Cap. 24 - Técnica Delphi

August 28, 2017 | Author: Darrell Owens | Category: Communication, Quality (Business), Information, Economics, Competitiveness
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Métodos e Teorias de Pesquisa em Comunicação- Duarte e Barros - CAP 24 - Teoria Delphi...

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Técnica Delphi

Antônio Maria Gomes de Castro e Suzana Maria Valle Lima

1 Introdução A partir da década de 60, os efeitos combinados de três revoluções – tecnológica, econômica e sociocultural – vêm desenhando diversas transformações nos sistemas sociais e econômicos mundiais. Essas transformações são o resultado de mudanças profundas nos paradigmas de desenvolvimento, tecnológico e institucional, que geram a necessidade de uma nova institucionalidade, compreendida como a redefinição de regras do jogo e práticas sociais que governam todas as organizações envolvidas. Estas transformações afetam a estratégia, a estrutura e a programação das organizações. Os impactos dessas mudanças podem estar inter-relacionados e demandar modificações das capacidades (competências) organizacionais, das prioridades, dos processos internos e dos produtos e serviços oferecidos pelas organizações. A formulação de estratégias sempre demanda, entre outros pré-requisitos, o conhecimento sobre cenários ou visões de futuro. Estratégias englobam padrões de respostas a oportunidades ou ameaças que devem ser interpretadas, a partir de eventos, fatos, comportamentos atuais e suas tendências. A aplicação de técnicas prospectivas oferece o marco conceitual e as ferramentas adequadas para trabalhar convenientemente esta questão. Este aparato técnico e gerencial tem sido introduzido na gerência das orga-

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nizações e é capaz de tornar mais precisa e eficaz a formulação de estratégias. Todavia, precisa manejar grandes quantidades de informação, sem a qual toda a sua eficiência se torna comprometida. Coletar, interpretar, armazenar, recuperar e difundir informação de qualidade sobre o desempenho das organizações é uma tarefa de formidável complexidade e de impacto direto sobre os futuros avanços das técnicas prospectivas. A informação representa um importante insumo para a realização de estudos prospectivos e é ao mesmo tempo produto desses estudos. Analisar sistemas nos quais se inserem as organizações demanda um enorme manancial de informação, a ser identi-ficado, coletado, interpretado, transformado no formato adequado, armazenado e poste-riormente recuperado. Todo este processo caracteriza um sistema de gestão da infor-mação e gera como produto uma base sistematizada de informação, que pode ser nova-mente utilizada no futuro. A lição que se pode derivar é a de que, em cenários de mudanças aceleradas e de incerteza, é necessário promover um constante reposicionamento estratégico da orga-nização. Todavia, para se reposicionarem, as organizações vão demandar um acervo de capacidades e de informações para a interpretação da realidade, a antevisão dos desdobramentos dos eventos presentes e a formulação de estratégias. As competências em aplicação e uso de técnicas prospectivas passam a representar uma forte demanda para a manutenção da sustentabilidade organizacional, neste ambiente de turbulência. As ferramentas prospectivas de inteligência estratégica já são amplamente utilizadas no ambiente de negócios pelas organizações, como forma de obtenção de competitividade e sustentabilidade organizacional. As aplicações e os usos são variados, em escopo, finalidades e métodos. Tais aplicações cobrem desde a prospecção do futuro do negócio, aplicando a técnica de cenários alternativos, até os estudos setoriais, visando à formulação de estratégias de gestão. Conhecer estas aplicações é uma forma de divulgar e promover a inteligência estratégica no âmbito das organizações de comunicação. Conseqüentemente, este capítulo se propõe a apresentar e analisar: (a) a importância e os usos da prospecção; (b) os métodos e as técnicas utilizados, com especial atenção para a Técnica Delphi. A apresentação será ilustrada com exemplos de metodologia, resultados e usos.

2 Conceito de futuro e de técnicas prospectivas. Estratégia A oferta adequada de produtos e serviços à clientela de uma organização requer a utilização de técnicas prospectivas das necessidades futuras, como orien-

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tação para o esforço organizacional. Tais técnicas se agrupam sob a denominação de análise prospectiva. A análise prospectiva é um conjunto de conceitos e técnicas para a previsão do comportamento futuro de variáveis socioeconômicas, políticas, culturais e tecnológicas. No âmbito da gestão organizacional, objetiva identificar as demandas atuais, potenciais e futuras do mercado de produtos e serviços da organização, que possam constituir-se em oportunidades ou ameaças. A análise prospectiva é uma base sólida para a competitividade e sustentabilidade institucional. É ela que vai permitir a compreensão e percepção, de forma sistemática, do comportamento de variáveis do ambiente organizacional, relevantes para a definição de rumos e estratégia. Para operacionalizar a análise prospectiva, é necessário conhecer as forças do contexto que, no momento presente, estão moldando o futuro de interesse da organização. Neste caso, a análise de sistemas é o enfoque a adotar. Uma discussão mais aprofundada sobre a aplicação e vantagens do enfoque sistêmico na análise prospectiva pode ser encontrada nos trabalhos de Castro et al. (2002), (2004). A seguir, examinam-se os marcos conceituais sobre análise prospectiva, para em seguida derivar, desse conjunto de teorias, metodologias aplicáveis à prospecção em comunicação.

