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March 31, 2017 | Author: amareli222 | Category: N/A
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MASSAUD MOISÉS

PROSA 1

21ª Edição

MASSAUD MOISÉS

A Criação Literária PROSA-1 FÔRMAS

EM PROSA • 1

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O CONTO • A NOVELA • O ROMANi,CE

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Copyright © 1967 Massaud Moisds.

Dados Internacionais de Catalcgação na ?ublicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Moisés, Massaud, 1928A criação literáfia : prosa 1 / Massaud Moisés. -- 20. ed. -- São Paulo : Cultrix, 2006. .

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' '"Fl>rmas em ~- - O eonto - A ntlvela O romance" • Bibliografia. ISBN 978-85-\16-0436-2 1. Cont0 2. C)l:ação (Literé.ria, arri~tiça etc) 3. Ficção - Histór.f e crítica, 4. ~iteratura em Prosa 5. Romance - História é critica 1. Título.

05-8415

CDD-808.888 Índices para catálogo sistemüico: l. Prosa literária : Literatura

808.888 ·

O pri.neiro número à esquerda indica a edição, ou reedição, desta obra. A primeira dezena à direita indica o ano em que esta edição, ou reedição foi publicada. Edição

Ano

22-23-24-25-26-27-28

11-12-13-14-15-16-17 Direitos reservados

EDITORA PENSAMENTO-CULTRIX LTDA. Rua Dr. Mário Vicente, 368 - 04270-000 - São Paulo,.SP Fone: 2066-9000 - Fax: 2066-9008 E-mail: [email protected]. br http://www.pensamento-cultrix.com.br Foi feito o depósito legal.

Para meus filhos, Ana Cândida Beatriz Cláudia Maurício Rodrigo (

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Sumário

PREFÁCIO DA 1• EDIÇÃO ................................................................. 9 PREFÁCIO DA 9• EDIÇÃO ..................... ;................................. :......... 13 NOTA PRÉVIA ..................................................................................... 17 1. FÔRMAS EM PROSA ........................................................................... 19 ll. O CONTO .............................................................................................. 29 1. A Palavra "Conto", 29 / 2. Históri~ do Conto, 32 / 3. Conceito e Estrutura, 37 / As Unidades do Conto, 4t> / Peisonagens, 50 / Estrutura, 52 / Linguagem, 53 / Trama, 65 / Ponto de Vista, 66 / Tipos de Conto, 73 / Começo e Epilogo no Conto, 81 / Conto, Poesia e Teatro, 85 / 4. Conto e Cosmovisão, 88 / 5. "A Cartcmante", 90 / 6. "Questão de Familia", 95 / 7. "No Judim", 99 / 8. Gráfico do Conto, 101 m. A NOVELA ........................................................................................... 103 1. A Palavra "Novela", 103 / 2. Histó~ da Novela, 104 / 3. Conceito e Estrutura, 112 /Ação, 113 /Tempo, 115 /Espaço, 117 /Estrutura, 118 / Linguagem, 120 / Pemonagens, 125 / trama, 126 / Começo e Epilogo na Novela, 128 / Ponto de Vista, 133 / ~ipos de Novela, 134 / Novela, Epopéia e História, 142 / 4. Novela e cbmiovisão, 146 / 5. O Tempo e o Vento, 150 / 6. Gráfico da Novela, 1'4 IV. O ROMANc:E ........................................................................................ 157 1. A Palavra "Romance'', 157 / 2. lfistórico do Romance, 158 / 3. Conceito e Estrutura, 165 / Ação, 1721 / Espaço, 176 / Tempo, 180 / Tempo-Espaço, 185 / O Romance de T po Histórico, 187 / O Romance de Tempb Psicológico, 202 / P gens, 226 / Linguagem, 239 / Trama, 264 JCom.posição, 272 / Planos arrativ°' 279 / Ponto de Vista, 282 / Começo e Epilogo no Romance, 293 / Tipos de Romance, 297 / 4. O Romance e as Demais Fonnas de imento, 304 / Romance e 1

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~~.T-:1'~~~~342

ÍNDICE DE NOMES ............... ~............................................................. 346 ÍNDICE DE ASSUNfOS ..... ........ .......................................................... 353

