Análise do Livro de Jeremias

June 20, 2019 | Author: peceribeiro | Category: Jeremias, Profeta, Septuaginta, Cativeiro Babilônico, Reino de Judá
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Análise do Livro de Jeremias Por Daniel John Clark  i. ii. iii.

Análise textual Biografia de Jeremias . Temas presentes no Livro de Jeremias .

Fundo Histórico do Livro de Jeremias

Para compreender melhor o livro de Jeremias é preciso sabermos um pouco sobre a história de Israel durante o período de sua profecia , do reinodo do Rei Josias (640 a.C ) até após a fuga para o Egito ( aproximadamente 587 a.C) . Após os reinados idólatras e malévolos dos reis Manassés e Amom , Josias , um javista convicto , chega ao  poder buscando buscando re-estabelecer re-estabelecer a verdadeira religião religião de Israel . Com a descoberta do rolo do livro da Lei Lei no templo a reforma de Josias ganha maior impulso tendo como base a destruição dos altares locais aonde acontecia o sincretismo religioso . Aproveitando-se da fraqueza dos Impérios Assírio e Egípcio Josias extende a sua influência para sobre o território do antigo Reino do Norte de Israel . Todavia Josias morre cedo na batalha de Megido numa tentativa desesperadora de evitar a volta da influência egípcia sobre a região da Palestina . O povo fez de Jeoacaz , filho de Josias , rei . Mas o Faraó-Neco vendo isso como tentativa de soberania mandou prender Jeoacaz e fez seu irmão Eliaquim , rei de Judá , mudando o seu nome para Jeoaquim para mostrar sua submissão . Jeoaquim foi um rei mal e corrupto . Enquanto o povo sofria sobre os pesados impostos do Faraó Jeoaquim construiu um palácio para si mesmo . Mandou também matar o profeta Urias , e só não matou a Jeremias devido aos amigos influentes do profeta . Internacionalmente o poder de Egito caiu após a batalha de Carquemis 605 a.C e Jeoaquim ficou submisso ao novo poder da época , o Império Babilônico de Nabucodonozor . Insensatamente Jeoaquim aproveitou um momento de fraqueza interna da Babilônia para rebelar-se contra Nabucodonozor. Durante alguns anos Jeoquim foi enfraquecido por ataques dos aliados de Nabucodonozor até esse vir com o seu exéricito sitiar Jerusalém . Durante esse período morre Jeoaquim e sobe ao trono o seu filho Joaquim que com a queda de Jerusalém é levado cativo para a Babilônia com os principais líderes da nação . Matanias , irmão de Jeoaquim , é colocado como rei por Nabucodonozor e seu nome muda para Zedequias . Incompetente e medíocre , Zedequias é levado a rebelar-se r ebelar-se pelos profetas nacionalistas trazendo a fúria de  Nabucodonozor  Nabucodonozor . A cidade de Jerusalém é destruída destruída e Zedequias Zedequias levado , cego cego , para o cativeiro cativeiro . A triste história de Judá termina com o assassinato do competente regente estabelecido por Nabucodonozor , Gedalias , e a fuga desesperada do remanescente remanescente para o Egito , fugindo da retaliação do imperador Babilônico .

Análise Textual de Jeremias Autoria

A questão da autoria de Jeremias difere dos demais livros proféticos devido à passagem de Jeremias 36 : 5 chamou a Baruque , filho de Nerias ; escreveu escreveu Baruque no rolo , segundo o que ditou " Então Jeremias chamou  Jeremias , todas as palavras palavras que a este o Senhor Senhor havia revelado revelado ."

Este rolo foi queimado pelo Rei Jeoaquim mas foi re-escrito por Baruque sobre ditado de Jeremias conforme o versículo 32 do mesmo capítulo . " Tomou , pois , Jeremias o outro rolo e o deu a Baruque , filho de Nerias o escrivão , o qual escreveu nele , ditado por Jeremias , todas as palavras do livro l ivro que Jeoaquim , rei de Judá , queimara no fogo ; e ainda se lhe acrescentaram muitas palavras semelhantes." Portanto pela evidência interna do texto nós podemos concluir que pelo menos boa parte do texto , deixando a questão de autenticidade para depois , teria sido escrito por Baruque sobre as ordens de Jeremias .  Naturalmente tal conclusão conclusão não permaneceria permaneceria sem ser atacado pela pela crítica velho-testamentária velho-testamentária . Autores como Bentzen , Gottwald , e Sellin-Fohrer , tem defendido a existência da influência de uma escola  jereminiana deuteronomista deuteronomista na autoria autoria do livro . Essa escola seria composta de seguidores e discípulos de Jeremias vivendo após a morte dele . Alguns autores situam essa escola como estando localizada na Babilônia durante o exílio exíli o mas para a maioria ela localizava-se na Palestina no pós- exílio . Essa escola teria tido dois objetivos principais : 1- Mostrar o cumprimento das previsões sobre o futuro do povo judeu feitas pelo profeta e portanto a sua visão sobre como deveria ser a reconstrução r econstrução da nação estava correta . 2- Reconciliar as palavras de Jeremias com o livro de Deuteronômio , e com a reforma deuteronomista feita  pelo Rei Josias que que serviria de base base para a reconstrução reconstrução da nação . Em relação a essa teoria podemos tecer os seguintes comentários : 1- A tese é basicamente não científica , pois ela não está sujeita à verificação ou à falsificação . Parte-se da teologia do comentarista a necessidade de estabelecer a existência ou não de uma escola jereminiana para  produzir aquelas palavras que o comentarista determina , sempre com com certa arbitrariadade , que Jeremias não não seria capaz de falar . 2. Existe um perigo da transposição da realidade das universidades modernas , com suas escoloas de  pensamento baseado nas nas posições de um grande pensador pensador , para o Israel Israel Antigo , sem nenhuma nenhuma evidência evidência  para afirmar a validade validade de tal transposição transposição . 3. Muitas das afirmações da crítica em relação à autoria de livros bíblicos estão baseados em critérios literários muito duvidosos . Por exemplo em relação ao livro de Jó Samuel Terrien afirma que pela parte de  poesia ser de uma qualidade superior à parte de prosa elas deveriam deveriam proceder de autores diferentes . Todavia a análisa das obras do inglês John Keats mostra que a sua poesia é superior à sua prosa e essa é superior à sua dramaturgia . Porém ninguém postula a existência de 3 Keats , um poeta , outro narrador e outro dramaturgo ! Mesmo assim no estudo bíblico , de maneira frustrante , qualquer mudança de estilo , linguagem ou temática é considerado por muitos autores como sendo suficiente para postular uma mudança de autoria . 4.Se a intenção da escola jereminiana foi de reconciliar a obra do profeta com o Deuteronômio e a reforma de Josias eles foram extremamente incompetentes no seu trabalho. Tal é o silêncio do profeta em relação às reformas de Josias que muitos analistas defendem que ele só começou o seu ministério profético apos o reinado deste .  Na minha opinião opinião uma conclusão conclusão muito mais segura segura a respeito da autoria do livro está em em dizer que ele é de co-autoria entre Jeremias e Baruque , esse último últi mo tendo registrado as palavras de Jeremias e registrado eventos históricos da vida do profeta .

Provavelmente teria havido também algum trabalho editorial no livro , particularmente na ordenação dos capítulos e no acréscimo do capítulo 52 ao livro , esse capítulo sendo basicamente a inclusão de 2 Reis 24:18 -25:30 . A Autenticidade das profecias de Jeremias

Ao abordamos a questão da autenticidade das profecias de Jeremias estamos refletindo sobre se as profecias contidas no livro brotaram da boca de Jeremias ou se foram colocados na boca dele por outras pessoas . De um ponto de vista conservador esse problema não ocorre pois aceita-se a genuinidade das profecias de Jeremias , registradas fielmente por Baruque . Os críticos liberais- racionalistas negam essa afirmação atribuindo muito do material presente no livro de Jeremias a outras fontes tendo sido erroneamente atribuído a ele . Basicamente essa teoria tem duas ramificações : 1) Segundo Pfeiffer , Baruque , provavelmente depois da morte de Jeremias , teria redigido as profecias de Jeremias e as adaptado para conformar com a sua posição deuteronomiana . 2) Segundo Bentzen , Sellin-Fohrer , e outros muitas profecias seriam produto da escola deuteronômica do  pós - exílio . Boggio defende a atividade dessa suposta escola afirmando que eles seriam homens piedosos , admiradores de Jeremias , levados ao refletirem sobre a mensagem desse profeta a pensar sobre sua mensagem para a época deles . Beswick & Chapman tentam suavizar isso afirmando que os antigos não se  preocupavam tanto como nós sobre questões de autoria e não viam problema em atribuir a uma pessoa famosa palavras que esse não disse . Basicamente os argumentos em favor dessa posição são os seguintes : 1) A evidência interna de Jeremias 36 : 32 : " Tomou , pois , Jeremias o outro rolo e o deu a Baruque , filho de Nerias , o escrivão , o qual escreveu nele  , ditado por Jeremias , todas as palavras do livro que Jeoaquim , rei de Judá , queimara no fogo ; e ainda se lhes acrescentaram muitas palavras semelhantes" Segundo muitos críticos essas palavras não foram escritas por Baruque e indicam a existência no livro de  palavras semelhantes às de Jeremias sem serem de sua autoria . Todavia tal posição distorce o texto para favorecer a teoria . O sentido natural desse texto seria que Baruque acrescentou ao texto palavras posteriores de Jeremias e as narrativas a respeito da sua vida e as perseguições que ele sofrera . 2) Questões de estilo . Boggio afirma que existem trechos em Jeremias com conteúdo semelhante mais adotando um estilo inapropriado para Jeremias . Tais trechos teriam sido escritos por seus admiradores . Tal argumento é na realida arbitrário e esotérico . Busca definir-se qual seria o estilo de um autor que viveu a milhares de anos e nega-se qualquer passagem que não segue a essa definição como sendo válida . Ainda mais tal argumento é na realidade circular pois define -se as passagens originais de acordo com o estilo do  profeta , mais só se pode justificar o estilo do profeta fazendo referência às passagens consideradas originais 3) Dependência de passagens de outros profetas como Isaías , Obadias e Oséias . Todavia tal argumentação só tem valor se o crítico aceitar a demora de tais obras para atingirem a sua forma escrita , pois uma vez que Jeremias pudesse ter esses textos em mãos ele poderia ser o autor dos oráculos influenciados por esses  profetas . Igualmente esse argumento só é válido negando qualquer elemento sobrenatural na Bíblia pois essas semelhanças entre os profetas poderiam originar-se da inspiração do Espírito Santo .

