Desempenho de Fundações de Edifícios

April 18, 2019 | Author: Kayto Dutra | Category: Building, Coefficient Of Variation, Stress (Mechanics), Foundation (Engineering), Steel
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Desempenho de Fundações de Edifícios...

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Desempenho de Fundações de Edifícios Alexandre Duarte Gusmão Escola Politécnica – Universidade de Pernambuco e CEFET/PE, Recife, Brasil RESUMO: O desempenho de uma edificação é governado pela interação entre a superestrutura, infra-estrutura e terreno de fundação, em um complexo mecanismo denominado de interação soloestrutura – ISE. Na prática, no entanto, esta interação é comumente desprezada, com os projetos de fundações e estrutural sendo desenvolvidos sem se levar em consideração tal mecanismo. O artigo apresenta as principais técnicas de monitoramento de edifícios, bem como os efeitos da ISE no seu desempenho. Vários casos de prédios monitorados são apresentados. Conclui-se que tanto a ISE quanto monitoramento de recalques já podem ser incorporados à prática de projetos e controle tecnológico da execução de edificações. PALAVRAS-CHAVE: Recalques, Fundações, Monitoramento, Interação Solo-Estrutura. 1

INTRODUÇÃO

As modernas teorias de análise estrutural consideram as edificações como sendo constituídas por três partes: (i) superestrutura, que corresponde à parte da edificação que será utilizada após a sua construção, e é constituída  por paredes, lajes, vigas e pilares; (ii) infraestrutura, que é constituída pelos elementos que transferem o carregamento da superestrutura  para o terreno de fundação (sapatas, blocos, estacas e cintas); (iii) terreno de fundação, que tem como objetivo absorver os esforços desenvolvidos na superestrutura (Fig. 1). O desempenho de uma edificação é na realidade governado pela interação entre estas três partes, em um complexo mecanismo denominado de interação solo-estrutura – ISE.  Na prática, no entanto, esta interação é comumente desprezada, com os projetos de fundações e estrutural sendo desenvolvidos sem se levar em consideração tal mecanismo (Gusmão, 1990). Em um projeto estrutural convencional de uma edificação, é normalmente assumida a hipótese dos seus apoios serem indeslocáveis, ou seja, não haver recalques. Em função disto, tanto o cálculo das cargas na fundação, como o dimensionamento dos elementos estruturais são feitos com base nesta hipótese. Por outro lado, o  projeto de fundações convencional é desenvolvido levando-se em consideração apenas as cargas nos apoios (obtidas no projeto

estrutural convencional), e as propriedades geotécnicas do terreno, desprezando-se o efeito da rigidez da estrutura. Com isto, se cria um verdadeiro fosso entre o terreno da fundação e a estrutura (Fig. 2). Também na prática pouco se tem monitorado o desempenho das edificações, mas apenas o desempenho das suas partes, que não reproduzem necessariamente o comportamento do “todo”, ou do “sistema” como afirma o Prof.  Nelson Aoki (Tabela 1).

Figura 1. Partes de uma edificação.

2

? INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA

V1 V2 V3 V4

V1 V2 V3 V4

?

S1 S2 S3 S4

PROJETO DA SUPERESTRUTURA

PROJETO DAS FUNDAÇÕES

Figura 2. Hipóteses básicas do projeto convencional. Tabela 1. Monitoramento do desempenho das partes da edificação. Parte Monitoramento / Ensaios -Controle dos materiais (alvenarias, Superestrutura concreto, aço, etc) -Controle dos processos construtivos (dimensões, prumos, etc) -Ensaios de placa Infra-Estrutura -Provas de carga em estacas -Controles de execução (negas, repique elástico, etc) Terreno de -Ensaios de laboratório Fundação -Ensaios de campo

Outro aspecto relevante, é que ninguém “compra” as partes de uma edificação, mas o seu todo, que na prática significa o seu desempenho (Fig. 3). É fundamental que também se faça o monitoramento do desempenho da edificação, ou seja, medição de cargas nos apoios e movimentos da fundação. Este trabalho tem como objetivo apresentar as principais técnicas de monitoramento de edificações, os efeitos da ISE no seu desempenho, e ainda vários exemplos de obras em diferentes condições de subsolo. SUPERESTRUTURA

INFRAESTRUTURA

TERRENO DE FUNDAÇÃO PARTES

CLIENTE $$$$

EDIFICAÇÃO

TODO

Figura 3. “Partes” versus “todo” de uma edificação.

MONITORAMENTO DE EDIFÍCIOS

2.1 Trabalhos mais Recentes O número de trabalhos publicados na literatura técnica sobre monitoramento de edifícios e ISE é muito pequeno se comparado com outros temas, tais como provas de carga, ensaios, etc. Para comprovar tal hipótese, foi feita uma revisão bibliográfica nos principais eventos freqüentados pela comunidade geotécnica  brasileira, e na Revista Solos & Rochas. Foram consideradas apenas as últimas edições dos eventos (Tab. 2). A Revista Solos & Rochas da ABMS, por exemplo, em quase 30 anos só publicou 04 artigos sobre monitoramento de edifícios, o que é muito pouco para a relevância do assunto. Há ainda várias dissertações e teses desenvolvidas nas universidades brasileiras nos últimos anos (Tabela 3). Certamente deve haver outros trabalhos não pesquisados pelo autor. Tabela 2. Relação de trabalhos recentes sobre monitoramento de edificações e ISE em Periódicos e Eventos. Periódico / Evento No. de Trabalhos Revista Solos & Rochas (1978 a 04 2005) Simpósio sobre ISE – São Carlos 07 (2000) Simpósio sobre Edifícios da Orla 04 de Santos – Santos (2003) INFOGEO – Curitiba (2001) 01 INFOGEO – Belo Horizonte 03 (2005) SEFE – São Paulo (1996) -SEFE – São Paulo (2000) 07 SEFE – São Paulo (2004) 05 COBRAMSEG – Brasília (1998) 03 COBRAMSEG – São Paulo 05 (2002) PCSMGE – Foz do Iguaçu 02 (1999) PCSMGE – Cambridge (2003) 02 ICSMGE – Hamburgo (1997) 04 ICSMGE – Istambul (2001) -ICSMGE – Osaka (2005) 04

Tabela 3. Relação de dissertações e teses recentes sobre monitoramento de edificações e ISE. Universidade Referência - Costa (2003) UFF - Rosa (2005) - Silva (2005) COPPE/UFRJ - Gonçalves (2004) UENF - Crespo (2004) - Reis (2000) - Iwamoto (2000) - Mendonça (2000) USP/SC - Holanda Jr. (2002) - Jordão (2003) - Ribeiro (2005) - Russo Neto (2005) UnB -Soares (2004) USP/SP - Cardozo (2002) UFPB/CG -Lucena (2003) UFPE - Milfond (1999) - Fonte (2000)

