Consumindo o Outro

April 3, 2019 | Author: Gisele Lemes Rodrigues | Category: Sociology, City, Potato, Knowledge, Sociedade
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Consumindo o “outro” - Branquidade, educação e batatas fritas baratas Michael W. Apple Comendo Batatas ritas Baratas ! sol se refletia no teto do pequeno carro, enquanto percorr"amos a estrada de pista simples. ! calor e a umidade fa#iam-me per$untar se sobraria al$um l"quido no meu corpo, ao fim da %ia$em, e le%a%a-me a apreciar os in%ernos de Wisconsin mais do que seria de se esperar. A ideias de in%erno parecia muito remota, neste pequeno pa"s asi&tico pelo qual eu tenho $rande apreço, mas o assunto em discussão não era o clima, eram as luta lutass dos dos educ educad ador ores es e ati% ati%is ista tass soci sociai aiss para para cons constru truir ir uma uma educ educaç ação ão que que foss fosse e considera%elmente mais democr&tica do que aquela %i$ente no pa"s, no momento. ! t'pico era peri$oso. (iscuti-lo filos'fica e formalisticamente em termos acad)micos era tolerado. *ra#)-lo abertamente + discussão e situ&-lo dentro de uma sria an&lise das estruturas de poder econmico, pol"tico e militar que a$ora det)m o controle sobre tantas coisas na %ida di&ria desse pa"s  uma outra questão.   medida que pro$red"amos por aquela estrada rural, no meio de uma das melhores con%ersaç/es que 0& ti%e sobre as possibilidades das transformaç/es educacionais e das realidades das opressi%as condiç/es que tantas pessoas esta%am enfrentando naquela terra, meu olhar da al$uma forma foi atra"do para um dos lados da estrada. 1um daqueles acont aconteci ecimen mentos tos quase quase aciden acidentai tais, s, que esclare esclarecem cem e crista cristali# li#am am o que realid realidade ade  realmente, meu olhar caiu sobre um ob0eto aparentemente inconsequente. 2m inter%alos re$ulares ha%ia pequenas placas de sinali#ação plantadas na terra a poucos metros do lu$ar onde a estrada e o campo se encontra%am. A placa era muito mais do que familiar. 3e%a%a a ins"$nia de um dos mais famosos restaurantes de fast food dos 2stados 4nidos. *rafe$amos por quilmetros, passando por terrenos aparentemente desertos, ao lon$o de uma plan"cie quente, ultrapassando sinal ap's sinal, cada um deles uma rplica do precedente, cada um com menos de meio metro de altura. 1ão se trata%a de outdoors. 2stes dificilmente dificilmente e5istem nessa pobre re$ião re$ião rural. Ao contr&rio, contr&rio, eles eram e5atament e5atamente e e5atamente6 i$uais +s pequenas placas que são encontradas pr'5imas +s fa#endas do meio-oeste americano e que indicam o tipo de semente de milho que cada a$ricultor plantou no seu campo. 4m ami$o che$ado e meu e5-aluno que ha%ia retornado +quele pa"s para trabalhar nas reformas educacionais e sociais que eram tão necess&rias aquela que se re%elou por fim uma per$unta in$)nua mas crucial para minha pr'pria educação. 7or que estas placas do 8888 estão ali9 :& um restaurante 8888 por perto99 Meu ami$o olhou-me surpreendido. Michael, %oc) não sabe o que estas placas si$nificam9 1ão h& restaurantes ocidentais num raio de oitenta quilmetros de onde estamos. 2stas placas representam e5atamente o que h& de errado com a educação, neste pa"s. !uça isto. 2 eu o escutei. *rata-se de uma hist'ria que dei5ou em mim uma marca indel%el porque ela condensa, em um con0unto importante de e5peri)ncias hist'ricas, as cone5/es entre nossas lutas como educadores e ati%istas, em muitos pa"ses, e as formas pelas quais o poder atua de forma diferencial na %ida cotidiana. 