Cai Wen Yu - Lao Qi Gong, 2012

February 14, 2017 | Author: Vinicius Oliveira Faria Bonfim | Category: N/A
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Veja site: http://www.caiwenyu.com.br/ O exercício básico de Yi Quan é o Zhan Zhuang, que &eacu...

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Mestre Cai Wen Yu

Livro editado por Cai Wen Yu: www.caiwenyu.com.br. Texto: Fabíola Luz Diagramação: José Banch e Rene Bueno Ilustrações: Adriana Lisboa Fotomontagem: Maria Carolina Turin Capa: Rene Bueno Todos os direitos desta obra reservados a Cai Wen Yu. Copyright: Cai Wen Yu É terminantemente proibida a reprodução total ou parcial desta obra, por qualquer meio ou processo, sem a expressa autorização do autor. A violação dos direitos autorais caracteriza crime descrito na legislação em vigor, sem prejuízo das sanções civis cabíveis.

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Lao QiGong

INDICE Prefácio

Pg.4

Introdução

Pg.6

Capitulo I O que é QiGong

Pg.9

Capítulo II Zhan Zhuang – Em pé como uma árvore As formas do treino

Pg.19

Capitulo III Entrar no rio

Pg.42

Capitulo IV Luta e Força

Pg.49

Capitulo V Meditação

Pg.61

Capitulo VI Saúde

Pg.64

Capitulo VII As Fases do treino

Pg.103

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PREFÁCIO

Vivemos em um mundo marcado pela pluralidade, pela fragmentação e por suas lamentáveis consequências. Faz parte disso a ingênua percepção que se tinha de que o estrago feito em uma parte do planeta não atingiria o outro lado; no entanto, determinou inúmeros desastres ecológicos, conforme se pode ver hoje. Ao focalizarmos o microcosmo da vida humana, notamos que o bem-estar físico e psíquico do homem contemporâneo segue a mesma propensão fragmentária – depende da atuação de vários especialistas entre médicos, fisioterapeutas, personal trainers etc., compondo um verdadeiro arsenal terapêutico, cuja manutenção é por vezes exaustiva e dispendiosa. Essa tendência revela, por um lado, a crença na autonomia das partes que compõem o organismo humano e, por outro lado, a terceirização do cuidado de si mesmo aos profissionais escolhidos. Assim, manter-se saudável, calmo e bem-disposto parece depender apenas da competência da equipe de cuidadores. Eis que surge então, do outro lado do mundo, um conjunto de exercícios e posturas cuja origem data dos primórdios da civilização chinesa. Ele devolve o corpo ao seu estado natural, chama-se QiGong, e em seu estilo mais antigo, fundado e ministrado pelo mestre Cai Wen Yu, é hoje denominado LaoQiGong. 4

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Com essa prática, pode-se experimentar que, assim como as partes do corpo não são isoladas umas das outras, um homem não é separado de outro homem, não é independente da ligação com a Terra, não está solto no Universo gozando da indiferença das estrelas. Ele é parte de um todo. Tudo está ligado, tudo é um. O treino do LaoQiGong permite identificar, no plano sensorial, o Qi – fio energético comum a toda vida manifesta, fator de ligação que unifica a complexa diversidade do mundo. Reconecta o sujeito com seu próprio eixo, unifica a percepção de suas várias dimensões em um todo capaz de tratar a si mesmo em inúmeros aspectos. Este trabalho pretende dar uma ideia dessa possibilidade. O conteúdo deste livro foi coletado a partir de conversas com o mestre Cai, no Parque da Aclimação, em São Paulo, tendo como ponto de partida minhas anotações de aula feitas durante anos de treino. As falas foram gravadas, transcritas, adaptadas à língua portuguesa – e estão agora dispostas à sua apreciação. Fabíola Luz1

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Médica psiquiatra (Unifesp), doutora em Psicologia Experimental (USP). Acupunturista (Amba). 5

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INTRODUÇÃO

A história da humanidade sempre foi a história do desenvolvimento contínuo do ser humano. O processo de seleção natural possibilitou várias mudanças na estrutura do corpo. Em primeiro lugar, do ponto de vista da seleção natural, o precursor do homem andava de quatro, depois passou a andar sobre os dois pés. Por causa disso, pôde aumentar seu campo de visão. As mudanças estruturais foram o primeiro passo para o desenvolvimento cerebral e possibilitaram a produção inicial das linguagens primitivas. Nessa época a humanidade conseguiu, por meio da linguagem, ajudar-se mutuamente e aumentar o nível de interação social. Em segundo lugar, graças ao andar bípede, os braços e pernas adquiriram funções diferentes e especializadas, possibilitando a fabricação de ferramentas e utensílios. O próprio uso do cérebro nesse ponto adquiriu um nível maior de desenvolvimento. Nesse momento, as atividades da vida humana não tinham como foco a sobrevivência individual, e sim a continuidade da sociedade como um todo. Essa é a diferença mais importante entre a sociedade humana e a da maioria dos animais. Pode-se dizer que a vida animal se resume em manter a continuidade da espécie: é um processo não histórico. Enquanto a vida humana constrói culturas e as deixa de herança aos descendentes, os animais não mostram mudanças nesse comportamento primitivo. Essa é a 6

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principal razão para afirmar-se que os homens vivem na história. Como já dissemos, as mudanças do corpo humano possibilitaram o aparecimento de funções muito específicas, especialmente do cérebro, que se desenvolveu cada vez mais. Por causa disso, a linguagem se tornou mais abundante e complexa, e o pensamento se ampliou. No estágio atual, o corpo humano costuma ser retratado como um instrumento avançado, com funções complexas, trabalhando como aparelho emissor e receptor com autocontrole próprio para análise, gerenciamento, dedução etc. Isso torna o homem a melhor calculadora biológica que existe. Nesse estado, o corpo humano parece estar no seu ápice e na perfeição. Eis a importante questão que analisaremos agora: o desenvolvimento humano, que aparenta estar perfeito, pode não estar no seu fim. Precisamos saber se o estado atual não é apenas mais um passo da evolução e, caso seja, como fazer para prosseguir o desenvolvimento. O LaoQiGong considera o desenvolvimento uma sucessão de etapas. Isso explicaria por que o pensamento lógico se dá em etapas. O corpo humano então estaria sujeito a melhoras, e consequentemente seu poder interior aumentaria. O cérebro nesse ponto se desenvolveria mais para chegar a um nível maior. Então, nesse estado, devemos repetir os mesmos passos dos nossos ancestrais primitivos para ascender cada vez mais (essa não é uma simples repetição, é a filosofia de voltar ao natural). 7

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Talvez a capacidade do homem de andar com os próprios pés não tenha alcançado sua plenitude, talvez estejamos mais uma vez num processo de seleção natural. Todas as ideias do LaoQiGong existem para explicar e exercitar esse tema. Ao mesmo tempo que é o ponto do começo, é o ponto final da filosofia do LaoQiGong. O aprimoramento do homem é o foco das suas atenções. É a partir daí que eu fundei o LaoQiGong. Outros tipos de QiGong, embora semelhantes em alguns pontos, não seguem os mesmos princípios que este, por isso a comparação não se aplica. Liberdade e expressão são o maior anseio humano, o limiar da vida e a meta final do LaoQiGong. Dizemos que os membros do homem não são apenas uma parte do conjunto do corpo, são uma parte do Universo, fazem todas as tarefas em benefício do universal. Cada pensamento e ação de nossas vidas sempre trará como pergunta se seremos capazes de beneficiar o Universo. Afirmamos que essa é a busca do LaoQiGong: unir o plano do homem, da terra, com os céus. Chamamos a isso ainda de junção com o Universo. Dizemos também que somente quem chegou a esse nível está na plena felicidade e saúde.

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CAPÍTULO I

O QUE É O QI O QUE É QIGONG O QUE É LAO QIGONG É difícil definir o que é o Qi. Na Antiguidade, foi definido pelos chineses de várias maneiras. Já disseram que Qi é cor, que é luz, que é brilho. Depois, disseram que Qi é informação, que é sentir. Nenhuma dessas palavras define, na verdade, o que é o Qi. Para dizermos algo que se aproxima do que queremos tratar neste livro, para termos uma ideia daquilo com que lidamos em nossa prática, podemos dizer que “Qi é a energia da vida”. Nossa vida é Qi. Mais precisamente, nossa vida é a energia do Qi. Ao nos darmos conta de que agora temos vida e a distinguimos, nesse momento percebemos o que é o Qi, por assim dizer. Creio que é mais sensato deixar esse assunto em aberto. Talvez no futuro, não se sabe daqui a quanto tempo, alguém poderá explicar com mais precisão o que é o Qi. Por ora, ficamos com isto: Qi é a energia da vida. Podemos dizer também o que não é Qi. Respiração não é Qi, imagem não é Qi, tirar energia do corpo de outra 9

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pessoa para remover doenças não é Qi. Também podemos dizer que “um estado de força” é o Qi. No budismo dizem que as pessoas mortas também têm Qi, que a pedra tem Qi; mas nós queremos o Qi das pessoas vivas, das plantas, dos animais. É isso que nos interessa, é com isso que lidamos na nossa prática. Na estrela distante, que parece incandescente, lá também existe Qi. Pode-se falar também do Qi do Universo, mas, para os fins deste livro, optamos por focalizar o Qi das pessoas vivas, das plantas, dos animais. É importante dizer ainda que não se pode falar do Qi de maneira separada, não se pode tratar isoladamente do Qi de uma pessoa. Do mesmo modo que, ao falarmos do peixe, não devemos considerá-lo isoladamente, e sim levar em conta também a água que o envolve – nesse contexto, a água e o peixe juntos são uma coisa só. Ao falarmos do Qi de uma pessoa, é preciso considerar o ar, a terra e a pessoa, tudo junto. Pois o Qi está em tudo, a tudo envolve. Outro olhar ainda poderia ser considerado a respeito do Qi, no plano microscópico. Muito se tem dito atualmente nessa direção, notadamente nos estudos sobre a física quântica. Mas, a rigor, nada se sabe com precisão. Muito se fala sobre o Qi humano, sobre o fato de que tudo tem Qi. Mas o que sabemos ao certo é que, quando queremos falar do Qi, precisamos levar em conta três coisas conjuntamente: o homem, a Terra, o Universo.

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O que é QiGong Há mais de 5 mil anos o povo chinês descobriu uma série de posturas e exercícios físicos que se mostraram eficazes na manutenção e recuperação da saúde e no aumento da força física. Essas práticas auxiliaram na sobrevivência daquele povo, como também possibilitaram bom desempenho nas lutas. Esse conjunto de exercícios veio a se chamar de QiGong, termo cujo significado se perdeu na origem dos tempos, mas que poderíamos traduzir aqui, para fins práticos, como “trabalho com o Qi”. Ou, conforme vimos anteriormente, ao traduzirmos o Qi como “energia vital”, podemos entender o QiGong como o “cultivo da energia vital”. O treino do QiGong gera várias sensações diferentes, que acabam por caracterizar esse tipo de prática. Isso nos leva a dizer também que QiGong é sentir, conforme veremos adiante. LaoQiGong é um tipo de QiGong Lao é uma palavra chinesa que significa “antigo”. A escolha do nome foi proposital, pois, a rigor, esse estilo não nasceu agora. A origem de tudo o que poderá ser lido nos capítulos seguintes perde-se no início da história do povo chinês, pois se refere ao período anterior ao do Imperador Amarelo – Huang Di, imperador lendário, sábio e moralmente impecável que, ao que tudo indica, governou a China de 2.690 a 2.590 a.C. Já naquela época, os chineses 11

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treinavam da mesma maneira com que praticamos hoje. A postura em pé, o jeito específico de andar, conforme veremos nos capítulos seguintes, remontam àquele tempo. LaoQiGong é um tipo de treino bem antigo, ligado à natureza, que originalmente se desenvolveu na busca da cura para doenças, no tempo em que não havia ciência, nem medicina, nem hospitais. Esse tipo de treino morreu na China, agora nós o descobrimos de novo. É importante frisar que não estamos inventando nada. O nome, a marca LaoQiGong, é apenas uma maneira de distinguir essa prática dos estilos que se podem encontrar em vários lugares do mundo, dado que este aqui preserva as posições e o entendimento do QiGong como era ensinado antigamente. O QiGong que se encontra hoje em dia, mesmo na China, é muito diferente. O original se ramificou em vários estilos, sendo que cada família desenvolveu teoria e prática muito diferentes entre si. Questionamos muitos desses estilos, porque não são ciência nem são natureza: parecem técnicas e posturas inventadas. A ciência e a natureza não mudam, sabemos que a química é igual aqui e na China; um cavalo corre da mesma maneira, aqui e na China. Nosso estilo, completamente ligado à natureza, não foi inventado, foi descoberto por mim a partir de pesquisas na tradição da arte marcial da minha família, da minha cultura e da observação na prática diária que desenvolvo há vários anos. Resolvemos batizá-lo de LaoQiGong justamente para fazer referência às raízes dessa prática milenar. Poderíamos ter usado o nome antigo, caso houvesse, mas esse estilo não tinha nome; naquele tempo, o povo chinês 12

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não tinha pressa em nomear as coisas nem as pessoas. O chinês da Antiguidade não se preocupava com isso; quando nascia um filho, somente mais tarde ele recebia um nome. Apenas a nossa marca é nova, para falar da descoberta de algo que já existia antigamente, mas não tinha nome. INTRODUÇÃO À PRÁTICA Duas considerações precisam ser feitas antes de iniciarmos a explanação da prática, desenvolvida nos capítulos seguintes. A primeira delas diz respeito às diferenças no modo de pensar oriental e ocidental. E, a segunda, à questão da forma e do conteúdo. A diferença no modo de pensar entre Oriente e Ocidente é a primeira questão a ser esclarecida. A cultura chinesa não tem interno e externo, a rigor. Para esclarecer isso, é preciso pensar que, para o chinês, quando você quer conhecer fora, primeiro precisa conhecer a si mesmo. E, quando conhece a si mesmo, já conhece fora. Por isso, fora é dentro, dentro é fora. Isso é mais ou menos o que prega a cultura da China, na sua origem. Por isso não há dentro, não há fora. Mas os chineses atualmente também se equivocam dizendo que dentro, interno, é a China; e fora, externo, é o Ocidente. Na verdade, esse não é o modo de conhecer a fundo alguma coisa. Quando conhecemos a fundo, dentro é fora, fora é dentro. Na medicina, você pode pensar que uma parte é o pé, outra parte é a cabeça, mas, na verdade, tudo é um só, é um corpo só. “Fora e dentro” também é outra maneira de 13

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falar do modo objetivo e subjetivo com que se aborda uma questão. Esse tema complicado da filosofia tem dividido, desde sempre, as várias correntes que passam a considerar como mais importante a visão objetiva dos fenômenos ou a visão subjetiva. Não me parece correta nenhuma dessas partes, isoladamente. Eu sempre digo que o pensamento humano do futuro não pode ser ocidental nem oriental. Que precisamos sair daí desse lugar em que estamos acostumados a ver os fenômenos, seja dentro ou fora, subjetivo ou objetivo, e ir a outra parte para olhar melhor. É como se estando na Terra precisássemos sair da Terra para ver a Terra. Do mesmo modo, falando do QiGong, se nossa investigação for feita de dentro do QiGong, a abordagem será superficial, como o falar de filosofia de dentro da filosofia será também superficial. Precisamos sair da filosofia para entender profundamente a filosofia, sair do QiGong para entender QiGong com profundidade. Assim a possibilidade de errar será menor. Essa linha de raciocínio nos leva à importante questão da forma e do conteúdo. A filosofia também se ocupa dela, desde sempre. E diz que o conteúdo é a essência da forma; que a forma também influencia o conteúdo; que uma forma pode ter vários conteúdos; que um conteúdo também pode ter várias formas etc. Para a nossa prática, queremos que o conteúdo seja sempre um, determinado, enquanto a forma pode ser diversa. O conteúdo não se altera, a forma precisa se alterar muito. Quanto mais formas, melhor. A rigor, dois conteúdos apenas 14

