apostila Completa 2008
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IPH UFRGS Maio 2008
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Introduzindo hidrologia WALTER COLLISCHONN – IPH UFRGS RUTINÉIA TASSI – IPH UFRGS Capa: Andreas Collischonn Ilustrações: Fernando Dornelles
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Capítulo
H I D R O L O G I A
Introdução O estudo da Hidrologia e conceitos fundamentais do ciclo hidrológico.
H
idrologia é a ciência que trata da água na Terra, sua ocorrênca, circulação, distribuição espacial, suas propriedades físicas e químicas e sua relação com o ambiente, inclusive com os seres vivos. A Hidrologia é o estudo da água na superfície terrestre, no solo e no sub-solo. De uma forma simplificada pode-se dizer que hidrologia tenta responder à pergunta: O que acontece com a água? A Hidrologia pode ser tanto uma ciência como um ramo da engenharia e tem muitos aspectos em comum com a meteorologia, geologia, geografia, agronomia, engenharia ambiental e a ecologia. A Hidrologia utiliza como base os conhecimentos de hidráulica, física e estatística. Existem outras ciências que também estudam o comportamento da água em diferentes fases, como a meteorologia, a climatologia, a oceanografia, e a glaciologia. A diferença fundamental é que a Hidrologia estuda os processos do ciclo da água em contato com os continentes.
Hidrologia nas Engenharias A humanidade tem se ocupado com a água como uma necessidade vital e como uma ameaça potencial pelo menos desde o tempo em que as primeiras civilizações se desenvolveram às margens dos rios. Primitivos engenheiros construíram canais, diques, barragens, condutos subterrâneos e poços ao longo do rio Indus, no Paquistão, dos rios Tigre e Eufrates, na Mesopotâmia, do Hwang Ho na China e do Nilo no Egito, há pelo menos 5000 anos.
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Hidrologia nas Ciências do Meio Ambiente O interesse em Ecologia e ciências do meio ambiente pela hidrologia é devido ao papel que esta ciência exerce no estudo dos aspectos físicos que condicionam o meio ambiente. A limnologia pode ser definida como o estudo ecológico de todas as massas de água continentais, incluindo lagos, lagunas estuários, represas, águas subterrâneas, águas temporárias, banhados e rios (Esteves, 1988). Apesar disso, a maior parte dos estudos de limnologia está focalizada em lagos. A hidrologia, por outro lado, tradicionalmente está mais ligada ao estudo dos rios. Entretanto, os conceitos abordados neste texto aplicam-se tanto a rios como a lagos, e, no caso das análises estatísticas, podem ser aplicadas à vazão como a outras variáveis, como o nível de lagos ou banhados, por exemplo. Grande parte do estudo da hidrologia foi desenvolvida para avaliar a variabilidade temporal de variáveis importantes do ciclo hidrológico e para projetar obras de engenharia adequadas para minimizar os impactos de manifestações extremas desta variabilidade, como enchentes e longas estiagens. Para a limnologia, por outro lado, a variabilidade temporal das variáveis hidrológicas constitui o pano de fundo em frente ao qual se desenvolvem os ecossistemas, e por isso deve ser mais bem compreendida. Portanto, também para a limnologia esta variabilidade temporal, caracterizada pelo regime hidrológico, é fundamental.
Hidrologia na Engenharia Elétrica O interesse em Hidrologia na Engenharia Elétrica é devido à utilização da água para a geração de energia. A potência de uma usina hidrelétrica é proporcional ao produto da descarga (ou vazão) pela queda. A queda é definida pela diferença de altitude do nível da água a montante (acima) e a jusante (abaixo) da turbina. A descarga em um rio depende das características da bacia hidrográfica, como o clima, a geologia, os solos, a vegetação. Em projetos de centrais hidrelétricas os estudos hidrológicos são necessários para:
• Escolha das turbinas adequadas e determinação da potência instalada.
• Análise da variação temporal da disponibilidade de energia. • Determinação da energia garantida ou firme. • Estimativa de vazões máximas em eventos extremos para dimensionamento das estruturas extravasoras.
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• Otimização da operação de sistemas interligados de geração elétrica que incluem hidrelétricas e termoelétricas.
•
Análise das relações entre o uso da água para geração de energia e outros usos, como irrigação, abastecimento urbano, navegação, preservação do meio ambiente e recreação.
No Brasil a geração de energia elétrica está fortemente ligada à hidrologia porque a quase totalidade da energia gerada e consumida é oriunda de usinas hidrelétricas. Considerando os dados da década de 1990, o Brasil é o terceiro maior produtor de energia hidrelétrica do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e do Canadá e a frente da China, da Rússia e da França. Entretanto, a energia hidrelétrica no Brasil corresponde a mais de 97% do total da energia elétrica gerada, enquanto que, na maior parte dos outros países, a energia hidrelétrica corresponde a percentuais muito menores do total, conforme a Tabela 1. 1. Destes países apenas a Noruega apresenta uma dependência semelhante da água no setor de energia, com 99% da energia de origem hidrelétrica. A dependência mundial da energia hidrelétrica é de apenas 20%, conforme pode ser observado na última linha da tabela.
Tabela 1. 1: Os dez países maiores produtores de energia hidrelétrica do mundo e a importância relativa da hidreletricidade na energia total produzida (Gleick, 2000).
País Estados Unidos Canadá China Brasil Rússia Noruega França Japão Índia Suécia Total dos 10 países Mundo
Capacidade Instalada(MW) 74.860 64.770 52.180 51.100 39.990 26.000 23.100 21.170 20.580 16.540 390.290 633.730
Energia Hidrelétrica produzida (GW.hora/ano) 296.380 330.690 166.800 250.000 162.800 112.680 65.500 91.300 72.280 63.500 1.611.030 2.445.390
Percentual da energia total produzida (%) 10 62 18 97 27 99 15 9 25 52 22 20
Mesmo em usinas termelétricas a água tem um papel fundamental e é consumida em quantidades significativas. Neste caso a água é utilizada nos ciclos internos de resfriamento e geração de vapor. Nos Estados Unidos as usinas termelétricas utilizam cerca de 260 bilhões de metros cúbicos por ano, o que corresponde a 47% da utilização total de água neste país. Deve se ressaltar, entretanto, que nem toda esta
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água é consumida, e grande parte retorna aos rios. Por este motivo, também as usinas termelétricas são construídas junto à fontes abundantes e confiáveis de água, e são necessários estudos hidrológicos para avaliar a sua disponibilidade.
A água A água é uma substância com características incomuns. É a substância mais presente na superfície do planeta Terra, cobrindo mais de 70% do globo. O corpo humano é composto por água mais ou menos na mesma proporção. Já um tomate é composto por mais de 90 % de água, assim como muitos outros alimentos. Todas as formas de vida necessitam da água para sobreviver. A água é a única substância na Terra naturalmente presente nas formas líquida, sólida e gasosa. A mesma quantidade de água está presente na Terra atualmente como no tempo em que os dinossauros habitavam o planeta, há milhões de anos atrás. A busca de vida em outros planetas está fortemente relacionada a busca de indícios da presença de água. A estrutura molecular da água (H2O) é responsável por uma característica fundamental da água que é a sua grande inércia térmica, isto é, a temperatura da água varia de forma lenta. O sol aquece as superfícies de terra e de água do planeta com a mesma energia, entretanto as variações de temperatura são muito menores na água. Em função deste aquecimento diferenciado e do papel regularizador dos oceanos, o clima da Terra tem as características que conhecemos. Comparada com outros líquidos a água também apresenta uma tensão superficial relativamente alta. Esta tensão superficial é responsável pela organização da chuva na forma de gotas e pela ascensão capilar da água nos solos. Os recursos de água têm determinado o destino de muitas civilizações ao longo história. Povos entraram em conflito e guerras foram iniciadas em torno problemas relacionados ao acesso à água. O crescimento da população mundial longo do último século tornou criticamente necessária a racionalização do uso água.
da de ao da
No Brasil a geração de energia elétrica é apenas um dos usos da água, mas sua importância é muito grande, chegando a influenciar fortemente as estimativas do valor associado á água.
A hidrosfera O termo hidrosfera refere-se a toda a água do mundo, que é estimada em aproximadamente 1,4 quilômetros cúbicos. Cerca de 97 % da água do mundo está nos oceanos. Dos 3% restantes, a metade (1,5% do total) está armazenada na forma de geleiras ou bancadas de gelo nas calotas polares. A água doce de rios, lagos e aqüíferos (reservatórios de água no subsolo) corresponde a menos de 1% do total.
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Em valores totais a água doce existente na Terra e a água que atinge a superfície dos continentes na forma de chuva é suficiente para atender todas as necessidades humanas. Entretanto, grandes problemas surgem com a grande variabilidade temporal e espacial da disponibilidade de água. A América do Sul é, de longe, o continente com a maior disponibilidade de água, porém a precipitação que atinge nosso continente é altamente variável, apresentando na Amazônia altíssimas taxas de precipitação enquanto o deserto de Atacama é conhecido como o lugar mais seco do mundo. No Brasil a disponibilidade de água é grande, porém existem regiões em que há crescentes conflitos em função da quantidade de água, como na região semi-árida do Nordeste. Mesmo no Rio Grande do Sul, onde a disponibilidade de água pode ser considerada alta, ocorrem anos secos em que a vazão de alguns rios não é suficiente para atender as demandas para abastecimento da população e para irrigação.
Tabela 1. 2: A água na Terra (Gleick, 2000).
Oceanos/água salgada Gelo permanente Água subterrânea
Percentual água do planeta (%) 97 1,7 0,76
Percentual da água doce (%) 69 30
Os processos do ciclo hidrológico são: precipitação; infiltração; escoamento; evapotranspiração e condensação.
Lagos Umidade do solo Água atmosférica Banhados Rios Biota
0,007 0,001 0,001 0,0008 0,0002 0,0001
0,26 0,05 0,04 0,03 0,006 0,003
O ciclo hidrológico O ciclo hidrológico é o conceito central da hidrologia. O ciclo hidrológico está ilustrado na Figura 1. 1. A energia do sol resulta no aquecimento do ar, do solo e da água superficial e resulta na evaporação da água e no movimento das massas de ar. O vapor de ar é transportado pelo ar e pode condensar no ar formando nuvens. Em circunstâncias específicas o vapor do ar condensado nas nuvens pode voltar à superfície da Terra na forma de precipitação. A evaporação dos oceanos é a maior fonte de vapor para a atmosfera e para a posterior precipitação, mas a evaporação de
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água dos solos, dos rios e lagos e a transpiração da vegetação também contribuem. A precipitação que atinge a superfície pode infiltrar no solo ou escoar por sobre o solo até atingir um curso d’água. A água que infiltra umedece o solo, alimenta os aqüíferos e cria o fluxo de água subterrânea. O ciclo hidrológico é fechado se considerado em escala global. Em escala regional podem existir alguns sub-ciclos. Por exemplo, a água precipitada que está escoando em um rio pode evaporar, condensar e novamente precipitar antes de retornar ao oceano. A água também sofre alterações de qualidade ao longo das diferentes fases do ciclo hidrológico. A água salgada do mar é transformada em água doce pelo processo de evaporação. A água doce que infiltra no solo dissolve os sais aí encontrados e a água que escoa pelos rios carrega estes sais para os oceanos, bem como um grande número de outras substâncias dissolvidas e em suspensão.
A energia que movimenta o ciclo hidrológico é fornecida pelo sol.
Figura 1. 1: O ciclo hidrológico.
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Capítulo
Bacia hidrográfica e balanço hídrico
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ciclo hidrológico é normalmente estudado com maior interesse na fase terrestre, onde o elemento fundamental da análise é a bacia hidrográfica. A bacia hidrográfica é a área de captação natural dos fluxos de água originados a partir da precipitação, que faz convergir os escoamentos para um único ponto de saída, seu exutório. A definição de uma bacia hidrográfica requer a definição de um curso d’água, de um ponto ou seção de referência ao longo deste curso d’água e de informações sobre o relevo da região. Uma bacia hidrográfica pode ser dividida em sub-bacias e cada uma das sub-bacias pode ser considerada uma bacia hidrográfica. A bacia hidrográfica pode ser considerada como um sistema físico sujeito a entradas de água (eventos de precipitação) que gera saídas de água (escoamento e evapotranspiração). A bacia hidrográfica transforma uma entrada concentrada no tempo (precipitação) em uma saída relativamente distribuída na tempo (escoamento). As características fundamentais de uma bacia que dependem do relevo são: •
Área
•
Comprimento da drenagem principal
•
Declividade
A área é um dado fundamental para definir a potencialidade hídrica de uma bacia, uma vez que a bacia é a região de captação da água da chuva. Assim, a área da bacia multiplicada pela lâmina precipitada ao longo de um intervalo de tempo define o volume de água recebido ao longo deste intervalo de tempo. A área de uma bacia hidrográfica pode ser estimada a partir da delimitação dos divisores da bacia em um mapa topográfico.
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Um exemplo de bacia delimitada é apresentado na Figura 2. 1. A bacia delimitada corresponde à bacia do Arroio Quilombo, próximo a Lomba Grande e Novo Hamburgo, até a seção que corresponde a ponte da estrada vicinal indicada no mapa. O divisor de águas apresentado como uma linha pontilhada separa as regiões do mapa em que a água da chuva vai escoar até a seção da ponte das regiões em que a água da chuva não vai escoar até esta seção. O divisor de águas passa, em geral, pelas regiões mais elevadas do entorno do Arroio Quilombo e de seus afluentes, mas não necessariamente inclui os pontos mais elevados do terreno. O divisor de águas intercepta a rede de drenagem em apenas um ponto, que corresponde ao exutório da bacia (no exemplo é a seção da ponte).
Figura 2. 1: Exemplo de uma bacia hidrográfica delimitada sobre um mapa topográfico.
A área da bacia pode ser medida através de um instrumento denominado planímetro ou utilizando representações digitais da bacia em CAD ou em Sistemas de Informação Geográfica.
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O comprimento da drenagem principal é uma característica fundamental da bacia hidrográfica porque está relacionado ao tempo de viagem da água ao longo de todo o sistema. O tempo de viagem da gota de água da chuva que atinge a região mais remota da bacia até o momento em que atinge o exutório é chamado de tempo de concentração da bacia. Tempo de concentração é o tempo que uma gota de chuva que atinge a região mais remota da bacia leva para atingir o exutório.
A declividade média da bacia e do curso d’água principal também são características que afetam diretamente o tempo de viagem da água ao longo do sistema. O tempo de concentração de uma bacia diminui com o aumento da declividade.
A equação de Kirpich, apresentada abaixo, pode ser utilizada para estimativa do tempo de concentração de pequenas bacias:
⎛ L3 ⎞ t c = 57 ⋅ ⎜⎜ ⎟⎟ ⎝ ∆h ⎠
0 , 385
onde tc é o tempo de concentração em minutos; L é o comprimento do curso d’água principal em km; e ∆h é a diferença de altitude em metros ao longo do curso d’água principal.
Outras características importantes da bacia Os tipos de solos, a geologia, a vegetação e o uso do solo são outras características importantes da bacia hidrográfica que não estão diretamente relacionadas ao relevo. Os tipos de solos e a geologia vão determinar em grande parte a quantidade de água precipitada que vai infiltrar no solo e a quantidade que vai escoar superficialmente. A vegetação tem um efeito muito grande sobre a formação do escoamento superficial e sobre a evapotranspiração. O uso do solo pode alterar as características naturais, modificando as quantidades de água que infiltram, que escoam e que evaporam, alterando o comportamento hidrológico de uma bacia.
Balanço hídrico numa bacia O balanço entre entradas e saídas de água em uma bacia hidrográfica é denominado balanço hídrico. A principal entrada de água de uma bacia é a precipitação. A saída de água da bacia pode ocorrer por evapotranspiração e por escoamento. Estas variáveis podem ser medidas com diferentes graus de precisão. O balanço hídrico de uma bacia exige que seja satisfeita a equação:
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dV = P− E −Q dt ou, num intervalo de tempo finito:
∆V = P−E−Q ∆t onde ∆V é a variação do volume de água armazenado na bacia (m3); ∆t é o intervalo de tempo considerado (s); P é a precipitação (m3.s-1); E é a evapotranspiração (m3.s-1); e Q é o escoamento (m3.s-1).
Figura 2. 2: Relevo de uma bacia hidrográfica e as entradas e saídas de água: P é a precipitação; ET é a evapotranspiração e Rs é o escoamento (adaptado de Hornberger et al., 1998).
Em intervalos de tempo longos, como um ano ou mais, a variação de armazenamento pode ser desprezada na maior parte das bacias, e a equação pode ser reescrita em unidades de mm.ano-1, o que é feito dividindo os volumes pela área da bacia.
P = E+Q onde P é a precipitação em mm.ano-1; E é a evapotranspiração em mm.ano-1 e Q é o escoamento em mm.ano-1.
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As unidades de mm são mais usuais para a precipitação e para a evapotranspiração. Uma lâmina de 1 mm de chuva corresponde a um litro de água distribuído sobre uma área de 1 m2. O percentual da chuva que se transforma em escoamento é chamado coeficiente de escoamento de longo prazo e é dado por:
C=
Q P
O coeficiente de escoamento tem, teoricamente, valores entre 0 e 1. Na prática os valores vão de 0,05 a 0,5 para a maioria das bacias. A Tabela 2. 1 apresenta dados de balanço hídrico para as grandes bacias brasileiras, de acordo com dados da Agência Nacional da Água (ANA). A região do Rio Grande do Sul está contida nas bacias do rio Uruguai e na bacia do Atlântico Sul, onde a precipitação média é de 1699 e 1481 mm por ano, respectivamente. Na bacia do rio Uruguai o escoamento é de 716 mm por ano, o que corresponde a 4040 m3.s-1 de vazão média nesta bacia, que tem área de 178.000 km2. Na bacia do Atlântico Sul, em que está inserida a bacia do rio Guaíba, o escoamento é de 643 mm por ano, enquanto a evapotranspiração, que completa o balanço, é de 838 mm por ano. O coeficiente de escoamento nas duas bacias é um pouco superior a 40%, o que significa que cerca de 40% da chuva é transformada em vazão, enquanto 60% retorna à atmosfera pelo processo de evapotranspiração.
Tabela 2. 1: Características de balanço hídrico das grandes regiões hidrográficas do Brasil (valores em mm correspondem às laminas médias precipitadas, escoadas e evaporadas ao longo de um ano).
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A tabela mostra que a evapotranspiração tende a ser maior nas bacias mais próximas do Equador. Observa-se também que a disponibilidade de água (vazão em mm por ano) é menor na bacia do rio São Francisco e na bacia Atlântico Leste (1) que inclui as regiões mais secas da região Nordeste do Brasil.
Exemplos 1) Qual seria a vazão de saída de uma bacia completamente impermeável, com área de 60km2, sob uma chuva constante à taxa de 10 mm.hora-1? Cada mm de chuva sobre a bacia de 60km2 corresponde a um volume total de 60.000 m3 lançados sobre a bacia, o que significa que em uma hora são lançados 600.000 m3 de água sobre esta bacia. Como a bacia é impermeável toda a água deve sair pelo exutório a uma vazão constante de 167 m3.s-1.
2) A região da bacia hidrográfica do rio Taquari recebe precipitações médias anuais de 1600 mm. Em Muçum (RS) há um local em que são medidas as vazões deste rio e uma análise de uma série de dados diários ao longo de 30 anos revela que a vazão média do rio é de 340 m3.s-1. Considerando que a área da bacia neste local é de 15.000 Km2, qual é a evapotranspiração média anual nesta bacia? Qual é o coeficiente de escoamento de longo prazo? O balanço hídrico de longo prazo de uma bacia é dado por P = E + Q onde P é a chuva média anual; E é a evapotranspiração média anual e Q é o escoamento médio anual. A vazão média de 340 m3.s-1 em uma bacia de 15.000 km2 corresponde ao escoamento anual de uma lâmina dada por: Q( mm / ano ) =
Q( m 3 .s −1 ) ⋅ 3600 ⋅ 24 ⋅ 365( s .ano −1 ) ⋅ 1000( mm.m −1 ) A( m 2 )
ou
Q( mm / ano ) = Q( m 3 .s −1 )
Q( mm / ano ) = 340 ⋅
3 ,6 ⋅ 24 ⋅ 365 A( km 2 )
3,6 ⋅ 24 ⋅ 365 ≅ 715 mm.ano −1 15000
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e a evapotranspiração é dada por E = P – Q =1600 – 715 = 885 mm.ano-1. O coeficiente de escoamento de longo prazo é dado por C = Q/P = 715/1600 = 0,447.
Exercícios 1) Uma bacia de 100 km2 recebe 1300 mm de chuva anualmente. Qual é o volume de chuva (em m3) que atinge a bacia por ano? 2) Uma bacia de 1100 km2 recebe anualmente 1750 mm de chuva, e a vazão média corresponde a 18 m3/s. Calcule a evapotranspiração total desta bacia (em mm/ano). 3) A região da bacia hidrográfica do rio Uruguai recebe precipitações médias anuais de 1700 mm. Estudos anteriores mostram que o coeficiente de escoamento de longo prazo é de 0,42 nesta região. Qual é a vazão média esperada em um pequeno afluente do rio Uruguai numa seção em que a área da bacia é de 230 km2. 4) Considera-se para o dimensionamento de estruturas de abastecimento de água que um habitante de uma cidade consome cerca de 200 litros de água por dia. Qual é a área de captação de água da chuva necessária para abastecer uma casa de 4 pessoas em uma cidade com precipitações anuais de 1400 mm, como Porto Alegre? Considere que a área de captação seja completamente impermeável.
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Precipitação
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água da atmosfera que atinge a superfície na forma de chuva, granizo, neve, orvalho, neblina ou geada é denominada precipitação. Na realidade brasileira a chuva é a forma mais importante de precipitação, embora grandes prejuízos possam advir da ocorrência de precipitação na forma de granizo e em alguns locais possa eventualmente ocorrer a neve. A chuva é a causa mais importante dos processos hidrológicos de interesse da engenharia e é caracterizada por uma grande aleatoriedade espacial e temporal. A água existente na atmosfera está, em sua maior parte, na forma de vapor. A quantidade de vapor que o ar pode conter é limitada. Ar a 20º C pode conter uma quantidade máxima de vapor de, aproximadamente, 20 gramas por metro cúbico. Quantidades de vapor superiores a este limite acabam condensando. A quantidade máxima de vapor que pode ser contida no ar sem condensar é a concentração de saturação. Uma característica muito importante da concentração de saturação é que ela aumenta com o aumento da temperatura do ar. Assim, ar mais quente pode conter mais vapor do que ar frio. A Figura 3. 1 apresenta a variação da concentração de saturação de vapor no ar com a temperatura. Observa-se que o ar a 10º C pode conter duas vezes mais vapor do que o ar a 0º C. O ar atmosférico apresenta um forte gradiente de temperatura, com temperatura relativamente alta junto à superfície e temperatura baixa em grandes altitudes. O processo de formação das nuvens de chuva está associado ao movimento ascendente de uma massa de ar úmido. Neste processo a temperatura do ar vai diminuindo até que o vapor do ar começa a condensar. Isto ocorre porque a quantidade de água que o ar pode conter sem que ocorra condensação é maior para o ar quente do que para o ar frio. Quando este vapor se condensa, pequenas gotas começam a se formar, permanecendo suspensas no ar por fortes correntes ascendentes e pela turbulência. Porém, em certas condições, as gotas das nuvens crescem, atingindo tamanho e peso
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suficiente para vencer as correntes de ar que as sustentam. Nestas condições, a água das nuvens se precipita para a superfície da Terra, na forma de chuva.
Figura 3. 1: Relação entre a temperatura e o conteúdo de vapor de água no ar na condição de saturação.
A formação das nuvens de chuva está, em geral, associada ao movimento ascendente de massas de ar úmido. A causa da ascensão do ar úmido é considerada para diferenciar os principais tipos de chuva: frontais, convectivas ou orográficas.
Chuvas frontais As chuvas frontais ocorrem quando se encontram duas grandes massas de ar, de diferente temperatura e umidade. Na frente de contato entre as duas massas o ar mais quente (mais leve e, normalmente, mais úmido) é empurrado para cima, onde atinge temperaturas mais baixas, resultando na condensação do vapor. As massas de ar que formam as chuvas frontais têm centenas de quilômetros de extensão e movimentam se de forma relativamente lenta, conseqüentemente as chuvas frontais caracterizam-se pela longa duração e por atingirem grandes extensões. No Brasil as chuvas frontais são muito freqüentes na região Sul, atingindo também as regiões Sudeste, Centro Oeste e, por vezes, o Nordeste. Chuvas frontais têm uma intensidade relativamente baixa e uma duração relativamente longa. Am alguns casos as frentes podem ficar estacionárias, e a chuva pode atingir o mesmo local por vários dias seguidos.
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Figura 3. 2: Tipos de chuvas
Chuvas orográficas As chuvas orográficas ocorrem em regiões em que um grande obstáculo do relevo, como uma cordilheira ou serra muito alta, impede a passagem de ventos quentes e úmidos, que sopram do mar, obrigando o ar a subir. Em maiores altitudes a umidade do ar se condensa, formando nuvens junto aos picos da serra, onde chove com muita freqüência. As chuvas orográficas ocorrem em muitas regiões do Mundo, e no Brasil são especialmente importantes ao longo da Serra do Mar.
Chuvas convectivas As chuvas convectivas ocorrem pelo aquecimento de massas de ar, relativamente pequenas, que estão em contato direto com a superfície quente dos continentes e oceanos. O aquecimento do ar pode resultar na sua subida para níveis mais altos da atmosfera onde as baixas temperaturas condensam o vapor, formando nuvens. Este
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processo pode ou não resultar em chuva, e as chuvas convectivas são caracterizadas pela alta intensidade e pela curta duração. Normalmente, porém, as chuvas convectivas ocorrem de forma concentrada sobre áreas relativamente pequenas. No Brasil há uma predominância de chuvas convectivas, especialmente nas regiões tropicais. Os processos convectivos produzem chuvas de grande intensidade e de duração relativamente curta. Problemas de inundação em áreas urbanas estão, muitas vezes, relacionados às chuvas convectivas.