1ão poderei transmitir os estranhos sentimentos que nos assola%am olhando aquela %asta, +s %e#es linda, +s %e#es assustadora e crescentemente despo%oada plan"cie. Ainda Ainda assim  crucial ou%ir a hist'ria. 2scutem-na. ! $o%erno da nação decidiu que a importação do capital estran$eiro  cr"tica para sua pr'pri pr'pria a sobre% sobre%i%) i%)nc ncia. ia. *ra#e *ra#err americ americano anos, s, alemãe alemães, s, brit;n brit;nico icos, s, 0apone 0aponeses ses e outros outros in%estidores e f&bricas claramente criar& empre$os, criar& capital para in%estimentos e tornar& a nação capa# de in$ressar rapidamente no sculo com as placas da referida empresa? e %ilas abandonadas. ! po%o, cu0a terra ha%ia sido tomada por tão pouco, mudara-se, naturalmente. Assim como em tantos outros lu$ares similares, nos pa"ses que os $rupos dominantes chamam de *erceiro Mundo, eles mi$raram para cidade. *omaram suas ma$ras posses e se mudaram para as fa%elas, sempre em e5pansão dentro e ao redor do nico lu$ar que oferecia al$uma esperança de encontrar suficiente trabalho remunerado >se todos, incluindo as crianças trabalhassem? para que pudessem sobre%i%er. ! $o%erno e os se$mentos importantes da elite empresarial oficialmente desencora0a%am isto, contratando, por %e#es, bandidos para queimar as cidades miser&%eis, outras %e#es, mantendo as condiç/es tão ad%ersas que nin$um $ostaria de morar ali. Mas, ainda assim, os despossu"dos %inham, +s de#enas de milhares.  Afinal as pessoas pobres não são irracionais. A perda de terra ar&%el tinha que ser compensada de al$uma forma e se isso implica%a ser empilhado em lu$ares que eram infernais, bem, quais eram as outras alternati%as9 :a%ia f&bricas, sendo constru"das na e em torno das cidades, que pa$a%am sal&rios incri%elmente bai5os >al$umas %e#es menos do que o suficiente para comprar o alimento necess&rio para repor as calorias $astas pelos trabalhadores no processo de produção?, mas ao menos poderia ha%er trabalho remunerado, se o su0eito ti%esse sorte. Assim, m&quinas $i$antes colhiam as batatas e as pessoas se transferiam para as cidades e o capital estran$eiro ficou feli#. 1ão  uma bonita hist'ria. 1ão o que ela tem a %er com a educação9 Meu ami$o continuou minha

educação. ! $o%erno dominado pelos militares deu todas essas $randes empresas internacionais %inte anos de isenção de impostos para facilitar as condiç/es de sua %inda para o pa"s. Assim, h& ho0e muito pouco dinheiro para fornecer sade, moradia, suprimento de &$ua, eletricidade, ser%iço de es$oto e escolar para milhares e milhares de pessoas que buscam o seu futuro na cidade ou foram literalmente empurrados para ela. ! mecanismo para não fornecer esses ser%iços era realmente inteli$ente. tomemos a falta de qualquer instituição de educação formal como e5emplo. 7ara que o $o%erno constru"sse escolas de%eria ser mostrado que ha%ia uma le$"tima necessidade para a reali#ação desse $asto. 2stat"sticas tinham que ser produ#idas de numa forma que fossem oficialmente aceita. =sto poderia ser feito apenas atra%s da determinação oficial de nmeros de nascimentos re$istrados. 2ntretanto, o pr'prio processo de re$istro oficial torna%a imposs"%el a milhares de crianças serem reconhecidas como realmente e5istentes. 7ara reali#ar a matr"cula na escola, a mãeo pai tinha que re$istrar o nascimento da criança no hospital local ou nal$uma instituição do $o%erno nenhum dos quais e5istiam nessa &rea de fa%elas. 2 mesmo que tal instituição pudesse ser encontrada, o $o%erno oficialmente desencora0a%a as pessoas %indas de fora da re$ião da cidade de mudar-se para ali. requentemente, recusa%a-se a reconhecer a le$itimidade da mudança, como uma maneira de impedir os a$ricultores desalo0ados de %irem para as &reas urbanas, aumentando, assim, a população. 