CRC

April 12, 2023 | Author: Anonymous | Category: N/A
Share Embed Donate


Short Description

Download CRC...

Description

 

BIOÉTICA

 

CURSOS DE GRADUAÇÃO – EAD Bioética – Bioética  – Prof. Dr. Marino Antonio Sehnem

Meu nome é Marino Antonio Sehnem e Sehnem e minha formação acadêmica inicial foi Filosofia; licenciei-me, depois, em Letras e Pedagogia. Fiz o Mestrado em Filosofia da Educação pela PUC-SP, e meu Doutoramento é em Serviço Social, nas áreas de Políticas Públicas e Movimentos Sociais, também pela PUC-SP. Sou professor universitário há mais de 40 anos e, simultaneamente às atividades docentes, exerci, nos últimos 20 anos, diversos cargos administrativos, como: Diretor de Faculdade, Coordenador e Chefe de Departamento, Assessor do MEC-SP para assuntos educacionais. Tenho publicado artigos em revistas, produzido livros em coedição e, nos últimos 10 anos, venho pesquisando, sistematicamente, a temática da Ética, Bioética e Sociedade. Também sou pesquisador do tema Religião e Ecologia. E-mail : [email protected] Fazemos parte do Claretiano - Rede de Educação

 

Marino Antonio Sehnem

BIOÉTICA

Batatais Claretiano 2013

 

© Ação Educacional Clareana, 2008 – Batata Batatais is (SP) Versão:: dez./2013 Versão

574.9574 S443b

 

Sehnem, Marino Antonio  Bioética / Marino Antonio Sehnem – Batatais, SP : Claretiano, 2013. 174 p. ISBN: 978-85-8377-028-2 1. Manipulação genética. 2. Aborto. 3. Eutanásia. 4. Clonagem. 5. Alimentos transgênicos. 6. Transplantes. 7. Doação de órgãos. 8. Ética. I. Bioética. .   CDD 574.9574 Corpo Técnico Técnico Editorial do Material Didático Mediacional Coordenador de Material Didáco Mediacional: Mediacional: J. Alves Preparação Aline de Fátima Guedes Camila Maria Nardi Matos Carolina de Andrade Baviera Cáa Aparecida Ribeiro Dandara Louise Vieira Matavelli Elaine Aparecida de Lima Moraes Josiane Marchiori Marns Lidiane Maria Magalini Luciana A. Mani Adami Luciana dos Santos Sançana de Melo Luis Henrique de Souza Patrícia Alves Veronez Montera Raquel Baptista Meneses Frata Rosemeire Cristina Astolphi Buzzelli Simone Rodrigues de Oliveira Bibliotecária Ana Carolina Guimarães – CRB7: 64/11

Revisão Cecília Beatriz Alves Teixeira Felipe Aleixo Filipi Andrade de Deus Silveira Paulo Roberto F. M. Sposati Ortiz Rodrigo Ferreira Daverni Sônia Galindo Melo Talita Cristina Bartolomeu Vanessa Vergani Machado Projeto gráfico, diagramação e capa Eduardo de Oliveira Azevedo Joice Cristina Micai Lúcia Maria de Sousa Ferrão Luis Antônio Guimarães Toloi Raphael Fantacini de Oliveira Tamires Botta Murakami de Souza Wagner Segato dos Santos

Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução, a transmissão total ou parcial por qualquer forma e/ou qualquer meio (eletrônico ou mecânico, incluindo fotocópia, gravação e distribuição na web), ou o arquivamento em qualquer sistema de banco de dados sem a permissão por escrito do autor e da Ação Educacional Claretiana. Claretiano - Centro Universitário Rua Dom Bosco, 466 - Bairro: Castelo – Batatais SP – CEP 14.300-000 [email protected] Fone: (16) 3660-1777 – Fax: (16) 3660-1780 – 0800 941 0006 www.claretianobt.com.br

Fazemos parte do Claretiano - Rede de Educação

 

SUMÁRIO CADERNO DE REFERÊNCIA DE CONTEÚDO 1 INT INTROD RODUÇÃ UÇÃO O .......... ................. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ....... 9 2 OR ORIEN IENTAÇÕES TAÇÕES PARA ESTUDO ESTU DO ...... ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ........... ..... 10

UNIDADE  1  FUNDAMENTOS EPISTEMOLÓGICOS DA BIOÉTICA 1 OB OBJET JETIVO IVOSS ........... ................. ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ........... ..... 19 2 CON CONTEÚ TEÚDOS DOS ............... ...................... ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ .......... .... 19 3 OR ORIEN IENTAÇÃO TAÇÃO PARA O ESTU ESTUDO DO DA UNI UNIDAD DADEE ....... ............. ............ ............. ............. ............ ............. ........... .... 20 4 INT INTROD RODUÇÃ UÇÃO O À UNI UNIDAD DADEE ........... .................. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ .......... .... 20 5 OR ORIGE IGENS NS DA ÉTI ÉTICA CA ...... ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ......... ... 21 6 ÉTI ÉTICA CA E A DIG DIGNID NIDADE ADE HUMANA HUMA NA ...... ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............ ..... 24 7 ÉTI ÉTICA, CA, BI BIOÉT OÉTICA ICA E SOC SOCIED IEDADE ADE ....... ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ......... 33 8 QU QUESTÕ ESTÕES ES AUTO AUTOAVALI AVALIATIVAS ATIVAS ....... ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ......... .. 34 9 CON CONSI SIDER DERAÇÕ AÇÕES ES ....... ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............ ..... 35 10 EREF REFERÊ ERÊNCI NCIA A ...... ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. .......... ... 35 11 REFER RE FERÊNC ÊNCIA IASS BIBLIO BIBL IOGR GRÁFI ÁFICA CASS ...... ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ......... 35

UNIDADE  2  ASPECTOS HISTÓRICO EVOLUTIVOS DA BIOÉTICA 1 2 3 4 5 6 7

OB JETIVO OBJET IVOSS ........... ................. ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ........... ..... 37 CONTEÚ CON TEÚDOS DOS ............... ...................... ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ .......... .... 37 ORIEN OR IENTAÇÃO TAÇÃO PARA O ESTU ESTUDO DO DA UNI UNIDAD DADEE ....... ............. ............ ............. ............. ............ ............. ........... .... 37 INTROD INT RODUÇÃ UÇÃO O À UNI UNIDAD DADEE ........... .................. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ .......... .... 38 ORIGE OR IGENS NS DA PALAVR PALAVRA A “BI “BIOÉT OÉTICA” ICA” ...... ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ........ .. 38 NASCI NA SCIMEN MENTO TO DA BIO BIOÉTI ÉTICA CA ...... ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ....... 40 DESENVOLVIMENTO DESEN VOLVIMENTO E CONSOLIDAÇÃO CONSOLI DAÇÃO DA BIOÉTICA BIOÉTI CA ... ...... ...... ...... ...... ....... ....... ...... ...... ...... ...... ... 47

8 QU ESTÃO AUTOAVAL AUTOAVALIATIVA IATIVA ............. ...... ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ....... 49 9 QUESTÃO CONSI CON SIDER DERAÇÕ AÇÕES ES ....... ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............ ..... 50 10 REF REFERÊ ERÊNCI NCIAS AS BIB BIBLIO LIOGR GRÁFI ÁFICA CASS ............... ...................... ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. .......... ... 50

UNIDADE  3  CONCEITOS E PRINCÍPIOS FUNDAMENT FUNDAME NTAIS AIS DA BIOÉTICA 1 2 3 4 5 6

OB JETIVO OBJET IVOSS ........... ................. ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ........... ..... 53 CONTEÚ CON TEÚDOS DOS ............... ...................... ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ .......... .... 53 ORIEN OR IENTAÇÕES TAÇÕES PARA O ESTU ESTUDO DO DA UNI UNIDAD DADEE ...... ............ ............ ............. ............. ............ ............. .......... ... 54 INTRO IN TRODU DUÇÃO ÇÃO À UN UNIDA IDADE DE ...... ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ....... 54 COMO COM O TUDO TUD O COMEÇO COM EÇOU U....... ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ...... 54 TEORIA TEO RIA PRINC PR INCIP IPIA IALI LISTA STA....... ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ........ 57

7 CRÍT CRÍTICA ICASS À TEORI TEORIA A PRI PRINCIP NCIPIAL IALISTA ISTA E SUAS LIMITAÇÕES ... ....... ....... ...... ...... ...... ...... ....... ...... .. 62 8 BIO BIOÉTICA ÉTICA:: É POS POSSÍVE SÍVELL CONSTRUIR CONSTRUI R UM CONSENSO? CONSENS O? ... ...... ...... ...... ...... ....... ....... ...... ...... ...... ...... ..... 64 9 QU QUESTÃO ESTÃO AUTOAVALIATIVA AUTOAVAL IATIVA ...... ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ....... 66

 

10 CON CONSID SIDERA ERAÇÕE ÇÕESS ...... ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............ ...... 67 11 EREF REFERÊ ERÊNCI NCIA A ...... ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ .......... .... 68 12 REFER RE FERÊNC ÊNCIAS IAS BIBLI BI BLIOG OGRÁF RÁFICA ICASS ....... ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ....... 68

UNIDADE  4  A BIOÉTICA E A INTERDISCIPLINARIDADE 1 OB OBJET JETIVO IVOSS ............ .................. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. .......... .... 69 2 CON CONTEÚ TEÚDOS DOS ............... ..................... ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ .......... .... 69 3 ORI ORIENTAÇÕ ENTAÇÕES ES PARA O ESTU ESTUDO DO DA UNI UNIDAD DADEE ....... ............. ............ ............. ............. ............ ............ ......... ... 70 4 INT INTROD RODUÇ UÇÃO ÃO À UNI UNIDAD DADEE ............ .................. ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ......... ... 71 5 PO PONTO NTO DE PARTID PARTIDA A DA BI BIOÉT OÉTIC ICA A MOD MODERN ERNA A ....... ............. ............ ............. ............. ............ ............ ......... ... 72 6 BIO BIOÉTI ÉTICA CA E INT INTERD ERDIS ISCIP CIPLI LINAR NARIDA IDADE DE ...... ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ......... ... 73 7 BIOÉTICA E SUAS FRONTEIRAS EPISTEMOLÓGI EPISTEMOLÓGICAS CAS...... ............. ............. ............ ............. ............. ...... 75 8 QU QUESTÃO ESTÃO AUTOAVALIATIVA AUTOAVAL IATIVA ...... ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ........ 85 9 CON CONSID SIDERA ERAÇÕE ÇÕESS ...... ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............ ...... 85 10 REFER RE FERÊNC ÊNCIAS IAS BIBLI BI BLIOG OGRÁF RÁFICA ICASS ....... ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ....... 86

UNIDADE  5  DIÁLOGO ENTRE A RELIGIÃO E A CIÊNCIA 1 OB OBJET JETIVO IVOSS ............ .................. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. .......... .... 87 2 CON CONTEÚ TEÚDOS DOS ............... ..................... ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ .......... .... 87 3 ORI ORIENTAÇÃ ENTAÇÃO O PARA O EST ESTUDO UDO DA UN UNIDA IDADE DE ...... ............. ............. ............ ............. ............. ............ ........... ..... 88 4 INT INTROD RODUÇ UÇÃO ÃO À UNI UNIDAD DADEE ............ .................. ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ......... ... 89 5 REL RELIGI IGIÃO ÃO E CIÊNCI CIÊ NCIA A ...... ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ......... 89 6 PRO PROCES CESSO SO DE SEC SECULA ULARI RIZAÇ ZAÇÃO ÃO ....... ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ....... 92 7 QUAND QUANDO O A CIÊNCIA CIÊNC IA ENCONTRA ENCO NTRA A RELIG RE LIGIÃO IÃO ... ....... ....... ...... ...... ...... ...... ...... ....... ....... ...... ...... ...... ...... ....... .... 94 8 QU QUESTÃO ESTÃO AUTOAVALIATIVA AUTOAVAL IATIVA ...... ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ........ 100 9 CON CONSID SIDERA ERAÇÕE ÇÕESS ...... ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............ ...... 101 10 EREF REFERÊ ERÊNCI NCIA A ...... ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ .......... .... 101 11 REFER RE FERÊNC ÊNCIAS IAS BIBLI BI BLIOG OGRÁF RÁFICA ICASS ....... ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ....... 101

UNIDADE  6  A BIOÉTICA E A MANIPULAÇÃO GENÉTICA 1 2 3 4 5

OB JETIVO OBJET IVOSS ............ .................. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. .......... .... 103 CONTEÚ CON TEÚDOS DOS ............... ..................... ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ .......... .... 103 INTROD INT RODUÇ UÇÃO ÃO À UNI UNIDAD DADEE ............ .................. ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ......... ... 104 ESTERILIDADE HUMANA HUMANA.................................................................................. .................................................................................. 104 PRINCIPAIS PRIN CIPAIS TÉCNICAS TÉCNIC AS DE REPRODUÇÃO REPRODU ÇÃO ASSISTIDA ASSI STIDA ... ....... ....... ...... ...... ...... ...... ...... ....... ....... ...... ..... .. 105

6 DESDOBRAM BRAMENTOS ENTOS DAS INTERVENÇ INTE RVENÇÕES ÕES PARA A SOCI SOCIEDADE EDADE ...... ... ...... ...... ....... ....... ...... 113 108 7 DESDO QUESTÃO QU ESTÃO AUTOAVAL AUTOAVALIATIVA IATIVA ............ ...... ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ .......

 

CON SIDERA ERAÇÕE ÇÕESS .......... ................ ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ........ .. 113 8 CONSID 9 EREF REFERÊ ERÊNCI NCIAS AS ...... ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ........ .. 114 10 REFER RE FERÊNC ÊNCIA IASS BIBLIO BIBL IOGRÁ GRÁFI FICAS CAS ...... ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ........ 114

UNIDADE  7  A BIOÉTICA E O ABORTO 1 2 3 4 5 6 7 8

OBJ ETIVOS OBJETI VOS ................ ...................... ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ...... 115 CONTEÚ CON TEÚDO DOSS .......... ................ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ......... ... 115 ORIENTAÇÃ ORI ENTAÇÃO O PARA O EST ESTUDO UDO DA UN UNIDA IDADE DE ...... ............. ............. ............ ............. ............. ............ ........... ..... 116 INTROD INT RODUÇ UÇÃO ÃO À UNI UNIDAD DADEE ............ .................. ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ......... ... 116 CONCEITUAÇ CONC EITUAÇÃO ÃO E PRINCIPAIS TIPOS TIP OS DE ABORTO ... ...... ...... ...... ....... ....... ...... ...... ...... ...... ....... ....... ..... .. 116 LEGISLAÇ LEGI SLAÇÃO ÃO BRASILEI BRAS ILEIRA RA SOBRE SOBR E O ABORTO ...... ......... ....... ....... ...... ...... ...... ...... ....... ....... ...... ...... ...... ...... ..... .. 118 SEXUAL SEX UALIDA IDADE DE HUM HUMAN ANA A E A FAMÍL FAMÍLIA IA ...... ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. .......... ... 119 ABORTO AB ORTOSS NÃO AS ASSIS SISTID TIDOS OS ...... ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ........ .. 121

9 AB ABORTO ORTOSS ASSIST ASS ISTID IDOS OS ...... ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ........... .... 123 10 PRINCI PR INCIPAIS PAIS ASPECTOS ASPEC TOS E DIMENSÕES DIMENS ÕES QUE ENVOLVEM EN VOLVEM O ABORTO ... ....... ....... ...... ... 124 11 QU QUESTÕE ESTÕESS AUTO AUTOAVALI AVALIATIVAS ATIVAS ................. ....................... ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ........... ..... 127 12 CON CONSID SIDERA ERAÇÕE ÇÕESS ...... ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ...... 128 13 REFER RE FERÊNC ÊNCIA IASS BIBLIO BIBL IOGRÁ GRÁFI FICAS CAS ...... ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ........ 128

UNIDADE  8  BIOÉTICA, EUTANÁSIA E CLONAGEM 1 OBJ OBJETI ETIVOS VOS ................ ...................... ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ...... 131 2 CON CONTEÚ TEÚDO DOSS .......... ................ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ......... ... 131 3 INT INTROD RODUÇ UÇÃO ÃO À UNI UNIDAD DADEE ............ .................. ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ......... ... 132 4 VOLTANDO ÀS ORIGE OR IGENS NS ....... .............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............ ..... 132 5 PO POLIS LISSEM SEMIA IA DA PALAVR PALAVRA A “EU “EUTANÁSI TANÁSIA” A” ....... ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ........... ..... 134 6 CLA CLASSI SSIFIC FICAÇÃ AÇÃO O DA EUTANÁ EUTANÁSI SIA A ....... ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ...... 136 7 DIS DISTANÁS TANÁSIA IA E SUI SUICÍD CÍDIO IO AS ASSIS SISTID TIDO O ...... ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ......... 136 8 CLONAG CLON AGEM EM ...................................................................................................... 141 9 CON CONCEI CEITO TO DE CLO CLONAG NAGEM......... EM............... ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ........ 142 10 AS POSS POSSIBIL IBILIDADE IDADESS DE CLONA CLONAGEM GEM HUMA HUMANA NA ... ....... ....... ...... ...... ...... ...... ....... ....... ...... ...... ...... ...... ...... ..... .. 145 11 QU QUESTÃO ESTÃO AUTO AUTOAVALI AVALIATIVA ATIVA ............... ...................... ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. .......... .... 148 12 CON CONSID SIDERA ERAÇÕE ÇÕESS ...... ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ...... 149 13 EREF REFERÊ ERÊNCI NCIAS AS ...... ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ........ .. 149 14 REFER RE FERÊNC ÊNCIA IASS BIBLIO BIBL IOGRÁ GRÁFI FICAS CAS ...... ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ........ 150

 

UNIDADE  9  ALIMENTOS TRANSGÊNICOS, TRANSPLANTES E DOAÇÃO DE ÓRGÃOS 1 2 3 4 5 6 7 8

OBJ ETIVOS OBJETI VOS ................ ...................... ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ...... 151 CONTEÚ CON TEÚDO DOSS .......... ................ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ......... ... 151 ORIENTAÇÃ ORI ENTAÇÃO O PARA O EST ESTUDO UDO DA UN UNIDA IDADE DE ...... ............. ............. ............ ............ ............. ............. ........... ..... 152 INTROD INT RODUÇ UÇÃO ÃO À UNI UNIDAD DADEE ............ .................. ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ......... ... 152 CONCEITUAÇÃ CONCE ITUAÇÃO O DOS ALI ALIMENTOS MENTOS TRANSGÊNI TRANS GÊNICOS COS ... ...... ...... ....... ....... ...... ...... ...... ...... ...... ....... ....... ... 153 ALGUN ALG UNSS ARG ARGUM UMENTO ENTOSS FAVORÁVE FAVORÁVEIS IS ...... ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ........... .... 155 ALGUNS ARGUMENTOS CONTRÁRIOS AO USO DOS TRANSGÊNICOS .. .... .... .... .... 156 ALIMENTOS TRANSGÊNICOS: IMPACT IMPACTOS OS SOBRE A SAÚDE E O MEIO AMBI AM BIEN ENTE TE ......................................................................................................... 157 9 TRA TRANSP NSPLAN LANTES TES E DOA DOAÇÃO ÇÃO DE ÓRG ÓRGÃOS ÃOS ....... ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............ ..... 160 10 RECO RECORDA RDANDO NDO ALG ALGUNS UNS FA FATOS TOS ...... ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ......... ... 161 11 DIME DIMENSÃO NSÃO SOCIA S OCIALL DO PROB PROBLEMA LEMA DE TRANSP TR ANSPLAN LANTE TE .... ....... ...... ...... ...... ...... ...... ....... ....... ...... ..... 163 12 O QUE Q UE É NECESSÁR NEC ESSÁRIO IO PARA A DOAÇÃ DOAÇÃO O DE D E ÓRGÃOS? Ó RGÃOS? ... ....... ....... ...... ...... ...... ...... ....... ....... ...... ..... .. 164 13 QU QUESTÕE ESTÕESS AUTO AUTOAVALIATI AVALIATIVAS VAS ................. ....................... ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ........... ..... 168 14 CON CONSID SIDERA ERAÇÕE ÇÕESS FIN FINAIS AIS ...... ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............. ............. ...... 169 15 EREF REFERÊ ERÊNCI NCIAS AS ...... ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ............. ............. ............ ........ .. 170 16 REFER RE FERÊNC ÊNCIA IASS BIBLIO BIBL IOGRÁ GRÁFI FICAS CAS ...... ............. ............. ............ ............. ............. ............ ............ ............. ............. ............ ........ 170

 

Caderno de Referência de Conteúdo

CRC Ementa ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Fundamentos epistemológicos da Bioética/ Aspectos histórico-evolutivos. Conceitos. Princípios fundamentais. Interdisciplinaridade. Questões atuais: manipulação genética. Aborto. Eutanásia. Clonagem. Alimentos transgênicos. Transplantes e doação de órgãos.

 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  ––––––––––––––––––––––––––––––––––––– –––––––––––––––

1. INTRODUÇÃO Caríssimo aluno, seja bem-vindo ao estudo da Bioética Bioética.. Você terá oportunidade de estudar o conceito da Bioética, a sua abrangência e os seus desdobramentos desdobramentos teórico-conceituais. À medida que você for se familiarizando com os principais conceitos e ideias sobre a Bioética, perceberá perceberá que se trata de uma área de conhecimento que transita pelos mais diversos campos do conhecimento científico, exigindo abertura, ou seja, diálogo  diálogo  por parte da Religião e da Ciência, uma vez que a Ciência precisa da Religião e a Religião também necessita da Ciência para avançar nas

 

10

© Bioética

pesquisas e estudos, visando à superação dos problemas existentes na sociedade contemporânea. contemporânea. A cada texto e a cada unidade, você trilhará novos passos na aquisição de conhecimentos e ampliará sua consciência com relação ao tema da Bioética. Portanto, coragem e ânimo itinerário qanálise ue exigirá você persistência e compromisso diárioneste de leitura e deque de de textos. Desejamos a você bons estudos!

2. ORIE ORIENT NTAÇÕES AÇÕES PARA ESTUD ESTUDO O Abordagem Geral Aqui, você entrará em contato com os assuntos principais deste conteúdo de forma breve e geral e terá a oportunidade de aprofundar essas questões no estudo de cada unidade. unidade. No entanto, essa Abordagem Geral visa fornecer-lhe o conhecimento básico necessário a partir do qual você possa construir um referencial referencial teórico com base sólida – científica e cultural – para que, no futuro exercício de sua profissão, você a exerça com competência cognitiva, ética e responsabilidade social. “É mais fácil desintegrar um átomo do que um preconceito” (Albert Einstein, 1879 – 1955).

A ética como pressuposto da bioética • Relação entre ética, bioética e sociedade. • Bioética – uma retrospe retrospectiva ctiva histórica Van Rensselaer Potter publicou em 1971 o livro Bioética: uma ponte para o futuro. Potter afirma: Como indivíduos, nós não podemos deixar nosso destino nas mãos de cientistas, engenheiros, tecnólogos e políticos que esqueceram ou nunca souberam essas verdades elementares

 

© Caderno de Referência de Conteúdo

11

Em 1974 criou-se nos EUA a “Comissão Nacional para a proteção de sujeitos humanos na pesquisa biomédica e comportamental”. Em 1978 o relatório Belmonte defendeu 3 princípios éticos universais: 1 o respeito pelas pessoas – a autonomia, 2 a beneficência, 3 a justiça. A Bioética no Brasil Os primeiros passos foram dados em 1993, quando o conselho federal de medicina editou a revista Bioética. Em 1996 foi criada a Sociedade Brasileira de Bioética, SBB. Em 1996, através da resolução 196/96, foi criada a comissão nacional de ética em pesquisa, CONEP; com a mesma resolução também foram criados os comitês de ética em pesquisa em nível local.  A situação atual  atual  Duas conquistas acadêmicas recentes: 1 a legitimação da bioética como disciplina acadêmica nos cursos universitários, e 2 a criação de núcleos e centros de pesquisa em bioética nas universidades, nos centros universitários e nos institutos de pesquisa. Temas e questões práticas da bioética  Algumas questões questões atuais Destaquem-se Destaque m-se alguns temas atuais polêmicos: O aborto, transplante e doação de órgãos, clonagem, eutanásia, células tronco embrionárias, planejamento populacional, alimentos orgânicos e transgênicos entre outros. O estudo e o debate sobre Bioética pode produzir dois sentimentos contraditórios: contr aditórios: o fascínio e a repulsa A ciência sem religião é manca, a religião sem a ciência é cega (Albert Einstein, 1879 – 1955) Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

12

© Bioética

Glossário de Conceitos Este glossário permite a você uma consulta rápida e precisa das definições conceituais, possibilitando-lhe um bom domínio dos termos técnico-científicos utilizados na área de conhecimento dos temas tratados em Bioética Bioética.. Veja, a seguir, a definição dos principais conceitos: 1) Genealogia: é o estudo da origem das leis, do mundo e do próprio homem. 2) Mito: é tudo aquilo que não pode pode ser explicado de forma empírica ou racional. 3) Secularização: é um processo histórico dos últimos séculos em que as crenças e as instituições religiosas perderam a sua centralidade e hegemonia, sendo substituídas pelas atividades econômicas e comerciais. Origina-se do latim seculum seculum,, que significa século ou tempo e se opõe a eterno. Indica a sociedade laica e secularizada, governada pela razão e livre da influência político-moral da Religião. 4) Ontologia: é a parte da Filosofia que estuda o ser humano dentro do seu contexto histórico. 5) Axiologia: é o estudo estudo que que se ref refere ere à teoria teoria dos valores morais, filosóficos e metafísicos metafísicos.. 6) Ética: pode ser entendida entendida como a forma forma de ser e de agir de cada um, sempre visando o bem comum ou coletivo. 7) Autonomia: Autonomi a: écomo a postura conscienteem e refletida de cada ser humano individualidade tomar decisões, em caminhar com as próprias pernas. 8) Responsabilidade: é desenvolv desenvolver er a capacidade de “responder” pelos seus atos e comportamentos. comportamentos. 9) Valoração/ aloração/V Valori alorização: zação: é a capacida capacidade de do ser humano atribuir maior ou menor importância às pessoas e às coisas. 10) Moral: é o conjunto conjunto de regras, normas e leis existentes na sociedade com a finalidade de regular as relaçõe relaçõess sociais. 11) Deontologia: refere-se à teoria do dever profissional, das relações entre médicos e seus pacientes.