4) Elementos deuteronominianos . Segundo Bentzen existem em Jeremias elementos que demonstram uma influência do livro de Deuteronômio e portanto seriam fruto da escola deuteronômica . Todavia tal tese depende das seguintes suposições : (i) Falta de apoio de Jeremias à reforma "deuteronomista" de Josias , pois se Jeremias tivesse simpatizado com essa reforma não haveria a necessidade da ação da escola deuteronômica. Como nem os críticos liberais conseguem atingir consenso em relação à posição de Jeremias frente a reforma a teoria de Bentzen é enfraquecida . Ë interessante observar a existência de críticos que afirmam ser Jeremias o autor da "história deuteronômica" baseada no livro de Deuteronômio o que eliminaria de completo a necessidade da escola deuteronômica . (ii) Aceitação da hipótese documentária a respeito do Pentateuco . A partir de uma rejeição de tal hipótese a existência de uma escola deuteronômica passa a ser uma impossibilidade. Mesmo para quem aceita a hipótese documentária a tese de Bentzen causa dificuldades devido à passagem de Jeremias 7:22 " Porque nada falei a vossos pais , no dia em que os tirei da terra do Egito , nem lhes ordenei cousa alguma acerca de holocaustos ou sacrifícios ." Sempre tem sido difícil conciliar essa passagem com as legislações de Levítico . ( Para uma explicação conservadora ver o comentário de Harrison ) . Todavia se fossemos postular a existência de editores pósexílicos seria natural acreditar que tal passagem seria alterada para conformar com o documento P - segundo os liberais esse documento teria surgido no exílio e passado a ter grande influência no período pós exílico . Se podemos mostrar que Jeremias não foi alterado para conformar com o documento P , porque razão deveríamos acreditar que ele foi alterado para conformar com o documento D? 5) A falta de ordem lógica e cronológica para as profecias . Não há no livro uma ordenação lógica das  profecias para que elas correspondam sequencialmente com eventos na vida de Jeremias . Portanto para muitos críticos isso serve como evidência do livro de Jeremias ser uma composição de tradições divergentes ajuntadas numa só coleção , uma mistura de oráculos genuínos de Jeremias com outros ditos . Todavia isso não explica porque não houve uma tentativa de harmonizar o livro de Jeremias , especialmente se existisse uma escola deuteronômica que harmonizasse o livro com a reforma deuteronômica. Uma conclusão mais coerente seria afirmar que o livro é composto de material diverso produzido por Jeremias com o mínimo de intervenção externa . portanto a falta de sequência existente dentro do livro . 6) A existência de profecias cumpridas. O fato de muitas das profecias feitas por Jeremias terem sido cumpridas leva muitos críticos , por não aceitarem o elemento sobrenatural da Bíblia a dizerem que tais  profecias aconteceram depois do evento profetizado .  Na minha opinião não existe evidência concreta o suficiente para acreditar-se que as profecias atribuídas a Jeremias não teriam sido na realidade feitas por Ele. Data de Composição do Livro

A posição conservadora a respeito da data da composição final do livro é bem representado por J . Bright que defende a composição do livro no fim da vida de Jeremias no Egito. Outros comentaristas aceitam que Baruque poderia ter terminado o livro após a morte de Jeremias . Quanto ao capítulo 52 do livro Bright defende a sua inclusão a pedido de Jeremias enquanto Harrison aceita que a sua inclusão poderia ter sido feita até setenta anos depois da destruição de Jerusalém . De qualquer maneira o livro estaria na sua forma completa antes do ano 520 a.C .

 Naturalmente como a posição liberal requer a existência de uma escola deuteronômica para redigir Jeremias teólogos dessa linha tendem a colocar a data de Jeremias após o exílio , a sua forma final sendo atingida em meados de 450-400 a.C .  Não nos convém entrar novamente nas limitações da posição liberal , apenas nos identificaremos com a  posição conservadora a respeito da composição do livro durante a vida de Jeremias ou logo após a sua morte . O problema da LXX

Um problema existente na análise textual do livro de Jeremias está nas diferenças existentes entre a versão da Septuaginta e a tradição Massorética . Basicamente são três as discrepâncias existentes : (i) A versão da LXX é um oitavo mais curto do que o TM . (ii) Os capítulos 46-51 do TM , contendo oráculos contra as nações , estão localizados após o capítulo 25 na LXX e encontram-se em ordem diferente nas duas versões . (iii) Os versículos 33:14-26 não constam da LXX . Para explicar essas discrepâncias 3 principais teorias existem . (i) Segundo Workman e Bentzen a LXX estaria mais próxima do texto original enquanto a versão do TM teria sofrido mais alterações e revisões .O problema nesse caso está em explicar a superioridade geral do texto da TM de Jeremias . (ii) Segundo Bright a versão da LXX teria sido alterado pelos seus tradutores , judeus alexandrinos , para dar um formato mais lógico às profecias e portanto fazer o livro mais atraente para a filosofia grega . Como exemplo dessa influência da filosofia grega ele cita a omissão das palavras " dos exercítos" na frase "Senhor dos Exércitos ."  Todavia essa teoria não é suficiente para explicar porque os tradutores teriam cortado quase 2700 palavras de Jeremias . (iii) Segundo Archer Jr . teria havido duas edições do Livro de Jeremias , uma incompleta publicada antes da sua morte e disseminado pelo Egito , outra composta por Baruque logo após a morte de Jeremias . A  primeira teria dado origem à versão da LXX e a segunda à versão do TM . Essa tese evita os problemas das anteriores mais depende de um evento histórico cuja ocorrência jamais seremos capaz de provar .  Na minha opinião devemos permanecer cautelosos ao tentarmos investigar a relação entre a LXX e o TM  pois não temos condições de chegarmos à verdade nesse caso . A questão que surge então é se tal discrepância seria o suficiente para duvidarmos da autenticidade das profecias de Jeremias ? Para mim essa resposta deve ser negativa pois só poderiamos duvidar dessa autenticidade se tivéssimos razão para suspeitar que há no livro atual de Jeremias material de uma data posterior e os problemas entre a LXX e a TM não são o suficiente para sugerir isso .

As origens de Jeremias

 Narra a introdução do livro de Jeremias que o profeta era : " filho de Hilquias , um dos sacerdotes que estavam em Anatote , na terra de Benjamin . " Jeremias 1 : 1 Alguns comentaristas como Auneau tem tentado fazer uma ligação com I Reis 2: 26 " E a Abiatar , o sacerdote , disse o Rei :

Vai para Anatote , para teus campos , porque és homem digno de morte ; porém não te matarei hoje m  porquanto levaste a arca do Senhor Deus diante de Davi , meu pai , e porque te afligiste com todas as aflições de meu pai ."