1ascimentos de pessoas que não tinham o direito le$"timo de ali estar não conta%am, de fato, como nascimentos. 2sta  uma brilhante estrat$ia na qual o 2stado cria cate$orias de le$itimação que definem problemas sociais de modos muito interessantes. Assim, não ha%iam escolas, nem professores, nem hospitais, nem infraestrutura. As causa profundas dessa situação não estão na situação imediata. 2las s' podem ser esclarecidas se nos centrarmos na cadeia de formação do capital internacional e nacionalmente?, nas necessidades contradit'rias do 2stado, nas relaç/es de classe e nas relaç/es entre campo e cidade que or$ani#am e desor$ani#am aquele pa"s. & fa#ia um bom tempo que meu ami$o e eu est&%amos rodando. eu me esquecera do calor. A frase final da narrati%a não  nada bomb&stica. oi dita de%a$ar e claramente, dita de um modo que a tornou ainda mais imperiosa. Michael, esses campos são a ra#ão pelas quais não e5istem escolas na minha cidade. não h& escolas porque h& tantas pessoas que $ostam de batatas fritas baratas9 Conto essa hist'ria que me foi contada, por uma srie de ra#/es. 2m primeiro lu$ar, porque este  simplesmente um dos modos mais poderosos que conheço de lembrar a mim mesmo da import;ncia capital de %er a escola relacionalmente, de %)-la em cone5ão, fundamentalmente, com as relaç/es de dominação e e5ploração da sociedade mais ampla. 2m se$undo lu$ar, e i$ualmente tão importante, conto essa hist'ria para marcar uma posição te'rica e pol"tica crucial. relaç/es de poder são de fato comple5as e n's precisamos realmente le%ar muito a srio o foco p's-moderno no local e na multiplicidade das formas de luta nas quais necessitamos nos en%ol%er. D tambm importante realmente reconhecer as mudanças que estão ocorrendo em muitas sociedades e %er a comple5idade do ne5o podersaber. 2ntretanto, em nossos esforços para e%itar os peri$os que acompanham al$uns aspectos das $randes narrati%as anteriores, não %amos a$ir como se o capitalismo ti%esse de al$uma forma desaparecido. 1ão %amos a$ir como se as relaç/es de classe não contassem. 1ão %amos a$ir como se tudo que aprendemos cobre as formas de compreender o mundo pudesse, de al$uma forma, ser 0o$ado fora simplesmente porque a$ora nossas teorias são mis comple5as.  A ne$ação dos direitos humanos fundamentais, a destruição do ambiente, as condiç/es ab0etas sob as quais as pessoas >apenas? sobre%i%em, a falta de um futuro si$nificati%o

para s milhares de crianças que mencionei em minha hist'ria tudo isso não  apenas ou mesmo primariamente um te5to para ser decifrado nos nossos li%ros acad)micos + medida que se$uimos nossos temas p's-modernos  uma realidade que milh/es de pessoas e5perimentam nos seus pr'prios corpos, diariamente. ! trabalho educacional que não se0a fortemente relacionado com a profunda compreensão destas realidades >e esta compreensão não pode abandonar a sria an&lise da economia pol"tica e das relaç/es de classe sem perder muito de sua força? est& em peri$o de perder a sua lama.  As %idas de nossas crianças e5i$em mais do que isso. Eobre a branquidade 1ão seria inadequado terminar esse ensaio com a ltima frase do par&$rafo precedente. Mas dese0o propor-me a al$umas refle5/es adicionais sobre o que si$nifica a hist'ria que contei, porque penso que o tema das batatas fritas baratas oferece um e5emplo e5tremamente importante da pol"tica do senso comum e da pol"tica, não apenas de classe, mas das suas intersecç/es com branquidade, com raça, colonialismo e neocolonialismo. *al%e# se0a apropriado, nesse momento, que eu di$a al$o sobre minhas opini/es pol"ticas. ui e continuo sendo um acadFemico ati%ista e um ati%ista acad)mico, dependendo da situação em que me encontro. Assim, como muitas outras pessoas, esforço-me por aliar meus escritos a mo%imentos pela transformação social e por permanecer um intelectual or$Fanico, cu0o trabalho tem ori$em nesses mo%imentos, mas tambm os realimenta. =sto  mais bem sucedido al$umas %e#es do que outras, mas e5i$e um esforço consciente. 