura deu óptima água, da qual se conserva sempre cheio, tanto de Verão como de Inverno, o que é realmente uma providência para o povo, porque esta parte do planalto é muito falto de água, e alguma que aparece é tirada de cisternas e reservatórios. Por fim o cristão e mouro, depois de se demorarem aqui alguns dias, desapareceram, deixando os grilhões e a arca de memória à Senhora. E certo é que ainda hoje, nos dias de romaria, ali se acham expostos ao público uns grossos grilhões de ferro, que dizem ser os mesmos da lenda, e a arca desapareceu corrompida com o decorrer dos anos – dizem os habitantes da freguesia. Versão B:

Junto à aldeia da Póvoa [concelho de Miranda do Douro], a distância de dois quilómetros, no alto de um monte, há um templo dedicado a Nossa Senhora do Nazo, de construção antiquíssima, ignorando-se por quem e quando se edificou. (...)

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Segundo a lenda, um homem daqui estava cativo em Argel, e, em uma noite que implorava à SS. Virgem que o tirasse do cativeiro, apareceu na madrugada à porta deste templo, ainda preso com os grilhões de ferro, que deixou por memória á Senhora. Diz também a lenda que este indivíduo se demorou alguns dias neste lugar, durante os quais abriu um poço que, a pequena profundidade, deu óptima água, que corre perenemente, tanto de inverno como de verão, o que é uma providência para o povo, porque a freguesia é muito falta de água, sendo a maior parte da que há de cisternas ou reservatórios mais ou menos rústicos. Versão C:

Um cristão foi a andar e achou-se na Moirama. Aí meteram-no numa arca e o moço da casa dormia por cima, para aquele não fugir. O cristão pediu do coração à Senhora do Nazo que o resgatasse, que ele lhe faria um poço para dar água para os romeiros. Um dia apareceu em terra cristã a arca com o cristão dentro e o mouro em cima. O mouro, quando ouviu tocar o sino, disse ao cristão: – Cristianismo, in tua terra há sincernos25? – Sim, muchos y buenos. – Levanta-te, cristianismo, que em tua terra estemos. O cristão obrigou o mouro a abrir o poço. Donde se vê que foi o cristão quem fez a promessa e o mouro quem a cumpriu. Versão D (O cristão, o mouro e a Senhora do Naso):

Noutros tempos nas terras de Miranda os cristãos eram escravos dos mouros. Havia então um cristão que tinha de trabalhar no duro durante o dia, e à noite era algemado de pés e mãos, e metido dentro de uma arca fechada. E em cima dela dormia um mouro que ali estava de guarda. O cristão, que tinha muita fé em Nossa Senhora do Naso, passava o tempo a rezar-lhe, implorando que o libertasse daquela escravidão. Até dentro da arca rezava. Por fim, num certo dia, ao amanhecer, a arca apareceu num lugar diferente daquele onde tinha ficado à noite. E em cima dela lá continuava o mouro, que acordou com o som dos sinos a tocar ali perto. Perguntou então ao cristão para dentro da arca: – Na tua terra há sinos? O cristão disse-lhe que sim. Então o mouro, sentindo-se vencido por aquele milagre, libertou-o e disse-lhe: – Podes mandar-me fazer o que quiseres. O cativo agora sou eu. Em resposta, o cristão ordenou-lhe que fizesse ali um poço. O mouro pôs-se então a escavar, sempre a escavar, e, como o cristão, nunca mais lhe deu ordens para parar, ele foi sempre escavando. E assim o poço nunca mais teve fim. Há quem fale que o dito poço não tem fundo, e que o mouro ainda lá anda a escavar. O povo canta ainda hoje a seguinte quadra: 25

Designação popular arcaica sinónimo de sinos. Relato semelhante, transmitido por Alzira da Conceição Martins, 67 anos, de Uva, Vimioso (2000), usa outra designação: censírios.

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Nossa Senhora do Naso, Olhai o que diz o mundo, Que tendes na vossa veiga Um poço que não tem fundo. 26. Fonte – Versão A: PEREIRA, José Manuel Martins, As Terras de Entre Sabor e Douro, Setúbal, J.L. Santos, 1908, pp. 238-239. Fonte – versão B: LEAL, Pinho – Portugal Antigo e Moderno, vol. 7, Lisboa, Livraria Editora de Mattos Moreira & Companhia, 1876, p. 604. Fonte – versão C: VASCONCELLOS, J. Leite – Contos Populares e Lendas, Coimbra, Acta Universitatis Conimbrigensis, 1969, pp. 734-735. Fonte – versão D: Inf.: Orquídea da Conceição Cubeiro Xavier, 40 anos; rec.: Miranda do Douro, 1999.

87 – O poço sem fundo Diz o povo que os mouros para se esconderem dos cristãos, resolveram construir no lugar do Naso, concelho de Miranda do Douro, um poço sem fundo. E quando este já ia muito fundo, ouviram uma voz que disse assim: – Ó Maria, traz cá as peneiras! Conta a lenda que os mouros, ao ouvirem tal, ficaram aterrorizados, pois pensaram que tinham chegado ao outro mundo. E por isso fugiram. Mas antes puseram uma cancela a meio do poço para as almas não passarem. Há quem diga que a cancela ainda lá está. Fonte: Inf.: Orquídea da Conceição Cubeiro Xavier, 40 anos; rec.: Miranda do Douro, 1999.

88 – A Fonte do Pingo No termo de Sendim, concelho de Miranda do Douro, existe junto ao rio Douro uma fonte no buraco de uma fraga. E como está sempre a pingar, o povo chama-lhe a "Fonte do Pingo". Conta-se que um pastor dormia à noite perto dessa fonte, num buraco doutra fraga que lá havia. E que um dia de manhã, quando ia com o gado a pastar, ouviu uma 26

Também a Senhora da Orada, em Melgaço, no Minho, é venerada por razões semelhantes. É tradição antiga – diz, a propósito, Leite de Vasconcellos – que, “pela protecção desta Senhora, se livraram muitos cativos que estavam em terras de Mouros, e que, recorrendo à Santíssima Virgem, apareceram às portas deste templo, com os grilhões e cadeias com que estavam presos” (1969: 511).

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linda voz de menina que vinha da fonte. Aproximou-se para ver quem era, mas não viu ninguém. Olhou então para a água e viu lá no fundo um cordão de ouro. Começou a puxá-lo e foi-o enrolando no braço. E quanto mais puxava e enrolava, mais o cordão vinha atrás. Nunca mais acabava. Ora, a dada altura, já lhe doía o braço com tanto peso. E como não conseguia enrolar mais, disse: – Arre, que pesado! Tal coisa não tivesse ele dito. Ouviu então a mesma voz, agora chorosa, que lhe disse: – Ah, maldito, que me dobraste o encanto! Então o cordão desapareceu. O pastor ficou cheio de medo e fugiu com as ovelhas. Dizem que nunca mais voltou para aqueles lados. Fonte: Inf.: Orquídea da Conceição Cubeiro Xavier, 40 anos; rec.: Miranda do Douro, 1999.

89 – O cabreiro e a moura Entre as povoações de Freixiosa e Vila Chã, no concelho de Miranda do Douro, passa uma ribeira onde há um poço conhecido como "Poço da Moura". Dizem que num dia de inverno passou junto daquele poço um cabreiro chamado António, e ouviu uma voz a dizer-lhe: – António, toma uma rosa. O cabreiro ficou cheio de medo, mas conseguiu responder, dizendo: – Rosas em Janeiro?! E para espanto maior, em resposta caiu na sua frente uma rosa vinda do poço. Foi uma moura que lha mandou. E a seguir disse-lhe: – Leva-a contigo e nunca a mostres a ninguém, se quiseres que a tua vida mude para melhor. António, ao chegar a casa, guardou a rosa no fundo da arca de roupa do seu quarto. Passados alguns dias, a sua mãe foi lá remexer e encontrou-a. E muito admirada foi contar às vizinhas. Nenhuma acreditou. Tiveram de ir lá ver com os próprios olhos. Só que ao abrirem de novo a arca o que encontraram foi um enorme carvão. A mãe passou assim por mentirosa. E António quando soube ficou muito triste. Voltou depois ao poço da Moura mas nunca mais teve sinal dela. Fonte: Inf.: Orquídea da Conceição Cubeiro Xavier, 40 anos; rec.: Miranda do Douro, 1999.

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90 – S. Bartolomeu e os mouros A aldeia de Teixeira, do concelho de Miranda do Douro, é muito devota a S. Bartolomeu. Com o amparo deste santo, o povo acredita estar livre das guerras. Diz-se que, no tempo dos mouros, estes tentaram invadir a aldeia e que o povo pediu ajuda a S. Bartolomeu. E a ajuda chegou. Quando os invasores estavam a entrar na aldeia formou-se nas "marras", um lugar que separa a povoação da Teixeira da povoação vizinha de Atenor, uma grande barreira que ninguém conseguia ver. Só os cavalos é que a viam e, por isso, não entravam. Voltavam sempre para trás. Até que os mouros desistiram. Este santo é venerado numa grande festa, que tem lugar no dia 24 de Agosto. Aos seus pés tem o diabo acorrentado. E na véspera da festa o povo liberta-o para que o santo vá sem ele na procissão. Por isso se diz que, nesses dias, o diabo anda à solta. E se acontece alguma coisa de ruim, diz-se: "Foi o diabo, ele anda à solta...". Fonte: Inf.: Maria do Carmo Lopes, 39 anos; rec.: Teixeira, Miranda do Douro, 2000

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Concelho de Mirandela

91 – Basília Um homem ia para Roma; perdeu-se e foi bater a um povo chamado Foz d’Aroiça27. Pernoitou numa casa, onde uma mulher lhe procurou de que sítio era. Ele respondeu: – De Rego da Vide28. Ela perguntou-lhe se sabia o sítio duma fraga, que tinha um buraco; ele respondeu que sim. Então ela disse-lhe: – Eu convido-o bem29 e há-de chegar ao dito buraco e dizer três vezes: Basília! Ele foi e respondeu-lhe uma voz de dentro: – Quem pelo nome me chama notícias de minha mãe traz. A dita mulher entregara-lhe uma jumentinha de massa, que ele devia conservar inteira até ao momento em que a voz lhe respondesse. Assim a devia lançar ao tal buraco. Ele, porém, levando-a no bolso, deixou-lhe quebrar uma perna. Quando a deitou ao buraco, ouviu: – Que infeliz tu foste! Dobraste o meu encanto. Além do dinheiro que minha mãe te deu, ficavas senhor dum grande haver. Contudo voltarás e aqui acharás todos os dias um tostão. Um dia ele estava a jogar e disse: “– Troco e torno a trocar, Que a fraga da moura Para tudo há-de dar.”

Desde então não deu a fraga mais nada. Fonte: VASCONCELLOS, J. Leite – Contos Populares e Lendas, Coimbra, Acta Universitatis Conimbrigensis, 1969, pp. 790-791.

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Não nos foi possível, na Região de Trás-os-Montes, localizar aldeia alguma com este nome. É de admitir que se trate de povoação antiga já extinta, ou então este nome corresponda a qualquer outra localizada em zona mais distante (por exemplo, no concelho de Lousã há uma aldeia chamada Foz do Arouce). 28 Pertence ao concelho de Mirandela 29 Regionalismo que é sinónimo de “recompenso-o bem”.

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92 – [Santa Comba e o rei Orelhão] Versão A30:

Dentro da cerca da vila se conta que no tempo dos mouros se recolheram nesta cerca os cristãos, que foram uns falsos, que entregaram as chaves aos mouros e degolaram todos os que estavam dentro, que dizem chegara o sangue onde hoje está o pelourinho. E desta vila eram naturais S. Leonardo e Santa Comba, de gente lavradora e pobre, que andavam no monte guardando o gado de seus pais; o rei mouro, que se chamava Orelhão, quis intender com a moça e eles foram fugindo até onde está um penhasco alto, e a santa se meteu pela fraga e ali escapou, [pois] que milagrosamente lhe abriu a passagem para dentro, e dizem [...]31 lhe tiraram as tripas, coração e os botaram a um poço no alto da serra. E da parte de fora do cabeço está outra capela da invocação de S. Leonardo, que dizem foi aqui martirizado. Aqui acodem muitas povoações em procissão de vários povos a pedirem água aos santos e tudo Deus lhes concede por sua intervenção. A esta parte lhe chamam agora Serra do Rei de Orelhão e em um cabeço que está para o sul da capela dos santos está o refúgio32 onde morava o rei mouro. Versão B:

Segundo a lenda, Santa Comba e São Leonardo guardavam os seus rebanhos na serra que hoje tem o nome da santa. Orelhão [rei mouro], tentado pela formosura desta (que tinha visto em uma caçada) fez-lhe as mais tentadoras promessas, e quando viu baldadas as suas diligências para seduzir a casta donzela, tentou empregar a força. Ela, vendo-se em tão iminente perigo, foge para junto de um penedo, e, invocando a Virgem Maria, esta se abre para esconder a santa. Orelhão, cego de furor e ardendo em desejos, desembainha a espada e dá tão grande cutilada no rochedo, que ainda hoje se lhe divisa o sinal. Então o feroz mouro vinga-se em Leonardo, matando-o no sítio da serra que por isso se chama fonte de São Leonardo, onde rebenta um manancial de água cristalina. Versão C:

Na Serra de Santa Comba, ao pé de Franco, a alguma distância de Mirandela, havia uma rapariga no tempo dos Mouros. Um governador foi uma vez atrás dela, mas quando a rapariga chegou ao pé de um penedo, este abriu-se e só ficaram de fora os cabelos. O governador mandou em seguida deitar fogo à serra, e ainda hoje se conhece o vestígio do incêndio. Em memória edificou-se ali a capela de Santa Comba, que era o nome da rapariga. 30

Fizemos nesta versão algumas correcções/actualizações de ortografia. Há certamente aqui uma lacuna do narrador original. Pela leitura de outras versões da mesma narrativa, presume-se faltar aqui a alusão à morte de S. Leonardo, sob as lançadas do rei mouro. 32 O local conhecido por “Refúgio do rei Orelhão” é um castro, onde se vêm restos de muros de pedra solta que se serviram de vedação e de habitações. (Alves, 1934a: 449). 31

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Versão D (A lenda do Rei Orelhão):

O nome de Lamas de Orelhão vem de um rei mouro muito mau que viveu nestas terras há muitos e muitos anos. Dizia-se até que o rei Orelhão tinha uma orelha de gato e outra de cão. Portanto, não era só mau. Era mau e feio. Contam os antigos que nesse tempo vivia também aqui uma pastora muito boa e bonita chamada Comba, que costumava ir para os montes com o rebanho juntamente com o seu irmão Leonardo. Um dia o rei Orelhão viu-a e, como era bonita, tentou seduzi-la. Primeiro esperou que estivesse afastada de seu irmão, depois abeirou-se dela e disse-lhe: – Quero que me venhas catar os piolhos. A menina, ao ver que se tratava do rei mouro, e como era ele quem ali mandava, obedeceu. Sentou-se então numa fraga e o rei encostou a cabeça ao seu colo para que o catasse. Estiveram assim horas e horas, pois o mouro, como estava a gostar do colo de Comba, já não queria sair dali. Até que adormeceu. Ela, ao vê-lo a dormir, desatou muito devagarinho o avental, pousou a cabeça do mouro na fraga e fugiu. Dali a nada o mouro acordou e, ao ver que a moça tinha fugido dele, montou no cavalo e foi em sua perseguição para a castigar. Ela fugiu, fugiu, e, ao sentir o mouro já perto, abeirou-se de uma grande fraga e disse: – Abre-te fraga bendita e salva Comba catita! E o milagre deu-se. A fraga abriu-se e a menina entrou nela, desaparecendo da vista do mouro. Este, numa última tentativa para alcançá-la, lançou contra ela a sua lança, que, ao embater na fraga, deixou lá um golpe tamanho que ainda hoje se pode ver. Entretanto, para tentar ajudar Comba, vinha já na mesma direcção o seu irmão Leonardo. Então o mouro pega, vingou-se nele. Só que o ódio era tanto, que não se limitou a matá-lo. Estripou-o. Mais tarde outros pastores foram achar as tripas do Leonardo atrás de um juncal. E nesse mesmo sítio nasceu uma fonte. A água é milagrosa. A fonte ainda hoje ali está e chama-se "Fonte de S. Leonardo". E na fraga onde Comba desapareceu o povo construiu depois uma capela, que tem o nome de Santa Comba dos Vales. 33 Fonte – versão A: Reverendo Matias Pires apud ALVES, Francisco Manuel – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Porto, vol. IX, 1934, p. 448. Fonte – versão B: LEAL, Pinho – Portugal Antigo e Moderno, vol. 4, Lisboa, Livraria Editora de Mattos Moreira & Companhia, 1874, p 31. Fonte – versão C: VASCONCELLOS, J. Leite – Contos Populares e Lendas, Coimbra, Acta Universitatis Conimbrigensis, 1969, pp. 548-549. Fonte – versão D: Inf.: Maria Emília (Tia Locas), 78 anos; rec.: Pai Torto, Mirandela, 1997. 33

É de referir que esta lenda corria já no seio do povo em inícios do Séc. XVI, altura em que António Ferreira lhe deu forma numa extensa composição poética narrativa, de notável elegância e erudição, apresentada em oitava rima decassilábica e sob o título “História de Santa Comba dos Vales”, sendo publicada pela primeira vez na obra “Poemas Lusitanos” editada em 1598. O poeta, que nasceu em Lisboa em 1528 e faleceu em 1569, casou em segundas núpcias com Maria Leite, de Lamas de Orelhão, onde chegou a residir por volta do ano de 1564 (Veloso Martins, s/d: 357), o que permite admitir que esta seria a versão mais comum da lenda.

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93 – A lenda de Dona Chama Versão A:

No alto do monte erguia-se uma torre que era habitada por uma linda princesa moura, afamada pelas suas extraordinárias riquezas e ainda mais pela sua beleza incomparável. Quando algum cavaleiro se dirigia às sentinelas da torre, solicitando licença para falar à princesa, as sentinelas, trazendo o consentimento da castelã, traduziam-no invariavelmente pela fórmula: A dona chama. Cavaleiro que entrasse na torre na torre não tornava a sair. Um denodado cavaleiro, mais feliz do que os outros, porque logrou sair são e salvo do empreendimento de que tantos nunca escaparam, pôde, depois de adormecida a princesa, tirar-lhe de um dedo um anel; levantou-se da cama com todo o cuidado para não a acordar e, chegando até às sentinelas que lhe quiseram embargar a passagem, mostrou-lhes o anel, sinal certo de indissolúvel aliança. Convencidas as sentinelas deixaram-no passar. A princesa, depois de acordada, não vendo o cavaleiro, gritou pelas sentinelas, que a informaram do sucedido. – Está descoberto o meu segredo! – exclamou a princesa, ficando em seguida encantada juntamente com os seus tesouros. A princesa, como era incontinente, recebia sempre os cavaleiros que a procuravam; depois para que não descobrissem o seu segredo – a princesa tinha pernas de cabra –, mandava-os matar. Se não fosse a astúcia do último cavaleiro, nunca se alcançaria saber que a linda moira que habitava a torre era Dona Chamorra, pernas de cabra, cara de senhora.34 Versão B:

A origem da vila de Torre de Dona Chama tem relação com a lenda de uma moura rica, poderosa e bela, que ocupava os seus dias em grande luxúria, seduzindo os homens e tornando-os objecto dos seus jogos de amor. Depois, para tentar preservar o pudor, mandava-os matar, com a justificação de que a haviam molestado na sua honra. Um dia, Dona Chama – assim era conhecida – atraiu aos seus encantos um jovem cavaleiro, cristão, dotado de grande astúcia e inteligência, que depressa percebeu a teia perversa em que, pela sedução, estava sendo enredado. Por isso, aceitou, na aparência, todos os jogos de amor e paixão de Dona Chama, mas, logo que a sentiu adormecida no leito, ergueu-se em silêncio, retirou-lhe de um dos dedos o valioso anel que simbolizava a sua honra, e abandonou sorrateiramente os aposentos. 34

Esta versão é a que consta igualmente nas Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança do Abade de Baçal (Alves, 1934: 457)

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Ao passar pelos criados, exibiu o anel dizendo que lhe fora emprestado pela senhora para que servisse de salvo-conduto à saída e à entrada do castelo. Ninguém lhe pôs, por isso, qualquer entrave. Contudo, o jovem saiu e já não voltou mais, e a bela moura, ao acordar pela manhã, levou tempo a acreditar e a aceitar que fora, pela primeira vez, enganada por um homem. Pela primeira vez, também, sentia-se prisioneira de uma paixão. Por isso, mandou todos os criados procurar o jovem, por terras próximas e longínquas, e ofereceu alvíssaras aos habitantes da zona para que o procurassem também. – Trazei-o até mim, por favor, pois tenho de recuperar o anel! – justificava a moura, fazendo crer que outra coisa não desejava senão fazer justiça pelo roubo a que fora sujeita. Em vão. Nem o jovem nem o anel apareceram mais. À frustração amarga de um amor desencontrado, Dona Chama juntava agora a desonra de ter perdido definitivamente o anel. Por isso, dali a dias, não conseguindo suportar o desgosto, a moura pôs o lindo vestido que usara no dia em que atraiu o jovem, penteou os longos cabelos, soltos e sedutores, e, por fim, cravou no peito um pequeno punhal, lançandose para a morte na cisterna do castelo. Durante muito tempo, o povo dizia ouvir os suspiros e gemidos da bela moura, que provinham do fundo da cisterna.35 Fonte – versão A: LOPO, Joaquim de Castro – "Excursão à Torre de Dona Chama", in O Aqueólogo Português, Vol. 1, nº 9, Lisboa, 1895, pp. 235-236. Fonte – versão B: PARAFITA, Alexandre – O Maravilhoso Popular – Lendas. Contos. Mitos., Lisboa, Plátano Editora, 2000, pp. 167-168.

94 – A sineta dos mouros Versão A:

Diz a tradição que, onde hoje se encontra a vila de Torre de Dona Chama, habitou outrora uma princesa moura que mandou construir uma torre num morro, de onde avistava tudo à volta. E na torre colocou uma sineta com a finalidade de chamar para as refeições as gentes que trabalhavam nos campos. Havia assim o hábito de, sempre que ouviam tocar a sineta, dizerem as pessoas: – Vamos lá, que a dona chama! E daqui nasceu o nome da povoação. Mas as pessoas antigas também dizem que a moura vivia com uma criada que era muito faladora e que gostava de ir conversar com as pessoas da povoação. A patroa, quando dava pela sua falta, tocava a sineta da torre e então a criada dizia para as pessoas: 35

Das duas versões aqui apresentadas, a segunda é a mais próxima das referências que a ela encontrámos nas Memórias Paroquiais de 1755. (apud, Azevedo, 1903: 216.

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– Tenho que ir, que a dona chama! Há quem diga que foi assim que nasceu o nome de Torre de Dona Chama. Versão B (Dona Chamôrra):

Dona Chamôrra era uma princesa moura muito bela e rica, mas ambiciosa e má. Tinha o seu castelo no monte mais alto de uma povoação que ela dominava e onde os habitantes eram seus escravos, entregando-lhe todo o ouro que arranjavam no dia a dia. E para que não se esquecessem de subir ao monte a entregarem-lho, ela ia à torre do castelo e tocava três vezes num enorme gongo de ouro. O som ecoava nas redondezas e cá em baixo o povo dizia: – Vamos, que a Dona Chama! E assim a moura amontoava riquezas e mais riquezas no seu castelo, ao mesmo tempo que o povo passava fome. Até que um dia o povo se cansou de tantos sacrifícios e, após reunião de todos, decidem revoltar-se contra a tirania da moura: deixaram de lhe levar mais ouro. Ela bem tocava no gongo, mas o povo... nada. Ela então, incapaz de lutar contra todos, e adivinhando que a seguir lhe iriam buscar o ouro ao castelo, resolve vingar-se à sua maneira. Agarra no ouro todo que tinha e enterra-o num poço bem fundo com uma enorme pedra em cima. E ao lado abre outro poço e enche-o de peste, cobrindo-o com uma pedra igual. De maneira que os poços não se diferençavam. Foi depois à torre do castelo, tocou três vezes para chamar o povo e disse: – Vou desaparecer, mas vós nada lucrareis com isso. Quem tentar encontrar o poço onde está o ouro enterrado, arrisca-se a encontrar o poço de peste e, se tal acontecer, morrereis todos. Por isso, se pobres estais, pobres ficareis. E o povo, conformado, retorquiu: – Pelo menos, somos livres! Diz-se que os poços ainda lá estão com as respectivas pedras em cima. E que ninguém se atreve a ir lá procurar o tesouro. Versão C (O roubo dos burros):

Contavam os mais antigos que os mouros, noutros tempos, viviam na torre da vila e dali mandavam em todas estas terras à volta. A mulher do rei mouro, que era muito má, quando queria chamar as pessoas para que fossem trabalhar para ela, tocava uma sineta e as pessoas então diziam: – A dona chama! A dona chama! E destas palavras ficou o nome Torre de Dona Chama. Um dia, o povo, farto de ser mandado pelos mouros, pediu ao rei cristão que viesse libertá-lo daquele jugo. O rei cristão veio no dia da festa da terra e resolveu pôr em prática um plano infalível. Mandou convidar o rei mouro para a cerimónia da bênção do pão, ao que este acedeu, comparecendo com toda a sua guarnição.

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E, como a torre ficou então desprotegida, o rei deu ordens aos populares para que, enquanto decorriam as cerimónias, fossem lá e roubassem todos os burros aos mouros que era a única cavalaria de que dispunham. E, com esta cavalaria, o povo ganhou a batalha, tomou o castelo e expulsou os mouros da povoação.36 Fonte – versão A: Inf.: Maria Beatriz Pires Pereira, 52 anos; rec.: Vilar de Ouro, Mirandela, 2001. Fonte – versão B: Inf.: Ana Maria Bernardo, 45 anos; rec.: Torre de Dona Chama, Mirandela, 2001. Fonte – versão C: PARAFITA, Alexandre – “Ritualização da guerra em Trás-os-Montes – O roubo dos burros”, in Revista Loa, n.º 19, Março 2004, Bragança, N-Meios, p. 5.

95 – A cisterna da Torre de Dona Chama No castelo da Torre de Dona Chama [concelho de Mirandela] há uma cisterna com uma moura encantada em mulher da cinta para cima e serpente da cinta para baixo. Uma vez passou por ali um homem, e a moura chamou-o e disse-lhe que fosse lá ao outro dia desencantá-la, e que não tivesse medo, porque ela nesse dia apareceria toda serpente, mas o homem ficaria rico. O homem foi. Quando a serpente ia a subir pelo homem acima, a dar-lhe um beijo na boca, assim que chegou à garganta, este intimidou-se e atirou-lhe com o casaco. A serpente enroscou-se, fugiu e exclamou: – Ah! Que dobraste o meu encanto! Ainda assim ela mandou ao homem que a certas horas fosse lá a um lugar, onde acharia uma pedra com doze vinténs, todos os dias. Nessa cisterna, na manhã de S. João, ouve-se um tear a trabalhar. Fonte: VASCONCELLOS, J. Leite – Contos Populares e Lendas, Coimbra, Acta Universitatis Conimbrigensis, 1969, pp. 762-763.

96 – [Mil ais] Milhais [é uma povoação do concelho de Mirandela]. A etimologia popular diz que o nome vem de mil ais soltados pelos mouros numa derrota que ali sofreram. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Porto, vol. X, 1934, p. 130.

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Estes episódios são, ainda hoje, ritualizados pelo povo nas festas de Santo Estêvão, nos dias 25 e 26 de Dezembro.

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97 – [O tesouro, a moura e o diabo] Nos Eivados, concelho de Mirandela, arrancaram uma oliveira por sonharem com um tesouro debaixo dela. Depois de muito ler no Livro de São Cipriano e de muito cavar, apareceu a moura e também o diabo, que ninguém aguentou pé firme, e por isso todos arrebatados por grande vendaval foram projectados a grandes distâncias, ficando o tesouro encantado como estava. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Porto, vol. IX, 1934, p. 632

98 – Lenda de Mirandela Há muito, muito tempo, na encosta sobranceira ao rio Tua, viviam os cristãos, cujo rei tinha uma filha muito bonita. E do lado de lá, na serra do Franco, a que também se chama a serra de Orelhão, viviam os mouros. E também lá havia um rei mouro, que tinha um filho. Quis o destino que um dia os dois príncipes os apaixonassem. Mas como não se podiam casar, nem sequer encontrarem-se, iam todos os dias cada um para a torre do seu castelo, no ponto que fosse mais alto, para poderem ver-se um ao outro. Até que, certa ocasião, os criados do príncipe mouro começaram a estranhar vêlo ir todos os dias para o alto do castelo. E perguntavam-lhe o que ia fazer. Então ele, sem se denunciar, mas também sem mentir, respondia-lhes sempre: – Vou à mira dela! E tantas vezes lá foi, que esse lugar para onde lançava os olhos, a contar mirar a princesa, passou a chamar-se assim mesmo: Mira dela. É hoje aí a cidade de Mirandela. Fonte: Inf.: Maria Elisa Belchior, 47 anos; rec:. Mirandela, 1999.

99 – A maldição da serra dos Passos Conta-se que nos tempos em que os cristãos andavam em guerra com os mouros, estas terras eram governadas por um rei cristão que tinha uma filha. Acontece

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que ela um dia conheceu um jovem mouro e apaixonou-se por ele. E como essa relação nunca seria abençoada, os dois decidiram fugir. O rei quando soube foi em sua perseguição e perdeu-os quando os jovens se esconderam na serra dos Passos, que então tinha farta vegetação. Vai daí, resolveu lançar fogo à serra para que morressem queimados. E por isso diz o povo que a serra está como está, sem vegetação, e onde só se vêem fraguedos, por causa da maldição que o rei cristão lançou aos dois fugitivos. Nunca mais ali nasceu nada que preste.37 Fonte: Inf.: Maria Elisa Belchior, 47 anos; rec:. Mirandela, 1999.

100 – O Monte da Moura Há na localidade de Suçães, do concelho de Mirandela, um lugar que é chamado "Monte da Moira". Contam os habitantes de Suçães que naquele lugar residiram os mouros e com eles uma princesa que se apaixonou por um soldado cristão. O pai, ao descobrir as inclinações amorosas da filha, mandou encerrá-la numa torre de um castelo. E assim a princesa nunca mais pôde ver o seu amado. E para matar o tempo passava os dias a tecer. Ainda hoje, as pessoas da aldeia dizem que na noite de S. João, à meia noite, se houve o bater do tear da infeliz princesa moura. Fonte: Inf.: Maria de Fátima Teixeira Colmeais, 46 anos: rec.: Mirandela, 1999.

101 – O tesouro dos mouros da Freixeda Há em Freixeda, concelho de Mirandela, um monte com uma fraga, onde dizem que se ouve chorar uma menina nas noites de lua cheia, ao mesmo tento que penteia os seus cabelos com um pente de ouro fino. Nesse sítio havia antigamente umas minas de ouro, que eram exploradas pelos mouros. Por isso eles tinham muito ouro. E quando se deu a tomada da Península pelos cristãos, esconderam-no todo num poço que existe na dita fraga, com intenção de voltarem mais tarde para o levarem. 37

O Abade de Baçal cita um relato algo semelhante, relacionado com a serra dos Passos. É, contudo, omisso relativamente à dicotomia religiosa e apresenta a figura de um pagem, em vez de um mouro, como namorado da filha do rei (Alves, 1934b: 648).

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Diz-se também que deixaram ainda no local um soldado com a família para montar guarda ao tesouro, mas como os cristãos eram em maior número, o soldado e a família foram mortos, ficando só a donzela moura que se escondeu no poço, onde está encantada, e só aparece em certas ocasiões para chorar a sua triste sorte. Este menina transforma-se numa feia serpente que durante o dia descansa na entrada do poço. E para lhe quebrar este encanto era preciso ir lá beijar a serpente, só que ninguém ainda teve coragem para tanto. Fonte: Inf.: Mabilde da Conceição Afonso, 47 anos (que no-la transmitiu tal como a ouviu a pessoas idosas de Freixeda, Mirandela); rec.: Macedo de Cavaleiros, 1999

102 – O caçador e a moura Contam ainda hoje alguns dos moradores mais antigos de Ferreira, concelho de Mirandela, que numa ocasião andava um homem à caça no monte do Serro, o lugar mais alto da aldeia, quando foi beber água a uma fonte e encontrou lá uma menina sentada, a pentear-se com um pente de ouro. A menina, que era uma moura, falou com o caçador, dizendo-lhe que estava ali há muitos anos encantada e que o seu encanto só seria quebrado por alguém que fosse muito corajoso e fizesse como ela pedisse. E que, se conseguisse desencantá-la, ficaria muito rico, ele e toda a família até à quinta geração. O caçador, que se achava um homem corajoso, aceitou. Ela então disse-lhe: – Primeiro venho transformada num sapo e subo até à tua boca para te dar um beijo. Depois venho transformada numa cobra, subo por ti acima e também te dou um beijo. E depois venho transformada num touro bravo e faço-te igual. Mas não podes ter medo nem fugir. Já sabes que serei sempre eu. E não te faço mal. A moura disse-lhe a noite em que teria de lá ir, e ele compareceu. Apareceu-lhe então um sapo muito feio, que lhe saltou para a cara dando-lhe um beijo na boca. E de repente o sapo transformou-se na linda princesa. Toda contente disse-lhe: – Vês como não custou nada? Agora voltarei feita numa cobra, por favor não tenhas medo. Apareceu-lhe então uma cobra a assobiar, subindo por ele acima. Deu-lhe também um beijo e ele aguentou. E mal o beijou, a cobra também se transformou em princesa, sorridente, e toda animada com a coragem do homem. A seguir era a vez do touro bravo. Ele então lá veio, todo enraivecido, fazendo tanta poeira com as patas, abanando a cabeça e a cornadura, espumando pela boca, que o homem ficou de tal modo assustado que desatou a fugir. Apareceu-lhe então a princesa, muito zangada, dizendo-lhe: – Maldito sejas tu e toda a tua família, pois dobraste-me o encanto. Serás um desgraçado até ao fim dos teus dias assim como toda a tua geração.

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E dizem que assim aconteceu. O homem morreu pobre e a família levou o mesmo caminho. Quanto à moura, lá está encantada à espera que o tempo do encanto passe, e alguém, mais corajoso, lá vá quebrar-lho. Ainda hoje muitos têm medo de se aproximar desse lugar. Fonte: Inf.: Maria Olímpia Morais, 43 anos; rec.: Mirandela, 2000.