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PREFÁCIO DA lfl EDIÇÃO 1

TODO UVRO tem sua históri4 A dàste, começa praticamente quando, em março de 1952, iniciei minha atfvidode docente nas Faculdades de Filosofia, Cibtcias e útras da U1*iversidade de São Paulo e da Universidade Mackenzie. Ao longo dos ~nos que medeiam entre aquela data e hoje, as questões mais candentes{da problemática literária foram objeto de exame no diálogo metódico d;:Jm os alunos, alguTJS dos quais atualmente empenhados na docência unifersitátia. A eles foram expostas, dentro·-e fora dtis aulas, as idéias que eii ia sedimentando. Naturalmente, alguTJS deles transpiraram minhas refldpes, antes que eu as reduzisse a termo... Mas em 1958, redigi um bre"fie estudo, espécie de balão de ensaio, acerca distinçies qual'itatiwi/f entre Conto, Novela e Román,. e publíqueil-0 no Andário da' F~e de Filosofia, Ciências e 1.etras, "Sedes Sapientiae~· da Ptmtiftctp Universidade Católica de São Paulo, correspondente a 1958/1959. Da /mesma forma procedi no tocante a um estudo relbtivo d po4Sia lírica e é*a, sob o titulo de Variações em torno do Épico e do LlriCOI estampado revista ''Anhembi'' de jidho de 1961. Mais odiante, rejutfdi-o e rep · uei-o, já agora com o titulo mudado para Qo Épico e Uo Lírico, na evista "Alfa", da Facatdade de Filosofia, Ciêntias e útfas de Maríli n.!! l, 1962. Nesse ínterim, já planejara e escrevera grMrde parte do, cap(núos co11Stantes neste livro. Um deles, amplamente retocado e o, apareceu na "Revista de útras" da Faculdade dê FiloStljia, ncias e útras de Assis, n11 5, 1964, sob o titulo de Condeito- e EStru do Conto, o qual, para integrar r(lfões. Depois de completá-la a presente obra, sofreu ali1uJa oJttrns 1

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com os capítulos relativos à notla, ao romanpe e à crítica, reescrevi ou retoquei todos os capítulos ante ri rmente redigidos. E dei ~orfinda a tarefa. Que dizer do que ai fica? e entre as ~rias observações que me acodem à lembrança, relaciono las mais objetivas e dir~tamente ligadas com o livro em si. Primeiro: nã~ sei ao certo como classificá-lo. Somente reconheço que não se trata dumt, teoria literária, pois meu propósito era outro, e mais modesto. Qual? SVriplesmente isto: um reexame das questões sempre abertas para quantqs já se abeiraram da crítica e da historiografia literária. Ou por outr~ repensar algl!UTlllS das bases conceituais e terminológicas em que se fu11lf4mentiim os estudos litertírios. Daí nasce o segundo ponto: que título a~buir a semelhante obra? De principio, chamei-a despretensiosamente l:Qiciação à Literatura, e com essa denominação cheguei a anunciá-la. Entiretanto, um amigo alertou-me para o fato de esse título dar margem a eqUtvocos, pois na verdade meu intuito não era iniciar o leitor na Literatura, isto é, na leitura das obras, mas, sim, nos estudos acerca da Litera~a, ou seja, nos problemas de crítica literária. Diante disso, acabei offando pelo nome de Introdução à Problemática da Literatura, o qua4 "'1 que pese ao caráter! pedan.tesco do vocábulo "problemática", meridianammte claro. Inclusive, o rótulo presta-se ainda para esclarfif:er a intenção principal que me orientou o espírito: oferecer ao leitor niíi(-esp«ia/izaá{), portanta aos estudantes e ao público em gera4 uma inic~ão, lilmQ intrQduçio ao exanie de alguns problemas fundamentais de teorlp e filosofia da Literatura. Esclarecer e orientar, eis o escopo duplo de$ livro. Em matéria de estll.dos literd,;.os, o progrefSO do sa~r se realiza por acúmulo e justaposição de inforipações: sob pena de incprrer em falhas interpretativas, ou repisar idéiaa,já jinnadas, o estudi.osa deve conhecer o saldo positivo da pesquisa reui,:ionatla com fS Q3SUntos do seu interesse. E a esse quantum acrescentaif, à semeJhan.ça dos q~ o precederam, os resultados da SJUJ própria invtstig1llfão. Foi, exatamente o que almejei neste livro: sem fazer tábua rasa~ conhecimento litertiÍrip alcançado até os nossos dias, pretendi ofereceflt. a minha proposta pasaa4 que enfeixa reflexões no geral vinculadas à ~xperiincia dqcente. De onde esta obra constituir-se num ensaio, ou se,fiuiserem,-nUllJ ensaio didático, voltado especialmente para a atividade IJiterária em vernáculo. Escusava lembrar que o livrt, não trata de.todos os assuntos, mas de alguns apenas, os considerados fundamentais e prem~s. Outros, cujo exame se torna necessário, delfuam por ora de ser discutidos visto escaparem dos limites em qµe ...romente apontava uma evidência. Além disso, o reparo da. va e dthnargem a uma interrogação: perante o progresso da biincia litet-ária dotr úl~s anos, continuaria em vigor a !· discordârn:m? Como tantcJ.s outros e#n tfll6lquer ttf"po, o presente livro nasceu da atividade docen,te. Natura~ pois, que ri.flita sedução por certo enfoque 1

