Criminologia Critica e Critica do Direito Penal Alessandro Baratta.pdf

August 4, 2017 | Author: RDiias | Category: Criminal Law, Sociology, Crimes, Crime & Justice, Science
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CRIMINOLOGIA

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CRÍTICA DO DIREITO PENAL

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Cril11in o/ógico APRESENTAÇÃO

Direção Pro! Dl: Nilo Batista

1999 Instituto Carioca de Criminologia Av. Beira Mar, 216 3 andar Tel.: 0(xx)21 263 2069 Fax: 532 3435 20021-060 Rio de Janeiro - RJ - Brasil e-mail: [email protected] Q

Projeto Gráfico Luiz Fernando Gerhardt Edição e Distribuição Editora Revan Ltda. Av. Paulo de Frontin, 163 - Rio Comprido 20260-010 - Rio de Janeiro - RJ Tel: 0(XX)21 25027495 - fax: 0(X.X)21 22736873 B22Gc

Baralta,Alessandro Criminologia Critica e Critica do Direito Penal: introdução à sociologiado direito penal / Alessandro Baratta; tradução) uarez Cirino dos Santos. -3 ed.Riode)aneiro: Editora Revan:Instituto Carioca de Criminologia,2002. ü

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25GP. ISBN 85-353-0188-7

Tradução de: Criminologia critica c critica dei diritlopenale. Incluibibliografia. 1. Direitopenal- Filosofia. 2. Sociologia jurídica; I. InstitutoCariocade Criminologia.11. Titulo CDD345

Com a publicação, em esmerada tradução do Prof. Dr. Juarez Cirino dos Santos, deste já clássico Criminologia Crítica e Crítica do Direito Penal - uma das mais notáveis e densas recensões do pensamento criminológico, escrita pelo mais brasileiro de todos os professores europeus, Alessandro Baratta - o Instituto Carioca de criminologia inaugura uma coleção que objetiva suprir o históri:.. co deficit editorial que a literatura criminológica registra em nosso país. A coleção Pensamento Criminológico incluirá, alternadamente, obras gerais e investigações monográficas; ainda que compreensivelmente concentrada na extraordinária produção latino-americana (já previstos Lolita Aniyar de Castro, Rosa deI Olmo e Raúl Zaffaroni), procuraremos trazer à luz certos textos fundamentais pouco difundidos entre nós, como por exemplo o trabalho pioneiro de Rusche e Kirchheimer, até hoje jamais vertido ao português. Sem embargo da utilidade da coleção para muitos campos d:ls ciências sociais, e especialmente para os historiadores do controle social penal - que, afinal de contas, fazem a própria história da criminologia - pretendemos atingir o público de formação jurídica, rompendo os preconceitos metodológicos que interpuseram um fosso entre juristas e criminólogos. Efetivamente, constitui um fenômeno recente o diálogo entre os saberes criminológicos e os saberes jurídico-penais. Desde sua fundação positivista, na segunda metade do século XIX, a criminologia buscou obter uma duvidosa autonomia acadêmica ao preço de não questionar a legitimidade do sistema penal, os motivos profundos da produção legislativa penal e o desempenho real das agências administrativas ou judiciais encarregadas de sua aplicação. 1

CRIMINOLOGIA

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CRíTICA E CRiTICA DO DIREITO PENAL