 

© Caderno de Referência de Conteúdo

13

12) Bioética: estudo sistemático da conduta humana, na área das ciências da vida e dos cuidados de saúde, quando essa conduta é examinada à luz dos valores e dos princípios morais. (Reich). Filosofia da inves investigação tigação e da prática biomédica (Sgreccia). Setor da ética que estuda os problemas inerentes à tutela da vida física e, em particular, as implicações éticas das ciências biomédicas (Leone). A ética aplicada aos novos problemas que se desenvolvem nas fronteiras da vida (Dicionário de Bioética. Aparecida, Editora Santuário, 2001).

13) Relatório Belmont: refere-se à Comissão Nacional para a Proteção de Sujeitos Humanos na Pesquisa Bioética e Comportamental norte-americana que trabalhou por quatro anos na elaboração dos princípios e fundamentos normativos da Bioética. 14) Liberalismo: é o conjunto de ideias e doutrinas que visam assegurar a liberdade individual da política,ada moral, da Religião etc., dentrono dacampo sociedade. 15) Paradigma: conceito que significa modelo ou padrão, um conjunto de ideias e valores capazes de explicar o mundo, o ser humano e a realidade. 16) Transdisciplinaridade: trata-se de uma nova abordagem científica em que o todo não é uma simples soma das partes, mas é uma concepção em que todas as coisas estão profundamente interligadas entre si. Equivale ao conceito de holismo segundo Edgar Morin. 17) Inquisição: ou Santo Ofício, foi um antigo tribunal eclesiástico instituído com o fim de investigar investigar e punir crimes contra a fé católica. 18) Multiculturalismo: engloba engloba o pluralismo pluralismo cultural, incluinincluindo a grande diversidade de línguas, costumes, leis, tradições e valores próprios de cada grupo étnico e social. 19) Pragmatismo: é uma concepção filosófica fundamentada nos valores práticos, imediatos, utilitaristas; trata-se de valores descartáveis, efêmeros e passageiros como a moda por exemplo. 20) Positivismo: é a visão de mundo segundo a qual a Ciência salvará o ser humano e criará um futuro positivo, suClaretiano - Centro Universitário Universitário

 

14

© Bioética

perando as negatividades entre os homens, em que a Religião deve ser eliminada. 21) Infertilidade: é a incapacidade, muitas vezes temporária, de uma mulher ou homem de ter filhos, por diversas causas que podem ser diagnosticadas por exames e acompanhamento acompanhament o médico. 22) Esterilidade: incapacidade mais ou exceto menosem definitiva e irreversível édea se conceber um filho, condições médicas excepcionais. 23) Aborto/Abortamento: Ab orto/Abortamento: é a expulsão natural ou provocada de um embrião ou feto, antes da data de viabilidade. 24) Eugenia: o termo eugenia foi usado pela primeira vez em 1883 pelo cientista inglês Francis Galton, pioneiro no tratamento trat amento da hereditariedade. A palavra é originária do grego e significa bom nascimento. 25) Eutanásia: o significado literal da palavra (etimologia) quer

26) 27) 28)

29) 30)

dizer “boa morte”, morte”, morte suave e sem sofrimento, sofrimento, ou ainda uma morte digna. Mais recentement recentemente, e, a eutanásia é entendida como ajuda ou antecipação da morte, ocasionada por ação ou omissão deliberada de outra pessoa. Distanásia: oposta à eutanásia, representa a tentativa de prolongamento da vida, enquanto houver uma mínima chance de sobrevida. Ortotanásia: ou morte natural, natural, significa encarar a morte como ciclo natural e humano. Clonagem: a palavra tem tem origem grega e quer dizer dizer ramo ou broto vegetal, constituindo-se num processo laboratorial pelo qual se reproduzem organismos idênticos e de mesma dotação genética, ou seja, que contenham o mesmo DNA, a partir de uma célula-mãe. Alimento transgênic transgênico: o: é todo o organismo organismo que passa por uma modificação genética por meio de técnicas de engenharia genética. Morte encefálica: pode ser considerada como a morte cerebral, ou seja, é a parte do sistema nervoso central contida do crânio e que abrange o cérebro. No casona decavidade ocorrer óbito, deve ser certificada a morte encefálicaa por um médico responsáv encefálic responsável. el.

 

© Caderno de Referência de Conteúdo

15

Questões Autoavalia Autoavaliativas tivas No final de cada unidade, você encontrará algumas questões autoavaliativas sobre os conteúdos ali tratados, as quais podem ser de múltipla escolha ou abertas com respostas objetivas ou dissertativas. Vale ressaltar que se entendem as respostas objetivas como as que se referem aos conteúdos matemáticos ou àqueles que exigem uma respost respostaa determinada, inalterada. Responder, discutir e comentar essas questões, bem como relacioná-la pode ser uma forma de você avaliar o seu conhecimento. Assim, mediante a resolução de questões pertinentes ao assunto tratado, você estará se preparando para a avaliação final, que será dissertativa. Além disso, essa é uma maneira privilegiada de você testar seus conhecimentos conhecimentos e adquirir uma formação sólida para a sua prática profissional. Você encontrará, encontrará, ainda, no final de cada unidade, um gabarito, que lhe permitirá conferir as suas respostas sobre as questões autoavaliativas autoav aliativas (as de múltipla escolha e as abertas objetivas). As questões dissertativas obtêm por resposta uma interpretação pessoal sobre o tema tratado. Por isso, não há nada relacionado a elas no item Gabarito. Você pode comentar suas respostas com o seu tutor ou com seus colegas de turma.

Bibliografia Básica É fundamental que você use a Bibliografia Básica em seus estudos, mas não se prenda só a ela. Consulte, também, as bibliografias complementares. Figuras (ilustrações, quadros...) Neste material instrucional, as ilustrações fazem parte integrante dos conteúdos, ou seja, elas não são meramente ilustrativas, pois esquematizam e resumem conteúdos explicitados no texto. text o. Não deixe de observar a relação dessas figuras com os conClaretiano - Centro Universitário Universitário

 

16

© Bioética

teúdos, pois relacionar aquilo que está no campo visual com o conceitual faz parte de uma boa formação intelectual. Dicas (motivacionais) Este estudo convida você a olhar, de forma mais apurada, a Educação como processo de emancipação do ser humano. É importante que você se atente às explicações teóricas, práticas e científicas que estão presentes nos meios de comunicação, bem como partilhe suas descobertas com seus colegas, pois, ao compartilhar com outras pessoas aquilo que você observa, permite-se descobrir algo que ainda não se conhece, aprendendo a ver e a notar o que não havia sido percebido antes. Observar é, portanto portanto,, uma capacidade que nos impele à maturidade. Você, como aluno dos Cursos de Graduação na modalidade EAD e futuro profissional da educação, necessita de uma formação conceitual sólida e consistente. Para isso, você contará com a ajuda do tutor a distância, do tutor presencial e, sobretudo, da interação com seus colegas. Sugerimos, pois, que organize bem o seu tempo e realize as atividades nas datas estipuladas. É importante, ainda, que você anote as suas reflexões em seu caderno ou no Bloco Blo co de Anotações, pois, no futuro, elas poderão ser utilizadas na elaboração de sua monografia ou de produções científicas. Leia os livros da bibliografia indicada, para que você amplie seus horizontes teóricos. Coteje-os com o material didático, discuta a unidade com seus colegas e com o tutor e assista às videoaulas. No final de cada unidade, você encontrará encontrará algumas questões autoavaliativas, que são importantes para a sua análise sobre os conteúdos desenvolvidos e para saber se estes foram significativos para sua formação. Indague, reflita, conteste e construa resenhas, pois esses procedimentos serão importantes para o seu amadurecimento intelectual.

 

© Caderno de Referência de Conteúdo

17

Lembre-se de que o segredo do sucesso em um curso na modalidade a distância é participar, ou seja, interagir, procurando sempre cooperar e colaborar com seus colegas e tutores. Caso precise de auxílio sobre algum assunto relacionado a este Caderno de Referência de Conteúdo, Conteúdo, entre em contato com seu tutor. Ele estará pronto para ajudar você.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

Fundamentos Epistemológicos da Bioética

      D       A       E

1

1. OBJETIVOS • Analisar e compreender a relação relação entre entre ética, ética, Bioética Bioética e sociedade. • Reconhece Reconhecerr e analisar a pluralidade cultural como um valor fundamental da condição humana. • Interpre Interpretar tar a pluralidade cultural como um valor fundafundamental da condição humana.

2. CONTEÚDO CONTEÚDOSS • Origens da ética. • Ética e a dignidade humana. • Ética, Bioética e sociedade.

 

20

© Bioética

3. ORIE ORIENT NTAÇÃO AÇÃO PARA PARA O ESTUD ESTUDO O DA UNIDADE UNI DADE 1) Para que você você aprofunde aprofunde mais os seus conhecimentos conhecimentos acerca do tema aqui abordado, sugerimos a leitura da seguinte obra: ELIADE, Mircea. Mito e Realidade. Realidade. São Paulo: Perspectiva, 2001. 2) No decorrer do estudo desta unidade será apresent apresentado ado a você, alguns filósofos. Antes de iniciar seus estudos é interessante que você conheça um pouco da biografia desses pensadores e para saber mais acesse o site indicado. Thomas Hobbes Thomas  Hobbes  (1588-679) foi filósofo inglês e estudou Física e Matemática. Publicou as obras De Cive ( 1642) e o Leviathan  (1651), em que expôs sua teoria sobre o poder político.

Thomas Hobbes. Disponível em: . Acesso em: 9 ago. 2010.

Jean Paul Sartre Jean Paul Sartre (1905-1980) foi filósofo, romancista, dramaturgo e político francês. Transitou do Existencialismo à Fenomenologia e passou, também, pelo Marxismo. Dentre sua vasta produção, destaca-se Crítica da Razão Dialética, obra publicada em 1960. Jean Paul Sartre. Disponível em: < http://sapiens.ya.com/webfilosofia/sartre.jpg >. Acesso em: 9 ago. 2010.

Celesti Ce lestin n Fre Freinet inet Celestin Freinet (1896-1966) foi um pedagogo francês e é um dos defensores da teoria das classes cooperativas, incentivando a cooperação e o trabalho coletivo na educação. Celestin Freinet. Disponível em: . Acesso em: 19 ago. 2010.

4. INTRODUÇÃO À UNIDADE Nesta primeira unidade de Bioética Bioética,, você será convidado a compreender a relação entre ética, Bioética e sociedade. Não é

 

Fundamentoss Epistemológicos da Bioética © U1 - Fundamento

21

possível introduzir diretamente o assunto da Bioética sem, antes, abordarmos a questão da ética, pois ela dará todo um embasamento teórico e contextual para podermos entender melhor os problemas da Bioética. Tratar da ética em termos de sua fundamentação histórica exige, de nossa parte, adentrarmos nos ambientes mais remotos dos seres humanos, passando pelo aparecimento e construção do pensamento filosófico grego. Para realizar essa retrospectiva histórica, faremos um corte histórico, a partir de 1.000 anos antes de Cristo, com a mitologia grega, passando pelos pré-socráticos, os sofistas e as figuras como Sócrates, Platão e Aristóteles. A ética é um tema filosófico que surge do desejo de dizer algo sobre o significado último da vida, do bem absoluto, do valor absoluto.

5. ORIGENS DA ÉTICA A origem da adoção de uma ética entre os seres humanos pode ter surgido da presença e da exist existência ência do mal, do sofrimento e da morte. Assim como temos a luz e a sombra, temos, também, o mal e o bem. Podemos nos perguntar: por que existe o mal? De onde ele se origina? O problema do mal aparece, num primeiro momento, nas narrativas narrativ as mitológicas. Nos mitos, criam-se e recriam-se, por meio de fábulas ou ficções alegóricas, os feitos primordiais que, supostamente, fornecem explicações e fundamentos tanto tanto para a adoção de normas sociais como para crenças e costumes, mediante a explanação da genealogia das genealogia  das leis, ou origem do mundo e do próprio homem.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

22

© Bioética

A palavra “genealogia” origina-se das termos gregs: “ genea” = geração e “logia” = discurso. A genealogia é, dentre os ramos do saber, o que se refere às famílias, estudando-lhes as origens, mostrando a sua evolução, descrevendo as gerações e traçando, embora resumidamente, a biografia das pessoas que as compõem. Disponível em:< http://www. ingers.org.br/Principiante.html>. Acesso em: 19 fev. 2009.

Muitas vezes, as explicações estão associadas às atividades de seres sobrenaturais ou de poderes excepcionais e permitem a  justificação de valores, atribuições, instituições e crenças que as sociedades vão construindo mediante representações simbólicas que contêm características características próprias da comunidade que os cria. Os mitos têm essa capacidade de reproduzir, de forma ideológica, as crenças e os fundamentos da sociedade que os produz. Enquanto narrativ narrativas as dos tempos primordiais no mundo grego clássico, o mito é definido como narração do sagrado, do inexplicável, inexplicáv el, do enigma. Temos, por exemplo, uma relação extensa de mitos gregos: os mitos da criação do mundo, os mitos dos heróis e de salvadores, os mitos sobre os diferentes diferentes povos e os mitos sobre os fins últimos do ser humano. Você poderá estar pensando que os mitos se constituem em algo pertencente aos povos antigos e que já foram totalmente eliminados na sociedade atual. Não é verdade. Mostraremos que temos, atualmente, uma série de mitos presentes e que caracterizam a sociedade atual. O conceito de mythos mythos,, proveniente da língua grega, significa aquilo que permanece vivo e presente na memória das pessoas e que precisa, necessariamente, dos ritos, das comemorações. Comemorar é trazer para a memória, é recordar, é avivar. Os gregos, muito cedo, tomaram consciência de que os mitos não teriam vida longa sem as festas, festas, os rituais, as comemorações. Nesse sentido, enquanto o mito é memória, o rito é comemoração; quer dizer, quando celebramos uma data, um acontecimento significativo, estamos avivando a memória para não a esquecer.

 

Fundamentoss Epistemológicos da Bioética © U1 - Fundamento

23

Temos de pensar que toda a mitologia grega e romana, e depois também a medieval, foi contada e repassada de geração para geração, por meio da oralidade, e o mais impressionante é que, até hoje, sobrevivem e se perpetuam os grandes mitos da antiguidade clássica. Enganam-se aqueles que acreditam que os mitos se referem às sociedades remotas e tribais; nunca tantos mitos existiram existiram como na sociedade contemporânea. contemporânea. Segundo Buzzi (2004, p. 147): Cada época recompõe sua fala, a partir de uma linguagem impregnada de mitos. Nesses, a sociedade consubstancia as tarefas da vida. A sociedade desenvolvida, a hegemonia do proletariado como fim de todas as alienações, a liberdade burguesa como dignidade do homem, a pátria, a máquinamáqu ina- motor, motor, os sofisticados sofisticado s bens de consumo, as drogas drogas e o turismo são mitos do homem de hoje.

No momento histórico em que aparece a linguagem escrita, por exemplo, as tradições éticas e morais começam a ser fixadas e adotadas pelos grupos humanos. Os povos gregos assimilaram a forma de escrever dos povos Fenícios, separando vogais e consoantes, e escreveram-nas separadamente. Dessa forma, chegou-se à escrita alfabética por volta de 800 anos antes de Cristo. E, a partir do surgimento da escrita, ocorre um problema, ou seja, a adequação da história viva, dinâmica e mutantee com aquilo que está fixado na escrita. mutant Por isso, temos de nos perguntar: como c omo conciliar, veicular, analisar e interpretar o novo, o dinâmico, o mutável com a escrita?

Nesse momento, aparece, então, a necessidade da interpretação do que está escrito como norma, como lei ou tradição, em correlação com os fatos concretos e reais. Por isso, utilizam-se a razão e a inteligência como parâmetros na conduta humana, e a tensão entre a teoria e a prática é permanente e exige constantes mediações. Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

24

© Bioética

Aristóteles (384-322) já preconizava que o homem é um ser social por natureza. Entretanto, Thomas Hobbes (1588-1679) afirmou que, em cada indivíduo, predomina o egoísmo, o domínio de um sobre o outro, em que a utilidade e o interesse são a única regra de conduta. Portanto, Portanto, na concepção hobbiana, para assegurar ou garantir a paz comum, deve acontecer a passagem do estado de natureza para o pacto social, quer dizer, a presença do contrato social. Contudo, Hobbes exagerou na sua análise, uma vez que o ser humano não é nem tão racional nem tão egoísta, pois é um ser que aprende a viver em sociedade, vivendo em grupo. Por meio do processo educativo, isto é, convivendo com pessoas e grupos formais e informais, na escola, na sociedade, cada um de nós pode transformar transf ormar o egoísmo em altruísmo ou, pelo menos, numa convivência cooperativa cooperativa e solidária.

6. ÉTI ÉTICA CA E A DIGN DIGNIDADE IDADE HUMA HUMANA NA Nas sociedades modernas, caracterizadas pelo processo intenso de industrialização e, consequentemente, de urbanização, constrói-se,, paralelamente, um processo de secularização constrói-se secularização,, no qual a consciência pessoal e a dignidade humana alicerçam o cidadão, o sujeito de direitos e de deveres. A secularização é um processo histórico dos últimos séculos, no qual as crenças e as instituições religiosas se converteram em doutrinas filosóficas e instituições leigas. As igrejas, templos, sinagogas e outros espaços considerados, tradicionalmente, sagrados vão, aos poucos, perdendo a sua centralidade, sendo ocupados e substituídos por atividades comerciais, turísticas e de serviços em geral. Não é possível ao ser humano fazer o bem sem considerar um princípio básico, que é a liberdade. Faz parte da dignidade humana agir por opção livre e consciente, movida e motivada pessoalmente, com ausência de qualquer coação externa ou interna.

 

Fundamentoss Epistemológicos da Bioética © U1 - Fundamento

25

Por que o ser humano é digno? Por que possui dignidade? A dignidade humana contém uma qualidade ôntica e axiológica,  que, no fundo, é um conceito com múltiplos significados e lógica, que abrange o respeito, a liberdade e a justiça. A dignidade ontológica refere-se refere-se ao ser enquanto ser humano que ultrapassa as suas ações e decisões.  ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  ––––––––––––––––––––––––––––––––––––– ––––––––––––––– Ontologia: é uma parte da Filosofia que se ocupa do ser humano. Surgiu entre os filósofos pré-socráticos no século 6 a.C., época em que faziam uma distinção entre essência e existência. Para muitos autores, é sinônimo de metafísica. Axiologia: é a parte da Filoso fia que estuda os valores, é a ciência dos valores; vocábulo criado por Karl Böhm em 1890. A axiologia é a teoria dos valores filosóficos, morais e metafísicos.

 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Mesmo que um ser humano aja de forma considerada indigna ou irresponsável, nunca deixará de ser uma pessoa, um ser

humano capaz de acertar e errar, digno de poder se defender, de se redimir e de se recuperar. Afirmar, portanto, a dignidade humana significa que não se pode atentar contra ela, nem a tratar de forma inferior à sua categoria ontológica. Assim, é no ex exercício ercício da liberdade, de fazer escolhas, de ter opções, que o ser humano revela toda a sua dignidade.  A presença da Ética como fundamento f undamento da vida coletiva Desde a formação grupos humanos, adotadas regras e normas dos que primeiros tinham como objetivo regularforam e tornar viável a convivência humana grupal e social, visando sempre ao bem comum. Aristóteles (384-322 a.C.) escreveu quatro obras filosóficas sobre o tema, com destaque para Ética a Nicômaco. Nicômaco. Do ponto de vista da Moral e da vida espiritual, Ética a Nicômaco continua Nicômaco continua sendo uma referência no assunto e contém uma atualidade impressionante, pois relaciona a ética ao contexto social quando afirma que o ethos ethos é  é a busca e a construção do bem comum. E o que significa o bem comum senão se não respeitar, preservar, preservar, considerar a situação e a Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

26

© Bioética

posição do outro, com base na sua cultura, no idioma, nos valores, e na compreensão do mundo e da realidade? Aristóteles (384-322 a.C.) produziu um conjunto enciclopédico sobre Lógica, Metafísica, Retórica, Poética e, especialmente, Ética a Nicômaco, Nicômaco, em que discute não só o Bem ou o Bem Supremo, mas também a excelência da moral e da vida intelectual. Como você pode notar, há, hoje, uma pluralidade de concepções culturais, ritos e linguagens que mapeiam os países e diferentes fere ntes povos, além das difere diferentes ntes classes sociais, o que imprime uma riqueza incomensurável nas múltiplas sociedades. Assim, é preciso reconhecer a legitimidade da pluralidade sociocultural, valorizando as diferenças entre as etnias (já que somos uma única raça humana), religiões e culturas sem nunca renunciar à busca da verdade, da democracia, da justiça e da igualdade real. Entretanto, se, por um lado, as plantas e os animais adaptam-se ao seu habitat  natural  natural e têm seus instintos largamente desenvolvidos, como as abelhas e as formig formigas, as, por outro, os seres humanos precisam, a toda hora, fazer escolhas livres e responsáv responsáveis. eis. Portanto, pode-se afirmar que os animais vivem ajustados ao seu meio, caso contrário, entrariam em extinção; o ser humano, em contrapartida, tem de utilizar sua inteligênc inteligência ia criativa para se integrar, para construir e transformar. Ele pode refletir prévia e conscientemente sobre os objetivos e os fins que pretende atingir, bem como decidir quais são os meios mais eficazes para concretizá-los. Assim, a programação instintiva é insuficiente para o ser humano sobreviver; então, ele alia o instinto com a inteligência e a racionalidade, racional idade, ou seja, sej a, desenvolve a capacidade capacid ade de pensar, refletir refletir,, discernir, avaliar, comparar e decidir qual a alternativa mais coerente e condizente com a realidade vivida. (1977) de autonomia autonomia essa  essa postura conscientePiaget e refletida dedenominou tomar decisões. Todos nós, quando crianças,

 

Fundamentoss Epistemológicos da Bioética © U1 - Fundamento

27

vivemos uma etapa de heteronomia, ou seja, em que algum adulto determine para a criança o que fazer e como fazer. Todavia, o grande desafio que os pais e a escola enfrentam, atualmente, é o de promover e propiciar a construção da autonomia da criança, do adolescente e do jovem, um ser em formação permanente. permanente.  ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  ––––––––––––––––––––––––––––––––––––– ––––––––––––––– Jean Piaget (1896-1980) foi um psicólogo, pedagogo e filósofo suíço. Inicialmente, especializou-se em Biologia, mas depois enveredou para a Lógica e a Epistemologia, o que o conduziu às pesquisas no campo da psicologia infantil. O conjunto de suas obras tem influenciado profundamente os educadores contemporâneos.

 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  ––––––––––––––––––––––––––––––––––––– –––––––––––––––  ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  ––––––––––––––––––––––––––––––––––––– –––––––––––––––  Au ton  Auto n om omia ia  quer dizer “poder decidir”, “poder escolher as condutas que se pretende trilhar”. A autonomia é uma questão problemática, pois ela é sempre relativa ao contexto familiar, escolar, social e, portanto, é condicionada por fatores biológicos, históricos e socioculturais. Deriva dessa característica humana, que é a autonomia, um outro aspecto valorativo fundamental, que é a responsabilidade  diante de nós mesmos e dos outros.

 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Originada do latim, a palavra “responsável “responsável”” quer dizer “responder”, “ter a capacidade de dar respostas aos desafios e às contradições humanas”. Respeitar a natureza, buscar uma melhor

qualidade de vida noéticos seu sentido abrangente, abrangen te,analisados sem gerar dentro prejuízodoa ninguém, são temas que precisam ser contexto pluralista existente atualmente. Como sabemos, esse é o preço da liberdade: inicialmente, temos de responder a nós mesmos, à nossa consciência, e, como somos seres gregários e essencialmente sociais, temos de prestar contas aos outros, à sociedade na qual estamos inseridos e da qual fazemos parte. Acerca da questão da responsabilidade, Sartre (1970, p. 22) expressou-se desta maneira: Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

28

© Bioética

Se verdadeiramente verdadeiramente a existência precede à essência, o ser humano é responsável pelo que é. Assim, o primeiro passo do existencialismo é pôr todo o ser humano de posse do que é, e assentar sobre ele a responsabilidade total de sua existência. E quando dizemos que o ser humano é responsá responsável vel por si mesmo, não queremos dizer que o ser humano é responsável por sua estreita individualidade, mas que é responsá responsável vel por todos os seres humanos.

Dessa maneira, a responsabilidade social diante dos outros, diante da sociedade, é uma marca registrada registrada de cada ser humano: sua essência comunitária, a sua constituição e construção social. É por isso que o ser humano é o único animal que precisa ser educado, como afirma Freinet (2001, p. 123): “A educação não é uma fórmula de Escola, mas sim uma de vida”. Observe que, se a educação estiver fundamentada no princípio da sociabilidade, da solidariedade, a ética não será barreira nem obstáculo de convivência, mas passará a ser um instrumento de defesa das pessoas na construção de um convívio fraterno e  justo. Em síntese, a solidariedade entre os humanos transforma-se em imperativo ético, ético, que possibilita o ex exercício ercício da autonomia com responsabilidade social. A alteridade, nesse caso, é um dos fundamentos da ética. A ética na teoria e na prática A vida humana está-se tornando cada vez mais complexa e desafiadora, considerando os problemas práticos que a convivência social nos apresent apresenta. a. Em épocas históricas anteriores, vivia-se numa concepção humana e de mundo mais homogênea, de princípios e valores baseados na teoria criacionista, que afirmava que Deus planejara todas as coisas, restando ao homem optar pelo caminho do bem ou do mal. Enquanto a maioria da população mundial era rural, ou seja, vivia no campo, a relação com a natureza tornava mais simples a vida das pessoas.