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didático: ao declará-lo no prefácio da primeira edição,' eu não escondia que tinha plena consciência do fato. Sucede, no enta~o. que uma obra não desmerece por ter sido elaborada nos quadrantes universitários: o que conta, são as idéias, a novidade da espetulação, o arranjo novo do saber antigo, a revisão das idéias-feitas, etc. Negar valfriade a uma obra apenas porque decorrente da atividade universitária é recusar não poucos títulos hoje definitivamente incorporados à bibliografia dos estudos literários. Como, aliás, estão de acordo todos quantos 'lidam, honesta e lucidamente, com tais assuntos., , ' Escrito a partir das reflex~s expostas a ~stullantes ,e colegas, dentro e fora das aulas, o presente livro se foi montando precipuamente sobre os textos analisados e interpretados. A teoria da poesia épica, depreendi-a do exame de poemas antigos e modernos centrqdos numa visão heróica e cosmogônica do ser humano. ' A teoria da novela, ergui-a com base nas novelas d! cavalaria francesas, espanholas e vernáculas, e nas novelas sentimen~ais e picarescas, em cotejo com similares românticos e modernos. A teoria do conto veio da reflexão em torno de autores que cultivaram a fôrma, sobretudo a partir do século XIX. A teor'9 do romance, aprendik na leitura de ficcionistas que a essa modalida(le narrativa se dedicaram desde a segunda metade do século XVIII. As próprias distinções entrt: poesia e prosa tiveramlanáloga origem, assim como a idéia das ''forç~trl:i.es '·. A prova que rram teorizações pessoais reside no fato de alglllflQS (como, por exempld1 a do conto e a da novela) ainda suscitarem retif;ões polêmicas ou a discrepância opiniática: proviessem de autores al"nígenas, estariam aceitps e denunciada sua origem estrangeira. Nem "'11fll coisa nem outra: a jleitura de obras teóricas tão-somente alargou e ratificou concepções que se iam definindo desde os fins da década de 40. Basta lembraF que os t!SfJUemas gráficos do conto, novela e romance, qrite se incluíram no ensa'io pwblicado em 1958 e se reproduzem ·neste liwp desde a prilfU!ira ediç40, apenas estilizam um gráfico de forma anu;/H}ide (semelhante ao ri.fe representa a célula humana) empregado porf11imjá em 1951. Não fique sem registro q~ muitas das ]H,stulaçõq aparentemente ''heterodoxas'', camu.jladas sob,_ a ro1qJQgem didática para poderem singrar, vêm sendo corroboradas ~la critica ~ recente, ainda que situada em óptica diversa da minha e objetivando, no exame qa obra literária, outros horl:i.ontes e valores. A~ longo do livro se mencionam algumas dessas confirmações, com o exclusivo propósito de prevenir o leitor contra a idéia de que em nosso t!SJfilÇO c,ultural i impossí~l erigir teorizações válidas para além de seus limita naturais. · 1

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A presente e,dição sofreu nova revisão e atualização. Refundido e acrescido em vários pontos, o texto igualmente se dilatou com um cap{tulo a respeito do'fenômeno poético (publicado autonomamente, em 1977, sob o tftulo de A 'Criação Poética, e que agora integra o conjunto da obrà no lugar devido), e outros acerca das expressões hfbridas da criação literária, desti1Ullf.os a preencher uma laCMna. Outros assuntos, já referidos no prefácio da primeira edição, ainda permanecem à margem ou porque transbordem das fronteiras desta obra ou porque demandem tratamento extensiv'1, digno de um livro. A despeito das modificações introduzidas nesta e ~ anteriores tiragens, esta obra se conserva, nos seus fundamentos e. nk sua linha metodológica, a mesma da edição original: as mudanças e acréscimos visam a tomá-la cada vez mais definida em suas propostas, r não a modificá-la para que se adapte, afoita e distorcidamente, às te~rias do momento. Por motivo~ técnicos, a matéria dispõe-se agora em dois volumes que, embora aut15nomos, guardam o mesmo v{nculo de mútua dependência que os seus rap{tulos estabeleciam eRtre si até a edição precedente.