A Tabela 4 apresenta um resumo dos  principais trabalhos nas fontes consultadas. Algumas observações podem ser feitas: (i) a maioria dos casos envolve fundações superficiais (sapatas e radier); (ii) há poucos casos de prédios de pequeno porte (abaixo de 05 pavimentos) e em alvenaria estrutural; (iii) a maior parte dos trabalhos brasileiros é da Região Nordeste (cerca de 40%). Atualmente o monitoramento de edificações ainda se restringe apenas à medição dos recalques. Ainda não se tem uma metodologia suficientemente difundida para medição das cargas nos apoios dos prédios, mas há trabalhos recentes promissores, tal como o apresentado  por Russo Neto (2005). O monitoramento de recalques no Brasil sempre esteve associado a obras com desempenho insatisfatório, com  patologias e muitas vezes necessidade de reforço das fundações. Neste sentido, parece que os problemas dos prédios em Santos causaram “traumas” nos nossos engenheiros, que muitas vezes preferem a máxima de que “o que os olhos não vêem, o coração não sente...”, como se o fato de medir ou não os recalques  pudesse influenciar o desempenho do prédio.  No entanto, há que se considerar, como destacam Danziger et al. (2000a), que as medições de recalques durante longos períodos nas fundações de obras em Santos constituem importantes contribuições para a Engenharia Brasileira, revelando o comportamento real

destas obras e norteando os projetos mais recentes de fundações (Machado, 1958). Um caso interessante de mudança desse  paradigma ocorreu em Recife, que é hoje o lugar onde mais se mede recalque de prédios no Brasil. Desde o início da Década de 90 do século passado, que foi feito um trabalho de conscientização da necessidade do monitoramento dos recalques, usando-se de algumas interessantes estratégias: (i) o monitoramento deve ser encarado como um controle tecnológico da obra, a exemplo de tantos outros, como controle da resistência do concreto; (ii) o monitoramento permite um melhor entendimento do comportamento de uma edificação, e uma retroanálise dos  parâmetros dos solos, o que tem conduzido a  projetos mais arrojados (e nem por isso menos seguros); (iii) o monitoramento permite identificar com mais segurança as causas de eventuais patologias que possam surgir nos  prédios, onde normalmente a fundação é colocada em suspeita (neste caso, quem tem exigido o monitoramento são as empresa executoras de fundações). Uma pesquisa no banco de dados da empresa de consultoria do presente autor mostrou que entre 1989 e 2005 foram monitorados 75 edifícios apenas em Recife, e que em apenas 11  prédios o monitoramento foi motivado pelo aparecimento de patologias, as quais nem sempre eram decorrentes de movimentos da fundação. Atualmente o monitoramento de recalques já está inclusive incorporado aos sistemas de qualidade de muitas construtoras em Recife. Um outro aspecto interessante é que o monitoramento representa um custo muito  baixo em comparação com o custo total da obra, ou mesmo em comparação com o custo de outros ensaios e controles (Tabela 5). 2.2 Medição de Recalques O equipamento empregado para medida dos recalques é bastante simples, sendo constituído  por pinos; referência de nível (RN); nível; e mira.

Tabela 4. Resumo dos trabalhos publicados sobre monitoramento e ISE em vários periódicos / eventos. Estrutura Tipo de Fundação Previsão de Recalques Tipo No. de Convencional Com ISE RN Pavimentos CA 15 Sapata Sim Não Vizinho CA 12 Sapata Sim Não NI CA 02 Sapata Sim Sim NI CA 19 Sapata Sim Sim NI CA 17 Sapata Não Não Bench-Mark CA 09 Sapata Sim Não Vizinho CA 09 Sapata Sim Não Vizinho CA 12 Sapata Sim Não Vizinho CA 12 Tubulão Sim Sim NI CA -CA CA CA CA CA CA CA CA CA

03 -20 15 08/11 12 (3x) 17 10 18 11 07

Sapata -Sapata Sapata Tubulão / Sapata Sapata Sapatas / Estacões Sapata Sapata Sapata Sapata

Não -Não Sim Sim Sim Não Não Não Não Sim

Não -Não Não Sim Sim Não Não Não Não Não

CA -CA CA -CA CA ALV CA

12 -12 (3x) 13 -12 13 (8x) 04 04/08/16/32

Sapata / Sangria -Sapata Hélice contínua -Estaca Franki Sapata Estacas escavadas --

Não -Sim Não -Não Não Não Sim

CA CA CA

08/11 08 15

Tubulão / Sapata Tubulão Sapata

Sim Não Não

Monitoramento Medição de Carga Não Não Não Não Não Não Não Não Não

Recalque (mm) 103 (máximo) 351,8 (médio) 175,5 (médio) -11,7 (máximo) 14,5 (máximo) 13,5 (máximo) 7,5 (máximo) 9,0 (máximo)

Não -Não Não Não Não Não Não Não Não  Não

4,8 (máximo) -12,0 (máximo) 105,5 (máximo) ---80 (máximo) 17 (máximo) 83 (máximo) 135 (máximo)

Não -Sim Sim -Não Não Não Sim

Vizinho -Vizinho Vizinho NI NI NI NI NI NI BenchMark NI -NI Vizinho -Vizinho Bench-Mark Bench-Mark --

Não -Não Não -Não Não Não Não

500 (máximo) --42 (máximo) -32,6 (máximo) 15 a 480 (médio) 45 (máximo) --

Sim Não Não

NI Vizinho Vizinho

Não Não Não

-4,1 (máximo) 93 (máximo)

Referência Gusmão (1994) Gusmão (1994) Gusmão (1994) Moura (1999) Castello et al. (2001) Lucena et al. (2004) Lucena et al. (2004) Lucena et al. (2004) Antunes e Iwamoto (2000) Danziger et al. (2000b) Fonte et al. (2000) Gusmão et al. (2000a) Gusmão et al. (2000b) Mendonça e Aoki (2000ª) Reis e Aoki (2000) Maffei et al. (2003) Campos (2003) Campos (2003) Campos (2003) Seixas e Gonçalves (2003) Falconi et al. (2003) Fonte et al. (2001) Reis e Aoki (2005) Maia et al. (2005a) Fonte e Fonte (2005) Danziger et al. (2000ª) Pacheco et al. (2000) Niyama et al. (2000) Madureira e Bezerra (2000) Mendonça e Aoki (2000b) Lobo et al. (2000) Gusmão (2000)

CA 20 Estaca Franki Não Não Vizinho Não 12 (máximo) CA = concreto armado; ALV = alvenaria estrutural; NI = não informado Tabela 4. Resumo dos trabalhos publicados sobre monitoramento e ISE em vários periódicos / eventos (continuação) Estrutura Tipo de Fundação Previsão de Recalques Monitoramento Tipo No. de Convencional Com ISE RN Medição de Recalque Pavimentos Carga (mm) CA 13 Estaca Hélice Não Não Vizinho Não 42 (máximo) CA 18 Sapata Sim Não Vizinho Não 14,5 (máximo) CA 05 Sapata Não Não NI Não 400 (máximo) CA 11/18 Sapata Sim Não -Não -CA 03 Sapata Sim Não Vizinho Não 6,74 (médio) CA 15 Sapata Não Não Vizinho Não 42 (máximo) CA

18

Sapata

Não

Não

Vizinho

Não

14,5 (máximo)

CA CA CA CA

17 13 04 15/13/20

Sapata Tubulão Sapata Sapata

Sim Não Sim Não

Não Não Não Não

NI Vizinho Bench-Mark Vizinho

Não Não Não Não

CA

--

Sapata

Não

Não

NI

Não

500 (máximo) 4,8 (máximo) 305 (máximo) 105/500/7,5 (máximo) --

CA

24

Sapata

Não

Não

Vizinho

Não

21 (máximo)

CA CA CA ALV CA

30 28 -04 15

Sapata Estaca Pré-moldada -Sapata Sapata

Não Não -Sim Não

Não Não -Não Não

NI NI -Bench-Mark Vizinho

Não Não Sim Não Não

26 (máximo) 21 (máximo) -444 (máximo) 93 (máximo)

CA CA

14 07

Tubulão Sapata

Não Sim

Não Não

Vizinho Bench-Mark

Não Não

9,1 (máximo) 115 (máximo)

CA CA CA CA

vários 12 25 18

-Estaca Franki Estaca “T” Estaca Pré-moldada

-Não Sim Sim

-Não Não Sim

-NI NI Bench-Mark

-Sim Não Não

Banco de dados 26,6 (máximo) 34,7 (máximo) --

CA

24

Radier Estaqueado

Sim

Não

NI

Não

31,1 (médio)

Gusmão (2000)

Referência Maia et al. (2004) Cavalcante et al. (2004) Oliveira e Oliveira (2004) Gonçalves (2004) Gonçalves et al. (2004) Gusmão Filho et al. (1998) Gusmão Filho et al. (1998) Mendonça et al. (1998) Lobo et al. (1998) Dias e Moraes (1998) Oliveira et al. (2002) Gonçalves e Cardozo (2002) Gusmão e Calado Jr. (2002) Soares e Soares (2002) Soares e Soares (2002) Russo Neto et al. (2002) Pedreira et al. (2002) Gusmão Filho et al. (1999) Lobo et al. (1999) Oliveira e Gonçalves (2003) Gusmão et al. (2003) Danziger et al. (1997) Décourt (1997) Gusmão Filho e Guimarães (1997) Yu-Kang et al. (1997)

