As Escrituras de Nitiren Daishonin - Cartas e Tratados

December 17, 2019 | Author: Anonymous | Category: Nitiren, Gautama Buddha, Religião e Crença, Ciência Filosófica, Ciência
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Seleção de cartas e tratados que Nitiren Daishonin escreveu para seus discípulos.

As Escrituras de Nitiren Daishonin Jossei Toda , o segundo presidente da Soka Gakkai teve a idéia de publicar as escrituras de Daishonin para comemorar o aniversário de setecentos anos da fundação do verdadeiro Budismo de Nitiren Daishonin. Em 1951, Nitiko Hori (18671957) começou a trabalhar na edição das escrituras de Nitiren Daishonin, conhecidas normalmente como Gosho. Em abril do ano seguinte, o texto completo foi publicado em um volume pela Soka Gakkai, sob o título Nitiren Daishonin Gosho Zenshu ou "As Escrituras de Nitiren Daishonin".

A autenticidade de todos os 426 documentos da coleção foi comprovada. Destes, 150 estão escritos pelo próprio punho de Nitiren Daishonin. Quando não se encontravam manuscritos de próprio punho, as cópias feitas por seus discípulos imediatos Nikko Shonin e Nitimoku Shonin, eram sempre comprovadamente possíveis.

Créditos: A maioria dos Goshos foi enviado por Charles Chigusa de Tokyo - Japão e alguns foram digitados por Neusa Codato, Takato Nakayoshi e Sandro Neto Ribeiro. Programação das Páginas: Sandro Neto Ribeiro Fonte: As Escrituras de Nitiren Daishonin - Ed. Brasil Seikyo

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INDICE: As Barragens da Fé Carta de Ano Novo Carta a Endo Saemon-no-jo As Profecias do Buda Sobre atingir o Estado de Buda A lei causal da vida A Perseguição de Tatsunokuti Resposta ao Lorde Nanjo Um Navio para atravessar o mar do sofrimento Comparação entre o Sutra de Lótus e os outros Sutras Resposta a Nitigon-Ama Sustentando a Fé no Gohonzon O siginificado da fé Carta a Domyo Zemmo Aspiração à Terra do Buda A Prática dos Ensinos do Buda A Virtude Invisível e a Recompensa Visível O Rico Sudata O Recebimento de novos feudos Resposta a Yasaburo Os Quatro Estágios da Fé e os Cinco Estágios da Prática O devoto do Sutra de Lótus encontrará perseguição O tambor no portal do trovão O kalpa de diminuição

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Um pai adquire fé Carta a Abtsu-bo O fácil parto de uma criança afortunada Resposta ao Lorde Shijo Kingo A Iluminação pelo Sutra de Lótus Sobre recomendar este ensino ao seu Lorde Carta a Niike Resposta a Shijo Kingo Resposta à Dama Ueno O Palácio Real Esta pessoa praticará entre o povo Os Quatro Bodhisattva como Objeto de Adoração Carta aos Bonzos do Templo Seitioji A Tartaruga de um Olho e o Tronco Flutuante de Sândalo Sobre a Torre do Tesouro O Portão do Dragão Carta a Missawa A felicidade neste mundo A essência do capítulo Juryo A Concessão do Mandala da Lei Mística Carta a Ko-no-Ama-Gozen Carta a Teradomori O Oferecimento de um robe de verão O tesouro de um filho dedicado O remédio benéfico para todas as doenças Os presságios Resposta a Ni Ama Resposta ao Lorde Hakiri Saburo Três Mestres Tripitaka oram por chuva Uma Admoestação contra o apego ao feudo Resposta ao Lorde Matsuno Resposta a Kyo' o A Consagração de Uma Imagem do Buda Sakyamuni feita por Shijo Kingo A origem de Urabon A Recitação dos Capítulos Hoben e Juryo Wu-Lung e I-Lung As Duas Espécies de Doença Carta a Nakaoki Nyudo O Sabor Salgado Universal Repreendendo a Calúnia à Lei e Erradicando Pecados Um Resumo do Capítulo Zokurui e de Outros A única frase essencial (explanação)

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As Barragens da Fé (Abutsubo Ama Goze Gohenji – Págs. 1307 a 1308) Em sua carta, a senhora perguntou-me de que forma o efeito varia de acordo com o grau de calúnia contra o Budismo. Para começar, o Sutra de Lótus foi ensinado para conduzir todas as pessoas à iluminação. Contudo, somente aqueles que possuem fé no mesmo atingem a iluminação. Aqueles que o caluniam caem no inferno de incessante sofrimento. Como o sutra afirma: “Aquele que se recusar a acreditar neste sutra e, ao invés disso, o calunia, imediatamente destrói as sementes apra se tornar um Buda neste mundo…Após morrer, cairá no inferno de incessante sofrimento”. Há vários graus de calúnia. Mesmo entre as pessoas que abraçam o Sutra de Lótus, são poucas a que sustentam firmemente tanto na mente quanto na ação. Porém, aquelas que o fazem não sofrerão grave punição, ainda que tenham cometido ofensas menores contra o Budismo. A fé sólida delas expia seus pecados tão seguramente quanto uma enchente extingue pequenas chamas. No Sutra Nirvana, Sakyamuni declara: “Se mesmo um bom sacerdote vê alguém caluniando a Lei e faz pouco caso dele, deixando de reprová-lo, de desalojá-lo ou de puní-lo pela sua ofensa, então, esse sacerdote está traindo o Budismo. Entretanto, se repreende severamente o caluniador, o rechaça e o pune, então, ele é meu discípulo e uma pessoa que realmente compreende os meus ensinos”. Esta advertência me força a manifestar-me contra a calúnia, a despeito da perseguição que enfrento, pois temo que eu possa tornar-me um inimigo do Budismo, caso não o faça. Contudo, a calúnia pode ser secundária ou grave, e há ocasiões em que devemos tomar pouco conhecimento dela ao invés de atacá-la. Os adeptos das seitas Tendai e Shingon caluniam o Sutra de Lótus e devem ser refutados. Porém sem uma grande sabedoria é muito difícil distinguir corretamente as doutrinas delas dos ensinos que Nitiren expõe. Portanto, às vezes, deve estar bem prevenido para deter-se de acatá-las, assim como eu fiz no “Tratado para a Pacificação da Terra Através do Estabelecimento do Verdadeiro Ensino”(Rissho Ankoku Ron).

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Reprovemos ou não, uma outra pessoa pela sua calúnia, é difícil impedí-la de cometer um pecado grave. Se vemos ou ouvimos alguém cometer a calúnia, e não fazemos tentativa alguma para fazê-lo parar, embora ele pudesse ser salvo, traímos nossos grandes dons de audição e visão e, deste modo, cometemos um ato de total inclemência. Chang-an (Shoan) escreve: “Se favorecer uma outra pessoa mas não possuir a benevolência para corrigí-la, o senhor é, na verdade, um inimigo dela”. As consequências dessa ofensa são extremamente difíceis de se apagar. O mais importante é fortalecer continuamente a sua compaixão para salvar os outros de suas próprias naturezas caluniosas. Quando as calúnias de uma pessoa são secundárias, ela pode, algumas vezes, precisar ser admoestrada, mas outras vezes isso é desnecessário, pois ela pode ser capaz de corrigir seus erros sem que ninguém lhe diga para fazê-lo. Reprove uma pessoa por agir contra o Budismo, quando necessário, para que ambos possam evitar a consequência da calúnia. Então, deve perdoá-la. A questão é que mesmo calúnias secundárias podem levar a calúnias graves, e os efeitos que a pessoa terá que sofrer serão muito piores. É isto que Chang-an (Shoan) pretendia dizer quando escreveu: “Remover o mal de um homem é como ser um pai para ele”. Há exemplos de calúnia mesmo entre os discípulos e crentes de Nitiren. Tenho certeza que ouviu a respeito de Itinosawa Nyudo. Em seu coração, ele é um dos discípulos de Nitiren, mas externamente ainda permanece na seita Nembutsu. Portanto, estou muito preocupado com a sua própria existência, e o presenteei com os dez volumes do Sutra de Lótus. Fortaleça a sua fé, mais do que nunca. Qualquer um que ensine as verdades do Budismo aos outros com certeza atrairá sobre si o ódio de homens e mulheres, sacerdotes e freiras. Deixe que digam o que desejarem. O mais importante é que confie a sua vida aos ensinos dourados do Sutra de Lótus, ao Buda Sakyamuni, a Tientai (Tendai), Miao-lo (Myoraku), Dengyo e Chang-an (Shoan). Este é o modo de praticar corretamente, de acordo com os ensinos do Buda. O Sutra de Lótus diz: “Se alguém ensinar este sutra por mesmo um momento na temível era que virá, ele receberá o apoio de todos os céus”. Esta passagem explana que, nos Últimos Dias, quando pessoas más, maculadas pelos três venenos, predominarão, qualquer um que abrace o verdadeiro ensino durante mesmo um curto período será auxiliado e apoiado pelos céus. Agora, deve nutrir o grande desejo de atingir a iluminação para a felicidade em sua próxima vida. Se duvidar ou caluniar o mínimo que seja, cairá no inferno de incessante sofrimento. Suponha que haja um navio que viaje em mar aberto. Mesmo que a embarcação seja construída fortemente, se tiver a menor fenda, os passageiros 5

certamente afundarão juntos. Mesmo que a barragem entre as plantações de arroz seja firme, se houver apenas uma única e minúscula rachadura nela, a água jamais será contida. Deve tirar a água da dúvida e da calúnia do navio de sua vida e solidificar as barragens de sua fé. Se a ofensa de um praticante for superficial, perdoe-o e o leve a obter benefícios. Se for grave, advirta-o a fortalecer a sua fé para que ele possa expiar o pecado. A senhora é uma mulher extraordinária, pois pediu-me para explanar os efeitos dos vários graus de calúnia. A senhora é tão louvável quanto a filha do Rei Dragão quando ela disse: “Revelei a doutrina Mahayana para salvar as pessoas do sofrimento”. O Sutra de Lótus afirma: “Perguntar sobre o significado deste sutra será realmente difícil”. Há muito poucas pessoas que inquirem sobre o significado do Sutra de Lótus. Esteja sempre determinada a denunciar calúnias contra o Budismo usando o máximo de sua habilidade. É de fato extraordinário que me ajude a revelar meus ensinos.

Respeitosamente, Nitiren 3 de setembro de 1275

Fundo de Cena

Nitiren escreveu esta carta no Monte Minobu, em 3 de setembro de 1275, no segundo ano após o seu retorno da Ilha de Sado. Na ocasião, ele contava com 54 anos de idade. A recebedora desta carta, Sennitiama morava em Sado. Ela e seu marido, Abutsubo, haviam abraçado o ensino de Nitiren Daishonin durante o seu exílio naquele local. Pouco se sabe sobre as origens de Senniti-ama. De acordo com a tradição, ela foi, outrora, dama de companhia de Uemon-no-Suke, que servia o Imperador Aposentado Jotoku e o acompanhou ao exílio quando este foi banido para Sado após a derrota das forças imperiais no Distúrbio Jokyu em 1221. Contudo, descobertas recentes parecem indicar que tanto Senniti-ama como Abutsubo eram provavelmente, nativos de Sado. O casal já estava bastante idoso quando os dois tornaram-se discípulos de Nitiren Daishonin. Nitiren Daishonin havia sido banido à pequena Ilha de Sado no Mar do Japão em outubro de 1271, após uma tentativa fracassada de decapitálo em Tatsunokuti em 12 de setembro de 1271. Nessa ilha desolada e 6

fria, ele recebe como morada uma minúscula capela em ruínas chamada Sanmai-do, que localizava-se num campo usado como cemitério, exposto a ventos gelados. A neve entrava pelos buracos do teto e das paredes, e afirma-se que a certa altura, Nitiren Daishonin possuía somente um casaco de palha para protegê-lo. As autoridades tinha a total intenção de que ele morresse. Além da falta de alimentação e abrigo, ele teve que lutar contra a hostilidade dos habitantes da ilha, a maioria composta de praticantes da Terra Pura, que enfureciam ao ouvir que o ‘mau sacerdote Nitiren’, que denunciou a fé que abraçavam, havia se instalado em Sado. Conta-se que Abutsubo, ele próprio um seguidor da seita da Terra Pura, foi até Sanmai-do aos gritos para enfrentar Nitiren Daishonin num debate, mas foi convertido aos seus ensinos e nunca mais recitou a Nembutsu novamente. A esposa de Abutsubo, Senniti-ama, também se converteu e, a partir de então, o idoso casal serviu a Daishonin com coragem e devoção. Embora o auxílio aos exilados fosse proibido por lei, eles se expuseram ao descontentamento da comunidade para prover-lhe alimento, materiais para escrita e outras necessidades, enganando por repetidas vezes, a guarda colocada ao redor de Sanmai-do, para visitá-lo tarde da noite. Numa carta escrita a Senniti-ama datada de 1278, Nitiren Daishonin diz: “Em que existência eu poderia esquecer a sua bondade ? Foi como se minha própria mãe tivesse renascido nessa província de Sado”. (Gosho Zenshu, pág. 1313). O casal continuou a assistir Nitiren Daishonin até ele ser perdoado e deixar a ilha em 1274. Eles se mantiveram profundamente dedicados à fé durante toda a sua vida e esforçaram para propagar os ensinos de Nitiren Daishonin entre os habitantes de Sado. Após Nitiren retirar-se ao Monte Minobu, Senniti-ama enviou o seu marido três vezes para visitá-lo. Nitiren Daishonin escreveu esta carta especialmente em resposta à pergunta de Senniti-ama sobre como os efeitos variam de acordo com a profundidade da calúnia da pessoa. Ele explana que calúnia – infamação da Lei Verdadeira, seja em pensamento, palavra ou ação – forma a causa fundamental para o sofrimento, e deste modo, devemos nos esforçar para eliminá-la e ajudar os outros a fazerem o mesmo. Entretanto, embora devamos ser consistentemente rigorosos em relação a nós mesmos a esse respeito, apontar ou não, os erros de outras pessoas, depende de circunstâncias específicas. Em todos os casos, explana Nitiren Daishonin, devemos ser guiados pela sabedoria e compaixão.

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Carta de Ano Novo Recebi cem bolinhos de arroz (Mushimoti) e um cesto de doces. O dia do Ano Novo é o primeiro dos dias, o primeiro dias dos meses, o início da primavera e o início do ano. Quem celebra esse dia tornar-se-á mais virtuoso e será amado por todos. Será como a lua que gradualmente se torna cheia à medida que se dirige do oeste para o leste ou como o sol que se torna cada vez mais brilhante à medida que viaja do leste ao oeste. Considerando a questão de onde estão o Inferno e o Buda, um sutra diz que o Inferno está debaixo da terra enquanto que outro diz que o Buda está no oeste. Entretanto, um pensamento cuidadoso esclarecerá que ambos existem em nossos próprios corpos. Tal como o vejo, a razão para isto é que o Inferno está no coração da pessoa que insulta seu pai e está também naquela que ridiculariza sua mãe. É como a semente de lótus que forma tanto a flor como uma nova vagem de semente. O Buda existe dentro do nosso coração. Tome, por exemplo, o fato de que o fogo pode ser produzido por pedra ou que jóias possuem valor em si mesmas. Nós, seres humanos, não podemos ver nossas sombrancelhas que estão próximas nem o céu distante. Do mesmo modo, não compreendemos que o Buda existe em nossa própria mente. Naturalmente pode desejar saber como o Buda pode nos alcançar quando, ao mesmo tempo, o nosso corpo humano, que herda o sangue dos pais, é a origem das três impurezas e o local dos desejos carnais. Ponderando-o reiteradamente, compreendemos ser razoável. A pura flor de lótus floresce do fundo lamacento de um lago; a fragrância do sândalo cresce da terra; as graciosas flores de cerejeira vêm da árvore; a bela Yang Gui Fei nasceu de uma serpente; e a lua nasce detrás das montanhas para espalhar a luz sobre elas. A desgraça vem da boca de uma pessoa e arruina-a, enquanto a boa sorte vem da mente e traz-lhe honra. A sinceridade que vem da mente de uma pessoa para oferecer presentes ao Sutra de Lótus no início do Ano Novo é como as flores que desabrocham de uma árvore, uma flor de lótus que se abre num lago, as flores de um sândalo que desprendem sua fragrância no Monte Sessen, ou como a lua começando a subir. Creio que o Japão, fazendose inimigo do Sutra de Lótus, convidou o infortúnio distante de mil milhas, ao passo que aqueles que crêem no Sutra de Lótus reúnem a boa sorte de dez mil milhas de distância. A sombra é formada pelo corpo tal como a sombra segue o corpo, os infortúnios cairão no país cujas pessoas são inimigas so Sutra de Lótus. Os crentes no Sutra de Lótus, por outro lado, são como o sândalo dotado de fragrância.

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05 de janeiro Nitiren

O FUNDO DE CENA O presente Gosho é uma carta que Nitiren Daishonin endereçou à esposa de Lorde Omossu. Esta carta foi datada de 5 de janeiro mas o ano foi omitido. Da primeira sentença, sabemos que a recebedora da carta, que foi chamada Myoitisonni, enviou presentes de Ano Novo a seu Mestre que vivia em Minobu. O Lorde Omossu foi assim chamado, comumente, porque vivia na área chamada Omossu, situada próxima ao atual Taissekiji. Seu nome completo era Ishikawa Shimbe Taissekiji Sanetada. Sua esposa era irmã mais velha de Nanjo Tokimitsu, um dos principais discípulos de Daishonin. Despertada à Lei Mística através da orientação de Nikko Shonin, continuou como uma devota crente por toda a sua vida. Nesta carta, Nitiren Dashonin elogia-a por sua genuína fé como foi expressada pelos seus oferecimentos, afirmando que isto sem falha trará a ela muito boa sorte e que ela será amada pelos outros por causa de sua virtude. Então, Daishonin claramente explana que tanto o Buda como o Inferno são condições inerentes em cada pessoa

Carta a Endo Saemon-no-jo (Endo Saemon-no-jo Gosho, pág.1336)

Recebi recentemente um indulto oficial e estou, no momento, retornando a Kamakura. Será este o ano no qual a passagem: "Agora, os votos originais que fiz já foram cumpridos"(1), se concretizará para mim ? Se não fosse a sua proteção, seria possível eu ter mantido a minha vida ? Eu poderia ter sobrevivido até ser perdoado ? Todas as realizações de minha vida devem-se unicamente ao senhor. O Sutra de Lótus diz: "Os jovens filhos das divindades celestiais o atenderão e o servirão. Espadas e bastões não tocarão, e o veneno não terá o poder de lesálo"(2). Como é reconfortante este sutra!

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Sendo este o caso, o senhor deve ser um emissário enviado pelos deuses celestes Bonten e Taishaku. Conceder-lhe-ei meus selos como um promessa de que irá renascer (na Terra Pura do) Pico da Águia. Deve levar um deles consigo para a sua próxima existência. (Quando chegar) ao Pico da Águia, chame: "Nitiren, Nitiren!" e eu virei encontrálo nessa ocasião. Escrever-lhe-ei novamente de Kamakura. Nitiren Em 12 de março de 1274. Fundo de Cena No dia 8 de março de 1274, um enviado do governo alcançou a ilha de Sado com uma carta de perdão para Nitiren Daishonin. Deste modo, terminaram os mais de dois anos de exílio, um período no qual Nitiren Daishonin escreveu vários de seus mais importantes Gosho e estabeleceu a base doutrinal para inscrever o objeto de adoração para se atingir o Estado de Buda, a ser concedido para toda a humanidade. Nitiren Daishonin e seu grupo deixaram Sado no dia 13 de março. Ele escreveu esta carta para Endo Saemon-no-jo no dia que imediatamente precedeu sua partida. Pouco se sabe a respeito dessa pessoa, embora pareça ter sido um samurai, e segundo algumas opiniões, fosse parente de Abutsu-bo. Esta é a única carta remanescente endereçada a ele. Neste sentido, pode-se dizer que representa os muitos corajosos seguidores de Nitiren Daishonin cujos nomes não nos foram transmitidos. Apesar de extremamente breve, esta carta exprime, de forma vívida, a gratidão de Nitiren Daishonin pela assistência de Endo durante o seu exílio. Ele também assegura calorosamente a Endo que a sua devoção na fé garantirá a sua felicidade futura. Notas 1. Sutra de Lótus, capítulo 2. 2. Ibidem, capítulo 14. Esta passagem refere-se ao benefício daquele que abraça o Sutra de Lótus.

Sobre atingir o Estado de Buda (Issho Jobutsu Sho)

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Se o senhor deseja livrar-se dos sofrimentos de nascimento e morte que vem suportando por eras eternas e deseja alcançar a suprema iluminação nesta existência, deve despertar para a verdade mística que sempre existiu dentro da sua vida. Esta verdade é o Myohorengue-kyo. Recitar o Myoho-rengue-kyo, portanto, capacita-lo-á a compreender a verdade mística dentro da sua vida. Myoho-rengue-kyo é o rei dos sutras, perfeita tanto nos caracteres como nos princípios. Suas palavras são a realidade da vida, e a realidade da vida é a Lei Mística. Esta é assim chamada porque elucida inclusive a mutualidade do relacionamento da vida e todos os fenômenos. Esta é a razão deste sutra ser considerado Myoho-rengue-kyo, 'a sabedoria de todos os Budas'. A vida, em cada momento, engloba tanto o corpo como o espírito, a entidade e o ambiente de todos os seres sensíveis em todas as condições de vida, assim como seres insensíveis _ plantas, céus e terras, até as mais minúsculas partículas de pó. A vida, em cada momento, permeia o universo e revela-se em todos os fenômenos. Aquele que entende esta verdade, demonstra a integridade da vida como o mundo fenomenal. Contudo, mesmo que recite e conserve o Myoho-rengue-kyo, se pensa que o estado de Buda existe fora do seu coração, isto já não é mais Lei Mística; é um ensino contrário a ela. Sendo assim, não é mais um ensino do Sutra de Lótus, mas um ensino provisório. Portanto, não é um caminho direto à iluminação. Desde que não é um caminho direto à iluminação, mesmo que pratique por um tempo incalculavelmente longo, não se pode atingir a iluminação. Por esta razão, torna-se muito difícil atingi-la. Portanto, quando se recita a Lei Mística e se lê o Nam-myoho-rengue-kyo, faça despertar a profunda fé que está indicando a sua própria vida, denominando-a de Nammyoho-rengue-kyo. Jamais pense que os 80.000 ensinos de Sakyamuni, assim como todos os Budas e Bodhsattivas do universo, existem fora de sua vida. Mesmo que estude o Budismo, se não perceber a natureza de sua própria vida, não se pode afastar do sofrimento da vida e da morte. Se procura o caminho fora de si mesmo e tenta praticar as mais variadas formas de exercício e de bondades, isto é igual a um pobre que calcula dia e noite a fortuna do seu vizinho e não obtém um tostão sequer para si. Tientai, portanto, afirma: "Se não percebe a natureza da sua própria vida, seus pecados passados não podem ser extinguidos". Isto quer dizer que, se não perceber a natureza da sua própria vida, mesmo que pratique o Budismo de nada adiantará; será apenas uma prática inteiramente inútil. Por esta razão, tal pessoa é humilhada como um praticante marginalizado do Budismo. Referindo-se a isto, no Maka Shikan consta: "Embora uma pessoa pratique o Budismo, suas concepções divergirão deste".

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Por isto mesmo, recitar o nome do Buda original (Nam-myoho-renguekyo), ler o sutra ou oferecer "Shikimi" e incenso, tudo isto virá a ser causa de benefícios e boa sorte na vida de uma pessoa. Assim crendo, todos devem professar com fé. Daí, uma passagem do sutra "Jomyokyo" afirma que a iluminação é proveniente da mente das pessoas comuns e que estes atingirão a iluminação com a transformação de seus sofrimentos em Nirvana. De acordo com o sutra, se a mente das pessoas é impura, sua terra também será impura. Pelo contrário, se suas mentes são puras, assim será a terra. Em uma palavra, não há duas terras _ pura e impura _ ao mesmo tempo. A diferença está na mente, boa ou má, das pessoas. Pelo mesmo motivo, não há diferença real entre um Buda e um mortal comum. Enquanto desnorteada pela ilusão, a pessoa é chamada mortal comum, mas uma vez iluminada, é chamada de Buda. Por exemplo, um espelho embaçado brilhará como uma jóia se for polido. Sua mente, agora desnorteada pela escuridão inata da vida, é como um espelho embaçado, mas se o polir, é certo que transforma-se-á claro como cristal de iluminação das verdades imutáveis. Manifeste-se fortemente na prática da fé, polindo seu espelho incessantemente, dia e noite. Como deve poli-lo? Não há outro modo a não ser devotar-se à recitação do Nam-myoho-rengue-kyo. O que então significa "myo"? É o nome dado ao mistério da mente, a incompreensível e inexpressível natureza da vida. Quando olhar em sua mente em qualquer momento, não perceberá a cor nem a forma para verificar que ela existe. Ainda assim, todavia, não poderá dizer que não existe, pois muitos pensamentos diferentes ocorrem continuamente no senhor. A mente, sem dúvida, é uma realidade que transcende tanto as palavras como os conceitos de existência e do nada. Não é nem existência ou inexistência, mas ao mesmo tempo, é dotado de ambas as qualidades. É uma entidade mística, o caminho médio que é a realidade de todas as coisas. "Myo" é o nome dado para a natureza misteriosa da mente e "ho" denota os modos em que ela se manifesta. "Rengue", o lótus, exemplifica fisicamente a maravilha desta lei. Uma vez que o senhor sabe que a sua vida é a verdade mística, compreende que as vidas de todos os outros também são, e que a compreensão é o sutra místico, "myokyo". É o rei dos sutras que provê o direto caminho para a iluminação porque declara que todos os pensamentos que o senhor tem, sejam bons ou maus, é a própria Lei Mística. Crendo nisto profundamente, em seu coração e recitando o Nam-myoho-rengue-kyo, definitivamente alcançará o Estado de Buda nesta existência. Por conseguinte, o Sutra de Lótus afirma: "Seguindo ao meu nirvana, deve tomar a fé neste sutra. Os que assim fizerem, estão certos de viajarem direta e verdadeiramente no caminho para o estado de Buda". Não permita que a mínima duvida se impomha sobre si. Com sua fé, alcance a iluminação nesta existência. 12

Nam-myoho-rengue-kyo. Nitiiren

FUNDO DE CENA Este Gosho foi escrito em 1255, em Kamakura, quando Nitiren Dashonin contava com 34 anos de idade e foi endereçado a Toki Jonin. Em 28 de abril de 1253, dois anos antes de escrever este Gosho, Nitiren Daishonin havia declarado a fundação da Nitiren Shoshu no Templo Kiyozumi com o propósito de salvar toda a humanidade. O Templo Kiyozumi situava-se na província de Awa, terra natal de Daishonin. Desde então, até a perseguição de Tatsunokuti ocorrida em setembro de 1271, Nitiren Daishonin desenvolveu uma grande campanha de propagação do Verdadeiro Budismo, tendo como centro a cidade de Kamakura. Toki Jonin converteu-se ao Budismo de Nitiren Daishonin por volta de 1254 e mais tarde devotou-se à vida sacerdotal, recebendo o nome de "Jonin". Em 16 de julho de 1260, por ocasião da Perseguição de Matsubagayatsu, ocorrido logo depois que Nitiren Daishonin enviou "Rissho Ankoku Ron" ao Regente Hojo Tokimune, Toki Jonin abrigou Nitiren Daishonin em sua própria residência, protegendo-o da perseguição. Juntamente com Shijo Kingo, Toki Jonin foi uma das pessoas centrais da propagação do Verdadeiro Budismo. Toki Jonin recebeu inúmeros Gosho de Nitiren Daishonin, tais como Kanjin no Honzon Sho, Sado Gosho, Jonin Sho, Resposta ao Lorde Toki, etc. O presente Gosho ensina qeu o ponto fundamental do Budismo é a iluminação, e onde se encontra o caminho direto para atingi-la. A iluminação evidencia-se somente nas pessoas que recitam o Daimoku e que tomaram a consciência de que são entidade da Lei Mística. Os incontáveis sutras expostos por Sakyamini, e inclusive todos os Budas e Bodhisattivas, encontram-se dentro da vida de cada pessoa. Portanto, mesmo que se devote à prática do Budismo, se não acreditar na existência do estado de Buda dentro da vida, não se pode escapar do sofrimento da vida e da morte. Ensina também a importância da prática da fé com convicção de que todas as ações em prol do Budismo transformam-se em boa sorte e benefícios a si mesmo.

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A Perseguição de Tatsunokuti (Shingo Kingo Dono Gohenji - Páginas 1113 a 1114)

Não posso expressar adequadamente a minha gratidão pelas suas freqüentes cartas. Na ocasião de minha perseguição no dia 12 do mês passado, o senhor não somente me acompanhou a Tatsunokuti como também declarou que morreria do meu lado. Fiquei profundamente comovido! Quantos não são os locais onde morri em existências passadas pela minha família, terras e parentes! Deixei minha vida em montanhas, mares e rios, em praias e à margens de estradas, mas nem uma vez morri pelo Sutra de Lótus ou sofri perseguições pelo Daimoku. Conseqüentemente, nenhum dos finais que encontrei me permitiu atingir a iluminação. Como eu não atingi o Estado de Buda, os mares e rios onde morri não são a terra do Buda. Nesta vida, porém, como devoto do Sutra de Lótus, fui exilado a Ito e quase decapitado em Tatsunokuti. Tatsunokuti, na Província de Sagami, é o local onde Nitiren deu sua vida. Por eu ter morrido aqui pelo Sutra de Lótus, como este lugar poderia ser menos que a terra do Buda? Uma passagem do Sutra diz: "Em todas as terras do Buda do Universo há somente um único veículo supremo,...! Isto não sustenta a minha afirmação? O "único veículo supremo" é o Sutra de Lótus. Não há nenhum ensino verdadeiro além do sutra de Lótus em qualquer uma das terras do Buda em todo o Universo. Os ensinos provisórios do Buda são excluídos, como o Sutra explica em outra parte. Sendo assim, todos os locais onde Nitiren encontra perseguições é a terra do Buda. De todos os lugares deste mundo, é em Tatsunokuti, em Katase da Província de Sagami que a vida de Nitiren reside. Por ele ter dado sua vida lá pelo sutra de Lótus, Tatsunokuti pode perfeitamente ser chamado de a terra do Buda. Esse princípio é encontrado no capítulo Jinriki, que afirma: "Seja num bosque, num jardim, numa montanha, num vale ou num extenso campo,... os Budas entram no nirvana." O senhor acompanhou Nitiren, jurando dar a sua vida como um devoto do Sutra de Lótus. Seu feito é infinitamente maior que o de Hung Yen, que rasgou o seu estômago e inseriu o fígado de seu falecido lorde, Yi Kung, para salvá-lo da humilhação e desonra. Quando eu alcançar o Pico da Águia, em primeiro lugar, contarei que Shijo Kingo, como Nitiren, decidiu morrer pelo Sutra de Lótus. Soube, secretamente, que estou para ser exilado à ilha de Sado por ordem do Regente Hojo Tokiyori. Dos três deuses celestiais, o deus da lua salvou minha vida em Tatsunokuti, surgindo na forma de um objeto brilhante, e o deus das estrelas desceu há quatro ou cinco dias para me cumprimentar. Agora, só resta o deus do sol, e ele com certeza me 14

protegerá. quão tranqüilizador! O capítulo Hosshi declara: "(O Buda) enviará deuses sob várias aparências para proteger o devoto do sutra de Lótus." Essa passagem não deixa espaço para dúvidas. O capítulo Fumon afirma: "A espada imediatamente se partirá em pedaços." Não existe nada falso nessas citações. A fé sólida e constante é algo vital. Com meu profundo respeito Nitiren 21 de Setembro de 1271 (Oitavo ano de Bun'ei) (Fonte: END, vol III, páginas 195 a 196)

Fundo de Cena Em 21 de setembro de 1271, houve apenas nove dias após a Perseguição de Tatsunokuti, Nitiren Daisnhonin escreveu esta carta a Shijo Kingo, que o havia acompanhado ao local da execução, preparado para morrer ao lado de seu mestre, Na época, Nitiren Dainhonin esta com 50 anos e ficou detido na residência de Honma Rokurozaemon, em Eti, ao norte de Tatsunokuti, enquanto o governo considerava que ação tomar com relação a ele. Esta foi a primeira escrita existente após a perseguição. Nitiren Daishonin expressa sua profunda admiração por Shijo Kingo, que jurou morrer como mártir ao lado do seu mestre. A seu mais fiel discipulo, Nitiren Daishonin revela alguma coisa sobre a sua verdadeira identidade, que posteriormente ele descreve em "A abertura dos Olhos", também oferecida a Shijo Kingo. No presente Gosho, ele afirma, "Tatsunokuti, na província de Sagami, é o local onde Nitiren deu a sua vida. Por eu ter morrido aqui pelo Sutra de Lótus, como este lugar poderia ser menos do que a terra do Buda? " Por que Nitiren Daishonin diz que "morre", quando na verdade, sobreviveu a tentativa de execução? A "Abertura dos Olhos" fornece maiores detalhes quando declara: "No décimo-segundo dia do nono mês do ano passado, entre as horas do Rato e do Boi (23:00 e 3:00 horas), esta pessoa chamada Nitiren foi decapitada. Foi a sua alma que chegou a esta Ilha de Sado..."Isto, com certeza, não significa que a sua alma tenha se separado do corpo no momento da morte. Nitiren Daishonin indica de forma indireta que o mortal comum chamado Nitiren alcançou a Ilha de Sado para cumprir a sua missão. "A perseguição de Tatsunokuti"afirma que a terra do Buda não é um lugar específico onde todos vivem num estado bem-aventurado de elevada compreesão. De acordo com o princípio de que o indivíduo e o seu ambiente são inseparáveis , qualquer local onde a pessoa dedique sua vida a sustentar a lei suprema do Budismo é a terra do Buda. Isto pode dar a impressão de que o praticante está sendo incitado a morrer pelo Sutra de Lótus. Porém a intenção não é esta. Como ele exprime: "Todos os locais onde Nitiren encontra perseguição é a terra do Buda". O ato de vencer dificuldades desenvolve a natureza de Buda do 15

indivíduo . Aplicando isto à prática religiosa , podemos dizer seguramente que dedicar a vida ao Gohonzon significa devotar o seu tempo e esforço a adorar o Gohonzon, estudando os ensinos de Nitiren Daishonin e incentivando a fé das outras pessoas. Nitiren Daishonin declara que Shijo Kingo, devido às suas ações devotadas, já criou as causas que o conduzirão à iluminação. Isto é pressuposto a partir da afirmação de que Nitiren Daishonin relatará a dedicação de Shijo Kingo quando ele alcançar o Pico da Águia. No final, este Gosho explana que os deuses budistas seguramente protegerão aqueles que efetuam seriamente a prática do Budismo. Nitiren Daishonin expressa sua alegria e convicção nesta certeza.

Um navio para atravessar o mar do sofrimento ( Shiiji Shiro Dono Gosho- Páginas 1448 a 1449) Quando perguntei a ele sobre e o que o senhor havia me dito outro dia, constatei ser exatamente como disse. O senhor, portanto, deve esforçar-se na fé, mais do que nunca, para receber os benefícios do Sutra de Lótus. Escute com os ouvidos de Shih K'uang (1) e observe com os olhos de Li Lou (2). nos Últimos Dias da Lei, (3) o devoto do Sutra de Lótus(4) surgirá infalivelmente. Quanto maiores sofrimentos lhe sobrevêm, maior a alegria que ele sente, devido à sua forte fé. O fogo não queima mais vivamente quando se adiciona lenha? Todos os rios fluem para o mar. Entretanto, a sua abundância faz com que os rios retrocedam? As correntezas do sofrimento desaguam no mar do Sutra de Lótus e precipitam-se contra o seu devoto. O rio não é rejeitado pelo oceano, nem o devoto recusa o sofrimento. Se não houvesse os rios fluentes não haveria mar. Do mesmo modo , sem adversidades não haveria devoto do Sutra de Lótus. Como Tient'ai(5) afirmou: "Todos os rios fluem para o mar, e lenha faz o fogo estrepitar". Deve perceber que é por causa de uma profunda relação cármica do passado que o senhor pode ensinar aos outros mesmo uma única sentença ou frase do Sutra de Lótus. O Sutra diz: "É extremamente difícil salvar aqueles que são surdos à Verdadeira Lei". A "Verdadeira Lei" indica o Sutra de Lótus.

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Uma passagem do capítulo Hosshi afirma: "Se há alguém, seja homem ou mulher , que secretamente ensine uma única frase do Sutra de Lótus, saiba que é o enviado do Buda". Isto significa que qualquer um que ensine a outras pessoas mesmo uma única frase do Sutra de Lótus é claramente o enviado do Buda, seja ele sacerdote ou freira, leigo ou leiga. O senhor é o praticante leigo e uma das pessoas descritas no Sutra. Aquele que ouve mesmo uma sentença ou frase do Sutra de Lótus e a alimenta no fundo do coração pode ser comparado a um navio que navega o mar do sofrimento. O Grande Mestre Miao-lo(6) declarou: "Mesmo uma única frase nutrida no fundo do coração infalivelmente o ajudará a alcançar a margem oposta. Ponderar sobre uma frase e praticá-la é exercer a navegação..." Uma passagem do Sutra de Lótus diz: ...como se a pessoa tivesse encontrado um navio para fazer a travessia." Esse "navio" poderia ser descrito da seguinte forma: O lorde Buda, um construtor de navios de sabedoria infinitamente profunda, coletou a madeira dos quatro sabores(7) e oito ensinos(8), projetou -o descartando honestamente os ensinos provisórios, cortou e mostrou os bordos, usando tanto o certo como o errado, e completou a embarcação usando os pregos do ensino único, supremo. Deste modo , ele lançou o navio ao mar do sofrimento. Largando as velas das três mil condições sobre o mastro da doutrina do Caminho Médio, (9) impelido pelo favorável vento de "todos os fenômenos revelam a verdadeira entidade," a embarcação navega à frente, transportando todos os praticantes que conseguem penetrar no estado de Buda através da sua pura fé. O Buda Sakyamuni (10) e o timoneiro, o Buda Taho(11) maneja as velas , e os Quatro Bodhisattvas(12) liderados por Jogyo movem harmoniosamente os remos regentes. Esse é o navio de " um navio para fazer a travessia", a embarcação do Myoho-rengue-kyo. Aqueles a bordo dele são os discípulos e seguidores de Nitiren. Acredite nisso sinceramente. Quando visitar Shijo Kingo ,(13) por favor, converse seriamente com ele. Eu lhe escreverei novamente.

Com o meu profundo respeito Nitiren Em 28 de abril

Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta para Shiiji Shiro, um samurai que vivia em Kamakura. Pouco se sabe a seu respeito. A parte conclusiva 17

deste gosho e referências feitas sobre ele na carta escrita para Shijo Kingo e Toki Jonin em 1280 e 1281, respectivamente, sugerem que ele era íntimo desses dois praticantes. De acordo com os registros de Nikko Shonin, Shiiji Shiro participou no cortejo fúnebre de Nitiren Daishonin. A partir daí, supõe-se que tenha sido um praticante devotado, que mantinha ligação estreita com Daishonin, especialmente nos seus últimos anos de vida. A detalhada metáfora do ‘navio para fazer uma travessia’ faz-nos imaginar se ele não estaria engajado num serviço relacionado com a construção de navios ou engenharia, embora nenhuma informação sobre esse ponto seja disponível. O manuscrito original não existe mais e algumas ambiguidades cercam a data de sua escritura. Tradicionalmente, afirma-se que Daishonin a tenha escrito em 28 de abril de 1261, aos 40 anos de idade, cerca de duas semanas antes de ser enviado ao exílio na Península de Izu. Contudo, um outro ponto de vista defende que tenha sido composta bem mais tarde. Referências como as encontradas nesta carta ao devoto do Sutra de Lótus encontrando ‘grandes sofrimentos’ raramente aparecem nas escrituras de Nitiren Daishonin anteriores à Perseguição de Tatsunokuti e exílio a Ilha de Sado. Além disso, o teor do incentivo de Daishonin, expresso no final do gosho: "Quando visitar Shijo Kingo, por favor, converse seriamente com ele" – sugere que Daishonin estivesse morando em algum lugar distante de Kamakura. Com base nessas observações, algumas pessoa supõem que este gosho tenha sido escrito após Daishonin ter se retirado para o Monte Minobu, talvez até no ano de 1281. Entretanto, nenhuma conclusão definitiva foi alcançada. As circunstâncias imediatas envolvendo o exílio a Izu em 1261 podem ser retrocedidas ao verão precedente, quando Nitiren Daishonin submeteu o seu famo tratado ‘Risho Ankoku Ron’ (A Pacificação da Terra através do Estabelecimento do Ensino Correto) ao imperado aposentado, Hojo Tokiyori, em 16 de julho de 1260. Os praticantes da Nembutsu de altas posições governamentais enfureceram-se com suas críticas à seita da Terra Pura em seu tratado, e em 27 de agosto de 1260, uma multidão atacou sua residência em Matsubagayatsu, em Kamakura. Daishonin escapou por pouco e obteve abrigo durante algum tempo com seu discípulo Toki Jonin, que morava na província vizinha, Shimousa. Quando ele retornou a Kamakura na primavera de 1261 e retomou seus esforços na propagação, foi preso e sentenciado, sem julgamento ou investigação, a ser exilado a Ito, na península de Izu. Se Nitiren Daishonin realmente escreveu este gosho em 1261, podemos pressupor que ele possivelmente tenha recebido alguma admoestração antecipada de sua expulsão eminente e estava incentivando seus discípulos a resistirem, mesmo no caso de perseguição. Por outro lado, se ele o escreveu no final de sua vida, então ao falar sobre tribulações, ele provavelmente estaria recordando-se da perseguição de Tatsunokuti e os sofrimentos do 18

exílio na ilha de Sado (1271-1274). De qualquer modo, este gosho prova seu espírito invencível em face das adversidades, e a sua voluntariedade para enfrentar perseguições em prol da Verdadeira Lei – uma atitude que ele manteve durante toda a sua vida. Na primeira parte deste Gosho, Daishonin explana que o devoto do Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei infalivelmente encontrará sofrimentos. No entanto, longe de serem motivos para lamentar, esses sofrimentos capacitam-no a cumprir o seu grande propósito. Ele explana que aquele que espontaneamente suporta essas dificuldades em prol da Verdadeira Lei seguramente experimentará a grande alegria de atingir o Estado de Buda. Daishonin também aponta quão difícil e, ao mesmo tempo, quão nobre é propagar a Lei nos Últimos Dias da Lei, quando as pessoas não ouvirão prontamente. Ele afirma que acalentar e praticar mesmo uma única frase do Sutra de Lótus levará uma pessoa à iluminação. Na parte final do gosho, utilizando a metáfora do "navio para fazer uma travessia", do vigésimo-oitavo capítulo do Sutra de Lótus, ele declara que o Nam-myoho-rengue-kyo das Três Grandes Leis Secretas é o ‘navio’ que seguramente transportará todos os praticantes, sobre o grande oceano do nascimento e morte, à praia da iluminação suprema. COMPLEMENTOS: 1. Shih k'uang: Um músico da corte da dinastia Chou, que serviu ao Duque P'ing de Chin. Ele foi famoso pelo seu extraordinariamente agudo senso de afirmação. De acordo com o Lu-Shih_Ch'um-Chíu, somente ele, dentre um grupo de músicos ilustres foi capaz de discernir que um sino que o duque havia mandado fundir não estava no tom perfeito. 2. Li Lou: Um personagem lendário da época do Imperador Amarelo. Célebre por sua visão excepcionalmente aguçada, afirma-se que era capaz de distinguir a ponta de um cabelo a centena de passos. 3. Últimos Dias da Lei: O período que, segundo se descreve, começou dois mil anos após a morte de Sakyamuni, quando as pessoas não podem mais atingir a iluminação através de seus ensinos. Nesta época, o Buda Original faz o seu advento para conduzir as pessoas à iluminação. Os budistas do tempo de Nitiren Daishonin geralmente acreditavam que os Últimos Dias da Lei haviam iniciado no ano de 1052. Tradicionalmente, afirma-se que este período irá durar "dez mil anos e mais, toda a eternidade". 4. Devoto do Sutra de Lótus: Aquele que propaga o Sutra de Lótus e pratica o budismo de perfeito acordo com seus ensinos. Nos Últimos dias da Lei, o tempo refere-se especialmente a Nitiren Daishonin, que ensinou a essência do Sutra de Lótus, a Lei do Nam-myoho-rengue-kyo, e cumpriu as profecias do Sutra. Numa acepção mais generalizada, indica os discípulos de Nitiren Daishonin que abraçam o nam-myoho-rengue-kyo e devotam-se a sua propagação. No sentido específico, "devoto do Sutra de Lótus"é um outro nome para o Buda Original do tempo sem começo, que surge nos Últimos Dias da Lei. 5. Tient'ai (538-597) : Também chamado Chih'i. O fundador da escola Tient'ai na China. Ele classificou a totalidade do corpo de sutras budistas de acordo com sua provável ordem, conteúdo e métodos de propagação, demonstrando que o Sutra de Lótus é o mais importante de todos eles. Suas explanações sobre o

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Sutra de Lótus posteriormente foram compiladas em três grandes obras: Hokke Guengui ( significado profundo do Sutra de Lótus), Hokke Mongu ( palavras e frases do Sutra de Lótus), e Maka Shikan( Grande concentração e discernimento). O Maka Shikan apresenta a profunda doutrina de Itinen Sanzen ( um único momento da vida contém três mil mundos), elucidando a possessão mútua da verdade última e todos os fenômenos. 6. Miao-lo (711-782) : Também chamado Chan-jan. Sexto patriarca da escola Tient'ai na China, considerado como um restaurador da escola. Ele escreveu detalhados comentários sobre as três principais obras de Tient'ai, contribuindo, assim, para a sistematização teórica de seus ensinos. Os comentários mais importantes de Miao-lo são o Hokke Guengui Shakusen, O Hokke Mongu Ki e o Makka Shikan Bugyoden Guketsu. 7. Quatro sabores: Os quatro primeiros dos cinco sabores- leite fresco, nata, coalhada, manteiga e gir (a manteiga purificada mais excelente, suposta possuir propriedades medicinais). Tient'ai utilizava esses cinco sabores como uma metáfora para os cinco períodos que nos quais ele dividiu os ensinos de Sakyamuni, ou seja, os períodos Kegon, Agon, Hodo,Hannya e Hokke-Nehan. Deste modo, ele comparou o processo através do qual o Buda Sakyamuni instruiu os seus discípulos e, gradualmente, desenvolveu a compreensão deles sobre o processo pelo qual o leite é transformado no gir. Os quatro primeiros sabores correspondem aos ensinos pré- Sutra de Lótus, enquanto o gir representa o próprio Sutra de Lótus. 8. Oito ensinos: Uma outra classificação do corpo de ensinos de Sakyamuni empregada pela seita Tient'ai. Consiste de duas subclassificações: os quatro ensinos de doutrina, uma classificação pelo conteúdo, e os quatro ensinos de método, uma no tripitaka (zogyo), correspondendo geralmente ao Hinayana que enfatiza o rompimento dos desejos mundanos, para se escapar do ciclo de renascimento; (2) o ensino de ligação de (tsugyo) que introduziu o conceito Mahayana de não substancialidade e Kuu; (3) o ensino perfeito (engyo) ou Mahayana verdadeiro, que revela a identidade última do Buda e todos os seres vivos. Os quatro métodos de ensino são: (1) o ensino súbito (tonkyo), ou os ensinos que o Buda expôs diretamente, a partir de sua própria iluminação, sem dar aos seus discípulos qualquer instrução preparatória; (2) o ensino gradual (zenkyo), que o Buda expôs em estágios progressivos para elevar gradualmente a compreensão de seus discípulos; (3) o ensino secreto(himitsukyo), ou os ensinos que o Buda planejou pregar para que cada um de seus ouvintes se beneficiasse com eles diferentemente, de acordo com sua respectiva capacidade, sem estar ciente disto; (4) o ensino indeterminado (fujokyo),através do qual cada um de seus ouvintes, conscientemente, recebiam um benefício diferente. Os quatro ensinos de doutrina são, algumas vezes, comparados aos quatro tipos de remédios, e os quatro ensinos de método às maneiras como esse remédio é prescrito e ministrado. No texto deste Gosho, "oito ensinos" indicam todos os sutras provisórios. O Sutra de Lótus era tradicionalmente conhecido na escola Tient'ai como "o ensino que transcende todas as oito categorias". 9. Caminho Médio: A Lei Mística ou realidade última de todas as coisas que está além de todos os conceitos unilaterais. Em termos das três verdades, a verdade do Caminho Médio transcende as verdades da não substancialidade e existência temporária embora manifeste em ambas. Nitiren Daishonin expressa o" Caminho Médio" como o Nam-myoho-rengue-kyo. Em contraste com as "velas das três mil condições"(sanzen) no texto do Gosho, "o mastro da doutrina do Caminho Médio" corresponde ao momento único da vida (Itinen ). 10. Buda Sakyamuni: O fundador histórico do budismo que viveu há mais de dois mil anos na Índia. Neste contexto, "sakyamuni"indica o Buda que propagou o Sutra de Lótus e sentou-se ao lado do Buda Taho na Torre do Tesouro> 11. Buda Taho: Um Buda que apareceu na assembléia do Sutra de Lótus sentado numa magnífica Torre do Tesouro que se elevava da terra. Segundo o capítulo Hoto (11º) do sutra, o Buda Taho vivia no mundo do Tesouro da Pureza na parte leste do Universo. Quando ainda se empenhava na prática de

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bodhisattva, ele prometeu que mesmo após Ter entrado no nirvana, surgiria na Torre do Tesouro, e atestaria a veracidade do Sutra de Lótus onde quer que qualquer um pudesse pregá-lo. Após reunir todos os Budas de todo Universo, Sakyamuni abre a Torre do Tesouro, e a convite de Taho, senta-se ao lado deste Buda. Sentados jjuntos na Torre do Tesouro, Taho representa a realidade objetiva da verdade última, e Sakyamuni, a sabedoria subjetiva para perceber esta verdade. 12. Quatro Bodhisattvas: Jogyo, Muhengyo, Jyogyo e Anryugyo. Os quatro líderes dos Bodhisattvas da Terra descritos no capítulo Yujutsu(15º) do Sutra de Lótus. No capítulo Jinriki (21º), como líder supremo desses bodhisattvas, o bodhisattva Jogyo recebe o mandato do Buda para propagar o Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei. 13. Shijo Kingo: Um samurai e médico habilidoso que vivia em Kamakura. Acredita-se que tenha se convertido aos ensinos de Nitiren Daishonin por volta de1256. Um dos mais dedicados entre todos os seguidores de Nitiren Daishonin. Ele manteve a fé solidamente durante toda a tumultuada carreira e atuou como figura central para os praticantes em Kamakura. RETIRADO DAS ESCRITURAS DE NITIREN DAISHONIN - VOLUME 3 - Páginas 257 à 263. EDITORA BRASIL SEIKYO LTDA.

Resposta a Nitigon-ama (Nitigon-ama Gozen Gohenji, pág. 1262)

No dia 8 de novembro de 1280, coloquei diante do Sutra de Lótus a prece escrita na qual a senhora, Nitigon-ama, expressa a sua oração, juntamente com seus oferecimentos de um kan de moedas e um robe sem forro feito de fios de fibra de casca de árvore, e relatei o assunto aos deuses do Sol e da Lua. Além disso, a senhora não deve presumir que compreenda a profundidade (dos benefícios do Gohonzon). O fato de a sua oração ser ou não ser respondida depende da sua fé; (e caso não o seja), a culpa não está , de modo algum, em mim, Nitiren. Quando a água é límpida, a lua se reflete nela. Quando o vento sopra, as árvores balançam. A mente de uma pessoa é como a água. A fé fraca é como a água lamacenta, e a fé resoluta é como a água límpida. As árvores são como os princípios (de todas as coisas), e o vento que as coloca em movimento é como a recitação do sutra. Deve entender os fatos deste modo. Com meu profundo respeito, Nitiren. Em 29 de novembro de 1280

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O Significado da Fé (Myoiti-ama Gozen Gohenji, pág.1255) O que chamamos de fé não é nada extraordinário. Assim como sua mulher estima seu marido, como um homem dá a sua vida pela sua esposa, como os pais não abandonam seus filhos, ou como uma criança se recusa a deixar sua mãe, da mesma maneira devemos depositar a nossa confiança no Sutra de Lótus, em Sakyamuni, em Taho e em todos os Budas e bodhisattvas das dez direções, bem como nos deuses celestiais e divindades benevolentes, e recitar Nam-myoho-rengue-kyo. Esse é o significado da fé. Além disso, deve ponderar as passagens do sutra: "Rejeitando honestamente os ensinos provisórios" e "Não aceitando nem mesmo um único verso de qualquer um dos outros Sutras" e jamais pensar em abandonálas, assim como uma mulher não joga for a o seu espelho ou um homem não se afasta de sua espada. Respeitosamente, Nitiren Em 18 de maio de 1280. END Vol.VI, pág.93 Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta em Minobu no dia 18 de maio de 1280, quando estava com 59 anos. Sua recebedora, Myoiti-ama, era parente de Nissho, um dos seis sacerdotes seniores, e morava em Kamakura. As poucas cartas remanescentes de Nitiren Daishonin para ela indicam que era uma praticante séria e de razoável instrução, emobra tivesse uma saúde frágil. O marido dela também era um praticante e o feudo deles foi confiscado devido à fé que abraçavam. Mais tarde, seu marido veio a falecer, deixando a Myoiti-ama a tarefa de criar sozinha seus dois filhos. Entretanto, apesar de suas dificuldades, ela continuamente fez oferecimentos a Nitiren Daishonin. Nesta carta, ele explana que a fé é uma expressão natural do coração humano e recomenda-lhe que 22

recite Nam-myoho-rengue-kyo com fé resoluta no Sutra de Lótus, ou seja, o Gohonzon, abandonando todos os ensinos provisórios.

Aspiração à terra do Buda ( TOKY NYUDO GOHENJI- PÁGINAS 955 À 956)

É agora o último período de dez dias do décimo primeiro mês. Enquanto estava vivendo em Kamakura, na Província de Sagami, eu pensava que a mudança das quatro estações era igual em todas as províncias, mas nos dois meses (1) que se passaram desde que cheguei nesta província do norte, Sado, os ventos congelantes estiveram soprando sem pausa, e embora haja ocasiões em que o gelo e a neve param de cair, jamais se vê a luz do sol. Sinto os oito invernos gelados(2) em meu presente corpo. Os corações das pessoas aqui são como os dos pássaros e animais; não reconhecem nem soberano, nem mestre ou pais. Muito menos distinguem a verdade do erro no Budismo, ou os bons mestres dos maus. Porém, não direi mais nada disto. Quando mandei de volta a Teradomari o sacerdote leigo que o senhor havia enviado no décimo dia do mês para acompanhar-me, escrevi e confiei-lhe certos ensinos para o senhor(3). Como provavelmente deve Ter suposto a partir dos mesmos, o advento da Grande Lei já está diante de nossos olhos. Nos mais de dois mil e duzentos anos desde a morte do Buda, em toda a Índia, China, Japão e no mundo inteiro, [conforme afirma o Grande Mestre Tient'ai:] "Vasubandhu e Nagarjuna perceberam claramente a verdade em seus corações, mas não a ensinaram. Ao invés disso, eles pregaram os ensinos Mahayana provisórios, que eram adequados às suas épocas".(4) Tient'ai e Dengyo deram uma indicação geral da mesma, mas deixaram a sua propagação para o futuro. Agora esta Lei secreta, a única grande razão pela qual todos os Budas fizeram o seu advento, será disseminada pela primeira vez neste país. E, não é Nitiren a exata pessoa que a propaga? Os augúrios de sua ascensão já surgiram. O grande terremoto da passada era Shoka(5) foi um grande presságio de uma espécie jamais presenciada em épocas prévias, algo totalmente sem precedentes nas

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doze gerações de governo divino(6), nos noventa reinados de imperadores humanos(7), e nos dois mil e duzentos anos e mais desde a partida do Buda. O capítulo Jinriky[do Sutra de Lótus] afirma: "Porque [haverá aqueles que] sustentarão fielmente este sutra após a morte do Buda, todos os Budas se alegram e exibem seus ilimitados poderes místicos". Este também se refere a "todas as leis do Buda"(8). Uma vez que esta grande Lei se propagar, os ensinos pré-Sutra de Lótus bem como todo o ensino teórico do Sutra de Lótus não mais proverão nem mesmo o menor benefício. O Grande Mestre Dengyo declara:"Quando o sol se levanta, as estrelas ficam escondidas(9)". E o prefácio escrito pelo sacerdote Tsun-shih(10) diz: "No ínicio dos Últimos Dias da Lei, [o Budismo levanta-se no leste e] ilumuna oeste". Essa grande Lei já apareceu. Os sinais prenunciando o seu advento superam em muito os de eras prévias. Ponderando o significado disso, percebo que é porque o tempo[ para a propagação] chegou. O Sutra afirma:"[Entre esses bodhisattvas] eram quatro que lideravam a multidão toda. O primeiro chamava-se Jogyo..."(11) Também diz: "Aquele que é capaz de sustentar este sutra na era maléfica dos Últimos Dias da Lei..."(12), e "Pegar o Monte Sumeru e atirá-lo longe.."(13). Gostaria que reunisse e mantivesse juntos num local os cinco cadernos que lhe mencionei, os quais contém passagem essenciais dos vários sutras e do "Daitido Ron". Por favor, assegure que as passagens essenciais dos tratados e comentários também não se tornem dispersos e perdidos. Diga aos sacerdotes jovens para não negligenciarem seus estudos. Não deve lamentar muito amargamente o meu exílio. Os capítulos Kanji e Fukyo(14) afirmam claramente[que o devoto do Sutra de Lótus enfrentará perseguições]. A vida é limitada, e não devemos poupá-la. Aquilo a que devemos aspirar, afinal, éa terra do Buda. NITIREN No vigésimo terceiro dia do décimo primeiro mês do oitavo ano de Bun'ei (1271). Estou mandando de volta alguns dos jovens sacerdotes[que me acompanharam até Sado]. Pode perguntar-lhes como é esta província e sobre as circunstâncias sob as quais eu vivo. Não é possível descrever esses assuntos por escrito. FUNDO

DE

CENA

No décimo dia do décimo mês, Nitiren Daishonin deixou Eti sob escolta armada,dirigindo-se para a ilha de Sado, onde ficaria exilado. No vigésimo primeiro dia, o grupo chegou ao porto de Teradomari no Mar do Japão, onde ventos adversos os compeliram a esperar por vários dias antes de realizarem a travesssia para Sado no vigésimo oitavo dia, e no primeiro dia do décimo primeiro mês chegou a Tsukahara, um campo desolado usado como cemitério, que iria ser o seu local de 24

exílio. Lá, foi lhe concedido um alojamento num pequeno templo dilapidado chamado Sammai-do. Vento e neve entravam pelos buracos enormes nas paredes e tetos. Talvez por causa da severa falta de alimento e abrigo, Nitiren Daishonin logo enviou de volta ao continete alguns dos jovens sacerdotes que o acompanharam. Pouco antes de fazê-lo, ele escreveu "Aspiração à Terra do Buda"e confiou-a a eles para seu seguidor Toki Jonin. Foi a primeira carta que lhe escreveu da Ilha de Sado. Toki Jonin, um crente leal, servia como vassalo do Lorde Tiba, na província de Shimosa. Toki foi um sacerdote leigo que converteu-se ao ensino de Nitiren Daishonin por volta de 1254. Tanto erudito como devotado, recebeu muitos importantes Gosho, mais notavelmente "O Verdadeiro Objeto da Adoração".Enquanto Nitiren Daishonon esteve exilado em Sado, ele contava com Toki para transmitir mensagens de encorajamento aos praticantes da área de Shimosa. Esse Gosho em especial indica que ele também havia pedido a Toki Jonin que cuidasse de seus livros e papéis pessoais durante sua ausência. O Gosho inicia-se com uma breve referência às condições rigorosas as vida de Nitiren Daishonin em Tsukahara. Embora ele decline descrever suas privações em detalhes, pode se Ter um vislumbre, através de suas observações quase causais, das terríveis adversidades que estava sendo obrigado a suportar. Nesta carta, ele expressa a sua disposiçào para encontrar a morte se necessário em prol do Sutra de Lótus, bem como a sua alegria por saber ser ele o devoto do Sutra de Lótus. Ele também declara que a Lei suprema jamais antes revelada por nenhum dos grandes mestres budistas do passado agora fez o seu advento. Ele interpreta o grande terremoto Shoka de 1257 como um presságio de sua ascensão, e cita várias passagens do Sutra de Lótus e outras fontes para provar a sua afirmação de que agora, no início dos Últimos Dias da Lei, é o exato tempo para a grande Lei (Nam-myoho-renguekyo) das Três Grandes Leis Secretas propagar-se. Nas poucas linhas finais, Nitiren Daishonin explica que, uma vez que a nossa vida neste mundo é transitória, devemos dedicá-la em prol da Lei Verdadeira. Ao invés de satisfações fugazes, a nossa meta última deve ser atingir a "terra do Buda"ou iluminação - o estado de ilimitado júbilo, no qual a pessoa percebe a verdade essencial interior. PALAVRAS E FRASES Nitiren Daishonin chegou a Sado no vigésimo oitavo dia do décimo mês. Ao referir-se a "os dois meses que passaram", ele indica que a sua permanência na ilha, que iniciou-se no décimo mês, agora já havia se estendido até quase o final do décimo primeiro mês. 1. Oito infernos gelados: Oito infernos que, segundo afirma, encontram-se sob o continente de Jambudvipa. Segundo o Sutra Nirvana, são: (1) o inferno de Hahava,(2) o inferno de Atata,(3) o

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inferno de Alala,(4) o inferno de Ababa,(5) o inferno do lótus azul, (6) o inferno do lótus vermelho-sangue,(7) o inferno do lótus escarlate, e (8) o inferno do lótus branco. O nome dos quatro primeiros derivam-se dos gritos dos sofredores, afirma-se, produzem nesses infernos devido ao frio terrível. Os quatro outros nomes originam-se das mudanças que ocorrem na aparência de sua carne quando o frio a faz abrir-se. 2. Isto se refere a "Carta de Teradomari", que Nitiren Daishonin escreveu a Toki Jonin no vigésimo segundo dia do décimo mês de 1271. 3. Maka Shikan,vol.5. 4. Um grande terremoto que ocorreu na noite do vigésimo terceiro dia do oitavo mês de 1257, nas vizinhanças de Kamakura, causando grande devastação e destruindo quase todos os templos e santuários da cidade. 5. Doze gerações de governo divino: As sete gerações de deuses celestiais e cinco gerações de deuses terrenos que, afirma-se, reinaram no Japão antes do primeiro imperador humano, Jimmu. A primeira das divindades terrenas foi Amaterasu Omikami, a deusa do Sol, reverenciada como a progenitora do clã imperial. 6. Noventa reinados de imperadores humanos: Os sucessivos imperadores do primeiro imperador, Jimmu(aprox. 660-585 AC) ao nonagésimo, imperador Kameyama (aprox.1259-1274). 7. No capítulo Jinriki (21º), ao transferir a Lei Mística ao Bodhisattva Jogyo, Sakyamuni declara: "Descrevi brevemente neste Sutra todas as leis do Buda, todos os tesouros secretos do Buda e todas as profundezas práticas do Buda". 8. Uma paráfrase do "Tendai Hokkeshu Dempogue". No original, o Grande Mestre Dengyo usa o sol para representar o Sutra de Lótus, e as estrelas para simbolizar os ensinos provisórios, ao passo que Nitiren Daishonin usa o sol para representar o Nam-myoho-rengue-kyo das Três Grandes Leis Secretas, e as estrelas para simbolizar os ensinos provisórios e também o ensino teórico do Sutra de Lótus. 9. Tsun-shih (964-1032): Um sacerdote da escola Tient'ai na dinastia Sung da China. O "prefácio" de Tsun-shih é a sua introdução para o " Daijo Shikan Homon"( O Método de Concentração e Discernimento no Mahayana) do mestre Tient'ai, Nan-yüeh (515-577). 10. A obra de Nan-yüeh ficou perdida durante séculos na China, mas uma cópia foi trazida ao Japão por Jakusho, um sacerdote da seita Tendai japonesa, quando ele viajou à China no início do século XI. Tsun-shih, portanto, diz que o Budismo "levanta-se no leste". Nitiren Daishonin parafraseia a sua expressão. 11. Sutra de Lótus, cap.15. 12. Idem, cap. 17. 13. Idem, cap. 11. Essa passagem é uma parte da seção em verso que explica os seis atos difíceis e nove fáceis. A sentença diz: "Pegar o Monte Sumeru e atirá-lo longe a imensuráveis terras do Buda - isto não é difícil...", seguindo-se mais tarde a afirmação: "Porém, nos tempos maléficos após a morte do Buda, ser capaz de pregar este Sutra- isto é de fato muito difícil!" 14. Capítulos Kanji e Fukyo: O décimo terceiro e o vigésimo capítulos do Sutra de Lótus. No capítulo Kanji, oitenta miríades de milhões de nayutas de bodhisattvas fizeram um voto de ensinar o Sutra de Lótus na terrível era maléfica após a morte do Buda. O juramento deles é proferido em verso e enumera os tipos de perseguição ao se propagar o sutra na era posterior. O capítulo Fukyo fala de um bodhisattva do mesmo nome, que perseverou em sua prática apesar da calúnia e insulto, atingindo finalmente a iluminação suprema através do benefício do Sutra de Lótus.

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Retirado do livro "As escrituras de Nitiren Daishonin volume V; páginas 143 à148. Editora Brasil Seikyo Ltda - 1º Edição.

A Virtude Invisível e a Recompensa Visível (Intoku Yoho Gosho, pág. 1178) Nada é mais terrível numa pessoa do que a deslealdade. Visto que o seu irmão mais velho e o seu irmão mais novo, por vontade própria, tornaram-se inimigos do Sutra de Lótus e o abandonaram, eles são os desleais, e o senhor em si não tem culpa. Porém, se negligenciar cuidar das esposas deles, com certeza estará agindo de forma desleal. Se o seu feudo for aumentado, proporcionelhes o necessário a partir de seus próprios estoques, não poupando esforços para assegurar o bem-estar delas. Somente se fizer isso, seus falecidos pais o protegerão sem falta, e as orações de Nitiren também serão respondidas. Não obstante que falhas as esposas de seus irmãos possam exibir, não preste atenção. Em vista dos fatos, acredito que simplesmente agir como recomendo, suas terras serão ainda mais ampliadas e o senhor obterá a confiança dos outros. Como tenho dito com freqüência, a virtude invisível gera recompensa visível. Embora todos os seus colegas samurais tenham feito calúnias a seu respeito ao seu lorde, e ele próprio tenha acreditado que essas acusações fossem verdadeiras, pelo fato de o senhor ter, durante alguns anos, acalentado honestamente um forte desejo quanto à salvação de seu lorde em sua próxima vida, pôde receber esse benefício. E, isto é apenas o início, esteja convicto de que a sua grande recompensa ainda está por vir. Além disso, o senhor deve manter um bom relacionamento com os outros praticantes, não vendo, ouvindo, nem apontando nada a respeito deles que possa desagradá-lo.

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Deve permanecer calmo e continuar oferecendo orações. O que mencionei anteriormente não é meramente a minha própria opinião. É o âmago dos mil volumes das escrituras externas e dos cinco mil volumes da escrituras internas. Com meu profundo respeito, Nitiren Em 23 de abril (END Vol. VI, pág. 61) Fundo de Cena Acredita-se que esta carta tenha sido escrita para Shijo Kingo em abril de 1278, enquanto Nitiren Daishonin estava vivendo no Monte Minobu. A mesma sugere que a situação de Shijo Kingo tinha começado a melhorar. No décimo mês do mesmo ano, suas terras foram aumentadas. Seguindo o conselho de Nitiren, o samurai conseguiu recuperar a confiança e o favor de seu lorde, sanando o rompimento que os havia separado desde 1274. Como resta apenas um fragmento deste Gosho, o conteúdo da parte precedente é desconhecido. Contudo, parece que os irmãos de Shijo Kingo haviam renunciado à fé no Sutra de Lótus e também abandonado suas obrigações familiares; e Nitiren Daishonin recomenda a Shijo Kingo que providencie o necessário para as esposas deles. Essa conduta, Nitiren Daishonin, não é apenas honrada e adequada, mas também possibilita conquistar o respeito dos outros. Em seguida, citando um ditado bastante conhecido, ‘a virtude invisível gera a recompensa visível’, Nitiren Daishonin declara que os benefícios que Shijo Kingo recebeu são efeitos de sua firme fé, e que o benefício supremo da iluminação é vindouro. Ele conclui incentivando Shijo Kingo a não tomar conhecimento dos efeitos dos outros praticantes e a manter um bom relacionamento com eles. Acredita-se que o manuscrito original deste Gosho tenha sido redigido em doze folhas de papel, sendo que as primeiras nove tenham sido perdidas. Das três, a décima página foi preservada num templo e a décima primeira e a décima segunda em outro. Só as páginas onze e doze foram incluídas nas escrituras em japonês (Gosho Zenshu) sob o título: ‘Virtude Invisível e a Recompensa Visível’. A página dez foi inicialmente considerada um fragmento independente, denominado Fuko Gosho (Sobre Deslealdade), e não incluída no Gosho Zenshu. Entretanto, estudos mais recentes indicam que a página dez é, na

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realidade, a que precede imediatamente ‘A Virtude Invisível e a Recompensa Visível’. Todas as páginas encontram-se traduzidas aqui.

O Recebimento de Novos Feudos (Shijo Kingo Dono Gohenji, págs. 1183-1184) Recebi um kan de moedas. Então, seu lorde concedeu-lhes novos feudos! Nem parece verdade; isso é tão surpreendente que fico pensando se não se trata de um sonho. Nem sei o que dizer. Isso se deve ao fato de as pessoas de todo o Japão e também de Kamakura, mesmo as que estão a serviço de seu lorde, inclusive os descendentes do clã dele, desaprovarem a sua crença no ensino de Nitiren. Sua fé contínua parecia incompreensível. O simples fato de ter tido permissão para permanecer no clã de seu lorde já foi motivo de espanto. Além disso, sempre que seu lorde lhe oferecia a concessão de uma nova propriedade, o senhor invariavelmente recusava-se a aceitála. Como deve ter parecido estranha aos seus colegas samurais essa sua recusa, como deve ter soado insultuosa ao seu lorde ! Sendo esse o caso, estava ansioso em saber como o senhor estaria passando superando essa época, e, além disso, soube que dezenas de seus colegas de clã fizeram calúnias a seu respeito para o seu lorde. Portanto, pensei que provavelmente não poderia obter um feudo; a gravidade de sua situação parecia opressiva. Além disso, até seus próprios irmãos o abandonaram. E, no entanto, apesar de tudo isso, foilhe concedido tal obséquio. Nenhuma honra poderia ser maior do que essa. O senhor conta que seus novos domínios ocupam uma área três vezes maior do que Tono'oka. Há um homem da província de Sado que se encontra aqui (em Minobu) e que conhece totalmente essa área. Ele diz que, das três vilas, a chamada Ikada é de primeira categoria. Embora os campos e arrozais possam ser poucos, os lucros são imensos. Dois dos feudos rendem cada um, anualmente, um colheita equivalente a mil kan, e o terceiro, trezentos kan. Esses são os méritos, afirma ele, de suas propriedades.

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De qualquer modo, o senhor foi abandonado pelos seus colegas samurais bem como pelas pessoas próximas, e eles riram a sua custa. Sob tais circunstâncias, uma carta oficial conferindo-lhe qualquer espécie de feudo, ainda que fosse inferior a Tono'oka, teria sido bemvinda. Entretanto, conforme se verificou, seus novos domínios, combinados, são três vezes maiores (do que Tono'oka). Não obstante o quanto essas propriedades possam se mostrar pobres, não se deve queixar delas, nem aos outros, nem ao seu lorde. Se elogiá-las repetidamente dizendo que são terras excelentes, seu lorde poderá conceder-lhe ainda mais feudos. Porém, se referir-se a elas como terras pobres com uma produção escassa, certamente será abandonado tanto pelo Céu como pelos outros homens. Deve manter isto em mente. O rei Ajatashatru foi um homem digno mas, por matar seu próprio pai, naquele exato momento, o Céu deveria, por justiça, tê-lo abandonado, e a terra deveria ter-se aberto para engolí-lo. Contudo, por causa do mérito que seu pai, o rei assassinado, havia adquirido fazendo durante vários anos oferecimentos diários ao Buda, os quais compreendiam quinhentas cargas de carroças, e pelo mérito que ele próprio conquistaria mais tarde tornado-se protetor do Sutra de Lótus, o Céu não o abandonou, nem a terra o engoliu. No final, em vez de cair no inferno, tornou-se um Buda. O seu caso é semelhante ao dele. Foi abandonado pelos seus irmãos, hostilizado pelos seus colegas samurais, perseguido pelos descendentes do clã e odiado por todas as pessoas do Japão. Porém, no décimo-segundo dia do nono mês do oitavo ano de Bun'ei, entre as horas do Rato e do Boi (da meia-noite às 2 horas), quando eu, Nitiren, havia incorrido no desagrado das autoridades governamentais, o senhor acompanhou-me de Kamakura a Eti, na província de Sagami, segurando firmemente as rédeas do meu cavalo. Como o senhor provou ser o mais digno aliado do Sutra de Lótus em todo o mundo, Bonten e Taishaku sem dúvida não poderiam vir a abandoná-lo. O mesmo se aplica com relação à consecução do estado de Buda. Não importando que graves ofensas possa ter cometido, por não ter ido contra o Sutra de Lótus e por ter mostrado sua devoção ao acompanhar-me, irá indubitavelmente tornar-se um Buda. O seu caso é como o do rei Utoku, que deu a própria vida para salvar o monge Kakutoku e tornou-se o Buda Sakyamuni. A fé no Sutra de Lótus atua como uma oração (para atingir o estado de Buda). Acima de tudo, fortaleça ainda mais seu espírito de procura pelo Caminho, de modo que possa alcançar o estado de Buda nesta existência. Nunca aconteceu um fato mais oportuno a nenhum membro do clã de seu lorde, seja sacerdote ou leigo. Ao falar assim sobre o recebimento de novos feudos pode-se parecer demasiadamente interessado em desejos mundanos, mas para os mortais comuns os desejos são algo natural, e, além disso, existe um modo de tornar-se um Buda sem erradicá-los. O sutra Fuguen, numa passagem que explana o âmago do 30

Sutra de Lótus, afirma: "Mesmo sem extinguir seus desejos mundanos ou negar os cinco desejos…". E o Makashikan do Grande Mestre Tientai diz: "Desejos mundanos são iluminação, os sofrimentos do nascimento e morte são nirvana". O Daitido Ron do Bodhisattva Nagarjuna, ao elucidar que o Sutra de Lótus ultrapassa todos os demais ensinos da existência do Buda, declara: "(O Sutra de Lótus é) como um grande médico que transforma o veneno em remédio". Isso significa que um médico de habilidade inferior pode curar males comuns com remédio, ao passo que um grande médico pode curar até mesmo doenças graves com veneno poderoso. Nitiren, Em outubro de 1278. (END Vol. VI, pág. 253) Fundo de Cena Esta carta foi escrita no Monte Minobu para Shijo Kingo em outubro de 1278. Durante uma época, o lorde Ema, a quem Shijo Kingo servia, havia se oposto à crença de seu subordinado no Sutra de Lótus e atormentou-o de várias maneiras, por exemplo, ameaçando-o de transferência a uma província remota a menos que ele abandonasse a sua fé. Os colegas samurais de Kingo também o tratavam com hostilidade, e por algum tempo esteve a ponto de ser deposto do clã e de perder por completo seu sustento. Kingo suportou vários anos de adversidades até 1277, quando suas circunstâncias mudaram para melhor graças ao fato de, em sua posição de médico, ter conseguido curar o lorde Ema de uma doença grave. Por volta de janeiro de 1278 ele pôde acompanhar o lorde numa missão oficial. Em outubro, quando esta carta foi escrita, Kingo recebeu não menos que três novos feudos. Contudo, pelo conteúdo deste Gosho, parece que ele não estava totalmente satisfeito com essa avassalação. Acredita-se que as propriedades que recebera localizavam-se na Ilha de Sado ou, de qualquer modo, numa região remota, o que pode ter-lhe causado descontentamento. Nesta carta, Nitiren Daishonin admoesta-o contra qualquer sentimento de queixa e recomenda-lhe que aprecie o fato de as circunstâncias estarem, agora, começando a ficar a seu favor.

Os Quatro Estágios da Fé e os Cinco Estágios da Prática (Shishin Gohon Sho, pág. 338-343)

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Recebi o cordão de moedas que enviou. Os eruditos do budismo desta época concordam todos que, tanto no tempo do Buda como após a sua morte, aqueles que desejam praticar o Sutra de Lótus devem devotarse aos tipos de aprendizado. Se negligenciarem qualquer um deles, não poderão alcançar o Caminho do Buda. No passado, eu também concordei com essa opinião (mas agora este não é mais o caso). Deixando de lado todas as escrituras sagradas da existência do Buda, examinemos o assunto à luz do Sutra de Lótus. Coloquemos de lado também os ensinos contidos nas seções preparação e revelação. Isto nos leva à seção transmissão, que constitui um espelho claro para os Últimos Dias da Lei e merece total confiança (na resolução desta questão). A seção transmissão possui duas partes. A primeira é a do ensino teórico e consiste em cinco capítulos, começando com o Capítulo Hosshi (O Mestre da Lei). A segunda é a do ensino essencial e compõese da parte final do Capítulo Funbetsu Kudoku (Distinção de Benefícios) mais os demais onze capítulos que constituem o restante do sutra. Os cinco capítulos do ensino teórico e os onze capítulos e meio do ensino essencial combinam-se totalizando dezesseis capítulos e meio, e neles está claramente explicado como se deve praticar o Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei. Se alguém ainda tiver dúvidas, pode, ainda, examinar o assunto à luz dos sutras Fuguen e Nirvana e, então, com certeza, não restará nenhuma obscuridade. Nesses capítulos de transmissão, os quatro estágios de fé e cinco estágios da prática expostos no capítulo Funbetus Kudoku representam os elementos essenciais mais importantes na prática do Sutra de Lótus, um espelho para as pessoas contemporâneas do Buda e de épocas após a morte dele. Ching-his escreve: "Produzir mesmo que um simples momento de fé e compreensão, representa o início na prática do ensino essencial". Desses vários estágios, os quatro estágios de fé foram designados aqueles que viveram na época do Buda, e os cinco estágios da prática, aqueles após a sua morte. Dentre estes, o primeiro dos quatro estágios da fé é o de produzir mesmo que um simples momento de fé e compreensão, e o primeiro dos cinco estágios da prática é o de alegrarse em ouvir pela primeira vez o Sutra de Lótus. Esses dois estágios formam juntos m escrínio contendo os tesouros dos "cem mil mundos e mil fatores" e os "mil reinos num simples momento da vida", eles são o portão de onde surgem todos os Budas das dez direções e das existências. Os dois sábios e dignos mestres Tientai e Miao-lo estabeleceram esses dois estágios iniciais da fé e prática, e apresentaram interpretações referentes a eles. Um equipara-os ao estágio de soji-soku, aos dez estágios de fé e ao estado do rei girador da roda de ferro. A segunda compara-os ao primeiro dos cinco estágios da prática, que se identificam com o estágio de kangyo-soku, no qual a pessoa ainda não 32

cortou as ilusões do pensamento e desejo. A terceira iguala-os ao estágio de myoji-soku. Reconciliando essas diferenças de interpretação, o Shikan afirma: "As intenções do Buda são difíceis de precisar. Ele explanou as coisas diversificadamente conforme a diferença na capacidade das pessoas as quais se dirigia." Se pelo menos entendessemos isso, que necessidade haveria de debates enfadonhos? A minha opinião é que, dessas interpretações, aquela que equipara esses dois estágios ao estágio de myoji-soku concorda melhor com o texto do Sutra de Lótus em si, pois, ao descrever o primeiro dos cinco estágios da prática que se aplicam ao tempo após a morte do Buda, o sutra faz referência à pessoa que ouve este sutra e, "sem caluniar ou falar mal dele, desperta sentimentos de aceitação e alegria". Se se comparar o estágio descrito aqui com um nível tão avançado como o de soji-soku, ou o do primeiro dos cinco estágios da prática que são identificados com o estágio de kangyo-soku, então as palavras "sem caluniar ou falar mal dele" seriam muito pouco apropriadas. Em particular, as passagens do capítulo Juryo que citam aqueles que "perderam a lucidez" e aqueles que "não perderam a lucidez" referemse, em ambos os casos, ao estágio de myoji-soku. Dever-se-ia também levar em consideração os trechos do Sutra Nirvana que dizem: "Não obstante acredite ou não, nascerá diretamente na terra do Buda", e "Se houver pessoas que, lá no local dos Budas tão numerosos como os grãos de areia do Rio Hiranyavati, conceberem a aspiração à iluminação, então, mesmo nesta era maléfica, conseguirão abraçar e defender um sutra como este e não o caluniarão". Além disso, na frase "um simples momento de fé e compreensão", a palavra "fë" concerne ao primeiro dos quatro estágios, e a palavra "compreensão", aos seguintes. Sendo assim, então "fé sem compreensão" aplica-se ao primeiro dos quatro estágios da fé. O segundo estágio da fé é descrito no sutra como aquele no qual a pessoa "compreende de modo geral o sentido das palavras" do sutra. E, no volume nove do Hokke Mongu Ki, lemos: "O estágio inicial é diferente dos outros, pois neste ainda não há nenhuma compreensão". Chegamos então ao capítulo seguinte, Zuiki Kudoku, (Os Benefícios da Alegre Aceitação), no qual o primeiro dos cinco estágios da prática, ou seja, "alegrar-se ao ouvir pela primeira vez o Sutra de Lótus", é reafirmado e esclarecido com relação às cinquenta pessoas que, por sua vez, ouvem e se alegram com o Sutra de Lótus, e o mérito que elas obtêm assim decresce a cada pessoa. Com respeito ao estágio alcançado pela quinquagésima pessoa, existem duas interpretações. A primeira sustenta que a quinquagésima pessoa está no estágio de "alegrar-se ao ouvir pela primeira vez o Sutra de Lótus"(e, está, portanto, no nível de Kangyo-soku). A outra que não se pode afirmar que a quinquagésima pessoa tenha ingressado no estágio de "alegrarse, ao ouvir pela primeira vez o Sutra de Lótus" e que ela se encontra 33

ainda no nível de myoji-soku. Essa última interpretação reflete a idéia de que "quanto mais verdadeiro o ensino, mais baixo o estágio (das pessoas que pode levar à iluminação). Consequentemente, por exemplo, o ensino perfeito pode salvar as pessoas de capacidade mais baixa do que conseguem as doutrinas dos quatro sabores e ensinos. De maneira semelhante, o Sutra de Lótus pode salvar pessoas de capacidade mais baixa do que consegue o ensino perfeito exposto antes dele, e o ensino essencial do Sutra de Lótus pode salvar mais pessoas do que o ensino teórico - pessoas de qualquer capacidade. Dever-se-ia ponderar cuidadosamente sobre a frase de seis caracteres: "Quanto mais verdadeiro o ensino, mais baixo o estágio (das pessoas que pode levar à iluminação)." Pergunta: Nos Últimos Dias da Lei, é necessário que os iniciantes na prática do Sutra de Lótus devotem-se a todos os três tipos de conhecimento associados ao ensino perfeito? Resposta: Essa é uma pergunta muito importante e, assim, recorrerei ao texto do sutra para respondê-la. Ao descrever o primeiro, o segundo e o terceiro dos cinco estágios da prática, o Buda restringe aqueles nesses estágios de praticar preceitos e meditação e coloca toda ênfase no simples fator da sabedoria. E como a nossa sabedoria é inadequada, ele nos ensina a substituí-la pela fé, fazendo dessa simples palavra "fé", o fundamento. A descrença é a causa para se tornar um icchantika e para caluniar a Verdadeira Lei, ao passo que a fé é a causa para a sabedoria e corresponde ao estágio de myoji-soku. Tientai comenta: "Quando uma pessoa alcança o estágio de soji-soku, os benefícios que acumulou não serão esquecidos quando ela renascer numa outra existência. Porém no caso das pessoas no estágio de myoji-soku ou kangyo-soku, aqueles benefícios serão esquecidos quando renascerem em existências sucessivas, embora possa haver algumas entre elas que não se esqueçam. Mesmo no caso das pessoas que esqueceram esses benefícios, se elas encontrarem um bom amigo, as sementes de bondade que plantaram em suas existências prévias serão revivificadas. Porém, se encontrarem um mau amigo, perderão suas mentes verdadeiras". Provavelmente foi isso o que aconteceu aos dois homens eminentes de média antigüidade, o Grande Mestre Jitaku e o Grande Mestre Tisho da seita Tendai. Eles viraram as costas para os ensinos de Tientai e Dengyo, que haviam sido bons amigos para ele, e transferiram sua devoção a Shan-wu-wei e Pa-kung, que eram maus amigos. E muitos dos eruditos nos Últimos Dias da Lei foram iludidos pela introdução de Eshin e sua obra Ojo Yoshu e, como resultado, perderam a verdadeira mente de fé no Sutra de Lótus, oferecendo sua lealdade aos ensinos provisórios representados por aqueles ligados a Amida. Eles são pessoas que "abandonaram o grande lugar e no lugar dele escolheram o pequeno". Se julgarmos a partir de exemplos do passado, eles provavelmente sofrerão durante incontáveis kalpas nos maus

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caminhos. É a pessoas como essa que Tientai referiu quando disse: "Se encontrarem um mau amigo, perderão sua mente verdadeira". Pergunta: Que prova o senhor pode oferecer para sustentar a sua alegação ? Resposta: O volume seis do Makashikan afirma: "As pessoas que são salvas pelos ensinos pregados antes do Sutra de Lótus são aquelas que alcançaram um alto nível de habilidade. Isto porque os ensinos apresentados nesses sutras são meros expedientes. Aqueles salvos pelo ensino perfeito do Sutra de Lótus pertencem a um nível baixo de habilidade, pois esse ensino representa a verdade. O Guketsu tece o seguinte comentário a respeito disso: "Essa passagem referente aos ensinos pregados antes do Sutra de Lótus esclarece o valor relativo dos ensinos provisórios e verdadeiro, pois mostra que quanto mais verdadeiro o ensino, mais baixo o estágio (das pessoas que pode salvar). Em contraste, quanto mais provisório o ensino, mais elevado deve ser o estágio (daqueles que o abraçam, para que estes sejam salvos)." E o nono volume do Hokke Mongu Ki diz: "Para determinar o estágio de habilitação, quanto mais profundo o objeto de meditação, mais baixo será o nível do praticante (que pode atingir a iluminação por intermédio dele)". Não direi nada aqui sobre os seguidores de outras seitas, mas por que os eruditos da seita Tendai colocam de lado essa interpretação de que "quanto mais verdadeiro o ensino, mais baixo o estágio das pessoas que pode salvar", e no lugar dela aceitam os escritos de Eshin, o Supervisor dos Monges ? O ensinos de Shan-wu-wei, Chin-Kang-chih e Pu-kung e os de Jikaku e Tisho, podem esperar mais um pouco. Essa é uma questão de máxima importância, a mais importante no mundo todo. As pessoas de discernimento deveriam prestar atenção ao que eu digo. Depois disso, se desejarem me rejeitar, deixe-as. Pergunta: Quanto aos praticantes dos Últimos Dias da Lei, os quais acabaram de despertar a aspiração à iluminação, a que tipo de prática ficam restritos? Resposta: Tais pessoas devem abster-se de praticar caridade, de manter os preceitos e os demais cinco paramitas, e são orientadas a recitar exclusivamente o Nam-myoho-rengue-kyo. Essa prática corresponde à capacidade das pessoas nos estágios de 'produzir mesmo que um simples momento de fé e compreensão' e 'alegrar-se ao ouvir pela primeira vez o Sutra de Lótus' e representa o verdadeiro propósito do Sutra de Lótus. Pergunta: Jamais havia escutado uma asserção dessa espécie. Ela deixa a minha mente atônita e me faz pensar se meus ouvidos não me enganaram. Por favor, cite claramente algumas passagens de prova textual das escrituras e, por gentileza, explore o assunto. 35

Resposta: O sutra diz: "Essas pessoas não precisam erguer estupas ou templos em meu benefício, nem construir abrigos de monges nem realizar os quatro tipos de oferecimentos à assembléia de monges". Essa passagem do sutra torna bastante claro que os praticantes que acabaram de despertar para a aspiração à iluminação estão proibidos a praticar a caridade, de manter os preceitos e os demais cinco paramitas. Pergunta: A passagem que o senhor acabou de citar somente de erigir estupas ou templos ou proporcionar sustento à assembléia de monges. Não diz nada sobre a manutenção dos vários preceitos. Resposta: A passagem menciona apenas o primeiro dos cinco paramitas, o da caridade, mas deixa de mencionar os outros quatro. Pergunta: Como sabemos ser este o caso? Resposta: Porque uma passagem subsequente, ao descrever o quarto estágio da prática, diz: "Muito mais ainda, então, se houver alguém que possa abraçar este sutra e, ao mesmo tempo, praticar a caridade, mantendo os preceitos (paciência, assiduidade, meditação e sabedoria)". Este texto do sutra indica claramente que as pessoas do primeiro, segundo e terceiro estágios da prática são proibidas de praticar a caridade, de manter os preceitos e os demais cinco paramitas. Somente quando alcançam o quarto estágio da prática (o de 'praticar os seis paramitas enquanto abraçam o Sutra de Lótus') recebem permissão para observá-los. E, como tais práticas são permitidas nesse estágio, podemos saber que, para as pessoas nos estágios iniciais, são proibidas. Pergunta: O trecho do sutra que acabou de citar parece sustentar o seu argumento. Mas o senhor pode apresentar alguma passagem de tratados ou comentários? Resposta: Que comentários gostaria que eu citasse? O senhor está se referindo aos tratados das quatro categorias de santos da Índia? Ou às obras escritas pelos mestres budistas da China e do Japão? Em ambos os casos, isso equivale a rejeitar a raiz e procurar entre os ramos, buscar a sombra sem considerar a forma, ou esquecer a fonte e valorizar somente o rio. O senhor ignoraria uma passagem do sutra perfeitamente clara e buscaria uma resposta nos tratados e comentários. Se houvesse algum comentário posterior que contradissesse a passagem original do sutra, então, deixaria de lado o sutra e seguiria o comentário? Todavia, atenderei o seu desejo e citarei algumas passagens. No nono volume do Hokke Mongu lemos: "Há o perigo de um iniciante ser desencaminhado por questões secundárias, e de que isso interfira na prática primordial. O iniciante deveria dedicar diretamente toda a sua atenção ao ato de abraçar o sutra; que é o tipo mais elevado de oferecimento. Mesmo que a pessoa coloque de lado as práticas

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formais, se mantiver (meditação sobre) o princípio, então, os benefícios serão muitos e de longo alcance." Nessa passagem do comentário, as 'questões secundárias' referem-se aos cinco paramitas. Se o iniciante tentar praticar os cinco paramitas ao mesmo tempo (em que abraça o Sutra de Lótus), isso pode concorrer para a obstrução de sua prática principal, que é a fé. Essa pessoa será como um pequeno navio que está carregado de riquezas e tesouros e parte para cruzar o mar. Tanto o navio como o tesouro afundarão. E as palavras 'deveria dedicar diretamente toda a sua atenção ao ato de abraçar o sutra' não dizem respeito ao sutra como um todo. Elas significam que a pessoa deveria abraçar exclusivamente o Daimoku, ou título, do sutra e não misturá-lo com outras passagens. Nem a recitação do sutra inteiro é permitida. Muito menos ainda os cinco paramitas! "Colocar de lado as práticas práticas formais, mas manter (a meditação sobre) o princípio" significa que a pessoa deve deixar de lado os preceitos e outras práticas específicas (dos cinco paramitas) e abraçar o princípio do Daimoku exclusivamente. Quando o comentário diz que "os benefícios serão muitos e de longo alcance", isso indica que se o iniciante tentar empreender várias outras práticas e o Daimoku simultaneamente, seus benefícios se perderão completamente. O Hokke Mongu prossegue: "Pergunta: Se o que diz é verdade, abraçar o Sutra de Lótus é o principal entre todos os preceitos. Por que, então, (ao descrever o quarto estágio de prática) o Sutra de Lótus fala sobre 'aquele que consegue manter os preceitos'? Resposta: Isto é feito para esclarecer por contraste o que é necessário nos estágios iniciais. Não se deveria criticar as pessoas nos estágios iniciais por deixarem de cumprir os requisitos atinentes somente aos estágios posteriores." Os eruditos de hoje, ignorando essa passagem do comentário, colocam as pessoas ignorantes dos Últimos Dias na mesma categoria que os dois sábios Nan-yueh e Tientai - um erro gravíssimo! Miao-lo acrescenta o seguinte: "Pergunta: Nesse caso, então, não há necessidade de construir estupas próprios para abrigar as relíquias do Buda, e não é preciso manter formalmente os preceitos ? E além disso, não é necessário prover esmolas para monges que efetuam as práticas específicas (dos seis paramitas) ?" O Grande Mestre Dengyo declarou: "Eu imediatamente deixei de lado os duzentos e cinquenta preceitos!". E o Grande Mestre Dengyo não foi o único a fazer isso, Joho e Dotyu, que foram discípulos de Ganjin, bem como os sacerdotes dos sete principais templos de Nara, da mesma maneira abandonaram-nos. Além disso, o Grande Mestre Dengyo deixou este aviso para as gerações futuras: "Se nos Últimos Dias da Lei houver pessoas que mantenham os preceitos, isto será algo raro e estranho, como um tigre na feira livre. Quem iria acreditar nisso?"