2, como tantas outras pessoas, isso tem si$nificado tomar parte concreta em esforços antirracistas, na pol"tica sindical, contra a $an;ncia empresarial, em mobili#aç/es contra a $uerra e o imperialismo, na pol"tica pela educação e em inmeras outras lutas. 7re%isi%elmente, isto inclui uma cota de riscos desde a confrontação com membros da Gu Glu5 Glan, at ser preso em um pa"s asi&tico >diferente daquele com o qual comecei este te5to? por falar contra repressão dos eu $o%erno militar aos direitos humanos e a prisão de professores l"deres sindicais. (i$o tudo isso, não para tentar demostrar que bom su0eito Michael Apple supostamente , mas para oferecer um tipo diferente de ar$umento. ! fato de al$um ser claramente um ati%ista pol"tico não $arante que ele este0a li%re das dinFamicas diferenciais de poder, din;micas que penetram em nossas %idas di&rias sob formas muito sutis. =sto pode e5i$ir um ato consciente para interromper nosso senso comum e tornar esta participação clara. 1a hist'ria que contei, raça e classe fa#em uma intersecção com relaç/es coloniais e neocoloniais tanto nacional quanto internacionalmente. (estaquei as cone5/es entre a pr&tica de consumo nos 2stados 4nidos e o empobrecimento de certos $rupos, claramente identific&%eis, numa nação asi&tica. 7enso estarem claras as relaç/es de classe que emer$em e que ali são criadas. A destruti%idade das relaç/es de produção e o correspondente empobrecimento de milhares e milhares de pessoas num pa"s como esse não podem ser separados da capacidade de consumir o po%o de outra nação. 1o entanto, esta tambm  uma hist'ria sobre dinFamica racial e sua institucionali#ação sob formas coloniais e neocoloniais. Helaç/es de branquidade são estruturalmente recriadas aqui. 1ão constitui um acidente hist'rico que estas relaç/es internacionais se0am criadas e toleradas entre um centro arro$ante e uma periferia que quando che$a a ser %ista  %ista pelos do centro como habitada por pessoas descart&%eis que, para os olhos dos imperiais, são, de al$um modo, diferentes ou menos que. 7or que isso não  'b%io9

Como educadores, estamos en%ol%idos numa luta em torno de si$nificados. 2ntretanto, nessa sociedade, como em todas as outras, apenas certos si$nificados são considerados 9le$"timos9, apenas certas formas de compreender o mundo acabam por tornar-se 9conhecimento oficial9. =sso não  uma coisa que simplesmente acontece. 1ossa sociedade  estruturada de tal modo que os si$nificados dominantes t)m mais possibilidades de circular. 2sses si$nificados, ob%iamente, serão contestados , serão resistidos e al$umas %e#es serão transformados, mas isso não diminui o fato de que culturas he$emnicas t)m maior poder para se fa#erem conhecidas e aceitas. ohn isIe e5pressa a idia de que nossos si$nificados estão i$ualmente implicados em relaç/es de poderJ A produção de cultura >e a cultura est& sempre em processo, nunca acabada?  um processo socialJ todos os si$nificados sobre o eu, sobre as relaç/es sociais, todos os discursos e te5tos que e5ercem esses importantes papis culturais podem circular, apenas, quando relacionados ao sistema social, no nosso caso, o capitalismo branco, patriarcal. Kualquer sistema social necessita um sistema cultural de si$nificação que sir%a para mant)-lo se0a para desestabili#&-lo, para fa#)-lo mais recepti%o a mudança. Cultura... e si$nificados... são portanto, inerentemente pol"ticos. 