CA 16 Radier Sim CA 40 Radier Sim CA 17 Radier Sim CA 13 Estaca Hélice Não CA = concreto armado; ALV = alvenaria estrutural; NI = não informado

Sim Sim Não Não

NI NI NI Vizinho

Não Não Não Não

182 (máximo) 2,69 (máximo) 28 (máximo) 42 (máximo)

Paramonov et al. (2005) Justo et al. (2005) Reul e Ripper (2005) Maia et al. (2005b)

Tabela 5. Comparação de custos entre o monitoramento de recalques e outros controles geotécnicos. Serviço Custo* (R$) -Prova de carga estática em - 12.000,00 a estaca (carga de ensaio de 3 MN) 15.000,00 -Prova de carga dinâmica (05 - 5.000,00 a ensaios + 02 análises capwap) 8.000,00 -Medição de recalques - 4.000,00** (nivelamento + 06 leituras) *estimado em Recife (1 US$ = R$ 2,30) **custo diluído ao longo do tempo de construção

2.2.1 Pinos Figura 4. Detalhe do pino usado em Recife.

Há vários tipos de pinos que podem ser usados no controle de recalques. Normalmente são fabricados em aço inoxidável, e usam um sistema tipo macho e fêmea. Inicialmente o elemento fêmea é fixado com material colante no ponto a ser monitorado (por exemplo, a face de um pilar). Por ocasião de cada medição, é introduzido o elemento macho através de rosca ao elemento fêmea. O macho deve possuir na sua extremidade uma base esférica, onde a mira se apóia. A Figura 4 mostra o pino que tem sido usado em Recife (notar que o macho está sem a sua base esférica). Este pino custa cerca de R$ 3,00 em Recife, mais R$ 10,00 de instalação  por unidade. Danziger et al. (1997) e Danziger et al. (2000a) apresentaram pinos fabricados em aço inoxidável, que são diferentes dos pinos habitualmente usados, em que o macho é fixado através de rosca à fêmea. O sistema usado é simplesmente encaixado, de forma a propiciar melhor acurácia aos resultados, uma vez que as medições são feitas com o macho sempre na mesma posição, diferentemente dos pinos tradicionais. Os pinos de encaixe têm a desvantagem, entretanto, de possuírem um diâmetro maior que os de rosca, o que torna um  pouco mais trabalhosa a sua instalação, além do maior custo.

Este último tipo está mais sujeito a deslocamentos provocados por várias causas, tais como choques, vibrações decorrentes de tráfego de veículos, etc. Este problema, no entanto, pode ser minimizado através da escolha do ponto de instalação. Em qualquer caso, é recomendável que sejam instalados pelo menos dois RNs. Ressalta-se, ainda, que o RN superficial sempre medirá os recalques diferenciais (que são os mais importantes), independente de se movimentar ou não. O grande problema do bench-mark é o seu elevado custo, o que normalmente duplica ou triplica o custo do monitoramento. Em Recife, um bench-mark custa entre R$ 150,00 e 200,00  por metro linear, dependendo da profundidade.  Na Tabela 4, pode-se observar que a maioria dos prédios monitorados usou como RN pontos vizinhos ao próprio prédio. 2.2.3 Nível O nível deve ser ótico e dotado de placa plano  paralela. É importante que o instrumento seja regularmente aferido por empresas especializadas.

2.2.2 Referência de Nível (RN)

2.2.4 Mira

A referência de nível ideal é aquela que se apresenta como indeslocável. Pode ser profunda (conhecida como bench-mark) ou superficial.

A mira deve ser graduada em chapa de invar,  para diminuir os efeitos das variações térmicas, e deve ser posicionada nivelada no pino (Fig.5).

Tabela 6. Freqüência do monitoramento de recalques. Etapa No. de Medições -Até a concretagem da 1ª laje Instalação dos  pinos +  Nivelamento -Até a concretagem da coberta +02 -Até o final do assentamento da +01 alvenaria -Até o final do revestimento interno +01 e externo: -Até o final do assentamento de piso +01 -Antes da entrega do prédio +01 Total 07

2.3 Medição de Cargas nos Apoios

Figura 5. Detalhe da mira apoiada no elemento macho.

2.2.5 Frequência do Monitoramento  Não há uma regra geral para se estabelecer a freqüência do monitoramento, nem a quantidade de pontos a serem monitorados. Como geralmente o custo dos pinos e das medições é baixo, é recomendável que todos os  pilares da estrutura principal do prédio sejam instrumentados. Caso não seja possível, deve ser feita uma distribuição de pinos que contemple toda a projeção do prédio.  Na Tabela 6, há uma sugestão de freqüência do monitoramento, que deve ser adaptada para cada caso. De um modo geral, deve-se concentrar um maior número de medições nas etapas de concretagem da estrutura e assentamento de alvenaria, por representarem cerca de 60% do carregamento de um prédio (excluindo-se os efeitos da ação do vento). É importante que os pinos sejam preservados após a ocupação do prédio, para permitir eventuais nivelamentos que sejam necessários. Danziger et al. (2000a) apresentam um exemplo de monitoramento, onde foram feitas seis medições mais o nivelamento.

A medição de carga nos apoios das edificações raramente é feita na prática (Danziger et al., 1997; Russo Neto et al., 2002; Russo Neto, 2005). A medição envolve muitas incertezas, além de exigir pessoal mais qualificado. A medição de carga é sempre feita de maneira indireta (células de carga e medidores de deformação), ou seja, mede-se a deformação em uma determinada seção, e a partir da relação tensão-deformação do material, chega-se à carga atuante.  No caso específico do concreto armado, que no nosso país representa a maior parte dos casos de edificações, o problema passa a ser mais complicado, tendo em vista a heterogeneidade da seção, onde o aço e o concreto têm  propriedades bem diferentes. As deformações são provocadas não apenas pela variação das tensões, mas há ainda que considerar os seguintes efeitos: (i) fluência, que é a deformação sob carga constante; (ii) retração do concreto decorrente da variação de umidade; (iii) variação térmica. O trabalho brasileiro mais completo sobre medição de carga em pilares é a tese de doutoramento de Russo Neto (2005), que desenvolveu um extensômetro mecânico de haste para medição da deformação dos pilares. O autor apresenta o caso da construção de um  prédio com 04 pavimentos, com estrutura de concreto armado pré-fabricado. Foram feitas medições de cargas e recalques durante toda a construção.

A Figura 6 apresenta a evolução da carga atuante em um pilar no período de construção do prédio. A carga teórica foi obtida através da modelagem da estrutura pelo programa SAP2000. Observa-se uma perfeita concordância entre os valores medidos e calculados. 3

INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA

3.1 Generalidades Como foi visto anteriormente, nos projetos convencionais de edificações são desprezados os efeitos da ISE provocados pela deformação do terreno e pela rigidez da estrutura. Diversos trabalhos têm mostrado que a ISE provoca uma redistribuição de esforços nos elementos estruturais, e em especial nas cargas nos pilares (Chamecki, 1954; Poulos, 1975; Gusmão, 1990). Esta redistribuição depende, entre coisas, da rigidez relativa estrutura-solo e da deformada de recalques da edificação. Uma outra conseqüência importante decorrente da ISE, é que a solidariedade existente entre os elementos da estrutura confere à mesma uma considerável rigidez, restringindo o movimento relativo entre os apoios, e fazendo com que os recalques diferenciais sejam menores que os estimados. Por isso, a consideração da ISE pode viabilizar  projetos de fundações que não seriam aceitos  por uma análise convencional.

