Acesso a Justica
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Artigo Revista da Escola de Magistratura de Alagoas...
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O MOVIMENTO MUNDIAL DE ACESSO À JUSTIÇA E OS CAMINHOS PARA A PRESTAÇÃO DE ASSISTÊNCIA JURÍDICA GRATUITA THE GLOBAL MOVEMENT FOR ACCESS TO JUSTICE AND THE ROADS FOR THE PROVISION OF FREE LEGAL AID
Gárdia Rodrigues Silva1 Olga Jubert Gouveia Krell 2
RESUMO: Observa-se os conornos do movimeno mundial de acesso à jusiça.
Para ecer os fios que o consroem, a ênfase recai em auores que realizam uma incursão nos meandros da assisência jurídica grauia, a exemplo de Mauro Cappelleti e Bryan Garh, assim como Boavenura de Sousa Sanos e Kim Economides. Nesse senido, o esudo abrange desde a evolução do conceio de acesso à jusiça aé os obsáculos e as soluções para alcançar aldireio, percorrendo a rajeória e as esraégias adoadas por disinos sisemas judiciários. PALAVRAS�CHAVE: Acesso à Jusiça; Assisência Jurídica Grauia; Movimeno
Mundial. ABSTRACT: IWe can observe he conours of he worldwide movemen of access
o jusice. To weave he hreads ha consruc i, he emphasis falls on auhors who make a foray ino he inricacies of free legal aid, such as Mauro Cappelleti and Bryan Garh, as well as Boavenura de Sousa Sanos and Kim Economides. In his sense, he sudy ranges from he evoluion of he concep of access o jusice o obsacles and soluions o achieve his righ, racing he rajecory and sraegies adoped by differen judicial sysems. KEY WORDS� Access o Jusice; Free Legal Aid; World Movemen. 1
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Douoranda em Sociologia e Direio pela Universidade Federal Federal Fluminense (UFF). Advogada Orienadora do Núcleo de Práica Jurídica, da Faculdade de Direio, da Universidade Federal de Alagoas (EMAJ/FD (EMAJ/FDA/UFAL). A/UFAL). Douora em Direio Direio Público pela Universidade Federa Federall de de Pernambuco Pernambuco (UFPE). Professora Associada da Faculdade de Direio, da Universidade Federal de Alagoas (FDA/UFAL).
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INTRODUÇÃO On one occasion, when the medieval justices of the king of England went out into the country on General Eyre, one Alic Al ic e, th thee dau gh ghte terr of Pi Pier erss Kn Knot otte te,, ca came me be befo fore re th thee co cour urtt and begged for help, saying that: “Alice can get no justice at all, seeing that she is poor and this Thomas is rich.” She told the court that she had no one to plead for her, praying: “For God’s sake, Sir Justice, think of me, for I have none to help me save God and you”. 3
Ao longo dos anos 1960 e seguines, imporanes esudos volam a aenção para o acesso à justiça e seus desdobramenos. Para raar do ema, é imprescindível recorrer à obra de Mauro Cappellei, James Gordley e Earl Johnson Jr., Toward Equal Justice: a comparative study of legal aid in modern societies.4 O excero em epígrafe revela o fio conduor da obra em comeno: a presação de serviços de assisência jurídica para os pobres. 5 Cappellei, ao valer-se da hisória de Alice, inaugura a primeira seção do livro, iniulada Legal Aid: modern themes and variations , com o exo The Emergence of a Modern Theme e, a parir dela, faz alusão a inúmeras ouras hisórias de pessoas desprovidas de meios econômicos para arcar com gasos decorrenes da conraação de advogado e cusos do processo. Toward Equal Justice raz uma compilação de exos e maeriais relacionados às resposas que os empos conemporâneos conferem a esse anigo dilema envolvendo o acesso à justiça . Ao versar sobre os avanços da assisência jurídica para pa ra os pobres os auores direcionam o olhar para os meandros do acesso à justiça em disinos conexos mundiais. É de regisrar-se que esse olhar é consruído sob os auspícios de um ambicioso projeo de invesigação coordenado por Cappellei, desenvolvido ao longo dos anos 1970, e volado para o esudo do ema acesso à justiça em uma perspeciva comparada: o Projeto de Florença. O documeno oficial de finalização desse projeo consise em uma obra de seis omos, publicados enre os anos de 1978 e 1979, com conribuições de diversos pesquisadores,
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CAPPELLETTI, Mauro; GORDLEY, James; JOHNSON JR., Earl. Towards Equal Jusice: a comparaive compara ive sudy of legal aid in modern socieies. Milano: Dot. A. Giuffrè, 1975. p. 5. Id. Ibid. De acordo com a expressão uilizada pelos auores: legal assistance for the poor.