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para uma mesma forma também é possível encontrar. Forma e conteúdo precisam ter harmonia. Não pode ser uma forma qualquer, pois aceitamos que há uma equivalência entre forma e conteúdo. Do mesmo modo que uma pessoa de coração ruim pode roubar, fazer um movimento ruim na vida. E uma pessoa de coração bom costuma fazer um movimento bom; assim como uma pessoa com saúde tem expressão bonita, e um doente não pode ser bonito. Do mesmo modo, para o QiGong, embora várias formas devam existir, não se pode fazer qualquer forma. Ao treinar é importante, principalmente no início, que se procure fazer a forma correta. Com o tempo recomenda-se não pensar no conteúdo e na forma, tem de parecer que não se está fazendo nada. Não fazer nada é um fazer. Mas esse é um estágio muito avançado da prática. Inicialmente é preciso ser cuidadoso. No treino, algumas regras precisam ser respeitadas. Primeiro, não se pode treinar sentado, pois essa posição não permite abrir a articulação do quadril nem outras articulações importantes que possibilitam sentir a energia da cauda. Essa estrutura se perdeu na evolução humana, mas sua energia se mantém e pode ser sentida em algum momento do treino. As formas não podem ser retas. A força que advém da reta quebra coisas, é força de destruição. Para começar, as formas do corpo precisam formar triângulos, alavancas, círculos, no mínimo. Sem isso, a energia não consegue 15

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funcionar. Como a força de uma máquina, a física do corpo precisa ter isso, essa é nossa forma. A forma não pode ser reta, a curva é a forma de melhor força, a forma da natureza. Parece-se com a espiral do DNA, com as curvas do cabelo, dos rios, das montanhas. Já a força da forma reta é força de quebrar coisas. Como prova disso propomos a seguinte experiência: em dois copos iguais, misture com uma colher, na mesma proporção, água e mel. Em um deles, a mistura deve ser feita com movimentos circulares; no outro, com movimentos retos. O resultado é que com o movimento circular fica difícil misturar o mel com a água. Os movimentos retos realizam a quebra mais rápido, facilitando a dissolução. Do mesmo modo, na arte marcial, a forma reta machuca mais. Na natureza, o caranguejo, o camarão, tudo tem curvas. Muitas vezes vemos formas retas na natureza. Mas, quando observadas por dentro, elas revelam inúmeras curvas. Isso é uma força do Universo à qual estamos ligados. Não podemos considerar o homem isolado do Universo. Não se pode separar, falar do ser vivo sem considerar a Terra, por exemplo. A relação dos seres com a Terra pode ser vista nas árvores. Uma laranjeira é igual em qualquer lugar do mundo, mas a forma apresenta variações, porque cada lugar é diferente. Comparem-se Brasil e China. Na China as raízes das árvores são profundas. Aqui, muitas vezes a raiz é exposta. É a mesma árvore, mas a forma da raiz é diferente, porque a energia da Terra é diferente, dependendo do lugar. O mesmo pode ser dito do animal, das pessoas. Há inúmeras 16

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formas, a vida é bonita justamente por essa diversidade. Se houvesse uma só forma, se fosse tudo igual, seria feio. Aí reside a beleza da Terra. Ainda em relação à forma, podemos dizer que para cada doente há uma forma que pode harmonizar o seu tipo de doença; no mínimo, uma forma pode auxiliar. Podemos citar a pressão alta. Nessa enfermidade, o doente precisa treinar com a mão para baixo. E se a coluna dói, como fazer? Quantas estruturas há para harmonizar as enfermidades? Podemos dizer que inúmeras. Não podemos nos estender nesse item, pois, de tão vasto, seria assunto para outro livro. Em cada tipo de esporte, também, há uma forma ideal para harmonizar os movimentos e obter o melhor resultado. Uma forma seria treinar, outra pular e assim por diante. Como podemos ver, a forma é um assunto vasto. No QiGong, como na natureza, toda forma está relacionada a algum conteúdo. Essa associação formaconteúdo foi um presente que a natureza nos deu, mas a inconsciência dessa relação tem nos impedido de cultivar tal padrão de harmonia que os animais usam o tempo todo; e, como consequência, tem nos levado a problemas de saúde de vários tipos. A prática do LaoQiGong é uma maneira de experimentar, no próprio corpo, essa correspondência entre forma e conteúdo e de usufruir os benefícios dela decorrentes. Vamos a ela.

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CAPÍTULO II

ZHAN ZHUANG EM PÉ COMO UMA ÁRVORE A forma O conjunto de posturas e exercícios do LaoQiGong compreende partes que podemos chamar de “as cinco fases do primeiro início”, nas quais modalidades específicas de força serão metas a ser alcançadas. São elas: a “força da forma”, a “força da máquina do corpo”, a “força do pensamento”, a “força do instinto” e a “força da energia”. Este livro tratará da “força da forma” e da “força da máquina do corpo”. Os outros tipos de força serão assunto de trabalhos futuros. Este capítulo tratará da força da forma. Desde sempre, na história do conhecimento humano, as considerações sobre a forma evocam o seu complemento, o conteúdo. Forma e conteúdo são assuntos da filosofia, e, nesse âmbito do conhecimento humano, forma e conteúdo podem ser vistos em várias representações: afirma-se que o conteúdo é a essência da forma, que a forma também influencia o conteúdo, que uma forma pode ter vários conteúdos, que um conteúdo também pode ter várias formas. 19

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Para o LaoQiGong, o conteúdo tem a forma correspondente. Assim como se espera que uma pessoa boa não jogue papel na rua e que faça movimentos bons, supõese que uma pessoa de coração ruim possa roubar, fazer coisas ruins. Do mesmo modo que uma pessoa com saúde costuma ter um rosto bonito, espera-se que alguém doente não se mostre bonito. Para nós, quanto mais feliz estiver a pessoa, mais saúde ela tem, mais bonita ela é. Portanto, no início do treino de LaoQiGong, a forma é muito importante, pois ela, uma vez correta, será equivalente ao bom conteúdo que buscamos alcançar. Em primeiro lugar, o treino precisa ser feito em pé. A postura sentada não permite a abertura adequada da articulação do quadril nem a movimentação de outras articulações importantes, muito menos a experiência de sentir a “cauda”. O LaoQiGong considera que o humano perdeu a cauda no processo de evolução, mas preserva a energia dela, conforme já foi dito. E que é preciso recuperar a sensação da energia dessa estrutura perdida. A forma do corpo durante o treino precisa ter círculos, triângulos, alavancas. Caso contrário, a energia não consegue fluir. A forma não pode ser reta. A força correspondente à forma reta é uma força destrutiva, ideal para quebrar coisas. No começo do treino é preciso atentar para a forma do corpo, que precisa ter curvas, círculos, formas semelhantes a rios, a montanhas, a forma do DNA, a forma da natureza, enfim. Na natureza, tudo tem curva. Mesmo as estruturas dos animais aparentemente retas são curvas no seu interior. Essa é uma força do Universo. É a energia do Universo que 20

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está em tudo o que existe. Por isso não se pode considerar o ser humano sozinho, de forma separada. Não se pode falar do homem sem falar da Terra, sem falar de energia que tudo abrange. No âmbito da natureza em geral, observamos que as árvores, embora sejam as mesmas em qualquer parte do mundo, possuem diferenças nas formas, porque cada lugar é diferente, como citamos no capítulo anterior. Com as pessoas ocorre o mesmo. Todas têm uma cabeça, dois olhos, dois braços, duas pernas, mas cada pessoa é diferente, e aí reside a beleza. O corpo humano pode apresentar inúmeras formas, inúmeras proporções. Mesmo se considerarmos as enfermidades, vamos observar que cada doença se apresenta de forma peculiar – no conjunto que a medicina chama de “sinais e sintomas”. Percebemos que, mesmo nessas circunstâncias, o treino de LaoQiGong pode beneficiar cada doente com a possibilidade de, no mínimo, uma forma específica que o auxiliará a retornar à saúde. Nos esportes também podemos observar os benefícios do entendimento da forma. O LaoQiGong compreende que o jogador, de qualquer modalidade esportiva, precisa treinar com o corpo ligado, e não fragmentado. Respeitando essa regra básica, precisará de uma forma específica para pular, outra para correr e assim por diante. Todas essas considerações sobre a forma precisam ser respeitadas pelos principiantes do treino de LaoQiGong. Somente em estágios mais avançados, recomenda-se que, durante a prática, não se pense na forma ou no conteúdo, No 21

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início do treino, precisamos atentar, com cuidado, para as orientações da postura, conforme veremos a seguir. As formas do treino Descreveremos agora, em linhas gerais, a primeira posição do LaoQiGong, que pode ser vista na figura 1. A coluna é reta, a cabeça levemente pendida para a frente, de modo que o queixo fique para dentro. Os braços abertos ao lado do corpo, como se pudessem abrigar duas bolas nas axilas. Os pés voltados para a frente, separados a uma distância equivalente à largura dos ombros. A coluna deve esticar, como se a cabeça atingisse o céu. Os pés devem estar plantados no chão, como se alcançassem o centro da Terra.

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fig. 1

Posição 2 - Zhan Zhuang, ou Tou Li Shou Shen A segunda forma será vista agora. Dada sua importância na prática do LaoQiGong, tentaremos descrever com detalhes a extensão dessa complexa posição, embora à primeira vista possa parecer simples. É chamada de Zhan Zhuang, termo que possibilita várias traduções, como “estar em pé como uma árvore”. Pode também ser chamada de Tou Li Shou Shen, que quer dizer “em pé, sozinho, segura o shen”. (Ver a figura 2.)

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fig. 2

A coluna é reta, a cabeça levemente pendida para a frente, de modo que o queixo fique para dentro. Os braços abertos como se abraçassem uma bola ou uma árvore. Os pés voltados para a frente, separados a uma distância equivalente à largura dos ombros. Vamos agora detalhar a posição focalizando: a expansão da cabeça, as articulações da cabeça, os músculos do rosto, os cinco pontos de ligação, os triângulos. Expandir a cabeça Consideramos que a raiz do humano está na cabeça. Essa afirmação se assemelha aos ensinamentos de algumas 24

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teorias ocidentais que dizem que do mesmo modo que a raiz das plantas vai ao encontro do seu alimento num processo de expansão no interior da terra, a cabeça humana se dirige ao mundo por meio da visão, audição, degustação, absorvendo a luz, o som, a comida etc. Analogamente, consideramos que a raiz das árvores está na terra e a raiz do humano está na cabeça. Durante o treino, pode-se sentir como se algo puxasse a cabeça para cima. Isso é importante, pois, quando a cabeça se dirige para cima, o pé pode ir para o chão, como se entrasse no chão. Em cima se liga ao céu, enquanto o pé se liga ao chão. Esse é um aspecto concreto fundamental do treino, é preciso sentir isso. Depois, com muito tempo de treino, vem a sensação de estarmos pendurados lá no alto, pelo cabelo. Essa conexão com o alto parece algo vazio, à primeira vista, mas não é, é a sensação da raiz de que falamos. Visualizando a postura da cabeça em relação ao corpo, é como se fosse uma bola, uma bexiga presa na ponta de uma vara – que, nessa, analogia seria a coluna reta. A coluna impõe certa reverência à posição do rosto, levando o queixo para dentro. A cabeça é o chefe do corpo, é o mais importante. Por isso, em todos os movimentos da prática de LaoQiGong, a cabeça vai primeiro. O que se observa comumente no ser humano é que a cabeça, que é o chefe, costuma ficar descansando, enquanto o corpo trabalha, o que acaba levando a vários problemas de coluna. Por isso precisamos sentir sempre que a cabeça puxa a coluna e puxa a cauda, por consequência: essa é uma regra básica. Sinta a cabeça grande, 25

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como se saísse do pescoço, como se fosse uma pipa. Esse é um ponto concreto importante do treino. As articulações da cabeça Prossegue-se então a postura Zhan Zhuang focalizando as articulações da cabeça no sentido de expandilas. Com a boca levemente aberta, buscando a expansão da mandíbula, é preciso sentir como se mordesse duas bolinhas nos últimos dentes da boca. É preciso relaxar a boca e sentir que lá no fundo existe uma base nas laterais do músculo da língua. Para isso a mandíbula tem de estar solta. Deve-se sentir as duas orelhas puxadas para cima, assim como o cenho, a raiz do nariz. A pele do rosto expandindo, a cabeça para cima, os caninos quase aparecem. É preciso sentir que as duas orelhas são puxadas em sentidos opostos, como se fossem orelhas de abano, como se fossem asas. É preciso sentir a pele do rosto expandindo. É preciso imaginar que a língua continua para dentro, na direção da base, e que, a partir da ponta, tem um tamanho ilimitado. Não é necessário preocupar-se com a relação da ponta da língua com o céu da boca, conforme outras práticas de QiGong enfatizam. Em algum momento do treino ela pode subir naturalmente. Pode-se apenas dizer que, quando isso acontece, o praticante está experimentando o corpo inteiramente ligado, como um todo. Deve-se sentir como se houvesse uma corda atravessando a boca semiaberta, oferecendo resistência ao 26

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movimento de ir para a frente. Nessa hora deve-se tentar experimentar a existência de três pontos: dois deles em pontos ilimitados, lá fora, e outro ponto dentro da boca. Também se deve procurar sentir como se houvesse um tubo que sai da garganta e alcança a barriga, num percurso único, como se o diafragma não existisse. Esse é o preparo para que, futuramente, esse tubo mantido dê condições para a respiração natural, que perdemos em função de preocupações da vida. Vale lembrar que, quando dorme, todo mundo abre a boca. Antes que se chegue a isso, no entanto, é possível que a barriga chame a atenção como algo que está preso. Esse já é um efeito do treino, é o corpo mostrando que uma parte precisa relaxar. E por isso, em muitos momentos do treino, é possível que a respiração chame a atenção, como se a barriga estivesse presa. Nesse momento, é preciso esquecer a barriga e a respiração, pensar em “fora do corpo”. Isso ajuda a esperar o tempo necessário de treino, quando a respiração natural acontecerá com tranquilidade. Às vezes pode-se usar som ao treinar. São sílabas ditas em alto e bom tom. O som atravessa o tubo e alcança o líquido da barriga, como se fosse um lago. Isso dará condições para que mais tarde se possa tentar falar sílabas secas sem que o ar saia, mas que vá para dentro e que, atravessando esse tubo imaginário, alcance os líquidos abdominais, ricocheteando-os. Esse é um exercício altamente benéfico para as vísceras.