2.1 Compreensão do futuro: abordagens e conceitos As noções de incerteza e de ambiente turbulento se combinam para originar o conceito de futuro adotado neste texto. Por este conceito, o futuro é visto como o resultado da interação entre tendências históricas e a ocorrência de eventos hipotéticos (CASTRO et al., 1998). DEFINIÇÃO DE FUTURO Futuro é o resultado da interação entre tendências históricas e eventos hipotéticos (BRUCE B. JOHNSON, citado por CASTRO et al., 1998). Este conceito de futuro está fortemente ligado à chamada “visão prospectiva”, em estudos de futuro. Por outro lado, incorpora também elementos da escola americana de estudos de futuro (forecasting ou estudos tendenciais) ao considerar as tendências históricas para desenvolver sua análise (JOHNSON et al., 1994).

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A idéia de futuros tendencial e alternativo é uma forma interessante de se organizar a reflexão sobre o futuro. Ao formular o futuro como uma continuação do passado (o que é uma hipótese plausível, porém de baixa probabilidade de ocorrência, uma vez que a turbulência é admitida não como hipótese, mas como fato), o estudioso do futuro pode obter uma referência para orientar os seus estudos. O futuro tendencial funciona como um marco de referência, que pode auxiliar na construção de visões alternativas de futuro. Quer utilizem princípios do estudo tendencial clássico quer de prospecção, os estudos do futuro não podem prescindir de: (1) identificar padrões no comportamento das variáveis presentes no sistema sob estudo; (2) identificar relações entre estas variáveis. Para atender a estas necessidades, a teoria geral de sistemas e particularmente as técnicas de análise de sistemas são de grande utilidade (ver CASTRO et al., 2002).

2.2 Utilização da prospecção na formulação de estratégias Os resultados dos estudos prospectivos servem à gestão estratégica. Enquanto a análise prospectiva procura responder à questão “o que pode acontecer no futuro?”, a estratégia tenta, a partir desse questionamento, definir escolhas do tipo: quem sou eu? o que posso fazer? o que vou fazer? como vou fazer? Assim, análise prospectiva e estratégia assumem uma vinculação estreita, onde a qualidade desta última é função direta da primeira. Análise prospectiva

Estratégia É a forma de definir rumos da organização, a partir de cenários futuros.

Tem como propósito responder à questão “o que pode acontecer no futuro?” Tem como propósito responder a questões do tipo: “quem sou eu? o que posso fazer? o que vou fazer? como vou fazer?” Conseqüentemente, a análise prospectiva gera o insumo básico, a base de informação sobre como o futuro pode se apresentar, para a formulação de estratégia, seja de organizações, setores, seja de segmentos produtivos. Esta base de informação se torna mais importante, à medida que se define estratégia para posições mais distantes no futuro e que se trabalha em ambientes com maior nível de turbulência. A comunicação é um dos ramos de atividade humana com grandes índices de

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risco, submetida a ambientes de alta turbulência (em geral, mais conhecimento é demandado em países menos desenvolvidos, onde as velocidades e as intensidades das mudanças são quase sempre maiores). Todas estas características a tornam uma cliente de estudos prospectivos, como ferramenta de gestão estratégica. O processo de incorporação de resultados de estudos prospectivos na gestão das organizações é conhecido como estratégia, formulação de estratégia ou planejamento estratégico. Na fase de implementação, o processo de monitoramento estratégico determina qual dos cenários elaborados explica melhor o momento presente e futuro próximo da organização e determina o conjunto de estratégias mais adequado para orientar a gestão e os rumos institucionais.

3 A Técnica Delphi

3.1

Características gerais

A Técnica Delphi foi desenvolvida por pesquisadores da Rand Corporation (WRIGTH, citado por CASTRO et al., 1995; CASTRO et al., 1998; LIMA et al., 2001). É aplicada a partir do produto da análise sistêmica de desempenho passado e presente do segmento em estudo, que determina fatores críticos de desempenho do sistema. A forma de operacionalização de uma pesquisa Delphi está representada na Figura 1. A Técnica Delphi se operacionaliza pela formação de um painel de especialistas (Painel Delphi) e pela elaboração de questionário interativo, aplicado em rodadas sucessivas. Apresenta as seguintes características (LINSTONE & TUROFF, 1975): •

busca de consenso entre especialistas sobre eventos futuros;

• baseia-se em avaliação intuitiva coletiva baseada em: (a) uso estruturado do conhecimento;(b) experiência dos especialistas; (c) criatividade; (d) anonimato; •

trabalha em ambientes com séries históricas deficientes;

• enfoque interdisciplinar; perspectivas de mudanças em tendências (rupturas); •

tratamento estatístico simples;



reavaliação de respostas para novo questionário.

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Figura 1 Processo de pesquisa de futuro utilizando a Técnica Delphi. O consenso é obtido a partir de sucessivas rodadas de questões, nas quais os painelistas avaliam alternativas e opinam sobre o futuro nos temas definidos como importantes. Nas rodadas seguintes, voltam a reavaliar suas posições anteriores, agora com o conhecimento da posição dos pares sobre as questões. Nesse processo interativo, o anonimato é preservado, sendo as posições dos painelistas colocadas para o painel sem que os participantes saibam sobre a autoria. O exame de opinião dos pares, sem que se conheçam os autores das opiniões, e a possibilidade de mudar uma opinião, sem que a pressão do grupo seja exercida, é talvez a maior fortaleza da Técnica Delphi. Este processo interativo de debate, sem os fatores subjetivos que estão sempre presentes em reuniões e outros tipos de eventos grupais, elimina parte do viés que a subjetividade introduz no exame das idéias, ajudando a conduzir a discussão na prevalência da lógica. Cada participante pode expressar suas concordâncias ou discordâncias às opiniões emitidas ao longo do painel de acordo com a lógica proposta pela pesquisa e com o seu próprio julgamento, sem levar em conta simpatias e antipatias pessoais, que muitas vezes contaminam o julgamento das proposições em um evento presencial. Obviamente, num painel Delphi as questões devem fornecer aos painelistas, criteriosamente selecionados, a informação necessária para que o mesmo possa fundamentar a sua avaliação. Não é razoável apenas perguntar como vai ser o futuro de determinado tema ou variável, mas oferecer ao avaliador alguma in-