103 – Lenda do buraco da Muradelha Havia nestas paragens um príncipe mouro que tinha uma filha casadoira muito bonita e que foi pedida em casamento por um outro príncipe, também mouro, muito rico e muito do agrado do seu pai. A jovem, como não gostava do noivo, passou a andar muito desgostosa e, para espalhar a tristeza, costumava ir para o monte cantar. Entretanto, o noivo, ao saber que ela o não queria, e pensando que ia para o monte em busca de alguém do seu agrado, enfeitiçou-a. Passado algum tempo, andava um pastor a guardar o seu rebanho, quando foi atraído por uma voz de mulher. Foi sempre atrás do som que ouvia, e acabou por ir dar ao monte da Muradelha, situado próximo de Vale de Salgueiro, concelho de Mirandela. Deparou então com uma moura encantada, que era metade mulher e metade cobra. E à cintura trazia uma corrente de ouro. Ele ficou muito admirado e assustado. Disse-lhe então ela: – Não tenhas medo. Um beijo teu basta para desfazer o meu encanto. E em troca dar-te-ei esta corrente de ouro. O pastor encheu-se de coragem e beijou-a. E assim o encanto da moura se quebrou, transformando-se numa bela jovem, que logo se apaixonou pelo seu salvador. Contudo, como sabia que esta paixão jamais seria aceite por seu pai, e sabendo que ele a aguardava para a entregar ao noivo, a jovem resolveu fugir, lançando-se ao rio Rabaçal. E o pastor, vendo-a lançar-se, foi atrás dela, mas pelo "Buraco da Muradelha", por onde vai uma mina, com cerca de três quilómetros, dar ao rio Rabaçal. Só que nunca mais se encontraram. Dizem os velhos que todas as noites de lua cheia a moura sobe o rio e vem ao cimo do monte cantar para o pastor. Fonte: Inf.: Maria da Graça Fialho Ferreira Garcia, 43 anos; rec.: Mirandela, 2000.

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104 – O lavrador e a cobra Vivia antigamente em Vale de Telhas, concelho de Mirandela, um lavrador que costumava levantar-se muito cedo para ir trabalhar. Numa certa madrugada de Primavera levantou-se, matou o bicho, tratou dos animais, pôs o arado na carroça e meteu-se ao caminho. Ao chegar ao Monte da Vide encontrou uma tremoncela38 no chão. Mas como tal coisa não lhe fazia falta, continuou o caminho. Mais à frente pôs-se a pensar que, se lhe não fazia falta agora, talvez lhe fizesse jeito depois. Por isso, voltou para trás para a apanhar. Só que quando lá chegou, o que lhe parecia uma tremoncela era agora uma enorme cobra, que lhe disse: – Já vens tarde. Tiveras aproveitado e ambos poderíamos ser felizes. Assim, dobraste-me o encanto e vais carregar esse peso o resto da vida. Serás sempre pobre. A seguir evaporou-se. Segundo se conta, a cobra não era mais senão uma princesa moura encantada. Fonte: Inf.: Ana Batista, 68 anos; rec.: Vale de Telhas, Mirandela, 2000.

105 – Lenda da Fonte de Vide Em Vale de Telhas, concelho de Mirandela, há um lugar a que o povo chama Fonte da Vide. Dizem os mais antigos, e já o ouviam dizer aos avós e bisavós, que naquela fonte há um encanto. Um encanto que é uma menina transformada em serpente. Dizem que duas senhoras, que vinham dos Possacos a vender leite a Vale das Telhas, ao passarem naquela fonte viram uma menina muito bonita, e puseram-se a falar com ela. E ela disse-lhes então: – Agora vêem-me aqui como menina, mas eu estou encantada numa serpente. Qual de vós me quer quebrar o encanto? Eu deixo-as ricas se o conseguirem. Mas não podem ter medo. Uma das mulheres fugiu logo, dizendo que tinha medo às serpentes. A outra não. Disse-lhe que sim. Então, dali a nada, a menina apareceu transformada em serpente e pôs-se a subir pela mulher acima. Ela deixou até certo ponto, mas ao chegar-lhe ao peito, a serpente esticou a cabeça para a beijar. Nesse momento, a mulher teve tanto medo que deu um grito e a serpente caiu. A seguir desapareceu. Foilhe por isso dobrado o encanto. Fonte: Inf.: Maria Inês Sousa, 42 anos; rec.: Vale de Telhas, Mirandela, 2000.

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Designativo local que equivale a timãozeira noutras zonas de Trás-os-Montes. Trata-se de uma espécie de timão rudimentar, feito em madeira, que serve para atrelar o arado ao animal.

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106 – A fraga da mula Perto da aldeia de Frechas, no concelho de Mirandela, há um local que é conhecido por "Fraga da Mula", onde muitos sempre tiveram receio de passar. Nesse local existe um poço onde se diz que está uma moura encantada. Diziam os mais velhos que para a desencantar era preciso ir lá um dia à meia noite, sem olhar para trás e levar um copo de leite e azeitonas. A quem cumprisse estas regras aparecia-lhe uma mula encantada que previa o futuro. Mas se as não cumprisse, o chão começava a abrir-se, as fragas rebentavam e saía de lá uma mula que engolia as pessoas. Daí a dita fraga ser chamada "Fraga da Mula". Fonte: Inf.: Lídia da Assunção Caseiro, 45 anos; rec.: Mirandela, 1999.

107 – Lenda do Regodeiro Diz a lenda que os mouros viveram nas proximidades do Regodeiro, no concelho de Mirandela, e que a aldeia ficou a dever-lhes o nome que tem. Conta-se que no sopé monte, ainda hoje, chamado "Cabeça dos Mouros", corria noutros tempos um regato, no qual os mouros se dedicavam à pesquisa de ouro. E por isso lhe chamaram "Rego do Ouro". Com o passar dos tempos, o povo foi dizendo "Regodouro" ou “Regodoiro”, e, por força do uso, o nome acabou por ficar Regodeiro39. Fonte: Inf.: Lídia da Assunção Caseiro, 45 anos; rec.: Mirandela, 1999.

108 – A grade de ouro Um dia estava um lavrador a pastorear as suas vacas perto de Vila Verdinho, concelho de Mirandela, quando lhe apareceu uma mulher desconhecida, que depois soube ser uma moura, e lhe disse: – Tens aí duas vacas que vão ter dois bezerros. Tu vais criá-los, mas nunca tires às vacas uma pinga de leite. Daqui a um ano, quando for S. João, metes os bezerros no rio com uma grade de gradar a terra. Se assim fizeres terás a tua fortuna. 39

Note-se que, numa grande parte do nordeste transmontano, a pronúncia do ditongo "oi" resulta muito próxima de "ei". Ex: Em vez de "Boas Noites", diz-se algo como "Boas neites". Assim se explica o facto de a denominação "Regodoiro" se haver fixado em "Regodeiro".

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O lavrador, ao chegar a casa, contou à mulher, pedindo-lhe que fizesse como a outra lhe tinha dito. O tempo passou, nasceram os bezerros e lá foram crescendo. Acontece que um dia a mulher do lavrador esqueceu-se do pedido do marido e foi tirar o leite às vacas. Estava então nesta tarefa quando, de repente, se lembrou; e, com a atrapalhação, atirou com o leite por cima de um dos bezerros, que logo ficou todo malhado de branco. Ao chegar a manhã de S. João, o lavrador fez como a moura lho havia dito: meteu os bezerros ao rio com a grade. E qual não é o seu espanto ao ver que a grade, ao ser puxada pelos animais, ia aparecendo à tona da água transformada em ouro. Só que, logo em seguida, do lado do bezerro malhado a grade começa a afundar-se. O lavrador dizia então para os bezerros: – Quer Deus queira, quer não queira, a grade vai p'ró cima da barreira!

É o vais. Quanto mais ele os picava mais a grade se afundava. E, dali a nada, tanto ela como os bezerros foram parar ao fundo das águas. Perdeu tudo. Ouviu-se então uma voz a dizer: – Maldito, que me dobraste o encanto! Fonte: Inf.: Gabriel Coelhoso Moreira, 45 anos; rec.: Vila Verdinho, Mirandela, 2001.

109 – A velha e o carvão Uma velhota de Vila Verdinho, concelho de Mirandela, andava um dia a guardar umas ovelhas num campo pegado à aldeia, quando lhe apareceram três mouras a pedirem-lhe um pouco de leite para matarem a sede. A velhota, como era pessoa bondosa, foi logo mugir as ovelhas, deu o leite a beber às mouras e ainda lhes ofereceu parte da merenda que tinha consigo. As mouras agradeceram e uma delas pega então nuns pedaços de carvão e dá-lhos como paga, dizendo que os guardasse até casa e que não se arrependeria. Ela guardou os pedaços de carvão no avental, mas, quando ia a caminho de casa, com medo que o marido viesse a saber que tinha dado o leite às mouras, resolveu atirá-los fora. Mais tarde, já em casa, ao sacudir o avental, viu que uns restinhos do carvão se tinham transformado em bocadinhos de ouro. O marido, que estava ao pé, ficou muito admirado, obrigando-a a contar tudo. Soube então da história do carvão e logo trataram de ir os dois, muito ligeiros, à procura dos bocados que ela tinha atirado fora no caminho. Mas já nada encontraram. Há quem diga que ainda lá andam, para cá e para lá, a saber do carvão. Fonte: Inf.: Olímpia da Ressureição, 92 anos; rec.: Vila Verdinho, Mirandela, 2000

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110 – A chave de ouro Antigamente, a gente era pobre e tinha de ir apanhar a lenha ao feixe. Como havia pouquinha, íamos para muito longe saber dela e tínhamos os pousadoros certos para descansar. Um dia deu-nos para chegar ao pé do “Fragão” [um grande penedo situado em Lameirinha], onde os antigos diziam que havia um encanto. Tomámos coragem e fomos ver a frincha do fragão. Vimos então lá uma chave com 60 centímetros de ouro. E chegámo-nos logo à frente a ver se a caçávamos. Mas de nada valeu. A chave pôs-se a fugir pela frincha adentro, como se tivesse pernas. E lá mais para os fundos ouvimos alguma coisa a fazer tlim-tlim. Como não vimos mais nada, julgámos que era a chave a tlintar, mas os antigos sempre disseram que ali havia uma tecedeira encantada e que, por isso, o tlim-tlim só podia ser o barulho do seu tear. Fonte: Inf.: Idalina da Conceição Cabages, 73 anos; rec.: Ribeirinha, Mirandela, 2001.

111 – A pocinha do Vale de Amieiro Versão A:

Em Vale de Amieiro, perto de Ribeirinha, havia antigamente uma pocinha de água, de onde saía um encanto. Mas não o via toda a gente. Dizem que esse encanto era uma menina que estava um bocadinho ao sol e depois sumia-se. Quem a viu dizia que estava a pentear-se. Ora esta menina também não falava com ninguém, a não ser, de vez em quando, com a madrinha e com o padrinho. Então o padrinho era muito jogador. E um dia, quando estava a perder, disse para os companheiros: – Eu cá jogo e torno a jogar enquanto a pocinha do Vale de Amieiro não secar!

Fez bem mal. Com estas palavras dobrou o encanto à afilhada que nunca mais apareceu. E a pocinha secou. Versão B (A donzela encantada e o jogador):

Na aldeia de Ribeirinha, concelho de Mirandela, brota de uma fraga uma água muito pura, que o povo acredita ser milagrosa. O local é hoje conhecido como Fonte de Nossa Senhora da Ribeirinha.

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Conta-se que numa ocasião ia de noite um homem àquela fonte e viu lá uma cobra. Vai daí, agarrou num pau e aprontou-se para lhe dar com ele. Nisto, a cobra pôs-se a falar e disse-lhe: – Não me mates, que não te arrependerás! O homem ficou muito admirado e já não lhe deu com o pau. Ela então continuou a dizer-lhe: – Eu sou uma donzela encantada e amanhã acaba o meu fado. Se aqui vieres à meia noite, eu subo por ti acima e dou-te um beijo na face. Porém, tu não podes fazer o mais pequeno gesto, nem estremecer, porque se o fizeres dobras-me o fado. Na noite seguinte, o bom homem voltou à fonte. Ia cheio de coragem e esperou pela meia noite. Ela então lá lhe apareceu como tinha dito. Depois subiu-lhe pelo corpo e o homem nem se mexeu. Só que, no momento em que o ia beijar na cara, ele estremeceu. Então a cobra desceu e, com uma fala que mais parecia um rugido, disse: – Dobraste-me o fado, mas não te arrependerás de aqui ter vindo. Todas as noites aqui encontrarás três moedas. O homem nunca se esquecia de ir lá buscar o dinheiro. Fazia-lhe jeito. Só que uma vez, quando estava a jogar, perdeu. E não se mostrou nada incomodado com isso. Disse então aos outros jogadores: – Enquanto na fonte da Ribeirinha todas as noites as três moedas encontrar, hei-de sempre poder jogar.

Tal coisa não tivesse dito. Nessa noite, quando lá foi saber das três moedas, o que encontrou foram três carvões. E nas noites seguintes nem isso. Fonte – versão A: Inf.: Idalina da Conceição Cabages, 73 anos; rec.: Ribeirinha, Mirandela, 2001. Fonte – versão B: Inf.: Sílvia de Jesus Costa Felgueiras, 46 anos; rec. Mirandela, 1999.

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Concelho de Mogadouro

112 – [O Castelo de Bouça de Aires] No termo de Urrós [no concelho de Mogadouro] fica o sítio chamado Picão de Bouça de Aires, a que chamam também Castelo de Bouça de Aires, formado por uns rochedos graníticos, muito altos, onde têm aparecido alicerces de casas e onde há uma escada cavada na rocha de quatro ou cinco degraus. Um dos rochedos apresenta cavidades ligadas umas a outras por sulcos, que, cheios de água pluvial durante o inverno, servem de fonte para muito tempo. Foram abertas pelos mouros, diz o povo. O Castelo de Bouça de Aires apresenta ainda restos de muros nas partes em que a defesa natural fraquejava e são constante preocupação dos sonhadores de tesouros, que frequentemente lá vão esquadrinhar, apesar de nada terem encontrado, mesmo quando sonham com o tesouro três noites a eito, auspício infalível no seu entender e no de toda a crendice bragançana. Numa das escavações apareceram umas contas pretas, assaz volumosas, indício de já estar perto o encanto, mas rugiram logo estampidos terríficos e tudo fugiu aterrado. A lenda verseja: Entre o Castelo de Bouça de Aires E o sítio de Correchá Há um bezerro de ouro Quem o achar seu será.

Mas só aparecerá na ponta da relha de um arado a lavrar; porém até hoje ainda nada surdiu... Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, pp. 153-154.

113 – Capela de Santa Cruz [Situada no sítio das Eiras, em Ventuzelos, concelho de Mogadouro] é tradição que foi mandada construir por um dos ascendentes dos Távoras que, andando em

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batalha contra os mouros40, pediu a Deus que o auxiliasse, e se ganhasse a batalha iria, depois dos mouros serem expulsos de Portugal, todos os anos visitar Jerusalém. Ganha a batalha, derrotados os mouros em toda a linha e expulsos de Portugal, começou ele a cumprir a sua promessa. Foi visitar Jerusalém um certo número de vezes, mas por fim, já velho e cansado com o peso dos anos e trabalhos da vida, não pôde acabar de cumprir a sua promessa. Prometeu então que, em recompensa, mandaria construir um templo no termo de Mogadouro, onde os cristãos pudessem visitar tudo quanto tinha visto de grandioso em Jerusalém41. Fonte: PEREIRA, José Manuel Martins, As Terras de Entre Sabor e Douro, Setúbal, J.L. Santos, 1908, pp. 105-106.

114 – Os forninhos de Alvagueira No sítio de Alvagueira, que fica a meia encosta do rio Douro, na margem direita da ribeira de Ventuzelo, existem umas palas nos rochedos chamados Forninhos de Alvagueira, e é tradição que foram habitados por uma gentinha brava que se alimentava de frutas e de répteis. Esta gente saía de manhã cedo pelos campos fora e recolhia à noite42. Frequentava este sítio uma pastora guardando o seu gado, de quem a tal gente era muito amiga e que muitas noites dormia junto ao curral que ficava a pequena distância do caminho dos forninhos. A pastora chamava-se Maria, e de noite quando os selvagens passavam, perguntavam sempre lá do caminho: – Ó Maria! Tu estás lá? – Eu estou – respondia ela. – Pois eu cá vou – tornavam eles. Próximo dos forninhos havia uns moinhos ribeirinhos que ainda hoje existem, e diz-se que uma ocasião o moleiro estava a assar, a um grande lume que tinha feito, um bocado de carne de porco aproveitando o pingo numa fatia de pão. Mas de repente 40

Foram os Távoras uma das famílias mais antigas e nobres de Portugal. Segundo alguns registos históricos, moldados ou diluídos em relatos lendários, têm a sua origem numa mulher moura, de nome Zahara, convertida ao cristianismo. D. Ramiro II de Leão, repudiando a sua esposa, Dona Urraca, raptou Zahara, a qual se fez cristã e obteve por baptismo o nome de Artida. Desta relação nasceu Alboazar Ramirez, cujos filhos viriam a ser ferozes inimigos dos mouros. Um deles, chamado D. Rausendo, foi o progenitor dos Távoras. Ao vencer os mouros, em 1037, nas margens do rio Távora, afluente do Douro, terá nascido aí o nome por que se tornou conhecida esta família (Pereira, 1908: 150). Deste D. Rausendo, a memória oral conserva igualmente o relato alusivo à criação da vila de Santa Marta de Penaguião, no Alto Douro, que é também apresentado neste trabalho. 41 São famosas as esculturas do interior desta capela, representando os passos de Cristo até ser pregado na Cruz, num registo aproximado dos motivos que o fundador da capela teria observado em Jerusalém. 42 Martins Pereira, num comentário que faz a esta narrativa, identifica esta gente como sendo “árabes humildes que, vivendo bem com os cristãos, ali se refugiaram da crueldade das guerras” (1908:111).

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entra pelo moinho dentro um homem dos da gentinha brava, com um grande espeto enfiado de lagartos e outros répteis, e pôs-se também a assá-los ao lume, começando por querer pingar com o assado do seu espeto no pão do moleiro, dizendo: – Pinga tu e pingo eu, e comeremos ambos de mistura. Ao que respondia o moleiro: – Assar sim, mas pingar não. Mas o homenzinho tanto teimou em querer pingar no pão do moleiro que este, já enfadado de o aturar, pega no espeto, que era uma vara de madeira, e dá-lhe duas ou três bordoadas com ele, e foge para Ventuzelo todo atrapalhado, com medo que a gente dos forninhos viesse atrás dele e o agarrasse no caminho. O certo é que o moleiro não voltou mais ao moinho e este esteve abandonado largos anos.43 Fonte: PEREIRA, José Manuel Martins, As Terras de Entre Sabor e Douro, Setúbal, J.L. Santos, 1908, p. 111.

115 – [A moura do castelo de Bemposta] Na vila de Bemposta [concelho de Mogadouro] houve em tempos uma mulher, casada, que tinha forno em casa onde todos os meses cozia o pão para sustento da sua família. Quando uma vez estava a começar a amassar, entra pela porta do forno uma mulher desconhecida, mas nova, bela e encantadora, ainda que no semblante se lhe denotava tristeza; sem dar palavra deitou-lhe água na masseira e retirou-se. A mulher nada lhe disse, mas contou o sucedido ao marido e este respondeu-lhe que se tornasse a ver essa mulher lhe perguntasse o que queria. Dias depois, e à hora de começar a amassar, apareceu a dita mulher. Então a dona do forno pergunta-lhe: – Quem sois vós, mulher? – Uma moura, encantada no castelo da vila, e se fores capaz de me desencantar dar-te-ei enormes tesouros que tenho – respondeu ela. Disse-lhe a outra que aceitava, mas era preciso que lhe dissesse o que ela tinha a fazer, para dar conhecimento ao marido. No rosto da moura raiou a alegria, a sua alma encheu-se de esperança, por lhe parecer chegada a hora de se ver livre de tão penoso cativeiro, e disse: 43

É de referir que Francisco Manuel Alves (Abade de Baçal) et al. (1968: 327) apresenta um relato semelhante a este respeitante ao concelho de Vimioso, onde existem as ruínas de um velho moinho, no ribeiro de Piaduros, no termo de Caçarelhos, que é conhecido como “moinho dos trasgos”. Segundo a lenda o moleiro abandonou-o quando, certa noite, ao assar um bocado de carne, lhe apareceu um trasgo a assar uma “espetada de lagartixas” e a tentar fazer pingar a gordura destas no pão onde ele aparava a gordura do seu assado. É também narrada esta lenda, com ligeiras variantes, na aldeia de Vilar de Peregrinos, no concelho de Vinhais, relativamente ao moinho Mansilha (informação dada ao autor por Olema Natércia Gonçalves). Pela semelhança dos relatos, poder-se-á admitir haver aqui uma certa convergência entre as figuras míticas dos trasgos e dos mouros.

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– Não precisas mais do que ter coragem; na noite de S. João, à meia noite em ponto, hás-de estar no largo do castelo, firme como uma estátua de mármore. Não tenhas medo, não fujas nem fales no teu Deus. O teu marido pode acompanhar-te, mas deve estar oculto. Então irá uma cobra ter contigo, assobiando e fazendo barulho; darte-á uma volta à cintura e um beijo na testa; depois, logo ali, a sua pele cairá despedaçada em bocados. Não tenhas medo que essa cobra sou eu, e ficarei logo desencantada e livre, e livre ficará toda a minha riqueza e toda será tua. Assim ficou combinado, e ao bater no relógio as doze horas da noite de S. João lá estava a mulher no local designado, e o marido oculto, ali, noutro lugar, próximo. Pouco depois ouvem-se assobios medonhos, um barulho estranho e a cobra aparece ao longe assobiando de instante a instante. Mas a mulher, apesar de resoluta, começou a apavorar-se, e quando a cobra ia chegando próximo dela, foge transida de medo, gritando: – Ai Jesus, quem me acode! Ai Jesus, quem me acode!... Ao mesmo tempo a moura, que se julgava quase livre, rompe em doloridos e longos suspiros, exclamando: – Ai que me dobraste o meu encanto, mulher! Ai que estou perdida para séculos! E nas trevas da noite foram-se perdendo aqueles dolorosos e enternecidos ais da moura encantada, enquanto a mulher e o marido fugiam aterrados para casa. Fonte: PEREIRA, José Manuel Martins, As Terras de Entre Sabor e Douro, Setúbal, J.L. Santos, 1908, pp. 337-339.

116 – [O castelo dos mouros de Vilarinho dos Galegos] No castelo dos mouros, de Vilarinho dos Galegos [concelho de Mogadouro], segundo diz a lenda, estão encantados um mouro e uma moura. Os tesouros neste castelo são enormes – diz-se. Ali existem teares de ouro, baús e malas atestadinhos de moedas de ouro, barras de ouro e prata, aos montes. Este tesouro desencantado chegaria para enriquecer o país inteiro. Conta-se que em tempos um homem destes sítios visitava amiudadas vezes o castelo. Um dia apareceram-lhe os mouros, mostraram-lhe aquela grandiosa riqueza e disseram-lhe: – Se queres ser senhor de todos estes tesouros, hás-de desencantar-nos. Para isso basta que tenhas coragem. Estás aqui, neste local, na noite de S. João, à meia noite em ponto; aqui virá ter um toiro bravo, urrando e fazendo barulho, mas não tenhas medo, que o toiro sou eu; não hás-de fugir nem falar no teu Deus; logo que chegue a ti põe-lhe a mão na testa, e basta.

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O homem aceitou. Na noite de S. João, à meia noite, lá estava no lugar marcado. Mas, eis que aparece o toiro, urrando e escavando no chão com as mãos e pés; e o homem, cheio de medo, vendo aproximar o toiro, foge gritando: – Ai Jesus, quem me acode! Ai Jesus, quem me acode! Tudo estava transtornado, é claro, e os mouros que se julgavam livres, desapareceram no meio de suspiros e dolorosos ais, e lá voltaram para o seu penoso cativeiro com o encanto dobrado. Fonte: PEREIRA, José Manuel Martins, As Terras de Entre Sabor e Douro, Setúbal, J.L. Santos, 1908, pp. 338-339.

117 – [O castelo do Mau Vizinho] Por baixo deste lugar [Algozinho, concelho de Mogadouro] se vê, e ainda fora da terra, em cinquenta palmos de altura, um castelo demolido, que dizem ser fabricado pelos mouros e, pelos vestígios que manifesta, fora bem fortalecido. A povoação de Algosinho (...) assenta na encosta da ribeira de Algosinho, coisa de seiscentos metros acima do Castelo do Mau Vizinho, também chamado Castelo dos Mouros, ou simplesmente Castelo, que é um pequeno recinto de vinte metros de diâmetro, pouco mais ou menos, cercado de muros de mais de metro de grossura, por um fosso e por uma faixa de dez metros de largura cravada de pedras de mais de metro de altura com a ponta aguçada para cima, à laia de estrepes, a fim de dificultar os ataques da cavalaria e infantaria. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Porto, vol. IX, 1934, p. 107.

118 – Vilarinho dos Galegos No termo de Vilarinho dos Galegos, concelho de Mogadouro, quilómetro e meio daquele povo, fica o Castelo dos Mouros, de que ainda há paredes com dois e três metros de altura, restos de muros e fossos em volta. Está situado num alto apenas acessível pelo lado norte, onde a defesa é constituída por larga facha de lajes de meio metro de altura enterradas no solo com a ponta aguda para cima, só mui dificilmente permitindo trânsito entre elas. Pelos outros lados defendem-no naturalmente os despenhadeiros que se precipitam sobre o Douro.

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(...) No Castelo dos Mouros está uma moura encantada, que na manhã de São João espaneja ao sol a capa de D. Feliz, que foi governador do Castelo, recamada de campainhas de oiro e prata. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Porto, vol. X, 1934, pp. 292-293.

119 – A lenda da fraga do Poio A certa distância da aldeia de Brunhoso, concelho de Mogadouro, no caminho do Poio, existe uma grande fraga redonda, com uma grande rachadela, e que é chamada a Fraga da Tecedeira, embora também seja conhecida como a Fraga do Poio. Contam os mais velhos que, em tempos antigos, houve por aquelas bandas uma luta com os mouros, onde foi raptado um príncipe cristão que tinha amores com uma bela princesa moura. Passado algum tempo, quando os mouros já se tinham ido destas paragens, apareceu ali a jovem, cheia de desgosto, e refugiou-se na dita fraga, na esperança de o príncipe um dia voltar. Esperou semanas, meses e anos. E depois de tanto esperar, resolveu pedir à senhora Miquelina, que ali passava todos os dias, a ver se lhe arranjava um tear para ocupar o tempo. A senhora Miquelina, como era a tecedeira mais importante da região, arranjou-lhe então um tear. E dizem que ao passar-lho para as mãos, este transformouse num tear de ouro. O príncipe nunca mais apareceu, mas ela continuou lá a viver e a tecer no seu tear. Diz-se que ainda hoje espera a chegada do príncipe. E a fraga passou a ser conhecida como a Fraga da Tecedeira. Na aldeia cumpre-se hoje a tradição de as pessoas mais velhas chamarem as mais novas e perguntarem: – Quereis ouvir uma princesa a tecer? As crianças encostam a cabeça e a pessoa mais velha dá-lhe com ela na fraga. Elas ficam então com um zunzum na cabeça, e perguntam-lhes: – Então, ouvistes? As crianças dizem que sim. Mas, quer tenham ouvido ou não, aprendem pelo menos que nem em todas as fantasias se pode acreditar. E amanhã, serão elas a transmitir essa mesma lição a outros. Fonte: Inf.: Maria Zita Baptista, 50 anos; rec.: Brunhoso, Mogadouro, 2001.

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120 – A lenda de Vale da Madre Conta-se que os mouros estavam na serra de Mogadouro e que os cristãos correram atrás deles, indo encontrar-se num vale onde travaram uma grande batalha. Aí os cristãos, no meio de grande aflição, pediram ajuda a Nossa Senhora, prometendo dar àquele lugar o nome de Vale da Madre de Deus. Como ganharam a batalha, cumpriram a promessa e assim nasceu o nome desta terra. Fonte: Inf.: Maria Eugénia Mesquita Cabanal, 46 anos; rec.: Mogadouro, 2001.

121 – A Fonte do Ouro Há em Santo André, na freguesia de Valverde, Mogadouro, uma fonte onde as mulheres costumavam ir lavar a roupa. É conhecida como a Fonte do Ouro e diz o povo que está lá uma moura encantada. Conta-se também que um dia uma mulher estava a lavar a roupa naquela fonte quando se lhe ardulhou44 uma corrente de ouro ao botão de uma camisa. Ela começou então a puxar, a puxar, e a dada altura, sentindo-se já cansada, disse: – Valha-me Deus! Ao dizer tal, a corrente desapareceu. A mulher ficou muito desiludida e contou no povo o sucedido. Por isso a fonte passou a chamar-se "Fonte do Ouro". Fonte: Inf.: Lídia Martins, 71 anos; rec.: Valverde, Mogadouro, 2001.

122 – Lenda do Poço do Dourado Na povoação de Zava, do concelho de Mogadouro, há um espinhaço montanhoso que é conhecido por "Cimas de Mogadouro". E neste local está uma gruta a que o povo chama "Poço Dourado", a propósito de uma lenda muito antiga. Conta-se que uma jovem pastora, enquanto o gado bebia, sentou-se na borda do poço a descansar e, de repente, viu reluzir na água um cordão de ouro. A pastora apressou-se a volteá-lo na mão, só que dobou, dobou, e o cordão nunca mais acabava. E como o peso já era muito, resolve então cortar o cordão com um calhau afiado, dizendo: 44

Regionalismo transmontano que é sinónimo de “enrodilhou”.

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– Para um par de meias já chega. E nesse momento, ouviu uma voz desconhecida que lhe disse: – Dobraste o meu encanto e fizeste a tua desgraça. Era uma moura que ali estava encantada. Aturdida, a pastora olhou para um lado e outro e não viu ninguém. E nesse instante, todo o ouro desapareceu. Fonte: Inf.: António Nascimento Moreiras, 43 anos; rec.: Mogadouro, 1999.

123 – O caminho da moura encantada Em Valverde, concelho de Mogadouro, num sítio chamado Cabeço do Castelo há um tesouro encantado numa área de terreno. Diz o povo que só pode ser achado pela "ponta da relha e pé da ovelha". Há também ali perto os Barrocais, onde fica a "Fraga dos Mouros". Esta fraga está coberta de musgo, mas pode ver-se nela um carreirão a todo o comprimento onde o musgo não nasce. O povo diz que é o caminho por onde passava uma moura encantada. Na aldeia há também duas fontes de mergulho, onde se diz que está uma moura encantada. Os mais velhos, especialmente as mães, diziam às crianças para não irem para lá sozinhas, pois a moura apanhava os meninos. Fonte: Inf.: António Nascimento Moreiras, 43 anos; rec.: Mogadouro, 1999.

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Concelho de Mondim de Basto

124 – Lenda do Alto dos Palhaços No Alto dos Palhaços, na parte virada para a freguesia de Vilar de Ferreiros, concelho de Mondim de Basto, existe uma grande mina que a tradição diz que está recheada de tesouros. A lenda chama-lhe a Mina dos Mouros e diz que tem cerca de oito quilómetros de comprimento e que vai sair junto do rio Tâmega, no Monte Crasto, numa fraga que o povo chama de Furato. Diz-se também que os mouros levavam através dessa mina os cavalos a beber da Senhora da Graça até ao rio. A mina está repleta de ouro e jóias e, para lá entrar, é preciso ler o livro de S. Cipriano ao contrário, e picar a moura encantada com um alfinete de ouro. Quem o fizer quebra-lhe o encantamento, fica com o tesouro e casa com ela. Só que ainda ninguém o conseguiu. Fonte: OLIVEIRA, Luis Jales de – Lendas de Mondim de Basto, texto policopiado para uso do Posto Municipal de Turismo de Mondim de Basto, 1999, p.10.

125 – O pequeno pastor e a moura Diz a lenda que, numa enevoada manhã de S. João, um pequeno pastor, que guardava o gado lá para as bandas dos Palhaços, [na freguesia de Vilar de Ferreiros, concelho de Mondim de Basto] viu uma enorme e estranha luz que quase o cegava completamente. Primeiro tentou fugir, mas como a curiosidade fosse maior que o medo, teve que olhar mais uma vez. Viu então uma linda e rica moura rodeada de tesouros, que o chamava irresistivelmente: – Vem cá! Leva todo o ouro que quiseres, mas não contes a ninguém, e, sobretudo, não olhes para trás!

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O pequeno pastor assim fez. Encheu a coirada45 de ouro e partiu, correndo pelo monte abaixo. Só que, no meio da descida, qualquer coisa mais forte do que ele o obrigou a olhar para trás e ver, uma vez mais, aquela luz maravilhosa. Depois de chegar a casa e de ter contado o acontecido, abriu a coirada para mostrar o ouro aos familiares, mas o encanto tinha desaparecido. O ouro tinha-se transformado em escória, ou seja rojões de ferro. Diz-se que, ainda hoje, se encontram muitos espalhados pelo monte, que o pastor deixou cair na sua corrida desenfreada para casa. Fonte: OLIVEIRA, Luis Jales de – Lendas de Mondim de Basto, texto policopiado para uso do Posto Municipal de Turismo de Mondim de Basto, 1999, p. 7.

126 – A bacia de ouro Existe uma mina no Alto da Senhora da Graça, perto da Garganta dos Palhaços, denominada Mina dos Mouros. Num dia primaveril, duas mulheres guardavam o seu rebanho e, quando deram conta, estavam perto da mina, da qual já tinham ouvido falar, e na qual habitava um povo: os mouros. Ao chegarem lá, encontraram um ancião que consigo trazia uma bacia de ouro. E, perante tanta riqueza, uma das raparigas, que era a mais ousada, sentou-se no colo dele enquanto a outra, aproveitando a ocasião, lhe deu com o cabo da roca na cabeça, deixando-o desmaiado. Depois encheram os aventais de ouro e fugiram. Quando iam a meio do caminho, ouviram uma voz que dizia: – Levai, levai, que levais para os vossos netos e bisnetos! Elas, ao ouvirem isto, olharam para trás e viram o homem no cimo dum penedo, mas continuaram o caminho. Um pouco mais à frente sentiram menos peso nos seus aventais, e qual não foi o seu espanto quando viram que o ouro se tinha transformado em carvão. Já muitos tentaram entrar na mina, mas nunca ninguém o conseguiu, porque, uma vez lá dentro, ninguém de lá sai. Fonte: OLIVEIRA, Luis Jales de – Lendas de Mondim de Basto, texto policopiado para uso do Posto Municipal de Turismo de Mondim de Basto, 1999, pp.8-9.

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Bornal de couro, que os pastores costumam trazer às costas.

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127 – O Monte Farinha e a Senhora da Graça Há muitos, muitos anos, andava um pobre moleiro pelas terras de Basto, com uma velha carroça de madeira, puxada por um não menos velho jerico, e levando um moinho que era o seu ganha-pão. Percorria todas as povoações daquelas redondezas, tocando uma gaita de capador, para anunciar a sua chegada. Ao ouvi-la, as pessoas acorriam ao largo da aldeia com sacos de milhão que trocavam por farinha. (...) Certo dia, encontrou no caminho uma graciosa senhora que caminhava a pé, sob um sol escaldante, e parou, compadecido, para a levar na sua carroça. Quando chegou perto de Mondim, avistou um bando de mouros que vinham ao seu encontro para lhe roubarem a farinha e o grão. Sem possibilidades de lhes fazer frente, chicoteou o jerico para se escapar. Mas o animal, assarapantado, meteu uma pata entre dois grandes calhaus e não conseguia libertar-se. Para o fazer sair daquele buraco, o moleiro apeou-se da carroça. Mas, enquanto puxava pela perna do jumento, chegaram os mouros que o mataram. Nesta corropita, a senhora, amedrontada, sem saber o que havia de fazer, saltou da carroça para cima duma pedra alta, ao lado, e disse, muito aflita: – Abre-te, pedra! Faz-me esta graça! E a pedra abriu-se prontamente. Deixou entrar a senhora e tornou a fechar-se rapidamente como se abrira. Então os mouros, ao verem aquele espantoso fenómeno, deixaram a farinha e o grão, e deram às de vila-diogo. Entretanto, o moinho, desgovernado, continuava a moer. Moeu, moeu, moeu..., até se formar um monte muito alto de farinha, só parando quando já não tinha mais grão para moer. As pessoas das localidades vizinhas, ao darem por aquele estranho acontecimento, acorreram ao local e exclamaram, muito admiradas: – Ih! Que monte de farinha! Desde então para cá, aquele sítio ficou a chamar-se Monte Farinha. Quanto à senhora, lá continua escondida, para sempre, na Pedra Alta, com medo dos mouros. O povo, que atribuiu o milagre à intervenção de Nossa Senhora, construiu uma capelinha branca, lá no alto do monte, para Lhe agradecer a graça feita à senhora da Pedra Alta, e deu-lhe, por isso, o nome de Senhora da Graça. Fonte: FERREIRA, Joaquim Alves – Literatura Popular de Trásos-Montes e Alto Douro, V Volume – Lendas e Contos Infantis, Vila Real, edição do autor, 1999, pp. 65-66.