M.M.

Universidade dei São Paulo julho de 1975/jaheiro de 1978

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NOTA

PRWIA

Para a nova edição deste volwne, que engloba a parte referente à Prosa dA Criaçãp literária, o texto foi i.DJegralmente revisto e atualizado. Em decorrência,lvários acréscimos foram introduzidos, sem alterar-lhe, no entanto, a fisionpmia original. E por motivos técnicos, a matéria se distribui agora em dois tomos, a saber: A Criação literária. Prosa - 1, que enfeixa os seguintes capítulos: 1. Fôrmas em Prosa, II. O Conto, m. A Novela, IV. O Romance; e A Criação Literárk. Prosa - II, que encerra os seguintes capítulos: 1. A ! Prosa Poética, II. O Ensaio, ill. A Crônica, IV. O Teatro, V. Outras Expressões HibJJidas, VI. A Critica uterina. Embora autônomos, os dois tomos guardam o mesmo vínculo de mútua dependência que os capítulos estabeleciam entre si até a edição precedente. E com vist~ à melhor informação ~ leitor, reproduzem-se os prefácios à 1" e 9" di. desta obra. 1

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M.M.

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1 - Fôrmas

em Prosa

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Muito mais complexo que o problema das fônnas poéticas é o das fôrmas aifl prosa. Primeiro, porque não se trata apenas de descrevê-las, como fizemos com as primeiras, mas de diferençá-las. Segundo, porqne constitui problema ainda aberto e de notória atualidade. A caraçterização e o histórico das fôrmas poéticas pertencem à retórica tradicional, enquanto a distinção e a análise das fôrmas em p~a constituem questões da moderna teoria literária. Antes do século XVIII, quase tão-somente a poesia é que interessava aos teóric:ps da Literatura, que entendiam por poesia a lírica, a épica e o A tal ponto as fônnas em prosa ostentavam menos cotação que os poucos estudos acerca do romance anteriores àquela centúria via de regra tinham por objetivo subestimá-lo, considerá-lo inferipr à epopéia, e mesmo à tragédia e à historiografia, ou satirizá-lo: J.,anglois {dit Francan), Le Tombeau des Romans ou il est discouru. I: Contre les Roma~. ,II: Pour les Romans (1626), Charles Sorel, Antiroman ou l'Histofre du Berger Lysis (1631) e De la Conna~ance de'S Bons Livrl!s, ou Examen des Plusieurs Auteurs (1672), Cirano, Lettre contre un Liseur de Romans (1663), Boileau, Dialogue sur les Héros de Roman (1665), Pierre-Daniel Huet, Traité de ['Origine des Romans (1670), A. Furetiere, Le Roman BourgJois (1704), 1 anônimo, )oman Nouveau (1683), Len-

ela, 4 vok., Sanlander, Coosejo Superior de ~ Científicas, 1943, voL I, pp. tis e ss. 9 Claude Biemond e leim Veui!!t:, "Aflmssiev Propp", Uftba111re, n 2 45, fev. 1982, apud Michele Simonsen, op. cit.,-1>. 40, de que fonlm extraídas as informações acerca das origens do conto (pp. 35-40).

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Nesse longo lapso de tempo, que· durou, segundo uns, até o advento da imprensa, ou segundo outros, até o século XVII, o conto se enquadraria no âmbito do que André Jolles chamou de "formas simples", em cqmtraposição a "formas artísticas". Enquanto essas se caracte~ ''como linguagem própria de um indivíduo bafejado pelo " (Daniel Delas, · io a &tilfatca &trutxral, de Michael Riffaterre, tr. bras., São Paulo, Cultrix, 1973, 18). :

