Blavatsky - Isis Sem Véu 3
January 7, 2024 | Author: Anonymous | Category: N/A
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LIVRO 3 TEOLOGIA I CAPÍTULO I A IGREJA: ONDE ESTÁ ELA? AS ESTATÍSTICAS DA IGREJA. (L. 3. pág. 13).
Nos Estados Unidos da América, sessenta mil homens (60.428) receberam salários para ensinar a ciência de Deus e as Suas relações com as Suas criaturas. Esses homens comprometem-se, por contrato, a transmitir-nos o conhecimento que trata da existência, caráter e atributos de nosso Criador; Suas leis e Seu governo; as doutrinas em que devemos acreditar e as obrigações que precisamos praticar. Cinco mil desses teólogos com o auxílio de 1.273 estudantes, ensinam esta ciência a cinco milhões de pessoas, de acordo com a fórmula prescrita pelo Bispo de Roma. Cinqüenta e cinco mil (55.287) ministros e itinerantes, representando quinze diferentes denominações, cada uma contradizendo todas as outras, no que a questão teológicas maiores ou menores, instruem, em suas respectivas doutrinas, outras trinta e três milhões (33.500.000) de pessoas. Existem algumas centenas de milhares de Judeus; alguns milhões de fieis orientais de todas as espécies; e uns poucos que pertencem à Igreja grega. O Deus dos unitaristas é um celibatário; a Divindade dos presbiterianos, metodistas, congrecionistas e as outras seitas protestantes ortodoxas, é um Pai sem esposa com um Filho idêntico ao próprio Pai. No esforço de se superarem umas às outras na ereção de suas sessenta e duas mil e tantas igrejas, casas de orações e salas de reunião em que se ensinam essas conflitantes doutrinas teológicas, gastou-se a soma de 334.485.581 dólares. Somente o valor dos presbíteros protestantes, nos quais se abriram os pastores e as suas famílias, é estimado em cerca de 54.114.297 dólares. Dezesseis milhões (16.179.387) de dólares são destinados todo ano para cobrir as despesas correntes apenas das seitas protestantes. Uma igreja presbiteriana em Nova York custa cerca de um milhão de dólares; um altar católico, um quarto de milhão! Não mencionamos a multidão de seitas menores, de comunidades e de extravagantes pequenas heresias originais desse país, que nascem num dia para morrer no outro, como os esporos de cogumelos, após um dia chuvoso. Não nos deteremos, também, para considerar os pretensos milhões de espiritistas, pois à maior parte deles falta a coragem de escapar-se de suas respectivas seitas religiosas. Eles são os Nicodemos clandestinos. Pois bem, perguntamos como Pilatos, "O que é a Verdade?" Onde devemos procurá-la, no meio dessa multidão de seitas em guerra? Cada uma delas pretende basear-se na revelação divina, e cada uma afirma possuir as chaves das portas do céu. Estará qualquer uma delas na posse rara da Verdade? Ou devemos exclamar como o filósofo budista. "Há apenas uma verdade sobre a Terra, e ela é imutável; ei-la: - a Verdade não está na Terra!" Embora tenhamos a intenção de trilhar por um caminho que foi exaustivamente batido pelos sábios eruditos que demonstraram que todo dogma cristão tem a sua origem num rito pagão, não obstante os fatos que eles exumaram desde a emancipação da ciência, nada perderão se forem repetidos. Além disso, propomonos a examinar esses fatos de um ponto de vista diferente e talvez original: o das antigas filosofias esotericamente compreendidas. Referimo-nos, de passagem, a elas em nosso primeiro volume. Vamos utilizálas como o modelo para a comparação dos dogmas cristãos e dos milagres, com as doutrinas e fenômenos da magia antiga, e da moderna “Nova Revelação”, como o Espiritismo é chamado por seus devotos. Como os materialistas negam os fenômenos sem investigá-los, e como os teósofos, admitindo-os, oferecem-nos a pobre escolha de dois manifestos absurdos - o Demônio e os milagres -, pouco perderemos recorrendo aos teurgistas, e eles podem realmente ajudar-nos a lançar uma grande luz sobre um assunto muitíssimo obscuro. CRENÇAS CRISTÃ, E PAGÃS COMPARADAS. (L.3.pág.16). É portanto insensato os autores católicos despejarem a sua bílis em frases como estas: "Em inúmeros pagodes, a pedra fálica assume com freqüência, como o baetylos grego, a forma brutalmente indecente do linga (...) o Mahâ-Deva". Antes de macularem um símbolo, cujo sentido metafísico é por demais profundo
para os modernos campeões dessa religião do sensualismo par excellence, o Catolicismo romano, eles deveriam destruir as suas igrejas mais antigas e modificar a forma da cúpula de seus próprios templos. O Mahâ-Deva de Elefanta, a Torre Redonda de Bhagalpur, os minaretes do Islão - redondos ou pontudos - são os modelos originais do Campanile de São Marcos, em Veneza, da Catedral de Rochester, e do moderno Duomo de Milão. Todos esses campanários, torrinhas, zimbórios e templos cristãos reproduzem a idéia primitiva do lithos, o falo ereto. "A torre ocidental da Catedral de São Paulo, em Londres", diz o autor de The Rosicrucians, "é um dos dois litóides que sempre se encontram na frente de todos os templos, sejam cristãos ou pagãos. Além disso, em todas as igrejas cristã, “particularmente nas igrejas protestantes, onde figuram de modo mais conspícuo, as duas tábuas de pedra da Providência Mosaica são colocadas sobre o altar, disposta em díptico, como uma única pedra, cuja parte superior é arredondada. (...) A da direita é masculina, a da esquerda, feminina”. Portanto, nem os católicos, nem os protestantes têm o direito de falar das “formas indecentes” dos monumentos pagãos, visto que eles ornamentam as suas próprias igrejas com seus símbolos do linga e do yoni, e até mesmo escrevem das leis de seu Deus sobre eles. Outro detalhe que não hora de forma particular o clero cristão poderia ser traduzido pela Inquisição. As torrentes de sangue humano derramados por essa instituição cristã e o número de seus sacrifícios humanos não têm paralelo nos anais do Paganismo. A Ísis egípcia era representada como uma Virgem Mãe por seus devotos, e segurando o seu filho, Hórus, nos braços. Em algumas estátuas e baixos-relevos, quando aparece só, ela está completamente nua ou velada da cabeça aos pés, Mas nos mistérios, em comum como quase todas as outras deusas, ela figura inteiramente velada da cabeça aos pés, como símbolo da castidade materna. Nada perderíamos se emprestássemos dos antigos um pouco do sentimento poético de suas religiões e da inata veneração que eles tinham por seus símbolos. Não é injusto dizer que o último dos verdadeiros cristãos morreu com o último dos apóstolos diretos. Max Müller pergunta convincentemente: "Como pode um missionário em tais circunstância fazer à surpresa e às perguntas de seus alunos, a não ser que se refira à semente e lhes diga o que o Cristianismo pretendeu ser? A menos que lhes mostre que, como todas as outras religiões, o Cristianismo também tem a sua história; que o Cristianismo do século XIX não é o Cristianismo da Idade Média, e que o Cristianismo da Idade Média não era o dos primeiros Concílios; que o Cristianismo dos primeiros Concílios não era o dos apóstolos, e que só o que foi dito por Jesus foi verdadeiramente bem dito? Podemos assim inferir que a única diferença característica entre o Cristianismo moderno e as antigas fés pagãs é a crença do primeiro num demônio pessoal e no inferno. "As nações arianas não tinham nenhum demônio", diz Max Müller. "Platão, embora de caráter sombrio, era um personagem respeitabilíssimo; e Loki (o escandinavo), embora uma pessoa maligna, não era um diabo. A deusa alemã Hel, como Proserpina, também havia conhecido dias melhores. Assim, quando aos alemães se falava na idéia de um semítico Seth, Satã ou Diabolus semita, não se lhes infundia temor algum". Pode-se dizer o mesmo do inferno. O Hades era um lugar muito diferente de nossa região eterna, e poderíamos qualificá-lo antes como um estágio intermediário de purificação. Também não o é o Amenti egípcio, a região de julgamento e purificação; nem o Adhera - o abismo de trevas dos hindus, pois mesmo os anjos caídos que nele foram precipitados por Shiva são autorizados por Parabrahman a considerá-lo como um estágio intermediário, no qual uma oportunidade lhes é concedida para se prepararem para graus mais elevados de purificação e redenção de seu miserável estado. O Gehenna do Novo Testamento era uma localidade situada fora dos muros de Jerusalém; e, ao mencioná-lo, Jesus empregava apenas uma metáfora comum. Donde então provêm o triste dogma do inferno, essa alavanca de Arquimedes da Teologia cristã, com a qual se conseguiu subjugar milhões e milhões de cristãos por dezenove séculos? Seguramente não das Escrituras judaicas, e aqui chamamos em testemunho qualquer erudito hebreu bem-informado. A única menção, na Bíblia, a algo que se aproxima do inferno é o Gehenna ou Hinnom, um vale próximo a Jerusalém, onde se situava Tophet, local em que se mantinha perpetuamente acesa uma fogueira queimando os detritos para fins de higiene. O profeta Jeremias informa-nos que os israelitas costumavam sacrificar suas crianças a Maloch-Hércules nessa região; e mais tarde descobrimos os cristãos substituindo calmamente essa divindade por seu deus do perdão, cuja ira não pode ser aplacada, a não ser que a Igreja lhe sacrifique suas crianças não batizadas e os seus filhos mortos em pecado no altar da "danação eterna"! Como chegaram os padres a conhecer tão bem as condições do inferno, a ponto de dividir as suas tormentas em duas categorias, a poena danni e a poena sensus, sendo a primeira a privação da visão beatífica; a segunda, as penas eternas num lago de fogo e enxofre? Se eles responderem que foi através do Apocalipse (XX, 10), "E o demônio que os seduzira foi arrojado no lago de fogo e enxofre, onde já se achavam a besta e o falso profeta que serão atordoados para todo o sempre", estamos preparados para demonstrar de onde o
próprio teólogo João retirou a idéia. Deixando de lado a interpretação esotérica de que o "demônio" ou o demônio tentador significa o nosso próprio corpo terrestre, que depois da morte certamente se dissolverá nos elementos ígneos ou etéreos, a palavra "eterna" pela qual os nossos teólogos interpretam as palavras "para todo o sempre" não existe na língua hebraica, nem como palavra, nem como sentido. Não há nenhuma palavra hebraica que expresse exatamente a eternidade; olam, segundo Le Clerc, significa apenas um tempo cujo começo e cujo fim não são conhecidos. Embora demonstre que essa palavra não significa duração infinita, e que no Velho Testamento a expressão para sempre significa apenas um longo espaço de tempo, o Arcebispo Tillotson deturpou-lhe completamente o sentido, no que toca à idéia das tormentas do inferno. De acordo com a sua doutrina, quando se diz que Sodoma e Gomorra pereceram no "fogo eterno", devemos entender a expressão apenas no sentido de que o fogo não se extinguiu até as duas cidades terem sido inteiramente consumidas. Quanto ao fogo do inferno, deve-se entender as palavras no sentido estrito da duração infinita. Tal é a sentença do sábio teólogo. Pois a duração da punição dos depravados deve ser proporcional à beatitude eterna dos justos. Diz ele, "Esses [falando dos depravados] terão, punição eterna; mas os justos, vida eterna". O SENTIDO ESOTÉRICO DO SOL. (L. 2. pás. 21). O Rev. T. Swinden, comentando as especulações de seus predecessores, preenche todo um volume com argumentos, segundo ele incontestáveis, visando mostrar que o Inferno se localiza no Sol. Há dois versículos do Apocalipse de São João que dizem o seguinte: “E o quarto anjo derramou sua taça sobre o Sol, e concedeu-lhe o poder de abrasar os homens pelo fogo. E os homens então abrasados por um calor intenso puseram-se a blasfemar contra o nome de Deus”. Isto é simplesmente uma alegoria pitagórica e cabalista. A idéia não é nova nem para Pitágoras nem para São João. Pitágoras colocava a “esfera de purificação no Sol”, Sol esse que, com a sua esfera, ele localizava, ademais, no centro do universo, tendo a alegoria um duplo sentido: 1º Simbolicamente, o Sol físico representa a Divindade Suprema, o sol espiritual central. Chegando a essa região, todas as almas purificam-se de seus pecados, e unem-se para sempre com seu espírito, depois de sofrerem anteriormente em todas as esferas inferiores. 2º Colocando a esfera do fogo visível no centro do universo, Pitágoras simplesmente insinuou o sistema heliocêntrico, que fazia parte dos mistérios, e era comunicado apenas no grau mais elevado de iniciação. São João dá a seu Verbo um significado puramente cabalístico, que nenhum “padre”, exceto aqueles que pertencem à escola neoplatônica, foi capaz de compreender. Por ter sido um discípulo de Amônio Saccas, Orígenes e entendeu, sendo por essa razão que o vemos negar corajosamente a perpetuidade das tormentas do inferno. Ele sustenta que não apenas os homens, mas inclusive os demônios (e por esse termo entendia os pecadores humanos desencarnados), após um período mais ou menos longo de punição, serão perdoados e finalmente reconduzidos aos céu. Em conseqüência dessa e de outras heresias, Orígenes foi, naturalmente, exilado. EXISTE UM UNIVERSO ESPIRITUAL E INVISÍVEL. (L. 3. pág. 23). Como os católicos tomando como prova os fenômenos psicológicos para provar a existência de um demônio pessoal, e o Conde de Gasparin, um antigo ministro de Louis Philippe, coletando inúmeros outros fatos para provar o contrário, os espíritas da França contraíram uma dívida de gratidão para com os seus adversários. A existência de um universo espiritual invisível povoado de seres invisíveis foi, então, inquestionavelmente demonstrada. Esquadrinhando as bibliotecas mais antigas, eles destilaram de seus relatos histórias a quintessência das provas. Todas as épocas desde os tempos de Homero até os dias atuais, forneceram os seus materiais mais preciosos e esses infatigáveis autores. Tentando provar a autenticidade dos prodígios produzidos por Satã nos dias que precedem a era cristã, assim como por toda a Idade Média, eles simplesmente estabeleceram as bases para o estudo do fenômeno em nossos tempos modernos. Entusiasta ardente e inflexível, des Mousseaux transforma-se contudo, inconscientemente, no demônio tentador, ou - como ele costuma qualificar o Diabo - na "serpente da Gênese". Em seu desejo de apontar a presença do Maligno em todas as manifestações, ele apenas consegue demonstrar que o Espiritismo e a Magia não são coisas movas no mundo, mas irmãs gêmeas muito antigas, cuja origem deve ser buscada na remota infância de antigas nações como Índia, Caldéia, Babilônia, Egito, Pérsia e Grécia. É evidente que des Mousseaux e de Mirville devem ter-se utilizado livremente das fontes literárias do Vaticano e de outros repositórios de conhecimentos católicos. Quando se tem tais tesouros em mãos manuscritos originais, papiros, e livros pilhados das mais ricas bibliotecas pagãs; antigos tratados sobre Maria e Alquimia; e registros de todos os processos sobre feitiçaria, e das sentenças decorrentes, tais como cavalete, fogueira e tortura, pode-se facilmente escrever volumes de acusações contra o Demônio. Temos boas razões para afirmar que há centenas de obras valiosíssimas sobre as ciências ocultas que foram condenadas a remanescer para sempre interditadas ao público, porém que são lidas e estudadas com atenção pelos
privilegiados que têm acesso à Biblioteca do Vaticano. As leis da Natureza são as mesmas tanto para o feiticeiro pagão, quanto para o santo católico; e um "milagre" pode ser produzidos tanto por um, como por outro, sem a menor intervenção de Deus ou do Demônio. Mas os fenômenos psíquicos tinham começado a atrair a atenção da Europa, e o clero iniciou a grita de que o seu tradicional inimigo reaparecera sob outro nome, e os “milagres divinos” começaram também a surgir em lugares isolados. Na Rússia, o clero sabe mais do que ninguém como impressionar os seus paroquianos, cuja piedade é sincera e a fé, poderosa sem milagres; e sabe que nada é melhor do que os milagres para semear a suspeita, a dúvida e finalmente o ceticismo que conduz diretamente ao ateísmo. Além disso, o clima é o menos propício, e o magnetismo da população média positivo e são demais para produzir fenômenos independentes; e a fraude não a solução. Por outro lado, nem na Alemanha protestante, nem mesmo na América, desde a época da Reforma, teve o clero acesso a qualquer uma das bibliotecas secretas do Vaticano. Em conseqüência, nada sabem sobre a magia de Alberto Magno. Quanto ao fato de a América ter sido inundada de sensitivos e de médiuns, a razão para isso deve-se em parte à influência climática e especialmente ao estado psicológico da população. Desde a época da feitiçaria de Salem, há 200 anos, quando os comparativamente poucos colonos tinham um sangue puro e não adulterado em suas veias, apenas se ouviu falar a respeito de "espíritos" não de "médiuns" até 1840. Os fenômenos apareceram pela primeira vez entre os membros da "Igreja do Milênio", cujas aspirações religiosas, cujo modo peculiar de vida e cuja pureza moral e castidade física conduzem à produção de fenômenos independentes de natureza tanto psicológica como física. A partir de 1492, milhares e mesmo milhões de homens de vários climas e de diferentes hábitos e costumes invadiram a América do Norte e, casando-se entre si, modificaram substancialmente o tipo físico dos habitantes. Em que país do mundo a constituição física das mulheres pode ser comparada com a constituição delicada, nervosa e sensível da parte feminina da população dos Estados Unidos? Em nossa chegada a esse país, surpreendemo-nos com a delicadeza semitransparente da pele dos nativos de ambos os sexos. Comparai um operário ou operária irlandesa que trabalhe duramente com um representante de uma genuína família americana. Um trabalha tão duro quanto o outro; ambos têm a mesma idade, e ambos são igualmente saudáveis; entretanto, ao passo que as mãos de um, após uma hora de ensaboamento, exibirão uma pele um pouco mais macia do que a de um jovem crocodilo, as do outro, não obstante o seu uso constante, permitir-vos-ão observar a circulação do sangue sob a fina e delicada epiderme. Não deve surpreender, portanto, que enquanto a América é a estufa dos sensitivos, a maioria de seu clero, incapaz de produzir milagres divinos ou de qualquer outra espécie, nega intransigentemente a possibilidade de qualquer fenômeno, exceto aqueles produzidos por truques e prestidigitação. É natural também que o clero católico, que conhece praticamente a existência dos fenômenos mágicos e espirituais, e que acredita neles, embora temendo as suas conseqüências, tente atribuir todos eles à influência do Demônio. A MAGIA PRATICADA PELO CLERO CRISTÃO. TEOGONIA COMPARADA, UMA NOVA CIÊNCIA. (L. 3. Pág. 29). Onde podemos encontrar, nos anais da Magia européia, encantamentos mais hábeis do que na misteriosa solidão dos claustros? Alberto Magno, o famoso bispo e feiticeiro de Ratisbona, jamais foi superado em sua arte. Roges Bacon era um monge, e Tomás de Aquino um dos mais eminentes discípulos de Alberto. Trithemius, abade dos beneditinos de Spanheim, foi o mestre, amigo e confidente de Cornélio Agripa; e enquanto as confederações de teósofos se disseminaram amplamente pela Alemanha, onde nasceram, ajudando-se mutuamente, e lutando durante anos pela aquisição de conhecimento esotérico, todo aquele que conseguisse tornar-se o discípulo favorito de certos monges poderia ser rapidamente iniciado em todos os ramos importantes da sabedoria oculta. Tudo isso faz parte da história e não pode ser negado. A Magia, em todos os seus aspectos, foi amplamente e quase abertamente praticada pelo clero até a Reforma. E mesmo aquele que foi outrora chamado de “Pai da Reforma”, o famoso John Reuchin, autor de Mundo maravilhoso e amigo de Pico della Mirandola, o mestre e instrutor de Erasmo, de Lutero e de Melanchton, era cabalista e ocultista. Em seu insaciável desejo de estender o domínio da fé cega, os primitivos arquétipos da Teologia cristã foram forçados a ocultar, na medida do possível, as suas verdadeiras fontes. Para esse efeito, eles queimaram ou destruíram, como se afirma, todos os manuscritos originais sobre Cabala, Magia e ciências ocultas que lhes caíram nas mãos. Eles supunham, em sua ignorância, que os escritos mais perigosos dessa espécie tinham desaparecido com o último gnóstico; mas um dia eles descobrirão o seu engano. Outros
documentos autênticos e igualmente importantes reaparecerão, talvez, "de maneira inesperada e quase miraculosa". Existem estranhas tradições correntes em várias partes do Oriente - no Monte Athos e no Deserto de Nítria, por exemplo - entre certos monges, e entre doutos rabinos da Palestina, que passam suas vidas comentando o Talmude. Eles dizem que nem todos os rolos e manuscritos, que segundo a história teriam sido queimados por César, pela turba cristã em 389, e pelo general árabe Omar, desapareceram como se acredita comumente; e a história que eles contam é a seguinte: "Ao tempo da disputa pelo trono em 51 a.C. entre Cleópatra e o seu irmão Dionísio Ptolomeu, o Bruckion, que continha mais de setecentos mil rolos, todos guarnecidos de madeira e de pergaminhos à prova de fogo, estava em reparos, e uma grande porção dos manuscritos originais, que eram considerados os mais preciosos, e que não tinham duplicatas, foram guardados na casa de um dos bibliotecários. Como o fogo que consumiu o resto foi apenas resultado de um acidente, não se tomou nenhuma precaução nesse momento. Mas, acrescentam eles, várias horas se passaram entre o incêndio da frota, por ordem de César, e o instante em que os primeiros edifícios situados nas proximidades do posto queimaram por sua vez, e em que todos os bibliotecários, auxiliados por várias centenas de escravos afetos ao museu, conseguiram salvar os rolos mais preciosos. Tão perfeita e sólida era a fabricação do pergaminho, que enquanto, em alguns rolos, as páginas internas e a guarnição de madeira foram reduzidas a cinzas, em outros, a guarnição de pergaminho permaneceu intata. Esses detalhes foram todos escritos em grego, latim e em dialeto caldaico-siríaco, por um jovem douto de nome Theodas, um dos escribas empregados no museu. A Enciclopédia Britânica, em seu artigo sobre Alexandria, diz: "Quando o templo de Serapis foi demolido (...) a valiosa biblioteca foi pilhada e destruída; e vinte anos depois as prateleiras vazias suscitaram o arrependimento (...) etc.". Mas não relata a sorte a sorte posterior dos livros pilhados. Rivalizando com os ferozes adoradores de Maria do quarto século, os modernos perseguidores clericais do liberalismo e da "heresia" encerrariam voluntariamente todos os heréticos e seus livros em algum moderno Serapião e os queimariam vivos. A causa desse ódio é natural. A pesquisa moderna nunca desvelou tanto, como agora, o segredo. "Não é hoje a adoração dos santos e anjos" - disse o Bispo Newton, anos atrás "em todos os respeitos, idêntica à adoração dos demônios dos primeiros tempos? Só o nome é diferente, a coisa é exatamente a mesma (...) exatamente os mesmos tempos, as mesmas imagens, que eram outrora consagrados a Júpiter e outros demônios, são agora consagrados à Virgem Maria e a outros santos (...) todo o Paganismo converteu-se e aplicou-se ao Papismo." Por que não ser franco e acrescentar que "uma boa porção dele foi adotada também pelas religiões protestantes?" A própria designação apostólica de Pedro origina-se dos mistérios. O Hierofante ou pontífice supremo portava o título caldeu pether, ou intérprete. Os nomes Phtah, Peth'r, a residência de Balsam, Patara, e Patras, os nomes das cidades oraculares, pateres ou pateras e, talvez, Buddha, tudo provêm da mesma raiz. Jesus diz: "Sobre esta petra edificarei minha Igreja, e as portas do Hades não prevalecerão contra ela", entendendo por petra o templo sobre a rocha, e por metáfora, os mistérios cristãos, cujos adversários eram os antigos deuses dois mistérios do mundo subterrâneo, adorados nos ritos de Ísis, Adónis, Átis, Sabásio, Dionísio e Elêusis. Nenhum apóstolo Pedro jamais esteve em Roma; mas o Papa, tomando o cetro de Pontifex Maximus, as chaves de Jano e Cibele, e adornando a sua cabeça cristã como o capelo da Magna Mater, copiado da tiara de Brahmâtma, o Supremo Pontífice dos iniciados da Índia antiga, tornou-se o verdadeiro Peter-Roma, ou Petroma. (A tiara do Papa é igualmente uma perfeita cópia da do Dalai-Lama do Tibete.). A Igreja Católica Romana tem dois inimigos bem mais poderosos do que os "heréticos" e os "infiéis"; e esses são - a Mitologia Comparada e a Filologia. A prova conclusiva é fornecida por muitos eruditos, e não cabe dúvida de que a Índia foi a alma mater, não apenas da civilização, das artes e das ciências, mas também de todas as grandes religiões da antigüidade, do Judaísmo e, por conseqüência, do Cristianismo, inclusive. Herder localiza o berço da humanidade na Índia, e mostra Moisés como um hábil e relativamente moderno compilador das antigas tradições bramânicas: "O rio que circunda o país (a Índia) é o sagrado Ganges, que toda a Ásia considera como o rio paradisíaco. Lá está também o bíblico Bihon, que não é outro senão o Indo. Os árabes o chamam assim até hoje, e os nomes dos países banhados por ele ainda entre os hindus". Jacolliot afirma ter traduzido todos os antigos manuscritos de folhas de palmeira que teve a sorte de ver permissão dos brâmanes dos pagodes. Numa dessas traduções, encontramos passagens que nos revelam a indiscutível origem das chaves de São Pedro, e o motivo da subseqüente adoção do símbolo por Suas Santidades, os Papas de Roma. Ele nos mostra, baseado no testemunho do Agrushada Parikshai, que traduz livremente como "o Livro dos Espíritos" (Pitris), que, séculos antes de nossa era, os Iniciados do templo escolhiam um Conselho
Superior, presidido pelo Brahmâtma, ou chefe supremo de todos esses Iniciados; que esse pontificado só podia ser exercido por um brâmane que alcançasse a idade de oitenta anos; que o Brahmâtma era o único guardião da fórmula mística, resumo de toda ciência, contida nas três misteriosas letras: A U
M
que significam criação, conservação e transformação. Só ele podia expor-lhe o significado na presença dos iniciados do terceiro e superior grau. Dentre os iniciados, todo aquele que revelasse aos profanos uma única verdade, ou mesmo o menor dos segredos confiados a seu cuidado, era condenado à morte. Aquele que recebia a confidência partilhava do mesmo destino. "Finalmente, para coroar esse hábil sistema", diz Jacolliot, "existia uma palavra ainda superior ao misterioso monossílabo A U M, que tornava aquele que lhe possuía a chave igual ao próprio Brahmâ. Só o Brahmâtma possuía esta chave, e a transmitia ao seu sucessor numa caixa fechada. "Essa palavra desconhecida, que nenhuma força humana pôde, mesmo hoje - quando a autoridade bramânica foi esmagada sob as invasões mongólicas e européias; quando todo pagode tem seu Brahmâtma -, força-lhe a revelação, era gravada num triângulo de ouro e preservada num santuário do templo de Asgartha, cujas chaves apenas o Brahmâtma possuía. Ele também portava sobre a sua tiara duas chaves cruzadas, seguras por dois brâmanes ajoelhados, símbolos de preciso depósito que tinha em guarda (...) Essa palavra e esse triângulo estavam gravados sobre a placa do anel que esse chefe religioso utilizava como um dos signos de sua dignidade; ambos eram também reproduzidos num sol dourado sob o altar, onde toda manhã o Sumo Pontífice oferecia o sacrifício do sarvamedha, ou sacrifício a todas as forças da natureza". Não é isso bastante claro? E afirmarão ainda os católicos que foram os brâmanes de há 4.000 anos que copiaram o ritual, os símbolos e as vestes dos Pontífices romanos? Não ficaríamos nem um pouco surpresos. Orígenes, Clemente de Alexandria, Calcídio, Metódio e Maimônides, com base na autoridade do Targum de Jerusalém, a maior autoridade ortodoxa dos judeus, afirmavam que as duas primeiras palavras no Gênese - BE-RÊSHÎTH, significam Sabedoria, ou Princípio, e que a idéia de que tais palavras significam "no princípio" jamais foi partilhada fora dos meios profanos, que não tinham permissão para penetrar mais profundamente no sentido esotérico da sentença. Beausobre, e depois dele Godfrey Higgins, demonstraram o fato. "Todas as coisas", diz a Cabala, "derivam, por emanação, de um princípio; e esse princípio é o Deus [desconhecido e invisível]. DEle emana imediatamente um poder substancial, que é a imagem de Deus, e a fonte de todas as subseqüentes emanações. Esse segundo princípio produz, pela energia [ou vontade e força] da emanação, outras naturezas, que são mais ou menos perfeitas, de acordo com seus diferentes graus de distância, na escala da emanação, da Fonte Primeira de existência, e que constitui diferentes mundos, ou ordens de ser, todos unidos ao poder eterno de que emanam. A matéria não é senão o efeito mais remoto da energia emanativa da Divindade. O mundo material recebe sua forma da ação imediata dos poderes bem abaixo da Fonte Primeira do Ser (...) Beausobre afirma ter Santo Agostinho, o maniqueu, dito o seguinte: `E se por Rêshîth entendemos o Princípio ativo da criação, e não o seu início, nesse caso percebemos claramente que Moisés jamais pretendeu dizer que o céu e a Terra foram as primeiras obras de Deus. Ele apenas disse que Deus criou o céu e a Terra por meio do Princípio, que é Seu Filho. Não é ao tempo que ele se refere, mas ao autor imediato da criação'". Os anjos, segundo Agostinho, foram criados antes do firmamento, e, de acordo com a interpretação esotérica, o céu e a Terra foram criados depois deles, emanados do segundo Princípio, ou o Logos - a Divindade criadora. "A palavra princípio", diz Beausobre, "não significa que o céu e a Terra foram criados antes de qualquer outra coisa, pois, para começar, os anjos foram criados antes disso; porém que Deus fez tudo através de Sua Sabedoria, que é Seu Verbum, e que a Bíblia cristã chamou de Princípio", adotando assim o sentido exotérico da palavra conferido às multidões. A Cabala - tanto oriental, quanto a judia - mostra que inúmeras emanações (as Sephiroth judias) originaram-se do Primeiro Princípio, o principal dos quais era a Sabedoria. Essa Sabedoria é o Logos de Fílon e Miguel, o chefe dos Aeôns (ou EONS, Espíritos Estrelares) gnósticos é o Ormasde dos persas; Minerva, deusa da sabedoria, dos gregos, que emanou da cabeça de Júpiter e a Segunda Pessoa da Trindade cristã. Os primeiro padres da Igreja não tiveram de quebrar a cabeça em demasia; eles encontraram uma doutrina adrede preparada que existia em todas as teogonias milhares de anos antes da era cristã. Sua Trindade não é senão o trio das Sephiroth, as primeiras três luzes cabalistas que, segundo Moisés Nachmanides, "Jamais foram vistas por alguém, não havendo nenhum defeito nelas, nem qualquer desunião". O primeiro número eterno é o Pai, ou o caos primitivo, invisível e
incompreensível dos caldeus, do qual emana o Inteligível. O Phtah egípcio, ou "o Princípio de Luz - não a luz em si, e o Princípio de Vida, embora não tenha em si nenhuma vida". A Sabedoria pela qual o Pai criou o céus é o Filho, ou o andrógino cabalista Adão-Cadmo. O Filho é o mesmo tempo o Râ Masculino, ou Luz da Sabedoria, Prudência ou Inteligência, Sephirah, a Sua parte feminina, e desse ser dual procede a terceira emanação, Binah ou Razão, a segunda Inteligência - o Espírito Santo dos cristãos. Por conseguinte, trata-se estritamente falando, de uma TETRAKTYS ou quaternidade, consistindo da Primeira Mônada Ininteligível, e de sua tríplice emanação, que constitui propriamente a nossa Trindade. Como então não constatar de imediato que, se os cristãos não tivessem propositadamente desfigurado em sua interpretação e tradução o texto do Gênese mosaico, para adaptá-lo às suas próprias concepções, teria sido impossível sua religião com seus dogmas atuais. Uma vez compreendida a palavra Rêshîth em seu novo sentido de Princípio e não de Início, e aceita a doutrina anatematizada das emanações, a posição da Segunda Pessoa da Trindade torna-se insustentável. Pois, se os anjos são as primeiras emanações divinas oriundas da Substância Divina, que existiam antes do Segundo Princípio, então o Filho antropomórfico é, na melhor das hipóteses, uma emanação como aqueles, e pode tanto ser o Deus hipostaticamente quanto nossas obras visíveis são nós mesmo. Que essas sutilezas metafísicas jamais entraram na cabeça do honesto e sincero Paulo (apóstolo) é evidente; e tanto mais o é porque, como todos os judeus eruditos, ele estava bem familiarizado com a doutrina das emanações e jamais pensou em deturpá-la. Como pode alguém imaginar que Paulo identificava o Filho com o Pai, quando ele nos diz que Deus criou Jesus "um pouco menor do que os anjos" (Hebreus, II, 9), e um pouco maior do que Moisés! "Pois esse HOMEM foi considerado de maior glória do que Moisés" (Hebreus, III, 3). Ignoramos quais ou quantas falsidades foram interpoladas posteriormente nos Atos pelos padres da Igreja; mas é evidente que Paulo sempre considerou a Cristo como um homem "cheio de Espírito de Deus", eis um ponto que não admite discussão: "No archê era o Logos, e o Logos estava com Theos" (João, I,1.). A Sabedoria, a primeira emanação de Ain-Soph; o Protogonos, a Hypostasis; o Adão-Cadmo dos cabalistas, o Brahmâ dos hindus; o Logos de Platão, e o "Inicio" de São João - são o Rêshîth, do Livro do Gênese. Se corretamente interpretado, ele subverte, como assinalamos, o elaborado sistema da teologia cristã, pois prova que atrás da Divindade criadora há um deus SUPERIOR; um planejador e arquiteto; e que o primeiro é apenas o Seu agente executor - uma simples FORÇA! "Todos sabem", escreveu Fausto, o grande maniqueu do século IV, "que os Evangelhos não foram escritos por Jesus Cristo, nem por seus apóstolos, mas muito tempo depois por algumas pessoas desconhecidas, que, julgando com razão que não lhes dariam crédito quando constassem coisas que não haviam testemunhado, encabeçaram suas narrativas com os nomes dos apóstolos ou dos discípulos contemporâneos". Ao comentar o assunto, A. Franck, o sábio e erudito judeu do Instituto e tradutor da Cabala, expressa a mesma idéia. "Não temos razão", pergunta ele, "em considerar a Cabala como um precioso vestígio da filosofia religiosa do Oriente, que, transportado para Alexandria, se misturou à doutrina de Platão, e sob o nome usurpado de Dionísio, o Areopagita, bispo de Atenas, convertido e consagrado por São Paulo, foi assim capaz de penetrar no misticismo da Idade Média?" Diz Jacolliot: "O que é então essa filosofia religiosa do Oriente, que penetrou no simbolismo místico da cristandade? Respondemos: Essa filosofia, traços da qual encontramos entre os magos, os caldeus, os egípcios, os cabalistas hebreus e os cristãos, não é outra senão a dos brâmanes hindus, discípulos dos pitris, ou espíritos residentes nos mundos invisíveis que nos cercam". Mas se os gnósticos foram destruídos pelas perseguições, a Gnose, baseada na secreta ciência das ciências, ainda vive. Ela é a terra que ajuda a mulher e está destinada a abrir sua boca para engolir o Cristianismo medieval, o usurpador e assassino da doutrina do grande Mestre. A Cabala antiga, a Gnose, ou o conhecimento tradicional secreto, jamais ficou sem os seus representantes, em qualquer época ou país. As trindades dos iniciados, reveladas à história ou ocultadas sob o véu impenetrável do mistério, foram preservadas e fixadas através das idades. Elas foram conhecidas como Moisés, Aholiab e Bezaleel, o filho de Uri, o filho de Hur, como Platão, Fílon e Pitágoras, etc. Na Transfiguração, vemo-las como Jesus, Moisés e Elias, os três Trismegisto; e os três cabalistas Pedro, Tiago e João - cuja revelação é a chave de toda a sabedoria. Descobrimo-las no crepúsculo da história judia como Zoroastro, Abraão e Terah, e depois como Henoc, Ezequiel e Daniel. Quem, dentre aqueles que sempre estudaram as filosofias antigas, que compreende intuitivamente a grandeza de suas concepções, a infinita sublimidade de seus conceitos sobre a Divindade, pode hesitar, por um instante, de dar preferência à suas doutrinas sobre a Teologia incompreensível, dogmática e contraditória das centenas de seitas cristã? Quem, tendo uma vez lido Platão e penetrado o seu τò óv, "a quem ninguém
jamais viu, exceto o Filho", [de duvidar de que Jesus foi um discípulo da mesma doutrina secreta que instruiu o grande filósofo? Pois, como já mostramos antes, Platão nunca afirmou ser o criador de tudo que escreveu, mas deu todo o crédito a Pitágoras, que, por sua vez, assinalava o remoto Oriente como a fonte de que derivaram sua informação e sua filosofia. Colebrooke mostra que Platão o confessa em suas epístolas, e diz que ele extraiu seus ensinamentos das doutrinas antigas e sagradas!. Além disso, é inegável que as teologias de todas as grandes nações concordam entre si e mostram que cada uma é parte de "um todo estupendo". Como os demais iniciados, vemos Platão em grandes dificuldades para ocultar o verdadeiro significado de suas alegorias. Toda vez que o assunto toca os maiores segredos da Cabala oriental, segredo da verdadeira cosmogonia do universo e do mundo ideal preexistente, Platão esconde sua filosofia na mais profunda escuridão. Seu Timeu é tão confuso que só um iniciado pode compreender-lhe o sentido secreto. E Mosheim pensa que Fílon encheu suas obras com passagens diretamente contraditórias com o único propósito de ocultar a verdadeira doutrina. Pelo menos uma vez, vemos um crítico na pista certa. E essa própria idéia da Trindade, assim como a doutrina tão amargamente condenada das emanações, qual é a sua mais remota origem? A resposta é fácil, e as provas estão agora às mãos. Na mais sublime e profunda de todas as filosofias, a da universal "Religião da Sabedoria", os primeiros traços da qual a pesquisa histórica agora encontra na antiga religião pré-védica da Índia. Como assinala o muito caluniado Jacolliot, "Não é nas obras religiosas da Antigüidade, tais como os Vedas, o Zend-Avesta, a Bíblia, que temos de procurar a exata expressão das dignas e sublimes crenças daquelas épocas". "A sagrada sílaba primitiva, composta das três letras A-U-M, na qual está contida a Trimûrti [Trindade] Védica, deve ser mantida em segredo, como outro triplo Veda", diz Manu, no Livro XI, Sloka 266. Svayambhû é a Divindade não revelada; é o Ser que existe por si; é o germe central e imortal de tudo que existe no universo. Três trindades emanam e nele se confundem, formando uma unidade Suprema. Essas trindades, ou a tríplice Trimûrti, são: Nara, Nârî e Virâj - a Tríadi inicial; Agni, Vâyu e Sûrya - a Tríada manifesta; Brahmâ, Vishnu e Shiva, a Tríada criadora. Cada uma dessas Tríadas torna-se menos metafísicas e mais adaptada à inteligência vulgar à medida em que desce. A última torna-se assim apenas o símbolo em sua expressão concreta; conclusão necessária de uma concepção puramente metafísica. Ao lado de Svayambhû, há as dez Sephiroth dos cabalistas hebreus, os dez Prajâpatis hindus - o Ain-Soph dos primeiros, que corresponde ao grande Desconhecido, expresso pelo A U M místico dos últimos. Diz Franck, o tradutor da Cabala: "Os dez Sephiroth (...) dividem-se em três classes, cada uma das quais nos apresenta a divindade sob um aspeto diferente, embora o todo permaneça uma Trindade indivisível. "Os primeiros três Sephiroth são puramente intelectuais no que concerne à Metafísica; expressam a identidade absoluta da existência e do pensamento, e formam o que os modernos cabalistas chamam de mundo inteligível" - que é a primeira manifestação de Deus. "Os três seguintes (...) fazem-nos conceber Deus em um de seus aspectos, como a identidade entre bondade e sabedoria; noutro aspeto, eles nos mostram, no bem Supremo, a origem da beleza e da magnificência [na criação]. Por isso, eles se chamam virtudes, ou constituem o mundo sensível. “Finalmente, sabemos, pelo último desses atributos, que a Providência Universal, o Artista Supremo, é também Força absoluta, a causa Todo-Poderoso, e que, ao mesmo tempo, essa causa é o elemento gerador de tudo que existe. São estes últimos Sephiroth que constituem o mundo natural, ou a natureza em sua essência e em seu princípio ativo, natrua naturans". Essa concepção cabalística revela-se idêntica à da filosofia hindu. Todo aquele que ler Platão e seu diálogo Timeu encontrará essas idéias fielmente reproduzidas pelo filósofo grego. Além disso, a imposição do segredo era tão estrita para os cabalistas, como o era para os iniciados de Adyta e os iogues hindus. "Fecha tua boca, para que não fales disto [o mistério], e teu coração, para que não pense em voz alta; e se teu coração escapar, trá-lo de volta, pois tal é o objetivo de nossa aliança". "Esse é o segredo que dá morte: fecha tua boca para não revelá-lo ao vulgo; comprime teu cérebro para que nada escape dele e caia noutra parte" (Agrushada-Pariskshai). Mas, se o conhecimento dos poderes ocultos da Natureza abre a percepção espiritual do homem, alarga-lhe as faculdades intelectuais, e o leva infalivelmente a uma veneração mais profunda do Criador, por outro lado a ignorância, a estreiteza dogmática e um medo infantil de contemplar o fundo das coisas levam invariavelmente ao fetichismo e à superstição. Quando Cirilo, o Bispo de Alexandria, abraçou abertamente a causa de Ísis, a deusa egípcia, e a antropomorfizou em Maria, a mãe de Deus, e a controvérsia trinitária estalou, desde esse momento, a doutrina egípcia da emanação do Deus criador oriundo de Emepht começou a ser torturada de mil maneiras, até que o Concílio concordou com a sua adoção na forma atual, que vem a ser o Ternário desfigurado dos cabalistas
Salomão e Fílon! Mas como sua origem era ainda por demais evidente, deram o nome de Cristo ao leste", ao Adão-Cadmo, ao Verbo, ao Logos, identificando-o em essência e existência com o Pai ou Ancião dos Dias. A Sabedoria oculta, segundo o dogma cristão, tornou-se idêntica e coeterna com a sua emanação, o Pensamento divino. O DOGMA DA REDENÇÃO. (L. 3. pág. 44). Se pararmos agora para considerar outro dos dogmas fundamentais da cristandade, a doutrina da redenção, podemos remontá-lo com facilidade ao Paganismo. Essa pedra angular de uma Igreja que se acredita erguida sobre rocha firme, há muitos séculos, foi agora escavada pela ciência, e revelou provir dos gnósticos. O Prof. Draper demonstra que esse dogma era pouco conhecido nos dias de Tertuliano, e que ele se "originou entre os gnósticos heréticos". Não nos permitiremos contradizer tão sábia autoridade, a não ser para sugerir que ele se originou tanto entre eles, como o seu Cristos "Ungido" e a Sophia. O primeiro, eles o modelaram com base no original do "Rei Messias", o princípio masculino da sabedoria, e a segunda, da terceira Sephiroth, da Cabala caldaica, e ainda de Brahmâ e Sarasvatî, ambos hindus, e dos pagãos Dionísio e Demeter. E aqui estamos em solo firme, visto que está agora provado que o Novo Testamento jamais surgiu em sua forma completa, tal como agora o encontramos, a não ser 300 anos depois da época dos apóstolos, e que o Zohar e outros livros cabalísticos datam do primeiro século de nossa era, se é que não são mais antigos. Os gnósticos partilharam de muitas das idéias essênias; e os essênios já possuíam os seus mistérios "maiores" e "menores", pelo menos dois séculos antes de nossa era. Eles eram os ozarim ou iniciados, os descendentes dos hierofantes egípcios, em cujo país haviam estado durante vários séculos antes de terem sido convertidos ao monasticismo budista pelos missionários do rei Asoka, amalgamando-se depois com os cristãos primitivos. Existiram provavelmente antes de os antigos templos egípcios terem sido destruídos e arruinados durante as incessantes invasões dos persas, dos gregos e de outras hordas conquistadoras. Os hierofantes representavam sua redenção no mistério da Iniciação, muitos séculos antes do surgimento dos gnósticos e mesmo dos essênios. Tal mistério era conhecido entre os hierofantes como o BATISMO DE SANGUE, e considerado não como uma expiação para a "queda do homem" no Éden, mas simplesmente como uma expiação para os pecados passados, presente e futuros da Humanidade ignorante, mas, não obstante, corrompia. O Hierofante tinha a opção de oferecer sua vida pura e imaculada como um sacrifício para sua raça aos deuses com os quais procurava se reunir, ou a vida de uma vítima animal. A primeira opção dependia inteiramente de sua própria vontade. No último momento do solene "novo nascimento", o iniciador passava a "palavra" ao iniciado, e imediatamente após ter-lhe colocado nas mãos uma arma, ordenava-lhe que o golpeasse. É essa a verdadeira origem do dogma cristão da redenção. Na verdade, numerosos foram os "Cristos" dos séculos pré-cristão. Mas eles morreram desconhecidos do mundo e desapareceram tão silenciosamente como misteriosamente da vista dos homens, como Moisés do topo de Pisgah, a montanha de Nebo (sabedoria oracular), após ter deposto suas mãos sobre Josué, que assim se tornou "cheio do espírito da sabedoria" (i.e., iniciado). O MISTÉRIO DA EUCARISTIA. (L. 3. pág. 45). O mistério da Eucaristia não é também propriedade exclusiva dos cristãos. Godfrey Higgins prova que ele foi instituído muitas centenas de anos da "Ceia Pascal", e diz que "o sacrifício do pão e do vinho era comum a muitas nações antigas". Cícero menciona-o em suas obras, e surpreende-se com a estranheza do rito. Um significado esotérico se lhe associou desde o início do estabelecimento dos mistérios, e a Eucaristia é um dos ritos mais antigos. Entre os hierofantes, ela tinha quase que o mesmo significado que para os cristãos. Ceres era o pão, e Baco era o vinho; o primeiro significava a regeneração da vida a partir da semente, e o segundo - a uva - o emblema da sabedoria e do conhecimentos; a acumulação do espírito das coisas, e a fermentação e a conseqüente força desse conhecimento esotérico, juntamente, simbolizadas pelo vinho. O mistério relacionava-se com o drama do Éden. Afirma-se que ele foi ensinado pela primeira vez por Jano, que foi também o primeiro a introduzir nos templos os sacrifícios do "pão" e do "vinho", em comemoração à "queda na geração" sob o símbolo da "semente". "Sou a verdadeira vinha, e meu Pai é o vinhateiro", diz Jesus [João, XV, 1], aludindo ao conhecimento secreto que podia comunicar. "Não mais beberei o fruto da vinha, até aquele dia em que beberei o vinho novo no Reino de Deus" [Marcos, XIV, 25]. O festival dos mistérios eleusianos tinha início no mês de Boedromion, que corresponde ao mês de setembro, o templo da vindima, e se estendia do 15º ao 22º dia do mês, isto é, por sete dias. O festival hebreu da Festa dos Tabernáculos começava no 15º dia e terminava no 22º dia do mês de Ethanim (outubro) que Dunlap mostra derivar de Adonim, Adonia, Attenim, Ethanim; e essa festa é chamada no Êxodo (XXIII, 16)
de festa da colheita. "Todos os homens de Israel se reuniram junto do rei Salomão, no mês de Ethanim, durante a festa, que é o sétimo mês". Plutarco pensa que as festas das tendas sejam tiros báquicos, não eleusinos. Assim "evocava-se diretamente a Baco", diz ele. O culto Sabaziano era sabático; os nomes Evius, ou Hevius, e Luaios são idênticos a Hivita e Levita. O nome francês Louis provêm do hebraico Levi; Iacchus é Iao ou Jeová; e Baal ou Adon, como Baco, era um deus fálico. "Quem pode subir à montanha [o lugar elevado] do Senhor?", pergunta o santo rei Davi, "quem pode ficar de pé no lugar de seu Kadesh?" (Salmos, XXIV, 3). Kadesh pode significar, num sentido, consagrar, venerar, sacrificar, e também iniciar ou pôr de lado; mas também significa o ministério de ritos lascivos (o culto de Vênus) e a verdadeira interpretação da palavra Kadesh é claramente traduzida em Deuteronômio, XXIII, 17; Oséias, IV, 14; e Gênese, XXXVIII, do versículo 15 ao 22. Os "santos" Kadeshuth da Bíblia eram idênticos, no que diz respeito aos deveres de seu ofício, às donzelas Nautch dos pagodes hindus mais recentes. Os Kadeshim hebraicos ou galli viviam "no Templo do Senhor, onde as mulheres teciam véus para o bosquete", ou busto de Vênus-Astartê, diz o sétimo verso do capítulo 23 de II Reis. A dança executada por Davi ao redor da arca era a "dança circular" que teria sido prescrita pelas amazonas para os mistérios. Tal era a dança das filhas de Shioh (Juizes, XXI, 21, 23 et passim), e a dos profetas de Baal (I Reis, XVII, 26). Trata-se simplesmente de uma característica do culto sabeu, pois denotava o movimento dos planetas em torno do Sol. Que a dança era um frenesi báquico, não resta dúvida. O sistro era utilizado nessa ocasião, e o motejo de Micol e a resposta do rei são muito expressivas. "O rei de Israel se fez louvar hoje, descobrindo-se na presença das servas como se descobriria um homem de nada". E Davi respondeu: É diante do Senhor, que eu danço [ou ajo luxuriantemente], e ainda me humilharei". Quando lembramos que Davi esteve entre os tírios e os filisteus, onde esses ritos eram comuns; e que ele arrebatou essa terra da casa de Saul, com a ajuda de mercenários de seus país, a aceitação e talvez a introdução de tal culto pagão pelo frágil "salmista" parece muito natural. Davi nada sabia de Moisés, ao que parece, e, se ele introduziu o culto de Jeová, não o fez em seu caráter monoteísta, mas simplesmente no de muito deuses das nações vizinhas - uma divindade tutelar a quem deu preferência, e a quem escolheu dentre "todos os outros deuses". Seguindo em sua ordem o estudo dos dogmas cristãos, se concentramos nossa atenção naquele que provocou as lutas ferozes até o seu reconhecimento, o dogma da Trindade, o que encontramos? Encontramolo, como já se mostrou, a Nordeste do Indo; e remontando à Ásia Menor e à Europa, reconhecemo-lo em vários povos que nada tinham de algo como uma religião estabelecida. As mais antigas escolas caldaicas, egípcias e mitraicas o ensinavam. O deus solar caldeu, Mitha, era chamado de "Triplo", e a idéia trinitária dos caldeus era uma doutrina dos acádios, que pertenciam a uma raça que foi a primeira a conceber uma Trindade metafísica. Os caldeus eram uma tribo dos acádios - de acordo com Rawlinson - que viviam na Babilônia desde tempos ancestrais. Eram os turânios, segundo outros, e instruíram os babilônios nas primeiras noções religiosas. Mas esses acádios, quem eram eles? Os cientistas que lhes conferem uma origem turaniana fazemnos os inventores dos caracteres cuneiformes; outros os chamam de sumerianos; outros, ainda, chamam suas línguas, da qual (por muito boas razões) não subsiste nenhum vestígio, de casdeanas, caldaicas, protocaldaicas, casco-cíticas, e assim por diante. A única tradição digna de crédito é que esses acádios instruíram os babilônios nos mistérios, e lhes ensinaram a língua sacerdotal ou dos mistérios. Esses acádios eram tão simplesmente uma tribo dos brâmanes hindus, agora chamados de arianos - e sua língua vernacular o sânscrito (Lembramos a esse respeito que o Cel. Vans Kennedy há muito externou sua opinião de que a Babilônia fora, outrora, sede da língua sânscrita e da influência bramânica.) dos Vedas; é a língua sagrada ou dos mistérios, aquela que, mesmo em nosso próprio século, é utilizado pelos faquires hindus e pelos brâmanes iniciados em suas evocações mágicas. Essa língua tem sido empregada desde tempos imemoriais, e ainda o é pelos iniciados de todos os países, e os lamas tibetanos afirmam que é nesse idioma que surgem os misteriosos caracteres sobre as folhas e o córtex do Kumbum sagrado. Jacolliot, que se deu ao trabalho de penetrar nos mistérios da iniciação bramânica traduzindo e comentando a Agrushada-Parikshai, confessa o seguinte: "Pretende-se também, sem que tenhamos podido verificar a afirmativa, que as evocações mágicas eram pronunciadas numa língua particular, e que era proibido, sob pena de morte, traduzi-las nos dialetos vulgares. As raras expressões que fomos capazes de reter, como - L'rhom, h'hom, sh'hrûm, sho'rhim, são fato muito curiosas, e não parecem pertencer a qualquer idioma conhecido". Todo aquele que viu um faquir ou um lama recitando seus Mantras e suas conjurações sabe que ele jamais pronuncia as palavras de modo audível quando se dispõe a realizar algum fenômeno. Seus lábio se movem, e ninguém jamais ouvirá a terrível fórmula pronunciada, exceto no interior dos templos, e mesmo aí
em cauteloso sussurro. Essa era então a língua agora batizada respetivamente por todos os cientistas, e, de acordo com suas propensões imaginativas e filológicas, de casdo-semítica, cíticas, protocladaicas, etc. No Livro de Hermes, expõe "Poimandres" todo o dogma da Trindade aceito pelos cristãos enunciado em sentenças distintas e inequívocas. "A luz sou eu", diz Poimandres, o PENSAMENTO DIVINO. "Sou o Nous ou inteligência, e sou teu Deus, mais antigo do que o Princípio Humano que escapa das Trevas. Sou o Germe do Pensamento, a PALAVRA resplendente, o FILHO de Deus. Sabe que o que assim vês e ouves em Ti é o Verbum do Mestre, é o Pensamento, que é Deus, o Pai (...) O oceano celestial, o ÉTER, que flui de leste a oeste, é o Sopro do Pai, o Princípio dador da vida, o ESPÍRITO SANTO!" "Pois eles não estão separados, e sua união é VIDA." Por mais antiga que possa ser a origem de Hermes, perdidos nos desconhecidos dias da colonização egípcia, existe no entanto uma profecia muito antiga, relacionada, segundo os brâmanes, diretamente ao Krishna hindu. É de fato estranho, para dizer o mesmo, que os cristãos pretendam basear sua religião numa profecia da Bíblia, que não existe em nenhum lugar nesse livro. Em que capítulo ou verso prometeu Jeová, o "Senhor Deus", enviar a Adão e Eva um Redentor que viria salvar a Humanidade? "Porei uma hostilidade entre ti e a mulher", diz o Senhor Deus à serpente, "e entre tua linhagem e a dela; ela te esmagará a cabeça e tu lhe ferirá o calcanhar". Nessas palavras, não há a menor alusão a um Redentor, e a mais sutil das inteligências não poderia extrair delas, tal como figuram no terceiro capítulo da Gênese, qualquer referência àquilo que os cristãos pretendem encontrar. Por outro lado, nas tradição e no Livro de Manu, Brahmâ promete diretamente ao primeiro casal enviar-lhes o caminho da salvação. "É dos lábios de um mensageiro de Brahmâ, que nascerá em Kurukshetra, Matsyam e na terra de Pañchâla, também chamada Kanya-Kuba [montanha da Virgem], que todos os homens da Terra aprenderão seu dever", diz Manu (Livro II, slokas 19 e 20). Os mexicanos chamam o Pai de sua Trindade de Izamna, o Filho, Bacab, e o Espírito Santo, de Echuak, "e dizem que a receberam [a doutrina] de seus ancestrais". Entre as nações semitas, podemos remontar a Trindade aos dias pré-históricos do fabuloso Sesostris, que é identificado por mais de um crítico com Nimrod, "o poderoso caçador". Manetho faz o oráculo recriminar o rei, e este pergunta em seguida: "Dizme ó forte no fogo, quem, mais do que eu, poderia subjugar todas as coisas? E quem, depois de mim?" E o oráculo disse: "Em primeiro lugar, Deus, logo o Verbo, e, depois, o Espírito".
CAPÍTULO II CRIMES CRISTÃOS E VIRTUDES PAGÃS ARTES OCULTAS PRATICADAS PELO CLERO, E AS CABEÇAS FALANTES.
(L. 3. pág.
61).
Já foi muitas vezes atestado o fato de que o Papa Silvestre II foi acusado publicamente pelo Cardeal Benno de ser feiticeiro e encantador. A impudente "cabeça oracular" feita por sua Santidade era da mesma espécie daquela fabricada por Alberto Magno. Esta última foi reduzida a pedaços por Tomás de Aquino, não porque fosse obra de um "demônio" ou fosse habitada por ele, mas porque o espetro que estava fixado no seu interior, por poder mesmérico, falava incessantemente e a sua verborréia atrapalhava o eloqüente santo na resolução dos seus problemas matemáticos. Essas cabeças e outras estátuas falantes, troféus da habilidade mágica dos monges e dos bispos, eram fac-símele dos deuses "animados" dos templos antigos. A acusação contra o Papa foi validada naquela época. Demonstrou-se também que ele era constantemente servido por "demônios" ou espíritos. Benedito IX, João XX e os Gregórios VI e VII, todos conhecidos como mágicos. O último Papa, além disso, foi o famoso Hildebrando, de quem se dizia ser perito em "extrair relâmpagos das suas mangas". Uma expressão que faz o Sr. Howitt, um venerado escritor espiritista, pensar que "aí está a origem do famoso trovão do Vaticano". "A Santa Inquisição", está instituição imortal do Cristianismo não ficou sem o seu Dante que lhe cantasse uma louvação. "Macedo, um jesuíta português", diz o autor de Demonologia, "descobriu a `origem da Inquisição' no paraíso terrestre e se atreve a alegar que Deus foi o primeiro a exercer as funções de um inquisitor contra Caim e os operários de Babel!" (Encontramos algumas afirmações interessantes do Livro Conflict between Religion and Science do Prof. Draper. ã p. 246, ele diz: “As famílias dos condenados eram lançadas a uma ruína irrecuperável. Llorente, o historiador da Inquisição, salienta que Torquemada e os seus colaboradores, no curso de dezoito anos, queimaram no poste 10.220 pessoas, 6.860 em efígie e puniram 97.321! (...) Com repugnância e indignação indizíveis, ficamos sabendo que o governo papal ganhou muito dinheiro com a venda aos ricos de indugências que os livrassem da Inquisição”.)
Em lugar algum, durante a Idade Média, foram as artes da magia e da bruxaria mais praticadas pelo clero do que na Espanha e em Portugal. Os mouros eram profundamente versados em ciências ocultas e em Toledo, Servilha e Salamanca estiveram, numa escola de Magia. Os cabalistas desta última cidade eram hábeis em todas as ciências abstrusas; conheciam as virtudes das pedras preciosas e de outros minerais e extraíam da Alquimia os seus mais profundos segredos. CONSIDERAÇÕES SOBRE DIABOS, ARTIGOS DE FÉ E A BÍBLIA.(L. 3 pág. 69). Já mencionamos a confissão de um eminente prelado a respeito de que a eliminação de Satã da Teologia seria fatal para a perpetuidade da Igreja. Mais isto só é parcialmente verdadeiro. O Príncipe do Pecado não mais existiria, mas o pecado sobreviveria se o Diabo fosse aniquilado, os Artigos de fé e a Bíblia continuariam a existir. Em suma, haveria ainda uma revelação pretensamente divina e a necessidade de intérpretes que se dizem inspirados. Devemos, portanto, considerar a autenticidade da Bíblia em si mesma. Devemos, estudar as sua páginas e ver se elas, na verdade, contêm os mandamentos da Divindade ou se são apenas um compêndio de tradições antigas e de mitos antiquados. Devemos tentar interpretá-las por nós mesmos - se possível. Quanto aos pretensos intérpretes, a única assimilação possível que podemos encontrar para eles na Bíblia é compará-los ao homem descrito pelo sábio rei Salomão nos seus Provérbios, ao perpetrador dessas “seis coisas (...) ou sete (...) que o Senhor odeia” e que são uma abominação para Ele, a saber: “um olhar altivo, uma língua mentirosa e mãos que derramam sangue inocente; um coração que maquina malvadíssimos projetos, pés prontos para correr ao mal; uma testemunha falsa que profere mentiras e o que semeia discórdias entre seus irmãos”. “Quando os demônios”, diz Agostinho, “se insinuam nas criaturas, começam por se conformar à vontade de cada um. (...) A fim de atrair os homens, começam por seduzi-los, simulando obediência. (...) Como se poderia saber, sem instrução dos próprios demônios, do que eles gostam e o que eles odeiam; o nome que atrai, ou aquele que os força a obedecer, toda essa arte, em suma, da magia, a síntese da ciência dos mágicos?” A esta impressionante dissertação do “Santo”, acrescentamos que nenhum mágico jamais negou que tivesse aprendido a arte por intermédio dos “espíritos”, quer estes tivessem agido sobre ele, um médium, independentemente da sua vontade, ou tivesse sido ele iniciado na ciência da “evocação’ por seus ancestrais
que a conheceram antes dele. Mas quem ensinou o exorcista, o padre que se reveste de uma autoridade não só sobre o mágico, mas também sobre todos esses “espíritos”, aos quais denomina demônios e diabos desde o momento em que eles obedecem apenas a ele? Ele deve ter aprendido em algum lugar e com alguém a manejar o poder que ele pretende possuir. Pois, pergunta Agostinho, “(...) como se poderia saber, sem instrução dos próprios demônios (...) o nome que atrai, ou o que os força a obedecer?” É inútil observar que conhecemos de antemão a resposta: “A Revelação (...) do dom divino (...) O Filho de Deus; não, o próprio Deus, por intermédio do Seu Espírito, que desceu sobre os apóstolos como o fogo pentecostal e que agora se diz obscurecer todo padre que pretende exorcizar por glória ou por dom. AS FILOSOFIAS COMPARADAS. (L. 3. pág. 82). Nunca houve nem haverá uma filosofia verdadeira - pagã, gentia, judaica ou cristã - que tenha seguido a mesma linha de pensamento. Gautama Buddha reflete-se nos preceitos de Cristo; Paulo e Fílon, o Judeu, são ecos fieis de Platão; e Amônio Saccas e Plotino conseguiram a sua glória imortal combinando os ensinamentos de todos os grandes mestres da verdadeira filosofia. "Provei todas as coisas; prendei-vos ao que é bom" - parece ser a divida de todos os irmãos do mundo. Menos para os intérpretes da Bíblia. A semente de Reforma foi plantada no dia em que o segundo capítulo da Epístola Católica de São Tiago entrou em conflito com o capítulo 11 da Epístola aos Hebreus, no mesmo Novo Testamento.(Dá-se o testemunho da Fé.) Quem acredita em Paulo não pode acreditar em Tiago, Pedro e João. (Do livro A Sabedoria Tradicional de H.P.B. pg. 192. HPB cita o seguinte: “Fé na Autoridade, e Fé na Intuição; a primeira é credulidade e superstição humanas, e a outra Crença e Intuição humanas. A Fé na autoridade, é baseada simplesmente em fontes humanas, ao passo que na Intuição ela têm como base à lógica e razão rigorosas, ou seja, à Fé do referido Apostolo.) Para serem cristãos como seu apóstolo, é
preciso que os paulinos combatam Pedro "face a face"; e, se Pedro "deve ser censurado" e se estava errado, então ele não era infalível. Como pode então o seu sucessor (?) se orgulhar da sua infalibilidade? Todo reino dividido contra si mesmo está certo da ruína; e toda casa dividida contra si mesma com certeza ruirá. Uma pluralidade de mestres é tão fatal em religião, quanto em política. O que Paulo pregou foi pregado por qualquer outro filósofo místico. "Mantende-vos firmes na liberdade em que Cristo vos fez livres e não vos sujeiteis novamente ao jugo da servidão! - exclama o honesto filósofo-apóstolo; e acrescenta, profeticamente inspirado: "Mas, se vos morderdes e vos devorardes uns aos outros, cuidado para que não sejais destruídos uns pelos outros".(Gálatas, V, 1,15.). A TRADIÇÃO DO RITUAL CABALÍSTICO, COMPARADO AO CATÓLICO ROMANO. (L. 3. pág. 83).
Eis a tradução do Ritual cabalístico e daquilo que se conhece geralmente como Ritual romano. Este último foi promulgado em 1851 e 1852, sob a sanção do Cardeal Engelbert, Arcebispo de Malines, e do Arcebispo de Pais. Falando sobre ele, o demonólogo des Mousseaux afirma: "É o ritual de Paulo V, revisto pelo mais erudito dos papas modernos, Benedito XIV, contemporâneo de Voltaire". CABALÍSTICO (judaico e pagão)
CATÓLICO ROMANO
Exorcismo do Sal O Padre-Mágico abençoa o Sal e diz: "Criatura de Sal, que a SABEDORIA [de Deus] esteja em ti; que ela preserve de toda corrupção as nossas mente e os nossos corpos. Por Hokhmael, [Deus da sabedoria] e pelo poder de Ruah Hokhmael [Espírito do Espírito Santo] que os Espíritos da matéria (espíritos maus) fujam diante dele. (...) Amém."
Exorcismo do Sal O Padre abençoa o Sal e diz: "Criatua de Sal, eu te exorcizo em nome do Deus vivo (...) sê a saúde da alma e do corpo! Por toda parte onde fores lançados, que o espírito impuro seja posto em fuga. (...) Amém".
Exorcismo da Água (e das Cinzas) "Criatura da Água, eu te exorcizo (...) pelos três nomes que são Netzah, Hode e Yesod [trindade cabalística], no começo e no fim, por Alfa e Ômega, que estão no Espírito Azoth [Espírito Santo, ou a `Alma Universal'], eu te exorcizo e adjuro. (...) Águia errante, que o Senhor te comande pelas asas do touro e de sua espada flamejante." (O querubim postado à porta leste do Éden.) Exorcismo de um Espírito Elemental "Serpente, em nome do Tetragrammaton, o Senhor; Ele te ordena, pelo anjo e pelo leão.