Medição da chuva A chuva é medida utilizando instrumentos chamados pluviômetros que nada mais são do que recipientes para coletar a água precipitada com algumas dimensões padronizadas. O pluviômetro mais utilizado no Brasil tem uma forma cilíndrica com uma área superior de captação da chuva de 400 cm2, de modo que um volume de 40 ml de água acumulado no pluviômetro corresponda a 1 mm de chuva. O pluviômetro é instalado a uma altura padrão de 1,50 m do solo (figura XXXX) e a uma certa distância de casas, árvores e outros obstáculos que podem interferir na quantidade de chuva captada. Nos pluviômetros da rede de observação mantida pela Agência Nacional da Água (ANA) a medição da chuva é realizada uma vez por dia, sempre às 7:00 da manhã, por um observador que anota o valor lido em uma caderneta. A ANA tem uma rede de 2473 estações pluviométricas distribuídos em todo o Brasil. Além da ANA existem outras instituições e empresas que mantém pluviômetros, como o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), empresas de geração de energia hidrelétrica e empresas de pesquisa agropecuária. No banco de dados da ANA (www.hidroweb.ana.gov.br) estão cadastradas 14189 estações pluviométricas de diversas entidades, mas apenas 8760 estão em atividade atualmente. Existem pluviômetros adaptados para realizar medições de forma automática, registrando os dados medidos em intervalos de tempo inferiores a um dia. São os pluviógrafos, que originalmente eram mecânicos, utilizavam uma balança para pesar o peso da água e um papel para registrar o total precipitado. Os pluviógrafos antigos com registro em papel foram substituídos, nos últimos anos, por pluviógrafos eletrônicos com memória (data-logger). O pluviógrafo mais comum atualmente é o de cubas basculantes, em que a água recolhida é dirigida para um conjunto de duas cubas articuladas por um eixo central. A água é dirigida inicialmente para uma das cubas e quando esta cuba recebe uma quantidade de água equivalente a 20 g, aproximadamente, o conjunto báscula em
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torno do eixo, a cuba cheia esvazia e a cuba vazia começa a receber água. Cada movimento das cubas basculantes equivale a uma lâmina precipitada (por exemplo 0,25 mm), e o aparelho registra o número de movimentos e o tempo em que ocorre cada movimento. A principal vantagem do pluviógrafo sobre o pluviômetro é que permite analisar detalhadamente os eventos de chuva e sua variação ao longo do dia. Além disso, o pluviógrafo eletrônico pode ser acoplado a um sistema de transmissão de dados via rádio ou telefone celular.
Figura 3. 3: Características de um pluviômetro.
A chuva também pode ser estimada utilizando radares meteorológicos. A medição de chuva por radar está baseada na emissão de pulsos de radiação eletromagnética que são refletidos pelas partículas de chuva na atmosfera, e na medição do da intensidade do sinal refletido. A relação entre a intensidade do sinal enviado e recebido, denominada refletividade, é correlacionada à intensidade de chuva que está caindo em uma região. A principal vantagem do radar é a possibilidade de fazer estimativas de taxas de precipitação em uma grande região no entorno da antena emissora e receptora, embora existam erros consideráveis quando as estimativas são comparadas com dados de pluviógrafos. No Brasil são poucos os radares para uso meteorológico, com a exceção do Estado de São Paulo em que existem alguns em operação. Em alguns países, como os EUA, a Inglaterra e a Alemanha, já existe uma cobertura completa com sensores de radar para estimativa de chuva.
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Também é possível fazer estimativas da precipitação a partir de imagens obtidas por sensores instalados em satélites. A temperatura do topo das nuvens, que pode ser estimada a partir de satélites, tem uma boa correlação com a precipitação. Além disso, existem experimentos de radares a bordo de satélites que permitem aprimorar a estimativa baseada em dados de temperatura de topo de nuvem.
Análise de dados de chuva As variáveis que caracterizam a chuva são a sua altura (lâmina precipitada), a intensidade, a duração e a freqüência. Duração é o período de tempo durante o qual a chuva cai. Normalmente é medida em minutos ou horas. A altura é a espessura média da lâmina de água que cobriria a região atingida se esta região fosse plana e impermeável. A unidade de medição da altura de chuva é o milímetro de chuva. Um milímetro de chuva corresponde a 1 litro de água distribuído em um metro quadrado. Intensidade é a altura precipitada dividida pela duração da chuva, e é expressa, normalmente, em mm.hora-1. Freqüência é a quantidade de ocorrências de eventos iguais ou superiores ao evento de chuva considerado. Chuvas muito intensas tem freqüência baixa, isto é, ocorrem raramente. Chuvas pouco intensas são mais comuns. A Tabela 3. 1 apresenta a análise de freqüência de ocorrência de chuvas diárias de diferentes intensidades ao longo de um período de 23 anos em uma estação pluviométrica no interior do Paraná. Observa-se que ocorreram 5597 dias sem chuva (P = zero) no período total de 8279 dias, isto é, em 67% dos dias do período não ocorreu chuva. Em pouco mais de 17% dos dias do período ocorreram chuvas com intensidade baixa (menos do que 10 mm). A medida em que aumenta a intensidade da chuva diminui a freqüência de ocorrência. A variável utilizada na hidrologia para avaliar eventos extremos como chuvas muito intensas é o tempo de retorno (TR), dado em anos. O tempo de retorno é uma estimativa do tempo em que um evento é igualado ou superado, em média. Por exemplo, uma chuva com intensidade equivalente ao tempo de retorno de 10 anos é igualada ou superada somente uma vez a cada dez anos, em média. Esta última ressalva “em média” implica que podem, eventualmente, ocorrer duas chuvas de TR 10 anos em dois anos subseqüentes.
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Tabela 3. 1: Freqüência de ocorrência de chuvas diárias de diferentes alturas em um posto pluviométrico no interior do Paraná ao longo de um período de, aproximadamente, 23 anos.
Bloco P = zero P < 10 mm 10 < P < 20 mm 20 < P < 30 mm 30 < P < 40 mm 40 < P < 50 mm 50 < P < 60 mm 60 < P < 70 mm 70 < P < 80 mm 80 < P < 90 mm 90 < P < 100 mm 100 < P < 110 mm 110 < P < 120 mm 120 < P < 130 mm 130 < P < 140 mm 140 < P < 150 mm 150 < P < 160 mm 160 < P < 170 mm 170 < P < 180 mm 180 < P < 190 mm 190 < P < 200 mm P > 200 mm Total
Freqüência 5597 1464 459 289 177 111 66 38 28 20 8 7 2 5 2 1 1 1 2 1 0 0 8279
O tempo de retorno pode, também, ser definido como o inverso da probabilidade de ocorrência de um determinado evento em um ano qualquer. Por exemplo, se a chuva de 130 mm em um dia é igualada ou superada apenas 1 vez a cada 10 anos diz-se que seu Tempo de Retorno é de 10 anos, e que a probabilidade de acontecer um dia com chuva igual ou superior a 130 mm em um ano qualquer é de 10%, ou seja: O Tempo de Retorno é igual ao inverso da probabilidade.
TR =
1 Pr obabilidade
Variabilidade espacial da chuva Os dados de chuva dos pluviômetros e pluviógrafos referem-se a medições executadas em áreas muito restritas (400 cm2), quase pontuais. Porém a chuva caracteriza-se por
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uma grande variabilidade espacial. Assim, durante um evento de chuva um pluviômetro pode ter registrado 60 mm de chuva enquanto um outro pluviômetro, a 30 km de distância registrou apenas 40 mm para o mesmo evento. Isto ocorre porque a chuva apresenta uma grande variabilidade espacial, principalmente se é originada por um processo convectivo. A forma de representar a variabilidade espacial da chuva para um evento, para um ano inteiro de dados ou para representar a precipitação média anual ao longo de um período de 30 anos são as linhas de mesma precipitação (isoietas) desenhadas sobre um mapa. As isoietas são obtidas por interpolação dos dados de pluviômetros ou pluviógrafos e podem ser traçadas de forma manual ou automática. A Figura 3. 4 apresenta um mapa de isoietas de chuva média anual do Estado de São Paulo, com base em dados de 1943 a 1988. Observa-se que a chuva média anual sobre a maior parte do Estado é da ordem de 1300 a 1500 mm por ano, mas há uma região próxima ao litoral com chuvas anuais de mais de 3000 mm por ano. As regiões onde as isoietas ficam muito próximas entre si é caracterizada por uma grande variabilidade espacial.
Variabilidade sazonal da chuva Um dos aspectos mais importantes do clima e da hidrologia de uma região é a época de ocorrência das chuvas. Existem regiões com grande variabilidade sazonal da chuva, com estações do ano muito secas ou muito úmidas. Na maior parte do Brasil o verão é o período das maiores chuvas. No Rio Grande do Sul, entretanto, a chuva é relativamente bem distribuída ao longo de todo o ano (em média). Isto não impede, entretanto, que em alguns anos ocorram invernos ou verões extremamente secos ou extremamente úmidos. A variabilidade sazonal da chuva é representada por gráficos com a chuva média mensal, como o apresentado na Figura 3. 5 para Porto Alegre. Observa-se que no Sul do Brasil existe uma distribuição mais homogênea das chuvas ao longo do ano, enquanto no Centro-Oeste ocorrem verões muito úmidos e invernos muito secos.
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Figura 3. 4: Exemplo de representação da variabilidade especial da chuva com um mapa de isoietas.
Figura 3. 5: Variabilidade sazonal da chuva em Porto Alegre e Cuiabá, representada pelas chuvas médias mensais no período de 1961 a 1990.
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Chuvas médias numa área Os dados de chuva dos pluviômetros e pluviógrafos referem-se a uma área de coleta de 400 cm2, ou seja, quase pontual. Porém, o maior interesse na hidrologia é por chuvas médias que atingem uma região, como a bacia hidrográfica. O cálculo da chuva média em uma bacia pode ser realizado utilizando o método da média aritmética; das Isoietas; dos polígonos de Thiessen ou através de interpolação em Sistemas de Informação Geográfica (SIGs). O método mais simples é o da média aritmética, em que se calcula a média das chuvas ocorridas em todos os pluviômetros localizados no interior de uma bacia.
EXEMPLO
1) Qual é a precipitação média na bacia da Figura 3. 6? Utilizando o método da média aritmética considera-se os pluviômetros que estão no interior da bacia. A média da chuva é Pm = (66+50+44+40)/4 = 50 mm.
Figura 3. 6: Mapa de uma bacia com as chuvas observadas em cinco pluviômetros.
O método das isoietas parte de um mapa de isoietas, como o da Figura 3. 4, e calcula a área da bacia que corresponde ao intervalo entre as isoietas. Assim, considera-se que a área entre as isoietas de 1200 e 1300 mm receba 1250 mm de chuva. Um dos métodos mais utilizados, entretanto, é o método de Thiessen, ou do vizinho mais próximo. Neste método é definida a área de influência de cada posto e é calculada uma média ponderada da precipitação com base nestas áreas de influência.
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Figura 3. 7: Mapa da bacia com chuvas nos postos pluviométricos para o exemplo 2. EXEMPLO
2) Qual é a precipitação média na bacia da Figura 3. 7? Utilizando o método dos polígonos de Thiessen o primeiro passo é traçar linhas que unem os postos pluviométricos mais próximos. A seguir é determinado o ponto médio em cada uma destas linhas e traçada uma linha perpendicular. A interceptação das linhas médias entre si e com os limites da bacia vão definir a área de influência de cada um dos postos. A seqüência é apresentada na próxima página. Área total = 100 km2 Área sob influência do posto com 120 mm = 15 km2 Área sob influência do posto com 70 mm = 40 km2 Área sob influência do posto com 50 mm = 30 km2 Área sob influência do posto com 75 mm = 5 km2 Área sob influência do posto com 82 mm = 10 km2
Precipitação média na bacia: Pm = 120x0,15+70x0,40+50x0,30+75x0,05+82x0,10 = 73 mm. Se fosse utilizado o método da média aritmética haveria apenas dois postos no interior da bacia, com uma média de 60 mm. Se fosse calculada uma média incluindo os postos que estão fora da bacia chegaríamos a 79,5 mm.
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Traçar linhas que unem os postos pluviométricos mais próximos entre si.
Traçar linhas médias perpendiculares às linhas que unem os postos pluviométricos.
Definir a região de influência de cada posto pluviométrico e medir a sua área.
Figura 3. 8: Exemplo de definição dos polígonos de Thiessen.
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Chuvas anuais A chuva média anual é uma das variáveis mais importantes na definição do clima de uma região, bem como sua variabilidade sazonal. O total de chuva precipitado ao longo de um ano influencia fortemente a vegetação existente numa bacia e as atividades humanas que podem ser exercidas na região. Na região de Porto Alegre, por exemplo, chove aproximadamente 1300 mm por ano, em média. Em muitas regiões da Amazônia chove mais do que 2000 mm por ano, enquanto na região do Semi-Árido do Nordeste há áreas com menos de 600 mm de chuva por ano. O clima, entretanto, não é constante, e ocorrem variações importantes em torno da média da precipitação anual. A Figura 3. 9 apresenta um histograma de freqüências de chuvas anuais de um posto localizado no interior de Minas Gerais, no período de 1942 a 2001. A chuva média neste período é de 1433 mm, mas observa-se que ocorreu um ano com chuva inferior a 700 mm, e um ano com chuva superior a 2300 mm. A distribuição de freqüência da Figura 3. 9 é aproximadamente gaussiana (parecida com a distribuição Normal). Conhecendo o desvio padrão das chuvas e considerando que a distribuição é Normal, podemos estimar que 68% dos anos Chuvas anuais têm uma apresentam chuvas entre a média menos um desvio distribuição de padrão e a média mais um desvio padrão. Da mesma freqüências semelhante a forma podemos considerar que 95% dos anos Normal. apresentam chuvas entre a média menos duas vezes o desvio padrão e a média mais duas vezes o desvio padrão. O desvio padrão da chuva anual no posto pluviométrico da Figura 3. 9 é de 298,8 mm.
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Figura 3. 9: Histograma de frequencia de chuvas anuais no posto 02045005, no município de Lamounier (MG).
EXEMPLO
3) O desvio padrão da chuva anual no posto pluviométrico da Figura 3. 9 é de 298,8 mm e a média de 1433 mm. Estime qual o valor de precipitação anual que é igualado ou superado apenas 5 vezes a cada 200 anos, em média. A faixa de chuva entre a média menos duas vezes o desvio padrão e a média mais duas vezes o desvio padrão inclui 95% dos anos em média, e 2,5 % dos anos tem precipitação inferior à média menos duas vezes o desvio padrão, enquanto 2,5% tem precipitação superior à média mais duas vezes o desvio padrão, o que corresponde a 5 anos a cada 200, em média. Assim, a chuva anual que é superada ou igualada apenas 5 vezes a cada 200 anos é: P2,5% = 1433+2x298,8 = 2030 mm
Chuvas máximas As chuvas intensas são as causas das cheias e as cheias são causas de grandes prejuízos quando os rios transbordam e inundam casas, ruas, estradas, escolas, podendo destruir plantações, edifícios, pontes etc. e interrompendo o tráfego. As cheias também podem trazer sérios prejuízos à saúde pública ao disseminar doenças de veiculação hídrica. Por estes motivos existe o interesse pelo conhecimento detalhado de chuvas máximas no projeto de estruturas hidráulicas como bueiros, pontes, canais e vertedores. O problema da análise de freqüência de chuvas máximas é calcular a precipitação P que atinge uma área A em uma duração D com uma dada probabilidade de ocorrência em um ano qualquer. A forma de relacionar quase todas estas variáveis é a curva de Intensidade – Duração – Freqüência (curva IDF). A curva IDF é obtida a partir da análise estatística de séries longas de dados de um pluviógrafo (mais de 15 anos, pelo menos). A metodologia de desenvolvimento da curva IDF baseia-se na seleção das maiores chuvas de uma duração escolhida (por exemplo 15 minutos) em cada ano da série de dados. Com base nesta série de tamanho N (número de anos) é ajustada uma distribuição de freqüências que melhor represente a distribuição dos valores observados. O procedimento é repetido para diferentes durações de chuva (5 minutos; 10 minutos; 1 hora; 12 horas; 24 horas; 2 dias; 5 dias) e os resultados são resumidos na forma de um gráfico, ou equação, com a relação das três variáveis: Intensidade, Duração e Freqüência (ou tempo de retorno).
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A Figura 3. 10 apresenta uma curva IDF obtida a partir da análise dos dados de um pluviógrafo que esteve localizado no Parque da Redenção, em Porto Alegre. Cada uma das linhas representa um Tempo de Retorno; no eixo horizontal estão as durações e no eixo vertical estão as intensidades. Observa-se que quanto menor a duração maior a intensidade da chuva. Da mesma forma, quanto maior o Tempo de Retorno, maior a intensidade da chuva. Por exemplo, a chuva de 1 hora de duração com tempo de retorno de 20 anos tem uma intensidade de 60 mm.hora-1.
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Figura 3. 10: Curva IDF para a cidade de Porto Alegre, com base nos dados coletados pelo pluviógrafo do DMAE localizado no Parque da Redenção, publicada pelo DMAE em 1972 (adaptado de Tucci, 1993).
Evidentemente as curvas IDF são diferentes em diferentes locais. Assim, a curva IDF de Porto Alegre vale para a região próxima a esta cidade. Infelizmente não existem séries de dados de pluviógrafos longas em todas as cidades, assim, muitas vezes, é necessário considerar que a curva IDF de um local é válida para uma grande região do entorno. No Brasil existem estudos de chuvas intensas com curvas IDF para a maioria das capitais dos Estados e para algumas cidades do interior, apenas. É interessante comparar as intensidade de chuva da curva IDF da Figura 3. 10 com as chuvas da Tabela 3. 2, que apresenta as chuvas mais intensas já registradas no mundo, para diferentes durações. Observa-se que existem regiões da China em que já ocorreu em 10 horas a chuva de 1400 mm, que é equivalente ao total anual médio de precipitação em Porto Alegre.
Tabela 3. 2: Chuvas mais intensas já registradas no Mundo (adaptado de Ward e Trimble, 2003).
Duração
Precipitação (mm)
Local e Data
1 minuto
38
Barot, Guadeloupe 26/11/1970
15 minutos
198
Plumb Point, Jamaica 12/05/1916
30 minutos
280
Sikeshugou, Hebei, China 03/07/1974
60 minutos
401
Shangdi, Mongólia, China 03/07/1975
10 horas
1400
Muduocaidang, Mongólia, China 01/08/1977
24 horas
1825
Foc Foc, Ilhas Reunião 07 e 08/01/1966
12 meses
26461
Cherrapunji, Índia Ago. de 1860 a Jul. de 1861
Exercícios 1) Qual é a diferença entre um pluviômetro e um pluviógrafo? 2) Além do pluviômetro e do pluviógrafo, quais são as outras opções para medir ou estimar a precipitação?
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3) Uma análise de 40 anos de dados revelou que a chuva média anual em um local na bacia do rio Uruguai é de 1800 mm e o desvio padrão é de 350 mm. Considerando que a chuva anual neste local tem uma distribuição normal, qual é o valor de chuva anual de um ano muito seco, com tempo de recorrência de 40 anos? 4) Considerando a curva IDF do DMAE para o posto pluviográfico do Parque da Redenção, qual é a intensidade da chuva com duração de 40 minutos que tem 1% de probabilidade de ser igualada ou superada em um ano qualquer em Porto Alegre? 5) No dia 03 de janeiro de 2007 uma chuva intensa atingiu Porto Alegre. Na Zona Sul a medição em um pluviômetro indicou 111 mm em 2 horas, e no centro outro pluviômetro indicou 80 mm em 2 horas. Qual foi o tempo de retorno da chuva em cada um destes locais? Considere intensidade constante e utilize a curva IDF do Parque da Redenção. 6) Qual é a diferença entre a chuva de 10 anos de tempo de retorno e 15 minutos de duração em Porto Alegre e a maior chuva já registrada no mundo com esta duração? 7) Qual é a chuva média na bacia da figura abaixo considerando que a chuva observada em A é de 1300 mm, a chuva observada em B é de 900 mm e a chuva observada em C é de 1100 mm?
30
D E S I G N
C U S T O M I Z A T I O N
4
Capítulo
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Infiltração e água no solo
I
nfiltração é definida como a passagem da água através da superfície do solo, passando pelos poros e atingindo o interior, ou perfil, do solo. A infiltração de água no solo é importante para o crescimento da vegetação, para o abastecimento dos aquíferos (reservatórios de água subterrânea), para armazenar a água que mantém o fluxo nos rios durante as estiagens, para reduzir o escoamento superficial, reduzir as cheias e diminuir a erosão.
Composição do solo A água infiltrada no solo preenche os poros originalmente ocupados pelo ar. Assim, o solo é uma mistura de materiais sólidos, líquidos e gasosos. Na mistura também encontram-se muitos organismos vivos (bactérias, fungos, raízes, insetos, vermes) e matéria orgânica, especialmente nas camadas superiores, mais próximas da superfície. A Figura 4. 1 apresenta a proporção das partes mineral, água, ar e matéria orgância tipicamente encontradas na camada superficial do solo (horizonte A). Aproximadamente 50% do solo é composto de material sólido, enquanto o restante são poros que podem ser ocupados por água ou pelo ar. O conteúdo de ar e de água é Figura 4. 1: Composição típica do solo (Lepsch, 2004). variável.
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A parte sólida mineral do solo normalmente é analisada do ponto de vista do diâmetro das partículas. De acordo com o diâmetro as partículas são classificadas como argila, silte, areia fina, areia grossa, e cascalhos ou seixos. A Tabela 4. 1 apresenta a classificação das partículas adotada pela Sociedade Internacional de Ciência do Solo, de acordo com seu diâmetro. Geralmente, os solos são formados por misturas de materiais das diferentes classes. As características do solo e a forma com que a água se movimenta e é armazenada no solo dependem do tipo de partículas encontradas na sua composição. Cinco tipos de textura de solo são definidas com base na proporção de materiais de diferentes diâmetros, conforme a Figura 4. 2.
Tabela 4. 1: Classificação das partículas que compõe o solo de acordo com o diâmetro.
diâmetro (mm) 0,0002 a 0,002 0,002 a 0,02 0,02 a 0,2 0,2 a 2,0
Classe Argila Silte Areia fina Areia grossa
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Figura 4. 2: Os cinco tipos de textura do solo, de acordo com a proporção de argila, areia e silte (Lepsch, 2004).
A porosidade do solo é definida como a fração volumétrica de vazios, ou seja, o volume de vazios dividido pelo volume total do solo. A porosidade de solos arenosos varia entre 37 a 50 %, enquanto a porosidade de solos argilosos varia entre, aproximadamente, 43 a 52%. É claro que estes valores de porosidade podem variar bastante, dependendo do tipo de vegetação, do grau de compactação, da estrutura do solo (resultante da combinação das partículas finas em agregados maiores) e da quantidade de material orgânico e vivo.
Água no solo Quando um solo tem seus poros completamente ocupados por água, diz se que está saturado. Ao contrário, quando está completamente seco, seus poros estão completamente ocupados por ar. É desta forma que normalmente é medido o grau de umidade do solo. Uma amostra de solo é coletada e pesada na condição de umidade encontrada no campo. A seguir esta amostra é seca em um forno a 105 oC por 24 horas para que toda a umidade seja retirada e a amostra é pesada novamente. A umidade do solo é calculada a partir da diferença de peso encontrada. Além deste método, denominado gravimétrico, existem outras formas de medir a umidade do solo. Um método bastante utilizado é o chamado TDR (Time Domain
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Reflectometry). Este método está baseado na relação entre a umidade do solo e a sua constante dielétrica. Duas placas metálicas são inseridas no solo e é medido o tempo de transmissão de um pulso eletromagnético através do solo, entre o par de placas. A vantagem deste método é que não é necessário destruir a amostra de solo para medir a sua umidade, e o monitoramento pode Saturação: condição em que todos os ser contínuo. poros estão ocupados por água Uma importante forma de analisar o comportamento da água no solo é a curva de retenção de umidade, ou curva de retenção de água no solo (Figura 4. 3). Esta curva relaciona o conteúdo de umidade do solo e o esforço (em termos de pressão) necessário para retirar a água
Capacidade de campo: Conteúdo de umidade no solo sujeito à força da gravidade Ponto de murcha permanente: umidade do solo para a qual as plantas não conseguem mais retirar água e morrem
do solo. Como uma esponja mergulhada em um balde, o solo que é completamente imerso em água fica completamente saturado. Ao ser suspensa no ar, a esponja perde parte da água que escoa devido à força da gravidade. Da mesma forma o solo tem parte da sua umidade retirada pela ação da gravidade, atingindo uma situação denominada capacidade de campo. A partir daí, a retirada de água do solo é mais difícil e exige a ação de uma pressão negativa (sucção). As plantas conseguem retirar água do solo até um limite de sucção, denominado ponto de murcha permanente, a partir do qual não se recuperarão mais mesmo se regadas. A curva de retenção de água no solo é diferente para diferentes texturas de solo. Solos argilosos tendem a ter maior conteúdo de umidade na condição de saturação e de capacidade de campo, o que é positivo para as plantas. Mas, da mesma forma, apresentam maior umidade no ponto de murcha. Observa-se na curva relativa à argila que a umidade do solo argiloso no ponto de murcha permanente é de quase 20%, o que significa que nesta condição ainda há Figura 4. 3: Curva de retenção de água no solo (Ward e Trimble, 2004) muita água no solo, entretanto esta água está tão fortemente ligada às partículas de argila que as plantas não conseguem retirá-la do solo, e morrem.
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Balanço de água no solo Em condições naturais a umidade do solo varia ao longo do tempo, sob o efeito das chuvas e das variações sazonais de temperatura, precipitação e evapotranspiração. Uma equação de balanço hídrico de uma camada de solo pode ser expressa pela equação
∆V = P − Q − G − ET onde ∆V é a variação de volume de água armazenada no solo; P é a precipitação; Q é o escoamento superficial; G é a percolação e ET é a evapotranspiração. A percolação (G) é a passagem da água da camada superficial do solo para camadas mais profundas. A evapotranspiração é a retirada de água por evaporação direta do solo e por transpiração das plantas. A infiltração é a diferença entre a precipitação (P) e o escoamento superficial (Q).
Movimento de água no solo e infiltração O solo é um meio poroso, e o movimento da água em meio poroso é descrito pela equação de Darcy. Em 1856, Henry Darcy desenvolveu esta relação básica realizando experimentos com areia, concluindo que o fluxo de água através de um meio poroso é proporcional ao gradiente hidráulico.
q=K⋅
∂h ∂x
Q = K ⋅ A⋅
e ∂h ∂x
onde Q é o fluxo de água (m3.s-1); A é a área (m2) q é o fluxo de água por unidade de área (m.s-1); K é a condutividade hidráulica (m.s-1); h é a carga hidráulica e x a distância.
