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Afilosofia eseuensino
Caminhosesentidos
jWfc Edições Loyola
COLEÇÃO FILOSOFAR É PRECISO ConselhoEditorial: AntonioEdmilsonPaschoal(PUC-PR) JoãoCarlosSallesPiresdaSilva(UFBA) .MarceloPerine(PUC-SP) SílvioGallo(UNICAMP) TelmadeSouzaBirchal(UFMG) Preparação:MaurícioBalthazarLeal CriaçãoeProjetoGráfico:MaurélioBarbosa MauroC.Naxara Capa:MauroC.Naxara Revisão:RenatodaRocha
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ISBN978-85.-15-03673-8 ©EDIÇÕESLOYOLA,SãoPaulo,Brasil,2009
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Apresentação......... ................................. ............ ....................... ....................... ........................ ....................... ................... ........9 9 Renê José Trentin Silveira e Roberto Goto
1.
DesafiosatuaisdoensinodaFilosofia............. Desafiosatuaisdo ensinodaFilosofia......................... .................. ................ ..........17 17 Antônio Joaquim Severino S everino
2.
OensinodeFilosofianaeducaçãoescolarbrasileira: conquistasenovosdesafios conquistasenovosdes afios...................... .......... ....................... ....................... ........................ .............. ..35 35 Dalton José Alves
3. Filosofiaesegurançanacional:oafastamentodaFilosofia docurrículodoensinomédionocontextodo regimecivil-militarpós-1964.......................... regimecivil-militarpós-1964.............. ....................... ....................... ...................... ..........53 53 Renê José Trentin Silveira
4.
OfilósofoeoprofessordeFilosofia: práticasemcomparação............... práticasemcomparação.... ....................... ....................... ....................... ........................ .............. ..79 79 Lidia Maria Rodrigo
5.
Umdiálogoeumsimpósiointermináveis Umdiálogoeumsimpósi ointermináveis.......... ...................... ........................ ................ ....95 95 Roberto Goto
Apresentação
os dias 3 e 4 de dezembro de 2007, o Grupo de Pesquisas Paideia, que reúne pesquisadores dedicados a estudos em filosofia e educação, realizou seu I Simposio sobre Ensino de Filosofia (I Simphilo) nas dependências da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O mote do evento foi: “O que significa dizer sim para o ensino de Filosofia?” Esta questão foi desdobrada e explorada em mesas-redondas que trataram de quatro temas específicos:
N
1) O ensino de Filosofia: história e atualidade 2) A filosofia e seu ensino: o(s) sentido(s) do filosofar e do ensinar Filosofia 3) O filósofo e o professor de Filosofia: práticas em comparação 4) Professores de Filosofia, seus colegas e alunos: aspectos éticos e políticos
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afilosofiaeseuensino — — caminhosesentidos caminhosesentidos
Na presente coletânea, o leitor encontra textos que contemplam os três primeiros temas, que dizem respeito mais diretamente às questões e razões históricas e metodológicas do ensino e da aprendizagem da Filosofia como disciplina escolar, bem como aos fundamentos ontológicos e antropológicos do filosofar em suas relações com as finalidades do ensinar filosofia. No entanto, embora a definição de temas aponte para uma demarcação de campos, não se pode esperar que esta seja rígida e precisa. Os aspectos acima aludidos acabam intercambiados nos artigos, como aliás se costuma esperar de abordagens de caráter filosófico: elas tendem, por exigências intrínsecas — para não dizer por vocação —, a abarcar e relacionar os diferentes aspectos, as várias facetas de cada questão em benefício de uma análise de conjunto e de uma compreensão tanto crítica quanto mais abrangente da(s) realidade(s) referida(s) no problema que alguém, um grupo, uma época ou uma tradição trouxe à baila para ser pensado c debatido. Este parece ser bem o caso de "Desafios atuais do ensino da Filosofia ” , texto em que Antônio Joaquim Severino oferece já uma espéci espé ciee de síntes sín tesee do debat deb ate, e, ao mesmo mesm o tempo tem po abrin abr indo do e delimitando caminhos para o trabalho do professor de Filosofia. Ao conceber o processo de ensino e aprendizagem de tal disciplina como o meio e a oportunidade de que os alunos (sobretudo — mas não só — os adolescentes) dispõem para buscar e promover sua inserção na história para aí descobrirem seus próprios sentidos de existência histórica, o autor põe em estreita conexão os fatores e elementos que constituem, de maneira essencial, aquele processo: a historicidade, a condição humana, a subjetividadé, as relações entre a pólis e a paideia. A esses fundamentos ou questões de fundo subordina o encaminhamento dos proble-
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apresentação
metodológicos, pedagógicos e institucionais, entendendo a Filosofia como um componente curricular que por si só não pode ser encarregado de salvar a educação, uma vez que a própria educação escolar como um todo não pode nem deve carregar a responsabilidade de “ resolver todos os problemas da sociedade brasileira, nem mesmo o da formação das pessoas”. Tais limites, que merecem ser lembrados “até para retirar dos ombros dos professores de Filosofia aquela ansiedade que os escraviza”, não os eximem contudo do “sério compromisso e da possibilidade de mas
contribuir, significativamente, para a formação dos adolescentes” — formação que não se deve dar na qualidade de “uma erudição