Exorcismo da Água "Criatura da água, em nome de Deus Todo-Poderoso, do Pai, do Filho e do Espírito Santo (...) sê exorcizado. (...) Eu te adjuro em nome do Cordeiro (...) O mágico diz touro ou boi - per alas tauri] do Cordeiro que caminha sobre o basilisco e a alfazema e que esmaga sob seus pés o leão e o dragão." Exorcismo do Diabo (.................................................................)
"Anjo da escuridão, obedece e foge com esta água santa [exorcizada]. Águia em cadeias obedece a esse sinal, e retira-te diante do sopro. Serpente móvel, arrasta-te a meus pés, ou sê torturada por este fogo sagrado e evapora-te diante desse incenso santo. Que a água volte à água [o espírito elemental da água]; que o fogo queime e o ar circule; que a terra volte à terra em virtude do Pentagrama, que é a Estrela da Manhã, e em nome do Tetragrammaton que é traçado no centro da Cruz de Luz. Amém."
"Ó Senhor, que aquele que carrega consigo o terror fuja, atacado pelo terror e que seja vencido. Ó tu, que és a Serpente Antiga (...) treme diante da mão daquele que, tendo triunfado das torturas do inferno [?] - devictis gemitibus inferni - chamou as almas à luz. (...) Quanto mais decaíres, mais terrível será a tua tortura (...) por parte d'Aquele que reina sobre os vivos e os mortos (...) e que julgará o século pelo fogo, saeculum per ignem, etc. Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém".
O SINAL DA CRUZ, NOS RITOS SAGRADOS. (L. 3. pág. 84). Seria realmente muito doloroso tirar de Roma, de uma única vez, todos os seus símbolos; mas é preciso fazer justiça aos hierofantes despojados. Muito tempo antes que o sinal da Cruz fosse adotado como símbolo cristão, ele era empregado como um sinal secreto de reconhecimento pelos neófitos e pelos adeptos. Diz Lévi (Éliphas Lévi): "O sinal da Cruz adotado pelos cristãos não pertence exclusivamente a eles. Ele é cabalístico e representa as oposições e o equilíbrio quaternário dos elementos. Constatamos, na estrofe oculta do Pater, que havia originalmente duas maneiras de fazê-lo, ou pelo menos duas formulas muito diferente de expressar o seu significado - uma reservada aos padres e aos iniciados; e outra, comunicada aos neófitos e aos profanos. Assim, por exemplo, o iniciado, levando a mão à fronte, diz: A Ti; então ele acrescentava pertencem; e continuava, enquanto levava a mão ao peito - o reino; ao ombro direito - e o perdão. Então ele juntava as mãos, acrescentando: através dos ciclos geradores: `Tibi sunt Malkhuth, et Geburah et Hesed, per Aeonas' - um sinal da Cruz total e magnificamente cabalístico, que as profanações do gnosticismo fizeram a Igreja militante e oficial perder completamente". O APÓSTOLO PAULO, PERTENCIA AO "CIRCULO" DOS INICIADOS. (L. 3. pág. 86). O Apóstolo dos Gentios era corajoso, franco sincero e muito culto; o Apóstolo da Circuncisão era covarde, cauteloso, insincero e muito ignorante. Não há nenhuma dúvida de que Paulo foi, parcialmente pelo menos, se não totalmente, iniciado nos mistérios teúrgicos. A sua linguagem, a fraseologia tão peculiar aos filósofos gregos, certas expressões usadas pelos iniciados são muitos sinais audíveis para essa suposição. Nossa suspeita foi reforçada por um artigo muito bem escrito, publicado em jornais nova-iorquinos, intitulado Paul and Plato, em que seu autor emite uma observação notável e, para nós muito precisa. Nas suas Epístolas aos Coríntios, ele nos mostra um Paulo abundante em "expressões sugeridas pelas iniciações de Sabazius e Elêusis e pelas leituras dos filósofos [gregos]. Ele [Paulo] se diz um idiôtes - uma pessoa ignorante no que concerne à Palavra, mas não à gnosis ou conhecimento filosófico. `Dizemos sabedoria entre os prefeitos ou iniciados' - escreve ele - `não a sabedoria divina num mistério, secreta - que nenhum dos arcontes deste mundo conheceu'". (I Coríntios,II,6,7,8.) O que mais quer o apóstolo dizer com estas palavras inequívocas, senão que ele próprio, que fazia parte dos mystae (iniciados), falava de coisas expostas e explicadas apenas nos mistérios? A "sabedoria divina num mistério que nenhum dos arcontes deste mundo conheceu" faz evidentemente alguma referência direta ao basileus da iniciação eleusiniana que ele conhecia. O basileus pertencia à comitiva do grande hierofante e era um arconte de Atenas; e, assim, era um dos principais mystae, pertencente aos mistérios interiores, aos quais apenas um número muito seleto e pequeno tinha acesso. Os magistrados que supervisionavam os eleusinos eram chamados arcontes. Uma outra prova de que Paulo pertencia ao círculo dos "iniciados" repousa no seguinte fato. Sua cabeça foi tosquiada em Anchrea (onde Lúcio Apuleio foi iniciado) porque "ele tinha um voto". Os nazars ou os postos à parte -, como vemos nas Escrituras judaicas, tinham de cortar seus cabelos, que usavam longos, e que "nenhuma navalha tocou" em tempo algum, e sacrificá-los no altar da iniciação. E os nazars eram uma classe de teurgos caldeus. Veremos depois que Jesus pertenceu a essa classe. Paulo declara que "De acordo com a graça de Deus que me foi dada, como sábio arquiteto lancei o fundamento". Esta expressão, arquiteto, usada apenas uma vez em toda a Bíblia, e justamente por Paulo, pode ser considerada como uma verdadeira revelação. Nos mistérios, a terceira parte dos ritos era chamada Epopteia, ou revelação, recepção dos segredos. Em substância, ela significa aquele estágio de clarividência divina em que tudo o que pertence a esta Terra desaparece e a visão terrena é paralisada e a alma pura e livre une-se ao seu Espírito, ou Deus. Mas a significação real da palavra é "vigilante", de eu me vejo. Em sânscrito, a palavra avâpta tem o mesmo significado, e também o de obter. A palavra epopteia é um composto, de sobre e de, ver, ou ser um vigilante, um inspetor - também utilizada para um arquiteto. O título de mestre-pedreiro, na Francomaçonaria, deriva daí, no sentido que ele tinha nos mistérios. Em conseqüência, quando Paulo se diz ser um
"arquiteto", ele está usando uma palavra eminentemente cabalística e maçônica, e que nenhum dos outros apóstolos utiliza. Assim, ele se declara um adepto, que tem o direito de iniciar outros. Se pesquisarmos nessa direção, como esses guias seguros, os mistérios gregos e a Cabala, diante de nós, será fácil encontrar a razão secreta pela qual Paulo foi tão perseguido e odiado por Pedro, João e Tiago. O autor da Revelação era um cabalista judeu pur sang, com toda a aversão aos mistérios herdada por ele de seus ancestrais. (Não é necessário afirmar que o Evangelho segundo São João não foi escrito por João, mas por um platônico ou gnóstico pertencente à escola neoplatônica.) O ciúme que sentia durante a vida de Jesus estendeu-se a Pedro; e foi só depois da morte do seu Mestre comum que vemos os dois apóstolos - dos quais o primeiro vestiu a Mitra e o Petalon dos rabinos judaicos - pregar com tanto zelo o rito da circuncisão. Aos olhos de Pedro, Paulo, que o humilhara, e ao qual considerava ser superior a ele em "conhecimentos gregos" e Filosofia, devia parecer naturalmente um mágico, um homem poluído com a "Gnoses", com a "sabedoria" dos mistérios gregos - e, talvez, "Simão, o Mago". (O fato de Pedro ter perseguido o "Apóstolo dos Gentios", com esse nome, não implica necessariamente que não existisse um Simão, o Mago, individualmente distinto de Paulo. Ele deve ter-se tornado um nome genérico de ofensa. Theodoret e Crissóstomo, os primeiros e mais prolíficos comentadores do gnosticismo daquela época, parecem fazer de Simão um rival de Paulo e afirmam que eles trocaram muitas mensagens entre si. O primeiro, um diligente propagandista daquilo que Paulo chama de "antítese da Gnose" (I Timóteo, VI,20), deve ter sido um espinho doloroso nas costelas do apóstolo. Há provas suficientes da existência real de um Simão, o Mago.) Quanto a Pedro, a crítica bíblica já mostrou que ele talvez não tivesse nada a ver com a fundação da Igreja latina em Roma, senão fornecer o pretexto de que o astucioso Irineu se aproveitou para fazer beneficiar essa Igreja com o novo nome do apóstolo - Petros ou Kêphas, um nome que se prestava tão bem, com um jogo de palavra, para ser associado ao de Petroma, o duplo jogo de tabletes de pedra usados pelo Hierofante nas iniciações durante o mistério final. Nisso, talvez, repouse escondido todo o segredo das pretensões do Vaticano. Como o Prof. Wilder tão bem sugere: "Nos países orientais, a designação Pether, [em fenício e em caldaico, um intérprete] parece ter sido o título desse personagem [o Hierofante]. (...) Há nesses fatos uma reminiscência das circunstâncias peculiares da lei mosaica (...) assim como a pretensão do Papa de ser o sucessor de Pedro, o Hierofante ou intérprete da religião cristã". Uma inscrição encontrada no túmulo da Rainha Menthu-hetep, da 11ª dinastia (2.782 a.C.), que se reconheceu ter sido transcrita do sétimo capítulo do Livro dos mortos (que data de pelo menos 4.500 a.C.), é mais do que sugestiva. Esse texto monumental contém um grupo de hieróglifos que, interpretados, se lêem: PTR. RF. SU. Peter - ref - su. A palavra, PTR, foi interpretada, parcialmente devido a uma outra palavra escrita num outro grupo de hieróglifos, sobre uma estrela, sob a forma de um olho aberto. Bunsen menciona ainda outra explicação de PTR - "mostrar". "Parece-me" - observa ele - "que nosso PTR é literalmente a forma `Patar' do velho aramaico e do hebraico, que ocorre na história de José como a palavra específica para interpretação; donde Pitrun deva ser o termo para interpretação de um texto, de um sonho". Num manuscrito do século I, uma combinação de textos demóticos e gregos, provavelmente um dos poucos que escaparam miraculosamente ao vandalismo cristão dos séculos II e III, quando todos esses manuscritos preciosos foram queimados sob acusação de Magia, encontramos diversas vezes repetidas uma frase que, talvez, possa lançar luzes sobre essa questão. Com relação a um dos heróis principais do manuscrito, constantemente referido como "o Iluminador Judeus" ou Iniciado, acredita-se que ele só se comunique com o seu Patar; esta palavra está escrita em caracteres caldaicos, e é associada, uma vez com o nome Shimeon. Muitas vezes, o "Iluminador", que raramente interrompe sua solidão contemplativa, nos é mostrado habitando uma caverna e ensinando, não oralmente, mas por intermédio do Patar, as multidões de discípulos ávidos de aprender que se postavam do lado de fora. O Patar recebe as palavras de sabedoria aplicando o ouvido a um buraco circular escavado num tabique que ocupa o instrutor dos seus ouvintes e as transmite à multidão, com explicações e comentários. Este era, com pequenas modificações, o método utilizado por Pitágoras, que, como sabemos, nunca permitiu que os seus neófitos o vissem durante os anos de provação, mas os instruída postado atrás de uma cortina que fechava a entrada da sua caverna. Mas, fosse o "iluminador" do manuscrito grego-demótico idêntico a Jesus ou não, continua válido o fato de que o vemos servir-se de um termo usado nos "mistérios" para designar aquele que mais tarde a Igreja católica elevará à categoria de porteiro do Reino do Céu e de intérprete da vontade de Cristo. A palavra Patar ou Peteer coloca ambos, mestre e discípulo, no círculo da iniciação e em relação com a "Doutrina Secreta". O
grande Hierofante dos antigos mistérios nunca permitiu que os candidatos o vissem ou ouvissem pessoalmente. Ele era o deus ex machina, a Divindade invisível que preside, transmitindo sua vontade e suas instruções por meio de um intermediário; e, 2.000 anos depois, descobrimos que os Taley-Lamas do Tibete seguiram por séculos o mesmo programa tradicional durante os mistérios religiosos mais importantes do Lamaísmo. Se Jesus conheceu o significado secreto do título que ele atribuiu a Simão, então ele era um iniciado; de outra maneira, ele não o teria conhecido; e se ele era um iniciado dos essênios pitagóricos, dos magos caldaicos ou dos padres egípcios, então a doutrina ensinada por ele era apenas uma porção da "Doutrina Secreta" ensinada pelos hierofantes pagãos aos poucos adeptos selecionados admitidos aos áditos sagrados. OS RITOS E VESTIMENTAS CERIMONIAIS. (L. 3. pág. 89). Por ora indicaremos sumariamente a extraordinária similaridade - ou antes identidade, deveríamos dizer - de ritos e de vestimenta cerimonial do clero cristão com os dos babilônios, dos assírios, dos fenícios, dos egípcios e de outros pagãos da Antigüidade. Se quisermos descobrir o modelo da tiara papal, devemos procurar os anais das lâminas assírias antigas. Convidamos o leitor a prestar a sua atenção à obra ilustrada do Dr. Inman, Ancient Pagan and Modern Christian Symobolism. Na p.64, reconhecerá prontamente a cobertura da cabeça de São Pedro no turbante usado pelos deuses ou anjos na antiga Assíria, "onde ela figura coroada por um emblema da trindade masculina" (a cruz cristã). "Podemos mencionar, de passagem", acrescenta o Dr. Inman, que, da mesma maneira que os católicos romanos adotaram a mitra e a tiara da `raça maldita de Ham', também adotaram o cajado episcopal dos áugures da Etrúria e a forma artística que emprestam aos seus anjos foi tomada aos pintores e aos fabricantes de urnas da Magna Grécia e da Itália Central". "Imaculada é Nossa Senhora Ísis", é a legenda inscrita numa gravura de Serapis e Ísis, descrita por King, em The Gnostics and their Remains, `Imaculada é Nossa Senhora Ísis', termos idênticos que foram aplicados posteriormente à personagem que se lhe seguiu em forma, títulos, símbolos, ritos e cerimônias (...) Assim, seus devotos transferiram ao novo sacerdócio as antigas insígnias da sua profissão, a obrigação do celibato, a tonsura e a sobrepeliz, omitindo, infelizmente, as abluções freqüentes prescritas pelo antigo credo”. Diante do santuário de Júpiter Ammon estavam suspensos sinos tilintantes, e era ao som dessas campainhas que os padres recebiam os seus augúrios; "um sino dourado e uma romã (...) ao redor da fímbria do manto", foi o resultado obtido entre os judeus mosaicos. Mas no sistema budista, durante os serviços religiosos, os deuses do Deva-Loka são sempre invocados e convidados a descer sobre os altares por meio de soar dos sinos suspensos nos pagodes. O sino da mesa sagrada de Shiva, em Kuhama, está descrito em Kailâsa e todo vihâra ou Lamaseria budista tem os seus sinos. Vemos, assim, que os sinos usados pelos cristãos provêm diretamente dos tibetanos budista e dos chineses. As contas e os rosários têm a mesma origem e foram usados pelos monges budistas por cerca de 2.300 anos. Os lingas dos tempos hindus são decorados em certas datas com grandes bagas provenientes de uma árvore consagrada a Mahâ-Deva e enfiadas em forma de rosário. O título de "monja" [nun, em inglês N.T.] é uma palavra egípcia e tinha para os egípcios o mesmo significado atual; os cristãos nem se deram ao trabalho de traduzir a palavra Nonna. A auréola dos santos foi usada pelos artistas antediluvianos da Babilônia toda vez que desejavam honrar ou deificar a cabeça de um mortal. AS VIRTUDES DO DIVINO MANU. A GRADUAÇÃO DOS MISTÉRIOS. (L. 3. pág. 92). "Ninguém que não tenha praticado, durante toda a sua vida, 10 virtudes que o divino Manu exige como um dever, pode ser iniciado nos mistérios do concílio", dizem os livros hindus de iniciação. Essas virtudes são: "a resignação; o hábito de fazer o bem em vez do mal: a temperança; a probidade pureza; a castidade; o domínio dos sentidos físicos; o conhecimento das Escrituras Sagradas; o da alma [espírito] Superior; a veracidade; a paciência". Só essas virtudes devem dirigir a vida de um verdadeiro iogue. "Nenhum adepto indigno deverá sujar com a sua presença as fileiras de iniciados santos durante 24 horas". O adepto é tido como acusado, se violar qualquer um desses votos. Certamente a prática dessas virtudes é incompatível com a noção de uma adoração do diabo ou de uma vida de lascívia! Quando homens como Pitágoras, Platão e Jâmblico, famosos por sua moralidade serena, tomavam parte nos mistérios e falavam dele como veneração, não convém aos nossos críticos modernos julgá-los tão precipitadamente tendo como base apenas o seu aspeto externo. Jâmblico fornece as descrições dos mais audaciosos; e a sua explicação, vinda de uma mente sem preconceito, deveria parecer perfeitamente plausível. "Exibições desse tipo", diz ele, "nos mistérios, pretendiam livrar-nos das paixões licenciosas, satisfazendo-nos a visão e ao mesmo tempo eliminando todo pensamento mau, por meio da santidade terrível que
acompanhava esses ritos". "Os homens mais sábios e melhores do mundo pagão", acrescenta o Dr. Warburton, "são unânimes em dizer que os mistérios foram instituídos puros e se propunham aos fins mais nobres pelos meios mais louváveis". Embora pessoas de ambos os sexos e de todas as classes pudessem participar desses ritos célebres, e mesmo que uma certa participação fosse obrigatória, pouco numerosos eram aqueles que atingiam a iniciação final e mais elevada. A gradação dos mistérios foi-nos dada por Proclo, no quarto livro da sua Teologia de Platão. "O rito perfectivo [teletê] precede a iniciação, o apocalipse final, epopteia." Teon de Esmirna, na sua Matemática, também divide os ritos dos mistérios em cinco partes: "a primeira consiste na purificação prévia, pois os mistérios não são transmitidos a todos que os querem receber; mas há algumas pessoas que são impedidas pela voz do arauto (...) pois é necessário que aqueles que não desejam ser excluídos dos mistérios, sejam primeiramente, aprimorados por certas purificações às quais se seguem os ritos sagrados: mas a recepção dos ritos sagrados sucede à purificação. A terceira parte é denominada epopteia, ou recepção. E a quarta, que é o fim e o objetivo da revelação, consiste em enfaixar a cabeça e cingi-la com as coroas (...) após o que ele [o iniciado] se torna um portador do archote, ou um Hierofante dos mistérios, ou exerça outra função qualquer no ofício sacerdotal. Mas a quinta, que é o resultado de todas as anteriores, é a amizade e a comunhão interior com Deus (...). E este era o último e o mais solene dos mistérios. Houve escritores que perguntaram freqüentemente qual seria o significado desta pretensão de "amizade e comunhão interior com Deus". Autores cristãos negaram as pretensões dos "pagãos" em relação a essa "comunhão", afirmando que só os santos cristãos foram e eram capazes de desfrutá-la; cépticos materialistas escarneceram das idéias de ambos. Após longos séculos de materialismo religioso e de estagnação espiritual, ficou bastante difícil, se não impossível, estabelecer com clareza as pretensões de cada parte. Os gregos antigos, que uma vez acorreram em multidões ao Agora de Atenas, com o seu altar ao "Deus Desconhecido", não mais existem; e os seus descendentes acreditam firmemente que encontraram o "Desconhecido" no Jeová dos judeus. Os êxtases divinos dos cristãos primitivos deram lugar a visões de caráter mais moderno, em relação perfeita com o progresso e a civilização. O "Filho do Homem" que aparecia nos êxtases embevecidos dos primeiros cristãos, vindo do sétimo céu, numa nuvem de glória e cercado de anjos e serafins alados, cedeu lugar a um Jesus mais prosaico e ao mesmo tempo mais comercial. Este nos é mostrado agora fazendo uma visita matinal a Maria e Marta na Betânia; sentando-se na "otomana" com sua irmã caçula, admiradora da "ética", enquanto Marta passa o tempo na cozinha preparando a refeição. E logo a imaginação febril de um pregador blasfemo e arlequim do Brooklin, o Rev. Dr. Talmage, no-la representa atarefada, "suor na fronte, o jarro numa mão e pinças na outra (...) na presença de Cristo", repreendendo-o vivamente por permitir que sua irmã `fizesse sozinha' todo o serviço". Desde o nascimento da concepção solene e majestosa da Divindade não-revelada dos antigos adeptos até essas descrições caricaturais daquele que morreu na Cruz por sua devoção filantrópica para com a Humanidade, muitos séculos se passaram e parece que o seu peso apagou, quase completamente, todo sentido de uma religião espiritual dos corações de seus seguidores confessos. Não espantam então, que a frase de Proclo não seja mais compreendida pelos cristãos e seja rejeitada como um "capricho" pelos materialistas, que, em sua negação, são menos blasfemos e ateus do que muitos dos reverendos e membros das igrejas. A DOUTRINA HINDU DOS PITRIS. (L. 3. pág. 99). No livro I do Gênese hindu, o Livro da Criação de Manu, os pitris são chamados de ancestrais lunares da raça humana. Eles pertencem a uma raça de seres diferentes da nossa e eles não podem ser chamados propriamente de "espíritos humanos" no sentido em que os espiritualistas usam esse termo. Eis o que se diz deles: "Eles [os deuses] criaram então os Yakshas, os Râkchasas, os Pisâchas (Pisâchas, demônios da raça dos gnomos, dos gigantes e dos vampiros.), Gandharvas (Gandharvas, demônios bons, serafins celestiais, cantores.), as Apsarasas, e os Asuras, os Nâgas (Os Asuras e os Nâgas são os espíritos titânicos e o dragão ou espírito com cabeça de serpente.) os Sarpas e os Suparnas e os Pitris - ancestrais lunares da raça humana" (Ver Institutes of Manu, livro I, sloka 37, onde os pitris são chamados de "progenitores da Humanidade").
Os pitris são uma raça de espíritos distintos que pertencem à hierarquia mitológica, ou antes à nomenclatura cabalística, e devem ser incluídos entre os gênios bons, os daemons dos gregos, ou os deuses inferiores do mundo invisível; e, quando um faquir atribui os seus fenômenos aos pitris, ele só quer dizer aquilo que os antigos filósofos e teúrgicos pretendiam, quando afirmavam que todos os "milagres" eram obtidos com a intervenção dos deuses, ou dos daemons bons e maus, que controlam os poderes da Natureza, os elementais, que são subordinados ao poder daquele "que sabe". Um faquir chamaria uma aparição ou um fantasma humano de palît, e um espírito feminino de pichalpâî, não de pitri. É verdade que pitarah significa
(no plural) pais, ancestrais; e piratâî é um parente; mas essas palavras são usadas com um sentido bastante diferente do que o dos pitris invocados nos mantrans. Afirmar, diante de um brâmane devoto ou de um faquir. que qualquer pessoa pode conversar com os espíritos dos mortos seria chocá-lo e isso lhe pareceria uma blasfêmia. A última estrofe do Bhâgavata-Purâna não diz que essa felicidade suprema só está reservada aos santos sanyâsins, aos gurus e aos iogues? Muito tempo antes de serem desembaraçadas de seus envoltórios mortais, as almas que só praticaram o bem, como as dos sannyâsins e dos vanaprasthas, adquirem a faculdade de conversar com as almas que as precederam no svarga." (Mansão Celestial, paraíso.). Nesse caso, os pitris, em vez de gênios, são os espíritos, ou antes, as almas dos desencarnados. Mas eles se comunicarão livremente apenas com aqueles cuja atmosfera for pura como as suas e a cujas kalâsas (invocações) poderosas eles podem responder sem riso de colocar em perigo a sua pureza celestial. Quando a alma do invocador alcançou o sâyujya, ou identidade perfeita de essências com a Alma Universal, quando a matéria é finalmente conquistada, então o adepto pode entrar livremente na comunhão de todos os dias e de todas as horas com aqueles que, embora aliviados de suas formas corpóreas, ainda estão progredindo por meio de uma série infindável de transformações inerentes na aproximação gradual do Paramâtman, ou a grande Alma Universal. A COMUNHÃO BRAMÂNICA DOS EGÍPCIOS. DESCIDA DA ALMA PARA A GERAÇÃO. (L. 3. pág. 102). Mesmos o episódio da Matrona Baubo - cujo modo excêntrico de consolação foi imortalizado nos mistérios menores - é explicado de uma maneira muito natural pelos mistagogos imparciais. Ceres-Deméter e as sua peregrinações terrestres à procura de sua filha são as representações evemerizadas de um dos assuntos mais metafísicos-psicológicos jamais tratados pela mente humana. É uma máscara para a narrativa transcendente dos videntes iniciados; a visão celestial da alma liberada do novo iniciado descrevendo o processo pelo qual a alma que ainda não encarnou desce pela primeira vez à matéria. "Bem-aventurado aquele que viu essas coisas comuns do mundo inferior; ele conhece tanto o fim da vida quanto a sua origem divina em Júpiter", diz Píndaro. Taylor demonstra, com base em mais de um iniciando, que os "espetáculos dramáticos dos mistérios menores eram destinados pelos antigos teólogos, os seus autores, a representar de uma maneira oculta a condição da alma impura investigada de um corpo terrestre por uma natureza material e física (...) que, na verdade, a alma, até ser purificada pela filosofia, morre após unir-se ao corpo (...)". O corpo é o sepulcro, a prisão da alma, e muitos padres cristãos admitiam com Platão que a alma é punida por sua união com o corpo. Esta é a doutrina fundamental dos budistas e de muitos brâmanes também. Quando Plotino observa que "quando a alma desceu para a geração [da sua condição semidivina], ela participa do mal e é levada para muito longe, num estado oposto à sua pureza e integridade primitiva, para ser completamente imersa em algo que nada mais é do que uma queda num lamaçal", ele está apenas repetindo os ensinamentos de Gautama Buddha. Se devemos acreditar nos iniciados antigos, devemos aceitar a sua interpretação dos símbolos. E se, além disso, vemo-los coincidir perfeitamente com os ensinamentos dos maiores filósofos e se vemos que o que sabemos simboliza o mesmo significado nos mistérios modernos do Oriente, então devemos acreditar que eles têm razão. Se Deméter era tida como a alma intelectual, ou antes a alma astral, metade emanação do espírito e metade corrompida pela matéria por sua sucessão de evoluções espirituais - podemos compreender facilmente a significação da Matrona Baubo, a Encantadora, que antes de conseguir reconciliar a alma, Deméter, com a sua nova posição, viu-se obrigada a assumir as formas sexuais de uma criança. Baubo é a matéria, o corpo físico, e a alma astral intelectual, ainda pura, não pode ser atirada em sua nova prisão terrestre a não ser que se apresente sob a forma de uma criança inocente. Até este momento, Deméter, ou Magna-mater, a Alma, vaga e hesita e sofre; mas, tendo bebido da poção mágica preparada por Baubo, esquece as suas penas; por um certo tempo ela se separa dessa consciência inteligente mais elevada que possuía antes de entrar no corpo de uma criança. A partir desse momento ela tentará reencontrá-la; e quando a idade da razão chaga a uma criança, a luta - esquecida durante os anos de infância - recomeça. A alma está colocada entre a matéria (o corpo) e o intelecto superior (o seu espírito imortal ou Nous). Qual dos dois ela conquistará? O resultado da batalha da vida reside na Tríade. (Tríade Superior, ou Corpo Espiritual, Âtma, Buddhi e Manas). É uma questão de alguns anos de desfrute físico na Terra e - se ela cometeu abusos - de dissolução do corpo terrestre, seguida da morte do corpo astral, que assim é impedido de se unir ao espírito superior da Tríade; só este nos confere a imortalidade individual; ou, por outro lado, a possibilidade de nos tornarmos mystae imortais; iniciados antes da morte do corpo nas verdades divinas da vida futura. Semideuses embaixo e DEUSES em cima.
Esse era o objetivo dos mistérios, tachado de diabólicos pela Teologia e ridicularizado pelos simbologistas modernos. Negar que há no homem certos poderes arcanos que ele desenvolve, pelo estudo psicológico, até o grau mais elevado, torna-se um Hierofante e então transmiti-lo a outros sob as mesmas condições de disciplina terrena é acusar de falsidade e de loucura os melhores, os mais puros e os mais sábios homens da Antigüidade e da Idade Média. Eles nunca permitiram que alguém suspeitasse daquilo que era dado ao Hierofante na última hora. E, entretanto, Pitágoras, Platão, Plotino, Jâmblico, Proclo e muitos outros conheciam os mistérios e afirmaram a sua realidade. Seja no "tempo interior", ou através do estudo privado da teurgia, ou pelo esforço de toda uma vida de trabalho espiritual, todos eles obtiveram a prova prática dessas possibilidades divinas para o homem na Terra em sua luta com a vida para merecer a vida na eternidade. Platão faz no Fedro (250 B, C) uma alusão ao que devia ser a última epopteia: "(...) iniciados nesses mistérios, aos quais é justo chamar de os mais sagrados de todos os mistérios (...) estamos livres das molestações dos males que nos esperariam períodos futuros. Da mesma maneira, em conseqüência dessa iniciação divina, tornamo-nos espectadores de visões divinas inteiras, simples, imóveis que têm sede na luz pura". Essa frase nos mostra que eles tinham visões, deuses, espíritos. Como Taylor observa corretamente, podemos concluir, dessa passagens emprestadas às obras dos iniciados, que "a parte mais sublime da opopteia (...) consistia na visão dos próprios deuses resplandecentes de luz", ou espíritos planetários superiores. A afirmação de Proclo a respeito desse assunto é inequívoca: "Em todas as iniciações e em todos os mistérios, os deuses apresentam-se sob muitas formas e surgem numa variedades de estados. E, às vezes, na verdade, eles se apresentam à visão numa luz sem forma; às vezes essa luz está de acordo com uma forma humana, e às vezes assume um estado diferente". "Tudo que existe sobre a Terra é a semelhança e a SOMBRA de algo que existe na esfera enquanto a coisa resplendente [o protótipo da alma-espírito] permanece numa condição imutável; o mesmo acontece com a sua sombra. Mas, quando a coisa resplendente se retira para longe de sua sombra, a vida também se retira para longe. E, entretanto, essa mesma luz é a sombra de algo mais resplendente do que ela mesma". Assim fala o Desâtîr, deixando ver assim a identidade das doutrinas esotéricas com as dos filósofos gregos. A segunda afirmação de Platão confirma nossa crença de que os mistérios dos antigos eram idênticos às iniciações, tal como são hoje em dia praticadas pelos adeptos budistas e hindus. As visões mais elevadas, as mais verdadeiras, são produzidas, não por estáticos naturais ou "médiuns", como às vezes erradamente se diz, mas por uma disciplina regular de iniciações graduais e de desenvolvimento de poderes psíquicos. Os mystai eram colocados em contato íntimo com aquilo que Proclo chama "naturezas místicas", "deuses resplendentes", porque, como diz Platão, "nós éramos puros e imaculados, libertos dessa vestimenta que nos cerca, e que denominamos corpo, ao qual estamos ligados como uma ostra à sua concha". A DOUTRINA DOS PITRIS PLANETÁRIOS. (L. 3. pág. 104). Assim, a doutrina dos pitris planetários e terrestres foi revelada totalmente na Índia antiga, como a conhecemos em nosso dias, apenas no momento da iniciação e aos adeptos dos graus superiores. São muito os faquires que, embora puros e honestos e devotados, nunca viram a forma astral de um pitri humano puro (um ancestral ou pai), senão no momento solene da sua primeira e última iniciação. É na presença de seu instrutor, o guru, e só antes que o vatu-faquir seja enviado ao mundo dos vivos, com sua vara de bambu de sete nós para sua proteção, que ele é colocado repentinamente face a face com a PRESENÇA desconhecida. Ele a vê e se prostra aos pés da forma evanescente, mas não lhe é confiado o grande segredo da sua evocação; pois ele é o mistério supremo da sílaba sagrada. O AUM contém a evocação da Tríade védica, a Trimûrti Brahmâ, Vishnu e Shiva, dizem os orientalistas; ela contém a evocação de algo mais real e objetivo do que essa abstração trina - dizemos nós, contradizendo respeitosamente os eminentes cientistas. É a Trindade do próprio Homem, em vias de se tornar imortal por meio da união solene do seu EGO - o corpo exterior, grosseiro, não sendo o invólucro levado em consideração nessa trindade humana. É quando essa Trindade, antecipando a reunião final triunfante além das portas da morte corpórea, torna-se durante alguns segundos uma UNIDADE, que o candidato é autorizado, no momento da iniciação, a contemplar seu Ego futuro. É assim que devemos interpretar o Desâtîr persa quando ali se fala do "Resplendente"; os filósofos-iniciados gregos, do Augoeides a brilhante "visão sagrada que reside na luz pura"; em Porfírio, quando diz que Plotino se uniu ao seu "deus" quatro vezes durante a sua vida. "Na Índia antiga, o mistério da Tríade, conhecido apenas dos iniciados, não podia, sob pena de morte, ser revelado ao vulgo", diz Brihaspati. Acontecia o mesmo nos mistérios da antiga Grécia e da Samotrácia. O mesmo acontece hoje. Ele está nas mãos dos adeptos e deve continuar sendo um mistério para o mundo, enquanto o erudito materialista o
considerar uma falácia indemostrável, uma alucinação insana e enquanto o teólogo dogmático o condenar como uma armadilha do Diabo. A comunicação subjetiva com os espíritos humanos, divinos, dos que nos precedem na terra silenciosa da bem-aventurança é dividida na Índia em três categorias. Sob a orientação espiritual de um guru ou sannyâsin, o vatu (discípulo ou neófito) começa a sentir a presença deles. Se não estivesse sob a tutela imediata de um adepto, ele seria controlado pelos invisíveis e estaria completamente a sua mercê, pois, entre essas influências, ele é incapaz de discernir o bom do mau. Feliz do sensitivo que estiver seguro da pureza de sua atmosfera espiritual! A esta consciência subjetiva, que é o primeiro grau, acrescenta-se, após algum tempo, o da clariaudiência. Este é o segundo grau ou estágio do desenvolvimento. O sensitivo - quando não foi submetido a um treinamento psicológico - agora ouve claramente, mas ainda é incapaz de discernir; é incapaz de verificar as suas impressões e está desprotegido contra os poderes astuciosos do ar que freqüentemente o enganam com vozes e palavras. Mas há a influência do guru; ela é o escudo mais poderoso contra a intrusão dos Bhûtnâ (demônio?) na atmosfera do vatu (discípulo ou neófitos), consagrado aos pitris puros, humanos e celestiais. O terceiro grau é aquele em que o faquir ou qualquer outro candidato sente, ouve e vê; e em que ele pode produzir, quando quiser, os reflexos dos pitris no espelho da luz astral. Tudo depende dos seus poderes psicológicos e mesméricos, que sempre são proporcionais à intensidade da sua vontade. Mas o faquir nunca controlará o Âkasa, o princípio espiritual da vida, o agente onipotente de todo fenômeno, no mesmo grau em que o faria um adepto da terceira e mais elevada iniciação. E os fenômenos produzidos pela vontade desses últimos geralmente não circulam pelos mercados a satisfação dos investigadores clamorosos. A unidade de Deus, a imortalidade do espírito, a crença na salvação apenas por nossos atos, mérito e demérito - esses são os principais artigos de fé da religião-sabedoria e as bases do Vedismo, do Budismo, do Parsismo; e constatamos que também o foram para o antigo Osirismo quando nós, abandonamos o deus-sol popular ao materialismo da ralé. "O PENSAMENTO escondia o mundo no silêncio e na escuridão. (...) Então o Senhor que existe por Si mesmo, e que não deve ser divulgado aos sentidos externos do homem, dissipou a escuridão e manifestou o mundo perceptível." "Aquele que pode ser percebido apenas pelo espírito, aquele que escapa aos órgãos dos sentidos, aquele que não tem nenhuma parte visível, que é eterno, a lama de todos os seres, aquele que nenhum pode compreender exibiu todo o Seu esplendor." Este é o ideal do Supremo, no pensamento de todo filósofo hindu. "Dentre todos os deveres, o principal é adquirir o conhecimento da alma suprema [O Espírito]; esta é a primeira de todas as ciências, pois só ela confere imortalidade ao homem." E os nossos cientistas falam do Nirvana de Buddha e do Moksha de Brahmâ como uma aniquilação completa! É assim que alguns materialistas interpretam os seguintes versos. "O homem que reconhece a Alma Suprema em sua própria casa, como também na de todas as criaturas, e que é igualmente justo para todos [homens ou animais], obtém a mais feliz de todas as sortes, a de ser finalmente absorvido no seio de Brahmâ." A doutrina do Moksha e do Nirvana, tal como foi compreendida pela escola de Maz Muller, não pode ser comparada com os inúmeros textos que se lhe poderiam opor, se desejasse, como uma refutação final. Há, em muitos pagodes, esculturas que contradizem totalmente essa acusação. Pedi a um brâmane que vos exprime o Moksha, dirigi-vos a um letrado budista e solicitai-lhe que vos defina o significado de Nirvana. Ambos responderão que em nenhuma dessas religiões o Nirvana representa o dogma da imortalidade do espírito. Que alcançar o Nirvana significa a absorção na grande Alma Universal, e que esta representa um estado, não um ser individual ou um deus antropomórfico, como alguns concebem a grande EXISTÊNCIA. Que um espírito, ao chegar a esse estado, se torna uma Parte do Todo integral, mas nunca perde a sua individualidade. Doravante, o espírito vive espiritualmente, sem temor de modificações posteriores de formas; pois a forma pertence à matéria, e o estado de Nirvana implica uma purificação completa e um livramento final até mesmo da partícula mais sublime de matéria. Essa palavra absorvido, quando se demonstra que os hindus e os budistas acreditam na imortalidade do espírito, deve significar necessariamente união íntima, nunca aniquilação. Que os cristão os chamem de idólatras, se ainda ousam fazê-lo, em presença da ciência e das últimas traduções dos livros sagrados sânscritos; eles não têm o direito de apresentar a filosofia especulativa dos sábios antigos como uma inconsistência e os próprios filósofos como loucos ilógicos. Com muito mais razão, poderíamos acusar os judeus antigos de niilismo. Não há uma única palavra nos Livros de Moisés - ou dos profetas - que, tomada
literalmente, implique a imortalidade do espírito. Entretanto, todos judeu devoto espera ser "recolhido no seio de A-Braham". SOCRATES, PROVA O PERIGO DA MEDIUNIDADE DESTREINADA. (L. 3. pág. 106). Os hierofantes e alguns brâmanes foram acusados de terem administrado bebidas fortes ou anestésicos aos seus epoptai para produzir visões que eles deveriam considerar como realidades. Eles se serviram e ainda se servem de beberagens sagradas que, como o Soma, possuem a propriedade de liberar a forma astral dos laços da matéria; mas nessas visões há muito pouco que se possa atribuir à alucinação, como nos vislumbres que o cientista, com ajuda do seu instrumento ótico, consegue do mundo microscópio. Um homem não pode perceber, tocar e conversar com o espírito puro por meio de nenhum dos seus sentidos corporais. Só um espírito pode conversar com um espírito e vê-lo; e mesmo a nossa alma astral, o Doppelgänger, é muito grosseira, muito tingida pela matéria terrena para que confiemos inteiramente em suas percepções e insinuações. O caso de Sócrates nos prova o perigo da mediunidade destreinada e como os sábios antigos, que o haviam compreendido, tinham razão em tomar suas precauções a esse respeito. O velho filósofo grego era um "médium"; em conseqüência, nunca fora iniciado nos mistérios, pois essa era a lei rigorosa. Mas ele possuía o seu "espírito familiar", como se dizia, o seu daimonion, e este conselheiro invisível tornou-se a causa de sua morte. Acredita-se geralmente que, se ele não foi iniciado nos mistérios, é por que ele mesmo não o quis. Mas os Anais secretos nos informam que foi porque ele não podia ser admitido aos ritos sagrados, e isso, precisamente, por causa da sua mediunidade. Havia uma lei contra a admissão não só daqueles que se sabia praticavam a feitiçaria, mas também daqueles que se acreditava possuírem um "espírito familiar". A lei era justa e lógica, porque um médium genuíno é mais ou menos irresponsável; e as excentricidades de Sócrates se explicam, de certa maneira, por este fato. Um médium deve ser passivo; e se ele tem uma fé cega no seu "espírito-guia", permitirá que este o domine, em vez de ser dominado pelas regras do santuário. Um médium dos tempos antigos, como o "médium" moderno, estava sujeito a entrar em transe sob dependência da vontade do "poder" que o controlava; assim, não se podia confiar a ele os terríveis segredos da iniciação final, "que não deveriam ser revelados, sob pena de morte". O velho sábio, em momentos descuidados de "inspiração espiritual", revelou aquilo que nunca havia aprendido e, assim, foi condenado à morte como ateu. Como, então é possível, tomando-se exemplos de Socrates, em relação às visões e às maravilhas dos opoptai do Templo Interior, afirmar que esses videntes, teurgos e taumaturgos fossem todos eles "espíritosmédium". Nem Pitágoras, Platão ou qualquer um dos últimos neoplatônicos mais importantes; nem Jâmblico, Longino, Proclo ou Apolônio de Tiana - nenhum deles foi médium; se o fossem, não teriam sido admitido nos mistérios, Taylor diz que "A afirmação das visões divinas nos mistérios está claramente confirmada por Plotino. E em suma, aquela evocação mágica formava uma parte do ofício sacerdotal dos mistérios e essa era a crença universal de toda a Antigüidade muito tempo antes dos primeiros platônicos" - tudo isto prova que, além da "mediunidade" natural existia, desde o começo dos tempos, uma ciência misteriosa, discutida por muitos, mas só conhecida por poucos. O uso dessa ciência comporta o desejo de reintegrar nosso único e verdadeiro lar - o pós-vida, e o desejo de uma união mais íntima com nosso espírito; o seu abuso é a bruxaria, a feitiçaria, a magia negra. Entre as duas está colocada a "mediunidade" natural; uma alma revestida de matéria imperfeita, um agente apropriado para uma ou para a outra e inteiramente dependente do ambiente da vida, da hereditariedade constitucional - tanto física quanto mental - e da natureza dos "espíritos" que atrai para si. Uma bênção ou uma maldição, conforme o caso, a menos que o médium seja purificado do lixo terrestre. A razão pela qual, em todas as épocas, muito pouco se sabe a respeito dos mistérios da iniciação é dupla. A primeira já foi explicada por mais de um autor e repousa na terrível penalidade que se seguia à menor indiscrição. A segunda corresponde às dificuldades sobre-humanas, aos perigos que o candidato corajoso dos tempos antigos tinha de enfrentar, e vencer ou morrer na tentativa, quando, o que é ainda pior, ele não perdia sua razão. Não havia perigo real para aquele cuja mente se tivesse espiritualizado completamente e que, desta maneira, estivesse preparado para as visões mais terríveis. Aquele que reconhecia o poder de seu espírito imortal e nunca duvidava em nenhum momento da sua proteção onipotente, nada tinha a temer. Mas infeliz do candidato em quem o menor temor físico - filho doentio da matéria o fizesse perder a visão da fé em sua própria invulnerabilidade. Aquele que não confiava totalmente em sua aptidão moral para aceitar o peso desses segredos extraordinários era condenado. O Talmude conta a história dos quatro Tannaim, que, em termos alegóricos, deviam entrar no jardim de delícias, isto é, ser iniciados na ciência oculta e final. "De acordo com os ensinamentos dos nossos santos mestres, os nomes dos quatro que entraram no jardim de delícias são Ben Asai, Ben Zoma, Aher e Rabbi A'qîbah (...)
"Ben Asai olhou e - perdeu a visão. "Ben Zoma olhou e - perdeu a razão. "Aher cometeu depredações na plantação" [misturou tudo e falhou]. "Mas Aîbah, que entrara em paz, saiu dali em paz, pois o santo cujo nome seja abençoado lhe disse `Este velho homem é digno de nos servir com glória'." A. Franck, em sua La Kabbale, diz-nos que "os comentadores eruditos do Talmude, os rabinos da sinagoga, explicam que o jardim de delícias em que as quatro personagens entraram não é senão esta ciência misteriosa, a mais terrível de todas as ciências para os intelectos fracos, e que leva diretamente à loucura". Aquele que tem o coração puro e que estuda com o objetivo de se aperfeiçoar e dessa maneira consegue mais facilmente a imortalidade prometida, não deve ter temor algum; mas aquele que faz da ciência das ciências um pretexto pecaminoso para seus motivos mundanos, deve temer. Estes jamais resistirão às evocações cabalísticas da iniciação suprema.
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CAPÍTULO III AS DIVISÕES ENTRE OS CRISTÃOS PRIMITIVOS. A SEMELHANÇA ENTRE O CRISTIANISMO PRIMITIVO E O BUDISMO. AS PRIMEIRAS SEITAS. (L. 3. pág. 116).
Clemente descreve Basilides, o gnóstico, como "um filósofo devotado à contemplação das coisas divinas". Essa muito apropriada expressão poderia ser aplicada a muitos fundadores das seitas mais importantes que mais tarde foram englobadas numa única - esse estupendo composto de dogmas ininteligíveis forjado por Irineu, Tertuliano, e outros, que agora recebe o nome de Cristianismo. Se tais seitas devem ser chamadas de heresias, então o Cristianismo primitivo deve ser incluído entre elas. Basilides e Valentino precederam a Irineu e Tertuliano; e os dois últimos padres tiveram menos fatos do que os dois primeiros gnósticos para mostrar que sua heresia era plausível. Nem o direito divino, nem a verdade asseguraram o triunfo de seu Cristianismo; apenas o destino lhes foi favorável. Podemos afirmar, com toda razão, que não há nenhuma de todas essas seitas - o Cabalismo, o Judaísmo, e inclusive o nosso atual Cristianismo - que não tenha nascido dos dois ramos principais desse tronco-mãe, a outrora religião universal, que precedeu a época védica - falamos do Budismo pré-histórico que se fundiu mais tarde no Bramanismo. A religião que mais se assemelhou aos ensinamentos dos poucos numerosos apóstolos primitivos religião pregada pelo próprio Jesus - [e a mais antiga de ambas, o Budismo. Este, tal como foi ensinado em sua pureza primitiva, e levado à perfeição pelo último dos Buddhas, Gautama, baseava sua ética moral em três princípios fundamentais. Ele afirmava: 1º: que todas as coisas existem como resultado de causas naturais; 2º: que a virtude acarreta a sua própria recompensa, e o vício e o pecado sua própria punição, e o 3º: que o estado do homem neste mundo é de provação. Neste três princípio se fundamentam todos os credos religiosos, que podem resumir-se em Deus e a imortalidade individual do espírito. Apesar da confusão dos dogmas teológicos posteriores; apesar da aparente incompreensibilidade das abstrações metafísicas que convulsionam a Teologia de cada uma das grandes religiões da Humanidade, assim que estas forem estabelecidas em base seguras, descobrir-se-á que a religião acima mencionada é a essência de toda filosofia religiosa, com exceção do Cristianismo moderno. Foi ela a religião de Zoroastro, de Pitágoras, de Platão, de Jesus, e mesmo de Moisés, embora os ensinamentos do legislador judeu tenham sofrido piedosas falsificações. Faremos um breve estudo das numerosas seitas que se reconheceram a si mesma como cristã; quer dizer, que acreditaram num Cristos, ou num UNGIDO. Procuraremos também explicar esta última expressão do ponto de vista cabalístico, mostrando-lhe o reaparecimento em todo sistema religioso. Seria proveitoso, ao mesmo tempo, observar até que ponto os primeiros apóstolos, Paulo e Pedro, concordavam em suas pregações sobre a nova Revelação. Muitas e boas obras foram escritas recentemente, refutando essa absurda pretensão. Entre outras, assinalamos The Christ of Paul, que a demole de modo muito engenhoso. O autor prova: 1º:que nenhuma Igreja foi estabelecida em Roma antes do reino de Antônio, o Pio; 2º: que, como Eusébio e Irineu concordam em que Lino foi o segundo Bispo de Roma, em cujas mãos "os abençoados apóstolos" depuseram a Igreja após havê-la fundado, isto só pode ter ocorrido entre os anos 64 e 68; 3º: que esse intervalo de anos caiu durante o reino de Nero, pois Eusébio afirma que Lino manteve seu ofício durante doze anos, tendo começado seu episcopado em 69, um ano após a morte de Nero, e vindo a morrer em 81. Em seguida, o autor prova, com argumentos irrefutáveis, que Pedro não poderia estar em Roma no ano 64, uma vez que se encontrava então na Babilônia, de onde escreveu sua primeira epístola, cuja data é fixada, pelo Dr. Lardner e outros críticos, nesse exato ano. Mas acreditamos que o seu melhor argumento consiste na prova de que não estava no caráter do covarde Pedro arriscar-se numa vizinhança tão estreita com Nero, que "alimentava as feras do Anfiteatro com a carne e os ossos dos cristãos" àquela época. Talvez a Igreja de Roma não tenha estado de acordo ao escolher como seu fundador titular o apóstolo que negou por três vezes o seu Mestre no momento de perigo; e que, além disso, com exceção de Judas, provocou o Cristo de tal modo a ponto de receber o epíteto de "Inimigo". "Afasta-te de mim, SATÃ", exclama Jesus, reprovando o insultuoso apóstolo. (Marcos, VIII, 33). Existe uma tradição grega que jamais foi aceita no Vaticano. Essa Igreja remonta sua origem a um dos chefes gnósticos - Basilides, talvez -, que viveu sob Trajano e Adriano, ao fim do século I e início do II. No que respeita a essa tradição particular, se o gnóstico é Basilides, então deveremos aceitá-lo como uma
autoridade suficiente, pois ele pretende ter sido discípulo do Apóstolo Mateus, e pupilo de Gláucias, este um discípulo do próprio São Pedro. Se o relato que se lhe atribui é autêntico, o Comitê Londrino para a Revisão da Bíblia faria bem em acrescentar um novo capítulo aos Evangelhos de Mateus, Marcos e João, contando a história da negação de Cristo por Pedro. A tradição de que estamos falando afirma que, quando, apavorado pela acusação do servidor do sumo-sacerdote, o apóstolo negou por três vezes o seu Mestre, e o galo cantou, Jesus, que então atravessava a galeria sob a guarda dos soldados, virou-se e, encarando a Pedro, disse: “Em verdade, Pedro, eu te digo que me negarás por todos os séculos vindouros, e jamais pararás enquanto não te tornares velho, e estenderás as mãos e um outro te cingirá e te levará para onde não queres” (João XXI, 18.). A última parte desta sentença, dizem os gregos, está relacionada com a Igreja, e profetiza a sua constante apostasia de Cristo, sob a máscara da falsa religião. Mais tarde, a passagem foi inserida no cap. XXI de João, mas todo esse capítulo foi denunciado como falsificação, antes mesmo de se ter descoberto que esse Evangelho jamais foi escrito em suma pelo Apóstolo João. O simples fato de que Pedro permaneceu até o fim como um "apóstolo da circuncisão" fala por si mesmo. Quem quer que tenha edificado a Igreja de Roma, não foi Pedro. Se fosse esse o caso, os sucessores desse apóstolo deveriam se submeter à circuncisão, ao menos por amor à fidelidade, e para mostrar que as afirmações dos Papas não carecem de fundamento. O Dr. Inman afirma que o relato diz que "em nossos tempos cristãos, os Papas devem ser perfeitos em sua vida privada", mas não sabemos se eles devem se submeter às exigências da lei levítica judaica. Os primeiros quinze bispos cristãos de Jerusalém, a começar de Tiago e incluindo Judas, foram todos judeus circuncidados. O SIGNIFICADO DO TERMO NAZAR E NAZARENO. (L. 3. pág. 120). Podemos de fato dar crédito a essa amizade entre Pedro e seus antigos correligionários, uma vez que descobrimos em Theodoret a seguinte afirmação: "Os nazarenos são judeus, que veneravam o UNGIDO [Jesus] como um homem justo e que utilizam o Evangelho segundo Pedro". (Theodoret, Haeret. fabul., II,II.) Pedro era um nazareno, de acordo com o Talmude. Ele pertencia à seita dos nazarenos mais recentes, que discordavam dos seguidores de João, o Batista, e que vieram a constituir uma seita rival; a qual - como reza a tradição - foi instituída pelo próprio Jesus. A história diz que as primeiras seitas cristã eram nazarenas, como João Batista, ou ebionitas, entre os quais se acham inúmeros parentes de Jesus; ou essênias (iessaens), os therapeutae, de que os nazarenos eram um ramo. Todas essa seitas, que apenas na época de Irineu começaram a ser consideradas como heréticas, eram mais ou menos cabalísticas. Elas acreditavam na expulsão dos demônios por meio de encantamentos mágicos, e praticavam esse método; Jervis aplica aos nabateanos e a outra seitas similares o epíteto de "errantes exorcistas judeus", significando a palavra árabe nabae "errar" e a hebraica, naba, "profetizar". O Talmude chama indiscriminadamente a todos os cristãos de Nozari. Todas as seitas gnósticas acreditavam igualmente na Magia. Irineu, ao descrever os seguidores de Basilides, diz: "Eles utilizam imagens, invocações encantamentos, e todas as outras coisas que pertencem à Magia". Dunlap, como base na autoridade de Lightfoot, mostra que Jesus era chamado de Nazaraios, por referência a seu exterior pobre e humilde; "pois Nazaraios significa separação, alienação de outros homens". O verdadeiro significado da palavra nazar, é devotar-se ou consagrar-se ao serviço de Deus. Como substantivo, significa uma diadema ou um emblema de tal consagração, uma cabeça assim consagrada. Afirma-se que José era um nazar. "A cabeça de José, o vértice do nazar entre seus irmãos." Sansão e Samuel, Shimshôn e Shemûêl) são descritos como nazars. Porfírio, ao tratar de Pitágoras, diz que este foi purificado e iniciado na Babilônia por Zar-adas, o chefe do colégio sagrado. Não se poderia supor, por conseguinte, que Zoro-Aster era o nazar de Ishtar, tendo Azr-adas ou Na-Zar-Ad o mesmo significado na troca de idiomas? Esdras, era um sacerdote e escriba, um hierofante, e o primeiro colonizador hebreu da Judéia foi Zoro-Bel ou o Zoro ou nazar da Babilônia. As Escrituras judias indicam dois cultos e religiões distintos entre os israelitas; o culto de Baco sob a máscara de Jeová, e o dos iniciados caldeus a que pertenciam alguns dos nazars, os teurgistas, e uns poucos profetas. As sedes de todos esses cultos localizavam-se todas na Babilônia e na Caldéia, onde se reconhecem claramente duas escolas rivais de magos. Aqueles que duvidarem desta afirmação terão nesse caso de explicar a discrepância entre a história e Platão, que, de todos os homens de sua época era, sem dúvida, um dos mais bem informados. Referindo-se aos magos, ele os mostra instruindo os reis persas (a respeito de) Zoroastro, como filho ou sacerdote de Oromasdes; e no entanto, Dario, na inscrição de Behistun, vangloria-se de ter restaurado o culto de Ormasde e de ter destruído os ritos mágicos! Evidentemente, havia duas escolas mágicas distintas e antagônicas. A mais antiga e a mais esotérica de ambas era a que, satisfeita com seus
conhecimentos inexpugnáveis e com seu poder secreto, consentia em aparentemente renunciar à sua popularidade exotérica, depondo sua supremacia nas mãos do reformador Dario. Os gnósticos posteriores mostraram a mesma prudente política, acomodando-se em todas os países às formas religiosas predominantes, mas permanecendo secretamente fiéis às suas próprias doutrinas essenciais. MOISÉS UM INICIADO. OS ENSINAMENTOS MINISTRADOS POR JESUS. (L. 3. pág. 120). Seja o que for que agora se acredite ter sido Moisés, demonstraremos que ele era um iniciado. A religião mosaica era, na melhor das hipóteses, um culto do Sol e da serpente, diluído, por algumas poucas nações monoteístas, antes que estas fossem introduzidas à força nas chamadas Escrituras inspiradas" por Esdras, ao tempo em que ele pretendia ter reescrito os livros mosaicos. Seja como for, o Livro dos números foi escrito mais tarde; e é tão fácil seguir nele o culto do Sol e da serpente, quanto em qualquer história pagã. O relato das serpentes de fogo é uma alegoria, em mais de um sentido. As "serpentes" eram os levitas ou os ofitas, que formavam a escola de Moisés (ver Êxodo, XXXII, 26); e a ordem do "Senhor" a Moisés, para dobrar a cabeça do povo "diante do Senhor contra o Sol", que é o emblema desse Senhor, não deixa margem e equívocos. Os nazars ou profetas, assim como os nazarenos, eram uma casta oposta ao culto de Baco, de modo que, em comum com todos os profetas iniciados, eles se mantinham fiéis ao espírito das religiões simbólicas e ofereciam uma forte oposição às práticas idólatras ou exotéricas da letra morta. Essa a razão pela qual os profetas foram, com tanta freqüência, lapidados pelo populacho, sob a instigação dos sacerdotes que tinham todo o interesse em favorecer as superstições populares. Ottfried Müller mostra quanto os mistérios órficos diferiam dos ritos populares de Baco, embora os Orphikoi sejam conhecidos por terem seguido o culto de Baco. O sistema de puríssima moralidade e de severo ascetismo promulgado nos ensinamentos de Orfeu, e seguido estritamente por seus partidários, é incompatível com a lascívia e a grosseira imoralidade dos ritos populares. A fábula de Aristeu que persegue Eurídice na floresta, onde há uma serpente que lhe causa a morte, é uma alegoria muito clara, que foi, em parte, explicada nos tempos primitivos. Aristeu é a força bruta, que persegue Eurídice, a doutrina esotérica, na floresta em que a serpente (emblema de todos os deuses solares, e cultuado sob seu aspecto grosseiro mesmo pelos judeus) a mata; ou seja, força a verdade a tornar-se ainda mais esotérica, e a buscar proteção no mundo inferior, que não é o inferno de nossos teólogos. Além disso, a sorte de Orfeu, estraçalhado pelas bacantes, é outra alegoria para demonstrar que os ritos grosseiros e populares são sempre mais bem-vindos do que a verdade divina mais simples, provando a grande diferença que deve ter existido entre o culto esotérico e o popular. Visto que os poemas de Orfeu e de Museu foram perdidos desde os tempos mais recuados, de modo que nem Platão nem Aristóteles reconheceram qualquer coisa autêntica nos poemas que ainda existiam em seu tempo, é difícil dizer com precisão em que consistiam seus ritos peculiares. Temos, no entanto, a tradição oral, e dela podemos tirar várias inferências; essa tradição assinala que Orfeu trouxe sua doutrina da Índia, sendo a sua religião a dos antigos magos - aquela à qual pertencem os iniciados de todos os países, a começar de Moisés, os "Filhos dos Profetas", e os ascéticos nazars (que não devem ser confundidos com aqueles contra os quais trovejaram Oséias e outros profetas) e terminando com os essênios. Esta última seita era composta de pitagóricos, antes que seu sistema tivesse sido mais degenerado do que aperfeiçoado pelos missionários budistas, que, como Plínio nos diz, se estabeleceram nas costas do Mar Morto, muitos séculos antes de seu tempo, "per saeculorum millia (Plínio, Nat. Hist., V. XV)". Mas se, por um lado, esses monges budistas foram os primeiros a estabelecer comunidades monásticas e inculcar a estrita observância das regras monacais dogmáticas, por outro lado, foram também os primeiros a impor e popularizar as severas virtudes exemplificadas por Sâkyamuni (o fundador do Budismo, o Senhor Gautama), e que foram anteriormente exercitadas em casos isolados de bem conhecidos filósofos e seus seguidores; virtudes pregadas dois ou três séculos depois por Jesus, praticadas por uns poucos ascetas cristãos, gradualmente abandonadas e inteiramente esquecidas pela Igreja cristã. Os nazars iniciados sempre obedeceram a essa regra, que havia sido seguida antes deles pelos adeptos de todos os tempos; e os discípulos de João foram apenas um ramo dissidente dos essênios. Por conseguinte, não podemos confundi-los com todos os nazars mencionados no Velho Testamento, e que são acusados por Oséias de se terem separado ou se consagrado a Bosheth; o que implicava a maior abominação possível. Inferir, como o fazem alguns críticos e teólogos, que isto significa abandonar a castidade ou a continência, é perverter seu verdadeiro significado ou ignorar totalmente a língua hebraica. O décimo primeiro verso do primeiro capítulo de Miquéias explica parcialmente o termo, em sua velada tradução: "Passai, ó habitante de Saphir, etc." e no texto original a palavra é Bosheth. Certamente, nem Baal, nem Iahoh Kadosh, com seu Kadeshim, eram deuses de ascética virtude, embora a Septuagint os chame, assim como aos galli - os sacerdotes perfeitos -, de iniciados e consagrados. O grande Sod do kadeshim, traduzido nos Salmos
LXXXIX, 7, como "assembléia de santos", não era senão um mistério dos "santificados" no sentido dado a esta palavra por Webster. A seita dos anziretas existiu muito tempo antes das leis de Moisés (Cf. Números, VI,2; Munk, Palestina, p.169), e teve origem entre o povo, em guerra aberta contra os "escolhidos" de Israel, a saber, o povo da Galiléia, a antiga olla-podrida das nações idólatras, onde foi erguida Nazara, a atual Nasra. Foi em Nazara que os antigos naziretas mantiveram seus "mistérios de vida" ou "assembléias" (como figura agora a palavra na tradução), que não passavam de mistérios secretos de iniciação, totalmente distintos em sua forma prática populares que eram realizadas em Biblos em honra de Adónis. Visto que os verdadeiros iniciados da Galiléia desterrada adoravam o verdadeiro Deus e desfrutavam visões transcendentais, o que faziam os "escolhidos" nesse mesmo tempo? Ezequiel no-lo diz (cap. VIII) quando, ao descrever o que viu, ele diz que a forma de uma mão o pegou pelos cabelos e o transportou da Caldéia a Jerusalém. "E lá estavam setenta dos senadores da casa de Israel. (...) `Filho do Homem, viste o que os anciões (...) estão fazendo no escuro?", pergunta o "Senhor". "Na porta da casa do Senhor (...) estavam as mulheres sentadas a chorar por Tamuz" (Adónis). Não podemos realmente supor que os pagãos jamais ultrapassaram o povo "escolhido" em certas vergonhas abominações de que os seus próprios o acusavam com tanta freqüência. Não é preciso ser um erudito em língua hebraica para admitir essa verdade; basta ler a Bíblia na tradução e meditar sobre as palavras dos "santos" profetas. Tal foi a razão do ódio dos nazarenos posteriores aos judeus ortodoxos - seguidores da Lei Mosaica exotérica - externo, aquilo que o vulgo conhece; público, exterior. O oposto a esotérico ou oculto -, que foram sempre acusados de adorar a Iurbo-Adunai, ou Senhor Baco. Passando sob o disfarce de Adoni-Iahoh, (testo original, Isaías, LXI,1), Iahoh e Senhor Tsavaötih, o Baal-Adônis, ou Baco, cultuado nos bosques e nos Jardins ou mistérios públicos, transforma-se enfim, sob a mão polidora de Esdras, no Adonai de Masorah - o Deus Único e Supremo dos cristãos! "Não adorarás o Sol cujo nome é Adunai", diz o Codex dos nazarenos; "cujo nome é também Kadesh [Salmos,XXXXIX,7.] e El-El. Esse Adunai elegerá para si uma nação, a qual se reunirá em multidões [seu culto será exotérico] (...) Jerusalém tornar-se-á o refúgio e a cidade dos Abortivos, que se aperfeiçoarão [circuncidarão] por meio da espada (...) e adorarão a Adunai [Codex nazaraeus, I,p.47]". Os nazarenos mais antigos, que eram os descendentes dos nazars da Escrituras, e cujo último líder proeminente foi João Batista, embora considerados pouco ortodoxos pelos escribas e fariseus de Jerusalém, eram, não obstante, respeitados, nunca tendo sido molestados. Mesmo Herodes "temia a multidão" porque considerava João um profeta (Mateus, XIV, 5). Mas os seguidores de Jesus pertenciam, evidentemente, a uma seita que se tornou um espinho ainda mais exasperante em seu flanco. Ela surgia como uma heresia dentro de outra heresia; pois enquanto os nazars dos tempos antigos, os "Filhos dos Profetas eram cabalistas caldeus, os adeptos da nova seita dissidente revelaram-se reformadores e inovadores desde o início. A grande semelhança observada por alguns crítico entre os ritos e as observações dos cristãos primitivos e os dos essênios pode ser explicada sem a menor dificuldade. Os essênios, como já observamos, eram missionários budistas convertidos que, ao mesmo tempo, invadiram o Egito, a Grécia e mesmo a Judéia, a partir do reino de Asoka, o zeloso propagandista; e ao passo que é evidentemente aos essênios que pertence a honra de terem tido o reformador nazareno Jesus como pupilo, descobrimos que este, no entanto, discordou de seus primeiros mestres quando a inúmeras questões de observância formal. Não podemos chamá-lo de essênio, pelas razões que indicaremos mais adiante, nem de nazar ou de nazário da seita mais antiga. O que Jesus foi podemos descobri-lo no Codex nazaraeus, nas injustas acusações dos gnósticos de Bardesane. "Jesu Mesio é Nebu, o falso Messias, o destruidor da religião antiga", diz o Codex. Ele é o fundador da seita dos novos nazars, e, como o indicam claramente as palavras, um seguidor da doutrina budista em hebraico, a palavra naba, significa "falar com inspiração"; e, nebo é um deus de sabedoria. Mas Nebo é também Mercúrio, e Mercúrio é Buddha no monograma hindu dos planetas. Além disso, descobrimos que os talmudistas afirmavam que Jesus era inspirado pelo gênio de Mercúrio. O reformador nazareno pertencia, sem duvida alguma, a uma dessas seitas; embora seja talvez impossível decidir absolutamente a qual delas. Mas o que é plenamente evidente é que ele pregava a filosofia de Buddha-Sâkyamuni - nome do fundador do budismo o Senhor Gautama -. Denunciados pelos últimos profetas, amaldiçoados pelo Sanhedrim, os nazars - que se confundem com os outros do mesmo nome, "que se consagraram à vergonha" - foram secreta, se não abertamente, perseguidos pela sinagoga ortodoxa. Tornase então claro por que Jesus foi tratado com tanto desdém desde o começo, e chamado depreciativamente de "o Galileu". Nataniel pergunta - "De Nazaré pode sair algo de bom?" (João, I,46), no início de sua carreira, e apenas porque ele sabe que se trata de um nazar. Não indica isto claramente que mesmo os nazars mais antigos não eram realmente hebraicos, mas antes uma classe de teurgistas caldeus? Além disso, visto que o
Novo Testamento é conhecido por seus erros de tradução e falsificações transparentes dos textos, podemos como razão suspeitar que a palavra Nazaré substituiu o termo nasaria ou nazari; e que o texto original rezava: "De um nozari, ou um nazareno pode sair algo de bom?", isto é, de um seguidor de São João Batista, com o qual nós o vemos associado desde o início de sua entrada em ação, após ter estado desaparecido por um período de aproximadamente vinte anos. Os equívocos do Velho Testamento nada são comparados aos dos Evangelhos. Nada mostra melhor do que essas evidentes contradições o sistema da piedosa fraude sobre o qual repousa a doutrina do Messias. "Este é o Elias que deve vir", diz Matheus de João Batista, forçando assim uma antiga tradição cabalística no quadro das evidências (XI, 14). Mas quando, ao se dirigirem ao próprio Batista, eles lhe perguntam (João, I, 21), "És tu o Elias?", ele diz "Não sou!" Quem sabe mais - João ou seu biógrafo? Qual é a revelação divina? O objetivo de Jesus, como foi evidentemente o de Gautama Buddha, consistia em prestar um largo benefício à Humanidade, produzindo uma reforma religiosa que lhe daria uma religião de pura ética; até então, o verdadeiro conhecimento de Deus e da Natureza permaneciam exclusivamente nas mãos das seitas esotéricas e de seus adeptos. Visto que Jesus utilizava óleo e que os essênios nunca usaram senão água pura, não se pode dizer que ele foi um essênio no sentido estrito da palavra. Por outro lado, os essênios foram também "postos de lado"; eles eram curadores (asaya) e habitavam no deserto como todos os ascetas. Mas, embora não se abstivesse de vinho, Jesus poderia se manter um nazareno. Pois no cap. VI de Números, vemos que, após o sacerdote ter agitado a cabeleira de um nazarita em oferenda diante do Senhor, "em seguida, um nazarita pode beber vinho" (VI, 20). a severa reprimenda do reformador ao povo que não se satisfazia com nada é expressa na seguinte sentença: "Veio João, que não come e não bebe, e dizeis: `O demônio está nele'. (...) Veio o Filho do Homem, que come e bebe, e dizeis: `Eis aí glutão e beberrão [Lucas, VII,33-4]". Apesar disso, ele era um essênio e um nazareno, pois podemos vê-lo enviando uma mensagem a Herodes para dizer que era alguém que expulsava demônios e que realizava curas, mas na verdade chamandose a si mesmo de profeta e declarando-se igual aos outros profetas. BATISMO, UM DIREITO DERIVADO. (L. 3. pág. 124). O batismo é um dos ritos mais antigos e foi praticado por todas as nações em seus mistérios, como abluções sagradas (Banho de todo o corpo ou parte dele.) Dunlap parece derivar o nome dos nazars de nazah, "aspersão"; Bahâk-Ziwa é o gênio que chamou o mundo à existência tirando-o da "água obscura", dizem os nazarenos; e o Persian, Arabic asd English Lexicon de Ricahardson afirma que a palavra Bahãk significa "chuva". Mas o Bahâk-Ziwa dos nazarenos não pode ser confundido tão facilmente com Baco, que "era e deus da chuva", pois os nazars foram os maiores adversários do culto de Baco. "Baco foi criado pelas Hyades, as ninfas da chuva", diz Preller; e Dunlap mostra, ademais, que, ao término dos mistérios religiosos, os sacerdotes batizavam (lavavam) seus monumentos e os untavam com óleo. Mas tudo isso é apenas uma prova indireta. Não é preciso provar que o batismo do Jordão era apenas um substituto dos ritos exotéricos de Baco e das libações em honra de Adónis ou Adónis - de quem os nazarenos tinham horror -, no propósito de demonstrar que essa seita nasceu dos "mistérios" da "Doutrina Secreta"; e seus ritos não podem em absoluto ser confundidos com os do populacho pagão, que simplesmente caiu na fé idólatra e irracional de todas as multidões plebéias. João foi o profeta desses nazarenos, e na Galiléia ele foi chamado de "Salvador"; mas não foi ele quem fundou essa seita cujas tradições remontam à mais alta antigüidade da teurgia caldaico-acadiana. "Os primeiros israelitas plebeus eram cananitas e fenícios, com o mesmo culto de adoração aos deuses fálicos - Baco, Baal ou Adon, Iacchos - Iao ou Jeová;" mas mesmo entre esses sempre houve uma classe de adeptos iniciados. Depois, o caráter dessa plebe foi modificado pelas conquistas assírias; e, finalmente, as colonizações persas superpuseram as idéias e os costumes fariseus e orientais, de que derivam o Velho Testamento e as instituições mosaicas. Os reis-sacerdotes asmoneus promulgaram o cânone do Velho Testamento em oposição aos Livros Secretos ou Apocrypha dos judeus alexandrinos - os cabalistas. Até a época de João Hircano eles foram asideus (chasidim) e fariseus (pârsîs), mas tornaram-se saduceus ou zadoquitas - partidários da regra sacerdotal em oposição à regra rabínica. Os fariseus eram dóceis e intelectuais; os saduceus, intolerantes e cruéis. Diz o Codex: "João, filho de Aba-Saba-Zacharia, conhecido por sua mãe Anasabet em seu centésimo ano, batizou durante quarenta e dois anos, quando Iesu Messias veio ao Jordão a fim de ser batizado por João. Mas ele perverterá a doutrina de João, alterando o batismo do Jordão, e pervertendo as sentenças da justiça." O batismo de água transformou-se no do Espírito Santo, em conseqüência, decerto, da idéia predominante entre os padres de instituir uma reforma e tornar os cristãos diferentes dos nazarenos de São João, dos nabateanos e dos ebionistas, a fim de dar lugar aos novos dogmas. Não apenas os sinóticos nos dizem que Jesus batizava como João, mas os próprios discípulos de João se queixavam disso, embora Jesus
não possa ser certamente acusado de seguir um rito puramente báquico. Os parênteses no verso 2 de João IV: "(...) ainda que o próprio Jesus não batizasse", são tão canhestros que indicam uma evidente interpolação. Mateus faz João dizer que aquele que viria depois não os batizaria com água, "mas com o Espírito Santo e com fogo". Marcos, Lucas e João corroboram essas palavras. Água, fogo e espírito, ou Espírito Santo, todos têm sua origem na Índia, como iremos demonstrar. Mas tal sentença apresenta uma estranha peculiaridade. Ela é abertamente negada em Atos, XIX, 2-5. Apollos, um judeu de Alexandria, pertencia à seita dos discípulos de São João; foi batizado e instruía a outros nas doutrinas do Batista. E não obstante, quando Paulo, aproveitando habilmente sua ausência em Corinto, encontra alguns discípulos de Apollos em Éfeso, e lhes pergunta se haviam recebido o Espírito Santo, recebe ele essa ingênua resposta: "Nunca ouvimos dizer que há um Espírito Santo". "Em que fostes batizados?", pergunta ele. "No batismo de João", dizem eles. Faz-se então Paulo repetir as palavras atribuídas a João pelos sinóticos, e esses homens "foram batizados em nome de Jesus", exibindo, além disso, no mesmo instante, o usual dom poliglota que acompanha a descida do Espírito Santo. Qual a conclusão a tirar? São João Batista, que é chamado de "percussor", para que "a profecia pudesse ser cumprida", o grande profeta e mártir, cujas palavras tinham um significado tão importante aos olhos de seus discípulos, anuncia o "Espírito Santo" aos seus ouvintes; faz as multidões se reunirem à margens do Jordão, onde, na grande cerimônia do batismo de Cristo, o prometido "Espírito Santo" aparece por entre os céus abertos, e a multidão ouve a voz, e no entanto ainda há discípulos de São João que "nunca ouviram dizer que há um Espírito Santo"! Na verdade, os discípulos que escreveram o Codex nazaraeus estavam certos. Mas não foi Jesus, e sim aqueles que vieram depois dele e tergiversaram a Bíblia para servir aos seus objetivos, que "perverteram" a doutrina de João, modificaram o batismo do Jordão e perverteram as sentenças da justiça". É inútil objetar que o Codex atual foi escrito séculos depois de os apóstolos diretos de João Batista terem feito seu trabalho de pregação. Tal é o caso dos nossos Evangelhos. Quando esse espantoso diálogo entre Paulo e os "batistas" teve lugar, Bardesanes ainda não havia feito a sua aparição e a seita não era considerada uma "heresia". Além disso, podemos julgar quão pouco a promessa de São João Batista referente ao "Espírito Santo" e a própria manifestação do "Espírito" afetaram seus discípulos, pela animosidade que estes mostraram para com os discípulos de Jesus, e por certa espécie de rivalidade manifestada desde o princípio. Ou melhor, tão pouco está João Batista seguro da identidade de Jesus como o esperado Messias que, depois da famosa cena do batismo no Jordão, e da confirmação oral do próprio Espírito Santo de que "Este é o meu Filho amado" (Matheus, III,17), descobrimos "o Precursor", em Mateus, XI, 3, enviando de sua prisão dois discípulos para perguntar a Jesus: "És tu aquele que há de vir, ou deveremos esperar outro?"! Essa flagrante contradição deveria, por si só, já ter satisfeito às mentes esclarecidas quanto à putativa inspiração divina do Novo Testamento. Mas podemos perguntar ainda: Se o batismo é um sinal de regeneração, e uma prática instituída por Jesus, por que os cristãos não batizam tal como Jesus aqui o faz, "com o Espírito Santo e com fogo", em vez de seguir o costume dos nazarenos? Ao fazer essas evidentes interpolações, que possível motivo teria tido Irineu para fazer as pessoas acreditarem que o epíteto de nazareno, dado a Jesus, provinha apenas da residência de seu pai em Nazaré, e não de sua filiação à seita dos nazaria, os curadores? Esse expediente de Irineu foi muito infeliz, pois desde tempos imemoriais os profetas dos tempos antigos haviam trovejado contra o batismo de fogo, tal como praticado por seus vizinhos, que comunicava o "espírito da profecia", ou o Espírito Santo. Mas o caso era de desespero; os cristãos eram universalmente chamados de nazarenos e iessênios (segundo Epifênio), e Cristo se alinhava simplesmente como um profeta e curador judeu - pois era assim que seus discípulos a si mesmo chamavam, e como tal eram vistos por seus seguidores. Em tal situação, não havia lugar, seja para uma nova Divindade; e como Irineu se entregou à tarefa de manufaturar a ambas, teve de dispor dos materiais disponíveis, preenchendo as lacunas com as suas próprias férteis invenções. JESUS UM VERDADEIRO NAZARENO. BATISMO COMO RITO DE INICIAÇÃO.
