A Onda Verde - Monteiro Lobato

May 4, 2017 | Author: Guizo Vermelho | Category: N/A
Share Embed Donate


Short Description

Download A Onda Verde - Monteiro Lobato...

Description

M o N T £. I R o

LOBATO

-?•

A Onda Ve r de

5BGUNDA EDIÇÃO

I

í

^ I

"1

I

-:â

DO MESMO AUTOR URUPÊS



Contos.

IDÉAS DE JECA TATU

CIDADES MORTAS — NEGRINHA — Contos. PROBLEMA VITAL —



Critica.

Contos e impressõe».

Hygiene e

NARIZINHO ARREBITADO

FABULAS



Phantasia.



sociologia.

Phantasia.

'*3l«^ít^*^t^-/•^:í;^->^í^^^

MONTEIRO LOBATO

A

Onda Verde

MONTEIRO LOBATO & Cia., exíitores RUA GUSMÕES. 70-SÂO PAULO— 1922

ONDA VERDE

A

jã /

/:<

«"-'^

o

QUEM

viaja pelos sertões

,^ Q

,

c\,

\ NÍ^

vê empolgado pelo espectáculo

se

lista

maravilhoso da preamar do café. nasceu

mou

do

pela frialdade

Mas não

parou.

Ahi começa

'^^ em

^ ,

terras

^

To-

fluminenses.

casa.

clima, á orilha

da Paulicéa.

Transpoz o baixadão geento

em Campinas.

mestre Café a perceber aue estava

Corredor de mundo, viajante exótico

vindo d'Arabia ou d'Africa, provara pelo ca-

minho todos os massapés

e sondara todos os climas.

Franzia o nariz, porém. Veiu vj.,

onda verde

desbordou para São Paulo e aqui,

vulto,

e foi espraiar-se

As

velhas fidalguias de

Europa entroncam no

Ter na linhagem um

banditismo dos cruzados.

facinora encoscorado de ferro, que saqueou, quei-

mou,

violou,

matou á larga no Oriente,

um marquez

padrão de gloria de entre os avós

um

"grilleiro"

é o

maior

de França. Ter

de hoje vae

ser

o

orgulho supremo dos nossos millionarios futuros.

Matarás, roubarás, são os mandamentos de alto

bordo do decálogo humano, eternos e

que a ingénua antepondo-lhes "Grillo" é

de Moysés tentou

lei

um

o advogado ou

inverter,

innocuo "não".

uma

zada por meio de

irreductiveis,

propriedade

um

titulo

"águia"

territorial

falso;

legali-

"grilleiro" é

qualquer manipulador

de

"grillos'; terras "grillentas"

as

que têm maromba

de

ou "engrilladas",

alchimia

forense no

titulo.

Como

este acridio proliferou

do que o permitte o tota

humana,

as

na Noroeste mais

coefficiente tolerável

conversas

accentuado locustismo.

resentem-se

da paalli

de

O "Gr



Vou

o"

11

i

comprar

/7 no "grillo" do doutor

terras

Honestino dos Anjos.



Não

leiro" sujo.

caias nessa

um

"gril-

de primeiríssima, que dá gosto,

da Ponte Preta

Porque ha tros

é

Qualquer dia escangalham-lhe com a

patota. "Grillo"

é o

O Honestino

!

!

Esse, sim ...

"grillos" geniaes, obra

de Caglios-

encarnados nos Lobões desovados pelo "vene-

rando mosteiro"

;

e os ha ineptos, mancos, fabrica-

dos ahi por sapateiros de Themis, "curiosos*' da

trampolinagem sem dedo para a

gosam de toda a consideração

coisa.

social

Aquelles devida á

obra dos meneurs de vistas largas, ao passo que a estes os cobre o povo de

irrisão.

— vae o senador Ponte macóta! — E que me de Beltrano? — Um com Alli

Preta,

um

"gríl-

leiro"

dizes

sujo! Borrou-se

indecente da

um

aquelle "grillinho"

Pedra Azul e anda agora a

outro mais inepto ainda. E'

um

tentar

crime deixar

a policia, soltos pelas ruas, typos dessa ordem,



Não A

tem a pinta

Onda Verde



2

! .

.

.

.

-

.

.

Monteiro Lobato

18



E'

O

"grilleiro"

isso.

um

é

papeis, resuscita sellos

Envelhece

alchimista.

do Império, inventa guias

de impostos, crea genealogias, ensina a

escre-

ver a velhos urumbevas que morreram analphabetos,

embaça

Jehovah,

tira

suborna escrivães

juizes,

Seu

a terra do nada.

e,

novo

laboratório

lembra as espeluncas dos Faustos medievos; mais pratico,

porém, não alchimiza

sophal ou o

da

elixir

alli

longa

a pedra philo-

Cagliostro

vida.

virou rábula: manipula a propriedade.

Envelhecer é toda

uma

um

titulo falso,

sciencia.

"enverdadeiral-o",

Mas*conseguem-no. Dão-lhe

a cor, o tom, o cheiro da velhice, e fazem-no

muitas vezes mais authentico do que os reaes.

Expõem-no ao

fumeiro,

a

tal

distancia

maça conforme o grau de ancianidade e

conseguem assim a

gamma

inteira

da

fu-

requerido,

dos amarelli-

dos, segredo até aqui de Chronos.

Emquanto o papel sões sabias, que lhe ás celluloses

se

defuma, fazeni-lhe asper-

dêem

d'antanho.

a rugosidade peculiar

O "Cr illp"

19

Finalmente, para impregnal-o do cheirinho, do

"bouquet" dos decennios, passeiam-no a cavallo, mettido entre o baixeiro e a carona.

E e

.

.

mais coisas fazem que os leigos não pescam,

que constituem o segredo do "ponto de bala".

Tudo da

pelle

dade de

isso,

ás vezes,

velhice,

mas

Veste o lobo a

falha.

fica

com o rabo da moci-

fora.

Conta-se de um, superiormente engenhado, que falliu

um

por artes de

raio

engrillado era perfeito,

onde o advogado

de

sol.

O

documento

sem cochilo minimo por

contrario, preposto a destramar

a marosca, pudesse levantar a perdiz.

que

virasse

e

revirasse

letra, e cotejasse

passe,

Por mais

o papel, e analysasse a

os dizeres, e cheirasse, e apal-

não atinava com o calcanhar de Achilles.

Já com dor de cabeça ia pôr de parte o quando Apollo intervêm. raio de

Um

pela janella e



de

chapa

contra

"grillo", sol entra

o

titulo.

Aquella súbita e intensa illuminação o perito pou-

de vislumbrar as

letras

d'agua com que a fabrica

--'•

20

marcara o papel.

Ao

E

lá estava

" F^-

7-:?^M***

Re-

a estreita da

documento do século dezesete.

.

.

trabalhinho de laboratório alliam-se, ao ar os actos annexos e complementares

livre,

-- -«li-j,^

Monteiro Lohaio

'

publica^ nesse

-



vio-

lências, suborno, incêndio de cartórios, sumiço de

autos.

Porque o

"grillo" é proteiforme, e para

pletar-se sobe até á óptica,

com-

subornando os theo-

dolitos dos engenheiros.

Que

prodigios opera

meiro é substituir

a

neste

corrente,

O

campo!

podometro, o

o

theodolito, a trigonometria e o mais por

trumento só de alta engenhosidade

*^Só o olhometro merece apparelho maravilhoso,

rios.

passa-se

para a

direita,

um

delle

:

um

ins-

o olhometro.

fé aos "grilleiros**, esse

de

muito usado pelos governos

Por intermédio

pri-

criação nossa, e já

em

estudos estatisticos.

mudam-se

affluente

os cursos dos

da margem esquerda

cream-se cachoeiras

em

sities

onde

o nivel é manso, e operam-se quantas mais revoluções geographicas se

fazem mister á patota.

1^

Um

"grilleiro" possue

o nome de

natureza esqueceu de crear;

com o

cação.

consegue locaK-

se

em

rio ás costas,

que a

E



vae

procura de collo-

.

A outro

fazia grande conta

O

ponto de certas divisas.

tal

rio

o "grillo" sahirá de primeiríssima.

zal-o, elle,

um

uma

cachoeira

homem não

em

pesta-

neja: constróe a cachoeira.

Ha

intervenção judiciaria.

Na

vistoria

chamam

para perito o morador mais antigo das redondezas.

O caboclo chega, defronta-se com a cachoeira

phantastica e abre

que vive

mão

alli,

a

bocca.

Cincoenta

conhecedor da zona como a palma da

— como

é que nunca viu^ aquelle "poder

d'agua", barulhento e espumoso? e,

entrando na agua, desfaz

com

Mas

abaixo, transformada

em

paulama e cipós

Era

"grillo"

.

.

.

come nas

desconfia

dois pontapés a

Paulo Affonso de mentira, que

O

annos



rola,

aguas

tranqueira de galhaça, "grillo'*

terras

!

.

.

.

apossadas pelos

caboclos mal apetrechados contra os percevejos

da

lei,

tanto quanto nas terras devolutas que, en-

Z2

Monteiro Lobato

*

grilladas a N., S.,

como

L., e O., derreten -se

torrão de assucar n'agua.

Calcula

uma

em

autoridade no assumpto

três

milhões de alqueires a área das terras "engrilla-

E

das" na Noroeste.

esses

milhões caminham

para quatro, visto como agora a industria do "grillo

'

interessa os

dadeiras piranhas

Não

paredros da politica, ver-

altos

em

matéria de voracidade.

ha exagero no calculo de

três

sabendo-se que ha "grillos" de 200, mil alqueires



os

e

seja

que

estes

grillos

500

e

á metade

tamanhos como

antigos ducados e principados

Verdade

300

territórios equivalentes

da Bélgica, quasi á Saxonia,

milhões,

allemães

!

.

.

.

são os grillos-

mães, os 420 da espécie.

Um "clan"

existe



de 480 mil alqueires

notável,



o

rei

da

não só pelo tamanho, como

pela perfeição da sua génese.

E' o "record-cricket", e merece publicidade para lição de quantos querem enriquecer depressa,

mas andam

ahi a malbaratar

patotinhas vagabundas.

o

engenho

com

^"•'^f?^-

o "G

r

i

Baseado em

titulo

domínio sobre uns "águia"

um

dia,

copia

em

questão, delimitada e dahi,

nha recta de duas léguas, até encontrar o

Ao tório,

óptica

li-

rio tal*.

que tirava a copia, soffreu uma allucinação escreveu

e

Mesmo

esta visão

ella

em

chegar neste ponto, o escrevente do car-

"duas".

dicina

um

estra-

autos onde

dos

lado nestes termos; "...

um

resolve

Amadurecido o plano

vinha a partilha da gleba

de

que lhe dava

authentico,

três mil alqueires,

engrillal-o.

requer,

tégico,

23

11 o''

"vinte

duas" onde rezava

fora das bebedeiras é

dupla das

um nome

e

coisas,

grego...

que ha de

commum

ter

em me-

Concluida a copia, vae

ao juiz para os sacramentos. Juiz, promotor e

collector

subscrevem-na,

depois

de

"conferido e concertado" do estylo. delles conferiu

nem

lançado o

Mas nenhum

concertou coisa nenhuma, de

accordo com a mais louvável das praxes, porque é preciso

E,

ter

confiança no escrivão, que diabo!

dest'arte, o grilleiro entrou

tão authenticos perante a Intervallo

lei

na posse d'uns autos

como

de quinze minutos.

os originaes.

Monteiro Lobato

24

Um

advogado surge

originaes.

Obtem-na

pede

e

vista

dos autos

e leva para casa o calha-

maço. quadro:

Terceiro

o

grilleiro

denuncia

esse

advogado como tendo perdido o papelorio. Themis assanha-se e intima o detentor a entregal-o

sob as penas da

lei:

prisão ou reconstrucção dos

autos perdidos.

O

bachiler, consternado, allega

que de facto os perdeu, e segue para o xadrez

como um verdadeiro martyr da

urúca.

E

lá,

entre

grades, antes de meditar Silvio Pellico e Dos-

toiewsky, já sente na cabeça o estalo de Archi-

medes



Eureka

!

.

.

.

Lembra-se que em mãos de

uma

um

amigo

existe

copia conferida e concertada, e compromct-

te-se a dal-a

em

troca

do

raio

sacy (evidentemente o sacy!.

.

do

original

.)

lhe furtara

que o

da

gaveta.

Quarto acto: deferimento, solenne

em

o panno.

cartório

do

soltura,

e entrada

"grillo" triumphal!

Reaccendem-se

Cae

as luzes e o grilleiro

O "C

r

i

25

11 o''

de génio entra na posse de 400 e tantos mil queires

em

vez dos miseráveis

E* ou não

em

film

um

oito

mil primitivos.

três

rasgo yankee, merecedor

partes

al-

composto

d'um

famous

pelos

pla^ers da Lask^ Corporation?

E

a Paramouni nos não

encommenda

entrcchos

destes

E' que não nos conhecem os progressos

lá fora;

não imaginam o galope do nosso ardego vorwaeris.

Galope tão grande que lingua.

novas

Todos

o

os dias

qu^^êem medida



se

povo

reflecte

palavras

crea

á evolução da esperteza.

Para baptismo destes looping-the-loop da ção forense só entre os bichos que o povo

analogias

na

competentes:

voam

avia-

encontra

águia,

grillo,

aguismo.

Mas não

basta.

Ha

necessidade de formas

novas, combinações estapafúrdias, connubios de rapinantes de alta envergadura



ultra-ligeiro.



com

ruminantes de

estas cabriolas vocabulares

têm força expressiva no

ca^SQ.

'-y-^^.

Monteiro Lobato

26

Ouvimos, uma vez, em roda onde

tavam

estes geniaes

de enthusiasmo

um

se

malabarismos, cair dos ouvintes.

commen-

em

crise

Piscou, faiscou

os olhos e improvisou este soberbo jacto de im-

pressionismo zoológico,

única

dizer toda a immensidade



Que

cabras-aguias

forma

capaz de

da sua admiração:

o "GRILLO"

ESTA'

XIMENES

Monu-

na berlinda, a propósito do

mento da Independência,

um

"diz-que-

diz-que" que toca de perto a honorabilidade pau''

listana

O

.

caso é este:

um

dos

dizer que nestas plagas

questão nisso,

apenas

organizou

de

um

concurrentes

ouviu

tudo se arranja, sendo

topete

e

geito.

Fiado

meticuloso plano de cam-

panha para arrebatar a muque a palma da

Não

vi-

somente,

como o fizeram

os demais, nos méritos artisticos

da sua obra: poz

ctoria.

em

confiou

jogo os melhores truques da psychologia de

ganhar concursos, na qual, dizem, é

Trouxe cunhas de

primeirissima,

um

génio.

cartas

dos

melhores padrinhos europeus, a começar do papa,

endereçadas aos paredros paulistanos

voz decisória no certamen.

com

M

28

Não

parou

bustos de rios

ahi.

mármore

o n

e

t

Anda

i

a

r

o

L

o b a

t

o

com

presentear

e bronze, de sua lavra, vá-

personagens marcantas do nosso alto bordo,

capazes de cochichar no ouvido da Themis que

vae decidir do concurso as palavrinhas magicas

da

victoria.

Não

por

esqueceu,

exemplo,

do Estado, nem, para maior

Não

lhe é cara.

o

presidente

reforço, pessoa

que

esqueceu o poderoso deputado-

poeta que entre nós exerce a funcção mimosa de

embaixador

ApoUo,

de

Minerva

e

Mercúrio

junto ao Thesouro Paulista.

Nem

esqueceu nenhum

dos

mimosos ageita-

dores de negócios, susceptiveis de ternura ante i

sua desinteressadissima amabilidade. Isto é publico

çõeszinhas,

por se

lá,

e

notório.

não publicas nem

Outras

combina-

notórias,

fiquem

no segredo dos bastidores. A' nossa the-

bastam os factos acima, reveladores da

ção de vencer outros

um

concurso

artistico

inten-

por meios

que não as qualidades da obra d'arte

apresentada.

0'*CriHo**Ximenes



Exaggero

!

O

29

homenagear com

facto de

bustos certas pessoas de S. Paulo não quer dizer

que.

.



Porque ao organizar a

Quer.

busteaveis só incluiu curso, vel

ou

nomes de julgadores do conna intenção

indirectos,

visi-

de puxar brasas para o seu gesso.