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Pergunta: Por que não advoga a meditação sobre os três mil mundos num único momento da vida (itinen sanzen) mas, e no lugar disso incentiva simplesmente a recitação do Daimoku? Resposta: Os dois caracteres que formam a palavra Nihon, ou "Japão", compreendem todas as pessoas e animais e riquezas das sessenta e seis províncias do país, sem uma simples omissão. E os dois caracteres que compõem a palavra Gasshi, ou "Índia" - não encerram igualmente a todas as setenta regiões da Índia ? Miao-lo diz: "Quando, para ser breve, somente o título do sutra é mencionado, o sutra todo está, deste modo, incluído. E ele também afirma: "Quando, em benefício da concisão, falamos dos Dez Mundos ou dez fatores, todos os mil reinos estão contidos aí". Quando o Bodhisattva Monjushiri e o Venerável Ananda vieram a compilar todas as palavras proferidas pelo Buda nas assembléias durante os oito anos (nos quais o Sutra de Lótus foi pregado), eles registraram o título Myoho-rengue-kyo, e para mostrar a compreensão deles (de que o sutra todo está contido nesses cinco caracteres), prosseguiram com as palavras "Assim eu ouvi". Pergunta: Se uma pessoa simplesmente recita Nam-myoho-rengue-kyo sem nenhuma compreensão do seu significado, os benefícios da compreensão estão incluídos desse modo ? Resposta: Quando um bebê toma leite, não tem compreensão nenhuma do seu sabor, e, no entanto, seu corpo é nutrido naturalmente no processo. Quem algum dia ingeriu remédios maravilhosos de Jivaka sabendo do que eram compostos ? A água não possui intenção nenhuma e, no entanto, pode extinguir o fogo. O fogo consome objetos e, contudo, como poderemos afirmar que o faça conscientemente ? Essa é a interpretação tanto de Nagarjuna como de Tientai, e eu a estou reafirmando aqui. Pergunta: Por que diz que todos os ensinos estão contidos no Daimoku? Resposta: Chang-an escreve o seguinte: "Consequentemente, (a explanação de Tientai do título) o prefácio exprime o significado profundo do sutra. O significado profundo indica o âmago do texto, e o âmago do texto abarca a totalidade dos ensinos teóricos e essencial. E Miao-lo escreve: "Com base no âmago do texto do Sutra de Lótus, pode-se avaliar todos os outros vários ensinos do Buda. Embora a água lamacenta não possua mente, consegue captar o reflexo da lua e, assim, naturalmente torna-se clara. Quando as plantas e árvores recebem chuva, não têm consciência do que estão fazendo, e, no entanto, elas não continuam flores? Os cinco caracteres do Myoho-rengue-kyo não representam o texto do sutra nem são o seu significado. Eles não são nada senão o intento do sutra inteiro. Desta forma, mesmo que o iniciante na prática religiosa possa não entender o 38

significado deles ao praticar, praticando esses cinco caracteres, corresponderá naturalmente ao propósito do sutra. Pergunta: Quando seus discípulos, sem nenhuma compreensão, simplesmente recitam as palavras Nam-myoho-rengue-kyo, que nível de habilidade alcançam? Resposta: Eles não apenas ultrapassam o nível elevado dos quatro sabores ou três ensinos, como o atingido pelos praticantes do ensino perfeito exposto nos sutras que precedem o Sutra de Lótus, mas também superam em milhões e milhões de vezes os fundadores da Shingon e das várias outras escolas do budismo - homens como Shanwu-wei, Chih-yen, Tzu-en, Chi-tsang, Tao-hsuan, Bodhidharma e Shantao. Portanto, rogo às pessoas deste país: Não menosprezem os meus discípulos! Caso se investigue o passado deles, saber-se-á que budas são grandes bodhisattvas que ofereceram donativos a budas durante um período de oitenta miríades de milhões de kalpas, e que efetuaram práticas religiosas seguindo Budas tão numerosos como os grãos de areai dos rios Hiranyavati e Ganges. E, quanto ao futuro deles, eles são dotados com o benefício da quinquagésima pessoa, excedendo o daquele que oferece donativos a todos os seres vivos por um período de oitenta anos. Eles são como um imperador menino envolto em fraldas, ou um grande dragão que acabou de nascer. Não os desprezem ! Não olhem para eles com desdém ! Miao-lo escreve: "Aqueles que molestam ou preocupam (os praticantes do Sutra de Lótus) terão suas cabeças partidas em sete pedaços, mas aqueles que oferecem donativos a eles desfrutarão boa sorte superior aos dez títulos honoríficos. O rei Udayaana comportou-se insolentemente com relação ao Venerável Pindolabharadvaja, e no espaço de sete anos perdeu a sua vida. O lorde de Sagami condenou Nitiren ao exílio, e dentro de cem dias irrompeu uma rebelião armada em seu domínio. O Sutra de Lótus diz: "Se alguém vir uma pessoa que abraça este sutra e tentar expor suas faltas ou males, não obstante o que fale seja verdade ou não, será atormentado pela hanseníase nesta existência… sofrerá várias doenças graves de natureza maligna". Também afirma: "Era após era será cego". Myoshin e Enti contraíram hanseníase em sua existência presente, ao passo que Doamidabutsu perdeu a visão. As epidemias que afligem nossa nação são punições da espécie descrita como "a cabeça sendo partida em sete pedaços". E, se presumirmos o grau de benefício de acordo com o da punição, então não poderá haver dúvidas de que meus seguidores desfrutarão uma "boa sorte superior aos dez títulos honoríficos".

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Os ensinos budistas foram introduzidos pela primeira vez no Japão no reinado do trigésimo soberano, Imperador Kimmei. Durante os vinte reinados e duzentos anos ou mais a partir daquela época até o reinado do Imperado Kammu, embora as assim chamadas seis seitas do budismo existissem no Japão, a superioridade relativa dos ensinos budistas ainda não havia sido determinada. Então, durante a era Enryaku (782-805), um sábio apareceu no país, o homem conhecido como Grande Mestre Dengyo. Ele examinou os ensinos das seis seitas, os quais já haviam sido propagados, e tornou todos os sacerdotes dos sete principais templo de Nara seus discípulos. Oportunamente, estabeleceu um templo no Monte Hiei para servir de templo principal, e convenceu os outros templos no país a servirem como ramificações deste. Desta maneira, os ensinos budistas no Japão vieram a ser unificados numa escola apenas. A norma secular igualmente não era dividida, mas claramente definida, de modo que a nação tornou-se purificada do mal. Se fôssemos citar as realizações de Dengyo, teríamos de dizer que todas elas brotaram da passagem (que declara que o Sutra de Lótus é o principal entre os sutras pregados) "no passado, presente ou futuro". No período seguinte, os três Grandes Mestres Kobo, Jikaku e Tisho, reivindicando estarem seguindo a autoridade chinesa, defenderam a idéia de que o Sutra Dainiti e os outros dos três mais importantes sutras Shingon são superiores ao Sutra de Lótus. Além disso, eles anexaram a palavra 'seita' aos ensinos Shingon, um termo que o Grande Mestre Dengyo havia omitido propositadamente, e reconheceram assim a Shingon como a oitava seita do budismo no Japão. Esses três homens persuadiram o imperador a emitir um édito (sustentando os ensinos Shingon) e propagou-os por todo o Japão, de modo que todos os templos passaram a contrariar, consequentemente, o princípio do Sutra de Lótus. Ao fazê-lo, violaram completamente a passagem (que declara que o Sutra de Lótus é o principal entre os sutras pregados) "no passado, presente ou futuro", e tornaram-se os grande inimigos de Sakyamuni, Taho e outros budas das dez direções. Depois disso, o budismo gradativamente decaiu e a norma secular também tornou-se cada vez mais ineficaz. Tensho Daijin, o Bodhisattva Hatiman e as outras divindades protetoras que durante tanto tempo habitaram o Japão perderam seu poder, e Bonten, Taishaku e os Quatro Reis Celestiais desertaram de nosso país. Agora a nação está a ponto de ruir. Que pessoa de sensibilidade poderia deixar de magoar-se ou lamentar-se por tal situação ? As falsas doutrinas propagadas pelos três Grandes Mestres são em geral disseminadas a partir de três locais: To-ji, Soji-ji, no monte Hiei, e Onjo-ji. Se não forem tomadas medidas para proibir estas atividades desses três templos, então, sem dúvida nenhuma, a nação será destruída e seu povo cairá nos maus caminhos. Apesar de ter discriminado de maneira geral a natureza da situação e informado o

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soberano, ninguém se aventurou a fazer uso do meu conselho. Que lamentável ! Fundo de Cena "Os Quatro Estágios da Fé e os Cinco Estágios da Prática" é considerada uma das dez principais escrituras de Nitiren Daishonin. Acredita-se que tenha sido redigida em 11 de abril de 1277, embora haja diferentes opiniões sobre o assunto. Toki Jonin, um dos discípulos mais versados e devotados de Nitiren Daishonin, havia-lhe enviado uma carta por intermédio de Ben Ajari Nissho, um dos seis discípulos seniores. Toki havia expressado preocupação a respeito de como poderia erradicar suas ofensas passadas e efetuar uma prática correta juntando à carta uma lista de perguntas específicas. Este Gosho é a resposta de Nitiren Daishonin. Nele o Buda Original enfatiza que a recitação do Nam-myoho-rengue-kyo com fé na Lei Mística é a prática correta para os Últimos Dias da Lei e contém o mérito de todas as outras práticas, conduzindo diretamente ao estado de Buda. Na parte inicial, Daishonin diverge daqueles seus contemporâneos que afirmavam que os praticantes do Sutra de Lótus devem devotar-se aos três tipos de conhecimento: preceitos, meditação e sabedoria. Afirmava-se tradicionalmente que esses três elementos abrangiam a totalidade da prática budista. Nitiren inicia sua explanação discutindo "os quatro estágios da fé e os cinco estágios da prática" enumerados pelo Grande Mestre Tientai com base no capítulo Fumbetsu Kudoku (17) do Sutra de Lótus. O primeiro estágio da fé, o de "produzir mesmo um único momento de fé e compreensão", e o primeiro estágio da prática, o de "alegrar-se ao ouvir pela primeira vez o Sutra de Lótus", correspondem, diz Nitiren Daishonin, à posição dos praticantes nos Últimos Dias da Lei. Entre as várias interpretações desses estágios iniciais, apresentadas nos ensinos registrados por Tientai e Miao-lo, ele designa como mais apropriada a visão de que eles correspondem ao estágio de myoji-soku, no qual a pessoa ouve pela primeira vez o Sutra de Lótus e adquire fé neste. Para as pessoas nesses estágios iniciais, prossegue Nitiren Daishonin, dos três tipos de conhecimento o Buda subtraiu a prática dos preceitos e da meditação, enfatizando somente a sabedoria. E como a sabedoria das pessoas nos Últimos Dias da Lei é inadequada, elas devem substituí-la pela fé; a fé no Sutra de Lótus torna-se a causa para se adquirir a sabedoria do Buda. Nitiren Daishonin então critica o Ojo Yoshu (Os Elementos Essenciais do Renascimento na Terra Pura), de Eshin, uma obra que havia encorajado grandemente as práticas da Nembutsu no Japão. Os adeptos da Terra Pura geralmente afirmavam que o Sutra de Lótus era profundo demais para a capacidade limitadas das pessoas nascidas nos Últimos Dias da Lei, destacando, por sua vez, a 'prática fácil' de recitar o nome do Buda Amida. Nitiren Daishonin responde que quanto mais elevado o ensino,

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mais baixa a capacidade das pessoas que ele consegue salvar; deste modo, o Sutra de Lótus pode levar todos os seres ao estado de Buda. A parte seguinte do Gosho explana que as pessoas nos Últimos Dias da Lei, as quais estão nos estágios iniciais da prática, não precisam praticar a caridade, manter preceitos ou qualquer outro dos cinco paramitas, mas devem devotar-se exclusivamente à recitação do Daimoku. Devemos entender aqui que Nitiren Daishonin não está rejeitando o espírito implícito em atos como a caridade; mas, ao contrário, está negando a sua eficácia como práticas formais. O mérito de todas essas boas ações, ele diz, está inerente no Daimoku. O Daimoku contém todos os ensinos. Nitiren Daishonin afirma que mesmo aqueles que o recitam sem compreender o seu significado seguramente atingirão o estado de Buda.

O Tambor no Portal do Trovão (Senniti-ama Gozen Gohenji, pág. 1315 a 1317) Recebi um kan de moedas, um to de arroz seco e outros artigos. Tokusho Doji, que ofereceu um bolo de lama ao Buda, renasceu como o Rei Asoka, e uma senhora idosa que ofertou ao Buda um mingau de arroz renasceu como um pratyekabuddha. O Sutra de Lótus é o mestre de todos os budas das dez direções e das três existências. Os budas das dez direções são o Buda Zentoku no leste, o Buda Muutoku no sudeste, o Buda Sendatoku no sul, o Buda Hose no sudoeste, o Buda Muryomyo no oeste, o Buda Ketoku no noroeste, o Buda Sotoku no norte, o Buda Sanjogyo no nordeste, o Buda Koshutoku do zênite e o Buda Myotoku do nadir. Os budas das três mil existências são os mil budas do passado Kalpa Glorioso, os mil budas do Kalpa Sábio, os mil budas do futuro Kalpa Constelação, bem como todos os outros budas descritos nos Sutras provisórios e verdadeiros, e exotéricos e esotéricos do Mahayana e do Hinayana, inclusive os sutras Kegon, Lótus e Nirvana. Esses Budas, e também os bodhisattvas nos mundos das dez direções, os quais são tão numerosos quanto os grãos de areia, originam-se, todos, do simples ideograma myo do Sutra de Lótus. Portanto, o sutra Fuguen, o epílogo do Sutra de Lótus, diz: "As três propriedades iluminadas da vida do Buda procedem do Hodo". O termo Hodo deriva-se de uma palavra indiana e foi traduzido na China como "grande veículo". Grande veículo, ou Mahayana, é um outro nome para o Sutra de Lótus. Os sutras Agon, quando comparados com as escrituras não-budistas, são considerados como sutras do Mahayana,

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ou sutras do grande veículo. Similarmente, os sutras Kegon, Hannya, Dainiti e outros, quando confrontados com o Sutra Agon, são definidos como sutras do Hinayana, ou sutras do pequeno veículo, quando comparados com o Sutra de Lótus. Como nenhum sutra supera o Sutra de Lótus, este é o único sutra do Mahayana. Para ilustrar, cada soberano dos oitenta e quatro mil países de Jambudvipa é denominado um grande rei em seu país. Mas quando comparado a um rei girador da roda, ele é chamado de rei inferior. De forma semelhante , cada um dos reis dos seis céus do mundo do desejo e dos quatro céus da meditação podem ser chamados de grande rei ou rei inferior (dependendo de com quem ele é comparado); mas o Rei Daibonten, que reside no topo do mundo da forma, é o único grande soberano que jamais poderá ser denominado de Rei menor. O buda é um filho, e o Sutra de Lótus, seus pais. Se os pais de mil filhos forem louvados, esses mil filhos se alegrarão. Se alguém faz oferecimentos aos pais, faz oferecimentos aos seus mil filhos também. Aquele que fizer oferecimentos ao Sutra de Lótus receberá os mesmos benefícios que teria realizando doações a todos os budas e bodhisattvas das dez direções, pois todos os budas das dez direções originam-se do simples ideograma myo. Suponha que um leão tenha cem filhotes. Quando o rei leão vê os seus filhotes serem atacados por outras feras ou aves de rapina, ele ruge; os cem filhotes, então, sentirse-ão encorajados, e as cabeças daqueles outros animais e aves de rapina serão partidas em sete pedaços. O Sutra de Lótus é como o rei Leão, que impera sobre todos os outros animais. Uma mulher que abraça o rei leão do Sutra de Lótus não precisa temer as feras dos estados de Inferno, da Fome e Animalidade. Todas as ofensas cometidas por uma mulher em sua vida são como grama seca, e o simples ideograma myo do Sutra de Lótus é como uma pequena fagulha. Quando se acende uma pequena fagulha sobre uma grande extensão de grama, não somente esta mas também árvores enormes e pedras imensas são todas consumidas. Tal é poder do fogo da sabedoria no simples ideograma myo. Todas as ofensas não apenas desvanecer-se-ão, mas também tornar-se-ão fontes de benefício, é isso o que significa transformar veneno em amrita. Por exemplo, a laca preta se torna branca quando se acrescenta a ela pó branco. As ofensas de uma mulher são como a laca, e as palavras Nam-myohorengue-kyo, o pó branco. Quando alguém morre, se estiver destinado a cair no inferno, sua aparência e seu corpo tornar-se-ão tão pesados como uma rocha que requer a força de mil homens para ser movida. Contudo, no caso de um devoto de fé verdadeira, mesmo que seja uma mulher de dois metros ou dois metros e meio de altura e de tez escura, no momento da morte sua fisionomia tornar-se-á pura e resplandescente, e o seu corpo tornar-se-á tão leve quanto as plumas de um ganso e tão suave e flexível quanto o algodão.

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De Sado até esta província há mil ri de distância, cruzando mar e montanhas. A senhora, como mulher, manteve firmemente a sua fé no Sutra de Lótus; e, ao longo dos anos, enviou repetidamente o seu marido aqui para me visitar em seu lugar. Seguramente, o Sutra de Lótus, Sakyamuni, Taho e todos os outros Budas das dez direções sabem de sua devoção. Por exemplo, embora a lua esteja a quarenta mil yojana de altura, no céu, seu reflexo aparece instantaneamente num lago na terra; e o som do tambor do Portal do Trovão é ouvido imediatamente a dez milhões de ri de distância. Apesar de permanecer em Sado, o seu coração veio a esta província. Essa e a maneira de se atingir o estado de Buda. Embora vivamos numa terra impura, nossas mentes residem no Pico da Águia. Simplesmente observar o rosto um do outro seria insignificante. O que importa é o coração da pessoa. Encontremo-nos algum dia no Pico da Águia, onde vive o Buda Sakyamuni. Nam-myoho-rengue-kyo, Nammyoho-rengue-kyo. Com meu profundo respeito, Nitiren Em 19 de outubro de 1278. (END Vol.VI. pág. 97)

Um Pai Adquire Fé (Hyoe-no Sakan Dono Gohenji, págs. 1095-1096) Como não tive notícias suas por um longo tempo, estava me sentindo um tanto ansioso. Porém, nada poderia ser mais maravilhoso que esse assunto que diz respeito a Tayu-no Sakan e você. É realmente magnífico ! É um fato comum que quando os Últimos Dias da Lei têm início, sábios e homens dignos desaparecem todos, e somente caluniadores, bajuladores, pessoas traiçoeiras de princípios fraudulentos preenchem a terra. Assim lemos os sutras. Por exemplo, quando a água seca, (o peixe dentro) do lago fica agitado, e quando o vento sopra, o mão não permanece calmo. Também lemos que na Era de Mappo, como secas, epidemias e chuvas e ventos intensos ocorrerão em sucessão, até o generoso se torna mesquinho e mesmo aqueles que buscam o Caminho desviam-se para idéias errôneas. Sendo este o caso, os sutras dizem-nos, pai e mãe, marido e esposa, e irmão mais velho e irmão mais novo serão colocados uns contra os outros, como caçador e cervo, gato e rato, ou falcão e faisão - sem mencionar as disputas entre

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estranhos. Ryokan e outros sacerdotes, inspirados por demônios, enganaram o pai de vocês, Saemon-no-Tayu, e tentaram destruir os dois, mas vocês próprios provaram ser sábios e ouviram minha admoestação. Portanto, assim como duas rodas sustentam uma carroça ou duas pernas suportam uma pessoa, como duas asas permitem que um pássaro voe ou como o Sol e a Lua auxiliam os seres vivos, os esforços de vocês dois levaram seu pai a ter fé no Sutra de Lótus. É unicamente por sua causa, Hyoe-no-Sakan, que as coisas tiveram tal resultado. De acordo com os ensinos do verdadeiro sutra, quando o mundo entrar no Últimos Dias da Lei e o budismo cair em completa desordem, um grande sábio surgirá no mundo. Por exemplo, o pinheiro, que resiste ao frio, é chamado de monarca das árvores, e o crisântemo, que continua a florir logo após outras plantas terem murchado, é conhecido como uma planta sagrada. Quando o mundo está em paz, homens dignos não se tornam aparentes, mas quando a era está em tumulto, tanto os sábios como os tolos são revelados por aquilo que eles são. É lamentável que Hei-no-Saemon e o lorde de Sagami tenham deixado de escutar a mim, Nitiren! Se o fizessem, com certeza não teriam decapitado os emissários da nação mongol que chegaram antes do ano passado. Sem dúvida, eles arrependem-se disso agora. O octogésimo primeiro soberano, o grande soberano conhecido como Imperador Antoku, incumbiu centenas de mestres Shingon, inclusive o sacerdote-chefe da Tendai Myoun, de oferecer orações numa tentativa de subjugar Minamoto Yoritomo, o general da direita. Entretanto, o feitiço deles "voltou-se contra o feiticeiro" conforme o sutra diz. Myoun foi decapitado por Yoshinaka, e o Imperador Antoku foi afogado no mar do Oeste. O octogésimo segundo, o octogésimo terceiro e o octogésimo quarto soberanos, o Imperador aposentado tonsurado de Oki, o Imperador aposentado de Awa e o Imperador aposentado de Sado, bem como o Imperador reinante - esses quatro governantes mandaram o sacerdote-cheefe da Tendai e o administrador de monges Jien, além de mais de quarenta outros monges eminentes, inclusive o Omuro e outros de Miidera, oferecerem orações para vencer o general de Taira, Yoshitoki. Contudo, novamente, os feitiços 'voltaram-se contra seus feiticeiros', e esses quatro governantes foram banidos para ilhas remotas. Quanto a esse ensino de grande mal (Shingon): Os três Grandes Mestres - Kobo, Jikaku e Tisho - repudiaram os ditos dourados de Sakyamuni que apontam o Sutra de Lótus como supremo, interpretando seu significado de modo que o Sutra de Lótus ocupasse o segundo ou terceiro lugar e o Dainiti, a posição mais elevada. Por depositarem sua confiança nessas visões distorcidas, os imperadores anteriormente mencionados destruíram tanto a nação como a eles próprios nesta vida e cairão no inferno de incessantes sofrimentos na próxima.

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Esse próximo ritual especial de oração será o terceiro. Entre meus discípulos, aqueles que faleceram provavelmente estão agora observando isto com os olhos de Buda. E o senhor, que foi poupado, assista com seus olhos de mortal comum! O soberano e os outros oficiais de alta posição serão levados para um país estrangeiro, e as pessoas dirigiram rituais de oração morrerão loucas, ou fugirão para outras províncias, ou se esconderão nas montanhas e florestas. O mensageiro do Lorde Buda Sakyamuni foi exibido humilhantemente duas vezes pelas ruas, e seus discípulos foram atirados na prisão, mortos, feridos ou expulsos das províncias onde estavam vivendo. Portanto, a culpa dessas ofensas certamente se estenderá a cada habitante daquelas províncias. Por exemplo, muitos serão atingidos pela lepra ou todos os tipos de doenças graves. Meus discípulos devem compreender este assunto completamente. Com meu profundo respeito, Nitiren Em 9 de setembro. Esta carta destina-se especificamente a Hyoe-no-Sakan. Deve também ser mostrada a todos os meus discípulos em geral. Não revele seu conteúdo aos outros. Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta em Minobu em 1277, a Ikegami Hyoe-no-Sakan Munenaga, o mais novo dos irmãos Ikegami, expressando sua alegria pela conversão do pai de Munenaga, Saemonno-Tayu Yasumitsu. Durante muitos anos, Yasumitsu havia se oposto obstinadamente à crença de seus filhos, tentando dividir os dois renegando por duas vezes o irmão mais velho, Munenaka, e prometendo tornar Munenaga seu herdeiro se abandonasse o ensino de Daishonin. Durante toda esta provação, Munenaka recusou-se firmemente a abandonar a sua fé, mas Munenaga, de tempos em tempos, vacilava. Contudo, graças às repetidas cartas de admoestação de Nitiren Daishonin, ele conseguiu resistir à pressão das exigências de Yasumitsu e, finalmente, assumiu um sólido compromisso com a fé. Agora que os dois irmãos haviam, por fim, vencido à oposição do pai e o convencido a abraçar o Sutra de Lótus, Nitiren Daishonin congratulava calorosamente Munenaga em particular, elogiando sua decisão de permanecer leal à sua fé e a seu irmão mais velho. Entretanto, conforme indica o pós-escrito, essa carta foi destinada não apenas a Munenaga, mas a todos os seguidores de Nitiren Daishonin. Seu conteúdo mais geral inicia-se com a passagem: "De acordo com os ensinos do verdadeiro sutra, quando o mundo entrar nos Últimos Dias da Lei e o budismo cair em completa desordem, um grande sábio

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surgirá no mundo". Isto se refere especificamente ao capítulo Jinriki (21) do Sutra de Lótus, no qual o Buda Sakyamuni transfere o Sutra de Lótus ao Bodhisattva Jogyo, para ser propagado nos Últimos Dias da Lei. Como o pinheiro que resiste ao frio, a Lei Mística, o âmago do Sutra de Lótus, permanece válida e floresce até mesmo nos maléficos Últimos Dias, quando os outros ensinos budistas entram em declínio. A última parte do Gosho adverte contra os ensinos errôneos da seita Shingon. No período que abrange o fim do século XII e o início de século XIII, no decorrer de um conflito longo e sangrento, clãs guerreiros conseguiram tomar o poder da corte imperial. Nitiren Daishonin atribui o colapso do governo imperial à fé na Shingon, salientando que em duas conjunturas vitais a corte e seus aliados buscaram a proteção dos rituais de oração da Shingon esotérica, com resultados desastrosos. Quando esta carta foi escrita, havia em andamento planos para empregar rituais Shingon novamente numa tentativa de impedir a iminente invasão mongol. Nitiren Daishonin avisa que enquanto as pessoas rejeitarem o ensino verdadeiro do Sutra de Lótus e depositarem sua confiança nas interpretações distorcidas do budismo, somente sofrimento poderá resultar disso.

O fácil parto de uma criança afortunada (Shijo Kingo Nyobo Gosho - Pág.1109) Soube que logo dará a luz. Condescendendo ao seu pedido de gohifu de fácil parto, preparei um escolhendo-o dentre o conhecimento que herdei. Contudo, deve possuir firme fé a fim de receber seus benefícios. Mesmo um remédio de rara virtude produzirá pouco efeito se veneno for adicionado a ele. Que utilidade terá uma espada a um covarde ? Acima de tudo, tanto a senhora como o seu marido são seguidores do Sutra de Lótus. A senhora seguramente dará à luz uma jóia de criança que dará seguimento à semente da propagação do Sutra de Lótus. Eu os parabenizo com toda a sinceridade. A criança herdará tanto os aspectos físicos como espirituais de suas vidas. Como poderia sofrer um parto prolongado ? A criança certamente nascerá facilmente. Se tomar este gohifu, não pode haver dúvidas. A escuridão torna-se luminosa quando uma lâmpada é acesa, e a água lamacenta torna-se clara quando a luz brilha sobre ela. Há algo mais radiante do que o sol e a lua ? Há algo mais puro do que a flor de lótus ? O Sutra de Lótus é o sol e a lua, e a flor de Lôtus. Portanto, é denominado Myoho-rengue-kyo (O Sutra da Flor de Lótus da Lei Mística). Nitiren é também como o sol e a lua, e também como a flor de Lótus.

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Se a água da fé for clara, a lua de benefícios lançará seu reflexo sobre a mesma e, sem dúvida, protegerá a pessoa. Um parto fácil está assegurado para a senhora. Uma passagem do Sutra de Lótus afirma: "Uma Lei maravilhosa como esta…"e uma outra "Como o fácil trabalho de parto, darão à luz uma criança afortunada…". Expliquei em detalhes a Ben-ko sobre as instruções oralmente transmitidas referentes ao gohifu. Deste modo, Ben-ko é o enviado do Buda. Tenha seriedade em sua fé. A deusa do Sol, Amaterasu Omikami concedeu uma gema ao deus da tempestade Susanoo no Mikoto, que, por sua vez, obteve a gema de um menino. Por esta razão, ela chamou a criança de seu próprio filho e deu-lhe o nome de Masaya Akatsu (Verdadeiramente Eu Conquisto). Como eu, Nitiren, provi a sua criança da semente de um fácil nascimento, ela será como a minha própria filha. O Sutra de Lótus declara que existe "um gema de mundos", e também proclama: "Obtivemos o supremo aglomerado de jóias sem esperá-lo". O buda Sakyamuni pronunciou: "Os seres vivos nele (o mundo tríplice) são todos meus filhos". A minha intenção também concorda exatamente com a que o Buda expressou nessas passagens. Quão feliz e quão auspicioso é o nascimento, que se aproxima, de seu filho! Escreverei novamente em uma outra ocasião. Respeitosamente, Nitiren Sétimo dia do quinto mês no oitavo ano de Bun'ei (1271) Fundo de Cena Esta carta é datada de 7 de maio de 1271, e foi endereçada a Nitiguennyo, a esposa de Shijo Kingo, em Kamakura. Esta é a mais antiga de muitas escrituras existentes que Nitiren Daishonin enviou à família Shijo. Nitiren Daishonin estava vivendo em Matsubagayatsu, Kamakura, na época desta escritura. Muito naturalmente, Nitiguennyo tornou-se cada vez mais apreensiva e nervosa à medida que se aproximava o nascimento de seu primeiro filho. Ela solicitou a Nitiren Daishonin que lhe concedesse um agente místico chamado gohifu, para que pudesse ter um parto tranquilo. Ele enviou-lhe imediatamente por intermédio de Ben Ajari Nissho, a sua primeira conversão entre o clero, juntamente com esta carta de incentivo. Nesta, Nitiren Daishonin prescrevea Nitiguennyo que tome o gohifu, que ele havia preparado especialmente para ela, com firme fé no Sutra de Lótus. Ao mesmo tempo, ele assegura-lhe um parto fácil, dizendo que a criança vindoura herderá a semente da propagação do

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Sutra de Lótus. Ele encerra expressando a sua grande alegria pelo nascimento do filho de Nitiguennyo. Em 8 de maio, o dia seguinte do recebimento da carta, Nitiguennyo deu à luaz a uma menina. O casal há muito desejava um filho, mas não conseguia tê-lo. Shijo Kingo já estava com 40 anos quanto esta primeira filha nasceu (a segunda, Kyo'o, nasceu um ano depois), e, por esta razão, a criança deve ter sido especialmente preciosa para o casal. Shijo Kingo enviou a notícia do seguro parto a Nitiren Daishonin, que imediatamente remeteu uma carta de congratulações, 'O Nascimento de Tsukimaro'. Juntamente com a notificação do nascimento, Nitiguennyo mandou-lhe um pedido de que Nitiren Daishonin atribuísse um nome à criança, e este, com alegria, chamou-a Tsukimaro (menina da lua cheia). Ele ficou tão feliz como se fosse a sua própria filha, uma vez que havia orado pelo bem-estar e felicidade de Nitiguennyo.

A Iluminação pelo Sutra de Lótus (Hokke Shoshin Jobtsu Sho) Questão: Há qualquer evidência para provar que devemos abraçar em particular o título do Sutra de Lótus da mesma maneira que abraçamos o título de Buda? Resposta: O Sutra de Lótus diz: "O Buda dirigiu-se às guardiãs do Budismo dizendo: ‘Sr protegerem aqueles que crêem firmemente no título do Sutra de Lótus, obterão mais boa sorte do que poderão medir’. As guardiãs na citação acima eram as dez filhas de Kishimojin1. Elas juraram diante de Sakyamuni proteger aqueles que abraçam o título do Sutra de Lótus que é o Nam-myoho-rengue-kyo. O iluminado, muito satisfeito com o juramento, elogiou-as altamente e disse que a boa sorte que elas poderiam acumular era imensurável. Grandiosos sem dúvida são os seus benefícios e virtuoso o seu comportamento. A citação precedente encoraja-nos a recitar o Nam-myoho-rengue-kyo durante todo o tempo, não importando o que fazemos em nossas vidas diárias. O Myoho-rengue-kyo2 é o princípio básico que esclarece que todos os seres humanos, Bonten3 e Taishaku4, Sharihotsu5 e Mokuren6, e os Bodhisattvas Monju7 e Miroku8, sem exceção, compartilham a mesma natureza de Buda, e que as naturezas iluminadas são idênticas à Lei

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Mística que todos os Budas descobrem dentro de si mesmos. Uma vez que recita o Nam-myoho-rengue-kyo, a voz de recitar fará surgir a natureza de Buda em todas as coisas, tanto sensíveis como insensíveis _ todos os Budas, todas as leis, Bodhisattvas e Shomon, Bonten e Taishaku, Emma9 que é dito ser o Lorde do inferno, o sol a lua e as estrelas, todos os deuses no céu e na terra, assim como naqueles que estão nos estados de Inferno, Fome, Animal, Ira, Tranqüilidade e Alegria. O poder do Myoho-rengue-kyo é infinito em termos de espaço e tempo. O Myoho-rengue-kyo que está nas profundezas da vida de uma pessoa deve ser estabelecido como objeto de adoração. Se adora este Gohonzon e recita o Nam-myoho-rengue-kyo, a natureza de Buda até aqui dormente surgirá dentro de si. Então, a senhora é um Buda. Para dar exemplo familiar, se um pássaro numa gaiola canta, os pássaros silvestres descerão do céu para juntarem-se ao redor do cativo. Assim que seus amigos circundam a gaiola, o pássaro faz um desesperado esforço para escapar. De maneira semelhante, se recitamos o Nammyoho-rengue-kyo oralmente, a nossa natureza de Buda será despertada sem falha. A mesma natureza em Bonten e taishaku também surge para nos proteger, e aquela natureza em Budas e Bodhisattvas começa a agir com grande alegria. Daí a passagem do Sutra de Lótus: "Se há uma pessoa que abraça a Lei Mística mesmo por um curto tempo, eu, assim como todos os outros Budas, muito nos alegraremos." Pelas três existências da vida que cobrem desde o infinito passado ao presente e ao eterno futuro, todos os Budas atingiram ou atingirão o Estado de Buda com a semente de Myoho-rengue-kyo. É a Lei Mística que todos os Budas aparecem para expor e que possibilita a todos os seres humanos a atingirem o Estado de Buda. Com isto arraigado profundamente em sua mente, deve recitar o Nam-myoho-rengue-kyo de todo o seu coração _ sem vaidade, preconceito ou apego _ de tal modo que possa a tornar-se um Buda. Nitiren FUNDO DE CENA

Nitiren Daishonin escreveu este Gosho em 1277 e enviou-o a uma crente chamada Myoho-ama, que vivia na Província de Suruga (atual Prefeitura de Shizuoka). Isto foi dois anos antes da perseguição de Atsuhara suceder nos crentes de Daishonin em uma área próxima ao Monte Fuji, motivando Daishonin a inscrever o Dai-Gohonzon. Quanto à recebedora deste Gosho, os detalhes são desconhecidos. Julgando da importância e profundidade deste escrito, contudo, ela parece Ter sido uma crente fervorosa e pura a quem seu mestre profundamente confiava.

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Neste Gosho, que é escrito na forma de diálogo, Nitiren Daishonin expõe que o Sutra de Lótus é o único ensino que possibilita a todos os seres humanos atingirem a verdadeira iluminação. Além disso, Daishonin esclarece que aquele que se dedica à propagação da Lei Mística de acordo com a predição de Sakyamuni, é o Buda Original de Mappo, a despeito de seu estado aparentemente humilde de vida. A presente tradução é a última parte deste Gosho.

1 - As Dez Filhas de Kishimojin: São coletivamente chamadas Jurassetsunyo. Kishimojin é um demônio feminino da qual se diz que criou suas filhas alimentando-as com crianças dos outros. Kishimojin e suas filhas representam as mulheres malvadas e de caráter furioso nos ensinos prévios ao Sutra de Lótus. Contudo, repreendidas pelo Buda e arrependendo-se de seus mais pecaminosos atos, juraram proteger os crentes no Verdadeiro Budismo de acordo com o 26° Capítulo do Sutra de Lótus. O significado de Jurassetsunyo do ponto de vista filosofia da vida é que todo ser humano tem possibilidade de agir tanto como bom ou como mau, de acordo com os fatores influentes dos arredores. Devido à influência iluminadora da Lei Mística, o nam-myoho-rengue-kyo, todas as pessoas podem vir a mostrar as suas mais favoráveis qualidades em seu próprio e único modo. 2 - Myoho-rengue-kyo: do ponto de vista do Budismo de Daishonin, indica o nammyoho-rengue-kyo. Sakyamuni revelou-o após profunda especulação da substância real da vida e do universo, que definiu como nam-myoho-rengue-kyo. Por outro lado, Nitiren Daishonin desenvolveu a iluminação de sakyamuni e penetrou na Lei subjacente à fusão harmoniosa entre cada vida individual e a substância original do universo. Ele declarou que a substância básica e última desta Lei é Nam-myohorengue-kyo e, além disso, incorporou-o na forma do Gohonzon. 3 – Bontem: Um dos deuses budistas que protege os crentes no Verdadeiro Budismo. Diz-se que vive no topo do monte Shumi (Sumeru) como um dos deuses budistas que governa o domínio da matéria. Ele representa as várias ações do universo para proteger aqueles que praticam o budismo de Nitiren Daishonin. 4 – Taishaku: Bontem e Taishaku são dois principais deuses padroeiros do budismo. Diz-se que ele é o rei dos deuses budistas no domínio dos desejos. Esteve presente na cerimônia do Sutra de Lótus e jurou proteger os crentes do Verdadeiro Budismo. 5 – Sharihotsu: Sariputra, em sânscrito. Entre os dez maiores discípulos de Sakyaminu, ele é bem conhecido como o "máximo em sabedoria". Ele nasceu numa família brâmane em Magadha, mostrando um notável brilho mesmo desde a infância. Embora tenha estudado e dominado todas as filosofias brâmanes, nunca esteve satisfeito com o conhecimento superficial e esteve sempre perplexo com os problemas básicos da vida. Então, na busca da verdade da vida, Sharihotsu praticou o budismo juntamente com o seu velho amigo, Mokuren, Impressionado pela profundeza do Budismo, ambos tornaram ativa parte na propagação do Budismo. 6 – Mokuren: Foi filho de uma rica família brâmane em Magadha. Primeiro, juntamente com Sharihotsu, estudou sob a orientação de Sanjaya Belathiputta, um dos seis principais pensadores nos dias de Sakyamuni. Contudo, insatisfeito com o ceticismo de Sanjaya, juntou-se à ordem de Sakyamuni para praticar o Budismo. Devido às suas excelentes habilidades inatas, Mokuren foi chamado de "máximo em força oculta" e foi um dos dez maiores discípulos de Sakyamuni.

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7 – Monju: Como um líder dos Bodhisattvas no Budismo de Sakyamuni, apareceu em muitos sutras, desempenhando um importante papel no ensino budista. Cada Bodhsattva que aparece nos sutras representa vários atributos da vida humana. Entre eles, Monju é considerado como a idealização ou personificação da sabedoria. 8 – miroku: Miroki significa benevolência sem igual. Nascido numa família brâmane na Índia meridional, tornou-se um discípulo de Sakyamuni. Na cerimônia do Sutra de Lótus, ajudou o Buda a ensinar perguntando-lhe para que esclarecesse as dúvidas dos crentes. Do ponto de vista do Budismo de Nitiren Daishonin, o Bodhisattva Miroku indica Nitiren Daishonin e seus seguidores que fizeram seus adventos a fim de remover o sofrimento das pessoas. 9 – Emma: Acreditava-se que ele vivia no inferno para julgar os mortos e punir os pecadores para impedir-lhes de repetir suas pecaminosas ações.

Carta a Niike (Niike Gosho - Páginas 1439 a 1444) Que felicidade é nascer nos Últimos Dias da Lei e poder compartilhar a propagação do Verdadeiro Budismo! Quão dignos de pena são aqueles que, embora nascidos nesta época não podem crer no Sutra de Lótus!’ Ninguém pode fugir á morte, uma vez nascido como ser humano; então, por que não praticar como preparação para a próxima vida? Quando observo o que as pessoas estão fazendo, percebo que, embora professem a fé no Sutra de Lótus e conservem os seus manuscritos, elas agem contra o espírito do Sutra e assim caem prontamente nos maus caminhos. Para ilustrar, uma pessoa tem cinco grandes órgãos internos porém se mesmo um só deles ficar doente, contaminará todos os demais, e a pessoa acabará morrendo. O Grande Mestre Dengyo afirmou: "Mesmo louvando o Sutra de Lótus ele destrói a sua alma". 5 Ele quis dizer que mesmo que uma pessoa abrace, leia e louve o Sutra de Lótus se trair a sua intenção estará destruindo não somente Sakyamuni, mas todos os outros Budas do universo. A soma das nossas más ações mundanas e do mau carma poderá ser tão grande quanto o Monte Sumeru mas, uma vez abraçando a fé neste sutra, desaparecerão como a geada ou o orvalho sob o sol do Sutra de Lótus Entretanto, se a pessoa cometer mesmo uma ou duas das catorze calúnias" mencionadas neste sutra, será quase impossível expiar o seu pecado. Matar um único Buda seria um pecado muito maior do que destruir todos os seres vivos do universo, e violar o espírito do Sutra é cometer o pecado de destruir todos os Budas.

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Aquele que incorrer em qualquer uma daquelas catorze, é um caluniador. O Inferno é uma moradia de fogo amedrontadora, e a Fome um lamentável estado onde pessoas famintas devoraram seus próprios filhos. Ira é contenda e discórdia e Animalidade é matar ou ser morto. O inferno do lótus vermelho-sangue é assim chamado porque o intenso frio desse inferno faz o indivíduo dobrar-se até que as suas costas abram-se e a carne sangrenta aflore como uma flor de Lótus carmesim. Existem ainda infernos mais horríveis. Uma vez caindo em tão mal estado, mesmo um trono ou um título de general nada significará. O indivíduo não será diferente do macaco numa corda, torturado pelos guardas do inferno. Para que lhe serviria então a sua fama ou a fortuna? Ele poderá ainda continuar arrogante e persistir em suas falsas crenças? Pare e pondere! Como é rara a fé que faz o indivíduo oferecer donativos a um Sacerdote que conhece a alma do Sutra de Lótus! Ele não se desviara para os maus caminhos, mesmo se o fizer uma só vez. Ainda maiores serão os benefícios resultantes de dez ou vinte contribuições ou de cinco anos, dez anos, ou uma vida de contribuições. E estão além da medida da sabedoria do Buda. O Buda ensinou que os benefícios de um só oferecimento ao devoto deste sutra são uma centena de milhares de miríades de vezes maiores do que o de oferecer ilimitados tesouros a Sakyamuni por mais de oito bilhões de aeons. Quando abraçar este sutra, o senhor transbordará de felicidade e verterá lágrimas de alegria. Parece impossível retribuir o nosso débito a Sakyamuni mas, através dos seus freqüentes oferecimentos a mim, nas profundezas destas montanhas, o senhor retribuirá os benevolentes préstimos do Sutra de Lótus e do Buda Sakyamuni. Lute ainda mais pela fé e jamais seja derrotado pela negligência. Todos parecem crer sinceramente quando abraçam inicialmente o Sutra de Lótus mas, com o passar do tempo, tendem a dedicar menos; deixam de respeitar ou servir ao Sacerdote, e criam arrogantemente visões distorcidas. Este fato é o mais temeroso. Empenhe-se no desenvolvimento da fé até o último momento de sua vida. Caso contrário, arrepender-se-á. Por exemplo, a viagem de Kamakura a Quioto leva doze dias. Se viajar durante onze dias e parar antes de completar o décimo segundo dia, como poderá admirar a lua da linda capital? Em qualquer circunstância, aproxime-se do Sacerdote que conhece a essência do Sutra de Lótus continue aprendendo dele a verdade do Budismo e prossiga a sua viagem da fé Como passam depressa os dias! Isso nos faz perceber como são curtos os anos que deixamos. Os amigos admiram as flores de cerejeira nas manhãs da Primavera e então partem, levados como as flores pelos ventos da impermanência, nada deixando senão os nomes. Embora as flores tenham sido dispersadas, as cerejeiras florescerão outra vez com a chegada da Primavera, mas quando renascerão aquelas pessoas? Os companheiros com quem compusemos poemas admirando a lua, nas 53

noites de outono, desapareceram com a lua atrás das nuvens passageiras. Somente suas imagens mudas continuam em nossos corações. A lua se põe atrás das montanhas do ocidente, mas nós iremos compor poemas sob a mesma no próximo outono. Mas onde estão os nossos companheiros que faleceram? Mesmo quando o Tigre da Morte ruge próximo a nós não o ouvimos. Quantos dias restam ainda ao cordeiro destinado ao sacrifico? Nas profundezas das Montanhas Nevadas vive um pássaro chamado Kankutyo que, torturado pelo frio paralisante, chora dizendo que fará um ninho na manhã seguinte. Todavia, quando o dia irrompe, ele se esquece das horas na luz morna da manhã, deixando de construir o seu ninho. Dessa forma, continua chorando em vão durante toda a vida. Isso também verdadeiro com as pessoas. Quando caem no inferno e se sufocam em suas chamas, desejam renascer humanas e juram deixar tudo de lado para servir os Três Tesouros" e atingir a iluminação na existência seguinte. Porém mesmo nas raras ocasiões em que renascem sob forma humana, os ventos da fama e da fortuna sopram com violência e a luz da prática budista é facilmente apagada. Sem qualquer escrúpulo, desperdiçam suas riquezas em insignificâncias, mas restringem mesmo a menor contribuição ao Buda, A Lei e ao Sacerdote. Isso é muito sério pois estão sendo influenciados pelos mensageiros do inferno. Este é o significado de "O bem aos centímetros convida o mal aos metros". Além disso, uma vez que esta é uma terra onde as pessoas caluniam o Sutra de Lótus os deuses, que deveriam estar protegendo-as, anseiam pela Lei e ascendem aos céus renunciando aos seus santuários. Os santuários vazios são então ocupados pelos demônios que desencaminham os adoradores. O Buda, uma vez completado seus ensinos, retomou ao paraíso eterno. Templos e santuários foram abandonados para tomarem-se moradias dos demônios Essas imponentes estruturas dispõem-se em filas, construídas com custeio do Estado, e ainda assim as pessoas sofrem. Essas não são simplesmente minhas próprias palavras, elas são encontradas nos sutras, então, o senhor deveria aprendê-las também. Nem os Budas nem os deuses jamais aceitariam oferecimentos daqueles que caluniam a Lei. Então como podemos nós seres humanos, aceitá-los? A divindade do Santuário Kasuga proclamou através de um oráculo que não aceitaria nada daqueles com corações. impuros, mesmo que tivesse de comer as chamas do cobre ardente; ela recusaria pôr os pés em suas casas, mesmo que tivesse que sentar no cobre em brasas. Ela preferiria visitar uma cabana miserável com ervas daninhas obstruindo a passagem, ou uma pobre e pequena casa de sapé. A entidade declarou que nunca visitaria o infiel mesmo que ele pendurasse grinaldas sagradas durante mil dias para recepcioná-la, mas que iria a uma casa onde as pessoas fossem devotas, não importando o quanto os outros desprezassem sua infelicidade. Lamentando que os caluniadores aniquilassem este país, os deuses 54

abandonaram-no e ascenderam aos céus. "Aqueles com corações. impuros" significa aqueles que recusam abraçar o Sutra de Lótus como é afirmado no quinto volume do Sutra de Lótus Se os próprios deuses consideram os oferecimentos dos caluniadores como "chama de cobre ardente", como poderíamos nós mortais comuns, possivelmente consumí-los? Se alguém estivesse para matar nossos pais e então tentasse oferecer-nos algum presente, poderíamos aceitá-lo? Nem mesmo os sábios e santos podem evitar o inferno dos incessantes sofrimentos se aceitarem oferecimentos dos caluniadores. Nem o senhor deve associar-se com os caluniadores, pois se assim o fizer, partilhará a mesma culpa com eles. O senhor deve temer isso acima de tudo. Sakyamuni é o pai, soberano e mestre de todos os Budas e deuses, de toda a assembléia dos homens e seres celestes e de todos os seres sensíveis. Que deus se rejubilaria se Sakyamuni fosse morto? Hoje todas as pessoas de nosso país provaram ser inimigas de Sakyamuni, mas, mais do que homens e mulheres leigos, são os bonzos com a compreensão distorcida que são os piores inimigos do Buda. HÁ dois tipos de compreensão a verdadeira e a distorcida. Não importa o quão erudita uma pessoa possa aparentar, se suas idéias são desvirtuadas, o senhor não deve ouvi-la. Nem deve seguir os bonzos simplesmente por que eles são venerados ou por que ocupam uma alta posição. Mas se uma pessoa possui a sabedoria para conhecer o espírito do Sutra de Lótus não importa o quão desprezível ela possa aparentar, venere-a e sirva-a como se ela fosse um Buda vivo. Isto é afirmado no Sutra. Esta é a razão por que o grande Mestre Dengyo disse que os homens e mulheres leigos que acreditam neste sutra, mesmo que careçam de conhecimento ou violem os preceitos, devem sentar-se acima dos reverendos Hinayana que observam rigorosamente os 250 mandamentos. Os bonzos deste sutra Mahayana devem, portanto, estar sentados numa posição mais alta. Acredita-se que Ryokan do Templo Gokurakuji seja um Buda vivo, mas os homens e mulheres que acreditam no Sutra de Lótus devem sentar-se acima dele. Parece extraordinário que esse Ryokan, que observa os 250 mandamentos, se torne nervoso e de olhar carrancudo todas as vezes que vê ou ouve sobre Nitiren. O sábio, parece, foi possuído por um demônio. Ele é como uma pessoa basicamente tranqüila que, quando bêbada, revela um lado maligno e causa problemas. O Buda ensinou que dar oferecimentos a Mahakashyapa, Shariputra, Maudgalyayana e Subhuti, que ainda não conhecem o Sutra, conduziria uma pessoa a cair nos três maus caminhos. Ele disse que esses quatro grandes discípulos eram mais desprezíveis do que cachorros selvagens ou chacais. Eles inflexivelmente sustentaram os 250 mandamentos budistas e a prática deles dos 3.000 critérios foi tão perfeita quanto a lua cheia. Mas até eles abraçarem o Sutra de Lótus eram ainda como cachorros selvagens para o Buda. Em comparação, nossos bonzos são tão desprezíveis que estão além de qualquer descrição.

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Os bonzos dos templos Kencho-ji e Engaku-ji quebraram o código de conduta de forma tão flagrante que se assemelham a uma montanha que se transformou num monte de pedregulhos. Seu comportamento licencioso é como o dos macacos. E completamente inútil procurar por salvação na próxima vida através de oferecimentos a esses bonzos. Não há dúvida que os deuses protetores abandonaram a nossa terra. Há muito tempo atrás, os deuses, Bodhisattvas e homens de erudição juraram juntos, na presença de Sakyamuni, que se houvesse uma terra hostil ao Sutra de Lótus eles se transformariam na geada e no granizo no verão para trazer a fome sobre a terra, ou se tomariam a peste para devorar a colheita, ou causariam a seca ou enchentes para arruinar os campos e as fazendas, ou se tomariam tufões e varreriam as pessoas para suas mortes, ou se transformariam em demônios e importunariam as pessoas. O Bodhisattva Hatiman estava entre aqueles presentes. Ele não teme quebrar o juramento feito no Pico da Águia? Se ele quebrasse sua promessa, certamente seria condenado ao inferno dos incessantes sofrimentos - uma atemorizante e terrível coisa para se contemplar. Até o enviado do Buda realmente aparecer para expor o Sutra de Lótus os governantes da terra não eram hostis ao sutra, pois eles reverenciavam todos os sutras igualmente. Entretanto, agora que estou propagando o Sutra de Lótus como emissário do Buda, todos - desde o governante até a mais simples pessoa tornam-se um caluniador. Até aqui, Hatiman fez todo o possível para evitar que as hostilidades contra o Sutra de Lótus se desenvolvessem entre nosso povo. Ele foi tão relutante quanto o ato dos pais de abandonar seu único filho. Mas, agora, temendo quebrar o juramento feito no Pico da Águia, ele destruiu seu santuário para ascender aos céus. Mesmo assim, se houvesse um praticante do Sutra de Lótus que desse sua vida por ele, Hatiman cuidaria dessa pessoa. Mas uma vez que tanto Tensho Daijin e Hatiman se foram, como poderiam os outros deuses permanecerem em seus santuários? Mesmo que eles não quisessem partir, como poderiam permanecer por mais um dia se eu os reprovaria por não manterem suas promessas? Uma pessoa pode ser um ladrão e, enquanto ninguém souber disso, ela pode viver onde quer que queira. Mas, quando denunciada como ladrão por alguém que a conheça, ela é forçada a fugir. Da mesma forma, uma vez que conheço seus juramentos, os deuses são compelidos a abandonar seus santuários. Contrariamente a crença popular, a terra tomou-se habitada pelos demônios Que vergonha! Muitos expuseram os vários ensinos de Sakyamuni, mas até agora, ninguém nem mesmo Tient’ai ou Dengyo, ensinou o mais importante de todos. Isso é como deveria ser, pois esse ensino aparece e propaga-

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se com o advento do Bodhisattva Jogyo durante os primeiros quinhentos anos dos (Últimos Dias da Lei. Não importa o que venha a acontecer, mantenha sempre imperturbável a sua fé no Sutra de Lótus. Assim, no último momento da vida, o senhor será recebido por mil Budas que o levarão rapidamente ao paraíso no Pico da Águia onde experimentarás a verdadeira felicidade da Lei. O senhor não deverá reprovar-me caso sua fé enfraqueça e não atinja a iluminação nesta existência. Se o fizer, o senhor será como o paciente que recusa o remédio que o médico lhe receitou e em seu lugar toma o remédio errado. Jamais lhe ocorrerá que a culpa é sua, e ele culpara o médico por não se curar. A fé neste sutra significa que o senhor certamente atingirá o Estado de Buda se for fiel á totalidade do Sutra de Lótus seguindo exatamente os seus ensinos, sem acrescentar nenhuma de suas próprias idéias ou seguir interpretações arbitrarias dos outros. Atingir o Estado de Buda não é nada extraordinário. Se recitar o Nammyoho-rengue-kyo 13 com a totalidade da sua vida, o senhor naturalmente ficará dotado das trinta e duas feições e oitenta características" do Buda. Sakyamuni afirmou: "No início jurei tomar todas as pessoas perfeitamente iguais a mim, sem qualquer distinção entre nós". Portanto, não é difícil tomar-se Buda. O ovo de um pássaro não contém sendo líquido, mas dele se desenvolve um bico, dois olhos e todas as partes que formam um pássaro, e pode voar pelos céus. Nós também. somos como o ovo, ignorantes e vis, mas, quando nutridos pela recitação do Nam-myohorengue-kyo, desenvolvemos o bico das trinta e duas feições do Buda e as penas das suas oitenta características e ficamos livres para voar nos céus da realidade última. O Sutra do Nirvana afirma que todas as pessoas estão envolvidas pela casca da ignorância, faltando-lhe o bico da sabedoria. O Buda volta a este mundo, tal como o pássaro-mãe retoma ao seu ninho e quebra a casca para que todas as pessoas, como aqueles filhotes, possam deixar seu ninho e voar nos céus da iluminação. "Conhecimento sem fé é uma descrição daqueles que podem ser versados no Sutra de Lótus mas não crêem nele. Essas pessoas jamais atingirão o Estado de Buda. Aqueles que tem "fé sem conhecimento" podem estar privados do conhecimento, mas eles crêem e podem atingir o Estado de Buda. Estas palavras não são meramente minhas, mas estão explicitamente afirmadas no sutra. No segundo volume do Sutra de Lótus o Buda disse a Shariputra "É através da fé e não da sua própria inteligência que o senhor poderá atingir a iluminação.11 Isso explica por que mesmo Shariputra, insuperável em sua inteligência somente pôde atingir o Estado de Buda abraçando e crendo firmemente no sutra. Somente o conhecimento não o podia levar A iluminação. Se Shariputra não poderia atingir a iluminação através do seu vasto conhecimento, como nós de reduzido conhecimento, 57

ousaríamos sonhar em atingir o Estado de Buda sem ter fé? O sutra explica que as pessoas nos Últimos Dias da Lei serão arrogantes embora seus conhecimentos do Budismo sejam superficiais, e mostrarão desrespeito aos sacerdotes, negligenciarão a Lei, e assim cairão nos maus caminhos. Se o indivíduo realmente compreende o Budismo, ele deveria demonstrá-lo em seu respeito ao Sacerdote, reverencia A Lei e oferecimentos ao Buda. O Buda Sakyamuni não esta agora entre nós e assim o senhor deverá respeitar a pessoa de sabedoria iluminada como se fosse o próprio Buda. Se o seguir com sinceridade, os seus benéficos serão abundantes. Se o indivíduo almeja a felicidade na próxima existência, deverá renunciar ao seu desejo pela fama e fortuna e respeitar o Sacerdote que ensina o Sutra de Lótus como um Buda vivo, não importando quão humilde seja a posição desse Sacerdote. Assim está escrito no sutra. A seita Zen viola atualmente os cinco grandes princípios da humanidade - benevolência retidão, honradez, sabedoria e fé. Honrar a sabedoria e a virtuosidade, respeitar os mais velhos e proteger os jovens, são condutas humanas universalmente reconhecidas tanto no budismo como nos domínios seculares. Mas os reverendos da Zen, que não são nada mais que uma plebe mal-educada, não são nem mesmo inteligentes o suficiente para distinguir o preto do branco. Eles vestiram agora pomposas vestimentas sacerdotais e tomaram-se tão presunçosos que menosprezam os bonzos eruditos e virtuosos das seitas Tendai e Shingon. Eles não observam nenhuma das maneiras apropriadas e pensam que estão numa posição maior do que os outros. Essas pessoas são tão insolentes que mesmo os animais são mais respeitáveis. Considerando isso, o Grande Mestre Dengyo escreveu que a lontra mostra seu respeito oferecendo o peixe que apanhou, O corvo na floresta carrega alimento para seus pais e avós a pomba toma o cuidado de pousar três ramos abaixo do de seu pai, os gansos selvagens mantêm uma perfeita formação quando voam e os cordeiros ajoelham-se para beber o leite de sua mãe. Ele pergunta que se os animais inferiores conduzem-se com tal respeito, como os seres humanos podem faltar em cortesia? Julgando das palavras de Dengyo, é natural que os bonzos da Zen possam estar confusos sobre o Budismo uma vez que ignoram até mesmo como os homens devem se comportar. Eles estão agindo como demônios Entenda claramente o que eu ensinei ao senhor aqui e pratique sem negligência. todos os ensinos dos oito volumes e vinte e oito capítulos do Sutra de Lótus. Quando o senhor ansiar por me ver, ore para o sol e ao mesmo tempo minha imagem se refletirá nele. Faça o reverendo que é meu mensageiro ler esta mensagem para o senhor. Confie nele como um reverendo com uma sabedoria iluminada e pergunte-lhe quaisquer questões que o senhor possa ter sobre o Budismo. Se o senhor não perguntar e resolver suas dúvidas, não poderá dispersar as nuvens negras de ilusão e será como tentar viajar mil milhas sem as pernas. Deixe meu mensageiro ler esta carta uma vez e mais uma vez

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e pergunte-lhe quaisquer questões que desejar. Na expectativa de vêlo novamente, eu concluo aqui. Respeitosamente, Nitiren No segundo mês do terceiro ano de Koan (1280) FUNDO DE CENA Nitiren Daishonin escreveu "Carta a Niike" no Monte Minobu, em fevereiro de 1280, aos cinqüenta e nove anos de idade. O recebedor, Niike Saemon-no-jo, era um oficial samurai do governo Kamakura. Ele tinha esse nome porque residia num local chamado Niike, no distrito Iwata, província de Totomi. Ele e sua esposa Niike-ama foram convertidos ao Budismo de Nitiren Daishonin por Nikko Shonin. Não se sabe muito sobre Niike, mas parece ter sido um fervoroso seguidor que serviu A Nitiren Daishonin com devoção. Nesta carta, Nitiren Daishonin explica sob diversos ângulos a atitude correta da fé e os benefícios oriundos dela. Nitiren Daishonin lamenta por aqueles que, embora nascendo numa época em que a Lei Mística se propagaria, recusam-se a abraçar a fé nela. Ele salienta a transitoriedade da vida humana e a conseqüente importância de não desperdiçar tempo na busca de valores transitórios. Em vez disso, é preciso discernir o que é realmente importante na vida e persistir até o fim na busca da Verdadeira Lei. Ele explica que o potencial para o Estado de Buda é inerente a todas as pessoas, e que a fé e não a capacidade intelectual, é a chave para manifestar a iluminação. PALAVRAS E FRASES 1 - (Últimos Dias de Lei: Período que se iniciaria dois mil anos após o falecimento do Buda Sakyamuni, quando os seus ensinos perderiam o poder o Buda Original faria seu advento para conduzir todas as pessoas A iluminação. Afirma-se que duraria por dez mil anos e mais. Os budistas japoneses na época de Nitiren Daishonin geralmente acreditavam que os Últimos Dias teriam se iniciado no ano 1052.

2 - Sutra de Lótus Genericamente, indica a escritura respeitada como o mais elevado ensino do Buda Sakyamuni, presumivelmente exposto durante os seus oito últimos anos de vida. Ele ensina que todas as

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pessoas podem atingir o supremo Estado de Buda, e unifica em si todos os ensinos anteriores e provisórios. O termo "Sutra de Lótus é também usado para indicar o mais elevado ensino budista de uma era específica, ou seja, o ensino que leva diretamente A iluminação. Nos Últimos Dias da Lei, indica o Nammyoho-rengue-kyo das Três Grandes Leis Secretas. Nitiren Daishonin usava freqüentemente o termo "Sutra de Lótus em seus escritos para indicar a lei do Nam-myoho-rengue-kyo ou o Gohonzon. 3 – Cinco grandes órgãos internos: pulmão, coração, baço, fígado e rins. 4 - Dengyo (767-822): Fundador da seita Tendai no Japão. Também conhecido como Saityo. Seu nome honorífico e o titulo é Dengyo Daishi (Grande Mestre Dengyo). As obras de Tient’ai confirmaram sua fé no Sutra de Lótus e, em 804, viajou A China para aprender as doutrinas de Tient’ai. Graças aos seus esforços, a seita Tendai tomou-se a mais influente no Japão, e a importância do Sutra de Lótus foi reconhecida em todo o país. 5 - Hokke Shuku: Dengyo fez esta observação em relação ao seu contemporâneo Tokuiti, um estudioso da Seita Hosso, o qual afirmou que a doutrina da iluminação universal do Sutra de Lótus é um ensino provisório. Nitiren Daishonin o emprega num I sentido amplo, indicando as pessoas de sua época que violam a intenção do sutra. 6 - Sakyamuni: Buda Sakyamuni, o fundador do Budismo, que viveu na Índia há mais de dois mil anos. 7 - Monte Sumeru: Montanha que, segundo a antiga cosmologia indiana, estaria no centro do mundo. Dizia-se que sua altura seria de oitenta e quatro mil yojana, sendo uma yojana igual A distância que o exército real caminharia num dia. 8 - Catorze calúnias Quatorze espécies de calúnia A verdadeira Lei ou aos seguidores, enumerados no Hokke Mongu Ki de Miao-lo, com base no capítulo Hiyu (32) do Sutra de Lótus. São: (1)arrogância, (2) negligência (3) julgamento arbitrário e egoístico, (4) entendimento superficial e presumido, (5) adesão aos desejos mundanos, (6) falta de espírito de procura, (7) descrença, (8) aversão, (9) dúvida deludida, (10) difamação (11) desprezo (12) ódio, (13) inveja, e (14) rancor. 9 - Inferno do Lótus Vermelho-Sangue: Um dos oito infernos frios que, na antiga cosmologia indiana, estaria sob a terra. Esses infernos são descritos no Kusha Ron, no Sutra do Nirvana e em outras obras. 10 - Montanhas Nevadas: Um nome do Himalaia, freqüentemente citado nas escrituras budistas.

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11 - Três Tesouros: Três pontos que todos os budistas devem respeitar e servir: o Buda, a Lei (Dharma, em sânscrito), e o Sacerdote (Sangha). O Buda é a pessoa iluminada A verdade última. A lei é o ensino que o Buda expõe para conduzir os outros A mesma iluminação que ele alcançou. O Sacerdote herda e transmite a Lei para as gerações futuras. As explanações dos Três Tesouros diferem conforme os ensinos do Budismo. Na Nitiren Shoshu, o "Buda" indica Nitiren Daishonin, a "Lei" indica o Dai-Gohonzon e o "Sacerdote" indica Nikko Shonin. 12 - Pico da Águia: Montanha localizada ao nordeste de Rajagriha, a capital de Magada, na antiga Índia, onde Sakyamuni teria exposto o Sutra de Lótus. Conforme usado neste Gosho, o termo "Pico da Águia" também simboliza a terra do Buda ou o Estado de Buda. 13 - Nam-myoho-rengue-kyo: A Lei Última ou realidade absoluta que permeia todos os fenômenos do universo. Indica também a invocação do Daimoku que constitui a prática básica do Budismo de Nitiren Daishonin. 14 - Trinta e duas feições e oitenta e duas características: Segundo vários sutras, seriam atributos físicos notáveis que os Budas possuiriam. Imaginava-se que cada uma delas teria sido adquirida como resultado de muitas existências de práticas meritórias. A noção dessas características notáveis servia para inspirar admiração nas pessoas e motiva-las a buscar o Caminho. Elas podem ser consideradas como símbolos da sabedoria, benevolência habilidades, etc, do Buda. 15 - Sutra de Lótus capítulo 2. 16 - Sutra do Nirvana: Compilação de ensinos que teriam sido expostos pelo Buda Sakyamuni no bosque sal, no último dia de sua vida, confirmando os mais importantes princípios do Sutra de Lótus. 17 - Shariputra: Um dos dez maiores discípulos do Buda Sakyamuni, conhecido como o supremo em sabedoria. No Sutra de Lótus ele é o primeiro a compreender o princípio do "veículo único do Buda" e recebe do Buda a profecia da sua futura iluminação. 18 - Sutra de Lótus capítulo 3.

Resposta à Dama Ueno (Ueno Ama Gozen Gohenji – páginas 1580 a 1582)

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Recebi uma fardo de arroz polido e um outro de taros lavados e, em gratidão, recitei Nam-myoho-rengue-kyo. O Myoho-rengue-kyo é como o lótus. O maha-mandara no céu e a flor da cerejeira no mundo humano são flores celebradas, mas o Buda não escolheu nenhuma delas para comparar ao Sutra de Lótus. De todas as flores, ele escolheu a flor de lótus para simbolizar o Sutra de Lótus. Há uma razão para isso. Algumas plantas dão primeiramente as flores, e depois as sementes, enquanto que outras as sementes vêm antes das flores. Algumas dão apenas uma flor e muitas sementes, outras dão muitas flores mas só uma semente, e ainda outras dão sementes e não flores. Assim, existem muitas variedades de plantas, mas o lótus é a única que dá flores e sementes simultaneamente. Os benefícios que todos os outros sutras não são definidos, porque eles ensinam que é primeiramente preciso fazer boas causas e somente então tornar-se Buda, numa época posterior. O Sutra de Lótus é inteiramente diferente. A mão que o acolher atingirá imediatamente a iluminação, e a boca que o recitar entrará imediatamente no estado de Buda, assim como a lua reflete-se na água no instante em que aparece atrás das montanhas do leste, ou como o som e o eco aparecem simultaneamente. É por este motivo que o sutra afirma: "Entre os que ouvem esta Lei, não há ninguém que não atingirá o Estado de Buda". Essa passagem afirma que se existem cem ou mil pessoas que abraçam este sutra, sem uma única exceção todas as cem ou mil tornar-se-ão Budas. Em sua carta, a senhora afirma: "Estou fazendo estas doações para comemorar o aniversário do falecimento do meu pai, lorde Matsuno Rokuro-zaemon. Como ele deixou muitos filhos, cerimônias serão feitas em sua memória de muitas diferentes maneiras. Eu acredito, entretanto, que essas cerimônias serão caluniosas a menos que rigorosamente baseadas no Sutra de Lótus". O ensino dourado do Buda Sakyamuni diz: "O Honrado-pelo-Mundo há tempo expôs suas doutrinas e deve agora revelar a verdade". O Buda Taho deu testemunho dizendo: "Todos os ensinos do Myoho-renguekyo são verdadeiros". E todos os Budas das dez direções deram crédito à verdade do sutra, estendendo suas línguas até o céu Brahma. O sudoeste do Japão, além do oceano, há um país chamado China. Naquele país, algumas pessoas acreditam no Buda mas não em deuses, enquanto que outras fazem exatamente o contrário. Talvez um situação semelhante tenha existido nos dias primitivos em nosso próprio país. Seja como for, certa vez, houve um calígrafo na China chamado Wu-lung. Em sua arte, ele não tinha rival em todo o país, tal como Dofu ou Kozei no Japão. Ele odiava o Budismo e jurou que jamais iria transcrever escrituras budistas. Quando o seu fim se aproximou, ele caiu seriamente doente. No seu leito de morte, expressou seus últimos desejos ao seu filho, dizendo: "Você é meu filho. Não somente herdou a minha habilidade, como escreve com melhor mão que eu próprio. Não importando que má influência possa agir sobre você, não deverá copiar o Sutra de Lótus". E então o sangue jorrou como fonte, dos seus cinco órgãos dos sentidos. Sua língua partiu-se em oito partes 62

e o corpo desintegrou-se em dez direções. Mas os seus parentes, ignorando os três maus caminhos, não compreenderam que isso era sinal de que ele cairia no estado de Inferno. O nome do filho era I-Lung. Ele também mostrou ser o melhor calígrafo da China. Obediente ao desejo do seu pai, ele jurou que jamais transcreveria o Sutra de Lótus. O rei, na época, tinha como nome Tsuma. Ele acreditava no Budismo e tinha especialmente o Sutra de Lótus em alta consideração. Ele queria ter esse sutra transcrito por um excelente calígrafo – que não fosse outro senão o melhor do país – para ter assim uma cópia para si mesmo. Assim, convocou I-Lung. Este explicou que o desejo do seu pai o proibia, e rogou ao rei que o dispensasse da tarefa. Não desejando obrigá-lo a desobedecer o desejo do pai, o rei chamou um outro calígrafo para transcrever o sutra. O resultado, entretanto, estava longe de satisfatório. O rei mandou novamente chamar I-Lung e disse-lhe: "Como o senhor afirma que o desejo do seu pai lhe proíbe, nós não o compelimos a transcrever o sutra. Nós insistimos, entretanto, que obedeça pelo menos a nossa ordem de escrever os títulos dos oitos volumes. I-Lung suplicou repetidamente para ser dispensado. O rei, agora furioso, disse: "O senhor continua insistindo no desejo do seu pai, mas ele foi tão súdito nosso quanto o senhor é. Caso recuse escrever os títulos temendo faltar para com o amor filial, nós o acusaremos de desobediência a decreto real". Dessa maneira, o rei repetiu a rigorosa ordem. I-Lung, embora não desejando contrariar o pai, compreendeu que não podia mais desobedecer a ordem real, e então escreveu os títulos (dos oitos volumes) do Sutra de Lótus, e entregou seu trabalho ao rei. Voltando para casa, I-Lung visitou o túmulo do seu pai e, derramando lágrimas, relatou: "O rei ordenou-me tão rigorosamente que eu, contra a minha vontade, escrevi os títulos (dos oito volumes) do Sutra de Lótus". Na sua tristeza não podia fugir à culpa de ser mau filho, e ficou junto ao túmulo durante três dias, jejuando até a beira da morte. Na hora do Tigre no terceiro dia, ele estava quase morto e sentiu como se estivesse sonhando. Ele olhou para o céu e viu um ser celeste que parecia exatamente igual a Taishaku numa pintura. Sua multidão de seguidores enchia o céu e a terra. I-Lung perguntou-lhe que era. O ser celeste respondeu: "Não me reconhece ? Eu sou seu pai, Wu-lung. Enquanto estive no mundo humano, aderi às escrituras não budistas e mantive inimizade com o Budismo, particularmente com o Sutra de Lótus. Por essa razão, caí no inferno dos incessantes sofrimentos. "Todos os dias a minha língua era arrancada várias centenas de vezes. Ora estava morto, ora estava vivo. Vivi chorando em agonia, alternadamente olhando para o céu e atirando-me ao solo, mas não havia ninguém que ouvisse os meus gritos. Queria comunicar ao mundo humano a minha angústia, mas não havia como fazê-lo. Sempre que você insistia em cumprir o meu desejo, suas palavras se 63

transformavam ora em chamas para atormentar-me, ora em espadas que choviam do céu sobre mim. Seu procedimento foi extremamente impróprio de filho. Entretanto, como estava agindo para cumprir o meu desejo, não pude odiá-lo pois eu estava apenas recebendo a retribuição do carma do meu próprio ato. "Enquanto pensava desse modo, apareceu repentinamente um Buda dourado no inferno dos incessantes sofrimentos, e declarou: "Mesmo que o universo esteja repleto de pessoas que tenham destruído suas boas causas, se elas ouvirem o Sutra de Lótus mesmo uma só vez, jamais deixarão de atingir a Iluminação". Quando esse Buda entrou no inferno dos incessantes sofrimentos, foi como se tivesse havia um dilúvio num grande incêndio. Quando meus sofrimentos diminuíram um pouco, juntei as palmas das mãos e perguntei-lhe que Buda ele era. O Buda respondeu: "Eu sou o caráter myo, um dos sessenta e quatro caracteres dos títulos do Sutra de Lótus que o seu filho, I-Lung, está agora escrevendo". Como oito caracteres constituem o título de cada um dos oitos volumes, um total de sessenta e quatro Budas apareceram e brilharam como muitas luas no plenilúnio, e a extrema escuridão do inferno dos incessantes sofrimentos transformou-se instantaneamente num fulgor ofuscante. Além disso, de acordo como o princípio de que todo lugar está, sem que se alterem as suas características, e é em si a terra do Buda, o inferno dos incessantes sofrimentos tornou-se imediatamente a capital da eterna terra do Buda. Eu e todos os outros ocupantes transformamo-nos em Budas sentados em flores de lótus, e acabamos de ascender ao palácio interno do céu Tushita. Estou relatando-lhe isso em primeira mão". I-Lung disse: "Foi a minha mão que escreveu os títulos. Como poderia o senhor ter sido salvo? Além disso, eu não os escrevi com fé (no Sutra de Lótus). Como seria possível isso tê-lo salvo?" Seu pai respondeu: "Como é tolo! Sua mão é a minha mão, e seu corpo é meu corpo. Seu ato de escrever caracteres é equivalente a eu fazê-lo. Embora você não tivesse verdadeira fé, não obstante escreveu os títulos com sua mão. Portanto, eu fui salvo. Imagine uma criança que ponha fogo em algo e, sem a mínima intenção de fazê-lo, provoca um incêndio. O mesmo acontece com o Sutra de Lótus. Se alguém professa a fé nele, mesmo involuntariamente, jamais deixará de tornar-se Buda. Entretanto, como estamos na classe leiga, estamos em melhor posição para nos arrependermos das palavras caluniosas passadas não importando quão graves elas tenham sido. I-Lung relatou tudo isto ao rei. O rei disse: "Nosso desejo foi respondido com esplêndidos resultados". Desde então, I-Lung desfrutou cada vez mais do favor real, e todo o povo do país passou a crer no Sutra de Lótus. O falecido Goro e o falecido lorde Matsuno foram, respectivamente, seu filho e seu pai. A senhora é a filha do lorde. Portanto, acredito que ele deve estar neste momento no palácio interno do céu Tushita. Permita que Hoki-bo lhe explique esta carta. Como escrevi apressadamente, foi impossível dar detalhes. 64

Com meu profundo respeito, Nitiren, Em 15 de novembro de 1281. Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta em 15 de novembro de 1281 a Ueno-Ama Gozen, mãe de Nanjo Tokimitsu, que doou parte de suas terras para Nikko Shonin fundar o templo principal Taisekiji. Daishonin contava sessenta anos de idade quando enviou esta carta em resposta aos oferecimentos que Ueno-Ama Gozen havia feito para honrar a morte de seu pai, lorde Matsuno Rokurozaemon. Nesta carta, Nitiren Daishonin faz a comparação da Lei Mística ou Myoho-rengue-kyo com o lótus e, contando uma antiga história chinesa de dois mestres calígrafos, ensina-lhe a importância de manter a fé na Lei Mística para continuar a fidelidade ao seu falecido pai. Primeiramente, Nitiren Daishonin explica a superioridade do Sutra de Lótus sobre todas as outras escrituras, em termos da sua revelação da simultaneidade da causa e do efeito, para atingir o Estado de Buda. E então, citando a história dos renomados calígrafos da antiga China, Wu-lung e I-Lung, que eram respectivamente pai e filho, Nitiren Daishonin lhe assegura que quando o filho abraça a fé no Sutra de Lótus, o pai pode atingir a iluminação. Na história que ele conta, o calígrafo Wu-lung caiu no inferno devido ao seu ódio ao Sutra de Lótus, mas como seu filho I-Lung transcreveu o título do Sutra, o pai salvou-se dos sofrimentos do inferno. Ueno-ama Gozen teve como marido Nanjo Hyoe-Shitiro, que servia o clã governante Hojo. Ele era o chefe da vila de Ueno, nas vastas encostas do monte Fuji, na área vizinha ao atual templo Taisekiji. Assim, ele era geralmente chamado lorde Ueno. Afirma-se que o casal converteu-se à fé nos ensinos de Daishonin, enquanto servia o governo de Kamakura. O terceiro Sumo-prelado Nitimoku Shonin foi neto de Ueno-ama Gozen. Quando seu marido faleceu, em 1265, Nanjo Tokimitsu tinha apenas sete anos de idade, mas ela o educou admiravelmente, e ele sucedeu o pai como lorde local. A forte e pura fé de Tokimitsu, ao que se acredita, desenvolveu-se a partir da fé inabalável da mãe que lhe permitiu superar muitas dificuldades. Admite-se que ela tenha vivido mais que Nitiren Daishonin, mas não se conhece a data exata do seu falecimento.

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Essa pessoa praticará entre o povo (Saemon Tayu Dono Gohenji, pág.1102)

Após algum tempo sem notícias suas, sua carta chegou. Além disso, recebi o robe forrado com uma guarnição azul, um chapéu, uma faixa, um kan (1) de moedas e uma cesta de castanhas. O tempo presente corresponde aos primeiros quinhentos anos dos Últimos Dias da Lei. (2). O texto do sutra afirma claramente que nesta época o Bodhisattva Jogyo fará seu advento e concederá os cinco caracteres do Nam-myoho-rengue-kyo (3) a todas as pessoas do Japão. Também esclarece que ele enfrentará o exílio e a perseguição. Eu, Nitiren, sou como o emissário do Bodhisattva Jogyo, pois estou propagando esta doutrina. O capítulo Jinriki diz: "Assim como a luz do Sol e da Lua ilumina toda a obscuridade, essa pessoa praticará entre o povo e dissipará a escuridão de todos os seres". A quem pensa que se refere "essa pessoa", da afirmação "essa pessoa praticará entre o povo", nesta passagem ? Acredito que deva indicar a pessoa que é a reencarnação do Bodhisattva Jogyo. O sutra declara: "Após a minha extinção, a pessoa deve aceitar e sustentar este sutra. Tal pessoa, com relação ao caminho do Buda, está assegurada, e não pode haver dúvida nenhuma". (4) O senhor, também, está seguramente auxiliando os esforços de propagação do Bodhisattva Jogyo. Nitiren Em 3 de dezembro de 1279. Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta em Minobu para Ikegami Munenaka, o mais velho dos irmãos Ikegami, em 3 de dezembro de 1279. Neste Gosho, Nitiren Daishonin sugere que ele é o Bodhisattva Jogyo, que surgirá nos Últimos Dias da Lei e propagará a Lei Mística conforme as predições feitas no Sutra de Lótus. Nitiren Daishonin afirma que, assim como o Bodhisattva Jogyo "praticará entre as pessoas e dissipará a escuridão de todos os seres", ele próprio está propagando agora a Lei Mística para salvara as pessoas nos Últimos Dias da Lei. Ele também

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diz que o bodhisattva será submetido a perseguições como exílio e execução, assim como o Sutra prediz. Aqui, Nitiren Daishonin refere-se à passagem do 13 capítulo Kanji do Sutra de Lótus que afirma: "Repetidas e repetidas vezes ele será banido". – "Haverá muitas pessoas ignorantes que irão.. nos atacar com espadas e bastões". "Exílio" indica o banimento de Nitiren Daishonin a Izu, de 1261 a 1263, à ilha de Sado, de 1271 a 1274. "Execução" diz respeito à Perseguição de Tatsunokuchi em 1271, quando ele foi quase decapitado. Na conclusão, Nitiren Daishonin encoraja Ikegami Munenaka na fé louvando-o como alguém que está ajudando o Bodhisattva Jogyo a propagar a Lei. Notas 1. Kan: Uma antiga unidade monetária japonesa que consistia em mil moedas atadas com um cordão. Os furos em algumas moedas japonesas modernas provêm dessa tradição. 2. Primeiros quinhentos anos dos Últimos Dias da Lei: O quinto e último período de quinhentos anos após a morte do Buda Sakyamuni. Corresponde ao início dos Últimos Dias da Lei. Segundo o Sutra Daijuku, esse é um período de contendas e disputas na qual o budismo de Sakyamuni perecerá. 3. Cinco caracteres do Nam-myoho-rengue-kyo: Os cinco caracteres são myo, ho, ren, gue e kyo. Nas escrituras de Nitiren Daishonin, Myoho-rengue-kyo é frequentemente empregado como sinônimo de Nam-myoho-rengue-kyo, que consiste em sete caracteres chineses. 4. Sutra de Lótus, capítulo 21.

Carta aos Bonzos do Templo Seitioji (Seitioji Taishu-tyu – págs. 893 a 895)

Congratulemo-nos mutuamente com a chegada do Ano Novo. Como o senhor não me visitou no ano passado, temi que algo desfavorável lhe tivesse acontecido. Caso o senhor tenha uma oportunidade de visitarme, poderia trazer-me emprestado do bonzo Isseko o Jujushin-ron, o Hizo Hoyaku, o Nikyo-ron e outros comentários da seita Shingon ? Eu preciso dos mesmos para refutar bonzos da Shingon que vieram durante certo tempo levantando clamores contra mim. Traga também o primeiro e o segundo volumes do Makashikan. Gostaria também que trouxesse o Toshun e o Fusho Ki se estiverem disponíveis. Peça emprestado o Shuyo Shu que está com Kanti-bo, o discípulo de Enti-bo. Além disso, ouvi dizer que ele possui ainda outros escritos importantes. Por favor, peça-os emprestado e diga-lhe que eu lhe devolverei o mais

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breve possível. Neste ano, ficará definitivamente resolvida a questão sobre quais ensinos budistas são corretos ou incorretos. Diga a Joken-bo, Guijo-bo e outros bonzos, em meu nome: "Freqüentemente Nitiren esteve a ponto de ser executado. Por duas vezes foi exilado e uma vez quase decapitado. Isso não foi devido a quaisquer erros mundanos de sua parte. Como criança, ele recebeu a suprema sabedoria do Bodhisattva Kokuzo vivo. Ele vinha orando devotadamente ao bodhisattva para tornar-se a pessoa mais sábia do Japão. O bodhisattva deve ter tido pena dele, pois presenteou-o com uma grande pedra preciosa brilhante como a estrela d’alva, que Nitiren guardou em sua manga direita. Posteriormente, lendo atentamente todo o corpo de sutras, ele conseguiu discernir a superioridade ou a inferioridade essenciais das oito seitas, assim como de todas as escrituras". A seita Shingon – especialmente merecedora de culpa, porque ela viola o Sutra de Lótus. Entretanto, eu ataquei primeiramente os erros das seitas Zen e Nembutsu. Tenho boas razões para a minha acusação. Reservarei a discussão sobre o certo e o errado das seitas budistas da Índia e da China para uma outra ocasião mas, no Japão, todos abandonaram o ensino correto do Sutra de Lótus e assim, sem exceção, ficaram destinados a caírem nos maus caminhos. Assim é porque, em cada templo e em todos eles, a seita Shingon invariavelmente acompanha a seita Hokke de maneira exata como a sombra acompanha o corpo. Assim, a prática correta do Sutra de Lótus é adulterada pela prática da Shingon, dos dezoito caminhos, e a sua realização da penitência aviltada por aquela baseada no sutra Amida. Por conferir títulos aos estudiosos da seita Tendai, o procedimento da Shingon predomina, enquanto que o do Sutra de Lótus fica relegado a uma posição secundária. Na realidade, os sutras da Shingon pertencem aos ensinos provisórios e são inferiores até mesmo aos sutras Kegon e Hannya. Entretanto, confusos nesse ponto, Jikaku e Kobo sustentam que os sutras Shingon são iguais ou mesmo superiores ao Sutra de Lótus. A cerimônia de animação de imagem recém construída do Buda é portanto conduzida com a oração do mudra e mandra do olho do Buda, estabelecida no Sutra Dainiti. Por essa razão, todas as imagens de madeira e pinturas do Buda no Japão ficaram sem alma e sem visão e, como resultado, foram possuídas pelo Demônio do Sexto Céu e seu bando, levando ruína aos seus próprios adoradores. Eis por que a corte imperial está prestes a perecer. Agora, os maus ensinos da Shingon estão surgindo em Kamakura, e ameaçam destruir todo o Japão. A Shingon não é a única seita herética. As seitas Zen e Jodo também sustentam idéias tão pervertidas a ponto de fugirem à descrição. Eu sabia que, se afirmasse isso, eu iria certamente perder minha vida. Todavia, eu estava determinado a retribuir o favor ao Bodhisattva Kokuzo. Com isso em mente, no vigésimo oitavo dia do quarto mês do quinto ano de Kentyo (1253), eu apontei os erros das várias seitas pela primeira vez a uma 68

pequena audiência que incluía Joen-bo do lado sul do alojamento de Dozen-bo no templo Seitioji, localizado no vilarejo Tojo, na província de Awa. Por mais de vinte anos deste então, eu persisti em minha declaração sem afastar um passo. Por essa razão, fui algumas vezes expulso de minha residência e exilado em outras ocasiões. Em tempos remotos, o Bodhisattva Fukyo foi batido com bastões. Agora, Nitiren é perseguido a espada. Todo o povo do Japão, tanto os sábios como os tolos, desde o soberano ao mais inferior homem comum, afirma que o bonzo Nitiren não é páreo para o estudiosos, mestres, grandes mestres e velhos sábios. Nitiren aguardou a oportunidade para dispersar suas descrenças. A época finalmente chegou quando tremendos terremotos ocorreram na era Shoka (1257), seguidos pelo aparecimento de um grande cometa na era Bun-ei (1264). Observando esses fenômenos, ele profetizou: "Nosso país sofrerá dois terríveis desastres: luta interna e invasão estrangeira. O primeiro ocorrerá em Kamakura, sob forma de disputas aniquiladoras entres os descendentes de Hojo Yoshitoki. O último pode vir de qualquer direção, mas aquele do oeste será o mais violento. O último ocorrerá por razões que não são outras senão pelo fato de todas as seitas budistas no Japão serem heréticas, pois, devido a essa heresia, Bonten e Taishaku ordenarão outros países a atacarem o nosso. Enquanto nosso país continuar não ouvindo aquilo que Nitiren diz, será certamente derrotado, não importando se existem cem, mil, ou mesmo dez mil generais valentes como Massakado, Sumitomo, Sakado, Toshihito ou Tamura. Somente quando suas palavras se mostrarem falsas, o povo deveria aceitar a fé nas idéias distorcidas das seitas Shingon, Nembutsu, e outras". Essa foi a profecia que ele fez divulgar amplamente. Eu advirto especialmente os bonzos do monte Kiyossumi. Se eles considerarem Nitiren com menos respeito que seus próprios pais ou os Três Tesouros, eles se tornarão desprezíveis mendigos nesta vida e cairão no inferno dos incessantes sofrimentos na próxima. Eu explicarei a razão. Certa vez, o vil Tojo Saemon Kaguenobu caçou o gamo e outros animais mantidos pelo templo Teitioji e tentou subjulgar os bonzos de cada templo de alojamento, para os crentes da Nembutsu. Naquela ocasião, Nitiren se opôs a Tojo em favor do lorde do feudo. Ele compôs um ardente juramento: "Caso os templos de Kyossumi e Futama caíam nas mãos de Tojo, Nitiren abandonará o Sutra de Lótus". E então atou-o à mão do seu objeto de adoração, para o qual orava continuamente. Dentro de um ano, ambos os templos ficaram livres de Tojo. Certamente o Bodhisattva Kokuzo jamais se esquecerá disso, portanto, como poderão os bonzos que desprezaram Nitiren deixar de serem abandonados pelos céus ? Ouvindo-me dizer isso, os mais tolos dos senhores poderão pensar que estou lhes invocando uma maldição. Entretanto, não é assim. Eu estou advertindo-os simplesmente porque sinto pena dos senhores ao imaginá-lo caindo no inferno dos incessantes sofrimentos após suas mortes.