acadêmica’', ’' , mas numa “forma de apreensão e vivência da própria condição humana”, como “ amadurecimento de uma experiência à altura da dignidade dessa condição, experiência a partir da qual as pessoas possam conduzir sua existênc ia histórica”. histórica”. Já o tra balho bal ho de Dalton Dal ton José Jos é Alves, Alv es, “ O ensino de Filosofia na educação escolar brasileira: conquistas e novos desafi os”, reme te mais diretamente ao processo histórico que culminou recentemente na reintrodução da Filosofia, ao lado da Sociologia, como disciplina obrigatória do currículo do ensino médio. O autor considera, entretanto, que tal marco histórico, representado pela lei n° 11.683, de 2 de junho de 2008, não deve ser tomado como um ponto de chegada dos esforços para consolidar a presença da disciplina na educação básica, mas como “ ponto de partida para novos e necessários avanços”. A s eu ver, a instituição da obrigatoriedade, no caso, “é uma conquista histórica, é o resultado de aproximadamente trinta anos de luta por uma educação de qualidade e acessível a todos os brasileiros(as), luta para a qual vêm contribuindo muitos educadores, estudantes, filósofos, sociólogos” — portanto, “não se pode classificá -la como um gesto espontâneo
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1 afilosofiaeseuensino — caminhosesentidos
e generoso dos gestores governamentais, mas sim como reconhecimento e atendimento de uma reivindicação histórica”. Lem brando que há o risco de retrocesso, uma “vez que se pode acordar
um dia e a Filosofia já estar novamente fora do elenco de conhecimentos fundamentais e básicos necessários à formação de todo cidadão”, propõe que o momento atual é “oportuno para se vojtar
a discutir a criação de uma associação nacional de ensino de Filosofia que reúna e dê mais força política às demandas da área, tais como: o debate pela inclusão da Filosofia no vestibular; [...] a metodologia e a didática do ensino de F ilosofia em sala de aula; [...] a formação de professores de Filosofia”. Adotando igualmente uma perspectiva histórica, Renê José Trentin Silveira discute as razões do afastamento da Filosofia do ensino médio no período da ditadura civil-militar instalada no Brasil em 1964. Inicia seu texto pondo em dúvida a opinião bastante difundida de que isso teria se dado em virtude da suposta “natureza crítica, contestadora ou mesmo subversiva” da discipli na. A seu ver, o referido afastamento foi produto de um processo mais complexo, cuja compreensão “passa pela análise da influên cia da Doutrina de Segurança Nacional e Desenvolvimento (DSND), principal suporte ideológico” daquele r egime, nas mudanças por ele implementadas na educação. Esta é a tarefa que ele se propõe, “ainda que em caráter preliminar”, em “Filosofia
e segurança nacional: o afastamento da Filosofia do currículo do ensino médio no contexto do regime civil-militar pós-1964 ” . Após caracterizar brevemente essa doutrina, procura explicitar o impacto que ela teve em algumas das medidas educacionais adotadas pelo governo, com destaque para “os acordos MEC USA1D” e a “reforma do ensino de I o e 2 o graus (Lei 5.692/71 )”. Argumenta que “tais medidas visavam, em última instância, a
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apresentação
transformar o sistema de ensino em instrumento de promoção da segurança e do desenvolvimento do país”, papel que a Filosof ía, bem como outras disciplinas humanísticas, não parecia disposta a desempenhar. Assim, “independentemente de ter ou não o ensino.de Filosofia uma natureza crítica ou subversiva”, era preciso eliminá-lo a fim de abrir espaço no currículo para matérias marcadamente doutrinárias, como Educação Moral e Cívica e Organização Social e Política do Brasil, plenamente identificadas com os objetivos do Estado de Segurança Nacional. A preocupação com a didática do ensino de Filosofia constitui o leitmotiv do texto de Lidia Maria Rodrigo, “ O filósofo e o professor de Filosofia: práticas em comparação”. Essas práticas,
a primeira consistindo no artesanato próprio do pensador, a outra constituindo o trabalho de apropriação, reformulação e socialização das teses e dos argumentos produzidos por aquele, são objeto por parte da autora de uma reflexão conceituai que se debruça sobre as relações de distinção e articulação entre o discurso filosófico original, de um lado, e o discurso didático, de outro. Na passagem do discurso primeiro elaborado pelo filósofo para o discurso segundo tecido pelo professor de Filosofia, ocorre uma inevitável simplificação, que “deve ser aceita, mas apenas
sob a condição de não se negar como mediação ou etapa transitória”. O discurso segundo é um discurso mediador no duplo sentido de que constitui “simultaneamente u ma etapa de transição, como passagem de uma condição a outra, e também um momento transitório, passageiro, que tem certa duração temporal e, por isso, deve existir sob o regime daquilo que é provisório”. O desafio que se oferece ao professor de Filosofia está em trabalhar de tal modo que o discurso didático cumpra efetivamente sua função mediadora e jamais seja entendido “como fim último