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formação sobre o desempenho anterior da variável questionada, sobre as forças que a impulsionaram e/ou restringiram e, a partir dessa base de informação, solicitar a avaliação do desempenho futuro. Por essa razão, a pesquisa Delphi deve ser calcada em um bom estudo diagnóstico e sistêmico do tema e num questionário criteriosamente elaborado. Estes três fatores (análise sistêmica, escolha dos painelistas e elaboração do questionário Delphi) serão detalhadamente apresentados a seguir.

3.2 Análise sistêmica Uma das questões cruciais para a formulação de uma visão de futuro no painel Delphi é a caracterização do sistema que será prospectado, suas variáveis e estruturas componentes e as relações entre estas variáveis. É somente a partir da compreensão dessa complexa rede de relações de causas e efeitos que se pode determinar como funciona um sistema, quais as variáveis que definem o seu comportamento e a partir daí estabelecer algum mecanismo de reflexão para formular cenários sobre esse compor-tamento no futuro. Essas abordagens são de natureza bastante diversificada. Castro et al. (2001) mencionam como técnicas disponíveis para realizar esta análise as Técnica do Iceberg (VAN DER HEIDJEN, 1997), a Matriz de Motricidade e Dependência (VIEIRA, 1999), a Matriz de Impacto Cruzado. GODET (1994) aponta ainda as técnicas MICMAC, como componente de um método denominado Análise Estrutural. Todas estas abordagens buscam decifrar a complexidade dos sistemas, identificando as variáveis-chaves que representem o seu comportamento passado e presente, para formular as hipóteses de comportamento futuro. Todavia, em muitos casos, as abordagens empregadas em geral não distinguem graus de hierarquias entre as variáveis, setores e eventos, ou seja, não consideram o caráter sistêmico das relações entre esses elementos, tornando difícil a criação de um marco lógico sobre o passado e o presente, que possa apoiar a formulação de hipóteses de futuros plausíveis. Neste ponto reside um fator crítico de qualidade dos estudos prospectivos (CASTRO et al., 2002). Sem um bom mapeamento das forças e dos eventos importantes que determinaram o passado e moldam o presente, é impossível traçar boas visões de futuros plausíveis, com robustez suficiente para orientar a formulação de estratégias.

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3.2.1 Aplicação do enfoque sistêmico como forma de compreensão da realidade Quando se olha para a realidade, esta se apresenta como um confuso emaranhado de fatos, eventos e relações, ocorrendo em dimensões temporais e espaciais distintas, e raramente prontamente perceptíveis ao analista. Este conjunto deve ser decifrado, transformado em algo organizado e com sentido, para se extrair dessa complexidade a informação estratégica para gerar decisão. O enfoque sistêmico possui no seu conteúdo lógico as ferramentas necessárias para solucionar esta dificuldade metodológica. Técnicas analíticas, como a modelagem de sistemas, permitem uma organização da realidade complexa, de forma a conectar as diversas dimensões envolvidas. Na Figura 2, ilustra-se a complexidade inerente a este processo de análise e como o enfoque sistêmico pode ser utilizado como ferramenta analítica. No caso, toma-se como exemplo uma análise no âmbito do agronegócio.

Figura 2 Aplicação do enfoque sistêmico à análise prospectiva. Utilizando os princípios da análise de sistemas, propõe-se que um sistema possa ser caracterizado por seu desempenho, ou sua capacidade de transformar insumos em produtos (CASTRO et al., 1995; CASTRO et al., 1999). Este desempenho pode ser representado por fatores críticos de desempenho, conforme representado pelas setas na Figura 2. Por sua vez, estes podem ser afetados pelas forças propulsoras e restritivas. Uma força propulsora ou restritiva é qualquer variável (ou grupo de variáveis, ou estrutura) que afeta fortemente o desempenho de um sistema, de um modo positivo ou negativo. As forças propulsoras, portanto, mantêm uma correlação positiva com o fator crítico, enquanto as forças restritivas apresentam uma correlação negativa com aquele fator.