128 – Os mouros e a ferramenta Quando os mouros andavam a fazer as minas da Ervedeira, a pia onde apontavam a ferramenta ficava do lado de Vila Chã. É a Pia dos Mouros. Ainda hoje lá existe. Por isso, sempre que era preciso, e como o rio ia grande, os mouros que estavam na banda de Vila Chã apontavam lá a ferramenta, depois vinham ao rio, e

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mandavam-na para a parte de cá. E os daqui traziam-na, trabalhavam com ela, e, quando estivesse rompida, devolviam-na outra vez para lá para que a tornassem a apontar. E andaram nisto muito tempo. Os mouros fizeram então as minas da Ervedeira, e até chegaram a fazer lá uma sineta. Uma senhora do Bilhó deu com ela, e trouxe-a aqui para a povoação. Foi o senhor padre Agostinho que depois a trocou por outra, já no meu tempo. Fonte: Inf. António Teixeira Rodrigues,76 anos; rec.: Bilhó, Mondim de Basto, 1999.

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Concelho de Montalegre

129 – [A tenda da moura] Na Fonte da Moura, próximo de Santo Amaro (Donões), [concelho de Montalegre] há a seguinte lenda: Passando ali um homem, apareceu-lhe uma moura com uma tenda em que tinha espingardas de ouro. Perguntando-lhe a moura o que mais lhe agradava, respondeu-lhe ser uma espingarda. A moura deu-lhe uma faxa para a sua mulher, que o homem depois enrodilhou num carvalho que estava fora da povoação; voando então a árvore pelos ares e aparecendo-lhe outra vez a moura, disselhe que ele lhe dobrara o encanto por não ter dito que gostava d’ela quando lhe perguntou do que gostava mais da tenda. Fonte: BARREIROS, Fernando Braga – “Tradições Populares de Barroso”, in Revista Lusitana, Vol. 18, Livraria Clássica Editora, Lisboa, 1915, pp. 300-301.

130 – O Córrego da Paixão Consta que no cume do Crasto [de Salto, concelho de Montalegre] tiveram os mouros uma cidade bem murada, donde saíam a roubar os lavradores; e que na Portela de Coartas tinham o seu passeio e ali jogavam os torneios e faziam escaramuças. Numa dessas ocasiões, um capitão, chamado Lux Fafes (ou Fafes Luz), saindo de uma emboscada, onde espreitava oportunidade, caiu, com uma grande manga de soldados, sobre os mouros, quebrou-lhes as Coartas de pau (disto proveio o nome do local), então muito usadas, desbaratou-os e matou muitos, que foram inteirados em um córrego, a que ainda hoje se chama por isso da Paixão46 46

A referência a “Córrego da Paixão” é substituída por “Mata da Paixão” numa versão de conteúdo muito parecido, que consultámos num manuscrito de 1730. Aí se diz: “No castelo do Crasto da Cidade viveram os mouros muito tempo e dele saíam a roubar os lavradores, e tinham passeio e jogo na Portela de Coartas aonde escaramuçavam e faziam suas galhofas, para onde mandavam vir suas coartas de pão, nesse tempo usadas, e jarras de água e vinho para matar a sede aos cansados. E estando em certo dia já cansados de passatempos e alguns bêbados, deu com eles Fafes Luz Capitão que com uma boa manga de soldados os estava vigiando de uma emboscada e lhes fez em cisco as

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Fonte: LEAL, Pinho – Portugal Antigo e Moderno, vol. 8, Lisboa, Livraria Editora de Mattos Moreira & Companhia, 1878, pp. 375358.

131 – [O cinto do mouro] Uma rapariga [de Lama Chã, concelho de Montalegre] teve um menino com um mouro, e o mouro, querendo vê-lo, pediu-lhe que lho trouxesse. Ela trouxe-lho e quando estava a catar o menino, o mouro matou-o. (...) Um dia o mouro teria presenteado a rapariga com um cinto. Na altura em que lho entregou, disse-lhe: – Vai-te embora, mas não olhes para trás até ao cimo daquele monte. Como a rapariga não se contivesse e olhasse para trás, o cinto desapareceu-lhe das mãos imediatamente. É crença que tal cinto se teria tornado em ouro maciço se ela não tivesse olhado para trás. Fonte: SANTOS JÚNIOR, J.R. – Quatro lanças de bronze de Lama Chã (Montalegre), Porto, Instituto de Antropologia da Universidade do Porto, 1968, p. 184.

132 – [As mouras dos Rameseiros] Diz a lenda que nos Rameseiros [próximo de Vilar de Perdizes, Montalegre] há mouras encantadas, e há quem afirme tê-las visto estender ouro ao sol. (...) Diz ainda a lenda que nos Rameseiros e sobre o penedo que tem as letras aparece uma moura a pentear-se, e que quando vê gente se esconde. Um homem já viu nos Rameseiros uma moura no feitio duma cabra a pentearse, e ela disse-lhe que, se lhe desse um beijo sem olhar para trás, ficaria rico para a sua vida, mas como ele fugisse, ela lhe disse: – Fuge barbote, que te tiram no capote. Fonte: BARREIROS, Fernando Braga – “Materiais para a Arqueologia do concelho de Montalegre", in O Arqueólogo Português, vol. 24, Lisboa, 1919-1920, p. 64.

coartas de que tomou o nome, e tomando-lhe a entrada de Crastro os apertou pelo caminho da Mata da Paixão aonde todos foram mortos, e mais deles enterrados, de que tomou o nome de Paixão, caso bastante lastimoso para eles.” (PEREIRA, Pe. João Barroso – Livro de antigas memórias da freguesia de Salto, lugar da Seara e outras partes vizinhas [livro manuscrito], Curros - Valpaços, 1730 p. 46)

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133 – [Crastelos ou Casas dos Mouros] No extremo oeste da freguesia [Vilar de Perdizes] e junto à margem esquerda do rio que separa Portugal de Espanha há o sítio de Crastelos ou Casas dos Mouros. (...) Diz a lenda que ali era a assistência da Mourama, e que as muralhas eram para lá não entrar a cavalaria dos cristãos, tendo-as os mouros esbarrondado para se não dar com as portas. Ainda se diz que dois homens acharam debaixo duma mó de moinho cinco esferas de ouro com que brincavam os mouros, e que há quem os tenha lá visto a tecer. Fonte: BARREIROS, Fernando Braga – “Materiais para a Arqueologia do concelho de Montalegre", in O Arqueólogo Português, vol. 24, Lisboa, 1919-1920, p. 65.

134 – [A marra dos mouros] Ficando fronteiros os castros de Sarraquinhos ou Fernão Mouro e o de Pedrário [povoações do concelho de Montalegre], diz a lenda que o governador do primeiro chamado Fernão e o do segundo chamado Crasto só tinham uma marra, e quando algum deles precisava dela pedia ao outro para lha atirar. Fonte: BARREIROS, Fernando Braga – “Materiais para a Arqueologia do concelho de Montalegre", in O Arqueólogo Português, vol. 24, Lisboa, 1919-1920, p. 69.

135 – [A força dos mouros] A montante de Mandis, e numa encosta, [na freguesia de Solveira, concelho de Montalegre] ficam as ruínas dum pequeno castro, constituído por umas muralhas sem fosso. Anda-lhe ligada a lenda de que o fizeram os mouros enquanto o povo estava ouvindo a missa, porque eles viravam as fragas todas num quarto de hora, e tinha mais força um mouro do que três juntas de bois. Fonte: BARREIROS, Fernando Braga – “Materiais para a Arqueologia do concelho de Montalegre", in O Arqueólogo Português, vol. 24, Lisboa, 1919-1920, p. 69.

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136 – [Fonte da Moura] Próximo do castro [dos Cortiços, em Cervos, Montalegre] há a chamada Fonte da Moura, na qual diz a lenda que apareceu uma rapariga com uma tenda a um velho pastor, e perguntando-lhe qual lhe agradava mais, se ela ou a tenda, ele lhe respondeu que a tenda, pelo que ela desapareceu. Fonte: BARREIROS, Fernando Braga – “Materiais para a Arqueologia do concelho de Montalegre", in O Arqueólogo Português, vol. 24, Lisboa, 1919-1920, p. 72.

137 – [Altar da Moura] A uns mil e quinhentos metros a noroeste [da povoação de Frades, freguesia de Cambezes, concelho de Montalegre] há um monte chamado Altar da Moura, no qual a lenda diz haver dinheiro dos mouros e aparecer na manhã de S. João uma moura a estender roupa. Fonte: BARREIROS, Fernando Braga – “Materiais para a Arqueologia do concelho de Montalegre", in O Arqueólogo Português, vol. 24, Lisboa, 1919-1920, p. 75.

138 – [Castro de Travassos] Versão A:

A este lugar [Marmurais, freguesia de Travassos, concelho de Montalegre] anda ligada a seguinte lenda: Um mouro do castro [de Travassos] namorou e raptou uma rapariga que andava com o gado num campo contíguo e a poente. Um dia foi com ela à feira de S. Domingos e lá lha roubaram, pelo que ele com as saudades cantava: Adeus penedos do Crastro Fontelas de Marmurais; Penedos de S. Domingos, Porque vos não arrasais? (...)

Ainda ouvimos outra versão da lenda do rapto da pastora pelo mouro. Assim, este, tendo-a agarrado, levou-a para o castro, e gostava muito que ela o catasse, mas um dia a rapariga deixou-o adormecer, e fugiu. O mouro chorava então muito por ela e dizia:

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Adeus penedos do Crastro, Fontelas de Marmurais, Adeus penas do meu peito Que vos não acabais. Versão B (Os mouros do Outeiro do Crasto):

Há em Travassos, concelho de Montalegre, o Outeiro do Crasto, onde se dizia haver num penedo uma residência de mouros. À volta havia propriedades das pessoas da aldeia. E a sul havia um lameiro da família Custódio, uma das famílias mais antigas de Travassos. Um dia uma menina desta família, chamada Teresa, andava com as vacas num lameiro, quando se abeirou dela um mouro, com palavras que ela não entendia. Por isso prometeu voltar no dia seguinte para lhas ensinar. Só que voltou uma vez, voltou outra, depois outra... até que lhe arranjou um filho. Quando o filho nasceu, para que a família dela não soubesse, o menino ficou a viver na residência dos mouros, onde a mãe ia todos os dias dar-lhe de mamar. Um dia, estava ela a amassar pão em casa, quando uma amiga deu conta que lhe caía leite dos seus peitos na massa. E perguntou-lhe: – Que te aconteceu para estares a deixar cair leite na massa? Então ela não teve remédio senão contar-lhe. – Foi um mouro que no lameiro do Crastro abusou de mim e fez-me um menino. E depois ficaram-me com ele e eu tenho de ir lá todos os dias a dar-lhe de mamar. Em troca prometeram-me um balde de libras. Mas não digas nada a ninguém, se não eles matam-me. A outra prometeu e cumpriu. O tempo passou, e por fim, num certo dia, quando ela acabou de amamentar o filho, uma moura lá lhe deu um balde cheio para as mãos e disse-lhe: – Não olhes para dentro do balde enquanto não chegares a casa. Mas ela, cheia de curiosidade, não resistiu e olhou para dentro do balde. E viu lá, em vez das moedas de ouro que esperava, uma grande quantidade de tições, que começaram a arder mal olhou. Ela então atirou com os tições fora, mas dois ficaram agarrados ao fundo do balde. Quando chegou a casa, olhou para o balde, e os dois tições que lá estavam eram, afinal, duas moedas de ouro. Voltou logo atrás, a apanhar os tições que tinha deitado fora, mas quando chegou ao sítio já nada encontrou. Passado algum tempo, um irmão da moça, desconfiado das suas saídas diárias, resolveu vigiá-la, acabando por ir descobri-la a dar de mamar ao menino, tendo o mouro ao seu lado. Ao ver tal, foi tanta a ira com que ficou, que deu com um sacho na cabeça do mouro, matando-o. A seguir teve de fugir, porque se não os outros mouros matavam-no a ele. E disseram então os mouros à moça: – O menino fica aqui. E tu podes vir vê-lo sempre que queiras. Mas a família nunca mais a deixou ir. Diz o povo que durante muito tempo se ouviram bater os teares dentro do penedo do Outeiro do Crasto. Depois deixaram de se

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ouvir, pois os mouros foram-se embora. Só que antes de partirem deixaram lá uma avultada riqueza para a Teresa. Diz-se ainda que há lá duas entradas que os mouros utilizavam, uma do lado sul e uma subterrânea do lado norte, por onde saíam para irem à água à beira dos moinhos do professor de S. Vicente. Versão C (A cristã cativa e o mouro):

Conta-se que no penedo do Outeiro do Crasto, na aldeia de Travassos, vivia um mouro encantado, que todos os dias, para cumprir o seu encanto, tinha que percorrer a distância entre o penedo dos Murmurais, Crasto e S. Domingos. E nestes passeios, encontrava sempre uma pastora da casa dos Cervos de Travassos, por quem se apaixonou. Como a pastora não lhe ligava, um dia o mouro raptou-a, levando-a para dentro do penedo, onde não havia porta nem jinela. A família procurou a moça por toda a parte, mas não a encontrou. Até que um dia uns pastores, que andavam com a rês47 perto do penedo, ouviram lá dentro bater um tear. Desconfiaram logo que ela estava cativa do mouro e puseram-se a vigiar o penedo. De nada adiantou, pois nunca conseguiram ver nem o mouro nem a menina. O mouro, para cumprir o seu encanto, só saía de noite e com palavras mágicas que a menina não entendia mas que abriam e fechavam o penedo. E assim passaram os anos. Depois a menina teve um filho do mouro, mas as saudades da sua família eram muitas e por isso vivia muito triste. Um dia, o mouro descuidou-se a dizer as palavras mágicas e ela conseguiu entendê-las. Ao sair dizia: – Abre-te, César! E o penedo abria-se. Depois dizia: – Fecha-te, César! Numa noite, fingiu que dormia e esperou que o mouro saísse do penedo. Depois vai ela com o menino ao colo e diz: – Abre-te, César! O penedo abriu-se e ela fugiu para sua casa, onde os familiares a receberam com alegria, mas muito preocupados pois eram cristãos e a criança era doutro sangue. Quanto ao mouro, assim que regressou e viu o penedo aberto, ficou muito aflito. E ao ver que sua amada tinha desaparecido com o filho, endoideceu e começou a vaguear pelos montes, dizendo: – Penedinhos do Castro, Penedinhos dos Murmurais, Penedinhos de S. Domingos, Porque não vos arrasais?”

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Na linguagem popular, a palavra rês assume uma dimensão semântica que equivale ao seu plural. É, por isso, entendida como rebanho.

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Até que um dia desapareceu de vez. Então a menina, como sabia que dentro do penedo havia uma grande fortuna, foi lá com a família buscá-la num carro de bois e ficaram todos muito ricos. Fonte – versão A: BARREIROS, Fernando Braga – “Materiais para a Arqueologia do concelho de Montalegre", in O Arqueólogo Português, vol. 24, Lisboa, 1919-1920, p. 77. Fonte – versão B: Inf.: António Joaquim Gonçalves, 56 anos; rec.: Travassos da Chã, Montalegre, 2001 Fonte – versão C: Inf.: Ana Barroso, 70 anos; rec. Penedones, Montalegre, 2001.

139 – [Lenda do Mosteiro de Pitões das Júnias] Versão A:

Segundo a lenda, nas repetidas correrias que os mouros faziam por estas terras [Pitões das Júnias, no concelho de Montalegre] nos fins do século XI, um cristão escondeu no tronco de um carvalho, a imagem de Nossa Senhora da Assunção. Pouco tempo depois, vindo dois fidalgos da Galiza caçar a estes montes, os seus cães, seguindo um porco montês, pararam latindo junto do carvalho. Apearam-se os cavaleiros, e vendo a santa imagem, determinaram logo fazer-lhe uma boa igreja e um mosteiro, que em pouco tempo ficaram concluídos. (....) Em um terreiro, junto à igreja, existia há poucos anos um antiquíssimo carvalho, todo oco, que alguns pretendem ser o mesmo onde Nossa Senhora foi achada. No portal que fecha o antigo recinto da cerca, hoje cemitério paroquial,48 existem dos lados, em tosca escultura, dois cães de pedra, a que se refere a lenda da achada da santa imagem. Versão B (Lenda de Nossa Senhora das Unhas):

Há uma tradição popular que diz que Nossa Senhora das Júnias, em Montalegre, começou por chamar-se Nossa Senhora das Unhas. E é assim que ainda hoje muita gente lhe pronuncia o nome. Diz o povo que isso se deve a uma lenda muito antiga. Andavam uns caçadores naquela zona a fazer uma montaria aos ursos, e a dada altura os cães, quando perseguiam aquelas feras, subiram a uma árvore e ficaram agarrados ao tronco sem se mexerem. Nem para cima, nem para baixo. Diz então um dos homens: – Que terão visto ali os cães? – Alguma coisa foi, vamos lá ver. Foram e encontraram num buraco do tronco da árvore uma imagem de Nossa Senhora. Os caçadores recolheram-na e mais tarde o povo quotizou-se para lhe 48

Deve aqui ser levado em conta que a actualidade desta informação respeita à época em que foi compilada por Pinho Leal.

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construir um templo. Entretanto, no tronco da árvore ficaram bem gravadas as unhas dos cães. E por isso o povo chamou à imagem Nossa Senhora das Unhas. Mais tarde soube-se que essa imagem e muitas outras haviam sido escondidas pelo povo cristão aquando da invasão dos mouros, para evitar que fossem roubadas ou destruídas49. Fonte – versão A: LEAL, Pinho – Portugal Antigo e Moderno, vol. 7, Lisboa, Livraria Editora de Mattos Moreira & Companhia, 1876, pp. 105-106. Fonte – versão B: Inf. – Padre António Lourenço Fontes, 62 anos; Montalegre, 2001.

140 – [O castelo de Montalegre] No castelo de Montalegre, precisamente à meia noite de S. João, aparecem três meninas muito lindas sentadas em cadeiras, tudo d’ouro. Já houve quem as visse, mas não se sabe o meio de as desencantar. É tradição que elas uma vez deram um avental de jóias a uma mulher, que as devia levar para casa sem falar durante o percurso, mas como ela, encontrando uma amiga que lhe perguntou o que levava no avental, dissesse que era muita riqueza que lhe ia mostrar, ao fazê-lo só achou carvão. (...) Uma vez um homem foi de noite chamar uma parteira da vila de Montalegre e levando-a ao castelo, ali levantou uma laje debaixo da qual estava um lindo edifício, e dentro dele duas meninas muito lindas, a mais velha das quais estava deitada com as dores de parto numa cama d’ouro. Nasceu então uma menina que a parteira entregou à companheira da parturiente. O homem abriu depois uma gaveta cheia de riquezas, e disse à parteira que levasse o que quisesse escolher, mas ela nada levou. (...) Entre duas pedrinhas colocadas no meio do caminho da Portela para o castelo de Montalegre, achou uma mulher, quando ia para a igreja do mesmo castelo, um cordão d’ouro. Puxando por ele viu que não tinha fim e chegando a certa altura disse “p’ra ser rica já me chega”, cortando-o, pois que não queria perder a missa. O cordão mal acabado de cortar começou a desfiar-se em sangue, ouvindo então a mulher vários gritos e maldições contra ela. Se se tivesse demorado a puxar pelo cordão enquanto o padre dizia a missa, quebrava-se o encanto. 49

Conhecem-se outros casos algo semelhantes da memória oral transmontana. A imagem de Santa Cecília foi descoberta numa silveira pelos cães de um pastor em Seixo de Manhoses, concelho de Vila Flor [inf. de Adelaide Roios, Seixo de Manhoses]. Em Sendim, concelho de Miranda do Douro, um lavrador achou a imagem da Santíssima Trindade na relha do arado, que a arrancou ao lavrar a terra [inf. de Maria do Carmo Lopes, Bragança]. Em Escarei, concelho de Ribeira de Pena, há uma imagem de S. Romão crucificado, pela qual o povo tem muita devoção. Diz-se que foi encontrada, há muito tempo atrás, por uns lavradores no meio dumas silvas. Quando as estavam a queimar, notaram que em certo sítio as silvas não ardiam. Foram lá ver o que era e descobriram a imagem [inf. transmitida por habitantes da aldeia de Escarei].

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Fonte: BARREIROS, Fernando Braga – “Tradições Populares de Barroso”, in Revista Lusitana, Vol. 18, Livraria Clássica Editora, Lisboa, 1915, p. 298.

141 - Lenda da Serra da Mourela Conta-se que, quando os mouros foram expulsos pelos cristãos das terras do norte, havia uma mulher moura que estava grávida e que teve as dores de parto no momento da fuga. Escondeu-se, por isso, numa gruta para poder ter o filho. Todos os mouros foram embora, mas ela ficou naquela gruta para criar o filho, e o povo diz que durante muito tempo se ouviu a moura a entoar bonitas canções de embalar. A gruta ficou assim conhecida como a “Pedra da Moura” e a serra onde ela está situada é a Serra da Mourela. Fica entre Pitões e Tourém, no concelho de Montalegre. Fonte: Inf.: José Cipreste Vaz, 61 anos; rec. Tourém, Montalegre, 2000.

142 – Foge Mouro Abaixo de Pisões, concelho de Montalegre, no tempo dos mouros, estes estavam acampados na borda do rio Rabagão, e o povo, quer de um lado, quer do outro, queria-os expulsar dali para fora. Só que eles faziam força e não saíam. Então o povo resolveu juntar as cabras todas e pôs em cada uma delas uma vela em cada corno, assim como uns chocalhos ao pescoço. Depois, quando era meia noite em ponto, o povo mandou as cabras à frente, com grande barulho, e foi atrás. Os mouros, com medo às luzes e ao ruído, e julgando que vinha ali um grande exército, fugiram deixando tudo quanto tinham. O lugar passou, por isso, a chamar-se "Foge Mouro". Fonte: Inf.: Júlio César Fernandes, 80 anos; rec.: Beçós - Salto, Montalegre, 2000.

143 – A Cova dos Maus Há um sítio próximo da aldeia da Seara, no concelho de Montalegre, que é conhecido como a "Cova dos Maus". Diz o povo que os mouros estiveram ali degradados. E também se diz que deixaram lá enterrado um pote cheio de moedas de ouro.

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Conta-se na Seara que, há muitos anos, dois homens daquele lugar, um da "Casa do Pires" e outro da "Casa D'Além", resolveram um dia ir à procura desse tesouro. Andaram vários dias a escavar, e nada. Por fim, o Pires sentiu a picareta a embater num objecto estranho, de cor escura, e, para que o outro não desse conta, disse: – Já estou cansado de tanto escavar para nada. Vamos mas é comer e voltamos cá depois. O outro concordou e lá foram. Só que, enquanto o da "Casa D'Além" foi a casa comer, o Pires voltou para trás e foi continuar a escavar. Saiu-lhe então um pote de ferro, cheio de moedas de ouro. E tratou logo de guardar tudo para si, sem nada dizer ao companheiro. Com aquele ouro começou uma casa, mas nunca foi terminada. A sua vida deu em andar para trás. E quando o dinheiro acabou disse: – Esta casa fica como espelho para a Seara. Ficou como castigo da sua ganância. Essa casa ainda existe e nunca chegou a ser terminada. As pessoas olham para ela com desconfiança e medo. E não gostam de passar lá perto, com medo que a vida lhes ande para trás. Fonte: Inf.: Maria de Fátima Magalhães Fernandes Alves, 49 anos; rec.: Beçós - Seara, Montalegre, 2000.

144 – As mouras da Portela do Antigo Antigamente viviam os mouros na Portela do Antigo, situada perto da aldeia de Penedones, concelho de Montalegre. E duas mulheres mouras que lá moravam costumavam vir à aldeia fazer serão com as mulheres de uma das casas do lugar de Denoura. Mas só entravam quando estivessem só as mulheres, por isso tinham de esperar que os homens fossem para a taberna ou para a cama. Um dia, um homem da aldeia, para as ver, disfarçou-se de mulher e pôs-se também à lareira a fiar com elas. Daí a pouco, chegaram as mouras e deitaram o filho de uma delas na cama por detrás do escano, junto com o filho dos donos da casa. Às tantas, uma moura descobriu que estava lá um homem, porque ele não era capaz de dar a volta ao fuso50. Dá então uma cotovelada na outra, e diz, apontando para o homem: – Bitcho larudo num chenhe lo fuso. E rapidamente levantam-se para sair. Acontece que, com a pressa, trocaram as crianças e a que levaram era a dos donos da casa. Quando estes deram conta ficaram muito aflitos, pois não sabiam como fazer para irem buscar o filho. Subiram então ao 50

Trata-se do acto de rodar o fuso, o qual, segundo a nossa informante, só é realizável eficazmente “com jeito próprio de mulher”.

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alto da Portela do Antigo e acenderam um grande lume, passando por cima dele a criança moura, ao mesmo tempo que diziam: – Queimar, queimar, menino arjão51! Queimar, queimar, menino arjão! Repetiram isto várias vezes, até que ouviram as mouras, também muito aflitas, a dizer: – Pega lo teu, deixa lo meu! Pega lo teu, deixa lo meu! Aproximaram-se e destrocaram as crianças. Mas nunca mais as mouras voltaram a ir fazer serão à aldeia. E pouco depois desapareceram do local, deixando lá as camas, feitas de pedra. Ainda hoje lá estão: uma de criança e duas de adulto. Fonte: Inf.: Maria da Conceição Barroso Pereira da Lama, 49 anos; rec.: Penedones, Montalegre, 2001.

145 – Lenda de Parafita Como era costume, no tempo de Verão o gado da casa do Branco, da aldeia de Parafita, concelho de Montalegre, ia para a Franjoseira e para o monte que a rodeava. Certo dia, uma das mulheres desta casa ia então com a rês e com as vacas para o lameiro. E enquanto olhava, ora para a rês ora para as vacas, ia fazendo na meia. Estava ela entretida no seu trabalho quando de repente lhe aparece uma moura vinda do Castelo, situado num monte próximo, a pedir leite. A mulher mugiu então uma vaca para um púcaro de barro preto e deu-o à moura. Esta agradeceu e foi-se embora, prometendo trazer-lhe o púcaro no dia seguinte. Ao outro dia, lá lhe apareceu com o púcaro. Mas trazia-o tapado. – Aqui tens o púcaro – disse ela. – Mas olha que só o deves destapar amanhã. A mulher aceitou essa condição. Porém, quando ia a caminho de casa, não conteve a curiosidade e destapou o púcaro. E viu então que estava cheio de carvões. Aborrecida, deitou-os fora e seguiu caminho. Ao chegar a casa, pousou o púcaro e meteu os animais na corte. E no dia seguinte, quando ia para mugir as vacas, ao pegar no púcaro viu que no fundo havia duas libras de ouro. Descobriu então que os carvões da moura eram mas é libras de ouro. Ainda foi procurar os que deitou fora, mas já os não achou. Fonte: Inf.: Maria Ermelinda Barroso Branco dos Santos, 39 anos; rec.: Parafita, Montalegre, 2001.

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Regionalismo que significa "não cristão" ou, no caso, mouro.

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146 – A navalha de ouro Entre as aldeias de Mourilhe e Frades, no concelho de Montalegre, há uma terra que o povo conhece como Lameiras de Vilarelho, onde se diz que está uma moura encantada com um valioso tesouro à sua guarda. Conta-se que um pastor, rapaz novo, andava um dia por lá com os bois e, a às tantas, apareceu-lhe à frente uma mulher também nova, tendo a seus pés uma manta de linho estendida e, sobre ela, muitas peças em ouro. O pastor ficou espantado com tudo o que via. A mulher, ao vê-lo tão interessado, disse-lhe: – De tudo o que à tua frente vês, escolhe o que mais te agradar e será teu. O rapaz mirou bem, uma vez, duas, três, e por fim decidiu-se. Apontou para uma navalha em ouro e escolheu-a. Como andava sempre a aguçar as aguilhadas para melhor dominar os bois, a navalha fazia-lhe jeito. E, para mais, sendo ela em ouro mais rico ficaria. A mulher ficou triste ao vê-lo fazer tal escolha, mas não se opôs. Apenas lhe disse: – Podias ter escolhido melhor. Não quiseste, pior para ti. Dito isto, deu-lhe a navalha e desapareceu. E o resto do ouro desapareceu também. O pastor meteu a navalha ao bolso e seguiu com os bois para casa. Quando lá chegou, recolheu os animais e foi a correr mostrar aos pais o presente que trazia. Meteu então a mão ao bolso, de onde esperava tirar a navalha de ouro, mas enganouse: o que tirou foi nada mais que um bocado de carvão. O rapaz ficou triste com’à noite. Depois pensou melhor e lembrou-se das palavras da misteriosa mulher ao dizer-lhe que podia ter escolhido melhor. Devia tê-la escolhido a ela, em lugar da navalha. Se o fizesse, ganhá-la-ia a ela e ao tesouro todo. Assim, se pobre já era, pobre continuou. Na manhã seguinte, e nos outros dias, ainda voltou ao mesmo sítio a tentar remediar o erro, mas de nada lhe valeu. Nunca mais encontrou a mulher. O povo acredita tratar-se da moura que ali está encantada há uns bôs mil anos. Fonte: Inf.: Maria Lucília Gomes Figueiredo, 40 anos; rec.: Montalegre, 2000.

147 – O mouro e a menina da Cidade de Mel Junto à aldeia de Penedones há um lugar chamado Padrões. Hoje já só lá há terrenos, mas dizem os antigos que houve ali uma cidade habitada por cristãos que se chamava “Cidade de Mel”. E realmente nesses terrenos têm aparecido cacos de cerâmica.

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Conta a lenda que na Cidade de Mel havia uma menina muito bonita por quem se apaixonou um mouro que morava junto à fonte da Anta. Um dia veio um pretendente de longe pedir a mão da menina ao seu pai, a qual lhe foi concedida. Fezse o casamento e ela foi morar noutra cidade. E então o mouro teve um grande desgosto e só dizia: – Cidade de Mel, Que já não vales nada, Deixaste fugir Uma rosa verde encarnada!

Dizem que na fonte da Anta, que então estava metida na terra e hoje está submersa pela albufeira do Alto Rabagão, nasceu depois um escramboeiro52 que marcava a entrada da residência dos mouros, e onde havia duas minas: uma de ouro e outra de peste. Quem lá entrasse, se primeiro encontrasse a de ouro traria grande riqueza e felicidade para a aldeia, mas se encontrasse a de peste traria grandes desgraças. Os habitantes de Penedones, com medo de encontrarem primeiro a mina de peste, nunca se atreveram a entrar ali. Fonte: Inf.: Ana Barroso, 70 anos; rec.: Penedones, Montalegre, 2001.

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Trata-se de “um arbusto baixo com picos muito afiados escondidos entre as folhas”, esclareceu a mesma informante.

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Concelho de Murça

148 – O poço da moira Conta-se que, antigamente, no sítio do Poço da Moira, na Ribeira de Noura [concelho de Murça], se ouvia, ao amanhecer, um melodioso cantar de mulher. Era duma donzela moura, que estava ali encantada. Todos queriam vê-la e apreciá-la. O problema era que, se alguém se aproximasse, logo o canto se calava. Muitos quiseram, pela calada da noite, surpreendê-la; mas escusado: ninguém o conseguiu. E a moira, todas as noites, continuava a cantar. Fonte: COSTA, António Luis Pinto da, O concelho de Murça (retalhos para a sua história), Murça, Câmara Municipal de Murça, 1992, p. 51.

149 – O rochedo da moira Num rochedo, redondo e sozinho, perto do Campo do Salto [em Noura, concelho de Murça], encontrava-se uma moura encantada. Esta só perderia o encantamento que ali a prendia, se, à hora do meio dia, um moço casadoiro conhecesse a sorte de ver um vestigo (cobra) e, sem medo, permitisse que ele subisse pelo seu peito acima e o beijasse. Nesse preciso momento, a jovem e linda moura transformarse-ia numa rapariga cristã, sem rival. Fonte: COSTA, António Luis Pinto da, O concelho de Murça (retalhos para a sua história), Murça, Câmara Municipal de Murça, 1992, p. 51.

150 – A moura de Sobreda Ia um homem a passar num caminho, próximo da aldeia de Sobreda, concelho de Murça, quando encontrou, sentada numa rocha, uma bela mulher a pentear os seus longos e negros cabelos. Como a achou muito bonita, procurou-lhe: – Que posso eu fazer, bela mulher, para a conquistar?

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E ela respondeu: – Só tens de me quebrar o encanto, que me tem dominada há 28 anos. – O encanto?! E como faço eu isso? – Amanhã de manhã vens aqui e encontrar-me-ás transformada numa cobra. Depois subo por ti acima e tu espetas-me uma agulha. Mas olha, não ma espetes na cabeça, porque podes cegar-me. Ao outro dia o homem lá foi. Viu então uma cobra muito feia, que subiu por ele acima. Mas como era muito feia, o homem sentiu tal repulsa que lhe deu uma palmada, atirando-a ao chão. E ao cair no chão a cobra transformou-se em mulher. E, como não chegou a ter tempo de vestir-se, apareceu nua. Com muita tristeza, disse então: – Ah, homem maldito, que dobraste o meu encanto! Perdeste a maior riqueza do mundo e nunca mais serás feliz! A mulher era uma moura encantada. Depois disto ficou mais 28 anos sob o encanto, e o homem nunca foi feliz. Fonte: Inf.: Maria Isabel Bessa Breia, 48 anos; rec.: Murça, 1999.

151 – O cavalo de ouro Diz o povo de Martim, concelho de Murça, que no monte do Irvedeiro, onde viveram os mouros, há um tesouro debaixo dum sobreiro. E que esse tesouro é nada mais nada menos que um cavalo todo em ouro. Também se diz que já muitas pessoas tentaram ir junto ao sobreiro procurá-lo, mas sentiram sempre uma energia estranha que as obrigava a desistir. Ainda hoje continua a falar-se em Martim do tesouro do cavalo de ouro, mas o certo é que nunca ninguém o conseguiu encontrar. Fonte: Inf.: Maria Isabel Bessa Breia, 48 anos; rec.: Murça, 1999.

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Concelho de Peso da Régua

152 – [A mina de peste e oiro] Em Portelo, ao pé da Régua, fala-se de uma mina com peste e oiro do tempo dos mouros; mas para ir desenterrar o oiro, tem de se passar pela peste, o que causaria a desgraça da povoação próxima. Fonte: VASCONCELLOS, J. Leite – Tradições Populares de Portugal, Lisboa, Imprensa Nacional – Casa da Moeda, 1986, p. 123.