(L. 3
pág. 126.)
Se queremos nos assegurar de que Jesus era um verdadeiro nazareno - embora com idéias de uma nova reforma -, não devemos buscar a prova nos Evangelhos traduzidos, mas nas versões originais de que dispomos. Tischendorf, em sua tradução do grego, da passagem de Lucas, IV, 34, chama-o "Iesou Nazarene"; e no texto siríaco lê-se "iasua, tu o nazaria". Portanto, se levarmos em conta tudo o que é enigmático e incompreensível nos quatros Evangelhos, revisados e corrigido em sua forma atual, veremos facilmente por nós mesmos que o verdadeiro e original Cristianismo, tal como pregado por Jesus, encontra-se apenas
chamadas heresias sírias. Somente delas podemos extrair noções claras sobre o que era o Cristianismo original. Tal era a fé de Paulo, quando Tertulo, o orador, acusou o apóstolo diante do governador Félix. Ele se queixava de que "encontramos esse homem (...) suscitador de tumultos (...) chefe da seita dos nazarenos"; e, ao passo que Paulo nega todas as outras acusações, confessa que "segundo o caminho que chamam de heresia, sirvo ao Deus de meus pais". Essa confissão vale por toda uma revelação. Ela mostra 1º: que Paulo admitia pertencer à seita dos nazarenos; 2º: que ele servia ao Deus de seus pais, não ao Deus cristão trinitário, de quem ele nada sabe, e que só foi inventado depois de sua morte; e 3º: que essa infeliz confissão explica satisfatoriamente que o tratado dos Atos dos Apóstolos, juntamente com o Apocalipse de João, que num dado momento foi completamente rejeitado, ficaram ambos fora do cânone do Novo Testamento durante um longo período de tempo. Em Biblos, os neófitos, assim como os hierofantes, após terem participado dos mistérios, eram obrigados a jejuar e a ficar em solidão por algum tempo. Um jejum e uma preparação muito rigorosa eram exigidos, tanto antes como depois das orgias báquicas e eleusinas; e Heródoto menciona, com medo e veneração, o LAGO de Baco, no qual "eles [os sacerdotes] davam, de noite, representações de sua vida e de seus sofrimentos Nos sacrifícios mítricos, durante a iniciação, uma cena preliminar de morte era simulada pelo neófito, que precedia à cena que o mostrava "renascendo pelo rito do batismo". Uma parte dessa cerimônia ainda é encenada nos dias de hoje pelos maçons, quando o neófito, qual o seu Grande Mestre Hiram Abiff, jaz morto, sendo despertado pelo forte aperto da garra do leão. Os sacerdotes eram circuncidados. O neófito não podia ser iniciado sem ter participado dos mistérios solenes do LAGO. Os nazarenos eram batizados no Jordão, e não podiam ser batizados em qualquer outro lugar. Eles também eram circuncidados, e deviam jejuar antes e depois da purificação pelo batismo. Afirmase que Jesus jejuou no deserto durante quarenta dias, imediatamente após o seu batismo. Até os dias de hoje há, na parte exterior de todos os templos na Índia, um lago, uma corrente ou um reservatório cheio de água sagrada, no qual os brâmanes e os devotos hindus se banham diariamente. Tais locais de água consagrada são necessários em todos os templos. Os festivais de banho, ou ritos batismais, ocorrem duas vezes por ano; em outubro e abril. Cada um dura dez dias; e, como no Egito e na Grécia antiga, as estátuas de seus deuses, deusas e ídolos são imersas nas águas pelos sacerdotes, sendo o objetivo da cerimônia livrá-las do pecado de seus adoradores, com os quais elas são carregadas e poluídas, até serem purificadas pela água sagrada. Durante o ârati, a cerimônia de banho, o deus principal de todos os templos é transportado em solene profissão para ser batizado no mar. Os sacerdotes brâmanes, que carregam as imagens sagradas, são seguidos geralmente pelo Mahârâja - os pés descalços, e quase nu. Por três vezes os sacerdotes entram no mar; na terceira vez, levam consigo todas as imagens. Erguendo-as com orações repetidas por toda a congregação, o Sumo Sacerdote mergulha as estátuas dos deuses por três vezes, em nome da Trindade mística, na água, após o que ficam todos purificados. O hino órfico afirma que a água é o maior purificador dos homens e dos deuses. Nossa seita nazarena, como se sabe, organizou-se por volta de 150 d.C., e viveu nas margens do Jordão, e na costa ocidental do Mar Morto, de acordo com Plínio e Flávio Josefo. Mas no Gnostics de King descobrimos, citada, outra afirmação de Josefo (Antiq., XV, 15), que diz que os essênios se haviam estabelecido nas costas do Mar Morto "milhares de séculos" antes do tempo de Plínio. ZOROASTRO UM NOME GENÉRICO. (L. 3. pág. 128). É natural, por conseguinte, que vejamos no nome de Zoroastro não um nome, mas um termo genérico a descoberta de cujo significado deixamos aos filósofos. Guru, em sânscrito, é um mestre espiritual; e, como Zaruastara significa, na mesma língua, aquele que reverencia Sol, por que seria impossível que, graças a algumas mudanças natural da linguagem, devido ao grande número de diferentes nações que se converteram ao culto do Sol, a palavra guru-astara, o mestre espiritual do culto do Sol, que se assemelha estreitamente ao nome do fundador dessa religião, se transformou gradualmente em sua forma primitiva Zuryastara ou Zoroastro? Opinam os cabalistas que houve apenas um Azaratusta e muitos guruastaras ou mestres espirituais, e que apenas um desses guru, ou antes, huru-aster, como é chamado nos antigos manuscritos, foi o instrutor de Pitágoras. À filosofia e aos nossos leitores deixamos a explicação pelo que ela vale. Pessoalmente, acreditamos nela, como acreditamos, quanto a esse assunto, muito mais na tradição cabalística do que na explicação dos cientistas, que até hoje ainda não conseguiram entrar em acordo sobre qualquer tema. Aristóteles afirma que Zoroastro viveu 6.000 anos antes de Platão; Hermippus de Alexandria, que teria lido os livros genuínos dos zoroastrianos, embora Alexandre Magno seja acusado de tê-los destruído, mostra Zoroastro como pupilo de Agonaces (Agon-ach, ou o Deus Ahon), vivendo 5.000 anos antes da queda
de Tróia. Er ou Eros, cuja visão é relatada por Platão, na República, teria sido, segundo Clemente de Alexandria, Zardosht. Embora o mago que destronou Cambises tenha sido um meda, e Dario proclame que aboliu os ritos mágicos para estabelecer os de Ormasde, Xanthus de Lídia declara que Zoroastro havia sido o chefe dos magos! Qual dos dois está errado? Ou ambos certos, falhando os intérpretes modernos em explicar a diferença entre Reformador e os seus apóstolos e seguidores? Esse lapso de nossos comentaristas lembra-nos o de Suetônio, que confundiu os cristãos com um certo Cristos, ou Cresto, como o grafa, e informa a seus leitores que Cláudio o baniu por causa da agitação que provocara entre os judeus. Finalmente, e para voltar outra vez ao nazars, Plínio faz menção a Zaratus nas seguintes palavras: "Ele era Zoroastro e Nazareno". Visto que Zoroastro é chamado de princeps dos magos, e que nazar significa separado ou consagrado, não é tal palavra uma tradução hebraica de mag? Volney assim o crê. A palavra persa na-zaran significa milhões de anos, e diz respeito ao "Ancião dos Dias" caldeu. Daí o nome de nazars ou nazarenos, que se consagraram ao Deus Supremo, o Ain Soph cabalístico, ou o Ancião dos Dias, o "Ancião dos Anciãos". Mas a palavra nazar pode ser encontrada também na Índia. No hindustani, nazar é a visão interna ou sobrenatural; nazar-bandî significa fascinação, um encantamento mesmérico ou mágico; e nazarân é a palavra para visão. Contudo nosso ponto de vista de que as doutrinas secretas dos magos, dos budistas pré-védicos, dos hierofantes do Thoth ou Hermes egípcio, e dos adeptos de qualquer século ou nacionalidade, incluindo os cabalistas caldeus e os nazars judeus, eram idênticos desde o início. Quando empregamos o termo budistas, não fazemos em absoluto menção ao Budismo exotérico instituído pelos seguidores de Gautama Buddha, nem à moderna religião budista, mas à filosofia secreta de Sâkyamuni, que em sua essência é certamente idêntica à antiga religião da sabedoria do santuário, o Bramanismo pré-védico. O "cisma" de Zoroastro, tal como é chamado, é uma prova direta disso. Pois não houve um cisma, estritamente falando, mas apenas uma exposição parcialmente pública de verdade religiosas estritamente monoteísta, até então ensinadas apenas nos santuários, e que ele havia aprendido dos brâmanes. Zoroastro, o fundador original do culto solar não pode ser chamado de fundador do sistema dualista, nem foi ele o primeiro a ensinar a unidade de Deus, visto que nada ensinou além do que os brâmanes lhe haviam comunicado. Se agora podemos provar - e podemos fazê-lo com base na evidência da Cabala e das tradições mais antigas da religião da sabedoria, a filosofia dos antigos santuários - que todos esses deuses, seja os dos zoroastristas, seja os do Veda, são apenas poderes ocultos da natureza personificados, servidores fiéis dos adeptos da sabedoria secreta - a Magia -, estaremos em terra firme. Por conseguinte, quando dizemos que o Cabalismo e o Gnosticismo procedem do asdeísmo ou do Zoroastrimo, queremos afirmar a mesma coisa, a menos que lhes demos o significado de oculto exotérico - o que não é o caso. Assim também, e nesse mesmo sentido, fazemos eco a King, o autor de The Gnostics, e a diversos outros arqueólogos, afirmando que as duas primeiras escolas procedem do Budismo, que é ao mesmo tempo a mais simples e a mais satisfatória das filosofias, e que resultou numa das mais puras religiões do mundo. É apenas uma questão de cronologia decidir qual dessas religiões, que diferem apenas na forma externa, é a mais antiga, e, por conseguinte, a menos adulterada. Mas mesmo isso só toca indiretamente no assunto de que aqui tratamos. Já há muito tempo antes de nossa era, os adeptos, exceto na Índia, haviam cessado de se congregar em grandes comunidades; mas seja entre os essênios, seja entre os neoplatônicos, seja, ainda, entre as inúmeras seitas dissidentes que nasceram para morrer, as mesmas doutrinas, idênticas em substância e espírito, se não sempre em forma, são sempre encontradas. Por Budismo, por conseguinte, entendemos a religião que significa literalmente a doutrina da sabedoria e que precede em muitos séculos à filosofia metafísica de SIDDHÂRTHA-SÂKYAMUNI (Nome do fundador do Budismo). A DOUTRINA DA TRANSMIGRAÇÃO PREGADA POR JESUS. (L. 3. pág. 131). Após dezenove séculos de forçadas eliminações dos livros canônicos de toda sentença que poderia instalar o investigador no caminho correto, tornou-se muito difícil mostrar, para satisfação da ciência exata, que os adoradores "pagãos" de Adónis, seus vizinhos, os nazarenos, e os essênios pitagóricos, os terapeutas curadores, os ebionitas e outras seitas foram todos, com pouquíssimas diferenças, seguidores dos antigos mistérios teúrgicos. No entanto, graças à analogia e a um firme estudo do sentido oculto de seus ritos e costumes, podemos traçar-lhes as afinidades. Foi dada a um contemporâneo de Jesus a possibilidade de mostrar à posteridade, interpretando a literatura mais antiga de Israel, a que ponto a Filosofia Cabalística concordava em seu esoterismo com a dos mais profundos pensadores gregos. Esse contemporâneo, ardente discípulo de Platão e Aristóteles, foi Fílon, o
Judeu. Porque explica os livros mosaicos de acordo com um método puramente cabalístico, ele é o famoso escritor hebreu a quem Kingsley chama de Pai do Novo Platonismo. É evidente que os terapeutas de Fílon são um ramo dos essênios. Seu nome o indica - médicos. Daí, as contradições, as falsificações e outros desesperados expedientes para reconciliar as profecias do cânone judaico com a natividade e a divindade do Galileu. Lucas, que era médico, é designado nos textos siríacos como Asaya, o essaiano ou essênio. Josefo e Fílon descreveram bastante essa seita para não deixar nenhuma dúvida em nossa mente de que o Reformador nazareno, após ter recebido sua educação nas moradas essênias do deserto, e ter sido profundamente iniciado nos mistérios, preferiu a vida livre e independente de um nazaria errante, e assim se separou ou se desnazarianou deles, tornando-se um terapeuta viajante, um nazaria, um curador. Todo terapeuta, antes de deixar sua comunidade, tinha de fazer o mesmo. Tanto Jesus como João Batista pregaram o fim da Idade (O significado real da divisão em eras é esotérico e budista. Os cristãos não iniciados tão pouco o compreenderam que aceitaram as palavras de Jesus literalmente e acreditaram firmemente que ele falava fim do mundo. Já antes houvera muitas profecias sobre a era vindoura. Virgílio, na quarta Écloga, faz menção a Metatron - uma nova prole que terminará com a idade de ferro para renascer com a idade de ouro.), o que prova seu conhecimento da computação secreta dos sacerdotes e dos cabalistas, que partilhavam com os chefes das comunidades essênias o segredo exclusivo da duração dos ciclos. Esses últimos eram cabalistas e teurgistas; "tinham seus livros místicos, e prediziam os eventos futuros", diz Munk. Dunlap, cujas pesquisas pessoais parecem ter sido coroadas de sucesso nessa direção, constata que os essênios, os nazarenos, os dositeus e algumas outras seitas já existiam antes de Cristo: "Elas rejeitavam os prazeres, desprezavam as riquezas, amavam uns aos outros em mais do que outras seitas, desprezavam o matrimônio, considerando o domínio sobre as paixões como uma virtude", diz ele. Todas essas virtudes era pregadas por Jesus; e se devemos aceitar os Evangelhos como um padrão de verdade, Cristo era um partidário da metempsicose, um reencanacionista - tal como esses mesmos essênios, que eram pitagóricos em todos os seus hábitos e doutrinas. Jâmblico afirma que o filósofo sammiano passou algum tempo com eles no monte Carmelo. Em seus discursos e sermões, Jesus sempre falou por parábolas e empregou metáforas com seus ouvintes. Esse hábito é também característico dos essênios e dos nazarenos; os galileus que habitavam em cidades e aldeias jamais foram conhecidos por empregarem tal linguagem alegórica. Na verdade, sendo alguns de seus discípulos galileu, como ele próprio, ficaram estes surpresos ao vê-lo empregar tal modo de expressão com o público. "Por que lhes falas por parábolas?", perguntavam com freqüência. "Porque a vós foi dado conhecer os mistérios do Reino dos Céus, mas a eles não", foi a resposta, que era a de um iniciado. "É por isso que lhes falo por parábolas: porque vêem sem ver, e ouvem sem ouvir, nem entender." (Mateus, XII, 10-3) Além disso, vemos Jesus expressando ainda mais claramente seus pensamentos - e em sentenças que são puramente pitagóricas - quando, durante o Sermão da Montanha, diz: "Não deis o que é sagrado aos cães, Nem atireis as pérolas aos porcos; Pois os porcos as pisarão E os cães se voltarão e vos morderão."
O Prof. A. Wilder, o editor de Eleusinian and Bacchic Mysteries, de Taylor, observa "uma idêntica disposição da parte de Jesus e Paulo para classificar suas doutrinas como esotéricas e exotéricas, `os mistérios do Reino de Deus para os apóstolos e `parábolas' para a multidão. `Pregamos a sabedoria', diz Paulo, `àqueles dentre eles que são perfeitos' (ou iniciados)". Nos mistérios de Elêusis e em outros, os participantes eram sempre divididos em duas classes: os neófitos e os perfeitos. Os primeiros eram às vezes admitidos na iniciação preliminar: a representação dramática de Ceres, ou a alma, que desce ao Hades (Essa descida ao Hades significa a sina inevitável de toda alma que se une por algum tempo a um corpo terrestre. Essa união, ou essa sombria perspetiva para a alma de se ver aprisionada na sombria morada de um corpo, era vista por todos os filósofos antigos, e ainda hoje pelos budistas modernos, como uma punição.). Mas só aos "perfeitos" era concedido desfrutar dos mistérios do divino Elysium, a morada celestial do abençoado, sendo o Elísio inquestionavelmente um correlato do "Reino dos Céus". Contraditar ou rejeitar o que está acima seria apenas fechar os olhos à verdade. A narrativa do Apóstolo Paulo, em sua segunda Epístola aos Coríntios (XII,2-4), impressionou a vários eruditos, bem versados nas descrições dos ritos místicos da iniciação dados por alguns clássicos, e que fazem alusão, sem nenhuma dúvida, à Epopteia final. "Conheci um certo homem que foi arrebatado ao Paraíso - se em seu corpo, se fora do corpo, não sei: Deus o sabe - e que ouviu palavras inefáveis, que não é lícito ao homem repetir." Essas palavras raramente foram consideradas pelos comentaristas, ao que saibamos,
como uma alusão às visões beatíficas de um vidente "iniciado". Mas a fraseologia é inequívoca. Essas coisas "que não é lícito ao homem repetir" são sugeridas pelas próprias palavras, e a razão que se dá para isso é a mesma que vemos repetida muitas vezes por Platão, Proclo, Jâmblico, Heródoto e outros clássicos. "Pregamos a SABEDORIA [apenas] àqueles que são PERFEITOS", diz Paulo [I Coríntios, II, 6.), sendo a seguinte a tradução clara e inegável dessa frase: "pregamos as doutrinas esotéricas mais profundas (ou finais) dos mistérios (que foram denominados sabedoria) apenas àqueles que são iniciados." Por conseguinte, no que diz respeito ao "homem que foi arrebatado ao Paraíso" - e que era evidentemente o próprio Paulo -, a palavra cristã Paraíso substituiu o nome Elísio. Para completar a prova, podemos relembrar as palavras de Platão, dadas noutro lugar, que mostram que, antes de um iniciado poder ver os deuses em sua luz mais pura, ele deve libertar-se de seu corpo; i.e., separar sua alma astral. Apuleio também descreve sua iniciação nos mistério da mesma maneira: "Aproximei-me dos confins da morte; e, tendo trilhado o limiar de Proserpina, retornei, após ter sido transportado por todos os elementos. Nas profundezas da meia-noite, vi o Sol faiscando com uma esplêndida luz, juntamente com os deuses infernais e supernos, e, ao me aproximar dessas divindades, paguei o tributo de uma devota adoração". Portanto, em comum com Pitágoras e outros reformadores hierofantes, Jesus dividiu seus ensinamentos em exotéricos e esotéricos. Seguindo fielmente os procedimentos pitagóricos-essênios, ele jamais se sentou à mesa antes dizer "graças". "O sacerdote reza antes de se pôr à mesa", diz Josefo, descrevendo os essênios. Jesus também dividia seus seguidores em "neófitos", "irmãos" e "perfeitos", se podemos julgar pela diferença que fazia entre eles. Mas sua carreira, pelo menos como um rabino público, foi de duração curta demais para lhe permitir estabelecer uma escola regular própria; e com exceção, talvez, de João, não consta que ele tenha iniciado qualquer outro apóstolo. Os amuletos e talismã gnósticos são, antes de mais nada, emblemas das alegorias apocalípticas. As "sete vogais" estão estritamente relacionadas com os "sete selos"; e o título místico Abraxas partilha tanto da composição de Shem ha-Mephosah, "a palavra sagrada" ou nome inefável, como era o nome chamado: A palavra de Deus, que "ninguém conhecia, exceto ele próprio", como o expressa João. O APOCALIPSE CABALIASTICO. L. 3. pág. 133). Seria difícil escapar às provas indiscutíveis de que o Apocalipse é obra de um cabalista iniciado, visto que essa Revelação apresenta passagens inteiras tomadas do Livro de Enoch e Daniel, sendo o segundo uma imitação abreviada do primeiro; e visto que, além disso, os gnósticos ofitas, que rejeitavam por completo o Antigo Testamento, por "provir de um ser inferior" (Jeová), aceitavam os profetas mais antigos, tais como Enoch, baseando sua fé nos ensinamentos desse livro. Mostraremos mais adiante como todos essas doutrinas estão estritamente relacionadas. Além disso, há a história das perseguições domicianas de mágicos e filósofos, que fornece uma prova tão boa como outra de que João era geralmente considerado um cabalista. Como o apóstolo havia sido incluído no rol dos cabalistas, sendo ademais de grande renome, o edito imperial o baniu não apenas de Roma, mas até do continente. Não eram os cristãos que - confundindo-os com os judeus, como o fazem vários historiadores - o imperador perseguia, mas os astrólogos e cabalistas. JESUS CONSIDERADO COMO UM ADEPTO. (L. 3. pág. 133). As acusações feitas a Jesus de praticar a magia egípcia foram numerosas, e, a um certo momento, universais, nas cidades em que ele era conhecido. Os fariseus, como afirma a Bíblia, foram os primeiros a acusá-lo, embora o Rabino Wise seja da opiniões de que o próprio Jesus era um fariseu. O Talmude assinala claramente que Tiago, o Justo, pertencia a essa seita, Mas esses sectários são conhecidos por terem sempre lapidado todos os profetas que lhes denunciam as más ações, e não é sobre esse fato que assentamos nossa afirmação. Eles o acusaram de feitiçaria, e de expulsar os demônios por Belzebu, seu príncipe, e com mais razão do que o clero católico, que mais tarde lançou a mesma acusação sobre mais de um mártir inocente. Mas Justino, o Mártir, afirma, com base em melhores autoridades, que os homens de sua época que não eram judeus sustentavam que os milagres de Jesus foram realizados por arte mágica a mesma expressão utilizada pelos céticos daqueles dias para designar os atos de taumaturgia realizados nos templos pagãos. "Eles se arriscaram até a chamá-lo de mago e enganador do povo", lamenta o mártir. No Evangelho de Nicodemos (os Acta Pilati), os judeus apresentam a mesma acusação na presença de Pilatos. "Não te falamos que ele era um mago?" (Evangelho segundo Nicodemos, II, 3 (Hone e Grynaeus.). Celso admite a mesma acusação, e como um neoplatônico acredita nela. A literatura talmúdica está repleta de detalhes minuciosos, e sua maior acusação é de que "Jesus podia voar tão facilmente pelos ares como os outros podem caminhar". (Talmud: Yôhânân.). Santo Agostinho afirmou que era crença geral de que ele havia sido iniciado no Egito, e de que escrevera livros a respeito da Magia, transmitidos a João. Havia uma obra intitulada Magia Jesu Christi que foi atribuída ao
próprio Jesus. Nas Aprovações clementinas lança-se a acusação a Jesus de não realizar seus milagres como um profeta judeus, mas como um mago, i.e., um iniciado dos templos "pagãos". (Magia Jesu Christi I, LVIII.) Era então comum, como ainda o é hoje, entre o clero intolerante das religiões antagônicas, assim como entre as classes mais baixas da sociedade, e mesmo entre os patrícios que, por várias razões, haviam sido excluído de qualquer participação dos mistérios, acusar, às vezes, os mais altos hierofantes e adeptos de feitiçaria e magia negra. Assim, Apuleio, que havia sido iniciado, foi igualmente acusado de bruxaria, e de trazer consigo a imagem de um esqueleto - um poderoso agente, como se afirma, nas operações da arte negra. Mas uma das melhores e mais inquestionáveis provas de nossa afirmação pode ser encontrada no chamado Museo Gregoriano. Sobre o sarcófago, que é adornado de baixos-relevos que representam os milagres de Cristo, pode-se ver a figura de Jesus, que, na ressurreição de Lázaro, aparece sem barba "e equipado com um bastão na atitude clássica de um necromante, ao passo que o cadáver de Lázaro está embalsamado exatamente como uma múmia egípcia". (King The Gnostics, p. 145 (1º ed.); o autor situa esse sarcófago entre as primeiras produções dessa arte que mais tarde inundou o mundo com mosaico e estampas representando as cenas e os personagens do "Novo Testamento".)
O SIGNIFICADO DE DEUS ENCARNADO. (L. 3. pág. 135). Tudo isso aponta inegavelmente para o fato de que, com exceção de alguns raros autodenominados cristãos que posteriormente triunfaram, toda a porção civilizada dos pagãos que conheciam Jesus honrava-o como um filósofo, um adepto a quem colocavam no mesmo nível de Pitágoras e Apolônio. Donde então essa veneração de sua parte por um homem simples, tal como o representam os sinóticos, um carpinteiro judeu pobre e desconhecido de Nazaré? Enquanto Deus encarnado, tudo o que se diz a seu respeito não resiste ao exame crítico da ciência; enquanto um dos maiores reformadores, inimigo inveterado de todo dogmatismo religioso, perseguidor do fanatismo, mestre de um dos mais sublimes códigos de ética, Jesus é uma das maiores e mais bem-definidas figuras no panorama da história humana. Sua época se perde, gradualmente, nas nuvens do passado; sua teologia, baseada na fantasia humana e sustentada por dogmas indefensáveis, pode, ou melhor, deve perder a cada dia um pouco mais de seu imerecido prestígio; só a grande figura do reformador moral e do filósofo, longe de empalidecer, se torna a cada século mais pronunciada e mais bemdefinida. Ela reinará suprema e universal até o dia em que toda a Humanidade reconhecer apenas um pai - o DESCONHECIDO, no alto - e apenas um irmão - toda a Humanidade, embaixo. Numa carta atribuída a Lêntulo, senador e conhecido historiador, endereçada ao senado romano, acha-se uma descrição da aparência pessoal de Jesus. A carta em si, escrita em péssimo latim, passa por ser uma evidente falsificação, mas nela encontramos uma expressão que sugere muitos pensamentos. Embora falsa, é evidente que aquele que a inventou procurou não obstante seguir estritamente uma tradição. Assim, os cabelos de Jesus são representados como "ondulados e crespos" (...) caindo-lhe sobre os ombros, e "separados ao meio segundo o costume dos nazarenos". Esta última frase mostra: 1º: Que havia uma tradição, baseada na descrição bíblica de João Batista, o nazaria, e dos costumes dessa seita. 2º: Se Lêntulo tivesse sido o autor dessa carta, é difícil acreditar que Paulo nunca tivesse ouvido qualquer menção a ela; e se este tivesse conhecimento de seu conteúdo, ele jamais teria afirmado que é uma vergonha para os homens ter os cabelos longos, infamando assim ao seu Senhor e Deus Cristo. 3º: Se Jesus tivesse os cabelos longos e "separados ao meio, segundo o costume dos nazarenos" (assim como João, o único de seus apóstolos que seguia tal costume), então teríamos mais uma boa razão para dizer que Jesus deve ter pertencido à seita dos nazarenos, motivo pela qual foi chamado de NAZARIA e não por que era habitante de Nazaré, pois aqueles nunca tinham os cabelos longos. O nazireu que se consagrava ao Senhor "não permitirá que a navalha lhe passe pela cabeça". "Ele será sagrado e deixará crescer livremente os cabelos", diz Números (VI,5). Sansão era um nazireu, e.i., consagrado ao serviço de Deus e nos cabelos estava a sua força. "Sobre a sua cabeça não passará navalha, porque o menino será nazireu de Deus desde o ventre da mãe" (Juizes, XIII, 5). Mas a conclusão final a inferir disso é a de que Jesus, que tanto se opôs a todas as práticas judias, não deixaria o cabelo crescer se não pertencesse a essa seita, que nos dias de João Batista já se havia tornado uma heresia aos olhos do Sanhedrin. O Talmude, ao falar dos nazareus ou nazarenos (que abandonavam o mundo, como os iogues e os eremitas hindus), chama-os de seita de médicos, de exorcistas errantes; o mesmo faz Jervis. "Eles percorriam o país, vivendo de esmolas e realizando curas." Epifânio diz que os nazarenos se aproximavam tanto quanto à heresia dos Coríntios, pois, embora possam ter existido "antes ou depois destes, eles são não obstante sincrônicos"; e acrescenta: "todos os cristãos naqueles tempos eram igualmente chamados nazarenos"!
A DOUTRINA DA PERMUTAÇÃO OU REVOLUTIO. (L. 3. pág. 136.) Na primeira observação feita por Jesus a propósito de João Batista, vemo-lo afirmar que este é o "Elias, que deverá vir". Esta afirmação, no caso de não ser uma interpolação posterior para simular o cumprimento de um profecia, dá a entender que Jesus, além de nazareno, também era cabalista e acreditava na reencarnação, pois nesta doutrina só estavam iniciados os essênios, nazarenos e discípulos de Simão, benYohai, de Hillel, sem que nada soubessem dela os judeus ortodoxos nem os galileus. A seita dos saduceus negava a imortalidade da alma. "Mas o autor desta restitutio foi nosso mestre Mosah, a paz seja com ele! Que foi a revolutio [transmigração] de Seth e de Helbel, para que pudesse cobrir a nudez de seu primeiro pai, Adão", diz a Cabala. Portanto, ao sugerir que João Batista era a revolutio ou transmigração de Elias, Jesus dá provas incontestáveis da escola a que pertencia. Mas essa doutrina da permutação, ou revolutio, não deve ser entendida como uma crença na reencarnação. Que Moisés era considerado como a transmigração de Abel e Seth não implica que os cabalistas - os que foram iniciados, pelo menos - acreditassem que o espírito idêntico de qualquer dos filhos de Adão reaparecera sob a forma corporal de Moisés. Isso apenas mostra qual o modo de expressão que empregavam para assinalar um dos mistérios mais profundos da Gnose oriental, um dos artigos de fé mais majestosos da Sabedoria Secreta. Esse modo era propositadamente velado a fim de revelar e ocultar a verdade apenas pela metade. Implicava que Moisés, como outros homens divinos, havia alcançado o maior de todos os estados sobre a Terra - o mais raro de todos os fenômenos psicológicos - a união perfeita do espírito imortal com a Díada terrestre. A Trindade estava completa. Um deus havia encarnado. Mas quão raras são essas encarnações! A EXPRESSÃO, “SOIS DEUSES” PARA OS CABALISTAS. (L. 3. pág. 137.) A expressão "Sois deuses", que, para os nossos estudiosos bíblicos é uma mera abstração, tem para os cabalistas um significado vital. Todo espirito imortal que se irradia sobre um ser humano é um Deus - o Microcosmo do Macrocosmo, parte e parcela do Deus Desconhecido, a Causa Primária de que ele é uma emanação direta. Possui todos os atributos de sua fonte original. Entre esses atributos estão a onisciência e a onipotência. Dotado de tais atributos, mas incapaz de manifestá-los enquanto está no corpo, durante cujo período são obscurecidos, velados e limitados pelas faculdades da natureza física, o homem habitado pela divindade pode elevar-se muito acima de seus semelhantes, pôr em evidência seus conhecimentos divinos e fazer prova de poderes deificos; pois, enquanto o resto dos mortais ao seu redor são ensombrecidos por seu EU divino, com todas as possibilidades de se tornarem imortais durante sua estada aqui, mas sem outra certeza do que seus esforços pessoais para conquistar o reino dos céus, o homem assim eleito já se tornou imortal enquanto está na Terra. Seu prêmio está assegurado. Doravante, ele viverá para sempre na vida eterna. Não apenas ele pode ter "domínio" sobre todas as obras da criação empregando a "excelência" do NOME (o inefável), mas será nesta vida, não, como Paulo afirma, "abaixo dos anjos". (Essa contradição, que é atribuída a Paulo em Hebreus, fazendo-o dizer a propósito de Jesus no cap. I, 4: "Sendo tão superior aos anjos", para afirmar imediatamente a seguir, no cap. II, 9: "Vemos a Jesus, que fora feito, um pouco menor que os anjos", mostra a forma pouco escrupulosa com que os escritos dos Apóstolos foram tratados, se é que estes jamais escreveram o que quer que fosse.)
Os antigos jamais sustentaram o pensamento sacrílego de que tais entidades perfeitas eram encarnações do Supremo, do Deus para sempre invisível. Nenhuma profanação da terrível Majestade ocupava qualquer lugar em suas concepções. Moisés e seus protótipos e tipos eram para eles apenas homens completos, deuses sobre a Terra, pois seus deuses (espíritos divinos) haviam penetrado seus tabernáculos santificados, os corpos físicos purificados. Os antigos chamavam deuses aos espíritos desencarnados dos sábios e heróis. Daí a acusação de politeísmo e de idolatria por parte daqueles que foram os primeiros a antropomorfizar as abstrações mais sagradas e mais puras de seus ancestrais. O sentido real e oculto dessa doutrina era conhecido por todos os iniciados. Os tannaim o comunicaram aos seus eleitos, os ozarim, nas solenes solidões das criptas e dos lugares desertos. Essa doutrina era esotérica e zelosamente guardada, pois a natureza humana era então igual à que é hoje, e a casta sacerdotal confiava tanto como hoje na supremacia de seu conhecimento, ambicionando a ascendência sobre as massas ignorantes; com a diferença, talvez, de que seus hierofantes podiam provar a legitimidade de suas afirmações e a plausibilidade de suas doutrinas, ao passo que hoje os fiéis devem se contentar com a fé cega. Enquanto os cabalistas chamavam a essa misteriosa e rara ocorrência da união do espírito com o ônus mortal confiado ao seu cuidado, de "descida do Anjo Gabriel" (sendo este um nome genérico), o Mensageiro da Vida, e o anjo Metatron, e enquanto os nazarenos chamavam de Hibil-Ziwa o Legatus enviado pelo Senhor Excelso, ele era universalmente conhecido como o "Espírito Ungido".
Foi, portanto, a aceitação dessa doutrina que levou os gnósticos a firmarem que Jesus era um homem ensombrecido pelo Cristos, ou Mensageiro da Vida, e que seu lancinante grito na cruz, "Eloi, Eloi, lama shâbahthani", lhe foi arrancado no instante em que sentiu que essa inspiradora Presença o havia finalmente abandonado, pois - como alguns o afirmaram - sua fé também o abandonara quando estava na cruz. Os primeiros nazarenos, que devem ser alinhados entre as seitas gnósticas, embora acreditando que Jesus era um profeta, sustentavam a seu respeito a mesma doutrina do "ensombrecimento" divino de certos "homens de Deus", enviados para a salvação das nações, e para chamá-las ao caminho do bem. "A mente divina é eterna, e é para luz, disseminada através de esplêndido e imenso espaço (pleroma). É a Geradora dos Aeons. Mas um destes se transforma em Matéria [Caos] produzindo movimento confusos (turbulentos); e por meio de uma parte da luz celeste ele a conformou numa boa constituição para o uso, mas foi o começo de todo o mal. O Demiurgo [da matéria] reclamou as honras divinas. Por conseguinte, Cristo ("o ungido"), o príncipe dos Aeôns [poderes] (expeditus), e, tomando a forma de um devoto judeu (Iesu), deveria conquistálo, mas, pondo-o [o corpo] de lado, partiu para as alturas". ("Segundo os nazarenos e os gnósticos, o Demiurgo, o criador do mundo material, não é o Deus supremo", (ver Dunlap, Sõd, tehn Son of the Man.) Explicaremos mais adiante o pleno significado do nome Cristos e o seu sentido místico. O DOGMA DOS GNÓSTICOS. (L. 3. pág. 138). E agora, a fim de tornar tais passagens mais inteligíveis, tentaremos definir, da maneira mais breve possível, os dogmas em que, com diferenças insignificantes, quase todas as seitas gnósticas acreditavam. Foi em Éfeso que floresceu nessa época o colégio mais célebre, em que tanto as doutrinas abstratas do Oriente como a filosofia de Platão eram ensinadas. Ele era o foco das doutrinas "secretas" universais; o misterioso laboratório de onde nasceu, vazada na elegante fraseologia grega, a quintessência da filosofia budista, zoroastrista e caldaica. Ártemis, o gigantesco símbolo concreto das abstrações teosófico-panteístas, a grande mão Multimamma, andrógina e padroeira das "escrituras de Éfeso", foi conquistada por Paulo; mas, embora os zelosos convertidos dos apóstolos tenham pretendido queimar todos os livros sobre as "artes curiosas", muitos deles restaram, possibilitando-lhes o estudo assim que o seu zelo esfriou. Foi de Éfeso que se irradiou quase toda a Gnose, que antagonizava ferozmente com os dogmas de Irineu; e foi ainda Éfeso, com seu numerosos ramos colaterais do grande colégio dos essênios, que revelou ser o viveiro de todas as especulações cabalistas que os tannaim haviam trazido do cativeiro. "Em Éfeso", diz J. Matter, "as noções da escola judaica-egípcia haviam então recentemente chegado para engrossar a vasta confluência de doutrinas gregas e asiáticas, de modo que não é de surpreender que os mestres aí se tenham desenvolvido para tentar a combinação da religião recentemente pregada pelo Apóstolo com as idéias há muito estabelecidas nesse local." Se os cristãos não se tivessem limitado às Revelações de uma pequena nação, aceitando o Jeová de Moisés, as idéias gnósticas jamais teriam sido acusadas de heresia; uma vez desembaraçado de seus exageros dogmáticos, o mundo teria possuído um sistema religioso baseado na pura filosofia platônica, e muito se teria ganho certamente com isso. Vejamos agora quais são as maiores heresias dos gnósticos. Escolheremos Basilides como o modelo para as nossas comparações, pois todos os fundadores das outras seitas gnósticas se agruparam ao seu redor, como um sistema planetário que toma luz de seu Sol. Basilides afirma que havia tomado todas as suas doutrinas do Apóstolo Mateus, e de Pedro, através de Gláucias, seu discípulo. De acordo com Eusébio, ele publicou vinte e quatro volumes de Interpretações dos Evangelhos, os quais todos foram queimados, fato que nos faz supor que continham mais verdades do que a escola de Irineu estava preparada para negar. Ele afirma que o Pai desconhecido, Eterno e Incriado, tendo dado nascimento em primeiro lugar ao Nous, à Mente, esta emanou de si mesma o Logos. O Logos (o "Verbo" de João) emanou por sua vez as Phronêsis, as Inteligências (espíritos divino-humanos). Das Phronêsis nasceu Sophia, a sabedoria feminina, e Dynamis - a força. Tais foram os atributos personificados da misteriosa divindade, o quintérnio gnóstico, que simboliza as cinco substâncias espirituais, mas inteligíveis, as virtudes pessoais ou os seres exteriores da divindade desconhecida. Essa é uma idéia eminentemente cabalística. Ela é ainda mais budista. O sistema primitivo da Filosofia Budista - que precedeu em muito Gautama Buddha baseia-se na substância incriada do "Desconhecido", o Âdi-Buddha (*). Essa Mônada eterna e infinita possui, como próprios de sua essência, cinco atos de sabedoria. Destes, por meio de cinco atos separados de Dhyâna, ela emitiu cinco Dhyâni-Buddhas; estes, como Âdi-Buddha, são imóveis em seu sistema (passivo). Nem Âdi, nem qualquer dos cincos Dhyâni-Buddhas jamais se encarnou, mas sete de suas emanações tornaram-se avatâras, i.e., encarnaram-se nesta Terra.
( * Âdi-Buddha - Os cinco fazem misticamente dez. Eles são Andrógino. "Tendo dividido seu corpo em duas partes, A Sabedoria Suprema tornou-se macho e fêmea" (Manu, livro I, sloka 32). Muitas idéias budistas primitivas se acham no Bramanismo. A idéia predominante de que o último dos Budistas, Gautama, é a nona encarnação de Vishnu, ou o novo Avatâra, é parcialmente refutada pelos Brâmanes, e totalmente rejeitada pelos eruditos teólogos budistas. Estes últimos insistem em que o culto de Buddha é muito mais antigo do que qualquer adoração bramânica dos Vedas, que eles chamam de literatura secular. Os Brâmanes mostram eles, provêm de outros países, e estabeleceram sua heresia sobre as divindades populares já aceitas. Conquistaram a terra pela espada, e conseguiram sepultar a verdade, edificando uma teologia própria sobre as ruínas da Teologia mais antiga de Buddha, que havia prevalecido durante séculos. Eles admitem a divindade e a existência espiritual de alguns dos deuses vedantistas; mas, como no caso da hierarquia angélica cristã, eles acreditam que todas essas divindades são muito inferiores, mesmo aos Buddhas encarnados. Não admitem a criação do universo Físico. Espiritual e invisivelmente, ele existe desde a Eternidade, e só se torna visível para os sentidos humanos. Por ocasião de sua primeira manifestação, Ele foi chamado do Reino do Invisível para o Visível por meio do impulso de Âdi-Buddha - a "Essência". Os Brâmanes computam vinte e duas dessas manifestações visíveis do universo governadas pelos Buddhas, e outras tantas destruições dele, pelo fogo e pela água, em sucessões regulares. Após a última destruição pelo dilúvio, ao fim do ciclo precedente (o cálculo exato, que compreende vários milhões de anos, é um ciclo secreto), o mundo, durante a presente idade de Kali-Yuga - MahâBhadra-Kalpa - foi governado, sucessivamente, por quatro Buddhas, o último dos quais foi Gautama, "Santo". O quinto, MaitreyaBuddha, está ainda por vir. Ele é o esperado Rei Messias cabalístico, o Mensageiro da Luz, o Saoshyant, o Salvador persa, que virá montado num cavalo branco. É também o Segundo Advento dos cristãos. Ver o Apocalipse de São João.)
Descrevendo o sistema de Basilides, Irineu, citando os gnósticos declara o seguinte: "Quando o Pai incriado e sem nome viu a corrupção da Humanidade, enviou o seu Nous primogênito ao mundo, na forma de Cristo, para a redenção de todos os que acreditam nele, por meio da força daqueles que fabricaram o mundo [o Demiurgo e seus seis filhos, os genii planetários. Ele surgiu entre os homens como o homem Jesus, e realizou milagres. Esse Cristo não morreu pessoalmente, pois Simão, o Cirenaico, sofreu em seu lugar, emprestando-lhe sua forma corporal, pois a Força Divina, o Nous do Pai Eterno, não é o corpóreo e não pode morrer. Portanto, todos aquele que afirma que Cristo morreu é ainda escravo da ignorância; todo aquele que nega tal afirmação está livre, e compreendeu o desígnio do Pai". (Irineu. Adv. Haer., I, XXIV, 4.).
Até aqui, e tomando-o em seu sentido abstrato, nada vemos de blasfemo neste sistema. Ele pode ser uma heresia contra a teologia de Irineu e Tertuliano (Tertuliano virou ele próprio a mesa, rejeitando, mais tarde, as doutrinas pelas quais lutara com tanto rigor, e tornando-se um montanista.), mas não é certamente sacrílego contra a idéia religiosa em si, e a todo pensador imparcial ela parece muito mais compatível com a dignidade divina do que o antropomorfismo do cristianismo atual. Os cristãos ortodoxos chamavam os gnósticos de Docetae, ou Ilusionistas, por acreditarem que Cristo não sofreu nem poderia sofrer realmente a morte - no corpo físico. Os livros bramânicos mais recentes contêm, de igual modo, muita coisa que repugna ao sentimento e à idéia reverente da Divindade; e, assim como os gnósticos, os Brâmanes explicam as lendas que poderiam chocar a dignidade dos seres espirituais, que se chama de deuses, atribuindo-os a Mâyâ, ou ilusão. Não se deve esperar que um povo, instruído e nutrido através de séculos sem fim entre todos os fenômenos psicológicos que as nações civilizadas (!) observam, mas rejeitam como incrível ou indignos, tenha seu sistema religioso compreendido, e menos ainda apreciado. As especulações mais profundas e mais transcendentais dos antigos metafísicos da Índia e de outras nações baseiam-se todas nesse grande princípio budista e bramânico que subjaz a todo o conjunto de suas metafísicas religiosas - a ilusão dos sentidos. Tudo o que é finito é ilusão, tudo o que é eterno e infinito é realidade. Forma, cor, o que ouvimos e sentimos ou vemos com nossos olhos mortais, tudo isso só existe na medida em que cada um de nós o concebe através dos sentidos. O universo para um cego de nascença não existe em forma ou cor, mas existe em sua privação (no sentido aristotélico), e é uma realidade para os sentidos espirituais do cego. Vivemos todos sob o poderoso domínio da fantasia. Apenas os originais superiores e invisíveis emanados do pensamento do Desconhecido são seres, formas e idéias reais e permanentes; na Terra, vemos apenas seus reflexos, mais ou menos corretos, e sempre dependentes da organização física e mental da pessoa que os contempla. Séculos incontáveis antes de nossa era, o Místico hindu Kapila, que é considerado por muitos cientistas como um céptico, uma vez que o julgam com a sua habitual superficialidade, expressou magnificamente essa idéia nos seguintes termos: "O homem [o homem físico] vale tão pouco que é coisa árdua fazê-lo compreender sua própria existência, e a Natureza. Talvez o que consideramos como universo, e os vários seres que parecem compô-lo, nada tenham de real, e não passem de produto da ilusão contínua - mâyâ - de nossos sentidos". E diz o moderno Schopenhauer, repetindo essa idéia filosófica de 10.000 anos de idade: "A Natureza não existe per se (...) A Natureza é a ilusão infinita de nossos sentidos." Kant, Schelling e outros metafísicos disseram o mesmo, e suas escolas sustentam tal idéia. Visto que os objetos dos sentido são sempre enganosos e flutuantes, não podem ser uma realidade. Só o espírito é imutável; portanto - é o único que é ilusório. Tal é a pura doutrina budista. A religião da Gnose (conhecimento), ramo mais evidente do Budismo, baseava-se por
completo nesse dogma metafísico. Cristos sofreu espiritualmente por nós, e muito mais agudamente do que fez o ilusório Jesus enquanto o seu corpo estava sendo torturado na Cruz. O Cristos grego tem vários sentidos, tais como "ungido" (óleo puro, crisma), e outros. Em todas as línguas, embora o sinônimo da palavra signifique essência pura ou sagrada, ela representa a primeira emanação da Divindade invisível, que se manifesta tangivelmente no espírito. O Logos grego, o Messias hebraico, o Verbum latino e o Virâj (o filho) hindu são identicamente os mesmos; representam uma idéia de entidades coletivas - de chamas que se destacam de um centro eterno de Luz. "O homem que cumpre atos piedosos, mas interesseiros [visando exclusivamente à sua salvação], pode alcançar as fileiras dos devas [santos]; mas aquele que cumpre desinteressadamente os mesmos atos piedosos vê-se liberto para sempre dos cinco elementos" (da matéria). "Percebendo a Alma Suprema em todos os seres e todos os seres na Alma Suprema, oferecendo sua própria alma em sacrifício, ele se identifica com o Ser que brilha em seu próprio esplendor". (Manu, livro XII, sloka 90, 91.) Assim, Cristos, como unidade, não passa de uma abstração: uma idéia geral que representa a agregação coletiva das inúmeras entidades espirituais que são as emanações da PRIMEIRA CAUSA infinita, invisível, incompreensível - os espíritos individuais dos homens, erroneamente chamados de almas. Eles são os filhos divinos de Deus, dos quais apenas alguns dominam os homens - mas estes a maioria; alguns permanecem para sempre espíritos planetários, e alguns - a frágil e rara minoria - se unem durante a vida em alguns homens. Seres divinos como Gautama Buddha, Jesus, Lao-Tsé, Krishna e uns poucos outros uniram-se permanentemente com seus espíritos - portanto, tornaram-se deuses sobre a Terra. Outros como Moisés, Pitágoras, Apolônio, Plotino, Confúcio, Platão, Jâmblico e alguns santos cristãos, tendo assim se reunido por intervalos, alinharam-se na história como semideuses e guias da Humanidade. Uma vez libertos de seus tabernáculos terrestres, suas almas liberadas, doravante unidas eternamente com seus espíritos, reúnem-se à hoste resplandecente, que está unida numa solidariedade espiritual de pensamento e ação, e que é chamada "a ungida". Daí a afirmação dos gnósticos que, sustentando que Cristos sofreu espiritualmente pela Humanidade, queriam subentender que foi seu Espírito Divino quem mais sofreu. OS PRECEITOS DE MANU. (L. 3. pág. 143). Abri agora o Livro de Manu, e lede: "A resignação, a ação de dar o bem pelo mal, a temperança, a probidade, a pureza, a repressão dos sentidos, o conhecimento dos Sâstras [os livros sagrados], e da alma suprema, a veracidade e a abstinência da ira, tais são as dez virtudes em que consiste o dever (...) Aquele que estudarem esses dez preceitos de dever, e depois de os terem estudado, a eles conformarem suas vidas, alcançarão o estado supremo". Se Manu não escreveu essas palavras muitos milhares de anos antes da era cristã, pelo menos nenhuma voz em todo o mundo ousará negar-lhes uma antigüidade de alguns séculos. O mesmo vale no caso dos preceitos do Budismo. Se voltarmos ao Pratimoksha-Sûtra e a outros tratados religiosos dos budistas, leremos os seguintes dez mandamentos: 1. Não matarás nenhuma criatura viva. 2. Não roubarás. 3. Não quebrarás teu voto de castidade. 4. Não mentirás. 5. Não revelarás os segredos dos outros. 6. Não desejarás a morte de teus inimigos. 7. Não desejarás as riquezas de outros. 8. Não pronunciarás palavras injuriosas e obscenas. 9. Não carias na luxúria (deitar em leito macio ou abandonar-se à lassidão). 10. Não aceitarás ouro ou prata. "Mestre, que devo fazer de bom para alcançar a vida eterna?", pergunta um homem a Jesus. "Observa os mandamentos. "Quais?" "Não matarás, não cometerás adultério, não roubaras, não prestarás falso testemunhos", é a resposta. "O que deverei fazer para ter a posse da Bodhi?" [conhecimento da verdade eterna], pergunta um discípulo ao seu mestre budista. "Qual é o caminho pelo qual se pode tornar um Upâsaka?" "Observa os mandamentos." "Quais são eles?" "Abstém-se durante toda tua vida do assassínio, do roubo, do adultério e da mentira", responde o mestre.
Preceitos análogos, como se pode constatar. Preceitos divinos, cuja observância purificaria e exaltaria a Humanidade. Mas são eles mais divinos quanto pronunciados por uma boca do que por outra? Se é divino trocar o mal pelo bem, a enunciação desse preceito por um nazareno lhe dá mais força do que a enunciação por um filósofo indiano ou tibetano? Vemos que a Regra de Ouro não se originou com Jesus; que sua origem está na Índia. Sem embargo de tudo o que fizemos, não podemos negar a Sakyamuni uma antigüidade de pelo menos vários séculos antes do nascimento de Jesus. Ao buscar um modelo para o seu sistema de ética, por que não poderia Jesus ter ido antes aos pés dos Himalaias do que aos pés do Sinai, se tão-somente as doutrinas de Manu e Gautama se harmonizavam exatamente com a sua própria filosofia, ao passo que as de Jeová lhe eram abomináveis e terríficas? Os hindus ensinavam a trocar o mal pelo bem, mas o mandamento javético rezava: "olho por olho, dente por dente". JEOVÁ É IDÊNTICO A BACO. (L. 3. pág. 144). Sustentariam ainda os cristãos a identidade do "Pai" de Jesus com Jeová, se pudesse aduzir uma prova suficiente clara de que o "Senhor Deus" não é outro senão o Baco pagão, Dionísio? Pois bem, a identidade do Jeová do Monte Sinai com o deus Baco é praticamente indiscutível. O Nome é Yava, ou Iao, segundo Diodorus e Lydus, que é o nome secreto do deus dos mistérios fenício; e ele foi realmente adotado pelos caldeus, para quem designava igualmente o nome secreto do criador. Em toda parte em que Baco era adorado, havia a tradição de Nisa e uma caverna em que ele era erguido. Beth-San ou Scythopolis, na Palestina, trazia essa designação; havia um local semelhante no Monte Parnaso. Mas Diodorus declara que Nisa se localizava entre a Fenícia e o Egito; Eurípedes afirma que Dionísio veio à Grécia oriundo da Índia; e Diodorus acrescenta seu testemunho: "Osíris foi erguido em Nisa, na Arábia Feliz; ele era filho de Zeus, e seu nome deriva do pai [nominativo Zeus, genitivo Dios], chamando-se então o local de Dios-Nysos" - o Zeus ou Júpiter de Nisa. Essa identidade de nome ou título é muito significativa. Na Grécia, Dionísio ocupava uma eminência superada apenas por Zeus, e diz Píndaro: “Assim governa o Pai Zeus e todas as coisas, e Baco Também.”
Mas, fora da Grécia, Baco era o todo-poderoso "Zagreus, o deus supremo". Moisés parece tê-lo adorado pessoalmente e em conjunto com o populacho no Monte Sinai; a menos que admitamos que ele era um sacerdote iniciado, um adepto, que sabia como levantar o véu que cobre o culto exotérico, porém manteve o segredo. "E Moisés edificou um altar, e o chamou de Jeová-NISSI", ao Iao-Nisi! Que melhor prova para mostrar que o deus do Sinai era indiferentemente Baco, Osíris e Jeová? S. Sharpe acrescenta também seu testemunho de que o local em que Osíris nasceu "era o monte Sinai, chamado pelos egípcios de Monte Nissa". A Serpente Brônzea era uma nahash, e o mês da Páscoa judaica, nisan. Se o "Senhor Deus" mosaico era o único Deus vivo, e Jesus, Seu único Filho, como explicar a fala rebelde deste último? Sem hesitação ou qualquer outra explicação, ele subverte a lex talionis judaica e a substitui pela lei da caridade e da abnegação. Se o Velho Testamento é uma revelação divina, o que será então o Novo Testamento? Devemos crer num Deus que se contradiz no curso de uns poucos séculos? Era Moisés um inspirado, ou não era Jesus o filho de Deus? Esse é o dilema de que os teólogos nos devem tirar. E é desse mesmo dilema que os gnósticos tentaram resgatar o nascente Cristianismo. Há dezenove séculos que a Justiça espera por comentadores inteligentes que apreciem essa diferença entre o ortodoxo Tertuliano e o gnóstico Marcion. "Como pode um deus", indagou Marcion, "quebrar os seus próprios mandamentos? Como pode ele defender a idolatria e o culto das imagens, e no entanto ordenar a Moisés que erija uma serpente de bronze? Como pode ordenar: "Não roubarás", e no entanto ordenar que os israelitas espoliem os egípcios de seu ouro e de sua prata?" Antecipando os resultados da crítica moderna, Marcion nega que se possa atribuir a Jesus as chamadas profecias messiânicas. Escreve o autor de Supernatural Religion: "O Emanuel de Isaías [VII, 14; cf. VIII, 4] não é Cristo; a `Virgem', sua mãe, é simplesmente uma `jovem' [uma almeh do templo]; e os sofrimentos do Servo de Deus (Isaías, LII, 13-LIII, 3) não são predições da morte de Jesus".
CAPÍTULO IV AS COSMOGONIAS ORIENTAIS E OS RELATOS BÍBLICOS COMPARAÇÕES ENTRE OS SISTEMAS, INDIANO, CALDEU E OFITA.(L. 3. pág. 154).