 

Fundamentoss Epistemológicos da Bioética © U1 - Fundamento

29

Contudo, vivemos, atualmente, num mundo de profundas diferenças econômicas, culturais, sociais e de valores, o que dificulta, sobremaneira, a regulação da vida societária. Há, ainda, um conceito fundamental fundamental na constituição da ética, que é o valor: a capacidade que o ser humano tem de valorização.

O que é valoração ou valorização? É o ato de atribuir maior ou menor importância às coisas, aos ob jetos e às pessoas.

Com isso, estamos afirmando que a ética está fundamentada, historicamente, sobre alguns princípios e valores universais permanentes e imutáveis, como a liberdade, a justiça, a solidariedade, a dignidade humana e assim por diante. Desse modo, a sociedade vai construindo uma escala hierárquica de valores, da mesma forma que cada um de nós também constrói a sua própria escala.  ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  ––––––––––––––––––––––––––––––––––––– ––––––––––––––– Por que, então, é difícil viver em sociedade e em harmonia? Porque, muitas vezes, há um choque na escala de valores social e pessoal, e as partes precisam repensar sua posição.  posição.  Logo, temos de nos perguntar: quais são os princípios, os valores que motivam uma pessoa a agir desta ou daquela forma? O que é justo ou não, o que é válido ou não, com base em que critérios?

 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Podemos, portanto, entender que a ética não se restringe apenas à prática profissional, no exercício da profissão, mas perpassa e está presente presente o tempo todo na vida do ser humano.

No entanto, a ética tem suas relações com a Religião, com a Sociologia, com o Direito, com a Filosofia, com as Ciências em geral, com a Biologia e a Medicina, com a mídia, com o trânsito, com as compras do supermercado e, até mesmo, com um estádio de futebol. Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

30

© Bioética

Assim, a compreensão de um tema tão complexo e abrangente tem de se fundamentar em critérios e valores claramente definidos para não correr o risco de fanatizar e radicalizar posições em detrimento dos matizes que a racionalidade e a convivência humana exigem. Por isso, o estudo da ética e, por extensão, da Bioética precisam buscar os fundamentos filosóficos, teológicos e científicos para superar a compreensão do senso comum, que, de um modo geral, é abordado no âmbito da mídia e nas conver conversas sas cotidianas. Fundamentar é buscar bases mais sólidas e consistentes para poder julgar e opinar.

Com base nesses critérios, superam-se a arbitrariedade, o fanatismo e os comentários baseados no simples “achismo”. No entanto, a fundamentação é sempre uma tentativa de responder à indagação: “baseados em que princípios fazemos juízos morais ou éticos?”; ou, ainda, a questões como “o que é a verdade?”. O bem e a justiça permanecem, até hoje, como questões abertas, apesar de possuirmos milhares de livros, enciclopédias, teses e discursos produzidos sobre o tema no decorrer da história.  história.  O conceito de ética tem sua origem explicativa na língua grega e significa o modo de ser, de comportar-se diante dos desafios do dia a dia. O Ethos Ethos engloba  engloba e traduz o esforço ativo e dinâmico da pessoa que reage diante do conte contexto xto familiar e social e do ambiente histórico-social. Nesse sentido, o estudo e a compreensão da ética, no seu sentido mais amplo, devem levar em conta a liberdade individual, ou seja, o livre-arbítrio e, por extensão extensão,, todo o conte contexto xto histórico-social. Dessa forma, o ser humano sempre está envolvido nos “porquês”. Na primeira infância, as perguntas são mais simples e diretas: o que é isso? O que é aquilo? Na adolescência, já começamos

 

Fundamentoss Epistemológicos da Bioética © U1 - Fundamento

31

a encarar os porquês em um outro nível. Na fase adulta, quando já atingimos a nossa autonomia, quando já definimos nossa personalidade e a identidade, participamos de forma consciente e crítica na construção de respostas sobre a existência como individualidade e subjetividade. Vamo amoss co comp mpreend reender er o qu que e é mor m oral? al? ––– –––––– –––––– –––––– –––––– –––––– –––––– –––

O conceito de moral vem do latim “mos”, “moris” e significa “costume”, “tradição”, “caráter”. Da palavra “mores” derivou “moralis”, utilizado por Cícero para traduzir a palavra grega “ethika”. Quer dizer, do ponto de vista etimológico, Ética e Mor al al têm um conteúdo semântico idêntico. A moral pode ser entendida, então, como um conjunto de regras de conduta consideradas válidas para instituições, grupos e pessoas.

 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  –––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– A ética é o estudo dos juízos de apreciação referentes à conduta humana, isto é, julgamos se são boas ou não, justas ou injustas.

Para uma melhor compreensão, poderíamos afirmar que a moral pode ser definida como a esfe esfera ra ou dimensão da legalidade das normas e das leis ou, em outras palavras, como foram discutidas, elaboradas, quando e como foram aprovadas. Numa sociedade democrática, há as instâncias do poder legislativo,, executivo gislativo executivo e judiciário: as casas legislativas são as câmaras de vereadores, a assembleia legislativa e o congresso nacional; o poder executivo é exercido pelo prefeito, governador e presidente da república; e o poder judiciário é constituído pelos juízes, desembargadores e outros que fiscalizam o cumprimento justo das leis. Podemos, então, estabelecer uma distinção entre a moral e a ética, na medida em que a ética exige uma reflexão e análise crítica e criteriosa sobre a conduta humana e as circunstâncias que a envolvem. Nessa perspectiva, a ética vai analisar a legitimidade das leis, ou seja, se as leis são justas, se somos realmente iguais perantee as leis, se auxilia ou não o ser humano a ser mais feliz. perant

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

32

© Bioética

 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  –––––––––––––––––––––––––––––––––––––– –––––––––––––– Em síntese, a ética é, para a moral, o que a teoria representa para a prática: a moral marca um tipo concreto de conduta; a ética é uma re flexão filosófica sobre o que a sustenta. Isso significa dizer que há problemas substanciais a serem enfrentados porque a teoria e a prática não são dissociadas: elas acontecem  juntas, simultaneamen simultaneamente. te.  

 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  –––––––––––––––––––––––––––––––––––––– ––––––––––––––

O ser humano é o únicolivres, ser vivo do planetae Terra que tem a capacidade de fazer escolhas conscientes deliberadas. A ética dá sentido à história Quando falamos da realidade, temos de recuper recuperar ar a dimensão histórica para que a ética e a Bioética se situem nela. No início desta unidade, afirmamos que a Moral e a Ética começaram começara m a ser usadas de forma mais sistemática a partir do uso da linguagem escrita. As regras, as normas edevem as leis,ser uma vez aprovadas, definidas por escrito e publicadas, observadas para guiar o comportamento humano numa vida grupal e pública. Desde já, surge um problema: a vida é dinâmica, mutante e variável, enquanto a lei permanece estática. Como, então, conciliar o dinamismo existencial com a escrita? Os valores, os paradigmas, as teorias explicativas mudam e a lei pode transf transformar-se ormar-se numa lei morta. No entanto, esse é um dos papéis da ética: refletir, analisar e questionar quando as leis geram discriminações, barreiras e in justiças, para, então, então, alterá-las, tornando-as mais justas e equânimes. Quando formos formo s capazes de perguntar e responder, responder, eticamente, diante de nós mesmos e diante dos outros, daremos sentido e significado à história. Deve-se observar, no entanto, que sentido, aqui, tem uma dupla dimensão: como significado e rumo, orientação e diretriz. Nesse sentido, a ética e a Bioética têm um conteúdo maravilhoso da história, na medida em que são capazes de dar significado e orientação à vida e à história humana individual e coletiva. A

 

Fundamentoss Epistemológicos da Bioética © U1 - Fundamento

33

ética, na verdade, é o fazer e o agir humano, que podem ser traduzidos pela palavra “práxis”, “práxis”, que é a humanização do ser humano pela história e a planificação da história pelo homem, que marcam a direção e a finalidade da Ética.

7. ÉTICA, BIOÉTICA BIOÉ TICA E SOCIEDADE S OCIEDADE Como você pode perceber, o estudo da Ética tem uma retrospectiva histórica milenar, como já afirmamos anteriormente, e tem seus suportes filosóficos, teológicos e socioculturais; em contrapartida, o estudo e a discussão sobre a Bioética são recentes no mundo e, no Brasil, ainda estão dando os seus primeiros passos. Acontece que vivemos, cotidianamente, sob o impacto de informações e notícias veiculadas, muitas vezes, de forma superficial e aligeirada, sem nos atermos ao significado mais profundo que elas contêm. É o caso da Bioética: transformou-se, rapidamente, num tema atual por tratar da vida e da qualidade dela no meio social. Em outras palavras, a Bioética “virou moda” e quase que, imperceptivelmente, ocupou o espaço da ética. Ambas têm profundas relações e fundamentos recíprocos, mas a Bioética discute mais os problemas práticos e, por isso, entre outros fatores, ela tomou a dianteira e relevou uma análise mais apurada e conte contextualizada. xtualizada. Podemos afirmar que a Bioética faz parte do repertório diário da vida das pessoas, dentro de uma linha pragmática e utilitarista. Foi com esse o objetivo que traçamos a introdução do estudo da Bioética, relacionando a ética com a Bioética Bi oética e seus vínculos estreitos com a sociedade e, sobretudo, o contexto de cada época, destacando destac ando os seus problemas e desafios mais significativos. Nas próximas etapas do nosso estudo, explicitaremos melhor essas relações dialéticas entre ética, Bioética e sociedade.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

34

© Bioética

 A Hum Hu m an anii d ad ade e co c o m o d est estii n o p l an anet etár árii o ––––––––––––––––––   A comunidade de destino planetário permite assumir e cumprir esta parte de antropo-ética, que se refere à relação entre indivíduo singular e espécie humana como todo.   Ela deve empenhar-se para que a espécie humana, sem deixar de ser instância biológico-reprodutora do humano, se desenvolva e dê, finalmente,com a participação dos indivíduos e das sociedades, nascimento concreto à Humanidade como consciência comum e solidariedade planetária do gênero humano.   A Humanidade deixou de constituir uma noção apenas biológica e deve ser, ao mesmo tempo, plenamente reconhecida em sua inclusão indissociável na biosfera; a Humanidade deixou de constituir uma noção sem raízes: está enraizada em uma “Pátria”, “Pát ria”, a Terra, Terra, e a Terra Terra é uma Pátria em perigo. A Humanidade deixou de constituir uma noção abstrata: é realidade vital, pois está, doravante, pela primeira vez, ameaçada de morte; a Humanidade deixou de constituir uma noção somente ideal, tornou-se uma comunidade de destino, e somente a consciência dessa comunidade pode conduzi-la a uma comunidade de vida; a Humanidade é, daqui em diante, sobretudo, uma noção ética: é o que deve ser realizado por todos e cada um (MORIN, 2002, p.113-114).

 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  –––––––––––––––––––––––––––––––––––––– ––––––––––––––

8. QUESTÕES AUTOAVALIATIVAS Sugerimos, neste tópico, que você procure responder às questões a seguir, que tratam da temática desenvolvida nesta unidade, bem como que as discuta e as comente comente.. A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para testar seu desempenho. Se encontrar dificuldades em responder a essas questões, procure revisar os conteúdos estudados para sanar suas dúvidas. Este é o momento ideal para você fazer uma revisão do estudo desta unidade. Lembre-se de que, na Educação a Distância, a construção do conhecimento ocorre de forma cooperativa e colaborativa. Portanto, compartilhe com seus colegas de curso suas descobertas. Confira, na sequência, as questões propostas para verificar seu desempenho no estudo desta unidade: 1) Se você abrir jornais ou revistas, revistas, ligar rádio, rádio, TV ou Internet Internet encontrará encontrará muimuitas notícias e artigos que falam e abordam o tema da Ética como sendo a busca e a construção bem A partire da l eitura leitura texto da dizer Unidade 1 procure explicitar odo que é ocomum. bem comum quem, de do fato, pode ou afirmar o que é o bem comum?

 

Fundamentoss Epistemológicos da Bioética © U1 - Fundamento

35

2) O que é Ética? E Bioética? Quais Quais as relações que se pode encontrar encontrar entre entre elas? E quais são as importâncias e implicações de cada uma na vida em sociedade?

9. CONSIDERAÇÕES concluímos primeira unidade, quetica. teve como ob jetivo Assim principal introduziresta introduzir você na temática temática da Bioética. Bioé Procuramos mostrar, desde o início, que o assunto contém uma dinâmica toda especial, na medida em que apresenta uma relação dialética da ética com a Bioética e a sociedade. No entanto, isso é apenas o início de um itinerário itinerário que irá evoluir,, aprofundar-se e ampliar-se a cada nova unidade luir unid ade a ser estudada. É importante que você não se desanime desani me nunca. Vá em frente, seguindo cada passo a ser trilhado, pois você terá novos conteúdos e explicaçõe explicaçõess que possibilitarão a compreensão e, sobretudo, a assimilação da Bioética em toda a sua complexidade.

10. EREFERÊNCIA MIRANDA, C. C. Guia do principiante em Genealogia. Genealogia. Disponível em: . Acesso em: 4 set. 2010.

Baruch Spinoza Baruch Spinoza (1632-1677) foi um filósofo holandês. Entrou em contato com Galileu e o pensamento renascentista de Giordano Bruno e, depois, foi influenciado por Descartes. Publicou: Princípios da filosofia de Descartes (1663) e Tratado teológico-político  em 1670 (Grande Enciclopédia Larousse Cultural). Baruch Spinoza: disponível em: . Acesso em: 4 set. 2010.

 

© U4 - A Bioética e a Interdisciplinaridade

71

Jean Jea n Jacques J acques Roussea Rouss eau u Jean Jacques Rousseau   (1712-1778), filósofo e romancista suíço de língua francesa, conheceu Voltaire, Diderot e outros filósofos iluministas, tendo colaborado na produção da Enciclopédia. Publicou diversas obras, com destaque para: O contrato social e Da educação em que vincula política, moral e educação (Grande Enciclopédia Larousse Cultural). Jean Jacques Rousseau: disponível em: . it.jpg>. Acesso em: 4 set. 2010. 2010.

Hans Ha ns Küng Kü ng Hans Kü ng  nasceu na Suíça em 1928. Em 1962, foi nomeado Hans pelo Papa João XXIII peritus, ou seja, consultor teológico para o Concílio Vaticano II. Em 1996, tornou-se presidente da Fundação de Ética Global Gl obal em Tübengen. Tem Tem uma vasta produção com destaque para: Igreja católica (2001), As religiões religiões do mundo  (2004), Teologia a caminho:  fundamentação para o diálogo ecumênico (1999), e O princípio de todas as coisas  (2007) (Grande Enciclopédia Larousse Cultural). Hans Küng: disponível em: . Acesso em: 4 set. 2010.

4. INTRODUÇÃO À UNIDADE Vamos prosseguir nossa caminhada com relação ao estudo introdutório da Bioética. Desde o início, deixamos claro que há uma relação estreita da Ética com a sociedade, e uma relação mais íntima da Ética com a Bioética, uma vez que elas se complementam. Em seguida, abordamos alguns aspectos históricos evolutivos da Bioética. Acabamos de analisar, na unidade anterior, alguns conceitos e princípios que fundamentam e dão sustentação sustentação à Bioética como um novo campo do saber. O nosso desafio, agora, é mergulhar mais a fundo na Bioética propriamentee dita e verificar toda a complexidade que é entender propriament o ser humano vivendo em grupo, em sociedade e quais as dificuldades daí decorrent decorrentes. es.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

72

© Bioética

5. PONTO DE PARTIDA DA BIOÉTICA MODERNA Podemos, inicialmente, afirmar que a Bioética não pode ser entendida apenas como um campo de saber específico, pois seu referencial ref erencial teórico e metodológico e a sua prática cotidiana no enfrentamento frentam ento dos problemas situam-se na intersecção da Medicina, da Biologia com as suas múltiplas ramificações e especializações, com as ciências humanas, como também com a Ética, o Direito, a Filosofia e a Teologia entre outros campos. Já vimos que Potter, Potter, em 1971, entendia a Bioética Bioét ica como uma ponte entre duas culturas: a das ciências e a das humanidades, que, ainda hoje, aparecem extremamente distanciadas. Mais que um precursor, Potter dedicou sua vida inteira ao fortalecimento e à abertura de caminhos para que a Bioética se incorporasse às diferentes culturas, para que ela se transformasse num projeto de vida para todos os seres humanos que habitam o planeta. Em 2 de julho de 1974, o Presidente norte-americano assinou um Projeto de Lei que ficou conhecido como a Lei Nacional  para a Investig Investigação ação Científica Científica.. Uma vez promulgada a lei, criou-se, em seguida, uma Comissão encarregada de estudar e apreciar os problemas éticos relativos à pesquisa científica nos campos da Biomedicina e das ciências do comportamento. A criação dessa Comissão respondia, pelo menos em parte, às duras críticas que a opinião pública fazia com relação aos abusos cometidos pelos pesquisadores na manipulação de pessoas e de animais em suas experiências laboratoriais. A Comissão tinha como compromisso básico revisar as normas do Governo Federal sobre a pesquisa científica, visando proteger os direitos e o bem-est bem-estar ar dos cidadãos em geral. o início, ficou estabelecido que a Comissão não deveria se Desde restringir apenas à identificação de possíveis abusos, mas, em especial, deveria dedicar-se a formular princípios gerais e os

 

© U4 - A Bioética e a Interdisciplinaridade

73

mais sólidos e abrangentes que pudessem orientar e guiar a pesquisa futura em Biomedicina e nas ciências de conduta. Como resultado prático, a Comissão, após quatro anos, divulgou o Relatório Belmont , já estudado anteriormente, descrevendo e apontando os três princípios gerais e fundamentais que são: o respeito pelas pessoas, a beneficência e a justiça. Segundo esse relatório, o princípio do respeito às pessoas apoia-se em duas convicções morais fundamentais: fundamentais: • devem-se tratar tratar as pessoas sempre como agentes autônomos; • devem ser tutelados tutelados os direitos direitos das pessoas pessoas cuja cuja autonoautonomia está diminuída ou comprometida. Isso quer dizer que o reconhecimento da autonomia alheia implica que lesem as escolhas das pessoas autônomas sejam respeitadassempre e que não a autonomia e os direitos de terceiros. O princípio da beneficência inclui, também, a obrigação de não fazer mal (a não maleficência) como dever moral de agir para beneficiar os outros. Já o princípio da justiça é entendido com base na chamada  justiça distributiva, que tem a ver com o que juridicamente é denominado como aquilo que pertence às pessoas ou aquilo que é devido a elas. O problema está no fato de que cada país tem a sua legislação, a Constituição, o seu Código Penal e a formulação de suas políticas públicas, o que fornece e fundamenta uma autonomia de cada Estado ou Nação.

6. BIOÉTI BIOÉTICA CA E INTERDISCIPLINARIDADE INTERDISCI PLINARIDADE Falar das “fronteiras” da d a Bioética é uma tarefa bastante complicada, porque envolve a compreensão dos paradigmas e das inter-relações da epistemologia, isto é, envolve o ser humano, que é o ser mais complexo do planeta Terra.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

74

© Bioética

O conceito  Paradigma pode ser definido como um modelo, um conjunto de ideias e valores capazes de situar os membros de uma comunidade em determinado contexto, de maneira a possibilitar a compreensão da realidade e a atuação, com base em valores comuns. Dessa forma, o paradigma engloba todo o referencial teórico-prático, todo um conjunto de saberes e conhecimentos produzidos, acumulados e transmitidos de geração para geração, mantendo vivas as tradições e costumes de um povo (Thomas Kunh).

O conhecimento, então, vai sendo construído com base nas experiências, na solução prática dos problemas, arquitetadas na forma criativa cri ativa de pensar pens ar,, discernir discer nir,, comparar, comparar, enfim, de fazer escolhas diante de uma situação desafiadora. Utilizamos o termo “fronteiras” entre aspas, porque compartilhamos da concepçãodeholística Edgar Morin, que see autodenoMorin, mina “sequestrador” saberesde e de conhecimentos defende a tese de que não há, efetivamente, fronteiras reais entre as ciências exatas, biológicas e humanas. Todas essas coisas estão intimamente interligadas entre entre si, de tal modo que a fronte fronteira ira é artificial, existindo apenas na cabeça das pessoas. As nossas Escolas e os Currículos estão organizados, de um modo geral, de forma estanque e fragmentados, o que nos fornece uma visão de mundo compartimentalizada com uma nítida separação entre as ciências exatas (as que possuem leis universais), as ciências da natureza (que têm causa e efeito) e as ciências humanas ou sociais (que têm conceitos e paradigmas diferenciados de uma região para a outra). Considerando as diferenças e diversidades econômicas, políticas e socioculturais entre os 240 países do mundo e levando em conta os limites que o sistema educacional nos apresenta em termos curriculares, poderíamos afirmar que não é por acaso que há uma “gradede “grade” ” curricular emdeque cada docente mora na sua “gaiola ouro”, ounas na Escolas, sua “torre marfim” sem estabelecer uma abordagem interdisciplinar.

 

© U4 - A Bioética e a Interdisciplinaridade

75

Segundo Morin, a transdisciplinaridade contém contém dois elementos básicos: primeiro, trata-se de algo mais que a mera intensificação do necessário diálogo entre as distintas áreas e disciplinas científicas, porque a questão que precisa ser explicitada é a da mudança de paradigma epistemológico; em segundo lugar, o diálogo entre as ciências será mais profundo se houver uma transmigr transmigração ação de certos conceitos fundantes por meio das diversas disciplinas  – em especial, a junção dos conceitos “complexidade” “complexidade” e “auto-or“auto-organização” como base e fundamento do enfoque transdisciplinar. Portanto, a concepção transdisciplinar é uma nova postura, um novo olhar do educador e do educando numa visão dinâmica e integradora dos fatos e dos conhecimentos científicos. A Bioética, nesse sentido, não é uma metafísica, mas é um conhecimento conheciment o pragmático e processual resultante resultante de quase todas as áreas científicas. O seu estudo e aprofundamento podem trazer benefícios inestimáveis, inestimáveis, salvar e prolongar vidas humanas. Em contrapartida, ela precisa ser tratada e estudada com responsabilidade, porque tanto pode trazer aplicações vitoriosas, como também pode produzir resultados ambíguos e perigosos.

7. BIOÉTI BIOÉTICA CA E SUAS SUAS FRONTEIRAS EPISTEMOLÓGICAS EPIST EMOLÓGICAS Tentar estabelecer clara e formalmente as fronteiras rigorosas de cada campo do saber é quase que uma tarefa desnecessária, uma vez que cada disciplina ou área de conhecimento tem a sua especificidade e a contribuição a dar com referência referência à explicação da vida humana. Há um leque para tentar dividir, classificar e descrever as fronteiras dos diversos campos do conhecimento da Bioética com relação aos demais campos do conheciment conhecimento. o. Contudo, abordaremos, nesta unidade, a classificação utilizada por Jean Bernard. Bernard.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

76

© Bioética

A Bioética e as fronteiras com a Filosofia A Ética é um tema recorrente da Filosofia; não é exclusivo dela, mas tem sido abordado por Sócrates, que foi o pioneiro em criticar as regras da sociedade grega como injustas e ambíguas. O filósofo, ao questionar profundamente a ética das aparências na estrutura e organização da sociedade grega, foi condenado à morte, embora não tenha deixado nada escrito. Platão, por sua vez, possui uma vast Platão, vastaa produção e o trabalho mais importante é a República República,, no qual expõe suas ideias políticas, filosóficas, estéticas, éticas e jurídicas. A sua filosofia culmina com a ética: a ideia do bem é, no seu modo de entender, a ideia suprema. Para uma realização, deve tender a todo procedimento humano, ou seja, o bem é imperativo moral para todos. Para Platão, Platão, há quatro tipos fundamentais de virtude: • a sabedoria ou prudência, própria da parte racional racional da alma; • a coragem, coragem, virtude da vontade, vontade, temperança temperança própria da sensibilidade humana; • a justiça, justiça, nascida do equilíbrio, equilíbrio, que se deve deve estabelecer estabelecer entre todas as disposições éticas e sociais. Aristóteles Aristóte les forma o tripé dos autores clássicos que conseguiram sistematizar, modo, o pensamento humano ocidental. Enquanto Sócratesgrosso e Platão construíram as bases filosóficas, Aristóteles, as bases científicas. Houve uma Filosofia e uma Ciência antes deles, mas a orientação dada por eles fez toda a pesquisa filosófica e científica posterior se basear nos resultados que eles nos deixaram. Até a época moderna de Galileu Galilei (1564-1642), que introduziu o método científico propriamente dito, toda a ciência ocidental era, fundamentalmente, aristotélica. Ele produziu uma vasta literatura sobre a Ética, que teve uma influência quase “bíblica” em toda a sociedade europeia medieval.