153 – A Mina de Dona Mirra Próximo do santuário de S. Leonardo de Galafura, no concelho do Peso da Régua, há uma mina em pedra, conhecida como a “Mina de Dona Mirra”. E conta a lenda que lá por baixo há um palácio com muitas riquezas, onde vive Dona Mirra, uma princesa moura encantada em serpente. E que o jovem que sonhar com ela e tiver coragem de lá entrar poderá ficar com todas as riquezas. Para isso terá de ir à meia noite e enfrentar a serpente. Esta sobe-lhe pelo corpo até lhe chegar à cabeça. Se o jovem não tiver medo, dá um beijo na boca da serpente e, assim, quebra-lhe o encanto. A serpente transformar-se-á numa linda princesa e logo aparecerá um belo cavalo para o jovem e ela montarem. Depois casará com a princesa e, devido ao grande tesouro que lá está escondido, serão muito ricos para sempre. Mas até hoje ainda nenhum jovem se aventurou. Fonte: Inf.: Maria da Assunção de Azevedo Botelho, 43 anos; rec.: Bujões - Abaças, Vila Real, 2000

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154 – Os figos de Dona Mirra Um dia, um homem que tinha uma Quinta próxima do santuário de S. Leonardo de Galafura, concelho do Peso da Régua, passou junto à mina de Dona Mirra e viu, à entrada, uma manta de figos a secar. Apanhou uma mão deles e meteu-os ao bolso com a intenção de os comer ao “matar o bicho” no armazém53. Contudo, quando meteu a mão ao bolso à procura dos figos, em lugar deles saíram-lhe libras de ouro. O homem esqueceu logo o “mata bicho” e foi a correr ao sítio onde tinha visto os figos a secar, para trazer o resto, só que já lá não encontrou nada. O que ouviu foi uma voz que lhe disse: – Tivesses levado os figos todos! Diz o povo que Dona Mirra é uma princesa encantada que tem à sua guarda um grande tesouro. Fonte: Inf.: Maria da Assunção de Azevedo Botelho, 43 anos; rec.: Bujões - Abaças, Vila Real, 2000

155 – Lenda do Fragão de S. Leonardo Em S. Leonardo de Galafura há um lugar chamado Fragão, onde, segundo a tradição, um rei mouro encantou a sua filha usando umas palavras mágicas que diziam: – Abre-te fraga, aqui fica a minha filha encantada até ao dia em que semearem linho sobre ti, fizerem com ele uma toalha e comerem sobre ela um jantar. Um pastor, que estava ali perto e ouviu tudo, logo resolveu ser ele a desencantar a princesa. Procurou boa terra e encheu com ela o fragão, depois semeou linho, regou-o todos os dias, colheu-o, fez com ele uma toalha, e por fim comeu sobre ela um jantar. Esperava ele, depois disto, que a princesa fosse desencantada. Mas enganou-se. É que faltavam as palavras mágicas. Tinha de as saber empregar correctamente. Por isso nada conseguiu, e a princesa lá continua encantada. Fonte: Inf.: Maria Isabel Nantes, 51 anos; rec.: Poiares, Peso da Régua, 2000.

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No Alto Douro, onde esta lenda foi recolhida, chama-se “armazém” à adega que cada família rural geralmente possui para uso próprio.

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156 – A bola de Dona Mirra Na encosta de S. Leonardo há um sítio chamado a Fonte dos Mouros, onde andava, certo dia, uma menina a apanhar lenha. Nisto aparece-lhe à frente uma grande cobra, com uma grande trança na cabeça. A menina ficou cheia de medo e ia para fugir, quando a cobra a chamou, dizendo: – Não tenhas medo, pois não te faço mal. Sou Dona Mirra e estou encantada nesta figura. Se quiseres, podes desencantar-me. – E o que tenho de fazer? – perguntou a menina. – Vais para tua casa, e quando a tua mãe cozer pão, pedes-lhe uma bola e trazes-ma. Mas tens de guardar segredo. Se conseguires desencantar-me torno-te rica. A menina assim fez. Esperou que a mãe cozesse e pediu-lhe então uma bola. Só que a mãe não lha deu sem perguntar para quem era. A miúda disse que era segredo. Mas a mãe insistiu. Por fim a filha, teve de dizer-lhe a verdade. Pegou depois na bola e levou-a à Fonte dos Mouros. Contudo desta vez já não encontrou Dona Mirra. Apenas ouviu uma voz muito zangada, que lhe disse: – O que precisavas era que te furasse a língua com uma agulha para aprenderes a guardar os segredos! Prometi tornar-te rica, mas, como castigo, ficarás pobre! Fonte: Inf.: Maria Isabel Nantes, 51 anos; rec.: Poiares, Peso da Régua, 2000.

157 – Os lagartos de Dona Mirra Os mais antigos costumam contar que numa mina situada no monte de S. Leonardo de Galafura está encantada uma princesa moura muito rica. É Dona Mirra. E dizem também que é guardada por dois grandes lagartos. Por isso quem a quiser desencantar e ficar com as suas riquezas terá de matar primeiro os dois lagartos. Contam ainda os antigos que se houver um jovem valente interessado em ir lá e vencer os lagartos, a princesa aparece-lhe transformada numa grande cobra. E então o jovem tem de deixar que ela suba por ele acima e lhe dê um beijo. Nesse momento o encanto quebra-se e o jovem fica com a princesa e com toda a sua riqueza, que está num palácio escondido debaixo do monte. Só que, ao que se sabe, nunca houve ninguém assim, capaz de vencer os lagartos e depois deixar-se beijar pela cobra. Por isso, Dona Mirra lá continua encantada. Fonte: Inf.: Maria Isabel Nantes, 51 anos; rec.: Poiares, Peso da Régua, 2000.

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158 – A moura e a giestas Conta-se que numa ocasião ia uma mulher de Galafura a passar num caminho situado no monte de S. Lourenço, quando encontrou uma menina que ocupava o seu tempo a atar as pontas das giestas de um lado ao outro do caminho, dificultando a passagem às pessoas. Perguntou-lhe a mulher: – Ó menina, que estás a fazer? – Olhe, tenho esta sina. Se ma quiser tirar, faço-a rica. A mulher quis saber como, e então a menina, que era uma moura encantada, disse: – A senhora só tem de desatar as giestas que eu estou a atar. E mal me consiga alcançar, quebra-me o encanto e livra-te desta sina. A mulher aceitou. Então a menina continuou a atar as giestas e a mulher a desatá-las. O problema é que, por mais que esta as desatasse, de nada lhe adiantava, pois a outra mais depressa as atava. Diz o povo que ainda lá andam as duas: uma a desatar e a outra a atar. Fonte: Inf.: Maria Isabel Nantes, 51 anos; rec.: Poiares, Peso da Régua, 2000.

159 – O cavalo de três pernas Houve um rapaz que, ao saber que a moura Dona Mirra estava encantada numa mina situada no monte de S. Leonardo de Galafura, e sabendo também que outros já tinham lá ido tentar desencantá-la e fracassaram, resolveu ir à mourama para que lhe dissessem qual a forma mais correcta para a desencantar. Chegado à mourama deramlhe uma bola de trigo de quatro cantos, e disseram-lhe: – Levas esta bola ao sítio onde ela está encantada, e dizes assim: Dona Mirra aqui te apresento o teu desencanto. O rapaz lá foi com o trigo dos quatro cantos, só que, como a viagem era muito longa, ao chegar ao meio do caminho a fome começou a apertar, e, vai daí, tratou logo de comer um dos cantos do trigo. Chegado à entrada da mina, disse: – Dona Mirra, aqui te apresento o teu desencanto. E de lá de dentro veio-lhe uma voz, muito triste, dizendo: – E como poderia eu cavalgar num cavalo de três pernas? De nada valeu ao rapaz tanto trabalho que teve, pois também ele a não conseguiu desencantar. Fonte: Inf.: Maria Isabel Nantes, 51 anos; rec.: Poiares, Peso da Régua, 2000.

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160 – Lenda de Moura Morta Houve noutros tempos um emir que vivia no castro de Cidadelhe e tinha uma criada moura ao seu serviço. Um dia, para tentar obter os favores dos cristãos que eram já muito poderosos nas redondezas, exigiu-lhe que aceitasse receber o baptismo, convertendo-se, desse modo, ao cristianismo. Ela, contudo, recusou. E como castigo, o mouro encerrou-a num cativeiro, acreditando que, pela força, ela cederia aos seus planos. Um dia a jovem conseguiu fugir, e lançou-se ladeiras abaixo na direcção do rio Sermanha. O mouro, mal deu por isso, veio em sua perseguição. E quando a fugitiva passou para o lado de cá do rio, já no concelho do Peso da Régua, e porque estava já em terras cristãs, abandonou-a. Entretanto, apanhada pelos cristãos, só lhe restavam duas saídas: voltar para trás e entregar-se ao mouro que a perseguia, ou ficar em terras cristãs e converter-se a esta religião. Não aceitou nenhuma delas. E lavrou assim a sua própria sentença de morte, sendo abatida pelas lanças dos cristãos54. E às terras onde o seu corpo foi deixado sem vida, o povo passou depois a chamar Moura Morta55. Fonte: Inf.: Maria Otília Figueiredo, 71 anos; rec.: Moura Morta, Régua. 2001.

161 – Lenda da Moura Encantada do Fontão O ribeiro do Fontão desce lá de cima de Loureiro e vem ter ao ribeiro da Meia Légua, no Rodo. Era essa água que movia a azenha da Quinta do Rodo. Conta-se que ali para os lados da entrada da Quinta do Casal, que dava para atravessar para Jugueiros, perto do sítio onde as mulheres da Costa do Vale lavavam a roupa, havia uma moura encantada na vinha da Adelaide Morais. Dizia-se que a moura 54

Esta figura de cristãos, implacáveis e sanguinários, é reconhecida como sendo os religiosos da Ordem de Malta, que, de resto, tiveram uma influência notável na zona, havendo, ainda hoje, em Moura Morta uma rua designada "Sítio da Casa da Comenda". E sabe-se também que as terras onde se localiza Moura Morta foram um couto da Ordem de Malta (Soares, 1936: 32). 55 A nossa informante lembrou que, por vezes, neste relato era indicada, como cativa, não uma moura mas uma judia, a quem o emir exigia a conversão ao cristianismo. Neste quadro, teria sido o imaginário popular a absorver aqui a figura de uma judia na figura de uma moura, um fenómeno que, de resto, é frequente nas tradições orais, onde o conceito de mouro costuma incorporar um vasto leque de figuras mitificadas, que tanto podem ser árabes, como celtas, romanos, suevos, visigodos ou judeus.

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aparecia ao meio dia, a pentear os compridos cabelos loiros; mas, se alguém a visse, transformava-se imediatamente numa cobra e fugia para os buracos do ribeiro. Fonte: FERNANDES, Adelaide – “Lendas, Usos e Costumes das Nossas Terras”, Jornal Amadora-Sintra, Sintra, Setembro 2002, n.º 129, p. 14.

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Concelho de Ribeira de Pena

162 – O tesouro de Lamelas No lugar de Lamelas, do concelho de Ribeira de Pena, há um sítio a que o povo chama "Alto das Lameiras" e que tem ao pé o "Outeiro dos Mouros" e mais abaixo a "Praça dos Mouros". Diziam os antigos que na noite de S. João, pela meia noite, quem lá fosse a ler, com atenção e com devoção, mas sem medo, o livro de S. Cipriano, havia de descobrir o sítio onde está um tesouro composto por uma grade, uma charrua e um cambão, tudo em ouro. Numa ocasião, isto há mais de cinquenta anos, foram lá uns rapazes mais corajosos de Ribeira de Pena, levados pela ideia e pela ambição do tesouro. Entre eles ia o Sr. José Joaquim Gaspar Andrade Borges, que nasceu em 191856. E descobriram então várias inscrições numa fraga. Alguns acreditam que elas têm a ver com o tesouro. Quer tenham, quer não tenham, o certo é que esta descoberta fez nascer o que é hoje conhecido como o Santuário Rupestre de Lamelas. Fonte: Inf.: José Gabriel Borges, 48 anos; rec.: Ribeira de Pena, 2001.

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Trata-se do pai do nosso informante.

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Concelho de Sabrosa

163 – [Os mouros do castelo de S. Domingos] Conta-se que os mouros desciam do alto do Castelo [de S. Domingos, em Provezende, concelho de Sabrosa] por uma mina que vinha sair à fonte de Santa Marinha, aonde eles traziam os cavalos a beber. (...) Há quem diga que já entrou pelo extremo desta galeria, que se acha, dizem, junto da esquina do norte da capela de S. Domingos, no ponto mais elevado do centro do castelo árabe, que ali se vê em ruínas. Fonte: SAAVEDRA, José Augusto Pinto da Cunha – Provezende Antigo e Moderno, Lisboa, 1935, p. 21.

164 – [O Chão dos Mouros em Donelo] Donelo [no concelho de Sabrosa] é uma povoação muito antiga e, pelo menos, do tempo dos árabes, pois há aqui um sítio chamado o Chão dos Mouros, que foi almocabar (cemitério) deles, e ainda ali se vêm sepulturas de diversos tamanhos e do feitio de um corpo humano, abertas a picão, nos rochedos. (...) Em 1874 morreu nesta povoação de Donelo uma mulher que, segundo a crença do povo daqui, viveu sete anos encantada, sem comer, mantendo relações (não sei que qualidade de relações) com um rei mouro, também encantado. Fonte: LEAL, Pinho – Portugal Antigo e Moderno, vol. 5, Lisboa, Livraria Editora de Mattos Moreira & Companhia, 1875, p 473.

165 – Lenda de Provezende Reza a tradição que a povoação hoje conhecida por Provezende foi nos primeiros tempos da nacionalidade um território dominado por Zaide, um rei mouro que tinha o seu aquartelamento no castelo de S. Domingos. Diz-se também que a ocupação do território pelos mouros obrigou os habitantes cristãos a abandonar as

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terras férteis do Vale Verde, Sardoeira e Balado, e a irem viver para o lugar do Lameirão, uma zona árida e pedregosa situada a uns dois quilómetros dali. Para cúmulo, estes ainda tinham de ir cultivar, a mando dos mouros e em seu exclusivo benefício, as terras que lhes haviam roubado. Ano após ano, porém, a revolta foi crescendo em silêncio no seio dos cristãos, até que um dia resolveram, sob a protecção de S. Miguel, seu patrono de então, invadir ao amanhecer o castelo e atacar os mouros para reaverem as suas terras. O ataque foi feroz e muitos cristãos morreram. Um pouco abaixo do castelo, seguindo a crista do monte, há um lugar conhecido por “Fiéis de Deus” que ganhou tal designação por aí terem sido sepultados os cristãos. Segundo a memória oral do povo, as suas ossadas ainda lá estarão. Ao serem apanhados de surpresa no seu aquartelamento, alguns mouros tentaram a fuga, sendo um deles o próprio rei Zaide que foi perseguido incessantemente por um grupo de cristãos. Para seu azar, ao chegar ao fundo do monte, no lugar de Gache, o cavalo em que fugia tropeçou e ele foi projectado para uma veiga, onde os cristãos o alcançaram e o despedaçaram, sem piedade, a golpes de cutelo. Diz a lenda que o rei mouro na agonia exclamou: – Prove Zaide! Prove Zaide! Estas terão sido as últimas palavras que os cristãos lhe ouviram, ficando de tal modo gravadas na sua memória que o sítio onde foi abatido passou a denominar-se Provezaide. Este nome, por corrupção sofrida ao longo dos tempos, viria a tornar-se Provezende. Fonte: PARAFITA, Alexandre – O Maravilhoso Popular – Lendas. Contos. Mitos., Lisboa, Plátano Editora, 2000, pp. 172-174.

166 – O castelo dos mouros Versão A:

Na vila de Sabrosa há um castro, denominado pelo povo “castelo dos mouros”, onde se diz existir uma mina que vai até ao castro de Cheires, no concelho de Alijó, por onde os mouros passavam com os próprios cavalos sem serem vistos por ninguém. Segundo a lenda, esta mina atinge uma enorme profundidade, ao ponto de passar por baixo do rio Pinhão, e os mouros iam dar de beber aos cavalos na água que pingava do rio para o seu interior. Ainda hoje há quem acredite na presença de seres estranhos. Uns dizem que são mouros, outros que é o próprio diabo. Versão B:

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É voz corrente nesta vila, e foi-nos dito com a maior convicção, que esse poço era a porta de entrada duma extensa galeria subterrânea com cerca de um quilómetro, ligando o castro de Sabrosa ao vizinho castro de Cheires que se levanta na encosta fronteira, a nascente, em alcantilado outeiro granítico da margem esquerda do rio Pinhão. Conta-se também que, certa vez, determinado padre se atreveu a descer à galeria, aonde encontrou duas estátuas, mas apanhou um susto de tal ordem que só conseguiu voltar à superfície agarrado à cauda do cão que o acompanhava. Fonte – versão A: PARAFITA, Alexandre – O Maravilhoso Popular – Lendas. Contos. Mitos., Lisboa, Plátano Editora, 2000, pp. 42-43. Fonte – Versão B: ERVEDOSA, Carlos M. N. – “O Castro de Sabrosa”, in Trabalhos de Antropologia e Etnologia (Dir.: Santos Júnior), Porto, Instituto de Antropologia “Dr. Mendes Corrêa” da Universidade do Porto, 1968, pp. 360-361.

167 – Em busca dos cordões de ouro Dizem os antigos que próximo do Castelo dos Mouros, no lugar de Cristelo, em Sabrosa, há uma mina que esconde um valioso tesouro, composto por muitos cordões de ouro, usados pelas princesas mouras que ali viveram há muitos e muitos anos. Conta-se também que, certo dia, uma moça foi beber água àquela mina e que, a cada gole, iam-lhe aparecendo nos pulsos os cordões de ouro, uns atrás dos outros, a faiscarem de tanto brilhar. A dada altura, o peso do ouro era já tanto, que a jovem exclamou: – Valha-me Deus! Foi o bastante para que todo o ouro desaparecesse. A jovem ficou assustada e intrigada com aquilo, e fez constar no povo o que lhe aconteceu. Como era rapariga de boas famílias, ninguém ousou duvidar do seu testemunho, pelo que, no dia seguinte, vários rapazes, tidos como grandes valentões, foram lá, cheios de coragem, e entraram pela mina dentro à procura dos cordões de ouro. Sorrateiros, lá foram pé ante pé ao longo da mina. Nisto, começam a ouvir uns rugidos estranhos, roucos e prolongados, misturados com estampidos e cheiro a enxofre, e... ó pernas para que vos quero. Diz-se que entraram ali com pezinhos de gato e saíram com patas de cavalo. Quanto ao tesouro, nunca mais houve quem ousasse voltar lá. Fonte: PARAFITA, Alexandre – O Maravilhoso Popular – Lendas. Contos. Mitos., Lisboa, Plátano Editora, 2000, p. 107.

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168 – O buraco onde urinavam os mouros No lugar de Crestelo, ao pé de uma vinha do Tio João Fragulho, há um buraco numa fraga, ao qual, segundo diziam os antigos, vinham os mouros de noite urinar. Costumava dizer o Tio João que, todas as manhãs, encontrava sempre uma água muito amarela naquele buraco, mesmo que não tivesse chovido, e que era a urina dos mouros. Dizia também que eles saíam do fundo de uma mina, onde estavam escondidos, e vinham de noite para ninguém os ver. Fonte: Inf.: Maria Helena Moreira Parafita, 65 anos; rec.: Sabrosa, 2000.

169 – A noiva encantada Conta a lenda que um rei mouro tinha uma filha, que estava destinada a casarse com um outro rei que vivia nas terras de Além-Douro. Ela, contudo, alheia às combinações do pai, apaixonara-se por um jovem da sua idade, filho de camponeses e de religião cristã. Por isso, na primeira ocasião, fugiu do seu palácio para casar com ele. O pai, quando soube, partiu em perseguição da filha e do noivo, alcançando-os no alto de S. Domingos (em Provezende, concelho de Sabrosa). Aí ordenou que decapitassem o rapaz e lançou sobre a filha um encantamento, que era errar permanentemente pela serra. Por isso, diz o povo que nas manhãs de Inverno, quando o nevoeiro vindo do rio Douro esconde a serra de S. Domingos, há quem tenha visto um vulto de mulher a deambular por ali, e que é a moura encantada à procura do seu noivo. Fonte: Inf.: António Carlos Correia da Silva, 42 anos; rec.: Sabrosa, 2001.

170 – A lenda da Pala da Moura Contam as pessoas mais velhas de Parada do Pinhão, concelho de Sabrosa, que do lado de lá do rio Pinhão há um abrigo feito de pedras enormes que era a entrada de um esconderijo dos mouros. Dão-lhe o nome de Pala. Dizem que os mouros esconderam ali um fabuloso tesouro, composto de dois potes de barro da altura de um homem, um cheio de ouro e outro de prata. E para que ninguém os roubasse, trabalharam de noite e de dia com picaretas e picos, e à luz da

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candeia. Por isso construíram minas e cavernas, e foram esconder o tesouro na mina mais profunda. Uma delas passava debaixo do rio e outra chegava até um castelo no lugar da Balsa, a cinco quilómetros para norte. Diz também o povo que ali vivia uma jovem moura, que saía da pala para tecer linho, o qual nas suas mãos ficava branco como a neve. Houve mesmo pessoas que afirmaram tê-la visto ao passarem numa madrugada de Primavera para a feira de Vilar de Maçada. Viram-na descer ao rio a buscar água num pote de barro e depois subir cantando em árabe. À entrada da pala poisou o pote e pôs-se a pentear os seus longos cabelos negros. Só que a moura, quando deu conta de um pequeno ruído causado por quem a estava a observar, desapareceu como que por encanto aos olhos de todos. Por isso aquela pala ainda hoje é conhecida por "Pala da Moura". Fonte: Inf.: António Carlos Correia da Silva, 42 anos; rec.: Sabrosa, 2001.

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Concelho de Santa Marta de Penaguião

171 – [Lenda de Penaguião] Versão A:

Segundo a tradição, foram os irmãos D. Thedo e D. Rausendo que expulsaram daqui [terras onde hoje está a vila de Santa Marta de Penaguião] os mouros, pelos anos de 1030. Quando os cristãos se viram senhores destas terras, colocaram a bandeira dos Albuazares (a de D. Thedo) no alto de um penhasco, e daqui procede o nome da vila – penaguião. Versão B (Lenda de Santa Marta de Penaguião):

Diziam os mais antigos que as origens de Santa Marta de Penaguião estão ligadas aos irmãos D. Rausendo e D. Tedo, dois heróis muito famosos nas terras do Douro, onde combateram os mouros expulsando-os da região. Conta a lenda que os mouros, quando invadiram estas terras, construíram uma fortaleza num morro próximo da vila, onde já só há ruínas. Aí dificilmente alguém se atreveria a combatê-los. Só com muita coragem. E coragem era o que não faltava a D. Rausendo e D. Tedo. Por isso, o povo, cansado do domínio dos mouros e dos seus tributos, um dia pediu-lhes ajuda. E os dois irmãos não hesitaram em responder ao apelo. Em segredo, juntaram numa noite de lua cheia os mais audazes da povoação, e colocaram-nos num local estratégico a meio da encosta. E os dois irmãos, com uma bandeira nas mãos, disseram: – Esta bandeira será o vosso guião! Quando a virdes colocada na penha, avançai que a entrada estará livre. E Santa Marta, vossa padroeira, há-de acompanharnos! Os dois escalaram então o castelo, e surpreenderam os mouros que estavam de sentinela, matando-os sem que tivessem podido dar o alarme. E de seguida, enquanto um dos irmãos abriu as portas do castelo, o outro foi ao alto da penha e colocou a bandeira bem à vista. Nisto, no esconderijo da ladeira, um dos moradores logo deu o alerta aos companheiros: – Vejam! Na penha... o guião!

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Foi o bastante para que todos irrompessem pela encosta, entrando no castelo, onde, pela surpresa e com o auxílio de D. Rausendo e D. Tedo, venceram os mouros, expulsando os que escaparam com vida. E àquele grito de alerta – “na penha... o guião! – se deve o nome que, primeiro, foi “Penha-guião” e, depois, se simplificou em Penaguião. E porque a bandeira os guiou e Santa Marta os acompanhou, depressa a vila ficou com o nome de Santa Marta de Penaguião57. Fonte – versão A: LEAL, Pinho – Portugal Antigo e Moderno, vol. 8, Lisboa, Livraria Editora de Mattos Moreira & Companhia, 1878, p. 432. Fonte – versão B: PARAFITA, Alexandre – “As três ‘origens’ de Santa Marta de Penaguião”, in VEJA – A Revista do Douro, nº 2, Agosto/2002, Peso da Régua, p. 52.

172 – Entre S. Pedro e Urval Diz a tradição, pela voz dos mais antigos destas terras, que por baixo do caminho que vai do lugar de S. Pedro ao lugar da Veiga, passando pelo Urval, no concelho de Santa Marta de Penaguião, numa zona de férteis paisagens vinhateiras, há uma mina dos mouros, por onde eles andavam e onde está enterrada grande riqueza em ouro. E também se diz que a riqueza é de tal valor que, antigamente, os mais velhos usavam o seguinte ditado: Entre S. Pedro e Urval está a riqueza de Portugal. Fonte: Inf.: Padre Manuel Joaquim Mourão, 63 anos; rec.: Sever, Santa Marta de Penaguião 2001.

173 – A fraga da Moura (Alvações do Corgo) Versão A:

Em Alvações do Corgo (...), a pouca distância, na margem do rio, entre umas vinhas, há uma gruta natural, rodeada de muitos penedos. A tradição popular apoderou-se dessa gruta e, segundo ela, aparece lá, na noite de S. João, uma moura, metade mulher e metade bicha, que tem naquela noite sempre muito varrida a entrada da gruta. Por isso se chama Fraga da Moura. 57

Pelo menos mais duas lendas são referenciadas, na tradição popular, procurando justificar o nome desta vila duriense. Uma respeita a um fidalgo de apelido Gedeom (que derivou em Guião), condenado a cumprir uma pena de desterro nestas terras. Outra trata de um conde francês, de nome Guillon, que foi condenado, por ofensas à padroeira da localidade (Santa Marta), a realizar grandes plantações de vinha no Douro. A ilustrar esta última lenda existem no edifício da Casa do Douro, no Peso da Régua, sugestivos painéis em vitral.

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Versão B (A moura que varre):

Sempre ouvi contar aos antigos que num local denominado Viso, junto à margem esquerda do rio Corgo, entre as freguesias de S. Miguel de Lobrigos e de Alvações do Corgo (S. M. Penaguião), há um encanto numa fraga. Dizem que é uma moura encantada em serpente e a guardar um pote de moedas de ouro. Tem-se ouvido também dizer que à entrada da fraga está sempre tudo muito limpo e varrido, e que é a moura que varre. Contaram-me que há quem tenha por lá passado num dia com o gado, deixando o chão todo sujo, mas ao outro dia aparece tudo muito varrido. Diz-se também que a rocha dá entrada para uma mina, e que, entrando lá, se acham umas escadas em pedra, cavadas na rocha. Quem lá entrou, só entrou até certa altura, pois a partir daí o medo é grande. Até dizem que já houve quem pegasse no pote cheio de moedas, mas que o medo foi tanto que logo deitou tudo a perder. Fonte – versão A: VASCONCELLOS, J. Leite – Contos Populares e Lendas, Coimbra, Acta Universitatis Conimbrigensis, 1969, p. 749. Fonte – versão B: Inf.: Francisco Morais, 40 anos; rec.: S. Miguel de Lobrigos, Santa Marta de Penaguião, 2001.

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Concelho de Torre de Moncorvo

174 – A lenda da Cabeça do Mouro Versão A:

Nam há documento por que conste sua fundação [igreja de São Salvador, no concelho de Torre de Moncorvo], e só huma vulgar tradiçam de que fora feita no lamentavel tempo em que os mouros dominavão esta terra por um christão em competência de hum mouro que ao mesmo tempo fazia uma mesquita no sítio da Portella, termo da villa de Moncorvo no fundo das Fragas dos Estevais, que convertida em templo de christãos, he hoje da invocaçam de Sam Mamede e ainda que no presente se ache arruinada, comtudo mostra a admirável forma da sua fundação. He da mesma tradiçam que estes dois oficiaes christão e mouro nesta sua competência contratarão que aquele que milhor fizesse a sua obra mataria o outro, e que acabando primeiro o christam a sua, e hindo ver a do mouro, e reconhecendo levar a sua vantagem, o convidara para logo vir tambem ver este a sua e vindo a isso caminho direito, descansando a huma fonte no cimo do lugar de Cabeça de Mouro termo da dita villa de Torre de Moncorvo junto da igreja della dilatando-se algum tempo a conversar dissera que se naquella ocasiam morria nam aviam de prejudicar nem fazer mal com seo veneno as muitas bichas58 que na muita distancia de terra, que dali se ve, havia, e que se tem e teve em toda ela por certo pela conhecida experiencia havida das muitas que tem mordido muitas pessoas sem prejuizo nem damno. E que havendo de beber na dita fonte, o christão dolosamente persuadira o mouro a que o fizesse primeiro e que fazendo-o e abaixando-se para isso, lhe cortara a cabeça com um treçado, de cujo sucesso ficara áquella fonte o nome de Fonte de Cabeça de Mouro, e que povoando-se depois o lugar, que ali há, se chamara pela mesma rezam Cabeça de Mouro. E povoando-se outro logo a elle vezinho do mesmo termo da Torre de Moncorvo se chamara Cabeça Boa per razam do dito sucesso, o prodigio de as bichas daquellas terras não prejudicarem, havendo muitas.59

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Segundo o autor da transcrição a designação de bichas corresponde a víboras. Esta transcrição conserva a ortografia do documento original, datado de 1721.

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Versão B:

No concelho de Torre de Moncorvo, há um lugar conhecido por “Cabeça do Mouro” a que está associado a seguinte lenda: Conta-se que um cavaleiro cristão, ao passar cansado e cheio de sede, encontrou uma nascente de água e logo desceu do cavalo para beber. Contudo, ao aproximar os lábios da água reparou que, dentro e fora do pequeno açude, havia víboras e escorpiões, o que o levou a dar um salto para trás e a afastar-se da água. Nisto, ouviu atrás de si uma voz que lhe perguntou: – Então tens sede e não bebes? – E como? Para ser mordido por uma víbora ou um escorpião?... O desconhecido era um mouro, que logo se aprontou a ajudar o cavaleiro cristão a matar a sede. – Podes beber descansado – disse-lhe o mouro –, que eu, com os poderes que tenho, encantarei todas as víboras e os escorpiões para que te não façam mal enquanto bebes! E assim aconteceu. Porém, vendo como todos os répteis estavam encantados, o cristão puxou da sua espada e cortou, no mesmo instante, a cabeça ao mouro para que este os não desencantasse. Por isso se diz que as víboras e os escorpiões destas redondezas são inofensivos para o homem e não há notícia de que alguma vez tenham feito mal a alguém, ao contrário do que acontece noutros sítios. Também no lugar da nascente existe hoje uma fonte de água fresca e pura, muito procurada para matar a sede no Verão, que é conhecida como a fonte da “Cabeça do Mouro”. Fonte – versão A: MORAIS, Joam Pinto de; PINTO, António de Sousa, Memorias de Anciães, 1721 – apud ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, pp.116-117. Fonte – versão B: PARAFITA, Alexandre – O Maravilhoso Popular – Lendas. Contos. Mitos, Plátano Editora, Lisboa, 2000, pp. 43-44.

175 – [Santo Apolinário e os mouros] Tendo-se os mouros assenhorado em 716 da cidade de Caliabria, e como Apollinário, bispo da mesma cidade, não quisesse renegar suas doutrinas, que eram as do cristianismo, nesse mesmo ano, segundo diz a lenda, os mouros o amarraram a dois touros bravos, e o levaram arrastado desde a cidade até ao lugar onde está a sua capela, atravessando o rio Douro, da parte da Beira Baixa para Trás-os-Montes. Chegado ali, ou à cidade de Ravêna60, que ficava mais no alto, foi cruelmente martirizado. 60

Povoação extinta, que esteve situada na coroa do Outeiro, próximo da aldeia de Urros, no concelho de Torre de Moncorvo.

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Os cristãos, que tinham por ele muita fé e respeito, mandaram construir um lindo túmulo e meteram dentro o corpo do santo, onde ainda hoje se venera dentro da sua capela. (...) No túmulo do santo estão representados, em relevo, os touros que o arrastaram e os mouros que o acompanharam.61 Fonte: PEREIRA, José Manuel Martins, As Terras de Entre Sabor e Douro, Setúbal, J.L. Santos, 1908, pp. 84-85.

176 – [O buraco dos mouros debaixo da capela] [Na freguesia de Urros, concelho de Torre de Moncorvo] está o alto chamado do Castelo, de grande elevação, e no seu cume se vê a antiga ermida de Nossa Senhora do Castelo, ou dos Prazeres. Esta capela é muito antiga. Neste alto há também uma grande caverna feita na rocha e que passa por baixo da ermida de Nossa Senhora, a qual dizem uns ser obra dos romanos, e outros dos mouros para sua vivenda. O povo também lhe chama buraco dos mouros. Esta caverna está à entrada cheia de hera e serve hoje de habitação às aves nocturnas62. Fonte: PEREIRA, José Manuel Martins, As Terras de Entre Sabor e Douro, Setúbal, J.L. Santos, 1908, p. 85.

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Pinho Leal também tornou pública esta lenda, observando que “a terra que cobria o corpo do santo tem sido quase toda tirada por um buraco, feito de propósito para isso; porque o povo acredita que, bebendo uma pitada desta terra misturada com água, é remédio infalível para curar as febres intermitentes”. E diz também que, junto à capela há um grande cipreste, o qual “nasceu de uma gota de água, que o santo ali vazara de uma cabacinha que tinha enchido quando passou o Douro”; e que também existe um chafariz, cuja água “está clara quando o Douro corre límpido e se faz turva quando o rio assim vai” (1882: 19-20). Conserva-se ainda na tradição popular o costume de “as mães prometerem os filhos que são muito maus” ao Santo Apolinário. E dizem esta quadra: “Santo Apolinário duro, Que amansais os touros bravos, Amansai-me esta criança Que é má com’ós diabos” [dita por António dos Santos Dias, 65 anos, em 1999, Carviçais, Torre de Moncorvo] 62 O padre Jerónimo Contador de Argote, na sua Memória do Arcebispado de Braga, também se refere a este “Buraco dos Mouros”. E diz que “tem largura bastante para andarem cinco ou seis pessoas emparelhadas” e que “houve pessoas que intentaram investigar o comprimento e fim desta notável concavidade, mas à vista do muito que corria para o interior, desistiram da empresa; só depõem que dentro acharam largos, formados à maneira de casas” (apud LEAL, 1882: 19).

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177 – [A “matança” dos mouros] [Na freguesia de Urros, concelho de Torre de Moncorvo] fica o monte chamado Matança, onde, segundo a tradição, houve uma grande batalha entre cristãos e mouros, renhida com tal rigor que deu em resultado não ficar vivo um só mouro. Dizem que ainda hoje, em alguns sítios se têm encontrado restos de ossadas humanas, e da tal famosa batalha lhe provém o nome. Fonte: PEREIRA, José Manuel Martins, As Terras de Entre Sabor e Douro, Setúbal, J.L. Santos, 1908, p. 86.