O
s dos ofitas, que assumiram uma forma definitiva na época de Marcion e dos basilideanos, encontramos a razão para as heresias de todas as outras seitas. Como todos os outros gnósticos, eles rejeitavam completamente a Bíblia mosaica. Não obstante, exceto algumas deduções originais de alguns dos fundadores mais importantes de diversos ramos do gnosticismo, a sua filosofia não era nova. Passando pela tradição cabalística caldaica, ela tomou os seus materiais nos livros herméticos e, se procurarmos mais longe ainda por sua especulações metafísicas, nós a encontramos enleada entre os dogmas de Manu e na gênese primitiva hindu pré-sacerdotal. Muitos dos nossos antiquários eruditos remontam as filosofias gnósticas ao Budismo, o que não diminui de maneira alguma os seus nem os nossos argumentos. Repetimos mais uma vez: o Budismo é a fonte primitiva do Bramanismo. Não foi contra os Vedas primitivos que Gautama protestou. Foi contra a religião sacerdotal e oficial de seu país; e os brâmanes, a fim de dar lugar e autoridade às suas castas, preencheram, num período posterior, os manuscritos antigos com slokas (versos) interpolados, com os quais queriam provar que as castas haviam sido predeterminadas pelo Criador pela razão de que cada classe de homens provinha de um dos membros nobres de Brahmâ. A filosofia de Gautama Buddha era aquela que, desde os tempos imemoriais, se ensinava no segredo impenetrável dos santuários internos dos pagodes. Não devemos nos surpreender, portanto, quando encontramos, em todos os dogmas fundamentais dos gnósticos, os dogmas metafísicos tanto do Bramanismo quanto do Budismo. Eles afirmavam que o Velho Testamento era a revelação de uma ser inferior, uma divindade subordinada, e que não continha uma única frase da sua Sophia, a Sabedoria Divina. Quanto ao Novo Testamento, ele perdera a sua pureza quanto os compiladores introduziram interpolações. A revelação da verdade foi sacrificada por eles para a promoção dos seus fins egoístas e para a manutenção de suas querelas. Essa acusação não parece ser muito improvável para aquele que está a par da luta constante entre os defensores da circunscrição e da "Lei" e os apóstolos que renegaram o Judaísmo. Os ofitas gnósticos ensinavam a doutrina das emanações, tão odiosa aos partidários da unidade na Trindade, e vice-versa. A Divindade Desconhecida, para eles, não tinha nome; mas a sua primeira emanação feminina era chamada Bythos ou Profundidade ( Grande Abismo ou Caos). Correspondia à Shekînah (Luz Primordial) dos cabalistas, o "Véu" que oculta a "Sabedoria" no cranium da mais superior das três cabeças. Como a Mônada pitagórica, essa Sabedoria sem nome era a Fonte de Luz, e Ennoia ou Mente é a própria Luz. Esta era chamada também de "Homem Primitivo", como o Adão-Cadmo, ou o antigo Adão da Cabala. Na verdade, se homem foi criado à imagem e à semelhança de Deus, então era igual à sua criatura em forma e figura - por conseguiste, ele é o "Homem Primitivo". O primeiro Manu, o que desenvolveu de Svayambhû, "o que existe, não revelado, em sua própria glória", também é, em certo sentido, o homem primitivo, para os hindus. Assim, o Bythos "sem nome e não-revelado", seu reflexo feminino, e Ennoia, a Mente revelada que procede de ambos, ou seu Filho, são as contrapartidas da primeira Tríade caldaica, bem como da Trimûrti bramânica. Comparemos: em todos os sistemas vemos A GRANDE CAUSA PRIMEIRA, o UM, o germe primordial, o TODO sublime e não-revelado, que existe por si mesmo. No CALDAICO PANTEÃO HINDU Brahman-Dyaus Ilu, o Ain Soph cabalístico (N.C. Sobre o assunto ver Etimologia de IAO cap. VII).
OFITA o Sem Nome, ou o Nome Secreto.
Quando o Eterno desperta do seu sono e deseja manifestar-se, divide-se em macho e fêmea. Torna-se então em cada um dos sistemas: A DIVINDADE DE DUPLO SEXO, o Pai e a Mãe universais. NA ÍNDIA Brahmâ Nâra (macho), Nârî (fêmea).
NA CALDÉIA Eikon ou Ain Soph. Anu (macho, Anata (fêmea).
NO SISTEMA OFITA Espírito Sem Nome Abrasax (macho), Bythos (fêmea).
Da união dos dois emana um terceiro, ou Princípio criativo - o FILHO, ou o Logos Manifesto, o Produto da Mente Divina. NA ÍNDIA Virâj o Filho
NA CALDÉIA Bel, o Filho
NO SISTEMA OFITA Ophis (outro nome de Ennoia), o Filho).
Além disso, cada um desses sistemas tem um Trindade masculina tríplice, procedendo cada uma por si mesma de uma Divindade feminina. Assim, por exemplo: NA ÍNDIA A Trindade - Brahmâ, Vishnu, Shiva - em UM, que é Brahma (gênero neutro), que cria e é criado pela Virgem Nârî (a Mãe de fecundidade perpétua).
NA CALDÉIA A Trindade - Anu, Bel, Hoa ( ou Sin, Samas, Bin) – que se reúne em UM que é Anu (de Sexo duplo) pela Virgem Mylitta.
NO SISTEMA OFITA A Trindade formada pelo Mistério chamado Sigê, Bythos, Ennoia. Eles se tornam UM, que é Abrasax, da Virgem Sophia (ou Pneuma), que é uma emanação de Buthos e do deus-Mistério e que por meio deles faz emanar Cristos.
Para deixá-lo mais claro, o Sistema Babilônico reconhece em primeiro lugar - o Um (Ad, ou Ad-ad), que nunca é nomeado, porém que é reconhecido em pensamento como o Svayambhû hindu. A partir daí ele se manifesta como Anu ou Ana - o único acima de tudo - Monas. Depois vem o Demiurgo chamado Bel ou El, que é o poder ativo da Divindade. O terceiro é o princípio da Sabedoria, Hea ou Hoa que também governa o mar e o mundo inferior. Cada um deles tem sua esposa divina - Anata, Belita e Davkina. Elas, todavia, não são senão Saktis (energia feminina ativa dos deuses) e não são especialmente reconhecidas pelos teólogos. Mas o princípio feminino é designado por Mylitta, a Grande Mãe, também chamada Ishtar. Quanto aos três deuses masculinos, temos a Tríade ou Trimûrti, e, acrescentando-lhe Mylitta, o Arba ou Quaternário (a Tetraktys de Pitágoras), que aperfeiçoa e potencializa tudo. Assim, temos os modos de expressão indicados acima. O diagrama caldaico que segue pode servir como ilustração para todos os outros: TRÍADA
Anu, Bel, Hoa,
Mylitta-Arba-il, ou Deus quaternário
Deus o Pai, Deus o Filho, Deus o Espírito Santo,
Maria, ou mãe desses três Deuses, dado que são apenas um, ou a Tetraktys celestial cristã.
torna-se, entre os cristãos: TRINDADE
Em conseqüência, Hebron, a cidade dos kabiri, era chamada Kiryath-Arba, cidade dos Quatro. Os kabiri eram Axieros, o nobre Eros, Axiokersos, o honorável ornado de chifres, Axiokersa, Deméter e Casmilos, Hoa, etc. (Kabiri, Axiokersa, são Divindades e deuses "os poderosos"). O dez pitagóricos denota o Arba-il ou o Quaternário Divino, emblematizado pelo linga (Um signo ou símbolo de criação abstrata. A Força converte-se no órgão de procriação masculino apenas nesta Terra.) hindu: Anu, 1; Bel, 2; Hoa, 3, que fazem 6. A Tríade e Mylitta, representando 4, perfazem dos Dez. Embora seja chamado de "Homem Primitivo", Ennoia, que é, como Pimandro egípcio, o "Poder do Pensamento Divino", a primeira manifestação inteligível do Espírito Divino em forma material, ele é como o Filho "Unigênito" do "Pai Desconhecido" de todas as outras nações. Ele é o emblema da primeira aparição da Presença Divina em suas próprias obras de Criação, tangível e visível, e em conseqüência, compreensível. O Deus-mistério, ou a Divindade nunca-revelada, fecunda por meio da Sua Vontade Bythos, a profundidade insondável e infinita que existe no silêncio (Sigê) e na escuridão (para o nosso intelecto) e que representa a idéia abstrata de toda a natureza, o Cosmos eternamente produtivo. (Bythos termo gnóstico que significa "Profundidade" ou "grande abismo", Caos. Equivalente a "espaço", antes que nele se tenha formado alguma coisa a partir dos átomos primordiais, que existem eternamente em suas profundezas, segundo os ensinamentos de Ocultismo.) Como nem o princípio masculino nem o
feminino, reunidos na idéia de uma Divindade bissexual nas concepções antigas; podiam ser compreendidos por um intelecto humano comum, a teologia de cada povo de criar, para a sua religião, um Logos ou palavra manifesta, de uma ou de outra forma. Para os ofitas e outros gnósticos, que extraíram os seus modelos diretamente de originais mais antigos, o Bythos não-revelado e sua contrapartida masculina produziram Ennoia e os três, por sua vez, produziram Sophia, completando assim a Tetraktys, que fará emanar o Cristos, a essência mesma do Espírito do Pai. Sob o aspeto do Um não-revelado, ou Logos oculto em seu estado latente, ele existiu por todo o sempre no Arba-il, a abstração metafísica; portanto, ele é UM com os outros enquanto
unidade, recebendo estes últimos (e todos eles), indiferentemente, os nomes de Ennoia, Sigê (silêncio), Bythos, etc. Sob seu aspeto revelado, ELE é Andrógino: Cristos e Sophia (Sabedoria Divina), que originam o homem Jesus. Irineu demonstra que ambos, Pai e Filho, amaram a beleza (formam) da mulher primitiva, que é Bythos - Profundidade - e também Sophia, e que, por sua vez, produziu conjuntamente Ophis e Sophia (de novo uma unidade bissexuada), sabedoria masculina e feminina, das quais uma é o Espírito Santo não revelado, ou antiga Sophia - o Pneuma - a "Mãe (intelectual) de todas as coisas"; a outra, a revelada, ou Ophis, representa a sabedoria divina que desceu à matéria, ou Deus-homem-Jesus, que os ofitas gnósticos representavam por uma serpente (Ophis). Fecundada pela Luz Divina do Pai e do Filho, o espírito supremo e Ennoia, Sophia produz por sua vez duas outras emanações - um Chistos perfeito, a segunda Sophia-Akhamôth imperfeita a partir da hokhmôth (sabedoria simples), que se torna a mediadora entre os mundos intelectuais e material. Cristos era o mediador e o guia entre Deus (o Supremo) e tudo o que de espiritual havia no homem; Akhamôth - a Sophia mais jovem - exercia a mesma função entre o "Homem Primitivo", Ennoia, e a matéria. Já explicamos o que havia de misterioso no significado do termos geral Cristos. No sistema ofita, Sophia, a Sabedoria Andrógina, também é o espírito feminino, ou a fêmea hindu Nârî (Nârâyana), movendo-se na superfície das águas - o caos, ou a matéria futura. Ela a vivifica à distância, mas não toca o abismo das trevas. É incapaz de fazê-lo, pois a Sabedoria é puramente intelectual e não pode agir diretamente sobre a matéria. Portanto, Sophia é obrigada a recorrer a seu Parente Supremo, mas, embora a vida proceda em primeiro lugar da Causa Inobservada e de seu Ennoia, nenhum deles pode, mais do que ela, ter algo em comum com o caos inferior em que a matéria assume sua forma definitiva. Assim, Sophia é obrigada a empregar nessa tarefa a sua emanação imperfeita, que é de natureza mista, metade espiritual e metade material. A única diferença entre a cosmogonia ofita e a dos nazarenos de São João é uma troca de nomes. Encontramos um sistema idêntico na Cabala, no Livro do mistério (Liber misterii). Esses três sistemas, especialmente o dos cabalistas e dos nazarenos, que foram os modelos para a cosmogonia ofita, pertencem ao gnosticismo oriental puro. O Codex nazaraeus começa da seguinte maneira: "O Supremo Rei da Luz, Mano, o primeiro grande UM", etc., sendo este último a emanação de Ferho - a VIDA desconhecida, sem forma. Ele é o chefe dos Eons, dos quais procedem (ou se originam) cinco raios refulgentes de luz Divina. Mano é o Rex Lucis, o Bythos-Enoia dos ofitas. Ele é a Lua Manifesta que rodeia a mais elevada das três cabeças revelando, Cristos o "Apóstolo Gabriel" e o primeiro Legado ou mensageiro da luz. Se Bythos e Ennoia são o nazareno Mano, então a Akhamôth de natureza dupla, semi-espiritual e semimaterial, deve ser Pthahil, considerada segundo seu aspeto espiritual; mas, se a consideramos conforme sua natureza grosseira, é o "Spiritus" dos nazarenos. Pthahil, que é o reflexo do seu pai, o Senhor Abathur, a terceira vida - assim como a Sophia primogênita é também a terceira emanação -, é o "homem mais novo". Apercebendo-se dos seus vãos esforços para criar um mundo material perfeito, o "Espiritus" chama em sua ajuda uma das sua progenitoras, o Karabtanos-Ialdabaôth (O espírito do desejo cego ou animal; símbolo do Kâma-rûpa. Espírito "sem sentido ou juízo".), que não tem razão nem judiciosidade ("matéria cega"), para se unir a ela para criar algo de definitivo com essa matéria confusa (turbulentos), tarefa que ela só é capaz de realizar depois de ter produzido, com esta união com Karabtanos, as sete estrelas. Como os seis filhos ou gênios do Ialdabaôth gnósticos, eles produzem então o mundo material. A mesma história se repete com relação a SophiaAkhamôth. Enviada por seu parente puramente espiritual, a Sophia primordial, para criar o mundo de formas visíveis, desceu ao caos e, dominada pela emanação da matéria, perdeu o seu caminho. Todavia, ambiciosa para criar um mundo de matéria-prima para si, ela se ocupou em flutuar daqui para ali sobre o abismo negro e deu vida e movimento aos elementos inertes, até que, irremediavelmente emaranhada na matéria, como Pthahil, ela é representada sentada imersa no lodo e incapaz de dele se safar; mas, pelo contato com a própria matéria, ela produz o Criador do mundo material. Ele é o Demiurgo, chamado pelos ofitas de Ialdabaôth, e, como mostraremos, o pai do Deus judaico na opinião de algumas seitas e na de outras, o Próprio "Senhor Deus". É neste ponto da cosmogonia cabalístico-gnóstica que começa a Bíblia mosaica. Tendo aceitado o Velho Testamento judaico como seu modelo, não espanta que os cristãos fossem forçados, pela posição excepcional em que foram colocados por sua própria ignorância, a extrair dele o melhor que pudessem. A IDENTIDADE DE JESUS, E O "DEUS DESCONHECIDO. (L. 3. pág. 159). Os primeiros grupos de cristãos, que Renan afirma não passarem de sete a doze homens em cada igreja, pertenciam, sem sombra de dúvida, às classes mais pobres e mais ignorantes. Não tinham, nem podiam ter, a menor idéia das doutrinas altamente filosóficas dos platônicos e dos gnósticos e, evidentemente, sabiam
muito pouco sobre a nova religião que se acabava de fabricar. Para esses [homens] - que, na qualidade de judeus, foram esmagados pelo domínio tirânico da "lei", tal como a compreendiam os anciãos das sinagogas, e, na qualidade de pagãos, sempre foram excluídos, como as castas mais baixas ainda o são na Índia, dos mistérios religiosos -, o Deus dos judeus e o "Pai" pregado por Jesus eram a mesma pessoa. As disputas que reinaram desde os primeiros anos que se seguiram à morte de Jesus, entre os partidários paulinos e os petrinos, tiveram um efeito deplorável. O que um grupo fazia, o outro considerava um dever sagrado desfazer. Se as Homilias são tidas como apócrifas e não podem ser admitidas como uma medida infalível para a animosidade que reinava entre os dois apóstolos, temos a Bíblia, e as provas que ela fornece a esse respeito são inumeráveis. Irineu parece tão irremediavelmente emaranhado em seus esforços estéreis para explicar, pelo menos no que concerne às aparências externas, as doutrinas verdadeiras de muitas seitas gnósticas e as apresentar ao mesmo tempo como “heresias” abomináveis, que, deliberadamente ou por pura ignorância, ele as confunde de uma tal maneira que poucos metafísicos seriam capazes de as desembaraçar sem o auxílio da Cabala ou do Codex. Assim, por exemplo, ele é incapaz de estabelecer a diferença entre os ofitas e nos diz que eles chamavam de “Hominem”, o “Deus de tudo”, e a sua mente de o SEGUNDO homem ou o “Filho do Homem”. Theodoret afirma a mesma coisa, ele que viveu mais de dois séculos depois de Irineu e que fez uma grande confusão com a ordem cronológica em que as diferentes seitas se sucederam. Nem os sethianistas (um ramo dos nazarenos judaicos) nem os ofitas, uma seita puramente grega, jamais pretendiam alguma coisa desse tipo. Irineu contradiz as suas próprias palavras ao descrever, em outro lugar, as doutrinas de Cenrinthus, o discípulo direto de Simão, o Mago. Ele diz que Cenrinthus ensinava que o mundo não foi criado pelo PRIMEIRO DEUS mas por uma virtude (virtus) ou poder, um Aeon tão distanciado da Causa Primeira que ele ignora até mesmo AQUELE que está acima de todas as coisas. Este Aeon dominou Jesus, engendrou-o fisicamente através de José por meio de uma mulher que não era virgem, mas apenas a esposa desse José, e Jesus nasceu então como todos os homens. Considerado deste ponto de vista físico de sua natureza, Jesus foi chamado de o “filho do homem”. Foi só depois de seu batismo que o Cristos, o ungido, desceu dos principados celestes sob forma de pomba, e o proclamou, através de Jesus, “o Pai DESCONHECIDO” (Irineu, Op. cit., I, XXVI, 1.). Se, portanto Jesus fosse considerado, do ponto de vista físico, como um filho de um homem e, do ponto de vista espiritual, como o Cristos, que o eclipsou, como poderia então o 'DEUS DE TUDO" o "Pai Desconhecido", ser chamado de Homo pelos gnósticos, um HOMEM, e a sua Mente de Ennoia, o SEGUNDO homem, ou filho do homem? Nem na Cabala oriental, nem no Gnosticismo, o "Deus de tudo" jamais foi antromorfizado. É só a primeira emanação, ou antes a segunda - pois Shekhînah, Sephirah, Profundidade e outras virtudes femininas primeiramente manifestadas também são emanações - que são chamadas de "homens primitivos". Assim, Adão-Cadmo, Ennoia (ou Sigê), os Logoi em suma, são os "filhos unigênitos", mas não os Filhos do Homem, denominação que pertence propriamente ao Cristos, o filho de Sophia (a primogênita) e do homem primitivo que o produz através da sua própria luz vibratória, que emana da fonte ou causa de tudo, por conseguinte a causa de sua luz também, o "Pai Desconhecido". Há uma grande diferença, estabelecida pela metafísica gnóstica, entre o primeiro Logos não-revelado e o "ungido", que é o Cristos. Ennoia pode ser chamado, como o compreende Fílon, de Segundo Deus, mas só ele é o "homem Primitivo e Primeiro", e de maneira alguma o Segundo, como Theodoret e Irineu o consideram. É só o desejo crônico deste último de associar de todas as maneiras Jesus, mesmo em seu Contra as heresias, ao Deus Supremo, o que o levou a tantas falsificações. A idéia de identificar o Deus Desconhecido mesmo, como o Cristos, o ungido - o Aeon que o eclipsou -, deixando-se o homem Jesus completamente fora da questão, nunca passou pela cabeça dos gnósticos, nem dos apóstolos diretos de Paulo, apesar do que poderiam fazer crer todas as falsificações que pudessem ser acrescentadas. Já nas primeiras tentativas de se comparar os manuscritos originais, com os que os sucederam, ficou bastante claro até que ponto essas falsificações deliberadas são audaciosas e desesperadas. Na edição que o Bispo Horsley preparou das obras de Sir Issac Newton, muitos manuscritos sobre assuntos teológicos foram prudentementes subtraídos à publicação. O artigo conhecido como Descida de Cristo ao inferno, que também está no Credo dos Apóstolos, não se encontra nos manuscritos dos séculos IV ou VI. Trata-se evidentemente de uma interpolação, copiada das fábulas de Baco e de Hércules e imposta à cristandade como um dogma de fé. A esse respeito, o autor do prefácio (David Casley e o Catálogo, publicado em Londres, em 1734) ao Catalogue of the Manuscripts of the King's Library (prefácio, p. XXIV) observa: "Espero que a inserção do artigo Descida de Cristo ao Inferno, no Credo dos Apóstolos, seja tão facilmente explicada, quanto a inserção desse versículo" (a saber, Primeira Epístola de São João, V, 7).
Ora, esse versículo se lê hoje da seguinte maneira: "Pois há três que prestam testemunho no Céu" o Pai, o Verbo e o Espírito Santo; e os três são Um". Esse versículo, que "devia ser lido nas igrejas", sabe-se hoje que é espúrio. Não se encontra "em nenhum manuscrito grego, exceto naquele de Berlim", que foi transcrito de alguma paráfrase interpolada entre as linhas. Na primeira e na segunda edições de Erasmo, impressas em 1516 e 1519, essa alusão às três testemunhas celestes está omitida; e o texto não está contido em nenhum manuscrito grego escrito antes do século XV. Não foi mencionado pelos escritores eclesiásticos gregos, nem pelos padres latinos primitivos, tão ansiosos por aceitar qualquer prova que os ajudasse a estabelecer as suas trindades; e foi omitido por Lutero em sua versão alemã. Cai assim por terra a coluna mais sólida da doutrina trinitária. Uma outra falsificação, não menos evidente, é citada pelo editor do Novo Testamento Apócrifo, segundo as palavras de Sir Isaac Newton. Newton observa que "o que os latinos fizeram a esse texto (Primeira Epístola de São João, V, 7), os gregos fizeram ao de São Paulo" (I Timóteo, III, 16). Pois, mudando o para f, a abreviatura de Øeós [Deus], no manuscrito de Alexandria, do qual se fizeram cópias posteriores, lê-se hoje: `Grande é o mistério da Divindade, DEUS manifesto na carne' ; ao passo que todas as versões antigas, dentre as quais a de Jerônimo, lêem: `Grande é o mistério da divindade, QUE SE manifestou na carne' . Newton acrescenta que, as discussões sobre essa falsificação estão terminadas, aqueles que lêem DEUS manifesto na carne, em vez de divindade que se manifestou na carne, consideram essa passagem como "um dos textos mais óbvios e mais pertinentes à discussão". E fazemos novamente a pergunta: Quem foram os primeiros cristãos? Aqueles que foram prontamente convertidos pelas simplicidade eloqüente de Paulo, que lhes prometeu, em nome de Jesus, a libertação dos laços estreitos do eclesiasticismo. Eles entenderam apenas uma coisa: eram os "filhos da promessa" (Gálatas, Iv, 28). A "alegoria" da Bíblia mosaica lhes fora desvelada; a aliança "do Monte Sinais, que gera filhos para a servidão", foi Agar (ibid., 24), a antiga sinagoga judaica, e ele a estava "na servidão com os filhos" com relação a Jerusalém, a nova e livre, "a mãe de todos nós". Por um lado, a sinagoga e a lei que perseguia todos aqueles que ousava ultrapassar a linha estreita da beatitude e do dogmatismo; por outro, o Paganismo com as suas sublimes verdades filosóficas ocultas à visão, desvelando-se apenas a poucos e deixando as massas procurarem desesperadamente quem fosse o Deus, neste panteão superlotado de divindades e subdivindades. Para os outros, o apóstolo da circuncisão, apoiado por todos os seus seguidores, prometia, se eles obedecessem à "lei", uma vida futura e uma ressurreição da qual não faziam idéia. Ao mesmo tempo, nunca perdeu uma só oportunidade de contradizer Paulo, sem o nomear todavia, mas indicando-o tão claramente que é quase impossível duvidar de quem seja aquele a quem Pedro se refere. Embora ele possa ter convertido alguns homens, que acreditavam na ressurreição mosaica prometida pelos fariseus ou caíram nas doutrinas niilistas dos saduceus, ou professavam o gentilismo politeísta da plebe pagã, que não reconhece nenhum futuro após a morte, a não ser um nada lúgubre - não achamos que a contradição sistemática dos dois apóstolos tenha contribuído para fortalecer sua obra de proselitismo. Obtiveram pouco sucesso no seio das classes pensantes eruditas, como a história eclesiástica demonstra claramente. Onde estava a verdade? E onde a palavra inspirada de Deus? Por um lado, como vimos, eles ouviram o apóstolo Paulo explicar que das duas alianças, "coisas que são uma alegoria", a antiga, a do Monte Sinais, "que gera filhos para a servidão", era Agar, a escrava; e o próprio Monte Sinais correspondia a "Jerusalém", que agora está "na servidão" com os seus filhos circuncisos; e a nova aliança era Jesus Cristo - a "Jerusalém do alto e livre", e, por outro lado, Pedro, que o contradizia e chegava até a injuriá-lo. Paulo exclama veementemente: "Desterrai a escrava e o seu filho" (a velha lei e a sinagoga). "O filho da escrava não herdará com o filho da mulher livre". "Permanecei firmes, portanto, na liberdade com que Cristo nos fez livres; não vos submetais novamente ao julgo da servidão. (...) Vede, eu, Paulo, eu vos digo que, se vos fazeis circuncidar, Cristo não vos aproveitará nada!" (Gálatas, IV, 30; V, 1-2). E o que é que Pedro escreve? O que quer ele dizer com estas palavras: "Porque falando palavras arrogantes de vaidade (...) Prometendo-lhes a liberdade, quando eles mesmos são escravos da corrupção: porque todo que é vencido, é também escravo daquele que o venceu. (...) Porque, se depois de se terem retirado das corrupções do mundo pelo conhecimento do Senhor e Salvador (...) se deixam delas vencer e enredar (...) melhor lhes era não ter conhecido o caminho da religião, do que depois de o ter conhecido tornar para trás, deixando aquele mandamento santo que lhes fora dado"(2 Pedro II, 1831). Pedro certamente não faz alusão aos gnósticos, pois eles nunca viram "o mandamento santo que lhes fora dado"; Paulo sim. Eles nunca prometeram a "libertação" da servidão, mas Paulo o fez repetidas vezes. Além disso, Paulo rejeita a "velha aliança", Agar, a escrava; e Pedro a ela se agarra com todas as suas forças. Paulo advertiu o povo contra os poderes e as dignidades (os anjos inferiores dos cabalistas); e Pedro, como
mostraremos a seguir, respeita-os e condena aqueles que não o fazem. Pedro prega a circuncisão e Paulo a proíbe. Mais tarde, quando todas essas asneiras, contradições e invenções foram forçosamente adaptadas ao quadro laboriosamente elaborado pelo clero da casta episcopal da nova religião, à qual se deu o nome de Cristianismo, e quando o próprio quadro caótico foi astuciosamente preservado de uma exame mais aprofundado, por meio de uma formidável coleção de penitências eclesiásticas e de anátemas, destinados a manter à distância os curiosos sob o pretexto falso de sacrifício e de profanação dos mistérios divinos, e quando milhões de pessoas foram massacrados em nome de Deus da misericórdia - nesse momento apareceu a Reforma. Ela merece, sem dúvida, o seu nome, no sentido paradoxal da palavra. Ela abandonou Pedro e diz que escolhe Paulo para seu único líder. E o apóstolo que vociferou contra a velha lei da servidão, que deu liberdade total aos cristãos de celebrar o Sabbath ou abandoná-lo, que rejeita tudo o que é anterior a João Batista - é agora proclamado o porta-bandeira do Protestantismo, que se apega à velha lei mais do que os judeus, aprisiona aquele que consideram o Sabbath como o fizeram Jesus e Paulo e ultrapassa a sinagoga do primeiro século em intolerância dogmática! Mas, então perguntaremos ainda, quem eram os primeiros cristãos? Sem dúvida alguma os ebionistas; e, a esse respeito, seguimos a opinião dos melhores críticos. "Não há dúvida de que o autor [das Homilias clementinas] era um representante do Gnosticismo, que foi, certa vez, a forma mais pura da cristandade primitiva. (...)" E quem eram os ebionistas? Os discípulos e seguidores dos nazarenos primitivos, os gnósticos cabalistas. No prefácio do Codex nazaraeus, o tradutor afirma: "Que os nazarenos não rejeitassem (os Aeons) é natural. Pois eles eram os instrumentos dos ebionistas, e estes admitiam esse fato". Além disso, Epifânio, o Homero cristão das Heresias, diz-nos que "Ebion conhecida os nazarenos, a forma dos ceríntios (que supõem que o mundo foi elaborado pelos anjos) e a denominação de Cristãos". Uma denominação sem dúvida aplicada muito mais corretamente a eles do que aos (chamados) cristãos ortodoxos da escola de Irineu e do Vaticano posterior. Renan mostra que os ebionistas reuniam em sua seita todos os parentes sobreviventes de Jesus. João Batista, seu primo e precursor, era o Salvador aceito pelos nazarenos e o seu profeta. Seus discípulos moravam do outro lado do Jordão, e o autor de Sõd, the Son of the Man prova, clara e peremptoriamente, que a cena do batismo do Jordão ocorreu no local do culto a Adônais. "Do outro lado do Jordão e além do lago moravam os nazarenos, uma seita que se acredita já ter existido quando do nascimento de Jesus e tê-lo compreendido entre os seus membros. Eles devem ter-se estendido ao longo da margem oriental do Jordão e ao sudeste, entre os árabes (Gálatas, I, 17, 21,: II, 11) e entre os sabeus na direção de Basra; e, ainda, eles devem ter-se dirigido para o norte do Líbano até a Antioquia, e também para o nordeste, até o estabelecimento nazareno de Beroea, onde São Jerônimo se encontrou. Os mistérios de Adónis ainda prevalecem no Deserto; nas montanhas, Aiai Adonai ainda era um grito". "Unido (conjunctus) aos nazarenos, todos (ebionita) ensinava aos outros a sua própria iniqüidade e resolveu que Cristo nascera da semente de um homem", escreve Epifânio. E, se eles, o fizeram, devemos acreditar que conheciam sobre o seu profeta contemporâneo muito mais do que Epfânio quatrocentos anos mais tarde. Theodoret, como fizemos ver em outro lugar, descreve os nazarenos como judeus que "veneram o Ungido como um homem justo" e utilizam o evangelho chamado "Segundo São Pedro". Jerônimo encontrou, na biblioteca reunida em Cesaréia pelo mártir Panfílio, evangelho idêntico e original, escrito em hebraico por Mateus, o apóstolo publicano. "Recebi dos nazarenos, que usavam [esse Evangelho] em Beroea, na Síria, permissão para traduzi-lo", escreve ele por volta do final do século IV. "No Evangelho que os nazarenos e os ebionistas utilizam", acrescenta Jerônimo. "e que traduzi recentemente do hebraico para o grego e que a maioria das pessoas diz ser o verdadeiro Evangelho de São Mateus", etc. (Jerônimo, Comment. to Matthew, livro II, cap.13. Jerônimo acrescenta que foi escrito em caldaico, mas com letras hebraicas [Dial. contra Pelag., III, 2].
A CRENÇA DOS VERDADEIROS CRISTÃOS PRIMITIVOS. (L. 3. pág. 165). À crença dos verdadeiros cristãos primitivos. Depois de ter produzido Ialdabaôth - de ialda, criança, e de baôth, uma terra desolada, uma desolação - Sophia-Akhamôth sofreu a tal ponto como o contato com a matéria, que, após uma luta extraordinária, ela escapa finalmente do caos pantanoso. Embora ignore o pleroma, a religião da sua mãe, ela alcançou o espaço mediano e chegou a sacudir as partículas materiais que estavam ligadas à sua natureza espiritual; depois disso, construiu imediatamente uma barreira infranqueável entre o mundo da inteligência (espíritos) e o mundo da matéria. Ialdabaôth é, assim, o "filho da escuridão", o criador do nosso mundo pecaminoso (a sua porção física). Ele segue o exemplo de Bythos e produz de si mesmo seis espíritos estelares (filhos). Todos eles têm a sua própria imagem e reflexos uns dos outros, que se tornam mais escuros
à medida que se afastem do seu pai. Com este, eles habitam sete regiões dispostas com uma escala, que começa abaixo do espaço mediano, a região da sua mãe, Sophia-Ahamôth, e termina com a nossa Terra, a sétima região. Eles são, assim, os gênios das sete esferas planetárias, das quais a mais inferior é a região da nossa Terra (a esfera que a circunda, nosso éter). Os nomes respectivos desses gênios das esferas são Iao, Tsabaôh, Adonaios, Eloaios, Horaios, Astaphaios. Os quatro primeiros, como todos sabem, são os nomes místicos do "Senhor Deus" judaico, sendo este, como afirma C. W. King, "rebaixado pelos fitas para as denominações dos subordinados do Criador; os dois últimos são os dos Gênios do Fogo e da Água". Ialdabaôth, que muitas seitas consideravam como o Deus de Moisés, não era um espírito puro; era ambicioso e orgulhoso e, rejeitando a luz espiritual do espaço mediano que sua mãe Sophia-Akhamôth lhe oferecia, pôs-se ele próprio a criar um mundo para si mesmo. Ajudado por seus filhos, os seis gênios planetários, ele fabricou o homem, mas não obteve êxito na primeira tentativa. Era um monstro; sem alma, ignorante e que caminhava sobre quatro patas no chão como uma fera material. Ialdabaôth viu-se obrigado a implorar a ajuda de sua Mãe Espiritual. Ela lhe transmitiu um raio da sua Luz e assim animou o Homem e o dotou de Alma. E então teve início a animosidade de Ialdabaôth contra sua própria criatura. Seguindo o impulso da luz Divina, o homem aumentou mais e mais o volume das suas aspirações; muito cedo ele começou a apresentar não a imagem do seu Criador Ialdabaôth, mas antes do Ser Supremo, o "Homem Primitivo", Ennoia. Então o Demiurgo foi dotado de cólera e inveja; e, ficando seu olho invejoso sobre o abismo de matéria, seu olhar, envenenado pela paixão, refletiu-se repentinamente nele como num espelho; o reflexo tornou-se animado e do abismo sai Satã, serpente, Ophiomorphos - "a incorporação da inveja e da esperteza. Ele é a união de tudo o que é mais abjeto na matéria como o ódio, a inveja e a astúcia de uma inteligência espiritual". Depois disso, e sempre com rancor face à perfeição do homem, Ialdabaôth criou os três da Natureza: o mineral, o vegetal e o animal, com todos os seus instintos perniciosos e pensamentos maus. Imponente para aniquilar a Árvore do Conhecimento, que cresce em sua esfera e em cada uma das regiões planetárias, mas determinado a afastar o "homem" da sua protetora espiritual, Ialdabaôth proibiu-o de comer do seu fruto, com medo de que ele revelasse à Humanidade os mistérios do mundo superior. Mas Sophia-Akhamôth, que amava e protegia o homem que ela animara, enviou o seu próprio gênio, Ophis, sob a forma de uma serpente, para induziu o homem a transgredir o mandamento egoísta e injusto. E o "homem" de repente tornou-se capaz de compreender os mistérios da criação. Ialdabaôth vingou-se, então, punindo o primeiro par, pois o homem, através do seu conhecimento, já havia conseguido uma companheira feita de suas metades espiritual e material. Aprisionou o homem e a mulher num calabouço de matéria, no corpo tão indigno de sua natureza, e no qual o homem ainda está encerrado. Mas Akhamôth ainda o protegeu. Ele estabeleceu entre a sua região celestial e o "homem" uma corrente de Luz Divina e continua a lhe fornecer iluminação espiritual. Seguem-se, então as alegorias que abrangem a idéia de dualismo, ou a luta entre o bem e o mal, o espírito e a matéria, que se encontra em toda cosmogonia e cuja fonte também deve ser procurada na, Índia. Os tipos e os antitipos representam os heróis desse panteão gnóstico, empregados das idades mitopoéticas mais antigas. Mas, nessa personagens - Ophis e Ophiomorphos, Sophia e Sophia-Akhamôth, Adão-Cadmo e Adão, os gênios planetários e os Aeons divinos - podemos reconhecer facilmente os modelos das nossas cópias bíblicas - os patriarcas evemerizados. Encontramos os arcanjos, os anjos, as virtudes e os poderes, com outros nomes, nos Vedas e no sistema budista. O Ser Supremo avéstico, Zeruana, ou "Tempo Ilimitado", é o tipo de todas essas "Profundidades", "Coroas" gnósticas e cabalísticas e mesmo do Ain Soph caldaico. Os seis Amshâspands, criados pela "Palavra" de Ormusde, o "Primogênito", têm seus reflexos em Bythos e suas emanações, e o antítipo de Ormusde-Ahriman e seu devas também participam da composição de Ialdabaôth e os seus seis gênios planetários materiais, embora não sejam totalmente maus. Akhamôth, entristecida com os males que afligiram a Humanidade, apesar da sua proteção, suplica à sua celeste Sophia - seu antitipo - que interceda junto à PROFUNDIDADE desconhecida para que ela envie Cristos (o filho e a emanação da "Virgem Celestial") em socorro da Humanidade que estava perecendo. Ialdabaôth e os seus filhos da matéria privam da luz divina a Humanidade. O homem deve ser salvo. Ialdabaôth já enviou o seu próprio agente. João Batista, da raça de Seth, que ele protege - como um profeta do seu povo, mas apenas uma pequena porção o ouviu - os nazarenos , os oponentes dos judeus, porque eles adoravam Iurbo-Adunai. (Iurbo e Adonai, segundo os ofitas, são nomes de Iao-Jeová, uma das emanações de Ialdabaôth. "Iurbo é chamado de Adonai pelos Abortos [os judeus]" (Codex nazaraeus, vol. III, p. 73). Akhamôth dissera a seu filho, Ialdabaôth, que o reino de Cristos seria apenas temporal e, assim, induzindo-o a enviar um precursor. Além disso, o fez causar o nascimento do homem Jesus da Virgem Maria, o seu próprio tipo da Terra, "pois a criação de um personagem material só poderia ser obra do Demiurgo; estava fora do alcance de
um poder superior. Logo que Jesus nasceu, Cristos, o perfeito, unindo-se a Sophia [sabedoria e espiritualidade], desceu através das sete regiões planetárias, assumindo em cada uma delas uma forma análoga e ocultando dos gênios a sua verdadeira natureza, ao mesmo tempo em que atraía para si as centelhas de Luz Divina que eles retinham em sua essência. Assim, Cristos entrou no Homem Jesus no momento do seu batismo no Jordão. A partir desse momento Jesus começou a operar milagres; antes disso, ignorava completamente a sua missão". (King, The Gnostics and their Remains, p. 31. [p.100 na 2ª ed. ]. Ialdabaôth, descobrindo que Cristos estava levando ao fim o seu próprio reino da matéria, excitou os judeus contra ele e Jesus foi condenado à morte *. (No Evangelho de Nicodemos, Ialdabaôth é chamado de Satã pelo autor piedoso e anônimo; evidentemente, uma das últimas flechas que ele atira contra seu inimigo já meio aniquilado. "Quanto a mim", diz Satã, desculpando-se ao príncipe do inferno. "eu o tentei [a Jesus] e excitei o meu velho povo, o judeu, com zelo e cólera contra Ele" (hone, apocr. N.T., Nicod., XV, 9.). De todos os exemplos da ingratidão cristã, este parece ser o mais conspícuo. Os pobres judeus foram, primeiro, roubados dos seus livros sagrados e, depois, num "Evangelho" espúrio, são insultados pela representação de Satã que pretende que eles sejam o seu "velho povo". Se eles fossem o seu povo, e ao mesmo tempo o "povo escolhido de Deus", então o nome desse Deus deveria ser escrito Satã e não Jeová. Isso é lógico, mas duvidamos que seja cortês para o "Senhor Deus de Israel".). * Bem como em J. J. Grynaeu, Monumenta S. Patrum Orthodoxographa, etc. (Basiléia, 1569, fol.), vol. I, tomo II, p.643 ff. (N. do Org.). Uma vez na
cruz, Cristos e Sophia abandonaram o seu corpo e retornaram à sua própria esfera. O corpo material do homem Jesus foi abandonado à terra, mas sendo dado a ele um corpo feito de éter (alma astral). "A partir desse momento, ele consistia apenas de Alma e de Espírito, razão pela qual os discípulos não o reconheceram após a ressurreição". Nesse estado espiritual de um simulacrum, Jesus permaneceu sobre a Terra durante mais dezoito meses. Nesta última permanência, recebeu de Sophia o conhecimento perfeito, a verdadeira Gnose que ele comunicou a alguns dos apóstolos que eram capazes de a receber. "Depois, acendendo ao espaço mediano, sentou-se à direita de Ialdabaôth, mas invisível a ele, e dali reúne todas as almas que foram purificadas pelo conhecimento de Cristo. Quando tiver reunido toda a Luz Espiritual que existe na matéria, no império de Ialdabaôth, a redenção será cumprida e o mundo será destruído. Essa é a significação da reabsorvição de toda a Luz Espiritual no Pleroma ou Plenitude, donde Ele desceu na origem." (King, op. cit., p. 31 [p. 100 na 2ª ed.]. JESUS JAMAIS AFIRMOU SER DEUS. (L. 3. pág. 172). É dos mais sugestivos o fato de não haver uma única palavra nas chamadas Escrituras sagradas que mostre que Jesus foi considerado como um Deus por seus discípulos. Eles não lhe renderam honras divinas nem antes, nem depois da sua morte. Suas relações com ele, se limitavam às de discípulos e "mestres", títulos que lhe davam, da mesma maneira com que os seguidores de Pitágoras e Platão se dirigiam aos seus respectivos mestres. Quaisquer que sejam as palavras que se atribuíam a Jesus, a Pedro, a Paulo e a outros, nenhuma delas é um ato de adoração de sua parte e o próprio Jesus nunca declarou a sua identidade com seu Pai. (Devemos ter em mente, todavia, as palavras proferidas por Jesus, conforme relatadas em João, X, 30 e XVII, 11, 22, onde se esclarece definitivamente sua identidade ou unicidade com o Pai. (N. do Org.). Ele acusou os fariseus de lapidar os seus profetas, não de deicídio. Ele se intitulava o filho de Deus, mas cuidou de afirmar repentinamente que todos eles eram filhos de Deus, o Pai Celestial de todos. Pregado dessa maneira, ele não fazia senão repetir a doutrina ensinada séculos antes por Hermes, Platão e outros filósofos. Estranha contradição! Jesus, a quem devemos adorar como o único Deus vivo, diz, logo após a sua Ressurreição, a Maria Madalena: "Ainda não subi a meu Pai; mas vai a meus irmãos e dize-lhes que vou para meu Pai e vosso Pai, e para meu Deus e vosso Deus!" (João, XX, 17.) Quer dizer isto que ele está de identificando com seu Pai? "Meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus" implica, por parte dele, um desejo de ser considerado em perfeita igualdade com seus irmãos - nada mais do que isso. Theodoret escreve: "Os hereges concordam conosco a respeito do começo de todas as coisas. (...) Dizem, porém, que não existe um Cristo (Deus), mas sim um lá no alto e um aqui embaixo. E que este último morou anteriormente em muitos; mas o Jesus, eles dizem num momento que ele vem de Deus, e em outro chamam-no de um ESPÍRITO". Esse espírito é o Cristos, o mensageiro da vida, que às vezes é chamado de Anjo Gabriel (em hebraico, o poderoso de Deus) e que, para os gnósticos, ocupava o lugar do Logos, ao passo que o Espírito Santo era considerado Vida. Entre os nazarenos, entretanto, o Spiritus ou Espírito Santo era menos honrado. Enquanto quase todas as seitas gnósticas consideravam - no um Poder Feminino, ao qual davam o nome de Binah, [ou] Sophia, o Intelecto Divino - entre a seita nazarena ele era o Spiritus Feminino, a geradora de todas as coisas da matéria, o caos em seu aspeto mau, tornado túrbido pelo Demiurgo. No momento da criação do homem, "havia luz do lado do PAI, e havia luz [luz material] do lado da MÃE. E este é o `homem dual', diz o Zohar. "Naquele dia [o último] morrerão os sete estelares maldispostos, também os filhos do homem que reconhecerem o Spiritus, o [falso] Messias, o Deus e a MÃE do SPIRITUS morrerão".
Jesus reforçava e ilustrava as suas doutrinas com sinais e maravilhas; e, se deixarmos de lado as pretensões daqueles que o deificaram, ele não fez senão o que fizeram antes dele outros cabalistas; e só eles, nessa época, pois dois séculos depois as fontes de profecia estavam completamente secas e, dessa estagnação de "milagres" públicos, originou-se o ceticismo da seita incrédula dos saduceus. Descrevendo as "heresias" daquela época. Theodoret, que não tinha nenhuma idéia do significado oculto da palavra Cristos, o mensageiro ungido, lamenta que eles (os gnósticos) afirmem que esse Mensageiro ou Delegatus mude seu corpo de vez em quando e "entre em outros corpos e se manifeste de maneira diferente em cada vez. E esses [os profetas obscurecidos] servem-se de encarnações e de invocações de vários demônios e de batismos na confissão de seus princípios. (...) Eles abraçam a Astrologia e a Magia e o erro matemático" (?), diz ele. Esse "erro matemático", de que se lamentou o piedoso escritor, levou posteriormente à redescoberta do sistema heliocêntrico, tão errôneo quanto ainda possa ser, e foi esquecido desde a época em que um outro "mágico" o ensinou - Pitágoras. Assim, as maravilhas de curas e as taumaturgias de Jesus, que ele transmitiu aos seus seguidores, mostram que estes aprendiam, na sua comunicação diária com Ele, a teoria e a prática da nova ética, dia-a-dia, no intercâmbio familiar da amizade íntima. A fé crescia progressivamente, como a de todos os neófitos, ao mesmo tempo em que crescia o conhecimento. Não devemos esquecer que Josefo, que certamente estava a par desse assunto, chama de "uma ciência" à habilidade de expulsar demônios. Esse crescimento da fé é particularmente visível no caso de Pedro, que, não possuindo fé suficiente para caminhar sobre a água, indo de barco até o seu Mestre, tornou-se finalmente um taumaturgo suficientemente hábil a ponto de Simão, o Mago, como se crê, lhe oferecer dinheiro para que lhe ensinasse o segredo da arte de curar e de realizar outras maravilhas. E Felipe, diz-se, tornou-se um Aethrobat tão bom quanto Abaris, de memória pitagórica, mas menos hábil que Simão, o Mago. Não existe nas Homilias, como também nas obras dos apóstolos, indicações algumas de que os amigos e os seguidores de Jesus o considerassem mais do que um profeta. Essa idéia está claramente estabelecida nas Homilias clementinas. Excetuando o fato de Pedro aí desenvolver um pouco longamente demais o seu ponto de vista sobre a identidade do Deus mosaico com o Pai de Jesus, toda a obra é dedicada ao monoteísmo (Admite-se um só Deus). O autor mostra-se severo, tanto contra o politeísmo (Admite-se muitas Divindades), quanto contra a pretensão à divindade de Cristo. Parece ignorar completamente o Logos, e a sua especulação limita-se à Sophia, a sabedoria gnóstica. Não há nenhum indício de uma Trindade hipostática, mas o mesmo obscurecimento da sabedoria gnóstica (Cristos e Sophia) é atribuído, no caso de Jesus, como nos de Adão, Enoch, Noé, Abraão, Isaac, Jacó e Moisés. Todas essas personagens são colocadas no mesmo nível e chamadas "profetas verdadeiros" e as sete colunas do mundo. Mais do que isso, Pedro nega veementemente a queda de Adão e, com ele, a doutrina da expiação, tal como foi ensinada pela Teologia cristã, ruí por terra, pois Ele a combate como uma blasfêmia. A teoria de Pedro sobre o pecado é a dos cabalistas judeus, e mesmo, ou de certa maneira, a platônica. Adão não só nunca pecou, mas, "como um profeta verdadeiro, possuído do Espírito de Deus, que, mais tarde, desceu sobre Jesus, ele não podia pecar". Em suma, toda a obra exibe a crença do autor na doutrina cabalista da permutação. A Cabala ensina a doutrina da transmigração do espírito; "Mosah é a revolutio de Seth e Hebel." "Dize-me, quem é que ocasiona o renascimento (a revolutio)?"- perguntou-se ao sábio Hermes. "Os Filhos de Deus, o homem único, pela vontade de Deus" - foi a resposta do "gentio." O FILHO DE DEUS E O ESPÍRITO IMORTAL. O CRISTIANISMO PRIMITIVO.
(L. 3. pág.
174).
O "filho de Deus" é o espírito imortal atribuído a todo ser humano. É esta entidade divina que é o "homem único", pois o escrínio que contém a nossa alma, e a própria alma, são semi-entidades e, sem o seu obscurecimento, o corpo e a alma astrais não são senão uma Díada animal. É preciso a Trindade para perfazer o "homem" completo e permitir-lhe continuar sendo imortal a cada "renascimento", ou revolutio, através das esferas subseqüentes e as ascendentes, cada uma das quais o aproxima do reino refulgente da luz eterna e Absoluta. (N.C. Relacionado à esse tema, o Livro da autora “A Sabedoria Tradicional, pg. 121 diz o seguinte: “I. Âtma (ou Âtman) - o “Eu Superior” não é nem o seu Espírito nem o meu, mas assemelha-se à luz do Sol que brilha sobre tudo. É o “princípio divino” difuso universalmente e é inseparável de seu Meta-Espírito uno e absoluto assim como o raio do sol é inseparável da luz solar. I Buddhi (a alma espiritual) é apenas o seu veículo. Nenhum deles separadamente, nem os dois coletivamente, são de maior utilidade ao corpo do homem que a luz do sol e seus raios o são para granito enterrado sob a terra, a menos que o Duo divino seja assimilado por, e refletido em, a consciência. Nem Âtman nem Buddhi são jamais alcançados pelo Karma, por que o primeiro é o mais elevado aspecto do Karma. [Karma - Fisicamente Ação; metafisicamente Lei de causa e efeito.], seu agente de SI MESMO em um aspecto, e o outro é inconsciente neste plano. Esta consciência ou mente é:
III. Manas, a derivação ou produto numa forma refletida de Ahamkâra, “a concepção do Eu” ou EGO-IDADE. É, portanto, quando unido inseparavelmente aos dois primeiros, chamado de EGO ESPIRITUAL e Taijasa (o radiante). Esta é a real Individualidade ou o homem divino. É esse Ego que - tendo encarnado originalmente na forma humana insensível animada por, mas consciente (uma vez que não tinha consciência), da presença em si mesmo da Mônada dual - fez da forma humanóide um homem real. É esse Ego, esse “Corpo Causal” que obscurece todas as personalidades em que Karma o força a encarnar; e é esse Ego o responsável por todos os pecados cometidos através de e durante cada novo corpo ou personalidade - as máscaras evanescentes que escondem o Indivíduo verdadeiro durante a longa série de renascimentos.
"O PRIMOGÊNITO de Deus, que é o `Véu sagrado', a `Luz das Luzes', é aquele que envia a revolutio do Delegatus, pois ele é o Primeiro Poder", diz o cabalista. "O Pneuma (espírito) e dynamis (poder), que vêm de Deus, não devem ser considerados como nada menos que o Logos, que é também [?] o Primogênito para Deus", responde um cristão. "Os anjos e os poderes estão no céu!" diz Justino, dando assim expressão a uma doutrina puramente cabalista. Os cristãos adotaram-na do Zohar e das seitas heréticas e, se Jesus as mencionou, não foi nas sinagogas oficiais que aprendeu a teoria, mas diretamente nos ensinamentos cabalistas. Nos livros mosaicos, elas são mencionadas raramente e Moisés, que estava em comunicação direta com o "Senhor Deus", preocupa-se muito pouco com elas. A doutrina era secreta e considerada herética pela sinagoga ortodoxa. Josefo lembra os hereges essênios ao dizer: "Aqueles que foram admitidos entre os essênios devem jurar não comunicar suas doutrinas a ninguém, a menos que essa pessoa as tenha recebido como eles, e também preservar os livros pertencentes à sua seita e os nomes dos anjos". (Josefo, Jewish Wars, II, VIII, 7). Os saduseu Olimpo aos deuses e aos semideuses, ou "espíritos". Apenas os cabalistas e os teurgos aderiam a essa doutrina desde tempos imemoriais e, em conseqüência, Platão e Fílon, o Judeu, depois dele, seguido primeiramente pelos gnósticos e depois pelos cristãos. Assim, se Josefo nunca escreveu a famosa interpolação a respeito de Jesus, forjada por Eusébio, por outro lado, ele descreveu, nos essênios, todas as características principais que encontramos nos nazarenos. Para orar, eles procuravam a solidão. "Quando tu orares, entra no teu aposento (...) e ora a teu Pai que está em segredo" (Mateus, VI, 6). "Tudo que foi dito por eles [pelos essênios] é mais forte do que um juramento. Eles se abstém de prestar juramento". "Mas eu vos digo que não presteis nenhum juramento (...) Que vossa palavra seja sim, sim, não, não" (Mateus, V, 34-7). Os nazarenos, bem como os essênios e os terapeutas, acreditavam mais nas suas próprias interpretações do "sentido oculto" das Escrituras mais antigas, do que nas leis mais recentes de Moisés. Jesus, como vimos antes, sentia uma veneração muito pequena para com os mandamentos do seu predecessor, com quem Irineu tanto ansiava compará-lo. Os essênios "entraram nas casas daqueles que eles nunca viram anteriormente como se fossem seus amigos íntimos". Esse era incontestavelmente o costume de Jesus e de seus discípulos. Epifânio, que situa a "heresia" ebionista no mesmo nível da dos nazarenos, também observa que os nazários se situavam logo após os Coríntios, tão injuriados por Irineu. A VERSÃO JUDAICA DO NASCIMENTO DE JESUS. (L. 3. pág. 177). A versão judaica do nascimento de Jesus está relatada no Sepher-Toledoth-Yeshu com as seguintes palavras: "Maria, tendo-se tornado mãe de um Filho, chamado de Yehôhûah, e tendo o menino crescido, ela e confiou aos cuidados do Rabino Elhânân, e a criança fez rápidos progressos nos conhecimentos, pois ele era bem-dotado de espírito e de compreensão. "O Rabino Yehôshûah, filho de Perahiah, continuou a educação de Yehôshûah (Jesus), depois de Elhânân, e o iniciou no conhecimento secreto; mas, tendo o rei Jannaeus ordenado matar os iniciados, Yehôshûah Ben-Perahiah fugiu para Alexandria, no Egito, levando consigo o menino." Durante a permanência em Alexandria, continua a história, foram recebidos na casa de uma senhora rica e erudita (a personificação do Egito). O jovem Jesus achou-a bela, não obstante "um defeito nos olhos", e o declarou ao seu mestre. Ouvindo-o, o mestre ficou tão zangado com o fato de o seu discípulo ter encontrado algo de bom no país da servidão, que "ele o amaldiçoou e expulsou o jovem de sua presença". Segue-se então uma série de aventuras contadas em linguagem alegórica que demonstram que Jesus completou a sua iniciação na Cabala judaica com uma aquisição adicional da sabedoria secreta do Egito. Quando a perseguição cessou, ambos retornaram à Judéia. (Talmude babilônico, Mishnah Sanhedrin, cap. XI, fol. 107 b, e Mishnah sotah, cap. IX, fl. 47 a. Ver também Éliphas Lévi, La science des esprits.)
Os agravos verdadeiros impostos a Jesus são mencionados pelo erudito autor de Tela Ígnea Satanae (as flechas de fogo de Satã) como sendo dois: 1°: que ele descobriu os grandes mistérios dos seus Templos por ter sido iniciado no Egito; e 2°; que ele os profanara aos expô-los ao vulgo, que não os compreendia e os desfigurava. Eis o que dizem:
"Existe, no santuário de Deus vivo, uma pedra cúbica, sobre a qual estão esculpidos os caracteres sagrados, cuja combinação dá a explicação dos atributos e dos poderes do nome incomunicável. Essa explicação é a chave secreta de todas as ciências ocultas da Natureza. É o que os hebreus chamam de Schem ha-Mephorash. Esta pedra está guardada por dois leões de ouro, que rugem quando alguém se aproxima. Jamais se perde de vista os portes do templo e a porta do santuário abre-se apenas uma vez ao ano, para admitir apenas o Sumo Sacerdote. Mas Jesus, que aprendera no Egito os `grandes segredos' durante a iniciação, fabricou para seu próprio uso chaves invisíveis e, assim. pôde penetrar no santuário sem ser visto. (...) Copiou os caracteres gravados na pedra cúbica e os escondeu em sua coxa (Arnóbio conta a mesma história de Jesus e narra como ele foi acusado de roubar ao santuário os nomes secretos do Santíssimo; foi com o conhecimento desses nomes que ele pôde operar todos os milagres. Adv. gent., I, 43.); depois, saindo do templo, meteu-se pelas estradas e começou a espantar as pessoas com os seus milagres. Os mortos era ressuscitados à sua ordem, os leprosos e os obsedados eram curados. Ele obrigou as pedras, que jaziam há séculos no fundo do mar, a subirem à superfície até que formassem uma montanha, de cujo pico ele pregava". O Sepher-Toledoth diz ainda que, incapaz de deslocar a pedra cúbica do santuário, Jesus fabricou uma de argila, que mostrou às nações e a fez passar pela verdadeira pedra cúbica de Israel. Essa alegoria, como as outras desse tipo de livro, deve ser "lida nas entrelinhas" - tem o seu significado secreto e deve ser lida duas vezes. Os livros cabalísticos explicam o seu significado místico. O mesmo talmudista diz, mais adiante, em essência, o seguinte: Jesus foi lançado à prisão e ali permaneceu por quarenta dias; depois foi flagelado como um rebelde sedicioso; depois apedrejado como blasfemador numa praça chamada Lud e finalmente crucificado. "Tudo isso" - explica Lévi - "porque revelou ao povo as verdades que eles [os fariseus] teriam guardadas para seu próprio uso. Ele havia adivinhado a teologia oculta de Israel, havia-a comparado com a sabedoria do Egito e havia deduzido a razão de uma síntese religiosa universal". Apesar da circunspecção com que devemos aceitar qualquer coisa que as fontes judaicas afirmem sobre Jesus, é preciso reconhecer que em algumas coisas elas parecem ser mais corretas em suas afirmações (quando e seu interesse direto não é posto em causa) do que os nossos bons mas zelosos padres. Uma coisa é certa: Tiago, o "Irmão do Senhor", nada diz sobre a ressurreição. Não chama Jesus nem de "Filho de Deus", nem de Cristo-Deus. Apenas uma vez, falando de Jesus, chama-o, de "Senhor da Glória", mas os nazarenos faziam a mesma coisa quando falavam de seu profeta Yôhânân bar Zachariah, ou João, filho de Zacarias (São João Batista). Suas expressões favoritas para o seu profeta são as mesmas usadas por Tiago ao falar de Jesus. Um homem nascido "da semente de um homem", "Mensageiro da Vida", da Luz, "meu Senhor Apóstolo", "Rei brotado da Luz", e assim por diante. "Não queirais pôr a fé de nosso Senhor JESUS Cristo, o Senhor da Glória", etc., diz Tiago em sua epístola (II, 1), dirigindo-se talvez a Cristo como DEUS. "A paz esteja consigo, meu Senhor JOÃO Abo Sabo, Senhor da Glória!" diz o Codex nazaraeus (II, 9), que se sabe dirigirse a um profeta. "Condenastes e matastes o Justo", diz Tiago (v, 6). "Yôhânân (João é o Justo, ele veio no caminho da justiça", diz Matheus (XXI, 32, texto siríaco). Tiago nem mesmo chama Jesus de Messias, no sentido que lhe atribuem os cristãos, mas alude ao cabalístico "Rei Messias", que é Senhor de Tsabaôth (v, 4) e repete muitas vezes que o "Senhor" virás, mas em nenhuma parte o identifica com Jesus. "Tende pois paciência, irmão, até a vinda do Senhor. (...) Tende paciência, pois a vinda do Senhor está próxima" (V. 7, 8). E ele acrescenta: "Tomai, irmãos, ao profeta [Jesus] que falou em nome do Senhor como um exemplo de aflição, de trabalho e de paciência". Embora nesta versão a palavra "profeta" esteja no plural, trata-se de uma falsificação deliberada do original, cujo propósito é evidente. Tiago, logo depois de ter citado os "profetas" como um exemplo, diz: "Vede (...) vós ouvistes qual foi a paciência de Jó e vistes o fim do Senhor" - combinando assim os exemplos desses dois caracteres admiráveis e colocando-os num mesmo nível de perfeita igualdade. O próprio Jesus não glorificou o profeta do Jordão? "Mas que saíste a ver? Um profeta? Certamente vos digo, e ainda mais do que um profeta. (...) Na verdade vos digo que entre os nascidos de mulheres não se levantou outro profeta maior que João Batista. Os nazarenos eram conhecidos como baptistas, sabeus e cristãos de João [mandeus]. Sua crença era a de que o Messias não era o Filho de Deus, mas apenas um profeta que seguiria João. "Yôhânân, o Filho de Abo Sabo Zachariah, diria a si mesmo: `Aquele que crer em minha justiça e em meu BATISMO será recebido em minha associação; partilhará comigo do assento que é a morada da vida, do supremo Mano e do fogo vivo" (Codex Nazaraeus, II, p. 115). Orígenes observa que "há alguns que dizem que João [Batista] era ungido (Christos)" (Orígenes, In Lucam homiliae, Hom. XXIV, cap. III). O Anjo Rasiel dos cabalistas é o Anjo Gabriel dos nazarenos e foi o escolhido pelos cristãos, dentre toda a hierarquia celeste, para ser o mensageiro da "anunciação". O gênio enviado pelo "Senhor da Celsitude" é chamado também de GABRIEL Legatus. Paulo deve ter tido os nazarenos em mente quando disse: "E depois de todos os outros, ele [Jesus]
também foi visto de mim como dum aborto" (I Coríntios, XV, 8), lembrando assim aos seus ouvintes a expressão usual dos nazarenos, que chamavam os judeus de "abortos, ou nascidos fora do tempo". Paulo orgulha-se de pertencer a uma heresia. Quanto as concepções metafísicas dos gnósticos, que viram em Jesus o Logos e o Ungido, começaram a ganhar terreno, os cristãos primitivos separaram-se dos nazarenos, que acusaram Jesus de perverter as doutrinas de João e de modificar o batismo do Jordão. Diz Milman que, "na medida em que ele (o Evangelho) ultrapassou as fronteiras da Palestina e o nome de `Cristo' adquiriu santidade e veneração nas cidades orientais, ele se tornou uma espécie de personificação metafísica, enquanto a religião perdeu seu objeto moral e assumiu o caráter de uma teogonia especulativa (Hist. of Christianity, p. 200; ed. original 1840). O único documento semi-original que nos chegou da época apostólica primitiva é os Logía de Mateus. A doutrina verdadeira e autêntica permaneceu nas mãos os nazarenos, nesse Evangelho segundo São Mateus, que contém a "doutrina secreta", os "Diabos de Jesus", mencionados por Papias. Esses ditos eram, sem dúvida, da mesma natureza dos pequenos manuscritos que eram colocados nas mãos dos neófitos, candidatos às Iniciações nos mistérios, que continham os aporrheta, as revelações de alguns ritos importantes e de símbolos. Não fosse assim, por que Mateus teria tomado tantas precauções para mantê-los em "segredo"? JESUS - Também chamado de Cristo ou Jesus Cristo. É preciso estabelecer uma distinção entre o Jesus histórico e o Jesus mítico. O primeiro era essênio e nazareno e foi mensageiro da Grande Fraternidade para pregar os antigos ensinamentos divinos, que deveriam ser a base de uma nova civilização. Pelo espaço de três anos foi Mestre divino dos homens e percorreu a Palestina, levando vida exemplar por sua natureza, compaixão e amor a humanidade. Operou quantidade enorme de prodígios, ressuscitando mortos, curando doentes, devolvendo a visão aos cegos, fazendo andar os paralíticos e realizando muitos outros atos que, por seu caráter extraordinário, foram qualificados de "milagrosos". A sublimidade de suas doutrinas ressalta principalmente em seu célebre Sermão da Montanha. Como Iniciado que era, ensinou também doutrinas esotéricas, porém as reservava unicamente para "os poucos", isto é, para seus discípulos eleitos. Ao Jesus históricos foram atribuídos vários feitos legendários, que o converteram em outro personagem puramente mítico, uma verdadeira cópia do deus Krishna, tão venerado na Índia. Glossário Teosófico de H. P. Blavatsky - ed. Ground).
OS CATÓLICOS ROMANOS TRANSFORMARAM MARIA MÃE DE JESUS. (L. 3. pág. 179). Foram os católicos romanos que transformaram Maria, a mãe de Jesus, numa deusa. Aos olhos de todos os outros cristãos ela era uma mulher, fosse o seu nascimento imaculado ou não. De acordo com a lógica estrita, Jesus confessou que João era maior do que ele próprio. Veja-se como a linguagem do Anjo Gabriel, ao se dirigir a Maria, coloca as coisas no seu devido lugar: "Bendita sois vós entre as mulheres". Essas palavras são inequívocas. Ele não a adora como a Mãe de Deus, nem a chama de deusa. Ele também não se dirige a ela como "Virgem", mas chama-a de mulher e só a considera superior às outras mulheres porque a sua extrema pureza lhe proporcionou uma melhor sorte. O CRISTIANISMO PRIMITIVO, SUAS SENHAS E SEUS GRAUS DE INICIAÇÃO. (L. 3. pág. 180).