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Permita-me dizer algumas palavras sobre a monja da família do lorde do feudo. Sendo mulher, e também tola, ela deve ter se voltado contra mim quando foi ameaçada pelos outros. Tenho pena dela porque, tendo esquecido seu débito de gratidão, irá cair nos maus caminhos na próxima existência. Apesar disso, entretanto, ela fez grandes favores aos meus pais, por isso estou orando para poder salvá-la desse destino por quaisquer meios possíveis. O Sutra de Lótus não é uma escritura extraordinária. Ele simplesmente revela que o Buda Sakyamuni atingiu a iluminação numa época ainda mais distante que o Gohyaku-Jintengo. Ele também prediz que Sariputra e outros discípulos se tornarão Budas no futuro. Os que não acreditarem naquelas palavras cairão no inferno dos incessantes sofrimentos. Não somente Sakyamuni declarou tudo isso, como também o Buda Taho atestou a sua verdade, e os Budas das dez direções estenderam suas línguas como meio de confirmação. Além disso, o Sutra de Lótus afirma que o devoto deste sutra receberá a proteção dos Bodhisattvas da Terra, Bodhisattvas Monju e Kannon, Bonten, Taishaku, os deuses do sol e da lua, os Quatro Reis Celestes, e as Dez Deusas. Portanto, não há outra maneira de atingir o Estado de buda senão praticando o Sutra de Lótus, pois é a única escritura que vê corretamente todas as coisas passadas e infalivelmente prevê o que acontecerá no futuro. Nitiren nunca viu a província de Tsukushi e nem sabe nada sobre o império mongol. Entretanto, como sua predição resulta do seu entendimento dos sutras, ela já se concretizou. Então, quando ele afirma que todos os senhores cairão no inferno dos incessantes sofrimentos pela ingratidão, como poderiam as suas palavras serem falsas ? Os senhores poderão estar por ora em segurança, mas esperem e vejam o que ocorrerá depois. Todo o Japão será reduzido ao mesmo estado miserável em que se encontram as ilhas de Iki e Tsushima. Quando um grande número de hordas mongólicas chegarem à província de Awa, os senhores, bonzos que aderem a seitas heréticas, irão recuar aterrorizados e finalmente cairão no inferno dos incessantes sofrimentos, dizendo: "Agora sei que o bonzo Nitiren estava certo. Quão pesaroso ! Quão vergonhoso ! Nitiren Em 11 de janeiro de 1276. Aos bonzos do templo Seitioji, na província de Awa. Esta carta será lida em voz alta pelos bonzos Sado e Suke Ajari diante da estátua do Bodhisattva Kokuzo para que todos os bonzos do Seitioji o ouçam.

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Fundo de Cena Conforme diz o título, esta carta foi endereçada aos bonzos do templo Seitioji em 11 de janeiro de 1276, por Nitiren Daishonin, que vivia então no monte Minobu. O templo Seitioji , localizado na província de Awa, foi o templo onde Nitiren Daishonin iniciou seu estudo no Budismo e declarou finalmente a fundação do seu novo Budismo. A carta afirma que Nitiren Daishonin orou à estátua do Bodhisattva Kokuzo do templo para tornar-se o homem mais sábio do Japão. Assim, ele obteve a grande sabedoria que lhe possibilitou compreender corretamente todas as escrituras budistas. A seguir, a carta refere-se à influência particularmente má da seita Shingon, que executava rituais esotéricos e afirmava a supremacia dos seus ensinos sobre o Sutra de Lótus. Para retribuir o favor do Bodhisattva Kokuzo, Daishonin lutou para refutar os ensinos distorcidos das outras seitas. Ele aponta que, apesar de ter sido perseguido pelas suas afirmações, sua predição da luta interna e invasão estrangeira tornou-se verdade. No final, a carta afirma a supremacia do Sutra de Lótus e adverte os bonzos do templo Seitioji a prestarem atenção aos ensinos de Daishonin.

Sobre a Torre do Tesouro (Abutsu-bo Gosho – Pág. 1304 a 1305)

Li sua carta com grande atenção. Também recebi o seu oferecimento à Torre do Tesouro, de um kan de moedas, arroz e outros artigos. Relatei isto respeitosamente ao Gohonzon e ao Sutra de Lótus. Por favor, fique tranqüilo. Em sua carta, o senhor pergunta: "O que significa o surgimento da Torre de Tesouro, onde o Buda Taho estava sentado, do interior da terra ?". A aparição deste santuário adornado de jóias (no décimoprimeiro capítulo do Sutra de Lótus) é de grande importância. No oitavo volume do seu Hokke Mongu, o grande mestre Tientai explicou o surgimento da Torre do Tesouro. Ele afirmou que a mesma possuía duas funções distintas: prestar crédito aos capítulos precedentes e abrir caminho para a revelação seguinte. Assim, a Torre do Tesouro apareceu para comprovar o ensino teórico e para introduzir o ensino essencial. Numa outra colocação, a Torre fechada simboliza o ensino teórico e a Torre aberta, o ensino essencial. Isto representa os dois princípios, do objeto (kyo) e do sujeito (ti), ou realidade e sabedoria.

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Contudo, isto é, extremamente complexo. Assim, não entrarei em maiores detalhes neste momento. Em essência, o surgimento da Torre do Tesouro indica que os três grupos dos discípulos de Sakyamuni atingiram a iluminação somente quando ouviram o Sutra de Lótus e perceberam a Torre do Tesouro dentro de suas próprias vidas. Agora, os discípulos de Nitiren estão fazendo o mesmo. Nos Últimos Dias da Lei, não há outra Torre do Tesouro além dos corpos dos homens e mulheres que abraçam o Sutra de Lótus. Logo, aqueles que recitam o Nam-myoho-rengue-kyo, não obstante a posição social, são em si, o Buda Taho. Não há outra Torre do Tesouro além do Myoho-rengue-kyo. O Daimoku do Sutra de Lótus é a Torre do Tesouro, em outras palavras, a Torre do Tesouro é Nam-myoho-rengue-kyo. Agora, o corpo inteiro de Abutsu Shonin é composto de cinco elementos universais – terra, água, fogo, vento e kuu. Esses cinco elementos, também são os cinco caracteres do Daimoku. Portanto, Abutsu-bo é a Torre do Tesouro, e a Torre do Tesouro é o próprio Abutsu-bo. Nenhuma outra informação é importante. Esta é a Torre do Tesouro ornamentado com os sete tipos de jóias – ouvir o verdadeiro ensino, acredita no mesmo, manter o preceito, atingir a paz mental, praticar assiduamente, devotar-se altruisticamente, e buscar sempre o auto-aperfeiçoamento. O senhor pode pensar que ofereceu presentes à Torre do Tesouro do Buda Taho, mas isto não é verdade. O senhor os ofereceu a si mesmo. O senhor próprio é um Buda verdadeiro que possui as três propriedades iluminadas. Deve recitar o Nam-myohorengue-kyo com esta convicção. Então, o lugar onde vive e recita o Daimoku é o local da Torre do Tesouro. O sutra diz: "Onde quer que alguém ensine o Sutra de Lótus, esta minha Torre do Tesouro se elevará e surgirá diante dele". Uma fé como a sua é tão extremamente rara que inscreverei a Torre do Tesouro especialmente para o senhor. Jamais deve transferí-la a ninguém, exceto o seu filho. Jamais deve mostrá-la aos outros, a menos que eles possuam uma fé sólida. Esta é a razão do meu advento neste mundo. Abutsu-bo, o senhor merece ser chamado de líder dessa província do norte. Seria possível que o Bodhisattva Jogyo tivesse renascido neste mundo como Abutsu-bo e tivesse vindo me visitar ? Quão maravilhoso ! Está além da minha capacidade compreender a razão do senhor possuir tão pura fé. Deixarei isto ao Bodhisattva Jogyo quando ele surgir, pois ele possui o poder de saber essas coisas. Não estou dizendo tudo isto sem um bom motivo. Explicarei melhor posteriormente. Com meu profundo respeito, Nitiren 13 de março de 1271 (nono ano Bun’ei)

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Fundo de Cena Uma pergunta de Abutsu-bo sobre a Torre do Tesouro foi responsável por uma das cartas mais comovente escritas por Nitiren Daishonin. A Torre do Tesouro é um recurso metafórico empregado no Sutra de Lótus. O mesmo deixava Abutsu-bo perplexo. Nitiren Daishonin aproveitou a oportunidade para dar ao seu idoso discípulo um relance conciso e surpreendente da realidade da vida. Este gosho, datado de 13 de março de 1272, explana o significado da Torre do Tesouro em termos dos ensinos mais importantes do Sutra de Lótus. Nitiren Daishonin diz que a Torre do Tesouro confirma o ensino teórico de shakumon e, ao mesmo tempo, declara a realidade eterna do ensino essencial de honmon. Ele diz que o importante a ser percebido é a Torre do Tesouro deve ser descoberta no coração de cada ser humano. A cerimônia do Sutra de Lótus não foi um evento histórico durante o qual um santuário colossal inscrustado de jóias emergiu fisicamente do solo. A Torre do Tesouro simboliza uma cerimônia da vida, um emergir das profundezas do coração, o mais elevado estado de vida. Nitiren Daishonin escreve que a Torre do Tesouro é o Nam-myohorengue-kyo. Ele também adverte que a entidade da Torre do Tesouro jamais será encontrada além das vidas, dos homens e mulheres que abraçam este sutra e que recitam o daimoku. Abutsu-bo está, sem dúvida, entre os homens e mulheres que abraçam este sutra, e ele também é igual à Torre do Tesouro. Abutsu-bo é uma parte do universo e, deste modo, seu corpo físico é constituído pela mesma matéria de todas as outras elementos do universo. Nitiren Daishonin declara que Abutsu-bo é o microcosmo e a entidade do Nam-myoho-rengue-kyo. O sutra descreve sete espécies de jóias decorando a Torre do Tesouro. Contudo, como mostra Nitiren Daishonin, essas jóias não são símbolos da vasta riqueza material, mas de sete nobre aspectos humanos. Pelo fato de a Torre do Tesouro significar as pessoas que abraçam este sutra, as sete jóias da fé também existem nas vidas destas pessoas. Nitiren Daishonin diz que o próprio Abutsu-bo é um Buda verdadeiro. Seria um erro considerar isto um mero elogio. É filosofia, pois identifica a natureza e a identidade que os seres humanos possuem no âmago de seu ser. Chamando o Gohonzon de Torre de Tesouro, ele revela que a forma física do Gohonzon é uma representação exata da Cerimônia do Ar, durante a qual o Buda que existe desde o eterno passado revela a sua verdade suprema a toda a humanidade. Finalizando, Nitiren Daishonin solicita a Abutsu-bo que corresponda à confiança nele depositada como líder dos praticantes de Sado.

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Carta a Missawa (Missawa sho – Págs. 1489 a 1490) Além disso, sobre a questão da doutrina, a que revelei antes do exílio à Ilha de Sado, deve ser considerada apenas como um ensino provisório. Se o soberano deste país desejasse manter o seu domínio enquanto vivo, deveria convidar-me para um debate público com os bonzos da seita Shingon. Aí então, declararia a verdade profundamente importante, que ainda não revelei nem mesmo aos meus discípulos, para evitar que aqueles bonzos tomassem conhecimento dela, e caso isso acontecesse, eles, naturalmente, iriam evitar-me. Entretanto, após a noite de 12 de setembro de 1271, na iminente decapitação em Tatsunokuti, revelei uma importante doutrina aos discípulos que me seguem fielmente, em caráter confidencial, da Ilha de Sado. Embora essa doutrina estivesse na consciência dos grandes mestres e precursores do Budismo, após a morte de Sakyamuni, como Makakasho e Anan, Nagarjuna e Vasubandu, Tientai e Miao-lo, Guishin e outros, ninguém se atreveu a revelá-la. A razão disso é que o Buda proibiu expressamente, dizendo: "Após a minha morte, esta Grande Lei não deverá ser revelada enquanto não chegar a Era dos Últimos Dias da Lei". Nitiren, embora não seja o mensageiro indicado, uma vez que chegamos à Era dos Últimos Dias da Lei, e por sorte, percebendo este Ensino Supremo, estou proclamando-o como uma introdução à Doutrina, até que o sábio apareça. Entretanto, se vier à luz este Ensino Supremo, as doutrinas pregadas pelos mestres e sábios das Eras dos Primeiros e Médios Dias da Lei tornar-se-ão como as luzes das estrelas após o ressurgimento do Sol. Seria o mesmo que os aprendizes reconhecessem suas incompetências, uma vez reconhecida a técnica de um mestre arquiteto. Nessa ocasião, os benefícios que os bonzos dos templos e santuários das Eras dos Primeiros e Médios Dias da Lei vêm pregando, desaparecerão totalmente. Somente esta Grande Lei será propagada para toda a humanidade. O senhor, como outros que tiveram revelação cármica com esta Doutrina, devem sentir-se satisfeitos. Sobre a esposa de Utsubussa, que veio visitar-me apesar da idade avançada, fiquei penalizado com isso, contudo, recusei-me a encontrála para evitar a grave pena de adesão ao culto do padroeiro da vila, que ela visitara com intenção primária. Ela apenas passou por aqui para visitar-me aproveitando-se dessa viagem. A razão disso é que o Sutra de Lótus é o soberano, e tais deuses são meros subordinados. Mesmo quando encararmos pelo costume social, é imperdoável visitar o soberano aproveitando-se da viagem à procura de seu subordinado. Além disso, que se torna monja deve colocar o Buda em primeiro plano. Como havia vários inconvenientes, deixei de atendê-la. Não somente a ela, mas recusei também todos aqueles que aproveitaram-

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se da viagem de descanso nas fontes termais, para visitar-me. Ela possui a idade dos meus pais, por isso senti-me penalizado pelo seu desapontamento. Porém, deixei de encontrá-la para que ela pudesse compreender a razão da verdadeira conduta. Fundo de Cena Esta carta também é conhecida como "Sobre antes e depois de Sado", foi escrita em 23 de fevereiro de 1278, no Monte Minobu, quando Nitiren Daishonin contava com 57 anos de idade. Ela foi endereçada a Kojiro Missawa (outra fonte consta que esta escritura foi recebida por seu neto, Massahiro Missawa) e residente na atual província de Shizuoka. Pouco se sabe sobre Kojiro Missawa; tem-se conhecimento apenas que era um proprietário de terras na localidade chamada Missawa, próximo do Monte Fuji. Sendo um proprietário de terras, sofria represálias do governo japonês daquela época, assim, a sua tendência seria, naturalmente, a de distanciar-se de Nitiren Daishonin. Num trecho anterior desta mesma carta, Nitiren Daishonin ensina sobre a dificuldade de levar avante a prática do Verdadeiro Budismo. Utilizando-se das passagens do Sutra do Nirvana, afirma que são muitas as pessoas que praticam o Budismo mas, os que atingem a iluminação, são tão raros como grãos de areia que sobram sobre a unha. Revela ainda, que Nitiren Daishonin é a pessoa que está levando avante corretamente a difícil prática do Budismo e que, ele próprio, é o Buda Original dos Últimos Dias da Lei. Nesta parte, Nitiren Daishonin ensina a Grande Lei que possibilita a salvação de toda a humanidade nos Últimos Dias da Lei. Citando a senhora Utsubussa, Nitiren Daishonin elucida a maneira correta de como encarar a prática do Budismo.

A Essência do Capítulo Juryo (Juryobon Tokui Sho – Págs. 1210 a 1212) Quando o Lorde Sakyamuni expôs o capítulo Juryo, ele afirmou, referindo-se aquilo que todos os seres vivos haviam escutado nos ensinos pré-Sutra de Lótus e nos ensinos teóricos do Sutra de Lótus: "Todos os deuses, homens e ashuras deste mundo acreditam que, após ter deixado o palácio dos Sakyas, o Buda Sakyamuni sentou-se no local de meditação, não distante da cidade de Gaya, ele alcançou a iluminação suprema". 75

Esta afirmação mostra a idéia sustentada por todos os discípulos do Buda e pelos grandes bodhisattvas, desde a época em que ouviram Sakyamuni pregar seu primeiro sermão, no Sutra Kegon, até o período quando expôs o capítulo Anrakugyo do Sutra de Lótus. Encontramos duas deficiências nos ensinos pré-Sutra de Lótus. Primeiro: (conforme declara Miao-lo), "por ensinarem que os Dez Mundos são separados entre si, não conseguem ir além das doutrinas provisórias". Ou seja, não elucidou a teoria de Itinen Sanzen, nem o princípio de descartar o provisório e revelar o verdadeiro, ou a capacidade daqueles nos dois veículos de atingirem o estado de Buda, todos os quais estão implícitos na doutrina dos dez fatores declarada no capítulo Hoben do ensino teórico. Segundo: "Por ensinarem que Sakyamuni alcançou a iluminação pela primeira vez neste mundo deixam de descartar a condição provisória do Buda". Deste modo, não revelam a iluminação original do Buda, exposta no capítulo Juryo. Essas duas grandes doutrinas (a consecução do Estado de Buda pelas pessoas dos dois veículos e a iluminação do Buda) são o âmago dos ensinos da existência do Buda, o real coração e medula de todos os sutras. O ensino teórico afirma que as pessoas nos dois mundos, de shomon e engaku, podem atingir o Estado de Buda, invalidando, deste modo, uma das incorreções encontradas nos sutras expostos durante os primeiros quarenta e tantos anos de pregação do Buda. Contudo, como o capítulo Juro ainda não havia sido revelado, a verdadeira doutrina de Itinen Sanzen permaneceu obscura e a iluminação das pessoas nos dois veículos não estava assegurada. Nestes aspectos o ensino teórico não difere do reflexo da lua sobre a água ou de plantas sem raízes vagando nas ondas. O Buda também declarou: "Entretanto, homens de devota fé, o tempo desde que eu na realidade alcancei a iluminação – cem, mil, dez mil, cem mil, nayuta aeons – é ilimitado e infinito". Com esta simples proclamação, ele refutou, como sendo grandes falsidades, as palavras do Sutra Kegon, que mencionam "A primeira vez que alcançou o caminho"; o Sutra Vimalakirti, que exprime: "Pela primeira vez o Buda sentou-se sobre a árvore"; o Sutra Daijuku, que pronuncia: "Passaramse dezesseis anos desde que o Buda alcançou a iluminação pela primeira vez"; o Sutra Dainiti, que descreve a iluminação do Buda como algo ocorrido "há alguns anos, quando sentei-me no local de meditação", o Sutra Ninno, que se refere à iluminação do Buda como um acontecimento de ‘vinte e nove anos atrás’; o Sutra Muryogui, que atesta: "Previamente fui ao local de meditação", e o capítulo Hoben do Sutra de Lótus, que diz: "Quando sentei-me pela primeira vez no local de meditação". Quando chegamos ao capítulo Juryo do ensino essencial, a crença de que Sakyamuni atingiu o Estado de Buda pela primeira vez na Índia é 76

demolida e os efeitos (iluminação) dos quatro ensinos são identicamente refutados. Quando os efeitos dos quatro ensinos são demolidos, suas causas são igualmente demolidas. "Causas" neste contexto indicam a prática budista (para atingir a iluminação) ou o estágio dos discípulos dedicados à prática. Assim, as causas e efeitos, na forma exposta tanto nos ensinos pré-Sutra de Lótus como no ensino teórico do Sutra de Lótus, são extirpadas, e as causas e efeitos dos Dez Mundos no ensino essencial são revelados. Esta é a doutrina da causa original e do efeito original. A mesma ensina que os nove mundos estão todos presentes no Estado de Buda sem início, e que o Estado de Buda existe nos nove mundos sem início. Esta é a verdadeira possessão mútua dos Dez Mundos, os verdadeiros cem mundos e mil fatores, o verdadeiro Itinen Sanzen. Considerando-se esta perspectiva, é evidente que o Buda Vairochana sentado num pedestal de lótus, conforme descrito no Sutra Kegon, o Sakyamuni de cinco metros enunciado nos sutras Agon, e os outros Budas provisórios citados nos sutras Hodo, Hannya, Konkomyo, Amida e Dainiti não passam de reflexos do Buda do capítulo Juryo. Eles são como imagens fugazes da lua no céu espelhadas na superfície da água contida em vasos de vários tamanhos. Os versados sacerdotes e eruditos das muitas seitas em primeiro lugar confundem o significado dos sutras nos quais baseiam-se suas próprias doutrinas e, mais fundamentalmente, ignoraram o ensino exposto no capítulo Juryo do Sutra de Lótus. Como resultado, tomam, por engano, o reflexo da lua sobre a água pela lua real, que brilha no céu. Alguns deles entram na água e tentam agarrá-la com suas mãos, enquanto outros tentam laçála com uma corda. Conforme o Grande Mestre Tientai afirma: "Eles não sabem nada da lua no céu, e fitam apenas a lua no lago". Ele quer dizer que aqueles presos aos ensinos pré-Sutra de Lótus ou aos ensinos teóricos do Sutra de Lótus não têm ciência da lua brilhando no céu e vêem somente o seu reflexo no lago. O Shogui Ritsu também refere-se a quinhentos macacos que, saindo da montanha, avistam a lua refletida na água e tentam pegá-la. No entanto, como se trata apenas de um reflexo, eles caem na água e afogam-se. Essa escritura equipara os macacos a Devadatta e o grupo de seis monges (que viveram na época da existência do Buda). Se não fosse pela presença do capítulo Juryo entre todos os ensinos de Sakyamuni, estes seriam como o céu sem o sol e a lua, um reino sem rei, as montanhas e mares sem tesouros ou uma pessoa sem uma alma. Sendo assim, sem o capítulo Juryo, todos os sutras são sem sentido. A grama sem raízes morrerá rapidamente, e um rio sem uma fonte não fluirá a longas distâncias. Uma criança sem pais é desprezada. Nam-myoho-rengue-kyo, o coração do capítulo Juryo, é a mãe de todos os Budas de todas as dez direções e das três existências – passado, presente e futuro. Com meu profundo respeito, 77

Nitiren Décimo-sétimo dia do quarto mês. Fundo de Cena No gosho ‘Abertura dos Olhos’, Nitiren Daishonin estabelece uma comparação entre os ensinos provisórios e veradeiro do Budismo. Cada ensino do Buda revela alguns aspectos da verdade, mas todos os ensinos provisórios destinam-se fundamentalmente apenas a conduzir à verdade perfeita do Sutra de Lótus. Além disso, o amâgo do Sutra de Lótus é o ensino essencial ou catorze capítulos finais, especificamente, o capítulo Juryo (décimo-sexto), no qual a Lei Suprema encontra-se implícita. Conforme Nitiren Daishonin afirma, "a doutrina de Itinen Sanzen é encontrada somente num lugar, oculto na profundezas do capítulo Juryo do ensino essencial do Sutra de Lótus". Ele atribui a causa das misérias e desastres que devastam o Japão à confusão no Budismo e ao fato das pessoas não conseguirem reconhecer a supremacia do Sutra de Lótus. Nesta escritura, Nitiren Daishonin aponta o ensino supremo por intermédio de sucessivos níveis de comparação – a comparação por intermédio de sucessivos níveis de comparação – a comparação entre ensinos pré-Sutra de Lótus e o ensino teórico (primeira metade do Sutra de Lótus), e a comparação entre o ensino teórico e o ensino essencial (segunda metade do Sutra de Lótus). Ele cita duas razões pelas quais o Sutra de Lótus é supremo. Uma é que o ensino teórico revela que as pessoas nos estados de Shomon (Erudição) e Engaku (Absorção) podem alcançar a iluminação, uma possibilidade terminantemente negada nos catorze capítulos prévios da pregação do Buda Sakyamuni. As predições do ensino teórico, de que as pessoas dos dois veículos atingirão o Estado de Buda, fundamentam a possessão mútua dos Dez Mundos e o conceito de que o Estado de Buda é viável a todos. A segunda razão é que, no capítulo Juryo do ensino essencial, o Buda Sakyamuni desmente que tivesse alcançado a iluminação pela primeira vez na Índia, e revela a sua iluminação original do remoto passado – um tempo denominado Gohyaku Jintengo. Então, Nitiren Daishonin conclui declarando que o âmago do capítulo Juryo é o Nam-myoho-rengue-kyo, a Lei máxima que é a semente para se atingir o estado de Buda. Em contraste com o capítulo Hoben (segundo) do ensino teórico, que discute o estado de Buda como um potencial inerente na vida de todas as pessoas, o capítulo Juryo mostra o estado de Buda como uma realidade manifesta na vida de Sakyamuni e também revela a eternidade do mesmo, que se estende além de seu nascimento neste mundo. Neste capítulo, o Buda Sakyamuni indica a causa de sua iluminação original, dizendo: "Certa vez, eu também pratiquei as

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austeridades de bodhisattva…". Como resultado, ele alcançou o efeito – o estado de Buda – conforme proclama no mesmo capítulo: "Desde que atingi o estado de Buda, um período inimaginavelmente longo se passou". Ele também esclarece que, sempre, desde aquela época, tem estado aqui, neste mundo, pregando a Lei, surgindo como muitos diferentes Budas e usando vários nomes. Contudo, Sakyamuni não revelou a verdadeira causa que o capacitou a atingir o Estado de Buda no remoto passado de Gohyaku Jintengo. Concluindo, Nitiren Daishonin identifica a verdadeira causa, ou Lei fundamental, que habilita todos os Budas a obterem sua iluminação como sendo o Nam-myoho-renguekyo das Três Grandes Leis Secretas "oculto nas profundezas do capítulo Juryo do ensino essencial". Esta escritura é datado de 17 de abril, porém, o ano desta escritura e a identidade do seu recebedor são incertos. O seu conteúdo é bastante semelhante ao que Nitiren Daishonin escreveu sobre a importância do capítulo Juryo em ‘A Abertura dos Olhos’. Portanto, embora geralmente considere-se que tenha sido escrito em 1271, alguns acreditam que tenha sido completado após Nitiren Daishonin ter escrito o seu tratado, ‘A Abertura dos Olhos’, em 1272. De qualquer modo, esta escritura declara de maneira muito clara e concisa as comparações sucessivas entre o ensino pré-Sutra de Lótus, os ensinos teóricos e essencial do Sutra de Lótus, e o Budismo de Nitiren Daishonin.

Carta a Ko-no-Ama Gozen (Ko-no-ama Gozen Gosho – Págs. 1324 a 1325) Recebi trezentos mon de moedas da esposa de Abutsubo. Como ambas as senhoras possuem a mesma mente, peçam a alguém que leia esta carta e ouçam-nas juntas. Recebi o robe de verão sem forro que enviou-me aqui, nos recessos desta montanha da Vila Hakiri, na província de Kai, da distante província de Sado, onde mora. O capítulo Hosshi do quarto volume do Sutra de Lótus afirma: "Se houver alguém que, em sua busca pelo Caminho do Buda, juntar as palmas de suas mãos durante todo um kalpa e, em minha presença, louvar-me com incontáveis versos, obterá imensurável benefício devido a esse elogio ao Buda. Porém, aquele que louvar os sustentadores desse sutra terá benefícios que ultrapassam até mesmo aquele". Isto significa que o benefício de fazer

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oferecimentos a um devoto do Sutra de Lótus na era maléfica dos Últimos Dias da Lei supera o de servir com toda sinceridade um Buda tão nobre quanto Sakyamuni com o corpo, boca e mente durante a totalidade de um kalpa médio. Embora isto possa parecer inacreditável, não deve duvidar, pois são os ditos dourados do Buda. O Grande Mestre Miao-lo esclareceu mais amplamente esta passagem do Sutra, dizendo: "Se houver alguém que moleste (um pregador do Dharma), então a cabeça dele será partida em sete pedaços; se houver alguém que faça oferecimentos (ao pregador), sua boa sorte excederá a dos dez títulos honoríficos". Em outras palavras, o benefício de fazer oferecimentos a um devoto do Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei ultrapassa o de fazer oferecimentos a um Buda dotado com os dez títulos honoríficos. Por outro lado, aquele que perseguir um devoto do Sutra de Lótus na era impura terá a sua cabeça quebrada em sete pedaços. Eu, Nitiren, sou a pessoa mais afortunada do Japão. A razão porque digo isto é a seguinte: Deixando de lado os sete reinados dos deuses celestiais e estando a cinco reinados dos deuses da terra além do meu conhecimento, e considerando somente o decorrer dos noventa reinados desde a época do primeiro imperador humano, Jimmu, até o presente, ou durante os mais de setecentos anos desde o reinado do Imperador Kimmei (quando o Budismo foi introduzido neste país), ninguém foi tão universalmente odiado quanto Nitiren devido tanto a assuntos seculares como budistas. Mononobe no Moriya queimou templos e pagodes, e Kiyomori Nyudo mandou destruir os templos Todai-ji e Kofuku-ji, mas as pessoas de seus clãs não alimentaram ódio contra eles. Masakado e Sadato rebelaram-se contra a corte imperial, e o Grande Mestre Miao-lo provocou o antagonismo dos sacerdotes dos sete principais templos de Nara, mas esses homens não foram odiados pelos clérigos, freiras, leigos e leigas de todo o Japão. No meu caso, entretanto, pais, irmãos, mestres e colegas, sacerdotes – cada simples pessoa, do governante ao povo – tratam-me como se eu fosse inimigo de seus pais, e mostram-me mais hostilidades do que se eu fose um rebelde ou um ladrão. Deste modo, algumas vezes fui aviltado por várias centenas de pessoas e outras, assediado por milhares; fui atacado por vários milhares; fui atacado com espadas e bastões. Fui tirado de minha residência e banido de minha província. Finalmente, incorri por duas vezes no desagrado do regente, sendo exilado numa ocasião à Península de Izu e, na seguinte, à Ilha de Sado. Quando fui banido para Sado, no mar do norte, não tive nem provisões para sustentar-me, nem roupas tão grosseiras como as feitas com cipós de glicínios para cobrir o meu corpo. As pessoas lá, tanto sacerdotes como leigos, odiaram-se ainda mais do que os homens e mulheres da província de Sagami. Abandonando no isolamento e exposto à neve, mantive a minha vida comendo grama.

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Senti-me como se estivesse experimentando pessoalmente o sofrimento de Su Wu, que sobreviveu alimentando-se de neve enquanto viveu em cativeiro na terra dos bárbaros do norte por dezenove anos, ou Li Ling, que ficou preso numa caverna rochosa na praia da costa norte durante seis anos. Suportei essa provação não por causa de alguma culpa minha, mas unicamente pelo desejo de salvar todas as pessoas do Japão. Contudo, enquanto estive exilado naquele local, a senhora e seu marido, Ko Nyudo, evitando os olhos dos outros, trouxeram-me alimentos à noite. Ambos os senhores estavam prontos a darem suas vidas em meu benefício, sem temer a punição por parte das autoridades da província. Portanto, embora a vida em Sado fosse severa, relutei em partir, sentindo-me como se o meu coração estivesse sendo deixado para trás, e eu parecia ser atraído para trás a cada passo que dava. Tento imaginar que laços cármicos formamos no passado. Exatamente quando estava ponderando o quanto isto era misterioso, a senhora enviou-me o seu preciosíssimo marido, como seu mensageiro, a esse distante lugar. Pensei ser um sonho ou uma ilusão. Apesar de não poder vê-la, estou certo que o seu coração permanece aqui, comigo. Todas as vezes para ansiar ver-me, olhe para o sol que se eleva de manhã e para a lua que surge à noite. Estarei invariavelmente refletidoo no sol e na lua. Na próxima existência, encontremo-nos na terra pura do Pico da Águia. Nam-myoho-rengue-kyo. Nitiren, Décimo-sexto dia do sexto mês. Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta no Monte Minobu, em 16 de junho de 1275, a mulher chamada Ko-no-ama, que morava no centro do governo da província da Ilha de Sado. Ko significa seção provincial. Enquanto Nitiren Daishonin esteve exilado em Sado, Ko-no-ama converteu-se a seus ensinos. Ela e seu marido, Ko Nyudo (Nyudo indicando sacerdote leigo) fizeram oferecimentos e ajudaram a protegê-lo. Após Nitiren Daishonin ter sido perdoado e deixar Sado, Ko Nyudo, assim como Abutsubo, empreenderam a longa jornada até Minobu para visitá-lo, Nitiren Daishonin menciona a visita de Ko Nyudo a ele em Minobu num Gosho intitulado ‘Resposta a Ko Nyudo’, data de abril de 1275. Como esta presente carta data de junho, uma explanação defende que possa ter sido escrita em 1274, ao invés de 1275.

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Em primeiro de novembro de 1271, Nitiren Daishonin foi levado a Tsukahara, o local inicial de seu exílio na Ilha de Sado. O seu abrigo era um santuário em ruínas chamaado Sanmai-do, o meio de um cemitério. O mesmo era exposto ao vento, e a neve caía através das enormes fendas no teto. Nitiren Daishonin permaneceu lá aproximadamente meio ano, tempo durante o qual escreveu ‘A Abertura dos Olhos’ e outras importantes obras. Então, foi transferido para a residência de Itinosawa Nyudo em Itinosawa. Enquanto esteve em Sado, conseguiu muitas conversões, inscreveu o Gohonzon para praticantes em particular e escreveu um grande número de valiosas cartas e tratados. Em 8 de março de 1274, um oficial do governo chegou à Ilha de Sado com uma ordem de perdão e Nitiren Daishonin retornou a Kamakura em 26 de março. Após a sua terceira repreensão ao governo, retirou-se a Minobu, onde devotou-se no asseguramento da transmissão correta de seus ensinos à prosperidade. Incumbido de transportar os presentes, um robe de verão, de sua esposa, e trezentos mon de moedas, de Senniti-ama, Ko Nyudo transpôs a longa distância para visitar Nitiren Daishonin em Minobu. Nesta carta, ele expressa sua consideração por essas doações, e explica o grande benefício de se fazer oferecimentos ao devoto do Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei, citando uma passagem do capítulo Hosshi (décimo) do Sutra. Em sequência, descreve as adversidades que suportou, especialmente em Sado, em prol do budismo, e expressa sua gratidão a Ko-no-ama e Ko Nyudo, que o protegeram mesmo diante do risco de suas vidas.

O Oferecimento de um Robe de Verão (Sajiki Nyobo Gohenji – pág.1231) A mulher é como a água que assume a forma de seu recipiente. A mulher é como a flecha, que se ajusta ao arco. A mulher é como o navio, que é guiado por seu leme. Portanto, a mulher tornar-se-á ladra se o seu marido for um ladrão, e ela tornar-se-á uma rainha se o seu marido for um rei. Se ele for um homem de virtude (que possui fé na Verdadeira Lei), ela tornar-se-á um buda. Não apenas nesta vida, mas também na próxima, a sua sina será determinada por seu marido. Hyoe no Saemon é um devoto do Sutra de Lótus. 82

Pelo fato de ser a esposa dele, não obstante o que possa acontecer, o Buda a reconhecerá como uma mulher do Sutra de Lótus. Além disso, a senhora ativou a fé espontaneamente, e enviou-me este robe de verão em prol do Sutra de Lótus. Há dois tipos de devotos do Sutra de Lótus: santos e mortais comuns. O santo despe-se de sua pele e usa-a para transcrever a palavra de um Sutra. Se o mortal comum oferece o seu único robe ao devoto do Sutra de Lótus, então, o Buda aceita-o como igual à pele que o santo removeu. O seu robe de verão foi oferecido aos Budas dos 69.384 caracteres que compõem o Sutra de Lótus. Deste modo, equivale a 69.384 robes. E, como cada um desses 69.384 Budas abrangem todos os 69.834 caracteres do Sutra, é como se tivesse oferecido essa quantidade de robes a cada um deles. Para ilustrar, suponha um vale de mil ri quadrados coberto com espessa grama. Quando uma pequena centelha do tamanho de um feijão é colocada sobre uma simples folha de capim, o incêndio espalha-se por todo o campo num instante, fazendo irromper um imensurável e ilimitado lençol de fogo. O mesmo é o caso deste robe. Embora seja apenas um, foi oferecido aos Budas de todos os caracteres do Sutra de Lótus. Esteja firmemente convicta de que os benefícios deste oferecimento estender-se-ão aos seus pais, seus avós e um número incontável de outras pessoas, a ainda o marido que a senhora ama com tanto afeto. Nitiren Vigésimo-quinto dia do quinto mês Fundo de Cena Em 25 de maio de 1275, Nitiren Daishonin escreveu esta carta, em Minobu, a Sajiki Nyobo, uma de suas seguidoras, que vivia em Kamakura. Afirma-se que Sajiki Nyobo tenha sido a esposa de Indo Saburo Zaemon Sukenobu, um irmão mais velho de Ben Ajari Nissho, um dos seis discípulos seniores de Nitiren Daishonin. Há pouquíssimos dados seguros a respeito dela. Por volta da primavera, Sajiki Nyobo gentilmente confeccionou um robe para Nitiren Daishonin vestir no verão. Nessa época, ele estava morando num eremitério no isolamento do Monte Minobu, sofrendo muitas privações. Nesta carta, Nitiren Daishonin explana o significado e benefício do oferecimento, e elogia a fé nutrida por Sajiki Nyobo. O parágrafo inicial reflete aspectos da sociedade feudal do Japão, na qual a mulher possuía pouca independência e sua sorte era amplamente determinada pelo marido. Nitiren Daishonin afirma que Sajiki Nyobo, por abraçar o Sutra de Lótus poderá atingir o estado de 83

Buda. Contudo, o que ele mais louva, é a fé sincera que a moveu espontaneamente a oferecer-lhe um robe. Em seguida, ele expõe dois tipos de devotos do Sutra de Lótus: santos, tais como os descritos nos sutras e mortais comuns. Apesar da expressão de dedicação dos dois possa diferir, os benefícios recebidos serão os mesmos. Finalmente, Nitiren Daishonin explica que uma vez que todos os Budas originam-se do Sutra de Lótus, o robe de Sajiki Nyobo, foi na realidade, oferecido a todos eles, e os benefícios dela serão, correspondentemente, grandes.

O Remédio Benéfico para todas as Doenças (Myoshin-ama Gozen Gohenji, pág. 1479 a 1480)

Recebi o seu presente de duas cestas de caqui curtido e uma cesta de berinjelas. Com respeito à doença do sacerdote leigo, seu marido: na China existiram os médicos chamados Huang Ti e Pien Chueh, e na Índia houve os doutores Jisui e Jivaka. Esses homens foram, cada qual, os tesouros de sua época e mestres dos médicos das épocas posteriores. Entretanto, eles jamais poderiam ser comparados à pessoa chamada Buda, um médico sem par. Esse Buda revelou o remédio da imortalidade: os cinco caracteres do Myoho-rengue-kyo. Além disso, ele ensinou que esses cinco caracteres são o ‘remédio benéfico para as doenças de todas as pessoas de Jambudvipa. O seu marido é uma pessoa do Japão, que está contido dentro de Jambudvipa, e agora sofre de um mal corporal. Contudo, a passagem do Sutra de refere claramente ao remédio benéfico para todas as doenças. Ademais, esse Sutra de Lótus é o maior de todos os remédios. Um soberano perverso chamado Rei Virudhaka matou mais de quinhentas mulheres do clã do Buda, e em consequência disso o Buda enviou a seu discípulo Ananda ao Pico da Águia para obter a flor de lótus azul. Quando ele encostou nos corpos das mulheres, elas retornaram à vida, e depois de uma semana, renasceram no Céu Trayastrimsha. Pelo fato de a flor denominada lótus ser dotada de tão esplêndida virtude, o Buda comparou-a à Lei Mística. A morte de uma pessoa não ocorre necessariamente através de uma doença. Em nossa própria época, as pessoas de Iki e Tsushima, embora não sofressem de algum mal, foram todas massacradas pelos mongóis de uma só vez. Do mesmo modo, essa doença de seu marido não implica necessariamente em morte. Agora, essa doença de seu marido pode ser devido ao desígnio do Buda, pois tanto o Sutra Vimalakirti

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como o Nirvana falam de pessoas doentes atingindo o estado de Buda. Da doença surge a mente que busca o caminho. Entre todas as doenças, os cinco pecados cardeais, a descrença incorrigível do icchantika e a calúnia à Lei são as graves moléstias que essencialmente afligiam o Buda. As pessoas do Japão de hoje, sem nenhuma exceção, afligem-se com a mais séria de todas as doenças, o grave mal da grande calúnia. Refiro-me aos seguidores das seitas Zen, Nembutsu e Ritsu, e aos mestres da Shingon. Precisamente pelo fato de a doença dele ser tão séria, eles próprios não a reconhecem nem os outros têm consciência dela. E, como este mal está piorando, guerreiros de todos os quatro mares atacarão a qualquer momento e o soberano, seus ministros e o povo, serão todos destruídos. Ver isto com os seus próprios olhos é realmente algo doloroso. Em sua vida presente, o sacerdote leigo, seu marido, não parece ter tido uma fé particularmente forte no Sutra de Lótus. Porém, agora que as forças do carma acumulado no passado o levaram a sofrer essa longa enfermidade, ele busca o Caminho dia e noite sem parar. Quaisquer ofensas menores que ele possa ter cometido nesta existência já devem ter sido, seguramente, erradicadas, e em virtude de sua dedicação ao Sutra de Lótus, o grande mal de sua calúnia no passado também será dissipado. Se ele tivesse de ir nesse instante ao Pico da Águia, sentiria uma alegria tão grande quanto se o sol tivesse surgido e iluminado todas as dez direções, e ele se veria muito contente, pensando como uma morte prematura poderia ser algo tão feliz. Não obstante o que possa acontecer a ele na estrada entre esta vida e a próxima, ele deve declarar-se um discípulo de Nitiren. Fazendo uma analogia, embora o Japão seja um pequeno país, se alguém simplesmente anunciar que é um vassalo do lorde de Sagami, merecerá inquestionável reverência. Eu, Nitiren, sou o sacerdote mais recalcitrante no Japão, mas com respeito à minha fé no Sutra de Lótus, sou o sábio mais importante do mundo inteiro. O meu nome alcançou as terras puras das dez direções, e o céu e a terra com certeza sabem disso. Se o seu marido declarar que é discípulo de Nitiren, nenhum demônio mau provavelmente poderá clamar ignorância sobre o nome. Não tenho palavras para expressar meus agradecimentos por sua sinceridade em enviar oferecimentos em muitas ocasiões. Com meu profundo respeito Os macacos contam com as árvores, e os peixes dependem da água. A senhora, como mulher, depende do seu marido. Por não desejar se separar dele, a senhora tosou seus cabelos e tingiu de preto as mangas do seu robe. Como o Buda das dez direções poderiam não sentir pena da senhora ? Nem o Sutra de Lótus jamais poderia abandoná-la. Acreditando nisto, deve confiar-se ao mesmo. Nitiren, 85

Em 16 de agosto Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta no Monte Minobu a Myoshin-ama, incentivando-a em vista da enfermidade crítica de seu marido. Acredita-se geralmente que tenha sido redigida em 1278. Detalhes sobre Myoshin-ama não são claros. Uma interpretação a identifica como a esposa de Takahashi Rokuro Hyoe Nyudo, o que a tornaria uma tia de Nikko Shonin. Outras teorias também foram sugeridas. De qualquer forma, ela morava no distrito Fuji, na província de Suruga e tinha se tornado uma seguidora de Nitiren Daishonin. A doença prolongada do marido a levou a tomar os votos como uma freira budista. O marido dela, no final, faleceu dessa doença, deixando sua esposa com uma criança pequena. Myoshin-ama manteve a sua fé após a morte de seu marido e visitou com frequência Nitiren Daishonin no Monte Minobu para levar-lhe oferecimentos. Nesta carta, respondendo ao relato de Myoshin-ama sobre a enfermidade do seu marido, Nitiren Daishonin cita uma passagem do capítulo Yakuo do Sutra de Lótus: "Este Sutra é o remédio benéfico para as doenças de todas as pessoas de Jambudvipa", e declara que nenhum remédio supera os cinco caracteres do Myoho-rengue-kyo. Este pode curar não somente os males físicos, mas também a muito mais séria calúnia contra a Lei Mística. Ele também encoraja Myoshinama a ver a doença de seu marido como uma manifestação da benevolência do Buda, pois o habilitou a despertar uma determinação que ele anteriormente não possuía. Nitiren Daishonin explica que por causa da sinceridade da fé recentemente despertada por seu marido, ele certamente conseguirá erradicar o mau carma de seus delitos, e mesmo que ele estivesse para morrer agora, iria experimentar a ilimitada alegria da Lei que transcende tanto a vida como a morte. Em seguida, Nitiren Daishonin prossegue, se ele for desafiado por qualquer coisa ameaçadora ou terrível em sua jornada entre a morte e o renascimento, deve simplesmente declarar que é discípulo de Nitiren, e com certeza será protegido. Nitiren Daishonin conclui louvando calorosamente Myoshin-ama por sua fé e reafirmando-lhe a proteção do Sutra de Lótus.

Resposta a Ni Ama (Ni Ama Gozen Gohenji – págs. 904 a907)

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Recebi um saco de algas marinhas secas enviadas pela senhora. Gostaria também de expressar meus agradecimentos pelo oferecimento de algas marinhas secas de O-ama Gozen. Este local é chamado de pico de Minobu. A província de Suruga fica ao sul, e são de cem léguas desde o litoral de Ukishima-ga-hara, naquela província, até este pico na vila Hakiri, na província de Kai. O caminho é dez vezes mais difícil do que numa estrada comum. O rio Fuji, o mais rápido de todo o Japão, corre do norte ao sul. Altas montanhas levantam-se a leste e a oeste deste rio, formando profundos vales, onde rochas imensas erguem-se em todos os lugares como elevados biombos. As águas do rio correm atravé do vale tão velozmente quanto uma flecha atirada através de um tubo por um forte arqueiro. O senhor precisa viajar ao longo das margens dos rios ou cruzar a corrente. O rio é tão veloz e cheio de pedras que um barco é frequentemente esmagado nas corredeiras. Através dessa perigosa trilha, chega-se então a uma grande montanha chamada pico de Minobu. Ao leste encontra-s o pico de Tenshi; ao sul, Takatori; a oeste, Shitimen, e ao norte, Minobu, e erguem-se tão altamente como se fossem quatro imensos biombos colocados de pé. Subindo por esses picos, vê-se abaixo uma vasta fileira de florestas, enquanto que, descendo aos vales, encontram-se imensas rochas colocadas lado a lado. O uivo dos lobos enche as montanhas, o guincho dos macacos ecoa pelos vales, os veados chamam melancolicamente as corças, e o barulho das cigarras soa estridentemente. Aqui, as flores da primavera florescem no verão, enquanto que as árvores dão frutos de outono no inverno. Ocasionalmente vê-se um lenhador juntando lenha e meus raros visitantes são antigos amigos. O monte Shang, na China, onde os Quatro Reclusos de Cabelos Brancos retiraram-se do mundo, e os profundos recessos das montanhas onde as Sete Sumidades da Floresta de Bambus se retiraram devem ter sido lugares como este. Subindo pelo pico, dá-se a impressão de que algas crescem ali, mas encontra-se somente um matagal extenso de samambaias. Descendo aos vales, certamente o senhor pensaria que outras algas marinhas estivessem ali crescendo, mas não há nada mais que uma densa mata de salsa. Embora desde há tempo não tenha mais pensado sobre minha terra natal, as algas me trazem lembranças triviais, deixando-me triste. É a mesma espécie de alga que via há muito tempo atrás na praia, em Katsumi, Itikawa e Kominato. Sinto um ressentimento injustificado porque a cor, forma e o gosto dessa alga permanecem imutáveis, enquanto que meus pais faleceram, e não posso conter as lágrimas. Basta. A senhora pediu-me para inscrever o Gohonzon para O-ama Gozen, mas encontro problemas em seu pedido.

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A razão é como segue. Este Gohonzon jamais foi inscrito por qualquer dos muitos estudiosos budistas que viajaram da Índia à China ou pelos bonzos que viajaram da China à Índia. Todos os objetos de adoração já consagrados nos templos em toda a Índia estão descritos sem exceção no Registro das Regiões Ocidentais, A Vida de Hsuan-chang, e Registro da Transmissão da Luz ( e este Gohonzon não está incluído entre eles). Nem pode ser encontrado entres os objetos de adoração dos vários templos, inscritos pelos sábios que viajaram da China ao Japão ou pelas sumidades que foram do Japão à China. Como todos os registros dos primeiros templos no Japão como o Gangoji e Shitennoji, assim como dos outros templos são mantido sem omissão em muitas histórias, começando com as Crônicas do Japão, os objetos de adoração desses templos são bem conhecidos, mas este Gohonzon jamais foi incluído entre eles. As pessoas podem dizer, sem dúvida: "Provavelmente não foi exposto nos sutras ou tratados. Eis porque as muitas sumidades não os pintaram e nem fizeram imagens dele". Eu digo que, como existem os sutras, aqueles que assim duvidam devem examinar se está ou não revelado nos sutras. É incorreto acusar este objeto de adoração meramente por não ter sido nunca pintado ou esculpido em épocas anteriores. Como exemplo, o Buda Sakyamuni certa vez subiu ao céu Tushita para cumprir obrigações para com sua mãe. Mas ninguém, em todo o mundo, com exceção do honorável Maudgalyayana, estava ciente disso, devido aos poderes sobrenaturais do Buda. Assim, mesmo que o Budismo exista, as pessoas não o perceberão se lhes faltar a capacidade adequada, e nem ele se propagará se a época não for adequada. Isso está de acordo com a lei natural, assim como ocorre o fluxo e o refluxo da maré no oceano e a lua no céu diminui e cresce com o tempo. O lorde Sakyamuni acalentou este Gohonzon em sua mente desde o remoto passado de Gohyaku-Jintengo mas, mesmo depois de aparecer neste mundo, ele não o expôs durante mais de quarenta anos após sua iluminação. Mesmo no Sutra de Lótus, ele não fez alusão ao mesmo nos capítulos prévios. Somente no capítulo Hoto (décimo-primeiro), ele começou a indicá-lo. Ele o revelou no capítulo Juryo e concluiu a sua explanação nos capítulo Jinriki e Zokurui. Bodhisattvas como Monju, do Mundo Dourado; Miroku, do Céu Tushita; Kannon, do Monte Potalaka, e Yakuo que assiste o Buda Nitigatsujomyo-toku disputaram entre si para solicitar (ao Buda que os permitisse propagar a fé no Gohonzon nos Últimos Dias da Lei), mas o Buda recusou. Aqueles bodhisattvas eram renomados como homens de excelente sabedoria e profundo conhecimento, mas como haviam começado há pouco tempo a ouvir o Sutra de Lótus, seus conhecimentos eram ainda limitados. Assim, não seriam capazes de suportar as grandes dificuldades dos Últimos Dias. 88

Então, o Buda declarou: "Existem os meus verdadeiros discípulos, que ocultei no fundo da terra desde o remoto passado de GohyakuJintengo. Eu o confiarei a eles". Assim dizendo, o Buda convocou aqueles bodhisattvas liderados por Jogyo, no capítulo Yujutsu, e confiou-lhes os cinco caracteres do Myoho-rengue-kyo, o coração do ensino essencial do sutra. Então, o Buda afirmou: "Os senhores não deverão propagá-lo no primeiro milênio dos Primeiros Dias da Lei ou no Segundo Milênio dos Médios Dias após meu falecimento. No começo dos Últimos Dias da Lei, monges caluniadores povoarão o mundo todo, e assim, os deuses celestes ficarão irados e cometas aparecerão no céu e a terra tremerá como o movimento das enormes ondas. Inumeráveis desastres e calamidades como seca, incêndios, enchentes, furacões, epidemias, fome e guerra. Serão tomados seus arcos e bastões e, como nenhum dos Budas, bodhisattvas ou divindades benevolentes poderá ajudá-los, eles todos morrerão e cairão como chuva no inferno dos incessantes sofrimentos. Nesse exato momento, reis poderão salvar seus países e o povo escapará das calamidades se abraçarem e crerem neste grande mandala dos cinco caracteres (do Myoho-rengue-kyo). No futuro, suas vidas não cairão nos grandes fogos do inferno dos incessantes sofrimentos". Agora, eu, Nitiren, não sou o Bodhisattva Jogyo, mas, talvez por seu desígnio, atingi o conhecimento geral desse ensino, e vim ensinando-o por estes vinte e poucos anos. Quando uma pessoa decide propagá-lo, encontrará dificuldades, conforme afirma o sutra: "Como o ódio e a inveja proliferam mesmo durante a existência do Buda, quão pior será no mundo após seu falecimento?", e "O povo estará repleto de hostilidade e será extremamente difícil de acreditar". Dos três tipos de poderosos inimigos preditos no sutra, o primeiro indica o governante do estado, administradores de condados e vilas, e lorde de feudos, assim como o povo comum. Acreditando nas acusações dirigidas pelo segundo e terceiro tipos de inimigos, que são sacerdotes, eles irão difamar, caluniar ou atacar o devoto do Sutra de Lótus com espadas e bastões. A vila Tojo, na província de Awa, embora localizada em local remoto, bem poderia ser denominada centro do Japão, porque a Deusa do Sol reside ali. Nos tempos antigos, ela viveu na província de Isse. Mais tarde, o imperador passou a ter profunda fé no Bodhisattva Hatiman e no Relicário Kamo, negligenciando a Deusa do Sol, deixando-a irada. Naquele tempo, Minamoto no Yoritomo escreveu um compromisso e ordenou a Aoka no Kodayu que a consagrasse no Relicário Externo de Isse. Talvez por ter assim satisfeito o desejo de deusa, Yoritomo tornou-se shogun e governou todo o Japão. Ele decidiu então que o Condado de Tojo se tornasse a residência da Deusa do Sol, e assim ela deixou de residir na província de Isse, mudando-se para a província de Awa. É como o Bodhisattva Hatiman que, nos tempos antigos, residiu em Dazaifu, na província de Tikuzen, mas que depois residiu em 89

Otokoyama, na província de Yamashiro, e que agora está em Tsurugaoka, em Kamakura, na província de Sagami. Nitiren começou a propagar o verdadeiro ensino no condado Tojo, na província de Awa, no Japão, dentre todos os locais do mundo inteiro. Assim, o administrador do condado tornou-se meu inimigo, mas agora está quase arruinado. O-ama Gozen é insincera e tola. Ela foi ainda indecisa, ora acreditando, ora renunciando à sua fé. Quando Nitiren incorreu no desagrado do governo, ela rapidamente rejeitou o Sutra de Lótus. Eis porque, mesmo antes, eu lhe disse: "O Sutra de Lótus é extremamente difícil de compreender e extremamente difícil de acreditar, sempre que nos encontrávamos. Se eu lhe conceder o Gohonzon por estar em débito com ela, as Dez Deusas certamente julgarão que sou um bonzo bastante parcial. Se eu seguir o sutra e não lhe conceder o Gohonzon devido à sua falta de fé, não serei parcial, mas ela poderá alimentar ódio contra mim, porque não compreende o seu erro. Eu expliquei os motivos da minha recusa detalhadamente numa carta a Suke no Ajari. Por favor, mande buscar a carta e mostre a ela. A senhora é do mesmo clã que O-ama Gozen, mas sua fé é mais profunda. Como a senhora enviou-me doações com frequência, tanto em Sado como aqui em Minobu, e como seu sincero espírito de fé parece não diminuir, eu lhe concederei o Gohonzon. Mas ainda me preocupo se a senhora conservará sua fé até o fim, e sinto-me como se estivesse caminhando sobre gelo fino ou encarando uma espada desembainhada. Eu lhe escreverei novamente com mais detalhes. Quando incorri no desagrado do governo, mesmo em Kamakura, novecentos e noventa e nove dentre mil abandonaram a fé, mas como o conceito popular contra mim está agora amenizado, alguns deles parecem estar arrependidos. Eu não incluo O-ama Gozen entre aquelas pessoas, e sinto profundamente por ela, mas não posso mais contratar o Sutra de Lótus na medida em que a carne substitui os ossos. Por favor, explique-lhe completamente porque não posso atender ao seu pedido. Em 16 de fevereiro de 1275 Nitiren Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta em 16 de fevereiro de 1275, no ano imediato após retornar de Sado e retirar-se no monte Minobu. Ele havia acabado de completar os cinquenta e quatro anos de idade. Esta

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carta foi uma resposta a um pedido de Ni-ama Gozen e de sua sogra Oama Gozen, pedindo que lhes inscrevesse o Gohonzon. O-ama Gozen havia sido a esposa do lorde Nagoe, detentor das terras que incluíam o condado de Tojo, onde nasceu Nitiren Daishonin (Tojo era inicialmente o nome de uma vila, mas depois tornou-se um condado. Eis porque, neste Gosho, Nitiren Daishonin refere-se ao mesmo tanto como uma vila ou um condado). Tanto Ni-ama Gozen como O-ama Gozen eram viúvas e viviam juntas em Tojo. A família de Daishonin estava aparentemente em dívida com O-ama Gozen por algum favor que ela lhe havia estendido. Certa vez, quando Tojo Kaguenobu, o administrador da mesma área, pressionou o lorde numa tentativa de trazer o templo Seitioji sob seu controle, Daishonin lutou em nome do lorde a fim de retribuir a gratidão e desafiou a tentativa de Kaguenobu. A inimizade que o administrador alimentou contra Daishonin naquela ocasião é considerada como uma das razões da Perseguição de Komatsubara, em 1264, quando Tojo Kaguenobu emboscou Daishonin e alguns de seus crentes. O-ama Gozen havia começado a praticar o Budismo de Nitiren Daishonin. Entretanto, conforme indica a carta, ela não foi persistente e abandonou sua fé quando Nitiren Daishonin foi preso e exilado à ilha de Sado em 1271. Entretanto, quando ele foi perdoado e retirou-se ao monte Minobu três anos depois, ela arrependeu-se do seu ato e voltou à fé, pedindo-lhe que inscrevesse um Gohonzon. Embora ele tivesse aparentemente ficado em dúvida à sua gratidão pessoal a ela, Daishonin recusou o pedido com base na visão rigorosa do Budismo, concedendo o Gohonzon somente a Ni-ama Gozen. Este escrito contém duas partes principais. Na primeira parte, Nitiren Daishonin agradece a Ni-ama Gozen pelo oferecimento de algas secas de sua terra natal. Ele descreve a isolação de sua vida no monte Minobu e a nostalgia evocada pelo gosto das algas secas enviadas da sua terra natal. A segunda parte é a sua resposta à solicitação, de Ni-ama Gozen e Oama Gozen, do Gohonzon. Primeiramente, ele explica o porquê do Gohonzon ser tão precioso e digno de respeito, tanto em termos da história do Budismo como dos ensinos do Sutra de Lótus. Ele ainda demonstra que precisou enfrentar perseguições para introduzir a verdadeira fé ao povo, empreendendo a tarefa do Bodhisattva Jogyo que foi encarregado pelo Buda Sakyamuni da missão da propagação no Últimos Dias da Lei. Na conclusão, ele diz a Ni-Ama Gozen que lhe conferirá o Gohonzon devido ao seu sincero espírito de fé, mas que não pode fazer o mesmo com O-Ama Gozen apesar dos seus sentimentos pessoais, porque a sua fé é ainda instável.

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Três Mestres Tripitaka oram por chuva (San Sanzo Kiu no Koto – Págs. 1468 a 1469) Quando se transplanta uma árvore, mesmo que ventos violentos possam soprar contra ela, esta não tombará se possuir um firme suporte para sustentá-la. Porém, mesmo uma árvore que tenha crescido no local adequado poderá cair, caso suas raízes sejam fracas. Mesmo uma pessoa de pouca coragem não tropeçará , se aqueles que a apóiam são fortes, enquanto que uma pessoa de considerável força de caráter, se deixada completamente só, pode cair nos caminhos do mal. Se o Buda não tivesse feito o seu advento nesse nosso grande sistema de mundos, então com a exceção de Sharihotsu e o venerável Kashyapa, todas as pessoas cairiam nos três maus caminhos. Contudo, pelos forte laços formados através de confiar no Buda, um grande número de pessoas pode atingir o estado de Buda. Mesmo pessoas perversas como o Rei Ajatashatru ou Angulimala, que ninguém esperava que algum dia conseguissem alcançar a iluminação, mas sim que cairiam no inferno Aviti, encontrando o grande homem, Sakyamuni, o lorde dos ensinos, puderam atingir o estado de Buda. Portanto, o melhor modo para se atingir o estado de Buda é encontrar um zentishiki, ou um bom amigo. Até onde a sabedoria do próprio indivíduo pode levá-lo ? Se uma pessoa possuir mesmo que somente a sabedoria suficiente para distinguir o quente do frio, ela deve procurar um bom amigo. Entretanto, encontrar um bom amigo é a coisa mais difícil possível de acontecer. Assim, o Buda comparou isto á raridade de uma tartaruga de um só olho achar um tronco de sândalo flutuante com uma concavidade do tamanho exato para retê-la, ou à dificuldade de se tentar abaixar uma linha do Céu Brahma e passá-la pelo buraco de uma agulha na Terra. Além disso, nessa maléfica era posterior, maus companheiros são mais numerosos que as partículas de poeira que formam a terra, enquanto que o número de bons amigos é menor do que a quantidade de terra que uma pessoa consegue amontoar sobre a unha.

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O Bodhisattva Kanzeon do Monte Potalaka agiu como um bom amigo para Zenzai Doji. Porém, embora ele tenha revelado o ensino específico e perfeito, ele não revelou-lhe o ensino puro e perfeito. O Bodhisattva Jotai vendeu-se como um oferecimento em sua busca por um bom mestre, em consequência do que, encontrou o Bodhisattva Donmukatsu. No entanto, ele somente aprendeu dele, as três doutrinas dos ensinos de ligação, específico e perfeito, e não recebeu instrução do Sutra de Lótus. Sharihotsu agiu como um bom amigo para um ferreiro e instruiu-o durante um período de noventa dias, mas conseguiu somente torná-lo uma pessoa de descrença incorrigível. Purna discursou sobre a doutrina budista por um espaço de todo um retiro de verão, mas ensinou sutras Hinayana a pessoas que possuíam capacidade para as doutrinas Mahayana e, desse modo, transformouas em adeptos do Hinayana. Desta forma, até mesmo grandes santos (tais como Kanzeon e Donmukatsu) não tinha permissão para pregar o Sutra de Lótus, e mesmo arhats que haviam obtido o fruto da emancipação (tais como Sharihotsu e Purna) nem sempre eram capazes de medir a capacidade das pessoas corretamente. Esses exemplos devem ser lembrados ao se julgar os eruditos nessa última era, a época maléfica em que nós vivemos. É muito melhor ser uma pessoa má que não aprende absolutamente nada do Budismo do que depositar fé em tais homens, que declaram que o céu é a terra, e o leste é o oeste e que o fogo é a água, ou afirmam que as estrelas são mais brilhantes que a lua ou que os montículos de terra das entradas dos formigueiros são mais altos do que o Monte Sumeru. Para julgar o valor das doutrinas budistas, eu, Nitiren, acredito que os melhores padrões são os da razão e da prova documental. E, mais valioso que a razão e a prova documental são as provas do fato real. No passado, por volta do quinto ano da era Bun’ei (1268), quando os bárbaros de Ezo rebelaram-se no leste e os enviados mongóis chegaram do oeste com suas exigências, eu presumi que aqueles eventos ocorreram porque as pessoas não depositam fé nas doutrinas budistas verdadeiras. Imaginei que rituais de oração certamente seriam realizados para subjugar o inimigo, e que esses ritos seriam dirigidos pelos sacerdotes da seita Shingon. Dentre a Índia, a China e o Japão, por enquanto deixarei a Índia de lado. Mas tenho a certeza de que o Japão, assim como a China será destruído pela seita Shingon. O mestre do Tripitaka Shan-wu-wei viajou da Índia para a China no reinado do Imperador Hsuan-tsung da dinastia Tang. Naquela época, havia uma grande seca, e Shan-wu-wei recebeu a ordem de realizar orações pela chuva. Ele conseguiu fazer cair uma forte chuva e como resultado, todos, do imperador às pessoas do povo, foram tomados pela alegria. Pouco depois, entretanto, começou uma forte ventania,

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impingindo destruição a todo o país, e o entusiasmo das pessoas se desvaneceu rapidamente. Durante o reinado, o Mestre do Tripitaka Chin-kang-chih saiu da Índia e foi para a China. Ele também orou pela chuva, e dentro do espaço de sete dias uma chuva intensa caiu e as pessoas alegraram-se como haviam feito anteriormente. Contudo, quando surgiu uma enorme ventania de violência sem precedentes, o soberano concluiu que a seita Shingon era uma seita maléfica e terrível e chegou quase a mandar Chin-kang-chih de volta a Índia. Este, porém, apresentou várias desculpas e consegui ficar. Novamente, no mesmo reinado, o Mestre do Tripitaka Pu-kung orou pela chuva. Dentro de dias, uma forte chuva precipitou-se, produzindo o mesmo êxtase de antes. Todavia, surgiu mais uma vez uma grande ventania ainda mais furiosa do que as duas anteriores, e durou por várias semanas antes de se acalmar. Que estranhas essas ocorrências! Não há uma única pessoa no Japão, sábia ou ignorante, que tenha conhecimento destes acontecimentos. Se alguém deseja conhecê-los. Seria melhor que me perguntasse em detalhes e aprendesse sobre assuntos enquanto ainda estou vivo. Quanto ao Japão, no segundo mês do primeiro ano da era Tentyo (824), houve uma grande seca. O Grande Mestre Kobo foi requisitado para orar pela chuva no jardim Shinsen’en. Porém, um sacerdote chamado Shubin ofereceu-se para substituí-lo e, dizendo ser membro do clero há mais tempo e possuir posição mais elevada do que Kobo, pediu que lhe fosse permitido dirigir o ritual. Shubin recebeu a permissão e efetuou as orações. No sétimo dia, caiu uma forte chuva, mas somente na capital e não na regiao rural circunvizinha. Então, Kobo foi instruído a assumir a tarefa de orar, mas sete dias se passaram sem que chuva alguma caísse e depois, outros sete dias, e mais outros sete dias. Finalmente, o próprio imperador orou por chuva e a fez cair. Entretanto, os sacerdotes do templo de Kobo, To-ji, referiram-se ao fato como ‘a chuva do nosso mestre’. Se alguém quiser maiores detalhes, somente precisa consultar os registros. Esta foi uma das maiores fraudes jamais conhecidas por nossa nação. E, além disso, houve a questão da epidemia que irrompeu na primavera do nono ano da era Konin (818) e a do almofariz tridentado de diamante, que também foram logros muito peculiares. Este fatos devem ser transmitidos verbalmente. Houve uma grande seca na China no período da dinastia Chen, mas o Grande Mestre Tientai recitou o Sutra de Lótus e, imediatamente, a chuva começou a cair. O soberano e seus ministros abaixaram suas cabeças e as pessoas do povo juntaram as palmas de suas mãos em reverência. Além disso, a chuva não foi torrencial, nem acompanhada 94

de vento, foi uma chuva fina. O soberano Chen sentou-se enlevado na presença do Grande Mestre e esqueceu-se completamente de voltar ao seu palácio. Naquela ocasião, ele curvou-se diversas vezes (em reconhecimento ao Grande Mestre). No Japão, na primavera do nono ano da era Konin, ocorreu uma grande seca. O Imperador Saga ordenou que Fujiwara no Fuyutsugu enviasse um oficial de posição inferior, Wake no Matsuna, (ao Grande Mestre Dengyo para pedir-lhe que oferecesse orações apelando por chuva). O Grande Mestre Dengyo orou por chuva, recitando o Sutra de Lótus, Konkomyo e Ninno, e no terceiro dia surgiram nuvens e uma chuva branda começou a cair de forma esparsa. O imperador ficou tão extasiado que deu permissão para a construção de uma plataforma para ordenação Mahayana, cujo estabelecimento havia sido tarefa muito difícil no Japão. Gomyo, o mentor do Grande Mestre Dengyo, foi um homem santificado, o mais notável sacerdote em Nara, a capital do Sul. Ele e quarenta de seus discípulos reuniram-se para a recitação do Sutra Ninno afim de orar pela chuva, e cinco dias depois ela começou a cair. Foi sem dúvida esplêndido que a chuva tenha caído no quinto dia, mas menos impressionante do que se tivesse ocorrido no terceiro dia, (como no caso do Grande Mestre Dengyo). Além disso, a chuva foi muito violenta, o que tornou a atuação de Gomyo inferior. Com esses exemplos, o senhor pode julgar o quanto os esforços de Kobo para produzir chuva foram inferiores. Desse modo, o Sutra de Lótus é superior, enquanto a Shingon é inferior. E, no entanto, como se quisessem ocasionar deliberadamente a ruína do Japão, as pessoas de hoje confiam exclusivamente na Shingon. Considerando o que aconteceu no caso do Imperador Aposentado de Oki, eu acreditava que se as práticas da Shingon fossem usadas para tentar dominar os mongóis e os bárbaros de Ezo, o Japão seguramente seria levado à ruína. Portanto, decidi não levar em consideração a minha própria segurança e fiz uma grave advertência. Quando o fiz, meus discípulos tentaram conter-me, mas em vista do rumo que os fatos tornaram, eles provavelmente estão satisfeitos por eu ter agido assim. Pude perceber algo que nem um único sábio na China ou do Japão entendeu em mais de quinhentos anos ! Quando Shan-wu-wei, Chin-kang-chih e Pu-kung oraram por chuva, esta caiu, mas foi acompanhada por ventos violentos. O senhor deve ponderara a razão disso. Há exemplos de pessoas que conseguiram fazer chover até através do uso de ensinos não-budistas, mesmo os taoístas, que mal merecem discussão. E é óbvio que se os ensinos budistas fosse aplicados corretamente, mesmo que sejam apenas os do Hinayana, como poderia a chuva deixar de cair ? E isso é ainda mais válido no caso de se utilizar um texto como o Sutra Dainiti, que, 95

embora inferior aos sutras Kegon e Hannya, é ainda um pouco superior aos sutras Agon (do Hinayana). Dessa forma, a chuva realmente caiu, mas o fato de ser acompanhada de violentas ventanias é um indicativo de que as doutrinas empregadas estavam contaminadas por erros graves. E o fato de o Grande Mestre Kobo não ter conseguido fazer chover apesar de orar durante vinte e um dias, e de ter se apropriado indevidamente da chuva que o imperador havia feito cair e afirmado ser sua, são indícios de que o erro dele era ainda mais sério do que o de Shan-wu-wei e o dos outros. Porém, a falsidade mais absurda de todas é a de que o próprio Grande Mestre Kobo registrou quando escreveu: "Na primavera do nono ano da era Konin (818), quando eu estava orando pelo fim da epidemia, o sol apareceu no meio da noite". Este é o tipo de mentira de que esse homem é capaz! Esse assunto é um dos segredos mais importantes confiado aos meus seguidores. Eles devem citar esta passagem para colocar seus oponentes contra a parede. Não entrarei na questão da superioridade doutrinal aqui, mas simplesmente salientarei que os assuntos sobre os quais escrevi são da máxima importância. Eles não devem ser levianamente discutidos ou transmitidos a outras pessoas. Entretanto, por ter-se mostrado sincero, estou chamando a sua atenção para esses fatos. E quanto a estas minhas admoestrações ? Como as pessoas veêm-nas com desconfiança e recusam-se a levá-las em consideração ocorrem desastres como os que enfrentamos agora. Se os mongóis atacaremnos com grande força, certo de que (os ensinos do Sutra de Lótus) propagar-se-ão amplamente nesta existência. Nessa ocasião, as pessoas que me trataram rudemente terão motivos para se arrepender. Os ensinos brâmanes datam de aproximadamente oitocentos anos antes da época do Buda. Primeiro, centralizavam-se nas duas divindades e ascetas, mas, posteriormente dividiram-se em noventa e cinco escolas. Entre os líderes brâmanes havia muitos homens sábios e pessoas dotadas de poderes sobrenaturais, mas nenhum deles foi capaz de libertar-se dos sofrimentos do nascimento e morte. Além disso, as pessoas que ofereceram fidelidade aos seus ensinos de um modo ou outro terminaram, todas, caindo nos maus caminhos. Quando o Buda surgiu no mundo, estes noventa e cinco grupos de brâmanes conspiraram com os soberanos, ministros e pessoas comuns dos dezesseis maiores estados da Índia, alguns deles insultando o Buda, outros atacando-o ou matando um número incalculável de discípulos e defensores leigos. Entretanto, o Buda não afrouxou sua determinação, pois disse que se parasse de pregar a Lei por causa da intimidação dos outros, todos os seres vivos com certeza também cairiam no inferno. Ele estava profundamente tomado pela compaixão e não pensava de forma alguma em desistir.

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Esses ensino brâmanes ocorreram através de uma leitura errada dos vários sutras dos Budas procederam o Buda Sakyamuni. A situação do Japão, hoje, é exatamente a mesma. Embora muitas espécies de doutrinas budistas estejam sendo ensinadas, basicamente, estas podem ser classificadas como pertencentes às oito seitas, às nove seitas, ou às dez seitas. Dentre as dez seitas deixarei de lado, no momento, a Kegon e outras. Pelo fato de Kobo, Jikaku, e Tisho terem se enganado quanto aos méritos relativos das seitas Shingon e Tendai, o povo do Japão, nesta existência, foi atacado por um país estrangeiro, e, na próxima, cairá nos maus caminhos. E, a queda da China, bem como o fato de seu povo ter sido destinado a cair nos maus caminhos, foram ocasionados pelos erros de Shan-wu-wei, Ching-kang-chih e Puk’ung. Além disso, após a época de Jikaku e Tisho, os sacerdotes da seita Tendai foram persuadidos pela falsa sabedoria desses homens e desenvolveram algo totalmente diverso da seita Tendai original. "Isto é realmente verdade?" – alguns de meus discípulos podem estar perguntando. Nitiren, tem, de fato, uma compreensão superior à de Jikaku e Tisho ? Porém, estou somente guiando-me naquilo escrito nos registros do Buda. O Sutra Nirvana declara que nos Últimos Dias da Lei, as pessoas que caluniarão a Lei do Buda e cairão no inferno de incessantes sofrimentos como resultado serão mais numerosas do que as partículas de poeira que compreendem a terra, enquanto que o número daqueles que sustentam a Lei Verdadeira será menor do que a quantidade de areia possível de se amontoar sobre a unha. E, o Sutra de Lótus diz que ainda que haja alguém capaz de erguer o Monte Sumeru e arremessá-lo para longe, será difícil encontrar alguém que consiga pregar o Sutra de Lótus, exatamente como este ensina, nos Últimos Dias da Lei do Buda Sakyamuni. Os Sutras, Daijuku, Konkomyo, Ninno, Shugo, Hatsunaion e Saishoo registram que, quando os Últimos Dias iniciarem, se surgir uma pessoa que pratique a Verdadeira Lei, então, aqueles que defendem ensinos falsos apelarão para o soberano e seus ministros, e estes acreditando em suas palavras, insultarão aquela única pessoa que mantém a Verdadeira Lei ou a atacarão, a enviarão ao exílio ou a executarão. Nessa oportunidade, Bonten, Taishaku, e todas as outras incontáveis divindades, e os deuses do sol e da terra, apossarão os soberanos, sábios, de países vizinhos e os farão destruir a nação onde tais fatos sucedem. A situação que enfrentamos no presente, é muito semelhante à descrita nesses sutras. Tento imaginar que boas causas formadas em seu passado tenham habitado todos os senhores a visitarem a mim, Nitiren ! Contudo, não obstante o que se possa descobrir ao examinar os seus passados, tenho a certeza de que, desta vez, os senhores conseguirão libertar-se dos sofrimentos do nascimento e morte. Suddhipanthaka não foi capaz de memorizar um ensino de catorze caracteres, mesmo num espaço de três anos, e no entanto, atingiu o estado de Buda. Devadatta, por outro lado, decorou 97

sessenta mil textos sagrados, mas caiu no inferno de incessante sofrimento. Esses exemplos descrevem com exatidão o mundo nessa atual era do Últimos Dias. Jamais pense que refiram-se somente a outras pessoas e não a nós próprios. Há muitas outras coisas que eu gostaria de dizer. Entretanto, encerrarei por aqui. Não sei como agradecer tudo o que tem feito nessas épocas turbulentas. Como sinal de gratidão, delineei para o senhor alguns importantes pontos em nossa doutrina. Muito obrigado pelas ervilhas e grãos de soja. Respeitosamente, Nitiren Em 22 de junho de 1275. Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu essa carta no Monte Minobu, em 22 de junho de 1275, aos cinquenta e quatro anos de idade. O seu recebedor, Nishiyama Nyudo, era o administrador da Vila de Nishiyama do Distrito Fuji, na província de Suruga. Pouco se sabe sobre ele. Nishiyama era o nome da vila governada por ele, e o título Nyudo (que penetrou no Caminho) indica que ele foi um sacerdote leigo – alguém que prestou os votos, mas não entrou para o templo e continua a viver no mundo como leigo. Uma explanação identifica-o como um parente materno do sucessor imediato de Nitiren Daishonin, Nikko Shonin, embora não se tenha certeza disso. De qualquer forma, ele parece ter sido um praticante sincero, que visitou Daishonin com frequência em Minobu, levando-lhe oferecimentos. Esta carta foi composta em resposta a um oferecimento deste tipo. Na parte inicial, Nitiren Daishonin explana a importância dos ‘bons amigos’ou zentishiki – aqueles que podem nos auxiliar em busca da iluminação. Pelo fato de Nishiyama ter pertencido anteriormente à seita Shingon, Nitiren Daishonin utilizou esta oportunidade para apontar as distorções nas interpretações do Budismo cometidas por esta seita. Ele não trata dessa questão na perspectiva da doutrina, mas das ‘provas de fatos reais’, demonstrando que, historicamente, essa seita falhou de forma visível em cumprir o critério mais importante na avaliação de doutrinas religiosas – a prova real, ou efeitos concretos positivos no mundo dos fenômenos. Implícito nisto está a idéia de que uma religião não é meramente um assunto do mundo invisível, espiritual, e deve ter a capacidade para transformar o mundo real onde vivemos. Os ‘três doutos eruditos’citados no título do Gosho são Shan-wu-wei, Ching-kang-chih, e Puk’ung, três monges hindus que introduziram os 98

ensinos esotéricos Shingon na China, no século VIII. Na porção do meio do gosho, Nitiren Daishonin relata ocasiões nas quais esses três homens oraram por chuva a pedido do trono, e, em cada caso, suas orações produziram ventanias destrutivas. As orações com base no Sutra de Lótus, como as oferecidas por Tientai na China e Dengyo no Japão, pelo contrário, trouxeram uma chuva branda e vivificante. Podemos entender a questão das orações por chuva como um teste do poder da religião para influenciar as condições objetivas, sob as quais os seres humanos vivem. Em países como o Japão e a China, onde o cultivo de arroz era uma parte essencial à economia, a seca prolongada poderia significar fome e privação. Deste modo, as orações por chuva eram uma parte importante da vida religiosa das pessoas, e a habilidade para produzir chuva através de rituais de oração era considerada uma prova de virtude do sacerdote que os celebrava e da doutrina que ele defendia. Não eram poucos os casos em que disputas com relação aos méritos relativos a ensinos rivais eram resolvidos através das orações por chuva. (Embora não seja mencionado nesta carta em particular, o próprio Nitiren Daishonin esteve envolvido num episódio desse gênero durante a grande seca de 1271, quando o iminente sacerdote da seita Shingon-Ritsu, Ryokan, recebeu a ordem do governo para orar por chuva. Nitiren Daishonin enviou-lhe um desafio, dizendo que se as orações de Ryokan tivessem sucesso, ele, Daishonin, tornar-se-ia discípulo de Ryokan. Porém, se Ryokan falhasse, deveria tornar-se discípulo de Daishonin. Ryokan concordou. Contudo, suas orações não trouxeram chuva, mas violentas ventanias. Ao invés de manter a sua promessa, ele caluniou Nitiren Daishonin perante as autoridades governamentais). Após citar exemplos na história da China e Japão nos quais os rituais Shingon ocasionaram apenas o desastre, Daishonin critica os erros de Kobo, o fundador da seita Shingon no Japão, e adverte sobre o fato de confiar nas orações dessa seita para a segurança da nação. O Japão, nessa época, estava enfrentando a ameaça do ataque do império mongol. Uma frota de invasão maciça lançada contra as ilhas do sul no Japão, em novembro de 1274, foi repelida por tempestades inesperadas. Porém, na primavera do ano seguinte, Klubai Klan mandou, novamente, emissários exigindo rendição. A ansiedade tomou o país quando o governo Kamakura organizou apressadamente defesas costais e o povo preparou-se para um segundo ataque. Mencionando vários sutras, Daishonin declara que a nação encontra-se nessa situação fundamentalmente porque as pessoas crêem em formas enganosas de Budismo, enquanto que o Sutra de Lótus, o ensino da iluminação universal é ignorado ou caluniado. Mostrando que as suas próprias circunstâncias combinam perfeitamente com as predições dos sutras, ele aponta que ele é o devoto do Sutra de Lótus, ou o Buda Original, nos Últimos Dias da Lei. 99

Concluindo, Nitiren Daishonin elogia Nishiyama pela sua sinceridade, assegurando-lhe que devido a sua devota fé, ele infalivelmente atingirá o estado de Buda nesta existência.

Resposta ao Lorde Matsuno (Matsuno Dono Gohenji, pág. 1388)

Recebi um kan de moedas, um sho de óleo, um robe e dez pincéis de escrita. Não sei como expressar adequadamente minha gratidão pela sinceridade que o senhor tem-me sempre demonstrado. Desta forma, deixarei a tarefa de louvá-lo a cargo do Sutra de Lótus e do Buda Sakyamuni. Conforme disse anteriormente, como um leigo, o senhor deve recitar Nam-myoho-rengue-kyo determinadamente de manhã e à tarde, dia e noite, e então testemunhar os resultados no último momento de sua vida. (Nessa ocasião) suba depressa a montanha da maravilhosa iluminação e olhe ao seu redor em todas as direções. Verá que o universo inteiro é a Terra da Luz Tranquila. O chão será de lápis-lazuli, e os oito caminhos serão separados por cordões de ouro. Quatro tipos de flores irão chover do céu, e a música ressoará no ar. Todos os Budas e Bodhisattvas estarão presentes, acariciados pelas brisas da eternidade, felicidade, verdadeiro eu e pureza. O Sutra de Lótus é realmente esplêndido! Como estou com pressa, não posso entrar em detalhes. Com meu profundo respeito, Nitiren Em 9 de setembro de 1277. Pós-escrito Poderia, por gentileza, enviar dez ryo de sementes da árvore mokurenju ? END Vol. VI pág.155

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A Consagração de Uma Imagem do Buda Sakyamuni feita por Shijo Kingo (Shijo Kingo Shakabutsu Kuyo-ji, págs.1144-1148) Em seu diário, o senhor escreveu que modelou uma imagem de madeira do Buda Sakyamuni. Com relação à cerimônia de abertura dos olhos apropriada para tal estátua, o sutra Fuguen declara: “Esse sutra Mahayana é o depósito de tesouro de todos os Budas, os olhos de todos os Budas das dez direções e das três existências”. Diz também: “Esse sutra Mahayana são os olhos de todos os Budas, pois através dos ensinos deste, eles adquirem os cinco tipos de visão”. A frase ‘adquirem os cinco tipos de visão’, neste sutra, refere-se aos olhos dos mortais comuns, os olhos divinos, os olhos de sabedoria, os olhos da Lei e os olhos do Buda. Esses cinco tipos de visão são naturalmente obtidos por aquele que sustenta o Sutra de Lótus, assim como uma pessoa que se torna um soberano de Estado é naturalmente obedecida por todo o povo, ou como o senhor do grande oceano que de forma natural, é seguido pelos peixes habitantes do oceano. Os sutras Kegon, Agon, Hodo, Hannya e Dainiti podem possuir os cinco tipos de visão nominalmente, mas não os contêm na realidade. O Sutra de Lótus possui-os tanto nominal quanto realmente. E mesmo que não os tivesse nominalmente, pode ter a certeza de que os possuiria na realidade. Quanto aos três corpos ou propriedades de um Buda, o sutra Fuguen afirma: “As três propriedades iluminadas da vida do Buda originam-se do Hodo. Este selo do grande Dharma assegura a entrada no mar do nirvana. As três propriedades puras de um Buda provêm desse vasto oceano. Essas três propriedades são o campo fértil de boa sorte para todos os seres humanos e celestiais, e o objeto mais supremamente ‘digno de oferecimentos’. As três propriedades dos corpos são: primeiro, o corpo Dharma do Tathagatta; segundo, o corpo de Júbilo do Tathagatta; e terceiro, o corpo manifesto do Tathagatta. Esses três tipos de corpos do Tathagata estão invariavelmente contidos em todos os Budas. Se tomarmos a Lua como exemplo, poderemos dizer que ela em si seja comparável ao corpo Dharma, sua luz ao corpo de júbilo, e seu reflexo ao corpo manifesto. Assim como uma única lua apresenta esses três diferentes aspectos, também um único Buda possui as virtudes desses três diferentes corpos. As doutrinas dos cinco tipos de visão e dos três corpos não são expostas em nenhum lugar além do Sutra do Lótus. Portanto, o Grande Mestre Tientai declarou: “O Buda, no decorrer de todas as três

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existências, possui consistentemente os três corpos. Porém, nos vários ensinos, ele manteve isto em segredo e não o transmitiu”. Nesta passagem do comentário, a frase ‘nos vários ensinos’ não se refere somente aos sutras Kegon, Hodo e Hannya, mas à totalidade do corpo de sutras exceto o Sutra de Lótus. E a frase ‘ele manteve isto em segredo e não o transmitiu’ significa que, em todo o corpo de escrituras, salvo o capítulo Juryo do Sutra de Lótus, Sakyamuni ocultou uma doutrina e não a revelou em lugar nenhum. Portanto, na realização da cerimônia de abertura dos olhos para imagens do Buda pintadas ou de madeira, a única autoridade em que se deve confiar são o Sutra de Lótus e a seita Tendai. Além disso, a doutrina de Itinen Sanzen baseia-se no conceito dos três reinos de existência. Os três reinos são: primeiro, o reino dos seres vivos; o reino dos cinco componentes; e terceiro, o reino do ambiente. Deixaremos de lado os dois primeiros no momento. O terceiro, o reino do ambiente, diz respeito ao reino das plantas e árvores. E o reino das plantas e árvores inclui as plantas e árvores com as quais se produzem as cinco nuanças de pigmento usadas na pintura. A partir desse pigmento, as imagens pintadas são criadas, e dessas árvores são feitas as estátuas de madeira. É o poder do Sutra de Lótus que se torna possível a infusão de uma ‘alma ou propriedade espiritual’ nessas estátuas. Essa foi a compreensão do Grande Mestre Tientai. No caso dos seres vivos, essa doutrina é conhecida como atingir o estado de Buda na forma presente; tratando-se de imagens pintadas e de madeira, é conhecida como a iluminação de plantas e árvores. Por esta razão (o Grande Mestre Chang-an) escreveu: “Jamais houve nada que se compare ao brilho e serenidade da meditação do estilo shikan”. E por isto (o Grande Mestre Miao-lo) afirmou: “Eles, no entanto, ficam chocados e nutrem dúvids quando ouvem pela primeira vez a doutrina de que os seres iluminados possuem a natureza do Buda”. Nunca se ouviu falar dessa doutrina (de itinen sanzen) nas eras (anteriores à do Grande Mestre Tientai), nem se teve conhecimento dela nas eras seguintes. E mesmo se tivesse aparecido, pode-se estar certo de que teria sido algo roubado dele. Entretanto, cerca de duzentos anos ou mais após a época de Tientai, Shan-wu-wei, Chin-kang-chih e Pu-kung fundaram a chamada seita Shingon com base no sutra Dainiti. E, então, embora não haja nenhuma menção dessa doutrina no Sutra de Lótus na forma como o Buda a expôs, eles roubaram a doutrina de itinen sanzen do Sutra de Lótus e a interpretação de Tientai da mesma, e prosseguiram tornando-a o núcleo da seita Shingon. Além disso, fingiram que a doutrina havia se originado na Índia, e deste modo enganaram e desencaminharam os eruditos recentes da China e Japão. Ninguém sabe na verdade da questão, mas todos igualmente aceitam e têm fé

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nas asserções da seita Shingon. Isto veio acontecendo continuamente durante mais de quinhentos anos até agora. Sendo este o caso, as imagens de madeira ou pintadas que foram feitas e consagradas antes da época da seita Shingon, (quando as práticas de Tientai eram seguidas), manifestaram poderes extraordinários, mas as dos templos e pagodes construídos após (as práticas da Shingon terem sido adotadas para a cerimônia de abertura dos olhos) produzem muito pouco benefício. Como há muitos exemplos disso, não entrarei em detalhes. Esse seu Buda, entretanto, é um Buda vivo. Não difere em nenhum aspecto da imagem de madeira do Buda feita pelo rei Udayana, ou daquela moderada pelo rei Bimbisara. Certamente, Bonten, Taishaku, as divindades do Sol e da Lua, e os Quatro Reis Celestiais o escoltarão assim como a sombra acompanha o corpo e o protegerão sempre. (Este é o primeiro ponto que desejo salientar). Seu diário também mostra que cada ano, durante o período de noventa dias, do oitavo dia do quarto mês ao décimo-quinto dia do sétimo mês, o senhor também empreende atos de devoção ao deus do Sol. O deus do Sol vive num palácio feito dos sete tipos de gemas. Esse palácio ocupa uma área de 816 ri ou 51 yojana. No meio dela, mora o deus do Sol, acompanhado de duas consortes, Sho e Musho. À sua direita e à sua esquerda estão enfileirados os setes luminares e os nove luminares, e na frente dele encontra-se a deusa Marishiten. O deus do Sol viaja numa carruagem feita de sete gemas puxada por oito excelentes cavalos, e no espaço de um dia e uma noite ele circula os quatro continentes, atuando como um olho para todos os seres vivos que moram neles. No caso dos outros Budas, bodhisattvas e divindades, dizem que ele concedem benefícios esplêndidos, mas com os nossos olhos de mortais comuns ainda estamos para vê-los. Quanto à divindade Sol, contudo, não pode haver dúvidas, pois seus benefícios estão diante de nossos próprios olhos. Se não fosse por Sakyamuni, o senhor dos ensinos, como benefícios como esses poderiam ser concedidos ? E, se não fosse pelo poder do maravilhoso sutra do veículo único, como tais prodígios poderiam aparecer diante de nós ? É magnífico contemplar isto ! Ao se inquirir como alguém pode retribuir essa divindade pelos seus favores, constata-se que, nas eras anteriores ao surgimento do budismo, as pessoas de uma natureza de discernimento curvavam-se todas diante dele ou consagravam-lhe oferecimentos, e todas elas, por sua vez, recebiam evidência de benefícios. Ao mesmo tempo, as pessoas que se voltavam contra ele eram todas punidas. Agora, se considerarmos o que os textos budistas têm a dizer, poderemos notar que o sutra Konkomyo, afirma: “O deus do Sol e deus da Lua, por atenderem a este sutra, estão habilitados a obter vitalidade 103

em abundância”. E o sutra Saishoo declara: “Através do poder desse sutra rei, esses luminares podem circular os quatro continentes”. Deve compreender, portanto, que é o poder da Lei budista que capacita as divindades do Sol e da Lua a realizar suas rondas dos quatro continentes. Os sutras Konkomyo e Saishoo são meros ensinos expedientes conducentes ao Sutra de Lótus. Em comparação ao Sutra de Lótus, são como o leite em relação ao ghee, ou metal em confronto com gemas preciosas. E, no entanto, inferiores como são, esses sutras habilitam as divindades celestiais a circularem os quatro continentes. Quão maior poder podem ganhar essas divindades, então, provando o doce sabor do ghee do Sutra de Lótus ! Portanto, no capítulo Jo, observamos que as divindades do Sol e da Lua são colocadas lado a lado com o deus das estrelas. E, no capítulo Hosshi, está predito que a divindade do sol atingirá o mais alto nível de iluminação e será conhecido como o Tathagata Sustentador do Fogo. Além disso tudo, seu falecido pai iniciou essa adoração da divindade Sol, e o senhor sucedeu-o na segunda geração, dando continuidade a essas cerimônias durante um longo período de tempo. Assim, como poderia essas divindade abandoná-lo ? Eu, Nitiren, também depositei minha confiança nessa divindade e, desta maneira, prossegui meus esforços no Japão durantes vários anos passados. Tenho já a sensação de ter alcançado a vitória. Esses benefícios claros só podem ser atribuídos a essa divindade. Há muitos outros pontos admiráveis em seu diário, mas não posso tratar de todos eles nesta carta. Quanto ao fato que mais admiro: Em suas cartas no passado, o senhor de tempos em tempos mencionava a sua preocupação com seus pais. E quando li a sua presente carta, não pude conter as minhas lágrimas, tão comovido fiquei por pena de sua aflição devido ao pensamento de que seus pais poderiam talvez estar no inferno. Entre os discípulos do Buda havia um chamado Venerável Maudgalyayana. O nome do seu pai era Kissen Shishi e o de sua mãe Shodainyo. Sua mãe, após falecer, caiu no reino dos espíritos famintos. Enquanto Maudgalyalyana ainda era um mortal comum, não tinha consciência deste fato, e assim, não tinha razão para preocupar-se com isso. Porém, após tornar-se discípulo do Buda, alcançou a posição de arhat e, adquirindo o olho divino, pôde perceber que sua mãe estava no reino dos espíritos famintos. Quando soube disso, fez oferecimentos de alimentos e bebida a ela, mas estes somente transformavam-se em chamas e aumentavam o seu tormento. Por causa disso, ele voltou correndo ao Buda e relatou o que havia acontecido. Pense em como ele deve ter se sentido na ocasião !