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ou exclusivo da aprendizagem”. A autora assinala que o “discurso mediador, quando exercitado como tal, tem a missão de construir, em seu próprio interior, os instrumentos de sua superação, ou seja, os instrumentos capazes de conduzir à autonomia intelectual do aluno”; no caso, “trata -se de direcionar o trabalho no sentido de promover a passagem da simplificação para a complexidade ” , sendo “o contato direto co rn os textos filos óficos” o “instrumento apropriado para essa transição”. Finalmente, Roberto Goto procura o sentido do ensinar Filosofia na exploração do sentido do filosofar: toma a filosofia como sujeito de “seu” ensino, indagando o que, neste casó, ela ensina 011 pode ensinar, na condição de mestra ou professora — questões que (re)conduzém para os temas da morte e do nascimento da filosofia. Se filosofar é buscar a verdade do real, dizendo o que ele é mesmo, a filosofía está morta, reduzida a uma coleção infindável de discursos a respeito dos quais não é possível decidir em termos, justamente, do verdadeiro e do falso. Mas pela mesma razão a filosofia teria nascido morta, pois a pretensão de dizer o real mostra-se desde o início louca, impossível de ser satisfeita, considerando-se que 0 real é o absolutamente outro do logos que ambiciona dizê-lo. O autor faz a distinção, nesse passo, entre um espanto púmeiro, que revela o real como absurdo, isto é, feericamente infenso e inacessível ao logos, e um espanto segundo, o qual se constituiria já por meio de um ardil ou artimanha do logos, que então inventa conceitos (como o do ser parmenidiano) para dar a si mesmo 0 artifício de realizar aquela pretensão de dizer o real. Em tal insistência, que conflita com a caracterização da filosofia como apenas um acervo de discursos, o articulista vê tanto loucura quanto lógica: perseguir a verdade mesma do real constitui 0 ceme do filosofar, o qual no entanto lança tal projeto no
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apresentação
infinito. Assim, na (des)medida em que o fim — a finalidade — dessa busca se projeta no infinito, o(s) sentido(s) do filosofar e do ensinar Filosofia move(m)-se na direção e na presença de “um diálogo e um simpósio intermináveis”, nos quais os discursos são produzidos, postos e/ou jogados, mas sempre apontando para o real, que os atravessa como a luz que passa e desaparece pelo buraco negro. Com o presente livro, o Grupo de Pesquisas Paideia — neste caso representado por seus integrantes vinculados à linha de pesquisa Ensino de Filosofia — procura ampliar o acesso do público às discussões desenvolvidas durante o I Simphilo, oferecendo novos subsídios para a reflexão sobre o ensino de Filosofia e sua prática em sala de aula — o que, espera, pode contribuir para sua consolidação e sua disseminação, agora como disciplina obrigatória do currículo de nível médio. Renê José Trentin Silveira e Robeño Goto
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Desafiosatuais doensinodaFilosofia Antônio joaquim Severino 1
Introdução A filosofia justifica-se plenamente na formação do adolescente, e sua presença faz-se absolutamente imprescindível no currículo do ensino que lhe é destinado. Essa presença justificase em decorrência da própria condição da existência humana, condição que se constitui através de suas mediações históricas, através do trabalho, através da participação social e através do desenvolvimento cultural das pessoas. E a educação é a grande mediadora dessas mediações concretas de nossa existência. Dada essa historicidade radical de nosso existir, nosso modo de ser 1. Professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo
(uspy.
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não é uma realidade pronta, mas um contínuo devir, um processo de construção, impondo-se a necessidade da formação. Mas é preciso, preliminarmente, superar uma visão idealizada do poder e do papel da filosofia, da educação e da escola. Temos a indevida propensão a esperar da educação escolar mais do que ela pode propiciar. E preciso descartar a concepção salvacionista da educação e, no âmbito da educação, o messianismo filosófico. A educação é simplesmente uma aposta... Não cabe à educação escolar resolver todos os problemas da sociedade brasileira, nem mesmo o da formação das pessoas. O que ela pode efetivamente fazer é contribuir, fazer um esforço para investir o máximo possível para essa formação, sem ter de responder por sua integralidade. E no âmbito da escola não cabc a uma única disciplina o encargo da formação integral dos educandos: NenHumai disciplina pode fazer isso sozinha, o investimento formativo é responsabilidade de todas as disciplinas, do ciirrículo em seu sentido mais amplo, do contexto c das pessoas envolvidas. É importante ressaltar isso de forma incisiva, até para retirar dos ombros dos professores de Filosofia aquela ansiedade que os escraviza, dada a elevada expectativa em relação ao poder formativo da filosofia. Mas a Filosofia no ensino médio tem um papel e uma responsabilidade, 110 que concerne à formação, análogos aos de todas as outras disciplinas c depende, tanto quanto as demais, do contexto cultural da cscola e da sociedade. Isso colocado, não deixa a filosofia de ter um sério compromisso e a possibilidade de contribuir significativamente para a formação dos adolescentes. Essa formação,'enquanto responsabilidade parcial da educação, não se resume, obviamente, no domínio de um acervo de conteúdos informativos e de deterrhinadas habilidades. Não é uma erudição acadêmica, é uma
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desafiosatuaisdoensinodafilosofia
forma de apreensão e vivência da própria condição humana, é o amadurecimento de uma experiência à altura da dignidade dessa condição, experiência a partir da qual as pessoas possam conduzir sua existência histórica.
Quando
se
fala
de
conhecimento
e
de
filosofia,
o
que
está
ein pauta é formação...