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A condutividade hidráulica K é fortemente dependente do tipo de material poroso. Assim, o valor de K para solos arenosos é próximo de 20 cm.hora-1. Para solos siltosos este valor cai para 1,3 cm.hora-1 e em solos argilosos este valor cai ainda mais para 0,06 cm.hora-1. Portanto os solos arenosos conduzem mais facilmente a água do que os solos argilosos, e a infiltração e a percolação da água no solo são mais intensas e rápidas nos solos arenosos do que nos solos argilosos. Uma chuva que atinge um solo inicialmente seco será inicialmente absorvida quase totalmente pelo solo, enquanto o solo apresenta muitos poros vazios (com ar). À medida que os poros vão sendo preenchidos, a infiltração tende a diminuir, estando limitada pela capacidade do solo de transferir a água para as camadas mais profundas (percolação). Esta capacidade é dada pela condutividade hidráulica. A partir deste limite, quando o solo está próximo da saturação, a capacidade de infiltração permanece constante e aproximadamente igual à condutividade hidráulica. Uma equação empírica que descreve este comportamento é a equação de Horton, dada abaixo:
f = fc + ( fo − fc ) ⋅ e − βt onde f é a capacidade de infiltração num instante qualquer (mm.hora-1); fc é a capacidade de infiltração em condição de saturação (mm.hora-1); fo é a capacidade de infiltração quando o solo está seco (mm.hora-1); t é o tempo (horas); e β é um parâmetro que deve ser determinado a partir de medições no campo (hora-1). Esta equação é uma função exponencial assintótica ao valor fc, conforme apresentado na Figura 4. 4.
Figura 4. 4: Curvas de infiltração de acordo com a equação de Horton, para solos argilosos e arenosos.
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Os parâmetros de uma equação de infiltração, como a de Horton, podem ser estimados a partir de experimentos no campo, sendo o mais comum o de medição de capacidade de infiltração com o método dos anéis concêntricos. O infiltrômetro de anéis concêntricos é constituído de dois anéis concêntricos de chapa metálica (Figura 4. 5), com diâmetros variando entre 16 e 40 cm, que são cravados verticalmente no solo de modo a restar uma pequena altura livre sobre este. Aplica-se água em ambos os cilindros, mantendo uma lâmina líquida de 1 a 5 cm, sendo que no cilindro interno mede-se o volume aplicado a intervalos fixos de tempo bem como o nível da água ao longo do tempo. A finalidade do cilindro externo é manter verticalmente o fluxo de água do cilindro interno, onde é feita a medição da capacidade de campo.
Figura 4. 5: Medição de infiltração utilizando o infiltrômetro de anéis concêntricos, e esquema do fluxo de água no solo.
Exercícios 1) Qual é o efeito esperado do pisoteamento do solo pelo gado sobre a capacidade de infiltração? 2) Considere uma camada de solo de 1 m de profundidade cujo conteúdo de umidade é 35% na capacidade de campo e de 12% na condição de ponto de murcha permanente. Quantos dias a umidade do solo poderia sustentar a evapotranspiração constante de 7 mm por dia de uma determinada cultura? 3) Uma camada de solo argiloso, cuja capacidade de infiltração na condição de saturação é de 4 mm.hora-1 , está saturado e recebendo chuva com intensidade de 27 mm.hora-1. Qual é o escoamento (litros por segundo) que está sendo gerado em uma área de 10m2 deste solo?
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4) Uma medição de infiltração utilizando o método dos anéis concêntricos apresentou o seguinte resultado. Utilize estes dados para estimar os parâmetros fc, fo e β da equação de Horton. Tempo (minutos 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 15 20 24
Total infiltrado (mm) 0.0 41.5 60.4 70.4 76.0 82.6 90.8 97.1 104.0 111.7 115.1 138.1 163.3 180.8
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5
Capítulo
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Evapotranspiração
O
retorno da água precipitada para a atmosfera, fechando o ciclo hidrológico, ocorre através do processo da evapotranspiração. A importância do processo de evapotranspiração permaneceu malcompreendido até o início do século 18, quando Edmond Halley provou que a água que evaporava da terra era suficiente para abastecer os rios, posteriormente, como precipitação. A evapotranspiração é o conjunto de dois processos: evaporação e transpiração. Evaporação é o processo de transferência de água líquida para vapor do ar diretamente de superfícies líquidas, como lagos, rios, reservatórios, poças, e gotas de orvalho. A água que umedece o solo, que está em estado líquido, também pode ser transferida para a atmosfera diretamente por evaporação. Mais comum neste caso, entretanto, é a transferência de água através do processo de transpiração. A transpiração envolve a retirada da água do solo pelas raízes das plantas, o transporte da água através da planta até as folhas e a passagem da água para a atmosfera através dos estômatos da folha. Do ponto de vista do profissional envolvido com a geração de energia hidrelétrica a evapotranspiração tem um interesse muito específico nas perdas de água que ocorrem nos reservatórios que regularizam a vazão para as usinas por evaporação direta da superfície líquida. Além disso, a evapotranspiração é um processo que influencia fortemente a quantidade de água precipitada que é transformada em vazão em uma bacia hidrográfica. Do ponto de vista da geração de energia, portanto, a evapotranspiração pode ser encarada como uma perda de água. Evaporação ocorre quando o estado líquido da água é transformado de líquido para gasoso. As moléculas de água estão em constante movimento, tanto no estado líquido como gasoso. Algumas moléculas da água líquida tem energia suficiente para romper a barreira da superfície, entrando na atmosfera, enquanto algumas moléculas de água na forma de vapor do ar retornam ao líquido, fazendo o caminho inverso.
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Quando a quantidade de moléculas que deixam a superfície é maior do que a que retorna está ocorrendo a evaporação. As moléculas de água no estado líquido estão relativamente unidas por forças de atração intermolecular. No vapor, as moléculas estão muito mais afastadas do que na água líquida, e a força intermolecular é muito inferior. Durante o processo de evaporação a separação média entre as moléculas aumenta muito, o que significa que é realizado trabalho em sentido contrário ao da força intermolecular, exigindo grande quantidade de energia. A quantidade de energia que uma molécula de água líquida precisa para romper a superfície e evaporar é chamada calor latente de evaporação. O calor latente de evaporação pode ser dado por unidade de massa de água, como na equação 5.1:
λ = 2,501 − 0,002361 ⋅ Ts
em MJ.kg-1
(5.1)
onde Ts é a temperatura da superfície da água em oC. Portanto o processo de evaporação exige um fornecimento de energia, que, na natureza, é provido pela radiação solar. A concentração máxima de vapor de água no ar a 20 oC é de, aproximadamente, 20 g.m-3.
O ar atmosférico é uma mistura de gases entre os quais está o vapor de água. A quantidade de vapor de água que o ar pode conter é limitada, e é denominada concentração de saturação (ou pressão de saturação). A concentração de saturação de vapor de água no ar varia de acordo com a temperatura do ar, como mostra a Figura 5. 1. Quando o ar acima de um corpo d’água está saturado de vapor o fluxo de evaporação se encerra, mesmo que a radiação solar esteja fornecendo a energia do calor latente de evaporação. Assim, para ocorrer a evaporação são necessárias duas condições: 1. que a água líquida esteja recebendo energia para prover o calor latente de evaporação – esta energia (calor) pode ser recebida por radiação ou por convecção (transferência de calor do ar para a água) 2. que o ar acima da superfície líquida não esteja saturado de vapor de água. Além disso, quanto maior a energia recebida pela água líquida, tanto maior é a taxa de evaporação. Da mesma forma, quanto mais baixa a concentração de vapor no ar acima da superfície, maior a taxa de evaporação.
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Figura 5. 1: Relação entre o conteúdo de água no ar no ponto de saturação e a temperatura do ar.
A umidade relativa é a medida do conteúdo de vapor de água do ar em relação ao conteúdo de vapor que o ar teria se estivesse saturado (equação 5.2). Assim, ar com umidade relativa de 100% está saturado de vapor, e ar com umidade relativa de 0% está completamente isento de vapor.
UR = 100 ⋅
w ws
em %
(5.2)
onde UR é a umidade relativa; w é a massa de vapor pela massa de ar e ws é a massa de vapor por massa de ar no ponto de saturação. A umidade relativa também pode ser expressa em termos de pressão parcial de vapor. De acordo com lei de Dalton cada gás que compõe uma mistura exerce uma pressão parcial, independente da pressão dos outros gases, igual à pressão que exerceria se fosse o único gás a ocupar o volume. No ponto de saturação a pressão parcial do vapor corresponde à pressão de saturação do vapor no ar, e a equação 5.2 pode ser reescrita como:
UR = 100 ⋅
e es
em %
(5.3)
onde UR é a umidade relativa; e é a pressão parcial de vapor no ar e es é pressão de saturação.
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Fatores que afetam a evaporação Os principais fatores que afetam a evaporação são a temperatura, a umidade do ar, a velocidade do vento e a radiação solar.
Radiação solar
A quantidade de energia solar que atinge a Terra no topo da atmosfera está na faixa das ondas curtas. Na atmosfera e na superfície terrestre a radiação solar é refletida e sofre transformações, de acordo com a Figura 5. 2. Parte da energia incidente é refletida pelo ar e pelas nuvens (26%) e parte é absorvida pela poeira, pelo ar e pelas nuvens (19%). Parte da energia que chega a superfície é refletida de volta para o espaço ainda sob a forma de ondas curtas (4% do total de enegia incidente no topo da atmosfera). A energia absorvida pela terra e pelos oceanos contribui para o aquecimento destas superfícies que emitem radiação de ondas longas. Além disso, o aquecimento das superfícies contribuem para o aquecimento do ar que está em contato, gerando o fluxo de calor sensível (ar quente), e o fluxo de calor latente (evaporação). Finalmente, a energia absorvida pelo ar, pelas nuvens e a energia dos fluxos de calor latente e sensível retorna ao espaço na forma de radiação de onda longa, fechando o balanço de energia. O processo de fluxo de calor sensível é onde ocorre a evaporação. A intensidade desta evaporação depende da disponibilidade de energia. Os valores apresentados na figura 5.2. referem-se às médias globais, o que significa que a energia utilizada para evaporação pode ser maior ou menor, dependendo principalmente da latitude e da época do ano. Regiões mais próximas ao Equador recebem maior radiação solar, e apresentam maiores taxas de evapotranspiração.
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Espaço
ondas curtas
ondas longas
100
Radiação Solar incidente
H I D R O L O G I A
6
20
4
38
6
26
16
Emitida pelas nuvens
Emitida pelo vapor de H2O e CO2
pela s
Absorvida pelo ar e poeira
re ref pe fletid lo pe letida ar a las upe nu rfície ve ns
Atmosfera
Absorvida pelo vapor de H2O e CO2
refle tida
Absorvida pelas nuvens 3
Fluxo de calor latente
15 Fluxo de calor sensível
Absorvida na superfície
Emitida pela superfície 51
21
7
23
Superfície (Terra + Oceanos)
Figura 5. 2: Média global de fluxos de energia na atmosfera da Terra.
Temperatura
A quantidade de vapor de água que o ar pode conter varia com a temperatura. Ar mais quente pode conter mais vapor, portanto o ar mais quente favorece a evaporação.
Umidade do ar
Quanto menor a umidade do ar, mais fácil é o fluxo de vapor da superfície que está evaporando. O efeito é semelhante ao da temperatura. Se o ar da atmosfera próxima à superfície estiver com umidade relativa próxima a 100% a evaporação diminui porque o ar já está praticamente saturado de vapor.
Velocidade do vento
O vento é uma variável importante no processo de evaporação porque remove o ar úmido diretamente do contato da superfície que está evaporando ou transpirando. O processo de fluxo de vapor na atmosfera próxima à superfície ocorre por difusão, isto
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é, de uma região de alta concentração (umidade relativa) próxima à superfície para uma região de baixa concentração afastada da superfície. Este processo pode ocorrer pela própria ascensão do ar quente como pela turbulência causada pelo vento.
Medição de evaporação A evaporação é medida de forma semelhante à precipitação, utilizando unidades de mm para caracterizar a lâmina evaporada ao longo de um determinado intervalo de tempo. As formas mais comuns de medir a evaporação são o Tanque Classe A e o Evaporímetro de Piche. O tanque Classe A é um recipiente metálico que tem forma circular com um diâmetro de 121 cm e profundidade de 25,5 cm. Construído em aço ou ferro galvanizado, deve ser pintado na cor alumínio e instalado numa plataforma de madeira a 15 cm da superfície do solo. Deve permanecer com água variando entre 5,0 e 7,5 cm da borda superior. A medição de evaporação no Tanque Classe A é realizada diariamente diretamente numa régua, ou ponta linimétrica, instalada dentro do tanque, sendo que são compensados os valores da precipitação do dia. Por esta razão o Tanque Classe A é instalado em estações meteorológicas em conjunto com um pluviômetro.
Figura 5. 3: Tanque Classe A para medição de evaporação.
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O evaporímetro de Piche é constituído por um tubo cilíndrico, de vidro, de aproximadamente 30 cm de comprimento e um centímetro de diâmetro, fechado na parte superior e aberto na inferior. A extremidade inferior é tapada, depois do tubo estar cheio com água destilada, com um disco de papel de feltro, de 3 cm de diâmetro, que deve ser previamente molhado com água. Este disco é fixo depois com uma mola. A seguir, o tubo é preso por intermédio de uma argola a um gancho situado no interior de um abrigo meteorológico padrão. Em geral, as medições de evaporação do Tanque Classe A são consideradas mais confiáveis do que as do evaporímetro de Piche.
Transpiração A transpiração é a retirada da água do solo pelas raízes das plantas, o transporte da água através das plantas até as folhas e a passagem da água para a atmosfera através dos estômatos da folha. A transpiração é influenciada também pela radiação solar, pela temperatura, pela umidade relativa do ar e pela velocidade do vento. Além disso intervém outras variáveis, como o tipo de vegetação e o tipo de solo. Como o processo de transpiração é a transferência da água do solo, uma das variáveis mais importantes é a umidade do solo. Quando o solo está úmido as plantas transpiram livremente, e a taxa de transpiração é controlada pelas variáveis atmosféricas. Porém, quando o solo começa a secar o fluxo de transpiração começa a diminuir. As próprias plantas têm um certo controle ativo sobre a transpiração ao fechar ou abrir os estômatos, que são as aberturas na superfície das folhas por onde ocorre a passagem do vapor para a atmosfera. Para um determinado tipo de cobertura vegetal a taxa de evapotranspiração que ocorre em condições ideais de umidade do solo é chamada a Evapotranspiração Potencial, enquanto a taxa que ocorre para condições reais de umidade do solo é a Evapotranspiração Real. A evapotranspiração real é sempre igual ou inferior à evapotranspiração potencial.
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Medição da evapotranspiração A medição da evapotranspiração é relativamente mais complicada do que a medição da evaporação. Existem dois métodos principais de medição de evapotranspiração: os lisímetros e as medições micrometeorológicas. Os lisímetros são depósitos ou tanques enterrados, abertos na parte superior, os quais são preenchidos com o solo e a vegetação característicos dos quais se deseja medir a evapotranspiração (Figura 5. 4). O solo recebe a precipitação, e é drenado para o fundo do aparelho onde a água é coletada e medida. O depósito é pesado diariamente, assim como a chuva e os volumes escoados de forma superficial e que saem por orifícios no fundo do lisímetro. A evapotranspiração é calculada por balanço hídrico entre dois dias subseqüentes de acordo com a equação 5.4, onde ∆V é a variação de volume de água (medida pelo peso); P é a chuva (medida num pluviômetro); E é a evapotranspiração; Qs é o escoamento superficial (medido) e Qb é o escoamento subterrâneo (medido no fundo do tanque). E = P - Qs – Qb - ∆V
(5.4)
Figura 5. 4: Lisímetros para medição de evapotranspiração.
A medição de evapotranspiração por métodos micrometeorológicos envolve a medição das variáveis velocidade do vento e umidade relativa do ar em alta freqüência. Próximo à superfície a velocidade do vento é paralela à superfície, o que significa que o movimento médio na vertical é zero. Entretanto, a turbulência do ar em movimento causa flutuações na velocidade vertical, que na média permanece zero, mas apresenta momentos de fluxo ascendente e descendente alternados. Na média estes fluxos são iguais a zero, entretanto num instante qualquer a velocidade ascendente pode ser dada por w’.
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A umidade do ar também tem um valor médio (q) e uma flutuação em torno deste valor médio (q’). O valor de q’ positivo significa ar com umidade ligeiramente superior à média q, enquanto o valor q’ negativo significa umidade ligeiramente inferior à média. Se num instante qualquer tanto w’ como q’ são positivos então ar mais úmido do que a média está sendo afastado da superfície, e se w’ e q’ são, ao mesmo tempo, negativos, então ar mais seco do que o normal está sendo trazido para próximo da superfície. De fato, esta correlação entre as variáveis umidade e velocidade vertical ocorre e pode ser medida para estimar a evapotranspiração. São necessários para isto sensores de resposta muito rápida para medir a velocidade do ar e sua umidade, e um processador capaz de integrar os fluxos w’.q’ ao longo do tempo.
Estimativa da evapotranspiração por balanço hídrico A evapotranspiração pode ser estimada, também, pela medição das outras variáveis que intervém no balanço hídrico de uma bacia hidrográfica. De forma semelhante ao apresentado na equação 5.4, para um lisímetro, pode ser realizado o balanço hídrico de uma bacia para estimar a evapotranspiração. Neste caso, entretanto, as estimativas não podem ser feitas considerando o intervalo de tempo diário, mas apenas o anual, ou maior. Isto ocorre porque, dependendo do tamanho da bacia, a água da chuva pode permanecer vários dias ou meses no interior da bacia antes de sair escoando pelo exutório. Para estimar a evapotranspiração por balanço hídrico de uma bacia é necessário considerar valores médios de escoamento e precipitação de um período relativamente longo, idealmente superior a um ano. A partir daí é possível considerar que a variação de armazenamento na bacia pode ser desprezada, e a equação de balanço hídrico se reduz à equação 5.5.
E=P–Q
(5.5)
EXEMPLO
1) Uma bacia de 800 km2 recebe anualmente 1600 mm de chuva, e a vazão média corresponde a 700 mm. Qual é a evapotranspiração anual?
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A evapotranspiração pode ser calculada por balanço hídrico da bacia desprezando a variação do armazenamento na bacia E = 1600 – 700 = 900 mm.
Equação de Thornthwaite Uma equação muito utilizada para a estimativa da evapotranspiração potencial quando se dispõe de poucos dados é a equação de Thornthwaite. Esta equação serve para calcular a evapotranspiração em intervalo de tempo mensal, a partir de dados de temperatura.
⎡10 ⋅ T ⎤ E = 16 ⋅ ⎢ ⎣ I ⎥⎦
a
onde E é a evapotranspiração potencial (mm.mês-1); T é a temperatura média do mês (oC); e a e I são coeficientes calculados segundo as equações que seguem: 1, 514
⎡T j ⎤ I = ∑⎢ ⎥ j =1 ⎣ 5 ⎦ a = 6,75 ⋅ 10 −7 ⋅ I 3 − 7,71 ⋅ 10 −5 ⋅ I 2 + 1,792 ⋅ 10 −2 ⋅ I + 0,49239 12
onde j é cada um dos 12 meses do ano; e Tj é a temperatura média de cada um dos 12 meses.
EXEMPLO
2) Calcule a evapotranspiração potencial mensal do mês de Agosto de 2006 em Porto Alegre, onde as temperaturas médias mensais são dadas na figura abaixo. Suponha que a temperatura média de agosto de 2006 tenha sido de 16,5 oC. Mês Janeiro Fevereiro Março Abril Maio Junho Julho
Temperatur a 24,6 24,8 23,0 20,0 16,8 14,4 14,6
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Agosto Setembro Outubro Novembro Dezembro
15,3 16,5 17,5 21,4 25,5
O primeiro passo é o cálculo do coeficiente I a partir das temperaturas médias mensais obtidas da tabela. O valor de I é 96. A partir de I é possível obter a = 2,1. Com estes coeficientes, a evapotranspiração potencial é:
⎡10 ⋅ 16,5 ⎤ E = 16 ⋅ ⎢ =53,1 mm/mês ⎣ 96 ⎥⎦ 2 ,1
Portanto, a evapotranspiração potencial estimada para o mês de agosto de 2006 é de 53,1 mm/mês.
Equação de Penman-Monteith As equações para cálculo da evapotranspiração são do tipo empírico ou de base física. A principal equação de evapotranspiração de base física é a equação de PenmanMonteith (equação 5.6).
⎞ ⎛ ⎜ ∆ ⋅ (R L − G ) + ρ A ⋅ c p ⋅ (e s − e d ) ⎟ ⎟ ⎜ ra 1 E=⎜ ⎟⋅ ⎛ rs ⎞ ⎟ λ ⋅ ρW ⎜ ⎜⎜1 + ⎟⎟ ∆ + γ ⋅ ⎟ ⎜ ⎝ ra ⎠ ⎠ ⎝
(5.6)
[MJ.kg-1] é o calor latente de onde E [m.s-1] é a taxa de evaporação da água; -1 vaporização; [kPa.ºC ] é a taxa de variação da pressão de saturação do vapor com a temperatura do ar; RL [MJ.m-2.s-1] é a radiação líquida que incide na superfície; G [MJ.m-2.s-1] é o fluxo de energia para o solo; ρA [kg.m-3] é a massa específica do ar; ρW [kg.m-3] é a massa específica da água; cp [MJ.kg-1.ºC-1] é o calor específico do ar úmido (cp = 1,013.10-3 MJ.kg-1.ºC-1);es [kPa] é a pressão de saturação do vapor ; ed [kPa] é a pressão real de vapor de água no ar; [kPa.ºC-1] é a constante psicrométrica (γ = 0,66); rs [s.m-1] é a resistência superficial da vegetação; e ra [s.m-1] é a resistência aerodinâmica. Os valores das variáveis podem ser obtidos pelas seguintes equações: λ = (2,501 − 0,002361 ⋅ T )
50
(5.7)
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ρ A = 3,486 ⋅
∆=
PA 275 + T
(5.8)
4098 ⋅ e s
(5.9)
(237,3 + T )2
⎛ 17,27 ⋅ T ⎞ e s = 0,6108 ⋅ exp⎜ ⎟ ⎝ 237,3 + T ⎠
ed = es ⋅
(5.10)
UR 100
γ = 0,0016286 ⋅
(5.11) PA λ
(5.12)
onde UR [%] é a umidade relativa do ar; PA [kPa] é a pressão atmosférica; e T [ºC] é a temperatura do ar a 2 m da superfície. Há uma analogia de parte da equação 5.6 com um circuito elétrico, em que o fluxo evaporativo é a corrente, a diferença de potencial é o déficit de pressão de vapor no ar (pressão de saturação do vapor menos pressão parcial real: es-ed) e a resistência é uma combinação de resistência superficial e resistência aerodinâmica. A resistência superficial é a combinação, para o conjunto da vegetação, da resistência estomática das folhas. Mudanças na temperatura do ar e velocidade do vento vão afetar a resistência aerodinâmica. Mudanças na umidade do solo são enfrentadas pelas plantas com mudanças na transpiração, que afetam a resistência estomática ou superficial. O valor de E, calculado pela B.1, é convertido para as unidades de lâmina diária pela equação a seguir. E a = E ⋅ fc
(5.13)
onde Ea [mm.dia-1] é a lâmina de evapotranspiração; E [m.s-1] é a taxa de evaporação da água e fc [mm.s.dia-1.m-1] é um fator de conversão de unidades (fc = 8,64.107). A energia disponível para a evapotranspiração depende da energia irradiada pelo sol, da energia que é refletida ou bloqueada pela atmosfera, da energia que é refletida pela superfície terrestre, da energia que é irradiada pela superfície terrestre e da energia que é transmitida ao solo. Normalmente, as estações climatológicas dispõe de dados de radiação que atinge a superfície terrestre (SSUP), medida com radiômetros, ou do número de horas de
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insolação (n), medidas com o heliógrafo, ou mesmo da fração de cobertura de nuvens (n/N), estimada por um observador. A estimativa da radiação líquida disponível para evapotranspiração depende do tipo de dados disponível. A situação de estimativa mais simples ocorre quando existem dados de radiação medidos, dados normalmente em MJ.m-2.dia-1, ou cal.cm-2.dia-1. Neste caso, o termo RL da equação de Penman-Monteith pode ser obtido da equação a seguir, que desconta a parte da radiação refletida. R L = SSUP ⋅ (1 − α )
(5.14)
onde RL [MJ.m-2.s-1] é a radiação líquida na superfície; SSUP [MJ.m-2.s-1] é a radiação que atinge a superfície (valor medido); e [-] é o albedo, que é a parcela da radiação incidente que é refletida (parâmetro que depende da cobertura vegetal e uso do solo). Quando existem apenas dados de horas de insolação, ou da fração de cobertura de nuvens, a radiação que atinge a superfície terrestre pode ser obtida considerando-a como uma fração da máxima energia, de acordo com a época do ano, a latitude da região, e o tipo de cobertura vegetal ou uso do solo. A insolação máxima em um determinado ponto do planeta, considerando que o céu está sem nuvens, é dada pela equação abaixo.
N=
24 ⋅ ωs π
(5.15)
[radianos] é o ângulo do sol ao onde N [horas] é a insolação máxima; s nascer (depende da latitude e da época do ano), e é dado por: ωs = arccos(− tan ϕ ⋅ tan δ )
(5.16)
onde [graus] é a latitude (positiva no hemisfério norte e negativa no hemisfério sul); s [radianos] é o ângulo do sol ao nascer; e [radianos] é a declinação solar, dada por: ⎛ 2⋅π ⎞ δ = 0,4093 ⋅ sin ⎜ ⋅ J − 1,405 ⎟ ⎝ 365 ⎠
(5.17)
onde [radianos] é a declinação solar; J [-] é o dia no calendário Juliano (contado a partir de 1 de janeiro). A radiação que atinge o topo da atmosfera também depende da latitude e da época do ano:
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S TOP = 15,392 ⋅
ρW ⋅ λ ⋅ d r ⋅ (ωs ⋅ sen ϕ ⋅ sen δ + cos ϕ ⋅ cos δ ⋅ sen ωs ) (5.18) 1000
onde [MJ.kg-1] é o calor latente de vaporização; STOP [MJ.m-2.dia-1] é a radiação no topo da atmosfera; ρW [kg.m-3] é a massa específica da água; [radianos] é a declinação solar; [graus] é a latitude; s [radianos] é o ângulo do sol ao nascer; e dr [-] é a distância relativa da terra ao sol, dada por: ⎛ 2⋅π ⎞ ⋅ J⎟ d r = 1 + 0,033 ⋅ cos⎜ ⎝ 365 ⎠
(5.19)
onde J é o dia do calendário Juliano. A radiação que atinge o topo da atmosfera é parcialmente refletida pela própria atmosfera, não atingindo a superfície terrestre. As nuvens são as principais responsáveis pela reflexão, e a estimativa da radiação que atinge a superfície terrestre depende da fração de cobertura de nuvens, conforme a abaixo: n⎞ ⎛ SSUP = ⎜ a s + b s ⋅ ⎟ ⋅ S TOP N⎠ ⎝
(5.20)
onde N [horas] é a insolação máxima possível numa latitude em certa época do ano; n [horas] é a insolação medida; STOP [MJ.m-2.dia-1] é a radiação no topo da atmosfera; SSUP [MJ.m-2.dia-1] é a radiação na superfície terrestre; as [-] é a fração da radiação que atinge a superfície em dias encobertos (quando n=0); e as + bs [-] é a fração da radiação que atinge a superfície em dias sem nuvens (n=N). Quando não existem dados locais medidos que permitam estimativas mais precisas, são recomendados os valores de 0,25 e 0,50, respectivamente, para os parâmetros as e bs (Shuttleworth, 1993). Quando a estação meteorológica dispõe de dados de insolação, a equação acima é utilizada com n medido e N estimado pela equação 5.15. Quando a estação dispõe de dados de fração de cobertura, utiliza-se o valor de n/N diretamente. Uma parte da radiação que atinge a superfície terrestre (SSUP) é refletida, conforme já descrito. A maior parte da energia irradiada pelo sol está na faixa de ondas curtas, de 0,3 a 3 µm. O balanço de energia, porém, também inclui uma pequena parcela de radiação de ondas longas, de 3 a 100 µm. O balanço de radiação de ondas longas na superfície terrestre depende, basicamente, de quanta energia é emitida pela superfície terrestre e pela atmosfera. Normalmente, a superfície terrestre é mais quente do que a atmosfera, resultando em um balanço
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negativo, isto é, há perda de energia na faixa de ondas longas. A equação a seguir descreve a radiação líquida de ondas longas que deixa a superfície terrestre.
