Bicos De Injeção_ Funcionamento e Relação Tempos x Volume
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O conjunto do material que apresento agora é, até onde sei, totalmente inédito em lingua portuguesa. Ele representa a compilação de diversos materiais fragmentados que foram sendo acumulados ao longo dos anos, cada um tratando de pequenos detalhes, até que eu pudesse reuni-los todos sob um mesmo artigo. Hoje em dia é comum termos sistemas de injeção em nossos carros, e muitos de nós conhecem cada componente que compõe um sistema de injeção. Ou ao menos pensamos que conhecemos. A diferença entre a verdade técnica e o modelo simplificado que nos acostumamos a ver é enorme. Todos costumamos a pensar num sistema de injeção tendo como componente principal a centralina de controle, porque, em tese, ela faria todo o serviço pesado de controle do sistema. É um engano, porque há outro componente do sistema tão importante quanto ela. Este componente é o bico de injeção. Embora a centralina controle dois subsistemas (injeção e ignição), o sistema de ignição a partir da centralina é um sistema elétrico completamente passivo, mas o mesmo já não se pode dizer do sistema de injeção por causa da complexa dinâmica do bico injetor. Comecemos por desfazer alguns enganos lógicos, mas que ficam plantados no fundo das nossas mentes. A primeira coisa que precisamos fazer é repensar o que sabemos do conjunto de injeção. Num motor carburado, o carburador é uma peça única, que mede o fluxo de ar passante, dosa o combustível e o pulveriza por este fluxo de ar, tudo isto feito por um componente totalmente passivo. O carburador é um componente que sequer tem "conhecimento" do motor. Basta ser alimentado com combustível, passar umfluxo de ar pelo difusor, e ele asperge uma quantidade calibrada de combustível nesse ar passante. Já a injeção tem uma conformação mais "orgânica" e dispersa, com sensores e atuadores espalhados pelo motor, controlados um "cérebro eletrônico" e mais uma série de outros dispositivos ao longo do veículo. Cada componente destes atua como um órgão de um organismo, realizando um trabalho específico para um funcionamento totalmente integrado. Qualquer componente que deixe de fazer seu trabalho adequadamente compromete o sistema como um todo. De pouco adianta uma centralina e um jogo de bicos de alta precisão se o regulador de pressão for impreciso ou se a bomba de combustível não fornecer a vazão na pressão necessárias. Depois, temos que repensar o trabalho da centralina. A centralina não injeta absolutamente nada, quem injeta é o bico. O papel da centralina é fornecer uma base de tempo regulada para que o bico injete uma quantidade precisa de combustível no motor. O sucesso de um bom projeto de injeção depende em menos de 50% da qualidade da centralina. Ela não faz mágica, e depende que todos os outros componentes, em especial os bicos, façam cada qual seu trabalho a contento para que o sistema funcione perfeitamente. Por fim, temos que compreender o verdadeiro papel do bico injetor dentro do sistema. O bico injetor é a interface entre o mundo elétrico da centralina e o mundo hidráulico do circuito de combustível, transformando comandos elétricos da centralina em volume de combustível injetado no coletor de admissão.
O bico injetor é, nada mais, nada menos, que uma válvula solenóide de precisão, com vazão calibrada. Sendo assim, ela tem dois subsistemas internos.