178 – A Lenda da Fraga Amarela Versão A:

Na Vilariça [concelho de Moncorvo] há uma pedra que servia de grade aos lavradores nos serviços agrícolas, por ser muito jeitosa. Um dia, que a ribeira ia muito grande, a pedra falou a um lavrador e disse-lhe: – Parte de mim o que quiseres e mete-me no bolso e deita-me à água. Ele assim fez e imediatamente a pedra se transformou em linda donzela moura sobre uma grade que, água abaixo, ia cantando: – Adeus Vale da Vilariça, Adeus Fraga Amarela63; Quanto ouro, quanta prata Não me ficam dentro dela. Versão B:

No castro de Adeganha há uma imponente fraga, a Fraga Amarela, onde, segundo dizem as gentes da aldeia, habita uma moura, que de vez em quando aparece e se ouve cantar de dentro do penedo. Ora contam que, certo dia, um lavrador que andava por perto a lavrar um campo, com uma pedra em cima da grade, como é costume nestas terras, para fazer peso e os espigões da grade revolverem melhor os torrões e a terra ficar melhor lavrada, sonhou com a moura. No sonho, a moura dizia-lhe que partisse a pedra da grade, enchesse os bolsos com os bocados assim partidos e deitasse o resto à ribeira da Vilariça. Quando acordou, o lavrador começou desse modo a fazer. Partiu três ou quatro bocados da pedra da grade, meteu-os nos bolsos do casaco, mas depois arrependeu-se e pensou: 63

Trata-se de uma fraga muito útil para o povo, pois funciona como relógio de sol. É meio dia quando o sol a cobre em toda a sua dimensão.

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– Que estou eu para aqui a fazer? Tem algum jeito, a encher os bolsos com pedras?... E deitou todo o resto da pedra da grade à ribeira da Vilariça. Foi então que em cima da Fraga Amarela surgiu a moura encantada a fiar numa roca e a lamentar-se, dizendo: – Adeus ó Vale do Ouro, Adeus ó Fraga Amarela! Tanto ouro, tanta prata Me ficaram dentro dela!

É que, quando o lavrador meteu as mãos nos bolsos do casaco verificou que os poucos bocados que lá tinha metido eram bocados de ouro. E muito arrependido ficou de não ter partido mais. Mas já nada havia a fazer, que ele tinha atirado com quase toda a pedra da grade à ribeira da Vilariça. Nem ele pôde obter mais ouro, nem o encanto da moura se desfez. Perdera e ela lá continua encantada na Fraga Amarela, aparecendo e fazendo-se ouvir de vez em quando. Versão C (A Lenda da Pedra Encantada) :

Conta a gente desta terra que, há muitos anos passados, quando toda a gente era humilde e dava as mãos ao trabalho, todos os camponeses se dirigiam para o campo, para cultivar os seus terrenos. Uns plantavam batatas e feijão, outros lançavam as sementes à terra, para depois colher o centeio e o trigo. Certo é que todos precisavam de agradar as terras e, para a grada ficar mais pesada, todos eles escolhiam uma pedra muito lisa e redondinha que, por magia ou coincidência, estava sempre ali à mão. Tudo isto se repetiu por muitos anos, até que um dia um moço sonhou com a pedra, isto é, sonhou que ela falava e lhe pedia que a ajudasse a voltar para a sua casa. Sonhou uma vez, sonhou duas e à terceira, sempre com o mesmo sonho, dirigiu-se ao campo, agarrou a pedra e dirigiu-se com ela até junto do rio Sabor. Aí partiu-lhe os quatro cantos, que era o que no sonho lhe fora pedido, depois atirou-a ao rio. Então, qual não foi os eu espanto ao ver que a pedra se transformou numa linda sereia que, seguia rio abaixo, nadando e cantando assim, com uma voz encantadora: – Adeus Vale da Vilariça, Adeus ó Fraga Amarela, Tanto ouro, tanta prata, Ali fica dentro dela. -

Nestes montes eu vivi Como pedra encantada, Tantos anos adormecida E pela grade embalada!.

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Versão D (Lenda dos Barrais da Vilariça):

Havia no Vale da Vilariça uma enorme pedra, que era usada por todos os lavradores para colocar em cima da grade quando andavam a agradar os terrenos para plantarem depois os melões. Essa pedra passava de parcela em parcela e com os anos foi-se gastando. Um dia, em que dois lavradores andavam desavindos, um deles, ao acabar de gradar a sua terra, decidiu não passar a pedra para o seu vizinho e, em vez disso, deitou-a para a ribeira, que passava perto. Nesse instante, formou-se uma trovoada enorme e a água passou a correr e a transbordar em todos os regatos. E, de repente, no cimo da corrente da ribeira turva, formou-se uma linda donzela que, enquanto seguia ribeira abaixo, cantava: – Adeus, barrais da Vilariça, Adeus ó Fraga Amarela, Tanto ouro e tanta prata, Que me ficam dentro dela!

Esta fraga é um grande penedo que se distingue dos outros pelo tamanho e pela cor amarelada. Diziam os mais antigos que nela se encontra um tesouro com muito ouro. Quanto a mim, o ouro que há está no terreno fértil do vale. O que é preciso é trabalhar nele e saber cultivá-lo. Fonte – versão A: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, p. 155. Fonte – versão B: PIGNATELLI, Inácio N. – “Histórias do Douro”, in Jornal de Notícias, Porto, 20-7-1997. Fonte – versão C: Inf.: Rosa Abade, 38 anos; rec.: Junqueira, T. de Moncorvo, 2001. Fonte – versão D: Inf.: Laurentina Carneiro, 74 anos; rec.: Horta da Vilariça, T. de Moncorvo, 2003.

179 – A moura encantada de Adeganha No antigo castelo de Adeganha [concelho de Moncorvo] existia uma passagem subterrânea que depois foi tapada. Lá dentro ficou uma jovem moira que os cristãos haviam raptado e ali encerraram. Era tecedeira e tecia fios de ouro. Pelo tempo fora, a moura ali ficou encantada. Um dia, um pastor andava por ali, guardando as cabras. Subiu ao cimo das ruínas do castelo e espreitou por um buraco. Viu umas escadas e desceu por elas. Começou a ver ouro, muito ouro. De repente, assustou-se e voltou a subir, cheio de medo. Ouviu então uma voz dizendo: – Ah, ladrão, que me dobraste o encanto! Era a voz da moura, lamentosa, que ali continuaria, encantada, pelos tempos fora. O encanto só podia ser quebrado por alguém que ali fosse à meia noite do dia de São João.

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E foi o que aconteceu. Um outro pastor, que guardava ovelhas, deixou perder uma delas que entretanto parira. Foi procurá-la de noite. Subiu ao castelo para ver se escutava os balidos da ovelha e da cria. De repente, espreitou pelo buraco. E lá dentro, viu uma toalha branca, de linho, cheia de figos secos. E que apetitosos!... Desceu, e foi encher os bolsos. Depois foi à procura da ovelha. Encontrou-a junto ao castelo, presa em umas silvas e acariciando o cordeirinho. Então meteu um figo à boca, mas... era de ouro. Os figos eram todos de ouro fino. Ouviu então um barulho leve, como de avezinha, e uma palavra cheia de ternura e felicidade: – Obrigada! Era a moura que voava, livre, para junto dos seus. O encantamento havia sido quebrado. Ficou da história uma quadra que o povo de Adeganha continua a cantar: “Aqui está Adeganha, Toda ela engalanada! Ao cimo tem o castelo Com sua moira encantada!” Fonte: ANDRADE, Júlio – “Lenda da moira encantada de Adeganha”, in Terra Quente, Mirandela, 1-12-1999.

180 – [Chelindrão da Presa] No sítio chamado Chelindrão da Presa, termo de Carviçais, concelho de Moncorvo, há cinco blocos enormes de pedra, forma esférica, com que os mouros jogavam os paus, diz a lenda. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, vol. IX, Porto, 1934, p. 454.

181 – Lenda do Bezerro de Ouro Há no termo do Felgar [concelho de Torre de Moncorvo], num sítio adonde é que chamam Olhadela, do lado de cá do rio, o castelo dos mouros. Ainda lá estão restos. E, nesse castelo, dizem que está um bezerro de ouro encantado. Já lá foram vários para tirar aquilo64, mas aquilo não sai. Diz que só saía à meia noite, indo lá um gaijo, que seja padre, a dizer missa. Ora, havia ali um no Felgar, que tinha sido ordenado há pouco tempo, e veio aqui a 64

Aquilo é uma designação que, na linguagem popular, procura traduzir o inexplicável, o satânico e, em muitos casos, o próprio Diabo – nome que o povo evita pronunciar (Parafita, 2000: 29)

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Carviçais, ao Padre Tavares, a pedir os hábitos de padre, e o Padre Tavares emprestoulhos. Depois, uns dez ou doze gaijos juntaram-se e foram lá com ele a dizer a tal dita missa. Formaram lá um altar e puseram-se então a dizer a missa. Às tantas, começaram a sentir barulho, e um dos fulanos, que lá estava a assistir à missa, disse p'ró gaijo que era padre: – Ó Cacinho65, o vitelo já urra! Conforme ele disse aquelas palavras, alevantou-se tamanha ventaneira... uns foram ter aqui, outros foram ter ali, outros salvaram o rio, e ninguém ficou lá. Só se encontraram ao outro dia, um aqui, outro ali, outro além, sem saberem p’ronde é que vieram nem p’ronde é que não vieram. Nenhum deles soube o caminho que tomou. Fonte: Inf.: António dos Santos Dias, 65 anos; rec.: Carviçais, Torre de Moncorvo, 1999.

182 – Lenda da Fraga da Pindura No termo de Felgar, há uma fraga a que chamam a Fraga da Pindura. E então um senhor qualquer sonhou lá com uma moura encantada. E sonhou que ela lhe dava dinheiro. Resolveu, por isso, ir lá, e quando lá chegou apareceu-lhe uma cobra muito grande. O homem hesitou, e ia já a começar a fugir, quando ouve uma voz que lhe diz: – Não fujas, senão dobras-me o encanto! Ele enfrentou a cobra, a cobra beijou-o e logo se desfez na figura duma moura. E diz-lhe então: – Olha, tu agora não precisas de trabalhar, nem de fazer nada. Quando quiseres dinheiro, vens aqui à Fraga da Pindura, metes a mão aqui nesta fincha66, e, todas as vezes que cá vieres, sai-te sempre uma moeda, ou duas, ou três. Não sei já a quantidade que era. Então o gaijo assim fez. Quando precisava de dinheiro, ia lá e saíam-lhe sempre aquelas moedas que ela lhe tinha dito. E desde então ele fazia ali uma vida de lorde no Felgar. Jogava, comia, bebia, e não trabalhava. A gente estava ali toda abismada. De onde é que lhe viria o dinheiro? Num dia qualquer, foi p’rá taberna a jogar o chincalhão. Lá bebeu um copito a mais, e, quando estava a perder, os outros disseram-lhe: – Hoije em vez de ganhares, perdes. Já perdeste aqui umas c’roas boas! E ele, enraivecido, ao ver sair-lhe um cinco de ouros, disse: – Troco! Vale seis! Enquanto a Fraga da Pindura o der, não há problemas. Não falta dinheiro! 65 66

Cacinho é diminutivo de Acácio. Seria, por isso, esse o nome do jovem padre. Designação popular equivalente a frincha.

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Ao outro dia, porque tinha perdido e precisava de dinheiro, foi lá à Fraga da Pindura. Meteu lá a mão e já não saiu moeda nenhuma. Como tinha descoberto tudo, nunca mais tirou lá dinheiro nenhum. Fonte: Inf.: António dos Santos Dias, 65 anos; rec.: Carviçais, Torre de Moncorvo, 1999.

183 – A fonte da Chuzaria Andava um homem a lavrar com dois burros num campo, em Larinho, do concelho de Moncorvo. A certa altura, como fazia muito calor, teve sede e foi beber à fonte da Chuzaria. E reparou então num fio de ouro que estava no fundo da água. Começou a puxar por ele, a puxar, a puxar, e o fio nunca mais acabava. Como já tinha passado muito tempo, o lavrador puxa-o com força e o fio quebrou. Nesse momento, ouviu a voz de uma moura encantada, que disse: – Ó desgraçado, que me dobraste o encanto! Mas mesmo assim vem cá todos os dias e encontrarás seis vinténs. O lavrador passou então a ter aquele rendimento, e por isso deu em ir todas as noites para a taberna jogar. A dada altura, começou a perder, sempre a perder, e disse aos colegas: – Troco e volto a trocar, enquanto a fonte da Chuzaria me der seis vinténs, não deixarei de jogar!

Ao outro dia, voltou ao mesmo local e dinheiro nem vê-lo. Mas, pior que isso, a fonte secou completamente. E assim continua. Fonte: Inf.: Teresa da Conceição Lopes, 64 anos; rec.: Larinho, Torre de Moncorvo, 2000.

184 – A lenda da Fonte de Carvalho Dizem os mais antigos que na Fonte de Carvalho, em Torre de Moncorvo, há uma moura encantada que canta maravilhosamente na noite de S. João. E também dizem que tem um novelo de ouro nas suas mãos e que no fim do fio está uma serpente. Nessa noite, o novelo cai ao tanque da fonte e a moura será desencantada se algum jovem apanhar nesse instante o novelo, o desfizer e deixar-se beijar pela

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serpente. Consta-se que muitas vezes lá foram tentar a façanha, mas nenhum consegue chegar ao fim com medo ao beijo da serpente. Por isso a moura lá continua encantada. Fonte: Inf.: Virgínia da Conceição de Castro, 68 anos; rec.: Torre de Moncorvo, 2001.

185 – Lenda da Ferrada Diz o povo do Larinho, concelho de Torre de Moncorvo, que no lugar da Ferrada o barulhinho que se ouve – pim pim, pim pim, pim pim... – é de uma moura encantada de grande beleza que ali passa os dias a fiar e a chorar por se encontrar presa. Todos os dias de S. João, à meia noite, vai estender as meadas de linho que fiou durante o ano, esperando que haja então algum cavalheiro que ali vá sozinho quebrar o encanto. Infelizmente os rapazes que lá vão, levam as namoradas, pelo que ainda nenhum lho quebrou. Fonte: Inf.: Maria da Conceição Ferreira, 61 anos; rec.: Felgar, Torre de Moncorvo, 2001

186 – A moura e o bezerro de ouro Há no Felgar um lugar chamado Olhadela, situado na margem direita do rio Sabor, onde existem restos de um muro que antigamente tinha três argolas de ferro para os mouros prenderem os cavalos. Também lá existe um grande buraco, a que o povo chama “cisterna”. Conta a lenda que nessa cisterna há uma moura encantada e um tesouro e que, para os encontrar, é preciso ir lá de noite com o livro de S. Cipriano. Já dois homens do Felgar lá foram a saber do tesouro. Chegaram, desenharam no chão um sino saimão e puseram dentro dele umas pedras para se sentarem enquanto liam o livro. E tudo estava a correr bem, até que, no meio de grandes estrondos, apareceu a moura com o bezerro de ouro. Um dos homens, ao ouvir tamanhos estrondos, teve tanto medo, que só soube dizer: – Valha-nos aqui Deus! Ditas tais palavras tudo desapareceu. E os dois homens foram atirados pelo ar, indo parar muito longe dali: um foi ter à Amarela e o outro à Fonte Salgueiro rumo à aldeia. Nunca mais se atreveram a voltar lá. Fonte: Inf.: António Felisberto Carrasqueira, 70 anos; rec.: Felgar, Moncorvo, 2001.

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Concelho de Valpaços

187 – [O Vale da Batalha] Próximo ao lugar de Alvarelhos [concelho de Valpaços] há um fortim arruinado chamado a Coroa. É tradição que nele habitava um rei mouro. E há outro sítio, entre Alvarelhos e Orcides, chamado Vale da Batalha, onde é tradição que se deram muitas batalhas aos mouros que eram sempre derrotados, porque S. Tiago, montado num cavalo branco, ajudava os cristãos, matando mouros sem dó nem misericórdia67. Finda a acção, se recolhia o santo cavaleiro a um vale, ao O. [oeste], onde depois se fez uma capela ao dito santo, da qual hoje apenas restam as ruínas. Fonte: LEAL, Pinho – Portugal Antigo e Moderno, Lisboa, vol.1, Livraria Editora de Mattos Moreira & Companhia, 1873, p. 174.

188 – Pia dos Mouros Há em Argeriz [concelho de Valpaços] a Pia dos Mouros, dos mouros e das mouras encantadas, que, quando os raios solares aquecem a encosta pedregosa, vêm secar e estender à cobiça dos mortais os seus tesouros. Aqui são meadas e meadas de fios de ouro. Mas, só de longe podem ser observados. Quando, mesmo que sorrateiramente, alguém se aproxima na mira de se apoderar ou pelo menos observar de perto o valoroso metal, tudo desaparece como que por encanto. Fonte: FREITAS, Adérito Medeiros – “Pias dos Mouros – Argeriz, Carrazedo de Montenegro”, in Trabalhos de Antropologia e Etnologia, Porto, Universidade do Porto, 1978, p. 265.

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A intervenção deste santo a ajudar os cristãos na luta contra os mouros é bastante comum em relatos da tradição oral, embora, por vezes, surja transfigurado noutras presenças, como a de S. Martinho, em Caramós, concelho de Felgueiras, ou a da própria Nossa Senhora, em Chacim, concelho de Macedo de Cavaleiros, etc., etc.

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189 – A mina da moura Perto do caminho que vai dar a Moreiras, há uma mina onde há muitos, muitos anos, habitava uma linda mourinha, filha de um mouro rico que, por ela lhe ter desobedecido, a encantou para nunca mais. Conta-se no povo que, nas madrugada de S. João, a mourinha sentava-se na relva do outeiro, e punha-se a pentear os seus longos cabelos com um pente de ouro e pedras preciosas, ao mesmo tempo que entoava uma cantiga triste. Ora, como era festa de S. João, o povo passava a noite toda a saltar a fogueira, a comer, a beber e a bailar, até altas horas. E no regresso a casa os caminhos enchiam-se de gente. Gente que evitava ir pelo atalho do outeiro, onde se ouvia o canto da moura encantada, porque todos tinham medo de sofrer também algum encanto. Diz que, quando algum homem sozinho passava junto ao outeiro, a moura costumava perguntar: – Diz-me cá: qual é mais bonito, o pente de ouro e pedras que o meu pai me deu, ou eu que aqui falo contigo? Ora, os homens ficavam de tal modo deslumbrados com a beleza da moura, que lhe respondiam sempre: – Bô?! A senhora é muito mais bonita! – Então o que preferes levar? O pente ou eu? – tornava a moura. Perante as duas hipóteses, a ambição dos homens levava-as sempre a escolher o pente. Era o pior que podiam dizer, pois dobravam-lhe o encanto. E por isso, há quem diga que ainda hoje ali continua encantada, à espera que alguém lhe quebre o encanto. Fonte: Inf.: Maria da Graça de Oliveira Gomes, de 54 anos; rec.: Lebução, Valpaços, 1999.

190 – A Fonte da Moura Em Nozelos, a pouco mais de meia hora de caminho de Lebução, existe uma casa grande abandonada, com uma quinta à volta onde está uma fonte de água fresca a correr noite e dia. Diz o povo que essa casa pertenceu ao mouro mais rico da região. Esse mouro tinha uma filha chamada Zaida, que era muito bonita e a quem não faltavam pretendentes. No entanto, o seu pai não tinha pressa em a casar. Acontece que, a dada altura, a jovem começa a dar mostras de estar apaixonada e o seu pai descobre que o moço era um cristão que ali veio ter sem se saber de onde. Por isso pôs a filha sob vigilância e ameaçou de morte os escravos que encobrissem os seus encontros com ele. Mas nem assim conseguiu saber de que modo eles se encontravam.

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Um dia, cansados desta situação, os dois jovens decidem fugir. Numa noite de Agosto, com o luar a inundar a paisagem, Zaida chega ao portão onde o amante a esperava, ergue os olhos para o céu e agradece ao seu Deus ter-lhe dado a coragem para fugir. Contudo nesse momento uma força superior transforma-a a ele numa fonte e a ela numa serpente. E por isso já não puderam sair dali. Diz o povo que o Deus de Zaida não aprovou uma união de diferentes religiões, pelo que encantou para sempre aquele par de namorados. E diz também que, em certas noites de Agosto ao luar, é possível ver a serpente a ir beber naquela fonte, conhecida como “Fonte da Moura”, onde vai matar saudades. Fonte: Inf.: Maria da Graça de Oliveira Gomes, de 54 anos; rec.: Lebução, Valpaços, 1999.

191 – A fonte fria Num monte próximo de Lebução há um lugar chamado Fonte Fria, onde corre uma água muito boa mas que as pessoas evitam beber. Esta fonte está ligada a uma lenda que vem do tempo das batalhas entre mouros e cristãos. Conta-se que nesse tempo uma princesa moura foi raptada por um cavaleiro que se tinha apaixonado por ela e trouxe-a para estas terras. A princesa, com as saudades da sua gente, passava os dias a chorar e perdera por completo a vontade de comer. Por isso foi ficando muito fraca e, dali a algum tempo, morreu. Enterraram-na naquele lugar e, ali mesmo, viria a nascer depois uma fonte de água muito fresca e muito pura. No entanto, nem toda a gente gosta de beber esta água, pois dizem que tem má sina. O povo acha que a água nasceu das lágrimas que a princesa verteu antes de morrer. E sobre a fonte correm ainda estes versos: “Quem desta água beber Triste sina há-de ter, Há-de viver e chorar E há-de sofrer por amar”. Fonte: Inf.: Maria da Graça de Oliveira Gomes, de 54 anos; rec.: Lebução, Valpaços, 1999.

192 – A tesoura da moura Certo dia um homem regressava do trabalho no campo e, ao passar junto à “Fonte Fria”, em Lebução, viu uma grande cobra que tinha corpo de mulher da cintura para cima. Era uma moura que estava ali encantada há muito tempo.

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Ela meteu então conversa com o homem, e este, cheio de medo, lá lhe foi respondendo ao que lhe era perguntado, acabando a moura por ficar a saber tudo sobre a sua vida. No fim, quando ele estava para se ir embora, a moura lança-lhe aos pés um tapete de figos, e diz-lhe: – Come os que quiseres. – Se mos dás, levo uma meia dúzia p’ra casa – diz-lhe o homem. Meteu os figos ao bolso e seguiu caminho. Ao chegar a casa, contou à mulher o que lhe tinha acontecido. E quando ia a meter a mão ao bolso para lhe dar os figos que trazia, qual não é o seu espanto, pois, em vez dos seis figos, tinha lá seis moedas de ouro. A mulher pôs-se logo a ralhar com ele por só ter trazido seis figos e ter lá deixado os outros. E obrigou-o a voltar lá, a ver se os trazia. O homem, embora contrariado, foi. Quando chegou de novo à “Fonte Fria”, ficou descoroçoado pois já lá não viu figo nenhum. Mas logo lhe apareceu novamente a cobra, que lhe estendeu um açafate de costura, dizendo-lhe: – Escolhe o que quiseres. O homem olhou logo para uma tesoura com cabos de ouro e cheia de pedras preciosas, e não hesitou. Pegou nela e levou-a. Mais adiante, a caminho de casa, escorregou numa pedra, espetou a tesoura no peito e morreu. Diz o povo que estas desgraças acontecem sempre que os encontros com mouras não são mantidos em segredo. Fonte: Inf.: Maria da Graça de Oliveira Gomes, de 54 anos; rec.: Lebução, Valpaços, 1999.

193 – A fraga da urze Ia uma vez um homem a caminho de Roma e perdeu-se, acabando por ir ter a um povoado onde pernoitou em casa de uma mulher que vivia sozinha. Ela quis saber de onde o homem vinha e ele respondeu-lhe: – Venho de Vilartão68. – Será que conheces um lugar com uma fraga que tem um buraco no meio onde nasceu uma urze? – Conheço – respondeu o homem. Então a mulher, em troca da hospedagem, fez-lhe um pedido: ir junto desse buraco e chamar três vezes pelo nome Artinga, a quem entregaria uma burrinha de

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Aldeia do concelho de Valpaços. São notórias as semelhanças deste relato com um outro que alude a Rego de Vide, no concelho de Mirandela, publicado por Leite de Vasconcelos (1969: 790-791) e também analisado neste trabalho.

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massa. O hóspede aceitou. A mulher deu-lhe então a burrinha de massa e rogou que a conservasse sempre inteira. O homem lá foi a Roma fazer o que tinha a fazer e, no regresso, dirigiu-se à tal fraga e chamou: – Artinga! Artinga! Artinga! E de lá de dentro respondeu-lhe uma voz: – Quem meu nome diz tão bem, traz notícias de minha mãe!

Ele atirou então a burrinha para o buraco. Só que, com as voltas que ela deu na algibeira com a ida e a volta de Roma, partira-se-lhe uma perna. Por isso, disse a mesma voz lá de dentro da fraga: – Dobraste-me o encanto! Por isso em vez de um grande tesouro que irias receber, vais ter de te contentar com apenas um tostão, que encontrarás nesta fraga sempre que cá vieres! E Artinga, que era uma moura encantada, lá ficou mergulhada na sua tristeza, à espera de nova oportunidade. O homem, que era jogador, passou a ir todos os dias buscar o tostão à fraga da urze. Um dia, como estava a ganhar, encheu-se de entusiasmo e disse para os companheiros da jogatina: “– Gasto e torno a gastar! Quando não tenho vintém, Subo à fraga da urze E o dinheiro cá me vem!”

Estragou tudo. Dali a dias, voltou a precisar de dinheiro e, quando foi à fraga da urze, já lá não encontrou nenhum tostão. As mouras não gostam que falem dos seus segredos. Fonte: Inf.: Maria da Graça de Oliveira Gomes, de 54 anos; rec.: Lebução, Valpaços, 1999.

194 – A parteira das mouras Viveu nestas terras [Lebução, concelho de Valpaços] uma velha parteira que era sempre chamada para assistir aos partos dos filhos das mouras. Um dia, foi chamada a um lugar que hoje é conhecido por “Outeiro da Moura”. Indicaram-lhe o lugar, mas quando lá chegou o que viu foi um rio com uma queda de água à sua frente. Ficou, por isso, especada a olhar para lá, sem saber o que fazer. – E agora? – perguntou ela, a pensar alto. Nisto, as águas afastaram-se à sua frente para lhe dar passagem. A parteira entrou. E lá dentro da queda de água encontrou um palácio de ouro e pedras preciosas.

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Nele morava uma bela moura que estava prestes a ter uma criança. Conta-se que a velha cumpriu a sua missão com a prática e o saber de muitos anos, e ao regressar a casa, o rio e a queda de água voltaram a ficar como antes. Fonte: Inf.: Maria da Graça de Oliveira Gomes, de 54 anos; rec.: Lebução, Valpaços, 1999.

195 – Lenda do Monte das Fragas Entre Lebução e Pedome há um monte cheio de fragas onde é muito custoso chegar. E numa dessas fragas há um tesouro guardado por uma moura encantada de cobra. Diz o povo que a cobra está ali há muitos e muitos anos à espera que alguém lhe quebre o encanto. E que, se por lá passar um rapaz solteiro à meia noite e não tiver medo da cobra, esta leva-o até ao tesouro. Conta-se que certa noite passou ali um rapaz e que, ao avistar a cobra em cima do penedo, pôs-se a atirar-lhe pedras. Uma delas acertou-lhe, e a cobra começou a chorar como se fosse uma pessoa. O rapaz ficou cheio de medo e fugiu, ouvindo atrás de si uma voz que lhe dizia, entre soluços: – Ah maldito, que dobraste o meu encanto! A cobra recolheu-se depois no seu refúgio, onde ficou a chorar, continuando ainda hoje à espera de um jovem corajoso que lhe vá quebrar o encanto. Fonte: Inf.: Maria da Graça de Oliveira Gomes, de 54 anos; rec.: Lebução, Valpaços, 1999.

196 – O rio seco No alto de Fiães [concelho de Valpaços], num lugar situado entre esta aldeia e o Monte d’Arcas, há ruínas de um antigo castelo onde viveu uma princesa moura. Diz o povo que esta princesa era muito boa, que falava com toda a gente e que andava sempre a passear pelos montes das redondezas. Um dia, num desses passeios, conheceu um jovem cristão, também príncipe, e apaixonaram-se. Só que a jovem já tinha o seu destino marcado pelo seu pai que a havia prometido a um rei mouro, seu companheiro de batalhas. Por isso a princesa foise encontrando sempre às escondidas com o jovem cristão. Até que o pai lhe marcou o casamento. Ao ver a data tão próxima, a jovem encontrou-se pela última vez com o príncipe cristão para se despedirem. E sucedeu que ambos choraram tanto neste último encontro, ao ponto de a seus pés se formar um grande lago. Esse lago foi crescendo e

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dele se formou um rio. Por fim separaram-se e cada um foi à sua vida para nunca mais se encontrarem. Quanto ao rio, é chamado de Rio Seco, correndo às vezes com muita água e outras vezes apenas com um fiozinho. E quando há tempestade, diz o povo que ele corre revolto e, entre os sons que produz, ouvem-se os soluços dos dois amantes. Fonte: Inf.: Maria da Graça de Oliveira Gomes, de 54 anos; rec.: Lebução, Valpaços, 1999.

197 – A lâmpada de ouro Conta-se que debaixo da Ponte da Puga, perto de Lebução, está há muitos séculos encantada e escondida uma lâmpada de ouro, que ali foi deixada pelos mouros. E que o encantamento só pode ser quebrado por um lavrador que tenha uma vaca, a qual dê à luz dois bezerros em noite de lua cheia e que eles mamem todo o leite que ela der. Ou seja, o lavrador não pode aproveitar o leite seja para o que for, e durante um ano inteiro. Um dia, calhou de um lavrador de Lebução ter uma vaca que pariu dois bezerros duma só vez numa noite de luz cheia. Ficou todo contente, e passado um ano foi com os touros ao tal lugar. Esperou até vir a meia noite e viu então a lâmpada de ouro a boiar no ribeiro. Tirou-a da água e levou-a à frente dos touros para casa. E a dada altura disse: – Graças a Deus, cá vai a lâmpada comigo! Nesse momento, uma voz saiu de dentro da lâmpada, respondendo-lhe: – Já não te lembras do leite que tiraste e deitaste no lombo da vaca!... E mal soaram tais palavras, a lâmpada desapareceu. É que o lavrador um dia tinha-se esquecido e pôs-se a mugir a vaca. E quando deu conta, pegou no leite e atirou-o por cima dela. Fonte: Inf. Maria Rosa Teixeira, 87 anos; rec.: Lebução, Valpaços, 1999.

198 – A moura e o torgueiro Antigamente os habitantes de Vilartão, no concelho de Valpaços, eram conhecidos por torgueiros porque se dedicavam a fazer carvão com torgos de urze. Um dia, um desses torgueiros andava a fazer carvão no lugar de Picões, e, sentindo sede, foi beber a uma fonte que lá existe. Quando acabou de beber, reparou que ao pé de si, e

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a mirá-lo, estava uma mulher toda vestida de ouro. Era uma moura. Ela enamorou-se do homem e disse-lhe: – Vou fazer-te rico. Toma este saco cheio de moedas de ouro, mas tens de prometer-me uma coisa: não dizer nada a ninguém que me encontraste e que eu te fiz rico. O homem aceitou e, antes de regressar a Vilartão, escondeu o saco das moedas debaixo de um torgo. Passados alguns dias começou a gabar-se de que tinha uma mulher que lhe dava moedas de ouro. Mas ninguém o levava a sério. Diziam que estava doido e passaram a tratá-lo como tal. Então o homem, para provar que não andava doido e que falava a verdade, disse aos seus vizinhos: – Ora esperai aqui, e ides ver como vos trago um saco de moedas de ouro que me foram dadas por ela. E lá foi a Picões à procura do ouro. Só que, ao chegar lá, o que encontrou debaixo do torgo foi apenas um saco cheio de carvões. Nada mais. E da moura também não achou sinais. Ao regressar ao povo todos se riram da sua mentira. E nunca mais o levaram a sério. Já nem o carvão lhe compraram. Fonte: Inf.: Maria da Graça de Oliveira Gomes, de 54 anos; rec.: Lebução, Valpaços, 1999.

199 – Lenda da Fonte da Urze Em Carrazedo de Montenegro, concelho de Valpaços, há uma fonte meio escondida nos silvados que é conhecida como a "Fonte da Urze". Dizem os antigos que na fonte há um tesouro e uma cobra. E que esta é uma moura encantada. Esta cobra costuma aparecer à meia noite a quem ali passar. E se a pessoa que ali passar não tiver medo, a cobra leva-a até ao tesouro. Dizem que já muitos lá foram e encontraram a cobra, só que costumam apanhar sempre um grande susto e fogem imediatamente. Por isso ainda ninguém conseguiu encontrar o tesouro. Fonte: Inf.: Lúcia Pereira, 50 anos; rec.: Junqueira, Valpaços, 1999.

200 – A Fada d'El Rei No lugar de Santa Maria de Émeres, do concelho de Valpaços, há uma propriedade que foi pertença de El Rei e por isso ainda hoje o local se chama "Val do Rei". Diziam os mais velhos que, há muitos e muitos anos, morou lá uma fada que era muito bela e que passava a maior parte do tempo sentada numa laje a pentear os seus longos cabelos.

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Diziam também que a fada era uma moura por quem o rei se apaixonara, e que ele costumava ir lá encontrar-se com ela, às escondidas da sua família. Até que o romance foi descoberto e ela foi expulsa. Entretanto, o rei foi obrigado a casar com uma mulher do seu sangue. Mas o pior é que nunca conseguiu ser feliz, e, por isso, muitas vezes voltou a Santa Maria de Émeres a saber da sua fada. Só que nunca mais a encontrou. Fonte: Inf.: Maria da Graça de Oliveira Gomes, de 54 anos; rec.: Lebução, Valpaços, 1999.

201 – O bezerro de ouro de Lebução Os mais velhos de Lebução, concelho de Valpaços, acreditam que num penedo que ali existe, e que é conhecido como a "pedra do boné" por ser redondo como um boné, está escondido um valioso tesouro, que é mais nada menos que um bezerro em ouro. E este tesouro só poderá ser encontrado através de umas rezas que estão no livro de S. Cipriano e que têm de ser ditas em latim. Conta-se que um dia houve uns homens valentes que convenceram um determinado padre, pois era o único que sabia latim, a ir lá com eles e a levar a caldeirinha da água benta. Ao chegarem junto da fraga, puseram-se então com as rezas e a repetirem em voz alta as palavras que o padre ia tirando do livro de S. Cipriano. Estiveram nisto um ror de tempo, e nada. Por fim, o padre meteu a mão na caldeirinha e lançou uma chapada de água benta sobre a fraga. E aí sim. A fraga começou a tremer, a terra a tremer também, e eles, de tão aflitos que ficaram, desataram a fugir dali para fora e já não quiseram mais saber do tesouro. Por isso ainda hoje lá está. Fonte: Inf.: Maria da Graça de Oliveira Gomes, de 54 anos; rec.: Lebução, Valpaços, 1999.