L n = f ⋅ ε ⋅ σ ⋅ (T + 273,2)
4
(5.21)
onde Ln [MJ.m-2.dia-1] é a radiação líquida de ondas longas que deixa a superfície; f [-] é um fator de correção devido à cobertura de nuvens; T [ºC] é a temperatura média do ar a 2 m do solo; [-] é a emissividade da superfície; [MJ.m-2.ºK-4.dia-1] é uma constante (σ=4,903.10-9 MJ.m-2.ºK-4.dia-1). A emissividade da superfície pode ser estimada pela equação abaixo.
ε = 0,34 − 0,14 ⋅ (e d )
(5.22)
onde ed é a pressão parcial de vapor de água no ar [kPa]. O fator de correção da radiação de ondas longas devido à cobertura de nuvens (f) pode ser estimado com base na equação a seguir:
f = 0,1 + 0,9 ⋅
n N
(5.23)
Por simplicidade, o fluxo de calor para o solo - termo G na equação de PenmanMonteith – pode ser considerado nulo, principalmente quando o intervalo de tempo é relativamente grande (1 dia). Na analogia da evapotranspiração com um circuito elétrico, existem duas resistências que a “corrente” (fluxo evaporativo) tem de enfrentar: resistência superficial e resistência aerodinâmica. A resistência aerodinâmica representa a dificuldade com que a umidade, que deixa a superfície das folhas e do solo, é dispersada pelo meio. Na proximidade da vegetação o ar tende a ficar mais úmido, dificultando o fluxo de evaporação. A velocidade do vento e a turbulência contribuem para reduzir a resistência aerodinâmica, trocando o ar úmido próximo à superfície que está fornecendo vapor, como as folhas das plantas ou as superfícies líquidas, pelo ar seco de níveis mais elevados da atmosfera. A resistência aerodinâmica é inversamente proporcional à altura dos obstáculos enfrentados pelo vento, porque são estes que geram a turbulência.
6,25 ra = u m ,10
⎛ ⎛ 10 ⎞ ⎞ ⋅ ⎜⎜ ln⎜⎜ ⎟⎟ ⎟⎟ ⎝ ⎝ z0 ⎠⎠
2
para h < 10 metros
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ra =
94 para h > 10 metros u m ,10
onde ra [s.m-1] é a resistência aerodinâmica; um,10 [m.s-1] é a velocidade do vento a 10 m de altura; z0 [m] é a rugosidade da superfície; h [m] é altura média da cobertura vegetal. A rugosidade da superfície é considerada igual a um décimo da altura média da vegetação. As estações climatológicas normalmente dispõe de dados de velocidade do vento medidas a 2 m de altura. Para converter estes dados a uma altura de referência de 10 m é utilizada a equação a seguir (Bremicker, 1998).
u m ,10
⎛ ⎛ 10 ⎞ ⎞ ⎜ ln⎜ ⎟ ⎟ ⎜ ⎜⎝ z 0 ⎟⎠ ⎟ = u m, 2 ⋅ ⎜ ⎟ ⎜ ln⎛⎜ 2 ⎞⎟ ⎟ ⎜ ⎜z ⎟⎟ ⎝ ⎝ 0 ⎠⎠
onde um,10[m.s-1] é a velocidade do vento a 10 m de altura; um,2 [m.s-1] é a velocidade do vento a 2 m de altura; z0 [m] é a rugosidade da superfície. A resistência superficial é a combinação, para o conjunto da vegetação, da resistência estomática das folhas. A resistência superficial representa a resistência ao fluxo de umidade do solo, através das plantas, até a atmosfera. Esta resistência é diferente para os diversos tipos de plantas e depende de variáveis ambientais como a umidade do solo, a temperatura do ar e a radiação recebida pela planta. A maior parte das plantas exerce um certo controle sobre a resistência dos estômatos e, portanto, pode controlar a resistência superficial. A resistência estomática das folhas depende da disponibilidade de água no solo. Em condições favoráveis, os valores de resistência estomática e, em conseqüência, os de resistência superficial são mínimos. A resistência superficial em boas condições de umidade é um parâmetro que pode ser estimado com base em experimentos cuidadosos em lisímetros. A grama utilizada para cálculos de evapotranspiração de referência tem uma resistência superficial de 69 s.m-1 quando o solo apresenta boas condições de umidade. Florestas tem resistências superficiais da ordem de 100 s.m-1 em boas condições de umidade do solo.
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Durante períodos de estiagem mais longos, a umidade do solo vai sendo retirada por evapotranspiração e, à medida que o solo vai perdendo umidade, a evapotranspiração diminui. A redução da evapotranspiração não ocorre imediatamente. Para valores de umidade do solo entre a capacidade de campo e um limite, que vai de 50 a 80 % da capacidade de campo, a evapotranspiração não é afetada pela umidade do solo. A partir deste limite a evapotranspiração é diminuída, atingindo o mínimo – normalmente zero – no ponto de murcha permanente. Neste ponto a resistência superficial atinge valores altíssimos (teoricamente deve tender ao infinito).
Evaporação em reservatórios A evaporação da água de reservatórios é de especial interesse para a engenharia, porque afeta o rendimento de reservatórios para abastecimento, irrigação e geração de energia. Reservatórios são criados para regularizar a vazão dos rios, aumentando a disponibilidade de água e de energia nos períodos de escassez. A criação de um reservatório, entretanto, cria uma vasta superfície líquida que disponibiliza água para evaporação, o que pode ser considerado uma perda de água e de energia. A evaporação da água em reservatórios pode ser estimada a partir de medições de Tanques Classe A, entretanto é necessário aplicar um coeficiente de redução em relação às medições de tanque. Isto ocorre porque a água do reservatório normalmente está mais fria do que a água do tanque, que tem um volume pequeno e está completamente exposta à radiação solar. Assim, para estimar a evaporação em reservatórios e lagos costuma-se considerar que esta tem um valor de aproximadamente 60 a 80% da evaporação medida em Tanque Classe A na mesma região, isto é: Elago = Etanque . Ft Onde Ft tem valores entre 0,6 e 0,8. O reservatório de Sobradinho, um dos mais importantes do rio São Francisco, tem uma área superficial de 4.214 km2, constituindo-se no maior lago artificial do mundo, está numa das regiões mais secas do Brasil. Em conseqüência disso, a evaporação direta deste reservatório é estimada em 200 m3.s-1, o que corresponde a 10% da vazão regularizada do rio São Francisco. Esta perda de água por evaporação é superior à vazão prevista para o projeto de transposição do rio São Francisco, idealizado pelo governo federal.
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Exercícios 1) Um rio cuja vazão média é de 34 m3.s-1 foi represado por uma barragem para geração de energia elétrica. A área superficial do lago criado é de 5000 hectares. Considerando que a evaporação direta do lago corresponde a 970 mm por ano, qual é a nova vazão média a jusante da barragem? 2) Uma bacia de 2300 km2 recebe anualmente 1600 mm de chuva, e a vazão
média corresponde a 14 m3.s-1. Calcule a evapotranspiração total desta bacia. Calcule o coeficiente de escoamento anual desta bacia.
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6
Capítulo
H I D R O L O G I A
Escoamento
V
azão é o volume de água que passa por uma determinada seção de um rio dividido por um intervalo de tempo. Assim, se o volume é dado em litros, e o tempo é medido em segundos, a vazão pode ser expressa em unidades de litros por segundo (l.s-1). No caso de vazão de rios, entretanto, é mais usual expressar a vazão em metros cúbicos por segundo (m3.s-1), sendo que 1 m3.s-1 corresponde a 1000 l.s-1 (litros por segundo). A vazão de um rio é o resultado da interação entre a precipitação e a bacia, e depende das características da bacia que influenciam a infiltração, armazenamento e evapotranspiração. O escoamento em uma bacia é, normalmente, estudado em duas partes: geração de escoamento e propagação de escoamento. O escoamento tem origens diferentes dependendo se está ocorrendo um evento de chuva ou não. Durante as chuvas intensas, a maior parte da vazão que passa por um rio é a água da própria chuva que não consegue penetrar no solo e escoa imediatamente, atingindo os cursos d’água e aumentando a vazão. É desta forma que são formados os picos de vazão e as cheias ou enchentes. O escoamento rápido que ocorre em conseqüência direta das chuvas é chamado de escoamento superficial (figura 6.1). Nos períodos secos entre a ocorrência de eventos de chuva a vazão de um rio é mantida pelo esvaziamento lento da água armazenada na bacia, especialmente da água subterrânea. Assim, o escoamento lento que Escoamento superficial ocorre durante as estiagens pode ser chamado de ocorre durante e imediatamente após a chuva. escoamento subterrâneo, porque a maior parte da água está chegando ao rio via fluxo de água através Escoamento subterrâneo é o do subsolo. que mantém a vazão dos rios durante as estiagens.
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ascenç ão
pico
Escoamento Superficial recessão
Escoamento subterrâneo
Figura 6. 1: Hidrograma de um rio como resposta a um evento de chuva: durante e imediatamente após a chuva predomina o escoamento superficial, enquanto durante a estiagem predomina o escoamento subterrâneo.
Geração de escoamento durante a chuva No capítulo 3 é analisado o processo de infiltração de água da chuva no solo. Dependendo da intensidade da chuva, parte da água não consegue infiltrar no solo e começa a se acumular na superfície. Em determinadas condições a água começa a escoar sobre a superfície, formando pequenos córregos temporários ou escoando na forma de uma lâmina em superfícies mais lisas. O escoamento gerado desta forma é denominado escoamento superficial, e é importante porque gera os picos de vazão nos rios, como resposta aos eventos de chuva. A geração do escoamento é um dos temas mais complexos da hidrologia, não porque a física envolvida seja complexa, mas sim porque a variabilidade das características da bacia é muito grande, e porque a água pode tomar vários caminhos desde o momento em que atinge a superfície, na forma de chuva, até o momento em que chega ao curso d’água. Existem dois principais processos reconhecidos na formação do escoamento superficial: precipitação de intensidade superior à capacidade de infiltração; e precipitação sobre solos saturados. Se uma chuva com intensidade de 30 mm.h-1 atinge um solo cuja capacidade de infiltração é de 20 mm.h-1, uma parte da chuva (10 mm.h-1) se transforma em escoamento superficial. Este é o processo de geração de escoamento por excesso de chuva em relação à capacidade de infiltração, também conhecido como processo Hortoniano, porque foi primeiramente reconhecido por Horton (1934).
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O processo Hortoniano é importante em bacias urbanas, em áreas com solo modificado pela ação do homem, ou em chuvas muito intensas, mas é raramente visto em bacias naturais durante chuvas menos intensas, onde o escoamento superficial é quase que totalmente originado pela parcela da precipitação que atinge zonas de solo saturado. Solos saturados são normalmente encontrados próximos à rede de drenagem, onde o nível do lençol freático está mais próximo da superfície.
Volume de escoamento: método SCS Um dos métodos mais simples e mais utilizados para estimar o volume de escoamento superficial resultante de um evento de chuva é o método desenvolvido pelo National Resources Conservatoin Center dos EUA (antigo Soil Conservation Service – SCS). De acordo com este método, a lâmina escoada durante uma chuva é dada por:
(P − Ia )2
Q=
(P − Ia + S )
S=
25400 − 254 CN
quando P > Ia e Q = 0 quando P ≤ Ia
onde Q é a lâmina escoada ou volume de escoamento dividido pela área da bacia (mm); P é a precipitação durante o evento (mm); S é um parâmetro que depende da capacidade de infiltração e armazenamento do solo (parâmetro adimensional CN – veja tabela 6.1); e Ia é uma estimativa das perdas iniciais de água, dado por Ia=S/5.
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Tabela 6.1: Valores aproximados do parâmetro CN para diferentes condições de cobertura vegetal, uso do solo e tipos de solos (A: solos arenosos e de alta capacidade de infiltração; B: solos de média capacidade de infiltração; C solos com baixa capacidade de infiltração; D solos com capacidade muito baixa de infiltração). Condição Florestas Campos Plantações Zonas comerciais Zonas industriais Zonas residenciais
A 41 65 62 89 81 77
B 63 75 74 92 88 85
C 74 83 82 94 91 90
D 80 85 87 95 93 92
(adaptado de Tucci et al., 1993)
EXEMPLO
1) Qual é a lâmina escoada superficialmente durante um evento de chuva de precipitação total P = 70 mm numa bacia com solos do tipo B e com cobertura de florestas? A bacia tem solos do tipo B e está coberta por florestas. Conforme a tabela anterior o valor do parâmetro CN é 63 para esta combinação. A partir deste valor de CN obtém-se o valor de S: S=
25400 − 254 = 149,2 mm CN
A partir do valor de S obtém-se o valor de Ia = 29,8. Como P > Ia, o escoamento superficial é dado por:
Q=
(P − Ia )2
(P − Ia + S )
= 8,5 mm.
Portanto, a chuva de 70 mm provoca um escoamento de 8,5 mm.
Escoamento durante a estiagem A água subterrânea tem sua origem principal na água da chuva que infiltra no solo e percola para camadas mais profundas. Ao longo de um período longo de chuvas é
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grande a quantidade de água que atinge os aqüíferos, especialmente o aqüífero superficial. Durante estes períodos o nível da água subterrânea se eleva. Por outro lado, ao longo de períodos secos, a água armazenada no subsolo vai sendo descarregada para as nascentes dos rios e o nível da água subterrânea diminui. Entretanto, ao contrário do escoamento superficial, o fluxo de água subterrânea é, normalmente, muito lento. A parte decrescente de um hidrograma após um evento de chuva, conhecida como recessão do hidrograma, reflete a diminuição do nível da água no ou nos aqüíferos de uma bacia ao longo do tempo. O momento a partir do qual pode se dizer que toda a vazão de um rio tem origem subterrânea corresponde ao momento final da chuva mais o período de tempo correspondente ao tempo de concentração da bacia, aproximadamente. Curvas de recessão de hidrogramas freqüentemente tem a forma de exponenciais decrescentes. Em regiões com chuvas marcadamente sasonais isto pode ser facilmente verificado. Como exemplo, a próxima figura apresenta um hidrograma de vazões observadas no rio dos Bois, no Estado de Goiás, ao longo de quatro anos entre 1990 e 1993. Nesta região as chuvas se concentram no período de dezembro a março e os meses de junho a setembro são extremamente secos. O hidrograma reflete esta característica climática apresentando vários picos de vazão nos meses de verão e uma longa recessão, raramente interrompida por pequenos aumentos da vazão, ao longo dos meses de inverno.
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Figura 6. 2: Hidrograma do rio dos Bois, em Goiás, de 1990 a 1993, com respostas às chuvas de verão e recessões durante os meses de inverno.
Destacando o período de estiagem de junho a setembro de 1991, é possível verificar o comportamento típico da recessão do hidrograma deste rio, como mostra a próxima figura. Quando representado em escala logarítmica, o hidrograma durante a estiagem mostra um comportamento semelhante a uma linha reta. Isto sugere que o comportamento da vazão do rio dos Bois ao longo deste período pode ser representado por uma equação do tipo: Q( t ) = Q0 ⋅ e
−t k
onde t é o tempo; Q0 é a vazão num instante t0; Q(t) é a vazão num instante t (por exemplo: t dias após t0); e é a base dos logaritmos naturais; e k é uma constante (em unidades de t).
(a)
(b)
Figura 6. 3: a) Hidrograma do rio dos Bois (GO) durante os meses de estiagem de 1991; b) o mesmo hidrograma representado em escala logarítmica e aproximado por uma linha reta
Esta aproximação da curva de recessão de vazão utilizando uma equação exponencial decrescente é válida para um grande número de casos e pode ser utilizada para prever qual será a vazão de um rio após alguns dias, conhecendo a vazão no tempo atual, considerando que não ocorra nenhuma chuva. A maior dificuldade para resolver este tipo de problema é estimar o valor da constante k, mas isto pode ser feito utilizando dois valores conhecidos de vazão espaçados por um intervalo de tempo ∆t., e rearranjando a equação exponencial, como mostra a equação a seguir:
63
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k=
− ∆t ⎛ Q(t + ∆t ) ⎞ ⎟ ln⎜ ⎜ Q ⎟ ⎝ (t ) ⎠
O valor de k depende das características físicas da bacia, em especial as suas características geológicas. Bacias localizadas em regiões onde predominam as rochas sedimentares normalmente tem maior capacidade de armazenamento de água subterrânea e os rios que drenam estas áreas apresentam valores de k relativamente altos. Bacias localizadas em regiões de rochas pouco porosas, como o basalto, tendem a apresentar valores de k mais baixos.
EXEMPLO
2) Durante uma longa estiagem de um rio foram feitas duas medições de vazão, com quatro dias de intervalo entre si, conforme a tabela abaixo. Qual seria a vazão esperada para o dia 31 de agosto do mesmo ano, considerando que não ocorre nenhum evento de chuva neste período? Data 14/agosto 15/agosto 16/agosto 17/agosto 18/agosto
Vazão 60.1 57.6
Espera-se que o comportamento do hidrograma na recessão seja bem representado por uma curva exponencial decrescente. A constante k pode ser Durante as estiagens a vazão de um rio diminui ao longo do tempo estimada considerando os dois valores de vazão conhecidos (60,1 e 57,6), separados por 4 dias. de acordo com uma função exponencial decrescente.
k=
−4 ≅ 94 ⎛ 57,6 ⎞ ln⎜ ⎟ ⎝ 60,1 ⎠
Portanto, a constante k tem valor de 94 dias. A vazão no dia 31 de agosto pode ser estimada a partir da vazão do dia 18, considerando a diminuição que ocorre ao longo dos 13 dias que separam estas duas datas: −13
Q(t ) = 57,6 ⋅ e 94 ≅ 50,2
64
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Portanto, a vazão esperada no dia 31 de agosto seria de 50,2 m3.s-1.
A idéia do reservatório linear simples O balanço hídrico geral de água subterrânea em uma bacia hidrográfica pode ser representado pelas mesmas equações apresentadas nos capítulos 1, 2 e 4: ∆V = G − E −Q ∆t
onde ∆V é a variação do volume de água armazenado no aqüífero da bacia (m3); ∆t é o intervalo de tempo considerado (s); G é a percolação do solo para o aquífero (m3.s1 ); E é a evapotranspiração (m3.s-1); e Q é o escoamento (m3.s-1). Normalmente a evapotranspiração diretamente a partir do aqüífero é nula e num período de estiagem o fluxo de percolação entre o solo e o subsolo (G) pode ser considerado desprezível. Assim, a equação acima pode ser reescrita, para um intervalo de tempo infinitesimal: dV = −Q dt
Aproximar a curva de recessão de um hidrograma durante uma longa estiagem por uma equação exponencial decrescente equivale a admitir a idéia que a relação entre armazenamento de água subterrânea e descarga do aqüífero para o rio é linear, como na equação a seguir: Q=
V k
ou
V = Q⋅k
onde V é o volume de água armazenado pelo aqüífero (m3); Q é a vazão que passa pelo rio durante a estiagem, que é equivalente à descarga do aqüífero (m3.s-1); e k é uma constate com unidades de tempo (s). Substituindo a relação linear na equação de balanço hídrico simplificada, obtém-se a relação: k
dQ =Q dt
A solução desta equação diferencial resulta numa equação exponencial decrescente, como apresentada na seção anterior deste capítulo:
65
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Q(t ) = c ⋅ e
−t k
ou
Q(t ) = Q0 ⋅ e
−t k
Durante uma estiagem uma bacia se comporta de forma semelhante a um reservatório linear simples, em que a vazão descarregada é proporcional ao volume armazenado.
Isto significa que, apesar de toda a complexidade existente no armazenamento e no fluxo de água subterrânea de uma bacia, a relação entre volume de água armazenado e vazão é aproximadamente linear. Esta afirmação é válida para condições de estiagem, na maior parte dos rios do mundo.
Escoamento em canais abertos O escoamento em rios e canais abertos é um fenômeno bastante complexo, sendo fortemente variável no espaço e no tempo. As variáveis fundamentais são a velocidade, a vazão, e o nível da água. Quando estas variáveis não variam ao longo do tempo em um determinado trecho do canal, o escoamento é chamado permanente. Quando as variáveis vazão, velocidade média e nível não variam no espaço o escoamento pode ser chamado de uniforme. A velocidade média de escoamento permanente uniforme em um canal aberto com declividade constante do fundo e da linha da água pode ser estimada a partir de equações relativamente simples, como as de Chezy e de Manning. A equação de Manning, apresentada a seguir, relaciona a velocidade média da água em um canal com o nível da água neste canal e a declividade. R 3 ⋅S u= h n 2
1
2
onde u é a velocidade média da água em m.s-1; Rh é o raio hidráulico da seção transversal (descrito a seguir); S é a declividade (metros por metro, ou adimensional); e n é um coeficiente empírico, denominado coeficiente de Manning. A Figura 6.2 apresenta um perfil longitudinal de um canal escoando em regime permanente e uniforme.
66
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Figura 6. 4: Perfil de um trecho de canal em regime de escoamento permanente e uniforme.
A Figura 6. apresenta uma seção transversal do canal, supondo que o canal tem a forma retangular. A profundidade de escoamento é y e a largura do canal é B.
Figura 6. 5: Seção transversal de um canal em regime de escoamento permanente e uniforme.
Denomina-se perímetro molhado a soma dos segmentos da seção transversal em que a água tem contato com as paredes, isto é: P = B + 2y onde P é o perímetro molhado (m); B é a largura do canal (m); e y é a profundidade ou nível da água (m). O raio hidráulico é a relação entre a área de escoamento e o perímetro molhado, ou seja:
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Rh =
A P
onde A é a área (B.y) e P o perímetro molhado. Das equações anteriores se deduz que quanto maior o nível da água y, maior a velocidade média da água no canal. O coeficiente n de Manning varia de acordo com o revestimento do canal. Canais com paredes muito rugosas, como os canais revestidos por pedras irregulares e os rios naturais com leito rochoso tem valores altos de n. Canais de laboratório, revestidos de vidro , por exemplo, podem ter valores relativamente baixos de n. Alguns valores de n de Manning para diferentes tipos de canais são dados na tabela a seguir. Tabela 6. 2: Valores de n de Manning para canais com diferentes tipos de revestimento de fundo e paredes (Hornberger et al., 1998). Tipo de revestimento Vidro (laboratório) Concreto liso Canal não revestido com boa manutenção Canal natural Rio de montanha com leito rochoso
n de Manning 0,01 0,012 0,020 0,024 a 0,075 0,075 a >1,00
A vazão em um canal pode ser calculada pelo produto da velocidade média vezes a área de escoamento, ou seja:
R 3 ⋅S Q = u ⋅ A = A⋅ h n 2
1
2
EXEMPLO
3) Qual é a vazão que escoa em regime permanente e uniforme por um canal de seção transversal trapezoidal com base B = 5 m e profundidade y = 2 m, considerando a declividade de 25 cm por km? Considere que a parede lateral do canal tem uma inclinação dada por m = 2, e que o canal não é revestido mas está com boa manutenção. Em um canal trapezoidal a área de escoamento é dada por
A=
(B + B + 2 ⋅ m ⋅ y ) ⋅ y 2
onde B é a largura da base, y é a profundidade e m = cotg α, de acordo com a figura abaixo.
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O perímetro molhado é dado por P = B + 2 ⋅ y 2 + (m ⋅ y )
2
Portanto A = 18 m2 e P = 13,9 m. O raio hidráulico é Rh = 1,3 m. A declividade de 25 cm por km corresponde a S = 0,00025 m.m-1,o coeficiente de Manning para um canal não revestido com boa manutenção é de 0,020, então a vazão no canal é dada por R 3 ⋅S Q = A⋅ h n 2
1
2
(1,3) ⋅ (0.00025) = 18 ⋅ 2
3
1
0,020
2
= 16,9 m3.s-1
Portanto, a vazão no canal é de 16,9 m3.s-1.
Medição de vazão A medição de vazão em cursos d’água é realizada, normalmente, de forma indireta, a partir da medição de velocidade ou de nível. Os instrumentos mais comuns para medição de velocidade de água em rios são os molinetes, que são pequenos hélices que giram impulsionados pela passagem da água. Em situações de medições expeditas, ou de grande carência de recursos, as medições de velocidade podem ser feitas utilizando flutuadores, com resultados muito menos precisos.
69
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Figura 6.3: Molinete para medição de velocidade da água.
Os molinetes são instrumentos projetados para girar em velocidades diferentes de acordo com a velocidade da água. A relação entre velocidade da água e velocidade de rotação do molinete é a equação do molinete. Esta equação é fornecida pelo fabricante do molinete, porém deve ser verificada periodicamente, porque pode ser alterada pelo desgaste das peças. A velocidade da água é, normalmente, maior no centro de um rio do que junto às margens. Da mesma forma, a velocidade é mais baixa junto ao fundo do rio do que junto à superfície. Em função desta variação da velocidade nos diferentes pontos da seção transversal, utilizar apenas uma medição de velocidade pode resultar em uma estimativa errada da velocidade média. Por exemplo, a velocidade medida junto à margem é inferior à velocidade média e a velocidade medida junto à superfície, no centro da seção, é superior à velocidade média. Para obter uma boa estimativa da velocidade média é necessário medir em várias verticais, e em vários pontos ao longo das verticais, de acordo com as figuras 6.4 e 6.5. A tabela 6.3, adaptada de Santos et al. (2001), apresenta o número de pontos de medição em uma vertical de acordo com a profundidade do rio e a tabela 6.4 apresenta o número de verticais recomendado para medições de vazão de acordo com a largura do rio. A tabela 6.3 mostra que são recomendados muitas medições na vertical, porém, freqüentemente, as medições são feitas com apenas dois pontos na vertical, mesmo em rios com profundidade maior que 1,20 m.