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Os cinco pontos Ainda na descrição da postura do Zhan Zhuang, atentemos para a existência de cinco pontos: a cabeça, os dois pés e as duas mãos. Além disso, um ponto no centro dos pés e outro no centro da cabeça (o lugar da fontanela dos recémnascidos), formando um triângulo. E quatro articulações: duas dos ombros e duas da virilha. Temos, então, cinco pontos, quatro articulações e a coluna reta, tudo ligado. Considerando na frente as quatro articulações e os cinco pontos, podem ser vistos três tipos de triângulo, para fora. Um deles é formado pela cabeça e pelos dois pés. O segundo é formado pelos cotovelos e pela nuca. O terceiro, pelos dois joelhos e pelo sacro. (Ver a figura. 2a.) Nas costas podemos visualizar outro triângulo formado pelas duas escápulas e pelo ponto de inserção do pescoço na cabeça. Além disso, nas costas, podem ser visualizadas também duas cruzes: uma formada pela cintura escapular cruzando a coluna e a outra pela cintura pélvica cruzando a coluna. Para dentro podem ser considerados mais três triângulos. O primeiro liga a sétima cervical com a parte superior do músculo trapézio. O segundo liga os dois pontos das articulações dos ombros com o coração. O terceiro liga os pontos da articulação do quadril com o umbigo. São os triângulos internos. Além disso, o LaoQiGong entende a coluna, vista longitudinalmente, como sendo composta de três partes: a cabeça, a parte que percorre o tronco e a cauda, tudo junto. 28

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fig. 2a

Assim, consideramos as condições básicas para a energia de máquina de força, que será vista no capítulo seguinte, como: coluna reta, cauda, cruz, seis triângulos, quatro articulações. E mais cinco pontos e cinco nucas diferentes. Isso é a máquina da energia. Consideramos que a preparação desses pontos no treino é a educação física do corpo, na medida em que a prática desse conhecimento tem a capacidade de consertar o corpo. Gostaríamos que terapeutas corporais conhecessem essa antiga sabedoria sobre o corpo. 29

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Sabemos que outras escolas de QiGong se preocupam com poderes sobrenaturais como mudar a cor da água, levantar objetos sem tocá-los etc. Nós não queremos o sobrenatural, não queremos novidade, queremos conhecer a verdade natural do corpo. A posição 2 –“sentado” A prática na importante segunda posição levará naturalmente a um desdobramento necessário, que chamaremos aqui de posição 2 – “sentado”. (Ver a figura 2b.)

fig. 2b

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Ao olharmos de perfil, na figura 2b, vamos observar mais detalhes da postura: na coluna reta, a cabeça tem o movimento de subir, enquanto o cóccix desce. É preciso notar que a postura “sentada” não se dá pela flexão do joelho, mas da articulação coxofemoral, ou do quadril. É preciso saber que, ao abrir a articulação do quadril, a barriga pode relaxar. Ao abrir o ombro, o coração e o pulmão podem relaxar. Abrir as articulações é a condição básica para fazer fluir a energia. O olhar É preciso ouvir o ilimitado, sentir grande. Lá há som, há a música do Universo. É preciso olhar o ilimitado para ativar o triângulo interno do olho. O olho faz uma espécie de alavanca quando olha para o ilimitado. Parece olhar a luz, é uma espécie de matéria, não é o ar. Nessa forma de olhar, o ar parece gelo, e o uso da tal alavanca parece quebrar o gelo, o ar não parece o ar, é como se fosse duro. É um tipo de foco, não é o olhar normal. Isso é o uso da alavanca no que chamamos de triângulo interno da visão. Por isso antigos mestres chineses, falando dos tendões, diziam que o chefe dos tendões está embaixo do pé, a terra dos tendões está na sola do pé. E o céu dos tendões está no olho. Esse tendão do olho é muito conhecido pelos antigos taoistas. Mas o que é? Como fica lá? Não é só a cabeça que levanta, há um pequeno movimento efetuado pela alavanca interna do olho. A cabeça não olha só para cima, há um pequeno movimento. 31

Mestre Cai Wen Yu

Essas sensações físicas aqui descritas são percepções da natureza do corpo, podem ser experimentadas por todo praticante disciplinado. Para esse nível de percepção, são necessários alguns anos de treino. A terceira posição

fig. 3; pos. 3

A terceira posição (ver a figura 3) é uma variante da posição 2 e 2a. As mesmas recomendações da posição anterior devem ser mantidas. Aqui, ainda com duas variantes: as mãos abertas para fora e em concha ou as mãos colocadas no ar, como se segurassem uma bola invisível. Nessa posição 32

Lao QiGong

pode-se experimentar a energia se deslocando para as mãos. E também se experimenta um balanço do corpo, que se sustenta em uma perna e na outra. A importância do exercício consiste em experimentar o peso do corpo, percepção fundamental no treino, conforme será visto adiante. A quarta posição A quarta posição, que deverá ser tentada depois de muito tempo de treino, quando o básico já tiver sido consolidado, consiste em se sentar no ar, com a coluna reta. Como se fosse uma variação da posição 2b, em que se levou o movimento do “sentar” ao seu limite. (Ver a figura 4.)

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Mestre Cai Wen Yu

fig. 4

O praticante se coloca, de cócoras, com a coluna reta. As mãos podem experimentar quatro posições: “abraçar a árvore”; abraçar a árvore com as mãos espalmadas para fora; ladear o corpo, como se formassem uma cruz em relação ao plano do corpo; e permanecer caídas lateralmente ao corpo. A posição tem importância para que se possa experimentar: a terra, você, o céu. É, na verdade, um exercício de mola. Essa posição facilita o treino da mola e permite caminhar como um animal que antecedeu o antropoide na história da evolução humana.

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Lao QiGong

Mestre Cai na 4ª. Posição

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Mestre Cai Wen Yu

A quinta posição Podemos observar na figura 5 a quinta posição. Nela, a coluna deve se manter reta, a cabeça para cima. Começa pela postura Zhan Zhuang. A seguir, um dos pés é levantado, numa posição que lembra certos animais alados, especialmente o flamingo dentro da água. (Ver a figura 5.)

fig. 5 36

Lao QiGong

Ao mesmo tempo que a coluna se mantém reta e a cabeça busca o céu, o pé que se encontra no chão busca o centro da Terra. É uma posição importante para equilibrar os dois lados, para trabalhar as polaridades do indivíduo: yinyang, masculino-feminino etc. A sexta posição Essa posição sentada não é recomendada a principiantes, pois seu efeito se dá quando é possível experimentar a ligação dos olhos com o pé contralateral, os dois pés colocados como se tocassem duas bolas.

fig. 6; pos. 6

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Mestre Cai Wen Yu

Mestre Cai na 5ª. Posição

Um iniciante poderia conseguir se sentar na posição, sem alcançar o efeito, que pode ser visto ao se observar a posição de cima (figura da direita). Ali visualizamos dois círculos concêntricos que se ligam à coluna. Se observarmos a mesma figura, a segunda imagem, caso fosse entendida como alguém andando no chão, também pode ser vista como o andar de um primata não humano. A sétima posição De extrema importância para a luta, essa posição parte também do Zhan Zhuang. Na sequência, o corpo é torcido para o lado. Possibilita a movimentação do peso do 38

Lao QiGong

corpo de maneira que se pode experimentar a ação da inércia no corpo.

fig. 7

No treinamento para a luta, a ausência da prática dessa posição leva o praticante a usar o músculo, em vez de experimentar a força advinda da movimentação do corpo. 39

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A posição 8 A oitava e última posição, só recomendada para o praticante experiente, consiste em abaixar o tronco em torção, com os braços abertos, para um lado e depois para o outro. A posição permite esticar, ao mesmo tempo, toda a coluna e, praticamente, toda a pele do corpo. (Ver a figura 8.)

fig. 8

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Lao QiGong

Mestre Cai na 8ª. posição

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CAPÍTULO III

ENTRAR NO RIO

Fabio Fabregas

O treino de LaoQiGong não se limita a buscar a forma. Também é sabido que não adianta buscar imagens do ilimitado, algo tão falado nesse meio; buscar apenas a imagem do ilimitado é sonho, não é verdade. É preciso que o corpo experimente por dentro alguma coisa. Que 42

Lao QiGong

experimente por dentro o ilimitado, caso contrário o praticante pode treinar durante dez anos e não mudar nada. Vamos descrever neste capítulo algumas sensações esperadas como resultado do treino de LaoQiGong. Vale frisar que as sensações que experimentamos não são imagens produzidas pela mente, mas percepções, tanto aquelas detectadas por meio dos sentidos conhecidos como outras que, embora naturais, não costumam ser acessadas por vias comuns, de modo espontâneo. Primeiramente precisamos saber que os exercícios da prática do LaoQiGong buscam a expansão do corpo, a abertura de todas as articulações, levando à separação entre os músculos e os ossos. Quando o osso se separa do músculo, a pele se abre, as células funcionam. Esse movimento de expansão que leva à abertura da pele é um excelente remédio para várias enfermidades, não somente as da pele. No taoismo se diz que, quando o osso está fechado, o músculo abre. O músculo é uma força, o osso é uma força, a pele é uma força. No nosso treino é preciso sentir que entre o osso e o músculo existe espaço. Isso é o que chamamos de relaxar. Relaxar é expandir. Conforme já disse em trabalho anterior2, relaxar não é ausência de força. Relaxar não é ficar mole, não é ser fraco, é expandir. Em termos concretos, é preciso ganhar espaço nas articulações e entre os músculos e os ossos. Depois disso é possível se comunicar com o espaço 2

‘QiGong, Arte marcial interna’, 2006 43

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‘fora’ dos limites do corpo. “Fora” não é você, mas quando você consegue abrir por dentro, “fora” também se expande e produz um efeito em você, muda o seu corpo. Ganhar espaço é um dos efeitos da prática do LaoQiGong; pele, barriga, coração, tudo ganha espaço. E é também uma das condições para que, na sequência, seja possível sentir outras coisas. Nas artes marciais, “ter esse espaço” tem sido equivalente a ter kung fu (ter energia). Nesse meio, tradicionalmente, é costume comparar as pessoas e dizer que fulano tem mais kung fu do que sicrano, referindo-se à pessoa que tem espaço maior, que conseguiu “conquistar” mais desse espaço no trabalho com o QiGong. Nós também sempre dizemos que é preciso sentir o ilimitado. Nós queremos o ilimitado, mas nem sempre conseguimos sentir isso, não é fácil, sempre deparamos com os limites. Já dissemos, no capítulo I, que QiGong é um sentir. Como? Não é sentir frio, sentir calor, sentir a água em contato com o corpo. Na verdade, é sentir muita coisa diferente daquilo a que estamos acostumados. Precisamos nos propor a sentir principalmente duas coisas: a força da Terra, aquela força da Terra que puxa as coisas, a chamada força centrípeta. E a força do ar que nos empurra. É isso que importa inicialmente. Quando aprendemos a expandir, somos capazes de sentir que o ar nos empurra. Queremos nos sentir leves, queremos sentir a força da Terra nos puxando, sentir o que é a vida humana na Terra, em contato com o ar. Assim como o peixe sente a água e a força da Terra, 44

Lao QiGong

assim como os animais que, em seu ambiente natural, se orientam também por essas sensações. O treino de QiGong tem três partes, costuma-se dizer. Primeiro é necessário experimentar o corpo inteiro ligado. A maioria das pessoas tem o corpo fragmentado, a cabeça, o tronco e as pernas parecem três partes distintas. Às vezes os alunos me perguntam se é possível existir a ligação apenas na forma, externamente, enquanto dentro não está ligado. É, no começo é só a forma, e é importante que a forma busque essa ligação, o todo do corpo. Depois, com o tempo, percebe-se que não é só a forma, que por dentro também está ligado. É isso o que nós queremos. Quando o corpo está ligado por dentro, aí existe a condição de sentir o ilimitado. Se a ligação se dá somente na forma, não existe a experiência do ilimitado, apenas a imagem dele. Quando eu sinto o ilimitado, muitas vezes ele se impõe a mim sem que eu o busque. Então costumamos dizer que o ligar pode ser experimentado de duas maneiras: na forma mesmo, em que se pode ver o corpo como uma coisa só; e por dentro, e aí, sim, é possível verdadeiramente experimentar o ilimitado. Em segundo lugar, é possível experimentar o que chamamos de mola. Para essa modalidade de treino é preciso considerar a existência da cabeça, da coluna e da cauda como uma coisa só. Essa estrutura unificada então fará o movimento de expansão e contração, concomitantemente com todas as articulações do corpo, de modo que tudo abre e fecha, como uma mola. Quando o praticante vivencia a mola, podemos dizer que já tem conteúdo, é a segunda ligação. 45

Mestre Cai Wen Yu

Em terceiro lugar, é possível experimentar o que chamamos de ondas. Essa é uma parte mais complicada. As ondas acontecem em qualquer direção. Aí, sim, a essa altura do treino, o praticante pode, de fato, experimentar o ilimitado. A rigor, já a partir da mola é possível sentir o ilimitado. Sem a experiência da mola, ou das ondas, consideramos que a experiência do ilimitado é só imagem, é apenas sonho. A experiência de ligar e de sentir o ilimitado possibilita a percepção de ondas dentro do corpo. Ondas são um efeito, são a energia do QiGong trabalhando, fazendo você se sentir maior, expandindo o seu corpo, os membros parecem compridos, tudo comprido. Se o corpo tem ondas, dentro tem fervor. Quando se chega lá, o corpo já sabe o que é QiGong. A experiência de ligar o corpo é mais fácil de alcançar. O praticante disciplinado pode conseguir esse resultado em pouco tempo. A experiência de ligar por dentro é mais difícil, às vezes liga, às vezes não. O mesmo acontece com as ondas: às vezes são percebidas em uma região do corpo, outras não. Ao chegar a esse ponto, você já entende o que é QiGong. Não é adquirir poderes, ser imortal, querer voar, ficar dias sem precisar comer. O LaoQiGong se preocupa com o ser humano; quer saber como o corpo funciona; como se podem aumentar as habilidades, é só isso. É preciso sentir como expandir, como funciona, qual é o limite para sentir o ilimitado do nosso corpo. Isso é o aumento da sensibilidade, não é filosofia. O corpo pode ter isso, todo mundo tem isso, só não sabe que tem. 46

Lao QiGong

A experiência da mola vem antes das ondas. É preciso usar a mola para chegar às ondas. A mola dá aumento da força, dá impulso, e a forma precisa mexer. Na experiência das ondas, a forma praticamente não mexe. Depois de muito treino você não sabe diferenciar o que é mola do que é onda. Na experiência da onda, primeiro se percebe a onda por dentro do corpo. Principalmente dos pés para as mãos. Depois para cima e para trás, como um tigre pronto para pular. Depois se percebe a onda lá fora, como se um grande mar fosse as ondas. Equivale a dizer que, quando se tem energia, não se deve guardar na barriga – como professa o taoismo, deve-se guardar fora. Como quando se ganha dinheiro, não se deve guardar no banco, mas fazer negócio. Quando as ondas são sentidas lá fora, a região do corpo que detecta essa percepção é a debaixo dos braços, nas axilas. Ao conseguir treinar as três possibilidades: ligar a forma, ligar por dentro na experiência da mola e vivenciar as ondas, o praticante conseguiu vivenciar o que se chama de entrar no rio. Ao experimentar entrar no rio, sente-se que todos os músculos querem expandir, querem abrir. Creio que a ciência diz que a possibilidade dos músculos de cada pessoa, quando ligados, soma toneladas de força, não me lembro bem. O músculo sozinho não pode muito, pois há forças contrárias à ação que ele executa. Mas, ao conseguir somar essa força toda, pela experiência de entrar no rio, é possível alinhar essas forças e conseguir uma força maior. 47

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Por fim, depois de vários anos de treino percebemos que a experiência de acertar a forma que levará a entrar no rio são pontes necessárias para atingir um estado em que se percebe que dentro e fora são uma coisa só. Para chegar até isso, precisamos praticar todos os dias.