202 – As pias dos mouros de Argeriz Perto de Argeriz, no concelho de Valpaços, há um sítio, onde se vêem duas pias, a que os antigos chamam "Pias dos Mouros". Há também lá umas escadas já muito deterioradas que dão acesso a uns subterrâneos que era onde os mouros viviam. Os antigos dizem que o local está encantado. E conta-se que certo pastor, quando foi para lá com o gado, numa altura do ano em que já não havia figos, encontrou um ror deles a secar. Meteu então uns poucos no bolso e seguiu.

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Quando chegou a casa os figos que trazia no bolso tinham-se convertido em moedas de ouro. Ficou todo contente e foi logo contar aos vizinhos. E também lhes contou como tinha encontrado os figos. Ora, outro pastor, ao ouvi-lo contar tal, e como também conhecia o sítio, foi logo lá para apanhar o resto dos figos. Mas enganou-se. No lugar dos figos encontrou cagalhões de burro. Ficou por isso todo zangado e acusou o outro de andar a mentir. Este então, para provar que não mentia, meteu as mãos no bolso do casaco, à procura das moedas de ouro para as mostrar. E nas mãos, o que é que lhe aparece? Já se está a ver: outro monte de cagalhões. Fonte: Inf.: Ilda Queiroga, 79 anos; rec.: Argeriz, Valpaços, 2000.

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Concelho de Vila Flor

203 – [O cântaro cheio de novelos de ouro] Há em Vale de Torno [concelho de Vila Flor] muitas fontes de óptima água potável. Entre estas, há uma de boa cantaria lavrada, dentro de um arco, com assentos dos lados, que é legendária69. Crê o povo que ali habita uma Naiade, que não é mais nem menos do que uma moura encantada, que se ouve tecer, em um tear de marfim, uma teia de ouro, em todas as manhãs do dia de S. João, antes de nascer o sol. Há muitos que têm passado a noite em claro, para terem a ventura de ouvir tecer a moura, mas não o têm conseguido. É ponto averiguado (e geralmente acreditado na freguesia...) que, indo certa mulher a esta fonte em uma das tais manhãs de S. João, em vez de água trouxe o cântaro cheio de novelos de ouro. A mulher, entusiasmada com tanta riqueza, exclamou: – Santo nome de Jesus! Foi a sua desgraça; porque apenas pronunciou o nome de Deus, os novelos de ouro desapareceram. Fonte: LEAL, Pinho – Portugal Antigo e Moderno, vol. 10, Lisboa, Livraria Editora de Mattos Moreira & Companhia, 1882, p. 91.

204 – [Na fonte do Lameiro de Cima] Há mouras e tesouros encantados (...) na fonte do Lameiro de Cima, termo de Vilas Boas [concelho de Vila Flor]. Em 1925 foram lá uns homens cavar para desenterrar o tesouro encantado, mas fugiram assustados ao ver o diabo ou a moura feita em horrendo bicho, e uma mulher foi levada pelos ares até cair no Cruzeiro do Prado. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Vol. IX, Porto, 1934, p. 498.

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Esta fonte é conhecida no seio do povo como Fonte de Paijoana (Pintado, 1998: 141)

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205 – [As mouras de Freixiel] Segundo a tradição popular no Castelo [em Freixiel, concelho de Vila Flor] existiu uma povoação dos mouros e em todas as manhãs de S. João ali se ouve uma moura a trabalhar num tear. Outros afirmam que, no mês de Agosto, se vêem mouras a apanhar figos e a estendê-los nas fragas, nos tendais. Fonte: MORAIS, Cristiano – Estudos Monográficos de Vila Flor: Freixiel, Vila Flor, Câmara Municipal de Vila Flor, 1995, p. 46.

206 – Lenda da Fonte da Crica da Vaca Esta fonte actualmente só corre desde o Outono até aos finais da Primavera. A água sai de uma abertura num colossal penedo a que, devido à sua forma, o povo chama Crica da Vaca. Segundo a tradição ali passou um cavaleiro, numa manhã de S. João, e tendo sede se baixou para beber, mas, quando o fazia, notando que qualquer coisa lhe entrava pela boca, parou de beber e viu que da fonte saía um grande colar de ouro. Então, muito contente, mas também assustado por pensar que podia ser coisa do diabo, benzeu-se e disse: – Deus me ajude. Nesse momento ouviu uma voz triste e distante dizendo-lhe: – Ah, meu bom cavaleiro, que me desgraçaste, pois acabas de me dobrar o meu encanto! E assim, diz o povo que ali continua uma bela moura encantada à espera de quem lhe parta o encanto. Fonte: MORAIS, Cristiano – Estudos Monográficos de Vila Flor: Freixiel, Vila Flor, Câmara Municipal de Vila Flor, 1995, pp. 46-47.

207 – [Mil Almas e Covas] No termo de Carvalho de Egas, concelho de Vila Flor, há um sítio chamado Mil Almas e outro as Covas. E por tradição ouvia-se dizer aos velhos que a causa de chamarem Mil Almas e Covas fora porque no tal sítio fora a última batalha que os cristãos tiveram com os mouros quando os extinguiram nestas terras, aonde dizem que os mataram e os enterraram. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Porto, vol. IX, 1934, p. 146.

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208 – Lenda da Fonte das Bestas Em Vila Flor é voz corrente que, escutando bem na bica da fonte de S. Sebastião, chamada Fonte das Bestas70, se ouvem, por horas mortas, os lamentos duma moura, que se crê formosa como a espuma do mar ou as estrelas do céu. Ora cheguemse para cá. Era uma vez um rapaz de Lodões que costumava vir à vila amiudadas vezes e, quando passava pela fonte de S. Sebastião, curvava-se sobre a tigelinha de ferro para matar a sede, até porque se dizia ser aquela água boa para fazer bom estômago. Uma noite, regressando da feira dos 15, cheio de calor, sentou-se na beira dos tanques da fonte (...) e, ao dar a meia noite no relógio da torre, levantou-se e foi debruçar-se para beber uns goles de água, antes de seguir viagem para a sua aldeia. De repente, estremeceu. Lá de dentro do cano pareceu-lhe ouvir uma voz conchichada. Com as fontes a latejar, a respiração suspensa, apurou o ouvido, Não havia engano. Uma voz maviosa com harpejos celestes, segredava-lhe carinhosamente, com acento estrangeiro: – O teu amor sou eu. Vem buscar-me. Salva-me e eu te darei o carinho com que sonhas, meu nobre redentor. O rapaz ficou desorientado, quis arrombar a porta da mina e ir lá dentro buscar a donzela que assim lhe falava. Mas um tropel de butes na calçada fê-lo pegar no casaco e desandar caminho fora. Nos dias que se seguiram, o único pensamento que o dominava era o segredinho da fonte. Magicou, magicou, e, uma noite, munido duma alavanca de ferro subiu a costa do Vale da Cal e chegou à fonte, doze badaladas batidas. Seguro de que o lugar estava deserto, estoirou a lingueta da fechadura e, cautelosamente, internou-se na frescura da mina, chamando pela sua moura. Mais uma chamada, alguns ruídos surdos... e o silêncio. Ao amanhecer, algumas raparigas que passavam ali, vendo a mina arrombada aproximaram-se e olharam lá para dentro. O pobre rapaz jazia morto em plena mina, com o rosto imerso no veio de água. Infortunado jovem, que assim desposou a sua moura, encantada há mil anos. Fonte: ADÃO, Cabral – Flores do Rio Azul, Setúbal, Edição da Tipografia Simões, 1953, pp-123-125

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É assim chamada por nela se dessedentarem os animais, e, segundo a tradição, foi edificada sobre as ruínas de uma velha fonte árabe (informação dada ao autor pelo professor Artur Manuel Pires, de Vila Flor)

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209 – A moura das Fragas do Rugido Na aldeia de Assares, do concelho de Vila Flor, há umas fragas que são conhecidas pelas "Fragas do Rugido", e dizem os mais antigos que há lá uma moura encantada na figura de uma grande cobra. Perto daquelas fragas havia antigamente uns tanques onde as mulheres iam lavar a roupa. Certo dia uma mulher da aldeia, quando estava a lavar, ouviu nas suas costas o ruído de uma grande cobra a rastejar, vinda das fragas. E tão aflita ficou que abandonou a roupa e fugiu para casa. À noite contou ao marido. Este, no entanto, não deu importância ao sucedido. E disse: – Só pode ser uma cobra como outra qualquer. Vai mas é lá buscar a roupa, que às tantas ainda ta roubam! No dia seguinte, a mulher voltou ao local para apanhar a roupa, e, quando estava a chegar lá, voltou a ouvir o mesmo ruído, logo cuidando que era a mesma cobra que ali estaria. Por isso, apenas pensou em pegar na roupa e ir-se embora. Qual não foi, porém, o seu espanto quando, ao pegar na roupa, encontrou dez reais numa beira dos tanques. Chegou a casa com eles e contou ao marido. E este o que pensou foi que só podia ser dinheiro que tinha ido na roupa de alguma mulher que lá fora lavar antes. Disse-lhe, por isso, para lá ir com o dinheiro no dia seguinte, pois alguém poderia andar à procura dele. A mulher voltou lá. E ao passar junto das fragas voltou a ouvir o mesmo ruído. A seguir olhou para o tanque e, na mesma pedra, lá estavam outros dez reais. Ficou toda contente e, ao pegar neles, aparece-lhe então uma grande cobra, que tinha cabelos negros e compridos, e que lhe disse: – Sou uma mulher como tu, e fui encantada ainda no berço. Se quiseres, podes desencantar-me. Só tens de vir todos os dias aqui, onde encontrarás sempre dez reais. E depois, haverá um dia, dia de S. João, em que me deixarás subir por ti acima até poder beijar-te. Ficarei então livre, e tu serás uma mulher rica. Mas não poderás nunca dizer a ninguém este segredo. A mulher foi para casa e disse ao marido que tinha devolvido o dinheiro à dona, nada contando sobre o encontro que teve. Nos dias seguintes passou a andar feliz, com boas roupas e muito luxo, e sempre a esconder ao marido a proveniência do dinheiro. A dada altura o marido começou a desconfiar da mulher, julgando que ela teria algum amante que lhe andava a dar aqueles luxos. E pediu-lhe explicações. Ela então não teve outro remédio se não confessar ao marido que andava a receber dinheiro por conta da ajuda que prometera dar à moura encantada. E no dia seguinte foram lá os dois, esperando encontrar os reais do costume. Só que desta vez já lá não havia dinheiro nenhum. E ouviram então uma voz chorosa de mulher, que soava entre as fragas, dizendo: – Ah, sua maldita, que me dobraste o encanto!

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E nunca mais apareceu. Nem ela nem os reais. A mulher deixou de ter direito a eles porque não cumpriu a sua parte no acordo, que era guardar segredo. Ficou, no entanto, mais descansada pois ganhou a confiança do marido. Depois foram gastando os reais que ainda tinham, e, acabados os reais, ficaram de novo pobres. E assim continuam. Fonte: Inf.: Maria Luís Gonçalves, 89 anos; rec.: Assares, Vila Flor, 2001.

210 – Lenda da Fonte do Lameiro Dizem os antigos que na Fonte do Lameiro de Cima, em Meireles, concelho de Vila Flor, havia uma moura encantada. E conta-se também que um dia o padre de Vilas Boas, que costumava ir rezar missa à aldeia de Meireles, que lhe era anexa, ao passar junto daquela fonte encontrou um tendal de figos a secar. E como ia em jejum, pensou: – Vou apanhar uns poucos, que bem jeito me darão para matar o bicho ao acabar a missa. No fim da missa foi para a sacristia, meteu a mão no bolso à procura dos figos, e qual não foi o seu espanto quando descobriu que, em vez dos figos, o que tinha no bolso eram moedas de ouro. Pousou-as na mesa e foi contar o sucedido às pessoas da aldeia. Mas poucas acreditaram nele. Levou-as então à Fonte do Lameiro de Cima a saber do tendal com o resto dos figos, mas já não havia nada. A seguir levou as pessoas à sacristia para, ao menos, lhes mostrar as moedas de ouro, só que, em vez das moedas, o que lá encontrou eram bocados de pedra e nada mais. Por isso, ainda hoje uns acreditam, outros não. Fonte: Inf.: Maria Lúcia Branco, 46 anos; rec.: Vila Flor, 2001.

211 – A menina e o cordão de ouro Num certo dia de Verão andavam os malhadores numa eira a malhar trigo, em Meireles, concelho de Vila Flor, quando a sede começou a apertar. Mandaram então uma menina buscar água num cântaro à Fonte do Lameiro de Cima. Esta fonte é cavada no solo e por isso é preciso descer umas escadinhas e introduzir o cântaro na água. Acontece que, quando a menina tirou o cântaro, este vinha com uma corrente de ouro. E quanto mais afastava o cântaro da água, mais comprida ia ficando a corrente. Ao ver o ouro sempre a crescer, e como não era ambiciosa, pensou:

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– Vou cortar a corrente, que este ouro já me chega. Apanhou então uma pedra, e, quando foi para quebrar a corrente de ouro, esta tinha desaparecido. E ao mesmo tempo ouviu uma voz a dizer-lhe: – Ai que me dobraste o encanto! Vai procurar alguém que me venha desencantar! A menina foi para junto dos malhadores e estes, ao vê-la com o cântaro vazio, ficaram muito zangados. Ela contou-lhes o que lhe aconteceu dentro da fonte. E disse que tinha medo de lá voltar. Foi então lá um dos malhadores, mais destemido. E mal desceu as escadinhas da fonte, apareceu-lhe uma serpente muito peluda. Ele começou a tremer de medo, e a serpente disse-lhe: – Não tenhas medo, que eu sou uma moura encantada e vivo nesta fonte até que me quebrem o encanto. Para isso tenho de subir por ti acima e beijar-te na cara. Mas não podes mexer nem estremecer, se não está tudo perdido. O homem ainda esperou que a serpente subisse por ele acima. Só que, ao chegar-lhe à cara, o medo foi tanto, que se pôs a tremer todo. E assim a serpente desapareceu, a soluçar de dor. Até hoje. Fonte: Inf.: Maria Lúcia Branco, 46 anos; rec.: Vila Flor, 2001.

212 – Lenda do Penedo Redondo Existe um lugar em Benlhevai, no concelho de Vila Flor, onde o terreno é plano e arenoso, e onde há um grande penedo de granito, do tamanho de um sobreiro, a que chamam o "Penedo Redondo" e que tem ao lado dois outros penedos mais pequenos. Conta-se que foi uma moura que trouxe para ali aqueles penedos. O grande e os pequenos. O maior trouxe-o à cabeça e os outros dois trouxe-os debaixo de cada um dos braços. E que ainda vinha a fiar ao mesmo tempo. O povo diz também que existe nesse lugar um tear de ouro, e que à meia noite do dia de S. João, se alguém passar perto, pode ouvi-lo a tecer. Fonte: Inf.: Esmeralda Nazaré Silva, 81 anos; rec.: Benlhevai, Vila Flor, 2001.

213 – Lenda de Vale Frechoso Em Vale Frechoso, do concelho de Vila Flor, existe na encosta de um monte um lugar cheio de mistério, formado por grandes penedos de granito, e onde há uma abertura que conduz a uma cova profunda. Diz o povo que, na altura em que os mouros deixaram esta terra, encantaram ali uma moura que ficou a guardar as suas riquezas. E

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conta-se também que os pastores costumavam ir para lá apascentar os seus rebanhos e que ouviam um tear a trabalhar, o que os deixava cheios de medo. Por isso deixaram de ir com o gado para aqueles lados. Ora, numa ocasião houve um pastor mais corajoso que resolveu lá ir a ver que tear seria esse. Era então meia noite. Pôs-se à escuta e, não tardou, ouviu o tear a trabalhar. Abeirou-se mais do local e, de repente, eis que lhe aparece uma linda donzela com seis pedras de ouro na mão. Ela estende-lhe a mão e diz: – Podes voltar sempre que quiseres pois sempre encontrarás as seis pedras de ouro. Mas não podes contar a ninguém. Eu sou uma moura encantada e, se fizeres como te digo, ajudar-me-às a quebrar o encanto. O pastor, que era pobre, começou então a enriquecer. E as pessoas da terra, a dada altura, começaram a falar, e obrigaram-no a dizer onde andava a arranjar a riqueza. O homem, viu-se de tal modo apertado pelos vizinhos, que resolveu contarlhes tudo. Por isso, na noite seguinte, ao voltar ao local, em vez das seis moedas de oiro habituais o que encontrou foram seis carvões e a moura lavada em lágrimas, que lhe disse: – Desgraçaste-me! Jamais serei desencantada! Conta o povo que, nesse local, quando alguém passa por volta da meia noite, continua a ouvir um tear a trabalhar. Fonte: Inf.: Filomena Morais Pereira da Costa, 48 anos; rec.: Vale Frechoso, Vila Flor, 2001.

214 – O choro da moura em Santa Comba da Vilariça Há em Santa Comba da Vilariça, concelho de Vila Flor, uma fonte de água muita pura, à qual está ligada a lenda de uma moura. Diz o povo que, há muito, muito tempo, viveu nestas terras uma princesa moura, que, quando os cristãos e os mouros deixaram de guerrear-se, sonhou em casar com um jovem cristão. Estava então tudo preparado para o casamento quando chegaram notícias de mais uma guerra entre cristãos e mouros. O noivo teve por isso de partir para o campo de batalha, no cumprimento do seu dever. E nessa batalha acabou por morrer. Acontece que a princesa moura continuou a esperá-lo. E como o noivo nunca mais aparecia, todos os dias ela chorava lágrimas e lágrimas de saudades. E dessas lágrimas – diz o povo – nasceu uma fonte, que hoje lá continua. E os murmúrios da água a correr lembram o choro constante da moura inconsolável. Fonte: Inf.: Maria José Teixeira de Almeida, 45 anos; rec.: Santa Comba da Vilariça, Vila Flor, 1999.

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215 – Lenda da Fraga do Pinhal Versão A:

Conta-se que num certo sítio chamado Fraga do Pinhal, em Valbom da Trindade, no concelho de Vila Flor, havia uma moura encantada numa cobra pelos pais, e quem tivesse coragem de a desencantar ficaria rico, pois os pais tinham colocado uma grande fortuna junto dela. Um dia um lavrador de Santa Comba da Vilariça andava a trabalhar ali perto quando avistou uma menina, muito bonita, que, de repente, desapareceu transformando-se numa cobra com três palmos de cabelo do rabo para trás, e lhe disse: – Deixa-me subir por ti acima e dar-te um beijo na testa. Se não estremeceres, o meu encanto desaparecerá e ficarás rico. O lavrador aceitou, e a cobra lá foi subindo por ele acima. Mas quando lhe ia a dar o beijo na testa, ele estremeceu e, com isso, a cobra caiu por ele abaixo. E disse-lhe então: – Ai ladrão, que dobraste o meu encanto! Mas, mesmo assim, vem cá todos os dias que encontrarás nesta fraga três moedas de ouro. Só que nunca me podes descobrir. O homem assim fez. Até que os vizinhos, admirados com o seu viver, e querendo saber de onde lhe vinha tanto dinheiro, resolveram emborrachá-lo. E ele, depois de já estar bem bêbado, disse: – Enquanto a minha fraguinha do Pinhal me não faltar, não preciso de trabalhar!

Ao outro dia, quando foi à Fraga do Pinhal, em vez de três moedas, encontrou três carvões, e nunca mais lá voltou a ver nada. E tudo por ter contado o segredo. Versão B (A fraguinha do Salgueiro):

Na encosta da Ponte do Salgueiro, perto de Valbom da Trindade, no concelho de Vila Flor, há uma fraga com uma brecha no meio e ao lado uma outra com uma pia no meio. Andava uma vez um homem de Santa Comba da Vilariça ali a fazer lenha, quando lhe apareceu uma cobra enorme, muito feia, negra e com pêlos. Assim que a viu o homem agarrou numa pedra para a matar. E nesse momento a cobra falou, dizendo-lhe: – Não me mates, senão perdes tudo! – Quem és tu? – perguntou o homem. – Estou encantada numa cobra. Mas preciso que me desencantem! E tu podes fazer isso! Se o fizeres ficarás rico! – Como tenho de fazer então?

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Ela explicou-lhe que no dia seguinte, antes do nascer do sol, teria de voltar lá, deixá-la enrolar-se por ele acima até à boca, e então ele teria de dar-lhe um beijo. Mas em momento algum ele poderia assustar-se ou ter medo. O homem aceitou e lá foi. À hora combinada, a cobra lá chegou a abanar as giestas por onde passava e a fazer muito barulho. Subiu então pelo homem acima, enrolou-se nele na cintura, e parou. Aí olhou para o homem e ele nem sequer pestanejou. Depois continuou a subir e chegou-lhe ao pescoço. Parou, voltou a olhar para ele, e então o homem estremeceu. Foi o bastante para estragar tudo. Disse-lhe a cobra: – Não pode ser! Dobraste-me o encanto! Mas por teres sido tão corajoso, deixote duas moedas de ouro em cima da pia todas os dias, antes do nascer do sol, e não podes contar nada disto a ninguém. O homem, como era calaceiro, deixou de trabalhar, pois tinha agora aquele rendimento seguro. E toda a gente da aldeia ia estranhando como é que era possível ele, sem trabalhar, passar o tempo na taberna, a beber e a comer do bom e do melhor. Donde lhe viria o dinheiro? Até que um dia, lá na taberna, de tanto beber apanhou uma grande bebedeira. E os que lá estavam aproveitaram então e perguntaram-lhe de onde lhe vinha o rendimento. E diz ele: – Enquanto a fraguinha do Salgueiro durar, escuso de trabalhar!

No dia seguinte foi lá como de costume, e, no lugar das moedas, estavam dois carvões. Fonte – versão A: Inf.: Maria Estefânia, 71 anos; rec.: Valbom da Trindade, Vila Flor, 1999. Fonte – versão B: Inf.: Maria Isabel Fontes, 35 anos; rec.: Vila Flor, 1999.

216 – Lenda da Fonte d'El Rei Uma senhora de Vila Flor, conhecida por Maria Pequena, foi um dia ao monte apanhar lenha e, ao passar na Fonte d'El Rei, viu uma menina, de cabelos muito compridos, que lhe perguntou: – Onde vais? – Vou ao monte buscar um molho de lenha – E as cordas? – Não tenho. Então a menina estendeu-lhe os cabelos e disse: – Toma umas cordas.

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Maria Pequena ao pegar nelas, reparou que eram de ouro. Mas ficou tão assustada que logo as deixou cair, fugindo para casa. Entretanto, pensou melhor durante a noite, e achou que bem podia ter ficado com o ouro. Por isso, ao outro dia voltou lá. Só que já não viu ouro nenhum. Nem voltou a menina, que era uma moura encantada. Fonte: Inf.: Carminda Aurora Morais, 42 anos; rec.: Vila Flor, 1999.

217 – A Fraga da Moura de Seixo de Manhoses Na aldeia de Seixo de Manhoses, do concelho de Vila Flor, conta-se que, numa certa noite, estavam umas raparigas a fiar o linho ao serão, e, quando era meia noite, lembraram-se de comer figos pretos. Só que embora soubessem onde os havia, àquela hora não se atreviam a ir lá. Até que uma delas, mais corajosa, disse: – Vou lá eu. As outras ficaram à espera, em lugar seguro, e a mais corajosa foi subir à figueira. Quando estava sobre ela, ouviu-se um grande barulho numa fraga próxima. As outras fugiram logo, mas ela deixou-se estar à escuta no meio da folhagem. E viu então que era um rei mouro que estava ali com a sua filha e que dizia: – Ficas aqui encantada, e só sairás quando esta fraga der linho mourisco, regado com sangue de gato preto. Dali a pouco a fiadeira apareceu junto das companheiras com os figos, muito fresquinhos, e estas ficaram muito admiradas pois pensaram que ela tivesse morrido de susto. Acabaram assim o serão a comer os figos. E sobre a moura encantada, nem palavra. Depois, a rapariga mais corajosa deixou chegar o tempo de semear o linho, levou terra para o cimo da fraga e semeou-o, regando-o então com sangue de gato preto. Quando o linho amadurou, foi lá, arrancou-o, e, ao arrancá-lo, a fraga abriu-se, quebrando-se o encanto da princesa moura. A moça ganhou assim um grande tesouro e ficou rica para sempre. A fraga lá está e o povo hoje identifica-a como a "Fraga da Moura". Fonte: Inf. Luzia Marcelino, 79 anos; rec.: Seixo de Manhoses, Vila Flor, 2000.

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Concelho de Vila Pouca de Aguiar

218 – Os três potes Na aldeia de Cidadelhe de Aguiar, situada entre montes e colinas, existem no cimo da serra umas muralhas antigas a que o povo chama "casa dos mouros". Reza a lenda que, nessas muralhas, existem três potes: um de ouro, outro de prata e o terceiro de peste. E que quem encontrasse o pote de peste traria um mal que atacava a aldeia. O povo, com o objectivo de ficar rico e feliz, andava a pensar ir à "casa dos mouros" escavar, à procura dos dois potes valiosos. Porém, uma curandeira, que também andava a escavar, ouviu uma voz que lhe disse: – Não me caves que eu empesto o mundo! Não me caves que eu empesto o mundo! Ao ouvir isto ela ficou cheia de medo. Voltou a correr para a aldeia, onde espalhou a notícia. E a partir dessa altura nunca mais ninguém quis ir à "casa dos mouros" para procurar os potes de ouro e de prata, com medo de encontrar o pote de peste. Fonte: "Lendas da Nossa Terra", in Jornal O Grito da Pequenada, Vila Pouca de Aguiar, Escolas do 1º Ciclo do Ensino Básico de Vila Pouca de Aguiar, Março de 1998.

219 – A casa dos mouros de Cidadelha Contam as pessoas que no monte de Cidadelha [concelho de Vila Pouca de Aguiar] existe o rabo de um boi e o rabo de uma vaca e por isso se diz: – Entre o rabo de boi e o rabo de vaca está o ouro e a prata.

Nesse monte há a casa dos mouros, tipo de uma gruta, junto ao rio Avelames, onde consta haver ouro e prata e muitos encantos. Até hoje nunca ninguém conseguiu lá entrar, mas já houve pessoas que tentaram, até com o livro de São Cipriano, mas não conseguiram. Houve um senhor que tentou entrar e que ouviu uma voz que dizia o seguinte:

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– Entrar entrarás, mas sair não sairás! Tiveram de tirar de lá o homem porque estava entalado na porta. E quando o tiraram estava em sangue. Fonte: "Lendas da Nossa Terra", in Jornal O Grito da Pequenada, Vila Pouca de Aguiar, Escolas do 1º Ciclo do Ensino Básico de Vila Pouca de Aguiar, Março de 1998.

220 – Lenda dos pintainhos de ouro Conta a lenda que nas ruínas das muralhas que há perto de Cidadelha [concelho de Vila Pouca de Aguiar], em tempos antigos, no tempo dos mouros, havia lá dentro uma galinha com pintainhos de ouro. Para vê-los bastava sentar-se à porta e ler o livro de São Cipriano, que logo apareciam. Fonte: "Lendas da Nossa Terra", in Jornal O Grito da Pequenada, Vila Pouca de Aguiar, Escolas do 1º Ciclo do Ensino Básico de Vila Pouca de Aguiar, Março de 1998.

221 – Lenda da fraga do gestal Conta a lenda que no lugar do Gestal [na aldeia de Moreira de Jales, concelho de Vila Pouca de Aguiar] os mouros enterraram debaixo de uma fraga um sino em ouro. Há quem diga que há já muitos anos tentaram entrar lá, mas o cheiro era tão horrendo que não o conseguiram fazer. Conta a mesma lenda que, para se chegar ao tesouro, teria de se passar por uma mina de mau cheiro, isto é, de peste. Fonte: AAVV – A nossa tradição oral... uma riqueza a preservar (narrador: Márcio Duarte Ribeiro), Vila Pouca de Aguiar, Escola Secundária de V. P. Aguiar, Junho de 1998, p. 42.

222 – A lenda da fraga das campainhas Conta a lenda que S. Cipriano deixou um livro no qual se diz que na povoação de Moreira [concelho de Vila Pouca de Aguiar] os mouros enterraram muitas riquezas, mas sempre debaixo de fragas. No lugar de Vale Bom, no Alto do Castelo, que é um conjunto de rochas todas expostas umas em cima das outras, sobressai a “fraga das

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campainhas”, que faz a separação dos concelhos de Vila Pouca de Aguiar e Murça. A fraga tem uma fenda arredondada ao centro, de cima para baixo, e, ao toque de qualquer objecto, parece ouvir-se campainhas. É aí que o livro de S. Cipriano fala que os mouros enterraram uma fortuna em ouro. Para alguém se apoderar do ouro teria de ler todas as páginas do livro sem ter medo e em redor da fraga, mas, ao lê-lo, não se podia enganar, senão nada acontecia. Por muitas vezes, houve grupos de homens que subiram até ao monte e aí começaram a ler o livro, mas poucas páginas liam, porque o medo era tanto que cada um fugia para seu lado, e só se encontravam na aldeia. Um vizinho de oitenta e quatro anos disse-me que, um dia, ele e mais quatro amigos foram nessa aventura. Ele até levou uma caçadeira, mas depois de se sentarem no chão e fazerem um “sino saimão”, que era uma das recomendações do livro de S. Cipriano, um deles começou a ler, e mal linha lido umas duas páginas ouviu-se um barulho na fenda da fraga, acompanhado de um clarão. Quando ele olhou, já se viu sozinho. Os amigos tinham fugido com medo, e ele, mesmo armado de caçadeira, também fugiu. Fonte: AAVV – A nossa tradição oral... uma riqueza a preservar, (narrador: Márcio Duarte Ribeiro), Vila Pouca de Aguiar, Escola Secundária de V. P. Aguiar, Junho de 1998, p. 45.

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Concelho de Vila Real

223 – O castelo de S. Tomé Diz a lenda que por baixo de uma fraga [na serra do Cabreiro, em S. Tomé do Castelo, concelho de Vila Real] existe uma grande caverna cheia de tesouros, cuja entrada defendem três guerreiros bem armados, altos como gigantes, bastando uma só bofetada de qualquer deles para fazer em saniscas a cara do atrevido que ali ousasse penetrar; Que estes gigantes guardam à vista não só aqueles tesouros, mas a senhora deles, uma moura formosíssima de sangue real, que ali está encantada há muitos séculos, à espera do seu paladino, que há-de um dia matar os guardas, libertando a princesa e os seus tesouros; Que alguns pastores de Águas Santas ou de Vila Meã, desta freguesia, já tiveram a dita de ver por uma fresta da penedia aquela moura formosíssima a tecer num tear de ouro maciço, cheia de anéis, pulseiras e colares de diamantes como estrelas; Que esta moura é mui gulosa de leite, tendo já sucedido por vezes desaparecerem de por ali vacas com os úberes bem retesados, aparecendo pouco depois, sem se saber como, com eles de todo vazios; Que algumas destas vacas se tornavam também tão gulosas da manjedoura especial da caverna, que até perdiam o amor aos vitelinhos, deixando-os morrer de fome e fugindo, como por encanto, para que as ordenhassem, a moura ou as suas fadas; Mas que um dia um pastor ladino, receando se lhe perdesse a sua vaca, tomara a esperta resolução de se lhe agarrar à cauda, não a largando por muitas horas, até que, ao fim da tarde, lá foi misteriosamente vaca e pastor para dentro da caverna... Que, por fim, a moura recompensara o pastor com a munificência que lhe era própria, tapando-lhe primeiro os olhos, para ignorar o caminho da caverna, e enchendo-lhe em seguida o chapéu de carvões, recomendando-lhe muito que tivesse todo o cuidado de os colocar, à hora própria, no lugar da transformação... Que, porém, o pastor não fora esperto, pois nunca pudera compreender que era mister colocar aqueles carvões ao orvalho na manhã de S. João, ficando por isso pobre como dantes, em vez de ter assegurado para sempre a sua independência, pois aqueles carvões eram grande riqueza de ouro e pedrarias de inestimável valor. Mau foi que o orvalho os não cristalizasse. Seriam, com efeito, puros diamantes. Termina a lenda dizendo que, a começar da caverna, vai uma grande mina por debaixo daquela e de outras fragas, na distância de quase uma légua, a qual fora

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construída pelos gigantes para roubar a fonte dos de Moscosinhos71, cuja água, límpida e cristalina, faz as delícias da moura e de seus guardas. Fonte: AZEVEDO, Manuel de – "Notícias Arqueológicas de Trásos-Montes – O castelo de S. Tomé" in O Arqueólogo Português, Vol. 1, nº 3, Lisboa, 1885, pp. 94-95.

224 – Lenda de S. Tomé do Castelo A aldeia de S. Tomé do Castelo, no concelho de Vila Real, deve o seu nome a uma velha fortaleza, já totalmente arruinada, onde os antigos dizem que havia uma moura encantada. E também dizem que ela era filha de um governador do castelo, um homem muito rico que escondeu os seus tesouros em túneis muito fundos que ainda lá existem. Um dia, diz que foram lá uns indivíduos procurar essa riqueza. E tanto procuraram que, a dada altura, lhes apareceu pela frente um ror de diabos, com focinhos muito feios, e que estavam vestidos com roupas em ouro e diamantes. À vista de tantos diabos, os homens desataram a fugir cheios de medo e foram meter-se em suas casas, onde pouco mais duraram. Deu-lhes um mal qualquer que os levou em coisa de poucos dias. Diz-se que estes indivíduos eram de uma aldeia vizinha chamada Mascosinhos, e também esta pouco mais durou. A recordá-la, hoje apenas existem umas ruínas junto ao monte de S. Bento72. Fonte: Inf.: Manuel Alcino Freitas, 57 anos; rec.: Ponte, Vila Real, 1997.

225 – [As talhas do mouro] Diz a lenda que a sepultura [situada na Veiga do Vilar, freguesia de S. Tomé do Castelo, concelho de Vila Real] era o lugar onde se sentava um mouro, que por séculos estivera de guarda a um grande tesouro que está defronte, dentro duma grande talha cheia de ouro e jóias; que depois se ausentara o mouro para o inferno por ordem do 71

Na freguesia de S. Tomé do Castelo, mantém-se ainda a tradição de que este povo de Moscosinhos (também designado Mascosinhos ou Mescosinhos), do qual ainda restam ruínas, extinguiu-se pela invasão de uma peste, de que apenas escapou um tal Petro Gomécio e sua família, que dali fugiram para fundarem a povoação vizinha de Águas Santas [nota do mesmo autor]. 72 Assinale-se que a tradição oral, à margem deste relato, tem vindo a justificar a extinção desta aldeia, que chegou a ser uma das mais populosas da zona, com o aparecimento, há cerca de meio milénio, de uma peste que matou quase todos os seus moradores [esclarecimento do mesma informante]

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demónio, deixando de guarda ao tesouro outras duas grandes talhas cheias, uma de fome e outra de peste. Feliz, dizem, do que encontrar a primeira, mas ai do que encontrar qualquer das outras duas! Fonte: AZEVEDO, Manuel de – "Notícias Arqueológicas de Trásos-Montes", in O Arqueólogo Português, Vol. 1, nº 5, Lisboa, 1895, p. 133.