O Cristianismo primitivo teve suas imposições de mão, suas senhas e seus graus de iniciação. As inumeráveis jóias e amuletos gnósticos são provas evidentes desse fato. Ele é uma ciência simbólica. Os cabalistas foram os primeiros a embelezar o Logos universal, com termos como "Luz da Luz", o Mensageiro da VIDA e da LUZ, e essa expressão foram adotadas in toto pelos cristãos, com a adição de quase todos os termos gnósticos, tais como Pleroma (plenitude), Arconte, Aeôns, etc. Quanto aos termos "Primogênito", o Primeiro e "Filho Unigênito"- eles são tão velhos quanto o mundo. Hipólito demonstra que a palavra "Logos" existia já entre os brâmanes. "Os brâmanes dizem que o Deus É Luz, não aquela que se pode ver, nem como a do Sol ou do fogo; mas eles têm um Deus LOGOS, não o articulado, o Logos da Gnose, pelos qual os MISTÉRIOS mais altos da Gnose são vistos pelos sábios". Os Atos e o quarto Evangelho abundam em expressões gnósticas. As expressões cabalísticas "o Primogênito de Deus emanado do Alto", junto com aquele que É o "Espírito do Ungido", e ainda "eles o chamaram o ungido do Supremo" foram reproduzidas em Espírito e em substância pelo autor do Evangelho segundo São João. "Aquela era a luz verdadeira" e "a Luz brilha nas Trevas". "E a PALAVRA foi feita carne". "E sua plenitude [pleroma] tem tudo o que recebemos", etc. (João i). O "Cristo", então, e o "Logos" existiram séculos antes do Cristianismos; a Gnose oriental foi estudada muito antes da época de Moisés e é preciso buscar a origem de todas essas doutrinas nos períodos arcaicos da filosofia asiática primitiva. A segunda Epístola de São Pedro e o fragmento de Judas, preservados no Novo Testamento, mostram, por sua fraseologia, que eles pertencem à Gnose oriental cabalística, pois usam as mesmas expressões dos gnósticos cristãos que elaboraram uma parte do seu sistema com base na Cabala oriental. "Atrevidos, por vontade própria, eles [os ofitas] não temem injuriar as DIGNIDADES", diz Pedro (2 Pedro, II, 10), o modelo original das injúrias posteriores de Tertuliano e de Irineu. "Da mesma
maneira [como Sodoma e Gomorra] também estes sonhadores asquerosos contaminam a carne, desprezam o DOMÍNIO e injuriam as DIGNIDADES", diz Judas (8), repetindo as mesmas palavras de Pedro e utilizando expressões consagradas na Cabala. Domínio é o "Império", o décimo Sephiroth cabalístico. Os Poderes e as DIGNIDADES são os gênios subordinados dos Arcanjos e dos Anjos do Zohar. Essas emanações são a vida mesma e a alma da Cabala é do Zoroastrianismo; e o próprio Talmude no seu estado atual, foi todo emprestado do Zend-Avesta. Em conseqüência, adotando o ponto de vista de Pedro, de Judas e de outros apóstolos judaicos, os cristãos tornaram-se uma seita dissidente dos persas, pois não interpretam o sentido de todos esses Poderes da maneira como os verdadeiros cabalistas. A admoestação de Paulo, aos seus convertidos, contra a adoração dos anjos, mostra o quanto ele apreciava, desde essa época, os perigos de se emprestar de uma doutrina metafísica a filosofia que só poderia ser corretamente interpretada pelos sues adeptos letrados, os magos e os tannaim judaicos. "Que nenhum homem, numa aparência de humildade e por um culto dos anjos, vos arrebate e se abandone às suas visões e se encha de um vão orgulho pelos seus pensamentos carnais", é a sentença deixada à porta de Pedro e dos seus defensores. No Talmude, Miguel é o Príncipe da Água, que tem sete espíritos inferiores subordinados a ele. Ele é o patrono, o anjo guardião dos judeus, como nos informam Daniel (X, 21) e os ofitas gregos, que o identificaram ao seu Ophiomorphos, a criação personificada da inveja e da malignidade de Ialdabaôth, o Demiurgo (Criador do mundo material); e ele pretende provar que ele era também Samuel, o príncipe hebraico dos maus espíritos, ou devas persas, que os judeus consideravam naturalmente como blasfemadores. Mas Jesus sancionou alguma vez essa crença nos anjos, exceto no caso de eles serem mensageiros e subordinados de Deus? E aqui a origem das últimas divergências entre as crenças cristã se liga diretamente a esses dois pontos de vista primitivos contraditórios. DAÊVAS - Também chamado de DEVA - um deus, uma divindade "resplandecente". Deva-Deus, da raiz div, "brilhar", "resplandecer". Um Deva é um ser celestial, seja bom, ou mau ou indiferente. Os Devas habitam "os três mundos" ou três planos superiores ao nosso. Há trinta e três grupos ou trezentos e trinta milhões deles. [Os Devas são, na Índia, o mesmo que os anjos e arcanjos entre os cristãos. O príncipe destes gênios celestes ou divindades inferiores é Indra, rei do firmamento ou céu. Deva como adjetivo, significa: divino, celeste, glorioso, resplandecente etc. G. Teosófico Editora Grund.
Paulo, acreditando em todos esses poderes ocultos do mundo "inobservado", mas sempre "presente", diz: "Marchais segundo o AÊON desse mundo, segundo o Arconte (Ialdabaôth, o Demiurgo) que tem o domínio do ar" e "Não lutamos contra a carne e o sangue, mas contra os domínios, os poderes: os senhores das trevas, a maldade dos espíritos das regiões superiores". Essa frase: "Estais mortos no pecado e no erro" pois "marchais segundo o Arconte", ou Ialdabaôth, o Deus e o criador da matéria para os ofitas, demonstra inequivocamente que: 1°: Paulo, apesar de algumas dissensões com as doutrinas mais importantes dos gnósticos, partilhava mais ou menos das suas noções cosmogônicas sobre as emanações, e 2°: que ele sabia perfeitamente que esse Demiurgo, cujo nome judaico era Jehovah, não era o Deus pregado por Jesus. Ora, se compararmos a doutrina de Paulo com os princípios religiosos de Pedro e Judas, veremos que eles não só adoraram Miguel, o Arcanjo, mas também reverenciaram SATÃ, porque este último, antes da sua queda, também era um anjo! Eles o faziam abertamente, e maltratavam os gnósticos por falarem "mal" dele. Ninguém pode negar o que segue: Pedro, denunciando aqueles que não temem injuriar as "dignidades", acrescenta imediatamente "Enquanto os anjos, superiores em força e em poder, não fazem acusações contra elas [as dignidades] diante do Senhor" (II, 11). O que são essas dignidades? Judas, em sua Epístola Geral, torna a palavra clara como o dia. As dignidades são os DIABOS!! Lamentando o desrespeito mostrado pelos gnósticos em relação aos poderes e às dignidades, Judas emprega como argumento as mesmas palavras de Pedro: "Quando Miguel, o Arcanjo, disputando com o diabo, altercava sobre o corpo de Moisés, não se atreveu a fulminar-lhe sentenças de blasfemo, mas disse: Manda-te o Senhor"(I, 9). Está claro? Se não está a Cabala se encarrega de nos fazer saber o que eram as dignidades. Considerando que o Deuteronômio nos diz que o "Senhor" enterrou Moisés num vale do país de Moab (XXXIV, 6) e que "ninguém conheceu até hoje o seu sepulcro", esse lapsus linguae de Judas dá uma coloração muito pronunciada às afirmações de alguns dos gnósticos. Eles só afirmavam o que foi ensinado secretamente pelos próprios cabalistas judaicos; a saber: que o Deus supremo era Desconhecido e Invisível; que "o Rei da Luz é um olho fechado"; que Ialdabaôth, o segundo Adão judaico, era o verdadeiro Demiurgo; e que Iao, Adonai, Tsabaôth e Elói eram a emanação quaternária que constituía a unidade do Deus dos hebreus - Jeová. Além disso, este também era por eles chamados de Miguel e de Samael, mas considerado como um anjo, muitos graus inferiores à Divindade. Afirmando essa crença, os gnósticos corroboravam os ensinamentos do maior dos doutores judaicos, Hillel, e outros Hillel, e outros teólogos babilônicos. Josefo mostra a grande deferência que a Sinagoga oficial de Jerusalém testemunhava pela sabedoria das escolas da Ásia Central. Os colégios de Sura, Pumbeditha e Sahardea eram considerados por todas as escolas da Palestina como a sede do ensino esotérico e teológico. A versão caldaica do Pentateuco, elaborada pelo célebre teólogo babilônico Onkelos, era considerada como a mais autorizada; e é de acordo com esse rabino
que Hillel e os outros tannaim, depois dele, afirmavam que o Ser que apareceu a Moisés na sarça ardente, no Monte Sinai, e que em seguida o enterrou, era o anjo do Senhor, Memra, e não o Senhor; e que este, que os hebreus do Velho Testamento tomavam por Iahoh, era apenas Seu mensageiro, um dos Seus filhos, ou emanações. Tudo isso estabelece apenas uma conclusão lógica - a saber, que os gnósticos eram muito superiores aos discípulos, do ponto de vista da educação e de informação geral, e mesmo em termos de um conhecimento dos princípios religiosos dos próprios judeus. Estando perfeitamente a par da sabedoria caldaica, os discípulos bem-intencionados, piedosos, fanáticos e ignorantes, incapazes de compreender completamente ou de extrair o espírito de seu próprio sistema, eram levados em suas discussões a adotar termos de um lógica convincente, tais como "bestas selvagens", "porcos", "cães" e outros epítetos tão livremente empregados por Pedro (apóstolos). A DOUTRINA DE ARCANJOS E ANJOS, NA TEOLOGIA CRISTÃ. (L. 3. pág. 184). A teologia cristã, tomando a doutrina dos arcanjos e dos anjos diretamente da Cabala oriental, da qual a Bíblia mosaica é apenas uma cópia alegórica, deveria pelo menos lembrar-se da hierarquia inventada por ela para essas emanações personificadas. As hostes dos querubins e dos serafins, que geralmente rodeiam as Madonas católicas em suas pinturas, pertencem, com os Elohim e os Beni Elohim dos hebreus, ao terceiro mundo cabalístico, o Yetzîrah. Este mundo é apenas uma grau mais alto do que Asiah, o quarto mundo e o mais inferior, no qual residem os seres mais grosseiros e mais materiais - os klippoth, que se satisfazem no mal e na malignidade, e cujo chefe é Belial! Explicando, à sua maneira, naturalmente, as várias "heresias" dos dois primeiros séculos, Irineu diz: "Nossos heréticos afirmam (...) que PROPATÔR só é conhecido do filho unigênito, isto é, da mente" (o Nous). Foram os velentianos, seguidores do "mais profundo doutor da gnose", Valentino, que afirmaram que "existia um AIÔN perfeito, que existiu antes de Bythos", ou Bythos (a Profundidade), "chamado Propatôr". Na metafísica religiosa dos hebreus, o Altíssimo é uma abstração; ele é "sem forma ou ser", "sem semelhança com nenhum outro". E até Fílon define o Criador como o Logos que vem depois de Deus, "o SEGUNDO DEUS". "O segundo DEUS que é sua SABEDORIA". Deus é NADA, ele é sem nome, eis porque o chamam Ain Soph - sendo que a palavra Ain significa nada. Mas se, de acordo com os judeus antigos, Jeová é o Deus, e Ele Se manifestou muitas vezes a Moisés e aos profetas, e se os cristãos anatematizaram os gnósticos que negaram o fato - como é, então, que lemos no quarto Evangelho que `Nenhum homem viu Deus EM TEMPO ALGUM, mas o Filho unigênito (...) é aquele que o fez conhecer"? [I, 18]. As mesmas palavras dos gnósticos, em espírito e em substância. Essa frase de São João - ou antes de quem escreveu o Evangelho que agora leva o seu nome - derrota todos os argumentos petrinos contra Simão, o Mago, inapelavelmente. As palavras são repetidas e enfatizadas no cap. VI, 46: "Não que alguém tenha visto o Pai, senão só aquele que é de Deus, esse [Jesus] é o que tem visto o Pai" - e é justamente essa objeção que Simão adianta nas Homilias. Essas palavras provam que, ou o autor do quarto evangelho ignorava totalmente a existência das Homilias, ou então que ele não era João, amigo e companheiro de Pedro, que ele contradiz com esta afirmação enfática. Seja como for, essa frase, como muitas outras que poderiam ser citadas com proveito, tende a confundir completamente o Cristianismo com a Gnose oriental e, por conseguinte, com a CABALA. Ao passo que as doutrinas, o código de ética e as práticas da religião cristã foram adaptadas do Bramanismo e do Budismo, suas cerimônias, vestimentas e cortejos foram tomados em bloco do Lamaísmo. Os mosteiros católicos romanos de monges e de monjas são cópias bastante servis de casas religiosas similares do Tibete e da Mongólia, e exploradores interessados na questão nos países budistas, obrigados a reconhecer esse fato desagradável, não tiveram outra alternativa senão, com um anacronismo que ultrapassou todos os limites, atribuir a ofensa de plágio a um sistema religioso que a sua própria mãe Igreja havia espoliado. Esse estratagema serviu a seu objetivo e teve a sua época. Chegou, finalmente, a hora em que esta página da história dever ser escrita.
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CAPÍTULO V OS MISTÉRIOS DA CABALA. N. Compilador AIN SOPH - O “Ilimitado” ou Infinito; a divindade que emana e se expande. Na Cabala, o Ancião dos Anciões; o Eterno; a Causa Primeira. Para os cabalistas caldeus primitivos, Ain Soph era “sem forma ou ser”, sem qualquer semelhança com outra coisa. A Divindade é Não-Coisa, é inanimada e, portando chamada Ain Soph, Ain significa Nada. SEPHIROTH - [Plural de Sephira]. - São as dez emanações da Divindade; a mais elevada é a formada pela concentração do Ain Soph Aur ou Luz infinita e cada Sephira produz, por emanação, outro Sephirah. Os nomes dos dez Sephiroth são: 1º) Kether, a Coroa; 2º) Chokmah, Sabedoria: 3º) Binah, Inteligência; 4º) Chesed, Misericórdia; 5º) Geburrah, Poder; 6º) Tiphereth, Beleza; 7º) Netzach, Vitória; 8º) Hod, Esplendor; 9º) Jesod, Fundamento; 10º) Malkuth, Reino. (G. Teosófico de H. P. B.) Os “Dez Membros” do “Homem Celeste” são os Dez Sephiroth, mas o primeiro “Homem Celeste” é o Espírito Não Manifesto do Universo, não devendo jamais ser desvirtuado e confundido com o Microposopo ou Microcosmo, a Face ou Aspecto Menor, o protótipo do homem no plano terrestre. O Microcosmo, como dissemos, é o Logos manifesto, e há muitos destes Logos. (A Doutrina Secreta de H.P.B.).
AS VÁRIAS REPRESENTAÇÕES DAS DIVINDADES, “AIN-SOPH E AS SEPHIRÔTH”. (L. 3. pág. 191).
Daremos atenção, agora, a alguns dos mais importantes mistérios da Cabala, e estudaremos suas relações com os mitos filosóficos de várias nações. Na mais antiga Cabala oriental a Divindade é representada como três círculos em um, cercados por uma certa exalação caótica ou fumacenta. No prefácio do Zohar, que transforma os três círculos primordiais em TRÊS CABEÇAS, descreve-se sobre estas uma exalação ou fumaça, nem preta, nem branco, mas incolor, e circunscrita num círculo. Essa é a Essência desconhecida. A origem da imagem judaica pode ser talvez remetida ao Poimandres de Hermes, o Logos egípcio, que aparece numa nuvem de natureza úmida, como fumaça que dela escapa. No Zohar, o Deus supremo é, como mostramos no capítulo anterior, e como no caso das filosofias hindus e budista, uma pura abstração, cuja existência objetiva é negada pelos últimos. É Hokhmanh, a "SABEDORIA SUPREMA", que não pode ser compreendida pela reflexão, e que repousa dentro e fora do CRÂNIO de LONGO ROSTO (Sephirah), a mais elevada das três "Cabeças". É o "Ain Soph infinito", a Não-Coisa. N. C. Acrescentamos a figura SEPHÎRÂ, criamos três triangulo, afim de que o leitor, tenha um ponto de referência para as explicações do texto.
As "três cabeças", superpostas umas às outras, foram evidentemente tomadas dos três triângulos místicos dos hindus, que também aparecem superpostos. A "cabeça" superior contém a Trindade no Caos, da qual brota a trindade manifesta. Ain Soph, o eterno irrevelado, que é ilimitado e incondicionado, não pode criar, e por conseguinte parece-nos um grande erro atribuir a ele um "pensamento criador", como o fazem habilmente os intérpretes. Em todas as cosmogonias, essa Essência suprema é passiva; se infinita, ilimitada e incondicionada, ela não pode ter nenhum pensamento ou idéia. Ela age não como resultado da volição, mas em obediência à sua própria natureza, e de acordo com a fatalidade da lei de que ela própria é a encarnação. Portanto, para os cabalistas hebreus, Ain Soph é não-existente, pois é incompreensível aos nossos intelectos finitos, e por conseguinte não pode existir para as nossas mentes. Sua primeira emanação é, Kether, a coroa. Ao ocorrer o momento para um período ativo, produz-se uma expansão natural dessa essência Divina de dentro para fora, obediente à lei eterna e imutável. Dessa Luz Eterna e Infinita (que para nós é trevas) se emite uma substância espiritual. Essa sendo a Primeira Sephirah, que contém em si as outras nove Sephiroth, ou inteligências. Em sua totalidade e unidade, elas representam o homem arquétipo, Adão-Cadmo, o que em sua individualidade ou unidade ainda é dual, ou bissexual, o Digamos grego, pois ele é o protótipo de toda a Humanidade. O temos, assim três trindades, cada qual contida numa "cabeça". Na primeira cabeça, ou face (a Trimûrti hindu de três faces), encontramos Kether, o primeiro andrógino, no ápice do triângulo superior, que emite Hokhmah, ou Sabedoria, uma potência masculina ativa - também chamada Yâh - e Binah, ou Inteligência, uma potência feminina e passiva, também representada pelo nome Yahweh. Essas três formam a primeira Trindade, ou "face", das Sephiroth. Essa Tríade emanou Hesed, ou misericórdia, uma potência ativa
masculina, também chamada Eloah, da qual emanou Geburah, ou justiça, também chamada Pa'had, uma potência passiva feminina; da união de ambas produziu-se Tiphereth, beleza, clemência, o Sol espiritual, conhecido por seu nome divino Elohim; e a segunda Tríade, "face" ou "cabeça", se formou. Essa emanaram, por sua vez, a potência masculina Netzah, Firmeza, ou Yehovah-Tsabaôth, que deu origem à potência passiva feminina Hod, Esplendor, ou Elohim-Tsabaôth; as duas produziram Yesod, Fundação, que é o poderoso existente, El Hay, propiciando assim a terceira trindade ou "cabeça". A décima Sephirah é antes uma Díada, e é representada nos diagramas como o círculo inferior. É Malkhuth, ou Reino, e Shekhînah, também chamad' Adonai e Cherubim entre as hostes angélicas. A primeira "cabeça" é chamada de mundo Intelectual; a segunda "cabeça" é o Sensual, ou o mundo da Percepção, e a terceira é o mundo material ou físico. O UNIVERSO ANTES DE TER UMA FORMA. A PRIMEIRA RELIGIÃO SABEDORIA. (L. 3. pág. 192).
"Antes de ter dado forma ao universo" - diz a Cabala -, "antes de ter produzido qualquer forma, ele era só, sem forma ou semelhança com o que quer que seja. Quem, então, pode compreendê-lo, tal como era antes da criação, visto que não tinha forma? Por conseguinte, é proibido representá-lo por qualquer forma, similitude, ou mesmo por seu nome sagrado, por uma simples letra, ou um simples ponto. (...) O Ancião dos Ancião, o Desconhecido dos Desconhecidos tem uma forma, mas não tem nenhuma forma, porque ele não pode ser compreendido. Quando assumiu uma forma pela primeira vez em Sephirah, sua primeira emanação, nove luzes esplêndidas dele emanaram". Voltaremos agora à cosmogonia esotérica hindu e à definição daqueEle "que é e não é". "Daquele que É, desse Princípio imortal que existe em nossas mentes mas não pode ser percebido pelos sentidos, nasce Purusha, o masculino e o feminino divinos, que se torna Nârâyana, ou Espírito Divino que se move nas águas." Svayambhû, a essência desconhecida dos brâmanes, é idêntico a Ain Soph, a essência desconhecida dos cabalistas. Assim como para estes, o Nome Inefável não pode ser pronunciado pelos hindus, sob pena de morte. Na antiga Trindade primitiva da Índia, que pode com certeza ser considerada como pré-Védica, o germe que fecunda o princípio da mãe, o ovo mundano, ou o útero universal, chama-se Nara, o Espírito, ou o Espírito Santo, que emana da essência primordial. Tal como Sephirah, a emanação mais antiga, é chamada de ponto primordial, e de Cabeça Branco, pois é o ponto da luz divina que surge das trevas insondáveis e infinitas. No Manu é "NARA", ou o Espírito de Deus, que movimenta "Ayana [Caos, ou lugar de movimento], e por isso é chamada de NÂRÂYANA, o que se move nas águas". Em Hermes, o egípcio, lemos: "No início do tempo, nada havia no caos". Mas quando o Verbo, que brotou do vazio como uma "fumaça sem cor", fez sua aparição, então "este Verbo, se moveu sobre o princípio úmido". E no Gênese [I,2], lemos o seguinte: E as trevas cobriam o abismo [caos], e o Espírito de Deus se movia sobre as águas". Na Cabala, a emanação do princípio passivo primordial (Sephirah), dividindo-se em duas partes, ativa e passiva, emite Hokhmah-Sabedoria e Binah-Yehovah, em conjunto com esses dois acólitos, que completam a Trindade, torna-se o Criador do Universo abstrato, sendo o mundo físico a produção de poderes posteriores e ainda mais materiais. Na cosmogonia hindu, Svayambhû emite Nara e Nârî, sua emanação bissexual, e dividindo suas partes em duas metades, masculina e feminina, essas fecundam o ovo cósmico, no qual desenvolve Brahmâ ou antes Virâj, o Criador. "O ponto de partida da mitologia egípcia" - diz Champollion "é uma Tríada (...) a saber, Kneph, Neith e Phtah; e Amon, o masculino, o pai; Mult, o feminino, a mãe; e Khonsu, o filho." AS DEZ SEPHIRÔTH, SÃO CHAMADOS DE "SENHORES DE TODOS OS SERES".
(L. 3.
pág. 193).
As dez Sephiroth são cópias tomadas dos dez Prajâpatis criados por Virâj, chamados de "Senhores de todos os seres", e correspondentes aos patriarcas bíblicos. Justino, o Mártir, explica algumas das "heresias" de sua época, mas de maneira bastante insatisfatória. Ele assinala, contudo, a identidade de todas as religiões do mundo em seus pontos de partida. O primeiro início se abre invariavelmente com a divindade desconhecida e passiva, que produz de si mesmo um certo poder ou virtude ativa, "Racional", que às vezes é chamada de SABEDORIA, às vezes do FILHO, e ainda de Deus, Anjo, Senhor e LOGOS. Este último termo se aplica às vezes à primeira emanação, mas em vários sistemas ele procede do primeiro raio andrógino ou duplo produzido no início pelo invisível. Fílon descreve essa sabedoria como masculina e feminina. Mas embora sua primeira manifestação tenha um início, pois procede de Olam (Aiôn, tempo), o maior de todos os Aeôns, quando emitidos dos Pais, ela permanece com ele antes de todas as criações, pois é parte dele. Por conseguinte, Fílon, o Judeu, chama Adão-Cadmo de "mente" (a Ennoia de Bythos, no sistema gnósticos). "Que a mente seja chamada de Adão."
O LIVRO DO GÊNESE UMA COMPILAÇÃO DAS LENDAS DO MUNDO ANTIGO.
(L. 3.
pág. 193).
Estritamente falando, é difícil conceber o Livro do Gênese judaico como outra coisa que uma chispa do tronco da árvore cósmica da Cosmogonia universal, traduzida nas alegorias orientais. Assim como todo ciclo é sucedido por um ciclo, e uma nação após outra vem ao placo do mundo para representar o seu breve papel, no majestoso drama da vida humana, cada novo povo deriva das tradições ancestrais à sua própria religião, dando-lhe uma cor local, e assinalando-a com suas características individuais. Embora cada uma dessas religiões tenha os seus traços distintos, pelos quais, na falta de outros vestígios arcaicos, a categoria física e psicológica pode ser estimada, todas preservam uma vinculação comum a um protótipo. Esse culto primordial não era outro senão a primitiva "religião da sabedoria". As Escrituras israelitas não são exceção. Sua história nacional - se podem elas reclamar qualquer autonomia antes do retorno da Babilônia, onde não eram mais do que seitas migratórias dos párias hindus - não pode remontar a antes de Moisés; e se esse sacerdote anteriormente egípcio deve, por causa da necessidade teológica, ser transformado num patriarca hebreu, devemos insistir em que a nação judia seja retirada dos juncos do Lago Moeris. Abraão, seu pretenso pai, pertence à mitologia universal. É bastante provável que ele seja um dos numerosos aliados de Zeruan (Saturno), o rei da idade de ouro, que é também chamado de Ancião (emblema do tempo). Está agora demonstrado pelos assiriólogos que nos antigos livros caldeus, Abraão é chamado de Zeru-an, - um homem rico em ouro e prata, um príncipe poderoso. Ele é também chamado de Zarouan e Zarman - um velho decrépito. A TORRE DE BABEL, CONSTRUÍDA PELOS DESCENDENTES DE SEM. (L. 3. pág. 194). Diz Eupolemos que Abraão nasceu em Camarina ou Ur, uma cidade de arautos da Verdade, e que inventou a Astronomia. Josefo afirma o mesmo de Terah, pai de Abraão. A Torre de Babel foi construída tanto pelos descendentes diretos de Sem como por aqueles "malditos" Cam e Canaã, pois naqueles tempos os povos eram "um só" e a "terra inteira falava a mesma língua"; Babel era apenas um Torre astrológica e seus construtores eram astrólogos e adeptos da primitiva religião da sabedoria, ou ainda do que nós chamamos de doutrina secreta. Sibila de Berosian diz: Antes da Torre, Zeru-an, os Titãs e Yapetosthes governavam a Terra; Zeru-an queria ser o supremo, mas os seus dois irmãos resistiram, até que sua irmão Astlik interveio e os apaziguou. Ficou combinado que Zeru-an deveria governar, mas os seus filhos homens seriam condenados à morte, e os fortes titãs foram designados para cumprir essa tarefa. OS MISTÉRIOS DO ESPÍRITO HUMANO, E A COROA IMORTAL. (L. 3. pág. 195). Elam, outro dos filhos de Sem, é Olam, e se refere a uma ordem ou ciclo de acontecimentos. No Eclesíastes, III, 11, é denominado "mundo". Em Ezequiel, XXVI, 20, de "dos velhos tempos". No Gênese, III, 22, a palavra tem o sentido de "para sempre"; e no cap. IX, 16, de "eterno". Finalmente, o termo é completamente definido, no Gênese, VI, 4, com as seguintes palavras: "Havia Nephilim (gigantes, homens caídos ou titãs) na Terra". A palavra é sinônimo de Aeôns. Em provérbios, VIII, 23, se lê: "Fui construído de Olam, de Rosh (sabedoria)". Com essa sentença, o sábio rei cabalista se refere a um dos mistérios do espírito humano - a coroa imortal da natureza trina do homem. Ao mesmo tempo que deve ser entendido como está acima, deve ser interpretado cabalisticamente significado que o eu (ou o meu eterno Ego imortal) ou a entidade espiritual foi fundido desde a eternidade infinita e inominável, por meio da sabedoria criativa do Deus desconhecido. Na tradução canônica se lê: "Desde a eternidade fui constituída e desde o princípio, antes de a Terra ser criada", o que é um contra-senso ininteligível, sem a interpretação cabalística. Quando Salomão é levado a dizer que era "desde o início... enquanto Ela (a Divindade Suprema) ainda não tinha feito a Terra... nem a parte mais elevada da poeira do mundo... eu estava lá, "e" quando Ele lançou os alicerces da Terra... então eu estava com Ele, como alguém criado com Ele" o que os cabalistas significam com o Eu, a não ser o seu próprio espírito divino, uma gota derramada daquela fonte eterna de Luz e Sabedoria - o espírito universal da Divindade? O facho de glória emitido por Ain Soph da mais alta das três cabeças cabalísticas, através do qual "todas as coisas brilham na Luz" o facho que sai através do Primus Adão, é o Espírito Individual de todo Homem. "E cada dia me deleitava com (Ain Soph) ele brincando o tempo todo diante dele... e as minhas delícias eram `estar com os filhos dos homens', acrescenta Salomão no mesmo capítulo dos Provérbios (30-1). O espírito imortal se compraz nos filhos dos homens, pois, sem o espírito nada mais havia do que dualidades (corpo físico e alma astral, ou aquele princípio de vida que anima até mesmo a menor das formas do reino
animal). Todavia, vimos que a doutrina ensina que esse espírito não pode se unir ao homem quando há matéria e tendências muito grosseiras de sua alma animal, que sempre o estarão expulsando devido ao seu grande número. Por essa razão, Salomão, que foi induzido a falar sob inspiração do próprio espírito que o possui durante toda a sua vida, proferiu as seguintes palavras de sabedoria: "Ouvi-me, meu filho" (o homem dual), "bem-aventurados os que guardam os meus caminhos... Bem-aventurado o homem que me ouve, e que vela diariamente à entrada da minha casa... Aquele que me achar, achará a vida, e obterás a salvação do Senhor... Aquele porém que pecar contra mim fará mal à sua alma... e ama a morte" (Provérbios, VIII, 32-6). Este capítulo, como foi interpretado por alguns teólogos, aplica-se, como tudo o mais, a Cristo, o "Filho de Deus", que repetidamente afirma que quem o seguir obterá a vida eterna e vencerá a morte. Mas até mesmo em sua tradução distorcida pode-se demonstrar que ele se refere a qualquer coisa que não o pretenso Salvador. Se aceitássemos isso nesse sentido, então a Teologia cristã de retornar, nolens volens, ao Averroísmo e ao Budismo; em suma, à doutrina da emanação. Pois Salomão diz: "Eu fui constituído de Olam e Rosh, sendo ambos parte da Divindade; e dessa forma o Cristo não seria, como a sua doutrina prega, o próprio Deus, mas apenas uma emanação Dele, como o Cristo dos gnósticos. Donde, o sentido da personalidade gnóstica da eternidade, palavra que significa ciclos ou determinados períodos da eternidade e, ao mesmo tempo, representa uma hierarquia de seres celestiais - os espíritos. Portanto, o Cristo algumas vezes é denominado de a "Eternidade". Mas a palavra "eterno" é errônea com relação aos Aeôns. Eterno é o que não tem começo e nem fim; no entanto, as emanações ou Aeôns, embora tivesse sido absolvidas na essência divina da eternidade, uma vez emanadas individualmente, têm princípio. Podem, portanto, ser infindáveis em sua vida espiritual, mas nunca eternas. Essas emanações intermináveis da única Causa Primeira, que foram todas transformadas pela imaginação popular nos diversos deuses, espíritos, anjos e demônios, eram consideradas tão pouco imortais que a todas se atribuiu uma existência limitada. E essa crença, comum a todos os povos da Antigüidade, aos magos caldeus bem como aos egípcios, e mesmo até hoje é mantida pelos bramanista e pelos budista, mais gloriosamente evidencia o monoteísmo dos antigos sistemas religiosos. Essa doutrina chama o período de vida de todas as divindades inferiores "um dia de Parabrahman". Depois de um ciclo de quatro bilhões, trezentos e vinte milhões de anos humanos - diz a tradição - a própria Trindade, com todas as divindades menores, será aniquilada, juntamente com o universo, e deixará de existir. Em seguida, gradativamente, um outro universo emergirá de pralaya (dissolução), e os homens sobre a Terra serão capazes de compreender SVAYAMBHÛ como ele é. Isoladamente, a causa primordial existirá para sempre, em toda a sua glória, enchendo o espaço infinito. Que prova melhor poderia ser acrescentada, do profundo sentimento de reverência com o qual o "pagão" considera a única Suprema causa eterna e todas as coisas visíveis e invisíveis? A CRENÇA NA ETERNIDADE, E A INDESTRUTIBILIDADE DA MATÉRIA. (L .3. pág. 196). Essa é novamente a fonte de onde os antigos cabalistas tiraram as suas doutrinas idênticas. Se os cristãos entendem o Gênese a seu modo, e ao aceitar literalmente esses textos impõem a crença da criação do mundo a partir do nada à massa inculta, atribuindo além disso a esse mundo um começo, certamente não são os tannaim, os únicos intérpretes do sentido oculto da Bíblia que merecem ser censurados. Eles nunca acreditaram, mais do que qualquer outro filósofo, nas criações espontâneas, limitadas ou ex nihilo. A Cabala sobreviveu para mostrar que a sua filosofia era precisamente a dos modernos budistas do Nepal, os Svâbhâvikas. Eles acreditam na eternidade e na indestrutibilidade da matéria e, a partir disso, em muitas criações e destruições anteriores de mundos, antes do nosso próprio. "Existiram mundos que pereceram." "A partir disso podemos ver que o Único Sagrado abençoado seja o Seu nome, criou e destruiu sucessivamente diversos mundos, antes de criar o mundo atual; e quando Ele criou este mundo disse: `Isso me agrada; os anteriores não me agradaram." Além disso, eles acreditavam, da mesma forma que os svâbhâvikas, agora chamados ateístas, que tudo procede (é criado) de sua própria natureza e que logo que o primeiro impulso é dado pela Força Criativa inerente na "Substância autocriada", ou Sephirah, tudo evolui de si mesmo, segundo o seu modelo, o mais espiritual protótipo que precede na escala da criação infinita. "O ponto indivisível que não tem limite e não pode ser compreendido (porque é Absoluto), se expande do íntimo, e forma uma grandeza que serve de veste (de véu) para o ponto indivisível. ... Ele, também, se expande do interior... Portanto, tudo foi originado através de uma constante agitação elevadora, e dessa forma finalmente o mundo se originou."
A TRINDADE CABALISTA, UM MODELO DA TRINDADE CRISTÃ. (L. 3. pág. 197). A trindade cabalística é um dos modelos da Trindade Cristã. "A Secular, cujo nome é santificado, tem três cabeças, que perfazem uma só." Tria capita exsculpta sunt, unum intra, et alterum supra alterum. "Três cabeças estão introduzidas uma na outra, e uma sobre a outra. A primeira cabeça é a Sabedoria Oculta (sapientia abscondita). Embaixo dessa cabeça está a SECULAR (Mônada Pitagórica), o mais secreto dos mistérios; uma cabeça que não é cabeça (caput quod non est caput); ninguém pode saber o que existe nesta cabeça. Nenhum intelecto é capaz de compreender esta sabedoria." Esse Senior Sanctissimus é envolvido pelas três cabeças. Trata-se da eterna LUZ da Sabedoria; e a sabedoria é a fonte de onde se originaram todas as manifestações. "Essas três cabeças incluídas em UMA CABEÇA (que não é cabeça); e essas três são curvadas para baixo (protegidas) por PEQUENA FACE (o Filho) e através delas todas as coisas brilham na Luz." "Ain Soph emite um raio de Luz a partir de El ou Al (o mais elevado Deus da Trindade), e a Luz segue com o raio, entra, passa através e sai do Primus Adão (Cadmo), que está oculto até que o plano das disposições (statum dispositionis) esteja pronto; esse raio passa por ele da cabeça até os pés; e nele (não Adão oculto) está a imagem de UM HOMEM." "Quem quiser ter assim um vislumbre da unidade sagrada, deve considerar uma chama surgindo de um carvão em brasa ou de uma lâmpada acesa. Em primeiro lugar, verá uma Luz dupla - uma branco e brilhante, uma preta ou azul: a luz branco está acima, ascendendo uma Luz direta, enquanto que a Luz azul ou preta, está abaixo e se parece com a base da precedente, ainda que ambas estejam tão intimamente interligadas que constituem uma única chama. A base, entretanto, formada pela Luz azul ou preta, está ligada novamente com a matéria ardente que está embaixo dela. A Luz branco nunca muda de cor, sempre permanece branco; no entanto, são observadas várias sombras na Luz mais baixa, ao mesmo tempo que na Luz que está mais abaixo de todas, além de tudo se observa que ela toma duas direções: acima, ela está unida com a Luz branco e embaixo com a matéria ardente. Ora, essa está constantemente se consumindo, perpetuamente ascende à Luz superior, e assim tudo se funde numa só unidade." Essas eram as idéias seculares da Trindade na unidade, como se ela fosse uma abstração. O homem, que é o microcosmo do macrocosmo, ou do arquetípico homem celestial, Adão-Cadmo, é igualmente trino; pois ele se constitui de corpo, Alma e Espírito. "Tudo que é criado pelo `Ancião dos Anciões' pode viver e existir apenas por meio de um macho e uma fêmea", diz o Zohar. Apenas Ele, de quem ninguém pode dizer "Tu", porque ele é o espírito da CABEÇA BRANCO em que as "TRÊS CABEÇAS" estão unidas, é Incriado. Do fogo sutil, um dos lados da Cabeça Branco, e do "ar sutil", do outro lado, emanar Shekhînah, o seu véu (o Espírito Sagrado tornado feminino). Esse alento, "diz Idrah Rabbah" é o mais secreto (occultissimus) atributo do Ancião dos Dias. O Ancião dos Ancião é o Oculto do Oculto. Todas as coisa são Ele, Ele está oculto de todos os lados. O cranium da CABEÇA BRANCO não tem começo, mas o seu fim tem um reflexo brilhante e uma perfeição que é o nosso universo." OS GNÓSTICOS E OS NAZARENOS PERSONIFICAM O PRIMEIRO E O SEGUNDO HOMEM. (L. 3. pág. 198). Os gnósticos, bem como os nazarenos, fazendo a alegoria da personificação dizem que o Primeiro e o Segundo homem amaram a beleza de Sophia (Sephirah), a primeira mulher, e dessa forma o Pai e o Filho fecundaram a "Mulher" celestial e de sua primordial escuridão procriaram a luz visível (Sephirah é a Luz Invisível ou Espiritual), "a que chamaram de CRISTO UNGIDO, ou Rei Messias". Este Cristo é o Adão de Barro que antes de sua queda, com o espírito de Adonai, seu Pai, e Shehinah Adonai, sua mãe, sobre ele; porque o Primus Adão é Adonai ou Adónis. A primordial existência se manifesta por sua sabedoria e produz o Logos Inteligível (toda a criação visível). Essa sabedoria foi venerada pelos Ofitas na forma de uma serpente. Até hoje, nós vemos que a primeira e a segunda vida são os dois Adões, ou o primeiro e o segundo homem. No presente jaz Eva, ou a ainda não nascida Eve espiritual, e ela está dentro do Adão Primordial, pois ela é uma parte dele mesmo, que é andrógino. A Eva de barro, ela que será chamada de "a mãe de tudo o que vive" no Gênese, está dentro de Adão, o segundo. E agora, a partir do momento de sua primeira manifestação, o SENHOR MANO, A sabedoria Ininteligível, desaparece da cena da ação. Ela se manifestará apenas como Shekînah, a GRAÇA; pois, a CORONA é "a mais íntima Luz de todas as Luzes", e portanto é a própria essência das "trevas". Na Cabala, Shekhînah é a nona emanação de Sephirah (Na Cabala Sephirah, ou a "Sagrada Anciã", é a Inteligência Divina), que contém todos os dez Sephiroth dentro de si mesma. Ela pertence à terceira Tríada e é produzida juntamente com Malkhuth ou "Reino", do qual ela é a contrapartida feminina. Além disso, assegura-se que ela é mais elevada que qualquer desses, pois ela é a "Glória Divina", o "véu", ou "a veste" de
Ain Soph. Os Judeus, cada vez que ela é mencionada no Targumin, dizem que ela é a glória de Jeová, que mora no tabernáculo, manifestando-se como uma nuvem visível; a "Glória" que descansa no assento sagrado do Sancta Sanctorum. No sistema nazareno ou bardesiano, que pode ser denominado de Cabala dentro da Cabala, o Ancião dos Dias - Antiquus Altus - que é o Pai do Demiurgo do Universo, é chamado a Terceira Vida, ou Abathur; e ele é o Pai de Pthahil, que é o arquiteto do universo visível, que ele chama à existência pelos poderes de seu génio, sob ordem do "Maior de Todos"; o Abathur corresponde ao Pai de Jesus na posterior Teogonia cristã. Então, essas duas Vidas superiores são a coroa dentro da qual mora o maior Ferho. "Ferho existia antes que qualquer criatura viesse à vida." Esta é a Primeira Vida, em forma e invisível, em que existe o vivente Espírito da Vida, Mais elevada GRAÇA. São UM a partir da eternidade, pois são Luz e a CAUSA da Luz. Portanto, correspondem à Sabedoria cabalística oculta e à oculta Shekhînah - o Espírito Sagrado. "Essa Luz que se manifesta é a veste do Oculto Sagrado, "diz Idrad Zutah. E o "homem celestial" é o Adão Superior". Ninguém conhece os seus caminhos, exceto Macroprosopus" (Face longa) - o deus superior ativo. "Não como eu estou escrito quero ser lido; neste mundo o meu nome será escrito Jeová e lido Adonai", diz acertadamente o Rabino. Adonai é Adão-Cadmo; ele é ambos, PAI E MÃE. Por essa dupla meiação, o Espírito do "Ancião dos Anciães" desce sobre Microprosopus (Pequena Face) ou o Adão do Éden, e o "Senhor Deus assoprou em suas narinas o alento vital". Quando a mulher se separou de seu andrógino, e se tornou uma individualidade distinta, a primeira história se repetiu novamente. Ambos, Pai e Mãe, os dois Adões, amam a sua beleza; e, em seguida, seguem a alegoria da tentação e da queda. Está na Cabala, bem como no sistema dos ofitas, em que ambos, Ophis e Ophiomorphos são emanações emblemáticas de serpentes, as precedentes representando a eternidade, a sabedoria e o espírito (como no magismo caldeu do culto, a áspide e a Doutrina da Sabedoria, nos velhos tempos), e mais tarde em Cunning, Envy e Matter. Tanto o espírito como a matéria são serpentes; e AdãoCadmo se torna Ophis que tenta a si mesmo - homem e mulher - a sabedoria da "Árvore do bem e do Mal", a fim de ensiná-los nos mistérios da sabedoria espiritual. A Luz tenta as Trevas, e as Trevas atraem a Luz, pois as trevas são a matéria e "a Mais elevada Luz não brilha em sua Tenebrae". Com a sabedoria sobrevem a tentação do Ophiomorphos e esta prevalece. O dualismo de qualquer religião existente é revelada pela queda. "Eu recebi um homem do Senhor" exclama Eva, quando o Dualismo, Caim e Abel - mal e bem - nasceu. "E Adão conheceu Hua, a sua mulher (astu), e ela engendrou e deu à luz Kin, e disse: Kanithi aish ath Yahveh Eu recebi ou obtive um marido, por Yahveh (Ish-homem)". AS VISÕES APOCALÍPTICAS. (L. 3. pág. 202). No Apocalipse de João, o Teólogo, se diz: "Eu voltei-me e vi... no meio dos sete candeeiros alguém semelhante ao Filho do Homem... sua cabeça e seu cabelo pareciam lá, brancos como neve; e seus olhos pareciam uma como chama de fogo... e seus pés eram semelhantes ao latão fino quando está numa fornalha ardente" (I,12,-5). João repete nessa passagem, como se sabe bem, as palavras de Daniel e de Ezequiel. "O Ancião dos Dias... cujo cabelo era branco como pura lã... etc." E "a semelhança de um homem... acima do trono... e a semelhança do fogo, e ela tinha refulgência a toda a volta". O fogo é "a glória do Senhor". Pthahil é o filho do homem, a Terceira Vida, e sua parte superior está representada tão branca como a neve; enquanto está em pé perto do trono do fogo ardente, ele tem a aparência de uma chama. Todas essas visões "apocalíptica" baseiam-se na descrição da "cabeça branca" de Zohar, em quem está unidade a trindade cabalista. A cabeça branca, "que oculta em seu crânio o espírito", e que é rodeada pelo fogo sutil. A "semelhança de um homem" é aquela de Adão-Cadmo, através de quem passa o facho de luz representado pelo fogo. Pthahil é o Vir Novissinis (o homem mais novo), o filho de Abathur, sendo esse último o "homem" ou a terceira vida (A primeira Díada andrógina, considerada como uma unidade em todas as computações secretas, é, por conseguinte, o Espírito Santo.), agora o terceiro personagem da Trindade. João vê "alguém semelhante ao filho do homem", segurando em sua mão direita sete estrelas, e de pé entre "sete candeeiros dourados (Apocalipse, I). Pthahil ocupa sua "posição no alto", segurando a vontade de seu pai, "o mais elevado Aeon que tem sete cetros e sete gênios, que astronomicamente representam os sete planetas ou estrelas. Ele está em pé "brilhando nas vestes do Senhor, resplandecente por meio dos gênios". Ele é o Filho do seu Pai, a Vida, e de sua mãe, o Espírito, ou Luz. No Evangelho segundo São João, Logos é representado como aquele em quem havia "Vida, e a vida era a Luz dos homens" (I, 4). Pthahil é o Demiurgo, e seu pai criou o universo visível da matéria através dele. N Epístola de Paulo aos Efésios (III, 9), diz-se que Deus "criou todas as coisas por meio de Jesus." No Codex, a VIDA - Progenitora diz: "Levante-se, vá nosso filho ungido em primeiro lugar, ordenando para todas as criaturas". "Assim como o Pai que vive me enviou", diz Cristo, "Deus enviou o seu filho ungido para que nós possamos viver" (João, VI, 57; I João, IV, 9).
Finalmente, tendo concluído a sua obra na Terra, Pthahil se eleva até o seu Pai Abathur. "Meu pai me enviou... Eu vou ao Pai", repete Jesus. Deixando de lado as disputas teológicas do Cristianismo, que tenta fundir o Criador Judaico do primeiro capítulo do Gênese com o "Pai" do Novo Testamento, Jesus a afirma repetidamente do seu Pai: "Ele está oculto". Certamente ele não teria denominado desta forma o sempre-presente "Senhor Deus" dos livros mosaicos, que Se mostrou a Moisés e aos Patriarcas, e que finalmente permitiu que os anciãos de Israel olhassem para Ele ("Então subiram Moisés e Abraão, Nadab e Abiú, e os setenta anciãos de Israel. E eles viram o Deus de Israel", Êxodo, XXIV, 9-10.). Quando Jesus se pôs a falar no templo em Jerusalém como da "Casa de seu Pai", ele não se referia à construção física, que ele afirmava poder destruir e reconstruir em três dias, mas ao templo de Salomão, o cabalista sábio, que indicava em seus Provérbios que cada homem é o templo do Senhor, ou do seu próprio espírito divino. Este termo "Pai que está oculto", nós também vemos tanto na Cabala como no Codex nazareus, e em outros lugares. Nós podemos rastrear essa denominação de um Deus "secreto" ainda mais para trás. Na Cabala, o "Filho" do Pai oculto que reside na luz e na glória, é o "Ungido", o Zeir-Anpîn, que une a si mesmo todas as Sephiroth, ele é o Cristo, ou o homem celestial. É através de Cristo que o Pneuma, ou o Espírito Sagrado, cria "todas as coisas", (Efésios, III, 9), e produz os quatro elementos, o ar, a água, o fogo e a terra. O "Filho do Homem" é um título que não deveria ser usado a não ser por cabalistas. Exceto, como verificamos acima, no Velho Testamento, ele é usado apenas por um único profeta - Ezequiel, o cabalista. Em suas relações mútuas e misteriosas, os Aeons ou Sephiroth são representados na Cabala por um grande número de círculos, e algumas vezes pela figura de um HOMEM, que é simbolicamente formado a partir desses círculos. Este homem é Zeir-Anpîn, e os 243 números de que a sua figura se constitui, se relacionam com as diferentes ordens da hierarquia celestial. A idéia original dessa figura, ou antes, o seu modelo, pode ter sido extraída do Brahmâ hindu, e as várias castas, representadas por algumas partes do seu corpo, como sugere King em seu Gnostics. Em um dos maiores e mais bonitos templos - caverna, em Ellora, dedicado à Visvakarman, filho de Brahmâ, existe uma representação deste Deus e de suas qualidades. Para alguém acostumado com a descrição de Ezequiel da "semelhança das quatro criaturas viventes" cada uma das quasi possuía quatro faces e as mãos de um homem embaixo de suas asas, etc., a figura de Ellora deve certamente parecer absolutamente Bíblicas. Brahmâ é denominado o pai do "homem" bem como de Júpiter e de outros deuses elevados. A REPRESENTAÇÃO BUDISTA DO MONTE MERU. (L. 3. pág. 205). É na representação budista do Monte Meru, chamado pelos birmanises Myénmo, e pelos siameses de Sineru, que nós encontramos um dos originais de Adão-Cadmo, Zeir-Anpîn, o "homem celestial", e de todos os Aeons, Sephiroth, poderes, domínios, tronos, virtudes e dignidade da Cabala. Entre duas colunas, que são unidas por um arco, cuja abóbada é em forma de meia-lua. Este é o domínio em que reside a Suprema Sabedoria do Âdi-Buddha, a Divindade Suprema e Invisível. Ao lado desse ponto central mais elevado, vem o círculo da emanação direta do Desconhecido - o círculo de Brahmâ segundo alguns hindus, do primeiro avatâra de Buddha, segundo outros. Isso corresponde ao Adão-Cadmo e às dez Sephiroth. Nove dessas emanações são circundadas pela décima, e ocasionalmente são representadas por pagodes, cada um portanto um nome que exprime uma das qualidades principais da Divindade manifesta. Abaixo, então, vêm os sete estágios, ou esferas celestiais, sendo esferas circulada por um mar. Essas são as mansões celestiais dos devatâs, ou desses, cada um deles perdendo um pouco de sua santidade e pureza, à medida que se aproximam da Terra. Em seguida vem o próprio Meru, formado por círculos inumeráveis dentro de três círculos maiores, representando a Trindade do homem; e para alguém familiarizado com o valor numérico das letras dos nomes bíblicos, como o da "Grande Besta", ou o de Mithras, e outros, trata-se de um assunto fácil estabelecer a identidade dos deuses-Meru com as emanações, ou com as Sephiroth dos cabalistas. Também os gênios dos nazarenos, com as suas missões especiais, são todos eles encontrados nesses mitos mais antigos, numa mais perfeita representação do simbolismo da "doutrina secreta", como era ensinada em eras arcaicas. O conjunto é rodeado por Mahâ-Samudra, ou o grande mar - a luz astral e o éter dos cabalistas e dos cientistas; e dentro do círculo central aparece "a semelhança com um homem". Ele é o Akhamôth dos nazarenos, a unidade dupla, ou o homem andrógino: a encarnação celestial, e uma representação perfeita de Zei-Anpîn (pequena face) o filho de Arikh-Aripîn (face longa). Agora, essa semelhança é representada em muitas lamaserias por Gautama Buddha, o último dos avatâras encarnados. Ainda mais embaixo, sob Meru, fica a morada da grande Nâga (literalmente "serpente", no Panteão hindu, é o nome dos espíritos dragão e serpente), que é chamada de Râjâ-Nâga, a serpente-rainha - a serpente do Gênese, a Ophis gnósticas - e a deusa da terra, Bhûmayî-Nârî, que receia o grande dragão, pois ela é Eve, "a mãe de tudo o que vive". Ainda
mais embaixo está a oitava esfera, as regiões infernais. As regiões mais superiores de Brahmâ são rodeadas pelo Sol, pela Luz e pelos planetas, os sete astrais dos nazarenos e justamente dessa maneira são descritos no Codex. Estes são os sete demônios impostores que iludiram os filhos de Adão: O nome de um deles é Sol, do outro é Spiritus Venereus, Astro; do terceiro é Nebu, Mercurius, um falso Messias; ... o nome é Sin, Luna; o quinto é Khîyûn, Saturno; o sexto é Bel, Zeus; o sétimo Nerig, Marte." Em seguida há "Sete Vidas procriadas", sete bons Astrais, "os quais são de Kebar-Ziwa, e são aqueles brilhantes, que brilham com forma e esplendor próprios que provêm do alto... No portal da CASA DA VIDA, o trono está dignamente colocado para o Senhor do Esplendor, e há TRÊS habitações". As habitações da Trimûrti, a trindade hindu estão colocadas ao lado da chave da abóbada - a meia-lua dourada, na representação de Meru. "E havia sob os seus pés [do Deus de Israel] como uma obra de pedra de safira." (Êxodo, XXIV, 10). Sob a meia-lua está o céu de Brahmâ, toda pavimentada com safiras. O paraíso de Indra é resplandecente com mil Sóis; o de Shiva (Saturno) fica no nordeste; seu trono é feito de lápis-lazuli e o chão do céu é de ouro incandescente. "Quando ele senta no trono, ele arde em chamas até a altura dos rins." Nesse deus reconhecemos a descrição dada por Ezequiel, no primeiro capítulo de seu livro, de sua visão, em que ele apreende a "semelhança de um homem" nas quatro criaturas viventes, que têm "quatro faces, quatro asas", que têm um par de "pés retilíneos que cintilam como a cor do bronze queimado... e seus anéis estavam cheios de olhos em volta de todos os quatro". Trata-se do trono e do céu de Shiva que o profeta descreve ao dizer "... e havia algo parecido com um trono, com a aparência de uma safira... e eu vi como a cor de âmbar [ouro] na aparência de fogo à sua volta... de seus rins e até mais para cima, e da aparência dos seus rins até mais para baixo, eu vi como aparência de fogo". (Ezequiel, I, 26, 27). "E seus pés eram semelhantes ao latão fino quando está numa fornalha ardente" (Apocalipse, I,15). "E a semelhança do semblante deles era... uma tinha o rosto de um querubim, e o rosto de um leão... eles também tinham o rosto de um boi e o rosto de uma água" (Ezequiel, I, 10; X, 14). Essa aparência quádrupla, encontramos nos dois querubins de ouro, nas duas extremidades do arco; essas quatro faces simbólicas foram adotadas, mais tarde, pelos evangelistas, uma por cada um como se pode verificar facilmente nas figuras de Mateus, Marcos, Lucas e João, prefixadas em seus respectivos evangelhos, na Vulgata Romana e nas Bíblias gregas. A identidade de Saturno com Shiva é mais corroborada ainda, se considerarmos o emblema deste último, o damaru, que é uma ampulheta, para mostrar a evolução do tempo, representada por esse deus na sua capacidade de destruição. O boi Nandi, o vâhana de Shiva e o mais sagrado emblema desse deus, é reproduzido no Ápis egípcio e no boi criado por Ormasde e morto por Ahriman. A religião de Zoroastro, baseada na "doutrina secreta", foi mantida pelo povo de Eritene; era a religião dos persas quando eles conquistaram os assírios. Desde aí, é fácil delinear a introdução desse emblema de VIDA representado pelo boi, em cada sistema religioso. O colégio dos magos o aceitou com a mudança da dinastia; Daniel é descrito como um rabino, o chefe dos astrólogos babilônios e dos magos; e por essa razão vemos os pequenos bois assírios e os atributos de Shiva reaparecendo de forma pouco modificada nos querubins dos judeus talmudísticos, assim como detectamos o boi Ápis nas esfinges ou nos querubins do Arco Mosaico; e como os encontramos há alguns milhares de anos mais tarde, na companhia de um dos evangelistas cristãos, Lucas. Quem alguma vez viveu tempo suficiente na Índia para se familiarizar, mesmo superficialmente, com as divindades nativas, deve verificar a semelhança entre Jeová e outros deuses, ao lado de Shiva Como Saturno, este último sempre foi muito respeitado pelos talmudistas. Ele foi reverenciado pelos cabalistas alexandrinos como o inspirador direto da lei e dos profetas; um dos nomes de Saturno era Israel, e nós mostraremos, em tempo, a sua semelhança de certa maneira, com Abraão, que Movers e outros sugeriram há muito tempo. Portanto, não deve nos causar espanto que Valentino, Basilides e os gnósticos ofitas colocassem a morada de seu Ialdabaôth, que também tanto é um destruidor, como um criador, no planeta Saturno; pois foi ele que ditou a lei no deserto e falou pela boca dos profetas. Se forem necessárias mais provas, nós as mostraremos no testemunho da própria Bíblia canónica. Em Amos, o Senhor se encolarizou com o povo de Israel. Ele rejeitou a queima de seus sacrifícios e ofertas e não ouviu as suas preces, mas indagou de Amos, "eles ofereceram sacrifícios e oferendas para mim no deserto por quarenta anos, ó casa de Israel? Porém, eles usaram o tabernáculo de teu Maloch e Chiun tuas imagens, a estrela de teu deus"(v. 25, 26). Quem eram Maloch e Chiun, a não ser Baal-Saturno-Shiva, e Chiun, Khîyûn, o mesmo Saturno cuja estrela os israelitas usaram para si mesmos? Parece não haver escapatória neste caso; todas essas divindades são idênticas. O SALVADOR DA HUMANIDADE. (L. 3. pág. 208). Saoshyant de Zoroastro é moldado no décimo avatâra bramânico, e o quinto Buddha dos seguidores de Gautama; e nós encontramos o anterior, depois de ter passado a parte integrante para o sistema cabalístico
do rei Messias, refletido no apóstolo Gabriel dos nazarenos, e Hibil-Ziwa, o Legatus, mandado para a Terra pelo Senhor da Celsitude e da Luz; todos esses - hindus e persas, budistas e judaicos, o Cristo dos gnósticos e o Philonean Logos são encontrados combinados no "Mundo feito carne" do quarto Evangelho. O Cristianismo inclui todos estes sistemas, improvisados para se adaptar às circunstâncias. Se considerarmos o Avesta encontraremos ali, o sistema dual que prevalece no esquema cristão. A luta entre Ahriman, as Trevas, e Ormasde, a Luz, tem continuado no mundo, desde o começo dos tempos. Quando chega o pior e parecer que Ahriman (trevas) conquistou o mundo, e corrompeu toda a Humanidade, então aparecerá o Salvador da Humanidade, Saoshyant. Ele virá montado num cavalo branco e seguido por um exército de gênios bons, igualmente cavalgando corcéis brancos como leite. E isso encontramos copiado de modo fideligno do Apocalipse: "Eu vi o céu aberto, e eis que apareceu um cavalo branco; e o que estava montado em cima dele se chamava o Fiel e o Verdadeiro... E seguiam-no os exércitos que estão no céu em cavalos brancos" (Apocalipse, XIX, 11, 14) O próprio Saoshyant nada mais é que a posterior permutação do Vishnu hindu. A figura deste deus pode ser encontrada até os dias de hoje, representada como o Salvador, o "Preservador" (a proteção do espírito de Deus), no templo de Râma. O quadro o apresenta em sua décima encarnação - O Kalki-avatâra, que está por vir - como um guerreiro armado montado num cavalo branco. Agitando sobre a sua cabeça a espada [da] destruição, na outra mão segura um escudo formado de anéis concêntricos, emblema dos ciclos que revolvem de grandes eras, pois Vishnu assim aparecerá no fim de Kali-Yuga, correspondendo ao fim do mundo esperado por nossos adventistas. "E de sua boca saía uma espada de dois gumes... e na sua cabeça estavam postos muitos diademas" (Apocalipse, XIX, 12, 15). Freqüentemente, Vishnu é representado com algumas coroas superpostas na suas cabeça. "E eu vi um anjo de pé no Sol" (17). O cavalo branco é o cavalo do Sol. Saoshyant, o salvador persa, também nasceu de uma virgem, e no fim dos dias virá como um redentor para regenerar o mundo, porém será precedido por dois profetas, que virão para anunciá-lo. Em conseqüência, os judeus que têm Moisés e Elias estão agora esperando pelo Messias. "Em seguida virá a ressurreição geral, quando os bons entrarão imediatamente nesta morada feliz - a terra regenerada; e Ahriman e seus anjos (os demônios), e os maus, serão purificados por imersão em um lago de metal derretido... Daí por diante, todos gozarão de felicidade imutável e, liderados por Saoshyant, para sempre cantarão louvores para o Sempiterno." O que acima é a perfeita repetição de Vishnu em seu décimo avatarâ, porque então ele arremessará os maus nas moradas infernais, nas quais, depois de se purificar, eles serão perdoados - mesmo aqueles demônios que se rebelaram contra Brahmâ, e foram violentamente derrubados no abismo sem fundo, por Shiva; como também os "abençoados" irão morar com os deuses, acima do Monte Meru. Orígenes sustentava firmemente que a doutrina do castigo eterno era errônea. Acreditava que no segundo advento de Cristo mesmo os demônios que figuravam entre os condenados seriam perdoados. A condenação eterna é uma invenção cristã posterior (Cf. Orígenes, De principüs, I, V, II, X; III, VI.
Tendo traçado desta maneira as semelhanças de visões no que diz respeito ao Logos, ao Metatron e ao Mediador, como são encontrados na Cabala e no Codex dos nazarenos cristãos e dos gnósticos, o leitor está preparado para apreciar a audácia do esquema patrístico ao reduzir a figura puramente metafísica em forma concreta e fazê-la aparecer como se o dedo da profecia tivesse sido apontado para Jesus, como o Messias por vir, desde tempos imemoriais. Um theomythos que pretende simbolizar o dia por vir, perto do encerramento do grande ciclo, quando as "boas novas" dos céus proclamarem a irmandade universal e a fé comum da Humanidade, o dia da regeneração - violentamente distorcido como se fosse um fato consumado. "Por que me chamaste de bem? não há nenhum bem, a não ser um, que é Deus," disse Jesus. É essa a linguagem de Deus? da segunda pessoa da Trindade, que é idêntica à Primeira? E se este Messias, ou Espírito Santo dos gnósticos e das trindades pagãs, vieram em sua pessoa, o que ele quis dizer com distinguir entre ele mesmo, o "Filho do Homem" e o Espírito Santo? "E quem quer que fale uma palavra contra o Filho do Homem, isso lhe será perdoado; mas àquele que blasfemar contra o Espírito Santo não será perdoado", diz ele. E como considerar a maravilhosa identidade dessa linguagem própria, com os preceitos enunciados, séculos atrás, pelos cabalistas e pelos iniciados "pagãos"? Dentre vários exemplos, selecionamos alguns. "Nenhum dos deuses, nem homem ou Senhor, pode ser bom, a não ser somente o próprio Deus", diz Hermes. "Ser um homem bom é impossível, apenas Deus possui esse privilégio", repete Platão, com uma ligeira modificação. Seis séculos antes de Cristo, o filósofo chinês Confúcio, disse que sua doutrina era simples e fácil de compreender (Lun Yü, cap. 5. inciso 15). Ao que um dos seus discípulos acrescentou: "A doutrina de nosso mestre consiste em ter sempre bondade no coração, e em fazer aos outros o que gostaríamos que eles nos fizessem". "Jesus de Nazaré, um homem aprovado por Deus entre vocês por seus milagres", exclamou Pedro, muito tempo depois da cena do Calvário. "Havia um homem enviado por Deus, cujo nome era João" diz o
quarto Evangelho, posicionando dessa forma (João) Batista em condições de igualdade com Jesus. João Batista num dos mais solenes atos de sua vida, o de batizar o Cristo, não pensa que vai batizar um Deus, porém usa a palavra homem. "Este é aquele de quem eu disse, depois de mim vem um homem." Falando de si mesmo, Jesus disse, "Ele busca matar-Me, um homem que lhes contou a verdade, que eu ouvi de Deus". Até mesmo o homem cego de Jerusalém, curado pelo grande taumaturgo, cheio de gratidão por seu benfeitor, ao narrar o milagre, não chama Jesus de Deus, mas diz simplesmente, "..... um homem que é chamado Jesus, fez o corpo". (João, IX, 11). Não encerramos a lista por falta de outros exemplos e provas, mas simplesmente porque o que dissemos agora já foi repetido e demonstrado por outros, muitas vezes e antes de nós. No entanto, não existe mal mais incurável que o fanatismo cego e irrazoável. Poucos são os homens que, como o Dr. Priestley, têm a coragem de escrever: "Nada encontramos parecido à divindade atribuída a Cristo antes de Justino, Mártir (A. D. 141), que, sendo um filósofo, transformou-se num cristão". O VERDADEIRO CRISTIANISMO ENCONTRADO NO BUDISMO, E EM OUTRAS RELIGIÕES PAGÃS. (L. 3 pág. 210). Maomé (nasceu em 571 d.C.) apareceu quase seiscentos anos depois do presumido deicídio (A denominação da morte que os judeus deram a Cristo). O mundo grego-romano ainda estava convulsionado por dissenções religiosas, resistindo a todos os editos imperiais do passado e ao Cristianismo compulsório. Enquanto o Concílio de Trento discutia a Vulgata, a unidade de Deus silenciosamente suplantou a Trindade, e logo os maometanos eram mais numerosos que os cristãos. Por que? Porque o seu profeta nunca procurou identificarse com Allah. De outro modo, se pode afirmar, com segurança, que ele nunca viveria para ver florescer a sua religião. Até os dias de hoje, o Maometanismo fez e ainda está fazendo mais prosélitos do que o Cristianismo. Buddha Siddhârtha veio como um simples mortal, séculos antes de Cristo. A ética religiosa de sua fé é presentemente encontrada, excedendo de longe em beleza moral, qualquer coisa jamais sonhada pelos tertulianos e pelos agostinianos. O verdadeiro espírito do Cristianismo pode ser encontrado totalmente apenas no Budismo; parcialmente, ele se revela em outras religiões “pagãs”. Buddha nunca fez de si mesmo um deus, nem foi endeusado por seus seguidores. Os budistas, no momento, são conhecidos por exceder em número os cristãos; eles são perto de 500.000.000. Enquanto isso, casos de conversão se tornaram raros entre os budistas, os bramanistas, os maometanos e os judeus, como para mostrar como são infrutíferas as tentativas dos nossos missionários; o ateísmo e o materialismo disseminam as suas úlceras gangrenosas e corroem mais profundamente, a cada dia, o próprio coração do Cristianismo. Não há ateus entre a população pagã, e aqueles poucos que existem entre os budistas e bramanistas, foram infectados pelo materialismo, e sempre podem ser encontrados nas grandes cidades densamente povoadas por europeus, e apenas entre as classes educadas. O Bispo Kidder, diz com muita veracidade: “se um homem sábio tivesse de escolher a sua religião a partir dos que a professam, talvez o Cristianismo fosse a sua última escolha”! Desde os primórdios do Cristianismo, quando Paulo reprovou a Igreja de Corinto pelo crime “como isso é chamado entre os gentios - de alguém poder possuir a mulher do seu pai”; e por fazer da “anta Ceia” um motivo de deboche e de beberagem (1 Corintos V, 1), a profissão do nome de Cristo tem sido muito mais um pretexto do que a prova do sentimento sagrado. Entretanto, a forma correta deste Verso é: “Onde quer que se ouça falar dessa prática lasciva como a que se vê entre as nações pagãs - a de possuir ou mesmo se casar com a mulher do seu pai”. A influência persa poderia ser indicada nesta forma de linguagem. A prática não existiu “em nenhum lugar entre as nações”, exceto na Pérsia, onde foi estimada como especialmente meritória. Daí, também, as histórias judias de Abraão casando-se com sua irmã, Nahor com sua sobrinha, Amram com a irmã do seu pai, e Judah com a viúva de seu irmão, cujos filhos parecem ter sido legitimados. As tribos arianas valorizavam casamentos endógamos, enquanto que os tártaros e todas as nações bárbaras exigiam que todas as uniões fossem exógamas. Havia apenas um apóstolo de Jesus, digno deste nome, e esse era Paulo. Entretanto, as suas Epístolas foram desvirtuadas por mãos dogmáticas antes de ser admitidas no Canon; a sua concepção da grande figura divina do filósofo que morreu por sua idéia ainda pode ser traçada em suas referências às várias nações Cristãs. Acontece apenas que quem quiser entendê-lo melhor ainda precisa estudar o Logos Philoneo, refletido de vez em quando no Sabda hindu (Logos) da escola Mîmânsâ. Quanto aos outros apóstolos, aqueles cujos nomes estão antepostos no Evangelho, nós não podemos acreditar muito em sua veracidade quando os vemos atribuindo ao seu Mestre milagres envolvidos por circunstâncias lembradas, se não nos mais velhos livros da Índia, ao menos naqueles antedatados ao Cristianismo, e na própria fraseologia das tradições. Quem, em seus dias de simples e cega credulidade, não
se maravilhou com a comovente história dada no Evangelho segundo Marcos e Lucas da ressurreição da filha de Jairo? Quem alguma vez duvidou de sua originalidade? E, ainda assim, a história é inteiramente copiada do Harivansa, e é lembrada entre os milagres atribuídos a Krishna. Nós traduzimos da versão francesa: “O Rei Angashuma contratou os esponsais de sua filha, a bela Kalâvatî, com o jovem filho de Vâmadeva, o poderoso Rei de Antavedi, chamado Govinda, a ser celebrado com grande pompa. “Mas quando Kalâvati estava se divertindo nos arvoredos com as suas amigas, ela foi picada por uma serpente e morreu. Angashuma dilacerou as suas roupas, cobriu-se de cinzas, e amaldiçoou o dia em que nasceu. “De repente, um grande rumor se espalhou através do palácio, e os seguintes gritos eram ouvidos, repetidos mil vezes: ‘Pasya pitaram; pasya gurum!’ ‘Vejam o Pai! Vejam o mestre! Então Krishna se aproximou, sorrindo, apoiando-se no braço de Arjuna... ‘Mestre!’ gritou Angashuna, arremessando-se aos seus pés, inundando-os com as suas lágrimas: ‘Veja minha pobre filha!’ e ele mostrou-lhe o corpo de Kalâvatî, estendido sobre uma esteira... “‘Por que se lamenta?’ replicou Krishna, com voz gentil. ‘Não vê que ela está dormindo? Ouça o som de sua respiração, semelhante ao do vento noturno que estremece as folhas das árvores. Veja, as suas faces ficando coradas, os seus olhos, cujos cílios tremulam como se estivesse para abrir os olhos; os seus lábios palpitam como para falar; ela está dormindo , estou lhe dizendo; e segure! veja, ela se move Kalâvatî! levante-se e ande!’ “Mal Krishna tinha falado, quando a respiração, o calor, o movimento e a vida retornaram pouco a pouco ao cadáver, e a pequena menina, obedecendo à ordem do semideus, levantou-se de sua esteira, juntando-se às companheiras. No entanto, a multidão maravilhada gritou: ‘Este é um Deus, uma vez que a morte para ele não mais que um sono’. Todas essas parábolas são reforçadas pelos cristãos, como a adição de dogmas que, por seu caráter extraordinário, deixaram bem para trás as concepções selvagens do Paganismo. Os cristãos, a fim de acreditar numa divindade, acharam necessário matar o seu Deus, para que eles mesmo vivessem! E agora, o Supremo, o desconhecido, o Pai da Graça e da Misericórdia e sua hierarquia celestial são manipulados pela Igreja como se fossem uns tantos astros teatrais e extras assalariados! eis séculos antes da era cristã, Xenófanes divulgou esse antropomorfismo, numa sátira imortal, relembrada e preservada por Clemente da Alexandria: “Há um Deus Supremo acima de todos os deuses, mais divino que os mortais, Cuja forma não é parecida com a dos homens, como também não é semelhante a sua natureza; Mas os fúteis mortais imaginaram que como eles mesmos, os deuses são procriados Com sensações humanas, com voz e membros corpóreos; Dessa forma, se os bois ou os leões tivessem mãos e pudessem trabalhar à moda dos homens, E pudessem esculpir com cinzel ou pintar a sua concepção da divindade Então os cavalos retratariam os deuses como cavalos, os bois os representariam como bois, Cada tipo de animal representa o Divino, com a sua forma e dotado com a sua natureza”.