O tam

directos

dos

lista

caso é serio, pois.

os gansos

E' desses que desper-

do Capitólio e os põe a grasnar de

apito na bocca. Significa,

nem mais nem menos,

o intuito friamente deliberado de vencer a todo o transe, pela peita de alto cothurno alliada a

um

fidalgo e artistico suborno.

Errou, todavia,

o

arguto

psychologo.

Está

próximo o julgamento das maquetas apresentadas e

s.

Itália

deram como

s.

verificará

como mentiram "ageitaveis'

os

os que na

nossos pro-

homens immaculados. Outra questão, tal

agora.

O

seu

projecto

é

que possa vencer pela simples força do va-

lor esthetico?

'

Monteiro Lobato

30

Não críticos

nos parece,

de

arte,

a

nem

quinam-no defeitos

aos

aos artistas esculptores. In-

sérios,

resaltantes á primeira

que o collocam

vista, falhas

nem

publico,

nós,

em

plano inferior ao

estupendo trabalho de Nicola Rollo, ao maravilhoso trabalho de Brizzolara é a formosa con-

cepção de Roberto Etzel.

Em

primeiro

lugar,

visa

apenas

o

bonito.

Ora, o bonito é inimigo figadal do bello e do grandioso,

qualidades

essenciaes

num

monu-

mento desta categoria.

Alem

anima nenhuma

é

um

Anima-o somente

mam,



o

geniali-

vago fulgor de concea intenção do bonito.

Todas

realmente bonito.

sitam a exposição e

Não

diz nada.

nenhum sopro de

idéa,

dade, nem, sequer, pção.

Não

disso é frio.

as

moças, que

param deante

delle,

E vi-

excla-

enlevadas:

Que

bellezinha!

Destituido

d'uma

que enfeixe em

forte

idéa

central,

directora,

harmonia de conjuncto

to-

-'l

•^síy

o

C

"

r

1 1

i

o

X

*'

m

i

n e

e

34

s

das as partes, abunda, entretanto,

em

detalhes

vazios de qualquer sentido.

em

zer? que significam

commemorado?

tórico

exercem

ra

E sal

face do

que

querem

que

Aquellas esphinges aladas,

monumento

funcção

dihis-

integrado-

alli?

com

o casal de leões

asas?

E

o outro ca-

de leões sem asas? Haverá nada mais cho-

cante que

esta

mescla disparatada de Egypto,

Assyria e

Uganda? Porque

varas, por

exemplo?

Ou

leões,

antas?

Ou

e

não capi-

zebús?

Ou

macacos ? Enfeites,

Uma em

simplesmente.

obra

d'arte,

de

qualquer

qualquer latitude, não ha de

só que final,

ter

categoria,

um

detalhe

não concorra logicamente para o

que não

se integre

pção. Tanto é defeito a lacuna

como a

cência; tanto é falha o que está demais

que está de menos.

E

effeito

na unidade da conce-

essa "menagèrie"

excres-

como o do pro-

jecto-Ximenez berra, urra, zurra como a mais ridicula

das

excrescências,

dizendo

bem

alto

Monteiro Lobato

32 que está

alli

sem finalidade nenhuma fora a de

occupar vazios que a fraca inventiva do esculptor não soube de que maneira encher. Enfeites, enfeites apenas.

O

mesmo

acontece

tescas

columnas

cantos,

como



com

as

candelabros,

quatro

gigan-

fincadas

nos

com a

clás-

frades de pedra, todas

mulherzinha allegorica no topo, soprando

sica

cometa ou segurando coroas.

São espeques que e

quebram a

lhe

pifio

da sua nota

não fundem no monumento

se

significação utilitária,

suprema com o

illuminativa.

Porque

motivo esses lampiões "lightiferos* e não quatro chafarizes, res

e

uma

ou quatro belvederes, com elevado-

em

"terrasse"

Falta de inventiva,

cima, para o chope?

pobreza

de

idéas,

in-

um

altar

com

capacidade de symbolizar.

Na

frente

do bloco

ergue-se

uma pyra onde chammeja um

fogo de bronze,

tocado á direita por imaginário vento.

Quando sentido

os ventos

contrario,

de verdade soprarem

que

ridicula

não

será

a

em tei-

0"Crillo**Ximeáes mosia dessa

mesmo

chamma sempre

33

inclinada

para o

lado!

Pyra! Lembra o Trovador:

Di

quella pira

rorrendo fuoco

.

.

Pyra, altar da pátria, fogo sagrado do patriotismo:

como soam a

conselheiro

Acácio

es-

chavões surradissimos, empifiados inda mais

ses

pela presença na

pções de Rollo.

sala

Um

das

artista

estupendas

conce-

de talento foge de

representar no bronze coisas por essência instáveis e movediças, tyliza-as.

A

esculptura é a arte

mesmo quando

Fugir

é

um

figura

Ou

então

es-

do repouso, e

movimento, toma-o

em

momentos de repouso.

seus

ma

como a chamma.

disto,

fixar,

por

exemplo,

a

cham-

pelo systema do instantâneo photographico,

positivamente cair no ridículo

que dá a chamma

O

realista

grupo central

vieux-jeu.

A

Onda Verde



3

impressão

da pyra-Ximenez.

symboliza

Paupérrima. E'



um

uma

apotheose

carro de

Roma,

Monteiro Lobato M

34



puxado por dois matungos

árabes,

Iheraça grega dentro, ladeada de calcante.

com uma muuma guarda no

Atrás, na rabada do troly,

um

índio

de tanga, á "highlander". E' Pery, o pobre do

Pery como o representam

mambembes

os tenores italianos dos

lyricos.

Este grupo significa o que

quizer.

se

E' a

Triumpho, a Independência, a De-

Victoria, o

mocracia, as Artes, a Cavação, apotheose fenia-

na ou allegoria aos Tenentes do Diabo, á vontade.

Dos grupos dão.

.

.

O

um

representa a escravi-

outro fica á mercê da phantasia inter-

pretativa de

Mas

lateraes

cada qual.

o coup de foudre, a nota

420 do monu-

mento, o lance de psychologia que lhe dará a victoria,

o ro^al-flush, é a frisa frontal que plagia

alto relevo o

em

quadro famoso de Pedro Américo.

Bonita, sim senhor

mas não

resiste

á mais

leve analyse.

D. Pedro no Abra-se

um

centro, a cavallo. parêntesis.

Diz a

.

.

historia

que o

Q "Crillo*'Ximenes "montava uma

príncipe

35 besta

possante

gatea-

da", e como o esculptor se metteu a fazer reconstituição histórica, verista, já

começou errando ca-

Feche-se o parêntesis.

vallarmente.

D. Pedro, no centro na

montado, des-

frisa,

feie o grito histórico, e pela abertura

de sua bocca

vê que já proferiu o "independência" e está

se

articulando

mento

"ou".

o

destes,

num mo-

Pergunta-se:

qual a attitude lógica dos ouvin-

única admissivel?

tes,

Resposta universal: a da attenção, a da ctrização; principe,

todos

de

suspensos,

galvanizados,

são do grito para

á

olhar

espera

da

fixo

ele-

no

conclu-

romperem em hurrahs

deli-

rantes.

Pedro

Américo

grupou

magistralmente

as

figuras e deu-lhes a única attitude lógica admis-

tudo por 20 contos.

sivel,

Ximenes pede 1000 contos mas não scena.

Cada

cavalleiro assume attitude á parte,

sem nenhuma ligação com o tam,

or

paraguayos enredavam tudo trincheiras,

com

como dizem que

isso

em

Os

lá.

frente das

fazem na Europa



o arame farpado, tornando assim difficilima

Durante

e penosíssima a approximação.

atacámos sem resultado.

Uma

dias

seis

das vezes conse-

guimos alcançar o morro, mas tivemos que rodar para

trás,

escangalhados.

No

sétimo dia Caxias

reuniu todas as forças disponíveis e concentrou

o ataque



O

Duro de

num

ponto

só.

Ahi vencemos.

trabalho da escalada? roer.

Cada

Nem me

assaltante ia

fale!

com uma

es-

Monteiro Lobato

72 cadinha

um

de bambu ou páo

feita

de galhos, ramos e folhagem, para atu-

feixe

E

lhar os fossos.

de fazer

ter

isso

Um

de balas do inimigo escondido!

Em Uma

Itororó.

.

Que

.

sob a chuva

horror!...

pensa que era Itororó?

pequena ponte de 4 a 5 metros de

sem guardas

Do

e mais

roliço,

cem

outro lado, a

assentaram a

comprido.

armada sobre um

lateraes,

artilharia,

Era forçoso

que carnificina

!

Os

metros,

ribeirão.

paraguayos

de modo a varrel-a a passar.

Passamos.

fio

Mas

nossos vacillavam deante d'a-

quella morte certa e foi

preciso

que

Osório e

num completo des"Quem for homem siga-me!"

Caxias se atirassem á prezo pela vida.

os

largo,

frente,

Aquelle arrojo electrizou-nos e passamos. Osório levou bala,

Os

mas Caxias

paraguayos, então, formaram quadrado,

a artilharia ao centro. pel-o.

saiu incólume.

Marchou com

canhões;

em

com

Osório dispoz-se a rom-

a cavallaria, mascarando os

certo ponto a cavalllaria abriu-se, os

canhões despejaram metralha, fazendo

cha no quadrado inimigo.

Por

uma

bre-

ella a cavallaria

Velefanos entrou,

como um

terrível

rível,

Em

ã

!

.

.

Paraguai

o

73

furacão, destroçando tudo. Ter.

Pírebebuy

A vílla

foi triste.

de mulheres e creanças.

O

conde

estava cheia

d'

Eu

intimou

o inimigo a render-se, fazendo-lhe ver que crime era

o

sacrifício

O

Inútil.

não cedia a

deixava-se esmagar,

Foram

razões.

que o ataque começaria ás

Rompeu horas.

.

.

ma%

avisados, então,

seis

a madrugada.

O

creaturas.

miseras

d'aquellas

paraguayo

de

da manhã.

Quatro,

cinco,

seis

chefe da artilharia veio pedir ordem

de fogo.

— Espere mais

meia hora, que até

lá talvez

surja a bandeira branca, disse o generoso prín-

repugnava

cipe, protelando a chacina, tanto lhe

o

sacrifício

de pobres não-combatentes.

Mas

es-

gottou-se a meia hora, e nada.

— Espere mais

quinze minutos.

Passaram-se mais quinze minutos e nada de bandeira branca. abertura do fogo:

O

conde,

então,

ordenou a

7' .

Monteiro Lobato

74



Não ha

remédio

.

.

.

Após uma hora de bombardeio a praça

era

nossa.

Que

horrível o espectáculo

de tantas mulheres

e creancinhas estraçalhadas pela metralha!

mas vejo

tou velho e cego,

quadro.

"horripilante

coisa a guerra

— —

E

^

!

.

.



Meu Deus

que horrorosa

.

a Lynch, conheceu-a?

Foi a alma damnada de Lopes, essa

Sim.

nem magra

ingleza linda, loura, de bello corpo,

nem

Acompanhava-o sempre.

gorda.

porque

Es-

vejo sempre, o

fiz

parte da escolta

que

Assumpção, para onde seguiu a

amazona que

a

Conheci-a

conduziu a

cavallo, valente

era.

Murmurava-se que a Lynch queria o fim de Lopes para entrar no goso sossegado das zas accumuladas.

Bem

possivel.

Mas, voltando ao conde: cipe!

Não

permittiu a

rique-

era

um

grande prín-

menor atrocidade.



dois coronéis foram fuzilados porque sobre elles

Veteranos do Paraguay

75

mandado

pesava a accusação de terem

arrancar

Depois da toma-

os olhos a prisioneiros nossos.

da de Pirebebuy, agiu com grande largueza, tribuindo roupa e faminta

e

— umas

alimento

assombravam-se d'aquillo. esperados, carinho. crudelissimo,

mulherada

á

três mil, talvez.

O

Em

As

dis-

rota

coitadas

vez dos horrores

inimigo que lhe pintavam

repartindo

compelias suas magras

provisões. Foi bonito, foi, foi.

.

.

Este velho soldado era o verdadeiro typo do heroe humilde, qye o é sem o saber. contraste de

um

Valente

outro, nosso conhecido,

terrogado, só se denunciou

como o

rei

que

in-

dos pol-

trões.

Fez alguns annos da campanha, mas era capaz de dar

ás suas narrativas

uma

bellicosa.

— Em Lomas — mas na — Ferido?

Valentinas, esteve?

Estive, sim,

enfermaria.

in-

impressão

MonietToLohaio

76

— Não. Uma Bellaco? — E em — Também na — Ainda — Não. Uma dor de — E em Tuyuty? cólica.

.

.

Estero

enfermaria.

a cólica?

dente damnada!

Ah,

Assisti á batalha inteira

gosei!

arredar pé do

meu

crever a coisa

como

— —

teza.

Assistiu-a .

da

posto.

Vi

a palminha das mãos. janella

do

com

hospital,

.

Não.

De

sem

tudo e posso des-

trás

d'um

bello

cupim

.

.

.

cer-

"^ ^!?^;?:íí^i^3f=^,;í.'-;

EUCALYPTOS

OS

fôramos medico e acaso nos surgisse, con-

SE

sultório

a

dentro,

um

cliente

nas ultimas,

queixoso de gelidez d' alma, ankilose do enthusiasmo,

indifferença

FFF,

cismo marca

em

gráo nirvanico, scepti-

receitar-lhe-iamos, incontinente,

o único medicamento capaz de salvar semelhante

desgraçado:

uma

Rio Claro.

E

infeliz

não

visita

daríamos a cabeça a cortar se o

regressasse enfolhado de esperanças,

como um plátano de flores,

ao Horto Florestal de

como

setembro, ou apendoado de

as roseiras

Porque o Horto não médio de ef feito

de outubro. se

limita a ser

aleatório:

é

um

um

tópico,

re-

um

porrete melhor que o mercurío para a syphilis ou

a aspirina para as nevralgias.



Mas

guntará o

que Horto maravilhoso é esse? perleitor.

Monteiro Lohaio

78

Ah coisas

o Horto é

!

uma

coisa séria.

"que só vendo".

E' d'essas

de energia que só julgamos

como Estados Unidos

com

prova,

absoluto.

os

E'

noves

uma

que poderemos

E' uma d'essas

e

lições vivas

possiveis

em

Allemanha.

E'

uma

convencimento

de

fora,

paizes

aberta que deixa entreluzir o

ser

no futuro.

goroso e nobremente

viril

E'

um

do trabalho

em connubio com a sciencia de uma victoria completa, esmagadora,

filho vi-

intelligente

verdade.

E'

a coroar

uma

batalha de dezesete annos.

O

Serviço Florestal da

constitue

um

eucalyptos, armados bilização

com

em

pé de guerra, com a mo-

marcada para d'aqui a

três annos.

essa edade, vinte annos, é que entrarão

batalha, a fecunda batalha

em

Companhia Paulista

formidável exercito de 8.500.000



em

da paz, desdobrados

dormentes, achas de lenha, postes, moirões,

taboado, carvão e essências.

Mas

a formação d'esse exercito não pára.

To-

dos os annos centenas de milhares de conscriptos

saem dos ^o»iJ

\.?^:.^

canteiros e

vão engrossar as phalanges

*0

E

s

u c a

l

y p

t

o

79

s

veteranas que se distribuem á beira da linha fér-

em

rea,

O Ahi

vários pontos estratégicos.

o

reside

em Rio Claro. commandante supremo, Edmundo general

quartel

situa-se

Navarro de Andrade, a maior autoridade mundial, hoje,

em

rações, d'alli tificial

matéria eucalyptica. Base de

oi>e-

do seio d'essa formidável floresta ar-

de mais de 3 milhões de

ai-vores é

que

parte a idéa coordenadora que uniformiza e articula

os demais corpos de exercito,

em

Boa Camaquan

Loreto,

deiro,

Vista,

acampados

Rebouças, Tatu, Cor-

e Jundiahy.

Centro de estudos

florestaes, esse horto

deixa

a perder de vista tudo quanto se fez no Brasil

por iniciativa governamental.

Burocracia nenhu-

ma, nenhum bysantinismo, nada que lembre a palermice

caem

Os

jjt-

V

os nossos

em que

nossos serviços públicos!

uma

Veiu

um

, 1.

inevitavelmente

serviços públicos.

horto onde se iniciara lyptos.