 

© U4 - A Bioética e a Interdisciplinaridade

77

Na era moderna, Immanuel Kant  e Baruch Spinosa  dedicaram-se mais a fundo na discussão do tema e, contemporaneamencontemporaneamente, o estudo e a discussão da Ética situam-se em todos os campos do conheciment conhecimento. o. Segundo Bernard (1993), os filósofos podem ser divididos, de maneira geral, em três grupos distintos: os indiferentes, indiferentes, os artificiosos e os renovador renovadores. es. Os indiferentes consideram os avanços da Medicina de forma emotiva e preferem manter-se manter-se equidistantes da agitação e da polêmica. Já os artificiosos procuram utilizar, com talento, tanto os progressos da Medicina como da Biologia, mas, em contrapartida, negligenciam a revolução terapêutica. Dessa forma, acabam esquecendo que a Medicina alimenta estudos e pesquisas para os filósofos e diminui o sofrimento dos seres humanos. Na terceira categoria, estão os renovadores, que percebem a importância das recentes descobertas biológicas e médicas, debruçam-se sobre a tarefa nada fácil de analisar o que é normal e o que é patológico, percebendo que os progressos da Biologia “iluminam” e trazem novas alternativas para temas e problemas especificamente especificamen te filosóficos. Com base nessa visão e concepção é que se estabeleceram intercâmbios reflexivos, anteriormente desconhecidos ou impossíveis de acontecer aco ntecer.. Portanto, podemos concluir que a Filosofia passa a ser uma importante auxiliar no estudo, no debate e na solução de problemas da Bioética. A Bioética e as fronteiras com a Teologia Os teólogos estão fundamentados fundamentados na sua fé, que é algo íntimo, interior, e os cientistas estão embasados no empirismo positivista; ambos, convencidos da posse da verdade, assumiram, durante séculos, uma postura rígida, excludente e antagônica.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

78

© Bioética

As fronteiras existentes entre a ciência e a Teologia eram, na verdade, elevados muros, fortificações e muralhas. Por esses motivos, foram condenados Galileu, Giordano Bruno e tantos outros, por meio da Inquisição, um tribunal eclesiástico vigente por quase toda a duração da Idade Média. A Inquisição  nasceu da intenção de combater as heresias populares que se multiplicavam na Europa a partir do século 12. Inicialmente, foi confiada aos tribunais ordinários, mas, em 1231, tornou-se “Tribunal Permanente”, dirigido por um Bispo, encarregado pelo “Papado” de lutar contras heresias. Tanto Galileu como Giordano Bruno tiveram de enfrentar a Inquisição, sendo o último queimado na fogueira (Grande Enciclopédia Larousse Cultural).

Precisamos destacar que os cientistas, em geral, acreditam demasiadamente na potencialidade da ciência: como se ela pudesse trazer as soluções mais mai s variadas e avançadas, na tentativa de superar problemas e limites até hoje existentes e, portanto, apostam todas as suas fichas nesse campo. Em contrapartida, os teólogos têm consciência de que o ser humano não é um ser pronto e acabado, e que ainda não se conhece o seu o pleno desenvolvimento desenvolvimento mental e espiritual. Mais do que nunca, há uma percepção e um certo consenso do exagerado expansionismo material, econômico e financeiro e uma extrema pobreza espiritual do homem contemporâneo. Em outras palavras, há, na prática, um enorme descompasso entre o avanço da ciência e da tecnologia, em detrimento dos valores humanos e do crescimento interior. O diálogo entre a ciência e a religião será objeto de estudo e aprofundamento na próxima unidade, contudo, será enfatizado agora também. Por inúmeras vezes, há posturas muito rígidas de ambas as partes (ciência e religião) e, ao reunir cientistas e teólogos para discutir os temas atuais da Bioética, a compreensão e um diálogo produtivo tornam-se muito difíceis, ou quase impossíveis.

 

© U4 - A Bioética e a Interdisciplinaridade

79

Há, atualmente, uma enorme lacuna entre as gerações, na qual o ser humano nunca viveu de forma tão solitária, vazia e frustrada. O uso intensivo do micro-ondas, do telefone celular, da TV e da internet criou uma distância mental entre as pessoas. Nas famílias de classe média, por exemplo, há tantos aparelhos de TV quantos forem os moradores. Uma pesquisa feita pela CET (Companhia de Engenharia de Tráfego), em novembro de 2007, em São Paulo, revelou que 62% dos automóveis que circulam diariamente na cidade têm apenas um ocupante, que é o motorista. Isso significa dizer que o automóvel, o micro-ondas, a TV e a internet são os símbolos máximos do individualismo exacerbado e presentee na sociedade. present Por isso, o diálogo entre a ciência e a religião, no início do século 21, busca um maior consenso para canalizar esforços convergentes no sentido de elaborar uma “agenda mínima comum”, na qual todos os o s seres humanos que estão descontentes descontentes e indignados com a exclusão social, a injustiça e a desumanidade busquem a construção de uma sociedade mais fraterna e feliz. A Bioética e as fronteiras com a Política A Ciência Política é a esfera do poder, isto é, do poder de decisão para adotar esse ou aquele caminho a trilhar. Platão foi o inventor da Política ao escrever o livro A livro A RepúbliRepública,, que dividiu em três partes: a primeira é a exposição e proposica ção de uma comunidade ideal (utópica) governada pelos filósofos; na segunda, ele apresenta o seu pensamento filosófico; e, na terceira, expõe as várias formas de governo, decidindo, no final, pela aristocracia como a melhor delas. Assim que os agregados humanos atingiram um certo grau de desenvolvimento da cultura, passaram a estabelecer hierarquias entre seus membros e a adotar conjuntos de normas reguladoras das relações entre grupos.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

80

© Bioética

A principal característica da organização política da Idade Média foi a formação dos feudos, entidades intermediárias entre o soberano e o cidadão comum. Os senhores feudais exerciam sua autoridade sobre todos os habitantes de seus domínios e o regime era monárquico, ou seja, era o rei quem representava a lei. Na era moderna, aparece a figura do Estado como uma instância jurídico-administrativa, supraideológica e suprapartidária que deveria administrar toda a sociedade. Afirmamos que “deveria administrar”, pois iremos verificar que, na prática, não foi isso o que aconteceu. Thomas Hobbes (1588-1679), como vimos anteriormente, escreveu o livro Leviatã Leviatã,, obra em que justifica a presença da monarquia absoluta como o regime que melhor se adapta à natureza humana. Segundo ele, o Estado surgiu e é necessário devido à precisão de controlar as violências dos homens entre si. Contudo, é importante aqui destacar o pensamento político de Jean Jacques Rousseau, Rousseau, autor do livro Contrato Social , obra em que aponta o regime democrático como aquele que melhor protege os direitos dos cidadãos. Rousseau não admite que o povo delegue seus direitos nem mesmo a uma assembleia eletiva, ou seja, o poder de participação e de decisão deve pertencer à totalidade dos cidadãos. Evidentemente, essas ideias e princípios inspiraram os líderes da Revolução Francesa em 1789, contribuindo para a destruição da monarquia absoluta, extinção gradativa dos privilégios da nobreza e do clero e a tomada do poder pela burguesia. A democracia de fato e de direito, na qual os cidadãos têm um peso real na tomada de decisões, está ainda muito precária no mundo há ditaduras veladas países quais a democracia aindainteiro: tem uma vida muito tenra, ecomo nonos caso do Brasil.

 

© U4 - A Bioética e a Interdisciplinaridade

81

Não podemos ter uma visão ingênua e nos iludir no que se refere ref ere à dimensão política; quem tem poder econômico tem, também, poder político e, com certeza, não quer perder esse poder. Quem trabalha na educação, por exemplo, precisa estudar e analisar as ambiguidades e contradições que contêm as instituições, os partidos, sindicatos, igrejas as organizações sociais para não se tornarospresa fácil noasjogo de einteresses na esfera política. As fronteiras entre a Bioética e a Política precisam conter uma constante vigilância e uma análise crítica vigorosa: o avanço da ciência e da tecnologia pode abrir portas e gerar benefícios para toda a sociedade, mas pode, também, trazer e produzir graves abusos e destruições. Nessa direção, as campanhas de vacinação obrigatórias realizadas no Brasil e em outros países do mundo são as responsáveis pelo quase desaparecimento de doenças como varíola, difteria, poliomielite entre outras doenças e epidemias. Em contrapartida, as fábricas e indústrias bélicas, os enormes investimentos em estratégias de guerra, a medicina esteticista e as derrubadas criminosas das florest florestas as estão, todos os dias, exibindo os seus milhões de dólares de lucros escandalosos e imorais. A violação das fronteiras da Bioética e da Política é trágica para a maioria da humanidade, pois os cientistas (que não estão neutros nesse jogo de interesses) produzem teorias, conhecimentos, paradigmas que passam a ser dogmas científicos para pautar e fundamentar sua ação predatória generalizada. generalizada. Nunca é demais perguntar quais são as políticas públicas, quanto de investimento é feito nos seres humanos e na gestão social e quanto é a fatia orçamentária para a pesquisa tecnológica. É razoável aceitar, aceitar, por exemplo, a morte de um bebê beb ê que não tem cérebro, mas é totalmente inaceitável que morram milhões de crianças no mundo inteiro pelo fato de não possuírem um prato de comida.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

82

© Bioética

A Bioética e as fronteiras com o direito As fronteiras entre duas propriedades, entre municípios ou entre dois países costumam ser precisas, a não ser que haja algum conflito entre as partes. As fronteiras entre a Bioética e o Direito, no entanto, ainda são muito imprecisas e nebulosas. Nem todas as leis são passíveis de interpretação interpretação dúbia ou conflituosa e, em se trat tratando ando de problemas novos da Bioética, em que não se estabeleceu uma jurisprudência, torna-se mais difícil um posicionamento. Num primeiro momento, o Direito pode adotar uma atitude silenciosa, isto é, enquanto não pode prever os progressos da ciência e da tecnologia, é razoável razoável uma postura de cautela. Contudo, temos os adeptos progressistas, de forma que os que estão mais abertos e dispostos a aceitar as inovações estmais estarão arão sujeitos a entrar no mérito da questão e a adotar posições flexíveis. Há uma diversidade de situações perante os avanços nas pesquisas e investigações que não permite ao legislador que elabore um código completo e minucioso em que se possam prever todas as eventualidad eventualidades. es. Como meio termo, podemos imaginar uma lei-quadro na qual estão elencados e explicitados os princípios básicos, sem entrar em detalhes, o que pode facilitar uma determinada tomada de posição. No entanto, dependendo das situações prementes, como se decidir com relação à eutanásia, o aborto, as células-troco embrionárias, e que carecem de uma legislação mais rigorosa, será difícil chegar a um consenso. As questões que envolvem a repetição de experiências e a solidez das decisões poderão figurar num segundo grupo no Direito, que terá mais tempo para a sua consolidação.

 

© U4 - A Bioética e a Interdisciplinaridade

83

A Bioética e as fronteir fronteiras as geográficas Segundo Bernard (1993), as fronteiras geográficas, sem dúvida, são fatores preponderantes para se entender os difíceis contornos da Bioética. Cada país, região e seu povo caracterizam-se por possuir língua, costume, tradição, valores próprios que vão imprimir certa solidez organizativa daquele grupo humano específico. Há, hoje, uma riqueza e, ao mesmo tempo, um problema que engloba o multiculturalismo: o pluralismo e a diversidade cultural que geram preconceitos, xenofobia e discriminações profundas e injustas. No Japão, por exemplo, é proibido por lei extrair um órgão de uma pessoa, logo após a constatação constatação da sua morte; os japoneses ricos, porém, atravessam o Oceano Pacífico para efetuarem, em São Francisco, um transplante de fígado ou de coração. No Brasil, a venda de um rim vivo é permitida e pode ser averiguada por meio de pequenos anúncios nos jornais e revistas. A fecundação artificial é inter i nterditada ditada pela Igreja Católica, mas largamente aceita e mesmo aconselhada por diversas Igrejas Protestantes. As variações geográficas podem ser entendidas por variados fatores. Em primeiro lugar, há, de fato, as diferenças culturais, em que cada povo constrói suas casas, tem sua própria arte culinária, suas festas que remontam a séculos, há milênios e que fazem parte constitutiva de sua história. Reside aí a riqueza incomensurável do multiculturalismo. Em segundo lugar, há as diferenças religiosas. A doutrina budista, por exemplo, é diferente da católica, do protestantismo, do islamismo, do hinduísmo e assim por diante. Não se pode, porém, admitir atitudes fundamentalistas, intolerâncias, preconceitos e oposições irredutíveis. Há a necessidade de se buscar os pontos de convergência, segundo Hans Kung , em seu livro As livro As religiões do mundo:: em busca dos pontos comuns. mundo comuns.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

84

© Bioética

Em terceiro lugar, devem ser levados em consideração os fatores econômicos: a pobreza é sempre um estímulo significativo para a venda de bebês, de órgãos humanos, o comércio de sangue, de fígado, de rim entre outros. Destaquem-se, ainda, as diferenças médicas: não somente a presença física da Medicina, uma vez que há lugares e regiões onde ela inexiste ou se apresenta totalmente precária, mas aquelas aliadas às políticas públicas de saúde de um sistema preventivo, e não apenas curativo, como é o caso cas o do “Sistema de Saúde Saú de Brasileiro”, Brasileiro”, em que temos um “Ministério de Doenças” e não de “Saúde”. A listagem das difere diferenças nças geográficas poderia ser estend estendida ida e ampliada, mas o important i mportantee é que cada um de nós tenha consciência de que essas diferenças diferenças existem e precisam ser reconhecidas e, sobretudo, respeitadas. Há, atualmente, uma tendência no sentido de se criar “Comitês de Ética” nas instituições, nas empresas, nos Estados e em regiões estratégicas que deverão discutir, elaborar e divulgar, pela mídia, suas decisões e posicionamentos, tentando aproximar as pessoas das organizações jurídicas e civis, buscando sempre ações mais convergentes. Os Comitês locais, regionais, nacionais e internacionais têm uma tarefa premente e importante: promover encontros, debates e simpósios bem como a produção de uma legislação que democratizee os estudos e pesquisas, as descobertas científicas para toda cratiz a sociedade, em especial, a adoção de medidas preven preventivas tivas quanto à saúde pública, ao planejamento familiar, em relação a uma alimentação mais correta, à adoção de atividades físicas que possam contribuir para uma efetiva efetiva melhoria da qualidade de vida de todas as pessoas, indistintamente. indistintamente. Esses Comitês, num primeiro momento, podem desempenhar um papel mais consultivo e informat informativo ivo do que propriament propriamentee  jurídico ou político, e o seu seu poder está, está, fundamentalme fundamentalmente, nte, na ética e na preservação dos valores humanos.

 

© U4 - A Bioética e a Interdisciplinaridade

85

Leitu Lei tura ra Complem Comp lement entar ar ––– –––––– –––––– –––––– –––––– –––––– –––––– –––––– –––––– –––––– ––––– ––  O global é mais que o contexto, é o conjunto conj unto das diversas partes par tes ligadas a ele de modo inter-retroativo ou organizacional. Dessa maneira, uma sociedade é mais de um contexto: é o todo organizador de que fazemos parte. O planeta Terra é mais do que um contexto: é o todo ao mesmo tempo organizador e desorganizador de que fazemos parte. O todo tem qualidades ou propriedades que não são encontradas nas partes, se estas estiverem isoladas umas das outras, e certas qualidades ou propriedades das partes podem ser inibidas pelas restrições provenientes do todo. Marcel Mauss dizia: “É preciso recompor o todo”. É preciso efetivamente recompor o todo para conhecer as partes (MORIN, 2002, p. 37).

 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  ––––––––––––––––––––––––––––––––––––– –––––––––––––––

8. QUESTÃO AUTOAVALIATIVA Sugerimos, neste tópico, que você procure responder às questões a seguir, que tratam da temática desenvolvida nesta unidade, bem como que as discuta e as comente comente.. autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para testarAseu desempenho. Se encontrar dificuldades em responder a essas questões, procure revisar os conteúdos estudados para sanar suas dúvidas. Este é o momento ideal para você fazer uma revisão do estudo desta unidade. Lembre-se de que, na Educação a Distância, a construção do conhecimento ocorre de forma cooperativa e colaborativa. Portanto, compartilhe com seus colegas de curso suas descobertas. 2) Potter dedicou sua vida inteira para fortalecer e construir caminhos para que a Bioética se transformasse num projeto de vida para todos os seres humanos que habitam o planeta Terra, fato que ainda está muito distante de acontecer. Pesquise na mídia uma matéria jornalística que contenha preconceito, xenofobia ou algum tipo de discriminação religiosa, sexual, étnica, ideológica ou de gênero.

9. CONSIDERAÇÕES Nesta unidade, tivemos a oportunidade de conhecer o ponto de partida da Bioética moderna, bem como os temas relacio-

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

86

© Bioética

nados à Bioética e à interdisciplinaridade interdisciplinaridade,, como às suas fronte fronteiras iras epistemológicas. Já na próxima unidade, poderemos estudar o processo de secularização e o momento em que a ciência encontra a religião. Até a próxima!

10.. REFERÊN 10 REFERÊNCIAS CIAS BIBLIOGRÁFICAS BIBLIO GRÁFICAS BERNARD, J. A J. A Bioética. Bioética. Lisboa: Instituto Piaget, 1993. BRAGA, K. S. Bibliografia sobre Bioética Brasileira: Brasileira: 1990 – 2002. Brasília: Letras Livres, 2002. DINIZ, D. Conflitos morais e Bioética. Bioética. Brasília: Letras Livres, 2002. GARRAFA, GARRA FA, V. V. Pesquisas em Bioética no Brasil de hoje. hoje . São Paulo: Gaia, 2006. VIDAL, M. Dez palavras chave em moral do futuro. futuro . São Paulo: Paulinas, 2003. VIEIRA, T. R. Bioética e Direito. Direito. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2003. MORIN, E. Os Sete Saberes necessários à Educação do Futuro. Futuro. São Paulo: Cortez, 2002.

 

Diálogo entre a Religião e a Ciência

5 1. OBJETIVOS • Compreender as especificidades especificidades entre Religião e Ciência, bem como as principais contribuições de cada uma no campo do saber. • Interpre Interpretar tar a autonomia autonomia de cada campo do conhecimento conhecimento eapriorismos buscar umediálogo efetivo entre ambas, sem partir de posições fechadas. • Analisar o processo processo de secularização e seus desdobramentos, o encontro da ciência com a religião, as principais fases de relacionamento entre ambas.

2. CONTEÚDO CONTEÚDOSS • Religião e ciência. • Processo de secularização. • Quando a Ciência encontr encontraa a Religião.

      D       A       E

 

88

© Bioética

3. ORIE ORIENT NTAÇÃO AÇÃO PARA PARA O ESTUD ESTUDO O DA UNIDADE UNI DADE 1)

Para saber mais sobre o período da

Idade Média,

sugerimos que

você pesquise sobre Jacques Le Goff, um Importante historiador da Idade Média, que escreveu várias obras importantes, dentre as quais destacamos: LE GOFF, J. A J.  A bolsa e a vida vida:: economia e religião na Idade Média. Tradução de Marcos de Castro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007.  ______.  A civilização do Ocidente medieval . Tradução de Manuel Ruas e José Rivair de Machado. 2. ed. Lisboa: Estampa/EDUSC, 2005. v. 1.  ______.  A civilização do Ocidente medieval . Tradução de Manuel Ruas. 2. ed. Lisboa: Estampa, 1995. v. 2.  ______. O Deus da Idade Média: Média: conversas com Jean-Luc Pouthier Pouthier.. Tradução de Marcos de Castro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007. LE GOFF, GOFF, J.; MONTREMY MONTR EMY,, J. M. de. (colaboraçã (col aboração). o). Em busca da Idade Média.. Tradução de Marcos de Castro. Rio de Janeiro: Civilização Média Brasileira, 2005. LE GOFF GO FF,, J.; SCHMITT SCHMITT,, J. C. Dicionário temático do Ocidente medieval . Tradução de Hilario Franco Junior. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado/EDUSC, 2002. v. 1.  ______. Dicionário temático do Ocidente medieval . Tradução de Hilario Franco Junior. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado/EDUSC, 2002. v. 2.

2) Para aprofundar seus conheciment conhecimentos os sobre sobre o assunto aqui abordado, sugerimos que você pesquise sobre William James (1842-1910). Ele foi um filósofo norte-americano que fundou o primeiro laboratório de Psicologia em Harvard, em 1876, e é o defensor do pragmatismo, que se trata de uma concepção filosófica fundamentada nos valores práticos, imediatos, utilitaristas. Podemos afirmar que esse é um dos valores preponderantes da sociedade atual, que adota o que se pode denominar “valores descartáveis”, utilitários e imediatistas.

 

© U5 - Diálogo entre a Religião e a Ciência

89

4. INTRODUÇÃO À UNIDADE Na Unidade 4, tivemos a oportunidade de conhecer o ponto de partida da Bioética moderna, além de analisarmos a Bioética e a interdisciplinaridade, bem como suas fronteiras epistemológicas. epistemológicas. Com tais conhecimentos, iremos, nesta unidade, aprofundar nossos estudos e aprender sobre o diálogo entre religião e ciência, bem como o processo de secularização. Bom estudo!

5. RELIGIÃO E CIÊNCIA Até agora, tangenciamos a temática do diálogo entre religião ema. ciência. Vamos, então, aprofundar um pouco mais esse probleDurante todo o percurso do conteúdo que trabalhamos até agora, você percebeu que a Bioética provoca dois sentimentos contraditórios contradit órios nas pessoas: ou de fascínio ou de repulsa. A primeira tendência, que tem uma ala significativa, apoia-se na concepção pragmática que defende que tudo pode ser feito desde que traga benefícios e melhoria para os seres humanos. É pensar que, quase como num passe de mágica, os problemas poderão ser resolvidos pelos avanços da ciência e da tecnologia. A segunda tendência (que tem muitos adeptos) é a da recusa na discussão de qualquer tema que envolva a eutanásia, o aborto ou a clonagem, no sentido de posicionar-se contra a adoção de experiências que se relacionam com a vida e a morte do ser humano. O diálogo entre a ciência e a religião é um tema complexo e abrangente e requer uma análise histórica contextual ampla para abranger as diversas dimensões que precisam ser consideradas no caso.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

90

© Bioética

Comecemos com as chamadas religiões históricas: o Judaísmo, o Islamismo e o Cristianismo. Estas são instituições milenares que nasceram, expandiram-se e consolidaram-se em quase todas as regiões do mundo. Os seus adeptos e seguidores baseavam a sua vida num corpo doutrinário, nas tradições, nos símbolos, nos princípios e valores que cada uma delas pregava e cultuava. Essas religiões, com ênfase no Cristianismo, tornaram-se instituições fortes, influentes, diríamos, mesmo, hegemônicas. Elas são portadoras de uma cosmovisão própria, têm regras e normas e defendem o que é certo ou errado, bem como o que se pode e o que não se pode fazer. Na Idade Média, prevalece prevaleceu u uma concepção teocêntrica, de tal maneira que toda a vida humana girav giravaa em torno da Igreja, que era construída no centro do vilarejo ou cidade, no ponto mais alto da topografia (acrópole), tinha uma torre e, no alto da torre, um sino que tocava para acordar as pessoas, para acorrer ao templo para as orações e missas; tocava, também, para avisar seus habitantess quando ocorria uma invasão ou saque. tante Tudo isso não era pouco, pois a Igreja exercia uma dupla função: a presença física, arquitetônica em torno da qual tudo convergia e, além disso, ela ditava as normas e as leis, as regras e os comportamentos comportament os que eram esperados pelos seus fiéis seguidores. Ao mesmo tempo, vale salientar que as religiões sempre tiveram oposições, dissidências e críticas contra a imposição de dogmas e normas que não podiam ser questionados. A Inquisição fez-se presente na maior parte do período medieval, visto que as fogueiras e prisões testemunharam as sanções atribuídas aos que não partilhavam e seguiam as determinações da doutrina da Igreja. Thomas Morus (1478-1535), Morus (1478-1535), chanceler de Henrique III, tendo desaprovado o rei quando de seu divórcio, foi obrigado a renunciar ao cargo. Preso, foi depois executado. Deixou uma obra de

 

© U5 - Diálogo entre a Religião e a Ciência

91

capital importância, a Utopia (1516), que, sob o disfarce de ficção, ficção, é uma ousada descrição de um sistema ideal de governo, totalmente contrário à monarquia absoluta existente na Inglaterra. Assim, o Renascimento não significou apenas a recuperação da valorização dos pensadores clássicos da Grécia, mas foi uma construção de uma nova concepção de mundo e do destino do homem. As transformações transformações por que passa o Ocidente nos séculos 15 e 16 vão, aos poucos, promovendo rupturas profundas que operam entre o passado e o presente. A expansão marítima, as descobertas geográficas e científicas são responsáveis por gerar o início do processo de globalização, que vai se consolidar apenas quatro séculos depois. No aspecto do surgimento e ampliação da ciência, iniciamos com Renée Descartes (1596-1650), Descartes (1596-1650), filósofo e matemático francês, que escreveu Discurso sobre o Método (1637). Método (1637). Preocupou-se com o acesso ao conhecimento claro e distinto, ligando a experiência ao conheciment conhecimento. o. Leonardo da Vinci (1452-1519) Vinci (1452-1519) era artista e sábio italiano. Foi quase que um enciclopedista: estudou Geologia, a flora e a fauna, Anatomia, Arquitetura, Mecânica e Hidráulica, Desenho, Matemática e Música. Sem exagero, podemos dizer que ele foi a expressão emblemática no campo científico-natural. No campo político, tivemos Niccolo Maquiavel  Maquiavel (1469-1527), que foi filósofo, escritor e político italiano. Escreveu O Príncipe, Príncipe, em 1513, e Arte e Arte da Guerra Guerra,, entre 1519 e 1520. Ele propunha uma ordem política inteiramente nova, ou seja, uma moral livre e laica, subordinada à razão de Estado em que os mais habilidosos utilizassem a religião para governar. Dessa forma, o ambiente silencioso, de contemplação e de oração medieval “ora “ora et labora”  vai   vai sendo substituído, gradativa-

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

92

© Bioética

mente, pelo mundo do trabalho, dos negócios, da exploração da natureza e do próprio homem. De um teocentrismo centralizador, passa-se, aos poucos, com muita resist resistência ência da Igreja e das forças conservadoras, a um antropocentrismo em que a prioridade é o mundo dos negócios e o lucro desenfreado.