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de diferenes localidades. 6 No enano, é a sua edição resumida resumi da que demarca o movementt , surgido após a Segunda Guerra Mundial, início do access to justice movemen e desinado a ornar o sisema jurídico acessível a odos, independenemene da renda. Com efeio, é a parir do Relaório Geral do Projeto de Florença , Acces es to Just Justice ice:: the t he worl worldwi dwide de moveme movement nt to make consubsanciado no livro Acc rights effective – a general report , sob a coordenação de Cappellei e Bryan Garh,7 que o ema é alçado à paua das mais diversas agendas. Esse ensaio, publicado no Brasil já nos anos finais de 1980, com o íulo Acesso Ace sso à Justi J ustiça ça ,8 raz um compêndio das invesigações empíricas realizadas por esses pesquisadores sobre o funcionameno dos sisemas judiciários de alguns países, a exemplo da Iália, França, Espanha, Porugal, Esados Unidos, enre ouros. Nessa direção, o esudo aborda desde a evolução do conceio de acesso à justiça aé os obsáculos e as soluções para alcançar esse direio. Liiganes do Judiciário, leis vigenes, sujeios coleivos, ineresses difusos, disparidades socioeconômicas, reformas judiciais, reformas em ouras insiuições da sociedade são algumas quesões que aravessam a obra em apreço. Apesar do viés eórico-processualisa que dá início ao projeo, dado que o debae emerge a parir do Cenro de Esudos de Direio Processual Comparado de Florença ou, em ouras palavras, do Projeto Florentino de acesso à justiça , a invesigação invesigação apresena aprese na um viés sócio-jurídico, e o resulado final reraa um imporane diagnósico do lugar reservado na sociedade para os problemas concernenes à efeividade de direios. 1
DOS CONTORNOS DO ACESSO À JUSTIÇA Acesso à justiç justiça a é uma caegori caegoriaa que pode ser uilizada a parir de disinos
espaços e empos. Por isso, se configura como um problema “amplo e complexo, além de comporar múliplas inerpreações: jurídica, econômica, políica ou sociológica”. 9 De acordo com Cappelleti e Garh, o ermo acesso à justiça é de difícil definição, mas indica as finalidades basilares do sisema jurídico, 6 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryan. Dimensioni della giusizia nelle socieà conemporanee: sudi di dirito giudiziario comparao. comparao. Bologna: Il Mulino, 1994. 7 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryan. Access o Jusice: he newes wave in he worldwide worldwide movemen o make righs effecive. Milano: Dot. A. Giuffrè, 1978. 8 CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryan. Acesso à Jusiça. Tradução: Ellen Gracie Norhflee. Poro Alegre: Sergio Anônio Fabris, 1988. 9 FALCÃO, Joaquim. Acesso à jusiça: diagnósico e raameno. raameno. In: AMB (Org.). Jusiça, Promessa e Realidade: o acesso à jusiça em países ibero-americanos. Rio de Janeiro: Nova Froneira,, 1996, p. 271. Froneira
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como um “sisema pelo qual as pessoas podem reivindicar seus direios e/ ou resolver seus liígios sob os auspícios do Esado”. Sendo assim, “o sisema deve ser igualmene acessível a odos”, assim como “deve produzir resulados que sejam individual e socialmene jusos.” Embora a ênfase recaia sobre a primeiraa finalidade, a segunda ambém é levada em consider primeir consideração ação no esudo, já pressupõee que “a jusiça social, al como desejada pelas sociedades modernas, pressupõ o acesso efeivo.” 10 Acompanhar a evolução eórica de acesso à justiça é acompanhar as próprias ransformações do Esado. No esado de mariz liberal, o acesso à justiça é adsrio ao ingresso em juízo ( input), ou seja, abrange ão somene o exercício do direio de ação, com a aividade judicial considerada apenas sob o aspeco formal e descriivo. Aplicação objeiva do direio legislado ao caso concreo, juiz especador do processo, conceio de acesso arelado a uma concepção privaisa, privaisa, filosofia essencialmene individualisa dos direios, são ouros demarcadores desse modelo. Nesse momeno, “afasar a ‘pobreza no senido legal’ — a incapacidade que muias pessoas êm de uilizar a jusiça e as insiuiçõe insiuiçõess — não é preocupação do Esado”.11 No laissez faire, a “jusiça […] só podia ser obida por aqueles que pudessem arcar com os seus cusos”. 12 No esado de mariz social ou de bem-esar social, o acesso à justiça esá em consonância com uma concepção mais publicisa do Direio. Crescimeno das funções esaais, aumeno e insrumenalização dos poderes judiciais, aplicação mais livre e subjeiva do direio pelos juízes, iso é, juiz adminisrador do processo como agene da mudança social, e processo considerado como poencial insrumeno de ransformação social, são alguns elemenos que perpassam esse modelo. “Insiuições mais compromeidas com as coningências sócio-políicas e menos apegadas ao formalismo conservador do período liberal” demarcam esse momeno. 13 O esado procedimenal do Direio esá assenado em pressuposos disinos dos modelos precedenes. Aqui, Cândido Rangel Dinamarco fala em acesso à justiça como “sínese de odo o pensameno insrumenalisa e dos grandes princípios e garanias consiucionais do processo”. Ao raar da instrumentalidade do processo , o auor refere que quando se fala em processo 10 11 12 13
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryan. op. ci., p. 8. Id. ibid., p. 9. democráico ico. Brasília: Gazea Jurídica, NUNES, Dierle; TEIXEIRA, Ludmila. Acesso à jusiça democrá 2013. p. 21. Id. ibid., p. 30.