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Ao utilizar a abordagem descrita na Figura 2, se estará aplicando uma das ferramentas mais poderosas do enfoque sistêmico, a análise de sistemas. Um sistema está analisado quando se definem os seus objetivos, a razão pela qual ele opera; os seus insumos, os elementos que entram no sistema; os seus produtos, elementos que saem do sistema; os seus limites; os seus componentes, elementos internos que transformam insumos em produtos; os fluxos, movimento de elementos entre os seus componentes, definindo as variáveis de estado e as taxas de fluxo, que podem ser utilizadas para medir o comportamento dinâmico e o desempenho do sistema (SARAVIA, 1986). Além destes elementos, se estará decompondo a complexidade do sistema estudado em hierarquias, com limites bem definidos e utilizando-se as técnicas de modelagem de sistemas. Modelagem é a técnica que configura a realidade como um sistema e constrói modelos para representá-la de forma diferente da dela própria. Os modelos construídos são representações pictóricas, conceituais, matemáticas ou qualquer outra forma de representação que possa ser utilizada para aumentar a compreensão da realidade. As ferramentas de análise e modelagem de sistemas ajudam na identificação de componentes de um sistema e na descrição das relações entre estes, de forma a determinar os fatores críticos de desempenho, aquelas variáveis de maior importância para determinado comportamento do sistema. Neste exercício, são também determinadas as forças propulsoras e restritivas aos fatores críticos, ou seja, as variáveis que se relacionam com estes, potencializando ou deprimindo o seu desempenho. Ao final do processo de modelagem, em geral se obtém uma rede de relações de variáveis causa e efeito, que descreve o desempenho do sistema que está sob análise. Determinar esta rede é um passo essencial para a análise diagnóstica de um sistema, especialmente para sua análise prospectiva.

3.3 Seleção de especialistas para o Painel Delphi Na operacionalização do Painel Delphi, selecionam-se especialistas, que respondem a questionário especialmente preparado para este tipo de técnica. A escolha dos especialistas é ao mesmo tempo um diferenciador dessa metodologia de pesquisa e um dos fatores-chaves de sucesso. Embora estes especialistas não tenham que neces-sariamente ter conhecimento formal, devem ter um conhecimento aprofundado, de forma a opinar com autoridade sobre os temas investigados. Na escolha dos especialistas, devem ser ponderadas as variáveis: o conhecimento dos especialistas nos temas abordados no Painel Delphi; a capacidade de imaginar possibilidades futuras de ocorrência de eventos relacionados ao tema em estudo e suas conseqüências; a capacidade de relacionar eventos de

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diversas naturezas (tecnológicas, econômicas, sociais) e seus impactos sobre o desempenho do sistema em estudo. São fatores relevantes a considerar na escolha a experiência do profissional no tema, contribuições relevantes, área de atuação e tipo de organização de origem. Diversidade de visões é um outro fator a considerar, sendo por isso importante selecionar profissionais que atuem em diversos campos profissionais, tais como na iniciativa privada, no setor público, universidade pública e privada, institutos de pesquisa público e privado etc. Ao contrário de outras técnicas de pesquisa (como o survey, por exemplo), nas quais a representatividade da amostra é o fator-chave de sucesso, na Técnica Delphi o conhecimento técnico e gerencial e a experiência profissional dos especialistas são as variáveis-chaves na escolha de respondentes para compor o painel Delphi. Tais elementos garantem a qualidade do painel e reforçam as opiniões obtidas a partir da pesquisa, como fonte para a formulação de estratégias para o sistema. Uma outra questão que necessita definição é em relação ao número de painelistas ou especialistas participando do painel. Em geral, esta é uma questão para a qual não há uma fórmula definida, uma vez que este número pode ser influenciado pela existência (e disponibilidade em participar) de especialistas em determinado tema. Como não se trata de representar estatisticamente uma determinada população, os critérios de decisão baseiam-se em julgamento intuitivo da equipe coordenadora do Painel. Como orientações de procedimentos, não se encontram bons estudos baseados em painéis com menos de 20 especialistas, nem com elevado número de participantes. Painéis com menos de 20 participantes podem apresentar problemas de cobertura e profundidade sobre os temas em discussão na pesquisa. Já aqueles com excessivo número de painelistas podem apresentar forte orientação à tendência central, na tabulação das respostas, reduzindo as possibilidades de obtenção de inovações, a partir de opiniões mais afastadas da tendência central. Além disso, podem tornar extremamente difícil o gerenciamento da pesquisa, limitando a obtenção de resultados. Em geral, painéis com um número entre 30 e 100 painelistas atendem aos requisitos de qualidade dos resultados e de factibilidade de gerenciamento da pesquisa, sendo por isso comumente referenciados na literatura pertinente.

3.4 Questionário Delphi: finalidade e preparação O questionário Delphi é o principal instrumento da análise prognóstica. Tem a finalidade de identificar a percepção do grupo de especialistas selecionados sobre o comportamento futuro de fatores críticos (e forças que os impulsionam

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e os limitam) ao desempenho do sistema objeto do estudo de futuro. Como já visto anteriormente, a análise prognóstica só pode ser iniciada a partir de estudo aprofundado, que reflita o momento atual e o passado, do sistema de interesse. Para começar a elaboração desse questionário, é fundamental que a equipe de especialistas tenha em mãos, portanto: a) fatores críticos e variáveis que os influenciam identificados e definidos; b) modelo das relações entre fatores críticos e as variáveis (ou conjuntos de variáveis, ou estruturas) que os influenciam; c) séries históricas ou medidas de situação atual sobre o comportamento de fatores críticos e de variáveis a eles relacionadas; • Se essas medidas não estão disponíveis, o próprio questionário Delphi é o instrumento para levantá-las. Cada pergunta do questionário deve possuir os seguintes elementos: a) corpo da pergunta: nesse segmento, são oferecidas as definições das variáveis que se quer analisar, na questão, seja isoladamente, seja em relação umas com as outras. Também se apresentam dados gerais sobre as variáveis e sua relevância para o sistema que está sendo analisado; b) informações, incluindo indicadores quantitativos relacionados à variável foco da questão, no momento da pesquisa; se disponível, devem ser feitas apresentações sintéticas e visuais de séries históricas desses indicadores; essas informações devem ser o resultado de análise diagnóstica realizada previa-mente sobre o sistema, na qual tenham sido identificados os fatores críticos e suas influências (impulsoras ou restritivas); c) solicitação de uma avaliação, do painelista, sobre a situação futura da variável. Essa solicitação pode ter a forma de uma pergunta estruturada (com respostas predefinidas), semi-estruturadas (respostas predefinidas acompanhadas por oportunidade para acréscimo de avaliações qualitativas ou comentários), ou abertas (respostas definidas pelo próprio painelista). O horizonte temporal (ano do futuro para o qual são realizadas as avaliações) deve ser claramente mostrado, em cada questão; d) opcionalmente, podem também ser incluídos cenários, na formulação de algumas questões. Esses cenários têm simplesmente a função de fornecer informações de contexto para as avaliações de futuro; e) instruções para resposta à questão, incluindo a forma da resposta (marcar com um X?, avaliar em uma escala?), alternativas de resposta e escalas de mensuração. Esses segmentos, apresentados aqui como itens isolados, na prática combinam-se, indistintamente, em cada questão Delphi. O Quadro 1 fornece um

