apontamentos_completos Cumprimento e não cumprimento das obrigações
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Apontamentos da disciplina de cumprimento e não cumprimento das obrigações. (Obrigações II )...
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Capítulo I – Cumprimento das obrigações
Aspectos gerais Noção de cumprimento – artigo 762º - 762º Nº1: o devedor cumpre a obrigação quando realiza a prestação a que está vinculado. Existem três sentidos para o cumprimento:
Sentido comum/menos rigoroso (artigo 762º nº1) – realização voluntária de prestação debitória por parte do devedor. Sentido amplo – realização voluntária ou coactiva da prestação debitória (abrange o artigo 817º do CC – princípio geral sobre a acção de cumprimento, envolve também uma realização compulsiva, isto é, realização forçada com recurso a tribunal). Sentido intermédio (829ºA) – o devedor cumpre sob ameaça de sanção compulsória. Exemplo: o devedor que não cumpra a obrigação no prazo estipulado de acordo com o sentido comum de comprimento, deverá pagar uma sanção compulsória por cada dia em que não cumpra. Duas notas acerca deste sentido intermédio: - Não constitui em rigor cumprimento; - O professor Antunes Varela critica esta alteração; o professor Galvão da Silva defende-a.
Princípios que regem o cumprimento: Não são os princípios gerais do contrato, mas sim de quaisquer obrigações, desde que respeitam ao momento do cumprimento. 1) Princípio da Boa fé – artigo 762º nº2 2) Princípio da Pontualidade – 406º nº1 3) Princípio da Integralidade – 763º Princípio da boa fé: - Aplicação aos contratos (aquando): a) Celebração dos contratos b) Na sua vigência c) No cumprimento das obrigações contratuais Deveres primários da prestação (entrega da coisa) Deveres secundários da prestação (coisa embolada/entregue na residência) Deveres acessórios da prestação (informação sobre a coisa)
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Violação destes últimos gera violação do princípio da Boa fé que, por sua vez, gera responsabilidade contratual. Princípio da pontualidade: - “Pontualmente cumprido” – tem que ser cumprido em todos os aspectos que estão estipulados – artigo 406º nº2. Princípio da Integralidade: - Quando há uma determinada obrigação, ela tem que ser cumprida integralmente (e não por partes), a não ser que tenha sido convencionado de maneira diferente pelas partes (exemplo: pagamento a prestação). [?] Atenção: isto é, difere de várias obrigações dentro do mesmo contrato (exemplo: rendas no arrendamento a cada mês correspondem a uma obrigação, portanto não se aplica aquele regime de antecipação das prestações, porque são obrigações diferentes). - Importância prática – se a prestação tem que ser feita por inteiro, e só se oferece metade, quem é que fica em mora em relação à metade que estou disposta a dar? O credor pode recusar-se a receber essa metade? Sim, consequência do princípio em causa, logo, o devedor fica em mora relativamente a toda a quantia. Excepções convencionais: estabelecidas pelas partes. Excepções legais: impostas pela lei. Quando é que a lei impõe que o credor está obrigado a aceitar uma parte da prestação? 1 – Obrigações incorporadas em letras e cheques (matéria de Direito Comercial). 2 – Regime da imputação do cumprimento (A tem 5 dívidas com B e a quantia que entrega não chega para pagar todas as dívidas, então, existem regras para saber a que divida se destina a quantia ou se se distribui por várias dívidas). 3 – Compensação parcial – desvio ao princípio da integralidade, paga-se uma parte e fica-se a dever a outra (817º nº2). Exemplo: X, devedor de Y, deve 1000€ e Y deve 200€, não é preciso que paguem um ao outro a totalidade do valor, isto é, se operar a compensação parcial, X fica a dever a Y 800€. Requisitos do cumprimento: Para que ele seja válido e eficaz é preciso: 1 – A capacidade do devedor (764º nº1): 2
- Nº1, 1ª parte (até disposição): Regras diferentes do regime geral da capacidade negocial (excepção) Em certas situações em que o devedor é incapaz, o cumprimento é valido; Atenção que aqui acto dispositivo é tradicionalmente contraposto a acto material e não a acto administrativo (ex: cortar relva; pintar uma parede); Acto de disposição – um menor ou um interdito podem realizar actos materiais; O devedor tem que ser capaz (ex: um menor não pode celebrar um contrato de CV, mas pode entregar a coisa, porque a transmissão da propriedade assume no momento da celebração do contrato). Esta regra do nº1 é igual à regra da capacidade negocial? O menor de 12 anos pode celebrar um contrato para cortar relva por 10 €? Não, tinha que ser celebrado pelo representante. Aqui falamos sim de capacidade de cumprimento, o devedor tem capacidade para levar a cabo apenas actos meramente materiais. Agora, imaginando que o negócio foi celebrado pelo representante legal, mas ainda não se entregou a coisa? O credor vai a casa do menor e este sem saber entrega-lhe a coisa, embora ela já tivesse vendida? È um acto material ou de disposição? É um acto material, porque no Direito Português, o acto de disposição deuse com a celebração do contrato (artigo 408º nº1). Entregar uma coisa já vendida não é o mesmo que vendê-la. 2ª Parte do nº1: 1 – Se forem praticados actos de disposição por devedor incapaz, que situações abrange? Quando o acto de cumprimento é inválido = pode ser destruído pela parte a quem prejudica; o representante legal pode impugnar o cumprimento; o credor pode oporse à impugnação do cumprimento, impugnando que o devedor não foi afectado pelo cumprimento. Ex: Dívida pecuniária – jovem de 14 anos deve 100 €, o credor bate à porta no dia em que vence a dívida e o pai do menor não está, mas o cheque está em cima da mesa e a criança entrega o cheque. Este é 3
um caso em que o devedor fica prejudicado? Pode ser impugnado? Não nos parece e cabe ao credor demonstrar que não. Já no caso de existirem dívidas recíprocas: C deve ao incapaz 500€ e este 100€ (compensação parcial), contudo paga tudo, aqui é notoriamente prejudicial. 2 – Capacidade do credor: Artigo 764º nº2 Se o credor for incapaz, é o seu representante legal que recebe a prestação; Se o incapaz porventura recebe a prestação e se a prestação chega ao incapaz, o representante não pode impugnar; se o incapaz recebe a prestação e fica com ela, o capaz não pode impugnar o acto também, mas se o incapaz deitou a prestação fora, já pode. 3 – Legitimidade do devedor para dispor do objecto da prestação: Exemplo: Falta do consentimento do cônjuge para a alienação de um bem = falta de legitimidade.
Invalidade do cumprimento Depende de saber qual a natureza do acto de cumprimento. Que natureza tem o acto de cumprimento? - Solução consensual na doutrina: não é um negócio jurídico, mas sim, acto jurídico simples (artigo 295º). Assim, sendo um acto jurídico simples, aplica-se o artigo 295º, que remete para a aplicação analógica do regime de invalidade dos negócios jurídicos (com as devidas aplicações), podendo desta forma ser objecto de uma acção de nulidade = aplicação extensiva do regime da declaração de nulidade e anulação do negócio jurídico.
Quem pode fazer a prestação?
- Artigo 767º – Princípios:
O devedor, na maioria dos casos. E um terceiro? - Nº1 – 3º interessado ou não (porque a intenção passa pelo cumprimento da obrigação do credor) no cumprimento da obrigação (Ex: Alberto paga a dívida de Joana, sem a conhecer de lado nenhum). 4
- Nº2 – Prestações infungíveis não podem ser cumpridas por terceiros.
[?] E se o credor não quiser receber? - O credor não pode recusar a prestação feita por terceiro, se esta for fungível. - Se o credor recusar a prestação por terceiro quando a prestação for fungível – nº1, o credor incorre em mora perante o credor. Casos de relevância da oposição do devedor relativamente à realização da prestação por parte de um terceiro (importância do interesse do credor, com a relevância secundária do interesse do devedor - artigo 768º nº2 – dois pressupostos: 1 – Se o credor quiser recusar também ele a prestação 2 – O terceiro não pode ficar sub-rogado no lugar do credor nos termos do artigo 592º (sub-rogação legal). Desta forma, é muito difícil que um terceiro que queira realizar a prestação, não a possa realizar. Importância: 768º nº2 – última parte. Consequências do regime do 768º nº1 e 2º? i) O terceiro pode cumprir contra a vontade do credor, se o devedor estiver de acordo; ii) O terceiro pode cumprir contra a vontade do devedor, se o credor estiver de acordo (nº2 parte final); iii) O terceiro pode cumprir contra a vontade de ambos, se for alguém se encontre numa das duas situações do 592º (nº2, 1ª parte) – regime de sub – rogação legal (= coloca-se no lugar de outrem, como forma de transmissão de direitos, neste caso). Porque aqui não é um terceiro qualquer, é um terceiro que por lei, está interessado no cumprimento do crédito. Situações de sub – rogação legal (592º): Quando o terceiro tenha garantido o cumprimento da obrigação (ex: o terceiro é fiador de A e paga o crédito deste para com B, passando assim a ser credor de A).
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Quando o terceiro tenha interesse no cumprimento da obrigação do devedor, para além dos casos anteriores (ex. sublocatário quanto à renda do locatário). L
Renda
A
Renda S – L (3º terceiro) Se L não pagar a A, SL vai perder automaticamente o quarto, portanto S-L vai ter interesse em cumprir a obrigação de L, ficando sub-rogado no lugar de A contra L. A quem pode ser feita a prestação?
Ao credor actual (pode não ser o originário, podem ser os herdeiros). Ao representante legal, quando o credor for incapaz. Aos titulares dos órgãos com função de representação da pessoa colectiva quando o credor for a pessoa colectiva. E nos casos da prestação feita a 3º? Em princípio extingue a obrigação (excepção 770º). E nos casos da prestação feita ao credor do credor? Exemplo: A deve 1000 € a B, B deve 1000 € C, A paga os 1000 € a C, a dívida extingue-se? O terceiro pode cumprir, isso não se contesta, porque é 3º (767º) – é fungível – logo a segunda dívida extingue-se obviamente. [?] A dúvida está em saber se a 1ª obrigação também fica extinta (770º alínea d)? - 1ª Parte: o credor B aproveita-se do cumprimento feito por
A a C. - 2ª Parte é discutível: há casos em que o credor tem interesse fundado (vantagem) em não considerar a obrigação como feita a si próprio (exemplo típico: excepção do incumprimento do contrato – se a 1ª dívida se considerar extinta, B não pode invocar este meio para pressionar A, ou seja, B vai preferir que se considere que a obrigação não foi feita a si próprio). E se o devedor cumprir a um credor aparente? - A prestação não extingue a obrigação, salvo em situações excepcionais. Exemplo: cessão de créditos: D --- C1 que elabora uma cessão de créditos a C2; D paga a C1 quando o credor actual era C2. Nesse caso, se o devedor cumprir antes de ter conhecimento da cessão, a obrigação extinguese. 6
Lugar e tempo da prestação Regime: 772º - 776º CC Lugar: Atenção, a principal razão pela qual se erra muito nesta questão prende-se com a aplicação do artigo 772º como regra – mãe: só que as excepções são mais importantes que a regra (pergunta comum de exame). Há que ver as normas especiais na regra dos “Contratos em especial”, a mais importante e comum é a regra especial do artigo 885º (compra e venda) – nº1 – no momento e lugar da entrega da coisa vendida (ou seja, não tem nada a ver com o domicilio do credor 772º). Qual é o lugar de entrega da coisa móvel? 773º - No lugar onde a coisa se encontrava ao tempo da conclusão do negócio (na loja por exemplo). Assim a resposta envolve a aplicação do artigo 885º + 773º. 774º - As obrigações pecuniárias devem ser cumpridas no domicílio do credor (ao contrário do princípio geral do artigo 772º). Logo, o 772º nº1 (no domicílio do devedor) é regra supletiva. Tempo: Obrigações puras/sem prazo (777º nº1) versus obrigações a prazo
Pode ser exigida a todo o tempo O devedor pode cumprir a qualquer altura São muito raras hoje em dia O 777º nº2 prevê que se possa atribuir um prazo a uma obrigação pura (através da intervenção do tribunal = processo judicial de fixação de prazo (777º nº2 + CPC).
Quando há prazo, este decorre a favor do devedor (presunção – artigo 779º). Ex: requisitamos um livro na biblioteca e dão – nos 15 dias, podemos devolvê-lo no 15º se quisermos. O beneficio do prazo é do devedor, excepto se o prazo tiver sido fixado/estabelecido em favor do credor ou em favor dos dois (por exemplo, o devedor quer cumprir, o credor não quer logo, este último incorre em mora e vice-versa).
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Perda do benefício do prazo (780º): - Situação de insolvência do devedor - Diminuição das garantias prestadas ou falta das garantias prometidas por causa imputável ao devedor (ex. uma casa está hipotecada e arde = a garantia desceu de valor, logo a dívida está menos protegida, logo o credor pode exigir o cumprimento imediatamente). Regime especial quanto a obrigações liquidáveis (781º) (+ regime especial relativamente à CV a prestações – 934º).
Antecipação da exigibilidade (não é automático) e não do “vencimento” (é automático)? A doutrina diz que a expressão “vencimento” é infeliz, porque o credor pode não querer o vencimento automático das prestações (o 781º aponta para isso) – a doutrina prefere a leitura como “exigibilidade”, de modo a que o credor tenha de exigir do devedor o pagamento das prestações, se assim o desejar (se não o desejar, o prazo mantém-se como estava). O 934º prevê a exigibilidade, o que vem reforçar a posição da doutrina quanto ao 781º (dizem que o legislador não usou a expressão “vencimento” no sentido rigoroso). Artigo 778º Nº1: O credor tem de provar que o devedor já tem a possibilidade de cumprir, para poder exigir a prestação. Mas se o devedor morrer, a prova não é necessária. Nº2: Se o devedor puder cumprir quando quiser, o credor só pode exigir dos herdeiros a satisfação da prestação através do património da herança e não do património próprios dos herdeiros. [?] E se ficar acordado que o devedor só cumpre se quiser? Não é uma obrigação jurídica, é meramente moral ou social.
Imputação do cumprimento D tem três dívidas para com C: uma de 100.000€; a segunda de 20.000€; e outra de 10.000€. Contudo só tem 50.000€. Como é que esta questão se resolve? Aplicação do artigo 783º = se o devedor tem várias dívidas da mesma espécie (por exemplo todas em €), pode escolher a dívida a ser paga com o seu património (desde que respeite o princípio da integralidade). 784º Nº1 – se o devedor não escolher, paga-se a dívida vencida.
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Nº2 – se não for possível seguir as regras do nº1, os 50.000€ são imputados nas 3 dívidas, de forma proporcionalmente/rateadamente (excepção ao princípio da integralidade). 785º - Se o património do devedor não chegar para isto tudo, paga-se pela ordem expressa no nº1 (despesas, indemnizações, juros, capital).
Capítulo II – Formas de extinção das obrigações Para além do cumprimento: realização do interesse do credor, da prestação a que estava vinculado; existem outras formas de extinção das obrigações. a) Dação em cumprimento: 837º e seguintes; b) Dação em função do cumprimento: 840º - não é uma forma de extinção imediata da obrigação, apenas se for realmente satisfeito o interesse do credor; c) Cessão de bens aos credores: 831º e seguintes (também não é uma forma imediata); d) Consignação em depósito: 841º e seguintes; e) Compensação: 847º e seguintes; f) Novação: 857º e seguintes; g) Remissão: 863º e seguintes; h) Confusão: 868º. a) Dação em cumprimento: - Noção: 837º CC - Necessidade de concordância do credor – ex: A deve 1000€ a B, quando A deve restituir, não tem esse dinheiro mas, tem um carro que vale o mesmo, menos ou mais, e, apresenta ao credor a possibilidade de lhe entregar o carro como forma de extinguir a dívida, e o credor aceita. Isto é possível, não foi através do cumprimento que a obrigação se extinguiu, mas sim através de uma prestação diversa. - Três elementos de caracterização da figura: 1. Realização de uma prestação diferente da que era devida; 2. Realização dessa prestação diversa tem que ter por fim, extinguir imediatamente a obrigação. 3. Acordo do credor relativo à exoneração do devedor em relação à obrigação. Elementos da noção:
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1. “Prestação de coisa diversa da que é devida”: dá a entender que, a exoneração teria apenas de se dar através de uma coisa, circunscrevendo-se à prestação de coisas. Contudo não é assim, devemos fazer uma interpretação ampla. Qual é então o âmbito de aplicação? - Pode ser através da prestação de uma coisa diversa da que era devida (ex. dado a trás = transmissão do Direito de propriedade). Mas, pode aplicar-se também à transmissão de um usufruto ou, até de um Direito de Crédito (ex. A credor de B, em 1000€; B não tem dinheiro na data de vencimento da obrigação, mas B também é credor de C, e tem um crédito com C que vale 1500€ e então pergunta: aceitas que te transmita o crédito com C? Extinguindo-se assim a minha dúvida? A aceita e transmite a B, com a consequência de se considerar imediatamente extinta a obrigação de 1000€ que me devias entregar. 2. Importante para distinguir esta da dação em função do cumprimento. Hipótese: A devia a B 1000€ (exemplo do carro). 1 – A diz a B que recebe o carro e a dívida fica extinta e B aceita = Exemplo de Dação em cumprimento. 2 – A entrega a B o carro e este com o valor da venda do carro extingue a dívida (sendo que se vender por 1500€, os 500€ voltam para o devedor). Aqui as partes não pretendem extinguir imediatamente a obrigação mas sim, que o credor facilite o cumprimento futuro da obrigação, com a entrega da casa; a obrigação em si, só será cumprida aquando da satisfação do valor total no futuro = Exemplo de dação em função do cumprimento. Existem duas hipóteses em que o legislador presume que, na dúvida, as partes decidiram seguir a dação em função do cumprimento – 840º nº2. 3. Exigência do acordo é um elemento que também se encontra na dação em função do cumprimento. O único elemento que permite distinguir é a vontade das partes. Distingue-se das seguintes figuras: - Dação em função do cumprimento;
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- Novação: têm em comum produzirem imediatamente a extinção da obrigação. Contudo, na novação criasse uma obrigação nova em substituição da antiga (o que não acontece na dação em cumprimento). - Obrigação com faculdade alternativa: exemplo - B diz, eu vendo este carro amarelo mas, reservo a faculdade de entregar um carro vermelho se não existir um carro amarelo na fábrica – foi no momento da celebração do contrato que o devedor reservou a faculdade de entregar coisa diversa; diferentemente, na dação em cumprimento, este acordo verifica-se no momento do cumprimento e não da celebração do contrato. - Regime: 837º e seguintes. - Principal efeito: extinção da obrigação com a imediata exoneração do devedor, extinguindo-se o crédito, as garantias e acessórios do crédito. - É exigida a capacidade do devedor, tendo em conta que se trata da alteração da prestação debitória e não do estrito cumprimento do dever de prestar (764º nº1). - Porque pode haver diferença de valor entre a prestação devida e a prestação efectuada, a dação deve ainda considerar-se exposta à impugnação pauliana (615º n1). - Para que haja uma pura dação em cumprimento, é essencial que a diferença de valor objectivo eventualmente existente entre as prestações, estas tenham sido queridas e acordadas pelas partes como equivalente ou correspectiva uma da outra. Caso contrário, haverá uma doação mista, tendo por base de apoio uma dação em cumprimento. [?] E se a coisa entregue em vez da prestação devida tiver um vício? Exemplo: se A deve a B 1500€ e se desonera, por acordo com o credor, mediante a entrega de um automóvel, tudo se passa praticamente como se B tivesse comprado o automóvel a A pela importância correspondente ao seu crédito. Ora, a existência de um vício que afecte a utilidade ou o valor da coisa ou direito transmitido vai determinar a protecção do credor, aplicando-se assim o artigo 838º. Nos termos deste artigo 838º, o credor pode optar também pela prestação primitiva, acrescida da indemnização correspondente aos danos que haja sofrido. Exemplo: imaginando que o automóvel entre ao credor em lugar dos 1500€ a que ele tinha direito, já tivera uma grande avaria em consequência da qual o 11
motor fora aberto e não funcionava mais perfeitamente. Neste caso, o credor poderá exigir a reparação ou a substituição da coisa (914º) ou reclamar a redução do valor que lhe foi atribuído (911º), mas pode optar antes pela entrega dos 1500€, acrescidos dos juros correspondentes, a partir do momento em que a prestação deveria ter sido efectuada, comprometendo-se a abrir mão do automóvel que recebera. É importante referir que a opção do credor pela prestação primitiva terá como efeito o renascimento da obrigação, com todas as suas garantias e acessórios, salvo se a nulidade ou a anulação da dação tiver tido origem em causa imputável ao credor (a contrario – excepção presente no artigo 839º). [?] Admitindo que a dívida que se visa extinguir com a dação em cumprimento afinal não existe? Como fica o devedor? Este terá o direito de exigir a restituição da coisa ou o direito transmitido, nos termos da repetição do indevido (art. 476º).
b) Dação em função do cumprimento: - Terminologia utilizada pelo legislador: “pro solvendo” - Não está escrito na letra do artigo que é exigido o acordo e consentimento, mas é exigível por força do princípio da pontualidade (artigo 762º); - Importância do nº2 – exemplo: Pagamento de uma dívida com um cheque: A compra uma mala e paga com cheque, não paga com dinheiro. O cheque é uma transmissão de um crédito sobre o banco. Mas e quando o cheque não tem cobertura? Eu recebi o cheque para facilitar o cumprimento, mas o meu interesse não foi satisfeito porque A não tinha dinheiro na conta, sendo assim, a dívida não se extinguiu, uma vez que não se extinguiu o interesse do credor. * Cedências de crédito. - Muitas vezes não fica claro entre as partes se se trata de uma dação em cumprimento ou em função do cumprimento, nestes casos, cabe ao devedor tentar provar que é uma dação em cumprimento (o que mais lhe interessa); se não conseguir provar, será uma dação em função do cumprimento (mais favorável ao credor). - A dação em função do cumprimento facilita a extinção da obrigação por exemplo através de: * Entrega de uma coisa * Prestação de facto * Transmissão de um crédito * Emissão de uma letra
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Nestes casos, ao lado da obrigação principal, existe uma nova obrigação, que poderá ser cumprida de forma a facilitar a extinção da principal. Exemplo: D
1000€
1000€
C
1000€ 3º
Até ao dia do vencimento do crédito, o C não tem a certeza que o 3º lhe vá satisfazer o crédito, portanto aceita-o, mas a título de dação em função do cumprimento, porque se o crédito não for satisfeito, a obrigação de 1000 € de D para com C, mantémse (embora sem D estar constituído em mora) e terá de ser cumprida. Se C aceitasse a título de dação de cumprimento, a obrigação de D para com C extinguia-se. E se C só conseguisse reaver por exemplo 900€, a obrigação de D para com C mantinha-se em 100€. Ou seja, quando é um crédito ou uma letra é mais complicado, porque não há nada palpável – subsistem duas obrigações. Se C se fizer pagar em excesso, a doutrina diz que a diferença a mais deve ser restituída ao devedor, porque este é que correu o risco de C não conseguir seguir pagar (e o credor não correr nenhum risco porque a obrigação D____C mantinha-se em qualquer dos casos). Presunção do artigo 840º nº2
Estabelece-se uma presunção legal: quando o devedor fizer uma cessão de créditos, estaremos em princípio, perante uma dação em função do cumprimento (a não ser que as partes estabeleçam o contrário). Isto porque uma cessão de créditos dá fracas garantias de que a obrigação seja cumprida (porque fica dependente de outra obrigação). c) Cessão de bens aos credores: - Noção: 831º CC - Não tem como efeito a extinção imediata da obrigação, cedese aos credores para que seja facilitada a satisfação dos seus créditos, através da liquidação do património. A dívida é extinta
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quando os credores satisfazem o valor com administração e disposição de bens. - Objecto: todo o património do devedor ou apenas uma parte (ideia de universalidade). Se forem bens determinados (X ou Y), estamos perante dação em função do cumprimento (conjunto identificado). - Não é uma acção executiva, porque esta cessão é espontânea e não forçada como na acção executiva. Esta cessão abrange os bens escolhidos pelo devedor e quem age liquidando o património do devedor são os credores. - Regime: * Forma – 832º (exige forma escrita + forma exigida para a validade da transmissão dos bens) + regime. - Efeitos: não são a extinção imediata mas sim, a transmissão para com os cessionários de poderes de administração e disposição dos bens com vista à satisfação de créditos. - O devedor tem apenas o poder de fiscalizar mais direito a prestação de contas. - Os credores não se tornam proprietários - 833º - Os outros credores não convencionaram, podem executar os bens através de acções executivas; só não podem os credores posteriores à cessão, nem os próprios cessionários. - Exoneração do devedor? Só a partir do momento em que os credores satisfizerem o seu crédito. - 836º - Permitindo ao devedor desistir a todo o tempo, a desistência não tem efeito retroactivo. d) Consignação em depósito: - Noção: Possibilidade reconhecida ao devedor ou a requerimento do 3º a quem seja lícito efectuar a prestação de coisa. A consignação em depósito só pressupõe a coisa e não o facto. O depósito é feito judicialmente à ordem do credor (alínea a do artigo 841º). - É a prestação de coisa ou dinheiro [?] E se o credor recusar a colaboração necessária, pode o devedor ter legitimo interesse em se desonerar, vencendo a resistência levantada pela contraparte, seja para se libertar definitivamente de obrigações de que a mora do credor o não isenta (816º), seja para se acautelar contra as dificuldades de prova da sua tentativa de cumprimento, que o tempo pode acumular contra ele, seja por outro motivo igualmente justificado. Exemplo: O vendedor do cavalo de corridas quis entregá-lo na data convencionada ao comprador; mas este, sob qualquer pretexto, esquivou-se de recebê-lo. O inquilino quis pagar a renda ao senhorio, que se recusou aceitá-la com o fundamento de que era superior o montante da prestação em dívida. 14
No primeiro caso, o devedor pode ter interesse em se libertar o mais depressa possível da obrigação de guardar, tratar e treinar o animal; no segundo, pode ter justificado interesse em não correr o risco de se ver envolvido num processo de despejo, baseado na falta de pagamento da renda. Mas, nem só nos casos de mora do credor se verifica, na prática, o interesse do devedor em se libertar da obrigação, prescindindo da cooperação da contraparte. Situação autêntica se regista nos casos em que, sendo incapaz, ou encontrando-se ausente, o credor careça de representante legal ou de curador, e o devedor pretenda, por qualquer razão plausível, pagar a dívida que entretanto se venceu.