6. PROCESSO DE D E SECULARIZAÇÃO SECULARI ZAÇÃO A primeira vez que a palavra “secularização” foi enunciada fora dos muros e dos textos da Igreja Católica foi para nomear o processo jurídico-político de desapropriação dos bens eclesiásticos em favor dos poderes seculares. Um retorno às fontes do conceito de secularização pode nos ajudar no debate atual em torno da fermentação contemporânea de religiosidades. De um lado, surge o Estado nacional moderno e, de outro, a progressiva secularização das instituições públicas em sociedades cada vez mais pluralistas em matéria de religiosidade. Max Weber  Weber  (1864-1920) estudou a história social do Ocidente no apogeu da racionalidade num mundo desencant desencantado, ado, em que o sagrado se exilou. A Europa, no final do século 19 e início do século 20, passou por um processo intenso de industrialização e urbanização, que gerou, entre outros fatores, o processo de secularização assim, as religiões perdendo as sua hegemonia, sua força,e,seus espaços centraisforam mais importante importantes e significativos. Assim, o sucesso da ciência foi total, pois ela está, supostamente, ao lado da verdade, identifica-se com ela, a única verdade, baseada na mais rigorosa objetividade, segundo os adeptos do Positivismo. Nessa perspectiva, Weber aborda o processo de secularização como a perda gradual cultural da religião no nascedouro e, sobretudo,, na consolidação da moderna cultura capitalista. sobretudo capitalista. Ele publicou A publicou  A Ética Protestante Protestante,,  em 1904, e utilizou o conceito “desencantamento” em vez de secularização. Para Weber,

 

© U5 - Diálogo entre a Religião e a Ciência

93

o desenvolvimento ocorre justamente em sociedades profundamente religiosas e é um processo essencialmente religioso, porquanto são as religiões éticas que operam a eliminação da magia como meio de salvação. Secularização,, em contrapartida Secularização contrapartida,, implica abandono, redução e subtração do significado religioso. Assim, a secularização é um processo mais rápido e perceptível, enquanto o desencantamento tem uma duração histórica mais longa, mais extensa. Quando a religião se deparou, pela primeira vez, com a ciência moderna, no século 17, o encontro foi amigável. Os principais fundadores da ciência, na sua maioria, eram devotos que diziam estudar, em seu trabalho científico, a obra do Criador. Já no século 18, alguns cientist cientistas as acreditavam acreditavam num Deus que havia planejado o Universo, e não mais num Deus pessoal envolvido ativamente ativamente no mundo e na vida humana. No século 19, já aparecem pensadores e cientistas hostis à religião. No século 20, a interação da Religião com a Ciência apresenta diferentes formatações, que analisaremos a seguir. Na virada do milênio, o que se pode observar é que houve um recrudescimento de interesse da discussão da Religião e da Ciência, em especial, os temas relacionados à Ética e à Bioética, que cruzam as dimensões da Ciência e da Religião. A Ciência preocupa-se com relações causais entre os fatos, enquanto a Religião se preocupa com o sentido e o propósito da existência exist ência humana. A relação entre a Ciência e a Religião é conflitante, fundamentalmente, pelo fato de ambas adotarem metodologias diferenciadas e específicas: uma tem como ponto de partida a crença no Deus e em valores sobrenaturais, sendo subjetiva, pessoal e íntima; em contrapartida, a Ciência é racional, objetiva, rigorosa, mensurável, devendo apresentar uma farta documentação comprobatória.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

94

© Bioética

Podemos entender a racionalidade científica como conhecimento dos limites, e a racionalidade teológica como aquela que se encontra com ela num plano mais profundo da intencionalidade última e da responsabilidade ética em todos os níveis: pessoal, histórico, social e ecológico. Assim, a teologia é capaz de dialogar com as ciências e a Filosofia, mantendo, cada uma das áreas do conhecimento, conheciment o, a sua especificidade.

7. QUANDO A CIÊNCIA ENCONTRA ENCO NTRA A RELIGIÃO RELIG IÃO Ian G. Barbour é professor emérito de Física e Religião no Carleton College em College em Northfiel, no Estado Minnesota, e escreveu o livro Quando a ciência encontra a religião: religião : inimigas  inimigas,,  estranhas ou parceiras? . Nesse livro, o autor classifica a grande variedade de maneiras que os estudiosos relacionam ciência e religião, divide-as em quatro etapas: a fase de conflito, a fase da independência, a fase de diálogo e a fase da integração. Vejamos, a seguir, cada fase resumidamente: 1) Primeira fase  fase  – conflito: a relação da Religião com a Ciência, no período histórico dos séculos 18 e 19, pode ser descrita como difícil, antagônica, conflitante conflitante e excludente. 2) Segunda fase – fase – independência: a partir do fim do século 19 e início do século 20, vão sendo criadas concepções de autonomia, de independência em termos teórico-metodológicos sobre a Ciência e a Religião. 3) Terceira fase  fase  – diálogo: mais ou menos na metade do século 20, inicia-se a construção de um novo paradigma, no qual a concepção mecanicista vai cedendo lugar a uma visão holística da realidade, adotando-se o método interdisciplinar, inclusive entre a Ciência e a Religião. 4) Quarta fase – fase – integração: as décadas de 1960 e de 1970 geraram uma série de movimentos sociais que buscavam uma mesma direção e convergência.

 

© U5 - Diálogo entre a Religião e a Ciência

95

Edgar Morin, já citado na Unidade 4, é o principal responsável pela defesa da tese de que todas as coisas no planeta Terra estão profundamente interligadas e conectadas por meio do conceito da transdisciplinaridade. Vivemos, cada vez mais, num mundo globalizado econômica, política e culturalmente, em que os fenômenos biológicos, psicológicos e ambientais estão todos marcadamente interdependentes entre si. Vamos, agora, descrever mais detalhadamente cada uma das fases. Primeira fase: conflito A Idade Média teve como preocupação principal a compreensão das coisas e não a de exercer ou buscar interpretações ou algum tipo de predição ou controle sobre o Universo. Os cientistas medievais, ao investigar investigar os desígnios subjacentes aos vários fenômenos naturais, consideravam do mais alto significado as questões referentes a Deus, à alma humana e à ética. Nos séculos 17 e 18, com o surgimento da ciência coadjuvado pela Filosofia, a noção de um universo orgânico, vivo e espiritual foi substituída pela concepção de um mundo como se fosse uma máquina. Esse desenvolvimento foi ocasionado por mudanças revolucionárias na Astronomia, na Física, culminando nas realizações de Copérnico, Galileu e Newton. Não se tratava de negar a existência de Deus, porém, fazia-se fazia-s e necessário encaminhá-lo para bem longe, de tal maneira que não atrapalhasse ou interferisse interferisse no mundo do trabalho, do comércio e dos negócios. A tendência dominante defendida por Karl Marx e Sigmund Freud era Freud  era a de que a religiosidade estaria com os dias contados, uma vez consolidado o processo de secularização. Foi um longo

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

96

© Bioética

período de críticas agudas ao papel da religião como mecanismo e instrumento instrument o de manipulação e de alienação. Marx, ao abordar a expansão do cristianismo, atribui-lhe o poder de controlar e de anestesiar a própria consciência humana. Freud, em se livro Totem e tabu, tabu, afirma que a religião presente na sociedade deverá ser passageira, uma vez que sua influência maior se registra nas sociedades primitivas. Podemos, com isso, constatar que as divergências maiores não residiam apenas no que se refere refere à abordagem metodológica, mas, sobretudo, às questões de fundo, da cosmovisão de mundo, do ser humano e da realidade que ambas construíam. Muitos exegetas exegetas bíblicos acreditam que a teoria evolucionista se choca contra a fé religiosa, enquanto os cientistas ateus alegam que a prova científica da evolução é incompatível com qualquer forma de teísmo. Para ambos, exegetas e cientistas, Ciência e Religião são inimigas, antagônicas e conflitantes. Esses dois grupos opostos ainda existem atualmente e ganham maior notoriedade na mídia, uma vez que os debates acalorados e, muitas vezes, fanatizados produzem maior audiência e, infelizmente, não ajudam a construir uma mentalidade mais receptiva e respeitosa na sociedade. Segunda fase: independência Nos primeiros anos do século 20, inicia-se uma nova etapa de construção de paradigmas e de teorias explicativas sobre o Universo,, os seres humanos e a realidade histórica. Podemos denomiverso nar essa fase como de autonomia e de independência do próprio pensamento. Os teólogos e cientistas, após décadas de divergências, chegaram à conclusão de que cada qual tem a sua especificidade de

 

© U5 - Diálogo entre a Religião e a Ciência

97

campo de estudo, e cada setor tem sua prioridade, abrangência e o contexto a ser respeitado. Cria-se uma consciência que cada um tem o direito de expressar-se, pressar -se, interpretar interpretar e construir sua teoria, com autonomia intelectual. Foi um período de grandes avanços em todas as áreas de conhecimento. Gastou-se menos tempo em defender-se, em atacar, em divergir e canalizou-se o esforço de produzir explicações sobre os problemas e desafios prementes da sociedade. Nesse período, as ciências, em geral, e as humanas, em especial, foram aprofundadas e especificadas em termos de especialização. Houve descobertas significativas nos campos da Biologia, da Anatomia, da Fisiologia com o estudo das células, da microbiologia e na descoberta das leis da hereditaried hereditariedade. ade. Destacamos a Genética, que se tornou uma das áreas mais ativas na pesquisa biológica, atingindo êxito na biologia molecular molecular,, integrando pesquisas e estudos biológicos com avanços na Medicina. Paralela e concomitantemente, a chamada Teologia Bíblica passa por importantes revisões histórico-críticas e surgem, ainda que esporadicamente, Centros Teológicos de Ciências da Religião, que estudam e debatem as múltiplas dimensões do processo de secularização; e o revigoramento da religiosidade em múltiplos formatos e manifestações. Assim, o ponto central que fundamenta a postura de independência é que a Ciência investiga e explica os fatos objetivos e comprovados; a Religião procura explicar o que a Ciência não dá conta nos assuntos que se referem referem aos valores e ao sentido último do ser humano. Segundo Barbour (2004), uma outra versão da tese da independência afirmaria que os dois gêneros de investigação investigação forneceriam perspectivas complementares do mundo, as quais não se excluiriam exc luiriam mutuamente.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

98

© Bioética

Terceira fase: diálogo  diálogo  A partir da metade do século 20, inicia-se um período histórico novo e fecundo entre a ciência e a religião, de diálogo, de intercâmbio de paradigmas. A formação humana e profissional caminhou por décadas na busca da especialização e, também, da compartimentalização dos saberes. compartimentalização A pesquisa científica aplicada à economia e à produção vai gerar um novo paradigma que é a tecnologia. Agora, os seres humanos têm à sua disposição os mais variados recursos e ferramenferramentas da tecnociência, que permitem construir uma concepção holística da realidade. Enquanto a Ciência, ao realizar pesquisa, delimita, fragmenta e reparte a realidade, a Filosofia busca analisar a realidade a partir de três princípios: pri ncípios: o rigor, rigor, a profundidade e a cosmovisão. No que se refere especificamente ao diálogo entre Ciência e Religião, destaca-se a realização do Concílio Vaticano II, entre 1963 e 1965, que lançou profundas raízes de interlocução entre as diferentes religiões, com pesquisas e estudos inter i nterdisciplinares. disciplinares. Amplia-se, também, uma consciência da necessidade de se buscar soluções globais aos problemas econômicos, políticos e sociais cada vez mais complexos e desafiadores, por meio de estudos interdisciplinares, estabelecendo laços mais próximos entre a Ciência e as Religiões. Em contrapartida, o excessivo crescimento tecnológico gerou um meio ambiente no qual a vida se tornou física e mentalmente doentia. Ar poluído, ruídos irritantes, enormes congestionamentos diários de tráfego urbano, poluentes químicos por toda parte; as preocupações com o trabalho, a saúde, bem como o futuro incerto para quem quer entrar no mercado de trabalho e permanecer nele são fontes inesgotáveis de stress stress físico  físico e psicológico e que passaram a fazer parte da vida cotidiana da maioria das pessoas que vive aglomerada nas metrópoles.

 

© U5 - Diálogo entre a Religião e a Ciência

99

Nessa linha de pensamento, discordamos bastante de Barbour com relação ao diálogo. Na verdade, o que estamos chamando de diálogo foi, e continua sendo, um “pseudodiálogo”, na medida em que estudiosos e pesquisadores de diferentes áreas se reúnem e discutem caminhos possíveis dentro das suas “gaiolas” ou “jaulas”, isolados, e cada qual com o seu referencial teórico. Cada um fica no seu lugar, no seu mundo, na sua concepção. Quer dizer, fala-se dos outros, fala-se para os outros, mas não se  fala com eles. (grifo meu) Em nossa modesta visão, o verdadeiro verdadeiro diálogo exige um despojamento, um desarmamento teórico-conceitual e o reconhecimento da legitimidade do outro. O diálogo não exige de nós, que, na maioria, somos adeptos de um neopositivismo arraigado e cristalizado,, mas exige a humildade de valorizar e incorporar a verdatalizado de do outro como verdadeir verdadeiraa e legítima. Em nível teórico, somos capazes, por meio de um esforço eventual, de aceitar as diferenças; di ferenças; entretanto, no momento de elaborar um projeto de pesquisa transdisciplinar, não temos tempo, disponibilidade nem interesse para que a hipótese seja realizada e concretizada. Quarta fase: integr integração ação Estamos cada vez mais em vias de construir uma nova visão da realidade. Esta baseia-se na consciência do estado de inter inter-rela-relação e interdependência de todos os fenômenos físicos, biológicos, psicológicos, sociais, culturais e espirituais. Essa concepção holística transcende as atuais fronteiras disciplinares e conceituais. Não há, no momento, uma estrutura bem estabelecida, conceitual ou institucional que abranja a formulação desse novo paradigma, mas as linhas principais de tal visão já estão sendo formuladas por cientistas, pesquisadores, organizações e comunidades que estão desenvolvendo novas abordagens transdisciplinares com base em princípios epistemológicos abrangentes.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

100

© Bioética

Da mesma forma, podemos afirmar que a separação entre o pensamento científico e religioso é artificial se adotarmos a concepção holística que não se refere apenas a uma justaposição ou somatória das partes entre si, mas sim a um todo conectado, plugado, interligado. O Diálogo Diálo go ent entre re tod t odos os os Homen Homenss ––– –––––– –––––– –––––– –––––– –––––– –––––– ––––– –– Em virtude de sua missão, que é iluminar o mundo inteiro com a mensagem evangélica e reunir em um único Espírito todos os homens de todas as Nações, raças, culturas, a Igreja torna-se o sinal daquela fraternidade que permite e consolida um diálogo sincero [...] O desejo de tal diálogo, que é guiado somente pelo amor à verdade, observada a devida prudência, de nossa parte não exclui ninguém nem os que, honrando os bens admiráveis do engenho humano, contudo não admitem ainda o seu Autor, nem aqueles que se opõe à Igreja e a perseguem de várias maneiras. Sendo Deus Pai o princípio e o fim de todas as coisas, somos todos chamados a ser irmãos. E por isso, destinados à única e mesma vocação humana e divina, sem violência e sem dolo, dol o, podemos e devemos cooperar para a construção construç ão do mundo na paz verdadeira. A Igreja no Mundo de Hoje- Constituição (PASTORAL GAUDIUM et Spes. 1966, p.115).

 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  –––––––––––––––––––––––––––––––––––––– ––––––––––––––

8. QUESTÃO AUTOAVALIATIVA Sugerimos, neste tópico, que você procure responder às questões a seguir, que tratam da temática desenvolvida nesta unidade, bem como que as discuta e as comente comente.. A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para testar seu desempenho. Se encontrar dificuldades em responder a essas questões, procure revisar os conteúdos estudados para sanar suas dúvidas. Este é o momento ideal para você fazer uma revisão do estudo desta unidade. Lembre-se de que, na Educação a Distância, a construção do conhecimento ocorre de forma cooperativa e colaborativa. Portanto, compartilhe com seus colegas de curso suas descobertas. 1) O Concílio Vaticano II realizado em Roma entre os anos de 19631965 elaborou e promulgou diversos Documentos Pontifícios com vistas ao diálogo da Igreja com a sociedade, em especial a Consti-

 

© U5 - Diálogo entre a Religião e a Ciência

101

tuição Pastoral Gaudium et Spes (Alegria e Esperança) e publicado pela Editora Vozes. Como atividade complementar co mplementar,, procure esse DoDo cumento valioso e atual e leia, pelo menos, a parte conclusiva que fala do Diálogo entre todos os Homens.

9. CONSIDERAÇÕES Nesta unidade, você teve a oportunidade de conhecer a Religião e a Ciência, o processo de secularização e ver o que ocorre quando a Ciência encontr encontraa a Religião. Lembre-se, entretanto entretanto,, da importância de consultar a bibliografia indicada para ampliar seus conhecimentos.

10. EREFERÊNCIA MUNDODOSFILOSOFOS. O Positivismo: Positivismo: Auguste Comte. Disponível em: . Acesso em: 9 ago 2010.

11.. REFERÊ 11 REFERÊNCIAS NCIAS BIBLIOGRÁFICAS BIBL IOGRÁFICAS ALVES, R. O que é religião?  São  São Paulo: Loyola, 2003. BARBOUR, I. G. Quando a ciência encontra a religião: religião : inimigas, estranhas ou parceiras? São Paulo: Cultrix, 2004. BUZZI, A. R. Introdução ao pensar :  o ser, o conhecimento, a linguagem. Rio de Janeiro: Petrópolis: Vozes, 2004. CAPRA, F. O ponto de mutação: mutação: a ciência, a sociedade e a cultura emergentes. São Paulo: Cultrix, 1982. FORTE, B. Teologia em diálogo. diálogo. São Paulo: Loyola, 2002. GEBARA, I. O que é teologia? teologia? São Paulo: Brasiliense, 2006. KÜNG, H. O princípio de todas as coisas. coisas . Rio de d e Janeiro: Petrópolis: Vozes, Vozes, 2007.  ______. Religiões do mundo: mundo: em busca dos pontos comuns. Campinas: Verus, 2004. LE GOFF, J. A J. A bolsa e a vida vida:: economia e religião na Idade Média. Tradução Tradução de Marcos de Castro. Rio de Janeiro: J aneiro: Civilização Brasileira, 2007.  ______.  A civilização do Ocidente medieval . Tradução de Manuel Ruas e José Rivair de  ______. A Machado. 2. ed. Lisboa: Estampa/EDUSC, 2005. v. v. 1. e 2.  ______. O Deus da Idade Média: Média: conversas com Jean-Luc Pouthier. Tradução de Marcos de Castro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2007.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

102

© Bioética

LE GOFF, J.; MONTREMY, J. M. de. (colaboração). Em busca da Idade Média. Média. Tradução de Marcos de Castro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2005. LE GOFF, J.; SCHMITT SCHMIT T, J. C. Dicionário temático do Ocidente medieval . Tradução Tradução de Hilario Franco Junior. Junior. São Paulo: Imprensa Im prensa Oficial do Estado/EDUSC, 2002. v. 1.  ______. Dicionário temático do Ocidente medieval . Tradução de Hilario Franco Junior. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado/EDUSC, 2002. v. 2. MCGRATH, A. E. Fundamentos do diálogo entre ciência e religião. religião. São Paulo: Loyola, 2005. MORIN, E. O pensar complexo complexo:: a crise da modernidade. São Paulo: Garamond, 1999. PETERS, T.; BENNET, G. (Org.). Construindo pontes entre a ciência e a religião religião.. São Paulo: Loyola, 2003. QUEIRUGA, A. T. Diálogo das religiões. religiões. São Paulo: Paulus, 2004. SANZOVO, J. V. Repensando o universo: universo: uma nova visão cosmológica. cosmoló gica. São Paulo: Rudyard, 2007.

 

      D       A       E

A Bioética e a Genética Manipulação

6

1. OBJETIVOS • Estudar e identificar identificar alguns temas atuais da Bioética como fundamentos epistemológicos significativos para compreenderr o ser humano em toda a sua complexidade. compreende • Subsidia Subsidiarr, de forma teórica, teórica, dados e informações sobre alguns temas relevantes dentro da Bioética, possibilitando rever posições e concepções com relação à vida e à morte. • Interpretar Interpretar,, de forma crítica, os conteúdos conteúdos referentes à Bioética sem partir de posições a priori  e   e de posturas fechadas e inflexíve inflexíveis. is.

2. CONTEÚDO CONTEÚDOSS • Manipulação genética. • Esterilidade humana.

 

104

© Bioética

• Principais técnicas de reprodução assistida. • Desdobramentos da intervenção genética para a sociedade.

3. INTRODUÇÃO À UNIDADE Veremos, nesta unidade, que a manipulação genética é um dos temas controversos dentro da Bioética atual, pois não apenas se refere a uma técnica de reprodução humana que contém dimensões científico-médicas, mas também envolve valores humanos, aspectos físicos e psicológicos, religiosos, éticos e tantos outros. Assim, entenderemos que a manipulação genética também pode ser denominada como reprodução assistida, visto que ela consiste em técnicas de reprodução humana pelas intervenções médicas voltadas para a solução de problemas de esterilidade e, assim, favorece favorece a reprodução da vida humana. Por fim, compreenderemos que essas intervenções têm diversos aspectos a serem considerados, tais como: o técnico, o científico, o médico, o psicológico, o sociocultural, o jurídico e o religioso. Bom estudo!

4. ESTERILIDADE HUMANA HU MANA Para que haja uma nova vida, um casal que queira ter filhos deve ser fértil. Nesse sentido, podemos definir como infertilidade infertilidade   a incapacidade de uma mulher ou de um homem (ou, ainda, ambos) ter filhos, embora essa situação possa não ser definitiva. Já a esterilidade esterilidade   é a incapacidade definitiva ou irreversível de se conceber um filho, embora haja casos em que se possa reverter essa situação por meio de procedimentos médico-cirúrgicos. As-

 

© U6 - A Bioética e a Manipulação Genética

105

sim, a esterilidade é uma doença (ou a consequência de alguma doença) que, geralmente, produz problemas psíquicos e/ou sociais. Muitas vezes, quando é enfrentada pelo casal, pode trazer uma série de frustrações e de problemas, podendo, inclusive, romper as relações matrimoniais ou dificultar a continuidade de uma convivência que se caracteriza caracterizava, va, até então, como amorosa e construtiva. Temos de entender que os filhos criam vínculos importantes não só na família à qual pertencem, mas também no âmbito social de convivência com o qual a família se relaciona. Por essa razão, a ausência deles limita essas possibilidades e pode acabar reduzindo a vida do casal de forma muito restrita. A vivência prática tem nos mostrado que a desilusão que a esterilidade causa pode provocar estragos na integridade psicológica do casal, gerando frustrações, tensões, censuras, discussões conflitantes, conflitant es, e até mesmo a possível separação do casal. Em contrapartida, a infertilidade pode ser aceita e assumida pelo casal de forma equilibrada, visto que há a possibilidade de adoção ou de formas alternativas de se lidar com a ausência de filhos, como, por exemplo, a participação do casal em atividades sociais ou filantrópicas. Além disso, é importante ressaltar que a esterilidade é considerada pela medicina como um processo patológico ou como uma disfunção, de forma que ela pode ser tomada como objeto de tratamento, seja cirúrgico, seja substitutivo, tendo por finalidade obter a descendência e restabelecer o equilíbrio psicológico e social do casal.

5. PRINCI PRINCIP PAIS TÉCNICAS TÉCNIC AS DE REPRODUÇÃO REPROD UÇÃO ASSISTIDA ASSI STIDA A medicina tem evoluído muito nas últimas décadas no que se refere tanto à Inseminação Artificia Art ificiall (IA) como também à Fecundação in vitro com vitro com Transferência de Embriões (FIVTE).

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

106

© Bioética

Assim, neste tópico, vamos analisar cada uma dessas técnicas de reprodução assistida. Inseminação Artificial (IA) A Inseminação Artificial é a técnica que consiste em levar o sêmen do marido ou de um doador, obtido previamente por masturbação como amostra fresca ou previamente congelada, à vagina ou ao útero da mulher receptora. Explicações acerca dos procedimentos da inseminação Para realizar-se a Inseminação Artificial, há uma série de procedimentos procediment os que devem ser seguidos. Inicialmente, realizam-se exames adequados na mulher para se saber se ela é estéril e qual aa finalidade causa da sua esterilidade.oAssim, a ovulação, com de estabelecer melhormonitora-se momento para que o óvulo possa se encontrar com os espermatozoides no interior da mulher. Em seguida, coleta-se o sêmen do marido ou de um doador. Nessa fase, é importante mencionar que há casos em que o sêmen do marido não é adequado para garantir que se produza a fecundação do óvulo, de maneira que se deve proceder, então, a sua preparação no laboratório laboratório,, selecionando os espermatozoides. Por fim, a inseminação propriamente dita consiste em depositar o sêmen na parte vaginal do colo do útero útero,, onde deve permanecer por, aproximadamente, seis horas, podendo, depois disso, ser retirado pela mulher. Fecundação in vitro com Transferência de Embriões A chamada Fecundação in vitro (FIV) vitro (FIV) é a realizada em laboratório sob as condições adequadas, na qual um ou mais óvulos são colocados em contato com espermatozoides.