.

marasmatica

visital-o

Conta-se de

um

sementeira de eucadia a mulher

do

se-

Monteiro Lobato

80

Iherilmente,

— E letas

Examinou

da Agricultura.

cretario

Não

e,

dando com

tudo,

mu-

os eucalyptos, disse:

Prefiro violetas.

gosto d'isto.

lá se substituíram os eucalyptos pelas vio-

da senhora

uma

Impossivel

mento

ministra

.

.

num estabelecimenos em departa-

coisa d'estas e muito

particular,

.

mento da maravilhosa empresa que

é a

Companhia

Paulista.

Resultado: o problema resolve-se de vez, a floresta crea-se

monstração aberto,

liso

em

proporções formidáveis, a de-

se torna exhaustiva e

e

o caminho fica

plano como rua d'asphalto, para

todos quantos queiram atirar-se á silvicultura.

E

tanto é assim que, contagiado pelo exemplo

da Paulista, e industriado por Edmundo Navarro, o plantio de eucalyptos cresce no Brasil, maravi-

lhosamente.

Em

S.

Paulo orça já por

treze mi-

lhões de arvores.

No

por quinze milhões.

Um industrial allemão,

man, lendo o

livro

Rio Grande do Sul anda

de Navarro, veiu de

Blecklá,

es-

OsEucal^pio& pecialmente, para verificar

do que

tidão

SJ

com

seus olhos a exac-

e hoje, gerente

lera;

nhia Geral de Industrias,

600.000 pés por anno.

em

A

da Compa-

S. Leopoldo, planta

Companhia de Morro

Velho, visando a futura exploração do ferro de Itabira, planta

200.000 annuaes.

nhia Florestal Fluminense tem

um

milhão.

A

Compa-

um programma

de

Ceará a Companhia de Me-

No

lhoramentos planta 100.000 por anno, para dormentes.

guá,

Em Santa Catharina a Companhia Aran-

em Laguna,

planta

em

larga

escala

de obter escoras para as minas de carvão.

afim

A Com-

panhia Electro-metallurgica de Ribeirão Preto pretende plantar 600.000 annuaes para abastacer

de carvão seus futuros tas,

altos

fomos.

Além

d*es-

numerosas pequenas plantações particulares sur-

gem em toda

parte,

de dez, de

mil arvores, todas filhas

vinte,

de cincoenta

do exemplo da Paulisfa

e orientadas pela visão segura de

Edmundo Na-

varro.

Pergunta-se: o Ministério da Agricultura,

annos e annos de

A

-_

^'

Onda Verde



funccionarnento, 6

com

em

verbas

Monteiro Lobato

82

enormes, fez até agora obra que se possa com-

parar a esta? tou-a,

Fomentou alguma

cultura, orien-

na escala e com a segurança d'esta mara-

vilhosa iniciativa particular?

O

núcleo mais antigo dos eucalyptos da Pau-

lista localiza-se

em

1903.

em

Jundiahy, plantado, cremos,

Constitue a velha guarda, de cujo

seio surgiram, este anno, os primeiros postes

para

o serviço de electrificação d'essa via-ferrea, no trecho de Jundiahy a

Merece

especial

Rio Claro.

menção

este

facto.

Discutindo-se qual a madeira mais conveniente

para a obra, os cêmipeões do nacionalismo restal

apresentaram-se

em campo com

flo-

o guaran-

tan nec plus ultra.

Debates.



Experimentemos, diz a Paulista.

Tudo

preparado para o grande match, saltam

á frente do cies

Palavrorio.

terrivel

de eucalyptos

campeão indigena



o robusta,

e o triticornis, conduzidos por

Navarro. '^'ã>^.

(^

o

mãos do

três espé-

butryoides entraineur

OsEucaly^ptos O

nacionalismo

australiano

seria

83

A

riu-se.

inevitável

do páo

derrota

porque o guarantan

apresentado era velho de cento e cincoenta annos,

no minimo, ao passo que os eucalyptos con-

tavam apenas dezesete risonhas primaveras. Lucta de Golias com David.

.

.

Mesmo assim, todos torciam pelo campeão num patriotismo de páo, gosando-se

cional,

tecipadamente da esfrega que

naan-

a madeira

ia soffrer

intrusa.

Iniciadas as experiências de resistência, o gua-

rantan rompe e

com uma carga de 2.790

kilos,

2m.05 de deflexão. Palmas.

tissimo, pois

Bravos.

Fora

que lhe bastava

apenas para ser approvado

A

um

lambuja de 2.190

resultado brilhan-

resistir

com gráo

informada, abriu

panha ... de abacaxi.

Mas

E

uma

kilos

nove.

kilos fez delirar

tusiasmo o patriotismo silvicultor. cionalista,

600

a

A

de en-

Liga Na-

garrafa de cham-

armou-se para bebel-a.

a experiência prosegue, entrando

em

scena

Monteiro Lobato

84

o robusta^ que rompe

Teve parabéns

com 2.378

kilos

de carga.

indulgentes, foi gabado, recebeu

palmadinhas de reconforto. Apanhara do nacional por dif f erença

A

de 4 2

imia vergonha.

Liga mandou hastear o pavilhão.

Mas

a experiência não estava conclusa, e pula

á arena o buir^oides, que robusta, que resiste tanto nal,



kilos

1

que

pois só

resiste

que o

mais

resiste

como o campeão

mais que

elle,

nacio-

e que o derrota

rompe á carga de 3.227

kilos

com

de-

flexão de 0,90.

Desapontamento.

O

nariz

coração da Pátria sangra.



O

triticornis

Vae o

triticornis

.

da Liga

cresce,

O

.

agora!

para o supplicio. Amarram-

Ihe o cabo ao pescoço.

Começa

a girar o pa-

rafuso millimetrico.

Uma

tonelada.

Duas

toneladas.

Duas

toneladas e mais

do guarantani

790

kilos

—o

indica

ÓsEucal}?ptos

S5

Três toneladas!! Quatro!!

Cinco

O

! !

Os

assombro é geral.

com tamanha

patriotas,

furiosos

torcem o arrocho

resistência,

com

fúria.

Cinco e meia! Seis

!

.

.

.

Chega a

Ha

legramma protestando:

E um

Liga bate

um

te-

truque! Deram-lhe a

Está infibrado de aço!

beber infusão de kola!

Não

A

ser desaforo!

é páo!

o

triticornis, impassível,

estalinho

de 6.517 teu, pois,

de 3.727

de dôr

kilos,

!

.

com

.

.

continua mudo, sem

Só deu o

deflexão de 3m.40.

o campeão indigena por kilos

berro á carga

uma

Ba-

differença

na carga de ruptura e 1m.35 no

Índice de deflexão.

Quando

as brisas levaram a

feito aos vários hortos

de

arvores, irmãs

da

nova do heróico

Paulista, oito milhões

do Friedenreich

vegetal,

tre-

Monte iroLohato

86 melicaram as

folhas.

O

passaredo já nascido

entre os eucalyptus desferiu trinos de victoria e as cigarras chiaram,

Emquanto

isso,

numa

na

vaia.

capital,

com dor

d'alma, a

Liga, re-arrolhando a garrafa de champanha, pu-

nha a bandeira a meio páo. de cinzas. de páo brasil. .

.

E

cobria a cabeça

MAIS EUCALYPTOS

ENTRE gura o dia

as nossas "fabulosas" liquezas,

em

em que

Raro

primeira plana a florestal.

nos panegericos

fi-

com que engana-

mos a barriga não vem á tona dos

uma

jornaes

referencia de bocca cheia a esse tesouro.

Não

obstante,

é incalculável

o

numero

de

metros cúbicos de madeira que o Brasil já im-

Todas

portou.

as estações

da Estrada de Ferro

Central, por exemplo, são construidas de pinho

Estradas de ferro ha, como a

de Riga.

Ma-

deira-Mamoré, cujos dormentes vieram da Austrália.

E

as nossas fabricas

de papel manipu-

lam-no com pasta de madeira vinda de fora. Natural,

isso.

Matta

é

riqueza unicamente

quando homogénea, formada d'uma vegetal.

E

Do

contrario, tel-a



espécie

ou não, é tudo um.

nossas mattas caracterizam-se pela abundância

Monteiro Lohalo

88

desastrosa de espécies misturadas.

de

crescem dois,

terra

alqueire

mil vegetaes

três

diffe-

o que é lindo á luz da esthetica, óptimo

rentes,

para

Num

mas, do ponto de vista da

tirar cipó,

dade económica,

De modo

um

utili-

desastre.

que o malsinado crime de devastar

mattas não é crime nenhum, antes beneficio, já

que meio único de remover da bolho

terra

um

tram-

Foi devastando-as que S. Paulo

inútil.

conseguiu crear a lavoura cafeeira, que não passa

da

substituição

anti-economica,

da heterogeneidade

pela

homogeneidade

natural, artificial,

utilitária.

E

é

replantando essas inúteis mattas nativas

que começamos a

ter

madeiras de construcção

de alto rendimento.

Núcleos a crescerem

naturaes,

em

homogéneos,

sociedade, só os temos na

de araucária do Paraná. só nos hortos de eucalyptos lista.

de

E

arvores

mancha

núcleos artificiaes,

da Companhia Pau-

Assim, as taes fabulosas riquezas não pas-

sam de

floreio rhetoriço, e

o Brasil, exçluido o

Mais E

a c a

l

^ p

t

89

o s ê

Paraná, é paupérrimo de mattas

de exploração

mas mattas

úteis só as terá

matlo,

muito

Possue

industrial.

imitação do que

úteis, susceptíveis

as plantar, á

quando

fez essa intelligente

empresa de

vias-ferreas.

Todas, e sobre-

Mas, plantar que espécie? esta

flora australiana.

Nenhuma

o eucalyptos

em

dadiva

maravilhosa

tudo eucalyptos,

outra espécie supera

rapidez de crescimento,

cilidade de cultura e

em porcentagem de

Desdobrado em cerca de duzentas

em

os misteres.

e,

fa-

renda.

espécies e va-

riedades, o eucalyptos adapta-se a todos os

mas, a todas as terras

da

cli-

como madeira, a todos

Para carvão, para

lenha, para dor-

mente, -para postes, para obras de marcenaria,

para extracção de essências utilitária

vantajoso

Na varro,

de

três

— não

que não desempenhe

como qualquer

elle

ha funcção

de modo tão

outra espécie.

encantadora vivenda de E>dmundo Na-

em Rio

Claro, ninho feliz a boiar no seio

milhões de eucalyptos perfilados

toda a mobilia, e o mais que

em

linha,

não sendo mobilia

'!"/.^

Monteiro Lobato

90 é

de páo, tudo

arrolhar as objecções levianas dos

O side

re-

no seu rendimento como madeira de consE'

iniciaes

d'uma

preço da

de 428

com

cultura nova entre nós,

cada arvore

que

alli,

com o

alto

está pelo custo

Ora, as primeiras arvores de 17

ráis.

annos utilizadas para

postes

obtiveram o preço

40$000, fora a lenha da galhaça.

calcula Navarro que hoje, quirida,

dizer

dispendiosas experiências

as

terra, etc,

liquido de

Basta

fantástico.

sobrecarregada

com

E

a experiência ad-

é possivel obtel-as por

metade de 428

e até de graça, tal seja a qualidade das ter-

ras reflorestadas

e o

que

se

tercallares

durante

o

primeiro

segundo anno

em

resultado das culturas inpossibilizem

o

e

deante,

segundo

como

rápido o crescimento das arvores

em média por anno — só se presta para •^^

maldizentes.

grande mérito d'essa arvore, entretanto,

trucção.

réis,

de modo a

é feito d'essa madeira,

é



entremeio,

anno.

Do

em extremo três

metros

a terra por ellas occupada

receber o capim catingueiro.

Mais Eucalvpíos dando um pasto

91

para carneiros e bo-

soffrivel

vinos.

Não se Vae além. e

não



contenta

a arvore milagrosa.

isso

como a

Resiste á geada,

laranjeira,

menos maravilhosamente ao fogo.

resiste

vimos,

com

em Rio

Claro,

um

grande trecho do

mãos

eucalyptal incendiado por

criminosas a 13

de setembro, e completamente rebrotado a 30 de outubro

— 47

dias depois.

Estes simples dados resaltam as benemerencias

sem conta da preciosa madeira

australiana, e mais

alguns frizarão o seu alto rendimento económico.



A

tros

a



lenha do eucalyptos sae

2$400

o metro cubico.

de lenha equivalem,

em

está saindo lá

Ora, como

seis

calorias, a

uma

meto-

nelada de carvão de pedra, segue-se que o combustivel obtido pelo florestamento intelligente of-

ferece por

que

14$400 a mesma somma de energia

comprávamos do

que já

lá foi,

por

por cento e tantos

inglez,

40$000



e

num tempo

feliz

que compramos hoje

os olhos

da cara

Monteiro Lobato

92

A solução nacional do problema do combustível para nossas vias férreas está na lenha dos euca-

que comporta ainda

lyptos, solução

gem

uma

vanta-

importantíssima, qual seja a de ficarem

casa, integralmente, os

Aqui

em que

bem



se

14$400 do

em

custo.

patenteado o crime de inépcia

insistem os nossos governos,

não

flores-

tando a Central e outras linhas de sua propriedade, de

modo

a libertal-as da dependência do

carvão inglez.

Se fizermos trasfegou,

em

as contas

milhares de contos^ para o papo do

em troca da sua em proporções de

hulha, o algarismo avul-

inglez,

tará

Deve

orçar

do que só a Central já

isso,

se

nos derrubar o queixo.

não exceder, por um milhão

de contos.

Que

luxo caro, a imbecilidade!

Mas não

calumniemos a Central. Ella

ás vezes, e faz o que pode.

coisa á beira ficar atraz

vos, coses ! )

'«-...

da

da .

.

linha,

.

Já plantou alguma

com o

Paulista.

agita-se,

fito

talvez de

não

Já plantou (desabotae-

herva cidreira.

'

'^:s-'-" ---"

"--^^^ -

_

':^jÍ'./--'' '-''' '

"

,

'-

,'



"

}''''"'-''

''^

-'"

".;-" •^

-

'•

~'

^ '

''

.

Mais Eucaliptos Lá

93

estão milhões de moitínhas rachiticas, pon-

tilhando de verde o leito da linha,

que

leiras

Com

se

em

duas

fi-

extendem de S. Paulo ao Rio.

que fim escolheu a herva cidreira e não

a violeta, ou a dhalia, ou o cravo de defunto?

Ninguém o

E' d'esses mysterios

sabe.

bem

mais profundos que o da Santissima Trindade.

Por

taes e outras é

que somos gentes

"um

dos povos mais sensatos e

do mundo", esquecendo-se

de que mundo.

O

que dizia Alberto Torres

Ha vários

e o

inteli-

de

declarar

mundo da

lua é um.

grande inimigo dos eucaiyptos é a formiga,

cujo serviço de extincção custa hoje á Paulista

35$000 por Hoje.

de chão.

alqueire

Antigamente sahia por muito menos,

a terça parte, ahi uns oito mil

réis, se tanto.

Porque augmentou assim?

Contos largos!.

Corria o anno de

.

.

.

A formiga, esfogueteada de todos os lados com os excellentes sulfuretos vindos de fora, alarmouse e foi pedir soccorro a

Jehovah.

Monteiro Lobato

94

—^ Puzeste-me no mundo e eu vivia feliz. Mas o homem inventou o sulfureto de carbono e a

minha espécie corre

risco

de extincção.

Sal-

va-me, Jehovah!

O

bom

deus, condoido, cofiou a barba eterna

e disse:

— Tens

razão.

Mas

socega.

Vou

dar-te

um

alliado precioso, o melhor dos alliados possiveis.

Vae em

A

paz, que remediarei os teus males.

formiga desceu á

mandou que

terra, jubilosa, e

Jehovah

a pombinha do Espirito Santo fosse

pousar na cúpula do palácio Monroe.

Não demorou nada da nação



e os nossos representantes

se sentiram inspirados.

Protejamos a industria nacional, disseram;

taxemos fortemente o producto que vem de

fora,

afim de que surjam entre nós grandes fabricas

de formicida indigena.