Para educar as novas gerações c preciso que cias se insiram· nesse processo todo de formação, de desenvolvimento, obra que é construída coletivamente. E preciso levar em conta a historicidadc e a solidariedade do processo que instaura a humanidade no tempo. Não há, pois, como inserir as novas gerações no mundo do trabalho, no mundo da participação social, no mundo da cultura, de maneira ingênua, de. maneira automática, de maneira mecânica ou de maneira dogmática. Por isso, a função da educação é exatamente explorar esta que é nossa única ferramenta: o conhecimento. Para que a educação, os currículos, o ensino possam se tornar fecundos e significativos em qualquer dos níveis da formação humana, em qualquer.de suas modalidades, obviamente é preciso que, ao lidar com eles, estejamos lidando adequadamente com o conhecimento. Isso quer dizer que não há processo de ensino, não há processo de aprendizagem se não há processo de produção e construção do conhecimento. Então aí é que entra a importância da abordagem filosófica, da postura filosófica, que interessam não a uma determinada função em particular, mas a todas as pessoas que estão passando por um processo de inserção no mundo da cultura contemporânea. Trata-se, pois, de uma exigência universa l·Equando chegamos, por exemplo, ao caso do ensino médio
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pouco importa se o adolescente vai ter a terminalidade de seus estudos nesse nível, inserindo-se já no mundo do trabalho, ou se ele vai para a universidade: sua formação filosófica é absolutamente necessária pára que ele, adolescente, possa se dar conta do significado de sua existência histórica, do significado da inserção dele, seja onde for — 110 mundo do trabalho, no mundo da profissão, no mundo da cultura. Bem entendido, a formação do jovem não é exclusividade da Filosofia. As perspectivas de todas as ciências humanas são igualmente importantes, mas não cabe a elas responder por todas as exigências de se lidar com 0 conhecimento na formação humana. Por isso, a ideia de que a formação filosófica se dará na transversajidade é mais um equívoco das apressadas mudanças setoriais que se vêm fazendo na educação em nosso país. Assim, tendo bem presente que estruturas curriculares não constituem panaceias automáticas, que o currículo em si é uma mediação, é preciso ficar também bastante claro que não se pode formar bem o adolescente se não se cria a oportunidade-para que ele possa desenvolver-se intelectualmente, para que ele possa lidar com 0 conhecimento de maneira adequada para que se promova como sujeito pessoal, para que ele se realize como ser humano, como membro de uma sociedade e como cidadão. De qualquer maneira, é preciso priorizar aquilo que é mais fundamental: a formação filosófica — entendendo-se a filosofia com esta postura, com esta atitude do espírito humano em relação às.coordenadas de sua própria existência histórica, social e cultural — é o que existe de mais fundamental. Por isso, ela se faz necessária em todos os níveis de ensino. E óbvio que 0 papel da filosofia na tarefa da emancipação do homem é fundamental, se se tem como meta a construção
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de um sujeito humano autônomo, se se tem em vista a emancipação do homem. Falar, pois, da prática e do ensino de Filosofia remete-nos ao exercício da subjetividade, o que nos faz lembrar que toda atividade intelectual humana, todo conhecimento como expressão dessa subjetividade já emergem 110 plano histórico e antropológico da espécie, intimamente articulado com o todo da prática existencial do homem. O conhecimento surge como uma estratégia da existência. Não constitui uma esfera isolada das demais coordenadas da vidâ, em que pese sua força centrífuga rumo à pretensa autonomia de funcionamento. Com esta consideração não estou assumindo nenhuma teoria pragmatista, utilitarista ou existencialista, apenas afirmando a íntima vincülação do pensar ao existir concreto do homem. Se isso já é válido para qualquer manifestação da subjetividade, o é muito mais ainda para 0 caso do conhecimento filosófico, apesar de ser ele a modalidade quê mais se expressa com autonomia em face dessas coordenadas objetivas. Mas esta é uma força cntrópica que leva à ilusão, à alienação. Cabe sim reconhecer uma pragmaticídade básica para a filosofia que se traduz como função intencionalizadora de nossa existência. E o esforço de busca de sentido deste existir, cabendo-lhe explicitar referências para a condução dessa existência, como inténcionalização das práticas reais que a constituem.