É precisamente para acudir todas as situações de tipo descrito, que a lei facilita ao devedor a possibilidade de se desonerar da obrigação, mesmo contra ou sem a vontade do credor, mediante o depósito da coisa devida. Pressupostos da consignação: - Prestação de coisa e não de facto (pode ser fungível; móvel; infungível); - Caso de mora do credor, incapacidade do mesmo, desconhecimento do paradeiro; - Pode ser requerida pelo devedor e por terceiro; - É a prestação de coisa ou dinheiro - A consignação é necessariamente judicial, só é válida se se processar a extinção da obrigação por um depósito feito extrajudicialmente (1024º C. processo civil); qualquer depósito extrajudicial não tem por efeito a extinção da obrigação. Porquê este regime? Para conferir a possibilidade ao credor de se defender e impugnar o depósito (motivo justificado). É uma faculdade conferida ao devedor, que não é obrigado a consignar. Regime – 3 pontos: 1. Criação de uma relação jurídica processual que se vai estabelecer entre o credor e o devedor ou 3º (1022º e seguintes). 2. Relação substantiva – 841º e seguintes. 3. Sujeitos: devedor que consigna a coisa, o credor e o consignatário.
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Em que situações é que pode operar a extinção? 841º CC - Nas situações do 841º a (ex. herança já está aberta, mas ainda não foi feita a partilha; o devedor ainda não sabe se deve entregar ao herdeiro X ou ao herdeiro Z e, assim, consigna a coisa em depósito e extingue a obrigação). - Quando o credor estiver em mora - Esta figura só opera por via judicial (para o devedor fazer valer a consignação em depósito tem de interpolar o credor judicialmente (C processo civil). d) Compensação - Se A deve 1000€ a B e este 500€ ao primeiro, faz-se uma compensação e A só tem de pagar 500€ a B. - Modalidades: a) Legal b) Convencional a) Requisitos legais (divisão doutrinal com objectivo estruturante) – 847º: 1. Reciprocidade de créditos, 2. Validade, exigibilidade e exequibilidade do crédito invocado ou “crédito activo” (= o da pessoa que está a invocar a compensação); 3. Fungibilidade do objecto das obrigações (só funciona se o crédito de A for em € e o de B também; não pode ser € e vacas), a não ser que seja acordada pelas partes numa compensação convencionada; 4. Existência ou validade do crédito a ser extinto ou “crédito passivo”.
Análise: 1: 1000€ A Credor
B Devedor 1000€ 16
A Devedor
B Credor
Distinção entre crédito passivo e activo: * Esta distinção faz-se não pela natureza dos créditos, mas sim tendo em conta quem o invoca. Imaginemos que quem invoca o crédito de 100€ é A, o 1º crédito vai ser o activo ou invocado por quem pede e a compensação (apagar o crédito); o 2º crédito vai ser o passivo ou a ser extinto (se fosse B a invocar seria o contrario). 2: Validade – Vamos admitir que o crédito é válido (se for inválido não pode proceder); Exigibilidade – Tem também de ter vencido para ser exigível (porque o prazo é estabelecido em favor do devedor), créditos não vencidos não podem ser invocados para efeitos de compensação. Exequibilidade – os créditos naturais não podem ser invocados para efeito da compensação, porque isso significaria prejudicar o detentor do crédito civil. Assim, se o crédito de A fosse um crédito natural e o de B um crédito civil, o de A não é exequível, não é judicialmente exigível (a obrigação que não sendo voluntariamente cumprida, dá direito à acção de cumprimento e execução do património do devedor – artigo 817º), logo, esta compensação não seria possível, na medida em que é preciso que este seja judicialmente exigível. Consequência: o crédito activo não pode ser um “crédito não vencido”, nem um crédito natural. 3: O objecto da prestação tem que ser de coisas fungíveis (da mesma espécie e qualidade). Ex: dinheiro por dinheiro. 4: É preciso que exista passivo não tem de ainda não vencido, benefício do prazo (o
e seja válido (para ser extinto), mas, o crédito ser exigível e exequível, pode ser um crédito porque quem invoca o activo, renuncia ao crédito passivo pode ainda não ser exigível). Crédito civil C. natural Se o crédito passivo for natural (X Y/ X Y) também não há problema, porque é X que vai invocar, é o devedor desse crédito que
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assim se dispõe a satisfazer um crédito natural (que não era judicialmente exigível). O crédito passivo pode ser o crédito não vencido ou crédito natural. * Renuncia ao prazo ou satisfaz o crédito que era natural e ele não está obrigado a pagar. Causas de exclusão da compensação (ou requisitos negativos) – revistos no artigo 853º CC: [O Professor AV, nesta matéria dos requisitos negativos, chama crédito principal ao crédito passivo*1] Trata-se de excepções que não permitem que o devedor considere extinta a sua dívida, por compensação com o crédito que dispõe sobre o seu credor.
____________________________________________________________________________________ *Exemplo para compreender a terminologia de Antunes Varela: A B Credor B X A Credor A invoca crédito contra B, para extinguir contra ele. É chamado crédito principal porque o objectivo é extinguir o passivo.
______________________________________________________________________ 1 – 853º Nº1 alínea a – Proveniência de facto ilícito doloso: Não podem ser extintos os créditos provenientes de factos ilícitos dolosos. Isto é, o devedor da respectiva indemnização não pode impor ao lesado a extinção da dívida com qualquer crédito que o lesante disponha contra ao seu credor. Qual a razão justificativa desta medida? Podendo a compensação traduzir-se num benefício para o compensante (que tem, através dela, plenamente assegurada a realização indirecta do seu contra crédito), não se considera justo que o autor do facto ilícito doloso aproveite de semelhante regime. O devedor tem assim que cumprir a obrigação de indemnizar e de correr quanto à cobrança do seu crédito, os riscos que suportam todos os demais credores. Sendo assim, nenhum fundamento existe para se permitir a compensação, na hipótese de o crédito do compensante provir também de um facto ilícito doloso. Ex. Se A dever 1000€ a B por causa dos estragos dolosamente causados nas culturas do prédio vizinho, e B dever 2000€ a A, por dolosamente ter faltado ao 18
cumprimento do contrato de ambos celebraram entre si, nenhum dos interessados pode desonerar-se perante o outro por compensação. Qualquer deles tem que cumprir integralmente e correr o risco da insolvência do devedor, quanto à cobrança do seu crédito. Exemplo: X empurra Y das escadas abaixo, Y magoou-se bastante e teve despesas hospitalares = crédito que nasceu da RC (Y tem o direito de receber mas numa acção independente da de dolo) --- X não pode invocar a compensação de créditos. Só se aplica ao crédito passivo ou crédito principal, porque renuncia àquilo que está estabelecido na lei. Contudo, a compensação pode operar, se o compensante for o credor da indemnização pelos danos provenientes do facto ilícito doloso. Exemplo: se A tiver o direito de exigir 150€ de B, que o agrediu, nada impedirá que o agredido se considere desonerado, por compensação, da dívida de igual montante por géneros que B lhe ofereceu. 2 – 853º Nº1 alínea b – Impenhorabilidade dos créditos principais: O devedor não pode livrar-se por meio da compensação, se o direito do seu credor for impenhorável. Os créditos impenhoráveis visam, via de regra, garantir a subsistência do credor ou da respectiva família, assim se explicando que a lei não permita a sua extinção por encontro com créditos não revestidos de igual força. È impenhorável por exemplo o direito a alimentos (2008º nº2). Exemplo: X é pai de Y e não o alimentou; depois vendeu-lhe o automóvel --- X invoca o crédito do pagamento do carro contra Y e quer compensá-lo através do crédito de Y contra X da pensão de alimentos. Não pode, só se aplica ao crédito passivo ou crédito principal, porque Y pode renunciar a essa vantagem que lhe é atribuída. 3 – Pertença do crédito principal ao Estado ou a outras pessoas colectivas públicas – nº1 alínea C: O artigo 853º nesta alínea exclui do âmbito da compensação os créditos do Estado ou de outras pessoas colectivas públicas, salvo quando a lei expressamente o autorize. Aqui estatui-se este regime em função da pessoa do credor e não do crédito. Exemplo: A deve 500€ ao Estado e o Estado detém um crédito de IRC de 500€ sobre A. Assim, A não pode invocar o seu crédito contra o Estado, para extinguir o crédito de 500€ do IRC do Estado contra ele.
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Esta regra é recíproca, aplica-se também ao crédito activo – o Estado não poderia renunciar a essa vantagem, porque, em todo o caso tratavam-se de contas públicas (seria desvio de poder por exemplo). Declaração de compensação: É uma declaração unilateral – judicial e extrajudicial (848º nº1) - Tem eficácia retroactiva (854º - desde o momento em que o 2º crédito nasceu – ou seja, caso a compensação opere, opera em relação ao momento em que os dois créditos se tornam compensáveis. -
Exemplo: A credor de B (2005) B devedor de A (2007) – opera a partir daqui e) Novação: Noção (que não está na lei): convenção pela qual as partes extinguem uma obrigação, mediante a criação de uma nova obrigação. Como se distingue uma verdadeira novação? Na novação nasce uma nova obrigação que ainda não está cumprida – é diferente da dação em cumprimento, porque nesta, a prestação é mesmo realizada (não há combinação), enquanto que, na novação não, trata-se sim de um combinação para o futuro. A novação também é diferente de uma simples “modificação do conteúdo da obrigação” (não tipificada na lei e feita tendo por base o princípio da liberdade contratual) – não é novação porque não há declaração expressa. ex. em vez de dar 5 aulas de chinês, da uma, daria 10 aulas em 30 minutos. Há uma pedra de toque para distinguir a novação de figuras afins: a exigência de declaração expressa (artigo 859º) – afirmar que querem fazer extinguir a obrigação antiga através da substituição por uma nova = tem que ficar claro que querem extinguir a anterior e contrair uma nova. Em termos práticos, a diferença é que, eventualmente, quaisquer garantias ou meios de defesa ou características da obrigação anterior não se mantêm – ela é totalmente substituída por uma obrigação nova; se for modificação, a obrigação anterior mantém-se, mas com um novo conteúdo, logo também as garantias e meios de defesa se mantêm (não se extingue assim qualquer obrigação).
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Modalidades:
Objectiva (857º) – tem duas sub-modalidades: 1 – Substituição do objecto (ex. A devia 1000€ a B e passa a dever X - Tem de haver declaração expressa). 2 – Alteração da causa – ex. A deve 500€ a título de pagamento de bem de uma CV a B, mas não tem dinheiro e, à data estipulada acordam que A passa a dever os 500€ a título de mútuo, porque B pode querer o regime de mútuo oneroso, com os juros compensatórios, que lhe é mais favorável do que o aditamento do pagamento do preço do CV.
Subjectiva (858º) – quanto aos sujeitos (podem mudar) Ex. A deve 500€ a B e passa a dever a C * É diferente da transmissão de crédito, porque aí tem as mesmas características e garantias, na novação nasce uma obrigação nova (ex. se na obrigação anterior havia um 3º a garantir com uma hipoteca, na nova deixa de haver). Também existem formas de extinção da obrigação sem satisfação do interesse do credor (casos em que a obrigação se extingue sem ter havido prestação): - Prescrição Remissão: Noção (Antunes Varela): a renúncia do credor ao direito de exigir a prestação, feita com a aquiescência da contraparte. 863º - Carácter contratual (A deve 100€ a B; contudo sabendo das fatalidades que entretanto recaíram sobre o devedor, B perdoa a dívida por via contratual = remissão). Aqui, o interesse do credor não chega sequer a seu satisfeito, nem sequer indirecta ou potencialmente, a obrigação extingue-se sem haver prestação. Aqui, é o próprio credor que renuncia ao poder de exigir a prestação devida, afastando definitivamente da sua esfera jurídica os instrumentos de tutela do seu interesse, conferidos por lei. Perdoar uma dívida só tem o valor de remissão quando também haja acordo do devedor, caso contrário seria uma “renúncia unilateral a um direito disponível”, logo tem de ser através de um contrato. Confusão:
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868º - Noção (Antunes Varela): dá-se quando, pelo facto de se reunirem na mesma pessoa as qualidades de credor e devedor da mesma relação creditória, a obrigação se extingue (o crédito e a dívida). A confusão aqui referida, é inteiramente diferente do fenómeno da reunião, na mesma pessoa, do direito de propriedade com algum outro Direito real limitado sobre a mesma coisa (ver. 1476º, 1 b; 1513º a e 1569º 1 a). Até porque a primeira é uma forma de extinção da obrigação e a segunda conduz à restauração da plena propriedade sobre a coisa. Exemplos paradigmáticos: 1 – “Mortis causa”: B deve a 1000€ a A, A fez um testamento e nomeou B para seu herdeiro; A morre; B é devedor de si próprio, porque A deixou-lhe tudo. 2 – “Entre vivos”: A sociedade X é credora de uma dívida de 100.000€ da sociedade Y; a dada altura a X e a Y fundem-se, passam a ser uma única pessoa colectiva, que, naturalmente, não vai pagar a si própria. Capítulo III – Obrigações Solidárias 1. Obrigações conjuntas versus obrigações solidárias - Segundo os critérios dos sujeitos: Singulares Obrigações Plurais
Conjuntas Solidárias Activas Passivas
* Duas expressões susceptíveis de gerar confusão
Obrigações conjuntas ou parciárias Noção (Antunes Varela): são as obrigações plurais cuja prestação é fixada globalmente, mas em que a cada um dos sujeitos compete apenas uma parte do débito ou do crédito comum. 22
Ou (Aula) – Aquelas em que a cada um dos credores ou devedores cabe apenas uma fracção do crédito ou débito comum. Obrigação plural passiva – exemplo: D1 D2 D3
C
(Cada um destes devedores deve cerca de 300€, sendo a totalidade da dívida – 900€)
C, só pode exigir a cada um dos devedores 300€, não pode exigir a totalidade da dívida a um só.
Obrigação plural activa – exemplo:
D
* *
C1 C2 C3
*
Cada um dos credores só pode exigir 300€.
* 300€ Por cada um Totalidade da dívida = 900€ Pluralidade mista: A B·*500€· E C
D F
Nestas obrigações conjuntas, as prestações dos devedores ou dos credores conjuntos resultam do fraccionamento ou parcelamento da prestação global, na qual tendem a integrar-se de novo, logo que cesse a causa da sua divisão. Nesse aspecto se distinguem das relações que nascem logo como obrigações separadas, embora ligadas por um nexo de complementaridade, mas marcadas por
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vínculos distintos: o empresário que contrata para um espectáculo os quatro componentes de um quarteto musical. Modalidades da conjugação:
Originária: quando são vários os sujeitos da obrigação, do lado activo ou passivo, no momento em que ela se constitui; Superveniente: quando ao credor ou devedor originário se substituem duas ou mais pessoas por sucessão mortis causa (também quando haja cessão a duas ou mais pessoas).
Pode cessar, quer num caso quer noutro caso, mediante a reunião na titularidade da mesma pessoa dos vínculos em que a obrigação se desmembrou. Conjugação como regime regra: Sendo a obrigação plural, a conjugação constitui o regime regra, visto que a solidariedade, tanto no lado activo como no lado passivo, só existe se for determinada por lei ou estipulada pelos interessados (513º). Assim: se A, B e C deverem 300€ a D, ou se obrigarem a entregar-lhe 300 moios de trigo ou 60 pipas de vinho, e nada disser na lei nem for convencionado pelas partes, cada um deles deverá apenas uma parte da prestação global. Regime:
O traço característico da conjugação é que havendo pluralidade de credores ou devedores, existe então uma pluralidade de vínculos, sendo cada vínculo autónomo dos outros, seguindo cada um a sua vida autónoma, podendo desta maneira cada um dos sujeitos dispor livremente do seu direito (por cessão, remissão, compensação).
O facto porém de a prestação ter sido fixada globalmente, não deixa de reflectir-se em certos aspectos da obrigação conjunta. Assim: se A vender 20 toneladas de carne a B e C, poderá recusar a entrega da metade da mercadoria a cada um dos compradores, enquanto não receber a totalidade do preço estipulado; tal como se A entrar em mora e esta puder servir de fundamento para a resolução do negócio por B e C, só em conjunto poderão exigir a resolução do mesmo, com base na mora verificada.
Assim, não necessitam de um regime específico/especial, diferentemente das obrigações solidárias, que foram 24
especialmente inseridas nos artigos 512º e seguintes; não havendo então nada na lei sobre obrigações parciárias, regem-se pelo regime geral. Obrigações solidárias (512º e seguintes) Noção (AV): A obrigação diz-se solidária, pelo seu lado passivo, quando o credor pode exigir a prestação integral de qualquer dos devedores e a prestação efectuada por um destes os libera a todos perante o credor comum (artigo 512º nº1). Duas notas típicas acerca da solidariedade passiva (512º nº1, 1ª parte) destacadas na lei: 1. O dever de prestação integral (que recai sobre qualquer devedor); 2. O efeito extintivo recíproco da satisfação dada por qualquer deles ao direito do credor. Exemplo prático: Se A, B e C deverem 9000€ a D, pela compra de uma herdade que lhe compraram, sendo solidária a obrigação, o credor (D), poderá exigir de A (como de B ou de C) a entrega da totalidade do preço, e não apenas um terço dela (havendo posteriormente relações internas = entre os devedores); tal como a prestação (espontânea ou compulsiva) efectuada por qualquer um dos devedores libera os outros dois em face de D. Duas notas típicas acerca da solidariedade activa (512º nº1, 2ª parte) destacadas na lei: 1. O direito à prestação integral por parte de qualquer dos credores; 2. O efeito extintivo (comum a todos os credores) da satisfação dada ao direito de qualquer deles. Exemplo prático: Se A dever 600€ a B, C e D em regime de solidariedade, qualquer destes (por exemplo B), pode exigir do devedor a entrega de toda a soma devida, e não só de um terço dela. A entrega feita dos 600€ feita a B exonera o devedor perante todos os outros credores. Se B posteriormente ao cumprimento, se tornar insolvente e não puder repartir com os outros a prestação recebida, são esses concredores e não o devedor, quem suporta o prejuízo. Fontes da solidariedade (artigo 513º)
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A solidariedade só existe quando:
Resulta da lei (por exemplo: 497º; 507º; 467º) Convenção das partes
Ao contrário do que acontece com as dívidas comerciais – artigo 100º do Código Comercial, em que o regime regra é o da solidariedade. Interesse prático da solidariedade: Solidariedade passiva:
Muito importante porque permite satisfazer o interesse do credor mais facilmente, na medida em que aumenta a sua segurança e por outro lado a solidariedade pode beneficiar ao mesmo tempo os próprios devedores; Exemplos de regimes legais: 497º nº1; 507º (responsabilidade pelo risco); Muito frequentemente por acordo das partes no contrato.
Solidariedade activa:
Reduzido interesse prático; Raros os casos legais; Lança sobre os vários credores o risco proveniente da insolvência do que receba a prestação, posterior ao recebimento; Por outro lado; facilita aos credores a exigência (sobretudo aqueles que estejam ausentes; incapacitados ou venham a ausentar-se) da prestação, diminuindo o risco da obrigação prescrever por falta de interpelação do devedor, se o credor interpelante tiver poderes para exigir o cumprimento, não apenas em seu nome mas também em nome dos outros; Pode aproveitar ao próprio devedor, uma vez que faculta a escolha do credor, junto do qual a prestação se torne mais cómoda ou menos dispendiosa.
Características da solidariedade: 1. Extinção integral do dever de prestar (lado passivo); 2. Extinção integral do direito de exigir a prestação (lado activo);
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3. Identidade da prestação relativamente a todos os sujeitos. 1 / 2: A solidariedade pressupõe, além da pluralidade de sujeitos de um ou de ambos os lados da relação obrigacional, o direito de exigir toda a prestação de qualquer dos devedores (solidariedade passiva) ou o direito a toda a prestação por parte de qualquer dos credores (solidariedade activa). Contudo não bastam apenas estas duas características para garantir a existência de solidariedade, aparecendo a terceira característica. 3: Muitos autores consideram requisito essencial da solidariedade a identidade da prestação que constitui objecto das obrigações. Outros afastam este requisito, com o fundamento de que os devedores solidários podem estar obrigados, mesmo nas relações externas a diferentes prestações (de diverso conteúdo). Tese que defende que este requisito é um requisito essencial na caracterização da solidariedade:
Tese oposta:
* Na definição da obrigação solidária, a lei (art.512º nº1) estatuir que cada um dos devedores responde pela prestação integral, ou que cada um dos credores tem a faculdade de exigir, por si só, a prestação integral.