O

E



O

resultado excedeu á expectativa das saúvas.

zás!



taxa de malhão.

formicida passou de

3$000

a lata a 14$000,

wi^^j^~fr-''

".-"«fíçiíyíf "*."^

'''

'

(

Mais Eucaliptos

95

^

e passou de óptimo a péssimo, impossibilitando-se, quasi,

a guerra que o lavrador

um

Jeca,

instante

movia á praga.

de pé, com clarões de espe-

rança nos olhos, acocorou-se de novo e recahiu

em

modorra.

— E

Paciência.

O

governo não quer. coradas,

as formigas, gordas,

multiplicadas ao

infinito,

.

.

felizes,

entraram a

sorrir

re-

do

pobre lavrador de mãos amarradas.

O

prejuizo que a enterite

põe á lavoura

Em

Governo-Saúva im-

E* cada vez maior.

é colossal.

compensação, o proteccionismo

do fumegar

as chaminés

rejubila, ven-

de umas tantas fabricas

novas, que incensam uns tantos ricos novissimos.

Como sulfureto

era natural, a prohibição

de carbono

foi

um

de eucalyptos, plantio

tio

maneira sorprehendente, tiva

do exemplo da

Mesmo

assim,

da entrada do

bello golpe

que

puxado

no plan-

se alastrava

pela

de

locomo-

Paulista.

continua.

As

sementes ven-

didas pelo Horto do Rio Claro passaram de

50

^gj^.

96 kilos

Monteiro Lobato

«

em 1916

gresso

a

574

kilos

em

1919.

O

Con-

um

impediu que a progressão fosse de

para cem, mas não impediu que fosse de

um

para

onze, o que já é alguma cousa.

No

tempo da colónia

Assumar

teria

mandado

plantadas, o que seria

um

qualquer conde de

arrancar todas as

um bocadinho mais

mudas

triste

.

.

.

TANGARÁS

os

APPARECEU seductor

reproduzidas,

aspecto,

cheio

pesadão — meio

manuseio,

ficil

um

ha dias

costurado que

livro,

de nada

de gravuras mal kilo

vem



e

de

dif-

a barbante,

de fora a fora, e não caderno a caderno, como o exige

a

commodidade da

Exemplar

leitura.

ty-

pico da arte livresca nos Estados onde Gutten-

berg não vai lá de pernas.

Para mal de peccados cheira o meira

vista,

para aboccar Entretanto,



em

uma

fim de governo patoteiro,

bolada.

quem vence

os

óbices

um

E' obra que

Onda Verde

feliz

idéa que

revela, já nas primeiras linhas,

observador seguro de

A

oppostos

apresentação material, e mette os dentes

no miolo, sae contente da vida pela teve.

á pri-

a sermão de encommenda, d'esses fer-

vidos ás pressas,

pela

livro,



7

si,

com

sério equilibrio

Monteiro L^obaio

98

de faculdades e capaz da visão ecológica das coisas.

E

escripta,

além

sóbrio

sem

seccura,

singelo

pittoresco

mo.

disso,

em bom

estylo,

sem vulgaridade,

sem galharada excessiva de

e

regionalis-

Terra Catharinense, chama-se, e assigna-o

Chrispim Mira.

Nelle se estuda, sob todos os as-

o Estado barriga verde, entreverando-se

pectos,

paizagens

com

de sociologia, e

Consegue

estatisticas,

historia

dess'arte o

com

sr.

com

anecdotas

visões

scenas de costumes.

Mira dar uma impres-

são exacta, quasi a sensação da terra catharinense.

E que e

de

si

dá a medida d'um

dizer, e o diz

escriptor

que tem o

bem, ás rápidas, com clareza

sinceridade.

Em

matéria de escriptores, temol-os de duas

categorias: a dos necessários e a dos inúteis. Uns,

revelam o paiz a sentindo e

si

próprio,

bem reproduzindo

bem

bem

os estados d' alma e

de corpo da brasilea coisa e da outros,

vendo,

brasileira gente;

tomeim tempo aos occupados

com uma

arte pela arte singularmente pulha.

Uns, constroem deveras uma

literatura:

fixa-

-í^^-

Os Tangarás

99

ção exacta do momento ethnico, cósmico e mental. Outros, bysantinizam. lhantes,

de omni

te,

Chronistas, ás vezes bri-

a varridela saneadora do

tempo não deixará de sua agitação na

terra

uma

esquirola siquer.

Chrispim Mira tem qualidades para fulgir na vivedoira plêiade dos primeiros.

que tenha

em



Mas não vem

Basta para

isso

suas forças.

a pêlo aqui

uma

analyse d'esse

senão o furto da pagina relativa aos tan-

livro,

garás. *:^ :tti/»>-âF95íídJít!!

OsTungarás na faina

103 descreve

choreographica e os

nestes

termos

"Das

aves catharinenses é a mais famosa.

azulada e de

crista

oito a dez, sob

mentos de festa

vermelha.

E'

Anda em bandos de

Nos moreunem-se no galho de uma ar-

o

commando de um.

vore e ao signal do tangará director, que pousa

em

galho fronteiro, iniciam o gorgeio. Compõe-se

de trez partes esse admirável concerto. meira o maestro modula,

em

solo,

um

Na

pri-

cântico do-

brado, ora terno, ora vibrante, as pennas meio

alvoroçadas pelo ardor da modulação, a cabecinha esticada, o bico entre-aberto, e o pescoço a regorgitar-se e a retrair-se deliciosas

E um

que

se

na emissão de notas

espalham pelo

permanece, assim, dois a

Caruso,

trinados,

um Tcunagno da

dilatando os sons

silencio

três

minutos,

floresta,

em

da matta.

como

sobrepondo

corridas longas,

numa precipitação vertiamortecendo-as em surdinas, tomando-as

encachoeirando as solfas ginosa,

vagarosas e atropelando-as

em

seguida,

em

lezas de violino e tons graves de barytono.

subti-

.,y.

Monteiro Lobato

104

Quando termina o hymno, rompem os demais em coro. Ás vezes se reúnem, combinam-se, estridulam uniformes, todas egualmente para a

as cabecinhas se distendem

frente, todos os pescoços

mesmos movimentos, todos

os

mesmo

têm

os bicos desferem o

canto macio, cheio, vivo, sonoro, extasiador.

Ha um

descanso rápido.

Os

tangarás saltitam

aos pares ou isolados pelo arvoredo.

que o maestro

trila

Eis porém,

de novo, e todos acodem ce-

leremente, retomando o seu posto: o

bando num

galho e o chefe noutro, a principio.

E, unisona-

mente, galhardamente, a encantadora e plumosa

um

numa

espécie

de bailado, pondo-se o tangará maestro a

saltitar

orchestra irrompe, a

em

só tempo,

ida e volta do seu galho para o outro onde

estão os companheiros, ao

mesmo tempo que

estes,

sempre a gorgear, pulam também, uns sobre os outros,

de modo que os primeiros vão

ficar atrás

dos últimos e depois estes atrás dos primeiros.

Cerca de cinco minutos

são

curiosa alegria avicular.

A

tro

consumidos

nessa

certo ponto o maes-

suspende o voo e perde-se na folhagem, can-

0CM^

N:

Os Tangarás

A

tando.

ainda

vêm

orchestra o acompanha, e de longe as

E'

bailado.

nunca mais

105

ultimas

um

do

vibrações

bellissimo

espectáculo que, visto

uma

vez,

se esquece."

uma avezinha com o homem,

Infelizmente o tangará é

pouco amigo de relações

rocidade conhece. Vive, por mattas, e não

isso,

esquiva,

cuja fe-

nos recessos das

dá espectáculos quando preso em

gaiolas ou viveiro. Fosse

como o

maravilhosa coisa seria termol-o

pardal, e que

a

avivar

com

canto e dansa a paizagem das grandes capitães!

Mas

é

ave envergonhada.

Tem

muito da caipi-

rinha arisca que se esconde atrás das portas. Elle

também e o

se

mundo

pardal.

.

.

esconde para dansar. é

dos sem-vergonhas.

Não

O

é cabotino,

mundo

é

do

-

twv.

;

"=«rj?

DA GUERRA

Ò P AE

OO

homem

uma

inventou

mesma

reza: o parasitismo na

parasitismo é

uma

E

do homem.

da

lei

Na

entre espécies differentes.

uma

coisa fora

a guerra

é,

espécie.

mas sempre

própria, só no caso

em

ultima analyse,

simples manifestação d'esse parasitismo. E' o

meio violento a que

um

Estado recorre para

cravizar povo mais fraco

e

aparasitar-se

vivendo-lhe á custa do sangue.

para

vida,

da natu-

Roma,

Venha

o vencido

atado, nú, á cauda dos carros de

triumpho, ou fique

nómico de

um

essência, o

mesmo.

em

suas terras no arroxo eco-

tratado de Versalhes, o facto

Ora, anti-natural, anti-biologica que é

ma

es-

nelle,

é,

na

tal for-

de parasitismo, a guerra constitue o supremo

mal, a cruel avariose que torturou, tortura e ha

de

torturar a

humanidade.

E

mal sem remédio.

riWíWr^

Monteiro Lobato

108 porque a guerra tremos —

mantém

A tica

tira

dos seus próprios effeitos ex-

victoria e derrota



b estimulo que

vivida a mentalidade guerreira.

apotheose dos heróes, a apresentação esthe-

de todos os crimes, o embellezamento

syste-

matico da carniçaria, o exalçamento das virtudes

na

guerreiras revigoram,

victoria,

bellica enfraquecida nos annos

a mentalidade

de paz.

Na derrota,

o soffrimento injusto, a espoliação do innocente e a insolência

da pata invasora crêam o ódio mortal

põem em

todas as almas a idéa suprema da

e

vingança.

Gloria e vingança:

eis

a

alma bifronte da

guerra.

Ha,

entretanto,

tanto no vencedor

um

erro monstruoso de visão,

como no

vencido.

Erro

de

pessoa.

Esse erro é o de

attribuir

ao povo contrario

todas as calamidades soffridas durante a guerra.

Não

ê o

povo que faz a guerra, é o Estado.

Pae da Guerra

o

O

povo

109

ao papel de machina, de carne

limita-se

soffredora e bode expiatório.

Os nero

povos são partes do grande todo que é o gé-

humano

e

têm a sensação inconsciente desta

unidade pregada por todos philosophos, de Christo a Novicow.

Esta verdade, porém, é nua verdades.

Tem,

pois, contra

como todas

as

o óbice tremendo

si

da nudez, porque o homem, creança ainda, e inda muito próximo do troglodita, só se embeléca ante os Ídolos lantejoulantes e

cados da mentira. Ídolo, religioso difficil é

A

de

ou

pomposamente embone-

Quanto mais missanguento o social,

mais

fieis

possue e mais

ser derrocado.

verdade da unidade humana não consegue

uma verdade moram no poço.

impor-se porque é suas irmãs que

e vive nua

como

Entretanto, de mil maneiras ella demonstra que a

humanidade

é o

grande corpo de que cada povo

ou raça é membro com funcções especiaes.

Um

é cérebro, pensa; outro é musculo,

age;

Monteiro Lobato

110

outro é pulmão, respira.

Este é cigarra, canta;

aquelle é formiga, trabalha.

Ha

o que inventa, ha o que aperfeiçoa, o que

industrializa, o

Ha

o

que commercia.

artista,

que compõe; ha o sábio, que

estuda; ha o mystico, que crêa religiões.

E

todos se servem

numa

entre

completando-se,

interdependência maravilhosa da qual re-

sulta o funccion amento

E

si,

harmónico do todo.

tão intima é esta troca de serviços que,

como

no individuo, a doença, a atrophia, a morte de

um membro inteiro,

affecta profundamente o organismo

quebrando-lhe o rythmo da vida.

Assim, a guerra quilibrio

é

de funcções

o Mal, porque é o dese-

num

corpo cuja harmonia

physiologica depende do perfeito equilibrio dos órgãos.

Imagine-se a guerra transportada para o corpo

humano.

Os pulmões

invadindo o cérebro e des-

troçando-lhe as cellulas cinzentas.

O

estômago

occupando militarmente o fígado e impondo-lhe a

O P

a e

da

Guerra

tarefa de fabricar sueco gástrico

Os

bilis.

rins,

em

Í11 vez da odiosa

vencedores do pâncreas, forçan-

do-o a pagar, como indemnisaçâo de guerra, dez litros

de pancreatina, e a passar o canal de Wir-

sung para a jurisdição do baço.

t

Pois absurdos assim acontecem no corpo da hu-

manidade em consequência da que

é

E

o direito do vencedor. a verdade, tão simples, tão entradiça pelos

olhos, d'essa interdependência tes

— povos

e raças



— humanidade,

inattingivel.

Os

séculos

foi, é,

passam

como no tempo de

Porque

harmónica das par-

necessária á saúde

grande corpo

d'ella

coisa monstruosa

Atilla.

se

acham empolgados por um

monstro parasitário de estupidez

um

e estamos longe

é assim?

Porque os povos

a

do

e continuará

infinito

infinita,

alhada

machiaveHsmo.

Esse monstro é o Estado.

Aquella visão de lynce

feita

homem que

foi

Frederico Nietszche já o denunciou pela bocca sybiHina de Zarathustra.

-'>t^^.-T>

Monteiro Lobato

112

*'Não ha mais povos entre Estados.

O

frios; elle

mente com frieza

Estado é o mais

corre, perenne,

da sua hocca

e

diz

nós,

ha

elle,

dos moTKtros

frio

a mentira que

es-

é esta: eu, o Estado,

sou o povo.

Mentira! Eram creadores povos

e lhes

deram uma

assim, á vida.

São

arapucas á massa

e

que crearam os

um

amor. Serviam,

fé e

os

destruidores os que

chamam

a

isso

armam

Estado;

estes

suspendem sobre a cabeça do povo um gladio e

cem

Onde

appetites.

comprehende o Estado

ainda ha povo, este não

e o detesta.

tem sua lingua do bem

e

.

.

Cada povo

do mal que o vizinho

não comprehende, linguagem inventada para seus costumes e as linguQs

leis.

Mas

do bem

diz mente, e tudo

Tudo bados.

e

o

o

do mal.

tudo o que

morde com dentes

suas entranhas são mentirosas.

mundo vêm homens de Estado

Em

que possue é roubado.

nelle é falso' elle

Até

Estado mente em todas

foi inventado

todos os valores,

pelos

homens

.

.

.

.

rou-

Ao

mas o

supérfluos.

»

'

_ /f'._;í'.-

'

^,«

Pae da Guerra

O

113

Vede como elle attrahe os supérfluos, como enlaça, como os masca e remasca.

— Nada ha maior que o monstro, eu sou o

eu sobre a

os

terra, urra

dedo de Deus.*

Esta visão do philosopho nunca se patenteou mais flagrante do que agora.

Foi o monstro

frio

quem

fez a guerra



a

em

guerra crudelissima que os povos padeceram sua carne sensivel.

E

foi

odiosa

ainda o monstro

em que

se torce

povos — dos povos fizeram a guerra.

quem

fez a paz, a paz

no garrote o pescoço dos

innocentes, pois os povos

Elles são victimas

porque são victimas do monstro

não

da guerra,

— Estado.

O

monstro empolga-os e a partir da escola organiza a mentira viva de que se alimenta e rebolca.

Mentira allemã de

um

em que

lado, mentira

franceza de outro, mentira ingleza, mentira liana, mentira

formas.

em

se

ita-

todos os idiomas, sob todas as

Director da mentalidade dos homens que

fazem a opinião publica, senhor dos instrumentos A

Onda Verde

—8

Monteiro Lobato

//«^

de diffusão de idéas, imprensa, correios,

o

rei

livros, telegraphos,

da mentira mente omnimodamente

e a tudo envenena

com

a sua mentira organizada,

desde as ondas hertzianas até a cera molle dos cérebros infantis.

E

não

os povos parasitados

percebem a sua monstruosa escravização ao parasita

que

nelle se enraizou

Não ha bém

cresce

não tem

como um cancro.

simile mais perfeito.

sem

Hmites,

O

cessar, invade todos os tecidos,

não attinge a

um

termo, é

embryonario que não chega a adulto e volve

num

mais.

Se

extirpam -

sentido só

— no de

lhe extirpam

uma

um

se desen-

alargar-se

cada vez

parte, renasce.

Se o

inteiro, resurge.

Também

o Estado não vive hoje

necessário á vida primitiva.

.

.

cancro tam-

como órgão

do povo qual era a sua missão

Mas como

dono, como senhor absoluto

d'esse povo. Elle é que é o principal.

O povo

é

o accessorio, a massa carnosa de que o Estado se alimenta.