O primeiro subsistema é o da válvula. Ela é feita do circuito hidráulico do combustível, do espigão ou estilete que abre e fecha a válvula, da sede de fechamento do estilete, do batente de abertura do estilete e da mola de fechamento do estilete. O segundo subsistema é o eletromagnético. Este subsistema é constituido pela bobina, pelo núcleo magnético estático (também chamado de estator) e do núcleo magnético móvel preso ao estilete (armadura). De uma forma simplificada, o bico injeta quando recebe um sinal elétrico da centralina, se abre ao comando, deixa passar uma vazão calibrada, e, quando cessa o sinal, ela se fecha. Esta é a idéia simplificada que todos conhecem, e em essência, não está errada. Mas ela não leva em conta muitos fenômenos que ocorrem na abertura e fechamento do bico que interferem enormemente no sistema, e que a centralina precisa saber compensar para que consiga injetar uma quantidade precisa de combustível. Como bico opera em frações de milisegundos, muitos fenômenos desprezíveis em escala de tempo humana tem enormes efeitos sobre o resultados de vazão. Para entendermos os problemas principais, vamos estudar um modelo equivalente ao do bico em ordem crescente de fenômenos. Imaginem uma torneira que, totalmente aberta, deixe vazar 1 litro de água por segundo. A quantidade de água que foi despejada por esta torneira é facilmente calculada. Em 10 segundos seriam despejados 10 litros, e em uma hora (3600 segundos), 3600 litros. Enquanto ela estiver totalmente aberta, vai deixar passar a máxima vazão possível. Esta é a condição que chamamos de "vazão de regime". Vamos complicar um pouco mais o modelo. Imaginem a torneira fechada, que para ser totalmente aberta precisa de 10 voltas, e que uma pessoa consegue abrí-la a uma velocidade constante de 1 volta por segundo. Imagine que a vazão da torneira também varie linearmente com a abertura dela. Entre esta torneira começar a ser aberta e ficar totalmente aberta se passaram 10 segundos e a volume vazado ao longo deste tempo foi de 5 litros. Mas a torneira também tem de ser fechada. Imagine que a torneira tenha uma dificuldade maior para ser fechada, e digamos que ela demore 20 segundos para ser fechada. No processo de fechamento, que vai demorar 20 segundos para acontecer, vão escorrer metade do volume vazado da torneira totalmente aberta no mesmo tempo, ou seja, 10 litros. Esta vazão variável entre abrir e fechar totalmente a torneira é chamada de "vazão transitória". Mais um detalhe para tornar o modelo mais completo. Imagine que quem abre e fecha a torneira fica sentado numa mesa a 10 metros de distância, e que caminha a 1 metro por segundo. Esta pessoa sai da sua mesa para abrir a torneira quando recebe um sinal que
manda abrir a torneira e fica do lado dela até receber um segundo sinal que manda fechá-la, quando então essa pessoa fecha a torneira e retorna para sua mesa. Vamos agora simular uma situação completa. Imagine que entre o sinal de comando de abertura e o de fechamento da torneira haverá um lapso de 60 segundos. - Com o primeiro sinal, a pessoa caminha até a torneira e gasta 10 segundos sem haver vazão alguma. - Mais 10 segundos, e a torneira está totalmente aberta, havendo vazado 5 litros com 20 segundos desde o sinal inicial; - A torneira fica aberta por mais 40 segundos, vazando mais 40 litros, totalizando 45 litros com 60 segundos no total, quando então o lapso se esgota e o segundo sinal é dado; - Após mais 20 segundos a torneira está fechada, com o débito de mais 10 litros, totalizando 55 litros para um tempo total de 80 segundos; - A pessoa retorna para sua mesa e fica pronta para novo sinal após mais 10 segundos. Durante esta fase, mais nenhuma água vaza pela torneira, totalizando 55 litros em 90 segundos. Para quem está do lado de fora comandando tudo, foi enviado um sinal de 60 segundos, mas o sistema todo vazou apenas 55 litros. Um fato que não é observado por quem está comandando de fora e que observa apenas a quantidade de água vazada da torneira, é que a vazão tem um atraso de 10 segundos para iniciar a vazar sobre o sinal de abertura, que há um atraso de 20 segundos para o fluxo de água cesse e que sobre este atraso existe outro de mais 10 segundos para que a pessoa esteja posicionada novamente em seu ponto de partida, que é a mesa. Conclui-se com isto, que quem está de fora não possui o controle efetivo nem da abertura da torneira nem de seu fechamento devido a estes atrasos, embora um determinado intervalo entre os sinais permita que um volume preciso seja vazado. O controle efetivo se dá acima do intervalo de vazão transitória, durante a vazão de regime. Um gráfico comparativo da vazão da torneira a partir dos sinais que comandam a abertura e o fechamento do bico seria este:
Variando os intervalos de comando, se observa o seguinte gráfico de volume vazado:
Concluimos que, para quem está de fora, controlando a vazão da torneira através do intervalo entre os dois sinais, é possível observar 3 faixas distintas de tempo. - Na primeira, até 10 segundos, a torneira não injetou nada. - Entre 10 e 20 segundos a torneira vaza um volume que em nada corresponde com a capacidade de vazão máxima. É onde a torneira oferece a vazão transitória. - A partir de 20 segundos o ganho em vazão passa a ser o nominal do bico. É o período do bico onde se estabelece a vazão de regime, e onde um aumento de intervalo
corresponde a um aumento linear de volume vazado. Se a pessoa que está controlando o processo desejar uma equação que lhe diga quantos litros ela irá obter, desde que ela queira trabalhar acima da condição de vazão transitória, esta equação seria: V = 15 + 1 * (Ti - 20), onde: - V: volume vazado pela torneira; - 15: Volume vazado durante a vazão transitória; - 1: Vazão da torneira em litros por segundo [l/s] - Ti: Tempo do intervalo de comando em segundos [s]; - 20: Tempo mínimo de intervalo de comando em segundos [s]. No entanto, para que tanto o gráfico como a equação correspondam precisamente ao processo, uma condição tem de ser observada. O tempo de regeneração total do sistema é de 30 segundos após o sinal de fechamento da torneira para que a pessoa que controla a torneira possa retornar à sua mesa. Este tempo tem que ser respeitado antes que um novo sinal de abertura seja dado. Qualquer novo sinal de abertura que venha a acontecer de zero a 20 segundos após o de fechamento irá comandar a abertura da torneira a partir de uma posição intermediária de fechamento. Qualquer intervalo entre 20 e 30 segundos do sinal de fechamento para o novo de abertura implicará que a pessoa deverá retornar do meio do caminho entre a torneira e a mesa. E os valores de vazão obtidos anteriormente não são repetidos. Portanto, o tempo de regeneração do sistema deve ser respeitado para um bom controle da vazão da torneira. O BICO INJETOR O comportamento do bico é muito semelhante ao modelo da torneira que foi descrito. A diferença básica é que, ao invés de contarmos o tempo em dezenas de segundos, computamos em centésimos de milisegundo. Os sinais de abertura e fechamento são os de tensão enviados pela centralina. O tempo que a pessoa leva da mesa até a torneira equivale ao atraso dado pela indutância da bobina até que o núcleo alcance uma magnetização mínima que consiga vencer a força da mola de retorno mais a força de retensão da pressão do combustível sobre o estilete. O tempo de abertura da torneira é equivalente ao tempo que o estilete demora para sair da sede de fechamento até bater no batente de abertura total. O tempo de fechamento da torneira se assemelha ao tempo que o estilete leva para sair do batente e fechar a sede. Por fim, o tempo que a pessoa leva da torneira até a mesa equivale ao tempo para a bobina dissipar o resto de energia acumulado no núcleo magnético e voltar ao repouso. Quatro efeitos físicos merecem destaque durante esta fase transitória do bico. Um é o efeito da magnetização do núcleo. O acionamento do bico é feito pela magnetização do núcleo, e essa magnetização significa transferir energia do circuito elétrico da bobina para o circuito magnético do núcleo, e isso não se faz de forma instantânea (interessante ler sobre a Lei de Lenz, que
explica esse fenômeno direitinho) por causa da indutância da bobina. Assim o campo magnético cresce de forma progressiva junto com o aumento da corrente na bobina, até que esta corrente se estabilize. O efeito contrário também ocorre, não se podendo remover a magnetização do núcleo enquanto a energia de magnetização não se dissipar. O segundo efeito é o chamado "efeito comporta". Imagine que temos uma piscina com uma abertura, e essa abertura é fechada por uma porta solta, apenas encostada pelo lado de dentro da piscina, mas que garante vedação total. Se tivermos um nível de água de 1 metro, essa porta sofrerá uma determinada pressão que resultará numa força da porta contra a borda da piscina. Se a lâmina d'água dobrar, dobra a força contra a porta. A própria pressão da água mantém a piscina fechada. Em determinado instante, se pode pensar em abrir a vazão da piscina empurrando a porta para dentro dela. Para começar a