* 512º Nº2 – segundo o qual a obrigação não deixa de ser solidária pelo facto de…ser diferente o conteúdo das prestações de cada um deles.
Efeitos da solidariedade passiva
Nas relações externas (entre credor e devedores): - Quanto ao credor: exclusão do benefício da divisão por parte do devedor (518º) – o credor está portanto protegido, na medida e que pode exercer o seu direito na totalidade e contra qualquer devedor. * Importância do artigo 519º nº1, 2ª parte – isto não significa que não possa pedir 900€ aos três credores por exemplo. Existe uma excepção na parte final deste nº1, que só procede em caso de insolvência.
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- Quanto aos devedores: satisfação do direito do credor por um devedor extingue a obrigação em relação a todos os demais (523º).
Nas relações internas (entre devedores): - Direito de regresso (524º). Ex. D1 paga os 900€ e terá de receber 300€ de D2 e 300€ de D3 – atenção: não é uma transmissão de créditos (sub-rogação), é um direito diferente do credor, não tem as mesmas garantias por exemplo.
Efeitos da solidariedade activa
Nas relações externas: - Quanto aos credores: possibilidade de cada credor exigir a prestação por inteiro (resulta do artigo 512º, nº1, 2ª parte), exonerando o devedor por inteiro. - Quanto ao devedor: extinção da obrigação em relação a todos os credores solidários (532º - repete o que está implicitamente referido no 512º nº1, 2ª parte).
Nas relações internas: - O credor que receber a prestação tem obrigação de satisfazer a parte que cabe aos demais credores (533º) – se a lei não dissesse, aplicava-se a figura do Enriquecimento sem causa.
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Capítulo IV – Objecto das obrigações Noção de objecto: o objecto da obrigação é a prestação debitória.
Noção, modalidades e requisitos da prestação: A prestação debitória, isto é, o comportamento positivo (actividade) ou negativo (abstenção) a desenvolver pelo devedor no interesse do credor, constitui em certa perspectiva o objecto directo e imediato da obrigação. E, aquilo que deve ser prestado representa paralelamente, o seu objecto mediato e indirecto. Em sede negocial cabe às partes fixar o critério, dentro dos limites da lei, o conteúdo da prestação (art. 398º nº1 e 405º), sendo que é consensual na doutrina que o devedor fica obrigado ao que convencionou e também ao que se infira dessa convenção, segundo os ditames da boa fé (762º nº2) - dai que se falem em deveres acessórios da prestação principal ou laterais, todos destinados à plena satisfação do interesse do credor. Doutrina corrente sustenta que estes deveres não têm autonomia, não prosseguem uma finalidade própria, visam apenas assegurar o exacto cumprimento dos interesses envolvidos numa relação obrigacional complexa. Conceito alargado de prestação (defendido pela doutrina alemã): abrange quer a acção de prestar como o resultado da prestação. Isto é, são elementos integrantes desse conceito a conduta do devedor e a efectivação do interesse do credor na prestação.
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Modalidades da prestação: A) Prestação de coisa e prestação de facto: Prestação de coisa: Diz respeito à entrega de uma ou várias coisas, tanto móveis como imóveis; Pode ter 3 sentidos: - Dar * Exemplo: A doa a B o quadro X; C vende a D 50 garrafas de vinho do Porto. - Prestar Exemplo: Considere-se a entrega inicial do prédio Z, efectuada por F ao arrendatário E, neste caso, o comportamento positivo do devedor traduz-se em prestar. - Restituir * Exemplo: E toma de arrendamento a F o prédio Z – a entrega do prédio que o inquilino E realiza no termo do contrato destina-se a devolver ao credor uma coisa que lhe pertencia mesmo antes do negócio fonte de obrigação. _________________________________________________________________________________________________ * As prestações de dar e restituir manifestam a característica comum de a coisa ser entregue ao credor para que este a retenha como sua.
Pode a coisa emprestada continuar a pertencer ao devedor, sendo a entrega feita ao credor apenas para que este se sirva dela em determinados termos. Prestação de facto Pode ser positiva (acção do devedor – exemplo: o comportamento de certa pessoa que se obriga a desenvolver uma certa actividade intelectual – 1152º) ou negativa (abstenção ou omissão). Nas prestações de facto, a conduta do devedor pode ter: - Mero carácter material = prestação de facto material. Exemplo: a construção de um edifício a que o empreiteiro se obrigou. - Consistir num acto jurídica = prestação de acto jurídico. Exemplo: a prática pelo mandatário de um ou mais actos jurídicos. 30
B) Prestações fungíveis e não fungíveis: Fungível: quando pode ser realizada tanto pelo devedor como por outra pessoa, sem prejuízo para o credor. Exemplos: serão fungíveis as prestações que se traduzem na realização de trabalho meramente material, que não requeira uma confiança ou competência especiais. Não fungível: quando a prestação obrigacional tem ser necessariamente cumprida pelo devedor. A infungibilidade da prestação resulta da sua própria natureza ou da vontade das partes (767º nº2). Exemplos: a pintura de um quadro de arte; o tratamento de uma doença ou uma intervenção cirúrgica, em que se atende às qualidades pessoais do devedor. Relevância prática:
Caso de inadimplemento: - Se a obrigação não é fungível, o credor tem apenas o direito de exigir uma indemnização dos danos para ele resultantes do não cumprimento. - Tratando-se de uma obrigação fungível, detém a faculdade presente no artigo 828º CC.
Só a certas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo, se podem aplicar sanções pecuniárias compulsórias (art. 829.ºA). Constituem simples meios destinados a constranger o devedor ao cumprimento.
Quanto à determinação das situações de impossibilidade subjectiva do cumprimento: - Prestação fungível: a impossibilidade quanto há pessoa do devedor não o exonera do cumprimento, visto que pode fazer-se substituir por terceiro. - Prestação na fungível: tem como consequência extinguir-se a obrigação (art. 791º).
C) Prestações instantâneas e prestações duradouras: Relacionadas com a sua maneira de realização temporal.
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Instantânea ou transeunte: respeita à prestação a executar num determinado momento, extinguindose a correspondente obrigação com esse único acto isolado de satisfação do interesse do credor. Exemplo: a entrega de determinada quantia ou coisa; a declaração de vontade negocial. - Para o efeito não se consideram os actos prévios, eventualmente necessários, pois correspondem a meros deveres acessórios da realização da prestação principal.
Duradoura: comportamento, positivo ou negativo, que se distenda no tempo. Aqui podemos encontrar duas sub-modalidades: - Divididas (fraccionadas ou repartidas): quando o cumprimento se efectua por partes, em momentos temporais diferentes. Exemplo: o preço pago a prestações. - Continuativas (contínuas ou de execução continuada): considera-se a prestação que consiste numa actividade ou abstenção que se prolonga ininterruptamente durante um período mais ou menos longo. Exemplo: a obrigação do trabalhador no contrato de trabalho. Prestações reiteradas, repetidas, com trato sucessivo ou periódicas: quando em vez de uma única prestação a realizar por partes (prestação fraccionada), existam (sendo que decorrem de uma só relação obrigacional) diversas prestações (repetidas) a satisfazer regularmente (ex: obrigação do inquilino pagar renda mensal ou anual) ou sem regularidade exacta (ex: obrigação de fazer reparações em determinada coisa, à medida que sejam necessárias). Só as dívidas liquidáveis fraccionadamente estão sujeitas à regra do artigo 781º ou ao regime especial dos artigos 934º e seguintes para a venda a prestações. Importância do artigo 793º - nos contratos de prestação periódica ou continuada, a impossibilidade de prestação de uma das partes durante x tempo, exonera a outra da contraprestação relativa a esse tempo.
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Numa prestação instantânea – pode o risco ficar de vez a cargo do credor: se A vende a B, o objecto X e este perece depois do contrato por caso fortuito, B deve satisfazer o preço embora fique sem a coisa comprada (arts. 408º e 796º). Requisitos da prestação: Para que a relação obrigacional se constitua validamente, exigese que a prestação debitória obedeça a certos requisitos. A) Possibilidade e licitude: A prestação tem que ser física e legalmente possível (280º nº1). A impossibilidade da prestação pode ser: - Originária: existe na altura da constituição do vínculo obrigacional; impede que a obrigação se constitua validamente. OU - Superveniente: aparece após a constituição do vínculo; extingue a obrigação quando esta se mostrar não imputável ao devedor ou então, transforma-a em responsabilidade civil (artigo 790º e seguintes). Para aqui interessa a impossibilidade originária que, determina a nulidade do negócio jurídico (401º nº1), atende-se para o efeito à data em que a obrigação se constituiu, sendo indiferente que se trate de uma impossibilidade definitiva da prestação ou de uma impossibilidade susceptível de desaparecer mais tarde. Importância: - Da excepção contida no artigo 401º nº2; - Do nº3 deste mesmo artigo: impossibilidade objectiva (para todas as pessoas) versus subjectiva (apenas para o devedor). Isto significa: Que só a impossibilidade objectiva invalida a obrigação, uma vez que não pode ser cumprida pelo devedor nem por qualquer outra pessoa; já a mera
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impossibilidade subjectiva não impede a válida constituição da obrigação, fazendo-se o devedor substituir no cumprimento por outrem. Só não será assim caso se prometa um facto a prestar pelo próprio promitente e apenas por ele (prestação na fungível) – aqui a impossibilidade assume um carácter objectivo e determina a nulidade.
Impossibilidade absoluta e relativa: - Absoluta: impossibilidade propriamente dita; Relativa: simples dificuldade ou onerosidade excessiva da prestação. Esta não produz qualquer feito anulatório, ressalvando-se a matéria do erro.
Impossibilidade física e legal/jurídica: - Física: resulta da própria natureza das coisas. Exemplo: a prestação que verse sobre irrealizável (esgotar a água do mar) ou que consista na prestação de uma coisa que não existe, embora por ventura já tenha existido, ou que nem mesmo pode vir a existir. - Importância do artigo 399º - o que foi agora dito não exclui a validade dos contratos que tenham por objecto a prestação de coisas futuras. Ver também 211º CC. Noção de coisa futura: as coisas que ainda não têm existência material e jurídica (ex: mercadoria a fabricar) mas também, as que existem só que ainda não pertencem ao alienante e são tomadas pelas partes
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que sobre elas negoceiam, como coisas alheias. * Assim, a lei admite a venda de bens futuros (artigo 880º) e de bens alheios (isto se as partes os considerarem nesse qualidade – artigo 893º; 939º). Estas normas aplicamse aos outros contratos onerosos, por força do artigo 939º. - Legal: deriva da lei. Exemplo: quando a prestação debitória consiste em algo que a lei de todo obstacula a que se produza, designadamente a celebração de um negócio proibido e considerado nulo caso se realize. Exemplos: 202º nº2 CC: contrato através do qual uma pessoa se obriga a vender uma coisa do domínio público; 875º: alguém se obriga a vender uma coisa imóvel por simples escrito particular. Distinção entre impossibilidade legal e ilicitude: - Artigo 280º nº1; - Existira ilicitude quando a prestação devida (fisicamente possível e não se analisando num acto que a ordem jurídica impeça de modo directo ou imediato) consista, num comportamento que viole uma proibição legal (ex: difamar, danificar a propriedade alheia, realizar um negócio jurídico proibido, embora não sob pena de nulidade. - A ilicitude do conteúdo negocial pode resultar, não da violação de um preceito especial da lei, mas da ofensa dos princípios de ordem pública*1 ou dos bons costumes*2 (280º nº2). Nos dois primeiros casos haverá ilicitude por ilegalidade e, no último caso, ilicitude por imoralidade. ________________________________________________________________ *1
–
Noção de ordem pública: são normas que visam directa e fundamentalmente tutelar os interesses superiores da colectividade. *2 –
Noção de bons costumes: substitui a de moral pública, utilizada pelo antigo código.
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________________________________________________________________ Nota: - 281º CC: embora a prestação a prestação em si mesma se mostre possível (física e legalmente) e lícita (conforme à lei, à ordem pública e aos bons costumes), ainda assim a obrigação será nula, desde que ambas as partes prossigam com o negócio jurídico com fim contrário à lei, à ordem pública ou, ofensivo dos bons costumes. Exemplo: A vende a B uma espingarda, sabendo os dois que esta se destina a assassinar C. B) Determinação ou determinabilidade: Pressupõe que o respectivo conteúdo fique desde logo determinado, ou se assim não acontecer, que seja determinável em momento posterior, através de um critério fixado pelas partes ou pela própria lei (artigo 280º nº1 + 400º). Razão desta exigência: não será valida a obrigação se o objecto da prestação não se encontrar desde logo completamente individualizado e nem possa vir a sê-lo por falta, ou inoperância, de um critério para esse efeito estabelecido pelas partes, no respectivo negócio jurídico, ou pela lei, em normas supletivas. A indeterminação do facto ou da coisa a prestar pode verificar-se em graus diversos. Especificando, as obrigações genéricas são obrigações de objecto apenas determinável (art. 539º e segs.), tal como as obrigações alternativas (art. 543º e segs.). De quem fica a cargo a determinação do conteúdo do objecto (art. 400º nº1)? - Pode ficar a cargo de uma das partes ou de terceiro, devendo em qualquer dos casos, ser efectuada segundo juízos de equidade, na falta de fixação de outros critérios. Artigo 400º nº2 – Princípio geral: se a determinação não puder ser feita ou não tiver sido feita no tempo devido, sê-lo-á pelo tribunal, sem prejuízo do disposto para as obrigações genéricas e alternativas. C) Conteúdo digno de protecção jurídica: artigo 398º nº2
Princípio da liberdade negocial (“as partes podem fixar livremente, dentro dos limites da lei, o conteúdo positivo ou negativo da prestação”) + “ a prestação não necessita de ter valor pecuniário; mas deve corresponder a um interesse do credor, digno de protecção legal” – artigo 398º nº1 e 2º).
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O actual CC dispensa o requisito da patrimonialidade, que exigia para a validade da obrigação que, prestação debitória tivesse um valor económico (defesa antes feita pela doutrina clássica). Esta dispensa é feita num sentido duplo: 1. A respeito da própria prestação em si. 2. A respeito do interesse do credor na prestação – impõem-se apenas que o interesse do credor seja digno de tutela jurídica. Análise do artigo 398º nº2:
a) A prestação não tem que revestir directa ou indirectamente um carácter pecuniário (avaliável em dinheiro). Isto é, não é necessário para a validade do vínculo obrigacional, que a respectiva prestação tenha um valor económico intrínseco; nem é necessário que o tenha de forma reflexa, resultante da natureza da contraprestação ou de uma avaliação feita pelas partes. Quando o acto do devedor em que a prestação se traduz não possua natureza patrimonial directa ou indirecta, cumpre distinguir se o interesse do credor é ou não, de natureza económica.
Se o interesse do credor é de natureza económica: pode dizer-se que a prestação assume um valor pecuniário reflexo. Exemplo clássico: A compromete-se para com B a deixar de tocar piano durante certas horas do dia, a fim de não prejudicar a elaboração de um trabalho, com valor pecuniário, que este traz entre mãos. Verificando-se o inadimplemento, poderá o credor B exigir ao devedor A, a indemnização desses danos não patrimoniais.
Se do mesmo que a prestação, também o interesse do credor não é de natureza económica: os meios para assegurar o cumprimento da obrigação ou a indemnização do interesse não patrimonial do credor variam conforme o caso concreto. A lei não os especifica, assim como também não menciona de forma precisa quais os interesses não pecuniários do credor que podem dar lugar a uma obrigação jurídica.
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O exemplo acima dado: A vincula-se a não tocar piano, com o objectivo de garantir a tranquilidade ou bemestar de B. Outro exemplo: A compromete-se a retirar publicamente uma injúria que fez a B, tendo este, um simples interesse moral na retracção daquele. Em tais situações, se o devedor não cumpre, poderá o credor, desde logo, requerer as providências cautelares adequadas à protecção do seu direito, o que o tribunal apreciará segundo as circunstâncias (art. 381º e segs CPC).
Na primeira hipótese: não cumprido A. As medidas referidas podem variar, por exemplo, entre a proibição judicial de tocar durante as horas convencionadas e a apreensão do piano. Na segunda hipótese: poderia B ser autorizado a fazer à custa de A, a declaração pública de que este se obrigara a retirar a injúria ou a publicar a sentença condenatória de A. Em qualquer dos casos, o credor teria sempre direito à reparação pecuniária dos danos patrimoniais causados pela inexecução do contrato, contando que os danos pela sua gravidade mereçam tutela jurídica (art. 496º nº1). b) Não se exige o carácter pecuniário do interesse do credor, impõe-se apenas que, o credor tenha um interesse digno da protecção do direito e que não verdade tenha querido estabelecer um autêntico vínculo jurídico. Deste modo: - Sanciona a possibilidade de se prosseguirem directamente interesses materiais ou puros interesses de ordem ideal ou moral (bens da religião, da ciência, da arte, da honra). - Faz depender a validade do vínculo obrigacional sem conteúdo pecuniário de dois requisitos: 1. Que o credor possua um interesse sério e não um mero capricho ou fantasia; 2. Que o devedor tenha
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assumido uma verdadeira obrigação jurídica e não um simples compromisso moral, de cortesia. [?] Quando é que podemos dizer que estamos perante um interesse não económico que merece protecção? O legislador não estabeleceu aqui um critério definitivo, deixou ao juiz a possibilidade de apreciar se o interesse é digno de protecção jurídica, não devendo contudo afastar-se, das ideias ou das orientações gerais da legislação. No pensamento do legislador está apenas o objectivo de tutelar os valores ou interesses não patrimoniais que sejam razoáveis numa perspectiva jurídica. Deve afastar-se assim, os puros caprichos ou excentricidades (ex: não usar gravata), quer as vinculações que embora legitimas e fundadas em face de outros ordenamentos, se encontram excluídas dos fins específicos visados pelo direito (ex: cumprimentar os vizinhos). Modalidades das obrigações quanto ao objecto: Obrigações divisíveis e indivisíveis Divisível: aquela cuja prestação pode ser fraccionada sem prejuízo da sua substância ou do seu valor económico. Indivisível: o inverso. Fontes da indivisibilidade (a indivisibilidade pode resultar): a) Da própria natureza da prestação; b) Convenção das partes; c) Da lei.
Esta distinção aplica-se tanto a obrigações de facto como a obrigações de prestação de coisa (assumindo particular importância nas últimas). Importância do artigo 209º. A divisibilidade/indivisibilidade apuram-se com base num critério económico – jurídico. A indivisibilidade pressupõe que as fracções ou actos em que poderia decompor-se a prestação, não equivalem proporcional e homogeneamente ao todo. Esta distinção só revela realmente importância prática a propósito das obrigações plurais não solidárias, porque tratando-se de uma obrigação singular, o devedor está adstrito a cumprir integralmente a prestação, seja ela ou não divisível (art. 763º). E se a obrigação é solidária, deste regime resultam consequências a que se chegaria por força da indivisibilidade.
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Princípio geral das obrigações divisíveis
Está consagrado artigo 534º CC. Diz-nos: são iguais as partes que têm na obrigação divisível os vários credores ou devedores, se outra proporção não resultar da lei ou do negócio jurídico.
Regime das obrigações indivisíveis:
Aplicam-se aqui certos princípios das obrigações solidárias, na medida em que não se pode fraccionar a prestação.
O regime legal das obrigações indivisíveis apresenta-se diverso, conforme se verifique pluralidade passiva (A) ou pluralidade activa B): A) Pluralidade de devedores (art. 535º, nº 1 e nº 2):
Solução: o credor só pode exigir a prestação de todos os devedores. Do mesmo modo, quando ao primitivo devedor da prestação indivisível sucedam vários herdeiros, também só de todos eles tem o mesmo credor a possibilidade de exigir o cumprimento da prestação.
A obrigação extingue-se em relação a todos os condevedores se é espontaneamente satisfeita por um deles tendo este, o direito de reclamar dos restantes a sua parte na responsabilidade comum. Nota: não se verificam as especialidades do regime estabelecido para o direito de regresso na solidariedade passiva.
Se a obrigação apenas se extinguir quanto um dos devedores, o credor continua a poder exigir a prestação integral dos restantes obrigados (dado que é indivisível), embora tenha que entregar a parte que cabia ao devedor/devedores exonerados (536º). Tal acontece com a remissão (865º nº1) e a confusão (870º nº1).
Artigo 536º: O preceito pretende evitar que da extinção da obrigação de um dos condevedores da prestação indivisível resulte prejuízo para os outros. O credor apenas terá que lhe entregar a parte que cabia ao devedor exonerado, se este a não despendeu antes da extinção do seu vínculo.
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Exemplo: A, B e C comprometem-se a prestar a D o quadro de arte X, do valor de 6000€, que já pertencia aos três em partes iguais. Antes do cumprimento, opera-se a confusão entre D e C, ou seja, reúnem-se em D as qualidades de credor e devedor (art.868º). D poderá exigir o quadro de A e B, sem que caiba proporcionar-lhes 2.000€, caso contrario haveria um locupletamento injustificado de A e B nesse montante. Artigo 537º - desde que a prestação indivisível se torne impossível por facto imputável a algum/alguns dos devedores, apenas sobre este (s) recai a responsabilidade de indemnizar, ficando os outros exonerados (537º). Quanto aos devedores não responsáveis aplica-se o artigo 790º e segs = situação de inadimplemento por impossibilidade não culposa. B) Pluralidade de credores (art. 538º, nº 1):
1ª Parte: Qualquer credor pode exigir prestação (= Obrigações Solidárias). Ratio: evitar negligência dos demais credores (se o legislador obrigasse os credores a coligarem-se para exigir o cumprimento, equivaleria a tornar uns dependentes da inércia dos outros) ou conluios entre um credor e o devedor (a fim de colocar os restantes na impossibilidade de efectuarem os seus créditos).
2ª Parte: Mas exoneração do devedor depende: (i) Cumprimento extrajudicial – só perante todos os credores. Ou outro modo de extinção da obrigação indivisível (dação em cumprimento, novação, etc). (ii) Cumprimento judicial – perante um só credor (nada impede contudo, uma acção conjunta). [?] Imaginemos que A deve a B e C um aparelho de televisão, quem vem depois a parecer por culpa do devedor. Uma vez que o aparelho de televisão (indivisível) foi substituído por um crédito de indemnização (divisível), cada um dos credores só pode exigir a sua parte.
Obrigações genéricas (Antunes Varela) Noção:
Regime jurídico: 539º - 542º CC
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Noção: obrigação cuja prestação só está determinada quanto ao género e quantidade. Exemplo: Compra-se 1kg de laranjas ou 1 frigorífico Bosch.