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como insrumeno, como meio para se chegar a um fim, os seus fios conduores devem ser previamene raçados para que os seus objeivos sejam alcançados, ou seja, os escopos jurídicos, sociais e políicos devem ser previamene delineados. Ao eleger esses escopos, o processo é invocado a “assumir as responsabilidades que dele espera a nação, devendo ser sempre permeável aos influxos da sociedade e abero aos valores subsanciais eleios”. 14 Traa-se de uma nova concepção, pauada pela subsiuição subsi uição do olhar dirigido para o jurisdicionado: “de um sujeio de piedade, como cliene, para ouro cenrado no sujeio políico, auor e desinaário das decisões que afeam o seu desino”.15 Para eviar a represenação discriminaória da perspeciva liberal, assim como a represenação paernalisa da perspeciva social dos direios, o acesso à justiça democrático raz oura proposa para a reconsrução das noções de direios, de jurisdição e de processo, e resa assim definido: O acesso à jusiça democráico democráico refere-se à consideração com que o jurisdicionado em suas reivindicações recebidas nas esferas oficiais de poder (inpu), a profundidade do diálogo (respeio aos direios fundamenais processuais), ao poder de influência que ele exerce sobre as decisões que lhe submeem (conradiório como direio de influência e não surpresa), e não só à eficácia quaniaiva e a produividade do sisema como um odo. 16
Depreende-se que de uma perspeciva de acesso formal, o referido conceio passa a ser acolhido a parir de uma perspeciva de acesso maerial, e é aponado como o “requisio fundamenal — o mais básico dos direios humanos — de um sisema jurídico moderno que preenda garanir, e não apenas proclamar os direios de odos”. 17 Para Marc Galaner, com o movimeno mundial de acesso à justiça, o ermo adquire conornos que revelam “a capacidade de uilizar as várias insiuições, governamenais e não governamenais, judiciais e exrajudiciais, onde um requerene poderia pleiear jusiça”, em conraposição aos momenos aneriores, nos quais acesso à justiça referia-se ão somene ao acesso às insiuições judiciais governamenais. 18 14 15 16 17 18
DINAMARCO, Cândido Rangel. A Insrumenalidade do Processo. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 149/320;. NUNES, Dierle; TEIXEIRA, Ludmila. op. ci., p. 197. Id. ibid., pp. 60-61. CAPPELLETTI; GARTH. op. ci. p. 12. GALANTER, Marc. Marc. Acesso à Jusiça em um mundo com capacidade capacidade social social em expansão. In: FERRAZ, Leslie Sherida (Coord.). Repensando o acesso à jusiça no Brasil: esudos inernacionais. Aracaju: Aracaju: Evocai, 2016, p. 12. v. 2 - Insiuos Inovadores.
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Nessa direção, acesso à jusiça é um amálgama desses exos e conexos, em palavras ouras, raa-se de uma concepção ampla, de um direio não adsrio ao acesso aos órgãos judiciários, eis que abrange equivalenes jurisdicionais adequados ao raameno de conflios, e revela um senido axiológico em consonância com uma ordem jurídica jusa. Apesar de, paulainamene, alcançar o saus de direio social básico, o conceio de efeividade é, de per si, algo vago. Conforme Cappellei e Garh, no conexo de um dado direio subsanivo, a plena efeividade pode ser enendida como “igualdade de armas” enre as pares, ou seja, “a garania de que a conclusão final depende apenas dos mérios jurídicos relaivos das pares anagônicas, sem relação com diferenças que sejam esranhas ao Direio e que, no enano, afeam a afirmação e reivindicação de direios”. 19 Ocorre que as diferenças enre as pares dificilmene são compleamene erradicadas. Nesse senido, os auores idenificam os obsáculos que circunscrevem al direio. 2
DOS OBSTÁCULOS AO ACESSO À JUSTIÇA [...] os cidadãos de menores recursos endem a conhecer pior os seus direios e, porano, a er er mais dificuldades em reconhecer um problema que os afea como sendo problema jurídico; [...] mesmo reconhecendo o problema como jurídico, como violação de um direio, é necessário que a pessoa se disponha a inerpor a ação. Os dados mosram que os indivíduos das classes mais baixas hesiam muio mais que os ouros em recorrer aos ribunais mesmo quando reconhecem esar perane um problema legal; [...] quano mais baixo é o esrao socioeconômico do cidadão, menos provável é que conheça advogado ou que enha amigos que conheçam advogados, menos provável é que saiba onde, como e quando pode conraar o advogado, e maior é a disância geográfica enre o lugar onde vive e a zona da cidade onde se enconram os escriórios de advocacia e os ribunais.20
Dificuldades de acesso a uma série de direios perpassam as experiências hisóricas de diversos países. O acesso à justiça é um desses direios. O fragmeno em realce, de Boavenura de Sousa Sanos, apona alguns enraves para a reivindicação de direios e/ou a solução de liígios perane as 19 20
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryan. Acesso à Jusiça. Tradução: Ellen Gracie Norhflee. Poro Alegre: Sergio Anônio Fabris Edior, 1988, p. 14. SANTOS, Boavenura de Sousa. Inrodução à Sociologia da Adminis Adminisração ração da Jusiça. Revisa Críica de Ciências Sociais. n.º 21, nov. 1986. p. 21.