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CAPÍTULO IV

LUTA E FORÇA Há mais de 5 mil anos o homem conhece o lugar em que se encontra a força do corpo para tudo, para viver, para lutar. Sabe-se que está na alavanca que se faz com o corpo. Não é necessário inventar nada. Hoje se sabe que a alavanca usa a energia potencial. Pode-se ter ciência dessa energia quando, de súbito, quase caímos – aquilo que nos sustenta, naquele momento, é essa energia de que falamos agora. O corpo humano foi construído em bilhões de anos. O corpo é uma ciência pronta para ser estudada. Não muda mais. Temos dois olhos, uma boca, um cotovelo em cada braço. Não precisamos de dois cotovelos. Precisamos saber como conhecer o corpo para saber usar o corpo. Podemos dizer que o estudo do kung fu ou do QiGong, que já tem 5 mil anos, é uma ciência do corpo. Nós precisamos saber como trabalhar, como mudar o corpo. O corpo é uma máquina. A alavanca, o triângulo, o círculo são os três materiais da força, podemos dizer assim. Após essas formas estarem devidamente entendidas e executadas, é preciso que a alavanca faça círculo e que o triângulo faça círculo. A alavanca faz círculo e isso constitui uma força, como pode ser visto no movimento das rodas de um trem. 49

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A alavanca A alavanca foi a primeira máquina que o homem conheceu. Arquimedes e Newton já falaram sobre a alavanca, a primeira máquina de força do corpo. Usar essa primeira máquina é fundamental para acessar a força. Sem a alavanca o corpo é só músculo, sem força. A alavanca permite usar a energia. Podemos nos perguntar por que, na prática do QiGong, a postura fundamental é a de “segurar a árvore”. A alavanca é a primeira resposta a essa pergunta. A postura de “abraçar a árvore” – Zhan Zhuang – produz várias alavancas. E, uma vez conquistado o todo do corpo, consciente do espaço existente em todas as articulações, percebemos que ele inteiro é uma alavanca, cujo movimento produz energia. A rigor, para fazer essa energia movimentar, é necessário ter alinhado a “árvore”, o peso do corpo e o pensamento. Na prática é necessário que as forças trabalhem juntas, todas funcionem ao mesmo tempo, ou de forma sincrônica. Como vemos, buscar entender o funcionamento da alavanca não equivale a encontrar prontamente o grande, o ilimitado. A necessidade de se ligar com o Universo é assunto da religião, a busca da imagem de deuses é sonho, conforme já dissemos. O LaoQiGong se propõe a conhecer a ciência do corpo para saber como usar a energia dele e então experimentar a ligação com o todo, com o Universo, pela via natural. 50

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A Força Força não é raiva ao quadrado. A força já foi definida por Newton na equação F = m.a., quer dizer, a quantidade de força é diretamente proporcional à massa e à aceleração. Quando nos movimentamos normalmente, por vezes é só uma parte que se mexe: o braço ou a perna, por exemplo. No treino de LaoQiGong, a conquista do “todo do corpo” equivale a um aumento da massa, na medida em que não é uma parte isolada que se movimenta, mas o corpo todo. Ao conseguir ligar o corpo todo, o “m” da equação aumenta, e a força também pode aumentar. Para cultivar a força, é necessário aprender a fazer do corpo uma arma, cujo peso é o peso do corpo = m. É necessário aprender a projetar esse “m” em direção ao adversário. Somente a conquista do “todo do corpo” 51

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possibilita essa projeção. Essa variável, obviamente, é limitada, na medida em que cada indivíduo tem um peso específico. Por outro lado, a aceleração também é beneficiada no treino de LaoQiGong. A aceleração mede a variação da velocidade, diz a física. Para adquirir velocidade, é preciso relaxar, o que se entende aqui por “expandir” o corpo, conforme vimos anteriormente. Assim diz a ciência do corpo, nosso objeto de pesquisa. A velocidade também é força, é um tipo de força; se analisarmos mais a fundo, só a velocidade é força; por isso precisamos relaxar, porque relaxar permite movimentar-se com velocidade. E como se faz o movimento? O movimento ocorre ao passarmos de uma estrutura para outra. É preciso saber qual é a melhor estrutura. Até agora, sabemos que a experiência do todo aumenta o “m” e que “relaxar” permite a velocidade. Então, tanto com o “m” quanto com o “a” da fórmula de Newton pode-se ganhar força. Força é energia. Essa é uma teoria de força. Na modalidade esportiva chamada “levantamento de peso”, já se sabe que o relaxar possibilita o levantamento rápido, enquanto o corpo duro não consegue velocidade. Do mesmo modo, na luta, o corpo duro não permite rapidez dos movimentos. É fácil imaginar a importância da movimentação rápida na defesa dos animais, inclusive do homem, contra predadores. Se um cachorro quiser me morder, e eu, por estar relaxado, me movimentar rápido, ele não conseguirá me atingir. 52

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Pode parecer uma teoria abstrata. Mas, concretamente, ao fazer o movimento, podemos dizer que a nossa força (ou energia) conta em primeiro lugar com a força da terra, em segundo lugar com a força do ar e em terceiro com a nossa força. As três variáveis precisam estar em harmonia, juntas. Para que eu me movimente para fora com rapidez, é preciso que jogue o “m” em direção à terra com rapidez. O peso do corpo bate rápido no chão e adquire “velocidade”. A força bate no chão, o chão joga para fora com força. Essa é “força centrífuga” que a física conhece. A força centrípeta e a força centrífuga, a rigor, acontecem ao mesmo tempo. É isso que chamamos de “força da terra”. Se não existisse a terra, não poderíamos ter uma força significativa. Um atleta que faz saltos consegue pular rápido quando bate rápido no chão porque o impulso vai no sentido contrário. A variável “a” da fórmula de Newton usa o pensamento, é o pensamento ajudando o corpo, levando-o a aumentar a velocidade. Ao ter consciência (pensamento) de que ali vem um tigre, você pode pular rápido para longe e escapar do perigo. Também sentimos a força do ar, ao fazer movimento. A força do ar possibilita ganhar velocidade. De que maneira, se, quando queremos ir para a frente, não podemos ir tão rápido quanto gostaríamos? Vamos nos lembrar de que um pneu de carro gira tão rápido que parece parado. Quando queremos ir rápido, ficamos quase parados porque o ar nos empurra, opõe-se ao nosso movimento, o ar nos segura, sentimos a força do ar. Queremos ir rápido, o ar nos 53

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empurra, a terra faz a força centrífuga, de modo que o nosso corpo não consegue se mexer, mas dentro funciona – aqui reside o ponto principal da força do ar. Uma analogia para esse mecanismo pode ser encontrada no funcionamento das armas, das bombas. A bala do revólver precisa que o ferro a segure. O ferro a segura e o ar a empurra. Desse modo a bala se movimenta para a frente. O nosso corpo é uma arma. A força da terra nos joga para fora e rápido. É importante que o ar nos empurre no sentido contrário. A força de dentro está em oposição à força do ar que está fora, e isso é o que dá movimento. Sem resistência não há movimento. Do mesmo modo, muitas coisas na vida só se desenvolvem se tiverem uma resistência. Já sabemos que para o LaoQiGong a força é composta de três partes: a força da terra, a força do ar e a força do homem. Consideramos que essa teoria seria importante para a educação física. Sem levar em conta essas variáveis, as lutas costumam usar apenas a raiva e a força do músculo. O uso da raiva não é eficaz: esse é o sentimento de pior energia, por ser uma energia fechada. Os esportes usam as articulações e os músculos, que são partes da energia, mas apenas partes. Acreditamos que os esportes, as lutas, a dança, as artes ganhariam muito caso levassem em conta a força da terra, do ar e do indivíduo, em harmonia. Nós não queremos ser imortais, nós queremos ser pessoas, nossa vida é ar e terra, por isso precisamos pensar nisso, em todas as áreas do conhecimento humano. 54

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A luta Forças de fora e de dentro A luta faz parte da história do homem, desde sempre. A arte marcial é o resultado da experiência de luta pela sobrevivência. Em cada período da história da China, na formação de cada sociedade, o indivíduo criou métodos de defesa e de ataque para sua própria proteção. Precisamos compreender as bases dessa luta, aprender como ela funciona, o que pode ser questionado, qual é o nosso objetivo na prática. Nós queremos que a energia do corpo funcione. Já sabemos que é preciso considerar a dimensão de fora. Ar e terra são de “fora”. Usamos fora para treinar dentro. Usamos dentro para sentir fora. Nenhum dos dois deve faltar. Os praticantes da arte marcial, tradicionalmente, têm considerado duas possibilidades em sua prática, chamadas interna e externa. Para eles, a arte marcial interna é aquela que só usa a respiração, só trabalha com o ar. Para nós não existe essa separação por considerarmos tudo uma coisa só, ou seja, treinar “fora” é importante, treinar “dentro” também é importante. Vamos deixar claro que treinar dentro é focalizar as alavancas, as molas etc. Enquanto as forças de fora são as forças da terra e do ar. Interno e externo nasceram do budismo. Na origem, o externo foi chamado assim porque os primeiros praticantes saíam de casa, iam para uma academia. O kung fu shaolim é externo, por exemplo. 55

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Primeiro, o corpo ligado, sozinho, tem harmonia, isso é o que chamamos de interno. Depois, a harmonia com o “fora” chamamos de externo. A energia precisa passar pelo corpo, o corpo é ponte. Terceiro, o kung fu interno não quer ganhar mais força, mas se propõe a ajudar a passar a força da natureza. No momento do treino, é importante esquecer o “dentro” e só sentir o “fora”. O efeito é dentro, mas não se pensa nele, é resultado de fora mais você juntos, em harmonia. Assim dizemos que usamos “fora” para treinar dentro. Só “fora” pode nos mudar. Não se deve usar dentro para ajudar fora, como pensar na barriga, pensar nos meridianos, para conseguir algum efeito no treino. O trabalho é feito com o corpo em relação com o “fora”. Eventualmente, algo de dentro pode nos chamar a atenção, mas isso já é um resultado, e não o início do processo. Na luta, então, há três forças: da terra, do ar e do indivíduo. A força do indivíduo parece uma arma, uma máquina, uma alavanca, tanto faz. Na luta, a força do ar somada à do adversário é uma força, a força de fora, pois a gente não bate no ar, bate no adversário. Usamos a força dele, nos ligamos à força dele. Primeiro, precisamos que o peso do corpo tenha movimento. Segundo, é precisa ter molas. Terceiro, ondas. Mola é uma linha. A onda ocorre em várias direções. Precisamos acessar as três coisas ao mesmo tempo. Isso é lutar. Usamos também a força do adversário. A força de fora equivale à força dele somada à força do ar. Podemos 56

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dizer que a frequência da respiração do corpo, a frequência da terra e a frequência do ar precisam estar juntas, em harmonia. Diante de uma pessoa sentada, sem movimento, não podemos fazer nada. O outro em movimento tem uma frequência, você tem uma frequência, a Terra tem uma frequência. Com tudo junto pode acontecer uma luta. O bom lutador sabe como usar essas três forças, em harmonia. A luta não tem mais a mesma procura que tinha no passado. É provável que, quando o homem começou a ficar em pé, o corpo dele tivesse mais força, ele estava mais perto do animal. Hoje, podemos dizer que o kung fu está nas armas. O humano cresceu muito. Em alguns lugares ganhou muito, em outros perdeu. O pensamento ganhou muito com a ciência, o que não deixa de ser um tipo de força. O corpo perdeu a cauda, perdeu a força. Com o crescimento da ciência, o homem produziu armas, uma espécie de prolongamento dos membros. Gostaríamos que, com o desenvolvimento da cabeça, o corpo não perdesse a força, a energia. Recuperar isso é o nosso trabalho com o corpo. E, em relação à cabeça, queremos abrir canais, outras formas naturais de percepção.

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CAPÍTULO V

MEDITAÇÃO O que é meditação? Para o LaoQiGong, meditação não é a imagem de uma coisa, de um deus, de uma paisagem. Imagem é a mente em atividade. Entendemos que a meditação é alcançada na ausência de imagem, na ausência de pensamento. A meditação deve ser feita com o corpo todo trabalhando, preferencialmente em pé, na postura Zhan Zhuang. Esse é o nosso modo de meditar. O homem tem cinco sentidos comuns: visão, audição, tato, olfato, paladar. E sabemos que existe a possibilidade de fechar esses canais e abrir outros que possibilitam trazer novas informações da vida. No treino do LaoQiGong, buscase o fechamento dos cinco sentidos e o esvaziamento da mente. Como resultado da meditação, aparece o “outro sentido”. O corpo, ademais, percebido como um todo, é capaz de sentir fora de seus próprios limites. Isso também é meditação. A abertura do “outro sentido” torna possível acessar habilidades humanas diferentes, habilidades incríveis que estão lá, mas permanecem fechadas. Consideramos que o desenvolvimento dessa potencialidade é um caminho 61

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importante para o desenvolvimento do ser humano, na medida em que aumenta a inteligência – é também o que chamamos de continuar a obra do humano, conforme mencionado na introdução deste trabalho. Um exemplo dessa habilidade de que falamos aqui acontece quando algum parente está com problemas e você telefona para ele preocupado, como se sentisse à distância que algo não vai bem. Episódios como esse são relativamente comuns entre pessoas da mesma família porque elas costumam estar conectadas numa mesma frequência. Outro exemplo desse “outro sentir” é o que ocorre com os animais. Eles sabem quando vai chover, quando se aproxima uma tempestade, um terremoto. Nosso corpo também sabe quando o tempo vai mudar, apenas não damos atenção a isso. Hoje usamos apenas a ciência, as máquinas, para obter esse tipo de informação. Mas as pessoas do campo, muito ligadas à natureza, ainda conseguem ter esse tipo de percepção. Nós podemos sentir mais, saber mais coisas. Nós temos recursos para isso: em nossa cabeça há bilhões de neurônios, dos quais só usamos um pouquinho. Queremos acessar outras possibilidades. A meditação é praticada para desenvolvê-las.