Nas sociedades de consumo massificado, grande parte das obrigações são genéricas e não específicas. Exemplo: mesmo quando compramos uma peça de roupa, vão-nos buscar o modelo das calças ao armazém sem haver escolha do objecto concreto; o mesmo se passará por exemplo com um carro. Nas hipóteses práticas, há sempre o cuidado de especificar o objecto em causa, por exemplo: A vendeu a B um automóvel antigo; um relógio em segunda mão; um apartamento, etc. São sempre coisas determinadas, para evitar que sejam obrigações genéricas. Consequências fundamentais:
Quanto à transmissão da propriedade: - Não aplicação da regra geral do artigo 408º nº1; - Regime especial do nº2: transferência de direito real sobre coisa indeterminada (falta que de entre os frigoríficos, o vendedor escolha qual vai entregar ao comprador) – a transferência da propriedade dá-se aquando da transformação da obrigação genérica em específica (ou seja, quando a coisa for determinada); - Há um regime especial em que não se exige directamente o conhecimento de ambas as partes (“sem prejuízo do disposto nas obrigações genéricas”- 408º nº2).
Quanto à transferência do “risco de perda ou deterioração da coisa”: - Não se aplica o regime do artigo 796º nº1; - Se ainda não é adquirente, não faz sentido que o risco corra por sua conta; porque na verdade, o vendedor ainda é proprietário – só há efeitos reais, logo, não se coloca o problema do risco.
Determinação e concentração da obrigação genérica: Concentração: processo de transformação da obrigação genérica ou específica. Quando opera? Em regra no acto de cumprimento (por exemplo: quando se entrega o frigorífico). Como? Em regra por escolha do devedor – artigo 539º - ex: tutela do devedor (pode escolher o objecto em concreto a entregar).
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Consequência natural da concentração por escolha do devedor: enquanto o género não perecer aquele não fica exonerado – 540º (tinha a intenção de entregar o frigorífico, contudo, este estragou-se; se ainda houver x1, x2, x3, ou seja, enquanto o género não perecer, o devedor tem de cumprir). Concentração da obrigação antes do cumprimento: - Previstos no artigo 541º (4 casos): 1. Por acordo entre as partes (o comprador escolhe em concreto o frigorífico que quer – no acto de cumprimento = entrega da coisa, já houve concentração. 2. Concentração natural (541º): - Lei: “quando o género se extinguir a ponto de restar apenas uma das coisas nele compreendidas”.
Não é necessariamente só uma (ex: pode haver um evento natural que destrua 900 das 1000 garrafas – se eu vendi 100 a B, essas 100 são automaticamente de B – da mesma maneira que se (se) tivessem destruído 930, as 70 eram de B, como se eu tivesse vendido 100).
Conjugação do regime da concentração natural como a passagem do artigo 408º nº2: Interpretação literal: parece que não é de exigir “Conhecimento de ambas as partes” para que a concentração natural opere a transmissão da propriedade + transferência do risco. Exemplo: B não precisa de saber que as outras 900 garrafas pereceram para se tornar proprietário. Contudo, se for feita uma interpretação teleológica do preceito, chega-se a uma conclusão contrária, senão os interesses do credor ficariam desprotegidos. Atenção: a concentração natural para operar judicialmente necessita do conhecimento do comprador (porque senão este não pode ir buscar as garrafas a correr, ou fazer um seguro, etc…) – se houver outro evento natural, perecem mais garrafas e a pessoa em causa tem que pagar as que comprou e não recebeu? Não, teleologicamente isto não faz sentido.
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3. Mora do credor: - Se o vendedor se atrasar (por exemplo uns minutos) no acto de cumprimento e o comprador não estiver em casa, houve concentração da coisa, pelo que o risco vai passar a correr por conta do comprador. 4. Nos casos previstos no artigo 797º - dívidas de envio: - É preciso identificar quem assumiu a responsabilidade do transporte da coisa que é objecto da obrigação, para se apurar uma verdadeira dívida de envio (ex: A vende x a B e acorda com I que é aquele que fará o transporte - a partir do momento em que entrega x a I, o risco deixa de correr por conta de A dois tipos de situações: se o transporte deve ser feito pelo alienante [pelos seus próprios meios ou contratando terceiros] não se trata de dívida de envio; se o transporte deve ser feito por um transportador independente, escolhidos por ambas as partes [exemplo típico: serviço postal], trata-se de uma dívida de envio. Se o transporte deve ser feito pelo adquirente, pelos seus próprios meios ou contratando terceiros, então o acto de cumprimento consiste na entrega da coisa ao transportador e a obrigação concentra-se no cumprimento (e não antes do cumprimento) – caso normal de obrigação genérica (não é o artigo 541º, mas sim 539º - regime geral). Obrigações genéricas (Almeida Costa) Determinação da prestação: A determinação do objecto da prestação faz-se em regra, mediante uma operação de escolha dentro do género convencionado. A escolha compete ao devedor, salvo se as partes a houverem atribuído ao credor ou a terceiro (art. 539). Em qualquer dos casos impõe-se a sua realização com base em juízos de equidade, se outros critérios não tiverem sido estipulados (art. 400º nº1). Cabendo ao devedor, o normal é ela ser efectuada à data do cumprimento, através da entrega da prestação ao credor; a escolha realizada pelo mesmo antes do cumprimento da obrigação só possui eficácia desde que se verifique acordo do credor (art. 540º e 541º), seria pouco razoável que essa escolha, se operasse sem o consentimento de quem vai passar a suportar o risco.
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No caso de a escolha competir ao credor ou a terceiro: Importa distinguir se existe ou não prazo fixado: não havendo prazo, a escolha poderá ser feita em qualquer momento, com independência da vontade do devedor, ou do devedor e do credor respectivamente. Exige-se porem que seja declarada ao devedor, ou a ambas as partes, conforme o caso (art. 542º nº1). A lei consagra o princípio da irrevogabilidade da escolha. Embora o artigo 542º nº1 se refira apenas à escolha feita pelo credor ou por terceiro, não se encontra razão para que o mesmo regime não vigore quando a escolha cabe ao devedor. [?] E se a escolha não é realizada no tempo devido? 1. Se a mesma pertence ao devedor ou a terceiro e não possa ser (ex: por incapacidade ou morte) ou não tenha sido feita tempestivamente por aquele a quem competia – sê-lo-á pelo tribunal (400ºnº2 CC + 1429º CPC). 2. Se a escolha pertence ao credor e ele não a efectua no prazo convencionado é a este que caberá (art. 542º nº2) – solução = art.400º nº 2 (ressalva). Concentração da obrigação (ver Antunes Varela) A transferência da propriedade e o risco: Nos contratos com eficácia real, se a transferência da propriedade respeita a coisa indeterminada, o direito transmite-se, em regra, logo que a coisa se torna determinada com o conhecimento de ambas as partes (art. 408º nº2).
o
o Dívidas de envio: Para identificar uma verdadeira dívida de envio é preciso apurar quem assumiu a responsabilidade do transporte da coisa que é objecto da obrigação: • •
Se o transporte deve ser feito pelo alienante – pelos seus próprios meios ou contratando terceiros não se trata de dívida de envio. Se o transporte deve ser feito por um transportador independente, escolhido por ambas as partes (exemplo clássico: Serviço Postal) – então trata-se de uma dívida de envio.
Nota: Se o transporte deve ser feito pelo adquirente – pelos seus próprios meios ou contratando terceiros – então o acto de cumprimento consiste na entrega da coisa ao transportador e a
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obrigação concentra-se no cumprimento (e não antes do cumprimento). o Concentração natural (ver página 42): •
Expressão legal: “quando o género se extinguir a ponto de restar apenas uma das coisas nele compreendidas” – o género se extingue a ponto de restar apenas uma quantidade igual ou superior à devida.
•
Conjugação com passagem do art. 408º, nº 2: – Através de uma interpretação literal parece que não é de exigir “conhecimento de ambas as partes” para que a concentração natural opere a transmissão da propriedade + transferência do risco – Mas a interpretação teleológica do preceito conduz à conclusão contrária – entende-se que a transferência da propriedade e do risco para o adquirente só opera quando ele conheça o facto da concentração. Vigora aqui o regime do artigo 408º nº2 e não a excepção ai previsto. Senão os interesses do credor ficariam gravemente desprotegidos, este é o único entendimento que permite a este tomar as providências que, considere adequadas à salvaguarda dos seus legítimos interesses, como por exemplo, efectuar um seguro do objecto que restou. Assim: até à transferência da propriedade, o risco corre por conta do alienante – artigo 540º e mesmo que padeça todo o género, ele suporta o risco não podendo exigir do credor a contraprestação. Contudo, se a deterioração ou o perecimento fortuito da coisa se dá após a concentração, depois da transferência da propriedade, é o credor que sofre o correspondente prejuízo (796º).
Obrigações alternativas
Noção – art. 543º, nº 1. A lei salienta claramente que a determinação do objecto a prestar está dependente de uma operação de escolha realizada pelo devedor.
Distinguem-se dos negócios condicionais: estamos perante um negócio deste tipo quando a determinação do objecto a prestar ocorra mediante a realização de um sorteio ou mediante outro facto futuro e incerto. Este tipo de negócios caracteriza-se pela indeterminação relativamente à eficácia do
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próprio vínculo jurídico obrigacional (nas obrigações alternativas a indeterminação reporta-se apenas ao objecto). As obrigações alternativas versam frequentemente sobre prestações de coisas ou de factos. Exemplos: A compromete-se a entregar a B o televisor X ou a aparelhagem estereofónica Z, à escolha de B; C obriga-se para com D a conduzir o seu carro num certo dia ou a cuidar do seu jardim, à escolha do credor.
Distinguem-se das obrigações genéricas: essas incidem sobre todos os objectos que integram o mesmo género, já as prestações alternativas, tanto podem ser do mesmo tipo (prestação de uma coisa pertencente ou não a um único género) como de tipo diferente (prestação de uma coisa ou de facto).
Distinção entre obrigações alternativas e cumulativas: ambas são obrigações compostas (o seu objecto é múltiplo). Contudo, nas alternativas o devedor está adstrito a prestar apenas algum/uns dos objectos sobre que a obrigação versa e não todos eles (ao contrário do que acontece com as cumulativas).
Distinção das obrigações (distinção doutrinal):
com
faculdade
alternativa
a) Nas Obrigações Alternativas existe mais do que um objecto, embora o devedor só esteja adstrito a prestar um dos objectos b) Nas Obrigações c/ faculdade alternativa (facultativas) só existe um objecto, o seu objecto é constituído por uma prestação, a única que o credor tem o direito de exigir, embora o devedor se possa exonerar mediante a realização de uma outra prestação (sem necessidade de consentimento do credor). [também pode depender de decisão do credor – caso do art. 442, nº2] O regime das obrigações com faculdade alternativa não coincide com o das alternativas. Em que termos? Questão principal – Escolha da prestação: • •
Princípio supletivo: compete ao devedor – art. 543º, nº 2. Mas escolha pode caber ao credor ou a terceiro – art. 400º nº1.
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Em qualquer dos casos as prestações são indivisíveis – artigo 544º. [?] Mas se escolha não for realizada? a) Se cabia ao devedor, competência passa para o credor – art. 548º (claro que a validade da sua escolha depende de ser comunicada ao credor). b) Se cabia ao credor, competência passa para o devedor – 549º + 542º,nº ½. c) Se cabia a terceiro, competência para o tribunal – art. 400º, nº 2 A escolha pode ser feita por declaração expressa ou tácita (217º) – verificando-se esta última quando a escolha cabe ao devedor, mediante a entrega efectiva da prestação. Uma escolha tácita pelo credor (a quem a mesma pertença) ocorrerá sempre que ele aceita sem qualquer reserva a prestação que o devedor efectue por iniciativa própria. Nota: a declaração de escolha não se confunde com o acto de cumprimento da obrigação (mesmo que haja coincidência cronológica).
Princípio da irrevogabilidade da escolha (artigo 549º) - Excepção: Obrigações alternativas de execução continuada ou trato sucessivo. Exemplo: A arrendatário de um prédio rústico compromete-se a pagar uma renda anual – a escolha feita em relação a uma prestação não é vinculativa para as futuras (salvo convenção das partes ou preceito da lei em contrário). Impossibilidade de uma ou algumas prestações:
A lei não se ocupa expressamente sobre a impossibilidade originária ou da ilicitude de uma ou várias prestações, e sendo assim, tendo a obrigação origem num negócio jurídico, aplicase o artigo 280º e 292º (normas gerais relativas à nulidade parcial). Só não será assim de acordo com as regras da redução (se se provar que a vontade real ou hipotética das partes era a de não celebrar o negócio sem a parte viciada).
Problema da impossibilidade superveniente (artigos. 545º, 546º e 547º): diz respeito à impossibilidade que se produza entre a constituição do vínculo obrigacional e a escolha (que depois de realizada transforma a obrigação em específica e em consequência à impossibilidade que se produza aplicamos o artigo 790º seguintes). Artigo 790º - a obrigação extingue-se desde que todas as prestações se tornem impossíveis por culpa do credor ou por qualquer outra causa não imputável ao devedor. [?] E se a impossibilidade total de der por causa imputável ao devedor? Aplicação do artigo 801º nº1. 48
Hipóteses previstas pela lei: I. Artigo 545º: se a impossibilidade não for imputável às partes, a obrigação considera-se limitada às prestações ainda possíveis (se restar uma única prestação = concentração da obrigação nessa única). II. Artigo 546º: impossibilidade imputável ao devedor. Aqui há que distinguir se a escolha lhe pertencia ou não. - Se sim: deve efectuar uma das prestações possíveis. - Se cabe ao credor: “este poderá exigir uma das prestações possíveis ou pedir a indemnização pelos danos provenientes de não ter sido efectuada a prestação que se tornou impossível, ou de resolver o contrato nos termos gerais”. III.Artigo 547º: Se a impossibilidade for imputável ao credor, há que distinguir se a escolha lhe pertencia ou não. - Se sim: considera-se cumprida a obrigação. - Cabendo a escolha ao devedor: também a obrigação se considera cumprida, a menos que este prefira efectuar outra prestação e ser indemnizado dos danos que houver sofrido. Aqui nesta hipótese procura-se evitar que por culpa do credor resulte fraudado o direito de escolha do devedor. [?] E se a escolha pertence a terceiro, tornando-se uma ou várias prestações impossíveis por facto imputável às partes? O problema aqui resolve-se com recurso a preceitos anteriormente analisados: Impossibilidade imputável ao devedor (artigo 546º) - O terceiro tem duas alternativas: 1. Optar por uma das prestações possíveis 2. Indemnização dos danos resultantes do não cumprimento da prestação Podia o terceiro optar pela resolução do contrato? Não, esta tem um carácter demasiado pessoal devendo competir ao credor. Impossibilidade imputável ao credor:
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- Considera-se cumprida a obrigação. Ressalva: existe todavia a possibilidade de o terceiro optar pela prestação possível, com indemnização dos danos que o devedor tenha sofrido (art. 547º).
Capítulo V - Transmissão de créditos e de dívidas. Cessão da posição contratual Transmissão de créditos: • •
Cessão de créditos Sub-rogação
Duas variantes muito importantes da prestação de créditos
Aspectos gerais Transmissão de direitos e obrigações: - Entre vivos vs mortis causa - A título singular versus título universal
Historicamente há uma resistência à admissibilidade da transmissão singular de direitos entre vivos (e ainda mais à transmissão singular de dívidas), na medida em que a obrigação nascia de um acto solene celebrado entre duas pessoas determinadas e, criava um vínculo de subordinação e dependência acentuadamente pessoal. Não se concebia a possibilidade de mudança de qualquer dos sujeitos da relação, sem que a relação se extinguisse e em lugar dela se criasse um novo vínculo.
A cessão da posição contratual é uma figura à parte, porque corresponde à relação obrigacional complexa (a transmissão de direitos e obrigações corresponde à relação obrigacional simples).
Cessão de créditos • Art. 577º, nº 1 – dá-nos uma ideia do que é a cessão de créditos. •
Noção (aula): verifica-se a cessão de um crédito quando o credor, mediante negócio jurídico, transmite a terceiro o seu direito.
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Noção (Antunes Varela): contrato pelo qual o credor transmite a terceiro, independentemente do consentimento do devedor, a totalidade ou uma parte do seu crédito (577º). •
Caso de modificação subjectiva (o sujeito muda) da relação obrigacional, mas, diferente da Novação subjectiva porque as garantias subsistem.
Designações: • • •
Cedente: chama-se cedente ao credor que, transmite o crédito a outrem. Cessionário: chama-se cessionário ao adquirente do crédito, sucessor do credor na titularidade do direito. Devedor cedido: chama-se devedor cedido ao devedor do crédito transmitido.
Âmbito do termo “cessão”: Designa o acto (contrato) realizado entre cedente e cessionário; Como o efeito fundamental da operação (a transmissão da titularidade do crédito). Distingue-se de contrato a favor de terceiro, embora o resultado prático seja equiparável. Exemplos: A) A emprestou 5000€ a B, pelo prazo de três anos, tendo a dívida sido afiançada por C. Passado um ano, o mutuante tem inesperadamente necessidade de dinheiro. Como não pode ainda exigir a restituição da quantia mutuada, vende o crédito por 4200€ a D, que não hesita em o adquirir pela confiança que depositou na solvabilidade do fiador. B) E vendeu uma quinta a F, por 30.000 €. Como vendeu em muito boas condições, graças ao intermediário, G, resolveu doar a este uma parte (5000€) do seu crédito sobre o comprador. C) H deve 2000€ a I e decide, com o assentimento do credor, transmite-lhe o crédito do igual montante que tem sobre J, para que I se considere imediatamente pago ou para que ele se possa pagar à medida que J for cumprido. D) L, produtor de cinema cinematográfico, carecido de meios para a realização do filme, transfere para a
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entidade que o financia, como garantia da dívida que contraiu, todas as receitas que a exibição do filme venha a proporcionar, até ao montante global do empréstimo e dos respectivos juros. Analisando: L – credor cedente Entidade financiadora – cessionário A Cessão de créditos serviu para que L assegurasse/garantisse o financiamento da entidade. Em todos os casos descritos, na base de finalidades muito distintas, há um fenómeno comum. É a transmissão do direito de crédito, no todo ou em parte, feita pelo credor a terceiro. Exemplo Tito: X vendeu um terreno a Y por 50.000€, utilizando Z como intermediário, que conseguiu que Y comprasse o terreno, por um preço inflacionado ---- X cede-lhe 10% do crédito em troca e diz a Y que deve dar esses 5000€ directamente a Z. Analisando: Cessão parcial de créditos antes do pagamento [é uma liberalidade] – tem a mesma finalidade que uma doação. A cessão de créditos é um negócio de causa variável: a razão de ser é diferente de caso para caso (ás vezes nem parece uma cessão de crédito) pode estar-lhe por trás: uma compra e venda; doação; dação em cumprimento; negócio de garantia de um crédito. Aspecto importante: a cessão de créditos dá-se independentemente do consentimento/vontade do devedor (577º nº1) – fica devedor de outro credor, mesmo contra a vontade dele. Na maioria das vezes, a alteração na pessoa do credor não prejudica o devedor, que em quaisquer circunstâncias continuará adstrito à necessidade de efectuar a mesma prestação. Excepção: no caso de cessão parcial pode não ser de todo indiferente para o devedor ter que efectuar apenas um acto de cumprimento, como antes da cessão, ou ter que desdobrar o cumprimento em vários actos, eventualmente realizáveis em locais diferentes. Efeitos da cessão de créditos Quanto ao cedente e ao cessionário (artigo 578º)
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Efeito principal: transmissão de crédito (do cedente para o cessionário) da prestação debitória. É por mero efeito do contrato que o cessionário adquire o poder de exigir a prestação, em seu nome e no seu próprio interesse, ao mesmo tempo que o cedente o perde. - O contrato não necessita de obedecer a nenhuma forma especial, à excepção do artigo 579º nº2. Outros efeitos: dependentes do negócio em causa. Exemplos: compra e venda, doação (578º nº1) – o artigo em causa remete para os regimes especiais, consoante o negócio que se trate: se for uma doação vai buscar-se o regime da doação; se for uma Compra - Venda vai buscar-se a compra e venda) – é pluricausal (vai procurar-se o regime correspondente). Quanto ao devedor (583º) - O devedor não é parte no contrato de cessão. - Efeitos dependem: Notificação judicial ou extrajudicial ou Aceitação da cessão do devedor – sem ter havido notificação ou Mero conhecimento da cessão (583º nº2) – “se porem antes da notificação ou aceitação o devedor pagar ao cedente…o pagamento não é oponível ao cessionário, se este provar que o devedor tinha conhecimento da cessão”. O mero conhecimento já é relevante, pelo que esse pagamento não é oponível ao cessionário, logo o devedor tem de pagar novamente (não pode dizer que pagou bem), só se não houvesse nenhumas destas três condições e ele pagasse de boa fé a um credor aparente, é que não tem que pagar outra vez. Sub-rogação:
Noção: quando um terceiro que cumpre uma divida alheia (ou para tal empresta dinheiro ou outra coisa fungível), adquire os direitos de credor originário em relação ao respectivo devedor.
A Sub – rogação é muito ampla, tem várias hipóteses
Regime jurídico: artigo 589º e seguintes.
Modalidade importante da transmissão do crédito, baseada no cumprimento da obrigação, a que a lei e os autores dão o nome de sub-rogação.