2stão centralmente en%ol%idos na distribuição e poss"%el redistribuição das %&rias formas de poder social >isIe, LN, p.L?. 2le prosse$ue, di#endoJ ! conhecimento nunca  neutro, nunca e5iste uma relação emp"rica e ob0eti%a com o real. Conhecimento  poder, e a circulação do conhecimento  parte da distribuição social do poder. A capacidade discursi%a para construir um senso comum que possa ser inserido na %ida cultural e pol"tica  central na relação social de poder >isIe, LN, pp. LO-LPQ?. 2ssas são afirmaç/es $enricas, mas quando aplicadas ao espec"fico da situação que relatei antes tornam-se ainda mais con%incentes. 2las colocam minha necessidade de ser ensinado sobre as condiç/es daquela %erde0ante plan"cie dentro de seu conte5to sociocultural mais amplo. 2las cristali#am em uma nica hist'ria diferenças de construção de si$nificados que separam o que no !cidente poder ser %isto simplesmente como comer batatas e naquela nação asi&tica  %isto por muitos ati%istas como a destruição das possibilidades de um futuro melhor para milh/es de crianças. A hist'ria documenta a import;ncia de se per$untar a quais $rupos pertencem as compreens/es que são postas em circulação 7or que eu nada sei sobre isso Kual a minha pr'pria locali#ação em um sistema internacional de relaç/es econFomicas que produ# essas condiç/es99  A hist'ria fala da continuada circulação de formas coloniais de compreensão, associadas de forma comple5a e sempre cambiantes com os modos de produção econmica e de distribuição e consumo que estamos acostumados. (e muitas maneiras, muitos de n's somos aprisionados nos discursos uni%ersali#antes de nosso pr'prio mundo, um mundo que pressup/e que de al$uma forma 0& sabemos como compreender os e%entos di&rios dos quais participamos. 1o entanto, a hist'ria que me contaram naquele passeio de carro e aquilo que %i são coisas que di#em respeito + questão de saber qual  a realidade q qual  o conhecimento isto , de quais $rupos que são tornados pblicos. R)m-me + mente aqui as pala%ras tão apropriadas de 2dSard EaidJ Eem e5ceç/es importantes os discursos uni%ersali#antes da 2uropa e dos estados 4nidos modernos sup/e o sil)ncio %olunt&rio ou não do mundo não-europeu. :& incorporação, h& inclusão, h& dom"nio direto, h& coerção. Mas raramente h& um reconhecimento de que o po%o coloni#ado de%eria ser ou%ido, *er suas idias conhecidas >Eaid, LT, p. PQ?. As idias de Eaid nos falam da relação entre as formas de compreensão que dominam nossa sociedade e do silenciamento das %o#es do mundo não-europeu, não-ocidental. 2ntretanto, não são apenas as %o#es que são silenciadas >e eu conscientemente empre$o a pala%ra silenciada ao in%s de silenciosa pra si$nificar que h& um processo ati%o no qual os $rupos dominantes t)m que fa#er um

esforço para manter o poder de seus si$nificados he$emnicos?, de forma que  quase por acidente que estou numa posição de ser ensinado a %er o mundo de forma diferente. Eão as cone5/es determinadas entre %idas nos pa"ses do centro e %idas nos pa"ses da periferia uma classificação em si mesma arro$ante e infeli# que são tornadas in%is"%eis nesse mesmo e e5ato momento. 2sta in%isibilidade  crucial. :& uma $eo$rafia social da branquidade. Eob muitos aspectos, branquidade  um conceito espacial. 