movê-la, é preciso vencer a força de retenção ("força de comporta"), mas uma vez que o fluxo de água passa no vão entre a porta e a borda da piscina, a força sobre a porta diminui. Pelo caminho reverso, se estivermos aproximando a porta da abertura, a força de comporta aumenta abruptamente com a aproximação da parede, causando um fechamento súbito da piscina. O terceiro efeito é o do mancal hidrostático. Pense numa biela girando junto com o virabrequim. Entre as duas peças, óleo é bombeado sob pressão. Esse óleo está submetido a uma certa pressão pela bomba e tem uma certa velocidade entre suas camadas (no caso causada pelo movimento relativo entre as duas peças). Isto cria um colchão de atrito reduzido mas com altíssima capacidade de carga, mantendo as peças separadas, evitando o desgaste. Por último, temos a inércia mecânica do conjunto do estilete. O primeiro efeito tem o seguinte impacto: conforme a bobina é ligada, o campo magnético no núcleo começa a aumentar de forma progressiva. Em determinado instante, a força magnética é suficiente para vencer a força da mola de retorno mais a força de efeito comporta sobre o estilete e o bico passa a abrir. Mas a magnetização pode, dependendo do projeto do bico, se extender por muito mais tempo que este tempo de início de abertura, indo muitas vezes além do tempo que o estilete leva para atingir o batente. Quanto mais o núcleo demorar para se magnetizar, mais lenta vai ser a abertura do bico. Quando o sinal da bobina é desligado, primeiro a bobina precisa dissipar o suficiente da energia contida no campo magnético do núcleo para que a força da mola de retorno seja maior e comece o movimento de fechamento do estilete. Quanto mais tempo a bobina demorar para dissipar essa energia, por mais tempo a mola terá que vencer o campo magnético para fechar, e o bico atrasa seu fechamento. No projeto dos bicos é importante dimensionar a saturação magnética dos núcleos móvel e fixo, o que permite força suficiente para uma abertura rápida, e limitação da energia contida no campo magnético para acelerar o fechamento. O ritmo de crescimento e descrescimo do campo magnético do núcleo é ditado pela indutância de uma bobina. Quanto maior a indutância (bobina com mais espiras) mais amortecido é o bico para abrir e fechar. Este é o ponto que gera a especificação do uso de bicos de alta ou baixa impedâncias. Se a tensão sobre a bobina variar, vai variar as taxas de magnetização do núcleo na
abertura, fazendo-o abrir mais rápido quanto mais alta for a tensão. No entanto, maior tensão não significa maior energia armazenada no núcleo quando ele estiver saturado. As diferenças no comportamento de abertura e fechamento do bico em função da tensão de alimentação fazem variar a vazão transitória oferecida pelo bico. É por causa disto que as centralinas precisam de uma curva de compensação do tempo de abertura do bico em função da tensão de alimentação. A pressão de alimentação do combustível também interfere grandemente na fase de abertura dos bicos. Quanto maior a pressão do combustível, maior o efeito comporta sobre o estilete do bico. Isto dificulta a abertura do bico, e aumenta significativamente o tempo que o bico precisa para começar a abrir. Com uma pressão de combustível elevada, a força de retenção sobre o estilete se torna tão alta que a magnetização do núcleo não é suficiente para abrí-la, e o bico não conseguirá abrir. Em projetos de injeção eletrônica original, quase sempre se mantém uma diferença de pressão constante entre a linha de combustível e a saída de bico para que o efeito comporta assim como a vazão do bico não variem e tenham de ser compensados. O efeito de mancal hidrostático interfere também na vazão do bico. Assim como no exemplo do conjunto biela-virabrequim, quando o combustível passa a fluir entre o estilete e sua sede, o filme de fluido móvel apresenta uma alta rigidez a qualquer esforço de fechamento. Conforme o bico abre e o fluxo de combustível se estabelece, este fluxo ajuda o estilete a abrir, mas quando o bico inicia o movimento de fechamento, o fluxo de combustível é máximo e altamente resistente ao fechamento, retardando bastante este fechamento. O efeito hidrostático entre o estilete e o assento é o principal responsável pelo fechamento do bico ser mais lento que a abertura. Quanto maior a pressão do combustível, maior a vazão, e quanto maior as duas, mais lento é o fechamento do bico. A inércia do conjunto móvel do estilete também oferece suas dificuldades durante a abertura e fechamento do bico. Uma vez que a aceleração