Esquema: 53
D -------- C I - Sub – rogação
Exemplos concretos:
A) Pai cumpre a dívida do filho e fica com a dívida relativamente ao filho. B) A pediu 5000€ emprestados a B, tendo um terceiro afiançado o cumprimento da dívida. Como o devedor, na altura própria, se recusou a pagar ou não pôde fazê-lo, pagou o garante da obrigação. Agindo assim, o fiador ficou sub-rogado nos termos do artigo 644º. Noção dada por Antunes Varela: substituição do credor, na titularidade do direito a uma prestação fungível, pelo terceiro que cumpre em lugar do devedor ou que faculta a este os meios necessários ao cumprimento. Não existe direito de regresso, típico da situação de solidariedade. Tem grande utilidade prática constituí uma modificação subjectiva da relação obrigacional. Razão de ser: Facilitar o cumprimento de obrigações por terceiros. O terceiro que paga é de algum modo favorecido, na medida em que adquire com o cumprimento da obrigação os direitos do credor, e realizando na maioria das vezes um interesse próprio; A sub - rogação nasce como forma de protecção do interesse do credor: mediante a satisfação do crédito por terceiro, quando o devedor possivelmente não estaria em condições de o fazer; Pode ainda ser favorável para o devedor, por se libertar da obrigação de cumprir (e de recair em mora se não o fizer) num momento que pode não ser oportuno para ele. Modalidades: A) Convencional (três tipos de acordo): i) Art. 589º - Sub-rogação entre o credor e terceiro: Exemplo: O credor declara que T vai ficar sub – rogado na sua situação e D passa a deverlhe a ele. ii)
Art. 590º - Pelo devedor (1ª forma): 54
Exemplo: D---C + T = o devedor declara que T vai cumprir a obrigação, passa a ser novo credor. iii)
Art. 591º - Sub-rogação pelo devedor (2 ª forma). Exemplo: D
C
T – que empresta 1000 € ao devedor para que este possa cumprir a dívida. O terceiro não cumpre directamente a obrigação de D, D vai declarar que T fica sub-rogado no lugar do credor, passando a ser credor. * Esta é talvez a única maneira de conseguir que T lhe empreste €. B) Sub-rogação legal – art. 592º: i) Quando o devedor tenha garantido o cumprimento (nº1. 1ª parte) O 664º é uma concretização do art. 592º. Exemplo: D deve a C --- F (fiador) – cumpre a obrigação, porque garantiu o cumprimento (antecipa-se à exigência judicial do credor) – artigo 592º nº1, 1ª parte, torna-se o novo credor. j) Quando o terceiro “estiver directamente interessado na satisfação do crédito.” Exemplo: D (construtor civil) deve a C (banco), T compra um andar hipotecado ao banco – antes, paga a hipoteca ao banco para comprar a casa livre de ónus ou encargos. Está interessado no cumprimento da obrigação D a C – fica sub-rogado no lugar do C (o banco), sendo que D passa a dever o valor da hipoteca a T (se T pela casa dever pagar 500.000€ e o valor da hipoteca for, por ex., 200.000€ faz-se uma compensação). Efeitos da sub-rogação (artigo 593º nº1)
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* O sub-rogado adquire os direitos do credor na medida em que tenha cumprido a obrigação (porque a sub-rogação pode ser parcial, logo o 3º só adquire parte dos direitos – 593º nº2). Sub – rogação parcial (artigo 593º Exemplo: 1000€ D
C (70€) + NC
(300€) 500€ T Estarão C e NC em igualdade de circunstância? A sub-rogação distingue-se do direito de regresso (próprio das relações internas nas obrigações solidárias): Exemplo – Direito de regresso: D1 1000€· C O direito de regresso nasce “ex novo” na esfera de D1, D2 que cumpre a obrigação. No caso da Sub-rogação: A sub-rogação envolve um benefício concedido a quem, sendo terceiro, cumpre, por interesse na satisfação do direito do credor. O direito de regresso no caso da solidariedade passiva, é uma espécie de direito de reintegração (ou de direito à restituição) concedido por lei a quem, sendo devedor perante o credor da prestação, cumpre, todavia, para além do que lhe competia no plano das relações internas. A natureza das situações donde emerge o direito de regresso parece explicar o facto de ao respectivo titular não se transferirem, na falta de estipulação em contrário, nem as garantias, nem os acessórios da dívida extinta. Exemplo: D
1000€
T
CC
Não nasce uma nova obrigação ou um novo direito de crédito. A obrigação mantém-se, com todas as garantias, prazos de prescrição etc, só o credor é que é diferente.
Exemplo 2: Se A, B e C deverem a D 9000€, em regime de solidariedade, e E tiver afiançado a dívida de A, o pagamento que B faça da prestação por inteiro nem lhe confere a qualidade de credor solidário perante os outros condevedores, nem lhe dará o direito de exigir qualquer responsabilidade do fiador de A, salvo se, pelos
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termos e que foi constituída, se mostrar que a fiança visava também cobrir a obrigação em que o afiançado viesse eventualmente a constituir-se perante os seus condevedores. Cessão de créditos vs sub-rogação, diferenças (Matéria está diferente do que o professor Antunes Varela apresenta): 1) Quanto à origem:
A cessão de créditos tem origem contratual, nasce de um negócio jurídico. A S-R pressupõe o cumprimento da obrigação
2) Quanto à garantia da existência e exigibilidade do crédito:
Artigo 578º nº1 – existe na cessão de créditos. Na S-R, o antigo credor não garante ao novo que o crédito exista, seja exigível e seja válido (só tem implicações a nível de Enriquecimento sem causa, não a nível do regime da S-R).
3) Quanto à intervenção da vontade do credor: Requer o acordo do credor – cessão de créditos. Pode haver S-R sem que o antigo credor tenha intervido. 4) Cessão de créditos parcial versus S-R parcial:
S-R parcial – exemplo: D
1.000€
C (700€)+ NC (300€) 300€
I Imaginemos que o devedor se dirige aos credores e entrega 300€ sem dizer para quem são, esses 300€ ficam para quem? Ambos vão querer ficar com eles. Quando a SR é parcial, não prejudica a situação do antigo credor, o credor originário tem preferência, não há igualdade de situações (593º nº2).
Cessão de créditos parcial – exemplo: D
1000€ 300€
C Cessão parcial (300€) 57
NC Imaginemos que o devedor se dirige aos credores e entrega 200€ sem dizer para quem são --- como não há qualquer preceito que dê prevalência a um deles, vigora a igualdade de circunstâncias, ou seja, vão 150€ para cada um.
Consequência das restantes consequências Transmissão singular de dívidas É feita através do instituto da assunção da dívida (595º e segs.) – a transmissão de créditos faz-se através de dois institutos. Assunção de dívida:
Noção de assunção de dívida: operação pela qual um terceiro (assuntor) se obriga perante o credor a efectuar a prestação devida por outrem. Opera uma mudança na pessoa do devedor, sem que haja qualquer alteração de conteúdo nem da identidade da obrigação. A contratação do devedor pode dar-se por duas formas descritas no artigo 595º nº1: 1. Contrato entre o antigo e o novo devedor com ratificação do credor. 2. Contratação directa entre o novo devedor e o credor, independentemente do consentimento do primitivo devedor.
Na vida real transmitir dívidas é sempre mais complicado que transmitir créditos. O termo Transmissão: Consagra a ideia de que a obrigação se transfere, sem perda da sua identidade, do primitivo devedor para o assuntor, ficando aquele exonerado a partir do momento em que este se vincula perante o credor. Excepção: 595º nº2. Exemplo: quando a mulher de um arrendatário promete ao senhorio pagar as rendas que o marido tem em dívida, a intenção dos contraentes tanto pode ser a de colocarem o novo devedor (que ofereça mais garantias de solvabilidade ao credor) em lugar do 58
primeiro, que seria exonerado, como a de chamarem a dívida ao património do novo obrigado, mas sem exonerar o antigo devedor, de forma a reforçar a direito à prestação devida. Modalidades de assunção da dívida: 1. Quanto à negociação ou celebração (595º nº1): a) Contrato entre o antigo e o novo devedor, ratificado pelo credor. b) Contrato entre o novo devedor e o credor, com ou sem o consentimento do antigo devedor (porque se o credor tem interesse em ter um novo devedor, o devedor anterior não tem que opinar. 2. Quanto aos efeitos (595º nº2 – não estão expressos): a) Assunção liberatória – há verdadeira transmissão de dívida (Exige declaração expressa) – “em qualquer dos casos do número anterior” (ou seja, tanto na alínea a como na b). b) Assunção cumulativa – não há verdadeira transmissão de dívida. O credor não declarou expressamente que exonerava o antigo devedor (pode C haver acordo do credor, como na alínea a e b do número anterior), * falta - então o antigo devedor responde em regime Ou seja, em bom rigor seria assim: de solidariedade com o novo obrigado. Artigo 595º nº2, 2ª parte – neste caso, aplica-se o regime da Significado disto: a principal intenção da solidariedade imperfeita, nãoaoé credor o regime comumdeda lei é porque conceder o poder solidariedade (construção doutrinal): exigir indistintamente e qualquer deles o cumprimento integral da obrigação. - Solidariedade nas relações externas (perante o credor); D1 + D2
Já nas relações entre devedores, não há automaticamente direito de regresso (só têm direito de exigir um do outro aquilo que acordaram previamente = seria desrespeitar o acordo, nomeadamente quando tenha havido negociação entre os dois devedores. Mas, quando tiver sido através da segunda modalidade de assunção quanto à negociação, poderá haver direito de regresso, embora não opere automaticamente (o tribunal tem que reconhecer). Cessão da posição contratual (Tese de doutoramento do Professor Mota Pinto – anos 60)
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É uma figura distinta, encaixada à força no programa. Vai haver transmissão de créditos e dívidas simultaneamente.
Noção (424º)
Terminologia (são os três protagonistas da operação): o Cedente: o contraente que transmite a sua posição. o Cessionário: o terceiro que adquire a posição transmitida. o Cedido: contraparte do cedente no contrato originário, que passa a ser contraparte do cessionário. Exemplo: Contrato de locação Locador A (Cedido)
Gozo do bem Renda
Locatário
B (Cedente) (cessão da posição contratual) C (Cessionário)
Aqui estamos perante uma relação obrigacional complexa na medida em que cede o gozo do bem e a dívida, mas também, deveres acessórios, secundários, etc; na cessão de créditos é uma obrigação simples (reduzida ao direito a uma prestação e a obrigação de realizar a contraprestação). •
Dois negócios (terminologia Antunes Varela): – –
•
Contrato-base ou originário (a locação entre A e B) Contrato instrumento pelo qual se opera a cessão (a cessão da posição entre B e C)
Requisitos para contratual:
se
fazer
uma
cessão
da
posição
1. Contrato bilateral 2. Consentimento do outro contraente (A): - Se o consentimento é anterior (424º nº2) a cessão é eficaz a partir: - Da notificação da cessão pelo cedente ao cedido; ou 60
- Do reconhecimento da cessão pelo cedido - Se o consentimento é posterior: a cessão só produz efeitos a partir da ratificação pelo cedido. •
Regime da cessão da posição contratual: - O contrato - base (objecto da cessão) segue o tipo contratual em causa. Exemplo: contrato de locação – vai seguir o regime que sempre seguiu. - Interessa-nos saber que regime vai seguir o contrato instrumental: o contrato instrumento ou a cessão propriamente dita é um negócio de causa variável. Exemplos: Compra – venda; doação. O regime vai ser de acordo com o tipo de negócio adoptado (425º - vai ser consoante o negócio que o contrato instrumento serve, vai variar consoante o conteúdo que as partes quiserem dar ao negócio). Paralelo com a Cessão de créditos (578º).
•
Distinção de figuras afins:
Contrato para pessoa a nomear A
BB
Reservava-se a faculdade de designar outra pessoa para o seu lugar.
C Diferenças: - Aqui, a nomeação de C tem efeitos retroactivos. - Na cessão da posição contratual só há produção de efeitos “ex novo”.
Sub – Contrato: A
Locação
B (paga a renda a C) Sub – locação C (paga uma renda a B)
B não sai da relação jurídica
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Diferenças: - Na cessão o cedente desliga-se da sua posição de contraparte. - No sub – contrato mantêm-se a relação original e nasce uma outra com o sub – contratado. *
Efeitos da cessão da posição contratual
- Nas relações entre o cedente e o cessionário: * Princípio geral (425º) – regime que corresponde ao negócio que pretenderam celebrar (C/V; dação em cumprimento; etc); * O cedente garante a existência e validade da posição transmitida (426º nº1). Mas, a contrario, o cedente não garante o cumprimento das obrigações pelo cedido (426º nº2) – não garante ao cessionário que o cedido cumpra as obrigações. - Nas relações entre o cedente e o cedido (não há preceito legal): * Em princípio a cessão exonera o cedente de todas as obrigações (porque o cedido concordou). * Mas é admissível uma convenção diversa (por exemplo se C não pagar a renda, B fica responsável pelo pagamento). - Nas relações entre o cessionário e o cedido: * O cessionário fica colocado na posição contratual em que se encontrava o cedente.
Capítulo VI – Garantia Geral das Obrigações (Meios conservatórios da garantia patrimonial) Qual a garantia geral das obrigações? O património do devedor (no tempo do Direito Romano era a pessoa do devedor). Só há uma garantia geral das obrigações (não há garantias gerais).
Princípio da responsabilidade ilimitada do devedor (601º): - É o património do devedor na altura do cumprimento (não na altura do nascimento da dívida). 62
- Excepções: - Bens impenhoráveis (ex: causa, frigorifico, TV) - Limitações da responsabilidade a certos bens: o Limitação legal: patrimónios autónomos e separados. Exemplo: a herança – enquanto a herança não estiver fechada, não pode ser atacada (só depois de ter sido aberta). o Limitação convencional (602º e 603º) – quando é que o património do devedor pode ser restringido por intervenção da vontade das partes ou de terceiro? - 602º: acordo entre as partes: * Desde que não se trate de “matéria subtraída á disponibilidade das partes (ex: obrigação de alimentos). - 603º: por determinação de 3º: * Nas doações e nas deixas testamentárias (ex: madrinha doa um palacete à afilhada e exclui o bem como oponível de resposta pelas dividas da afilhada) – pode; no caso de ser testamento também pode. Concursos de credores (604º) •
Princípio da generalidade e da igualdade dos credores D
1000€ C1 500€ C2 100€ C3
Se D só tiver 1000€ de património, vai ser rateado patrimonialmente pelos 3 credores comuns (diferentemente dos credores preferenciais). Nº2 – Causas legítimas de preferência: Garantias especiais das obrigações (os credores que as tiverem em seu favor são credores preferenciais). Meios conservatórios da garantia patrimonial: 1. Declaração de nulidade 2. Sub-rogação do credor ao devedor 3. Impugnação pauliana 63
4. Arresto (importante para processo civil) 1) Declaração de nulidade: Noção (605º) Esta faculdade é desnecessária face ao regime geral de nulidade (286º)? Para que é que é necessário este artigo? O artigo 605º dispensa que “o acto produza ou agrave a insolvência do devedor” – não é preciso que o credor prove que esse acto produziu o agravou a insolvência do devedor. Exemplo: D só tem uma jóia e faz um negócio simulado doando a jóia – C não precisa de provar que essa doação diminuíra a solvência do devedor. Importância prática do instituto: é grande devido à frequência dos negócios simulados. Efeitos quanto a todos os credores (605º nº2): X
C 1 1C H Y D Venda 2 C Simulada Z 3 D desata a fazer vendas simuladas de todos os bens e em nome de H por exemplo. Imaginemos que C1 consegue a declaração de nulidade de venda de D a H, os bens X, Y, Z voltam para D e tanto C1 como C2 e C3 podem executar o seu património (apesar de não ter sido só C1 a actuar). 2) S-R do credor ao devedor (606º): Noção: possibilidade do credor de se substituir ao devedor no exercício de direitos ou poderes que competem a este último, mas que o devedor não concretiza (ou seja, para os casos de omissão do devedor). Noção Antunes Varela: faculdade concedida ao credor de se substituir ao devedor no exercício de certos direitos capazes de aumentarem o activo, diminuírem o passivo ou impedirem uma perda do activo do património do obrigado. Exemplos: a) Aceitar uma herança
D
C1 C2
D recebe uma herança (uma quinta) e não vai aceitá-la para não ir às mãos dos credores – o credor pode aceitar a herança por ele. 64
C3 b) Invocar a prescrição de uma obrigação
D
C1 C2 C3 (prescreveu)
D é amigo de C3 e não invoca a prescrição – C1 e C2 podem invocar a prescrição em vez de D.
Âmbito de aplicação da S-R do C ao D (artigo 606º nº1) Direitos de conteúdo patrimonial - Mas excluem-se aqueles que por sua própria natureza ou disposição da lei, só possam ser exercidos pelo respectivo titular. Exemplo: D ia casar-se com uma senhora bastante rica e muda de ideias – o C não pode obrigá-lo a casar. Exemplo 2: Revogação de doação por ingratidão do donatário: D doa à tia uma quinta, a tia é ingrata e não tem o mínimo de interesse na quinta, o D pode revogar a doação mas decide não fazê-lo – o C não pode sub -rogar-se e revogar). Requisitos: o Inacção do devedor o Essencialidade da sub – rogação (606º nº2): exemplo: esquecemo-nos de pagar o almoço, chega o sócio da subrogação e começa a sub-rogar -se. Não pode, só pode fazê-lo se isso for essencial para preservar o seu património, porque o devedor pode ter património mais que suficiente e pode querer satisfazer o crédito, ou seja, pode não estar inactivo e a sub – rogação pode não ser essencial.
Efeitos: o Em relação a todos os credores (609º) – todos os credores vão beneficiar por exemplo da invocação da prescrição. Nota: Comparação entre o 605º nº1 (acção de nulidade) e o artigo 606º: A lei foi mais severa e restritiva na concessão da sub – rogação do que na abertura da acção de nulidade. Na declaração de nulidade reconhece-se a legitimidade dos credores para a requererem, logo que tenha interesse na declaração, “não 65
sendo necessário que o acto produz ou agrave a insolvência do devedor”; na sub – rogação para que o credor possa recorrer à operação, é indispensável que a realização do acto seja essencial à satisfação ou à garantia do direito do credor. Assim, desta comparação percebemos que para o exercício da sub – rogação, necessita o credor de provar: a) Que do acto omitido pelo devedor resultou a insolvência dele, sendo o exercício do direito indispensável para eliminar tal resultado; b) Ou que da omissão resultou a impossibilidade de satisfação (cumprimento) do direito ao credor, como sucede quando a inacção do devedor provoque a privação, para o seu património, da coisa não fungível essencial à realização da prestação devida.
3) Impugnação pauliana Noção: faculdade que a lei concede aos credores de atacarem judicialmente certos actos válidos (ou até mesmo actos nulos*1) praticados pelos devedores em seu prejuízo. ______________________________________________________________________ *1 – Mesmo os actos nulos sujeitos à declaração de nulidade estão sujeitos à impugnação pauliana. ______________________________________________________________________ Origem da denominação: devido aos juristas Paulos, de tempo romano.
Exemplos de actos atacáveis: -
Venda Doação Renúncia e direitos Assunção de novas dívidas
Âmbito de aplicação (610º e 615º nº1 e 2): - Artigo 610º: * “ Actos que envolvem a diminuição da garantia patrimonial do crédito” (têm que ser essenciais à garantia do crédito) – actos que
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provoquem a redução do “activo ou aumento do passivo”. * E “não sejam de natureza pessoal” (ainda que com reflexos patrimoniais) – casar, divorciar, adoptar, perfilhar. - Artigo 615º nº1: * É possível impugnar actos nulos - mas porque é que será preciso recorrer à impugnação pauliana se temos a declaração de nulidade? - Justificação: Porque seria justo ficar de fora, por exemplo, uma venda simulada, que é extremamente difícil de provar – se conseguiu provar os requisitos da impugnação pauliana (já os vamos ver, também deverão pode invocá-lo relativamente aos actos nulos (porque a nulidade pode muito difícil de provar). - Artigo 615º nº2 1ª parte: impossibilidade de impugnação do cumprimento de obrigação já vencida: C1 (vence a 31 Setembro) D C2 C3 (não venceu a 31 Dezembro, venceu a 31 de Julho) Imaginemos que D já pagou a C2 e a C3, mas a C1 não – o artigo 615º nº2, 1ª parte diz que C1 não pode impugnar, porque D cumpriu a tempo e horas a dívida para com C3 quando a sua ainda não era exigível (porque só vencia a 30 Setembro). - Artigo 615º nº2, 2ª parte – mas já é possível impugnar o cumprimento: 1. De uma obrigação ainda não exigível 2. De uma obrigação natural 1. Imaginemos que D cumpriu a dívida de C2 no dia 29 Setembro (pode, porque o prazo corre a seu favor), ou seja, quando ainda não era exigível – o cumprimento desta obrigação é impugnável. 2. Suponhamos que a dívida para com C2 era uma obrigação natural – se não existisse esta disposição não podia impugnar (porque uma obrigação natural, quando é cumprida é bem cumprida).
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404º (excepto no que a lei disponha) – 615º nº2 2ª parte. O legislador preferiu proteger o credor civil – ele pode impugnar o cumprimento da obrigação natural. Requisitos da impugnação da 1ª transmissão: Exemplo: T vende a D (1ª transmissão), D tem um credor. T vende posteriormente a X e consecutivamente X vende a Y. Como é que é possível atacar a primeira transmissão? - Artigo 610º e 612º: 1) Anterioridade do crédito (610º alínea a) Crédito ____ Acto de impugnação_____ Impugnação
Se o acto fosse antes, o credor já não poderia contar com esse bem do devedor para satisfazer o seu crédito; Excepção a esta anterioridade: excepto se o acto que tiver sido anterior for doloso (o devedor sabia que ia contrair o crédito no dia seguinte, por exemplo, então praticou o acto antes, para prejudicar o credor – se o credor conseguir provar isto, poderá impugnar).
2) Impossibilidade ou agravamento da impossibilidade de satisfação integral do crédito (610º alínea b) – se o devedor tiver património suficiente para satisfazer o crédito, não há impugnação. Atenção: especialidade do ónus da prova: o devedor interessado na manutenção do acto tem de provar a “suficiência dos bens” (611º 2ª parte) = se o credor impugnar, tem de ser o devedor/3º a provar que tem património suficiente para satisfazer integralmente o crédito (protecção maior do credor). 3) Má fé por parte do devedor e de terceiro (612º requisito eventual, pode ou não, ser necessário) – se o acto de transmissão for oneroso, exige-se má fé do devedor e do terceiro; se for gratuito, a má fé não é exigível. Muitas vezes, a impugnação pauliana não procede porque não se consegue provar a má fé de terceiro – é a diabolica probatio (não se conhece o terceiro, sendo difícil provar). Justificação para a diferença de regimes onerosos versus gratuitos: merece maior protecção o terceiro adquirente num acto oneroso (porque fez um sacrifício, deu uma
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contrapartida), do que um acto gratuito (não fez qualquer sacrifício). Por isso, é que se forem vendas simuladas, além de ser difícil de provar, tem de se provar a má fé de terceiro. O conceito de má fé para estas situações (612º nº2): consciência do prejuízo que o acto causa ao credor (porque o terceiro geralmente não tem intenção de prejudicar – mas pode ter consciência). Requisitos para a impugnação das transmissões subsequentes (613º): D C T1 Quando C dá conta, a coisa já está, por T2 T3 exemplo, nas mãos de T2… pode impugnar = dois requisitos. Artigo 613º: 1. Verificação dos requisitos da impugnação pauliana quanto á primeira transmissão (de D para T1). 2. Má fé do sub – alienante (T1) e do sub – adquirente (T2) se o acto for oneroso. Efeitos – 3 tipos de situações: a) Relação entre o credor e o 3º adquirente C-----D-----3º: - 616º Nº1: o credor tem o direito á restituição dos bens “na medida do seu interesse”; não pode executá-los no património de terceiro (ex: a dívida é de 2000€ e o bem vendido é de 10.000€ --- o C pode vender o bem em hasta pública por 10.000€, ficar com os 2000€ e os restantes 8000€ vão para o terceiro. Diferentemente da sub – rogação; há um ataque directo ao património de 3º - os bens não regressam ao património do D. Conclusão: a procedência da impugnação pauliana atribui ao credor um direito pessoal de restituição (no Código de Seabra isto não estava expresso). [?] Concorrência do credor beneficiário da impugnação pauliana com os credores do 3º adquirente – é como se C se tornasse um credor directo do 3º.
C ---- D ---- 3º
C1 C2 C3
Quem prevalece? C versus C1 – C2 versus concurso? - A doutrina, embora não haja consenso, defendem o concurso em igualdade de circunstâncias entre C e os credores do 3º. 69
b) Relações entre os credores: - 616º Nº4: a impugnação pauliana apenas é eficaz em relação ao credor que a tenha requerido. - Exemplo: No exemplo só um credor é que requer a impugnação. Na prática, o negócio não é atacado. O bem C1 D T que foi alienado porque T é que vai ser C2 executado para ser vendido em hasta C3 pública e para que C1 se faça pagar (o excesso vai para T). Este regime só é favorável ao credor que o utiliza (pode portanto ser mais vantajoso que a nulidade – apesar de ser mais difícil de provar – porque a nulidade vai beneficiar a todos os credores). c) Relações entre o devedor e o 3º adquirente: - 617º/1: * O devedor tem responsabilidade para com o T; * Se o acto é gratuito, o devedor é responsável segundo o regime das doações; No acto gratuito * Se o acto é oneroso, o devedor só é responsável não tem de se nos termos do Enriquecimento sem causa (qualquer provar a má fé de terceiro estava necessariamente de má fé) – se o 3º, por isso ele acto é oneroso exige-se que o terceiro tivesse pode estar de boa consciência de que estava a prejudicar os credores; fé, merecendo logo, não merece tanta protecção, aplicando-se maior protecção. assim as regras do enriquecimento sem causa em vez da RC. Arresto Noção: apreensão judicial de bens com o valor suficiente para assegurar o cumprimento da obrigação.