Para esses comentaristas Jeremias era descendente desse Abiatar , expulso por Salomão , e do sumo sacerdote Eli . Esse detalhe é usado para explicar os seguintes aspectos teológicos da mensagem de Jeremias : 1- A sua denúncias contra os sacerdotes hebreus . Jeremias viria de uma família excluída do meio sacerdotal e portanto estaria mais disposto a condenar os erros dos sacerdotes . 2- O fato de Jeremias afirmar que o templo de Jerusalém não salvaria o povo da destruição. Se Jeremias realmente originava de uma família sacerdotal prejudicada por Salomão e alienado do culto no templo a sua atitude para com o templo torna-se mais fácil de entender . 3- Ênfase no santuário histórico de Silo , associado com a família de Eli . Apesar dessa teoria ser extremamente criativa e interessante , devemos observar que nem todos os comentaristas ( Sehlin-Fohrer ) aceitam que podemos afirmar com certeza que Jeremias era descendente de Abiatar e mesmo entre aqueles que aceitam esse fato , nem todos aceitam as influências teológicas ( Harrisson , Bright ) . Boggio ver grande relevância no fato de Jeremias ser da tribo de Benjamin , a tribo de Saul ,

e não da tribo de Judá , a tribo de Davi . Dessa maneira Jeremias não seria defensor da teologia real de Judá , que sustentava a linhagem Davídica mas estaria mais ligado às tradições do Êxodo . Todavia Boggio exagera ao tentar estabelecer uma oposição entre as teologias reais e do Êxodo e ao tentar inferir qual seria a mentalidade benjamita nesse período a partir de evidência escassa . Uma outra posiçao , radicalmente diferente é proposta por Robert Wilson . Ele sugere que Hilquias pai de Jeremias seria o mesmo Hilquias que encontrara o "livro deuteronomista" dentro do templo . Wilson também sugere que Salum , tio de Jeremias , seria o mesmo Salum casado com Hulda , a profetisa consultada por Josias a respeito do livro da Lei em II Reis 22:14 . Dessa maneira , Jeremias ao invés de vir de uma família de sacerodotes marginalizados , faria parte da liderença sacerdotal de Judá e sua família estaria no centro da reforma deuteronomista de Josias . Apesar dessa teoria trazer uma visão nova para o estudo de Jeremias ela está baseada em dados muitos escassos , a coincidência de nomes , para poder orientar o nosso estudo . Portanto o que nós sabemos , e podemos saber a respeito de Jeremias , é muito limitado . Apesar das várias teorias propostas provocarem questões e discussões interessantes nós não devemos permitir que a nossa análise do livro seja determinada por visões subjetivas da vida de Jeremias . Data de Início do Ministério Archer Jr. expõe a posição conservadora a respeito de Jeremias afirmando que esse começou o seu

ministério no décimo -terceiro ano de Josias , isso é 626 a.C , com mais ou menos 20 anos de idade . Tal afirmação baseia-se nos seguintes textos : "a ele veio a palavra do Senhor , nos dias de Josias , filho de Amom , rei de Judá , no décimo-terceiro ano do seu reinado ."  Jeremias 1: 2

 " Durante vinte e três anos , desde o décimo terceiro de Josias , filho de Amom , rei de Judá , até hoje , tem vindo a mim a palavra do Senhor . "  Jeremias 25:3

Todavia tal afirmação tem sido contestada por outros comentaristas que admiram o fato de Jeremias não ter tido uma atuação destacada durante o reinado de Josias , basicamente tendo se mantido em silêncio . Gottwald propõe a teoria de Jeremias ter nascido em 626 a.C e começado o seu ministério no reinado de Jeoaquim .Esses versículos refereriam ao nascimento dele e a sua auto-compreensão como tendo sido chamado para o ministério profético até mesmo antes de ter nascido conforme Jeremias 1 : 5 " Antes que eu te formasse no ventre materno , eu te conheci , e antes que saisses da madre , te consagrei e te constitui profeta às nações ."  Novamente nós temos aqui uma teoria criativa mas para a qual nós temos pouca chance de encontrar confirmação . A única afirmação que podemos fazer é que se essa teoria fosse verídica o autor teria escolhido uma maneira estranhíssima de se expressar e por isso preferimos a data de 626 a.c para o início do ministério de Jeremias . As etapas do ministério de Jeremias No reinado de Josias (640-609)

Aceitando o ministério profético de Jeremias durante o reinado de Josias , permanece a dificuldade em reconciliar o fato dele pregar alguns oráculos contra o povo de Judá nessa época mas permanecer em silêncio em relação à reforma de Josias . Algumas comentaristas propostas para resolver essa dificuldade vêem oposição entre Jeremias e a reforma : o à reforma deuteronômica quanto a sua ênfase sobre o templo de Jerusalém , o seu silêncio seria sinal de sua desaprovação da reforma ( Hyatt , May) 2- Jeremias apoiava a reforma deuteronômica mas era contra a ênfase sobre o templo de Jerusalém que alienava famílias sacerdotais como a dele ( Granild , Sehlin-Fohrer ) 3- Jeremias inicialmente apoiava a reforma mais depois a rejeitou ( Eissfeldt , Rudolph , Rowley ) O problema com essas teorias é elas não conseguirem explicar a admiração de Jeremias pelo Rei Josias expressa em Jeremias 22:15 : " Reinaras tu só porque rivalisas com outro em cedro ? ( falando sobre Jeoaquim) Acaso teu  pai (Josias) não comeu e bebeu , e não exercitou o juízo e a justiça ? Por isso tudo lhe sucedeu bem."

Tais teorias também não explicam porque a família de Safa , que participou da reforma de Josias , buscou  proteger Jeremias das perseguições sofridas por ele , se Jeremias foi um oponente da reforma . Outras teorias buscam perceber uma relação mais positiva entre Jeremias e a reforma de Josias : 1- Jeremias teria apoiado a reforma de Josias e sido grandemente influenciada por ela . O seu silêncio a respeito da reforma seria um sinal de sua aprovação . Os oráculos contra Judá seriam portanto de origem anterior à descoberta do livro da Lei no templo . ( Harrisson , Bright ) 2- Jeremias teria apoiado a reforma mas percebido que ela não atingiria o essencial , o coração das pessoas . Portanto ele destinou a sua pregação para o essencial , condenar o pecado da nação que traria o castigo e a condenação divina sobre o povo . ( Beswick & Chapman)

Para mim essa última teoria traz a base para compreendermos a relação entre Jeremias e a reforma de Josias . Jeremias simpatizaria com a reforma mas com a percepção profética perceberia a insuficiência da reforma a longo prazo . Conformeafirma Robert Wilson a reforma para ser eficiente precisaria de muitos anos para serimplementada , portanto Jeremias teria concentrado-se em buscar levar a reforma à suas consequências mais radicais . Durante o Reinado de Jeoacaz (609 )

Como o reinado de Jeoacaz durou apenas três meses , antes de ser deposto pelo Faraó Neco temos apenas um oráculo a respeito desse rei , Jeremias 21:10-12,mas essa data de depois do reinado de Jeoacaz quando ele já era dfhhhfhfffgfgfvgcbcbbcprisoneiro no Egito. Durante o Reinado de Jeoaquim (609-597) e Joaquim (597)

Durante o reinado de Jeoaquim percebemos Jeremias na oposição.Ele condena o rei pela sua posição próegípcia , pela sua política de concentração de riqueza e injustiça e pela idolatria que continuava a ser  praticada . Esse foi um momento de muita dificuldade para Jeremias, proibido de ir para o templo pelo rei , tendo a sua obra queimada pelo rei ao ter sido lido no templo e sendo ameaçado de morte pelos seus inimigos . O Rei Jeoaquim assassinou o profeta Urias nessa época e só não matou a Jeremias pois esse se escondeue foi  protegido por amigos influentes . Durante o Reinado de Zedequias (597-587)

Após a morte de Jeoaquim , a queda de Jerusalém e o primeiro cativeiro a situação em Jerusalém parece tornar-se polarizada . Alguns defendem que o futuro do povo está na co-operação com os seus dominadores  babilônicos , outros defendem a revolta contra Nabucodonozor . Jeremias assume a primeira posição defendendo que o futuro do povo hebreu não estava no templo e na linhagem de Davimas na submissão a Deus e o castigo que ele impôs sobre o povo . Por essa razão Jeremias engaja em debates fortes com Hananias , um profeta que defendia a revolta contra Nabucodonozor . O novo rei , Zedequias , instalado por  Nabucodonozor é vacilante. As vezes ele consulta Jeremias , outras vezes ele o persegue . Mesmo depois de ter lançado Jeremias na cisterna podemos observar Zedequias consultar-lo ( Jeremias 38) . Infelizmente para Jeremias o rei não consegue afastar-se da influência de Hananias e seus partidários conforme percebemos em Jeremias 38 : 5 " Respondeu o rei Zedequias : Ele está nas vossas mãos . O rei não pode fazer coisa alguma contra vós . " e revolta-se pateticamente contra Nabucodonozor . A posição de Jeremias é confundida crescentemente com traição e ele perde toda a esperança em relação ao povo que permanece em Judá , eles são "figos ruins" , a esperança para o futuro está naqueles que jáforam levados para o exílio . Com a queda de Jerusalém , a vida de Jeremias é salva pela ordem expressa de Nabucodonozor . ( Jeremias 39:11) O fim do ministério do profeta

Com a queda de Jerusalém pela segunda vez . Jeremias opta por ficar em Judá com Gedalias e tentar reconstruir a nação em co-operação com os babilônios . Todavia Gedalias é assassinado por Ismael e Jeremias é levado , contrário à sua vontade , para o Egito . Lá ele continua sendo uma figura polêmica , condenando os judeus por oferecerem sacrifícios aos deuses egípcios . Depois dessa controvérsia não temos mais informações pessoais a respeito de Jeremias apesar da tradição judaica afirmar que Jeremias teria sido martirizado pelos judeus que ele condenara no Egito . 4.