E ouçam Vyâsa - o poeta panteísta da Índia que, como todos os cientistas podem provar, pode ter vivido, como Jacolliot, bem uns cinqüenta mil anos atrás - discursando sobre Mâyâ, a ilusão dos sentidos: O CULTO AS DIVINDADES. (L. 3. Pág. 212). Todos os dogmas religiosos servem para ofuscar a razão humana. ... O culto às divindades, sob as alegorias em que está escondido o respeito às leis naturais, afasta a verdade, em benefício das superstições mais desprezíveis" (Vyâsa-Maya) (Vyâsa - Literalmente "aquele que desenvolve ou amplia", um revelador, porque o que ele explica, interpreta e amplia é um mistério para o profano. Mâyâ - Ilusão. O poder cósmico que torna possível a existência fenomenal e as percepções da mesma.)
Deve-se à cristandade, a pintura de Deus Poderoso segundo o modelo da abstração cabalista do "Ancião dos Dias". De antigos afrescos dos tetos das catedrais, de missais católicos, e de outros ícones e imagens, agora nós o encontramos representado pelo pincel poético de Gustave Doré. A Sua respeitável e desconhecida majestade, que nenhum pagão ousou reproduzir de forma concreta, figura na Bíblia Ilustrada de Doré, pertencente ao nosso século. Pisando nas nuvens que flutuam no meio do ar, atrás dele as trevas e o caos e o mundo sob os seus pés, um majestoso homem idoso está de pé, sua mão esquerda segurando suas roupas flutuantes em volta do corpo, a sua mão direita erguida num gesto de comando. Ele disse a Palavra, e de sua pessoa altamente emanava uma eflugência de Luz - O Shekinah. Como uma concepção poética, a obra honra o artista, mas valorizará ela a Deus? Melhor o caos atrás Dele, do que a Sua figura; pois no caos, ao menos, temos um mistério solene. De nossa parte, preferimos o silêncio dos antigos pagãos.
No seu imoderado desejo de encontrar provas da autenticidade do Novo Testamento, os melhores homens, os mais eruditos estudiosos, até mesmo entre os protestantes divinos, freqüentemente caíram em deploráveis armadilhas. Não podemos acreditar que tão culto comentarista como Cônego Westsott, poderia ter-se mantido na ignorância dos escritos cabalísticos e talmudístico. Como então, o vemos citando, com serena certeza, apresentando "as notáveis semelhanças com o Evangelho de São João", das passagens da obra O Cordeiro de Hermes, que são máximas completas da literatura cabalística? "A visão que Hermes dá da natureza e do trabalho de Cristo não é menos harmoniosa que a doutrina apostólica, e ela oferece notáveis analogias como o Evangelho de São João... Ele (Jesus) está uma pedra mais alto que as montanhas, capaz de manter o mundo inteiro, secular, e ainda tendo um portão novo!... Ele é mais velho que a criação, assim ele pode aconselhar-se com o Pai sobre a criação que ele fez... Ninguém pode chegar até ele a não ser através do seu Filho". "Deus", diz Hermes, "plantou um vinhedo, isto é, Ele criou os povos e lhes deu Seu Filho; e o Filho. ... ele mesmo redimiu os seus pecados, etc."; isto é, o Filho lavou-os em sangue, e comemorando isto, os cristãos bebem vinho em sua comunhão. Na Cabala revela-se que o Ancião dos Anciães ou o "Face Longa" plantou um vinhedo, significando o último a Humanidade; e a vinha simbolizando a Vida. O Espírito do "Rei Messias" é, portanto, mostrado lavando as suas vestes no vinho que vem de cima, da criação do mundo. Adão, ou A-dão é "sangue". A vida da carne está no sangue (nephesh-alma). E Adão-Cadmo é o Único-Criado. Noah também plantou um vinhedo, o viveiro alegórico da futura Humanidade. Como uma conseqüência da adoção da mesma alegoria, nós a encontramos no Codex nazareno. Sete vinhas são procriadas, que surgem de Kabar-Ziwa, e Ferho (ou Parcha) Raba as rega. Quando os abençoados subirem entre as criaturas de Luz, eles verão Kabar-Ziwa, Senho da Vida, e a Primeira VINHA! Essa metáfora cabalísticas são, dessa forma, repetidas naturalmente no Evangelho segundo São João (XV, 1); "Eu sou a verdadeira videira, e o meu Pai é o agricultor." No Gênese (XLIX, 10-1), o moribundo Jacó é levado a dizer: "Não se tirará o cetro de Judah [os filhotes de leão], nem general que proceda de sua coxa, até que venha Shiloh... Amarrando à vinha, o seu jumento e o chicote do seu jumento na vinha escolhida; ele lavou as suas vestes no vinho, e o seu manto no sangue das uvas". Shiloh é o "Rei Messias" assim como o Shiloh de Efraim, que se tornou a sede e o lugar do santuário. No Targum de Onkelos, o babilônio, lê-se as palavras de Jacó: "Até que venha o Rei Messias". A profecia falhou, tanto no sentido cristão, como no judaico-cabalista. O cetro partiu de Judah, quer o Messias há tenha vindo ou esteja por vir, a menos que acreditemos, como os cabalistas, que Moisés foi o primeiro Messias, que transferiu a sua alma para Joshua - Jesus. (Devemos lembrar ao leitor, a esse propósito, que Josué e Jesus são um único e mesmo nome. Nas Bíblias eslavas Josué lê-se - Iessus (ou Jesus) Navin.)
Hermes diz: "E, no meio da planície ele me mostrou uma grande pedra branca que aparecera na planície, e a rocha era mais alta que as montanhas, retangular de forma a poder sustentar o mundo inteiro; mas aquela rocha era velha, tendo um portão esculpido nela, e a escultura do portão me parecia recente". No Zoar, nós encontramos: "Para 40.000 mundos superiores o branco do crânio de Sua Cabaça (do mais Sagrado Ancestral in abscondito) se estende... Quando Zeir [a primeira reflexão e imagem do seu Pai, o Secular dos Seculares] abrir, através do mistério dos setenta nomes de Metratron, descendo em Yetzîrah (o terceiro mundo), um novo portão... o Spiritus Decisorius cortará e dividirá as vestes (Shekinah) em duas partes... Na vinda do Rei Messias, da sagrada pedra cúbica do Templo uma luz branca surgirá durante quarenta dias. Essa se expandirá, até encerrar o mundo inteiro... Nessa ocasião o Rei Messias permitirá a sua revelação e será visto saindo do portão do jardim de Odan [Éden]. Ele será revelado no país de Galil. Quando os pecados de Israel forem expiados, ele levará o povo através do novo portão para o lugar do julgamento. "No Portão da Casa da Vida, o trono está preparado para o Senhor do Esplendor." E, "Esta pedra e este portão são o Filho de Deus. `Como, Senhor', eu disse, à pedra é velha e o portão é novo?' Ouça', Ele disse, `e entenda, ó homem ignorante. O Filho de Deus é mais velho que toda a Sua criação, assim, foi o conselheiro do Pai em Sua obra de criação; e por isso ele é velho'". Ora, essas duas afirmativas não são apenas puramente cabalísticas, sem nem mesmo uma mudança de expressão, mas são igualmente bramânicas e pagãs. "Vidi virum excellentem, coeli terraeque conditore natu majorem. ... Eu vi o mais excelente (superior) HOMEM, que é mais velho por nascimento que o criador do céu e da Terra", diz o Codex cabalista. O Dionísio Eleusiano, cujo nome particular era Iacchos (Iaccho, Iahoh) - o Deus de quem se esperava a liberação das almas - era considerado mais velho que o Demiurgo. Nos mistérios de Anthesteria e Limnae (os lagos), depois do costumeiro batismo pela purificação com água... os Mystae eram induzidos a passar através de outra porta (portão), um portão específico para esse propósito, que era chamado de "portão de Dionísio" e "portão dos purificados". No Zohar, conta-se aos cabalistas que o mestre de obras, o Demiurgo, disse ao Senhor: "Deixe-nos fazer o homem à Sua imagem". Nos textos originais do primeiro capítulo do Gênese, está: "E o Elohim
(traduzido como o Supremo Deus), que era o mais elevado dos deuses e dos poderes, disse: Deixe-nos fazer o homem à nossa (?) imagem, segundo a nossa semelhança". Nos Vedas, Brahmâ se aconselhou com Parabrahman, sobre o melhor modo de criar o mundo. Citando Hermes, Cônego Westcott, mostra-o perguntando: "e por que o portão é novo, Senhor?" eu disse. Ele respondeu: "porque ele foi manifestado no último dia da Providência; por essa razão o portão novo foi feito, a fim de que, os que forem salvos, possam entrar no reino de Deus". Neste trecho há duas particularidades dignas de nota. Para começar, ele atribui ao "Senhor" uma afirmação falsa, do mesmo caráter daquela enfatizada pelo apóstolo João e que trouxe, num período posterior, tantas disputas inconvenientes à totalidade dos ortodoxos cristão, que aceitavam literalmente as alegorias apostólicas. Como o Messias, Jesus não foi manifestado no último dos dias; pois o último estava ainda por chegar, contrariando um grande número de profecias divinamente inspiradas, seguidas consequentemente de esperanças frustradas, do testemunho de sua vinda imediata. A crença de que os "últimos dias" viessem, era natural, uma vez que a vinda do Messias fosse conhecida. A segunda peculiaridade é encontrada no fato de que a profecia não poderia ser aceita, pois mesmo em sua determinação aproximada ela constitui uma contradição direta de Marcos, que fez com que Jesus atestasse distintamente que nem os anjos, nem o próprio Filho, conheciam tal dia e tal hora. A isso podemos aduzir, que como a crença inegavelmente se originou com o Apocalipse, isso deveria ser uma prova evidente por si mesma, de que isso pertence aos cálculos peculiares dos cabalistas e dos santuários pagãos. Foi o cômputo secreto de um ciclo, que, de acordo como o seu cálculo, deveria se encerrar na parte final do primeiro século. Também deve ser aceito como prova concludente, o fato de que o Evangelho segundo São Marcos, bem como o atribuído a João, e o Apocalipse, foram escritos por homens, nenhum dos quais estava bastante familiarizado com o outro. Primeiramente, o Logos foi definido definitivamente como petra (rocha) por Fílon; a palavra, além disso, como mostraremos em outro lugar do livro, significa na língua dos caldeus e dos fenícios "intérprete". Justino, o Mártir, o chama em suas obras de "anjo" e faz uma nítida distinção entre o Logos e o Criador. "A Palavra de Deus é Seus Filho... e ele também é chamado Anjo e Apóstolo, pois declara tudo o que devemos saber (interpretar), e é enviado para declarar tudo o que está à vista." "Aedan Inferior é distribuído em seus próprios caminhos, em trinta e duas margens de caminhos, embora ainda não sejam conhecidas de ninguém exceto de Zeis. Mas ninguém conhece o AEDAN SUPERIOR nem Seus caminhos, exceto o Face Longa" - o Deus Supremo. Zeir é o gênio nazareno que é chamado Hibil-Ziwa, e Gabriel Legatus - também de "apóstolo Gabriel". Os Nazarenos sustentavam, aos lado dos cabalistas, que mesmo o Messias que tinha de vir não conhecia o "Aedar Superior", a Divindade oculta; ninguém a conhecia exceto o Deus Supremo. Dessa forma, mostrou que acima da Suprema Divindade Inteligível, há uma ainda mais secreta e não revelada. Zeir-Anpîn é o terceiro Deus, enquanto o "Logos", segundo Fílon, o Judeu, é o segundo. Isso é revelado nitidamente no Codex. "O falso Messias dirá: Eu sou Deus, filho de Deus, meu Pai me enviou para cá. Eu sou o primeiro Legate, eu sou Hibil-Ziwa, eu vim do alto! Mas desconfie dele; pois ele não será Hibil-Ziwa, Hibil-Ziwa não permitirá que o vejam nesta era." Daí o fato da crença de muitos gnósticos, de que não foi Hibil-Ziwa (o Arcanjo Gabriel) quem "ofuscou" Maria, porém Ialdabaôth (o criador do mundo), que formou o "corpo material de Jesus; Cristo se uniu a essa corpo, apenas na hora do batismo, no rio Jordão. Podemos duvidar da afirmação de Nork, segundo a qual "o Berêshîth Rabbah, a parte mais antiga do Midrah Rabboth, era conhecido dos padres da Igreja numa tradução grega"? Mas se, por um lado, eles estavam suficientemente familiarizados com os diferentes sistemas religiosos de seus vizinhos a ponto de erigirem uma nova religião que se pretendia ser distinta de todas as outras, sua ignorância do Velho Testamento, deixando de lado a questão mais complicada da metafísica grega, parece-nos hoje deplorável. "Assim, por exemplo, em Mateus, XXVII, 9 e s., a passagem oriunda de Zacarisas, XI, 12, 13, é atribuída a Jeremias", diz o autor de Supernatural Religion. "Em Marcos I, 2, uma citação de Malaquias, III, 1, é atribuída a Isaías. Em I Coríntios, II, 9, uma passagem citada como Escritura Sagrada não se encontra no Velho Testamento, sendo tomada, como afirmam Orígenes e Jerônimo, de uma obra apócrifa, A Revelação de Elias, sendo esta passagem de igual modo citada pela chamada Primeira Epístola de Clemente aos Coríntios (XVI, 8)," Quando se pode confiar nos piedoso padres em suas explicações de diversas heresias podemos ilustrá-lo no caso de Epifânio, que tomou erroneamente a Tétrada sagrada de Pitágoras, chamada na Gnose valentiana de Kol-Arbas, por um chefe herético. O que devemos pensar das fraudes involuntárias e das falsificações deliberadas dos ensinamentos daqueles cujas concepções diferiram das deles; a canonização da Aura Placida (brisa gentil) mitológica; no par das mártires cristãs Santa Aura e Santa Plácida; a deificação de uma lança e de uma capa, sob os nomes de São Longinus e Santo Amphibolus; e as citações dos profetas, que não se acham em nenhum profeta; e poderíamos muito bem
perguntar se a chamada religião de Cristo jamais foi outra coisa que não um delírio incoerente, desde a morte do Grande Mestre. Tão maliciosos eram os santos padres em sua tenaz perseguição às pretensas "heresias", que os veremos contar, sem hesitação, as inverdades mais flagrantes, e inventar narrativas inteiras, no propósito de convencer os ignorantes com argumentos que de outro modo careceriam de qualquer base. Se o erro em relação à Tétrada teve origem, de início, como simples conseqüência de uma fraude não premeditada de Hipólito, as explicações de Epifânio e outros que caíram no mesmo erro absurdo têm uma aspeto mais inocente. Quando Hipólito denuncia gravemente a grande heresia da Tétrada, Kol-Arbas, e afirma que o imaginário chefe gnóstico é "Colarbasus, que tenta explicar a religião por medidas e números", podemos simplesmente rir. Mas quando Epifânio, com abundante indignação, elabora sobre o tema "que é a Heresia XV", e, pretendendo estar perfeitamente a par do assunto, acrescenta que "um certo Heracleon segue os passos de Colarbasus, o que é a Heresia XVI", então à acusação de fraude deliberada. Se esse zeloso Cristão pode se vangloriar sem rubor de ter "feito exilar, graças à sua informação, setenta mulheres, mesmo de alta estirpe, por meio das seduções de almas que ele havia conseguido convencer a participar de sua seita", ele nos fornece boas razões para condená-lo. Assinala C. W. King, muito habilmente, a esse respeito, que "podemos suspeitar que esse digno renegado se salvou nesse caso do destino de seus companheiros de religião denunciando seus cúmplices, na abertura da perseguição". E assim, um após outro, pereceram os gnósticos, únicos herdeiros dos poucos restos da verdade não adulterada do Cristianismo primitivo. Tudo era confusão e desordem nesses primeiros séculos, até o momento em que todos esses dogmas contraditórios foram finalmente impingidos ao mundo cristão, e a discussão foi proibida. Por vários séculos, tornou-se um sacrilégio, punível com severas penalidades, e mesmo com a morte, procurar compreender aquilo que a Igreja havia tão convenientemente elevado ao nível de mistério divino. Mas como os cristãos bíblicos se havia devotado a "pôr a casa em ordem", os papéis foram invertidos. Os crentes pagãos acorrem agora de todas as partes do globo para reclamar o seu quinhão, e a Teologia cristã começa a ser suspeita de bancarrota. Tal é o triste resultado do fanatismo das seitas "ortodoxas", que, para emprestar uma expressão do autor de The History of the Decline and Fall of teh Roman Empire, jamais foram, como as gnósticas, "as mais polidas, as mais sábias e as mais dignas do nome cristão". E, se nem todos "sentissem o cheiro do alho", como Renan o disse, nenhum desses santos cristãos, por outro lado, jamais teria hesitado em derramar o sangue de seus vizinhos, se as concepções destes últimos não estivessem de acordo com as suas. E assim todos os nossos filósofos foram arrastados pelas massas ignorantes e supersticiosas. Os filaleteus, os amantes da verdade, e sua escola eclética pereceram; e lá, onde a jovem Hipatia ensinava as doutrinas filosóficas superiores' e lá, onde Amônio Saccas explicara que "tudo o que Cristo tinha em mente era reinstalar e restaurar em sua primitiva integridade a sabedoria dos antigos - de pôr um limite ao domínio predominante da superstição (...) e exterminar os vásios erros que haviam se enraizado nas diferentes religiões populares". Não mais os preceitos saídos da boca do "filósofo instruído em Deus", mas outros expostos pela encarnação de uma superstição cruel e diabólica. "Se teu pai" - escreve São Jerônimo - "se deita em tua porta, se tua mãe descobre a teu olhos e seio que te nutriu, esmaga o corpo sem vida de teu pai, esmaga o seio de tua mãe, e, com os olhos secos, refugia-te no Senhor que te chama"!! Essa sentença é igualada, se não superada, por esta outra, pronunciada num espírito semelhante. Ela emana de outro pai da Igreja primitiva, o eloqüente Tertuliano, que espera ver todos os "filósofos" no fogo infernal do Gehena. "Como seria magnífica essa cena! (...) como eu riria! Como eu regozijaria! Como eu triunfaria ao ver tantos reis ilustres que passam por ter subido ao céu gemendo com Júpiter, seu deus, nas trevas inferiores do inferno! Queimariam então os soldados que perseguiram o nome de Cristo num fogo mais cruel do que aquele que acenderam para os santos!" Essas expressões sanguinárias ilustram o espírito do Cristianismo até o presente. Mas ilustram elas os ensinamentos de Cristo? De modo algum. Como diz Éliphas Lévi: "O Deus em nome do qual esmagaríamos o seio de nossa mãe, nós o veremos no futuro, um inferno largamente aberto a seu pés, e uma espada exterminadora em suas mãos (...) Moloch queimava as crianças por apenas uns poucos segundos; estava reservado aos discípulos de um deus que se pretendia ter morrido para redimir a Humanidade na cruz, criar um novo Moloch cuja pira é eterna!" ******** ***
CAPÍTULO VI AS DOUTRINAS ESOTÉRICAS DO BUDISMO PARODIADAS NO CRISTIANISMO AS DECISÕES DO CONCILIO DE NICEIA. (L. 3. pág. 223). Nicéia I, Concílio de. Primeiro dos encontros ecumênicos do cristianismo, convocado pelo imperador Constantino e realizado em 325, na cidade de Nicéia, hoje Iznik, na Turquia. Condenou o arianismo e promulgou o credo conhecido como Símbolo de Nicéia. ©Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações Ltda. Heresia Disputas cristológicas entre Oriente e Ocidente. O reconhecimento do cristianismo com o Edito de Milão e sua posterior conversão em religião oficial do Império Romano fizeram da igreja um centro de lutas políticas, especialmente entre Oriente e Ocidente. A primeira ocasião de controvérsia surgiu com a doutrina de Ário, sacerdote que, de sua comunidade em Alexandria, negava a natureza divina de Jesus Cristo. O imperador Constantino convocou o primeiro concílio ecumênico em Nicéia, no ano 325, e sugeriu a expressão "o Filho é consubstancial ao Pai". Sufocado militarmente, o arianismo difundiuse entre os povos germânicos mas, na Espanha visigoda, chegou a perdurar como doutrina oficial até o ano 589. Durante o século V, de fato, o problema de como conciliar a natureza divina com a humana na pessoa de Cristo dividiu as duas grandes escolas teológicas. A de Antioquia, mais racionalista e realista, insistiu no aspecto humano; a de Alexandria, propensa à especulação mística, no lado divino. A disputa entre Antioquia e Alexandria sofreu a interferência das flutuações do patriarcado de Constantinopla e do imperador, que temia a fragmentação do império. Na linha da escola de Antioquia, Nestório defendeu com tal ênfase a tese das duas naturezas de Cristo que o apresentou como duas pessoas, de onde se deduz que Maria não era mãe de Deus (theotokos). Essa doutrina foi condenada pelo Concílio de Éfeso (431). Entre os séculos V e VIII a escola de Alexandria, que impusera suas teses em Éfeso, acentuou sua posição até o ponto de defender que em Cristo só havia uma natureza, a divina (monofisistas), ou uma vontade (monoteletas). Essas doutrinas foram condenadas nos concílios de Calcedônia (451) e Latrão (649). ©Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações Ltda. Nicéia II, Concílio de. Sétimo concílio ecumênico das igrejas cristãs, realizado em 787 na antiga cidade de Nicéia, atualmente Iznik, na Turquia. Convocado para resolver a Controvérsia Iconoclasta, iniciada em 726, disciplinou o sentido da veneração das imagens. ©Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações Ltda.
Não devemos nos esquecer de que a Igreja cristã deve os seus Evangelhos canônicos atuais e, por conseguinte, todo o seu dogmatismo religiosos, ao Sortes Sanctorum. Incapaz de se pôr em acordo sobre quais eram os mais inspirados divinamente, dentre os numerosos Evangelhos existentes à sua época, o misterioso Concílio de Nicéia resolveu deixar à intervenção miraculosa da decisão sobre essa questão embaraçante. Esse Concílio de Nicéia pode muito bem ser chamado de misterioso. Havia mistério, em primeiro lugar, no número místico dos seus 318 bispos, a que Barnabé (Epístola de Barnabé, VIII, 11-3; ed. por Hone, Londres, 1820.) deu muita importância; além disso, não há concordância entre os escritores antigos quanto à época e ao local de realização dessa reunião, nem mesmo sobre quem seria o bispo que a presidiu.(Mosheim, An Eccl. Hist., cent. IV, parte II, cap. V, inciso 12.)
Não obstante o grandiloqüente elogio de Constantino (Socrates Scholasticus, Eccl. Hist., I, IX.), Sabino, o Bispo de Heracléia, afirma que, "exceto Constantino, o imperador, e Eusébio Panfílio, esses bispos eram um conjunto de criaturas iletradas, simples, que não compreendiam coisa alguma" (Ibid., I, VIII.) - o que equivale a dizer que eram um bando de imbecis. Essa era aparentemente a opinião de Papus, que nos conta do pouco de magia executada para saber quais eram os Evangelhos verdadeiros. No seu Synodicon desse Concílio, Papus diz [que], tendo "posto promiscuamente todos os livros apresentados à escolha do Concílio sob a mesa da comunhão de um igreja, eles [os bispos] pediram ao Senhor que os escritos inspirados fossem deixados sobre a mesa, ao passo que os espúrios ficassem sob ela - e isso realmente aconteceu" (Fabrício, Bibl. graeca, livro VI. cap. III, 34, "Synodus Nicaena"). Mas ninguém nos diz quem ficou com as chaves da câmara conciliaria durante aquela noite! Com base na autoridade das testemunhas eclesiásticas, portanto, tomamos a liberdade de dizer que o mundo cristão deve sua "Palavra de Deus" a um processo adivinhatório, pelo qual a Igreja, em seguida, condenou vítimas infelizes como conjuradores, encantadores, mágicos, feiticeiros e vaticinadores e os queimou aos milhares! Falando desse fenômeno verdadeiramente divino da escolha dos manuscritos, os padres da Igreja dizem que o próprio Deus preside as Sortes. Agostinho confessa que ele próprio usou essa
espécie de adivinhação. Mas as opiniões, como também as religiões reveladas, estão aptas a se modificarem. Aquele que por quase mil e quinhentos anos foi imposto à cristandade como um livro em que toda e qualquer palavra foi escrita sob a supervisão direta do Espírito Santo e onde nenhuma sílaba, nenhuma vírgula, poderia ser modificada sem o cometimento de um sacrilégio - esse livro está agora sendo retratado, revisado, corrigido e tosquiado em versículos inteiros, em alguns casos em capítulos inteiros. E, assim, tão logo uma nova edição venha a lume, seus doutores o aceitarão como uma nova "Revelação" do século XIX, sob o risco de serem considerados infleis. Assim, vemos que, tanto no interior quanto no exterior dos seus recintos, a Igreja infalível deve ser acreditada mais do que seria razoavelmente conveniente. Os ancestrais dos nossos teólogos modernos encontraram justificativa para as Sortes no versículo que diz que "A sorte é lançada, mas toda decisão vem do Senhor" (Provérbios, XVI, 33. No Egito Antigo e na Grécia, bem como entre os israelitas, varetas e bolas chamadas "sortes adivinhatórias sagradas" eram usadas para essa espécie de oráculos nos templos. O sacerdote interpretava o desejo do deus segundo as figuras pela justaposição acidental dessas sortes.), e agora os seus herdeiros diretos afirmam que "o Diabo
é quem decide”. OS SÍMBOLOS DA CRUZ E DO PEIXE. (L. 3. pág. 225). De acordo com King e com outros numismatas e arqueólogos, a cruz foi colocada naquele lugar como um símbolo da vida eterna. Como um Tao, ou cruz egípcia, era utilizada nos mistérios báquicos e eleusinos. Símbolos do duplo poder gerador, era colocada sobre o peito do iniciado, após o cumprimento do seu "novo nascimento", e depois que os mystai retornassem do seu batismo no mar. Era um sinal místico de que seu nascimento espiritual se regenerara e unira sua alma astral com seu espírito divino e de que ele estava pronto para ascender em espírito às moradas bem-aventuradas da luz e da glória - as Eleusinia.(Os Mistérios a ELESIANOS, remonta ao ano de 1.800 .C., e segundo Epifânio, era praticado nos dias de Inaco.) O Tao era um talismã mágico, ao mesmo tempo que um emblema religioso. Foi adotado pelo cristãos através dos gnósticos e dos cabalistas, que o usaram corretamente, como suas jóias testemunham, e que tinham o Tao (ou cruz ansata) dos egípcios e a cruz latina dos missionários budistas que a haviam trazido da índia (onde ela ainda pode ser encontrada) dois ou três séculos a.C. Os assírios, os egípcios, os americanos antigos, os hindus e os romanos possuíam-na com várias, mas muito pequenas modificações de forma. Até uma época muito avançada na Idade Média, foi considerada um encanto poderoso contra a epilepsia e a possessão demoníaca; e o "signo de Deus vivo", trazidos na visão de São João pelo anjo que vinha do Este "para marcar os servidores de nosso Deus em suas testas", era o mesmo Tao místico - a cruz egípcia. No vitral de Saint-Dénis (França), esse anjo está representado marcando com esse sinal a fronte do eleito; a legenda diz: SIGNUM TAY. King, o autor de Gnostics, lembra-nos nesse livro que "essa marca é geralmente trazida por Santo Antônio, um recluso egípcio". O verdadeiro significado do Tao nos é dado pelo São João cristão, pelo Hermes egípcio e pelos brâmanes hindus. É evidente que, para o apóstolo, pelo menos, ele significava o "nome Inefável", como ele denomina esse "sinal do Deus vivo" poucos capítulos adiante, o "nome do Pai escrito em suas frontes". O Brahmâtma, o chefe dos iniciados hindus, possuía sobre a cobertura da sua cabeça suas chaves cruzadas, símbolo do mistério da vida e da morte; e, em alguns pagodes budistas da Tartaria e da Mongólia, a entrada de uma câmara no templo, que geralmente continha a escada que leva ao dagoba interior (Dagoba é um pequeno templo de forma globular em que são preservadas as relíquias de Gautama.), e os pórticos de alguns prachidas (Os prachidas são construções de todas as formas e dimensões, como os nossos mausoléus, e são consagrados a oferendas votivas aos mortos.) estão ornamentados com uma cruz formada de dois peixes, que se encontra também em alguns zodíacos budistas. Não nos espantaríamos em saber que o emblema sagrado dos túmulos das catacumbas, em Roma, a vesica piscis, deriva desse mesmo signo zodiacal budista. É fácil formar uma idéia do quanto essa figura geométrica se difundiu nos símbolos mundiais pelo fato de que há uma tradição maçônica segundo a qual o templo de Salomão foi construído sobre três fundações que formavam o "Tao triplo", o três cruzes. No seu sentido místico, a cruz egípcia deve a sua origem, como emblema, à compreensão, pela filosofia primitiva, de um dualismo andrógino de toda manifestação da natureza, que procede do ideal abstrato de uma divindade igualmente andrógina, ao passo que o emblema cristão é um simples efeito do acaso. Se a lei mosaica tivesse prevalecido, Jesus teria sido apedrejado (Os registros talmúdicos afirmam que, após ter sido enforcado, ele foi apedrejado e sepultado sob a água, na junção de dois rios. Mishnah Sanhedrin, VI, 4; Talmude da Babilônia, mesma cláusula, 48a, 67a [citado por E. Renan]). O crucifixo era um instrumento de tortura e tão comum entre os romanos, quanto desconhecido das nações semíticas. Era chamado "Árvore da Infância". Só mais tarde é que ele foi adotado como símbolo cristão; mas, durante as duas primeiras décadas, os apóstolos olhavam para ele com horror. Não é certo que João tivesse em mente a cruz cristã quando falava
do "sinal do Deus vivo", mas o Tao místico - o Tetragrammaton, ou nome poderoso, que, nos talismãs cabalísticos mais antigos, era representado pelas quatro letras hebraicas que compõem a Palavra Sagrada. (N. C. - Tetragrammaton - “Quando, no princípio, o seu Pai \ ..., o Inconcebível, o Sem-Existência e em Sexo \ o Ain-Soph cabalístico \, desejou que o seu Inefável \ o Primeiro Logos ou Æon \ nascesse, e que o seu Invisível se revestisse de uma forma, sua boca se abriu e pronunciou o Verbo, semelhante a Ele mesmo. Este Verbo (Logos), como permanecesse próximo, manifestou-se sob a forma do Uno Invisível, demostrando assim o que era. O Nome \ Inefável \ foi articulado \ por meio do Verbo \ da seguinte maneira. Ele \ o Supremo Logos \ pronunciou a primeira Palavra de seu Nome... que era uma combinação \ sílaba \ de quatro elementos \ letras \. Depois foi acrescentada a segunda combinação, também composta de quatro elementos. Em seguida, a terceira de dez elementos, que foi sucedida pela quarta, com doze elementos. A pronúncia de todo o nome compreende, portanto trinta elementos e quatro combinações. Cada elemento tem suas próprias letras, seu caráter, pronúncia, agrupamento e semelhanças peculiares; mas nenhum deles percebe a forma daquilo de que é o elemento, nem entende a voz do seu vizinho ; contudo, o som que cada um emite diz tudo \ o possível \ quando ele julga ser bom chamar ao todo... E são estes sons que manifestam na forma de Æon Sem Existência e Não-Gerável; e são estas formas que se chamamos Anjos que perpetuamente contemplam a Face do Pai \ o Logos, o “Segundo Deus”, que permanece próximo a Deus, o “Inconcebível”, segundo Filon \”. do Libro A Doutrina Secreta de H. P. B.Volume II.)
Sabe-se que os emblemas cristãos mais antigos - antes da representação da aparência corporal de Jesus - foram o Carneiro, o Bom Pastor e o Peixe. A origem deste último emblema, que tanto embaraçou os arqueólogos, torna-se, assim, compreensível. Todo o segredo repousa no fato, facilmente perceptível, de que, ao passo que na Cabala o Rei Messias é chamado de "Intérprete ou Revelador do Mistério e mostrado como a quinta emanação, no Talmude - por razões que explicaremos agora -, o Messias é muito freqüentemente designado como "DAG" ou Peixe. Trata-se de uma herança dos caldeus e tem relação - como o próprio nome indica - com o Dagon babilônio, o homem-peixe, que foi o instrutor e o intérprete do povo, a quem ele apareceu. Abarbanel explica o nome, dizendo que o sinal de sua vinda (do Messias) "é a conjunção de Saturno e Júpiter no signo de Pisces". Em conseqüência, na medida em que os cristãos queriam a todo preço identificar o seu Cristos com o Messias do Velho Testamento, eles o adotaram tão prontamente, que se esqueceram de que a sua verdadeira origem datava de uma época bastante anterior ao Dagon babilônico. Para termos uma idéia da extensão em que os cristãos primitivos confundiam o ideal de Jesus com qualquer dogma cabalístico, basta consultar a linguagem com que Clemente de Alexandria se dirigiu a seus irmãos em religião. Quando debatiam sobre a escolha do símbolo mais apropriado para lhes lembrar Jesus, Clemente os advertiu com as seguintes palavras: "Gravai sobre a gema do vosso anel uma pomba, ou um barco empurrado pelo vento [o Argha], ou um peixe". Estava o bom padre, ao escrever essa sentença, obsedado pela lembrança de Josué, filho de Nun (chamado Jesus nas versões gregas e eslava); ou havia ele esquecido a interpretação real desses símbolos pagãos? Josué, filho de, ou Nave (Navis), poderia com absoluta propriedade adotar a imagem de um barco, ou mesmo a de um peixe, pois Josué significa Jesus, filho de deus-peixe; mas era realmente muito arriscado conectar os emblemas de Vênus, de Astartê e de todas as deusas hindus - o argha, a pomba e o peixe - com o nascimento "imaculado" de seu deus! Parece que nos primeiros dias do Cristianismo existia uma diferença muito pequena entre Cristo, Baco, Apolo e Krishna hindu, a encarnação de Vishnu, cujo primeiro avatar originou este símbolo do peixe. No Bhâgavata-Purâna bem como em muitos outros livros, mostra-se o deus Vishnu assumindo a forma de um peixe com uma cabeça humana, a fim de reencontrar os Vedas perdidos durante o dilúvio. Tendo ajudado Vaivasvata a escapar com toda a sua família na arca, Vishnu, tomado de piedade pela Humanidade fraca e ignorante, permaneceu com eles durante algum tempo. Foi esse deus que os ensinou a construir casas, a cultivar a terra e a agradecer à Divindade desconhecida, que ele representava, por meio da construção de templos e da instituição de uma adoração regular; e, como ele continuasse metade peixe, metade homem, todo o tempo, a cada pôr-do-sol ele voltava ao oceano, onde passava a noite. "Foi ele"- diz o livro sagrado - "que ensinou os homens, após o dilúvio, tudo o que era necessário à sua felicidade. "Certa vez ele mergulhou na água e nunca mais voltou, pois a terra se cobrira novamente com vegetação, frutos e gado. "Mas ele ensinara aos brâmanes o segredo de todas as coisas" (Bhâgavata-Purâna, VIII, 24). Até aqui, vemos nessa narrativa o duplo da história fornecida pelo babilônico Berosus sobre Oannes, o peixe-homem, que não é outro senão Vishnu - a menos, na verdade, que admitamos que foi a Caldéia que civilizou a Índia! Talvez possamos lançar luzes adicionais sobre essa embaraçante questão do peixe-símbolo se lembrarmos ao leitor que, de acordo com o Gênese, o primeiro dos seres vivos criados, o primeiro tipo de vida animal, foi o peixe. "E Elohim disse: `Que as águas produzam em abundância criaturas que possuem vida' (...) e Deus criou grandes baleias (...) e a manhã e a tarde construíram o quinto dia" [Gênese, I, 20-3]. Jonas foi engolido por um grande peixe e lançado para fora três dias depois. Os cristãos consideram esse fato como
uma premunição dos três dias de sepultura de Jesus que precederam a sua ressurreição - embora a afirmação dos três dias seja tão fantasiosa quanto todo o resto e também seja adotada para enquadrar com a ameaça de destruição do templo e de sua reconstrução em três dias. Entre o sepultamento e a alegada ressurreição transcorreu apenas um dia - Sabbath judaico -, pois ele foi enterrado na tarde da sexta-feira, ressuscitado na aurora do domingo. Todavia, sejam quais forem as circunstâncias que devam ser tomadas com uma profecia, a história de Jonas não pode ser considerada uma delas. É significativo que essa dupla denominação de "Messias" e "Dag" (peixe), dos talmudistas, pudesse ser aplicada ao Vishnu hindu, o Espírito "Conservador" e a segunda pessoa da trindade bramânica. Essa divindade, que já se havia manifestado, ainda é considerada como o futuro Salvador da Humanidade e Redentor escolhido, que ressurgirá em sua décima encarnação ou avatâra, como o Messias dos judeus, para conduzir os bem-aventurados e restituir-lhes os primeiros Vedas. No seu primeiro avatar, pretende-se que Vishnu tenha aparecido à Humanidade sob a forma de um peixe. No templo de Râma, há uma representação desse deus que corresponde perfeitamente à de Dagon, tal como Berosus no-lo apresenta. Ele possuía o corpo de um homem que saía da boca de um peixe e segura em suas mãos o Veda perdido. Vishnu, além disso, é o deus da água, em certo sentido, o Logos do Parabrahman, pois, como as três pessoas da divindade manifestada intercambiam constantemente seus atributos, vemo-lo, no mesmo templo, representado reclinado sobre a serpente de sete cabeças, Ananta (eternidade) e se movendo, como o Espírito de Deus, sobre a superfície das águas originais. Vishnu é, evidentemente, o Adão-Cadmo dos cabalistas, pois Adão é o Logos ou o primeiro Ungido, da mesma maneira que o segundo Adão é o Rei Messias. Lakshmî, a contrapartida passiva ou feminina de Vishnu, o criador e o conservador, também é chamada Âdi-Mâyâ. Ela '[e a "Mãe do Mundo", Devamatrî, a Vênus-Afrodite dos gregos; também Ísis e Eva. Ao passo que Vênus nasceu da espuma do mar, Lakshmî brota da água, quando da agitação do mar; nascida, ela é tão bela, que todos os deuses se apaixonam por ela. Os judeus, emprestando os seus tipos onde os pudessem conseguir, calcaram a sua primeira mulher no padrão de Lakshmî. É curioso que Viracocha, o Ser Supremo do Peru, significa, literalmente, "espuma do mar". Já dissemos acima que, de acordo com os cálculos secretos peculiares aos estudiosos da ciência oculta, Messias é a quinta emanação, ou potência. Na Cabala judaica, em que os dez Sephiroth emanam de Adão-Cadmo (colocado abaixo da coroa), ele vem em quinto lugar. Assim também no sistema gnóstico; assim também no budista, em que o quinto Buddha - Maitreya - aparecerá em seu último advento para salvar a Humanidade antes da destruição final do mundo. Se Vishnu é representado em sua futura e última aparição como o décimo avatar ou encarnação, é apenas porque cada unidade, considerada como um andrógino, manifesta-se duplamente. Os budistas que rejeitam essa encarnação bissexual reconhecem apenas cinco. Assim, ao passo que Vishnu fará sua última aparição na sua décima encarnação, Buddha cumprirá o mesmo em sua quinta. (Os Sephiroth cabalísticos são dez, ou cinco pares). TRANSCRIÇÃO DE PASSAGEM DE ESCRITURA HINDU. (L. 3 pág. 232.) "Quando este mundo saiu das trevas, os princípios elementares sutis produziram a semente vegetal que animou as plantas em primeiro lugar; das plantas, a vida passou para corpos fantásticos que nasceram do ilus das águas; depois, através de uma série de formas e de animais diversos, ela chegou ao HOMEM." (Bhâgavata-Purâna, livro XII, cap. 9 e 10).
"Ele [o homem, antes de sê-lo] passara sucessivamente através das plantas, dos vermes, dos insetos, dos peixes, das serpentes, das tartarugas, do gado e dos animais selvagens; esse é o grau inferior." "Essas são, desde Brahmâ até os vegetais, as transmigrações que ocorrem neste mundo." (Manu, livro XII, 42; livro I, 50).
Na cosmogonia de Sanchoniathon, os homens também evoluíram do ilus do caos, e aí encontramos a mesma evolução e transformação das espécies. E agora daremos a tribuna ao Sr. Darwin: "Eu acredito que os animais descendem, no máximo, de quatro ou cinco progenitores". E ainda: “Posso inferir, por analogia, que provavelmente todos os seres orgânicos que viveram sobre esta terra descenderam de uma mesma forma primordial. (...) Considero todos os seres, não como criações especiais, mas como os descendentes lineares de alguns poucos seres que viveram muito tempo antes do depósito da primeira camada do sistema siluriano. E ainda: "Posso inferir, por analogia, que provavelmente todos os seres orgânicos que viveram sobre a terra descenderam de um mesma forma primordial. (...) Considero todos os seres, não como criações especiais, mas como os descendentes lineares de alguns poucos seres que viveram muito tempo antes do
depósito da primeira camada do sistema siluriano".
(Período do Paleozóico, precedido pelo Ordoviciano e seguido pelo Devoniano. O Período Siluriano ocorreu aproximadamente à 30 milhões de anos, segundo a ciência atual.).
Em suma, viveram no caos de Sanchoniathon e no ilus de Manu. Vayâsa e Kapila vão mais além de Darwin e Manu. "Eles vêem em Brahmâ apenas o nome do germe universal; eles negam a existência de uma Causa Primaria e pretendem que tudo o que existe na natureza se desenvolveu apenas em conseqüência de forças materiais e fatais", diz Jacolliot. Afirmações do Sr. Jacolliot: "Perguntamos um dia a um brâmanes do pagode de Chidambaram, que pertence à escola cética dos naturalistas de Vyâsa, se ele acreditava na existência de Deus, Ele nos respondeu, sorrindo: `Aham eva Parabrahman' - `Eu mesmo sou um deus'. "`O que quereis dizer com isto?' "`Quero dizer que tudo que existe sobre a terra, por mais humilde que seja, é uma porção imortal da matéria imortal'". Essa teria sido a resposta que acudiria a todo filósofo antigo, cabalista ou gnóstico, dos primeiros tempos. Ela contém o espírito mesmo dos mandamentos délficos e cabalísticos, pois a filosofia esotérica resolveu, séculos atrás, a questão de saber o que o homem era, é e será. Se as pessoas que acreditam no versículo da Bíblia que ensina que "O Senhor Deus formou o homem da poeira do chão e soprou em suas narinas o alento da vida", rejeitam ao mesmo tempo a idéia de que todo átomo dessa poeira, como toda partícula dessa "alma viva", contêm "Deus" me si mesma, então lamentamos a lógica desse cristão. Ele ignora os versículos que precedem. Deus abençoa igualmente todas as feras dos campos e toda a criatura viva, na água, como no ar, e Ele a todas elas dota de vida, que é um sopro de Seu próprio Espírito, e da alma do animal. A Humanidade é o Adão-Cadmo do "Desconhecido", Seu microcosmo e Seu único representante na Terra, e todo homem é um deus na Terra. Poderíamos perguntar a esse erudito francês, que parece tão familiarizado com todos os slokas dos livros de Manu e de outros escritores védicos, o significado dessa frase que ele conhece tão bem: "As plantas e a vegetação revelam um grande número de formas por causa das suas ações precedentes; estão cercadas pela escuridão, mas, não obstante, estão dotadas de uma alma interior e sentem igualmente o prazer e a dor". Se a Filosofia hindu ensina a presença de um grau de alma nas formas mais inferiores da vida vegetal, e mesmo em todos os átomos do espaço, como é possível que ela recusasse o mesmo princípio ao homem? E se ela admite o espírito imortal no homem, como pode ela logicamente negar a existência da fonte original - não direi a primeira, mas a Causa eterna? Nem os racionalistas, nem os sensualistas, que não são capazes de compreender a metafísica indiana, deveriam julgar a ignorância dos metafísicos hindus segundo os seus próprios critérios. O grande ciclo, como observamos anteriormente, inclui o progresso da Humanidade desde seu germe no homem primordial sob a forma espiritual, até o abismo mais profundo da degradação a que ele puder chegar - cada etapa sucessiva na descida sendo caraterizada por uma força e consistência da forma física maiores do que o anterior - e termina com o Dilúvio. Mas enquanto o grande ciclo, ou idade, cumpre o se curso, sete ciclos menores são percorridos, cada um deles marcando a evolução de uma nova raça que procede da raça anterior, num mundo novo. E cada uma dessas raças, ou grandes tipos da Humanidade, se subdivide em famílias, e estas em nações e tribos, como vemos hoje os habitantes da Terra divididos em mongóis, caucasianos, indianos, etc. PARA OS ANTIGOS A CIÊNCIA ERA ESPIRUTAL, E A RELIGIÃO CIENTÍFICA.
(L. 3.
pág. 234).
Antes de mostrar, por meio de diagramas, a semelhança estreita que existe entre as filosofias esotéricas de todos os povos antigos, por meio de diagramas, a semelhança estreita que existe entre as filosofias esotéricas de todos os povos antigos, embora geograficamente remotos uns dos outros, seria útil explicar brevemente as idéias reais que estão na base de todos esses símbolos e de todas essas representações alegóricas que tanto têm embaraçado os comentadores não-iniciados. Melhor do que qualquer outra coisa, isso pode mostrar que Religião e Ciência estavam mais intimamente ligadas do que gêmeos, nos dias de outrora; que as duas formavam um só corpo desde o momento da concepção. Com atributos mutuamente conversíveis, a Ciência era espiritual e a Religião era científica. Como o homem andrógino do primeiro capítulo do Gênese -"macho e fêmea", passivo e ativo; criado à imagem do Elohim. A Oniciência desenvolveu a onipotência, essa última exigia o exercício daquela, e assim o gigante possuía domínio sobre todos os quatro reinos do mundo. Mas, como o segundo Adão, esses andróginos estavam destinados a "cair e
perder os seus poderes" tão logo as duas metades da dualidade se separassem. O fruto da Árvore do Conhecimento dá a morte sem o fruto da Árvore da Vida. O homem deve conhecer a si mesmo antes de poder conhecer a gênese última, mesmo dos seres e poderes cuja natureza é ainda menos desenvolvida do que a sua. O mesmo acontece com a Religião e a Ciência; unidas elas eram infalíveis, pois a intuição espiritual estava ali para confirmar as limitações dos sentidos físicos, a ciência exata rejeita o auxilio da voz interior, ao passo que a religião se torna simplesmente teologia dogmática - cada uma delas é um cadáver sem alma. O CICLO DA CIÊNCIA ESOTÉRICA. (L. 3. pág. 234). A doutrina esotérica, então, ensina, como o Budismo e o Bramanismo, e até mesmo a perseguida Cabala, que a Essência una, infinita e desconhecida existe desde toda a eternidade e que, em sucessões regulares e harmoniosas, ela é passiva ou ativa. Na fraseologia poética de Manu, essas contradições são chamadas o "Dia" e a "Noite" de Brahmâ. Este pode estar "desperto" ou "adormecido". Os Svâbhâvikas, ou filósofos da mais antiga escola de Budismo (que ainda existe no Nepal), especulam apenas sobre a condição ativa dessa "Essência", que eles chamam de Svabhavat, e consideram insensato teorizar sobre o poder abstrato e "incognoscível" em sua condição passiva. Eis por que são chamados de ateus tanto pela Teologia cristã, quanto pelos cientistas modernos nenhum dos dois é capaz de entender a lógica profunda da sua filosofia. Aquela não admitirá nenhum outro Deus que não os poderes secundários personificados que edificaram às cegas o universo visíveis e que se transformou no Deus antropomórfico dos cristãos e o Jeová troando entre relâmpagos e trovões. Por sua vez, a ciência racionalista saúda os budistas e os Svâbhâvikas como os "positivistas" dos tempos arcaicos. Se nos inclinarmos a um ponto de vista parcial da filosofia destes últimos, talvez os nossos materialistas estejam corretos em suas opiniões. Os budistas pretendem que não haja um Criador, mas uma infinidade de poderes criadores, que formam coletivamente a substância única eterna, cuja essência é inescrutável - e, portanto, não é um assunto apropriado para a especulação de uma verdadeiro filósofo. Sócrates recusou-se invariavelmente a discutir o mistério do ser universal, e, entretanto, ninguém o acusaria de ateísmo, exceção feita aos que procuraram a sua destruição. Ao inaugurar um período ativo, diz a Doutrina Secreta, uma expansão dessa essência Divina, que age de dentro para fora, ocorre em obediência à lei eterna e imutável, e o universo fenomenal ou visível é o resultado de uma longa cadeia de forças cósmicas colocadas progressivamente em movimento. Da mesma maneira, quando a condição passiva é retomada, ocorre uma contradição da essência Divina e a obra anterior da criação é aniquilada gradual e progressiva. O universo visível se desintegra, seu material se dispersa - e a "escuridão", solitária e abandonada, recobre uma vez mais a superfície do "abismo". Para empregar uma metáfora que poderia comunicar mais claramente a idéia, uma exalação da "essência desconhecida" produz o mundo e uma inalação o faz desaparecer. Esse processo tem-se repetido desde toda a eternidade e nosso universo atual é apenas um, de uma série infinita que não teve começo, nem terá fim. Não podemos, por conseguinte, construir nossas teorias baseadas nas manifestações visíveis da Divindade, nos seus fenômenos naturais objetivos. Aplicar a esses princípios viradores o nome de Deus é pueril e absurdo. Também se poderia dar o nome de Benvenuto Cellini ao fogo que funde o metal, ou ao ar que esfria depois de ter passado pelo molde. Se a Essência espiritual íntima sempre oculta, e abstrata para as nossas mentes, que age nessas forças deve ser relacionada com a criação do universo físico, ela só o pode ser no sentido que lhe deu Platão. Ela poderia ser chamada, no melhor dos casos, de edificador do universo abstrato que se desenvolveu gradualmente no Pensamento Divino em que ela jazia em estado latente. Tentaremos mostrar, o significado esotérico de Gênese e a sua concordância perfeita com as idéias de outras nações. Veremos que os seis dias de criação possuem um significado insuspeitado por muitos comentadores, que exercitam as suas habilidades até o ponto máximo tentando reconciliá-las com a Teologia cristã e a Geologia não-cristã. Por mais desfigurado que possa estar o Velho Testamento, ele ainda conserva em seu simbolismo o suficiente do original, em seus pontos principais, para mostrar sua semelhança com as cosmogonias das nações mais antigas do que a dos judeus. Reproduzimos aqui os diagramas das cosmogonias hindu e caldaico-judaica. A antigüidade do diagrama dos primeiros pode ser inferida do fato de que muitos dos pagodes bramanicos foram desenhados e construídos com base nessa figura, chamada de Srî-Yantra". E contudo, vemos que os cabalistas judeus e medievais o tinham em grande estima e que lhe deram de "selo de Salomão Seria muito fácil encontrar a sua origem, uma vez que somos lembrados da história do rei-cabalista e das suas relações com o Rei Hiram e com Ophir - o país dos pavões, do ouro e do marfim -, cujas terras devemos procurar na Índia Antiga.
DIAGRAMA HINDU
DIAGRAMA CALDAICO
EXPLICAÇÃO DOS DOIS DIAGRAMAS QUE REPRESENTAM: OS PERÍODOS CAÓTICOS E FORMADORES, ANTES E DEPOIS QUE NOSSO UNIVERSO COMEÇASSE A EVOLUIR. DO PONTO DE VISTA ESOTÉRICO BRAMÂNICO, BUDISTA E CALDAICO, QUE CONCORDAM EM TODOS OS PONTOS COM A TEORIA EVOLUTIVA DA CIÊNCIA MODERNA. A DOUTRINA HINDU
A DOUTRINA CALDAICA
O Triângulo Superior
O Triângulo Superior
Contém o Nome Inefável. É o AUM que só deve ser pronunciado Mentalmente, sob pena de morte. O Parabrahman Não-revelado, o Princípio Passivo; o "mukta" absoluto e incondicionado, que não pode entrar na condição de um Criador, pois este, a fim de pensar, querer e agir, deve ser finito e condicionado (baddha); por conseguinte, em um sentido, deve ser um ser finito. "ELE (Parabrahman) foi absorvido no não-ser, imperceptível , sem qualquer atributo distinto, inexistente para os nossos sentidos. Foi absorvido no seu sono (para nós) eterno e (para ele) periódico", pois era uma das "Noites de Brahmâ". Portanto, ele não é a Primeira, mas a Causa Eterna. Ele é a Alma das Almas, que nenhum ser pode compreender nesse estado. Mas "aquele que estuda os Mantras secretos e compreende a Vâch (o Espírito ou voz oculta dos Mantras, a manifestação ativa da Força latente) aprenderá a compreendê-lo em seu aspeto "revelado".
Contém o Nome Inefável. É Ain-Soph, o, Ilimitado, o Infinito, cujo nome só é conhecido pelos iniciados e não pode ser pronunciado em voz alta sob pena de morte. Não mais do que Parabrahman, AinSoph não pode criar, pois ele está na mesma condição de não-ser; ele é [Ain] inexistente enquanto se encontra em seu estado latente ou passivo em Olam (o tempo ilimitado e infinito); como tal, não é o Criador do universo visível, nem é o Or (Luz). Transformar-se-à nele mais tarde, quando o período de criação o tiver compelido a expandir a Força dentro de si, segundo a Lei de que é a essência corporificadora. "Aquele que aprende a conhecer, o Merkabah e o la'hash (fala secreta ou encantação) aprenderá o segredo dos segredos ."
Tanto "Ele, quanto Ain-Soph, em sua primeira manifestação de Luz, emergindo da Escuridão, podem resumir-se no Svabhavat, a Substância Eterna Auto-existente não-criada que produz tudo; ao passo que tudo o que for de sua essência é produzido por sua própria natureza. O Espaço que Circunda o Triângulo Superior
O Espaço que Circunda o Triângulo Superior
Quando a "Noite de Brahmâ" chegou ao fim e soou a hora de o Auto-existente manifestar-Se por revelação, ele tornou sua glória visível ao enviar de sua Essência um Poder ativo, que, feminino no começo, torna-se subseqüentemente andrógino. Ë Aditi, o "Infinito", o Ilimitado, ou antes o "Desmedido". Aditi é a "mãe" de todos os deuses, e Aditi é o Pai e Filho. "Quem nos levará de volta ao Grande Aditi, para que eu possa ver pai e mãe?" É em conjunção com essa Força Feminina que o Pensamento Divino mas latente produz a grande "Profundidade" - água. "A água nasceu de uma transformação da luz (...) e de uma modificação da água nasceu a terra, diz Manu (livro I, 78)."Sóis filhos de Aditi, nascida da água, vós que sóis nascidos da terra, ouvi meu chamado. "Nessa água (ou caos primitivo) o andrógino "Infinito, que, com a Eterna, forma a primeira Tríada abstrata, representada por AUM, depositou a vida universal. É o Ovo Mundano, em que ocorre a gestação de Purusha, ou o Brahmâ Manifesto. O germe que fecundou o Princípio-Mãe (a água) é chamado Nara, o Espírito Divino ou Espírito Santo, e as próprias águas são uma emanação dela, Nârî, enquanto o Espírito que se move sobre as águas é chamado de Nârâyana. "Naquele ovo, o grande Poder permaneceu inativo todo o ano do Criador, a cujo Final, por seu próprio pensamento, fez com que o ovo se dividisse." A metade superior tornou-se o céu, a inferior a terra (ambos em sua forma ideal, não em sua forma manifesta). Assim, essa segunda Tríada, apenas um outro nome para a primeira (nunca pronunciado em voz alta), e que é a Trimûrti secreta e primordial pré-védica verdadeira, consistia de
Quando chegou o período ativo, Ain-Soph emitiu, de sua própria essência eterna, Sephirah, o Poder ativo, chamado de Ponto Primordial, e a Coroa, Kether. Foi só através dela que a "Sabedoria Desmedida" pôde dar uma forma concreta ao seu Pensamento abstrato. Dois lados do triângulo superior, o lado direito e a base, são formados de linhas interrompidas; o terceiro, o do lado esquerdo é formado por uma linha pontilhada. É através deste lado que emerge Sephirah. Espalhando-se em todas as direções, ela circunda finalmente todo o triângulo. Nessa emanação do princípio ativo feminino, a partir do lado esquerdo do triângulo místico, pressagia-se a criação de Eva a partir do lado esquerdo de Adão. Adão é o Microcosmo do Macrocosmo e é criado à imagem de Elohim. Na Árvore da Vida, (Etz Haiyim] a Tríada tripla está disposta de maneira que os três Sephiroth masculinos fiquem à direita, os três femininos à esquerda, e os quatro princípios que os unem no centro. Do Orvalho Invisível que cai da "Cabeça" Superior, Sephirah cria a água primordial, ou o caos assumindo forma. É o primeiro passo para a solidificação do Espírito, que, através de várias modificações, produzirá a terra. "É preciso terra e água para fazer uma alma vivente", diz Moisés. Quando Sephirah emerge, da Divindade latente, como um poder ativo, ela é feminina; quando assume o papel de um Criador, torna-se masculino; eis por que é andrógina. Ela é o "Pai e a Mãe Aditi" da cosmogonia hindu. Após ter meditado sobre a "Profundidade", o "Espírito de Deus" produz a sua própria imagem na água, o Útero Universal, simbolizado em Manu pelo Ovo Dourado. Na cosmogonia cabalística, Céu e Terra estão personificados por Adão-Cadmo e pelo segundo Adão. A primeira Tríada Inefável, contida na idéia abstrata das "Três Cabeças", era um "nome de mistério". Ela se compunha de Ain-Soph, Sephirah e Adão-Cadmo, o Protogonos, sendo este idêntico ao primeiro, pois que era bissexual. Em toda a Tríada existe um macho, uma fêmea e um andrógino. Adão -Sephirah é a Coroa (Kether). Ele se empenha na obra da criação, produzindo em primeiro lugar Hokhmah, Sabedoria Masculina, uma potência masculina ativa, representada por, Yãh, ou as Rodas da Criação, [Ophanim], das quais procedeu Binah, Inteligência, potência feminina e passiva, que é Yahveh, que vemos figurar na Bíblia como o Supremo. Mas este Yahveh não é o Yod-heva cabalístico. O binário é a pedra angular da Gnosis. Assim como o binário é a Unidade que se multiplica e que é autocriadora, os cabalistas mostram que o AinSoph passivo "Desconhecido" faz emanar de si mesmo Sephirah, que, tornando-se luz visível, produz, diz-se, Adão-Cadmo. Mas, no sentido oculto, Sephirah e Adão são uma mesma luz, latente e ativa, invisível e visível. O segundo Adão, como o tetragrama humano, produz por sua vez Eva, em um dos seus lados. É com essa segunda Tríada que os cabalistas se ocuparam, dificilmente fazendo uma referência ao Supremo e ao Inefável e nunca chegando a fazer qualquer declaração escrita. Todo conhecimento relativo a este último foi partilhado oralmente. É o segundo Adão, então, é a unidade representada por Yod, emblema do princípio cabalístico masculino, e, ao mesmo tempo, ele é Hokhmah, Sabedoria, enquanto Binah ou Yehovah é Eva; o primeiro Hokhmah emanado de Kether, ou o andrógino, Adão-Cadmo, e o segundo, Binah, de Hokhmah.
Nara,
Pai-Céu,
Nârî, Mãe-Terra, Virâj, o Filho-ou Universo. A Trimûrti, que compreende Brahmâ, o Criador, Vishnu, o Conservador, e Shiva, o Destruidor e Regenerador, pertence a um Período posterior. É uma ilusão antropomórfica, inventada para uma compreensão popular das massas não-iniciadas. O Díkshita, o iniciado, conhecia muito mais e melhor. Assim, essa profunda alegoria - com cores de uma fábula ridícula, dada no AitareyaBrâhmanam, que resultou nas representações, em alguns templos, de Brahmâ-Nara, sob a forma de um touro, e sua filha, Aditit-Nârî, na de uma bezerra - contém a mesma idéia metafísica da "queda do homem", ou do Espírito na geração - a matéria. O Espírito Divino Que-tudo-impregna, personificado sob os símbolos do Céu, do Sol e do Calor (fogo) - a correlação das forças cósmicas - fecunda Matéria ou Natureza, filha do Espírito. E o próprio Brahmâ se vê forçado a se submeter, e a suportá-la, à penitência das maldições de outros deuses (Elohim) em razão desse incesto. (Ver Coluna correspondente.) De acordo com a lei imutável e, por conseguinte, fatal, Nara e Nârî são ao mesmo tempo Pai e Filha. A Matéria, por suas transformações infinitas, é o produto gradual do Espírito. A unificação de uma Causa Suprema Eterna exigiu essa correlação; e, se a natureza é o produto ou o efeito dessa Causa, ela deve, por sua vez, ser fecunda pelo mesmo Raio divino que produziu a própria natureza. As alegorias cosmogônicas mais absurdas, se analisadas sem preconceito, estão sempre baseadas numa necessidade estrita e lógica.