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O senhor é um mortal comum, possuindo não mais do que o olho mortal e, deste modo, não pode ver que reino os seus pais ocupam agora e aflige-se com o pensamento de que eles talvez estejam no inferno. Esta é em si uma manifestação de devoção filial. Bonten, Taishaku, as divindades do Sol e da Lua, e os Quatro Reis Celestes com certeza olharão para o senhor com piedade. O sutra Kegon diz: “Aqueles que não compreendem suas obrigações filiais em muitos casos se depararão com uma morte prematura”. E o sutra Kambutsu Sokai declara: “Essa (falha em pagar uma dívida de gratidão) é a causa que leva ao renascimento no Inferno Aviti”. Contudo, agora o senhor já demonstrou uma preocupação sincera pelos seus pais, e os deuses celestiais seguramente atenderão suas orações. ( Esse é o segundo ponto que desejo enfatizar ao senhor). Em sua carta, também menciona certos pontos que, considerando completamente o âmago da questão, acredito que não deva fazer. Eu, Nitiren, sou odiado pelo povo do Japão. Isto se deve inteiramente ao fato de o lorde de Sagami me ver com hostilidade. Admito que o governo tenha agido totalmente além da razão, mas mesmo antes de ter encontrado minhas dificuldades eu previa que problemas daquele tipo ocorreriam e resolvi que, não obstante o que pudesse me acontecer no futuro, não deveria nutrir nenhum ódio com relação aos outros. Essa determinação talvez tenha atuado como uma espécie de oração, pois consegui sobreviver, com segurança, a uma grande número de provações. E, agora, não enfrento tais dificuldades. De quem foi a ajuda que me permitiu escapar da morte pela fome quando fui exilado à província de Sado, ou que torna possível que eu recite o Sutra de Lótus aqui nas montanhas como tenho feito até agora ? A sua ajuda somente. E se indagássemos quem possibilitou-lhe oferecer tal auxílio, teríamos que dizer que foi o lorde Ema Nyudo. Embora ele próprio não esteja consciente desse fato, isto sem dúvida atuou como uma espécie de oração em meu favor. E, sendo assim, a oração de seu lorde também se tornou uma espécie de oração em seu benefício também. Além disso, graças ao seu lorde o senhor pôde cumprir suas obrigações para com seus pais. Não importando o que pudesse acontecer, não seria correto deixar o serviço a alguém com quem tem tamanha dívida. Se ele o rejeita repetidamente, não há o que fazer. Porém, o senhor próprio não deve abandoná-lo, não obstante como a sua vida possa ser colocada em perigo. Na passagem do sutra que citei acima, consta que aqueles que não compreendem suas obrigações podem deparar-se com uma morte prematura. Em contraste, aqueles que cumprem seus deveres filiais não encontrarão tal morte.

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O pássaro conhecido ocmo cormorão é capaz de comer ferro, mas apesar de seu interior poder digerir ferro, eles não fazem mal aos embriões dentro do corpo da mãe. Há peixes que comem pedregulhos, mas isto não mata os filhotes dentro do corpo do peixe que ainda não foram desovados. A árvore chamada sândalo não pode ser queimada pelo fogo, e o fogo nos céus da pureza não pode apagado pela água. O corpo do Buda Sakyamuni não pôde ser queimado, apesar de trinta e dois fortes homens encostarem tochas nele, e quando emanou fogo do corpo do Buda, as divindades dragões do mundo tríplice derramaram chuvas na tentativa de apagá-lo, mas este não foi extinto. Agora o senhor auxiliou Nitiren em seus atos de mérito. Portanto, não será muito difícil para as pessoas perversas causarem-lhe dano. E, se por acaso algo lhe acontecer, pode estar certo de que se trata de uma punição, nesta vida, pelo ódio que manifestou em alguma existência passada com relação ao devoto do Sutra de Lótus. A punição desse tipo jamais pode ser evitada, não importando o quanto a pessoa possa se embrenhar nas profundezas das montanhas ou no mar distante. É por isso que o bodhisattva Fukyo foi atacado com varas e bastões, e que o Venerável Maudglyayana foi morto por um grupo de brâmanes da Escola Vara de Bambu. Logo, que causa o senhor tem para se afligir ? Para evitar problemas inesperados, é melhor suportar pacientemente. Após ler esta crta, durante os cem dias seguintes não deve sair descuidadamente para beber à noite com seus colegas ou outros em lugares além de sua própria casa. Se o seu lorde o chamar durante o dia, vá vê-lo sem demora nenhuma. Se o chamar à noite, então alegue algum mal súbito nas três primeiras vezes que ele o fizer. Se ele persistir em chamá-lo mais de três vezes, então informe os seus subordinados ou outra pessoa e faça-os verificar se não há problemas nas encruzilhadas antes de partir para atender aos chamados. Se portar-se dessa maneira circunspecta, e os mongóis atacarem nosso país nesse ínterim, os sentimentos das pessoas com relação ao senhor mudarão, tornando-se diferentes do que foram no passado, e elas não pensarão mais em atacá-lo como a um inimigo. Com respeito àquilo que me escreveu, mesmo que tivesse cometido algum erro, não deveria pensar levianamente em deixar o serviço ao seu lorde – muito menos ainda se não é culpado de nenhuma falta. Nesse caso, não deve dar atenção, não obstante o que os outros possam dizer. Quanto ao seu desejo de se tornar um sacerdote leigo, haverá tempo de sobra para fazê-lo mais tarde. Mesmo então, se surgirem circunstâncias que não o satisfaçam em corpo ou mente, más influências tentarão atuar sobre o senhor. Atualmente há mulheres que se tornam freiras para enganar os outros, e homens que se tornam sacerdotes leigos e cometem grande mal. Nunca deve envolver-se em questões assim. 106

Embora não esteja sofrendo de doença nenhuma, deveria receber tratamento de aplicação de moxa em dois lugares de seu corpo para que depois possa alegar doença se isso se tornar necessário. E, caso algum tipo de distúrbio ocorra, por enquanto envie outra pessoa para observar o que está havendo. É difícil escrever em detalhes tudo o que gostaria de dizer-lhe. É por isso que não entrei em assuntos de doutrina aqui. Quanto ao sutra, eu o copiarei para o senhor quando o clima ficar um pouco mais fresco.

Com meu profundo respeito, Nitiren Em 15 de julho de 1276.

Fundo de Cena

Nitiren Daishonin escreveu esta carta em Minobu para Shijo Kino no dia 15 de julho de 1276, quando estava com 56 anos de idade. Evidentemente, Shijo Kingo havia feito uma imagem de madeira do Buda Sakyamuni em benefício de seus falecidos pais e pedira a Nitiren Daishonin que realizasse uma cerimônia de abertura dos olhos para consagrá-la. Esta carta é a resposta de Nitiren Daishonin. Na passagem inicial, Daishonin afirma que somente quando o Sutra de Lótus é usado para consagrar uma imagem do Buda é que esta se torna dotada dos cinco tipos de visão e dos três corpos ou propriedades iluminadas que os Budas possuem. Todos os Budas, ele declara, adquirem os cinco tipos de visão e as três propriedades em virtude do Sutra de Lótus; o mesmo vale para as imagens do Buda. Afirmava-se popularmente que a cerimônia de abertura dos olhos para consagrar uma imagem do Buda infundia na imagem um ‘espírito’ ou ‘alma’. Nitiren Daishonin, contudo, explica o assunto mais profundamente baseando-se na doutrina de Itinen Sanzen, que esclarece que seres inanimados, como as árvores e as plantas das quais são feitas as imagens de madeira e as pintadas, possuem inerentemente a natureza do Buda e podem manifestá-la. O conteúdo da primeira parte do Gosho lembra o gosho intitulado ‘Abrindo os Olhos de Imagens de Madeira ou Pintadas’.

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Nitiren Daishonin na realidade designou o Gohonzon das Três Grandes Leis Secretas, ao invés de imagens do Buda, como o objeto de adoração. Entretanto, quando este gosho foi escrito, o Dai-Gohonzon ainda seria inscrito; além disso, fazer imagens do Buda era uma prática bastante disseminada e, numa época em que a maioria das pessoas reverenciavam o buda Amida, Nitiren Daishonin algumas vezes aprovava provisoriamente a execução de imagens de Sakyamuni como um ato conducente à compreensão correta. Esse assunto é discutido em alguns detalhes no gosho “O Douto Erudito Shan-wu-wei”. Uma atitude similar também delineia a parte seguinte do gosho, no qual Daishonin comenta a prática hereditária de Shijo Kingo de adorar a divindade Sol em certas épocas do ano. Ele explica no contexto que o poder e ações da divindade Sol, no final, derivam da Lei Budista, que o Sutra de Lótus expõe. Nitiren Daishonin, então, elogia Shijo Kingo por sua devoção filial. O pai de Kingo havia falecido em 1253, e sua mãe, em 1270, e ele havia pedido muitas vezes a Nitiren Daishonin que realizasse cerimônias em memória deles. Nesta carta, comovido pelos temores de Kingo de que seus pais pudessem estar sofrendo no inferno, Nitiren Daishonin assegura-lhe que os deuses budistas com certeza terão pena dele e responderão suas orações. Nessa ocasião, Shijo Kingo estava sendo tratado asperamente pelo seu lorde por causa de sua crença no Sutra de Lótus, e provavelmente dissera a Daishonin que desejava abandonar o serviço a seu lorde. Ansioso para que seu discípulo não agisse precipitadamente e que resolvesse seu dilema através da fé, Nitiren Daishonin recomenda-lhe que não nutra ódio contra o lorde Ema. Ele afirma que, ao proporcionar sustento para Kingo, Ema possibilitou que cumprisse seus deveres filiais e também que fizesse oferecimentos ao devoto do Sutra de Lótus. Seria errado, diz Nitiren Daishonin, abandonar levianamente alguém com quem se possui uma dívida tão profunda. Desta maneira, ele encoraja Shijo Kingo a considerar a relação feudal entre lorde e vassalo na perspectiva da fé. Esta carta termina com um conselho específico de como Kingo deveria comportar-se. Nessa época, Shijo Kingo estava correndo perigo físico devido à animosidade de seus colegas samurais, e Nitiren Daishonin previne-o para estar alerta. Ele aconselha-o, por exemplo, a não sair bebendo descuidadosamente em nenhum lugar for a de sua própria casa e, se possível, evitar atender chamados do seu lorde à noite.

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A Recitação dos Capítulos Hoben e Juryo (Gassui Gosho, pág. 1199 a 1203) Na carta que me enviou pelo mensageiro, a senhora diz que costumava recitar um capítulo do Sutra de Lótus por dia, completando a totalidade do sutra no espaço de vinte e oito dias, mas que agora lê somente o capítulo Yakuo uma vez a cada dia. A senhora pergunta (se isto é satisfatório, ou) se deveria retornar à sua prática anterior de ler todos os capítulos revezadamente. No caso do Sutra de Lótus, pode-se recitar o sutra inteiro, de vinte e oito capítulos em oito volumes, todos os dias ou pode-se recitar apenas um volume, ou um capítulo, ou um verso, ou uma frase, ou uma palavra; ou pode-se recitar simplesmente o Daimoku, Nam-myohorengue-kyo, somente uma vez por dia, ou recitá-lo uma vez no curso de sua existência; ou ouvir outra pessoa recitá-lo e alegrar-se ao escutá-lo, e assim sucessivamente até o quinquagésimo grau de distância do indivíduo inicial que primeiro recitou o Daimoku. Nesse caso, sem dúvida, o espírito de fé se tornaria fraco e o sentimento de alegria muito atenuado, como as noções vagas que podem ocorrer à mente de uma criança de dois anos, ou como a mentalidade de uma vaca ou de um cavalo, incapaz de distinguir o antes do depois. E, no entanto, os benefícios obtidos por tal pessoa são cem, mil, dez mil, cem mil vezes maiores do que os conseguidos pelas pessoas de excelente habilidade inata e sabedoria superior que estudam outros sutras: pessoas como Shariputra, Maudgalyayana, Monju e Miroku, que memorizaram a totalidade dos textos dos vários sutras. O próprio Sutra de Lótus nos diz isso, e a mesma opinião é expressa nos sessenta volumes do comentário de Tientai e Miao-lo. Assim, o sutra afirma (com respeito a esses benefícios): “Mesmo que a quantidade deles fosse medida com a sabedoria do Buda, o limite deles não poderia ser encontrado. Nem mesmo a sabedoria do Buda consegue sondar os benefícios que tal pessoa obterá. A sabedoria de Buda é tão maravilhosa que consegue saber até o número de gotas de chuva que caem em nosso sistema de mundo principal durante um período de sete dias ou duas vezes sete dias. E também lemos que os benefícios adquiridos por aquele que recita não mais que uma simples palavra do Sutra de Lótus são a única e exclusiva coisa que a mesma não pode penetrar. Como, então, poderiam pessoas comuns como nós, que cometeram tantas ofensas graves, ser capazes de entender tais benefícios ? Por mais imensos que possam ser esses benefícios, agora já se passaram cerca de dois mil e duzentos anos desde a morte do Buda. Durante muitos anos as cinco impurezas floresceram, e atos bons de 109

qualquer natureza são deveras raros. Agora, mesmo que uma pessoa possa fazer o bem, no curso da realização de um único ato bom, ela acumula dez atos maus, de modo que no final, em prol de um pequeno bem, ela comete um grande mal. E, no entanto, em seu coração, orgulha-se de ter praticado um ‘grande bem’ – assim são os tempos em que vivemos. Além disso, a senhora nasceu na remota terra do Japão, um minúsculo país insular no leste separado por duzentos mil ri de montanhas e mares do país onde nasceu o Buda. É também uma mulher oprimida pelos cinco obstáculos e subordinada às obediências. Quão incrivelmente maravilhoso é, portanto, o fato de, apesar desses impedimentos, a senhora ter sido capaz de abraçar a fé no Sutra de Lótus ! Até mesmo os sábios ou os eruditos, tais como aqueles que estudaram atentamente todos os ensinos sagrados propostos pelo Buda no decorrer de sua existência e que dominaram tanto as doutrinas exotéricas quanto as esotéricas, estão atualmente abandonando o Sutra de Lótus e, no lugar deste, estão recitando o Nembutsu. Que bom carma a senhora deve ter formado no passado, então, para ter nascido como uma pessoa que pode recitar mesmo que um verso ou frase do Sutra de Lótus ! Quando li a sua carta , senti como se meus olhos estivessem fitando algo mais raro que a flor udumbara, algo ainda menos frequente do que a tartaruga de um olho só encontrar um tronco flutuante com uma cavidade para comportá-la com exatidão. Comovido à admiração sincera, achei que gostaria de acrescentar apenas uma palavra ou uma expressão de meu próprio júbilo, empenhando-me dessa maneira para realçar o seu mérito. Temo, contudo, que assim como as nuvens obscurecem a lua ou como a poeira empana um espelho, muitas tentativas de descrição breves e desajeitadas sirvam somente para encobrir e ofuscar os benefícios incomparavelmente maravilhosos que receberá, e o pensamento me aflige. Contudo, em resposta à sua pergunta, dificilmente eu poderia permanecer em silêncio. Por favor, entenda que estou meramente juntando à minha gota aos rios e oceanos ou acrescentadno minha vela ao sol e à lua, esperando, desse modo, aumentar mesmo que um pouco o volume de água ou o brilho da luz. Em primeiro lugar, com relação ao Sutra de Lótus, não obstante a pessoa recite todos os oito volumes, ou apenas um volume, um capítulo, um verso, uma frase, ou simplesmente o daimoku ou o título, a senhora deve entender que os benefícios resultantes são, em todos os casos, os mesmos. Isso é como a água do grande oceano – uma 110

única gota contém água de todos os inúmeros córregos e rios, ou como a jóia de concessão de desejos que, apesar de ser uma única jóia, pode fazer chover todos os tipos de tesouro sobre o formulador do desejo. E o mesmo se confirma para cem, mil, dez mil ou cem mil dessas gotas d’água ou dessas jóias. Um simples ideograma do Sutra de Lótus é como essa gota d’água ou essa jóia, e todos os cem milhões de caracteres do Sutra de Lótus são como as cem milhões dessas gotas ou jóias. Por outro lado, um simples ideograma dos outros sutras, ou o nome de qualquer um dos vários Budas, é como uma gota d’água de algum córrego ou rio em particular, ou como apenas uma pedra de uma montanha em particular, ou um mar em particular. Tal gota não contém a água de inúmeros córregos e rios e tal pedra não possui as virtudes inerentes a inumeráveis outros tipos de pedras. Portanto, com relação ao Sutra de Lótus, é louvável recitar qualquer capítulo no qual tenha depositado a sua confiança, não obstante qual seja. Falando de modo geral, entre todos os ensinos do Thatagata, nunca foi constatado que algum tivesse palavras falsas. No entanto, quando ponderamos mais profundamente sobre os ensinos budistas, verificamos que mesmo entre os ditos dourados do Thatagata existem várias categorias, tais como o Mahayana e o Hinayana, os ensinos provisórios e os verdadeiros, as doutrinas esotérica e exotéricas. Essas distinções originam-se dos próprios sutras e, de acordo com isso, observamos que estas estão toscamente delineadas nos comentários dos vários eruditos e mestres. Exprimindo a essência do assunto, entre as doutrinas propostas pelo Buda Sakyamuni nos cinquenta anos ou mais de sua vida de doutrinamento, aquelas apresentadas nos primeiros quarenta anos ou tantos são de natureza questionável. Podemos afirmar isso porque o próprio Buda claramente declarou no Sutra Muryogui: “Nesses mais de quarenta anos, ainda não revelei a verdade”. E, no Sutra de Lótus, o próprio Buda proclama com respeito a cada uma das palavras e frases do mesmo: “Descartando-me honestamente dos ensinos provisórios, exporei somente o Caminho Supremo”. Além disso, o buda Taho surgiu das profundezas da terra para acrescentar o seu testemunho, pronunciando: “O Sutra de Lótus…Tudo que o senhor (Buda Sakyamuni) expôs é a verdade”. E todos os Budas das dez direções reuniram-se na assembléia onde o sutra estava sendo pregado e estenderam suas línguas para oferecer maior suporte à asserção de que dentro do Sutra de Lótus não há uma única palavra que seja falsa. Foi como se um grande rei, sua consorte e seus súditos mais veneráveis tivessem, todos, em unanimidade, prestado sua promessa.

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Suponha que um homem ou uma mulher que recite mesmo que uma simples palavra do Sutra de Lótus esteja destinado a cair nos maus caminhos por ter cometido os dez maus atos, os cinco pecados cardeais, as quatro ofensas maiores ou incontáveis outros delitos graves. Mesmo que o Sol e a Lua nunca mais emergissem do leste, mesmo que a própria grande terra tombasse, ainda que as marés do grande oceano parassem de ter fluxo e refluxo, ainda que uma pedra quebrada pudesse ser totalmente recomposta, ou que as águas dos córregos e rios cessassem de fluir ao oceano, nenhuma mulher que tenha colocado sua fé no Sutra de Lótus jamais seria arrastada aos maus caminhos como resultado de ofensas mundanas. Se uma mulher que deposita sua fé no Sutra de Lótus algum dia caísse nos maus caminhos em causa de excessiva cobiça, então, o Buda Sakyamuni, o Buda Taho e os Budas das dez direções imediatamente seriam culpados de quebrarem o voto que têm sustentado durante a extensão de incontáveis kalpas de nunca dizerem uma mentira. A ofensa deles seria ainda maior do que as desvairadas falsidades e logros de Devadatta ou as ultrajantes mentiras ditas por Kokalika. Porém, como seria possível tal coisa algum dia acontecer ? Desse modo, uma pessoa que abraça o Sutra de Lótus está totalmente garantida desses benefícios. Por outro lado, mesmo que a pessoa não cometa um único ato mau em toda a sua existência, e em vez disso observe os cinco preceitos, os oito preceitos, os dez preceitos, os dez bons preceitos, os duzentos e cinquenta preceitos, os quinhentos preceitos ou um número incontável de preceitos; ainda que possa aprender todos os sutras de memória, faça oferecimentos a todos os outros Budas e Bodhisattvas e acumule mérito imensurável, se, no entanto, falhar em colocar sua fé no mesmo, mas considerar que este se encontra no mesmo nível que os outros sutras e ensinos dos outros Budas; ou se reconhecer a sua superioridade, mas se dedicar constantemente a outras disciplinas religiosas, praticando o Sutra de Lótus somente de tempos em tempos; ou se ela associar, em termos amistosos, a sacerdotes da Nembutsu, que não acreditam no Sutra de Lótus e ao mesmo tempo caluniam a Lei; ou se pensar que aqueles que insistem que o Sutra de Lótus não se adequa à capacidade das pessoas na era posterior não são culpados de nenhuma falta, então, todo o mérito de incontáveis aos bons que realizou durante o curso de uma vida, subitamente desvanecerá. Além disso, os benefícios resultantes de sua prática do Sutra de Lótus ficará, por algum tempo, obscurecido, e ela cairá na grande cidadela do inferno Aviti tão certamente quando a chuva cai do céu ou as rochas ruem dos picos aos vales. Entretanto, mesmo que a pessoa possa ter cometido os dez maus atos ou os cinco pecados cardeais, contanto que não vire suas costas ao Sutra de Lótus, sem dúvida, renascerá na Terra Pura e atingirá o estado de Buda em sua próxima existência. Por outro lado, lemos no sutra que mesmo uma pessoa que observa os preceitos, abraça todos 112

os outros Sutras e acredita nos vários Budas e Bodhisattvas, se falha em ter fé no Sutra de Lótus, seguramente cairá nos maus caminhos. Embora minha capacidade seja limitada, quando observo a situação no mundo atual parece-me que a grande maioria tanto dos crentes leigos como do clero é culpada de caluniar a Lei. Porém, voltando à sua questão: conforme eu disse antes, embora nenhum capítulo do Sutra de Lótus seja desprezível, entre todos os vinte e oito capítulos, o capítulo Hoben e o capítulo Juryo são particularmente importantes. Os capítulos restantes são todos, de certo modo, os ramos e folhas desses dois capítulos. Portanto, para a sua recitação regular, eu recomendo que pratique a leitura das partes em prosa dos capítulos Hoben e Juryo. Além disso, seria apropriado se escrevesse cópias separadas dessas partes. Os vinte e seis capítulos restantes são como a sombra que acompanha uma forma ou o valor inerente em uma jóia. Se recitar os capítulos Juryo e Hoben, então os capítulos remanescentes naturalmente estarão incluídos mesmo que não os recite. É verdade que os capítulos Yakuo e Devadatta tratam especificamente da consecução do estado de Buda ou do renascimento na Terra Pura por parte das mulheres. Porém, o capítulo Devadatta é um ramo e folha do capítulo Hoben, e o capítulo Yakuo é um ramo e folha dos capítulos Hoben e Juryo. Portanto, deve recitar regularmente esses dois capítulos, o Hoben e o Juryo. Quanto aos demais a senhora pode realizá-los de tempos em tempos quando tiver um momento de lazer. Além disso, em sua carta a senhora diz que diversas vezes por dia curva-se em reverência aos sete caracteres do Daimoku, e que todos os dias repete as palavras Namu-itijo-myoden dez mil vezes. Contudo, nos períodos menstruais abstém-se de ler o Sutra. A senhora pergunta se é aceitável recitar o Daimoku e o Namu-itijo-myoden (estar diante do objeto de adoração) em tais ocasiões. Também indaga se deve abster-se de ler o sutra durante o seu período menstrual ou, caso contrário, quantos dias após o final de seu período deve esperar antes de retornar a recitação do sutra. Esse é um assunto que preocupa todas as mulheres e a respeito do qual sempre inquirem. Em épocas passadas também encontramos muitas pessoas dirigindose a essa questão referente às mulheres. Entretanto como os ensinos sagrados propostos pelo Buda no curso de sua existência não tocam nesse ponto, ninguém conseguiu oferecer uma prova escritural clara na qual se possa basear uma resposta. Em meu próprio estudo dos ensinos de certos atos sexuais ou o consumo de carne ou vinho ou os cinco alimentos picantes em dias específicos do mês, jamais me deparei com qualquer passagem nos sutras ou tratados que fale de impedimentos ligados à menstruação.

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Enquanto o Buda encontrava-se no mundo, muitas mulheres na aurora de suas vidas tornaram-se freiras e devotaram-se à Lei Budista, mas elas nunca foram evitadas por causa de seu período menstrual. A julgar a partir disso, eu diria que a menstruação não representa nenhum tipo de impureza proveniente de uma causa externa. É simplesmente uma característica do sexo feminino,um fenômeno relacionado com a perpetuação da semente do nascimento e morte. Ou, num outro sentido, poderia ser considerada como um tipo de doença cronicamente periódica. No caso das fezes e da urina, embora essas seja substâncias produzidas pelo corpo, contanto que a pessoa siga hábitos de higiene, não há proibições especiais relativas às mesmas a serem observadas. Com certeza, o mesmo deve valer com referência a menstruação. É por isso que, penso, não ouvimos falar de regras específicas quanto a impedimentos pertinentes ao assunto, na Índia ou China. O Japão, contudo, é a terra dos deuses. E é próprio desse país o fato de, apesar de os Budas e Bodhisattvas teresm se manifestado aqui na forma de deuses, esses deuses, por mais estranho que pareça, não se adequam aos sutras e tratados. Entretanto, se alguém vai contra os mesmos, é provável que atraia punição real. Quando averiguamos minuciosamente os sutras e tratados, constatamos que há uma doutrina chamada preceito zuiho bini, que corresponde a esses casos. O ponto principal desse preceito é que, contanto que não envolva nenhum ato seriamente ofensivo, mesmo que a pessoa se aparte dos ensinos num pequeno grau, deve evitar de ir contra os modos e costumes do país. Esse é um preceito exposto pelo Buda. Porém, parece que alguns homens sábios, não conscientes desse fato, clamam que como os deuses são seres semelhantes a demônios, são indignos de reverência. E, através de insistirem na correção de suas idéias, parece que eles imprimem danos na fé de muitos crentes. Se agirmos conforme este preceito de zuiho bini, então, uma vez que os deuses do Japão em muitos casos desejaram que fossem observadas proibições referentes ao período de menstruação, as pessoas nascidas nesse país provavelmente fariam bem em estar conscientes dessas proibições e honrá-las. Contudo, não acho que tais proibições devam interferir nas devoções religiosas diárias de uma mulher. Eu presumiria que, para começar, são pessoas que nunca tiveram fé alguma no Sutra de Lótus que lhe dizem o contrário. Elas estão tentando achar algum modo para fazê-la parar de recitar o Sutra, mas acham-se incapazes de apontar isto diretamente e aconselhá-la a deixar o sutra de lado. Assim, usam o pretexto da impureza corporal para tentarem distanciá-la do mesmo. Elas a intimidam afirmando que, se continuar com suas devoções regulares durante o período de mácula, estará tratando o Sutra com

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desrespeito. Dessa maneira, pretendem persuadí-la a cometer uma falta. Espero que mantenha em mente tudo o que eu disse sobre esse assunto. Com base nisso, mesmo que seu período menstrual demore sete dias, caso se sinta muito indisposta abstenha-se da leitura do sutra e recite simplesmente o Nam-myoho-rengue-kyo. Além disso, quando realizar suas devoções, não precisa curvar-se na frente do sutra. Se inesperadamente sentir aproximar-se da morte, então, mesmo que estivesse comendo peixe ou ave, se pudesse ler o sutra, a senhora o faria e, igualmente, recitaria o nam-myoho-rengue-kyo. Nem é preciso dizer que o mesmo princípio se aplica durante o seu período menstrual. Recitar as palavras namu-itijo-myoden equivale à mesma coisa. Porém, é melhor que recite apenas o nam-myoho-rengue-kyo, como o bodhisattva Vasubandhu e o grande mestre Tientai o fizeram. Há razões específicas pelas quais eu digo isto.

Respeitosamente, Nitiren Em 17 de abril de 1264

Fundo de Cena

Nitiren Daishonin escreveu esta carta em 1264, enquanto morava em Kamakura, para a esposa de Hiki Daigaku Saburo Yoshimoto. Ele havia estudado o confucionismo na capital imperial de Quioto e servido ao imperador aposentado Juntoku. Posteriormente, dirigiu-se a Kamakura onde foi empregado pelo governo militar como um erudito confuciano. Acredita-se que tenha se tornado seguidor de Nitiren Daishonin por volta de 1260. Segundo a tradição, ele decidiu abraçar o ensino de Nitiren Daishonin ao ler um rascunho do Rissho Ankoku Ron (A Pacificação da Terra Através do Estabelecimento do Verdadeiro Budismo). Tanto ele como sua esposa foram praticantes fervorosos. Evidentemente, a esposa de Yoshimoto havia enviado uma carta a Nitiren Daishonin fazendo perguntas específicas a respeito das formalidades a serem observadas na adoração do Sutra de Lótus. Esse gosho é a resposta de Nitiren Daishonin.

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A primeira pergunta dela foi: Que capítulo do Sutra de Lótus devem ser recitados na prática diária ? Em resposta, na primeira parte do gosho, Nitiren Daishonin explana que o Sutra de Lótus é o auge dos ensinos expostos pelo Buda em sua existência, e é a verdade atestada por todos os Budas do universo. Assim como o oceano contém as águas de todos os rios e córregos, o Sutra de Lótus encerra dentro de si os benefícios de todos os outros ensinos. Deste modo, num sentido amplo, recitar qualquer parte do mesmo é um ato digno de máximo louvor e criará um mérito que se encontra além da imaginação. Entretanto, entre todos os vinte e oito capítulos, os capítulos Hoben (segundo) e Juryo (décimo-sexto) são especialmente vitais. Esses capítulos são como a raiz e os outros são como as folhas e ramos. Portanto, quando se recita os capítulos Hoben e Juryo, todos os outros estão, na realidade, inclusos. Essa passagem em particular, de onde se deriva o nome do Gosho, é uma evidência de que Nitiren Daishonin logo nos primórdios estabeleceu a recitação dos capítulos Hoben e Juryo como a forma básica da prática diária apoiando a entoação do daimoku. A segunda pergutna da esposa de Yorimoto referia-se a que proibições em especial ela deveria observar ao realizar o gongyo durante seu período menstrual. Por esta razão, essa carta algumas vezes é denominada ‘Gosho sobre a Menstruação’. Tanto a pergunta em si como a explicação de Nitiren Daishonin devem ser compreendidas dentro de seu contexto histórico. O xintoísmo (caminho dos deuses), a religião oficial japonesa, enfatiza fortemente a manutenção da pureza do ritual e havia estabelecido um grande número de impedimentos ou tabus para prevenir incorrer em máculas. Morte, doença, ferimentos, parto, menstruação, etc, eram considerados fontes de contaminação, e uma pessoa em contato com qualquer uma dessas fontes de contaminação era solicitada a passar por um ritual de purificação antes de se dedicar às atividades de adoração. As mulheres, consequentemente, era proibidas de tomar parte em práticas religiosas durante o seu período menstrual. Esses tabus estavam profundamente enraizados na consciência popular e continuavam a ser respeitados muito tempo após a introdução do budismo, sendo frequentemente misturados com práticas budistas ao ponto de poucas pessoas terem conhecimento de sua origem nãobudista. Por exemplo, era parcialmente pela preocupação de evitar a impureza que as mulheres eram muitas vezes proibidas de entrar nos recintos dos monastérios budistas. Em resposta à pergunta da esposa de Yoshimoto, Nitiren Daishonin primeiro afirma que nenhum dos sutras menciona tabus referentes à menstruação. Dessa forma, ele esclarece que nada relativo à pureza do ritual ou à prevenção se deriva do budismo. Da perspectiva budista, explica Nitiren Daishonin, não há motivo para se considerar a menstruação impura, trata-se simplesmente de uma função natural do corpo.

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Todavia, ele prosseguiu, o costume de se obseravr tais proibições e tabus estava firmemente estabelecida na sociedade japonesa, e a pessoa não deve rejeitar categoricamente costumes e observâncias sociais simplesmente porque não têm relação com o budismo. Neste sentido, ele cita os princípios de zuiho bini – o preceito para se seguir os costumes da localidade – que declara que, mesmo que a pessoa possa se desviar, em detalhes menores, do ensino budista, ela deve evitar violar desnecessariamente as regras da sociedade. Tal flexibilidade é característica do budismo, que se preocupa em capacitar as pessoas a despertarem para a verdade fundamental de todas as coisas, e não em governar os detalhes de suas vidas. Assim, em sua propagação, o budismo habilidosamente adaptou seus aspectos periféricos ao tempo e lugar, abarcando costumes locais, mantendo, ao mesmo tempo, sua mensagem essencial intacta. No entanto, embora detalhes menores do budismo possam adaptados à sociedade, certos pontos básicos não devem ser comprometidos. Nitiren Daishonin, portanto, diz à esposa de Yoshimoto que, ao honrar as convenções sociais – nesse caso, obedecer às proibições – ela não as deve cumprir cegamente a ponto de interferir em sua prática budista diária. A recitação do sutra e a entoação daimoku constituem as práticas mais fundamentais para um praticante do ensino de Nitiren Daishonin e devem ser cumpridas fielmente.

As Duas Espécies de Doença (Nakatsuka Saemon-no-jo Gohenji – Páginas 1178 a 1179) As doenças dos seres humanos podem ser divididas em duas categorias gerais, sendo a primeira a doença do corpo. As doenças físicas abrangem cento e uma perturbações do elemento terra, cento e um desequilíbrios do elemento água, cento e um distúrbios do elemento fogo, somando um total de quatrocentos e quatro males. Essas doenças podem ser curadas com os remédios prescritos por médicos habilidosos como Jisui, Rusui, Jivaka e Pien Chueh. A segunda categoria é a doença da mente. Essas enfermidades surgem dos três venenos da avareza, ira e estupidez e são de 84 mil espécies. Somente um Buda pode curá-las. Deste modo, elas estão além dos poderes de cura das duas divindades brâmanes e dos três ascetas, sem mencionar os de Shen Nung e Huang Ti. As doenças da mente diferem grandemente em severidade. Os três venenos e suas 84 mil variações, que afligem os mortais comuns dos seis caminhos podem ser tratados pelo Buda das seitas Kusha, Jojitsu e

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Ritsu, que derivam-se do ensino Tripitaka, do Hinayana. Contudo, se alguém tentar usar os ensinos Hinayana para curar os três venenos e oitenta mil doenças que originam-se da calúnia aos sutras Mahayana, tais como os sutras Kegon, Hannya e Dainiti, esses males irão meramente, tornar-se piores e jamais serão curados. Eles podem ser tratados somente com os ensinos Mahayana. Além disso, se alguém tentar usar os sutras Kegon, Hannya e Dainiti ou os ensinos Shingon e Sanron para curar os três venenos e oitenta mil doenças que surgem quando os praticantes de vários sutras Mahayana opõem-se ao Sutra de Lótus, essas enfermidades tornar-se-ão muito mais sérias. Para ilustrar, as chamas lançadas pela madeira ou carvão podem ser facilmente extintas pela água. Porém, o fogo produzido pelo óleo queimando ficará ainda mais intenso, suas chamas subirão ainda mais, se alguém derramar água sobre o mesmo. As epidemias que têm assolado o Japão desde o ano passado não podem ser classificadas dentro das quatrocentas e quatro doenças do corpo. Portanto, estão além dos poderes de cura de Hua To e Pien Chueh. Tampouco correspondem a nenhuma das 84 mil doenças que podem ser tratadas com os ensinos Hinayana ou Mahayana provisório. Por esta razão, as orações oferecidas pelos sacerdotes das seitas baseadas nesses ensinos não somente deixarão de dar fim às epidemias, mas as agravarão muito mais. Mesmo que as epidemias diminuam este ano, infalivelmente irromperão novamente nos próximos anos. Provavelmente, cessarão somente após algo terrível ter acontecido. O Sutra de Lótus diz: “Se eles procurarem o caminho da medicina e tratarem a doença de acordo com a prescrição, produzirão somente complicações maiores, ou causarão, talvez, até a morte…A doença deles tornar-se-á cada vez mais grave”. O Sutra Nirvana afirma: “Nessa ocasião, o Rei Ajatashatru de Rajagriha.. tumores tomarão todo o seu corpo…(O rei disse) “Esses tumores têm causa espiritual e não se originam de uma desarmonia dos quatro elementos. Mesmo que as pessoas digam que há um médico que pode curá-los, pode ser possível que não haja um médico que pode curá-los, pode ser possível que não haja”. Miao-lo declara: “Os sábios podem ver presságios e o que eles predizem, como as cobras conhecem o caminho das cobras”. As atuais epidemias são como os tumores virulentos do rei Ajatashatru, que não podiam ser curadas por ninguém além do Buda. Elas podem ser erradicadas somente pelo Sutra de Lótus. Eu, Nitiren, contraí diarréia no trigésimo dia do décimo-segundo mês do ano passado, e, até o terceiro ou quarto mês deste ano, tornou-se frequente a cada dia e mais severa a cada mês. Justamente quando eu estava pensando que devia ser o meu carma imutável (morrer nesta ocasião), o senhor enviou-me um excelente remédio. Desde que o tomei, minha doença diminuiu gradativamente e agora é insignificante diante da intensidade anterior. Gostaria de saber se o Lorde Buda 118

Sakyamuni poderia ter entrado em seu corpo para ajudar-me, ou talvez os bodhisattvas da Terra tenham me conferido o bom remédio do Myoho-rengue-kyo. Tikugo-bo lhe explicará tudo isto em maiores detalhes. Pós escrito: O seu mensageiro chegou por volta da Hora do Cão (19:0021:00) no vigésimo-quinto dia deste mês. As coisas que o senhor mandou-me são incalculáveis. Por favor, transmita minha gratidão ao Lorde Toki pelo seu oferecimento de um traje de verão. Por favor, diga à sua esposa o quanto entristeceu a morte de seu avô.

Com meu profundo respeito, Nitiren Vigésimo-sexto dia do sexto mês

Fundo de Cena

Nitiren Daishonin escreveu esta carta, no Monte Minobu, para Shijo Kingo em Kamakura, em 26 de junho de 1278, quando contava com 57 anos. Shijo Kingo foi um devotado seguidor de Daishonin e um samurai a serviço da família Ema, uma ramificação do clã dominante, Hojo. Ele era um médico excelente, bem como um mestre em artes militares. Nesta carta, Daishonin expressa sua gratidão pelo remédio que Shijo Kingo havia prescrito e enviado a ele juntamente com outros oferecimentos. O seu conteúdo assemelha-se com o de um outro gosho, ‘Tratado da Doença’, escrito para Toki Jonin na mesma data. A passagem inicial, de fato, é de fato idêntica. A vida de Nitiren Daishonin em seu retiro no monte Minobu estava longe de ser fácil. Os invernos eram rigorosos e ele não possuía um abrigo adequado. O alimento era um outro problema pois as provisões fornecidas pelos seus seguidores nem sempre eram suficientes. Além disso, por quase toda a metade de 1278, ele sofreu uma diarréia crônica e debilitante. Nesta carta, Nitiren Daishonin refere-se aos dois tipos de doença: doença do corpo, que origina-se fundamentalmente de causas físicas, e doença da mente, que surge da ilusão e desejos mundanos. Ele explana que a doença do corpo pode ser curada por médicos suficientemente habilidosos, mas as doenças da mente não podem. Somente os ensinos budisas proporcionam um remédio para esses distúrbios. Ele também atribui as epidemias que assolavam o Japão à 119

calúnia ao Sutra de Lótus. Nem o ensino Hinayana e nem o Mahayana provisório poderá combatê-los, ele diz. A fé no Sutra de Lótus somente erradicará a calúnia das pessoas e removerá o sofrimento delas.

O Sabor Salgado Universal (Doitsu Shioaji Gosho – Pág.1447) Há seis espécies de sabor: o primeiro é suave, o segundo é salgado, o terceiro é acre, o quarto é azedo, o quinto é doce e o sexto é amargo. Mesmo que o senhor prepare um suntuoso banquete com cem diferentes pratos, ele não será adequado como banquete para um grande rei se faltar o único sabor do sal. Mesmo o prato mais extraordinário de todas as terras e mares será insípido se não contiver sal. O oceano tem oito qualidades misteriosas. Primeiro, o oceano torna-se gradualmente mais profundo. Segundo, sua profundidade é demasiadamente grande para ser imaginada. Terceiro, seu gosto é salgado é o mesmo em todos os lugares. Quarto, sua maré flui e reflui regularmente. Quinto, ele abriga muitos tesouros. Sexto, os seres vivos muito desenvolvidos residem nele. Sétimo, o oceano livra-se de todos os cadáveres. Oitavo, embora ele absorva todos os rios e grandes tempestades, seu volume não aumenta, nem diminui. A primeira qualidade, ‘o oceano torna-se gradualmente profundo’, indica figurativamente que o Sutra de Lótus gradualmente leva todas as pessoas, desde os mortais comuns desprovidos de conhecimento até os sábios possuidores de conhecimento, a alcançarem o caminho do Estado de Buda. ‘Sua profundidade é demasiadamente grande para ser imaginada’, indica que o campo do Sutra de Lótus pode ser compreendido e compartilhado somente entre Budas; os bodhisattvas no estágio de togaku ou abaixo não tem possibilidade de conseguí-lo. Quanto à qualidade ‘seu gosto salgado é o mesmo em todos os lugares’, indica que todos os rios, que não contém sal, são comparáveis aos sutras diferentes do Sutra de Lótus, e não possibilitam a ninguém atingir a iluminação. Assim como a água de todos os rios acaba fluindo para o oceano tornando-se salada, os homens das mais diferentes capacidades, instruídos através dos vários ensinos provisórios, tornam-se capazes de alcançar o caminho do Estado de Buda através da fé no Sutra de Lótus. ‘Sua maré flui e reflui regularmente’ indica que todos os que abraçam a Lei Mística certamente alcançarão o estágio da não-regressão, mesmo que percam suas vidas. ‘Ele abriga muitos tesouros’ significa que as práticas e ações virtuosas de todos os Budas e bodhisattvas, assim

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como os benefícios dos paramitas, estão todos contidos dentro da Lei Mística. Quanto à qualidade ‘seres vivos muito desenvolvidos vivem nele’, Os Budas e bodhisattvas são aqui referidos como ‘seres vivos muito desenvolvidos’ porque possuem grande sabedoria. O grande desenvolvimento, a grande mente aspiradora, as grandes características extraordinárias, as grandes forças que derrotam o mal, a grande pregação, a grande autoridade, os grandes poderes ocultos, e a grande benevolência desses Budas e bodhisattvas – originam-se do Sutra de Lótus. ‘O oceano livra-se de todos os cadáveres’ significa, que através do Sutra de Lótus, uma pessoa pode livrar-se por toda a eternidade da ofensa de caluniar a Lei ou possuir descrença incorrigível. A oitava qualidade, ‘Seu volume não aumenta, nem diminui’ significa que a alma do Sutra de Lótus é o ensino segundo o qual todas as pessoas possuem igualmente a natureza do Buda. A salmoura, numa tina ou pote de uvas conservada em sal, flui e reflui exatamente de acordo com a maré do oceano. Um devoto do Sutra de Lótus submetido ao aprisionamento é como o sal da tina ou do pote, ao passo que o Buda Sakyamuni, que livrou-se da casa em chamas, é como o sal do oceano. Aprisionar um devoto do Sutra de Lótus é aprisionar o próprio Buda Sakyamuni. Como devem estar impressionados Bonten, Taishaku e os Quatro Reis Celestes ao presenciarem isso ! As Dez Deusas juraram punir aquele que perseguisse o devoto do Sutra de Lótus, partindo sua cabeça em sete partes. Quando será cumprido esse juramento, se não for agora ! Chagas virulentas abriram-se repentinamente em todo o corpo do rei Ajatashatsu, que havia aprisionado o rei Bimbisara. Como pode aquele que aprisiona um devoto do Sutra de Lótus evitar o sofrimento de ter o corpo todo aberto em chagas ?

Nitiren

Fundo de Cena

Não se conhece a data e o recebedor deste Gosho, e as razões que o levaram a ser escrito são também incertas, por falta de documentação confiável. Nitiren Daishonin poderia ter escrito este Gosho numa época em que seus discípulos estariam enfrentando perseguições, conforme indicam as afirmações: “Um devoto do Sutra de Lótus submetido ao aprisionamento” ou “aquele que aprisiona um devoto do Sutra de Lótus…” Existem diversos pontos de vista no tocante ao ano que foi escrito. Segundo um deles, teria sido em 1261, quando Daishonin foi exilado a Izu; segundo outro, em 1271, quando foi exilado à ilha de Sado; e, de acordo com um terceiro, em 1279, quando perseguições 121

atingiram seus seguidores em Atsuhara. Dentre todas, 1261 parece ser a data mais provável. Este Gosho consta de três seções. Na seção de abertura, Nitiren Daishonin afirma que há seis espécies de sabores, dos quais o do sal é o mais importante. Sem o sal, qualquer alimento perderia seu gosto. Através desta metáfora, Daishonin mostra que todos os sutras somente adquirem seus verdadeiros significados uando baseados na verdade revelada no Sutra de Lótus. Na segunda seção, ele cita as oito qualidades místicas do oceano enumeradas no Sutra do Nirvana, a fim de ilustrar as esplêndidas caracteristicas do Sutra de Lótus. Na seção final, Daishonin compara o sal contido num pote ou tina de uvas conservadas em sal ao seguidor do Sutra de Lótus, e compara o sal do oceano ao Buda Sakyamuni. O sal do pote ou da tina constituía originalmente parte do oceano. Assim, a salmoura desse pote ou tina flui e reflui exatamente como o oceano e, analogamente, aprisionar um devoto do Sutra de Lótus é o mesmo que aprisionar o próprio Buda Sakyamuni. Daishonin proclama que aqueles que perseguem os devotos do Sutra de Lótus estão destinados a receber punições através das mãos dos deuses celestes. Em contraste, os que abraçam a Lei Mística podem no final atingir o Estado de Buda como mortais comuns, mesmo que encontrem sofrimentos.

Um Resumo do Capítulo Zokurui e de Outros (Nitinyo Gozen Gohenji, págs. 1245 a 1250) Recebi o seu oferecimento de sete kan de moedas. A essência do capítulo Zokurui (vigésimo-segundo) do Sutra de Lótus consta a seguir. O Buda, (levantando-se de seu assento na Torre do Tesouro), postando-se no espaço aberto, e para realizar uma transferência do Sutra de Lótus, tocou, não menos do que três vezes as cabeças do bodhisattva Jogyo e de seus seguidores, de Monju e de seus seguidores, de Daibonten, de Taishaku, dos deuses do sol e da lua, dos Quatro Reis Celestes, dos reis dragões, das dez filhas demônios e de outros. Eles haviam se aglomerado diante do Buda tão numerosamente quanto o orvalho, preenchendo os quatrocentos bilhões nayuta d emundo como a grama de Musashino ou as árvores que cobrem o monte Fuji. Eles ajoelharam próximos uns dos outros, curvando seus 122

corpos de modo que suas cabeças tocassem o chão e transpirando com as palmas das mãos justapostas. (O Buda Sakyamuni tocou suas cabeças) assim como uma mãe afaga o cabelo de seu único filho. Então, Jogyo, os deuses do sol e da lua, e os outros receberam a ordem auspiciosa do Buda e prometeram propagar o Sutra de Lótus na era posterior. Quanto ao capítulo Yakuo (vigésimo-terceiro): No passado, um bodhisattva chamado Kiken aprendeu o Sutra de Lótus do Buda Excelência Brilho Puro do Sol e da Lua. Ele também ficou profundamente comovido por esse favor recebido de seu mestre e pela sublimidade do Sutra que esgotou todos os seus tesouros preciosos em oferecimentos. Ainda insatisfeito, ele ungiu-se com óleo e queimou seu corpo como um oferecimento ao Buda por um período de doze anos, assim como hoje queimamos óleo inserindo nele um pavio e acendendo-o. Então, em sua existência seguinte, fez de seus braços tochas e queimou-os por setenta e dois anos como um oferecimento ao Sutra de Lótus. Deste modo, se uma mulher faz oferecimentos ao Sutra de Lótus agora, no quinto período de quinhentos anos, todos os benefícios desse bodhisattva serão legados a ela sem exceção, assim como um homem rico transfere toda a sua fortuna a seu único filho. O capítulo Myoon (vigésimo-quarto) fala de um bodhisattva chamado Myoon que vive na terra do Buda rei da Sabedoria da Constelação Pura Flor no Leste. No passado, na era do buda Rei da Nuvem Som do Trovão, ele foi a Dama Jotoku, a esposa do rei Myoshogon. Naquele tempo, a Dama Jotoku realizou oferecimentos ao Sutra de Lótus no mundo saha, esse bodhisattva veio para assistir à cerimônia e prometeu proteger as mulheres que abraçassem o Sutra de Lótus na era posterior. O capítulo Kannon (vigésimo-quinto) também é denominado capítulo Fumon. A primeira parte descreve o mérito daqueles que depositam fé no bodhisattva Kanzeon (ou Kannon) – daí, o título capítulo Kannon. A parte final expõe o mérito daqueles que abraçam o Sutra de Lótus, (o ensino da iluminação universal) que o bodhisattva Kannon sustenta – daí, o título do capítulo Fumon (portão universal). O capítulo Dharani (vigésimo-sexto) relata que os dois santos, os dois deuses celestiais, e as dez filhas demônios protegerão os devotos do Sutra de Lótus. Os dois santos são Yakuo e Yuze, e os dois deuses celestiais são Bishamon e Jikoku. As dez filhas demônios são os dez principais demônios femininos, as mães de todos os demônios dos quatro continentes. Além disso, essas dez filhas demônios possuem uma mãe chamada Kishimojin. A natureza dos demônios é alimentar-se de seres humanos. Seres humanos são compostos de trinta e seis elementos: excremento, urina, saliva, carne, sangue, pele, osso, os cinco principais órgãos internos, os seis principais órgãos externos, o cabelo, o pelo do corpo, a respiração, 123

a vida, etc. Demônios de capacidade inferior alimentam-se de excremento e coisas do gênero. Demônios de capacidade intermediária comem ossos e partes similares, ao passo que, demônios de capacidade superior vivem da vitalidade humana. Como demônios de capacidade superior, as dez filhas demônios subsistem a partir da vitalidade humana. Elas são os poderosos demônios que geram epidemias. Há dois tipos de demônios – bons e maus. Demônios bons alimentamse de inimigos do Sutra de Lótus, enquanto que os demônios maus alimentam-se de devotos do sutra. Como devemos interpretar as grandes epidemias que se espalharam por todo o Japão tanto no ano passado como neste ? De uma certa perspectiva, são obras dos demônios bons, que estão devorando inimigos do Sutra de Lótus com a aprovação de Bonten, Taishaku, dos deuses do sol e da lua e dos Quatro Reis Celestiais. Entretanto, por outro ângulo, são trabalhos dos demônios maus, que estão se alimentando de praticantes do Sutra de Lótus por recomendação do Demônio do Sexto Céu. Os demônios bons devorando os inimigos do Sutra de Lótus são como soldados do governo punindo inimigos do soberano. Porém, os demônios maus comendo devotos do Sutra de Lótus são como gatunos e ladrões da noite matando soldados do governo. Por exemplo, quando o budismo foi trazido ao Japão, o importante ministro Mononobe no Moriya e outros que se opuseram a este foram assolados pelas epidemias, mas Soga no Umako e outros (que defenderam o budismo) também adoeceram. Três sucessivos imperadores, Kimmei, Bidatsu e Yomei, acreditaram no budismo e no Buda Sakyamuni em seus corações, mas externamente adoravam a Deusa do Sol e os santuários de Kumano, obedecendo aos ritos tradicionais da nação. Como a sua fé no Buda e nos ensinos dele era fraca, ao passo que sua fé nos deuses era forte, esses governantes foram arrastados pela influência mais forte e morreram nas epidemias de varíola. Deve ponderar, com base nesses exemplos, os dois tipos de demônios mencionados acima, bem como as razões pelas quais as epidemias se alastram entre as pessoas do mundo de hoje e porque alguns dentre os meus seguidores também adoecem e perecem. Segue-se, por um lado, que aqueles que empenham suas vidas em prol da fé não adoecerão, ou que mesmo que fiquem doentes, eles se recuperarão. Por outro lado, se encontraram grandes demônios maus, podem ser privados de suas vidas. O caso deles será, então, como o de Hatakeyama Shiguetada, que no final foi destruído pelo número avassalador de seus inimigos, embora fosse o general mais poderoso no Japão. Demônios maus possuiram todos os mestres da Shingon no Japão, e como todos os sacerdotes Zen e Nembutsu opõem-se a Nitiren, esses demônios espalham-se desenfreadamente por todo o país. Além disso, 124

os seguidores de Bonten, Taishaku, os deuses do sol e da lua, e as dez filhas demônios também enxamearam o Japão, e os dois lados estão lutando ferozmente para derrotarem-se um ao outro. Uma vez que as dez filhas demônios juraram proteger os devotos do Sutra de Lótus em geral, poder-se-ia pensar que elas devam proteger todos aqueles que abraçam o Sutra (mais isso nem sempre acontece). Mesmo entre as pessoas que abraçam o Sutra de Lótus, algumas são mestres Shingon e o lêem e recitam, mas, ao mesmo tempo, declaram a superioridade do sutra Dainiti. Tais pessoas estão, na realidade, caluniando o Sutra de Lótus. E o mesmo princípio se aplica também a (todos aqueles que praticam, mas acreditam na superioridade de) qualquer outra seita. Mesmo que aqueles que abraçam o Sutra de Lótus conforme as palavras deste, há alguns que nutrem ressentimento com relação ao devoto do Sutra de Lótus por causa de sua avareza, ira e estupidez, ou por causa de assuntos mundanos, ou por causa de suas várias ações. Embora essas pessoas acreditem no Sutra de Lótus, elas não obterão o benefício da fé, e ao invés disso, atrairão punição. Para ilustrar se um filho desobedecer seu pai e mãe, estará agindo de maneira pouco filial, exceto num caso no qual estes estejam tramando uma rebelião. Mesmo que um pai possa roubar a amada esposa de seu próprio filho, se o filho ou filha desviarem-se mesmo que um pouco do caminho da devoção filial, criarão causas que os levarão a serem abandonados pelo céu nesta vida e a cair no inferno Aviti na próxima. Ainda mais grave é o ato de ir contra um soberano digno, que é superior a um pai ou a uma mãe. E, ainda mais sério, é ir contra um mestre secular, que é cem trilhões de vezes superior aos pais ou soberano de uma pessoa. Quão grave deve ser, então, ir contra um mestre budista que abandonou o mundo secular; e, muito mais ainda, o mestre do Sutra de Lótus. Afirma-se que o rio Amarelo torna-se claro uma vez em mil anos, e que um sábio, igualmente, surge no mundo uma vez a cada mil anos. Um Buda faz o seu advento no mundo uma vez em incontáveis kalpas. Entretanto, mesmo que a pessoa possa deparar-se com um Buda, é muito mais difícil encontrar o Sutra de Lótus. E, mesmo que encontre o Sutra de Lótus, é ainda mais raro, para um mortal comum da era posterior, encontrar um devoto do Sutra de Lótus. A razão disso é que o devoto do Sutra de Lótus que o expõe na era posterior, ultrapassa (os Budas e bodhisattvas que aparecem nos) sutras Kegon, Agon, Hodo e Hannya e os mais de mil e duzentos honrados do sutra Dainiti – que não expuseram o Sutra de Lótus. O Grande Mestre Miao-lo afirma em seu comentário: “Aqueles que fazem oferecimentos (ao devoto do Sutra de Lótus) terão boa sorte que supera a dos dez títulos honoráveis, ao passo que aqueles que (o) afligem terão sua cabeça partida em sete pedaços”.

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As epidemias que a nação japonesa tem sofrido desde o ano passado, bem como as da passada era Shoka, são totalmente sem precedentes nos reinados dos mais de noventa imperadores que governaram o Japão desde o início da era imperial. Essas calamidades parecem ter origem no fato de que as pessoas odeiam a presença de um sábio neste país. É exatamente a isso que se refere quando se diz que um cão que late para um leão terá os seus intestinos dilacerados, e que um asura que tentar engolir o sol e a lua terá a sua cabeça quebrada. Dois terços de todas as pessoas do Japão já adoeceram nas epidemias e metade delas pereceu. O terço restante pode não estar aflito no corpo, mas esta aflito na mente. Visível ou invisivelmente, as cabeças delas, com certeza, se partiram. Existem quatro tipos de castigos – geral e individual, imperceptível e perceptível. Se o povo nutre ódio por um sábio, a punição geral será infligida sobre o país inteiro, estendendo-se aos quatro continentes, aos seis céus do mundo do desejo e aos quatro céus de meditação. Quando a inimizade é dirigida a um homem digno, apenas aqueles que o sentem sofrerão punição. As epidemias que se alastram agora no Japão são uma punição geral. Seguramente as pessoas devem ter contrariado um sábio que vive neste país. Pelo fato de uma montanha conter uma jóia, suas plantas e árvores não murcham. Pelo fato de o país ter um sábio, esse país é protegido da ruína. Pessoas ignorantes não percebem que as plantas e árvores numa montanha não murcham por causa da presença de uma jóia. Nem percebem que um país declina devido à hostilidade com relação a um sábio. Mesmo que o sol e a lua brilhem, a sua luz não beneficia o cego. Qual a utilidade do som das vozes para o surdo ? As pessoas do Japão estão todas como que cegas ou surdas. Como seria imenso o benefício se alguém pudesse abrir todos esses olhos e ouvidos, pudessem fazer todos os olhos enxergarem e os ouvidos escutarem ! Quem conseguiria talvez este benefício ? E eu devo acrescentar que mesmo que os pais dêem nascimento a uma criança dotada de visão e audição, se não houver nenhum mestre para instruí-la, seus olhos e ouvidos não serão melhores do que os de um animal. Entre as dez direções, todas as pessoas do Japão aspiram ao oeste. Entre todos os Budas, elas reverenciam o Buda Amida e entre todas as práticas, invocam o nome de Amida. Alguns fazem dessas preocupações suas bases embora se ocupem com outras práticas, enquanto outros se devotam à Nembutsu somente. Nos mais de vinte anos desde o quinto ano da era Kentyo (1253) até o presente, primeiro esclareci os ensinos do Buda em sua existêncai em termos de seu mérito relativo, sequência de propagação e profundidade, e fundamentado nisto, afirmei a superioridade do Daimoku do Sutra de Lótus em relação à invocação do nome do Buda Amida. Entretanto, ninguém, do soberano às pessoas do povo, deu atenção às minhas palavras. Eles indagaram a meu respeito a seus mestres, apelaram a seus lordes, conversaram com seus companheiros, falaram às suas 126

esposas, filhos e subordinadas, de modo que rumores referentes a mim se espalharam a cada província, distrito, vila e aldeia, bem como a seus templos e santuários. Como resultado, todos vieram a conhecer o meu nome, e todos eles dizem que caso se compare o Sutra de Lótus com a Nembutsu, a Nembutsu é superior e o Sutra de Lótus não está a altura de competir com o mesmo, e que outros sacerdotes são dignos de respeito, ao passo que eu, Nitiren, sou desprezível. Assim, o soberano me olhou com hostilidade, as pessoas passaram a me odiar, e todo o Japão se tornou um grande antagonista do Sutra de Lótus e de seu devoto. Porém, se eu disse isto, não apenas o povo do Japão em geral, mas também os ignorantes entre os meus seguidores pensarão que estou inventando mentiras infundadas numa tentativa de fazer as pessoas acreditarem em mim. Contudo, estou falando tudo isto em benefício daqueles homens e mulheres que crêem nos princípios do budismo e deixarei que estes realizem seu próprio julgamento. O capítulo Myoshogonno (vigésimo-sétimo) é especialmente aplicável às mulheres, pois explica como uma pessoa encorajou o seu marido (a ter fé no Sutra de Lótus). Na era posterior também, embora o nome dela possa diferir, uma esposa que levar o seu marido a ter fé desfrutará o mesmo benefício da Dama Jotoku. Muito mais afortunado é um caso como o seu, no qual tanto a esposa como o marido possuem fé ! É como um pássaro que possui duas asas ou uma carroça que possui duas rodas. Há alguma coisa que não possam alcançar ? Pelo fato de existir um céu e uma terra, um sol e uma lua, o sol brilha e a chuva cai, e as plantas e árvores do benefício seguramente florescerão e frutificarão. Prosseguindo, chegamos ao capítulo Kambotsu (vigésimo-oitavo). Embora houvesse muitos monges entre os discípulos do Buda Sakyamuni, Mahakashyapa e Ananda sempre o acompanham, à sua direita e à sua esquerda, assim como os ministro da direita e à esquerda que escoltam o soberano. Isto quanto o Buda expôs os Sutra Hinayana. Além disso, entre todos os inumeráveis Bodhisattvas, Fugen e Monju eram distinguidos como os ministros da direita e da esquerda do Buda Sakyamuni. Foi estranho, portanto, que o bodhisattva Fuguen, um dos dois ministros de Sakyamuni, durante os oito em que o Buda revelou o Sutra de Lótus, que supera todos os outros sutras de sua vida de ensinos, na cerimônia onde os Budas e Bodhisattvas das dez direções se reuniram em números que excediam os das partículas de poeira que compõem a terra. Porém, quando o capítulo Myoshogonno havia sido exposto e a pregação do Sutra de Lótus estava chegando ao fim, o bodhisattva Fuguen veio correndo atrasadamente da terra do Buda Rei que Ultrapassa a Excelência Assombrosa das Gemas, no leste, acompanhado dos sons de bilhões de instrumentos musicais e liderando uma comitiva de incontáveis números dos oito tipos de seres 127

inferiores. Provavelmente temendo o desagrado do Buda por sua chegada tardia, ele assumiu uma expressão grave e jurou com toda a sinceridade proteger o devoto do Sutra de Lótus na era posterior. O Buda, indubitavelmente satisfeito com a sinceridade extraordinária de Fuguen em jurar propagar o Sutra de Lótus por todo o continente de Jambudvipa, elogiou-o por isso – mais calorosamente, na verdade, do que havia louvado os outros Bodhisattvas de categoria superior. Não é algo comum, para uma mulher na era posterior, ter decidido fazer um oferecimento para cada um dos vinte e oito capítulos desse maravilhoso Sutra de Lótus. Na cerimônia do capítulo Hoto (décimoprimeiro), os Tathagattas, Taho e Sakyamuni, os Budas das dez direções e todos os bodhisattvas se reuniram. Quando pondero onde o capítulo Hoto está agora, vejo que deve ser encontrado no Lótus de oito pétalas do coração dentro do peito da Dama Nitinyo. Isto é igual à semente do Lótus que contém a flor de Lótus em seu interior ou a uma imperatriz carregando um príncipe herdeiro em seu ventre. Quando alguém, tendo observado os dez bons preceitos, está destinado a nascer como um príncipe herdeiro e aguarda o seu nascimento no ventre de uma imperatriz, os deuses celestiais o protegem. É por isso que um príncipe herdeiro é denominado Filho do Céu. Cada um dos 69.384 caracteres dos vinte e oito capítulo do Sutra de Lótus é como um príncipe herdeiro e é como a semente de um Buda. Existem sombras na escuridão, mas as pessoas não conseguem discerní-las. Há trilhas no céu onde pássaros voam, porém as pessoas não conseguem reconhecê-las. Há caminhos no mar ao lono dos quais os peixes nadam, mas as pessoas não conseguem percebê-los. Todas as pessoas e coisas dos quatro continentes são refletidas na Lua sem uma única exceção, mas as pessoas não conseguem vê-las. Contudo, elas são visíveis ao olho divino. De modo semelhante, os mortais comuns não conseguem enxergar que o capítulo Hoto existe dentro do corpo da Dama Nitinyo, mas Sakyamuni, Taho e os Budas das dez direções percebem-no. Eu, Nitiren, também presumo que seja este o caso. Quão digno de respeito ! O rei Wen da dinastia Chou foi vitorioso na batalha porque tomava o cuidado de prover a subsistência das pessoas mais idosas. Perto do final dos trinta e sete reinados, efetuado por seus descendentes, que se estenderam por oitenta anos, houve alguns incidentes de mau governo, mas no geral a dinastia Chou prosperou graças àquela virtude fundamental. O rei Ajatashatru, apesar de ser um homem muito mau, conseguiu manter o trono durante noventa anos devido ao mérito do seu pai, o rei Bimbisara, que havia realizado oferecimentos ao Buda por vários anos. 128

O mesmo princípio continua valendo hoje. Não penso que o atual regime irá durar muito, pois se opõe ao Sutra de Lótus. Entretanto, provavelmente por causa dos excelentes administradores do falecido Gon no Tayu e do antigo governador de Musashi, parece estar seguro por algum tempo. Contudo, nesse caso também, o atual governo no final irá desmoronar se continuar sua inimizade com referência ao Sutra de Lótus. Os oficiais do governo erroneamente acham que os sacerdotes Nembutsu são amistosos em relação ao Sutra de Lótus, ao passo que Nitiren é hostil à Nembutsu; e eles clamam acreditar em ambos os ensinos. Eu, Nitiren, digo em réplica; se não há nada vitalmente errado com o presente governo, então, por quê irromperam tais epidemias, fome e guerras sem precedentes ? Por que as autoridades submeteram, por duas vezes, o devoto do Sutra de Lótus à grave punição sem o permitirem enfrentar as outras seitas num debate aberto ? Quão lamentável ! Mesmo sob tais circunstâncias, a senhora, como uma mulher, herdou a vida do Sutra de Lótus. Na realidade, herdou a vida dos pais de Sakyamuni, Taho e todos os Budas das dez direções. Existe alguém mais no mundo que desfrute de tal boa sorte ?

Com meu profundo respeito, Nitiren Em 25 de junho.

Fundo de Cena

Nitiren Daishonin escreveu esta carta no Monte Minobu, no mês de junho de 1278, para a sua seguidora Dama Nitinyo. Acredita-se que ela tenha sido ou a esposa de Emon-no-tayu Munenaka, o mais velho dos irmãos Ikegami, ou a filha de Dama Matsuno, embora não haja evidências claras. Conforme indicado pela passagem, ‘Não é algo comum, para uma mulher na era posterior, ter decidido fazer um oferecimento para cada um dos vinte e oito capítulos desse maravilhoso Sutra de Lótus’, Nitiren Daishonin redigiu esta carta em resposta aos sinceros oferecimentos dela. Na mesma, ele delineia os sete últimos capítulos do Sutra de Lótus – do vigésimo-segundo, Zokurui, ao vigésimo-oitavo, Kambotsu – e descreve o benefício de cada capítulo. Daí, o título do gosho. 129

Inicialmente, Nitiren Daishonin discute o capítulo Zokurui, identificando o âmago desde como sendo a cerimônia de transferência do Sutra de Lótus. No capítulo precedente, Jinriki (vigésimo-primeiro), o Buda Sakyamuni transfere o Sutra de Lótus especificamente ao bodhisattva Jogyo e os outros Bodhisattvas da Terra. No capítulo Zokurui, ele faz uma transferência geral do Sutra de Lótus aos Bodhisattvas da Terra, e outros Bodhisattvas liderados por Monju, aos deuses budistas incluindo Bonten, Taishaku os deuses do Sol e da Lua e os Quatro Reis Celestes, e as dez filhas demônios, afagando-lhes a cabeça três vezes. Em seguida, Nitiren Daishonin resume os capítulos Yakuo (vigésimoterceiro), Myoon (vigésimo-quarto) e Kannon (vigésimo-quinto), descrevendo o benefício e proteção conferidos pelos bodhisattvas Yakuo, Myoon e Kannon. Esses capítulos explicam que esses bodhisattvas, que receberam a transmissão do Sutra de Lótus no capítulo anterior, propagarão os ensinos do Buda, manifestando os seu próprios poderes de forma plena, salvando, desse modo, todas as pessoas. Nitiren Daishonin, então, passa ao vigésimo-sexto capítulo, Dharani, no qual os Bodhisattvas Yakuo e Yuze, os dois reis celestiais Bishamon e Jikoku, e as dez filhas demônios juram proteger os devotos do Sutra de Lótus que propagarão os ensinos do Buda na era maléfica que virá. Aqui, Nitiren Daishonin esclarece as funções dos dois tipos de demônios – bons e maus. Segundo ele explana, os demônios bons alimentam-se dos inimigos do Sutra de Lótus, ao passo que os demônios maus devoram os devotos do Sutra. Ele também interpreta as epidemias que então devastavam o Japão com base nisto, e aponta o quanto é terrível perseguir o devoto do Sutra de Lótus, que deseja conduzir todas as pessoas à iluminação. A últim parte do gosho trata do vigésimo-sétimo capítulo, Myoshogonno, e do capítulo final, Kambotsu, o capítulo Myoshogonno conta como a Dama Jotoku levou o seu marido, o rei Myoshogon, a ter fé no Sutra de Lótus. Como a Dama Nitinyo e o seu marido eram, ambos, seus seguidores, Nitiren Daishonin salienta o quão imensos serão os benefícios que um marido e esposa podem receber devotando-se juntos à fé. O capítulo Kambotsu descreve a proteção do bodhisattva Fuguen, que jurou salvaguardar o Sutra de Lótus e o seu devoto após a morte do Buda. Após ter delineado os sete últimos capítulos do Sutra, do Zokurui ao Kambotsu, Nitiren Daishonin elogia a fé da Dama Nitinyo em fazer um oferecimento para cada um dos vinte e oito capítulos do Sutra de Lótus. Ele declara que a Cerimônia do Ar, que começa no meio do capítulo Hoto (décimo-primeiro) deve ser encontrada no coração de Dama Nitinyo. Nitiren Daishonin retratou essa Cerimônia do Ar quando inscreveu o Gohonzon. Essa passagem corresponde a uma outra, que consta em ‘O Real Aspecto do Gohonzon’, escrito um ano antes para Dama Nitinyo, que afirma: ‘Nunca procure o Gohonzon além de si 130

mesma. O Gohonzon somente existe dentro da nossa carne humana, das pessoas comuns que abraçam o Sutra de Lótus e recitam Nammyoho-rengue-kyo’. Em conclusão, Nitiren Daishonin louva a Dama Nitinyo como alguém que, embora viva numa época turbulenta num país cujos líderes se opõem ao Sutra de Lótus, preserva a herança do Sutra e receberá benefício imensuravelmente grande.

As Profecias do Buda (Kembutsu Mirai-Ki - Página 505 a 509) O sétimo volume do Sutra de Lótus diz: "Durante o último período de 500 anos a após minha morte, o Sutra de Lótus propagar-se-á por todo o mundo e nunca cessará seu fluxo." Eu, por outro lado, lamento: passaram-se aproximadamente 2.220 anos desde o falecimento do Buda, e que mau carma impediu-me de nascer durante os dias do Buda ou ver os quatro santos dos Primeiros Dias da Lei ou, ainda, encontrarme com Tientai, Dengyo e outros nos Médios Dias da Lei? Por outro lado contente quando penso na boa sorte que me possibilitou nascer no último período de 500 anos e ler este ensino dourado do Buda. Mesmo que tivesse nascido nos dias do Buda, não teria sentido pois aqueles que ouviram os ensinos dos primeiros "quatro sabores" não ouviram até agora o Sutra de Lótus. E, ainda, mesmo que eu tivesse nascido nos Médios Dias da Lei não teria não teria o mínimo significado, pois mesmos os sábios das sete seitas ao norte e três do sul do rio Yangtze, assim como os sábios da Kegon, Shingon e outras seitas, não acreditaram no Sutra de Lótus. Tientai, o Grande, afirmou: "No último período de 500 anos a Lei Mística será propagada e irá até o futuro distante oferecendo à humanidade abundantes benefícios." Não estava ele se referindo ao tempo do Kossen-rufu? Dengyo, o Grande, declarou: "Os Primeiros e Médios Dias estão quase passando e os Últimos Dias estão muito próximos." Suas palavras revelam quanto ele desejou viver no começo dos Últimos Dias da Lei. A comparação dos benefícios nestas três eras revela que ultrapasso Ryuju e Tenjin e ainda, Tientai e Dengyo. Questão: O senhor não é a única pessoa que vive neste período de 500 anos. Por que está particularmente contente com isso?

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Resposta: O quarto volume do Sutra de Lótus diz: "Desde que o ódio e a inveja eram abundantes durante a existência do Buda, quão pior será no mundo após seu falecimento?" A respeito disso, Tientai, o Grande, disse: "Será muito pior no futuro porque o Sutra de Lótus é muito difícil de ser ensinado." Miao-lo, o Grande, disse: "O Sutra de Lótus é difícil de ser ensinado - significa a dificuldade de ensinar o sutra às pessoas de tal modo que elas possam compreender." O bonzo Tido disse: "Um provérbio secular diz que o bom remédio é sempre amargo. De maneira semelhante, este sutra destroi a ligação aos cinco veículos e admite somente o Supremo Veículo, rejeita os mortais comuns como os santos que seguem os ensinos provisórios, e rejeita o Himayana... como o Mahayana... Todas as pessoas que são repudiadas perseguem os crentes do Sutra de Lótus." Dengyo, o Grande, proclamou: "Falando do tempo, é o fim dos Médios Dias da Lei e o começo dos Últimos Dias da Lei. Quanto ao lugar, é uma terra localizada ao Leste de T'ang e ao oeste de Katsu. A respeito de seus habitantes, são pessoas manchadas pelas cinco impurezas numa época de conflitos. Uma passagem do sutra diz: Desde que o ódio e a inveja eram abundantes mesmo durante a existência do Buda, quão pior será o mundo após seu falecimento?" Estas palavras têm sido justificadas." Dengyo escreveu como se estivesse falando a respeito de seus próprios dias, mas na realidade, estava descrevendo a presente era. É isto que dá significado tão profundo às suas palavras: "Os Primeiros e Médios Dias estão passando e os Últimos Dias estão muito próximos. Ö sutra diz em parte: "Os demônios e as pessoas sob seus controles, os espíritos dos céus e do mar, os demônios horríveis, os demônios que consomem a vitalidade humana e os outros perpetrarão o mal através destas perseguições. "Em uma outra parte do sutra, os nomes dos outros demônios aparecem: "Demônios horríveis, demônios espertos, demônios vermelhos, alaranjados, negros, azuis e etc." O sutra está dizendo que as pessoas, que em existências prévias abraçaram os ensinos provisórios, o Bramanismo ou as doutrina do homem e do céu, nascem nesta existência como demônios, espíritos celestes e seres humanos, que perseguem o devoto do verdadeiro ensino quando o vêm ou o servem. Questão: Comparando os Primeiros e Médios Dias com os últimos Dias da Lei, parece-me que as duas eras anteriores brilham muito mais do que a dos Últimos Dias; as épocas eram boas e as pessoas muito mais devotadas. Por que o sutra rejeita aquelas épocas e fala somente a respeito da presente era? Resposta: É difícil sondar a mente do Buda. Sem dúvida, mesmo eu sou incapaz de fazer isso. Mas, se olhamos os sutras Hinayana, por exemplo, podemos compreender mais claramente. Durante o milênio dos Primeiro Dias da Lei, os sutras Hinayana podiam oferecer todos os três - ensino, prática e prova. No milênio seguinte dos Médios Dias da Lei, o ensino e a prática foram continuadas, mas não mais havia qualquer prova real. Agora nos Últimos Dias da Lei, o ensino 132

permanece,

mas

não



nem

prática

nem

prova.

Procurei entre o soberano e seus súditos, entre todos os bonzos e freiras, todos os leigos e leigas, por alguém que tivesse cumprido as predições do Buda à luz destes ensinos. Tenho feito isso para provar a verdade de suas palavras, mas, à parte de Nitiren, não posso encontrar nenhuma pessoa assim. Certamente estamos agora no começo dos Últimos Dias da Lei, mas, se Nitiren não tivesse aparecido, as predições do Buda tornar-se-iam falsas. Questão: Dizendo assim o senhor não está sendo um bonzo extremamente presunçoso - ainda mais presunçoso do que Daiten ou Shizen. Não é assim? Resposta: Caluniar Nitiren é um pecado ainda mais grave do que os pecados cometidos por Devadatta e Muku-ronshi. Posso parecer arrogante, mas meu único propósito é cumprir as predições do Buda e revelar a verdade de seus ensinos. Há alguém, além de Nitiren, entre os japoneses, que posso ser chamado de devoto do Sutra de Lótus? Acusando Nitiren, o senhor fará as profecias do Buda tornarem-se somente mentiras. Isso não torna o senhor uma pessoa de grande mal? Questão: Certamente o senhor cumpriu a predição do Buda sobre o devoto do Sutra de Lótus, mas não há outros devotos do Sutra de Lótus talvez na Índia ou China? Resposta: Pode haver somente um sol nos céus. Pode haver mais de um soberano a governar a terra? Questão:

Que

prova

o

senhor

tem?

Resposta: A lua aparece no oeste e espalha sua luz em direção ao leste. O sol surge no leste e lança seus raios ao oeste. O mesmo é verdadeiro como Budismo. Ele se espalhou do oeste ao leste nos Primeiros e Médios Dias da Lei, mas viajará do leste ao oeste nos Últimos Dias da Lei. Miao-lo, o Grande, disse: "O Budismo foi perdido na Índia, e estão procurando-o fora." Assim, não há mais Budismo na Índia. Há cento e cincoenta anos na China, durante o reinado do Imperador Kao Tsung, os bárbaros do norte invadiram Tongking e puseram um fim ao que de pouco foi deixado lá tanto do Budismo como da ordem política. Agora não resta nem um único sutra Hinayana na China; além disso, a maioria dos sutras Mahayana foi perdida. Mesmo quando Jakusho e outros bonzos foram do Japão para levarem alguns sutras para a China, não havia ninguém lá a quem estes sutras pudessem ser ensinados. Seus esforços foram tão sem sentido como se tentassem ensinar o Budismo a estátuas de madeira ou pedra vestidos com roupas de bonzos e segurando tigelas de mendicância. 133

É por isso que Junshiki disse: "O Budismo foi primeiro transmitido ao oeste, tal como a lua aparece primeiro no oeste. Agora o Budismo retorna ao leste como o sol surgindo no leste." As palavras de Miao-lo e Junshiki tornam claro que o Budismo foi perdido tanto na Índia como na China. Questão: Agora posso ver que não há Budismo na Índia ou na China. Como, todavia, pode o senhor estar certo de que o Budismo morreu nos continentes orientais, ocidentais e setentrionais do mundo? Resposta: O oitavo volume do Sutra de Lótus diz: "Após o falecimento do Buda, propagarei o Sutra de Lótus dentro do continente meridional inteiro e nunca o permitirei perecer." A palavra "dentro" indica que os três outros continentes foram excluídos. Questão: O senhor cumpriu a profecia do Buda; agora, o que o senhor próprio prediz? Resposta: Não pode haver dúvidas de que o último período de 500 anos já começou como profetizado pelo Buda. Digo que, sem falha, o Budismo surgirá e fluirá do leste, da terra do Japão. Ocorrendo presságios na forma de calamidades naturais de uma magnitude maiores do que as já testemunhas nos Primeiros ou Médios Dias da Lei. Quando o Buda nasceu, girou a roda da doutrina, e também quando entrou no Nirvana, os presságios foram maiores do que quaisquer já observados, tanto os auspiciosos como os sinistros. O Buda é o mestre de todos os santos. Os sutras descrevem como, ao nascimento do Buda, cinco cores de luz preencheram o ar, brilhando muito em todas as direções, e a noite tornou-se tão clara quanto o meio-dia. Na morte do Buda, doze arcos brancos cruzaram o céu no norte ao sul, a luz do sol foi extinguida, e o dia tornou-se tão escuro quanto à meia noite. Seguiram-se os doze mil anos dos Primeiros e Médios Dias da Lei; santos nasceram e santos morreram, budistas e outros, mas nunca houve qualquer presságios de tamanha magnitude. Do começo do período Shoka até este ano, contudo, tem havido tremendos terremotos e extraordinários fenômenos no céu, exatamente como os sinais que marcaram o nascimento e morte do Buda, indicando-nos que nasceu um santo com a estatura de um Buda. Um grande cometa cruzou o céu, mas para qual soberano ou súdito este presságio veio? A terra tremeu e abriram-se grandes fissuras por três vezes, mas para qual santo ou sábio isto ocorreu? Estes tremendos presságios, claramente, sejam bons ou maus, são de tal gravidade que devem significar algo extraordinário. Sem dúvida, a Grande Lei Pura está surgindo e a Lei Pura está se extinguindo. Tien-tai afirmou: "Pela, fúria da chuva pode-se saber a grandeza do dragão, e pela plenitude da lótus pode-se saber a profundeza da água." Miao-lo disse: "O sábio pode ver os presságios e o que estes predizem 134

tal

como

a

cobra

sabe

seu

próprio

caminho.

"Há vinte e um anos, eu, Nitiren, compreendi o que estava para vir. Desde então tenho sofrido perseguição dia após dia e mês após mês. Durante os últimos dois ou três anos quase fui morto. As possibilidades de que eu sobreviva neste ano ou mesmo neste mês são uma em dez mil. Se houver alguém que questione, peçam aos meus discípulos por explanação detalhadas. Quão prazeroso é em uma existência poder expiar os pecados de caluniar desde o eterno passado! Quão afortunado é ser capaz de servir ao Buda, Qua nunca foi conhecido até agora! Antes de qualquer um, oro para que possa conduzir à verdade e os outros que me perseguiram. Contarei ao Buda Sakyamuni sobre todos os meus discípulos Que me ajudaram. Antes de morrer, desejo também passar os grandes benefícios desta fé aos meus pais que me deram nascimento. Como se num sonho, compreendi o significado do Capítulo 'Hoto' do Sutra de Lótus que diz: "Lançar o Monte Sumeru às incontáveis terras dos Budas não seria impossível. Mas, propagar este sutra no mundo repleto de maldade após o falecimento do Buda será extremamente difícil." Dengyo, o Grande, proclamou: "Sakyamuni ensinou que o superficial é fácil de abraçar, mas que o profundo é difícil. Abandonar o superficial e procurar o profundo requer coragem. Tien-tai, o Grande, praticou verdadeiramente os ensinos de Sakyaminu e propagou a fé no Sutra de Lótus na China. Dengyo e seus seguidores herdaram a doutrina de Tien-tai e disseminaram-na por todo o Japão." Nascido na província de Awa, Nitiren tornou-se o herdeiro direto desses três mestres budistas e propagou o Sutra de Lótus nos últimos Dias da Lei. Juntos devem ser chamados de "os quatro mestres do Budismo nos três países." Nam-myoho-rengue-kyo, Nan-myoho-rengue-kyo. Em NITIREN FUNDO

11

de

maio

DE

de

1273.

CENA

Nitiren Daishonin escreveu este Gosho em 11 de maio de 1273 enquanto em exílio na Ilha de Sado. A ilha era tão desolada que dificilmente poderia provê-lo das necessidades da vida. Não obstante, Nitiren Daishonin estava totalmente esquecido das suas próprias dificuldades e devotou todas as suas energias para deixar sua filosofiade-vida para toda a humanidade e assim, encorajar seus discípulos em sua fé. Com confiança e coragem, Daishonin defrontou bravamente as

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perseguições que Sakyamuni havia que ocorreria ao devoto do Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei. Tendo cumprido todas as predições de Sakyamuni, Daishonin identificou-se como o devoto. Embora este século agora nos separe de Daishonin, sua compaixão em salvar a humanidade e o significado da sua grande profecia está se tornando cada vez mais ampla e profunda com o passar dos tempos. Quando Nitiren Daishonin expôs pela primeira vez a verdade última no Sutra de Lótus, ninguém o acreditou; além disso, caíram perseguições sobre ele uma após outra exatamente como o Buda Sakyamuni havia profetizado no Sutra de Lótus. As perseguições que o atacaram foram tão severas que sua vida estava continuamente em risco. Todavia, ele sabia que ninguém mais poderia estabelecer a validade do Sutra de Lótus. Ele sozinho estava tão devotado à causa do sutra que as perseguições, não importando quão grandes, não tinham nenhum efeito a ele. O título "A Profecia do Buda" tem dois significados: um é a predição do Buda Sakyamuni de que o devoto do Sutra de Lótus aparecerá no início do Últimos Dias da Lei para propagar a crença no sutra a despeito de grandes perseguições. Foi Nitiren Daishonin quem cumpriu esta profecia. O significado mais profundo deste título envolve a própria profecia de Nitiren Daishinin que, nos Últimos Dias da Lei, durando até o eterno futuro, o Verdadeiro Budismo será propagado por todo o mundo para beneficiar a humanidade. Portanto, o Sutra de Lótus que Sakyamuni profetizou que deveria se propagar no começo dos últimos Dias da Lei indica a Grande Lei Pura, o Nam-myoho-rengue-kyo. O devoto do Sutra de Lótus que Sakyamuni profetizou que deveria aparecer para expor este ensino significa Nitiren Daishonin, o Buda Original que pode mostrar à humanidade o caminho da salvação. Quando estudamos este Gosho, devemos compreender que temos de viver cada uma das palavras de Nitiren Daishonin afim de cumprir sua predição. Nitiren Daishonin enfrentou com bravura suas perseguições e estabeleceu o verdadeiro objeto de adoração. Ele simplesmente desejou incentivar seus futuros discípulos a propagarem a fé no Gohonzon por todo o mundo. Agora é o exato tempo para assim fazermos. No Gosho é citada a explanação de Tien-tai sobre o Sutra de Lótus que "cada palavra é o próprio Buda Original." Daishonin tomou esta frase de coração e procurou o significado de cada caráter no Sutra de Lótus para determinar seu significado em relação a si próprio. E com sua resoluta prática da fé, demonstrou a verdade a cada palavra. Foi por causa já valorosa luta de Nitiren Daishonin que o Sutra de Lótus, que estava ameaçado de ser despojado do seu significado por interpretações formalísticas, renasceu como uma grande fênix e tornou a viver valiosamente. Devemos nos aproximar do Gosho que é o ensino 136

para esta era do mesmo modo que Nitiren Daishonin se aproximou do Sutra de Lótus. "A Profecia do Buda" pode ser dividido em sete seções: Nitiren Daishonin (1) esclarece a profecia de Sakyamuni;(2) torna claro que há perseguições nos Últimos Dias da Lei; (3) proclama que o Verdadeiro Budismo deve ser propagado ao mundo nos Últimos Dias da Lei; (4) Identifica-se como Buda Original que aparecia nos Últimos Dias da Lei; (5) mostra a não existência do Budismo tanto na Índia como na China; (6) explana como o Verdadeiro Budismo será propagado por todo o mundo nos Últimos Dias da Lei. Nitiren Daishonin primeiramente menciona a profecia de Sakyamuni de que o Sutra de Lótus será propagado por todo o mundo nos Últimos Dias da Lei. Embora lamente que não nasceu durante a vida do Buda, ou nos Primeiro e Médios Dias da Lei, Daishonin ao mesmo tempo alegra-se por Ter nascido nos Últimos Dias da Lei. Tien-tai e Miao-lo que apareceram nos Médios Dias quiseram viver nos Últimos Dias quando surge o Verdadeiro Budismo para dar grandes benefícios a toda a humanidade. Aos olhos do Budismo, Nitiren Daishonin tinha a boa sorte incomparavelmente maior do que Tien-tai e Dengyo. Na Segunda seção, Nitiren Daishonin substancia as razões das perseguições que cairiam ao devoto do Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei. Todos os santos budistas, inclusive Sakyamuni, juntaram-se para dar testemunho ao fato de que a maior de todas as perseguições atacaria o devoto dessa época. Nitiren Daishonin devota as três seções para provar que o Gohonzon (o verdadeiro objeto de adoração)O ganhará a fé das pessoas em todo o mundo nos Últimos Dias da Lei. As pessoas nesta época perderam o espírito do Budismo de Sakyamuni porque estão tão cheias de impurezas que o distorceram irrevogavelmente. Alheio a isto, contudo, as pessoas ainda apoiam-se em vários ensinos de Sakyamuni e mostram hostilidade para o Budismo de Daishonin. A hostilidade e a calúnia contra o Verdadeiro Budismo criadas pela confusão a respeito do Budismo em geral são marcos claros dos Últimos Dias. Foi para restaurar o humanismo e paz nesta época que Nitiren Daishionin consagrou sua vida para fundar e propagar o Verdadeiro Budismo. Na Quarta seção, citando várias frases do Sutra de Lótus, Nitiren Daishonin revela que ele é o verdadeiro devoto do Sutra de Lótus que Sakyamuni profetizou que apareceria no começo dos Últimos Dias da Lei. Ele mostra como as descrições maiores do que ele para o propósito da propagação do Sutra de Lótus. Com isto, contudo, Daishonin não somente esclarece que é o devoto, mas, mais fundamentalmente , revela que é o Buda Original estabelecendo a base para o fluxo eterno do Verdadeiro Budismo no futuro. A Quinta seção assinala que o Budismo não mais é viável tanto na Índia 137

como na China. Tal como o Budismo morreu nesses dois países, o Verdadeiro Budismo de Nitiren Daishoinin surgiu na terra oriental do Japão. O Budismo indiano propagou-se do oeste para o leste, mas agora o Budismo tão brilhante quanto o sol retornará do leste ao oeste. Nitiren Daishonin revela a sua própria profecia na Sexta seção. Anteriormente, ele mencionou as grandes perseguições que cairiam sobre si, mas aqui Daishonin compara os presságios que ocorreram antes da inscrição do Daí-Gohonzon com os que ocorreram nos de Sakyamuni. Quando o Buda Sakyamuni nasceu, quando expôs pela primeira vez a Lei, e quando morreu, apareceram sinais de grande magnitude, mas antes e após o nascimento de Daishonin surgiram presságios de muito maior gravidade, predizendo que um Budismo ainda maior do que o de Sakyamuni estava para surgir. Nitiren Daishonin dedicou a última seção para os seus discípulos. Ele os confiou com a tarefa de propagar o Verdadeiro Budismo por todo o mundo no futuro. Disto devemos compreender que Daishonin enfrentou bravamente todas as perseguições sob o firme desejo de que seus discípulos deveriam viver para a mesma causa e realizarem a propagação mundial do Verdadeiro Budismo.