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CAPÍTULO VI

SAÚDE “Aqueles que nos tempos antigos conheciam a maneira de conservar uma boa saúde, sempre nortearam seu comportamento do dia –a dia de acordo com a natureza. Seguiam o princípio do Yin e do Yang e se conservavam de conformidade com a arte da profecia, baseada na interação do Yin e do Yang. Eram capazes de modular sua vida diária em harmonia, de forma a recuperar a essência e a energia vital, portanto podiam se cuidar e praticar a maneira de preservar uma boa saúde.” (Princípios de Medicina Interna do Imperador Amarelo – Bing Wang. São Paulo. Editora Ícone, 2001, pág. 25)

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Está registrado no livro do Imperador Amarelo que seus antepassados usavam a arte marcial para curar doenças e aumentar a sabedoria. Em outro livro, da mesma época, está registrada a viagem do Imperador Yu, que viu pessoas fazendo QiGong, bebendo água de orvalho depositada sobre as plantas e jejuando. Na China, o Imperador Yu (também chamado de Da Yu) tem uma influência histórica igual à de Confúcio, Lao Tse e o Imperador Amarelo. Seu grande feito foi o de ter desviado as águas de um rio, trabalho que durou três anos; durante esse período, ele jamais voltou para seu palácio, apesar de ter passado três vezes na frente do mesmo. Diz a lenda que se machucou e que a cura de sua perna se deu de forma muito interessante. Depois de observar um grande pássaro (já extinto), que andava de maneira muito estranha – seus passos circundavam uma rocha, atrás da rocha havia uma serpente, o pássaro conseguiu mover a rocha e comer a serpente –, o Imperador Yu passou a imitar o andar do pássaro, curando dessa forma a sua perna. Esses passos ficaram conhecidos como os “Passos do Yu”. Os Passos do Yu são considerados movimentos milagrosos que usam o Qi das pessoas, do ambiente e do Universo. Depois do surgimento da religião taoísta, eles foram considerados a essência da arte marcial. Posteriormente, os monges taoistas, ao praticarem os Passos do Yu, acharam muitas semelhanças com o símbolo 65

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do Bagua, já muito conhecidos por eles. Na verdade, poucos conhecem os Passos do Yu, que, a rigor, podem ser considerados como o segredo da vitória nas artes marciais. As lutas feitas hoje têm como ponto principal a forma de andar. Quando assistimos a uma derrota, não é porque não há velocidade ou força, mas porque os passos estão errados, o que prejudica a liberação da força. Numa luta é necessário controlar a distância entre você e seu oponente. Perceber essa distância é o mais difícil e o mais importante. A história do passarinho, não sabemos se é verdade ou não. Mas há outra que pode ser comprovada. Tem um tipo de concha que sabe como comer o caranguejo. A concha circunda o caranguejo e ele fica parado, até morrer. A concha só pode comê-lo depois que a carne apodrece. Não sei o que ocorre, se é energia, química ou símbolos que o seguram o caranguejo e o fazem parar. Entre os animais há vários exemplos em que um dança e o outro fica parado. Parecem símbolos de caça. O que acontece, exatamente, não sabemos. Talvez na história de Da Yu, a relação entre o pássaro e a serpente seja parcialmente verdadeira, talvez não. O importante é que Da Yu viu o animal andar, e por isso fez o QiGong. Pode-se dizer que até hoje a ciência aprende muito com os animais. O andar do QiGong se caracteriza por ser mais natural. Em direção ao natural não se pode inventar nada, é necessário descobrir. Há muitas linhas do QiGong que não são nem natureza nem ciência. Sabemos que a química, a física, seja no Brasil, na China, na França, são sempre iguais, o que confere o seu valor. Mas a arte marcial 66

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seguiu um caminho em que parece que tudo é subjetivo, feito sozinho, não é natural. No Brasil e na China um cavalo corre da mesma maneira, porque é natural. O QiGong ficou diferente porque o caminho que percorreu, no mundo, não é um caminho natural. O LaoQiGong, conforme dissemos no começo do livro, propõe-se a descobrir o que é natural, a entender a ciência da energia. O treino precisa ser feito em pé, preferencialmente. É o natural, assim como em casa de passarinho ninguém fica sentado. O QiGong não deve ter nem 1% de subjetivo. Nada pode ser inventado. Quando começa a treinar, às vezes o aluno pensa: “Eu faço assim ou assim?”. Na verdade, não precisa se preocupar com isso, com o tempo o corpo conserta tudo sozinho. O subjetivo não pode ser conhecido, ao passo que o objetivo pode. Você pode, e eu também, porque somos iguais, temos a mesma estrutura, a mesma natureza. Assim, você pode chegar lá, não apenas o mestre pode chegar lá. O que é saúde? Saúde, a rigor, não é considerada como um efeito do QiGong. A saúde é vista como um estado normal. Os humanos não deveriam ter doenças, mas humanos têm doenças, agora mais do que nunca. Pode-se dizer então que agora a saúde parece importante. Se você é tranquilo, come de maneira equilibrada, descansa como se deve, dificilmente terá doença. Mas 67

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sabemos que mais ou menos 17% de toda população é doente. Um dos resultados do treino é que o praticante fique mais forte, tenha mais habilidade, mais força – a rigor, isso é saúde. Uma das formas de explicação desse resultado é o fato de que o treino do LaoQiGong acaba expandindo praticamente toda a pele do corpo, consequência natural da abertura das articulações que a prática possibilita, conforme vimos em capítulos anteriores. Sabemos que na pele se encontram as vias energéticas naturais chamadas de “meridianos” usados pela acupuntura, que, quando estimulados aumentam o fluxo energético e promovem a saúde. Assim podemos ver que dentro do nosso corpo existe médico, hospital, remédio, existe tudo para uma vida saudável, desde que a gente não atrapalhe a natureza. Podemos dizer que temos uma energia que cuida da saúde. Os animais, em seu meio natural, não têm médico, não têm ciência, mas também podem se curar. Antigamente, o povo chinês observava os animais, para saber que remédio tomar diante das enfermidades. Quando um animal machuca o corpo, ele sabe que planta comer para resolver o seu problema. Aproveitando a sabedoria do animal, o chinês começou a experimentar as mesmas ervas no ser humano em situações parecidas e a catalogar as plantas úteis. Isso deu origem à vastíssima fitoterapia chinesa, hoje em dia aplicada no mundo inteiro. 68

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O Imperador Amarelo disse a respeito da relação do homem com a natureza que o circunda: “A respiração do Universo é o melhor ar que existe”. Até agora, não achei outra ideia melhor que essa. Saúde não é igual a não ter doença. Saúde é uma força. Assim como nosso intestino precisa ter força, os dentes precisam ter força, o coração precisa ter força. Não se pode tomar água muito fria, comer muito sal faz com que a gente se sinta mal. É preciso comer menos, com o aumento da idade. Há uma série de regras de alimentação e de hábitos de vida necessários para proteger essa força chamada saúde. Muita coisa já é conhecida sobre o funcionamento do organismo humano de modo geral, sobre o que se deve e o que não se deve comer ou fazer. E muita coisa também pode ser descoberta individualmente ao avançarmos no treino do LaoQiGong, dado que a percepção do corpo aumenta. Aprende-se a saber do que o corpo precisa e demora-se mais para chamar o médico: a gente acorda o médico que está dentro de nós. Hoje em dia o ser humano se preocupa muito com a saúde, gasta muito dinheiro com hospital e com remédio, porque está doente. Agora as pessoas não conseguem dormir, não conseguem ter um hábito intestinal saudável, têm muitos problemas por causa do estilo de vida, da alimentação errada e pelo fato de viverem muito alienadas do próprio corpo. Antes as pessoas morriam em função das infecções. Agora é o estilo de vida, a alimentação errada que as matam. Cientistas já provaram que o humano pode viver 120 anos, 69

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pois há recursos para isso. E por que não vive mais do que os 70, 80 anos habituais? Esse é um assunto que nos interessa, a longevidade. É um grande tema, uma questão ainda em aberto para o humano. LaoQiGong e Acupuntura Para o pensamento chinês, o conceito de Yin e Yang é fundamental, é considerado uma grande regra da natureza. O Yin precisa estar para dentro, o Yang para fora. A frente do corpo é Yin precisa ficar para dentro. As costas são Yang precisam ficar para fora. Tudo na natureza é assim: nos peixes, nos animais, nas folhas. Precisamos usar a regra da natureza para saber o que é certo, o que é errado. É ela quem determina, não estamos inventando nada. Yin e Yang precisam estar em equilíbrio. O corpo precisa manter-se, ao mesmo tempo, relaxado e tenso, em equilíbrio. Yin para dentro, Yang para fora, relaxar para dentro e tenso para fora. Como um martelo, que na ponta tem de ser pesado e no cabo, relaxado, assim precisa ser a postura do corpo. Nas artes marciais, por exemplo, a mão precisa estar pesada, o corpo relaxado. E para a lança - a arma da arte marcial -, também vale a mesma coisa: a arma precisa estar pesada e o corpo leve. Para desempenhar bem outras habilidades humanas, como a música, por exemplo, também vale a mesma lei da natureza: O violino pesado, o músico relaxado. Para dentro relaxar, para fora tenso. 70

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Outra regra também precisa ser considerada: para cima é Yang, para baixo é Yin. Isso é a natureza. Mas hoje em dia, Yin e Yang andam bagunçados e assim, o Yin se desloca para cima, o que pode causar pressão alta, por exemplo. Nessas condições, da hipertensão, segundo o conhecimento chinês, podemos dizer que o rim está fraco e a cabeça doente. Confúcio disse: ‘o Céu está em cima, a Terra está embaixo’. Portanto, a ordem já está dada. Céu, Terra, e no meio estamos nós, os seres vivos. Já existe a ordem. A chuva cai em direção à Terra. Ela é a mãe que tudo acolhe. O pai, o Céu, quer energia para cima. Nos dias de hoje, a lei da natureza não tem sido mais respeitada, existe uma bagunça para cima e para baixo. Por isso há novas doenças. Por exemplo, numa noite dessas, ouvimos, estranhamente, um passarinho acordar e cantar às 4 horas da manhã, não nos deixando dormir. Isso é a desarmonia do yin e do yang. Em outras palavras, é a falência da ecologia. O ser humano tem hoje muitos problemas. A ciência explica a causa desses transtornos de outra maneira. Diz que o humano está diferente por causa da alimentação etc.. Nós temos outra forma de explicar: é a energia humana que quebra a energia da natureza e como consequencia, nada pode funcionar bem. O treino do LaoQiGong tem resolvido alguns problemas de saúde, que não se solucionaram pela via convencional. Por exemplo, uma mulher jovem tinha um problema no útero que a impedia de ter filhos. Após um ano e meio de treino, engravidou e agora já tem duas crianças. O corpo sozinho arrumou a energia. Outra moça não podia 71

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engravidar, embora não tivesse doença aparente. Treinou bagua por dois anos e hoje tem uma filha. Um rapaz com uma cifose acentuada melhorou bastante. Outro com tremor nas mãos e tic nervoso, também sarou do problema. A essência da Acupuntura, da medicina chinesa e do Qigong, é a energia, o Qi. É possível sentir o Qi treinando o LaoQigong. Pode-se dizer que medicina chinesa e Acupuntura são uma prática do Qigong. Acupuntura e Qigong. É difícil falar claro sobre isso. Primeiro porque nem todo mundo sabe de fato o que é Qigong. Há muitas linhas que fazem a respiração, e treinam Dan tian, como no Qigong taoísta. Outros fazem o Qigong sentado, como no budismo. Esses conceitos prendem o corpo e a energia da natureza que, não conseguindo funcionar, entra em desarmonia. Esses sistemas têm mais de 500 anos de existência. Muitos grandes mestres do taoísmo já disseram que esse sistema não estava certo. Não sou eu quem está falando. Um grande mestre já disse que era preciso treinar a percepção de que ‘não tem eu, não tem fora, tudo não tem’. E assim se colocou em posição contrária ao Qigong taoísta. Segundo, muitas pessoas acham que a teoria do Jing Luo (meridianos) é a teoria do Qigong, mas não é certo, porque isso é misturar duas ciências diferentes. Simplesmente não é a mesma coisa. Jing Luo é uma grande 72

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coisa para a medicina chinesa, é ciência. Ciência e LaoQigong não são a mesma coisa. Em primeiro lugar, para a ciência, quanto mais concreto, melhor. Mais claro, melhor. Buscam-se as partes menores da matéria, os prótons, os elétrons. Tudo isso é muito bom. Enquanto para o Qigong é o contrário, quanto maior, melhor. Por exemplo, se você quer treinar, você o fará juntamente com o Universo. Depois você pode pensar: ‘o Universo o que é?’ Sabemos que tem a família do sol, depois outras galáxias, e depois o que é? Nós não sabemos. ‘Não saber o que é’ faz parte da teoria do LaoQigong. Não se sabe o que é, não é claro, isso faz parte do pensamento do LaoQigong. E na verdade, não precisa falar claro, LaoQigong não é ciência. É só praticar de determinado jeito e ver o resultado, é o efeito que importa. Em segundo lugar, a ciência precisa da verdade, precisa de provas, se não, não é ciência. Ao passo que o LaoQigong se parece mais com filosofia, com religião. Não precisa de verdade, de prova, não pode provar nada. É algo com sistema próprio, com filosofia própria, não se pode misturar. Assim como na religião, se uma pessoa morreu pergunta-se ‘pra onde vai’? ‘Vai ao paraíso’, não precisa provar isso, basta acreditar. Em terceiro lugar, já falamos aqui que Acupuntura e medicina não são o mesmo caminho do Qigong. Por que? Primeiro porque a teoria é diferente. Medicina e Acupuntura 73

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precisam de, no mínimo, duas pessoas trabalhando, o paciente e o médico. Enquanto no Qigong treina-se sozinho, sozinho juntamente com a natureza. No Qigong, sujeito e objeto são uma coisa só. Por isso a teoria não pode ser igual. Em quarto lugar, o objetivo é diferente. A medicina quer, como efeito, eliminar a doença. E saber qual é a doença. Enquanto o efeito do Qigong não é só tirar a doença. Qigong quer que a pessoa e a energia estejam em harmonia. Com movimento e harmonia. Quando a energia não está em movimento, há um problema, a pessoa fica doente. A medicina chinesa fala que a dor acontece quando a energia não flui. Quando volta a fluir, não dói mais. Pode-se dizer que o Qigong mantém a saúde, e a medicina elimina a doença. E pode responder também, qual é a causa da doença. Qigong é importante para o médico saber qual é a regra de determinada doença. A medicina pode se dirigir diretamente para o paciente. Enquanto o Qigong deveria ir para médicos, pois o Qigong pode ensinar aos médicos qual é a regra da doença, qual é a causa não material de determinada doença. Na teoria do Qigong, a pessoa, a Terra, o ar (ou Universo) são o material. Terra, pessoa e Universo quer dizer: é preciso sentir a força da pessoa, a força da gravidade da Terra e a força de resistência do ar. Três forças mais uma, como ‘abcd’, as 3 são iguais e compõem uma coisa só, uma força só, a quarta força. A força da pessoa, a força da Terra e a força do ar, são uma força só. Esse é o material do LaoQiGong. Enquanto para a medicina o material é o paciente. 74

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A terceira coisa diferente entre aprender LaoQigong e aprender medicina é que o sistema não é o mesmo. Antigamente a medicina chinesa era como Qigong. Agora não é mais, é só habilidade. Agora medicina e Acupuntura usam o sistema da anatomia, da dissecção de cadáver. O cadáver é o material, cortar o cadáver é o sistema. Conhecem a doença usando essa idéia. O remédio usa essa idéia, cortar a pessoa, usar faca, tesoura. E assim, a medicina pode ter descoberto muita coisa que ajuda o ser humano. Mas o LaoQigong precisa do ser vivo. LaoQigong não usa faca, não usa tesoura, usa a vida. LaoQigong e medicina tem 4 pontos diferentes: teoria diferente, material diferente, sistema diferente, efeito diferente. Essas quatro diferenças podem nos ajudar a estudar Qigong e a medicina da Acupuntura. Tudo é importante, o que não se pode dizer é: ‘eu sou médico, eu sei QiGong’. Mas, apesar das diferenças, já falei outras vezes que medicina é mais próxima de LaoQigong, do que outras áreas do conhecimento humano, como a engenharia, por exemplo. E o médico acupunturista precisa saber LaoQigong. Por exemplo, na prática de inserir as agulhas, o acupunturista precisa estar concentrado no seguinte: O médico, a agulha e o paciente precisam ser uma coisa só trabalhando ao mesmo tempo. Podemos dizer que a energia do médico é o motor. A agulha é a passagem da energia, o instrumento, o caminho intermediário. O paciente é o receptor da energia do médico. Assim a energia do paciente pode voltar a funcionar. É como um sistema. Deve-se buscar movimentar a energia do paciente, colocá-la em harmonia. 75

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Assim pode-se dizer que a dor acontece quando a energia não flui. Hoje em dia não é mais praticada assim. Só se pensam em meridianos, quais são os pontos no paciente, só isso. Agora os acupunturistas têm somente habilidade, mas isso não é a energia da Acupuntura. Na verdade, na medicina chinesa, a agulha, o médico, o paciente, cada um representa 1/3 de energia. Agora só se pensa no paciente, e faltam dois lados a considerar: o do médico e o da agulha. Podemos dizer que o sistema de acupuntura é mais importante para o médico do que para o paciente. Na parte do paciente, pode-se pensar em meridianos e pontos. Mas o médico precisa treinar LaoQigong. Há, sem dúvida, muitos grandes médicos, que descobriram muitas coisas, e, mesmo cuidando somente dos meridianos e dos pontos, conseguiram ajudar muita gente. Mas não faltou uma parte. O melhor exercício para o médico acupunturista é o Laoqigong. As outras linhas de qigong já não conseguem fazer fluir a energia de modo adequado como faziam os antigos chineses. Como treinar LaoQigong para acupuntura, é um grande assunto. Para falarmos disso, usando a caneta e o papel é muito difícil. É preciso demonstração prática, muito tempo de treino. No entanto, deixamos apenas citado aqui lembrando que, primeiramente é preciso ligar a agulha e o médico, como se a agulha fosse parte do corpo dele. Ao treinar assim ele vai sentir que a agulha e o corpo podem ter força igual, em harmonia. 76

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E em segundo lugar, é preciso saber que a força da Terra, a gravidade, a força de resistência do ar e a força da pessoa precisam fazer o movimento ao mesmo tempo e levar energia para a agulha. Assim é possível sentir que a agulha pode ser mais pesada que o corpo. Como se a agulha fosse grande, ilimitada. Nesse estágio você terá a prova de que a sua energia já chegou na agulha. Para isso é preciso treinar muito o LaoQigong. Em terceiro lugar precisa sentir as condições das três partes do processo (paciente, agulha e médico) como uma única coisa. É preciso ainda lembrar de outra regra: treinar a forma curva, e a força reta. Usar triângulo (no corpo do médico) para fazer círculo, a alavanca para fazer círculo. Após muito treino da força reta para frente chega-se a um estágio em que a forma não mexe, só energia se movimenta. Depois de saber tudo isso, pode-se começar a estudar Acupuntura, pois isso é a base de todo o processo de cura, no modo chinês de encarar a doença e o tratamento.