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exemplo de questão Delphi, na área de comunicação. A seguir, descrevem-se alguns princípios relevantes para a elaboração de questões Delphi. Elaboração de questões Delphi: Um primeiro passo é a decisão sobre o grau de estruturação das respostas. De modo geral, a recomendação é para que se estruture o quanto possível cada questão, possibilitando, no entanto, oportunidades para que o painelista apresente a lógica para suas respostas, especialmente a partir da segunda rodada do Painel, onde essa lógica é essencial para o bom uso do conhecimento que é compartilhado em uma investigação Delphi. O grau de estruturação dependerá também do quanto se conhece e se conta com medidas sobre o fator/variável que cada questão focaliza. No entanto, mesmo quando não se conta com essas mensurações, o próprio Painel pode ser utilizado para obtê-las, por meio de escalas ordinais. A forma mais simples de mensuração é a distinção de respostas em diferentes categorias nominais: por exemplo: aprovados/não aprovados; feminino/masculino; grupo 1/grupo 2/grupo 3/grupo 4; Estados Unidos/Brasil/México etc. Essas mensurações podem ser contadas em freqüências e percentuais de respostas. Podem-se utilizar também escalas ordinais, em que as unidades sob análise são classificadas em relação a uma variável que pode ser mensurada em um continuum, mas para a qual não temos medidas diretas disponíveis. Por exemplo, pode-se perguntar a um painelista qual a probabilidade de um dado evento, no futuro, e oferecer a ele, como alternativas de respostas: “alta probabilidade”, “média probabilidade” e “baixa probabilidade”. Uma forma de mensuração mais interessante – pelas possibilidades de análise que permite – são as escalas de intervalo. Nestas, aplica-se uma escala em que se pressupõem intervalos iguais, entre medidas numéricas, correspondendo a diferentes estados da variável de interesse. Por exemplo, pode-se perguntar sobre a capacidade de fiscalização de uma determinada lei, no futuro, em uma escala ordinal de 10 pontos, em que o número 1 corresponde à “capacidade quase nula” e o número 10 à “capacidade extremamente elevada”. Assumem-se, nesse caso, intervalos iguais entre os vários pontos da escala. A grande vantagem desse tipo de mensuração é que permite a realização de inúmeras análises estatísticas, tornando mais rica a compreensão de um determinado fenômeno. As questões fechadas podem ter diferentes estruturas: a) dicotômicas (com respostas do tipo sim-não) ou de múltipla escolha (com mais de duas alternativas de natureza qualitativa), correspondendo às escalas nominais e ordinais;

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b) ou definidas por uma escala de intervalo, como a escala de Likert (escala de concordância, de cinco a sete pontos), que é uma das mais utilizadas. Quadro 1 E  xemplo de questão Delphi na área de comunicação (a partir de informações da ANJ, 2003).

LEITURA DE JORNAIS 1. Segundo a Associação Nacional de Jornais, o Brasil mostra tendência para alta na circulação de jornais, ainda que se verifiquem ocasionalmente pequenas reduções, como ocorreu em 2001. Essa Associação aponta que a circulação anual está em 64,2 exemplares por mil habitantes (considerando-se somente a população adulta), muito abaixo dos países desenvolvidos, sem falar nos que, como Japão ou Noruega, passaram muito dos 600 exemplares por mil. Sabe-se que entre as causas do baixo índice de circulação de jornais no Brasil estão o nível educacional da população e a sua composição etária. A mesma associação informa, em sua página eletrônica, que leitores que mais lêem jornais estão na faixa etária de 15 a 34 anos, correspondendo, atualmente, a um total de 62 milhões de pessoas, dos quais cerca de 50% são os que lêem jornais, na atualidade. Observa-se ainda que, nessa faixa etária, vem caindo sistematicamente a taxa de analfabetismo (de 20,1%, em 1990, para 13,6%, em 2000), ao mesmo tempo em que tem aumentado (para até 95%, em algumas regiões) a taxa de escolarização, na faixa de 7 aos 14 anos. Essa população de analfabetos, nessa faixa etária, corresponde a um total de 16 milhões de pessoas, aproximadamente. Considerando essas informações e uma taxa anual de crescimento da população de 1,8% ao ano, estime o total de leitores, em 2010, nessa faixa etária, indicando sua avaliação na Tabela seguinte: Anos 2001 2002 2010