do estilete (e, por consequencia, sua velocidade e sua posição) depende diretamente da soma das forças sobre ele e inversamente à massa, e como o bico precisa reagir rapidamente aos comandos, o estilete precisa ser suficientemente leve para responder rapidamente. Ajuda também neste quesito um deslocamento limitado do estilete, que gira em torno de 0,15 mm na maioria dos bicos. Todos estes efeitos são de natureza não linear, o que dificulta um controle efetivo da vazão durante a fase transitória do bico. Tentar operar o bico dentro da fase transitória significa que as variações do volume injetado para cada passo de tempo que a centralina possa dar não é linear, podendo num certo tempo de abertura manter a mistura muito pobre e com um único passo de tempo a mais, deixá-la bastante rica. Apesar disto, desde que os parâmteros externos ao bico (tensão de alimentação da bobina e pressão de combustível) estejam sob controle, a quantidade de combustível que é injetada ao final desta fase transitória apresenta um valor bastante preciso. Então, para os projetistas de sistemas de injeção, os bicos tem que ser especificados de forma que o menor tempo de injeção (condição de marcha-lenta) fique acima da região
transitória de vazão, de forma que a variação da vazão fique linear e controlável pelo tempo da centralina. O gráfico "Volume injetado x Tempo de injeção" de um bico se assemelha com o seguinte:
Chama-se de "latência" (também "dead time", "atraso", "tempo morto") o tempo que o bico demora para começar a abrir. Alguns autores preferem referir-se à latência como o tempo até o final da região de vazão transitória. É apenas uma questão de referencial. O que realmente importa é que tanto a latência como seu complemento, que é a regeneração do bico, são fortemente influenciados por estes efeitos. Apesar da latência e do tempo de regeneração serem fenômenos que se estabelecem totalmente com baixos tempos de acionamento do bico, eles tem forte impacto mesmo nos maiores tempos de injeção. Quanto maiores os tempos de latência e regeneração, maiores as perdas de volume injetado pelo bico, porque reduz o tempo de vazão de regime. Os tempos de injeção são cíclicos no motor, e dependem da rotação do motor. Quanto maior a rotação, onde o motor oferece maior potência e precisa de mais combustível, menor o tempo disponível para o bico injetar. E, quanto maiores os tempos de latência e regeneração de um bico, menor o tempo disponível para a vazão de regime, portanto menor o combustível injetado ao final do pulso de comando. Enquanto o motor se acha em regime de carga parcial, a centralina pode ter um mapa de tempos que seja adequado para injetar a quantidade necessária de combustível. Mas problemas sérios podem aparecer nas altas potências, quando a necessidade de combustível é máxima. Nestas condições, quanto menores a latência e a regeneração, melhor. Um exemplo dos problemas de aumento de latência, comum em carros turbo fortemente preparados com dosador HPI, ocorre por causa da pressão. A idéia do dosador HPI é subir a pressão absoluta da linha de combustível muito acima da pressão de coletor de admissão, de forma a aumentar a vazão do bico nas maiores potências. Para um bico constantemente aberto (ou seja em vazão de regime), a variação da vazão de combustível aumenta na proporção da raiz quadrada do aumento de pressão. Mas, concomitante ao aumento da vazão, o aumento de pressão também aumenta o efeito comporta, aumentando a latência numa curva semelhante a uma exponencial. O comportamento do bico, para um determinado tempo de acionamento, é inicialmente aumentar a vazão com o aumento da pressão, mas a partir de certo ponto, com o aumento da latência, essa vazão se estabiliza (o ganho de vazão em regime é compensado pelo aumento do tempo que o bico demora para abrir), diminui e até zera a partir da pressão que causa a retenção total do estilete de bico. Este fenômeno leva boa parte dos preparadores a cometer um erro sob determnadas condições. Eles pensam exclusivamente no ganho de vazão em função da pressão. Quando vão preparar um motor bastante potente podem precisar aumentar a pressão da linha de combustível para manter a proporção ideal de mistura. No entanto, sob determinadas configurações, principalmente de bicos, podem cair na região de aumento exponencial