Symbiose

sui

sangue e o outro

generis

com o

onde

um

entra

com o

appetite inextinguível.

.

.

o P

Todas

Guerra

da

a e

115

creaçôes do Estado são grifanhas e de

utilidade unilateral.

O militarismo,

o patriotismo

o imperialismo, o colonialismo, a burocracia, o prio

vilegio,

Mas

dentuças!

uma machiavelice de confundir-se com o povo e

a sua obra prima, de

infinita, é

a arte

como organização

dar-se



a censura:

fisco,

intelligente e necessária

do povo. Se os cancros pensassem e tivessem colas e agencias telegraphicas, a

cancro, a lição permanente cellulas

gem

do corpo atacado

Estado

O

inglez,

Mas quem Os

do cancro perante

seria a

caso recente da grande

accendeu?

propaganda do

mesma

as

lingua-

dos Estados de hoje.

official

No

es-

Estado:

quem

guerra:

— o Estado

a

allemão, o

o Estado francez, o Estado

russo.

lhe soffreu os horrores inenarráveis?

povos respectivos.

A paz de urubus,

quem a

o Estado allemão, o Estado

fez?

O

inglez,

Estado: o



Estado

francez.

E tes?

quem

lhe vae soffrer os horrores consequen-

Os povos

respectivos.

Monteiro Lobato

116

Entretanto, toda a gente sabe que os povos

nunca fizeram guerra entre

porque os povos

si,

são compostos de creaturas de carne dolorosa, de pães, de mães, de filhos, de esposas, de irmãs



de corações, emfim, inimigos natos da guerra,

porque para quem

Apesar

é

coração guerra é dor.

d'isso a guerra continua.

E

não ha

es-

perança de que os povos abram os olhos, tirem

do poço a verdade espesinhada o cancro

frio,

tempo o

filho,

de vez

e extirpem

o parasita monstruoso que é a

o pae e a

mãe da

guerra

.

.

.

um

!«?>.•

f^r- ^'K^

"HOMO SAPIENS"

QUANDO o homem abdicar — ou

de-

for

posto da terrena realeza, que usurpa, e

em

seu poleiro o plebiscito livre de todos os seres vi-

ventes enthronizar o boi, a phoca ou o abutre, a

vida do globo ganhará immenso

em

amabilidade.

Amabilidade é o caracter do que é digno de ser

amado

e a vida

na

terra,

homem, positivamente não o Enthronizado que seja boi,





1

um

— ha de tudo

sob a regência do

é.

d'esses animaes

resentir-se

—o

de immedia-

ta melhoria.

Os

bois

não falam, nem escrevem, d'onde

sulta impossivel sicos

da magna carta bovina;

as excellentes qualidades

veladadas por

re-

conhecer d'antemão os pontos báentretanto,

dadas

de caracter e coração

elles até aqui, é lógico

re-

prever que

Monteiro Lobato

118

a realeza de guampas será infinitamente mais gentil

do que a dura realeza humana. Quantas

instituições,

meros sonhos de ideólogos

hoje, só as teremos então te previsivel:

!

Uma d'ellas é

facilmen-

a Sociedade Protectora das Crean-

ças.

Porque não ha maiores victimas da crueldade e

da incomprehensão do

rei

actual

débeis serezinhos de carne tenra.

creanças pobres.

.

do que

estes

Sobretudo as

.

Durante a guerra, quando

a

Allemanha bom-

bardeava, passou alguma vez ante os olhos do

germânico flammivomo a imagem das pequeninas victimas ?

E

agora, que o alliado

bardeia

com

ultimatuns

commodamente bom-

peiores

do que obuzes,

passa pela mente dos estadistas a

imagem das

victimas pequeninas?

Quantas, a esta hora, na Allemanha, na stria,

Áu-

na Turquia, com grandes olhos assustados,

purgam nas

torturas

da fome o crime de guerra

commettido pelos pães?

H

*'

o

m

o

Sapiens"

119

Magras, dolorosas, entanguidas...

A

meia ração geral estancou-lhes o

seio materno.

O

leite

das vaquinhas não existe

Ah! Os

mais. Levou-as, ás vaccas, o Tratado...

Torquemadas do momento prevêem

mos

do

leite



nos mini-

detalhes o requinte da tortura. Clemenceau,

Lloyd George, Foch, os grandes chefes de malta, tigrinos,

é

sabem que a dor nos

o melhor castigo aos pães.

los

em

Os

As

E

filhos innocentes

descem aos estábu-

pacifica e risonha pilhagem ás vaccas...

processos da guerra e

armas, as mesmas.

da paz são

Numa,

os mesmos.

grosses Berthas

que vomitam ferro e gazes asphyxiantes grosses Clemenceaus, grosses artigos

dum-dum

;

noutra,

Fochs que expluem

e paragraphos shrapnells,

re-

cheiados de gazes consumptores. Artilheiros de quatrocentosevintes ou artilheiros

de tratados: cannibaes que nunca meditaram

um

instante nas victimas innocentes d*essa fero-

cia truculenta

chamada

patriotismo, culto

gue ao Moloch moderno: Pátria.

de san-

Monteiro Lobato

120

No Moloch

phenicio, de ferro incandescente,

despejavam os sacerdotes dezenas de creancinhas vivas para que o chiar das carnes, os gemidos e

o fumo aplacassem

No

um

Moloch-Tratado

deus. os sacerdotes

da Pátria

despejam milhões de creancinhas para que mor-

ram de consumpção, lentamente,

e

aplaque as

do Baal Patriotismo.

iras

A

mesma

estupidez sempre, sempre o

mesmo

requinte de crueza.

O

grande principio da

justiça

humana, consa-

grado pelo Deus carniceiro inventado pelo

imagem

á sua

homem

e semelhança, resume-se nesta coi-

sa horrenda: o innocente pagará o crime

do pec-

cador. Principio biblico! divino! principio irreductivel

que dominou hontem com Herodes, domina

hoje

com

os Tigres, dominará

Lenines, porque é própria do

de.

.

amanhã sob

homem

os

a iniquida-

.

Mas ha

de a vida do planeta

eterno sob a regência

ficar assim

da iniquidade?

ah

"Homo Sapiens" Todos

os seres, transfeitos

121

numa

legião infi-

de espoliados, hão de eternamente curvar

nita

cabeça á tyrannia?

Não

E' forçoso que

!

se

opere a revulsão de

tudo e que do poleiro desça o

rei

máo.

Eia, pois, animaes todos da terra: basta de es-

cravidão

!

Levantae-vos, leões do Sahara, tigres da índia, onças

da

do

terra, cascavéis

do Arizona,

bisões rontes,

do

Brasil, e vós todos,

dos campos, lobos da Rússia, girafas,

elephantes, rhinoce-

hippopotamos, hyenas, chacaes,

condores, tubarões, golphinhos:



E' tempo de conspirar contra o evoluiu

da agua,

ar,

e,

urubus,

uni-vos!

que

gorilha

senhor da Intelligencia e da



Fé,

é

uma

vos opprime a ferro e fogo.

A

intelligencia d'elle,

doença,

uma

Só produz

bem o

sabeis,

hypertrophia cancerosa de instincto.

males. E' a

mãe do

soffrimento.

guerra, a fome, a peste são filhas suas, filhos seus todos os horrores

A

como são

que fazem odiosa a



'

'

-

--"

""'

.""-1.

Monteiro Lobato

/22



vida na Terra:

men-

os deuses carniceiros, a

a riqueza, a miséria, o Estado, a

tira,

''S:

o ca-

lei,

dafalso, a inquisição, o patriotismo, a farda.

Não

possuis

nada

d'isso e sois felizes.

Resolveis vossos problemas

com tamanho

acer-

que não tendes problemas.

to,

Que

perfeição nas abelhas !

A mais rudimentar

colmeia constitue ideal inattingivel ao senhor da intelligencia.

As

aves e os insectos sorriem dos

seus progressos da aviação.

toleram os Carusos.

Os

Os

ratos

rouxinoes não lhes

zombam da

guerra

Os pombos apiedamse da sua pobreza de instinctos. Esvoaçando num hospital, a mosca, tão bem apparelhada para a vique

elles

lhes

declaram.

da, tão segura de voo, tão aguda de faro, tão precisa nos fins,

qual

um

bom

partido.

Vossa

vê a miséria physiologica do

monturo infecto de que só

ella

homem

sabe

tirar

vida, animaes, é perfeita de rythmo e

de belleza. Se ha perturbações nella; se vos estraçoeun as aves a tiro; se vos deixam os ninhos

;...".,«»-

**

H

o

m

o

Sapiens**

123

orphãos, para que

morram de fome

innocentes; se vos

pescam nas aguas com arma-

os implumes

dilhas traiçoeiras; se todas as vossas passagens an-

dam tramadas de toeiras; se vos

arapucas, de mundéos, de ra-

roubam

os ovos

no ninho ou o mel

nas colmeias; se vos aprisionam cantores e se

em

jaulas os que

em

gaiolas os

sabem defender-se;

vos jungem ás carroças, a carros pesadissimos,

á canga dos arados; se vos furam o focinho para metter argolas dolorosas; se vos enfreiam a boca

de

caçam no mar a harpão

ferros cruéis; se vos

de aço e na

terra a balas explosivas

;

se

penduram

nos açougues a carne dos vossos cadáveres; se vos invadem todos os dominios, e vos incendeiam os campos, e vos

cam elle

innundam

drenam

as aguas, e vos

que o

faz. Elle, o

machiavelice da consciente

Em

da



arte

os pântanos

macaco

glabro, o

intelligencia.

da



é

r« por

Elle, o cultor

dor.

toda a parte está

incarnado,

as mattas, e vos sec-

elle

como o próprio mal

matando, esfolando, torturando,

sa-

Monteiro Lobato

124

queando, desnaturando, perturbando a harmonia das

coisas.

Em

proveito próprio, ao

menos?

Oh, não!

E da

não porque a maior victima do homem

é o próprio

quemada dos o

homem

é

homem. Lobo de

si

próprio,

in-

Tor-

seus próprios filhinhos innocentes,

Prometheu roendo com seus próprios

dentes o próprio figado.

Que

esperar,

pois

da

realeza

d'um

calceta

d 'esta marca?

Animaes todos da Terra, basta de submissão! Uni-vos!

-"

'Vv'- ,. ,

';; ^'r r ^jí; í-í;; "; -v-.-:

V

U

QUANDO

Deus, de mangas arregaçadas,

emprehendeu a tarefa de organizar o mundo, o que existia era o cahos. já estavam nelle,

mas

ás tontas,

Todas

as coisas

no desarranjo d'um

immenso deposito de mercadorias "empasteladas".

A

obra da creação

e harmonia. Jehovah,

tanhas,

planicies,

simples obra de

foi

pegando

ia-os

rios,

lagos,

ordem mon-

dispondo sobre a crosta

nua, ao sabor d'um plano de geo-esthetica preestabelecido. Feito o que, cuidou

do aformosea-

mento.

Havia em coisas lindas.

certo ponto

Montão

museu das mais

uma grande

cahotico

de

reserva de

maravilhas,

bellas aguas, das mais bellas pe-

dras, despejo

desordenado d*uma cornucopia de

fada, era

o Grande Almoxarifado das Bel-

alli

lezas Naturaes, d'onde

Jehovah

ia

tirando mara-

^P'^:^-:'--r--^



Í3?*^^^K

!•:.

'

Monteiro Lobato

126

vilhas para alindar as regiões recem-geographa-

das.

O

deposito, porém, era inesgotável e, por mais

primores que fornecesse

ao

permaneceu quasi intacto após

presepista,

insigne

sete dias

de requi-

sições continuas.

posteriores conseguiram

Estudos

localizar

a

sede do Grande Almoxarifado. Situava-se, nin-

guém mais o

onde é hoje o Rio de Ja-

discute,

neiro.

Mas

as outras regiões prejudicadas

reclamaram contra a vah,

Summa

Diplomacia, resolveu

natureza

um

o

lá, disse elle

ás

por mãos desse povo, o excesso de

e,

dito,

problema

povo fechado aos encantos da

que vocês se queixam minguará dia a

O

rateio

injusta distribuição, e Jeho-

de uma forma engenhosa. Ponho reclamantes,

no

o

feito.

dia.

Jehovah povoou o Rio com

os elementos mais aptos para corrigir o seu erro,

e os homens escolhidos trabalharam nos,

sem

um momento

var que Deus é

:i£Éfei^-

como Bren-

de folga, na obra de pro-

também a Summa Psychologia.

* "'~í^fí >*'•-

"

*^'^.

..'—t' Í^T-'.

Uruguaiana Entre o que

foi,

175

de

Uruguayana

feito,

feição pela qual temol-a hoje, vai

O

azul das montanhas.

.

um

abysmo.

Quem

.

for

da belleza não queira nunca vel-o de azul é

grande

a

mentira da

e a

amigo"

perto.

natureza.

O

E' a

mentira por excellencia. E' tão mentira que não

Não ha

existe.

cortar no azul

azul.

A

montanha

linda,

do céo o seu azul de

a re-

saphira, é,

de perto, aspereza, precipicio, perambeira, bossoroca,

matta hispida trêimada de cipós e ar-

E

ranha-gato. céo.

.

não

é azul.

Nem

ella,

nem o

.

Assim, a

Possue,

historia.

como a montanha,

o seu azul nitido, fulgurante, luminoso. e factos, vistos á distancia

Homens

que azula, despertam

suaves emoções e até enthusiasmo. Se nos appro-

ximamos,

de nós! o azul

ai

morre e tudo

histórico

fica prosaico, colorido

descora,

da grisalha

suja das coisas contemporâneas.

Distancia e tempo ditos sejam,

:

os dois pães

do

azul.

Bem-

que é de abençoar tudo quanto aju-

Monteiro L

176 da a crear a

coisa bella

o h a

i

o

que possue a vida: a

mentira azul.

O

de Rebouças, supprimindo o tempo,

diário

desfaz o azul de Uruguayana e mostra-nos esse episodio da lidade.

As

campanha como

elle

o

a frouxidão,

indecisões,

foi

a politica-

gem emmaranhando-se como herva de nho na acção

militar,

na rea-

passari-

a incapacidade dos che-

a imprevisão, a falta de tudo, a desordem,

fes,

o negocismo.

A

.

.

resistência dos invasores eternizava-se,

nos pela efficiencia

do

exercito

me-

paraguayo ou

pela fraqueza do nosso do que pela conveniência

da

politicalha.

tece, virou negocio,

Por

fim,

como sempre acon-

dos dois lados, prolongar a

marosca.

O dos: se

cerco se fazia de

com

modo

favorável aos

sitia-

portas abertas para que se prolongas-

a resistência e se protelasse o desfecho que

poria termo á pepineira.

E

desfaçatez que o imperador

dar o caso.

a tal ponto chegou a foi

em

pessoa

liqui-

A acção catalitica do seu alto espirito

Uruguaiana Uruguayana

fulminante.

rendeu-se.

a approximação.

perto.

rapidez

heroes d'esse feito, só Pedro II avulta

Dos com

com

agiu

honestidade

de

Í77

Azul de longe

Grande de

longe, maior de

e azul de perto.

Luminosa

excepção á regra do azul.

Rebouças, no decurso do

"Só Pedro

vezes:

diário,

é brasileiro".

II

diz varias

Porque aos

mais achava, apenas, negociantes.

Uruguayana

foi

um

caso typico de inópia mili-

tar.

Lopes,

evidentemente

exercito e lança-o, qual

no

O

seio

de

um

agarra

louco,

um

dardo, ou

um

um

de

alfinete,

paiz immenso, de carne atonica.

dardo penetra uns centimetros e pára. Perdida

a força inicial do arremesso, abre na baleia

pequena

ferida,

nem

benigna,

nem

uma

maligna.

A

natureza operando, a ferida apostema, forma-se

tumor e o estrepe cáe por se o caso

Toda A

si,

de maduro. Foi

es-

da invasão paraguaya.

a agitação mavortica do "império sonOnda Verde



12

: •r'.

Monteiro L

178

como nos chamavam

so**,

um

apressou de

mor

os

o h a

ó

não

argentinos,

O

dia a queda do estrepe.

i

tu-

veio a furo no prazo certo,

Estigarribia,

selvagem bronco, penetrando no

Rio Grande com alguns milhares de trouxe na

bagagem o gérmen do

asseclas,

desastre.

vencel-o incruentamente bastava esperar.