1esse caso, ela implica %i%er uma %ida intimamente conectada de maneira identific&%el + din;mica internacional que tem alterado tão radicalmente as relaç/es econmicas pol"ticas e culturais, em muitas naç/es. 1ão est&, necessariamente, baseada numa escolha consciente. Ao contr&rio, ela est& profundamente cimentada nas nossas compreens/es do senso comum, da %ida cotidiana. compramos nossas roupas, comemos nossa comida e fa#emos o que fa#emos de um modo que naturali#a as relaç/es sociais e econmicas que realmente criaram as condiç/es para a produção e o consumo dessas roupas e dessa comida. A branquidade, pois,  uma met&fora para o pri%il$io, para a capacidade de comer batatas fritas baratas. !b%iamente, este não  um ar$umento no%o nem ori$inal. :& uma tradição bastante lon$a na economia pol"tica que nos fa# lembrar que cada ob0eto manufaturado não  simplesmente uma coisa que carre$amos na mão. 2ssa %isão, de fato,  mais do que apenas reificante. Ao contr&rio, um ob0eto manufaturado, ou processado de caros t)nis e camisas e mesmo + comida que colocamos na boca  corporificação concreta do trabalho humano e das relaç/es sociais produti%as e destruti%as que resultam nele, ou são o resultado de sua feitura. Assim, comer batatas fritas baratas si$nifica colocar a comida na nossa boca, masti$&-la e en$oli-la. 1o entanto, neste mesmo e e5ato momento,  tambm e profundamente um ato social pleno. Ei$nifica estar inserido no ponto final de uma lon$a cadeia de relaç/es que retirou pessoas da terra, causou sua ida para as fa%elas e ne$ou aos seus filhos cuidados mdicos e escolas. Ainda, de modo mais imediato, si$nifica estar em uma relação com os trabalhadores que preparam as fritas e as ser%iram, no restaurante de fast food, trabalhadores que usualmente recebem um pa$amento e5tremamente bai5o, nenhum benef"cio, nenhum sindicato, e de%em esfalfar-se em dois ou tr)s empre$os de tempo parcial para tentar colocar comida na sua pr'pria mesa. 2stou tentando di#er, neste momento, que comer batatas fritas baratas  uma das e5press/es m&5imas da branquidade. (e modo muito similar, quase todos os benef"cios econmicos desfrutados ho0e pelos ricos e mesmo pelos não tão ricos num pa"s como os 2stados 4nidos dependem do desen%ol%imento hist'rico de uma infraestrutura econmica, depende do trabalho nãoremunerado ou de bai5o custo. *rabalho que frequentemente te%e a raça como uma din;mica constituti%a a sustent&-lo. Assim, não seria e5a$erado di#er que as f&bricas t)5teis do 1orte industrial foram alimentadas pelo trabalho não-remunerado dos escra%os que culti%a%am a matria prima no Eul >ob%iamente, a economia inteira dependia do trabalho não-remunerado das mulheres, em casa, ou na fa#enda?. 7or centenas de anos, capitalismo e escra%idão esti%eram %inculados, numa tensa relação. (este modo, a branquidade como pri%il$io, não  apenas uma met&fora espacial mas tambm temporal.  As condiç/es de e5ist)ncia, a partir das quais nossa economia atual se desen%ol%eu, t)m suas ra"#es no solo de centenas de anos deste trabalho. 1's, presentemente, apro%eitamos as %anta$ens obtidas com esse trabalho. >=nfeli#mente uma sria discussão sobre o fato de que essas presentes e tão desi$ualmente controladas e distribu"das %anta$ens são completamente de dependentes dessas relaç/es hist'ricas dificilmente %em + tona no conhecimento oficial do curr"culo escolar. =sto d& bem uma ideia sobre a import;ncia daquilo que não  ensinado nas escolas, assim como daquilo que  parte do corpus do conhecimento considerado le$"timo?.