Noção Antunes Varela: apreensão judicial de bens do devedor, quando haja justo receio de que este os inutilize ou os venha a ocultar. Segundo este autor, a noção de “justo receio de perder a garantia patrimonial”, abrange três situações: 1. Suspeitas de fuga do devedor
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2. Receio de subtracção dos bens 3. Risco de perdas das garantias do crédito
+ É preciso que haja razões objectivas, convincentes, capazes de explicar a pretensão drástica do requerente, e não a alegação de meras convicções, desconfianças, suspeições de carácter subjectivo. + Artigo 407º Código do processo Civil Requisitos: 1. Se o arresto for requerido contra o devedor o credor tem que provar “justo receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito (619º nº1) ”. 2. Quando a transmissão tenha sido judicialmente impugnada (por declaração de nulidade ou por impugnação pauliana), admite-se que o arresto seja requerido contra 3º (a título excepcional, porque em princípio só os bens do devedor é que podem ser arrestados) – 619º nº2. Simultaneamente com a nulidade ou impugnação pauliana, ele pode intentar um arresto contra o 3º (porque o terceiro pode alienar a outros 3os).
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Capítulo VII – Garantias especiais das obrigações Noção de garantias especiais: meios destinados a reforçar, em beneficio de determinado credor, a garantia comum dos credores, dada a todos eles, em pé de igualdade. As garantias especiais podem ser: pessoais ou reais. Pessoais: para além do património do devedor responder pelas dívidas, o património de outra ou outras pessoa/s. Exemplo: Fiança – há um reforço quantitativo, fica não só com uma, mas com duas partes de garantia. - Distinguem-se da: * Da solidariedade passiva (porque o fiador, por exemplo, está numa situação subsidiária em princípio; e, mesmo que não esteja, nunca será um verdadeiro devedor, porque fica sub – rogado nos direitos do credor – na solidariedade só há direito de regresso na parte correspondente ao outro devedor). * Assunção de dívida: - Liberatória: 3º torna-se o único devedor (na garantia pessoal, há o fiador também). - Cumulativa: o 3º torna-se devedor solidário (é como na solidariedade).
Reais: atribuem ao credor o direito de satisfazer o seu crédito de preferência aos demais credores pelo valor ou pelos rendimentos de determinados bens do devedor ou de um terceiro. * Há um reforço qualitativo: quando determinado crédito tem uma preferência qualitativa sobre aquele bem. Os privilégios creditórios e o direito de retenção, incidem geralmente sobre bens do próprio do devedor e traduzemse no tratamento preferencial concedido ao titular da garantia sobre determinados bens desse património. * Haverá eventualmente um reforço quantitativo também. Exemplo: D
C1 C2 C3 Penhor T–W
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O penhor, a hipoteca, a caução e a consignação de rendimentos, podem recair sobre os bens do devedor como sobre coisas pertencentes a terceiros. Prestação de caução
Regime: 623º e seguintes
É uma garantia especial que se concretiza através de uma garantia pessoal ou real – é um caso à parte que se concretiza através de uma ou outra forma de garantia (623º nº1 – várias modalidades).
Noção: garantia que põe lei, decisão judicial ou negócio jurídico, é imposta ou autorizada para assegurar o cumprimento da obrigação eventual ou de extensão indeterminada.
Exemplo: * Artigo 567º nº1 – para garantir a indemnização em forma de renda (o lesante pode vir a não ter meios para pagar a renda – o tribunal pode exigir a prestação de uma caução como garantia de que o lesante vai cumprir a obrigação, porque pode ser uma obrigação de extensão indeterminada. Assim, pode exigir uma caução por constituição de uma hipoteca sobre x bens do devedor). * Caução a prestar pelos administradores de uma S.A. os administradores podem ficar fiadores em relação a eventuais danos que venham a causar à sociedade, no exercício da sua função de administradores, para assegurar o cumprimento de uma obrigação eventual.
Garantias pessoais reguladas no CC: - Fiança (687º e seguintes) - Subfiança (630º) - Mandato de crédito (629º) Outras não reguladas no CC - Aval (figura eminentemente comercial) - Garantia autónoma - Carta de conforto (praticada no âmbito bancário) Fiança
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Características (tradicionalmente enumeram-se duas (1.acessoriedade; 2. Subsidiariedade – Antunes Varela/ Almeida Costa), mas vamos ver quatro (Januário da Costa Gomes – especialista na matéria): 1. Acessoriedade (627º nº2; 628º nº1; 631º nº1; 632º nº1): - É acessória (627º nº2) – consequências: * A forma da fiança deve seguir a forma da obrigação principal (628º nº1); * Não pode exceder o valor da obrigação principal (631º) * Não é válido se a obrigação principal for inválida (632º) – excepção 632º nº2 (exemplo): Se D é menor e o F, seu avô (e que sabia que ele era menor à data da constituição da fiança), a fiança é válida – excepção ao princípio da acessoriedade (a outra excepção está no artigo 782º). 2. Finalidade de segurança do crédito afiançado (manifesta-se na sobrevivência à impossibilidade de cumprimento pelo devedor). * É o ponto central da questão: a verdadeira razão de ser da fiança (se o D não consegue pagar ao C, a obrigação do fiador subsiste). 3. Negócio de risco (tem para o fiador uma forte consequência: há o risco de vir a perder o montante ou bem com que garantiu a obrigação de D). 3. Subsidiariedade (eventual, pode ou não existir) * Traduz-se no benefício da excussão (638º - se o D não paga, o C não pode exigir de F o pagamento, até que tenha executado todos os bens de D. m * Mas pode haver uma renúncia ao benefício da excussão por parte de F, assumindo-se, nomeadamente, como principal pagador da obrigação (isto por exigência dos credores, normalmente quando são bancos que, quer dois devedores no mesmo plano, e não apenas em regime de subsidiariedade) – artigo 640º alínea a. Problema da fiança “omnibus” (fiança geral): - Prática bancária - Os bancos começaram a exigir fiadores (às vezes os próprios administradores da empresa com o seu património) para os empréstimos concedidos às empresas – depois, como as empresas continuavam a ter negócios com o banco, este estendia essa fiança a todos os empréstimos/ negócios realizados entre 74
ambos (nasciam com o negócio concreto, mas passavam a aplicar-se à generalidade dos negócios entre as partes – aplicavam - se inclusive a objectos indetermináveis: negócios que ainda não foram previstos. Discussão na doutrina e jurisprudência: - Acórdão uniformizador de jurisprudência (nº4/2001 de 23 de Janeiro): “é nula por indeterminabilidade do seu objecto, a fiança de obrigações futuras, quando o fiador se constitua garante de todas as responsabilidades provenientes de qualquer operação em direito consentido, sem menção expressa da sua origem ou natureza e independentemente da qualidade em que o afiançado intervenha”. Solução talvez um pouco radical: todas as fianças dependentes foram declaradas nulas (talvez uma opção pela redução seria mais sensata). Garantias reais 1) 2) 3) 4) 5) 6)
Consignação de rendimentos Penhor Hipoteca Privilégios creditórios Direito de retenção Penhora (818º) e Arresto
1. Consignação de rendimentos:
Artigo 656º nº1 - Em vez de se afectar o bem em si, afectam-se os rendimentos. Exemplo: (Rendas de um arrendamento de um prédio) como garantia.
Artigo 656º nº2 – Modalidades quanto à amplitude: - Abrange o cumprimento da obrigação e pagamento de juros; ou - Abrange só uma destas componentes
Artigo 658º nº1/2 - Espécies quanto ao título constitutivo: - Voluntária - Judicial
2) Penhor (diferente da penhora) * Noção de penhora (art. 822º): a penhora é uma determinação especial para apreender certos bens.
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Duas categorias: - Penhor de coisas - Penhor de direitos
Objecto do penhor (objectos empenháveis): coisas móveis e direitos que tenham por objecto coisas móveis, em ambos os casos não susceptíveis de hipoteca (carros, barcos, aviões estão sujeitos a hipoteca, logo não estão sujeitos a penhor) – podem ser empenhadas participações sociais (quotas e acções).
Exigência de publicidade no penhor: - Exige-se que a entrega da coisa empenhada ou de documento que confira a disponibilidade sobre ela. - Excepção (penhor sem desapossamento) no domínio do Direito Comercial.
Penhor sobre direitos: - 679º (regime) * Aplica-se o regime do penhor sobre coisas, com as devidas adaptações. - 680º (objecto) paradigmático * É um caso de um “direito sobre direitos”. 3) Hipoteca
Figura rainha das garantias reais das obrigações
Distinção do penhor: - Quanto ao objecto: imóveis + móveis registáveis (coisas móveis equiparadas para efeitos de hipoteca – a lista pode aumentar) – 688º. - Necessidade de registo: na hipoteca, a forma de dar publicação é o registo - Dispensa de desapossamento
Características: - Realidade (é preciso incidir sobre um bem, dai nascendo um direito real de garantia). - Especialidade (quanto ao bem e quanto à delimitação do crédito – tem de se saber qual o bem especificamente e qual o crédito qualitativa e quantitativamente. - Publicidade (através do registo) - Indivisibilidade (696º) – ex: não se pode hipotecar só a cozinha; o objecto da hipoteca é indivisível.
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- Acessoriedade (730º a) – se a obrigação principal morrer, também morre a hipoteca. Modalidades: - Hipoteca legal (704º) - a lei prevê que possa ser constituída: a) Uma hipoteca contra os devedores de IMI, se a autarquia registar essa hipoteca – ou seja, não nasce automaticamente, é preciso que seja registada (registo constitutivo). Em todos os casos, o registo tem efeito constitutivo (a lei prevê, o registo faz a hipoteca nascer). - Hipoteca judicial (710º nº1) – com base em “sentença que condenar o devedor à realização de uma prestação em € ou outra coisa fungível”. Com base numa sentença, o autor (credor) vai ao registo e constitui uma hipoteca sobre um bem imóvel do réu (devedor) – não é o juiz que declara a hipoteca. A sentença só serve de base, o registo também é constitutivo. Figura que caiu em desuso (mas que, na realidade é um bom expediente). - Hipoteca voluntária (687º) – o registo é condição de eficácia mesmo entre as partes. Não tem tanta importância como na hipoteca judicial ou legal, não é constitutivo, mas ainda assim é condição de eficácia entre as partes (existe, mas não produz efeitos enquanto não for registada). 4) Privilégios creditórios
Figura bastante complexa
Noção (733º): a lei prevê que certos credores, por causa da importância do seu crédito, tenham privilégios tais que o seu crédito passa por cima dos outros (ex: trabalhadores com salários em atraso – os trabalhadores têm um privilégio creditório a seu favor.
É uma garantia perigosa, porque os 3os não têm meio de saber se sobre os bens dessa pessoa (com quem contratam) incidem privilégios creditórios (na hipoteca podem consultar o registo; no penhor a pessoa não terá o bem).
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Os privilégios creditórios nascem de listas que a lei prevê (ver 736º; 739º; 740º; 741º; 742º; etc).
Julga-se que está a contar com o património de uma pessoa quando se contrata com ela, mas podem, sobre ele, haver privilégios creditórios que colocam o nosso crédito em segundo plano. Confronto entre privilégios creditórios versus hipotecas legais Semelhanças: - Base legal - Garantia atribuída em atenção à causa do crédito Diferenças: - Registo da hipoteca - O privilégio creditório, se não precisa de ser registado, abrange coisas móveis não registáveis também. - Força da garantia (751º - o privilégio creditório prevalece sobre a hipoteca, mesmo que esta seja anterior). O privilégio creditório é o papão de todos os credores que não o tenham. Exemplo: C1 (hipoteca sobre x) D
C2
X
O privilégio creditório do Estado, (a quem D deve o IRC) prevalece sobre a hipoteca de C1.
C3 Estado
Modalidades: - Privilégios mobiliários (bens móveis) ou imobiliários (bens imóveis) - Especiais (bens certos e determináveis) vs. Gerais (dizem respeito a todos os bens do devedor). - Mobiliários gerais: abrange todos os bens móveis do devedor. - Imobiliários gerais: antes não existiam, em princípio só os mobiliários é que seriam especiais e gerais. Os privilégios creditórios imobiliários seriam sempre especiais (isto porque os p.c. são uma desprotecção muito forte dos demais credores).
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Mas, por legislação avulsa, foram criados certos p.c. mobiliários e imobiliários gerais e especiais (revogação tácita do regime de CC, porque foi através de um DL). A intervenção do legislador em 1966: limitou os privilégios creditórios previstos no CC (artigo 8º nº1 do DL nº47344, de 25 de Novembro, 1966 + artigo 735º nº3 CC – redacção originária, em 2003 acrescentou-se estabelecidos neste código). Ou seja, só alterando o CC é que se poderiam criar privilégios creditórios imobiliários gerais. O legislador desrespeitou ambas as normas: criou privilégios creditórios gerais (desde 1983) e depois, alterou o CC (2003) só para não haver incongruências (porque a revogação tácita bastaria). Problema da eventual inconstitucionalidade dos privilégios creditórios gerais (mobiliários e imobiliários) que, por serem de tal maneira amplos que não são susceptíveis de serem conhecidos pelos restantes credores: Acórdãos do Tribunal Constitucional: - Nº363/2002 (dívidas à segurança social) - Nº 362/2002 (dívidas de IRS) – se o privilégio creditório geral passa por cima de outras garantias reais (ex: direito de retenção; hipoteca) é inconstitucional.
A redacção originária do artigo 751º não tinha o termo “especial” vs. 49º - Alterados pelo DL 38/2003
Os privilégios creditórios gerais não são verdadeiras garantias reais, porque não são oponíveis a terceiros, não há sequela. Só são verdadeiras garantias reais os privilégios creditórios especiais, que incidem sobre bens determinados. 5) Direito de retenção
Faculdade que tem o detentor da coisa de não a entregar a quem lha pode exigir, enquanto este não cumprir uma obrigação a que está adstrito para com ele.
Artigo 754º - o crédito resulta de: 1. Despesas feitas por causa da coisa. Exemplo: Pessoa que fica com o cavalo de outra e o animal come imenso. 2. Danos causados pela coisa.
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Exemplo: Cavalo estragou alguma coisa e enquanto o dono não lhe pagar a indemnização ele não devolve o animal.
Requisitos: 1. Que o titular detenha licitamente uma coisa que tem que deve entregar a outrem. 2. Que o titular seja simultaneamente credor daquele a quem deve a restituição da coisa. 3. Que entre os dois créditos haja uma relação de conexão funcional entre as duas obrigações definidas. 4. Que nasça de despesas feitas com a coisa (para a valorizar por exemplo) ou de danos por ela causados.
Casos especiais: Artigo 755º - Não é preciso que se verifiquem os requisitos gerais do artigo 754º. Não existe conexão objectiva entre os créditos. Ex: 755º nº1 alínea b – malas não fazem despesas nem causam danos no hotel. Mas existe comunhão de funcionalidade dos dois créditos. Ex: contrato de hospedagem. Ou são regimes especiais não podem ser aplicados por analogia Problema com a excepção de não cumprimento do contrato: - Semelhança: em ambos o titular do direito pode recusar a prestação, enquanto o credor não cumprir, por sua vez, aquela prestação a que está obrigado. Exemplo: X não entrega carro enquanto A não pagar a reparação. Neste caso, a entrega do carro é acessória da obrigação principal que é a reparação do carro. É em contrapartida da reparação que Y paga o dinheiro. E é portanto aí que está o sinalagma – a exceptio aplica-se em relações sinalagmáticas (428º). Diferenças: 1. Literal: o “A exceptio” aplica-se nas relações sinalagmáticas; o O direito de retenção pressupõe a existência de obrigações conexas mas não sinalagmáticas. Aqui, X pode invocar o direito de retenção porque a reparação é despesa realizada por causa da coisa (cabe no artigo 754º). 80
2. o O direito de retenção incide apenas sobre coisas; o A exceptio refere-se a obrigações de prestação de coisa ou de facto. 3. o O direito de retenção pode ser afastado mediante prestação de caução suficiente – 756º, alínea d. o A “exceptio” não pode ser afastada mediante prestação de garantias – 428º nº2. 4. Natureza jurídica: o Direito de retenção é garantia real – credor tem o direito de preferência sobre a coisa. o “Exceptio” – é apenas meio para conduzir a contraparte ao cumprimento – credor concorre em igualdade de circunstâncias. Direito de retenção: * Coisas imóveis ou móveis registadas não se exige registo porque o direito nasce directamente da lei. * 759º Nº2: direito de retenção prevalece sobre hipoteca ainda que anterior. * Conjugação do artigo 751º + 759º nº2: 1º Privilégio creditório especial (imobiliário) 2º Direito de retenção 3º Hipoteca 6) Penhora Insere-se na acção executiva Noção: consiste na apreensão judicial dos bens do devedor com o objectivo de, à custa desses bens serem pagos os credores exequentes. O direito de preferência sobre os demais credores – 822º (em relação aos bens objecto de penhora torna-se credor preferencial). Arresto
Preventivo: meio conservatório da garantia patrimonial. Artigo 622º: remete para os efeitos da penhora – 822º - também o arresto sendo decretado, 81
atribui direito de preferência a quem o requereu (também se torna garantia real). - A penhora e o arresto são garantias reais que se concretizam por via judicial. Capítulo VIII - Não Cumprimento das Obrigações Aspectos gerais •
Noção: situação objectiva de não realização da prestação = inadimplemento.
•
Ocorre quando a prestação não foi realizada nem pelo devedor, nem por terceiro, nem a obrigação se extinguiu por outras formas distintas do cumprimento (ex: prescrição).
Modalidades do não cumprimento: Quanto á causa: i.
Por causa não imputável ao devedor. - De facto de terceiro: que destruiu a coisa devida; - De circunstâncias de força maior: doença súbita e grave que impediu a actuação do artista no concerto em que havia de participar.
ii.
Por causa imputável ao devedor. Exemplo: Foi este quem vendeu a B o prédio que prometera vender a A; quem destruiu uma coisa que devia entregar.
iii.
Mora do credor. Exemplo: recusa cooperar, sendo a sua cooperação indispensável à realização da prestação.
Quanto aos efeitos: i.
Mora: Atraso ou retardamento no cumprimento da obrigação. A prestação não é executada no momento próprio, mas ainda é possível, por continuar a corresponder ao interesse do credor. A prestação ainda se mantém no essencial, a utilidade que tinha para ele. Exemplo: A devia entregar em Fevereiro 1000€ a B; ou restituir os livros que C lhe emprestou.
ii.
Incumprimento definitivo:
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Casos em que a prestação não tendo sido efectuada, já não é realizável no contexto da obrigação, por várias razoes: - Porque se tornou impossível - Porque o credor perdeu o direito à sua realização - Porque sendo ainda possível materialmente, perdeu o seu interesse para o credor Nota: o não cumprimento da obrigação pode contudo provir da impossibilidade da prestação (impossibilidade fortuita ou causal, imputável ao credor ou ao devedor) ou, da falta irreversível de cumprimento, em alguns casos equiparada por lei à impossibilidade (art.808º nº1). Exemplos: G deveria pintar a sala de F que, entretanto foi devorada por um incêndio; A deveria entregar a B um livro que entretanto se perdeu ou inutilizou.
iii.
Cumprimento defeituoso Exemplo: Um comerciante que cumpre oportunamente a obrigação, mas entregando géneros avariados ou produtos deteriorados.
Impossibilidade do cumprimento e mora não imputáveis ao devedor: Regime: artigo 790º a 795º - não são ainda RC (porque não é imputável ao devedor).
A regulamentação – mãe da matéria da RC obrigacional está nos artigos 798º a 812º.
Quando não é por culpa do devedor, “impossibilidade” e não incumprimento.
Estamos sempre a falar de impossibilidade superveniente (se originária, não seria um problema de não cumprimento, mas sim de invalidade do negócio jurídico).
chama-mos
Modalidades de impossibilidade superveniente • Impossibilidade objectiva: * Artigo 790;
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* Quando a prestação da coisa ou de facto se torna inteiramente impossível (por todos, ninguém pode efectuar a prestação = inviabilidade que respeita a todas as pessoas). Exemplo: Um relógio cai no chão, mas é reparável – a entrega do relógio não se torna inteiramente impossível. * Consequência: extinção da obrigação •
Impossibilidade subjectiva: * Artigo 791º * Só diz respeito ao sujeito (Ex: a pessoa que tinha de entregar o relógio fica doente). * Consequência: Geralmente não extingue a obrigação. Só extingue se no cumprimento o devedor não puder fazerse substituir por terceiro (art. 791º).
•
Impossibilidade temporária: * Não releva para extinguir a obrigação. * Mas pode tornar-se impossibilidade definitiva (art. 792º, nº 2).
•
Impossibilidade parcial: * Não exonera o devedor (aproxima-se de uma excepção – em sentido amplo - ao princípio da integralidade da prestação. Exemplo: Um dos 6 volumes do CC anotado de AV e PL estraga-se, o devedor continua a ter que entregar os outros 5. * Mas há o regime especial do art. 793º, nº 2
Consequências da situação de impossibilidade:
Quanto aos contratos bilaterais (como é o caso da Compra e venda; c.p.s) C.P.S. F D
C E O que é que é acontece à contraprestação? Artigo 795º nº1 – o credor fica desobrigado da contraprestação, ou seja, C não tem de pagar o dinheiro, ele tem o direito a recuar de acordo com o E s/c (se já tiver pago; se for mais favorável ao devedor). Porquê de acordo com o E s/c? Porque a causa é não imputável ao devedor (não se aplica a casos de imputabilidade ao devedor – nesses casos o devedor tem de pagar muito mais. + 796º Nº1: no contrato de compra e venda, se ignorássemos as regras da transferência do risco, em face de uma impossibilidade de entrega, o comprador não teria que pagar o 84
preço; com o 796º nº1, dá-nos a solução oposta (C paga o dinheiro e fica sem a coisa) --- prevalecem as regras do risco, porque são especiais em relação à regra do artigo 795º (regime geral dos contratos bilaterais). Nota: no c.p.s. não se aplica (não é susceptível de transferir o risco). Quanto aos “contratos bilaterais” – art. 795º • •
Solução do nº 1 Mas necessidade de conjugar com regras sobre transferência do risco de perda ou deterioração da coisa – art. 796º, nº 1 Conclusão i. ii.