Esboços de Jeremias

Archer Jr. , oferece o seguinte esboço de

Jeremias

I . Profecias sob Josias e Jeoaquim 1:1-20:18 A chamada do profeta e sua comissão 1:1-19 O pecado e a ingratidão da nação 2:1-3:5 Predita a devastação vinda do norte ( Os caldeus ) 3:6- 6 : 30 A ameaça do exílio na Babilônia , 7:1 -10:25 A aliança violada , e o sinal do cinto de linho 11:1-13:27 A seca ; o sinal do profeta solteiro ; a advertência acerca do sábado 14:1 -17:27 O sinal da casa do oleiro 18:1 - 20: 18

II . Profecias posteriores no reinado de Jeoaquim e Zedequias 21:1-39:18  Nabucodonozor , instrumento de Deus para punir Zedequias e Jerusalém , 21:1 -29:32 O Reino Messiânico do Futuro 30:1 - 33:26 O pecado de Zedequias e a lealdade dos Recabitas 34:1 -35:19 A oposição de Jeoaquim , e sua destruição do rolo profético 36:1-32 Jeremias na prisão durante o cerco 37:1 -39:18

III .Profecias após a queda de Jerusalém 40:1 - 45: 5 Ministério entre os remanescentes de Judá 40:1 -42:22 Ministério entre os fugitivos no Egito 43:1-44:30 Encorajamento a Baruque 45:1-5

IV. Profecias contra Nações Pagãs 46:1-51:64 Egito 46:1-28 Filístia 47:1-7 Moabe 48:1-47 Amom , Edom , Damasco , Arábia , Elão 49:1-39

Babilônia 50:1-51:64 V. Apêndice Histórico 52:1-34 Percebemos nesse autor , uma preocupação de relacionar o seu esboço com o contexto da vida de Jeremias . A seguinte versão mais simplificada aparece em Sehlin-Fohrer : 1-25 ameaças contra Judá e Jerusalém 26-35 promessas em favor de Israel e Judá 36-45 A parte principal do livro de Baruc 46-51 ameaças contra outras nações 52 o apêndice Sendo apenas uma versão resumida da anterior . Auneau apresenta

o seguinte esboço

I . O julgamento de Israel e de Judá 1- 25 Os primeiros ciclos de profecias 1-10 o engajamento do profeta em sua missão 11-20 O julgamento discriminatório 21-24 O julgamento de Judá e das nações 25

II . O destino da palavra divina e do seu profeta 26-45 a eficácia da palavra e a fidelidade do profeta 26-36 a paixão do profeta 36-44 A palavra de conforto dirigida a Baruc 45

III . Os oráculos contra as nações 46-51 IV . O apêndice histórico 52 Auneau varia em relação aos comentaristas anteriores pois ele afasta-se da perspectiva do profeta em montar o seu esboço e concentra mais na palavra , e sua relação com o povo e o profeta . Finalmente seria interessante observar os esboços oferecidos pelas duas Bíblias de Estudo Conservadoras , a Biblia de Thompson e a Bíblia Vida Nova. Bíblia de Thompson :

I. A chamada do profeta 1 II . Repreensões , , advertências e promessas aos judeus 2-20 III. Denúncia de governantes e também de falsos pastores e falsos profetas 21-23 IV. Predições dos juízos divinos , a destruição de Jerusalém e os setenta anos de cativeiro 24-29 . V. Promessas de restauração dos judeus 30-33 VI . Profecias ocasionadas pelos pecados de Zedequias e Jeoiaquim 34-39 VII. A condição miserável do restante que ficou em Judá , e as profecias contra eles . 40-44 VIII . A consolação a Baruque 45 IX . Profecias contra as nações hostis . 46-51 Enigmaticamente Thompson omite o capítulo 52 ! Bíblia Vida Nova ( resumida )

I. Jeremias um Guerreiro de Deus 1:1-33:26 II . Jeremias um vigia de Deus : apressando a Palavra 34:1-45:5 III . Jeremias , uma testemunha de Deus à nação : O Senhor onipotente reina 46:1-52:34 Enquanto a Bíblia de Thompson preocupa-se muito mais numa visão temática do livro , a Bíblia Vida Nova explora muito mais a perspectiva do profeta e sua relação com a palavra de Deus . Qual esboço é o melhor ? Na realidade esboços diferentes servem a propósitos difentes do estudante . Todavia para esse trabalho consideramos mais úteis os esboços de Archer Jr . , por sua ênfase histórica , e o esboço de Auneau por sua ênfase teológica .

Temas Presentes no Livro de Jeremias Aliança Apostasia Julgamento Nova Aliança Falso Profetismo Confissões 3.1 Jeremias e a Aliança

Jeremias mostra na sua profecia uma consciência profunda da aliança entre Deus e o povo hebreu , estabelecido no Monte Sinai . Para Jeremias o relacionamento entre o povo e Deus deveria ser regido por essa aliança , conforme Jeremias 11:1-5 mostra : " Palavra que veio a Jeremias da parte do Senhor :Ouve as palavras desta aliança , e fala aos homens de  Judá , e aos habitantes de Jerusalém.Dize-lhes :

 Assim diz o Senhor , o Deus de Israel : Maldito o homem que não obedecer às palavras desta aliança , que ordenei a vossos pais no dia em que os tirei da terra do Egito , da fornalha de ferro dizendo : Daí ouvidos à minha voz , e fazei conforme tudo que vos mando , e vós me sereis por povo , e eu vos serei por Deus .Então confirmarei o juramento que fiz a vossos pais , de dar-lhes uma terra que manasse leite e mel , como se vê neste dia .  E eu respondi :Amém , Ö Senhor . "

 Nessa passagem podemos perceber a consciência de Jeremias a respeito dos seguintes aspectos da aliança : 1- A aliança estabelece o governo de Deus sobre o povo de Israel que passa a pertencer exclusivamente a ele . Isso traz um paralelo com Êxodo 20 : 1-2 " Então falou Deus todas estas palavras :  Eu sou o Senhor teu Deus , que te tirei da terra do Egito , da casa da servidão ."

e com Deuteronômio 5:1-2 "Chamou Moisés a todo o Israel , e disse-lhes : Ouve , ó Israel , os estatutos que hoje vos proclamo aos ouvidos , para que os aprendeis e cuideis de praticá-los . O Senhor vosso Deus fez aliança conosco em Horebe."

Portanto Jeremias estava profetizando dentro de uma tradição israelita , numa perspectiva conservadora voltando até a Moisés , de perceber Israel como nação separada para ser de Deus e obedecer os seus mandamentos .

2- A prosperidade do povo de Israel está condicionado à sua obediência aos mandamentos de Deus .  Novamente podemos estabelecer um paralelo com Deuteronômio 30:15-18 "Vê , hoje te proponho a vida e o bem , a morte e o mal . Pois hoje te ordeno que ames o Senhor teu Deus , andes nos seus caminhos , e guardes os seus mandamentos , estatutos e leis ; então viverás e te multiplicarás , e o Senhor teu Deus te abençoará na terra a qual passarás a possuir . Porém se o teu coração se desviar , e não quiseres dar ouvidos , e fores seduzido , e te inclinares a outros deuses e lhes  prestares culto , eu te anuncio hoje que certamente perecerás . Não prolongarás os dias na terra a qual vais  , passando o Jordão , para a possuíres ." Jeremias , como o autor de Deuteronômio , afirmam que não ocorria nada de aleatório na história do povo de Israel , o bem-estar do povo estava ligado com a sua fidelidade a Deus . Portanto a ameaça babilônica não era algo apenas político , era fruto da desobediência do povo , permitindo a Jeremias a audácia de chamar  Nabucodonozor de servo de Deus ( Jeremias 25:9) 3.2 A Apostasia de Israel

Mostrando a influência de Oséias , que profetizara no Reino do Norte cerca de 150 anos antes , Jeremias compara o povo hebreu à uma mulher adúltera traindo o seu marido conforme Jeremias 2: 1 " Vai e clama aos ouvidos de Jerusalém : Assim diz o Senhor : Lembro-me de ti , da devoção da tua

mocidade , do amor dos teus desposórios , de como me seguiste pelo deserto , numa terra não semeada . "

e Jeremias 3:1

"Se o homem despedir a sua mulher , e ela se ausenter dela , e se ajuntar a outro homem , tornará ele mais  para ela ? Não se poluirá de todo aquela terra ? Mas tu te maculaste com muitos amantes ; tornarias agora  para mim ? diz o Senhor . " Essas passagens mostram um paralelo forte com Oséias 2:5 " Porque a sua mãe se prostituiu e os concebeu em desgraça . Ela disse : Irei atrás de meus amantes , que me dão o meu pão e a minha àgua , a minha lã e o meu linho , o meu óleo e as minhas bebidas "  Nessas passagens Jeremias e Oséias afirmam que a apostasia do povo é tão grande que equivale-se à  prostutuição de uma mulher casada . Mas do que consistiria essa apostasia ? 1- Idolatria . Jeremias 32:34 nos mostra que a idolatria do povo chegou ao ponto de colocarem ídolos no  próprio Templo de Jerusalém . 2- Sacrifícios de crianças a Baal e a Moloque no vale de Himom ao sudeste de Jerusalém Jeremias 7:31. A adoração oficial a Moloque volta até Salomão ( I Reis 11:7) mas não temos evidência dele ter sacrificado um filho a esse deus . 3- Abandono da palavra de Deus . Jeremias 35 nos concede uma comparação interessante . Os recabitas por terem obedecido as normas severas estabelecidas pelo seu antepassado Jonadabe , seriam poupados no juízo vindouro . Esses serviam de contraste para o povo hebreu que rejeitara os mandamentos de Deus  Jeremias 35 : 17 . 3.3 O Julgamento Divino