Total de leitores, na faixa de 15 a 34 anos 32,8 milhões 33,5 milhões ______ milhões

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Utilize o espaço abaixo para explicar o raciocínio lógico utilizado para fazer a estimativa acima:

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______________________________________________________________________ Para qualquer tipo de mensuração (escalas nominais, ordinais ou de intervalo) que esteja incluída em uma questão, a formulação desta deve obedecer às recomendações a seguir. A pergunta deve ser formulada de modo simples, usualmente com termos de linguagem comum. Deve ser específica e referir-se a um único conceito ou dimensão de julgamento (CONVERSE e PRESSER, 1986). As alternativas de resposta devem ser mutuamente exclusivas, devem ser exaustivas (isto é, todas as possibilidades devem estar incluídas, inclusive as combinações entre alternativas); a questão central deve estar clara, dentro de cada alternativa. As instruções para resposta (ou o argumento da pergunta) devem tornar claro se o cliente ou usuário pode escolher mais de uma alternativa. A exclusão da alternativa média é recomendada, especialmente se se quer – como é o caso – uma resposta mais comprome-tida dos avaliadores (CONVERSE e PRESSER, 1986; PAYNE, 1980). É particularmente útil observar que as alternativas de resposta devem apresentar nível de agregação semelhante. Por exemplo, para a pergunta “que tipo de mídia será mais acessado pelo consumidor, no futuro?”, as alternativas poderiam ser: “(a) Jornal, (b) Rádio; (c) Televisão etc.” A alternativa “imprensa” não seria adequada, por representar outro nível de agregação, que inclusive engloba as demais alternativas. Em alguns casos muito particulares – especialmente quando não se conhecem todas as alternativas possíveis –, os menus podem incluir uma alternativa “outros/ outras”, para acomodar respostas que não se enquadrem nas demais possibilidades de resposta. Perguntas abertas (isto é, aquelas em que não são oferecidas alternativas de resposta) devem ser formuladas de modo tal que requeiram respostas discursivas ou explicações sobre o tema tratado (e não respostas do tipo sim-não). Isto porque este tipo de questão pode ser extremamente útil para a identificação de aspectos qualitativos não facilmente detectados através de questões fechadas (em que as alternativas de respostas são fornecidas de antemão). O Quadro 2 apresenta um conjunto de regras básicas a serem utilizadas na elaboração de questões Delphi. Uma orientação extremamente importante, para o desenvolvimento de questionários, de maneira geral, e particularmente para Questionários Delphi, é a necessidade de aperfeiçoamento exaustivo desse instrumento, de modo a eliminar vieses de in-

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terpretação não prevista pela equipe de especialistas. Assim, a elaboração deve dar-se pelo ajuste de inúmeras versões de um instrumento inicial, até que a equipe avalie que, dentro de seu conhecimento, não pode incluir mais nenhum aperfeiçoamento. Quadro 2 Orientação para a formulação de perguntas em Questionário Delphi.

ORIENTAÇÃO GERAL √√ Tenha certeza de entender em profundidade o tema de cada pergunta/grupo de perguntas. √√ Tenha certeza de que o tema está totalmente definido (quem, por quê, quando, onde e como). √√ Tenha certeza de que o tema faz sentido para seu público-alvo (os especialistas). √√ Decida que tipo de pergunta é melhor para o tema – perguntas abertas, opção múltipla etc. √√ Evite expressar-se de maneira ofensiva em relação ao painelista (por exemplo, sendo didático demais). √√ Evite ambigüidades em palavras ou expressões. √√ Evite perguntas com negativa dupla (por exemplo: Você não concorda que tal evento não vai ocorrer, no futuro?). √√ Use poucas e simples palavras para formular as perguntas; palavras conhecidas são as melhores. PERGUNTAS ABERTAS √√ Há mesmo necessidade de perguntas abertas? √√ Verifique se as perguntas abertas podem ser convertidas em perguntas estruturadas. √√ Elabore perguntas abertas de forma suficientemente diretiva para que suas expectativas sobre as respostas sejam atendidas. PERGUNTAS COM MÚLTIPLAS ALTERNATIVAS √√ Evite alternativas implícitas; transforme-as em alternativas sobre a pergunta proposta. √√ Alternativas devem ser mutuamente exclusivas, ou deve existir a alternativa para resposta “ambas”. √√ Alternativas devem ser complementares. √√ Evite duplicidade de objetos em uma mesma pergunta, dividindo-a em duas questões. √√ Deixe claro se é possível escolher mais de uma alternativa. √√ Evite um número exagerado de alternativas. √√ Formule cada alternativa com precisão e clareza.

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Nesse momento, a equipe deve submeter essa versão a um teste – denominado validação semântica – com um conjunto reduzido de especialistas, com as mesmas características daqueles que irão participar do Painel Delphi. Nesse teste, objetiva-se uma avaliação de clareza e dificuldade apresentada por cada questão Delphi. O procedimento consiste em aplicar a versão mais aperfeiçoada do questionário, para que esse grupo de especialistas lhe responda. Solicita-se também que esses painelistas registrem pontos não claros, dificuldades para responder e sugestões de aperfeiçoamento. Esse registro pode também ser feito com a ajuda de outro instrumento, com essa finalidade. Terminada a validação semântica, a equipe deve analisar os dados obtidos e tomar decisões sobre pontos a aperfeiçoar no questionário. Feitos esses ajustes, pode-se, afinal, preparar e realizar o Painel Delphi.