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brá-lo num romance, Eça escreveu uma 'Pbra que ·continua a ser essen~ialmen~ um conto,, ~m.hora os v~·s enxertos e ª. lentidão narrativa sug:rram o contrari~ Um confro . to entre os cf01s textos, que desse conta de seu c~r específi , reclamaria um longo estudo. Não sendo possível f~.·.·. -lo no esI.o deste livro, contentemo-nos com algumas indica"es.. , . "Civilização" gravita ~redor de · idéia oentl1tl: Jacinto, supercivilizado e rico, precoqemen.te env~do, bocejava de tédio infinito em seu pa1ácio f>e~ta, 1Rté que um dia resolve passar algum tempo em suac quinta de lforges, e lá, em meio à natureza, recupera seu gosto :le viver. ~do a tese de Rousseau e os romances campesinos d~Júlio Dinis, p conto se distende entre as páginas 79 e 118 da ediçio compulsa4a (Contos, Porto, Lello, 1946). Escassas 40 páginas, que poderiam reduzir-se, com proveito, à metade, senão menos, ~ o narra.d~ se ativesse ao cerne da situação e não se desviasse 1por atalhos ~ minúcias redundantes. Aceitemos, porém, o texto ctmo se apresienta e vejamos como se comporta em face dA Citlad, e as Serraa,, que tem, Ili\ edição de 1944, da mesma casa editomt 369 pá~. Para desdobrar quatro cJ.e,;enas de págltias, já de si abundantes, ein quase quatro centenas, S:QIPente fazend.4> interpolações, agregando observações, dando asas ~ia, demorando-se nas passagens doutrinais, enfim, encompridtndo o texto artificial e desnecessariamente. Alguns exemplos ba$rão para ~ uma id4ia do descompasso aritmético, que não aliji:ra, na sua estrutura, o conto original: eliminem-se os excertos e lo,p se perceb~ que o núcleo dramático de "Civilização" é o mesno dA Cidatj,e e as Serras. Dois momentos nítidos 114 distinguem nwna e noutra narrativa, demarcados pela ida do fidalgo Jacinto • Torges, em "Civilização'', e a Tormes, nA Cidade e as Serras. Enquanto naquele a viagem ocorre à página 93, nA Cidade e as Serras dá-se à página 164. Como Eça multiplicou 14 páginas em 164? Simplesmente inflando o texto: em "Civiliação' ', o natndor surpreende Jacinto aos 30 anos, portanto à beira:íle viver Seu momento de transformação ou momento de crise, ccino de -hábitq no universo do conto 13 ; nA Cidade e as Serras, não llÓ o imagina rnascido em Paris (o que evidencia a artificiosidade ~ tanto hiperb,ólica que preside o novo A

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13 A esse propósito, ver Mary l..QJl!iile Pratt, ''Tho Shm:t ,itocy: llro Long arul lhe Short of it", Poetics, Amsterdam, vol. 10, n• 2/3, junho 1981, IP· lli2-184.

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traçado narrativo, como se detém no avô, no pai e na infância de Jacinto. É que, nas palavras de um romancista atento à especificidade do seu ofício, ''uma personagem de romance jamais pode ser confinada nos limites estieitos do como, assim como a personagem do conto jamais pode ser alargada até as dimensões do romance sem qualquer alteração em sua natureza''. 14 E daí para a frente, toca de esnúuçar tudo, a começar pela Idéia que esse "Princípe da Orã-Ventu:ra"\concebera, seguida de estirados diálogos em torno de questões intelectuais e mundanas, neutras do ponto de vista dramático; enfim. arexaustiva pormenorização do dia-a-dia de Jacinto e Zé Fernandes: (agora sabemos o nome do narrador e amigo do herói) se espicha até um pouco menos da metade do volume. Se tais ingredientes, certo que adicionados com brilho e o inimitável estilo queiroskno, ~ carga dramática, constituindo episódios ou capítulos de um 100mplexo processo de interação social, estariam.os ahte algo difesente do conto. Mas não é o que sucede: as intetpolaÇões e e.x:cUDOs não constituem pólos dramáticos, mas enchimento verbal que apenas adia o instante dramaticamente significativo, quarub o hfllói abandona o pa1ácio, - situado na província portuguesa, no conto; e, no 202 de Champs Elysées, em Paris, nA que o outro é espaço--comdrama. Em "Civilização'', o espaço dramático situa-se em Torges; a estada no pa]ácio é mttro preparati\lb para a viagem ao local onde o herói, vivendo seu thomento pririiegiado, sofreria a decisiva mudança de caráter. ~''Questões ~ Familia", de Dalton Trevisan, adiante transcrito, observa-se p a casa do protagonista é secundária do prisma · . 'tico, · to a do sogro se apresenta tão cheia de .conflitos la.. tes que a r sendo palco da morte do herói. 43