Em Jeremias temos a consciência de que o pecado do povo chegara a tal ponto de ser impossível ele ser salvo do castigo de Deus . Numa das passagens mas severas do Velho Testamento Jeremias 11:14 lemos : " Portanto , não ores por este povo , nem levantes por eles nem clamor ou oração , porque não os ouvirei no tempo em que clamarem a mim , por causa do seu mal . "  Nessa passagem o profeta é proibído de interceder pelo povo pois Deus já estava disposto a condenar-los  pelo seu pecado . Para Jeremias a salvação do povo não estava em resistir e lutar contra o Império Babilônico mas em coorperar com Nabucodonozor que estava sendo usado por Deus e buscar o bem da Babilôbnia conforme Jeremias 29 : 7 . Beswick & Chapman e Boggio afirmam que Jeremias teve de enfrentar muita

resistência à sua mensagem de julgamento devido à crença sobre Jerusalém ser intocável por nela estar o templo de Jerusalém e o descendente de Davi reinando . Essa crença apoiava-se sobre um evento histórico : o livramento miraculoso da cidade da invasão do Rei Assíro Senaqueribe , e as palavras de Isaías registradas em II Reis 19:34 : "Eu defenderei esta cidade , para a livrar , por amor de mim e por amor do meu servo Davi."

Jeremias levanta-se contra essa distorção das palavras de Isaías pelos seus contemporâneos afirmando que a religiosidade praticada em Judá ela falsa e não agradava a Deus . No capítulo 7 ele ensina que a religiosidade que não é acompanhada pela obediência aos mandamentos de Deus é vã e falsa . Radicalmente nesse capítulo ele afirma que a crença no poder do templo é mentirosa : " Não vos fieis em palavras falsas , dizendo : Templo do Senhor , templo do Senhor , templo do Senhor é este . " Falando na tradição de Isaías e Amós Jeremias levanta-se contra a falsa religião , que mantém as aparências exteriores de piedade mas que não busca uma vida que agrada a Deus . Devemos notar particularmente a coragem de Jeremias em atacar os sacerdotes de Judá considerando que Jeremias vinha de uma família

sacerdotal . O profeta cita a destruição do santuário tradicional em Siló , possivelmente ligado a sua família , como evidência de que um santuário não salva o povo dos seus pecados .  Nisso está uma grande contribuição de Jeremias para a religião judaica e a religião cristã . Ele mostra que a fé em Deus poderia transcender o templo de Jerusalém , que havia futuro para a fé javista além da destruição do e o fim da soberania de Judá pois a religião de Israel transcendia a nação de Israel . 3.4 A Nova Aliança em Jeremias

Já analisamos a consciência de Jeremias sobre o povo ter desobedecido de tal maneira a aliança firmada no Sinai que a condenação tornara-se inevitável . Todavia para Jeremias nem tudo era desespero pois no futuro Deus restauraria o seu povo estabelecendo uma nova aliança segundo Jeremias 31 : 31-34 "Vêm dias , diz o Senhor , em que farei uma aliança nova com a casa de Israel e a casa de Judá . Não conforme a aliança que fiz com os seus pais , no dia em que os tomei pela mão , para os tirar da terra do  Egito , porque eles invalidaram a minha aliança , apesar de eu os haver desposado , diz o Senhor . Mas esta é a aliança que farei com a casa de Israel depois daqueles dias , diz o Senhor . Porei a minha lei no seu interior , e a escreverei no seu coração . Eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo . Não ensinará alguém mais a seu próximo , nem alguém a seu irmão , dizendo : Conhecei ao Senhor , porque todos me conhecerão  , desde o menor deles até o maior , diz o Senhor . Pois lhes perdoarei a sua maldade , e nunca mais me lembrarei dos seus pecados . " Conforme Chris Wright o conceito da nova Aliança aparece não só em Jeremias como também em Ezequiel e em Isaías 40-55 , sendo caracterizado por: (i) Um novo relacionamento com Deus , dinâmico e pessoal . (ii) Uma nova experiência do perdão divino ( Jeremias 31:34) (iii) Uma nova obediência à lei , sincera , partindo do coração humano . (iv) Um Novo Rei da linha de Davi ( Jeremias 33:15) (v) Uma nova abundância da natureza . Tradicionalmente a visão conservadora tem sido que essa nova aliança foi estabelecida por Cristo no seu ministério . Mas será tal visão correta ? Segundo Gottwald : "Leituras cristãs dessa passagem como uma antecepação da nova aliança em Cristo Jesus deturparam com frequência a passagem numa expectativa altamente individualizada e espiritualizada ." Todavia Gottwald é forçado a apelar para um "pregador jereminiano" para sustentar a sua tese que em essência parte de um ceticismo exagerado sobre a possibilidade de encontrarmos ligação entre o Velho e o  Novo Testamento . Em defesa da posição conservadora podemos afirmar : (i) Tal parece ter sido a posição de Jesus ( Lucas 22:20 ) (ii) Essa posição foi adotada tanto por Paulo quanto pelo autor de Hebreus . ( I Coríntios 11:25 , Hebreus 8 : 8-13 , 10 : 16 )

(iii) O primeiro ministério de Cristo e o dom do Espírito Santo cumprem 4 dos 5 elementos da profecia de Jeremias . Quanto ao quinto aspecto esse provavelmente refere à segunda vinda de Cristo . Resumindo nas palavras de John Skinner Jeremias : "ao projetar a sua própria experiência no futuro , como a forma que a verdadeira religião deve assumir universalmente , lançou um brilhante facho de luz através dos séculos , que , por fim , ilumina alguém que é o sim e o Amém a todas as promessas de Deus - Jesus , o mediador da nova aliança , o autor da salvação eterna ." 3.5 O Falso Profetismo

Um dos problemas enfrentados por Jeremias foi a incredulidade para com a sua profecia . Enquanto muitos  pregavam que a cidade de Jerusalém seria salvo , Jeremias pregava o juízo . A dificuldade de Jeremias era agravada pelo fato que ele não realizava grandes sinais . Jeremias não realizava curas e maravilhas como Elias e Eliseu , não era capaz de fazer a sombra voltar como Isaías . Como ele poderia comprovar que a sua mensagem era de origem divina e as dos outros era falsa se lhe faltava até uma visão divina como Micaías teve em I Reis 22 . Em Jeremias não temos uma dissertação sobre o falso profetismo mas temos os seguintes indícios sobre a falsa profecia : (i) O falso profeta não fala a palavra de Deus , mas fala as palavras do seu próprio coração . ( Jeremias 23:16) . Mas como saber quem fala de Deus e quem fala do coração ? (ii) O falso profeta traz apenas mensagens de otimismo , ele não expõe e nem condena o pecado do povo . (Jeremais 7:4-6) . (iii) O falso profeta não tem um compromisso ético , levando muitas vezes uma vida de imoralidade e  pecado .( Jeremias 29:21-23) (iv) O falso profeta faz previsões que não se concretizam , como foi o caso do falso profeta Hananias que  previu a restauração da soberania de Judá em 2 anos . ( Jeremias 28 ) 3.6 As Confissões de Jeremias

Predestinado antes do seu nascimento para ser o verdadeiro profeta de Deus , ( Jeremias 1:4-5) , Jeremias nem sempre mostrava-se contente com a sua vocação ou com o sofrimento pela qual ele teve de passar . Em várias passagens( Jeremias 11:18-23, 12:1-6 , 15:10-21 , 17:12-18, 18:18-23 , 20:7-18 ) , denominadas "confissões de Jeremias" por eruditos . Alguns tem buscado encontrar nessas passagens um simbolismo na qual Jeremias retrata na sua vida o sofrimento da nação . Todavia considero tal procedimento incompatível com o conteúdo desses textos . Creio ser muito mais coerente enxergar nessas passagens a dificuldade de Jeremias em conviver com a sua vocação e com a mensagem pesada ( Jeremias 23 :29 ) que Deus esperava dele pregar . Portanto em comparação com os outros profetas do Velho Testamento , talvez com a exceção de Oséias , enxergamos muito mais profundamente para dentro da alma de Jeremias . Em Jeremias o lado humano , frágil do profeta de Deus torna-se muito mais evidente . Conclusão

Concluímos citando Jeremias 23 :23 :

" Acaso sou Deus apenas de perto , diz o Senhor , e não também de longe ? " A grande contribuição do livro de Jeremias estava em ver que Deus , e sua relação com o seu povo , transcendia o templo de Jerusalém e a soberania da nação de Judá . Enquanto os falsos profetas agiam como-se soubessem tudo a respeito de Deus , e o incluiam nos seus falsos esquemas nacionalistas , Jeremias , o verdadeiro profeta , respeitava a profundidade da natureza de Deus e agia como o seu porta-voz . Dessa maneira o livro de Jeremias tornou-se um ponto de referência para o povo judeu entender a sua situação e o seu futuro , como podemos perceber nas citações de Daniel e de Esdras. A profecia de Jeremias trouxe uma explicação convincente sobre o passado do povo e esperança para o futuro permitindo que a chama da fé javista permanecesse acesa . Portanto como cristãos somos todos nós herdeiros de Jeremias e de seu ministério . Somos também grandes devedores à Jeremias . Primeiramente a sua visão da nova aliança influenciou fortemente a teologia neotestamentária e também a teologia protestante . Em segunda lugar Jeremias nos mostra como a fé pode  permanecer firme durante momentos de crise e desespero sendo um forte apoio para cristãos de todas as épocas em momentos difíceis .