3.5 Estudos prospectivos e informação

3.5.1 Informação como insumo aos estudos prospectivos Os estudos prospectivos demandam informação, para formar a base para a prospecção do futuro. A dificuldade é, em geral, identificar fontes de informação sobre o desempenho do sistema ou dos seus componentes, no formato demandado pelo modelo de análise, com confiabilidade suficiente e em séries históricas de duração compatível com os objetivos dos estudos. O padrão da informação disponível é, em geral, organizado por disciplinas, enquanto os estudos prospectivos adotam o enfoque sistêmico. Esta é uma das causas de dificuldades de formato. O registro na versão disciplinar tende a ser estático, enquanto a visão sistêmica é dinâmica, incluindo a variável tempo no processo analítico. Por isso, raramente estão disponíveis no acervo de informação existente sobre um sistema (por exemplo, uma cadeia produtiva) séries históricas sobre fluxos entre as organizações componentes. Uma outra dificuldade é a obtenção de informação qualitativa e quantitativa que permita analisar processos produtivos e gerenciais. Isto ocorre por razões diversas. Determinadas dimensões das organizações sofrem com a falta de registro, e isto na maioria das empresas, tornando a recuperação da informação sobre operação e custos dos processos produtivos e gerenciais um exercício árduo e impreciso. Em outras organizações, onde os processos de registro de informação são mais aprimorados, a questão do sigilo para minimizar a imitação competitiva torna a coleta de informação ainda mais problemática, havendo muitas vezes a

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necessidade de empregar técnicas de coleta cruzada, para esclarecer determinados temas. As técnicas empregadas para esta tarefa são a coleta de dados secundários, realizada por processo de pesquisa bibliográfica e de busca na Internet, e levantamento direto, entrevistando stakeholders, servidores e clientes das organizações. Este trabalho de campo permite à equipe coletar um grande acervo de informações qualitativas e eventualmente quantitativas, de grande utilidade para a análise de desempenho dos sistemas, e raramente disponível em bases de informação mais estruturadas. Uma vez coletada, a informação é organizada em séries históricas, gráficos, tabelas ou em formato descritivo, quando se tratar de informação qualitativa. Neste tratamento, as planilhas eletrônicas e os softwares de análise estatística são as ferramentas mais empregadas. Estas ferramentas informatizadas também permitem o armazenamento, a recuperação rápida e o intercâmbio eletrônico, viabilizando o trabalho de pesquisa em redes virtuais. 3.5.2

Informação como produto dos estudos prospectivos

Uma das grandes contribuições dos estudos prospectivos é a ampliação da base de conhecimento sobre o desempenho dos sistemas e das organizações analisados. Esta visão sistêmica e prospectiva que um bom estudo proporciona é relativamente escassa no mercado de conhecimento e de grande valor para a formulação de estratégias de gestão. Ademais, estes exercícios contribuem para a formação de uma cultura estratégica nas organizações (VAN DER HEIDJEN, 1997), o que influencia positivamente a implementação das estratégias traçadas a partir dos resultados dos estudos prospectivos.

4 Aplicações da Técnica Delphi nas organizações de comunicação As organizações de comunicação produzem ou transferem informação e conhecimento para a sociedade. Os estudos prospectivos são importante ferramenta para a gestão de competitividade de negócios, para a gestão de programas e projetos, entre outros. Entre muitos possíveis usos, a prospecção tecnológica pode indicar oportunidades e ameaças ao desenvolvimento tecnológico, setorial e regional, apontando gargalos, limitações, oportunidades e demandas por tecnologias e serviços. De uma forma geral, têm sido observados aplicações de estudos sistêmicos e pros-pectivos com diferentes propósitos. Podem-se mencionar aplicações na

Técnica Delphi

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gestão de sistemas sociais e econômicos e organizações (gestão de negócios), no desenvolvimento social e econômico, na formulação de políticas públicas. São exemplos dessas aplicações as seguintes: • Gestão da eficiência (produtividade e custos): estas são as aplicações mais usuais do conceito. A partir do exame de entradas e saídas do sistema ou das organizações componentes, e de seus processos produtivos, determinam-se fatores limitantes à produtividade e aos custos, gerando-se a informação pertinente para a melhoria do desempenho dos diversos sistemas produtivos. Exemplos dessas aplicações são encontrados nos estudos sobre a competitividade das cadeias produtivas da soja (CASTRO et al., 2000), da manga (LEITE et al., 1998), do melão (DIAS et al., 1998), da uva (GAMA et. al., 1998) e do dendê (LIMA et al., 2000). • Gestão da qualidade e da diferenciação: os requisitos de qualidade dos produtos e processos dos clientes intermediários e finais de uma cadeia produtiva ou de uma organização podem ser determinados, assim como a importância e o nível de cumprimento desses requisitos objetivamente avaliados, e a partir desses produtos é possível definir políticas para a gestão da qualidade e da diferenciação de produtos dessa cadeia produtiva ou organização (ver PESSOA & LEITE, 1998). • Gestão da competitividade: competitividade é em geral determinada por vantagem comparativa em custos, o que indica maior eficiência produtiva, ou por diferenciação de produtos. O estudo comparativo de cadeias produtivas ou organizações competidoras é um ótimo instrumento para indicar fatores críticos de competitividade de natureza tecnológica, gerencial ou estrutural, uma vez que permite uma visão sistêmica sobre o desempenho de sistemas e processos produtivos. Os estudos sistêmicos e prospectivos apontam fatores críticos de competitividade no presente e no futuro, criando uma base de informação para a formulação de estratégias de competitividade (ver WRIGHT & JOHNSON, 1992; CASTRO et al., 2002). • Gestão da sustentabilidade ambiental: a análise dos processos produtivos agrícola e industriais e de suas interfaces com o meio ambiente pode ser avaliada, estimando-se possíveis impactos atuais e futuros sobre a sustentabilidade ambiental (ver NOGUEIRA et al., 1998; BELARMINO et al., 1998). • Gestão dos mercados e oportunidades (foco): ao analisar o comportamento de consumidores intermediários e finais de produtos e subprodutos de uma cadeia produtiva ou organização, os estudos prospectivos geram informação para a decisão sobre ênfases de produtos e mercados consumidores (ver LEITE & CASTRO, 2003; BRISOLA & CASTRO, 2004).