A filosofia é sempre paideia, pois está intrínsecamente comprometida com a formação política de todos os homens... Isto quer dizer que o pensar filosófico, em sua substantividade, desdobra-se numa dupla dimensão: uma dimensão política
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e uma dimensão pedagógica, ou seja, a busca do sentido não é única e exclusivamente um problema do sujeito individual, não é só epistêmica e ética, ela é sempre ligada à esfera do sujeito coletivo, histórico e social. A humanidade, como sujeito coletivo pensante, busca explicitar e construir sentidos que tenham a ver com o direcionamento do agir histórico de seu conjunto. E sempre prenhe de universalidade, por mais que seja um exercício individual. Ora, isso transforma toda atividade intelectual, c de modo direto e explícito a filosofia, numa explícita pedagogia política. A filosofia torna-se uma paideia na medida em que, necessariamente, se destina a formar a coletividade humana. Por isso mesmo, e na exacerbação, todo filósofo é um educador da cidade. Não sem razão, impõe-se insistir em que o compromisso fundamental do conhecimento é com a construção da cidadania, entendida esta como uma forma adequada de existência no âmbito da pólis, adequada porque realizando uma necessária qualidade de vida, que o próprio conhecimento, ferramenta privilegiada da espécie, lhe permite configurar historicamente. Assim, discutir o ensino da Filosofia, em meu entender, pressupõe que tenhamos sempre presente esse modo intrínseco de ser do pensar filosófico. A tarefa pedagógica relacionada com o filosofar parcce-me direcionada por estes dois vetores. O primeiro vetor é o alcance geral da reflexão filosófica. Com efeito, o refletir filosófico assim concebido precisa atingir toda a comunidade humana, ou seja, por hipótese todos os homens deveriam estar pensando com vistas à intencionalização de suas existências. É claro que a efetiva realização dessa necessidade é algo historicamente precário, dada a carência das mediações huma-
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nas disponíveis. Mas tem-se isso por horizonte quando insistimos, ainda que molecularmente, em levar pedagógicamente a filosofia às crianças da escola fundamental, aos adolescentes da escola média e aos jovens dó ensino superior, quaisquer que sejam suas opções vocacionais 011 profissionais. A filosofia dirige-se então ao todo da população, e sua finalidade é formativa do humano. Não se pode ser plenamente huinanizado sem a prática do pensar reflexivo, sem o seu efetivo exercício. Mas o outro vetor é o do ensino especializado, destinado à preparação de verdadeiros “especialistas ” em filosofia. Na verdade, este aspecto da tarefa pedagógica da filosofia não se desvincula do primeiro, uma vez que a preparação destes especialistas tem sua razão de ser no desempenho daquela primeira tarefa, ou seja, não se formam filósofos num mero processo de autorreprodução. Eles são formados para educar filosoficamente todos os sujeitos educandos como futuros integrantes da pólis. O curso de F ilosofia não pode voltar-se para a reprodução de uma categoria técnica de alta especialidade, que girasse em tornõ de si mesma, ou para a sustentação de setores igualmente especializados da sociedade. E por isso mesmo que a formação filosófica deveria perpassar, impregnar capilarmente, todo o organismo universitário e societário. Trata-se de um tipo de formação que diz respeito a todo mundo. , Talvez essas afirmações, em tese, sejam até consensuais entre nós, mas 0 problema é sua concretização. Sem dúvida, isso não está ocorrendo na prática. E impõe-se-nos explorar ao máximo as poucas e precárias mediações que ate então conseguirnos, historicamente, implementar. É hora então de nos referirmos as práticas concretas que estamos desenvolvendo nos últimos tempos em nossos meios educacionais.
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A formação filosófica é uma exigência universal, ou seja, ela é necessária na formação e na atuação de todos os profissionais Uma primeira consideração é reiterar a pertinência dos esforços que vêm sendo desenvolvidos com o intuito de educar filosoficamente todos os educandos em todos os momentos de seu tempo escolar. E de se reconhecer então a procedência da experiência pedagógica do exercício filosófico pleno desde o ensino fundamental. Sem prejuízo de todas as cautelas è das eventuais limitações das experiências realizadas ou dos modelos paradigmáticos adotados, parece acertado historicamente levar as crianças à experiência de um diálogo filosófico, munindo-as de estratégias adequadas para que nelas se inicie, na verdade se ative a capacidade de pensar sistematicamente que é própria da filosofia. Igualmente válidas são a continuidade e a expansão da formação filosófica dos adolescentes no ensino médio. Indiscutível sua relevância nessa fase tão significativa na formação da identidade do ser humano. Os investimentos na formação filosófica de crianças e adolescentes parecem-me procedentes, uma vez que essa formação contribui mesmo para o amadurecimento de opções, por parte de jovens, pelo campo da prática filosófica. Para tudo precisamos de uma sensibilização, como bem o mostra o caso da sensibilidade estética. No caso então do ensino superior, a formação filosófica torna-se uma exigência ainda mais abrangente c completa, já que agora a educação envolve-se diretamente com a própria produção do conhecimento, com a responsabilidade não só pela preparação profissional para a atuação direta nos destinos da pólis, mas também pela sustentação do próprio processo de produção da ciência. "·
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Até pela relevância e pela imprescindibil idade do exercício da reflexão filosófica no seio da cultura, o ensino da Filosofia merece um cuidado muito especial, na medida em que é o locus principal de desencadeamento de todo o processo da busca de sentido. Não se trata apenas de se instruir numa determinada habilidade nem de se apropriar de um acervo de conhecimentos. Trata-se, ao contrário, de se instaurar, de se desenvolver e de amadurecer um estilo de reflexão, um modo de pensar, um jeito especial de fazer atuar a subjetividade. Obviamente, isto tem de ser conquistado através de mediações pedagógicas, fazendo-se assim absolutamente imprescindível o ensino. E aqui é o momento de me posicionar criticamente contra a ideia de que esse refletir surge na transversalidade do aprendizado geral das demais disciplinas de um currículo. Certo, não cabe mesmo fetiehizar o currículo, mas mediações específicas precisam estar atuantes para que aprendamos a filosofar.