A Lei Causal da Vida (Dosho Domyo Gosho - Páginas 1114 a 1115) Espero que a senhora leia repetidamente esta carta, juntamente com a esposa de Toshiro. O sol dispersa a escuridão, por mais profunda que seja. O coração (ignorante) de uma mulher pode ser comparado à escuridão total, e o Sutra de Lótus ao sol. (dando um outro exemplo), embora os bebês desconheçam suas mães, estas jamais esquecem os seus filhos. O Buda Sakyamuni é como se fosse a mãe, e as mulheres são como suas filhas. Se a mãe e as crianças tiverem em mente uma às outras, jamais se separarão. Entretanto, caso apenas uma pense sobre a outra, elas estarão unidas em algumas ocasiões, mas separadas em outras. O Buda é como a pessoa que sempre acalenta os outros, enquanto que as mulheres são como as pessoas que não fazem assim. Se procurarmos realmente o Buda, ele jamais deixará de revelarse a nós. Mesmo chamando uma pedra de jóia, ela jamais se transformará em jóia. E a jóia não se transformará em pedra, por mais que seja assim chamada. Em nossa época, todas as doutrinas da Nembutsu e de outras seitas, baseadas nos 138

ensinos provisórios do Buda, são como pedras. Embora as pessoas considerem a doutrina Nembutsu como o Sutra de Lótus, ela não é de modo algum, o Sutra de Lótus. Além disso, mesmo que elas caluniem o Sutra de Lótus, o seu valor continua inabalado, assim como a jóia não se transforma jamais em simples pedra. Não faz muito tempo, viveu na China um mau governante chamado Imperador Hui-tsung1. Ludibriado por um bonzo taoista, ele destruiu todas as estátuas do Buda e os sutras. E ainda ordenou que os bonzos budistas e as monjas renunciassem ao clerado; todos obedeceram, com exceção de um bonzo chamado, Fa-tao2, que não se intimidou diante da ordem imperial. Por esse motivo, ele foi marcado a fogo na face e exilado ao sul do rio Yang-tzé. Nitiren assemelha-se ao bonzo Fa-tao por ter nascido numa época em que a classe governante confia na seita Zen que, sob todos os aspectos, é tão herética quanto o Taoismo, e por ter encontrado grandes perseguições. Sinto que não é fato corriqueiro a senhora haver, apesar de ter nascido como mortal comum e viver agora em Kamakura (sede do governo militar) abraçado ao Sutra de. Lótus sem se influenciar pelos olhos inquiridores dos outros, e sem apegar-se à sua própria vida. Só posso imaginar que isso é como se fosse uma jóia mágica que, segundo se afirma, torna pura a água lamacenta que entra em contato com ela. Ou então, parece-se com aquela que aprende alguma coisa nova de um sábio e confia nas palavras desse homem e compreende que estão cheias de razão. Será que isso acontece porque o Buda Sakyamuni e os Bodhisattvas Fuguen3 Yakuo4 e Shukuoke estão vivendo em seus corações? O Sutra de Lótas diz que as pessoas em todo o mundo podem crer no sutra graças à ajuda do Bodhisattva Fuguen. A mulher é como se fosse o cipó, e o homem como o pinheiro. Sem o pinheiro, o cipó não pode ficar de pé nem por um instante. Apesar disso, a senhora enviou seu marido a esta Ilha de Sado, nesta época turbulenta, quando lhe faltam inclusive criados fiéis. Isso demonstra que a sua fé é mais sólida que a terra. Certamente os deuses terrestres devem compreender esse fato. A sua fé é mais elevada que o céu, e os deuses celestes Bontem e Taishaku6 devem também estar cientes disso. O Buda ensinou que as pessoas, desde o momento do

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nascimento, são servidas por dois mensageiros do céu, Dosho e Domyo, que as acompanham de perto como se fossem a sombra das pessoas, jamais as deixando mesmo por um segundo. Revezando-se, eles vão aos céus contar os bons e maus atos da pessoa, tanto importantes como não importantes, nos mínimos detalhes. Portanto, os céus já devem estar cientes da sua fé. Quão encorajador! Em Abril de 1272 Uma

Resposta

à

esposa

de

Shijo

Kingo.

Nitiren 1 - Hui-tsung: oitavo governante da dinasia Sung da China (10821135). Embora tenha subido ao poder em 1100, pouco se interessou em governar. Ao invés disso, desenvolveu plenamente o seu talento na caligrafia e pintura. Dentro de sua política religiosa, encorajou o Taoísmo nativo da China e tentou destruir o Budismo. Em 1127, a sua dinastia (Sung Setentrional) foi destruída por uma tribo mongólica. 2 - Fa-tao: um bonzo-chefe budista (1086-1147) que viveu durante o reinado do imperador Hui-tsung. Em 1119, o imperador Hui-tsung emitiu uma ordem imperial para dissolver as ordens budistas, e Fa-tao protestou contra o imperador. O imperador, furioso com a advertência de Fa-tao, mandou que ele fosse marcado a fogo na face e exilado ao sul do rio Yang-tzé. 3 - Bodhisattva Fuguen (Samantabhadra em sâscrito): juntamente com Monju (Manjusri), é um dos líderes dos bodhisattvas dos. ensinos teóricos. Ele representa as faculdades da razão e do saber. No 28º capítulo do Sutra de Lótus (Fuguen), ele fez um juramento de proteger o Sutra de Lótus e seus crentes. 4 - Bodhisattva Yakuo (Bhasajya em sânscrito): bodhisattva que serve às pessoas dando-lhes remédios para curar suas moléstias físicas e espirituais. 5 - Bodhisattva Shukuoke: bodhisattva que aparece no 23º capítulo (Yakuo) do Sutra de Lótus, desempenhando o papel de interrogador do Buda. 6 - Bonten e Taishaku: Afirma-se que Bonten, um dos principais dpeuses budistas, vive" no mundo da matéria, sobre o monte Sumeru, e governa o mundo "saha". Taishaku é também um dos principais deuses protetores do Budismo. Originalmente era o deus do trovão da mitologia indiana primitiva, e foi adotado como divindade protetora do Budismo. Como o apoio dos Quatro Reis Celestes, ele comanda os

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trinta e três deuses que residem no alto do monte Sumeru ( é diferente do deus Taishaku que aparecia sob diversas formas para testar o espírito de procura de Sakyamuni quando este buscava a iluminação).

Resposta ao Lorde Nanjo (Nanjo Dono Gohenji - Páginas 1578 a 1579) Acabei de ouvir de seu mensageiro que o senhor está sofrendo de uma doença grave. Espero que se recupere logo e venha me visitar. Recebi também seus presentes de dois sacos de sal, um saco de feijãosoja, uma sacola de algas marinhas frasco de bambu contendo sakê. Não o vejo desde que voltou da província de Kozuke para casa, e estava ansioso por notícias a seu respeito. Mal consigo encontrar palavras para descrever o quanto eu aprecio a sua sinceridade em enviar-me uma carta e seus muitos oferecimentos. Como bem o soube, um dos Sutras conta a história de Tokusho Doji, que ofereceu um bolo de lama ao Buda e, mais tarde, renasceu como rei Asoka, que governou a maior parte da Índia. Por ser o Buda digno de respeito, o menino pôde receber esta grande recompensa, embora o bolo fosse apenas de lama. Entretanto o Buda Sakyamuni ensina que aquele que fizer oferecimentos ao devoto do Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei obterá uma boa sorte incomparavelmente maior do que conseguiria doando infindáveis tesouros ao Buda, por cem mil aeons. Portanto, quão maravilhosa é a sua genuína sinceridade em proteger o devoto do Sutra de Lótus através dos anos! De acordo com as palavras do próprio Buda, o senhor certamente renascerá na terra pura do Pico da Águia. Que boa sorte o senhor possui! Esta é uma região montanhosa distante de qualquer habitação humana. Não há uma única vila em qualquer direção. Embora eu more em uma cabana tão abandonada, no fundo desta carne mortal, eu preservo a Lei secreta máxima, herdada do Buda Sakyamuni no Pico da Águia. O meu coração é onde todos os Budas entram no nirvana. Minha língua, onde eles giram a roda da doutrina. Minha garganta, onde eles nascem neste mundo, e meus lábios onde eles atingem a iluminação. Esta montanha é onde habita o magnifico devoto do Sutra de Lótus. Portanto, como pode ser menos sagrada que a terra pura do Pico da Águia? Por ser a Lei suprema a pessoa é digna de respeito. Como a

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Pessoa é digna de respeito a terra é sagrada. O capítulo Jinriji diz: "Seja num bosque, sob uma árvore, ou mum monastério... os Budas entram para o nirvana." Aqueles que visitam este lugar podem, instantaniamente, expiar os pecados que cometeram desde o infinito passado e transformar suas ilusões em sabedoria, seus erros em verdade, e seus sofrimentos em liberdade. Um viajante sofredor da Índia Central, certa vez, veio ao Lago Munetchi para apagar as chamas da angústia em seu coração. Ele proclamou que aquelas águas sastifaziam todos os seus desejos, assim como um lago de águas frescas e cristalinas sacia a sede. Embora o Lago Monetchi e este local sejam diferentes, o princípio é exatamente o mesmo. Deste modo, o Pico da Águia na Índia está agora, aqui, no Monte Minobu. Faz longo tempo desde que esteve aqui pela ultima vez. Deve vir me visitar o mais rápido que puder. Estou esperando asiosamente para vê-lo. Como posso descrever a sua sinceridade? Realmente é esplêndida! NITIREN 11 de setembro (Fonte: END, vol III, páginas 289 a 290)

de

1281

Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu A Pessoa e a Lei no Monte Minobu em 11 de setembro de 1281, um ano antes de sua morte. Ele a endereçou a Nanjo Tokimitsu, o jovem administrador do vilarejo Ueno, na província de Suruga, que era seguidor de Daishonin desde a infância. Daishonin escreveu esta carta para agradecer Tokimitsu pelos vários oferecimentos que ele havia enviado através d sus mensageiro, e também para encorajá-lo durante a batalha contra doença que ele estava enfrentando. Neste Gosho, Daishonin declara o imenso benefício conferido àqueles que fazem doações ao devoto do Sutra de Lótus. Ele também revela a si como Buda Original completamente iluminado à Lei do Nam-myoho-rengue-kyo, através da qual todos os Budas, através do espaço e tempo, atingem a iluminação, e conclui que o local onde ele reside é a terra do Buda. Além disso, ele explana que todos que abraçam esta Lei também atingirão o Estado de Buda, triunfando sobre todas as angústias e conquistando uma vida em que todos os desejos são realizados.

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Comparação entre o Sutra de Lótus e os Outros Sutras (Shokyo to Hokekyo to Nan-I no Koto – Págs.991 a992)

Questão: O capítulo Hosshi, no volume quatro do Sutra de Lótus, diz: "o mais difícil de crer e o mais difícil de compreender". Qual o significado dessa passagem ? Resposta: Já se passaram mais de dois mil anos desde que o Buda expôs o Sutra de Lótus na Índia. Levou pouco mais de mil e duzentos anos até ser trazido da China para o Japão. E mais de setecentos anos se passaram desde então. Após o falecimento do Buda, haviam apenas três pessoas que compreenderam o verdadeiro significado dessa passagem do Sutra de Lótus. O primeiro foi o bodhisattva Nagarjuna na Índia, que afirmou em seu Dai-ron. "(O Sutra de Lótus) é como um grande médico que transforma o veneno em remédio…". Essa foi a maneira como explicou o significado da passagem "o mais difícil de crer e o mais difícil de compreender" (O segundo), na China, Tientai, o grande mestre da sabedoria, interpretou a passagem do contexto do sutra: "Entre todos os sutras que o Buda pregou, prega e pregará, o Sutra de Lótus é o mais difícil de crer e o mais difícil de compreender". (O terceiro) no Japão, o Grande Mestre Dengyo, detalhou essa frase: "Todos os sutras dos primeiros, quatro, dentre os cinco períodos, pregados no passado, o Sutra do Infinito Significado agora sendo pregado, e o Sutra do Nirvana que será pregado no futuro, são fáceis de crer e fáceis de compreender. Isso porque o Buda ensinou-os de acordo com a capacidade da audiência. O Sutra de Lótus é o mais difícil de crer e o mai difícil de compreender porque o Buda o expôs partindo da sua iluminação". Questão: Seria possível explicar mais ? Resposta: Em resumo, a facilidade de crer e compreender é atribuível ao ensino do Buda adaptado à capacidade das pessoas. Por outro lado, a dificuldade de crer e compreender é atribuível ao ensino segundo a sua própria iluminação. Kobo Daishi e seus adeptos do templo To-ji no Japão sustentam que, dentre todos os ensinos exotéricos (ensinos do Buda Sakyamuni), o Sutra de Lótus é o mais difícil de crer e o mais difícil de compreender. Entretanto, contrastando com os ensinos esotéricos (ensinos do Buda Dainiti), eles afirmam, o Sutra de Lótus é fácil de crer e fácil de compreender. Jikaku, Tisho e seus seguidores argumentam que tanto o Sutra de Lótus como o Sutra Dainiti estão entre os mais difíceis de crer e mais difíceis de compreender mas, dentre esses dois, o Sutra Dainiti é de longe o mais difícil de crer e compreender. 143

Todas as pessoas no Japão concordam com essas duas argumentações. Entretanto, após ler todos estes sutras, Nitiren toma um diferente ponto de vista. As escrituras não budistas são mais fáceis de crer e compreender que os sutras Hinayana. Mas esses sutras são mais fáceis que o Dainiti e outros sutras (Hodo), os quais são mais fáceis que os sutras Hannya. O mesmo é verdade com os sutras Hannya e Kegon, os sutras Kegon e do Nirvana, o do Nirvana e o de Lótus, e os ensinos teórico e essencial do Sutra de Lótus. Questão: Qual é o significado de conhecer estas diferenças ? Resposta: Nenhum sutra é igual ao de Lótus, o grande farol que ilumina a longa noite do sofrimento da vida e da morte, ou uma poderosa espada que pode destruir a escuridão fundamental inerente à vida do homem. Outras seitas, tais como a Shingon e a Kegon, acreditam em ensinos revelados segundo as capacidades das pessoas. Elas são evidentemente fáceis de crer e de compreender. Nos ensinos que admitem as diferenças nas capacidades das pessoas, o Buda desce ao nível delas para satisfazer os desejos das pessoas dos nove mundo, tal como um sábio pai faria para o seu filho ignorante. Por outro lado, ensinos expostos a partir da iluminação do Buda indicam que ele ensina o homem mantendo-se dentro do mundo do Estado de Buda. É como se fosse um santo pai que educa seu filho ignorante da maneira como ele deseja. À luz desse princípio, Nitiren considerou cuidadosamente os sutras Dainiti, Kegon, do Nirvana, e outros (provisórios), apenas para chegar à conclusão de que todos eles foram expostos de acordo com a capacidade das pessoas dos nove mundos. Questão: Há alguma evidência que prove isso tudo ? Resposta: O Sutra Shoman diz: Para aqueles que não ouviram ou aceitaram qualquer ensino falso, o Buda os leva à maturidade através de boas causas para a Tranquilidade e Alegria. Para os que buscam o estado de Erudição, o Buda expõe o ensino que os leva àquele estado. Para os que buscam o estado de Absorção, o Buda revela o ensino para esse estado. Para os que buscam ensinos Mahayana, o Buda os ensina. Isso mostra porque os ensinos do Buda são fáceis de crer e fáceis de compreender – os sutra Kegon, Dainiti, Hannya, do Nirvana, e outros. (Em contraste, o Sutra de Lótus diz) "Naquele tempo, através do Bodhisattva Yakuo, o Honrado-pelo-Mundo dirigiu-se aos oitenta mil grandes buscadores da Lei: "Yakuo, o senhor vë dentro desta multidão incontáveis deuses, reis dragões, yakshas, gandarvas, ashuras, garudas, kinnaras, mahoragas, humanos e não humanos, assim como monges, monjas, leigos e leigas. O senhor vê nesta multidão aqueles que buscam a categoria de shomon (Erudição), os que buscam a categoria de Pratyeka-Buda (Absorção), e os que buscam a categoria de Buda ? Se qualquer um deles ouvir um único verso ou uma única frase do Sutra de Lótus na presença do Buda e experimentar um único 144

momento de alegria, eu lhe confiro a profecia de que ele atingirá a suprema iluminação." Nos sutras provisórios, Sakyamuni ensinou o seguinte: cinco preceitos para as pessoas da Tranquilidade, dez preceitos para os da Alegrai, as quatro qualidades inimagináveis da benevolência, simpatia, alegria e imparcialidade a Bonten, uma cerimônia para doação imparcial de esmolas ao Rei Demônio, duzentos e cinquenta preceitos para bonzos, quinhentos preceitos para freiras, as Quatro Nobre Verdades para as pessoas de Erudição, a corrente de doze elos da causalidade dependente às pessoas em Absorção, e o seis paramitas para os Bodhisattvas. Esses ensinos são comparáveis à água adaptando-se à vasilha, redonda ou quadrada. Poderiam também ser comparados com um elefante que usa apenas a força suficiente para vencer o seu inimigo. O Sutra de Lótus é inteiramente diferente de todos esses sutras. Ele foi igualmente concedido a todos, incluindo os oitos grupos de seres sensíveis e os quatro tipos de crentes. O Sutra de Lótus, portanto, é comparável a uma régua para traçar linhas retas, ou comparável ao leão, o rei dos animais, que sempre usa a sua máxima força independentemente da força do seu oponente. Quando o senhor vê todos os sutras no espelho claro do Sutra de Lótus, fica evidente que os três sutras do Buda Dainiti e os três sutras básicos do Jodo são ensinos expostos segundo a capacidade das pessoas. Entretanto, esse fato foi esquecido no passado por mais de quatrocentos anos no Japão porque, por motivos que desconhecemos, os ensinos de Kobo, Jikaku, e Tisho foram amplamente aceitos. É como trocar a pedra preciosa por uma pedra comum ou a madeira de sândalo por uma madeira comum. Como resultado, a confusão no Budismo atirou a sociedade na confusão. O Budismo é como o corpo e a sociedade como a sombra. Quando o corpo de curva, assim o faz a sombra. Quão afortunados são todos os meus crentes que seguem as verdadeiras intenções do Buda e naturalmente fluem no oceano da sabedoria. Os estudiosos budistas de hoje acreditam em ensinos que foram expostos segundo as capacidades das pessoas, e mergulham no mar dos sofrimentos. Explicarei mais numa outra ocasião. Com meu profundo respeito, Nitiren Em 26 de maio de 1280. Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta no Monte Minobu para Toki Jonin, em Shimousa (atual prefeitura de Chiba), em 1280, um ano após haver inscrito o Dai-Gohonzon. Ele estava com cinquenta e nove anos de 145

idade. Toki era um dos discípulos principais que protegiam Daishonin justamente com Ota Jomyo e Soya Kyoshin, residentes na mesma região e Shijo Kingo, que vivia em Kamakura. Toki e sua esposa receberam trinta outras cartas, incluindo Carta de Sado, O Verdadeiro Objeto de Adoração e Sobre Atingir o Estado de Buda. Usando o método de perguntas e respostas, Nitiren Daishonin explica a Toki uma passagem no Capítulo Hosshi do Sutra de Lótus, que diz: "o mais difícil de crer e o mais difícil de compreender". No começo da carta, ele faz referência aos três únicos estudiosos budistas que, na história do Budismo, interpretaram corretamente essa frase: Nagarjuna, na Índia; Tientai, na China; e Dengyo, no Japão. A seguir, ele explica os dois tipos de ensino: o provisório, que o Buda ensinou segundo a capacidade das pessoas, e o Sutra de Lótus, que ele ensinou segundo a sua própria iluminação, Daishonin afirma que o primeiro é fácil de crer e compreender, enquanto que o último é o mais difícil de crer e compreender. Entretanto, ele adiciona, o Sutra de Lótus é o único ensino através do qual uma pessoa pode remover a escuridão inerente à vida. Finalmente, Daishonin afirma que, como o povo japonês acreditou nos ensinos desencaminhadores de Kobo e outros bonzos, a confusão reinou no mundo do Budismo e, consequentemente, a sociedade mergulhou em grande dificuldades. Ele enfatiza que o verdadeiro Budismo é a base da paz e prosperidade no país. Ele afirma: "O Budismo é como o corpo e a sociedade como a sombra. Quando o corpo de curva, assim o faz a sombra." Ele conclui que os seguidors de Nitiren Daishonin podem atingir a iluminação porque eles crêem no verdadeiro ensino do Buda, enquanto que intelectuais e outras pessoas que acreditam em ensinos expostos segundo a capacidade do povo somente mergulharão no mar de sofrimentos

Sustentando a Fé no Gohonzon (Myoshin-Ama Gozen Gohenji - Página 1477) Recebi seus vários oferecimentos. Estou lhe confiando o Gohonzon para a proteção de sua jovem criança. Esse Gohonzon é o coração do Sutra de Lötus e os olhos de todas as escrituras. É como o sol e a lua no céu, um poderoso governante na terra, o coração num ser humano, a jóia da concessão dos desejos(1) entre os tesouros e o pilar de uma casa. 146

Quando se abraça essa mandala, todos os Budas e deuses juntam-se ao redor da pessoa, acompanhando-a como uma sombra, e protegemna dia e noite, como guerreiros guardam seu soberano, como pais amam seus filhos, como peixe precisa de água, como as árvores e plantas anseiam por chuva, ou como os pássaros dependem das árvores. Deve confiar na mesma com todo o seu coração. Com meu profundo respeito, NITIREN No vigésimo quinto dia do oitavo mês FUNDO DE CENA

Nitiren Daishonin escreveu esta carta na Monte Minobu em 25 de agosto de1275, quando estava com 54 anos de idade. Foi dirigida a Myoshin-Ama, uma praticante que morava na Vila Nishiyama, no Distrito fuli, Província de Suruga. Nitiren Daishonin diz a Myoshin-Ama que ele está concedendo-lhe o Gohonzon pela proteção de sua criança, exemplifica que o Gohonzon é "o coração do Sutra de Lótus e os olhos de todas as escrituras".

Carta a Domyo Zemmon (Domyo Zemmon Gosho, pág.1242) Recebi seu pedido de orações por seu pai, e as oferecerei na presença do Buda. Com referência à oração, há a oração perceptível e a resposta perceptível, a oração perceptível e a resposta imperceptível, a oração imperceptível e a resposta imperceptível, a oração imperceptível e a resposta perceptível. Contudo, o ponto essencial é que, contanto que cumpra a fé neste sutra, todos os seus desejos serão realizados tanto na existência presente quanto na futura. O terceiro volume do Sutra de Lótus declara: "Embora o demônio e seus súditos estejam lá, eles todos protegerão a Lei budista". E o sétimo volume afirma: "…sua doença desvanecerá imediatamente, e ele encontrará juventude perpétua e vida eterna". Não deve duvidar desses ditos dourados. Sou 147

profundamente grato pela visita de Moiti-ama a esta montanha. Entreguei a ela um pergaminho escrito, que eu gostaria que lesse, Nam-myoho-rengue-kyo. Nitiren, Em 10 de agosto de 1276 END Vol.VI, pág. 261 Fundo de Cena Esta carta foi escrita em Minobu em agosto de 1276. Pouco se sabe sobre Domyo Zemmon, o seu recebedor (Zemmon significa sacerdote leigo e é equivalente a Nyudo). De acordo com várias conjeturas, ele pode ter sido um subordinado de Myoiti-ama, um subordinado de Endo Saburo Zaemon Sukenobu, um irmão mais velho de Ben Ajari Nissho, ou o marido de Sajiki Nyobo. Entretanto, não se dispõe de nenhuma informação confiável. De qualquer modo, Domyo evidentemente havia confiado a Myoiti-ama uma carta solicitando a Nitiren Daishonin que orasse pelo seu pai que estava doente. Nesta breve resposta, Nitiren Daishonin esclarece a relação entre a oração e o benefício resultante. ‘Oração perceptível’ indica a oração oferecida com um objetivo ou propósito claro. ‘Oração imperceptível’ refere-se àquela que a pessoa oferece sem uma meta específica, simplesmente recitando continuamente o daimoku sem um fim concreto urgente em mente. ‘Resposta perceptível’ designa a realização imediatamente visível das orações de uma pessoa. ‘Resposta imperceptível’ é o benefício que pode não se tornar manifesto imediatamente, mas se evidencia ao longo do tempo, como por exemplo a purificação gradual da vida da pessoa. Embora existam quatro combinações e respostas possíveis, Nitiren Daishonin enfatiza que o importante é simplesmente manter uma forte fé no Gohonzon. Aquele que assim o fizer, ele afirma, concretizará clarametne todos os seus desejos tanto na existência presente como na futura.

A Prática dos Ensinos do Buda (Nyossetsu Shugyo Sho - páginas 501 a 502) Está agora claro que os que nasceram nesta terra e aceitaram a fé neste sutra quando, a sua propagação é empreendida nos últimos Dias

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da Lei sofrerão perseguições ainda mais severas do que as que ocorreram na vida do Buda. Naquela época, o mestre foi um Buda e seus discípulos grandes Bodhisattvas e Arhats. Além disso, o Buda expôs o Sutra de Lótus somente após ter ensinado completamente e disciplinado todos os que estavam para ouvi-lo, inclusive os deuses, os humanos, tanto os leigos como os ordenados, e as oito espécies de seres inferiores. Agora, nos Últimos Dias da Lei, mesmo que o ensino, a capacidade das pessoas e o estágio para a propagação estejam prontos, devemos esperar ainda mais hostilidades, pois esta é a era da incessante confrontação após a Lei Pura ter sido perdida. Além disso, o mestre não é senão uma pessoa comum e seus discípulos vieram entre os ímpios, manchados pelas três impurezas. É por isso que o virtuoso mestre é rejeitado e os maus bonzos são pelo contrário aproximados. O que é mais, uma vez que se tornou um seguidor ou discípulo do verdadeiro devoto do Sutra de Lótus cuja prática está de acordo com os ensinos do Buda, está destinado a defrontar os três poderosos inimigos. Portanto, do exato dia em que começou a ouvir este ensino, deve estar plenamente preparado para defrontar as três espécies de perseguições que são certas de serem mais terríveis após o falecimento do Buda. Embora meus discípulos tenham já ouvido sobre isto, alguns ficaram aterrorizados quando perseguições maiores e menores nos atacaram, chegando ao ponto de abandonarem a sua fé. Não os adverti antecipadamente? Tenho estado ensinando diretamente do sutra --""Desde que há grande hostilidade e contenda contra este sutra mesmo enquanto o Buda vive, é certo de ser mais terrível após o seu falecimento." As palavras "é certo de ser mais terrível após o seu falecimento" que tenho estado repetindo dia e noite, aponta para este exato momento. Não há razão para ficar subitamente amedrontado quando na realidade vê ou ouve sobre eu sendo levado de minha habitação, ferido ou censurado oficialmente duas vezes e exilado a distantes províncias. Questão: O devoto que pratica de acordo com os ensinos do Buda pode desfrutar uma vida pacífica neste mundo. Por que então surgem incessantemente os três poderosos inimigos? Resposta: Sakyamuni defrontou nove grandes perseguições por causa do Sutra de Lótus. No distante passado, o Bodhisattva Fukyo foi ferido com bastões e pedras. Chu Tao Shung foi exilado para o Monte Su, o Bonzo Fa Tao foi marcado na face e Shishi-sonja foi decapitado. Tientai, o Grande, sofreu oposição das sete seitas setentrionais e três meridionais, e Dengyo, o Grande, foi ofendido pelas seis seitas na velha capital de Nara. O Buda, estes Bodhisattvas e os grandes santos foram todos devotos do Sutra de Lótus e, todavia, sofreram grandes perseguições. Se negar que eles praticaram de acordo com os ensinos do Buda, então onde pode encontrar os que praticaram? Esta é a era de conflito em que a Lei Pura foi perdida. Além disso, este mau país, o 149

governador, seus ministros e até mesmo a população em geral estão, sem exceção, manchados pelo mal. Eles se opuseram ao verdadeiro ensino e, ademais, respeitaram doutrinas e bonzos heréticos. Os demônios, portanto, enfurecidos, invadiram a terra e estão causando os três perigos e sete calamidades. Que tempo desfavorecido é sem dúvida este em que Nitiren , sob ordem do Buda, nasceu nesta terra ! É impossível opor-se ao decreto do Lorde Buda. Assim, tenho posto completa fé no sutra e começado a batalha entre os ensinos provisórios e o verdadeiro. Vestindo a armadura da tolerância e cingindo a espada dos verdadeiros ensinos a bandeira do Myoho-rengue-kyo, a essência dos oito volumes inteiros do Sutra de Lótus. Retesando então o arco da declaração do Buda "a verdade não foi revelada" e entalhando a flecha de "honestamente abandonem os ensinos provisórios, montei na carreta puxada pelo grande boi branco e derrubei os ensinos provisórios. Atacando aqui e ali, refutei as seitas Nembutsu, Shingon, Zen Rtsu e outras. Alguns dos meus adversários fugiram precipitadamente, enquanto outros se renderam e ainda foram capturados, tornando-se meus discípulos. Repeli seus ataques e venci-os, mas uma multidão de inimigos estão para se opor ao único rei da Lei e ao punhado que o segue. Assim a batalha continua ainda hoje. "A prática do Sutra de Lótus é Chakubuku, a refutação das doutrinas provisórias." Verdadeiro às letras deste dito dourado, os crentes de todos os ensinos provisórios e seitas serão finalmente vencidos e juntar-se-ão aos seguidores do rei da Lei. Tempo virá em que todas as pessoas entrarão no caminho do Estado de Buda, e a Lei Mística sozinha florescerá por toda a terra. Então, quando todas as pessoas estiverem recitando simultaneamente o Nam-myoho-rengue-kyo, o vento não vergará a ramagem ou os galhos e nem cairá torrencialmente a chuva para cavar a terra. O mundo tornar-se-á calmo e sereno como foi na era de Fu Hsi e Shen Nung na antiga China. Não somente as pessoas serão libertadas do infortúnio e desastre por todas as suas vidas, como também aprenderão a arte de viver longa e plenamente. Observe o tempo em que a eternidade da Lei e do homem será provada. Não pode haver a mínima dúvida a respeito da solene promessa no sutra para uma vida pacífica neste mundo.

FUNDO

DE

CENA

Em maio de 1273, ainda sob a severa privação do exílio na Ilha de Sado. Nitiren Daishonin escreveu este Gosho a seus discípulos e seguidores. Estava então com 52 anos de idade e foi justamente um ano e meio após a Perseguição de Tatsunokuti, que ocorreu em 12 de setembro de 1271. Sua vida na ilha foi a mais desencorajante por

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causa do intenso frio e as raras provisões levadas a ele. No incidente de Tarsunokuti, Nitiren Daishonin completou a sua missão como Bodhisattva Jogyo, cumprindo as profecias do Sutra de Lótus e revelando-se Buda Original da Era de Mappo. Dentro e em volta da área de Kamakura, contudo, a perseguição aos seguidores de Daishonin tornaram-se insuportáveis e muitos abandonaram a fé. O mestre havia, como sabiam, quase sido morto em Tatsunokuti, e seu exílio a Sado era muito mais severo do que a vida aprisionada de hoje. Sua vida estava exposta ao perigo pelos heréticos inimigos. Os seguidores ficaram amedrontados e desencorajados. Eles se perguntavam porque Daishonin tinha que sofrer tais grandes perseguições. Alguns discípulos foram banidos de Kamakura, atirados à prisão, privados de suas propriedades ou expulsos. Daishonin estava bem ciente de seus sofrimentos e constantemente enviou-lhes encorajamento em todas as possíveis oportunidades. Este Gosho é um exemplo de como escreveu como se estivesse deixando seu último desejo e testamento. O título, "Prática dos Ensinos do Buda", literalmente significa praticar em exato acordo com os ensinos do Buda. Há duas interpretações disto. Uma é que Nitiren Daishonin viveu de acordo com os ensinos de Sakyamuni e cumpriu todas as profecias do Sutra de Lótus. Uma outra é que as pessoas nos Últimos Dias da Lei (Mappo) devem cumprir os ensinos de Daishonin. Para Daishonin, o "ensino" foi o Sutra de Lótus exposto por Sakyamuni, e para nós é o Nam-myoho-rengue-kyo das Três Grandes Leius Secretas que Nitiren Daishonin ensinou e também os seus ensinos compilados no Gosho, Nikkan Shonin, o 26.° Sumo Prelado, afirmou que o título indica as Três Grandes Leis Secretas - o objeto de adoração, invocação e o sumo santuário do Verdadeiro Budismo. "Os ensinos do Buda" correspondem ao verdadeiro objeto de adoração, Daí-Gohonzon, e a "Prática" é a recitação do Nan-myohorengue-kyo, ambos os quais requerem o lugar - o sumo santuário - no qual o Daí-Gohonzon está consagrado e é adorado. Nikkan Shonin também delineou a relação entre a "prática" e os "ensinos do Buda" em termos de mestre e discípulo, pessoa e Lei, e prática para si e para os outros. "Prática" indica o discípulo, a pessoa e a prática para si mesmo, enquanto os "ensinos do Buda" indica o mestre, a lei e a prática para os outros. Quando estes dois tornam-se unos, podemos verdadeiramente chama-los de prática dos ensinos de Daishonin. Nitiren Daishonin mostra neste Gosho que a verdadeira prática é o Chakubuku, isto é, transmitir o Verdadeiro Budismo a muitas pessoas, ajudando-as a dirigir vidas para a auto perfeição. Um mês antes de escrever este Gosho, Daishonin havia completado o "Kanjin-no Honzon Sho" (Sobre o Verdadeiro Objeto de Adoração) em abril de 1273 no qual explicou o Daí-Gohonzon e que todas as pessoas podem alcançar a iluminação. No "Kanjin-no Honzon Sho" revelou que a iluminação provém da firme fé no Gohonzon e enfatizou a importância da prática para si mesmo - Gongyo e Daimoku. A "Prática dos Ensinos do Buda" 151

foi subseqüentemente escrito para esclarecer a importância da prática para os outros Chakubuku. Qualquer filosofia sem a sua prática é uma idéia morta, e a prática sem filosofia não pode ser senão impulsiva e unilateral. O importante é reconciliar a filosofia com a prática, pois a grandeza de uma filosofia somente é reconhecível quando brilha pelo comportamento e experiência da pessoa. Este Gosho, ensina-nos a praticar o Budismo de Daishonin com a nossa mente, palavras e ações. Todos desejam viver uma vida pacífica neste mundo. O capítulo 'Yakussoyu' (a Parábola das Ervas) diz: "Os que crêem no Sutra de Lótus viverão pacificamente em sua presente existência e renascerão num bom lugar no futuro". Nitiren Daishonin, contudo, ensina Que quando uma pessoa pratica seus ensinos, os três poderosos inimigos surgirão sem falha. Podemos viver uma vida pacífica somente com uma constante luta contra estes três. Ele explica que uma vida pacífica não é uma vida livre de preocupação ou ansiedade, mas uma independente e realizada, isto é, nunca frustada por quaisquer problemas. No curso das nossas vidas, estamos sujeitos a defrontar dificuldades e privações por muitas vezes. Mas, desafiando-as e superando-as, podemos desenvolver a verdadeira independência. O homem vive na sociedade, e é portanto impossível vivermos uma vida calma e pacífica quando o nosso mundo é ainda abalado por guerras ou pela fome e seca. Daishonin diz neste Gosho que uma vida tranqüila somente pode ser conseguida dentro de uma sociedade pacífica. Chakubuku significa superar o mal e desenvolver o bem: é o único modo de subjulgar o egoísmo e construir a auto confiança. "A prática do Sutra de Lótus é Chakubuku, a refutação das doutrinas provisórias." Este é o espírito do Buda Original e tem sido fervorosamente levado avante pela Soka Gakkai, como podemos ver através da dedicação dos nossos sucessivos presidentes. Na análise final, a "prática dos ensinos do Buda" significa alcançar o Kossen-rufu através do Chakubuku.

O Rico Sudatta (Ueno Dono Gohenji, págs. 1574 e 1575) Recebi o seu oferecimento de um kan de moedas. Por ter demonstrado tal sinceridade, estou lhe dizendo o seguinte. Não deve pensar que eu seja um sacerdote ganancioso.

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Há um caminho para se tornar um Buda facilmente, e ensinarei ao senhor. Ensinar algo a uma outra pessoa é como lubrificar as rodas de uma pesada carroça para que estas girem, ou como colocar um barco na água para fazê-lo flutuar sem dificuldade. O caminho para se tornar um buda facilmente não é nada extraordinário. É, por exemplo, dar água a uma pessoa com sede em tempo de seca ou proporcionar fogo para alguém congelando no frio. Ou, ainda é, conceder a uma outra pessoa algo insubstituível: quando a própria vida está para ser extinta por falta de alguma coisa, a pessoa oferece exatamente esse algo como donativo a um outro. Houve certa vez um governante chamado Rei Konjiki. Seu país foi, durante doze anos, atormentado por uma grande seca, e um número incontável de pessoas morreram de fome. Nos rios, cadáveres se empilhavam como pontes, e, na terra, esqueletos se acumulavam como oiteiros de sepulcro. Naquele tempo, o Rei Konjiki concebeu uma grande aspiração à iluminação (para salvar o povo) e distribuiu uma grande quantidade de donativos. Ele cedeu tudo o que podia, até restarem apenas cinco meras medidas de arroz em sua despensa. Quando seus ministros o informaram de que isto o iria alimentar durante um único dia, o grande rei pegou as cinco medidas de arroz e a cada um de seus súditos famintos deu um grão, dois grãos, três grãos ou quatro grãos, distribuindo-os, dessa maneira, a todos. Então, ele voltou-se para o céu e bradou que morreria de fome no lugar do povo, tomando para si a dor da fome e sede deles. O céu escutou-o e imediatamente enviou-lhe a doce chuva da imortalidade. Quando essa chuva tocava os corpos ou caía sobre as faces das pessoas, a fome dela era satisfeita e, no espaço de um momento, todos os habitantes do país foram revivificados. Na Índia, houve uma pessoa chamada Sudatta. Sete vezes ele ficou reduzido à pobreza, e sete vezes ele tornou-se um homem rico. Durante esse último período de privação, as pessoas (da cidade) haviam todas fugido ou perecido, até que sobraram apenas ele e sua esposa. Eles tinham somente cinco medidas de arroz, suficientes para se manterem por cinco dias. Nessa ocasião, cinco pessoas – Mahakashyapa, Shariputra, Ananda, Rahula e o Buda Sakyamuni – vieram, revezando-se para pedir donativos e receberam as cinco medidas de arroz. Daquele dia em diante, Sudatta tornou-se o homem mais rico em toda a Índia e construiu o Monastério Jetavana. Deve entender todas as situações similares a partir desses exemplos. O senhor já se assemelha ao devoto do Sutra de Lótus, assim como um macaco se parece com o homem ou um bolinho de arroz lembra a lua. Por ter protegido tão intensamente as pessoas de Atsuhara, as pessoas deste país o consideram um traidor, como Masakado da era Shohei (931-938) ou Sadato da era Tengui (1053-1058). Isto ocorre unicamente porque o senhor entregou a sua vida ao Sutra de Lótus. O céu, de forma alguma, o considera um homem que traiu o seu lorde. Além disso, a sua pequena vila tem sido pesadamente tributada e o 153

povo dela tem sido, repetidamente, submetido ao trabalho forçado, até o ponto de o senhor próprio não possuir nenhum cavalo para montar, e sua esposa e filhos carecem de roupas. Entretanto, apesar de sua própria pobreza, o senhor sentiu compaixão pelo devoto do Sutra de Lótus, pensando que ele deveria estar cercado pela neve nas profundezas das montanhas e necessitando de alimento. Assim, o senhor enviou-me um kan de moedas. O seu oferecimento é como o da mulher pobre que deu a um pedinte o único manto, que ela e seu marido dividiam, ou como o de Rida, que cedeu o painço de seu jarro a um pratyekabuddha. Quão admirável ! Falarei a respeito em maiores detalhes posteriormente. Com meu profundo respeito, Nitiren Em 27 de dezembro de 1280. (END- Vol.VI, pág.185) Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu este Gosho no Monte Minobu, no inverno de 1280, para Nanjo Tokimitsu, o jovem administrador da Vila Ueno na província de Suruga que era seu discípulo desde a infância. A partir da época em que Nitiren Daishonin veio a morar em Minobu, Tokimitsu tornou-se especialmente próximo de Nikko Shonin e apoiou os seus esforços de propagação na área Fuji. Durante a perseguição de Atsuhara, ele usou a sua influência para proteger os outros praticantes, abrigando alguns em sua própria casa e intervindo a favor da libertação daqueles que haviam sido presos. Nitiren Daishonin homenageou-o pela sua coragem denominando-o Ueno, o sábio, apesar de o rapaz mal ter vinte anos na época. Este Gosho foi escrito no ano seguinte do clímax da Perseguição de Atsuhara. Naquela oportunidade as autoridades de Kamakura, em retaliação ao apoio de Tokimitsu aos seguidores de Nitiren Daishonin, impôs difíceis taxas punitivas à sua propriedade e exigiu que ele fornecesse homens para trabalho não pago. Entretanto, a despeito de sua própria pobreza, a primeira preocupação de Tokimitsu era com relação à Nitiren Daishonin, e, de alguma maneira, ele conseguiu enviar-lhe um kan de moedas. Profundamente comovido, Nitiren Daishonin escreveu-lhe esta carta, em resposta. Na primeira parte, ele louva o espírito de doação como uma causa que conduz à iluminação e explana dois tipos de oferecimentos. No primeiro caso, oferece-se a pessoa aquilo de que ela mais necessita. No segundo, dá-se a outra pessoa algo essencial a ela, embora o doador em si possa ter somente um item do mesmo, e não possa sustentar a sua vida sem isso. O espírito subjacente a tal ato é o da disposição de oferecer a própria vida, uma postura fundamental da fé.

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Na parte seguinte, citando os exemplos do Rei Konjiki e do mercador Sudatta, cujo nome deu título ao Gosho, Nitiren Daishonin reafirma que o sincero espírito de dedicação expresso nos oferecimentos de Tokimitsu constitui o caminho direto para o estado de Buda e produzirá benefícios insondáveis.

Resposta a Yasaburo (Yasaburo Dono Gohenji, págs. 1449-1451) Em sua carta diz: "Embora eu seja um leigo ignorante, entre os ensinos que escutei do senhor, fiquei especialmente impressionado pela passagem no segundo volume do Sutra de Lótus que declara: 'Agora este mundo tríplice (é todo meu domínio…)'. Essa passagem mostra que esse presente país, Japão, é o domínio do Buda Sakyamuni. Não apenas a Deusa do Sol, o grande Bodhisattva Hatiman, o imperador Jimmu e todos os outros deuses, bem como do soberano da nação às pessoas do povo, todos moram dentro de reino dele, mas também, além disso, ele é um Buda a quem devemos muito por três razões. Primeira, ele é nosso soberano; segunda, ele é nosso mestre; e terceira, ele é nosso pai. Entre todos os Budas das dez direções, somente o Buda Sakyamuni é devoto dessas três virtudes. Portanto, ainda que todas as pessoas do país Japão servissem ao Buda Sakyamuni sinceramente da mesma forma que o fazem agora ao Buda Amida, como estariam colocando-o lado a lado com um outro Buda e tratando-o de maneira igual, isto ainda seria um grave erro. Por exemplo, mesmo que uma pessoa fosse o próprio governante além de sábio, se alguém transferisse sua lealdade ao rei de um outro país, e apesar de morar no Japão prestasse honras ao rei da China ou de Koguryo e menosprezasse o soberano do Japão, tal pessoa poderia ser descrita como alguém que honra o grande soberano desse país ? Isto é muito mais verdadeiro no caso dos sacerdotes do Japão, que sem exceção tosaram os cabelos e vestiram seus mantos como discípulos do Tathagata Sakyamuni. Eles não são os discípulos do Buda Amida. Contudo, sacerdotes que não possuem nenhum recinto em seus templos onde Sakyamuni esteja consagrado ou onde a meditação do Sutra de Lótus seja praticada, ou que não tenham nenhuma imagem pintada ou de madeira (de Sakyamuni) nem mesmo uma cópia do Sutra de Lótus, estão colocando de lado o Buda Sakyamuni, que é dotado de todas as três virtudes. Por todo o país, em cada distrito, vila e casa, eles erigem um número maior de imagens do Buda Amida - que

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não possui nem uma única dessas virtudes - do que o de pessoas existentes, e recitam exclusivamente o nome do Buda Amida sessenta ou oitenta mil vezes por dia. Embora tais atos pareçam ser muito admiráveis, quando examinamos a questão à luz do Sutra de Lótus, constatamos que essas pessoas pias são culpadas de ofensas mais graves do que as dos homens perversos que cometem os dez atos maléficos diariamente. Os ímpios não acreditam em Buda nenhum, e não podem, portanto, ser acusados de terem mudado suas lealdades. Além disso, se eles se tornassem pessoas pias, poderiam até se devotar ao Sutra de Lótus. Entretanto, parece impossível que as pessoas do Japão hoje possam inclinar seus corações com maior sinceridade e afeto ao Buda Sakyamuni do que ao Buda Amida, ou ao Sutra de Lótus do que ao Nembutsu. Deste modo, são malfeitoras, são piores e mais terríveis caluniadoras e icchantika em todo o mundo. Com relação a essas pessoas, o Buda Sakyamuni declarou no segundo volume do Sutra de Lótus: "Após morrerem, cairão no inferno de incessantes sofrimentos". Os sacerdotes do Japão são todos homens de grande mal, superando até mesmo Devadatta ou o Venerável Kokalika. E, pelo fato de as pessoas leigas reverenciarem-nos e fazerem oferecimentos a eles, esse país está sendo transformado, diante de nossos olhos, no inferno de incessante sofrimento. Incontáveis pessoas então, em seus presentes corpos, sofrendo fome e peste, agonias horríveis como jamais vistas em épocas anteriores e, além disso, serão atacadas por uma potência estrangeira. Isto se deve unicamente às ações de Bonten, Taishaku, dos deuses do Sol e da Lua, e outras divindades. Em todo o Japão, eu, Nitiren, sozinho compreendi porque tais coisas estão acontecendo. Inicialmente ponderei se deveria ou não me manifestar. Porém, o que iria fazer? Poderia virar as costas aos ensinos do Buda que é o pai e mãe de todos os seres vivos ? Decidindo suportar o que quer que pudesse suceder a mim, comecei a falar, e nesses mais de vinte anos fui tirado da minha residência, meus discípulos foram mortos, fui ferido, exilado duas vezes e, finalmente quase fui decapitado. Eu me pronunciei unicamente porque há muito sabia que as pessoas do Japão enfrentariam grande sofrimento e senti pena delas. As pessoas ponderadas deveriam, portanto, perceber que encontrei essas provações em benefício delas. Se fossem pessoas que compreendem suas obrigações ou que são capazes de raciocinar, então, de cada dois golpes que incidem sobre mim, elas receberiam um em meu lugar. Porém, longe disso, na realidade eles criaram ódio com relação a mim - algo que não consigo entender. E os leigos, não tendo encontrado a verdade do assunto, tiram-me de minha casa ou odeiam meus discípulos. É além da compreensão. Por exemplo, se alguém mesmo que inconscientemente, confundisse seu pai com um inimigo e o insultasse ou golpeasse e o matasse, como poderia escapar da culpa da ofensa ? Essas pessoas não reconhecem a sua beligerância e ainda acham que eu, Nitiren, sou beligerante. São como um mulher ciumenta que fita com olhos furiosos uma cortesã e, inconsciente de 156

sua própria expressão desagradável, queixa-se de que o olhar da cortesã é assustador. Esses fatos ocorreram somente porque o soberano não me (inquiriu sobre a verdade das doutrinas budistas). A razão de ele não ter investigado é que as pessoas deste país são culpadas de tantas ofensas que o mau carma delas destinou-as a, sem falha, serem atacadas por um país estrangeiro nesta presente existência e a caírem no inferno de incessante sofrimento na próxima - (deve explicar o assunto desta maneira). Então, declare a seu oponente: 'Acredito nisso tudo porque está claramente evidente nos sutras. Embora possa atacar e ameaçar pessoas desvaliosas como nós ou tirar-nos de nossas casas, no final jamais terá sucesso nisso. Nem mesmo a Deusa do Sol ou o Bodhisattva Hatiman poderia obter à força a obediência desse sacerdote (Nitiren), quanto mais os mortais comuns ! Assim, ouvimos que ele nunca cedeu diante de sucessivas perseguições e tornou-se ainda mais firmemente determinado'. Caso aquele sacerdote diga algo em resposta, pergunte se o que o senhor acabou de dizer deve ser considerado como uma visão distorcida. Pergunte-lhe se o Sutra de Lótus de fato não contém uma passagem com o sentido de que o Buda Sakyamuni é nosso pai, nosso mestre e nosso soberano. Se ele disser que sim, indague se há também uma outra passagem que afirma que o Buda Amida é o pai, soberano e mestre dele: Sim ou não ? Caso responda que existe uma passagem do sutra assim, pergunte se ele tem, então, dois pais. Se disser que não há tal passagem, pergunte por que ele abandonou seu pai e está dedicando inteiramente o seu apreço a outra pessoa. Além disso, deve asseverar que o Sutra de Lótus não se assemelha aos outros sutras, citando a passagem: "Nesses mais de quarenta anos, (ainda não revelei a verdade)". Se ele mencionar a passagem "Ela irá diretamente à terra tranqüila e feliz", então pergunte se isso significa que ele se rende à alegação com a qual o senhor acabou de encurralálo. Nesse caso, deve explanar mais detalhadamente o significado desta passagem. O senhor deve estar firmemente determinado. Não poupe seu feudo, não pense em sua mulher e filhos. Não coloque o Dharma em perigo por depender de outros. Deve simplesmente decidir-se. Olhe para o mundo este ano como um espelho. Quando tantos morreram, o fato de ter sobrevivido até agora foi para que pudesse encontrar esta oportunidade. É aqui que irá cruzar o rio Uji. É aqui que atravessará o Seta. Esse acontecimento determinará se conquistará a honra ou desgraçará o seu nome. Afirma-se que a forma humana é difícil de se obter e o Sutra de Lótus é difícil de acreditar. Tenha a decisão de que Sakyamuni, Taho e os outros Budas das dez direções se reunirão todos e entrarão em seu corpo para assistir-lhe. Se for chamado para visitar o administrador, deve primeiro explicar tudo isto completamente.

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Com meu profundo respeito, Nitiren. Em 4 de agosto de 1277. (END Vol. VI, pág. 299)

Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta no Monte Minobu, no dia 4 de agosto de 1277. Yasaburo, o praticante a quem foi endereçada, não deve ser confundido com Funabori Yasaburo, que abrigou Nitiren Daishonin durante o seu exílio em Izu. Segundo algumas fontes, este tratava-se de um certo Saito Yasaburo que morava na província de Suruga. As expressões utilizadas no último parágrafo sugerem que ele pode ter sido um samurai. De qualquer modo, o recebedor deste Gosho estava, visivelmente, preparando-se para um debate próximo com um sacerdote da seita da Terra Pura e havia procurado o conselho de Nitiren. Ela pode, a grosso modo, ser dividida em duas partes. A primeira e mais longa delineia a argumentação geral que Yasaburo deve apresentar no debate com um seguidor da seita da Terra Pura. A segunda, se inicia com 'Caso aquele sacerdote diga algo em resposta…', instrui-o sobre como deve impor certos pontos específicos ao seu oponente e recomenda-lhe que reúna um espírito resoluto. A primeira parte deste Gosho explana que somente Sakyamuni possui as três virtudes de soberano, mestre e pai com relação às pessoas desse mundo saha. Aqui, a virtude de soberano indica o poder do Buda de proteger todos os seres; a virtude de mestre significa a sua sabedoria para instruí-los e levá-los à iluminação; e a virtude de pai representa a sua compaixão de cuidar deles. Na época de Nitiren Daishonin, por causa da crescente influência da seita da Terra Pura, as pessoas tendiam cada vez mais a depositar sua confiança no Buda Amida do paraíso do oeste, esperando obter renascimento em sua terra pura após a morte. Sob tais circunstâncias, Nitiren Daishonin freqüentemente enfatiza a referência a Sakyamuni, fundador histórico do budismo de que fato surgiu neste mundo. Aqui, ele afirma que adorar Amida, o Buda de um outro mundo, e desprezar Sakyamuni é um ato de total deslealdade. Deste modo, embora os que acreditam em Amida possam aparentemente estarem devotando-se a atos pios, na realidade são culpados de uma ofensa muito pior do que a dos homens ímpios sem nenhuma consciência religiosa. O erro grave deles, diz Nitiren, está causando desastres ao país na forma de fome, epidemias e a iminente invasão mongol. Ele explica que, por saber que as pessoas estavam, desta forma, destinadas a experimentar grandes sofrimentos, decidiu pronunciar-se contra a fé mal orientada delas e

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sofreu repetidas injúrias como resultado. No parágrafo conclusivo, Nitiren Daishonin adverte Yasaburo a não ser influenciado por considerações periféricas nem pela sua própria mente, e a considerar esse encontro crítico com total responsabilidade coo a acontecimento decisivo de sua vida. Com tal determinação, ele conseguirá manifestar a proteção de todos os Budas e demonstrar a superioridade do Sutra de Lótus, conquistando honra eterna com base na Verdadeira Lei.

O Devoto do Sutra de Lótus encontrará perseguição (Hokke Gyoja Honan-ji, págs. 965 a 967) Para Kawanobe e sua gente, o Sacerdote Yamoto Ajari e outros, e todos os meus discípulos e meus seguidores Saburo Zaemon-no-jo e Toki. Respeitosamente, Nitiren. Pós-escrito: Nagarjuna e Vasubandhu foram, ambos, eruditos de mil obras. Contudo, eles expuseram somente os ensinos Mahayana provisórios. Embora entendessem (o significado de) o Sutra de Lótus em seus corações, eles não o declararam em palavras. (Existe uma transmissão oral referente a isto). Tientai e Dengyo chegaram até a expô-lo, mas deixaram sem revelar o objeto de adoração do ensino essencial, os quatro Bodhisattva, o supremo santuário e os cinco caracteres do Nam-myoho-rengue-kyo. As razões dele foram, primeiro, porque o Buda não havia transferido o ensino a nenhum deles, e, segundo, porque o tempo não era oportuno e a capacidade das pessoas ainda não havia amadurecido. Agora chegou o tempo e os quatro Bodhisattvas com certeza farão o seu advento. Eu, Nitiren, fui o primeiro a compreender isto. Afirma-se que o vôo de um pássaro azul anuncia a aparição da Rainha do Oeste, e que o conto de uma pega prediz a chegada de uma visita. Da mesma maneira, há presságios que prenunciam o advento dos quatro Bodhisattvas). Todos aqueles que se consideram meus discípulos devem saber que agora é o tempo para os outros Bodhisattvas aparecerem. Portanto, mesmo que isso possa lhes custar suas vidas, jamais devem abandonar sua fé. Toki, Saburo Zaemon-no-jo, Kawanobe, Yamamoto Ajari e o restante dos senhores, cavalheiros e sacerdotes, devem ler esta carta uns para os outros e prestar atenção. Nessa era impura, devem sempre conversar juntos e jamais devem parar de orar pela sua próxima vida.

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O quarto volume do Sutra de Lótus declara: "Como o ódio e a inveja (com relação a este sutra) abundam mesmo durante a existência do Buda, muito piores serão no mundo após a sua morte!" O quinto volume diz: "As pessoas nutrirão rancor (contra o Sutra de Lótus) e acharão extremamente difícil acreditar". O trigésimo oitavo volume do Sutra Nirvana afirma: "Naquele tempo havia um número incontável de brâmanes que conspiraram em conjunto e foram em massa até o rei Ajatashatru de Magadha dizendo: Atualmente existe um homem de perversidade incomparável, um monge chamado Gautama. Oh! Rei, Vossa Majestade nunca o examinou e isto foi despertar muito medo em nós. Todas as espécies de pessoas más, esperando obter lucros e donativos, ocorreram a ele aos bandos e tornaram-se seus seguidores. (Eles não praticam a bondade. Ao invés disso, usam o poder de encantos e magias para convencer homens como) Mahakashyapa, Shariputra e Mandgalyayana. Isto ilustra bem o significado da passagem: "Como o ódio e a inveja abundam mesmo durante a existência do Buda…" O monge de grande virtude Tokuiti insultou o grande Mestre Tientai Chihche, dizendo: "Olhe aqui, Chih-I, discípulo dequem você é? Com uma língua menor que sete centímetros de comprimento, você calunia os ensinos que vem da língua longa e ampla do buda ?" Tokuiti também afirmou: "Com certeza, ele (Tientai) deve ser perverso e insano". Mais de trezentos sacerdotes, incluindo os prelados de alta categoria dos sete principais templo de Nara como o Supervisor de Monges Gomyo e o Mestre de Disciplina Keishin, atuaram insultos ao Grande Mestre Dengyo, dizendo: "Assim como na terra da Hsia do oeste na época central houve um brâmane mau chamado Eloquência Demoníaca que enganava as pessoas, agora, neste reino leste do Japão há um monge de cabeça raspada que cospe palavras astutas. Demônios como esse atrairão para si aqueles que têm mentes semelhantes e enganarão e desencaminharão o mundo". Contudo, Dengyo em seu "Hokke Shuku": "Sakyamuni ensinou que o superficial é fácil de abraçar, mas o profundo é difícil. Abandonar o superficial e buscar o profundo requer coragem. O Grande Mestre Tientai confiou no Buda Sakyamuni, obedeceu-lhes e trabalhou para sustentar a escola Hokke (Lótus), propaando os seus ensinos por toda a China. Nós, do Monte Hiei herdamos a doutrina de Tientai e labutamos para manter a escola Hokke e para disseminar seus ensinos por todo o Japão." Durante a existência toda do Buda assim como nos dois mil anos dos Primeiros e Médios Dias da Lei que se seguiram à sua morte, houve somente devotos do Sutra de Lótus. Eles foram o próprio Buda Sakyamuni, Tientai e Dengyo. Em contraste, Shan-wu-wei e Pu-kung da escola Shingon, Tu-shun e Chih-yen da escola Kegon, e os mestres da escola Sanron e Hosso, todos, interpretaram as sentenças do Sutra do verdadeiro ensino de uma forma que estas concordassem com o 160

significado dos Sutras provisórios. Eruditos como Nagarjuna e Vasubandhu compreenderam internamente (o significado de) o Sutra de Lótus, mas não o expressaram em palavras externamente. Nem mesmo as quatro categorias de santos. Nos Primeiros Dias da Lei poderiam se comparar com Tientai e Dengyo em se tratando de propagar o Sutra de Lótus conforme o mesmo ensina. Se a predição do Sutra for verdadeira, deve existir um devoto do Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei, e as imensas dificuldades que ele encontrará excederão àquelas que ocorreram durante a vida do Buda. O próprio Buda experimentou nove grandes provações. Ele foi caluniado por Sundari; ofereceram-lhe papa de arroz fétida; foi forçado a comer forragem de cavalo; o Rei Virudhaka massacrou a maior parte do clã Sakya; foi esmolar, mas sua tigela permaneceu vazia; Chinchomanavika caluniou-o; Devadatta empurrou uma enorme pedra no alto de um morro (numa tentativa de matá-lo); e o vento frio obrigou-o a buscar mantos para se proteger. E, além disso, ele foi denunciado por todos os brâmanes, conforme mencionei anteriormente. Se considerarmos a predição no Sutra (de que o ódio e a inveja serão 'muito piores' após a morte do Buda), então Tientai e Dengyo não cumpriram a profecia do Buda. Em vista de tudo isso, deve aparecer no início dos Últimos Dias da Lei assim como o Buda predisse. De qualquer modo, no dia 7 de dezembro de 1273, uma corte de Hojo Tokiyori, o ex-governador da província de Musashi, alcançou a província de Sado. A missiva à qual ele apôs seu selo, diz: Ouvimos um boato de que Nitiren, o sacerdote exilado em Sado, está liderando seus discípulos na maquinação de alguns atos nocivos. Seu estratagema é totalmente ultrajante. A partir de agora, aqueles que seguirem sacerdotes serão severamente punidos. Se houver quem, mesmo assim, viole essa proibição, seus nomes deverão ser informados. Esta é uma ordem oficial. Sacerdote Kan'e Em 7 de dezembro de 1273. A Eti-ro Rokuro Zaemon-no-jo. Essa carta afirma que eu "maquinando alguns atos nocivos". Os brâmanes caluniaram o Buda, dizendo que Gautama era um homem mau. Eu, Nitiren, sofri pessoalmente cada uma das nove grandes provações. Entre elas, o massacre a que Virudhaka submeteu o clã Sakya, ir pedir donativos e ser deixado com um tigela vazia, e ser forçado a procurar mantos como proteção contra o vento frio. Foram grandes testes que superaram em muito aqueles que ocorreram durante a existência do Buda. Esses são sofrimentos que Tientai e Dengyo jamais enfrentaram. Os senhores realmente devem saber que, somando Nitiren aos, há agora um quarto devoto do Sutra de Lótus, que surgiu nos Últimos Dias da Lei. Quão feliz estou por cumprir as palavras da profecia do Sutra: "Muito piores serão no mundo após a sua morte!" Quão triste eu me sinto pelo fato de que todas as pessoas 161

deste país cairão no inferno Aviti! Não entrarei em detalhes aqui, ou esta carta se tornará muito complicada. Devem considerá-la por si próprios. Nitiren Em 14 de janeiro de 1274. Todos os meus discípulos e seguidores devem ler e ouvir esta carta. Aqueles que são diligentes devem discutí-la entre si.

Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta para todos os seus discípulos sacerdotes e seguidores leigos, incluindo Toki Jonin, Shijo Kingo, Kawanobe e Yamato Ajari, no dia 14 de janeiro de 1274. Embora um mês mais tarde o governo viesse a decretar o seu perdão, nessa ocasião Nitiren Daishonin ainda estava sendo tratado como um criminoso, um fato evidente a partir das ordens promulgadas por Hojo Tokiyori citados neste gosho. (As mesmas também são mencionadas no Gosho "O Comportamento do Buda"). A hostilidade das autoridades, somadas as dificuldades como o frio e a fome, tornavam a sobrevivência de Nitiren Daishonin deveras precária. Nesta carta, ele salienta a seus discípulos que mantenham firmemente a fé, mesmo sob o risco de suas vidas. Ele também declara que é o verdadeiro devoto do Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei. O Sutra de Lótus afirma: "Como o ódio e a inveja com relação a este Sutra abundam mesmo durante a existência do buda, muito piores serão no tempo após a morte!" Nitiren Daishonin indica que somente ele, de acordo com a predição do Buda, experimentou, em prol do Sutra, perseguições maiores do que aquelas enfrentadas pelo Buda Sakyamuni ou pelos Grandes Mestres Tientai e Dengyo. O Pós-escrito dessa carta, que na realidade aparece em seu início, contém um referência antecipada às grandes Leis Secretas - o objeto de adoração, o supremo santuário e a invocação ou Daimoku do ensino essencial como a doutrina que nem Sakyamuni ou seus sucessores da Índia, China e Japão jamais revelaram. Esses elementos formam o âmago do budismo de Nitiren Daishonin, e parece que ele já os tinha em mente há muito tempo. O Gosho "Desejos Mundanos são Iluminação", datada no mês de maio de 1273, fala de 'assuntos importantes contidos no capítulo Juryo do ensino essencial' e a "Carta a Guijo-bo", datada do mesmo mês, cita 'as grandes Leis Secretas, a incorporação de dos três mil mundos numa existência momentânea da vida, no capítulo Juryo'. O gosho "O Verdadeiro Objeto de Adoração", concluído em abril de 1273, especifica o Daimoku e o objeto de adoração, declarando: "… eles não colocaram o Nam-myoho-rengue-kyo em prática real nem

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estabeleceram o verdadeiro objeto de adoração"; um outro gosho, "O Verdadeiro Aspecto de Todas as Leis" datado no mês seguinte, também menciona o Daimoku e o objeto de adoração: "Nitiren, no entanto, foi o primeiro a propagar a Lei Mística confiada ao Bodhisattava Jogyo para ser disseminada nos Últimos Dias da Lei. Nitiren foi também o primeiro a inscrever o Gohonzon…", contudo, Nitiren Daishonin nunca havia se referido especificamente ao supremo santuário até escrever essa carta. Neste sentido, esse Gosho é especialmente importante pois é a primeira escritura remanescente que enumera todas as Grandes Leis Secretas.

O Kalpa de Diminuição (Guenko Gosho, pág. 1465 a 1467) O kalpa de diminuição tem sua origem na mente humana. À medida que os venenos da avareza, ira e estupidez intensificam-se gradativamente, a duração da vida dos seres humanos decresce correspondentemente e a estatura diminui. Antes da introdução do budismo nas terras da China e do Japão, os clássicos externos dos Três Soberanos, Cinco Imperadores e Três Sábios eram utilizados para ordenar a mente das pessoas e governar o mundo. Entretanto, como as mentes das pessoas perdiam gradativamente a benevolência e ficavam cada vez mais maldosas, a sabedoria desses clássicos, uma vez que era superficial, não podia mais refrear as ofensas dessas pessoas, pois sua maldade era profunda. Por ter-se tornado impossível governar o mundo por meio dos clássicos externos, os sutras budistas foram introduzidos gradativamente e, quando foram empregados no governo, a tranqüilidade foi restituída ao mundo. Isso se deu unicamente porque a sabedoria do budismo elucida completamente a natureza da mente das pessoas. O que é denominado atualmente 'escrituras externas' difere essencialmente dos clássicos externos originais. Quando o budismo foi introduzido, os clássicos externos e as escrituras budistas rivalizaramse. Porém, como oportunamente os clássicos externos foram derrotados e o soberano e o povo deixaram de empregá-los, os adeptos dos clássicos externos tornaram-se seguidores das escrituras internas, e o confronto anterior chegou ao fim. Nesse interim, contudo, os seguidores dos clássicos externos extraíram o âmago das escrituras internas, aumentando deste modo a sua sabedoria, e incorporaram-no 163

aos clássicos externos. Soberanos tolos presumem que tal sabedoria deriva da excelência dessas obras eternas. Além disso, enquanto a sabedoria benéfica diminuía gradativamente e uma sabedoria perniciosa passava a dominar as mentes das pessoas, apesar de os homens tentarem governar a sociedade através de escrituras budistas, o mundo não ficava em paz quando eles empregavam a sabedoria dos sutras Hinayana. Nessa época, os sutras Mahayana foram propagados e usados no governo, e a ordem foi, até certo ponto, restaurada no mundo. Depois disso, pelo fato de a sabedoria dos ensinos no Mahayana ter-se tornado por sua vez inadequada, a sabedoria do sutra do veículo único foi produzida e utilizada para governar o mundo e, por um período breve, o mundo esteve em paz. Na época atual, nem os clássicos externos, nem os sutras Hinayana, nem os sutras Mahayana, nem o veículo único do Sutra de Lótus possuem qualquer efeito. A razão disso é que a intensidade da avareza, ira e estupidez na mente das pessoas compete com a superioridade da benevolência do Grandiosamente Iluminado e Honrado pelo Mundo. Para ilustrar, um cão, na acuidade de seu faro, é superior ao homem; ao farejar o cheiro de pássaros e animais, seu nariz não é inferior ao poder olfativo natural de um grande sábio. A aguçada audição da coruja, a precisão visual do gavião, a graça do linguajar do pardal, e magnificência do corpo do dragão - tudo isso supera até mesmo as faculdades de um homem sábio. Desta forma, o grau extremo de avareza, ira e estupidez na mente das pessoas no mundo impuro dos Últimos Dias está além do poder de controle de qualquer sábio ou homem digno. Isso porque apesar de o Buda ter curado a avareza com o remédio da meditação sobre a vilania do corpo, de ter sanado a ira com a meditação sobre a compaixão por tudo, e de ter tratado a estupidez com a meditação sobre a cadeia de doze elos de geração dependente, ensinar essas doutrinas agora simplesmente torna as pessoas piores e aumenta a sua avareza, ira e estupidez. Por exemplo, o fogo é extinto pela água, e o mal é vencido pelo bem. No entanto, se a água é derramada sobre o fogo que emergiu da água, terá, contrariamente, um efeito igual ao do óleo produzindo conflagração ainda maior. Agora, neste maléficos Últimos Dias, o grande mal surge menos de más ações seculares do que os relacionados com as doutrinas do mundo religioso. Pelo fato de as pessoas hoje não terem consciência disso e tentarem cultivar raízes de mérito, o mundo decai ainda mais. Dar apoio aos sacerdotes da Tendai, Shingon e outras seitas de hoje pode parecer um ato de mérito, mas na realidade é um grande mal que supera até os cinco pecados cardeais e os dez maus atos. Por esse motivo, se houver um homem sábio no mundo com sabedoria igual à do Grandiosamente Iluminado e Honrado pelo Mundo, o qual, 164

para restaurar a ordem no mundo, encontre um soberano sábio como o Rei Sen'yo, e se juntos derem um fim completo a esses atos de 'bondade' e cometerem o grande 'mal' de censurar, banir, suprimir donativos ou mesmo decapitar as pessoas das oitos seitas que julgados homens de sabedoria, então, o mundo com certeza seria até certo ponto pacificado. Isso é explicado no primeiro volume do Sutra de Lótus, onde consta: "O Verdadeiro Aspecto de todos os fenômenos só pode ser compreendido e compartilhado por budas". Na frase "consistência do início ao fim", 'início' indica a raiz do mal e raiz do bem, ao passo que 'fim' significa o resultado do mal e resultado do bem. Aquele que despertou completamente para a natureza do bem e do mal, de suas raízes aos seus ramos e folhas, é denominado Buda. Tientai afirma: "A vida a cada momento é dotado dos Dez Mundos". Chang-an afirma: "O Buda considerou esta doutrina a razão máxima (de seu advento). Como poderia ser fácil de compreender para algum ser ?". Miao-lo acrescenta que "essa é a revelação última da verdade final e suprema". O Sutra de Lótus proclama: "(E não importando o que ele pregue de acordo com a sua compreensão) jamais ira contradizer a verdade". E, Tientai interpreta isso como "nenhuma questão da vida ou do trabalho difere de forma alguma da realidade última". Uma pessoa de sabedoria não é alguém que pratica o budismo separadamente dos assuntos mundanos mas, ao contrário, é alguém que compreende inteiramente os princípios pelos quais o mundo pode ser governado. Quando a dinastia Yin tornou-se corrupta e as pessoas estavam sofrendo, Tai-Kung Wang surgiu no mundo e decapitou o Rei Chou, acabando com a angústia do povo. Quando o segundo soberano (da mesma dinastia) levou o povo a experimentar a amargura, Chang Liang apareceu e restaurou a ordem no mundo, possibilitando-lhe conhecer a doçura. Embora esses homens tenham vivido antes da introdução do budismo, eles ajudaram as pessoas como emissários do Lorde Sakyamuni. E, apesar de os adeptos dos clássicos externos não terem consciência disso, a sabedoria desses homens incorporava em sua essência a sabedoria do budismo. Se no mundo atual, na época do grande terremoto da era Shoka ou na ocasião do enorme cometa da era Bun'ei tivesse havido um soberano de notável sabedoria, ele certamente teria dado atenção a mim, Nitiren. Ou, mesmo se não o fizesse, quando irrompeu a disputa dentro do clã dominante no nono ano de Bun'ei (1272) ou quando os mongóis atacaram no nono ano da mesma era (1274), ele deveria ter-me recebido como o Rei Wen da dinastia Chou recebeu Tai-kun Wang, ou me procurado como o Rei Kao-ting da dinastia Yin procurou Fu Yueh percorrendo sete ri de distância. Assim, afirma-se que o sol e a lua não são tesouros para alguém que é cego, e que um homem digno será odiado por um governante tolo. Em vez de prosseguir detalhadamente, encerrarei aqui. O âmago do Sutra de Lótus é exatamente como explanei. Não deve considerá-lo de outra maneira. Um grande mal pressagia a chegada de um grande bem. Se a totalidade de 165

Jambudvipa foi atirada ao caos, não poderá haver dúvidas de que (este sutra) irá 'propagar-se por todo o continente de Jambudvipa'. Estou enviando Daishin Ajari para visitar o túmulo do falecido Rokuro Nyudo. No passado, era da opinião de que se houvesse pessoas na região de Kanto que tivessem ouvido este ensino eu próprio iria até seus túmulos e recitaria o Jigague. Contudo, se fosse lá sob as atuais circunstâncias, toda a província saberia no mesmo dia, e isso causaria um alvoroço que alcançaria até mesmo Kamakura. E embora elas possam ter uma fé inabalável, onde quer que eu vá, as pessoas deste lugar têm de temer os olhos dos outros. Como ainda não fui visitá-lo, pensei no quanto o falecido Rokuro Nyudo deveria estar ansiando por me ver, e que deveria haver algo que pudesse fazer. Portanto, antes de tudo, enviei um discípulo para recitar o Jigague diante do túmulo. Peço sua compreensão em relação a isto. Com meu profundo respeito. Fundo de Cena Tanto a data como o destinatário deste Gosho são desconhecidos, embora se acredite que tenha sido escrito no Monte Minobu algum tempo após 1276. A julgar pelo parágrafo conclusivo, Nitiren Daishonin pode tê-lo enviado, por intermédio de seu discípulo Daishin Ajari, a alguém do clã do falecido Takahashi. Rokuro Hyoe Nyudo, um praticante que viveu em Kajima, no distrito Fuji, província de Suruga. A partir da afirmação inicial: "O Kalpa da diminuição tem a sua origem na mente humana", Nitiren Daishonin explica que o mundo decai em conseqüência da ilusão humana. À proporção que a avareza, ira e estupidez na mente das pessoas intensificam-se, ensinos progressivamente mais elevados tornam-se necessários para contê-las. Nos atuais Últimos Dias da Lei, esses venenos estão tão difundidos que os ensinos provisórios não só são incapazes de refreá-los, mas também, na realidade, agravam-nos muito mais. Nessa era, esclarece Nitiren Daishonin, os piores males na verdade não advêm dos delitos seculares, mas do apego as formas provisórias de budismo, cuja prática não serve mais para se acumular o mérito conducente à iluminação. Citando a passagem do capítulo Hoben (2) do Sutra de Lótus que diz, "O verdadeiro aspecto de todos os fenômenos só pode ser compreendido e compartilhado entre budas", Nitiren Daishonin explana que somente a sabedoria de Buda consegue discernir a verdade suprema que trará paz ao mundo. Ele também explica que uma pessoa de verdadeira sabedoria não é alguém que efetua a disciplina budista isolado do mundo, mas alguém que entende totalmente os princípios

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pelos quais o mundo pode ser gerido. Isso está de acordo com o ensino do Sutra de Lótus de que a realidade última manifesta-se em todos os fenômenos. Nesse sentido, pode-se dizer que até mesmo os sábios ministros do passado, que ajudaram a trazer paz às suas dinastias nas épocas anteriores à introdução do budismo, compreenderam uma parte da Lei Budista. Embora o soberano do Japão não tenha ouvido a admoestação de Nitiren Daishonin de que somente a fé na Lei Mística poderia devolver a paz ao país, este continuou convicto de que o seu ensino um dia floresceria. Conforme sugere o título deste Gosho, "O Kalpa da Diminuição", os desastres que atormentavam a sociedade em seu tempo, tais como o grande terremoto da era Shoka (1275) e o cometa da era Bun'ei (1264) foram considerados por Nitiren Daishonin, num sentido, como fatos gerados pela ilusão humana e apego a ensinos inferiores. Entretanto, num outro sentido, de acordo com o que indicam as palavras do Gosho "um grande mal pressagia a chegada de um grande bem", Nitiren Daishonin também interpreta-os como prenúncios da ascensão e propagação da Lei. O Gosho é concluído com expressões de preocupação com o bem-estar do devotado seguidor, o falecido Rokuro Nyudo.

Carta a Abtsu-bo (Abutsu-bo Gosho) Agora, o corpo de Abutsu-Shonin é composto dos cinco elementos: terra, água, fogo, vento e kuu. Estes cinco são também indicativos dos cinco caracteres do Daimoku. Portanto, Abutsu-bo é a própria Torre de Tesouro e esta é o próprio Abutsu-bo. Qualquer outra interpretação é desnecessária. Esta Torre de Tesouro é decorada com as sete espécies de tesouros:audição, fé, preceito, convicção, devoção, apego e reflexão. O senhor pode pensar que ofereceu doação à Torre de Tesouro do Buda Taho, mas não é exatamente isso. O senhor ofereceua a si mesmo. O senhor mesmo é um Buda da Verdadeira percepção de "Sanjin-soku-itsu". Acreditando desta forma o senhor deve recitar o Nam-Myoho-Rengue-Kyo. Então, o lugar onde o senhor reside é o local da Torre do Tesouro. É por causa disso que o sutra cita:"No local onde se prega o Sutra de Lótus, Minha Torre de Tesouro, Aparecerá diante dele". Por ser a sua fé tão respeitável, vou-lhe inscrever a Torre de Tesouro (Gohonzon). O senhor nunca deverá transferi-la a ninguem a não ser para o seu próprio filho. Mostre-a apenas para as pessoas de forte fé. Esta é a razão do meu advento neste mundo.

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FUNDO DE CENA A "Carta a Abutsu-bo" foi escrita em 13 de março de 1272 por Nitiren Daishonin, aos 51 anos de idade, quando de encontrava vivendo na Ilha de Sado. Antes de se converter ao Verdadeiro Budismo, Abutsu-bo foi um crente fanático de uma seita herética. Quando tomou conhecimento da chegada de Nitiren Daishonin na Ilha de Sado, Abutsu-bo foi tentar combatê-lo através de um debate religioso. Contudo desde então, apesar dos seus 80 anos de idade, sempre procurou proteger Daishonin, dedicando-se de forma assídua no aprimoramento da prática da fé. A pureza da vida de Abutsu-bo é louvado no contexto da carta, onde podemos sentir a profunda paixão e o espírito de procura do idoso discípulo. A passagem acima é apenas uma parte da "Carta a Abustu-bo", onde Nitiren Daishonin esclarece o significado da Torre de Tesouro. Do ponto de vista do Verdadeiro Budismo, a Torre de Tesouro representa o Gohonzon ou a vida do Buda. Daishonin afirma que a avida daquele que recita o Daimoku ao Gohonzon é a Torre de Tesouro. No final Nitiren Daishonin afirma que a revelação do Gohonzon é a razão do seu advento neste mundo. (END. VOL . I PÁG. 347/348)

Resposta ao Lorde Shijo Kingo (Shijo Kingo Dono Gohenji, págs. 1193-1194) Recebi o arroz que me enviou de Tono'oka. Usei-o como um oferecimento aos sacerdotes na cerimônia de urabon no sétimo mês deste ano. Os sacerdotes que participaram, a assembléia reunida no Pico da Águia, o Buda e os deuses devem, com certeza, ter aceitado o seu oferecimento e estar exultantes. Palavras não traduzirão meu reconhecimento pela sua infalível sinceridade e pelas suas freqüentes visitas. De qualquer forma, não pode haver dúvida a respeito de sua iluminação na próxima existência. Lembro-me, acima de tudo, da maneira como o senhor agarrou as rédeas de meu cavalo, acompanhando-me descalço e derramando lágrimas de consternação, quando incorri no desagrado das autoridades e estava para ser decapitado em Tatsunokuti, na província de Sagami, no oitavo ano da era Bun'ei (1271). O senhor estava até mesmo preparado para cometer hara-kiri se minha execução fosse, de fato, consumada. Quando eu poderia esquecer isso ? E isso não é tudo. Exilado na ilha de Sado, enterrado como estava sob as neves do mar do Norte e exposto aos ventos dos picos do Norte, mal

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parecia que sobreviveria. Abandonado até pelos meus amigos de longa data, pensei que não poderia voltar a minha terra natal assim como um pedra que está no fundo do oceano, que requer a força de mil homens para movê-la, pode flutuar na superfície. Mortal comum como sou, naturalmente, senti saudade das pessoas de minha vila natal. Para o senhor, uma pessoa leiga pressionada pelo tempo de serviço, crer no Sutra de Lótus é um fato, em si, muito raro. Além disso, transpondo montanhas e rios e cruzando o grande mar azul, o senhor veio de tão longe para me visitar. Como a sua decisão poderia ser inferior à daquele que abriu seus ossos na Cidade das Fragrâncias, ou daquele que atirou seu corpo nas Montanhas Nevadas ? Além disso, de minha parte, embora houvesse tão pouca possibilidade de ressurgir no mundo, por uma razão ou outra fui perdoado na primavera do décimo-primeiro ano de Bun'ei (1274) e pude retornar a Kamakura. Ao ponderar o significado destes fatos, creio que agora devo estar livre do carma dos erros passados. Uma vez quase perdi minha vida. Na era Kotyo fui exilado na província de Izu, e na era Bun'ei, à ilha de Sado. Por ter advertido repetidamente as autoridades, enfrentei uma perseguição após outra. Entretanto, exatamente por esta razão, certamente já escapei da acusação de 'trair o budismo'. Contudo, quando expressei o desejo de deixar o mundo e ir para uma floresta para buscar o Caminho, as pessoas manifestavam diferentes opiniões. Todavia, por motivos cuidadosamente considerados, vim a esta montanha que fica nesta província, onde já passei sete primaveras e outonos. Deixando de lado no momento a questão da minha sabedoria, em suportar privações e sofrer ferimentos como um aliado do Sutra de Lótus, supero até mesmo o Grande Mestre Tientai da China e excedo até o Grande Mestre Dengyo do Japão. Isto porque o tempo fez as coisas assim. Se sou realmente um devoto do Sutra de Lótus então o Senhor Sakyamuni do Pico da Águia, o Buda Taho da Terra da Pureza Preciosa, os Budas das dez direções que são emanações de Sakyamuni, os grande bodhisattvas do ensino essencial, os grandes bodhisattvas do ensino teórico, Bonten, Taishaku, as divindadesdragões e as dez filhas-demônios devem estar todos presentes neste lugar. Onde há água, há peixes. Onde há madeiras, os pássaros se reúnem. A ilha montanhosa de P'eng-lai está cheia de pedras preciosas, e os sândalos crescem no Monte Malaya. O ouro é encontrado nas montanhas de onde brota o rio Li-shui. Este local é exatamente igual. É o lugar da 'concentração de benefícios' onde habitam Budas e bodhisattvas. Os benefícios do Sutra de Lótus que tenho há muito tempo recitado devem ser mais vastos do que o céu. Deste modo, tendo vindo aqui 169

freqüentemente ano após ano, é certo que ainda nesta existência o senhor erradicará os impedimentos cármicos que acumulou desde o tempo sem começo. O senhor deve empenhar-se ainda mais. Nitiren, Em 8 (END Vol. VI, pág. 257)

de

outubro

Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta para Shijo Kingo em 1280 a fim de expressar seus agradecimentos por um oferecimento de arroz. Ele também elogia a dedicação extraordinária de Kingo, manifestando sua gratidão não só pelo espírito indomável que o samurai demonstrou na ocasião da Perseguição de Tatsunokuti, mas também pelos grandes esforços que ele empenhou desde então visitando Daishonin e proporcionando-lhe as provisões necessárias, tanto na ilha de Sado como no monte Minobu. Nitiren Daishonin estava na época perto do final de sua vida, sua saúde era fraca e provavelmente desejasse demonstrar o seu profundo reconhecimento a Shijo Kingo pela devoção durante toda sua vida. Na segunda parte da carta, Daishonin afirma a sua convicção de que, tendo superado várias provações em prol do Sutra de Lótus, ele seguramente livrou-se do carma de calúnias passadas. Ao sofrer tal perseguição pela causa da Lei Mística, supera até mesmo os grandes mestres do passado, Tientai e Dengyo. Ao fazê-lo, mostrou ser o devoto do Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei. Ele expressa a sua iluminação como uma pessoa cuja vida é una com a Lei descrevendo a sua morada no deserto monte Minobu como um local onde se reúnem budas, bodhisattvas e divindades.

Sobre Recomendar este Ensino a Seu Lorde (Shukun Jinyushi Homon Men-Yodozai-ji, pág. 1132-1133)

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Recebi dois Kan de moedas. O principal tesouro dos seres sensíveis não é nenhum outro senão a própria vida. Aqueles que tiram a vida estão fadados a cair nos maus caminhos. Os reis giradores da roda observaram o preceito de "não matar" como o primeiro, dos dez bons preceitos. O Buda pregou os cinco preceitos no início dos sutras Hinayana e fez de "não matar" como o primeiro deles. Ensinou também "não matar"como o primeiro dos dez maiores preceitos no Sutra Bommo do Mahayana. O capítulo Juryo do Sutra de Lótus contém os benefícios do preceito de "não matar "do Buda Sakyamuni. Consequentemente, aqueles que matam serão abandonados por todos os Budas das três existências e os deuses dos seis céus do mundo do desejo não o protegerão. Os eruditos de nosso tempo estão conscientes disso, e eu, Nitiren, também tenho uma compreensão geral disso. Entretanto, as circunstâncias de matar variam, e a ofensa da pessoa que foi morta pode ser grave ou leve. Se alguém matar o assassino de seus pais, de seu soberano ou de seu mestre, então, embora cometa o mesmo delito de matar, seu sério pecado será, na realidade, tornar-se mais ameno. Isto também é algo que nossos eruditos contemporâneos sabem. Porém, mesmo os bodhisattvas, com sua grande benevolência, se fizerem oferecimentos aos inimigos do Sutra de Lótus, com certeza cairão no inferno de incessantes sofrimentos. Em contraste, mesmo aqueles que cometem os cinco pecados cardeais, se odeiam esses inimigos, definitivamente renascerão nos reinos humano ou celestial. O Rei Sen'yo e o Rei Utoku, que destruíram, respectivamente, os quinhentos e os inumeráveis inimigos do Sutra de Lótus, tornaram-se o Buda Sakyamuni neste mundo. Os discípulos de Sakyamuni, tais como Mahakashyapa, Ananda, Shariputra, Maudgdyayana e outros incontáveis seguidores, foram os que, naquela oportunidade, estiveram na vanguarda da batalha e dissiparam o inimigo, matando-os, ferindoos ou exultando no combate. O monge Kakutoku tornou-se o Buda Kasho. Ele foi um devoto do Sutra de Lótus muito compassivo que, naquela ocasião, pediu ao Rei Utoku que atacasse os inimigos do sutra como se fossem pessoas que estivessem traindo seu pai e mãe desde uma existência passada. Nossa época presente corresponde aquele tempo. Se o soberano aceitasse as palavras de Nitiren, ele se tornaria como os dois reis. No entanto, ele não apenas as rejeitou, mas também pôs-se ao lado dos inimigos do Sutra de Lótus, de modo que toda a nação agora ataca a mim, Nitiren. Do soberano às pessoas comuns, todos tornaram-se caluniadores cujas ofensas ultrapassam até mesmo os cinco pecados cardeais. Todos pertencem à facção do soberano. Embora em seu coração o senhor pense como Nitiren, a sua pessoa está a serviço do seu lorde. Desta maneira, parece ser extremamente difícil evitar que cometa a ofensa de cumplicidade na calúnia. Todavia, o senhor transmitiu este ensino ao seu lorde e recomendou que tivesse fé nele. Quão admirável ! Mesmo que ele não o aceite agora, o senhor conseguiu impedir a ofensa da cumplicidade. De agora em diante, deve 171

ter cuidado com o que fala. Os deuses celestes o protegerão sem falta, e eu próprio direi a eles que o façam. Por favor, tome toda precaução possível. Aqueles que o odeiam estarão muito mais vigilantes esperando um ensejo para prejudicá-lo. Não vá mais a nenhuma festa regada a bebidas à noite. Que mal há em beber na companhia de sua esposa somente ? Mesmo que compareça a banquetes com outros durante o dia, jamais relaxe a sua guarda. Seus inimigos não terão oportunidade para atacá-lo, a menos que tirem vantagem de uma ocasião em esteja bebendo. Cuidado nunca é demais. Com meu Nitiren Em 26 de (END. Vol. VI - pág. 57)

profundo setembro

respeito, de

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Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta no mês de setembro de 1274 a Shijo Kingo, um de seus principais seguidores em Kamakura e um samurai a serviço da família Ema, uma ramificação do clã dominante, Hojo, Nela, ele louva Shijo Kingo por sua coragem em aventurar-se a apresentar o ensino de Nitiren Daishonin a seu lorde, Ema Mitsutoki (ou o filho de Mitsutoki, Tikatori, segundo outra fonte). O título completo deste Gosho significa: "Sobre Recomendar Este Ensino ao Seu Lorde, Evitando Assim a Ofensa de Cumplicidade na Calúnia". "A ofensa de cumplicidade na calúnia", diz respeito à calúnia que ocorre quando alguém, apesar de não cometer calúnia, faz oferecimentos aos inimigos da Lei Verdadeira ou age em concordância com caluniadores, deixando de admoestá-los. Perto da época da retirada de Nitiren Daishonin ao Monte Minobu, Shijo Kingo havia recomendado os ensinos de Daishonin ao Lorde Ema. Como muitos praticantes, Shijo Kingo havia despertado uma nova convicção na fé quando Daishonin, contra todas as expectativas, retornou a salvo de Sado. Durante o exílio, a profecia de Nitiren Daishonin de conflito interno, feita em sua escritura Risho Ankoku Ron (A Pacificação da Terra através do Verdadeiro Budismo) havia-se concretizado na forma de uma disputa pelo poder dentro do clã dominante Hojo, e agora que os mongóis estavam aprontando seus exércitos para o ataque, o cumprimento de sua segunda profecia, a de invasão estrangeira, parecia iminente. Essas podem estar entre as razões que levaram Shijo Kingo a falar sobre o assunto ao seu lorde. Lorde Ema era então um seguidor do sacerdote Ryokan do templo Gokurakuji. Afirma-se também que a família Ema construiu Tyorakuji, um templo da seita Jodo entre os sete principais em Kamakura. De

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qualquer modo, o Lorde Ema ressentiu-se daquilo que ele considerou como presunção do seu vassalo, quando ele tentou convertê-lo, e atormentou-o de várias maneiras. Certa vez até mesmo ameaçou transferir Kingo para a remota província de Etigo se não renunciasse à sua fé no Sutra de Lótus, anos se passariam até que o samurai pudesse recuperar a confiança de seu lorde. Neste Gosho, Nitiren Daishonin explana que 'não matar' é o primeiro entre todos os preceitos. Contudo, em certo aspecto, caluniar o Sutra de Lótus é uma ofensa ainda maior do que matar, pois alguém que se opõe ao sutra na verdade nega a natureza de Buda eternamente inerente em todos os seres, cuja compreensão é o propósito máximo da vida. Nitiren Daishonin elogia Shijo Kingo por ter insistido a seu Lorde que passasse a ter fé no Sutra de Lótus, evitando assim a ofensa de cumplicidade na calúnia. Ele também aconselha Kingo a ser cauteloso na fala e ação e partir de então, mostrando discernimento da personalidade do samurai bem como dos perigos que ele estaria enfrentando.