Onde nasceu o profeta Jeremias?

Jeremias nasceu no povoado de Anatot, pertinho de Jerusalém, entre 650 e 640 a.C. Era filho do sacerdote Helcias, da casa de Eli. Talvez descendesse de Abiatar, chefe dos levitas em Jerusalém na época do rei Davi, e que foi desterrado para Anatot por Salomão, segundo 1Rs 2,26-27. O que significa o nome Jeremias?

O significado do nome é incerto. Há duas possibilidades. Yirmeyâhû quer dizer "Iahweh exalta", "Iahweh é sublime" ou "Iahweh abre (=faz nascer)". Este nome era bastante comum nos tempos bíblicos. São conhecidos pelo menos sete personagens, mais ou menos importantes, com este nome. O que sabemos da infância e da formação de Jeremias?

Quase nada. Parece que ele jamais assumiu qualquer função sacerdotal. Pelo contrário, denunciou duramente o papel exercido pelos sacerdotes de seu tempo. O que, por outro lado, aponta para sua rigorosa visão levítica, e possível formação, de como deveria agir um sacerdote. Consta, nesta linha, que o rei Josias (640-609 a.C.) proibira o exercício do ofício aos sacerdotes não provenientes de Jerusalém, segundo 2Rs 23,8-9. Qual foi a influência do profeta Oséias sobre Jeremias?

Não existe nenhuma dúvida acerca da influência de Oséias sobre o pensamento de Jeremias. Além dos fatores geográficos - Anatot pertence à tribo de Benjamin - e familiares - Jeremias descendia, talvez, de Eli, sacerdote de Silo - é possível que a educação de Jeremias tenha incluído os ensinamentos de Oséias. Entendo que Oséias e Jeremias foram os dois profetas mais radicais de todo o Israel, pois foram os que mais perto chegaram de uma compreensão profunda das causas da opressão que o povo de Israel vivia naquele tempo. Ambos entendem, por exemplo, que onde o javismo caducou ou se oficializou e foi, por isso, neutralizado por práticas institucionais do aparelho estatal, a corrupção, a opressão e o despotismo generalizado dominaram. O processo (rîbh) que fazem a Israel por não " conhecer a Deus " é sintomático, como em Os 4,1-3 e Jr 2,8;4,22 e a interessantíssima crítica ao rei Joaquim (609-598 a.C.) em Jr 22,13-19. Onde Jeremias começou a profetizar ?

É possível que Jeremias tenha começado a profetizar em Anatot. Mas foi perseguido, quiseram matá-lo em sua própria terra, segundo Jr 11,18-12,6. Não conhecemos o motivo desse complô armado contra Jeremias por seus conterrâneos (Jr 11,21) e até por seus familiares  (Jr 12,6). Talvez por ter apoiado a reforma do rei Josias, que destruiu os santuários regionais e centralizou as atividades cultuais em Jerusalém, ele tenha prejudicado os interesses de sua família de sacerdotes. Ou, quem sabe, o duro teor de sua crítica social e religiosa tenha provocado tão violenta reação. Durante toda a sua vida Jeremias irá incomodar muita gente, que tentará, a qualquer custo, calar a sua boca. Durante quanto tempo Jeremias atuou como profeta ?

Jeremias atuou cerca de 50 anos, de 627 a ca. 580 a.C. , sob os governos de Josias (629-609 a.C.), Joaquim (609-598 a.C.), Sedecias (597-586 a.C.) e Godolias/exílio (586/ca.580 a.C.). Por isso, costumamos dividir, didaticamente, sua atuação segundo estes quatro períodos. Que tipo de texto há no livro de Jeremias?

Há quatro tipos de textos no livro de Jeremias: Oráculos em forma de poesia, como Jr 4,5-6,30 o Relatos autobiográficos, como Jr 1,4-19 o Relatos biográficos, como Jr 26, 1-24 o Discursos em prosa, como Jr 7,1-8. o Como se convencionou unir em um só os dois primeiros tipos, quase totalmente em forma poética, costuma-se classificar os textos de Jeremias em três tipos: A. Palavras de Jeremias em verso e relatos autobiográficos em verso e prosa a B. Relatos biográficos, na 3  pessoa, sobre Jeremias, atribuídos por muitos a Baruc, seu secretário C. Discursos em prosa, em número de 10, de autoria incerta, mas que muitos atribuem aos mesmos autores de Josué, Juízes, 1e 2 Samuel e 1 e 2 Reis, a chamada Obra Histórica Deuteronomista (OHDtr), possivelmente composta por levitas. Então, nem tudo que está no livro vem do profeta Jeremias?

Não. O livro de Jeremias passou por um longo e complicado processo de formação. Oráculos (= palavras proféticas) isolados foram sendo reunidos ao longo dos anos, de modo que temos hoje uma antologia da pregação de Jeremias e não um livro no sentido moderno. Ou melhor: temos uma antologia de antologias , em um processo que começou ainda durante a vida de Jeremias e prosseguiu ao longo da época pós-exílica. A versão grega da Bíblia chamada Setenta ou Septuaginta (= LXX) tem um texto de Jeremias bem mais curto do que o texto massorético (= TM), o nosso texto hebraico, além de colocar vários oráculos noutra ordem. Isso é explicado, em geral, com a existência de dois textos independentes de Jeremias: um mais antigo e mais curto, que se perdeu, e que serviu de base para a tradução dos LXX; outro, mais recente, que recolheu vários acréscimos, e que nos foi transmitido pelos massoretas (= os rabinos "transmissores" do texto hebraico). O que fez Jeremias no tempo de Josias? No tempo de Josias, 10  período de sua atuação , Jeremias proclamou um julgamento contra Israel por causa de sua

infidelidade a Iahweh e sua adesão a outros deuses, especialmente os deuses que garantiam a fertilidade da natureza, os chamados baalim. Os comentaristas reconhecem como sendo deste período Jr 2,1-4,4 e Jr 30,1-31,37, todos textos de tipo A. Que texto exemplifica bem a sua pregação neste período? Jr 2,1-37. É um texto escrito em um gênero literário muito usado pelos profetas, o rîbh (= processo). Funciona assim:

parte-se do pressuposto de uma aliança entre as duas partes em questão, Iahweh e Israel. Iahweh abre, então, através do profeta, um processo contra Israel, motivado por sua quebra do pacto. Como parte ofendida, Iahweh convoca a natureza como testemunha, questiona o comportamento de Israel, relembra os benefícios passados e ameaça com uma punição. Neste texto, rico em imagens, à moda de Oséias, Jeremias relembra com nostalgia a fidelidade dos primeiros tempos e a contrapõe à infidelidade atual, pois Israel trocou Iahweh pelos ídolos que nada valem e não podem socorrê-lo na hora do aperto. Jeremias responsabiliza alguém pela infidelidade ao javismo?

Sim. Em Jr 2,1-4,4 Jeremias responsabiliza quatro tipos de autoridades pela idolatria e pela desgraça em que caiu o país: são os reis, os príncipes, os sacerdotes e os profetas. A volta ao javismo é possível se Israel resolver praticar a verdade ('emeth), o direito (mishpât ) e a justiça (sedhâqâh), segundo Jr 4,2. O que pensava Jeremias da reforma de Josias?

Esta é a coisa mais estranha desta fase da pregação de Jeremias: ele não faz nenhuma alusão à reforma social e religiosa empreendida pelo rei Josias naqueles anos  (sobre a reforma cf. 2Rs 22,1-23,27). É possível que, embora visse com muita expectativa a ação do governo, ele tenha se decepcionado com os escassos resultados de um movimento imposto de cima para baixo, pela força das armas. Assim, teria preferido manter prudente silêncio a respeito. O que fez Jeremias no tempo do rei Joaquim?