No resgate das contribuições dos filósofos clássicos, impõe-se levar em conta a historicidade do processo do conhecimento Quando se fala de estratégias que possam tornar operativas essas mediações, logo vem à tona o recurso à história da filosofia. Qual é o lugar da história do pensamento 110 processo de ensino/ aprendizagem da Filosofia? O convívio com os filósofos parece um caminho óbvio. Mas é preciso ter muita sensibilidade c lucidez para trilhá-lo. Ao recorrer à história da filosofia no processo dc ensino/aprendizagem da Filosofia, deve-se levar em conta a afirmação da historicidade do conhecimento e não uma convicção historicismo. Com efeito, impõe-se o resgate do pensar filo-
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sófico do passado, daquilo pelo que ele se tornou clássico, porque o filosofar, como toda modalidade de conhecimento humano, se faz também pela prática histórico-social de um sujeito coletivo. Em que pese a inarredável mediação dos sujeitos individuais, os grandes filósofos, o pensamento humano constituiu-se por múltiplas contribuições que se articulam na temporalidadc histórica e na espacialidade social. O filosofar é, sem dúvida, uma grande experiencia coletiva, como, de resto, o é toda a cultura humana. Mas resgatar as etapas que foram se sucedendo e se superando ao longo dessa trajetória não é fazer um puro rastreamento arqueológico. Esse processo do passado só se legitima na exata medida em que nos subsidia na compreensão das articulações de nossa experiência atual. Nossa experiencia contemporânea só ganha significado se relacionada a esse devir, o mesmo que nos lança rumo ao futuro, ou seja, instaurar o sentido hoje só se legitima enquanto esclarecimento para o direcionar dc nossa existência futura, como investimento na continuidade da construção do futuro da espécie. Por tudo isto, o exercício do filosofar implica um diálogo especial com os pensadores do passado e mesmo com os pensadores contemporâneos. Num caso como no outro, não estamos diante de um produto sui generis do qual nos apropriaríamos para uma espécie de fruição egocêntrica, más de um processo de pensamento, de reflexão, de indagação que busca esclarecer o sentido de todos os objetos de nossa experiencia, mesmo quando já significados pelo senso comum ou pelas ciências. E se, com relação aos pensadores do passado, não cabe exibi-los num museu de ideias antigas, com relação aos pensadores atuais não cabe expô-los no museu das ideias contemporâneas. Entendam-me bem: a mediação pedagógica exige a retomada
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e
a exposição destas ideias, não como uma peça de anatomia 0 u de museu, mas como uma dinâmica energética do pensar que problematiza nossa própria atualidade. Trata-se, antes, no processo de ensino/aprendizagem da Filosofia, de articular bem o produto e o processo. Incorpora-se o processo pelo resgate reconstrutivo do produto, revivendo o processo que foi como que objetivado no produto. Praticar o processo puro, a partir dc um debate supostamente originário, é desconhecer a historicidade do próprio processo. Só possq aprender a pensar pensando, mas, para nós, pensar implica retomar aquilo que é resultante do já pensado. Eis a justificativa e a significação mais profunda do diálogo com os pensadores que nos antecederam no tempo c com aqueles que convivem conosco num mesmo espaço social, na contcmporaneidade. Só assim a prática da filosofia se torna paideia, ou seja, se faz pedagogia para formar o cidadão. Por isso, ela precisa expor também ao real, ou melhor, se expor a ele, ao real, que se confronta com as ideias. Formar a juventude e formar os formadores da juventude, os educadores em geral e o filósofo-educador, em particular, é habilitá-los ao exercício dc uma forma dc pensamento que seja competente, criativa e crítica com relação à realidade do existir. O filosofar contemporâneo não pode deixar de considerar que é também tarefa sua decodificar a atualidade do mundo, investir na explicitação dc seu sentido na contingcncialidade de seu produzir histórico. Por isso, ele é uma investigação sobre o sentido do presente, com tudo que isto tem de arriscado. Torna-se necessário para o filósofo estar atento às manifestações do real histórico do momento; daí a decorrente exigência dc diálogo com todas as demais expressões do conhécimento, pois afinal a filo-
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sofia não dará conta, sozinha, de toda essa hermenêutica do real, da vida e da história. Mas é bom lembrar ainda que essa atualidade é extremamente sedutora, eis que ela se estrutura sobre toda uma poderosa tecnologia midiática, reforçada por uma hegemônica ideologia, extremamente persuasiva, de um pretenso neoliberalismo. E a cultura midiática que impregna todo o atual universo humano. Por isso, muitos pensadores deixam-se envolver pelo mavioso canto da sereia, supostamente pós-moderna. Sereia que c também esfinge, pelo caráter enigmático que esta cultura atual também assume, pronta a nos devorar se não a decifrarmos. Na leitura dos filósofos, é preciso igualmente superar uma abordagem puramente filológica de seus textos... Por outro lado, o rigor metodológico que se faz necessário para o resgate do pensamento dos filósofos nunca deve reduzirse à pura exegese estruturalista de seus textos. Não se pode perder de vista que o texto, a linguagem foram apenas a mediação sígnica, imprescindível para que o filósofo pudesse registrar, com um mínimo de objetividade, seu pensamento e, sobretudo, para que pudesse alocá-lo 110 accrvo da produção cultural da humanidade, deixando-o à nossa disposição. Tanto o historieismo quanto 0 textualismo parecem-me insuficientes e reducionistas pedagógicamente, e acabam por dificultar em vez de facilitar 0 aprendizado amadurecido e formativo da Filosofia. Por isso, na leitura, na reelaboração dos textos, o estudante deve ter bem presente o carátcr processual do texto filosófico — ele não se esgota em si mesmo. E nosso diálogo com os textos é também, e fundamentalmente, um diálogo com o con-