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Seminário realizado em Osasco para Academias de Arte Marciais

Seminário de QiGong para Educação Física

Seminário na USP sobre QiGong

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Seminário sobre QiGong UNICAMP

Mestre Cai em clínicas na Alemanha e em Rondônia

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DEPOIMENTOS A seguir, vamos ler depoimentos de vários alunos que se prontificaram a fazer um relato breve da sua experiência com o LaoQiGong, para que se tenha uma ideia viva do resultado do processo que estamos tentando descrever neste livro. Lea von Hrabovsky, artista plástica, 77 anos Comecei a ter aulas com o mestre Cai Wen Yu em 2004, aos 71 anos de idade. Pulsos e joelhos ficaram fortificados. O desgaste das solas dos sapatos passou a dar-se por igual. O peso do corpo ficou mais bem distribuído. Atualmente chego a perceber quantos movimentos pouco lógicos faço. A consciência do corpo ficou maior. A evacuação melhorou. Quase não me resfrio. Era demais. A dispersão diminuiu. Sou mais produtiva, também inventiva. Tenho soluções práticas divertidas. Minhas pernas ficaram mais retas, bem menos curvas. Christian, analista de sistema Quando comecei a praticar diariamente o LaoQiGong, notei que minhas dores nas costas sumiram e minha coluna, segundo quem entende de massagem, se alinhou. A minha dança também melhorou muito depois do treino. Faço aulas de dança (forró) aos fins de semana e tinha muito problema com dores nos joelhos e com o meu equilíbrio. Agora, noto que meu 81

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joelho não dói mais e meu equilíbrio melhorou muito! Eu me poupo muito mais, no sentido de não dormir mal, comer mal e exagerar em qualquer atividade física ou de lazer (isso atrapalha muito a prática do QiGong.). Estou reparando em partes do corpo que nem imaginava que existiam (como a articulação do quadril) e me divirto muito com todo esse aprendizado. Gil Em relação à parte física, senti uma grande melhora de uma “dorzinha” nas costas, região torácica, que às vezes me incomodava. O incômodo melhorou bastante. Também percebi melhora na flexibilidade, realizando alguns movimentos que há muito não conseguia mais fazer. Também tenho a sensação de que meus golpes (chutes, socos, cabeçadas etc.) ficaram mais potentes. Quanto à questão energética e psíquica, tenho a sensação de uma boa melhora, inclusive no metabolismo e sistema imune. Costumo sentir muito sono, e necessito dormir um pouquinho durante o dia. Mas isso pode ser apenas um costume de família, não me incomodando desde que eu possa cumprir a quantidade de sono de que necessito. Como esclarecimento, estou treinando apenas os exercícios básicos de Zhang Zhuan, alguns aspectos do Yi Chuan, exercícios de respiração, flexibilidade e alongamento. Sem mais delongas, fico por aqui com muito Axé para todos! Um abraço!

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Maurício Eu comecei a treinar com 15 anos de idade, tinha a fantasia de aprender kung fu. Fui passando de academia em academia, de mestre em mestre, procurando aprender uma modalidade. Não tinha a preocupação se aprendia o certo ou o errado. Eu sempre esbarrava em algum problema e ia para outra academia, outra modalidade... Acabei treinando várias modalidades de kung fu, kendo, esgrima, jiu-jítsu, luta grecoromana, boxe, levantamento de peso, que foi onde eu acabei me machucando. Foi a última coisa que treinei, porque eu tinha a preocupação de ganhar força. Como tive a experiência de treinar com atletas de ponta na Rússia, percebi que alguns deles eram fortes demais, parecia que eu estava treinando com estátuas. Na China também senti a mesma coisa, percebi que faltava muita força em mim e eu comecei a me preocupar só com a força. Eu fazia exercício isométrico, levantamento básico, uma modalidade de levantamento de peso, e acabei ganhando muita força, só que era uma força que eu só conseguia usar até certo ponto. Por exemplo, eu ia fazer luta com os companheiros e percebia que conseguia travar a luta, mas, quando eu precisava relaxar para atacar, demorava muito tempo entre o relaxar e armar um ataque rápido.

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Foi aí que conheci o mestre e comecei a treinar QiGong, que eu já tinha começado a treinar com outro mestre. Eu estava um dia na casa desse outro mestre, e o mestre Cai apareceu por lá. Meu mestre na época disse: “ Você treina com ele”. Eu fiquei meio injuriado, mas depois entendi que foi a melhor coisa que tinha acontecido. Percebi que o mestre Cai tinha um conhecimento muito mais profundo do QiGong. Um dia ele estava me mostrando a força e disse que ia me mostrar 84

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como é. Ele agiu como se a gente fosse praticar Tou shou: eu fazia força para abaixar o braço dele e eu sentia a minha barriga ficar dura. Quanto mais força eu fazia, mais eu ficava na ponta dos pés. Eu não conseguia firmar os pés no chão e fazer força para baixo. Aí eu disse: “É isso!”. Eu tenho de treinar isso! Aí eu comecei a me dedicar 100% ao negócio. A média de treino destes 7 anos iniciais foi de cinco horas por dia, todo dia, para chegar à força que eu queria. Ainda estou no processo. Eu percebi que essa caminhada que fiz, de 2.500 quilômetros carregando 65 quilos, me deu a convicção de que eu estou com essa força. Noriko, 61 anos A prática do LaoQiGong com o mestre Cai resolveu um problema que tinha até alguns anos atrás. Eu sofria de uma dor na coluna, na região lombar, constante. Parecia que a minha coluna estava meio travada: eu sentia dificuldade em levantar da cama, sair do carro, me inclinar para lavar o rosto etc. Hoje em dia, se fizer algum esforço muito grande, é a lombar que vai reclamar mais, pois é o meu ponto fraco. Mas nem se compara ao que eu sentia antes. A prática do LaoQiGong me ensinou a tomar consciência da minha coluna e a exercitá-la.

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Fabio Rezende Já treino com o Mestre Cai há muitos anos, e quase não há comparação com o rapaz sedentário e sem energia que eu era com o que sou hoje. Costumava sofrer com dores nas costas, por causa de uma lordose adquirida após anos curvado sobre os livros e o computador, mas, depois que comecei a treinar LaoQiGong, esse problema, que me incomodava bastante, foi diminuindo até desaparecer. E nem percebi quando foi que as dores sumiram, de tão natural que foi o processo de recuperação; eu apenas me esqueci que elas existiam. Sem falar que agora tenho sempre uma motivação a mais para continuar evoluindo nos treinos, motivação esta que afeta positivamente muitos aspectos da minha vida. Ian Prado Smit Kitadai, Antes e depois Quando Cai Wen Yu apresentou-me sua arte, logo notei que estava diante de algo que o pensamento ocidental não estava acostumado. Sempre achei que kung fu era mais um sistema de exercícios intensos, complementar à formação cultural de alguém. Mas, depois da apresentação do QiGong de Cai Wen Yu, vi que o kung fu é uma forma de linguagem. Linguagem, no entanto, não significa aqui uma língua com a qual “conversaríamos” de forma instrumental com um estrangeiro ou programaríamos uma máquina. Linguagem significa aqui aquilo que revela em nós uma maneira de ser. Especificamente o kung fu, revela em nós uma maneira de ser 86

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aquele que luta. Daí a conotação científica atribuída ao kung fu por Cai Wen Yu. “Kung fu” para nós, no termo grego, deve ser entendido como um logos, ou seja, algo como “kungfulogia”. Agora, o treino não é mais uma relação de professor-aluno, com vista a passar certas formas de conteúdos conservados em manuais antigos, mas é um encontro de investigadores de uma linguagem. O treino desta linguagem demonstra seu rigor científico pela deslumbrante capacidade de transformação do corpo. Este rigor é garantido pela ênfase no treino da postura da árvore (ou Zhan Zhuang). Neste treino, Wang Zhiang Zhai, o fundador do estilo Yi-Chuan e importante intérprete dessa postura, atingiu uma enorme capacidade de luta, lutando por unificar as artes marciais internas. Neste projeto, ele buscou esgotar as possibilidades da postura da árvore, sempre tendo em vista a unificação das forças do corpo. Se tal unificação é possível, o desenvolvimento do golpe deve acompanhar tal unificação. Assim, o treino tende a certo caminho de desenvolvimento de luta corporal, o qual sempre tem em vista a relatividade da força como princípio. Isso mantém o treino livre de qualquer sistematização formal de movimentos, os quais gerariam efeitos equivocadamente idealizados. Atento ao princípio, garante-se um excelente valor de verdade no que se pensa e se treina neste estilo de kung fu, o Yi-Chuan. Se eu pudesse sintetizar tudo num eixo antes e depois, esse eixo seria a questão da linguagem. Antes, basicamente, não conhecia meu corpo. Estava perdido naquele discurso de que se deve simplesmente intuir o 87

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que se aprende sobre o corpo. Isso é insensível. O corpo, na realidade, começa a se fechar, atrofiar e embrutecer. Não supunha que o corpo tinha uma linguagem própria. Não supunha que tal linguagem constitui uma forma de conhecimento a ser investigado. Após o treino, os retornos são imediatos. O corpo se abre, e as tensões somem: relaxa. E isso, segundo o mestre, é a saúde. Conhecendo o próprio corpo, ganha-se uma nova sensibilidade. Para efeitos físicos que tanto custamobter, o treino oferece opções: corrigir postura, trabalhar a respiração, o coração e etc. Lucia Ribas, 44 anos, professora universitária. Treino há dois anos e meio. O QiGong, trabalho com a energia, me fez ter um contato maior com os processos alquímicos que acontecem no meu corpo, além de ter-me aberto para uma vasta experiência de aprendizagem com o Universo. Esse Universo está aberto para quem quiser contatá-lo e absorver seus milésimos registros através da energia descendente do Céu e ascendente da Terra. Dou parabéns ao Mestre Cai, que carrega consigo essa tradição milenar e pura, possuindo carisma, seriedade e precisão ímpares em seu trabalho

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Vera A sutileza da relação mestre e aluno é difícil de ser descrita em palavras. No entanto, algo que é muito aparente e surpreendente no meu contato com o Mestre Cai é a capacidade que ele tem de me manter em pé. Sim, literalmente, me manter em pé. Muitas vezes, o peso do ar atmosférico e a densidade dos pensamentos que vagueiam pela mente me colocam para baixo e me fazem sentar num parque onde somos frequentadores assíduos. E lá ele surge, com uma saudação, um sorriso, sua fala encorajadora que funcionam como uma saudável medicina. Alan Zanini, 33 anos, policial rodoviário federal, bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais e acadêmico de Educação Física. Treino há oito anos (com intermitências) de treino. Parto da crença de que o objetivo da vida é o aperfeiçoamento, para o qual o tempo é fator determinante. Prolongar o tempo de vida amplia as possibilidades de experiências engrandecedoras. Assim, a saúde deve ser preocupação básica do vivente. Além da longevidade, saúde compreende vigor físico e emocional, e DISPONIBILIDADE de espírito para encarar os obstáculos com a alegria de quem vê neles oportunidades. É essa DISPONIBILIDADE e alegria que sinto nos períodos em que consigo treinar o LAOQIGONG. Quando as urgências da vida fazem-me sacrificar por períodos o tempo do kung fu, são 91

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justamente os momentos em que a imunidade orgânica baixa e ao mesmo tempo aparece o desânimo. Treinar tornou-se então um vício. Não fácil e passivo como o de ver TV. Antes um vício como o de subir a montanha, cujo prazer está em sentir-se capaz a cada metro, fortalecido na maior força do ser humano: a da vontade. Treinar é difícil, exige esforço, mas repercute como uma “desfragmentação diária de disco”. Tudo funciona melhor: o sono, o intestino, o brilho da pele, a serenidade no olhar e no pensamento. O LaoQiGong significa para mim uma técnica primorosa de autoconhecimento e de autocultura”. Cinira, (Turma do Bosque - Campinas) 59 anos A experiência da prática do LaoQiGong nos últimos três anos levou-me a: Maior conscientização corporal, favorecendo a correção de vícios posturais e o uso do corpo de forma mais adequada nas atividades da vida diária, com consequente diminuição de dores. Descobrir que por meio do corpo podemos expandir todo o nosso ser e entrar em comunhão com todo o Universo e toda a criação. Saber que um corpo mais solto e flexível pode nos ajudar a flexibilizar a mente e o espírito, permitindo-nos até superar bloqueios e nos tornarmos pessoas mais abertas para aceitar e lidar melhor com a diversidade. 92

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Por meio da postura básica do LaoQiGong, pude dedicar-me à prática da meditação de forma mais disciplinada e concentrada.