Quando Joaquim, de 25 anos de idade, assumiu a mando do faraó do Egito, o governo de Judá em 609 a.C., Jeremias rompeu, de vez, com as instituições do Estado. Jeremias tornou-se, então, um ferrenho adversário da classe sacerdotal de Jerusalém, já que sob os desmandos do governo de Joaquim a reforma de seu pai Josias se perdeu totalmente, restando um culto superestimado como garantia da nação, conseqüência da centralização de todas as atividades religiosas no Templo de Jerusalém e na mão de seus sacerdotes. Culto agora usado para mascarar os males sociais e os crimes contra o povo.

a

O que fez Jeremias em sua 1  intervenção na época de Joaquim? Um violento discurso contra o Templo , que foi conservado em duas versões: Jr 7,1-15 (texto tipo C) e Jr 26,1-24

(texto tipo B). O primeiro destaca o conteúdo, o segundo as circunstâncias do discurso. Entre setembro de 609 e abril de 608 a.C., talvez durante uma festa, Jeremias coloca-se no pátio do Templo e denuncia a confiança da população judaíta no Templo de Iahweh como falsa e promete a destruição do santuário, tal qual outrora acontecerá com Silo. A morte de Josias em combate contra o faraó, o curto governo de seu filho Joacaz (3 meses), seu exílio, a dependência do Egito sob Joaquim: tudo isso criara um clima de incerteza e insegurança geral. O que faz o povo? Refugia-se na crença de que a presença de Iahweh no Templo garante a cidade e a sua liberdade. Jeremias denuncia esta crença porque, segundo ele, só a aliança Iahweh-Israel poderia garantir o povo. Mas esta não funcionava, pois nos tribunais não se praticava o direito, oprimiam-se o estrangeiro residente, o órfão e a viúva, condenava-se o inocente e, além disso, seguiam-se deuses estrangeiros. O que acontece com Jeremias?

Conta-nos Jr 26,1-24 que Jeremias quase morre por fazer tal denúncia. Aos olhos do pessoal do Templo, como sacerdotes e profetas, Jeremias cometera duas blasfêmias: falara em nome de Iahweh e falara contra a casa de Iahweh. Perante o tribunal a que é levado, ele, porém, confirma suas palavras e só não morre porque alguém se lembrou do profeta Miquéias, que, um século antes, pregara destino parecido para o Templo e para a cidade e nada sofrera. O que disse Jeremias sobre o governo de Joaquim?

Denuncia o governo de Joaquim como ganancioso, assassino e violento, segundo Jr 22,13-19, um dos mais duros oráculos proféticos já pronunciados contra um rei. Jeremias compara Joaquim ao seu pai Josias e denuncia o rei como antijavista, pois não cumpre sua função real de exercer a justiça e o direito e de proteger os mais fracos. No começo de seu governo, Joaquim preocupa-se em construir um novo palácio - ou um anexo ao antigo exatamente no momento em que a crise econômica se agravava. Dependente do Egito, a quem pagava tributo, colocou a população para trabalhar de graça na construção. Jeremias vai dizer ao rei que ele, quando morrer, nem merece ser sepultado, mas como um jumento deverá ser jogado para fora das muralhas de Jerusalém, pois, ao contrário de seu pai, Joaquim "não conhece Iahweh". O que mais ameaça Judá neste momento? Jr 4,5-6,30 e Jr 8,13-17 falam de um " inimigo que vem do norte ". Embora haja várias possibilidades de identificação

desse inimigo, muitos comentaristas pensam que Jeremias está falando de Nabucodo nosor, o rei babilônico, que invade regiões da Palestina em 605/604 a.C., trazendo o terror da guerra para as fronteiras de Judá. Muitos dos versos de Jeremias, nestes poemas, são de uma dramaticidade impressionante, como Jr 5,15-17, sobre a nação que vem de longe para atacar Judá: nação antiga, nação duradoura, cujos homens são heróis. Nação que devorará os filhos, os animais e todo o alimento de Judá, destruindo pela espada suas fortalezas. Segundo Jeremias, é Iahweh quem aplicará a Judá tal castigo. Mas o que motiva tão cruel castigo de Judá?

A ruptura da aliança. Em Judá, Jeremias só vê rebeldia contra Iahweh, levando o povo a maldades e crimes sem conta. Não há o mínimo " conhecimento de Deus ", que só é possível através da prática do direito, da justiça, da solidariedade. Os poderosos tramam sistematicamente contra o povo, todos buscam desesperadamente a riqueza e não há paz. A mentira domina, desde o ensinamento dos profetas à lei dos sacerdotes, levando o país ao caos. Todos se tornam inimigos de todos. Impera a idolatria. O fim será trágico, segundo os capítulos 8 e 9 de Jeremias. Percorrendo as ruas de Jerusalém, Jeremias constata a ausência do direito e da verdade entre as pessoas comuns (Jr 5,1), mas maior corrupção encontra entre os grandes e poderosos, que não agem mal por ignorância, senão por determinação consciente e persistente (Jr 5,4-5). Quanto mais a crise nacional se aprofunda, mais os líderes se recusam a encontrar soluções. Só procuram satisfazer seus interesses imediatos e deixam o país afundar: "Eles cuidam da ferida do meu povo superficialmente, dizendo: 'Paz! Paz!', quando não há paz"  , diz Jr 6,14. Com extremo realismo - válido para todas as épocas - em Jr 5,26-28 são descritos os poderosos e suas armadilhas de apanhar o povo e escravizá-lo impunemente. Por que Jeremias foi proibido de entrar no Templo?

Porque, segundo Jr 19,14-20,6, possivelmente por volta de 605 a.C., quando Nabucodonosor venceu o faraó Necao II e ameaçou Judá, o profeta foi ao pátio do Templo e anunciou a destruição de Jerusalém. Acabou preso por Fassur, chefe da guarda do Templo, surrado e colocado no tronco por uma noite. Depois disso, foi-lhe proibida, segundo Jr 36,5, a entrada no Templo. Sem poder ir até o povo, o que faz Jeremias?

Convoca o escriba Baruc e dita-lhe os oráculos de julgamento contra a nação. Este episódio da primeira escrita do livro, narrado em Jr 36,1-32, aconteceu no quarto ano do governo de Joaquim,em 605 a.C.

No ano seguinte, em dezembro de 604 a.C. Jeremias manda Baruc ler o livro (= rolo) no Templo. O momento é dramático: Nabucodonosor atacava, então, a cidade filistéia de Ascalon, vizinha de Judá. Por isso, talvez, Jeremias, tenha acreditado ter soado a hora da verdade para Judá. O "inimigo do norte" está às portas. Ou conversão ou destruição, alerta o profeta. O que fez Joaquim ao tomar conhecimento do manuscrito?

Queimou-o e mandou prender Jeremias e Baruc, segundo Jr 36, 21-26. A leitura feita por Baruc no Templo foi ouvida por membros do governo de Joaquim que não apoiavam as suas atitudes. Na esperança de convencer o rei a mudar sua política, levaram o manuscrito até Joaquim, que o ouviu mas não se convenceu. Jeremias e Baruc, bem escondidos, não foram achados. Após algum tempo, Jeremias, que não é de desistir, manda que Baruc escreva tudo de novo e ainda acrescente ao livro outras palavras, diz Jr 36,27-32. Todos os profetas da época pensavam como Jeremias?

De modo algum. Acreditam alguns especialistas que talvez o fato mais desorientador para Jeremias nesta época era a análise errada da situação feita por pessoas que se apresentavam para falar em nome de Iahweh como seus profetas. Por isso, em Jr 14,13-16 e Jr 23,13-40 podemos ver como Jeremias luta para desmascarar os falsos profetas  que, falando em seu próprio interesse, "fortalecem as mãos dos perversos, para que ninguém se converta de sua maldade" , que seduzem o povo com suas mentiras e seus enganos, roubando um do outro a palavra de Iahweh. Jeremias conclui que dos profetas de Jerusalém saiu a impiedade para todo o país. Qual o significado das "confissões" de Jeremias?

Mais do que "confissões", deveríamos falar aqui de diálogos com Iahweh, lamentos, orações, disputas. Foi durante este período de sua vida, durante o governo de Joaquim, que Jeremias mais sentiu o peso de sua missão. Obrigado a ser do contra, a pregar a desgraça para o seu povo, a remar contra a corrente, ameaçado, rejeitado, caluniado, desprezado, ele se lamenta, amaldiçoando até mesmo o dia em que nasceu. São textos difíceis de ser datados com precisão. É possível que tenham sido escritos em 605 a.C. como um desabafo, não como oráculos previamente ditos ao povo. Talvez possam ser lidos como uma síntese das crises vividas pelo profeta desde o começo de sua atividade. São 5 textos: a