*al%e# eu possa tornar mais claro meu ar$umento de que estamos estreitamente conectados, de mil maneiras, com relaç/es de pri%il$ios, atra%s de um outro e5emplo, mais uma %e#, pessoal. *omemos o ensaio que %oc) est& lendo. 2nquanto olho pela  0anela do edif"cio no qual ele est& sendo escrito, %e0o uma usina termeltrica. 2sta  uma importante parte da hist'ria. 2sta manhã, Michael Apple %eio para seu $abinete, abriu a porta, li$ou o interruptor de lu# e começou a di$itar. 7odemos interpretar isso como um simples ato f"sico. Apple coloca sua mão sobre o interruptor, aciona-o e sur$e a lu#. entretanto, este simples ato não  tão simples porque ele precisa ser entendido relacionalmente. Michael Apple realmente abriu a porta, li$ou a lu#, foi at sua mesa e iniciou a di$itação. Mas Michael tambm tinha uma relação annima mas não menos real com os homens e mulheres mineiros que esca%aram o car%ão, em condiç/es frequentemente peri$osas e crescentemente e5plorati%as, car%ão este que foi queimado para produ#ir a eletricidade que permitiu que a lu# fosse acesa. A ação de di$itar este te5to  totalmente de pendente desse trabalho. Meu prop'sito, com este e5emplo, não  colocar um foco luminoso >perdoem-me o trocadilho? sobre essas condiç/es de uma forma tal que poderia nos le%ar ao imobilismo. Ah, tudo  tão complicado politicamente que tudo o que fa#emos tem $ra%es implicaç/es. Ao contr&rio, meu ob0eti%o  discutir sobre a nature#a do senso comum. 1ossos >refere-se aqui a $rupos brancos e economicamente pri%ile$iados? modos ordin&rios de compreender nossa ati%idade cotidiana, dentro e fora da educação, podem tornar e5tremamente dif"cil que apreciemos completamente o ne5o das relaç/es sociais das quais participamos. 1as pala%ras de isIe, dese0o desestabili#ar nossas compreens/es ordin&rias da educação e da nossa pr'pria posição na sociedade mais ampla. Como Antnio Uramsci nos lembra%a, a dominação racial, de $)nero e de classe  le$itimada atra%s da criação do senso comum, atra%s do consentimento. 2ste tema  especialmente importante ho0e, dada + restauração conser%adora que  tão poderosa nas esferas econFomica, pol"tica e cultural da sociedade, uma %e# que uma compreensão da nature#a estrutural dessas cone5/es est& sendo retirada de nossas %idas di&rias. Meu dese0o b&sico  que pensemos o social, reconheçamos que %i%emos en%ol%idos em processos de dominação e subordinação que são muito %elados. Compreender isso, pode e5i$ir que nos des%encilhemos do senso comum porque n's estamos profundamente interconectados, queiramos ou não. ! branco  definido não como um estado, mas como uma relação com o preto, ou com o marrom, ou amarelo, ou %ermelho. ! centro  definido como uma relação com a periferia. 1os nossos modos usuais de pensar essas quest/es, a branquidade  al$o sobre o qual não temos que pensar. ela est& simplesmente a". *ratase de um estado naturali#ado de ser. *rata-se de uma coisa normal. *udo o mais  o outro. D o l& que nunca est& l&. Mas est& l&, porque ao nos reposicionarmos para %er o mundo, como constitu"do a partir de relaç/es de poder e pri%il$io, a branquidade como pri%il$io desempenha um papel crucial. 2ste mesmo senso de conecti%idade ou relacionalidade, no seu conte5to internacional,  tornado caro, nas pala%ras $a$ue0antes do Er. WhisIeV Eisodia, nos %ersos Eat;nicos de Ealman Hushdie. ! problema com os in...in$leses  que sua his... hist'ria aconteceu no alm mar, assim, eles não sabem o que ela si$nifica. Colocar qualquer outro $rupo nacional pri%ile$iado no lu$ar de in$leses pouco muda a ideia de Hushdie sobre a nature#a de nossa compreensão ou a falta dela das relaç/es internacionais e das %anta$ens desi$uais que t)m ori$em nos modos pelos quais tais relaç/es são ho0e estruturadas. 7ensamentos finais + $uisa de conclusão. Contei uma hist'ria autobio$r&fica e refleti sobre ela para lançar lu#es sobre a espacialidade da branquidade como uma relação internacional. 7elo fato de que $rande parte constitui uma narrati%a pessoal, necessito admitir *er estado um pouco preocupado com o que fi# nesse ensaio.