"O ser nasceu do não-ser" diz um verso do Rig-Veda. O primeiro ser teve de se tornar andrógino e finito, em virtude mesmo da sua criação como um ser. E assim, mesmo a Trimûrti sagrada, que contém Brahmâ, Vishnu e Shiva, terá fim quando a "noite" de Parabrahman suceder ao "dia" atual, ou período de atividade universal. A segunda Tríada, ou antes a primeira - pois a mais suprema é apenas uma abstração pura -, é o mundo intelectual. A Vâch que a circunda é uma transformação mais definida de Aditi. Além da sua significação oculta no Mantra secreto, Vâch é personificada como o poder ativo de Brahmâ que procede dele. Nos Vedas ela fala de si mesma como a alma suprema e universal. "Trago o Pai sobre a cabeça [da mente universal]; e minha origem está no meio do oceano e, portanto, penetro todos os seres. (...) Dando origem a todos os seres, eu passo como a brida [Espírito Santo]. Estou acima desse céu, além dessa terra; e aquilo que o Grande Ser for, eu o sou". Literalmente, Vâch é a fala, o, poder de despertar, por meio do arranjo métrico contido no número de sílabas dos Mantras, os poderes correspondentes no mundo invisível. Nos mistérios sacrificiais, Vâch desperta o Brahamâ (Brahmâ jinvati), ou o poder que repousa latente na base de toda operação mágica. Ela existe desde toda a eternidade como Yajña (sua forma latente), em estado dormente em Brahmâ desde o "não-começo" e procede dele sob a forma de Vâch (o poder ativo). É a chave da "Traividyâ", a três vezes sagrada ciência que ensina os Yajus (os mistérios sacrificiais). Tendo falado da Tríada não-revelada e da primeira tríada dos Sephiroth, chamada de "mundo intelectual", pouco resta a ser dito. Na grande figura geométrica que tem um triângulo duplo, o círculo central representa o mundo no universo. O triângulo duplo pertence a uma das mais importantes, senão a mais importante delas, figura mística da Índia. É o emblema da Trimûrti, ou três em um. O triângulo que tem o ápice voltado para cima indica o princípio masculino; voltado para baixo, o feminino; os dois tipificam, ao mesmo tempo, o espírito e a matéria. Esse mundo no universo infinito é o microcosmo no macrocosmo, como na Cabala judaica. É o símbolo do útero do universo, o ovo terrestre, cujo arquiteto é o ovo mundano dourado. É desse seio espiritual da mãe Natureza que procedem todas os grandes salvadores do universo - os avatares da Divindade invisível. "Daquele que é e que, portanto, não é, do não-ser, Caída Eterna, nasceu o ser Purusha", diz Manu, o legislador. Purusha é o "macho divino", o segundo deus, e o avatar, ou o Logos de Parabrahman e seu filho divino, que por sua vez produziu Virâj, o filho, ou o tipo ideal do universo. "Virâj inicia a obra da criação ao produzir os dez Prajâpati, `os senhores de todos os seres'". De acordo com a doutrina de Manu, o universo está sujeito a uma sucessão periódica e interminável de criações e dissoluções, períodos de criação que são chamados Manvantaras. "É o germe [que o Espírito Divino produziu de sua própria substância ] que nunca perece no ser, pois ele se torna a alma do Ser e, no período de pralaya [dissolução], torna a se absorver no Espírito Divino, que repousa desde toda a eternidade em Svayambhû, o Autoexistente'". Como mostramos, nem os Svâbhavikas - filósofos budistas - nem os brâmanes acreditam numa criação do universo ex nihilo, mas acreditam na Prakriti, as indestrutibilidade da matéria. A evolução das espécies e o sucessivo aparecimento de diversos tipos novos estão claramente mostrados em Manu. ."Da terra, do calor e da água nasceram todas as criaturas, animadas, produzidas pelo germe que o Espírito Divino extraiu de sua própria substância. Assim, Brahmâ estabeleceu as séries de transformações da planta até o homem, e do homem até a essência primordial. (...) Entre elas, cada ser (ou elemento) sucessivo adquire a qualidade do precedente; e, à medida que galga um dos graus, ele é dotado de novas propriedades".
Se combinarmos com Yod, as três letras que formam o nome de Eva, teremos o divino tetragrama, pronunciado IEVO-HEVAH, Adão e Eva, Jehovah, masculino e feminino, ou idealização da Humanidade corporificada no primeiro homem. É assim que podemos provar que, enquanto os cabalistas judaicos, em comum com os seus mestres iniciados, os caldeus e os hindus, adoravam o Deus Supremo e Desconhecido, no silêncio sagrado dos seus santuários, as massas ignorantes de todas as nações adoravam algo que era certamente menos do que a Substância Eterna dos budistas, os chamados ateus. Como Brahmâ, a divindade manifestada no Manu mítico, ou o primeiro homem (nascido de Svayambhû, ou o Auto-existente) é finito, assim também Jeová, corporificado em Adão e Eva, é apenas um deus humano. Ele é o símbolo da Humanidade, uma mistura do bem com uma porção do mal inevitável; de espírito caído na matéria. Adorando Jeová, simplesmente adoramos a natureza, corporificada no homem, metade espiritual e metade material, no melhor dos casos: somos panteístas, quando não adoradores de fetiches, como os judeus idólatras, que sacrificavam em lugares elevados, nos bosques, ao princípio masculino e feminino personificado, ignorando IAÔ, o "Nome Secreto" Supremo dos Mistérios Shekinah é a Vâch hindu, adorada nos mesmos termos. Embora seja mostrada na Árvore da Vida cabalística como procedente da nona Sephiroth, Shekinah é o "véu" de Ain-Soph e a "veste" de Jeová. O "véu", que durante longas eras ocultou o verdadeiro Deus supremo, o Espírito universal, e mascarou Jeová, a divindade exotérica, fez com que os cristãos o aceitassem como o "pai" do Jesus iniciado. Todavia, os cabalistas, bem como os Dîkshita hindus, conheciam o poder de Shekînah ou Vâch e o chamavam de "sabedoria secreta" [Hokhmah nistharah]. O triângulo representou um papel importante no simbolismo religioso de toda grande nação, pois, em toda parte, ele representou os três grandes princípios -espírito, força e matéria; ou o princípio ativo (masculino), passivo (feminino) e o dual ou correlativo que participa de ambos e os mantém unidos. Era o Arba ou "quaternário" kabiri, sumariados na unidade da Divindade suprema. Encontra-se nas pirâmides egípcias, cujos lados iguais se elevam até se perderem num ponto culminante. No diagrama cabalístico, o círculo central da figura bramânica é substituído pela cruz; a perpendicular celestial e a linha de base horizontal terrestre. Mas a idéia é a mesma: Adão-Cadmo é o tipo da humanidade como uma totalidade coletiva, na unidade de Deus criador e do espírito universal. "Daquele que é sem forma, o inexistente (também a Causa eterna, mas não a Primeira), nasceu o homem celeste." Mas após ter criado a forma do homem celeste [Adam Illa-ah], ele "usou-a como veículo no qual ele desceu", diz a Cabala. Assim, Adão-Cadmo é o avatar do poder oculto. Após isso, Adão cria ou engendra, pelo poder combinado do Sephiroth, o Adão terrestre. A obra de criação também é iniciada por Sephirah na criação dos dez Sephiroth (que são os Prajâpati da Cabala, pois eles são igualmente os Senhores de todos os seres). O Zohar afirma a mesma coisa. Segundo a doutrina cabalística, houve mundos antigos (Zohar, III, p. 292b). Tudo retornará um dia àquilo de onde procedeu. "Todas as coisas de que este mundo consiste, tanto o espírito, quanto o corpo, voltarão ao seu princípio e às razões de onde precederam" (Zohar, II, 218b). Os cabalistas também defendem a indestrutibilidade da matéria, embora sua doutrina seja ainda mais cuidadosamente encoberta do que a dos hindus. A criação é eterna e o universo é a "veste" ou "o véu de Deus" - Shekinah; e este é imortal e eterno como Aquele no seio em que ele sempre existiu. Todo o mundo é estabelecido com base no padrão do seu predecessor, e cada vez mais grosseiro e material que o precedente. Na Cabala, todos eles tinham o nome de centelhas. [Zohar, III, p. 292.b] Finalmente, nosso mundo atual grosseiramente material foi formado.
Esta, acreditamos, é a verdadeira teoria dos evolucionistas modernos.
Na narrativa caldaica do período que precede à gênese de nosso mundo, Berosus fala de um tempo em que nada existia a não ser a escuridão, e um abismo de águas, povoado de monstros horríveis, "produziu um princípio duplo. (...) Naquelas criaturas estavam combinados os membros de todas as espécies de animais. Além delas, havia peixes, répteis, serpentes e outros animais monstruosos, que assumiam as formas e as feições uns dos outros".
DOUTRINA CABALISTA DA COSMOGONIA. (L. 3. pág. 239). Temo a seguinte afirmação no primeiro livro de Manu: "Sabei que a soma de 1.000 eras divinas compõe a totalidade de um dia de Brahmâ; e que uma noite é igual a um dia". Mil eras divinas são iguais a 4.320.000.000 anos humanos nos cálculos bramânicos. "Na expiração de cada noite, Brahmâ, que estava adormecido, desperta e [pela energia do movimento] emana de si mesmo o espírito, que em sua essência É, e entretanto não É." "Movido pelo desejo de criar, o Espírito [a primeira das emanações] opera a criação e dá nascimento ao éter, no qual os sábios reconhecem a faculdade de transmitir o som. "O éter engendra o ar, cuja natureza é tangível [e que é necessário vida]. "Por uma transformação do ar, a luz é produzida. "[Do ar e] da luz [que engendra o calor], forma-se água [e a água é o útero de todos os germes vivos]. Durante todo o imenso período de criação progressiva, que se estende por 4.320.000.000 anos, o éter, o ar, a água e o fogo (calor) estão constantemente produzindo matéria sob o impulso do Espírito, ou do Deus não-revelado que preenche toda a criação, pois ele está em tudo, e tudo está Nele. No Sepher Yetzîrah, o livro cabalístico da Criação, seu autor repetiu evidentemente as palavras de Manu. Nele, a Substância Divina está representada como se tivesse existido sozinha desde a eternidade, desmedida e absoluta; e fez emanar de si mesma o Espírito. "O Espírito de Deus vivo é Um, abençoado seja Seu nome, que vive para sempre! Voz, Espírito e Palavra - eis o Espírito Santo"; e esta é a Trindade cabalística abstrata, tão sem-cerimônia antropomorfizada pelos padres. Desse UM triplo emanou todo o Cosmo. Primeiramente, o elemento criador; e depois o número TRÊS, Água, que procede do ar; Éter ou Fogo completam o quaternário místico, o Arba-il. "Quando o Oculto quis revelar-Se, produziu primeiramente um ponto [ponto primordial, ou o primeiro Sephirah, ar ou Espírito Santo], deu-lhe uma forma sagrada [os dez Sephiroth, ou o homem celeste] e a recobriu com uma rica e esplêndida veste, que é o mundo. "Ele fez do vento os seus mensageiros, e, do Fogo flamejante, os seus servidores", diz o Yetzîrah, mostrando o caráter cósmico dos anjos evemerizados posteriores, e que o Espírito permeia os mínimos átomos do Cosmo. (É interessante lembra Hebreus, I,7 em relação a essa passagem. "Aquele que faz dos seus anjos [mensageiros], espíritos, e dos ministros [servos, aqueles que prestam auxílio], chama de fogo". A semelhança é demasiado viva para que deixemos de inferir que o autor de Hebreus estava tão familiarizado com a "Cabala" quando costumam os seus adeptos.)
Quando o ciclo da criação chega ao seu final, a energia da palavra manifesta está enfraquecida. Só ele, o Inconcebível, é imutável (sempre latente), mas a Força Criadora, embora também seja eterna, ela também, porque estive ali desde o "não-começo", deve sujeitar-se aos ciclos periódicos de atividade e de repouso; como ela teve começo em um dos seus aspetos, quando de sua primeira emanação, ela também deve, por conseguinte, ter um fim. Assim, a tarde sucede o dia, e a noite da divindade se aproxima. Brahmâ está adormecido pouco a pouco. Em um dos livros do Zohar lemos a seguinte afirmação: "Enquanto Moisés velava sobre o monte Sinai em companhia da Divindade, que uma nuvem ocultava à sua visão, sentiu uma grande temor se apoderar dele e perguntou repentinamente: `Senhor, onde estás (...) dormes, Senhor?' E o Espírito lhe respondeu: `Eu nunca durmo; se eu dormir por um momento sequer antes da minha hora, toda a Criação entrará em dissolução em um instante'." E Vâmadeva Modaliyar descreve a "noite de Brahmâ", ou o segundo período da existência Divina Desconhecida, com as seguinte palavras: "Estranhos rumores se fazem ouvir, os quais procedem de todos os lugares. (...) São os precursores da Noite de Brahmâ; o crepúsculo ergue-se no horizonte e o Sol desaparece atrás do trigésimo grau de Makara (signo do zodíaco) e não chega ao signo de Mina (o pisce zodiacal, o signo de peixes). Os gurus dos pagodes, designados para velar pelo râsi-chakra [Zodíaco], já podem quebrar seus círculos e instrumentos, pois são doravante inúteis. "A luz enfraquece gradualmente, o calor diminui, os lugares inabitáveis multiplicam-se sobre a Terra, o ar torna-se mais e mais rarefeito; as fontes de água secam, os grandes rios vêem exaustas as suas ondas, o oceano mostra o seu leito de areia e as plantas morrem. Os homens e os animais diminuem de estatura dia-a-dia. A vida e o movimento perdem sua força, os planetas mal podem gravitar no espaço; extinguem-se um a um, como uma lâmpada que a mão do chokra [servo] não enche mais. Sûrya (o Sol) vacila
e se apaga, a matéria entra em dissolução (pralaya) e Brahmâ retorna a Dyaus, o Deus Não-revelado, e, cumprida a sua tarefa, adormece. Outro dia passou, a noite se estende e continua até a futura aurora. "Agora, os germes de tudo o que existe entram novamente no Ovo Dourado do Seu Pensamento, como nos diz o divino Manu. Durante Seu repouso pacífico, os seres animados, dotados dos princípios de ação, interrompem as suas funções e toda sensação (manas) adormece. Quando todos são absolvidos na ALMA SUPREMA, essa alma de todos os seres dorme em completo repouso, até o dia em que ela resume sua forma e desperta novamente de sua escuridão primitiva." OS DEZ AVATARAS MÍSTICOS DE VISHNU. (L. 3. pág. 241). Se examinarmos os dez avataras místicos de Vishnu, nós os veremos relacionados na seguinte progressão: 1. Matsya-Avatâra: como peixe. Este será igualmente o seu décimo e último avatar, ao final do Kaliyuga. 2. Kûrma-Avatâra: como uma tartaruga. 3. Varâha: como um javali. 4. Nara-Sinha: como um homem-leão; último estágio animal. 5. Vâmana: como um anão; primeiro passo em direção à forma humana. 6. Parasu-Râma: como um herói, mas ainda um homem imperfeito. 7. Râma-Chandra: como o herói do Ramâyana. Um homem perfeito fisicamente; seu parente próximo, amigo e aliado Hanuman, o macaco-deus. O macaco dotado de fala. 8. Kisna-Avâtara: o Filho da Virgem Devakî, formado por Deus, ou antes pelo Deus Visnhu manifesto, que é idêntico a Adão-Cadmo. (A Essência Primacial ou Última não têm nome na Índia. É indicada às vezes por "Isso" ou por "Este". "Este [Universo] em sua origem não era nada. Não havia céu, nem terra, nem atmosfera. Aquele ser inexistente (Asat) disse `Serei'.) Krishna também é chamado Kâneya, o Filho da Virgem. 9. Gautanma-Buddha, Siddhârtha, ou Sâkya-Muni. (Os budistas rejeitam a doutrina de que seu Buddha seria uma encarnação de Vishnu.) 10. Esse Avatar ainda não se cumpriu. É aguardado para o futuro, como o Advento dos cristãos, cuja idéia foi, sem dúvida alguma, copiada dos hindus. Quando Vishnu apareceu pela última vez, ele virá como um "Salvador". De acordo com a opinião de alguns brâmanes, ele se manifestará sob a forma de Kalki (cavalo branco). Outros afirmam que ele o montará. Esse cavalo é o envoltório do espírito do mal, e Vishnu o montará, invisível a todos, até que o tenha conquistado pela última vez. O Kalki-Avatâra, ou a última encarnação, divide o Bramanismo em duas seitas. A dos Vaishnava recusa-se a reconhecer as encarnações do seu deus Vishnu sob formas literalmente animais. Eles afirmam que essas formas devem ser tomadas em sentido alegórico. Nessa relação dos avatares, encontramos a evolução gradual e a transformação de todas as espécies desde o lado pré-siluriano de Darwin até o ilus de Sanchoniathon e Berosus. Começando com a era azóica, correspondente ao ilus em que Brahmâ implanta o germe criador, passamos pelas eras paleozóica e mesozóica, cobertas pelas primeira e pela segunda encarnações como o peixe e a tartaruga; e pela cenozóica, que abrange as encarnações nas formas animal e semi-humana do javali e do homem-leão; e chegamos ao quinto período, culminante com a "era da mente, ou idade do homem", cujo símbolo na mitologia hindu é o anão - a primeira tentativa da natureza na criação do homem. Nessa relação é preciso considerar a sua idéia principal, e não julgar o grau de conhecimento dos filósofos antigos por meio da aceitação literal da forma popular em que ele nos é apresentado no grande poema épico Mahâbarata e num de seus capítulos, a Bhagavad-Gîtâ. Até mesmo as quatro eras da cronologia hindu contêm uma idéia mais filosófica do que parece superficialmente. Elas as define de acordo com os estados psicológicos ou mental e físico do homem durante esse período. Krita-yuga, a idade de ouro, a "idade da alegria", ou inocência espiritual do homem; Tretâ-yuga, a idade da prata, ou do fogo - o período da supremacia do homem e dos girantes e dos filhos de Deus; Dvâpara-yuga, a idade do bronze - uma mistura, já de pureza e de impureza (espírito e matéria), a idade da dúvida; e, finalmente, a nossa, a Kali-yuga, ou idade de ferro, ou escuridão, miséria e tristeza. Nessa idade, Vishnu chegou a se encarnar em Krishna, a fim de salvar a humanidade da deusa Kâlî, consorte de Shiva, o aniquilador de tudo - a deusa da morte, da destruição e da miséria humana. Kâlî é o melhor emblema para representar a "queda do homem"; a queda do espírito na degradação da matéria, com todos os seus resultados terríveis. Devemos nos livrar de Kâlî para conseguir o Moksha, ou Nirvana, a morada da Paz abençoada e do Espírito.
Para os budistas, a última encarnação é a quinta. Quando vier o Maitreiya-Buddha, então nosso mundo atual será destruído e um novo mundo, e melhor, o substituirá. Os quatro braços de toda Divindade hindu são os emblemas das quatro manifestações anteriores de nossa terra, após seu estado invisível, enquanto a cabeça tipifica o quinto e último Kalki-Avatâra, quando a terra será destruída e o poder de Budh - a Sabedoria (de Brahmâ, para os hindus)- será novamente chamada a se manifestar - como um Logos - para criar o mundo futuro. Nesse esquema, os deuses masculinos tipificam o Espírito e seus atributos divinos, ao passo que suas contrapartes femininas - as Sakti - representam as energias ativas desses atributos. A Durgâ (virtude ativa) é uma força sutil, invisível, que corresponde a Shekînah - a vestimenta de Ain-Soph. Ela é a Sakti por cujo intermédio o "Eterno" passivo faz surgir o universo visível a partir da sua primeira concepção ideal. Cada um desses três personagens da Trimûrti exotérica utiliza a sua Sakti como um Vâhana (veículo). Cada um deles é, o momento, a forma que está sentada no carro misterioso de Ezequiel. Não vemos menos claramente expressa, nessa sucessão de Avatares, a verdadeira idéia filosófica de uma evolução espiritual e física simultânea dos animais e do homem. A partir de um peixe, o progresso dessa transformação dual faz passar a forma física pela tartaruga, pelo javali e pelo homem-leão; e, depois, aparecendo no anão humano, mostra Parasu-Râma, uma entidade fisicamente perfeita e espiritualmente nãodesenvolvida, até levar a Humanidade personificada num homem divino ao ápice da perfeição e espiritual um deus sobre a Terra. Em Krishna e nos outros Salvadores do mundo reconhecemos a idéia filosófica do desenvolvimento dual progressivo compreendida pelo Zohar e tão claramente expressa por ele. O "Homem Celeste", que é o Protogonos, Tikkun, o primogênito de Deus, ou a Forma ou Idéia universal, engendra Adão. Eis por que este é de nascimento divino na Humanidade e dotado dos atributos de todos os dez Sephiroth. São eles: Sabedoria, Inteligência, Justiça, Amor, Beleza, esplendor, Firmeza, etc. Eles fazem dele o Fundamento ou Base, "o poderoso ser vivo", [El-Hay], e a coroa da criação, colocando-o assim como o Alfa e o Ômega para reinar sobre o "reino" - Malkhuth. "O homem é ao mesmo tempo a conseqüência e o mais alto grau da criação", diz o Zohar. "Logo que o homem foi criado, tudo estava completo, inclusive os mundos superiores e os mundos inferiores, pois tudo está compreendido no homem. Ele reúne em si mesmo todas as formas." Mas isto não diz respeito à nosso Humanidade degenerada; é só ocasionalmente que nascem homens que são os tipos daquilo que o homem deveria ser e não é. As primeiras raças de homens eram espirituais e os seus corpos protoplásticos não eram compostos das substâncias grosseiras e materiais que entram na composição dos homens de hoje. Os primeiros homens foram criados com todas as faculdades da Divindade, com poderes bastante superiores aos das legiões angélicas, pois eles eram emanações diretas de Adão-Cadmo, o homem primitivo, o Macrocosmo; ao passo que a Humanidade atual é em muitos graus inferior mesmo à do Adão terrestre, que era o Microcosmo, ou "o mundo em miniatura". Zeir-Anpîn, a figura mística do Homem, consiste de 243 números, e vemos nos círculos que se sucedem uns aos outros que foram os anjos que emanaram do "Homem Primitivo", não os Sehpiroth dos anjos. Em conseqüência, o homem devia ser, desde o começo, um ser que possuía uma natureza ao mesmo tempo progressiva e regressiva. Tendo no ápice do ciclo divino, ele se afastou gradualmente do centro de Luz, adquirindo em cada esfera inferior a que chegava (mundos habitados por uma raça diferente de seres humanos) uma forma física mais sólida e perdendo uma parte das suas faculdades divinas. Na "queda de Adão" devemos ver, não a transgressão pessoal do homem, mas apenas a lei da evolução dual. Adão, ou o "Homem", dá início à sua carreira de existência com a sua permanência no jardim do Éden, "vestido de vestes celestiais, uma veste de luz celeste" (Zohar, II,229b); mas, quando foi expulso, é "vestido" por Deus, ou a Lei Eterna de Evolução ou necessitarismo, com túnicas de pele. Mas, mesmo sobre essa terra de degradação material - em que a centelha divina (Alma, uma corrupção do Espírito) devia começar a sua progressão física numa série de aprisionamentos a partir da pedra até o corpo de um homem -, se ele exercitar a sua VONTADE e chamar a sua divindade em seu socorro, o homem pode transcender os poderes do anjo. "Não sabeis que havemos de julgar os anjos?" pergunta Paulo (1 Corintos, VI,3). O homem real é a Alma (Espírito), ensina o Zohar. "O mistério do homem terrestre vem após o mistério do homem celeste (...) o sábio pode ler os mistérios na face humana" (II,76a). Esta é outra das muitas frases pelas quais Paulo pode ser reconhecido como um iniciado. Por razões que já enunciadas, consideramos mais dignas de genuinidade certas Epístolas dos Apóstolos, agora consideradas como apócrifas, do que muitas passagens suspeitas dos Atos. E encontramos corroboração deste ponto de vista nas Epístolas de Paulo a Sêneca e de Sênaca a Paulo. Em uma mensagem, Paulo chama Sêneca de "meu respeitável mestre", ao passo que Sêneca se dirige ao apóstolo simplesmente como "Irmão". Não temos mais direito de julgar o Bramanismo e o Budismo pelas formas absurdas e às vezes repugnante do culto popular, do que julgar a verdadeira religião da filosofia judaica pelos absurdos da Bíblia
exotérica. Se quisermos procurar a essência verdadeira da filosofia de Manu e da Cabala, reconheceremos que Vishnu é, da mesma maneira que Adão-Cadmo, a expressão do próprio universo e que suas encarnações são personificações concretas e variadas das manifestações desse "Todo Assombroso". "Eu sou a Alma, ó Arjuna. Eu sou a Alma que existe no coração de todos os Seres; e Eu sou o começo o meio, e também o fim das coisas existentes" - diz Krishna aos seu discípulo, na Bhagavad-Gîtâ (cap. X). "Eu sou o Alfa e o Ômega, o começo e o fim (...) Eu sou o primeiro e o último", diz Jesus a João (Apocalipse, I,8,17). Brahmâ, Vishnu e Shiva são uma trindade numa unidade, e, como a trindade cristã, são mutuamente conversíveis. Na doutrina esotérica, eles são uma única e mesma manifestação daquele "cujo nome é sagrado demais para ser pronunciado e cujo poder é majestoso e infinito demais para ser imaginado". Assim, descrevendo-se os Avatares de um deles, todos os outros estão incluídos na alegoria, com uma modificação de forma, mas não de substância. É dessas manifestações que emanaram os muitos mundos anteriores e que emanará aquele que deve vir. Além do fato de o Râmâyana ser o maior poema épico do mundo - a fonte e a origem da inspiração de Homero -, esse Avatar oculta um dos problemas científicos dos tempos modernos. Os brâmanes cultos da Índia nunca compreenderam a alegoria da famosa guerra entre homens, gigantes e macacos, senão como uma alegoria da transformação das espécies. Estamos persuadidos de que se os acadêmicos europeus se dirigissem a alguns brâmanes culto nativos em busca de informações, em vez de rejeitar unânime e incondicionalmente a sua autoridade, e se eles, com Jacolliot - contra quem se ergueram - procurassem luz nos documentos mais antigos espalhados em profusão por todos os pagodes do país, eles aprenderiam lições curiosas, mas muito úteis. Se alguém perguntar a um brâmanes erudito sobre a razão do respeito devido aos macacos - respeito que se origina na história dos feitos valorosos de Hanunman, o generalíssimo e fiel aliado do herói do Râmâyana -, essa pessoa abandona imediatamente a idéia errônea de que os hindus atribuem honras divinas a um deus-macaco. Talvez aprendesse - se o brâmanes o julgasse digno de uma explicação - que os hindus vêem no macaco apenas aquilo que Manu queria que ele fosse: a transformação da espécie mais diretamente relacionada com a da família humana - uma ramo bastardo enxertado em seu próprio tronco antes da perfeição final desta última. (Um cientista de Hanover publicou recentemente uma obra intitulada Über die Auflösung der Arten durch natürliche Zuchtwahl, em que mostra, com grande ingenuidade, que Darwin estava completamente enganado ao remontar a origem do homem ao macaco. Ao contrário, ele afirma que é o macaco que se desenvolveu do homem. Que, no começo, a Humanidade foi, moral e fisicamente, os tipos e os protótipos da nossa atual raça e da dignidade humana, por sua beleza de forma, regularidade de traços, desenvolvimento craniano, nobreza de sentimentos, impulsos heróicos e grandeza de concepções ideais. Isso é pura filosofia bramânica, budista e cabalística. Seu livro é copiosamente ilustrado com diagramas, tabelas, etc. Ele afirma que o envelhecimento e a degradação do homem, moral e fisicamente, podem ser facilmente verificados através das transformações etnológicas até os nosso dias. E, como uma porção já degenerou em macacos, também o homem civilizado dos dias de hoje será sucedido, pelo menos, sob a ação da inevitável lei da necessidade, por descendentes semelhantes. Se pudermos julgar o futuro pelo presente, parece bastante possível que um corpo tão não-espiritual e materialista como o dos nossos cientistas termine como simiae e não como serafins.). Ele aprenderia, além disso, que aos olhos dos "gênios" cultos, o homem espiritual ou interior é uma coisa e que o seu envoltório físico, terrestre, é outra. Que a natureza física, a grande combinação de correlações físicas de forças que avançam em direção à perfeição, foi obrigada a se servir do material que tinha em mãos; ela modela e remodela enquanto prossegue e, terminado a sua obra no homem, apresenta-o apenas como um tabernáculo apropriado ao obscurecimento do espírito Divino. Mas este dá ao homem o direito de vida e de morte sobre os animais inferiores a ele, na escala da natureza, ou o direto de os torturar. Exatamente o contrário. Além de ser dotado de uma alma - que qualquer animal, e mesmo qualquer planta, também possui mais ou menos -, o homem tem uma alma imortal racional, ou Nous, que deveria torná-lo pelo menos igual em magnanimidade ao elefante, que caminha cuidadosamente para não esmagar os animais mais frágeis do que ele. É esse sentimento que faz com que os brâmanese e os budistas construam hospitais para animais doentes, e até mesmo para insetos, e a preparar refúgios onde eles possam terminar os seus dias. É esse mesmo sentimento, ainda, que faz com que o sectário jainista sacrifique metade da sua vida a varrer do seu caminho os insetos inúteis e impotentes e a não privar da vida mesmo os menores dos seres; e é ainda esse sentido da mais elevada benevolência e de caridade para com os fracos, por abjetos que possam parecer, que os faz honrar uma das modificações da sua própria natureza dual que posteriormente deu lugar, na crença popular, à metempsicose. Nenhum sinal dela existe nos Vedas; e, sendo a verdadeira interpretação dessa doutrina discutida extensamente em Manu e nos livros sagrados budistas e limitada desde o início às castas sacerdotais cultas, não devemos espantar com idéias absurdas do povo a seu respeito.
Houve evolucionistas antes do dia em que Noé mítico teve de, na Bíblia, flutuar em sua arca; e os cientistas antigos estavam mais bem informados, e tinham as suas teorias mais bem definidas, do que os evolucionistas modernos. Platão, Anaxágoras, Pitágoras, as escolas eleatas da Grécia, bem como os antigos colégios sacerdotais caldaicos - todos eles ensinaram a doutrina da evolução dual; a doutrina da transmigração das almas referia-se apenas ao progresso do homem de um mundo a outro, após a morte nessa Terra. Toda filosofia digna desse nome ensinava que o espírito do homem, se não a alma, era preexistente. "Os Essênios", diz Josefo, "acreditavam que as almas eram imortais e que elas desciam dos espaços etéreos para se acorrentarem aos corpos". Filon, o Judeu, por sua vez, diz que "o ar está cheio delas [das almas]; aquelas que estão próximas da Terra, descendo para se ligarem aos corpos mortais, retornam a outros corpos, desejosas que são de viver neles". No Zohar, a alma implora a sua liberdade diante de Deus: "Senhor do Universo! Estou feliz neste mundo, e não quero ir para outro mundo, onde eu serei uma criada e estarei exposta a todas as espécies de poluições" A doutrina da necessidade fatal, a Lei eternamente imutável, é afirmada na resposta da Divindade: "Contra a tua vontade tornar-te-ás um embrião e contra a tua vontade tu nascerá". A luz seria incompreensível sem a escuridão, para torná-la manifesta por contraste; o bem não seria o bem se não existisse o mal, para mostrar a natureza sem preço de benefício; é assim que a virtude pessoal não teria nenhum direto ao mérito, se ela não atravessasse a fornalha da tentação. Nada é eterno e imutável, exceto a Divindade Oculta. Nada do que é finito - seja porque teve um começo ou porque terá um fim - pode permanecer estacionário. É preciso avançar ou recuar; e uma alma que tem sede de reunir-se ao seu espírito, o único a lhe conferir imortalidade, deve purificar-se através de transmigrações cíclicas, avançando para a única Terra da Bem-aventurança e do Repouso Eterno, chamada de "O Palácio do Amor", [hekal ahabah], no Zohar; de "Moksha", na religião hindu; de "Pleroma da Luz eterna, entre os gnósticos e de Nirvana, pelos budistas. Os cristãos chamam-na de "Reino dos Céus" e pretendem terem sido os únicos a encontrar a verdade, ao passo que não fizeram mais do que inventar um novo nome para uma doutrina que é tão velha como o homem. Está no Zohar a prova de que a transmigração da alma não tem relação alguma com a condição do homem sobre essa Terra após a morte, não obstante os numerosos erros de seus tradutores. "Todas as almas que se alienaram do Santo Ser - louvado seja Seu nome - no céu, lançaram-se a um abismo no momento mesmo da sua existência e anteciparam o momento de seu retorno a esta Terra. (...) Vinde e vede quando a alma chega à morada do Amor. (...) A alma não pode enfrentar essa luz sem vestir o manto luminoso. Pois, exatamente como a alma enviada para a Terra veste uma veste terrestre para aqui se preservar, também ela recebe uma veste brilhante para ser capaz de olhar sem perigo no espelho cuja luz procede do Senhor da Luz." Além disso, o Zohar ensina que a lama não pode chegar à Terra da Bem-aventurança se não tiver recebido o "beijo sagrado", ou a reunião da alma com a substância de que ela emanou - o espírito. Todas as almas são duais, e, ao passo que são o princípio feminino, o espírito é masculino. Enquanto aprisionado no corpo, o homem é uma trindade, a menos que a sua poluição seja tal, que tenha provocado seu divórcio do espírito. "Infeliz da alma que prefere para seu divino marido [espírito] o casamento terrestre com seu corpo terrestre", recorda um texto do Livro das Chaves. Essas idéias sobre as transmigrações e a trindade do homem eram sustentadas por muitos dos padres cristãos primitivos. Foi a confusão entre alma e espírito, feita pelos tradutores do Novo Testamento e pelos antigos tratados filosóficos, que ocasionou tantos mal-entendidos. Foi também uma das muitas razões por que Buddha, Plotino e muitos outros iniciados são agora acusados de desejar a extinção total de suas almas "absorção na Divindade" ou "reunião com a alma universal" - que, segundo as idéias modernas, significa aniquilação. A alma animal deve, naturalmente, ser desintegrada em suas partículas, antes de ligar a sua essência pura ao espírito imortal. Mas os tradutores, tantos dos Atos quanto das Epístolas, que fixaram as bases do Reino dos Céus, e os comentadores modernos do Sûtra da Fundação do Reino da Retidão budista, malbarataram o sentido do grande apóstolo do Cristianismo e do grande reformador da Índia. Os primeiros suprimiram a palavra, de maneira que nenhum leitor imagina que ela tenha alguma relação com a alma; e, com esta confusão entre alma e espírito, os leitores da Bíblia só podem formar uma idéia errada desse assunto; e os intérpretes do sûtra não conseguiram compreender o significado e o objeto dos quatro graus do Dhyâna budista. A TRINDADE DO HOMEM ENSINADA PELO APOSTOLO PAULO. (L. 3. pág. 246). Nos escritos de Paulo, a entidade do homem está dividida em uma Trindade - carne, existência psíquica ou alma e a entidade obscurecedora e ao mesmo tempo interior ou ESPÍRITO. A sua fraseologia é muito clara quando ele ensina a anastasis, ou a continuação da vida daqueles que morrem. Ele afirma que há
um corpo psíquico semeado no corpo corruptível e um corpo espiritual que se eleva em substância incorruptível. “O primeiro homem é da Terra e o segundo é celeste.” Mesmo Tiago (III, 15) identifica a alma ao dizer que “sua sabedoria não vem lá do alto, mas é terrena, psíquica, demoníaca (ver texto grego). Platão, falando da Alma (psichê), observa que, “quando ela se alia ao Nous [substância divina, um deus, assim como psychê é uma deusa], ela faz tudo bem e felizmente; mas é diferente quando ela se liga a anoia” (Quando está ligada a Mente Inferior. N.C.). Àquilo que Platão chama Nous, Paulo chama de Espírito; e Jesus faz do coração aquilo que Paulo diz da Carne. A condição natural da Humanidade é o que: Por intermédio de Adão veio a primeira (a morte) e por Cristo, a última (ressurreição), pois foi ele o primeiro a ensinar publicamente à Humanidade o “Caminho Nobre” para a vida Eterna, como Gautama ensinou o mesmo Caminho para o Nirvana. Para cumprir os dois objetivos há apenas um caminho, segundo os ensinamentos de ambos. “Pobreza, castidade, contemplação ou prece íntima; desdém para com a riqueza e as alegorias ilusórias desse mundo.” “Entrai nesse Caminho e ponde um fim à tristeza; em verdade o Caminho foi proclamado por mim, que descobri como amortecer os golpes da aflição. Vós deveis, por vós mesmos, fazer esse esforço; os Buddhas são apenas pregadores. Os avisados que adentrem o Caminho estão livres da servidão do Impostor (Mâra). (Mâra - O Deus da Tentação, o Sedutor, que tratava de afastar Buddha de seu Sendeiro. É denominado “Destruidor” e “Morte” (da Alma).
Entrai pela porta estreita: porque larga é a porta e espaçoso o caminho que leva para a destruição. (...) Segui-me. (...) Todo aquele que ouve estas palavras e não as observa será comparado ao homem insano” (Mateus, VII, 13-26). “Eu não posso fazer de mim mesmo coisa alguma” (João, V, 30). “Os cuidados deste mundo e o engano das riquezas sufocam as palavras” (Mateus XII, 22)., dizem os cristãos; e é só se desembaraçar de todas as ilusões que o budista entra no “Caminho” que o levará “para longe das vagas agitadas do oceano da vida” e o conduzirá “Para a calma Cidade da Paz, à alegria verdadeira e ao repouso do Nirvana”. Também os filósofos gregos foram tornados mais obscuros do que místicos pelos seus tradutores muito sábios. Os egípcios adoravam o Espírito Divino, o Um Único, sob a forma de NOUT. É incontestável que foi dessa palavra que Anaxágoras tirou seu denominativo Nous, ou, como ele o chama, - a Mente ou Espírito autopotente. “Todas as coisas”, diz ele, “existiam no caos; então veio Nous e introduziu a ordem”. Ele também denomina de Nous o Um que governava os muitos. Segundo ele Nous era Deus; e o Logos era o homem, a emanação daquele. Os poderes externos perceberam os fenômenos; só o Nous reconheceu os noumena, ou coisas subjetivas. esta é uma noção puramente budista e esotérica. Foi aí que Sócrates encontrou seu fio condutor e o seguiu, e Platão depois dele, assim como todo o mundo do conhecimento interior. Onde o antigo mundo jônico-italiano culminou em Anaxágoras, o novo mundo começou com Sócrates e Platão. Pitágoras fez da Alma uma unidade automotora, com três elementos o Nous , o phrên e o thumos; ela partilha esses dois últimos com os animais; só o primeiro é seu eu essencial. Assim se refuta a acusação de que ele ensinava a transmigração; ele não a ensinava mais do que GautamaBuddha, apesar de a populaça hindu o ter transformado [o ensinamento de Buddha] numa superstição popular, após a sua morte. se Pitágoras a emprestou de Buddha, ou se Buddha a emprestou de qualquer outro - isto não tem a mínima importância; a doutrina esotérica é a mesma. A escola platônica é ainda mais explicada em relação a esse tema. O verdadeiro eu está na base de tudo. Sócrates ensinava, portanto, que ele possuía um (daimonion), um algo espiritual que o punha na trilha para a sabedoria. Ele próprio não sabia nada, mas esse algo o colocou no caminho do tudo aprender. Platão veio depois dele com uma investigação completa do princípios do ser. Havia um Agathon, Deus Supremo, que produziu em sua própria mente um Paradeigma (latim), “ou seja um modelo ou padrão” de todas as coisas. Ele ensinou que no homem estava “o princípio imortal da alma”, um corpo mortal e uma espécie de alma mortal distinta”, que estava colocada num receptáculo do corpo, separada da outra; a parte imortal estava na cabeça, a outra estava no tronco. É evidente que Platão considerava o homem interior como constituído de duas parte - uma era sempre a mesma, formada da mesma entidade da Divindade, e a outra era mortal e corruptível. “Platão e Pitágoras” - diz Plutarco - “dividem a alma em duas partes, a racional (noética) e a irracional (agnoia)”; “a parte da alma do homem que é racional é eterna, pois embora ela não seja Deus, é o produto de uma divindade eterna; mas a parte da alma que é desprovida de razão (agnoia) morre”. “O homem, diz ainda Plutarco, “é composto, e estão errados aqueles que pensam que ele é composto de apenas duas partes. Pois eles imaginam que a compreensão faça parte da alma, mas eles se enganam nisso
não menos do que aqueles que fazem da alma uma parte do corpo; pois a compreensão (Nous) é muito superior à alma, assim como a alma é melhor e mais divina do que o corpo. Ora, essa composição da alma com a compreensão produz a razão; e, com o corpo, a paixão; desta, uma é o começo ou princípio do prazer e da dor e a outra, da virtude e do vício. Dessas três partes reunidas e compactadas, a Terra forneceu o corpo, a Lua, a alma, e o Sol, a compreensão para a geração do homem. “Ora, das mortes que morremos, uma faz do homem dois de três, e a outra um de [sobre] dois. A primeira ocorre na região e na jurisdição de Ceres (Ceres - Lat. - Em grego, Demeter. Como aspecto feminino do Pai-Éter, Júpiter, é esotericamente o princípio produtor do Espírito onipenetrante, que anima todo germe no Universo material.). Os atenienses dizem ainda que os mortos são consagrados a Ceres. Quanto à outra morte, ela ocorre na Lua ou na região de Prosérpina. É assim que o que é terrestre permanece com uma e é o celeste Hermes (Divino) que habita a outra. Este arranca violentamente a alma do corpo; mas Prosérpina, suavemente e durante muito tempo, separa a compreensão da alma. Por essa razão ela é chamada de Monogenês, unigênita, ou antes que-engendra-apenasum, pois a melhor parte do homem torna-se isolada quando é separada por ela. Ora, uma e outra acontecem de acordo com a natureza. Ordena a Sorte quer toda alma, com ou sem compreensão (Nous), uma vez retirada do corpo, vague durante algum tempo, mas não o mesmo tempo para todas, na região situada entre a Terra e a Lua. Pois aqueles que foram injustos e dissolutos sofrem aí a punição devida às suas ofensas; mas os bons e virtuosos são aí retidos até que sejam purificados e tenham, por expiação purgado todas as infeções que possam ter contraído com o corpo, como por exemplo pela doença, vivendo na parte mais doce do ar chamada Campinas de Pluto, onde permanecem durante algum tempo determinado e fixado anteriormente. E então, como se retornassem de uma peregrinação ou de um longo exílio de sua pátria, têm um gosto de alegria, como o que era experimentado principalmente por aqueles que se iniciavam nos Mistérios sagrados, misturando com temor, admiração e esperança a cada um”. O daimonion de Sócrates era esse Nous, mente ou compreensão do divino. “O Nous de Sócrates”, diz Plutarco, “era puro e não estava misturado com o corpo mais do que a necessidade exigisse. (...) Toda alma possui alguma parcela de Nous, razão, um homem não pode ser um homem sem ela; mas, de conformidade com a proporção em que cada alma está misturada com a carne e o desejo, ela se transforma e se torna irracional em conseqüência da dor e do prazer. Cada alma não se mistura de uma única maneira; algumas mergulham no corpo e, assim durante essa vida, seus corpos são corrompidos pelo desejo e pala paixão; outras estão parcialmente misturadas, mas a parte mais pura [Nous] permanece sempre fora do corpo. Ela não mergulhou no corpo, mas paira acima dele e troca [obscurece] a parte mais externa da cabeça do homem; ela cumpre o efeito de uma corda que sustentaria e dirigiria a parte rebaixada da alma, enquanto esta for obediente e não se deixar dominar pelos desejos da carne. A parte que mergulhou no corpo é chamada de alma. Mas a parte incorruptível é chamada Nous e o vulgo pensa que ela está neles, como também imagina que a imagem refletida por um espelho está naquele espelho. Mas os mais inteligentes, que sabem que ela está fora, chamam-na Daemon”(um deus, um espírito). “A alma, como um sonho, escapa-se rápida, mas não imediatamente após ter-se separado do corpo, porém mais tarde, quando está só e separada da compreensão (Nous). (...) A alma - moldada e formada pela compreensão (Nous), e moldado e formando o corpo, abraçando-o por todos os lados - recebe dele uma impressão e uma forma; de maneira que, embora separada da compreensão e do corpo, ela conserva ainda a sua figura e a sua semelhança por longo tempo, a ponto de poder, com razão, receber o nome de imagem. “E a Lua é o elemento dessas almas, porque as almas se dissolvem nela, como os corpos dos mortos o fazem na Terra. Na verdade, dentre estes, aqueles que foram virtuosos e honestos, que viveram uma vida quieta e filosófica, sem se meterem em questões inoportunas, dissolvem-se rapidamente; porque, abandonados pelo Nous compreensão, e não fazendo uso das paixões corporais, desaparecem rapidamente.” Até mesmo Irineu, inimigo mortal e infatigável de toda heresia grega e “pagã”, explica a sua crença na trindade do homem. O homem perfeito, segundo ele, consiste de carne, alma e espírito. “)...) carne, anima et spiritu: el altero quidem salvante et figurante, qui est spiritus; altero quod unitur et formatur, quod est caro; id vero quod inter haec est duo, quod est anima; quae aliquando quidem subsequens spiritum, elevatur ab eo; aliquando autem consentiens carni, decidit in terrenas concupiscentias”. E Orígenes, no seu Comentário Epistolar aos Romanos, diz: “Há uma divisão tríplice no homem - o corpo ou carne, a parte mais baixa de nossa natureza, sob a qual a antiga serpente inscreveu por meio do pecado original a lei do pecado e pela qual somos tentados para as coisas vis e todas as vezes em que somos vencidos pela tentação, associados ao Diabo; o espírito, no qual ou pelo qual exprimimos a semelhança da natureza divina em que o Melhor Criador, a partir do arquétipo da sua própria mente, gravou com seu dedo (isto é, seu espírito) a Lei eterna da honestidade; por ele estamos reunidos (aglutinados) a Deus e feitos um com Deus. Na terceira, a alma é o mediador entre esses dois, mas, do mesmo modo que, numa república
facciosa, só se pode ser aliado de um ou de outro partido, ela é chamada de um lado e de outro e é livre para escolher o partido ao qual deve aderir. Se, renunciando à carne, ela tende para o partido do espírito, torna-se espiritual; mas, se inclina para os desejos da carne, ela se degenera em corpo”. Platão define a alma como “o movimento que é capaz de se mover”. “A alma é a mais antiga de todas as coisas e o começo do movimento.” “A alma foi gerada antes do corpo, e o corpo é posterior e secundário, pois ele é, de acordo com a natureza, governado pela alma governante.” “A alma que administra todas as coisas que são movidas em todos os sentidos, administra também os céus.” “A alma, então, dirige todas as coisas no céu, e na Terra, e no mar, por seus movimentos - cujos nomes são desejar, considerar, cuidar de, consultar, formar opiniões verdadeiras e falsas, estar em estado de alegria, tristeza, confiança, temor, ódio, amor, bem como todos os outros movimentos primários acrescentados a estes (...) sendo ela uma deusa , sempre escolhe como um aliado o NOUS, um deus, e disciplina todas as coisas correta e felizmente; mas quando se associa a anoia - e não a Nous - faz tudo exatamente ao contrário.”(Platão, As leis, X, 896-897B.) O VERDADEIRO BUDISMO. (L. 3. pág. 249). Nessa linguagem, como nos textos budistas, o negativo é tratado como existência essencial, A aniquilação inclui-se numa exegese similar. O estado positivo é um ser essencial, mas não se manifesta como tal. Quando o espírito, segundo a tese budista, entra no Nirvana, perde a sua existência objetiva, mas conserva a subjetiva. Para as mentes objetivas, isto é tornar-se absolutamente nada; para as subjetivas, coisa-alguma, nada que possa ser manifestado pelos sentidos. Essas citações, embora longas, são necessárias ao nosso propósito. Melhor do que tudo, elas mostram a concordância existente entre as mais antigas filosofias "pagãs" - não "iluminadas pela luz da revelação divina", para usar essa curiosa expressão de Laboulaye em relação a Buddha - e o Cristianismo primitivo de alguns padres. A filosofia pagã, bem como o Cristianismo, todavia, devem suas idéias elevadas sobre a alma e o espírito do homem e sobre a Divindade desconhecida ao Budismo e ao Manu hindu. Não espanta que os maniqueus afirmassem que Jesus era uma permutação de Gautama; que Buddha, Cristo e Mani eram uma e a mesma pessoa, pois os ensinamentos dos dois primitivos eram idênticos. Foi a doutrina da Índia antiga que Jesus professou quando pregava a renúncia completa ao mundo e às suas vaidades, a fim de chegar ao reino dos Céus, Nirvana, onde "nem se casa, nem se dá em casamento, mas onde se vive como os anjos". Foi ainda a filosofia de Siddhârthra-Buddha que Pitágoras expôs, quando dizia que o ego era eterno com Deus e que a alma atravessa vários estágios (os Rûpa-lokas hindus) para chegar à excelência divina; entretanto, o thumos voltava à Terra e o phrên era ilimitado. Assim, a metempsicose era apenas uma sucessão de disciplinas através dos refúgios celestes, para que se desembaraçasse da mente exterior, para separar o Nous do phrên, ou alma, o "Viññâna-skandha" budista, o princípio que vive do Karma e dos skandhas (grupos). É este último - a personificação metafísica das "ações" do homem, boas ou más - que, após a morte do seu corpo, se encarnam, por assim dizer, e reúnem os seus compostos invisíveis e imortais num corpo novo, ou antes num ser etéreo, o duplo do que o homem era moralmente. É o corpo astral do cabalista e as "ações encarnadas" que formam o novo eu consciente, pois seu Ahamkara (o ego, autoconsciência), dado a ele pelo Mestre soberano (o sopro de Deus), [que] nunca pode perecer, pois é imortal per se na qualidade de um espírito; donde o sofrimento do eu recém-nascido, até que se liberte de todo pensamento, desejo ou paixão terrenos. Vemos agora que os "quatro mistérios" da doutrina budista foram pouco compreendidos e apreciados como a "sabedoria" de que fala Paulo e pregada "entre aqueles que são perfeitos" (iniciados), a "sabedoriamistério" que "nenhum dos Arcontes desse mundo conheceu". O quarto grau do Dhyana budista, o fruto do Samâdhi, que leva à perfeição última, ao Visodhana (termo traduzido corretamente por Burnouf como "aperfeiçoado"), foi totalmente mal-interpretado por outros, e mesmo por ele próprio. Definindo a condição de Dhyana, Saint-Hilaire afirma que: "Finalmente, tendo chegado ao quarto grau, o asceta não possui mais sentimento de beatitude, por obscuro que ele possa ser (...) ele também perdeu toda a memória (...) atingiu a impassibilidade, tão próxima do Nirvana quanto possível (...) Todavia, essa impassibilidade absoluta não impede que o asceta adquira, nesse momento preciso, a Oniciência e o poder mágico; uma flagrante contradição, com que os budistas se preocupam tanto quanto muitos outros". E por que eles haveriam de se preocupar com ela, quando essas contradições não são, de fato, contradições? Não nos convém falar agora das contradições nas religiões de outros povos, quando as da nossa suscitaram, além dos três grandes corpos conflitantes - Romanismo, Protestantismo e Igreja Oriental -, mil e uma seitas minúsculas muito curiosas. Seja como for, eis aqui um termo aplicado à mesma coisa pelos
"mendicantes" sagrados budistas e por Paulo, o Apóstolo. Quando este último diz": "Se eu puder conseguir a ressurreição dos mortos [o Nirvana], será porque já paguei o seu preço ou atingi a perfeição" (fui iniciado), utilizando assim uma expressão comum entre os iniciados budistas. Quando um asceta budista chega ao "quarto grau", ele é considerado um rahat. Produz toda a sorte de fenômenos apenas com o poder de seu espírito liberado. Um rahat, dizem os budistas, é aquele que adquiriu o poder de voar pelo ar, de se tornar invisível, de comandar os elementos e de executar todo tipo de maravilhas comum e erradamente chamadas de meipo (milagres). Ele é um homem perfeito, um semideus. Ele se tornará um deus quando alcançar o Nirvana; pois, como os iniciados de ambos os Testamentos, os adoradores de Buddha sabem que eles "são deuses". "O Budismo genuíno, franqueando as barreiras entre a mente finita e infinita, estimula os seus seguidores a aspirar, por seus próprios esforços, àquela perfectibilidade divina - de que o homem é capaz, segundo o seu ensinamento e que, conquistada, torna o homem um deus", diz Brian Houghton Hodgson. Tristes e desolados foram os caminhos e cobertas de sangue as trilhas tortuosas por que o mundo dos cristãos foi levado a abraçar o Cristianismo de Irineu e de Eusébio. E, no entanto, a menos que aceitemos os pontos de vista pagãos, como a nossa geração poderia ter resolvido o problema dos mistérios do "reino dos céus"? O que mais o mais piedoso e culto dos cristãos sabe do destino futuro e do progresso dos nossos espíritos imortais do que o filósofo gentio de outrora ou o "pagão" moderno que vive além do Himalaia? Pode ele se gabar de saber tanto, embora trabalhe na chama brilhante da revelação "divina"? Vimos um budista fiel à religião dos seus pais, tanto em teoria quanto na prática; e, cega, quanto pudesse ser a sua fé, absurdas que fossem as suas noções sobre alguns pontos doutrinais particulares, enxertos posteriores de um clero ambicioso - apesar de tudo isso o seu Budismo, nos trabalhos práticos, é muito mais semelhante à imagem de Cristo em ação e em espírito, do que vemos na vida média dos nossos padres e ministros cristãos. Só o fato de que sua religião lhe ordena "honrar sua própria fé e jamais denegrir a de outros" é suficiente. Ele coloca o lama budista infinitamente mais alto do que qualquer padre ou clérigo que creia ser seu dever sagrado amaldiçoar o "gentio" publicamente e sentenciá-lo e à sua religião à "condenação eterna". O Cristianismo torna-se, a cada dia, uma religião de puro emocionalismo. A doutrina de Buddha baseia-se inteiramente em obras práticas. Um amor geral para com todos os seres, humanos e animais, é o seu núcleo. Um homem que sabe que, se não trabalhar, morrerá de fome, e compreende que não há um bode expiatório para carregar por ele as suas iniqüidades - este homem está dez vezes mais certo de se tornar um homem virtuoso, do que aquele a quem se ensina que o assassínio, o roubo e a libertinagem se lavam (brancos como a neve) num instante, se ele acreditar num Deus que, para usar uma expressão de Volney, "já tomou alimentos na Terra e agora se converteu no alimento de seu povo". ************ ***
CAPÍTULO VII AS PRIMEIRAS HERESIAS E AS SOCIEDADES SECRETAS OS NAZARENOS, OS OFITAS E OS DRUSOS MODERNOS. (L. 3. pág. 256).
Trataremos nos dois capítulos seguintes das mais importantes seitas secretas cristãs - as chamadas “Heresias”, que se difundiram entre o primeiro e o quarto séculos de nossa era. Lançando rapidamente a vista nos ofitas e nos nazarenos, passaremos às suas cisões que ainda existem na Síria e na Palestina, sob o nome de drusos do Monte Líbano, e próximo a Basra ou Bassorah, sob o nome de mandeus, ou Discípulos de São João. Todas essas seitas têm uma conexão imediata com o nosso assunto, pois pertencem à família cabalística, tendo outrora abraçado a secreta “Religião da Sabedoria” e reconhecido como Supremo o Deus dos Mistérios do Inefável Nome. Dando notícia dessas numerosas sociedades secretas do passado, iremos compará-las com outras tantas sociedades modernas. Concluiremos com uma rápida análise dos jesuítas, e desse venerável pesadelo da Igreja católica romana - a Francomaçonaria moderna. Todas essas fraternidades antigas e modernas - excetuada a moderna Franco-maçonaria estiveram e estão mais ou menos relacionadas com a Magia - tanto prática como teoricamente, e todas elas sem exceção da Franco-maçonaria - foram e ainda são acusadas de demonolatira, blasfêmia e imortalidade. Uma após outra, a maré do tempo engolfou as seitas dos primeiros séculos, não deixando subsistir senão uma única em sua integridade primitiva. Esta única existe, ainda ensina a doutrina de seu fundador, ainda exemplifica sua fé em obras de força. As areias movediças que engoliram todas as outras conseqüências da agitação religiosa dos tempos de Jesus, com seus relatos, relíquias e tradições, lhe forneceram terra firme. Expulsos de sua terra natal, seus membros encontraram refúgio na Pérsia, e hoje ainda o viajante ansioso pode conversar com os descendentes diretos dos “Discípulos de João”, que ouviram, nas margens do Jordão, o “homem enviado por Deus” por quem foram batizados e em quem acreditaram. Esse povo curioso, que conta com cerca de 30.000 almas, é erroneamente chamado de “CrisTãos de São João”, mas, na verdade, deveria ser conhecido por seu antigo nome, nazareus, ou pelo novo mandeus. A designação que se lhes dá de Cristãos é totalmente errônea. Eles não acreditam em Jesus como Cristo, nem aceitam sua expiação, não aderem à sua Igreja e não o reverenciam suas “Escrituras Sagradas”. Nem cultuam ao Deus-Jeová dos judeus e dos cristãos, circunstância que prova naturalmente que seu fundador, João Batista, também não lhe prestava culto. E se assim for, que direito tem ele a um lugar na Bíblia, ou na galeria de retratos dos santos cristãos? Além disso, se Ferho era seu Deus, e se ele foi “um homem enviado por Deus”, deve ter sido enviado pelo Senhor Ferho, e foi em seu nome que ele batizou e pregou. Ora, se Jesus foi batizado por João, a conclusão a que se chega é que ele foi batizado de acordo com a fé do Batista; portanto, também Jesus acreditava em Ferho, ou Faho, como o chamam; tal inferência parece ser corroborada pelo seu silêncio em relação ao nome de seu “Pai”. E por que pareceria ridícula a hipótese de que Faho não é senão uma das muitas corruptelas de Fho, ou Fo, que é o nome pelo qual os tibetanos e os chineses chamam o Buddha? No Norte do Nepal, Buddha é invocado com muito mais freqüência pelo nome Buddha. O livro de Mahâvansa mostra como o trabalho de proselitismo do Budismo se iniciou bastante cedo no Nepal; e a história ensina que os monges budistas invadiram a Síria e a Babilônia no século anterior à nossa era, e que Buddhasp (Nosdhisattva), o pretenso caldeu, foi o fundador do Sabianismo ou batismo. Qual era o credo dos verdadeiros batistas, al-Mughtasilah, ou nazarenos, explicamo-lo noutras partes, pois eles são os mesmos nazarenos de quem já tanto falamos, e cujo Codex citamos. Perseguidos e ameaçados de aniquilação, eles encontraram refúgio na comunidade nestoriana, permitindo-se assim o serem arbitrariamente classificados como cristãos, mas, assim que a oportunidade se ofereceu, separaram-se e hoje, passados vários séculos, não merecem sequer nominalmente a denominação. Que sejam assim chamados, não obstante, pelos autores eclesiásticos, não é difícil de compreender. Eles conhecem muito bem o Cristianismo primitivo para se ignorá-los por completo, pois testemunhar contra eles com suas tradições, sem o estigma da heresia, viria destruir a confiança no que eles podem dizer. Não se pode negar-lhe o legado da doutrina batista; suas tradições não apresentam um única falha. O que eles ensinam hoje, seus antecessores ensinaram na própria época em que fizeram sua aparição na história. Eles são os discípulos daquele João que anunciou o advento de Jesus, que o batizou e que declarou que ele (João) não era digno de desamarrar as sandálias . Quando ambos - o Mensageiro e o Messias - estavam no Jordão, e quando o mais velho consagrava o mais jovem - seu próprio primo, também, humanamente falando - os céus se abriram e o Próprio Deus, na forma de uma pomba, desceu num raio de luz sobre o seu “Amado
Filho”! Se esse relato é correto, como podemos explicar a infidelidade dos nazarenos sobreviventes? Longe de acreditar que Jesus era o Filho Único de Deus, eles na verdade afirmaram aos missionários persas, que, no século XVII, foram os primeiros a revelá-los aos europeus, que o Cristo no Novo Testamento era “um falso mestre”, e que o sistema judeu, assim como o de Jesus (?), vieram do reino das trevas ! Quem o saberia melhor do que eles? Onde se podem encontrar testemunhas vivas mais fiéis? Os clérigos cristãos nos querem impingir um Salvador ungindo e anunciado por João, e os discípulos desse mesmo Batista, desde os primeiros séculos, estigmatizaram esse personagem ideal como um impostor, e a seu putativo Pai, Jeová, como “um Deus espúrio”, o Ialdabaôth dos ofitas! Infelizmente para o Cristianismo, o dia virá em que algum destemido e honesto erudito persuadirá seus pares mais velhos a lhe permitirem traduzir o conteúdo dos livros secretos e compilar suas antigas tradições! Uma estranha ilusão faz com que alguns autores pensem que os nazarenos não têm nenhuma outra literatura sagrada, nenhuma outra relíquia literária do que as quatro obras doutrinárias, esse curioso volume repleto de Astrologia e Magia que eles são instados a ler atentamente no pôr-do-Sol (domingo). Essa busca da verdade conduz-nos, de fato, a caminho tortuosos. Muitos são os obstáculos que a astúcia eclesiástica colocou no caminho de nossa descoberta da fonte primeira das idéias religiosas. O Cristianismo está em julgamento, e assim tem sido desde que a ciência se sentiu bastante, forte para agir como um Promotor Público. A presente obra expõe uma parte do processo. Quantas verdades há nessa Teologia? Através de que seitas elas tem sido transmitida? Donde provém ela primariamente? Para respondê-lo, devemos traçar a história da Religião Mundial, tanto através das seitas cristãs como através das de outras grandes subdivisões religiosas da raça, pois a Doutrina secreta é a Verdade, e a religião que a conservou de forma menos adulterada é a que mais se aproxima do divino. ETIMOLOGIA DE IAÔ. (L. 3. pág. 259). O primeiro esquema (Encontra-se no cap. IV) - o dos ofitas -, desde o início, difere da descrição dada pelos padres, na medida em que torna Bythos, a profundidade, uma emanação feminina, e lhe atribui um lugar que corresponde ao de Pleroma, mas numa região muito superior, ao passo que os padres nos asseguram que os gnósticos davam o nome de Bythos à Causa Primária. Como no sistema cabalístico, ele representa o vazio ilimitado e infinito no qual está oculto nas trevas o motor Primeiro Desconhecido de tudo. Ele envolve como um véu: em suma, reconhecemos novamente o "Shekinah" do Ain-Soph. Tomado separadamente, o nome de `IAO, Iao, assinala o centro superior, ou antes o presumido em que se supõe que o Desconhecido possa permanecer. Em torno de Iao, corre a legenda CEMEC EIAAM ABPA∑A≡, "O eterno Sol-Abrasax" (o sol espiritual central de todos os cabalistas, representando em alguns diagramas destes últimos pelo círculo de Tiphereth). Dessa região de insondável Profundeza surge um círculo formado de espirais, que, na linguagem do simbolismo, significa o grande ciclo, composto de ciclos menores. Enrolada em seu interior, de modo a seguir as espirais, repousa a serpente - emblema da sabedoria e da eternidade - o Andrógino Dual: o ciclo que representa Ennoia, a Mente Divina, e a Serpente - o Agathodaimôn, o Ophis - a Sombra da Luz. Ambos eram os Logoi dos ofitas; ou a unidade como Logos que se manifesta como um princípio duplo de bem e mal, pois, de acordo com suas concepções, esses dois princípios são imutáveis, e existem desde a eternidade, e continuarão a existir para sempre. Este símbolo explica a adoração por esta seita da Serpente, como o Salvador, enrolada em torno do pão Sacramental, ou de um Tao. Como unidade, Ennoia e Ophis são o Logos; quando separados, um é Árvore da Vida (espiritual), o outro, a Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal. Por conseguinte, descobrimos Ophis incitando o primeiro par humano - a produção material de Ialdabaôth, mas que devia seu princípio espiritual a Sophia-Akhamôth - a comer o fruto proibido, embora Ophis represente a Sabedoria Divina. A Serpente, a Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal, e a Árvore da Vida, são símbolos transplantados do solo da Índia. A Arasamaram, a árvore baniana, tão sagrada para os hindus, desde que Vishnu, durante uma de suas encarnações, repousou sob sua enorme sombra e aí ensinou filosofia e ciência à Humanidade, é chamada de Árvore do Conhecimento e Árvore da Vida. Sob a protetora ramada dessa rainha das flores, os gurus ensinam a seus pupilos as primeiras lições sobre a imortalidade e os iniciam nos mistérios da vida e da morte. Na tradição caldaica, os Yava-ALEIM do Colégio Sacerdotal passam por ter ensinado aos filhos dos homens como se tornarem iguais as eles. Até o presente, Foh-tchou, (Foh-tchou significa literalmente, em chinês, o senhor de Buddha, ou o mestre das doutrinas de Buddha-foh.) que vive em seu Foh-Maëyu, ou templo de Buddha, no topo do "Kuen-lun-shan", a grande montanha, produz seus maiores milagres religiosos sob uma árvore chamada, em chinês, de Sung-Ming-Shu, ou a Árvore do Conhecimento e a Árvore da Vida, pois a ignorância é morte, e só o conhecimento dá imortalidade. Esse maravilhoso
espetáculo ocorre de três em três anos, quando uma enorme multidão de budistas chineses se junta em peregrinação no local sagrado. Ialdabaôth, o "Filho das Trevas" e o criador do mundo material, habitava o planeta Saturno, que o identifica ainda mais com o Jeová judeu, que era o próprio Saturno, de acordo com os ofitas, que lhe recusam o nome sinaítico. De Ialdabaôth emanam seis espíritos que habitam, respetivamente, com seu pai, os sete planetas. Estes são: Tsabaôth - Marte; Adonaios - Sol; Iao - Lua; Eloaios - Júpiter; Astaphaios - Mercúrio (espírito da água); e Horaios - Vênus, espírito do fogo. Em suas dadas funções e descrição, os sete planetas são idênticos aos Sapta-lokas hindus, os sete locais ou esferas, ou os mundos superiores ou inferior, pois representam as sete esferas cabalísticas. Para os ofitas, eles pertencem às esferas inferiores. Os monogramas desses planetas gnósticos são igualmente budistas, diferindo estes últimos embora em pequena escala, dos das usuais "casas" astrológicas. O diagrama nazareno, exceto numa troca de nomes, é idêntico ao dos gnósticos, que, evidentemente, dele extraíram suas idéias, acrescentando umas poucas designações derivadas dos sistemas de Basilides e Valentino. Para evitar repetições, apresentaremos os dois quadros em paralelo. Assim, descobriremos que, na Cosmogonia nazarena, os nomes de seus poderes e genii estão nas seguintes relações com os dos gnósticos: NAZARENO
GNÓSTICO-OFITA
PRIMEIRA TRINDADE Senhor FERHO - a Vida que não é Vida - o Deus Supremo. A Causa que produz a Luz, ou o Logos in abscondito. A água de Jordanus Maximus - a água da Vida, ou Ajar, o princípio feminino. Unidade numa Trindade, encerrada em ISH AMON. SEGUNDA TRINDADE (A manifestação da primeira)
PRIMEIRA UNIDADE NUMA TRINDADE IAÔ - o Inefável Nome da Divindade Desconhecida - Abraxas, e o "Abraxas, e o "Sol Espiritual Eterno", Unidade encerrada na Profundeza, Bythos, princípio feminino - o círculo ilimitado, no qual repousam todas as formas ideais. Dessa Unidade emana a SEGUNDA TRINTADE (idem)
1. Senhor MANO - o Rei da Vida e da Luz – Rex Lucis. A Primeira VIDA, ou o homem primitivo.
1. Ennoia - mente.
2. Senhor Jordão - manifestação ou emanação de Jordanus Maximus – as águas da graça. Segunda VIDA.
2. Ophis, o Agathodaimôn.
3. O Pai Superior - Abathur. Terceira VIDA. Essa Trindade produz também uma díada - Senhor Lehdoio, e Phtahil, o genius (o primeiro, uma emanação perfeita; o segundo, uma emanação imperfeita). Senhor Jordão - "o Senhor de todos os Jordão". manifesta NETUBTO (Fé sem Obras).