Figura 6. Evolução da carga de um pilar ao longo da construção (Russo Neto, 2005). Tabela 8. Efeitos da interação solo-estrutura em edifícios.

A Tabela 8 mostra as conseqüências destas hipóteses.

principais

3.2 Movimentos da Fundação Burland e Wroth (1974) propuseram um conjunto consistente de definições para descrever os movimentos da fundação (Figura 7  – notar que o recalque está representado pela letra W). Um dos conceitos mais usados na  previsão de patologias em edificações decorrentes de movimentos da fundação é a rotação relativa ou distorção angular ( b).  No caso da inclinação ser nula, o seu valor coincide com o da rotação ( Q), que pode ser calculada pela relação entre o recalque diferencial entre dois pontos e o seu vão, facilitando os cálculos.

Figura 7. Movimentos da fundação (Gusmão, 1990).

Hipótese

Conseqüências

-Apoios são considerados indeslocáveis.

-Redistribuição de cargas e esforços nos elementos estruturais, especialmente vigas e pilares. -Alívio de carga nos pilares mais carregados e sobrecarga nos pilares menos carregados. -Pode haver danos nos elementos estruturais. -Apoios podem recalcar de maneira independente uns -A ligação entre os elementos estruturais confere à dos outros. estrutura uma rigidez, que restringe os recalques diferenciais. -A deformada de recalques medida é mais suave que a estimada convencionalmente. -Há uma tendência de uniformização dos recalques. -O carregamento do prédio só ocorre ao final da sua -À medida que a estrutura vai sendo construída, vai construção. havendo um aumento do seu carregamento, e dos recalques absolutos. -Há, no entanto, um aumento da rigidez da estrutura, que faz com que haja uma tendência de uniformização dos recalques. -Há uma altura limite, correspondente aos cinco primeiros  pavimentos, em que praticamente não há mais aumento da rigidez para fins de uniformização dos recalques.

3.3 Avaliação dos Efeitos da ISE Gusmão (1994) mostrou que se pode analisar o desempenho de uma edificação qualquer o associando a dois diferentes modelos: um que represente o valor médio dos recalques (tensãodeformação do terreno); e outro que represente a sua distribuição (interação solo-estrutura), como mostra a Figura 8. A ISE influencia a deformada de recalques da edificação, fazendo com que fique mais suave, embora o recalque absoluto médio seja independente. Com isto, pode-se admitir que o recalque absoluto médio seja função apenas do carregamento total da estrutura e das  propriedades de deformação do terreno. Conseqüentemente, a diferença entre os valores do recalque médio medido e estimado pode ser associada à representatividade do modelo tensão-deformação adotado (Fig. 9). A distribuição dos recalques e, consequentemente a ISE, pode ser associada a sua dispersão, representada através do coeficiente de variação CV (relação entre o desvio-padrão e a média do recalque absoluto). Com isto, a diferença entre os valores do coeficiente de variação medido e estimado pode ser associada à representatividade do modelo de ISE adotado.

Si = S + Si S S

= f ( tensão-deformação )

Si = f ( interação solo-estru tura )

ESTIMADO CONVENCIONALMENTE MEDIDO

Figura 8. Modelos para estimativa do recalque de edificações (Gusmão, 1994).

Figura 9. Influência da rigidez na distribuição dos recalques de edificações (Gusmão, 1994).

A Tabela 10 mostra algumas características referentes à distribuição dos recalques estimados e medidos. Os recalques médios têm a mesma ordem de grandeza, revelando uma  boa representatividade do modelo tensãodeformação adotado na previsão dos recalques.  No entanto, como era de se esperar, o coeficiente de variação dos recalques medidos é menor que o dos recalques estimados, devido à influência da rigidez da estrutura na tendência à uniformização dos recalques. 3.4 Efeito da ISE nos Recalques Diversos trabalhos têm mostrado que os recalques total e diferencial máximo diminuem de grandeza com o aumento da rigidez relativa estrutura-solo, sendo que os recalques diferenciais são mais influenciados por essa rigidez que os recalques absolutos (Meyerhof, 1953; Barata, 1986; Gusmão, 1990). O recalque médio é praticamente independente da rigidez, ou seja, independe da consideração ou não da ISE.  No Caso 1, como o recalque médio estimado e medido têm a mesma ordem de grandeza,  pode-se compará-los diretamente para avaliar os efeitos da ISE (Fig. 14). Observa-se que para os pilares em que os recalques estimados são inferiores ao valor médio (linha tracejada), os recalques estimados são menores que os medidos. Já para os pilares que têm recalque  previsto acima da média, ocorre o inverso, ou seja, os recalques estimados são maiores que os medidos. Isso mostra que à medida que os recalques ocorrem, há uma transferência de carga dos pilares mais carregados (alívio) para os menos carregados (acréscimo). Tabela 10. Características da distribuição dos recalques. Recalques Característica Estimado sem Medido ISE Média 79,2 82,3 (mm) Desvio-padrão 15,0 13,4 (mm) Coeficiente de 0,189 0,162 variação – CV

A Figura 15 apresenta a comparação entre os recalques diferenciais (ou rotação) estimados sem ISE e medidos (desprezou-se a inclinação de corpo rígido do prédio). Observa-se que os recalques diferenciais medidos são menores que os estimados, e que a previsão sem ISE era que várias rotações atingissem valores maiores que 1/300, que é o limite de início de fissuramento de painéis de alvenaria em estruturas aporticadas de concreto (Bjerrum, 1963). De fato, até a época da última medição dos recalques, o prédio não apresentava quaisquer  patologias relacionadas a movimentos da fundação. 120 Sest < MÉDIA Sest > MÉDIA

   )   m   m    (    O    D    I    D    E    M    E    U    Q    L    A    C    E    R

80

Sest < Smedido (ACRÉSCIMO) Sest > Smedido (ALÍVIO)

40

0 0

40

80

120

RECALQUE ESTIMADO SEM ISE (mm)

Figura 14. Recalque absoluto convencionalmente versus medido – Caso 1.

estimado

50.00

1 / 150 ROTAÇÃO MEDIDA ESTIMADA CONVENCIONALMENTE

40.00

   )   m   m    (    L    A    I    C 30.00    N    E    R    E    F    I    D    E 20.00    U    Q    L    A    C    E    R

INÍCIO DE FISSURAMENTO EM PAINÉIS DE ALVENARIA (BJERRUM, 1963)

1 / 300

1 / 500

10.00

1 / 1000 0.00 0

2

4

6

8

10

VÃO ENTRE PILARES (m)

Figura 15. Rotação estimada convencionalmente versus medida – Caso 1.

3.5 Efeito da ISE na Carga dos Pilares Gusmão (1990) definiu o fator de recalque (AR), que serve para avaliar os efeitos da redistribuição de cargas nos pilares:  AR

=

S i S m

 

A Figura 19 mostra a evolução do CV com o carregamento da estrutura. Nota-se que mesmo havendo um aumento do carregamento (e dos recalques absolutos), há uma tendência de redução do valor de CV, especialmente no início da construção do edifício.

(1) 1.60 ARest < 1

onde: Si  = recalque absoluto do apoio i; S m = recalque absoluto médio.

ARest > 1

1.20

A ISE faz com que haja um alívio de carga nos pilares mais carregados e uma sobrecarga nos pilares menos carregados. A Figura 16 mostra a comparação entre os valores de AR estimados convencionalmente e medidos. Observa-se que, para a maioria dos pilares que têm recalque absoluto estimado maior que a média (Arest > 1), há uma tendência do valor de AR estimado ser maior que o AR medido (ARest > ARmed), evidenciando um alívio de carga. Já nos pilares que têm recalque absoluto estimado menor que a média (Arest < 1), há uma tendência do valor de AR estimado ser menor que o AR medido (ARest < ARmed), evidenciando um acréscimo de carga.

 ARest < A Rmed (ACRÉSCIMO)

   d   e   m    R    A

 ARest > A Rmed (ALÍVIO)

0.80

0.40 0.40

0.80

1.20

1.60

ARest

Figura 16. Comparação entre os valores de AR estimado convencionalmente e medido – Caso 1.