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Figura 6.4: Perfil de velocidade típico e pontos de medição recomendados.
Figura 6. 5: Seção transversal com indicação de verticais onde é medida a velocidade.
Tabela 6..3: Número e posição de pontos de medição na vertical recomendados de acordo com a profundidade do rio (Santos et al. 2001). Profundidade (m) 0,15 a 0,60 0,60 a 1,20 1,20 a 2,00 2,00 a 4,00 > 4,00
Número de pontos 1 2 3 4 6
Posição dos pontos 0,6 p 0,2 e 0,8 p 0,2; 0,6 e 0,8 p 0,2; 0,4; 0,6 e 0,8 p S; 0,2; 0,4; 0,6; 0,8 p e F
Tabela 6. 4: Distância recomendada entre verticais, de acordo com a largura do rio (Santos et al., 2001). Largura do rio (m) 250
Distância entre verticais (m) 0,3 0,5 1,0 2,0 3,0 4,0 6,0 8,0 12,0
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Portanto, a medição de vazão está baseada na medição de velocidade em um grande número de pontos. Os pontos estão dispostos segundo linhas verticais com distâncias conhecidas da margem (d1, d2, d3, etc.) (figura 6.6). A integração do produto da velocidade pela área é a vazão do rio. Considera-se que a velocidade média calculada numa vertical é válida numa área próxima a esta vertical de acordo com a figura 6.7.
Figura 6. 6: Exemplo de medição de vazão em uma seção de um rio, com a indicação das verticais, distâncias (d) e profundidades (p) – os pontos indicam as posições em que é medida a velocidade no caso de utilizar apenas dois pontos por vertical.
Figura 6. 7: Detalhe da área da seção do rio para a qual é válida a velocidade média da vertical de número 2.
A área de uma sub-seção, como apresentada na figura 6.7 é calculada pela equação abaixo:
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⎛ (d + d i +1 ) (d i −1 + d i ) ⎞ ⎛ (d − d i −1 ) ⎞ − Ai = pi ⋅ ⎜ i ⎟ = p i ⋅ ⎜ i +1 ⎟ 2 2 2 ⎝ ⎠ ⎝ ⎠
onde o índice i indica a vertical que está sendo considerada; p é a profundidade; d é a distância da vertical até a margem. Na figura 6.7, por exemplo, a área da sub-seção da vertical 2 é dada por: ⎛ (d − d 1 ) ⎞ A2 = p 2 ⋅ ⎜ 3 ⎟ 2 ⎠ ⎝
As pequenas áreas próximas às margens que não são consideradas nas sub-seções da primeira nem da última vertical (figura 6.8) não são consideradas no cálculo da vazão. Assim, a vazão total do rio é dada por: N
Q = ∑ vi ⋅ Ai i =1
onde Q é a vazão total do rio; vi é a velocidade média da vertical i; N é o número de verticais e Ai é a área da sub-seção da vertical i.
Figura 6. 8: As áreas sombreadas junto às margens não são consideradas na integração da vazão.
EXEMPLO
4) Uma medição de vazão realizada em um rio teve os resultados da tabela abaixo. A largura total do rio é de 23 m. Qual é a vazão total do rio? Qual é a velocidade média?
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Vertical
1
2
3
4
5
Distância da margem (m) 2,0 5,0 8,0 17,0 22,0 Profundidade (m) 0,70 1,54 2,01 2,32 0,82 Velocidade a 0,2xP (m.s-1) 0,23 0,75 0,89 0,87 0,32 Velocidade a 0,8xP (m.s-1) 0,15 0,50 0,53 0,45 0,20 Para cada uma das verticais de medição é determinada a área da sub-seção correspondente. Considera-se, para isso, que as velocidades medidas na vertical ocorrem em uma região retangular de profundidade pi e largura 0,5x(di+1 – di-1) . A vazão total é dada pela soma das vazões de cada sub-seção. Vertical
1
2
3
4
5
Total
Distância da margem (m) Profundidade (m) Largura da vertical (m) Área da sub-seção (m2) Velocidade a 0,2xP (m.s-1) Velocidade a 0,8xP (m.s-1) Velocidade média na vertical (m.s-1) Vazão na sub-seção (m3.s-1)
2,0 0,70 2,50 1,75 0,23 0,15 0,19 0,33
5,0 1,54 3,0 4,62 0,75 0,50 0,63 2,91
8,0 2,01 6,0 12,06 0,89 0,53 0,71 8,56
17,0 2,32 7,0 16,24 0,87 0,45 0,66 10,72
22,0 0,82 3,0 2,46 0,32 0,20 0,26 0,64
23
37,13
23,16
A vazão total é de 23,16 m3.s-1. Este valor pode ser arredondado para 23,2 m3.s-1 porque normalmente os erros das medições de velocidade, distância e profundidade não justificam tanta precisão. A velocidade média é igual à vazão total dividida pela área total, ou seja, v=
23 ,16 = 0 ,62 37 ,13
A velocidade média é de 0,62 m.s-1.
A curva-chave O ciclo hidrológico é um processo dinâmico, governado por processos bastante aleatórios, como a precipitação. Para caracterizar o comportamento hidrológico de um curso d’água ou de uma bacia não basta dispor de uma medição de vazão, mas sim de uma série de medições. É desejável que esta série estenda-se por, pelo menos, alguns anos, e é necessário que o intervalo de tempo entre medições seja adequado para acompanhar os principais processos que ocorrem na bacia, isto é, permitam
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acompanhar as cheias e estiagens. Em um rio muito grande, de comportamento lento, isto pode significar uma medição por semana. Por outro lado, em um rio com uma área de drenagem pequena, em uma região montanhosa, com rápidas respostas durante as chuvas, pode ser necessária uma medição a cada minuto. A medição de vazão, conforme descrita no item anterior, é um processo caro, o que impede medições de vazão muito freqüentes. Normalmente a medição de vazão em rios exige uma equipe de técnicos qualificados e equipamentos como molinete, guincho e barcos. Em função disso, as medições de vazão são realizadas com o objetivo de determinar a relação entre o nível da água do rio em uma seção e a sua vazão. Esta relação entre o nível (ou cota) e a vazão é denominada a curva-chave de uma seção. Com a curva-chave é possível transformar medições diárias de cota, que são relativamente baratas, em medições diárias de vazão. Para gerar uma curva-chave representativa é necessário medir a vazão do rio em situações de vazões baixas, médias e altas. A figura 6.9 apresenta, de forma gráfica, o resultado de 62 medições de vazão realizadas entre 1992 e 2002, no rio do Sono no posto fluviométrico Cachoeira do Paredão, no Estado de Minas Gerais. Cada ponto no gráfico corresponde a uma medição de vazão. Observa-se que há mais medições de vazão na faixa de cotas e vazões baixas. Isto ocorre porque as vazões altas ocorrem apenas durante as cheias, que podem ser bastante rápidas e raramente coincidem com os dias programados para as medições de vazão.
Figura 6. 9: Dados de medição de vazão do rio do Sono, de 1992 a 2002.
A curva chave é uma equação ajustada aos dados de medição de vazão. Normalmente são utilizadas equações do tipo potência, como a equação a seguir: Q = a ⋅ (h − h 0 )b
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onde Q é a vazão; h é a cota; h0 é a cota quando a vazão é zero; e a e b são parâmetros ajustados por um critério, como erros mínimos quadrados. A figura 6.10 apresenta uma equação do tipo acima ajustada aos dados do rio do Sono.
Figura 6. 10: Equação do tipo potência ajustada aos dados de medição de vazão do rio do Sono de 1992 a 2002.
A curva chave de uma seção de rio pode se alterar com o tempo, especialmente em rios de leito arenoso. Modificações artificiais, como aterros e pontes, também podem modificar a curva chave. Por isto é necessário realizar medições de vazão regulares, mesmo após a definição da curva. Em trechos de rios próximos à foz, junto ao mar, lago ou outro rio, a relação entre cota e vazão pode não ser unívoca, isto é, a mesma vazão pode ocorrer para cotas diferentes, e cotas iguais podem apresentar vazões diferentes. Nestes casos o escoamento no rio está sob controle de jusante. O nível do rio, lago ou oceano, localizado a jusante, controla a vazão do rio e não é possível definir uma única curvachave. Este problema pode ser superado gerando uma família de curvas-chave, através da combinação da vazão, da cota local e da cota de jusante (Santos et al., 2001). É claro que esta alternativa é bastante trabalhosa e deve ser evitada, dando-se preferência à instalação de postos fluviométricos em locais livres da influência da maré, ou do nível de jusante. Este texto apresenta uma introdução às técnicas de medição de vazão e determinação da curva chave. Maiores detalhes podem ser encontrados em textos específicos, como o de Santos et al. (2001).
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Vertedores e calhas Em cursos d’água de menor porte é possível construir estruturas no leito do rio que facilitam a medição de vazão. Este é o caso das calhas Parshal e dos vertedores de soleira delgada. Vertedores de soleira delgada são estruturas hidráulicas que obrigam o escoamento a passar do regime sub-crítico (lento) para o regime super-crítico (rápido) para as quais a relação entre cota e vazão é conhecida. Assim, o nível a água medido a montante com uma régua ou linígrafo pode ser utilizado para estimar diretamente a vazão (figura 6.11).
Figura 6. 11: Vertedor triangular para medição de vazão em pequenos cursos d’água.
Um vertedor triangular de soleira delgada com ângulo de 90º (figura 6.11), por exemplo, tem uma relação entre cota e vazão dada por: Q = 1,42 ⋅ h 2 ,5
onde Q é a vazão em m3.s-1 e h é a carga hidráulica em metros sobre o vertedor que é a distância do vértice ao nível da água (figura 6.12), medido a montante do vertedor, conforme indicado na figura 6.11. Esta relação pode ser utilizada diretamente, embora na maioria dos casos seja desejável a verificação em laboratório.
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Figura 6. 6: Vertedor triangular com soleira delgada em ângulo de 90º.
A Calha Parshal é um trecho curto de canal com geometria de fundo e paredes que acelera a velocidade da água e cria uma passagem por escoamento crítico. A medição de nível é feita a montante da passagem pelo regime crítico, e pode ser relacionada diretamente à vazão. As calhas Parshal são dimensionadas com diferentes tamanhos, de forma a permitir a medição em diferentes faixas de vazão. A principal vantagem das calhas e dos vertedores é que existe uma relação direta e conhecida, ou facilmente calibrável, entre a vazão e a cota. A calha ou o vertedor tem a desvantagem do custo relativamente alto de instalação. Além disso, durante eventos extremos estas estruturas podem ser danificadas ou, até mesmo, inutilizadas.
Figura 6. 13: Calha Parshall para medição de vazão em pequenos córregos ou canais.
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Medição de vazão com equipamento Doppler Em rios médios ou grandes, alguns medidores eletrônicos de velocidade, como o ADCP, substituem os molinetes com grandes vantagens. Estes instrumentos permitem medir a velocidade em muito mais pontos ao longo da seção transversal de um rio em muito menos tempo. Além disso, estes instrumentos comunicam-se diretamente a microcomputadores, transferem os dados de velocidade e calculam a vazão automaticamente, reduzindo substancialmente o tempo necessário para preencher planilhas no campo e para digitar estes dados, posteriormente, no escritório. A grande desvantagem destes instrumentos é o custo de aquisição. Apesar disto, estes equipamentos vêm se tornando cada vez mais comuns, e possivelmente levarão, em poucos anos, ao abandono completo das medições com molinetes.
Estimativas de vazão em locais sem dados Normalmente não existem dados de vazão exatamente no local necessário. Assim, muitas vezes é necessário estimar valores a partir de informações de postos fluviométricos próximos. A este procedimento, quando realizado de forma cuidadosa e detalhada, dá se o nome de regionalização hidrológica. A forma mais simples de regionalização hidrológica é o estabelecimento de uma relação linear entre vazão e área de drenagem da bacia. Suponha que é necessário estimar a vazão média em um local sem dados localizado no rio Camaquã, denominado ponto A. A área de drenagem no ponto A é de 1700 km2. Dados de um posto fluviométrico localizado no mesmo rio, no ponto B, cuja área de drenagem é de 1000 km2 indicam uma vazão média de 200 m3.s-1. A vazão média no ponto A pode ser estimada por Q A = QB ⋅
AA AB
onde AA é a área de drenagem do ponto A e AB é a área de drenagem do ponto B, e QA é a vazão média no ponto A e QB é a vazão média no ponto B. Esta forma de estimativa pode ser aplicada também para estimar vazões mínimas, como a Q90 e a Q95. Obviamente, este método tem muitas limitações e não pode ser usado quando a bacia for muito heterogênea quanto às características de relevo, clima, solo e geologia. Para estimar vazões máximas em locais sem dados este método tende a superestimar as vazões quando a área de drenagem do ponto sem dados é maior do que a área de drenagem do ponto com dados.
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Métodos de regionalização mais complexos incluem variáveis como a precipitação média, características de comprimento e declividade do rio principal, tipos de solos e geologia, e podem gerar informações relativamente confiáveis para locais sem dados. Os detalhes da regionalização hidrológica são apresentados de forma aprofundada em livros como Tucci (1998). Em resumo, a regionalização de vazões busca identificar relações entre os valores de vazões máximas, mínimas e médias com a área da bacia e outras características físicas da região. As relações normalmente são da forma apresentada na equação apresentada abaixo: Qref = a ⋅ A b
onde a e b são constantes para uma região hidrológica homogênea, isto é, que tem aproximadamente as mesmas características geológicas e climáticas.
Exercícios 1) Como se origina o escoamento superficial em uma bacia durante as chuvas? 2) Qual é a lâmina escoada superficialmente durante um evento de chuva de precipitação total P = 60 mm numa bacia com solos do tipo B e com cobertura de florestas? O que ocorreria com o escoamento caso as florestas fossem substituídas por plantações? 3) Durante uma longa estiagem de um rio foram feitas duas medições de vazão, conforme a tabela abaixo. Qual seria a vazão esperada para o dia 31 de agosto do mesmo ano, considerando que não ocorre nenhum evento de chuva neste período? data 14/ago 15/ago 16/ago 17/ago 18/ago 19/ago
Vazão (m3.s-1) 60.4 51.7
4) Durante uma longa estiagem de um rio foram feitas seis medições de vazão, conforme a tabela abaixo. Qual seria a vazão esperada para o dia 31 de agosto do mesmo ano, considerando que não ocorre nenhum evento de chuva neste
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período? Considere que durante a estiagem a bacia se comporte como um reservatório linear. Data 14/ago 15/ago 16/ago 17/ago 18/ago 19/ago
vazão 123.1 116.2 109.6 103.2 97.3 91.8
5) O que é a curva-chave? 6) Para que servem as calhas Parshal? 7) Qual é a vazão que escoa em regime permanente e uniforme por um canal de concreto liso com seção transversal trapezoidal com largura da base B = 2 m e largura no topo de 5 m, com altura total de 2 m e com profundidade y = 1,5 m, considerando a declividade de 15 cm por km?
8) Qual é a vazão que faria transbordar o canal do exercício anterior? 9) A tabela abaixo apresenta dados de medição de vazão em uma seção transversal de um rio. Deseja-se ajustar uma equação do tipo Q = a.(h-h0)b a estes dados para gerar uma curva-chave. Estime o valor dos coeficientes a, b e h0. usando sua calculadora ou o software Excel. Nível – h (m) 0,10 0,50
Vazão (m3/s) 0,40 1,34
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0,80 0,90 1,90 1,85 2,01 0,45 0,70
7,9 9,3 12,5 11,8 14,5 1,1 6,0
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7
Capítulo
Hidrologia Estatística
A
s variáveis hidrológicas como chuva e vazão têm como característica básica uma grande variabilidade no tempo. Para analisar a vazão de um rio ou a precipitação em um local ou região, incluindo a sua variabilidade temporal, é necessário utilizar alguns valores estatísticos que resumem, em grande parte, o comportamento hidrológico do rio ou da bacia. Entre as estatísticas mais importantes estão a média, a média mensal, a variância, os mínimos e máximos.
A média A vazão ou precipitação média é a média de toda a série de vazões ou precipitações registradas, e é muito importante na avaliação da disponibilidade hídrica total de uma bacia. n
x=
∑x i =1
i
n
A vazão média específica é a vazão média dividida pela área de drenagem da bacia. As vazões médias mensais representam o valor médio da vazão para cada mês do ano, e são importantes para analisar a sazonalidade de um rio. A Figura 7. 1 apresenta um gráfico das vazões médias mensais do rio Cuiabá na seção da cidade de Cuiabá, com base nos dados de 1967 a 1999.
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Figura 7. 1: Vazões medias mensais do rio Cuiabá em Cuiabá (dados de 1967 a 1999).
Observa-se nesta figura que há uma sazonalidade marcada, com estiagem no inverno e vazões altas no verão. As maiores vazões mensais médias ocorrem em Fevereiro e as menores em Agosto, o que é conseqüência direta da sazonalidade das chuvas, que ocorrem de forma concentrada no período de verão.
A mediana A mediana é o valor que é superado em 50% dos pontos da amostra. A média e a mediana podem ter valores relativamente próximos, porém não iguais. A mediana pode ser obtida organizando os n valores xi da amostra em ordem crescente. Sendo x k com k = 1 a n, os valores de x organizados em ordem decrescente, a mediana é obtida por:
Mediana = x p com p = e Mediana =
x p + x p +1
2
n −1 + 1 se n for ímpar; 2
se n for par.
O desvio padrão O desvio padrão é uma medida de dispersão dos valores de uma amostra em torno da média. O desvio padrão é dado por:
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∑ (x n
s=
i =1
i
−x
)
2
n −1
o quadrado do desvio padrão s2 é chamada variância da amostra.
A curva de permanência A elaboração da curva de permanência é uma das análises estatísticas mais simples e mais importantes na hidrologia. A curva de permanência auxilia na análise dos dados de vazão com relação a perguntas como as destacadas a seguir.
•
O rio tem uma vazão aproximadamente constante ou extremamente variável entre os extremos máximo e mínimo?
•
Qual é a porcentagem do tempo em que o rio apresenta vazões em determinada faixa?
•
Qual é a porcentagem do tempo em que um rio tem vazão suficiente para atender determinada demanda?
A curva de permanência expressa a relação entre a vazão e a freqüência com que esta vazão é superada ou igualada. A curva de permanência pode ser elaborada a partir de dados diários ou dados mensais de vazão. A Figura 7. 2 apresenta o hidrograma de vazões diárias do rio Taquari, em Muçum (RS), e a curva de permanência que corresponde aos mesmos dados apresentados no hidrograma. Observa-se que a vazão de 1000 m3.s-1 é igualada ou superada em menos de 10% do tempo. Apesar de apresentar picos de cheias com 7000 m3.s-1 ou mais, na maior parte do tempo as vazões do rio Taquari neste local são bastante inferiores a 500 m3.s-1. Para destacar mais a faixa de vazões mais baixas a curva de permanência é apresentada com eixo vertical logarítmico, como mostra a Figura 7. 3.
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Figura 7. 2: Hidrograma de vazões diárias do rio Taquari em Muçum (RS) e a curva de permanência correspondente.
Figura 7. 3: Curva de permanência do rio Taquari em Muçum com eixo das vazões logarítmico para dar destaque à faixa de vazões mais baixas.
Alguns pontos da curva de permanência recebem atenção especial:
•
A vazão que é superada em 50% do tempo (mediana das vazões) é a chamada Q50.
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•
A vazão que é superada em 90% do tempo é chamada de Q90 e é utilizada como referência para legislação na área de Meio Ambiente e de Recursos Hídricos em muitos Estados do Brasil.
•
A vazão que é superada em 95% do tempo é chamada de Q95 e é utilizada para definir a Energia Assegurada de uma usina hidrelétrica.
EXEMPLO
1) Os dados de vazão do rio Descoberto em Santo Antônio do Descoberto (GO) foram organizados na forma de uma curva de permanência, como mostra a Figura 7. 4. Um empreendedor solicita outorga de 2,5 m3.s-1 num ponto próximo no mesmo rio. Considerando que a legislação permite outorgar apenas 20% da Q90 a cada solicitante, responda: é possível atender a solicitação?
Figura 7. 4: Curva de permanência do rio Descoberto, em Santo Antônio do Descoberto (GO), para o exemplo 1.
Observa-se na curva de permanência que a vazão Q90 é de 7 m3.s-,1 aproximadamente. Portanto a máxima vazão que pode ser outorgada para um usuário individual neste ponto corresponde a:
Qmax = 0 ,2 ⋅ 7 = 1,4 m 3 ⋅ s −1 Como o empreendedor solicitou 2,5 m3.s-,1 não é possível atender sua solicitação.
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A curva de permanência também é útil para diferenciar o comportamento de rios e para avaliar o efeito de modificações como desmatamento, reflorestamento, construção de reservatórios e extração de água para uso consuntivo. A Figura 7. 5 apresenta as curvas de permanência dos rios Cuiabá, em Cuiabá (MT), e Taquari, em Coxim (MS), baseadas nos dados de vazão diária de 1980 a 1984. As duas bacias tem áreas de drenagem de tamanho semelhante. A bacia do rio Cuiabá tem, aproximadamente, 22.000 km2, e a do rio Taquari cerca de 27.000 km2. O relevo e a precipitação média anual são semelhantes. A vazão média do rio Cuiabá é de 438 m3.s-1 neste período, enquanto a vazão média do rio Taquari é de 436 m3.s-1, ou seja, são praticamente idênticas. Entretanto, observa-se que as vazões mínimas são mais altas no rio Taquari do que no rio Cuiabá e as vazões máximas são maiores no rio Cuiabá. O rio Cuiabá apresenta maior variabilidade das vazões, que se alternam rapidamente entre situações de baixa e de alta vazão, enquanto o rio Taquari permanece mais tempo com vazões próximas da média. Esta diferença ocorre basicamente porque a geologia da bacia do rio Taquari favorece mais a infiltração da água no solo, e esta água chega ao rio apenas após um longo período em que fica armazenada no subsolo. A vazão do rio Taquari é naturalmente regularizada pelos aqüíferos existentes na bacia, enquanto que na bacia do rio Cuiabá este efeito não é tão importante.
Figura 7. 5: Comparação entre as curvas de permanência dos rios Taquari (MS) e Cuiabá (MT).
A Figura 7. 6 apresenta as curvas de permanência de vazão afluente (entrada) e efluente (saída) do reservatório de Três Marias, no rio São Francisco (MG). Este
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reservatório tem um grande volume e uma grande capacidade de regularização, permitindo reter grande parte das vazões altas que ocorrem durante o período do verão, aumentando a disponibilidade de água no período de estiagem. Como resultado observa-se que a vazão Q90 é alterada de 148 m3.s-1 para 379 m3.s-1 pelo efeito de regularização do reservatório, enquanto a vazão Q95 é alterada de 120 m3.s-1 para 335 m3.s-1.
Figura 7. 6: Curvas de permanência de vazão afluente e efluente do reservatório de Três Marias, no rio São Francisco (MG).
Portanto o efeito da regularização da vazão sobre a curva de permanência é torná-la mais horizontal, com valores mais próximos da mediana durante a maior parte do tempo.
Séries temporais A vazão de um rio é uma variável que se modifica de forma contínua no tempo, e pode ser representada em um hidrograma, que é o gráfico que relaciona os valores de vazão com o tempo, como na figura 7.7. Diversas análises estatísticas de dados hidrológicos são realizadas de forma mais conveniente sobre valores discretos no tempo, ao contrário das seqüências contínuas. A partir de uma seqüência contínua de vazões é possível identificar séries temporais de valores discretos, como, por exemplo, as vazões médias anuais, as vazões máximas anuais e as vazões mínimas anuais, conforme representado na figura 7.8 e na tabela 7.1. As séries discretas que são obtidas a partir da observação de alguns anos de dados de vazão são tratadas como amostras do comportamento de um rio ou de uma bacia. A
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população, neste caso, seriam todos os anos de existência de um rio. A vazão é considerada uma variável aleatória porque depende de fenômenos climáticos complexos e de difícil previsibilidade a partir de um certo horizonte.
Figura 7. 7: As vazões variam continuamente no tempo (linha) mas a partir dos dados de vazão é possível gerar séries temporais discretas, como as médias, máximas (triângulos) e mínimas (círculos) anuais (adaptado de Dingman, 2002).
Figura 7. 8: Gráfico das séries discretas de médias, mínimas e máximas anuais.
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Tabela 7. 2: Valores das séries temporais discretas de vazões médias, mínimas e máximas anuais relativos à figura anterior.
Ano
Vazão média anual 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996
95 93 72 86 56 73 96
Vazão mínima anual Vazão máxima anual 57 132 69 126 48 100 60 113 29 80 53 88 68 132
Risco, probabilidade e tempo de retorno Séries temporais discretas são convenientes para avaliar riscos em hidrologia. Risco é muitas vezes entendido como um sinônimo de probabilidade, mas em hidrologia é mais adequado considerar o risco como a probabilidade de ocorrência de um evento multiplicada pelos prejuízos que se espera da ocorrência deste evento. Projetos de estruturas hidráulicas sempre são elaborados admitindo probabilidades de falha. Por exemplo, as pontes de uma estrada são projetadas com uma altura tal que a probabilidade de ocorrência de uma cheia que atinja a ponte seja de apenas 1% num ano qualquer. Isto ocorre porque é muito caro dimensionar as pontes para a maior vazão possível, por isso admite-se uma probabilidade, ou risco, de que a estrutura falhe. Isto significa que podem ocorrer vazões maiores do que a vazão adotada no dimensionamento. A probabilidade admitida pode ser maior ou menor, dependendo do tipo de estrutura. A probabilidade admitida para a falha de uma estrutura hidráulica é menor se a falha desta estrutura provocar grandes prejuízos econômicos ou mortes de pessoas. Assim, a probabilidade de falha admitida para um dique de proteção de uma cidade é a probabilidade de que ocorra uma cheia em que o nível da água supere o nível de proteção do dique. Diques que protegem grandes cidades deveriam ser construídos admitindo uma probabilidade menor de falha do que diques de proteção de pequenas áreas agrícolas. A tabela 7.2 apresenta o tempo de retorno em anos adotado, normalmente, para diferentes tipos de estrutura.