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insâncias judiciárias. Quando reivindicados, o vuluoso número de processos, o excessivo formalismo das práicas forenses e a morosidade processual são ouros obsáculos que circunscrevem a ramiação da ação judicial. Consoane Cappelleti e Garh, 21 (I) cusas judiciais; (II) possibilidade das pares e (III) problemas relaivos aos ineresses difusos figuram como emas principais quando se fala em obsáculos ao acesso à justiça e, em conjuno com ouros subemas, figuram como imporane diagnósico para as proposições e conclusões do Relaório Geral do Projeto de Florença. No ocane às cusas judiciais: a) em geral, a resolução resolução formal de liígios liígios é excessivamene excessivamene dispendiosa, dispendiosa, o que implica alos cusos para as pares, inviabilizando, assim, o acesso à jusiça pelos mais necessiados necessiados;; b) nas pequenas causas, causas, muias vezes, os os cusos do processo judiciário judiciário podem ulrapassar o monane da conrovérsia; e c) o empo de ramiação do processo pode elevar elevar ainda mais os os seus cusos, cusos, pressionando as pares mais desfavorecidas economicamene para abandonar a causa ou aceiar acordos com valores inferiores aos de direio. Em relação à possibilidade das pares, Cappelleti e Garh valem-se dos esudos de Galaner 22 sobre o ema, e uilizam o ermo cunhado pelo auor para raar das vanagens e desvanagens que os liiganes podem evenualmene dispor. Nesses ermos, enumeramos algumas delas: a) a recursos financeiros, considerando considerando a capacidade de cusear o processo processo e seus desdobrame desdobramenos; nos; b) apidão para reconhecer reconhecer um direio direio e propor uma ação ou sua defesa, considerando a capacidade de reconhecer a exisência de um direio juridicamene exigível, assim como a capacidade de ranspor barreiras como diferença de recursos financeiros, de educação e de status social; c) liiganes “habiuais” ( repeat player) e liiganes “evenuais” ( oneshotter), considerando a habiualidade no exercício de liigação. Aqui, Galaner23 ressala as vanagens dos primeiros liiganes: maior conhecimeno do Direio e, correlaivamene, maior capacidade de esruurar o liígio; economia de escala, dado o volume de processos; 21 22 23
CAPPELLETTI, id. ibid. GALANTER, Marc. Marc. Why he “haves” “haves” come ou ou ahead: speculaions speculaions on he limis limis of legal legal change. Law and Sociey Review, Amhers, n. 9, n.º 1, 1974. Id. ibid.
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possibilidade de maior esreiameno das relações com os membros do Poder Judiciário, enre ouras. No que ange aos problemas especiais dos ineresses difusos, os auores referem-se à uela adequada de direios difusos ou coleivos, a exemplo da proeção ao meio ambiene e da proeção ao consumidor. Diane da complexidade das sociedades conemporâneas, conemporânea s, revela-se insuficiene a uela meramene individual. individua l. “Os direios e os deveres não se apresenam mais, como nos Códigos radicionais, de inspiração individualísica-liberal, como direios e deveres essencialmene individuais, mas mea-individuais e coleivos”. É possível falar em “ipos novos de uela, não confiados exclusivamene ao ineresse maerial e ao capricho da iniciaiva individual”, eis que “o indivíduo pessoalmene lesado, legiimado a agir exclusivamene para a preparação do dano a ele advindo, não esá em posição de assegurar nem a si mesmo nem à coleividade uma adequada uela conra violações de ineresses coleivos”. 24 Obsáculos de ordem econômica (pobreza, fala de acesso à informação, represenação ineficaz), procedimenal (inadequação de formas radicionais de resolução de conflios e insiuos jurídicos) e organizacional (fala de uela e regulamenação de ineresses difusos), apresenam maior ou menor imporância e incidência, em consonância com a pessoa, a insiuição e a demanda em quesão. Da idenificação desses óbices, depreende-se que são mais recorrenes e desfavoráveis para pequenas causas e auores individuais, noadamene, pessoas em siuação de pobreza e vulnerabilidade. Nessa eseira, são esses casos que revelam maiores problemas quano à afirmação e/ou reivindicação reivindicaç ão de direios. Segundo Galaner, 25 as empresas e o Esado figuram com maior frequência nos processos, assim como apresenam maiores índices de viória. Ao raar do assuno, o auor coloca em evidência que a parir da lei, muias dessas desigualdades poderiam resar afasadas ou minimizadas, mas, em muias siuações, o problema é agravado. Os novos direios subsanivos, que são caracerísicos do moderno Esado de bem-esar social, no enano, êm precisamene eses conornos: por um lado, envolvem envolvem esforços para apoiar os cidadãos conra os governos, os consumidores conra os comercianes, o povo conra os poluidores, os 24 25
CAPPELLETTI,I, Mauro. CAPPELLETT Mauro. Formações Formações sociais sociais e ineresses coleivos coleivos diane da da jusiça jusiça civil. civil. Rivisa di Dirito Processuale. Padova, v. v. 30, p. 365, 1975. GALANTER, Marc. Why he “haves” come ou ahead: speculaions on he limis of legal change. Law and Sociey Review. Amhers, n. 9, n.o 1, 1974.