Para

O

bom

cabo de guerra, indicado para expugnal-o, era

mesmo grande auxiliar de Fábio: o tempo. Emquanto o Império, convulsionado, improvisao

va a

resistência e

cia-se a ta.

E

si

o "castigo", Estigarribia ven-

próprio, naquella

no dia

em que

Capua

rota e famin-

Porto Alegre deu

assalto,

não tinha mais inimigos pela

exercito

paraguayo não passava de

maltrapilhos,

ansiosos por

uma

tarem-se da disciplina e comer

inicio

ao

frente.

O

um bando de

coisa

só:

em paz

liber-

o chur-

rasco.

André Rebouças que

assistiu

vapor

de bordo do "Onze de Junho*\

fluvial.

brasileira

descreve a scena do assalto

Viu

a cavallaria

caminharem sem

um

um

e a infantaria

disparo

em

di-

'mi.

Uruguaiana recção da praça.

J79

Viu tremular a bandeira

auri-

verde no cemitério posto a cavalleiro da cidade.

E

viu chegar, ás

irradiando

As

com

tarde,

um

official,

a grata nova da capitulação.

marcharam como num pas-

nossas forças

militar,

seio

3 horas da

sem

guardar,

elementares de arte bellica. cou-se sob o alcance

da

disposições

sequer,

A

artilharia collo-

fuzilaria

paraguaya.

O

general Flores teve a impressão de que as nossas forças

caminhavam como a bandear-se para

o inimigo.

Rebouças descreve

Estigarribia,

quem

a

viu

a bordo.

"Alto, pretos,

corpulento,

typo geral dos

muito

moreno,

homens do

cabellos

interior

do

Ceará ou Pernambuco. Demonstrava sangue-frio e

segurança admiráveis; continuamente fuman-

do, só cuidava de rehaver uns arreios de prata

que estavam no "Taquary"

e

6000 patacões

que deixara

official

ao qual

Em

onde

•;

r^*

em mãos d'um escreveu uma carta.

se contava

-ít'íCS«

paraguayo,

suas canastras,

descobrir documentos officíaes

",

•;;-

'^^fjgt-IV.íy^

Monteiro Lobato

180

importantíssimos, "havia apenas leques, peças de

seda e jóias."

Pobre

Estigarribia

appetites fortes,

!

No

fundo,

um homem

de

que tinha o seu problemazinho

pessoal a resolver.

Lopes, "traição"

incomprehensivo,

d'um modo

este

da

sua

feroz: entregando-lhe a

lha á lascivia dos soldados.

E'

vingou-se

.

fi-

.

o ponto culminante da tragedia, e on-

de Lopes revelou melhor a sua humanidade. Porque "o próprio dos homens"

é fazer o innocente

pagar o crime do peccador. Dos homens

Deus dos homens, o Uruguayana, estaria

caiu,

e

do

biblico. pois,

de madrugada;

e

terminada a guerra se Pedro II não com-

mettesse o erro de reincidir no erro de Lopes, in-

vadindo-lhe os dominios.

Essa invasão custou-

nos rios de dinheiro e de sangue, gentina, e

amamentou a Ar-

deu com a Monarchia do Brasil

em

terra.

Cinco annos de guerra foram

sufficientes

para

desenvolver entre nós o gérmen do militarismo, o

,^:lJ*

Urugua}?ana qual, senhoreando-se

uso e goso

to

181

da

situação,

uma Republica

extemporã.

Do

ponto de vista hymano,

de

vista imperial, proseguir

desastre.

fez para seu

Uruguayana devera

bem como do na guerra ter sido

pon-

foi

um

um

ponto

final.

O

fazel-a

virgula,

deu com o Império

em

na

da

terra.

Que grande pontuação

sciencia,

Politica, a sciencia

t^

o DICCIONARIO BRASILEIRO

ASSIM

como

o portuguez

pela corrupção popular d'esta brasileiro

está

do

saiu

saindo do portuguez.

latim»

lingua,

O

o

proces-

formador é o mesmo: corrupção da lingua

so

mãe.

A

cândida ingenuidade dos grammaticos

chama corromper ao que

chamam

os biologistas

evoluir.

Acceitemos o labéo, e corrompamos de cabeça erguida o idioma luso, na certeza de estar-

mos a elaborar obra magnifica.

Novo

ambiente, nova gente, novas coisas, no-

vas necessidades de expressão: nova lingua.

E'

risivel

idéas e esse se

o esforço do

carranca,

incomprehensivo, que

phenomeno

curto de

deblatera

contra

natural, e tenta paralysar a nos-

elaboração linguistica

em nome d*um

respeito

Monteiro Lobato

184

pelos velhos

supersticioso

que corromperam o

A

nova lingua,

em que Cabral

Não

tabus portuguezes.

.

.

latim. filha

da

lusa,

nasceu no dia

aportou ao Brasil.

ha documentos, mas

é provável

que

o

primeiro brasileirismo surgisse exactamente no dia

22 de

abril

de 1500.

E

desde então não se pas-

sou dia sem que a lingua do reino não fosse na colónia infiltrada de vocábulos novos, de forma-

ção

local,

ou modificada na significação dos an-

tigos.

Hoje, após 400 annos de vida, a differencia-

ção está caracterizada de modo tão accentuado,

um camponez do Minho nem é comprehendido por um ou um gaúcho do sul.

que

Quer.

isto

não comprehende jeca de S. Paulo

dizer que no povo

creação puramente popular





e a lingua é

a scisão já está

completa.

Nas classes cultas a differença é menor, se bem que accentuadissima, sobretudo na pronun-

a?^^^*^:^^^-

o Diccionario Brasileiro

185

no empriígo das palavras novas. Até

cia e

ar-

chaismos lusos resuscitaram cá, e são correntes

Um

tomado como bra-

de norte a

sul.

sileirismo:

o emprego do pronome pessoal "elle

como complemento

d'elles foi

directo.

Ora,

*

isso é coisa ve-

forma anterior ao descobrimento do Brasil,

lha,

dizem os escabichadores de antigualhas, Cintra

E

á frente.

provam que

cioneiros,

na

dis", etc.

E

ella",

Não

de uso corrente nos can-

"Demanda do

Graal", no

"Ama-

citam de Fernão Lopes muito "viu

"nomeamos

um

pes!

é

elle", etc,

— de Fernão Lo-

dos grandes pães da lingua. é brasileirismo, pois, essa

revelha.

E'

um

forma velha e

lusitanismo resurrecto

na

coló-

Outros protestam que não, que não é

nia.

ar-

chaismo resurrecto e sim forma nativa, peculiaridade das línguas indigenas faladas no Brasil pré-luzo.

O

facto é que no paiz todo, na linguagem fa-

lada, o "elle" e o "ella"

a

,

desbancaram o "o" e o

apesar da resistência dos letrados e da re-

sistência

da lingua

escripta.

Não

nos consta que

Monteiro Lobato ^

786 algum

de mérito usasse, na

escriptor

verso, essa forma, te incida nella.

proisa

ou no

embora falando familiarmen-

Mas

dia virá

em que

se

romperá

essa barreira, porque as correntes glossicas os

irresistiveis,

lingua, e esta

Verão,

grammaticos não são donos da

não é uma creação

lógica.

pois, nossos futuros netos,

tanta autoridade

ção

politica

são

como o

da mais

um Ruy, uma com

actual, abrir

alta importância

de

oraesta

forma que inda choca o belletrismo de hoje: Brasil, senhores, vi elle o

E

que

verão

Irellas"

um

amei

elle o

me deram

um

"ouvir es-

assim:

divisei èlla

na janella.

ma

ser-

as forças, ele.

futuro Bilac lançar

H ontem Será

mais que pude,

O

isso,

.

.

simplesmente, a rehabilitação da for-

lusa dos pré-classicos, ou a victoria

taxe tupi.

da syn-

o Diccionario Brasileiro Riem-se?

Não

é matéria

de

riso.

J87

E* a anno-

tação singela da marcha d'um phenomeno.

Inda nos detém

hoje

o

medo á

ferula dos

grammaticos d'além mar, e de seus prepostos no Brasil.

Não

obstante, a corrente

do "elle"

a dia e acabará expungindo a

Além

do

cresce dia

"o**.

d'estas incoerciveis modificações synta-

temos outra feição evolutiva operada

cticas,

larga escala:

em

a adopção de palavras novais por

injuncções das necessidades ambientes.

A

lingua é

um

meio de expressão. Modifi-

ca-se sempre no sentido de augmentar o poder

da expressão.

A

variedade de coisas novas que

tivemos necessidade de expressar,

novo como o

Brasil,

num mundo

forçou no povo

um

surto

copiosissimo de vocábulos. Elles brotam por ahi

a fora

como cogumelos durante a chuva. Lu-

ctam entre fructos

Os

si.

Os

fracos, os inúteis,

caem, como

temporões, bichados antes de maduros.

bons, os expressivos e necessários,

vencem e

Monteiro Lobato

188

ficam aquartelados na lingua.

A

lingua falada. Depois penetram na chcimada

Passam

ratura regional.

na

principio,

lite-

d'ahi aos glossários de

brasileirismos e entram, por fim, consagrados,

no

pantheon dos diccionarios.

A

do

extensão

nosso

favoreceu

território

grandemente o neologismo. Houve, além

disso,

a contribuição copiosa do indio e do negro.

agora a do italiano

mães no

em São Paulo

Ha

e a dos alle-

sul.

A maioria d'estas palavras são de absoluta necessidade.

Como

falar

da vida amazonica sem

recurso ás mil palavras de creação local? pintar o rio

Rio Grande sem

gaúcho?

E

falar

Ha

recorrer ao vocabulá-

do Rio sem tomar

rescas invenções glotticas

Como

do cafageste

no portuguez termos

que

as pitto-

carioca?

substituam o

"encrenca" e seus derivados, de creação allemã catharinense ?

E

a "uruca", a "caguira", o "en-

grossamento", como enunciar a coisa vras do

Sem

com

pala-

Moraes ? coragem ainda de lançarmos o nosso

dic-

^

o D icei onar io Brasileiro cionario,

vemol-o já

em

trabalhos preparatórios,

a delinear-se nas obras de

Rohan

189

Romaguera, Taunay,

e tantos outros collectores

de regionalis-

mos.

Virá a seu tempo. Convencer-nos-emos de que,

com

se saimos

um

dia

de Portugal, nada mais temos

o ex-reino, hoje tumultuosa republica. Virá,

talvez,

muito breve.

em

anda

O

elaboração.

diccionario brasileiro já

Um

professor

paulista,

Francisco de Assis Cintra, emérito sabedor da

lin-

gua e rijamente dotado para o trabalhoso da empresa,

acaba de

inicial-o

sob as méiis intelligentes

bases.

Em

matéria

diccionaristica

vivemos

ainda

hoje na absoluta dependência de Portugal.

mos o que Portugal nos manda, Aulete,

Te-

Vieira,

Cândido de Figueiredo. Este nos deu a honra insigne

de

incluir

sileirismos;

na sua obra boa copia de bra-

os mais,

entretanto,

são diccionarios

rigorosamente portuguezes.

Quem rico



Alberto Rangel, por exemplo, o mais

bateador de termos regionaes da nossa

lite-

Monteiro L

J90

não tem meios de lhe comprehender

ratura,

pensamento.

e, se

i

o

o

com uma

Esbarra a cada passo

palavra collectada por elle

recorre aos dic-

na mesma.

cionarios, fica

No

o h a

Ruy

próprio

Barbosa

quantas

palavras

não existem que o carranca portuguez não nos deu a honra de "endiccionariar" ?

por^, não

Isso,

é culpa d'elles,

léxicos portuguezes, para seu uso, lá.

nossa,

que fazem

A

culpa é

que já era tempo de termos publicado o

nosso diccionario.

Pensando

assim, o prof. Assis Cintra empre-

hendeu a obra sob

do novo

:

eliminar

diccionario todas as palavras portugue-

zas desusadas no sitanismos de

tamente

as seguintes bases

Brasil,

já archaismos, já lu-

moderna creação popular, absolu-

inúteis

para as nossas necessidades ex-

pressivas.

Eliminar todas as palavras coloniaes portuguezas que atravancam os diccionarios actuaes, fazendo-os obesos.

O Diccionario Brasileiro

191

a significação

Dar, principalmente,

que os

vocábulos portuguezes têm aqui no Brasil, e subsidiariamente a que têm no ex-reino.

Introduzir todas as nossas creações linguisticas,

as collectadas pelos

andam

e as

glossaristas

que

soltas.

em summa, que precisa quem vive Fazer,

pratico de

o diccionario

nesta terra, que já foi co-

lónia e está custando a se convencer

de que não

mais o é. Será, pois, alto alcance,

uma

obra de grande utilidade c

porque consolidará definitivamente

o scisma operado na velha lingua lusa.

Acontece hoje o seguinte: Aulete e procura a palavra pronuncia *âne*'

um



(an-e). Ri-se, está

menino abre o

hein; e vê lá a claro,

e

chama

ao pobre Aulete.

Outro vae ao C. de Figueiredo em busca da palavra "chupim", que elle ouve todos os dias

applicada a tico-tico, e,

um

passarinho pretc que parasita o

por analogia, aos "maridos" de pro-

,...^--;-^pf^^5^:

-'^

Monteiro Lobato

192 fessoras.

plo,

:

Não

encontra.

Mas

encontra, por exem-

"coloqueio", pássaro africano. Cintra abri-

pondo em seu logar o

rá a gaiola ao coloqueio,

chupim. Está aquelle estafermo a empatar

um

poleiro precioso.

Dirão:

melhor conservar todas as pala-

seria

vras portuguezas e incluir todas as nossas. Isso seria fazer

uma alman jarra

ineditavel,

ou

caris-

sima, ao passo que o peneiramento ideado por

a obra das múmias inúteis que se

elle alliviaria

esmirram

alii,

dos exotismos d' índia e Angola

com que nada temos que ver, ro, commodo, num volume só

daria livro maneie por preço

ao

al-

cance do povo.

Acoimam mas não lingua,

lhe

bom

o nosso pobre povo de ignorante,

dão sequer e barato!

um

Os

diccionario

da sua

succedaneos portugue-

zes que lhe indicam, sobre lhe

não satisfazerem

as exigências, custam os olhos

da

cem

mil

Além

cara, oitenta,

réis.

d'esta novidade o prof. Cintra pretende

dar o máximo rigor ás definições, approximando-

íVi;-3a'-'-->ç-

O Diccionario Brasileiro se

193

dos grandes diccionarios estrangeiros,

Webs-

á frente. Fugirá, assim, ás erronias que

ter

lete

increparam

e Figueiredo

em que incidiram, Abro ao acaso rado:



se

anteriores

bem que em menor

este ultimo e leio:

e

escala.

"desarvo-

que fugiu desordenadamente". Logo:

navio desarvorado:

nadamente

£

aos

Au-



navio que foge desorde-

!

são papões da lingua. Dão-nos

em

cima de

is,

palmatória e ensinam-nos o que se não deve dizer,

esquecidos de que não se deve dizer, sobre-

tudo, asneiras.

Muita

coisa se projecta para a

da independência. Se cionario Brasileiro,

for levado a

um

termo o Dic-

nenhuma commemoração

será

um

mo-

mais significativa. Valerá por

numento e por

commemoração

esplendido

grande passo na "realização"

d*uma independência "proclamada", vae fazer cem annos.

A

Onda Verde



13

GRANDE PRPBLEMA

o

PELAS o

sr.

columnas do Estad^ de S. Paulo

Braga

Cincinnato

artigos sobre os

escreve

magnos problemas económicos do

seu Estado natal, dá-lhe balanço

mostra os caminhos para

um programma

traça

formosos

que,

ás

riquezas,

uma riqueza maior e em regimen de opi-

nião, o candidataria á presidência

da Republica,

pelo menos.

De

facto, sae-se d*esse estudo

de que S. Paulo está

rico.

com

Só em

a certeza

1919 uma

exportação de milhão e meio de contos, e saldo

commercial vertiginoso. Infelizmente S. Paulo não conduz de par os saldos

Não

com

económicos os saldos da sua cultura.

progride

com o synchronismo que ha

mister.

Endinheira-se, mais do que enriquece.