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Tabela 7.2: Tempo de retorno adotado para diferentes estruturas, de acordo com o risco associado. Estrutura Bueiros de estradas pouco movimentadas Bueiros de estradas muito movimentadas Pontes Diques de proteção de cidades Drenagem pluvial Grandes barragens (vertedor) Pequenas barragens
TR (anos) 5 a 10 50 a 100 50 a 100 50 a 200 2 a 10 10.000 100
O risco também pode estar relacionado a situações de vazões mínimas. Por exemplo, considere uma cidade que utilize a água de um rio para abastecimento da população. Dependendo do tamanho da população e das características do rio, existe um sério risco de que, num ano qualquer, ocorram alguns dias em que a vazão do rio é inferior à vazão necessária para abastecer a população. No caso da análise de vazões máximas, são úteis os conceitos de probabilidade de excedência e de tempo de retorno de uma dada vazão. A probabilidade anual de excedência de uma determinada vazão é a probabilidade que esta vazão venha a ser igualada ou superada num ano qualquer. O tempo de retorno desta vazão é o intervalo médio de tempo, em anos, que decorre entre duas ocorrências subseqüentes de uma vazão maior ou igual. O tempo de retorno é o inverso da probabilidade de excedência como expresso na seguinte equação:
TR =
1 P
(7.1)
onde TR é o tempo de retorno em anos e P é a probabilidade de ocorrer um evento igual ou superior em um ano qualquer. No caso de vazões mínimas, P refere-se à probabilidade de ocorrer um evento com vazão igual ou inferior. A equação acima indica que a probabilidade de ocorrência de uma cheia de 10 anos de tempo de retorno, ou mais, num ano qualquer é de 0,1 (ou 10%). A vazão máxima de 10 anos de tempo de retorno (TR = 10 anos) é excedida em média 1 vez a cada dez anos. Isto não significa que 2 cheias de TR = 10 anos não possam ocorrem em 2 anos seguidos. Também não significa que não possam ocorrer 20 anos seguidos sem vazões iguais ou maiores do que a cheia de TR=10 anos.
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Existem duas formas de atribuir probabilidades e tempos de retorno às vazões máximas e mínimas: métodos empíricos e métodos analíticos. Probabilidades empíricas podem ser estimadas a partir da observação das variáveis aleatórias. Por exemplo, a probabilidade de que uma moeda caia com a face “cara” virada para cima é de 50%. Esta probabilidade pode ser estimada empiricamente lançando a moeda 100 vezes e contando quantas vezes cada uma das faces fica voltada para cima. O problema das probabilidades empíricas é que quando o tamanho da amostra é pequeno, a estimativa tende a ser muito incerta. Suponha, por exemplo, que apenas 6 lançamentos sejam feitos para estimar a probabilidade de que uma moeda caia com a face “cara” voltada para cima. É possível que seja estimada uma probabilidade muito diferente de 50%. Para contornar este problema é comum supor que os dados hidrológicos sejam aleatórios e que sigam uma determinada distribuição de probabilidade analítica, como a distribuição normal, por exemplo. Esta metodologia analítica permite explorar melhor as amostras relativamente pequenas de dados hidrológicos, como se descreve na seqüência deste capítulo.
Chuvas anuais e a distribuição normal O total de chuva que cai ao longo de um ano pode ser considerado uma variável aleatória com distribuição aproximadamente normal. Esta suposição permite explorar melhor amostras relativamente pequenas, com apenas 20 anos, por exemplo. A distribuição normal é descrita em qualquer livro introdutório de estatística e se aplica a muitos tipos de informações da natureza. Um gráfico da função densidade de probabilidade da distribuição normal tem uma forma de sino e é simétrica com relação à média, que é o valor central. A forma em sino indica que existe uma probabilidade maior de ocorrerem valores próximos à média do que nos extremos mínimo e máximo. A função densidade de probabilidade (PDF) da distribuição normal é uma expressão que depende de dois parâmetros: a média e o desvio padrão da população, conforme a equação seguinte: f x (x ) =
⎡ 1 ⎛x−µ x ⋅ exp ⎢− ⋅ ⎜⎜ 2 ⋅π ⋅σ x ⎢⎣ 2 ⎝ σ x 1
93
⎞ ⎟⎟ ⎠
2
⎤ ⎥ ⎥⎦
(7.2)
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onde µx é a média da população e σx é o desvio padrão da população. Para o caso mais simples, em que a média da população é zero e o desvio padrão igual a 1, a expressão acima fica simplifcada: f z (z ) =
⎡ z2 ⎤ ⋅ exp ⎢− ⎥ 2 ⋅π ⎣ 2⎦ 1
(7.3)
onde z é uma variável aleatória com média zero e desvio padrão igual a 1. O gráfico desta última é apresentado na figura 7.9. A área total sob a curva é igual a 1. A área hachurada representa a probabilidade de ocorrência de um valor maior do que z (figura de cima) ou menor do que z (figura de baixo). A área sob a curva pode ser calculada por integração analítica, mas resulta numa série infinita. Por este motivo, as aplicações práticas são mais comuns na forma de tabelas que relacionam o valor de z com a probabilidade de ocorrer um valor maior do que z ou menor do que z. Existem, também, tabelas que fornecem valores da área entre 0 e z, ou de –z a z. No final do capítulo é apresentada uma tabela de probabilidades da distribuição normal. No programa Excel é possível obter os valores das probabilidades utilizando a função DIST.NORMP(z), que dá a probabilidade de ocorrer um valor inferior a z. Lembrando a relação entre probabilidades e tempos de retorno, é interessante saber os valores de z que correspondem a alguns valores específicos de probabilidade, como 0,1 0,01 e 0,001. Estes valores correspondem aos tempos de retorno de 10, 100 e 1000 anos. No final do capítulo é apresentada uma tabela de probabilidades da distribuição normal, indicando os valores de z correspondentes aos tempos de retorno de 2 a 10000 anos.
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Figura 7. 9: Gráfico da distribuição normal (na figura superior é indicada a área hachurada que representa a probabilidade de ocorrer um valor maior do que z; e na figura inferior é indicada a área hachurada que representa a probabilidade de ocorrer um valor menor do que z).
Uma variável aleatória x com média µx e desvio padrão σx pode ser transformada em uma variável aleatória z, com média zero e desvio padrão igual a 1 pela transformação abaixo: z=
x − µx
(7.4)
σx
Esta transformação pode ser utilizada para estimar a probabilidade associada a um determinado evento hidrológico em que a variável segue uma distribuição normal. Considere, por exemplo, a chuva anual em um determinado local. Anos com chuva próxima da média são relativamente freqüentes, enquanto anos muito chuvosos ou muito secos são menos freqüentes. Em muitos locais as chuvas anuais seguem, aproximadamente uma distribuição normal, como mostra a figura 7.10.
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Figura 7. 10: Histograma de freqüências de chuvas anuais no posto pluviométrico localizado em Lamounier, MG (código 02045005 - ver capítulo 3).
A probabilidade de ocorrência de chuvas anuais superiores a 2000 mm, por exemplo, pode ser estimada a partir da análise dos dados de n anos, e da suposição de que os dados seguem uma distribuição normal.
EXEMPLOS
2) As chuvas anuais no posto pluviométrico localizado em Lamounier, em Minas Gerais (Código 02045005) seguem, aproximadamente, uma distribuição normal, com média igual a 1433 mm e desvio padrão igual a 299 mm. Qual é a probabilidade de ocorrer um ano com chuva total superior a 2000 mm? Considerando que a média e o desvio padrão da amostra disponível sejam boas aproximações da média e do desvio padrão da população, pode se estimar o valor da variável reduzida z para o valor de 2000 mm: z=
x − µx
σx
≅
x − x 2000 − 1433 = = 1,896 s 299
de acordo com a Tabela A, no final do capítulo, a probabilidade de ocorrência de um valor maior do que z=1,896 é de aproximadamente 0,0287 (valor correspondente a z=1,9). Portanto, a probabilidade de ocorrer um ano com chuva total superior a 2000 mm é de, aproximadamente, 2,87%. O tempo de retorno correspondente é de pouco menos de 35 anos.
96
H I D R O L O G I A
Isto significa que, em média, um ano a cada 35 apresenta chuva total superior a 2000 mm neste local.
3) As chuvas anuais no posto pluviométrico localizado em Lamounier, em Minas Gerais (Código 02045005) seguem, aproximadamente, uma distribuição normal, com média igual a 1433 mm e desvio padrão igual a 299 mm. Qual é a probabilidade de ocorrer um ano com chuva total inferior a 550 mm? A distribuição normal é simétrica. A probabilidade de ocorrer um valor superior a z é igual à probabilidade de ocorrer um valor inferior a –z. Assim, z=
x − µx
σx
≅
x − x 550 − 1433 = = −2,95 s 299
de acordo com a Tabela A, no final do capítulo, a probabilidade de ocorrência de um valor maior do que z=2,95está entre 0,0012 e 0,0019. Portanto, a probabilidade de ocorrer um ano com chuva total superior a 2000 mm é de, aproximadamente, 0,15%. O tempo de retorno correspondente é de pouco menos de 666 anos. Isto significa que, em média, um ano a cada 666 apresenta chuva total inferior a 550 mm neste local.
Vazões máximas Selecionando apenas as vazões máximas de cada ano em um determinado local, é obtida a série de vazões máximas deste local e é possível realizar análises estatísticas relacionando vazão com probabilidade. As séries de vazões disponíveis na maior parte dos locais (postos fluviométricos) são relativamente curtas, não superando algumas dezenas de anos. Analisando as vazões do rio Cuiabá no período de 1984 a 1992, por exemplo, podemos selecionar de cada ano apenas o valor da maior vazão, e analisar apenas as vazões máximas (tabela 7.3). Reorganizando as vazões máximas para uma ordem decrescente, podemos atribuir uma probabilidade de excedência empírica a cada uma das vazões máximas da série, utilizando a fórmula de Weibull: P=
m N +1
(7.5)
97
H I D R O L O G I A
onde N é o tamanho da amostra (número de anos); e m é a ordem da vazão (para a maior vazão m=1 e para a menor vazão m=N). O resultado é apresentado na tabela 7.4.
Figura 7. 11: Série de vazões do rio Cuiabá em Cuiabá, de 1984 ao final de 1991, evidenciando a vazão máxima de cada ano.
Tabela 7.3: Vazões máximas anuais entre 1984 e 1991. Ano 1984 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991
Q máx 1796.8 1492.0 1565.0 1812.0 2218.0 2190.0 1445.0 1747.0
Tabela 7.4: Vazões máximas reorganizadas em ordem decrescente, com ordem e probabilidade empírica associada. Ano 1988 1989 1987
Vazão (m3/s) 2218.0 2190.0 1812.0
Ordem 1 2 3
Probabilidade 0.11 0.22 0.33
98
TR (anos) 9.0 4.5 3.0
H I D R O L O G I A
1984 1991 1986 1985 1990
1796.8 1747.0 1565.0 1492.0 1445.0
4 5 6 7 8
0.44 0.56 0.67 0.78 0.89
2.3 1.8 1.5 1.3 1.1
O problema da estimativa empírica de probabilidades é que não é possível extrapolar a estimativa para tempos de retorno maiores. Por exemplo, se é necessário estimar a vazão máxima de 100 anos de tempo de retorno, mas existem apenas 18 anos de dados observados, as probabilidades empíricas permitem estimar vazões máximas de TR próximo de 18 anos. Para extrapolar as estimativas de vazão máxima é necessário supor que as vazões máximas anuais seguem uma distribuição de probabilidades conhecida, como no caso das chuvas anuais. Infelizmente, porém, as vazões máximas não seguem a distribuição normal. Histogramas de vazões máximas anuais tendem a apresentar uma forte assimetria positiva (longa cauda na direção dos maiores valores), o que invalida o uso da distribuição normal (figura 7.12).
Figura 7.12: Comparação entre um histograma de vazões máximas observadas do rio Cuiabá em Cuiabá entre 1967 e 1999 e a distribuição normal. Para superar este problema existem outras distribuições de probabilidade que são, normalmente, utilizadas para a análise de vazões máximas. A mais simples destas distribuições é a denominada log-normal. Nesta distribuição a suposição é que os logaritmos das vazões seguem uma distribuição normal.
99
H I D R O L O G I A
Se o objetivo da análise é determinar a vazão de 100 anos de tempo de retorno em um determinado local, por exemplo, a seqüência de etapas para a estimativa supondo que os dados correspondem a uma distribuição log-normal é a seguinte: •
Obter vazões máximas de N anos
•
Calcular os logaritmos das vazões máximas
•
Calcular a média e o desvio padrão dos logaritmos das vazões máximas
•
Obter o valor de z para a probabilidade correspondente ao tempo de retorno de 100 anos
•
Obter o valor do logaritmo da vazão de tempo de retorno de 100 anos a partir da equação 7.4
•
Obter o valor da vazão através da função inversa do logaritmo.
Esta seqüência de etapas fica mais clara na aplicação em um exemplo.
EXEMPLOS
4) As vazões máximas anuais do rio Guaporé no posto fluviométrico Linha Colombo são apresentadas na tabela abaixo. Utilize a distribuição log-normal para estimar a vazão máxima com 100 anos de tempo de retorno. ANO MAXIMA 1940 953 1941 1171 1942 723 1943 267 1944 646 1945 365 1946 1359 1947 411 1948 480 1949 365
ANO MAXIMA 1950 1192 1951 356 1952 246 1953 1093 1954 840 1955 622 1956 falha 1957 598 1958 646 1959 953
ANO MAXIMA 1960 falha 1961 718 1962 503 1963 falha 1964 457 1965 915 1966 742 1967 840 1968 331 1969 320
ANO MAXIMA 1970 365 1971 671 1972 1785 1973 726 1974 397 1975 480 1976 falha 1977 673 1978 760 1979 780
ANO MAXIMA 1980 653 1981 537 1982 945 1983 1650 1984 1165 1985 888 1986 728 1987 809 1988 945 1989 1380
ANO MAXIMA 1990 falha 1991 falha 1992 falha 1993 1115 1995 639
Este exemplo apresenta uma situação muito comum na análise de dados hidrológicos: as falhas. As falhas são períodos em que não houve observação. As falhas são desconsideradas na análise, assim o tamanho da amostra é N=48. Utilizando logaritmos de base decimal, a média dos logaritmos das vazoes máximas é 2,831 e o desvio padrão é 0,206. Para o tempo de retorno de 100 anos a probabilidade de excedência é igual a 0,01. Na tabela B, ao final do capítulo, pode-se obter o valor de z correspondente (z=2,326). A vazão máxima de TR=100 anos é obtida por:
100
H I D R O L O G I A
z≅
x−x s
2,326 ≅
x − 2,831 0,206
x = 2,326 ⋅ 0,206 + 2,831 = 3,31 Q = 10 3,31 = 2041
Portanto, a vazão máxima de 100 anos de tempo de retorno é 2041 m3/s. Este procedimento pode ser repetido para outros valores de TR, e o resultado pode ser apresentado na forma de um gráfico, relacionando vazão com tempo de retorno, como na figura 7.13. Nesta figura fica claro, também, que a suposição de uma distribuição log-normal é muito mais adequada do que a suposição de uma distribuição normal.
Figura 7.13: Vazões máximas do rio Guaporé em Linha Colombo. Comparação entre o ajuste e as probabilidades empíricas (pontos), supondo distribuição normal (linha pontilhada) e distribuição log-normal (linha contínua).
101
H I D R O L O G I A
Os métodos de estimativa de vazões máximas apresentados neste texto são relativamente simples e a forma de apresentação é resumida. Para realizar análises de vazões máximas mais rigorosas normalmente é necessário testar três ou mais distribuições de probabilidade teóricas, e avaliar qual é a distribuição que melhor se adequa aos dados. Metodologias mais aprofundadas podem ser encontradas em Tucci (1993), Maidment (1993) e Wurbs e James (2001).
Vazões mínimas A análise de vazões mínimas é semelhante à análise de vazões máximas, exceto pelo fato que no caso das vazões mínimas o interesse é pela probabilidade de ocorrência de vazões iguais ou menores do que um determinado limite. No caso da análise utilizando probabilidades empíricas, esta diferença implica em que os valores de vazão devem ser organizados em ordem crescente, ao contrário da ordem decrescente utilizada no caso das vazões máximas. A aplicação da análise estatística para vazões mínimas é analisada através de um exemplo. EXEMPLOS
5) A tabela abaixo apresenta as vazões mínimas anuais observadas no rio Piquiri, no município de Iporã (PR). Considerando que os dados seguem uma distribuição normal, determine a vazão mínima de 5 anos de tempo de retorno. A distribuição normal se ajusta bem aos dados observados? Vazão mínima
ano 1980
202
1981
128.6
1982
111.4
1983
269
1984
158.2
1985
77.5
1986
77.5
1987
166
1988
70
1989
219.6
1990
221.8
1991
111.4
1992
204.2
1993
196
1994
172
1995
130.4
1996
121.6
102
H I D R O L O G I A
1997
198
1998
320.6
1999
101.2
2000
118.2
2001
213
Os valores de vazão mínima são reorganizados em ordem crescente e a probabilidade empírica para cada valor é calculada. A seguir é calculada a média e o desvio padrão do conjunto de dados.
ano
ordem
probabilidade
TR empírico
Vazão mínima
1988
1
0.04
23.0
70
1985
2
0.09
11.5
77.5
1986
3
0.13
7.7
77.5
1999
4
0.17
5.8
101.2
1982
5
0.22
4.6
111.4
1991
6
0.26
3.8
111.4
2000
7
0.30
3.3
118.2
1996
8
0.35
2.9
121.6
1981
9
0.39
2.6
128.6
1995
10
0.43
2.3
130.4
1984
11
0.48
2.1
158.2
1987
12
0.52
1.9
166
1994
13
0.57
1.8
172
1993
14
0.61
1.6
196
1997
15
0.65
1.5
198
1980
16
0.70
1.4
202
1992
17
0.74
1.4
204.2
2001
18
0.78
1.3
213
1989
19
0.83
1.2
219.6
1990
20
0.87
1.2
221.8
1983
21
0.91
1.1
269
1998
22
0.96
1.0
320.6
Média = 163 Desvio padrão = 65.2 Os valores da vazão para diferentes tempos de retorno são calculados por: Q = Q − SQ ⋅ K
Onde K é o valor da tabela da distribuição normal para as probabilidades (veja tabela B ao final do capítulo).
103
H I D R O L O G I A
Tempo de retorno
K
2 5 10 50 100
Q
0 0.842 1.282 2.054 2.326
163.1 108.2 79.5 29.2 11.5
Na figura abaixo vê-se que o ajuste da distribuição normal não é muito bom para estes dados. A vazão mínima com tempo de retorno de 5 anos é estimada em 108 m3/s. 350
.
300
Vazão mínima (m3/s)
250 200 150 100 50 0 1.0
10.0
100.0
Tempo de retorno (anos)
Normalmente, as análises estatísticas de vazões mínimas são realizadas sobre as vazões mínimas de 7 dias, 15 dias ou 30 dias de duração. Neste caso, para cada ano do registro histórico encontra-se a vazão mínima média de 7 dias (médias móveis de 7 dias). O restante do procedimento de análise é semelhante ao apresentado aqui.
Vazões máximas em pequenas bacias Em pequenas bacias, onde normalmente não existem dados de vazão medidos, as vazões máximas são necessárias para dimensionar estruturas de drenagem, como bueiros, bocas de lobo e calhas. Nestas situações é mais comum a utilização de um método de estimativa baseado em dados de chuva, que são transformados em vazão. O método mais simples é conhecido como método racional, e é aplicável para bacias de até, aproximadamente, 2 km2.
104
H I D R O L O G I A
O método racional se baseia na seguinte expressão: Q=
C ⋅i ⋅ A 3,6
(7.6)
onde Q é a vazão de cheia (m3.s-1); C é um coeficiente de escoamento superficial; i é a intensidade da chuva (mm.hora-1); e A é área da bacia hidrográfica (km2). A área de drenagem pode ser obtida a partir de mapas e de levantamentos topográficos. O coeficiente de escoamento pode ser avaliado a partir de condições do solo, vegetação e ocupação da bacia (tabelas 7.5 e 7.6). Tabela 7.5: Valores de C (coeficiente de escoamento do método racional) para diferentes superfícies. Superfície
intervalo
Asfalto
0,70 a 0,95
0,83
Concreto
0,80 a 0,95
0,88
Calçadas
0,75 a 0,85
0,80
Telhado
0,75 a 0,95
0,85
grama solo arenoso plano
0,05 a 0,10
0,08
grama solo arenoso inclinado 0,15 a 0,20
0,18
grama solo argiloso plano
0,13 a 0,17
0,15
grama solo argiloso inclinado 0,25 a 0,35
0,30
áreas rurais
valor esperado
0,0 a 0,30
Tabela 7.6: Valores de C (coeficiente de escoamento do método racional) de acordo com a ocupação da bacia. Zonas
C
Centro da cidade densamente construído
0,70 a 0,95
Partes adjacentes ao centro com menor densidade 0,60 a 0,70 Áreas residenciais com poucas superfícies livres
0,50 a 0,60
Áreas residenciais com muitas superfícies livres
0,25 a 0,50
Subúrbios com alguma edificação
0,10 a 0,25
105
H I D R O L O G I A
Matas parques e campos de esportes
0,05 a 0,20
A intensidade da chuva é obtida a partir da curva IDF (veja capítulo 3) mais adequada ao local da bacia. Para obter a intensidade i é preciso definir a duração da chuva e o tempo de retorno. O tempo de retorno pode ser obtido por tabelas, como a tabela 7.7, que relacionam o tipo de estrutura com o TR normalmente adotado. Tabela 7.7: Tempos de retorno adotados para projeto de estruturas. Estrutura
TR (anos)
Bueiros de estradas pouco movimentadas
5 a 10
Bueiros de estradas muito movimentadas
50 a 100
Pontes
50 a 100
Diques de proteção de cidades
50 a 200
Drenagem pluvial
2 a 10
Grandes barragens (vertedor)
10000
Pequenas barragens
100
Micro-drenagem de área residencial
2
Micro-drenagem de área comercial
5
A duração da chuva é considerada igual ao tempo de concentração (veja capítulo 2). Esta hipótese é adotada para que o cálculo represente uma situação em que a vazão máxima ocorre quando toda a bacia está contribuindo para o exutório.
A distribuição binomial A distribuição de probabilidades binomial é adequada para avaliar o número (x) de ocorrências de um dado evento em N tentativas. As seguintes condições devem existir para que seja válida a distribuição binomial: 1) são realizadas N tentativas; 2) em cada tentativa o evento pode ocorrer ou não, sendo que a probabilidade de que o evento ocorra é dada por P enquanto a probabilidade
106
H I D R O L O G I A
de que o evento não ocorra é dada por 1-P ; 3) a probabilidade de ocorrência do evento numa tentativa qualquer é constante e as tentativas são independentes, isto é, a ocorrência ou não do evento na tentativa anterior não altera a probabilidade de ocorrência atual. Estas propriedades ficam mais claras considerando o exemplo de um dado de seis faces. A probabilidade de obter um “seis” num lançamento qualquer é de 1/6. A probabilidade de não obter um “seis” num lançamento qualquer é de 5/6. Se um dado é lançado uma vez, resultando em um “seis”, isto não altera a probabilidade de obter um “seis” no lançamento seguinte. De acordo com a probabilidade binomial, a probabilidade de que um evento ocorra x vezes em N tentativas, é dada pela equação 7.7. Px ( X = x) =
N! N −x ⋅ P x ⋅ (1 − P ) x!⋅( N − x )!
(7.7)
Nesta equação Px(X=x) é a probabilidade de que o evento ocorra x vezes em N tentativas. P é a probabilidade que o evento ocorra numa tentativa qualquer e (1-P) é a probabilidade que o evento não ocorra numa tentativa qualquer.
EXEMPLOS
6) Calcule a probabilidade de obter exatamente 5 “coroas” em 10 lançamentos de uma moeda. Neste caso x =5 e N=10. A probabilidade de obter “coroa” num lançamento qualquer é de 50%, ou 1/2. A probabilidade de obter exatamente 5 “coroas” pode ser calculada pela equação 7.7. 5
10! ⎛1⎞ ⎛ 1⎞ Px ( X = 5) = ⋅ ⎜ ⎟ ⋅ ⎜1 − ⎟ 5!⋅(10 − 5)! ⎝ 2 ⎠ ⎝ 2 ⎠
10 −5
= 0,246
Portanto, a probabilidade de obter exatamente 5 “coroas” em 10 lançamentos é de 24,6%.
7) A probabilidade da vazão de 10 anos de tempo de retorno seja igualada ou excedida num ano qualquer é de 10%. Qual é a probabilidade que ocorram duas cheias iguais ou superiores à cheia de TR = 10 anos em dois anos seguidos?
107
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Neste caso x =2 e N=2. A probabilidade de ocorrer a cheia num ano qualquer é de 10%, ou 1/10. A probabilidade de ocorrer exatamente 2 cheias em 2 anos pode ser calculada pela equação 7.7. 2
2! 1⎞ ⎛1⎞ ⎛ ⋅ ⎜ ⎟ ⋅ ⎜1 − ⎟ Px ( X = 2) = 2!⋅(2 − 2 )! ⎝ 10 ⎠ ⎝ 10 ⎠
2−2
2
⎛1⎞ = ⎜ ⎟ = 0,01 ⎝ 10 ⎠
Portanto, a probabilidade de ocorrerem exatamente 2 cheias em 2 anos é 1%.
8) A probabilidade da vazão de 10 anos de tempo de retorno seja igualada ou excedida num ano qualquer é de 10%. Qual é a probabilidade que ocorra pelo menos uma cheia desta magnitude (ou superior) ao longo de um período de 5 anos? Este problema poderia ser resolvido somando a probabilidade de ocorrência de 1 única vazão com estas características ao longo dos 5 anos com a probabilidade de ocorrência de 2 vazões, e assim por diante para 3, 4 e 5 casos. Porém, neste caso, a melhor forma de resolver o problema é pensar qual é a probabilidade de que não ocorra nenhuma vazão igual ou superior ao longo dos 5 anos, que poderá ser chamada de P(x=0). A probabilidade de que ocorra pelo menos uma cheia será dada por 1-P(x=0). Sendo assim, calculamos primeiramente a probabilidade com x =0 e N=5. 0
Px ( X = 0) =
1⎞ 5! ⎛1⎞ ⎛ ⋅ ⎜ ⎟ ⋅ ⎜1 − ⎟ 0!⋅(5 − 0 )! ⎝ 10 ⎠ ⎝ 10 ⎠
5− 0
5
⎛9⎞ Px ( X = 0) = 1 ⋅ ⎜ ⎟ = 0,59 ⎝ 10 ⎠
Portanto, a probabilidade de não ocorrer nenhuma vazão igual ou superior a vazão com TR=10 anos ao longo de 5 anos é de 59%. Isto significa que a probabilidade de ocorrer pelo menos uma vazão assim é de 41%.
108
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Tabelas da distribuição normal Tabela A: Probabilidade de ocorrer um valor maior do que Z, considerando uma distribuição normal com média zero e desvio padrão igual a 1.