Em "Missa do Galo'', ,pido ,se pa a na "sala da frente" daquela "casa assobradada c!p.'. 1R114. do Se ". Ali o . drama começa e tennina. Seus antece+n~ além secun~os, em poucas palavras se narram: "vim de Mangara 'ba para o Rio de Janeiro, meses antes, a estudar PJ*paratórios" Mesmo -que o narrador se detivesse a relatar-nos sua1vida pre , teria de fazê-lo como síntese dramática. Com isso, t unidade de iespaço continuaria a ser observada. Daí o dinamismo 4o lugar físiot> em que a açio decorre: o contista, como se manejasettuma.·cânuu;a:i c~ca, apenas se demora no cenário diretamente relacio$tdo com o dmma. Verse-á, mais adiante, quando *.tratar da .4,escrição,· de que modo funciona esse mecanismo de fllfoque geográfico. A unidade de ação co~, a unidade de espaço, e esta decorre da circunstânciaade apenas d4terminack> ambiente encerrar hnpottância dramáti~ Da ~ forma que uma única ação, por veicular conflito, ~ a narpttiva, wu único espaço serve-lhe de teatro. Pode-se dlur, co~te, que no conto se processa a determinação "1 espaço (e também do tempo como se verá), na medida em.que~ demais lijg~ (~ '2omentos) são vazios de dramaticidade. Do tont:ráfi.o, pe4 criação de vários pólos dramáticos, haveria desequih'brio interno, t? o conto perderia o seu caráter próprio para tomar~ esbQço da novela ou rQmance. Por outras palavras, da mesma fQ'llpla que há espa90-'sem-c4'ama e espaço-com-drama, no conto disÜ!llguem-se acf,)nteci~ntos-sem-drama e acontecimentos-com-drama:. estes é que,constituem a ação central da narrativa, enquanto ostoulros funci~ como satélites. A noção de espaço se~ imediaw.ente a de tempo. E aqui também se observa unidade. Com .efeito, 'PS aeOJJ,tecimentos narrados no conto podem dar-se eJ11 curto lapito de ta.npo: já que não interessam o passado e o futmro, o conflitp se passa em horas, ou dias. Se levam anos, de dua&!:uBJa: 1) ou trata-se dÚm embrião de romance ou novela, 2) ou o lqo tempo ~erido -.parece na forma de síntese dramática, que envolv~ habi~Imente, o passado da personagem. Em "Missa do Galo'', os antecedentes t:emporais estão postos de parte: apenas sabemos a iJlade dos protagonistas; sabemos que tudo ocorre mais ou :menos ·$lfm vinte e twês horas e meia-noite: "ouvi bater 01l74t horas, mas quase sem dar por elas, um acaso''. Tampouco interet;am os acon~imentios posteriores ao episódio: umas poucas referêocias, que vão suhlimhadas, não alterama unidade de tempo do CJPlllO, :rpemiq porque vagas, secundárias e destituídas de força llkamática: "Pelo Ano-Bom fui para

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Mangaratiba. Quando tomei ao Rio de Janeiro, em março, o escrivão tinha morrido de apoplexia. ConQeição morava no Engenho Novo, mas nem a visitei ,nem a encorptrei. Ouvi mais tarde que casara com o escrevente juramentado do marido''. O conto, voltado que ~tá para o centro nevrálgico da situação dramática, abstrai tudo quanto, na esfeia do tempo, encerra importância menor. Assim se explica que .O. seja estranha, ou escassamente compatível, a ''duração'' bergsQfÜana, ou a complexa intersecção de planos temporais, engendrada pela memória associativa, ou por outro expediente análogo. De onde a "objetividade" do conto: desprezando os desvios e atalh0$inarrativos, concentra-se no âmago da questão em fo~. Tal "objetividade", presente ainda em outros aspectos, mais adiante examinados, salta aos olhos com as três unidades, de ação, tempo e lugar. Assinale-se que fazem lembrar o teatro, notadamente o clássico, numa relação que será eircunstanciada num tópico específico. Às unidades referidas acrescente-se a de tom: os componentes da narrativa obedecem a uma estruturai;ão harmoniosa, com o mesmo e único escopo, o de provocar no lfitor uma só impressão, seja de pavor, piedade, ódio, simpatia, termiu"a, indiferença, etc., seja o seu contrário. Corresponde à "unidade de efeito ou de impressão", proposta por Poe na famosa resenha a Twice-Told Tales, de Nathaniel Hawthome, publicada em 1842, na Graham's Magazine. Não obstante posta em dúvida 'por vários cmicos, empenhados em ressaltar-lhe a limitação, um.a vez que nãe recobre todos os contos, 18 (a unidade de tom) continua indispensável para a melhor compreensão da estrutura do QOnto. É que,_ como apontamos nas preliminares ao estudo das fônnas em prosa, não se pode esperar que a teoria do conto englobe tQdos os espéQimes no gênero. Raciocinar com as exceções não inVJl]ida a teoria, salvo se o número delas prevalecer sobre o das Illl1J'3tivas que serviram para que a teoria se erguesse. Mas, nesse caso~ deixariam de ser exceções ... Ainda que se trate de uma ohviedade lpgica, oríticoahá qoo Dão atentam para ela. Compreend€t:;-se com mais segura.1ça e nitidez que no conto tudo há de eon~ ~· a impressãca única, quando nos L:!mbramos de. que ele º.pera, · a ação e Dit>.·. com os caracteres.. Estes, entendidos QOlllo persona . redon.d4 ·no gnu múimo de com-