226 – Gruta com feitio de Mesquita Por espaço de meio quarto de légua, vai este rio (Sordo) [na freguesia de Torgueda, concelho de Vila Real] por baixo da terra, sem que se veja água alguma, e por isso se chama Sordo. Este sítio, onde o rio se oculta aos olhos por baixo da terra, é medonho e foi habitado dos mouros, onde tinham mesquita e grandes salas por baixo de uma penedia quase inacessível e muito despenhada. Ainda hoje se vê a entrada patente, e muitas pessoas arrojadas e ambiciosas têm entrado naquela profundidade com a ambição de buscar tesouros, e muitas outras só por curiosidade de ver e averiguar a disposição daquelas cavernas, que dizem ser algumas o pavimento de pedra lavrada e outras terem abóbada fechada em arcos da mesma pedraria, mas todos padecem grandes temores e medos, porque, dizem, vêm lá figuras armadas ou diabólicas, que os assombram e impedem de passarem alguns lugares que também desejam ver.73 Fonte: AZEVEDO, Pedro A. de – "Extractos arqueológicos das Memórias Paroquiais de 1755", in O Arqueólogo Português, vol. 8, nº 4, Lisboa, 1903, p. 102.

227 – A moira e o carvoeiro Há muitos anos atrás, quando o carvão era uma das mais preciosas fontes de energia, os povos da serra do Alvão tinham aí o seu ganha pão. Havia então em Vila Real a feira do carvão, onde afluíam carvoeiros de Vila Marim, Quintela, Mondrões, Agarez, Adoufe, Pena e outras povoações. Estes homens eram verdadeiros escravos de trabalho e tinham de labutar de sol a sol, sempre sujos e negros, para terem a malga do caldo ao fim do dia. Tal sina é explicada pela seguinte lenda que os povos da serra conservam.

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Foi actualizada a ortografia que, originariamente, corresponde ao documento de 1755.

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Certo dia, um homem saiu de casa, ao alvorecer, para fazer carvão no monte, contudo, quando chegou ao sítio onde havia as zogas e os canhotos para arrancar da terra, lembrou-se que não trazia uma picareta e assim não poderia trabalhar. Pôs-se, por isso, a amaldiçoar a sua sorte, enquanto se resolvia a voltar ou não a casa para trazer tal ferramenta. Nisto, apareceu-lhe uma moira, muito bela, que, sabedora da dificuldade do homem, lhe mostrou uma picareta toda em ouro, ao mesmo tempo que lhe disse: – Eu tenho a solução para todos os teus problemas! Vês esta picareta toda em ouro? Não é de uma coisa destas que andas à procura? – Se eu tivesse essa picareta, já nem precisaria de fazer carvão! – respondeu o homem. – Pois então vou dar-te a escolher – tornou-lhe a moura. – Preferes ficar comigo ou com esta picareta? O homem, apesar de estar deslumbrado com a beleza da mulher, nem hesitou na resposta: – Se ma dás, prefiro ficar com a picareta, pois com ela sei que vou governado. – Então toma-a lá e vai à tua vida! – disse-lhe a moura. – Se me tivesses escolhido a mim serias rico para sempre, assim sê-lo-ás apenas enquanto te durar este ouro. Só então o homem descobriu o erro que cometera. Havia sido traído pela sua ambição. A mulher era uma princesa moura que ali estava encantada. Se a tivesse escolhido tê-la ia desencantado e casaria com ela. Assim, a moura lá continua encantada, algures, e ele, mal se esgotou o ouro que levou, voltou a ficar pobre e foi obrigado a retomar o trabalho de carvoeiro. Por isso, e como sina traçada pela bela moira, os carvoeiros do Alvão tiveram sempre de trabalhar duramente para não morrerem de fome. Fonte: PARAFITA, Alexandre – O Maravilhoso Popular – Lendas. Contos. Mitos., Lisboa, Plátano Editora, 2000, pp. 169-170.

228 – A moura da Ponte da Aradeira Contam os antigos que na Ponte da Aradeira, situada na estrada da Campeã que liga a Mondim de Basto, vive uma moura encantada junto a uns rochedos, aí guardando um riquíssimo tesouro. E contam também que ela tem corpo de cobra e cabeça de mulher, e que, nas noites de Verão, vem com o luar estender roupa nas rochas e pentear os seus belos cabelos com um pente de ouro. Há quem diga que houve noutros tempos rapazes que tentaram ir quebrar-lhe o encanto. Contudo, nunca o conseguiram, porque quem quisesse aventurar-se tinha de ir sozinho àquele lugar, e à meia noite em ponto esperar que a cobra saísse para se vir

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pentear nas rochas. O rapaz teria de levar com ele uma aguilhada com ferrão, e ter a coragem de, no momento em que ela estivesse a pentear-se, espetar-lho no corpo para a desencantar. Se lhe conseguisse fazer sangue, o corpo da cobra transformar-se-ia no de uma linda mulher, e uma das rochas abrir-se-ia para que ele ficasse senhor do tesouro lá guardado. Como nunca houve quem tivesse a coragem de lá ir sozinho, pois o sítio mete medo a qualquer um, a moura e o tesouro lá continuam, esperando eternamente por alguém que os vá desencantar. Fonte: PARAFITA, Alexandre – O Maravilhoso Popular – Lendas. Contos. Mitos., Lisboa, Plátano Editora, 2000, p. 171.

229 – O Vale da Bela Luz Há muitos, muitos anos, uns homens mudaram um marco de uma tapada, situada no Valongo, na aldeia de Ludares. Quando o dono da tapada viu, ficou todo arreliado e foi falar com eles para que voltassem a pôr o marco onde estava. Mas eles disseram-lhe que não, pois afiançavam que o sítio do marco era aquele. Quando o dono da tapada morreu, as pessoas viram uma mulher muito bela a fazer de marco, no sítio de onde os homens o tinham tirado. Toda a gente ficou então a saber que era ele quem tinha razão. Dizem também que a mulher era uma moura. Depois ela desapareceu e passou a ver-se então uma luz no mesmo lugar. Por isso o povo ainda hoje chama àquele lugar o Vale da Bela Luz. Fonte: Inf.: Nilza da Conceição Alves Correia, 50 anos; rec.: Ludares, Vila Real, em 2001.

230 – Lenda do Poço de Panóias Nas fragas de Panóias, situadas próximo de Vila Real, há um buraco que conduz a um poço muito fundo e que tem gerado muito medo nos habitantes daquele lugar, que é também conhecido como Laijinhas. Dizem eles que algo de terrível se passa lá por baixo, e que se alguém cair naquele poço já não sai vivo. Os antigos costumavam dizer também que aquela era uma das entradas para o Inferno e que ali mora o Diabo que à noite sai de lá "aos guinchos"74. 74

Segundo a nossa informante, um dos antigos párocos de Valnogueiras, conhecido como padre Domingos, tentou, em vão, corrigir esta ideia no seio do povo, ao procurar demonstrar que os habitantes desse poço seriam apenas morcegos corpulentos, e os “guinchos” ali ouvidos nada mais seriam que os sons agudos que é habitual produzirem na escuridão dos seus refúgios.

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Este poço, ainda segundo a voz do povo, vai dar a uma mina que acaba num lugar chamado Fonte do Poço onde está uma moura encantada. Conta-se que, numa ocasião, um homem das Laijinhas, quando andava a ensinar um cão para a caça, atirou com uma pele de coelho bravo para o tal buraco das fragas de Panóias. E o cão, como era obediente, foi logo atrás da pele, mas já lá não regressou. Dizem que durante oito dias e oito noites ninguém deu fé dele, até que foi aparecer na aldeia de S. Cibrão, a três quilómetros daquelas fragas, todo queimadinho. E de seguida morreu. Fonte: Inf.: Maria Elisabete Lopes, 45 anos; rec.: Valnogueiras, Vila Real, 2000.

231 – Lenda da moura branquinha Contam os antigos que uma senhora de Valnogueiras, concelho de Vila Real, quando foi levar o almoço ao marido, que andava a trabalhar numas terras para os lados da Ponte Pedrinha, que fica sobre a ribeira de Tanha, ao passar na Fonte do Poço deparou com uma moura muito bonita, branquinha de cara e de mãos, mas vestida de negro. Estava sentada nos ramos de uma oliveira. – Quem és tu? – perguntou. A moura não respondeu. A mulher aproximou-se mais e insistiu: – Quem és e o que fazes aqui? Queres uma pinga de água? Como voltasse a não ter resposta, a mulher abeirou-se da oliveira para ver se reconhecia aquela cara, ao mesmo tempo que continuava a tentar meter conversa com ela e a oferecer-lhe coisas. Então a moira quebrou o silêncio e disse-lhe: – Deixa-me em paz! Não quero nada do que é teu! E como houvesse insistência da parte da mulher em continuar a conversar, a moura não esteve com mais aquelas: levantou voo e desapareceu na direcção da mina da Fonte do Poço. Dizem que continua lá encantada. Fonte: Inf.: Maria Elisabete Lopes, 45 anos; rec.: Valnogueiras, Vila Real, 2000.

232 – A moura, o pássaro e a cobra Havia uma moura, muito bela e bondosa, que era pretendida por todos os jovens da moirama. Porém só de um gostava a valer. Entretanto, seu pai, um homem feroz e ambicioso, queria obrigá-la a casar com um mouro muito rico, embora de idade avançada. Vai daí, contra a vontade da filha marcou o dia do casamento.

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Ora, como a jovem só tinha olhos para aquele por quem se apaixonara, contoulhe as intenções do pai e, desde logo, os dois planearam fugir. Só que o pai descobriu os planos de fuga dos dois, e, perante isso, resolveu apressar a data do casamento. – Vais casar-te amanhã mesmo! – disse-lhe. A moça, como não tinha possibilidades de avisar o rapaz de quem gostava, resolveu livrar-se de tal casamento fugindo de casa nessa mesma noite. E atrás dela correram logo seu pai e vários criados. Ao amanhecer, já a jovem tinha chegado a um lugar chamado Cavadas, que fica entre Galegos e Ludares, no concelho de Vila Real. Mas os perseguidores estavam já prestes a alcançá-la. Foi então que a jovem avistou um grande pássaro, e, pensando que ele a poderia levar para longe, correu na sua direcção com quantas forças lhe restavam. Só que ao chegar perto viu que se tratava dum simples penedo. Um penedo que tinha, de facto, as formas de um grande pássaro. Ficou então muito aflita. E como os seus perseguidores montavam bons cavalos e já se encontravam próximo de si, a moura escondeu-se entre os carrapiços e o panasco do monte, bem juntinho do penedo. E disse para o penedo: – Serias a minha salvação se fosses um pássaro verdadeiro!... Nisto os perseguidores estavam já junto ao penedo, a procurar em todos os esconderijos que havia. E eis que se ouve então um silvo de cobra a cortar os ares. Os perseguidores olharam e viram, de facto, a cabeça de uma enorme cobra pronta a saltar-lhes em cima. E foi de tal ordem o susto que apanharam que deitaram a fugir para trás, desistindo da perseguição. Depois a jovem encontrou-se com o seu amado e foram felizes para sempre. No mesmo local é possível ver um grande penedo que de um lado parece um grande pássaro e do outro parece a cabeça de uma cobra também muito grande. O povo chama-lhe o “penedo da moura”. Fonte: Inf.: Maria Elisabete Lopes, 45 anos; rec.: Valnogueiras, Vila Real, 2000.

233 – Os mouros e a capela da Senhora de Guadalupe Uma das tradições populares sobre a capela de Nossa Senhora de Guadalupe, situada próximo de Ponte, no concelho de Vila Real, diz que foi construída da noite para o dia. Embora as probabilidades históricas apontem noutro sentido75, o povo acredita que foi obra dos mouros, pois só eles tinham poder e magia para construi-la numa noite. 75

O Prof. Doutor Martins de Freitas, estudioso da história local, entretanto falecido, chegou a indicarnos conhecer documentos que demonstram que a referida capela foi construída no Séc. XVI pelo clérigo D. Pedro de Castro, importante figura da Igreja local.

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Segundo a lenda, os mouros ao serem derrotados pelos cristãos, e para poderem sobreviver, tiveram de refugiar-se em grutas que haviam construído, previamente, na zona. Só assim se livravam de ser descobertos, aproveitando a noite para saírem. E era também de noite que se dedicavam a apanhar e a trabalhar as pedras para depois construírem o que lhes lembrasse. Lembrou-lhes então de construírem uma capela. Assim, quando já tinham as pedras prontas e devidamente numeradas, e porque não podiam andar mais do que uma noite a construir o que quer que fosse, de contrário seriam descobertos, escolheram uma noite de inverno por ser mais comprida, depois foram lá e, de uma assentada, ergueram a capela. Fonte: PARAFITA, Alexandre – “Os mouros e a capela da Senhora de Guadalupe”, in VEJA – A Revista do Douro, nº 4, Outubro/2002, Peso da Régua, p. 50.

234 – [O cristão, o mouro e a Senhora de Guadalupe] A capela da Senhora de Guadalupe, em Vila Real, tem no seu exterior uma quantidade de imagens provocatórias que sempre foram motivo de espanto e desassossego para o povo. Podem ver-se figuras de pessoas com orelhas de animais, outras com a língua de fora e a fazer caretas, figuras exibindo partes sexuais, e por aí adiante. É por isso uma capela diferente das que se conhecem na região. O povo encontra explicação para tal numa tradição muito antiga, segundo a qual a capela foi construída por um mouro. A lenda é a seguinte: Conta-se que os mouros, ao serem expulsos desta região, levaram um cristão cativo, no intuito de mais tarde pedirem um resgate por ele. Contudo, ao perceberem que o cristão era pobre e que pouco valeria, resolveram fechá-lo numa caixa para o engordarem e depois comerem-no. Davam-lhe então de comer por uma frincha da caixa. O cristão depressa percebeu a intenção dos mouros e, por isso, na primeira ocasião, agarrou um rato que lhe entrou dentro da caixa e matou-o, guardando-lhe os dedos. E assim, quando os mouros lhe perguntavam: – Então, estás gordinho? O cristão mostrava-lhes, pela frincha, os dedos do rato, e os mouros diziam: – Ah, desgraçado, que estás cada vez mais seco! Assim não nos vais servir de nada! Por isso resolveram matá-lo. E ficou um mouro de guarda deitado sobre a caixa até ao momento da execução. O cristão, ao perceber o que o esperava, pôs-se a rezar a Nossa Senhora, pedindo que lhe valesse. E tanto rezou, tanto rezou, que, de um momento para o outro, a caixa onde ele estava voou e foi poisar na aldeia de Ponte. E em cima dela lá continuava o mouro a dormir.

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Ao fazer-se manhã, o mouro acorda com o cantar dos galos e pergunta: – Ó cristão, na tua terra há galos? – Há – diz o cristão. – Então grande milagre conseguiste, pois estás na tua terra! Abriu-lhe a caixa e o cristão saiu. O mouro passou então a ser escravo do cristão, e este, em castigo do que teve de passar na mourama, obrigou-o a construir uma capela dedicada a Nossa Senhora no sítio exacto onde a caixa pousou. A capela lá está. Fonte: PARAFITA, Alexandre – “Os mouros e a capela da Senhora de Guadalupe”, in VEJA – A Revista do Douro, nº 4, Outubro/2002, Peso da Régua, p. 50.

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Concelho de Vimioso

235 – [O mouro e a boieira] No sítio chamado Fornos, termo de Algoso [concelho de Vimioso], há uma fonte aonde vive um mouro encantado que, certo dia, apareceu a uma boieira prometendo-lhe imensas riquezas se o desencantasse. Para isso bastava que se não assustasse quando ele lhe aparecesse à hora aprazada em figura de touro bravo, em jeito de querer escorná-la, ou de serpente a trepar por ela acima para a beijar. A rapariga prometeu, mas fugiu quando da investida da serpente, e o mouro desapareceu, lastimando-se dolente: – Ai que me dobraste o encanto. Fonte: ALVES, Francisco Manuel; AMADO, Adrião Martins – Vimioso: Notas Monográficas, Coimbra, Junta Distrital de Bragança, 1968, p. 321.

236 – [Lenda do cordão de oiro] Há lenda de moura encantada na fonte que está no sítio dos Fornos, termo de Algoso [concelho de Vimioso]. É a lenda do cordão de oiro, aparecido a uma mulher que foi lá beber. Esta dobou, dobou, até que o fio se quebrou com o peso do novelo, convertendo-se então tudo rapidamente em carvões e ouvindo-se ao mesmo tempo uma voz que dizia: – Ai, que me dobraste o encanto! Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Vol. IX, Porto, 1934, p. 498.

237 – Lenda da Serra do Mó Conta-se que no cume da Serra do Mó, que é metade espanhola e metade portuguesa, vivia um rei mouro com a sua esposa e três filhas: Zaida, Zoleida e Zulmira.

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No sopé da serra, próximo de Avelanoso, no concelho de Vimioso, existia uma fonte, chamada "Fonte da Moura", onde as filhas do rei costumavam ir pentear-se. Um certo dia, Zoleida encontrava-se sozinha na fonte, onde tinha ido pentear os seus cabelos com um pente de ouro. Estava a chorar. Passando então por ali um pastor, perguntou-lhe este: – Porque choras, menina? – Choro porque deixei cair o meu pente de ouro na fonte. O pastor retirou-lhe o pente da fonte e, ao vê-la feliz e tão agradecida, apaixonou-se por ela. E continuaram a encontrar-se naquela fonte. Daí o nome "Fonte da Moura". O rei mouro, quando soube, opôs-se ao romance, por o pastor ser cristão e pobre, e ela ser moura e rica. Só que a paixão foi mais forte, e ela resolveu fugir com o pastor. Depois converteu-se ao cristianismo e casou com ele. Fonte: Inf.: Alice Baptista Martins, 78 anos; rec.: Avelanoso, Vimioso, 2001.

238 – Lenda do Castelo de Algoso Conta-se que o castelo de Algoso, no concelho de Vimioso, foi habitado por um rei mouro que usava de grande tirania sobre as povoações da zona. Com ele vivia uma filha que se enamorou de um fidalgo cristão, tendo ela própria auxiliado os cristãos quando estes tentaram reconquistar o castelo. Os cristãos conseguiram assim levar de vencida o rei mouro. Porém este logo descobriu a traição da filha. E por isso, como castigo, encantou-a na figura de uma serpente, deixando-a nos subterrâneos do castelo a guardar um valioso tesouro. Ele, entretanto, tratou de fugir por uma mina que lá havia, na esperança de voltar um dia para reaver o seu tesouro. Diz o povo que esta mina entra pelo monte da Penenciada adentro, e que, em noites de S. João, tem sido vista uma donzela muito linda com os cabelos soltos, a chorar, sentada sobre uma fonte ali situada, e que desaparece aos primeiros alvores da madrugada, aparecendo no seu lugar uma enorme serpente com uma grande cabeleira, a rastejar, a rastejar, até que desaparece também. Por esta razão não há quem se atreva a entrar dentro da mina e a procurar o tesouro que lá existe. A fonte é conhecida pelo nome de "Fonte de S. João Baptista" e o povo reconhece-lhe poder na cura de certos males. Por isso é alvo de muitas romarias, especialmente no dia de S. João. Ao lado há uma capela dedicada a este santo. Fonte: Inf.: António Augusto Fernandes, 72 anos; rec.: Algoso, Vimioso, 2001

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239 – Lenda da Fonte de S. João A Fonte de S. João, que existe em Algoso, no concelho de Vimioso, é, segundo o povo, uma fonte encantada, onde vive uma moura. Diz-se que um dia um humilde jornaleiro, ao passar por ali, viu a moura e puseram-se a conversar um com o outro. E de tanto conversarem, a moura engraçou com o homem, ao ponto de lhe prometer tudo quanto lhe pedisse. O jornaleiro, admirado com tal oferta, disse-lhe: – Seis vinténs por dia me bastam. – Está bem – aceitou a moura. – Cá os encontrarás debaixo de uma pedra, se vieres apanhá-los ao dar a meia noite e não contares a ninguém. Assim fez o jornaleiro, noite após noite. E como tinha esta diária assegurada, deixou de trabalhar. Passou então a viver melhor do que os seus vizinhos. Estes, todos os dias, quando iam para o trabalho ao amanhecer, chamavam-no sempre: – Vens connosco? Ele agradecia, mas não ia. Até que se cansou de estar sempre a ser chamado, e, por isso, numa certa manhã respondeu-lhes: – Enquanto a fonte de S. João me der a jornada, não precisarei de mais nada!

Tais palavras foram a sua desgraça. Daí em diante, nunca mais a fonte lhe deu nenhum vintém. Fonte: Inf.: Inês Rosa Fundo Afonso Martins, 44 anos; rec.: Vimioso, 1999.

240 – O lagar de ouro de Algoso76 Diz-se que em Algoso há, num certo sítio, um tesouro encantado, deixado pelos mouros. E que o tesouro é nada mais nada menos que um lagar de ouro. Contam os antigos que um dia, para o desencantar, foi lá um padre com o povo fazer rezas e esconjuros, daí resultando o aparecimento do diabo, sentado na ponta do peso do lagar. E também se diz que o diabo tinha uma cara muito feia, e que se pôs a dizer: – O tesouro aqui está. Onde quereis que vo-lo apresente?

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Trata-se de uma variante da lenda “A Fraga da Tecedeira”, do concelho de Alfândega da Fé, identificada com o nº 4. Cremos que a proximidade geográfica entre os dois concelhos pode ter facilitado uma importação de motivos de uma narrativa para a outra.

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Tanto o povo como o padre, ao verem a focinheira do dito, desataram a fugir em debandada e não quiseram mais saber do tesouro. Dizem que ainda lá está, mas que ninguém se atreve a procurá-lo. Fonte: Inf.: Inês Rosa Fundo Afonso Martins, 44 anos; rec.: Vimioso, 1999.

241 – O pente e o cabelo da moura Na aldeia de Frades, do concelho de Vimioso, há um local chamado Puio, onde se conta que, numa certa manhã de Primavera, andava um pastor com o seu rebanho, e que, ao chegar a hora de comer a merenda, dirigiu-se, com o farnel às costas, para junto da fonte que hoje se chama Poço da Moura. Depois de comer a merenda, ia beber água, mas, ao chegar à fonte, viu lá uma princesa a pentear-se com pente de ouro. Ela então procurou-lhe: – Ó pastor, o que é mais lindo: o meu pente ou o meu cabelo? O pastor pôs-se a olhar bem e a pensar, e por fim respondeu-lhe: – São lindos os seus cabelos, mas o pente sempre é melhor. Ela então encheu-se de desgosto e lançou-se à água, para não mais ser vista. Diz-se que o pastor, ao preferir o pente, lhe dobrou o encanto. E também se diz que em manhãs de S. João outros têm sentido ali um tear a tecer. Pensa o povo que é a moura mais o seu encanto, e, daí, àquela fonte deram o nome de Poço da Moura. Fonte: Inf.: Inês Rosa Fundo Afonso Martins, 44 anos; rec.: Vimioso, 1999.

242 – Lenda do Penedo da Abrunheira Em Santulhão, no concelho de Vimioso, há um lugar chamado Abrunheira, junto ao rio Sabor, que tem um grande penedo, onde, segundo a tradição, aparece nas manhãs de S. João uma moura encantada a tecer num tear de ouro e a guardar um valioso tesouro. Diz o povo que antigamente o penedo estava do lado de Paradinha Nova, do concelho de Bragança. E então uns rapazes, que andavam à procura do tesouro, encontraram lá um escrito que dizia: – Quem este penedo volver, achará um grande haver.

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Como o penedo era muito grande e pesado, foram chamar todos os rapazes de Santulhão, e, todos à uma, lá conseguiram volver o penedo. E quando o viraram encontraram outro escrito que dizia assim: – Deus seja louvado, que já estou do outro lado!

O tesouro que os rapazes esperavam encontrar nunca apareceu. Diz o povo de Santulhão que esse tesouro é a paisagem única, e extraordinariamente bela, que dali se avista. Fonte: Inf.: Francisca Teresa Fernandes Moreno, 47 anos; rec.: Bragança.

243 – O bruxo do castelo de Algoso Há muitos e muitos anos, contavam os nossos avós, o castelo de Algoso era dos mouros e vivia lá um bruxo muito rico, que tinha andado a juntar muito ouro e muitas jóias. Um dia, os cristãos resolveram tomar o castelo e expulsar os mouros. Então o bruxo, como era adivinho, soube deste ataque, e, horas antes, saiu do castelo com o tesouro para, sorrateiramente, ir enterrá-lo ao pé de uma fonte ali perto. Quando estava nestes trabalhos, eis que lhe aparece uma rapariga, que ia buscar água à fonte com uma cantarinha de barro. Então o bruxo, com receio de que a moça denunciasse o seu segredo, tratou logo de a encantar com as suas artes mágicas. E disse: – Em cobra ficarás encantada, p'ra que andes sempre de boca calada!

Assim aconteceu. A moça lá ficou junto àquela fonte transformada em cobra. Depois os cristãos tomaram o castelo aos mouros, matando uns e expulsando outros, e do bruxo nunca mais se soube nada. Diz o povo que, em noites de S. João, há quem tenha visto junto ao castelo uma jovem muito bela a dançar ao luar, achando-se, sobre as pedras da fonte, a pele de cobra que despe por momentos. E quando alguém se aproxima para tentar ir à fala com ela, logo a jovem desaparece e volta para a água da fonte, arrastando consigo a pele que a vai transformar de novo numa horrível cobra. Fonte: Inf.: António Augusto Fernandes, 72 anos; rec.: Algoso, Vimioso, em 2001.

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Concelho de Vinhais

244 – A tomada de Souane aos mouros Senhores da vila de Souane [povoação hoje extinta], davam os mouros amiudadas sortidas pelas terras circunvizinhas, causando aos cristãos prejuízos sem conta. Cansados estes de por tanto tempo sofrerem o jugo do invasor, resolveram organizar um pequeno núcleo de resistência, constituindo o centro das operações no Castelo de Pinheiro Novo, vulgarmente chamado Cidade de Santa Rufina, na margem oposta do rio Rabaçal. A empresa era difícil, porque o Castro de Souane, além de ser guarnecido de fortes muralhas, tinha pelo sul a protecção das outras povoações de Lomba em posse dos mouros, especialmente Quiraz sua fundação, e pelo norte a encosta íngreme inçada de fraguedos enormes até à margem do rio. Por duas vezes o exército cristão escalou a encosta e pôs cerco à vila, mas debalde: os esculcas mouriscos depressa punham os habitantes em sobressalto, obrigando os cristãos a uma custosa retirada. Vendo-se assim impossibilitados para nova investida, recorreram à protecção do apóstolo Santiago. Fizeram preces durante outro dias... E milagre extraordinário! Na manhã do nono dia puderam ver numerosa cavalgada baixando dos montes do Pinheiro Novo. Há festa. Nessa noite o glorioso cabo de guerra mandou reunir todos os bois, vacas e cabras que havia nas aldeias vizinhas, e depois de colocar-lhes nos chifres archotes e faróis, marchou com o exército em direcção a Souane. A noite estava escura. Já junto das muralhas, mandou acender os faróis, fazendo entrar o luzido exército para dentro do povoado77. Os mouros, desprevenidos, acordam em alta gritaria, encontrando a maior parte, em louca correia, a morte nas pontas dos animais enraivecidos e nas lanças dos infantes e dos cavaleiros fogosos. Souane foi arrasada. Os que puderam escapar, exteriorizaram o sentimento de 77

Esta estratégia de defesa popular é igualmente referida noutras zonas da região e do país, embora em relação a inimigos diferentes. Leite de Vasconcelos (1963: 727) cita a mesma lenda em Viseu referindose a Viriato contra os romanos e noutras partes contra os franceses (Guerra Peninsular). Também em Vila Pouca de Aguiar, distrito de Vila Real, correm versões de uma lenda de um tal “Capitão Vidoedo” que afugentou os espanhóis do vale de Aguiar ao organizar, durante a noite, um exército de reses com lampiões nos chifres (AAVV, 1998: 35-36). Refira-se ainda que, numa outra lenda incluída neste trabalho e referente a Alturas de Barroso, concelho de Boticas (n.º 17), refere-se o uso da mesma estratégia, agora num combate de mouros contra mouros.

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perderem para sempre a afamada povoação, soltando dos outeiros distantes estes doridos queixumes: – Adeus, formosa vila de Souane! Nunca mais te tornaremos a ver! Que a maldição caia sobre os cristãos! Fonte: MARTINS, Firmino – Folclore do Concelho de Vinhais, vol. 1, 1987, pp. 272-273

245 – O choro da moura [de Souane] Uma formosa mourinha, perseguida pelos soldados, pôde escapar à morte ficando encantada em um fragueiro à beira do rio [Rabaçal]. Em ameno dia de primavera andava uma rapariga a pastorear o rebanho na encosta florida do Rabaçal, quando viu em cima do penedo informe uma donzela a pentear as fartas madeixas com pentes de ouro cravejados de rútilos diamantes, ao mesmo tempo que fazia a comida em uma sertã colocada sobre a fogueira crepitante. Tímida a princípio, por julgar ver alguma alminha do outro mundo, cobrou ânimo depois, dirigindo-se-lhe desta maneira: – Quem és? – Eu sou a linda moura de Souane. Choro aqui noite e dia a minha desgraça. Livras-me do encantamento? – E que queres que eu faça? – Vem daqui a oito dias e dir-te-ei as condições. Mas não digas o que viste a ninguém, porque se o disseres, dobras-me o encanto e serei eternamente desgraçada. E desapareceu. A pastora não guardou segredo. Decorridos os oito dias voltou com o rebanho para a beira do rio, vendo sobre a penedia a pobre mourinha de sertã ao lume e de formosas madeixas ondulando à brisa quente. Vieram à fala. Mas a moura, já senhora da inconfidência, começou a chorar a desdita, precipitando-se no leito do rio. Por largo tempo ecoaram nas margens do rio os queixumes doridos, vendo ainda hoje o povo no marulhar da água no sopé do fragueiro informe o choro triste da moura a carpir a saudade pungitiva da formosa vila de Souane... E em certas manhãs de estio, ao observar as gotas cristalinas do orvalho nos líquenes da rocha, diz serem as lágrimas que eternamente vertem os olhos da moura em momentos de mais acerba lembrança. E, como prova indestrutível do facto, vê nos sinais gravados na rocha a sertã e a colher com que cozinhava. Fonte: MARTINS, Firmino – Folclore do Concelho de Vinhais, vol. 1, 1987, pp. 273-274

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246 – [A moura encantada e o lenhador] À meia noite do dia de S. João, o curioso poderá ouvir em diferentes rochas da região [de Souane] o tac-tac surdo de velhos teares de amoreira e o vai-vem da lançadeira através de dourados fios de seda, impelida pelas formosas mãos de lendária moura encantada. Um dia, um lenhador, percebendo o rodopio de um sarilho, aproximou-se da alta penedia e viu uma linda compatriota de Tárique a transformar as fartas maçarocas em sedosas meadas. E pôde ver que, terminada a tarefa, a novo trabalho deu começo: colocar sobre a dobadoura as meadas e enovelar os delgados fios, ao mesmo tempo que molhava os dedos lassos no límpido arroio que lhe corria aos pés. E, como não conhecia o regulamento dos encantos, ou, talvez, levado pela beleza inexcedível da donzela, foi-se aproximando, dirigindo-lhe carinhosa fala. De repente, o fio partiu-se, o fuso de ouro caiu na corrente murmurante, e, com surpresa, observou a pobre moura a fugir para a misteriosa galeria da rocha, de tranças soltas ao vento, a chorar, com a encantação dobrada. É que ela havia-se esquecido de molhar os dedos na água, humedecendo-os de saliva, e, por isso, o fio partiu, e ela recolheu, apressada, para o encantamento, não sem ter tempo de levar os pentes cravejados de rútilos diamantes com que tinha alisado as louras madeixas. Fonte: MARTINS, Firmino – Folclore do Concelho de Vinhais, vol. 1, Câmara Municipal de Vinhais, 1987, pp. 277-278

247 – [A moura e a pastora] Na Lameira da Moura, termo de Edroso [concelho de Vinhais], apareceu uma moura a uma pastora, prometendo-lhe quanto dinheiro quisesse se a desencantasse. Porém ela recusou, por não saber como explicar a seus pais a proveniência do dinheiro. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Vol. IX, Porto, 1934, p. 499.

248 – [A moura no rio Mente] Na Forjinha, termo de Vilar Seco da Lomba [concelho de Vinhais], há numa fraga um buraco com escada cavada na rocha, onde, segundo a lenda, entrou um cão e foi sair à margem do rio Mente, alguns quilómetros distante. (...) Também aparecia uma moura às pastoras, com vestidos brilhantes, dizendo-lhes:

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– Trocai a vossa pobreza pela minha riqueza. Outras vezes via-se a lavar roupa no rio Mente. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Vol. IX, Porto, 1934, pp. 499-500.

249 – A moura de Cidagonha Na aldeia de Moimenta, concelho de Vinhais, há um lugar com sinais de antigas fortificações conhecido por Cidagonha, e a que o povo também chama “cidade dos mouros”. Diz a lenda que vivia ali uma princesa mourisca encantada que, ora aparecia a pentear os seus cabelos com um pente de ouro, ao luar, ora a tecer num tear de ouro, cujo bater compassado dos pentes na teia e o ruído dos pedais poderiam ouvirse na povoação em noites calmas. Outras vezes poderia ouvir-se a referida princesa cantar melodiosas canções de saudade, cujas palavras não seriam perceptíveis. Segundo a lenda, o tesouro seria constituído pelo tear, o pente e muitos outros utensílios e jóias da princesa, incluindo um manto, tudo em ouro. Mas tratando-se de um tesouro encantado, este só poderia ser descoberto por pata de ovelha e ponta de relha. Fonte: MARTINS, João Vicente – Moimenta da Raia – uma aldeia comunitária em evolução e mudança, Braga, Ed. Autor, 1995, p. 83

250 – [A lenda de Igreja de S. Facundo] A Igreja de S. Facundo [na vila de Vinhais] é um templo venerando pela sua arquitectura, tradições e antiguidade. Foi a primeira matriz desta paróquia e das paróquias circunvizinhas até muitas léguas de distância, pois é considerada como a igreja mais antiga deste bispado. (...) Diz a tradição que os Santos Facundo e Primitivo, cavaleiros galegos, sendo perseguidos pelos mouros depois de um combate, se acolheram na dita igreja e nela permaneceram algum tempo, e que, em memória deste facto, sendo depois martirizados e canonizados, se deu à dita igreja o título de S. Facundo78. 78

Segundo Firmino Martins, Facundo foi um heróico oficial do exército cristão na luta contra os bárbaros que invadiram a Península. Este autor está, por isso, em desacordo com Pinho Leal que, ao apresentá-lo como tendo sido perseguido pelos mouros, o situa, desde logo, num tempo muito distante daquele. Escreve sobre este oficial Firmino Martins: “Logo que soube da marcha através da Península do bárbaro conquistador, saiu com um punhado de cristãos ao seu encontro; vendo impossível a resistência, recuou desde as montanhas da Galiza até à povoação antiquíssima de Crespo, hoje extinta, a que corresponde em parte o actual bairro do Eiró [em Vinhais], onde se travou sangrenta batalha; os

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Fonte: LEAL, Pinho – Portugal Antigo e Moderno, vol. 12, Lisboa, Livraria Editora de Mattos Moreira & Companhia, 1890, pp. 149-150.

251 – [O mouro e a igreja de S. Facundo] Andando uma grande briga de mouros e católicos no sítio por baixo donde hoje é o convento dos frades (...), venceram os cristãos, e vendo um destes que fugia um mouro da batalha à rédea solta, o foi seguindo com a lança. Corria o mouro a refugiarse na Igreja do Santo [São Facundo], já ferido, e o cristão sobre ele. Entrou o mouro na igreja, e o cristão ao chegar à porta se lhe pregaram na cantaria do limiar dela as mãos do cavalo. De sorte que hoje se vêem ser as estampas das ferraduras cravadas nela79. Benzeu-se o católico e prostrado de joelhos se humilhou e o mouro se converteu80. Fonte: Inácio Xavier de Morais Sarmento de Mariz – apud MARTINS, Firmino, Folclore do Concelho de Vinhais, vol. 1, 1987, p. 100.