Z
Probabilidade 0.0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 0.6 0.7 0.8 0.9 1.0 1.1 1.2 1.3 1.4 1.5 1.6 1.7 1.8 1.9 2.0 2.1 2.2 2.3 2.4 2.5 2.6 2.7 2.8 2.9 3.0
0.5000 0.4602 0.4207 0.3821 0.3446 0.3085 0.2743 0.2420 0.2119 0.1841 0.1587 0.1357 0.1151 0.0968 0.0808 0.0668 0.0548 0.0446 0.0359 0.0287 0.0228 0.0179 0.0139 0.0107 0.0082 0.0062 0.0047 0.0035 0.0026 0.0019 0.0013
109
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Tabela B: Probabilidade de ocorrer um valor maior do que Z, considerando uma distribuição normal com média zero e desvio padrão igual a 1.
z 0.000 0.842 1.282 1.751 2.054 2.326 2.878 3.090 3.719
Probabilidade 0.5 0.2 0.1 0.04 0.02 0.01 0.002 0.001 0.0001
TR 2 5 10 25 50 100 500 1000 10000
Exercícios 1) Uma análise de 40 anos de dados revelou que a chuva média anual em um local na bacia do rio Uruguai é de 1800 mm e o desvio padrão é de 350 mm. Considerando que a chuva anual neste local tem uma distribuição normal, qual é a chuva anual de um ano muito seco, com tempo de retorno de 10 anos? 2) O que é a curva de permanência? 3) Qual é a porcentagem do tempo em que é superada ou igualada a vazão Q90? 4) Se um rio intermitente passa mais da metade do tempo completamente seco, qual é a sua Q80? 5) É correto afirmar que a vazão Q90 é sempre inferior a Q95 em qualquer ponto de qualquer rio? E o inverso? 6) É correto dizer que a vazão Q95 é igual à soma das vazões Q40 e Q55? Explique. 7) Qual é o efeito de um reservatório sobre a curva de permanência de vazões de um rio? 8) Estime a vazão máxima de projeto para um galeria de drenagem sob uma rua numa área comercial de Porto Alegre, densamente construída, cuja bacia tem área de 35 hectares, comprimento de talvegue de 2 km e diferença de altitude ao longo do talvegue de 17 m. 9) Na cidade de Porto Amnésia um apresentador de televisão defende a remoção do dique que protege a cidade das cheias do rio Goiaba. Ele argumenta afirmando que o dique foi dimensionado para a cheia de 50 anos,
110
H I D R O L O G I A
e que há 65 anos não ocorre na cidade nenhuma cheia que justificaria a construção de qualquer dique. Analise as idéias do apresentador. Calcule qual é a probabilidade de que não ocorra nenhuma cheia de tempo de retorno igual ou superior a 50 anos ao longo de um período de 65 anos. 10) Na mesma cidade um arquiteto propõe a substituição de 2000 metros do dique por uma estrutura composta por peças móveis removíveis de 10 m de comprimento. Quando estas peças são expostas à pressão da água equivalente a que ocorreria durante uma cheia, a probabilidade de falha (para cada uma) é de 0,01 %. Qual é a probabilidade de que, durante uma cheia, pelo menos uma das peças venha a falhar? 11) Considerando a idéia de risco como a probabilidade de ocorrência de um evento associada aos prejuízos potenciais decorrentes deste evento, avalie qual é a pior situação: a. Uma cidade protegida por um dique dimensionado para a cheia de 100 anos de tempo retorno. Caso a cheia supere o dique, serão inundados 2 bairros, com prejuízo total estimado em 800 milhões de reais. b. Uma ponte dimensionada para a cheia de 25 anos de tempo de retorno. Caso a cheia atinja a ponte esta será destruída. A construção de uma nova ponte e a interrupção temporária do tráfego totalizam um prejuízo de 75 milhões de reais.
111
8
Capítulo
H I D R O L O G I A
Regularização de vazão
A
variabilidade temporal da precipitação e, conseqüentemente, da vazão dos rios freqüentemente origina situações de déficit hídrico, quando a vazão dos rios é inferior à necessária para atender determinado uso. Em outras situações ocorre o contrário, ou seja, há excesso de vazão. A solução encontrada para reduzir a variabilidade temporal da vazão é a regularização através da utilização de um ou mais reservatórios. Os reservatórios têm por objetivo acumular parte das águas disponíveis nos períodos chuvosos para compensar as deficiências nos períodos de estiagem, exercendo um efeito regularizador das vazões naturais. Em geral os reservatórios são formados por meio de barragens implantadas nos cursos d‘água. Suas características físicas, especialmente a capacidade de armazenamento, dependem das características topográficas do vale em que estão inseridos, bem como da altura da barragem.
Características dos reservatórios Um reservatório pode ser descrito por seus níveis e volumes característicos: o volume morto; o volume máximo; o volume útil; o nível mínimo operacional; o nível máximo operacional; o nível máximo maximorum. Outras características importantes são as estruturas de saída de água, eclusas para navegação, escadas de peixes, tomadas de água para irrigação ou para abastecimento, e eventuais estruturas de aproveitamento para lazer e recreação.
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Vertedores
Os vertedores são o principal tipo de estrutura de saída de água. Destinam-se a liberar o excesso de água que não pode ser aproveitado para geração de energia elétrica, abastecimento ou irrigação. Os vertedores são dimensionados para permitir a passagem de uma cheia rara (alto tempo de retorno) com segurança. Um vertedor pode ser livre ou controlado por comportas. O tipo mais comum de vertedor apresenta um perfil de rampa, para que a água escoe em alta velocidade, e a jusante do vertedor é construída uma estrutura de dissipação de energia, para evitar a erosão excessiva. Nas fotografias da figura abaixo é possível ver o vertedor da barragem de Itaipu em operação. Na outra fotografia o vertedor da barragem Norris, nos EUA, não está operando, o que significa que toda a vazão está passando através das turbinas.
Figura 8. 1: As barragens Norris (Clinch River, Tenessee, EUA) e Itaipu (Rio Paraná, Brasil-Paraguai).
A vazão de um vertedor livre (não controlado por comportas) é dependente da altura da água sobre a soleira, conforme a Figura 8. 2 e a equação abaixo:
Q = C ⋅L⋅h
3
2
113
onde Q é a vazão do vertedor (m3.s-1); L é o comprimento da soleira (m); h é a altura da lâmina de água sobre a soleira (m); e C é um coeficiente com valores entre 1,4 e 1,8. É importante destacar que a vazão tem uma relação não linear com o nível da água.
Figura 8. 2: Vertedor de soleira livre.
Figura 8. 3: Curva de vazão do vertedor da usina Corumbá III nas situações de comportas completamente ou parcialmente abertas.
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Descarregadores de fundo
Descarregadores de fundo podem ser utilizados como estruturas de saída de água de reservatórios, especialmente para atender usos da água existentes a jusante. A equação de vazão de um descarregador de fundo é semelhante à equação de vazão de um orifício, apresentada abaixo: Q = C ⋅ A⋅ 2 ⋅ g ⋅ h
onde A é a área da seção transversal do orifício (m2); g é a aceleração da gravidade (m.s-2); h é a altura da água desde a superfície até o centro do orifício (m) e C é um coeficiente empírico com valor próximo a 0,6. Semelhante à equação do vertedor, destaca-se que a vazão de um orifício tem uma relação não linear com o nível da água.
Curva cota – área - volume
A relação entre nível da água, área da superfície inundada e volume armazenado de um reservatório é importante para o seu dimensionamento e para a sua operação. O volume armazenado em diferentes níveis define a capacidade de regularização do reservatório, enquanto a área da superfície está relacionada diretamente à perda de água por evaporação. A Tabela 8. 1 apresenta a relação cota – área – volume do reservatório da usina Corumbá III, construída recentemente no rio Corumbá, no Estado de Goiás. Devido às características topográficas da área inundada, a relação entre cota e área não é, em geral, linear. Da mesma forma, a relação entre cota e volume também não é linear.
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Tabela 8. 1: Relação cota – área – volume do reservatório Corumbá III, em Goiás. Cota (m) 772,00 775,00 780,00 785,00 790,00 795,00 800,00 805,00 810,00 815,00 820,00 825,00 830,00 835,00 840,00 845,00
Área (km2) 0,00 0,94 2,39 4,71 8,15 12,84 19,88 29,70 43,58 58,01 74,23 92,29 113,89 139,59 164,59 191,44
Volume (hm³) 0,00 0,94 8,97 26,40 58,16 110,19 191,30 314,39 496,50 749,62 1.079,39 1.494,88 2.009,38 2.642,00 3.401,09 4.289,81
Volume morto e nível mínimo operacional
O Volume Morto é a parcela de volume do reservatório que não está disponível para uso. Corresponde ao volume de água no reservatório quando o nível é igual ao mínimo operacional. Abaixo deste nível as tomadas de água para as turbinas de uma usina hidrelétrica não funcionam, seja porque começam a engolir ar além de água, o que provoca cavitação nas turbinas (diminuindo sua vida útil), ou porque o controle de vazão e pressão sobre a turbina começa a ficar muito instável. O tamanho do volume morto é definido no projeto da barragem e do reservatório, mas pode ser alterado com o tempo em função do assoreamento. Em reservatórios de abastecimento de água o volume morto é o que se encontra abaixo da tomada de água de bombeamento.
Volume máximo e nível máximo operacional
O nível máximo operacional corresponde à cota máxima permitida para operações normais no reservatório. Níveis superiores ao nível máximo operacional podem ocorrer em situações extraordinárias, mas comprometem a segurança da barragem. Geralmente o nível máximo operacional concide com o nível da crista do vertedor ou com o limite superior de capacidade das comportas do vertedor. O nível máximo operacional define o volume máximo do reservatório.
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Volume útil
A diferença entre o volume máximo de um reservatório e o volume morto é o volume útil, ou seja, a parcela do volume que pode ser efetivamente utilizada para regularização de vazão.
Nível máximo maximorum
Durante eventos de cheia excepcionais admite-se que o nível da água no reservatório supere o nível máximo operacional por um curto período de tempo. A barragem e suas estruturas de saída (vertedor) são dimensionados para uma cheia com tempo de retorno alto, normalmente 10 mil anos no caso de barragens médias e grandes, e na hipótese de ocorrer uma cheia igual à utilizada no dimensionamento das estruturas de saída o nível máximo atingido é o nível máximo maximorum.
Nível meta
Na operação normal de um reservatório costumam ser utilizadas referências de nível de água que devem ser seguidas para atingir certos objetivos de geração energia e de segurança da barragem. O nível meta é tal que se o nível da água é superior ao nível meta, deve ser aumentada o vertimento de vazão, para reduzir o nível da água no reservatório, que deverá retornar ao nível meta.
Curva guia
A curva guia é semelhante ao nível meta, porém indica um nível da água no reservatório variável ao longo do ano, que serve de base para a tomada de decisão na operação. Uma curva guia pode indicar, por exemplo, o limite entre o uso normal da água, quando o nível da água está acima do nível indicado pela curva guia, e o racionamento, quando o nível da água está abaixo da curva guia.
Volume de espera
O volume de espera, ou volume para controle de cheias, corresponde à parcela do volume útil destinada ao amortecimento das cheias. O volume de espera é variável ao longo do ano e é definido pelo volume do reservatório entre o nível da água máximo operacional e o nível meta. Se um reservatório tem o uso exclusivo para controle de cheias, então o volume de espera é maximizado, podendo ser igual ao volume total, ou igual ao volume útil. Se um reservatório tem múltiplos usos, há um conflito entre a utilização para controle de cheias e os outros usos.
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A geração de energia elétrica é particularmente conflitante com o controle de cheias porque a criação do volume de espera reduz o volume disponível para regularizar a vazão, o que reduz a vazão que pode ser regularizada, afetando a potência, ou energia firme. Além disso, a operação com um volume de espera, e com nível meta inferior ao nível máximo operacional, reduz a diferença de altura (queda), que está diretamente relacionada à potência da usina.
Cota da crista do barramento
A cota da crista do barramento é definida a partir do nível da água máximo maximorum somado a uma sobrelevação denominada borda livre (free board) cujo objetivo é impedir que ondas formadas pelo vento ultrapassem a crista da barragem. A figura a seguir apresenta um esquema com os diferentes níveis e volumes que caracterizam um reservatório.
Tipos de centrais hidrelétricas Quanto ao uso das vazões naturais, as usinas hidrelétricas podem ser: centrais a fio d’água; centrais com reservatório de acumulação ou centrais reversíveis. Usinas hidrelétricas com reservatórios cujo volume é pequeno em relação à vazão afluente, são denominadas usinas a fio d’água, porque a energia que podem gerar depende diretamente da vazão do rio. A regularização de vazão proporcionada por reservatórios de usinas a fio d’água é desprezível. Nestes casos a barragem é construída para aumentar a diferença de nível da água (queda) entre a tomada de água e a turbina. Esta situação é típica das Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs). Uma usina com reservatório de acumulação dispõe de um reservatório de tamanho suficiente para acumular água na época das cheias para uso na época de estiagem e, portanto, pode dispor de uma vazão substancialmente maior do que a vazão mínima natural. Uma usina reversível é utilizada para gerar energia durante o período em que ocorre o pico da demanda no sistema elétrico, utilizando água previamente bombeada para um reservatório temporário, aproveitando o excesso de oferta de energia nos períodos que não coincidem com o pico de demanda. Quanto à potência as centrais hidrelétricas podem ser classificadas em: •
Micro – Potência inferior a 100 kW
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•
Mini – Potência entre 100 e 1000 kW
•
Pequenas - Potência entre 1000 e 10000 ou 20000 kW
•
Médias – Potência entre 10 e 100 MW
•
Grandes – Potência maior do que 100 MW
Quanto à altura de queda da água (H) as centrais hidrelétricas podem ser classificadas em: •
Baixíssima queda – H < 10 m
•
Baixa queda – 10 < H < 50 m
•
Média queda – 50 < H < 250 m
•
Alta queda – H > 250 m
Balanço hídrico de reservatórios A equação de continuidade aplicada a um reservatório é dada por: ∂S = I −Q ∂t
onde S é o volume (m3); t é o tempo (s); I é a vazão afluente (m3.s-1) e Q é a vazão de saída do reservatório (m3.s-1), incluindo perdas por evaporação, retiradas para abastecimento, vazão turbinada e vertida. Esta equação pode ser reescrita em intervalos discretos como:
St +∆t − St = I −Q ∆t onde I e Q representam valores médios da vazão afluente e defluente do reservatório ao longo do intervalo de tempo ∆t. Considerando uma variação linear de I e Q ao longo de ∆t, a equação pode ser reescrita como:
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St +∆t − St I t + I t +∆t Qt + Qt +∆t = − ∆t 2 2
onde It ; It+∆t ; Qt ; Qt+∆t são os valores no início e no final do intervalo de tempo. Esta equação é utilizada quando o intervalo de tempo é relativamente pequeno (1 dia ou menos), especialmente no caso de análise de propagação de cheias em reservatórios. Quando o intervalo de tempo é longo (um mês, por exemplo) a equação é simplificada para: St +∆t = St + entradas − saídas
onde as saídas representam todo o volume retirado do reservatório ao longo do intervalo de tempo. Esta equação pode ser utilizada para dimensionamento e análise de operação de um reservatório.
Propagação de cheias em reservatórios Considerando um reservatório com vertedor livre, em que a vazão de saída é uma função do nível da água no reservatório, a equação abaixo pode ser aplicada recursivamente. St +∆t − St I t + I t +∆t Qt + Qt +∆t = − ∆t 2 2
Nesta equação, em cada intervalo de tempo são conhecidas a vazão de entrada no tempo t e em t+∆t; a vazão de saída no intervalo de tempo t; e o volume armazenado no intervalo t. Não são conhecidos os termos St+∆t e Qt+∆t , e ambos dependem do nível da água. Como tanto St+∆t e Qt+∆t são funções não lineares de ht+∆t , a equação de balanço pode ser resolvida utilizando a técnica iterativa de Newton-Raphson, ou o método de bissecção, a cada intervalo de tempo. Uma forma mais simples de calcular a propagação de vazão num reservatório é o método conhecido como Puls modificado. Neste método a equação acima é reescrita como:
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2 ⋅ St +∆t 2 ⋅ St + Qt +∆t = I t + I t +∆t + − Qt ∆t ∆t
onde os termos desconhecidos aparecem no lado esquerdo e os termos conhecidos aparecem no lado direito. Uma tabela da relação entre Qt+∆t e 2.(St+∆t )/∆t pode ser gerada a partir da relação cota – área – volume do reservatório e através da relação entre a cota e a vazão, por exemplo para uma equação de vertedor.
EXEMPLO
1) Calcule o hidrograma de saída de um reservatório com um vertedor de 25 m de comprimento de soleira, com a soleira na cota 120 m, considerando a seguinte tabela cota –volume para o reservatório e o hidrograma de entrada apresentado na tabela abaixo, e considerando que nível da água no reservatório está inicialmente na cota 120 m.
Tabela 8. 2: Relação cota volume do reservatório do exemplo.
Cota (m)
Volume (104 m3)
115 120 121 122 123 124 125 126 127 128 129
1900 2000 2008 2038 2102 2208 2362 2569 2834 3163 3560
121
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130
4029
Tabela 8. 3: Hidrograma de entrada no reservatório.
Tempo (h)
Vazão (m3.s-1)
0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20
0 350 720 940 1090 1060 930 750 580 470 380 310 270 220 200 180 150 120 100 80 70
O primeiro passo da solução é criar uma tabela relacionando a vazão de saída com a cota. Considerando um vertedor livre, com coeficiente C = 1,5 e soleira na cota 120 m, a relação é dada pela tabela que segue: Tabela A H (m) 120 121 122 123 124 125 126 127 128 129 130
Q (m3/s) 0.0 37.5 106.1 194.9 300.0 419.3 551.1 694.5 848.5 1012.5 1185.9
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Esta tabela pode ser combinada à tabela cota – volume, acrescentando uma coluna com o valor do termo 2.(St+∆t )/∆t , considerando o intervalo de tempo igual a 1 hora: Tabela B H (m)
120 121 122 123 124 125 126 127 128 129 130
Volume (S) (104 m3) 2000 2008 2038 2102 2208 2362 2569 2834 3163 3560 4029
Q (m3/s)
2.S/∆t+Q (m3/s)
0.0 37.5 106.1 194.9 300.0 419.3 551.1 694.5 848.5 1012.5 1185.9
11111 11193 11428 11873 12567 13542 14823 16439 18421 20790 23569
No primeiro intervalo de tempo o nível da água no reservatório é de 120 m, e a vazão de saída é zero. O volume acumulado (S) no reservatório é 2000.104 m3. O valor de 2.S-Q para o primeiro intervalo de tempo é 11111 m3.s-1. Para cada intervalo de tempo seguinte a vazão de saída pode ser calculada pelos seguintes passos: a) calcular It + It+∆t b) com o resultado do passo (a) e com base no valor de 2.(St)/∆t - Qt para o intervalo anterior, calcular 2.(St+∆t)/∆t + Qt+∆t pela equação
2 ⋅ St +∆t 2 ⋅ St + Qt +∆t = I t + I t +∆t + − Qt ∆t ∆t
c) obter o valor de Qt+∆t pela tabela B, a partir da interpolação com o valor conhecido de 2.(St+∆t)/∆t + Qt+∆t calculado no passo (b) d) calcular o valor de 2.(St+∆t)/∆t - Qt+∆t a partir da equação abaixo e seguir para o próximo passo de tempo, repetindo os passos de (a) até (d) ⎛ 2 ⋅ S t + ∆t ⎞ ⎛ 2 ⋅ S t + ∆t ⎞ − Qt + ∆t ⎟ = ⎜ + Qt + ∆t ⎟ − 2(Qt + ∆t ) ⎜ ⎝ ∆t ⎠ ⎝ ∆t ⎠
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Os resultados são apresentados na tabela abaixo: Tempo (h)
I (m3.s-1)
I1+I2
2S/dt-Q
2S/dt+Q
Q
0
0
350
11111
11111
0
1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20
350 720 940 1090 1060 930 750 580 470 380 310 270 220 200 180 150 120 100 80 70
1070 1660 2030 2150 1990 1680 1330 1050 850 690 580 490 420 380 330 270 220 180 150 70
11236 11785 12630 13591 14476 15073 15315 15224 14914 14495 14019 13543 13093 12682 12341 12045 11791 11580 11415 11298
11461 12306 13445 14660 15741 16466 16753 16645 16274 15764 15185 14599 14033 13513 13062 12671 12315 12011 11760 11565
113 260 407 534 633 697 719 711 680 635 583 528 470 416 361 313 262 216 172 133
A figura abaixo mostra os hidrogramas de entrada e saída do reservatório.
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O exemplo mostra que o reservatório tende a suavizar o hidrograma, reduzindo a vazão de pico, embora sem alterar o volume total do hidrograma. É interessante observar que no caso do exemplo, em que o reservatório tem um vertedor livre, a vazão máxima de saída ocorre no momento em que a vazão de entrada e de saída são iguais. O cálculo de propagação de vazões em reservatórios, como apresentado neste exemplo, pode ser utilizado para dimensionamento de reservatórios de controle de cheias, e para análise de operação de reservatórios em geral. Mediante algumas adaptações o método pode ser aplicado para reservatórios com vertedores controlados por comportas e para outras estruturas de saída.
Dimensionamento de um reservatório O dimensionamento de um reservatório pode ser realizado com base na equação: St +∆t = St + entradas − saídas
sujeita às restrições 0 < St+∆t < Vmax; onde Vmax é o volume útil do reservatório. Neste caso as entradas são as vazões afluentes estimadas para o local em que se deseja construir o reservatório e as saídas são incluem a demanda de água e as perdas. Se o problema é dimensionar um reservatório com o volume necessário para regularizar uma vazão D, os passos são: a) Faça uma estimativa inicial do valor de Vmax b) Aplique a equação abaixo para cada mês do período de dados de vazão disponível (é desejável que a série tenha várias décadas). As perdas por evaporação (E) variam com o mês e podem ser estimadas por dados de tanque classe A. A demanda D pode variar com a época do ano. A vazão vertida Qt é diferente de zero apenas quando a equação indica que o volume máximo será superado. S t + ∆t = S t + I t − Dt − Et − Qt
c) Em um mês qualquer, se St+∆t for menor que zero, a demanda Dt deve ser reduzida até que St+∆t seja igual a zero, e é computada uma falha de antendimento.
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d) Calcule a probabilidade de falha dividindo o número de meses com falha pelo número total de meses. Se esta probabilidade for considerada inaceitável, aumente o valor do volume máximo Vmax e reinicie o processo.
Algumas hipóteses são feitas neste tipo de simulação: 1) o reservatório está inicialmente cheio; 2) as vazões observadas no passado são representativas do que irá acontecer no futuro.
EXEMPLO
1) Um reservatório com volume útil de 500 hectômetros cúbicos (milhões de m3) pode garantir uma vazão regularizada de 55 m3.s-1, considerando a seqüência de vazões de entrada da tabela abaixo? Considere o reservatório inicialmente cheio, a evaporação nula e que cada mês tem 2,592 milhões de segundos. mês jan fev mar abr mai jun jul ago set out nov dez
Vazão (m3/s) 60 20 10 5 12 13 24 58 90 102 120 78
A solução é obtida montando a tabela que resulta da aplicação sucessiva da equação S t + ∆t = S t + I t − Dt − Et − Qt
com It dado pela tabela acima; Et igual a zero e Qt igual a zero, exceto quando é necessário verter.
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A demanda de 55 m3.s-1 é igual a 143 hm3 por mês. No primeiro mês observa-se que sobra água. No segundo mês a demanda é maior do que a vazão de entrada e o volume no reservatório começa a diminuir. O volume no início do terceiro mês é dado por S t + ∆t = 500 + 52 − 143 = 409 e assim por diante. No início do mês de agosto o volume calculado é negativo, o que rompe a restrição, portanto o reservatório não é capaz de regularizar a vazão de 55 m3.s-1. Mês Jan Fev Mar Abr Mai Jul Ago
S (hm3) 500 500 409 293 163 52 -57
I (hm3) 156 52 26 13 31 34 62
D (hm3) 143 143 143 143 143 143 143
Q (hm3) 13 0 0 0 0 0 0
Em uma planilha eletrônica ou uma calculadora científica é fácil repetir o cálculo até que o volume atenda a vazão regularizada desejada. Da mesma forma é fácil determinar em uma planilha eletrônica qual é a maior vazão que pode ser regularizada com um dado volume de reservatório. Teoricamente, a máxima vazão que pode ser regularizada é a vazão média do rio no local em que está a barragem. Este valor máximo é impossível de ser atingido porque a criação do reservatório aumenta a perda de água por evaporação.
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Figura 8. 4: Relação entre o volume do reservatório e a vazão regularizada em uma bacia cuja vazão média é 25,4 m3.s-1, sem considerar a evaporação do reservatório.
Operação de reservatórios
Restrições de operação: Volume máximo e mínimo; nível máximo e mínimo. Em muitos casos os reservatórios têm múltiplos usos, como no caso da combinação de uso para geração de energia elétrica e para controle de cheias. No exemplo da figura a seguir, o reservatório R é operado para gerar energia nas turbinas, e para evitar inundações na cidade C. A cidade começa a ficar inundada quando o rio em C supera a vazão de 6000 m3.s-1. Existe um acordo entre o governo local e a empresa que opera a usina para que o vertimento do reservatório seja controlado para evitar que se supere este valor limite, o que caracteriza uma restrição à operação do reservatório. Normalmente esta situação é complicada pela existência de um ou mais afluentes (como o afluente A da figura) cuja vazão não é controlada pelo reservatório. Portanto, a vazão que pode ser liberada pelo reservatório R depende do valor máximo que pode escoar na seção em frente à cidade C e da vazão que está chegando pelo afluente A, isto é, a restrição é variável no tempo.
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Figura 8. 5: Reservatório R operando com restrição de vazão que pode ser liberada para jusante, para evitar a inundação na cidade C.
Impactos ambientais de reservatórios No passado considerava-se que a geração hidrelétrica era uma forma de produção de eletricidade com mínimos impactos ambientais. Atualmente, essa visão tem sido questionada, embora em diversos aspectos os impactos ambientais são relativamente pequenos em relação às formas alternativas normalmente utilizadas: usinas térmicas a carvão ou nucleares. Apesar destes impactos, a população muitas vezes vê com bons olhos a construção de uma usina hidrelétrica na área de seu município. Isto ocorre porque existe uma compensação financeira obrigatória, em que parte dos rendimentos auferidos na geração de energia elétrica são pagos ao município, de acordo com o tamanho da área inundada e com a potência da usina. Entre os impactos ambientais importantes das usinas hidrelétricas encontram-se impactos sociais; impactos sobre a flora e a fauna do local inundado; impactos sobre a fauna do rio a jusante; impactos sobre o sistema de transportes; impactos sobre a geração de gases de efeito estufa. Impactos sociais
Os impactos sociais mais evidentes da implantação de uma usina hidrelétrica decorrem da remoção das pessoas que habitam a área inundada pelo reservatório. Os impactos deste tipo iniciam mesmo antes da construção da obra em si, já que a perspectiva da inundação futura reprime ou não incentiva o investimento no local. Esta situação pode se estender por vários anos, em função de indefinições sobre a construção ou não da obra. Durante este período as localidades sujeitas a inundação experimentam um estado de estagnação.