1  confissão: Jr 11,18-12,6 a 2  confissão: Jr 15,10-11.15-21 o a 3  confissão: Jr 17,14-18  o a 4  confissão: Jr 18,18-23 o a 5  confissão: Jr 20,7-10.14-18  o O que diz Jeremias em cada uma das cinco "confissões"? Da primeira "confissão"  já falamos na pergunta 5: seus conterrâneos e familiares tentam matá-lo em Anatot,quando o

 jovem. Mas Jeremias amplia o problema, questionando porque persiste a prosperidade dos ímpios e a paz dos apóstatas. Daqueles que vivem falando em Iahweh, mas na verdade estão muito longe dele. Daqueles que têm uma fachada de piedade, mas não estão, de fato, com Iahweh. E Jeremias conclui que este é um problema para o qual ele não tem resposta... Na segunda confissão  a questão colocada por Jeremias é: vale a pena ser profeta? Jeremias confessa estar vivendo a suprema tentação profética, que é a vontade de se acomodar, de desistir, de aceitar a cooptação, de "ser normal", de passar para o lado daqueles a quem ele critica para sair da solidão a que é obrigado a viver. Na terceira confissão  Jeremias apela a Iahweh contra os seus perseguidores que lhe cobram a realização da palavra de Iahweh por ele pregada e o profeta não sabe mais o que fazer. Jeremias se sente desacreditado perante seus ouvintes, porque as desgraças prometidas não acontecem. Vive duramente pressionado. Na quarta confissão  Jeremias denuncia nova trama contra a sua vida. Seus adversários argumentam que podem tranqüilamente eliminá-lo, já que o sacerdote, o sábio e o profeta (ligado aos interesses da corte) não lhes faltarão. Com tristeza o profeta constata: estes que querem eliminá-lo são os mesmos a quem ele tantas vezes defendeu diante de Iahweh... Na quinta confissão , a mais dramática e a mais conhecida de todas, usando fortes imagens, Jeremias chega ao máximo de sua angústia. Acredita que Iahweh o enganou: o seduziu para ser profeta e o dominou, para depois abandoná-lo. Agora todos querem sua queda, inclusive seus amigos. Por isso, ele quer parar de ser profeta, mas o problema é que não consegue, pois as palavras de Iahweh queimam-no como fogo. Fogo que atinge até os ossos. Então, Jeremias amaldiçoa o dia em que nasceu: "Maldito o dia em que eu nasci! (...) Maldito o homem que deu a meu pai a boa nova: 'Nasceu-te um filho homem!' (...) porque ele não me matou desde o seio materno, para que minha mãe fosse para mim o meu sepulcro e suas entranhas estivessem grávidas para sempre. Por que saí do seio materno para ver trabalhos e penas e terminar os meus dias na vergonha?".

E o que aconteceu com o rei Joaquim?

Em 600 a.C. Nabucodonosor tentou invadir o Egito e não conseguiu. Joaquim rebelou-se e morreu em dezembro de 598 a.C., provavelmente assassinado, enquanto os babilônios marchavam para tomar Jerusalém. Seu filho Joaquin, de 18 anos de idade, o substituiu, mas capitulou 3 meses depois, no dia 16 de março de 597 a.C. O rei foi deportado para a Babilônia com a corte e a classe dirigente. No seu lugar, os babilônios deixaram seu tio, outro filho de Josias, de nome Sedecias, então com 21 anos de idade, para dirigir um Judá todo arruinado. Com várias cidades destruídas e com a economia do país desorganizada, pouco restava ao fraco Sedecias que pudesse ser feito. 0

O que fez Jeremias neste 3  período, sob o governo de Sedecias?

Jeremias começa criticando as pretensões do novo governo através da visão dos dois cestos de figos  de Jr 24,1-10. Segundo o profeta, os exilados correspondem a  figos bons, enquanto o atual governo se parece com  figos estragados. É possível que o novo governo, instalado no poder sob Sedecias, se afirmasse como a solução para o país, já que os "maus", os governantes anteriores, tinham sido exilados, pagando por seus crimes. Jeremias é de opinião contrária. Para ele o problema continua. Nada fora resolvido e a sombra do Templo não garantirá ninguém. Jeremias escreveu uma carta aos exilados?

Sim. Ainda nos primeiros anos do governo de Sedecias Jeremias escreveu aos exilados de 597 a.C., segundo Jr 29,123. Ele tenta desfazer as ilusões alimentadas por falsos profetas, durante convulsões sociais acontecidas no império babilônico, de que o exílio estava para acabar. Segundo Jeremias, os exilados devem aprender a viver tranqüilamente entre os babilônios, pois o exílio será longo. O que pensa Jeremias de uma rebelião contra a Babilônia?

Em Jr 27,1-22 e Jr 28,1-17 ele se opõe radicalmente a tal aventura incitada em Jerusalém pelos pequenos reinos da Síria-Palestina que se encontravam na mesma situação de Judá. Colocando um jugo (= haste apoiada no pescoço e ombros para transportar carga) sobre o próprio pescoço, Jeremias simboliza o domínio babilônico a que estavam submetidos (Jr 27,2-3). Confrontando-se com o profeta Hananias, que, ao quebrar o jugo de Jeremias, simbolicamente prega a necessidade da rebelião e a libertação fácil, Jeremias consegue convencer o governo a se manter quieto. O que disse Jeremias a Sedecias quando Jerusalém foi sitiada?

Quando Jerusalém foi cercada pelas tropas babilônicas em janeiro de 587 a.C., Jeremias disse ao rei Sedecias que a vitória de Nabucodonosor era inevitável, pois Iahweh entregara a cidade nas mãos do inimigo, já que não houve conversão (Jr 34,1-7). Por que Jeremias é preso nesta época?

Porque, segundo Jr 37,11-16, ele tentou sair da cidade para ir a Anatot tomar posse de um campo que comprara de um primo. Como o Egito enviara um exército para ajudar Jerusalém, os babilônios tinham levantado temporariamente o cerco da cidade para enfrentá-lo. É nesta ocasião que Jeremias é acusado por oficiais do exército de passar para o lado dos babilônios, é preso e jogado numa cisterna de captação de água, onde quase morre. Já segundo Jr 38,1-13, Jeremias é preso, acusado de traição pelos nobres, ministros de Sedecias, porque estaria exortando o povo à rendição. É provável que temos aqui dois relatos diferentes do mesmo episódio. Mas há alguma mensagem de esperança em Jeremias?

"Para arrancar e para destruir": esta foi a principal missão de Jeremias. Mas também para "construir e para plantar", como diz Jr 1,10. Na verdade, espalhados pelo livro de Jeremias, encontramos poucos textos que manifestam alguma esperança. Jr 31,31-34, o famoso texto que fala da nova aliança, é um destes. Em geral, sua autenticidade tem sido contestada. Argumenta-se, por exemplo, que Jeremias nunca chegou a tais alturas teológicas, porque o texto é perfeito, completo e assim por diante. Porém, alguns pensam que Jeremias pode ter tido tal idéia no começo de sua pregação e a aplicado ao reino do norte, tendo depois, nestes últimos dias, adaptado a fala a Judá. Claro que o texto final, redigido em prosa, tem a mão de algum redator posterior, talvez deuteronomista. Mas isto não é suficiente para negar a paternidade da idéia a Jeremias. O que diz Jr 31,31-34?

Faz uma contraposição entre a antiga aliança, feita após o êxodo, e a nova aliança, a ser feita no futuro. Enquanto a antiga aliança precisava de intermediários, a nova não precisará, pois a lei será colocada no íntimo (= coração, seio) do povo de Israel. Se a antiga aliança foi rompida pelos pais de Israel, a nova não o será jamais, porque haverá perfeita sintonia entre Iahweh e Israel. O objetivo desta nova aliança: conhecer Iahweh. É o repetido tema do conhecimento de Iahweh que aqui volta. É um tema da maior importância e explica muitas das atitudes e palavras de Jeremias. Jeremias chegou mais perto do que ninguém da compreensão do verdadeiro problema de Israel de sua época, que era a estrutura tributária do Estado. Sua rejeição de instituições como o Templo e seu aparelho cultual ou a corte e sua administração é, na verdade, a denúncia dos aparelhos do Estado tributário como antijavistas e perniciosos para o povo.

A proclamação de uma nova aliança, onde o javismo não precisaria de mediações para ser vivido, é a radicalização utópica de sua pregação. É o sonho de Jeremias. 0

E o 4  período da atuação de Jeremias?

Após a queda de Jerusalém em 19.07.586 a.C., assistimos ao crepúsculo do profeta. Deixado livre pelos babilônios, Jeremias escolheu ficar com o governador Godolias, neto de Safã, escriba chefe da reforma de Josias, membro de uma família que sempre apoiara Jeremias em Jerusalém. Assim, junto ao resto do povo pobre que ficou no país, Jeremias certamente alimenta ainda a esperança de "construir e plantar", como conta o texto que fala de sua vocação em Jr 1,10 E como Jeremias terminou seus dias?

A situação em Judá se complicou rapidamente, quando um príncipe davídico chamado Ismael, que escapara para Amon, voltou e assassinou Godolias, provavelmente em outubro de 5 86 a.C., segundo Jr 41,1-18. Os sobreviventes, entre eles Jeremias, fogem para o Egito, temendo uma represália babilônica (Jr 42,1-43,7). Lá no Egito, em Táfnis, cidade situada a leste do delta do Nilo, o inc ansável profeta, que já devia ter uns 70 anos de idade, passa a repreender a idolatria que seus conterrâneos ali praticavam, segundo Jr 44,1-30. Depois disso, nada mais sabemos sobre Jeremias. Diz a lenda que o profeta de Anatot foi apedrejado e morto por seus conterrâneos, lá no Egito. Esta lenda está no apócrifo Vida dos profetas, um texto escrito por um judeu da Palestina no século I d.C.

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