Resposta ao Lorde Shijo Kingo (Shijo Kingo Dono Gohenji – Págs. 1180 a 1182) Recebi um kan de moedas e respeitosamente relatei ao Sutra de Lótus que era um oferecimento de Yorimoto. Eu creio que o lorde Sakyamuni, o Buda Taho e os Budas das dez direções, assim como os deuses do sol e da lua certamente o protegerão. Se um homem tenta se aperfeiçoar neste mundo, mesmo aquelas pessoas consideradas dignas e sábias, para não mencionar as pessoas comuns, ficarão invejosas e alimentarão malevolência contra ele. Três mil cortesãs tiveram ciúmes de Wang-Chao-chun, a favorita do imperador Yuan-ti da dinastia Han anterior. As consortes de Taishaku, em número de noventa e nove milhões de nayuta, odiaram invejosamente Kyoshika. O ministro Fujiwara no Saneyori invejou o príncipe imperial Kaneakira, e Fujiwara no Tokihira, então ministro da esquerda, ficou invejoso de Sugawara no Mitizante e acusou-o falsamente perante o imperador, causando o seu exílio. Considere a sua própria situação à luz desses exemplos. O território do seu lorde Ema Nyudo foi vasto, mas agora diminuiu. Ele tem muitos filhos que poderiam sucedê-lo e tem também muitos funcionários que vieram desde há tempo prestando-lhe serviço. Estes devem estar sendo tomados de crescente inveja, à semelhança dos peixes que 173

ficam agitados quando a água da sua lagoa diminui e como os pássaros que brigam entre si para agarrar os galhos quando os ventos do outono começam a soprar. Além disso, como o senhor desobedeceu o seu lorde e contrariou a sua vontade de tempos em tempos, as calúnias levadas a ele contra o senhor devem ter-lhe parecido mais do que plausíveis. Entretanto, apesar do senhor ter tido as suas terras confiscadas algumas vezes, em sua carta afirmou que lhe foi conferido um território. Isso é realmente maravilhoso. É precisamente a afirmação de que virtudes invisíveis trazem recompensas visíveis. Isso deve ter acontecido devido à sua profunda sinceridade em tentar levar o seu lorde à fé no Sutra de Lótus. O rei Ajatashatru, embora tendo sido uma vez inimigo do Buda, começou a ter fé no Sutra de Lótus após ser advertido pelo seu ministro Jivaka, e pôde assim prolongar a sua vida e continuar o governo. O rei Myoshogon corrigiu as suas idéias errôneas através do conselho de seus dois filhos Jozo e Joguen. Isso é também verdade no seu caso. O lorde Ema está agora provavelmente mais brando devido à sua admoestração. Isso aconteceu unicamente devido à sua profunda fé no Sutra de Lótus. Quanto mais profundas as raízes, mais exuberantes são os ramos. Quanto mais distante a fonte, mais longa a corrente. Semelhantemente, todos os outros sutras que não o Sutra de Lótus, têm raízes superficiais e curtas correntes, enquanto que o Sutra de Lótus tem raízes profundas e uma distante fonte. Eis porque o Grande Mestre Tientai afirmou que o Sutra de Lótus pode sobreviver e propagar-se mesmo numa era maléfica. Muitas pessoas aderiram à fé neste ensino. Mas como grandes perseguições, tanto oficiais como não, ocorreram repetidamente a mim, apesar daquelas pessoas terem me seguido durante um ano ou dois, muitas delas abandonaram a fé e algumas voltaram-se inclusive contra o Sutra de Lótus. Algumas parecem aparentemente crer, mas alimentam dúvidas em seus corações, enquanto que outros aparentemente renunciaram à fé, embora possam estar continuando a crer em particular. O Buda Sakyamuni, herdeiro do rei Sudodana, foi um grnde rei que governou os oitenta e quatro mil, duzentos e dez países do mundo. Todos os reis de todo o mundo curvaram-se diante dele, e a ele pertenciam dez miríades de milhões de servidores. Não obstante, ele deixou o castelo do rei Sudodana aos dezenove anos e entrou no monte Dandaka, onde se entregaria as austeridades durante doze anos. Naquele tempo, foi assistido por apenas cinco homens: AjnataKaundinya, Asvajit, Bhardrikah, Dassabla Kashyapa e Mahanaman. Dos cinco, entretanto, dois deixaram Sakyamuni durante os primeiros seis anos, enquanto que os restantes três desertaram nos últimos seis anos (não mais acreditando nele). Embora deixado sozinho, Sakyamuni continuou sua prática e tornou-se Buda. 174

O Sutra de Lótus é ainda mais difícil de acreditar (do que Sakyamuni), assim, o próprio sutra afirma que é "…o mais difícil de se crer e o mais difícil de se compreender". Além disso, nos Últimos Dias da Lei, perseguições são muito mais frequentes e intensas do que durante a existência do Buda Sakyamuni. O sutra afirma que um devoto do sutra que persevera mesmo enfrentando perseguições receberá benefícios muito maiores do que aqueles obtidos através da doação de oferecimentos ao Buda por todo um aeon. Estamos agora a dois mil, duzentos e trinta e tantos anos desde o falecimento do Buda. Aqueles que propagaram o Budismo na Índia por mais de mil anos após seu falecimento estão registrados na história sem omissão, e os que disseminaram o Budismo na China por mil anos e no Japão por setecentos anos estão também claramente relacionados. Muitos poucos deles, entretanto, encontraram perseguições tão terríveis quanto as do Buda. Muitos descreveram-se como homens dignos ou sábios, mas nenhum deles chegou a viver a predição do sutra, "(Como o ódio e a inveja proliferam mesmo durante a existência do Buda,) quão pior será no mundo após o seu falecimento?". O Bodhisattva Nagarjuna, Tientai e Dengyo encontraram grandes perseguições pelo Budismo, mas não foram tão grandes quanto as que o Buda descreve nos sutras. Isso acontece porque eles nasceram antes da época em que o Sutra de Lótus devia ser propagado. Nós já entramos no "último meio milênio", ou início dos Últimos Dias da Lei. Esta época é como o sol no solstício do verão do décimo-quinto dia do quinto mês ou a lua da colheita no décimo-quinto dia do oitavo mês. Os grandes mestres Tientai e Dengyo nasceram demasiadamente cedo para vê-la; os que nasceram depois se lamentarão de terem chegado tarde demais. A principal força do inimigo já foi derrotada (por Nitiren), e o restante não é páreo para mim. Agora é a época exata profetizada pelo Buda como "o último meio milênio", "o começo dos Últimos Dias da Lei", ou a era indicada pela passagem "quão pior será no mundo após seu falecimento?". Se as palavras do Buda não forem falsas, um sábio já deve ter aparecido certamente neste mundo. De acordo com os sutras, a maior guerra que o mundo já presenciou deverá tomar lugar como sinal do advento desse sábio, e como tal guerra já ocorreu, o sábio já deve ter aparecido neste mundo. O aparecimento, de um animal lendário chamada kylin indicou aos contemporâneos chineses que Confúcio era um sábio, e não há dúvida de que o relicário de uma vila ressoa para anunciar a vinda de um sábio. Quando o Buda fez seu advento neste mundo, o crescimento da árvore de sândalo informou aos seus contemporâneos de que ele era um sábio. Lao-Tzu foi reconhecido como sábio porque, ao nascer, a sola de um pé estava marcada como o caráter chinês "dois"e a do outro com o caráter "cinco".

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Então, como se poderia reconhecer o sábio do Sutra de Lótus dos Últimos Dias da Lei ? O sutra afirma que a pessoa que prega e abraça o Sutra de Lótus é o enviado do Buda. Em outras palavras, aquele que abraça um único verso, capítulo, volume ou os oito volumes, ou que recita o título do Sutra de Lótus, é o emissário do Buda. E também aquele que persevera diante de grandes perseguições e abraça o sutra do começo ao fim é o emissário do Buda. Eu não me considero de modo algum emissário do Buda, pois sou mortal comum. Entretanto, como incorri no ódio dos três forte inimigos e fui exilado duas vezes, eu sou como o enviado do Buda. Embora, apesar do meu coração estar impregnado dos três venenos e meu corpo ser do mortal comum, eu sou como o enviado do Buda, porque minha boca recita Nam-myoho-rengue-kyo. Se buscar um exemplo do passado, posso ser comparado ao Bodhisattva Fukyo. Se olhar para o presente, eu tenho vivido a descrição do sutra das perseguições ‘a espada e bastão, rochas e pedras’. Sob essa luz, indubitavelmente chegarei ao lugar de iluminação no futuro, e aqueles que me sustentaram irão também residir juntamente na terra pura. Eu tenho muitas outras coisas a lhe contar, mas irei parar aqui, e deixarei o restante para o senhor imaginar. O acólito doente recuperou-se, o que me deixa muito feliz. Daishin-ajari morreu exatamente como o senhor previu. Mesmo o antigo médico mestre indiano Jivaka não seria páreo para o senhor. Todos estão aqui profundamente impressionados pela sua habilidade médica e previsão, e eu não sou exceção. Viemos comentando uns aos outros como suas predições sobre Sammi-bo e Soshiro tornaram-se verdadeiras, exatamente como duas réplicas igualam-se perfeitamente. Eu confio minha vida ao senhor e não consultarei outro médico. Em 15 de setembro de 1278. Nitiren. Fundo de Cena Nitiren Daishonin, então com cinquenta e sete anos de idade e vivendo no monte Minobu, enviou este escrito a Shijo Kingo em 15 de setembro de 1278, em resposta a uma carta e doações. Em sua carta, Shijo Kingo relatou que o lorde Ema não estava mais descontente com ele, e lhe havia dado terras maiores. Nitiren Daishonin expressou sua indisfarçável alegria com essa notícia e elogiou Shijo Kingo por sua fé que lhe havia dado forças para superar e suportar vários anos de dificuldades. Agora, Shijo Kingo não estava mais pobre, e podia oferecer um kan de moedas a Daishonin.

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Neste escrito, Nitiren Daishonin inicialmente atribui a boa sorte de Kingo à sua sincera fé que lhe possibilitou viver mesmo sob as falsas acusações contra ele e reconquistar a confiança do seu lorde. A seguir, salienta a extrema dificuldade de acreditar no Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei e a imensurável boa sorte que pode ser obtida com essa fé. Finalmente, à luz dos sutras, ele se refere à sua própria missão como ‘o enviado do Buda’ para propagar a essência do Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei. Ele promete que todos os que lhe apoiarem atingirão, juntamente com ele, a iluminação. Daishonin cita duas razões para afirmar que ele é "como o enviado do Buda". Uma delas é o fato de ter experimentado a profecia do Sutra de Lótus de que o seu devoto na era posterior ao falecimento do Buda enfrentaria perseguições ainda maiores do que a dos dias de Sakyamuni, ele seria atacado com bastões e pedras, e seria exilado mais de uma vez. A outra razão está baseada nas predições das escrituras, de que, quando o sábio da última era surgir, iria ocorrer a maior guerra que o mundo teria presenciado. Nitiren Daishonin concluiu que a campanha de conquista mongólica correspondia às descrições do sutra. Shijo Kingo (1230-1300) foi um fiel crente que dedicou-se resolutamente à fé no Gohonzon, e protegeu e seguiu Nitiren Daishonin, decidido a morrer junto. No ano seguinte, ele recebeu o manuscrito de ‘A Abertura dos Olhos’, um dos mais importantes escritos de Daishonin, revelando a sua iluminação. Como Shijo Kingo era suficientemente ousado para tentar o chakubuku ao seu lorde Ema Nyudo, no ano de 1274, logo se envolveu em dificuldades. O lorde Ema desaprovou a sua fé, e os colegas invejosos aproveitaram a oportunidade para fazer acusações a Ema contra ele. Nos anos seguintes, Kingo viu o sofrimento, pois o lorde Ema reduziu o seu feudo e não lhe depositou confiança. A situação piorou em 1276 quando o lorde lhe ordenou a transferir-se para uma província distante caso não renunciasse à fé no Budismo de Daishonin. Kingo lutou duramente para enfrentar esse impasse, seguindo as orientações de Daishonin. No ano de 1277, uma epidemia abateu sobre Kamakura e o lorde Ema caiu doente. Seu descontentamento com Shijo Kingo perdeu comparativamente a significância. Embora o lorde tivesse recorrido a todos os meios de tratamento, ele não melhorou e, no final, não teve escolha senão recorrer à ajuda de Kingo. A habilidade médica e o dedicado tratamento de Kingo conseguiram a cura e isso, juntamente com a sua inflexível lealdade, dissiparam a ira de Ema. Este renovou então a sua confiança em Shijo Kingo e, no ano seguinte, conferiu-lhe um feudo muito maior do que o anterior. Este gosho foi escrito em resposta ao primeiro relato de Shijo Kingo de que as circunstâncias haviam mudado para melhor.

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O Palácio Real (Oshajo no Koto – Págs.1137 a 1139) Recebi um e meio kan de moedas. Estou contente por ter me informado detalhadamente sobre o incêndio que destruiu o templo Gokuraku-ji. A conflagração está mencionada no Sutra Ninno como sendo o terceiro, e no Sutra de Lótus como sendo o primeiro dos sete desastres. Nenhuma espada pode cortar o ar e nenhum fogo pode queimar a água. Semelhantemente, nenhum fogo pode fazer mal a um sábio, a um homem digno, a um homem de boa sorte ou a um homem de sabedoria. A grande cidade murada de Rajagriha, na antiga Índia, segundo se acredita, continha novecentas mil casas, mas foi destruída por grandes incêndios que irromperam em sete ocasiões. Quando o rei viu o povo a ponto de fugir da cidade em desespero, ficou infinitamente triste. Naquela ocasião, um sábio aconselhou-o, dizendo: "A conflagração, como um dos sete desastres, ocorre quando um sábio deixou o país e a boa sorte do rei acabou. Neste caso, entretanto, embora os sucessivos incêndios tivessem destruído as casas do povo, jamais invadiram o palácio real. Isso indica que a culpa não está no rei, mas no povo. Portanto, se chamar a cidade inteira onde moram, de "palácio real" o deus do fogo receará queimar suas casas". O rei achou esse conselho razoável, e chamou a cidade de Rajagrilha (Palácio Real), e nunca mais houve fogo desde então. Essa história nos ensina que o fogo não pode destruir um homem de grande boa sorte. Neste país, entretanto, o palácio do shogun acabou de queimar, indicando que a boa sorte do Japão está a ponto de terminar. Calamidades estão visitando este país com crescente frequência, provavelmente devido aos bonzos envolvidos em calúnias estarem oferecendo ferventes orações na tentativa de subjulgarem a mim, Nitiren. O nome revela a essência de uma coisa. O ‘santo’ caluniador, Ryoka-bo (Bonzo do Duplo Fogo) é o mestre de todas as pessoas, superiores e inferiores, que vivem em Kamakura. Um dos dois incêndios reclamou-o como vítima, reduzindo o Gokuraku-ji (Templo do Paraíso) a Jigoku-ji (Templo do Inferno). O outro incêndio saltou sobre o palácio do governo, devorando-o. Além disso, esse duplo fogo não somente devastou o país nesta existência, como augura que o mestre de todo o Japão e seus

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discípulos cairão, na próxima existência , no inferno de incessantes sofrimentos e arderão nas suas chamas cármicas. Os bonzos ignorantes não ouviram as palavras de um homem de grande sabedoria e, como resultado, este desastre aconteceu. Quão pesaroso ! Eu já escrevi ao senhor a respeito disso. A propósito, criei a égua que o senhor me ofereceu e ela encontrou um par, dando nascimento a um potro castanho. Que cavalo maravilhoso ! Eu desejo que o veja de qualquer maneira. Aqui, eu tenho também ouvido falar bastante sobre Nagoe no Ama. Foime dito que alguém encontrou-a e repreendeu severamente por louvar o ensino teórico de Tientai. Quanto às orações de sua esposa, eu acredito que sua fé deva ser fraca, apesar dela não duvidar do Sutra de Lótus. Eu creio que mesmo os que aparentam crer tal como o sutra ensina podem na verdade não ter sólida fé, conforme o senhor está bem ciente. Além disso, é muito mais fácil agarrar o vento que imaginar a mente de uma mulher. O fato das orações de Nitiguen-nyo não terem encontrado resposta é comparável a um forte arco com uma corda frágil, ou uma boa espada nas mãos de um covarde. Não é de modo algum um falha do Sutra de Lótus. Explique bem a ela que ela mesma deve abandonar os ensinos da Nembutsu e da Ritsu de uma vez por todas, e que deverá esforçarse ao extremo para ensinar os outros a fazerem o mesmo, a exemplo do senhor que manteve sua fé firmemente apesar do ódio dos outros. Não importando o quanto ela possa crer no Sutra de Lótus, duvido que ela tenha tanto ódio do inimigo quanto teria de uma prostituta. Em todos os assuntos mundanos, aqueles que se opõem a seus pais ou desobedecem ao governante incorrem no ódio celestial pela conduta imprópria do filho ou falta de lealdade. Entretanto, se o pai ou o governante de uma pessoa torna-se inimigo do Sutra de Lótus, a desobediência é um ato de amor filial e retribui a gratidão à nação. Portanto, desde quando li pela primeira vez o Sutra de Lótus, eu sustentei minha fé sem vacilar, mesmo quando meus pais me imploraram de mãos juntas para que eu desistisse, o meu mestre renegou-me e o regente exilou-me duas vezes e quase me levou à morte. Como eu perseverei, existem agora pessoas pensando que meus ensinos podem ser verdadeiros. Posso bem ser a única pessoa em todo o Japão a desobedecer ao soberano, aos pais e ao mestre, e receber ainda a proteção celestial no final. Observe o que acontecerá no futuro. Se os bonzos que maltratam a mim, Nitiren, orarem pela paz do país, simplesmente apressarão a ruína da nação. Finalmente, se as consequências se tornarem realmente graves, todo o povo japonês, do governante ao povo comum, tornar-se-á escravo dos mongóis de rabichos nos cabelos e arrependar-se-á amargamente. Além da agonia que espera os caluniadores na próxima existência, eu convoquei Bonten, Taishaku, os deuses do sol e da lua, e os Quatro 179

Reis Celestes para punirem, nesta existência, aqueles que se tornaram inimigos do Sutra de Lótus, para servir como advertência ao povo. Pelos resultados de minha predição, o senhor verá se eu, Nitiren, sou ou não devoto do Sutra de Lótus. Quando eu falo desta maneira, os governantes e outros podem pensar que estou fazendo ameaças, mas de maneira alguma falo com base em ódio. Eu falo com base na profunda benevolência no sentido de permitir-lhes erradicarem nesta vida as torturas do inferno dos incessantes sofrimentos a que, de outro modo, estão destinados a cair. O Grande Mestre Chang-an disse: "Aquele que torna possível a um ofensor livrar-se do mal está agindo como um pai para ele". Eu, Nitiren, que os admoestro pelos seus males, sou o pai e a mãe do governante e o mestre de toda a humanidade. Há muito mais que gostaria de lhe dizer, mas irei parar aqui. Eu lhe agradeço pelos seus oferecimentos do carregamento de um cavalo de trigo debulhado e gengibre. Em 12 de abril de 1275. Nitiren. Fundo de cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta em 12 de abril de 1275, em resposta ao relato de Shijo Kingo de que o templo Gokuraku-ji e o palácio do shogun, ou governante militar , haviam sido destruídos em incêndios. Daishonin tinha então cinquenta e quatro anos. No ano anterior, havia se retirado aos recessos do Monte Minobu, após retornar do exílio à ilha de Sado e advertir, sem sucesso, o governo de Kamakura, pela terceira vez. Naquela época, o Japão encontrava-se em estado de tumulto. Em outubro de 274, uma maciça frota invasora mongólica havia sido enviada contra a região ocidental do país, embora essa tentativa de invasão tivesse sido frustrada por uma tempestade além da época. Em adição, irrompiam grandes incêndios e tumultos esporádicos. Tudo isso contribuia para a extrema aflição do povo. A ameaça mongólica persistia porque um outro enviado de Kublai Klan chegou em abril de 1275, exigindo que o Japão jurasse vassalagem ao império mongol. Na primeira parte desta carta, Daishonin atribuiu os incêndios de Kamakura e outras calamidades à perda da boa sorte do povo, resultante da calúnia e distorção dos ensinos budistas. O título do Gosho é tirado da antiga história de Rajagriha (palácio real) que Daishonin cita para dar apoio ao tema. Essa história aparece no Hokke Mongu ( Palavras e Frases do Sutra de Lótus, de Tientai). Em virtude do

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rei de Rajagriha ter boa sorte, ele conseguiu finalmente proteger o seu povo e a capital mas, no caso do Japão, tanto o governante como povo haviam perdido a boa sorte. Através de um jogo de palavras, Daishonin refere-se ao bonzo chefe do Gokuraku-jo (Bonzo do Duplo Fogo), mostrando que o incêndio do Gokuraku-ji e do palácio do shogun tinham origem na calúnia dentro da mente de Ryokan. A frase "Duplo Fogo" tem dois sentidos. Primeiramente, indica o fogo que consumiu o Gokuraku-ji e o palácio – os centros da religião e do governo. Indica também que a calúnia de Ryokan não somente causou o incêndio – um dos sete desastres – nenste mundo, como irá fazer a ele e seus seguidores caírem no ‘fogo’ metafórico ou estado de inferno, na existência posterior. Na parte seguinte do gosho, usando termos que Shijo Kingo poderia facilmente compreender, Nitiren Daishonin lhe sugere uma forma de encorajar a esposa. Ele explica que não é suficiente crer simplesmente no Sutra de Lótus; é preciso também rejeitar as práticas heréticas. Além disso, é preciso praticar não somente para si mesmo, como para os outros. Ele afirmou: "O fato das orações de Nitiguen-nyo não terem encontrado resposta é comparável a um forte arco com uma corda frágil, ou uma boa espada nas mãos de um covarde. Não é de modo algum um falha do Sutra de Lótus". Essa passagem é bastante conhecida e sob o nosso ponto de vista, podemos interpretá-la como indicativa de que o poder do Gohonzon é absoluto; somente a nossa fé é relativa. É importante esforçar para solidificar a nossa fé a fim de extrair plenos benefícios do Gohonzon. Daishonin fala sobre o verdadeiro significado da lealdade. Em sua sociedade, o povo acreditava que em quaisquer circunstâncias era necessário ser leal e obediente aos pais, mestre e soberano. Entretanto, diz Daishonin, se essas pessoas se opõem ao verdadeiro budismo, o ato de não obedecê-lo (no sentido de desistir da fé) é na realidade o maior ato de lealdade, porque, assim fazendo, o indivíduo pode levá-los à iluminação. Portanto, ele afirma, manteve sua prática inabalavelmente apesar de encontrar oposição por todos os lados. O último parágrafo indica que o próprio Daishonin possui as três virtudes do Buda, como soberano, mestre e pais de todas as pessoas, porque ele lhes torna possível livrarem suas vidas das causas fundamentais da infelicidade. Shijo Kingo (1230-1300) foi um fiel crente que dedicou-se resolutamente à fé no Gohonzon, e protegeu e seguiu Nitiren Daishonin, decidido a morrer junto. Em 1272 , ele recebeu o manuscrito de ‘A Abertura dos Olhos’, um dos mais importantes escritos de Daishonin, revelando a sua iluminação. Como Shijo Kingo era suficientemente ousado para tentar o chakubuku ao seu lorde Ema Nyudo, no ano de 1274, logo se envolveu em dificuldades. O lorde Ema desaprovou a sua fé, e os colegas invejosos 181

aproveitaram a oportunidade para fazer acusações a Ema contra ele. Nos anos seguintes, Kingo viu o sofrimento, pois o lorde Ema reduziu o seu feudo e não lhe depositou confiança. A situação piorou em 1276 quando o lorde lhe ordenou a transferir-se para uma província distante caso não renunciasse à fé no Budismo de Daishonin. Kingo lutou duramente para enfrentar esse impasse, seguindo as orientações de Daishonin. No ano de 1277, uma epidemia abateu sobre Kamakura e o lorde Ema caiu doente. Seu descontentamento com Shijo Kingo perdeu comparativamente a significância. Embora o lorde tivesse recorrido a todos os meios de tratamento, ele não melhorou e, no final, não teve escolha senão recorrer à ajuda de Kingo. A habilidade médica e o dedicado tratamento de Kingo conseguiram a cura e isso, juntamente com a sua inflexível lealdade, dissiparam a ira de Ema. Este renovou então a sua confiança em Shijo Kingo e, no ano seguinte, conferiu-lhe um feudo muito maior do que o anterior. Este gosho foi escrito exatamente quando as dificuldades pessoais de Kingo começaram a assediá-lo.

Os Quatro Bodhisattva como Objeto de Adoração (Shibossatsu Zoryu Sho – Págs. 987 a 989)

Eu recebi um manto branco de inverno, um manto clerical cinza, um sobrepeliz da mesma cor e um kan de moedas. Não tenho palavras para expressar toda minha gratidão pela sua incansável devoção. Algum dia gostaria de vê-lo para dizer-lhe tudo o que desejo expressar. Em sua carta, o senhor perguntou: "O senhor disse-me que um objeto de adoração deve ser constituído pelo lorde Sakyamuni do ensino essencial, ladeado pelos Quatro Grandes Bodhisattvas da Terra que assistiram-no desde que ele atingiu a iluminação no mais remoto passado. Porém, quando será estabelecido tal objeto de adoração?" Respondendo, mais de dois mil anos já se passaram desde o falecimento do Buda. Nesse período, o Budismo propagou-se pelo mundo todo, especialmente na Índia, China e Japão, em tal extensão que monges são tão numerosos quanto plantas de arroz e linho, e as doutrinas são inumeráveis como talos de bambu. Entretanto, nem um só tempo nesses três países fez um objeto de adoração do Lorde Sakyamuni do ensino essencial ladeado pelos bodhisattvas que são seus discípulos originais. Aqueles que construíram os miríades de templos no Japão não sabiam que era preciso fazer um objeto de adoração do Lorde Sakyamuni ladeado pelos Quatro Bodhisattvas. 182

Embora o príncipe Shotoku tivesse fundado o Shitennoji, o primeiro templo budista no Japão, ele estabeleceu como seu objeto de adoração uma estátua do Buda Amida ladeada por figuras como os bodhisattva Kanon e Seishi, assim como os Quatro Reis Celestes. O Grande Mestre Dengyo construiu o Templo Enryakuji, mas ele consagrou uma imagem do Buda Yakushi do mundo oriental no edifício principal como objeto de adoração. Ele não fez um objeto de adoração do Lorde Sakyamuni que atingiu a iluminação no mais remoto passado e de seus assistentes que estiveram com ele desde então. Jamais ouvi falar de tal objeto de adoração em nenhum dos sete grandes templos de Nara, e muito menos nos templos dos subúrbios. Tendo desde há tempo mantido dúvidas sobre o problemas, eu consultei as passagens do Sutra de Lótus, e elas revelam por que esse objeto de adoração nunca surgiu antes. O sutra afirma claramente que ele não deve ser estabelecido antes da era profetizada de conflitos, no início dos Últimos Dias da Lei. Os estudiosos e mestres budistas que apareceram neste mundo durante os Primeiros e Médios Dias da Lei não estabeleceram este objeto de adoração porque honraram a proibição do Buda. Se um objeto de adoração do lorde Sakyamuni, que atingiu a iluminação a incontáveis aeons, e o dos seus assistentes tivesse sido feito durante os Primeiros e Médios Dias da Lei, como o Bodhisattva Jogyo irá estabelecer esse objeto de adoração nos primeiros quinhentos anos dos Últimos Dias, aqueles grandes estudiosos e mestres que apareceram nos Primeiros Médios Dias nem mesmo o descreveram em palavras. Nagarjuna e Vasubandhu sabiam dele em seus corações, mas não falaram aos outros sobre ele. O Grande Mestre Tientai o conhecia, mas não expôs o seu verdadeiro significado, embora o tivesse ensinado em parte, pois ele era a reencarnação de um bodhisattva do ensino teórico. Ele o ensinou vagamente, como a voz do cuco que uma pessoa ouve meio adormecida, mas que parece um sonho, uma vez acordada. Outros mestres budistas não disseram mais que uma só palavra sobre eles, pois, no Pico da Águia, o Buda Sakyamuni proibiu rigorosamente aqueles estudiosos e mestres budistas que apareciam nos Primeiros e Médios Dias da Lei de revelar, mesmo indiretamente, qualquer coisa sobre o Lorde Sakyamuni do ensino essencial que atingiu a iluminação no mais remoto passado e os Quatro Grandes Bodhisattvas da Terra liderados por Jogyo, que o acompanharam desde então. Isso aconteceu porque aqueles estudiosos e mestres eram pessoas do ensino teórico e que não tinham permissão de aparecerem nos Últimos Dias da Lei. Agora que entramos nos Últimos Dias, um objeto de adoração deverá ser feito, do Buda Original ladeado pelos seus assistentes originais, pois esta é a época mais adequada à luz das palavras douradas do Buda. Como esta era corresponde à época prevista, os Bodhisattvas da Terra logo aparecerão neste mundo e estabelecerão um objeto de adoração dos Quatro Bodhisattvas. Eis porque o Grande Mestre Tientai ansiou por esta época, dizendo: "No quinto meio milênio, o Caminho Místico irá propagar-se e beneficiará a humanidade pelo futuro", e 183

porque o Grande Mestre Dengyo aspirou por este tempo, dizendo: "Os Primeiros e Médios Dias estão quase terminados, e os Últimos Dias estão próximos. Agora é de fato a época em que o Único Veículo exposto no Sutra de Lótus possibilitará as pessoas de todas as capacidades atingirem o Estado de Buda". Sob o ponto de vista mundano, eu, Nitiren, sou a pessoa mais pobre do Japão mas, à luz do Budismo, sou a pessoa mais rica do mundo. Quando percebo que isso é assim unicamente porque o tempo é correto, fico exultante de alegria e não consigo conter minhas lágrimas. É impossível pagar meu débito de gratidão ao lorde Sakyamuni. Penso que mesmo os vinte e quatro sucessores dos ensinos do Buda são menos afortunados que eu; talvez nem mesmo a boa sorte dos Grandes Mestres Tientai e Dengyo se iguale à minha. Isso acontece porque agora é a época exata para estabelecer o objeto de adoração dos Quatro Bodhisattvas. Questão: Com que autoridade o senhor afirma que os Quatro Bodhisattvas devem ser estabelecidos como o objeto de adoração ? Resposta: O capítulo Yujutsu (décimo-quinto) do Sutra de Lótus lê em parte: "Entre os bodhisattvas existem quatro que lideram toda a multidão: o primeiro – chamado Jogyo; o segundo Muhengyo; o terceiro, Jyogyo; e o quarto, Anryugyo". Questão: Há alguma passagem do sutra que limita o estabelecimento desse objeto de adoração ao quinto meio milênio ? Resposta: O capítulo Yakuo (vigésimo-terceiro) do Sutra de Lótus lê em parte: "No quinto meio milênio após a minha morte, realizem o Kossenrufu mundial e jamais permitam que o seu fluxo cesse". O senhor mencionou também em sua carta que as pessoas ligadas a Ota Jomyo estão aparentemente afirmando que o ensino teórico do Sutra de Lótus não pode levar de modo algum à iluminação. Eles estão cometendo um sério engano. Lembre-se do seguinte, acerca dos ensinos teóricos e essencial do Sutra de Lótus: "O que é superficial ou profundo, superior ou inferior, tolerante ou inflexível, subordinado ou primário, deve ser julgado de acordo com a época e a capacidade das pessoas. A propagação dos ensinos do Buda é dividida em três períodos, e assim são as capacidades das pessoas. Nos primeiros quinhentos anos dos Primeiros Dias após o falecimento do Buda, propagou-se apenas o Budismo Hinayana, enquanto que nos seguintes quinhentos anos propagou-se o Budismo Mahayana provisório. Os mil anos dos Médios Dias viram o aparecimento do ensino teórico do Sutra de Lótus. No início dos Últimos Dias, somente o ensino essencial do Sutra de Lótus se propaga mas, mesmo assim, o ensino teórico não deve ser rejeitado. Em nenhuma parte de todo o Sutra de Lótus nos é permitido rejeitar os primeiros catorze capítulos 184

(que compreendem o ensino teórico). A distinção entre ensino teórico e ensino essencial do Sutra de Lótus é baseada na tríplice classificação da totalidade dos ensinos do buda de acordo com as épocas em que apareceram. Os ensinos pré-Sutra de Lótus devem se propagar nos Primeiros Dias; o ensino teórico nos Médios Dias, e o Últimos Dias são a época de propagação do ensino essencial. Nesse tempo, o ensino essencial é primário, enquanto que o teórico é subordinado. Entretanto, aqueles que por isso rejeitam o último, afirmando que não é o caminho da iluminação e acreditam somente no primário, não aprenderam ainda o verdadeiro significado do ensino de Nitiren. São donos de uma visão completamente distorcida. Esta doutrina, referente aos ensinos teórico e essencial, não é de minha autoria (ela foi ensinada pelo Buda). Aqueles que a distorcerem podem unicamente estar possuídos dos demônios, que levarão eles e outros ao inferno de incessantes sofrimentos. Quão tolos! Ensine claramente os outros como eu tenho ensinado o senhor durante estes muitos anos (para que eles não fiquem confusos). Aqueles que se consideram meus discípulos e praticam o Sutra de Lótus devem praticar exatamente da mesma maneira que eu faço. Assim fazendo, Sakyamuni, Taho e as emanações de Sakyamuni de todas as direções, assim como as Dez Deusas irão protegê-los. Todavia, quanto a todas as pessoas que distorcem o ensino, não consigo imaginar o que se passa em seus corações. Lamentei ter tomado conhecimento em sua carta do falecimento do bonzo Nitigyo. Eu recitei o Sutra de Lótus e o Nam-myoho-rengue-kyo por ele, orando sinceramente a Sakyamuni, Taho e aos Budas das dez direções, para que o recebam no Pico da Águia. Eu não me recuperei ainda da doença, e por isso lhe escrevi brevemente. Eu lhe escreverei novamente. Com meu profundo respeito Nitiren Em 7 de maio de 1279. Fundo de Cena Esta carta foi escrita no Monte Minobu em 17 de maio de 1279. Na época, Nitiren Daishonin estava com 58 anos de idade. Acredita-se que Toki Jonin (1216-1299), o destinatário, tenha se tornado discípulo de Daishonin em 1254. Como samurai e oficial do governo Kamakura, ele usou sua influência para proteger Nitiren Daishonin quando este teve que deixar brevemente o local de Matsubagayatsu em 1260. Toki Jonin tinha bom conhecimento geral do Budismo, e a ele foram confiados

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diversos escritos Adoração’.

importantes,

como

‘O

Verdadeiro

Objeto

de

A primeira parte desta carta refere-se a uma questão levantada por Toki Jonin sobre a afirmação de Daishonin, de que um objeto de adoração deve ter sido feito do Lorde Sakyamuni que atingiu a iluminação no mais remoto passado, ladeado pelos Quatro Bodhisattvas. O objeto de adoração aqui mencionado corresponde ao que foi descrito em ‘O Verdadeiro Objeto de Adoração. Ali, Daishonin afirma: "O Nammyoho-rengue-kyo aparece no centro da Torre do Tesouro, com os Budas Sakyamuni e Taho sentados à direita e à esquerda, e os Quatro Bodhisattvas da Terra, conduzidos por Jogyo, flanqueiam-nos", e "Agora é que os Bodhisattvas da Terra aparecerão nesta terra e estabelecerão o supremo objeto de adoração sobre a terra, que mostra o Buda Sakyamuni do ensino essencial flanqueando o Buda Original". O objeto de adoração aqui discutido é na realidade o Gohonzon, onde o Nam-myoho-rengue-kyo, a vida do Buda Original, aparece no centro, ladeado pelos dois Budas, Sakyamuni e Taho que, por sua, estão ladeados pelos quatro Bodhisattvas. No presente Gosho, Daishonin refere-se a este Gohonzon simplesmente como "um objeto de adoração do Lorde Sakyamuni do ensino essencial ladeado pelos bodhisattvas que são seus discípulos originais". Superficialmente, Daishonin fala sobre Sakyamuni que atingiu a iluminação em Gohyaku-Jintengo e os Bodhisattvas da Terra. Entretanto, sob um ponto de vista mais profundo, ‘Sakyamuni do essencial’ refere-se ao Buda Original de Kuon Ganjo. O objeto de adoração do ensino essencial é descrito da seguinte maneira em ‘O Verdadeiro Objeto de Adoração’. "O mundo saha que Sakyamuni pregou no Capítulo Juryo é a eterna terra pura, impermeável as três calamidades e aos quatro ciclos de mudança. Neste mundo, o Buda é eterno, transcendendo o nascimento e a morte, e seus discípulos são também eternos". Esta passagem explica o objeto de adoração com os ideais – o Buda e a terra – aspirados pelas pessoas. Esse é o objeto de adoração descrito no ensino essencial para os discípulos contemporâneos do Buda Sakyamuni. Em contraste, quando Daishonin afirma em ‘O Verdadeiro Objeto de Adoração’ que "Quanto ao ensino essencial, ele foi endereçado exclusivamente aos povos dos Últimos Dias da Lei", ele afirma que o objeto de adoração dos Últimos Dias encontra-se nas profundezas do ensino essencial e que o "Bodhisattva Jogyo irá estabelecer esse objeto de adoração nos primeiros quinhentos anos dos Últimos Dias". Daqui

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podemos concluir que por objeto de adoração mencionado no presente gosho, ele refere-se ao Gohonzon. Daishonin afirma que à luz do Budismo, ele é a pessoa mais rica deste mundo. Ele faz essa afirmação em termos de tempo ou seja, ele nasceu precisamente na época em que o verdadeiro objeto de adoração deve ser estabelecido. Entretanto, sob um outro ponto de vista, ele é o Buda Original que pode conduzir todas as pessoas à iluminação, tendo portanto ilimitada boa sorte dentro de si mesmo. Na última parte desta carta, ele dá resposta à notícia de Toki Jonin, de que alguns dos crentes que cercam Ota Jomyo estavam afirmando que o ensino teórico deve ser rejeitado. Aparentemente, eles pensavam que, como o ensino teórico não leva à iluminação nos Últimos Dias, não haveria necessidade de recitar o capítulo Hoben no Gongyo. Nitiren Daishonin afirma que isso é um sério engano, pois o Sutra de Lótus jamais negou os primeiros catorze capítulos. Ele explica que ensinos diferentes adaptam-se a diferentes períodos, e o início dos Últimos Dias é a época quando o ensino essencial do Sutra de Lótus deve se propagar. Com isso, ele se refere não aos catorze últimos capítulos do Sutra de Lótus de Sakyamuni, mas ao Nammyoho-rengue-kyo, a essência do capítulo Juryo. Na recitação do gongyo, a prática primária é a recitação do Nammyoho-rengue-kyo, e a prática suplementar é a leitura dos capítulos Hoben e Juryo. O último é ainda dividido em dois. Conforme afirma Daishonin: "…o ensino essencial é primário, enquanto que o teórico é subordinado". Neste Gosho, Daishonin deixa claro que nós devemos tanto ler o capítulo Hoben como o Juryo no Gongyo. Vistos sob a iluminação de Daishonin, esses capítulos explicam o grande poder do Gohonzon que possibilita a todos atingirem o Estado de Buda.

A Tartaruga de um Olho e o Tronco Flutuante de Sândalo (Matsuno Dono Goke Ama Goze Gohenji – Págs. 1390 a 1393)

O capítulo Anrakugyo, do quinto volume do Sutra de Lótus afirma: "Bodhisattva Monjushiri, quanto a este Sutra de Lótus, em número incontável de países não é possível ouvir nem mesmo o seu nome". Esta passagem indica que nós, seres vivos, transmigrando pelos seis caminhos do mundo tríplice, nascemos algumas vezes no mundo da alegria, outras vezes na Tranqüilidade e ainda outras vezes nos mundos de Inferno, Fome e Animalidade. Assim, temos nascido em

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incontáveis número de países, onde passamos por inumeráveis sofrimentos e ocasionalmente desfrutamos prazeres, mas nem uma só vez nascemos num país onde o Sutra de Lótus tenha se propagado. Ou, mesmo que tenhamos eventualmente nascido em tal país, não recitamos o Nam-myoho-rengue-kyo. Jamais sonhamos em recitá-lo e nem ouvimos outros recitarem-no. Para ilustrar a extrema raridade de encontrar este sutra, o Buda comparou-a com a dificuldade da tartaruga de um olho encontrar um tronco flutuante de sândalo com uma abertura sobre ele. Esta seria a essência dessa analogia: ‘no leito do oceano, a oitenta mil yojana de profundidade, vive uma tartaruga. Ela não tem membros nem nadadeiras. Seu ventre é como ferro em brasa, e o dorso de seu casco é gelado como as Montanhas Nevadas. O que essa tartaruga anseia dia e noite, da manhã ao anoitecer – o desejo que expressa a cada momento – é resfriar seu ventre e aquecer o dorso do seu casco. O pé de sândalo vermelho é considerado sagrado, assim como um sábio entre as pessoas. Todas as outras árvores consideradas comuns são comparada às pessoas ignorantes. A madeira desse pé de sândalo tem o poder de resfriar o ventre da tartaruga. A tartaruga deseja por todos os meios subir no tronco de sândalo e colocar seu ventre na abertura do mesmo para resfriá-la, e ao mesmo tempo expor o dorso ao sol para aquecê-lo. Entretanto, pelas leis da natureza, ela pode subir à superfície do oceano uma vez a cada mil anos, e mesmo assim, é difícil para ela encontrar um tronco de sândalo. O oceano é vasto e a tartaruga pequena, e os troncos flutuantes são poucos. Mesmo encontrando troncos de outras madeiras, raramente encontra um de sândalo. Mesmo tendo a sorte de encontrar um tronco de sândalo, raramente ele tem a abertura do tamanho do seu ventre. Se (a abertura for muito grande e…) cair dentro dela, não poderá aquecer o seu dorso do seu corpo e ninguém poderá tirá-la de lá. Se a abertura for muito pequena, a tartaruga não poderá colocar seu ventre nela, e as ondas a arrastarão para for a, fazendo-a mergulhar de volta para o fundo do oceano. Mesmo quando, vencendo todas as adversidades, a tartaruga encontrar um tronco flutuante de sândalo com uma abertura do tamanho adequado, por ela ter um só olho, a sua visão é distorcida, e vê o tronco ir para leste quando ele está realmente indo para oeste. Assim, quanto mais apressadamente ela nada para subir no tronco, mais se afasta dele. Quando o tronco vai para leste, ela o vê indo para oeste e, de maneira semelhante, confunde o sul com o norte. E assim, sempre se afasta do tronco e jamais se aproxima dele. Dessa maneira, o Buda explicou como é difícil para a tartaruga de um olho encontrar um tronco flutuante de sândalo com uma abertura adequada sobre ele, mesmo uma só vez em incontáveis e infinitos kalpas. Ele usou essa analogia para ilustrar a raridade de encontrar o Sutra de Lótus. Entretanto, é preciso estar ciente de que mesmo 188

encontrando o tronco flutuante de sândalo do Sutra de Lótus, e ainda mais raro encontrar a abertura da Lei Mística do Nam-myoho-renguekyo, que é difícil de recitar. O oceano representa o mar dos sofrimentos do nascimento e da morte e a tartaruga representa a nós, os seres vivos. Sua falta de membros indica a nossa falta de boa sorte. O calor do seu ventre representa os oito infernos quentes aos quais somos levados pela nossa ira e ressentimento, e o frio do dorso de seu casco representa os oito infernos frios que resultam da nossa cobiça e ganância. Sua permanência no fundo do oceano indica que caímos nos três maus caminhos e não podemos emergir facilmente. Sua ascensão à superfície somente uma vez em cada mil anos ilustra a dificuldade de emergir dos três maus caminhos e nascer como ser humano mesmo uma só vez em incontáveis kalpas, na época em que o Buda Sakyamuni apareceu neste mundo. Outros troncos flutuantes, como os do pinheiro e do cipreste, são fáceis de serem encontrados, mas um tronco de sândalo é difícil de ser encontrado. Isso ilustra que é fácil encontrar os outros sutras, mas que é difícil encontrar o Sutra de Lótus. E mesmo que a tartaruga encontre um tronco flutuante de sândalo, encontrar um com uma abertura adequada sobre ele é ainda mais difícil. Isso significa que, mesmo que alguém encontre o Sutra de Lótus, é raro vir a recitar os cinco caracteres do Myoho-rengue-kyo, que é a sua essência. A tartaruga confunde o leste com o oeste e o norte com o sul. Semelhantemente, os mortais comuns consideram ensinos superiores como sendo inferiores e ensinos inferiores como sendo superiores, apesar dele exibirem seus conhecimentos e fingirem ser sábios. Eles consideram ensinos sem força como sendo capazes de conduzir à iluminação e declaram que os ensinos inapropriados à capacidade das pessoas são adequados a elas. Assim, acreditam que o ensino Shingon é superior e o Sutra de Lótus é inferior, e que o primeiro adapta-se às capacidades das pessoas, e que o último não. Pondere bastante sobre o que acabo de relatar. O Buda fez seu advento na Índia e pregou vários ensinos sagrados durante sua vida. No quadragésimo terceiro ano de sua vida de pregações ele começou a expor o Sutra de Lótus. Nos oito anos subsequentes, todos os seus discípulos abraçaram o Sutra de Lótus, que se compara a uma pedra dos desejos. Entretanto o Japão distancia-se da Índia em duzentos mil ri de montanhas e mares, de tal modo que o povo daqui não pode nem mesmo ouvir o Sutra de Lótus. Um mil, duzentos e mais anos após o falecimento do Buda Sakyamuni, o Sutra de Lótus havia sido trazido para a longínqua China, mas ainda não havia sido transmitido ao Japão. Um mil, quinhentos e mais anos após falecimento de Sakyamuni, o Budismo foi trazido de Paekche para o Japão durante o reinado do trigésimo governante do Japão, o 189

imperador Kinmei. Além disso, nos setecentos aos que haviam se passado desde que o príncipe Shotoku fez o Budismo vir pela primeira vez da China, o Sutra de Lótus e todos os outros sutras foram propagados amplamente de modo que, desde o governante até o povo comum, as pessoas sensatas vieram a abraçar a totalidade ou um volume ou capítulo do Sutra de Lótus, a fim de retribuir a gratidão aos seus pais. Assim, elas acreditam que estão realmente abraçando o Sutra de Lótus. Mas, elas jamais recitaram Nam-myoho-rengue-kyo e, embora pareçam crer no Sutra de Lótus, estão longe de fazê-lo. É como se a tartaruga de um olho, tendo encontrado o sândalo sagrado que é difícil de ser encontrado, não pusesse seu ventre na abertura. Não o fazendo, teria encontrado o sândalo sem finalidade alguma, e afundaria instantaneamente de volta ao fundo do oceano. Nestes mais de setecentos anos, o Sutra de Lótus propagou-se largamente em nosso país, e aqueles que lêem, fazem oferecimentos ou abraçam este sutra são mais numerosos que mudas de arroz e cânhamo ou pés de bambu e junco. Entretanto, ninguém entre eles, recita o Nam-myoho-rengue-kyo, da mesma maneira como invoca o nome do Buda Amida, e nem diz aos outros para que o recitem. Ler os vários sutras ou invocar os nomes dos vários Budas é comparável à tartaruga encontrar um tronco de madeira comum. Não sendo sândalo, o tronco não pode resfriar o ventre da tartaruga. Não sendo o sol, não pode aquecer o dorso do seu casco. Tais ensinos meramente agradam os olhos e alegram a mente, mas não trazem benefícios. São como plantas que dão flores mas não frutos, ou como palavras que não são colocadas em prática. Somente Eu, Nitiren, recitei pela primeira vez o Nam-myoho-renguekyo no Japão. Nos vinte ou mais anos desde o verão do quinto ano da era Kentyo (1253), vim recitando Nam-myoho-rengue-kyo sozinho dia e noite, da manhã ao anoitecer. Aqueles que recitam o Nembutsu são dez milhões. Não disponho de apoio de nenhuma autoridade, enquanto os aliados da Nembutsu possuem poder e são de nobre estirpe. Entretanto, quando o leão ruge, todos os outros animais silenciam, e o cão se aterroriza como a sombra do tigre. Assim que o sol se levanta no céu do oriente, as luzes de todas as estrelas desvanecem completamente. A invocação do nome de Amida tem exercido influência onde o Sutra de Lótus não foi propagado. Mas, uma vez estabelecida a invocação do Nam-myoho-rengue-kyo, a Nembutsu será como um cão acovardandose diante do leão ou a luz das estrelas desvanecendo perante o Sol. O Daimoku e a Nembutsu são tão diferentes quanto o falcão e o faisão. Eis porque todas as quatro espécies de pessoas vêem-me com inveja e porque todos, das posições elevadas às baixas, sentem aversão por mim. Aqueles que fazem acusações infundadas contra mim povoam o país e os corruptos abarrotam a terra. Assim, o povo escolhe o que é inferior e detesta o que é superior. É como se alguém afirmasse que o 190

cão é mais valente do que o leão, ou que as estrelas são mais brilhantes do que o Sol. Assim, minha má reputação como homem de idéias errôneas espalhou-se para longe e amplamente, de tal forma que eu fui de variadas maneiras acusado falsamente, difamado, atacado a espada e bastão, e mais de uma vez exilado. Todas as perseguições coincidem perfeitamente com a passagem do quinto volume do Sutra de Lótus. Assim, lágrimas brotam em meus olhos e a alegria enche o meu corpo. Não tenho aqui vestuário suficiente para cobrir meu corpo nem provisões bastantes para sobreviver. Sou como Su Wu, que se sustentou comendo neve enquanto viveu entre os bárbaros do norte, ou então Po I, que sobreviveu com samambaias quando viveu no monte Shou-yang. Quem, a não ser meus pais, se daria ao incômodo de visitar-me neste lugar ? Se não fosse a proteção dos três tesouros, como eu poderia sustentar minha vida por um só dia ou mesmo por um só momento ? Posso somente maravilhar-me com o fato da senhora enviar-me um mensageiro com tanta freqüência, quando nós são chegamos sequer a nos encontrar. O quarto volume do Sutra de Lótus afirma que o Buda Sakyamuni tomará a forma de um mortal comum para fazer oferecimentos ao devoto do Sutra de Lótus. Teria tal fato manifestado em sua vida, ou seria isto a expressão da sua virtude acumulada no passado ? Uma mulher conhecida como a filha do Rei Dragão atingiu o estado de Buda através da fé no Sutra de Lótus, e assim ela jurou proteger as mulheres que abraçassem este sutra na última era. Estaria a senhora relacionada com ela ? Quão digno de respeito !

Nitiren Em 26 de março de 1279 Do sinal cíclico tsuchinoto-u Fundo de Cena

Nitiren Daishonin escreveu esta carta no monte Minobu, em 26 de março de 1279, à viúva de Matsuno Rokuro Zaemon Nyudo, que residia em Matsuno, no distrito Ihara, província de Suruga. A filha de Matsuno despojou Najo Hioe Shitiro, pai de Nanjo Tokimitsu, e acredita-se que eles tenham se convertido aos ensinos de Daishonin através dessa ligação com a família Nanjo. Nitiji, um dos seis maiores discípulosbonzos de Daishonin, foi um dos seus filhos. Acredita-se que Matsuno Rokuro Zaemon tenha falecido em 1278, um ano antes deste gosho ser escrito. 191

Naquele tempo, os desastres eram freqüentes no Japão, e em particular, a fome que persistiu no outono e no inverno de 1278 gerou indescritível miséria. Numa carta a Nanjo Tokimitsu, datada de outubro de 1278, Daishonin escreveu: "No ano passado e neste, uma grande epidemia surgiu neste país e pessoas morreram como árvores derrubadas por um vendaval ou capim esmagado pela neve. Parece que nem uma só pessoa será deixada com vida…Nos oitavo e nono meses, houve pesadas chuvas e fortes ventos, de modo que em todo o Japão perderam-se colheitas e os sobreviventes estão quase impossibilitados de sobreviverem"(Gosho Zenshu, pág.1552) Esta passagem nos permite entrever as circunstâncias sob as quais Daishonin e seus seguidores lutaram para empreender a fé. Apesar dessas dificuldades, mesmo após a morte do seu marido, a senhora Matsuno freqüentemente enviava oferecimentos a Daishonin em seu retiro no monte Minobu, embora esta carta pareça indicar que ela não o tenha encontrado pessoalmente. A passagem conclusiva elogia sua dedicação. Nesta carta, detalhando a história da tartaruga de um olho só, mencionada no capítulo Myoshogonno (vigésimo sétimo) do Sutra de Lótus, Daishonin explica como é raro e maravilhoso encontrar o Sutra de Lótus, e mais ainda, encontrar a Lei Mística do Nam-myoho-renguekyo. E então, recordando brevemente a introdução do Sutra de Lótus da Índia à China, e depois ao Japão, Daishonin observa que, embora o Sutra de Lótus tenha se propagado desde há tempo no país e as pessoas aparentemente o respeitem, ninguém recita o daimoku, que é o seu núcleo. Assim, embora pensem que estão crendo no Sutra de Lótus, ninguém pratica realmente o Sutra de Lótus ou desfruta os benefícios que ele tem a oferecer. A parte final do gosho toca brevemente na luta tenaz de Daishonin por um período de mais de vinte anos após haver publicamente proclamado a lei do Nam-myoho-rengue-kyo. Ele enfrentou pessoalmente todas as perseguições que o Sutra de Lótus previa para o devoto nos Últimos Dias da Lei. Todavia, em vez de desestimulá-lo, a oposição que encontrou fortaleceu a sua convicção de que ele próprio estava cumprindo a missão do devoto do Sutra de Lótus dos Últimos Dias da Lei – uma convicção que o enchia de irresistível alegria, mesmo entre as dificuldades. Na conclusão, Daishonin expressa sua admiração e gratidão à sincera devoção da senhora Matsuno.

O Portão do Dragão (Ueno Dono Gohenji – Págs. 1560 a 1561)

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Na China há uma cachoeira chamada Portão do Dragão. Suas águas precipitam-se de uma altura de mais de trinta metros e são mais velozes que uma flecha atirada por um forte arqueiro. Afirma-se que milhares de carpas reúnem-se na bacia abaixo esperando subir as cataratas, pois aquela que conseguisse esse intento transformar-se-ia num dragão. Contudo, nem uma única carpa em cem, mil, ou mesmo dez mil, consegue escalar a queda d’água, nem após dez ou vinte anos. Algumas são arrastadas pelas correntes intensas, algumas caem presas de águias, falcões, milhafres e corujas, e outras são presas em redes, ou até mesmo atingidas pelas flechas de pescadores que se alinham em cada uma das margens da vasta cachoeira. Tal é a dificuldade que uma carpa enfrenta para se tornar um dragão. Houve, certa vez, dois importantes clãs guerreiros no Japão – Minamoto e Taira. Eles eram como dois fiéis cães de guarda nos portões do Palácio Imperial. Eles eram tão ansiosos para proteger o imperador quanto um lenhador o é para admirar a lua cheia quando esta surge detrás das montanhas. Eles maravilhavam-se com as festas elegantes dos nobres da corte e suas damas, assim como os macacos das árvores se enlevam com a visão da lua e estrelas brilhando no céu. Embora fossem de classe inferior, eles almejavam encontrar algum modo de misturarem-se nos círculos da corte. Porém, embora Sadamori do clã Taira tenha dominado a rebelião de Masakado, ainda assim não foi admitido para a corte. Nenhum de seus descendentes, incluindo o famoso Masamori, o foi. Nunca até a época do filho de Masanori, Tadamori, nenhum membro do clã Taira teve permissão para entrar para a corte. Na linhagem seguinte, Kiyomori, e seu filho Shiguemori, não somente desfrutaram a vida entre os nobres da corte, mas também se tornaram diretamente relacionados com o trono quando a filha Kiyomori casou-se com o imperador e teve um filho com ele. Atingir o Estado de Buda não é mais fácil que homens de posição inferior penetrarem nos círculos da corte ou carpas escalarem o Portão do Dragão. Shariputra, por exemplo, praticou austeridades de bodhisattva durante sessenta aeons para atingir o Estado de Buda, mas no final, rendeu-se aos obstáculos e caiu novamente nos caminhos dos dois veículos. Até mesmo alguns daqueles ensinados por Sakyamuni, quando ele foi o décimo-sexto filho do Buda Daitsu, caíram no mundo dos sofrimentos durante um período de sanzen jintengo. Alguns outros ensinados por ele no passado remoto, quando atingiu a iluminação pela primeira vez, sofreram por um período de gohyaku jintengo. Todas estas pessoas praticaram o Sutra de Lótus, mas, quando perseguidas pelo Demônio do Sexto Céu na forma de seus soberanos ou outras autoridades, abandonaram sua fé e, deste modo, vagaram entre os seis caminhos por incontáveis aeons. Até o presente momento, esses eventos pareciam não ter nenhuma relação conosco. Contudo, agora nos encontramos enfrentando o mesmo tipo de perseguição. Haja o que houver, todos os meus 193

discípulos devem alimentar o grande desejo de atingir a iluminação. Somos realmente afortunados de estarmos vivos após devastadoras epidemias que ocorreram no ano passado e retrasado. Porém, agora com a iminente invasão mongol, parece que poucos sobreviverão. No final, ninguém pode escapar da morte. Os sofrimentos na época da invasão não são piores do que aqueles que qualquer um dos casos, deve estar disposto a oferecer sua vida pelo Sutra de Lótus. Pense nesse oferecimento como uma gota de orvalho reunindo-se ao oceano ou uma partícula de areia retornando à terra. Uma passagem do sétimo capítulo do Sutra de Lótus diz: "O nosso desejo é compartilhar esses benefícios igualmente com todas as pessoas, e nós, juntos com elas, atingiremos o Estado de Buda". Com profundo respeito Nitiren Em 6 de novembro de 1279 Pós-escrito: Escrevi esta carta em profunda gratidão pelo encorajamento que o senhor está oferecendo àqueles envolvidos na perseguição de Atsuhara. Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta em 6 de novembro de 1279, quando contava com 58 anos de idade e vivia no monte Minobu. O recebedor desta carta, Nanjo Tokimitsu (1259-1332), era o administrador da vila de Ueno, na província de Suruga, na área do Monte Fuji. Portanto, ele, algumas vezes, é referido como Lorde Ueno. Embora estivesse com apenas vinte anos na época em que este gosho foi escrito, as mortes prematuras do seu pai e irmão mais velho já haviam colocado sobre seus ombros a responsabilidade de cargo hereditário de administrador. Praticante desde a infância, ele foi um pilar para os seguidores de Nitiren Daishonin da área de Fuji e auxiliou sinceramente os esforços de propagação de Nikko Shonin, a quem ele respeitava e acatava grandemente. Quando Nitiren Daishonin retirou-se para o Monte Minobu, Nikko Shonin assumiu a liderança ativa da campanha de propagação, concentrando o seu empenho na área ao redor do Monte Fuji. Não demorou muito até que o seu notável sucesso em conseguir conversões nessa área começasse a alarmar as autoridades locais. A partir de 1278, uma série de ameaças e atos violentos contra os praticantes aconteceram no vilarejo vizinho, Atsuhara, no Distrito Fuji. Esses incidentes, coletivamente conhecidos como Perseguição de Atsuhara, culminara

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na prisão ilícita de vinte praticantes leigos em 21 de setembro de 1279, e na execução de três deles em 15 de outubro, aproximadamente três semanas antes desta carta ser escrita. Durante este período tenso, Tokimitsu exerceu todos os esforços possíveis para proteger seus companheiros, escondendo alguns deles em sua casa e empenhandose para a libertação daqueles que haviam sido presos. O pós-escrito deste gosho: "Escrevi esta carta em profunda gratidão pelo encorajamento que o senhor está oferecendo aqueles envolvidos na perseguição de Atsuhara", louva a atitude corajosa do jovem na ocasião. Como administrador de uma vila, Tokimitsu estava diretamente a serviço do governo militar de Kamakura, cujas autoridades olhavam com desaprovação o seu apoio aos seguidores de Nitiren Daishonin. Eles fizeram represálias, impondo pesadas taxas punitivas à sua propriedade. A uma certa altura, ele não podia nem mesmo manter um cavalo – uma necessidade virtual para um oficial samurai – e sua esposa. Myoren, e seus filhos não possuíam roupas adequadas. Entretanto, o casal jamais vacilou em sua dedicação, continuando a enviar a Daishonin quaisquer provisões que lhe fossem possíveis, apesar das circunstâncias limitadas. Em anos posteriores, Nanjo Tokimitsu prosperou e doou a Nikko Shonin o trecho de terra chamado Oishigahara. Vendo que os vinte praticantes camponeses de Atsuhara estavam dispostos a dar sua vida se necessário fosse, ao invés de negar sua fé, Nitiren Daishonin percebeu que um número suficiente de praticantes já possuía uma convicção sólida o bastante para que ele finalmente cumprisse o seu propósito máximo, o que ele efetuou em 12 de outubro de 1279, inscrevendo o Dai-Gohonzon como objeto de adoração para se atingir o estado de Buda nos Últimos Dias da Lei. Vinte e sete anos de provações e sofrimentos, que se iniciaram na ocasião em que Nitiren Daishonin declarou pela primeira vez o seu ensino de Nam-myoho-rengue-kyo, frutificaram naquele dia, e o acesso para o estado de buda foi assegurado para todas as pessoas desta época e do futuro. Naquele tempo, o Japão enfrentava várias crises, tanto internas como externas. Durante os dois anos prévios, epidemias haviam assolado o país, deixando a morte em seu rastro, e agora o medo novamente tomava o povo, a medida que as notícias confirmavam os rumores de que o Grande Império Mongol logo tentaria uma segunda invasão. Em novembro de 1274, os exércitos de Klubai Khan haviam lançado uma esquadra de invasão maciça da Coréia contra as ilhas do sul do Japão, Iki e Tsushima. As fontes divergem quanto à proporção exata das força de ataque. Entretanto, indubitavelmente estava entre as maiores operações navais da antigüidade, envolvendo, provavelmente cerca de 450 navios carregando 15.000 tropas mongóis, e um número igual de marinheiros e auxiliares coreanos. Os mongóis estavam armados como bestas mortais que podiam alcançar 240 jardas e máquinas para atirar 195

projéteis – a primeira experiência do Japão com a pólvora. Além disso, os oficiais mongóis possuíam longa prática em manobrar grandes corpos e tropas em formação, o que o Japão não possuía. Com relação a seus prisioneiros, os mongóis mostravam uma crueldade repugnante. Os japoneses resistiram corajosamente, mas somente uma tempestade inesperada, que levou a frota invasora a recuar ao mar, salvou-os do desastre. Após cinco anos, chegaram notícias à nação de que uma segunda tentativa de invasão estava sendo preparada. Enquanto os proprietários de terras da principal ilha do sul, Kyushu, apressadamente erigiam fortificações de pedras, o governo de Kamakura recrutava soldados entre os seus vassalos e criados, enviando uma corrente de homens e equipamentos para o sul a fim de reforçar as guarnições de lá. Além do temor geral da invasão, os seguidores de Nitiren Daishonin tinham uma razão mais específica para se preocuparem. O incidente de Atsuhara marcou a primeira ocasião em que a opressão dos oficiais do governo havia sido dirigida aos seguidores de Nitiren Daishonin, ao invés de meramente se dar como seguimento da perseguição voltada à sua pessoa. A execução do três mártires de Atsuhara, somada aos rumores inquietadores de que Nitiren Daishonin poderia ser exilado por uma terceira vez, sugeria que uma nova onda de perseguições das autoridades pudesse estar para irromper. Através desta carta a Nanjo Tokimitso, um líder entre os praticantes, Nitiren Daishonin se refere diretamente as dúvidas e temores que provavelmente estavam atormentando seus seguidores. Ele enfatiza que aquele que determina dentro do seu coração a atingir o estado de Buda, com certeza, enfrentará grandes dificuldades. Uma vez que a morte é inevitável, ele diz, a pessoa deve dedicar a sua vida à busca da iluminação e devotar-se ao Sutra de Lótus. Agindo assim, ela conseguirá atingir o ilimitado e eterno estado de Buda.

A Felicidade neste mundo (Shingo Kingo Dono Gohenji - Páginas 1143)

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Não há maior felicidade para os seres humanos, que orar o Nammyoho-rengue-kyo. O sutra diz: "As pessoas lá (em minha terra) são felizes e tranqüilas. "Felizes e Tranqüilas" indica a alegria da Lei. Obviamente, você está incluído entre as "pessoas". "Lá" significa o mundo inteiro, o que inclui o Japão. "Felizes e tranqüilas significa saber que nossa vida - nosso corpo e mente, nós e nosso ambiente - e a entidade de Itinen Sanzen, e o Buda da liberdade absoluta. Não há maior felicidade que ter fé no Sutra de Lótus. Este nos promete "paz e segurança nesta vida e boas circunstância na próxima". Jamais permita que os impasses da vida o perturbem. Afinal, ninguém pode escapar dos problemas, nem mesmo santos ou sábios. Apenas ore Nam-myoho-rengue-kyo e quando beber sakê, permaneça em casa com a sua esposa. Sofra o que tiver que sofrer. Desfrute o que existe para ser desfrutado. Considere tanto o sofrimentos como a alegria como fatos da vida, e continue orando o Nam-myoho-renguekyo, não obstante o que aconteça. Então, experimentará a infinita alegria da Lei. Fortaleça a sua fé mais do que nunca. Com Nitiren Em

meu 27

profundo de

junho

respeito, de

1276

(Fonte: END, vol III, páginas 199)

Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu o presente Gosho, quando encontra-se em Minobu no verão de 1276. O endereçado, Shijo King, foi um samurai e médico que serviu a família Ema, uma ramificação do clã governante, Hojo. Na época, Shijo Kingo enfrentava o período mais solitário e perigoso de toda sua vida. Dois anos antes, ele havia tentado persuadir corajosamente o seu lorde, Ema Mitsutoki, a abraçar o ensino de Nitiren Daishonin. O lorde Ema era um defensor do bonzo Riokan, que odiava Nitiren. Por essa razão, ele reagiu com extremo descontentamento às advertências do seu vassalo. Os aprendizes de samurai de Shijo Kingo, invejando sua habilidade e a confiança que o lorde sempre havia depositado nele, aproveitaram a oportunidade para relatar informações falsas e maldosas sobre ele, ao Lorde Ema. Em consequência disso, o Shijo Kingo perdeu a proteção do seu lorde. A situação piorou seriamente nos anos seguintes. Colegas rancorosos espreitavam uma ocasião para assassinar Shijo Kingo e, à certa altura, o Lorde Ema exigiu que ele escrevesse um juramento renuciando à sua fé, ou teria seus bens confiscados. Entretanto, graças aos incentivos contínuos de Nitiren Daishonin além da sua própria impertubável fé, Kingo conseguiu resistir a essas provações com sucesso, e finalmente, recuperar a

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confiança do Lorde Ema que, em 1278, concedeu-lhe um feudo três vezes maior que o que ele possuía anteriormente. A felicidade neste mundo é uma das várias cartas que Nitiren Daishonin escreveu a Shijo Kingo para amparar sua decisão durante esse período crítico. Embora extremamente breve, representa uma afirmação comovente e atemporal de o que vem a ser realmente a felicidade e como atingí-la. Transmite também, em palavras simples e com profundo humanismo, o benefício de orar Nam-myoho-rengue-kyo, e como um budista deve conduzir os assuntos comuns de sua vida.

A Concessão do Mandala da Lei Mística (Myoho Mandala Kuyo-ji - Págs. 1305 a 1306 Estou concedendo o Gohonzon de Myoho-rengue-kyo. Embora o daimoku deste seja escrito com somente cinco ou sete caracteres, é o mestre de todos os Budas das três existências e o selo que garante a iluminação de todas as mulheres. O mesmo será a lâmpada na escuridão da estrada para o próximo mundo e um excelente cavalo para carregá-las sobre as montanhas da morte. É como o sol e a lua no céu ou o Monte Sumeru na Terra. É um navio para transportar as pessoas sobre o mar do sofrimento. É o mestre que conduz todas as pessoas à iluminação. Este mandala jamais foi revelado ou propagado em lugar algum deste mundo, nos mais de 2.220 anos desde a morte do Buda. (A prescrição do) remédio difere de acordo com a doença. Remédios comuns auxiliarão uma indisposição leve. Porém, para doenças graves, o elixir deve ser usado. Durante os 2.220 anos ou mais desde a morte do Buda, as doenças das pessoas, ou seja, suas ilusões e carma negativo, não eram sérias e uma sucessão de versados sacerdotes surgiram para agir como médicos e ministrar remédios apropriados às necessidades dessas doenças. Esses versados sacerdotes vieram das seitas Kusha, Jojitsu,, Rishu, Hosso, Sanron, Shingon, Kegon, Tendai, Jodo e Zen. Cada uma dessas seitas prescreveu o seu próprio remédio. Por exemplo, a seita Kegon expôs princípio das seis formas e dez mistérios, a seita Sanron advocou o caminho médio das oito negações, a seita Hosso enfatizou a percepção de que todos os fenômenos derivam-se somente da consciência, a seita Ritsu sustentou os duzentos e cinquenta preceitos, a Seita Jodo invocou o nome do Buda Amida, a seita Zen explanou a consecução do Estado de Buda através da percepção da verdadeira natureza da pessoa, a seita Shingon propôs a meditação a respeito dos cinco elementos e a seita Tendai estabeleceu a teoria de Itinen Sanzen.

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Agora, contudo, entramos nos Últimos Dias da Lei, e os remédios dessas várias seitas já não mais curam a doença das pessoas. Além disso, todos os japoneses tornaram-se icchantika e pessoas de grave calúnia. A ofensa deles é ainda maior do que a de matar o pai ou a mãe, incitar uma rebelião ou ferir um Buda. O Japão está repleto de indivíduos cujas ofensas ultrapassam até mesmo as daquele que sozinho removesse os olhos de todos os seres humanos num sistema de mundos maior, ou que destruísse todos os templos e relicários nos mundos das dez direções. Consequentemente, as divindades celestiais lançam para baixo o seu fulgor furioso sobre a nossa nação dia após dia, ao passo que as divindades mundanas estremecem em contínua fúria. Apesar disso, todas as pessoas de nossa época acreditam ser isentas de faltas, e nenhuma delas possui dúvidas de que renascerá na Terra Pura e atingirá a iluminação. O cego não pode ver o compreender o brilho do sol, e alguém que esteja profundamente adormecido não sentirá nem mesmo um terremoto estrondando como um grande tambor. O mesmo acontece com todo o povo do Japão (que não percebe suas próprias ofensas). As ofensas cometidas pelos homens são mais graves do que as praticadas pelas mulheres. De modo análogo, as ofensas das freiras são mais graves do que as dos leigos, e as dos sacerdotes, mais graves do que as das freiras. Entre os sacerdotes, as ofensas daqueles que observam os preceitos são piores do que as do sacerdotes que os violam, e as dos sacerdotes versados são ainda mais sérias. Tais sacerdotes são como as pessoas com lepra branca entre os leprosos, e, dentre os com lepra branca, a mais maligna. Então, que grande médico ou que remédio eficaz pode curar a doença de todas as pessoas nos Últimos Dias da Lei ? Elas não podem ser curadas pelas mudras e mantras do Buda Dainiti, nem pelos quarenta e oito votos do Buda Amida ou pelos doze grandes votos do Buda Yakushi, nem mesmo pela sua promessa de ‘curar todas as doenças’. Esses remédios não somente falham em curar tais males; eles agravam-nos muito mais. O lorde Sakyamuni reuniu o buda Taho bem como todos os outros Budas, que eram as suas próprias emanações, de todas as dez direções e deixou um grande remédio – os cinco caracteres do Myohorengue-kyo – para as pessoas dos Últimos Dias da Lei. Ele recusou-se a confiá-lo a qualquer um dos bodhisattvas como Hoe, Kudokurin, Kongosatta, Fuguen, Monju, Yakuo e Kannon, e muito menos a Mahakashyapa, Shariputra (ou qualquer outro homem dos dois veículos). Mais propriamente, haviam quatro grandes bodhisattvas, incluindo Jogyo, que haviam sido discípulos do Buda Sakyamuni desde Gohyaku Jintengo. Nem mesmo por um momento eles jamais haviam se esquecido do Buda. Sakyamuni convocou esses bodhisattvas e transferiu o Myoho-rengue-kyo a eles.

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Uma mulher que tomar esse remédio eficaz será rodeada e protegida por esses quatro grandes bodhisattvas. Quando ela se levantar, o mesmo farão os bodhisattvas, e quando ela caminhar ao longo da estrada, eles também o farão. Ela e os bodhisattvas serão tão inseparáveis como um corpo e sua sombra, como um peixe e a água, como a voz e seu eco, ou como a lua e sua luz. Se esses quatro grandes bodhisattvas desertarem a mulher que recita o Nam-myohorengue-kyo, eles atrairão sobre si a cólera de Sakyamuni, Taho e todos os outros Budas das dez direções. Pode estar certa de que a ofensa deles seria muito mais terrível do que a de Kokalika. Quão reconfortante ! Nam-myoho-rengue-kyo, Nam-myoho-rengue-kyo. Nitiren Fundo de Cena A data e o recebedor desde gosho são incertos. Contudo, geralmente considera-se que tenha sido escrito em 1273, cerca de dois anos após Nitiren Daishonin ter sido exilado na Ilha de Sado, à esposa de Abutsubo, que era conhecida como Senniti-ama. Apesar das severas privações e contínuas ameças à sua vida, Nitiren Daishonin conseguiu sobreviver ao primeiro inverno em Sado. Com o tempo, a situação melhorou um pouco, quando ele foi transferido, de sua dilapidada cabana em Tsukahara, a Itinosawa, em abril de 1272. O número de pessoas em Sado que professavam a fé em seu ensino cresceu, e Abutsu-bo e sua esposa tornaram-se sustentáculos desta comunidade de praticantes. Na casa onde Nitiren Daishonin morava em Itinosawa, a esposa do proprietário tornou-se uma praticante, e ele próprio desenvolveu uma atitude favorável, embora não tenha se convertido. Abutsu-bo e sua esposa haviam se tornado seguidores de Nitiren Daishonin durante a permanência dele em Tsukahara. Afirma-se que Abutsu-bo, inicialmente um devotado praticante da Nembutsu, foi enfrentar Nitiren Daishonin num debate, mas ele próprio foi convertido. Abutsu-bo e Senniti-ama serviram fervorosamente a Nitiren Daishonin como seus mantenedores e protetores enquanto ele encontrava-se no exílio em Sado, e mesmo após Daishonin retirar-se para o monte Minobu, Abutsu-bo fez três viagens para visitá-lo a despeito de sua avançada idade. Nitiren Daishonin endereçou muitas cartas de apreço a eles. Na época em que Nitiren Daishonin escreveu este gosho, ele já havia começado a inscrever o Gohonzon para certos discípulos de fé excepcional. Na realidade, o primeiro desses Gohonzon data de um período brevemente após a perseguição de Tatsunokuti, em 1271. Eles vieram a ser reconhecidos como ‘receptibilidade e vínculo específico’. Alguns deles ainda são existentes, e as inscrições dos mesmos são mais simples comparadas ao Dai-Gohonzon, que Nitiren Daishonin

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concederia a toda humanidade em 1279. Em 1272 e 1273, ele completou suas duas escrituras mais importantes, "A Abertura dos Olhos" e "O Verdadeiro Objeto de Adoração", tratando de aspectos teóricos ou doutrinais do Gohonzon. Neste gosho, Nitiren Daishonin afirma que o Gohonzon, embora seja inscrito com apenas cinco ou sete caracteres chineses, é o mestre para conduzir todas as pessoas à iluminação e que o mesmo incorpora a Grande Lei nunca antes revelada, durante os dois mil anos dos Primeiros e Médios Dias da Lei. Ele incentiva Senniti-ama, explanando que o único modo de salvar as pessoas do sofrimento e curar todas as doenças é abraçar o Gohonzon, o eficaz remédio da Lei Mística. Se ela nutrir profunda fé no mesmo, ele diz, todos os deuses budistas e bodhisattvas seguramente o protegerão.

Carta de Teradomari (Teradomari Gosho – págs. 951 a 954) Recebi o cordão de moedas que enviou-me. Aqueles determinados a buscar o Caminho devem, todos, reunir-se e executar o conteúdo desta carta. Este mês (o décimo mês), no décimo dia, deixamos a vila de Eti, no distrito de Aiko, na província de Sagami. Ao longo do caminho, paramos em Kumegawa, na província de Mussashi, e, após viajar durante doze dias, chegamos aqui ao porto de Teradomari, na província de Etigo. Daqui atravessamos o mar para a província insulana de Sado. Porém, no momento, os ventos não estão favoráveis e eu não sei quando partiremos. As privações da jornada foram piores do que eu poderia ter imaginado e, deveras, além do que poderia exprimir na escrita. Deixarei a seu cargo a conjetura do que suportei. Entretanto, estava preparado para tais dificuldades desde o princípio. Deste modo, não há propósito em começar a queixar-me delas agora. Portanto, não direi mais nada a respeito. O quarto volume do Sutra de Lótus declara: "Como o ódio e a inveja em relação a este sutra são abundantes mesmo durante a existência do Buda, quão pior não será no mundo após a sua morte ?". O quinto volume afirma: "As pessoas serão repletas de hostilidades e terão extrema dificuldade em acreditar". E, o trigésimo oitavo volume do Sutra Nirvana expõe: "Naquela ocasião, todos os brâmanes dirigiramse ao (Rei Ajatashatru), dizendo: "Ó, Grande Rei, presentemente há um homem de incomparável perversidade, um monge chamado Gautama".

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Todas as espécies de pessoas más, esperando obter lucro e esmola, congregaram-se a ele e tornaram-se seus seguidores. Eles não praticam a bondade e, ao invés disso, usam o poder de encantamentos e magia para persuadirem homens como Mahakashyapa, Shariputra e Maudgalyayana". Esta passagem do Sutra Nirvana narra as palavras maldosas que vários praticantes brâmanes pronunciaram contra a Buda Sakyamuni, porque ele refutou as escrituras pregadas pelos mestres originais deles, as duas divindades e os três ascetas. Na passagem acima do Sutra de Lótus, contudo, não era o Buda em si que estava sendo considerado como um inimigo. Mais propriamente, conforme explana Tientai, é (o Sutra de Lótus que está sendo objetado pelos) "vários shravakas e pratyekabuddhas e bodhisattvas que buscavam somente o Buda de iluminação recente". Em outras palavras, pessoas que não mostram nenhum desejo de ouvir ou acreditar no Sutra de Lótus ou que dizem que não se iguala à capacidade delas, embora possam não exatamente caluniar de fato a Lei, devem ser consideradas inimigas invejosas e hostis. Observando a situação quando o Buda encontrava-se no mundo e comparando-a com a situação desde a sua morte, podemos afirmar que os eruditos das várias seitas do mundo atual são como os brâmanes da época do Buda. Eles também falam de "um homem de incomparável perversidade", referindo-se a mim, Nitiren. Eles expressam: "Todas as espécies de pessoas más congregaram-se a ele", indicando meus discípulos e seguidores. Os praticantes brâmanes, tendo recebido e transmitido incorretamente os ensinos dos Budas anteriores, mostraram hostilidade com relação ao Buda posterior, Sakyamuni. Os eruditos das várias seitas de hoje estão fazendo a mesma coisa. Praticamente, eles deixaram que a sua própria maneira de compreender os ensinos do Buda os levasse às visões heréticas. Eles são como pessoas que, atordoadas pela bebida, pensam que a enorme montanha diante delas está girando sem parar. E, deste modo, temos agora essas oito seitas ou dez seitas, todas contendo-se entre si por causa de suas várias doutrinas. O décimo-oitavo volume do Sutra Nirvana enuncia a doutrina das ‘jóias preciosas que resgatam a vida’. O Grande Mestre Tientai, após estudar e ponderar esta passagem concluiu que a ‘vida’ refere-se ao Sutra de Lótus, e as ‘jóias preciosas’, aos três primeiros dos quatro ensinos expostos no Sutra Nirvana. Porém, então, que importância possui o quarto, ou o ensino perfeito que o Sutra Nirvana também revela ? Este ensino representa uma reiteração da doutrina, já apresentada no Sutra de Lótus, referente à natureza do Buda eternamente inerente e foi pregada para conduzir as pessoas ao Sutra de Lótus, de onde se originou. O ensino perfeito do Sutra Nirvana, da natureza de Buda eternamente inerente, na realidade, pertence o Sutra de Lótus. Os

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méritos exclusivos do Sutra de Nirvana, consequentemente, limitam-se aos três primeiros dos quatro ensinos (e não incluem o quarto). O terceiro volume do Hokke Guengui de Tientai declara: "O Sutra Nirvana oferece jóias preciosas para resgatar a vida (do Sutra de Lótus) e, portanto, as mãos aplaudem e o acordo é concluído". O terceiro volume do Hokke Guengui Shakusen explana isto, dizendo: "A escola Tendai cita esta metáfora para apontar que os contéudos do Sutra Nirvana devem ser considerados jóias preciosas (que resgatam a vida do Sutra de Lótus)". O Grande Mestre Tientai, em sua obra intitulada Shi’nenjo, cita a passagem do Sutra de Lótus que diz: "Embora eles possam expor vários caminhos…", e declara que os quatro sabores (dos sutras Kegon, Agon, Hodo e Hannya) também devem ser considerados jóias preciosas. Assim sendo, então, tanto o Sutra de Nirvana, que foi pregado após o Sutra de Lótus, como os outros sutras que foram expostos antes, devem ser concebidas como jóias preciosas oferecidas em prol do Sutra de Lótus. Contudo, os eruditos do mundo atual são da opinião de que esta interpretação representa uma doutrina sugerida somente pela seita Tendai, e que nenhuma das outras seitas a aceita. Quando eu, Nitiren, examino a questão, no entanto, tenho o seguinte a dizer: As oito ou dez seitas, às quais estamos nos referindo, vieram, todas, à existência após a morte do Buda e são a criação dos vários eruditos e mestres desse intervalo. Entretanto, não devemos avaliar os sutras que o Buda pregou durante a sua existência com base nas doutrinas das seitas estabelecidas após a sua morte. Os julgamentos propostos por Tientai, porém, então em completo acordo com os ensinos dos vários sutras. É errado descartá-los por representarem apenas as opiniões de uma única seita. Os eruditos das várias seitas continuam a agarrarem-se às opiniões errôneas de seus respectivos mestres. Portanto, declaram que as práticas religiosas devem ser acomodadas às capacidades das pessoas, ou deferem às idéias de seus fundadores ou tentam persuadir os dignos soberanos da época a serem aliados. O resultado disso tudo é que no final eles abandonam-se completamente às intenções maldosas, ocupam-se de alternadas disputas doutrinais, e sentem prazer em infligir injúrias contra pessoas que são isentas de culpa. Entre as várias seitas, as opiniões da Shingon são particularmente deturpadas. Seus fundadores, Shan-wu-wei e Chin-kang-chih, sustentaram: "O conceito de Itinen Sanzen é o mais importante de todos os princípios de Tientai, o coração e o âmago dos ensinos formulados pelo Buda no curso de sua existência. Porém, não levando em conta a doutrina de que os três mil mundos são abrangidos pela mente, que compõe a base tanto dos ensinos exotéricos como esotéricos, os mudras e mantras formam a parte mais crucial dos 203

ensinos budistas". Os líderes Shingon das épocas recentes têm usado este pronunciamento como um pretexto para declarar que todos os sutras que não mencionam madras e mantras devem ser considerados inferiores e, na realidade, não diferentes dos ensinos não-budistas. Alguns dos mestres esotéricos asseveram que o Sutra Dainiti foi pregado por um Buda (Buda Dainiti) diferente do Buda Sakyamuni, outros afirmam que é o mais elevado dos ensinos expostos pelo Lorde Sakyamuni, ao passo que ainda outros dizem que o mesmo Buda manifestou-se uma vez na forma de Buda Sakyamuni para pregar os sutras exotéricos, e, numa outra ocasião, surgiu na forma de Buda Dainiti para ensinar os sutras esotéricos. Deste modo, compreendendo incorretamente os princípios subjacentes do Budismo, produzem uma interminável coleção de opiniões errôneas. Eles são como um grupo de pessoas que desconhecendo a verdadeira cor do leite, arrisca várias especulações sobre a matiz que poderia ter o leite, embora nenhuma consiga concebê-la corretamente". Ou, são como os cegos da parábola, que tentam imaginar a real forma do elefante. Neste sentido, os eruditos das várias seitas devem entender que o Sutra Dainiti se exposto antes do Sutra de Lótus, está no mesmo nível do sutra Kegon e, se ensinado depois do Sutra de Lótus, está no mesmo nível do sutra Nirvana, (ambos os quais servem apenas como jóias preciosas para resgatar a vida do Sutra de Lótus). Não é possível que o Sutra de Lótus na Índia contivesse descrições de mudras e mantras e que aqueles que traduziram o texto para o chinês tivessem omitido esses trechos – Kumarajiva denominando a sua versão Myoho-rengue-kyo ? E, não é também possível que Shan-wu-wei tivesse acrescentado mudras e mantras e intitulado a sua versão Sutra Dainiti ? Por exemplo, havia outras versões do Sutra de Lótus, tais como o Sho-hokke-kyo, o Tem-bon-hokke-kyo, o Hokke-zanmai-kyo e o Satsuun Fundari-ko. Na Índia após a morte do Buda, o bodhisattva Nagarjuna foi aquele que verdadeiramente entendeu a relação entre o Sutra de Lótus e os outros sutras, ao passo que na China, o Grande Mestre Tientai Chih-che foi o primeiro a compreendê-la corretamente. Homens como Shan-wu-wei da escola Shingon, Cheng-kuan da escola Kegon, Chia-hsiang da escola Sanron e Tzu-en da escola Hosso defenderam publicamente as doutrinas da escola que haviam estabelecido, mas em seus corações estavam completamente convencidos pelos ensinos da escola Tientai. No entanto, ignoravam este fato (e, portanto, desenvolveram opiniões errôneas). Como poderiam evitar de serem culpados de caluniar a Lei ? Algumas pessoas criticam-me, dizendo: "Nitiren não compreende a capacidade das pessoas da época, mas circula por aí pregando de maneira áspera – esta é a razão dele deparar-se com dificuldades". Outras pessoas alegam: "As práticas de chakubuku descritas no capítulo Kanji são para bodhisattvas que estejam muito avançados na prática, (não para alguém como Nitiren. Ele deveria seguir os métodos 204

de Shoju) do capítulo Anrakugyo, porém ele deixa de agir deste modo". Outros ainda queixam-se de que dedico toda a minha atenção aos ensinos doutrinais (e não falo nada sobre a observação da mente). Estou plenamente ciente de todas essas críticas contra mim. Contudo, recordo o caso de Pien Ho que teve os seus pés amputados, e o de Kiyomaro (literalmente, Homem Puro), que foi cognominado Kegaremaro (Homem Imundo) e quase levado à morte. Todas as pessoas da época riram deles com escárnio, mas ao contrário daqueles dois homens, os que riram não deixaram nenhum bom nome atrás deles. E, todas as pessoas que dirigem críticas injustas contra mim irão encontrar um destino semelhante. O capítulo Kanji declara: "Haverá muitas pessoas ignorantes que nos amaldiçoarão e difamarão". Observo minha própria situação nesta passagem. Por que não se aplicaria a todos vocês também ? "Eles nos atacarão com espadas e bastões", a passagem continua. Eu experimentei essa passagem do sutra com o meu próprio corpo. Por que meus discípulos não fazem o mesmo ? Mais adiante, a passagem diz: "Constantemente eles circularão no meio do povo procurando, desta forma, caluniar-nos". "Eles dirigir-se-ão aos governantes, altos ministros, brâmanes e grandes patronos do Budismo (…caluniando-nos e difamando-nos)". E, "eles defrontam-nos com linguagem imprecatória e cenhos furiosos; repetidamente seremos banidos". "Repetidamente" significa muitas vezes. E eu, Nitiren, fui banido repetidas vezes e, por duas vezes, fui condenado ao exílio. O Sutra de Lótus invariavelmente conclui a pregação do Dharma de todos os Budas das três existências. Os eventos passados descritos no capítulo Fukyo estou experimentando agora, conforme predito no capítulo Kanji; deste modo, o presente profetizado no capítulo Kanji corresponde ao passado do capítulo Fukyo. O capítulo Kanji do presente será o capítulo Fukyo do futuro e, nessa ocasião, eu, Nitiren, serei o bodhisattva Fukyo deste. O Sutra de Lótus consiste numa única obra de oito volumes e vinte e oito capítulos, mas eu ouvi que o sutra, na forma em que existiu na Índia, era longo o suficiente para estirar-se por uma extensão total de um yojana. Em outras palavras, deve ter havido muito mais capítulo nele. A versão de vinte e oito capítulos usada atualmente na China e Japão representa a parte mais essencial de uma versão condensada. Deixemos de lado por enquanto a seção revelação do sutra. Na parte seguinte transmissão, os três pronunciamentos do capítulo Hoto são proferidos para a assembléia reunida no Pico da Águia e presentes na Cerimônia do Ar. Quanto ao voto feito no capítulo Kanji pelos vinte mil, os oitenta mil, e os oitenta miríades e milhões de nayutas de grandes bodhisattvas, um homem de sabedoria superficial como eu não pode compreendê-lo. Porém, eu observaria que a frase "numa era de medo e maldade"que consta no capítulo indica o início dos Últimos Dias da Lei. 205

Essa ‘era de medo e maldade’ é referida posteriormente no capítulo Anrakugyo como ‘era posterior’. E, olhando outras traduções do sutra, constatamos que no Sho-hokke-kyo aparece como ‘na era posterior futura’ ou ‘na era posterior vindoura’, enquanto que no Tembon-hokkekyo apresenta-se como ‘numa era de medo e maldade’. Nessa era posterior que corresponde ao nosso próprio tempo, os três tipos de inimigos surgiram, mas nem um único dos oitenta miríades de milhões de nayutas de bodhisattvas pode ser visto em lugar nenhum. É como um lago ressequido ressentindo a falta de sua porção plena de água, ou uma lua minguante que está longe de ser cheia. Se a água é límpida, a imagem da lua reflete-se nela, e se árvores são plantadas, pássaros podem aninhar-se nelas. Portanto, eu, Nitiren, propago este sutra no lugar dos oitenta miríades de milhões de nayutas de bodhisattvas. Peço que aqueles bodhisattvas concedam-me o seu auxílio e proteção. O sacerdote leigo que porta esta carta diz-me que o senhor instrui-o a acompanhar-me à província de Sado. Porém, em vista das despesas da viagem e outras dificuldades, estou enviando-o de volta ao senhor. Eu já conheço a profundidade de sua consideração. Por favor, explique aos outros o que escrevi aqui. Estou muito preocupado a respeito dos sacerdotes que estão na prisão, e espero que me informe sobre a situação deles na primeira oportunidade. Respeitosamente, Nitiren Na hora do Galo (5:00 – 7:00) do vígésimo-segundo dia do décimo mês Fundo de Cena Após a sua tentativa fracassada de executar Nitiren Daishonin em Tatsunokuti, em 12 de setembro de 1271, Hei no Saemon, delegadochefe do Departamento de Assuntos Militares e Policiais, não teve outra alternativa a não ser seguir as instruções originais do governo e entregá-lo à custódia de Honma Rokuro Zaemon Shiguetsura, o delegado de Sado. Nitiren Daishonin ficou confinado durante aproximadamente um mês de residência de Honma em Eti, província de Sagami, aguardando a decisão de seu destino pelo governo. Nesse intervalo alguns problemas não identificados haviam ocorrido na residência do regente Hojo Tokimune, e um adivinho disse-lhe que o acontecido tinha relação com a tentativa de execução. Tokimune ordenou a soltura de Nitiren Daishonin, mas os eventos rapidamente trabalharam contra a sua decisão. Uma onda de incêndios criminosos e assassinatos assolou Kamakura e haviam boatos que diziam que os seguidores de Nitiren Daishonin eram culpados. O governo, então, ordenou que os planos originais de exílio fossem acionados. 206

Em 10 de outubro, Nitiren Daishonin deixou Eti, escoltado pelos soldados de Honma. Quando o grupo chegou à costa do Mar do Japão no dia 21, a neve cobria o chão e o mar estava turbulento. Eles foram forçados a parar durante vários dias num posto chamado Teradomari, em Etigo (atual prefeitura de Niigata), e esperar que os ventos se acalmassem o suficiente para permitir a travessia para a ilha de Sado. Afirma-se que Teradomari tenha prosperado a partir do início do século IX como um porto para o tráfego de navios entre a ilha de Sado e a ilha principal do Japão. No dia seguinte à sua chegada a Teradomari, Nitiren Daishonin escreveu esta carta e confiou-a a um sacerdote leigo, que Toki Jonin havia enviado para acompanhá-lo. Toki Jonin foi um dos principais seguidores de Nitiren Daishonin, e serviu como um subordinado de um certo Lorde Tiba na província de Shimosa. Ele havia convertido-se ao budismo de Nitiren Daishonin por volta de 1254. Sendo um homem de considerável erudição, recebeu muitas das importantes obras de Nitiren Daishonin, inclusive "O Verdadeiro Objeto de Adoração". O grupo alcançou Sado em 28 de outubro e chegou em 1 de novembro a Tsukahara, o local designado para o banimento de Nitiren Daishonin. Nenhum de seus inimigos esperava que ele retornasse desse lugar frio e assustador. Nitiren Daishonin permaneceu em Sado aproximadamente dois anos e meio, durante os quais conseguiu converter muitas pessoas, inscreveu o Gohonzon para praticantes em particular e escreveu vários importantes Gosho, revelando a sua iluminação como o Buda Original que surge nos Últimos Dias da Lei para salvar toda a humanidade. A comunidade de praticantes em Kamakura havia ficado bastante abalada pelos acontecimentos da perseguição de Tatsunokuti e o exílio a Sado, e muitos, dentre os seus discípulos abandonaram a fé, ou passaram a nutrir dúvidas, quando viram Daishonin ser perseguido, e a perder a confiança no seu ensino. Entre aqueles que apostataram estavam alguns que começaram a criticar Nitiren Daishonin, afirmando que ele encontrava perseguições por ser rigoroso demais em sua maneira de propagar, ou que provavelmente não poderia ser o devoto do Sutra de Lótus, pois havia falhado em receber a proteção dos deuses budistas.. A fim de ajudar seus discípulos a dissiparem suas dúvidas e perseverarem na fé, Nitiren Daishonin, durante o seu exílio, escreveu um grande número de Gosho nos quais procurou oferecer respostas exatas às várias questões que eles possuíam, tais como porque os deuses budistas parecem não dedicar-lhes proteção e porque o chakubuku é o modo de propagação apropriado nos Últimos Dias da Lei. Esta carta é a primeira dessas escrituras. No início desta carta, Nitiren Daishonin menciona de passagem as privações e dificuldades que experimentou durante os doze dias de viagens a Teradomari. Ele, então, cita passagens de escrituras para mostrar que, nos Últimos Dias da Lei, o ódio e a inveja em relação ao 207

Sutra de Lótus serão piores do que durante a existência do Buda. Afirma que ele próprio está confrontando de fato tais oposições, em exato acordo com as predições dos sutras. Em seguida, fazendo alusão à doutrina de Tientai sobre ‘as jóias preciosas para resgatar a vida’, baseada no sutra Nirvana, Nitiren Daishonin declara a superioridade do Sutra de Lótus com referência a todos os outros sutras e aponta as visões errôneas dos eruditos das várias seitas, que deixam de reconhecer isto. Em particular, de Shan-wu-wei e outros. Ele adverte que os seguidores das várias seitas estão cometendo a ofensa de caluniar o Sutra de Lótus, não conscientes de que seus patriarcas interiormente concordavam com ensinos da escola Tientai, que se fundamentam no Sutra de Lótus. Nitiren Daishonin enumera, então, quatro frequentes críticas à sua prática do chakubuku, levantadas não apenas pelos seus inimigos, mas também por alguns de seus próprios seguidores, e declara que as provações que encontrou combinam perfeitamente com as profecias do capítulo Kanji (décimo-terceiro) do Sutra de Lótus, referentes às perseguições que acompanharão a propagação nos Últimos Dias da Lei. Na perspectiva do sutra, ele próprio é o devoto que propaga o sutra nesta era posterior. Finalmente, ele expressa a sua gratidão a Toki Jonin por tudo o que havia feito por ele, e pede-lhe que o informe o mais rápido possível como os seus discípulos presos estão passando.