3.6 Efeito da Seqüência Construtiva  Normalmente é admitida a hipótese do carregamento da estrutura ocorrer apenas no final da sua construção. Gusmão e Gusmão Filho (1994) mostraram, no entanto, que à medida que a estrutura vai sendo construída, vai havendo um aumento do seu carregamento e dos recalques absolutos. Mas, há também um aumento da rigidez da estrutura, que faz com que haja uma tendência de uniformização dos recalques (Fig. 17). Gusmão et al. (2003) apresentaram resultados de monitoramento de recalques de 20  prédios em Recife. A Figura 18 mostra a variação dos valores de AR (máximo e mínimo) com a evolução do carregamento. Observa-se claramente que há uma tendência dos recalques máximo e mínimo se aproximarem da média (AR = 1), à medida que a estrutura vai sendo construída, e a sua rigidez vai aumentando.

Figura 17. Efeito da seqüência construtiva (Gusmão e Gusmão Filho, 1994). 2.50 ARmax ARmin

2.00

1.50    R    A

1.00

0.50

0.00 0

20

40

60

80

100

CARREGAMENTO (%)

Figura 18. Evolução dos valores de AR com o carregamento – banco de dados (Gusmão et al., 2003).

1.00

0.60

PRIMEIROS PAVTOS

0.80

0.40 0.60    V    C

   V    C

0.40 0.20

0.20

0.00

0.00 0

20

40

60

80

100

0

100

CARREGAMENTO (%)

Figura 19 Evolução dos valores de CV com o carregamento – banco de dados (Gusmão et al., 2003).

300

400

Figura 20. Evolução dos valores de CV medido – Caso 1.

2.00

3.7 Influência dos Primeiros Pavimentos  No item anterior foi mostrado que o aumento do número de pavimentos da edificação promove um aumento da rigidez da estrutura, e diminui a dispersão do recalques. É importante notar, no entanto, que esta tendência à uniformização dos recalques não cresce de maneira linear com o número de pavimentos. A Figura 20 apresenta a evolução do CV ao longo do tempo para o Caso 1. Já na Figura 21 é apresentada a evolução dos valores de AR máximo e mínimo. Em ambos os casos, nota-se claramente que há uma altura limite, que em geral corresponde aos cinco primeiros  pavimentos, em que praticamente não há mais aumento da rigidez para fins de uniformização dos recalques (Gusmão Filho e Guimarães, 1997). Isso ocorre devido ao fato de estruturas aporticadas abertas com painéis se comportarem, segundo planos verticais, de maneira semelhante a uma viga parede. Com isso as partes mais baixas da estrutura sofrerão apenas deformações de flexão (Goshy, 1978), como mostrado na Figura 22. Este fato deve ser levado em consideração no caso de enrigecimento de estruturas com o objetivo de se diminuir o nível dos recalques diferenciais (Gusmão e Gusmão Filho, 1990).

200

TEMPO (dias)

PRIMEIROS PAVTOS

ARmax 1.60

ARmin

1.20    R    A

0.80

0.40

0.00 0

100

200

300

400

TEMPO (dias)

Figura 21. Evolução dos valores de AR medido – Caso 1.

Figura 22. Analogia da viga parede (Goshy, 1978).

4 INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA DANOS EM EDIFÍCIOS

E

4.1 Danos Causados por Recalques Um projeto de fundações deve sempre contemplar três requisitos básicos: (i) estabilidade, ou seja, deve haver uma adequada segurança contra a ruptura do terreno e do elemento estrutural da fundação (sapata, estaca, etc); (ii) desempenho satisfatório, ou seja, os movimentos da fundação para as condições de trabalho (estado limite de serviço) devem ser compatíveis com as características da estrutura, a fim de se evitar danos à edificação (estéticos, funcionais ou estruturais); (iii) durabilidade, ou seja, a vida útil da fundação não deve ser inferior à da própria estrutura. Os danos causados pelos movimentos da fundação podem ser classificados em estéticos, funcionais e estruturais (Burland et al., 1977). Por outro lado, a maioria dos critérios usados  para avaliação de danos em edificação faz a comparação entre os movimentos da fundação e valores ditos como limites ou admissíveis (Tabela 10) Como já foi mostrado anteriormente, a ISE influencia significativamente os valores dos recalques da edificação, especialmente os recalques diferenciais. Logo, o uso desses critérios para avaliação de danos sem a consideração da ISE pode levar a soluções conservadoras de fundação. 4.2 Patologias Típicas

Tabela 10. Critérios para avaliação de danos em edificações (Gusmão e Gusmão Filho, 1995). Parâmetro Dano Referências Associado Recalque -Estético -Terzaghi e Peck (1987) Absoluto -Funcional -Polshin e Tokar (1957) Máximo -Sowers (1962) Distorção -Estético -Skempton e Angular -Funcional MacDonald (1956) Máxima -Estrutural -Bjerrum (1963) Tensão -Estético -Burland e Wroth (1974) Máxima -Estrutural de Tração

Surgem tensões cisalhantes nas faces na  parede, e uma tração máxima a 45º. Dependendo da magnitude, pode ocorrer o fissuramento da parede nesta direção, normalmente na junta entre os tijolos (Holanda Jr., 2002). O recalque também provoca o surgimento de momentos negativo e positivo nos apoios  periférico e central da viga, respectivamente. Se a viga não estiver devidamente armada, pode haver fissuramento (Fig. 23). Finalmente, o recalque também provoca uma redistribuição das cargas nos pilares, havendo uma migração de carga do pilar central para os  pilares extremos. O acréscimo de carga pode  provocar o esmagamento do pilar. Segundo Maffei et al. (2003), há que se considerar a rigidez da estrutura na redistribuição dos esforços na estrutura. Se a deformada de recalques for uniforme, há apenas uma translação da estrutura (sem inclinação), e não surgem esforços adicionais na estrutura, mesmo sendo a mesma flexível ou rígida.

A ocorrência de recalques diferenciais causa o aparecimento de esforços secundários nos elementos estruturais. A Figura 23 (Gusmão e Gusmão Filho, 1995), por exemplo, mostra o caso de um painel de alvenaria apoiado em uma viga de concreto armado. Admitindo-se que haja um recalque diferencial da coluna central em relação aos demais apoios (situação muito comum de ocorrer na prática), o recalque afeta a  parede, a viga e os pilares. Figura 23. Patologias típicas em uma estrutura aporticada de concreto (Gusmão e Gusmão Filho, 1995).

Se, ao contrário, a deformada não for uniforme, a estrutura perfeitamente flexível acompanha os movimentos do terreno e também não há esforços adicionais na estrutura. Se, no entanto, for uma estrutura rígida, há uma significativa redistribuição de esforços.  No caso de estruturas de concreto armado, como a seção de armadura varia ao longo das vigas, o momento resistente é variável, o que facilita a formação de rótulas plásticas, tornando a estrutura isostática. Isso faz com que deixem de ocorrer esforços adicionais devido a novos recalques. O colapso da estrutura só ocorre após ser esgotada a capacidade de rotação das rótulas plásticas. Portanto, as estruturas de concreto podem se adaptar a recalques diferenciais, desde que devidamente armadas, de modo a manter o equilíbrio entre os esforços solicitantes e os resistentes (Maffei et al., 2003).