Regime geral dos contratos bilaterais Regime especial dos contratos que constituem ou transmitem efeitos reais
Ou seja, temos o regime geral dos contratos bilaterais (795º) sobre qual vai prevalecer o regime especial dos contratos que constituem ou transmitem efeitos reais (796º nº1). Problema resultante de lacuna da lei: 795º nº2 é insuficiente (frustração do fim da prestação) – remete para as aulas práticas. Incumprimento definitivo e mora imputáveis ao devedor = responsabilidade Obrigacional Aspectos gerais e Pressupostos Quando é que se verifica uma situação de responsabilidade civil obrigacional? - Quando ocorre a violação de uma obrigação em sentido técnicojurídico (cujas fontes são contratos, negócios jurídicos unilaterais, gestão de negócios, E S/C, responsabilidade civil obrigacional. Tese específica do professor Menezes Cordeiro – tem uma posição discordante relativamente a estes pressupostos (“tese da fonte”) Na RC há uma influência do Direito Francês que faz com que haja uma presunção não só de culpa como também de ilicitude e de nexo de causalidade; assim, o credor só terá que provar o facto e o dano. Menezes Cordeiro diz também que o artigo 483º (sob influência do BGB) é muito mais avançada que o 798º (herdado do Código de Seabra = influência francesa) – o Prof. Menezes Cordeiro diz que no artigo 798º se presume a culpa, a ilicitude e o nexo causal – só precisa de provar o facto e o dano (para ter direito á indemnização). 85
Crítica da generalidade da doutrina: numa leitura actualizada do CC, deve-se considerar que o artigo 798º abrange os pressupostos do 483º (destruir isso através de uma interpretação historicista – seria eliminar esse património do 483º). Incumprimento imputável ao devedor (1) ≠ incumprimento não imputável ao devedor (2) Incumprimento imputável ao devedor É o próprio devedor que não realiza a prestação, culposamente (798º e segs).
Incumprimento não imputável ao devedor A prestação não é realizada por caso imputável ao terceiro, ao credor, etc (790º a 797º).
Incumprimento imputável ao devedor É o devedor que dá origem ao cumprimento da prestação; É o próprio devedor que, por acto culposo, não cumpre a prestação; Casos de prestação com prazo absolutamente fixo (que não é cumprido); Decorre o prazo previsto e a prestação não é realizada nem dentro do prazo, nem no prazo razoavelmente fixado pelo credor (808º); O próprio devedor declara, antes de o prazo terminar, que não vai cumprir a obrigação (é uma declaração antecipada de incumprimento) – discutível se é incumprimento ou não (o Prof. Antunes Varela diz que é incumprimento imputável ao devedor; o Prof. João Tiago Antunes diz que o máximo que se pode admitir é que haja uma situação de mora (tal como o Prof. Menezes de Leitão). Faculdades do credor : 1) indemnização – 801º nº1 2) resolução – 801º nº2 3) commudum de representação Consequência: Indemnizar os prejuízos causados ao credor (seja incumprimento definitivo ou falta de cumprimento – 798º).
Que indemnização é esta? Qual o dano indemnizável?
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* Abrange quer o dano emergente, quer o lucro cessante (564º) e também os danos futuros (desde que sejam previsíveis). * É controvertido: será pelo interesse contratual positivo (visa colocar o credor na situação em que se encontraria se não se tivesse verificado o facto ilícito) ou pelo interesse contratual negativo (visa colocar o credor na situação em que se encontraria se não tivesse confiado ma celebração do contrato)? - interesse contratual positivo : ind. Das vantagens que o credor obteria se o negocio tivesse sido cumprido . - interesse contratual negativo : situação em que estaria se não tivesse realizado o contrato . Professor Antunes Varela e Almeida Costa (tese clássica): - O credor pode pedir indemnização pelo interesse contratual positivo ou pode resolver o contrato (colocando-se na situação em que se encontraria se não se tivesse celebrado, exigindo a restituição de tudo o que tiver dado) + indemnização pelos prejuízos causados (801º nº1), que acaba por ser pelo interesse contratual negativo. Argumentos : 4) destruir a resolução , leva a destruir retroactivamente os efeitos do contrato , logo não faz sentido que a indemnização continue a abranger os efeitos da não realização . 5) dto á resolução só nos contratos sinalagmáticos , logo tem que existir um nexo de reciprocidade . coerente com a reciprocidade é o regime do 801º nº2 , em que se permite cumular a indemnização por interesse cont. positivo + resolução , destruindo-se nexo de reciprocidade 6) 858º + 908º estabelecem que no cump defeituoso há clara distinção entre interesse contratual positivo e negativo . Versus Professor Baptista Machado e Vaz Serra - Veio dizer que essa indemnização pode ser pedida com fundamento no interesse contratual positivo - 801º nº2 criticam que no 801º nº2 , a letra refere-se á resolução , mas em rigor não é a verdadeira resolução do 432º . contestam o carácter retroactivo . em alternativa , o credor tem 2 hipóteses : 1. 801º nº1 – grande indemnização + sem contraprestação 2. 801º nº2 – pequena indemnização + contraprestação , porque no valor da indemnização devida descontaria o valor da contraprestação. Argumentos : 802º - regime da impossibilidade parcial – parece resultar a consequência de que o credor pode cumular indemnização por interesse contratual positivo + resolução . 87
Versus Tese intermédia Há que distinguir consoante o credor já tenha ou não realizado a contraprestação . Se já tiver realizado , então se o credor quer resolver apenas pode beneficiar do regime da resolução + ind. Por interesse cont. negativo Se não tiver realizado , pode optar por ind. Por interesse cont. positivo , mas receber indemnização menor descontando o valor da contraprestação. Exemplo : A e B celebram troca . A obrigado a entregar piano de 5.000 euros em troca de vaso de 6.000 euros . piano é entregue , mas o vaso é destruído por causa imputável ao devedor = impossibilidade de cumprimento por causa imputável ao devedor . Situação do credor A ? 1) exigir indemnização – 801º nº1 ( a tal grande ind.) + contraprestação 2) resolver contrato (se já entregou , tem direito á restituição) + indemnização. Por interesse cont. positivo + 1.000 euros . pela tese do prof. AV - recebe piano , mas não recebe os 1.000 euros . commudum de representação : (3ª faculdade do credor ) 794º - concede ao credor a possibilidade de exigir a prestação ou substituir-se 803º - extensível ao 794º - se o credor fizer valer este dto a indemnização será reduzida na medida correspondente ao commudum de representação . - se opta por este regime , já não pode resolver Pressupostos (Art. 798º) •
Mas devem considerar-se os pressupostos gerais da responsabilidade civil (483º): 1. Facto 2. Ilicitude
1.2. Incumprimento + relação de desconformidade da conduta devida com o comportamento realizado pelo devedor. Mas há causas de justificação da ilicitude? Cumprimento de um dever (ex: penhor de créditos: o devedor (684º e 685º) tem o direito de não pagar o crédito ao credor que empenhou o crédito, tendo o dever de pagar ao credor pignoratício.
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Exercício de um direito: - Excepção de não cumprimento (428º e segs) – está restrita aos contratos bilaterais, sinalagmático. O devedor pode recusar legitimamente a prestação (seja de facto, seja de coisa), desde que haja uma conexão funcional entre as prestações).
Direito de retenção (754º e segs.) – funciona entre nós, como uma garantia real (uma causa legítima de preferência – 604º nº2; porque no 758º o legislador compara-se ao penhor (se for por coisas móveis) e à hipoteca (se for por coisa imóvel) como uma causa lícita de incumprimento da obrigação, como um mecanismo compulsório (visa compelir o devedor a cumprir a obrigação). Questão 1: o direito de retenção abrange as coisas do proprietário (antes que a contraparte efectue a prestação)? Já que é uma forma de compelir o devedor poderia dizer-se que sim. O professor Júlio Gomes e o professor Pedro Romano Martinez dizem que sim. Questão 2: E abrange as coisas de 3º? A doutrina diz que sim, desde que o 3º tenha estado envolvido na origem do incumprimento. Três requisitos para que o direito de retenção seja accionado (Antunes Varela): 1. Licitude na retenção da coisa 2. Reciprocidade de créditos 3. Especial conexão substancial entre a coisa retida e o crédito do autor da retenção Direito de retenção versus exceptio: Na exceptio, a obrigação pode ser de prestação de facto ou coisa versus a retenção só pode ter como objecto uma coisa. A exceptio pressupõe que entre as duas obrigações exista uma relação genética (aquele nexo de sinalagma) versus direito de retenção (não se exige o sinalagma, mas exige-se uma conexão especial (754º). 3. Culpa - Professor Antunes Varela: é possível apontar ao incumprimento um juízo de reprovação ou censura, que assenta no reconhecimento no caso concreto, perante as circunstâncias do caso concreto, de que o obrigado podia e devia ter agido de outro modo.
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A culpa do devedor pode revestir duas formas: dolo ou negligência: * Dolo: - Directo: se o devedor visar intencionalmente o incumprimento. Ex: taxista recusa-se a levar alguém – quem já tinha contratado. - Necessário: o devedor não quer o incumprimento; mas tem consciência que o incumprimento será consequência necessária da sua conduta. Ex: taxista aceita transportar duas pessoas à mesma hora. Eventual: o devedor configura o incumprimento como consequência possível da sua conduta (é do género “que se lixe! Se acontecer, aconteceu”). Versus Negligência: * Consciente: o devedor representa a possibilidade de ocorrência do incumprimento, mas actua sem se conformar com essa possibilidade. Ex: caso do taxista, que apesar de partir tarde, está convencido de chegar a horas. * Inconsciente: o devedor nem sequer prevê a hipótese de incumprimento. Ex: taxista esquece-se de ir buscar uma pessoa.
Esta distinção tem importância prática, a nível das consequências do regime aplicável: 853º nº1 alínea a; 956º; 957º; 1134º; 1151º, etc.
Artigo 1681º alínea a: se o marido ou a mulher administrarem os bens um do outro (no tempo dos dotes) e se a administração for ruinosa, só se tiver havido dolo é que responde.
Artigo 814º nº1: também exige o dolo na mora do credor.
Artigo 815º nº1: exige dolo do devedor.
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Questão do artigo 494º: aplica-se à RCC (Menezes Leitão) versus não se aplica à RCC (Antunes Varela).
- Não há culpa do devedor se o incumprimento for imputável ao 3º, credor ou situação de força maior ou caso fortuito. - A culpa não tem de ser provada pelo credor – 799º: presunção de culpa do devedor. - Como é que se aprecia a culpa? Em abstracto – tendo por referência a diligência típica de um “bom pai de família”. - Se forem obrigações de meios (em que o devedor assume uma determinada actuação para atingir um determinado fim. Exemplo: Obrigações que um médico ou advogado assumem – não prometem curar ou ganhar a acção; tem de se provar o incumprimento (a perda ou a acção) e a falta de diligência exigível. - A doutrina distingue a culpa grave de culpa leve: * só são proibidas cláusulas que exonerem a responsabilidade nos casos de culpa grave (artigo 18º alínea d das CCG) – culpa grave: a desconformidade só se unificaria numa pessoa com pouquíssima diligência (o comum dos mortais nunca incorreria) versus culpa leve (só uma pessoa absolutamente excepcional é que não incorreria). 4. Dano
Só há RC se houver dano;
[?] Devem ou não ser indemnizáveis os danos morais? Dano – especificidade AV – na responsabilidade obrigacional, os danos não patrimoniais não seriam indemnizáveis. Tese afastada pela doutrina hoje em dia, o legislador prevê esta possibilidade.
5. Nexo de causalidade entre o facto e o dano (563º)
Teoria da causalidade adequada (facto ilícito tem de ser causa + causa adequada à produção do dano).
Artigo 807º - risco + RCC = prescinde do juízo de causalidade adequada. Exemplo: Caso de incêndio; ou de coisa que vai de comboio e o comboio sofre um acidente.
Responsabilidade pelos actos dos auxiliares: Artigo 800º nº1 - Auxiliares do cumprimento: nesta hipótese haverá responsabilização do devedor, mas para que este seja responsável não é exigível que, ele tenha culpa na escolha das pessoas que o 91
representam ou dos seus auxiliares, existe mesmo que ele não tenha culpa. Mas, só responde se os actos praticados pelos auxiliares forem actos culposos, se o incumprimento do auxiliar ou representante for culposo, caso contrário nã o responde – sob pena de se entrar no regime da responsabilidade objectivo. i) Dependentes ii) Não dependentes Confronto com o artigo 500º: * Difere porque o artigo 800 não exige nenhuma relação de dependência o subordinação entre o devedor e o auxiliar – mesmo que não exista esta relação, o devedor é responsável. Se for contratado uma empresa para o tratamento de um doente, a empresa respondera pelos danos causados pelo médico ao doente, mesmo que não exista contrato de trabalho. * Nº2 do artigo 800º - nos termos deste nº2 a responsabilidade do devedor pode ser convencionalmente excluída ou limitada mediante acordo prévio, senão violar normas que consagram deveres de ordem pública. Entende a doutrina que essas normas serão normas que tutelam a integridade física ou moral do credor ou das suas relações familiares. Atenção que esta limitação da responsabilidade, respeita apenas à exclusão por facto danoso provocado pelo representante ou auxiliar do devedor, não por ele mesmo. Artigo 809º - específico para actos do devedor. O professor Almeida Costa pressupõe uma interpretação restritiva deste nº2: os auxiliares de cumprimento do devedor podem ser auxiliares dependentes do mesmo ou independentes; interpreta este nº2 as convenções de exclusão ou limitação…só seriam admissíveis se se tratasse de auxiliares não dependentes, tratando-se de auxiliares dependentes, a convenção de exclusão (etc) por actos de auxiliares dependentes só será admissível por acto do auxiliar praticados por culpa leve (nos termos dos actos praticados pelo próprio devedor). Violação do cumprimento : 1) mora 2) incumprimento definitivo 3) cumprimento defeituoso (=violação positiva do contrato) 1) Mora do devedor (804º e seguintes) Noção: nº2 do artigo 804. Interpretando a noção: - Existe mora quando se verifique um atraso no cumprimento da obrigação, ou seja, esse atraso tem que ser ilícito e culposo. Não basta qualquer atraso. E 92
presume-se a culpa do devedor nesse atraso – aplicável a presunção do art. 799º CC. Tem que ser ilícito: pode suceder que exista justificação para o atraso, excluindo-se assim a ilicitude e não sendo aplicável este receito. Por exemplo não cumpre por aplicação do 428º - artigo de excepção ao cumprimento do contrato, logo não é ilícito não se aplica o regime da mora. - Não é qualquer atraso ilícito e culposo, é necessário que havendo atraso, continue a ser possível a realização da prestação, na verdade pode suceder que não realizada no tempo devido, esta se torne impossível de realizar e aqui aplicasse não a mora do devedor mas a impossibilidade de cumprimento imutável ao devedor (801º e seguintes). - É ainda necessário que o credor mantenha objectivamente o interesse na realização da prestação: se o atraso implicar para o credor a perda objectiva do interesse da realização da mesma. Ex: A contrata B para a realização de uma conferência e B atrasa-se de tal forma que quando chega a conferência esta no limite do horário definido = havia um prazo essencial que não foi cumprido (aplicando-se o regime do incumprimento definitivo). - Para que o devedor entre em mora a prestação tem que se ter tornado certa, exigível e líquida. Com as seguintes nuances: certa (pode acontecer que não seja ainda certa no momento em que o devedor deve cumprir e se atrasa, porque a determinação cabia ao devedor e este não procedeu à sua determinação = mora); exigibilidade (em regra não entra em mora devedor que não cumpre obrigação inexigível, há excepção do artigo 805º nº2 alínea C). Em regra exige-se que seja líquida (que não está ainda apurado o montante da prestação devida) tudo havia, se a falta de liquidez for imputável ao devedor haverá mora (excepção); se se tratar de responsabilidade civil por facto ilícito ou pelo risco, o devedor constitui-se em mora desde a citação (805º nº3 CC). 2º Problema: em que momento e que o devedor entra em mora? Artigo 805ºnº1 e 2. A regra consta do nº1, e a solução quanto ao momento depende da natureza da obrigação quanto ao tempo do seu vencimento (remete para matéria do prazo da prestação). A regra que vigora nesta matéria é o artigo 777º nº1 CC. Nas obrigações puras quando é que o devedor entra em mora? Nº1 do artigo 805º - entra em mora a partir da interpelação para o cumprimento. Nº2 do 805º - excepção a esta regra: Alínea a – obrigações com prazo certo = dispensase a interpelação. Se o prazo for incerto (ainda não foi determinado) haverá necessidade de interpelação. Sendo a prazo
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certo o devedor esta imediatamente constituído em mora desde o momento de verificação do prazo. Obrigação com prazo certo: é necessário distinguir as obrigações que pressupõem a participação do credor – devem ser realizadas no domicílio do devedor, o credor tem que se dirigir ate lá. O devedor não realizou porque o credor não compareceu a casa do devedor, o credor não colaborou não há mora. Mas se fosse ao contrário, ele entra em mora nesse mesmo dia, independentemente de interpelação. Alínea b – conciliação desta aliena com o nº3 do mesmo artigo (matéria das aulas praticas) C – solução justa para que o devedor não resulte beneficiado com o seu próprio facto ilícito. Para além destas hipóteses, certa doutrina (Galvão Telles, Almeida costa) acrescentam uma outra hipótese: aquela situação em que o devedor declare peremptoriamente a sua intenção de não cumprir, entra em mora sendo dispensável a interpelação do credor. O prof AV diz que nem a mora, há desde logo incumprimento definitivo.
Efeitos jurídicos que decorrem da mora do devedor: A) Obrigação de reparação de danos (804º nº1) – esta obrigação de reparação é uma obrigação que coexiste com o dever de o devedor realizar a prestação devida, uma vez que ainda existe simples mora e a prestação ainda é possível, subsistindo a obrigação. Se o devedor estava obrigada a restituir 100 € no dia 1, no dia 2 esta ainda obrigado a entrar a quantia mais reparação dos danos causados pelo devedor. Pressupostos da obrigação de indemnizar – pelos danos resultantes da mora nos termos da responsabilidade obrigacional. Caberá ao credor provar que teve danos com o atraso da mesma – mas esta regra comporta importantes excepções no domínio das obrigações pecuniárias – artigo 806º CC: o Nº1: presunção de que os danos existem. Está o credor dispensado de provar que sofreu danos. Há uma dispensa da prova da verificação do dano. o O legislador presume também qual é o montante da prestação devida. o 1146º CC – limite máximo da convenção
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o Nº3: em regra o credor da obrigação pecuniária não pode provar que sofreu dano mais elevado que o legal ou convencionado para fim indemnizatório. Mas nestas hipóteses deste número pode provar. B) Inversão ou agravamento do risco de perda ou deterioração da coisa – artigo 807º. C) Transformação da mora em incumprimento definitivo (801º e seguintes do CC). ARTIGO 808º - Quando? Nº1. Quais os requisitos? Terá de tratar-se de uma perda objectiva e imediata do interesse na prestação. 2) Incumprimento definitivo / impossibilidade da prestação Regime: artigo 801º a 803 – aplica-se analogicamente às demais situações de incumprimento definitivo. b) Obrigação de indemnizar: Artigo 801º nº1 CC incumprimento por causa imputável ao devedor. A indemnização a que se reporta o nº1 é pelo interesse do cumprimento. Mas também artigo 798º - se a prestação ainda é possível. c) Direito de resolução do contrato bilateral: - 801º Nº2 – condição resolutiva tácita) se o contrato for bilateral (direito de resolução + exoneração/ reaver a prestação + direito de indemnização). * Qual a natureza jurídica da indemnização? C) Cómodo de representação: * Artigo 803º - aplica-se o disposto no 794º, com redução no montante da indemnização que tenha recebido. 3) Cumprimento defeituoso: Traços genéricos: terceira forma de violação do dever de prestar – o cumprimento defeituoso: “Violação positiva do contrato” (também assim conhecido)
Principais problemas desta temática: 1. Distinguir o verdadeiro e próprio comportamento defeituoso 2. Qual o seu regime jurídico
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O legislador não falou de incumprimento defeituoso na parte geral, porque é difícil estabelecer regras gerais de cumprimento defeituoso – assim, o legislador definiu isso na parte especial e em legislação avulsa e referiu vagamente o 799º nº1. 1.
Quando a prestação devida tiver sido realizada (uma acção de cumprimento); mas em desconformidade com o conteúdo do dever (o credor não viu adequadamente satisfeito o seu interesse); o credor aceitou a prestação (pretendendo reagir à prestação que foi realizada, nota: se se conformou com o defeito não podemos aplicar este artigo – haverá dação em cumprimento). Se não se conformar com o defeito = cumprimento defeituoso.
Pressupostos de aplicação : - prestação diversa da do conteúdo do dever - defeitos na prestação - credor aceita prestação pretendendo reagir Exemplo : A contrata B para por telhado e aquilo fica mal e entra agua - fim da prestação não é realizado - sofre danos resultantes da prestação - ração estragada pela agua : danos da prestação + danos por morte dos animais desvalorização da prestação danos distintos da prestação 2. regime art. 799º nº1 – ónus da prova do devedor Arts 913º e segs – C/V de coisas defeituosas; Art. 905º e seguintes + DL 67/03 84/ 08 – regime do cump defeituoso na venda de bens de consumo DL 67/2006: transposto para a ordem jurídica por imposição de uma directiva comunitária – mal feito, porque dá a sensação que sempre que se trate de um bem de consumo se vai aplicar este diploma avulso (sem se olhar para o CC). Outros países inseriram o diploma no CC. Na prática, é este diploma o principal regime jurídico de CV de coisas defeituosas (67/2006 + 84/2008) – aplicase mais do que o CC embora só na CV). Doutrina tenta arranjar um regime geral a) 799º - presunção de culpa aplica-se ao cumprimento defeituoso 96
b) Os danos sejam de frustração das utilidades causados pela prestação ou danos exteriores ( frustração = incump definitivo ou resolução) --- credor tem dto : Reparação ou eliminação dos defeitos – 914º Nova prestação Resolução ( danos exteriores = ex. frigorifico incendeia cozinha) --- credor tem dto : Nova prestação + indemnização por danos ( cumulável) Sanção pecuniária compulsória • Influência do direito francês •
No Direito Português: a prisão com uma vertente compulsória deixou de existir em Portugal, também a aplicação de prisão a casos de incumprimento da obrigação de alimentos não tem hoje carácter compulsório. Contudo o artigo 829-A do CC consagra providências compulsórias de natureza pecuniária.
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Âmbito de aplicação (art. 829º-A, nº 1): –
Obrigações de facto (positivo ou negativo)
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Não fungíveis
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Em que não se exigem especiais qualidades científicas ou artísticas [?] Conclui-se deste preceito que o legislador admite este instituo em termos muito limitados: 1) Só pode funcionar em obrigações de prestação de facto positivo ou negativo e desde que o cumprimento dessas não exija especiais qualidades cientificas ou artísticas do devedor; 2) O tribunal está impedido de agir oficiosamente enquanto a imposição da providência depende de um pedido do credor; 3) A sanção pecuniária pode referir-se a cada dia de atraso no cumprimento ou a cada infracção, consoante as circunstâncias da hipótese concreta aconselhem.