Reduzind0 seu horizonte a uma inofensiva explicação causal do delito e do delinqüente, a criminologia positivista não apenas relegitimava o sistema penal, mas também criava o impasse, tão celebrado, da dependência que seu objeto guardava do direito vigente. A fantástica recepção que na América Latina teve a antropologia criminal, com seu método "clínico", vincula-se a sua utilidade, num continente marcado desde sua descoberta por conflitos étnicos freqüentemente convertidos em genocídios, para a dissimulação ideológica do controle social penal que a's oligarquias exterminadoras deviam exercer. Por seu turno, os,jJ'ristas viam com desconfiança esses saberes "profanos"; o mais relJomado dos penalistas brasileiros, Nélson Hungria, chegou em certo momento a preconizar uma "doutrina de Monroe: o direito penal é para os juristas, exclusivamente para os juristas". Ficara em aberto saber se os juristas eram exclusivamente para o direito penal. A superação das criminologias funcionalistas que haviam sucedido ao positivismo, através de um vigoroso pensamento crítico que inverteu a equação legitimante, outorgando ao próprio sistema penal - aí compreendida a produção legislativa penal - a condição de objeto qo afazer criminológico, responderia negativamente a essa questão. Exceção feita ao jurista imobilizado pelas teias da tradição escolástica, que sacraliza o texto legal e empareda as possibilidades hermenêuticas na ortodoxia da lectura ." do dIreIto '.. algumas das "crIses penal - pense-se na própria crise, da pena - sinalizavam a insuficiência do método dogmático para a reflexão jurídica, especialmente no campo angustiante dos operadores do sistema penal. Dentro do próprio âmbito da dogmática juridico-penal muitos avanços s~ deviam a partir de contribuições externas, provindos ora da filosofia. (como as transformações que o conceito de ação final imprimiu em toda a teoria do delito), ora da sociologia (como as recentes e polêmicas contribuições do funcionalismo sistêmico à imputação objetiva) ora da psicologia (por exemplo, nas áreas da imputabilidade e d~ erro).' etc. O conjunto das reflexões teóricas e dos dados empíricos ~umdos por uma criminologia nova, que reinventara o próprio SIstema penal como seu objeto por excelência e que se concebia como vértice interdisciplinar, metodologicamente pluralista, do encontro daquelas reflexões e daqueles dados, necessariamente 2

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passaria a oxigenar a elaboração jurídica: ou bem o jurista pensa o sistema penal do qual participa, ou bem se converte num juristaobjeto, reprodutor mecânico das funções concretas de controle social penal numa sociedade determinada. Na atual conjuntura brasileira, em que o conhecimento e o debate dos problemas associados ao controle social penal- violência urbana, drogas, violações de direitos humanos, a instituição policial, Ministério Público, Poder Judiciário, a questão penitenciária, violência no campo, etc. - integram a agenda política dos partidos e alimentam cotidianamente os meios de comunicação de massa, a conveniência de que a formação criminológica se inscreva na formação jurídica básica dispensa maiores considerações. Isso deve ser feito sem perda dos conteúdos especificamente jurídicos, que só avançarão ao influxo dessa tardia "ciência geral do direito penal" que desabrocha num quadro planetário no qual o discurso penal já desloca o foco perigosista do proletariado, onde estava por ocasião do Programa de Marburgo, para o conjunto de grupos sociais cotidianamente marginalizados pelo empreendimento neoliberal que, para usar os termos lisztianos, "costumamos reagrupar sob a compreensiva denominação" de excluídos. Com essas esperanças, a coleção Pensamento Criminológico pretende constituir-se no grande repositório de estudos multidisciplinares sobre crime, direito e sociedade no Brasil. Prof. Dr. Nilo Batista

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Uma das questões relativas ao significado histórico e teórico do pensamento expresso pela escola liberal clássica foi colocada em recente debate historiográfico sobre a posição que tal escola ocupa no contexto do pensamento criminológico. Trata-se de saber se, na história desse pensamento, a escola liberal clássica representa somente a época dos pioneiros ou, melhor, constitui seu primeiro capítulo, não menos essencial do que os subseqüentes. David Matza e, após seu exemplo, Fritz Sack1 quiseram reavaliar, como se indicou no capítulo precedente, a importância da Escola clássica não só para o desenvolvimento histórico da criminologia, mas também para a fase atual de revisão crítica de seus fundamentos. Seja qual for a tese aceita, um fato é certo: tanto a Escola clássica quanto as escolas positivistas realizam um modelo de ciência penal integrada, ou seja, um modelo no qual ciência jurídica e concepção geral do homem e da sociedade estão estreitamente ligadas. Ainda que suas respectivas concepções do homem e da sociedade sejam profundamente diferentes, em ambos os casos nos encontramos, salvo exceções, em presença da afirmação de uma ideologia da defesa sociaF, como nó teórico e político fundamental do sistema científico. A ideologia da defesa sociaJ3 (ou do "fim") nasceu contemporaneamente à revolução burguesa, e, enquanto a ciência e a codificação penal se impunham como elemento essencial do sistema jurídico burguês, aquela assumia o predomínio ideológico dentro do específico setor penal. As escolas positivistas herdaram-na da Escola clássica , transformando-a em algumas de suas premissas, em conformidade 41