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Finalmente, quando a obra inicia e a inundação da área habitada passa a ser certa, surgem dúvidas e discussões sobre o valor da indenização. Embora o valor comercial da terra possa ser estimado de forma razoável, o apego dos habitantes à terra também é devido a um valor afetivo, por questões históricas, que é intangível, ou seja, dificilmente quantificável. Nesta situação é comum o surgimento de especulações e de confrontos de cunho político. Entre os impactos sociais também podem ser incluídos impactos culturais, como a perda, provavelmente para sempre, de sítios arqueológicos, ou eventualmente de lugares sagrados para culturas indígenas. Durante a construção ocorrem alguns impactos sociais positivos, devido ao aumento de oferta de emprego, e o aumento de consumo local, em função do grande número de trabalhadores. Após a conclusão da obra, porém, surge um impacto negativo porque muitos trabalhadores perdem seus empregos mas não deixam imediatamente o local. Impactos sobre a fauna e a flora do local inundado
Os impactos sobre a flora e a fauna do local inundado por um reservatório são os que ganham maior atenção da mídia. Isto ocorre porque durante o primeiro enchimento do reservatório a área seca vai se tornando restrita e os animais ficam concentrados em pequenas ilhas. Campanhas de resgate de fauna são organizadas em que os animais são capturados e levados para um novo habitat, após um período de adaptação. A sua sobrevivência neste novo hábitat é incerta, uma vez que o espaço provavelmente já está ocupado por outros indivíduos da mesma espécie, e os recursos dos quais a espécie depende são limitados. A vegetação inundada não apenas é extinta, como também pode provocar sérios problemas de qualidade de água no lago, durante a sua decomposição. Isto ocorre porque o oxigênio dissolvido (OD) na água é consumido durante o processo de decomposição, e a concentração de OD é reduzida para níveis inferiores ao limite para a sobrevivência dos peixes. Assim, o processo de enchimento pode resultar numa grande mortandade de peixes e outras espécies aquáticas ou que dependem dos peixes para sobreviver, como as aves. Impactos sobre a fauna e a flora do rio a jusante
Os impactos da criação de um reservatório sobre a área inundada são fáceis de perceber, e têm sido, há muitos anos, considerados na análise de viabilidade de um empreendimento. Os impactos no rio a jusante começaram a ser reconhecidos a menos tempo, e surgiram a partir da constatação de que a presença de certas espécies de peixes, por exemplo, diminuía após alguns anos da existência do reservatório. Os impactos no rio a jusante decorrem, entre outras causas, do obstáculo imposto pela barragem à migração dos peixes, o que pode ser apenas parcialmente contornado pela construção de uma escada de peixes.
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Mais importante que isto é a alteração do regime hidrológico (sucessão de cheias e estiagens), que modifica o habitat do rio a jusante. Grandes reservatórios modificam, também, o fluxo de sedimentos e de nutrientes de um rio. O melhor exemplo disso no Brasil ocorre no rio São Francisco, onde a construção de uma série de usinas hidrelétricas, especialmente a de Sobradinho, com um enorme reservatório, interrompeu o fluxo de sedimentos que ficam depositados no reservatório e não atingem mais a foz. Em função disso, o equilíbrio entre a erosão marinha na costa e o aporte de areia pelo rio foi alterado, resultando num recuo de centenas de metros da linha da praia. Uma pequena vila de pescadores já foi destruída e o processo não parece estar estabilizado ainda. Os nutrientes básicos que mantém a cadeia alimentar na água são o nitrogênio e o fósforo. Estes nutrientes estão dissolvidos na ou adsorvidos aos sedimentos, e são retidos, em grande parte, nos grandes reservatórios. Em conseqüência disso, menos nutrientes chegam até a região do estuário deste rio, o que limita o desenvolvimento do fitoplâncton, que é a base da cadeia alimentar. Em conseqüência disso, a população que vivia da pesca artesanal junto à foz do rio não mais consegue sobreviver desta atividade.
Exercícios 1) Qual é a perda de energia na usina de Sobradinho devida à evaporação direta do lago? Considere que a altura de queda H = 27,2 m; a eficiência e = 0,90; e que uma evaporação de 10 mm por dia ocorre sobre a área da superfície do lago, que corresponde a 4200 km2. 2) Um reservatório com volume útil de 500 hectômetros cúbicos (milhões de m3) pode garantir uma vazão regularizada de 25 m3.s-1, considerando a seqüência de vazões de entrada da tabela abaixo? Considere o reservatório inicialmente cheio, a evaporação constante de 200 mm por mês, área superficial e que cada mês tem 2,592 milhões de segundos. Mês Jan Fev mar abr mai jun jul ago set
Vazão (m3/s) 55 27 10 5 12 13 24 51 78
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Out Nov Dez
102 128 73
3) Um reservatório com volume útil de 150 hectômetros cúbicos é suficiente para regularizar a vazão de 28 m3.s-1 num rio que apresenta a seqüência de vazões da tabela abaixo para um determinado período crítico? Considere o reservatório inicialmente cheio, 200 km2 de área superficial constante e que cada mês tem 2,592 milhões de segundos. Os dados de evaporação de tanque classe A são dados na tabela (veja capítulo 5). Mês Vazão (m3/s) Evaporação tanque classe A (mm/mês)
jan
fev
mar
abr
mai
jun
jul
ago
set
out
nov
dez
98
45
32
27
24
20
19
18
17
14
78
130
100
110
120
130
140
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120
110
105
100
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Capítulo
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Qualidade da água
A
água é um elemento vital para as atividades humanas e para a manutenção da vida. Para satisfazer as necessidades humanas e ambientais, é necessário que a água tenha certas características qualitativas, e as exigências com relação à pureza da água variam com o seu uso. A água utilizada para análises clínicas, por exemplo, deve ser tanto quanto possível isenta de sais e outras substâncias em solução ou suspensão. Já para a navegação e para a geração de energia, por exemplo, a água deve apenas atender ao requisito de não ser excessivamente agressiva às estruturas. Para os processos biológicos incluindo a manutenção dos ecossistemas, a alimentação humana e a dessedentação animal, as exigências são intermediárias.
Massa, concentração e fluxo Aspectos fundamentais da qualidade da água são, normalmente, apresentados em termos de concentração de substâncias na água. A concentração é expressa como a massa da substância por volume de água, em mg.l-1, ou g.m-3. Por exemplo, ao acrescentar e dissolver 12 mg de sal em um litro de água pura, obtém-se água com uma concentração de 12 mg.l-1. De forma semelhante, quando são misturados volumes de água com concentrações diferentes, a concentração final equivale a uma média ponderada das concentrações originais, o mesmo ocorrendo no caso de vazões. Assim, se um rio com vazão QR e concentração CR recebe a entrada de um afluente com vazão QA e com concentração CA. Admitindo uma rápida e completa mistura das águas, a concentração final é dada por: CF =
QR ⋅ C R + Q A ⋅ C A QR + Q A
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EXEMPLO
1) Uma cidade coleta todo o esgoto cloacal, mas não tem estação de tratamento. Assim, a vazão de esgoto de 0,5 m3.s-1 com uma concentração de 50 mg.l-1 de Nitrogênio Total é lançada em um rio com uma vazão de 23 m3.s-1 e com uma concentração de 1 mg.l-1 de Nitrogênio Total. Considerando mistura completa qual é a concentração final no rio a jusante da entrada do esgoto. A concentração final, considerando mistura completa e imediata é CF =
QR ⋅ C R + Q A ⋅ C A QR + Q A
ou seja C F =
23 ⋅ 1 + 0,5 ⋅ 50 = 2,04 23,5
portanto a concentração final é de 2,04 mg.l-1.
A carga ou fluxo de um poluente ou substância é dada pelo produto entre a vazão e a concentração. No exemplo anterior, o fluxo de Nitrogênio Total no rio, a jusante da entrada de esgoto é dado por: m 3 ⋅ mg Kg WF = QF ⋅ C F = 23,5 ⋅ 2,04 = 23,5 ⋅ 2,04 = 48Kg .s −1 s ⋅l s
Parâmetros de qualidade de água A qualidade da água é avaliada de acordo com a concentração de substâncias denominados parâmetros de qualidade de água. As concentrações destes parâmetros são importantes para a caracterização da água frente aos usos a que ela se destina. Por exemplo, para ser bebida a água não pode ter uma concentração excessiva de sais. Alguns dos principais parâmetros de qualidade de água são apresentados a seguir. Temperatura
A temperatura é uma das características mais importantes da água de um rio. A temperatura exerce um efeito sobre as reações químicas e a atividade biológica na água. A velocidade das reações químicas duplica para cada 10º. C de aumento de temperatura da água. A temperatura também controla a concentração máxima de oxigênio dissolvido na água (Benetti e Bidone, 1993). Oxigênio Dissolvido
O Oxigênio Dissolvido (OD) é necessário para manter as condições de vida dos seres que vivem na água, e, portanto, é um parâmetro importante na análise da poluição
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de um rio. O OD é consumido pelos seres vivos, especialmente os organismos decompositores de matéria orgânica. A concentração de OD na água aumenta por fotossíntese de plantas e algas aquáticas ou por reareação, no contato com a atmosfera. O OD tem uma concentração máxima para dadas condições de temperatura e salinidade da água, que é conhecida como concentração de saturação. A concentração de saturação aumenta com a redução da temperatura da água. pH
O pH expressa o grau de acidez ou alcalinidade da água, em valores de 0 a 14, sendo que valores inferiores a 7 indicam águas ácidas e valores superiores a 7 indicam águas alcalinas (Benetti e Bidone, 1993). DBO
A água dos rios e de esgotos cloacais e industriais contém matéria orgânica. Esta matéria orgânica é decomposta por microorganismos que, em geral, consomem oxigênio no processo de decomposição. A DBO, ou Demanda Bioquímica de Oxigênio, representa o consumo potencial de oxigênio para decompor a matéria orgânica existente na água.
Usos da água e qualidade da água A recente tendência mundial de aumento da escassez de água tem acentuado os conflitos pelos diversos usos desse bem, tais como: abastecimento da população, irrigação de lavouras, dessedentação de animais, pesca, indústria, navegação, geração de energia, lazer, diluição de esgoto, preservação de ecossistemas, entre outros.
Tabela XX: Faixa de valores típicos e observados de alguns parâmetros de qualidade de água em rios (adaptado de McCutcheon et al., 1993). Parâmetro Temperatura pH Oxigênio Dissolvido Nitrogênio Total Nitrogênio Orgânico Amônia Nitrito Nitrato
Valores típicos 4.5 a 8.5
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Valores observados 0 a 30 1a9
Unidades C
o
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Fósforo Total Ortofosfato Carbono orgânico total DBO DQO Dureza Cor Condutividade Sólidos Suspensos Totais Ferro Alumínio Níquel Cobre Cromo Chumbo Mercúrio
Exercícios 1) Uma usina termoelétrica será instalada às margens do rio Azul, em um local em que a curva de permanência é apresentada na figura abaixo. A temperatura da água do rio é de 17oC e uma vazão água utilizada para resfriamento, de 1,3 m3.s-1 será lançada pela usina termelétrica, com temperatura de 43 oC. Qual será a temperatura final do rio a jusante do lançamento considerando mistura completa? Considere como referência a Q95.
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10 Capítulo
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D E S I G N
C U S T O M I Z A T I O N
Aspectos da legislação e gestão dos recursos hídricos
A
escassez da água já atinge cerca de 80 países, envolvendo cerca de 40% da população do globo, condição que se reflete na produção agrícola, no desenvolvimento urbano e industrial e, em particular, no acesso das pessoas à água potável.
Essa escassez tem acentuado os conflitos pelos diversos usos desse bem, tais como: abastecimento da população, irrigação de lavouras, dessedentação de animais, pesca, indústria, navegação, geração de energia, lazer, diluição de esgoto, preservação de ecossistemas, entre outros. No Brasil, a Constituição Federal de 1988 definiu as águas como bens públicos e colocou os corpos d’água sob os domínios Federal e Estadual. São Estaduais os rios que nascem e têm foz em território de um Estado e as águas subterrâneas. Os demais corpos d’água encontram-se sob o domínio da União (como a legislação diz respeito à água e não à Bacia Hidrográfica, podem ocorrer casos em que o rio está sob domínio federa e estadual, como é o caso do Rio Uruguai). Assim, tanto estados brasileiros como a União vêm desenvolvendo o Sistema de Gestão de Recursos Hídricos. Esses Sistemas são fruto da criação de modelos de gestão que abrigam entidades gerenciais organizadas em torno da Bacia Hidrográfica como unidade ideal de planejamento, gestão e intervenção. No âmbito da União foi aprovada a Lei 9.433/97, que instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos e criou o Sistema Nacional de Gestão de Recursos Hídricos e, mais recentemente, a Lei 9.984/00 criou a Agência Nacional de Águas (ANA), que tem como atribuição implementar os instrumentos da política nacional. No que diz respeito ao Rio Grande do Sul, a Constituição Estadual de 1989 e a Lei 10.350/94 estabeleceram a gestão das águas sob seu domínio.
A Lei 10.350/94 regulamentou o Sistema Estadual de Recursos Hídricos (SERH), que já era contemplado na Constituição Estadual de 1989. Desde então, o SERH vem sendo implementado nas 23 bacias hidrográficas do Estado (figura 10.1), através da
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criação de comitês de gerenciamento de bacias hidrográficas, e da gradativa implementação dos instrumentos de planejamento (Planos de Bacia e Plano Estadual) e gestão (outorga, tarifação e rateio de custos) previstos na legislação. A seguir são descritos brevemente o SERH e os instrumentos de planejamento e gestão.
Figura 10.1: Bacias hidrográficas do Rio Grande do Sul (Fonte: SEMA/RS, 2005)
O Sistema Estadual de Recursos Hídricos O SERH se fundamenta num modelo de gerenciamento caracterizado pela descentralização das decisões e pela ampla participação da sociedade organizada em Comitês de Bacia. Assim, mesmo que o Estado seja o detentor do domínio das águas (superficiais e subterrâneas) de seu território, conforme determina a Constituição Federal, ele compartilha a sua gestão com a população envolvida. Fazem parte do SERH os seguintes departamentos: - Conselho de Recursos Hídricos (CRH); - Departamento de Recursos Hídricos (DRH);
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- Comitês de Gerenciamento de Bacias Hidrográficas (CGBH); - Agências de Regiões Hidrográficas (ARH); - Fundação Estadual de Proteção Ambiental (FEPAM).
O Conselho de Recursos Hídricos O CRH é um órgão colegiado constituído por Secretários de Estado, representantes de Comitês de Bacias, Sistemas Nacionais de Recursos Hídricos e do Meio Ambiente, que tem o papel de instância deliberativa superior do Sistema. É atualmente presidido pelo Secretário Estadual do Meio Ambiente. Os demais órgãos estatais que integram o sistema são: Obras Públicas e Saneamento, com a vice-presidência do CRH; Agricultura e Abastecimento; Coordenação e Planejamento; Saúde; Energia, Minas e Comunicações; Ciência e Tecnologia; Transportes; Casa Civil; e Secretaria do Desenvolvimento e dos Assuntos Internacionais. São atribuídas ao CRH as seguintes funções: • Propor alterações na Política Estadual de Recursos Hídricos; • Opinar sobre qualquer proposta de alteração na Política Estadual de Recursos Hídricos; • Apreciar o anteprojeto de Lei do Plano Estadual de Recursos Hídricos; • Aprovar relatórios anuais sobre a situação dos recursos hídricos; • Aprovar critérios de outorga do uso da água; • Aprovar os regimentos internos dos Comitês de Bacias; • Decidir os conflitos de uso da água em última instância; • Representar o Governo Estadual, através do seu Presidente, junto a órgãos federais e internacionais, em questões relativas a recursos hídricos; • Elaborar o seu Regimento Interno.
O Departamento de Recursos Hídricos O DRH é o órgão responsável pela integração do Sistema Estadual de Recursos Hídricos. É o DRH que concede a outorga do uso da água e subsidia tecnicamente o CRH. Ao DRH são atribuídas as seguintes funções:
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• Elaborar o anteprojeto de lei do Plano Estadual de Recursos Hídricos; • Coordenar e acompanhar a execução do Plano Estadual de Recursos Hídricos; • Propor ao Conselho de Recursos Hídricos critérios para a outorga do uso da água e expedir as respectivas autorizações de uso; • Regulamentar a operação e uso dos equipamentos e mecanismos de gestão dos recursos hídricos; • Elaborar Relatório Anual sobre a situação dos recursos hídricos no Estado; • Assistir tecnicamente o CRH.
Os Comitês de Gerenciamento de Bacias Hidrográficas Os CGBH representam a instância básica de participação da sociedade no Sistema. Tratam-se de colegiados instituídos oficialmente pelo Governo do Estado. Exercem poder deliberativo, uma vez que é no seu âmbito que são estabelecidas as prioridades de uso e as intervenções necessárias à gestão das águas de uma bacia hidrográfica, bem como devem ser dirimidos, em primeira instância, os eventuais conflitos. Fazem parte do CGBH pessoas que têm diferentes interesses com relação ao bem água: os usuários (são as pessoas que têm interesse “utilitário-econômico-social”); a população (tem interesses difusos, vinculados ao desenvolvimento sócio-econômico, aspectos culturais ou políticos e proteção ambiental); o poder público (detentor do domínio das águas). A Lei 10.350, de 30 de dezembro de 1994, estabelece a proporção de representatividade nos comitê. Segundo a referida Lei, os CGBH devem ser formados por 40% de representantes dos usuários da água, 40% dos representantes da população e 20% dos representantes de órgãos públicos da administração direta estadual e federal. Ao CGBH cabem as seguintes atribuições: • Encaminhar ao DRH proposta relativa à própria bacia para ser incluída no anteprojeto de lei do Plano Estadual de Recursos Hídricos; • Conhecer e manifestar-se sobre o anteprojeto de lei do Plano Estadual de Recursos Hídricos; • Aprovar o Plano da respectiva bacia e acompanhar a sua implementação; • Apreciar o relatório anual sobre a situação dos recursos hídricos, no Estado; • Propor ao órgão competente o enquadramento dos corpos de água da bacia; • Aprovar os valores a serem cobrados pelo uso da água;
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• Realizar o rateio do custo das obras a serem executadas na bacia; • Aprovar os programas anuais e plurianuais de investimentos em serviços e obras da bacia; • Compatibilizar os interesses dos diferentes usuários e resolver eventuais conflitos em primeira instância.
As Agências de Regiões Hidrográficas O CRH dividiu o Estado, para efeito de gerenciamento de Bacia Hidrográfica, em três regiões hidrográficas: a da Bacia do Uruguai, a da Bacia do Guaíba e a das Bacias Litorâneas (figura 10.2). Cada uma dessas regiões hidrográficas conta com uma ARH. À ARH cabe assessorar tecnicamente os CGBH na elaboração de propostas relativas ao Plano Estadual de Recursos Hídricos, no preparo dos Planos de Bacia e na tomada de decisões que demandem estudos técnicos. A ARH também pode auxiliar os CGBH no enquadramento dos corpos d’água, operar os mecanismos de gestão, arrecadar e aplicar os valores correspondentes à cobrança pelo uso da água.
Figura 10.2 - Agências de Regiões Hidrográficas (Fonte: SEMA/RS, 2005)
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Fundação Estadual de Proteção Ambiental A FEPAM é o órgão ambiental do Estado que integra o Sistema Estadual de Recursos Hídricos com o Sistema Estadual de Meio Ambiente. Cabe à FEPAM a concessão de outorga quando se trata de um uso d’água que afeta as condições qualitativas dos recursos hídricos. Compete também à FEPAM a aprovação do enquadramento dos corpos de água, de acordo com os objetivos de qualidade, com base na proposta elaborada pelos comitês de bacias.
Instrumentos de Planejamento Enquadramento O enquadramento as águas brasileiras em classes de uso foi estabelecido pela Resolução nº 020/86 do Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA. Assim, para as águas doces foram definidas cinco classes: especial e de 1 a 4. Para as águas salobras e salinas foram definidas duas classes: 5 e 6; e 7 e 8, respectivamente. Uma vez que estabelece o nível de qualidade a ser alcançado e/ou mantido em um determinado segmento de um corpo de água, ao longo do tempo, o enquadramento é considerado um instrumento de planejamento do meio ambiente. No Rio Grande do Sul o enquadramento é feito através de um processo de discussão com os usuários e a população de uma dada bacia hidrográfica, no âmbito do CGBH podendo contar também com o auxílio da ARH. O enquadramento também pode ser considerado como um Instrumento de Planejamento estratégico, visto que podem ser estabelecidas metas de enquadramento de um corpo hídrico a longo prazo. Plano de Bacia Hidrográfica Os Planos de Bacia Hidrográfica (PBH) são elaborados pelas ARH e sujeitos à aprovação dos CGBH. Os PBH têm por finalidade operacionalizar, no âmbito, de cada bacia hidrográfica, por um período de 4 anos, com atualizações periódicas a cada 2 anos, as disposições do Plano Estadual de Recursos Hídricos. O PBH deve compatibilizar os aspectos quantitativos e qualitativos, de modo a assegurar que as metas e usos previstos pelo Plano Estadual de Recursos Hídricos sejam alcançados simultaneamente com melhorias sensíveis e contínuas dos aspectos qualitativos dos corpos de água.
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Dentro do PBH devem ser contemplados os programas de intervenções estruturais e não-estruturais e sua distribuição espacial., bem como o esquema de financiamento desses programas. Plano Estadual de Recursos Hídricos O Plano Estadual de Recursos Hídricos (PERH) tem abrangência estadual com detalhamento por Bacia Hidrográfica. O PERH é elaborado com base nas propostas encaminhadas pelos CGBH o pode considerar ainda: propostas individuais ou coletivas dos usuários da água; planos setoriais ou regionais de desenvolvimento; tratados internacionais; estudos, pesquisas, entre outros. No Plano Estadual de Recursos Hídricos, são apresentados os seguintes elementos: metas especificadas na Política Estadual de Recursos Hídricos, a serem atingidas em prazos determinados; inventário da disponibilidade hídrica; inventário dos usos e conflitos; projeções de usos, disponibilidades e conflitos potenciais; definição e análise de áreas críticas, atuais e potenciais; diretrizes para outorga do uso da água; diretrizes para cobrança; e limite mínimo para a fixação de valores a serem cobrados. O PERH contempla os programas de desenvolvimento nos municípios e considera a variável ambiental, mediante a incorporação de Estudos de Impacto Ambiental e correspondentes Relatórios de Impacto Ambiental, no âmbito do planejamento de cada bacia hidrográfica.
Instrumentos de Gestão A Outorga de Uso A outorga consiste no “consentimento, concessão, aprovação” do direito de uso da água. Ela representa um instrumento, através do qual o Poder Público autoriza, concede ou ainda permite ao usuário fazer o uso deste bem público. É através deste que o Estado exerce, efetivamente, o domínio das águas preconizado pela Constituição Federal. É através da outorga que é regulando o compartilhamento entre os diversos usuários, visto que o principal objetivo da outorga é assegurar o controle qualitativo e quantitativo dos usos da água. A Lei 10.350, de 30 de dezembro de 1994, em seu artigo 29, explica que qualquer empreendimento ou atividade que alterar as condições quantitativas e/ou qualitativas das águas, superficiais ou subterrâneas, tendo como base o Plano Estadual de Recursos Hídricos e os Planos de Bacia Hidrográfica, dependerá de outorga. Caberá ao Departamento de Recursos Hídricos a emissão de outorga para os usos que alterem as condições quantitativas das águas.
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O Decreto nº 37.033, de 21 de novembro de 1996, regulamentou este instrumento, estabelecendo os critérios para a concessão, "licença de uso" e "autorização", bem como para a dispensa. O Decreto nº 42.047, de 26 de dezembro de 2002, regulamenta disposições da Lei nº 10.350, de 30 de dezembro de 1994, com alterações, relativas ao gerenciamento e à conservação das águas subterrâneas e dos aqüíferos no Estado do Rio Grande do Sul. De forma geral, estão sujeitos à outorga os seguintes usos dos recursos hídricos: I) derivação ou captação de parcela de água existente em um corpo d’água para consumo final, inclusive abastecimento público ou insumo produtivo; II) extração de água de aqüífero subterrâneo para consumo final de processo produtivo; III) lançamento em corpo d’água de esgotos e demais resíduos líquidos ou gasosos, tratados ou não, com fim de sua diluição, transporte, ou disposição final; IV) aproveitamento dos potenciais hidrelétricos; V) outros usos que alterem o regime, a quantidade ou a qualidade da água existente em um corpo d’água. No site da SEMA/RS (www.sema.rs.gov.br) é possível encontrar os formulários e termos de referência para as diferentes modalidades de autorização prévia e outorga. Encontram-se disponíveis formulários para águas subterrâneas (autorização, regularização e outorga) e superficial (regularização e reserva de disponibilidade). A Cobrança pelo Uso A cobrança pelo uso do recurso hídrico tem alguns objetivos como reconhecer a água como bem econômico e dar ao usuário uma indicação de seu real valor, incentivar a racionalização do uso da água, e obter recursos financeiros para o financiamento dos programas e intervenções contemplados no Plano de Bacia Hidrográfica. A cobrança pelo uso da água fica sujeita à outorga, pois não pode haver cobrança de atividades e obras clandestinas ou cujos usos não tenham sido outorgados. A utilização a cobrança é uma forma de aplicação do princípio usuário-poluidorpagador, uma vez que o poluidor, deve assumir os custos de poluição. O valor da cobrança é estabelecido nos Planos de Bacia Hidrográfica, obedecendo as seguintes diretrizes gerais: I) na cobrança pela derivação da água são considerados: o uso a que a derivação se destina, o volume captado e seu regime de variação, o consumo efetivo, a classe de uso preponderante em que estiver enquadrado o corpo de água onde se localiza a captação.
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II) na cobrança pelo lançamento de efluentes de qualquer espécie, são considerados: a natureza da atividade geradora do efluente, a carga lançada e seu regime de variação, sendo ponderados na sua caracterização, parâmetros físicos, químicos, biológicos e toxicidade dos efluentes, a classe de uso preponderante em que estiver enquadrado o corpo de água receptor, o regime e variação quantitativa e qualitativa do corpo de água receptor. Os valores arrecadados na cobrança pelo uso da água são destinados a aplicações exclusivas (intervenções estruturais e não-estruturais) e não transferíveis na gestão dos recursos hídricos da bacia hidrográfica de origem.
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