O Tesouro de um Filho Dedicado (Senniti-ama Gohenji, págs. 1318-1322) Fiquei profundamente preocupado em ouvir as notícias sobre a freira, a esposa de Ko Nyudo. Por favor, diga-lhe que penso nela com muito carinho. Recebi seu vários presentes: um kan e quinhentos mon de moedas, algas, plantas marinhas, wakame e arroz seco, e relatei respeitosamente o fato na presença do Sutra de Lótus.

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O Sutra de Lótus diz: "Entre aqueles que ouviram esta Lei, não há ninguém que não atingirá o estado de Buda". Embora essa passagem consista em apenas dez caracteres, ler pelo menos uma única frase do Sutra de Lótus é ler sem omissão todos os ensinos sagrados pregados pelo Buda Sakyamuni durante a sua existência. Portanto, o Grande Mestre Miao-lo diz: "Se, ao propagar o Sutra de Lótus, a pessoa for interpretar mesmo que uma de suas doutrinas, deve levar em consideração os ensinos de toda a existência do Buda e dominá-los do início ao fim". Por ‘início’ele indica o Sutra Kegon, e por ‘fim’ele se refere ao Sutra Nirvana. O Sutra Kegon foi exposto na época em que o Buda havia obtido a iluminação pela primeira vez, quando os grandes bodhisattvas Sabedoria Dharma, Floresta de Mérito e outros, atendendo à solicitação de um bodhisattva chamado Lua de Emancipação, pregaram diante do Buda. Não sei que forma esse sutra pode ter na Índia, no palácio do rei Dragão ou no Céu Tushita, mas foi trazido ao Japão numa versão de sessenta volumes, uma de oitenta volumes e uma de quarenta volumes. No caso do último dos ensinos, o Sutra Nirvana, eu mais uma vez não sei que forma pode ter na Índia ou no palácio do rei Dragão, mas em nosso país existe numa versão de quarenta volumes, uma de trinta e seis volumes e uma de dois volumes. Além desses sutras, há os sutras Agon, os sutras Hodo e os sutras Hannya, que atingem cinco ou sete mil volumes. Porém, mesmo que não vejamos ou ouçamos falar de nenhum desses vários sutras, se lemos pelo menos uma única palavra ou frase do Sutra de Lótus, é como se estivéssemos lendo cada uma das palavras de todos esses diversos sutras. É como os dois caracteres que compõem o nome da Índia, Gasshi, ou o nome do Japão, Nihon. Os dois caracteres que formam o nome Gasshi embarcam as cinco regiões da Índia, os dezesseis principais reinos, os quinhentos reinos intermediários, os dez mil reinos menores e os incontáveis pequenos países iguais a grãos de painço espalhados, todos com suas grandes áreas de terra, imensas imontanhas, suas plantas e árvores e seus habitantes humanos e animais domésticos. Ou é como um espelho, que pode ter só um, duas, três, quatro ou cinco polegadas de tamanho, mas consegue refletir a imagem de uma pessoa de trinta centrímetros ou um metro e meio de altura, de uma enorme montanha de três metros, seis metros, trinta metros ou trezentos metros. Assim, quando lemos a passagem acima do Sutra de Lótus, compreendemos que todas as pessoas que tivessem conhecimento do sutra, sem uma única exceção, atingirão o estado de Buda. Todos os vários seres nos nove mundos e seis caminhos diferem entre si em suas mentes. É comparável ao caso de duas pessoas, três pessoas ou cem ou mil pessoas. Apesar de todas terem um rosto de 209

aproximadamente trinta centímetros de comprimento, nenhum parece exatamente igual ao outro. As mentes delas diferem e, portanto, seus rostos também. Muito maior ainda é a diferença entre as mentes de duas pessoas, de dez pessoas e de todos os seres vivos nos seis caminhos e nos nove mundos ! É tão grande que alguns adoram as cerejeiras floridas e outros amam a Lua, alguns preferem o sabor azedo e outros, o amargo; alguns gostam de pequenas coisas e outros, de grandes. As pessoas têm vários gostos. Algumas preferem o bem e outras, o mal. As pessoas são de vários tipos. Contudo, embora elas possam diferir uma das outras em pontos como esses, quando compreendem o Sutra de Lótus, todas tornam-se como uma única pessoa em corpo e uma única pessoa em mente. É semelhante aos vários rios que, quando fluem para o grande oceano, passam a ter todos um gosto salgado; ou as várias espécies de pássaros que, quando se aproximam do Monte Sumeru, assumem todos a mesma cor (dourada). Desta maneira, Devadatta, que havia cometido três dos cinco pecados capitais e Rahula, que observou todos os duzentos e cinquenta preceitos, tornaram-se, ambos, identicamente, Budas. E tanto o rei Myoshogon, que mantinha visões errôneas, como Shariputra, que sustentava visões corretas, receberam, igualmente, predições de que atingiriam o estado de Buda. Isto porque, como nas palavras da passagem citada anteriormente, "Não há ninguém que não atingirá o estado de Buda". No sutra Amida e em outros expostos durante os primeiros quarenta anos ou mais da vida de pregação do Buda, consta que Shariputra conquistou um grande mérito recitando o nome do buda Amida, um milhão de vezes no espaço de sete dias. Porém, como esses sutras foram repudiados como ensinos pertencentee ao período no qual o Buda ‘não havia ainda revelado a verdade’, essa recitação na realidade é tão sem sentido quanto ferver água durante sete dias, e depois, despejá-la no oceano. A Dama Vaidehi, por meio de ler o sutra Kammuryoju, conseguiu atingir o estágio conhecido como a percepção de não-nascimento e nãoextinção. Entretanto, uma vez que esse sutra foi descartado com as palavras do Buda de que ele iria agora ‘rejeitar honestamente todos os ensinos provisórios’, a menos que a Dama Vaidehi abraçasse a fé no Sutra de Lótus, ela teria de voltar à sua posição anterior de mulher comum. Os atos de grande bem não são nada com que se possa contar. Se a pessoa não conseguir encontrar o Sutra de Lótus, de que servirão? Tampouco a pessoa deve lamentar ter cometido atos de grande mal. Pois se apenas praticar o veículo único, poderá seguir os passos de Devadatta (para atingir o estado de Buda). Tudo isso porque a

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passagem do sutra que a declar "Não há ninguém que não atingirá o estado de Buda" não foi proferida em vão. Alguns podem estar tentando imaginar onde o espírito do falecido Abutsubo pode estar neste momento. Porém, usando o claro espelho do Sutra de Lótus para refletir a imagem dele, eu, Nitiren, posso vê-lo entre a assembléia no Pico da Águia, sentado dentro da Torre de Tesouro do Buda Taho e voltado para o leste. Se o digo não for verdade, então, não se trata de nenhum erro meu. Ou melhor, a língua do Buda Sakyamuni, que disse: "O Honrado do Mundo não muito expõe suas doutrinas e agora deve revelar a verdade", juntamente com a língua do Buda Taho, que declarou: "O Sutra de Lótus…Tudo o que o senhor (Buda Sakyamuni) expôs é a verdade", bem como as línguas de todos os vários Budas, que estavam sentados lado a lado nos quatrocentos bilhões de terras, tão numerosos quanto as plantas de cânhamo e arroz, quanto as estrelas ou hastes de bambu, dispostos sem nenhuma lacuna entre si, e que, sem uma única exceção, estenderam suas línguas até o palácio de Daibonten, todas essas línguas, eu afirmo, apodrecerão num instante como uma baleia que morreu e se deteriorou, ou como um amontoado de sardinhas que se decompõe. Todos os Budas nos mundos das dez direções serão culpados da ofensa de falar grandes mentiras; o chão da terra pura da Luz Tranquila, que é feito de ouro e esmeraldas, subitamente se abrirá; e todos esses Budas, como Devadatta, mergulharão de cabeça para baixo na grande cidadela do inferno de incessantes sofrimentos. Ou, como aconteceu à freira Dharma Fragrância de Lótus, chamas furiosas brotarão de seus corpos por causa das grandes mentiras que disseram, e o jardim de flores do Mundo do Tesouro Lótus, uma Terra de Recompensa Real, imediatamente será reduzido a um local de cinzas. Porém, como isso seria possível ? Se só o falecido Abutsubo deixasse de ser admitido na Terra Pura da Luz Tranquila, então, todos esses Budas cairiam num mundo de grande sofrimento. Pondo todo o resto de lado, deve considerar o assunto sob esse prisma. Com base nisto, poderá julgar a verdade ou a falsidade das palavras do Buda. O homem é como o pilar, a mulher, como a viga mestra. O homem é como as pernas de uma pessoa, a mulher, como o tronco. O homem é como as asas de um pássaro, a mulher, como o corpo. Se as asas e o corpo ficarem separados, como o pássaro poderá voar ? E, se o pilar tomba, a viga com certeza cai no chão. Um lar sem um homem é como uma pessoa sem alma. Com quem poderá discutir questões de negócios, e a quem poderá servir bons alimentos ? Ficar longe de seu marido por um simples dia ou dois é motivo de inquietação. E a senhora foi separada de seu marido no vigésimo-primeiro dia do terceiro mês do ano passado, e passou o

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restante do ano sem ver o retorno dele. Agora, já é o sétimo mês deste ano. Mesmo que ele não volte, por que não envia alguma notícia ? As flores de cerejeira, que se dispersaram um dia, floresceram novamente, e a fruta que outrora caiu, formou-se de novo nas árvores. As brisas de verão não mudaram, e as cenas de outono são as mesmas do ano passado. Por que é que, só nesse assunto,as coisas têm de ser tão diferentes do que foram, e nunca mais voltarão a ser iguais ? A lua põe-se e surge novamente; as nuvens dissipam-se e, então, ajuntam-se mais uma vez. Até mesmo o céu deve lastimar e a terra lamentar o fato desse homem ter partido e de que nunca mais retornará. A senhora deve sentir o mesmo. Conte com o Sutra de Lótus como posição para a sua jornada e depressa, bem depressa, ponha-se a caminho da Terra Pura do Pico da Águia para que possa encontrá-lo lá ! Há uma passagem num dos sutras que diz que os filhos são os inimigos de uma pessoa. "As pessoas neste mundo cometem muitos pecados por causa dos filhos", esta afirma. No caso dos pássaros conhecidos como águia de crista e águia, embora os pais criem seus filhotes com compaixão, voltam-se contra eles e comem seus pais. E o pássaro chamado coruja após ser chocado, invariavelmente devora a sua mãe. Esse são exemplos entre as criaturas inferiores. Mesmo entre os seres humanos, o rei Virudhaka tomou o trono de seu pai, por quem sentia ressentimento, e o rei Ajatashatru assassinou seu pai. An Lu-shan matou sua mãe adotiva, e An Chi’in-hsu matou seu pai, An Lu-shan. An Chi’ing-hsu foi morto por Shih Shih-ming (que era como um filho para ele) e Shih-shih-ming, por sua vez, foi assassinado por seu filho, Shih Ch’ao-i. Assim, há boas razões para se dizer que os filhos sejam inimigos. O monge chamado Sunakshatra era filho do Buda Sakyamuni, o senhor dos ensinos. Porém, ele conspirou com o mestre não-budista chamado Êxito por Intermédio de Austeridades e tentou, repetidas vezes, matar o Buda. Há também uma passagem do sutra que diz que os filhos são um tesouro. Portanto, o sutra declara: "Em virtude dos benefícios que os filhos e filhas acumularam por meio da prática religiosa, um grande brilho reluzente surge iluminando o reino do inferno, e os pais (sofrendo no inferno) são capazes, desse modo, de despertar uma mente de fé. Contudo, mesmo que o Buda nos tivesse ensinado (que os filhos são um tesouro), poderia deduzir isto simplesmente pelas evidências diante de seus olhos. Na Índia houve certa vez um grande soberano, o rei do país chamado Parthia. Esse rei gostava exageradamente de cavalos e de criação de cavalos. Com o tempo, tornou-se tão perito em criá-los que conseguia não somente converter um cavalo imprestável num animal de 212

qualidade notável, mas também podia transformar um boi num cavalo. No final, até mesmo transmutava pessoas em cavalos e cavalgava-os. Os cidadãos de seu próprio Estado ficaram tão aflitos com essa última façanha dele que ele se restringiu a transformar homens de outras terras em cavalos. Consequentemente, quando um mercador viajante veio a seu reino de um outro país, ele ofereceu-lhe uma poção para beber, tornou-o um cavalo e amarrou-os nos estábulos reais. Mesmo sob circunstâncis ordinárias, o mercador ansiava pela sua pátria e, em particular, pensava com saudade em sua mulher e em seu filho. Portanto, ele achou a sua sina muito difícil de suportar. Porém, como o rei não permitia que voltasse para casa, ele não poderia fazêlo. Na verdade, mesmo que tivesse sido possível, o que poderia fazer lá em sua atual forma ? Assim, tudo o que lhe restava era lamentar o seu destino. Esse homem tinha um filho que, quando o seu pai deixou de regressar no tempo esperado, começou a imaginar se seu pai havia sido morto, ou talvez tivesse adoecido. Sentindo que, como filho, deveria descobrir o que havia acontecido com o seu pai, partiu para uma viagem. Sua mãe lamentou-se, queixando-se de que seu marido já tinha ido para uma outra terra e deixado de voltar, e que se ela agora fosse abandonada pelo seu único filho também, não saberia como prosseguir. Mas o filho estava tão profundamente preocupado com o pai que, mesmo assim, pôs-se a caminho de Parthia em busca dele. (Ao chegar lá) alojou-se por uma noite numa pequena hospedaria. O dono da casa disse: "Que tristeza! Você é ainda tão jovem, e posso ver pelo seu semblante e postura que é uma pessoa distinta. Tive um filho um dia, mas ele partiu para um outro país e talvez tenha morrido lá. Pelo menos não sei o que sucedeu com ele. Quando penso no destino de meu próprio filho, mal posso olhar para você. Digo isso porque aqui neste país temos uma causa para grande pesar. O rei deste país é tão exageradamente afeito a cavalos que se aventura a fazer uso de uma estranha espécie de planta. Se ele dá uma das estreitas folhas dessa planta para uma pessoa comer, ela transforma-se num cavalo. Se ele oferece uma das folhas largas da planta a um cavalo, este torna-se uma pessoa. Não faz muito tempo, um mercador veio aqui de um outro país. O rei deu-lhe algumas folhas dessa planta, transformou-o num cavalo, e está mantendo-o secretamente confinado no primeiro de seus estábulos reais. Quando o filho escutou isto, pensou que seu pai provavelmente deveria ter sido transformado num cavalo, e perguntou: "Qual é a cor do pelo do cavalo?" O dono da casa respondeu: "O cavalo é castanho com manchas brancas nas costas".

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Após ter-se informado de todos esses fatos, encontrou uma maneira de aproximar-se do palácio real, onde conseguiu roubar algumas folhas largas da estranha planta. Quando deu-as ao seu pai, que havia sido transformado num cavalo, ele voltou à sua forma original. O rei do país, maravilhado com o que ocorrera, entregou o pai ao filho, pois este havia mostrado ser um grande modelo de preocupação filial, e depois disso nunca mais transformou homens em cavalos. Quem senão um filho teria percorrido tal distância à procura de seu pai ? O venerável Maudgalyayana salvou sua mãe dos sofrimentos do mundo dos espíritos famintos, e Jozo e Joguen persuadiram o pai a abandonar suas idéias heréticas. É por isso que se diz que um bom filho é o tesouro dos pais. Agora, o falecido Abutsubo foi um habitante de uma ilha erma e distante no mar do norte do Japão. No entanto, estava receoso a respeito de sua existência futura, e assim assumiu votos religiosos e aspirou à felicidade na próxima vida. Quando encontrou a mim, Nitiren, um exilado na ilha, ele abraçou o Sutra de Lótus e, na primavera do ano passado, tornou-se um Buda. Quando a raposa do Monte Shita encontrou a Lei do Buda, ficou insatisfeito com a vida, almejou a morte, e renasceu como o deus Taishaku. Da mesma maneira, Abutsu Shonin ficou cansado de sua existência nesse mundo impuro e, portanto, tornou-se um Buda. Seu filho, Tokuro Moritsuna, seguiu seus passos, vindo a ser um sincero devoto do Sutra de Lótus. No ano passado, no segundo dia do sétimo mês, ele apareceu aqui em Minobu, em Hakuri, na província de Kai, tendo viajado mil ri por montanhas e mares com cinzas de seu pai penduradas em seu pescoço, e depositou-as no lugar dedicado à prática do Sutra de Lótus. E, este ano, no primeiro dia do sétimo mês, ele veio novamente ao Monte Minobu para visitar o túmulo de seu pai. Com certeza, não existe tesouro maior do que um filho, nenhum tesouro maior do que um filho ! Nam-myoho-rengue-kyo, nam-myoho-rengue-kyo. Nitiren, Em 2 de julho. Pós-escrito: Estou enviando um manto sacerdotal de seda tingida. Por favor, informe Bungo-bo. Os ensinos do Sutra de Lótus já estão se propagando por todo o Japão. Bungo-bo deve encarregar-se de propagá-los na região de Hokuriku, mas não pode fazê-lo a menos que se torne bem versado. Diga-lhe que se apresse e venha até aqui, no máximo, no dia 15 de setembro. Por gentileza, remeta-me os vários textos sagrados tão logo quando possível por intermédio de Tamba-bo, como fez com o diário. Por favor,

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mande-me Yamabushi-bo aqui conforme instruí antes. Fico muito contente em saber que vocês o trataram com tal amabilidade. Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu este gosho no verão de 1280 à sua seguidora, Senniti-ama, na Ilha de Sado. O marido dela, Abutsubo Nittoku, havia falecido no ano anterior. Esta carta exprime a profunda solidariedade pela sua perda, bem como a convicção dele nos benefícios insondáveis do Sutra de Lótus. Originalmente um ardente praticante da Nembutsu, o falecido Abutsubo foi um dos primeiros convertidos por Nitiren Daishonin. A tradição conta que logo após o exílio de Daishonin para aquele local, ele foi à morada de Daishonin em Tsukahara para desafiá-lo num debate, mas, em vez disso, converteu-se aos ensinos de Nitiren Daishonin juntamente com sua esposa, Senniti-ama. O casal idoso proveu-o de alimento e suprimentos e também ofereceu-lhe proteção enquanto ele esteve em Sado, expondo-se à desaprovação das autoridades. Após Nitiren Daishonin ter sido perdoado da sentença de exílio e ter-se retirado para o Monte Minobu, Abutsubo, apesar de sua idade avançada, fez três viagens para vê-lo. Afirma-se que tenha morrido em 21 de março de 1279, aos noventa e um anos. Posteriormente, naquele mesmo ano, seu filho, Tokuno Moritsuna, fez uma peregrinação a Minobu com as cinzas de Abutsubo e as sepultou lá. Senniti-ama e Tokuro continuaram a sustentar os ensinos de Daishonin em Sado. Senniti-ama estava preocupada a respeito das privações da vida de Nitiren Daishonin em Minobu e no ano seguinte enviou Tokuro para levar vários oferecimentos a ele. Tokuro chegou a Minobu no dia 1 de julho de 1280. Nessa ocasião, Nitiren Daishonin escreveu esta carta a Senniti-ama em reconhecimento aos seus sinceros oferecimentos, confiando-a ao filho dela na sua viagem de volta. Na parte inicial, Nitiren Daishonin declara que ler uma frase do Sutra de Lótus é o equivalente a ler todos os ensinos expostos pelo Buda Sakyamuni durante sua existência. Ele assegura a Senniti-ama que todas as pessoas que abraçam o Sutra de Lótus irão, sem uma única exceção, atingir o estado de Buda, e portanto, à luz do ‘espelho claro do Sutra de Lótus’, não pode haver dúvida nenhuma de que o seu falecido marido, Abutsubo, havia alcançado o estado de Buda também. Na parte restante da carta, Nitiren Daishonin encoraja Senniti-ama diante da solidão após a morte de seu marido, e também elogia a devoção filial de seu filho, Tokuro. Especialmente comovido pelas duas visitas de Tokuro a Minobu em benefício de seu pai, Nitiren Daishonin encerra a carta exclamando: "Com certeza, não há tesouro maior do que um filho, nenhum tesouro maior do que um filho!". 215

Os Presságios (Zuisso Gosho – Págs. 1140 a 1142) Estranhas ocorrências no céu atemorizam todas as pessoas e calamidades na terra inquietam a todos. Quando o Buda estava prestes a expor o Sutra de Lótus, ocorreu o surgimento dos cinco presságios e dos seis presságios. Destes, o presságio da terra agitando-se denota que a terra tremeu de seis modos diferentes. Interpretando esse fato no terceiro volume de seu Hokke Mongu, o Grande Mestre Tientai afirma: "(Um dos seis é que) o leste eleva-se e o oeste declina. O quadrante leste corresponde à cor verde e governa o fígado que, por sua vez, governa os olhos. O quadrante oeste corresponde à cor branca e governa os pulmões que, por sua vez, governa o nariz. Consequentemente, o leste elevando-se e o oeste declinando, indicam que os benefícios dos olhos aparecem e, em resposta, os desejos mundanos dos olhos desaparecem. De maneira similar, quando os benefícios do nariz surgem, em resposta, os desejos mundanos do nariz desaparecem. De forma semelhante, a elevação e declínio de outras direções significam o surgimento do benefício e desaparecimento dos desejos mundanos com respeito aos outros órgãos sensoriais". Com relação a isso, o Grande Mestre Miao-lo diz: "As direções indicam os seis orgãos dos sentidos. Já está estabelecido que os olhos e o nariz representam, respectivamente, o leste e o oeste. Segue-se portanto, que os ouvidos e a língua equivalem, respectivamente, ao norte e ao sul. O centro correlaciona-se com a mente, ao passo que as quatro direções indicam o corpo. O corpo é dotado com os quatro órgãos sensoriais, e a mente é ligada a todos os quatro. Portanto, a mente induz a elevação ou declínio com referência (às funções sensoriais do) corpo". As dez direções são ‘ambiente’ (eho), e os seres sensíveis são ‘vida’ (shoho). O ambiente é como a sombra, e a vida, o corpo. Sem corpo não pode haver sombra. Analogamente, sem a vida, o ambiente não pode existir, embora a vida seja sustentada pelo seu ambiente. Os olhos correspondem ao quadrante leste. A partir disto, sabemos também que a língua corresponde ao quadrante sul, o nariz, ao quadrante oeste, e os ouvidos, ao quadrante norte, o corpo, a todos os quatro quadrantes, e a mente, ao centro. Portanto, quando os cinco órgãos sensoriais das pessoas estiverem desordenados, os quatro quadrantes bem como o centro ficarão sobressaltados e estremecidos, e como sinais da consequente destruição da terra, as montanhas ruirão, a grama e árvores murcharão e os rios secarão. Quando os olhos, ouvidos e outros órgãos sensoriais das pessoas estão confusos e 216

perturbados, mudanças incomuns ocorrem no céu, e quando as mentes delas estão agitadas, a terra treme. Algum sutra já foi pregado sem que a terra tremesse de seis maneiras diferentes ? Esse fenômeno invariavelmente ocorreu cada vez que o Buda expôs um sutra. Contudo, quando o Buda, prestes a expôr o Sutra de Lótus, fez a terra estremecer de seis modos diferentes, as pessoas ficaram especialmente atônitas. O bodhisattva Miroku formulou uma pergunta sobre esse fenômeno e o bodhisattva Monjushiri respondeu. Isto porque o presságio era maior, tanto em magnitude como em duração, do que quando os outros sutras foram pregados, e as questões das pessoas eram, portanto, mais difíceis de solucionar. Desta forma, Miao-lo afirma: "Nenhum sutra Mahayana jamais foi pregado sem a reunião de multidões de pessoas, sem o Buda emitir um raio de luz de sua testa, sem flores choverem do céu ou sem a terra sacudir. Entretanto, nunca antes as pessoas ficaram tão imensamente abismadas como estavam agora". Isto significa que presságios haviam anunciado a pregação de todos os outros sutras também, mas nenhum havia sido tão assombroso (como aqueles que ocorreram quando o Sutra de Lótus foi exposto). Por esta razão, o Grande Mestre Tientai declara: "As pessoas dizem que quando uma aranha tece a sua teia, isto indica que algum acontecimento feliz está próximo, e se uma pega fala, prenuncia a chegada de um convidado. Até mesmo tais insignificâncias são preditas por algum sinal. Como, então, grandes assuntos poderiam ocorrer sem presságios ? Por intermédio do próximo, o distante é revelado". Assim, o Buda manifestou grandes augúrios, jamais vistos antes durante os seus mais de quarenta anos de pregação, quando expôs o ensino teórico do Sutra de Lótus. Todavia, os presságios que anunciaram o ensino essencial ultrapassam amplamente os sinais que precederam o ensino teórico, muito mais do que estes, por sua vez, excederam os presságios que prenunciaram os ensinos pré-Sutra de Lótus. Uma magnífica torre do tesouro brotou do chão e, então, multidões de bodhisattvas emergiram da terra. Os grandes tremores dessa ocasião foram como vendavais soprando sobre o oceano, criando ondas do tamanho de montanhas, que arremessam um pequeno navio como se fosse uma folha de junco, tragando até mesmo suas velas. Portanto, embora Miroku tenha indagado a Monju a respeito dos presságios que surgiram no capítulo Jo, com referência aos grandes prodígios que ocorreram no capítulo Yujutsu, ele perguntou diretamente ao próprio Buda. Miao-lo explica esse fato, dizendo: "Como o ensino teórico diz respeito a assuntos que são superficiais e, comparativamente, recentes, Monju poderia oferecer respostas de crédito. Por outro lado, a iluminação original do Buda no remoto passado era tão difícil de compreender que ninguém, exceto o próprio Buda, poderia ser confiada a explicação". O Buda não se preocupou em esclarecer os presságios do ensino teórico, mas Monju sabia, de forma geral, o que significavam. Os presságios do ensino essencial, no entanto, ele não conseguia nem mesmo começar a

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sondar. E, esses presságios referiam-se somente a eventos ocorrentes durante a existência de Sakyamuni. Então, quando o Buda veio a pregar o capítulo Jinriki, ele exibiu dez poderes místicos. Estes eram incomparavelmente mais extraordinários do que os presságios do capítulo Jo ou os dos capítulos Hoto e Yujutsu. O feixe de luz que o Buda emitiu (de sua testa) na oportunidade do capítulo Jo iluminou apenas dezoito mil mundos ao leste, mas o que ele irradiou (de seu corpo inteiro) na ocasião do capítulo Jinriki abrangeu todos os mundos das dez direções. Enquanto o tremor da terra no capítulo Jo limitou-se aos mundos do sistema maior de mundos, no capítulo Jinriki todos os mundos dos Budas das dez direções tremeram de seis modos diferentes. E, os sinais que surgiram na nossa própria época são igualmente espantosos. Os grandes presságios do capítulo Jinriki predisseram que a essência do Sutra de Lótus propagar-se-ia, após a morte do Buda, quando os dois mil anos dos Primeiros Dias da Lei tivessem passado e os Últimos Dias da Lei tivesse começado. Uma passagem do sutra afirma: "Porque (haverá aqueles que) fielmente sustentarão este sutra após a morte do Buda, todos os Budas alegram-se e demonstram seus ilimitados poderes místicos". Consta também ‘(aquele que conseguir sustentar este sutra) na era maléfica dos Últimos Dias da Lei…’. Pergunta: Todos os presságios, sejam bons ou maus, predizem algo que irá ocorrer dentro de uma ou duas horas, um dia ou dois, um ou dois anos, ou dentro de sete ou doze anos no máximo. Como poderia haver presságios que anunciem aquilo que irá acontecer mais de mil anos depois ? Resposta: O evento predito pelos presságios que aconteceram no reinado do Rei Chao da dinastia Chou tornou-se realidade após mil e quinze longos anos. O sonho do Rei Kiriki concretizou-se depois de não menos que vinte e dois mil anos. Como, então, pode duvidar que existam presságios que predizem algo, de mais de dois mil anos antes de realmente acontecer ? Pergunta: Por que os presságios profetizando a época após a morte do Buda Sakyamuni foram maiores do que os relativos à sua existência ? Resposta: A terra treme em resposta à agitação dos seis órgãos sensoriais das pessoas. Dependendo da extensão dessa agitação, os seis modos diferentes nos quais a terra estremece variarão em intensidade. Os ensinos pré-Sutra de Lótus parecem extinguir os desejos mundanos (associados aos seis órgãos sensitivos) das pessoas, mas na realidade não o fazem. Em contraste, o Sutra de Lótus subjuga a escuridão fundamental (da qual todos os desejos mundanos originam-se). Consequentemente, a terra sacode violentamente. Além disso, há muito mais pessoas más nessa era posterior do que durante a existência do Buda. Foi por esta razão que, para os Últimos Dias da Lei, 218

o Buda ocasionou o surgimento de presságios muito maiores do que os referentes à sua própria época. Pergunta: Que prova pode oferecer (de que o número de pessoas más é maior nos Últimos Dias)? Resposta: O sutra afirma: "Uma vez que o ódio e inveja com relação a este sutra abundam mesmo durante a existência do Buda, quão pior não serão no mundo após a sua morte?" Deixando de lado os sete reinados dos deuses celestiais e os cinco reinados dos deuses da terra, nos mais de dois mil anos dos noventa reinados de governantes humanos, o grande terremoto da era Shoka e o extraordinário fenômeno que surgiu no céu durante a era Bun’nei foram prodígios sem precedentes no Japão. Se as pessoas estiverem repletas de alegria, presságios auspiciosos aparecerão no céu, e o abalo causado pelo deus Taishaku balançará a terra. Por outro lado, se a mente delas estiver obcecada pelo mau, haverá mudanças no céu e calamidades terríveis na terra. A magnitude das ocorrências sinistras no céu variam conforme o grau da ira das pessoas; o mesmo vale para os desastres na terra. O Japão atual está repleto de pessoas, do governante aos cidadãos comuns, cujas mentes estão possuídas pelo mal. Esse mal nasce do ódio deles contra mim, Nitiren. Há um sutra intitulado Shugo Kokkai, uma escritura que veio depois do Sutra de Lótus. O mesmo relata que o rei Ajatashatru foi até o Buda e perguntou: "Todo ano, meu país foi assolado por secas, furacões violentos, enchentes, fome e peste. Além disso, fomos atacados por uma outra nação. Por que esses desastres haveriam de ocorrer, quando este é exatamente o país onde o Buda fez o seu advento ?". O Buda responde: "Esplêndido, esplêndido! É admirável de sua parte, ó grande rei, ter feito tal pergunta. Porém, o senhor cometeu muitos erros e males. Entre estes, matou o seu prório pai e, tomando Devadatta como seu mestre, feriu-me. Pelo fato de essas serem duas ofensas muito grave, o seu país é acossado por inumeráveis desastres". O sutra prossegue, citando as palavras do Buda: "Após a minha morte, nos Últimos Dias da Lei, quando monges como Devadatta preencherão a Terra, surgirá um único monge que abraça a Verdadeira Lei. Os monges maus o exilarão e condenarão à morte esse homem da Verdadeira Lei. Eles violarão não apenas a consorte do rei, mas também as filhas das pessoas comuns, cobrindo o país, deste modo, com a semente dos caluniadores. Por este motivo, a nação sofrerá várias calamidades e, posteriormente, será invadida por um país estrangeiro". Os seguidores da Nembutsu no mundo atual são exatamente como os monges maus mencionados no sutra acima. Além disso, a presunção dos mestres da Shingon ultrapassa a de Devadatta dez bilhões de vezes. Permita-me descrever brevemente a conduta esquisita da seita Shingon. Seus sacerdotes pintam uma imagem dos dez honoráveis 219

sentados no lótus de oito pétalas no centro do Mundo Útero. Então colocam-se sobre essa pintura e pisando os rostos dos Budas, realizam a sua cerimônia de unção. Isto é como se estivessem pisando em cima dos rostos dos seus próprios pais ou na cabeça do imperador deles. Sacerdotes como esses preenchem o país inteiro, tornando-se os mestres tanto dos da alta camada como da baixa. Não é de admirar que o país esteja face à ruína ! O que afirmei anteriormente é o mais importante de meus ensinos. Explicarei o assunto novamente numa outra ocasião. Escrevi-lhe um pouco a respeito disso antes, mas não fale aos outros indiscriminadamente. O senhor enviou-me expressões de sua sinceridade não somente uma vez ou duas, mas sempre que a oportunidade fez-se presente. Não consigo encontrar palavras (para expressar minha gratidão). Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta em Minobu, em 1275, quando estava com 54 anos de idade. Como a parte final está faltando, não se sabe com certeza o seu recebedor. Porém, considera-se de forma geral, que tenha sido endereçada a Shijo Kingo, um samurai e um dos mais leais seguidores de Nitiren Daishonin. Nessa época, Shijo Kingo estava enfrentando a oposição do seu lorde e colegas samurais por causa da fé. Em outubro de 1274, os mongóis haviam lançado um ataque maciço contra as ilhas do sul, Iki e Tsushima, e avançaram para Kyushu. As perdas japonesas foram vertiginosas. Entretanto, quando os exércitos mongóis retornaram aos seus navios de guerra à noite, surgiu uma tempestade inesperada e danificou fortemente a esquadra deles. No ano seguinte, contudo, Kublai Khan novamente mandou emissários, ameaçando uma nova invasão, caso o governo japonês não reconhecesse a lealdade ao Império Mongol. Durante este período, Nitiren Daishonin encontrava-se atarefado em Minobu escrevendo cartas, treinando os seus discípulos e oferecendo explanações sobre o Sutra de Lótus. ‘Os Presságios’ interpreta a ameaça mongol e outras calamidades recentes à luz de seu ensino. No início desta carta, Nitiren Daishonin discute os presságios que se manifestaram quando o Buda Sakyamuni expôs o Sutra de Lótus com referência ao princípio da unicidade da vida e seu ambiente (esho funi). Expandindo ainda mais esse princípio, ele explica que, quando os seis órgãos sensoriais ou faculdades de percepção das pessoas estão iludidas, mudança incomuns ocorrem no céu e na terra. Essa afirmação reflete a verdade de que embora a vida e seu ambiente sejam dois fenômenos independentes, fundamentalmente são unos e inseparáveis.

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Em seguida, Nitiren Daishonin esclarece que a pregação do Buda é sempre precedida de presságios, cuja magnitude mostra a profundidade do ensino a ser revelado. Deste modo, os prodígios que anunciaram o Sutra de Lótus foram maiores do que os que antecederam qualquer outro sutra. Além disso, os sinais que prenunciaram o ensino essencial (segunda metade) do Sutra de Lótus superam em muito os que introduziram o ensino teórico (primeira metade). Nitiren Daishonin cita a emergência da Torre de Tesouro e a aparição dos Bodhisattvas da Terra como presságios revelando a superioridade do ensino essencial em relação ao ensino teórico. Ademais, ele diz, os grandes portentos do capítulo Jinriki (vigésimoprimeiro) ultrapassam mesmo estes, e predizem que a Lei de Nammyoho-rengue-kyo, indicada nas profundezas do capítulo Juryo (décimo-sexto) irá propagar-se amplamente nos Últimos Dias da Lei, que se iniciaram dois mil anos após a morte do Buda Sakyamuni. Nitiren Daishonin, então, retorna às agitações e ocorrências estranhas no Japão durante a sua própria época. Todas estas, ele conclui, ocorrem porque as pessoas opõem-se ao devoto do Sutra de Lótus que propaga a essência do mesmo nos Últimos Dias da Lei. Especificamente, ele adverte que devido à calúnia perpretada pelos praticantes da Nembutsu e mestres da Shingon, o Japão seria destruído por um país estrangeiro. Como as pessoas estavam perseguindo Nitiren Daishonin, elas sofreriam grandes calamidades. Isto implica que ele não é ninguém senão o Buda dos Últimos Dias da Lei – que é ‘o mais importante de meus ensinos’ mencionado no último parágrafo.

Resposta ao Lorde Hakiri Saburo (Hakiri Saburo Dono Gohenji, págs.1369 a 1373) Em Kamakura há discípulos meus chamados Tikugo-bo, Ben Ajari e Daishin Ajari. Seria bom se os chamasse e, demonstrasse-lhes o devido respeito, e mantivesse debate com eles. Eu darei-lhe um esboço de meus importantes ensinos. Eles também estão bem familiarizados com a grande Lei que jamais foi propagada no Japão e, portanto, seria apropriado se o senhor estudasse sob a sua assistência. (Em sua carta, o senhor diz em essência:) "Logo que recebi sua carta, as dúvidas que eu nutria anteriormente foram removidas, assim como quando um vento forte sopra para longe as camadas de nuvens e a lua brilhante aparece à vista. Entretanto, para as pessoas da época presente, sejam elas de alta ou de baixa posição, essa sua doutrina é difícil de acreditar. A razão disso é que o Sutra de Lótus promete que aqueles que praticam a Lei do Buda ‘desfrutarão paz e segurança nesta vida e boas circunstâncias na próxima’. Se é assim, então por

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que o sacerdote Nitiren, embora se denomine um devoto do Sutra de Lótus, tem de se deparar com tantas dificuldades ? As pessoas estão dizendo que deve ser porque seus ensinos não estão de acordo com o desejo do Buda." Contudo, com relação a essas críticas infundadas (está claro que as dificuldades que encontro) devem-se ao meu carma de existências passadas. Não há razão para o senhor ficar subitamente surpreso apenas porque atraí a fúria das autorirdades governamentais. Como explicação, se examinar o texto do Sutra de Lótus, constatará que está declarado que nos Últimos Dias da Lei, quando uma pessoa praticar o Sutra de Lótus assim como este ensina, ela com certeza encontrará muitas dificuldades. Isso está nitidamente esclarecido no texto, e qualquer um que possua olhos precisa só olhar para ver o que está lá. Deste modo, por exemplo, o quarto volume do Sutra de Lótus diz: "Como o ódio e a inveja (com respeito a esse Sutra) são abundantes mesmo durante a existência do Buda, como serão piores então no mundo após a sua morte!" E o quinto volume afirma: "As pessoas então nutrirão rancor (contra o Sutra de Lótus) e o considerarão extremamente difícil de acreditar. Também diz: "Haverá muitas pessoas ignorantes que nos amaldiçoarão e falando mal de nós, e nos atacarão com espadas e bastões, e com pedras e telhas". E prossegue: "Haverá monges nessa era maléfica (com idéias perversas…). Ou existirão monges que viverão em retiro, nas florestas e usarão roupas de trapos remendados, eles pregarão o Darma para leigos vestidos em trajes brancos e serão respeitados e reverenciados pelo mundo como se fossem arhats que possuem os seis poderes sobrenaturais. …Eles circularão constantemente entre as pessoas, altos ministros, brâmanes e grandes patronos do budismo bem como a outros monges, caluniando e falando mal de nós…Demônios apossarse-ão de outros e, através deles, proferirão maldições e insultos e amontoarão humilhações sobre nós…seremos banidos por vezes repetidas". O Sutra Dainehan diz: "Icchantika, indivíduos de descrença incorrigível, fingem ser arhats, morando em lugares desertos e falando caluniosamente dos Sutras Mahayana. Quando as pessoas comuns vêem, supõem que sejam todos arhats verdadeiros, e referem-se a eles como grandes bodhisattvas". Também afirma: "Após os Primeiros Dias da Lei terem terminado e os Médios Dias da Lei terem começado, haverá monges que darão a impressão de obedecer às regras da disciplina monástica. Porém, eles mal lerão ou recitarão os sutras e, ao invés disso, aspirarão a todos os tipos de comida e bebida para alimentarem seus corpos. … Embora vistam os trajes de um monge, andarão em busca de donativos assim como um grande número de caçadores que comprimem seus olhos, dando passos leves. Eles serão como um gato à espreita de ratos."

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E o Sutra Hatsunaion declara: "Há também icchantika assemelham-se a arhats (mas que comete maus atos)."

que

Agora, quando ergo esse espelho brilhante (dos textos do sutra) e volto-o para o Japão, tudo está refletido lá sem a menor obscuridade. Quem são os monges que viverão em retiro nas florestas e usarão roupas de trapos remendados? "Quando as pessoas comuns vêem, supões que sejam todos arhats verdadeiros e referem-se a eles como grandes bodhisattvas"- a quem isso diz respeito? Quem são as pessoas que "dão a impressão de obedecer às regras da disciplina monástica, mas mal lêem ou recitam os sutras"? Conforme podemos compreender dessas passagens das escrituras, Sakyamuni, como seus olhos de Buda, observou a situação que predominaria no início dos Últimos Dias da Lei. Se, quando essas era tivesse chegado, não houvesse pessoas do tipo que o Buda descreveu, então, o Honrado do Mundo seria culpado de pronunciar palavras falsas e infundadas. (E, se fosse o caso, então) quem depositaria fé nos ensinos teóricos e essencial do Sutra de Lótus, e na doutrina da natureza de Buda eternamente inerente, que foi pregada no bosque das árvores shala ? E agora que eu, Nitiren, leio essas passagens do sutra com o propósito de provar a veracidade das palavras do Buda, aplicando-as a este país, o Japão (interpreta-as desta maneira). A passagem concernente a "monges que viverão em retiro nas florestas"refere-se a (os sacerdotes do) Kentyo-ji, Jufuku-ji, Gokuraku-ji, Kennin-ji, Tofuku-ji e outros templos das seitas Zen, Ritsu e Nembutsu no Japão. Esses templos atrozes surgiram no mundo para ocasionar a destruição dos templos do Monte Hiei e os outros templos da seita Hokke (Lótus) ou Tendai. Aqueles que "usarão roupas de trapos remendados" e "darão a impressão de obedecer às regras da disciplina monástica"são os atuais "observadores dos preceitos"com suas sobrepelizes feitas com cinco, sete ou nove cortes de tecido. Aqueles que são "respeitados e reverenciados pelo mundo"e "referem-se a eles como grande Bodhisattvas"são homens como Doryu, Ryokan e Shoiti. O "mundo"que os respeita corresponde ao soberano e aos homens de autoridade de nossa época presente. E "as pessoas ignorantes"e "pessoas comuns"(citadas nessas passagens das escrituras) são todas as pessoas do Japão, tanto de alta como de baixa posição. Eu, Nitiren, sou um mortal comum e, portanto, sou incapaz de ter fé no ensino do Buda. Porém, com relação ao que estou dizendo aqui, conheço a situação tão claramente como se conhece o fogo ou a água quando se toca a mão neles. Segundo a escritura, se um devoto do Sutra de Lótus aparecer, ele será amaldiçoado e insultado, atacado com espadas e bastões, e banido. Contudo, se se aplicar essa passagem do Sutra ao mundo de hoje, não 223

há uma única pessoa a quem se adeque. Quem, então, deve ser respeitado como o devoto do Sutra de Lótus? Será possível que os inimigos do Sutra de Lótus tenham feito aparição, mas que não haja ninguém que o defenda? Entretanto, será igual a dizer que há um leste, mas nenhum oeste, ou que o existe, mas a terra não. Se esse fosse o caso, as palavras do Buda passariam de mentiras, não é ?

sua isso céu não

Pode parecer auto-elogio de minha parte, mas tendo ponderado a respeito, darei crédito às palavras do Buda. Eu, o sacerdote Nitiren, sou o devoto citado na escritura. Além disso, o Buda, falando dos eventos de seu passado, diz no capítulo Fukyo (do Sutra de Lótus): "Naquele tempo, houve um bodhisattva chamado Jofukyo (Jamais Desprezar)…Eles o amaldiçoaram e insultaram…Algumas pessoas apedrejavam-no com varas e bastões, e o apedrejaram com pedras e telhas". Desta maneira, o Buda Sakyamuni mencionou sua própria prática no passado para encorajar e incentivar (o devoto do Sutra de Lótus) no início dos Últimos Dias da Lei. (No passado,) o Bodhisattva Jogyo foi açoitado com varas e bastões em prol do Sutra de Lótus, e pôde imediatamente alcançar o estágio supremo de myogaku. Agora eu, Nitiren, em prol do mesmo sutra, fui atacado nesta existência com espadas e bastões, e fui banido duas vezes para lugares distantes. Pode haver qualquer dúvida, portanto, de que no futuro atingirei o maravilhoso fruto do estado de Buda ? Após a morte do Tathagata Sakyamuni, as quatro categorias de santos apareceram nos Primeiros e Médios Dias da Lei e empenharam-se para propagar o Sutra de Lótus, mas mesmo naquele tempo encontraram numerosas dificuldades. Assim, entre os sucessores, na linguagem dos ensinos de Sakyamuni, o vigésimo, o Bodhisattva Aryadeva, foi assassinado, e o vigésimo-quinto, o venerável Aryasimha, foi decapitado. O oitavo sucessor, Buddhamitra, o e décimo-terceiro, o Bodhisattva Nagarjuna, carregaram, cada qual, uma bandeira vermelha e postaram-se diante da entrada do palácio do soberano (na esperança de atraírem sua atenção), o primeiro durante doze anos e o segundo durante sete anos. Chu Tao-sheng foi banido para uma montanha em Su-chou, o sacerdote Fa-tsu foi assassinado, o Mestre do Tripitaka, Fa-tao foi marcado na face, e o mestre do Darma Hui-yuang foi censurado e acusado. O Grande Mestre Tientai enfrentou em debate os líderes das dez escolas do norte e do sul da China, e o Grande Mestre Dengyo refutou as visões errôneas das seis seitas de Nara. Dependendo do fato de esses homens terem vivido no tempo de soberanos sábios ou tolos, suas idéias foram aceitas ou rejeitadas, mas 224

em nenhum dos casos eles foram desleais ao desejo do Buda. Mesmo durante os Primeiros e Médios Dias da Lei, eles encontraram tais dificuldades. É muito mais provável, então, que se encontre dificuldades nos Últimos Dias! Em prol do Sutra de Lótus, já invoquei sobre mim a ira das autoridades, mas considero isso como máxima boa sorte. É como trocar telhas e pedregulhos por ouro e prata. E, no entanto, não posso deixar de me afligir quando me lembro das palavras do Sutra Ninno: "Uma vez que os sábios tenham partido, então, os sete desastres com certeza aparecerão". Os sete desastres abrangem imensas secas e grandes insurreições militares. O Sutra Saishoo afirma: "Pelo fato de homens maus serem respeitados e homens bons serem submetidos à punição, as estrelas e constelações, juntamente com os ventos e chuvas, deixam, de se moverem em suas estações apropriadas". Agora, a quem se refere a expressão "homens maus (que) são respeitados e favorecidos"? Eles são homens como aqueles de quem falei anteriormente. E a quem se refere a frase "homens bons (que) são submetidos à punição"? É aquele que mencionei acima, o qual foi "banido por repetidas vezes". E a passagem sobre "estrelas e constelações" relaciona-se com as ocorrências estranhas e pressagiosas que aconteceram no céu e na terra durante cerca de vinte anos passados. Se essas passagens dos sutras são verdadeiras, então, o banimento de Nitiren é um agúrio que prediz a queda da nação. Mesmo antes de eu ter incorrido no desagrado das autoridades, previ que isso aconteceria e declarei a razão no Rissho Ankoku Ron. Quem pode duvidar que o que eu digo é verdade ? E é por isso que me aflijo. Agora já se passaram 2.222 anos desde o falecimento do Buda. Durantes os mil anos dos Primeiros Dias da Lei, Nagarjuna, Vasubandhu e outros atuaram como os emissários do Buda, propagando os seus ensinos. Contudo, eles disseminaram somente os dois ensinos – o Hinayana e o Mahayana provisório – e não difundiram os ensinos do Mahayana verdadeiro. Por volta de quinhentos anos após o início dos Médios Dias da Lei, o Grande Mestre Tientai surgiu na China para refutar as visões errôneas das escolas do norte e do sul e para estabelecer o ensino correto. Na área do estudo doutrinal, ele propôs a teorias dos cinco períodos, e no campo das práticas meditativas, expôs o conceito de itinen sanzen. Toda a China, em comum acordo, louvava-o como um sábio Pequeno Sakyamuni. E, no entanto (dos três tipos de conhecimento), ele propôs a meditação perfeita e a sabedoria perfeita, mas não propagou os preceitos perfeitos.

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Então, mil e oitocentos anos após a morte do Buda, o Grande Mestre Dengo fez o seu advento no Japão e refutou as visões errôneas que foram mantidas pelas seis seitas do budismo durantes os duzentos anos ou mais desde a época do Imperador Kimmei. Além disso, ele propôs os preceitos da iluminação perfeita e imediata, que Tientai não havia propagado. Esses são os grandes preceitos da iluminação perfeita e imediata ministradas na plataforma de ordenação no Monte Hiei. Contudo, nos mais de dois mil anos desde a morte do Buda, embora tenham sido construídos dezenas de milhares de templos nas terras da Índia, China e Japão, não houve nenhum templo ou pagode dedicado ao senhor do ensino essencial, nem houve ninguém que tenha propagado os cinco caracteres do Myoho-rengue-kyo, que foram confiados especificamente aos incontáveis bodhisattvas que emergiram da terra. Apesar de haver passagens documentais dizendo que devam ser propagados (no início dos Últimos Dias da Lei), ninguém os disseminou em toda a nação. Seria porque o tempo e a capacidade das pessoas ainda não eram oportunos ? O Buda, falando do futuro, disse: "No quinto meio milênio após a minha morte, declare e propague amplamente (o Sutra de Lótus) e jamais permita que o seu fluxo cesse". O Grande Mestre Tientai predisse: "No quinto meio milênio, o Caminho Místico propagar-se-á e beneficiará a humanidade pelo futuro distante". E o Grande Mestre Dengyo escreveu: "Os Primeiros e Médios dias da Lei estão quase encerrados, e os Últimos Dias da Lei estão próximos. Agora é exatamente a época em que o veículo único exposto no Sutra de Lótus mostrará como se adequa perfeitamente às capacidades de todas as pessoas". Todas essas passagens e seus comentários referem-se a eventos que irão ocorrer no início dos Últimos Dias da Lei. Ademais um brâmane da Índia certa vez disse: "Cem anos após eu morrer, o Buda aparecerá no mundo". E um erudito confucionista predisse: "Dentro de mil anos, o budismo será transmitido à China". Assim, até mesmo esses prognósticos de pessoas comuns estão de acordo com a verdade. Muito mais dignos de confiança, portanto, devem ser os pronunciamentos de pessoas como Dengyo e Tientai, para não dizer nada das predições das bocas douradas dos Budas Sakyamuni e Taho ! O senhor deve entender verdadeiramente que chegou o tempo para o senhor do ensino essencial realizar seu advento e para os cinco caracteres do Myoho-rengue-kyo, nunca antes propagados, difundiremse pelo mundo todo. Pode haver qualquer dúvida sobre isso ? Entretanto, há pessoas que ouviram repetidamente a respeito desses assuntos através do sacerdote Nitiren e, mesmo assim, agora que me deparei com essas grandes dificuldades, abandonaram a fé. O senhor, por outro lado, ouviu meus ensinos somente por uma ou duas horas 226

em apenas uma ou duas ocasiões. E, sei ainda que não abandonou sua fé, mas continua mantendo-se fiel a ela. O Grande Mestre Miao-lo escreveu: "Portanto, sabemos que se, nos últimos dias, uma pessoa pode ouvir sobre a Lei mesmo que brevemente, e se, tendo-a ouvido, desperta fé com relação a ela isso ocorre por causa das sementes plantadas numa existência anterior". E ele também diz: "Tendo nascido no final dos Médios Dias da Lei, pude observar essas palavras verdadeiras do sutra. A menos que se tenha plantado as sementes da auspiciosa causalidade em uma existência anterior, então, é realmente difícil encontrar tal oportunidade". O Sutra de Lótus declara: "Pessoas que, em existências passadas, fizeram oferecimentos a dez bilhões de Budas, renascerão no mundo dos seres humanos e abraçarão a fé neste Sutra de Lótus". E o Sutra do Nirvana afirma que as pessoas que ofertam donativos a budas tão numerosos quanto as areias dos rios Hiranyavati e Ganges renascerão numa era maléfica posterior e terão fé neste Sutra (de Lótus). O rei Ajatashatru foi um homem mau que matou seu pai e aprisionou sua mãe. No entanto, quando foi à assembléia onde o Buda estava pregando o Sutra do Nirvana e ouviu os ensinos do Sutra de Lótus, ele não apenas se recuperou das chagas que haviam irrompido (como resultado de seus maus atos) em sua existência presente, mas sua vida também foi prolongada por quarenta anos; e embora ele não possuísse originalmente as raízes da fé, no final alcançou o primeiro estágio de segurança, cumprindo a profecia de Sakyamuni de que ele atingiria o estado de Buda. Devadatta foi um homem de descrença incorrigível, o pior do mundo inteiro. Em todos os sutras anteriores pregados durante a existência do Buda, ele era repudiado como um caso sem esperança. Porém, com a pregação do Sutra de Lótus, foi predito que ele, no final, atingiria o estado de Buda e se tornar-se-ia conhecido como o Tathagata Rei Celestial. A julgar por esses exemplos, podemos concluir que para as pessoas más que vivem nos Últimos Dias, a consecução do estado de Buda não depende do fato de suas ofensas serem leves ou graves, mas unicamente se possuem ou não fé neste sutra. No seu caso, o senhor é membro de uma família guerreira, um homem mau que dia e noite está envolvido na tarefa de matar. Como o senhor não deixou o seu lar (para tornar-se um sacerdote) e continuou um guerreiro até o presente, através de que meios pode escapar dos três maus caminhos ? Deve pensar sobre isso muito cuidadosamente. O âmago do Sutra de Lótus é a revelação de que se pode atingir a iluminação suprema em seu estado presente, sem mudar sua condição original. Isso significa que, sem pôr de lado os seus impedimentos cármicos, pode-se ainda atingir o Caminho do Buda. Desse modo, 227

Tientai diz: "Os outros sutras predizem o estado de Buda para os bons, mas não para os maus…Somente este Sutra (Lótus) prediz o estado de Buda para todos". E Miao-lo afirma: "Somente no ensino perfeito a relação inversa e a relação positiva são, essencialmente, unas. Nos outros três tipos de ensinos, essas duas relações são inteiramente separadas". Talvez eu devesse aprofundar-me na questão da iluminação poder ser ou não atingida através dos vários sutras antes do Sutra de Lótus, mas esse é um assunto a ser discutido com alguém totalmente versado nos termos e categorias budistas. Todavia, há discípulos a quem ensinei os aspectos fundamentais com relação a esse ponto e, dessa maneira, o senhor deve convocá-los e ouvir a essência da questão através deles. Em outra ocasião eu lhe escreverei mais sobre o assunto. Com meu profundo respeito Nitiren Em 3 de agosto de 1273 END Vol. VI, pág.127 Fundo de Cena A perseguição de Tatsunokuti, em 12 de setembro de 1271, e o subsequente exílio na Ilha de Sado, foram as maiores provações de Nitiren Daishonin. Sua vida naquela ilha agreste foi de dificuldades contínuas: faltavam-lhe alimento e roupas adequadas, e a hostilidade dos sacerdotes da Nembutsu e seus seguidores impunham um perigo constante. Além de seus sofrimentos pessoais, Nitiren Daishonin estava preocupado pela notícia de que muitos de seus seguidores que viviam em Kamakura haviam começado a duvidar de seus ensinos após vê-lo perseguido, ele escreveu um grande número de cartas incentivando seus discípulos a perseverarem. Este Gosho em particular foi escrito em 3 de agosto de 1273, quando Nitiren Daishonin estava com 52 anos de idade, em resposta às dúvidas de Hakiri Sanenaga (ou do filho de Sanenaga, segundo outra fonte). Hakiri Sanenaga era o administrador da região de Minobu, na parte sul da província de Kai, a qual abrangia as três vilas de Hakiri, Mimaki e Iino. Ele também era chamado Hakiri Saburo de Hakiri Rokuro Sanenaga ou Nambu Rokuro Sanenaa. Anteriormente um crente da seita da Terra Pura, havia-se convertido através de Nikko Shonin, que posteriormente tornou-se o sucessor de Nitiren Daishonin. Quando Nitiren Daishonin decidiu deixar Kamakura, em 1274, Hakiri recebeu-o animadamente em Minobu. Após a morte de Nitiren Daishonin, ele serviu Nikko Shonin durante algum tempo. Porém, sob a influência de Niko, que era então instrutor-chefe dos sacerdotes e também uma pessoa extremamente indulgente, Hakiri, acabou desviando-se da 228

ortodoxia dos ensinos de Nitiren Daishonin. Ele mandou que se construísse uma imagem do Buda Sakyamuni, fez peregrinações a santuários xintoístas, erigiu um monumento Nembutsu em Fukushi, e doou um templo à seita da Terra Pura. Essas ações levaram Nikko Shonin a deixar Minobu, sentindo que ele não mais poderia proteger a pureza do ensino de Nitiren Daishonin naquele lugar. Na parte inicial deste Gosho, Nitiren Daishonin refere-se primeiro a uma questão levantada em uma carta interior de Hakiri: "…o Sutra de Lótus promete que aqueles que praticam a Lei do Buda ‘desfrutarão paz e segurança nesta vida e boas circunstâncias na próxima’. Se é assim, então por que o sacerdote Nitiren, embora se denomine um devoto do Sutra de Lótus, tem de se deparar com tantas dificuldades?" Hakiri não era, de modo algum, o único a nutrir essa dúvida; vários dos discípulos de Nitiren Daishonin haviam ficado bastante abalados pela Perseguição de Tatsunokuti e pelo exílio em Sado. Em resposta, Nitiren Daishonin cita passagens dos sutras de Lótus e do Nirvana, os quais predizem o quanto será difícil propagar a Lei Verdadeira, e oferece exemplos históricos de pessoas que se depararam com perseguições em prol do Budismo. O próprio Buda predisse que os devotos do Sutra de Lótus estão fadados a encontrar oposição e hostilidade; longe de serem motivos para dúvidas, as provações de Nitiren Daishonin servem para demonstrar que ele é, de fato, o devoto do Sutra de Lótus nos Últimos Dias da Lei. Contudo, Nitiren Daishonin prossegue, se as pessoas perseguirem o devoto do Sutra de Lótus, então vários desastres e calamidades acontecerão sem falta, conforme descrito nos sutras Ninno e Saisho. Neste sentido, seu banimento é um presságio da queda da nação, um desastre que ele havia predito anteriormente no Rissho Ankoku Ron (A Pacificação da Terra através do Estabelecimento do Verdadeiro Budismo). Ele, então, revê brevemente a sequência de propagação dos ensinos budistas nos Primeiros e Médios Dias da Lei, e declara que chegou a época para o Nam-myoho-rengue-kyo, a Lei suprema oculta nas profundezas do ensino essencial do Sutra de Lótus, propagar-se por todo o mundo. Finalmente, Nitiren Daishonin diz que a perseverança de Hakiri na fé indica que ele possui um laço profundo com o Budismo. Apesar de ser samurai e estar portanto envolvido com a tarefa de matar, ele pode seguramente atingir o estado de Buda atravé da fé na Lei Mística.

Uma Admoestação Contra o Apego ao Feudo (Shijo Kingo Dono Gohenji – págs.1163 a 1164)

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A sua carta, datada do dia vinte e cinco do mês passado, chegou na Hora do Galo (5:00-7:00) do dia vinte e sete do mesmo mês. Lendo a carta oficial de seu lorde (ordenando que o senhor se submetesse a um juramento escrito renunciando a sua fé no Sutra de Lótus) e a sua própria promessa de não escrever tal juramento, sinto que a sua determinação é algo tão raro quanto ver a planta udumbara florida é tão admirável quanto a fragrância do sândalo vermelho germinante. Shariputra, Maudgalyalyana e Mahakashyapa foram grandes arhats que conquistaram os três discernimentos e os seis poderes sobrenaturais. Além disso, eles foram bodhisattvas que, através de ouvir o Sutra de Lótus, atingiram o primeiro estágio de desenvolvimento e o primeiro estágio de segurança, alcançando a percepção do não-nascimento e não-extinção. Entretanto, até mesmo essas pessoas consideravam-se incapazes para suportar as grandes perseguições que acompanham a propagação do Sutra de Lótus no mundo saha durante os Últimos Dias da Lei, e recusaram-se a aceitar a tarefa. Como, então, poderia um mortal comum nos Últimos Dias da Lei, que ainda não erradicou as três categorias de ilusão, tornar-se um devoto deste sutra? Embora, eu, Nitiren, possa ter sido capaz de resistir a ataques de varas e bastões, telhas e pedras, a difamação e perseguição pelo soberano, como poderiam os praticantes leigos, que possuem esposas e filhos e são ignorantes do Budismo, fazer o mesmo ? Talvez teria sido melhor que eles nunca tivessem abraçado a fé no Sutra de Lótus em primeiro lugar. Se eles mostrarem-se incapazes de sustentar a fé até o fim, mantendo-a somente por um curto tempo, serão zombados pelos outros. Pensando deste modo, senti pena do senhor. No entanto, no decorrer das repetidas perseguições que sofri, bem como durante as duas sentenças de exílio a mim atribuídas, o senhor demonstrou resolução inabalável. Isto apenas já foi magnífico o bastante. Porém, agora, apesar das ameaças de seu lorde, o senhor escreveui um juramento de prosseguir com a sua fé no Sutra de Lótus mesmo ao custo de seus dois feudos. Não consigo encontrar palavras suficientes para louvá-lo. O Buda duvidou que até mesmo os Bodhisattvas Fuguen e Monju pudessem empreender a propagação do Sutra de Lótus na era posterior a ele. Portanto, confiou os cinco caracteres do Myoho-renguekyo a Jogyo e a outros líderes dos incontáveis Bodhisattvas da Terra. Agora, ponderando o significado desse acontecimento, pergunto-me se o Bodhisattva Jogyo poderia ter alojado-se em seu corpo com o intuito de auxiliar a mim, Nitiren. Ou, talvez, isto possa ser o desígnio benevolente do senhor Buda Sakyamuni. O fato de os subordinados de seu lorde (que ressentem-se do senhor) estarem tornando-se ainda mais presunçosos, certamente deve ser obra de Ryokan e Ryuzo. Se escrever um juramento descartando-se de sua fé, essa multidão não apenas se tornará mais arrogante do que 230

antes, mas com certeza, também mencionarão o fato a todos que encontrarem. Então, todos os meus discípulos em Kamakura serão acossados até não restar nenhum. Faz parte da natureza dos mortais comuns não saber o que os aguarda no futuro. Aqueles que têm boa ciência do assunto são chamados sumidades ou sábios. Omitindo exemplos do passado, citarei um do presente. O Lorde Hojo Yoshimasa renunciou aos seus dois domínios e tornou-se um sacerdote leigo. Soube que, no final, ele abandonou todas as suas muitas propriedades, deixou seus filhos e filhas e também sua esposa e isolou-se do mundo. O senhor não possui nem filhos nem irmãos com quem possa contar. Os seus dois feudos são tudo o que possui. Esta vida é como um sonho. A pessoa não sabe nem se estará viva amanhã. Mesmo que o senhor se torne o mais miserável dos mendigos, jamais desonre o Sutra de Lótus. Como de qualquer forma a vida é breve, o senhor não deve chorar por causa do seu destino. Como o senhor mesmo escreveu em sua carta, deve agir e falar sem o mínimo servilismo. Adulação ou lisonja somente lhe causarão maiores danos. Mesmo que os seus feudos sejam confiscados ou que o senhor próprio seja expulso, pense que isso se deva à ação das Dez Deusas, e confie-se a elas. Não tivesse eu, Nitiren, sido exilado e tivesse permanecido em Kamakura, certamente teria sido morto na batalha. De maneira análoga, como o fato de continuar a serviço de seu lorde poderia vir a ser prejudicial ao senhor, o Buda Sakyamuni pode muito bem ter projetado os acontecimentos (de forma que seja forçado a partir). Escrevi uma petição em seu favor. Há vários sacerdotes (que são meus discípulos em Kamakura), mas como eles são muito pouco confiáveis, estava pensando em enviar-lhe Sanmi-bo. Contudo, como ele ainda não se recuperou de sua doença, estou mandando-lhe este outro sacerdote no lugar dele. Peça a Daigaku Saburo, Taki no Taro ou ao Lorde Toki, que faça uma cópia esmerada da petição quanto tiver tempo, e apresente-a ao seu lorde. Se puder fazer isto, esse seu problema será resolvido. O senhor não precisa apressar-se muito. Ao invés disso, deve unir-se solidamente aos seus companheiros na fé. Quanto aos outros, deixe-os gritar contra o senhor o quanto quiserem. Então, se conseguir submeter a petição, a notícia sobre a mesma se espalhará por toda Kamakura e talvez alcance até o próprio regente. Isto significará o infortúnio transformando-se em boa sorte. Explanei-lhe os ensinos do Sutra de Lótus há algum tempo. Questões de consequências menores surgem do bem, mas uma questão de grande significado seguramente indica que a desgraça se transformará em imensa boa sorte. Se as pessoas lerem esta petição, os inimigos do Budismo serão revelados. O senhor tem apenas que afirmar de forma breve: "Não pretendo deixar o clã de meu lorde e devolver o meu feudo por espontânea vontade. Entretanto, se o meu lorde confiscá-lo,

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considerarei isto como um oferecimento ao Sutra de Lótus e um ensejo para alegrar-me". Diga isto num tom mordaz. O senhor não deve de modo algum portar-se de maneira servil em relação ao magistrado. Diga-lhe: "Este meu feudo não é algo que o meu lorde tenha concedido-me por qualquer motivo comum. Ele conferiu-o a mim porque salvei a sua vida com o remédio do Sutra de Lótus, quando ficou gravemente doente. Se ele tomá-lo de mim, a doença dele seguramente voltará. Nessa ocasião, mesmo que ele peça desculpas a mim, Yorimoto, não as aceitarei". Tendo feito uso de suas palavras, despeça-se de uma maneira abrupta. Sob nenhuma circunstância, não deve comparecer a quaisquer reuniões. Mantenha estrita guarda à noite. Tenha boas relações com os vigias noturnos e solicite o auxílio deles. O senhor deve estar sempre acompanhado deles. Se não for desapossado desta vez, as possibilidades são de nove contra uma de que os seus colegas samurais realizem um atentado contra a sua vida. Haja o que houver, não morra vergonhosamente. Nitiren, No sétimo mês do terceiro ano de Kenji (1277), no signo cíclico de hinoto-ushi Fundo de Cena Nitiren Daishonin escreveu esta carta no Monte Minobu, em julho de 1277, quando estava com 56 anos de idade, a Shijo Kingo, um de seus seguidores mais devotados, em Kamakura. O nome completo e título de Shijo Kingo eram Shijo Nakatsukasa Saburo Zaemon-no-jo Yorimoto, sendo Kingo um equivalente do título Saburo Zaemon-no-jo. Ele servia à família Ema, uma ramificação do clã dominante, Hojo, e era bem versado tanto na medicina como nas artes marciais. À medida qe os seguidores leigos de Nitiren Daishonin intensificavam suas atividades de propagação, passaram a encontrar várias dificuldades e perseguições. Por volta de 1274, após Nitiren Daishonin retornar do exílio à Ilha de Sado e retirar-se para o Monte Minobu, Shijo Kingo tentou apresentar os ensinos de Nitiren Daishonin ao seu lorde, Ema Tikatoki, um seguidor do sacerdote Ryokan do Templo Gokurakuji. O lorde Ema não acolheu cordialmente a crença de seu subordinado no Sutra de Lótus e atormentou-o de várias formas. Num certo momento, incitado pelos comentários caluniosos dos colegas samurais de Kingo, o Lorde Ema ameaçou reduzir o seu feudo e até mesmo transferí-lo à remota província de Etigo, caso ele não renunciasse a sua fé. Em junho de 1277, Shijo Kingo casualmente compareceu a um debate religioso em Kuwagayatsu, em Kamakura, no qual Sanmi-bo, um 232

discípulo de Nitiren Daishonin, derrotou o sacerdote Ryuzo-bo, um protegido de Ryokan. Os outros subordinados do Lorde Ema, invejosos de Kingo, viram no acontecimento uma oportunidade para prejudicá-lo e relataram mentirosamente que ele havia tumultuado forçosamente o debate. Isto despertou a ira do Lorde Ema e ele expressou a ameaça de confiscar o feudo de Kingo. Nessa conjuntura, Nitiren Daishonin escreveu uma petição ao Lorde Ema, em nome do samurai, e enviou-a a Kingo para ser submetida numa ocasião favorável. Esta foi a ‘Carta de Petição de Yorimoto’. Logo depois, o Lorde Ema ficou doente. Finalmente, ele não teve escolha senão pedir ajuda a Shijo Kingo. Ele recuperou-se com tratamento de Kingo, e depois disso, depositou renovada confiança nele. Posteriormente, Shijo Kingo, obteve dele uma propriedade três vezes maior do que a anterior. Quando Shijo Kingo recebeu uma carta oficial do Lorde Ema, após o Debate de Kuwagayatsu, ordenando-lhe que escrevesse um juramento desertando de sua fé no Sutra de Lótus, ele mandou a carta a Nitiren Daishonin em Minobu, juntamente com uma carta de sua autoria, na qual prometia jamais escrever tal juramento. O presente gosho, foi uma das respostas de Nitiren Daishonin. Embora breve, está repleta de orientações e incentivos para Shijo Kingo em meio às suas adversidades. No início desta carta, Nitiren Daishonin elogia a firme determinação de Shijo Kingo ao jurar dar prosseguimento à sua fé a despeito das ameaças do seu lorde. Afirmando: "Mesmo que o senhor se torne o mais miserável dos mendigos, jamais desonre o Sutra de Lótus" – ele define uma atitude básica na fé. Não obstante qual possa ser a posição social ou que adversidade possa encontrar, é de vital importância dar continuidade à fé, sem nunca perder a integridade como um devoto do Sutra de Lótus.

Resposta a Kyo’o (Kyo’o dono Gohenji) END, vol I, págs. 275 e 276

Justamente quando estava esperando ouvir suas notícias novamente, chegou o mensageiro que o senhor se preocupou em me enviar. Recebi também a dádiva em dinheiro que em minhas presentes circunstâncias é muito mais valiosa do que qualquer tesouro a ser encontrado na terra ou no mar. Desde que ouvi do senhor a respeito de Kyo’o Gozen, tenho estado orando por ela aos deuses do sol e lua em todos os momentos do dia e

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da noite. O Gohonzon que enviei há algum tempo deve ser conservado sem tirar do corpo mesmo por um instante sequer. Este Gohonzon nunca foi concedido, muito menos inscrito, por alguém nos Primeiros ou Médios Dias da Lei. Diz-se que o leão, rei dos animais, avança três passos, e então recua um para saltar, desprendendo a mesma força quando apanha uma diminuta formiga ou ataca ferozes animais. Ao inscrever este Gohonzon para a sua proteção, Nitiren é igual ao rei leão. É isto o que o sutra quer dizer por “a força de um leão no ataque”. Creia neste Gohonzon com todo o seu coração. O Nammyoho-rengue-kyo é como um rugido de um leão. Que doença pode portanto ser um obstáculo? Está escrito no sutra que os que abraçam o Daimoku do Sutra de Lótus serão protegidos pela Kishimojin e suas dez filhas. Eles desfrutarão da felicidade como Aizen e da boa sorte como Bishamon. Onde quer que sua filha possa brincar, nenhum mal poderá acontecer, será livre do medo tal como o rei leão. Isto significa que entre as dez filhas de Kishimojin, a proteção de Kodainyo é a mais profunda. Mas tudo depende de sua fé. Uma espada será inútil nas mãos de um covarde. A poderosa espada do Sutra de Lótus deve ser manejada por alguém corajosa na fé. Então será tão forte quanto um demônio armado com um cajado de ferro. Eu, Nitiren, inscrevi minha vida em “sumi”, assim, creia no Gohonzon com todo o seu coração. O coração do Buda é o Sutra de Lótus, mas a vida de Nitiren não é nenhuma outra senão o Nam-myoho-rengue-kyo. Miao-lo afirma em suas interpretações: “A revelação da iluminação original do Buda é o coração do sutra.” Os infortúnios de Kyo’o Gozen serão mudados em boa sorte. Reuna a sua fé e ore a este Gohonzon. Então, o que é que não pode ser alcançado? Deve crer que acontecerá tal como o Sutra de Lótus diz: “Os desejos das pessoas se realizam como a água fria e límpida de um tanque sacia a sede das pessoas”. E diz ainda: “Eles terão paz e segurança nesta existência e nascerão em boas circunstâncias na próxima.” Quando for perdoado do exílio nesta província, apressar-meei a Kamakura onde nos encontraremos. Se uma pessoa considera a força do Sutra de Lótus, encontrará juventude perpétua e vida eterna diante de seus olhos. Minha única preocupação é que ela possa morrer jovem; portanto, estou orando com todas as minhas forças aos deuses para protegê-la. Eduque-a para ser como a Dama Jotoku ou a filha do Rei Dragão. Nam-myoho-rengue-kyo, Nam-myoho-rengue-kyo. Respeitosamente, Nitiren Em 15 de agosto de 1273

Fundo de Cena END, Vol. I, págs. 277 e 278

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A carta foi datada em 15 de agosto de 1273, quando Nitiren Daishonin estava exilado na Ilha de Sado. As perseguições assolaram-no por toda a sua vida após declarar o Verdadeiro Budismo em 1253. O período do exílio a Sado foi a mais dura das perseguições. Surpreendentemente, contudo, foi mais prolífico durante esse período que durou de outubro de 1271 a fevereiro de 1274. Em 1272 trabalhou na “Herança da Lei Última da Vida” e “A Abertura dos Olhos”. Em 1273, escreveu “o Verdadeiro Objeto de Adoração” em abril, e “A Verdadeira Entidade da Vida” em maio. Escreveu muitas outras cartas e tratados importantes durante o exílio até o seu perdão em 1274. No mesmo ano em que retornou a Kamakura e retirou-se aos pés do Monte Minobu, tal como ele havia predito em 1260 em sua obra “Pacificação da Terra pela Propagação do Verdadeiro Budismo”. Esta tese tinha precipitado todas as suas perseguições. Julgando do seu conteúdo, Kyo’o, a recebedora desta carta, parece ter sido uma filha de Shijo Kingo. Em setembro do ano precedente, Daishonin enviou uma carta aos Shijo que em parte diz: “Como tiveram Kyo’o Goze, agora têm uma filha fervorosa que será uma herdeira da sua herança nesta vida ...” Parece, portanto, que Kyo’o estava aproximadamente com um ano de idade ao tempo desta segunda carta. Nesta luz, podemos presumir que a carta foi dirigida a Shijo Kingo e sua esposa, Nitiguennyo, embora fosse endereçada à sua filha. Em maio daquele ano, Shijo Kingo visitou seu mestre na Ilha de Sado. Assim, o desejo de Nitiren Daishonin em ouvir sobre Shijo Kingo, que expressou no começo desta carta, implica que não houve comunicação desde maio. Shijo Kingo foi um homem de forte fé que viveu em Kamakura. Desde o início da Perseguição de Tatsunokuti defendeu Nitiren Daishonin com o espírito de mártir, dizendo que estava desejando morrer se o seu mestre fosse executado. Nitiren Daishonin elogiou sua fé e entesourouo. Como tinha habilidade médica, algumas vezes prescreveu remédios a Nitiren Daishonin quando este declinou em saúde nos seus últimos anos. Kingo era também muito emotivo e sincero. Por outro lado, era tão franco que algumas vezes lhe era difícil dar-se bem com outras pessoas em seu redor. Até se pôs em perigo quando seus colegas atentaram contra a sua vida, mas levou avante uma forte e sincera fé por toda a sua vida e permaneceu como um modelo de crente. Kishimojin e suas dez filhas: Representam o Estado de Fome. Demônios femininos que aparecem no Capítulo Darani (26º) do Sutra de Lótus. Diz-se que Kishimojin tinha dez filhas (Jurassetsunyo) e as alimentavam com os bebês de outras. Ela, portanto, simboliza o egoísmo de uma mãe que faz de tudo para seus filhos, mesmo ao sacrifício dos filhos de outros. Na cerimônia do Sutra de Lótus, contudo, ela, juntamente com suas filhas, juraram proteger os devotos do Sutra de Lótus. Sua mudança de atitude indica que devida a influência iluminante da Lei Mística, todas as pessoas podem mostrar suas qualidades mais favoráveis em seu único modo. (END, vol. I pág. 329) 235

Fudo e Aizen: Fudo tinha-se encarnado em um escravo, a fim de servir a todos os seres, e tinha jurado destruir todo o mal no mundo. Aizen é o deus que preside sobre os erros, em outras palavras representa os desejos mundanos. Aizen também significa o princípio budista de que os desejos mundanos pode ser mudados em iluminação, enquanto Fudo indica o princípio de que os sofrimentos da vida e morte podem ser transformados em iluniação. (END, vol. I pág. 328) Bishamon: Bishamon é um dos Quatro Reis Celestes ou lordes dos quatro céus, que pressumidamente viveram no meio das quatro encostas do Monte Sumeru. Bishamon tem como função ouvir os sutras e proteger o lugar onde é praticado. No 26º Capítulo (Darani) do Sutra de Lótus, os Quatro Reis Celeste juram proteger aqueles que abraçam o Sutra de Lótus. (END, vol. I pág. 314) Miao-lo: (711 – 782) 9º sucessor da Seita Tendai na China. Ele é considerado o restaurador das seitas e elaborou profundos comentários sobre os trabalhos de Tientai. (END, vol. I pág. 315)

A Origem de Urabon (Shijo Kingo Dono Gosho – págs. 1111 a 1112) Recebi um to de arroz polido branco como a neve , um recipiente de bambu de óleo denso como saquê envelhecido e um oferecimento monetário de um kan, que o senhor preocupou-se em enviar-me pelo mensageiro como uma doação pela cerimônia de Urabon. Fiquei profundamente comovido pelo conteúdo de sua carta. A cerimônia de Urabon tem sua origem na época em que o Venerável Maudgalyalyana salvou sua mãe, Shodai-nyo, que devido à punição cármica pela sua ganância e mesquinhez, havia caído no mundo da Fome por um período de quinhentas existências. Contudo, ele não conseguia habilitá-la a tornar-se Buda. Isto porque ele próprio ainda não era devoto do Sutra de Lótus e, deste modo, não podia ajudar sua mãe a atingir o Estado de Buda. Posteriormente, na assembléia de oito anos no Pico da Águia, ele tornou-se um Buda chamado Tamalapattra, Fragrância de Sândalo, através de abraçar o Sutra de Lótus e recitar Nam-myoho-rengue-kyo. Naquela ocasião, sua mãe tornou-se Buda também. O senhor também perguntou-me a respeito de oferecer alimento aos espíritos famintos. O terceiro volume do Sutra de Lótus diz: “É como se alguém viesse de uma terra esfomeada e, subitamente, encontrasse um banquete de um grande rei”. Esta passagem indica que os quatro grandes homens da Erudição, pessoas de capacidade intermediária, jamais haviam ouvido falar da mais fina iguaria chamada ghee até o Sutra de Lótus ter sido exposto. Então, pela primeira vez eles

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saborearam ghee para alegria de seus corações, findando rapidamente. Deste modo, a fome insaciada de muito tempo em seus corações. Portanto, quando fizer oferecimentos de alimentos aos espírito famintos, deve recitar a passagem acima do sutra e orar Nammyoho-rengue-kyo pelo repouso destes. Os espíritos famintos são geralmente divididos em trinta e seis tipos. Um deles, os espírito famintos com formato de caldeirão, não possuem olhos nem boca. A razão disto é que, enquanto encontravam-se neste mundo, eles atacaram as pessoas, encobertos pela noite, ou cometeram roubos. Os espíritos famintos comedores de vômito alimentam-se da comida que as pessoas expelem. A causa do estado deles é a mesma dos espíritos famintos com forma de caldeirão. E é também por terem roubado o alimento das pessoas. Os espíritos famintos possuidores de propriedades são ávidos o bastante pra tentarem extrair água até mesmo dos cascos dos cavalos. Enquanto vivos, eles tinham ciúmes de suas propriedades e ocultavam seu alimento. Os espíritos famintos não possuidores de propriedades referem-se àqueles que nunca ouviram falar de alimento ou bebida desde o seu nascimento. Os espíritos famintos devoradores da Lei renunciam ao mundo para propagar o Budismo somente porque pensam que, se pregarem a Lei, as pessoas os respeitarão. Buscando a fama e fortuna mundanas, gastam toda sua presente existência tentando superar os outros em tudo. Ele não ajudam as pessoas nem tentam salvá-las, nem mesmo os seus próprios pais. Tais indivíduos são denominados espíritos famintos devoradores da Lei, ou aqueles que usam a Lei para satisfazerem seus desejos. Quando observamos os sacerdotes de nosso tempo, alguns deles secretamente recebem oferecimentos somente para si. O Sutra Nirvana denomina tais homens de sacerdotes com coração de cão. Em sua próxima existência eles se tornarão demônios com cabeça de boi. Outros recebem oferecimentos abertamente, mas, por serem mesquinhos, não os dividem com os outros. Em sua próxima existência, eles nascerão como demônios com cabeça de cavalo. Alguns praticantes leigos não oram pelo repouso de seus pais, que caíram no mundo do Inferno, Fome ou Animalidade e que estão sofrendo agonias excruciantes. Eles próprios vestem-se e alimentam-se luxuosamente, possuindo em abundância bois, cavalos e servos e divertem-se à vontade. Como os seus pais devem invejá-los e ressentir-se por eles ! Mesmo os sacerdotes, com a excessão de pouquíssimos, negligenciam a oração pelo descanso de seus pais e mestres nos aniversários da morte deles. Com certeza, os deuses do sol e da lua no céu e as divindades na terra devem estar furiosos e indignados com eles, condenando-os como maus filhos. Embora tais ingratos possuam forma humana, não são 237

melhores do que os animais. Eles deviam ser chamados bestas com cabeça humana. Eu, Nitiren, estou convencido de que, através de erradicar os impedimentos cármicos de espécie descrita acima, estarei apto a dirigir-me à terra pura do Pico da Águia no futuro. Portanto, embora várias perseguições graves possam cair sobre mim como chuva ou elevar-se como nuvens, por encontrá-las em prol do Sutra de Lótus, meus sofrimentos não se parecem em nada com sofrimentos. Aqueles que se tornaram discípulos e seguidores desta pessoa, Nitiren, são devotos do Sutra de Lótus. Especialmente a finada Myoho, cujo aniversário de falecimento incide no décimo-segundo dia do mês, não era senão uma devota do Sutra de Lótus e uma seguidora de Nitiren. Como poderia ela possivelmente ter caído no mundo da Fome ? Sem dúvida alguma ela encontra-se agora na presença de Sakyamuni, Taho e de todos os Budas das dez direções. Eles próprios devem estar dizendo: “Então esta é a mãe de Shijo Kingo!”, e com assentimento unânime, acariciam-lhe a cabeça e elogiam-na veementemente. De parte dela, deve estar contando ao Buda Sakyamuni que esplêndido filho ela tem. O Sutra de Lótus diz: “Se houver homens ou mulheres de devota fé, que, ouvindo o capítulo Devadatta do Sutra de Lótus, com o coração puro acreditam e reverenciam-no, não nutrindo nenhuma dúvida ou incertezas, eles não cairão no mundo do Inferno, Fome ou Animalidade, e renascerão na presença de todos os Budas ds dez direções. Eles escutarão constantemente este sutra, onde quer que possam nascer. Se renasceram no mundo da Tranquilidade ou Alegria, desfrutarão de felicidade suprema. Se estiverem na presença do Buda, irão renascer pela transformação de um flor de lótus. Observe a frase “mulheres de devota fé”. Se isto não se refere à falecida Myoho, então, a quem se referiria ? O sutra também afirma: “É difícil sustentar a fé neste sutra. Aquele que o abraça mesmo por um curto período alegrará a mim (Sakyamuni) e a todos os outros Budas. Uma pessoa como esta será louvada por todos os Budas”. Não obstante o quanto eu, Nitiren, possa exaltar a sua mãe, não será o bastante. Porém, o sutra declara que ela será ‘elogiada por todos os Budas’. Quão reconfortante ! Com esta convicção, deve aprofundar a sua fé ainda mais. Nam-myoho-renguekyo, nam-myoho-rengue-kyo.