*al preocupação le%a-me a fa#er uma ad%ert)ncia a mim mesmo e a %oc), leitor, sobre al$um dos efeitos ocultos do >$eralmente elo$i&%el? impulso de empre$ar re$istros autobio$r&ficos para ele%ar as cone5/es, não apenas entre a educação e a sociedade mais ampla, mas tambm entre n's e outros $rupos de pessoas e que podem estar ocultas, dados os mapas de realidade que empre$amos. Muito do "mpeto por detr&s das narrati%as pessoais  moral. A educação  sita, corretamente, como um empreendimento tico. ! pessoal  %isto como um modo de despertar sensibilidades ticas. !u  percebido, corretamente, como uma maneira de dar %o# +s sub0eti%idades das pessoas que t)m sido silenciadas. :& muito a elo$iar nesta posição. 1o entanto, alho se mantm um tanto abafado nos bastidores, em muitas %ariantes de tais hist'rias uma pun$ente consci)ncia do pol"tico, das estruturas sociais que condenam tantas pessoas identific&%eis a %idas de luta econmica e cultural >e tambm corporal? e, em al$uns casos, desespero. a#er cone5/es entre o que pode ser chamado de ima$inação liter&ria e narrati%a e o mo%imento concreto que busca transformar nossas instituiç/es  simplesmente essencial neste caso. Ar$umentos pol"ticos não constituem alternati%as para preocupaç/es morais. Eão, antes, estas preocupaç/es tomadas seriamente, em suas implicaç/es plenas. !ra, frequentemente %e0o os relatos e as narrati%as interpretati%as como con%incentes e plenos de si$nificados. 2, ob%iamente como usei essa forma, neste ensaio, não quero descartar o seu poder. 2ntretanto permitam-me ser pouco sutil e apresentar minha preocupação aqui tambm frequentemente estes te5tos correm o risco de cair num indi%idualismo possessi%o. Mesmo quando o autor fa# a coisa certa e discute seu lu$ar social, num mundo dominado por condiç/es opressi%as, se ele não for refle5i%o em relação a isso, seu te5to pode ser%ir + função confortadora de di#er basicamente che$a de falar sobre %oc)s, dei5em-me contar-lhes sobre mim. 7or estar ainda bastante comprometido em le%antar quest/es sobre as din;micas de raça e classe  que me preocupo com as perspecti%as que supostamente reconhecem as %o#es ne$adas de muitas pessoas no nosso pensamento sobre educação mas que, na %erdade, ainda acabam pri%ile$iando os brancos, as mulheres ou homens de classe mdia, numa necessidade aparentemente infinita de autoe5ibição. 1ão interpretem de forma errnea o que estou di#endo aqui. Como 0& foi fartamente documentado em trabalhos feministas e p's-colonialistas, o pessoal  frequentemente a presença ausente por detr&s dos escritos mais desencarnados, mas ao mesmo tempo  i$ualmente crucial que interro$uemos nossos moti%os ocultos, nesses casos, quando empre$amos tais modos de apresentação. D a insist)ncia no pessoal, uma insist)ncia que sustenta em $rande parte a mudança para formas liter&rias e bio$r&ficas, tambm, em parte, um discurso de classe9 (e%emos admitir seu poder em esclarecer como o mundo  constru"do, em torno de muitos ei5os de poder, e de aclarar tambm nossa participação pessoal nesses ei5os. 2ntretanto, embora o pessoal possa ser pol"tico, podemos per$untarJ o pol"tico se es$ota no pessoal9 Ainda maisJ porque de%emos pressupor que o pessoal  menos dif"cil de entender que o mundo e5terno99 3e%anto essas quest/es, mas não posso respond)-las de forma que %alha para todas as situaç/es. ! que posso di#er  que tais quest/es necessitam ser feitas por todos n's que estamos compreendidos com mltiplos pro0etos en%ol%idos na luta por uma educação mais emancipat'ria. 7or esta mesma ra#ão, contei uma hist'ria da minha pr'pria educação como branco e %isitante estran$eiro que est& conscientemente conectada a uma clara compreensão da realidade das relaç/es de e5ploração e dominação estruturalmente $eradas, relaç/es que fa#em com que nos per$untemos at mesmo se e5iste al$uma educação numa situação como essas. foi, para mim, um momento educati%o sobre o que si$nifica ser branco num conte5to internacional, um momento educati%o que tronou claro para mim como o pri%il$io penetra nos atos humanos mais

b&sicos, tais como comer. Como %oc)s poderiam esperar e eu estou certo que muitos de %oc)s o fariam, se ti%essem uma e5peri)ncia similar, estou a$ora en%ol%ido, de forma mais consciente, no apoio +s aç/es dos mo%imentos democr&ticos naquele pa"s asi&tico, tanto nos 2stados 4nidos quanto l&. como %oc)s poderiam tambm esperar, não como batatas fritas baratas. Michael W. Apple  professor da 4ni%ersidade de Wisconsin, Madison, 24A.

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