 

© U6 - A Bioética e a Manipulação Genética

107

Explicações acerca dos procediment procedimentos os da fecundaçã fecundação o Com a ajuda de um microscópio, pode-se acompanhar todo o processo de desenvolvimento desenvolvimento do embrião ou dos embriões origiori ginados. Assim, uma vez conseguida a fecundação in vitro, vitro, e depois de ter sido considerada bem-sucedida, procede-se a Transferência dos Embriões (TE) para o interior do útero da mulher. É importante ressaltar que a chamada Fecundação in vitro  vitro  com Transferência de Embriões (FIVTE) consiste, basicamente, em: coleta do óvulo da mulher, coleta do sêmen e Fecundação in vitro  vitro  com Transferência de Embriões. Nesse sentido, é recomendado que a transferência dos embriões seja feita entre 24 e 48 horas depois da fecundação. Então, terminada a FIVTE, a mulher permanece em repouso e em decúbito por várias horas ou, até, por um dia inteiro inteiro,, podendo ser liberada em seguida. Na hipótese de a gravidez ser conseguida, o que pode ser confirmado duas semanas mais tarde, realizam-se os exames de controle e as prescrições médicas normais e necessárias. Dessa forma, as técnicas de reprodução humana assistida foram pensadas e também utilizadas para resolver os problemas de esterilidade masculina ou feminina. Entretanto, o que se pode perceber nos últimos anos que a manipulação genética originou uma autêntica revolução revolução naérealidade e no imaginário da reprodução humana. O que está ocorrendo é um descompasso entre o uso da tecnologia de reprodução e a discussão e a elaboração da legislação e de normas, as quais são sempre muito lentas. Há inúmeras intervenções que têm a finalidade reprodutiv reprodutivaa imediata ou mediata. Essas intervenções, geralmente, geralmente, são divididas em três tipos: • Intervenç Intervenções ões com finalidade reprodutiv reprodutiva, a, que são, basicamente, a IA e a FIVTE.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

108

© Bioética

• Intervenções Intervenções com embriões pré-implant pré-implantados ados ou com com embriões “sobrantes” em laboratório. Nesses casos, seria sempre preferível a “doação” imediata a casais necessitados, fazendo quase que uma pré-doação, do que utilizar o congelamento congelament o dos embriões. • Intervenções no processo reprodutor, reprodutor, sobre as quais o Brasil ainda não tem uma legislação explícita. Com relação às técnicas de reprodução assistida, é importante mencionar que, dentro das inúmeras alternativas que se praticam atualmente com relação às intervenções no processo reprodutivo, há duas situações muito polêmicas, que são: a escolha do sexo e a clonagem de embriões, as quais enfrentam posturas bastante negativas e questionadoras dentro da comunidade médica e científica.

6. DESDOBRAMENTOS DAS INTERVENÇÕES PARA A SOCIEDADE A abertura de possibilidades e o uso efetivo das diversas técnicas de reprodução assistida trazem trazem mudanças significativa significativass para a sociedade e, especialmente, para as pessoas que vivem e participam desse processo. outras palavras, o que se pretende aqui édos fazer uma exreflexãoEm sobre o uso da ciência genética sem abusar pontos tremos, ou seja, ou pode-se fazer tudo em nome do bem-estar do ser humano, ou, então, nada se pode fazer, uma vez que tudo já está predeterminado. Portanto, partimos do ponto de que é preciso reconhecer que a esterilidade é algo problemático e que não pode ser analisado sob o ponto de vista apenas biológico, mas também psicológico, humano e social. A ausência de filhos na vida de um casal bem como a certeza da impossibilidade de tê-los são complicadas e todos os esfor esforços ços realizados para que seja solucionado o problema são elogiáveis.

 

© U6 - A Bioética e a Manipulação Genética

109

No Brasil, por ex exemplo, emplo, embora não tenhamos estudos mais completos sobre o problema da esterilidade, segundo dados de especialistas,, cerca de 20% dos casais têm algum tipo de problema especialistas sobre a reprodução humana – um dado que é bastante significativo. Assim, podemos destacar alguns desdobramentos com relação às técnicas de reprodução humana, tais como: • O casal, a partir do critério de livre escolha, escolha, decide superar os obstáculos biológicos, psicológicos ou sociais da esterilidade, buscando uma procriação livremente assumida. • A procriação procriação como um direito direito – da escolha passa-se ao direito, sem nenhum extremismo, seja pelo aborto, seja pela supervalorização, mediante as técnicas de reprodução. • A procriação como ação não relacional – no caso de mulheres desacompanhadas, solteiras, separadas, divorciadas, viúvas, que tenham direito ao uso das técnicas de reprodução reproduç ão humana assistida. Logo, a escolha não nã o está apenas no ato de procriar procr iar,, mas também nas condições de procriação, superando superando as deficiências genéticas que, porventura, existirem. Pela literatura literatura pesquisada, não há nenhum consenso com relação ao direito de a mulher constituir sua própria família. No Brasil, a Resolução n. 1358, de 11 de novembro de 1992, trata dessa questão, estabelecendo que: [...] toda mulher, capaz nos termos da Lei, que tenha solicitado e cuja indicação não se afaste dos limites desta Resolução, pode ser receptora das técnicas de reprodução assistida, desde que tenha concordado de maneira livre e consciente em documento de consentimento informado. Estando casada ou em união estável, será necessária a aprovação do cônjuge ou do companheiro, após processo semelhante de consentimento informado (BRASIL, 1992, p. 180).

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

110

© Bioética

Dessa forma, é esse o entendime entendimento nto majoritário com relação às intervenções no processo reprodutor humano quando se refere às técnicas de reprodução humana assistida, e, também, quando necessita impedi-lo via controle de natalidade. Poderíamos nos questionar, ainda, se é válido e, sobretudo, ético utilizar as intervenções da reprodução assistidadivorciada, fora do matrimônio, ou seja, uma mulher solteira, separada, viúva, ou que tem para uma união homossexual. Em resposta a isso, a Constituição brasileira traz-nos assuntos referentes à família, à criança, ao adolescente e ao idoso. Podemos ter uma ideia desses assuntos mediante a informação contida no Capítulo VII, parágra parágrafo fo 5º, que diz: “Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela pel a mulher mul her..” Ainda segundo o que rege a Constituição brasileira, brasileira, Art. 226 no parágrafo 7º, lê-se: Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte das instituições oficiais ou privadas (BRASIL, 1998).

Logo, o casamento ainda é o âmbito humano em que a pessoa necessita estar parase que a procriação seja concretiz concretizada. ada.e,Partindo da hipótese de que o próprio casamento não garante, garant em si mesmo, um ambiente qualitativo para a educação e para a formação que toda criança e/ou adolescente tem direito, inferimos que, fora dele, será muito mais difícil para a criança encontrar o amor, o carinho e o acompanhamento necessários para se sentir uma pessoa amada e querida. Assim se explica a ênfase dada na Constituição acerca da chamada paternidade chamada  paternidade responsável, responsável, em que se reafirma que, embora o casal seja livre, o fato de ele ter tomado a decisão de gerar um filho mostra que estava ciente da responsabilidade assumida

 

© U6 - A Bioética e a Manipulação Genética

111

com relação à tarefa tarefa de criar o filho com amor e carinho, não dando, pois, importância apenas à vida material. Por conseguinte, não são aceitáveis, moral e eticamente, as chamadas gravidezes “adotivas” ou “de aluguel”, em que a mulher contrata uma mãe para realizar, em troca de dinheiro ou por outras razões, a tarefa da gestação. Técnicas de reprodução assistida: intervenções especiais Há, ainda, as intervenç intervenções ões especiais nas técnicas de reprodução assistida que precisam ser citadas e comentadas. Destacam-se as seguintes: • O uso de embriões depois da morte de um dos cônjuges, cônjuges, em que se extrai o esperma de um recém-f recém-falecido alecido ou utiliza-se o sêmen congelado previamente, ou seja, coletado antes da morte do marido. Ambas as situações descritas gerariam um “filho órfão,” o que, de toda maneira, não seria aconselhável, uma vez que este não teria a oportunidade de viver num ambiente familiar. • O uso da FIVTE em mulheres mulheres com idade avançada. avançada. Essas “mães-avós” com mais de 60 anos, por exemplo, não se encontram mais numa situação biológica adequada para proporcionar a educação de uma criança, uma vez que o filho passa a ser, praticamente, um neto. • A seleção seleção arbitrária arbitrária do sex sexo o do filho. No fundo, considera-se uma manipulação humana que ultrapassa a necessidade do uso terapêutico, ou mesmo pode ser considerado como uma discriminação injusta entre sexos. Podemos concluir, então, que a utilização da manipulação genética que visa resolver o problema da esterilidade modificou profundamentee a concepção sobre o casamento e a família, espeprofundament cialmente a nuclear. Por fim, com relação a este tema, podemos indicar três posturas ou concepções bastante díspares, mas presentes na apreciação favorável ou contrária na utilização da repro-

dução humana assistida: Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

112

© Bioética

• Numa perspectiva pragmática e utilitarista, utilitarista, a adoção da postura com relação ao fato de que todos os recursos e técnicas que possam ser acionados por um casal estéril é válida e benéfica para o próprio casal. Assim, ela pode ser encontrada tanto na esfera científica como na opinião pública. • No extremo oposto, oposto, encontra-se o magistério católico, que se opõe ao uso do recurso das técnicas de reprodução e que o considera como ato lesivo à vida do casal. Essa posição não se ref refere ere apenas a casos extremos, como idade avançada da mãe e aluguel do útero, mas também ao uso intraconju intraconjugal. gal. • Numa postura intermediária, intermediária, estão aqueles que consideram válido o uso do recurso de técnicas de reprodução para resolver o problema da esterilidade, desde que se jam acompanhadas as implicações sociais e psicológicas no casal e nos indivíduos. Como você pode perceber, a adoção desse processo pode ocasionar ansiedades, expectativas expectativas e, no caso de fracasso ou experiência mal-sucedida, podem advir traumas e frustrações maiores do que as esperanças otimistas otimistas do início. Assim, perante o desdobramento de problemas que podem se fazer presentes às pessoas que vivenciam esse processo, a psicologia e a religião podem ajudar muito no enfrentamento enfrentamento de modificações significativas na condição e na convivência humana. Leitu Lei tura ra Compl Com plement ementar ar ––– –––––– –––––– –––––– –––––– –––––– –––––– –––––– –––––– –––––– ––––– ––   Os avanços extraordinários da ciência, nos últimos anos em relação à biologia, à reprodução humana e à genética, trouxeram muitas esperanças de cura de doenças, mas também profundas inquietações e interrogações éticas. O que antes o acaso ou a natureza resolviam, hoje passa pelo crivo da intervenção humana. As possibilidades técnicas de implementação de determinadas inovações no âmbito da vida humana, como clonagem,utilização de células tronco embrionárias, manipulação de embriões nas clínicas de reprodução assistida, entre outros procedimentos, estão obrigando a humanidade a pensar nos seus valores e repensá-los.

 

© U6 - A Bioética e a Manipulação Genética

113

  A emergência e o interesse público pela discussão ética dizem que nem tudo o que é tecnicamente possível é necessariamente desejável para a vida e a dignidade humana. A ciência é inventiva, inovadora e ousada. A ética, nesse cenário, procura salvaguardar a dignidade de todos sob a ótica da responsabilidade e da prudência. É a sabedoria humana que vai discernir o bem e o mal, o que deve ser implementado e o que deve ser limitado. En fim, o que ajuda o ser humano a ser mais feliz, nasce do diálogo honesto e respeitoso entre ousadia científica e prudência ética. Portanto, não se trata de satanizar, a priori, a ciência (PESSINI, 2006, p. 44).

 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  ––––––––––––––––––––––––––––––––––––– –––––––––––––––

7. QUESTÃO AUTOAVALIATIVA Sugerimos, neste tópico, que você procure responder às questões a seguir, que tratam da temática desenvolvida nesta unidade, bem como que as discuta e as comente comente.. A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para testar seu desempenho. Se encontrar dificuldades em responder a essas questões, procure revisar os conteúdos estudados para sanar suas dúvidas. Este é o momento ideal para você fazer uma revisão do estudo desta unidade. Lembre-se de que, na Educação a Distância, a construção do conhecimento ocorre de forma cooperativa e colaborativa. Portanto, compartilhe com seus colegas de curso suas descobertas. 1) Você estudou nessa nessa Unidade temática temática a possibilidade dos casais terem terem filhos, o que pode ser considerado uma dádiva divina e maravilhosa. A Constituição Brasileira refere-se à paternidade (e maternidade) responsável, responsável,  quando reafirma que, embora o casal seja livre na tomada de decisão de gerar um filho, deve estar ciente da responsabilidade de assumir a taref tarefaa de criá-lo com amor e carinho, não dando apenas importância i mportância à vida material. Faça uma pequena pesquisa por meio de jornais, revistas e da Internet sobre o problema do abandono de crianças e adolescentes no Brasil e procure relacionar a afirmação anterior com os dados estatísticos profundamente desumanos e inaceitáveis existentes no país.

8. CONSIDERAÇÕES Chegamos ao final desta unidade, na qual tivemos a oportu-

nidade de conhecer e aprender um pouco mais sobre a genética, Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

114

© Bioética

no que tange à manipulação, à esterilidade e às intervenções no processo de reproduç reprodução. ão. Na próxima unidade, estudaremos conteúdos relacionados ao aborto. Entretanto, antes de iniciá-la, faça uma pausa, reflita e certifique-se de que não há nenhuma dúvida deixada para trás.

9. EREFERÊNCIAS BRASIL, Constituição da República Federativa do. Título VIII: VIII: da ordem social, 1998. Disponível em: . federa tiva_brasil.pdf>. Acesso em 9 ago. 2010. 201 0. DATASUS. Departamento de Informática do SUS. Disponível em: . Acesso em: 9 ago. 2010.  2010.  EDIÇÕES LOYOLA. Home page. page. Disponível em: . Acesso em: 9 ago. 2010.

10.. REFERÊN 10 REFERÊNCIAS CIAS BIBLIOGRÁFICAS BIBLIO GRÁFICAS BARCHIFONTAINE, Christian de Paul. Bioética e início da vida: vida: alguns desafios. São Paulo: Centro Universitário São Camilo, 2004. BRASIL. Conselho Federal de Medicina. Resolução n. 1358, de 11 de novembro de 1992. Adota normas éticas para a utilização das técnicas de reprodução humana assistida. Diário Oficial da União, União, Brasília, DF, 19 nov. 1992. DINIZ, D. Conflitos morais e bioética. bioética. Brasília: Letras Livres, 2001. DWORKIN, R. Domínio da vida-aborto, vida-aborto,  eutanásia e liberdades individuais. individuais. São Paulo: Martins Fontes, 2003. FORTES, P. Bioética e saúde pública. pública. São Paulo: Loyola, 2003. JUNIOR, Klinger Fontinele. Ética e bioética em enfermagem. enfermagem. São Paulo: AB, 2006. MINISTÉRIO DA SAÚDE. Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher . Plano de ação 2004-2007. 2004 -2007. Brasília, DF, DF, 2004. MOSER, A. Biotecnologia e bioética: bioética: para onde vamos? Petrópolis: Vozes, Vozes, 2004. PESSINI, L. Problemas atuais da bioética. bioética. São Paulo: Loyola, 1997.  ______. Bioética: um grito por dignidade de viver . São Paulo: Paulinas, 2006.

 

      D       A       E

A Bioética e o Aborto

7 1. OBJETIVOS • Estudar o tema aborto aborto com base nas suas múltiplas dimensões para poder compreender toda a sua dramaticidade e complexidade. • Analisar as implicações decorrent decorrentes es do aborto, não apenas para a gestante, mas para toda a sociedade.

2. CONTEÚDO CONTEÚDOSS • • • •

Conceituação e principais tipos de aborto. Legislação brasileira que versa sobre esse tema. Sexualidade humana e a família. Abortos não assistidos e assistidos.

• Principais aspectos e dimensões que envolv envolvem em o aborto. aborto.

 

116

© Bioética

3. ORIE ORIENT NTAÇÃO AÇÃO PARA PARA O ESTUD ESTUDO O DA UNIDADE UNI DADE 1) Para aprofundar seus conheciment conhecimentos os sobre sobre a história da eugenia praticada pela medicina nazista com o apoio dos americanos, uma ótima sugestão de leitura é a obra  obra   A Guerra Contra os Fracos Fracos,, de Edwin Black, editada em 2003, pela A Girafa Editora Ltda.

4. INTRODUÇÃO À UNIDADE Na unidade anterior anterior,, conhecemos conteúdos relacionados à manipulação genética, à esterilidade humana e às principais técnicas de reprodução assistida. Nesta unidade, nosso objeto de estudo será o “aborto”, o qual é um tema pertinente perti nente de bastante discussão, uma vez que envolve valores éticos e cristãos. Acerca desse tema, você conhecerá alguns conceitos, tipos, a legislação brasileira, bem como os seus principais aspectos e dimensões.

5. CONCEITUAÇÃO E PRINCIPAIS TIPOS DE ABORTO Inicialmente, é importante que seja mencionado que, na verdade, o termo correto para tratar-se do ato de interrupção da gravidez “abortamento”, porém, com o tempo, a ser chamado deé “aborto”. Por isso, utilizaremos apenaspassou esse termo (“aborto”) neste caderno. A palavra “aborto” vem do latim “abortus “abortus”, ”, que quer dizer expulsão natural ou provocada de um embrião ou feto, juntamente com os anexos ovulares, antes da data de viabilidade. Há, atualmente, uma variedade conceitual significativa sobre os tipos de aborto, e isso não acontece por acaso. Na verdade, cada pesquisador ou debatedor no assunto, para impressionar o leitor ou o ouvinte, utiliza termos e conceitos que possam oferecer certo impacto ou sensibilizar o outro, no sentido de convencê-lo a aderir

a essa ou àquela postura, a favor ou contra o aborto.

 

© U7 - A Bioética e o Aborto

117

A terminologia médica oficial, basicament basicamente, e, pode ser sintetizada em quatro tipos de aborto: 1) Interrupção Eugênica da Gestação  Gestação  (IEG): são os casos de aborto ocorridos em nome de práticas eugênicas, ou seja, de situações em que se interrompe a gestação por valores e princípios racistas, sexistas e étnicos. Em geral, a IEG acontece contra a vontade da gestante, sendo obriob rigada a abortar. Aqui é impossível não fazer referência à medicina nazista praticada nos judeus, negros e ciganos, durantee a Segunda Guerra Mundial. durant 2) Interrupção Terapêutica da Gestação (ITG): Gestação (ITG): são os casos de abortos praticados para salvaguardar a saúde materna, ou seja, para salvar a vida da gestante. gestante.

No Brasil, o Código Penal prevê e aceita essa prática de aborto, assim como no caso de estupro, que abordaremos mais adiante.

3) Interrupção Seletiva da Gestação (ISG): Gestação (ISG): são os casos de aborto que tratam de alguma anomalia fetal, isto é, situações em que se interrompe a gestação pela constatação de lesões fetais. Os casos que justificam a ISG são as patologias incompatíveis com a vida extrauterina, sendo um exemplo clássico o da anencefalia, isto é, quando o bebê não tem cérebro. 4) Interrupção Voluntária Voluntária Gestação (IVG): Gestação  (IVG): são os casos de aborto ocorridos emda nome da autonomia reprodutiva da gestante ou do casal, isto é, situações em que se interrompe a gestação porque a mulher ou o casal não mais deseja a gravidez. Nesse sentido, há diferentes legislações nos diversos países do mundo que impõem uma série de limitações com relação à prática abortiva. Com exceção da primeira modalidade (IEG), todas as outras formas de aborto, por princípio, levam em consideração a vontade da gestante ou do casal em dar continuidade à gravidez. Há muitos autores que preferem utilizar a expressão “auto-

nomia reprodutiva” em vez de utilizar “interrupção voluntária da Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

118

© Bioética

gravidez”, que, segundo eles, explicitaria mais claramente a liberdade de escolha, de decisão. Também não há o menor consenso sobre o resultado de um aborto, de forma que as denominações variam: “embrião”, “feto,” “criança”, “não nascido” e “pessoa”. Até a 8ª semana de gestação, o termo científico correto é “embrião”, o qual é usado para indicar que o seu desenvolvimento ainda está no estágio inicial. Por exemplo, até a 10ª semana de gravidez, ainda não existem células que irão constituir os ossos e os músculos, e os órgãos vitais ainda estão imaturos. imaturos. Além disso, o sistema nervoso está dando os seus primeiros passos na 8ª semana, o que descarta a hipótese de consciência ou dor. Nessa fase, o tamanho do embrião é de 27 a 35 milímetros, aproximadamente. aproximadamente.

6. LEGISLAÇÃO BRASILEIRA BRASILE IRA SOBRE O ABORTO Grosso modo, podemos dividir o mapa do mundo em três grandes grupos de países: no primeiro grupo, há, aproximadamente, 56 países que permitem o aborto, representando 40% da população mundial; no segundo grupo, em torno de 40 países permitem o aborto com restrições; e, por fim, no terceiro grupo de países, onde está a maioria, inclusive o Brasil, não se permite o aborto, exceto nos casos previstos no Código Penal. Como afirmamos, o Código Penal Brasileiro, nos artigos de 124 a 127, afirma que o aborto é considerado crime contra contra vida. No entanto, a Legislação excetuou dois casos de aborto, previstos no artigo 128, incisos I e II do Código Penal, em que se deixa de punir o agente quando houver risco de vida da mãe, ou quando a gravidez for resultado de estupro.  Classificação de abortos permitidos A lei Brasileira prevê a permissão de aborto nas seguintes

situações:

 

© U7 - A Bioética e o Aborto

119

• Aborto terapêutico: terapêutico: é aquele que é efetuado em casos em que há perigo de vida para a gestante, ou perigo de lesão grave e duradoura para a saúde física e/ou psíquica da mulher, mulher, ou, ainda, quando quan do há má-formação fetal. Qualquer uma dessas hipóteses está enquadrada na legislação vigente. • Aborto por violação: violação: aborto permitido quando a gravidez resulta de crime contra a liberdade e autodeterminação sexual da mulher. A interrupção tem de ser realizada nas primeiras 16 semanas de gestaç gestação. ão. • Aborto em menores de idade: idade: para que possa ser realizado o aborto, é sempre necessário o consentimento da mulher grávida. No caso de a mulher grávida ser menor de 16 anos, o consentimento é prestado pelo representante legal legal por ascendente ou, na sua falta, por quaisquer parentes de linha colateral. Fora os casos elencados, o aborto, no Brasil, é considerado ilegal. Então, por aborto ilegal entende-se a interrupção de uma gravidez, quando os motivos não se encontram enquadrados na legislação em vigor, ou quando é realizado em locais que não são oficialmente reconhecidos. Em todas as outras situações, estão previstas penas tanto para a mulher como para quem realiza o procedimento, as quais variam de três a dez anos de reclusão. Além disso, as penas são aumentadas em um terço caso a gestante sofra lesão corporal de natureza grave, e são duplicadas no caso de morte por causa da lesão, considerando-se, considerando-se, nesse caso, um crime de homicídio.

7. SEXUALIDADE HUMANA E A FAMÍLIA Por muito tempo, tivemos como modelo de família o patriarcal, no qual o casamento era visto e encarado como possibilidade de um bom negócio e de ascensão social. Já na sociedade moder-

de um bom negócio e de ascensão social. Já na sociedade moder Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

120

© Bioética

na, a família nuclear passa a ser vista como uma instituição de dupla condição: a natural e a cultural. A família é a instituição humana mais universalizada no tempo e no espaço histórico. Ela não foi instituída por nenhum legislador, mas está pré-formada na espécie humana desde os primórdios. Nesse contexto, a condição natural é exigida pela condição da espécie humana, que necessita organizar os vínculos de parentesco,, de matrimônio e de filiação e, desse modo, assegurar a contesco tinuidade do grupo humano, incorporando a ele novos indivíduos. Já a condição cultural é necessária, pois a estrutura e as funções da instituição familiar estão submetidas às variações da evolução humana e do pluralismo cultural. Entretanto, nas sociedades atuais, a família passou por profundas mudanças, uma vez que sua formação passou a apresent apresentar ar variações significativas, nas quais há casais que vivem em casas separadas, mulheres que desempenham papéis de pai e mãe, homens que desempenham ambos os papéis, casais sem filhos, homens e mulheres solteiros, e assim por diante. Da mesma forma, a sexualidade humana passou por rupturas e transformações nessas últimas décadas, no mundo inteiro. Existem muitas informações sobre a vida sexual, comparada com gerações anteriores, que está iniciando mais cedo. Os casamentos estão sendo adiados pelos jovens e, também, desfazendo-se com maior rapidez; a questão da virgindade deixou de ser tabu; os medicamentos que agem sobre as disfunções eréteis propiciam uma vida sexual mais intensa para as gerações de terceira idade e o uso intensivo de métodos contraceptivos possibilitam uma vida sexual contínua e prolongada. Dentro desse leque de novas opções para os seres humanos, o fato mais grave assustador é que,de anualmente, ximadamente, 210e milhões de casos gravidez noocorrem, mundo. apro-

 

© U7 - A Bioética e o Aborto

121

Desse número elevado, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS, 1999), 46 milhões, ou seja, 22% terminam com um aborto induzido e, de um modo geral, a grande maioria das mulheres com até 45 anos de idade já teve, ao menos, um antecedente de interrupção voluntária de gravide gravidez. z. Ainda conforme a OMS, o mais dramático é que cerca de 20 milhões desses abortos são classificados como inseguros, pelo fat fato o de serem realizados por pessoal não qualificado e/ou em condições sanitárias inadequadas. É importante mencionar, ainda, que há, basicamente, dois tipos diferentes diferentes de aborto: os assistidos e os não assistidos.

8. ABORTOS NÃO ASSISTIDOS A SSISTIDOS Pensemos na seguinte hipótese: se todos aqueles que tiverem uma vida sexual regular adotassem métodos contraceptivos, utilizando-os de forma correta e perfeit perfeita, a, mesmo assim, existiriam, pelo menos, 6 milhões de gravidezes gravidezes acidentais, todos os anos, no mundo. Assim, mesmo com elevados índices de utilização de contraceptivos, podem ainda ocorrer gravide gravidezes zes indesejadas, que podem ser interrompidas por meio do aborto abor to pelas próprias mulheres ou pelos casais. Podemos, agora, definir “aborto “aborto não assistido” assistido” como um procedimento para interromper a gravidez indesejada, o qual é efetuado por pessoas sem as qualificações profissionais necessárias e/ou em ambientes sem as mínimas normas médicas adequadas. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que cerca de 20 milhões de abortos não assistidos são realizados todos os anos e em torno de 95% deles ocorrem, infelizmente, nos países mais pobres.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

122

© Bioética

Dentre esses números, há a taxa de um aborto não assistido para cada sete nascimentos; contudo, nas regiões mais pobres, essa taxa aumenta consideravelmente. Aproximadamente, 13% das mortes relacionadas com a gravidez são atribuídas como decorrência de abortos não assistidos. Segundo fontes do Ministério da Saúde no Brasil, o parto representa a primeira causa da internação de adolescentes no Sistema Único de Saúde (SUS). Na faixa etária entre 15 e 19 anos, o principal motivo para a internação das mulheres é a gravidez, o parto ou o pós-parto.