Progredir, hoje, é menos encher a caixa dos

Monteiro Lobato

196

bancos ou o pé de meia feiçoar,

plebeu



cultivar o cérebro.

esta cultura for-

económicas.

nece indestructiveis bases a

do que aper-

AUemanha. Revelou-se, com a

lentissima

nizou

um

de bens materiaes accumulados pela

saque a

frio,

tos reza a historia.

ram-na

Mas siste

opu-

guerra,

Vencida pela "civilização",

cultura.

Veja-se

em

orga-

esta

o mais completo de quan-

Confiscaram-lhe tudo, puze-

fraldas, nua.

está arruinada a

AUemanha? Não! Sub-

a sua maior riqueza, a mental, representada

pela cultura dos seus

filhos.

Riqueza de que o

tra-

tado de Versalhes não a pode expropriar. Arvore

de producção indefinida. Vieiro enexgotavel.

Que

é arrancar os fructos á arvore se ella os possue la-

A

tentes e infinitos? ta,

em

oitenta

povo —

cultura allemã

em

cincoen-

annos — minutos na vida de um

refará,

que

farte,

tudo quanto lhe

pi-

lhou a civilização.

Riqueza

é cultura, e só ella.

Portugal: onde está o ouro que Portugal dre-

nou do Brasil quando o Brasil era

Jí^íJak-

seu, e

o que

o Cr ande Problema da Africa e das índias

197

em marfim

tirou

e espe-

ciarias?

Caso typico d'um phenomeno inverso ao da Allemanha. Endinheirado



os

gorgomilos,

velho reino não soube e não poude fixar

em

o

casa

a bolada dos navegadores.

Papas

lhe os cobres, sendo

dos milhões

um

rei

de

de citação forçada o caso

que

cruzados

a

incultura

de

deu pelo superlativo "fidelissimo".

Finda a maré, passado o fluxo da Portugal tombou no

de,

comeram

espertos e traficantes ladinos

marasmo,

sorte gran-

arruinado,

dando logar áquella pagina tremenda de Ramalho sobre a mendicância lusa todos,

Sem

do

rei



mendigos

ao porteiro de repartição.

cultura

não

se fixa,

não

se

perpetua a

ri-

queza.

Entre nós, a Amazónia viu canalizar-se para seu bolso

Mas tra,

um

Pactolo de esterlinas refulgentes.

o ouro entrou por

como

uma

a vacca amarella.

porta e saiu por ou-

Não

havia cultura;

P-Sy*-!??-

Monteiro Lobato

198

não houve progresso, si

e

o vagalhão deixou após

apenas a sulsugem.

Em

S.

Paulo será assim,

se

debaixo da rique-

za cafeeira não se construirem os alicerces que lhe darão fixidez e estabilidade.

Corre-nos hoje

tudo

á

feição.

O

con-

café

tmúa, magico, a borbotar golphões do ex-vil metal.

Veio a geada grande,

tudo.

Saiu-nos,

parada ganha

Mas

entretanto,

foi

de

um

um

fim

o

e parecia

ro^al

flush:

de a

milhão de contos.

no dia da crise? Quando o Azar sub-

Portugal,

como na Amazónia, como em com que contaremos para contrabatel-o ?

Onde

dique,

stituir-se

o

á Sorte,

o

remédio, o para-choques, a

arvore que se não esgota esse recurso



a

cultura?

Onde

de que a AUemanha, mais pobre que

Job, forçada a entregar á "civiHzação" suas vaccas, seu carvão, sua potassa e seus

derradeiro pfennig, vae lançar

mão

marcos



o

para resur-

gir?

Vale o

cérebro.

D'um

simples chimico sae

uma

»

\

o Grande Problema descoberta que revoluciona o ce

um

199

mundo

e enrique-

paiz.

Por

artes

de Edison e Marconi cream-se

for-

midáveis industrias. Liebig deu mais lucro á sua terra do que a victoria

As

de 1870.

guerras, a politica, o mexerico dos

homens

de Estado, o palavriado dos Lloyd Georges, dos Millerands, dos Eberts, tudo isso nada vale, que é agitação

apenas;

quem

neste

momento

está

creando os novos rumos da Europa, é algum humilde sábio desconhecido, lá no fundo do seu

la-

boratório.

Quando Bonaparte os destinos

como

como um

A

de

dirigir

facto os dirigia

obra do primeiro fica na

jorro de sangue; a

do segundo

a dominação dos mares.

Ora,

pois,

só vence, só crêa,

queza a cultura, e tido é

illusão

do mundo, quem de

era o obscuro Fulton. historia

dava á

se

uma

serie

em

S.

Paulo

de "boladas".

só constitue

o

que

ri-

temos

Monteiro L

200 E' preciso

mos passo

Infelizmente,

No

de bem

bem

longe estamos de nos con«

século da chimica, onde a nossa escola

No

o

d'isto.

c)*isto.

chimica?

i

porque só dare-

decisivo para a frente depois

nos convencermos

vencer

este ponto,

frisar

o b a

século

da

technica, qual

a

de

nossa

educação technica?

do bacharelismo.

Persiste a lagarta rosada

O

estudante não estuda, "cava" a carta, o funesto diploma.

Senhor

d'ella, toca depois a

"cavar"

a vida.

Em

matéria do ensino superior, além do me-

gatherio fóssil

do "sagrado mosteiro", onde Lo-

bão emperra os

espiritos e

onde,

numa modorra

de cinco annos, gestam-se promotores públicos, requeredores de

habeas-corpus e mais a paraexiste

uma

escola de

do

que

alumnos;

em inicio, e outras Todas, porém, com a preoccupação de

menores.

sitalha inteira

engenharia

uma de

de Themis,

com mais

medicina

lentes

diplomar,

O Grande Problema

20 f

annelar de pedras varias os furabolos matriculados.

Casas de sciencia que

apparelhem

technicos

E

maravilhosos para a industria, onde? quaes?

onde bibliothecas populares, escolas especializadas, laboratórios

bem montados,

collegios hones-

que apetrechem para a vida os rapazes?

tos

E

onde a comprehensão de que a sciencia é tudo e fora d'ella

não ha salvação?

D'ahi o perigo ante as rebordosas da

sorte, e

consequente programma a adoptar.

Reflexos da incultura, temol-os

a

cada

ins-

tante.

Na

politica,

onde basta

ser

mudo,

inodoro e insipido para alcançar o

titulo

incolor,

de

esta-

dista.

Sem

cultura

impossivel opinião;

impossivel politica

sem opinião

que não seja essa pyorrhéa

que nos derranca, e cuja missão, no dizer d*um velho politico já morto, é desfazer de dia os passos

que as coisas dão naturalmente de

noite.

Monteiro Lobato

2Ò2

Da de

periódica incursão no governo de bandos

piratas, qual a

O

A

causa?

incultura.

dominio eterno do coronelão analphabeto,

por quê? Incultura.

Se a honestidade

e a competência, inopinada-

mente, assumem o governo, obra é

de mero

isso

acaso, e logo a pirataria colligada, que lhe cobre-

em

ja

são.

torno, minando-as, alcançam-lhe a succes-

Por que

Na

isso? Incultura.

lavoura, após a geada, o desespero

cultor pol-o

em caminho

do

novo, o algodão.

agri-

Vem

a lagarta e come-lhe o melhor do hercúleo esforço.

Por que?

Em

Incultura.

damo-nos ao

ridiculo

de

nos deixar embahir, embeiçar, embrulhar por

um

questão

artistica

patarata italiano que vae metter no bolso milhares

de contos

more passado

Porque?

em

troca de

á

nossa

um

attestado

ingenuidade

em máresthetica.

Incultura.

Inútil proseguir.

O nosso problema capital, cia, é crear

-^

magno por

excellen-

a cultura. Escolas profissionaes para

o Grande Problema o povo,

não

203

uma em

ou dez, mas cem,

cinco,

cada cidade.

A

escola primaria ensina a

ensina a tirar partido

leitura.

A

profissional

Uma

sem outra

sem espingarda.

é cartucho

em

Depois,

cima,

superiores, escolas anneis,

da

ler.

mas

escolas

technicas,

escolas

que não dêem diplomas nem

sciencia fecunda:



isso fará

de São

Paulo uma verdadeira nação moderna, tirandoIhe o caracter

de Phenicia

italo-brasileira, encra-

vada numa índia contemplativa, em modorra á beira

do mar

Que

e dos rios.

legou ao

a Grécia,

como

mundo Carthago? se alicerçou

Um nome.



na cultura, é eterna,

chegou até nós, influencia-nos, ensina-nos, e

le-

vará sua vibração luminosa pelo tempo afora até á

consummação dos Mais vale

um

séculos.

Platão,

um

Aristóteles,

um

Es-

chylo que vinte grozas de condes macarronicos,

emersos d'uma lata de óleo ou d'um barrilete

de banha

falsificada.

Monteiro Lobato

2i)4

O

o cérebro. faz,

magno problema

nosso

E

como a

burocráticas,

da apenas, páo

mas

si,

com um

jogo

annel

Os demais problemas

no topo;

se solvem por

capital encontra solução.

caso contrario, tudo é instabilidade, perigo,

cahos, indecisão

O

reduz a escolas.

ao molde allemão ou norte-

quando o problema

Em

se

não decorativas, de facha-

e sebo

efficientissimas,

americano.

o homem,

escola é que o faz e o re-

o nosso magno problema

Não

pois,

é,



progresso de feliz.

Tem

jogo.

São Paulo

é,

por emquanto,*

ganho contra tudo, governos

api-

ratados e "pulgão branco", coronelões e "lagarta rosada".

Abriu

seu

caminho

económico

União, apesar da Republica,

apesar

da

dos

seus

vira tanto

como

apesar

grandes estadistas do Micomicão.

Mas pode a sorte

do

perder, que

jogo. Diga-o a

Para que não penetre victoriosa

nada

Amazónia.

perca, para que sua bsmdeira

como a de Paes Leme no

seio

o Grande Problema da

civilização, o

caminho é

roxa do cérebro paulista

onde até agora só

se





:

esse

cultivar a terra

Oeste virgon

semearam pergaminhos de*

corativos e aros de ouro

no engaste.

um

20S

com

crystaes coloridos

A

G R A N D E

UMA

I

D É A

grande idéa incuba-se numa disposição

humilde escondida á cauda do

Uma

Reforma do Ensino.

art.

1

9 da

idéa que, desenvolvi-

da, extinguirá rapidamente o analphabetismo entre nós.

Perceberão os professores

uma

gratifica^

ção addicional pela alphabetiz^çâo que lograrem.

Está aqui o

busilis.

Basta meditarmos

um momento

sobre o caso

para apprehendermos o alcance d'estas palavras.

Denunciaun

ellas

o primeiro passo dado pelo

Estado para a desescravização económica do professor.

Até aqui cuidava-se de

tudo,

menos de

atten-

der aos interesses pessoaes do professor publico.

Com um

ordenadinho calculado o sufficiente para

não morrer de fome

e

não andar nú, o professor

Monteiro Lobato

208 não passava de pirar a

pobre diabo sem

menor melhoria de

Todo do

um

o

mundo

direito a as-

vida.

trabalha movido pela ambição

lucro; elle teria que trabalhar

sem

perspecti-

va de lucro nenhum.

O

mais baixo operário traz deante dos olhos a

miragem consoladora da

Pode

O

riqueza.

Pode

guindar-se á cúspide dos millionarios. professor, não. Seus horizontes

com

trancavam-se

250 ou 300

económicos

a ridicula muralha dos eternos

mil réis mensaes, quer dizer, o feijão-

zinho diário e a roupinha modesta. Só,

ao cabo .

de

trinta

annos

de premio da aposentadoria mil

prosperar.

de :

a

serviço,

mesma

só, só.

o

E

gran-

miséria de

reis.

Dest'arte, ser professor era auto-condemnar-se

uma

creatura

edade madura

humana

a consumir a mocidade, a

e até a velhice

dado: marcação de passo. vida te.

300$000 não

Marca Ora,

sae

do

num

Quem logar,

castigo

de

sol-

ganha toda a economicamen-

passo, de castigo.

isso

matava o

professor.

Por mais abne-

Grande Idéa

A

gado que

fosse



209

e neste mirnclo ninguém tem

obrigação de ser abnegado

annos d'essa archi-estafante



dentro de alguns

de

tarefa

ensinar

Era

crianças, o martyr estava "estafetado".

homem

um

morto, sem ideas, sem sonhos, de alma

azeda, indifferente a tudo quanto se relacionasse

com

a pedagogia.

Essa coisa tão linda nos para

elle era

livros,

a pedagogia,

Cada

a suprema infernização.

vidade froebeliana,

um

meio novo

de

no-

encanzi-

nal-o.

Os

governos nunca se lembraram de que o pro-

fessor é

um homem como

os outros e que,

dos os homens, cada qual só tem resolver:*© problemazinho pessoal

um

como

problema a

da sua prospe-

ridade económica.

^

Conhecem a vida de um



está elle, a estas horas,

á frente de

um punhado

e broncas.

Sol de rachar, fora.

A

Onda Verde



to-

14

professor

do bairro?

num fundão

deserto,

de crianças poWezinhas

Monteiro Lobato

2/0

Um

calorão, na salinha humilde.

Pela janella aberta o martyr vê a estrada

ser-

peando, vermelha, até sumir-se nas massas monótonas da verdura; e no céo azul, andorinhas

a

traçarem figuras de geometria no espaço. Si volta os olhos, vê, pendurada a

no batente da

O

janella,

um

prego,

a gaiola do curió.

Pensa na cidade,

professor está meditativo.

no luxo das capitães, na riqueza dos automóveis reluzentes, nos theatros, nas coisas todas

"que valem a pena".

Tem uma

Mas

grilheta aos pés.

permitte economias

da vida

tudo lhe é vedado.

O

que ganha não lhe

nem para um regabofe annual

nas volúpias da civilização, pelas

férias.

E

será

sempre assim, aos 25, aos 30, aos 40, aõs 60 annos...

Seu presente se

é negro; o futuro, peior,

porque

resume nos mesmos magros trezentos mil

réis,

mais a hemorrhoida. Alli, pois, toda a vida, entre aquelles meninos desattentos... José,

;Js>

.M:

o pretinho de olhos vivos, não sae do

'^i:m.

Grande ídéa

A

O

b-a-bá.

Dicto, caboclinho opilado, é aquella

modorra sem é disparar

21 f

fim.

Os

para casa.

outros todos o que

Um

querem

na arapu-

está a pensar

ca que armou ás rolinhas. Outro remexe na algibeira as minhocas

A

com que

escola é desinteressante

vai pescar.

— bem o

Como também sabe o meio de Mas

em

tornal-a attractiva.

aquillo melhore ou não.

cansaço

O

elle...

está arrasado, neurasthenico e pouco se lhe

dá que ço,

sabe



e

quem

professor boceja.

lhe

paga

Olha o

scismas a ouvil-o chilrear ao

Exigiria

esfor-

esse esforço? curió. sol,

Perde-se sob

o im-

menso azul do céo escaldante.



Zézinho, vá ver se o curió tem agua.

você, António, traga o livro.

— —

letra é esta?

Agá.

Não!

Et

— —

Que

E

r

O,

Não! E* emme.

-- Nãol

/

'^'

Monteiro Lobato

212 1.^







— Você, Chiquinho, dê um quinau Que — E' — Não. Adeante! — E' — Não. Ninguém sabe? Prestem

aqui

seu

letra é esta?

neste camello.

zê!

enne!

attenção:

isto é

o

A

! .

.

.

Era o "a". Ninguém ainda

Que desanimo

infinito.

Está aqui o que

é,

.

sabia o

"a"...

.

por dentro e por fora,

um

condemnado ao "estafetamento pedagógico". * Pois bem. to? elle

Querem

fazer resurgir esse autóma-

Nada mais fácil. Basta apenas admittir que é um homem como todos os outros, abrindo

ante seus olhos a miragem da prosperidade. Basta "interessal-o"

do" o seu

na obra pedagógica "remuneran-

trabalho.

— "Terás

os

mesmos

saes para o custeio

trezentos mil réis

do estômago e da

'^' * ''á

"Um

lupplicio

moderno", nos Urupêa.

men-

prole.

E

Cran

A

terás, ainda,

d

é

l

213

d é a

ao fim do anno,

tanto por cabeça

um

addicional de

de analphabeto que

abrires

á

luz."