18 V., por exemplo, Im Rcid, op. cit., p. 55. í:

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plexidade (ver o tópico referente às p~~ens, no capítulo destinado ao romance), situam-se fora da tiva curta, émbora seus protagonistas usuais não sljl confundam com meros bonecos de mola nas mãos do ficcionistt. Terldo em · a ~dade de impressão, ou respeitando-a espol!l.taneamente,I à medida q11e urde sua trama, o narrador dispõe de tm eapaço e k um tempo circunscritos para movimentar-se. Sua mitta não consiSte em criar seres vivos à nossa imagem e semelhançl, complexoSI e quiçá múltiplos, como pretende o romance, mas atuações de tonflito em que todos os leitores se espelhem. Somos todos eventwris personagens de conto, poucos de nós protagonizariam romances. O esforço inventivo do contista se dirige para a formulação de um drama em tomo de um sentimento, único e forte, a ;ponto de gerar uma impressão equivalente no leitor. A unidade de tom se efideneia pela·' 'tensão interna da trama narrativa'', 19 ou seja, pela funcionalidade de cada palavra no arranjo textual, de modo que nenhuma se possa retirar sem comprometer a obra em sua totalidade, c"'1 acrescentar sem trazer-lhe desequilíbrio à estrutura. Toda excrec::ência ou amplificação toma-se, assim, indesejável. Entretanto, in:Jt>õe-se distinguir: 1) a digressão que provém dum alargamento illamltivo ou do intuito de, fixando os olhos em ingredientes acessórios, distrair o leitor e adiar o clímax dramático; e 2) a digressãál resultante do empenho estilístico do narrador, ao dilatar o texto ,pelo acréscimo de not&ções plásticas, descritivas, a fim de propiciar ao leitor a contemplação de um momento de beleza verbal, não raro vibrante de estesia poética. Por paradoxal que se afigure, e> primeiro tipo não se justifica, pois escancara uma porta dramática que o narrador não pode invadir, sob pena de principiar uma :WStória paralEila e, com isso, dar origem a uma estrutura imprópria oo conto, ou nllesmo anômala, posto que obediente a algumas de suall matrizes básicas. Somente o segundo tipo, por não derivar para situações tangenciais, tem razão de ser no universo do conto. · · Um exemplo da primeim alternativa pode ser colhido no conto ''O Filho'', de Fialho de A11neida, história duma pobre camponesa que vai à estação de trem eiperar o filho· que regressaria do Brasil. Logo após introduzir-nos a ;rotagonista, o narrador se entretém por um instante na descrição de•outras pessOflS que também aguardam:

19 Júlio Cortázar, Último Round, 2• ed., México,. Siglo XXI Ed, 1970, p. 38.

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~ classe, e.Dite bagagens e cobertores de lã, dormem aDS montes, ra~ que vão tabalhar para o Alentejo, os varapaus de castanho atravessarJos, os tamanc., ao lado, os pés descal~s. e mn cheiro a lobo que se evola ~ suas ~ montanhesas. Nostalgicamente, alguns tasquinham lllil pão de milho horríwl, com sardinhas assadas entre as pedras.20