A Figura 30 mostra as rotações medidas entre os pilares vizinhos. Observa-se que várias rotações atingiram valores entre 1/300 e 1/500, o que era coerente com alguns dos danos observados. N-SPT

0

10

20

30

0  AREIA ARGILOSA

 ARGILA SILTOSA

10  AREIA FINA SILTOSA

20  ARGILA SILTOSA

30

SONDAGEM SP-01

ESTACAS PRÉ-MOLDADAS DE CONCRETO COM COMPRIMENTO VARIÁVEL

 AREIA MÉDIA E FINA PROF.(m) 40

4.3 Exemplo – Caso 2 Para exemplificar a influência da ISE nos danos de edifícios, será considerado o caso de um conjunto residencial composto por 07  prédios em concreto armado com 17  pavimentos, que foram construídos no Recife (Gusmão e Gusmão Filho, 1994). O projeto previa que as estacas tivessem comprimento variando entre 30 e 42 m, dependendo da profundidade da camada resistente (Fig. 24). Na execução do estaqueamento, ficou comprovado que algumas estacas não atingiram a camada resistente. Mesmo diante do impasse, o empreendedor resolveu continuar a construção sem nenhum reforço da fundação, que se fosse necessário seria feito a durante a construção dos prédios. Foi, feito, então, o monitoramento de todos os 30 pilares de todos 07 prédios, durante 18 meses. Neste período, surgiram vários danos na estrutura nos blocos. A Figura 29 mostra as isorecalques da última medição do Bloco F, que foi onde houve a maior incidência de danos. A maior parte dos danos eram fissuras nas alvenarias, mas também havia fissuras em lajes e vigas. Apesar do  prédio ser simétrico, houve uma pequena inclinação de corpo rígido da ordem de 1/4000.

Figura 24. Perfil do subsolo – Caso 2. P2

P1

P3   P4

P5

P7

P8

P6

P9 P10

P11

P18

P19

P15

P16

P17

P12

P13

P20

P21

P22

P23

0

P14

P25 P26 P27

P24

2

4

6

P28

P30

P29

8

Figura 25. Isorecalques medidos – Caso 2. 50.00

1 / 150 ROTAÇÃO MEDIDA

40.00

   )   m   m    (    L    A    I    C 30.00    N    E    R    E    F    I    D    E 20.00    U    Q    L    A    C    E    R

1 / 300

1 / 500

10.00

1 / 1000 0.00 0

2

4

6

VÃO ENTRE PILARES (m)

Figura 26. Rotações medidas – Caso 2.

8

10

 No entanto, havia a suspeita dos danos terem sido provocados não apenas por recalques. Foi, então, feito um levantamento completo de todas as patologias em todos os 17 andares do prédio (Fig. 27). Observa-se que os danos ocorreram em todos os pavimentos, mas houve de fato uma maior incidência nos primeiros  pavimentos. Com isso, ficou comprovado que os danos surgidos não foram provocados apenas por recalques, mas também por deformação excessiva de alguns elementos estruturais (lajes e vigas). Estes danos eram fáceis de serem identificados, pois se repetiam em todos os  pavimentos com a mesma intensidade, diferentemente dos danos provocados por recalque, que eram mais intensos nos primeiros  pavimentos. 5 PREVISÃO DE RECALQUES CONSIDERANDO-SE A ISE EM EDIFÍCIOS 5.1 Histórico Em 1953, Meyerhof publicou um trabalho que é considerado uma das primeiras tentativas de se considerar os efeitos da ISE em edificações. 50

40

PRÉDIO BLOCO F

   )   m    (    O    I    D 30     É    R    P    O    D    A    R 20    U    T    L    A

A análise está baseada na teoria da elasticidade tanto para o solo, quanto para a estrutura. São apresentados diversos gráficos que mostram a influência da rigidez relativa estrutura-solo nos recalques e momentos fletores na fundação. O autor sugere também fórmulas que permitem substituir a edificação real por outra com rigidez equivalente, simplificando as análises de ISE. Em 1954, Samuel Chamecki publicou um dos mais importantes trabalhos da história da geotecnia no Brasil, onde foi apresentada uma metodologia para análises de ISE. O método requer uma análise iterativa, até que haja a convergência das reações de apoio e recalques. Poulos (1975) apresentou uma metodologia geral para estimativa do recalque de uma edificação, na qual a superestrutura, fundação e terreno de fundação são tratados como um sistema único. Na realidade a metodologia é semelhante à proposta por Chamecki (1955), mas foi desenvolvida na forma matricial, o que facilita a sua implementação em programas computacionais. Barata (1986) apresentou uma metodologia, em caráter experimental, para previsão de recalques levando-se em consideração a rigidez da estrutura. Neste trabalho o autor tenta exprimir graficamente a relação entre a deflexão relativa e o recalque absoluto máximo, e a rigidez da estrutura, que é representada pela relação entre a altura do prédio e o seu comprimento em planta. Gusmão (1990), mostrou que a metodologia apresentou resultado satisfatório para o Caso 1 (Fig. 28).

5o. PAVTO

10

ESTR.

FUNDAÇÃO

0 0

20

40

60

NÚMERO DE FISSURAS

Figura 27. Distribuição dos danos nas alvenarias por  pavimento e suas prováveis causas – Caso 2.

Figura 28. Aplicação da metodologia proposta por Barata (1986) ao Caso 1 (Gusmão, 1990).

5.2 Modelos mais Recentes

Há várias pesquisas no mundo com proposição de metodologias para a consideração da ISE na  previsão de recalques. No Brasil, em particular, destacam-se os trabalhos desenvolvidos na USP/São Carlos coordenados por Nelson Aoki e José Cintra; na UFPE, por Antônio Oscar da Fonte; na COPPE/UFRJ por Fernando Danziger e Paulo Santa Maria; na UERJ e UFF por Bernadete Danziger e Eliane Carvalho; na USP/São Paulo por Carlos Maffei e Heloísa Gonçalves; na UENF por Paulo Maia; na UnB  por Renato Cunha; e na UPE por Alexandre Gusmão. Um interessante trabalho foi desenvolvido  por Reis (2000), que inclusive conquistou o Prêmio Icarahy da Silveira da ABMS. Neste trabalho estuda-se a ISE de grupo de edifícios com fundações superficiais, em maciço de solos de argila mole. O comportamento ao longo do tempo da argila mole é analisado com o modelo reológico de Kelvin. Os parâmetros do modelo são determinados através do ajuste entre as curvas recalque–tempo do modelo e as curvas medidas em três prédios, construídos simultaneamente, na cidade de Santos/SP. A ISE provoca uma tendência de uniformização dos recalques, e isto fica evidente ao compararem-se os recalques calculados com procedimento convencional com os recalques calculados considerando o efeito da rigidez da superestrutura. O mecanismo de transferência de carga entre os  pilares provoca recalques maiores que os determinados convencionalmente nos pilares  periféricos. Nos pilares centrais, o mecanismo de transferência de carga produz recalques menores que os calculados sem interação (Fig. 29). Outro ponto importante é o fato do valor do recalque de uma fundação não ser condicionado apenas pela carga que chega nesta fundação, e sim pelo estado de tensões a que o maciço está submetido. Este estado de tensões depende de todas as cargas, em todos os pilares, inclusive de prédios vizinhos (Reis, 2000). Paramonov et al. (2005), apresentaram um software de previsão de ISE com base no MEF, com implementação de vários modelos para a superestrutura, infra-estrutura e terreno de fundação. É apresentado um exemplo de um

 prédio modelado como uma caixa. Quando se considera o efeito da ISE, os esforços normais nas paredes externas dos andares inferiores chegam a aumentar até 234% (Fig. 30). Apesar dessa magnitude, os autores concluem que mesmo em análises não lineares considerandose a plastificação do solo, os valores não se alteram de modo significativo. Também se observa que os efeitos da ISE não atingem mais que três pavimentos. Outros modelos para cálculo de recalques considerando-se a ISE podem ser encontrados em Fonte (2000), Iwamoto (2000) e Ribeiro (2005).