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texto, este entendido como a realidade multifacetada do existir que envolve o pensador. Que os textos clássicos da filosofia constituem base para a reflexão e o debate filosóficos é uma conclusão incontestável, sobretudo na fase da formação. O texto tem uma inquestionável dimensão pedagógica. A familiarização coma abordagem sistemática dos textos com o intuito de uma leitura consistente é mediação valiosa no processo formativo. O contato e o convívio com textos de boa qualidade nos permitem evitar cairmos no mero opiniónismo do senso comum ou na litcratice de consumo. O trabalho do conceito é um esforço necessário para qué não predomine no espírito dos iniciantes um ccrfo sentimentalismo, tendência sempre presente quando se pretende debater questões que têm a ver com as condições da existência dos seres humanos. Não se trata de ser tolerante com opiniões idiossincráticas. Mas nada disso autoriza a que se tome um texto como uma peça autônoma, áutossuficiente, como se ele não fosse o veículo da discussão de uma problemática objetiva, que vai além da trama textual. A abordagem do filósofo até pode apoiar-se na abordagem do filólogo ou do linguista, mas ela é diferente. O objetivo da formação filosófica, bem como da atuação do filósofo, é sempre a prática da reflexão filosófica, reflexão que precisa ter como conteúdo os temas/problemas gerais relativos ao todo da existência humana, mediados pelos temas específicos da experiência vivenciada nos diversos âmbitos de nosso existir.
Conclusão Não se pode perder de vista que o que está, pois, em pauta é a formação, 011 seja, uma vontade utópica, à qual não cabe jamais renunciar: explicitar pedagógicamente ao adolescente 0 sentido
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de sua existência, subsidiando-o na compreensão do lugar que ele ocupa na realidade histórica de seu mundo. Subsidiar o jovem aprendiz a ler o seu mundo para se ler nele.
Esta a grande tarefa pedagógica da filosofia e seu grande desafio em sua especificidade curricular. Ao contrário do que deve ocorrer na graduação de Filosofia, aqui não se tem em pauta o preparo de especialistas no conhecimento filosófico, no qual a informação, o domínio das categorias teóricas e das referências históricas da filosofia têm um lugar proeminente no desenvolvimento da atividade didática. Aqui está em pauta um exercício de reflexão, uma experiência dc subjetividade. Isso exige de nossa parte uma inflexão na prática do ensino de Filosofia, de modo que se possa levar o aluno do ensino médio ao exercício desse pensamento, à apreensão do sentido de sua existência, o que deve ser feito mediante um processo interativo do adolescente com o mundo de sua experiência existencial. Trata-se de ativar um diálogo do adolescente com o mundo de sua cultura e cóm a cultura de seu mundo histórico, levando em conta sua relação com a natureza, com a sociedade e com o universo simbólico em que vive subjetivamente, ainda que mediada pela conceituação. Esse diálogo supõe mediações, entre as quais se destacam aquelas exercidas pelo professor, pelo currículo e pelos conteúdos das disciplinas. É que esse processo interativo de formação não ocorre só no âmbito da F ilosofia, mas no âmbito de todas as disciplinas. Embora essa mediação formativa se enfatize no caso da Filosofia porque esta se coloca uma finalidade explícita, direta e imediata, tendo assim uma especificidade como intenção dc formação na medida em que procura subsidiar o sujeito edu-
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cando a ressignificar sua experiência do mundo, ela faz isso com a ajuda do conhecimento... Daí a necessidade, no plano da atividade didática, de abordar de forma interdisciplinar a multidisciplinaridade das ciências e de todas as demais formas de saber e de sentir. Por isso, as estratégias do ensino de Filosofía no curso médio precisam envolver necessariamente uma permanente interrelação com as demais disciplinas e/ou áreas que constituem o conjunto formativo nesse nível. Não só por pura estratégia didática, mas porque elas traduzem efetivamente vias de abordagem do real, elas são mediadoras da experiência que o adolescente está tendo do mundo. Esta experiência é viabilizada pelas múltiplas dimensões da sensibilidade do educando: • a sensibilidade histórica: vivendo a historicidade da vida humana • a sensibilidade política: vivendo as relações dc poder entre os
homens • a sensibilidade cósmica: pela qual vive sua integração ao mundo
natural • a sensibilidade biológica: pela qual vive sua condição de organismo
vivo • a sensibilidade intelectual: pela qual cxcrce sua capacidade epis-
têmica de conhecimento e reflexão
• a sensibilidade estctica: pela qual vivencia a vida pelos sentidos*
gerais • a sensibilidade ética: pela qual vivencia o valor do agir humano
A formação humana se dá pelo desenvolvimento e pelo aprimoramento dessas múltiplas formas da sensibilidade, o que