Os dados estatísticos totalizadores mais recentes apontam que são realizados, em média, mais de um milhão de abortos anuais, de forma que a maior parte deles é feita de modo inseguro. Decorrências de abortos não assistidos Temos de analisar, ainda, as consequências decorrentes do aborto não assistido, no qual pelo menos uma em cada cinco mulheres que recorreram a ele sofreu, posteriormente, infecção no processo de reprodução. Essas infecç infecções ões revelam-se muito complicadas e, muitas vezes, conduzem à infertilidade, podendo causar até mesmo a morte da paciente. É sabido que o acesso aos serviços médicos para um aborto é restrito por lei e que, mesmo que a lei permita o aborto, os serviços médicos e hospitalares são insuficientes ou de baixa qualidade. No entant entanto, o, as mulheres com maior capacidade financeira conseguem adquirir serviços médicos competentes competentes no setor privado da Saúde. Em contrapartida, as mulheres mais pobres que vivem em regiões isoladas ou que se encontram em situações mais vulneráveis, tais como: refugiadas políticas, mulheres deslocadas de suas casas, adolescentes e, em particular, mulheres solteiras têm

menor acesso às informações e aos serviços de saúde reproduti

 

© U7 - A Bioética e o Aborto

123

va; são, na maioria das vezes, muito fragilizadas e vulneráveis à coerção e à violência sexual e podem adiar a decisão de fazer um aborto, tornando-se passíveis à prática do aborto não assistido e com pessoal não qualificado.

9. ABORTOS ASSISTIDOS ASS ISTIDOS Pelo que acabamos de descrever anteriormente, quase todas as mortes e complicações decorrentes decorrentes de um aborto não assistido poderiam ser evitáveis. Do ponto de vista médico e clínico, os procedimentos e as técnicas para a indução determinada de um aborto são bastante simples e, especialment especialmente, e, seguros. Logo, quando praticado por pessoal médico qualificado, com equipamentos apropriados e em condições sanitárias adequadas, o aborto é uma das intervenções médicas mais seguras. Estudos e dados estatísticos do Instituto  Alan Guttmacher   revelam que em países onde as mulheres têm acesso a serviços médicos seguros, o risco de morte é ínfimo, ou seja, um caso para cada 100.000 pessoas. Já nos países pobres e em desenvolvimento, o risco de morte devido a complicações decorrentes de um aborto não assistido é centenas de vezes maior do que o risco do aborto realizado por profissionais em condições seguras. Nesse sentido, o Instituto Alan Guttmacher (2004) produziu estimativas para o Brasil no período compreendido entre 19962005, em que houve a redução de 38% de abortamentos. A grande maioria desses abortamentos induzidos (3 em cada 4 em 2005) ocorreu nas regiões nordeste e sudeste. A taxa anual de abortamentos induzidos por 100 mulheres de 15 a 49 anos no país foi reduzida de 3,69% em 1992 para 2,7% em 2005. Até o momento, estudamos o problema dentro da ótica da saúde pública e da concepção médica e sanitária; todavia, não está

em discussão apenas o aspecto econômico e financeiro, tampouco tampouco Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

124

© Bioética

só o lado da saúde pública: há outros inúmeros aspectos e valores que precisam ser avaliados e considerados, os quais são tão ou mais importantes. É o que veremos no tópico a seguir.

10. PRIN 10. PRINCIPAIS CIPAIS ASPECTOS AS PECTOS E DIME D IMENSÕ NSÕES ES QUE Q UE EN VOLVEM VOL VEM O ABORTO A BORTO Para compreendermos compreendermos com maior profundidade o problema do aborto, temos de refletir sobre os aspectos biológicos, psicológicos, mentais, ético-morais, legais, financeiros, religiosos, entre outros que o envolvem. Sem nenhuma pretensão de esgotá-los, destacaremos apenas os aspectos que são considerados essenciais: 1) Aspectos educacionais e culturais: culturais: as camadas de baixa renda são grandes parcelas da sociedade, especialmente aquelas que não tiveram oportunidades de escolarização, e, também, não por coincidência, que não conhecem os principais métodos contraceptivos, não faze fazendo, ndo, consequentemente, o uso deles.

Em ambientes rurais e mais isolados, os casamentos são realizados precocemente. Nessas uniões, geralmente, há prole numerosa, visto que esse tipo de população não conhece os métodos contraceptivos seguros, ou, se os conhece, não têm acesso fácil aos meios contraceptivos.

2) Aspectos econômicoeconômico-financeiros financeiros:: apesar de as pessoas terem acesso às informações e aos conheciment conhecimentos os adequados sobre os métodos contraceptivos, não fazem o uso deles, uma vez que os produtos são caros ou não têm o devido acesso a eles. Logo, para a classe trabalhadora que recebe entre um e dois salários mínimos por mês, o uso regular da pílula ou de preservativos acaba inviabilizando essa prática pelo elevado custo. 3) Aspectos políticopolítico-administrativos administrativos:: cada país ou região tem a sua população total compatível com os recursos e

 

© U7 - A Bioética e o Aborto

125

as condições de vida. Isso quer dizer que cada país deveria ter um planejamento da política populacional, com estudos e projeções que indicassem a necessidade ou não do cresciment crescimento o demográfico necessário e possível. 

No caso brasileiro, nas duas últimas décadas, a taxa vegetativa de crescimento, que é a diferença entre nascimentos e mortes durante um ano, decresceu significativamente: de 3,5% caiu para 1,7%. Em termos estatísticos, o Brasil, ainda assim, tem o aumento de um milhão e setecentas mil crianças por ano, e, se considerarmos as creches, as moradias, os hospitais, a alimentação e os empregos, não há poder público que garanta, efetivamente, as condições adequadas para esse aumento populacional anual.

4) Aspectos de saúde pública: pública: o aborto não está relacionado apenas de aossaúde valores éticosque e morais, mas também um contexto pública, é um direito previstoa na Constituição. Destacamos que o Ministério da Saúde não trata apenas das doenças em si, mas também da saúde preventiva, de forma que todo cidadão deveria visitar, ao menos, um dentista e um médico por ano para exames periódicos e de rotina. Desse modo, os cofres públicos estariam livres das internações hospitalares longas, trazendo uma melhor qualidade de vida à população.

5) Aspectos psicológicos e emocionais: emocionais: qualquer que seja a situação econômica e financeira da mulher grávida, o aborto sempre trará consequências psicológicas graves e negativas, que, se não tratadas, poderão provocar sequelas indesejáveis para o futuro. 6) Aspectos legais e jurídicos: jurídicos: cada país tem a sua Constituição, o seu Código Civil e Penal e as demais normas e leis para regular e regulamentar a vida em sociedade. Essas leis precisam ser estudadas, debatidas, revistas e atualizadas, de forma a verificar em que medida elas têm a sua dimensão de legalidade e legitimidade, se ajudam na construção da liberdade, da equidade, da justiça

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

126

© Bioética

e da cidadania, bem como observar até que ponto, de fato, somos iguais perante a lei. 7) Aspectos filosóficos: filosóficos: enquanto a Biologia estuda o corpo humano na sua constituição física, a Filosofia estuda o ser humano na sua dimensão ontológica, ou seja, percebe o ser humano na sua totalidade vivendo vivendo no planeta Terra de forma coletiva e integrada. 8) Aspectos religiosos: religiosos: todos os países do mundo, independentemente do estágio econômico e civilizatório em que se encontram, têm um patrimônio espiritual e cultural. É importante ressaltar que as religiões, com seu corpo doutrinário, suas tradições, valores valores e princípios que norteiam e orientam os seus crentes e seguidores, precisam ser respeitadas e valorizadas. Assim, do ponto de vista religioso, a grande maioria das religiões, em especial a Igreja Católica, desde o século 4º, assume uma posição contrária ao aborto em qualquer estágio, pois considera a concretização da concepção na junção do espermatozoide com o óvulo, de forma que a alma é infundida no novo ser no momento da fecundação. Dessa maneira, a Igreja propõe como método contraceptivo apenas a abstinência sexual nos dias férteis da mulher. Em contrapartida, nas Igrejas Reformadas, há um leque de opções e atitudes mais amplo com relação ao aborto. A principal diferença entre elas e a Católica está no respeito à vida da mãe, sobre a qual recairá a prioridade da preservação da vida. Já no Judaísmo, o aborto não é desejável, mas não é considerado um assassinato e, em todos os casos, é a saúde da mulher que prevalece tanto no que se refere ao equilíbrio físico como ao psíquico. No Hinduísmo e no Budismo, o cerne da questão está no modo de interpretar o sêmen, considerado o veículo transmissor da vida, uma vez que, para essas religiões, é no momento da fecundação (óvulo–espermatozóide) em queéseportador dá o início da vida. Ambas, por isso, defendem que o homem da vida ea

mulher é portadora de um corpo cuja finalidade é proteger o feto.

 

© U7 - A Bioética e o Aborto

127

Além disso, elas defendem uma concepção machista, na qual o homem é que tem o direito de decidir pela continuidade ou não da gestação. De toda maneira, temos de avaliar o processo cultural de cada país e de cada povo, tendo a consciência de que cada nação tem o seu idioma, as suas tradições, os seus valores e princípios, bem como uma legislação autônoma que precisa ser respeitada. Como você pode perceber, o diálogo entre a ciência e a religião é difícil pelo fato de, muitas vezes, existirem posturas extremadas entre as duas formas de interpre interpretar tar a realidade. No entanto, estamos estamos certos de que a religião precisa da ciência e vice-versa, para que seja construída uma sociedade mais compreensiv compreensivaa e feliz. O resp r espeit eito o à Vida Vi da –––––––––– ––––––––––––––– –––––––––– –––––––––– ––––––––––– –––––––––––– ––––––  Até muito recentemente, recentem ente, tanto o início da vida vi da humana quanto o seu final escapavam por completo nossoecontrole. pordaobra acaso, da natureza, ou, então, “graças adoDeus”, também Nascia-se se despedia vidado pelas mesmas razões. O conhecimento humano era muito pequeno em relação a esses processos.  Hoje, essa realidade mudou e praticamente prati camente quase tudo passa pelo crivo criv o da ação e/ou intervenção humana. Agora, tal intervenção acontece à luz de que valores e princípios? Aumentou muito a responsabilidade da vida, pois nem tudo o que é técnica e cientificamente possível de realizar-se é eticamente aceitável. Diante do imperativo tecnológico, do fazer algo novo a qualquer custo, devemos contrapor o imperativo ético, que vai perguntar por que fazer? Qual o sentido? Essa intervenção honra a dignidade humana? Entramos, aqui, no âmago da discussão ética (PESSINI, p. 38).

 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  ––––––––––––––––––––––––––––––––––––– –––––––––––––––

11.. QUESTÕES 11 QUESTÕ ES AUTOAV AU TOAVALI ALIA ATI TIV VAS Sugerimos, neste tópico, que você procure responder às questões a seguir, que tratam da temática desenvolvida nesta unidade, bem como que as discuta e as comente comente.. A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para testar seu desempenho. Se encontrar dificuldades em responder a essas questões, procure revisar os conteúdos estudados para sanar suas dúvidas. Este é o momento ideal para você fazer uma revisão do estudo desta unidade. Lembre-se de que, na Educação

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

128

© Bioética

a Distância, a construção do conhecimento ocorre de forma cooperativa e colaborativa. Portanto, compartilhe com seus colegas de curso suas descobertas. 1) A questão do aborto aborto envolve múltiplos e distintos distintos aspectos que precisam precisam ser levados em consideraçã consideração, o, mas de toda a maneira, antes de praticápraticá-lo, lo, as pessoas precisam pensar nas suas consequências. Pelo fato da sua gravidade e importância, releia o texto da Legislação Brasileira que prevê os casos nos quais a realização do aborto é permitida por lei. 2) Troque Troque ideias e converse com seus amigos, parentes e conheci conhecidos dos a respeito do aborto, para que você se torne um agente multiplicador de consciências bem informadas e responsáveis responsáveis diante da maior riqueza que é a vida humana.

12. CONSIDERAÇÕES Nesta unidade, vimos que a questão do aborto precisa ser muito bem situada e contextualizada, uma vez que se está tratando do início de uma vida, do seu desenvolvimento desenvolvimento e, talvez, do seu término. Dessa forma, pudemos compreender compreender que a vida é uma dádiva divina e que, por isso, precisa ser preservada sempre. De posse desses conhecimentos, vamos estudar, na Unidade 8, a eutanásia e a clonagem. Até lá!

13.. REFERÊN 13 REFERÊNCIAS CIAS BIBLIOGRÁFICAS BIBLIO GRÁFICAS BARCHIFONTAINE, C. de P. Bioética e início da vida: vida:  alguns desafios. São Paulo: Centro Universitário São Camilo, 2004. DINIZ, D. Conflitos morais e bioética. bioética. Brasília: Letras Livres, 2002. DWORKIN, R. Domínio da vida: vida: aborto, eutanásia e liberdades individuais. São Paulo: Martins Fontes, 2003. MARKHAN, Ú. Aborto Ú. Aborto espontâneo. espontâneo. São Paulo: Summus, 2004. PAPALEO, C. C. Aborto C.  Aborto e contracepção contracepção:: atualidade e complexidade da questão. Rio de

Janeiro: Renovar, 2000.

 

© U7 - A Bioética e o Aborto

VIEIRA, T. R. Bioética e Direito. Direito. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2003. PESSINI, L. Bioética Bioética:: um grito por dignidade de viver. viver. São Paulo: Paulinas, 2006.

129

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

      D       A       E

Bioética, Eutanásia e Clonagem

8

1. OBJETIVOS • Compreender Compreende r a eutanásia como um problema controverso da Bioética, uma vez que envolve a vida humana. • Incentivar a leitura leitura e o debate sobre o tema, ampliando ampliando a consciência com relação à adoção ou não da eutanásia. • Estudar a questão questão da clonagem, clonagem, compreendendo compreendendo as contribuições que essa técnica pode trazer ao ser humano. • Abordar a clonagem clonagem terapêutica terapêutica e discutir discutir os pontos fav favooráveis e contrários para a sociedade.

2. CONTEÚDO CONTEÚDOSS • Voltando às origens. • Polissemia do conceito eutanásia. • Classificação da eutanásia.

 

132

© Bioética

• Distanásia e ortotanásia. • Conside Considerações rações favoráv favoráveis eis e contrárias à adoção da eutanásia. • Conceituação e abrangência. • Clonagem veget vegetal, al, animal e humana. • Abordagem sobre os limites limites e as possibilidades possibilidades do uso da clonagem.

3. INTRODUÇÃO À UNIDADE No estudo da unidade anterior, você foi subsidiado com conteúdos sobre o aborto, assunto que envolve valores éticos e cristãos. Embrenhamo-nos nas malhas tortuosas e emblemáticas da Bioética e vamos dar um passo adiante. Agora, nesta nesta unidade, entra em cena um tema com um vocabulário bem complicado: eutanásia, distanásia e ortotanásia. No rol dos assuntos polêmicos que caracterizam o estudo da Bioética, está incluída, também, a clonagem. Entretanto, não se preocupe: cada fato a seu tempo. Daremos as explicações plausíveis que irão facilitar o nosso itinerário. A clonagem abordada com base na sua conceituação nos seus diferentesserá tipos. Dessa forma, centralizaremos o enfoquee da clonagem humana e seus desdobramentos possíveis em uma outra oportunidade. Bom estudo!

4. VOLTANDO ÀS ORIGENS O ser humano é o único ser vivente da Terra consciente de sua finitude, que sabe que sua passagem neste mundo é transitória e que deve terminar um dia; em outras palavras, ele tem a

certeza de que irá morrer.

 

© U8 - Bioética, Eutanásia e Clonagem

133

O estudo sobre a morte e o fato de morrer motivou a medicina a criar um novo ramo do conhecimento científico sobre o assunto, o qual é denominado Tanatologia, ou seja, a ciência que estuda a morte e que busca, na Filosofia e nas Ciências Sociais, as diferentes formas de representação ritualística da extinção da vida entre diferentes povos e culturas. Houve épocas em que o ser humano se sentia senhor tanto de sua vida quanto de sua morte. Então, com o desenvolvimento científico, encontrou-se uma solução para o dilema; tal fato foi traduzido na medicalização da morte, o que ocorreu no século 19. Assim, passou-se a determinar que os doentes fossem levados e morressem nos hospitais, ao contrário do que ocorria antes, quando as pessoas morriam em casa. Com isso, a morte tornou-se laica e não mais religiosa. Dentro desse ela transformou-se em uma dimensão menos dramáticacontexto, e mais técnica, na qual era o médico quem decretava quando se deveria interromper todo e qualquer tipo de tratamento. Vamos buscar, na História, as primeiras notícias com relação ao uso da eutanásia. Nesse sentido, veja como Suetônio Suetônio,, no século 2º, descreveu a morte do Imperador Augusto: Sua morte foi suave, tal como sempre a tinha desejado, porque quando ouvira dizer que alguém tinha morrido rapidament rapidamentee e sem dor,, ele desejava o mesmo para si e os seus, usando dor usan do a expressão euthanásia (De vitae Caesarum) (SUETÔNIO apud LEPARGNER, 2009). Caio Suetônio  (69-126) foi arquivista e historiador latino que escreveu uma biografia sobre a personalidade dos Imperadores romanos.

Bem mais tarde, Thomas Morus, Morus, no seu livro Utopia (1516), expressou sua posição com relação à morte: Se a doença é incurável e faz-se acompanhar de dores agudas e contínuas angústias, os sacerdotes e magistrados devem ser os primeiros a exortar os infelizes a decidirem-se a morrer. Então, devem fazer com que vejam que, não tendo mais utilidade neste mundo, não têm razão para prolongar uma vida que corre por sua conta e os torna

insuportáveis para os outros (MORUS apud  LEPARGNER,  LEPARGNER, 2009).

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

134

© Bioética

Thomas Morus (1478- 1535), por vezes conhecido, como já mencionamos, como Thomas More, renascentista e grande humanista, escreveu o livro Utopia  e foi falsamente acusado de incesto por Henrique VIII, preso pre so na Torre Torre de Londres e, mais tarde, tar de, executado.

No século 17, Francis Bacon compartilha dessa mesma atitude e defende o uso da eutanásia. Já a tradição deontológica é claramente oposta oposta à eutanásia, isso desde Hipócrates Hipócrates,, e a sua condenação percorre os códigos médicos de vários países. As legislações dos países variam, pois uma parte adota a eutanásia, outros fazem restrições restrições e há aqueles que a proíbem.

Hipócrates foi o maior médico da Antiguidade (460-377 a.C.). É conhecido como pai da medicina e o famoso Juramento de Hipócrates foi criado a partir de sua inquestionável conduta ética. Até hoje, os recém-formados realizam o juramento de colocar a serviço da sociedade os conhecimentos adquiridos dentro da medicina. Acesse o site disponível em: . Acesso em: 30 jun. 2009, e conheça o Juramento de Hipócrates.

5. POLI POLISSE SSEMIA MIA DA PALAVRA PALAVRA “EUTANÁS “EUTANÁSIA IA”” A palavra eutanásia designa uma morte suave, sem sofrimento; outros ainda a traduzem por morte digna, digna, mas cada pessoa, cada grupo interpreta a dignidade que convém à pessoa no contexto de suas próprias crenças, isto é, do seu contexto familiar, social e cultural (LEPARGNEUR, 1999).

Etimologicamente, “eutanásia” quer dizer “boa morte”. Na acepção moderna, essa ausência de sofrimento é provocada pela antecipação voluntária voluntária da morte de uma pessoa que sofre de maneira insuportável.

 

© U8 - Bioética, Eutanásia e Clonagem

135

A eutanásia é realizada com a ajuda de auxiliares benevolentes ou com a antecipação de óbito, por compaixão, ocasionada por ação ou omissão deliberada de outra pessoa. De acordo com Hubert Lepargneur (1999),  “Se a eutanásia é a morte de acordo com as aspirações do sujeito, reconheçamos nela um lugar privilegiado da aplicação do princípio-mor da bioética de cunho norte-americano: a autonomia do sujeito humano”. Em nível teórico, há princípios, valores e crenças que podem figurar como impedimentos de tomar essa ou aquela posição controversa. Ainda de acordo com Lepargneur (1999): Na prática, a palavra chega a significar o adiantamento de um óbito que o sujeito deseja em razão de sofrimentos que suas convicções e sensibilidade não conseguem agüentar e/ou valorizar. O conceito é freqüentemente usado de maneira pejorativa ou imprópria, não sem riscos de confusões com conceitos realmente próximos. A eutanásia não deve ser confundida com o homicídio, matança criminal, direta ou indireta (como o envenenamento) envenenamento) de uma pessoa, sem seu consentimento sequer implícito. O “homicídio por piedade” existe, mas este tipo de “eutanásia” não pode ser defendido como padrão normal da mesma. A eutanásia é também muito vizinha do suicídio (muito pouco condenado no Antigo Testamento, se tanto) sendo, no fundo, um suicídio assistido. O uso preferível do termo “eutanásia” visa à situação em que o interessado quer livremente morrer, mas não consegue realizar seu desejo amadurecido amadurecido,, por motivos físicos. Compreende-se atualmente a eutanásia como o emprego ou abstenção de procedimentos que permitem apressar ou provocar o óbito de um doente incurável, a fim de livrá-lo dos extremos sofrimentos que o assaltam ou em razão de outro motivo de ordem ética. A afirmação teórica de que, em nossos dias de farmacopéia avançada, toda dor encontra seu analgésico eficaz não corresponde ainda a uma prática generalizada. Na eutanásia, a morte deve constituir a finalidade primária e não secundária da intervenção. [...] O cerne da eutanásia consiste, portanto, no adiantamento voluntário da morte pessoal por qualquer meio disponível, na maioria das vezes para evitar sofrimentos julgados insustentáveis, encurtar uma vida inútil, sem sentido (por exemplo, pela perda da honra em certas culturas como a japonesa, reconhecemos que neste caso trata-se trat a-se de suicídio) ou penosa. [...] [...] mais problemática é a interpretação interpretação do desejo de eutanásia por

parte de um paciente incapaz in capaz de se exprimir exprimi r, já que existe o risco de transferir-lhe, indevidamente, uma aspiração que lhe é estranha. Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

136

© Bioética

As incertas fronteiras fronteiras da eutanásia podem se sobrepor aos confins da consciência, da capacidade de se comunicar, bem como às incertezas interpretativas.

6. CLASSIFICAÇÃO DA EUTANÁSIA Segundo Goldim apud  Barbosa   Barbosa (2007), a eutanásia, dependendo do critério considerado, pode ser classificada de diversas formas, destacando-se as seguintes: Quanto ao tipo de ação Eutanásia ativa: ativa: o ato deliberado de provocar a morte sem sofrimento do paciente, por fins misericordiosos. Eutanásia passiva ou indireta: indireta: a morte do paciente ocorre dentro de um quadro terminal, ou porque não se inicia uma ação médica ou porque há interrupção de uma medida extraordinária, com o objetivo de minorar o sofrimento. Eutanásia de duplo efeito: efeito: a morte é acelerada como uma conseqüência indireta das ações médicas que são executadas executadas visando ao alívio do sofrimento de um paciente terminal. Quanto ao consentimento do paciente Eutanásia voluntária: voluntária: quando a morte é provocada atendendo a uma vontade do paciente. Eutanásia involuntá involuntária ria:: quando a morte é provocada contra a vontade do paciente. Eutanásia não-volunt não-voluntária ária:: quando a morte é provocad provocadaa sem que o paciente tivesse manifestado manifestado sua posição em relação a ela.

7. DIST DISTANÁSIA ANÁSIA E SUICÍDIO SUIC ÍDIO ASSISTIDO ASS ISTIDO A distanásia distanásia é  é a agonia prolongada, é a morte com sofrimento físico ou psicológico do indivíduo ainda lúcido e consciente. Esse termo foi proposto por Morache, em 1904, no seu livro Nascimento e Morte e Morte  e que foi publicado em Paris pela Editora ALCAN (OLIVEIRA et al .,., s/d).

Em outras palavras, a distanásia distanásia é a tentativa de adiar o desfecho da morte enquanto houver uma mínima chance de sobrevida. Mas até que ponto o médico deve relatar ao paciente a sua

verdadeiraa situação? Ele deve contar toda a verdade ou não? verdadeir

 

© U8 - Bioética, Eutanásia e Clonagem

137

Em geral, para cada situação haverá uma norma ou recomendação, pois depende de cada caso, da pessoa, da sua família, da sua condição real, e assim por diante. A postura diante da distanásia também é complicada, porque a eterna tentativa de manter a pessoa viva, mesmo que ela esteja em coma profundo, também é discutível, afinal, não está em jogo somente o paciente, mas também a sua família, os seus parentess e, inclusive, a vaga no hospital. parente O termo ortotanásia tem sido usado como sinônimo de morte natural (do grego - orthós: normal, correta e thánatos: morte), ou eutanásia passiva na qual se age por omissão (inversamente à eutanásia ativa na qual existe um ato comissivo com real induzimento ou auxílio ao suicídio), esta seria também a manifestação da morte boa, desejável; ao contrário, enquanto isso o termo distanásia seria, portanto, a morte dolorosa, com sofrimento, conforme se observa com freqüência nos pacientes terminais de AIDS, câncer doenças incuráveis, e tantas outras (OLIVEIRA et al .,., s/d).