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locaários conra os locadores, os operários conra os parões (e os sindicaos); por ouro lado, o ineresse econômico de qualquer indivíduo — como auor ou réu ré u — será provavelmene pequeno. É evidenemene uma arefa difícil ransformar esses direios novos e muio imporanes — para odas as sociedades modernas — em vanagens concreas para as pessoas comuns.26
Para Galaner,27 o acesso à justiça desponou no cenário legal como pare de um “rio inelecual”, composo pela perspeciva da dispua em esudos jurídicos e pelo movimeno Alternative Dispute Resolution (ADR). Apesar da emergência em conjuno nos anos 1970, decorrene de um movimeno de responsabilidade (accountability) e recursos (remedy) promovido pelos ribunais e legislaivos, os “rigêmeos”, adoados por diferenes países, seguiram disinas rajeórias e foram combinados com ouros mecanismos. A perspeciva da dispua nos esudos jurídicos consise em uma consrução eórico-inelecual eórico-inelecual com ênfase na pirâmide da dispua. De acordo com o auor, a disposição de qualquer seor conforma uma pirâmide, na qual a base dos problemas ou danos é subjacene a uma camada de danos percebidos que, por sua vez, leva a uma camada sucessivamene menor de queixas, reivindicações e dispuas. “Uma pare dessas dispuas é levada a advogados e Tribunais, como pares sucessivamene menores são objeo de julgamenos, recursos e decisões judiciais publicadas.” Valendo-se dos ensinamenos de William Felsiner, Richard Abel e Ausin Sara em The Emergence and Transformation os Disputes: Naming, Blaming, Claiming (1980-1981), Galaner faz referência às camadas da pirâmide: “nomeando (o reconhecimeno e a idenificação de um dano), acusando (a idenificação de um agene humano responsável por al dano) e, finalmene, reivindicando (ajuizando uma ação conra a pare)” e realça os obsáculos de acesso à justiça decorrenes das disparidades enre os usuários dos sisemas judiciais. Em uma releiura do ema, a parir de uma experiência experiênci a brasileira, os esudos empíricos de Sanos, realizados em uma comunidade do Rio de Janeiro, com o nome ficício de Pasárgada, ao longo da década de seena, acrescenam ouros obsáculos ao acesso à justiça , como sociais e culurais. Nas palavras do auor, a discriminação social no acesso à justiça é um fenômeno mais 26 27
CAPPELLETTI; GARTH. Op. ci., p. 12. GALANTER, Marc. Marc. Acesso à Jusiça em um mundo com capacidade capacidade social social em expansão. In: FERRAZ, Leslie Sherida (Coord.). Repensando o acesso à jusiça no Brasil: esudos inernacionais. Aracaju: Aracaju: Evocai, 2016, pp. 19-20. v. 2 - Insiuos Inovadores.
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complexo do que parece, pois, “para além das condicionanes econômicas, sempre mais óbvias, envolve condicionanes sociais e culurais resulanes de processos de socialização e de ineriorização de valores dominane dominaness muio difíceis de ransformar”. 28 Ao coejar o Direio oficial esaal e o Direio informal não oficial, fundado na Associação de Moradores dessa comunidade, como insância de resolução de conflios enre vizinhos, principalmene em quesões sobre habiação e propriedade, Sanos desvela uma realidade que, diane do disanciameno enre as insiuições e a sociedade, abarca a adoção de ouros procedimenos para a resolução de conflios, disinos dos procedimenos esaais. De acordo com o auor, o Esado conemporâneo não em o monopólio da produção e disribuição do direio, “o direio esaal coexise na sociedade com ouros modos de juridicidade, ouros direios que com ele se ariculam de modos diversos.” 29 A parir dessas idenificações, são proposas algumas soluções para se alcançar ouro paamar de acesso à justiça.