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às exigências políticas que assinalam, no interior da evolução da sociedade burguesa, a passagem do estado liberal clássico ao estado social. O conteúdo dessa ideologia, assim como passou a fazer parte _ embora filtrado através do debate entre as duas escolas - da filosofia dominante na ciência jurídica e das opiniões comuns, não só dos representantes do aparato penal penitenciário, mas também do homem de rua (ou seja, das every day theories), é sumariamente reconstruívelna seguinte série de princípios. a) Princípio de legitimidade. O .Estado, como expressão da sociedade, está legitimado para reprimir a crimínalidade, da qual são responsáveis determinados indivíduos, por lpeio de instâncias oficiais de controle social (legislação, polícia, magistratura, instituições penitenciárias). Estas interpretam a legítima reação da sociedade, ou da grande maioria dela, dirigida à reprovação e condenação do comportamento desviante individual e à reafirmação dos valores e das normas sociais. b) Princípio do bein e do mal. O delito é um dano para a sociedade. O delinqüente é um elemento n~ativo e disfuncional do sistema social. O desvio criminal é, pois, o mal; a sociedade constituída, o bem. c) Princípio de culpabilidade. O delito é expressão de uma atitude interior reprovável, porque contrária aos valores e às normas, presentes na sociedade mesmo antes de serem sancionadas pelo legislador. d) Princípio da finalidade ou da prevenção. A pena não tem, ou não tem somente, a função de retribuir, mas a de prevenir o crime. Como sanção abstratamente prevista pela lei, tem a função de criar uma justa e adequada contra motivação ao comportamento criminoso. Como sanção concreta, exerce a função de ressocializar o delinqüente. , e) Princípio de igualdade. A criminalidade é violação da lei .1 penal e, como tal, é o comportamento de uma minoria desviante. A ., lei penal é igual para todos. A reação penal se aplica de modo igual aos autores de delitos. im f) Princípio do interesse socíal e do delito natural. O núcleo central dos delitos definidos nos códigos penais das nações civiliza'. das representa ofensa de interesses fudamentais, de condições es~. senciais à existência de toda sociedade. Os interesses protegidos " pelo direito penal são interesses comuns a todos os cidadãos. Ape~ ;1,

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nas uma pequena parte dos delitos representa violação de determinados arranjos políticos e econômicos, e é punida em função da consolidação destes (delitos artificiais). As diferenças entre as escolas positivistas e a teoria sobre criminalidade da escola liberal clássica não residem, por isso, tanto no conteúdo da ideologia da defesa social e dos valores fundamentais considerados dignos de tutela, quanto na atitude metodológica geral com relação à explicação da criminalidade. Matza4 colocou em evidência esta diferença de modo particularmente claro: seguindo o modelo da Escola positiva e da criminologia positivista ainda hoje amp~amente difundida, a tarefa da criminologia é reduzida à explicaçao causal do comportamento criminoso, baseada na dupla hipótese do caráter complementar determinado do comportamento criminoso, e da diferença fundamental entre indivíduos criminosos e nãocriminosos. A tal modelo vem contraposto o da Escola clássica, que !el~ por ~bjeto, mais que o criminoso, o próprio crime, ligando-se à ldela do lIvre arbítrio, do mérito e do demérito individual e da igualdade substancial entre criminosos e não-criminosos. Estas diferenças não incidem em mais do que um dos princípios acima individualizados: o relativo à atitude interior do delinqüente (culpabilidade). Este adquire um significado moral-normativo (desvalor, condenação moral) ou simplesmente sócio-psicológico (revelador de periculosidade social), conforme se parta da premissa da Escola clássica ou da Escola positiva. Mas se, por um lado, só o primeiro significado será idôneo para sustentar a ideologia de um sistema penal baseado na retribuição (ideologia que, de resto, como se viu, não é, absolutamente a mais difundida no seio da orientação liberal clássica), por outro, ambas as impostações, se bem que de maneira diferente, são aptas a sustentar a ideologia de um sistema penal baseado na defesa social. O conceito de defesa social parece ser, assim, na ciência penal, a condensação dos maiores progressos realizados pelo direi to penal moderno. Mais que um elemento técnico do sistema legislativo ou do dogmático, este conceito tem uma função justificante e racíonalizante com relação àqueles. Na consciência dos estudiosos e dos operadores jurídiccs que se consideram progressistas, isso tem um conteúdo emocional polêmico e, ao mesmo tempo, reassegurador. De fato, por ser muito raramente objeto de análise, ou

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