252 – [O Serro de Penhas Juntas] O Serro de Penhas Juntas, dois quilómetros distante do povo, concelho de Vinhais, é constituído por um enorme penhasco de três quilómetros aproximadamente de comprimento, que segue em linha recta para o rio Tuela, distante quatro quilómetros. Está cheio de enormes e compridas galerias para exploração de minério, que demonstram insano labor e grandes e ricos filões. Em volta dos fragueiros, e principalmente no Múrio, aparecem pedaços de mós manuais, restos de casas sem cimento, fossos, muralhas de pedra solta e recintos fortificados, cobertos de pedras de metro enterradas no solo com a ponta para cima, à maneira de estrepes, dispostas com tal arte que, mesmo a pé, dificilmente se anda por entre elas. (...) A lenda diz que os trabalhos do Serro foram feitos pelos mouros, comunicando as galerias com o rio Tuela, e que há grandes tesouros guardados pelo diabo, que às vezes sai aos pastores em forma de touro preto. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Porto, vol. IX, 1934, pp. 539-540.

bárbaros, em maior número, derrotaram o exército cristão, aprisionando S. Facundo, que mataram às punhaladas” (1987: 101) 79 Durante séculos a pedra da entrada na capela ostentou marcas de ferraduras, contudo, em 2000, a cantaria antiga foi substituída por outra, onde já não é possível ver quaisquer sinais [informação colhida pelo autor junto de habitantes locais]. 80 Colocámos a pontuação neste texto e corrigimos algumas imperfeições ortográficas

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253 – [A Fraga do Pingadeiro] Versão A:

Perto da Fraga das Ferraduras [no termo de Cerdedo, concelho de Vinhais] fica a enorme Fraga do Pingadeiro, debruçada sobre o ribeiro Cabanelas, afluente do Rabaçal, à qual se refere a lenda da formosa Helena, filha de rei cristão, raptada por um mouro disfarçado em peregrino, que fugiu levando-lhe um colar de pérolas, supondo-se perseguido. Ela refugia-se no fragueiro de noite, para escapar às feras, e com rede feita de tiras do manto e dos seus cabelos apanha peixes de dia para se alimentar. Quando alfim chegaram seus irmãos e pai, que diligentes a procuraram e inquiriram do colar, apenas lhes apresentou algumas contas, caídas ao mouro na precipitação da fuga e encontradas no estômago das trutas pescadas. As outras diz o povo que ficaram no fundo do regato, sendo devido a elas o fino sabor das suas trutas.81 Versão B (A lenda das pérolas no fundo do rio):

Há muitos, muitos anos, vivia nas terras do Norte uma formosa princesa, que ocupava os dias passeando pelos montes e vales do seu reino, num bonito cavalo branco. Entre os seus enfeites, sobressaía um belo colar de pérolas, que naquele tempo simbolizava o estado de pureza da moça que o trazia. O pai, um poderoso rei cristão, estava sempre e recomendar-lhe todo o cuidado nesses passeios, que podiam ser perigosos devido à presença dos mouros por perto. Ela, contudo, não mostrava ter cuidado algum. Um dia, o cavalo regressou ao castelo sem a princesa, e logo toda a gente se sobressaltou. O seu pai mandou reunir todos os homens da guarnição e partiu com eles à procura da filha, acabando por avistá-la, ao longe, no cavalo de um mouro que a raptara e a levava para terras distantes. E não tardou que os perseguidores alcançassem o cavalo do mouro, que galopava mais lento, ou não levasse ele carrego dobrado. O raptor, vendo-se incapaz de levar a sua avante, resolveu livrar-se da jovem, e, ao atravessar o rio Rabaçal, atirou-a à água. Mas ao fazê-lo, deitou as mãos ao colar de pérolas e exclamou: – Posso não te levar comigo, mas o colar também tu o não levarás! As pérolas caíram à água e a corrente encarregou-se de as espalhar e fazer desaparecer. Quando o rei e os seus homens chegaram junto da jovem encontraram-na num choro enorme. Mas não chorava pelo tormento que passara nas mãos do raptor, chorava sim pelo colar perdido. E apontava para o leito do rio, num gesto de súplica, que comoveu o rei e todos quantos o acompanhavam. Perder aquele colar seria um sinal de desonra para qualquer donzela, e muito mais sendo ela uma princesa. 81

Esta versão da lenda é igualmente apresentada pelo Pe. Firmino Martins em Folklore do Concelho de Vinhais, (1987: 275-277). Contudo, este autor procura apresentar um texto romanceado, e no qual investe um excessivo labor literário, pelo que optámos pelo relato acima transcrito, levando ainda em conta o facto de ser mais antigo.

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Tudo fizeram para consolá-la, mas em vão. A jovem não queria regressar sem o colar. O rei resolveu então ordenar aos seus homens que acampassem ali algum tempo, até conseguir acalmar a filha e poderem voltar ao castelo. Passado um momento, ouviu-se a voz de um soldado em altos gritos: – Alteza! Alteza! Alvíssaras! – Que quer aquele homem?! - perguntou o rei, intrigado. Trazia na mão uma das pérolas perdidas. Tirara-a do ventre de uma truta, que tinha acabado de pescar no rio. No olhar da princesa nasceu um brilho de esperança. E logo todos os presentes correram para diferentes zonas do rio, tentando cada um pescar o maior número de trutas. O próprio rei foi pescar também. Dali a nada, parecia um milagre o que estava a acontecer: tanto o rei como os soldados haviam pescado tantas e tantas trutas, que, depois de abertas, tinha sido possível encontrar, finalmente, as pérolas perdidas. E assim a princesa pôde recuperar o seu valioso colar e regressar, feliz, ao castelo, servindo-lhe o sucedido de lição, pois não voltou a ignorar os conselhos do pai. Este, para comemorar, mandou fazer um grande banquete para o povo com as trutas que pescaram no rio. Foi de comer e chorar por mais. Nunca ninguém havia provado peixe mais saboroso. Ainda hoje as trutas do rio Rabaçal, que atravessa o concelho de Vinhais, em Trás-os-Montes, são famosas pelo seu sabor inigualável. Dizem os antigos que é um dom que ganharam com as pérolas da princesa. Fonte – versão A: ALVES, Francisco M. – Memórias ArqueológicoHistóricas do Distrito de Bragança, Porto, vol. IX, 1934, p. 620. Fonte – versão B: PARAFITA, Alexandre A Comunicação e a Literatura Popular, Plátano Editora, Lisboa, 1999, pp 110-111.

254 – [Santa Comba de Ousilhão] Na Fraga da Vela, também chamada Fraga da Ferradura, termo de Ousilhão, concelho de Vinhais, há o sinal de uma ferradura bem nítida gravada no rochedo.(...) Diz a lenda que a ferradura fora gravada pela pata do cavalo de um mouro perseguidor de Santa Comba, que ao chegar à fraga dissera: – Abre-te fraga bendita, que no mundo ficarás escrita. De repente a fraga abriu-se para recolher a santa e livrá-la do mouro. Perto do rochedo havia uma capela dedicada a Santa Comba, que, arruinando-se, transferiram a padroeira para a igreja matriz da povoação, perseverando contudo os toponímicos Monte de Santa Comba e Fraga da Ferradura, derivados do local da capela e das gravuras do rochedo. Fonte: ALVES, Francisco M. – Memórias Arqueológico-Históricas do Distrito de Bragança, Porto, vol. IX, 1934, p. 643.

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255 – A moura e o cavaleiro cristão Próximo da povoação de Vila Verde, no concelho de Vinhais, existiu noutros tempos uma torre fortificada, que serviu de refúgio a uma princesa moura. Seu pai, um monarca tirano que reinava no norte da Península Ibérica, viu-se de tal forma perseguido e derrotado pelos cristãos que resolveu esconder naquela torre a sua filha predilecta, fazendo-a acompanhar de uma escolta de guerreiros dispostos a tudo para impedir que algo de mal lhe acontecesse. A vinda da princesa para aquele refúgio causou na população das redondezas grande curiosidade, tanto mais que se dizia ser uma jovem de beleza nunca vista. Os guerreiros mouros encarregavam-se, por sua vez, de manter longe dela os olhares curiosos dos habitantes das redondezas. Acontece que, entre estes, havia um jovem cavaleiro cristão que combatia nas hostes de São Tiago, onde era respeitado pela sua valentia, e que, de tempos a tempos, vinha em visita aos seus pais em Vila Verde, aí trabalhando na agricultura como os demais. Ao saber da presença da bela moura na torre, logo procurou maneira de a ver de perto. Dirigiu-se a um pastor que guardava habitualmente um rebanho nos prados à volta e disse-lhe: – Se me emprestares o teu capote, o cajado e o bornal, ofereço-me para ir, no teu lugar, guardar o rebanho. Poupar-te-ei trabalho. O pastor aceitou e o jovem lá foi com o rebanho para junto da torre. E voltou a ir dias e dias seguidos, até que, de tanto persistir e de tanto se aproximar da torre, conseguiu finalmente ver a princesa e cruzar com ela olhares de cumplicidade amorosa. Embora sem trocarem palavra, que a tanto se não atreveriam nem um nem outro, acabaram ainda assim enamorados. Depois o jovem teve de voltar para o seu posto nas tropas cristãs e a princesa lá ficou, sozinha e triste, olhando insistentemente os horizontes, sem nada saber sobre tão prolongada ausência. Passaram semanas, passaram meses, e o misterioso pastor que ela se habituara a ver nos verdes prados não havia meio de aparecer. Por sua vez, o moço cansou-se das saudades e pediu licença por uns dias para ir à sua terra-natal e disfrutar de novo da mágica visão que tanto o desassossegava. Ali chegado, voltou a procurar o pastor: – Empresta-me outra vez o capote, o cajado e o bornal, que eu vou guardar o teu rebanho. A princesa, que já não tinha esperança de poder voltar a vê-lo, teve grande surpresa e alegria quando ali o encontrou de novo mais o rebanho, olhando fixamente para a torre e para ela. Os olhares que trocaram foram, para um e para o outro, a certeza de que o amor entre ambos era cada vez maior. Por fim, o cavaleiro voltou a partir. Esperava-o agora o cumprimento do dever. Para lhe afagar a alma e lhe acalentar a esperança, bastara-lhe aquele brilhozinho que viu, ao longe, nos olhos da jovem moura. Partiu, por isso, mais feliz que nunca. Contudo, desta vez, o pastor que lhe emprestara o capote e o rebanho não suportou a inveja de o ver escolhido e desejado aos olhares da moura, pelo que

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resolveu traí-lo, denunciando-o ao chefe dos guerreiros. E a resposta não se fez esperar. O chefe mouro, para se vingar de tal ousadia, foi com os seus homens à povoação e arrasou as habitações do bairro onde o jovem vivia. E não satisfeito, levou a sua crueldade ao ponto de chacinar todos os moradores, por pensar que, dessa forma, o mataria também a ele. Concluída esta vingança, dirigiu-se à princesa e ordenou: – Reuni o vosso enxoval, que ao amanhecer levar-vos-ei para junto do vosso pai. E fá-lo-ei sabedor das vossas leviandades. A princesa não ripostou, pois já de nada lhe valeria. Sabia também que a esperavam dias terríveis junto do seu pai e que não teria forças para o enfrentar, sobretudo agora que julgava estar morto o jovem por quem se havia enamorado e que era, afinal, a razão dos seus castigos. Por isso, na manhã seguinte, ao passar com a escolta nas escarpas de um lugar chamado Pena Cabreira, onde apenas podia seguir uma pessoa de cada vez, a jovem adiantou-se e foi empurrando para o abismo um a um todos os mouros que a acompanhavam. Segundo a lenda, após esta façanha, a bela princesa desapareceu no interior de uma gruta próximo dali, ficando encantada numa fraga que ainda hoje o povo identifica como a “fraga da moura”. Tempos depois, o jovem cavaleiro regressou a casa, e, ao ser informado do que se havia passado na sua ausência, montou num javali e procurou, desesperadamente, a princesa, até que na referida gruta encontrou restos de seda e damasco que terão feito parte das suas vestes. Naquela mesma noite, noite de S. João, ouviu gemidos longínquos misturados com o chiadouro de um tear em movimento. Reza a lenda que o moço, depois de dias e dias de espera infrutífera à entrada da gruta, regressou aos combates com os mouros, e que o seu fiel javali ficou petrificado num cabeço próximo, olhando fixamente a “fraga da moura”, onde ainda hoje espera o seu regresso82. Fonte: PARAFITA, Alexandre – O Maravilhoso Popular – Lendas. Contos. Mitos., Lisboa, Plátano Editora, 2000, pp. 172-174.

256 – A fraga onde Nossa Senhora descansou No lugar de Valpaço, próximo de Espinhoso, no concelho de Vinhais, há uma fraga que é conhecida como a “fraga do Valmiro” e que tem o furo de um sombreiro, onde Nossa Senhora esteve a descansar algum tempo. Dizem os antigos que os mouros vieram para a matar, por isso está lá também a marca do calcanhar de um deles, e 82

- No local é possível ainda identificar um penedo que a erosão do tempo ajustou ao formato de um javali, e que contribui para dar sentido a esta lenda. Note-se que ela está de tal forma enraizada no seio do povo, que, em noites de S. João, é tradição os rapazes roubarem os burros que encontram a jeito para irem neles fazer o percurso que o cavaleiro cristão terá feito em busca da princesa, acabando a noite junto da “fraga da moura”, onde vão ouvir o matraquear e o chiadouro do tear.

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Nossa Senhora teve de fugir para o alto da serra, no lugar de Vale de Janeiro, onde o povo lhe fez uma capela, que ainda lá está. É a capela de Nossa Senhora da Saúde. Fonte: Inf.: Graciano Augusto Morais, 81 anos; rec. Espinhoso, Vinhais, 1999

257 – A Fraga dos Mouros de Espinhoso Na aldeia de Espinhoso, num sítio elevado, conhecido como o Alto da Torre, está localizada a “Fraga dos Mouros”, onde o povo diz que está uma moura encantada a tecer fios de ouro, e que ali ficou quando os mouros fugiram destas terras. Nesse lugar há também uma gruta que dá entrada para uma grande sala, onde cabem à vontade vinte homens. Era aí que os mouros faziam vida. Diz ainda o povo que eles iam por essa gruta buscar água ao rio Rabaçal.83 Fonte: Inf.: Padre Joaquim São Vicente, 80 anos; rec.: Espinhoso, Vinhais, em 2001.

258 – Lenda do Caúnho Conta-se que há muitos anos no lugar do Caúnho, em Agrochão, no concelho de Vinhais, ouvia-se um tear a tecer no meio de uma rocha, num monte longe da povoação. Um rapaz, intrigado com o barulho, aproximou-se e viu então uma cobra enorme, com uma grande cabeleira, a qual penteava com um rico pente de ouro e diamantes. A cobra ao ver o rapaz disse-lhe: – Se me deres um beijo vou fazer-te feliz. Estou aqui encantada nesta horrível serpente, mas sou uma linda princesa moura. Aceitas dar-me um beijo? O moço aceitou. Mas ao aproximar-se sentiu tanto medo que recuou e fugiu. Ela ainda tentou apanhá-lo, mas ele foi mais ligeiro. E nas suas costas ouviu-a dizer: – Ah, ladrão, que dobraste o meu encanto! O rapaz contou na povoação o sucedido. Outros moços foram lá também, mas nenhum voltou a vê-la. Mesmo assim continua a dizer-se que em certos dias ainda há quem ouça ali o bater do tear. Fonte: Inf.: Antónia de Conceição Magro Gomes, 46 anos; rec.: Agrochão, Vinhais, 2001. 83

Esta fraga, segundo outro informante da aldeia [Graciano Augusto Morais, 81 anos, em 1999], era outrora também conhecida por “Fraga da Aliança”, e, em esclarecimento desta designação diz-se que “quando havia temporal os mouros e os cristãos refugiavam-se lá todos juntos”.

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259 – Lenda da Torca de Balmeão Junto a um lameiro, no termo de Vilar de Peregrinos, concelho de Vinhais, há um lugar que o povo conhece como a Torca de Balmeão, onde passa um pequeno ribeiro e para onde as mulheres costumavam levar o linho para ficar macio. Diz que, há muito tempo, ficou ali uma moura encantada com um bebé, que muitas vezes se ouve chorar. E também se diz que ela só se livraria do encanto se o bebé fosse baptizado, e que, para ficar baptizado, bastaria que fosse amamentado por uma mulher que também estivesse baptizada. Um dia uma mulher da aldeia foi tirar o linho da laga84, e deixou ficar o seu menino a dormir à sombra de umas árvores do lameiro enquanto ela trabalhava. Então a moura, que estava à espreita, foi lá e trocou os bebés, ficando à espera que a mulher lá fosse dar de mamar. Dali a nada, a mulher ouvia uma voz que lhe dizia: – Ó mulher do linho, vai calar o teu menino! Mas ela, como conhecia bem o filho, e como o tinha deixado bem farto, só respondia: – O meu bem calado está! E continuava o seu trabalho sem lhe dar ouvidos. Por fim a moura, cansada de ouvir o seu menino a chorar tanto, voltou a ir lá e destrocou-os. Diz-se que, por isso, ainda lá continua na Torca do Balmeão, com o filho a chorar, à espera de ser baptizado. E também se diz que o som do ribeiro, quando vem mais forte, é o choro do bebé. Fonte: Inf.: Ana Maria Fernandes, 78 anos; rec.: Vilar de Peregrinos, Vinhais,1999

260 – As mulheres do linho e as mouras Perto da aldeia de Celas, no concelho de Vinhais, há umas fragas que têm aí uns dez metros ou mais de altura, as quais o povo conhece como "Torre de Celas". Diz-se que noutros tempos viveram ali os mouros. Conta-se na aldeia que as mulheres iam para os campos mondar o linho, deixando os seus filhos sozinhos. Então as mouras da "Torre de Celas" gritavam-lhes: – Ó mulheres do linho, olhai os meninos que estão a chorar! Porque não os ides acarinhar? 84

Designação dada ao local onde o linho fica a amaciar.

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E as mulheres respondiam: – Deix'ós chorar, quem os lá deixou que os vá buscar!

E não ligavam nenhuma ao que as mouras diziam85. Fonte: Inf.: Francisco Brás, 86 anos; rec.: Celas, Vinhais, 1999.

261 – Lenda das Fragas do Carvalhal Há no termo de Vilar de Peregrinos, concelho de Vinhais, umas fragas que são conhecidas como as “Fragas do Carvalhal”. Diz a crença popular que nelas habitaram os mouros, e que um dia, não se sabe bem porquê, ficou ali uma moura encantada a tecer num tear de ouro também encantado. Diz-se ainda que quem encontrasse o tear, ficaria com ele, quebraria o encanto à moura e poderia ficar também com ela. O povo da aldeia sente que estas fragas têm grande mistério. Há lá uma entrada de forma circular, igual a um forno de lenha, e que depois se divide em vários túneis subterrâneos. Num deles se diz que está a moura a tecer. Conta-se na aldeia que, há uns anos atrás, uns rapazes, levados pela curiosidade, foram espreitar esses túneis e que meteram lá um cão para ver o que acontecia. Ora o cão demorou dois dias a sair, e diz que foi aparecer do outro lado do monte, a uns dez quilómetros dali, e que estava todo peladinho. O povo acha que foi a moura quem o pelou, e por isso acredita que ela continua lá. E há também, ainda hoje, quem diga que na manhã de S. João é costume ouvir-se lá o ruído do tear. Fonte: Inf.: Olema Natércia Gonçalves 33 anos; rec.: Vilar de Peregrinos, Vinhais, 1999.

262 – A fraga da Moura de Sobreiró de Cima Diz-se que perto de Sobreiró de Cima, num monte que fica entre esta povoação e a de Lagarelhos, no concelho de Vinhais, há a Fraga da Moura. Há até uma quadra que diz: “Sobreiró, terra tão linda, Tão linda não deve haver! E lá na fraga da Moura Há um tear a tecer!” 85

A obtenção de um sentido para esta narrativa só é possível numa dimensão pragmática que requer a sua inclusão no contexto da narrativa anterior, identificada como "Lenda da Torca de Balmeão". Depreende-se, pois, que “acarinhar” um bebé equivaleria, na prática, a amamentá-lo.

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Conta-se que um rapaz de Sobreiró de Cima ia a passar no monte e encontrou no chão um cordão de ouro. Agarrou nele e pôs-se a enrolá-lo, a enrolá-lo, e foi fazendo um novelo. Só que o cordão nunca mais acabava. E como a dada altura já era grande e pesado demais, o rapaz vai e corta-o. Nesse instante, o cordão ficou negro como carvão. E apareceu-lhe então uma rapariga desconhecida, que lhe disse: – Ah, ladrão, que me dobraste o encanto! Dito isto desapareceu. Dizem-se que se ouve ali, em certos dias, o barulho de um tear. E a tecedeira é ela, só que ninguém a consegue ver. Fonte: Inf.: Graciano Augusto Morais, 81 anos; rec.: Espinhoso, Vinhais, 1999.

263 – O tesouro da Cerca Diziam os mais antigos de Gestosa de Lomba que, num lugar chamado Cerca, onde viveram os mouros, havia um tesouro enterrado e que no livro de S. Cipriano se dizia como encontrá-lo. Ora, como só o padre sabia ler o livro, uns poucos de homens da povoação pediram-lhe que fosse lá com eles a ver se davam com o tesouro. O padre aceitou. O pior é que um deles teria de entregar, em troca, a alma ao diabo. E voluntários não os havia. Resolveram então fazer a proposta a um galego que andava a trabalhar por estes lados e que aceitou logo, pois era muito pobre e tinha a família na sua terra a passar necessidade. E lá foram numa certa noite. Os homens escavavam, escavavam, e o padre lia o livro de S. Cipriano. Às tantas, deparam com uma porta, de onde sai o diabo para levar a alma do galego. Este, coitado, vendo uma coisa tão feia à sua frente, ficou de tal modo assustado que só soube dizer: – Jesus, mi vida, mi alma és para Dios! Ditas estas palavras, a porta fechou-se de repente e o diabo desapareceu. E os homens voaram para longe, o padre também. Ficaram sem vontade de lá voltar. A cova que abriram ainda hoje se pode ver.86 Fonte: Inf.: António Joaquim, 75 anos; rec.: Gestosa de Lomba, Vinhais, 2001.

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É de assinalar que esta lenda corre, em versão quase igual, com referência ao lugar de Aguieiras (num fragueiro, onde assenta a capela de Nossa Senhora do Monte), no vizinho concelho de Mirandela. Narrada pelo Abade de Baçal, reza assim esta versão: “Um homem do povo sonhou haver lá um tesouro, e, quando o procurava, apareceu-lhe o diabo, que prometeu dar-lho em troca da alma. No dia seguinte, levou um galego que se comprometeu a dar a sua em troca de alguns cobres, mas quando surgiu o diabo em figura horrenda, assustou-se e clamou: ‘Valga-me Dios’ Imediatamente desapareceu o diabo, bem como o tesouro, já posto à vista, e os homens ‘saíram a nove’, isto é, fugiram a pés de cavalo.” (Alves, 1934a: 152).

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Índice Remissivo das Fontes do Corpus Fontes secundárias (bibliográficas): AAVV (A nossa tradição oral... uma riqueza a preservar) – n.ºs 221, 222) ADÃO, Cabral – n.º 208 ALVES, Francisco M. – n.ºs 2, 3, 4, 5, 6, 20, 21, 22, 23, 25-B, 26, 27, 28, 44, 68, 69, 70, 71-A, 73, 92 – A, 96, 97, 112, 117, 118, 174-A, 178-A, 180, 204, 207, 236, 247, 248, 252, 253-A, 254. ALVES, Francisco Manuel; et.al– n.º 235 ANDRADE, Júlio (Jornal Terra Quente) – n.º 179 AZEVEDO, Pedro A. de – n.º 226 AZEVEDO, Manuel de – n.ºs 223, 225. BARREIROS, Fernando Braga – n.ºs 128, 140, 132, 133, 134, 135, 136, 137, 138-A. COSTA, António Luis Pinto da – n.ºs 148, 149. COUTO, Artur Monteiro do – n.º 12. DIAS, Jorge – n.º 24. ERVEDOSA, Carlos M. – n.º 166-B. FERNANDES, Adelaide – n.º 161 FERREIRA, Joaquim Alves – n.ºs 50, 127. FREITAS, Adérito Medeiros – n.º 188. GRÁCIO, Joaquim – n.º 7. Jornal Notícias da Pequenada (Escola de Sanfins do Douro, Alijó) – n.º 8. Jornal O Grito da Pequenada (Escolas de V. P. Aguiar) – nºs 218, 219, 220. MIRANDA JÚNIOR, Avelino; et al. – n.ºs 13, 14, 15, 16, 17. SANTOS JÚNIOR, J.R. – n.ºs 18, 19, 131) SANTOS JÚNIOR, J. R.; et al. – n.ºs 52, 53-A, 53-B, 54 LEAL, Pinho – n.ºs 1, 42, 72-A, n.º 84, 86-B, 92-B, 130, 139,164, 171-A, 187, 203, 260. LEAL, Silva – n.ºs 46, 66 LOPO, Albino Pereira – nº 25-A. LOPO, Joaquim de Castro – 93-A MARTINS, Firmino – n.ºs 244, 245, 246, 251. MARTINS, João Vicente – n.º 249. MORAIS, Cristiano – n.ºs 205, 206. NETO, Joaquim Maria – n.º 35. OLIVEIRA, Luis Jales de – n.ºs 124, 125, 126 PARAFITA, Alexandre – n.ºs 72-B, 9, 93-B, 165, 166-A, 167, 174-A, 227, 228, 253-B, 255, 94-C, 171B, 233, 234.

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PEREIRA, Pe. João Barroso – n.º 51. PEREIRA, José Manuel Martins – n.ºs 86-A, 113, 114, 115, 116, 175, 176, 177. PIGNATELLI, Inácio N. – n.º 178-B. SAAVEDRA, José Augusto Pinto da Cunha – n.º 163. TEIXEIRA, Flora – n.º 43. TEIXEIRA, António J. – n.º 67. VASCONCELLOS, J. Leite de. – n.ºs 45, 86-C, 91, 92-C, 95, 173-A, 152.

Fontes primárias (informantes): Alice Baptista Martins (Avelanoso, Vimioso) – n.º 237 Alzira Correia Alves da Veiga (Bagueixe, Macedo de Cavaleiros) – n.º 83 Ana Barroso (Penedones, Montalegre) – n.ºs 138-C, 147 Ana Batista (Vale de Telhas, Mirandela) – n.º 104 Ana Lázaro (Morais, Macedo de Cavaleiros) – n.º 82 Ana Maria Amaral Faria (Bragança) n.ºs 37, 38 Ana Maria Bernardo (Torre de Dona Chama, Mirandela) – n.º 94-B Ana Maria Fernandes (Vilar de Peregrinos, Vinhais) – n.º 259 Ângelo José Morais (Macedo de Cavaleiros) – n.ºs 77, 78 Antónia de Conceição Magro Gomes (Agrochão, Vinhais) – n.º 258 António Augusto Fernandes (Algoso, Vimioso) – n.º 238, 243 António Carlos Correia da Silva (Sabrosa) – n.ºs 169, 170 António dos Santos Dias (Carviçais, Torre de Moncorvo) – n.º 181, 182 António Felisberto Carrasqueira (Felgar, Moncorvo) – n.º 186 António João (S. Pedro de Sarracenos, Bragança) – nº 29 António Joaquim Gonçalves (Travassos da Chã, Montalegre) –n.º 138-B António Joaquim (Gestosa de Lomba, Vinhais)– n.º 263 António Nascimento Moreiras (Mogadouro) – n.ºs 122, 123 António Teixeira Rodrigues (Bilhó, Mondim de Basto) – n.º 129 Belizanda dos Anjos (Grijó, Macedo de Cavaleiros) – n.º 80 Bernardino Vieira de Oliveira (Barqueiros, Mesão Frio) – n.º 85 Carminda Aurora Morais (Vila Flor) – n.º 216 Ermelinda Olívia Ferreira (Ferreira, Macedo de Cavaleiros) – n.º 71-B Esmeralda Nazaré Silva (Benlhevai, Vila Flor) – n.º 212 Eugénia Gonçalo (Nozelos, Macedo de Cavaleiros) – n.º 75 Filomena Morais Pereira da Costa (Vale Frechoso, Vila Flor) – n.º 213 Francisca Teresa Fernandes Moreno (Bragança) – n.ºs 39, 242 Francisco Brás, 86 anos (Celas, Vinhais) – n.º 260 Francisco Gomes Carvalho (Bairro da Caixa, Chaves) – n.º 65 Francisco Morais (S. Miguel de Lobrigos, Santa Marta de Penaguião) – n.º 173 Gabriel Coelhoso Moreira (Vila Verdinho, Mirandela) – n.º 108 Graciano Augusto Morais (Espinhoso, Vinhais) – n.ºs 256, 262 Idalina da Conceição Cabages (Ribeirinha, Mirandela) – n.ºs 110, 111-A Ilda de Jesus Paredes (Peredo, Macedo de Cavaleiros) – n.º 74 Ilda Queiroga (Argeriz, Valpaços) – n.º 202 Inês Rosa Fundo Afonso Martins (Vimioso) – n.º 239, 240, 241 José Cipreste Vaz (Tourém, Montalegre) – n.º 141

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José Gabriel Borges (Ribeira de Pena) – n.º 162 Júlio César Fernandes (Beçós - Salto, Montalegre) – n.º 142 Laurentina Carneiro (Horta da Vilariça, T. de Moncorvo) – n.º 178-D Lídia da Assunção Caseiro (Mirandela) – nºs – 106, 107 Lídia Martins (Valverde, Mogadouro) – n.º 121 Lúcia Gonçalves (Castro de Avelãs, Bragança) – n.º 32 Lúcia Pereira (Junqueira, Valpaços) – n.º 199 Luzia Marcelino (Seixo de Manhoses, Vila Flor) n.º 217 Mabilde da Conceição Afonso (Macedo de Cavaleiros) – nºs 72-C, 76-A, 101 Manuel Alcino Freitas (Ponte, Vila Real) – n.º 224 Manuel Carvalho (Carlão, Alijó– n.º 11 Manuel Rodrigues (Arcas, Macedo de Cavaleiros) n.º 76-B Maria Ângela Almeida (Santa Comba de Rossas, Bragança) – n.º 41 Maria Antónia Machado Ferro (Santa Comba de Rossas, Bragança) – n.º 40 Maria Arminda Teixeira Rodrigues (Carrazeda de Ansiães) – n.º 47 Maria Beatriz Pires Pereira (Vilar de Ouro, Mirandela) – n.º 94-A Maria Celeste da Silva (Pastoria, Chaves) – n.º 59-A Maria da Assunção de Azevedo Botelho (Bujões - Abaças, Vila Real) n.ºs 153, 154 Maria da Conceição Barroso Pereira da Lama (Penedones, Montalegre) – n.º 144 Maria da Conceição Félix Fonseca (Zedes, Carrazeda de Ansiães) – nº 43-B Maria da Conceição Ferreira (Felgar, Torre de Moncorvo) – n.º 185 Maria da Graça Fialho Ferreira Garcia (Mirandela) – n.º 103 Maria da Graça Oliveira Gomes (Lebução, Valpaços) – n.ºs 55, 56, 57,58, 63, 189,190, 191, 192, 193, 194, 195, 196, 198, 200, 201. Maria de Fátima Magalhães Fernandes Alves (Beçós - Seara, Montalegre) – n.º 143 Maria de Fátima Teixeira Colmeais (Mirandela) – n.º 100 Maria do Carmo Lopes (Bragança) – nºs 36, 90 Maria do Rosário Pinto (Macedo de Cavaleiros) – n.º 81-B Maria Elisa Belchior (Mirandela) – n.ºs 98, 99 Maria Elisabete Lopes (Valnogueiras, Vila Real) – n.ºs 230, 231, 232 Maria Emília –Tia Locas (Pai Torto, Mirandela) – n.º 92-D Maria Emília Alves (Bragança) – n.º 35-B Maria Ermelinda Barroso Branco dos Santos (Parafita, Montalegre) – n.º 145 Maria Estefânia (Valbom da Trindade, Vila Flor) – n.º 215-A Maria Eugénia Mesquita Cabanal (Mogadouro) – n.º 120 Maria Fernanda Farinha Martins (Chaves) – n.ºs 61,62, 64 Maria Fernanda M. Cardoso Dias (Alijó) – n.º 10 Maria Helena Moreira Parafita (Sabrosa) – n.º 168 Maria Hermínia Tomás (Chaves) – n.º 60 Maria Inês Sousa (Vale de Telhas, Mirandela) – n.º 105 Maria Isabel Bessa Breia (Murça) – n.ºs 150, 151 Maria Isabel da Silva Barja (Chaves) – n.º 59-B Maria Isabel Fontes (Vila Flor) – n.º 215-B Maria Isabel Nantes (Poiares, Peso da Régua) – n.ºs 155, 156, 157, 158, 159 Maria José Santos Salgueiro (Bragança) – n.ºs 25D, 34 Maria José Teixeira Almeida (Vila Flor) – n.ºs 48, 49, 214 Maria Lúcia Branco (Vila Flor) – n.ºs 210, 211 Maria Lucília Gomes Figueiredo (Montalegre) – n.º 146 Maria Luis Gonçalves (Assares, Vila Flor) – n.º 209 Maria Olímpia Morais (Mirandela) – n.º 102 Maria Otília Figueiredo (Moura Morta, Régua) – n.º 160

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Maria Rosa Teixeira, 87 anos (Lebução, Valpaços) – n.º 197 Maria Teresa Afonso Malta (Macedo de Cavaleiros) – n.º 79 Maria Virgínia Pires Torres (Castelãos, Macedo de Cavaleiros) – n.º 81-A Maria Zita Baptista (Brunhoso, Mogadouro) – n.º 119 Neuza da Conceição Estevinho (Bragança) – n.º 33 Nilza da Conceição Alves Correia (Ludares, Vila Real) – n.º 229 Olema Natércia Gonçalves (Vilar de Peregrinos, Vinhais) – n.º 261 Olímpia da Ressureição (Vila Verdinho, Mirandela) – n.º 109 Orquídea da Conceição Cubeiro Xavier (Miranda do Douro) – n.ºs 86-D, 87, 88, 89 Padre António Lourenço Fontes (Montalegre) – n.º 139-B Padre Joaquim São Vicente (Espinhoso, Vinhais) – n.º 257 Padre Manuel Joaquim Mourão (Sever, Santa Marta de Penaguião) – n.º 172 Raquel de Lassalete Vaz Rodrigues (Bragança) – n.ºs 30, 31 Rosa Abade (Junqueira, T. de Moncorvo) – n.º 178-C Sílvia de Jesus Costa Felgueiras (Mirandela) – n.º 111-B Teresa da Conceição Lopes (Larinho, Torre de Moncorvo) – n.º 183 Virgílio do Vale (Vila Boa, Vinhais) – n.º 25-C Virgínia da Conceição de Castro (Torre de Moncorvo) – n.º 184

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