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·'' ■ # enriquece a experiência do educando que se forma, se humaniza. Com sua dimensão sintetizante, a filosofia pode e deve trabalhar conjuntamente com todas as disciplinas, articulando suas linguagens e explicitando significações parcialmente abordadas pelas ciências. Mas retomar a experiência de vida não é mover-se no inicdiatismo espontancísta da emocionalidade dos sujeitos singulares, como se fosse o cultivo de uma subjetividade intimista e sentimental. Por isso, o ensino de Filosofia para os estudantes do nível médio não pode limitar-se a uma sensibilização emotiva, apelando a uma espécie de sentimentalismo. Ocorre que o exercício da reflexão sobre os lemas da existência humana pressupõe a mediação de conceitos e categorias que não brotam espontaneamente. Os conceitos são necessários para o filosofar, lídimo exercício de pensamento rigoroso, que precisa superar toda forma de sensò comum. Daí a necessidade do recurso ao acervo cultural disponível da filosofia, que se encontra na produção filosófica. Eis a razão de ser do diálogo sistemático com os pensadores e especialistas, do recurso diuturno à sua produção escrita. Apenas, essa frequentação precisa ser feita ancorada na problematização da experiência dos educandos. Trata-se de um diálogo cuja temática transita numa articulação dialética entre o particular e o universal. A atividade didática com a Filosofia deve, pois, utilizar .materiais comuns, debater temas de interesse recíproco, explorar interfaces, relacionando as dimensões mais abstratas, necessárias para a compreensão do sentido do existir humano. Ciências e filosofia empenham-se em dar conta do sentido da condição humana, buscando mostrar que ela se configura como resultante de uma longa prática, histórica e social, que pressupõe
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o habitat natural da realidade física e biológica e formas peculiares de sensibilidade, dc expressão, de linguagens e simbolizações. Para assim atuar, o professor de Filosofia precisa exercitar u m permanente convívio com a prática efetiva dos professores das demais disciplinas, acompanhando o seu processo de ensino, os conteúdos trabalhados. Não para repeti-los, mas para explicitar suas implicações. Enquanto os professores de disciplinas do campo histórico-social procuram colocar os adolescentes diante do processo histórico que vai construindo a humanidade, o professor de Filosofia deve ajudar o aluno a decodificar a significação desse processo em sua totalidade significativa, mostrando o que é existir na temporalidade, discutindo a dialética do passado/ presente/futuro. Trata-se de mostrar ao jovem que ele vive inserido no processo temporal, que faz parte de uma longa história, cm cujo processo ele deve inserir-se para lhe dar continuidade.
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OensinodeFilosofíanaeducaçãoescolar brasileira:conquistasenovosdesafios Dalton ]osé A/ves 1
A origem do problema: ambigüidades e contradições da LDB Em 7 de julho de 2006, o Conselho Nacional de Educação (CNE) aprovou um parecer que exige a presença da Filosofía e da Sociologia como disciplinas obrigatórias no currículo do ensino médio das escolas públicas e privadas do Brasil. Homologado em 11 de agosto de 2006 pelo ministro da Educação, Femando Haddad 2,
1. Professor da Universidade Estadual do Norte Fluminense “D arcy Ribeiro ” (UENF). 2. Despacho do ministro publicado no Diário Oficial da Urtião de 14 de agosto de 2006. Na mesma linha deste parecer, a lei n° ti.683, de 2 de i'inho de 2008, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo presidente da República em exercício, José Alencar, altera o arligo 36 da lei n 9.394/96, no sentido de incluirá Filosofia e a Sociologia como disciplinas obrigatórias nos currículos do ensino médio.
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o parecer CNE/CEB n° 38/2006 altera especificamente a resolução CNE/CEB n° 3/98, em seu artigo 10°, § 2 o, suprimindo a alínea b e incluindo o § 3 o com a segu inte redação: “As propostas pedagó gicas das escolas deverão assegurar tratamento de componente disci plinar obrigatório à Filosofia e à Sociologia". Assim, procura sanar
a ambigüidade da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) — lei n° 9.394/96 —, a qual prescreve em seu artigo 36, § Io, inciso III, que ao final do ensino médio o educando deverá demonstrar, entre outras coisas, “domínio dos conhecimentos de ilosofia e de sociologia necessários ao exercício da cidadania”.
O problema era saber dc que tipo dc “domínio” s e tratava e quais “conhecimentos” de filosofia e de sociolog ia, mais exatamente, ele envolvia. Ainda: por que esteS eram “necessários”? Para o “exercí cio” de qual “cidadania”? Criticava -se na LDB a falta de clareza a respeito de como se deveria dar concretamente nas escolas o acesso aos “conhecimentos de filosofia e de sociologia”, se na forma de disciplina específica do currículo e com professor habilitado na
área ou se diluído em outras disciplinas como tema transversal, projetos multidisciplinares etc. Tal ambigüidade vinhá gerando interpretações contraditórias entre os gestores governamentais e das escolas, bem corno entre os próprios professores, alunos e a sociedade em geral, o que tendia a inviabilizar, na prática, uma presença efetiva da Filosofia nesse nível de ensino, ao contrário do que sc poderia imaginar à primeira vista (ALVES 2002). Sc no caso da Filosofia e da Sociologia a resolução CNE/ CEB n° 3/98 limitava-se a reproduzir o texto da LDB quase literalmente, sem dar maiores definições (ver alínea b); disciplinas como Educação Física e Arte vinham indicadas explicitamente como componentes curriculares obrigatórios (ver alínea a), o que pode ser visualizado no quadro abaixo (grifos meus):
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