da latência, e então acontece o inesperado: quanto mais eles aumentam a pressão do combustível, mais pobre fica a mistura, e não o contrário. E eles ficam sem entender o que ocorre. Outro problema comum é haver uma configuração que aumenta a latência e a regeneração do bico (exemplo: resistência de contato ou fios finos que limitam a corrente no bico) e o bico não conseguir fornecer o volume injetado suficiente para as necessidades do motor em alta potência. Aí o preparador, partindo de um ponto de vista prático, diz que "o bico está pequeno" (o bico não tem vazão suficiente). A solução oferecida acaba sendo a de trocar por um bico de maior vazão. Uma das formas de reduzir a latência é reduzindo a indutância e a resistência elétrica das bobinas dos bicos. Em algumas situações, isto é crítico. Imaginemos um motor de 4 cilindros girando a 6000 rpm. Neste motor cada cilindro admite a cada 20 ms, mas as admissões sobrepostas no coletor de admissão ocorrem a cada 5 ms. Imaginemos que usemos neste motor bicos com latência de 1 ms mais 1,5 ms a título de regeneração do bico, totalizando 2,5 ms de tempo. Para um motor com injeção multi-ponto sequencial, que injeta 1 vez a cada aspiração, cada bico tem 20 ms para injetar todo seu combustível, mas perde 2,5 ms por latência e regeneração. Este tempo perdido não é crítico, representando apenas 12,5% do tempo total disponível, deixando 87,5% para a vazão de regime do bico. Para um motor multi-ponto semi-sequencial, existem 2 injeções por aspiração, com pulsos de no máximo 10 ms sobre os quais incidem 2,5 ms de latência e regeneração. A latência mais a regeneração representam neste caso 25% do tempo máximo do pulso, mas ainda é adequada porque disponibiliza 75% do tempo para a vazão de regime. Para um motor mono-ponto a situação já complica. Neste tipo, há uma injeção para cada um dos 4 cllindros, oferecendo 5 ms de tempo máximo e contra 2,5 ms entre latência e regeneração, que agora representam 50% do ciclo. É muito tempo transitório com vazão limitada, e ele precisa ser reduzido para que haja mais tempo para a vazão de regime. Para as injeções multi-ponto são comumente usados bicos do tipo de alta impedância (também conhecidos como "saturados"). Estes bicos tem bobinas com várias espiras e resistência elétrica por volta de 16 Ohms, e podem ser acionados continuamente pela tensão de 12 Volts do circuito elétrico. São, portanto, bicos mais lentos em latência. Mas a maior simplicidade de acionamento diminui o custo da centralina. Injeções mono-ponto usam bicos de baixa impedância, com bobinas com poucas voltas e resistência elétrica por volta de 2 Ohms. Estes bicos não podem ser acionados direta e continuamente pela tensão de 12 Volts pelo risco de queima. Para eles existem 2 formas de alimentação. Uma é através de um resistor limitador de corrente, denominado "balast" (ou resistor de lastro) e que vai em série com o bico injetor. A outra forma é através de um driver eletrônico, tipo "Peak & Hold". Este tipo de driver liga o bico injetor aos 12 Volts do circuito de alimentação e monitora a corrente que passa bobina. Ele deixa a corrente subir até o valor de 4 Ampéres, para então reduzir o valor da corrente para 1 Ampére, e assim o conserva até haver o sinal de desligamento do bico. Considera-se que o bico esteja totalmente aberto antes de atingir os 4 Ampéres, e a corrente de 1 Ampére é suficiente para mantê-lo aberto mas com magnetização reduzida para diminuir dissipação de calor e o tempo de fechamento do bico. O driver Peak & Hold é muito mais eficiente na redução da latência do bico que o uso do resistor
balast, mas é muito mais complexo e caro. Oportunamente poderemos estudar melhor estes tipos de bicos e o tipo de acionamentos deles. Pelo menos 3/4 dos problemas de injeção relacionados ao controle dos bicos estão relacionados com a latência e a regeneração destes bicos. Por isso, o controle dos fatores que as afetam é de suma importância. Em injeções originais, alguns parâmetros interferentes (como a diferença de pressão de combustível nos bicos) são mantidos constantes, enquanto outros são compensados pela centralina (caso da tensão de alimentação do circuito elétrico). Assim, os carros são produzidos em larga série sem nenhum problema. No entanto, em carros preparados, todo o sistema é refeito, e fica sujeito a estas alterações, quer seja de forma intencional (caso de dosadores HPI) ou não (caso de emendas elétricas mal feitas com resistência de contato). E é aqui que surgem os problemas. Este artigo analizou aspectos técnicos de funcionamento interno dos bicos injetores. Estudamos os principais fenômenos que ocorrem dentro deles em detalhes. A partir do estudo destes fenômenos, podemos entender muitos dos problemas que afetam a injeção de combustível e as formas