Immediatamente sua vida futuro

sorri,

se

sua prosperidade possibiliza-se.

gratificação annual, recebida de mittir-lhe-á a

Será

em

um

A

bloco, per-

accumulação do sonhado pecúlio.

quando o professor

regabofe

ou em S. Paulo.

em

um

seu

breve a casinha própria, o conforto da

familia ou, ta,

transfigura,

é solteiro e farris-

em regra, pelas Mas como essa

troca de meninos

no Rio

férias,

bolada só vem

desanalphabetizados,

fará prodigios para vencer a

resistência

elle

mental

da jécalhada miúda. Despertar-lhe-á o gosto pela escola, tornando-a interessante; dispensará a ins-

pecção porque o seu interesse coincidirá rá

com

em

ensinar crianças

o interesse do Estado; e realiza-

o que a obrigatoriedade não conseguiu até aqui.

Irá elle próprio desencovar analphabetinhos por

quanta biboca houver para matriculal-os

em

sua

escola, conseguindo dos pães, por meios geitosos«

o que não consegue a carranca da

Içi.

Pudera!

•^

Monteiro Lobato

214

Cada

bichinho d'aquelles, vale, preparado,

phabetado, dos,

'^^-^

um

um

cobre regular;

O

cobrão.

dependendo,

to-

arranjo de sua vida ficará

da sua

pois,

sommados

e,

al-

diligencia e

do seu

es-

forço.

Na

lucta

moderna

a victoria será d'este pital.

entre o capital e o trabalho

por

um

O operário passará de escravo

ticipará dos lucros.

ariamente,



trabalhará

com o

ca-

a sócio. Par-

assim, interessado pecuni-

com amor.

O professor também só te

accôrdo

agirá de

quando passar de escravo a

do houver proporcionalidade

modo

efficien-

interessado, quan-

entre o seu esforço

e a remuneração percebida.

Assim, nada mais sábio do que o artigo lei

nova onde

se

lançam

ção entre o professor e o

as bases

da

em 5$000

9 da

reconcilia-

interesse publico.

Infelizmente, a timidez dos reformadore trou

1

arbi-

por cabeça o premio ao "mata-

dor" de analphabeto.

E' pouco, é nada. Devia

ser

de 20.000

réis

'

£

^1» "^

T.

,•*»

Grande

A

d

I

emquanto não pode

215

é a

ser

de 50 ou 100.

A

5.000

professor

40 cabeças da hydra que o pode esfolar num anno rendem-lhe 200

mil

Muito pouco.

réis

por cabeça, as

réis.

decisivamente

em

Insufficiente para influir

sua psychica.

Se foram 50$, imaginemos, seriam

dois contos

annuaes. Bolada, portanto. Dinheiro que já en-

che a mão.

em

Achega

preciosa, permissiva

cinco ou dez annos esteja

folgado, ou, se é gastador,

elle, se é

com

de que

económico,

a resaca de meia

dúzia de farras supimpas na memoria.

Renascido assim de ambição, o autómato de outrora operará prodigios, e taes, que a hydra

analphabetismo dará o berro dentro

do

de poucos

annos.

Nos lobo, o

velhos paizes

europeus,

meio de extinguir a fera

assolados foi

pelo

pôr-lhe a pre-

mio a cabeça. Ponha-se a premio aqui a cabeça

do lobo do analphabetismo té

nos mais Ínvios recessos.

e elle será perseguido



o

DA

22

ESSE

"MARAJÓ

que por ahi vae

delírio

pelo

M

futebol

tem seus fundamentos na própria natureza humana.

O

espectáculo da lucta sempre

maior encanto do pessoal ou

do

homem;

foi

o

e o prazer da victoria,

partido, foi, é e será a ambrósia

dos deuses manipulada na

terra.

Admiramos hoje

os grande philosophos gregos, Platão, Sócrates, Aristóteles; seus coevos, porém, to

admiravam mui-

mais aos athletas que venciam no estádio. Milon

de Crotona, campeão na arte de torcer pescoços a touros, só para nós tem

massa popular grega,

menos importância que

Para

seu mestre Pylhagoras.

seria

de que o philosopho pudesse gloria

Em

do

os gregos, para a

inconcebível a idéa

um

dia offuscar a

luctador.

França, antes da surra homérica que lhe

deu Dempsey, o

homem

verdadeiramente popuUr

Monteiro Lobato

2/8

George Carpentier. mestre em sÔccos de

era

meira classe; e sincero,

se

dessem nas massas

veriam que

elle

sobrepujava

um em

pri-

balanço prestigio

aos próprios chefes supremos vencedores da guerra.

Nos Estados Unidos ha sempre um campeão de box tão entranhado na

em

está

suas

mãos

idolatria

do povo que

subverter o regimen politico.

Entre nós ha o exemplo recente de Friedenreich,

um

pé de boa pontaria pelo qual milha-

res

de creaturas, sobretudo creanças, são capazes

de

sacrificar a vida.

E

os delirios collectivos provocados pelo

bate de dois campeões assistir-se

em campo?

Impossivel

a espectáculo mais revelador

humana do que o jogo de tam a primazia paulistanos

em-

da alma

em que dispuitalianos, em S. Pau-

futebol e

lo.

Não

é

mais esporte, é guerra.

Não

se

ba-

tem duas equipes, mas dois povos, duas nações, duas raças inimigas. Durante todo o tempo da lucta,

de quarenta a cincoenta mil pessoas

deli-

'.

*-

:-y

O 22 da "Marajó" ram,

em

transe, extacticas,

219

na ponta dos pés, co-

como cordas de

ração aos pulos e nervos tensos

Conforme

viola.

cio absoluto

corre o jogo, ha pausas de silen-

na multidão suspensa, ou deflagra-

de enthusiasmo que só a pala-

ções violentissimas

E

vra delirio classifica.

gente pacifica, bondosa,

incapaz de sentimentos exaltados, sae fora de torna-se

si,

capaz de commetter os mais horrorosos

desatinos.

A lucta de vinte e duas forma

em

feras

possibilizando

no campo, trans-

cihcoenta mil espectadores,

os

um

feras

esfaqueamento

conflicto horrendo,

caso

um

O tar

jogo de futebol teve

o nosso povo do

vivia.

Antes

politica tinha

a

num

incidente qualquer

em corisco as electricidades muladas em cada individuo.

funda

mutuo,

psychicas accu-

honra de desper-

marasmo de nervos em que

d'elle, só

nas classes medias a lucta

o prestigio necessário para

uma

exal-

taçãozinha periódica.

E

isso

porque de todos os esportes tentados

no Brasil só o futebol conseguiu acclimar-se, co-

Monteiro L o

220

mo

o café. Hoje, alastrado de norte a

formou-se quasi interessar

em

praga,

vivamente,

h a

sul, trans-

conseguindo, só

exaltadamente,

i

elle,

delirante-

mente o nosso povo.

No

Estado de S. Paulo não ha recanto,

loca, fazenda, bairro

onde

se

vil-

não veja num chão

plaino e batido os dois rectângulos oppostos, assignaladores

d*um ground.

Pelas regiões novas,

de virgindade só agora atacada pelos invasores, é

commum

uma

topar-se de súbito,

em

plena matta,

clareira aberta e limpa onde, nas horas

folga, os derrubadores



Tudo

assistimos a

muito

um

match em certa fazenda.

bem arrumado;

os pla^ers unifor-

mizados, de meias grossas e botinas ferradas, qual nos clubs das cidades. ners, goals,

de

de páo vêm bater bola.

E

falando

em

tal

coT'

hands, half-times, a inglezia inteira

dos termos technicos.

Ao

nosso lado o fazendeiro explicava:

— Aquelle madrugada

goal-keeper é carreiro;

está

amanhã de

de pé no chão puxando lenha.

vfifJf-^-rS-^j^ "-ir^V

o 22 da

O

"Ma

r

a



t

j

o

•*

center-half é madeireiro;

está-me

umas perobas na roça velha. Os

lavrando

full-backs são

tropeiros e os forwards, simples puxadores

de en-

xada.

Era assombroso! Estávamos deante da maior revolução de costumes jamais operada

de Santa Cruz.

E

em

terras

tudo por arte e obra de

uma

simples esphera de couro estufada de ar!...

Antes de

um

futebol, só a

capoeiragem conseguiu

mesmo

cultozinho entre nós e isso

ses baixas.

Teve

Friedenreichs,

seus

só nas clas-

seus periodos áureos, produziu e

acabou perseguida

afinal

com grande magua dos tradicionaque viam nella uma das nossas poucas coi-

pela policia, listas

sas

de legitima creação' indigena.

Infelizmente não se guardou memoria escripta d*esse esporte, cujos annaes se

ravilhosas proezas. cantores,

Não

teve

não teve sábios que

do olvidio e de todo o nosso ;

teiras,

encheram de mapoetas,

não teve

as salvaguardassem rico

passado de ras-

rabos d'arraia e soltas restam apenas ane-

fl'

Monteiro Lobato

222 cdotas esparsas,

em

via de se diluírem na

memoria

de velhos contemporâneos

Que

bellos themas a nossa literatura deixa á

margem, victima que

da

é

eterna fascinação fran-

ceza

Que

em

se fixe, pois,

de forma, ao me-

letra

nos o caso do 22 da "Marajó",

narrado pelo maior humorista

Mark-Twain

digioso

tanto chiste

brasileiro, esse pro-

que é o

inédito

snr.

Fe-

Lopes.

linto

O ro,

com

22 da "Marajó"

mestre

em

era

um

imperial marinhei-

desordens e amigo de revirar de

pernas para cima kiosques de portuguezes. Rapazi-

nho bonito, imperava na Saúde onde suas proezas de capoeira excepcional

em

bocca, discutidas

do.

E

taes fez

andavam de bocca

como façanhas de Rolan-

que o governo, incommodado, de-

portou-o para o norte, a servir no Alto

nas

em

Pará.

canhoneira

A

da

flotilha

estacionada

mudança de clima regenerou-o

paz, resolvendo

tirar

Amazono

e o ra-

partido dos seus dotes pias-

^^'rv^ír^ffWTaiP'

í

O 22 da "Marajó'* ferrou

ticos,

chandler,

223

namoro com a mulher de um

da qual

Pouco durou o

se tornou logo

ship'

o amante.

trio. •

O

shipchandler morreu e o 22 casou-se

a viuva, herdeira

de

tos

com

réis.

d'um paço de quatrocentos con-

Pediu baixa, obteve-a logo e

a esposa

com

em viagem de

núpcias á Europa,

onde permaneceu por dois annos. gressou á pátria, elegendo o

foi

Ao

cabo, re-

Rio de Janeiro para

residência definitiva.

Mas

quanto mudara! Transformado

num

per-

gentleman, embasbacava a rua do Ouvidor

feito

com o

seu apuro de trajes, suas polainas, suas

sua cartola café-com-leite.

luvas,

Quem

é?

Quem



é? Ninguém sabia.

Algum fidalgo, certamente, Não vêem que modos distinctos?

E

cochichavam.

o 22, impávido, petroneando, de monóculo

no olho, a olhar de cima par os homens e as coisas.

.

.

Tinha hábitos

certos e todos os dias passava

'

,

-

-r

^

ry--^^

7-^

*'—

Monteiro Lobato

224

pelo largo de S. Francisco,

como paca

pelo car-

reiro.

Aconteceu, porém, que

alli

era ponto de

uma

roda de rapazes chiques, fortemente despeitados ante a esmagadora rival perigoso,

feminino.

Os

elegância

do desconhecido,

sem duvida, em matéria de esporte quaes rapazes, depois de muito co-

chicho, deliberaram quebrar a proa ao novo concurrente, apenas

aguardando para

a boa op-

isso

portunidade.

Certa vez

em que

o Petronio passava mais

imponente do que nunca, coincidiu approximarse

da roda chique

gabava de

Quem

um

ser mestre

capoeira mordedor, que se

em

"soltas".

sabe hoje o que é "solta", nesta época

de kikes e shooies? Solta era uma cabeçada sem hands,

isto é,

Mas mil

j'.

adversário.

o capoeira chegou e mordeu-os

em

cinco

reis.



-

sem encostar a mão no

Perfeitamente,

responderam

os

rapazes,

mas primeiro has de sapecar uma

solta naquelle

freguez que

!

-

alli

vae de monóculo

.

.

o

"

22 d a



E E

corpo.

já!

Ma

r

a

j

ó

"

225

exclamou o capoeira, gingando o

tirando o chapéo foi postar-se na cal-

çada por onde vinha o 22, de cartola e monóculo,

sacudindo passos de lord, muito esticado

em Londres. Um, dois, três. Quando Petronio o defrontou, o capoeira avança e despeja-lhe uma formidentro

do seu

croisé cortado .

.

dável e primorosa cabeçada.

O

desconhecido, porétn, quebrou o corpo, e

a cabeça

do atacante

foi

de encontro á parede,

mesmo tempo que um pé bem manejado plantava-o no chão com elegantissima rasteira. O ao

mordedor, tonto e confuso, mal ergueu-se e já

desabou de novo, cerceado por outra teira.

Passara, imprevistamente, de

aggredido

e,

vata

aggressor a

desnorteado, deu sebo ás canelas,

indo apalpar o gallo a

Emquanto

gentil ras-

cem

passos de distancia.

o Petronio, concertando a gra-

isso

com grande

calma, dirigia a palavra aos

moços elegantes, assombradissimos

— Só uma

besta destas dá soltas sem negaça!

Já dizia o Cincinato Quebra- Louça A Onda

Verde



15

:

soltas

sem

'aC'T

Monteiro Lobato

226

em lampeão de

negaça só

peasse, inda



lá.

O

Se gram-

esquina.

Trinca-Espinhas, o Estre-

Zé da Gamboa

o

polia,

tem-nas neste caso, mas

e outros praxistas admitisto

semovente não é firme de

E

».

mesmo



quando o

letra.

gyrando a bengala de unicórnio entre

dedos annelados,

finamente

superior,

os

concluiu,

com saudades:

— Já

gostei d'este divertimento.

posição social e o meio

em que

Hoje, minha vivo não m*o

permittem mais. Vejo, porém, que a arte está decaindo.

E

.

.

lá se foi, imperturbável e superior,

murmu-

rando comsigo:



Os

Soltas

sem negaça.

elegantes, passado o

.

.

Forte besta!

momento de

estupor,

planearam solemne desforra. Contratariam o

fa-

moso Dente de Ouro, da Saúde, para romper o baluarte e quebrar de vez a proa ao estranho per-

sonagem.

Tudo

assentado, no dia

jio carreiro,

com

do

ajuste postaram-se

o rompe e rasga á frente.

o 22 da "Marajó"

—E'

aquelle! disseram,

227

mal repontou ao

lon-

ge a cartola clara do Petronio.

Dente de Ouro avançou nhecido.

Ao

feito

para o desco-

porém,

fronteal-o,

entrepara,

num grande sorriso palerma: Você por aqui ? O 22

e

abre-se

— — Cala

!

.

.

!

.

.

.

.

o bico moleque, e toma lá para o

ci-

Mas afasta-te, que hoje sou gente e não ando em más companhias, disse o Petronio^ correndo-lhe uma pellega e seguindo caminho. garro.

Dente de Ouro voltou para o grupo dos elegantes,

alisando a nota.

— Então? —

perguntaram

estes,

desnorteados

pelo imprevisto desenlace. 'cês 'tão bestas!

Pois aquelle é o 22 da

"Marajó", corpo fechado para sardinha e pé que nunca malou saque. Estrompar o 22? da "Marajó?" 'cês 'tão bestas!.

.

.

'^.. -.'. J.:ifi'>'

>^ai^-'?ja.£>i^r&«^;;3JK^i.'

^

tv

N

1

D

Jl Onda Verde

O

"Çrillo"

O

''Grillo'

A O

5

.

.........

f5

27 39

Ximenes

Lua Córnea

,5/

Incomprehendido

Veteranos do l^araguay

67

Os Eucalyptos

77

Mais

87

Eucaliptos

Os Tangarás

O

"Pae da Querra

"Homo

Sapiens"

.

.

97

.

107 /

//

Luvas!

125

Dramas da Crueldade

753

Dialecto Caipira

143

Os

153

livros

fundamentaes

índice

II

63

Condes

/

Uruguayana

173

O O

Diccionario Brasileiro

183

Çrande "Problema

195

Grande Idéa

207

J O

rt-a'^-

22

da "Marajó"

2/7

1

/^

View more...

Comments

Copyright ©2017 KUPDF Inc.
SUPPORT KUPDF