Na sala de éspera da

E a descrição segue nesse diapasão por mais wn longo parágrafo: a única justificativa para a digressão reside no fato de aqueles figurantes servirem de pano de fundo, paisagem social, no qual se estabelece o drama da campônia. Mas trata-se dwn pano de fundo inoperante do ângulo dramático, uma vez que não colabora para adensar o clima de tragérua que se avizinha. Ao contrário, faz supor outros conflitos, que o narrador, obviamente, não pode revolver sem ameaçar o equilíbrio do conto. Na verdade, pennite admitir que, por momentos, o narrador se alheia do caso da velha, delineado com realismo, como pedia o decálogo em moda no tempo, para se entregar, subjetivamente, à pintura ilum quadro melancólico: E os mais novos, quinze atJOS, dezesseis, clezoito anos, todos alegres daquela primeira migração às sementeiras de lá ~o, esses não param examinando tudo pelos cantos, espantados, desl.llllllbmála:>s, fulvos e bonitos como bez.errinhos de mama; e ei-los estacam diante dlJs relógios, dos aparelhos do telégrafo, a sala do restaurante cheia de flo:!JS, os chalés de hospedagem, e os pequenos jardins dos empregados da esljação... Dois ou três arranham nas bandurras fados chorosos,imeJ.odias locaia;dmna tristeza penetrante, em cujos balanços, gemidos, estriblflios, se aco~o murmúrio dolente das azenhas, vozes da serra, risob!s da romagem, balip do pulvilhal que entra no ovil, todas as indefinidas virg~ dessa saspcla terra da Beira, núcleo de força, e ainda agora a mais impeluta ara da família portuguesa. 21

O excurso provoca quebra da te:qsão narrativa, determinando um recomeço que pode aer prejudicial conforme seja a freqüência e volume das inserções: Q conto exterwo corre sempre o risco, mais do que o brev~ de alongar desnec~amente o âmbito da ação. P~r outro la~o, q,ualquer'.conto malo~. q quando d~tituído ~ ~n­ sao: formu\a-la e sustentk-la, n1.1p1 at:f!W11ento seno1de, constitm o desafio enffentarl9 por tqdo contista. ~ Ora, o ·narrador não esconde que conhece a situação aflitiva daqueles migrantes em ~usca de trabalho, suscetível, por isso, de 1

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20 e 21 Fialho de Almeida, O País das Uvas, Lisboa, Clássica, 1946, p.70.

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gerar outras narrativas, d.i:W'entcs da que nos .apresenta em ''O F~o' '. A digre6são ~ pll>de fimcioruJ ~mo autêntica paisagem social quando dramaticamellte neutra o~ macessivel 1lo olhar do narrador, como no seguinte t>asso, do cottto "José Matias", de Eça de Queirós: O sujeito de óculos de o~,,,. ~· cou . ?... Não ~·meu amigo. Talvez um parente rico, · que ll nos elitemirs, com o parentesco .· , qJmdo o já Óão itnportuna, nem corretamente coberto de compromete. O homem obeslit de carão '~o, dentro da vitfuia, é o Alves "Capão", que tem um jomàli onde desgraÇMlamente a ftl.osofia não abunda, e que se chama a "Piada". Que relação o-rprendia ao Matias? ... Não sei. Talvez se embebedassem llldl mesmas tuca4; talvez o José Matias ultimamente colaborasse na "Piada"; talvez debaixo daquela gon:lura e daquela literatura, ambas tão sórdidal( se abrigue ~ alma compassiva. 22

em que o desconhecimen~ do narrador:, ou o seu conhecimento relativo mas fechado, sela 1$1 definitivo o caso daqueles figurantes ocasionais, convocados, como ''extras'' cinematográficos, para uma ''tomada'' em que a sua ~ça se confun4isse com o próprio cenário. A segunda alternativa pG>de ser ilusb!ada com o seguinte parágrafo, do conto "Os Olhos ckbeada Um", lile Branquinho da Fonseca: Ao sair desembrulhou a iarta e começod a ler enquanto caminhava pelo corredor abaixo. E parou. E 'iroltou para tráà Foi para o quarto de dormir, fechou a porta à chave, e cori:leçou, serenamente, a ler tudb desde o princípio. Pela janela entrava uma noite muito calma, tom estrelas e luar. Ouviam-se as rãs a coaxar e a água a cafr no tanque do jardim. Pedro, imóvel, sentado diante daqueles papéis amarelbs, com o olhat parado, lia: 23 l

onde o trecho desde "Pelaf.ºanela" até "jardim" constitui pausa para contemplar paisagem, dispensável :Como sugestão de atmosfera, adiamento do desenlac , e admissív~l porque neutro do ponto de vista dramático (mera deicrição poética de ambiente). O conto monta-se, portaito, à volta ~ uma só idéia ou imagem da vida, desprezando os ac~rios e, via ,de regra, considerando as personagens apenas como íhstrutnentos , da ação. Uma narrativa bem resolvida obedece est>
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