3. Sophia - Andrógina - sabedoria, que, por sua vez - fecundada pela Luz Divina -, produz Cristos e Sophia-Akhamôth (um, perfeito, a outra, imperfeita), como uma emanação. Sophia Akhamôth emana Ialdabaôth - o Demiurgo, que produz a criação material e sem alma. "Obras sem Fé (ou graça).
Ademais, os sete genii planetários ofitas, que emanam um do outro, reaparecem na religião nazarena, sob o nome de "Sete demônios impostores", ou estrelares, que "enganarão a todos os filhos de Adão". São eles: Sol; Speritus Venereus (o Espírito Santo, em seu aspeto material), a mãe dos "sete estrelares mas dispostos", que correspondem ao Akhamôth gnóstico; Nebu, ou Mercúrio, "Um falso Messias, que depravará o antigo culto de Deus"; SIN (ou Luna, ou Shuril); KHÎYÛN (ou Saturno); Bel-Júpiter; e o sétimo, Nerig, Marte (Codex Nazaraeus, I. p.55). O Cristos dos gnósticos é o chefe dos sete Aeons, os sete espíritos de Deus segundo São João; os nazarenos têm também seus sete genii ou bons Aeôns, cujo chefe é Rex Lucis, seu Cristo. Os Sapta-Rishis, os sete sábios da Índia, habitam os Sapta-Puras, ou as sete cidades celestiais. Nas jóias ofitas de King, encontramos o nome de Iao repetido e amiúde confundido com o de Ievo, ao passo que este último representa simplesmente um dos genii antagônicos a Abraxas. A fim de que tais nomes sejam tomados como idênticos com o nome de Jeová judeu, não tardaremos em dar a explicação dessa palavra. Parece-nos muito estranho que tantos eruditos arqueólogos tenham tão pouco se empenhado para mostrar que há mais de um Jeová, e que o nome teve origem com Moisés. Iao é certamente um título do Ser Supremo, e diz respeito apenas parcialmente ao Inefável Nome; mas ele não se originou com os judeus, nem foi propriedade única destes. Mesmo se aprazou a Moisés conferir esse nome ao "Espírito" tutelar, a suposta divindade nacional protetora do "povo escolhido de Israel", não há nenhuma razão possível para que outras nacionalidades O recebam como o Deus Supremo e Único. Mas negamos sumariamente tal pretensão. Além disso, há o fato de que Yâho ou Iao era um "Nome dos mistérios" desde o início, pois jamais foram empregados antes da época do Rei Davi. Anteriormente, poucos ou nenhum nome próprio havia sido composto com iah ou yah. Parece antes que Davi, tendo estado entre os tirenses e os filisteus (2 Samuel),
deles tenha trazido o nome de Jeová. Ele nomeou Zadok sumo-sacerdote, e é dai que provêm os zadoquias ou saduceus. Viveu e reinou em primeiro lugar em Hebron, Habir-on ou cidade de Kabir, onde os ritos dos quatro (deuses dos mistérios) eram celebrados. Nem Davi, nem Salomão reconheciam a Moisés ou à sua lei. Eles aspiravam construir um templo a Iao, como as estruturas erigidas por Hirão a Hércules e Vênus, Adon e Astartê. Diz Fürst: "O antiquíssimo nome de Deus - Yâho (...) que em grego se escreve 'Iaw, parece, à parte sua etimologia, ter sido um antigo nome místico da divindade suprema dos semitas. Foi assim que ele foi passado a Moisés, quando este teve a sua iniciação em HOR-EB - a caverna - sob a direção de Jethro, o sacerdote kenita ou cainita de Madiã. Na antiga religião dos caldeus, vestígios da qual se acham entre os neoplatônicos, a divindade suprema entronizada acima dos sete céus, que representa o princípio de luz espiritual Nous (Nous, a designação dada por Anaxágoras à Divindade Suprema, foi tomada do Egito, onde o chamavam NOUT) e que é concebida como um demiurgo, (Por um pequeno número, todavia, pois os criadores do universo material sempre foram considerados como divindades subordinadas ao Deus Supremo.) chamava-se 'Iaw, que era, como o Yâho hebreu, misteriosa e indizível (...) e cujo nome só era comunicado aos iniciados (...) Os fenícios tinham um deus supremo, cujo nome era trilítero (literatrina) e secreto (...) e que era 'Iaw. Para compreender o sentido real e primitivo do termo 'IAO e a razão pela qual ele se tornou a designação para a mais misteriosa de todas as divindades, precisamos buscar a sua origem na fraseologia figurativa de todos os povos primitivos. Devemos, antes de mais nada, recorrer, para nossa informação, às fontes mais antigas. Num dos Livros de Hermes, por exemplo, afirma-se que o número DEZ é a mãe da alma, e que a vida e a luz estão nele unidos. Pois "o número 1 (um) nasce do espírito, e o número 10 (dez) da matéria", "a unidade fez o DEZ, o DEZ, a unidade". Uma vez que reconhecemos o fato de que, entre todos os povos da mais alta Antigüidade, a concepção mais natural da Primeira Causa que se manifesta em suas criaturas - as quais não podiam deixar de lhe atribuir toda a criação - era a de uma divindade andrógina; de que o princípio masculino era considerado como o espírito invisível vivificante, e o feminino, a mãe Natureza, poderemos então compreender por que essa misteriosa causa veio a ser inicialmente representada (na escrita pictográfica, talvez) como a combinação do alfa e do Ômega dos números, um decimal, e depois como IAÔ, um nome trilítero, que contém em si uma profunda alegoria. IAÔ, em tal caso, significaria - etimologicamente falando - o "Alento da Vida", gerado ou produzido entre um princípio natural masculino ereto e um princípio feminino como a forma de um ovo; pois, em sânscrito, as significa "ser", "viver ou existir", sendo sua significação original a de "respirar". "Foi com base nessa raiz", diz Max Müller, "em seu sentido original de `respirar', que os hindus formaram asu, "alento", e asura, o nome de Deus, que significa, seja o "alento", seja o doador do alento". Seu sentido é certamente este último. Em hebraico, "Iâh" e "Iâh" significa "vida". Cornélio Agripa, em seu tratado sobre a Preeminência da Mulher, mostra que a palavra Eva sugere uma comparação com os símbolos místicos dos cabalistas, tendo o nome da mulher uma afinidade com o inefável Tetragrammaton, o nome mais sagrado da divindade. Os nomes antigos tinham sempre uma consonância com as coisas que representavam. Em relação ao misterioso nome da Divindade em questão, a insinuação até aqui inexplicável dos cabalistas quanto à eficácia da letra H, "que Abarão retirou de sua esposa Sarah" e "colocou no meio de seu próprio nome", torna-se clara. Os tempos mais sagrados dos hindus são os do Jagan-nâtha. Essa divindade é reverenciada por todas as seitas da Índia igualmente, e Jagan-nâtha é chamado de "Senhor do Mundo". Ele é o deus dos mistérios, e seus templos, que são muito numerosos em Bengala, têm todos a forma de uma pirâmide. Não há nenhuma outra divindade que forneça tal variedade de etimologista quanto Yâho, nem um nome que possa ser pronunciado de maneira tão diversa. Foi apenas associando-o com os pontos massoréticos que os rabinos das épocas posteriores conseguiram transformar Jeová em "Adonai" - ou Senhor. Philo Byblius grafa-o em caracteres gregos como 'IEYΩ (IEVO). Theodoret diz que os samaritanos pronunciavam tal nome com 'Iaßé (Yabe), e os judeus Aïa; Diodorus afirma que "os judeus relatam que Moisés chamava seu Deus de "Iaϖ", o que a faria pronunciar como já indicamos - Iah-Ô. É com base na autoridade da própria Bíblia, por conseguinte, que afirmamos que antes de sua iniciação por Jethro, seu sogro, Moisés jamais ouviu a palavra Yâho. A futura Divindade dos filhos de Israel chama da pira ardente e dá Seu nome como "Eu sou o que sou", e especifica cuidadosamente que é o "Senhor Deus dos Hebreus" (Êxodo, III,18), não de outras nações. A julgar por seus próprios atos, através dos relatos judeus, temos dúvidas de que o Cristo, se tivesse surgido nos dias do Êxodo, seria bem recebido pela irascível Divindade sinaítica. Contudo, o "Senhor Deus", que se torna, segundo Sua própria confissão, Jeová apenas no sexto capítulo do Êxodo (versículo 3), vê sua veracidade posta em dúvida no Gênese, XXII, 9, 14, em cuja passagem revelada Abarão edifica um altar a Jehovh-Jireh.
Por conseguinte, pareceria natural estabelecer uma diferença entre o Deus dos mistérios 'Iaw, adotado desde a mais alta antigüidade por todos os que participavam do conhecimento esotérico dos sacerdote, e suas contrapartes fonéticas, tratadas com tão pouca reverência pelos ofitas e outros gnósticos. Tendo sido oprimidos, como o Azâzêl dos desertos, pelos pecados e iniqüidades da nação judaica, parece agora difícil para os cristãos terem que confessar que aqueles a quem consideravam aptos a considerar o "povo eleito" de Deus - seus únicos predecessores no monoteísmo - eram, até um período muito tardio, tão idólatras e politeístas quanto os seus vizinhos. Os sagazes talmudistas escaparam por longos séculos da acusação, escondendo-se atrás da invenção massorética. Mas, como em todas as outras coisas, a verdade veio por fim à luz. Sabemos agora que Ihoh, deve ler-se Yâhoh e Yâh, não Jeová. Yâh dos hebreus é exatamente o Iacchos (Baco) dos mistérios; o Deus "de quem se espera a libertação das almas - Dioniso, Iacchos, Iachoh, Iahoh, Iao". Aristóteles, portanto, estava certo quando disse: "Joh, era Oromazdes e Ahriman Pluto, pois Deus do céu, Ahura-Mazda, monta uma carroça que o Cavalo do Sol segue". E Dunlap cita Salmos, LXVIII, 4 que diz: "Louvai-o por seu nome Yâh, Que monta os céus a um cavalo".
e então que "os árabes representavam Iauk (Iach) por um cavalo. O Cavalo do Sol (Dionísio)". Iah é um abrandamento de Iah", explica ele. "h e h são intercambiáveis; assim como também, e se abranda em h. Os hebreus exprimem a idéia da VIDA tanto por um h quanto por um h; como hiah, `ser', hiah, `ser'; Iah, Deus da Vida, Iah, `Eu sou'". Podemos portanto repetir essas linhas de Ausônio: "Os filhos de Ogyges chamam-me Baco; o Egito pensa que sou Osíris; Os misianos chamam-me Phanaces; os indianos vêem-me como Dionísio; Os ritos romanos fazem-me Liber; a raça árabe pensa que sou Adoneus; Os lucanenses, o Deus Universal (...)"
E o povo eleito, Adónis e Jeová - poderíamos acrescentar. Quão pouco se compreendeu a filosofia da antiga doutrina secreta, provam-nos as atrozes perseguições dos Templários pela Igreja, sob a acusação de adorarem o Demônio na forma de um bode Baphomet! Sem aprofundar os antigos mistérios maçônicos, não há um só maçom - dentre os que sabem alguma coisa, que não esteja a par da verdadeira relação entre Baphomet e Azâzêl, o bode expiatório do deserto, cujo caráter e cujo significado foram inteiramente pervertidos nas traduções cristã. "Esse terrível e venerável nome de Deus", diz Lanci, bibliotecário do Vaticano, "através da pena dos glossários bíblicos, transformou-se num demônio, numa montanha, num deserto, num bode. Na Royal Masonic Cyclopaedia, de MacKenzie, o autor assinala com correção que "essa palavra deveria ser dividida em Azaz e El", pois ela "significa Deus da Vitória, mas é aqui empregada no sentido de Autor da morte, em contraste com Jeová, o Autor da vida; este último recebia um bode morto como oferenda". A Trindade hindu é composta de três personagem, que se podem converter numa única. A Trimûrti é una, e, em sua abstração, indivisível. No entanto, vemos que uma divisão metafísica tem lugar desde o início. Ao passo que Brahmâ, embora coletivamente represente os três, permanecendo sob o pano, Vishnu é o Dador da Vida, o Criador, o Preservador, e Shiva é o Destruidor, a divindade mortuária. "Morte ao doador da Vida, vida ao propiciador da Morte. A antítese simbólica é grande e bela", diz Bliddon. "Deus est Daemon inversus" - essa frase dos cabalistas torna-se agora clara. É apenas o intenso e cruel desejo de apagar o último vestígio das antigas filosofias, pervertendo-lhe o sentido, por medo de que os seus próprios dogmas não lhe sejam corretamente atribuídos, que impele a Igreja Católica a exercer uma tal perseguição sistemática contra os gnósticos, os cabalistas e mesmo os relativamente inocentes maçons. Ai de nós! Quão pouco a divina semente, disseminada pelas mãos do humilde filósofo judeu, fincou raízes ou produziu qualquer fruto! Se aquele que verberou a hipocrisia, que lutou contra a prece pública, recriminando-lhe o exibicionismo inútil, pudesse lançar seu pesaroso olhar sobre a Terra, das regiões de beatitude eterna, veria ele que essa semente não caiu, nem num terreno estéril, nem à margem do caminho. Não, ela fincou fundas raízes no solo mais fértil; aquele enriquecido até a pletora pelo sangue e pela mentira humana.
O SIGNIFICADO DO NIRVANA. (L. 3. pág. 276). Desde o dia mesmo em que o primeiro místico encontrou os meios de comunicação entre este mundo das hostes invisíveis, entre a esfera da matéria e a do puro espírito, concluiu ele que abandonar essa misteriosa ciência à profanação do vulgo seria perdê-la. Abusar dela levaria a Humanidade a uma rápida destruição; seria o mesmo que fornecer bombas explosivas a um grupo de crianças em dar-lhes fósforos. O primeiro adepto iniciou apenas uns poucos selecionados, e guardou o segredo das multidões. Ele reconheceu seu Deus e sentiu que o grande Ser estava consigo. O "Âtman", o Si-Mesmo, o poderoso Senhor e Protetor, assim que o homem o conheceu como o "Eu sou", o "Ego Sum", o "Asmi", deu a prova de todo o seu poder àquele que era capaz de reconhecer a "voz do silêncio". Desde os dias do homem primitivo, descritos pelo primeiro poeta védico, até a nossa época moderna, não houve um único filósofo digno desse nome que não tenha conquistado, no santuário silencioso de seu coração, a grande e misteriosa verdade. Se era um iniciado, ele a aprendeu como uma ciência sagrada; se não, como Sócrates, que repetia a si mesmo, assim como a todos os seus colegas, o nobre preceito, "Ó homem, conhece-te a ti mesmo", conseguiu reconhecer seu Deus em si mesmo. "Sois deuses", diz-nos o rei salmita, e vemos que Jesus lembra aos escribas que a expressão "Sois deuses" se dirigia a outros homens mortais, e que ele reclamava para si o mesmo privilégio sem incorrer em qualquer blasfêmia. E, como um eco fiel, Paulo, embora afirmado que somos todos "o templo do Deus vivo", acrescenta cautelosamente que afinal de contas todas essas coisas são apenas para os "sábios", e que não é "lícito" falar delas. Portanto, devemos aceitar o convite, e anotar simplesmente que mesmo na fraseologia bárbara e torturada do Codex nazaraeus, encontramos a mesma idéia. Como uma corrente subterrânea, rápida e clara, ela flui sem misturar sua pureza cristalina com as ondas lodosas e pesadas do dogmatismo. Entontramo-lá no Codex, assim como nos Vedas, no Avesta, no Abhidharma, tanto nos Sânkhua-Sûtras de Kapila como no Quarto Evangelho. Não podemos atingir o "Reino dos Céus" sem antes nos unir indissoluvelmente como nossa Rex Lucis, o Senhor Esplendor e da Luz, nosso Deus Imortal. Devemos primeiro conquistar a imortalidade e "tomar o Reino dos Céus pela força", oferecido ao nosso eu material. "O primeiro homem, tirado da terra, é terrestre; o segundo homem é o Senhor do céu (...) Vede, eu vos dou a conhecer um mistério", diz Paulo (I Coríntios, XV, 47,51). Na religião de Sâkya-Muni, que os eruditos comentadores se têm comprazido em considerar como puramente niilista, a doutrina da imortalidade é definida com muita clareza, não obstante as idéias européias, ou antes, cristãs, sobre o Nirvana. Nos livros sagrados jainistas de Pattana, o Gautama Buddha moribundo é assim interpelado: "Sobe ao Nirvi (Nirvana) saindo desse corpo decrépito ao qual foste enviado. Sobe à tua morada anterior, ó Abençoado Avatâra!" Isto nos parece o próprio oposto do Niilismo. Se Gautama é convidado a retornar à sua "morada anterior", e essa morada é o Nirvana, então é incontestável que a Filosofia Budista não ensina a aniquilação final. Assim como se pretende que Jesus apareceu a seus discípulos após a morte, do mesmo modo acredita-se ainda hoje que Gautama retorna do Nirvana. E se ele existe aí, tal estado não é um sinônimo de aniquilação. Gautama, assim como todos os outros grandes reformadores, tinha uma doutrina para os seus "eleitos" e outra para as massas, embora o objetivo principal se sua reforma consistisse em iniciar a todos, na medida em que era permissível e prudente fazê-lo, sem distinção de castas ou riquezas, nas grandes verdades até então mantidas em segredo pela egoísta classe bramânica. Gautama Buddha foi o primeiro, na história humana, quem movido pelo generoso sentimento, reúne toda a Humanidade num único amplexo, convidando o "pobre", o "aleijado" e o "cego" à mesa do festival real, da qual excluiu aqueles que haviam até então se sentado a sós, em orgulhoso isolamento. Foi ele quem, como mão enérgica, abriu pela primeira vez a porta do santuário ao pária, ao decaído e a todos os "aflitos pelos homens" vestidos em ouro e púrpura, porém que eram amiúde mais dignos de piedade do que os proscritos a quem apontavam desdenhosamente o dedo. Tudo isso fez Siddhârtha seis séculos antes de outro reformador, tão nobre quanto bondoso, embora menos favorecido pela sorte, em outra terra. Se ambos, conscientes do grande perigo de fornecer a uma população inculta a espada de dois gumes do conhecimento que dá poder, deixaram na mais profunda sombra o quadrante mais interno do santuário, quem, familiarizado com a natureza humana, poderá censurá-los por isso? Mas, ao passo que um agiu por prudência, o outro foi forçado a adotar esse meio. Gautama deixou intacta a parte esotérica e mais perigosa do "conhecimento secreto", e viveu até a idade avançada de oitenta anos, com a certeza de ter ensinado as verdades essenciais, e de a elas ter convertido um terço do mundo; Jesus prometeu a seus discípulos o conhecimento que confere ao homem o poder de produzir milagres ainda maiores do que aqueles que ele fizera, e morreu, deixando apenas uns poucos homens fieis, a meio caminho do conhecimento, para lutarem com o mundo ao qual não podiam comunicar senão o que eles próprios conheciam pela metade. Mai tarde, seus seguidores desfiguraram a verdade ainda mais do que eles próprios o haviam feito.
Não é verdade que Gautama nunca ensinou qualquer coisa a propósito da vida futura, ou que ele negou a imortalidade da alma. Perguntai a qualquer budista inteligente quais são suas idéias sobre o Nirvana, e ele expressar-se-á como o fez o conhecido Wong Ching Foo, o orador chinês, agora em viagem a este país, numa recente conversa conosco sobre o Niepang (Nirvana). "Esse estado", observou ele, "segundo todos entendemos, significa uma reunião final com Deus, que coincide com a perfeição do espírito humano por sua libertação final da matéria. É exatamente o contrário da aniquilação pessoal". O Nirvana significa a certeza da imortalidade pessoal no Espírito, não na Alma, que, como uma emanação finita, deve certamente desintegrar suas partículas - um composto de sensações humanas, paixões e anseios por alguma espécie objetiva de existência - antes que o espírito imortal do Ego esteja completamente livre, e por conseguinte certo de não mais sofre qualquer forma de transmigração. E como pode o homem atingir esse estado, enquanto o Upâdâna, esse estado de anseio pela vida e mais vida, não desaparecer do ser senciente, do Ahamkara vestido, contudo, com um corpo sublimado? É o "Upâdâna", o intenso desejo, que produz a VONTADE, e é a vontade que desenvolve a força, e esta gera a matéria, ou qualquer objeto provido de forma. Assim, o Ego desencarnado, movido por esse desejo imortal que nele reside, fornece inconscientemente as condições de suas sucessivas autoprocriações em várias formas, que dependem de seu estado mental e de seu Karma, as boas e más ações de sua existência anterior, comumente chamadas de "mérito e demérito". Eis por que o "Mestre" recomendava a seus mendicantes o cultivo dos quatro graus de Dhyâna, o nobre "Caminho das Quatro Verdades", i.e., essa aquisição gradual da indiferença em face da vida ou da morte; esse estado de autocontenplação espiritual durante a qual o homem perde completamente de vista sua dupla individualidade física, composta de corpo e alma, e unindo-se com seu terceiro eu imortal, o homem real e celeste, mergulha, por assim dizer, na Essência divina, donde o seu próprio espírito procede como uma centelha oriunda de uma chama comum, Assim, o Arhat, o santo mendicante, pode alcançar o Nirvana quando ainda na Terra; e seu espírito, totalmente liberto dos entraves da "sabedoria psíquica terrestre e demoníaca", com a designa São Tiago, e sendo por natureza onisciente e onipotente, pode sobre a Terra, por meio simplesmente de seu pensamento, produzir os maiores fenômenos. DA ANTIGUIDADE DAS RELIGIÕES. (L. 3. pág. 278). Exceto uns poucos arqueólogos imparciais que reconhecem um claro elemento budista no gnosticismo, assim como em todas as seitas efêmeras, pouco conhecimento temos de autores que, escrevendo sobre o Cristianismo primitivo, conferiram ao assunto a sua devida importância. Não temos fatos suficientes para, pelo menos, sugerir algum interesse nesta direção? Não aprendemos que já nos dias de Platão havia "brâmanes" - leia-se missionários budistas, samaneus, samãs ou shamans - na Grécia, e que num dado momento eles invadiram o país? Não mostra Plínio que eles se estabeleceram nas costas do Mar Morto, por "milhares de anos"? Fazendo o devido desconto ao exagero, restam-nos ainda vários séculos antes de nossa era como margem. E não é possível que sua influência tenha deixado marcas mais profundas em todas essas seitas do que geralmente se acredita? Sabemos que a seita jainista afirma derivar o Budismo de seus dogmas esse Budismo que existia antes de Siddhârtha, mais conhecido como Gautama Buddha. Os brâmanes hindus, a quem os orientalistas europeus negam o direito de conhecer qualquer coisa a respeito de seu próprio país, ou de entender sua linguagem e seus registros melhor do que aqueles que nunca estiveram na Índia, com base no mesmo princípio pelo qual os judeus são proibidos, pelos teólogos cristãos, de interpretar suas próprias Escrituras -, os brâmanes, dizíamos, têm registros autênticos. E estes mostram que a encarnação do regaço da Virgem Avany do primeiro Buddha - Luz Divina - teve lugar alguns milhares de anos antes de Cristo, na ilha do Ceilão. Os brâmanes rejeitam a afirmação de que ele foi um dos avatâra de Vishnu, mas admite o surgimento de um reformador do Bramanismo nesse época. A história da Virgem Avany e de seu filho divino, Sâyamuni, está registrada em um dos livros sagrados dos budistas singaleses - o Culla-Niddesa; e a cronologia bramânica fica a grande revolução budista e a guerra religiosa, e o desenvolvimento subseqüente do Sâkya-muni no Tibete, na China, no Japão e em outros lugares, no ano 4.620 a.C. É claro que Gautama Buddha, o filho do Rei de Kapila-vastu, e o descendente do primeiro Sâkya, através de seu pai, que era da casta guerreira, Kshatriaya, não inventou sua filosofia. Filantrópico por natureza, suas idéias foram desenvolvidas e amadurecidas quando ele ainda estava sob a tutela de Tîrthamkara, o famoso guru da seita jainista. Esta afirma que o Budismo atual era um ramo divergente de sua própria filosofia, e que ela é a única a congregar os poucos seguidores do primeiro Buddha, a quem se permitiu ficar na Índia, após a expulsão de todos os outros budistas, provavelmente porque haviam assumido algum compromisso, abraçando certas noções bramânicas. É curioso, para dizer o mínimo, que três religiões dissidentes e inimigas, como Bramanismo, Budismo e Jainismo, concordem tão perfeitamente em suas tradições e cronologias quanto ao Budismo, e que nossos cientistas dêem ouvidos apenas às suas próprias
injustificadas e especulações e hipóteses. Se o nascimento de Gautama pode, com alguma razão, ser fixado por volta do ano 600 a.C., então os Buddhas precedentes devem ter algum lugar na cronologia. Os Buddhas não são deuses, mas simplesmente indivíduos protegidos pelo espírito de Buddha - o raio divino. Ou será que é porque, incapazes de sair da dificuldade pela ajuda apenas de suas próprias pesquisas, nossos orientalistas preferem suprimir e negar o todo, a atribuir aos hindus o direito de conhecer algo sobre sua própria religião e história? Estranha maneira de descobrir a verdade! O argumento comum aduzido contra a pretensão jainista, no tocante a ser a fonte da restauração do antigo Budismo, de que o dogma principal desta última religião é oposto à crença dos jainistas, não resiste à análise. Os budistas, dizem nossos orientalistas, negam a existência de um Ser Supremo; os jainistas admitem um, mas protestam contra a afirmação de que "Ele" pode interferir no governo do universo. Os budistas não negam em absoluto tal coisa. Mas se algum erudito desinteressado pudesse estudar cuidadosamente a literatura jainista, nos milhares de livros preservados - os deveríamos dizer ocultos - em Râjputâna, Jaisalmer, em Pattan e outros lugares; e especialmente se ele pudesse apenas ter acesso aos mais velhos de seus volumes sagrados, descobriria uma perfeita identidade de pensamento filosófico, se não de ritos populares, entre os jainistas e os budistas. O Âdi-Buddha e o Âdinâtha (ou Âdisvara) são idênticos em essência e propósito. Mas, se seguirmos os traços dos jainistas, com seus reclamos quanto à possessão dos templos-cavernas mais antigos, e seus registros de um antigüidade quase incrível, dificilmente poderemos vê-los sob uma luz diferente daquela em que eles próprios se vêem. Devemos admitir com toda certeza que eles são os únicos verdadeiros descendentes dos primitivos proprietários da Índia antiga, desapossados por aquelas misteriosas hordas conquistadoras de brâmanes de pele clara que vemos, na aurora da história, surgir como os primeiros pioneiros nos vales do Jumnâ e do Ganges. Os livros dos Sravakas - os únicos descendentes dos Arhats, os jainistas primitivos, os eremitas nus das florestas de outrora, podaríamos lançar alguma luz talvez sobre muitas questões enigmáticas. Mas terão os nossos eruditos europeus, na medida em que seguem à sua própria política, tido jamais acesso aos volumes correto? Temos nossas dúvidas a esse respeito. Perguntai a qualquer hindu digno de fé como os missionários trataram os manuscritos que por má sorte caíram em suas mãos, e julgai então se podemos censurar os nativos por tentarem salvar da profanação os "deuses de seus pais". OS CRISTÃOS E OS CRESTÃOS. (L. 3. pág. 280). Os gnósticos cristãos surgiram por volta do início do século II, e justamente na época em que os essênios desapareceram misteriosamente, o que indica que eles eram os essênios, e, ademais, crististas puros, isto é, acreditavam no que um de seus próprios irmãos havia pregado, e o compreenderam melhor do que ninguém. Insistir em que a letra Iota, mencionada por Jesus em Mateus (V, 18), indicava uma doutrina secreta relativa aos dez Aeons, basta para demostrar a um cabalista que Jesus pertencia à Franco-maçonaria daqueles dias; pois "I", que é o Iota em grego, tem outros nomes em outras línguas; e é, como o era entre os gnósticos daqueles dia, uma senha, que significa o CETRO do Pai, nas fraternidades orientais que existem ainda hoje. Mas no primeiros séculos, esses fatos, mesmo se conhecidos, foram propositadamente ignorados, e não apenas negados à opinião pública na medida do possível, mas veementemente negados sempre que o assunto vinha à baila. As denúncias dos padres tornaram-se mais amargas na proporção da verdade que procuravam refutar. "Deduz-se daí" - escreve Irineu, queixando-se dos gnósticos - "que eles não aceitam nem as Escrituras, nem a tradição". Devemos, portanto, nos espantar, quando mesmo os comentadores do século XIX, tendo apenas uns poucos fragmentos dos manuscritos gnósticos para comparar com os volumosos escritos de seus caluniadores, foram capazes de detectar a fraude em quase todas as páginas? Quanto mais os gnósticos polidos e eruditos, como todas as suas vantagens da observação pessoal e do conhecimento dos fatos, compreenderam o estupendo esquema de fraude que estava sendo consumado diante de seus próprios olhos! Porque acusariam eles a Celso por afirmar que sua religião se baseava por completo nas especulações de Platão, com a diferença de que as doutrinas deste eram muito mais puras e racionais do que as deles, quando vemos Sprengel, dezessete séculos depois, escrevendo o seguinte? - "Não apenas pensavam eles [os cristãos] descobrir os dogmas de Platão nos livros de Moisés, mas, além disso, pesavam que, introduzindo o platonismo no Cristianismo, elevariam a dignidade dessa religião e a tornariam mais popular entre os pagãos." Eles o introduziram tão bem que não apenas a Filosofia Platónica foi selecionada como uma base para a trindade, mas mesmo as lendas e as histórias míticas correntes entre os admiradores do grande filósofo - homenagem tradicional a todo herói digno de deificação - foram restauradas e utilizadas pelos cristãos. Sem ir para além da Índia, não tinham eles um modelos pronto para a "concepção miraculosa", na lenda de Perictionê, a mãe de Platão? A esse respeito, afirmava também a tradição popular que ela o havia concebido
imaculadamente, e que o deus Apolo era seu pai. Mesmo a anunciação por um anjo a José "num sonho", os cristãos a copiaram da mensagem de Apolo a Ariston, esposo de Perictionê, de que a criança a nascer dela era filho desse deus. Assim também, afirma-se que Rômulo era filho de Marte e da virgem Réa Sílvia. Tertuliano, de quem des Mousseaux faz a apoteose em companhia de seus outros semideuses, o vêem com olhos bem diferentes Reuss, Baur e Schwegler. A falacidade da afirmação e a inexatidão de Tertuliano, diz o autor de Supernatural Religion, são amiúde ostensivas. Reus caracteriza seu cristianismo como "âpre, insolent, brutal, ferrailleur. Carece de unção e de caridade, e às vezes mesmo de lealdade, quando se vê diante de uma oposição (...) Se no século II, todos os partidos, com exceção de alguns gnósticos, eram intolerantes, Tertuliano era o mais intolerante de todos"! A obra iniciada pelos primeiros padres foi completada pelo bombástico Agostinho. Suas especulações supratranscendentais sobre a Trindade; seu diálogo imaginário com o Pai, o Filho e o Espírito Santo, e as revelações e as veladas alusões a seus ex-irmãos, os maniqueus, levaram o mundo a cobrir o gnosticismo de opróbrio, e lançou em profunda sombra a insultada majestade do Deus único, adorado em reverente silêncio por todos os "pagãos". Eis por que toda a pirâmide de dogmas do Catolicismo romano repousa, não sobre provas, mas sobre suposições. Os gnósticos haviam colocado os padres na parede com muita habilidade, e a única salvação destes foi recorrer à fraude. Durante quase quatro séculos, os grandes historiadores quase contemporâneos de Jesus não tiveram a menor notícia seja de sua vida, seja de sua morte. Os cristãos espantam-se com uma omissão tão incompreensível do que a Igreja considera o maior evento da história universal. A primeira e a mais importante seita de que ouvimos falar é a de Nicolaitenses, de quem João, no Apocalipse, faz a voz em sua visão dizer que odeia sua doutrina. Esses Nicolaitenses eram os seguidores, contudo, de Nicolau de Antioquia, um dos "sete" escolhidos pelos "doze" para distribuir os fundos comuns aos prosélitos de Jerusalém (Atos, II, 44, 45; VI, 1-5), algumas semanas, ou talvez meses, depois da Crucificação; e um homem "de bom nome, cheio de Espírito Santo e de sabedoria" (versículo 3). Parece, pois, que o "Espírito Santo e a sabedoria" vindos do alto garantiam tão pouco contra as acusações de "heresia", como se os "eleitos" dos apóstolos jamais os houvessem protegido. Seria fácil descobrir que espécie de heresia era essa que ofendia, mesmo se não tivéssemos outras fontes de informação mais autênticas, nos escritos cabalísticos. A acusação e a natureza precisa da "abominação" figuram no segundo capítulo do Apocalipse, versículo 14, 15. O pecado era simplesmente - o matrimônio. João era "virgem"; vários padres atestam o fato com base na autoridade da tradição. Mesmo Paulo, o mais liberal e o mais nobre de todos, encontra dificuldades para reconciliar a posição de um homem casado, com a de um fiel servo de Deus. Há também "uma diferença entre um esposa e uma virgem". Esta última cuida "das coisas do Senhor", e a outra apenas "de como pode agradar ao esposo". "Se alguém julga agir de modo inconveniente para com a sua virgem (...) que se casem. Mas aqueles que, no seu coração tomou firme propósito (...) e tem a força de vontade, e assim decidiu (...) conservar sua virgem, esse procede bem". Portanto, aquele que se casa "age bem" (...) mas aquele que não a dá em casamento procede melhor ainda". "Estás ligado a uma mulher?" pergunta ele. "Não procures mulher. Não estás ligado a uma mulher". (27) E assinalando que, de acordo com seu julgamento, ambos serão mais felizes se não se casarem, acrescenta, como grave conclusão: "E julgo que possuo o Espírito de Deus" (40). Muito longe desse espírito de tolerância estão as palavras de João. Segundo sua visão, há "apenas cento e quarenta e quatro mil que foram resgatados da terra", "esses são os que não se contaminaram com mulheres: são virgens". Isso parece conclusivo; pois, exceto Paulo, nenhum desses primitivos Nazari, "apartados" e devotados a Deus, parece fazer uma grande diferença entre "pecado" com o relacionamento do matrimônio legal e a "abominação" do adultério. Com tais opiniões e com tal estreiteza de espírito, é perfeitamente natural que esses fanáticos tenham começado por lançar essa iniqüidade como uma mácula à face dos irmãos, prosseguindo em suas acusações. Como já mostramos, é apenas Epifânio que dá minuciosos detalhes dos "toques" e outros sinais de reconhecimentos entre os gnósticos. Por outro lado, é absurdo acreditar que pessoas como os gnósticos - que, de acordo com Gibbon, eram os homens mais ricos, mais orgulhosos, mais polidos e mais sábios dentre os que "se chamavam cristãos" - fossem culpados das ações reprováveis e libidinosas com que Epifânio se compraz em acusá-los. Mesmo se eles fossem como esse "grupo de maltrapilhos, quase nus, de rostos ferozes", que Luciano descreve como os seguidores de Paulo, hesitaríamos em acreditar em tal infame história. É muito menos provável que homens que eram não apenas platônicos, mas também cristãos, tenham sido culpados de ritos tão absurdos.
DA PUREZA DAS REFORMAS RELIGIOSAS. (L. 3. pág. 287). Todas as grandes reformas religiosas foram puras em seu início. Os primeiros seguidores de Buddha, assim como os discípulos de Jesus, eram homens da mais alta moralidade. A aversão pelo vício experimentada pelos reformadores de todas as idades está comprovada nos casos de Sâkyamuni, Pitágoras, Platão, Jesus, São Paulo, Amônio Saccas. Os maiores líderes gnósticos - se tiveram menos sucesso - não foram menos virtuosos na prática, nem menos puros moralmente. Marcion, Basilides, Valentino eram famosos por suas vidas ascéticas. Os Nicolaitenses, que, se não pertenciam ao grande corpo dos ofitas, contavam entre as pequenas seitas que foram por ele absorvidas no início do século II, devem sua origem, como já mostramos, a Nicolau de Antioquia, "um homem de bom renome, cheio do Espírito Santo e de Sabedoria". Que absurda a idéia de que tais homens teriam instituído "ritos libidinosos"! Seria o mesmo que acusar Jesus de ter promovido os ritos similares que vemos praticados com tanta freqüência pelos cristãos medievais ortodoxos atrás da segura proteção dos muros monásticos. O cristianismo dogmático e fabricado do período Constantino é simplesmente um rebento das numerosas seitas conflitantes, elas mesmas meias-castas, nascidas de pais pagãos. Cada uma delas poderia reivindicar seus representantes convertidos ao chamado corpo ortodoxo de cristãos. E como todo dogma recém-nascido tinha de ser aceito por maioria de votos, toda seita coloria a substância principal com a sua própria nuança, até o momento em que o imperador impunha ao mundo, como a religião de Cristo, essa miscelânea, de que ele evidentemente não entendia uma palavra. Fatigado por seus vãos esforços para aprofundar esse pântano insondável de especulações internacionais, incapaz de apreciar uma religião baseada na pura espiritualidade de uma concepção ideal, o Cristianismo entregou-se à adoração da força bruta representada pela Igreja edificada por Constantino. Desde então, entre os milhares de ritos, dogmas e cerimônias copiados do Paganismo, a Igreja só pode reivindicar uma única invenção, absolutamente original, a saber, a doutrina da condenação eterna, e um costume, o do anátema. Os pagãos rejeitavam a ambos com horror. "Uma execração é uma coisa temerária e terrível", diz Plutarco. "Por tal razão, a sabedoria de Atenas foi condenada por ter recusado a amaldiçoar Alcebíades [por profanação dos mistérios], quando o povo lhe pedia para fazê-lo; pois, ela era uma sacerdotisa de preces, não de maldições". "Pesquisas aprofundadas mostrariam" - diz Renan - "que quase tudo no Cristianismo é mera bagagem trazida dos mistérios pagãos. O culto cristão primitivo nada é senão um mistério. Toda a política interna da Igreja, os graus de iniciação, o imperativo do silêncio, e a mesma de frases da linguagem eclesiástica, não têm outra origem. A revolução que sufocou o Pagamismo parece à primeira vista (...) uma ruptura absoluta com o passado (...) mas a fé popular salvou seus símbolos mais populares do naufrágio. O Cristianismo introduziu, de início, tão poucas modificações nos hábitos da vida privada e social que para muitos, nos séculos IV e V, é incerto se deve contá-los entre os pagãos ou entre os cristãos; muitos parecem ter trilhado um caminho indeciso entre os dois cultos." Falando mais adiante da Arte, que formou uma parte essencial da religião antiga, diz ele que "foi difícil quebrar uma de suas tradições. A arte cristã primitiva não passa, na verdade, de arte pagã em sua decadência, ou de natureza inferior. O Bom Pastor das catacumbas em Roma é uma cópia do Aristeu, ou do Apolo Nomios, que figura na mesma postura dos sarcófagos pagãos, e ainda traz a flauta de Pan no meio das quatro estações. Na tumba cristã do Cemitério de São Calixto, Orfeu encanta os animais. Noutro lugar, o Cristo como Júpter-Plutão, e Maria como Proserpina, recebem as almas que Mercúrio, portanto um elmo de largas bordas e trazendo na mão o caduceu do condutor de almas (psychopompos), lhes leva, na presença das três parcas. Pégaso, o símbolo da apoteose; Psychê, o símbolo da alma imortal; o Céu, personificado por um homem velho; o rio Jordão, e Vitória, representada em inúmeros monumentos cristãos." Como já mostramos alhures, a comunidade cristã primitiva era composta de pequemos grupos espalhados por toda parte, e organizados em sociedades secretas, com senhas e sinais. Para evitar as incessantes perseguições de seus inimigos, eles eram obrigados a buscar segurança e a se reunirem em catacumbas abandonadas, em locais inacessíveis das montanhas, e em outros esconderijos seguros. Toda reforma religiosa depara, em seu início, com tais dissabores. Desde a sua primeira aparição, vemos Jesus e seus doze discípulos reunindo-se à parte, em refúgios seguros no deserto, e entre os amigos de Betânia. Se a cristandade não se tivesse composto de "comunidades secretas" desde o início, a história teria mais fatos para relatar sobre seu fundador e seus discípulos do que aqueles que agora dispõe. É verdadeiramente surpreendente constatar a pouca importância que a personalidade de Jesus exerceu sobre seu próprio século. Renan mostra que Fílon, que morreu por volta do ano 50, e nasceu muitos anos antes de Jesus, vivendo na Palestina, onde a "boa nova" era pregada por todo o país, segundo os Evangelhos, jamais ouviu falar dele (Essa afirmação, infelizmente, é errada. Fílon, o judeu, residiu principalmente em Alexandria, "a morada favorita dos judeus cultos" (Yonge, The Works of Philo Judaeus, Prefácio), mas visitou Jerusalém pelo menos
Josefo, o historiador, que nasceu três ou quatro anos após a morte de Jesus, menciona a sua execução numa breve sentença, e mesmo essas poucas palavras foram alteradas "por mão cristã", diz o autor da Vida de Jesus. Escrevendo no final do século I, quando Paulo, o erudito propagandista, conforme se alega, havia fundado tantas igrejas, e Pedro, estabelecido a sucessão apostólica, que a cronologia irinaico-euseviana pretende já contar com três bispos de Roma, Josefo, o cuidadoso enumerador e minucioso historiador mesmo das seitas mais insignificantes, ignora inteiramente a existência de uma seita cristã. Suetônio, secretário de Adriano, escrevendo na primeira quadra do século II, sabe tão pouco de Jesus ou de sua história a ponto de dizer que o Imperador Cláudio "baniu todos os judeus, que causavam contínuas perturbações, por instigação de um tal Chêstos", ou seja, Cristo, segundo podemos supor. O próprio Imperador Adriano, escrevendo ainda mais tarde, estava tão pouco impressionado com os dogmas ou com a importância da nova seita que, numa carta a Serviano, mostra acreditar que os cristãos eram adoradores de Serapis. "No século II", diz C. W. King, "as seitas sincréticas que haviam surgido em Alexandria, o berço do gnosticismo, encontraram em Serapis um tipo profético de Cristo como Senhor e Criador de tudo, e Juiz da vida e da morte". Portanto, ao passo que os filósofos "pagãos" jamais haviam considerado Serapis, ou antes a idéia abstrata que nele se encarnava, senão como uma representação da anima mundi, os cristãos antropomorfizaram o "Filho de Deus" o seu "Pai", não encontrando modelo melhor para ele do que o ídolo de um mito pagão! "Não há dúvida" - assinala o mesmo autor - "que a cabeça de Serapis, marcada como é sua face por uma grave e pensativa majestade, forneceu a primeira idéia para as imagens convencionais do Salvador". (King, The Gnostic, etc. p.68 [p. 161-62 na 2ª ed.]. Em uma vez. N. do Org.)
Symbolical Language of Ancient Art and Mythology, de R. Payne Knight, Serapis é representada com longos cabelos, "penteados para trás e dispostos em madeiras que caem sobre seus ombros como os da mulher. Todo seu corpo está sempre envolto num traje que lhe desce até os pés" (§ CXLV). Essa é a imagem convencional de (Jesus) Cristo.)
Nas notas tomadas por um viajante - cujo episódio com os monges do Monte Athos foi mencionado acima - encontramos que, durante sua juventude, Jesus havia tido freqüentes contatos com os essênios pertencentes à escola pitagórica, e conhecidos como koinobioi. Acreditamos que Renan se equivoca quando afirma dogmaticamente que Jesus "ignorava por completo os nomes de Buddha, Zoroastro e Platão"; que ele jamais havia lido um livro grego ou budista, "embora mais de um elemento de sua doutrina procedesse do Budismo, do Parsismo e da sabedoria grega". Isso é conceder um meio-milagre, e dar muita oportunidade ao acaso e à coincidência. É um abuso de privilégio quando um autor, que afirma escrever fatos históricos, tira deduções convencionais de premissas históricas, e então chama sua biografia de - uma Vida de Jesus. Assim como qualquer compilador das lendas relativas à história problemática do profeta nazareno, não tem ele uma polegada de terreno seguro em que se apoiar; não se pode afirmar o contrário, exceto por vias dedutivas. No entanto, ao passo que Renan não tem um único fato solitário para mostrar que Jesus jamais havia estudado os dogmas metafísicos do Budismo e do Parsismo, ou tido conhecimento da filosofia de Platão, seus oponentes têm as melhores razões do mundo para suspeitar o contrário. Quando eles acreditam que - 1ª, todas as suas máximas têm um espírito pitagórico, quando não repetições verbatim; 2ª, seu código de ética é puramente budista; 3ª, seu modo de vida e seus atos são essênios; e 4ª, sua maneira mística de expressão, suas parábolas, e seus hábitos são os de um iniciado, seja grego, caldeu ou mágico (pois os "Perfeitos", que falaram da sabedoria oculta, pertenciam à mesma escola de saber arcaico em todo o mundo), é difícil escapar à conclusão lógica de que ele pertencia ao mesmo corpo de iniciados. É um pobre tributo pago ao Supremo, essa tentativa de impingir-Lher quatro evangelhos, nos quais, contraditórios como são, não há uma única narrativa, sentença ou expressão peculiar, cujo paralelo não possa ser encontrado em alguma doutrina ou filosofia mais antiga. Na verdade, o Todo-Poderoso - não fosse apenas para poupar às gerações futuras a sua atual perplexidade poderia ter trazido Consigo, em Sua primeira e única encarnação na Terra, algo original - algo que traçasse uma linha distinta de demarcação entre Ele e os numerosos outros deuses encarnados pagãos, que haviam nascidos de virgens, e todos salvadores, mortos ou sacrificados para o bem da Humanidade. Concessões demais foram feitas ao lado emocional da história. O que o mundo precisa é uma concepção menos exaltada, porém mais fiel, de uma personagem por cuja adoração aproximadamente metade da cristandade destronou o Todo-Poderoso. Não contradizemos o erudito mundialmente famoso, quando em sua Vida de Jesus, aduz com afirmações históricas. Contestamos apenas umas poucas asserções injustificáveis e insustentáveis que o narrador emotivo deixou escapar nas páginas, por outro lado tão belas, de sua obra uma vida construída sobre meras probabilidades, mas de alguém que, se aceito como personagem histórica, tem maiores direitos ao nosso amor e à nossa veneração, falível como é em toda a sua grandeza, do que se o representamos como um Deus onipotente. É apenas neste último caráter que Jesus pode ser visto por todo espírito reverente como um fracasso. Não obstante a escassez das obras filosóficas de que agora dispomos, poderíamos apresentar inúmeros exemplos da perfeita identidade entre as máximas pitagóricas, as hindus e as do Novo Testamento. Não há dúvida a esse respeito. O que é necessário é um público cristão que examine o que lhe for mostrado, e
que dê seu veredicto de maneira honesta. A fraude já teve sua hora, e cometeu o que havia de pior. "Não devemos nos assustar", diz o Prof. Müller, "se descobrimos traços de verdade cristã, entre os sábios e os legisladores de outras nações." Após a leitura dos seguintes aforismos filosóficos, quem poderá acreditar que Jesus e Paulo jamais leram os filósofos gregos e indianos? VERSÍCULOS DO NOVO TESTAMENTO
MÁXIMAS DE SEXTO, O PITAGÓRICO, E DE OUTROS PAGÃOS
1. "Não ajunteis para vós tesouros na terra, onde a traça e o caruncho os destroem, e onde os ladrões arrombam e roubam"(Mateus, VI, 19). 2. "E se tua mão te escandalizar, corta-a; é melhor para ti entrares mutilado para a vida, do que, tendo duas mãos, ir para o inferno", etc. (Marcos, IX,43). 3. Não sabeis que sois um templo de Deus, e que o Espírito de Deus habita em vós?" (1 Coríntios, III,16). 4. "Deste modo vos tornareis filhos de vosso Pai que está no Céu (...) sede perfeitos como o vosso Pai que está no céu é perfeito (Mateus, V, 45-8). 5. "Fazei ao próximo o que desejais que o próximo vos faça."
1. "Possui apenas as coisas que ninguém te possa roubar."
6. "Ele faz nascer o seu Sol igualmente sobre maus e bons, e cair a chuva sobre justos e injustos" (Mateus, V, 45). 7. "Pois àquele que tem, lhe será dado (...) ao que não tem, mesmo o que tem lhe será tirado" (Mateus, XIII, 12). 8. "Bem-aventurado os puros de coração, porque verão a Deus" (Mateus, V, 8).
2. É melhor queimar uma parte do corpo do que deixá-la no estado em que está, assim como é melhor para um homem depravado morrer que viver." 3. "Tendes em vós algo semelhante a Deus: portanto, consideraivos como o templo de Deus." 4. "A melhor honra que se pode prestar a Deus é conhecê-lo e imitá-lo." 5. "O que não desejo que os homens me façam, eu também não faço para os homens" (Analetos de Confúcio, cap. V, XV; ver Masx Müller, Chips, I, pp. 304 e s.). 6. "A Lua brilha mesmo na casa do Pecador"( Manu). 7. "Dá-se àquele que dão; rouba-se aqueles que roubam" (Ibid.). 8. "Só a pureza da mente permite ver a Deus" (ibid.) - ainda hoje uma máxima popular na Índia.
Platão não escondeu o fato de que extraiu suas melhores doutrinas filosóficas de Pitágoras, e que foi simplesmente o primeiro a reduzi-las a uma ordem sistemática, mesclando-se ocasionalmente com suas próprias especulações metafísicas. Mas o próprio Pitágoras obteve suas recônditas doutrinas, primeiro dos descendentes de Mochus, e depois dos brâmanes da Índia. Ele foi também iniciado nos mistérios dos hierofantes de Tebas, os magi persas e caldeus. Assim, podemos traçar, passo por passo, a origem de muitas de nossas doutrinas na Ásia Menor. Retirai do Cristianismo a personalidade de Jesus, tão sublime graças à sua incomparável simplicidade, e o que resta? A História e a Teologia comparada nos dão a melancólica resposta: "Um esqueleto esfarelado constituído dos mitos pagãos mais antigos"! Enquanto o nascimento mítico e a vida de Jesus são uma cópia fiel do Krishna bramânico, seu caráter histórico de reformador religioso na Palestina, é o que mais se assemelha a Buddha, na Índia. Em mais de um sentido, sua grande semelhança nas aspirações filantrópicas e espirituais, assim como nas circunstâncias externas, sendo tudo verdadeiramente impressionante. Embora filho de um rei, ao passo que Jesus era apenas um carpinteiro, Buddha não pertencia por nascimento à alta casta dos brâmanes. Como Jesus, ele se sentiu insatisfeito com o espírito dogmático da religião de seu país, a intolerância do clero, sua exibição externa de devoção, e suas cerimônias e orações inúteis. Assim como Buddha rejeitou violentamente as leis e as regras tradicionais dos brâmanes, Jesus declarou guerra contra os fariseus e os orgulhosos saduceus. O que o nazareno fez como conseqüência de seu nascimento e de sua posição humilde, Buddha o fez como uma penitência voluntária. Ele viajava como um mendigo; e - ainda como Jesus -, no curso da vida, procurava de preferência a companhia dos publicanos e dos pecadores. Ambos tinham em mente tanto uma reforma social, como uma reforma religiosa; e, dando o golpe de misericórdia à antiga religião de seus países, ambos se tornaram o fundador de uma nova religião. "A reforma de Buddha", diz Max Müller, "teve na origem muito mais um caráter social do que uma caráter religioso (...) O elemento mais importante da reforma budista sempre foi o seu código social e moral, não suas teorias metafísicas. Esse código moral (...) é um dos mais perfeitos de que o mundo tem notícia (...) e aquele cujas meditações procuravam libertar a alma do homem da miséria e do medo da morte, libertaram o povo da Índia da servidão degradante de uma tirania sacerdotal." Ademais, o conferencista acrescenta, por outro lado, que, se fosse diferente, "Buddha poderia ter ensinado a filosofia que lhe aprouvesse, e dificilmente lhe teríamos ouvido o nome. O povo não lhe teria notado a existência, e seu sistema cairia como uma gota no oceano da especulação filosófica, pelo qual a Índia tem sido inundada por todos os tempos."
ASPECTOS DA CRUCIFICAÇÃO DE JESUS. (L. 3. pág. 291). Ocorreu o mesmo com Jesus. Enquanto Fílon, que Renan chama de irmão mais velho de Jesus, Hillel, Shammai e Gamaliel, são raramente mencionados - Jesus tornou-se um Deus! No entanto, puro e divino como era o código moral ensinado por Jesus, ele jamais poderia ser comparado como o de Buddha, não fosse a tragédia do Calvário. O que propiciou a deificação de Jesus foi sua morte dramática, o sacrifício voluntário de sua vida, que foi feito, como se pretende, para o bem da Humanidade, e o posterior dogma conveniente da expiação, inventado pelos cristãos. Na Índia, onde não se dá nenhum valor à vida, a crucificação teria produzido pouco efeito, se algum. Num país em que - como o sabem todos os indianistas os fanáticos se condenam à morte lenta, em penitência que duram anos; em que as macerações mais terríveis são auto-inflingidas pelos faquires; em que jovens e delicadas viúvas, num espírito de bravata contra o governo, assim como por causa do fanatismo religiosos, sobem à pira funerária como um sorriso nas faces; em que, para citar as palavras do grande conferencista, "os homens na flor da idade se jogam sob o carro de Jaggeernâth, para serem esmagados até a morte pelo ídolo em que acreditam; em que o querelante que não consegue justiça se deixa morrer de fome à porta de seu juiz; em que o filósofo que pensa que aprendeu tudo que este mundo lhe pode ensinar, e que aspira pela absorção na Divindade, se joga tranqüilamente no Ganges, a fim de chegar à outra margem da existência", em tal país, mesmo uma crucificação teria passado despercebida. Na Judéia, e mesmo entre nações mais bravas que os judeus - os romanos e os gregos -, em que todos eram mais ou menos apegados à vida, lutando desesperadamente para conservá-la, o fim trágico do grande reformador deveria ter produzido um profunda impressão. Os nomes de heróis menores como Mucius Scaevola, Horatius Cocles, a mãe dos Gracchi, e outros, chegaram à posteridade; e, durante nossos anos de escola, e mesmo depois na vida, suas histórias despertaram nossa simpatia e granjearam uma reverente admiração. Mas poderemos jamais esquecer o sorriso de desprezo de certos hindus em Benares, quando uma senhora inglesa, esposa de um clérigo, tentou impressioná-los com a grandeza do sacrifício de Jesus, ao dar sua vida para nós. Foi então que pela primeira vez ficamos impressionados com o papel que o grande drama do Calvário exerceu nos eventos subseqüentes da fundação da cristandade. Mesmo o imaginativo Renan foi impelido por esse sentimento a escrever, no último capítulo de sua Vida de Jesus, umas poucas páginas de singular e delicada beleza. Apolônio, contemporâneo de Jesus de Nazaré, foi, como ele, um entusiasta fundador de uma nova escola espiritual. Talvez menos metafísico e mais prático do que Jesus, menos terno e perfeito em sua natureza, ele, não obstante, inculcou a mesma quintessência de espiritualidade, e as mesmas elevadas verdades morais. Seu grande erro consistiu em confiná-las por demais às classes superiores da sociedade. Enquanto o pobre Jesus pregava "Paz na terra e boa vontade para com os homens", Apolônio era o amigo dos reis, e privava com a aristocracia. Nasceu no seio desta, e era um homem de riqueza, ao passo que o "Filho do Homem", representando o povo, "não tinha onde repousar a cabeça"; não obstante, os dois "fazedores de milagre" exibiam uma impressionante similaridade de propósitos. Já antes de Apolônio havia aparecido Simão, o Mago, denominado "o grande Poder de Deus". Seus "milagres" são mais extraordinários, mais variados e mais bem atestados do que os dos apóstolos ou os do próprio filósofo galileu. O materialismo nega o fato em ambos os casos, mas a história o comprova. Apolônio seguiu a ambos; e quão grandes e renomados foram seus atos miraculosos em comparação como os do pretenso fundador do Cristianismo, conforme afirmam os cabalistas, temos novamente a história e Justino o Mártir, para comprová-lo. CONSIDERAÇÕES SOBRE BUDDHA, JESUS E APOLÔNIO DE TIANA. (L. 3. pág. 292). Como Buddha e Jesus, Apolônio foi um intransigente inimigo de toda a ostentação exterior de piedade, de toda a exibição de cerimônias religiosas inúteis e de toda a hipocrisia. Se, como o Salvador cristão, o sábio cristão, o sábio de Tyana tivesse, por preferência, buscado a companhia do pobre e do humilde; e se, ao invés de morrer confortavelmente, e com mais de cem anos de idade, tivesse sido um mártir voluntário, proclamado a verdade divina de uma cruz, seu sangue se teria provado tão eficaz para a subseqüente disseminação das doutrinas espirituais, como o do Messuas cristão. As calúnias atiradas contra Apolônio foram tão numerosas como falsas. Mesmo dezoito séculos depois da sua morte, ele foi caluniado pelo Bispo Douglas em sua obra contra os milagres. Nisso o justo Rev. Bispo colidiu contra os fatos históricos. Se estudarmos o assunto com um espírito imparcial, percebemos rapidamente que as éticas de Gautama Buddha, Platão, Apolônio, Jesus, Amônio Saccas, e seus discípulos, baseavam-se todas na mesma filosofia mística; que todos reverenciavam um Deus, seja O considerado como o "Pai" da Humanidade, que vive no homem como o homem vive nele, seja como o Incompreensível Princípio Criador; todos viveram vidas sublimes. Amônio, falando de sua filosofia, ensinava que sua escola datava dos dias de Hermes, que trouxe sua sabedoria da Índia. Tratava-se da mesma contemplação mística do iogue: a
comunhão do Brahman com seu próprio Eu luminoso - o "Âtman". E esse termo hindu é cabalístico par excellence. O que é o Eu? - pergunta-se no Rig-Veda; "O Eu é o Senhor de todas as coisas (...) todas as coisas estão contidas nesse Eu; todos os eus estão contidos nesse Eu. O próprio Brâhman não é senão Eu", é a resposta. Diz Idrah Rabbah: "Todas as coisas são Ele, e em todas as partes Ele está oculto. O Adão-Cadmo dos cabalistas contém em si todas as almas dos israelitas, e está em todas as lamas", diz o Zohar. Os princípios fundamentais da Escola Eclética eram portanto idênticos às doutrinas dos iogues, os místicos hindus, e do Budismo primitivo dos discípulos de Gautama. E quando Jesus assegurava a seus discípulos que "o espírito da verdade, que o mundo não pode receber porque não O vê, nem O conhece", está com eles e neles, que "estão nEle e Ele neles, ele apenas expunha a mesma doutrina que reconhecemos em toda filosofia digna desse nome. Saint-Hilaire, o erudito e cético sábio francês, não acredita numa palavra da parte miraculosa da vida de Buddha; não obstante, ele é franco ao dizer que Gautama só é excedido por Cristo na grande pureza de sua ética e de sua moralidade pessoal. "Não hesito em dizer", assinala Barthélemy Saint-Hilaire, "que, com exceção apenas de Cristo, não há, entre os fundadores de religiões, uma figura mais pura ou mais tocante do que a de Buddha. Sua vida é imaculada. Seu heroísmo constante iguala suas convicções (...) Ele é o modelo perfeito de todas as virtudes que prega; sua abnegação, sua caridade, a doçura inalterável de seu caráter não o abandonam em nenhum momento. Ele abandonou, aos vinte e nove anos, a corte de seu pai para tornar-se um monge e um mendigo (...) e quando morreu nos braços de seus discípulos, foi com a serenidade de um sábio que praticara a virtude por toda a vida, e que morre convencido de ter encontrado a verdade. Esse merecido panegírico não é mais vigoroso do que aquele que o próprio Laboulaye pronunciou, e que despertou a ira de des Mousseaux. "É mais do que difícil", acrescenta este último, "compreender como homens não assistidos pela revelação subiram tão alto e se aproximaram tão perto da verdade". É curioso que haja tantas almas elevadas "não assistidas pela revelação"! E por que deveríamos nos espantar com o, fato de que Gautama morreu com serenidade filosófica? Como afirmam corretamente os cabalistas: "A morte não existe, e o homem jamais abandona a vida universal. Aqueles que pensamos estarem mortos ainda vivem em nós, assim como nós vivemos neles (...) Quanto mais se vive para os seus semelhantes, menos se deve temer a morte". E, poderíamos acrescentar, aquele que vive para a Humanidade faz muito mais por ela do que aquele que morre. O Inefável Nome, em busca do qual tantos cabalistas - que não conheciam nenhum adepto oriental, ou mesmo europeu - consumiram em vão seus conhecimentos e suas vidas, repousa latente no coração de todos os homens. Esse nome mirífico que, de acordo com os antigos oráculos, "se lança nos mundos infinitos, pode ser obtido de duas maneiras: pela iniciação regular, e através da "pequena voz" que Elias ouviu na caverna de Horeb, a montanha de Deus. E "quando Elias a ouviu, cobriu o rosto com o manto, e saiu, e pôs-se à entrada da caverna. E veio-lhe uma voz (...)". Quando Apolônio de Tiana desejava ouvir a "sigilosa voz", ele costumava envolver-se dos pés à cabeça com um manto de fina lã, após ter feito alguns passes magnéticos, e pronunciava, não o "nome", mas uma invocação bem-conhecida de todo adepto. Então, lançava o manto sobre a cabeça, e seu espírito translúcido ou astral se libertava. Nas ocasiões ordinárias, ele não trajava nenhuma veste de lã. A posse da combinação secreta do "nome" conferia ao hierofante o poder supremo sobre qualquer ser, humano ou não, inferior a ele em força de alma. Portanto, quando Max Müller nos fala da "Majestade Oculta" quíxua, que jamais devia ser aberta por mãos humanas, o cabalista compreende perfeitamente qual o sentido da expressão, e não se surpreende ao ouvir a exclamação desse erudito filólogo: "Ignoramos do que se trata!" Não podemos repetir suficientemente que é apenas através das doutrinas das filosofias mais antigas que se pode entender a religião pregada por Jesus. É através de Pitágoras, Confúcio e Platão que podemos compreender a idéia que subjaz ao termo "Pai" no Novo Testamento. O ideal platônico da Divindade, que ele chama de Deus eterno e invisível, o Criador e Pai de todas as coisas, é o próprio "Pai" de Jesus. Esse Ser Divino de quem o sábio grego diz que não pode ser nem invejoso, nem o criador do mal, pois não pode produzir senão o que é bom e justo, não é com certeza o Jeová mosaico, o "Deus ciumento", mas o Deus de Jesus, que "só é bom". Ele louvou Seu poder divino que a tudo abarca, e Sua onipotência, mas insinua que, por ser imutável, Ele não pode jamais alterar suas leis, i.e., extirpar o mal do mundo através de um milagre. Ele é onisciente, e nada escapa de Seu olhar vigilante. Sua justiça, que descobrimos encarnada na lei da compensação e da retribuição, não deixará um crime sequer sem punição, uma virgula sequer sem recompensa; e portanto declara que o único meio de honrar a Deus é cultivar a pureza moral. Ele rejeita por completo não apenas a idéia antropomórfica de que Deus teria um corpo material, mas rejeita com repulsa as
fábulas que atribuem paixões, querelas e crimes de toda sorte aos deuses menores. Ele nega com indignação que Deus Se permite ser propiciado, ou antes subornado, por preces e sacrifícios. O Fedro de Platão expõe tudo o que o homem foi uma vez, e o que ainda pode vir a ser. "Antes de o espírito do homem cair na sensualidade e nela ser incorporado pela perda de suas asas, ele vivia entre os deuses do mundo aéreo espiritual, onde tudo é verdadeiro e puro". No Timeu, ele diz que "houve um tempo em que a Humanidade não se perpetuava, mas vivia na forma de espíritos puros." No mundo futuro, diz Jesus, "nem eles se casam, nem elas são dadas em casamento", mas "são como os anjos de Deus no Céu". Quando lemos a verdadeira história de Buddha e do Budismo escrita por Müller, e as entusiásticas opiniões expressas por Barthélemy Saint-Hilarie e Laboulaye, e quando, finalmente, um missionário papal, uma testemunha ocular, e alguém que pode ser acusado de tudo, menos de parcialidade para com os budistas queremos falar do Abade Huc -, não consegue senão expor a sua admiração pelo elevado caráter individual desses "cultores do demônio", devemos considerar a filosofia de Sâkyamuni como algo mais do que a religião de fetichismo e ateísmo que os católicos nos querem forçar a acreditar. Huc foi um missionário e seu primeiro dever consistia em considerar o Budismo como um rebento do culto de Satã. O pobre Abade Huc foi riscado da lista de missionários em Roma, após a publicação de seu livro de viagens. Isto ilustra quão pouco podemos aprender da verdade sobre as religiões de outros povos através dos missionários, quando seus relatos são preliminarmente revisados pelas autoridades eclesiásticas superiores, e os viajantes severamente punidos por falar a verdade. Quando Marco Polo perguntou a homens que recebiam, e ainda recebem, a pecha de "ascetas obscenos", em suma, os fieis de certas seitas da Índia, geralmente chamados de "iogues", "se não tinham vergonha de andarem nus como o faziam", eles responderam ao indagador do século XII como o fariam a um missionário do século XIX: "Andamos nus", disseram eles, "porque nus viemos ao mundo, e nada desejamos possuir que seja deste mundo. Ademais, não temos conhecimento de um pecado da carne e, por conseguinte, não temos vergonha de nossa nudez, tal como vós não tendes ao mostrar vossas mãos e vossos rostos. Vós que conheceis os pecados da carne, vós tendes razão em vos envergonhar, e em cobrir vossa nudez".
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