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Fabinho, 29 anos Treino há seis anos, sou músico profissional e professor de música. Descrever o que seja LaoQiGong não é uma tarefa fácil. A primeira definição que tive quando comecei a treinar foi que se tratava de um “kung fu interno”. Bom, e o que vem a ser um “kung fu interno”? Após anos de treino, o que vai ficando evidente é que a razão e a ciência não abarcam toda a realidade. Há outra parte da realidade que está aqui para ser tocada, mas que está ao mesmo tempo atrás de um véu que se remove aos poucos, conforme se avança no treino. É nessa lacuna de nossa vida que se encaixa o treino, nessa parte intuitiva de que o mundo que vemos é apenas uma parte do todo. As novas habilidades alcançadas com o treino não nos torna super-heróis. Antes nos mostra o que é a realidade e como crescer dentro dessa realidade. Conhecer a Terra e o Ar. Parece que não, mas há muito de nosso corpo que não conhecemos e muito a ser explorado. Shifu3 sempre diz que nosso objetivo é recuperar nossa força animal, perdida durante nosso desenvolvimento como espécie, e aliá-la com nosso intelecto humano. Ou seja, harmonizar o animal com o racional. O objetivo é bonito, mas não é fácil de ser alcançado. A natureza do treino nos deixa frente a frente com nosso maior 3 Shifu é a maneira familiar de chamar Mestre Cai, vem do chinês “Mestre” ou “Pai”. 94

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adversário nessa vida, nós mesmos. E se conhecer nem sempre é prazeroso. Há muito lixo que acumulamos com o passar dos anos, muitos conceitos, preconceitos, sentimentos, infelizmente todos sem utilidade. “Joga lixo fora”, ouvimos muito durante o treino e disso não podemos esquecer nunca. Um dos aspectos mais interessantes do LaoQiGong é que ele é prática antes de ser teoria. Não há uma receita-teoria para como “sentir” a “energia”, sente-se naturalmente. E desse sentimento vem a descoberta do corpo, do mundo, desse sentimento vem a saúde do corpo, o conserto do que está errado ou quebrado. Tenho a impressão de que nos dias atuais a humanidade vive sob o preceito de que tudo é alcançado facilmente, inicia-se algo hoje e daqui a poucos dias alcança-se a conclusão daquilo. Sou obrigado a dizer que isso é mentira. A construção do conhecimento, o desenvolvimento do treino levam anos. E são esses anos que nos trazem amadurecimento e aprofundamento no conhecimento. Viver é isso, é buscar o que te faz feliz. E essa busca exige coragem e perseverança. Viver é como uma barca que é conduzida pela correnteza do tempo. Não temos controle total sobre a barca, mas conseguimos dar nossa contribuição ao seu movimento. E dito tudo isso segue minha definição atual de LaoQiGong, que é ao mesmo tempo o desafio e o tesouro: “Conhece-te a ti mesmo”. Iniciei meu treino com o Mestre Cai em 2003, como parte de um grupo de universitários interessados em Arte Marciais. Éramos todos praticantes de luta, e muitos de nós eventualmente desistimos para nos dedicarmos exclusivamente ao treino de Zhang Zhuang. Os primeiros sinais de resultado 95

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foram físicos, com uma melhora considerável no relaxamento e no alinhamento do corpo. Essa melhora foi visível em todos nós. Logo em seguida, pude perceber em mim uma tranquilidade mental e emocional. Surgiu, ao longo do tempo, uma sensação de leveza, como se as coisas fossem muito ligadas umas às outras. Também senti uma hipersensibilidade ao estado emocional e físico das pessoas à minha volta. O treino de Zhang Zhuang também mudou muito minha noção de saúde e trouxe à tona questões emocionais, físicas e espirituais que outrora não me preocupavam ou de que eu não tinha consciência. Essas percepções foram em muito confirmadas em outras atividades pelas quais tenho interesse. Percebi que o estudo do meu instrumento musical ficava distinto principalmente nos dias em que treinava. Percebi melhora nas minhas sessões regulares de acupuntura, como se meu corpo respondesse melhor ao tratamento. Eu me percebi mais sensível aos alimentos e às bebidas que ingeria. Em minha opinião, essas sensações estão diretamente relacionadas à quantidade de tempo que dedico aos treinos individualmente. Luiz Fernando Bertolucci, profissional de Rolfing®

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anos,

médico e

Treino LaoQiGong há três anos e meio.Minha experiência com o treino de LaoQiGong tem sido muito positiva. A prática tem proporcionado bem-estar físico e também emocional. A proposta de buscar uma qualidade de movimento natural me parece muito adequada e se encaixa em minha 96

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busca pela compreensão e pela experiência do potencial autorregulador do organismo. Isso também combina muito bem com minha ocupação: trabalho com um tipo de terapia manual (Rolfing®) e vejo muita congruência entre os princípios de ambas as práticas. Geisler Quando comecei a treinar com o mestre, meu interesse era o QiGong. Porém, com o passar do treino descobri que algumas ideias que tinha sobre o QiGong foram quebradas, até hoje continuam sendo quebradas. Antes de treinar com o mestre Cai, praticava Shaolin, estilo serpente. No começo foi difícil ficar naquela postura por algum tempo, pois estava acostumado a formas de treino físico como flexões e outras atividades. Eu chegava no domingo para treinar e lá vinha ele, arrumava minha postura e me deixava lá um bom tempo, depois fazia a caminhada. No começo eu pensei: “Esse chinês está me enganando”. Mesmo assim, não abandonei o treino. Mas sempre pensando, sempre lutando comigo mesmo para permanecer naquela postura. Com o tempo fui percebendo que tinha algo especial nesse treino, começou a ficar interessante, mas para isso demorou algum tempo. Agora, quanto mais eu treino, mais dúvidas e ideias aparecem. Então chega o mestre e tira minhas dúvidas e quebra minhas ideias. E assim vou mudando e descobrindo coisas. Sei que para treinar QiGong é fundamental confiar no mestre.

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Mestre Cai Wen Yu

Heiko Roschke, fisioterapeuta e professor de artes marciais. Começei a treinar artes marciais aos 11 anos na Alemanha e hoje tenho 41 anos e moro no Brasil. Experimentei diversos estilos de kung fu em vários países até encontrar Mestre Cai, em São Paulo. Ao conhecer o Mestre, toda a experiência adquirida mostrou-se insuficiente. Todo o tempo de prática foi por mim questionado em relação ao que de fato é o kung fu. Não mais eram importantes a força, a luta e a imagem produzida pelos movimentos corporais... Era algo mais: a verdadeira essência. É difícil traduzir em palavras a mescla de emoções e sentimentos vivenciados. Mais de duas décadas de prática foram abandonadas após ter conhecido Cai. Meu corpo machucado respondeu quase que de imediato aos efeitos do QiGong. Harmonia e equilíbrio passaram a ser inspirados e expirados a cada movimento durante o treino e, principalmente, nas posturas sem movimento, ou seja, estáticas. Nestas posturas apenas visivelmente o corpo não se mexe, porém o real efeito é o oposto da inércia. Eu me mantenho fiel às orientações de Cai. O caminho foi árduo e longo, mas necessário para que eu pudesse reconhecer o verdadeiro Mestre.

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José Francisco B. Jr., analista de Sistemas. Treino há sete anos. Em todo esse tempo eu aprendi a perseverar no treino, a descobrir tanto a parte física do meu corpo como, principalmente, a psicológica. Isto teve consequências diretas em minha vida: de como encarar o mundo e como aprender e crescer com os desafios encontrados. O resultado não poderia ser outro, eu me sinto feliz. Marcelo Cardozo Demarco, 48 anos, servidor público (médico-veterinário) Treino Xing Yi desde 1990. Treinei com Heiko de maio a novembro de 2008. Tive apenas um contato com Mestre Cai, mas certamente nos poucos dias que passamos juntos minha forma de praticar o Xing Yi Quan mudou. Aprendi com o Mestre na sua maneira de agir, de observar, de comer, de falar (no pouco que pude conversar com ele) e na forma de demonstrar e vivenciar as práticas de LaoQiGong e Bagua feitas no seminário. A cada dia que pratico, sinto que os ensinamentos do Mestre ficam mais claros e já não são mais parábolas a ser compreendidas e sim “caminhos a ser percorridos”. As montanhas já não parecem intransponíveis, já é possível visualizar as trilhas que devem ser seguidas para chegar ao cume. Não posso deixar de falar de meu professor, Heiko Roschke, que muito me ajudou nessa “descoberta de mim 99

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mesmo”. Na avaliação e no reconhecimento de “minhas capacidades e de minhas potencialidades”. Usando as palavras de Heiko, troquei o Fogo pela Água. Admiro muito a relação do Mestre com Heiko, onde me parece existir o carinho e o respeito de um Pai com seu Filho. Espero sinceramente que em algum momento desta minha rápida passagem pela nossa Mãe Terra eu possa ser capaz de dar, e receber, o mesmo carinho e respeito àqueles que comigo convivem. Márcia, 49 anos, engenheira de segurança Venho treinando o LaoQiGong há cerca de um ano e me sinto menos ansiosa, mais concentrada e consequentemente com melhor qualidade de vida. Quando conheci o LaoGiGong fazia uso de paroxetina (Pondera) de 30 miligramas e, graças a Deus, hoje já reduzi para 0,5 miligrama a cada dois dias. Paulo Há estações em que eu treino, noutras fujo. Quando volto, aprendo do princípio, mas não é no mesmo lugar, é adiante. Meus movimentos têm-se tornado diferentes: o modo como ando ou como carrego objetos, com os braços curvos, quadril dominante, os passos fundos na terra. Penso se agora ando tão distintamente quanto o mestre, o qual percebo entre as pessoas do parque pelo modo como se move. Ainda não, mas o caminho deve ser o mesmo. 100

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A cabeça é puxada pelo céu, os braços pelas árvores ao redor. Descobri isso, aprendi o equilíbrio e junto cansaço, doença, antibióticos. Três ou quatro meses pensando no fim... depois um reinício: o chão é mole! Esquece árvore, esquece braço: é como um trampolim! Mas, daí, junto, a enxaqueca. Dizem que QiGong faz jogar fora tudo de ruim. Eu disse isso, e o mestre saiu rindo. Fabiola Luz Treino LaoQiGong há 5 anos. Creio que o meu entusiasmo por essa prática já está explicitado no prefácio. Gostaria apenas de citar duas passagens marcantes que experimentei até agora. A primeira delas aconteceu no segundo ano de treino. Em determinado momento, passados mais ou menos 30 minutos na prática do ‘andar’, percebi que minha língua se levantou em direção ao céu da boca, sem que eu houvesse determinado. Na ocasião, o mestre esclareceu que se tratava de um sinal de que o corpo, naquele momento, experimentava o todo. Desde então, a posição da língua passou a ser uma espécie de guia a me sinalizar a postura correta. A segunda experiência aconteceu recentemente. Era um dia tranquilo, meu corpo estava descansado, treinava o Zhen Zhuang. Beirando os 50 minutos na posição, de repente, deixei de sentir o corpo e experimentei uma espécie de ‘nada’. Isso é bem difícil de descrever. Digo que a sensação que mais se aproxima, chama-se ‘paz’, e é muito bom. 101

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1 – Foto acima direita e esquerda – Seminário Uruguai para Médicos e Artistas. 2 – Foto central direita e esquerda – Seminário Argentina 3 – Foto inferior esquerda e direita – Seminário Ballet de Dança ensinar QiGong para dançarinas.

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CAPÍTULO FINAL

AS FASES DO TREINO Antes de descrever as fases do treino, vamos falar de alguns conceitos importantes, de um pouco da história e dos tipos de QiGong. O primeiro conceito importante para o que vamos conversar aqui diz que o crescimento se dá para a frente e em círculos, em espiral, melhor dizendo. Os processos da vida e da natureza andam para a frente, assim como a primavera desse ano foi diferente da do ano passado. Podemos dizer que crescer é estar em sintonia com círculos que andam para a frente. O segundo ponto refere-se à união dos contrários. Todos sabem que tudo tem dois lados, é necessário saber a distância certa entre os opostos. Por exemplo, um porcoespinho tem as conhecidas hastes no próprio corpo, cortantes à aproximação de outro animal. No clima frio eles precisam se aproximar para reter calor. Para isso, fazem muitas tentativas, até encontrar a distância ideal. Do mesmo modo, as brigas são comuns entre amigos, são como motor da energia de estar junto. Compreendemos assim que manter duas forças opostas é conquistar outra força distinta das partes opostas, exemplificada pelo calor dos porcos-espinhos e pela conservação da amizade. 103

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O terceiro ponto diz respeito à eterna transformação que se pode observar na vida. Antes que se esgote uma fase, o broto da fase nova já se encontra lá. É dentro do velho que nasce o novo, dentro da primavera existe a semente do verão. Nessa direção, a filosofia diz que as coisas não podem ser analisadas como objetos fixos, mas em movimento. E que não existem isoladas, independentes, mas como um todo coerente e interligado. O método dialético da filosofia fala da “ação recíproca”, ou do modo como tudo se relaciona. Assim, o fim de um processo é sempre o começo de outro. A chance é a negação da velha coisa. Podemos dizer que a chance ocorre no momento da virada entre o velho e o novo. Isso é o que se chama de oportunidade. Para efetivarmos uma coisa, é necessário conhecer a natureza. Caso contrário, você pode ter iniciativa própria, mas, se não é o momento, não há chance, não há oportunidade. Um pouco de História Até 2 mil anos atrás, o QiGong era natureza, harmonia, só se preocupava em manter a saúde, em tirar a doença. Por isso a prática era honesta: cada ação, cada movimento eram praticados com seu propósito definido, buscando um efeito específico. As pessoas só queriam saúde, longevidade. Por isso treinavam certo, o assunto era claro, definido. Esse foi o início do QiGong. De 2 mil anos atrás até agora, a coisa progrediu de modo diferente, como era de esperar que ocorresse em algum momento, pois a negação do primeiro início é uma lei 104

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natural, é crescimento. E encontramos o que podemos chamar de “a segunda fase do QiGong”, que permanece até agora. A terceira fase ainda não chegou, mas sabemos que essa segunda fase já contém a semente da terceira. A fase atual, a segunda fase do QiGong, agregou muita coisa errada. A religião – em particular o budismo e o taoismo – incorporou o Qigong, que antes era uma prática das pessoas comuns que buscavam saúde. Budismo O budismo nasceu na Índia, mas cresceu também na China. Sabemos que quando Gautama morreu, o budismo se separou em “grande budismo” e “pequeno budismo”. O “grande budismo” diz que não existe forma, não existe ideia, não há budismo. São afirmações profundas e difíceis de entender. Por isso o grande budismo, em 2 mil anos, não é forte. Poucas pessoas acreditam, poucas pessoas treinam no mundo. Já o “pequeno budismo” tem uma teoria bonita, uma prática bonita, mas não é um bom caminho. Por isso na Índia já diminuiu muito o número de seus adeptos. Eles mesmos dizem: “Temos 96 caminhos ruins de budismo”. Sakiamuni (Sidarta) queria ajudar o ser humano a sair do “mar de sofrimento”. Ele sozinho sofreu muito. Certa vez, quando tinha fome, Gautama comeu carne e quase morreu. Ele disse: “Agora eu sei o que é o mar de sofrimento”. Os budistas não podem comer carne. Budismo não é forma. 105

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O taoismo diz que há 3 mil maus caminhos. Sua prática é bonita. A virtude do taoismo foi de, desde o início, experimentar. Na prática do QiGong, a gente treina, mas não sabe qual é o caminho certo. Quando você quer comprar um carro sabe qual é o melhor, qual é o mais bonito. Quando quer treinar Qigong, não sabe, com certeza, qual é o correto. Na segunda fase, o QiGong quase morreu. A terceira fase começa a se levantar agora. Essa é a chance para o LaoQiGong. Começa em quase todos os países, hoje, um tipo de fervor em relação às artes marciais. Sabe-se que atualmente, no mundo, 180 milhões de pessoas treinam tai chi chuan. É provável que algumas dessas pessoas treinem certo, mas a maioria faz apenas uma coreografia bonita. Nós queremos ajudar o humano. Às vezes uma pessoa quer mudar o modo de pensar, mas não consegue porque precisa mudar o cérebro, não pode só mudar o pensamento. Conforme dissemos na introdução deste trabalho: a evolução dos humanos ainda não terminou, ainda há muito a mudar. Tipos de QiGong O QiGong abarca mais de 1.500 tipos. Grosso modo, porém, podemos dividi-lo em dois grandes tipos. Um desses dois tipos busca a imagem. Focaliza a respiração e o pensamento na busca da energia, procura fazer o pensamento puxar a energia. Não consideramos esse um bom caminho, mas não é tudo errado, é o ideal. 106