3 DOS MODELOS DE PRESTAÇÃO DE ASSISTÊNCIA JURÍDICA Para superar os obsáculos econômicos, organizacionais e procedimenais, Cappelleti e Garh apresenam um conjuno ariculado de reformas jurídicas, caegorizadas cronologicamene. São algumas soluções práicas ou “ondas renovaórias” que emergem a parir dos anos 1960, reunindo “seus coneúdos e objeivos, objeivo s, na demonsração das ransformações conceiuais do acesso à jusiça, como paradigma a ser aplicado no esudo do fenômeno processual e noreador de projeos de reformas nos sisemas jurídicos processuais”. processuais”. 30 Essas soluções ou “ondas” esão consubsanciadas consubsanciadas:: (I) na criação de assisência judiciária para aqueles desprovidos de recursos para cusear esses serviços; (II) na inclusão de ineresses difusos como objeos de proeção jurídica, sobreudo na área de proeção do meio ambiene e proeção do consumidor; e (III) no acesso à jusiça efeivo, com a reforma dos modelos em voga. Traa-se, Traa-se, como refere Cappelleti, de uma série de avanços insiucionais. insiucionais. 28 29 30
SANTOS, Boavenura de Sousa. Inrodução à Sociologia da Adminis Adminisração ração da Jusiça. Revisa Críica de Ciências Sociais, n.o 21, nov 1986, pp. 21-22. SANTOS, op. ci. GOMES NETO, José Mário Wanderle Wanderley. y. O acesso à justiça em Mauro Cappellei: análise eórica desa concepção como “movimeno” de ransformação das esruuras do processo civil brasileiro. Poro Alegre: Sérgio Anonio Fabris, 2005, p. 62.
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A primeira onda, iniciada em 1965 com os escriórios de advocacia de bairro do programa do Deparameno de Oporunidades Econômicas (Office of Economic Opportunity ), compreendeu a reforma de insiuições para o provimeno de serviços legais para os pobres. A segunda onda buscou ampliar a represenaividade dos “ineresses difusos”, ais como aqueles de consumidores e ambienalisas: começou nos Esados Unidos com o desenvol desenvolvimeno vimeno de “escriórios de advocacia de ineresse público”, manidos por fundações. A erceira onda adveio nos anos 1970 com a mudança de foco para as insiuições de processameno de dispuas em geral, ao invés de simplesmene as insiuições de represenação legal; alernaivas menos formais às cores e aos procedimenos judiciais. judiciais.31
Em um primeiro momeno, “os esforços para incremenar o acesso à jusiça nos países ocidenais concenraram-se, muio adequadamene, em proporcionar serviços jurídicos para os pobres”. 32 Ao versar sobre a assisência jurídica para os pobres, a primeira solução ou “onda” faz referência a alguns modelos de presação desses serviços. Um deles é o modelo Judicare (a), adoado na Áusria, Inglaerra, Holanda, França e Alemanha. Esse sisema é pauado na assisência como direio e, nessa eseira, envolve a presação de serviços por advogados pariculares cuseados pelo Esado, para fins de proporcionar aos liiganes hipossuficienes a mesma represenação em juízo que eriam caso pudessem pagar por esses serviços. Ouro modelo, advindo do Programa de Ec onomic ic Opport Opp ortunit unity y, em 1965, com o moe Serviços Jurídicos do Office of Econom “guerra conra a pobreza” 33 é o (b) advogado remunerado pelos cofres públicos. São serviços jurídicos presados por advogados de “escriórios de vizinhança”, siuados na própria comunidade. Os serviços, volados para a promoção dos ineresses dos pobres, são pagos pelo governo, sendo adepo desse sisema os Esados Unidos. E, o erceiro modelo, refere-se ao sisema miso (c), no qual os países buscam o encadeameno dos modelos aneriores, como sisemas que se complemenam, a exemplo da Suécia e da Província de Quebec, no Canadá, com a possibilidade de escolha enre o aendimeno por advogados servidores públicos ou por advogados pariculares. Essas soluções são direcionadas para superar obsáculos econômicos para o efeivo acesso à justiça . Levando-se em 31 32 33
CAPPELLETTI, Mauro. Access o Jusice and Welfare Sae. 1981, p. 56. CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryan. Acesso à Jusiça. Tradução: Ellen Gracie Norhflee. Poro Alegre: Sergio Anônio Fabris Edior, 1988, pp. 31-32. Cf.: JOHNSON JR, Earl. Jusice and reform: he formaive years of he legal services program.