Figura 29. Curvas isorecalques calculados com grupo de  prédios com e sem ISE (Reis, 2000). 40 ANÁLISE CONVENCIONAL INTERAÇÃO SOLO-ESTRUTURA

30    )   m    (    O    I    D     É    R    P 20    O    D    A    R    U    T    L    A

3o. PAVTO

10

+ 234 % ??? 0 0

1000

2000

ESFORÇO NORMAL NA PAREDE (kN/m)

Figura 30. Esforço normal com e sem ISE na parede externa do prédio (adaptado de Paramonov et al., 2005)

6 DESEMPENHO DE FUNDAÇÕES DE EDIFÍCIOS EM RECIFE 6.1 Prática de Fundações no Recife Morfologicamente a Cidade do Recife apresenta duas paisagens muito distintas: os morros e a  planície. A ocupação da cidade com edificações de grande porte tem se dado, contudo, apenas no espaço confinado entre os morros e a orla marítima, que se constitui em uma grande  planície de origem flúvio-marinha.  Neste contexto geológico, o subsolo típico é muito variado. Encontram-se camadas de areia fina e média, de compacidade fofa, intercaladas ou seguidas por outras, seja de argila orgânica mole, seja de areia concrecionada muito compacta ou arenitos bem consolidados. Os depósitos de argila orgânica mole e média são encontrados em cerca de 50% da área da  planície, muitas vezes em subsuperfície e com espessuras superiores a 15 m. Por tudo isto, a prática atual de fundações no Recife é fortemente direcionada pelas características geológico-geotécnicas do subsolo, ainda que outros fatores influenciem na escolha e sejam assim encontrados diversos tipos de fundação na cidade (Gusmão, 2005). 6.2 Metodologia para Medições de Recalques

Interpretação

da construção do prédio e adota-se a tensão vertical final no topo da camada argilosa (Fig. 31 e 32). Para exemplificar a metodologia  proposta, serão apresentados alguns casos de monitoramento de prédios em Recife. 6.3 Terrenos com Camadas de Argila Mole  No Bairro de Boa Viagem, há dois perfis geotécnicos típicos (Fig. 33). No caso (a), a camada argilosa mole aparece a partir de 10 m de profundidade, e a solução de fundação típica  para prédios com até 15 lajes, é a adoção de sapatas associadas a um melhoramento do terreno superficial com estacas de compactação.  Neste caso, os recalques máximos medidos são normalmente superiores a 100 mm.

po 1 2

Dpo

H

CAMADA ARGILOSA

das

Oliveira et al. (2002) apresentaram uma metodologia para interpretação de medições de recalque, como se a construção do prédio fosse um ensaio edométrico no campo. Foi introduzido o conceito de curva normalizada tensão-deformação da fundação. A normalização é feita considerando-se a relação entre o recalque médio do prédio de uma dada medição, dividido pela espessura da camada de argila mole (H). A idéia desta interpretação é analisar leituras de recalque como um ensaio de adensamento no campo, com as devidas ressalvas em termos de condições de contorno, principalmente pelo fato da drenagem ser parcial em cada carregamento.  Nesta análise os valores intermediários são obtidos a partir de leituras de recalque ao longo

Figura 31. Hipótese para o cálculo da tensão vertical no topo da camada argilosa – fundação com sapatas.

1

po

2

H

Dpo CAMADA ARGILOSA

Figura 32. Hipótese para o cálculo da tensão vertical no topo da camada argilosa – fundação com estacas.

NT

N-SPT

NT

0

10

20

30

40

SAPATA

0

5m ESTACAS DE COMPACTAÇÃO

8m

ESTACAS DE COMPACTAÇÃO (AREIA + BRITA)

5

 AREIA FINA E MÉDIA

10 m 10

20 m  ARGILA MOLE

15

 ARGILA MOLE

 ARGILA ORGÂNICA SILTOSA SONDAGEM ANTES

20

35 m (a)

APÓS

35 m PROF.(m) 25

(b)

Figura 33. Perfis típicos em Boa Viagem e soluções de fundações (Gusmão, 2000).

 No caso (b), a camada argilosa aparece a uma pequena profundidade, inviabilizando uma solução em fundação superficial. A solução típica é a utilização de estacas tipo Franki ou  pré-moldadas de concreto assentes entre 12 e 18 m de profundidade, trabalhando com carga reduzida (50 a 80% da carga admissível como elemento estrutural). Os recalques máximos medidos para prédios com mais de 15 lajes são normalmente inferiores a 40 mm. A Figura 34 mostra o perfil geotécnico do subsolo do Caso 3, bem como alguns detalhes da fundação. A Figura 35 apresenta as isorecalques referentes à última medição. Este  prédio, junto com o Caso 1, é representativo do  perfil tipo (a) mostrado na Figura 33. A Figura 36 mostra a curva edométrica de campo obtida pela metodologia proposta (Casos 1 e 3). As curvas exibem uma tensão de escoamento ou de sobreadensamento que separa dois tipos de comportamento, com diferentes inclinações na curva tensão-deformação. O escoamento neste caso é uma desestruturação devido à compressão (Oliveira et al., 2002). Para os dois casos, o valor do OCR é igual a 1,24. Este valor é compatível com as pesquisas sobre as argilas moles do Recife, que têm mostrado que as mesmas são levementes sobreadensadas (Coutinho e Bello, 2005).

Figura 34. Perfil do subsolo – Caso 3. P1

P2

14.00 14.00

P3

P4

12.00 12.00

P5

P8 P6

P7

P9

P10

10.00 10.00

8.00 8.00

6.00 6.00

4.00 P11 4.00

P12

P13

P14

2.00 2.00

P15

P17 P16

0.00 0.00 2.00 2.00

4.00 4.00

6.00 6.00

8.00 8.00

10.00 10.00

12.00 12.00

14.00 14.00

Figura 35. Isorecalques medidos – Caso 3.

Figura 36. Curva edométrica de campo – Casos 1 e 3.

16.00 16.00

As Figuras 37 e 38 mostram o perfil geotécnico do subsolo dos Casos 4 e 5, bem como alguns detalhes da fundação profunda. As Figuras 39 e 40 apresentam as isorecalques referentes às últimas medições. Estes dois casos de prédios são representativos do perfil tipo (b) mostrado na Figura 40. A Figura 41 mostra a curva edométrica de campo. Neste caso, os valores de OCR são ordem de 1,60. Este valor é maior que o obtido  para os Casos 1 e 3, onde a camada de argila é mais superficial.

argilosas já havia sido observada por Gusmão (2000) em ensaios edométricos feitos em amostras de boa qualidade (Fig. 42). Este aumento do OCR na camada mais profunda está  provavelmente associado ao fato desta camada ser mais antiga (Massad, 1999). P1

P2

P3

P8 P4

P5

P7

P6

N-SPT 0

10

20

30

40

P10

P9

P11

P12

0 SONDAGEM

 AREIA FINA E MÉDIA

SP-1

5

 ARGILA ORGÂNICA SILTOSA

ESTACA PRÉ-MOLDADA DE CONCRETO

10

P13

P16 P14

P15

P17

P18

15

 AREIA MÉDIA E FINA

20

0 25

2

4

6

8

Figura 39. Isorecalques medidos – Caso 4.

 ARGILA ORGÂNICA SILTOSA

30

35

P2

P1

P3

P4

P5

P6

40  AREIA FINA SILTOSA

P7

P8

PROF.(m) 45

P9

P10

P11 P12

Figura 37. Perfil do subsolo – Caso 4.

N-SPT 0

10

20

0 30

P17 P13

2

4

6

P14

P15

P16

8

40

Figura 40. Isorecalques medidos – Caso 5.

0 SONDAGEM

 AREIA FINA E MÉDIA

SP-1

ESTACA TIPO FRANKI

10 MELHORAMENTO (AREIA + BRITA)

 ARGILA SILTOSA

20

 ARGILA SILTOSA

30

 AREIA MÉDIA E FINA PROF.(m) 40

Figura 38. Perfil do subsolo – Caso 5.

Esta diferença do OCR entre as camadas

Figura 41. Curva edométrica de campo – Casos 4 e 5.