•
Fixação do destino da sanção – nºs 2 e 3. Daqui se retiram várias conclusões: 1) A indemnização pelo incumprimento não se confunde com a sanção pecuniária compulsória;
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2) Esta última providência, embora fixada pelo tribunal de acordo com critérios de razoabilidade, uma vez cominada, torna-se definitiva, isto é, insusceptível de revisão oficiosa ou a requerimento das partes. 3) A quantia liquidada reverte, em montantes iguais, para o credor e para o Estado. A existência e subsistência da sanção pecuniária compulsória pressupõe a viabilidade do cumprimento da obrigação a que se reporta e, a culpa do devedor. Justifica-se portanto que o mesmo a afaste, mostrando que o cumprimento já não se torna possível ou que o incumprimento não lhe é imputável. Nº4 – imposição legal. Realização coactiva da prestação Se a obrigação depois de vencida, não é voluntariamente cumprida, dá a lei ao credor o poder de, consoante os casos, exigir judicialmente o cumprimento ou executar o património do devedor. Este direito de requerer a intervenção dos tribunais é a compensação natural da proibição imposta ao credor lesado de arrancar ele, por suas próprias mãos, mediante o emprego da força, a prestação que o obrigado lhe deve. É a proibição da auto-defesa (artigo 1º CPC) + artigo 2º CPC No que diz respeito aos direitos de crédito, o credor pode socorrer-se perante os órgãos judiciários através da acção de cumprimento e da acção de execução (artigo 817º). Funções: - Acção de cumprimento: destinada a obter a declaração da existência e da violação do direito e a intimação solene, emanada do tribunal. - Acção de executiva: normalmente chamada de execução. Se o credor já dispõe de uma sentença ou de outro documento que ateste com grande probabilidade a existência do direito alegado, ele pode requerer a acção executiva (449º nº2 alínea C CPC). Se porem não possui documento que indicie com o grau de probabilidade exigido na lei processual (45º nº1 CPC) a existência do direito de crédito, ele tem que recorrer à acção de crédito para obter a declaração oficial da existência e violação do direito e a intimação solene dirigida ao devedor para que cumpra. Na acção de cumprimento: A decisão favorável obtida pelo credor, que reconheça a possibilidade da prestação, constitui uma intimação ao cumprimento, um apelo forte, solene, á realização coactiva da prestação.
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Se o devedor condenado acatar a decisão, poderá ainda dizerse que ele cumpre a obrigação, na medida em que existe realização voluntaria (mesmo que forçada) da prestação devida. Por outro lado, se o devedor não acatar, o credor recorre á acção executiva, o tribunal cita o executado a pagar (811º nº1) ou nomear bens à penhora, ou para fazer entrega da coisa (928º nº1) e o citado, obedecendo ao derradeiro apelo da justiça, realiza voluntariamente a prestação em falta.
Se a prestação devida se torna impossível por facto imputável ao devedor e o credor lesado vai a juízo requerer a indemnização a quem tem direito; Se o devedor citado para pagar ou entregar a coisa devida na execução para pagamento de quantia certa, não acata a citação e o credor prossegue com a execução para satisfação, à custa de bens do devedor relapso, da indemnização a que faz jus; Se o devedor da prestação de facto se recusa a cumprir e o credor ingressa em juízo com a acção executiva destinada a obter, ou a reparação do facto fungível por terceiro à custa do executando ou a indemnização que lhe compete (933º nº1 CC) o processamento da extinção da relação de credito opera-se de modo diferente, já não há realização coactiva da prestação devida; já não há cumprimento (coercivo, forçado) da obrigação, o que houve sob o prisma do direito substantivo, foi a substituição do direito à prestação principal, pelo direito á indemnização. * Direito à indemnização: a que corresponde um dever de prestar que não é mais do que um dever secundário de prestação, inteiramente distinto do direito á prestação principal, mas que se insere na mesma relação de crédito, no mesmo direito complexo de obrigação.
Noção de execução por equivalente: dá-se este nome à realização coactiva do acima referido direito secundário, à indemnização, que a lei substantiva confere ao credor sempre que a prestação principal se torna impossível – nome dado pelos processualistas. Dá-se este nome para justificar que a acção judicial já não visa a realização coactiva da prestação principal, mas sim a obtenção da vantagem ou atribuição patrimonial que como seu equivalente económico – jurídico, a lei substantiva coloca ao alcance do credor. Configuração que se coloca ao lado da acção de cumprimento, da realização forçada da prestação e da execução por equivalente, assume a chamada execução específica. - A execução específica tem em comum com a acção de cumprimento o facto de proporcionar ao credor a obtenção devida, mas distingue-se pelo facto de a prestação ser realizada pelo tribunal, que apreende a coisa devida e a entrega ao
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credor, que substitui o promitente faltoso na emissão da declaração da vontade prometida. Imaginando que o devedor não cumpre a determinação contida na sentença ou na citação para a acção executiva e não sendo possível a execução específica, há que recorrer à execução por equivalente, caso o credor persistir na realização coactiva da prestação?! Funciona então a garantia geral da obrigação segundo a qual pelo cumprimento da obrigação respondem todos os bens do devedor susceptíveis de penhora (601º) – é através destes bens que o credor obtém através do tribunal, a soma necessária, correspondente à indemnização dos danos que a falta de cumprimento lhe causou. Nota: a execução dos bens tem limites: - Não pode atingir os bens indispensáveis ao seu sustento e do seu agregado familiar; - Há também que salvaguardar os direitos dos demais credores - Pode bem suceder que a indemnização devida ao credor não obrigue a sacrificar todos os bens do obrigado (o processo de selecção judicial começa por uma selecção das coisas realmente necessárias à obtenção da indemnização). Esta selecção é feita através do acto de penhora, que confere ao credor o direito de ser pago com preferência em relação a qualquer credor que não tenha garantia anterior. [?] A concessão deste direito é uma questão de grande controvérsia na doutrina, mas para o professor Antunes Varela, parece fazer sentido se tivermos em conta a natureza singular que hoje, reveste a acção de execução (art.865º CPC). Acto da penhora: - Os bens são colocados à ordem do tribunal para, posteriormente serem vendidos (venda judicial), esta venda pretende a necessária obtenção, à custa do devedor (que é proprietário dos mesmos bens), da quantia necessária à indemnização do prejuízo causado ao credor pelo não cumprimento da obrigação. - Nesta venda judicial há um afastamento do direito de propriedade (art. 62º CRP) autorizado e previsto pela própria lei. Mora do credor
Noção: há mora do credor sempre que a obrigação na foi cumprida no momento próprio, porque o credor, sem causa justificativa, recusou a prestação que lhe foi regularmente
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oferecida ou não realizou os actos de cooperação de sua parte necessários ao cumprimento. Nota: Nem sempre a colaboração do credor se reduz ao acto de recepção da prestação, há casos em que se exige mais do que isso, por exemplo: ao credor incumbe procurar ou mandar buscar a prestação ao domicílio do devedor; no contrato de transporte por exemplo, em que a prestação de uma das partes está ou pode estar dependente do fornecimento de certos meios ou de instruções a cargo da outra parte.
Requisitos (artigo 813º CC
Não basta para haver mora que o credor se recuse a receber a prestação oferecida ou omita os actos que deveria praticar. A recusa pode acontecer, caso seja justificada, que é o que acontece quando o devedor pretende, por exemplo: entregar coisa diversa da devida; coisa de qualidade inferior à escolhida; pode a omissão ser devida a caso de força maior (doença grave e inesperada do credor) ou até a facto do devedor, culposo ou não culposo (o credor não foi receber a prestação, por ter sido atropelado pelo devedor).
Não se exige culpa do credor – a exigência de culpa neste caso pressuporia que o credor fosse obrigado a aceitar a prestação, o que não é inteiramente verdadeiro, uma vez que é unânime na doutrina que o credor não tem qualquer dever de aceitar a prestação mas sim um ónus, sendo que deve-se ressalvar-se neste sentido os casos em que pela convenção das partes, se verifique que a prestação foi estipulada também no interesse do devedor (ex: artista contratado para participar num espectáculo de renome, que também interessa à sua propaganda artística. Dai que se tenha definido como requisito a falta de requisito justificado, é o caso do senhorio se recusar a receber a renda; o do querer injustificadamente uma renda de montante superior; o do industrial que não levanta os produtos na data em que se comprometera a fazê-lo.
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Natureza – Mora do credor não constitui acto ilícito – Credor tem o ónus e não o dever de aceitar a prestação
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Figuras próximas da mora do credor (Antunes Varela): - Não se confunde com as situações em que a falta da colaboração necessária do credor, produz a desoneração definitiva do devedor, porque este se obrigou, por exemplo, a oferecer a prestação em determinado momento (prazo absolutamente fixo) e a ofereceu num
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momento oportuno, sendo o credor (por facto a ele imputável) quem a não a recebeu. Exemplo: é o caso do indivíduo que adquire o bilhete para assistir à competição desportiva, ao recital artístico, á representação teatral e falta ao espectáculo (porque não quis ou não pôde assistir); pessoa que se inscreve num cruzeiro, paga a inscrição, mas falta à partida do barco. Aqui, não se trata de casos de impossibilidade da prestação, porque a possibilidade da prestação, em si mesma considerada, acaba muitas vezes por se manter; o que há é a perda do direito pelo seu não exercício no tempo oportuno ou por facto compreendido na zona de risco imputável ao credor. Apesar disso, aplica-se aqui analogicamente os artigos 795º nº2 e 815º nº 2 (suponha-se por exemplo que a empresa organizadora do cruzeiro, avisada à última hora da impossibilidade de participação do inscrito, ainda consegue vender o lugar dele, embora por preço inferior) e o artigo 1227º.
Efeitos: Nota: existe uma diferença fundamental entre o regime dos obstáculos levantados à realização da prestação, no caso de mora do credor, e o regime das circunstâncias que tornam impossível a prestação por causa imputável ao devedor. No último caso o devedor, ele fica exonerado nos termos do artigo 790º nº1 e 795º nº2; no primeiro, o devedor continua vinculado à prestação. –
Atenuação da responsabilidade do devedor – art. 814º, nº 2: Quando o credor entra em mora, o devedor (convertido num depositário forçado do objecto da prestação devida) responde apenas pela guarda e conservação da coisa, pelos danos provenientes do seu dolo; quanto aos demais, cessa imediatamente a sua responsabilidade (a menos que procedam de culpa sua). Quanto aos frutos da coisa: terá que restituir só os frutos percebidos, não os percipiendos (os que ele mesmo, ou um proprietário diligente, poderia ter obtido (1271º). As próprias somas devidas (obrigações pecuniárias) deixam de vencer juros (convencionados ou legais) sem que ao credor aproveite sequer o facto de eles vencerem a favor do devedor.
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Inversão ou agravamento do risco de perda ou deterioração da coisa – art. 815º: A mora do credor agrava ainda de modo especial a posição do credor em matéria de risco pela impossibilidade superveniente da prestação quer esta provenha de causa acidental quer de facto de terceiro. O risco passa a correr por conta do credor, ou seja, terá que indemnizar as despesas infrutíferas que o devedor tenha efectuado com os preparativos da prestação e, não ficará desonerado da contraprestação, mesmo que se perca parcial ou totalmente o seu crédito. Logo, se após a mora do credor, o devedor de prestação não fungível se impossibilitar de cumprir por causa que não lhe é imputável, não perderá o direito à contraprestação – sendo que aqui se verificam duas limitações: o 1ª: se o devedor obtiver alguma vantagem, com a extinção da obrigação, o benefício será descontado no valor da contraprestação a que o credor continua vinculado (815º nº2); Exemplo: Depois da mora do credor, a empreitada que ele adjudicara na sua casa ao pedreiro A tornou-se impossível, porque o edifício ardeu entretanto. Na contraprestação prometida por B (dono da casa) haverá que deduzir não apenas o custo dos materiais que A houvesse de adquirir para cumprir a empreitada (1229º), mas também o lucro por ele obtido em outra obra cuja execução não teria sido possível sem a falta da primeira. o 2ª: Se a prestação impossibilitada for divisível, a contraprestação a que o credor fica adstrito terá apenas o valor correspondente à parte dessa prestação, cuja impossibilidade esteja ainda causalmente ligada à mora de credor. Exemplo: O pintor encarregado de efectuar o retrato de A incapacitou-se, depois de o credor incorrer em mora, mas numa altura em que, sem o acidente havido, aquele teria realizado duas apenas das dez sessões previstas para a execução do trabalho. O credor fica vinculado à contraprestação correspondente a estas duas sessões.
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Obrigação de indemnizar devedor (limitadamente) – art. 816º:
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O credor fica obrigado a indemnizar o devedor pelas maiores despesas que este fez com o oferecimento infrutífero da prestação e com guarda e conservação do respectivo objecto. Baseada na ideia: a prestação do devedor não deve tornar-se mais gravosa por facto imputável à contraparte = evitar que a prestação debitória se torne mais gravosa para o obrigado por acto do credor. Não se visa aqui a reparação dos danos que o devedor haja sofrido à mercê de qualquer conduta ilícita do credor. Exemplo: o devedor de Coimbra que se comprometera a entregar a mercadoria no Porto, teve de custear a viagem de retorno dessa mercadoria, com que não contou, perante a recusa do credor em aceitar a prestação. Nestes termos, o mesmo devedor, terá sido forçado (contra as suas expectativas) a guardar e conservar o objecto da prestação recusada, suportando os respectivos encargos de armazenamento, se o fizer enquanto devedor e não como gestor de negócios. São estas despesas, causadas pela injustificada atitude do credor que o artigo 816º manda indemnizar. Despesas a cargo do credor (exemplos): prémios do seguro pagos sobre a coisa durante o período da mora; o sustento dos animais; a armazenagem de mercadorias; as despesas com pessoal de carga, descarga ou vigilância e outros encargos da mesma natureza. Âmbito do artigo 816º: - Concretiza o círculo dos danos provocados pela falta de cooperação do credor, que este é obrigado a compensar, excluindo de forma implícita outros danos que o devedor haja sofrido. - O que é que está dentro do círculo de encargos a compensar? As despesas a mais que, o devedor tenha feito, não apenas com o oferecimento infrutífero da prestação, mas também, com o oferecimento da prestação a tempo oportuno, quando esta se tenha tornado mais dispendiosa para o devedor por falta de adequada cooperação do credor – exemplo: o credor não forneceu quando devia a matéria – prima ou nas instruções necessárias ao fabrico, o que obrigou o dono da fábrica a gastar mais do que o custo
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normal (em exemplo).
horas
extraordinárias
por
Apesar de não se tratar em bom rigor de um caso de mora (se a encomenda for entregue dentro do prazo previsto), o artigo 816º autoriza por analogia que, se obrigue o credor a indemnizar o acréscimo de encargos que o devedor teve de suportar com a prestação. –
Possibilidade de consignação em depósito da prestação – art. 841º, nº 1, b)
Fixação contratual dos direitos do credor
Toda a área das obrigações está em princípio coberta pelo princípio da liberdade contratual, as partes gozam desta liberdade dentro dos limites ético-jurídicos estabelecidos por lei para celebrarem os contratos que, melhor prossigam os seus interesses e para darem às obrigações que deles resultem, o conteúdo que melhor satisfaça as necessidades delas. Podendo também modificar ou extinguir os mesmos de mútuo acordo, bem como, as cláusulas inscritas nos mesmos e as obrigações dele decorrentes. Contudo, não gozam de igual liberdade no que respeita ao capítulo do não cumprimento das obrigações, quer se trate de falta definitiva do cumprimento, quer se trate de mora do devedor ou cumprimento defeituoso da obrigação. Neste caso, enquanto as obrigações se mantiverem, a lei não permite que o credor renuncie antecipadamente a qualquer dos direitos de que ele dispõe contra o devedor que não cumpre (artigo 809º). Quais são então os direitos cuja renuncia antecipada a lei proscreve nesta disposição imperativa? - Direito à indemnização dos danos sofridos (em qualquer das formas de não cumprimento culposo); - Direito à realização coactiva da prestação se ela for possível; - Direito à realização do contrato (quando a obrigação não cumprida provenha de um contrato sinalagmático). - Direito ao cómodo de representação.
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O credor pode não exercer nenhum dos direitos acima indicados e, pode renunciar em definitivo ao exercício de qualquer deles, depois que o não cumprimento se verificou, o que não pode é abdicar antecipadamente de qualquer deles. Estes direitos constituem a armadura irredutível do direito de crédito, neles reside a força intrínseca da juridicidade do vínculo obrigacional. I – Convenções disciplinadoras da responsabilidade civil II – Cláusula penal I – Convenções disciplinadoras da responsabilidade civil Modalidades: A) Convenções de agravamento B) Convenções de limitação C) Convenções de exclusão
Artigo 809º (ver melhor aulas práticas) (a) Interpretação literal (A.V.): o Por uma questão de certeza do Direito e de segurança das relações jurídicas, este artigo não abriu qualquer brecha em relação a nenhum dos direitos que integram a guarnição defensiva do interesse do credor (ressalvando claro o actos dos representantes legais ou auxiliares). o Âmbito da proibição: a proibição de renúncia antecipada tanto vale assim para os casos em que a violação do direito do credor resulta de dolo do devedor, como para situações em que a falta de cumprimento assenta na mera negligência do obrigado. o Oposição: Pinto Monteiro: limita a proibição das cláusulas de exclusão aos casos de dolo e de culpa grave. (b)Interpretação restritiva (posição maioritária) o Renúncia ao direito de indemnização não afecta os demais direitos do credor o Argumento de ordem sistemática: artigo 18º, c) das C.C.G. Cláusula penal Regime: artigos 810 a 812º CC Aspectos gerais e controvérsias doutrinárias: 106
Modelo tradicional: modelo unitário, não distingue vários tipos e concebe uma única modalidade de cláusula penal submetida a um único regime (Antunes Varela). Noção (Antunes Varela – conjugando a noção dada no preceito legal com a real dimensão da figura): é a estipulação pela qual as partes fixam o objecto da indemnização exigível do devedor que não cumpre, como sanção contra a falta de cumprimento. Para esta doutrina há uma fixação antecipada em caso de não cumprimento, cumprimento defeituoso. A parte desta definição (pré avaliação do quantitativo da indemnização devida) pode suceder que as partes visem alcançar ainda outra finalidade: a finalidade compulsório ou sancionatória, visando sancionar o devedor em caso de incumprimento. A doutrina tradicional diz que este regime é unitário e aplicável independentemente destas duas finalidades. Artigo 810º nº1: noção que atende cláusula penal com a finalidade compulsória (para além da primeira finalidade). Tese posta em causa pela doutrina do Professor Pinto Monteiro: defende que não há um modelo unitário, mas sim que existem vários tipos de cláusula penal que se distinguem através do critério da finalidade ou escopo das partes. 1) Fixação antecipada da indemnização: o professor dirá que o CC define apenas esta modalidade. Teve como objectivo evitar litígios e o risco de uma possível avaliação judicial do incumprimento. Vantagem: não tem que provar o montante dos danos, apenas desencadear a aplicação da cláusula penal e demonstrar o incumprimento. O devedor teria vantagem: prevenir – se - ia de uma indemnização avultada superior às suas expectativas (ambos conhecem antecipadamente as consequências de um incumprimento, assumem risco de o montante ser maior ou menor que o fixado na cláusula). Duas outras modalidades são admissíveis: 1) CP em sentido estrito: faz jus ao conceito de pena – punitiva: levar o devedor ao cumprimento, vem substituir a indemnização. Montante devido como castigo que não acresce à indemnização devida. Constitui uma outra prestação devida em caso de cumprimento e que o credor pode exigir em vez de exigir a indemnização (correspondente ao valor dos danos). Confere ao credor uma obrigação com faculdade alternativa:
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verificando-se o incumprimento o credor tem possibilidade de escolha. 2) Compulsiva ou sancionatória: e acordado com um plus; algo que acresce à indemnização devida ou a indemnização especifica da prestação. Finalidade punitiva e compulsória (estimular o devedor ao cumprimento). Tipos mais frequentes: - Moratória: cláusula de fixação antecipada da indemnização devida em caso de mora. Tem direito á indemnização mais à finalidade compulsória. - Cláusula penal por incumprimento definitivo Antunes Varela – Artigo 810º aplicável a todos os tipos: Nº2 – aplicável a qualquer cláusula independente do escopo das partes O artigo que suscita mais polémica é o artigo 811º: - Se foi estabelecida uma cláusula moratória: pode o credor exerce-la mais exigir o valor da prestação devida. A questão é a primeira parte do artigo 811º - esta proibição faz sentido se reportada à CP indemnizatória, é evidente que não se pode pedir cumulativamente a indemnização e cumprimento do contrato (fixação antecipada da indemnização) mas e se se aplica à CP em sentido estrito ou compulsória? Doutrina tradicional (aplica-se a todas) – o artigo 811º vem proibir as cláusulas penais em que se convencione que o devedor tem q pagar certo montante a título sancionatório se incumprir, ou qualquer função punitiva. Pinto Monteiro – só se aplica a modalidade de fixação antecipada da indemnização, a compulsória esta fora do princípio da liberdade contratual que é o que se pretende regular. Nº2 – 1 parte: proíbe ao credor exigir indemnização pelo dano excedente – faz todo o sentido porque é o corolário do cumprimento do acordo que as partes convencionaram. Nº3 – Susceptível de crítica: o credor não pode em caso algum exigir indemnização que exceda o valor do prejuízo resultante do valor do incumprimento da obrigação principal. Se por um lado faz sentido o nº2, também faria sentido que se o dano sofrido fosse inferior ao valor fixado na CP o credor pudesse exigir o valor presente na C e não o valor que efectivamente se verificou, vem desvirtuar a cláusula penal (inversão do ónus da prova - o credor apenas retira a vantagem de ter que ser o devedor a provar o valor inferior – não era este o objectivo das partes aquando da fixação) – aplicação por AV. Já Pinto Monteiro diz – vamos restringir o âmbito de aplicação do nº3 do artigo 811º - de que forma? Vamos admitir que esta proibição não se aplica a todo e qualquer cláusula penal de tipo 1 mas apenas a CP de fixação antecipada do montante em que tenha havido nos termos da parte final do nº2 do artigo 811º tenha havido acordo das partes que permita ao credor exigir a indemnização pelo dano excedente – se ele fosse inferior não podia pedir a indemnização fixada na CP (cláusula quanto ao regime do ónus da prova). Argumento quanto a esta 108
restrição: artigo 812º CC – se permitimos a aplicação geral do artigo 811º do montante indemnizatório deixa de ter alcance pratico o artigo 812º do CP. Para a doutrina que defende que o nº3 não se aplica a qualquer modalidade de cláusula penal essa doutrina dirá que o artigo 812º sem resolver o problema em caso de a cláusula penal prever uma quantia superior À definida. Mas a restante perguntar - se - à para que serve o artigo 812º. Nota: para a doutrina do professor Pinto Monteiro: ao abrigo do princípio da liberdade contratual era possível convencionar uma cláusula punitiva e compulsória. O contraio para a outra doutrina não aconteceria o mesmo. Não se aplica o nº1 do 811º. A doutrina do professor Pinto Monteiro sempre se aplicaria o artigo 812º relativamente a qualquer das modalidades. Última hipótese prática: Nota de resolução: 1) As partes visaram a função indemnizatória – fixação… (artigo 811º para as duas teses) Problema do nº3 do artigo 811º - só poderia exigir os 500€, valor efectivamente sofrido, para tese que aplica o nº3 apenas a parte… não tendo havido acordo de partes o credor podia exigir os dois mil €. Invocar o artigo 812º CC 2) Valor superior – pelo nº2 do 811º não pode pedir. Quanto ao 812º também não porque não permite aumento equitativo.
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