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cona que “o auxílio de um advogado é essencial”, é dever do Esado garanir o acesso à justiça aos necessiados necessiados..34 “O segundo grande movimeno no esforço de melhorar o acesso à jusiça enfrenou o problema da represenação dos ineresses difusos, assim chamados os ineresses coleivos ou grupais, diversos daqueles dos pobres”. pobres” . Esse movimeno enseja reflexões sobre as básicas e radicionais noções de processo civil e sobre o papel dos ribunais, e correlaas ransformações. ransformações. A perspeciva individualisa individualisa do processo judicial é subsiuída por oura, com um viés mais social e coleivo. Sendo assim: (II) objeos de proeção jurídica, incluídos como ineresses difusos, compreende a: a) proposiura de ações em defesa de ineresses públicos ou coleivos por meio governamenal; b) proposiura por meio de Procurador-Geral privado, al como ocorre nos Esados Unidos; ou ainda por meio de c) sociedades de advogados pariculares do ineresse público, al como ocorre na França. Para superar os obsáculos organizacionais, os auores sugerem uma solução “pluralísica para o problema de represenação dos ineresses difusos”, que “combine recursos e iniciaivas ano do seor público quano de grupos de pariculares para uma reivindicação mais eficiene dos ineresses difusos”. 35 A erceira solução ou “onda” converge para uma (III) concepção mais ampla de acesso à justiça , e al abrangência “inclui a advocacia, judicial ou exrajudicial, seja por meio de advogados pariculares ou públicos, mas vai além”. 36 Essa solução não abandona as écnicas aneriores, mas sim amplia a gama de possibilidades para ornar o acesso efeivo, com uma muliplicidade de reformas, com alerações em procedimenos, mudanças em esruuras de anigos e novos ribunais, uso de pessoas leigas ou para profissionais, modificações jurídicas para eviar liígios ou faciliar sua solução, uso de mecanismos alernaivos para a resolução dos liígios, enre ouros. Para Mario Gryszpan,37 a erceira onda decorre e, ao mesmo empo, em po, envolve, as ondas 34 35 36 37
CAPPELLETTI, op. ci., p. 38. CAPPELLETTI, CAPPELLETTI,I, op. ci., p. 49; 66. CAPPELLETT Id. ibid., p. 67. GRYNSZPAN, Mario. Cidadania, jusiça e violência . Rio de Janeiro: FGV, 1999, p. 100.
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aneriores, “expandindo e consolidando o reconhecimeno e a presença, no Judiciário, de aores aé enão excluídos, desembocando num aprimorameno ou numa modificação de insiuições, mecanismos, procedimenos e pessoas envolvidos no processameno e na presença de dispuas na sociedade”. Essa onda requer: a) Reforma dos procedimenos judiciais em geral, com a melhoria dos ribunais e de seus procedimenos, a exemplo dos Esados Unidos, da Françaa e da Alemanha; Franç b) o uso de Méodos alernaivos alernaivos para resolução dos conflios, conflios, com a uilização de procedimenos mais simples e/ou de julgadores mais informais, a exemplo dos Esados Unidos, por meio de: i. Juízo Arbiral, Arbiral, como procedimeno procedimeno relaivamene relaivamene informal, com julgadores doados de formação écnica ou jurídica e decisões vinculaórias vinculaór ias com limiadas possibilidades de recurso; ii. da Conciliação, como procedimeno que não demanda julgameno, revela mais fácil cumprimeno, e resaura os laços dos relacionamenos relacionameno s prolongados; e iii. dos Incenivos econômicos, como insrumeno para esimular acordos. A insauração de: c) Insiuiçõe Insiuiçõess e procedimenos procedimenos especiais especiais para para deerminados ipos de causas de paricular imporância social, aqui em-se os desvios especializados e a criação de ribunais especializados, a exemplo dos Esados Unidos, Ausrália, Suécia, Inglaerra, Inglaerra, enre ouros, mediane a uilização de: i. Procedimeno Procedimenoss especiais especiais para pequenas causas, a exemplo exemplo das relações de consumo ou de locação; ii. Tribunais de “Vizinhança” ou “Sociais” para solucionar divergências nas comunidades; iii. Tribunais Especiais para demandas de consumidores; iv. Mecanismos Especializados para garanir direios “novos” em ouras áreas do Direio; d) Mudanças nos méodos méodos uilizados para a presação presação de serviços serviços jurídicos, jurídicos, a exemploo dos Esados Unidos, da Alemanha, e da Inglaerra, com o uso de: exempl v. “Parajurídi “Parajurídicos”, cos”, assisenes assisenes jurídicos jurídicos com diversos diversos graus graus de reinameno em Direio, e de Revista da ESMAL / Alagoas-AL / ano 2017 / n.º 6 / Novembro 2017 / ISSN 1678-0450