0

1

OCR

2

3

0 OCR LABORATÓRIO MONITORAMENTO

   )   m    (    E    D    A    D    I    D    N    U    F    O    R    P

10

20

30

Figura 42. Variação do OCR com a profundidade para amostras de boa qualidade (adaptado de Gusmão, 2000).

quadrangular cobrindo toda a área de projeção da lâmina do prédio, estendendo-se uma ou duas filas de estacas além dos limites da lâmina, visando cobrir regiões influenciadas pelo espraiamento das pressões (Gusmão, 2005b). O objetivo de se compactar camadas superficiais arenosas com baixa compacidade é a melhoria das suas propriedades de resistência, diminuindo os níveis de deformações, e conferindo à camada melhorada uma elevada rigidez. Tal densificação pode ser atribuída à combinação de três efeitos: (i) deslocamento do material no terreno igual ao volume da estaca; (ii) introdução de material compactado; (iii) vibração devido ao processo executivo. N-SPT 0

6.4 Terrenos com Fragmentos de Conchas e/ou Corais A Figura 43 mostra o perfil geotécnico do subsolo do Caso 6, cuja fundação é superficial. A peculiaridade deste caso está na presença de uma camada de fragmentos de corais e conchas entre 5 e 13 m de profundidade, que aparece com freqüência em várias regiões da cidade do Recife (Pacheco et al., 2000). A Figura 44 mostra a curva edométrica de campo obtida pela metodologia proposta. Notase que há um comportamento próximo de um colapso para uma tensão vertical de 147 kPa. Este fato pode indicar que houve esmagamento dos fragmentos de corais e conchas no campo (“crushing”). Outro aspecto interessante é que mesmo sendo um material com comportamento granular, a sua compressibilidade é da mesma ordem de grandeza de uma argila mole (recalque normalizado igual a 1,1 %), o que mostra que o esmagamento dos grãos deve ser considerado nos projetos de fundações neste tipo de formação geológica.

10

20

30

40

0  AREIA FINA E MÉDIA

2

 AREIA FINA E MÉDIA CONCRECIONADA

SAPATA

4

6

FRAGMENTOS DE CORAL E CONCHA, COM AREIA

8

10

12

14  AREIA MÉDIA E FINA

16

18

SONDAGEM SP-6

PROF.(m) 20

Figura 43. Perfil do subsolo – Caso 6.

6.5 Terrenos Arenosos com Melhoramento A técnica de melhoramento com estacas de compactação de areia e brita tem sido largamente utilizada no Recife e várias outras cidades nordestinas desde a Década de 70, com resultados bastante satisfatórios. Esta técnica consiste na execução de uma malha

Figura 44. Curva edométrica de campo – Caso 6.

O melhoramento possibilita elevar a pressão admissível do terreno para valores de até 600 kPa, implicando em uma significativa diminuição dos volumes de escavação e de concreto. Esta técnica tem permitido a adoção de fundações superficiais em prédios com até 30 pavimentos, em locais que de outra maneira requereriam fundações profundas (Gusmão Filho e Gusmão, 1990; 1994 e 2000). A Figura 45 mostra o perfil geotécnico do subsolo do Caso 7. Trata-se de uma estrutura aporticada de concreto armado com 24 lajes e 23 pilares na sua lâmina principal. As fundações do prédio são superficiais tipo sapatas para uma pressão de trabalho de 450 kPa, associadas a um melhoramento do terreno com estacas compactação (Gusmão e Calado Jr., 2002). A Figura 46 mostra a variação do recalque médio com carregamento médio da estrutura. Observa-se uma relação praticamente linear, como seria esperado para um depósito granular. Este mesmo comportamento tem sido observado em vários outros prédios em terrenos melhorados em Recife. Com o objetivo de se obter o módulo de deformabilidade do maciço (Es), foi feita a retroanálise do recalque médio medido do  prédio através da equação clássica da Teoria da Elasticidade:  Es

 po  B ⋅



(1



μ 

2

)

=

 I   



Smedio

(2)

onde: po = pressão média transmitida pelo  prédio; Smedio = recalque médio do prédio; B = largura do prédio em planta; I = coeficiente que depende da forma em planta do prédio, e da rigidez do prédio (tomado igual a 1 para todos os casos). Também foi retroanalisado o coeficiente de correlação a entre Es e o valor do N SPT médio até uma profundidade igual à largura em planta do prédio (B). α 

( MPa )

 Es ( MPa) =

 N SPT 

 

(3)

0

No. GOLPES / 30 cm 10

20

30

40

50

0.00

-2.00 AREIA FINA E MÉDIA SILTOSA

-4.00

-6.00

AREIA FINA E MÉDIA ARGILOSA

SONDAGEM

-8.00

ANTES

AREIA FINA SILTOSA

DEPOIS

-10.00 COTA (m)

Figura 45. Perfil do subsolo – Caso 7 (Gusmão e Calado Jr., 2002). CARREGAMENTO (%) 0

20

40

60

80

100

0.00

   )   m   m    ( 5.00    O    I    D     É    M 10.00    E    U    Q    L    A 15.00    C    E    R

RECALQUE MEDIDO REGRESSÃO LINEAR (r^2 = 0,94)

20.00

Figura 46. Evolução do recalque médio com o carregamento – Caso 7.

A Tabela 11 apresenta os valores de Es e a retroanalisados. Os valores de Es variam de 99 a 196 MPa e são típicos de uma areia medianamente compacta a compacta. Já o valor de a varia de 6,7 a 10,9 MPa, e tem valor médio de 8,6 MPa (Figura 47). Este valor é maior que o normalmente sugerido em outros trabalhos (Barata, 1986). A provável explicação está no fato do maciço não ser homogêneo, como pressupõe a Equação (2). Na realidade, há uma camada de material resistente (solo melhorado) sobrejacente a uma camada fraca (solo natural), o que faz com o módulo equivalente aumente.

Tabela 11. Retronálise do módulo de deformabilidade do maciço – Terrenos melhorados. Caso No. Smedio  NSPT Es a Pavtos (mm) (MPa) (MPa) 8 25 14,65 11 99 9,0 9 23 3,59 18 196 10,9 10 29 23,00 18 147 8,2 11 22 5,82 15 101 6,7 12 26 18,25 20 166 8,3 13 30 20,36 14 122 8,7 14 17 13,46 15 114 7,6 15 16 14,17 12 113 9,4 16 24 14,53 12 128 10,7 17 20 14,47 14 100 7,2

   )   a    P    M    (

200

   O    N    E    R    R    E    T    O 160    D    E    D    A    D    I    L    I    B    A    M    R    O 120    F    E    D    E    D    O    L    U    D     Ó    M

AGRADECIMENTOS O autor gostaria de agradecer à empresas que autorizaram a divulgação dos resultados dos seus controles, e aos vários profissionais que  participaram dos projetos das edificações. Um agradecimento especial é feito aos Engenheiros Jaime de A. Gusmão Filho e Gilmar de Brito Maia, pelas discussões dos resultados. O autor também agradece o convite feito  pela Comissão Organizadora do evento, em especial, ao Colega Alessander Kormann.

Es = 8,6 . NSPT (MPa)

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80

10

12

14

16

18

20

NSPT

Figura 47. Correlação entre o módulo de deformabilidade e o NSPT do terreno de fundação.

7

Mostra-se, ainda, já há disponíveis ferramentas computacionais que permitem, sem maiores dificuldades, que a ISE seja considerada nos  projetos de edificações.

CONCLUSÕES

Apesar de não ser considerada nos projetos convencionais, a interação solo-estrutura é quem comanda o desempenho da fundação e da  própria estrutura de uma edificação. O trabalho mostrou que a ISE promove uma tendência à uniformização dos recalques, e uma redistribuição de esforços nos elementos estruturais. Vários aspectos influenciam a rigidez da estrutura, mas o principal é a altura da edificação, e em especial os seus primeiros  pavimentos. Os casos de obras apresentados mostraram que o monitoramento deve ser desmistificado  pelos geotécnicos e engenheiros estruturais, e deve ser considerado como mais um controle tecnológico da construção de um prédio.

Fundações Diretas em Terrenos de Compressibilidade Rápida e com a Consideração da  Rigidez da Estrutura. Tese de Concurso para

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