Com meu profundo respeito,

Nitiren

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Décimo-segundo dia do sétimo mês

Fundo de Cena

A escritura “A Origem de Urabon” foi escrita a Shijo Kingo em julho de 1271. Shijo Kingo havia enviado vários oferecimentos a Nitiren Daishonin como uma doação por um serviço memorial a ser realizado para sua mãe, que havia falecido há alguns anos no dia 12 de julho. Em resposta, Daishonin escreveu esta carta a Shijo Kingo, na qual ele ensina que somente o ato de recitar Nam-myoho-rengue-kyo beneficia fundamentalmente os falecidos. A primeira parte, de onde deriva-se o nome desta escritura, discute a origem da cerimônia de Urabon. Daishonin afirma que esta iniciou com o discípulo de Sakyamuni, Maudgalyayana, que salvou a sua falecida mãe dos sofrimentos do mundo da Fome. Esta tradição era amplamente aceita na época de Daishonin. Entretanto, ele interpreta-a na perspectiva do Sutra de Lótus e do Daimoku de Nam-myoho-renguekyo, que é a essência do sutra. Ele salienta que, apesar de Maudgalyayana ter sido capaz de aliviar o sofrimento de sua mãe, não conseguiu conduzí-la a atingir o estado de Buda até que ele ouvisse o Sutra de Lótus no Pico da Águia, abraçasse-o e recitasse o Nam-myohorengue-kyo, atingindo, assim, a iluminação. Nessa ocasião, sua falecida mãe pode atingir o estado de Buda também De acordo com a crença popular, os espíritos daqueles que haviam sido avaros ou egoístas enquanto vivos sofriam de fome. Nitiren Daishonin, subsequentemente, discorre sobre vários tipos de espíritos famintos descritos nos textos budistas e esclarece as causas passadas, ou maus atos que eles cometeram nas existências anteriores, que os levaram a nascer desta forma. Nessa parte, ele também expõe os verdadeiros motivos de muitos sacerdotes de sua época, referindo-se a eles como ‘espíritos famintos devoradores da Lei’, que usam os ensinos budistas como um meio para obter fama e riqueza pessoal. Embora finjam ter um sincero desejo de propagar os ensinos budistas, em seus corações são gananciosos e escondem os oferecimentos recebidos dos outros, guardando-os para si. Nitiren Daishonin também censura aqueles budistas, sejam do clero ou leigos, que negigenciam a realização dos serviços memoriais pelo repouso de seus falecidos pais ou mestres. Finalmente, Nitiren Daishonin encoraja Shijo Kingo dizendo que, uma vez que a finada mãe de Kingo havia sido uma devota praticante, ela 239

não poderia estar sofrendo no mundo da Fome. Mais provavelmente, os Budas deveriam estar louvando-a calorosamente no Pico da Águia por causa da devoção de seu filho ao Sutra de Lótus. Deste modo, ele incentiva Kingo a aprofundar ainda mais a sua fé.

Wu-Lung e I-Lung (Ueno Ama Gozen Gohenji – páginas 1580 a 1582) Recebi uma fardo de arroz polido e um outro de taros lavados e, em gratidão, recitei Nam-myoho-rengue-kyo. O Myoho-rengue-kyo é como o lótus. O maha-mandara no céu e a flor da cerejeira no mundo humano são flores celebradas, mas o Buda não escolheu nenhuma delas para comparar ao Sutra de Lótus. De todas as flores, ele escolheu a flor de lótus para simbolizar o Sutra de Lótus. Há uma razão para isso. Algumas plantas dão primeiramente as flores, e depois as sementes, enquanto que outras as sementes vêm antes das flores. Algumas dão apenas uma flor e muitas sementes, outras dão muitas flores mas só uma semente, e ainda outras dão sementes e não flores. Assim, existem muitas variedades de plantas, mas o lótus é a única que dá flores e sementes simultaneamente. Os benefícios que todos os outros sutras não são definidos, porque eles ensinam que é primeiramente preciso fazer boas causas e somente então tornar-se Buda, numa época posterior. O Sutra de Lótus é inteiramente diferente. A mão que o acolher atingirá imediatamente a iluminação, e a boca que o recitar entrará imediatamente no estado de Buda, assim como a lua reflete-se na água no instante em que aparece atrás das montanhas do leste, ou como o som e o eco aparecem simultaneamente. É por este motivo que o sutra afirma: “Entre os que ouvem esta Lei, não há ninguém que não atingirá o Estado de Buda”. Essa passagem afirma que se existem cem ou mil pessoas que abraçam este sutra, sem uma única exceção todas as cem ou mil tornar-se-ão Budas. Em sua carta, a senhora afirma: “Estou fazendo estas doações para comemorar o aniversário do falecimento do meu pai, lorde Matsuno Rokuro-zaemon. Como ele deixou muitos filhos, cerimônias serão feitas em sua memória de muitas diferentes maneiras. Eu acredito, entretanto, que essas cerimônias serão caluniosas a menos que rigorosamente baseadas no Sutra de Lótus”. O

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ensino dourado do Buda Sakyamuni diz: “O Honrado-pelo-Mundo há tempo expôs suas doutrinas e deve agora revelar a verdade”. O Buda Taho deu testemunho dizendo: “Todos os ensinos do Myoho-renguekyo são verdadeiros”. E todos os Budas das dez direções deram crédito à verdade do sutra, estendendo suas línguas até o céu Brahma. O sudoeste do Japão, além do oceano, há um país chamado China. Naquele país, algumas pessoas acreditam no Buda mas não em deuses, enquanto que outras fazem exatamente o contrário. Talvez um situação semelhante tenha existido nos dias primitivos em nosso próprio país. Seja como for, certa vez, houve um calígrafo na China chamado Wu-lung. Em sua arte, ele não tinha rival em todo o país, tal como Dofu ou Kozei no Japão. Ele odiava o Budismo e jurou que jamais iria transcrever escrituras budistas. Quando o seu fim se aproximou, ele caiu seriamente doente. No seu leito de morte, expressou seus últimos desejos ao seu filho, dizendo: “Você é meu filho. Não somente herdou a minha habilidade, como escreve com melhor mão que eu próprio. Não importando que má influência possa agir sobre você, não deverá copiar o Sutra de Lótus”. E então o sangue jorrou como fonte, dos seus cinco órgãos dos sentidos. Sua língua partiu-se em oito partes e o corpo desintegrou-se em dez direções. Mas os seus parentes, ignorando os três maus caminhos, não compreenderam que isso era sinal de que ele cairia no estado de Inferno. O nome do filho era I-Lung. Ele também mostrou ser o melhor calígrafo da China. Obediente ao desejo do seu pai, ele jurou que jamais transcreveria o Sutra de Lótus. O rei, na época, tinha como nome Tsuma. Ele acreditava no Budismo e tinha especialmente o Sutra de Lótus em alta consideração. Ele queria ter esse sutra transcrito por um excelente calígrafo – que não fosse outro senão o melhor do país – para ter assim uma cópia para si mesmo. Assim, convocou I-Lung. Este explicou que o desejo do seu pai o proibia, e rogou ao rei que o dispensasse da tarefa. Não desejando obrigá-lo a desobedecer o desejo do pai, o rei chamou um outro calígrafo para transcrever o sutra. O resultado, entretanto, estava longe de satisfatório. O rei mandou novamente chamar I-Lung e disse-lhe: “Como o senhor afirma que o desejo do seu pai lhe proíbe, nós não o compelimos a transcrever o sutra. Nós insistimos, entretanto, que obedeça pelo menos a nossa ordem de escrever os títulos dos oitos volumes. I-Lung suplicou repetidamente para ser dispensado. O rei, agora furioso, disse: “O senhor continua insistindo no desejo do seu pai, mas ele foi tão súdito nosso quanto o senhor é. Caso recuse escrever os títulos temendo faltar para com o amor filial, nós o acusaremos de desobediência a decreto real”. Dessa maneira, o rei repetiu a rigorosa ordem. I-Lung, embora não desejando contrariar o pai, compreendeu que não podia mais desobedecer a ordem real, e então escreveu os títulos (dos oitos volumes) do Sutra de Lótus, e entregou seu trabalho ao rei.

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Voltando para casa, I-Lung visitou o túmulo do seu pai e, derramando lágrimas, relatou: “O rei ordenou-me tão rigorosamente que eu, contra a minha vontade, escrevi os títulos (dos oito volumes) do Sutra de Lótus”. Na sua tristeza não podia fugir à culpa de ser mau filho, e ficou junto ao túmulo durante três dias, jejuando até a beira da morte. Na hora do Tigre no terceiro dia, ele estava quase morto e sentiu como se estivesse sonhando. Ele olhou para o céu e viu um ser celeste que parecia exatamente igual a Taishaku numa pintura. Sua multidão de seguidores enchia o céu e a terra. I-Lung perguntou-lhe que era. O ser celeste respondeu: “Não me reconhece ? Eu sou seu pai, Wu-lung. Enquanto estive no mundo humano, aderi às escrituras não budistas e mantive inimizade com o Budismo, particularmente com o Sutra de Lótus. Por essa razão, caí no inferno dos incessantes sofrimentos. “Todos os dias a minha língua era arrancada várias centenas de vezes. Ora estava morto, ora estava vivo. Vivi chorando em agonia, alternadamente olhando para o céu e atirando-me ao solo, mas não havia ninguém que ouvisse os meus gritos. Queria comunicar ao mundo humano a minha angústia, mas não havia como fazê-lo. Sempre que você insistia em cumprir o meu desejo, suas palavras se transformavam ora em chamas para atormentar-me, ora em espadas que choviam do céu sobre mim. Seu procedimento foi extremamente impróprio de filho. Entretanto, como estava agindo para cumprir o meu desejo, não pude odiá-lo pois eu estava apenas recebendo a retribuição do carma do meu próprio ato. “Enquanto pensava desse modo, apareceu repentinamente um Buda dourado no inferno dos incessantes sofrimentos, e declarou: “Mesmo que o universo esteja repleto de pessoas que tenham destruído suas boas causas, se elas ouvirem o Sutra de Lótus mesmo uma só vez, jamais deixarão de atingir a Iluminação”. Quando esse Buda entrou no inferno dos incessantes sofrimentos, foi como se tivesse havia um dilúvio num grande incêndio. Quando meus sofrimentos diminuíram um pouco, juntei as palmas das mãos e perguntei-lhe que Buda ele era. O Buda respondeu: “Eu sou o caráter myo, um dos sessenta e quatro caracteres dos títulos do Sutra de Lótus que o seu filho, I-Lung, está agora escrevendo”. Como oito caracteres constituem o título de cada um dos oitos volumes, um total de sessenta e quatro Budas apareceram e brilharam como muitas luas no plenilúnio, e a extrema escuridão do inferno dos incessantes sofrimentos transformou-se instantaneamente num fulgor ofuscante. Além disso, de acordo como o princípio de que todo lugar está, sem que se alterem as suas características, e é em si a terra do Buda, o inferno dos incessantes sofrimentos tornou-se imediatamente a capital da eterna terra do Buda. Eu e todos os outros ocupantes transformamo-nos em Budas sentados em flores de lótus, e acabamos de ascender ao palácio interno do céu Tushita. Estou relatando-lhe isso em primeira mão”. I-Lung disse: “Foi a minha mão que escreveu os títulos. Como poderia o senhor ter sido salvo? Além disso, eu não os escrevi com fé (no Sutra 242

de Lótus). Como seria possível isso tê-lo salvo?” Seu pai respondeu: “Como é tolo! Sua mão é a minha mão, e seu corpo é meu corpo. Seu ato de escrever caracteres é equivalente a eu fazê-lo. Embora você não tivesse verdadeira fé, não obstante escreveu os títulos com sua mão. Portanto, eu fui salvo. Imagine uma criança que ponha fogo em algo e, sem a mínima intenção de fazê-lo, provoca um incêndio. O mesmo acontece com o Sutra de Lótus. Se alguém professa a fé nele, mesmo involuntariamente, jamais deixará de tornar-se Buda. Entretanto, como estamos na classe leiga, estamos em melhor posição para nos arrependermos das palavras caluniosas passadas não importando quão graves elas tenham sido. I-Lung relatou tudo isto ao rei. O rei disse: “Nosso desejo foi respondido com esplêndidos resultados”. Desde então, I-Lung desfrutou cada vez mais do favor real, e todo o povo do país passou a crer no Sutra de Lótus. O falecido Goro e o falecido lorde Matsuno foram, respectivamente, seu filho e seu pai. A senhora é a filha do lorde. Portanto, acredito que ele deve estar neste momento no palácio interno do céu Tushita. Permita que Hoki-bo lhe explique esta carta. Como escrevi apressadamente, foi impossível dar detalhes.

Com meu profundo respeito, Nitiren, Em 15 de novembro de 1281.

Fundo de Cena

Nitiren Daishonin escreveu esta carta em 15 de novembro de 1281 a Ueno-Ama Gozen, mãe de Nanjo Tokimitsu, que doou parte de suas terras para Nikko Shonin fundar o templo principal Taisekiji. Daishonin contava sessenta anos de idade quando enviou esta carta em resposta aos oferecimentos que Ueno-Ama Gozen havia feito para honrar a morte de seu pai, lorde Matsuno Rokurozaemon. Nesta carta, Nitiren Daishonin faz a comparação da Lei Mística ou Myoho-rengue-kyo com o lótus e, contando uma antiga história chinesa de dois mestres calígrafos, ensina-lhe a importância de manter a fé na Lei Mística para continuar a fidelidade ao seu falecido pai. Primeiramente, Nitiren Daishonin explica a superioridade do Sutra de Lótus sobre todas as outras escrituras, em termos da sua revelação da simultaneidade da causa e do efeito, para atingir o Estado de Buda. E 243

então, citando a história dos renomados calígrafos da antiga China, Wu-lung e I-Lung, que eram respectivamente pai e filho, Nitiren Daishonin lhe assegura que quando o filho abraça a fé no Sutra de Lótus, o pai pode atingir a iluminação. Na história que ele conta, o calígrafo Wu-lung caiu no inferno devido ao seu ódio ao Sutra de Lótus, mas como seu filho I-Lung transcreveu o título do Sutra, o pai salvou-se dos sofrimentos do inferno. Ueno-ama Gozen teve como marido Nanjo Hyoe-Shitiro, que servia o clã governante Hojo. Ele era o chefe da vila de Ueno, nas vastas encostas do monte Fuji, na área vizinha ao atual templo Taisekiji. Assim, ele era geralmente chamado lorde Ueno. Afirma-se que o casal converteu-se à fé nos ensinos de Daishonin, enquanto servia o governo de Kamakura. O terceiro Sumo-prelado Nitimoku Shonin foi neto de Ueno-ama Gozen. Quando seu marido faleceu, em 1265, Nanjo Tokimitsu tinha apenas sete anos de idade, mas ela o educou admiravelmente, e ele sucedeu o pai como lorde local. A forte e pura fé de Tokimitsu, ao que se acredita, desenvolveu-se a partir da fé inabalável da mãe que lhe permitiu superar muitas dificuldades. Admite-se que ela tenha vivido mais que Nitiren Daishonin, mas não se conhece a data exata do seu falecimento.

Carta a Nakaoki Nyudo (Nakaoki Nyudo Shosoku, pág. 1331-1335) Recebi um kan de moedas que me enviou e relatei respeitosamente o fato na presença do Myoho-rengue-kyo. O país, Japão, localiza-se em Jambudvipa, ao sul do Monte Sumeru. Jambudvipa mede sete mil yojana tanto em comprimento como em largura. Em Jambudvipa há oitenta e quatro mil países, isto é, as cinco regiões da Índia, dezesseis reinos maiores, quinhentos reinos intermediários, e dez mil reinos menores, bem como incontáveis países menores, como grãos de painço espalhados, e ilhas como partículas de poeira. Todas essas terras encontram-se no grande oceano, como folhas caídas flutuando lá e cá num lago. O nosso país, Japão, é uma pequena ilha neste oceano. Foi, outrora, tão pequeno que desaparecia de vista quando a maré subia – tornando-se visível somente quando a maré baixava – até as duas divindades aumentarem até o seu atual tamanho. Seu primeiro soberano humano foi um grande imperador chamado Jimmu. Por aproximadamente trinta reinados após o dele, nem um Buda, nem sutras, nem sacerdotes existiram neste país, apenas pessoas comuns e deuses. Como não havia budismo algum, as pessoas não conheciam o inferno nem aspiravam à terra pura. Mesmo

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quando a morte as separavam de seus pais ou irmãos, elas não tinham idéia de o que acontecia com os falecidos. Eles devem ter considerado a morte algo comparável ao desvanecer do orvalho ou ao pôr-do-sol e da lua. Então, durante o reinado do trigésimo imperador, o grande governador Kinmei, o rei Songmyong de Paekche, um Estado a noroeste do Japão, enviou a este país uma imagem de bronze dourada do Buda Sakyamuni, uma série de sutras expostos pelo Buda, e vários sacerdotes para lê-los para o povo. Contudo, o Buda era uma estátua e não uma pessoa viva, e os sutras não possuíam semelhança nenhuma com as escritas. Os sacerdotes falavam, mas ninguém conseguia entender o que eles pregavam. Além disso, a aparência deles não era nem de homem nem de mulher. Por todos esses motivos, as pessoas ficaram desconfiadas e desanimadas. Os ministros da esquerda e da direita reuniram-se na presença do imperador e discutiram o assunto de vários ângulos. Prevaleceu a opinião de que o budismo não deveria ser adotado. Deste modo, a estátua do Buda foi rejeitada e os sacerdotes presos. Então, no décimo quinto dia do segundo mês do segundo ano do reinado do imperador Bidatsu, o príncipe Shotoku, filho do Imperador Yomei, voltou-se ao leste e recitou “Namu Buda Sakyamuni”, e com isso as relíquias do Buda materializaram-se em sua mão. No sexto ano do reinado do imperador Bidatsu, o princípe leu e recitou o Sutra de Lótus. Desde então, mais de sete séculos decorreram e mais de sessenta imperadores reinaram, e o budismo gradualmente propagouse por todo o Japão. Entre as sessenta e seis províncias e as duas ilhas, não há lugar algum onde este não tenha alcançado. Em cada província, cada distrito e cada cidade, vila e aldeia, recintos, pagodes e templos budistas foram construídos, e o budismo agora habita em 171.037 lugares. Homens de sabedoria tão brilhantes como o sol e a lua disseminaram o budismo geração após geração, e homens dignos que reluzem como as miríades de estrelas preenchem cada província. Em benefício de si mesmo, eles praticam a Shingon, os sutras Hannya e o Sutra Ninno, ou recitam o nome do Buda Amida, ou crêem em Kannon, Jizo, ou os mil budas, ou lêem e recitam o Sutra de Lótus. Porém, quando incentivam a prática de sacerdotes ignorantes e leigos, eles meramente dizem: “recite apenas o ‘Namu Amida Butsu”. Suponha que uma mulher tenha um bebê. Se a criança cair numa vala ou num rio, ou estiver sozinha, ela gritará ‘mamãe!’. Ouvindo isto, a mãe irá deixar tudo de lado e vir ao seu auxílio. O mesmo se mantém com relação ao Buda Amida. Nós somos as crianças e ele é a nossa mãe. Desta forma, se cair no abismo do Inferno ou no fosso da Fome, simplesmente recite ‘Namu Amida Butsu’, e ele jamais deixará de vir salvá-lo – assim como um eco segue um som”. É isso que todos esses homens de sabedoria têm dito sempre. Portanto, o nosso país, Japão, vem há muito seguindo o costume de recitar essa frase.

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Agora, eu, Nitiren, não sou um morador da capital, o centro do país, nem filho de um general nas fronteiras. Sou meramente filho de um cidadão do povo e venho de uma província remota. Entretanto, recito Nam-myoho-rengue-kyo, que nem uma única pessoa no Japão jamais recitou durante os mais de setecentos anos passados. Além disso, declarei que recitar o nome do Buda Amida como as pessoas o fazem, reverenciando-o como o fariam a seus pais, ao sol e à lua, ou aos seus lordes, sentindo-se como se tivesse achado um navio para realizar uma travessia ou encontrado água quando estivessem com sede, ou alimento quando com fome, gera o carma que os levará a cair no inferno de incessante sofrimento. Eles ficaram, portanto, tão chocados e rancorosos como pedras tivessem sido cozidas com a sua comida, como se o cavalo deles tivesse tropeçado e saído em disparada, como se um tufão tivesse começando a soprar enquanto eles tivessem atravessando as águas de um rio ou lago, como se um grande incêndio tivesse irrompido numa área povoada, como se tivessem repentinamente sido atacados por um inimigo,ou como se uma prostituta tivesse se tornado uma imperatriz. Contudo, durante vinte e sete anos, de 28 de abril de 1253, até agora – novembro de 1279, não recuei nenhuma vez e continuei a declarar cada vez mais energicamente – assim como a lua cresce ou a maré sobe. Inicialmente, quando eu, Nitiren, sozinho recitava o Daimoku, aqueles que me viam, encontravam, ou me escutavam tapavam seus ouvidos, fitavam-se com olhos furiosos, contorciam suas bocas, cerravam os punhos e rangiam os dentes. Até os meus pais, irmãos, mestres e amigos tornaram-se meus inimigos. Então, o administrador e o senhor feudal de onde eu morava voltou-se contra mim. Posteriormente, a província inteira estava em tumulto, e, no final, o povo todo ficou alarmado. Nesse interim, algumas pessoas começaram a recitar Nam-myoho-rengue-kyo ou para me imitar ou para zombar de mim, ou aparentemente por fé, ou aparentemente para me depreciar. Agora, um décimo das pessoas no Japão recita somente o Nam-myohorengue-kyo. Os nove décimos restantes são aqueles que recitam tanto o Daimoku com o nome do Buda Amida, os que hesitam entre os dois, e aqueles que recitam apenas a Nembutsu. As pessoas deste último grupo insultam-me como se eu fosse um inimigo de seus pais ou de seus lordes, ou um opositor declarado de uma existência passada. Os líderes da vila, distrito e províncias me odeiam como se eu fosse um traidor. Como continuei a proclamar meus ensinos dessa forma, fui sucessivamente expulso de um lugar para outro, forçado a ficar mudando por todo o Japão, como um tronco à deriva no mar à mercê dos ventos, ou como uma minúscula pluma que flutua no ar e, então, paira, ora subindo, ora descendo. Algumas vezes, fui açoitado, preso, ferido, ou exilado para lugares longíquos. Outras vezes, meus discípulos foram mortos ou eu próprio fui banido. Então, em 12 de setembro de 1271, incorri a fúria do governo e fui subsequentemente exilado para a ilha província de Sado ao norte. 246

Embora eu nunca tenha violado as leis seculares, nem mesmo ao mínimo, as autoridades me acusaram, dizendo: “Esse sacerdote chegou ao ponto de declarar que os falecidos sacerdotes leigos Saimyoji e Gokurakuji caíram no inferno. Ele é pior do que um traídor”. Eles estavam para me decapitar num local chamado Tatsunokuti, em Kamakura, na província de Sagami, mas então, aparentemente reconsideraram, pensando: “É verdade o crime dele é deveras horrendo, mas ele é, no entanto, um devoto do Sutra de Lótus. Se o matarmos irrefletidamente, não se sabe que desastre poderá ocorrer. Por outro lado, se o deixarmos numa ilha remota, ele certamente perecerá de uma causa ou outra. Ele não é odiado somente pelo soberano, mas o povo todo o considera um inimigo de seu pais. Ele provavelmente será assassinado ou morrerá de fome a caminho de Sado ou após ter chegado àquela província”. Assim, ele decidiram livrar-se de mim desta maneira. No entanto, possivelmente graças à proteção do Sutra de Lótus e das Dez Deusas, ou talvez pelo fato de o Céu ter percebido a minha inocência, embora muitos dos ilhéus me odiassem, houve um homem idoso chamado Nakoki no Jiro Nyudo (que agiu como amigo). A sabedoria dele era tão avançada quanto a sua idade, e ele desfrutava de uma saúde robusta e tinha a estima das pessoas locais. Provavelmente pelo fato desse homem venerável ter dito a respeito: “Esse sacerdote não pode ser uma pessoa comum”, os filhos dele não se ressentiam fortemente a mim. Como a maioria das pessoas estavam a serviço dos subordinados da família Nakaoki, eles também não fizeram nenhuma tentativa de me causar dano por conta de sua própria autoridade e obedeceram cuidadosamente as instruções do governo. Mesmo que a água possa estar enlameada, ela se tornará clara novamente. Mesmo que a lua possa estar escondida atrás das nuvens, ela seguramente reaparecerá. De modo semelhante, cedo ou tarde, minha inocência ficará nítida, e minhas predições mostrarão não ter sido em vão. Talvez por causa disso, embora os membros da família Hojo e os influentes lordes tenham insistido que eu não fosse perdoado, fui, no final, desobrigado de minha sentença de exílio por decisão exclusiva do regente Hojo Tokimune e voltei a Kamakura. Eu, Nitiren, sou o súdito mais leal do Japão. Não creio que jamais tenha havido, nem jamais haverá , alguém que possa igualar-se a mim neste aspecto. A razão pela qual digo isso é a seguinte. Quando o grande terremoto sucedeu durante a era Shoka (1257-1259) e o imenso cometa apareceu no primeiro ano de Bun’ei (1264), um grande número de homens sábios, tantos budistas como não-budistas, realizaram divinações, mas não conseguiram determinar as causas destes desastres, nem predizer o que estava para acontecer. Quanto a mim, Nitiren, isolei-me numa biblioteca de escrituras e, após ponderar os textos, concluí que, pelo fato de as pessoas reverenciarem os sacerdotes dos ensinos Mahayana provisório e Hinayana, tais como a 247

Shingon, Zen, Nembutsu e Ritsu, e darem pouca importância ao Sutra de Lótus, Bonten e Taishaku repreenderiam-nas ordenando um país do oeste a atacar o Japão. Submeti uma advertência escrita nesse sentido ao falecido sacerdote leigo Saimyoji. As pessoas de todas as religiões zombaram dela e rejeitaram-na, mas nove anos mais tarde, no quinto ano de Bun’ei (1268), chegou uma declaração oficial do grande Império Mongol anunciando sua intenção de atacar o Japão. Como a minha predição havia concretizado-se, os crentes Nembutsu, os mestres da Shingon, e outros ressentiram-se de mim e tramaram contra a minha vida. Apresentando uma analogia, na China, entre as concubinas do imperador Hsuang-tsung, havia uma linda mulher conhecida como a Dama do Palácio Shang-yang. Ela era a beleza máxima do império. A consorte do imperador, Yang Kuei-fei, olhava para ela e pensava: “Se for permitido a ela servir próxima do imperador, com certeza ela roubará sua predileção por mim”. Assim ela forjou um édito imperial e mandou banir ou executar os pais e irmãos da dama. A própria dama foi presa e torturada por não menos que quarenta anos. O meu próprio caso é semelhante a esse. “Se as advertências de Nitiren tornarem-se amplamente conhecidas, o governo terá de pedir a ele que ore pela derrota do grande Império Mongol. E, se o Japão de fato for vitorioso, ele se tornará o principal sacerdote nesse país. Nós, por outro lado, perderemos a nossa influência e prestígio”. Pensando assim, talvez, os sacerdotes das outras seitas levantaram falsas acusações contra mim. Inconsciente dos motivos deles, o regente acreditou em suas palavras e agora está para levar a nação à ruína. De maneira análoga, o segundo imperador da dinastia Ch’in da China, instigado pela língua caluniosa de Chao Kao, mandou executar Li Ssu, e posteriormente ele próprio pereceu nas mãos de Chao Kao. E, o imperador Daigo do Japão, induzido pelas palavras caluniosas do ministro da esquerda, Fujiwara no Tokihira, baniu o ministro do direita. Depois disso, o imperador caiu no inferno. O atual regente é exatamente como esses dois imperadores. Ele acredita nas palavras dos mestres Shingon, na seita Zen, nos sacerdotes Ritsu, aqueles que observam os preceitos, e nos sacerdotes Nembutsu, todos ele inimigos do Sutra de Lótus, e trata a mim, Nitiren, com animosidade. Embora, eu seja de origem humilde, abraço o Sutra de Lótus, que Sakyamuni, Taho, todos os Budas das dez direções, Bonten, Taishaku, os deuses do sol e da lua, os Quatro Reis Celestiais, as divindades dragões, Tensho Daijin, e o Bodhisattva Hatiman protegem e consideram precioso, assim como as pessoas valorizam e não desejam desfazer-se de seus olhos, como os deuses celestiais veneram Taishaku, ou como uma mãe ama seu filho. Portanto, todos esses budas e deuses punirão aqueles que perseguirem o devoto do

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Sutra de Lótus, ainda mais severamente do que alguém açoitaria um inimigo de seus pais ou do que o governo puniria rebeldes. Agora, vocês dois são o filho e a nora do falecido Jiro Nyudo. Talvez seja porque vocês são o filho e a nora de um homem tão profundamente sábio, que, seguindo os passos dele, não somente acreditam no Sutra de Lótus, que o próprio soberano do país rejeita, mas também suprem as necessidades do devoto do Sutra de Lótus, trazendo-me, a cada ano, oferecimento e viajando mil ri para visitarme. Além disso, no décimo-terceiro aniversário da morte de sua pequena filha, vocês erigiram um sotoba de quase cinco metros de altura com os sete caracteres do Nam-myoho-rengue-kyo, inscritos nele. Afirma-se que, quando o vento norte sopra, os peixes do mar do sul que são tocados por ele são libertados de seus sofrimentos; e quando o vento vem do leste, os pássaros e gansos nas montanhas do oeste que entram em contato com o mesmo escapam do caminho da Animalidade e nascem na corte interna do Céu Tushita. Quão maiores ainda serão os benefícios daqueles seres humanos que se alegram com esse sotoba, tocam-no com suas mãos, ou fitam-no com esses olhos ! Creio que, como resultado do benefício consequente de terem erigido esse sotoba, os seus falecidos pais devem estar iluminando a terra pura tão brilhantemente como o céu e a lua no céu. Ademais, vocês próprios, o filho querido deles e a sua esposa, bem com os filhos de vocês, viverão até completarem cento e vinte anos. E depois de morrerem, estarão com os seus pais na terra pura do Pico da Águia. Devem considerar isso tão certo quanto o fato de a lua refletir-se na água clara, ou de um tambor produzir som quando batido. Caso ergam quaisquer sotoba no futuro, assegurem-se que tenham o Daimoku do Sutra de Lótus inscrito neles também.

Escrito no Monte Minobu Nitiren, Em 30 de novembro de 1279. À esposa de Nakaoki Nyudo.

Fundo de Cena

No dia 30 de novembro de 1279, um mês após ter inscrito o DaiGohonzon, Nitiren Daishonin escreveu esta carta a Nakaoki Nyudo e sua esposa, praticantes que viviam em Nakaoki, na Ilha de Sado. Embora o título deste Gosho seja Carta a Nakaoki Nyudo, o seu pós 249

escrito menciona especificamente a esposa de Nakaoki. Aparentemente, Nitiren Daishonin escreveu-a para ambos quando Nakaoki veio visitá-lo no Monte Minobu. O pai de Nakaoki Nyudo, Nakaoki Jiro Nyudo, já tinha falecido quando esta carta foi escrita. Ele, por muitos anos desfrutou a confiança das pessoas locais em Sado, mas apesar de sua posição na comunidade e sua própria fé de longa data na Nembutsu, ele aparentemente abraçou os ensinos de Nitiren Daishonin quando se encontraram durante o exílio de Daishonin. Mais tarde, Nakaoki Nyudo também se tornou seguidor de Nitiren Daishonin juntamente com a sua esposa. Após Nitiren Daishonin ter sido perdoado e ter ido morar em Minobu, Nakaoki Nyudo repetidamente realizou a viagem de Sado até lá para visitá-lo e levar-lhe oferecimentos. No início desta carta, Nitiren Daishonin descreve que o budismo foi introduzido ela primeira vez no Japão, e como ensinos errôneos como os da Nembutsu e os da Shingon disseminaram-se por todo o país. Por apontar os erros das várias seitas, Nitiren Daishonin enfrentou repetidas perseguições, que culminaram na tentativa fracassada de decapitá-lo em Tatsunokuti e seu subsequente exílio à Ilha de Sado. Contudo, prossegue, somente ele esclarece a causa subjacente dos recentes desastres que atingiram a nação, recomendando às pessoas a abandonarem os ensinos errôneos e, no lugar disso, recitarem o Daimoku do Sutra de Lótus. Portanto, ele é o ‘súdito mais leal em todo o Japão’. Embora as pessoas possam desprezá-lo e as autoridades perseguirem-no, como ele abraça o Sutra de Lótus, que todos os Budas estimam, ele tem certeza de que será protegido pelos deuses budistas. Em conclusão, Nitiren Daishonin louva a fé dos Nakaoki em apoiar o devoto do Sutra de Lótus e assegura-os dos grandes benefícios nesta vida e na próxima.

Repreendendo Erradicando

a

Calúnia

à

Lei e Pecados

(Kashaku Hobo Metsuzai Sho, págs.1125 a 1132) Li sua carta cuidadosamente. No passado também, quando fui exilado na província de Izu por causa do Sutra de Lótus, realmente alegrei-me, embora suponha que quando diga isso as pessoas pensem que não esteja sendo modesto. Se, desde o passado sem começo, eu tivesse alguma vez sido acusado por causa do Sutra de Lótus, e se eu fosse ou não sinceramente devotado a ele, teria então nascido nesta existência como um mero mortal comum ? (Portanto, quando fui condenado ao exílio) apesar de 250

ter-me sentido abatido por um instante, ao ver que isso era em prol do Sutra de Lótus fiquei também muito contente, pois pensei que poderia desse modo erradicar até certo grau os pecados de minhas existências passadas. Contudo, as várias ofensas graves representadas pelos dez atos maléficos, as quatro ofensas maiores, as seis ofensas maiores, as oito ofensas maiores, as dez ofensas maiores, os cinco pecados que condenam ao inferno de incessante sofrimento, a calúnia à Verdadeira Lei e o pecado da descrença incorrigível, acumulados desde o passado sem começo, devem ser muito maiores do que montanhas enormes e mais profundos do que o grande mar. Em se tratando dos cinco pecados capitais, o cometimento de mesmo um deles condenará a pessoa ao inferno de incessante sofrimento pelo espaço de um kalpa inteiro. Um kalpa é a extensão de tempo que se gasta para o período de duração da vida dos seres humanos descrever de oitenta mil para dez mil, diminuindo a um razão de um ano a cada cem, para então aumentar novamente até atingir oitenta mil anos na mesma proporção. Aquele que mata seus pais cairá no inferno de incessante sofrimento e padecerá suas dores terríveis sem um momento de descanso durante esse período de tempo. Quanto à pessoa que calunia o Sutra de Lótus, apesar de na realidade não ser sincera, se manifestar um aspecto de animosidade ou se fizer pouco caso não do sutra em si, mas daqueles que agem em nome deste, cairá no inferno de incessante sofrimento por incontáveis kalpas do tipo descrito acima. As pessoas que atormentaram e bateram no bodhisattva Fukyo comportaram-se a princípio com essa hostilidade, embora mais tarde tenham abraçado a fé e se tornado seguidoras do Sutra de Lótus, admirando Fukyo e tratando-o com grande respeito, prestando-lhe honras iguais às que as divindades celestiais ofereciam a Taishaku, e reverenciando-o como o fazemos ao sol e à lua. Contudo, não conseguiram extinguir a grande ofensa da primeira calúnia, de modo que foram condenadas ao inferno Aviti por mil kalpas, e durante vinte bilhões de kalpas foram abandonadas pelos três tesouros. Se se comparar (a retribuição) aos cinco pecados capitais e a calúnia à Lei com uma doença, então os cinco pecados capitais seriam como a insolação, que ataca subitamente. A calúnia à Lei, por outro lado, é como a lepra, que não parece tão grave no começo, mas pouco a pouco torna-se, de fato, séria. As pessoas que cometem a calúnia à Lei, renascem, em sua maioria, no inferno de incessante sofrimento ou, em alguns casos, nos seis caminhos inferiores. Se renascerem no mundo dos seres humanos, então, diz o sutra, sofrerão por causa da pobreza, de baixa posição social, de lepra, e etc. Quando eu, Nitiren, ergo o claro espelho do Sutra de Lótus diante de minha própria pessoa, tudo é limpidamente revelado, e não pode haver dúvida alguma de que, em minhas existências prévias, fui culpado de 251

caluniar a Lei. Se em minha presente existência eu não eliminar essa ofensa, então como posso escapar das dores do inferno no futuro ? Como poderia juntar as graves ofensas que acumulei era após era desde o remoto passado distante e erradicá-las todas em minhas existência presente, para que possa ser poupado de grandes dores no futuro ? Quando ponderei sobre esta questão, ocorreu-me que agora, na época presente (dos Últimos Dias da Lei), caluniadores da Lei preencherão todas as províncias da nação. E o que é pior, o soberano da nação é ele próprio o principal perpetrador dessa calúnia. Se num tempo assim, eu não eliminar esses pesados pecados, então quando poderei fazê-lo ? Ora, se eu, Nitiren, pessoa insignificante que sou, andasse de um lado para outro por todo o Japão denunciando esses caluniadores, então inumeráveis pessoas das quatro categorias de budistas que seguem doutrinas errôneas juntariam num instante suas imensuráveis vozes para insultarem-me. Nessa ocasião, o soberano da nação, aliando-se aos monges que caluniam a Lei, passaria a me odiar e tentaria me decapitar ou ordenaria o meu exílio. E se esse tipo de acontecimento viesse a ocorrer repetidas vezes, então, as ofensas graves que acumulei ao longo de incontáveis kalpas poderiam ser extirpadas no espaço de uma simples existência. Esse, então, foi o grande plano que concebi; e agora ele está prosseguindo sem o menor desvio. Dessa forma, quando me vejo, portanto, sentenciado ao exílio, só posso sentir que meus desejos estão sendo realizados. No entanto, sendo um mero mortal comum, algumas vezes inclinei-me a arrepender-me de ter iniciado esse caminho. E se até mesmo eu sou assaltado por esses sentimentos, então isso deve ser ainda mais verdadeiro no caso de uma mulher como a sua, que desconhece totalmente as circunstâncias que cercam o assunto ! Pessoas como o senhor e ela não compreendem plenamente os ensinos budistas, e me aflige pensar o quanto devem ter se arrependido por terem um dia escolhido seguir Nitiren. E, contudo, ao contrário do que se poderia esperar, sobue que vocês dois estão ainda mais firmes e dedicados em sua fé do que eu próprio, o que não é, de maneira alguma, um fato comum ! Imagino se o próprio Sakyamuni, o senhor dos ensinos, não teria penentrado em seus corações, e isto me emociona a ponto de eu mal conseguir conter minhas lágrimas. O Grande Mestre Miao-lo diz em seu comentário (Hokke Mongu Ki, sete): “Portanto, sabemos que se nos últimos dias uma pessoa conseguir ouvir a Lei ainda que brevemente e se, ao ouví-la, despertar fé nessa Lei, isso acontecerá por causa das sementes plantadas em uma existência anterior”. E ele também diz (Makashikan Bugyoden Guketsu, dois): “Tendo nascido no final dos Médios Dias da Lei, pude observar essas verdadeiras palavras do sutra. A menos que se tenha plantado as sementes da causalidade em uma existência anterior, então é realmente difícil encontrar essa oportunidade”. 252

Durante os primeiros quarenta anos ou mais de sua vida de ensinamento, Sakyamuni manteve secretos os cinco caracteres do Myoho-rengue-kyo. Não apenas isso, também permaneceu silencioso com relação a eles quando pregou os primeiros catorze capítulos do Sutra de Lótus, os quais compreendem o ensino teórico. Foi somente no capítulo Juryo que ele falou abertamente sobre os dois caracteres rengue, que (representam os cinco caracteres Myoho-rengue-kyo) e indicam o Verdadeiro Efeito e a Verdadeira Causa. O Buda não confiou esses cinco caracteres a Monju, Fuguen, Miroku, Yakuo e os outros de seu grupo. Ao invés disso, convocou os bodhisattvas Jogyo, Muhenyo, Jyogyo e Anryugyo e seus seguidores da Grande Terra da Luz Tranquila e transferiu-lhe os cinco caracteres. O que sucedeu então não foi nenhuma cerimônia comum. O Tathagatta Taho, que vive no mundo da Pureza do Tesouro, fez sua aparição, sentado em uma torre que emergiu da terra e era adornada com sete tipos de gemas. O Buda Sakyamuni purificou quatrocentos bilhões de mundos nayuta além deste grande sistema de mundos, plantou neles fileiras de árvores preciosas de quinhentos yojana de altura com a distância entre si de uma flechada, colocou um trono de leão de cinco yojana de altura debaixo de cada árvore preciosa, e assentou nesses tronos todos os budas das dez direções, que eram suas emanações. Depois disso, o buda Sakyamuni removeu seu manto empoeirado, abriu a Torre de Tesouro, e sentou-se ao lado do Tathagatta Taho. Foi como se o Sol e Lua surgissem lado a lado no céu azul, ou como se Taishaku e o Rei Nascido da Coroa da Cabeça se sentassem juntos no Salão da Lei Benéfica. Monju e os outros bodhisattvas deste mundo, bem como Kannon e os bodhisattvas dos outros mundos, reuniram-se no espaço aberto por todas as dez direções como muitas estrelas que preenchem o céu. Nessa oportunidade, estavam reunidos nesse lugar os grandes bodhisattvas como Sabedoria do Dharma, Floresta de Méritos, Bandeira de Diamante, Repositório de Diamante e outros, em número igual ao das partículas de poeira dos mundos das dez direções, que se reuniram nos sete locais e oito assembléias do Sutra Kegon e eram discípulos do Buda Vairochona, que se senta sobre o pedestal de lótus dos mundos das dez direções. Budas e bodhisattvas que haviam se congregado como nuvens na Grande Câmara do Tesouro quando os sutras Hodo foram pregados: “Subhuti, Taishaku e os mil budas que haviam se reunido para ouvir os sutras Hannya; os quatro budas e quatro bodhisattvas, pertencentes aos nove honrados sobre os lótus de oito pétalas, que aparecem no Sutra Dainiti; os trinta e sete honrados do Sutra Kongotyo; e os budas e bodhisattvas dos mundos das dez direções que se juntaram na cidade de Kushinagara para ouvir o Sutra do Nirvana. Todas essas figuras foram reconhecidas por Monju, Miroku e os outros de seu grupo, que conversaram com eles, de modo que parecia que os grandes bodhisattvas Monju e Miroku estavam bastante acostumados a sua presença. 253

Porém, após aqueles quatro bodhisattvas que emergiram da terra terem feito seu advento, o bodhisattva Monjushiri, cujo ensino o buda Sakyamuni foi o nono a herdar, e que é a mãe dos budas das três existências, bem como o Bodhisattva Miroku, que sucederá o buda Sakyamuni após o seu próximo renascimento – quanto estes dois, Monju e Miroku, ficaram ao lado desses quatro bodhisattvas, pareciam não ter qualquer importância. Eram como humildes lenhadores mesclando-se à companhia de nobres senhores, ou como macacos e chimpanzés sentando-se ao lado de leões. Sakyamuni convocou os quatro bodhisattvas e confiou-lhes os cinco caracteres do Myoho-rengue-kyo. E essa transmissão também não foi nenhum fato comum, pois o Buda primeiro manifestou dez poderes místicos. Quando Sakyamuni estendeu sua longa e ampla língua para cima até o limite do mundo da forma, todos os outros budas fizeram o mesmo, de modo que suas línguas estenderam-se no ar acima dos quatro bilhões de mundos nayuta assim como cem, mil, dez mil, cem mil arco-íris preenchendo o céu. Deveras maravilhoso foi o espetáculo ! Dessa maneira, o Buda exibiu os prodígios de seus dez poderes místicos, e, naquilo que é denominado transferência da essência, ele extraiu o amâgo e a essência do Sutra de Lótus e transmitiu-os aos quatro bodhisattvas. Ele ordenou-lhes fervorosamente que a concedessem, após sua morte, a todos os seres das dez direções. Depois disso, manifestou ainda outro poder místico e confiou este sutra, o Lótus, e os demais ensinos sagrados ensinados durante sua existência, a Monju e os outros bodhisattvas deste e de outros mundos, às pessoas dos dois veículos, e aos seres humanos e celestiais, divindades dragões e outros. Esses cinco caracteres, Myoho-rengue-kyo, não foram transmitidos nem a Mahakahsyapa, Shariputra ou os outros discípulos, embora esses homens tivessem, desde o início, acompanhado o Buda tão proximamente como uma sombra segue o corpo. Contudo, mesmo deixando isso de lado, porque o Buda se recusou a confiá-los a bodhisattvas como Monju e Miroku ? Apesar de carecerem de capacidade, parecia improvável que ele os rejeitasse. Há na verdade muitos aspectos enigmáticos acerca dessa questão. Porém, o fato foi que os bodhisattvas dos outros mundos não foram aceitos porque a ligação deles com este mundo era pequena ou, em outros casos, apesar de os bodhisattvas serem deste mundo saha, só haviam estabelecido ligações recentemente; ou, em ainda muitos casos, alguns foram recusados porque, embora fossem discípulos do Buda, não se encontravam entre os seus discípulos quando ele despertou pela primeira vez a aspiração à iluminação (num remoto passado). Desse modo, entre aqueles que haviam sido seus discípulos durante os quarenta anos ou mais que precederam à pregação do Sutra de Lótus, ou durante à pregação do ensino teórico, os catore primeiros capítulos do Sutra de Lótus, não havia nenhum que pudesse 254

ser denominado um discípulo original. Observamos a partir do sutra que apenas esses quatro bodhisattvas tinham sido discípulos de Sakyamuni, o senhor dos ensinos, desde o remoto passado de gohyaku-jintengo; desde a época em que ele despertou pela primeira vez à iluminação, eles não haviam seguido nenhum outro Buda nem requerido a instrução dos ensinos teóricos e essencial. Assim, Tientai diz: “(A grande assembléia) testemunhou os bodhisattvas da Terra somente fazendo esse juramento”. E ele também afirma: “Esses são meus (de Sakyamuni) discípulos destinados a propagar minha Lei”. Miao-lo declara: “Os filhos disseminarão a Lei do pai”. E Tao-hsien diz: “Pelo fato da Lei ser aquela percebida pelo Buda no remoto passado, foi transferida para aqueles que foram seus discípulos naquele tempo distante”. Desta forma, estes cinco caracteres do Myoho-rengue-kyo foram confiados a esses quatro bodhisattvas. No entanto, após o falecimento do Buda, durante os mil anos dos Primeiros Dias da Lei, os mil anos dos Médios Dias da Lei e os duzentos e vinte anos ou mais que decorreram desde o início dos Últimos Dias da Lei, em nenhum lugar da China, Japão ou em qualquer outro lugar do mundo inteiro esses quatro bodhisattvas não fizeram nem mesmo uma única vez o seu advento. Por que? Embora os ensinos do Myoho-rengue-kyo não tenham sido especificamente confiados ao bodhisattva Monjushiri, ele permaneceu neste mundo por quatrocentos e cinquenta anos após o falecimento do Buda para propagar os sutras Mahayana, e mesmo em época subsequentes descia de vem em quando da Montanha Perfumada ou da Montanha Clara e Fria assumindo a forma de um monge eminente com a finaliade de disceminar os ensinos budistas. O bodhisattva Yakuo tomou a forma do grande mestre Tientai, (o bodhisattva) Kanzeon tornou-se o grande mestre Nan-yueh, e o bodhisattva Miroku tornou-se Fu Tashih. Além disso, os discípulos Mahakashyapa e Ananda empenharam-se para propagar os ensinos do Buda após a sua morte durante vinte e quarenta anos, respectivamente. E, no entanto, em todo este tempo, os herdeiros legítimos do Buda, a quem haviam sido confiados os ensinos do Myoho-rengue-kyo, deixaram de fazer sua aparição. Durante este período de mais de duzentos anos, soberanos dignos e soberanos sábios prestaram honras às imagens pintadas ou de madeira de Sakyamuni, o senhor dos ensinos, como seu principal objeto de adoração. Porém, apesar de terem feito retratos dos Budas dos ensinos Hinayana e Mahayana; dos sutras Kegon, Nirvana e Kammuryoju; do ensino teórico do Sutra de Lótus e do sutra Fuguen; do Buda do sutra Dainiti e de outros sutras Shingon; e dos budas Sakyamuni e Taho do capítulo Hoto, o Sakyamuni do capítulo Juryo jamais foi representado em templo algum ou monastério de montanha em nenhum lugar. É muito difícil compreender o porquê disso. 255

O Buda Sakyamuni fez referência específica ao quinto período de quinhentos anos e nunca designou os dois anos dos Primeiros e Médios Dias da Lei como o tempo para a propagação do Sutra de Lótus. O Grande Mestre Tientai disse: “Os Primeiros e Médios Dias da Lei estão quase encerrados, e os Últimos Dias estão próximos”. Desse modo, ele próprio julgou que o final dos Médios Dias da Lei não era ainda o tempo para a propagação do Sutra de Lótus. Devemos supor, então, que os incontáveis grandes bodhisattvas que emergiram da terra pretendem permanecer em silêncio e imóveis e quebrar a promessa que fizeram quando os ensinos foram confiados a eles por Sakyamuni, Taho e os outros budas das dez direções ? Entretanto, mesmo os homens dignos descritos nas escrituras nãobudistas sabem que se deve aguardar a época. O cuco sempre espera até o quarto ou quinto mês para entoar sua canção. Similarmente, lemos no sutra que esses grandes bodhisattvas devem, do mesmo modo, esperar até os Últimos Dias da Lei para aparecer. Por que digo isso ? Tanto as escrituras internas como as externas deixam claro que, antes de um certo acontecimento predestinado de fato ocorrer, presságios sempre surgirão. Assim, quando a aranha tece a teia, isso significa que algum acontecimento feliz sucederá, e quando a pega chama, indica que um visitante chegará. Se até esses eventos menores têm seus presságios, o que dizer então das ocorrências maiores ? Dessa forma, os seis acontecimentos auspiciosos descritos no capítulo Jo do Sutra de Lótus são grandes presságios, excedendo em magnitude quaisquer outros sinais maiores que tenham aparecido durante toda a vida do buda Sakyamuni. E os grandes prenúncios descritos no capítulo Yujutsu são imensuravelmente maiores em magnitude do que esses. Portanto, Tientai afirma: “Observando a fúria da chuva, podemos dizer a grandeza do dragão que a causou, e examinando o desabrochar das flores de lótus, podemos dizer a profundidade do lago onde elas crescem”. E Miao-lo declara: “Homens conseguem ver presságios e o que estes predizem, assim como as cobras conhecem o caminho das cobras”. Agora eu, também, ao discernir o significado dos presságios, devo ter uma parte do poder dos sábios. O grande terremoto que irrompeu no primeiro ano da era Shoka (1257), no dia 23 de agosto de 1264, (quando o marcador reverso se encontrava no setor do céu com o signo cíclico de hinoene), no dia 4 de julho – esses são importantes augúrios como jamais ocorreram antes, durante os dois mil e duzentos anos ou mais desde a morte do Buda. Imagino se não são fortes sinais indicando que aqueles grandes bodhisattvas estão agora para fazer seu advento neste mundo responsabilizando-se pela Grande Lei.

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Ondas de três metros de altura não se levantam em uma poça de trinta centímetros de extensão, e o zurro de um jumento não consegue fazer os ventos soprarem. Embora o governo do Japão hoje esteja em caos e o povo grite de angústia, essas condições apenas dificilmente poderiam causar o surgimento desses importantes presságios. Quem poderá duvidar que esses não sejam grandes sinais predizendo que, apesar de o Sutra de Lótus ter perecido, na realidade é eterno. Durante os mais de dois mil anos (desde a morte do Buda), houve governantes maus que foram amaldiçoados por seus súditos e pessoas traiçoeiras que foram odiadas por todos. Mas Nitiren, embora não seja culpado de crime algum, durante os mais de vinte anos passados foi amaldiçoado e insultado, atacado com espadas e bastões e apedrejado com rochas e telhas, tanto pelas pessoas de alta como de baixa posição. Este não é um acontecimento comum ! O meu caso é tal como o do Bodhisattva Fukyo, que perto do fim da Lei do Buda Ionno foi amaldiçoado e insultado por um período de muitos anos. Além disso, o Buda Sakyamuni citou o exemplo desse bodhisattva e predisse que, nos Últimos Dias da Lei, após a sua morte, os fatos se desenrolariam da mesma maneira que na época de Fukyo. E, no entanto, nem aqui perto do Japão nem na muito distante terra da China jamaias se teve conhecimento de que algo assim tenha ocorrido em prol do Sutra de Lótus. Por me odiarem, as pessoas não mencionam o significado do meu sofrimento. Se eu o mencionar, poderá parecer bajulação própria. Se deixar de citá-lo, entretanto, cometerei a ofensa de negar as palavras do Buda. Falo sobre isso porqe o procedimento de um homem de valor é dar pouca importância à própria vida e valorizar a Lei. Eu, Nitiren, assemelho-me ao bodhisattva Fukyo. Se o soberano de uma nação ou um súdito matam seus pais, embora esses assassinos sejam de posições sociais muito diferentes, ambos cairão no inferno de incessante sofrimento porque seus crimes são idênticos. Da mesma forma, apesar de o bodhisattva Fukyo e eu nos encontrarmos em níveis diferentes, efetuamos a mesma ação. Portanto, se o bodhisattva Fukyo está destinado a atingir o estado de Buda, pode haver qualquer dúvida de que obterei também o fruto do estado de Buda ? O bodhisattva Fukyo foi amaldiçoado pelos monges arrogantes que observaram todos os duzentos e cinquenta preceitos. Eu, Nitiren, sou caluniado e insultado por Ryokan, que é conhecido como o mais notável observador dos preceitos. Os monges que ultrajaram Fukyo, embora posteriormente tenham vindo a seguí-lo, ainda tiveram de sofrer no inferno Aviti por mil kalpas. Mas Ryokan ainda tem de buscar 257

meus ensinos. Por isso, não conheço (toda a gravidade de sua ofensa). Ele pode estar destinado a sofrer no inferno por incontáveis kalpas. Lamentável ! Lamentável ! Pergunta: Com respeito ao grande terremoto acontecido na era Shoka, o senhor afirmou em seu ensaio admonitório, o Rissho Ankoku Ron, confiado em 16 de julho de 1260 para que o apresentasse a Sua Excelência, o falecido sacerdote leigo de Saimyo-ji, o senhor afirmou sua opinião de que o céu e a terra ficariam furiosos porque o povo do Japão estava destruindo o budismo por causa de sua crença no Sentyaku-shu, de Honen, e que esse erro causaria rebeliões no país e invasão de países estrangeiros. Mas agora o senhor diz que o terremoto foi um presságio auspicioso da propagação do Sutra de Lótus. Como o senhor explica a discrepância entre essas duas opiniões ? Resposta: Essa é uma boa pergunta. O quarto volume do Sutra de Lótus diz: “Uma vez que o ódio e a inveja com relação a este sutra são abundantes mesmo durante a existência do Buda, como serão piores então no mundo após a sua morte!” E no sétimo volume, referindo-se ao tempo ‘após a sua morte!’. E no sétimo volume, referindo-se ao tempo ‘após a sua morte’ quando as coisas serão ‘muito piores’, o Buda diz: “No quinto período de quinhentos anos após a minha morte, declare e propague amplamente (o Sutra de Lótus)”. Assim, vemos que o ódio em profusão após a morte do Buda acontecerá no quinto período de quinhentos anos, quando o Myoho-rengue-kyo propagar-seá. E imediatamente após a passage acima, o Buda adverte sobre os perigos do ‘demônio, as pessoas do demônio, ou as divindades, dragões, yakshas e kumblhandas’. Quando o sacerdote-chefe Hsing-man viu o Grande Mestre Dengyo, exclamou: “As palavras sagradas não se tornarão extintas. Agora encontrei este homem ! Todas as doutrinas que aprendi transferirei a este acharya das terras do Japão”. E hoje a situação é exatamente a mesma. Agora, no início dos Últimos Dias da Lei, chegou a época de os cinco caracteres do Myoho-rengue-kyo serem propagados de modo que todas as pessoas do Japão possam receber a semente dos ensinos do Buda. Quando uma mulher de posição inferior torna-se grávida do filho do soberano, as outras mulheres ficam com raiva e inveja. E quando uma pessoa de origem humilde é presenteada com uma jóia da coroa do rei, então grandes problemas com certeza surgirão. Assim, o sutra diz: “As pessoas dessa época ressentir-se-ão (do Sutra de Lótus) e o considerarão extremamente difícil de acreditar”. O sutra Nirvana declara: “Se forem infligidos transtornos a um sábio, então o país onde ele vive será atacado por outros países”. E o sutra Ninno afirma essencialmente a mesma coisa. Se eu, Nitiren, for atacado, então, partindo do céu e da terra e das quatro direções, 258

grandes calamidades verterão como chuva, jorrarão como fontes ou virão serpeando com ondas. Se a multidão de monges, aquelas hordas de gafanhotos que afligem a nação, e oministros que estão no poder no governo persistirem em suas calúnias e acusações cada vez maiores contra mim, então grandes desastres ocorrerão em magnitude crescente. Quando um demônio ashura tentou atirar contra o deus Taishaku, sua flecha ricocheteou e furou-o no olho. E quando os pássaros garuda tentaram atacar o rei dragão Anavatapta, chamas irromperam de seus próprios corpos e consumiram-nos. O devoto do Sutra de Lótus é inferior a Taishaku ou ao rei dragão Anavatapta ? O grande mestre Chang-an escreveu: “Aquele que destrói ou traz confusão à Lei Budista é um inimigo da Lei. Se uma pessoa age como amiga de outra, mas não tem benevolência para corrigí-la, na realidade é sua inimiga”. E ele também diz: “Aquele que torna possível ao ofensor livrar-se do mal age, portanto, como um pai deste”. Todas as pessoas do Japão têm sido desencaminhadas pelas declarações desvairadas de Honen, que pede-lhes que ‘os descartem, fechem, ignorem e abandonem’ (todos os sutras exceto os sutras de sua seita), ou dos homens da seita Zen, que falam de uma ‘transmissão especial com exceção dos sutras’, de modo que não há uma única pessoa que não esteja destinada a cair na grande fortaleza do inferno de incessante sofrimento. Assim sendo, ao longo dos mais de vinte anos passados, jamais cessei de bradar em voz alta contra esses erros, não temendo nem o soberano da naçõa nem as pessoas comuns. Não sou de maneira alguma inferior aos sinceros ministros Lung-peng e Pi Kan da antiguidade. Sou como o Kannon de mil braços, o bodhisattva de grande benevolência, que empenha-se para salvar de uma vez todos os seres confinados no inferno de incessantes sofrimentos. Quando várias crianças são apanhadas por um incêndio, mesmo que os pais desejem salvá-las todas de uma vez que têm apenas dois braços eles precisam decidir qual resgatar primeiro e qual deixar para depois (o verdadeiro ensino do Buda) é um pai com mil braços, dez mil braços, ou cem mil braços. Os sutras pregados antes do Sutra de Lótus possuem somente um ou dois braços, por assim dizer. Contudo, o Sutra de Lótus, que ‘instrui todos os seres vivos, fazendo-os entrar no Caminho do Buda’, é um genuíno bodhisattva de inumeráveis braços. Se considerarmos o Sutra de Lótus e os comentários de Chang-an, então Nitiren Daishonin é pai e mãe benevolente de todo o povo do Japão. O céu pode estar nas alturas, mas tem ouvidos para ouvir o que está acontecendo. A terra pode ser profunda, mas tem olhos perspicazes para observar. O céu e a terra sabem agora (como se encontra a situação). E no entanto eu, que sou pai e mãe de todo o povo, sou atormentado, insultado e enviado ao exílio. Nunca se ouviu 259

falar antes dos abusos do governo que ocorreram neste país nos últimos dois ou três anos, os quais excedem todos os limites da razão. Em sua carta, o senhor mencionou a sua devoção filial a sua falecida mãe. Lendo-a, fiquei tão comovido que mal pude conter minhas lágrimas. Há muito tempo, na China, houve cinco rapazes, inclusive Yuangchung. Originalmente, eles eram estrangeiros de diferentes regiões e tinham sobrenomes diferentes, mas fizeram uma promessa de tornarem-se irmãos e jamais voltarem-se uns contra os outros e com o tempo acumularam três mil tesouros. Todos os rapazes eram órfãos, e pesarosos por esse fato, quando encontraram uma mulher idosa ao longo da estrada, decidiram honrála como se fosse sua mãe. Assim o fizeram durante vinte e quatro anos, nunca indo contra o desejo dela o mínimo que fosse. Então, a mãe subitamente adoeceu e ficou impossibilitada de falar. Os cincos filhos fitaram o céu e disseram: “Nossos esforços para cuidar de nossa mãe não foram apreciados e ela foi apanhada por uma doença que a impede de falar. Se o céu conceder aos nossos sentimentos filiais qualquer reconhecimento, oramos para que lhe restitua a capacidade de falar”. Naquele momento, a mãe disse aos seus cinco filhos: “Em tempos passados, fui a filha de um homem chamado Yang Meng da região de Tai-yuan. Casei-me com Chang Wen-chien, que era do mesmo lugar, mas ele faleceu. Naquela época, tive um filho chamado Wu-i. Quando ele estava com sete anos, a rebelião irrompeu na região, e eu não sei o que aconteceu com ele. Vocês, meus cinco filhos, cuidaram de mim por vinte e quatro anos, mas eu nunca lhes contei sobre isso. Meu filho, Wu-I, tinha marcas parecidas com as setes estrelas da Ursa Maior em seu peito e, na sola de seu pé direito tinha uma mancha negra”. Acabando de dizer isso, ela morreu. Quando os cinco filhos estavam acompanhando o corpo dela ao cemitério, encontraram o magistrado local na estrada. O magistrado deixou cair uma bolsa contendo documentos importantes, e os cinco rapazes, sendo acusados de roubá-la, foram detidos e amarrados. Quando o magistrado os confrontou, indagou: “Quem são vocês ?”, e os cinco jovens contaram-lhe tudo o que ouviram de sua mãe. Ao ouvir isso, o magistrado quase caiu de seu assento, fitou os céus e então curvou-se em prantos. Ele libertou os cinco homens das cordas que os prendiam, conduzindo-os ao seu assento, e disse: “Sou Wu-I, e foi de minha mãe que cuidaram ! Durante estes vinte e quatro anos conheci muitos prazeres, mas como jamais pude parar de pensar em minha amada mãe, eles nunca foram reais prazeres para mim !”. Logo,

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ele apresentou os cinco homens ao soberano do país, e cada um foi designado chefe de uma província. Deste modo, mesmo estranhos foram recompensados quando se reuniram e trataram alguém como a um pai ou mãe. Isto se aplica ainda mais ao caso de irmãos e irmãs verdadeiros quando eles tratamse com amabilidade e cuidam de seus próprios pais ! Como o céu poderia deixar de aprovar ? Jozo e Joguen utilizaram-se do Sutra de Lótus para conduzir seu pai, que mantinha conceitos errôneos, à salvação. Devadatta foi inimigo do Buda, e foi condenado pelos sutras ensinados durante o primeiro período de quarenta anos da vida de pregação do Buda. O momento de sua morte foi aterrorizador; a terra se abriu e ele caiu no inferno de incessante sofrimento. Porém, no Sutra de Lótus, ele foi convocado de volta e recebeu a predição de que se tornaria o Tathagatta Rei Celestial. O rei Ajatashatru matou seu pai, mas pouco antes de o Buda entrar no Nirvana, ele ouviu os ensinos do Sutra de Lótus e conseguiu escapar dos grandes sofrimentos do inferno Aviti. Esta província de Sado é como o reino dos animais. Além disso, é repleta de discípulos de Honen que me odeiam milhares e milhares de vezes mais do que as pessoas de Kamakura o faziam. Eu nunca estou certo se conseguiria sobreviver. Contudo, graças ao apoio caloroso de ambos, consegui manter minha vida até agora. Quando considero isso, suponho que uma vez que Sakyamuni, Taho e outros Budas das dez direções e os grandes bodhisattvas fazem oferecimentos e prestam reverência ao Sutra de Lótus, esses budas e bodhisattvas devem estar informando seus pais a cada hora do dia e da noite (que vocês estão me auxiliando). E o fato de desfrutar agora o favor de seu lorde também deve ser devido à proteção que recebe de seus pais. Não pense em seus parentes como irmãos. Considere-os como se fossem seus próprios filhos. É verdade que entre os filhos há aqueles parecidos com os filhotes de coruja, que afirma-se, comem sua própria mãe, ou como das feras harei, que esperam por uma oportunidade para devorar seu próprio pai. Apesar de seu próprio filho, Shiro, cuidar de seus pais, se ele for uma pessoa má, talvez não haja nada a ser feito. Entretanto, mesmo um estranho pode decidir-se a dar sua própria vida pelo senhor. Assim, se tratar seus irmãos mais novos como se fossem seus próprios filhos, eles podem tornar-se seus aliados para a vida toda e, sem dúvida, isso também causará uma impressão favorável aos outros. E, do mesmo modo, se considerar suas irmãs mais novas como filhas, então, porque ela não haveriam de retribuir com devoção filial ? Quando fui exilado neste lugar, achei que ninguém viria visitar-me. No entanto, tenho não menos que sete ou oito pessoas aqui comigo, e se não fosse pela sua consideração, não sei como poderíamos conseguir provisões para o grupo todo. Tenho certeza de que tudo isto deve-se 261

ao fato de as palavas do Sutra de Lótus terem penetrado seus corpos para oferecer-nos auxílio. Estou orando para que, não obstante o quanto os tempos possam se tornar turbulentos, o Sutra de Lótus e as dez filhas-demônios protejam todos vocês, orando tão fervorosamente como se quisesse acender fogo com madeira molhada ou extrair água de um solo ressecado. Há muitos outros assuntos a serem discutidos, mas encerrarei aqui.

Nitiren.

Fundo de Cena

Nitiren Daishonin escreveu este gosho na Ilha de Sado em 1273 para seu devotado seguidor, o samurai Shijo Kingo, que vivia em Kamakura. A essa altura, Nitiren Daishonin estava exilado nessa desolada ilha por cerca de um ano. Naquela época, o banimento era uma forma de punição que só perdia para a pena de morte, e as circunstâncias cruéis do exílio frequenteente destruíam o espírito e custava a vida daqueles que recebiam essa sentença. Entretanto, nesta carta, Nitiren Daishonin diz que apesar das privações do exílio, seu sentimento principal é de alegria. Ele foi banido exatamente porque denunciou os erros daqueles que caluniam o Sutra de Lótus. Daishonin explica que pelo fato de ter encontrado essa grande provação por causa do sutra, dessa forma ele com certeza erradicará nesta existência seu mau carma acumulado desde o distante passado. Este é o princípio de ‘repreender a calúnia à Lei e erradicar os pecados’, citado no título do gosho. Daishonin prossegue explanando que quando o Buda Sakyamuni pregou o Sutra de Lótus, ele transmitiu os cinco caracteres do Myohorengue-kyo, a essência de seu ensino, somente para os bodhisattvas da Terra. Esses bodhisattvas são aqueles destinados a surgir e propagar este ensino no início dos Últimos Dias da Lei. Daishonin afirma que os surpreendentes acontecimentos recentes, tais como o terremoto devastador que assolou Kamakura em agosto de 1257, e um imenso cometa que apareceu de junho a agosto de 1264, devem ser entendidos como presságios anunciando o advento desses grandes bodhisattvas. Embora Nitiren Daishonin não declare isso tão diretamente, o gosho indica que ele é a pessoa exata que efetua a tarefa desses Bodhisattvas da Terra, propagando a essência do Sutra de Lótus. Nitiren Daishonin subsequentemente compara-se a Fukyo, um bodhisattva que consta no Sutra de Lótus e que reverenciava todas as pessoas como futuros Budas e como consequência enfrentou insultos. 262

Daishonin diz que de acordo com a predição do Buda Sakyamuni, nos Últimos Dias da Lei, época em que o Sutra de Lótus propagar-se-á, os acontecimentos irão se desenrolar da mesma forma como na época do bodhisattva Fukyo. O fato de Nitiren Daishonin ser perseguido, assim como Fukyo, por causa do Sutra de Lótus, indica que ele é o devoto do Sutra nos Últimos Dias da Lei. O texto levanta então uma questão: No Rissho Ankoku Ron, Nitiren Daishonin interpretou os desastres que estavam ocorrendo no país como o efeito da crença difundida em ensinos desencaminhadores. Agora ele os interpreta como presságios da disseminação do Sutra de Lótus. Como conciliar essas duas concepções ? Nitiren Daishonin esclarece que esta é uma questão de perspectiva; não existe nenhuma contradição fundamental. Por um lado, quando chega a época da propagação do Sutra de Lótus, desastres surgem quando as pessoas persistem em abraçar ensinos provisórios que não se adequam mais à época. Por outro lado, quando o devoto do Sutra de Lótus que deve propagar seus ensinos aponta tais erros e é perseguido em consequência disso, grandes calamidades resultam infalivelmente. Nitiren Daishonin acrescenta que ao denunciar os erros das outras seitas, ele agiu unicamente pelo espírito de compaixão de bodhisattva, conforme expresso por Chang-an: “Aquel que torna possível ao ofensor livrar-se do mal, age portanto como se fosse seu pai”. Na parte final do gosho, Nitiren Daishonin louva a devoção de Shijo Kingo a sua falecida mãe. Citando a história de Yuan-chung e os quatro irmãos adotados por ela, explana que tal conduta filial jamais deixará de ser recompensada. Ele conclui com expressões de gratidão a Shijo Kingo e sua família, cujos oferecimentos ajudaram Nitiren Daishonin e seus acompanhantes a sobreviverem sob as condições severas do exílio em Sado. A preocupação compassiva de Nitiren Daishonin com seus discípulos, mesmo em meio à sua própria adversidade, é claramente visível na passagem final.

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Explanação do Gosho A Única Frase Essencia l Comentários fe itos pelo Departamento de Estudo da SGI -USA. Tradução não oficial para a l íngua portuguesa - Teresinha M. Santos, NY

Comentários Myoho, a recebedora de " A Única Frase Essencial," havia perguntado a Nitiren Daishonin: "Posso atingir a iluminação apenas recitando Nam-myoho-rengue-kyo?" Numa época em que o Budismo estava mais do que qualquer outra coisa associado a elaborados rituais e doutrinas esotéricas, poderíamos conjeturar o subtexto de sua questão como sendo: "Atingir a iluminação é algo tão simples assim?" "Como pessoas comuns, podemos nós a qualquer momento atingir a iluminação?" No Japão medieval, para um crente leigo, especialmente uma mulher, perguntar sobre assuntos budistas a um sacerdote poderia ser tomado como falta de respeito à autoridade sacerdotal. Embora sua pergunta tenha sido feita a favor de seu esposo doente, Myoho deve ter-se sentido pouco confortável tendo de escolher entre buscar um entendimento mais aprofundado de sua fé, ou meramente continuar mantendo o seu prescrito lugar na sociedade. Percebendo isto, Nitiren Daishonin primeiro louva Myoho por seu espírito de busca. Na verdade, o começo da carta é repleto de louvor e apreciação. "É uma rara fonte de boa fortuna para voce inquirir sobre o Sutra de Lótus e indagar seu significado. "Sua ação de questionar sobre o Sutra de Lótus está entre os seis atos difíceis. Isto é uma indicação certa de que se a senhora abraçar o Sutra de Lótus, tornar-se-á um Buda em sua presente forma." "A senhora perguntou se alguém pode atingir o estado de Buda apenas por recitar Nam-myoho-rengue-kyo, e esta é a mais importante de todas as questões." Daishonin era perspicarzmente cônscio de que conhecimento e entendimento dão origem à confiança e autoconfiante fé, enquanto que a repressão da dúvida que surge naturalmente no decorrer de nossa prática, conduz a fé cega crivada de medo e ansiedade. Por isso, Daishonin encoraja Myoho a

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desafiar suas dúvidas e a fazer perguntas livremente na pesquisa das verdades Budistas. Explicando que Nam-myoho-rengue-kyo, sendo a essência do Sutra de Lótus, contém todos os benefícios do Budismo, Daishonin ensina a Myoho - e a todos nós - que quando pessoas comuns como nós recitamos o daimoku com fé em nossa natureza de Buda inata, podemos arremessar a luz da esperança até mesmo dentro do mais escuro canto de nossos corações, como uma lanterna iluminando "um lugar que tem sido escuro por cem, mil ou dez mil anos"; que podemos mudar qualquer coisa que por muito tempo pensamos ser impossível mudar, e desfrutar de felicidade nunca sonhada; que certamente podemos atingir a iluminação quaisquer que sejam as nossas circunstâncias atuais. "Da mesma forma, incluso dentro do título de Nammyoho-rengue-kyo, ou daimoku, está o sutra inteiro… o título é para o sutra assim como os olhos são para o Buda." A simples frase Nam-myoho-rengue-kyo contém a totalidade do Sutra de Lótus, o qual é a culminação dos ensinamentos de Sakyamuni. Usando metáforas e citando outras escrituras, Daishonin explica o porquê disto. Antes desta passagem, ele escreve que o Sutra de Lótus revela nossos corpos, mentes e ações como os dos Budas, e aqueles que abraçam e acreditam em até mesmo uma frase ou verso do Sutra de Lótus podem atingir o estado de Buda. Embora seja o título do sutra, Nam-myoho-rengue-kyo também contém sua essência. Daishonin compara isto com o caráter essencial das pessoas que pode ser revelado nos seus olhos ou, com uma nação inteira que pode ser expressa no seu nome. Então ele conclui: "Da mesma forma, incluso dentro do título de Nam-myoho-rengue-kyo, ou daimoku, está o sutra inteiro, consistindo de todos os oito volumes, vinte e oito capítulos, e 69.384 caracteres, sem a omissão de um único caractere." Ele apóia sua conclusão com textos de Po Chü-I, um famoso poeta chinês, e de Miao-lo, um erudito da escola T'ien-t'ai, da China. O Sutra de Lótus ensina o potencial universal para o estado de Buda dentro da vida de todas as pessoas. No segundo capítulo, Sakyamuni declara para seu discípulo: "Sharihotsu, voce deve saber / que no início eu fiz um juramento, / esperando tornar todas as pessoas / iguais a mim, sem nenhuma distinção entre nós"(The Lotus Sutra, Burton Watson, pag.36). Aqui, Sakyamuni indica que todas as pessoas podem elas próprias revelarem-se como Budas. 265

Por esta razão a vida de cada pessoa, não importando como ela ou ele possa aparentar neste momento, é merecedora do maior respeito. Portanto, de acordo com o Sutra de Lótus felicidade reside na auto- realização, e não na procura de benções de uma divindade externa. O que mais interessa é ter fé em nosso verdadeiro potencial, e nossos esforços para externá-lo na sua mais completa proporção. O potencial de compaixão, sabedoria e coragem de cada pessoa é igual ao de Buda. Como fundador do Budismo, Sakyamuni começou pregando seus profundos ensinamentos depois de ter despertado para o supremo potencial existente em todas as pessoas incluindo ele próprio. Embora o supremo potencial delas possa ainda não ter sido realizado, todas as pessoas merecem nosso mais profundo respeito por possuí-lo. Além disso, os que estão se esforçando para o despertar de seus estados de Buda pela preservação do Sutra de Lótus serão honrados pelos seus nobres esforços. Como injunção final de Sakyamuni no sutra: "Se voce vê uma pessoa que aceita e preserva este sutra, voce deve levantar-se e saudá-la, mostrando-lhe o mesmo respeito que voce deve ter a um Buda"(LS28, 324). A universalidade do estado de Buda como exposta no Sutra de Lótus está incorporada em Nam-myoho-rengue-kyo, a lei fundamental da vida e do universo. Portanto, Nammyoho-rengue-kyo é mais do que uma simbólica representação do sutra; é o alicerce sobre o qual o sutra se mantém. Como Daishonin escreve, "Nam-myoho-rengue-kyo não é apenas o âmago dos ensinamento da existência de Sakyamuni, mas também o coração, a essência e o princípio máximo do Sutra de Lótus" ("Isto É o Que Eu Ouvi,"WDN, 860). " Todas as coisas têm seu ponto essencial, e o coração do Sutra de Lótus é seu título de Nam-myoho-rengue-kyo, ou o daimoku. Realmente, se você o recita pela manhã e à tardinha, você está lendo corretamente o Sutra de Lótus por inteiro…" A questão que induziu Nitiren Daishonin a escrever esta carta surgiu no meio da atmosfera geral da comunidade Budista cotidiana. Era uma época na qual os sacerdotes Budistas enfatizavam rituais esotéricos e formalidades. As pessoas eram ensinadas que a prática Budista apropriada incluía copiar sutras ou atender aos serviços de preces, ou ouvir os sermões de um eminente sacerdote, de forma que tais rituais e formalidades tornaram-se uma norma. Por conseguinte, experiência religiosa em Budismo era vista como algo que requeria a mediação de sacerdotes. Budismo 266

tornou-se algo que as pessoas comuns assistiam autoridades praticar, e não algo que elas próprias experimentassem diretamente. Num clima espiritual como este, era bem natural que Myoho estranhasse se a própria pessoa recitando Nam-myoho-rengue-kyo seria o suficiente. Sakyamuni viajou de cidade em cidade para partilhar seus ensinamentos com as pessoas, escravas ou reis igualmente. Muitos séculos depois, porém, seus ensinamentos tornaram-se propriedade exclusiva dos sacerdotes. Pelo tempo em que o Budismo floresceu no Japão medieval, os ensinamentos de Sakyamuni haviam se transformado em mero ornamento espiritual, um símbolo de status da classe dominante. Cercado destas condições, Daishonin revelou a jóia de todos os ensinamentos Budistas. Estava escondida no Sutra de Lótus como Nam-myohorengue-kyo, e ele ensinou a prática de recitar esta frase para felicidade de si próprio e dos outros. Este ensinamento e sua prática eram simples e acessíveis para as pessoas comuns, cuja maioria era analfabeta e não poderia nem copiar nem recitar os sutras escritos em clássico chinês. Mas, isto não é muito simples apenas recitar Nammyoho-rengue-kyo? Enfocando tal dúvida, Daishonin explica nesta carta a profundidade de sua simples prática. " Todas as coisas têm seu ponto essencial." Aqui Daishonin explica que Nam-myoho-rengue-kyo é a essência do Sutra de Lótus; portanto, quando recitamos Nam-myohorengue-kyo, é a mesma coisa como recitar o sutra inteiro. "Desse modo," Daishonin continua, "se voce incessantemente recitar o daimoku, estará lendo o Sutra de Lótus continuamente." Os volumosos trabalhos da escola T'ien-t'ai da China também atestam a profundidade do daimoku, diz Daishonin. Um coisa simples não tem de ser simplística. Da mesma forma como podemos nos beneficiar de um supercomputador simplesmente ao ligar sua tomada, podemos também revelarnos como Budas simplesmente recitando Nam-myoho-renguekyo como uma afirmação de nosso próprio inato estado de Buda. "Um ensinamento tão fácil de manter e de praticar como este foi exposto para o bem de todos os seres vivos no maligno mundo destes últimos dias. Nos supostos Últimos Dias da Lei, é dito que a verdade do Budismo de Sakyamuni está obscurecida pela corrupção clerical e que o sofrimento das pessoas aumenta por causa 267

da confusão espiritual delas. Nos Últimos Dias da Lei, por conseguinte, um profundo ensinamento é necessário para aliviar a confusão das pessoas. Sua prática, porém, deve ser facilmente entendida e levada adiante por pessoas comuns, como Daishonin explica aqui. A união do simples e do profundo em Nam-myohorengue-kyo é uma expressão da imensa compaixão de Daishonin como o Buda dos Últimos Dias da Lei. Pode ser dito que, por causa de ter sido tão grande o desejo de Daishonin de possibilitar todas as pessoas dos Últimos Dias da Lei a atingirem o estado de Buda, ele concentrou sua profunda sabedoria para perceber a realidade essencial de todas as pessoas como seus inatos estados de Buda. Daishonin entendeu que, através da simples prática de recitar Nammyoho-rengue-kyo associada a uma fervorosa expectativa de revelar o supremo potencial interno, as pessoas comuns podiam trazer à tona o mesmo estado de vida que Sakyamuni e Daishonin haviam alcançado, não importando seus graus de conhecimento Budista. De uma perspectiva, os Últimos Dias da Lei é um tempo de corrupção e confusão. Entretanto, da perspectiva de Daishonin é o tempo para que seu verdadeiro ensinamento Nam-myoho-rengue-kyo - seja difundido amplamente. As pessoas não devem ser simplesmente deixadas com seus sofrimentos, entregando-se elas próprias à vazias e esotéricas práticas religiosas. Pelo contrário, seus sofrimentos devem ser transformados no desejo pela busca de seus verdadeiros potenciais e servirem como um trampolim para o desenvolvimento de suas forças internas. Daishonin enfatiza a importância de dissipar a confusão das pessoas sobre o Budismo, de forma que elas possam evitar o prolongamento sem propósito de seus sofrimentos. "E porque que eles aparentam ser verdadeiros sacerdotes, as pessoas acreditam sem a menor dúvida no que eles pregam. Portanto, sem se darem conta, as pessoas que os seguem tornam-se inimigas do Sutra de Lótus e do Buda Sakyamuni." O quarto trecho do Sutra de Lótus que Daishonin cita é a famosa passagem da qual o termo kossen-rufu deriva. Kossen-rufu é a pronúncia em Japonês para a máxima do sutra "divulgar amplamente [o Sutra de Lótus]" como aparece na célebre tradução chinêsa de Kumarajiva. No capítulo "Casos Antigos do Bodhisattva Rei dos Remédios" do sutra, Sakyamuni incita um dos discípulos deste bodhisattva: "Depois que eu entrar em extinção, no período dos últimos quinhentos anos voce deve divulgar amplamente [o Sutra de 268

Lótus] por toda a parte de Jambudvipa 8 e nunca permita que esta divulgação seja interrompida, nem permita que demônios maus, pessoas do diabo, seres celestiais, dragões, os demônios yakshas 9 ou kumbhanda 1 0 aproveitem-se e tirem vantagem!"(SL23, 288). Kossen-rufu significa a criação de uma sociedade pacífica através da divulgação ampla do Budismo, especialmente o ensino de Nam-myoho-rengue-kyo, que foi o principal objetivo de Daishonin. Como ele cita em uma carta intitulada, "Retribuindo Dívidas de Gratidão": "No Japão, China, India, e em todos os outros países de Jambudvipa, cada pessoa, independentemente de ser sábia ou ignorante, irá pôr de lado outras práticas e juntar-se à recitação de Nam-myoho-rengue-kyo. Esta doutrina nunca foi ensinada antes. Aqui, em toda a terra de Jambudvipa, em todos os 2.225 anos desde o falecimento do Buda, nem uma única pessoa a recitou. Nitiren sozinho, sem poupar sua voz, agora recita Nam-myoho-rengue-kyo, Nam-myoho-rengue-kyo…. Se a compaixão de Daishonin é verdadeiramente imensa e abrangente, Nam-myoho-rengue-kyo irá difundir-se por dez mil anos e mais, por toda a eternidade, pois contém o poder benéfico de abrir os olhos cegos de cada ser vivo do Japão, e de bloquear as estradas que levam ao inferno de incessantes sofrimentos." (WND, 736). De acordo com o conceito dos "cinco períodos de quinhentos anos" 1 1 como descrito no Sutra Grande Coleção, após o falecimento do Buda Sakyamuni o Budismo passa por vários estágios de divulgação e prosperidade, e de corrupção e confusão. Através da história budista, vários foram os ensinos divulgados e que declinaram em diferentes períodos e lugares. Nos Últimos Dias da Lei, durante os quais a corrupção e confusão do Budismo se tornam exaltadas, um ensino profundo porém de fácil acesso se torna necessário. Daishonin identificou e revelou este ensinamento tão necessário para os Últimos Dias da Lei como Nam-myohorengue-kyo - a essência do Sutra de Lótus. Como o trecho do sutra acima citado e os próprios escritos de Daishonin deixam claro, o trabalho dos praticantes do Budismo nos Últimos Dias da Lei é dobrado. Somos requisitados a divulgar o ensino de Nam-myohorengue-kyo amplamente através do mundo por amor à paz e pela felicidade das pessoas. A propagação do Budismo de Nitiren Daishonin, todavia, acarreta muitos grandes obstáculos, os quais o sutra metaforicamente descreve como demônios. Um segundo, e muitas vezes esquecido aspecto de kossen-rufu, por conseguinte, é o de superar aqueles obstáculos à divulgação do ensino de Daishonin e proteger 269

sua integridade contra confusão e corrupção. Estes dois aspectos de kossen-rufu, ou seja, divulgar o ensinamento e superar os obstáculos a sua propagação, são inseparáveis; estão integrados à prática Budista nos Últimos Dias da Lei. Podemos divulgar Nam-myoho-rengue-kyo "tornando-o amplamente público" através do mundo inteiro, agora e no futuro, como Daishonin desejou e de acordo com o Sutra de Lótus. Entretanto, somente podemos fazer isto se não permitirmos que o fluxo de seu ensinamento seja cortado, nem que aqueles que obstruem sua propagação aproveitemse e tirem vantagem. Em "A Única Frase Essencial," Daishonin ressalta que muitas pessoas de seus dias foram iludidas pelos adornos sacerdotais - aspectos tais como eminência, rituais e cerimônias elaboradas, as suntuosas edificações de adoração nas quais eles oravam, etc. Os seguidores estimavam os ensinamento destes sacerdotes sem considerarem seus conteúdos. O declínio do Budismo nos Últimos Dias da Lei é devido, em parte, à corrupção dos sacerdotes e suas distorções do Budismo. A outra metade da culpa vai para as pessoas que comportavam-se com ingenuidade e ignorância. Daishonin conseqüentemente exprime sua preocupação: "Portanto, sem se darem conta, as pessoas que os seguem tornam-se inimigas do Sutra de Lótus e do Buda Sakyamuni." O fundamento do Budismo é sincera fé, como o próprio Daishonin declara, "Ter fé é a base do Budismo" ("O Real Aspecto do Gohonzon,"WND, 832). Todavia, sinceridade que carece de razão causa miséria. O Daishonin ressalta que "As pessoas são ignorantes de suas faltas." Porém, do ponto de vista do Budismo, embora as pessoas possam ser sinceras em seus intentos, se seguirem falsos ensinamentos, não podem escapar de suas responsabilidades por darem apoio à distorção do Budismo. Isto é o que é chamado de "ofensa de cumplicidade na difamação" pela qual as pessoas sofrerão o mesmo grau de retribuição dos verdadeiros difamadores da Lei. Por esta razão, aqueles que despertaram para o verdadeiro ensino de Nam-myoho-rengue-kyo têm a responsabilidade de ressaltar todas as distorções do Budismo e de ajudar os outros a superarem suas ilusões sobre o Budismo. Enquanto a maioria das pessoas estava avaliando as escolas Budistas pela boa aparência dos sacerdotes, Myoho e seu esposo reconheceram a verdade do Budismo nos ensinamentos de Daishonin e começaram a recitar Nam-myoho-rengue-kyo afim de expressarem seus inatos estados de Buda. O Daishonin escreve para louvá-los pela rara fé que eles têm, não manchada pelas confusões do Budismo em seus 270

arredores. Além disso, ele apoia a confiança deles na profundidade e imenso poder de Nam-myoho-rengue-kyo, ou, "a única frase essencial."

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Jambudvipa: De acordo com a visão da antiga India, um dos quatro continentes situados nas quatro direções ao redor do Monte Sumeru. Jambudvipa está localizado ao sul e é o lugar onde os Budas aparecem. É muitas vezes tido como referindo-se ao mundo inteiro. 9

yakshas (Skt): Um tipo de demônio. Originalmente, seres que serviam a Kubera, o deus da riqueza na antiga mitologia da India. Os yakshas foram incorporados ao budismo como um dos oito tipos de seres nãohumanos que trabalham para proteger o Budismo. Os yakshas são tidos como seguidores do rei celeste Vaishravana e protetores do norte, embora alguns sutras os retratem como demônios que atormentam e prejudicam os seres humanos. 1

0 kumbhanda (Skt): Uma classe de demônios. São considerados atendentes de Crescimento e Desenvolvimento, um dos quatro reis celestiais. 1

1 "os cinco períodos de quinhentos anos": Cinco períodos consecutivos descritos no Sutra Grande Coleção, que prediz o curso do Budismo nos primeiros duzentos e cinquenta anos seguintes à morte de Sakyamuni, uma época na qual é esperado que o Budismo seja divulgado, prospere e eventualmente decline. Numa seqüência cronológica, os cinco períodos de quinhentos anos são: (1) a idade de se chegar à emanicipação, (2) a idade da meditação, (3) a idade do estudo e recitação dos sutras e de receber preleção sobre eles, (4) a idade da construção de templos e relicários, e (5) a idade das contendas e disputas na qual os ensinos de Sakyamuni serão obscurecidos e perdidos. Os Períodos (1) e (2) constituem os Primeiros Dias da Lei; os Períodos (3) e (4), os Intermediários Dias da Lei, e o Período (5), o começo dos Últimos Dias da Lei.

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