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vi. Planos de Assisência Jurídica mediane convênio ou em grupo, aravés aravés de Planos e proposas para ornar os advogados mais acessíveis, mediane cusos razoáveis aos indivíduos das classes média e baixa e, por fim, a e) Simplificação do Direio, com com a enaiva enaiva de ornar mais mais fácil que as pessoas saisfaçam as exigências para a uilização de deerminado remédio jurídico, a exemplo dos Esados Unidos e da Nova Zelândia. Nesses ermos, essas configurações são o eixo esraégico do Relaório Geral do Projeto de Florença. O movimeno mundial de acesso à justiça é assinalado pela criação desses diversos mecanismos, marcados ma rcados por uma aiude mais posiiva do Esado; pela melhoria das esruuras de assisência jurídica; pela reformulação procedimenal e insiucional; pela revisão de noções radicionais; enre ouros demarcadores. O reconhecimeno dos obsáculos a serem ransposos e o desenvolvimeno desses insrumenos, são condições primeiras para a busca de uma ordem jurídica igualiária. Para Kim Economides,38 para além das soluções e/ou “ondas” proposas por Cappelleti e Garh, há uma quara “onda renovaória” quando se fala em acesso à justiça. A parir de um projeo inerdisciplinar, Justi ce in inerdisciplinar, iniulado Access to Justice Rural Britain Project, o auor raz oura perspeciva analíica, fundada fund ada em olhar não apenas para a ofera, mas ambém para a demanda de serviços jurídicos. Com efeio, esabelecendo como pono de parida a indissociabilidade enre ofera e demanda, Economides busca idenificar os obsáculos ao acesso que circunscrevem os próprios operadores do Direio. Há, pois, um deslocameno do eixo de invesigação, dos desinaários da presação jurisdicional, passa para os presadores desse serviço. Após direcionar o olhar para o acesso à justiça nas comunidades rurais, no sudoese da Inglaerra, a parir de uma invesigação sobre disribuição e rabalho de advogados e sobre necessidades legais, o auor confere ênfase aos esudos no campo da éica legal, eis que “o acesso dos cidadãos à jusiça é inúil sem o acesso dos operadores do direio à jusiça”. Considerando que a linha de acesso à justiça adoada pelo Projeto de Florença é macro políica, diz o auor que “é hora de examinar ambém, no nível micro, as compreensões 38
ECONOMIDES, Kim. Lendo as ondas do “Movimeno “Movimeno de Acesso à Jusiça”: episemologia versus meodologia? In: PANDOLFI, Dulce Chaves e al. (Orgs.) Cidadania, jusiça e violência. Rio de Janeiro: FGV, 1999.
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pariculares de jusiça alcançadas por membros individuais da profissão jurídica: o movimeno conemporâneo de acesso à jusiça precisa volar sua aenção para o novo ema da éica profissional”. Não se raa, pois, de eleger uma dessas abordagens, mas sim de “criar, susenar e equilibrar em nossa análise do acesso à jusiça uma nova sínese enre os níveis macro e micro”. 39 De um lado, o auor vola a aenção para a meodologia, e refere que para compreendê-la é preciso raar igualmene de rês elemenos: “a) a naureza da demanda dos serviços jurídicos; b) a naureza da ofera desses serviços jurídicos; e c) a naureza do problema jurídico que os clienes possam desejar razer ao fórum da jusiça”. 40 Sendo assim, para superar os obsáculos ao acesso a justiça pelos presadores de serviços jurídicos, é preciso levar em cona, em um primeiro momeno, o acesso dos cidadãos ao ensino do Direio e ao ingresso nas profissões jurídicas e, em um segundo momeno, como se dá o acesso de ais operadores à jusiça, após invesidos nas carreiras. A solução aqui é um encadeameno enre a esruura macro, eixo da demanda, e a esruura micro, eixo da ofera.
CONSIDERAÇÕES FINAIS O acesso à justiça pode ser considerado um direio basilar para a garania de odos os demais direios. Em ouras palavras, a iularidade de direios maeriais resa assegurada quando há efeivação do acesso à justiça . Traa-se de um direio esruurane das sociedades conemporâneas, conemp orâneas, eis que é só a parir dele que é possível falar em um Esado democráico de direio. 41 O surgimeno do movimeno de acesso à justiça, em disinos países, e de diferenes formas, revela uma preocupação em relação a aender às necessidades daqueles que durane muio empo não iveram condições de reivindicar seus direios. 42 São proposas e reformas voladas para a efeivação de direios de pessoas comuns. Apesar dos riscos e limiações, acenam para a afirmação da cidadania.
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De acordo com Hilary Sommerlad, 43 a relação reflexiva e concomianemene consiuiva enre direio e sociedade orna o acesso à justiça fundamenal para o coneúdo da cidadania: Uma jusiça acessível aos não privilegiados é provavelmene a chave para a necessidade mais urgene nas nossas noss as democracias do final do século: o desafio da inclusão. A não ser que consigamos cons igamos resolver os problemas da marginalização e exclusão, os regimes que criamos e consolidamos não merecerão o adjeivo de “democráicos”. […] A não ser que alcancemos acesso geral e universal, o direio à jusiça coninuará a ser um privilégio e não um direio”.44
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