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A psicologia diz que o pensamento é uma função do cérebro. Se não há cérebro, não há pensamento. Mas, se tirarmos a cabeça, a energia não desaparecerá. Esse tipo de QiGong usa só imagem, só a ideia. E isso é somente uma parte do corpo. Sabe-se também que o pensamento reflete o mundo objetivo. Se não há mundo objetivo, não há pensamento. A psicologia já provou isso. Para fazer QiGong, a rigor, não há forma, não há ideia, não há si mesmo: ele é imaterial. Pensar vem primeiro ou existir vem primeiro? O QiGong, no passado, quase derrubou a filosofia e sua divisão entre mundo concreto e abstrato que trazia como corolário a discussão de que existir viria antes de pensar. Na China Antiga registrava-se uma série de experiências de atravessar a parede, atear fogo com o pensamento em um material qualquer. Hoje se sabe que isso era mentira, ilusionismo, teatro. Algumas pessoas até hoje, usam QiGong com essa ideia. O LaoQiGong A prática do QiGong não pressupõe um sistema, uma ideia. No treino de QiGong o material é você. É diferente da medicina, onde o material é o outro, o paciente. A religião também busca isso, para ela o foco também é você. Ela se preocupa em como sair do “mar de 107

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sofrimento”. Por isso podem ser úteis para nós as quatro regras do budismo: 1. considere que não existe o “eu”. Quando sinto o “eu”, já tenho egoísmo, já entro no mar de sofrimento. Se não existe um eu, não há idade, não há pessoa. O artista, como um cantor, também precisa ser assim: quando cantar, não pode pensar no que as pessoas estão achando, não pode se preocupar com o público. Ao treinar é igual: não pense na respiração, respiração não é você. Não queira que o pensamento puxe a energia. Ao pensar na energia, já existe separação, você já entra no “mar de sofrimento”, já está em mal caminho. Precisamos saber que não há forma, não há algo ideal, não há “eu acho”. Existem, sim, critérios. Quando avaliamos alguém treinando e dizemos que está bonito, ou que houve progresso, não se trata de um “eu acho”. A avaliação é feita baseada em critérios. É preciso levar sempre em conta o que é o material para nós. A apreciação deve considerar a terra, o ar, você. Esse é o material que nos interessa. Observamos sempre como o seu corpo está ligado num todo harmônico, como a terra puxa você, como se liga com o ar. A rigor, em última instância, avaliamos a influência do Universo sobre nós. Agora vamos detalhar os critérios para avaliação do rendimento do praticante de LaoQiGong. Pessoas que treinam há muito tempo querem saber como podem avaliar o seu treino, se progrediram ou não, o que precisam fazer para ir adiante. Esse é um assunto importante. 108

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Vamos dividir o processo em fases, a que chamaremos de inícios porque, a rigor, são verdadeiros começos a cada etapa. Em cada início avaliaremos: como o corpo sente, como o pensamento se comporta, quais são os problemas, como continuar. Primeiro início Consideramos o primeiro início o período que vai de um mês a seis meses de treino. O iniciante treina dez minutos, 20 minutos, os músculos estão tensos, a respiração é difícil, os ombros doem, a articulação dói, as pernas doem. Alguns têm menos problemas, mas, no geral, não se sentem muito confortáveis. No plano do pensamento, observa-se uma espécie de paixão. Só paixão: quando o iniciante treina, tem medo de treinar, teme a dificuldade. A paixão dá lugar à dúvida e, nesse momento do treino, é provável que 70% desistam. Perdem a paixão e se instala uma dúvida, que acaba por vencer a certeza inicial, na maioria das vezes. Podemos nos perguntar qual é o problema. A questão é que o pensamento quer relaxar, mas o corpo não consegue. A cabeça quer uma coisa, e o corpo não obedece. É como na analogia do cavalo e da carroça, sempre citada no budismo. Se o cavalo não anda, você bate no cavalo, e não na carroça. O cavalo pode obedecer e andar mais rápido, já a carroça quebraria se você continuasse batendo. O pensamento é o cavalo, o corpo a carroça. 109

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Então, é fundamental desenvolver a coragem, a confiança, a paciência. Na falta de qualquer um deles, o praticante desiste do treino. Na verdade, no desenvolvimento de outras habilidades ocorre o mesmo. Se você estuda música, no começo o som não sai direito. Então é necessário ter coragem, confiança, paciência. Segundo início Chamamos de segundo início o período que vai de seis meses a dois anos ou 3 anos, mais ou menos. A partir de agora, já podemos fazer a ressalva de que, quando eu digo seis meses ou dois anos, não me refiro à idade de treino, mas à idade do kung fu. A pessoa pode treinar durante apenas um ano e pode chegar à idade de três anos; o oposto também se observa, um aluno pode treinar seis anos e se encontrar no segundo início. A idade do QiGong depende da pessoa, da natureza de cada um. A essa altura, o corpo começa a expandir-se. Os músculos se soltam, abrem. O corpo mudou, algumas partes já estão ligadas, braços ou pernas. As partes referidas aqui não equivalem às partes de outros esportes, são as partes do QiGong. Observamos também que o lado yang cresce com mais facilidade, o yin com menos. O lado yang expande-se primeiro, o yin dos dois lados precisaria crescer também, mas geralmente leva de dois a três anos para crescer. Yin e yang correspondem a uma regra da natureza. O lado yin dificilmente é sentido. Gilberto, um aluno de oito anos de 110

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treino, já sente uma espécie de pele invisível que lhe sai dos braços até o chão, como uma asa de morcego. No segundo início, a paixão muda para interesse. Interesse em QiGong. O corpo quer treinar, sofre um pouco, mas você está feliz. Só o corpo está cansado. Como uma criança brincando, você não se importa com o cansaço. A criança tem interesse por tudo e isso é mais importante para ela do que todo o resto. Nesse estágio, o pensamento tem pressa. Esse é um problema, aqui entra o “mar de sofrimento”. E é preciso ter paciência, estar tranquilo e saber que o interesse já é efeito do treino, é uma possibilidade de sair do “mar de sofrimento”. A essa altura, você mal ganhou um benefício do treino e já quer outro. Mas não se pode ter pressa. Eu sempre digo que é importante ser shagua, um bobo. Nessa fase, quanto mais shagua, melhor. Quando alguém diz “faça isso”, deve-se responder “está bem, eu faço”. Se você for um grande shagua, terá um futuro interessante no QiGong. Não se compare a ninguém, sinta-se um bobo, apenas treinando, fazendo o que tem de ser feito e pronto. Se não tiver essa disposição, não poderá crescer no treino. Se você não entender o que é QiGong, acate o fato: o aluno precisa ser honesto. Ser shagua é ser honesto. O bobo tem muitos amigos. O problema nessa fase é que as três partes não conseguem se ligar. A essa altura do treino, no máximo ligam-se duas partes. Como a parte de cima e a parte de baixo não conseguem se ligar, o corpo apresenta grande pontos em que a energia não passa. É preciso mudar o cérebro. 111

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Nosso corpo é como uma rede com muitos pontos, todos ligados. É preciso abrir esses pontos. Nosso treino quer isso. O taoismo diz que é difícil a energia passar pelo joelho, por exemplo. O terceiro problema ocorre quando, a essa altura do treino, o aluno machuca o corpo. Quando sente determinado lugar fatigado, a continuação do treino acaba machucando ou aumentando mais o desconforto. Como treinar, então? É preciso usar o fora para treinar o dentro. Use o fora, como no exercício de entrar no rio, citado anteriormente, e a água consertará você. Pense em lá fora, entre no rio: a água envolverá você, ela vai mudar você. O pensamento querendo o lá fora, o efeito será a mudança do corpo. Terceiro início De quatro a seis-sete anos de idade de QiGong. O corpo sente que os membros já têm energia, sente que ela vai para a barriga. É um todo integrado, belo, como uma bola. Primeiro ponto: o corpo é sentido como duas salas, duas cavidades, uma embaixo (abdome) e a outra em cima (tórax). Antes, no máximo, sentiam-se os braços ligados na coluna. Segundo ponto: aqui já aparece o morcego, isso é a força da terra. Terceiro: já se sente abrirem-se as grandes articulações, que são tornozelo joelho, quadril, nuca, cabeça. É possível 112

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abrir tudo, tudo tem força para separar-se. Antes sentíamos o corpo todo ligado. Agora, sente-se o todo, mas também as partes. Antes tudo era duro, agora já se separa, torna-se flexível, como se a parte e o todo se misturassem. Quarto: agora você sente a respiração cheia. Na verdade, todos tínhamos esse sentir. Dentro já se liga com o fora, fora já se liga com o dentro, já se constata isso. Ao fazer Zhang Zhuan, parece que o umbigo liga-se com o lá fora, que existe esse contato. Se você sente lá pesado, percebe que aqui está leve. Se quer que lá fora esteja leve, precisa sentir que aqui está pesado. Quinto: você sente que algo puxa sua cabeça, parece estar pendurado. É preciso sentir a raiz da cabeça. No humano, a raiz está acima, conforme dissemos anteriormente. As dançarinas são treinadas para sentir isso e conseguem, só não têm a compreensão, a teoria para explicar. Também podemos dizer que parece haver uma pedra grande na cabeça. Sentir-se pendurado ou com uma pedra grande na cabeça são coisas diferentes. Às vezes, a metade puxa você e a outra metade empurra. Isso é “esticar e dobrar”, é a essência do esporte. Isso é a raiz do humano. Sentir-se pendurado é importante. No terceiro início, esses dois movimentos se misturam. Também se pode perceber a dinâmica entre o esticar e o dobrar. O esporte, de modo geral, precisaria levar isso em conta. Precisaria saber que, ao se lidar com a força em harmonia no Universo, é preciso esticar para treinar o dobrar. E dobrar para treinar o esticar. Que a forma precisa ser curva, e a força reta. Esse é a essência do esporte. Nesse 113

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início pode-se perceber que dentro o treino é energia, fora é pele. Você sente que a pele parece tensa, parece que é pesada e que puxa você. Cinco: o rosto tem movimento. Parece que pode fechar e abrir, mesmo que não se tenha intenção de fazer mímica facial. Seis: parece ser possível dividir do corpo com o pensamento. Agora pensamento e corpo começam a ligar-se. O pensamento pode dirigir o corpo. Agora o pensamento é crença, é fé no LaoQiGong. Nessa fase o interesse pode mudar: infelizmente o praticante pode interromper o treino. Esta é uma sequência natural, pela qual todos os praticantes passam: paixão, interesse, crença. Quando se chega a esse início sente-se autoconfiança, às vezes arrogância. Nesse início, você se sente chefe do Universo, sente que o Universo é pequeno. O taoismo diz que você é o Universo, o Universo é você. Mas nesse início você se sente mais do que o Universo. O pensamento está alto. Essa é a crença e esse é o risco: é preciso livrar-se da arrogância. Nesse estágio não se pode ser bobo: você é inteligente, você não pode perguntar a ninguém como treinar. O problema desse estágio é que a cabeça, a coluna, a cauda ainda não se ligam. A cauda não nasceu: você já tem força, mas não é a força da cauda. O corpo já mudou, mas cabeça, coluna e cauda ainda não estão prontas. O “fora” ainda não é verdade. Você ainda não pode sentir que a sua mão pode chegar lá longe. 114

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No início anterior eu dizia para usar o “fora”. Agora, você precisa treinar o corpo para mudar o “fora”. Entrar e sair, mudar. Se você não mudar para fora, não poderá crescer. Os artistas também têm esse problema. Os cientistas também. Um artista muito forte, famoso, depois de um tempo poderá não crescer mais. Qual o problema? Perdeu a chance, não sabe como mudar. Quando chegar aqui, você precisará saber aonde vai. Precisará mudar: se não mudar, não irá adiante. Outro ponto é que agora o pensamento precisa ser o mais importante. Antes era o corpo. Agora o pensamento vale mais, o corpo menos. Depois, o pensamento poderá ser descartado. O que é ser inteligente? É você saber da oportunidade, saber aonde vai. A vida sempre nos apresenta isso. Nesse início, você tem de ser seguro sozinho, você é o patrão de sua vida. Quarto início Dos sete anos até os dez anos de treino observamos as seguintes mudanças. Primeiro: o conjunto cabeça-coluna-cauda já existe. Segundo: a energia já passa para o sistema reprodutor. Órgãos sexuais já têm energia, tanto no homem como na mulher. Terceiro: você sente que o fora tem algo que sempre puxa você. Árvore, montanha, terra, tudo parece envolver você, segurar você. Também pode sentir ondas junto de você, ao andar na rua. Isso é “fora”. Penso que os animais sentem 115

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isso. Nesse início, o corpo é, no máximo, igual ao de qualquer animal. O pensamento vem primeiro. Você está muito tranquilo. A essa altura, você conhece tudo das regras da natureza. Você entende que religião e filosofia, na essência, são regras da natureza. Você sabe o que é nascer, o que é morrer. Você já tem consciência do conteúdo de outras ciências. Você pode conversar com um médico e, mesmo sem conhecer a medicina, saber o problema de saúde que uma pessoa tem. Isso é sabedoria. Você pode não saber música, mas sabe música, de certa maneira. Você consegue avaliar uma música. Como resultado dos dez anos de treino, o corpo já mudou, já chegou lá, o morcego, a cauda, tudo está descartado. Agora, sim, não há sistema, não há nada: é o vazio. Vazio é nada e é tudo. Você sente que sua força parece um choque, pode produzir choque. Esse é o efeito último. Quando o choque sai do dedo, é a energia da terra que passa por você e vai adiante. Depois, não é só o dedo: cada ponto do corpo alcança essa sensação de choque. Terminou, você chegou lá. E eu acho que todo mundo pode chegar lá. O fora parece ter força. Isso é terra, você e ar misturados, juntos em uma coisa só. Nosso caminho sem o treino só chega até aqui. Quando chegarmos lá, poderemos achar outro caminho, em que não estão fixados limites. Nós, juntos, precisamos fazer essa mudança. Esse é o importante efeito do QiGong. Na última fase não há problema. É o vazio. 116

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O problema dessa, ou de qualquer fase, se dá quando uma pessoa diz “eu já treino há sete anos e não sinto isso”. Pode ser que o pensamento esteja errado ou corpo esteja errado. Talvez você já sinta os efeitos e não saiba dizer. Você precisa pensar no que aconteceu. Talvez a prática esteja errada. É preciso me perguntar como eu treino, me observar, observar outros praticantes no treino e também refletir sozinho. Olhar e treinar e pensar: não pode faltar nenhuma dessas condições. É importante também olhar a natureza: animais, árvores, montanhas. E atentar para as informações deste livro. Preocuparse em acertar. Se você está errando, não pode treinar sozinho. Eu errei por muitos anos, tentei muita coisa. Não preciso tentar mais. Por isso, posso ajudar vocês. Eu costumo aprender olhando os animais. Um animal tem movimento. Parece que puxa energia de nós. A natureza mostra, mas muitas vezes não conseguimos ver. O ser humano, no entanto, não tem um grande mestre. Tudo está mais ou menos no mesmo nível. Falta um grande artista, um grande cientista. Falta um grande mestre da vida. A natureza é quem pode nos orientar. Quando um aluno me pergunta qual é minha idade de LaoQiGong, eu respondo que como ele, também estou estudando LaoQiGong. Ser imortal não é voar, atravessar paredes, fazer milagres. É entender o que é a vida, ter um pouco de sabedoria. Isso é o que buscamos. A filosofia também quer 117

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conhecer o sentido último da existência. A diferença é que o nosso processo conduz às respostas sem livros, por intermédio da prática e do conhecimento da natureza em nós e fora de nós, que o treino possibilita. Então, nesse sentido, pode-se dizer que o LaoQigong é uma prática da filosofia.

Meditação do Lao QiGong

Seminário no Rio de Janeiro

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Treino Lao QiGong

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