É importante ressaltar ainda que, na ortotanásia, podem ser adotadas medidas paliativas para aliviar o sofrimento da pessoa que está em vias de falecer. A ortotanásia pode ser encarada, então, como a síntese ética entre morrer com dignidade e o respeito à vida humana, que se caracteriza pela negação da eutanásia (abreviação da vida) e da distanásia (prolongamento da agonia e do processo de morrer). Assim, a ortotanásia permite ao doente que se encontra diante da morte iminente e inevitável, sendo rodeado pela família, amigos e pelos próprios profissionais da saúde, enfrentar com naturalidade a realidade dos fatos, encarando o fim da vida não como uma doença da qual se busque a cura a qualquer custo custo,, mas sim como uma condição que faz parte do ciclo natural e humano. Algumas considerações contrárias ao uso da eutanásia Há inúmeros argumentosque expostos e defendidos pordo médicos, estudiosos e especialistas não admitem a hipótese uso

da eutanásia. Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

138

© Bioética

Nesse sentido, foi realizada uma pesquisa na PUC-SP nos anos de 2006 e de 2007, na qual foi analisada a fundamentação teórica sobre o tema. Houve, também, uma pesquisa empírica, de forma que foram entrevistadas aproximadamente 60 pessoas de diferentes áreas: médicos, advogados, psicólogos e religiosos de vários credos. O mesmo tema foi objeto de estudo de um grupo de estudantes de Direito da PUC-SP, no qual 20 pessoas relativamente idosas, 10 pessoas leigas, 15 servidores da justiça, 10 médicos e 5 sacerdotes foram entrevistados. O principal argumento que apareceu nas entrevistas é pautado na tradição bíblica: a vida não pertence ao ser humano, mas a Deus. Quer dizer, há a crença de que o direito da vida e da morte pertença exclusivamente a Deus. Dessa forma, do argument total de entrevistados, 48% alegaram a influência religiosa como argumento o formador de opinião. Um segundo argumento que apareceu com frequência foi a questão financeira: a eutanásia, uma vez implementada, poderia gerar um comércio, banalizando a vida humana, esquecendo-se do seu verdadeiro valor. Houve, ainda, entrevistados que alegaram o próprio princípio Constitucional no artigo 5º da Constituição Federal, que afirma: “a vida é um direito inviolável, inviolável, não sujeito a qualquer qualquer tipo de renúncia” renún cia”.. Outro argumento que aparece com certo destaque contra a eutanásia é o avanço contínuo da ciência médica, em que se toma por provável o fato de que o que ainda hoje não possui cura, em um futuro bem próximo, poderá passar a tê-la. Assim, alguns entrevistados declararam-se totalmente contrários à prática da eutanásia, pelo fato de viverem, mais do que nunca, os valores pragmáticos pragmáticos e utilitaristas que visam exterminar todos os considerados inúteis e improdutivos  improdutivos dentro  dentro de uma pers-

pectiva capitalist capitalista. a.

 

© U8 - Bioética, Eutanásia e Clonagem

139

Algumas considerações favoráveis favoráveis ao uso da eutanásia Com relação aos ao s argumentos favoráveis favoráveis à eutanásia, o mais consistente e frequente destacado pelos advogados, médicos e especialistas é o que parte, novamente, dos princípios constitucionais, ou seja, da dignidade humana e da autonomia do paciente, as quais deveriam ser levadas em consideração na decisão médica. Alegam os entrevistados que, na maioria das vezes, são os familiares que, de maneira egoísta, procuram protelar a vida de seu parente querido até um final terrivelmente doloroso, para que, assim, possam permanecer perto dele por mais tempo. Já na hipótese de o paciente pedir para não adiar o sofrimento e estando ele em sã consciência, para eles, o médico e os parentes deveriam obedecer-lhe. O princípio da autonomia, se for considerado e valorizado de fato, tem o seu peso e a sua validade; logo, ao ser acoplado à dignidade humana, ele amplia e alarga o fundamento da tomada de decisão do paciente que está, ainda, em plena consciência. Atualmente, as pesquisas que são feitas no mundo inteiro revelam que todos os avanços da ciência e da medicina que proporcionam uma melhor qualidade de vida ao ser humano e que o auxiliam a superar os seus problemas são válidos e desejáveis. A ciência biomédica, por ex exemplo, emplo, conta com um arsenal de ferramentas para controlar ou mitigar a dor física. No entanto, o problema persiste, persiste, pois, quando acalmadas as dores, o sofrimento continua. Com efeito, vêm à nossa mente as seguintes perguntas: por que há o sofrimento? Por que sofremos? Infelizmente, como sabemos, essa dúvidas não podem ser respondidas cientificamente. O atendimento e acompanhamento deos pacientes representam uma situação desafiadora para médicos,terminais para os

amigos e para os familiares. Opta-se, então, pelo cuidado com a dor Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

140

© Bioética

e com o sofrimento humano nas suas dimensões física, psíquica, social e espiritual, garantindo-lhe a dignidade no momento final. Segundo Francisconi e Goldim (2003), as questões que se colocam são as seguintes: o paciente deve saber de toda a verdade desde o início? Ou é melhor que o médico aguarde uma oportunidade mais adequada para conversar com os familiares e, assim, somente depois revelar a verdade ao doente? Nesse momento, deve-se tomar muito cuidado, uma vez que essa revelação pode gerar um impacto pequeno, ou, então, um trauma, que pode trazer prejuízos psicológicos devastadores. Só pode se auto-determinar, de maneira adequada, aquela pessoa que tiver pleno conhecimento dos fatos médicos ligados à sua doença. Para tanto, o acesso à verdade é essencial. Mas o direito à verdade cria uma obrigação para os médicos de sempre dizer a verdade para os pacientes? O médico prudente avaliará cada caso tentando pesar os prós e contras(FRANCISCONI; das duas alternativas: dizer a verdade ou mentir para o paciente (FRANCISC ONI; GOLDIM, 2003).

Além disso, o argumento de aliviar o sofrimento do paciente está presente em boa parte da literatura que trata da eutanásia. Encontra-se esse argumento, também, nas entrevistas citadas anteriormente, em que a maioria dos entrevistados é favorável a essa prática. Até onde o ser humano pode suportar o sofrimento? Quem vai determinar o limite e a capacidade de enfrent enfrentar ar uma enfe enfermirmidade irreversível que retire, por completo, o desejo de viver? É bastante provável aceitar que, assim como somos ajudados a nascer, nascer, poderíamos podería mos ser, ser, também, ajudados ajudado s a morrer sem dor ou sofrimento, caso isso seja realmente possível. No entanto, o problema é tão abrangente e complexo que mesmo os profissionais da saúde e os especialistas na área não têm uma posição formada e firmada com relação à eutanásia, de forma que muitos deles acreditam, no fundo, que cada caso precisa ser avaliado e analisado dentro do contexto familiar, social, cultural etc. Até Até mesmo em países cuja legislação é mais sólida, as

dúvidas e os impasses continuam.

 

© U8 - Bioética, Eutanásia e Clonagem

141

Atualmente, há certo consenso nos benefícios que a biotecAtualmente, nologia pode trazer para a preservação da vida, na erradicação e cura de doenças e na reversibilidade da expectativa diante de condições mais adversas. Mas o que precisa ser discutido e aprofundado exaustivamente é o mau uso desses recursos, com suas implicações éticas, econômicas e legais, evitando-se que seja transformado em um instrumento de exploração ou em um mecanismo de sofrimento inútil e injusto. Propomos, então, que a discussão sobre a eutanásia não apenas se restrinja ao âmbito acadêmico e escolar ou na dimensão da formação dos profissionais da Saúde, mas, também, amplie-se para toda a sociedade, do modo que os meios de comunicação, que são concessões públicas, assumam, de fato, seu papel de construir uma mentalidade madura e equilibrada no meio social a que servem. Abordar a Bioética significa, portanto, ingressar em um terreno complicado e desafiador, especialmente quando se trata da vida e da morte, ou seja, do aborto, da eutanásia e da clonagem, a qual será nosso próximo assunto.

8. CLONAG CLONAGEM EM Até aqui, realizamos uma caminhada tranquila e estimulante, na medida em que nos deparamos com temas que ainda proporcionarão muito  muito “pano para para manga”, manga”, como se diz d iz na linguagem linguagem popular popular.. Em fevereiro de 1997, a Revista Nature Nature noticiava  noticiava com destaque a história da primeira clonagem animal com sucesso, realizada por Ian Vilmut , no Roslin Institute de Edimburgo: Edimburgo: a ovelha Dolly. O fato de a clonagem ter sido realizada em um mamífero e, sobretudo, a partir científica de uma célula adulta ou importância diferenciadatoda fez com que essa experiência assumisse uma especial

não só no meio da opinião pública, mas também no meio científico. Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

142

© Bioética

Assim, quase que imediatamente, começou-se a falar da possibilidade de se poder faz fazer er a clonagem em seres humanos. É interessante mencionar que um pouco antes, em 1993, ocorreu uma experiência envolvendo a divisão de embriões humanos, ou seja, a clonagem de células embrionárias totipotenciais. Contudo, com a clonagem da ovelha Dolly, realizada com células diferenciadas, levantou-se a hipótese da possibilidade da clonagem humana.

9. CONCEITO DE CLONAGEM A palavra “clonagem” tem sua raiz proveniente do termo “clon clon”, ”, originada do grego e que quer dizer “ramo”, “estaca”. A clonagem é, pois, um processo pelo qual se reproduzem organismos idênticos, ou seja, que têm a mesma dotação genética, o mesmo DNA dos quais procedem os organismos vivos. vivos. Portanto, a clonagem não pode ser entendida como algo natural ou espontâneo, visto que se realiza por meio de uma intervenção humana especial. Desse modo, uma vez que é uma intervenção humana especial no processo de reprodução, ela pode ser realizada em todas as dimensões da naturez natureza, a, tanto em micro-organismos no reino vegetal, animal e humano. INFORMAÇÃO COMPLEMENTAR ––––––––––––––––––––––– O termo “clone” foi criado em 1903 pelo botânico Herbert J. Webber enquanto pesquisava plantas no Departamento de Agricultura dos Estados Unidos. Segundo Webber, o termo vem da palavra grega “ Klón”, que significa broto vegetal. É, basicamente, um conjunto de células, moléculas ou organismos descendentes de uma célula e que são geneticamente idênticas à célula original. Dessa forma, a clonagem é um processo de reprodução assexuada, onde são obtidos indivíduos geneticamente iguais (micro-organismo vegetal ou animal) a partir de uma célula-mãe. É um mecanismo comum de propagação de espécies de plantas, bactérias e protozoários. Em humanos, os clones naturais são gêmeos univitelinos, seres que compartilham do mesmo DNA, ou seja, do mesmo material genético originado pela divisão do óvulo fertilizado (LEITE, s/d).

 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  –––––––––––––––––––––––––––––––––––––– ––––––––––––––

 

© U8 - Bioética, Eutanásia e Clonagem

143

Clonagem em micro-org micro-organismos anismos A manipulação de micro-organismos na forma de vírus e de bactérias com objetivos biotecnológicos biotecnológicos possibilita o uso da clonagem; por exemplo: se forem introduzidos genes humanos em bactérias, obteremos insulina humana e hormônios de crescimento. Com a mesma base, podem-se produzir vírus ou bactérias para outras finalidades, como, por ex exemplo, emplo, para eliminar insetos nocivos, produzir adubos nitrogenados e, até, produzir armas biológicas. Clonagem no reino vegetal Esses tipos de intervenções descritas anteriormente também podem ser praticados na genética do reino veget vegetal. al. A replicação nas plantas, por exemplo, é uma prática habitual passada de geração para geração e bastante comum entre os agricultores, em especial, entre os fruticultores, que realizam a prática do enxerto em árvores frutíferas. O enxerto trata da parte de um organismo anterior, como, por exemplo, uma árvore frutífera, da qual se faz uma replicação em uma árvore silvestre convertida; assim, a partir do enxerto, origina-se uma nova árvore frutífera. Além disso, esse enxerto tem vantagem sobrefrutos as demais plantas frutíferas, ele não cresce muito e produz em menor tempo que aspois demais. Nesse sentido, o uso de técnicas de clonagem nas espécies vegetais é realizado após as modificações genéticas (como, por exemplo, em plantas transgênicas), fazendo-se a replicação de espécies geneticamente modificadas em legumes e cereais, como o tomate, a batata, o arroz, o trigo e assim por diante. Por essa razão, o universo de possibilidades é vasto e promissor. Logo, o que se pretende, em última instância, com o uso dessas técnicas é elevar e melhorar os resultados da agricultura agri cultura e,

portanto, dos alimentos em geral. Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

144

© Bioética

Clonagem de animais A clonagem em animais é um fenômeno ainda mais significativo. Por volta da década de 1930 do século passado, registraramregistraram-se os primeiros avanços na Biologia Celular e Molecular, com a prática das cisões embrionárias e com a produção artificial de gêmeos. Assim, na década de 1950, começou-se a realizar a clonagem de rãs na fase embrionária e, em 1980, começaram a ser clonados ratos com células embrionárias. Já a partir da década de 1990, ocorreram os clones embrionários com ovelhas, gado bovino e, sobretudo, com macacos. O caso da ovelha Dolly, em 1997, foi um marco importante, pois Ian Vilmut fizera mais de 270 experiências anteriores, todas fracassadas. Até aquele momento, não se conseguira a clonagem com células somáticas. Depois da clonagem de Dolly, veio a clonagem de Polly, uma ovelha em cujo DNA introduziu-se i ntroduziu-se um gene humano para que fosse aumentada a potencialidade das proteínas do leite, deixando-o mais adequado para o consumo humano. Com essa experiência bem-sucedida, houve a continuidade de inclusão de um gene humano, com o objetivo de transplantes humanos e da produção de medicamentos medicament os para os seres humanos. Em alguns países, como EUA e Japão, foram clonados, no mesmo ano (1997), bezerros bezerros com células somáticas. A repetição e a ampliação de experiências com clonagem de animais possibilitaram que os Centros de Pesquisa clonassem apenas partes de organismos de animais, com o objetivo de utilizar os órgãos e os tecidos para consolidar os resultados e as conclusões sobre a segurança nesse processo.

 

© U8 - Bioética, Eutanásia e Clonagem

145

10.. AS POSSIBILIDADES DE CLONAGEM HUMANA 10 Do ponto de vista científico, não se pode descartar a hipótese de, em um futuro não muito distante, realizar-se a clonagem nos seres humanos. Na Universidade de George Washington (EUA), em 1993, uma equipe de pesquisadores já conseguira realizar uma divisão de embriões humanos. Contudo, até hoje, não há experiências em clonagem humana com células diferenciadas. De toda maneira, a clonagem como pesquisa científica tem as suas ambivalências e contradições. Nas experiências com micro-organismos e vegetais, por exemplo, podem ser produzidos medicamentos e, também, a celulose como forma de substituição ao uso tradicional da madeira. Em contrapartida, a clonagem de micro-organismos pode também ser utilizada para produzir armas biológicas. Além disso, a clonagem de plantas transgênicas transgênicas visa aumentar a quantidade e a qualidade de alimentos para toda a humanidade. Em compensação, ela põe em risco ri sco a biodiversidade, podendo acarretar acarret ar o desaparecimen desaparecimento to de espécies animais, com eliminação de pragas, juntamente com as plantas. Com a prática da clonagem, o reino animal poderá ser incrementado e ampliado no que tange à zootecnia, à biotecnologia e às técnicas de transplantes. transplantes. Em contrapartida, não se pode negar os intere interesses sses econômico-financeiros das grandes corporações internacionais em controlar os preços dos produtos e mercadorias no mundo inteiro. No caso da ovelha Dolly, por exemplo, foi uma empresa farmacêutica que patrocinou todo o período experimental e, com o anúncio do sucesso, suas ações tiveram grande destaque destaque e valorização no mercado de capitais. Já em relação à clonagem humana, em termos técnico-científicos, esta é possível de ser realizada; contudo, devem ser ques-

tionados quais seriam os aspectos positivos dessa experiência. Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

146

© Bioética

Muitos pesquisadores defendem a ideia de que a clonagem de células embrionárias criaria a possibilidade de se prever doenças, geneticamente geneticamente transmitidas, podendo-se selecionar uma parte do DNA sadio e, assim, fazer uma replicação. Em outras palavras, a reprodução de seres idênticos, geneticamente, ofereceria uma melhor aceitação de transplantes entre eles. Outra hipótese bastante lembrada é que a clonagem permitiria estudar melhor as doenças genéticas, como, por exemplo exemplo,, o câncer. câncer. Como já estudamos anteriormente, nas técnicas de reprodução assistida, o que ocorre não é a falta, mas o excesso de embriões guardados nos laboratórios. Dessa forma, a clonagem humana realizada a partir de células somáticas teria a vantagem de poder resolver o problema de procriação em um casal estéril e que não encontrou a solução da infertilidade pelos meios científicos disponíveis hoje em dia. É importante que deixemos bem claro que há dois tipos de clonagem humana, a saber: a clonagem reprodutiva e a clonagem terapêutica. Em janeiro de 2001, um grupo de cientistas liderado por Panayotis Zavos, um ex-professor da Universidade de Kentucky, juntamente com o pesquisador italiano Severino Antinori, disse que clonaria um ser humano nos próximos dois anos. Assim, surgiu a dúvida: quem usaria a clonagem humana meramentee reprodutiva e com quais finalidades? merament Nesse sentido, não há, no mundo inteiro, nenhuma legislação segura e explícita e que contenha alguma fundamentação consistente. No caso, a clonagem terapêutica pode ser pensada para o futuro, tendo em vista que possa vir a combater uma série de doenças como Parkinson, Alzheimer e outras. Pode ser utilizada, também, como método reprodutivo pelos casais que enfrentam problemas de infertilidade, mas deve pautar-se pela ética de se

problemas de infertilidade, mas deve pautar se pela ética de se trazerem traze rem benefícios a toda a sociedade, sem excluir ninguém.

 

© U8 - Bioética, Eutanásia e Clonagem

147

Como você pode perceber, problemas complexos como esses exigem análises complexas e aprofundadas; em outras palavras, a clonagem contém uma série de aspectos que não podem ser reduzidos ou simplificados. O ser humano possui a dignidade como pessoa, como sujeito, agente de construção e transformação. Por isso, ele não pode ser reduzido a uma “coisa”. Tratar o ser humano como objeto de manipulação é uma forma de violência que precisa, de todas as maneiras, ser evitada. O homem contém uma biodiversidade que não apenas é genética própria, mas também tem um caráter cultural plural. Vale ressaltar que a clonagem reprodutiva reproduti va traz em seu bojo o risco da manipulação humana, seja ela racista, social ou comercial. Etidade; há, ainda, o ser humano temTrata-se a sua própria idenele éoutro um seraspecto: único, original e singular. do princípio de individualização individualização,, e a clonagem atenta diretamente contra ele. Dessa forma, a clonagem de células humanas com fins terapêuticos apresenta-se como uma alternativa bastante promissora para um futuro próximo, uma vez que ela não ocasiona uma clonagem completa de um ser humano, mas apenas obtém, pela replicação a partir de células células--mães mães,, células humanas que substituam outras, visando à cura de doenças como o diabetes, o Alzheimer e tantas outras. O ponto mais polêmico reside no uso de células somáticas ou embrionárias. No caso do uso de embriões, está-se ferindo a dignidade humana, correspondente à vida que vai nascer. Em contrapartida, o uso de células-mães somáticas pode ser justificado e validado. Para encerrar esta unidade, citamos dois importantes nomes: Richard J. Roberts, pesquisador britânico, e Roger Konnberg, pesquisador norte-americano, são ganhadores prêmios Nobel de Medicina em 1993 e que de Química em 2006,dos respectiva-

mente, os quais afirmam que a realização da clonagem é possível Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

148

© Bioética

de forma técnico-científica; porém, até o momento, a concepção ética postula a inviabilidade da clonagem de seres humanos. Recr Re criar iar a vida: vi da: oi oitavo tavo di dia a da d a criação? cr iação? –– –––– –––– –––– –––– –––– –––– –––– –––– –––– –– O crescente conhecimento científico e poder de intervenção sobre a vida humana que a humanidade conquistou nos últimos anos, especi ficamente na área da biologia e genética, com possibilidade real de re-criação da vida, assusta muita gente. Manchetes na mídia alardeiam, com freqüência, a expressão os “cientistas não deveriam brincar de Deus”. Temos uma questão teológica implícita nessa frase. Na maioria das vezes, a expressão “brincar de Deus” destina-se a proibir certas formas de pesquisa científica e terapia médica, significando que o ser humano não tem direito de alterar os planos estruturais dos organismos vivos, inclusive do seu próprio, pois isso se constituiria em uma usurpação do privilégio de Deus criador. A todo e qualquer avanço cientí fico, levanta-se a placa: “Não brincará de Deus”. “Diante dos extraordinários progressos da biotecnologia, a expressão bíblica de que o ser humano foi criado à “imagem e semelhança de Deus” está sendo substituída por outra: “Autocriado à sua própria imagem e semelhança” [...] Deus criouea anatureza como algo bom,marcantes. mas ela não completa. O sofrimento, a doença morte são realidades O está conhecimento cientí fico que adquirimos busca o aprimoramento da criação que herdamos. A humanidade, criada à imagem e semelhança de Deus, atua não concorrendo com Deus, mas em aliança com ele. Por outro lado, o ser humano é apenas uma pálida imagem de Deus. Suas intervenções técnicas também são marcadas, com freqüência, pelo mal, pecado e finitude, é sua marca de criatura. Surge, aqui, a necessidade de sabedoria ética, para discernir e orientar que intervenções tecnocientí tecnoci entíficas deveriam ser evitadas ou encorajadas. Nessa visão, o ser humano não é um mero executor passivo do eterno destino traçado desde sempre, mas alguém que, no uso de sua liberdade criativa e responsável, assume sua vocação original de ser. Concluímos lembrando Paul Ramsey, que diz: “Não deveríamos brincar de Deus antes de aprendermos a ser seres humanos; e quando aprendermos a ser seres humanos, não desejaremos brincar de Deus” (PESSINI, 2006, p.54-55).

 ––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––  –––––––––––––––––––––––––––––––––––––– ––––––––––––––

11. QUESTÃO AUTOAVALIATIVA Sugerimos, neste tópico, que você procure responder às questões a seguir, que tratam da temática desenvolvida nesta unidade, bem como que as discuta e as comente comente.. A autoavaliação pode ser uma ferramenta importante para testar seu desempenho. Se encontrar dificuldades em responder

a essas questões, procure revisar os conteúdos estudados para sanar suas dúvidas. Este é o momento ideal para você fazer uma

 

© U8 - Bioética, Eutanásia e Clonagem

149

revisão do estudo desta unidade. Lembre-se de que, na Educação a Distância, a construção do conhecimento ocorre de forma cooperativa e colaborativa. Portanto, compartilhe com seus colegas de curso suas descobertas. 1) Booker Washington é autor da seguinte frase: “ Uma grama de aplicação vale mais de que uma tonelada de abstração.” Inspirado nessa ideia, procure conversar conversar com familiares, familiares, parentes e amigos para checar quem já teve um problema familiar semelhante de uma longa internação hospitalar,, às vezes na UTI e em coma e como foi decidida talar dec idida essa ess a questão. Optou-se pelo ciclo da naturez natureza, a, ou foi adotada a eutanásia ou a distanásia? Essa checagem visa aferir a distância que existe numa discussão teórica ou abstrata e o enfrentamento de um problema real e concreto, sobretudo quando envolve alguém muito querido e familiar.

12. CONSIDERAÇÕES Nesta unidade, conhecemos as definições de eutanásia, distanásia e ortotanásia, bem como suas características. Estudamos, também, a clonagem com base na sua conceituação e nos seus diferentes tipos. Na próxima unidade, convidare convidaremos mos você a conhecer conteúdos relacionados aos alimentos transgênicos e à doação de órgãos. Até lá!

13. EREFERÊNCIAS APARECIDA, et al. Saúde em foco: uma proposta para reflexão em ética e cidadania. Disponível em: . Acesso em: 26 maio 2009.

16.. REFERÊN 16 REFERÊNCIAS CIAS BIBLIOGRÁFICAS BIBLIO GRÁFICAS BARCHIFONTAINE, C. de P. Bioética e início da vida: vida: alguns desafios. São Paulo: Centro Universitário São Camilo, 2004. BERNARD, J. A J. A bioética. bioética. Lisboa: Instituto Piaget, 1993. BOFF,, L. Ética da vida. BOFF vida. Rio de Janeiro: Sextante, 2005. BOREM, A. Escape gênico: os riscos do escape gênico da soja no Brasil.  Brasil.   Revista Biotecnologia,, Campinas, ano 2, v. 10, 1999. Biotecnologia CASSIRER, E. Ensaio sobre o homem. homem. São Paulo: Martins Fontes, 1997. CHIAVACCI, E. Breves lições de bioética. bioética. São Paulo: Paulinas, 2004. CORDEIRO, A. R. Plantas transgênicas: transgênicas: o futuro da agricultura sustentável. História, Ciência, Saúde. Rio de Janeiro: Manguinhos, 2000. v. 7.

ECHEVERRI A, T. ECHEVERRIA, T. M. Cenários do amanhã: amanhã: sistemas de produção de soja e os transgênicos. Campinas: UNICAMP, 2001.

 

© U9 - Alimentos Transgênicos, Transplantes e Doação de Órgãos

171

GARRAFA, V. Pesquisas em bioética no Brasil de hoje. hoje . São Paulo: Gaia, 2006. LONDRES, F. Transgênicos no Brasil : as verdadeiras conseqüências. São Paulo: Revista Candeia, 2007. PESSINI, L. Problemas atuais da bioética. bioética. São Paulo: Loyola, 1997. PESSINI, L.; BARCHIFONTAINE; C. P. (Orgs.). Buscar sentido e plenitude de vida: vida: bioética, saúde e espiritualidade. São Paulo: Paulinas, 2008. SOCIEDADE DE TEOLOGIA E CIÊNCIAS DA RELIGIÃO-SOTER. Sustentabilidade da Vida e Espiritualidade.. São Paulo: Paulinas, 2008. Espiritualidade ZANCAN, G. O desafio das plantas geneticamente modificadas. modificadas . São Paulo: Cadernos de Ciência e Tecnologia da USP, 2001. v. 18. ZATZ, M.  A biologia molecular contribuindo para a compreensão e a prevenção das doenças hereditárias. hereditárias. São Paulo: Ciência & Saúde, 2002. 2 002. v. 7.

Claretiano - Centro Universitário Universitário

 

View more...

Comments

Copyright ©2017 KUPDF Inc.
SUPPORT KUPDF