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• Gestão da comunicação e da informação: sistemas sociais são compostos de organizações e outros segmentos sociais com funções distintas e geograficamente dispersos. Para desempenhar suas funções, necessitam informação tecnológica, gerencial e de mercados de fatores e de produtos, geradas interna e externamente ao sistema. A forma como a informação é produzida, flui e é apropriada pelos diversos componentes do sistema social e é um fator preponderante no seu desempenho atual e futuro. Este conhecimento é essencial para desenvolver estratégias de gestão de informação no sistema. Um exemplo de estudo dessa natureza foi feito cobrindo a cadeia da soja no Mato Grosso (DUARTE & CASTRO, 2004). • Melhoria da base de informações: boas decisões demandam informação de qualidade (bibliografia, sites, bases de dados). Os estudos prospectivos geram informação dessa natureza, que pode ser democratizada em processos alternativos de gestão de informação, accessível aos diversos extratos sociais componentes dos sistemas sociais. • Melhoria da imagem e sustentabilidade institucional: estudos de desempenho de sistemas sociais e cadeias produtivas, por órgãos governamentais e não governamentais, geram uma importante contribuição aos atores da cadeia, contribuindo para realçar a imagem institucional positiva das organizações patrocinadoras desses estudos, perante a sua clientela. • Gestão da distribuição de benefícios (eqüidade): o exame dos fluxos de capital de uma determinada cadeia ou sistema social pode indicar aos gestores de políticas públicas as discrepâncias na apropriação dos benefícios produzidos nesses sistemas e a necessidade de intervenções localizadas, para garantir um acesso mais equânime às oportunidades e aos benefícios gerados pela atividade produtiva. • Geração e gestão de políticas públicas: a implantação de políticas específicas orientadas para determinado setor ou região podem ser acompanhadas e ter os seus impactos avaliados, principalmente no que tange à competitividade das cadeias produtivas e ao desenvolvimento dos sistemas sociais afetados. Ao revelar com maior precisão a natureza dos gargalos tecnológicos e não tecnológicos, e as oportunidades e ameaças futuras ao desempenho da cadeia produtiva, e ao desenvolvimento dos sistemas sociais, os estudos prospectivos contribuem para orientar a formulação de novas políticas públicas de apoio ao desempenho da cadeia e do desenvolvimento dos sistemas sociais. Um exemplo desse tipo de uso é o trabalho de Yamaoka & Watanabe (1998), sobre a cadeia produtiva da seda no Paraná.

Técnica Delphi

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5 Conclusão A Técnica Delphi foi desenvolvida inicialmente para apoiar estudos estratégicos na Rand Corporation. Com a evolução e a difusão do seu uso, a cada dia são identificadas novas aplicações para esta metodologia. Este texto examina conceitos, métodos e usos dessa metodologia, mostrando possibilidades de aplicação gerais e específicas, no âmbito da comunicação e organizações vinculadas ao tema. Vários usos e aplicações da Técnica Delphi exemplificados neste texto podem ser de interesse das organizações e estudiosos da comunicação, seja para realizar estudos e pesquisas sobre a ciência da comunicação, seja para organizar a gestão estratégica das organizações envolvidas. O marco conceitual e os procedimentos metodológicos apresentados aparentemente não apresentam dificuldade para ser incorporados ao âmbito da comunicação, podendo por isso representar mais uma ferramenta poderosa para gerentes e pesquisadores dessa área. Ressalte-se que a análise de sistemas, notadamente no que tange ao estudo de fluxos de informação, representa um complemento indispensável às técnicas prospectivas, devendo por isso ser incorporada como técnica complementar às aplicações da técnica Delphi na comunicação. A realização de estudos de futuro, como se viu, não é um exercício de adivinhação ou de pura arte. Na verdade, envolve grandes doses de rigor metodológico, seja na realização de estudos diagnósticos de base, seja no levantamento de percepções de especialistas no tema que se está investigando, essencial para a validade e a solidez das análises de futuro que se pode fazer, a partir desses levantamentos. Estudos prospectivos têm se tornado cada vez mais relevantes, como ferramenta poderosa e sistemática para gerar conhecimento que permita desenhar planejamentos e estratégias com maiores chances de sucesso, especialmente naquelas áreas em que decisões que estão sendo tomadas, no presente, tenham conseqüências ou impactos apenas em horizontes temporais de longo prazo. Esse é certamente o caso dos sistemas de geração de informação e conhecimento, como é o caso da comunicação.

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Técnica Delphi

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