de contorná-los. Há mais considerações a serem feitas sobre a aplicação dos bicos injetores, como geometria de jato e posicionamento. Mas este assunto será abordado oportunamente. Esse artigo que eu coloquei seria o "alfabeto" dos bicos através do qual se lê um sistema de injeção funcionando. Vejam como a coisa é sutil. Tem as injeções de "8 bicos", que na verdade são dois bancos de bicos acionados por dois drivers separados com mapas separados de injeção. Nessas injeções normalmente se usam 4 bicos de baixa vazão no primeiro banco, prá fazer a marcha-lenta e a fase aspirada, e o segundo banco usa bicos de alta vazão prá alimentar na hora que o turbo pressuriza. Tem um defeito que os preparadores acham normal e que não conseguem corrigir é que, o carro vem acelerando e, quando entra o segundo banco o carro sempre dá uma mancada porque fica gordo, depois refina e vai embora. O que ocorre é que os bicos praticamente só conseguem injetar da fase de vazão transitória prá frente. Antes desse ponto os bicos não injetam nada e, quando chega num certo ponto, passam a injetar um certo valor praticamente de vez. É solução que, uma vez entendido o funcionamento dos bicos se contorna com facilidade. Mas que preparador vai ficar reparando nesse tipo de detalhe? O certo de se fazer um carro acelerar com esse esquema sem essa mancada de gordo é fazer os bicos de alta entrarem já com um tempo acima da sua latência e recuar os
tempos dos bicos do primeiro estágio, de modo que o volume injetado não apresente um degrau súbito. Como eu disse, os princípios de funcionamento dos bicos é o alfabeto com que se lê um sistema injetado. Só que um sistema injetado é uma bíblia grossa, com muitos verbetes, e com muitas interpretações. Obs: fiquei 4 dias escrevendo e tirando arestas deste texto prá ele chegar assim em sua versão final. Tenho muito mais coisa assim prá escrever, mas cadê o tempo prá poder me dedicar? Fernando Furini ,
tem duas coisas. Uma é a parte de que a bobina não resiste ficar 100% do tempo aberta. ela pode ficar assim até por uns poucos minutos, mas não em regime permanente. A segunda coisa é o respeito à regeneração do bico. O bico nem fechou e a centralina já está mandando ele abrir de novo. Desse jeito, ele vai apresentar uma vazão que nada tem a ver com a curva característica dele, simplesmente porque ele não fez o ciclo completo de abertura e fechamento, mas foi pego no meio do caminho. Aqui no Brasil, o pessoal "ixpecirista" chama não respeitar esse período de "emendar pulsos", porque o bico se comporta como se ele não recebesse sinal prá fechar. Só tem um jeito: medindo a vazão pulsada na condição de tempo limite. Se vc tem um motor de 4 cilindros que o limite de giro seja, digamos, 6000 rpm, então se tem 5 ms entre uma aspiração e outra. Se a centralina usa uma lógica semi-sequencial, então os bicos injetam alternadamente com as aspirações dos cilindros, ou seja, eles injetam junto com uma e pulam a próxima. Assim o ciclo tem metade da frequência das aspirações totais. Desta forma, os bicos deste motor injetam 2 vezes para cada aspiração individual de cada cilindro tendo um limite de tempo de 10 ms no total. Como o limite de abertura do bico é de 80%, então o bico tem que injetar álcool suficiente em 8 ms prá alimentar o motor. Agora, se o motor tem alimentaão mono-ponto, aí tem uma injeção a cada aspiração, e, usando o mesmo exemplo acima, o tempo limite do bico é de 4 ms prá injetar o combustível necessário. Comparando esses dois exemplos, vemos que no caso do mono-ponto, o bico precisa ter vazão para cada cilindro por cada pulso de injeção, enquanto no multi-ponto o bico tem a metade dos ciclos de latência e regeneração, o dobro do tempo por pulso de injeção, e tem que alimentar um único cilindro. Fazendo as contas na ponta do lápis conforme eu indiquei no artigo acima, vc vê que o bico monoponto precisa de baixa latência (daí ele geralmente ser de baixa impedância) e ter uma vazão enorme.
Agora dá prá entender porque o pessoal usa bico de monza a álcool mono-ponto no lugar de bicos suplementares ao invés de bicos multi-ponto. Por aqui dá prá ver que o bico precisa de boa folga no tempo de injeção à plena potência prá passar o motor prá álcool só pelo remapeamento. É muito fácil o motor acbar ficando pobre em alta potência se for convertido só no remapeamento. O pessoal tem o chute de 40% a mais nos tempos, mas, conforme o bico e suas características, esse chute pode não ser bom (daí eu não chamá-lo de C.H.U.T.E.).
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